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O Primeiro Ciclo da Borracha

 A borracha já era utilizada pelos indígenas desde períodos anteriores à conquista ibérica. Cristóvão Colombo
levou exemplares de bolas de borracha fabricadas pelos indígenas da América Central, para a Espanha no
século XVI.
 A borracha silvestre amazônica era conhecida na Europa desde a década de 40 do século XVIII (1740),
quando o cientista francês Charles Marie de La Condamine, realizando pesquisas na Amazônia, no final
desta década enviou para a Academia de Ciências de Paris centenas de “pelas” de borracha produzidas por
indígenas peruanos (inaugurando a biopirataria da seringa na Amazônia).
 Em 1762, o botânico Chirstian Fusée Aublet, outro pesquisador francês sobre as propriedades industriais da
borracha silvestre amazônica deu à seringueira a denominação científica de Hévea Brasiliensis.
 Com o passar dos anos, a Amazônia tornou-se polo de extrativismo do látex e da produção da borracha
silvestre, porém em pequena escala.
 Ao longo do século XIX, sobretudo após a década de 1840, os vales do Madeira, Mamoré e Guaporé
vincularam-se ao circuito da borracha e passaram a ser explorados por seringalistas bolivianos e brasileiros,
que utilizavam a mão-de-obra dos indígenas locais do vale do rio Beni na Bolívia e mais tarde a mão-de-
obra nordestina que migrou para a Amazônia a partir da década de 1870, trabalhando nos seringais como
coletores de látex (seringueiros).
 A exploração do látex levou à formação de vastos seringais, que passavam a pertencer a latifundiários, mais
tarde chamados de seringalistas ou coronéis de barranco. Os trabalhadores eram os seringueiros, que podiam
ser nativos (mansos) ou nordestinos (brabos). O regime de trabalho estruturava-se na dependência entre o
trabalhador e o proprietário através de um sistema de crédito/dívida conhecido como regime do toco ou do
barracão.
 Os seringueiros eram divididos em dois grupos: Mansos => naturais da Amazônia conheciam os segredos da
florestas e dos rios; Brabos => naturais do nordeste, tinham enorme dificuldade de adaptação ao meio
ambiente.
 O proprietário do seringal era chamado de Coronel do Barranco ou seringalista, trabalhava a partir de
financiamentos feitos pelo capital estrangeiro. Os trabalhadores eram chamados de seringueiros, de origem,
condição e situação humilde, vinculavam-se aos seringalistas por trabalharem em seus latifúndios (seringais)
e por estarem dependentes do regime contratual do Barracão (também chamado Aviamento ou Habilito).
 O Barracão era onde o seringueiro comprava os produtos indispensáveis para sobrevivência e vendia a
produção de borracha obtida por ele. O sistema de crédito/ dívida fazia com que o seringueiro estivesse
sempre devendo ao Barracão.
 A produção era financiada (aviada) pelas casas de aviamento de Belém e Manaus. A maior parte do lucro
ficou com as grandes empresas estrangeiras e com grupos de aviamento nacionais.
 Na década de 1870, o inglês Alexander Wickham contrabandeou sementes de seringueira, que foram
cultivadas em Kew Garden, em Londres e de lá foram levadas para a Malásia. A produção asiática derrubou
a produção amazônica entre 1912 e 1913.
 O Primeiro Ciclo da Borracha iniciou-se no século XIX e prolonga-se até a primeira metade do século XX,
(1850-1920) quando a produção brasileira é superada pela produção da Malásia.
 A França e os EUA produziam artefatos de borracha (botas, chapéus e capas de chuvas) na cidade de Belém
do Pará que eram vendidos na região e também exportados. A Europa e os Estados Unidos enviavam roupas
e sapatos para serem impermeabilizados na Amazônia.
 Na década de 1830 os países industrializados expandiam sua produção de máquinas e outros produtos
inovadores no mundo ocidental. Neste contexto produtivo, ocorre uma das mais importantes descobertas
relacioanadas à Hévea Brasiliensis, o químico inglês Joseph Priestley descobriu a utilização da borracha para
apagar inscrições a lápis no início da década de 1870.
 No ano de 1893, os cientistas Charles Nelson Goodyear, norte americano, e Thomas Hankook, inglês, a
serviço de seus respectivos governos, descobriram, quase simultaneamente, o processo de vulcanização da
borracha, ao adicionarem enxofre à borracha silvestre refinada. Este processo ficou conhecido como
Vulcanização da Borracha. Esse método tornou a borracha resistente ao frio e ao calor e assegurou maior
elasticidade e impermeabilidade ao produto.
 Em 1878, o escocês John Boyd Dunlop, empregou a borracha vulcanizada na fabricação de pneus para
bicicletas. Em consequência, a produção da borracha silvestre da Amazônia aumentou levando ao crescente
interesse dos Estados Unidos, França, Inglaterra e Alemanha sobre a região amazônica.
 Zonas de produção de borracha na Amazônia Rondoniense – no espaço físico onde surgiria o estado de
Rondônia, os maiores centros de produção de borracha estavam localizados nos vales do médio e baixo
Madeira, do Guaporé-Mamoré, do Abunã, do Jamary, do Gy-Paraná e do Roosevelt.
 O auge do Primeiro Ciclo da Borracha (1870 – 1900), fator econômico impulsionado pelo elevado grau de
desenvolvimento dos parques industriais dos Estados Unidos da América e da Europa, principalmente depois
da invenção do automóvel pelo norte-americano Henry Ford, e da fabricação de pneus automotivos pelos
irmãos Michelin, franceses.
 O imperador D. Pedro II coloca em prática uma nova política de atração migratória para o Norte e o Centro-
Oeste, tendo em vista as necessidades dos seringais por mais mão de obra e a grave crise socioeconômica
que se abateu sobre o Nordeste, com ênfase no estado do Ceará, em razão das devastadoras secas de 1877,
1878, 1879 e 1880. Milhares de nordestinos foram atraídos e recrutados para o trabalho nos seringais
amazônicos.
 As rotas de entrada desses imigrantes nordestinos, ocorridas na área geográfica que constitui o estado de
Rondônia, davam-se através dos rios Amazonas, Madeira, Jamary e Gy-Paraná, ou Amazonas, Madeira,
Mamoré e Guaporé. Havia outra alternativa seguindo a rota São Paulo – Cuiabá, daí prosseguindo para os
vales do Guaporé, Mamoré e Abunã.
 A biopirataria da Seringueira – um dos motivos que provocaram o declínio da economia gomífera na
Amazônia está relacionado à biopirataria de mudas e sementes de seringueiras patrocinada pela Inglaterra,
França e EUA. Dos diversos biopiratas conhecidos, o mais famoso e, por isso mesmo, o responsável por este
tipo de espionagem e contrabando bem-sucedidos, foi o botânico inglês Henry Alexander Wickhan, a
serviço do Laboratório Real de Londres.
 Wickhan realizava na região do Pará estudos sobre o cultivo de seringueira em outras áreas de floresta
tropical. Por várias vezes comandou a remessa de amostras de sementes e mudas de seringueira para
Londres. No dia 29/05/1876 ele embarcou no navio “Amazonas” sua maior carga, contando com o apoio de
autoridades alfandegárias no porto de Belém do Pará.
 A partir de agosto de 1876 o governo inglês passou a realizar experimentos para o cultivo plantation de
seringueiras nos jardins botânicos do Ceilão e de Cingapura. Teve início, assim, o processo de heveicultura
nas colônias do Sudeste Asiático, da África e da América Central.
 O auge desse sistema extrativo/produtivo/exportador na Amazônia compreende o espaço de tempo que vai
da segunda metade da década de 1870 ao início dos anos 1920.
 Neste período, o espaço físico que constitui a Amazônia rondoniense eram percorridos e esparsamente
ocupados por seringueiros, caucheiros e comerciantes através dos seus principais caminhos: os rios, as
estradas sertanistas, o varadouro aberto pela comissão Rondon e a ferrovia Madeira-Mamoré.
 A partir de 1910, o último ano de grande demanda da economia gomífera, tem início o declínio do Primeiro
Ciclo da Borracha. A partir de então, a produção da borracha nativa na Amazônia não suportou a competição
com a borracha cultivada no Sudeste Asiático, na África e na América Central. Na década subsequente
consolidou-se o final do ciclo.

O SEGUNDO CICLO DA BORRACHA


 No dia 08 de dezembro de 1941, (durante a Segunda Guerra Mundial) tropas japonesas, integrantes da
aliança germânica denominada Eixo, invadiram a Malásia Britânica (Malásia, Birmânia, Bornéu e
Tailândia), ocupando os seringais cultivados que forneciam borracha silvestre à Inglaterra, aos EUA, à
França e aos países aliados. Em 08 de fevereiro de 1942, os japoneses invadiram Cingapura, aprisionaram
130 mil soldados ingleses e impediram o fornecimento de borracha produzida nos seringais desta colônia
britânica pra a Inglaterra e seus aliados na guerra. Em seguida, forças japonesas invadiram as Índias
Orientais (Indonésia), nas Ilhas de Java e Sumatra, aprisionaram 37 mil holandeses, entre soldados e
marinheiros da Marinha Mercante. O resultado destas invasões foi o corte no fornecimento de borracha
silvestre às tropas dos Estados Unidos, da Inglaterra e seus aliados. Sem alternativas de curto prazo, o
governo norte-americano voltou suas atenções para o Brasil, outrora maior produtora de borracha silvestre
do mundo, e propôs ao governo brasileiro a ampliação do Tratado de Washington, assinado em 1941, com a
finalidade de revitalizar os seringais amazônicos e mato-grossenses.
 Em agosto de 1942, Brasil e Estados Unidos assinam um aditamento ao Tratado de Washington e declaram a
Amazônia brasileira uma “Zona-de-Guerra”, para reativar, emergencialmente, a produção de borracha
silvestre em larga escala. Vários órgãos foram criados pelo governo norte-americano para dar suporte a essa
nova condição geopolítica da região amazônica e controlar o sistema extrativista da borracha.
 O Tratado de Washington gerou 41 aditamentos que ficaram conhecidos como “Acordos de Washington”.
Desses, 21 referiam-se ao fomento da produção da borracha na Amazônia. Com base nesses aditamentos
foram implantados órgãos como o Banco de Crédito da Borracha - BCB, hoje Banco da Amazônia S/A –
BASA, para atuar como banco do fomento da economia. O BCB ficou incumbido de financiar 60% da
produção gomífera e comprar 100% da borracha produzida, desarticulando o sistema controlado pelas Casas
Aviadoras e Exportadoras do Primeiro Ciclo da Borracha.
 As firmas de aviamento, no entanto, continuaram a funcionar de forma paralela, modificando seus métodos e
financiando 100% da produção.
 Outros órgãos criados para o gerenciamento do Segundo Ciclo da Borracha:
 Serviço Especial de Saúde Pública, SESP, entidade mantida pela Fundação Rockeffeller, com a incumbência
de estabelecer políticas de saúde pública de modo a promover o saneamento básico, construir unidades de
saúde, combater a malária e outras endemias reinantes nas principais vilas e cidades da região. Este órgão
também ficou responsável pela construção de aeroportos, dentre eles, o de Porto Velho, para escoar a
borracha por via aérea.
 SAVA – Superintendência do Abastecimento o Vale Amazônico – mecanismo de compra da produção de
borracha e fornecimento de víveres aos seringais. Órgão independente da influência das casas aviadoras.
Apesar disso, a maioria dos seringueiros continuou submetida à escravidão do débito.
 SEMTA – Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores para a Amazônia, encarregado de recrutar no
Nordeste os Soldados da Borracha e conduzi-los à Amazônia.
 CAETA – Comissão Administrativa de Encaminhamento de Trabalhadores para a Amazônia, encarregada de
atrair trabalhadores Nordeste para a Amazônia, os “Arigós”, não inseridos no perfil dos soldados da
borracha, elevando o povoamento dos seringais e o das cidades. O termo “Aroigó” era um apelido pejorativo
dado aos nordestinos analfabetos e inexperientes dos seringais.
 RDC – Rubber Development Company – encarregada do transporte de passageiros e do envio da borracha
para os EUA.
 No dia 1º de setembro de 1943, o presidente Getúlio Vargas expede o Decreto-Lei nº 5.225 que cria o
Batalhão da Borracha, unidade militar à qual seriam incorporados os Soldados da Borracha, oficializando a
condição militar ativa daqueles recrutados para a Batalha da Borracha nas selvas amazônicas.
 No dia 06 de setembro de 1942 teve início a transferência oficial de trabalhadores para os seringais
amazônicos, tarefa desempenhada pela CAETA e pelo SEMTA, para fazer frente ao esforço de guerra
brasileiro na região amazônica. Surgiram, assim, dois personagens atuantes, diferenciados no modo de
recrutamento e na atração migratória para o sistema extrativo-produtivo do Segundo Ciclo da Borracha: o
Arigó, imigrante nordestino, voluntário e assalariado, conduzido para a Amazônia pela CAETA, e o Soldado
da Borracha, jovem em idade de incorporação às Forças Armadas, recrutado no Nordeste pelo SEMTA.
 O Segundo Ciclo da Borracha ocorreu entre 1942 e 1945.
Síntese de conteúdos elaborados por Viviane Simões, professora Licenciada em História pela UNIR –
Universidade Federal de Rondônia.

Machadinho D’Oeste – Rondônia

2016

REFERÊNCIAS:

MATIAS, Francisco. Formação Histórica e Econômica de Rondônia, Do século XVI ao XXI, Geografia e
História – atualidades. 3 ed. Porto Velho, INDAM, 2010.

TEIXEIRA, Marcos Antônio Domingues. FONSECA, Dante Ribeiro da. História Regional (Rondônia). 2 ed.
Porto Velho, Rondoniana, 2001.

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