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ESCOLA DE MINAS
OURO PRETO
2014
TÚLLIO SOUZA DE JESUS
OURO PRETO
2014
ii
J585r Jesus, Túllio Souza de.
Reflexões a respeito das relações homem x natureza x tecnologia: Os
riscos que o homem cria e vivencia [manuscrito] / Túllio Souza de Jesus.
– 2014.
x, 58f. : il., color., graf., tab.
CDU: 658.5
Banca Examinadora
________________________________________________
Prof. Msc.Bruna de Fátima Pedrosa Guedes Flausinio
Universidade Federal de Ouro Preto
Orientadora
__________________________________________________
Prof. Dr. Davi das Chagas Neves
Universidade Federal de Ouro Preto
Examinador
________________________________________________
Prof. Msc. Tays Torres Ribeiro Chagas
Universidade Federal de Ouro Preto
Examinadora
iii
Aos meus pais, acima de tudo.
v
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais Aderbal e Maria Aparecida pelo apoio e reconhecimento de minhas
conquistas.
À minha orientadora, professora Msc. Bruna de Fátima Pedrosa Guedes Flausinio, pela
oportunidade de expandir meus conhecimentos além do conhecimento técnico na minha
formação como engenheiro.
Aos examinadores da banca, Prof. Dr. Davi das Chagas Neves e Prof. Msc. Tays Torres
Ribeiro Chagas pela oportunidade de expor meu trabalho.
vi
RESUMO
vii
ABSTRACT
For many years the man was related in various ways with nature and science that guides
their concepts. For many centuries nature was seen as an extension of man, but at a certain
moment that relationship fell apart and humans began to subdue it. With the industrial
revolution, the pace quickened to a path of no return for the total destruction of the
environment and human life in the future. Given this perspective, the environmental
movement of the 1960s and the subsequent environmental conferences came to show the
need to rethink human activity on the planet. There comes the need for an ethic of
responsibility, proposed by the German philosopher Hans Jonas that is designed to make
this society responsible for the existence of the future generation. In addition, the
technological development of the twentieth century proves that developed a risk society
that lives under the threat of devastating and catastrophic hazards. For this we introduce
some emblematic nuclear accidents in history involving radioactive emissions and
consequences that remain for many decades.
viii
LISTA DE FIGURAS
ix
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO................................................................................... 11
x
CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO
11
Já se tem certeza de que os riscos tecnológicos podem ter consequências sociais,
ambientais, econômicas etc. Os seus efeitos respingam de uma forma ou de outra no
próprio homem.
Um fator que também requer destaque nessa questão é a dinâmica dessa relação ao
longo do tempo. Ora, o conhecimento das ciências e das técnicas acabou por colocar a
natureza em um plano abaixo do que estava o homem. Este, por sua vez, passou a subjugá-
la a seu bel prazer. Aos poucos foram sendo criadas formas e mais formas de modificar e
utilizar os recursos naturais em detrimento da instauração de uma nova modernidade, que
foi se liquefazendo. De acordo com Bauman (2003), o mundo vive uma modernidade
líquida, ou seja, uma modernidade imediata que é leve, líquida, fluida e infinitamente
dinâmica.
12
1.1 Objetivos
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doutrinas do progresso tecnológico. Além disso, apresenta a importância dos acidentes
radioativos ocorridos nos últimos anos que marcaram a história da humanidade, bem como
a necessidade de se aprender com os erros do passado para evitar no futuro, novos
acontecimentos semelhantes.
14
CAPÍTULO 2 – A ORIGEM DA CIÊNCIA E AS PRIMEIRAS CONCEPÇÕES
CIENTÍFICAS DA RELAÇÃO HOMEM - NATUREZA
É sabido que a relação homem versus natureza não é uma ciência contemporânea,
ela vem se estabelecendo do estudo racional através de séculos da existência da vida
humana no planeta terra. Ainda que o homem tenha acordado tardiamente para o problema
no ritmo do desenvolvimento e crescimento econômico ditado pelo passar dos anos, é de
grande valia apresentar o modo como essa relação estabeleceu-se nas diversas passagens
da humanidade. O “Movimento ambiental”, nascido apenas no século passado, por volta
dos meados dos anos 1960 apresenta-se ao mundo como o divisor de comportamentos
entre os tecnocratas conservadores do progresso e os catastrofistas, que “anunciavam o
apocalipse para o dia seguinte caso o crescimento demográfico e econômico não fosse
imediatamente estagnado” (SACHS, 2002, p.51). Esse movimento veio aflorar o problema
da poluição ambiental e a busca por um novo tipo de desenvolvimento, pautado na
sustentabilidade, uma espécie de terceira via média entre o economismo arrogante e o
fundamentalismo ecológico.
Ainda que o assunto seja recente, o sonho do equilíbrio dessa relação parte de
épocas remotas, principalmente da essência de entender, em sua complexidade, o
significado de recurso natural e o controle sobre este. Ao analisar os períodos vividos pelo
ser humano, observam-se diferentes concepções, pois os processos produtivos foram se
modificando ditando a forma como o equilíbrio deixou de existir. Antes tudo era para
sobrevivência, sem excessos. Então surgem os excedentes, a produção em massa, o
crescimento populacional, industrialização, poluição e o pensamento sustentável.
15
2.1 As origens do saber científico e o papel da natureza
Para Morin (2005), o conhecimento científico não faz mais do que provar suas
virtudes de verificação e descoberta em relação a todos os modos de conhecimento,
conduzindo a uma grande aventura da descoberta do universo, da vida e do homem. No
início, os investigadores eram amadores, ao mesmo tempo filósofos e cientistas e a
atividade científica era sociologicamente marginal. Atualmente, a ciência tornou-se
poderosa e esta inserida no centro da sociedade e é alimentada e controlada pelos poderes
econômicos.
1
Pré-socráticos é o nome utilizado para designar os primeiros filósofos gregos. O famoso filósofo Sócrates é
tido como um “divisor de águas”, pois marca o fim da era dos filósofos da natureza.
16
ocorriam no meio e questionavam o porquê e como tudo acontecia. A chave da explicação
do mundo estaria então, para esses pensadores, no próprio mundo, abrindo-se, assim, ao
conhecimento, à possibilidade de explicação à ciência.
17
Heráclito, era o fogo como a inquietude. Anaxímenes considerou o surgimento da vida a
partir do ar, a substância fundamental.
18
ética, seus conhecimentos perduram até os dias de hoje. Segundo Marcondes (2005), a
concepção filosófica de Sócrates pode ser caracterizada como um método de análise
conceitual, ilustrado pela célebre questão socrática “o que é?”, através da qual se busca a
definição de uma determinada coisa, geralmente uma virtude ou qualidade moral. Segundo
o autor, a discussão parte da necessidade de se entender algo melhor, através de uma
tentativa de se encontrar uma definição, assim o método Socrático envolve o
questionamento do senso comum, das crenças e opiniões que temos, consideradas vagas,
imprecisas, parciais e incompletas. Nesse sentido, a reflexão filosófica vai mostrar que não
sabemos aquilo que pensamos saber.
É inegável que Sócrates é o “pai da ética”, ao dialogar com os sofistas2 refuta seu
relativismo moral em defender a identidade entre os interesses individuais e os
comunitários como único caminho para a felicidade, o que implica na valorização da
bondade e na busca do conhecimento. Marcondes (2005), a crítica de Sócrates aos sofistas
consiste em mostrar que o ensinamento sofístico limita-se a uma mera técnica ou
habilidade argumentativa que visa a convencer o oponente daquilo que diz, mas não leva
ao verdadeiro conhecimento. A conseqüência então era, devido à influência dos sofistas, as
decisões políticas estavam sendo tomadas não com base em um saber, mas na dos mais
hábeis em retórica. Os sofistas não ensinavam, portanto, o caminho para o conhecimento,
mas para a obtenção de uma “verdade consensual”, resultante da persuasão.
Desse modo, pode-se inferir que a ética defendida por Sócrates é tida como uma
força transformadora capaz de trazer felicidade a sociedade e ao indivíduo, o desejo de
2
Sofistas são mestres de retórica e oratória, muitas vezes mestres itinerantes, que percorriam cidades-estados
fornecendo seus ensinamentos, sua técnica, suas habilidades aos governantes e aos políticos em geral
19
uma harmonia entre os diversos interesses individuais e coletivos. Há o surgimento de um
novo elemento, não natural, mais inerente ao homem, próprio da sua essência como ser – a
ética. É um marco de suma importância na transição do pensamento e da construção da
ciência como um todo e pode-se dizer que há um desprendimento do recurso natural, no
entanto, a preocupação é o bem moral, o bem estar, o fazer o que é certo. Tal valor moral
proposto por Sócrates é perfeitamente cabível a atualidade, uma vez que o jogo de
interesses políticos individuais do século XXI vem se tornando cada vez menos ético no
que diz respeito ao modo de uso dos recursos naturais ainda existentes no mundo.
Platão desenvolveu uma teoria dualista e encontrou na sua teoria das ideias um
modo de explicar a realidade. O mundo dos sentidos com o qual se chegaria a um
conhecimento aproximado, imperfeito. E o mundo das ideias, pelo qual podemos ter um
conhecimento seguro com o uso da razão. Assim, ele pretende analisar, avaliar, julgar as
manifestações culturais gregas e o processo decisório em Atenas e suas consequências,
tentando descobrir a sua significação, bem como a que motivações profundas do homem
elas correspondem. Para Platão, os homens nascem com 2 instintos naturais básicos, a
curiosidade e o medo.
20
“E agora, meu caro Glauco, é preciso aplicar exatamente essa alegoria ao que dissemos
anteriormente. Devemos assimilar o mundo que apreendemos pela vista à estada na prisão,
a luz do fogo que ilumina a caverna à ação do Sol. Quanto à subida e à contemplação do
que há no alto, considera que se trata da ascensão da alma até o lugar inteligível, e não te
enganarás sobre minha esperança, já que desejas conhecê-la. Deus sabe se há alguma
possibilidade de que ela seja fundada sobre a verdade. Em todo o caso, eis o que me
aparece, tal como me aparece; nos últimos limites do mundo inteligível, aparece-me a idéia
do Bem, que se percebe com dificuldade, mas que não se pode ver sem concluir a luz e o
senhor da luz, no mundo inteligível ela própria é a soberana que dispensa com sabedoria,
seja na vida privada, seja na vida pública”. (In Abel Jeannière. Platão. Rio de Janeiro, Jorge
Zahar, 1995).
21
resultados, resolver um problema; por exemplo o médico que visa a cura do paciente.
Porém, esse objetivo ou fim pretendido condiciona o tipo de saber, limitando-o
direcionando-o. O saber teórico deve ser inteiramente livre e gratuito e, para isso, não deve
ter fins específicos. É só realmente no inicio do período moderno (sécs. XVI-XVII), com
pensadores como Renné Descartes, Galileu Galilei e Francis Bacon, que ciência e técnica
serão pensadas interagindo, a técnica sendo uma espécie de aplicação prática do
conhecimento científico. Na visão grega clássica, ciência e técnica eram vistas como
radicalmente diferentes.
22
religiosas e pela “Peste Negra”, além do fator mais importante acerca dos estudos sobre a
ciência, o monopólio restritivo da igreja nos campos da educação e cultura.
Marcondes (2005) divide o período medieval em duas fases totalmente distintas do ponto
de vista filosófico e cultural. A Primeira corresponde ao período que se segue à queda do
Império romano (séc. V) praticamente até os sécs. IX-X, quando a situação política e
econômica começa a se estabilizar. A fase final, (sécs. XI-XV) equivale ao
desenvolvimento da escolástica e a grande produção filosófica que se dá com a criação das
universidades, até a crise do pensamento escolástico e o surgimento do humanismo
renascentista (sécs. XV-XVI). Para efeito deste trabalho, exploraremos apenas a fase final
acerca da Escolástica e das contribuições dos mais importantes estudiosos para o campo
das ciências.
3
A filosofia medieval corresponde ao longo período histórico que vai do final do helenismo (sécs. IV-V) até
o renascimento e o início do pensamento moderno (final do séc. XV e séc. XVI), aproximadamente dez
séculos, portanto.
23
astronomia moderna. Os estudos de Galileu Galilei permitiram uma fonte de conhecimento
para os estudos físicos, através dos primeiros estudos sistemáticos do movimento
uniformemente acelerado e do movimento do pendulo, lei dos corpos e o principio da
inércia, precursoras da mecânica Newtoniana.
“Antes de 1500, a visão de mundo dominante na Europa, assim como na maioria das outras
civilizações, era orgânica. As pessoas viviam em comunidades pequenas e coesas, e
vivenciavam a natureza em termos de relações orgânicas, caracterizada pela
interdependência dos fenômenos espirituais e materiais e pela subordinação das
necessidades individuais as da comunidade. (...) A natureza da ciência medieval era muito
diferente daquela ciência contemporânea, baseava-se na razão e na fé, e sua principal
finalidade era compreender o significado das coisas e não exercer a predição ou o controle.
Os cientistas medievais, (...) consideravam do mais alto significado as questões referentes a
Deus, à alma humana e à ética”. (CAPRA, 2003, p.49)
Para Marcondes (2005), o pensamento moderno talvez seja mais fácil de ser
compreendido por nós, pelo fato de estarmos mais próximos dele do que do antigo e do
medieval, e por sermos ainda hoje, de certo modo, herdeiros dessa tradição. O conceito de
modernidade está sempre relacionado para nós ao “novo”, aquilo que rompe com a
tradição. Trata-se, portanto, de um conceito associado quase sempre a um sentido positivo
de mudança, transformações e progresso.
Segundo o mesmo autor, a revolução científica tem seu ponto de partida na obra de
Nicolau Copérnico, Sobre a revolução dos orbes celestes (1543), em que defende
matematicamente o sistema heliocêntrico, rompendo com o sistema geocêntrico
4
O Humanismo nasceu praticamente ao final da idade média através da forma de pensar de classes mais
favorecidas a respeito da nova ordem social, econômica e política que havia se estabelecido. Valorizava a
antiguidade clássica e pregava o antropocentrismo. Esse movimento abriu caminho para o Renascimento.
24
estabelecido há praticamente vinte séculos. Desse modo, representa um dos fatores de
ruptura mais marcantes do inicio da modernidade.
Sob essa ótica moderna de ciência, Marcondes (2005) defende que este pode ser o
ponto de partida do “mecanicismo” como modelo físico de universo. Dessa forma o
mecanicismo vê a natureza como um mecanismo, constituído de elementos como as
engrenagens de um relógio e a função da ciência passa a ser descrever a natureza desses
elementos e as leis e princípios que explicam seu funcionamento. A revolução cientifica
pode ser considerada uma grande realização do espírito crítico humano, com sua
formulação de hipóteses ousadas e inovadoras e com sua busca de alternativas para a
explicação cientifica.
25
racional completa dos fenômenos naturais, em um sistema regido por princípios mecânicos
e matemáticos.
“É verdade que não vemos em lugar algum demolirem todos os edifícios de uma cidade,
com o exclusivo propósito de reconstruí-los de outra maneira, e de tornar assim suas ruas
mais belas; mas vê-se na realidade que muitos derrubam suas casas para reconstruí-las,
sendo ainda por vezes obrigados a fazê-lo, quando elas correm o risco de cair por si
próprias, por seus alicerces não se encontrarem muito firmes. A exemplo disso, convenci-
me de que não seria razoável que um particular tencionasse reformar um Estado, mudando-
o em tudo desde os alicerces e derrubando-o para em seguida reerguê-lo; nem tampouco
reformar o corpo das ciências ou a ordem estabelecida nas escolas para ensiná-las; mas que,
a respeito de todas as opiniões que até então acolhera em meu crédito, o melhor a fazer
seria dispor-me, de uma vez para sempre, a retirar-lhes essa confiança, para substituí-las em
seguida ou por outras melhores, ou então pelas mesmas, após havê-las ajustado ao nível da
razão”. (O discurso do método, p. 8)
Marcondes (2005) classifica o “empirismo” como uma posição filosófica que toma
a experiência como guia e critério de validade de suas afirmações, sobretudo nos campos
26
da teoria do conhecimento e da filosofia da ciência. Assim, todo conhecimento resulta de
uma base empírica, percepções ou impressões sensíveis, desenvolvendo-se a partir desses
dados. Um dos melhores exemplos desse interesse pela técnica e pela ciência experimental
é Leonardo da Vinci (1452-1519). O grande pintor italiano foi também um inventor de
objetos mecânicos, desenhou modelos de máquinas e objetos voadores, alem de
demonstrar um interesse profundo por anatomia e biologia.
27
algo exterior a sociedade humana, retratando uma separação entre natureza e sociedade,
sendo a relação entre ambos, mecânica, ou seja, o homem dominaria a natureza através das
artes mecânicas. Ele já realizava de certa forma uma conexão entre indústria e ciência, ou
seja, as artes mecânicas a serviço da produção, visando aumento da produtividade no
processo de trabalho.
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Apesar do desenvolvimento tecnológico, cabe a crítica ao tipo de produção
desenvolvida, à da produção em massa em benefício do enriquecimento individual, um
desenvolvimento tecnológico sem reflexão.
Nesse momento vivido no mundo surge a figura de Karl Marx, que direciona seu
pensamento na análise do trabalho, questão praticamente ausente da análise dos filósofos
desde a antiguidade. Para Marcondes (2005), o trabalho é uma relação invariante entre a
espécie humana e seu ambiente natural, um sistema de ação instrumental, surge na
evolução da espécie, mas condiciona nosso conhecimento da natureza ao interesse no
possível controle técnico dos processos naturais.
Agora este período, que contempla do final do séc. XIX e o início do séc. XXI, logo
após a Revolução Industrial, foi um momento novo da evolução humana repleto de novas
descobertas científicas, igualmente revolucionárias, que provocaram, e ainda provocam
transformações profundas nas relações do campo científico, tecnológico e social. Para
Marcondes (2005), merece destaque a revolução da informática na questão da inteligência
artificial, a revolução biológica, a engenharia genética, a possibilidade de criar novas
espécies ou manipular as características de uma espécie. Além disso, é válido ressaltar a
invenção da fissão nuclear e, a partir então desse conhecimento, desenvolver-se a técnica
da manipulação nuclear, seja para fins bélicos, energéticos, da saúde, ou suas demais
29
utilizações. Essa manipulação nuclear que posteriormente será mais abordada no que diz
respeito aos assuntos da responsabilidade do uso dessa técnica, bem como seus riscos,
efeitos e acidentes ocorridos. O contexto da sociedade econômica e tecnologicamente
avançada do final do século XX exige novas análises e novas formas de pensar, e também
será trabalhada a seguir.
Pode-se afirmar que o movimento ambiental que surge no final da década de 1960 e
inícios de 1970 é o ponto de partida para um novo pensamento acerca dos problemas
sócio-ambientais decorrentes de séculos de desenvolvimento sem planejamento. Nesse
momento nasce o sentimento de reflexão do uso da técnica a serviço do homem no uso dos
recursos naturais e suas conseqüências globais. O momento em que o homem se vê em
conflito com sua evolução tecnológica, principalmente o conflito ético.
Consideração ética esta que esta inserida nos problemas mundiais como o
crescimento e urbanização desordenada das grandes metrópoles, desigualdades sociais,
consumo excessivo de recursos não-renováveis, redução da biodiversidade, alterações
climáticas e em todo o risco tecnológico, social e ambiental envolvido na manipulação de
energia nuclear.
30
CAPÍTULO 3 – A INDUSTRIALIZAÇÃO, A FORMAÇÃO DA SOCIEDADE
CONTEMPORÂNEA E A TOMADA DE CONSCIÊNCIA DOS RISCOS
TECNOLÓGICOS E AMBIENTAIS
Novos rumos foram tomados a partir da revolução industrial no fim do século XIX.
A própria retirada do homem do campo teve inúmeras implicações. A divisão em
diferentes esferas de homem, terra e dinheiro (capital) provavelmente foi decisiva para
impulsionar a submissão da natureza ao novo homem-máquina. Pode-se dizer que a
industrialização do final do século XIX deu à humanidade um ponta-pé inicial a um
período de pós-industrialização, ou de modernização5, visto que este certamente estabelece
um divisor de águas muito importante na história da humanidade. Ulrich Beck, em sua
obra Sociedade de risco (2010) caracteriza o termo “pós” como uma senha que aponta para
um além que não é capaz de se nomear. Esse além que se desencadeou durante todo o
século XX e ainda está presente nos dias atuais, mérito dos avanços tecnológicos e do agir
humano no planeta.
5
Modernização significa o salto tecnológico de racionalização e a transformação do trabalho e da
organização, englobando para alem disso muito mais: a mudança dos caracteres sociais e das biografias
padrão, dos estilos e formas de vida, das estruturas de poder e controle, das formas políticas de opressão e
participação, das concepções de realidade e das normas cognitivas.
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Se por um lado as tecnologias produzidas pelos conhecimentos científicos
trouxeram resultados benéficos para melhoria das condições de vida, o caso da bomba
atômica e a manipulação genética evidenciam que os prejuízos também se tornam
irreversíveis. Trata-se de uma linha tênue sob a forma como o conhecimento científico é
conduzido que faz com que as escolhas possam ter resultados catastróficos e irreversíveis.
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Estocolmo foi a criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e
Desenvolvimento – PNUMAD. Posteriormente, ocorreram outras conferências como a
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada no
Rio de Janeiro, em junho de 1992, também conhecida pelo nome Rio 92, que foi
responsável pela formulação de importantes documentos, a saber: a Declaração do Rio de
Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, a Convenção sobre
Diversidade Biológica, a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do
Clima, a Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação, a Declaração de
princípios sobre florestas e a Agenda 21. Desde então, já ocorreram mais duas sequências
da Rio 92: a Rio + 10, realizada em Joanesburgo, em 2002 e a Rio + 20, novamente no Rio
de Janeiro, em 2012.
33
pudessem usufruir dos recursos naturais. Em outras palavras, seguindo a proposta do
presente trabalho, o homem teria chegado em um ponto de inflexão. Tornar-se-ia
necessário adotar uma postura mais prudente com o uso da tecnologia para usufruir os
benefícios dos recursos naturais.
Propôs então uma ética voltada para uma responsabilização das gerações presente
para com as gerações futuras, visando às intervenções humanas sobre a natureza e a
34
sobrevivência do planeta. Ou seja, ele considerava que nossos descendentes não poderiam
ser ignorados, tampouco a qualidade do meio ambiente.
Hans Jonas considerava que o poder alcançado pelo progresso técnico deu aos
homens um poder de ação que ultrapassa o que fora suposto, sendo assim não há mais
argumentos que possam neutralizar a relação ciência-técnica.
“(...) A diferença radical entre o papel que o conhecimento teria no sentido antigo e que tem
no sentido moderno. Dei-me conta de que o lugar da dignidade da contemplação do ser, tal
como desenvolveu Aristóteles, Platão e os Estóicos, havia surgido algo que está orientado a
um uso prático, isto é, o domínio da natureza: o conhecimento do ser já não segue a
compreensão da natureza e a contemplação da ordem intemporal das coisas, se não, pelo
contrário, trata de utilizar a natureza para algo que ela mesma jamais havia pensado”.
(JONAS, 2005, p.338).
35
abordada nos meios de comunicação e na política, evidenciando sua importância para
analisar a relações entre ciência, tecnologia e sociedade.
36
responsabilidade, preservar a presença dos homens no futuro, obrigando as gerações
presentes se tornarem responsáveis pela mesma.
Hoje, a ética tem a ver com atos que têm um alcance causal incomparável em direção ao
futuro, e que são acompanhados de um saber de previsão que, independentemente do seu
caráter incompleto, vai muito além, do que se conhecia antigamente. É preciso acrescentar
à simples ordem de grandeza das ações a longo termo, freqüentemente a sua
irreversibilidade. Tudo isso coloca a responsabilidade no centro da ética, inclusive os
horizontes de espaço e tempo que correspondem aos das ações (JONAS, 1995, p.17).
A preservação da vida não é reservada apenas aos humanos, mas recai sobre este
especialmente pelo fato de ser o mais desenvolvido da natureza, conferindo uma especial
responsabilidade. Desse modo, o impacto sofrido no meio ambiente e o cuidado com as
coisas extra-humanas, incluem que a natureza deve ter um significado próprio, “a natureza
como uma responsabilidade humana é seguramente o novum sobre o qual uma nova teoria
ética deve ser pensada” (JONAS, 2006, p.39).
a) O fim e o valor
Para Séve (1990), “O fim é aquilo em vista do qual existe uma coisa para cuja
produção ou conservação se realiza um processo ou se empreende uma ação”. É
37
fundamental para a teoria de Jonas (2005), que se atribua um fim a tecnologia, exemplifica
com um martelo, que fora criado para martelar, seu fim faz parte de seu conceito e como
em qualquer outro artefato e é a causa do seu devir. No entanto, sua finalidade não encerra
o seu juízo de valor, é preciso atribuir um ”valor de uso” as tecnologias empregadas.
c) A heurística do medo
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Considerando a possibilidade de riscos e danos irreversíveis para as gerações
futuras, Jonas oferece a precaução e cautela na avaliação das situações, um modo
conservador no agir humano para as invenções tecnológicas. É cabível retomar aqui o caso
da fissão nuclear, que certamente não fora desenvolvida com finalidade bélica, mas faz
parte de um trágico momento da história. “Ambos os lados na corrida armamentista são
confrontados com o dilema do constante crescimento do poder militar e cada vez menor o
da segurança nacional” (HARDIN, 1968).
Diante dessa heurística de medo que cabe ao homem agir sob uma ética responsável
e sob a insegurança das consequências tecnológicas. Jonas (2006), afirma que a impotência
do nosso saber com respeito a prognósticos de longo prazo faz com que se deva dar mais
peso à ameaça do que à promessa. Portanto é necessário dar mais ouvidos a profecia da
desgraça do que à profecia da salvação. Diante desse cenário de incertezas e riscos, o
futuro da humanidade tem de ser incluído nas escolhas do presente. O dever para com o
que ainda não existe exige que não se arrisque uma não existência de gerações futuras em
virtude das ações do presente.
39
CAPÍTULO 4 – A INVENÇÃO DO PODER RADIOATIVO: UM GRANDE RISCO
A SER ASSUMIDO
É sob essa ótica que a ética proposta por Hans Jonas contribui de forma
inestimável, enfrenta a tecnologia e sua relação com as ciências sociais e naturais como
problema filosófico. Jonas inverte a perspectiva marginal da intervenção humana sobre a
natureza do campo técnico para o campo ético. Uma mudança de “coordenadas ao qual a
vida e o pensamento estão sujeitos na modernidade industrial” e “a crença na ciência e no
40
progresso – começa a cambalear, e surge um novo crepúsculo de oportunidades e riscos”
(BECK, 2010, p.18).
De acordo com o sociólogo alemão Ulrich Beck (2010), os riscos não são uma
invenção moderna. Ele compara com os riscos assumidos por Cristovão Colombo (1451-
1506) em sua busca por novas terras e o desbravamento do novo continente. No entanto,
assume que estes, por sua vez, eram riscos pessoais e não situações de ameaça global,
como o desenvolvimento da fissão nuclear. Acerca daquela época, a etimologia de “risco”
era atribuída à ousadia e aventura, a curiosidade do novo, e não era cabível que pudesse
atingir o patamar da destruição da terra ou o comprometimento das gerações futuras.
Assim, o que hoje entra na categoria dos riscos não era necessariamente considerado como
tal no passado quando os homens tinham de afrontar perigos de frio, secas ou inundações
(VEYRET, 2007, p.13).
É esse o sentido de risco que Beck (2010) assume para a nova sociedade de risco.
Diante do progresso tecnológico atingido até a invenção da fissão nuclear e posteriormente
o desenvolvimento de bombas nucleares e geração de energia nuclear, a sociedade vive
uma relação de fragilidade com a tecnologia que oferta riscos catastróficos. Para Beck
(2010), os riscos e as ameaças são medidas de modo invariavelmente argumentativo. O que
prejudica a saúde e destrói a natureza é freqüentemente indiscernível à sensibilidade e aos
olhos nus. Além disso, muitos dos novos riscos (contaminações nucleares ou químicas,
substâncias tóxicas nos alimentos, enfermidades civilizacionais) escapam inteiramente à
capacidade perceptiva humana imediata e possivelmente não produzirão efeitos durante a
vida dos afetados de primeira ordem, mas nos seus descendentes.
41
4.1.1 Globalização dos riscos
Sob essas circunstâncias de riscos que o planeta está imerso e a crítica de que não
existem fronteiras para os riscos tecnológicos provenientes do domínio nuclear. Ao mesmo
tempo em que o poder de destruição de uma simples falha em uma usina de energia nuclear
ou o seu uso para guerras, é de ordem ilimitada e seus efeitos perdurarão por muitos anos
após. “É verdade, ao menos em parte que, os usos e os efeitos da ciência moderna fogem
ao controle e que certos riscos são tão ameaçadores quanto globalizados” (VEYRET, 2007,
p.25). O risco está presente em toda a parte e faz prevalecer um sentimento de insegurança
alimentado pelo próprio progresso da segurança e o desenvolvimento de ciências e de
técnicas cada vez mais sofisticadas.
Nessa civilização avançada, e moderna, acaba por surgir uma nova destinação
global de alcance mundial fundada na ameaça. Destinação diante da qual a possibilidade de
escolhas individuais dificilmente se sustenta, em razão de que, no mundo pós-
industrialização, os poluentes e venenos estão entrelaçados com a base natural e a
consumação elementar da vida. Existe uma suscetibilidade ao risco que interdita a escolha
frente à impotência e a “sensação de não haver amanhã” (BECK, 2010).
42
Frente à degradação industrialmente forçada das bases ecológicas da vida, a
consideração de seu conjunto retoma os conceitos de que a natureza não pode mais ser
concebida sem uma sociedade, e a sociedade não mais sem natureza. A natureza não será
mais subjugada como no final dos séculos XIX e XX. Implica agora em dizer que as
destruições da natureza, integrada à circulação universal da produção industrial, deixa de
ser mera destruição da natureza e passam a ser elemento constitutivo da dinâmica social,
econômica e social (BECK, 2010).
Ulrich Beck entende que devido sua característica dominante, ao longo do decorrer
cientifico, a “incalculabilidade” dos efeitos colaterais da técnica científica se intensifica e o
conceito chave de “calculabilidade” é posto em questão atualmente. “As possibilidades de
estimabilidade dos efeitos colaterais saltam à vista somente quando se leva em conta que,
com a passagem para a modernidade reflexiva, o próprio conceito de “calculável-
incalculável” se altera: Calculabildade já não quer dizer apenas controlabilidade
racionalmente funcional e incontrolabilidade tampouco significa a impossibilidade de um
controle racionalmente funcional” (BECK, 2010, p.262).
Para Beck (2010), a energia nuclear é, nesse sentido, um jogo altamente perigoso
com a presumida “infalibilidade” do avanço tecnológico. Ela compromete pessoas tanto
pelo seu uso quanto por meio de vazões radioativas. Os resíduos nucleares são prova disso,
já que muito pouco ou quase nada se pode fazer para eliminá-los, a não ser o seu
isolamento e armazenamento controlado, a fim de que a radiação possa decair, o que pode
levar, inclusive, a centenas de anos. Outro risco é associado ao vazamento da radiação
decorrente de acidentes, por exemplo, que pode ocasionar efeitos biogenéticos nas
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gerações futuras. Diante dessa questão tão alarmante, o presente trabalho aponta alguns
dos acidentes ocorridos nos últimos anos e suas conseqüências catastróficas.
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No tocante aos acidentes decorrentes da radiação nuclear, pode-se caracterizá-los
como sendo aqueles que compreendem todas as ocorrências acidentais que envolvem
radiações ionizantes capazes de afetar os organismos vivos e destruir a vida. Incluem os
acidentes nucleares que envolvem grande liberação de energia e de radioatividade, e os
acidentes radiológicos, decorrentes do uso impróprio ou inadequado de fontes radioativas
utilizadas na medicina e na pesquisa. Os efeitos provocados por esses tipos de acidentes,
por persistirem na maioria dos casos por longos períodos de tempo, requerem especial
atenção na destinação e guarda dos rejeitos radioativos que deles resultam. Suas interfaces
com a saúde e a vida requerem ações extremamente eficazes e rápidas, assegurando
proteção física contra a radioatividade de todos os envolvidos na ocorrência, inclusive nas
equipes de socorro.
Os últimos 200 anos de progresso tecnológico nos permite inferir que “o homem é
capaz de imitar as ações da natureza, conseguindo reconstituir, de alguma forma, as
condições que prevaleciam antes de sua intervenção” (VALLE, 2003, p.61). Ele copia os
ciclos naturais, doma os fenômenos físicos e reações químicas em seu favorecimento para
geração de energia e desenvolvimento de novos materiais. Infelizmente, no caso das
substancias radioativas o homem não foi capaz de imitar a natureza. Ao liberar a energia
do átomo, não considerou os efeitos de longa duração da radioatividade e a impossibilidade
de reverter, em curto prazo, tais efeitos.
Para a natureza e seu ciclo, não diante da intervenção humana, a questão temporal
não é uma barreira nem muito menos um empecilho. Ela aguardou milhões e até bilhões de
anos para transformar átomos instáveis em outros mais estáveis. “Da mesma forma que na
lenda do “aprendiz de feiticeiro”, o homem aprendeu a “mágica” de liberar a energia do
átomo, mas não sabe agora como revertê-la” (VALLE, 2003, p.62).
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O grande problema envolvido se dá no decaimento natural dos átomos, o de alguns
como, por exemplo, o do rádio e do urânio processa-se em períodos de ordem geológicas.
As substâncias radioativas, naturais ou criadas pelo homem têm seu efeito medido pela
chamada meia-vida, isto é, o período de tempo necessário para que o nível de intensidade
da radiação emitida caia para a metade. Para efeito de comparação, a meia-vida do urânio
238 é de 4,5 bilhões de anos e a do plutônio, elemento transurânico criado pelo homem, é
de 24 mil anos (VALLE, 2003). A meia-vida tem grande importância na busca de soluções
para os acidentes que envolvem essas substâncias, em função da definição dos tipos de
proteção, local de disposição e guarda, reprocessamento, além de cuidados com os rejeitos
radioativos.
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A fissão nuclear ocorre quando um núcleo pesado absorve um nêutron e, como resultado, ele se parte em
dois núcleos mais leves chamados de fragmentos ou produtos de fissão, sendo emitidos, simultaneamente,
dois ou mais nêutrons. Há liberação de enorme energia durante esse processo. A combinação entre a energia
liberada e a reprodução de novos nêutrons é o que torna possível a construção de um reator nuclear, no qual
as fissões em cadeia podem ser auto mantidas, ocorrendo, ao mesmo tempo, uma liberação contínua de
energia, que na matriz energética recebe o nome de energia nuclear.
Já a fusão nuclear é quase o inverso da fissão nuclear, em que núcleos leves podem colidir, e se fundir
formando núcleos mais pesados. Há também uma quantidade considerável de energia liberada nesse
processo. As bombas atômica podem ser fabricadas a partir de ambos os mecanismos.
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Brasil, o acidente da usina de Three Mile Island nos Estados Unidos, da usina de
Chernobyl na Ucrânia e a Usina de Fukushima no Japão.
Todo o material que esteve em contato com a sucata radioativa teve de ser
removido, incluindo camadas de solo das áreas afetadas. Construiu-se, para receber esse
material que totaliza mais de 4 mil toneladas, um depósito especial no município de
Abadia de Goiás, administrado pela Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN, a
cerca de 25 quilômetros do local da tragédia (VALLE, 2003).
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Fig. 4.1 – Imagens do acidente de Goiânia com Césio 137
Durante o ano de 1979, ocorreu o primeiro grave acidente com uma instalação para
uso pacífico da energia nuclear. Um dos reatores de Three Mile Island, nos Estados
Unidos, fundiu parte de seu núcleo em decorrência de uma combinação de falha técnica
com erro humano, obrigando à evacuação emergencial de milhares de moradores das
regiões vizinhas. Valle (2003) ressalta que embora esse acidente não tenha chegado a
provocar mortes, fixou-se na sociedade a imagem tão temida da catástrofe nuclear
provocada por uma falha técnica que poderia ter fugido completamente ao controle dos
operados da unidade acidentada.
Embora não tenha causado vítimas, o acidente de Three Mile Island despertou o
medo da população pelos riscos advindo daquele novo tipo de geração de energia. Muitos
protestos se espalharam pelos EUA e contribuíram para frear a construção de novas usinas
em todo o mundo, além de reforçar a questão da segurança de tais instalações. A seguir, a
Figura 4.2 mostra a reportagem de capa da revista Time a respeito do derretimento do
reator em Three Mile Island, em decorrência de falha humana.
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Fig. 4.2 - Edição da revista TIME destacando a controvérsia sobre a usina nuclear de Three
Mile Island, em 9 de abril de 1979
Fonte: http://ciencia.hsw.uol.com.br/corrida-nuclear4.htm
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estrôncio-90 e césio-137. Isótopos radioativos emitidos pelo reator em chamas (VALLE,
2003, p.64). Estima-se que nas regiões afetadas diretamente pelo acidente há uma
população da ordem de 7 a 9 milhões de habitantes. Entretanto a radiação emitida se fez
sentir a milhares de quilômetros do local e pôde ser medida até no Japão. Para Valle
(2003), os números do acidente são polêmicos e discrepantes, pois oficialmente registra-se
31 mortes, a maioria bombeiros que combatiam o fogo. Entretanto, os fatos mostram que o
índice de câncer da tireóide nas crianças dessas regiões decuplicou desde então, além das
malformações fetais e danos genéticos. Cálculos baseados na variação da expectativa de
vida nas regiões afetadas permitem estimar em 32 mil o número de mortes atribuíveis ao
acidente, nos dez anos que se seguiram à terrível explosão. Uma área de 30 quilômetros de
raio ao redor do local do acidente foi evacuada, incluindo a cidade de Pripryat, hoje
abandonada. Cerca de 60 povoações tiveram de ser abandonadas, cerca de 400 mil
habitantes foram deslocados e perderam as terras e o sustento.
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d) Usina de Fukushima no Japão
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nas suas proximidades” (CARTA CAPITAL, 2014). Cerca de 146 mil pessoas foram
retiradas da região em torno do reator, e ninguém poderá viver lá por décadas.
Além disso, o acidente nuclear aumentou relativamente o risco de câncer nas zonas
mais afetadas, segundo um relatório da Organização Mundial de Saúde – OMS, divulgado
em 2013. O estudo considera que, em um raio de 20 Km ao redor da central acidentada, o
risco de câncer de tireóide entre as mulheres e as crianças chega a 1,25%, acima do índice
comum, de 0,75%. Além disso, a OMS recomenda que é necessário realizar o
acompanhamento ao longo dos anos das populações mais expostas (CARTA CAPITAL,
2013).
Fonte: http://www.greenpeace.org
Dessa maneira, o acidente em questão tem grande importância nesse trabalho para
ilustrar os riscos provindos da utilização da energia nuclear. Ressalta suscetibilidade de
imprevistos e intempéries devastadoras da natureza, fatos que por mais que possam ser
previstos, com certa precisão, ainda são incapazes de serem contidos, e estamos à mercê de
suas consequências.
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Ainda com efeito sobre esse acidente, fica clara a dificuldade do manejo das
técnicas nucleares com relação aos seus efeitos no longo prazo. As consequências
negativas associadas aos acidentes nucleares são duradouras, em muitos casos longe de
solução ainda em nossa geração. Evidencia-se a necessidade de responsabilidade acerca do
uso dessas técnicas a fim de garantir qualidade de vida e ambiental nos próximos séculos,
especialmente próximo a áreas com atividades radioativas.
A revolução industrial, por sua vez veio a finalmente dar um ponta-pé inicial na no
pensamento tecnocrata que perdura até os dias de hoje. A invenção das máquinas a vapor e
a produção em larga escala, o êxodo exacerbado para os centros urbanos, a mão de obra
proletária versus a burguesia marcaram essa época. O pensamento de Karl Marx, acerca
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desse momento da história, foi muito válido e serviu como base para o movimento
ambiental que veio aflorar apenas na década de 1960.
Existe, portanto, uma sociedade de risco que fora desenvolvida durante o século
XX, resultado da evolução desenvolvimento das relações entre a ciência, tecnologia e
sociedade acerca dessa evolução da humanidade pós revolução industrial. O inusitado
poderio tecnológico atingido pelo homem já é capaz de afetar irreversivelmente a
qualidade do meio ambiente e a presença de vida futura no planeta.
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Os acidentes radioativos emblemáticos e abordados nesse trabalho elucidam o
tamanho do risco que se assume ao utilizar-se dessa tecnologia poderosa que desmitifica a
fronteira real e simbólica atrás das quais aqueles que não eram afetados podiam se
recolher. A lição mais importante aprendida acerca dos acidentes nucleares é o
desconhecimento da imensidão dos seus riscos. De fato, seu efeito não é instantâneo nem
visível como os demais riscos usuais, que afetam a integridade física humana.
O trabalho também permitiu realizar uma reflexão sobre como a sociedade de riscos
vem se comportando perante os erros do passado. Há uma linha tênue entre o aprendizado
e o viver “à sombra do passado”, conforme sugere o autor Clive Ponting. A repetição do
erro com relação aos acidentes nucleares prova que ainda há um grande caminho a se
trilhar em relação à uma postura de responsabilidade perante as atividades humanas.
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acidente-nuclear-4990.html>. Acesso em 1 de dezembro de 2014.
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segundo a OMS. Saúde. Acidente Nuclear. Publicado em 28/02/2003. Disponível em:
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VALLE, Cyro Eyer do. Meio Ambiente: acidentes, lições, soluções. São Paulo: Editora
Senac, 2003.
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