Capítulo 01
As várias categorias de interesses
Interesse público é o interesse da coletividade, em seu todo. É o próprio Estado que, por seus órgãos,
chama para si a tarefa de dizer, num dado momento, em que consiste o interesse de todos. O povo só interfere nessa
decisão quando se manifesta, direta ou indiretamente, pelas vias cabíveis (eleições, plebiscitos, etc.).
Ao tomar decisões no suposto benefício de todos, o Estado, não raro, confronta seus interesses com os dos
indivíduos. É tradicional a divisão entre Direito Público e Direito Privado. Nesse sentido, o interesse público
consiste na contraposição do interesse do Estado ao do indivíduo; o interesse privado consiste na contraposição
entre os indivíduos, em seu inter-relacionamento.
Hoje a expressão Direito Público tornou-se equívoca, quando passou a ser utilizada para alcançar também
os interesses sociais, os interesses indisponíveis do indivíduo e da coletividade, e até os interesses coletivos ou os
interesses difusos. Nos últimos anos tem-se reconhecido uma categoria intermediária de interesses, que, não sendo
estatais, são mais que meramente individuais, porque compartilhados por grupos, classes ou categorias de pessoas.
Todas essas dificuldades recomendavam que os interesses de grupos alcançassem disciplina processual
própria, para a adequada defesa em juízo dos direitos coletivos, também chamados de direitos de terceira geração.
No Brasil tal defesa começou a ser sistematizada com o advento da Lei 7.347/85 e, em seguida, com a Lei
8.078/90, que distinguiu os interesses transindividuais em difusos, coletivos em sentido estrito e individuais
homogêneos.
Como o interesse do Estado ou dos governantes não coincide necessariamente com o bem geral da
coletividade, Renato Alessi entendeu oportuno distinguir o interesse público primário (o bem geral) do interesse
público secundário (o modo pelo qual os órgãos da Administração veem o interesse público).
O interesse público primário é o interesse social (o interesse da coletividade ou da sociedade como um
todo). A distinção de Alessi permite evidenciar que nem sempre coincidem o interesse público primário e o
secundário.
Partindo da constatação de que a sociedade atual é cada vez mais complexa e fragmentária – pois os
interesses de grupos se contrapõem de forma acentuada – alguns doutrinadores têm sustentado o esvaziamento do
conceito de interesse público, ou têm negado que exista um único bem comum. Assim, melhoras os serviços sociais
à disposição das classes mais pobres pode exigir aumento de impostos para as classes mais favorecidas, o que será
contrapor os interesses dos grupos diretamente envolvidos no problema.
Situados numa posição intermediária entre o interesse público e o interesse privado, existem os interesses
transindividuais (interesses coletivos em sentido lato), os quais são compartilhados por grupos de pessoas. São
interesses que excedem o âmbito estritamente individual, mas não chegam propriamente a constituir interesse
público.
Sob o aspecto processual o que caracteriza tais interesses é a circunstância de que a ordem jurídica
reconhece a necessidade de que o acesso individual dos lesados à justiça seja substituído por um acesso coletivo, de
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
modo que a solução obtida no processo coletivo não apenas deve ser apta a evitar decisões contraditórias, como,
ainda, deve conduzir a uma solução mais eficiente da lide, porque o processo coletivo é o exercício em proveito de
todo o grupo lesado.
Há, pois, interesses que envolvem uma categoria determinável de pessoas e outros que são compartilhados
por grupo indeterminável de indivíduos ou por grupo cujos integrantes são de difícil ou praticamente impossível
determinação (como os difusos).
Todos os interesses de grupos, classes ou categorias de pessoas merecem tutela coletiva para acesso à
Justiça, e não apenas tutela individual.
A tutela coletiva apresenta as seguintes características:
a) Estabelece-se uma controvérsia sobre interesses de grupos, classes ou categorias de pessoas;
b) É frequente a conflituosidade entre os próprios grupos envolvidos;
c) A defesa judicial coletiva faz-se por meio de legitimação extraordinária;
d) A destinação da indenização normalmente é especial;
e) Como os colegitimados ativos para a ação civil pública ou coletiva não são titulares dos interesses
transindividuais objetivados na lide, é necessário que a imutabilidade do decisum ultrapasse os limites das
partes processuais;
f) Preponderam os princípios da economia processual.
4. Interesses difusos
São interesses ou direitos transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato. Embora o CDC se refira a uma relação fática ser o elo comum
entre os lesados, é evidente que essa relação fática também se subordina a uma relação jurídica; entretanto, nos
direitos difusos a lesão ao grupo não decorrerá diretamente da relação jurídica em si, mas sim da situação fática
resultante. Ex: uma propaganda enganosa pela televisão relaciona-se com questões fáticas e jurídicas; contudo, o
que reúne o grupo para fins de proteção difusa é o seu acesso efetivo ou potencial à propaganda enganosa.
Os interesses difusos não são mera espécie de interesse público, pois nem todos os interesses difusos são
compartilhados pela coletividade ou comungados pelo Estado. Tais interesses podem caracterizar-se por uma larga
área de intrínseca conflituosidade, em razão da qual se mostram ineficientes os procedimentos e a estrutura que
normalmente se prestam à mediação de conflitos.
O objeto dos interesses difusos é indivisível. O interesse ao meio ambiente hígido, p.ex., não pode ser
quantificado ou dividido entre os membros da coletividade.
5. Interesses coletivos
Em sentido lato, a expressão direitos coletivos refere-se a interesses transindividuais, de grupos, classes ou
categorias de pessoas. O CDC, entretanto, introduziu um sentido mais restrito de interesses coletivos. Coletivos, em
sentido estrito, são interesses transindividuais indivisíveis de um grupo determinado ou determinável de pessoas,
reunidos por uma relação jurídica básica comum. Esse mesmo conceito mais restrito foi retomado pela Lei do
Mandado de Segurança (Lei 12.016/09, art. 21, par. único, I).
Tanto os interesses coletivos como os difusos são indivisíveis, mas se distinguem não só pela origem da
lesão como também pela abrangência do grupo. Os interesses difusos supõem titulares indetermináveis, ligados por
circunstâncias de fato, enquanto os coletivos dizem respeito a grupo, categoria ou classe de pessoas determinadas
ou determináveis, ligadas pela mesma relação jurídica básica.
Por sua vez, os interesses coletivos e os interesses individuais homogêneos têm também um ponto de
contato: ambos reúnem grupo, categoria ou classe de pessoas determináveis; contudo, distinguem-se quanto à
divisibilidade do interesse: só os interesses individuais homogêneos são divisíveis, supondo uma origem comum.
Para o CDC, interesses individuais homogêneos são aqueles de grupo, classe ou categoria de pessoas
determinadas ou determináveis, que compartilhem prejuízos divisíveis, de origem comum, normalmente oriundos
das mesmas circunstâncias de fato.
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Para a Lei do MS interesses individuais homogêneos sã os decorrentes de origem comum e da atividade ou
situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante do mandado de segurança
((art. 21, par. único, II).
Em sentido lato, os interesses individuais homogêneos não deixam de ser também interesses coletivos.
Tanto os individuais homogêneos como os difusos originam-se de circunstâncias de fato comuns;
entretanto, são indetermináveis os titulares de interesses difusos, e o objeto de seu interesse é indivisível; já nos
interesses individuais homogêneos, os titulares são determinados ou determináveis, e o objeto da pretensão é
divisível.
Como exemplo de interesses individuais homogêneos, suponhamos os compradores de veículos produzidos
com o mesmo defeito de série. Há uma relação jurídica comum subjacente entre os consumidores, ,as o que os liga
no prejuízo sofrido não é a relação jurídica em si, mas o fato de que compraram carros do mesmo lote produzido
com o defeito em série. Cada integrante do grupo terá direito divisível à reparação devida. Ao contrário, se a ação
pública versasse sobre interesses coletivos, em sentido estrito (ex: nulidade de cláusula contratual), deveria ser
decidida de maneira indivisível para todo o grupo.
7. Conclusões
Em síntese, se dentre uma série de bens de consumo, vendidos a usuários finais, um deles foi produzido
com defeito, o lesado terá interesse individual na indenização cabível. Já os interesses serão individuais
homogêneos, a ligar inúmeros consumidores, quando toda a série de um produto saia de fábrica com o mesmo
defeito.
Por sua vez, quando em ação civil pública se reconheça tão somente a ilegalidade de um aumento aplicado
nas prestações de um consórcio, teremos interesses coletivos; já, porém, a pretensão à restituição de prestações
pagas indevidamente variará de acordo com as cotas de cada um deles (interesses individuais homogêneos).
Os interesses só serão verdadeiramente difusos se, além de terem objeto indivisível, for impossível
identificar as pessoas ligadas pelo mesmo laço fático ou jurídico.
Constitui erro comum supor que, em ação civil pública ou coletiva, só se possa discutir uma só espécie de
interesse transindividual. Não raro, nessas ações, discutem-se direitos de mais de uma espécie.
Outra confusão recorrente precisa ser desfeita: o mesmo interesse não pode ser simultaneamente difuso,
coletivo e individual homogêneo, pois se trata de espécies distintas. O que pode ocorrer é que uma única
combinação de fatos, sob uma única relação jurídica, venha a provocar o surgimento de interesses transindividuais
de mais de uma categoria, os quais podem até ser defendidos no mesmo processo coletivo.
Capítulo 02
Legitimação ordinária e legitimação extraordinária
1. Legitimação ordinária
A legitimação ordinária é a maneira clássica de defender os interesses em juízo, meio pelo qual a própria
pessoa que se diz lesada defende seu interesse. Excetuando-se as hipóteses em que o Estado reserve a si próprio a
iniciativa de agir, no mais, diante da natureza disponível dos direitos privados, o ordenamento jurídico privilegia o
individualismo para identificar os sujeitos legitimados que podem pedir a atuação dos órgãos jurisdicionais em
busca da restauração da ordem jurídica violada.
2. Legitimação extraordinária
A legitimação extraordinária, ou anômala, ocorre quando o Estado não levar em conta a titularidade do
direito material para atribuir a titularidade da sua defesa em juízo. Em alguns casos, o Estado permite que a defesa
judicial de um direito seja feita por quem não seja o próprio titular do direito material, ou, pelo menos, por quem
não seja o titular exclusivo desse direito.
Por ser excepcional, depende de autorização expressa (ao contrário do que ocorre com a legitimação
ordinária) e poderá ocorrer: a) quando, em nome próprio, alguém esteja autorizado a defender direito alheio; b)
quando, numa relação jurídica que envolva vários sujeitos, a lei permite que um só dos integrantes do grupo lesado
defenda o direito de todos.
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
A substituição processual é uma forma de legitimação extraordinária, que consiste na possibilidade de
alguém, em nome próprio, defender em juízo direito alheio. Não se confunde, pois, com a representação, pela qual
alguém, em nome alheio, defende o interesse alheio.
Nas ações civis públicas ou coletivas alguns legitimados substituem processualmente a coletividade de
lesados (legitimação extraordinária). Tal legitimação dá-se em proveito da efetividade do interesse violado.
Nem todos os estudiosos reconhecem o caráter de legitimação extraordinária aquela que se encontra no
polo ativo das ações civis públicas ou coletivas. Alguns autores apontam estar presente uma verdadeira legitimação
ordinária, quando o Ministério Público, os entes políticos, seus órgãos descentralizados e as associações, em nome
próprio, propõem ações civis públicas em defesa de seus interesses, caso em que sua legitimação é concorrente e
disjuntiva.
Entendem alguns autores, assim, que seria tal legitimação autônoma, exigindo substituo certo. Contudo,
não seguimos tal entendimento, pois o Direito brasileiro não faz distinção.
Em nosso entendimento, a substituição processual nas ações civis públicas ou coletivas não se dá apenas
nas hipóteses de defesa de interesses individuais homogêneos, mas também quando ajam na tutela judicial de
interesses coletivos, e, portanto, indivisíveis. Da mesma forma, quando ajam no zelo de interesses difusos.
Enfim, se entendêssemos que os legitimados ativos à ação civil pública ou coletiva agem por direito
próprio, chegaríamos à incorreta conclusão de que jamais haveria litispendência ou coisa julgada entre duas ações
civis públicas com a mesma causa de pedir e o mesmo objeto, quando movidas por legitimados ativos diferentes.
TÍTULO II
A AÇÃO CIVIL PÚBLICA E O MINISTÉRIO PÚBLICO
Capítulo 03
Ação Civil Pública
Considerando a titularidade do poder de invocar a tutela judicial do interesse, Calamandrei anotou: “Como
entre os poderes de disposição está compreendido também o poder de invocar a garantia jurisdicional, a distinção
entre direito privado e direito público no campo substancial se projeta no processo através da legitimação para agir:
e se tem, em consequência, ação privada quando o poder de provocar o exercício da jurisdição está reservado de
modo exclusivo ao titular do interesse individual que a norma jurídica protege, e a ação pública quando tal poder é
confiado pelo Estado a um órgão público especial, que age, independente de qualquer estímulo privado, por dever
de ofício.
Sob o aspecto doutrinário, ação civil pública é a ação de objeto não penal proposta pelo Ministério Público.
A Lei 7.347 não se utilizou da melhor técnica, pois utilizou a expressão ação civil pública para referir-se à ação
para a defesa de interesses transindividuais, proposta por diversos colegitimados ativos, entre as quais até mesmo
associações privadas.
A ação civil pública da Lei 7.347 nada mais é do que uma espécie de ação coletiva, como o mandado de
segurança coletivo e a ação popular.
Como denominaremos, pois, uma ação que verse a defesa dos interesses difusos, coletivos ou individuais
homogêneos?
Se ela estiver sendo movida pelo Ministério Público, o mais correto, sob o prisma da doutrina, será chamá-
la de ação civil pública. Mas se tiver sido proposta por associações civis, mais correto será denominá-la ação
coletiva.
Segundo a Constituição Federal, o Ministério Público nunca terá legitimidade exclusiva para a promoção
de ação civil em defesa de interesses transindividuais. São colegitimados ativos para as ações civis públicas ou
coletivas previstas na LACP ou no CDC as pessoas jurídicas de direito público interno, as associações civis, os
sindicatos e alguns outros órgãos e entidades que, em momento próprio, aqui serão estudados.
2. Ações de iniciativa do Ministério Público
Nota: nesse capítulo o autor faz uma referência enorme a todas as ações previstas no ordenamento
brasileiro, motivo pelo qual é inviável a descrição de todas elas, bastando para tanto que seja enviada cópia dessa
parte para os membros do grupo.
Capítulo 4
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
A atuação do Ministério Público no processo civil
A maneira usual de analisa r a atuação do Ministério Público no processo civil consiste em distinguir suas
funções de parte e fiscal da lei. A nosso ver, contudo, não basta identificar a forma pela qual a atuação do MP se
manifesta. Devemos identificar o aspecto formal, mas, mais do que isso, é preciso compreender a causa e a
finalidade dessa mesma atuação funcional.
Segundo a forma pela qual o MP se manifesta no processo civil, podemos distinguir as situações como:
a) Autor, por legitimação ordinária (ex: ações de nulidade de casamento, ações diretas de
inconstitucionalidade);
b) Autor, por substituição processual (ações civis públicas ambientais);
c) Interveniente em razão da natureza da lide (mandado de segurança, ação popular);
d) Interveniente em razão da qualidade de parte (ações em que haja interesse de incapaz, acidente do
trabalho, pessoa com deficiência, etc);
e) Réu (embargos do executado ou de terceiro ou quando o próprio MP seja o exequente).
Diz a lei que, exercitando a ação civil pública, ao MP cabem os mesmos poderes e ônus que às partes
(CPC, art. 81).
Essa assertiva deve ser entendida em termos, pois os membros MP, p.ex., não prestam depoimento pessoal;
não adiantam despesas; não se sujeitam aos mesmos prazos para contestar e para recorrer; não recebem nem são
condenados em custas e honorários advocatícios. E, quando sucumbe, o MP não responsabiliza a si próprio, mas ao
Estado, de que é órgão.
A razão para a concessão de prazo diferenciado ao Ministério Público se explica pela melhor defesa do
interesse público e em razão das peculiaridades da atuação ministerial.
O Ministério Público é parte imparcial?
Por parte quer-se dizer que é sujeito de ônus e faculdades na relação processual; por imparcial quer-se dizer
que conserva liberdade para emitir seu pronunciamento. Assim, se propuser uma ação em defesa de interesses
globais da sociedade, apesar de sua posição formal de parte, não deixará o MP de zelar pela ordem jurídica.
Quando, porém, agir como representante da parte ou substituto processual de pessoa determinada (como na
ação civil ex delicto), estará vinculado à defesa do interesse cujo zelo lhe foi cometido.
Em tese é igual a importância da atuação do Ministério Público agente e interveniente, passando a ser uma
só a filosofia que inspira tanto sua decisão sobre se propõe ou não uma AC ão civil pública, como sua decisão sobre
se assume ou não a promoção de uma ação já proposta, em caso de abandono ou desistência dos colegitimados,
tudo em decorrência do princípio da obrigatoriedade.
Quando a lei lhe confere legitimidade para agir ou intervir na defesa de um interesse, está ipso facto a dar-
lhe capacidade postulatória, a ser exercitada por seus órgãos, e tal capacidade inclui a impetração direta de
mandado de segurança, inclusive para garantia das próprias funções institucionais.
A atuação do Ministério Público é exigida nos feitos cujo objeto guarde compatibilidade com sua finalidade
institucional. Não fosse assim, o MP cobraria multas administrativas e cheques, ou interviria nas ações patrimoniais
em que se discutissem perdas e danos entre partes maiores e capazes, pois sempre poderia estar havendo violação
à ordem jurídica.
Nas ações em que o MP está institucionalmente destinado a agir, sua ação ou intervenção será essencial à
prestação da função jurisdicional do Estado.
São três as causas que trazem o Ministério Público ao processo: a) a existência de interesse indisponível
ligado a uma pessoa (ex: ligado a um incapaz); b) a existência de interesse indisponível ligado a uma relação
jurídica (ex: ação de nulidade de casamento); c) a existência de um interesse, ainda que não propriamente
indisponível, mas de suficiente abrangência ou repercussão social, que aproveite em maior ou menor medida a toda
a coletividade (ex: em ação para a defesa de interesses individuais homogêneos, de largo alcance social, ou a defesa
de pessoas carentes).
Pode ser total ou apenas parcial a indisponibilidade do interesse cujo zelo justifique a intervenção do
Ministério Público. A indisponibilidade absoluta que significar a impossibilidade de que o direito seja objeto de
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
abdicação total ou parcial, ou de transação. Entretanto, há interesses relativamente indisponíveis, que em parte
permitem transações, devendo a instituição fiscalizar essa indisponibilidade parcial.
A indisponibilidade não esgota as hipóteses de intervenção ministerial, pois, mesmo que o interesse não
seja a rigor indisponível, poderá ainda haver intervenção ministerial desde que sua defesa convenha à coletividade.
Em caso de eventual conflito entre o interesse público primário e o secundário, será pelo primeiro deles que
deverá zelar o Ministério Público, só defendendo este último quando efetivamente coincida com o primeiro.
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2ª Parcela do resumo feita por
Cristiane
Organizadora dos resumos
Após o advento da Lei 7347/85, coube por primeiro á própria CF/88 ampliar o rol dos legitimados
ativos para a defesa dos interesses transindividuais, bem como o objeto das ações coletivas: a) as entidades
associativas, quando expressamente autorizadas, passaram a deter legitimidade para representar seus filiados
judicial ou extrajudicialmente; b) foi instituído o mandado de segurança coletivo; c) o objeto da ação popular foi
alargado; d) os sindicatos passou a caber a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria; e)
o rol dos legitimados ativos para a ação de inconstitucionalidade foi ampliado; f) o MP recebeu ampla legitimação
para as ações civis publicas; g) os indios, suas comunidades e organizações passaram a deter legitimação ativa para
a propositura de ações em defesa de seus interesses.
Reportando-se á LACP, sobrevieram as Leis: 7853/89 (ACP em defesa de portadores de deficiência);
7913/89 (ACP de responsabilidade por danos causados aos investidores no mercado de valores imobiliários); o
ECA; o CDC; a Lei 8884/94 (instituiu a ação de responsabilidade por danos causados pó infrações á ordem
econômica); o Estatuto da Cidade (inclui no objeto da ACP a defesa da ordem urbanística); a Lei 9494/97 (limitou
o alcance da coisa julgada na LACP); a MP 2180-35/2001 (restringiu o objeto da ACP); o Estatuto de Idoso.
Dentre todas as alterações impostas no sistema de defesa de interesses transindividuais, papel especial
teve o CDC. Esse diploma legislativo concedeu á L 7347/85 campo de abrangência integral que para ela tinha sido
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
originariamente destinado pelo Congresso Nacional antes do veto do presidente da Republica. O CDC ainda
admitiu o litisconsórcio entre Ministerios Públicos e o compromisso de ajustamento, e efetuou correções e
acréscimos ao texto original da LACP.
Recentemente sucessivas leis forem editadas no intuito de restringir o alcance das tutelas coletivas, tais como:
lei 9494/97; vedações em matérias que afetam diretamente o governo federal (questões tributarias e FGTS);
tentativa de ameaçar o parquet através de uma responsabilização pessoal de seus membros e ate a previsão absurda
da reconvenção na ACP de improbidade administrativa, o que não logrou êxito, etc.
Por força do artigo 113 do CDC, em plena vigência, permite-se tanto o litsiconsorcio entre Ministerios
Publicos diversos como o Compromisso de Ajustamento de Conduta.
Uma leitura superficial do artigo 1° da LACP, poderia fazer crer que não pode ser objeto de ACP a tutela de
interesses individuais homogêneos. Equivoco completo, pois, como a LACP e o CDC se integram no tocante a
defesa coletiva de interesses transindividuais, também os interesses individuais homogêneos estão alcançadas pela
proteção da LACP.
A LACP cuida somente da defesa coletiva de interesses transindividuais, isto é, seu objeto são somente
interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, que reúnem grupos, classes ou categorias de pessoas.
ACP ainda se presta para que o MP possa questionar políticas publicas, quando infringirem princípios
constitucionais e da administração publica ou quando revestidas de desvio ou abuso de poder. Contra ato
jurisdicional não se admite ACP. O STF já reconheceu não caber Ação Popular contra ato jurisdicional.
Causa de pedir são os fundamentos de fato e de direito em que se baseia ação (respectivamente CP.próxima e
CP.remota). Sabe-se que a causa de pedir não é protegida pelo manto da coisa julgada, em regra. Pedido é o bem da
vida almejado pelo autor da demanda.
Em matéria de ACP e ações coletivas, por exceção, a lei admite condenações genéricas. O fato de a condenação
ser genérica não lhe retira, porem, o caráter da certeza e liquidez.
A ACP e a ação coletiva estão sujeitas ao principio da congruência, ou da correlação, ou seja, o juiz deve decidir
a lide dentro dos limites do pedido. Assim, a imutabilidade erga omnes ou ultra partes da sentença correspondera
aos limites do pedido formulado na ação coletiva.
Na mesma ACP é possível pedir a tutela de mais de um tipo de interesse transindividual, bem como nela é ainda
possível acumular pedidos, desde que compatíveis. Em suma, as razoes sócio-juridicas que levaram a eclosão da
defesa coletiva dos interesses transindividuais justificam que, em beneficio da expressiva parcela da população
destinatária dessa tutela, o direito processual seja interpratado com largueza, em proveito da questão de fundo, pois,
nesses pedidos de alta densidade social: busca-se a efetiva tutela desses direitos, permitindo uma margem de
mobilidade para o interprete.
Via de regra, não cabe ao judiciário, sob pretexto de conceder a tutela de direitos transindividuais, controlar os
atos administrativos do Executivo. No entanto, em algumas situações especificas é licito ao judiciário rever alguns
desses atos administrativos, quando houver, excesso de poder, desvio de finalidade, atos administrativos de reação
impositiva, etc.
Ao zelar para que os poderes públicos e os serviços de relevância pública se desincumbam de seus misteres, não
esta impedido o MP de investigar, em tese, ate mesmo a omissão do administrador, principalmente a vista do
principio da reação impositiva.
Nada impede, pois, que, em tese, se proponha ACP ou coletiva contra o Estado, com o pedido de obrigação de
fazer, ainda que isso envolva gastos orçamentários.
O dever jurídico de boa gestão administrativa consiste na obrigação do agente publico, respaldado pelos
princípios constitucionais, direcionar sua ação para a medida mais adequada e eficiente para atender o interesse
público. A atuação discricionária esta limitada externamente, à lei, e, internamente, ao dever jurídico de boa gestão
administrativa.
Numa ação civil qualquer (exceto na ADI), é feito o controle de constitucionalidade caso a caso. Sabemos que,
nas ACP’s ou coletivas, a inconstitucionalidade de uma lei poderá ser causa de pedir remota (fundamento jurídico
do pedido). O que a jurisprudência tem recusado é o uso da ACP para atacar lei em tese. No entanto, o uso da ACP
para atacar leis de efeitos concretos não é vedada. Exemplo: suponha que de forma inconstitucional uma Câmara de
Vereadores edite resolução para aumentar a remuneração dos vereadores. Será possível ACP para obrigá-los a
devolver o quer receberam indevidamente.
A constituição admite a indenização por danos morais em diversas hipóteses. Sabe que o ato ilícito pode, pois,
causar danos geradores de efeitos patrimoniais ou extrapatrimoniais. Aplicam-se essas disposições à tutela coletiva?
O CDC no artigo 6°, VI, reconheceu expressamente a reparação por danos morais e patrimoniais, individuas,
difusos e coletivos. A lei 8429/92, artigo 11, também sancionou danos morais à coletividade, como aqueles que
atentem contra os princípios da administração publica. E por fim a lei ACP regulamentou expressamente no seu
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
artigo 1°, a responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados a qualquer valor transindividual de que
cuida esta lei.
Existe direito de resposta coletivo? Não so os direitos individuais, mas também os coletivos são objeto de
proteção jurídica, inclusive para o fim de resposta coletiva (CF, arts°5, XXXV e 221).
Proteção Legal do Meio Ambiente: o decreto 83.540/79, já tinha previsto a propositura pelo MP de ação de
responsabilidade civil por danos decorrentes de poluição por óleo. Em seguida a lei 6938/81 atribui a
responsabilidade ao parquet para constranger o poluidor a indenizar os danos causados ao meio ambiente.
Existia uma certa dificuldade na defesa do meio ambiente antes da edição da LACP. Essa lei teve o grande
mérito de colocar nas mãos dos promotores de justiça um instrumento investigatório de caráter pré-processual,
importantíssimo, o inquérito civil. A CF assegurou que todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo, essencial a sadia qualidade de vida.
A defesa do meio ambiente supõe observância do principio da responsabilidade objetiva. No que diz a
degradação dos ecossistemas, do patrimônio e dos recursos naturais da zona costeira, a lei infraconstitucional
estabelece um regra especial: exige que o MP comunique ao Conselho Nacional do Meio Ambiente o teor das
sentenças condenatórias e dos acordos judiciais que disponham a respeito.
Entretanto, mesmo que esteja havendo ou tenha completado a recuperação natural do meio ambiente degradado,
antes disso já terá havido violação do direito, suscetível de reparação indenizatória. No caso, da violação do direito
surge o dever de indenizar a coletividade pelo período em que teve diminuída a fruição de um bem jurídico a ela
assegurada (interesse difuso).
A doutrina considera que a interação de elementos naturais, artificiais e culturais também integra o meio
ambiente. Estão assim alcançadas todas as formas de vida, não so aquelas da bioata como da biodiversidade, e ate
mesmo esta protegido o meio que as abriga ou lhes permite subsistência.
É possível considerar o meio ambiente sob os seguintes aspectos: meio ambiente natural, meio ambiente
artificial, meio ambiente cultural, neste ultimo incluindo o meio ambiente do trabalho.
Tudo o que diga respeito ao equilíbrio ecológico e induza a uma sadia qualidade de vida, é, pois, questão afeta
ao meio ambiente. Assim, devem ser combatidas todas as formas de degradação ambiental, em qualquer nível.
A defesa da probidade administrativa não envolve interesse transindividual (de grupos, Classes ou Categorias de
pessoas), mas sim, interesse público primário (bem gera da coletividade).
Está o Ministério Público legitimado à defesa do Patrimônio Público e da moralidade administrativa, pela ação
civil pública.
Por meio da lei de Improbidade administrativa (Lei 8429/92), os atos de improbidade administrativa são
classificados em três categorias, todos eles sujeitos á sanções civis isoladas ou cumulativas (afora as sanções
penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica). a) os atos que importem enriquecimento ilícito;
b) os atos que causem prejuízo ao erário; c) os atos que atentem contra os princípios da Administração Pública.
Nessa matéria, têm surgido comentários e até mesma postura doutrinária, no sentido de que:
a) As condutas descritas na Lei de Improbidade Administrativa, quando imputadas a autoridades detentoras de
prerrogativa de foro, não se convertem em crimes de responsabilidade.
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
b) Os agentes políticos que respondem pelos crimes de responsabilidade tipificados no Dec. Lei 201/67 não se
submetem á Lei de Improbidade (Lei nº 8429/92), pois, caso contrário, haveria um “bis in idem”;
c) A ação de improbidade administrativa da lei nº 8429/92 tem natureza penal.
No entanto, devemos descartar esses três entendimentos. Ora, é verdade que, em tese, nem todo ato de
improbidade administrativa configura crime de responsabilidade, pois os respectivos contornos típicos nem sempre
coincidem. Contudo, nada impede que um ato de improbidade administrativa provoque, a um só tempo, mais de um
efeito jurídico. Tomamos, por exemplo, um alcance praticado por agente público: será, a um só tempo, ilícito civil,
na modalidade de causar dano ao erário (passível de ressarcimento), e, ainda, ilícito penal (passível de sanção
criminal em decorrência do peculato), e, por fim, crime de responsabilidade (passível de julgamento político que
leve ao impeachment). Inexiste o propalado bis in idem, uma vez que se trata de fundamentos e efeitos jurídicos
diferentes, até porque as sanções da Lei nº 8.429/92 não tem natureza Criminal.
1) Receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica,
direta ou indireta...
2) Perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a alienação, permuta ou locação de bem
móvel ou imóvel,..
3) Perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a alienação, permuta ou locação por preço
inferior ao do mercado.
4) Utilizar, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza,
de propriedade ou á disposição de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º, bem como o trabalho de
servidores públicos, empregados ou terceiros contratados por essas entidades.
5) Receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar a exploração ou a prática
de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de contrabando, de usura ou de qualquer outra atividade ilícita..
6) Receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer declaração falsa sobre
medição ou avaliação em obras públicas...
7) Adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de
qualquer natureza...
8) Aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento para pessoa física ou
jurídica com interesse na administração Pública..
9) Perceber Vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verba pública de qualquer
natureza;
10) Receber vantagem econômica para omitir ato de ofício, providência ou declaração de que esteja obrigado;
11) Incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo
patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º
As investigações devem alcançar não só documentos e informações referentes à gestão pública do agente, como
e ainda principalmente seu patrimônio privado, do agente público em geral (da Administração direta, indireta ou
fundacional), que se enriqueça ilicitamente, com influência ou abuso de cargo ou função.
Havendo enriquecimento ilícito do administrador, mesmo que o proveito não tenha saído diretamente dos cofres
públicos, raramente deixará de existir dano ao patrimônio público. Aqueles que, p.ex., subornam os administradores
para contratar com a Fazenda certamente levarão os pagamentos ilícitos á conta do custo da obra ou do serviço
realizado. E, mesmo que não o fizessem, ainda teria havido o dano moral, decorrente da violação aos Princípios da
Administração.
1) Facilitar ou Concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou
jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º;
2) Permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores
integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º..
22
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
3) Doar á pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou
assistenciais, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art.1º..
4)Permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrantes do patrimônio de qualquer das
entidades referidas no art.1ª..
5) Permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado.
6) Realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares..
7) Conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais e regulamentares...
8) Frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;
9) Ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;
10) Agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do
patrimônio público;
11) Liberar verba pública saem estrita observância das normas pertinentes..
12) Permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;
13) Permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de
qualquer natureza, de propriedade ou á disposição de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º, bem como o
trabalho de servidor público, empregados ou terceiros contratados por essas entidades.
Por fim, na terceira categoria de atos sancionados na Lei nº 8.429/92, a lei considera constituir improbidade
administrativa, a atentar contra os princípios da Administração Pública, qualquer ação ou omissão que viole os
deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições.
Por cuidar de atos que ferem a moralidade administrativa, o art. 11 da Lei n. 8.429/92 não cuida de
responsabilidade objetiva, mas sim, pressupõe dolo ou, pelos menos, culpa.
O art. 10 da Lei 8429/92 menciona expressamente o dolo e a culpa. Já os arts. 9º e 11 (que cuidam dos atos que
importem enriquecimento ilícito ou violação a princípios da Administração) não aludem à modalidade culposa.
Cabe perguntar: Então o enriquecimento ilícito por ato culposo não é típico de improbidade? A frustração
culposa da licitude de um concurso público não viola a moralidade Administrativa? Mas como poderia ser ímprobo
ou desonesto quem não agiu com dolo, e sim apenas com culpa?
Respondendo a essas indagações, a Jurisprudência do
STJ tem-se inclinado preponderantemente a entender necessário o dolo nas figuras dos arts. 9º e 11 da LIA, e a
bastar ao menos a culpa nas do art.10 da mesma Lei.
Tanto na esfera do Direito Civil, como no Direito Penal, há responsabilidade por Culpa; na esfera disciplinar
também.
E na Administração, por que o administrador só por dolo poderia ser punido? E se ele for negligente?
Se ele é negligente está violando o dever de eficiência e lealdade da Administração; está descurando de um zelo
que é ao mesmo tempo o pressuposto e a finalidade de seu mister; está deixando de lado o dever de honestidade
que deveria iluminar o seu trabalho; ele é ímprobo. O Administrador não está lidando com bens seus, e sim com
bens coligidos com muito sacrifício pela coletividade, dos quais ele espontaneamente pediu para cuidar, e ainda é
remunerado para isso.
E o art. 10 reforça essa conclusão, porque expressamente prevê a forma dolosa ou culposa para qualquer ato de
improbidade administrativa que cause prejuízo ao erário. Destarte, tomando um mero exemplo, se o administrador
permite que um particular incorpore, de forma indevida, valores municipais, e se ao fazer isso ele foi desidioso ou
negligente, ele faltou com o dever de honestidade, porque um administrador honesto e zeloso – isso faz parte da
definição de administrador. Ser Honesto é pressuposto de quem exerça cargo público, não é qualidade.
4. A questão do Prejuízo.
A defesa de alguns réus em ações de improbidade administrativa, argumentam, e até mesmo alguns julgados tem
entendido, que não haveria dano (real) ao patrimônio público, pois a obra feita, sem licitação estaria pronta; os
funcionários públicos contratados sem concurso público, estariam, apesar da “irregularidade”, trabalhando e
cumprindo jornada de trabalho.
Tais entendimentos devem ser afastados e tidos por inaceitáveis, porque;
23
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Nem se poderia invocar falta de dolo do administrador. O dolo que se exige é o comum, a vontade genérica de
fazer o que a lei veda, ou a de não fazer o que a lei manda. É preciso deixar claro que está em questão um princípio:
Pode o administrador contratar impunemente, sem concurso ou concorrência, fazendo tabula rasa da Lei?
Se o administrador puder fazê-lo, poderá, então, contratar impunemente seus parentes ou apaniguados para
ocuparem sinecuras ou fazerem obras que terceiros poderiam fazer melhor e mais barato para a Fazenda Pública.
Em matéria de dinheiros públicos, “quem gastar, tem que gastar de acordo com a lei”. Assim, aduzem Sérgio
Ferraz e Lúcia Valle Figueiredo: “Quem gastar em desacordo com a lei, há de fazê-lo pro sua conta, risco e perigos.
Pois, impugnada a despesa, a quantia gasta irregularmente terá de retornar ao Erário Público”.
O dano à moralidade administrativa está sempre presente quando a Administração dispensa indevidamente
licitação ou concurso: estará contratando pessoal sem a seleção necessária, desconsiderando critérios de probidade
e impessoalidade, deixando de selecionar os melhores, estará, em suma, abrindo mão do dever de buscar os
melhores preços e a melhor qualidade de materiais ou concorrentes; estará, enfim, ferindo a moralidade
administrativa.
Aquele que praticou os atos terá agido por sua conta, riscos e perigos. Ainda que pronta a obra, entregue o
fornecimento ou prestado o serviço, se impassível de convalidação o ato praticado, impõe-se a devolução.
Não só pode a Administração locupletar-se ilicitamente, como ainda não pode realizar despesas não autorizadas
pela lei.
Enfim, em se tratando de dano ao patrimônio público, em, diversos casos a própria lei expressamente presume a
lesividade. A declaração de nulidade do contrato administrativo opera retroativamente, o que não exonera a
Administração do dever de indenizar o contratado, contando que a nulidade não lhe seja imputável, sem prejuízo de
promover-se a responsabilidade de quem lhe deu causa.
5. As Sanções.
A constituição estabelece que os atos de Improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos
políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens, e o ressarcimento do erário, na forma e gradação
previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível, deixando claro que essas sanções especiais têm natureza
civil e não criminal.
Além das sanções civis, penais e funcionais, impõem-se mais algumas sanções especiais, como é o caso da
perda de bens ou valores, do ressarcimento integral do dano, da perda da função pública, da suspensão de direitos
políticos, da multa etc.
Em cada uma das hipóteses de que cuida o art. 12 da LIA, a perda do cargo e a suspensão de direitos políticos
seriam de aplicação obrigatória e cumulativa com as demais sanções pecuniárias e administrativas previstas no
próprio dispositivo?
Hoje a própria lei se encarrega de responder a questão formulada. A lei nº 12.120/09 alterou a redação do art. 12
para dispor: “independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está
o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou
cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato”(...).
E bem assim oi fez a alteração na LIA, pois não parecia a melhor a aplicação sempre cumulativa das sanções,
porque desarrazoado seria punir da mesma maneira o agente político que cometesse um dano culposo de pequena
monta que proveito algum tivesse trazido a ele ou a terceiros, e aquele que de maneira dolosa se enriqueceu
ilicitamente à custa do patrimônio público. Não apenas a fixação das penas deve levar em conta a extensão do dano
24
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
causado e o proveito patrimonial obtido pelo agente, mas também a própria imposição da pena deve considerar a
gravidade da infração cometida. Não fosse assim, trataríamos de maneira igual situações absolutamente díspares.
Acresce que agentes públicos há para os quais a Constituição estabeleceu forma própria de destituição. Embora
nada obste a que sejam civilmente responsabilizados e sancionados por eventuais danos ao erário (como em ação
Popular), não é compatível com o sistema vigente que estes sejam apenados com sanções próprias dos crimes de
responsabilidade a serem impostas em sede de ação civil fundada na Lei n.8429/92 (como a perda da função
pública). Caso se admitisse o contrário, um juiz de primeiro grau poderia destituir um presidente da República ou
todos os ministros do Supremo Tribunal Federal; assim, esse juiz estaria a usurpar competência para decidir sobre a
prática de crimes de responsabilidade por parte desses agentes, em relação aos quais a Constituição estabelece
mecanismos próprios de destituição quando comentam crimes de responsabilidade.
Devemos entender que a perda da função pública poderá ser decretada mais de uma vez, em decorrência de
condenações diferentes, mas, naturalmente, só será cumprida uma única vez. Por fim, a aplicação das sanções da lei
independe: a) da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público, salvo quanto a pena de ressarcimento; b) da
aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelos tribunais ou Conselhos de Contas.
É possível promover ação civil pública de responsabilidade contra agente político que tenha foro especial para
crime de responsabilidade?
O Plenário do Supremo Tribunal Federal inclinou-se majoritariamente pela resposta negativa, entendendo que a
lei de improbidade Administrativa não é aplicável aos agentes públicos, ate para evitar a subversão de
competências, ou seja, que um juiz de singular pudesse destituir um presidente da República ou os ministros da
maior Corte.
A ação civil pública da Lei 8.429/92, processada diretamente perante juízes singulares, não se presta para a
decretação de perda de cargo ou de função pública de agentes políticos que, por força da Constituição, tenham
forma própria de controle de sua responsabilidade política. Entretanto, nada obsta a que as demais sanções da Lei
nº 8.429/92 lhes sejam impostas por via de ação popular ou de ação civil pública (Como a perda de bens
ilicitamente adquiridos, ou o ressarcimento integral do dano).
Assim, nas ações civis públicas movidas contra o agente público que tenha violado os arts. 9º a 11 da Lei de
Improbidade Administrativa, nem sempre se poderá pedir a perda da função pública. Para algumas autoridades, há
regras de competência e procedimentos específicos para a decretação da perda do cargo: são as autoridades que têm
forma própria de investidura e destituição, prevista diretamente na Constituição (como o Chefe de Poder Executivo
Federal ou estadual, os ministros do STF, os membros do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Tribunais
de Contas, etc.). Para a decretação da perda da função pública ou para a suspensão de direitos políticos desses
agentes, é necessário utilizar-se do procedimento próprio, perante o foro adequado, que se aplica às autoridades que
estejam sujeitas a julgamento pro crime de responsabilidade.
Em suma, posto que ainda sem um posicionamento seguro sobre a matéria, o STF tem afirmado que:
a) o Agente político, mesmo afastado da função que atrai o foro por prerrogativa de função, deve ser processado
e julgado perante esse foro, se acusado criminalmente por fato ligado ao exercício das funções inerentes ao cargo;
b) O agente político não responde à ação de improbidade administrativa se sujeito a crime de responsabilidade
pelo mesmo fato;
c) os demais agentes públicos, em relação aos quais a improbidade não consubstancie crime de
responsabilidade, respondem à ação de improbidade no foro definido por prerrogativa de função, desde que a ação
de improbidade tenha por objeto ato funcional.
Ainda que não se possa, efetivamente, valer-se da Lei n.8429/92 para impor perda de cargo a autoridades que
estejam sujeitas a procedimento próprio de destituição por crime de responsabilidade, no tocante à
responsabilização pecuniária do agente público, essa responsabilização pode e deve dar-se irrestritamente junto aos
juízos de primeiro grau, como é da tradição de nosso Direito (como há muito já ocorre por meio das ações
populares). A responsabilidade penal nem com a responsabilidade político-administrativa, e somente para estas
últimas é que a Constituição estatuiu foro privilegiado.
7. A Prescrição.
8. O Processo.
A lei de improbidade Administrativa instituiu um processo próprio para a apuração e a punição das infrações,
que deve ser seguido para as ações fundadas no art. 17 da Lei nº 8.429/92, destinadas à imposição das sanções
político-civis previstas em seu art.12, não para as demais ações civis públicas de responsabilidade civil destinadas à
anulação de atos administrativos e á obtenção do ressarcimento do dano correspondente.
Segundo os arts. 16 e 17 da Lei 8.429/92, a ação de improbidade será ajuizada pelo ministério Público ou pela
pessoa jurídica interessada, tendo rito ordinário.
Quem será réu na ação de que cuida a Lei. Nº 8.429/92?
O agente Público.
Para o ajuizamento da ação civil de improbidade, não se exige prova pré-constituída; bastam indícios de autoria
e materialidade; caberá a instrução, sob as garantias do contraditório, fornecer ou não as provas necessárias.
No afã de dificultar ou até inviabilizar as ações civis públicas contra os governadores, outra medida provisória
chegou ao cúmulo de tentar instituir reconvenção contra os agentes do Ministério Público que ousassem processar
autoridades por improbidades... Essa medida provisória encerrava tal despautério que foi revogada antes de viger
por um único mês sequer..
Como já tem decidido o STJ, a ação civil pública, de que cuida a Lei n.7.347/85, pode ser cumulada com pedido
de reparação de danos por improbidade administrativa, formulado com base na lei n.8.429/92.
Nas ações de improbidade administrativa, impõe-se o litisconsórcio entre o agente ímprobo e as demais pessoas
ou empresas que possam estar envolvidas na fraude? Embora o ato ilícito importe solidariedade, não se trata de
litisconsórcio necessário (CPC, art.47).
Se a ação de improbidade estiver sendo movida contra o administrador, pessoalmente, os honorários de seu
advogado deverão ser suportados pelo administrador, não pela pessoa de Direito Público.
O pedido na ação civil pública de improbidade não pode se envolver a perda de cargo ou função pública, em
relação a agentes políticos para os quais a Constituição tenha imposto forma própria de destituição por crime de
responsabilidade. (item visto anteriormente).
A constituição e as leis expressamente autorizam o Ministério Público a ajuizar ação civil pública em defesa do
patrimônio público. Apesar da clareza do texto constitucional, e não obstante seu alcance altamente social, a
26
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
verdade é que muito se discutiu e ainda se discute sobre a legitimidade do Ministério Público na defesa do
patrimônio público.
Os principais argumentos que têm sido expostos no sentido de que o Ministério Público não poderia nem
deveria defender o patrimônio público são de naturezas diversas.
Alguns acórdãos chegam a mencionar que o art. 129, III, da Constituição, seria mera norma programática, de
forma que, para ter eficácia, precisaria de regulamentação na lei infraconstitucional. Ora, essa objeção merece ser
repelida, pois perdeu sua eventual força com o advento da Lei de Improbidade Administrativa, que legitima a
iniciativa do Ministério Público nessa área (art.17 da Lei n.8.429/92), e com o advento da Lei Complementar
n.75/93 (art.6º VII) e da Lei n.8.625/93 (art.25,V), que também regulamentam o uso da ação civil pública pelo
Ministério Público, na defesa do patrimônio público e social.
Outro argumento, seria o de que a defesa do patrimônio público não contempla interesses difusos ou coletivos,
e, portanto, não está inserida no objeto da ação de que cuida o art.1] da Lei n.7347/85, que disciplina a ação civil
pública. É igualmente insustentável essa segunda linha de raciocínio. Primeiro porque grande parte dos interesses
de que cuida a Lei n.7347/85 coincidem com a defesa do patrimônio público, em sua conceituação legal (Como o
meio ambiente e o patrimônio cultural); depois, porque leis outras existem a permitir a ação do Ministério Público
na defesa do Patrimônio público, em especial as já citadas Leis ns. 8.429/92 e 8.625/93 e a lei Complementar n.
75/93.
A terceira ordem de objeções tem consistido em negar ao Ministério Público a legitimidade para defender o
patrimônio público, porque essa instituição está proibida, pela Constituição, de representar em juízo as entidades
públicas (CR, art.129, IX).
Essa objeção não merece melhor sorte que as anteriores. Após criada a Advocacia da Fazenda, o Ministério
Público perdeu sua atribuição histórica de representação dos entes estatais. Assim, a Fazenda passou a ter seus
procuradores, que devem encarregar-se da cobrança de sua dívida ativa em juízo, de sua defesa judicial, do zelo de
todos os seus interesses patrimoniais perante o Poder Judiciário. Neste Caso, agora por legitimação extraordinária,
tanto pode o cidadão defender o patrimônio público, como também o Ministério Público pode fazê-lo, sempre com
fulcro na própria ordem constitucional (CF, arts 5º, LXXIII, e 129, III).
Não é absurdo algum que o Ministério Público defenda o patrimônio público, ainda que esteja impedido de dar
representação judicial à Fazenda. Quando o Ministério Público defende o patrimônio Público em juízo, em nada
contraria sua natureza institucional, e seria de todo ilógico que a Constituição e as leis legitimassem um único
cidadão para defender o patrimônio de todos, mas negassem essa possibilidade ao Ministério Público, encarregado
que é de defender toda a coletividade. Por isso que, hoje, não mais tem qualquer sentido sustentar que a única
hipótese em que o Ministério Público pode defender o patrimônio público seria apenas em caso de o cidadão
desistir da ação popular, como ocorria antes da Constituição de 1988.
O Próprio art.6º, inc. XIV, letra f, da LC n.75/93 comete ao Ministério Público a defesa da probidade
administrativa. Soma-se a isso, o art. 17 da Lei n.8.429/92 (LIA), que confere ao Ministério Público a ação civil
para reparar o dano causado ao patrimônio público pelo agente estatal. Diante disso, não se pode negar que a defesa
do patrimônio público seja também atribuição institucional do Ministério Público, até porque leis regulamentares
não faltam na matéria.
Cabe, porém, insistir: na defesa do patrimônio público, o Ministério Público não é nem legitimado ordinário,
nem representante ou advogado da Fazenda. A Fazenda Pública tem os seus próprios procuradores; estes é que
devem representar a Fazenda. O Ministério Público, aliás, está proibido de representar a Fazenda em juízo (art.129,
IX da CF).
Mas, uma vez que o Ministério Público está proibido de representar a Fazenda em juízo, não estaria aí a vedação
constitucional para que ele defenda a Fazenda?
Então, onde entra o Ministério Público na defesa do patrimônio público, se advogado da Fazenda ele não
mais o é? Entra se e quando o sistema de legitimação ordinária falhar.
O papel do Ministério Público é compatível com a defesa do erário, sim, mas por meio da legitimação
extraordinária (daquele que, em nome próprio, defende direito próprio); e só deve empreendê-la quando houver
uma razão especial para isso, ou seja, quando o sistema de legitimação ordinária não funcione. Alei ainda prevê e a
jurisprudência endossa a possibilidade de litisconsórcio facultativo entre o Ministério Público e a Fazenda no pólo
ativo, em defesa do patrimônio público.
E quando é que não funciona o sistema de legitimação ordinária para a defesa do patrimônio Público?
O sistema não funciona quando o administrador não o deixa funcionar. É o que ocorre, por exemplo, quando é o
próprio administrador em exercício que cometeu o ato de improbidade que gerou dano á Fazenda Pública.
Poder-se-ia dizer que, para resolver problemas como esses, já existe a ação popular: o cidadão poderia agir em
defesa do erário e o interesse público não ficaria prejudicado. Esse argumento é falacioso. Reduzir a possibilidade
27
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
de defesa do patrimônio público á legitimação ativa da Fazenda e do cidadão seria fazer com que o interesse
público ficasse prejudicado, e muito. Sabemos que a ação popular é instrumento assaz excepcional, utilizado
normalmente mais por motivações políticas que por razões de altruísmo. De tão excepcional é que podemos dizer
que, como solução efetiva, a ação popular não funciona. O remédio que rarissimamente usado, que é uma
verdadeira preciosidade, não se presta á normalidade do funcionamento de um sistema.
Após bastante controvérsia, embora sem maior razão à vista do claro mandamento constitucional (CR, art. 129,
III), os tribunais passaram a admitir a legitimidade do Ministério Público para a defesa do patrimônio público, por
meio da ação civil pública.
Assim, de sua parte, o Superior Tribunal de Justiça acabou por pacificar o entendimento no sentido de que, sem
prejuízo da iniciativa da própria Fazenda Pública lesada - que detém a legitimação ordinária -, o Ministério Público,
na qualidade híbrida de órgão do Estado e ainda defensor de interesses indisponíveis da sociedade, também está
legitimado à defesa do patrimônio público, por meio da ação civil pública. Em razão disso, assim dispõe a
Súm.n.329 do STJ: “O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa do patrimônio
público”.
Por sua vez, o Supremo Tribunal Federal igualmente tem admitido a legitimação do Ministério Público para
propor as ações civis públicas em defesa do patrimônio público.
O entendimento do Supremo Tribunal Federal, acima transcrito deve ser acolhido, embora com uma ressalva.
Nem sempre o patrimônio público consiste em interesses difusos. Poderá haver tal coincidência, como em questões
ambientais ou ligadas ao patrimônio cultural; não, porém, no caso de valores exclusivamente econômicos, que
também podem ser defendidos pelo Ministério Público, embora não constituíam interesses difusos.
Como vimos, o papel do Ministério Público na defesa do patrimônio público é hoje previsto pela Constituição.
Contudo, não mais cabe aos membros do Ministério Público atuar como advogados da Fazenda: esta tem seus
próprios procuradores. Outrossim, não se exige que o Ministério Público intervenha necessariamente em toda ação
em que se discuta questão patrimonial afeta ao erário público.
Devemos lembrar que, bem por outro lado, embora haja instrumentos legislativos que permitam em tese a
responsabilização de administradores ímprobos, os procuradores gerais – Chefes dos Ministérios Públicos -, porque
investidos pelos governadores a quem deveriam fiscalizar, não são os mais altos administradores. A excessiva
concentração de poderes em mãos dos procuradores gerais permite-lhes que possam, burlando o Princípio do
Promotor Natural, designar e afastar discricionariamente quem queriam para obter atuação conforme seus critérios
de oportunidade e conveniência, que podem coincidir com os dos governadores que os escolheram ou que podem
reconduzi-los ao cargo.
Ora, a melhor forma de o Ministério Público estimular o administrador a buscar a responsabilidade dos
servidores é, ao mesmo tempo que acione o servidor ímprobo, também acionar o administrador omisso no
cumprimento do dever. E não apenas arquivar a representação...
Segundo a constituição, cabe ao Ministério Público, entre outros deveres, a defesa do patrimônio público e
social.
E o que seria patrimônio social, assim referido na constituição?
O adjetivo social é usado generosamente pela Constituição como,para referir-se aos valores sociais do trabalho,
função social da propriedade, ao desenvolvimento social, á seguridade social, á integração social, á previdência
social, à orientação social, ao complexo social, ao patrimônio social, ao complexo social, ao patrimônio social, á
paz social, á ordem social, á assistência social, á função social, á justiça social, á contribuição social, á promoção
social, á comunicação social, á organização social e ao Serviço Social (art.240).
Além disso, as expressões patrimônio social e interesse social também são utilizadas em Direito quando se quer
referir a entes morais ou entidades corporativas (pessoas jurídicas). Contudo, não é nesse último sentido,
evidentemente que a Constituição usou a expressão para cometer a defesa de interesses sociais ao Ministério
Público.
O exame de contexto do uso de cada expressão deixa claro que o Constituinte não se valeu do adjetivo social
com o mesmo valor, mas sim o fez em diversas acepções , como quando o ligou claramente ao interesse público,
ora ao interesse da sociedade como um todo, ora ao das classes menos favorecidas economicamente, ora ao
equilíbrio das relações de trabalho.
No caso da atribuição do Ministério Público de defender o patrimônio público e social, a nosso ver, com esta
última expressão, quis a Constituição significar mais do que apenas a defesa de grupos hipossuficientes (pessoas
pobres, necessitados, trabalhadores, favelados, posseiros, vítimas de crimes, presos, indígenas, pessoas
28
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
marginalizadas etc), mas também “os pilares da ordem social projetada pela Constituição e na sua correspondência
com a persecução dos objetivos fundamentais da República, nela consagrados, e até mesmo o próprio patrimônio
da sociedade como um todo (interesses gerais da coletividade, sejam materiais ou imateriais, como os interesses
estritamente culturais).
Enfim, diversamente do que ocorre com a defesa do patrimônio público, cujo objeto é definido na lei
infraconstitucional, esta não define o que seja patrimônio social, embora já se tenha valido do conceito de interesse
social, como para fins de desapropriação.
CAPÍTULO 11
TOMBAMENTO
Desconsiderando aqui as outras acepções do termo, que ora não nos interessam, tombamento é o ato de fazer o
tombo, ou seja, o inventário dos bens de raiz, com todas as respectivas demarcações, ou fazer o registro ou relação
de coisas ou fatos referentes a uma especialidade ou região. Na definição de Maria Helena Diniz, tombamento é a
“restrição administrativa ao direito de probidade realizada pelo Estado, em face do interesse da cultura e da
proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, proibindo demolição ou modificação de prédios tidos como
monumentos históricos e exigindo que sues reparos obedeçam á sua caracterização.
Qual a origem da expressão tombamento ou tombo, com esse sentido especial de aqui se cuida?
Como anotou Hely Lopes Meirelles, “as expressões Livros do Tombo e tombamento provêm do Direito
Português, onde a palavra tombar significa inventariar, arrolar ou inscrever nos arquivos do Reino, guardados na
Torre do Tombo. Por tradição, o legislador brasileiro conservou as expressões reinícolas, na nossa Lei de
tombamento. E fez bem, porque começou, assim, a preservar o nosso patrimônio lingüístico, dando o exemplo aos
que vão cumprir a lei.
Para os fins de que ora cuidamos, o tombamento é apenas uma forma especial de proteção administrativa de
bem de valor cultural, que pressupõe todo um procedimento administrativo necessário para identificar certos bens
como merecedores dessa proteção, e também para descrevê-los e relacioná-los num livro próprio, com o fim de
assegurar a melhor defesa.
Como tombamento não é pressuposto da proteção jurisdicional, seu mérito pode ser constrasteado em juízo. Não
se pode, porém, questioná-lo em sede de mandado de segurança, se a discussão envolver questão probatória que
suponha produção em procedimento próprio (como uma perícia para identificar ou não o valor cultural do bem, ou
oitiva de testemunhas em audiência); nesse caso, estaria desfigurada a liquidez e certeza que são o pressuposto do
mandamus.
Qualquer pessoa jurídica de direito público interno pode tombar um bem, nada impedindo que o façam
simultaneamente União, Estado e Município ou Distrito Federal. Tanto bens públicos como particulares podem ser
tombados; o tombamento pode, ainda, incidir sobre bens que integrem o meio ambiente natural (como os sítios e
paisagens notáveis), cultural (como os monumentos históricos) ou artificial (como o espaço urbano construído).
Para que sobrevenha o tombamento, não é necessário que seja particular; até mesmo bens públicos podem ser
tombados.
Segundo o § 1º do art. 216 da Constituição Federal, o Poder Público, com a colaboração da Comunidade,
promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro por diversos meios de acautelamento e preservação, entre os
quais o tombamento. O dec. Lei n. 25/37 disciplina o tombamento na esfera federal.
Sem prejuízo de aceitar-se a teoria abstrata, a doutrina classifica as ações conforme a natureza do
provimento jurisdicional pretendido, conhecimento, execução e cautelar. Alguns autores ainda
acrescentam os provimentos mandamentais, que visa obter um mandado judicial dirigido a outro ente
estatal. A rigor, porém, não se trata de uma nova categoria, pois a ação mandamental não deixa de ser
um preceito condenatório.
A partir da lei 11.232 de 2005, a execução, como processo autônomo, ficou reservada para os títulos
executivos extrajudiciais, diferentemente dos títulos judiciais (cumprimento de sentença). A liquidação
de sentença da mesma forma perdeu a condição de ação incidental para se tornar apenas um
procedimento incidental do processo de conhecimento.
Cabem hoje ações civis públicas ou coletivas: a) principais – condenatórias (reparatórias ou
indenizatórias), declaratórias e constitutivas; b) cautelares (preparatórias ou incidentes); c) cautelares
satisfativas, que não dependem de outra ação dita principal; d) de execução de título extrajudicial; e)
mandamentais; f) quaisquer outras, com qualquer preceito cominatório, declaratório ou constitutivo.
Em matérias de ações civis públicas, o pedido condenatório, que envolva obrigação de fazer ou de
pagar, foi aquele que mais diretamente cuidou a lei 7.347, em seu art. 3º, mas, como se viu, a tutela
cível dos interesses transindividuais não se limita, nem se poderia limitar, a sentenças condenatórias,
incluindo-se, inclusive, ações preventivas que visem à tutela inibitória, mediante a condenação a uma
obrigação de fazer ou não fazer. Isso para a defesa transindividual de consumidores, do meio ambiente,
do patrimônio cultural ou ainda para qualquer outro interesse difuso, coletivo ou individual
homogêneo, admitindo-se todas as espécies de ações, com qualquer rito.
a) Provimento mandamental:
Para Pontes de Miranda, na ação mandamental o juiz manda, não declara, nem constitui, nem
condena. Segundo a Constituição, a ação mandamental pode ser impetrada em caráter coletivo, por
organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento a
pelo menos um ano, quando em defesa de interesses e seus membros ou associados (v. lei 12.016 de
2009).
Por sua destinação de tutor constitucional de interesses transindividuais, o Ministério Público
também poderá valer-se do mandado de segurança coletivo. Da mesma forma o podem os demais
legitimados à ação coletiva.
Cabe mandado de segurança (legitimidade passiva) contra autoridade pública ou agente de pessoa
jurídica no exercício de atribuições do poder público. Não cabe, entretanto, contra atos de
administradores de empresas públicas, ou de sociedade de economia mista, ou, ainda, de
concessionárias de serviço público, quando os atos praticados forem de mera gestão comercial.
No ECA (art. 212, § 2º), a ação mandamental destina-se a combater atos ilegais ou abusivos de
autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público que lesem
direito líquido e certo previsto no próprio estatuto, regendo-se essa ação pelas normas previstas na lei
12.016 de 2009.
Embora as ações civis públicas, o mandado de segurança coletivo e a ação popular se prestem a
proteger efetivamente a defesa de interesses transindividuais, elas também podem ser utilizadas para a
defesa do interesse público primário.
b) Provimento injuntivo:
Entre as ações de natureza coletiva, também devemos admitir a impetração de mandado de injunção
coletivo. Havendo omissão das casas legislativas em cumprir seu dever constitucional de legislar, e se
essa omissão configurar causa que inviabilize o exercício de liberdades, prerrogativas e direitos
proclamados pela constituição, justifica-se a utilização do mandado de injunção.
1. Rito processual:
31
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Nas ações civis públicas, pode-se valer do procedimento sumário ou ordinário, nos termos da lei
processual. No Juizado Especial, tanto da lei 9.099, quanto das leis 10.259 e 12.153 (juizado especial
da fazenda pública), embora não se tenha vedado expressamente a utilização de ações coletivas lato
sensu nas leis 9.099 e 12.153, não se permite essa impetração, por se estar diante de um microssistema
de juizado especial, aplicando-se, analogicamente, a lei 10.259 de 2001.
Nos processos de conhecimento, a fase de execução poderá abranger a execução para entrega de
coisa, a execução de obrigações de fazer ou de não fazer, a execução para a entrega de quantia certa
contra devedor solvente ou insolvente, e, a partir da lei 11.232 de 2005, o processo autônomo de
execução ficou reservado para os títulos executivos extrajudiciais, como o compromisso de
ajustamento de conduta.
2. Ação cautelar:
3. Antecipação de tutela:
Também resta plenamente cabível nos processos coletivos, tanto pela correta interpretação do artigo
4º da LACP, quanto pela aplicação analógica do art. 273 do CPC, e, por fim, do § 3º do art. 84 do CDC.
A antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional não se confunde com o asseguramento dos efeitos
práticos do processo principal (medida cautelar).
4. Ações individuais:
Para a defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais (homogêneos ou não), no que for cabível,
aplicam-se os dispositivos do Título III do CDC, que dizem respeito à defesa do consumidor em juízo
(arts. 81 a 104).
Nessa linha, invocando os dispositivos que o CDC traz sobre a defesa de interesses individuais
homogêneos, que se integram aos da LACP, Ada Pellegrini demonstra ser cabível a iniciativa dos
legitimados ativos do art. 5º da LACP, visando “a reparação dos danos pessoalmente sofridos pelas
vítimas de acidentes ecológicos, tenham estes afetados, ou não, ao mesmo tempo, o ambiente como um
todo. E a ação coletiva de responsabilidade civil pelos danos ambientais seguirá os parâmetros dos
artigos 91 a 100 do CDC, inclusive quanto à previsão de preferência da reparação individual sobre a
geral e indivisível, em caso de concurso de créditos (CDC, art. 99).”
Em suma, o acesso à jurisdição é garantia não só individual como coletiva, o que significa que tanto
o acesso individual como o coletivo não podem ser obstados aos lesados. Mas, se o lesado optar pela
defesa de seus interesses em ação individual, só a ele caberá decidir se lhe convém, opportuno
tempore, a suspensão do processo individual, para, só então, beneficiar-se in utilibus da decisão
32
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
proferida em ação civil pública ou em ação coletiva. Entretanto, ele precisará mais que suspender seu
processo individual: deverá dele desistir, se quiser se beneficiar do julgamento proferido em sede de
mandado de segurança coletivo. Se o próprio autor da ação individual não tiver tomado a iniciativa de
dar-se por ciente do ajuizamento da ação coletiva, deverá o juiz fazer cientificar o autor dessa ação
individual, para que exerça, querendo, o direito a que aludem o art. 104 do CDC, ou o art. 22, § 1º, da
lei 12.016 de 2009. O ônus de requerer a suspensão ou a desistência da ação individual é apenas do
lesado que, caso isso não faça, não se beneficiará in utilibus, com o resultado do processo coletivo;
nesse passo, o sistema processual não instituiu ônus algum ao réu.
A despeito de o CDC e da LMS não haverem estipulado o momento para que o lesado individual
manifeste sua pretensão de se valer do resultado da ação coletiva lato sensu, entende HNM que o limite
deverá ser o julgamento final de qualquer uma das ações, a individual ou a coletiva, após o que a
economia processual objetivada teria perdido a razão de ser. O réu deverá ser ouvido quanto ao pedido
de suspensão ou de desistência do processo individual, de forma que o pedido pode ser impugnado.
A lei não fixa o tempo máximo para a suspensão do processo. Para o autor, a suspensão perdurará
até que sobrevenha a decisão final na ação coletiva, salvo se, antes disso, o autor da ação individual
desistir da suspensão do processo; mas, neste último caso, não se beneficiará da eventual decisão
favorável que seja proferida na ação coletiva.
Em face do ajuizamento de uma ação civil pública, pode o tribunal suspender todas as ações
individuais que poderiam ser alcançadas pelo julgamento da ação coletiva?
Em 2009, o STJ (2ª Seção), por votação majoritária, entendeu que sim. Pretendendo “atualizar a
interpretação jurisprudencial para adequar-se às exigências da realidade processual de agora”, essa
Corte entendeu que a lei 11.672 de 2008 (lei dos recursos repetitivos) se prestaria a permitir a
suspensão das ações individuais em curso em todo o país, à vista do ajuizamento de uma única ação
civil pública cujo objeto englobaria os pedidos individuais; além disso, tal solução não prejudicaria os
direitos constitucionais dos indivíduos, pois lhes ficava sempre garantida a possibilidade de
ajuizamento das ações individuais, embora lhes seja negado o prosseguimento desde o início. Por fim,
sugere a existência de precedentes dessa Corte, “não fulminando o processo individual pela
litispendência”.
Compreende-se a preocupação da posição majoritária, mas essa não é o entendimento mais
abalizado para a matéria, segundo HNM. Primeiro, a decisão negou direito fundamental (CR, art. 5º,
XXXV), e, segundo, a lei invocada como supedâneo para a suspensão dos processos individuais desde
o nascedouro não garante a providência pretendida pelo tribunal, cuidando apenas de recursos especiais
repetitivos e não da suspensão de ações judiciais. Por ultimo, os precedentes aludidos cuidaram de
matéria análoga ao caso que estabeleceu a tese vencedora.
Vamos a uma última questão: a coisa julgada na ação coletiva sempre beneficiará os autores de
ações individuais, quer seu objeto sejam interesses individuais homogêneos, coletivos ou difusos? Ou
somente beneficiará os autores de ações individuais se os interesses em jogo forem coletivos e
individuais homogêneos, excluídos os difusos? A dúvida é pertinente e decorre da falta de melhor
técnica legislativa no art. 104 do CDC, que se refere aos efeitos erga omnes ou ultra partes “a que
aludem os incisos II e III” do art. 103 – e esses incisos reportam-se apenas aos interesses coletivos e
individuais homogêneos, não aos difusos.
Entretanto, parece-nos existir um erro de remissão no artigo 104 do CDC, pois que, se a coisa
julgada proferida em ação coletiva destina-se mesmo a ultrapassar as partes formais do processo, está
claro que a imutabilidade da coisa julgada deverá beneficiar in utilibus: a) todos os lesados individuais
que não tenham ação em andamento, b) a todos os lesados individuais que, tendo ação em andamento,
hajam requerido oportunamente sua suspensão. Assim, a remissão correta que o art. 104 do CDC
deveria fazer é aos três incisos do artigo 103, e não apenas aos dois últimos. E essa é a interpretação
que deve prevalecer, com a análise sistemática dos artigos 81, parágrafo único, 103 e 104 do CDC.
1. Generalidades.
a) O direito de punir:
33
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
O direito de punir não é interesse difuso, nem coletivo, nem individual homogêneo: como decorrência
ou expressão direta da soberania estatal, é interesse público, em sentido estrito. O estado é o único titular
do interesse material de impor sanção pelo descumprimento da lei criminal que ele próprio previamente
tenha editado. Há dois mecanismos básicos para aplicar a lei penal: ora se vale o Estado de seus próprios
órgãos para instaurar a ação apta a exercer o ius puniendi (ação penal pública), ora, em casos excepcionais,
permite que o particular acione a jurisdição (ação penal privada). Mesmo que a criminalização se dê tendo
em vista interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos (v.g. meio ambiente), na verdade, o
objeto da ação penal daí decorrente não será a defesa direta de interesses transindividuais, mas sim o
exercício do ius puniendi estatal. Na ação pena, os interesses transindividuais são defendidos apenas
indiretamente.
Apesar de alguns autores apontarem a existência de princípios básicos a serem adotados quando da
tutela penal dos interesses difusos (v.g. como a responsabilidade penal da pessoa jurídica, a
responsabilidade pessoal do representante da pessoa jurídica), o que se tem por certo é que aquilo que
torna especial os interesses difusos não é sua proteção penal, e sim a defesa processual dos interesses
transindividuais.
Em vista da diversidade de pedidos e de causa de pedir, não há, obviamente, qualquer possibilidade
de litispendência entre ambas. Quanto às prejudicialidades, há que se mencionar que é relativa a
independência da prestação jurisdicional cível, em relação à lide penal. A regra é a independência das
responsabilidades, mas há exceções previstas na lei.
A decisão de uma controvérsia civil pode constituir questão prejudicial para o juiz penal. Se a
decisão sobre a existência da infração penal depender da solução de controvérsia de competência do
juízo civil, poderá haver suspensão do processo penal, devendo a decisão civil vincular o juiz criminal.
Da mesma forma, mas agora na situação inversa, a decisão de uma ação penal pode vincular o juiz
cível em matérias que já se tenham sido definitivamente decididas pelo juízo criminal. Assim, esta é a
regra: a responsabilidade civil é independente da criminal; existem, porém, as exceções, nas quais a
decisão na esfera criminal extravasa seus efeitos sobre a ação civil (v. CPP, arts. 66 e 67).
Em síntese, a sentença criminal que reconheça a inexistência do fato criminoso impedirá seja
suposta a prática deste mesmo fato usada como causa de pedir na ação civil pública destinada a obter
indenização patrimonial fundada na prática do mesmo fato. Mas, ao reverso, nem sempre a sentença
penal impedirá a condenação civil, como quando: a) absolva por falta de provas, b) reconheça a
extinção da punibilidade por prescrição ou outro motivo que exclua a análise do mérito, c) extinga o
processo por questões processuais, sem apreciar o mérito da causa.
Nos crimes de ação pública, a legitimação para agir é privativa do Ministério Público.
Nos crimes de ação pública, se o Ministério Público se quedar inerte, caberá ação penal provada
subsidiária da pública (CR, art. 5º, LIX). Ponto interessante aqui é o artigo 80 do CDC que introduziu uma
inovação no direito brasileiro, no sentido de que permite que os colegitimados ativos para a ação coletiva
possam propor ação penal subsidiária. Assim, estão intitulados a assistir o MP, ou a propor a ação penal
subsidiária, as entidades e órgãos da administração pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade
jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos pelo CDC, e as
associações legitimadas.
34
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Poderiam a União, os Estados, os Municípios e o DF ser assistentes do MP ou ajuizar a ação penal
subsidiária? Numa interpretação puramente literal, a resposta seria negativa, pois essas pessoas jurídicas de
direito público, embora colegitimadas à ação coletiva, não estão referidas nem no inc. III, nem no inc. IV
do artigo 82 do CDC, e sim apenas em seu inc. II. Entretanto, numa interpretação teleológica, nada obsta a
que o façam, pois se até seus órgãos podem fazê-lo, mesmo aqueles sem personalidade jurídica, com maior
razão deve podê-lo ente estatal a que eles pertencem.
3. Assistência ao MP:
O espírito da norma do artigo 80 do CDC é tornar mais completa e efetiva a defesa dos interesses
difusos, coletivos e até individuais (homogêneos ou não), relacionados com a defesa do consumidor. Ao
legislador não pareceu bastante assegurar a vários legitimados, de forma concorrente e disjuntiva, a
iniciativa para propor ações coletivas, ou mesmo para litisconsorciarem-se ou assistirem-se reciprocamente
na área civil. Nessa matéria, posto se deterem legitimidade concorrente na área criminal para promoverem
diretamente a ação penal pública, os legitimados do art. 5º da LACP ou do art. 82 do CDC tem-na agora
para propor a ação penal privada subsidiária, ou para intervirem como assistentes do MP no processo
criminal (v. CPP, art. 29).
1. Generalidades.
Hoje, por força da remissão contida no artigo 21 da LACP, passaram a caber quaisquer espécies
de ações ou pedidos em defesa de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. Em
suma, a ação civil pública ou a ação coletiva podem ter por objeto evitar o dano, repará-lo ou
buscar a indenização pelo dano causado.
Cabem ações civis públicas condenatórias, cautelares de execução por títulos extrajudiciais,
meramente declaratórias, constitutivas ou as chamadas ações mandamentais.
1. Conexidade e continência:
Discutiremos aqui se é possível haver conexidade, continência e litispendência entre ação civil pública
ou coletiva e outras ações. Para tanto, relembrar os elementos identificadores das ações (partes, pedido e
causa de pedir).
Primeiramente, sem ainda esgotar o rol das alternativas, é possível haver conexidade, continência e
litispendência entre: a) uma ação civil pública e outra ação civil pública, b) uma ação coletiva e outra ação
coletiva, c) uma ação civil pública e uma ação coletiva. Num segundo momento, teremos a discussão sobre
a possibilidade de haver conexidade, continência ou litispendência entre ação civil pública e outras ações,
como as ações populares e até mesmo as ações individuais.
Relativamente às ações civis públicas ou coletivas entre si consideradas, pode estar em curso uma ação
civil pública ou coletiva, com objeto que vise obter a reparação de danos a interesses transindividuais,
quando sobrevém o ajuizamento de outra ação civil pública ou coletiva para discutir interesses difusos,
coletivos ou individuais ou homogêneos, com pedido idêntico (caso de litispendência), ou conexo (caso de
conexão), ou ainda até mesmo mais abrangente do que o da primeira ação (caso de continência).
35
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Passemos agora à análise das ações civis públicas ou coletivas em face de outras ações de natureza
diversa, como as ações populares e até as ações individuais. Não raro, a propositura de ações civis públicas
ou coletivas, em defesa de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos precederá ou sucederá o
ajuizamento de ações populares ou até ações individuais, cuja causa de pedir possa ser a mesma e cujo
objeto possam ser comuns, ou ao menos estar abrangidos pelas primeiras.
Naturalmente, o ajuizamento de ações civis públicas não impedirá a propositura de ações individuais
que tenham por objeto pretensões diferenciadas por danos variáveis, ainda que baseadas nos mesmos
fundamentos fáticos. E a hipótese inversa também é verdadeira. Com efeito, é garantia constitucional o
acesso à jurisdição para a defesa não só de interesses individuais como coletivos.
08ª Parcela do resumo feita por
Alexandre
274-311 , Até 10. A disputa ribaspaiva@hotmail.com
2. LITISPENDENCIA
É a coincidência dos três elementos identificadores da ação, partes, pedido e causa de pedir. Nesse sentido,
HNM afirma que, à primeira vista, poderia se concluir que ela só ocorreria entre duas ações civis publicas ou ações
coletivas se propostas pelo mesmo autor, contra o mesmo réu e sob o mesmo pedido e causa de pedir.
No entanto, o autor adverte que há litispendência também nos casos em que as referidas ações são propostas por
partes diversas, como por exemplo uma associação civil e qualquer outro legitimado. Isso porque nas ações civil
publicas e nas ações coletivas a coisa julgada se forma erga omnes. Alem disso, se pode haver coisa julgada entre
duas ações civis públicas (mesmo pedido e mesma causa de pedir), ainda que com autores diferentes, por
consequência é admissivel a litispendência se ambas em andamento. A mesma conclusão vale para as ações
populares. A razão disso tudo é que os cidadãos (nas populares) e os colegitimados (nas ações civis públicas) agem
em substituição processual em beneficio da coletividade lesada.
O artigo 104 do CDC nega a possibilidade de litispendência entre ações individuais e ações civis publicas ou
coletivas para defesa de interesses difusos e coletivos. Razão: não coincidem partes e pedido, por exemplo a
individual para reparação de danos diferenciados e a coletiva que versa interesses indivisíveis.
Em decorrência da mesma norma, o CDC admitiria, a contrario sensu, a litispendência entre ação individual e
uma ação civil publica ou ação coletiva para defesa de interesses individuais homogêneos. HNM afirma que, a
rigor, nem mesmo no caso de interesses individuais homogêneos haveria uma verdadeira litispendência, seria caso
de conexão ou, em casos mais específicos, de continência. Ademais, o ajuizamento de ação civil publica sobre o
mesmo objeto não induz litispendência porque não pode impedir o direito individual subjetivo da ação, assegurado
na Carta Magna.
Para que haja a litispendência (rectius, continência) prevista no artigo 104 são condições implícitas: a) na ação
individual o lesado postule a reparação daquilo que seu dano tenha de comum ou uniforme com outros lesados (ex:
defeito de produto em série, todos consumidores serão prejudicados, mesmo custo da substituição ou da
indenização pela reposição da peça defeituosa); e b) na ação civil publica ou coletiva,o pedido compreenda a
reparação dos prejuízos individuais homogêneos de todo o grupo ou ao menos se reconheça uma lesão de caráter
coletivo (sentido estrito). Outro exemplo citado da continência: individual para anular uma cláusula de contrato de
adesão e ação civil pública ou coletiva com o mesmo pedido, mas para todo o grupo de lesados.
Não haverá continência muito menos litispendência se na individual o lesado estiver postulando indenização de
prejuízos diferenciados, tais como lucros cessantes e danos emergentes. O objeto das ações é diverso, o pedido na
individual não está contido na civil pública ou coletiva.
A lei da ação civil pública expressamente prevê que não há prejuízo para a propositura de ação popular. Em tese,
coexistem ambas, mas para não haver decisões contraditórias elas não poderão ser ajuizadas simultaneamente se
tiverem a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
É possível conexidade entre ação civil pública e ação popular em matéria ambiental ou em defesa do patrimônio
publico. Pode até mesmo haver litispendência, se os legitimados ativos atuarem como substitutos processuais.
Aparente e formalmente, não haveria identidade, mas na prática sim, por exemplo, dois cidadãos propõem ação
popular para defesa do mesmo bem jurídico em nome da coletividade.
Mas e aqueles legitimados que também defendem direito próprio em uma ação civil publica ou coletiva, isso
não obstaria a litispendência? Não, pois admitida essa tese a litispendência já não seria possível em razão da
diversidade de ações – não se formaria a coisa julgada erga omnes. Em suma, se pode formar coisa julgada entre
elas, é plenamente possível haver litispendência.
36
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
A questão dos limites territoriais da coisa julgada (artigo 16 LACP) será tratada em capitulo oportuno, mas o
autor adverte desde já que “se a coisa julgada proferida em ação civil pública ou coletiva gerar a imutabilidade erga
omnes ou ultra partes do decisum, relevância alguma terá saber qual a competência territorial do juiz prolator para
fins de determinar os limites da coisa julgada. A competência é decisiva para se definir quem julga o pedido, a
imutabilidade erga omnes ou ultra partes não depende da competência mas, sim, do resultado do processo. O artigo
é criticável, pois permite soluções contraditórias e até mesmo injustas.
Não há conexidade entre ação civil publica ou coletiva e ação penal, por evidente diversidade de falta de objeto.
3. UNIDADE OU EXTINÇÃO DO PROCESSO
Havendo litispendência, as ações iguais são reunidas no mesmo juízo por prevenção. O código de processo
civil dispõe que o juiz pode ordenar a reunião de ações propostas em separado. O código procura equiparar o
tratamento dados às hipóteses de conexão e continência, mas é preciso estabelecer algumas distinções: a) sob
continência, a reunião dos processos é necessária para evitar julgamentos inconciliáveis; b) já na conexão, a reunião
se dá quando for conveniente e oportuna (aí sim vale o disposto no artigo 105 CPC). PARA HNM, a reuniao de
processos é uma faculdade judicial e não uma norma cogente, o objetivo é celeridade, menos onerosidade e evitar
sentenças contraditórias.
O autor menciona que há respeitável entendimento no sentido de que envolvendo a conexão matéria de ordem
publica, não haveria faculdade do juiz, mas um dever. Entretanto, inclusive na jurisprudência majoritária, vem se
reconhecendo certa discricionariedade para o juiz avaliar até que ponto a reunião convem conforme o caso. No caso
de demanda individual para reparo de dano diferenciado não pode se reconhecer conexão ou continência com ação
civil publica. Também não pode haver se presente diversidade de parte e de pedidos, ou se o fundamento das ações
for diverso. Por fim, para que seja possível a reunião o juízo junto ao qual se pretende a reunião dos processos deve
ser competente para todas as ações.
CAPÍTULO 16
1. REGRAS GERAIS
A lei estabeleceu regras especiais de competência para facilitar a defesa dos interesses transindividuais em
juízo. Como regra geral, o foro é o do local do dano (ou no que possa vir a ocorrer o dano). No caso dos interesses
transindividuais indisponíveis, essa regra é absoluta, competência funcional. No CDC há norma especifica para a
ação coletiva que verse a defesa dos interesses individuais homogêneos de consumidores (artigo 93).
Se o dano for regional ou nacional, envolvendo ou não consumidores, a acao deve ser proposta na capital
do estado ou no Distrito Federal, aplicando-se as regras da competência concorrente (CPC). De âmbito local, a
competência será determinada em razão do foro do local do dano.
Como o artigo 93 do CDC não alude sobre competência absoluta ou funcional, o autor entende se tratar de
competência territorial e relativa, mas ressalta que, apesar de relativa, não pode haver eleição de foro pois um
legitimado não pode vincular para todos os demais.
No caso do ECA, NÃO é o local do dano, mas onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão, ressalva a
competência da justiça federal e dos tribunais superiores.
Para improbidade administrativa, a competência é do juízo cível, pois as sanções da lei não tem natureza
criminal. Para o autor, somente as sanções da perda do cargo e da suspensão dos direitos políticos é que devem
observar o mesmo foro dos crimes de responsabilidade.
No tocante à justiça militar, dá-se interpretação restrititva à atual redação do artigo 125 §4º CF/88: a
competência para julgar ação proposta contra ato disciplinares militares é do juízo comum, ainda que do ato possa
resultar perda da patente ou da graduação militar.
Por fim, não se inclui na competência dos juizados especiais as ações por improbidade administrativa nem as
demandas que envolvam direitos transindividuais.
2. AS QUESTÕES DECORRENTES DAS RELAÇÕES DE TRABALHO
a) a competência da Justiça do Trabalho
Com a mudança imposta pela EC 45/04, o STF tratou do tema e, inclusive, editou a sumula vinculante 22:
“a justiça do trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais
decorrentes de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não
possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgacao da EC 45/04”.
Havendo dano moral na relação de trabalho, violação a direito da personalidade quando um trabalhador é
submetido a vexame ou humilhação, a competencia é da justiça laboral. O mesmo vale para caso em que um
acidente de trabalho compromete a capacidade laborativa.
Em suma, caberá à justiça estadual somente julgar processo por danos morais se a ofensa se deu quando
extinta a relação de trabalho e o fundamento do pedido tiver sido de natureza eminentemente civil, como é o caso
da ofensa à honra. Fora tais hipóteses, a defesa dos interesses transindividuais cabe ao MPT.
37
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
b) o meio ambiente do trabalho
Para quem defende que cabe à justiça trabalhista, o fundamento está no artigo 114 da Constituição, com a
redação dada pela EC 45/04. A outra tese sustenta que se cabe à justiça estadual processar e julgar ações movidas
contra o INSS, também lhe seria dado o julgamento das causas que versem sobre o meio ambiente do trabalho
(posição já defendida antes mesmo do advento da sumula 736 STF).
O AUTOR se filia a primeira. Inicialmente, dizia ser competência decorrente, mas na atualidade diz se
tratar de competência especifica da justiça do trabalho. Menciona que a 2ª turma do STF decidiu nesse sentido e
que o julgamento do RE 206220/MG foi uma das fontes da sumula 736 STF. Tratava-se de ação civil publica
movida pelo MPMG cuja causa de pedir era a precariedade das condições laborativas dos empregados de diversos
bancos, sobretudo excesso de serviços e descumprimento do período mínimo de intervalo entre as jornadas de
trabalho.
Entretanto, é preciso notar que o caso envolvia de fato matérias atinentes ao direito do trabalho e, portanto, da
competência da justiça laboral. Assim, numa ação civil publica em que se discuta muito mais que controvérsias
oriundas da relação de trabalho, a questão deve ser apreciada pela justiça estadual – ex: colocação de filtros em
chaminés, pois a poluição não prejudica somente aos funcionários, mas a todos da cidade e região.
c) os interesses transindividuais indiretamente ligados às relações do trabalho
O autor cita como exemplo questões que digam respeito: à acessibilidade ao trabalho de pessoas idosas
e/ou com deficiência, observância das normas de defesa da criança e do adolescente nas relações de trabalho,
validade de concursos de ingresso e outras ações de caráter coletivo que envolvam indiretamente uma relação de
trabalho.
Em todos esses exemplos, segue-se a regra do item anterior, se a causa for relacionada a aspectos da
própria relação de trabalho, competência da justiça laboral, do contrário, mais ampla a questão e a relação de
trabalho não for objeto da ação, a competência é da justiça comum.
3. A COMPETÊNCIA ABSOLUTA
De acordo com o artigo 2º da LACP, a competência é funcional, do foro do local do dano. Hugo Nigro
Mazilli afirma que quis a lei assegurar que tal competência é absoluta, inderrogavel e improrrogável por vontade
das partes. Nesse sentido, mais clara ainda foi a previsão do ECA (local da ação ou omissão). O autor afirma, ainda,
que houve nítido equivoco do legislador ao dispor no artigo 16 da LACP sobre competência “territorial”, pois na
verdade ela é absoluta.
4. A COMPETÊNCIA EM MATÉRIA DE INSTERESSES TRANSINDIVIDUAIS
a) Interesses difusos e coletivos
Vale a regra do artigo 2º LACP, local do dano, competência absoluta para os interesses transindividuais de
que trata a lei.
b) Interesses individuais homogêneos
Ocorrendo lesões a interesses individuais homogêneos, o artigo 93 do CDC estabelece regras próprias da
competência, foro da capital do estado ou do pais, para danos regionais ou nacionais conforme o caso.
c) os limites da competência territorial do juiz prolator
Na defesa dos interesses difusos e coletivos a competência é absoluta, porque funcional, não se trata de
competência territorial relativa. Ocorre que a lei 9494/97 estabeleceu que a coisa julgada só se estenderia aos
limites da competência territorial do juiz prolator da sentença. A lei é fruto da MP 1570/97, que não respeitou os
requisitos constitucionais para sua edição, e tinha por objetivo enfraquecer o alcance e os efeitos da lei da ação civil
publica.
A lei 9494 introduziu a locução adverbial “nos limites da competência territorial do órgão prolator”. Mazilli
critica a lei e diz que o acréscimo é de todo equivocado, de redação infeliz e inócua. O legislador confundiu limites
da coisa julgada com competência, e competência absoluta com competência territorial. A imutabilidade erga
omnes dos efeitos de uma sentença com transito em julgado não tem nada a ver com a competência.
Alem disso, o legislador esqueceu de modificar o disposto no CDC (artigos 93 e 103) e o sistema da ação
popular, cujo artigo 18 serviu de inspiração para o artigo 16 da LACP. Uma sentença que proíbe a fabricação de um
produto nocivo a rios que banham vários estados, vale em todo o pais, não somente na localidade em que foi
prolatada a decisão. Se assim não for, serão várias as decisões contraditórias em todo o país, o que contraria os
fundamentos e as finalidades da defesa coletiva dos interesses transindividuais.
Inócua, a alteração promovida pela lei 9494/97 levararia ao paradoxo de um dano em duas ou mais comarcas
vizinhas jamais poder ser conhecido por um único juiz, pois nenhum dos juízes dos locais do dano terá
competência plena. Assim, várias ações deveriam ser propostas pois diversos os juízes competentes. Para evitar
tudo isso, a solução é reconhecer a ineficácia da alteração trazida pela lei.
38
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Se os danos forem locais, o inquérito civil será instaurado e a ação proposta conforme as regras da prevenção.
Dano regional ou nacional, na respectiva capital ou Distrito Federal.
d) Conclusão
Nos termos do CDC e da LACP, ressalvada a competência da justiça federal, os danos serão apurados na
justiça estadual: onde ocorrer o dano se local, e se o dano for regional ou nacional, alternativamente no foro da
Capital do Estado ou do Distrito Federal.
5. A COMPETÊNCIA EM MATÉRIA DE DEFESA DO CONSUMIDOR
a) Competência relativa
Na defesa dos interesses transindividuais dos consumidores, o CDC traz apenas um artigo (93) no tocante
aos interesses individuais homogêneos. Nada dispôs sobre os interesses difusos e coletivos dos consumidores. É
caso em que entra a aplicação integrada entre a LACP e o CDC.
Mas a competência prevista no artigo 93 do CDC é absoluta (como expressamente o faz a LACP) ou seria
relativa? Mazilli entende ser relativa, pois o código não a eleva expressamente à condição de competência absoluta
(ao contrário do que faz o artigo 2º LACP e o artigo 209 ECA) e ainda elenca critérios alternativos para a
determinação da competência.
A competência seria, então, relativa, dotada de algumas peculiaridades: a impossibilidade de eleição, derrogação
ou prorrogação de foro. Competência relativa e territorial, observadas tais peculiaridades, pois os legitimados
ativos não podem pactuar foro contratual que vincule os demais colegitimados.
b) O domicílio dos substituídos
A MP 2180-35 acrescentou o artigo 2-A à lei 9494/97: “a sentença civil prolatada em ação de caráter
coletivo proposta por entidade associativa, na defesa dos interesses e direitos dos seus associados, abrangerá apenas
os substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicilio no âmbito da competência territorial do orgao
prolator”. O paragrafo único ainda dispõe que a inicial devera ser instruída com a ata da assembleia da entidade e
com a relação nominal dos associados e seus endereços.
Mazilli afirma que se trata de mais uma tentativa canhestra de restringir os efeitos da lei. Exemplifica
dizendo que uma associação nacional jamais poderia defender os interesses de toda a classe, cada um teria que
propor sua ação individual, o que seria negar o acesso à justiça.
A melhor interpretação é no sentido de que se o dano for nacional ou regional, a ação coletiva deve ser
proposta na capital do estado ou do Distrito Federal, e o juiz terá competência para decidir para todos, residentes ou
não na capital. Ou seja, independe da residência dos substituídos ou do foro do prolator da sentença.
Apesar de em alguns casos a competência ser relativa, por serem os legitimados ativos meros substitutos
processuais dos lesados, não se pode falar em eleição ou renuncia ao foro.
Em resumo, não vale a exigência imposta pela referida medida provisória e a legitimação é extraordinária,
diferente seria se fosse caso de representação processual.
O artigo 5º da Lei 7.347/85 estabelece o rol de legitimados ativos para propor ação civil pública. Dentre
eles, vale destacar os órgãos sem personalidade jurídica (desde que autorizados pela autoridade administrativa
competente), que poderão ajuizar ACPs ou ações coletivas, não só em matéria de consumidor, como também meio
ambiente, pessoas idosas, deficientes, qualquer área afim.
Tem-se questionado a legitimação da Defensoria Pública para propor ACP em benefício de um grupo
indeterminável de pessoas. Isso por que, neste grupo, a Defensoria acabará por defender necessitados e não
necessitados. Por tal entendimento, ela só poderia defender pessoas individualizáveis ou identificáveis, e não
direitos transindividuais.
Como a DP tem dever institucional de defesa dos necessitados, HNM diz que negar legitimidade para ela
ingressar com ACP seria negar os próprios fundamentos do processo coletivo, já que poderia defender todos os
necessitados, um a um, mas não poderia defender todos, de uma só vez, num único processo (coletivo). E
prossegue dizendo que a DP até pode propor ACP ou coletivas, em defesa de interesses difusos, coletivos e
individuais homogêneos de pessoas que se encontrem na condição de necessitados (insuficiência de recursos),
mesmo que com isso possam ser indiretamente beneficiadas terceiras pessoas que não se encontrem na condição de
deficiência econômica. Mas entende que no tocante à defesa dos interesses coletivos em sentido estrito e
individuais homogêneos (duas hipóteses em que se tem grupos determináveis de pessoas), é necessário que os
beneficiários da ação sejam pessoas necessitadas.
E a OAB, pode ajuizar ACPs? HNM entende que sim. Segundo ele, trata-se de ações em que há
substituição processual da classe. Mas, sem ser para a defesa da classe dos advogados, HNM entende que a OAB
também possui legitimidade para ajuizar ACPs ou coletivas, já que possui natureza jurídica de autarquia especial, e,
como tal, pode ajuizar ACPs de objeto compatível com seus fins institucionais, previstos no art. 44 da Lei 8.906/94.
No mesmo sentido, HNM entende que as Agências Reguladoras (autarquias sob regime especial), os
sindicatos e as comunidades indígenas podem propor ações coletivas.
Atualmente, tanto a lei quanto a jurisprudência tem alargado o rol de legitimados para a defesa de direitos
transindividuais, já tendo, esta última, admitido o ajuizamento de ações por: a) antigo síndico da massa falida; b)
comissão de representantes de adquirentes de unidades em condomínio ou incorporações; c) condomínio de
edifícios de apartamentos.
HNM entende que as sociedades cooperativas não são legitimadas ativas, já que sua personalidade
associativa é voltada para a atividade econômica, não se confundindo, pois, com as associações civis.
E, por fim, diz que o cidadão não tem legitimidade para ajuizar ACPs ou coletivas, mas poderá ingressar
com Ação Popular que, em alguns casos, poderá ter caráter coletivo.
2. REPRESENTAÇÃO ADEQUADA
HNM diz que segundo o sistema da LACP e do CPC, as associações, para ajuizar ACPs ou coletivas, serem
litisconsortes ou assistentes, precisam ter representação adequada, a qual é composta de dois requisitos:
a) pertinência temática – finalidade institucional compatível com o objeto de ação coletiva;
b) pré-constituição há pelo menos um ano nos termos da lei civil - pode ser dispensado pelo juiz. Segundo
HNM, serve para conferir à associação condições legais de representatividade do grupo.
Requisitos estes parecidos com os exigidos para o ajuizamento do Mandado de Segurança Coletivo, por parte da
organização sindical, entidade de classe, ou associação legalmente constituída.
HNM diz que por identidade de razões, o requisito da constituição ânua também se aplica aos sindicatos,
que são pessoas jurídicas de direito privado, com caráter associativo, bem como às fundações de direito privado. E
isso porque a intenção do legislador seria de excluir da limitação temporal apenas os legitimados públicos, ou seja,
os órgãos públicos ou entidades da administração direta e indireta (CDC, art. 82, I a III).
42
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Conquanto o requisito da constituição ânua possa ser dispensado pelo juiz (manifesto interesse social
evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido), podendo
até mesmo ser completado no curso da ação (STJ, REsp. 236.499), o mesmo não pode ocorrer com o outro
requisito, o da pertinência temática.
HNM diz que para o preenchimento da pertinência temática, é possível que a finalidade institucional possa
ser razoavelmente genérica, ou seja, não é preciso que a associação seja constituída para defender em juízo
especificamente aquele exato interesse controvertido no caso concreto. Entretanto, essa generalidade não pode ser
desarrazoada, sob pena de admitir-se uma associação civil para a defesa de qualquer interesse, o que desnaturaria a
exigência da representatividade adequada.
HNM pergunta se a representatividade adequada só se aplica às associações civis, ou se também alcança as
fundações privadas, sindicatos, ou até mesmo órgãos e entidades da administração. Segundo ele, numa
interpretação mais literal (art. 5º, LACP e art. 82, IV, CDC), seria possível concluir que somente a associação civil
teria que preenchê-lo. Mas, Mazzilli entende que “onde há a mesma razão, deve-se aplicar a mesma disposição”. E,
por isso, defende que as fundações privadas, sindicatos e até os órgãos e entidades da administração pública têm
seus fins peculiares, que devem ser cotejados com o objeto da ação coletiva. Ex.: uma autarquia criada para o
turismo não poderia ajuizar ACP na área de saúde.
Para Mazzilli, só não tem sentido exigir pertinência temática do MP, da União, Estados, Municípios e do
DF, em razão de suas vocações para a defesa de interesses públicos e coletivos lato sensu, o que faz presumir que
teriam legitimidade para defender qualquer interesse coletivo. No mesmo sentido, não se exigiria pertinência
temática dos Partidos Políticos, tendo em vista sua larga abrangência programática. Assim, associações, sindicatos,
fundações privadas e entidades da Administração indireta devem preencher a pertinência temática.
O art. 2º, caput e parágrafo único, da Lei 9.494/97 prevê que a sentença de ação coletiva movida por
entidade associativa abrangerá apenas os substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no
ambiento de competência órgão prolator; e que nas ações proposta contra pessoas jurídicas de Direito Público, a
petição inicial deverá estar instruída com a ata da assembleia da entidade associativa que a autorizou, junto com a
relação nominal dos associados e indicação dos respectivos endereços.
HNM entende que essas duas normas seriam aplicadas apenas quando da defesa de direitos individuais
homogêneos, até porque o proveito objetivado na ação será sempre divisível entre os integrantes determináveis do
grupo. Porém, diz ser desarrazoado exigir relação nominal / endereço, como se de representação processual se
tratasse, e, mais ainda, pretender estabelecer a imutabilidade da sentença através do domicílio do associado.
Exatamente nesse sentido, HNM cita que o STF (RMS 23.566-DF), no âmbito do Mandado de Segurança Coletivo,
disse que o supracitado dispositivo não se aplica em relação aos órgãos da Justiça que tenham jurisdição nacional,
porque abrangem todos os substituídos onde quer que tenham domicílio no território nacional.
Diante disso, Mazzilli conclui o seguinte: há sentido processual na exigência de autorização em ata de
assembleia ou em estatuto para os direitos individuais homogêneos e coletivos em sentido estrito. Entretanto, é
absurda a exigência de relação nominal / endereço, tanto em relação a direitos individuais homogêneos, coletivos
em sentido estrito e, com muito mais razão em se tratando de direitos difusos, dada a indeterminabilidade do seu
objeto e também dos sujeitos envolvidos.
Mazzilli diz que, assim como não se exige o requisito da constituição ânua para o MP e para os entes
federativos (U, E, M, DF), também não se exige o requisito da representatividade adequada, estando, em tese, todos
legitimados a impetrar ACPs ou coletivas. Ele diz que o interesse do MP é presumido, porém, os demais
legitimados (até mesmo os entes federados) deverão ter interesse concreto na defesa do interesse objetivado na
ACP ou coletiva. Ele cita que N. Nery apresenta entendimento diverso, no sentido de não haver necessidade de
apresentar interesse concreto. Para Nery seria possível que o Estado do RS ingressasse com uma ACP para a
proteção do meio ambiente do Estado do AM, porquanto o interesse processual na ACP seria aferível em razão da
qualidade do direito tutelado.
HNM diz que a representatividade adequada e pertinência temática são na verdade pressupostos
processuais e não condições da ação.
Assim, conclui que para ajuizar ACP ou coletiva a associação deverá estar expressamente autorizada, seja
pelos estatutos (o que dispensa autorização em assembléia), seja pela deliberação da própria assembléia.
HNM faz um último questionamento no sentido de se no curso da ACP a associação vier a perder a
representatividade adequada. O que fazer? Ele diz que o juiz tem duas alternativas: a) reconhecer a carência da
ação; b) outro legitimado poderá assumir a promoção da ação.
3. Legitimação das associações civis, dos partidos políticos, dos sindicatos e das fundações privadas
43
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Primeiramente, é preciso distinguir que as entidades civis podem ingressar com ação coletiva para
defender: a) todo o grupo (incluindo os associados ou não associados) ; e b) diretamente seus associados. Já em se
tratando de MS Coletivo, somente poderá ajuizar para a totalidade ou parte de seus associados. Ou seja, não
abrangerá os não associados.
HNM destaca que nos últimos anos o 3º Setor tem assumido importante papel na defesa de direitos
coletivos, até mesmo porque o Estado não tem tido capacidade de atender à demanda de serviços sociais.
Nos limites de seus fins estatutários, a jurisprudência já reconheceu a legitimidade de associações para a
defesa de direitos de seus associados nas seguintes situações: a) dos centros acadêmicos para defender os
estudantes em matéria de interesses individuais homogêneos; b) associação de moradores de bairro para defender o
meio ambiente; c) das associações de funcionários para obter benefícios coletivos; d) dos sindicatos em defesa de
direito relacionado com a categoria que representam.
A autorização exigida no art. 5º, XI, da CF, para que a associação possa defender seu associado pode
decorrer do próprio estatuto, da assembléia geral ou mesmo de deliberação da diretoria, se assim permitirem os
seus atos constitutivos.
Porém, note que o art. 82, IV, CDC, dispensou a autorização de assembléia, exatamente porque se a
associação incluir entre seus fins institucionais a defesa de direitos dos consumidores, já terá havido autorização
estatutária.
HNM levanta o questionamento se caso apenas alguns associados autorizem a ação coletiva, esta
abrangeria apenas estes ou todos? Ele cita que o STF, na AO 152-8/RS, decidiu que ela está legitimada a defender
todos seus associados e não apenas àqueles que deram autorização expressa. Isso porque tem-se aqui legitimação
extraordinária (substituição processual) e não representação processual. E mais, a ação coletiva pode beneficiar até
mesmo quem não seja associado. Isso por conta do caráter indivisível dos direitos coletivos. Esse entendimento
vale até mesmo para os direitos individuais homogêneos. Ou seja, as associações teriam legitimidade para pleitear
em juízo em favor de todos aqueles que se encontrem na situação alcançada por seus fins, ainda que dela não sejam
associados. Nesse sentido, cita precedentes do STJ (ex.: REsp 132.502-RS). Todavia lembra que o MS Coletivo só
pode atingir os associados, no todo ou em parte (art. 21 da Lei 12.016/09).
Mazzilli, porém, adverte que a associação não detém legitimidade para ajuizar ação coletiva que beneficie
parte de seus associados e que prejudique outra parte, simultaneamente, citando precedente do STJ que entendeu
que nesse caso a associação estaria contrariando em parte seu fim institucional.
A jurisprudência tem admitido benefícios da assistência judiciária gratuita quando a entidade não disponha
de recursos para custear as despesas do processo.
Mazzilli também reconhece a possibilidade de associações de associações terem legitimidade para ingressar
com ACP ou coletiva, dizendo que essa discussão se deu mais no âmbito da ADIn, tendo o STF reconhecido a sua
legitimidade.
Os partidos políticos têm natureza associativa. Assim, podem ajuizar demandas coletivas, desde que no
interesse dos seus filiados ou das suas próprias finalidades institucionais.
Vale ressaltar que não se exige pertinência temática dos partidos políticos em razão de sua larga
abrangência programática.
Embora CF não seja expressa quanto a possibilidade de defesa de direitos difusos pelos sindicatos,
HNM entende que eles estariam incluídos na expressão “interesses coletivos”, que teria sido usada em seu
sentido amplo.
Nesse sentido, a lei ordinária conferiu aos sindicatos a possibilidade de atuarem como substitutos
processuais, não apenas dos seus sindicalizados, mas também de todos os integrantes da categoria.
HNM ressalta que direitos individuais não homogêneos somente poderão ser defendidos pelos sindicatos
através de representação processual, diferentemente das ações coletivas em que ocorre substituição processual
(legitimação extraordinária).
44
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Relembre-se que no âmbito do MS Coletivo, o sindicato somente tem legitimidade para ingressar com ação
coletiva para defesa de seus sindicalizados, no todo ou em parte.
Sobreleva ressaltar que a legitimação dos sindicatos serve tanto para o processo de conhecimento quanto
para o de execução. Assim, não necessitam de autorização para ingressar com liquidação / execução, já que se trata
de substituição processual.
Vale destacar também que o sindicato pode defender interesses transindividuais não só em matérias
diretamente ligadas à própria relação trabalhista, mas também em questões relativas ao meio ambiente do trabalho
ou à condição de consumidores de seus associados.
Conforme já foi dito anteriormente, HNM defende também a necessidade de o sindicato preencher o
requisito de pré-constituição ânua, pelo fato de ser espécie de entidade civil.
O sindicato poderia cobrar honorários de seus membros ao ingressar com ação em juízo? HNM diz que se o
sindicato estiver agindo por representação processual, seria possível. Mas se por substituição processual, não seria
possível.
E as centrais sindicais, têm legitimidade para propor ACPs ou coletivas? HNM entende que sim por dois
motivos: a) possuem natureza de associação civil; b) fazendo analogia com as associações de associações.
O art. 5º, IV, da LACP admitiu a legitimação ativa da fundação. HNM diz que como a lei não fez distinção
entre fundação pública e privada, não é dado ao intérprete fazer essa distinção para afastar a legitimidade desta
última, até mesmo porque, deve-se propiciar o mais amplo acesso Judiciário e melhor tutela aos interesses
coletivos. Assim, ele entende que tanto a fundação pública quanto a privada estão legitimadas.
CAPÍTULO 17
4. A legitimação ativa do Ministério Público
Inicialmente se questionou sobre a legitimidade do MP para assegurar a tutela judicial dos interesses
transindividuais, com esteio nos seguintes argumentos, arrolados por Mancuso: “a) O MP é uma instituição
naturalmente voltada à persecução de delitos tradicionais, comuns, mostrando pouca vocação persecutória quando
se trata de delitos de natureza econômica ou coletiva; b) o MP estrutural e funcionalmente está demasiadamente
conexo ou subjacente à estrutura do poder estatal, para que dele se pudesse esperar a necessária autonomia e
combatividade desejável, quando se trate de tutela aos interesses supraindividuais; c) ao MP falta aparelhamento e
infraestrutura indispensáveis à tutela desses interesses especiais”.
Mas esta era uma leitura do MP europeu, especialmente o italiano, em que o MP era ramo do Poder
Judiciário, e que não poderia ser aplicada à martelo ao novo ordenamento brasileiro, especialmente após a Lei n.º
7.347/85 e a CF/88, conforme advertiu Capelletti.
Ademais, pelas características do Brasil, mister se faz um distanciamento entre o MP e o Poder Executivo,
ao contrário do modelo de alguns países. Daí a relevância das prerrogativas e garantias dos membros do MP, bem
como da forma de escolha dos chefes da instituição.
5. Legitimação concorrente
É concorrente e disjuntiva a legitimação ativa para a propositura de ações civis públicas ou coletivas em
defesa de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, pois cada um dos colegitimados pode ajuizar
essas ações, quer litisconsorciando-se com outros, quer fazendo-o isoladamente. É concorrente, porque todos os
colegitimados do art. 5º da LACP ou do art. 82 do CDC podem agir em defesa de interesses transindividuais: é
disjuntiva porque não precisam comparecer em litisconsórcio.
Ainda que os colegitimados também tenham interesse próprio à reintegração do direito lesado (como uma
associação civil que inclua, entre seus fins estatutários, a defesa daquele interesse), na verdade, no processo
coletivo, os legitimados ativos agem por substituição de todo o grupo lesado, defendendo direitos individuais de
cada um de seus integrantes, às vezes até mesmo divisíveis e individualmente quantificáveis (como no caso dos
interesses individuais homogêneos). E, em caso de procedência, a coisa julgada nas ações civis públicas ou
coletivas forma-se em proveito de todo o grupo, e não dos legitimados ativos. Isso evidencia que, na defesa de
45
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
quaisquer interesses transindividuais (difusos, coletivos ou individuais homogêneos), os colegitimados ativos estão
defendendo muito mais do que meros interesses próprios.
Nas ações civis públicas ou coletivas, o interesse de agir do Ministério Público é presumido; já as pessoas
jurídicas de direito público interno e os demais colegitimados devem demonstrar em concreto seu interesse.
6. Ampliação da legitimidade ativa
Embora alguns órgãos públicos possam não ter personalidade jurídica (o próprio Ministério Público não a
tem), poderão, em alguns casos, ter personalidade judiciária, como ocorre nas mesas das câmaras legislativas, ou
com os órgãos estatais de defesa do meio ambiente ou do consumidor (como os Procons), nos municípios e Estados
em que eles sejam meros serviços públicos despersonalizados, etc.
7. Os cidadãos e os titulares de interesses individuais
A instituição da ação civil pública em nada prejudica o cabimento das ações populares (LACP, art. 1º,
caput). Ajuizada a ação coletiva, a pessoa que tem processo individual em andamento será instada a dizer se quer
suspender seu processo para beneficiar-se do julgado coletivo, ou se prefere continuar seu processo individual (art.
104, CDC). Cria-se-lhe, pois, um direito: pode optar por entrar no processo coletivo ou não. O sistema vigente é o
correto (CDC, arts. 94 e 104): em vez de ser um ônus do lesado pedir sua exclusão do processo coletivo, é seu
direito suspender o processo individual.
No caso de ser proposta ação civil pública ou coletiva com objeto potencialmente mais abrangente, cuja
eventual procedência possa abarcar o que esteja sendo pedido em ações individuais já em curso, o tratamento
jurídico será o seguinte:
a) se a ação civil pública ou coletiva versar a defesa de interesses difusos, não haverá litispendência com ações
individuais, exceto se se tratar de ação popular que tenha a mesma causa de pedir e o mesmo pedido de uma ação
civil pública (até porque ação popular não é a rigor uma ação individual). O lesado que tenha ação individual em
andamento não irá requerer sua suspensão no prazo assinalado no art. 104, CDC, nem se habilitará como
litisconsorte (assistente litisconsorcial) na ação civil pública ou coletiva que verse interesses difusos, salvo se a
causa de pedir e o pedido destas ações guardarem correspondência com o de sua ação individual. Igualmente, não
haverá suspensão da ação individual, se nesta o lesado estiver pedindo a reparação de seu interesse individual
diferenciado. Entretanto, se na ação individual o lesado estiver pedindo reparação decorrente de um dano cuja
materialidade e autoria sejam objeto de ação civil pública que verse interesses difusos (por exemplo, danos ao meio
ambiente causados pela explosão de uma usina nuclear), então existirá a necessária correlação entre a ação
individual e a coletiva, e o indivíduo poderá pedir a suspensão de seu processo individual para eventualmente
aproveitar, in utilibus, a coisa julgada erga omnes que venha a formar-se na ação civil pública, evitando ter de
discutir novamente a existência e a autoria do mesmo dano, que é a base do seu pedido individual.
b) se a ação civil pública ou coletiva versar defesa de interesses coletivos, também não haverá litispendência
com ações individuais caso em curso: inexistirá identidade de partes ou de pedidos. Aliás, a rigor, em todas as
hipóteses desmembradas do art. 104, CDC, só poderemos ter em tese conexão ou no máximo continência entre
ação coletiva e ação individual. Não pode haver identidade alguma de pedidos entre a ação coletiva e a ação
individual, para que se pudesse falar em litispendência. Continência ou conexão, sim, isso é possível. Como
exemplo de continência, suponhamos que, em ação individual relativa a questão de consumo, seja pedida a
nulidade de uma cláusula contratual, e, em ação civil pública, o Ministério Público peça a nulidade da mesma
cláusula em benefício, agora, de todos os consumidores que se encontrem na mesma situação. Para que o indivíduo
se beneficie do resultado da ação civil pública, deverá requerer a suspensão de seu processo individual; fazendo-o a
tempo, o interessado poderá habilitar-se como litisconsorte na ação civil pública ou coletiva.
c) se a ação civil pública ou coletiva versar interesses individuais homogêneos, o CDC sugere, em interpretação
a contrario sensu, haver litispendência com as ações individuais dos lesados que visem à reparação do prejuízo
divisível, naquilo que tenha de idêntico com o dos demais lesados. Entretanto, o certo é afirmar o contrário: não há
falar verdadeiramente em litispendência nesses casos, pois não se trata da mesma ação. O mais correto é considerar
a hipótese como de continência, por ter a ação coletiva objeto mais abrangente que as ações individuais. Se o autor
da ação individual não requerer sua oportuna suspensão, sua ação prosseguirá e não será afetada pelo julgamento da
ação coletiva, mas, se ele preferir a suspensão da ação individual, poderá habilitar-se como litisconsorte na ação
coletiva.
Em se tratando de concorrência entre ação individual e mandado de segurança coletivo, igualmente não
haverá litispendência entre eles, mas, em vez de suspender sua ação, o indivíduo deverá dela desistir, no prazo de
trinta dias, se quiser beneficiar-se do julgado coletivo.
CAPÍTULO 18
1. Generalidades
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
2. Litisconsórcio
Em consequência da legitimação concorrente e disjuntiva para as ações civis públicas ou coletivas, é
possível o litisconsórcio ativo inicial: um colegitimado pode ingressar em juízo só ou em litisconsórcio com outro
ou outros legitimados.
Se, porém, um colegitimado ingressa em ação já proposta por outro deles, cabe distinguir:
a) se ele adita a inicial para alterar ou ampliar o objeto do processo, haverá litisconsórcio ulterior;
b) se a causa de pedir ou o pedido continuam o mesmo, não há litisconsórcio e sim assistência litisconsorcial.
Se a legitimidade ativa é concorrente e disjuntiva, nada impede:
a) o litisconsórcio inicial (ou seja, qualquer dos colegitimados natos pode litisconsorciar-se com qualquer outro
para a propositura da ação);
b) ou a assistência litisconsorcial (se o colegitimado não se litisconsorciou para a propositura da ação, pode
habilitar-se como assistente litisconsorcial do autor, depois de já proposta a ação);
c) ou o litisconsórcio ulterior (ou seja, desde que observadas as normas procedimentais, nada impede que o
colegitimado adite a inicial, ampliando o pedido ou a causa de pedir).
Só não pode ser ré, em ação civil pública ou coletiva, a própria coletividade considerada
transindividualmente. O sistema da legitimação extraordinária foi concebido justamente para permitir que
indivíduos, fragmentariamente lesados pela violação de direitos, sejam substituídos no polo ativo de um único
processo coletivo por um legitimado ativo, para obter-se uma só prestação jurisdicional que beneficie todo o grupo
de pessoas lesadas. Pela sistemática vigente, excetuada a hipótese de ação popular, os indivíduos não poderão ser
autores de ações em que se defendam interesses transindividuais (difusos, coletivos ou individuais homogêneos, de
todo o grupo, classe ou categoria de pessoas), quer isoladamente, quer em litisconsórcio unitário facultativo, pois os
legitimados ativos são aqueles do art. 5º da LACP e do art. 82 do CDC.
Sempre que na ação civil pública o pedido seja idêntico ou conexo com o que qualquer cidadão poderia
fazer em ação popular, não há como recusar a este último o litisconsórcio ou a assistência litisconsorcial no polo
ativo da ação coletiva.
Em regra, a lei não legitima extraordinariamente o indivíduo a defender interesses difusos, coletivos e
individuais homogêneos de toda a categoria. Somente em limitada medida ele defenderá o seu próprio interesse por
legitimação ordinária, no seio de ação civil pública ou coletiva.
Pode o indivíduo ser litisconsorte ou habilitar-se como assistente litisconsorcial, se tinha legitimidade
ordinária ou extraordinária para fazer o mesmo pedido, ou fazer um pedido conexo, ou fazer um pedido que esteja
contido naquele da ação civil pública ou coletiva.
É verdade que pessoa jurídica não pode propor ação popular. Entretanto, como em alguns casos o objeto da
ação popular pode ser idêntico ou conexo ao da ação civil pública, isso significa que, se uma associação civil
poderia propor uma ação civil pública com pedido idêntico ou conexo com o de uma ação popular, o que obrigaria
à extinção do segundo processo ou à reunião dos processos, conforme o caso – hipótese em que seria tratada como
litisconsorte – passa a ser admissível o litisconsórcio entre associação e cidadão (tanto na ação popular como na
ação civil pública), nos mesmos casos em que já estariam ambos legitimados a defender o meio ambiente ou o
patrimônio histórico e cultural.
CAPÍTULO 19
1. Os legitimados passivos
a) A regra geral: nas ações civis públicas ou coletivas, qualquer pessoa, física ou jurídica, pode, em tese, ser
parte passiva. Há, porém, uma limitação: os legitimados ativos, em regra, não podem representar passivamente a
categoria, classe ou grupo de lesados.
b) A ação declaratória incidental: como o objeto da ação declaratória incidental é a ampliação dos limites
objetivos da coisa julgada, se admitíssemos seu cabimento no processo coletivo, estaríamos a aceitar, por vias
transversas, pudesse ser formulado pedido contra a coletividade.
c) O Ministério Público como réu: enquanto órgão estatal desprovido de personalidade jurídica, o Ministério
Público não poderá ser parte passiva na relação processual formada em processo coletivo.
d) As autoridades no polo passivo: as autoridades coatoras não integrarão o processo coletivo, salvo se
estiverem sendo pessoalmente responsabilizadas na ação. Já no mandado de segurança coletivo, têm legitimidade
passiva tanto a autoridade coatora como a pessoa jurídica interessada. Outrossim, na ação civil pública de
improbidade administrativa, a competência não se deslocará para os tribunais, salvo se, cumulativamente: a) o
pedido envolver a perda do cargo ou suspensão de direitos políticos; b) a infração versar crime de responsabilidade
de autoridade que goze de foro por prerrogativa de função.
e) a desconsideração da personalidade jurídica: o sistema jurídico brasileiro acolhe, como regra, a chamada
teoria maior da desconsideração, ou seja, além da prova de insolvência, exige-se a demonstração de desvio de
finalidade (teoria subjetiva da desconsideração), ou a demonstração de confusão patrimonial (teoria objetiva da
desconsideração). Em se tratando, porém, de defesa do consumidor ou do meio ambiente, nosso direito aplica a
chamada teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica, a qual é calcada na exegese autônoma do §5º
do art. 28, CDC. Segundo a teoria menor, a incidência deste dispositivo não se subordina à demonstração dos
requisitos do caput do art. 28, mas apenas à prova de que a mera existência da personalidade jurídica está a causar
obstáculo ao ressarcimento dos consumidores. Em matéria ambiental, também poderá ser desconsiderada a pessoa
jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio
ambiente (teoria menor da desconsideração). A desconsideração inversa da personalidade jurídica caracteriza-se
pelo afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, em oposição ao que ocorre na desconsideração de
personalidade jurídica propriamente dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar
a pessoa jurídica por obrigações do sócio controlador. Considerando-se que a finalidade da disregard doctrine é
combater a utilização indevida do ente societário por seus sócios, o que pode ocorrer também nos casos em que o
sócio controlador esvazia o seu patrimônio pessoal e o integraliza na pessoa jurídica, conclui-se, de uma
48
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
interpretação teleológica do art. 50 do CC, ser possível a desconsideração inversa da personalidade jurídica, a fim
de atingir bens da sociedade em razão de dívidas contraídas pelo sócio controlador.
f) Entes sem personalidade jurídica
g) A intervenção de terceiros: quando a hipótese envolver responsabilidade objetiva, não se admitirá
denunciação da lide para discutir culpa de terceiro nos autos da ação civil pública ou coletiva porque a lide
secundária (fundada na culpa) não interessará à solução da lide principal.
h) A citação dos beneficiários do ato impugnado: se o resultado do processo coletivo deve atingir direitos
subjetivos de terceiros, a citação destes será indeclinável.
11ª Parcela do resumo feita por
Anna
388-425 , Até Capítulo 24 annafloresflower@hotmail.com
CAPÍTULO 20
INTERESSE PROCESSUAL
O interesse de agir do MP é presumido pela própria norma que lhe impõe a atribuição. Quando a lei lhe
confere legitimidade para acionar ou intervir, é porque lhe presume o interesse. Da mesma forma, quando a lei
concede ao MP a faculdade de recorrer, também está presumindo que a defesa do bem jurídico que justificou sua
intervenção no feito está a supor a existência de interesse público na eventual reforma do julgado, quer compareça
como órgão agente (parte) ou interveniente.
De acordo com a intensidade do interesse público a ser velado, o MP atua de forma mais ou menos intensa,
tanto é assim, que há casos em que ao MP é conferido o direito de ação e há casos em que lhe é concedido apenas a
intervenção em determinado processo.
Mazzilli defende que o MP pode e até deve recusar sua atuação quando falte toda e qualquer nota de
indisponibilidade ao interesse, ou quando lhe falte toda e qualquer conotação social. Não basta simplesmente que a
legislação infraconstitucional presuma a existência de interesse público; é preciso que o interesse público
efetivamente exista, sendo assim reconhecido pelo órgão legitimado a defendê-lo. A única hipótese em que seria
válida a recusa ministerial, ainda que exigida por lei, seria se a norma infraconstitucional lhe cometesse atribuição
em desacordo com suas finalidades institucionais.
Há que se ressaltar que existe diferença entre o conceito de interesse processual e o de interesse de agir. O
interesse de agir é extraprocessual, que possui o MP sempre que a lei lhe cometa uma atuação institucionalmente
compatível com sua função. Já o interesse processual é a adequação entre a necessidade de o MP recorrer ao
Judiciário e a utilidade prática do provimento jurisdicional pretendido. Pode o juiz, sem ofender às atribuições
legais e constitucionais ao Ministério Público atribuídas, afirmar, no caso concreto, que inexiste adequação entre o
pedido formulado e a utilidade prática objetivada no processo, caso em que o juiz julgará pela carência da ação. O
mesmo raciocínio pode ser empregado no que tange à interesse processual na esfera recursal.
2- Os demais legitimados
O interesse de agir também é abstratamente presumido para as pessoas de direito Público interno.
Entretanto, pode-lhes faltar em concreto o interesse processual. Quanto aos outros legitimados ativos à ACP ou
ação coletiva, o interesse de agir e o interesse processual não se presumem, devendo vir demonstrados em concreto.
O interesse da União, de entidade autárquica federal ou empresa pública federal, quando presente nas ações
de caráter coletivo, ensejará a competência da Justiça Federal. Tal interesse deve-se manifestar na condição de
50
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
autor, réu, assistente ou opoente, excetuadas as causas de falência, de acidente de trabalho, as sujeitas à Justiça
Eleitoral e à Justiça do Trabalho.
Finaliza Mazzilli dizendo que para propor ACP ou ação Coletiva é necessário ter interesse de agir e
legitimidade (regra geral: art. 3º CPC).
3- A subsistência do interesse processual
Tal como ocorre com as demais condições da ação, o interesse processual deve estar sempre presente,
desde a propositura da ação e durante todo o seu desenvolvimento. Desaparecendo o interesse processual após o
início da ação, sobrevirá a carência da ação, devendo o processo ser extinto sem resolução do mérito. Há casos em
que a perda do interesse processual se dá de forma apenas parcial, caso em que o MP deve continuar na lide.
Sempre agindo em prol do interesse público primário, pode o MP pedir a improcedência de ACP que ele
mesmo propôs, assim, nada impede que, em busca do bem comum, ao final da instrução, o órgão ministerial se
convença de que não há base para a procedência de qualquer ação, seja ele o autor ou não. Poderá assim lançar seu
parecer de improcedência.
Ressalte-se que na esfera penal, a lei veda expressamente a desistência da ação penal pública (art. 42 do
CPP) , contudo não faz o mesmo na esfera cível. Desse modo, em tese, é possível a desistência de ACP, observados
os preceitos legais. Visto isso, deve-se ter em mente que o mero parecer de um membro do Ministério Público
favorável à improcedência da ação que ele mesmo propôs não equivalerá necessariamente à desistência, até porque
o réu pode optar pelo julgamento de mérito.
De outra banda, Mazzilli ainda informa que o princípio da unidade não impede que outro membro do MP
discorde do pedido de improcedência feito por seu antecessor e resolva apelar, buscando resultado positivo para
demanda. Isso se deve à liberdade de convicção e à independência funcional que permeiam a atividade ministerial.
Capítulo 21
Unidade do Ministério Público
1- Princípios Institucionais
São princípios institucionais do MP a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional. Unidade
significa que os membros do MP integram um só órgão, sob uma só direção; indivisibilidade significa que seus
membros podem ser substituídos uns pelos outros na forma estabelecida pela lei. Tal unidade é verificada é
verificada em cada unidade: nos Estados-membros e dentro de cada ramo do MPU. Somente se é possível defender
uma unidade do Ministério Público Nacional no que diz respeito à sua função, abstratamente considerada diante da
lei.
No que tange à independência funcional, deve-se concebê-la como algo que se contrapõe à hierarquia
funcional, decorrente do Direito Administrativo. Daí se conclui que, em razão do referido princípio, o membro MP
exerce seu ofício sem se ater a ordens ou injunções de outras instituições ou órgãos do Estado, subordinando-se
apenas à CF e às leis; os membros do MP exercem suas funções sem se ater a ordens ou injunções funcionais de
outros membros, da própria instituição, nem mesmo do PGJ ou de outros órgãos de administração ou execução.
Ressalte-se que a administração envolve apenas direção administrativa da instituição, não havendo hierarquia
funcional.
2- As promotorias de justiça
As promotorias e procuradorias de justiça são órgãos estritamente administrativos, que não podem ser
destinatários de atribuições funcionais. As atribuições decorrentes das atividades-fim da instituição cabem aos
Promotores e Procuradores de Justiça, órgãos de execução do MP ou, em alguns poucos casos, a alguns órgãos
colegiados de execução, entre os quais não se inserem as Promotorias e Procuradorias de Justiça.
As atribuições do Promotor de Justiça devem ser fixadas em lei e não por atos administrativos da própria
instituição e de seus dirigentes. Eis o princípio do promotor natural, segundo o qual o membro do MP para atuar em
determinado caso é escolhido por prévios critérios legais e não casuisticamente.
3- Pluralidade ou unidade de agentes no feito
O MP sempre oficiará na ACP, quer como autor, quer como interveniente e, tanto em uma hipótese quanto
em outra, deverá defender o correto cumprimento da lei. O STJ entendeu, de forma acertada na opinião de Hugo
Nigro Mazzilli, que em ACP cujo autor seja o MP, não é necessário oficiar outro membro como interveniente.
Entretanto, se, no caso concreto, for incompatível que o mesmo membro concilie a defesa de todos os interesses
afetos por lei ao MP, nesse caso não se pode vedar a atuação de outro membros MP no zelo de interesses
inconciliáveis com aqueles defendidos pelo primeiro (Ex: ação movida por membro do MP contra réu incapaz).
51
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
4 – Conflitos de atribuições
Caracteriza-se o conflito de atribuições entre membros do MP quando:
a) 2 ou + deles manifestam simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias
atribuições, em exclusão às de outro membro (conflito positivo);
a) Ao menos um membro negue a própria atribuição funcional e atribua a outro membro que
já tenha se recusado (conflito negativo).
Nesses casos, por iniciativa de qualquer dos membros do MP envolvidos ou por iniciativa do legítimo
interessado pode ser provocada a decisão do conflito.
Os conflitos de atribuições entre membros do mesmo MP são resolvidos por sua respectiva lei orgânica, em
geral cabendo ao respectivo PGJ dos Estados(âmbito estadual); ao PGR, se disser respeito a diferentes ramos do
MPU (âmbito federal); às Câmaras de Coordenação e Revisão, como recurso ao respectivo Procurador-Geral, se o
conflito ocorrer dentro de cada sub-ramo do MPU (MPF, MPT, MPM, MPDFT).
A legislação é omissa nos casos de conflitos de atribuições MPUxMPE e MPE x MPE (de outro estado-
membro). À vista da teoria da organicidade, o conflito MPExMPE consiste em conflito entre os próprios estados.
Apreciando a questão, o STF fez a seguinte distinção: se o conflito de atribuições entre membros do MP puder
configurar, em tese, um conflito entre magistrados vinculados a tribunais diversos, a solução caberá ao STJ, por
analogia ao art. 105, I da CF; se o conflito entre membros do MP vinculados a instituições diferentes não
configurar, nem mesmo virtualmente, um conflito de jurisdição, a solução caberá ao STF, com supedâneo no que
dispõe o art. 102, I, f da CF.
E se a discordância ocorre entre juiz e promotor?
Vejamos as hipóteses:
- Recusa de intervenção por um órgão do MP no processo civil: tem-se aplicado analogicamente o art. 28 do
CPP;
- O juiz discorda da forma ou do conteúdo da peça apresentada pelo “Parquet”: nesse caso, como não houve
inércia do órgão ministerial, o máximo que o juiz pode fazer é comunicar o fato ao órgão correicional do MP, para
os fins administrativos que se fizerem necessários. O que está escrito nos autos, está escrito, já está lançada a
manifestação oficial do MP, pelo seu órgão com atribuições para expendê-la.
- O MP entende que a competência é da Justiça Federal e não local. O juiz entende que a competência é dele
próprio, discordando da remessa. Quem resolve? Geralmente o juiz nesse caso costuma remeter os autos ao PGJ,
que se insistir na remessa, deve o juiz fazê-lo, vez que caso o juiz “ad quem” entenda não ser dele a competência,
instaura-se o conflito negativo de competência, recebendo o caso a solução processual adequada.
5- Litisconsórcio de MPs
Tratado no Cap. 18, n.5.
Capítulo 22
Desistência da Ação
Se o órgão do MP entender que não é caso de assumir a promoção da ação civil pública ou coletiva, objeto
de desistência por parte de algum colegitimado, na visão de Hugo Nigro Mazzilli, deverá submeter previamente
suas razões ao Conselho Superior do Ministério Público, que, se discordar de seu entendimento, poderá designar
outro membro para prosseguir no feito.
Deve-se ouvir o Conselho por analogia, já que, se para não propor ação, isso deve ser feito, com maior
razão ouvi-lo no caso de não continuidade de ação em que houve desistência ou abandono infundados.
De outra banda, se a desistência da ACP for homologada, ao MP restará recorrer ou propor outra ACP, se
necessário.
Caso o MP, não envie por sua própria deliberação enviar ao CSMP a motivação da não continuidade da
ACP o juiz poderá remeter os autos ao referido Conselho para, sendo o caso, designar outro membro da Instituição
para prosseguir com a ação.
Capítulo 23
Desistência pelo Ministério Público
1 – Igual tratamento processual para as formas de desistência
Os colegitimados ativos à ACP ou Ação Coletiva não são titulares do direito material posto em litígio,
sobre o qual não possuem qualquer disponibilidade; sua disponibilidade cinge-se ao conteúdo processual da lide.
Além do que se discutiu até o momento, resta saber se o MP pode desistir de ACP por ele próprio movida.
Já vimos em outra passagem que o MP não pode desistir da ação penal. Motivos: a possibilidade de franca
desistência ou abandono por parte do MP, em matéria penal, poderia ensejar pressões sobre o titular privativo da
ação e levar à impunidade de governantes, poderosos e outros tipos de criminosos.
A situação no processo civil é diferente do panorama penal: o MP, na esfera cível, não é o único legitimado
e , a exemplo do que ocorre com os substitutos processuais, tem disponibilidade sobre o conteúdo processual do
53
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
litígio (decidir se propõe ou não a ação, se requer ou não provas, se desiste delas, se recorre ou não...). A lei
expressamente admite a existência de desistências fundadas, como já se viu.
Desse modo, qualquer legitimado pode desistir da ACP, cercando a lei de maiores cautelas a desistência
realizada por associações civis, vez que não sendo órgãos públicos, não zelam pela comunidade presumidamente.
Mazzilli entende que o MP pode desistir da ACP por ele mesmo movida. Assim, desde que o MP se
convença, de maneira fundamentada que não existe ou que talvez nunca houve lesão ou ameaça de lesão apontada
na inicial, o MP poderá desistir da ação por ele mesmo proposta, sem que com isto esteja violando qualquer dever
funcional. De outro lado, estará quebrando o dever de agir se identificar a lesão ou ameaça de lesão e, mesmo
assim, não agir ou indevidamente desistir da ação que deveria promover. O MP tem liberdade de apreciar
motivadamente se existe ou não interesse que imponha sua atuação.
Concluindo, embora o MP possa em tese desistir tanto da ação quanto do recurso cível, tais manifestações,
entretanto, só podem ser exercidas de forma excepcional, em hipóteses em que, acima de tudo o interesse público
seja atendido com a desistência.
2- Homologação pelo Conselho Superior do Ministério Público
Nos excepcionais casos em que se justifique a desistência da ACP pelo membro do MP, deverá ele,
analogicamente, ter a cautela de, antes de lançá-la aos autos, remeter sua manifestação fundamentada ao Conselho
Superior do Ministério Público, para homologar ou rejeitar sua promoção. Na opinião de Mazzilli, caso o CSMP
discorde da desistência, deverá nomear outro membro para prosseguir com a ação.
Caso o MP, não envie por sua própria deliberação enviar ao CSMP a motivação da não continuidade da ACP o
juiz poderá remeter os autos ao referido Conselho para, sendo o caso, designar outro membro da Instituição para
prosseguir com a ação. Só que isto não seria muito recomendável, pois poderia comprometer a isenção do
magistrado.
Caso não haja o envio da pretensão de desistência motivada do MP ao CSMP, e o juiz homologue a desistência
lançada no processo, poderá haver interposição de apelo por algum interessado ou propositura de nova ACP por um
dos colegitimados.
2 . AS REQUISIÇÕES
Nos procedimentos a seu cargo, o membro do Ministério Público pode também expedir REQUISIÇÕES. Entre
outras finalidades, a requisição pode consistir em ordem legal de realização de diligências ou apresentação de
documentos ou informações por parte do destinatário à autoridade requisitante. Algumas notificações só podem ser
encaminhadas pelo próprio Procurador-Geral, quando tiverem como destinatários o Governador do estado,
membros do Poder Legislativo estadual e os desembargadores (Lei nº 8625/93, artigo 26; LC nº 75/93, artigo 8º, §
4º). As requisições serão cumpridas gratuitamente e também supõem prazo mínimo razoável para atendimento, que
dependerá das circunstâncias concretas.
Constitui objeto das requisições do Ministério Público: a) o fornecimento de documentos, exames, perícias e
informações; b) a realização de vistorias, exames e perícias; c) instauração de inquérito policial ou a realização de
diligências investigatórias; d) a instauração de sindicância ou procedimento administrativo.
Atuando em sua área de atribuição, o órgão do Ministério Público terá o poder de requisição, não importa seja
federal, estadual ou municipal a autoridade, a repartição ou o órgão destinatário dessa requisição. Importa apenas se
quem requisita tem atribuições para tanto.
Nada impede, pois, que um órgão do Ministério Público estadual investigue dano cuja reparação seja da
competência da Justiça local, mas precise de documento que esteja em poder de uma autoridade ou de uma
repartição federal.
No julgamento de Mandado de Segurança, impetrado pelo Ministério Público de São Paulo contra o Ministro de
Estado da Aeronáutica, o STJ admitiu “a competência do Ministério Público no concernente à requisição de
informações e documentos de quaisquer órgãos da Administração, independentemente de hierarquia, advém de
sede constitucional e visa ao interesse público que se sobrepõe a qualquer outro ( a fim de que possíveis fatos
constitutivos de crimes sejam apurados), pondo-lhe, a Lei Maior, à disposição, instrumentos eficazes para o
exercício das atribuições constitucionalmente conferidas.” (MS nº 5370-DF, 1ª Seç., STJ).
Assim, como ocorre com as notificações, as requisições dirigidas ao Governador, aos membros do Pode
Legislativo ou aos membros de segunda instância do Poder Judiciário serão encaminhadas pelo Procurador Geral
de Justiça. ENCAMINHADAS, apenas; sua EXPEDIÇÃO, já vimos, é de responsabilidade do órgão de execução
competente.
O servidor público deverá fornecer espontaneamente ao Ministério Público as informações e elementos
necessários à apuração de lesões a interesses transindividuais; não o fazendo, estará sujeito à requisição, sob as
cominações da lei (LACP, artigo 6º, e Lei 8429/92, artigo 15).
A falta injustificada ou o retardamento indevido do cumprimento das requisições importará a responsabilidade
de quem lhe deu causa, o que, em certos casos, poderá envolver não só aspectos disciplinares ou funcionais, como
até mesmo responsabilidade criminal.
Mesmo havendo o desatendimento à requisição de documentos indispensáveis, poderá ser proposta Ação Civil
Pública. A falta de documentos necessários, não impõe a inépcia da inicial, pois o juiz pode requisitá-los
diretamente durante a instrução.
Nos casos em que o Ministério Público precise pedir ao Poder Judiciário a requisição de documentos, qual
deverá ser o procedimento a seguir?
Poderá se valer de um procedimento inominado de jurisdição voluntária (CPC, arts. 1103 e 1104), ou seja, em
caso de lide, um procedimento cautelar de busca e apreensão (CPC, arts. 839 e s.).
3. AS MATÉRIAS SIGILOSAS.
As leis impõem diversas formas de sigilo, a começar pela própria Constituição.
As hipóteses de sigilo legal poder ser reunidas em dois grupos: a) o das informações OBJETIVAMENTE
sigilosas – visa proteger matérias especiais, v.g., a segurança nacional; b) o das informações SUBJETIVAMENTE
sigilosas – visa proteger informações confidenciais em benefício de pessoas determinadas, v.g., a informação do
médico.
O sigilo pode ser imposto, nos casos previstos na lei; a) por motivo de interesse público fundado na segurança
da sociedade ou do Estado; b) por conveniência da investigação promovida pela autoridade pública; c) em respeito
à imagem ou à privacidade das pessoas; d) para a proteção de outros interesses que o legislador repute relevantes.
Aponta João Bernardino Gonzaga as hipóteses de desobriga do sigilo profissional: “a) quando há o
consentimento do interessado; b) quando o exige o bem comum; c) quando o exige o bem de um terceiro; d)
quando a revelação evita um dano à pessoa interessada; e) quando poupa um dano ao próprio depositário”. A
60
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
essas acrescentamos mais uma; por vezes a lei permite ou até exige revelação de segredo, v.g., denúncia pelo
médico de doença de notificação compulsória; notícia de crime de ação pública etc..
Qual o tratamento legal a ser dado às informações sigilosas, quando requisitadas pelo Ministério Público?
Por si só, a LACP não assegurou ao MP o acesso direto à informação sigilosa. Sob a sistemática da lei nº
7347/85, o MP deveria propor a ação, cabendo ao juiz requisitar a informação sigilosa. Já o ECA, o membro do MP
passou a ter acesso a toda e qualquer informação, mesmo que sobre ela recaia sigilo legal, mas, nesse caso, torna-se
responsável pelo seu eventual uso indevido (ECA, artigo 201, § 4º). Por sua, a Lei nº 8625/93 e a LC nº 75/93
passaram a assegurar ao MP o acesso imediato a quaisquer informações, mesmo as sigilosas, impondo-lhe, porém,
responsabilidade em caso de uso indevido.
Confere-se hoje ao membro do MP acesso incondicional a qualquer banco de caráter público ou relativo a
serviço de relevância pública, sem prejuízo de sua responsabilidade civil e criminal pele eventual uso indevido das
informações e documentos sigilosos a que teve acesso. Isso significa que o MP tem acesso à informação, inclusive
nos casos de sigilo legal, excetuadas apenas, e obviamente, as hipóteses em que a Constituição exija autorização
judicial para sua quebra.
Quanto ao sigilo das comunicações telefônicas, SÓ PODE SER QUEBRADO POR ORDEM JUDICIAL, nas
hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal e instrução processual penal.
Se o MP necessita obter uma informação protegida pelo sigilo legal, o artigo 8º, § 2º, da LC nº 75/93 e artigo 26,
§ 2º, da Lei nº 8625/93 lhe permitirão efetuar a correspondente requisição, sem que o sigilo possa, portanto, ser
oponível pela autoridade requisitada. Esses dispositivos legais configuram justa causa para que o depositário do
sigilo revele a informação à autoridade requisitante, ficando, porém, obrigado a resguardar o sigilo ao membro do
MP que venha a ter acesso à informação.
Para localizar pessoas ou obter dados patrimoniais em investigações por danos ao patrimônio, o MP costuma
oficiar a cartórios eleitorais e instituições bancárias ou fiscais, requisitando-lhes as informações pertinentes.
Diversas decisões do TSE têm entendimento que, em beneficio da privacidade do cidadão, é o cadastro de
eleitores de acesso exclusivo à própria justiça eleitoral, ao cidadão e à Justiça criminal; dessa forma, chegam a
vedar seu acesso até mesmo a outros órgãos da Justiça e ao Ministério Público.
Mas , ao mesmo tempo, coexistem entendimentos diversos no próprio TSE. Com base no artigo 129, VI, da CF,
e no artigo 8º da LC nº 75/93, também já se decidiu, corretamente, de forma favorável à requisição direta do MP.
A par disso, leis outras asseguram o acesso do MP a todo tipo de informações, até mesmo de caráter sigiloso,
independentemente de requisição judicial. Assim, como ficou bem decidido pelo STJ, em passagem antes já
lembrada, as atividades do MP “revestem-se de interesse público relevante – oponível a qualquer outro – que deve
ser cuidado com previdência, eis que a outorga desse poder constitui reflexo de suas prerrogativas institucionais.
A ocultação e o não fornecimento de informações e documentos é conduto impeditiva da ação ministerial e,
consequentemente, da Justiça, se erigindo em abuso de poder”, sendo, por ademais, “entendimento assente na
doutrina que o Ministério Público, em face da legislação vigente, tem acesso até mesmo às informações sob sigilo,
não sendo licito a qualquer autoridade opor-lhe tal exceção.” (RSTJ, 107:21).
O Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu que o MP tem acesso direto a informações fiscais e bancárias,
quando da investigação de atos ilícitos (Processo nº 2001.02.01.033100-1). Por sua vez, o STJ assentou que o MP
pode requisitar informações bancárias, desde que não cobertas pelo sigilo legal (REsp. nº 1.094.770-DF).
Invocando o princípio constitucional da publicidade dos atos da Administração, bem decidiu o STF que o
“poder de investigação do Estado é dirigido a coibir atividades afrontosas à ordem jurídica, e a garantia do sigilo
bancário não se estende ás atividades ilícitas. A ordem jurídica confere explicitamente poderes amplos de
investigação ao MP – art. 129, incisos VI, VIII, da Constituição Federal, e art. 8º, incisos II e IV, e § 2º, da LC nº
75/93. Não cabe ao Banco do Brasil negar, ao MP, informações sobre nomes de beneficiários de empréstimos
concedidos pela instituição, com recursos subsidiados pelo erário federal, sob invocação do sigilo bancário, em se
tratando de requisição de informações e documentos para instruir procedimento administrativo instaurado em
defesa do patrimônio público”. (MS nº 21.729-DF)
A partir desse precedente, deve-se entender que o MP pode determinar diretamente a requisição de informações
bancárias que digam respeito a dinheiros ou verbas públicas, mesmo que o dinheiro desviado tenha ido parar em
contas particulares. (RE nº 535.478-SC)
6. DESATENDIMENTO À REQUISIÇÃO
A LACP criou um nova figura penal: haverá crime contra a administração pública, se ocorrer, apenas sob a
forma DOLOSA, RECUSA, RETARDAMENTO OU OMISSÃO de dados técnicos indispensáveis à propositura da
ACP, quando requisitados pro órgão do MP – art. 10, LACP.
Preleciona o artigo 5º, inciso XXXIII, da CF: “todos têm o direito a receber dos órgãos públicos informações
de seus interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de
responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível á segurança da sociedade e do Estado”.
O habeas data visa assegurar ao interessado: a) conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante,
constantes em registro e banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público; b) a retificação de
dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo.
Por sua vez, o CDC disciplina o acesso do consumidor a informações de seu interesse.
A LACP e LAP asseguram que a associação civil ou o cidadão podem requerer às autoridades competentes as
certidões e informações que julgarem necessárias; somente lhes será negada a informação nos casos de sigilo.
Hoje desenvolve-se o direito da coletividade às informações que digam respeito a produtos, serviços, dinheiros e
negócios públicos, ações e decisões governamentais e tudo o mais que possa interferir, direta ou indiretamente, na
qualidade de vida da população, inclusive e especialmente na qualidade do meio ambiente.
8. LEI DA MORDAÇA
Tem se orquestrado no Congresso Nacional um esforço para que os meios de comunicação em massa não mais
tenham acesso às investigações conduzidas por outros organismos públicos que não as próprias Comissões
Parlamentares de Inquérito, dirigidas pelos próprios parlamentares.
Há diversos projetos em andamento no Congresso Nacional, que visam proibir aos membros do MP, da Polícia
ou do Poder Judiciário, nas investigações e processos em andamento, que revelem indevidamente a terceiros ou aos
meios de comunicação fatos ou informações de que tenham ciência em razão do cargo, e que violem o sigilo legal,
a intimidade, a vida privada, a imagem e a honra das pessoas.
Certo é que, em si, uma investigação não significa logicamente responsabilidade do investigado, até porque
prevalece o princípio jurídico da presunção de inocência até a decisão final em contrário. Entretanto, sendo oficial a
investigação, a publicidade sobre o que está sendo investigado é perfeitamente compatível com a transparência que
se exige num regime democrático, desde que, naturalmente, a autoridade que investiga deixe claro que não se está
diante de uma imputação definitiva de culpa. Inaceitáveis, sim, são as investigações secretas; não as que são feitas
de público à luz do dia, pois permitem o adequado controle, inclusive judicial.
É certo que a liberdade de informação está sujeita a limites éticos e legais, justamente para evitar abusos – e,
apesar disso, esses abusos infelizmente ocorrem. Mas não precisamos de modificações da lei vigente para permitir
a punição das autoridades que divulguem fatos que a lei considere sigilosos, dos quais tenham conhecimento em
razão do ofício.
Para combater abusos, a lei vigente já contempla sanções adequadas: a) considera crime a quebra do sigilo legal
(CP, art. 153, §1ª-A); art. 325, CP); b) impõe o correspondente responsabilidade pecuniária por danos patrimoniais
e morais (CC, art. 186); c) permite o enquadramento do agente público na lei de Improbidade Administrativa, por
violação do sigilo funcional (Lei nº 8429/92, art. 11, III).
Entretanto, o que se pretende nessas propostas de reformas legislativas, infelizmente, não é coibir os abusos,
para isso já existem canais adequados, ainda que muitas vezes falte usá-las. O que se pretende é amordaçar e
intimidar os investigadores.
62
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Em suma, não é recomendável impor, como regra, o sigilo nas investigações policiais ou ministeriais. O que se
deve fazer, sim, é coarctar os abusos, quando ocorram.
Nada impede, entretanto e, ao contrário, tudo recomenda que as autoridades, quando não recaia na hipótese o
sigilo legal, prestem contas à sociedade, publicamente, do que estão fazendo ou fizeram no desempenho de múnus
público investigatório; nesse caso, é claro, não devem antecipar juízos de valor, especialmente em razão da
presunção constitucional de inocência.
CAPÍTULO 27
INQUÉRITO CIVIL
1. GENERALIDADES
Criado na Lei nº 7347/85 e consagrado na Constituição Federal de 1988, o inquérito civil é uma investigação
administrativa a cargo do MP, destinada basicamente a colher elementos de convicção para eventual propositura de
ação civil pública; subsidiariamente, serve para que o MP: a) prepare a tomada de compromissos de ajustamento de
conduta ou realize audiências públicas e expeça recomendações dentro de suas atribuições; b) colha elementos
necessários para o exercício de qualquer ação pública ou para aparelhar para o exercício de qualquer outra atuação
a seu cargo.
Com o fito de determinar a materialidade e a autoria de fatos que possam ensejar o ajuizamento do processo
coletivo pelo MP, por meio do inquérito civil podem-se promover diligências, requisitar documentos, informações,
exames e perícias, expedir notificações, tomar depoimentos, proceder a vistorias e inspeções.
O inquérito civil é procedimento investigatório não contraditório; nele não se decidem interesses nem se
aplicam sanções; antes ressalta-se sua informalidade.
Como as investigações nele produzidas têm caráter inquisitivo, é relativo o valor dos elementos de convicção
hauridos no inquérito civil, da mesma forma que no inquérito policial.
A instauração do inquérito civil sequer é pressuposto processual para que o MP compareça em juízo: o inquérito
pode ser dispensado se já existirem elementos necessários para propor a ação civil pública.
Quer esteja o inquérito civil arquivado ou em andamento, isso nada interfere com a possibilidade de que os
colegitimados ajuízem diretamente, a qualquer momento, a ação civil pública ou coletiva. Muito menos sua
instauração ou seu arquivamento impedem ou condicionam o ajuizamento de ações individuais.
Em todas as hipóteses, a não propositura da ação civil pública sujeita-se a controle, ou seja, tanto o
arquivamento de inquérito civil como de meras peças de informação pelo membro do MP será objeto de revisão
obrigatória pelo Conselho Superior da instituição (LACP, artigo 9º e § 1º).
O que são peças de informação? São elementos de convicção em que se possa basear o MP para propor ou não a
ação civil pública.
O inquérito civil é uma investigação regular, cuja instauração, nas hipóteses previstas na lei, obsta ao curso do
prazo decadencial (CDC, artigo 26, § 2º, III); enquanto peças de informação são elementos avulsos de convicção,
que podem ou não ensejar a instauração de um inquérito civil ou a prática de outros atos ministeriais.
Em princípio, nulidades ou vícios do inquérito civil não terão reflexo na ação judicial. Tais irregularidades não
vão além de empanar o valor do próprio inquérito: é o principio da incolumidade do separável. Entretanto, os atos
que efetivamente sejam dependentes de uma prova ilícita, mesmo atos judiciais, estarão contaminados por está.
O inquérito civil presta-se não só a apurar lesões a interesses metaindividuais, como também, por analogia, a
colher elementos preparatórios para a instauração de qualquer ação judicial de iniciativa do MP.
Estão sujeitos a reexame do colegiado competente do MP até mesmo os arquivamentos de inquérito civil ou de
peças de informação quando determinados pelo próprio procurador-geral.
Em caso de ilegalidade, desvio de finalidade ou falta de atribuições, poderá o inquérito civil ser trancado por
mandado de segurança, impetrado pelo interessado. O habeas corpus pode ser usado para impedir condução
coercitiva, se ilegalmente determinada dentro de um inquérito civil; não se presta, porém, para trancar o próprio
inquérito civil, salvo se este vier a ser usado exclusivamente para investigar infração penal e se a essa investigação
faltar justa causa.
As principais regras de competência para conhecer e julgar os habeas corpus impetrados contra os órgãos do MP
por atos praticados no curso do inquérito civil: a) se o ato de coação partir do Procurador Geral da República, a
competência para conhecer e julgar o respectivo habeas corpus será do STF; b) se partir do procurador geral de
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
justiça, simetricamente caberá ao Tribunal de Justiça; c) se partir de membro do MPU que oficie perante os
tribunais, ao STJ; d) se partir de membro do MPU que não oficie perante tribunais, aos TRF’s, ressalvada a
competência da Justiça Eleitoral; e) se partir de membro do MP local, ao Tribunal de Justiça.
Desde a instauração do inquérito civil até o encerramento, obsta-se a decadência do direito do consumidor de
reclamar dos vícios aparentes ligados ao fornecimento de serviço ou produto (CDC, art. 26, § 2º, III).
A perícia produzida no inquérito civil instruirá naturalmente a ação civil pública a ser proposta pelo MP; além
disso, poderá ser aproveitada no processo penal referente a infrações lesivas ao meio ambiente.
São essas as fases do inquérito civil: a) instauração – por portaria ou despacho em requerimento ou
representação; b) instrução; c) conclusão.
A LACP contém apenas referências mínimas ao inquérito civil. Assim, por falta de melhor regulamentação da
matéria, não raro as leis locais de organização do MP acabaram desbordando seu objeto, e se puseram a disciplinar
o próprio inquérito civil. Surgiram, também, diversos atos regulamentares dos órgãos de administração superior de
cada MO e do próprio CNMP a esse respeito.
3. INSTRUÇÃO E SIGILO
O órgão do MP que preside o inquérito civil tem poderes instrutórios gerais próprios à atividade inquisitiva,
como ocorre com o delegado de polícia, no inquérito policial.
No curso do inquérito civil caberia aplicação da regra que permite a inversão do ônus da prova, por analogia ao
inciso VIII do artigo 6º da CDC?
Não, pois inexiste ônus da prova no inquérito civil, mero procedimento administrativo investigatório de caráter
preparatório para eventual ação civil pública.
Sendo o inquérito civil mero procedimento, do qual se vale o MP para colher elementos de convicção que lhe
permitam tomar uma iniciativa a seu cargo, ele não é tecnicamente um processo, pois por meio dele não se criam,
não se alteram nem se extinguem direitos, e muito menos se aplicam sanções; assim, não se submete às regras do
contraditório.
Terá o advogado alguma participação no inquérito civil?
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Essa participação é possível, mas não necessariamente. Não será raro vê-lo requerendo a própria instauração do
inquérito civil, ou acompanhando as investigações, ou acompanhando o indiciado ou testemunhas que devam
depor.
A regra geral é a de que o inquérito civil sujeita-se ao princípio da publicidade, salvo se: a) MP teve acesso a
informações sigilosas que passaram a integrar os autos; b) da publicidade puder resultar prejuízo à investigação ou
ao interesse da sociedade, ou ainda ao interesse do Estado.
Quando for o caso de impor sigilo do inquérito civil, pode ele ser objetado contra o advogado?
Apreciando matéria análoga, sobre o sigilo em inquérito policial, o STF editou a súmula vinculante nº 14.
Ressalvados, pois, os casos em que a lei admita ou imponha o sigilo, fora daí qualquer interessado terá acesso às
informações colhidas no inquérito civil, bem como terá direito à expedição de certidões. Ao fim das investigações –
sempre ressalvadas as hipóteses de sigilo legal -, deve-se dar ampla publicidade ao que nele foi apurado, inclusive
para que os interessados possam arrazoar perante o colegiado competente do MP, quando da revisão do
arquivamento, ou propor diretamente a ação civil pública, na qualidade de colegitimados natos ou autônomos.
Existe falso testemunho em inquérito civil?
A lei nº 10268/01, que alterou o artigo 342 do CP, refere-se apenas ao falso testemunho prestado em processo
judicial ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral – e não menciona o inquérito civil, o que assume
relevo, diante do principio da tipicidade, pedra angular do Direito Penal.
A LACP não estipula prazo para conclusão do inquérito civil. Assim, atos regulamentares locais acabaram
fixando prazos variáveis, e assim também o fez o artigo 9º da Res. 23/07-CNMP, segundo a qual o inquérito civil
deverá ser concluído no lapso temporal de um ano, prorrogável pelo mesmo período quantas vezes forem
necessárias, por decisão fundamentada de seu presidente.
O MP não requer e sim PROMOVE o arquivamento do inquérito civil, sem qualquer intervenção estatal.
Embora por motivos diferentes, não há vício algum no fato de o MP dar a última palavra tanto no arquivamento
do inquérito policial como no arquivamento do inquérito civil. No primeiro caso, o titular do direito de punir o
crime é o Estado; se seu órgão legitimado deixa fundamentadamente de promover a ação penal pública, daí surge
conflito de interesses nem lesão a direitos individuais ou transindividuais, a exigir a prestação jurisdicional.
Quando, porém, o MP arquiva o inquérito civil, em tese podem ficar sem correção lesões a interesses
metaindividuais, cujo titular é o Estado, mas aqui, diversamente da área penal, o MP não detém privativamente da
ação civil pública, e, se deixar de propô-la, outros legitimados poderão ajuizá-la. Assim, o arquivamento do
inquérito civil pelo MP não impõe qualquer óbice ao conhecimento de lesão de direitos individuais ou
transindividuais pelo Poder Judiciário.
Submete-se a controle do colegiado competente do MP o arquivamento de inquérito civil ou de peças de
informação.
Na fase de revisão de arquivamento do inquérito civil pelo colegiado competente do MP, faculta-se o
arrazoamento às associações interessadas.
Nada impede a reabertura do inquérito civil pelo próprio membro do MP que o arquivou. Enquanto, porém,
pender de revisão o ato de arquivamento pelo colegiado do MP, o órgão a quo deixa de ser o promotor natural do
caso e, nesse ínterim, somente o próprio colegiado poderá mandar prosseguir as investigações.
Do arquivamento do inquérito civil devem ser cientificados os interessados, assegurando-se a publicidade ao
ato. A partir do momento em que se dê publicidade ao arquivamento, volta a correr o prazo decadencial por vício
no produto ou em serviço, cujo curso estava obstado desde a instauração do inquérito civil.
O que é arquivamento parcial do inquérito civil?
É quando o órgão do MP resolver propor a ação só em relação a alguns dos fatos ou a alguns dos agentes, estará
havendo arquivamento parcial. Nesse caso, para evitar o chamado arquivamento implícito, deverá assim proceder:
a) apresentará em juízo a petição inicial da ação que entenda cabível, acompanhada dos autos do inquérito; b)
encaminhará ao colegiado competente do MP, em separado, sua promoção fundamentada de arquivamento parcial,
acompanhando-a de cópia das principais peças do inquérito.
Se o colegiado recusar a homologação do arquivamento parcial, será designado outro membro do MP para
propor ação de maior objeto, aplicando-se, oportunamente, as regras processuais de conexão e continência.
Sobrevindo controvérsia sobre qual membro do MP oficiará em ambos os feitos, será resolvida pelas regras dos
conflitos de atribuição.
5. O ARQUIVAMENTO IMPLÍCITO
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
O arquivamento de inquérito civil tem sempre de ser expresso, e a fundamentação do arquivamento deve ser
lançada nos autos, para permitir sua revisão pelo colegiado competente da instituição.
O inquérito civil termina com o arquivamento ou com a propositura da ação civil pública nele baseada.
Quando o inquérito civil investigue mais de um evento danoso ou mais de um envolvido, dentro da sua
independência funcional, o membro do MP pode livremente propor a ação civil nos limites que entenda mais
adequados; isso significa que pode propor apenas em relação a alguns dos objetos ou alguns dos investigados. Mas,
se a ação não abranger todos os objetos ou todos os investigados, estará havendo, de fato, um arquivamento parcial
do inquérito civil.
Para o adequado controle de seu ato, o membro do MP deverá extrair cópia das principais peças do inquérito
civil e, acompanhadas de manifestação fundamentada, remetê-las a reexame do colegiado competente. Se não o
fizer, terá praticado um irregular arquivamento implícito.
Não é o juiz que controla a não propositura da ação civil pública: quem o faz é o CSMP ou umas das Câmaras
de Coordenação e Revisão do Ministério Público da União.
A qualquer momento os colegitimados podem propor a ação civil pública omitida pelo órgão ministerial. Quer
esteja em andamento ou já arquivado o inquérito civil, quer se trate de arquivamento expresso ou implícito, a
legitimação ativa para as ações civis públicas ou coletivas é concorrente e disjuntiva.
6. CONTROLE DO ARQUIVAMENTO
No MP estadual, o controle de arquivamento do inquérito civil está a cargo do CSMP; no âmbito do MPU, o
controle é afeto a umas das Câmaras de Coordenação e Revisão.
No sistema da LACP, tendo lançado promoção de arquivamento do inquérito civil ou das peças de informação,
comete falta funcional o promotor de justiça que não remete os autos ao CSMP para revisão de seu ato, em três
dias.
Recebendo os autos de inquérito civil, com manifestação de arquivamento lançada por membro do MP, poderá o
CSMP, na forma de ser regimento: a) homologar a promoção de arquivamento; b) reformar a promoção de
arquivamento, determinando seja proposta a ação civil público; c) determinar novas diligências investigatórias.
Qualquer que seja a deliberação do colegiado competente do MP, há necessidade de que sua deliberação seja
precedida de relatório e fundamentação, pois é dever de todos os membros da instituição indicar os fundamentos
jurídicos de suas manifestações processuais.
De qualquer forma, porém, homologado o arquivamento do inquérito civil, aos autos retornarão à promotoria ou
procuradoria de origem.
Em caso de reforma da promoção de arquivamento, novo membro do MP será designado para o ajuizamento da
ação.
Por que o primeiro membro do MP tem a liberdade para decidir se propõe ou não a ação civil, mas o segundo é
obrigado a propô-la? Isso não consistiria na violação do princípio da independência funcional?
Não a violação. O primeiro membro do MP, quando promoveu o arquivamento do inquérito civil, agiu por
atribuição próprias; era o promotor natural e, assim, detinha o poder de dizer, em nome da instituição, qual a
solução para o caso. Já o segundo membro não é o promotor natural do caso; passará agir apenas por delegação do
colegiado competente do MP, em cumprimento a uma deliberação que a lei não cometeu a ele e sim ao órgão
colegiado da própria instituição, e a este sim agora é deferida a decisão final, com plena observância da
independência funcional.
Recusada a promoção de arquivamento, a quem competirá escolher o órgão que deve promover a ação? Ao
Conselho Superior do Ministério Público ou ao Procurador Geral?
Como cabe o CSMP rever as decisões de arquivamento, inclusive quando determinado pelo próprio procurador-
geral, é consectário lógico que caiba a esse colegiado a escolha de quem vai cumprir sua decisão em cada de
rejeição do arquivamento. Ao procurador geral cabe o ato material de formalizar a designação. Essa a mens legis –
e não poderia ser diferente, senão o procurador geral, caso vencido na deliberação do Conselho, poderia escolher
quem pensasse como ele, e a decisão do colegiado poderia restar prejudicada.
Se o órgão do MP entender que não tem atribuição para realizar as investigações ou para propor a ação civil,
lançará manifestação fundamentada e encaminhará os autos do inquérito civil a quem de direito. Quando essa
remessa significar o envio dos autos ao MP de outro Estado ou a um dos ramos do MPU, o órgão do MP que
pretenda efetivar essa remessa deverá fazê-la por intermédio do CSMP de sua própria instituição. Isso significa
viabilizar a revisão de seu ato, que em última análise significa a declinação de atribuições da instituição a que
pertence. No caso, caberá analogia com o controle de arquivamento instituído pelo artigo 9º, § 1º da LACP.
66
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
O inquérito civil visa basicamente a investigar danos ao patrimônio público e a quaisquer interesses
metaindividuais, como os referentes ao meio ambiente, ao consumidor, ao patrimônio cultural, a pessoas portadoras
de deficiência, investigadores no mercado de valores mobiliários, criança e adolescente.
Por analogia, aplica-se o sistema da LACP no tocante a inquéritos civis e peças de informações destinadas a
apurar lesões a interesses outros que nãos os metaindividuais.
Aplica-se, pois, o mesmo sistema de controle de arquivamento do inquérito civil pelo CSMP ou pelas CCR nas
mais diversas áreas cíveis de atuação ministerial, desde que se enseje, em tese, ajuizamento de ação civil pública
pelo MP.
Tanto a Res nº 23/07 – CNMP, como a Lei Complementar paulista nº 734/93, criaram recursos administrativos
ora apenas contra a instauração – artigo 5º da Res. 23/07; ora tanto contra a instauração como a não instauração do
inquérito civil – artigo 107 da LOEMP. Fizeram-no, porém, de forma írrita. De um lado, o CNMP não tem função
legislativa. De outro lado, também a lei paulista se excedeu. Não que a lei estadual não pudesse dispor sobre
procedimentos já disciplinados por lei federal, assim violando o modelo federal do inquérito civil.
Desdobrando, acintosamente do âmbito que lhe reservou a Constituição Federal – que seria somente matéria de
organização, atribuições e estatutos do MP local – artigo 128, §5º, CF; diz a Lei Complementar Paulista nº 734/93
que: a) do indeferimento de representação para instauração de inquérito civil, caberá recurso ao CSMP, no prazo de
10 dias, contados da data em que o autor da representação tiver ciência da decisão; b) da instauração do inquérito
civil caberá recurso ao Conselho, no prazo de 5 dias, a contar da ciência do ato impugnado.
A lei federal conferiu ao CSMP o encargo de rever o arquivamento do inquérito civil, mas não lhe deu poderes
para impedir sua instauração nem para impedir investigações.
Incurial, portanto, que, dispondo sobre o inquérito civil, o legislador estadual se afaste do modelo federal e
inove, ao instituir recurso contra sua instauração.
Nem o membro do MP que instaurou o inquérito civil, nem outro membro qualquer podem impedir o
prosseguimento das investigações iniciadas, a não ser promovendo regularmente seu arquivamento, que deve ser
submetido aos correspondentes mecanismos de controle. Órgão ministerial algum tem ascendência ou hierarquia
funcional sobre os demais, em vista do princípio da independência funcional: no desempenho de seus atos finais, os
órgãos originários de execução do MP só estão submetidos ao controle de legalidade a cargo do judiciário.
É possível que ocorram ilegalidades ou abusos na instauração ou na condução de inquérito civil ou de
procedimento preparatório. Caberá, então, habeas corpus ou mandado de segurança. Esse controle jurisdicional
sobre os atos dos agentes políticos não pode ser substituído pro controle hierárquico sem previsão em lei federal,
sob pena de desfigurar a liberdade funcional dos membros do MP.
9. COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO
No exercício das funções previstas no artigo 129, II, da Constituição, o MP pode promover audiências públicas,
no zelo para os Poderes Públicos e os serviços de relevância pública observem os direitos assegurados na
Constituição.
Tem ainda o MP a seu dispor, no exercício das atribuições que comete o artigo 129, II, da CF, o poder de expedir
recomendações para que os Poderes Públicos e os serviços de relevância pública obedeçam aos direitos
assegurados na Constituição.
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Ambos os instrumentos de atuação funcional estão regulamentados no artigo 27, parágrafo único, IV, da Lei nº
8625/93.
Liminares e Recursos
Em ação civil pública ou coletiva não cabe liminar: a)contra ato do pode publico de que caiba recurso com
efeito suspensivo, independente de caução; b)contra decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo;
c)contra decisão judicial transitada em julgado; d) se o objeto da cautelar visar a compensação de créditos
tributários ou previdenciários, entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, reclassificação ou
equiparação de servidores, concessão de aumento ou extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza; e)
se a liminar esgotar no todo ou em parte o objeto da ação; f) antes de se ouvir a Fazenda.
Examinemos a última limitação: a exigência de prévia audiência do representante judicial da pessoa jurídica de
Direito Público, que deverá pronunciar-se em 72 horas. Embora não diga a lei, essa exigência só terá razoabilidade
se não significar denegação de acesso efetivo à prestação jurisdicional.
Os tribunais tem atenuado ainda mais o rigor da restrição. O Supremo Tribunal Federal tem admitido a
antecipação de tutela contra o poder público, quando condenada a Fazenda em regular processo de conhecimento,
desde que presente o periculum in mora. Pela mesma via, tem entendido que as tutelas de urgência podem
justificar-se em juízo de ponderação de casos excepcionais, em que de regra não caberiam. Por sua vez, o Superior
Tribunal de Justiça assentou que o art. 1º da Lei 9.494/97 deve ser interpretado restritivamente, não incidindo em
situação especialíssimas, nas quais restam evidentes a força maior, o estado de necessidade ou a exigência de
preservação da vida humana.
4. Impugnações à decisão sobre a liminar
a) Impugnação à concessão da liminar
Mecanismos para impugnar a concessão da liminar: impugnação recursal ao alcance de todos os interessados, e
o pedido de liminar só pode ser formulado por pessoa jurídica de Direito Público interno ou pelo Ministério
Público.
O caminho recursal - Para pugnar recursalmente a concessão de liminar em ação civil pública ou coletiva, ou
em mandado de segurança coletivo, cabe agravo retido nos autos ou agravo por instrumento.
Dispondo de regra própria, a lei especial permite que, em ação civil pública o próprio juiz da causa receba
qualquer recurso com efeito suspensivo; entre os recursos admissíveis na ação civil pública ou coletiva, não se
exclui o agravo contra concessão de liminar.
Assim, nas ações civis públicas, faculta-se ao agravante o direito de noticiar a interposição do agravo ao juízo a
quo para viabilizar o cumprimento do art.14 da lei especial. Mas interposto o agravo diretamente perante o tribunal,
não se pode obstar a que o relator conceda o efeito suspensivo se não o tiver feito o juízo a quo.
Diante do peculiar sistema da LACP, o recorrente pode pedir ao juiz relator da decisão agravada que confira
efeito suspensivo ao agravo. Não o tendo feito o juiz, e desde que haja requerimento do interessado, o relator do
agravo poderá conferir efeito suspensivo ao recurso, sendo desnecessário a impetração de segurança para tal fim.
Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é admissível a ação de segurança conta ato judicial,
para atribuir efeito suspensivo a recurso que não o tenha, desde que o recurso haja sido efetivamente interposto e
admitido.
Se a liminar houver sido concedida em tribunal local, pelo relator, sua cassação não será obtida por meio de
agravo regimental, e sim por decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça
em pedido de suspensão de liminar, conforme tenha ou não fundamentação constitucional. Não cabe recurso
extraordinário contra acórdão que defere medida liminar.
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
O Pedido de suspensão de liminar – requisitos para a suspensão de liminar: a)requerente, pessoa jurídica de
Direito Público interno ou Ministério Público; b)destinatário, presidente do tribunal a qual couber o julgamento do
respectivo recurso; c)causa; manifesto interesse público ou flagrante ilegitimidade; d)fim, evitar grave lesão à
ordem, à saúde, è segurança pública e à economia pública; e)pressupostos gerais de cautela, plausibilidade do
direito e a urgência na concessão da medida.
A jurisprudência tem entendido que esse benefício da Fazenda Pública se estende às suas autarquias e também
as fundações pública, que são tidas como espécies do gênero autarquia.
Há regras próprias para buscar a suspensão dos efeitos da decisão recorrida. Nas ações civis públicas ou
coletivas, o juiz poderá conceder liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo. No mandado
de segurança coletivo, o juiz também poderá conceder liminar, em decisão também sujeita à agravo.
Concedida liminar contra o Estado, suas autarquias ou fundações, seu representante judicial será intimado
pessoalmente. O ente estatal ou Ministério Público, poderão interpor o agravo. Não obtendo o efeito suspensivo
quer junto ao juiz, quer junto ao relator do agravo, poderão pedir ao presidente do tribunal competente a suspensão
da liminar (sem prejuízo da necessária interposição do agravo).
Não é condição para a suspensão de liminar que a Fazenda Pública ou o Ministério Público hajam previamente
interposto recurso contra a liminar. Suspensa a liminar, o recurso será desnecessário, pois a suspensão vigorará até
o transito em julgado da decisão de mérito na ação principal.
A decisão que conceder ou negar a suspensão da liminar, caberá agravo, no prazo de cinco dias, que será levado
a julgamento na sessão seguinte a sua interposição. Trata-se do agravo conhecido como interno, regimental ou
inominado; sua interposição e seu processamento correm nos próprios autos do pedido de suspensão da liminar, e,
assim, independem da formação de instrumento.
Se do julgamento do agravo de que trata a nota anterior resultar a manutenção ou o restabelecimento da decisão
que se pretende suspender, prosseguindo nesse rol interminável de remédios favoráveis só para a Fazenda Pública,
a Med. Prov. N. 2.180-35/01 e depois a LMS ainda asseguram novo pedido de suspensão, dirigido agora ao
presidente do tribunal competente para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário.
Segundo a jurisprudência majoritária do Supremo Tribunal Federal, a suspensão da liminar não perde a vigência
com o advento da sentença de procedência, pois a suspensão da liminar vigora até o transito em julgado da decisão
de mérito da ação principal.
Com razão, anotou Teori Zavaski que a Fazenda pode pedir a suspensão de liminar que tenha sido contra si
concedida, mas não a reforma de decisão do presidente do tribunal que tenha suspendido a medida anteriormente
deferida em seu favor, pois o acolhimento desse pedido significaria, na pratica, a concessão de uma liminar, e não a
suspensão, e, para esse propósito, não se presta o pedido de suspensão que trata a Lei 8.437/92, seja porque não há
previsão específica nesse sentido, seja porque tal pedido não possui natureza jurídica recursal.
b) Impugnação à denegação da liminar
Denegação de liminar cabe agravo, o tocante à decisão do relator que conceder ou denegar a medida liminar,
dela caberá agravo ao órgão competente do tribunal que a integre.
Sob o sistema da ação civil pública ou coletiva, pode o juiz conferir efeito suspensivo a qualquer recurso.
5. A reconsideração da liminar
Em ação civil pública ou coletiva, ainda que o juiz tenha negado a concessão da liminar, poderá reexaminar a
qualquer momento sua decisão, enquanto não proferir a prestação jurisdicional definitiva. Da mesma forma, antes
de dar a sentença, poderá o juiz a qualquer tempo, revogar a liminar que concedeu, desde que se convença de terem
cessado ou de não terem ocorrido os motivos que levaram à sua concessão.
Mantida a liminar, quando da prolação da sentença, a lei admite, que a requerimento do Ministério Público ou
de pessoa jurídica de Direito Público interessada, o presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do
recurso, possa deferir a suspensão da execução da sentença enquanto pender o apelo (o que corresponde hoje à fase
de cumprimento de sentença, nos termos da Lei n.11.232/05).
Como já antecipamos, nosso entendimento é o de que, em casos excepcionais, convindo ao interesse público,
poderá o juiz condicionar a revogação da liminar ao transito em julgado da sentença de improcedência – o que se
explica pelas consequências muitas vezes irreversíveis dos danos a valores de que cuida a Lei da Ação Civil
Pública.
6. Os recursos em geral
São admissíveis quais quer ações civis, de qualquer rito ou objeto, para a defesa dos interesses transindividuais.
Nas ações civis públicas ou coletivas, os recursos serão os do Código de Processo Civil. Registre-se que o prazo
especial de 10 dias, previsto no art.198, II do ECA, só se aplica aos procedimentos dos arts. 152 e 197 do mesmo
estatuto, mas não as ações civis públicas para a defesa de direitos relacionados com a proteção da criança e
69
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
adolescente, porque, quanto a estas, os recursos e os prazos também são aqueles da lei processual civil geral (ECA,
art. 212 §1º).
Assim, no processo coletivo, devem ser observados os prazos de as demais regras processuais do diploma
codificado.
Não é, porém, em tudo que o sistema recursal do Código de Processo Civil se aplica, quando se cuide de ação
civis públicas ou coletivas.
Como nas ações civis públicas e coletivas, para evitar dano irreparável a parte, o juiz poderá conceder efeito
suspensivo aos recursos, isso significa que o efeito suspensivo do recurso dependerá de uma decisão motivada do
juiz. A regra é recebimento do recurso sem o efeito suspensivo; silente o juiz a respeito, entende-se que não
conferiu efeito suspensivo ao recurso. Conclui-se, pois, que os recursos no sistema da LACP têm apenas o efeito
meramente devolutivo como regra geral.
A regra nas ações civis públicas e coletivas é a de que nem mesmo à apelação te efeito suspensivo, salvo se o
juiz expressamente o conceder. Mas, se o juiz não Recber com efeito suspensivo a apelação, tem-se admitido a
impetração de mandado de segurança para conferir-lhe tal efeito.
Será, porém, recebida só no efeito devolutivo a apelação interposta contra a sentença que confirme a
antecipação da tutela.
A possibilidade de ser conferido efeito suspensivo a qualquer recurso, em sede de ação civil pública, recebeu
interpretação restritiva junto ao Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual a regra do art. 14 da LACP destina-se
apenas as instancias ordinárias, não alcançando a interposição de recurso especial ou extraordinário.
Duplo grau de jurisdição nas ações civis públicas e coletivas? Em regra as sentenças proferidas em ação civil
pública ou ação coletiva não se sujeitam ao duplo grau obrigatório de jurisdição, exceto:
1º) carência ou improcedência da ação civil pública com o mesmo objeto que poderia ter sido pedido em ação
popular, por analogia ao art. 19 de Lei n. 4.717/65.
2º) carência ou improcedência, proferida na ação civil pública que verse interesses transindividuais de pessoas
portadoras de deficiências.
3º) sentença desfavorável à Fazenda, nos casos gerais Código de Processo Civil, que é de aplicação subsidiária
ao processo coletivo.
4º) sentença que conceda a ordem, no mandado de segurança coletivo.
Multas
1. As multas cominatórias
Nas ações civis públicas ou coletivas, tanto em decisão liminar (inito litis), como em tutela antecipada ou até
mesmo na sentença, o juiz pode impor multa diária, de caráter cominatório, independentemente de requerimento do
autor.
A multa imposta liminarmente (no início da lide) será devida desde o descumprimento da ordem liminar;
entretanto, só será exigível depois que transite em julgado a sentença favorável ao autor.
A multa imposta em decorrência da concessão de tutela antecipada é exigível a partir do momento fixado pelo
juiz, para assegurar mais pronta exequibilidade da decisão;
A multa imposta na sentença é devida em razão do atraso no cumprimento do preceito contido na sentença.
Destina-se especificamente a favorecer o cumprimento espontâneo da obrigação imposta no decisum. É exigível em
caso de execução, devendo o juiz especificar. Entretanto por força da regra do art.14 da LACP, sua real
exigibilidade dependerá do efeito dado pelo juiz à eventual apelação.
A multa fixada em compromisso de ajustamento de conduta tem caráter consensual. As multas podem ser
impostas inclusive contra o Estado.
2. Multa liminar
A multa liminar é devida desde o descumprimento. É exigível só depois do transito em julgado da sentença.
3. Multa imposta em tutela antecipada
A concessão de tutela liminar depende de pedido do autor, mas o juiz pode impor até mesmo de ofício um
multa diária, para garantir o cumprimento da tutela antecipada.
4. Multa imposta na sentença
Atreinte, condenação pecuniária proferida em razão de tanto por dia de atraso (ou por qualquer unidade de
tempo, conforme as circunstancias), destinada a obter do devedor o comprimento de obrigação de fazer pela
ameaça de uma pena suscetível de aumentar indefinidamente. Caracteriza-se a astreinte pelo exagero da quantia
que se faz a condenação, que não corresponde ao prejuízo real causado ao credor pelo inadimplemento, mas
depende da existência de tal prejuízo. É antes uma pena imposta com caráter cominatório para o caso em que o
obrigado não cumpra a obrigação no prazo fixado pelo juiz.
70
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Destarte, as multas impostas na sentença tronam-se conhecidas em doutrina e jurisprudência com astreinte.
Nos termos do art. 11 da LACP e 84, §4º, do CDC, para assegurar o cumprimento da obrigação de fazer, a
sentença pode impor multa diária, ainda que sem pedido do autor – o que constitui derrogação ao princípio
dispositivo ou da demanda. Por força da integração entre LACP e CDC, tais regras não valem apenas para a defesa
do consumidor , mas sim para a defesa de qualquer interesse transindividuais (meio ambiente, patrimônio cultural,
pessoa idosas, etc.)
Podem ser impostas multas contra o Estado, inclusive as astreintes. A execução, nesse caso será feita por
quantia certa.
Segundo a Súm. n. 410 – STJ, a previa intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a
cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.
5. Multas administrativas e multas impostas em compromissos de ajustamento
Na tutela de interesses transindividuais, não raro se vale o legislador de multas administrativas, que vão para
fundos específicos. Tendo em vista o caráter difuso da destinação dessas multas, o Ministério Público não só pode
cobrá-las me proveito da coletividade, como ainda poderá intervir nas respectivas ações de cobrança.
Nos compromissos de ajustamento de conduta, é comum imporem-se multas cominatórias , para o caso de seu
descumprimento; entretanto, ainda que até costumeiras e extremamente úteis, não são indispensáveis.
As multas impostas nos compromissos de ajustamento de conduta normalmente têm o caráter cominatório, já
que se destinam a assegurar o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. Em alguns casos, dentro da livre
negociação das partes, não raro na pratica acabam assumindo caráter compensatório, embora tais compromissos
visem primordialmente a construir obrigações de ajustamento de conduta, e não a constituir dívida de valor.
Essas multas de caráter administrativo, ainda que permitam inscrição na dívida ativa, não tem caráter tributário,
e deve ser executada em cinco anos, sob pena de prescrição.
Fundos para reconstruir o bem lesado
1. Generalidades
Nem todo produto arrecadado nas ações civis públicas ou coletivas destinam-se ao fundo de que cuida o art. 13
da LACP. Em alguns casos, pode destinar-se a reparação de lesões individuais homogêneas.
Primeira questão, lesado individual pode obter junto ao fundo do art.13 da LACP a reparação de seu dano
particularizado, caso a ação civil pública ou coletiva que cuidou da reparação do dano global tenha sido julgada
procedente e o preceito tenha sido cumprido.
As regras são as seguintes:
a)Na ação civil pública ou coletiva que verse a defesa da interesses difusos, o indivíduo, ainda que faça parte do
grupo lesado, não receberá parte alguma do produto da indenização, que é indivisível;
b)Na ação civil pública ou coletiva que verse a defesa de interesses coletivos, em sentido estrito esse proveito
será indivisível, como é próprio aos interesses coletivos em sentido estrito, assim não poderá evidentemente ser
repartido entre os lesados;
c)Há ações civis públicas ou coletivas que mesclam interesses divisíveis e indivisíveis (ação civil pública para
defesa de interesses coletivos em sentido estrito), pode ocorrer que o juiz conceda uma medida liminar, uma
medida cautelar ou até mesmo uma antecipação de tutela, e em qualquer dessas hipóteses, imponha multa pelo
eventual descumprimento da cominação. Nesse caso ainda que ação verse interesses coletivos em sentido estrito (e,
por definição indivisíveis), o produto da multa destina-se a acrescer as indenizações individuais, podendo ser
repartido entre integrantes do grupo determinável de lesados. Isso porque nessa ação estarão presentes dois tipos de
interesse de grupos: os coletivos, invisíveis e os individuais homogêneos divisíveis.
d)Na ação civil pública que verse a tutela de interesses individuais homogêneos, seu objeto uma indenização
global pelo dano causado, naquilo que tenha de uniforme para todos os lesados, para oportuna divisão entre eles.
Nesse caso, receberão sua cota, em proporção, somente aqueles que se apresentarem, desde que, na liquidação e
execução, comprovem terem regularmente sofridos os danos a interesses individuais homogêneos.
2. Perda do Prazo para habilitação dos lesados
No processo coletivo, a regra é a de que a execução em razão das lesões individuais seja feita pro meio de
representação processual das vítimas ou sucessores; só quando não haja tempestiva habilitação dos lesados é que a
execução será coletiva, por substituição processual do grupo por um dos legitimados ativos da ação coletiva.
72
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Decorrido o prazo de um ano sem habilitação do lesado, ao menos em quantidade suficiente para absorver toda
a indenização a eles destinada, pode ocorrer que haja um saldo residual. Nesse caso, e somente nesse caso, as
indenizações provenientes de interesses individuais homogêneos serão recolhidas ao fundo de reparação de
interesses difusos lesados.
Assim em matéria de interesses individuais homogêneos, a fase de cumprimento de sentença poderá ser
coletiva, mas decorrido, um ano sem que se habilitem interessados em número compatível com a gravidade do
dano, os colegitimados pra a ação coleiva, poderão promover o cumprimento da sentença, revertendo o produto da
indenização ao fundo.
Ocorrendo, pois, lesões individuais homogêneos (divisíveis), se algum lesado se habilitar a tempo quando da
fase de cumprimento da sentença coletiva, e demonstrar ter direito a uma parte do produto da condenação, a ele
deverá ser destinada a parcela do valor da condenação que lhe deva caber em proporção.
Parece-nos que os lesados que ao se habilitarem a tempo, só por ação direta individual poderão discutir seus
prejuízos.
Contra quem esses lesados individuais ajuizarão ações diretas? Deverão mover a ação contra o causador do
dano, se objetivarem indenizações por lesões individuais diferenciadas. Mas, quanto à fração que lhes caiba na
indenização por interesses individuais homogêneos, não poderão posteriormente formular pedido algum contra o
causador do dano, que já foi executado e pagou tudo o que devia na ação coletiva; assim poderão ajuizar ação
contra a pessoa jurídica a que pertença o ente gestor do fundo o qual recebeu um dinheiro que destinava ao
indivíduo lesado.
Quanto aos danos individuais diferenciados, é evidente que não pode ser indenizado com o produto do fundo do
art. 13 da LACP; só podem ser discutidos em ação individual, não em ação civil pública ou coletiva.
1. A liquidação da sentença
Se a sentença proferida em ação civil pública ou coletiva não determinar o valor devido, é preciso proceder à
sua liquidação.
A LACP nada dispõe sobre liquidação da sentença, enquanto o CDC só o faz no tocante a defesa de interesses
individuais homogêneos. Isso significa que a liquidação no processo coletivo passa agora a obedecer as alterações
trazidas ao CPC pela lei n. 11.232/05 e legislação subsequente.
Principais regras para liquidação no processo coletivo?
a) em caso de procedência do pedido, a condenação será genérica, devendo fixar a responsabilidade do réu pelos
danos causados;
b) quando a determinação do valor da condenação depender apenas de calculo aritmético, o credor requererá o
cumprimento da sentença, na forma do art.475-J do CPC, instruindo o pedido com memória discriminada e
atualizada do calculo.
c) caberá liquidação por arbitramento, quando isso tenha sido determinado pela sentença, ou convencionado
pelas partes, ou ainda quando o exigir a natureza do objeto da liquidação;
d) será feita a liquidação por artigo, quando houver necessidade de alegar e provar fato novo.
Com a procedência da ou ação civil pública ou coletiva, o título judicial obtido favorecerá todo o grupo, classe
ou categoria de indivíduos lesados, observados os limites do pedido e do decisum.
Levando, pois, em conta a legitimidade concorrente e disjuntiva para a tutela coletiva, qualquer colegitimado
pode promover a liquidação coletiva da sentença, perante o mesmo juízo do processo de conhecimento, observadas
as seguintes peculiaridades, de acordo com a natureza do interesse transindividual em jogo:
a) condenação por interesses transindividuais homogêneos, também a vítima e seus sucessores podem promover
a liquidação individual da sentença na parte que lhe toque; apenas se não o fizerem é que os colegitimados da ação
civil pública ou coletiva poderão promover a execução coletiva em benefício do grupo;
b) na condenação por danos a interesse coletivo em sentido estrito, a regra anterior também é aplicável, por
analogia. Com efeito, se a vítima ou seus sucessores tem ação individual suspensa, na forma do art. 104 do CDC,
podem ter interesse na execução individual do julgado coletivo que os favoreça;
c) sentença condenatória que verse e a tutela de interesses difusos, só os colegitimados da ação civil pública ou
coletiva podem promover sua liquidação, salvo apenas se, como cidadão detiver a legitimidade para propor ação
popular com o mesmo objeto.
Em face da sistemática introduzida pela Lei n. 11.232/05 a decisão da liquidação que fixa o quantum debeatur,
passa a ser impugnável por agravo de instrumento. Permite-se a liquidação provisória procedida em autos
apartados, no juízo de origem.
73
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
A liquidação por forma diversa da estabelecida na sentença não ofende a coisa julgada (Súm. n. 344 do STJ) “a
coisa julgada somente torna imutável a forma de liquidação depois do transito em julgado da sentença proferida no
processo de liquidação e não no transito em julgado da sentença proferido no processo de conhecimento.”
5. A reconsideração da liminar
Enquanto não proferir a prestação jurisdicional definitiva, pode o juiz reexaminar a qualquer momento a decisão
que negou ou que concedeu a liminar. Se ao sentenciar julgar o pedido improcedente, deverá o juiz tornar sem
efeito a liminar antes concedida, embora nada obste que condicione a revogação da liminar ao trânsito em julgado
da sentença, para evitar danos irreparáveis. Já se a sentença for de procedência, mais lógico é que nesse momento,
em que exerce cognição exauriente, a liminar anteriormente concedida, em cognição incompleta, seja mantida. De
qualquer forma, mantida a liminar por ocasião da sentença, o presidente do Tribunal ad quem pode conceder
suspensão da execução da sentença.
6. Os recursos em geral
Nas ações civis públicas ou coletivas aplica-se de modo geral do sistema recursal do CPC (inclusive disposições
sobre prazo em dobro para recorrer), mas devem ser observadas algumas peculiaridades da legislação especial
(LACP, ECA, etc). Assim, por exemplo, segundo a LACP o recebimento do recurso sem efeito suspensivo é a
regra, devendo o contrário ser feito de forma motivada pelo juiz, inclusive admitindo-se mandado de segurança
para obter esse efeito. STF: em recurso extraordinário não cabe medida cautelar inominada para obter efeito
suspensivo, se o recurso não admitido no Tribunal de origem; no máximo pode o presidente do TJ deferir a medida,
que perdurará enquanto o STF ratificá-la ou não.
Existe duplo grau de jurisdição obrigatório em ações coletivas? Em regra não salvo: 1. carência ou
improcedência em ação que o objeto for o mesmo que poderia ter sido pedido em ação popular, por analogia do art.
19 da Lei 4.717/65; 2. carência ou improcedência em ação que envolva direitos transindividuais de portadores de
deficiência (Lei 7.853/89, art. 4º, §1º); 3. sentença contra a Fazenda Pública, nos termos do art. 475 do CPC; 4.
sentença que conceda a ordem no mandado de segurança coletivo.
O juiz pode, nas ações civis públicas, independente de requerimento do autor, impor multa diária de caráter
cominatório, tanto em decisão liminar como em tutela antecipada ou até mesmo na sentença, sendo que: a) a multa
imposta liminarmente, como meio de pressão psicológica sobre a parte, é devida desde o descumprimento da
ordem, mas só é exigível após trânsito em julgado da decisão favorável ao autor; b) a multa imposta em decorrência
75
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
da concessão de tutela antecipada é exigível a partir do momento fixado pelo juiz, ou seja, mesmo antes da
sentença, para assegurar mais pronta exequibilidade da decisão; c) a multa imposta na sentença, em ação que vise
ao cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer (art. 11 LACP; art. 84, § 4º, do CDC), é devida por eventual
atraso no cumprimento do preceito contido na sentença, sendo exigível em caso de execução, mas a sua real
exigibilidade vai depender do efeito dado pelo juiz a eventual apelação; d) a multa fixada em compromisso de
ajustamento de conduta tem caráter consensual, sendo exigível a partir do momento nela fixado, sendo em geral
cominatória (às vezes compensatória, com a advertência de que as partes não tem poder de dispor do direito
material, pois dele não são titulares, não constituindo portanto limite de responsabilidade do causador do dano).
As multas podem ser cobradas inclusive em face do Estado (STJ). O produto é recolhido ao fundo de reparação
de interesses difusos, mas se estiverem em jogo interesses divisíveis a multa acrescerá as indenizações individuais.
Súmula 410 STJ: a prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa
pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.
Os meios de coação, entre os quais se inclui a multa cominatória, são aqueles de que se socorre o direito para
exercer influência sobre a vontade do obrigado. O chamado astreinte, originário da jurisprudência francesa, é a
condenação pecuniária de determinado valor por dia de atraso. Liebman: as obrigações de fazer ou não fazer são,
em maior ou menor extensão, inexequíveis, donde então o esforço para encontrar meios de induzir o obrigado a
cumpri-las, sob a ameaça de pesadas sanções. É uma pena de caráter cominatório. Os meios de subrogação, por sua
vez, consistem naqueles em que o órgãos jurisdicionais tendem por sua conta a conseguir para o credor o bem a que
este tem direito, sem participação do devedor.
Legislador não raro se vale de multas administrativas na tutela de interesses transindividuais (ex.: infrações
administrativas ambientais, do consumidor, ECA). Tendo em vista o caráter difuso da destinação dessas multas, o
Ministério Público pode cobrá-las ou intervir nas respectivas ações de cobrança.
Uma das mais peculiares características da tutela coletiva de interesses transindividuais consiste na dificuldade
de dar destino adequado ao produto de eventual condenação. Mesmo que se verse sobre interesses divisíveis, há a
dificuldade de apurar o produto de uma condenação e dividi-lo entre milhares de lesados. Tal dificuldade foi um
dos três maiores empecilhos para o surgimento do processo coletivo (ao lado da questão da substituição dos lesados
no pólo ativo e da coisa julgada erga omnes).
LACP, art. 13, enfrentou a questão criando um fundo fluido destinado à reparação dos interesses
transindividuais lesados, denominado Fundo de Defesa dos Direitos Difusos pela Lei 9.008/95. Os valores do
fundo, sempre que possível, devem aplicados para reparação do próprio bem lesado. Se impossível, poderá ser
usado para preservar ou reparar outros bens compatíveis.
Portanto, aplicação do produto do fundo é bastante flexível, dependendo de discernimento e imaginação. De
fato, a Lei 9.008/95 passou a prever diversas aplicações para o dinheiro, além da reconstituição dos bens lesados
(promoção de eventos educativos e culturais, edição de material informativo relacionado à lesão, modernização
administrativa dos órgãos relacionados à proteção do bem lesado). Mas sempre deverá haver compatibilidade com
a origem dos interesses lesados. Há membros do Ministério Público que aspiram a que os recursos do fundo sejam
usados no custeio de suas investigações (perícias, etc.). Mas isso depende de previsão legislativa, que ainda não
existe. A possibilidade do fundo ser usado para pagar indenização a lesado individuais será analisada no capítulo
seguinte.
Naturalmente, a destinação da indenização para o fundo só ocorre em caso de danos indivisíveis. Se divisíveis
(interesses individuais homogêneos), o dinheiro será repartido entre os próprios lesados, salvo se faltarem
interessados individuais a reclamar a sua parte, hipótese em que o dinheiro também irá para o fundo (art. 100 e seu
parágrafo único do CDC). Ainda vale registrar que na lesão ao patrimônio público em sentido estrito, em que o
lesado é a Fazenda, o dinheiro irá recompor o patrimônio estatal.
A flexibilidade do uso das verbas faz com que doutrina remeta esse instituto ao fluid recovery norte-americano,
mas o sistema das class actions norte-americanas de distribuição do dinheiro é bem distinto. Críticas ao sistema
brasileiro centram-se em dois pontos: 1. necessidade de ampliar a efetividade de utilização dos recursos (ex.:
perícias ambientais); 2. conselhos gestores criados pelo poder executivo com composição numerosa e burocrática.
De acordo com o nosso sistema federativo, a LACP prevê um fundo federal e fundos estaduais. Recursos irão
para o fundo federal se ação tiver tramitado em vara federal e envolver interesse da União, empresa pública ou
entidade autárquica federal. Existem ainda outros fundos semelhantes ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos:
fundo Nacional do Meio Ambiente, fundo Naval, fundos Estaduais ou Municipais do Meio Ambiente, fundos
Municipais dos Direitos da Criança e Adolescente.
76
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
A lei prevê a participação obrigatória do Ministério Público e representantes da comunidade no conselho gestor
do fundo. Isso é proibido pela Constituição, que lhes veda o exercício de qualquer outra função pública, salvo uma
de magistério. Desse modo seriam inconstitucionais a previsão de participação do Ministério Público em conselhos
de defesa de direitos humanos, de entorpecentes, comissões de trânsito, enfim, em órgãos administrativos.
Lei 9.008/1995, art. 2º, §2º, prevê os recursos que integram o Fundo de Direitos Difusos. Vê-se que os valores
originam-se não só de condenações em ações civis públicas, mas também de multas cominatórias, multas por
infrações administrativas, etc.
A pessoa individualmente lesada não depende das ações coletivas para obter seu direito, já que tem acesso direto
à prestação jurisdicional. Mas também é fato que a decisão proferida na ação civil pública em defesa de direitos
individuais homogêneos e até de direitos coletivos em sentido estrito pode ter repercussão direta na defesa dos
interesses individuais, já que a coisa julgada pode se estender in utilibus para além das partes.
Sobre a possibilidade do lesado individual obter a reparação do seu dano junto ao fundo do art. 13 LACP, tem
se que: a) a indenização fixada em ação de defesa de interesses difusos tem caráter global, indivisível, de modo que
mesmo que faça parte do grupo lesado o indivíduo não terá parte alguma do produto da indenização; b) se a ação
versar sobre direitos coletivos em sentido estrito, ainda que o proveito diga respeito a grupos determináveis, este
será indivisível e não será repartido entre os lesados (ex.: declaração de nulidade de contrato de adesão); c) se a
ação mesclar interesses divisíveis e indivisíveis, eventual produto de multa por obrigação descumprida, por
exemplo, poderá acrescer à indenizações individuais, assim como o valor da condenação por danos morais
coletivos, já que nessa ação estarão efetivamente presentes interesses coletivos em sentido estrito e individuais
homogêneos; d) no caso da demanda versar sobre interesses individuais homogêneos, o seu objeto será receber uma
indenização global pelo dano causado, naquilo que tenha de uniforme para todos lesados, para oportuna divisão
entre aqueles que se apresentarem na posterior fase de liquidação e comprovarem regularmente terem sofrido os
danos de que cuidou a ação; o dinheiro, então, num primeiro momento deve ser depositado em conta remunerada à
disposição do Juízo (só irão para o fundo se houver saldo após pagamento das indenizações).
No caso dos direitos individuais homogêneos a liquidação e a execução de sentença poderão ser promovidas
pela vítima e seus sucessores, e, casa não haja tempestiva habilitação dos lesados, a execução será coletiva, ou seja,
promovida pelos legitimados de que trata o art. 82 CDC, abrangendo as vítimas cujas indenizações já tiveram sido
fixadas em sentença de liquidação, sem prejuízo do ajuizamento de outras execuções.
Se decorrer um ano sem que haja habilitação de lesados, ao menos em quantidade suficiente para absorver toda
a indenização, as indenizações serão recolhidas ao fundo de reparação interesses difusos lesados. No caso da ação
versar sobre interesses de investidores lesados no mercado de valores mobiliários, o prazo para habilitação é maior,
de dois anos (art. 2º da Lei 7.913/89).
Como se contam esse prazos? O artigo 96 do CDC previa a publicação de edital para ampla ciência do trânsito
em julgado da decisão condenatória, mas foi vetado por erro de remissão (remetia ao artigo 93 ao invés do artigo
94). Mas o erro deve ser relevado, e de fato tal edital deve ser publicado, correndo então o prazo de um ano, ou dois
anos, para habilitação dos lesados (para Arruda Alvim, ao contrário, conta-se do trânsito em julgado). Veja-se que a
mencionada Lei 7.913/89, que cuida da ação de responsabilidade por danos aos investidores no mercado de valores
mobiliários, prevê expressamente a fixação do aludido edital, o que deve ser aplicado por analogia às demais
hipóteses de interesses individuais homogêneos.
Por outro lado, a Lei 7.913 diz que o prazo de dois anos para habilitação é decadencial, restrição que não pode
ser estendida às demais ações coletivas. O que ocorre, então, com o lesado que não for investidor financeiro e
perder o prazo? Esses interessados devem entrar com ação direta individual para discutir seus prejuízos, em face do
causador do dano, se objetivarem indenização por lesões individuais diferenciadas (vale dizer, não homogêneas,
lesões que não são comuns ao grupo, por exemplo, lucros cessantes e danos emergentes por defeito de fabricação
de um automóvel).
Se, por outro lado, os lesados pretenderem a fração que lhes caiba na indenização por interesses individuais
homogêneos (ex.: no caso do automóvel defeituoso, indenização pela substituição da peça defeituosa será comum a
todos os lesados), não poderão formular pedido algum contra o causador do ano, que já foi executado e pagou o que
devia. Poderão, então, demandar contra a pessoa jurídica a que pertença o ente gestor do fundo que recebeu o
dinheiro que se destinava ao indivíduo lesado, enquanto não se consumar a decadência ou prescrição do direito
material em questão (ex.: 5 anos, previsto no CDC, para indenização por fato do produto ou serviço; 3 anos,
previsto no CC, para as reparações civis em geral)
16ª Parcela do resumo feita por
77
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Leandro
- 616
CAPÍTULO 36 – LIQUIDAÇÃO, CUMPRIMENTO DA SENTENÇA E EXECUÇÃO
A LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA
A LACP nada dispõe sobre liquidação da sentença, enquanto que o CDC só o faz no tocante à
defesa de interesses individuais homogêneos. Portanto, deve-se utilizar as regras do CDC, e
supletivamente, as do CPC (que, pela Lei 11232/05, se dá mediante procedimento incidental subsequente
ao processo de conhecimento).
Em síntese, na liquidação para qualquer interesse coletivo (por aplicação analógica), tem-se:
c) também poderá haver liquidação por arbitramento – ex.: danos morais (475-C, CPC) ou por
artigos – ex.: apurar as consequências do dano, os lucros cessantes, etc (475-E, CPC).
2ª) Obrigação de entregar coisa – o juiz fixará o prazo para o cumprimento (461-A CPC);
3ª) Obrigação por quantia certa – caso o devedor não pague no prazo devido, o juiz imporá multa,
conforme 475-J.
Com efeito, não incidem as disposições concernentes ao cumprimento de sentença nas execuções
por quantia certa contra a Fazenda Pública, dada a existência de rito próprio (730 CPC), supondo citação
e embargos do devedor (736 e 745 CPC). Após o trânsito em julgado, no momento próprio será feita a
expedição de precatório. Por outro lado, nas dmais condenações (que não por quantia certa) as regras
serão a do sistema comum, com as devidas ressalvas cabíveis no processo coletivo.
78
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
No tocante aos interesses difusos, o título executivo beneficiará de forma indivisível os titulares do
direito material. Portanto, o cidaddão só poderá promover o cumprimento da sentença se o objeto da
condenação disser respeito à proteção de um interesse que, como cidadão, ele também poderia defender
(ex.: meio ambiente, patrimônio público, etc.)
A expressão “Fazenda Pública” não abarca as empresas públicas, sociedades de economia mista e
suas subsidiárias, que explorem atividade econômica própria das empresas privadas.
Conforme 475-L e seus incisos, referida impugnação só poderá incidir sobre matérias que possam
ser reconhecidas de ofício ou qualquer causa superveniente que seja impeditiva, modificativa ou extintiva
da obrigação, dentre outras.
Nas execuções contra o Estado, não raro este argumenta pela impossibilidade de cumprimento da
decisão, invocando o princípio da reserva do possível. No entanto, tal argumento já deveria ter sido
oposto no processo de conhecimento, não cabendo discutir novamente a lide, conforme 475-G CPC, salvo
se as razões de invocação forem supervenientes à sentença condenatória (475-L).
Os embargos à execução (ação para desconstituir título executivo) e a ação autônoma (ação para
discutir a existência, validade ou eficácia dos títulos e atos de execução) cabem nas execuções por títulos
executivos extrajudiciais.
EXECUÇÃO PROVISÓRIA
Cabe execução no processo coletivo, conforme as regras do CPC. No MS coletivo também caberá,
salvo nos casos em que for vedada a concessão de medida liminar.
Os compromissos de ajustamento de conduta têm eficácia de título executivo extrajudicial (art. 5º,
§6º, LACP), assim permitem a execução forçada, inclusive contra a Fazenda Pública.
Na execução de obrigação de Fazer/Não Fazer, fundada em título extrajudicial, ao despachar a
inicial, o juiz fixará multa por dia de atarso no cumprimento da obrigação e a data a partir da qual será
devida; se o valor da multa já estiver previsto no título, o juiz poderá reduzi-lo, caso o considere
excessivo (645 CPC).
Com efeito, a súmula 410 STJ exige prévia intimação pessoal do devedor para a cobrança de
multa pelo descumprimento de obrigação de fazer/não fazer.
Diversamente do que agora ocorre nos títulos executivos, no extrajudicial poderá o executado
79
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Resposta: Tanto o 475-L, quanto o 741, VI, CPC, só permitem suscitar prescrição que for
superveniente à senteça condenatória.
Entretanto, o STJ excepciona para a hipótese de ocorrer execução individual in utilibus, pois seria
nessa oportunidade que se poderia suscitar a prescrição contra a pretensão individual ( que pode ser
alegada em qualquer tempo e grau de jurisidição), pois tal ação é de elevada carga cognitiva, já que antes
de se promover a individualização e a liquidação do valor devido, há de se verificar a titularidade do
exequente em relação ao direito material.
A jurisprudência do STJ tem entendido que a exceção criada pela norma do art. 4º da MP 2180-35,
que exclui, em favor da Fazenda Pública, o pagamento dos honorários advocatícios nas execuções não
embargadas, é de ser afastada não somente nas execuções individuais de julgados em sede de ACP, mas
também nas ações coletivas ajuizadas por sindicato como substituto processual, com igual razão de
decidir, por ser indispensável promover a liquidação do valor a ser pago, e a individualização do crédito,
inclusive com a demonstração da titularidade do direito do exequente, resultando pois induvidoso, o alto
conteúdo cognitivo da ação de execução – ver súmula 345 STJ.
No caso de execução individual de decisão proferida em processo coletivo, diz a lei ser
competente o juízo da liquidação da sentença ou o da ação condenatória. Isso significa que a lei especial
está expressamente permitindo ao credor que liquide a senteça em foro diverso da ação condenatória,
assim se afastando da regra geral do CPC e favorecendo o credor, permitindo-lhe liquidar a sentença em
seu domicílio – ver. 101, I, CDC.
Para interesses difusos ou coletivos, a liquidação /execução devem ser no juízo da condenação e
nos mesmos autos, como uma nova fase do processo. Já para os interesses individuai homogêneos, o art.
80
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
98, §2º, I, CDC, faculta que a execução individual seja no foro da condenação ou no foro da liquidação
da sentença, facilitando-se para os lesados individuais dispersos por todo o país.
O art. 2º, L. 9494/97 dispõe que nas ações coletivas propostas por associações, somente os
substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial
do juiz prolator da sentença, e cujos nomes já tenham constado da relação apresentada com a petição
inicial, é que poderão beneficiar-se com a procedência, e , ipso facto, executar a parte que lhes caiba na
sentença coletiva.
No entanto, a jurisprudência se firmou no sentido de restringir essa norma no sentido de que tal
limitação dos efeitos da coisa julgada aos associados somente quando a ação seja proposta
exclusivamente no interesse deles. Ademais, quando o dano tiver características regionais ou nacionais, a
competência do juiz se estenderá a todo o local do dano (93, II, CDC), o que pode abranger até todo o
País.
Porém, em regra, o fundo de que cuida o art. 15 da LACP destina-se apenas a receber receitas
decorrentes de lesòes a interesses indivisíveis. Esse fundo näo receberá: a) indenizaçòes decorrentes de
lesòes a interesses indivìduais diferenciados, em hipótese alguma; b) indenizaçòes decorrentes de
interesses individuals divisíveis (homogêneos), salvo apenas, e somente, num único caso. Esta exceçäo só
ocorre se, decorrido o prazo do art. 100 do CDC, os lesados individuais näo se habilitarem ao processo
coletivo; nessa eventuaîidade, os colegitimados ativos à civil pública ou coletiva promoveräo a
liquidaçäo e a execuçäo coletivas, e, entäo, o produto da indenizaçäo devida reverterá para o fundo (CDC,
art. 100, parágrafo único). Somente nesse caso o fundo poderá receber dinheiro decorrente de
indenizaçòes por danos individuaís homogéneos e, portanto, divisíveis.
Portanto, essa será, consequentemente, a única hipótese em que os lesados individuais podern pedir
levantamento da parte que lhes toca na verba correspondents, depositada no fundo.77 A destinaçäo dessa
verba depositada no fundo - e somente dessa Verba específica - sobrestada enquanto os lesados
individuais tiverem processos individuais de indenizaçäo em andamento, pendentes de decisäo de
segundo grau.
A soluçäo do problema da coisa julgada foi uma das grandes dificuldades para instituir a defesa
coletiva em juízo. De acordo com a teoria clássica, a coisa julgada significa a irnutabilidade do que foi
definitivamente decidido, limitadamente às partes do processo, o que não se coadunaria com a tutela
coletiva.
Para resolver esses problemas atinentes à extensäo subjetiva da imutabilidade dos efeitos da coisa
julgada, adveio a LACP e inspirou-se no modelo que já existia em nosso Direito e era aplicado em
matéria das ações populares. Baseada, pois, no art. 18 da LAP, a redaçäo originária do art. 16 da LACP
previa que a sentenga proferida em ação civil pública faria coisa julgada erga omnes, exceto se a ação
tivesse sido julgada improcedente por falta de provas, caso em que outra poderia ser movida, sob idéntico
fundamento, desde que instruída com nova prova.
Assim, em sua redagäo originária, a LACP mitigou a coisa julgada nas açóes civis públicas e coletivas,
de acordo com o resultado do processo (secundum eventum litis):
a) Em caso de procedência, haverá coisa julgada. Assim, o comando contido na sentença será imutável
erga omnes, ou seja, contra todos. Nem as próprias partes da civil pública originária (colegitimado ativo
versus causador do dano) nem quaisquer outros legitimados ativos, nem quaisquer outras pessoas, tenharn
ou não tomado parte efetiva no processo de conhecimento, - ninguém, enfirn, poderá discutir em juízo,
novamente, a mesma questäo;
b) Em caso de improcedência por qualquer motivo que não a falta de provas, também haverá coisa
julgada. Assirn como na hipótese da letra anterior, o decisum será imutável erga omnes;
c) Em caso, porém, de improcedência por falta de provas, não haverá coisa julgada; outra poderá ser
proposta, com base em nova prova.
A redaçäo originária do art. 16 da LACP sofreu, entretanto, uma alteração trazida pelo art. 2° da Lei n.
9.494/97, com o intuito de restringir o alcance da coisa julgada aos limites territoriais da competência do
juiz prolator. Assim o dispositivo: “A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da
competência territorial do prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por
insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra com idêntico
fundamento, valendo-se de nova prova.”
Na alteraçâo procedida em 1997 ao art. 16 da LACP, o legislador confundiu límites da coisa julgada (a
imutabilidade erga omnes da sentença, ou seja, seus limites subjetivos, atinentes às pessoas atingidas pela
imutabilidade) com competência territorial (que nada tem a ver com a imutabilidade da sentença, dentro
ou fora da competência do juiz prolator, até porque, na ação civil pública, a competëncia sequer é
territorial, e sim funcional).
82
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Além disso, a alteração procedida no art.16 alcançou o sistema do CDC. Porém, é um só o sistema
da LACP e do CDC, em matéria de açòes civis públicas e coletivas, pois ambos os diplomas legais se
interpenetram e se completam, ensejando um todo harmônico (LACP, art. 21, e CDC, art. 90). Pois bem,
de um lado, o CDC estende a competência territorial do juiz prolator a todo o Estado ou a todo o País, em
caso de dano regional ou nacional (art.93, II); de outro lado, o CDC disciplina adequadamente a coisa
julgada na tutela coletiva (art. 103) e seus principios aplicarn-se não só à defesa coletiva do consumidor,
como também à defesa de quaisquer interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, tenham ou
não origem nas relaçôes de Consumo (como os interesses ligados ao meio ambiente, ao patrimônio
cultural, às pessoas portadoras de deficiência etc). Naturalmente, em face dessa conjugação de normas,
restou ineficaz a alteração que o art. 2º da Lei n. 9.494/97 procedeu no art. 16 da LACP.
Portanto, o sistema do CDC sobre coisa julgada é muito mais completo do que o da LACP, näo foi
alterado pela Lei n. 9.494/97, e ainda alcança inteiramente toda e qualquer defesa de interesses difusos,
coletivos e individuais homogêneos. Assim, o sistema do CDC passa a reger a coisa julgada em todos os
processes coletivos, não só aqueles atinentes à defesa do consumidor, como, de maneira integrada, os que
digam respeito à defesa de quaisquer interesses transindividuais.
Enfirn, näo é a imutabilidade erga omnes da coisa julgada que será nacional, regional oulocal. A
imutabilidade da coisa julgada, quando obtida em ação civil pública ou coletiva, sempre alcançará todo o
território nacional enquanto decisão de soberania do Estado; o que poderá ter maior ou menor extensão é
o dano, que, este sim, poderá ser nacional, regional ou apenas local.
De quanto se expôs, o CDC (que tem aplicaçäo subsidiária para qualquer ação civil pública ou
coletiva, e, portanto, se aplica à defesa de qualquer interesse transindividual mesmo que se refira
exclusivamente à defesa dos consumidores), _ o CDC disciplinou de forma mais coerente e integrada o
fenômeno da coisa julgada nas açöes coletivas, fazendo-o de acordo com a natureza do interesse
objetivado.
a) Interesses difusos - a sentença transitada em julgado será imutável erga omnes, exceto se a
improcedência decorrer de falta de provas, caso em que outra poderá ser proposta com nova prova.
Em hipótese alguma a coisa julgada prejudicará interesses individuais, nem mesmo em caso de
improcedência por motivo outro que não a falta de provas.
b) Interesses coletivos - a sentença será imutável ultra partes mas limitadamente ao grupo, categoria ou
classe de lesados, exceto se a improcedência se der por falta de provas, caso em que outra ação poderá ser
proposta com base em nova prova.
Enfirn, no processo coletivo, semelhantemente ao que ocorre no tocante à extensäo das lirninares,
83
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
também para saber a quem a sentença de procedência beneficiará, é necessário levar em conta não a
competência territorial do juiz que a proferiu, e sim a natureza do pedido e a extensäo em que foi
acolhido.
Apesar de erga omnes e ultra partes serem expressöes que, isoladamente consideradas, não se
distinguiriam (pois ambas significam que a imutabilidade da sentença ultrapassa as partes do processo), o
legislador tratou de forma diversa seus efeitos. Ao estipular as regras que informam uma e outra das
hipóteses (art. 105, I a III, do CDC), olegislador mostrou que quis efetivamente diferenciá-las: com coisa
julgada erga omnes, quis alcançar imutabilidade do decisum em relação a todo o grupo social, e com
coisa julgada ultra partes, quis alcançar, sim, também mais do que as meras partes da ação coletiva, mas
menos do que todo o grupo social, porque agora limitou a imutabilidade ao grupo, classe ou categoria de
pessoas atingidas. A propósito, basta comparar a redaçäo dos incs. I e II do art. 103 do CDC.
Na ação civil pública ou coletiva, estäo em jogo interesses transindividuais de pessoas substituídas
processualrnente no polo ativo por um legitimado de oficio. Assim, apenas e somente se essas ações
forem julgadas procedentes é que a ímutabilidade do decisum poderá ultrapassar as partes formais para
beneficiar (e para prejudicar) toda a categoria, classe ou grupo de lesados. O fundamento da
improcedência só importa para aferir se outra ação civil pública ou coletiva poderá ou näo ser ajuizada
(assim, apenas no caso de improcedência por falta de provas é que outra poderá ser proposta). Mas,
quanto aos lesados individuais, pouco importa o fundamento da improcedência; esta jamais prejudicará
aos lesados individuais, exceção feita aos lesados individuais que tenham intervindo no processo coletivo
como assistentes litisconsorciais do autor. Assirn, mesmo que a sentença proferida no processo coletivo
afirme a inocorrência do evento danoso, ou reconheça autoria diversa para os fatos, não se impedirá aos
lesados que ajuízern ações individuais contra quem bern entendam, salvo se tiverem intervindo na
coletiva, caso em que ficariam vinculados ao decisum. Não fosse assim, os lesados individuais veriam
formar-se contra eles a coisa julgada, sem que tivessem tido acesso à jurisdiçäo.
Em suma, o alcance da imutabilidade da coisa julgada obtida nas ações civis públicas ou coletivas deve
ser aferido segundo o resultado da ação (secundum eventum litis):
b) Pedido julgado improcedente _ no processo coletivo, a improcedência por falta de provas não gera
imutabilidade do decisum, pois nova ação poderá ser proposta por qualquer legitimado ativo, se fundada
em nova prova (coisa julgada secundum eventum probationis). A improcedência por qualquer motivo que
não a falta de provas terá, conforme o caso, eficácia erga omnes ou ultra partes, a impedir o ajuizamento
de outro processo coletivo com o mesmo objeto (segundo o sistema do CDC, a imutabilidade será ultra
partes, quando a sentença deva se estender ao grupo, classe ou categoria de lesados determináveis,
reunidos de maneira indivisível pela mesma relação jurídica básica; será erga omnes nos demais casos).
Entretanto, se o objeto da ação coletiva consistir na defesa de interesses coletivos, em sentido estrito, ou
84
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
de interesses individuais homogêneos, a improcedência, por qualquer fundamento que seja (insuficiência
de provas ou näo), jamais impedirá a propositura de ações individuais, salvo para os lesados que tenham
comparecido à coletiva como assistentes 1itisconsorciais do autor.
a) a coisa julgada será erga omnes, na ação civil pública ou coletiva, que verse interesses difusos,
quando julgada procedente;
b) a coisa julgada será erga omnes, na ação civil pública ou coletiva que verse interesses difusos, caso
a improcedência se funde em qualquer motivo que não seja a falta de provas;
c) näo haverá coísa julgada material na ação civil pública ou coletiva que verse interesses difusos, se a
improcedência for por falta de provas;
d) a coisa julgada será ultra partes, mas limitadamente ao grupo, classe ou categoria de lesados, na
ação civil pública ou coletiva que verse interesses coletivos, quando julgada procedente;
e) a coisa julgada será ultra partes, mas Iimitadamente ao grupo, classe ou categoria de lesados, na
açãocivil pública ou coletiva que verse interesses coletivos, caso a improcedência se funde em qualquer
motivo que näo seja a falta de provas;
f) não haverá coisa julgada material, na ação civil pública que verse interesses coletivos, se a
improcedência for por falta de provas, salvo para os lesados individuais que intervieram na ação coletiva;
g) a coisa julgada será erga omnes, na ação civil pública ou coletiva que verse interesses individuais
homogêneos, se for julgada procedente, e, nesse caso, benefìciará vítimas e sucessores;
h) não haverá coisa julgada material, na ação civil pública ou coletiva que verse interesses individuais
homogêneos, caso venha a ser julgada improcedente por qualquer motivo, salvo para os lesados
individuais que intervieram na ação coletiva.
1. As custas processuais
Afastando a regra do artigo 33 do CPC, a LACP diz que não haverá adiantamento de custas e despesas
processuais o que, pela mens legis, deverá ser interpretado apenas para o autor, pois o réu deverá sim adiantar
custas e despesas.
1.Generalidades
Provas são os meios pelos quais as partes se utilizam para comprovar os elementos fáticos aduzidos em suas
alegações, geralmente sendo produzidos na audiência de instrução.
Pode ser utilizada prova digitalizada? Sim, nos termos do art. 11 da Lei 11419/06, é possível a utilização do
meio eletrônico, sob responsabilidade de seu signatário.
E quanto à prova emprestada? Sim, desde que não se constitua como a prova única, e que seja dado à parte
contra a qual se produza a prova o direito ao contraditório. Inclusive a prova decorrente de escuta telefônica poderá
ser usada.
2. O ônus da prova
Em regra, caberá ao autor provar os fatos constitutivos de seu direito e ao réu a prova dos fatos impeditivos,
modificativos e extintivos do direito do autor.
Entretanto, o CDC facilita a defesa dos direitos do consumidor e estabelece a possibilidade da inversão deste
ônus. Ao autorizar a inversão do ônus da prova o legislador não quer alcançar apenas o consumidor individual,
mas, com mais razão ainda, o consumidor coletivo, razão pela qual os seus substitutos processuais poderão se
utilizar deste benefício.
Devemos saber que a inversão não é discricionária, devendo ser avaliada no caso concreto, sabendo que poderá
ser decretada em caso de hipossuficiência ou de verossimilhança das alegações, utilizando-se, para tanto, das regras
ordinárias de experiência.
Não são apenas fatores de ordem econômica que justificam tal inversão, mas também questões de ordem
prática, eis que em muitas das ocasiões será o fornecedor aquele apto a produzir provas de índole técnica.
Qual o momento adequado para a inversão do ônus da prova? Deverá ser o momento da produção da prova, e
não o momento da sentença. Normalmente o juiz o fará no momento do saneamento. Tal medida é a mais
adequada, pois caso contrário as partes seriam surpreendidas no momento da sentença, não havendo como a parte
onerada se desincumba deste ônus.
Se, entretanto, somente após a conclusão dos autos o magistrado entende pela regra da inversão, deverá
converter o julgamento em diligência.
A inversão da prova se dará apenas no Direito do Consumidor? Ora, devemos tomar as regras do CDC e da
LACP como um estatuto único, podendo então ser aplicada a quaisquer interesses metaindividuais.
3. As dificuldades na avaliação
São muitas as dificuldades da prova em matéria de direitos individuais, sobretudo se tomarmos as defesas de
interesses difusos. Além das dificuldades naturais, enfrentam-se dificuldades financeiras.
Assim, como estamos diante de situações em que não há adiantamento de custas, e a prova às vezes cabe ao ente
autor (nas situações em que não há inversão), devemos saber que o custeio da prova caberá ao Estado, não sendo
justo deixar o perito arcar do próprio bolso.
Registre-se que a súmula 232 do STJ “A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do
depósito prévio dos honorários do perito.” Aplica-se não somente à Fazenda como parte, mas também à Fazenda
quando seus órgãos despersonalizados ajuízam ações coletivas – como o MP.
87
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Predomina na jurisprudência que o Estado deverá arcar com tais adiantamentos, assim como o MP, situação esta
que não merece ser acolhida, tendo em vista que o MP é órgão do Estado.
Sendo público o órgão a que se requisita a perícia (universidades, etc.) a questão se resolve. Se for privada a
instituição teremos problemas, eis que a falta de recursos e o tempo da demanda dificultarão a perícia particular.
Assim, cabe à Fazenda adiantar as custas, se necessário.
Se o ônus da prova for invertido, caberá ao réu adiantar tais custas.
4. O papel da perícia
Não existem critérios para avaliar os danos causados a interesses metaindividuais, devendo sempre prezarmos
por uma reparação in natura, ou seja, buscando a restituição integral.
Caso contrário, sendo impossível tal reparo, que seja então indenizado o interesse lesado com a quantia
respectiva indo a um fundo de direitos difusos.
Também será útil a precisão da perícia no que tange à análise da responsabilidade dos réus, não só no que tange
à real extensão dos danos, mas também à prova do nexo causal correspondente a cada réu.
Os membros do MP serão responsabilizados pessoalmente quando ajam fora das próprias atribuições. Nos casos
de dolo ou fraude, a responsabilidade poderá envolver aspectos penais, civis e funcionais. No caso de culpa a
responsabilidade será apenas funcional.
A DEFESA DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
1. O PRINCÍPIO DA IGUALDADE
Embora não seja nova a preocupação é relativamente recente a melhor conscientização, cujo motivo inicial está
ligado à reabilitação de pessoas que a última grande guerra tornara deficiente – Assembleia da ONU aprovou
Declaração dos Direitos das Pessoas com Retardo mental em 1971, a seguir em 1975 editou a Declaração dos
Direitos das Pessoas Deficientes.
Em 1983 a OIT proclamou sua Convenção 159 visando a reabilitação profissional do deficiente para integrar ou
reintegrar ele na sociedade.
Em 2006 a ONU adotou por consenso a primeira Convenção Relativa aos Direitos da Pessoa com Deficiência.
Segundo seu artigo 1º seu objeto consiste em promover, proteger e assegurar o exercício pleno e equitativo de todos
os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua
dignidade inerente. No artigo 2º dispõe discriminação por motivo de deficiência significa qualquer diferenciação,
exclusão ou restrição baseada em deficiência, com propósito ou efeito de impedir ou impossibilitar o
reconhecimento, o desfrute ou o exercício, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, de todos os
91
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
direitos humanos e liberdades fundamentais nos âmbitos político, econômico, social, cultural, civil ou qualquer
outro. Abrange todas as formas de discriminação, inclusive a recusa de adaptação razoável.
O conceito de deficiência por força da integração do tratado internacional ao nosso direito é o constante do
artigo 1º da referida convenção, segundo o qual pessoas com deficiência são aquelas que tem impedimentos de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras,
podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
A partir da CF/88 houve maior desenvolvimento e preocupação com o tema. Em seu artigo 7º, XXXI assegurou
como direito social a proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do
trabalhador portador de deficiência. Nos artigos 23, II, e 24, XIV, estipulou como competência comum cuidar da
saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência. No artigo 37, VIII, impôs
que a lei reservasse percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas com deficiência. Ao cuidar da
assistência social, garantiu um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência que comprove não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida pela família. Entre outros mandamentos.
Dando cumprimento a esses mandamentos, diversas leis sobrevieram: a) Lei 7.853/89 disciplinou a proteção das
pessoas portadoras de deficiência e sua integração social; b) o Estatuto dos Servidores da União regulamentou
percentual de cargos para deficientes; c) Lei 8899/94 dispôs sobre o transporte da pessoa com deficiência; d) Lei
10.098/00 trouxe critérios básicos para promoção da acessibilidade, entre outras.
Tem sido o escopo da lei compensar a situação de quem sofra limitação, de qualquer natureza, conferindo-lhe
maior proteção jurídica.
O verdadeiro princípio da isonomia consistiria em conceder mais tempo, num concurso, ao candidato que
tivesse problema motor, justamente para igualá-lo aos demais.
O correto é verificar se há justificativa racional, isto é, fundamento lógico, para, à vista do traço desigualador
escolhido, conferir o específico tratamento jurídico construído em função da desigualdade proclamada. Caso
contrário, invocando, sem maior critério a fórmula da chamada “discriminação positiva”, poderemos estar
cometendo uma distorção igualmente gratuita e indevida.
2. A DEFESA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
Coube a lei 7.853/89 disciplinar a proteção e a integração social das pessoas portadoras de deficiência. Pela
primeira vez a lei aludiu expressamente à atuação do Ministério Público nessa área.
Na verdade, o MP não atua apenas em ações que versem interesses individuais homogêneos, coletivos ou
difusos relacionados com a proteção das pessoas portadoras de deficiência. Seu papel interventivo ocorrerá em
qualquer ação em que seja parte uma pessoa nessas condições, que se trate de limitação física ou mental, posto não
se verifique incapacidade para os fins do CC, desde que o objeto dessa ação esteja relacionado com a dita
deficiência. Exemplos: ação indenizatória promovida por pessoa que sofra de acentuada deficiência e cujo objeto
seja a reparação decorrente do acidente que lhe causou tal limitação, deverá estar ela assistida pelo MP; com maiz
razão estará o MP presente nas ACP relacionad as pessoas com deficiência.
TJ/SP entendeu que só a qualidade da parte não é suficiente para ensejar atuação do MP no processo. Contudo,
quando essa mesma pessoa litige sobre matéria a respeito de sua condição, e, mais ainda, que interesse a toda
categoria de deficientes – como eliminação de barreiras arquitetônicas para seu acesso ao transporte público –
existirá interesse público evidenciado pela qualidade da parte e pela natureza da lide, a ensejar intervenção
ministerial, até porque a solução daquela ação normalmente não dirá respeito apenas ao interesse de um único
indivíduo, mas de toda a coletividade.
Deve ainda o MP zelar para que os Poderes Públicos e os serviços de relevância pública observem os direitos e
princípios constitucionais de proteção aos deficientes, como acesso a edifícios públicos.
Em ACP que verse sobre os interesses discutidos, havendo carência ou improcedência, impõe-se o obrigatório
duplo grau de jurisdição.
3. A QUESTÃO TERMINOLÓGICA
3. A questão terminológica
A legislação, a jurisprudência e a doutrina têm usado diversas formas para se referir às pessoas em condição
deficitária. Mais recentemente, o emprego da expressão pessoa portadora de deficiência passou a substituir o
emprego de deficiente, para dar enfoque à condição de pessoa deste. É a expressão escolhida pela CF vigente.
A seguir a convenção detém-se sobre os direitos e garantias das pessoas com deficiência, e
sobre os deveres do Estado e das pessoas em geral em relação às primeiras.
93
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
No Brasil as principais regras sobre pessoas com deficiência foram estabelecidas pela Lei 7.853/89,
regulamentada pelo Decreto 3.298/99. As diretrizes da política nacional para integração das PPD (pessoas
portadoras de deficiência) estão no art. 6º do Decreto 3.298/99. Os objetivos no art. 7º. No tocante à equiparação de
oportunidades em favor PPD o legislador assegurou-lhes acesso à saúde, educação, habilitação ou reabilitação
profissional, ao trabalho à cultura, ao desporto, ao turismo e lazer.
5. A acessibilidade em geral
Essa questão está disposta no art. 9º da Convenção Internacional sobre os direitos da PPD (Dec.
6949/09) número 1 (alíneas “a” e “b”) e 2 (alíneas “a” a “h”).
Entre nós, a Lei n.º 10.098/00 estabeleceu normas gerais e critérios básicos para a promoção de
acessibilidade considerando-a como: a possibilidade e a condição de alcance para utilização com segurança e
autonomia, dos espaços, mobiliários urbanos, edificações, transportes e sistemas e meios de comunicação por
PPD (art. 2º). Referida lei classificou os entraves (obstáculos) à mobilidade em barreiras: arquitetônicas
urbanísticas (existentes em espaços públicos); barreiras arquitetônicas na edificação (interior de edifícios);
barreiras nos transportes; barreiras na comunicações (art. 2º, inciso II).
A Lei n.º 10.098/00 estabeleceu também regras para o projeto, construção e implantação nas cidades. Para
seu conhecimento recomenda-se a leitura dos artigos 3º, 4º, 5º, 6º ,7º (caput e p.único), 11, 12, 13, 16, 17, todos da
referida lei.
Além disso, as organizações representativas de pessoas com deficiência receberam da Lei n.º 10.098/00
legitimidade para acompanhar o cumprimento dos requisitos de acessibilidade por ela estabelecidos (art. 26). Sua
legitimidade para agir em juízo na defesa do grupo advém da LACP art. 5º e CF ar. 5º, XXI.
6. O mercado de trabalho
Questão que tem causado muitas controvérsias diz respeito ás normas que dispõe sobre o acesso
das PPD ao mercado de trabalho.
Como vimos, nas últimas décadas, houve sensível evolução do tratamento jurídico conferido às
pessoas com deficiência. A CF/88 trouxe normas protetivas e garantidas de sua integração, como na acessibilidade
a edifícios e transportes. E a Lei 7853/89 disciplinou sua proteção e integração social. Quanto ao acesso ao
mercado de trabalho a CF vedou qualquer forma de discriminação nos salários e critérios de admissão dos
trabalhadores portadores de deficiência, bem como exigiu lhes fosse reservado percentual dos cargos e empregos
públicos (CF, art. 7º, XXI e 37 VIII).
O Estatuto dos Servidores Públicos Federais assegurou-lhes o percentual de 20% (Lei 8112/90, art.
5º,§ 2º, cuja eficácia é plena). No Estado de São Paulo esse percentual é de 5% (LC Paulista n.º 683/92). Em MG é
de 10%.
Os editais de concursos públicos devem consignar a reserva de cargos para as PPD. Eles
concorrerão em igualdade de condições com os demais, no que diz respeito ao conteúdo e à avaliação das provas.
Após o julgamento das provas, haverá duas listas: a geral, com a relação de todos os candidatos aprovados, e a
especial, com a relação dos deficientes aprovados, fazendo-se a nomeações alternadas, até que alcance o percentual
exigido pela lei (RMS nº 18.669/RJ, STJ, julgado em 7.10.94).
Para que se dê efetividade ao mandamento constitucional, os candidatos portadores de deficiência
aprovados, ainda que com médias inferiores aos demais, devem estar inseridos no número total de vagas existentes,
observada a proporção exigida em lei (STJ, MS 11983/DF, 3ª seção, j. 12.12.97 – info. 342).
A reserva de vagas, contudo, não afasta a necessidade de aprovação no concurso, devendo ser
compatíveis com a deficiência as atribuições a serem desempenhadas. Ela não afasta a exigência de aprovação em
etapa do concurso público em que se avalia a capacitação física do candidato. Naturalmente, à guisa de exemplo,
um candidato a motorista de ambulância de uma prefeitura não pode ser cego.
Segundo MAZZILLI, há uma regra implícita para a admissão de PPD aos cargos e empregos, ou
seja, é necessário que a deficiência não impeça o exercício da função ou do cargo pretendido (tanto que a
Convenção 159 da Organização Internacional do Trabalho – OIT refere-se a “emprego adequado”) e a Lei 8213/91
em seu artigo 93 exige que a pessoa portadora de deficiência esteja habilitada para o trabalho pretendido. Caso
contrário feriria o princípio implícito da razoabilidade.
A exigência de admissão das PPD não fica restrita ao serviço público, sendo também exigida de empresas
privadas um percentual de trabalhadores reabilitados ou de pessoas portadores de deficiência, desde que
habilitadas. A Lei 8213/91 exige que na iniciativa privada haja: entre 2 e 5% de PPD nas empresas com mais de
100 empregados (2% para empesas de 100 a 200; 3% de 201 a 500; 4% de 501 a 1000; 5% para as que excedam a
1.0000 empregados).
94
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
O autor critica muito a proposta de criação da chamada contribuição de cidadania para as empresas que,
não querendo manter o percentual pagariam um valor a um fundo e, assim, ficaram dispensadas de contratar PPD.
Ou seja, pagariam uma taxa para terem o direito de discriminar!
Para Mazzilli, o papel da sociedade vai além de apenas constatar ou lastimar a situaçãoo de deficiência; há
um dever social de obrigaçãoo positiva, qual seja, de buscar vencer, suplementar, atenuar ou, até, em último caso
conviver condignamente com a deficiência.
2. A prescrição e a decadência
Decadência – em caso de procedência da ação civil pública, os credores terão o prazo de 2 anos para se
habilitarem ao recebimento do que lhes é devido, contados da data da publicação do edital a que alude ao art. 2º da
Lei 7913/89, caso contrário os valores serão revertidos e recolhidos ao fundo mencionado no art. 13 da Lei
7347/85.
95
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Prescrição – o prazo supracitado em nada se confunde como prazo para o credor ou seu substituto processual
ajuizarem a ação individual ou coletiva de ressarcimento, pois aqui, sim, se trata de prazo prescricional. E qual
seria esse prazo? A lei é omissa a respeito e reporta subsidiariamente ao sistema da lei 7.347/85, que também não
diz nada sobre prescrição. Assim, a jurisprudência do STJ, nesses casos, tem recomendado a aplicação analógica do
prazo de 5 anos previsto no art. 21 da Lei 4.717/65.
Regem-se pela Lei 7.347/85, doravante LACP, as ações civis públicas por danos materiais e morais causados
por infração da ordem econômica e economia popular.
No conceito de prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica, está compreendida a defesa da
liberdade de iniciativa, da livre concorrência, da função social da propriedade, assim como a defesa dos
consumidores e a repressão ao abuso do poder econômico.
De acordo com a Lei 8.884/94, que considera a coletividade como titular dos bens jurídicos protegidos por essa
Lei, o combate à ordem econômica orienta-se pelos ditames constitucionais (liberdade de iniciativa, livre
concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico).
Ao dispor sobre infrações à ordem econômica, a Lei 8.884/94 estabeleceu as seguintes regras de
responsabilidade:
Art. 15. Esta lei aplica-se às pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado, bem como a quaisquer
associações de entidades ou pessoas, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente, com ou sem
personalidade jurídica, mesmo que exerçam atividade sob regime de monopólio legal.
Art. 16. As diversas formas de infração da ordem econômica implicam a responsabilidade da empresa e a
responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores, solidariamente.
Art. 17. Serão solidariamente responsáveis as empresas ou entidades integrantes de grupo econômico, de fato ou
de direito, que praticarem infração da ordem econômica.
Art. 18. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada
quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos
estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de
insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
O art. 20 da Lei 8.884/94 traz as infrações administrativas; o art. 21 traz as hipóteses de infração à ordem
econômica.
As infrações administrativas à ordem econômica serão apuradas por meio de processo administrativo julgado
pelo CADE, podendo ser impostas as penalidades descritas nos arts. 23, 24 e 25 da Lei 8.884/94.
A prescrição será regulada pela Lei 9.873/99, em cinco anos contados da prática do fato ou, no caso de infração
permanente do dia em que cessar.
HIPÓTESE DE AÇÕES CIVIS PÚBLICAS
Caberá ao MPF propor ACP e executar os julgados, de acordo com o disposto nos art. 12 e 53 da Lei 8.884/94.
Ao executar os compromissos efetuados pelo CADE e executar o julgados do CADE o MPF agirá sob
requerimento deste, ao passo que para propor ACPs em defesa da ordem econômica e financeira agirá de forma
autônoma.
Na respectiva área de atribuição, os MPs dos Estados ou da União poderão propor ACPs destinadas não só a
impedir a prática de infrações à ordem econômica, como também a obter o reconhecimento da responsabilidade
civil por danos morais ou patrimoniais daí decorrentes.
97
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Emerson Carlos Cittolin dos Santos
Resumo do livro A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, 25 ed.
O ordenamento jurídico confere ao MP e aos demais colegitimados a ação civil pública para a defesa dos
interesses transindividuais ligados à proteção das minorias.
Mais especificamente no tocante ao MP, para desincumbir suas potencialidades, tem ele os seguintes
meios ou instrumentos: a) a ação penal, para responsabilizar todos que, ao violarem as regras democráticas,
também cometam ações penalmente típicas; b) a ação de inconstitucionalidade e a representação interventiva,
para assegurar a prevalência do princípios democráticos; c) o inquérito civil e a correspondente ação civil pública
106
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
especialmente para cobrar o zelo pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública
aos direitos assegurados na CF, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; d) o controle externo da
atividade policial, para assegurar não só o cumprimento dos seus deveres de zelo pela ordem jurídica, como ainda
e principalmente para coibir os abusos contra as liberdades individuais e sociais e, sobretudo para evitar que só
cheguem à Justiça os casos que a polícia ou os governantes queiram; e) o zelo cidadão o pelos direitos
constitucionais do cidadão, podendo ouvir representantes da sociedade civil, promover audiências públicas e
expedir recomendações; f) a defesa de minorias (como as vítimas de preconceitos, as pessoas portadoras de
deficiência, os idosos, os índios, as crianças e adolescentes); g) a visita aos preso, que hoje se amontoam em
cadeias e presídios em condições sub-humanas, para as quais fecham os olhos, o Estado e a sociedade; h) o
combate à inércia governamental em questões como mortalidade infantil, falta de ensino básico, falta de
atendimento de saúde, defesa do meio ambiente e do consumidor, entre outras prioridades.
Um dos instrumentos mais poderosos para o desempenho das novas funções ministeriais é, pois, o
processo coletivo, que deve ser usado com o fim de resgatar uma grande parcela da população, totalmente
marginalizada dos benefícios sociais.
Anotou Marcelo Pedroso Goulart: “(...). Num primeiro momento, esse uso democrático do direito
significaria: a) fazer cumprir as leis que já existem e não têm eficácia social, pois tutelam interesses dos grupos
sociais marginalizados; b) encontrar nos princípios constitucionais os critérios das opções interpretativas, uma vez
que temos uma Constituição democrática que convive com uma legislação infraconstitucional arcaica; e, c)
explorar as contradições e as ambiguidades do direito positivo.”
É certo que esse tipo de atuação do MP tem caráter político, pois diz respeito à interferência no modo de
conduzir os assuntos de interesse do Estado e dos cidadãos, a qual se faz por meio do uso do processo como
instrumento político de participação.; não caráter político-partidário, pois isto seria vedado à própria instituição e a
seus agentes.
Nesse sentido anotou Calmon de Passos: “(...). Não se cuida de retirar do processo sua feição de garantia
constitucional, sim fazê-lo ultrapassar os limites da tutela dos direitos individuais, como hoje conceituados. (...).
Despe-se o processo de sua condição de meio para realização de direitos já formulados e transforma-se ele em
instrumento de formulação e realização dos direitos. Misto de atividade criadora e aplicadora do direito, ao mesmo
tempo.”
Observam, a propósito, Antônio Augusto Camargo Ferraz e João Lopes Guimarães Jr. que o MP alcança
sua atuação política por meio da propositura das ações civis e penais a seu cargo, de forma que, “(...) o exercício
dessa função política será mais profundo à medida que interferir mais efetiva e intensamente na realidade
brasileira. E, embora na defesa da sociedade a instituição atue em áreas de interesse da população em geral,
parece claro que sua ação deva atingir, sobretudo, os interesses das parcelas excluídas do acesso à Justiça, em
causas que propiciem melhoria na qualidade de vida desse contingente mais desassistido. A assunção dessa
função social impõe a responsabilidade de provocar a aplicação da lei na perspectiva mais direta de atenuar os
efeitos das desigualdades sociais. Só teremos democracia e cidadania plenas quando a injustiça social for
eliminada com todas as suas consequências (analfabetismo, moralidade infantil, criminalidade urbana etc.)”,
Enfim, a defesa das minorias é um campo onde o MP ainda não desenvolveu todo o seu potencial.
107
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
CAPÍTULO 50
DEFESA DAS MULHERES
SUMÁRIO: 1. Generalidades. 2. O princípio da igualdade. 3. A defesa de interesses transindividuais.
1. Generalidades
Desde as sociedades primitivas e até os dias de hoje os homens usam da força não apenas para se
defender. Explicações históricas para a desigualdade concreta existente entre eles e as mulheres não faltam. Veja-
se que, enquanto o concubinato do homem casado era tolerado, o adultério da mulher era tratado com exagero
rigor; o homem era o chefe da sociedade conjugal e a mulher era relativamente incapaz e lhe devia obediência;
quanto aos direitos políticos, a mulher não podia votar; no tocante ao acesso ao trabalho e aos cargos mais
elevados ou mais bem remunerados, ainda hoje persiste forte discriminação contra a mulher.
Não bastasse toda essa discriminação social, ainda temos o grave problema da violência física contra a
mulher, especialmente aquela conhecida como violência doméstica, ou seja, a agressão praticada pelos seus
parceiros (marido, companheiro, amante, namorado etc).
2. O princípio da igualdade
Nossa Constituição inclui entre os objetivos fundamentais da República “promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, assegurando que “os
homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos da Constituição”.
Naturalmente, essa igualdade não é nem pode ser absoluta, porque, naqueles pontos em que homens e
mulheres são naturalmente diferentes, a lei tem de levar em conta as diferenças (como os aspectos decorrentes
da maternidade).
Em tudo o mais que independa da natural diferença dos sexos, qualquer forma de discriminação entre
homens e mulheres é indevida.
Em razão dos abusos que muitas vezes são impostos à mulher, dada a condição física superior que o
homem normalmente ostenta em relação a ela, a lei tem tido preocupação especial em sua proteção,
especialmente no campo da violência doméstica. Nesse escopo, foi editada a Lei n. 11.340/06, que cria
mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, entre os quais: a)a criação de Juizados
de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (art. 14); b) penas mais rigorosas para aqueles que cometam
violência doméstica e familiar contra a mulher (arts. 17 e 43); c) medidas judiciais de urgência a favor da mulher e
contra o agressor (arts. 18 a 24 e 42).
A Lei n. 11.340/06 foi confessadamente editada “nos termos do parágrafo 8º do art. 206 da CF”.
Entretanto, esse parágrafo na verdade dispõe, de forma correta, que “o Estado assegurará a assistência à família
na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas
relações”. Isto é, o dispositivo não distingue.
O verdadeiro princípio da igualdade exige que, em tese, todas as formas de violência doméstica sejam
tratadas de maneira igual.
108
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Ao proteger mais intensamente a mulher, a lei está dando exequibilidade a tratados internacionais que
obrigam o Brasil a essa preocupação tuitiva. Na verdade, tanto a CF como os tratados internacionais exigem, com
razão, que se defenda a mulher, mas não que não se defenda o homem que esteja em condições de necessitar de
igual proteção. Como diz Tercio Sampaio Ferraz Júnior, “uma lei cuja norma discipline a conduta de uma entidade
individualizada, ignorando outras que se achem na mesma situação, cria um privilégio, que contraria o preceito
constitucional de que todos devem ser iguais perante a lei”.
Segundo o caput do art. 37 da Lei n. 11.340/06, “a defesa dos interesses e direitos transindividuais
previstos nesta Lei poderá ser exercida, concorrentemente, pelo MP e por associação de atuação na área,
regularmente constituída há pelo menos um ano, nos termos da lei civil”. Seu parágrafo único acrescenta que “o
requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz quando entender que não há outra entidade com
representatividade adequada para o ajuizamento da demanda coletiva”.
Tal dispensa/possibilidade, também existe para as ações civis públicas com outros objetos; o fundamento,
porém, é diferente: nestas se exige manifesto interesse social, evidenciado pela dimensão ou característica do
dano ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.
Embora a Lei 11.340 só mencione, como legitimados ativos, o MP e as associações, à vista da perquirição
da mens legis não vemos porque não admitir concorrentemente a possibilidade de as pessoas jurídicas de Direito
Público e os órgãos públicos defenderem os interesses transindividuais das mulheres. Essa possibilidade decorre
da legitimação genérica concedida ao Estado e aos órgãos públicos em matéria de processo coletivo, que decorre
do sistema da LACP combinada com o CDC.
O art. 33 da Lei n. 11.340/06 dispõe que, “ enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica
e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar
as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do
Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente”. Seu parágrafo único diz que “será garantido
o direito de preferência, nas varas criminais, para o processo e o julgamento das causas referidas no caput”.
A criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher seria facultativa (art. 14), e, se
instituídos, seriam órgãos da Justiça ordinária com experiência civil e criminal, para o processo, o julgamento e a
execução das causas decorrentes da prática d violência doméstica e familiar contra a mulher.
Contudo, será que essa regra faz incluir as ações civis públicas para a proteção da mulher? Cremos que
não, pois os processos coletivos não se prestam às regras simplificadas dos juizados especiais (v. Cap. 12, n. 2).
Sem dúvida, poderia a lei instituir varas especiais para o julgamento de qualquer tipo de violência
doméstica, mas não apenas para julgar a violência “contra a mulher”. Também a violência doméstica praticada
pela mulher contra a mulher (a mãe contra a filha, ou a filha contra a mãe), ou pela mulher contra o homem (a mãe
contra o filho, a filha contra o pai, a mulher contra o marido) – todas elas, sob o aspecto jurídico, merecem em
tese, a mesma resposta legal.
Pelo que já se expôs, normas como essa padecem do vício da inconstitucionalidade. E ainda que assim
não fosse, a norma somente visaria às ações civis públicas “decorrentes da prática da violência doméstica e
familiar contra a mulher”. Fora da abrangência da norma estariam as ações para proteger as mulheres nos seus
direitos como ser humano, como para proibir uma propaganda discriminatória contra elas, para garantir sua
109
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
acessibilidade a empregos ou uma remuneração paritária à dos homens nas mesmas funções e com as mesmas
responsabilidades, para defendê-las como consumidoras efetivas ou potenciais etc. todas essas ações civis
públicas devem ser propostas perante a Justiça cível, seguindo as regras normais de competência, de acordo com
a legislação específica.
CAPÍTULO 51
DEFESA DOS CONTRIBUINTES
1. Generalidades
Tributos são prestações pecuniárias compulsórias (aqui excluídas as sanções por ato ilícito), instituídas
por lei, devidas em razão de um fato gerador, e cobradas por meio de atividade administrativa vinculada, dividindo-
se em impostos, taxas e contribuições de melhoria.
Sujeito passivo da obrigação tributária é a pessoa obrigada ao pagamento do tributo. O sujeito passivo da
obrigação principal é considerado contribuinte quando tenha relação pessoal e direta com a constituição do fato
gerador tributário. São contribuintes as pessoas físicas ou jurídicas em qualquer situação de sujeição passiva
tributária, inclusive a responsabilidade, a substituição, a solidariedade ou a sucessão tributária.
O poder impositivo tributário do Estado sujeita-se a limites legais e éticos. Assim, a tributação justa não
pode ter o caráter de confisco, devendo atender aos princípios da isonomia, da capacidade contributiva, da
equitativa distribuição da carga tributária, da generalidade e da progressividade.
Para combater os abusos no poder de tributar, a CF garante tanto o acesso individual como coletivo à
jurisdição, pois a norma do art. 5º, XXXV, é ao mesmo tempo garantia individual e coletiva. Entretanto, apesar
disso, passaram a entender alguns que as lesões a contribuintes não poderiam ser investigadas por inquérito civil
nem ser objeto de ação civil pública ou coletiva, por não envolverem questões de consumidores, como se, após a
110
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
integração da LACP e do CDC, já não tivesse ficado claro que o sistema de tutela coletiva abrange a defesa de
quaisquer interesses transindividuais, e não apenas aqueles ligados à relação de consumo...
No máximo, a Corte mais alta tem conseguido admitir que o MP poderia valer-se da ação civil pública
para questionar tarifas, não tributos. Ou então, poderia propor ação civil pública para discutir matéria tributaria,
desde que em favor do fisco, e não dos sujeitos passivos da obrigação tributária...
Ainda na linha indevidamente restritiva, afirmou-se alhures que a defesa de interesses transindividuais de
contribuintes não se inseriria nem na categoria de interesses difusos, nem coletivos, nem individuais homogêneos.
Assim, no acórdão proferido pelo STF, quando do julgamento do RE n. 195.056-PR, essa questão foi discutida,
tendo-se chegado a esta conclusão majoritária, mas concessa vênia equivocada, de que “o MP não tem
legitimidade ativa para propor ação civil pública que verse sobre tributos”, exceto quando se trate de tarifas e os
beneficiários sejam equiparados a consumidores. Mais surpreendente, ainda, foi essa mesma Corte ter afirmado,
também de forma majoritária, em outro julgamento do plenário, que o MP só poderia defender interesses difusos,
mas não aqueles “de grupo ou classe de pessoas, sujeitos passivos de uma exigência tributária cuja impugnação,
por si só, só pode ser promovida por eles próprios, de forma individual ou coletiva”...
É certo que não se pode usar a ação civil pública ou coletiva como indevido sucedâneo das ações diretas
para controle abstrato e concentrado de constitucionalidade – e essa questão já foi discutida no cap. 6, n.8. mas
se a ação civil pública ou coletiva não estiverem a usurpar papel que não lhes é próprio, nada deve impedir sejam
usadas para a defesa coletiva de quaisquer interesses transindividuais, mesmo que de natureza tributária ou de
qualquer outra. Assim, p. ex., não se deve impedir, em tese, que uma associação civil de funcionários ajuíze ação
civil pública destinada a obter o cancelamento de lançamentos de um imposto sobre seus associados, se esse
tributo tiver sido fixado de forma inconstitucional. Note-se que, nesse caso, a tutela coletiva não visaria a obter a
ineficácia total e erga omnes da lei (o que não seria mesmo lícito pedir em ação civil pública), mas sim a obter o
cancelamento de lançamentos concretos, e apenas para seus associados.
Não obstante a clara dicção constitucional que assegura a tutela coletiva como direito fundamental, e
caberá nos direitos coletivos latu sensu, o governo federal, abusando das medidas provisórias, busca evitar ou
impedir o acesso coletivo à jurisdição, em matérias onde ficaria em xeque o interesse público secundário. Assim, o
Presidente da República editou medida provisória, segundo a qual “não será cabível ação civil pública para
veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o FGTS ou outros fundos de natureza
institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados”...
Ou seja, é como se o governante dissesse: como a CF e as leis instituíram um sistema para a defesa
coletiva de direitos, e como esse sistema pode ser usado contra o governo, então impeço o funcionamento do
sistema para não ser acionado em ações coletivas, nas quais posso perder tudo de uma só vez. E é com isso que
contam os governantes, quando cobram “empréstimos compulsórios” jamais devolvidos, criam contribuições
“provisórias” que se tornam definitivas; cobram impostos confiscatórios sobre salários; retêm arbitrariamente as
devoluções de impostos cobrados a mais, negam devolução da correção monetária de que se apropriou o Estado
nas contas do FGTS...
E é exatamente com isso que contam esses governantes: como nem todos os indivíduos vão à Justiça (na
verdade pouquíssimos o fazem), passa a ser bom negócio causar lesões a interesses transindividuais, e, ao
mesmo tempo, proibir o uso de ações coletivas, contando, não raro, com a conivência, o endosso ou a
complacência dos tribunais.
O parágrafo único do art. 1º da LACP, introduzido e mantido por medida provisória, fere a regra
constitucional de que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, a qual não se
111
A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
refere somente a direitos individuais,e sim também coletivos, pois de ambos cuida o art. 5º (incisos, XXI, XXXV e
LXX) da CF, longe, aliás, de ter desejado restringir o objeto da ACP, quis sim, ampliá-lo, como se vê também,
exemplificativamente, dos arts. 8º, III, 129, III, 232, que permitem com largueza a tutela coletiva por iniciativa de
entidades de classe, associações civis, sindicatos, Ministério Público, comunidades indígenas. Suprimida que seja
a possibilidade de acesso coletivo à jurisdição, inúmeras lesões transindividuais ficarão efetivamente sem
proteção judicial, pois o acesso individual em casos de lesões fragmentárias é simplesmente inviável. Assim,
qualquer lei que impeça ou inviabilize a tutela coletiva é claramente inconstitucional, pois a lei infraconstitucional
não pode proibir nem o acesso individual nem o acesso coletivo à jurisdição.
Resta esperar que o STJ e o STF, ao contrário do que têm feito, venham um dia a coibir essas práticas
governamentais abusivas, especialmente nas áreas sociais, econômicas e tributárias, como quando impedem o
acesso coletivo à jurisdição.
Alguns tributos podem assumir caráter de lesão a interesses transindividuais, até mesmo divisíveis, como
em cobranças indevidas de contribuições de melhorias, ou em aumentos ilegais de taxas ou até impostos (nos
quais podem haver danos a interesses coletivos ou individuais homogêneos). Nesses casos, se não é mesmo
possível, nem próprio, ajuizar ação civil pública para obter, por vias transversas. Aquilo que só uma ação direta de
inconstitucionalidade permitiria (como a supressão de todos os efeitos atuais e futuros da própria lei), ao menos é
perfeitamente possível que a ação civil pública da LACP seja utilizada, p. ex., para obter o cancelamento de
lançamentos indevidos em determinado exercício, ou para buscar a repetição do indébito de tributos já recolhidos,
sempre em defesa de grupo, classe ou categoria de pessoas que tenham sofrido lesão a interesses individuais
homogêneos.
Mas, o ajuizamento da ACP só será possível se seu objeto não visar a atacar todos os efeitos da lei, atuais e
futuros, e sim só alguns efeitos concretos. Se houver esse cuidado, não se poderá dizer que a ACP estaria a
substituir indevidamente a ADI.
Desde que presentes os pressupostos e as finalidades que identifiquem necessidade de defesa coletiva
de interesses transindividuais, não se pode afastar, ao menos em tese, a possibilidade de investigar danos a
contribuintes por meio de inquérito civil ou a possibilidade de ajuizar as correspondentes ações coletivas ou civis
públicas.
Entretanto, em nosso País, estamos muito longe da justiça tributária. Como bem observou Rita de Cassia
Vieira Gomes Romano, “é necessário traçar a zona de capacidade contributiva, para usar a expressão do
professor Humberto Ávila, cujos extremos inferior e superior corresponderiam, respectivamente, à garantia do
mínimo existencial (princípio da dignidade humana) e à proibição do confisco (princípios da liberdade e da
propriedade). A finalidade fiscal deve ser avalizada. De que forma? Pelo princípio da igualdade, verificando-se a
generalidade da aplicação da lei, a capacidade contributiva dos cidadãos e a universalidade da imposição
tributária. Já os tributos de cunho extrafiscal deveriam ter seus fins regulatórios testados pelo postulado da
proporcionalidade (o que significa atender à adequação e à necessidade da medida), para que se possa ter de
fato uma nova mentalidade na relação Fisco-contribuinte”.
CAPÍTULO 52
DEFESA DE QUALQUER INTERESSE TRANSINDIVIDUAL
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
1. Generalidades
Com a devida vênia, equivoca-se a jurisprudência restritiva, que pretende que, em matéria de interesses
individuais homogêneos, a ação civil pública só poderia ser ajuizada em defesa de consumidores.
Como já demonstrado, em tese, quaisquer interesses difusos ou coletivos podem hoje ser defendidos por
meio de ACP ou ação coletiva, ainda que não estejam expressamente mencionados no art. 1º da LACP. O CDC e
a LACP complementam-se reciprocamente: em matéria de defesa de interesses transindividuais, uma lei é de
aplicação subsidiária para a outra.
Ao cuidar da ação civil pública de iniciativa do MP, o inc. III do art. 129 da CF só se referiu à defesa de
“interesses difusos e coletivos”, sem mencionar os interesses individuais homogêneos. Mas é simples a razão
dessa aparente exclusão: o conceito de “interesses individuais homogêneos” só foi formulado em nosso Direito
positivo em 1990, com o CDC, de maneira que, dois anos antes, ao mencionar “interesses coletivos”, a CF só o
poderia fazer em sentido lato, que também compreende os de hoje chamados interesses individuais homogêneos
(v. Cap. 4, n.15). como têm reconhecido os tribunais superiores, os interesses individuais homogêneos são
subespécie dos interesses coletivos, de maneira que a ACP presta-se à tutela não apenas de direitos individuais
homogêneos concernentes às relações consumeristas, como à de quaisquer outras espécies de interesses
transindividuais.
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A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUIZO
Para exemplificar, nessa linha de entendimento, o STF tem admitido a defesa de interesses individuais
homogêneos até mesmo fora da estrita relação de consumo, como em matéria de direitos trabalhistas, ou em
matéria de acesso a certidões previdenciárias. Aliás, em matéria de aumentos indevidos de mensalidades
escolares, essa mesma Corte entendeu, corretamente, estar o MP legitimado a promover em juízo a defesa de
qualquer interesse coletivo, lato sensu, por meio da ação civil pública, incluindo-se aqueles individuais
homogêneos.
TÍTULO V
CONCLUSÕES
CAPÍTULO 53
SÍNTESE DOS PRINCIPAIS PONTOS DO TRABALHO
Este capítulo consta de 20 pequenos parágrafos (pontos) que devem ser lidos na íntegra por
todos. Portanto, por questões de praticidade e economia do nosso tempo, remetam-se ao
Título V e às páginas seguintes (779 a 781) do documento em pdf. anexo ao email. Obrigada a
todos pela colaboração e bons estudos!!!
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