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GOMES DE MATOS, F Applied peace linguistics: a New Frontier for TESOLers. Braz-Tesol Newslever, jun. 2008. GOMES DE MATOS, F O direito comunicativo fundamental. Revista ‘Ave Maria. Séo Paulo, jun. 2008. p. 19. wavwavernatiainternet, com.br LADO, Robert. Linguistics across cultures. Ann Arbor, University of ‘Michigan Press, 1967. NEVES, Maria Helena de Moura. Gramidtica de usos do portugués. Sio Paulo: Editora da UNESP, 2002. Katia Maria Santos Mota as diferencas, resgatando o coletivo = novas perspectivas multiculturais no ensino de linguas estrangeiras No man isan island, entire of itself every man is a piece of the continent, 1 part of the main; [..] any man’s death diminishes ‘me, becauge I ar involved in mankind; and therefore never send to know for ‘whom the bel tolls; it tolls for thee. John Donne Inicio este texto lembrando-me de dois fatos que observei quando me encontrava no metr6: no primeiro, em Boston, ao ler mensagens co- merciais expostas nos letreiros do vagio, percebi que muitas delas, escri- tas em espanhol, tinham sido pichadas em tinta spray e sobrepostas por uma outra que dizia, em letras bem marcantes, Speak English; no segun- do, em Santiago do Chile, uma mensagem comercial sobre um curso de inglés dizia Aprenda inglés, pero sin perder sw latinidad e, mais abaixo, 0 texto explicava que, ao aprender inglés naquela escola, 0 aluno nao dei xaria de ser um latino, mas seria um latino mais preparada profissional: mente, Penso que esses dois exemplos ilustram muito bem as representa: gbes sociais sobre a relacdo linguagem/identidade social. No primeito, alguém demonstra claramente sua indignagéo ao perceber a legitimida de do uso do espanol em um ambiente piblico de uma cidade norte- americana, A sua reagéo revela nfo s6 a crenca € 0 desejo de que o inglés seja a Gnica lingua oficial, mas, considerando a realidade local da cres- cente onda xenofébica, configura-se como um ato politico ao afirmar que a presenca de hispanicos no pals ¢ ameacadora ao “bem-estar" da comunidade dominante. No segundo exemplo, percebe-se que alingua~ gem do texto comercial tenta convencer o piblico da possibilidade de se aprender inglés, conciliando o interesse de investimento profissional com a preservacdo da sua identidade latina. Parece que, nesse caso, a escola pretende dar visibilidade a uma posicéo ideolégica contra a homoge- neizacSo de identidades, diante da globalizacao. Essa breve introducao enfoca a linguagem néo 56 como capital cultural, mas também como capital simbélico, de acordo com as dina micas de relagées de poder que trazem prestigio politico e hierarquia social. As préticaé discursivas atuam, entdo, como produto da relagio entre um conjunto de “hébitos lingifsticos’, adquiricios nos diversos carn- pos sociais, ¢ um “mercado lingafstico”, ideologicamente determinado, que posiciona hierarquicamente as diferentes formas do sujeito se ex pressar. Os valores, crengas ¢ atituces em referencia as diversas linguas situam-se, assim, de acordo com as regras hegeménicas estabelecidas por esse “mercado” (BOURDIEU, 1994). Nessa concepgo, em ambos os ca- sos aqui narrados, a lingua inglesa est caracterizada como detentora do poder em uma situagéo de bilingiismo com o espanhol. Ocorre, entre- tanto, que podemos ter dois diferentes caminhos de andlise: no exemplo de Boston, estabelece-se claramente uma situagao de competitividade entre as duas linguas e a pretensa impossibilidade de coexisténcia, carac- terizando uma situagio de bilingtiismo subtrativo; no exemplo de Santi- ago, apresenta-se uma intencao de coexisténcia entre as duas linguas (a Ifmgua inglesa se torna um capital cultural de investimento social), ca- racterizando uma situacdo de bilingUismo aditivo’. Nesse sentido, 0 bilinguismo subtrativo € vista como resultado de uma ideologia cultural- mente assimilacionista, que reforga atitudes “lingiicistas™, em apoio a0 posicionamento imperialista da lingua inglesa; enquanto que o bilingiismo aditivo se caracteriza por uma ideologia libertadora, sécio interacionista, culturalmente sensfvel, que delega “empoderamento” aos grupos socialmente excluidos. Essas duas concepgées se cor desenvolvimento deste texto, no qual pretendo dialogar sobre os contetidos culturais que circulam nas priticas pedagégicas de linguas estrangeiras. Le- vanto as seguintes quest6es: a) De que forma os professores de LE (Lingua Estrangeira) provocam a exclusio das identidades dos alunos, rejeitando ‘suas tradigées culturais, seguindo uma abordagem assimilacionista?b) Como ‘censinode LE pode incluir as culturas locais, ou outras culturas silenciad: contribuindo para a formacéo de uma sociedade mais solidéria? iguram como o pontode partida parao Em busca de uma vinculagao lingua e cultura no ensino de LE Fazendo uma retrospectiva das metodologias de ensino de LE, em referéncia aos conteddos culturais, lembro-me que no inicio da década de 70, quando comecei s ensinar inglés, o método audiolingual estava, entdo, no auge ¢ a abordagem cultural que prevalecia era essencialmen te anglo-conformista, na qual os livros ilustravam o mundo ideal da cul- tura WASP (White Anglo Saxon Protestant), o professor enfatizava o trei namento de estruturas lingisticas rigidas (sem qualquer preocupacio com as variagbes lingtifsticas sociais ou regionais) e a imitacgo de pa deBes foncl6gicas ‘corretos” visando a alcangar a prontincia ideal (native- like). As praticas pedagégicas levavam, assim, a apropriacio de uma nova ‘dentidade, inculcada por valores de superioridade cultural, A sala de aula transformava-se em uma ilha cultural de imersio no mundo do estrangeiro, no sonho de “civilidade” do colonizador, Os alunos eram es- Umulados a substituir seus nomes por equivalentes em ingles, aimitar os discursos dos personagens dos livros ou dos filmes didéticos; enfim, a transferir-se, em viagens imagindrias ou reais, para os te:tiuGrios mals “abencoados” do hemisfério norte Sendo porta-vozes dessa pedagogia da assimilagio, em plena épo- ca de ditaduras militares na América Latina ¢ da crescente onda de antiamericanismo em decorréncia dos movimentos estudantis da déca- da de 60, os professores de inglés eram considerados os mais alienados e reacionarios de qualquer instituicéo de ensino. Essa imagem permanece ainda, em tempos recentes, em muitos espacos de ensino, conforme mos- tra Moita Lopes (1996) em pesquisa realizada com 102 professores de inglés, na qual o autor elabora um quadro comparativo (sobre as opini- Ges dos informantes em referéncia as caracterfsticas do povo brasileiro e 3s do americano) que vem demonstrar, claramente, a forte presenca de esterestipos culturais que estimulam atitudes discriminatérias a favor 4a considerada superioridade do povo americano, Posicionam-se, assim, 08 professores como veiculos de manipulagéo ideolégica da cultura es. trangeira, desconhecendo a possibilidade de um trabalho de enriqueci- mento cultural, pois, segundo o autor, “a aprendizagem de uma LE, 20 Contrétio do que podem pensar alguns, fomnece talvez o material primeito para tal entendimento de si mesmo e de sua propria cultura, j4 que faci- lita o distanciamento cxftico através da aproximagio com uma outra cultura". (MOITA LOPES, 1996, p. 43) A pattir das conquistas politicas em decorréncia dos movimentos, sociais em prol dos direitos civis das minorias norte-americanas, 0s dis- cursos educacionais nos Estados Unidos, aos poucos, contribuftam para uma revisio critica da ideologia da assimilagéo — que sustentava a visio de que a formacio cultural do pafs era decorrente de um efeito melting pot em que as diversas culturas foram “misturadas” para caracterizar 0 ideal democrético da nago ~ € passaram a incorporar a ideologia do pluralismo cultural, ao projetar a imagem utépica da nagéo como um ‘mosaico multifacetado em diversas culturas que convivem harmoniosa- mente. Nessa orientagio, ao passarmos a adotar o método comunicati- vo no ensino de LE, amplamente divulgado no Brasil na década de £0, 0 enfoque sociolingiistico mudou de direcionamento, na tentativa de enfocar simulag6es de situagées comunicativas reais, demarcando a pre- senga de varidveis lingtiisticas a depender da contextwalizacéo dos even- tos de fala, Os livros didaticos, ento, comecaram a apresentar ilustra- g6es de culturas marginalizadas eos textos auténticos a representar vo- zesde identidades sociais antes exclufdas. O rétulo do multiculturalismo comeca a surgir através de uma pedagogia da tolerdncia, na qual os gru- posditos silenciados passam a ter alguma visiblidade em espagos secun- dérios dos livros, em atividades consideradas come curiosidades cultu- rais, ou ressaltando o caréter exético das culturas até entio vistas como *primitivas" Reconhecemos, entretanto, que esses “avangos culturais" ainda so bem incipientes, pois em nada interferem na formagao da consciéncia cxftica de cidadania, pois, como explica Santomé (1995), os contetidos culturais, na verdade, so geralmente tratados na escola como um “cur riculo turfstico" que, segundo o autor, se caracteriza em cinco tipos de enfoque: a) a trivializagfo ~ os contetidos culturais dos grupos no majoritérios s40 abordados com superficialidade e banalidade, come sendo aspectos turfsticos: costumes alimentares, folclore, formas de vestir, ritu- ais festivos etc.; b) osouvenir—decorar a sala com objetos multiculturais, ow apresentar uma miisica de alguma tradigéo cultural desconhecida, como atividade extra do semestre, ou planejar umas poucas tarefas esco- lates lembrando a existéncia dessas culturas, sem qualquer preocupagéo em implementar condic6es de produgtio de uma leitura crftica;¢) cele- brag6es étnicas - quando o estudo da diversidade cultural néo faz parte do cotidiano da escola, mas, de forma descontextualizada do curricula central, celebra-se, por exemplo, o dia do indio; d) a estereotipagem — préticas discursivas que inculcam esteredtipos culturais; e) a tergiversa- do’ — quando se enquadra como naturais as situagdes de opressao, tipo “isso sempre houve porque faz parte da natureza humana" ou néo con- frontando a questo, dando respostas evasivas. Concluimos, ento, quea presenca figurativa de elementos culturais nfo assegura, ou pode, até mesmo, distorcer os prinefpios auténticos do movimento multiculturalista Aabordagem multiculturalista’ e sua aplicac&o no ensino de LE Aeducagao multicultural pretende recontextualizar o papel politi- co da escola, discutindo a adogao de novos curriculos multirreferenciais que venham a incorporar discursos historicamente silenciados e a despre- zar aqueles potencialmente silenciadores. Em outras palavras, a pedago- gia multicultural acredita na valorizacdo da voz do sujeito/ professor edo sujeito/estudante, assim como no desenvolvimento da sensibilidade de escuta as miiltiplas outras vozes, desconstruindo a polarizacdo dos sabe- res ¢ assumindo, através do dialogismo, uma perspectiva de construgéo doconhecimento de forma dialética e multidimensional. Dois conceitos introdutérios precisam ser definidos para que melhor se estabeleca o campo de aco do multiculturalismo: cultura e identidade. O primeiro comporta, sem dvida, uma larga abrangéncia de referénci- 28; prefiro, no entanto, assinalar aquela que define a palavra “cultura” na perspectiva antropolégica, a qual incorpora os distintos modos de vida, valores e significados compartilhados por diferentes grupos em determi- nados periodos histéricos. Enfatiza a sua dimensdo simbélica, minimizando o seu caréter essencialista (o que ela é), mas reforgando 0 caréter performativo (o que ela faz), como os grupos constroem e trans- mitem suas préticas sociais. Quanto ao segundo conceito, o de identida- de, reconheco a dificuldade de conciliar suas méltiplas interpretacoes, mas tessalto aqui os valores de pertencimento e interacao social; nesse sentido, retomo a colocagio de Weeks, citado em Cavalcanti (2001, .107], que define “identidade” como “aquilo que temos em comum com algumas pessoas e o que nos diferencia de outras. E uma mescla de posicionamento individual com relac6es sociaist...) Cada um de nés vive ‘uma variedade de identidades potencialmente contraditérias”. Em ou- tras palavras, de acordo com Woodward (2000, p. 38), Tor um lado, a identidade € vista como tendo algum “nticleo essencial" que distinguiria um grupo de outro. Por outro, aiden- tidade € vista como “contingente’; isto é, como o produto de uma intersecclo de diferentes componentes, de discursos po- Iiticos e culturais e de histéria particulares. Ressalta-se, assim, a natureza multifacetada de nossas identida- des, a énfase na negociacdo de sentidos, na mutabilidade de papéis ¢ na continuidade do processo de construgao de identidades. O discurso e as identidades sociais sdo historicamente construidos; os significados sao produzides pelos interlocutores em uma rela¢do dialégica (BAKHTIN, 1981; HALL, 1990; FOUCAULT, 2002). Otermo “multiculturalismo”, que xessalta a inclusdo da diversidade ‘40 bem-estar da humanidade, cultural como decisio politica essencial p € usado, na verdade, de uma forma bastante polissémica, pois, de acor do com McLaren (2000), abrange posturas ideol6gicas que se configu- rem em quatro tendéncias: a) conservadora ~ serve apenas como ponto de partida, mas a meta é a assimilagio, a homogeneizagio; b) huma- nista liberal —atende grupos socialmente marginalizados, através de pro- jet0s especificos, no sentido de promover a igualdade intelectual; c)libe- ral de esquerda fortalece as identidades culturais marginalizadas em movimentos separatistas de exclusio da cultura dominante; d) critico/ tevolucionsrio— busca o comprometimento com uma politica critica de justica social a partir de uma agenda de transformagéo. Podemos compreender melhor as tendéncias apresentadas por ‘Mclaren através, por exemplo, da andlise de livros didéticos, Em uma visio conservadors, encontramos textos ¢ imagens ilusteativas de diversas culturas que circulam nas unidades pedagégicas, mas o foco principal da ligdo permanece sendo aqueles valores culturais socialmente privilegiados; dessa forma, a cultura periférica serve como transicdo para a cultura cen- tral, como forma “camuflada’ de incluso cultural. Em uma visio consi- derada ‘humanista liberal", os materiais pedagégicos se destinam & edu. cago de classes populares no sentido de promover a incluso social, mas, na verdade, eles reforgam a realidade social vigente em que os discursos mantém as relagdes de poder, como acontece, por exemplo, em vérios ‘materiais de ensino de inglés exclusivamente direcionados a trabalhadores imigtantes nos Estados Unidos. im uma visio liberal de esquerda, 0 pro- gtama de ensino seleciona textos que apresentam, exclusivamente, con- tetidos culturais do grupo subalterno ao qual os alunos pertencem; a in- tengo pode parecer como de valorizacio da cultura de origem, mas, im- plicitamente, representa uma politica de segregacio, de determinismo so- lal, preservando, na verdade, uma perspectiva monoculturalista que im- ede o acesso as competéncias profissionais da classe dominante. Ficamos, assim, com a perspectiva critica/revolucionéria que seria aquela q compromete com o papel transformador da escola, O modelo de educagio multicultural, seguindo a visao critica/revo- Iucionéria, incorpora, segundo Banks (1998, p. 28), quatro campos de aco com objetivos espectficos: a) integragao de contetdos -estimular ainser fo de contetidos e materiais didétices que utlizem discursos contex: tualizados na diversidade cultural; b) construcéo do conhecimento— aju- dar oalunoa entender, investigar e analisar as formas como as disciplinas escolares tem sido orientadas dentro de pressupostos teéricos, esquemas referenciais, perspectivas e vieses que fazem parte de determinadas traci- «Ges culturais que determinam a construcéo do conhecimento; c) pedago- gia da eqlidade - modificar os padroes de ensino, de observacéo e avalia clo do processo escolar no sentido de facilitar a aprendizagem de estudan- tes provenientes de grupos subalternizados sacialmente; d) empoderarmento dacultura escolar promover a eqitidade educacional, redimensionandoa distribuicSo do poder na estrutura organizacional da escola, incluindo a participagdo efetiva de todos os membios da comunidade escolar Ainfluéncia de Freire no ensino de inglés como segunda lingua ‘Appattir da década de 80, com a crescente onda migrat6ria prove- niente da América Latina e do Sudeste Asiatico, as escolas norte-ameri- canas passaram a conviver com uma populagio acentuadamente multilingde e multicultural. Diversos projetos pedagégicos fundamen: tam-se, entdo, na Pedagogia Radical, através do seu representante mé- ximo, Henry Giroux, o qual se propée a desenvolver uma politica cultu- ral baseada nas idéias de Bakhtin e de Freire. Giroux acredita que a es- cola deve analisar eriticamente a produgio e transformagdo dos proces- sos culturais a partir de trés discursos essenciais: o da produgio, 0 do texto eo das culturas vivas. No primeiro, é necessério que se compreen- da a insercGo da escola na realidade social e que se veja criticamente como a sociedade determina e controla’a atuagdo da escola para que esta sirva aos interesses da classe dominante. No discurso do texto, os educadores devem, durante todo o processo educacional, estar atentos para os significados das formas culturais que circulam nas atividades escolates; outras vozes necessitam ser ouvidas para que os alunos tenham. maior diversidade de formas de conhecimento. E, finalmente, énodis- curso das culturas vivas que o educador e o educando conseguem refletir sobre suas historias, seus relatos pessoais, a multiplicidade de identida- des, suas possibilidades de transformagao social (GIROUX, 1986). Rela: to, a seguir, exemplos de caminhos freireanos adatados por trés experi- ancias pedagégicas aqui selecionadas. Peterson (1991) descreve 0 projeto de alfabetizacio em inglés como segunda lingua, em uma escola bilingte de Milwaukee (Estado de Wisconsin), no qual os alunos so encorajados a falar dos seus conflitos, das suas condig6es de opressao social, O autor relata, por exemplo, que diante da fala de um aluno sobre a ocorréncia de uma greve geral local, toda a classe se interessou em discutir a questo da greve. Foi sugerido, entéo, na aula de inglés, que se fizessem entrevistas com os trabalhadores para co: nhecer suas reivindicagées. No momento em que um trabalhador Fala so- bre seu saldrio, uma aluna se manifesta dizendo: ~ That's more money than ‘my mont makes.° Diante da voz da estudante, a turma se posicionou contré- ria greve e foi proposto, ento, um projeto pedagégico sobre as condicbes reais de trabalho das familias dos estudantes. Nessa abordagem, ressalta- se a importancia politica da voz do estudante, além de mostrar como 0 cenfoque de um contflito local traz.a oportunidade de o aluno querer inves- tigar sua prépria realidade de vida, Esse mesmo projeto trabalha com a produco da escrita em inglés, em uma perspectiva interdisciplinat, pro- pondo, por exemplo, a reescrita dle textos do livro de Ciéncias Sociais, a pattirda insercSo de novos contetidos pesquisados pela turma. As ativida- desde leitura em inglés, muitas vezes, passam a ser baseadas em pequenos textos auténticos, consideracis altamente polémicos, como, por exemplo, um trecho de um discurso do Bispo Desmond Tu Tu, que diz: ‘When the missionaries first came to Africa they had bibles and we had the land. They said, ‘Let us pray’. We closed our eyes. When we opened them we had the bibles and they had the land” ‘Uma outra experincia interessante €a andlise de livros didaticos de inglés, em uma classe de imigrantes trabalhadores de baixa renda, apre- sentada por Auerbach & Burgess (1987), na qual identificam varios textos com uma forte imposi¢o de valores culturais distantes da realidade social dos alunos, tais como: a) um didlogo que descreve um dia livre do estudan- te em um clube de golfe; b) um texto que ilustra, como uma das vanta~ ¢gens do telefone, a busca de informacio sobre as condig6es climsticas para se praticar esqui; ) uma conversa no telefone com um médico particular sobre um problema de satide; d) um texto sobre aluguel de iméveis que descreve uma lista de deveres do inquilino, sem mencionar qualquer refe~ séncia sobre seus direitos. Nessa mesma pesquisa, os autores apontam que as diferengas culturais so, muitas vezes, usadas como pretextos para si- tuagées de humor, de forma desrespeitosa & condicdo de vida do imigran- te, como acontece, por exemplo, no seguinte didlogo que mostra um imi- grante asidtico em uma agéncia de empregos. ~ What did you do in Laos? ~ I taught College for 15 years. I was Deputy, Minister of Education for 10 years, and then. =I see, Can you cook Chinese food?” Uma terceira experiéncia de ensino de inglés se passa com alunos imigrantes trabalhadores rurais, na qual Thomas Graman (1988) questi- ona também o contetido dos textos didéticos, mas critica psincipalmente © uso de estratégias mecinicas que reforcam a pura automatizacio de estruturas formais da lingua, sem enfatizar a produgéo de signiticados. Seguindo a postura de Freire, o autor acredita que a sala de aula nado deveria ser palco de treinamento de vozes prescritas para enfrentar a realidade exterior do mundo, mas, ao contrério, deveria ser considerada como o microcosmo do préprio mundo real, no qual os estudantes e pro- fessores fossem estimulados a compartilhar suas questdes € procurar possiveis solucdes. © autor acredita que a principal contribuicéo da pe- dagogia de Freire para o ensino de inglés como segunda lingua éa énfase dada no aprender a pensar por si proprio e a expressat suas idéias em linguagem auténtica. © aluno deve perder o medo de falar dos seus con- flitos, das suas opinides, fazendo com que a sala de aula se torne um ambiente favordvel & livre expresso de pensamento, como assegura Graman (1988, p. 448), a0-dizer [J by applying Freire’s pedagogy tolearning, students and teachers have the opportunity and the means to do more than learn language: they can win the freedom to think and act as critically conscious beings. This is the humanizing process of education.” Ensino de LE, inserindo a multiculturalidade em projetos pedagégicos O mundo pés-moderno traz a quebra de fronteiras geopréficas, a partir da consolidacdo da “conexdo planetéria® decorrente das redes midiéticas. Processos de desterritorializacdo e consegiientes reterrito- cultural, implicam na organizagao de “territ6rios culturalmente mais hibridos, no sentido rializagdes, moldadas por uma dindmica simbélice de permitirem/facilitarem o didlogo intercultural, quem sabe até possi- bilitando a emergéncia de novas formas, multiplas, de identificacao* {HAESBAERT, 2002, p. 41). A globalizagao, trazendo a pretensao de pro- mover a homogeneidade cultural, vem também provocando uma crise deidentidade nos nfveis global, local e pessoal, causando movimentos de sesisténcia, de revitalizacao de culturas silenciadas, de afirmagao de ele- mentos multiculturais. Nesse contexto, as linguas consideradas internacionais, como o inglés e 0 espanhol, ao adquirirem o status de Iinguas francas, v8o per- dendo as caracteristicas culturais de vinculagao as identidades nacionais dos falantes nativos” ¢, aos poucos, vio assumindo a tendéncia para a hibridizagao cultural, Justifica-se, assim, que o ensino dessas linguas as- suma, primordialmente, o objetivo instrumental de ser vefculo de comu- nicagao internacional (nas relagGes pessoais ¢ transacionais), de afirma- do politica das identidades dos aprendizes, de exploracdo de outros ter- rit6rios culturais. Reforgando o caréter instrumental das Ifnguas inter- nacionais, McKay (2000, p. 7-8) aponta trés aspectos relevantes entre cultura e ingua internacional, baseando-se em Smith: a) os aprendizes