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Copyright da selegto de textos e apresentagio © 2005, Celso Castro Copyright desea edigdo © 2005: Norge Zahar Editor Leda, ‘ua Mexico 31 sobreloja site: wwwzaharcombr “Todos os direitos reservados. A teprodugio ndo-aurorizada desta publicagio, no todo ‘ou em part, constitu violagio de direitos autorais (Le 9.610/98) Capa: Miriam Lerner Foto da capa: Vierine demonstrando a evolugdo de fusos, langadeira reares, United States National Museum, 1890, ‘Copyright © Smithsonian Institution MAH 21389 Messe seatos de Morgan, Tylor lecionados, apresentacio erevisio, ‘raducio, Maria Licia de Oliveira, — Rio de Janeito: Jorge Zahar Bl, 20 (Antropologia sot ‘Contes: A sociedade antiga/Lewis Henry Mor- ‘gan Acitncia da cultura/Edward Burner Tylor —O ;pologiasocal/James George Frazer 37.9 1963. 1V, Tula. V. Série. cpp 306 | as-asas cpu 3167 SUMARIO N Apresentagao 7 Asociedade antiga 42 Lewis HENRY MORGAN Aciénciada cultura 67 Eowano BURNETT Tor O escopo da antropologia social 101 Jaws Groce Frazer « Evolucionismo Cultural “Para ahistvia das sucrsivas edigbes dese livro, ve George Stocking, Je, “Reading che Palimpsest of Inquiry. N and che Hiscory of British Social Anthropology’ in: George Delimiing Antropo- egy (Madison: The Universiey of Wiscon: verso para o portugués de uma edigto posteio: te antropolgi, Preparid por wma comisio do Real Intute de Antropologis da Gre Bretanha eda Irland (S40 Paulo: Cultrx, 1971). "Publicado no Journal ofthe Ancvopoogcal Inte, vol xii, 1888-1889, 245-72. *Citado em Ackerman, opi, p95, traduso minh. "Uma versio condensada de edigSes posteroces dolivro foi publicada em poreugués pela antiga Zahar Edicores, "*Cartade24 de novembro de 19 ao minha. "Para essa tarefa, conse prineipalmente os livos de Race, Culture and Evolution: Esay in he History of Evolution (C “versity of Chicago Press, 1982) e Delimiting Ansbropology (0 “Invention of PrimitieeSocier (Londres: Routledge, 1986); Robert Carneito,Ev0- |usionism in Cultural Anchropology (Boulder: Westview Press, 2003) ler, Historia del enlogte Tylor lor profesionales ities (México: -m Ackerman, op.cit,p.208, radu ge Stocking, Je, cde la Casa Chata, 1977) e Peter. Bowler, Bolution — the History ofa I kkeley: University of California Press, 2003, 3 ed), ™Citado por Carneito,opcit, p.4, traduglo minha. "Bm Relatvizanda: Uma introdusdo 2 antropalogia social (PetrOpolis: Vozes, 1981, p99). Bsse texto est inclufdo na colecanea de rexcos de Boss Antropolgiacltur, Ua tov centifica da cultura (Rio de Jane: Zaher Bditore sd, p 167-206), Um exemplo disponivel em porcugués é o texto “Morgan e a ancropologia, contemporanea”, de Terray,op.cic, p. ™ Para uma critica contundente da sociobiologia,escrita por um antropélogo cculeucal logo apés a publicagdo do livro de Wilson, ver Marshall Sablins, The Use and Abuse of Biology: An Anthropological Critique of Sociobiology (Ann Atbor: “The University of Michigan Press, 1976) - através da barbdrie, até a ci Ou investigagdes sobre as linhas progresso humano desde a selvageria, fr (a0: PREFACIO grande antigitidade da humanidade sobre a terra jé foi conclusivamente determinada. Parece singular que as provas tenham sido descobertas to recentemente, apenas nos iiltimos 30 anos, e que a atual gerag3o seja.a primeira chamada a reconhecer fato tio imporcante. Sabe-se agora que a humanidade existiu na Europa durari- te 0 periodo glacial, e até mesmo antes de seu comeso, havendo toda probabilidade de ter sido originada numa era geolégica anterior. Sobreviveu a muitas ragas de animais das quais foi contemporanea e, nos diversos ramos da familia humana, pas- sou por um processo de desenvolvimento tao notavel nos cami- nhos seguidos quanto em seu progresso. Como a provivel excensao da carreira da humanidade esté ligada a perfodos geol6gicos, exclui-se, de antemao, qualquer ‘medida limitada de tempo. Cem ou duzentos mil anos nao seria uma estimativa excessiva do tempo transcortido desde 0 desaparecimento das geleiras no hemisfério norte até o presen- te. Independentemente de quaisquer diividas que possam cer- car 05 calculos aproximados sobre um periodo cuja duragio teal no se conhece, a existéncia da humanidade estende-se pelo passado imensuravel e se perde numa vasta e profunda antigilidade. “” Evolucionisme Culeural Esse conhecimento muda substancialmente as idéias que prevaleceram a respeito das relagdes dos selvagens com os bar- baros e dos bérbaros com os homens civilizados. Pode-se afir- maragora, com base em convincente evidéncia, que aselvageria precedeu a barbarie em todas as tribos da humanidade, assim como se sabe que a barbarie precedeu a civilizagio. A historia da raga humana é uma s6 ~ na fonte, na experiéncia, no pro- gresso. E tao natural quanto apropriado desejar saber, se possivel, como todas essas eras apés eras de tempos passados foram util- zadas pela humanidade; como os selvagens, avangando através de passos lentos, quase imperceptiveis, alcangaram a condi¢io mais elevada de birbaros; como os barbaros, por um avango pro- agtessivo semelhante, finalmente aleangaram a civilizacio; e por que outras eribos e nagdes foram deixadas para tris na corrida para o progresso ~ algumas na civilizagao, algumas na barbarie e outras na selvageria. Nao é demais esperar que, em algum mo- ‘mento, essas diversas questdes sejam respondidas. Invengées e descobertas mantém relagbes seqitenciais 20 longo das linhas do progresso humano e registram seus suces- sivos estdgios; por outro lado, as instituigdes sociais e civis, em virtude de sua conexéo com perpétuos desejos humanos, de- senvolveram-se a partir de uns poucos getmes primérios de pensamento, Elas exibem registros de progresso semelhantes. Essas insticuigdes, invengdes e descobertas incorporatam e pre- servaram os principais fatos que agora permanecem como ilus- trativos dessa experiéncia. Quando organizadas e comparadas, tendem a mostrar a origem Gnica da humanidade, a semelhan- Ga de desejos humanos em um mesmo estigio de avanco e a Apresentasio s uniformidade das operagdes da mente humana em condigoes ilares de sociedade. Ao longo da tiltima parte do periodo de selvageria e por todo o perfodo de barbatie, a humanidade estava organizada, em geral, em gentes,frattias e tribos.’ Essas organizacées preva- leceram, em todos os continentes, por todo o mundo antigo, e constituiam os meios através dos quais a sociedade antiga era organizada ¢ mantida coesa. Sua estrutura ¢ suas.relagdes como membros de uma série orginica, bem como os direitos, privilégios e obrigagdes dos membros das gentes, clas Fratrias ¢ das tribos,ilustram o crescimento da ideia de governo na men- te humana. As principais instituigSes da humanidade tiveram origem na selvageria, foram desenvolvidas na barbérie e estio amadurecendo na civilizagio. Do mesmo modo, a familia passou por formas sucessivas, criou grandes sistemas de consangilinidade e afinidade que duram até os dias de hoje. Esses sistemas registram as relagdes existentes na familia no periodo em que cada um, respectiva- ‘mente, foi formado, e contém um registro instrutivo da expe- ritncia da humanidade enquanto a familia estava avangando da consangitinidade para a monogamia, passando por formas intermediarias, : ‘A idéia de propriedade passou por um crescimento e um desenvolvimento semelhantes. Comecando do zero, na selva- geria, a paixio pela propriedade, como representando a sub- sisténcia acumulada, tornou-se agora dominante na mente ‘bumana nas ragas civilizadas, As quatro classes dle fatos indicadas acima’ se estendem em Jinhas paralelas ao longo dos caminhos percottidos pelo pro- “ Evolucionisme Cultural gresso humano, da selvageria a civilizagdo, e constituem os principais temas de discussio deste volume. Ha um campo de trabalho no qual, como americanos, te ‘mos um interesse ~ bem como uma obrigagio ~ especial. Sendo reconhecidamente abundante em riqueza material, 0 conti- nence americano é também o mais rico de todos em materiais etnolégicos, filolégicos e arqueolégicos que ilustram o grande perfodo da barbétie, Como a humanidade foi uma s6 na ori- gem, sua trajet6ria tem sido essencialmente uma, seguindo por canais diferentes, mas uniformes, em todos os continentes, ¢ ‘muito semelhantes em todas as tribos e nagées da humanidade que se encontram no mesmo status de desenvolvimento. Se- gue-se dai que a hist6ria e a experigncia das tribos indigenas americanas teptesentam, mais ou menos aproximadamente, a historia e experiéncia de nossos préprios ancestrais remotos, quando em condigdes correspondentes. Sendo uma parte do registro humano, suas instituigdes, artes, invengdes e expetién- cias priticas possuem um grande e especial valor que alcanca muito mais do que apenas a raga indigena, Quando descobertas, as tribos indigenas americanas re- presentavam trés petiodos étnicos distintos, e mais completa- mente do que eram entio representados em qualquer outra lologia e arqueolo- gia estavam disponiveis em abundancia sem paralelo; mas, como essas ciéncias praticamente s6 passaram a existit no pre- sente século, ¢ so incipientemente exercidas entre nés ainda hoje, trabalho a ser feito superava os trabalhadores. Além dis- 50, enquanto os restos de fésseis enterrados serfio mantidos na parte da terra. Materiais para a etnologia, terra para o fucuro estudante, o mesmo nao aconteceré com Apresentacao a que sobra das artes, linguagens e instituigdes indigenas. El estdo perecendo a.cada dia, e tem sidoa pormais de trés sé- culos, A vida étnica das tribos indigenas est declinando sob a influéncia da civilizagio americana; suas artes e linguagens es- tao desaparecendo e suas instituigées esto se dissolvendo. Dentro de mais uns poucos anos, fatos que podem ser agora facilmente coletados sero impossiveis de descobris. Tais circunsténcias apelam fortemente aos americanos para que en- trem nesse amplo campo e colham sua abundance seara. Rochester, Nove York, margo de 1877 PARTE I - Desenvolvimento da inteligéncia através das invengées e descobertas CaPiruLo1- Periodos Etnicos Smais recentes investigagdes a respeito das condigdes pri- A mitivas da raga humana esto tendendo a conclusio de gue a humanidade comegou sua carreita na base da escala ¢ seguitt um caminho ascendente, desde a selvageria até a civili- asdo, através de lentas acumulagdes de conhecimento experi- mental. Como é inegavel que partes da familia humana tenham existido num estado de selvageria, outras partes num estado de barbarie ¢ outras ainda num estado de civilizagao, parece tam- bém que essas trés distintas condigSeé esto conectadas umas as outras numa seqiténcia de progresso que é tanto natural como necessétia. Além disso, 6 possivel supor que essa seqitén- cia tenha sido historicamente verdadeira para toda a familia humana, até © status respectivo atingido por cada ramo. Essa suposicao baseia-se no conhecimento das condicées em que ocorte todo progresso, e também no avango conhecido de diversos ramos da familia através de duas ou mais dessas condigbes. a socedade Anciga seguintes, sera feita uma tentativa de apresen. 05s P as 8 icional da rudeza da condicSo primitiva da hus carevid®™" evolusio gradual de seus poderes mentais manidad igs da experiéncia, e de sua prolongada lua com os smorais 0", encontrava em sua marcha a caminho da civil obscicil0® 4 denciasestardo baseadas, em parte, na grande zagio invencdes e descobertas que se estende ao longo sequent?” ninho do progresso humano, mas levam em con de rod? ent 28 insttuigSes domésticas que expressam 0 ta, prinOP 4 certas idéias e paixses, cresc oe quesvancamos na diregao das idades primitivas id seguindo as diversas linhas de progresso,e eli- paapés outra, na ordem em que aparecerein, in- mina abet, de um lado, e instituigdes, de outro, veng6e © capazesde perceber que as primeiras tém uma re toxna?" siya entte ‘si, enquanto as tiltimas foram se desdo- spt" lagao PN brand sou uumaco®™", de uns poucos germes primérios de pensamen. jas enquanto invengdes ¢ descobertas tiveram 1enos direta, as instituigdes se desenvol- do anterior de selvageria. Tiveram uma desc . oP arts ds idades, com as Hinhas de sangue, ¢ xaram um desenvolvimento légico uishts primérias. Com © conhecimento proj hes, podemos esperar indicar os principais 8 nha Pel Pr geenvolimento humano, As provas a serem apre- jatio, pancipalmente, de instituigdes don ‘cas; Lewis Henry Morgan s as referéncias a tealizagdes de natureza estritamente intelectual seto de carérergeral ereceberdo atengio secundiétia aqui Os fatos indicam a formacio gradual o desenvolvimento subseqitente de certas idéias, paixdes e asp cBes. Aquelas que ocupam as posicdes mais proeminentes podem ser generaliza- das como sendo ampliagées das idéias particulares com as quais estio respectivamente conectadas. Além das invengdes € descobertas, essas idéias sio as seguintes 1 Subsistencia IL Governo IL. Linguagem WV. Familia V. Religiéo Vi Vida doméstica arquitetura VIL Propriedade Primeira, A sul isténcia Foi aumentada e aperfeigoada por uma série de artes sucessivas, introduzidas no decorrer de lon- 80s intervalos de tempo e conectadas mais ou menos direta- ‘mente com invengdes e descobertas, Segunda. O getme do governo deve ser buscado na organi zasio por gentes no status de selvageria; e seguido, através de formas cada vez mais avangadas, até o estabelecimento da socie dade politica. Tercera. A fala humana parece ter se desenvolvido a pattit dlas formas mais rudes e simples de expressio. A linguagem de estos ou sinais, como sugeride pot Lucrécio; tem que ter prece- dlido alinguagem articulada, assim como o pensamento precede fala, O monos: ico precedeu o tbico, tal como esse prece- deu as palavras concretas, A inteligencia humana, inconsciente 2 A Sociedade Amiga, de propésito, desenvolveu a linguagem articulada utilizando os sons vocais, Esse grande tema, em si mesmo uma dea especifica de estudo, esté fora do escopo da presente investigacio. Quarta, Com respeito a familia, seus estagios de crescimen- to estio incorporados em sistemas de consangitinidade e afini- dade e nos costumes relacionados ao casamento, por meio do qual, coletivamente, a histéria da familia pode ser seguramence tragada através de diversas formas sucessivamente assumidas. ‘Quinta. © crescimento de idéias religiosas esti cercado de tantas dificuldades intrinsecas que talvez nunca receba uma explicagio perfeitamente satisfatdria, A religido trata, em tio ‘grande medida, da natureza imaginativa e emocional e, conse- qiientemente, de to incertos elementos do conhecimento, que todas as religides primitivas so grotescas e, numa certa medi- a, ininteligiveis, Esse tema também esté fora do plano deste ‘trabalho, exceto quando puder crazer sugestoes incidentais, Seata. A arquitetura da habitac2o, que esté ligada a forma da familia e a0 plano de vida doméstica, permite uma ilustra- so razoavelmente completa do progresso desde a selvageria até a civilizagdo. Seu crescimento pode ser tragado da cabana do selvagem, através das habitagdes comunais dos barbaros, até a casa da familia nuclear das nagdes civilizadas, com todos 0 vinculos sucessivos através dos quais um extremo est co- nectado a0 outro, Esse tema serd observado incidentalmente. Ultima. A idéia de propriedade foi lentamente formada na ‘mente humana, permanecendo em estado nascente e precério porimensos perfodos de tempo. Surgindo durantea selvageria, requereu toda a experiéncia daquele periodo e da subseqiiente barbarie para desenvolver-se e preparar o cérebto humano para @ aceitagao de sua influéncia controladora. Sua dominancia, Lewis Henry Morgan 8 como uma paixiio acima de todas as outras, marca o comeco da civilizagio, Bla nfo apenas levou a humanidade a superar os obsticulos que atrasavam a civilizagio, mas também a estabe- lecer a sociedade politica baseada no territério e na proptieda- de, Um conhecimento ctitico sobre a evolucio da idéia de propriedade incorporaria, em alguns aspectos, a parte mais no- tavel da historia mental da humanidade. ‘Teatarei de apresentar alguma evidéncia do progresso hu- mano ao longo dessas diversas linhas e através de sucessivos pe- riodos étnicos, tal como revelado por invengdes e descobertas e pelo crescimento das idéias de governo, familia e propriedade. Pode ser explicitada aqui a premissa de que todas as for- mas de governo sio redutiveis a dois planos gerais, usando a palavra plano em seu sentido cientifico. Em suas bases, os dois sio fundamentalmence distintos. O primeiro a surgir esté ba- seadlo em pessoas ¢ em relagbes puramente pessoais, e pode ser distinguido como uma sociedade (societas). A gens é a unidade dessa organizacio. No petiodo arcaico, ocorreram estagios su- cessivos de integracdo: a gens, a fratria, acribo e a confederacio de tribos, que constituiam um povo ou nacio (popilus). Num periodo posterior, uma coalescéncia de tribos na mesma area, formando uma nagdo, tomou o lugar da confederagio de tri- bos ocupando areas independentes. Assim ocorreu, através de prolongadas eras, apés 0 aparecimento da gens, a organizacio uase universal da sociedade antiga; e perdurou entre os gregos © romanos apés o surgimento da ci cdo. O segundo plano é baseadlo no territétio ena propriedade, © pode ser distinguido como um estado (civitas). Avila ou discri- to, circunscrita por limices e cercas, com a proptiedade que contém, é base ou unidade do estado, ea sociedade politica é 4 A Sociedade Antiga seu resultado. Essa esté organizada sobre areas territoriais ¢ trata da propriedade e das pessoas, através de relagées tertito- tiais. Os sucessivos estigios de integracdo sao avila ou disttito, que éa unidade de organizagao; o condado ou provincia, que é uma agregacdo de vilas ou distritos; e 0 dominio ou territétio nacional, que é uma agregacio de condados ou provincias; ¢ 0 Povo de cada uma delas esta organizado em um corpo p ‘Apés terem alcangado a civilizacio, coube aos gregos e roma- ros, usando suas capacidades até o limite, inventar a vila e 0 distrito e, assim, inaugurar o segundo grande plano de gover- Ro, que permanece até o presente entre as nacdes civilizadas. Na sociedade antiga, esse plano territorial eta desconhecido. Quando ele apareceu, fixou as linhas de fronteira entre a socie- dade antiga ea moderna, nomes com os quais a distingao ser reconhecida nestas paginas. Pode-se observar também que as instituigdes domésticas dos barbaros, e mesmo dos ancestrais selvagens da humanida- de, ainda esto exemy com tamanha completude que, exceto pelo periodo estrita- ‘mente primitivo, os diversos estgios desse progresso esto ra- zoavelmente preservados. Eles so vistos na organizacéo da sociedade com base no sexo, depois com base no parentesco e, finalmente, com base no territério; através das sucessivas for- mas de casamento e de familia, com os sistemas de consan- Slinidade assim criados; através da vida familiar e de sua arquitetura, e através do progresso nos usos relativos a proprie- dade ¢ a transmissao da mesma pot heranga. A teoria da degradacdo humana para explicar a existéncia dos selvagens e dos barbatos jé nao é mais sustentével. Ela apa- receu como um corolatio da cosmogonia mosaica' e foi aceitaa Lewis Heney Morgan 5 partir de uma suposta necessidade que jé nao existe. Como teo- ria, € no apenas incapaz. de explicar a existéncia de selvagens como também no encontra suporte nos fatos da experiéncia humana. Os remotos ancestrais das nages arianas presumivelmen- te passaram por uma experiencia similar das tribos barbaras e selvagens existentes. Embora a experiéncia dessas nagées con- tenha todaa informagio necessétia para lustrar os petiodos de civilizagao tanto antigos quanto modemos, ¢ também uma parte do tem que ser deduzida, em sua maior parte, da conexio que imo perfodo de barbérie, sua experiéncia anterior pode ser eracada entre os elementos de suas instituigdes € ventos existentes ¢ os elementos similares ainda preservados nas instituigbes e inventos das eribos selvagens e barbaras. Pode ser observado, finalmente, que a experiéncia da hu- manidade tem seguido por canais quase uniformes; que as necessidades humanas, em condicdes similares, tém sido subs- tancialmente as mesmas; e que as operacdes de pti tal tém sido uniformes em virtude da identidade especifica do cérebro em todas as racas da humanidade. Isso, no entanto, 6 io men- apenas uma parte da explicagao da uniformidade dos resulea- dos. Os germes das principais instituigdes e artes da vida foram desenvolvidos enquanto o homem ainda era um selvagem. Em. larga medida, a experiéncia dos periodos subseqtientes de bat mento que se seguit a essas concepsdes originais. Onde quer que se possa tracar uma conexio, em diferentes continentes, entre uma instituicao hoje existente e uma origem comum, es- tard implicito que os préprios povos derivam de um estoque original comum. 6 A Sociedade Antiga A discussdo dessas diversas classes de fatos seré facilitada pelo estabelecimento de um certo ntimero de periodos étnicos, cada um represencando uma condicéo distinta de sociedade ¢ podendo ser distinguido dos outros por sew modo de vida peculiar. Os termos “Idade da Pedra”, “do Bronze” e “do Ferro”, introduzidos por arquedlogos dinamarqueses, tém sido extre- mamente iiteis para certos propésitos, e continuario a sé-lo ara a classificacao de objetos de arte antiga; mas o progresso do conhecimento tornou necessirias outras e diferentes subdi- vis6es. Implementos de pedra nao foram totalmente deixados de lado com a introdugio das ferramentas de ferro nem das de bronze. A invengio do processo de fundicao do minério de fer- ro criou uma época étnica, mas dificilmente podemos datar Juma outra que se tenha iniciado com a produgdo do bronze. Além disso, como a época dos implementos de pedra se sobre- Oe aos periodos dos instrumentos de bronze e ferro, e como a do bronze também se sobrepde a do ferro, nao é possivel cit- cunscrever cada um desses periodos e trati-los como indepen- dentes e distintos, Dada a grande influéncia que devem ter exercido sobre a condicao da humanidade, as sucessivas artes de subsisténcia, surgidas a longos intervalos, provavelmente virdo a poss tat, a0 final, bases mais satisfat6rias para essas divisoes, Mas a pesquisa ndo foi levada suficientemente longe nessa directo para produzir a informagao necessétia. Com nosso conheci- mento atual, o principal resultado pode ser obtido selecionan- do outras invengSes ou descobertas que permitam suficientes testes de progresso para caracterizar o comeco de sucessivos pe- tiodos étnicos. Mesmo que sejam aceitos como provis6tios, es- ses periodos se revelatio convenientes e tices. Veremos como Lowis Henry Morgan a cada um dos que serdo propostos em seguida cobrité uma cul- tura distinea e representaré um modo de vida particular, O periodo de selvageria, de cuja parte mais antiga sabe-se muito pouco, pode ser dividido, provisoriamente, em erés sub- periodos. Esses podem ser chamados de periodo inicial, interme- didrio ox final de selvageria; e a condigao da sociedade em cada ‘um, respectivamente, pode ser distinguida como status inferior, intermediério ou superior de selvagetia. Da mesma forma, o petiodo de barbarie se divide natur: ‘mente em trés subperfodos, que serio chamados de periodo i cial, intermediario ou final de barbarie; e a condigao da sociedade em cada, respectivamente, sera distinguida como status infé- rior, intermedidrio ou superior de barbétie. Para marcar o comeso desses diversos periodos, é di nao impossivel, encontrar testes de progresso que se revelem absolutos em sua aplicagio e sem excecées em todos os conti- nhentes. Mas também nfo € necessério, para 0 propésito em iiios, que nio existam excegdes. Sera suficiente que as princi- pais tribos da humanidade possam ser classificadas, de acordo com 0 grau de seu progresso relativo, em condicées que pos- sam ser reconhecidas como distintas. 1. Status inferior de selvageria, Esse periodo comecou com a infin- cia da raga humana, e pode-se dizer que terminou com aaquisi- so de uma dieta de subsisténcia & base de peixes ¢ com um conhecimento do uso do fogo. A humanidade estava entio vi- vendo em seu habitat original restrito, subs ecastanhas. O comeco da fala articulada ocorre nesse perfodo. Nio restou, no periodo hi .do com frutas ‘ico, nenhum exemplo de tribos da humanidade nessa condigio. 8 ‘Sociedade Antiga IL. Status intermedidrio de seluageria. Comegou com a aqui ‘sao de uma dieta de subsisténcia baseada em peixes ¢ com um conhecimento do uso do fogo, e terminou com a invengio do arco-e-flecha. A humanidade, enquanto nessa condigao, espa- Ihou-se, a partir de seu habitat original, por grande parte da su- petficie da terra, Entre ttibos ainda existentes, encaixam-se no status intermediario de selvageria, por exemplo, os australia os ¢ a maior parte dos polinésios, quando descobertos. Ser suficience dar um ou mais exemplos de cada status, TIL Status superior de selvageria. Comegou com a invengio do atco-e-flecha e erminou com ainvengio da arte da cerimica. No tempo de sua descoberta, encontravam-se no status superior de selvageria as tribos dos atapaseos, no tertitério da bafa de Hud- son, as tribos do vale do Columbia e certas tribos costeiras da ‘América do Norte e do Sul, Isso encerrao perfodo de Selvageria. IV. Status inferior de barbdrie. Quando se levam em conta to- dos os aspectos, a invengio ou prética da arte da cerimica é Provavelmente, o teste mais efetivo e conclusivo que se pode escolher para fixar uma linha demarcatéria, necessariamente arbi ia, entre a selvageria e a barbarie, Hé muito foram reco- nhecidas as especificidades de cada uma das duas condigies, mas nilo se produziu, desde entio, nenhum ctitério para defi- nir etapas de progresso de uma condigao para a outra. Assim, todas as tribos que nunca alcangaram a arte da cerimica sero , Familia e propriedade, cada qual respondendo a uma parte do livra Ancient Society. (NT) » Tio Lucrecio Cara l6sofo e poeta romano, autor de De rerum “ Aexplicagio biblica para a criagio da humanidade. (NT) Lewis Henry Morgan 6 * Foram aqui suprimidas tes paginas do texto original nas quaisse discutem, com detalhes técnicos que ndo sio fundamentais para objetivo desta coleté nea, a5 tazdes para a adocdo do uso da cerimica como matco de separagio de perfodos étnicos. idéia central de Morgan é que“A manufacura decerdmica pessupde uma vida alded e considerivel progresso nas attes simples.” (N. Org)

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