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Colecionador: o exercício
Resumo: Esse artigo busca entender como o Title: Mabe Bethônico and the Collector: the
trabalho Mabe Bethônico e o Colecionador exercise of looking and thinking through images
pode ser representativo de um imaginário e Abstract: This paper attempts to under-
investido de desejos de construção e de re- stand how the work Mabe Bethônico and the
construção de memória, resignificando as Collector can be representative of an imagi-
imagens para além da efemeridade do con- nary and invested of desire of construction
sumo e transformando-as em novos objetos and reconstruction of memory, resignifying
de interesse. images beyond the ephemeral nature of con-
Palavras chave: Mabe Bethônico, Mabe Bethôni- sumption and turning them into new objects
co e o Colecionador, coleção, imaginário. of interest.
Keywords: Mabe Bethônico, Mabe Bethônico
and the Collector, collection, imaginary.
Introdução
A artista brasileira Mabe Bethônico começou em 1996 a desenvolver uma
coleção de imagens retiradas de jornais, agrupadas primeiramente em quatro
grandes temas: destruição, corrosão, construção e flores. Com a grande profu-
são de imagens na contemporaneidade, a coleção expandiu-se rapidamente e
foi ficando mais complexa, e Mabe precisou ampliar sua categorização, incluin-
do subdivisões para os temas iniciais.
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Alberti, Raquel Sampaio (2012) “Mabe Bethônico e o Colecionador:
o exercício de olhar e pensar através de imagens.”
1. Coleções
Mabe Bethônico e o Colecionador (Figuras 1 e 2), no momento que se integra
permanentemente ao Museu da Pampulha, nos faz pensar sobre a relação das
obras com as instituições que as abrigam. O projeto é uma coleção dentro de
outra coleção (a de obras do Museu), e a figura do Colecionador, de certa forma,
emula o papel desempenhado pela instituição museológica na seleção do que
vai ou não fazer parte de seu acervo. As categorias em que estão organizadas
as imagens são uma espécie de “texto de apoio”, são como pistas para possíveis
maneiras de como o espectador pode se relacionar com a coleção.
Desde sua concepção, Mabe Bethônico e o Colecionador é desafiador, co-
meçando por sua “leitura”, que não é propriamente confortável. É um projeto
tem foco nas possibilidades ficcionais dos documentos, e isso, somado a sua
possibilidade de permanente mutação, convida a refletir sobre a natureza do
objeto de arte e seu comportamento dentro de uma instituição. Através do re-
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curso da coleção, o obra escreve uma história alternativa para as imagens que a
compõe e dialoga também com o papel que a instituição tem no registro histó-
rico dentro do campo das artes.
Essas imagens, distanciadas de suas funções originárias, também fazem
com que a coleção sejam a antítese do consumo. Ou seja, quando o Colecio-
nador toma posse de uma imagem e a traz para coleção, ele também a desloca
de sua condição de mera possessão e a coloca à disposição de uma nova rede
de conexões e correspondências. A imagem é testemunha de seu uso para a
comunicação massiva mas, fora de seu contexto e também compulsivamente
acumulada, ela reencontra sua eficácia.
Colecionar é guardar para poder em outro momento lançar um novo olhar
sobre o que se guardou. E a medida que a coleção cresce, cada olhar é novo, e
é modificado pelas novas relações que se pode fazer. Assim, através da apro-
priação e deslocamento dessas imagens, a coleção ajuda também a dar conta e
explicitar como a proliferação de imagens veiculadas pelos meios de comunica-
ção ilustram nosso imaginário contemporâneo.
2. Imaginário e memória
“Não é a imagem que produz o imaginário, mas o contrário” (Maffesoli, 2001).
O imaginário é uma construção histórica de um grupo, país ou comunidade, e é
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Alberti, Raquel Sampaio (2012) “Mabe Bethônico e o Colecionador:
o exercício de olhar e pensar através de imagens.”
Figura 3 – On Kawara, Date Paintings (em Figura 4 – On Kawara, Date Paintings (em
andamento desde os anos 1960). andamento desde os anos 1960).
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de. A coleção e o colecionador constituem um jogo de concentração e disper-
são de fragmentos-objetos, uma obra inacabada e inacabável, um labirinto
com milhares de passagens que constituem as incursões criticas do coleciona-
dor (Perrone & Engelman, 2005).
Conclusão
Mabe Bethônico e o Colecionador é uma coleção dinâmica, que lança um
olhar resignificador sobre as imagens que são geradas compulsivamente pelas
mídias de comunicação. Cada espectador que entra em contato com o trabalho
reaviva suas memórias pessoais, enquanto se relaciona e resignifica a coleção
de imagens. Portanto, podemos dizer que essa coleção é investida de desejos de
construção e de reconstrução de memória, e reverte o valor de uso das imagens
para além da efemeridade do pronto-consumo, permitindo transformá-las em
novos objetos de interesse e permitindo também que possamos fazer leituras
mais ricas e pessoais.