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Relações Etnicorraciais
Educação para as
Relações Etnicorraciais
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN Secretaria de Educação a Distância – SEDIS
Reitora Secretária de Educação a Distância
Ângela Maria Paiva Cruz Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo
Vice-Reitor Secretária Adjunta de Educação a Distância
José Daniel Diniz Melo Ione Rodrigues Diniz Morais
Diretora da EDUFRN
Coordenadora de Produção de Materiais Didáticos
Luis Álvaro Sgadari Passeggi (Diretor)
Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo
Wilson Fernandes de Araújo Filho (Diretor Adjunto)
Coordenadora de Revisão
Judithe da Costa Leite Albuquerque (Secretária)
Maria da Penha Casado Alves
Conselho Editorial
Coordenador Editorial
Luis Álvaro Sgadari Passeggi (Presidente)
José Correia Torres Neto
Ana Karla Pessoa Peixoto Bezerra
Anna Emanuella Nelson dos S. C. da Rocha Projeto Gráfico
Anne Cristine da Silva Dantas Ivana Lima
Christianne Medeiros Cavalcante Conselho Técnico-Científico – SEDIS
Edna Maria Rangel de Sá Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo – SEDIS (Presidente)
Eliane Marinho Soriano Aline de Pinho Dias – SEDIS
Fábio Resende de Araújo André Morais Gurgel – CCSA
Francisco Dutra de Macedo Filho Antônio de Pádua dos Santos – CS
Francisco Wildson Confessor Célia Maria de Araújo – SEDIS
George Dantas de Azevedo Eugênia Maria Dantas – CCHLA
Maria Aniolly Queiroz Maia Ione Rodrigues Diniz Morais – SEDIS
Maria da Conceição F. B. S. Passeggi Isabel Dillmann Nunes – IMD
Maurício Roberto Campelo de Macedo Ivan Max Freire de Lacerda – EAJ
Nedja Suely Fernandes Jefferson Fernandes Alves – SEDIS
Paulo Ricardo Porfírio do Nascimento José Querginaldo Bezerra – CCET
Paulo Roberto Medeiros de Azevedo Lilian Giotto Zaros – CB
Regina Simon da Silva Marcos Aurélio Felipe – SEDIS
Richardson Naves Leão Maria Cristina Leandro de Paiva – CE
Rosires Magali Bezerra de Barros Maria da Penha Casado Alves – SEDIS
Tânia Maria de Araújo Lima Nedja Suely Fernandes – CCET
Tarcísio Gomes Filho Ricardo Alexsandro de Medeiros Valentim – SEDIS
Teodora de Araújo Alves Sulemi Fabiano Campos – CCHLA
Wicliffe de Andrade Costa – CCHLA
Legendagem e Audiodescrição
Jefferson Fernandes Alves
Gestão do Fluxo de Revisão
Rosilene Alves de Paiva
Revisão de Estrutura e Linguagem
Eugenio Tavares Borges
Revisão de Língua Portuguesa
Margareth Pereira Dias
Revisão de Normas da ABNT
Verônica Pinheiro da Silva
Revisão Tipográfica
Letícia Torres
Revisão de Prova
Fabíola Barreto Gonçalves
Diagramação
Carolina Aires Mayer
Criação e Edição de Imagens
Carolina Aires Mayer
Anderson Gomes
Utilização do banco de imagens:
http://www.freepik.com/
Catalogação da Publicação na Fonte. Bibliotecária Verônica Pinheiro da Silva CRB-15/692.
ISBN é 978-85-425-0692-1
CDU 9
C512h
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aos parâmetros do projeto gráfico. © Copyright 2005. Todos os direitos reservados a Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – EDUFRN.
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Sumário
Apresentação institucional 6
Apresentação da disciplina 7
A
Secretaria de Educação a Distância – SEDIS da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte – UFRN, desde 2005, vem atuando como fomentadora, no
âmbito local, das Políticas Nacionais de Educação a Distância em parceira
com a Secretaria de Educação a Distância – SEED, o Ministério da Educação –
MEC e a Universidade Aberta do Brasil – UAB/CAPES. Duas linhas de atuação
têm caracterizado o esforço em EaD desta instituição: a primeira está voltada para
a Formação Continuada de Professores do Ensino Básico, sendo implementados
cursos de licenciatura e pós-graduação lato e stricto sensu; a segunda volta-
-se para a Formação de Gestores Públicos, através da oferta de bacharelados e
especializações em Administração Pública e Administração Pública Municipal.
Para dar suporte à oferta dos cursos de EaD, a SEDIS tem disponibilizado
um conjunto de meios didáticos e pedagógicos, dentre os quais se destacam os
materiais impressos que são elaborados por disciplinas, utilizando linguagem e
projeto gráfico para atender às necessidades de um aluno que aprende a distân-
cia. O conteúdo é elaborado por profissionais qualificados e que têm experiên-
cia relevante na área, com o apoio de uma equipe multidisciplinar. O material
impresso é a referência primária para o aluno, sendo indicadas outras mídias,
como videoaulas, livros, textos, filmes, videoconferências, materiais digitais e
interativos e webconferências, que possibilitam ampliar os conteúdos e a inte-
ração entre os sujeitos do processo de aprendizagem.
Assim, a UFRN através da SEDIS se integra ao grupo de instituições que
assumiram o desafio de contribuir com a formação desse “capital” humano
e incorporou a EaD como modalidade capaz de superar as barreiras espaciais
e políticas que tornaram cada vez mais seleto o acesso à graduação e à pós-
graduação no Brasil. No Rio Grande do Norte, a UFRN está presente em polos
presenciais de apoio localizados nas mais diferentes regiões, ofertando cursos
de graduação, aperfeiçoamento, especialização e mestrado, interiorizando
e tornando o Ensino Superior uma realidade que contribui para diminuir as
diferenças regionais e transformar o conhecimento em uma possibilidade concreta
para o desenvolvimento local.
Nesse sentido, este material que você recebe é resultado de um investimento
intelectual e econômico assumido por diversas instituições que se comprometeram
com a Educação e com a reversão da seletividade do espaço quanto ao acesso
e ao consumo do saber E REFLETE O COMPROMISSO DA SEDIS/UFRN COM
A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA como modalidade estratégica para a melhoria dos
indicadores educacionais no RN e no Brasil.
6
Apresentação da disciplina
E
ste livro tem como objetivo ajudar na concretização da Lei 10.639/2003,
que instituiu como política de Estado, em caráter de obrigatoriedade, a
inclusão da temática História e Cultura Afro-brasileira no currículo escolar,
compreendendo desde a educação infantil até a formação de professores.
Tendo em conta que no momento de instituição dessa Lei havia, na forma-
ção dos professores, um quadro de déficit real, no que diz respeito aos conteúdos
exigidos por ela, o presente trabalho busca dar apoio didático a esses educadores,
auxiliando a superar essa carência da formação inicial para que, assim, estejam mais
bem-preparados no instante de pôr em prática essa exigência educacional e social.
O livro foi feito e pensado para ter uma estrutura e uma escrita didáticas. Desti-
nando-se a todo e qualquer profissional da Educação, é, porém, direcionado mais espe-
cificamente a educadores da área de História, Arte, Sociologia, Pedagogia e Literatura.
Este trabalho foi, inicialmente, elaborado para aplicação em um curso de aper-
feiçoamento, voltado aos professores da rede pública de Educação Básica do Rio
Grande do Norte. O curso, intitulado Educação Para as Relações Etnicorraciais, foi
oferecido pela Secretaria de Educação a Distância (SEDIS) da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte (UFRN). Ao fim do curso, após uma interação com alunos
e tutores, pudemos aperfeiçoar o material, com revisões, mudanças e acréscimos
nos textos, para só então publicá-lo agora.
Não se pretendeu, aqui, oferecer um manual de todos os temas relativos à
História e Cultura Afro-brasileira. Até porque já existem muitos manuais assim
disponíveis. Buscamos, antes, abordar certos temas pontuais que sempre se mos-
traram problemáticos na abordagem direta em sala de aula. O objetivo central é,
portanto, ajudar a desfazer os muitos nós que existem quando se trata da efetivação
na prática da Lei 10.639/2003, do ensino dos conteúdos que lhes correspondem.
7
O papel dos africanos na
construção socioeconômica
do Brasil
Aula
1
Apresentação
N
esta primeira aula, trataremos do papel desempenhado pelos
africanos e seus descendentes na construção socioeconômica do
Brasil. Abordar esse tema é falar, inevitavelmente, da escravidão e
da condição do sujeito escravo, fatores que condicionaram tal construção.
Esse assunto traz muitos outros. Por isso, fizemos, uma síntese,
enfocando alguns pontos considerados cruciais para que o educador
tenha uma base em que se apoiar no momento de analisar como um
sistema econômico escravista influenciou na construção das relações
sociais no Brasil.
A aula se inicia com uma discussão em torno do conceito de
escravismo; depois abordamos o tráfico negreiro e a escravidão na
história do Brasil, passando pelas questões da vida que levava o es-
cravo, das consequências desse sistema brutal, e da polêmica, desde
a década de 1960, em torno da abordagem de Gilberto Freyre sobre
a escravidão. Para finalizar, damos algumas informações sobre o
período escravista no contexto do Rio Grande do Norte.
Bons estudos!
Objetivos
9
O conceito de escravidão
Em nosso dia a dia, costumamos falar e ouvir inúmeras afirma-
ções sobre escravidão aplicadas a diferentes situações de humilhação,
exploração no trabalho e outras formas de sujeição. Se, por exemplo,
ganhamos pouco dinheiro para trabalharmos muito, dizemos logo
que “somos escravos”. O educador deve, entretanto, saber que esse
é um uso comum do termo “escravo”, e não um conceito histórico.
Apesar de não haver problema em usar esse termo em seu sentido
comum, ele deve também ser trabalhado em sala de aula apropriada-
mente, conceitualmente, para que o aluno tenha clareza da diferença
entre uma situação de exploração determinada, por mais absurda e
intolerável que seja ela, e a condição de ser escravo nas várias so-
ciedades que se utilizaram dessa prática. A grande dificuldade para
se falar com precisão sobre escravidão é justamente encontrar um
parâmetro para diferenciar os indivíduos submetidos à escravidão,
daqueles submetidos a formas diversas de sujeição e exploração.
Para iniciar essa tarefa, tomamos então uma definição bastan-
te flexível e abrangente, que nos é dada pelo antropólogo Claude
Meilassoux (1995), para quem a escravidão é uma forma de explo-
ração sobre uma classe de indivíduos considerada distinta, e que se
caracteriza pela renovação continuada desses indivíduos, seja lá de
que forma isso aconteça: por comércio, reprodução etc.
Além disso, em sala de aula, para diferenciar a escravidão das
demais formas de exploração, é preciso encontrar uma maneira de
demonstrar que a grande diferença está no fato de que a escravidão
define, antes de tudo, um status jurídico. E a distinção capital entre
ser escravo e ser um servo na Idade Média, por exemplo, ou ser
escravo e ser explorado ou submetido a trabalhos compulsórios na
sociedade atual, está justamente no fato jurídico de o escravo ser
propriedade do senhor (SILVA, 2008). Somente a exploração pela
escravidão torna o sujeito propriedade de outro.
Por mais que haja traços comuns a todas as formas de escravidão
conhecidas até hoje, cada época e lugar possuem suas marcas e mo-
dos próprios de fazê-la. É preciso levar em conta a historicidade dessa
instituição para chegar a noções mais precisas e evitar generalizações
sem fundamento, pois o escravo do Império Romano, por exemplo,
mesmo sendo propriedade de seu senhor, é tratado de maneira bem
diferente do escravo do Brasil escravista. Cada época reserva suas
próprias maneiras de praticar a escravidão.
No Brasil, como sabemos, a escravidão foi iniciada com a utili-
zação dos indígenas, que depois foram substituídos pelos africanos.
A renovação contínua de braços escravos se deu pelo comércio marí-
timo, que ficou conhecido como “tráfico negreiro”. Mesmo no Brasil,
Atividade 1
A família escrava
Comumente, a História que é ensinada nas escolas, no que se
refere ao período escravista, repete sempre as mesmas fórmulas e
modelos de explicação, o que faz com que, muitas vezes, tenha-se
uma visão superficial acerca desse tema, com enfoque concentrado
sempre nos mesmos pontos: o latifúndio e a monocultura, ambos
ligados à escravidão. A vida escrava para além desses limites, em
sala de aula, quase nunca é explorada.
Na visão mais tradicional, que não percebe a vida do escravo mais
intimamente, a única forma possível que ele teria para resistir seria a re-
volta ou a fuga. Essa visão ignora que a resistência dos africanos e negros
escravizados foi além da insurreição contra o senhor. E um bom exemplo
disso é o tema da família escrava, que já gerou muitas controvérsias entre
os historiadores. Para falar sobre ela, tomaremos como suporte o livro
clássico do historiador Robert Slenes, intitulado Na senzala, uma flor.
Atividade 3
Fonte: FREYRE, Gilberto. Casa-grande & Senzala. 41. ed. Rio de Janeiro: Record, 2000.
Atividade 7
Resumo
Referências
ASSUNÇÃO, Luiz. Levantamento de fontes sobre escravidão no
sertão potiguar – séc. XIX. Projeto de Pesquisa. Departamento de
Antropologia; PROPESQ; UFRN. Natal: UFRN, 2008.
Aula
2
Apresentação
E
sta aula tratará da participação africana na formação sociocultural
brasileira. Para compreender este assunto, que é vastíssimo e pode
ser abordado sob diversos enfoques, iremos nos deter no tema das
religiões chamadas de afro-brasileiras.
Estudar este tema é algo de suma importância para a preparação
do educador que pretende combater preconceitos, adquirir uma con-
cepção mais pluralista sobre a História do Brasil, e contribuir para a
revalorização da história, cultura e memória afro-brasileira.
A aula foi estruturada para que possamos compreender as cha-
madas religiões afro-brasileiras, sua história, suas características, suas
peculiaridades, e, por meio delas, adquirirmos uma noção mais clara
sobre o lugar e a contribuição das culturas africanas no processo de
formação de nossa sociedade. Esperamos que o conteúdo lhe inquiete!
Bons estudos!
Objetivos
41
Para entender de religião
Antes de abordarmos especificamente as religiões afro-brasileiras
é importante esclarecer que uma das grandes dificuldades comu-
mente encontradas para se falar de qualquer tipo de religião surge
do fato de que, as religiões são, de variadas formas, responsáveis por
fornecer o próprio sentido da vida de seus adeptos. Exatamente por
isso convido você a fazer um pequeno exercício antropológico de
compreender o outro que possui uma religião diferente e entender
como as ciências sociais pensam as manifestações dessa natureza.
Sabemos que para os religiosos, a fé fundamenta uma verdade
sobre o mundo. Ela explica uma série de incertezas humanas sobre
como surgimos, porque estamos aqui, e para onde vamos após a
morte. Além disso, as religiões também fornecem valores e modelos
de ação para o dia a dia: toda uma leitura sobre o mundo, sobre
como as coisas são, e sobre como devem ser, para muitas pessoas se
dá pela lente da religião.
Por esses motivos é comum nos depararmos com estranhos, ami-
gos, alunos ou mesmo colegas de trabalho que tenham enormes difi-
culdades em se permitir estudar, ou mesmo se informar, sobre como
funcionam sistemas religiosos diferentes do seu. Alguns se sentem
como se suas verdades estivessem prestes a desmoronar, e todo o
sentido de sua vida podendo ir por água abaixo. Essa sensação de ame-
aça, muitas vezes de maneira inconsciente e impensada, com muita
frequência gera atitudes defensivas e, no pior dos casos, intolerantes.
A proposta aqui, é mostrar o processo de construção das religiões
afro-brasileiras, as características gerais desse campo e suas ricas
contribuições para a cultura brasileira. O processo de formação dessas
religiões, mostra que elas se construíram à margem da sociedade,
suportando toda a sorte de violência física e simbólica. Desse modo,
para que o nosso exercício antropológico funcione, é necessário que
nos voltemos para aquelas concepções mais caras a nós, sendo re-
ligioso ou não, para pensar que a importância que as opiniões dos
outros têm para eles é a mesma que as nossas têm para nós mesmos.
Desde o século XIX o Brasil passou a permitir a liberdade de cul-
to, ao menos legalmente. Na Constituição de 1988, o Brasil passou
a defender a ideia de um estado laico e com diversidade cultural,
não só passou a tratar as religiões como iguais como passou a criar
estratégias para acabar com situações de discriminação e preconceito.
Ao longo de todo esse processo as religiões afro-brasileiras sofreram
com manobras que visavam distanciá-las de direitos assegurados a
todos. Se há 100 anos, essas religiões foram perseguidas por serem
acusadas de falsa medicina, charlatanismo e bruxaria; hoje, com a
modernização do preconceito, os perseguidores passaram a utilizar o
O encontro de religiosidades
Para iniciar as nossas reflexões sobre as religiões afro-brasileiras,
é imprescindível tratar de alguns pontos relativos à religiosidade dos
conquistadores portugueses no encontro com os povos existente na
África e na América no período das grandes navegações, destacando
o modo como os colonizadores passaram a representar a religiosidade
dos povos que foram submetidos à escravidão.
Desde muito tempo, as populações europeias haviam sugerido
imagens sobre o mundo de além-mar. Histórias maravilhosas sobre
viagens contavam sobre as gentes exóticas dos trópicos, monstros
terríveis e natureza edênica. Elas alimentaram a imaginação daqueles
ciosos por conhecer esse mundo distante. Aliado a isso, ao longo de
sua história, a Igreja Católica desenvolveu um aparato teórico para
auxiliar os seus religiosos na percepção do “diabo” e nas maneiras
de combatê-lo. Muitas vezes, no entanto, a imagem do mal personi-
ficado serviu de justificativa para inúmeras injustiças e violências,
tanto na Europa, quanto na relação desta com outros povos e cultu-
ras. Com o argumento de salvar as almas daqueles que professavam
outras religiões, que aos olhos cristãos eram enganados pelo inimigo
de Deus, buscava-se a conversão mesmo por meio da força, impondo
com violência a ideia de que Jesus era o único salvador.
Precisamos nos distanciar de nossas concepções religiosas – o que
nem sempre é fácil! – e depositar um olhar de estranhamento, pois o
fato de Portugal afirmar-se como uma nação católica foi decisivo para
a maneira como as relações estabelecidas com os outros povos foram
conduzidas. Além do intuito de conquistar novas terras e riquezas,
Portugal estava empenhado em difundir a fé nas Sagradas Escrituras
Calundus
Ponto cantado I
Ponto cantado II
Religiões de possessão
Conforme argumentamos, há uma imensa diversidade de práti-
cas no segmento religioso afro-brasileiro. Não obstante, essas religi-
ões também guardam, entre elas, várias características em comum.
A primeira, e mais importante, é, evidentemente, o fato de todas pos-
suírem a presença de alguma matriz africana em suas origens. Afora
esse fato, há também outro elemento comum a todas essas religiões
sobre o qual queremos falar, fenômeno pouco compreendido e sobre o
qual muito se especula preconceituosamente: é o transe de possessão.
É comum, entre as pessoas que não pertencem às religiões afro-
-brasileiras, questionar e duvidar da veracidade do transe de posses-
são, acusando os pais e mães de santo de “atores” ou “charlatões”.
De início, para evitar equívocos e preconceitos, é preciso esclarecer,
então, o que é o transe, e o que é a possessão.
Como bem explica a antropóloga Maria Helena Villas-Boas
Concone (1987), “transe” é um termo psiquiátrico que diz respei-
to a estados alterados de consciência. Tais estados se caracterizam
pela descontinuidade das funções da personalidade, por alterações
sensoriais, e pela perda da memória e descontinuidade dos padrões
comportamentais. E o mais importante: o transe não está ligado, ne-
cessariamente, a nenhuma manifestação religiosa. Um bom exemplo
de transe desligado da experiência religiosa é o transe hipnótico, às
vezes utilizado por psiquiatras em alguns pacientes.
Além do transe não estar necessariamente ligado a alguma re-
ligião, é preciso esclarecer também que existem vários fatores di-
ferentes que podem conduzir pessoas a esse estado: ingestão de
substâncias psicoativas, uso de música, uso de dança ritual, prática
de jejum, uso de tabaco, entre outras. Em todas essas formas variadas
de se chegar ao transe, o que temos é o mesmo resultado: a pessoa
entra num estado alterado de consciência e tem sua memória, sua
personalidade e seus sentidos alterados. Portanto, o transe é um
termo técnico ligado ao contexto psicológico e psiquiátrico.
Atividade 3
O que é macumba
Se chegarmos para uma turma de alunos e perguntarmos o que é
Tambor de Mina, Batuque ou Terecô, o mais provável é que ninguém
saiba responder. Por outro lado, se perguntarmos o que é “macumba”,
receberemos de imediato uma enxurrada de respostas. E mais: já é pos-
sível prever qual o teor dessas respostas, pois o termo macumba carrega
consigo inúmeros sentidos depreciativos que todos nós conhecemos.
Atividade 4
1) Cultos visto como aqueles que guardaram fortes traços de origem
africana. São religiões baseadas no culto aos deuses africanos
como: o Candomblé, o Xangô, o Tambor de Mina e o Batuque.
Xangô
Batuque
Cabula
Macumba
Candomblé de Caboclo
Catimbó-Jurema
Jarê
Panteão
Concepção do transe
Iniciação
Hierarquia religiosa
Dança ritual
Atividade 6
Candomblé Umbanda
Panteão
Concepção do transe
Iniciação
Hierarquia religiosa
Dança ritual
Atividade 7
CORRESPONDÊNCIA ENTRE OS
DEUSES AFRICANOS E SANTOS CATÓLICOS
São Jerônimo
Xangô Badé-Quevioso Zaze São Pedro
São João
N. Sra. da Conceição
Dandalunda
Iemanjá Abé N. Sra. dos
Quimssimbe
Navegantes
Bamburucema
Iansã Sobô Santa Bárbara
Matamba
Jesus Cristo
Zambi
Oxalá Mavu-Lissa N. Sr. do Bom Fim
Lemba
(BA)
Erê, Ibeji
Hohó São Cosme
(espíritos Vunje
Tobosi São Damião
infantis)
Atividade 8
Figura 3 – Tronco de Jurema.
Fonte: Marcos Queiroz.
Figura 4 – Banquete de Cavungo.
Fonte: Luiz Assunção.
Leituras complementares
Autoavaliação
Para iniciar sua autoavaliação, sugerimos que você retome
1 a Atividade 1 e faça uma análise da sua resposta. Houve
mudanças na sua visão sobre as religiões afro-brasileiras?
Se houve, quais foram?
Referências
ANDRADE, Mário de. Música de Feitiçaria no Brasil. 2. ed. Belo
Horizonte: Itatiaia, 1983.
Aula
3
Apresentação
N
esta terceira aula, refletiremos conceitualmente sobre a ca-
tegoria quilombo, seja numa perspectiva histórica, seja por
meio do significado que o termo adquiriu no contexto atual.
Pelo viés da história, é importante perceber o significado que esse
termo possui como símbolo da resistência negra contra a escravidão.
Porém, com o estabelecimento do Art. 68 da Constituição Federal
Brasileira, que assegura a titulação das terras dos denominados “re-
manescentes das comunidades de quilombos”, foi preciso rever esse
conceito. Diante disso, houve a necessidade de redimensionamento
do termo quilombo com o objetivo de permitir o acesso mais amplo,
das populações afro-brasileiras, à emancipação social e aos direitos
civis. Por causa suas experiências em campo, os antropólogos fo-
ram convocados a repensar o termo quilombo, por meio do viés da
autoatribuição da identidade e das estratégias de ocupação da terra.
O nosso caminho é iniciado a partir da concepção clássica de
quilombo. Em seguida conheceremos um pouco do quilombo mais
famoso de nossa história: Palmares. Depois abordaremos os debates
que suscitaram uma nova concepção de quilombo e quais os motivos
que levaram a essa revisão. Diante disso, torna-se necessário enten-
der quais os conceitos que norteiam as políticas para as comunidades
quilombolas. Para finalizar, tomaremos ciência da situação atual das
comunidades quilombolas no Rio Grande do Norte.
Bons estudos!
Objetivos
86
Quilombos: episódios
da resistência negra
Durante o período escravista no Brasil, os africanos e seus descen-
dentes criaram inúmeras formas de resistir à exploração a que estavam
sujeitos. A ideia de que negros e negras aceitaram passivamente todos
os maus-tratos sofridos durante a escravidão é um equivoco histórico
que é fruto, dentre outros motivos, do desconhecimento dos processos
de luta desenvolvidos pelos africanos que aqui foram escravizados e
do racismo que, mesmo velado, produz visões negativas sobre o negro,
tal como a de que aceitou todo aquele sofrimento passivamente. Como
afirmamos logo de início, não foi isso o que aconteceu.
A Revolta da Chibata, a Revolta dos Malês, as organizações da
Frente Negra Brasileira, após a Abolição, dentre outros fatos, só re-
afirmam o inconformismo. Dentre as várias formas de resistência
desenvolvidas pelos escravos africanos, porém, a fuga e a formação
de quilombos foi uma das que mais se destacaram. Os habitantes dos
quilombos eram costumeiramente chamados de quilombolas, mo-
cambeiros ou calhambolas. Mesmo perseguidos pelo aparato militar
da colônia e do império, muitos quilombos conseguiram sobreviver
por muito tempo. As relações de aliança com índios e brancos pobres
eram estratégias que ajudavam nessa sobrevivência.
Como lembra o estudioso Kabengele Munanga (2006, p.74), havia
grande variedade na economia interna dos quilombos, mas era comum
que estes vivessem do saque aos engenhos de açúcar, fazendas e po-
voações, onde conseguiam comida, armas e mulheres. Além disso, os
Atividade 1
Figura 2 – Antônio Parreiras – Zumbi, 1927 - Óleo sobre tela - A 115,3 x L 87,4 cm.
Atividade 2
Atividade 3
COMUNIDADES QUILOMBOLAS DO RN
29.Capoeiras dos
Negros*#@
Acari 1.Higinos Macaíba 30.Bonsucesso
31.Lagoa do Sítio
32.Riacho do Sangue
33.Boa Vista dos
Negros*#@
Açu 2.Bela Vista Piató*# Parelhas
34.Poço Branco
35.São Sebastião
Antonio
4.Timbaúba Patu 37.Jatobá*#@
Martins
5.Lagoa da Ilha
6.Barra 38.Negros das
Afonso Arqueiras
Pedro Avelino
Bezerra 7.Carreta
39.Aroeiras*#@
8.Curralinho
10.Sítio Pavilhão*#@
Bom Jesus Poço Branco 41.Acauã*#@
11.Sítio Grossos*#
17.Coqueiros; 52.Cajazeiras*
Ceará-
18.Capoeira dos Santo Antônio 53.Camaleão
-Mirim
Negros 54.Toscão
Cerro Corá 19.Negros do Boinho São Gonçalo 55.Serrote
Grossos 20.Alagamar São Miguel 56.Vieira
21.Boa Vista; São Paulo do
Ipueira 57.Alecrim
22.Negros do Barcão Potengi
58.Gameleira de
Ipanguaçu 23.Picadas*# São Tomé
Baixo*#
Ielmo 24.Nova Serra Negra do
59.Negros da Serra
Marinho Descoberta*# Norte
Jardim do 25.Pretos do Bom Tenente
60.Poço do Açude
Seridó Sucesso Ananias
26. Comunidade
Jundiá Tibau do Sul 61.Sibaúma*#
Pires
Lagoa
Nova/ 62.Baixa do
Bodó/ 27. Macambira *#@ Quinquim*
Santana do Touros
63.Geral*#
Matos
64.Areias
Luís Gomes 28.São Bernardo
I
(*) Possui certidão de autorreconhecimento expedida pela Fundação Cultural Palmares.
(#) São as comunidades que entraram com o pedido de titulação do território.
(@) Comunidades que possuem o laudo antropológico concluído.
Leituras complementares
Autoavaliação
Como é sabido por todos os educadores da rede pública, o
1 dia 20 de novembro é o Dia Nacional da Consciência Negra.
Nesse dia, muitas escolas realizam atividades que permi-
tem aos alunos conhecer melhor a história e cultura afro-
-brasileira, e discutir os problemas raciais, culturais e étnicos
relativos a essa parte da nossa história nacional. Para que
possamos compartilhar experiências, gostaríamos que você
relatasse a seguir se em sua escola tem sido feita alguma
atividade sobre o assunto. Se a resposta for sim, diga como
tem se dado, e faça sua análise sobre os resultados alcança-
dos. Se a resposta for não, explique quais os impedimentos.
Referências
ALMEIDA, Alfedo Wagner Berno de. Quilombos e as Novas
Etnias. Manaus: UEA Edições, 2011.
Anotações
9 788542 506921