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Resumo
O artigo discute a vivência das docentes-autoras nas disciplinas de Teoria Geral da Administração
(TGA) e Sociologia e Ética nas Organizações, a partir de uma revisão bibliográfica. Nessa perspectiva,
propõe e analisa, a partir de uma visão critica e dialética, a participação de tais disciplinas na grade
curricular do curso de Administração, como fundamentais para a formação do profissional crítico. A
questão principal discutida é como essas disciplinas se enquadram no processo de construção de um
posicionamento questionador do aluno de Administração. Os resultados mostram que é possível sair
dos “lugares comuns” e refletir sobre a prática docente.
Algumas questões geram um despertar para o ensino dos estudos sobre a TGA no que
tange a duas questões: inserção e forma.
Por um lado, os determinantes sociais e políticos que emergem da construção social da
realidade, possibilitam demonstrar a Administração como ciência desenvolvida para o controle.
Por outro, a gestão pode ser entendida como um conjunto de técnicas funcionalistas na utilização
e reprodução do capital, cujo conteúdo se desmembra em modelos ideais de organização do
trabalho dos quais as empresas modernas se apropriam.
Essa dicotomia é refletida no primeiro ponto - inserção – a maneira como se dá a inclusão
da disciplina TGA na grade curricular do curso Bacharelado de Administração. Uma alternativa
pode ser a opção dotada de elementos que formem alunos críticos da realidade e agentes de
transformação social à medida que possam entender o “porquê” e não somente o “como” dos
processos de produção capitalista. Compreender o que faz o gerente vai mais além do planejar,
organizar, dirigir e controlar. Questões críticas: “por que faz?” e “por que é o gerente quem
faz?”.
A partir da Revolução Industrial têm-se construções históricas que auxiliam o
entendimento dessas questões. Uma vez que esse marco produziu desafios administrativos
importantes, com a incorporação do progresso técnico pelas grandes corporações industriais, os
planos de produção começaram a apresentar mudanças significativas. Em termos de produção, o
panorama era o desenvolvimento da técnica de produção em massa e o surgimento das grandes
corporações industriais, que investiam consideravelmente em equipamento e tecnologia visando
ao rendimento humano na produção (Landes, 1969).
Nesse contexto, podemos discutir a questão da forma. O Taylorismo surge na aplicação
dos métodos das ciências aos problemas da Administração, com o objetivo de atingir uma
elevada eficiência industrial, através do the best way, ou o melhor caminho para se desempenhar
tarefas. Os principais métodos científicos aplicáveis aos problemas da administração em resolver
o aumento da produtividade e a redução dos custos de produção foram observação e mensuração.
A principal implicação desse processo é a simplificação extrema do trabalho que é reduzido a
uma só operação, ou mesmo a um só movimento, e a produtividade passa a ser responsabilidade
da organização e não mais do indivíduo.
As funções da gerência surgem devido ao trabalho cooperativo e o capitalista assume esta
função por ser ele o dono do capital e responsável pela minimização das incertezas do processo
de produção. A coordenação é necessária num sistema complexo, com mais pessoas, o capitalista
é o gerente e tem uma função social – é o gerente porque é o capitalista, conforme ressalta
Braverman (1974).
A gerência científica foi fundada pelo engenheiro americano Frederick W. Taylor (1856-
1915) que elaborou uma nova proposta de organização do trabalho com a aplicação de métodos e
técnicas da engenharia industrial na forma de organizar o trabalho. No contexto anterior, a
produção familiar impedia a divisão do trabalho e, no empenho de comprar o trabalho acabado,
aliviava o capitalista das incertezas do sistema com a fixação de determinado custo unitário. O
controle sem a centralização era impossível e assim o requisito para a gerência era a reunião de
trabalhadores na empresa, sob a supervisão de um capataz.
O Taylorismo tenta resolver o problema da falta de conhecimento da gerência quanto às
rotinas de trabalho e do tempo necessário para sua realização, da ausência de uniformidade nas
técnicas e métodos de trabalho, bem como da subjetividade do trabalhador, uma vez que a
subordinação mecânica não consegue controlar o trabalho que o capitalismo necessita. A
Administração Científica, além de fornecer uma sustentação ideológica, sistematiza esse
controle, contribuindo para a reprodução do sistema capitalista. Porém, o controle objetivo não é
total, já não existe uma mecanização plena, a mecanização é definida para cada setor do trabalho,
além de cada setor definir o seu trade-off, considerando mecanização versus flexibilidade.
Braverman (1974) destaca que o trabalho é afetado, por diversos fatores, tais como: a
história passada pelo trabalhador; condições sociais gerais sob as quais trabalham; condições
próprias da empresa; condições próprias do seu trabalho; organização do processo de trabalho;
diferentes formas de supervisão. Com vistas a ampliar os estudos da gerência, Elton Mayo
pesquisa o ajustamento do trabalhador ao processo de produção em curso, projetado pelo
engenheiro industrial, preocupando-se com a seleção, adestramento e manipulação, pacificação e
ajustamento da mão de obra, a fim de adaptá-las ao processo de produção de trabalho assim
organizado.
A concorrência capitalista impõe a divisão do trabalho como princípio fundamental da
organização industrial, na oficina é imposta pelo planejamento e controle. As operações não são
separadas umas das outras como são atribuídas a diferentes trabalhadores. A divisão do trabalho
aumenta a produtividade à medida que aumenta a destreza do trabalhador individualmente,
diminuindo o tempo gasto na produção, permitindo que um homem faça o trabalho de muitos.
Braverman (1974) constata que não é só a técnica pura que interessa ao capitalista, mas o
consórcio da técnica com o capital. Formam-se dois pólos, aquele cujo tempo nada vale –
execução – e outro cujo tempo é extremamente valioso – planejamento –, lei geral da divisão do
trabalho capitalista.
A partir deste recorte histórico, pode-se demonstrar como a TGA seria vista de uma
maneira crítica, apresentando os “porquês” e não somente o “quê” e “como” o processo
administrativo é conduzido nas organizações. Também há temas transversais no ensino da TGA
como conflito, controle e cultura organizacional, no entanto, esta foi uma opção que conduz à
reflexão sobre os primórdios do papel da gerência no contexto do Taylorismo.
Segundo Wolff (1993), a atividade da universidade possui problemas complexos, cuja
solução requer habilidade e imaginação por parte do corpo docente e da administração. Enquanto
o capitalismo requer trabalhadores com habilidade técnica e alto nível de imaginação,
inventividade e iniciativa individual, o sistema, por sua vez, exige crescimento, que se baseie na
inovação técnica e administrativa. Entretanto, o ser humano é levado a desenvolver atividades
criativas por motivações internas, e não somente pelo crescimento econômico contínuo.
A partir das questões observadas em apenas duas disciplinas da grade curricular do curso
de Administração, TGA e Sociologia, criamos mais anseios acerca do que pode ser construído a
partir da teoria crítica.
Não tivemos aqui a pretensão de propor soluções, pelo contrário, a partir de nossa realidade
tivemos a oportunidade de levantar mais questionamentos, como se seguem:
A Educação Superior está servindo de muleta para dar suporte e continuidade às relações de
dominação capitalista?
Há uma cientifização dos mercados ou mercantilização das ciências?
Quem educa os educadores?
Nesse sentido, verifica-se uma lacuna a ser sanada nos cursos de bacharelado que, ao nosso
ver, transcendem aos planos de ensino e permeiam estruturas políticas e institucionais das IES.
O desafio da educação pode estar no equilíbrio de forças que movem a diversidade de
interesses dos agentes das IES. Resgatar o "sentido de uso" no processo de construção da própria
história individual pode abrir um espaço de reflexão e capacidade crítica que gera valores sociais
que contaminam e iniciam o processo de articulação entre grupos, que podem gerar mudanças
em longo prazo, impactantes não somente no ambiente universitário, mas na sociedade na qual
está inserida.
Referências Bibliográficas
BENJAMIN, Walter. Sobre Arte, Técnica, Liguagem e Política. Lisboa: Relógio D’Água, 1992.
BRAVERMAN. Trabalho e Capital Monopolista. Rio de Janeiro: Zahar, 1980.
BUARQUE, Cristóvão. A aventura da universidade. São Paulo: Unesp, 1994.
LANDES, D.S. The Unbound Prometeus. Cambridge: Cambridge University Press, 1980.
SILVA JR., J. R. e SGUISSARD, U. Novas faces da Educação Superior no Brasil. São Paulo:
Cortez, 2001.
WOLFF, R. P. O ideal da universidade. Parte I. 29- 86p. São Paulo: Unesp, 1993.