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EXMO. SR. DR.

JUIZ DE DIREITO DA VARA ÚNICA


DA COMARCA DE CAMPINAS –PI

Processo de origem: 0000005-00000000000

XXXXXXXXXXXXXXXXX, já qualificado nos autos, vem mui


respeitosamente à presença de Vossa Excelência com
fulcro Art. 355 do Novo Código de Processo Civil, propor

CONTESTAÇÃO

à ação de busca e apreensão interposta por XXXXXXXX


CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, também
já qualificada nos autos, pelos motivos de fato e de direito
a seguir aduzidos.

PRELIMINARMENTE

Como já é de conhecimento do MM. Juiz o requerido teve


seu veículo Hilux apreendido em seu domicílio por oficial
de justiça e força policial por estar e débito em 01(um)
prestação, conforme docs. acostados na inicial de busca e
apreensão promovida pelo Autor.

Com relação à medida liminar concedida por Vossa


Excelência, requer-se desde já a sua reconsideração, uma
vez que a apreensão do bem trará prejuízo irreparável ao
Requerido, pois esse é essencial à continuidade do trabalho
da seu comércio.

A apreensão do mesmo acarretou a paralisação de toda


atividade desenvolvida no comércio e lavoura,
especialmente de seus empregados, acarretando danos
irremediáveis, os quais certamente resultarão na falência
da Requerido, pois o bem em questão constitui
praticamente a totalidade do maquinário utilizado nas suas
empreitadas, uma vez que este equipamento é utilizado
diariamente na atividade da empresa. Com a retirada do
bem do requerido sua família está passando por
dificuldades e impossibilitando o sustento da família do
requerido.

Como consectário dos direitos e garantias individuais


asseguradas pela Constituição de 1988, o contrato que
preveja a restituição sumária do bem, sem oportunidade de
contraditório, fere princípios básicos constitucionalmente
garantidos no seu art. 5º:

"LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens


sem o devido processo legal;

[...]
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo,
e aos acusados em geral são assegurados o contraditório a
ampla defesa, com os meios inerentes."

Ao se restituir sumariamente os bens, como pretende a


Requerente, estará sendo cometida uma arbitrariedade,
pois não há chance para o contraditório. Assim vem
entendendo a jurisprudência conforme a recente decisão
da 14ª Vara da Justiça Federal de São Paulo,
compreendendo que não apenas o DL 911, mas toda a
legislação que permita perda sumária de bens, deixou de
vigorar a partir da Constituição de 1988, verbis:

"Trata-se de considerar o 'due process of law' em sua


inteireza, ou seja, em todo processo, seja administrativo,
seja judicial, há de se conformar com as regras
previamente estabelecidas em lei, vedada, sob qualquer
pretexto, a mais tênue maneira de desrespeito
procedimental ou de alteração de seu conteúdo." (Guia
Jurídico, Ainda removendo entulhos, 11/17, janeiro de
1993).

O então Tribunal de Alçada do Estado do Paraná também


compreende que a restituição sumária constitui lesão a
direitos e garantias. Em recente acórdão do dia 14 de maio
de 1994, a 4ª Câmara Cível julgou, seguindo orientação
firme de precedentes, no mesmo sentido:

"ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - BUSCA E APREENSÃO


DEFERIDA LIMINARMENTE - BEM DEIXADO NA
QUALIDADE DE DEPOSITÁRIA FIEL - ADMISSIBILIDADE
DIANTE DAS DIFICULDADES QUE A MEDIDA
ACARRETARIA À DEVEDORA, COM REFLEXOS SOCIAIS
INDISCUTÍVEIS. RECURSO DESPROVIDO."

Inobstante isto, a apreensão do veiculo em questão


constitui um exagero, eis que, conforme demonstrativos
juntados aos presentes autos pelo próprio Banco, o veiculo
está com 75% do valor venal pago. Portanto, as garantias
se apresentam indubitavelmente excessivas e
desnecessárias.

O requerido não se nega a pagar o restante do débito com


o banco, mas desde que o veículo seja devolvido para que o
requerido possa adimplir o restante das parcelas vencidas
e vincendas.

1. DO MÉRITO

1.1 Do adimplemento substancial

Como já relatado acima o requerido já adimpliu


75% do valor venal do carro, constando no contrato do
banco já acostados na presente ação o valor de R$
140.000,00 (cento e quarenta mil reais), dos quais foi dada
entrada de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) e pagas mais
de 15 (quinze prestações) somando um total de 120.000,00
(cento e vinte mil reais). Deste modo é entende-se ser
muito cômodo o banco apreender o veiculo tendo este sido
adimplido em quase sua totalidade, evidenciando o
enriquecimento ilícito do requerente.
O requerido mostra que o valor pago, até o
momento, é elevado, o que remete à boa-fé do contestante
no que se refere à relação de direito material firmada pelas
partes e se harmoniza com o disposto nos
arts. 421 e 422 do CC, o que caracteriza o adimplemento
substancial do contrato.
A propósito da temática, os magistérios de
NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA ANDRADE NERY
ao comentarem o artigo 421 do CC (Código
Civil Comentado, p. 797, item 21, ed. Revista dos
Tribunais, 11ª edição):

“Adimplemento substancial. Jornada IV Dir Civ


STJ361: “O adimplemento substancial decorre
dos princípios gerais contratuais, de modo a
fazer preponderar a função social do contrato e o
princípio da boa-fé objetiva, balizando a
aplicação do CC 475.”

No mesmo diapasão doutrinário é o ensinamento


de Lucas Gaspar de Oliveira Martins , in verbis:

“Diante do exposto, cumpre asseverar que a


teoria do adimplemento substancial opera como
um limite ao direito formativo extintivo de
resolver os contratos, obstando que um
irrelevante descumprimento causado por uma
das partes seja considerado causa suficiente
para o desfazimento do vínculo. Por conta dessa
teoria, não se extingue o vínculo contratual,
mantendo-se todos os direitos e obrigações
estabelecidas, oferecendo-se ao credor a via do
ressarcimento das perdas e danos, uma vez que
o descumprimento de escassa importância
autoriza tão somente a permanência do vínculo,
mas não admite o afastamento da
responsabilidade da parte inadimplente.”

A respeito da possibilidade da resolução do


contrato disposta no art. 475 do CCadverte Sílvio de Salvo
Venosa :
“Não se esqueça que, em qualquer caso, o contrato deve
ser examinado à luz de sua função social (art. 421) e sob o
prisma dos princípios da boa-fé (art. 422).”

A respeito da matéria, o seguinte aresto desta


Câmara:

“APELAÇÃO CÍVEL. RESOLUÇÃO DE


PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL.
SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DO
PEDIDO. RECURSO DOS RÉUS. Hipótese em
que resulta caracterizado o adimplemento
substancial do contrato, com o pagamento de
quantia correspondente a cerca de 70% do preço
do negócio. Descabimento da pretensão de
resolução. Precedentes da Câmara. Consequente
reforma da sentença para julgar improcedente o
pedido, ressalvada a possibilidade dos autores
pleitearem, em ação própria, o saldo do preço.
APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Cível Nº
70060300480, Décima Nona Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relatora: Desa.
Mylene Maria Michel, Julgado em 18/12/2014)”

Também na mesma direção jurisprudencial,


colaciono julgados do Egrégio STJ:

“RECURSO ESPECIAL. LEASING. AÇÃO DE


REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CARRETAS.

EMBARGOS INFRINGENTES. TEMPESTIVIDADE.


MANEJO ANTERIOR DE MANDADO DE
SEGURANÇA CONTRA A DECISÃO. CORRETO O
CONHECIMENTO DOS EMBARGOS
INFRINGENTES. INOCORRÊNCIA DE AFRONTA
AO PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE.
APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO
SUBSTANCIAL E DA EXCEÇÃO DE
INADIMPLEMENTO CONTRATUAL.

Ação de reintegração de posse de 135 carretas,


objeto de contrato de "leasing", após o pagamento
de 30 das 36 parcelas ajustadas.

Processo extinto pelo juízo de primeiro grau, sendo


provida a apelação pelo Tribunal de Justiça,
julgando procedente a demanda.

(REsp 1200105/AM, Rel. Ministro PAULO DE


TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA,
julgado em 19/06/2012, DJe 27/06/2012)”
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE RESCISÃO
PARCIAL - CONTRATO DE COMPRA E VENDA -
SALDO DEVEDOR DIMINUTO - ENTENDIMENTO
OBTIDO DA ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-
PROBATÓRIO - IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME -
INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 5 E 7 DESTA CORTE
- TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL -
APLICAÇÃO - POSSIBILIDADE - PRECEDENTES -
AGRAVO IMPROVIDO.

(AgRg no AREsp 155.885/MS, Rel. Ministro


MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em
16/08/2012, DJe 24/08/2012)”

“DIREITO CIVIL. CONTRATO DE


ARRENDAMENTO MERCANTIL PARA AQUISIÇÃO
DE VEÍCULO (LEASING). PAGAMENTO DE
TRINTA E UMA DAS TRINTA E SEIS PARCELAS
DEVIDAS. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. AÇÃO DE
REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DESCABIMENTO.
MEDIDAS DESPROPORCIONAIS DIANTE DO
DÉBITO REMANESCENTE. APLICAÇÃO DA
TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL.

É pela lente das cláusulas gerais previstas


no Código Civil de 2002, sobretudo a da boa-fé objetiva e
da função social, que deve ser lido o art. 475, segundo o
qual "[a] parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a
resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o
cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos,
indenização por perdas e danos".
Nessa linha de entendimento, a teoria do
substancial adimplemento visa a impedir o uso
desequilibrado do direito de resolução por parte do credor,
preterindo desfazimentos desnecessários em prol da
preservação da avença, com vistas à realização dos
princípios da boa-fé e da função social do contrato.
No caso em apreço, é de se aplicar a da teoria do
adimplemento substancial dos contratos, porquanto o réu
pagou: 75% da obrigação total. O mencionado
descumprimento contratual é inapto a ensejar a
reintegração de posse pretendida e, consequentemente, a
resolução do contrato de arrendamento mercantil, medidas
desproporcionais diante do substancial adimplemento da
avença.

Não se está a afirmar que a dívida não paga


desaparece, o que seria um convite a toda sorte de fraudes.
Apenas se afirma que o meio de realização do crédito por
que optou a instituição financeira não se mostra
consentâneo com a extensão do inadimplemento e, de
resto, com os ventos do Código Civil de 2002. Pode,
certamente, o credor valer-se de meios menos gravosos e
proporcionalmente mais adequados à persecução do
crédito remanescente, como, por exemplo, a execução do
título.

(REsp 1051270/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,


QUARTA TURMA, julgado em 04/08/2011, DJe
05/09/2011)”

“ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. Busca e apreensão.


Falta da última prestação. Adimplemento
substancial.
O cumprimento do contrato de financiamento,
com a falta apenas 10 (dez) prestações de 60,
não autoriza o credor a lançar mão da ação de
busca e apreensão, em lugar da cobrança da
parcela faltante. O adimplemento substancial
do contrato pelo devedor não autoriza ao credor
a propositura de ação para a extinção do
contrato, salvo se demonstrada a perda do
interesse na continuidade da execução, que não
é o caso.

Na espécie, ainda houve a consignação judicial


do valor da última parcela.

Não atende à exigência da boa-fé objetiva a


atitude do credor que desconhece esses fatos e
promove a busca e apreensão, com pedido
liminar de reintegração de posse.Recurso não
conhecido.(REsp 272.739/MG, Rel. Ministro
RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA,
julgado em 01/03/2001, DJ 02/04/2001, p. 299)”

A propósito da matéria, os seguintes arestos


desta Corte:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO


FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO.
MORA CARACTERIZADA. ADIMPLEMENTO
SUBSTANCIAL CARACTERIZADO. Dispõe o
art. 3º do Decreto-Lei nº 911/69 que o credor
fiduciário tem o direito de reaver o bem que se
encontra na posse do devedor, desde que
comprovada a mora. A regular constituição do
devedor em mora restou comprovada nos autos.
No caso, houve válida notificação extrajudicial.
No entanto, restou caracterizado o
adimplemento substancial do contrato.
RECURSO IMPROVIDO. DECISÃO
MONOCRÁTICA. (Agravo de Instrumento Nº
70065492761, Décima Quarta Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relatora: Desa.
Miriam A. Fernandes, Julgado em 01/07/2015)”.

Ademais, cabe ainda salientar que, o fato de estar


sendo reconhecido o adimplemento substancial do
contrato, não significa que o devedor esteja se eximir do de
pagar as parcelas vincendas, sendo o caso o requerente
poderá consignar os pagamento a vencerem em juízo.

Ademais, conferir meios colimados a retirar do


devedor a posse sobre o bem, após efetuar o pagamento
de praticamente a integralidade do quanto avençado, seria
privilegiar eventual enriquecimento injustificado da
entidade financeira, vez que, além dos valores contratados
e já recebidos em grande parte daquele, ainda poderia
vender o bem dado em garantia para exclusiva satisfação
do crédito restante, desvirtuando muitas vezes o valor real
da coisa, já que normalmente é vendida por preço bem
abaixo daquele praticado pelo mercado.
Desse modo, tem-se por inadequada a via eleita
pelo Autor, uma vez que a medida adotada se mostra
demasiadamente drástica diante das circunstâncias do
caso concreto.

DOS PEDIDOS

Diante do exposto, presentes os requisitos legais,


respeitosamente na presença de Vossa Excelência, requer-
se desde já a reconsideração da decisão, com eventual
revogação da medida liminar constritiva. Caso este não
seja o entendimento de Vossa Excelência, requer-se que
nomeie a própria Requerida como depositária do bem
apreendido, evitando a paralisação das atividades da
empresa e a ocorrência dos danos irreparáveis acima
apontados.

Ao final, requer-se o julgamento de total procedência do


pedido formulado, condenando o Requerente ao
pagamento de todas as custas processuais, assim como dos
honorários advocatícios.

Protesta-se pela produção de todas as provas em direito


admitidas, especialmente pelo depoimento pessoal do
representante legal do réu, perícia contábil e oitiva de
testemunhas.

Nesses Termos,

Pede Deferimento.
Campinas – PI 30 de abril de 2016.

Termos em que pede e espera deferimento.

_________________________________________

Walber Ricardo Nery de Sousa


OAB: 11.784/PI

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