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Conselheiros - Agentes
Multiplicadores do Patrimônio
21/06/2017
Belo Horizonte/MG
• ANAIS •
ISSN 2176-2783
Anais do IX Mestres e
Conselheiros - Agentes
Multiplicadores do
Patrimônio
9º edição
Disponível em <www.even3.com.br/anais/mestreseconselheiros2017>
ISSN: 2176-2783
1. Arquitetura
COORDENADOR GERAL
PROF. DR. LEONARDO BARCI CASTRIOTA (UFMG)
COMISSÃO CIENTIFICA
PROFESSORA DOUTORA ANA MEIRA (UNISINOS)
PROFESSORA DOUTORA BEATRIZ COUTO D´AMARAL (UFMG)
PROFESSORA DOUTORA MARIETA CARDOSO MACIEL (UFMG)
PROFESSOR DOUTOR LEANDRO BRUSADIN (UFOP)
PROFESSOR DOUTOR LEONARDO BARCI CASTRIOTA (UFMG)
PROFESSORA DOUTORA MARIA CRISTINA VILLEFORT (UFMG)
PROFESSORA DOUTORA MARGARETH PIMENTA (UFSC)
COMISSÃO ORGANIZADORA
ANDREA LANNA MENDES NOVAIS (MPE)
ARLETE SOARES DE OLIVEIRA (IEDS)
CARLA VIVIANE DA SILVA ÂNGELO (IEDS)
DANIELLE BARROSO CALDEIRA (IEDS)
GUILHERME MACIEL ARAÚJO (PPG-ACPS)
LUCIANA ROCHA FÉRES (PPG-ACPS)
VALÉRIA SÁVIA TOMÉ FRANÇA (IEDS)
VILMAR PEREIRA DE SOUSA (IEDS)
PATROCÍNIO
CONSELHO REGIONAL DE ARQUITETURA E URBANISMO – MINAS GERAIS-
CAU-MG
CAPES
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – PROGRAMA PAIE
INSTITUTO DE ARQUITETOS DO BRASIL – IAB/MG
RESUMO
1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO
ARTIGO FINAL
1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO
APRESENTAÇÃO DE EXPERIÊNCIA
1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO
RESUMO
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RESUMO
RESUMO
Este artigo trata das memórias de Barra Longa, uma das mais antigas cidades
de Minas Gerais, localizada na Zona da Mata mineira e que ainda possui um
importante acervo arquitetônico e cultural. Ele surgiu da necessidade de
registrar as memórias da cidade, guardadas por pessoas que, em sua história
de vida, mantêm consigo valiosas informações que não foram divulgadas e/ou
registradas publicamente. Neste trabalho, a memória é tratada como principal
instrumento de preservação da cultura, pois ela é fonte de registro das
vivências, capaz de resguardar a identidade local, visto que há uma grande
dificuldade em encontrar documentos que auxiliem no entendimento da história
de Barra Longa. A Monografia Histórica do município, escrita pelo Cônego
Raimundo Otávio da Trindade em 1917, com sua primeira versão publicada no
ano de 1918, é um exemplo dos raros livros que registram a história da cidade.
Exemplo da casualidade, o livro foi encontrado em posse de moradores de
Barra Longa. O documento foi a principal fonte para a redescoberta de uma
história que a população desconhecia e a motivação do aprofundamento da
pesquisa. A monografia escrita pelo Cônego demonstra sua preocupação em
registrar a cultura local. No ano em que o livro completou seu centenário, foi
iniciado um trabalho para resgatar seu conteúdo, fazendo com que o objetivo
que o Cônego Raimundo teve, ao escrevê-lo, fosse alcançado: enaltecer o rico
valor cultural da antiga cidade de Barra Longa. O Cônego registrou aspectos
físicos e culturais do município, a partir de documentos e memórias pessoais.
Expressa sua opinião, criticando, principalmente, as perdas patrimoniais que
ocorreram durante os anos. Algumas transformações foram registradas em
fotos e documentos, outras encontram-se guardadas nas memórias de pessoas
idosas que fazem relatos importantíssimos que merecem atenção e requerem
registro, para que não se percam com o tempo. As duas principais igrejas, que
são uns dos poucos remanescentes da arquitetura colonial, sofreram grandes
alterações físicas. São necessárias ações de preservação em Barra Longa
para que seu patrimônio cultural permaneça, e para que não se perca no tempo
por falta de registros. A ausência de um órgão de proteção e de catalogação do
seu acervo faz com que grande parte dos registros não seja resguardada. A
descontinuidade do interesse por parte dos gestores pelo patrimônio é um dos
fatores que colocam em risco a sua conservação. As peculiaridades de uma
cidadezinha do interior, com traços culturais bem típicos, precisam ser
cuidadosamente preservadas. A memória de um povo pode ser retratada
através de registros orais, que passam de geração a geração, mas para que
sobreviva e não perca sua especificidade, torna-se necessário o registro
adequado e um competente programa de educação patrimonial.
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A cidade de São Luís é inicialmente habitada por índios tupinambás e tem seu
direito de exploração concedido a Portugal pelo Tratado de Tordesilhas,
contudo sua fundação só é reconhecida com a ocupação francesa em 1612 e
edificação do Forte São Luís. A escolha do local para a implantação do forte foi
cuidadosamente realizada, visando facilitar a defesa do solo. Essa área
consiste no núcleo embrionário da cidade e corresponde a uma das praças
mais importantes da cidade atual, conhecida como Praça Dom Pedro II. Este
trabalho objetivou pesquisar as transformações urbanísticas, arquitetônicas e
as funções exercidas por esse espaço ao longo da história de São Luís. Para
tanto estudou-se brevemente sobre a história da cidade e, posteriormente, fez-
se um recorte histórico na área de estudo e uma análise tipológica das
principais edificações que compõe o conjunto arquitetônico na praça, entre
elas: Igreja da Sé, Palácio dos Leões, Palácio de La Ravardière, edifício João
Goulart, entre outras. O espaço, inicialmente denominada Avenida
Maranhense, teve seu nome atual instituído em 1925, através da Resolução
n.340, de 30 de novembro. A Praça D. Pedro II passou por diversas
intervenções que transformaram significativamente seu aspecto ao longo dos
anos, operações que alteraram desde disposição dos canteiros até a
pavimentação e iluminação. De forma menos significativa, pequenas
intervenções foram realizadas, buscando conservar a estrutura existente. A
análise tipológica se propôs a ilustrar como as modificações em cada edifício
afetam a paisagem da Praça Pedro II. Como exemplo a Igreja da Sé, sua data
de construção, 1622, aproxima-se a da fundação da cidade. Inicialmente uma
construção em pedra e cal, teve seu modelo original demolido e reconstruído
em 1680. Apesar das diversas intervenções realizadas, a mais importante é a
de 1922, na qual teve sua fachada modificada. A análise propriamente dita é
feita através da divisão da fachada de cada edificação em níveis horizontais e
verticais, onde se faz a identificação de cada elemento, indo desde o número
de esquadrias até elementos ornamentais observados, especificando, quando
possível, qual o estilo e material apresentado por cada um. As informações
obtidas permitem concluir que a história da Praça Pedro II se entrelaça à da
cidade, estando presente desde sua fundação e acompanhando seu
crescimento. As diversas funções exercidas pela praça revelaram-se no
desenvolvimento da pesquisa, exercendo desde o papel de núcleo embrionário
até funções militares, como forte da cidade em sua fundação; políticas, sendo a
sede do poder administrativo estadual e municipal; religiosas, abrigando a
Catedral de São Luís; e, mais recentemente, de turismo, com hotéis e também
como rota dos passeios que ocorrem no centro histórico. Esse espaço mostrou-
se de suma importância para a cidade colonial e se mantém preservado para a
cidade moderna.
RESUMO
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RESUMO
RESUMO
Este artigo tem como objeto de estudo do conjunto urbano da Praça Pedro II
em Teresina, capital do Estado do Piauí e configura mais um produto da
Pesquisa do Patrimônio histórico urbano e arquitetônico do entorno da Avenida
Antonino Freire e da Praça Pedro II: memória e usos do Núcleo de Estudos da
Arquitetura Piauiense – NEAPI do Centro Universitário UNINOVAFAPI.
RESUMO
RESUMO
Para a obtenção dos dados sobre a percepção dos diversos agentes sociais
envolvidos na preservação do patrimônio serão utilizadas entrevistas
realizadas, por Flavia de Assis Lage, para elaboração da dissertação cujo titulo
é “A Gestão do Patrimônio Cultural em Minas Gerais: novas dimensões e
paradoxos”, transcritas nos anexos desse trabalho.
RESUMO
RESUMO
RESUMO
Por muitos anos parte das edificações da rua Sapucaí estiveram abandonadas
e fechadas para uso, o que vem sendo gradualmente modificado com a
retomada do uso dessas edificações num processo recente, desde 2010.
Através de ações de micropolítica de alguns coletivos da cidade, como
ressonância dos movimentos políticos de ocupação da Praça da Estação nas
adjacências da rua Sapucaí, várias intervenções urbanas foram ocorrendo,
primeiro na própria rua, chamando atenção para a paisagem urbana, com
ações de ocupação e lazer temporárias, blocos de carnaval etc e,
posteriormente, as edificações foram ganhando novos usos comerciais e de
serviços, como restaurantes, bares, escritórios e locais de entretenimento com
exibição de filmes, workshops de qualificação profissional etc, e, se destaca,
sem que as edificações tenham recebido reforma do tipo Retrofit, mantendo
assim a experiência estética de um espaço que estava em abandono e
possibilita, agora, novas experimentações.
RESUMO
RESUMO
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Por isso, este trabalho tem como objetivo apresentar esta comunidade a partir
de seu processo histórico de estruturação, associando a construção de
tradições e cultura através da sua relação com o território – seus saberes e
modo de viver. Envolvendo os membros da comunidade como atores deste
processo, pretende-se demonstrar a identificação dos patrimônios culturais
com base na metodologia de Inventário Participativo (IPHAN) a fim de gerar
subsídios para a construção do processo de educação patrimonial.
RESUMO
RESUMO
O Brasil está entre os 10 países no mundo com o maior PIB, porém, também
está na lista dos 10 países com maior desigualdade social. Essa desigualdade
muitas vezes é acentuada pela falta de planejamento urbano e pelo
crescimento desordenado das cidades - entre as quais podemos citar Maceió-
AL. A capital alagoana, como muitas cidades litorâneas do Brasil, apresenta a
faixa de orla marítima basicamente ocupada por uma elite financeira. Seu
crescimento urbano se dá principalmente a partir dos investimentos privados,
que visam atender uma pequena faixa privilegiada da população, em
detrimento de uma urbanização coordenada pelo poder público - que deveria
privilegiar o interesse social e a democratização do uso da cidade.
Maceió é uma das cidades que cresceram mais rapidamente nos últimos anos
no Brasil e, atualmente, o foco de sua expansão imobiliária se direciona para o
seu litoral norte. O Zoneamento apresentado no Plano Diretor de Maceió
(2005) e no Código de Urbanismo e Edificações do Município de Maceió (2007)
permite a construção de edifícios verticais com até 20 pavimentos, na faixa
litorânea iniciada no bairro de Jacarecica até parte do bairro de Riacho Doce
(excetuando o pequeno trecho da ZIAP 6 - Foz do rio Jacarecica).
Preocupados com a crescente expansão e verticalização desordenada
do litoral norte, moradores e frequentadores dos bairros de Guaxuma, Garça
Torta e Riacho Doce, iniciaram, em 2014, uma mobilização social que deu
origem ao movimento “Abrace a garça”. Movimento que defende o crescimento
urbano sustentável do litoral norte e maior participação popular frente às
decisões do poder público sobre a cidade. O movimento propõe a
implementação de políticas públicas pautadas no interesse social e não do
mercado imobiliário.
RESUMO
RESUMO
O tema deste trabalho tem como enfoque uma leitura sobre o processo de
tombamento do Centro Histórico de Cuiabá a partir de pesquisas em busca do
valor atribuído, propondo fazer reflexões sobre o processo de tombamento e
também, sobre o seu processo de patrimonialização, voltando-se para os
conflitos que compuseram esse processo, através da análise das diferentes
narrativas das instituições sociais da esfera municipal, estadual, federal e
comunidade. Procurando entender de que forma estes agentes interagiram não
somente no campo das ações, mas dos debates estabelecidos durante o
processo de tombamento. Que tipo de valor foi atribuído? O que foi
reconhecido como portador de valor naquele processo?A cidade tem os seus
usos e suas relações estabelecidas. Entende-se que a forma como as pessoas
usam e interagem é um caráter muito forte e difícil de conhecer, perceber e
trabalhar com ele. Observou-se que a denominação Centro Histórico é pouco
reconhecida pela comunidade que frequenta esse lugar. Acredita-se que o
nome do lugar é atribuído pelas relações que as pessoas possuem. A questão
do nome é significativa, afinal “o que as palavras significam e o que o outro
atribui aquela palavra que eu uso?”. Além de Centro Histórico quais as outras
denominações usadas, e quais os seus valores? Propõe-se também
compreender sobre o envolvimento da comunidade nesse processo de
patrimonialização, visto que o contexto histórico que permeava o processo de
tombamento do Centro Histórico de Cuiabá estava passando por um processo
de democratização nacional. Tal contexto apresentava como marco a
Constituição Federal de 1988, a qual, numa perspectiva específica de
patrimonialização, além de ampliar o conceito de patrimônio, postulava sobre a
maior abertura da participação de outros atores sociais nas políticas de
preservação. Busca-se identificar quais os instrumentos usados ou não no
processo de mediação entre as atuações dos órgãos públicos envolvidos e a
sociedade. Perceber se a atribuição de valor da população, o que ela
valorizava ou não foi incluso como variável nesse processo.
RESUMO
RESUMO
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RESUMO
1) RESUMO
2) ABSTRACT
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RESUMO
O presente artigo tem como objetivo geral apresentar o sítio histórico da cidade
de Floriano, situada ao sul do estado do Piauí, a partir de uma abordagem que
evidencia dois aspectos principais: as características arquitetônicas
predominantes nas diversas tipoligas da cidade, como: residências, igrejas,
casarões, escolas e hospitais; seguida de uma reflexão acerca dos
instrumentos e agentes para a proteção do patrimônio da preservação do
patrimônio nível nacional, estadual e principalmente municipal. Desenvolveu-se
a partir da percepção da crescente descaracterização da arquitetura histórica
da cidade, como uma das consequências da fragilidade e/ou inexistência de
instrumentos de proteção em algumas das esferes de proteção, e baseou-se
em uma metodologia que se utiliza de levantamentos físicos in loco,
levantamentos bibliográficos e documentais. Resulta na percepção da
necessidade do estabelecimento de políticas de proteção para a salvaguarda
desse importante patrimônio, que são referências que caracterizam e fazem
parte da história desse município.
RESUMO
RESUMO
RESUMO
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Este artigo tem como objetivo apresentar uma parte da monografia de final de
curso de especialização em Acessibilidade Cultural, promovido pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro em parceria com o Ministério da
Cultura. Este trabalho pretende problematizar a questão das obras no entorno
do Espaço Cultural Barroquinha, situado no Centro Histórico de Salvador (BA).
Como questão principal se as mesmas atendem aos critérios de acessibilidade
necessárias para que as pessoas com deficiência possam desfrutar do direito à
cultura. Para tanto, o trabalho apresenta uma contextualização e atualização
das legislações vigentes de Patrimônio Cultural e Acessibilidade, um panorama
histórico sobre o bairro da Barroquinha, pontuando a direito cidade e situando
os mais pobres e as pessoas com deficiência; e por fim apresentação do
Espaço Cultural Barroquinha e avaliação de acessibilidade da Ladeira da
Barroquinha (utilizando parte do instrumento desenvolvido pelo Núcleo de
Design Gráfico Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande do Sul).
RESUMO
RESUMO
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Este trabalho se insere nos estudos que tratam da participação social nas
políticas públicas, especificamente relacionado à preservação de Sítios
Históricos Urbanos no Brasil. A participação social nas políticas públicas é um
tema cada vez mais estudado e discutido, num momento de crise do modelo de
representação política que ocorre no contexto nacional e internacional, com
desconfiança por parte dos cidadãos em relação às instituições políticas
tradicionais e ao esvaziamento dos partidos políticos. Ao mesmo tempo, a
população reivindica, cada vez mais, seu direito de participar de decisões que
afetam direta ou indiretamente sua vida. Para a preservação do patrimônio, a
participação social é condição indispensável, entretanto, não é efetiva na
política patrimonial do Brasil. A ausência de participação acarreta
consequências negativas na preservação do patrimônio. A população, em
geral, não participa do processo, conhece pouco sobre o patrimônio e, por isso,
não se sente comprometida, não se relaciona com o bem tombado e não lhe
confere o valor esperado. Não há instrumentos para participação social
definidos na política de proteção patrimonial, por isso a participação se dá de
diferentes formas e com diferentes graus de envolvimento, a depender de cada
projeto e de seus gestores. Nesta pesquisa, estabelece-se como recorte
temporal a Constituição Federal de 1988, por esta ser considerada a
Constituição Cidadã, que possibilita a criação de diversos espaços e
instrumentos para participação da sociedade nas decisões relacionadas às
políticas públicas. Como recorte espacial, estabelece-se o Sítio Histórico
Urbano, por ser a cidade o lugar propício ao exercício da democracia e os
sítios históricos, por ser interesse do estudo o patrimônio entendido como
conjunto, e não edificações ou monumentos isolados. A pesquisa objetiva
identificar estratégias para participação social na preservação de Sítios
Históricos Urbanos. Para isso, adota o Sítio Histórico de Santa Leopoldina, um
dos cinco Sítios Históricos do estado do Espírito Santo, tombado pelo Conselho
Estadual de Cultura em 1983, como objeto concreto de experimentação de
metodologia participativa visando o estabelecimento de estratégias para
participação social na preservação do sítio. Para isso, realiza-se revisão
bibliográfica sobre a participação social, seus instrumentos e metodologias;
análise do Sítio Histórico de Santa Leopoldina no campo urbanístico-ambiental,
socioeconômico e da gestão urbana e do sítio histórico. A participação social
nas políticas públicas com qualidade é uma questão complexa e por isso não
vai se tornar efetiva rapidamente, mas, para que seja um dia alcançada, é
necessário começar colocá-la em prática.
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O estudo da paisagem discute sua formação por meio dos elementos culturais
e naturais em todos os seus aspectos, enquanto o estudo do edifício é
compreendido por meio da sua materialidade e contexto urbano. As teorias da
restauração são de suma importância para o desenvolvimento de uma
metodologia específica de análise em obras de intervenção ou restauro em
bens de interesse cultural. Dessa forma este artigo parte do entendimento das
etapas de intervenção em um bem patrimonial arruinado, analisando questões
que envolvam paisagem, monumento, ambiência e técnica em todas as suas
especificidades. Toma como estudo de caso um conjunto de ruínas localizadas
no centro histórico de São João del-Rei (MG), a partir da abordagem de seu
histórico, enfatizando as transformações sofridas ao longo do tempo, até sua
conformação atual. O objeto em questão insere-se em um complexo de
construções caracterizadas como fortificações da Guerra dos Emboabas,
dentro do perímetro de entorno de tombamento do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). O interesse pelo estudo dessas ruínas
nasce da preocupação com a conservação da memória que se faz necessária
e se consolida em proposta de intervenção apresentada com base nas teorias
do restauro. A ruína é o testemunho da idade, do envelhecimento e da
memória, podendo nela estar expressa a essência do monumento, fazendo-se
imprescindível sua permanente conservação. Em São João del-Rei, os
monumentos arruinados não tem sua preservação assegurada, em parte pela
ausência de diretrizes voltadas para esses bens, assim como por atitudes da
própria população que, na maioria das vezes, não entende a importância da
proteção de seu próprio patrimônio. Pretende-se, aqui, despertar o potencial do
ambiente analisado como um espaço de lazer, entretenimento e cultura para
moradores, através de proposta projetual, contribuindo para a valorização da
história da cidade e da paisagem urbana.
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Título:
Resumo :
Ano 2017
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Para tanto, as referências teóricas estudadas serão, “O Artífice” que trata dos
trabalhos artesanais e suas habilidades, associando o trabalho feito à mão,
com o trabalho da mente, “As grandes cidades e a vida dos espíritos” e
“Passagens”. Serão analisadas a partir do estudo das obras seminais de
Richard Sennett (1943), Walter Benjamin (1994), Stella Bresciani (2005) e
Simmel, (1903). Os dados obtidos na pesquisa de campo serão analisados à
luz das teorias previamente apresentadas.
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4) Realizar uma tabela com os dados obtidos e gerar uma comparação entre as
transformações ocorridas entre as três cidades envolvidas.
RESUMO
A busca de formas de suprir uma parte desta demanda é o tema deste artigo,
relatando parte do desenvolvimento e do processo de elaboração de um livro
infantil e juvenil sobre características da arquitetura civil e da paisagem urbana
das cidades históricas como um instrumento de Preservação do Patrimônio
Cultural Edificado.
RESUMO
Este artigo apresenta uma análise crítica bibliográfica que teve como objetivo
contextualizar, em uma região de Minas Gerais, a pesquisa sobre os
brinquedos e jogos tradicionais que, passando de geração em geração, foram
assumindo versões particulares na produção artesanal. A finalidade é verificar
a presença e dessa forma registrar e preservar a memória de objetos lúdicos
que podem estar fadados à extinção. Defende-se a realização desta
investigação no campo do design afetivo e da memória de um povo, num
movimento de mapear, registrar e preservar objetos biográficos que, em sua
mistura de materialidade e socialidade, fazem parte da memória e da
identidade dos grupos de brincantes. Apesar de toda a construção
contemporânea em torno das novas tecnologias, constata-se que há práticas
lúdicas muito antigas e tradicionais que se mantêm vivas no patrimônio cultural,
deixando fortes alguns brinquedos na condição de mensageiros de uma
memória coletiva. Para Latour (2001), há uma simetria a ser explorada entre
sujeitos e objetos: os humanos criam objetos interferindo inteiramente sobre
eles, mas estes objetos também interferem nas formas de viver, de ser e estar
no mundo dos homens, pois a vida do ser humano não transcorre isoladamente
da ação que os objetos exercem sobre eles. Nesta primeira etapa do projeto,
para seguir o desenho deixado por estes objetos, foram realizadas
observações deste estudo no sentido de fundamentar a entrada no campo para
a verificação das práticas artesanais vigentes na região. Entende-se que essa
pesquisa de design afetivo, em torno dos brinquedos artesanais que ganharam
relevância afetiva através da história e se constituíram como indícios de
tradição que passa de geração em geração, pode trazer às crianças a
possibilidade de conhecer e atualizar, em suas práticas lúdicas, aquelas que
fazem parte da memória de seus grupos de pertença, de seus fazeres e
interações com materiais.
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No decorrer destes dez anos fatos dos mais variados ocorreram destacando-
se: a falta da construção de um relacionamento de pertença entre o Campus e
os moradores da cidade ao ponto da grande maioria dos alunos que se
matricularam nos cinco cursos que fizeram parte da proposta acadêmica inicial
serem oriundos da capital e de outras cidades do Estado; processos de
violência contra os estudantes que atingiram seu auge em meados de 2014
que resultaram na suspensão temporária das aulas e na posterior transferência
das atividades dos cursos de Dança e Teatro para a sede da UFS em São
Cristóvão; falta de conservação e restauro técnico científico das edificações
históricas ao ponto do desabamento de um dos arcos das ruinas das
edificações em 2017 e da interdição do sobrado número 117 a
aproximadamente 4 anos.
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Pequenos museus podem ser os mais frágeis e vulneráveis, aqueles que não
possuem um planejamento claro e de conhecimento de toda a sua equipe
estão ainda mais vulneráveis.
Com o intuito de cativar o público este artigo tem relata algumas ações
educativas que podem ser desenvolvida no Museu Educativo Gama D’Eça e
Victor Berssani, instituição pertencente à Universidade Federal de Santa Maria.
Cabe ressaltar que as ações identificadas podem ser adaptadas para o Museu
visto que em geral são ofertadas por grandes instituições museológicas e
podem não representar a atual realidade do Museu. Desse modo, os museus e
os patrimônios, assim como diversos outros elementos simbólicos, precisam
ser vistos como dispositivos de criação e invenção de representação,
narrativas, imagens sobre o passado e a memória.
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O DIREITO À CIDADE
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O teatro no Brasil tem suas origens no século XVI com Padre Anchieta e suas
peças de catequização, mas a construção do primeiro espaço para as artes
cênicas só foi concretizada em 1770, data de inauguração do mais antigo
teatro brasileiro em Ouro Preto. Com quase trezentos anos da existência
dessas casas de espetáculo no Brasil, uma questão emerge: onde e como está
preservada a memória desse patrimônio artístico, sendo o teatro parte tão
representativa da cultura brasileira? Esse patrimônio das artes cênicas assume
diversos formatos, podendo abranger tanto o patrimônio arquitetônico, na forma
dos edifícios teatrais e casas de espetáculo, como seu patrimônio móvel –
gravações em vídeo, fotografias, libretos, materiais de divulgação, além do
figurino e do cenário produzidos especificamente para cada obra.
Considerando o cenário exposto, surge uma indagação interessante: que é
feito com esse patrimônio móvel? Mais especificamente, o que é feito com o
figurino das peças de teatro e espetáculos de ópera e dança após o período de
apresentação?
Buscando destrinchar essa última questão, este trabalho apresenta uma
análise do processo de conservação dos figurinos produzidos pela Fundação
Clóvis Salgado para espetáculos apresentados em um dos mais importantes
teatros do estado de Minas Gerais: o Palácio das Artes. Com base em
entrevistas, visitas técnicas e materiais de referência, é feito um diagnóstico do
processo de preservação do figurino - sob responsabilidade e gestão de um de
seus equipamentos culturais, o Centro Técnico de Produção (CTP) - desde o
inventário das peças produzidas até a higienização, arquivamento e
catalogação final do acervo devolvido após a execução do espetáculo. Nesse
diagnóstico, são levantadas, também, as condições ambientais e de
infraestrutura dos galpões e instrumentos utilizados para armazenamento das
peças. Além disso, o presente estudo discorre brevemente sobre a história da
conservação do patrimônio móvel artístico no Palácio das Artes e apresenta
algumas aplicações desse figurino guardado e preservado.
RESUMO
RESUMO
Desta forma, cria-se um olhar, mais apurado dos alunos, que irá se transformar
em aprimoramento da sua formação profissional, ao mesmo tempo que, estes
estudantes trazem novos olhares para os funcionários do MIS.
RESUMO
RESUMO
Palavras-chave: Patrimônio.Associação.Pertencimento
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS
RESUMO
RESUMO
RESUMO
Quando uma cidade vai se fazendo no sítio, várias são as razões de ser de
seus gestos urbanos. Dentre elas, situa-se a relação do homem com a
natureza e, no contexto em que se insere a cidade de Maceió, ela tem
aparecido determinante no processo de sua apropriação física e imagética.
Desde a situação geográfica da cidade – uma faixa de terra entre o mar e a
lagoa, até sua toponímia que significa “o que tapou o alagadiço”. Um dia, no
seu começo, essa atmosfera foi repelida pelos princípios higienistas e a cidade
buscou vencer seu destino de ilha. Mais tarde, outro movimento moderniza a
cidade, balizado pela sedução da feição original do lugar. A orla marítima
passou a ser apropriada pela especulação imobiliária e pela Indústria do
Turismo que fizeram dos traços geográficos uma marca construída pelo
Marketing. Nesse processo, devido ao distanciamento do centro urbano, alguns
cantos, por um tempo, se mantiveram salvos das interferências drásticas da
urbanização. Cantos da cidade de Maceió que nem se viam parte dela e que,
por isso, puderam se construir a partir de gestos lentos, ao passo da rotina da
convivência – como os bairros Garça Torta e Riacho Doce, a 10 km do centro
da capital no sentido de seu litoral Norte. Nas últimas décadas, esses
parênteses urbanos têm atraído um outro habitante, o que percorre o lugar em
busca de um ambiente distinto da “cidade grande”. Tem seduzido também, por
meio da propaganda, outros que querem ser dali moradores e buscam uma
atmosfera paradisíaca reforçada pelos novos panfletos de venda de edifícios
de 20 andares. Contudo, habitantes fixos e fluxos, parecem estar às margens
do conteúdo, dos processos, das dinâmicas e memórias daquele lugar que
justificam seus próprios aspectos atraentes. A ideia desta proposta de artigo é
apresentar o processo de estudo que tomou a experiência lúdica como método
de acessar a história do lugar, visando o registro e a socialização de um
conhecimento baseado na empiria e na oralidade de famílias de moradores que
por gerações participaram da construção daquela paisagem com suas próprias
naturezas. Tal experiência consistiu em uma contribuição para a historiografia
de dois bairros no limiar de drásticas mudanças em suas feições físicas e, por
extensão, em suas relações cotidianas. Além disso, os produtos da pesquisa
constituem-se, especialmente, um resultado de exercício de outros
mecanismos de identificação de um rico conteúdo silencioso e invisível,
funcionando como uma ferramenta incitante de relações de pertencimento
entre os habitantes e o próprio lugar que ele habita, na medida em que
favorece o compartilhamento de histórias e memórias. O trabalho, portanto,
aborda percursos subjetivos de um canto da cidade, ou seja, de relações
cotidianas hoje ameaçadas que se deram à beira de mar, de rio e de morro,
que foram reformatadas na linguagem de um objeto de cunho extensionista
com potencial de uso enquanto instrumento de patrimonialização.
UM POUCO DE CADA
RESUMO
A antiga colônia Hammonia, que já foi distrito de Blumenau possui uma áreas
de 247,3 m² e possui cerca de dezoito mil habitantes. Situa-se encravada em
vales com declividade acentuada, sendo entrecortada por rios caudalosos com
corredeiras e razoável extensão de florestas nativas preservadas. Há diversas
comunidades abrangendo patrimônio cultural preservado (arquitetura
enxaimel), habitantes fluentes nos idiomas de seus ancestrais a exemplo de
Sellin, Dalbergia, Rafael, Ribeirão das Pedras e outras. Neste contexto, pratica-
se caminhadas ao ar livre na floresta (wandern), ciclismo, tirolesa, rapel,
raffting, dentre outros esportes radicais. Permanecem ainda os clubes de caça
e tiro amadores, clubes de bolão, corais, grupos folclóricos adulto e infantil
bandas musicais.
Merecem ser valorizados os conhecimentos dos habitantes e documentá-los,
seja a memória, os saberes e suas diversas interfaces, o idioma e os dialetos,
as canções, as receitas, fabricação dos produtos caseiros, bolos (Kuchen),
geléias, conservas como sauerkraut (chucrute), cervejarias artesanais, cultivo
de uva e produção de suco e de vinho, o artesanato, os lugares, métodos
construtivos, conhecimentos de restauro de edificações enxaimel, energias
limpas como as rodas d´água, engenhos e moinhos, nas festas, nos pic-nics,
os bailes, cultivo de trutas e outros. A ideia é de que os saberes se propaguem
e se perpetuem no tempo e que sejam replicadas através das gerações e para
os turistas.
RESUMO
RESUMO
Título: Uma rua de muitos lugares: roteiro pelo Centro Histórico de Cuiabá
RESUMO
lf_lobato@yahoo.com.br
RESUMO
A cidade de Teresina tem como uma das várias marcas da sua paisagem
urbana a variedade de edificações com feições neocoloniais, sendo as
construções originalmente residenciais predominantes nesse contexto. Um
exemplar distinto dessa produção é o Memorial Zumbi dos Palmares,
inaugurado no dia 25 de julho de 2007, que abrigou originalmente uma escola,
construída como parte de um esforço comum no âmbito nacional para a difusão
da educação e muito importante, durante muitos anos, para a cidade de
Teresina. Diante disso, o presente artigo objetiva apresentar as características
dessa edificação como parte do cenário local e discutir o seu uso como um
importante recurso de educação patrimonial na cidade, além da relação deste
com a preservação das características do prédio. Baseia-se em uma
metodologia que englobou principalmente levantamentos bibliográficos,
documentais e físicos in loco, resultando em uma discussão sobre educação
patrimonial e preservação do patrimônio edificado teresinense.
SILVA, CARLIENE LIMA E (1); SILVA, WANDERSON LUIS SOUSA E (2); SOUSA,
TAIANNE VANNE NECO (3); MOREIRA, AMANDA CAVALCANTE (4).
RESUMO
O centro histórico da cidade de Teresina-PI tem sido descaracterizado significativamente no decorrer
das últimas décadas, especialmente pela transformação quase que total dessa área que, originalmente,
abrigava principalmente os usos residenciais, comerciais e institucionais em uma zona, atualmente, de
serviço, comercial e institucional. Diante desta percepção, neste artigo abordamos essa transformação
e sua relação com a fragilidade dos instrumentos de proteção a partir do caso da Rua Barroso, no
quarteirão que ladeia a Praça Landri Sales, logradouro de grande destaque na cidade, especialmente
pela sua estreita relação com a história e a memória da cidade de Teresina. Por intermédio de estudo
temporal das mudanças e reconstituição do perfil de uso das edificações, através de fontes
documentais, bibliográficas e entrevistas, constatou-se a extrema descaracterização dessas
edificações, resultando em profunda mudança da paisagem urbana, sobretudo na substituição da
tipologia residencial por distintas funções.
Palavras-chave: patrimônio arquitetônico, residências de Teresina-PI, Rua Barroso, Praça Landri
Sales.
Assim, em seu primeiro plano urbanístico, Teresina, que segundo Brandim, “já nasceu sob os
auspícios do discurso moderno”, demonstrava cuidado com os espaços livres ao delimitar
sete espaços para futuras praças. A Praça Landri Sales só foi construída em 1955 – apesar
de ter sido incluída no plano Saraiva de 1855 –, durante o governo de Agenor Barbosa de
Almeida (1955 – 1959).
O projeto de autoria e execução de Raimundo Nonato Portela de Melo foi concebido, segundo
MARQUES (2005, p. 12) “em estilo eclético, com lago, fonte com elementos decorativos, arco
em pedra, gruta e balaustradas neocoloniais em semicírculos, e alguns elementos do estilo
moderno como canteiros geométricos desestruturados distribuídos de forma orgânica”.
Nesse período, a praça atraía uma população diversa desde crianças a idosos, estudantes do
Liceu Piauiense, comerciantes – o que ocorre até hoje. “Com o passar dos anos a praça sofreu
fortes descaracterizações em seu espaço. E, no final da década de 1970, o lago, a fonte e a
gruta foram extintos por se tornarem foco de contaminação e refúgio para marginais”
(MARQUES, 2005). A Praça também sofreu com o processo de mutação dos usos daquela
área. Além da desfiguração ocorrida por falta de manutenção em seu mobiliário e
equipamentos, a mudança do uso residencial para outros usos (comercial, institucional ou
serviço) no entorno afetou a sua utilização. Só após uma reforma realizada em 2006, a praça
recupera ar de espaço público.
Visto este contexto e a aplicação dos novos códigos urbanos, Teresina passou por uma
‘cirurgia’ para dar lugar a novos tipos de moradia nas demais zonas da cidade, sofrendo,
segundo Lima, um progressivo e irreversível processo de verticalização, com o crescente
aumento de enormes edifícios que passavam a ocupar, intensamente, espaços vazios, em
áreas nobres da cidade, conjugando a construção de conjuntos habitacionais nos lugares
mais longínquos da periferia, alterando sensivelmente a paisagem.
Diante desse processo, nosso objeto de estudo, localizado na Rua Barroso, são as
construções pertencentes ao quarteirão que ladeia a praça Landri Sales, em seu lado
esquerdo, no sentido norte-sul.
Imóvel 664
Datada como a construção mais antiga dentre as estudadas, a atual sede do Conselho
Municipal de Educação do Piauí (CME-PI) – demarcada como o lote 1 (Figura 01) possui um
dos edifícios com as características formais mais bem preservada do quarteirão.
A casa foi construída pela família do dono original, o clínico Agenor Barbosa de Almeida, figura
importante na sociedade piauiense da época por ter exercido vários cargos públicos de
destaque, tendo sido também prefeito da cidade de Teresina entre 1955 e 1959, construindo
durante seu mandato a praça Landri Sales (1955), que se localiza em frente sua antiga
residência.
Durante um longo período, depois de Agenor e sua família se mudarem para o Rio de Janeiro,
a casa permaneceu abandonada, permanecendo assim até o início dos anos 2000, quando
funcionou na edificação um estabelecimento comercial por nome de JC Livros Usados – que
ocupou o estabelecimento até 2009. A antiga residência é alugada, atualmente, para a
Prefeitura de Teresina, sob jurisdição da Secretaria Municipal de Educação e Cultura
(SEMEC) desde 2010. Entretanto, somente a partir de 2014, o edifício passou a servir de sede
para o CME-PI.
Dos elementos arquitetônicos notados nesta construção que podem ser caracterizados como
pertencentes ao Estilo Missões são: poucos andares, uso de telha cerâmica do tipo capa
canal, alpendres com arcos plenos, guarda-corpo com balaustrada de alvenaria e o
revestimento rústico das fachadas com reboco grosso em relevo ou com texturas e desenhos
informais e variados – no caso do edifício, reboco ondulado que remete a escamas de peixe
com pintura impermeável. A maioria das características do Mission Style foi amplamente
utilizada em Teresina, mas é importante destacar que o pátio interno praticamente não existiu
nos exemplares encontrados na cidade, sendo essa uma das principais singularidades locais.
Por fim, segundo o Inventário de Proteção do Acervo Cultura de Teresina (IPAC) de 1998, o
estado de conservação do imóvel é classificado como bom com descaracterização reversível
– classificação esta que perdura até hoje.
Imóvel 658/650
Adjacente a propriedade supracitada, localiza-se o imóvel que pertencia a Domingos Fortes
Castelo Branco e foi adquirido em 1944 por Armênio Braz da Cruz, que residiu na mesma
moradia até o seu falecimento e era conhecido como um hábil alfaiate. A residência foi
construída inicialmente como uma única edificação e posteriormente bipartida. Atualmente,
as residências geminadas são habitadas por duas de suas filhas. No número 658, habita
Teresinha Reverdosa e no número 650, Conceição Nobrega.
Estes são os únicos imóveis que permaneceram com tipologia residencial e mantiveram bem
conservadas as suas características construtivas. Segundo o inventário do IPAC de 1998, as
casas possuem alvenaria em tijolo, revestido em pintura impermeável, cobertura em telha
cerâmica (telhado 1/2 cana artesanal), vedações em venezianas e vidro, vergas retas, beiral
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externo em cimalha e bica, beiral interno em bica simples, ferragens em grades de ferro,
soleiras e pisos internos em cerâmica esmaltada. Destacando que, ocorreram apenas
algumas alterações, notadas externamente, visando segurança e conforto térmico.
Imóvel 646/642
A casa seguinte é a de número 646, de propriedade do casal Pedro Falcão Lopes e esposa
Zelina de Assunção Silva, pais do Desembargador aposentado Augusto Falcão Lopes. Os
cônjuges residiram o imóvel contemporaneamente ao senhor Armênio Braz de Cruz. A
residência sofreu o mesmo processo notado na limitante direita. Em janeiro de 1981, segundo
o IPAC, as casas já constituíam dois núcleos independentes.
Apresentava ainda em 1998, segundo o IPAC, uso residencial; porém, no presente, o número
646, funciona como o Escritório Ednan Soares Coutinho Advogados Associados, fundado em
2003; e o número 642 é um estabelecimento do ramo alimentício com denominação de Casa
Grill Self-Service.
Figura 02: Fachadas do Imóvel 646/642 em 1998 (1); Fachadas do Imóvel 646/642 em 2017 (2).
Autor: Wanderson Luis, 2017.
Segundo o IPAC, em 1998, o estado de conservação era classificado como bom com
pequenas alterações; no entanto, atualmente constata-se um quadro bem diferente do
apresentado, onde as duas atuais fachadas encontram-se totalmente descaracterizadas. Das
citadas no estudo, esta é a edificação que mais sofreu alterações em sua fachada e
volumetria, sendo perceptível a adição de mais um pavimento e uso de material
contemporâneo no escritório de advocacia contrastando com a edificação geminada, Casa
Grill – que, por sua vez, tenta recriar, de modo infeliz, elementos arquitetônicos de fachadas
ecléticas.
Assim como a primeira casa citada, de Agenor Barbosa, a edificação caracteriza-se por seguir
os moldes do Estilo Missões, ressaltando a presença de: torreão de planta circular coberto
por telhado cônico, telhado movimentado coberto com telhas de capa canal, a quase
inexistência de beirais, alpendres com arcos plenos, revestimentos rústicos das fachadas com
reboco grosso em relevo.
Segundo Moreira (2016, p. 347), é possível ressaltar “que, nesse momento, popularizou-se
uma tendência já sinalizada no período anterior: a repetição de padrões, onde residências
com características extremamente semelhantes foram construídas em pontos distintos da
cidade.”, sendo possível deparar-se com diversos exemplares no centro histórico de Teresina.
O imóvel esteve por um período sendo alugado e posteriormente foi comprado pela
Associação do Pessoal da Caixa Econômica Federal - APCEF, em 1996, que precisou fazer
algumas reformas no telhado, piso e pintura, melhoramentos para promover a acessibilidade,
incluindo uma rampa de acesso na fachada principal e a criação de salas com o uso de
paredes de gesso, mantendo a edificação ainda muito bem conservada no modo como foi
construída.
O edifício de 3 pavimentos se destaca em meio aos exemplos estudados neste artigo tanto
por seu uso já comercial quanto por suas características formais modernistas. Dentre alguns
elementos arquitetônicos modernos presentes no edifício, podemos citar: uso de formas
geométricas, ausência de ornamentação, panos de vidros contínuos nas fachadas e uso de
brise-soleils. Além disso, também utiliza materiais construtivos característicos do movimento
moderno como o concreto armado, o vidro e o ferro.
Perfis de uso
Resultando das informações colhidas, estudadas e analisadas neste escrito, os perfis de usos
elaborados dentro de um recorte temporal de 20 anos – de 1997 a 2017 – evidenciam não
somente a descaracterização física de algumas das edificações que ladeiam o quarteirão da
praça Landri Sales, na rua Barroso, como também argumentam a favor a conservação de
exemplares representativos de estilos arquitetônicos relevantes. Todavia, a custódia e
sobrevivência do patrimônio arquitetônico físico, de certo modo, não percorre o mesmo
caminho da atribuição do ofício dessas construções. No que se confrontam patrimônio
arquitetônico e usos, a tendência é uma separação imediata dos dois termos, porém, esses
perfis esboçam uma certa relação entre os dois; onde, ora o uso dita a manutenção da estética
do edifício, ora a relevância arquitetônica da obra dificulte certas funções. Choay (2001, p.
230) diz que a arquitetura é a única, entre as artes maiores, cujo uso faz parte de sua essência
e mantém uma relação complexa com suas finalidades estética e simbólica.
Dentro desse recorte temporal, é notória a alternância de uso das edificações – queira elas
tenham sido resguardadas fisicamente ou não. Ao passo que a paisagem urbana foi alterada
juntamente às necessidades de uma nova vida citadina, as moradias se fizeram menos
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presentes, desenrolando uma nova malha para a cidade e proporcionando o ingresso de
novas funções.
Ponderando sobre os dois cenários retratados, descobre-se um certo equilíbrio entre os novos
usos de serviço e institucional, além da perpétua coexistência com o comércio – contexto
comum à região. Ao mesmo tempo, as residências são esquecidas em detrimento da aparição
destas novas tipologias de uso. Tal qual observa-se na ilustração (Figura 04), apenas dois
quintos dos imóveis investigados foi capaz de perdurar seu uso residencial primitivo, enquanto
que os demais se transformaram no decorrer dos anos.
Figura 04: Usos em 1997 (1); Usos em 2017 (2). Autor: Carliene Lima, 2017.
Conclusão
Cada cidade traz parte de sua história contada pelas edificações que compõem seu cenário
urbano. Esse conjunto é a lembrança viva e palpável da cultura e dos costumes daqueles que
estruturaram a configuração dos espaços que conhecemos hoje, sendo inegável a
necessidade de proteger esse acervo. Segundo Lemos (1981, pg.19)
O recorte estudado, demonstra perfeitamente essa situação. A medida que o centro assume
as características atuais, as residências, uma a uma, assumem outro uso. Entretanto, no
desenrolar desse processo, observam-se dois comportamentos distintos no que se refere a
edificação pré-existente. A primeira situação aparece nos edifícios do SEST/SENAT, n. 620,
e nos Escritório de Advocacia, n. 646, e Casa Grill, n.642. Existe uma completa omissão com
a construção original. Isso se deve, normalmente, a necessidade de negar à arquitetura
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existente uma nova função. Demolição, alteração do gabarito e descaracterização das plantas
baixas e de fachadas de forma irreversível são algumas das alterações observadas nesses
lotes. Em contrapartida, outras construções, como a atual CMEI, n.664, e APCEF, n.632,
entendem que a ideia de mudança de uso não necessariamente precisa estar atrelada a
alterações significativas na estrutura e/ou estética original do edifício. Esse comportamento,
no que diz respeito as intervenções nos bens arquitetônicos, foi publicado em um documento
denominado Carta de Veneza, conhecido no II Congresso Internacional de Arquitetos e
Técnicos dos Monumentos Históricos em 1964.
SANTOS, Lívia Maria Macêdo; AFONSO, Alcília; SILVA, Valério de Araújo; FREIRE, Pamela
K. Ribeiro Franco. Requalificação do Centro Histórico de Teresina: século XXI. Teresina:
Universidade Federal do Piauí.
SILVA, Guilhermina Castro; LOPES, Wilza Gomes Reis; LOPES, João Batista. Aspectos
relacionados ao uso e apropriação de praças em áreas centrais de cidades:
transformações e permanências. Curitiba: Editora UFPR, 2009.
RESUMO
No Brasil, considera-se que o estilo moderno arquitetônico foi inaugurado em meados da década de
1930, com a construção do prédio do Ministério da Educação e Cultura, em equipe liderada por Lúcio
Costa e consultoria de Le Corbusier. Contudo, esse estilo arquitetônico ganha impulso e se consolida
no país sob a figura do político Juscelino Kubitschek e sua parceria com o arquiteto Oscar Niemeyer.
O modernismo pretendeu a construção de um mundo público e comum em relação ao seu passado
contíguo, constituindo novos procedimentos, práticas e referenciais teóricos. Relacionar bases
sociais, teoria, prática e materiais fornecidos pela revolução intelectual, científica e técnica foi o
manifesto da arquitetura moderna e é também aquilo que conecta a obra de Niemeyer não apenas a
outros lugares do início do século XX, como também a outros lugares da história.
Pensados dentro da trama do modernismo brasileiro, os edifícios projetados por Niemeyer,
especialmente dentre as décadas de 1940 e 1960, desde a Pampulha até Brasília, ambas
reconhecidamente patrimônio cultural, adquirem sentido a partir do diálogo que o arquiteto procura
estabelecer entre seus projetos e o processo histórico global e que ele traduz no interior de sua
disciplina e seu exercício profissional.
A síntese entre tecnologia e forma, característica das obras de Niemeyer, ganha expressão durante
os principais anos de política de Juscelino Kubitschek, a saber, como Prefeito da capital Belo
Horizonte (1940-1945), como governador de Minas Gerais (1951-1955) e como Presidente da
República (1956-1961); bem como Juscelino encontra a expressão de progresso e modernidade, para
o desenvolvimento dos lugares por onde passou como político, nas obras do arquiteto.
Por meio de uma arquitetura monumental, vinculada ao poder político, Juscelino diminuía o papel do
indivíduo enquanto participação política na cidade, reforçando que a modernização do país era o
principal e, para tal, o sujeito deveria fazer parte da massa, sem se sobrepor a esta. Criando um
cenário da espetacularização através de uma arquitetura imponente, Juscelino também conseguiu
tirar o foco dos problemas econômicos advindos do endividamento estatal bem como da disparidade
social que se configurava junto com o Estado Moderno. O país crescia economicamente a duras
penas, mas crescia, e junto a isso foi consolidando uma imagem da arquitetura do poder em suas
principais cidades.
Dessa forma, o Estado é o principal propulsor das principais propostas arquitetônicas renovadoras
desde a década de 1930, que modificam nossas imagens sobre o conjunto da produção da cidade e
da paisagem. Do mesmo modo que a arquitetura se consolida como uma importante peça no cenário
político, fazendo parte da compreensão dos processos de reestruturação nacional, especialmente nos
processos de modernização e produção.
Palavras-chave: Modernismo; Política; Arquitetura; Poder; Patrimônio Cultural.
A síntese entre tecnologia e forma, característica das obras de Niemeyer, ganha expressão
durante os principais anos de política de Juscelino Kubitschek, a saber, como Prefeito da
capital Belo Horizonte (1940-1945), como governador de Minas Gerais (1951-1955) e como
Presidente da República (1956-1961); bem como Juscelino encontra a expressão de
progresso e modernidade, para o desenvolvimento dos lugares por onde passou como
político, nas obras do arquiteto.
De acordo com Danilo Macedo (2008, p.239), o contato entre Juscelino e Niemeyer
frutificaria e se consolidaria com a repercussão nacional e internacional de Pampulha. De
fato, durante a passagem de Juscelino pelo Governo de Minas Gerais (1951-1955),
praticamente todas as obras realizadas por Oscar no Estado de Minas Gerais devem-se ao
contato com o estadista; quer seja pela contratação direta do estado para a realização de
obras publicas, quer seja através de relações com membros destacados da elite política e
econômica mineira.
O “fracasso” desse projeto evidencia uma arquitetura voltada para enaltecer uma forma de
poder associada ao Estado e até mesmo à própria arquitetura. A intenção de se criar uma
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imagem forte para a cidade, com intenção de também elevar uma imagem de progresso,
futuro e melhores condições, desconsiderou as características da sociedade aristocrata
mineira à época, ainda muito tradicional e que prezava, dentre outras coisas, pela
propriedade da terra, conforto e consumo e, assim, não se subjugaria a um projeto de
moradia como o Conjunto Governador Kubitschek.
A primeira delas, de 1951, foi o Conjunto Governador Kubitschek, que segundo Danilo
Macedo, se tratava
Em 1953, em Belo Horizonte, Niemeyer projeta outra importante torre no centro da cidade o,
então, edifício sede do Banco Mineiro da Produção. Conforme Danilo Macedo (2008, p.
247), este edifício está disposto no nó viário mais importante do centro de Belo Horizonte, a
praça Sete de Setembro.
Fonte: Site Arch Daily. Fonte: Acervo da autora. Fonte: Site Descubra Minas.
Por fim, como último grande período da parceria Juscelino Kubitschek e Oscar Niemeyer
tem-se os anos de 1956 a 1961, quando Juscelino se torna Presidente da República e o
plano da construção de uma nova capital para o país é executado, sob os projetos
arquitetônicos de Niemeyer e projeto urbanístico do também modernista Lúcio Costa.
Ressalta-se ainda que,
Ainda, de acordo com Lauro Cavalcanti (2002, p. 94), “o jeito moderno brasileiro de fazer
monumentos conseguira conciliar economia e luxo, simplicidade e imponência”, nascendo
assim, sob o pretexto de desenvolvimento do interior do país e integração nacional, a nova
capital do Brasil: Brasília. Para o planejamento de Brasília houve um harmônico
entrosamento entre os desenhos de Lúcio Costa, os edifícios de Niemeyer, o paisagismo de
Burle-Marx e os artistas convidados para realizar as esculturas públicas.
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Ademais, Niemeyer teve em Brasília a oportunidade de consolidar, em larga escala, uma
linguagem pessoal que vinha se delineando em projetos isolados há quase duas décadas.
Nos palácios da nova capital e centro político nacional, o arquiteto atingiu uma composição
espetacular através de simplificação e ousadia nas formas exteriores, conseguindo, assim,
de forma simultânea, criar monumentos e símbolos nacionais. O projeto de Brasília era,
concomitantemente, arquitetônico e social e contribuiria para definitivamente eternizar os
nomes de Juscelino e Niemeyer nas páginas da história da política e da arquitetura, em
âmbito nacional e internacional.
Por meio dessa arquitetura monumental, vinculada ao poder político, Juscelino diminuía o
papel do indivíduo enquanto participação política na cidade, reforçando que a modernização
do país era o principal e, para tal, o sujeito deveria fazer parte da massa, sem se sobrepor a
esta. Criando um cenário da espetacularização através de uma arquitetura imponente,
Juscelino também conseguiu tirar o foco dos problemas econômicos advindos do
endividamento estatal bem como da disparidade social que se configurava junto com o
Estado Moderno. O país crescia economicamente a duras penas, mas crescia, e junto a isso
foi consolidando uma imagem da arquitetura do poder em suas principais cidades. De
acordo com Darcy Ribeiro (1985):
Referências
CAVALCANTI, Lauro. Quando o Brasil era moderno: guia de Arquitetura 1928-1960. Rio de
Janeiro: Aeroplano, 2001.
MIRANDA, Wander Melo (Org.). Anos JK: margens da modernidade. São Paulo: Imprensa
oficial do Estado; Rio de Janeiro: Casa de Lucio Costa, 2002.
TEIXEIRA, Carlos M. Em obras: história do vazio em Belo Horizonte. São Paulo: Cosac &
Naify Edições, 1999.
<http://www.academia.edu/10895962/imagem_dial%C3%A9tica_na_cidade>. Acesso em
maio de 2015.
RESUMO
O artigo trata do edifício-sede do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí (1972), situado na cidade de
Teresina-PI e projetado pelo arquiteto Acácio Gil Borsói durante o Governo de Alberto Tavares Silva
(1971-1975), período correspondente ao surgimento das primeiras obras arquitetônicas com estilo
brutalista na cidade de Teresina. Tem como principal objetivo como discutir a preservação desta
edificação, pela sua relevância histórica e arquitetônica para a cidade e fornecer o diagnóstico do
estado atual da obra estudada quanto à conservação e proteção do patrimônio, evidenciando a
fragilidade dos seus instrumentos de proteção atualmente. Justifica-se pela necessidade de estimular
a implementação de políticas mais incisivas de proteção deste importante exemplar e tem como
fontes o próprio objeto arquitetônico, tratado como documento pertinente para a elaboração da
pesquisa, publicações a respeito do tema e entrevistas com agentes que lidam com sua preservação
nas mais diversas esferas
Palavras-chave: Tribunal de Justiça do Estado do Piauí; Patrimônio Moderno; Acácio Gil Borsói;
Arquitetura Brutalista.
Possui como objeto de estudo o espaço delimitado pela Praça Desembargador Edgar
Nogueira, seu prédio principal e sua configuração no mesmo, desde o período de sua
construção até os dias atuais, que se consolidou como um dos ícones da arquitetura
moderna brutalista.
O Estado do Piauí fica localizado na região nordeste do país, sendo sua atual capital
Teresina. Teve como primeira capital a cidade de Oeiras, até o ano de 1852 quando a sede
do estado foi transferida para Teresina, cidade que foi estrategicamente projetada para
abrigar a capital piauiense por causa de proximidade com os rios Parnaíba e Poty, o que
possibilitava boas condições de navegabilidade na época e por estar perto da cidade de
No início da década de 70, o engenheiro Alberto Silva assume o governo do Piauí por meio
de eleições indiretas. Esse primeiro mandado é marcado por grandes obras como a reforma
do Hospital Getúlio Vargas, construção de estradas e da primeira etapa do estádio Albertão.
No entanto, apesar da gestão modernizadora de Silva, impulsionado pela a época do
milagre econômico brasileiro, a pobreza e a concentração de renda continuavam a aumentar
na capital piauiense. (REIS, 2013).
Na década de 1970, Teresina encontra-se entre as capitais brasileiras com elevadas taxas
de crescimento populacional, em um cenário urbano recheado de problemas, contradições e
desigualdades de ordem econômica e social. Pode-se listar entre as questões mais graves a
falta de moradia ou a moradia em condições inadequadas, casas construídas às margens
da estrada de ferro que cortava a cidade, às margens dos rios Poti e Parnaíba, no leito de
ruas.
Muitas são as razões que sustentam a saída dos trabalhadores rurais do campo para a
cidade. Eles sofrem muitas influências, o “atraso da agricultura tradicional” baseada na
agricultura familiar e de subsistência, em sua grande maioria não remunerada, sujeitas às
intempéries do clima, irregularidade na distribuição das chuvas, com períodos prolongados
de estiagens, aliados ainda à concentração de terras nas mãos de poucos, formando
imensos latifúndios, o que dificultava o acesso à terra aos pequenos produtores, obrigando-
os a trabalhar em sistemas agrícolas desfavoráveis para esses segmentos, comuns no
sertão do Nordeste, nos quais os trabalhadores rurais utilizam a terra de terceiros para o
cultivo e pagam com parte da produção, minguando ainda mais os escassos recursos do
homem do campo.
O Censo Demográfico de 1970 indica que a população urbana brasileira tinha ultrapassado
pela primeira vez a população rural. O processo de industrialização, o rápido processo de
urbanização em curso no país, somados ao formato da estrutura fundiária que imperava em
todo o território, fato que, no geral, provocava péssimas condições de vida do homem no
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campo, foram apontados como os principais responsáveis pelo deslocamento de milhares
de famílias para a zona urbana. O Piauí, acompanhando o que estava acontecendo em
outras partes do país, teve crescimento de sua população urbana, mas o fenômeno
concentrou-se nas principais cidades: Teresina, Parnaíba, Floriano e Picos, cidades que
concentravam 84,2% de toda a população urbana do estado. Acrescente-se que os dados
colhidos junto ao IBGE dão conta que o Piauí contava com apenas 32% da população
vivendo nas cidades. (IBGE, 2015)
Formou –se aos 25 anos em 1949, e junto com alguns colegas montou um escritório na
Avenida Rio Branco no Rio de Janeiro, iniciando a sua produção de edifícios com
características modernas, tendo como base os arquitetos Le Corbusier, Oscar Niemeyer e o
paisagista Roberto Burle Marx. Em 1951, com vontade de mudar Borsói vai à Recife para
ser professor na Escola de Belas Artes, o que mais tarde se transformaria em Ateliê de
Arquitetura, e que no futuro se tornaria a Faculdade de Arquitetura da UFPE, que está
bastante ligada a arquitetura regional, voltadas ao lugar onde está inserida.
“Em minha produção sempre procurei pôr em prática, conceitos de arquitetura como
obra acabada- como condição para sua plena realização – diferentemente de um
‘projeto’, mas, assumindo o controle da construção, da tecnologia e da
responsabilidade na condução do processo criativo. ” (Borsói, 1984.)
A linguagem brutalista difundida pela escola paulista, que tem como mestre o arquiteto
Vilanova Artigas talvez representasse uma referência na busca de uma continuidade por
uma assimilação entre a cultura paulista. Não negligenciamos esses fluxos, que se davam
entre arquitetos, governantes, e empresários do setor privado. A estética brutalista estava
associada não somente a principal capital economia do país, mas como uma tipologia das
grandes obras, fartamente encomendada por vários Estados, muitas já conhecidas por meio
do avanço das comunicações. Embora a técnica do concreto moldado in loco fosse nesse
momento uma ótima resolução para tipos de megaestruturas ou edifícios de grande porte,
havia uma imagem difundida pela nova arquitetura brasileira, que tinha fora do âmbito
erudito, sinuosidades representativas em cada camada social, ou popular.
O conceito de arquitetura brutalista, vem sendo trabalhado por diversos autores, dentre eles
está Ruth Zein, que afirma:
Como explica Zein (2006), o primeiro brutalismo foi utilizado pela primeira vez, em 1947, por
Le Corbusier, na obra da Unidade habitacional de Marselha na França, que adotou a
linguagem em demais produções até os anos 60, por meio de um conjunto característico de
pequenos e macro detalhes.
O novo brutalismo surgiu na Inglaterra, nos anos 50, com a produção da família Smithson
para um concurso de uma escola em Hunstanton-Norfolk, na qual foi empregada a solução
pela "honesta manifestação de estrutura de materiais" (FUÃO, 2000).
Fuão não concorda com a afirmativa de ter sido a obra da Escola em Hunstanton-Norfolk a
primeira a adotar o estilo brutalista, pois concorda com Reyner Banham, em: "O Brutalismo
em arquitetura, ética ou estética?", quando este autor cita que de fato, o primeiro edifício
que levou o título de Brutalismo, foi o Instituto de Illinois (1945-47) projetado pelo arquiteto
alemão Mies van der Rohe.
No final da década de 1960, chegam à cidade arquitetos diplomados como Antônio Luiz
Dutra de Araújo, Miguel Dib Caddah e Raimundo Dias. Antônio Luiz destacou-se com a
elaboração de diversos exemplares modernistas como o Ministério da Fazenda, na Praça da
Bandeira; o edifício Palácio do Comércio, na rua Senador Teodoro Pacheco; a matriz do
Banco do Estado do Piauí; a sede municipal da Caixa Econômica Federal, na Rua Areolino
de Abreu; e a sede da CEPISA, na Avenida Maranhão esta última com caráter brutalista.
Além de várias residências e outros edifícios em Teresina, Parnaíba e cidades no
O projeto está implantado na Praça Desembargador Edgar Nogueira, no bairro Cabral, zona
periférica ao centro de Teresina, sendo concebido como " um marco inscrito no tecido
geográfico, paisagístico e cultural da região", segundo colocou Marco Antônio Borsói
(BORSOI, 2006), que complementa: "Nele, os artifícios arquitetônicos do rigor geométrico
da composição, traçados reguladores, proporção, ritmo, escala e sentido monumental
reagem, dialeticamente, com a natureza livre e informal à sua volta." Além de ser um
exemplar ideal da arquitetura bioclimática, este edifício vem a ser uma das mais importantes
obras brutalista de Teresina, devido às suas soluções projetuais e construtivas.
Em 2001 foi construído um anexo ao edifício, que dialoga com o edifício principal, utilizando
o sistema de pré-fabricados, que foi construído em apenas cinco meses.
Nesse sentido, observa-se uma grande diversidade de ações nos edifícios modernistas pelo
potencial como patrimônio cultural. Entende-se as obras modernas como patrimônio cultual
tendo por base os escritos de fruição e apropriação da arquitetura como cultura material
descrito por Piñon:
[...]a noção de arquitetura como patrimônio arquitetônico tem uma dimensão pública
que é inerente à sua essência: a não ser que seja reduzido ao seu mero valor
econômico – em cujo caso seria suficiente para lhe conferir credibilidade – tanto no
seu aspecto afetivo e simbólico com no estritamente estético, o patrimônio requer
uma base social que o aprecie e lhe confira sentido histórico. (PIÑON, 2006)
De acordo com Argan (1991), não se deve haver na cidade uma diferenciação entre área
“histórica” e área “moderna”, para ele uma sociedade que não dá valor a sua história e tem
as obras de arte como peças do passado, fora de um momento contemporâneo, fazem com
que se conceba como obras de arte o que está nos museus, e assim se perca a noção de
fatos urbanos como fatos artísticos. Argan afirma que a cidade é obra humana, testemunho
de memórias, e, portanto, fato artístico. A distinção entre área “histórica” e área “moderna”
gera sentimento anti-histórico à zona nova da cidade e um caráter somente histórico à zona
antiga, assim, a cidade moderna cresce e a cidade histórica se estagna, refletindo na falta
de uso e de preservação discutida por Rossi.
Considerações Finais
Quanto ao prédio aqui apresentado, está vinculado espacial e visualmente com o seu
entorno e para onde há visão. O Tribunal, foi construído em 1972, e está implantado num
local com cotas mais altas e suas varandas dão uma visão da cidade de Teresina. A sua
topografia acidentada foi bem aproveitada, já que o edifício foi alocado aproveitando os
desníveis e se adequando aos mesmos, um dos motivos para que o primeiro pavimento seja
menor que os demais, enquanto isso o segundo pavimento tem ligação direta com a Praça
Des. Edgar Nogueira, pois estão na mesma cota.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Borsói sempre sensível ao espaço, coloca o prédio aberto e ao mesmo tempo protegido, o
que convida ao público em geral para entrar e usufruir.
Nota-se que a obra de Borsói utiliza –se de peças que tem papel estrutural, com um número
de elementos conciso do jeito que ele planejava, sempre evitando os gastos supérfluos em
seus projetos.
Isto acontece, de modo muito objetivo, como na escolha de materiais como o concreto, a
madeira, o vidro, como na quantidade de peças para montagem, desenhadas e detalhadas
pelo arquiteto. A economia não tornou o prédio simples e sim um representante do
movimento brutalista no Estado do Piauí.
Apesar de terem utilizado materiais pesados, a estrutura traz uma busca pela leveza, afinal
Borsói sempre nos lembra que seus edifícios são feitos de materiais sólidos, apoiados e
fincado no solo.
Acácio tirou partido dos materiais eleitos para projetar soluções bioclimáticas para este
edifício, que é um outro ponto fundamental na arquitetura produzida no Piauí. O Estado tem
altas temperaturas e uma alta taxa de insolação, e requer soluções bioclimáticas para a sua
produção arquitetônica, e observou-se que neste exemplar, o edifício possui um bom
conforto térmico, não o mesmo que se tinha na época, mas ainda é satisfatório.
ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo, Companhia das Letras, 1991
BASTOS, Maria Alice Junqueira; ZEIN, Ruth Verde. Brasil: arquiteturas após 1950. São
Paulo, Perspectiva, 2010.
BORSOI, Acácio Gil. Et al. Arquitetura como Manifesto. Funcultura Pernambuco. Recife
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BORSOI, Marco Antônio y Wolf, José. Documento: Acácio Gil Borsói. Revista Arquitetura e
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FEITOSA, Ana Rosa Soares Negreiros. Arquitetura Brutalista obras de Acácio Gil Borsói,
Tribunal Judiciário e a Assembleia Legislativa do Piauí, 2013
PÁDUA, Carolina Dal Ben. Arquitetura Moderna: um estudo sobre preservação. Dissertação
de Mestrado FAUSP, 2013.
REIS, Marcela Miranda Félix. DO RISO AO GRITO: a atuação dos jornais Gramma e
Chapada do Corisco, na década de 1970 em Teresina – PI. 2013, 146 p. Teresina.
Dissertação (Mestrado em Comunicação). Universidade Federal do Piauí. 2013.
SEGAWA, Hugo. Arquiteturas do Brasil 1900- 1990. Ed.USP, São Paulo, 2002.
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Zein, Ruth. Breve introdução à arquitetura paulista brutalista. Arquitextos, n. 069.01. São
Paulo, Portal Vitruvius, fev. 2006 <www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq069/arq069_01.asp>;
RESUMO
Entende-se por Patrimônio Cultural, o conjunto de bens materiais e imateriais que fazem parte da
cultura de determinado povo. A cultura por sua vez é construída através das gerações num processo
de transmissão de significados, conhecimentos, crenças e modo de viver. Ao tratarmos de patrimônio
cultural, destaca-se sua função e referências à identidade, a ação e a memória de diferentes grupos
sociais. Este, materializado na forma de construções, mantém vivo todo caráter intelectual e cultural
de civilizações anteriores pois, se torna testemunho vivo e tangível de períodos passados. Numa
sociedade extremamente dinâmica, em que determinados bens se tornam obsoletos num rápido
intervalo de tempo e, onde o conhecimento é globalizado, a preservação do patrimônio é a garantia
de que a história de determinada sociedade se preserve, valorize e seja divulgada para as gerações
futuras, através da atuação dos poderes governamentais e dos cidadãos. Segundo Argan (1995), os
monumentos desempenham um papel informativo em sistema de comunicação, com uma função
cultural e educativa, ou seja, didática pois, compartilham a história das cidades, porém em uma
perspectiva ideológica. Na contemporaneidade, o patrimônio cultural desempenha, além de sua
função didática, memorial e identitária, uma importante estratégia urbanística, onde o patrimônio
passa a inserir-se num contexto turístico e consequentemente, econômico. Um trabalho
multidisciplinar entre distintos profissionais, de diversos campos de conhecimento, pode garantir uma
melhor interpretação do comportamento das pessoas, entendendo melhor a formação da memória e
identidade, a configuração espacial da paisagem, a importância de sua manutenção, dentre outros
aspectos envolvidos com a cidade. Dessa forma, objetiva-se abordar a importância do patrimônio
dentro do meio no qual está inserido, especificamente na cidade de Juiz de Fora, MG. Pois, ao
tratarmos de patrimônio cultural, nos referimos ao conjunto de bens dos diferentes grupos sociais
dentro desse contexto comunitário, a cidade. Além disso, busca-se relacionar as atividades de
preservação ao planejamento estratégico do município. O método de pesquisa se aplica na revisão
bibliográfica, apoiada na leitura sobre memória e identidade social, no estudo das políticas de
preservação do patrimônio e, no estudo de caso da cidade de Juiz de Fora. Esta, que possui um
conjunto arquitetônico eclético e art déco importante no cenário local e regional, que apesar de
protegidos, ainda não possuem uma valorização cultural que atinja todos os aspectos da paisagem,
enquanto cidade e social, enquanto cidadania. Considera-se que na contemporaneidade, as políticas
e premissas patrimoniais encontram-se estabelecidas. Porém, há trabalho a executar, no que diz
respeito a conscientização e valorização social, esta, associada a educação patrimonial e as políticas
públicas. Assim, o trabalho deve ser na relação indivíduo e sociedade.
Palavras-chave: Memória; Preservação; Planos Urbanos.
A preservação é dever do Estado e direito da comunidade, que deve ver registrada de forma
a manter viva a memória, como documento de fatos e valores culturais de seu povo. Em
Juiz de Fora, recorte desse estudo, mantém viva a memória de sua existência, através do
conjunto arquitetônico que, faz reluzir sua trajetória e história marcante. Musse (2007)
afirma: "[...] uma cidade que era próxima à antiga “Côrte”, no início do século XX, se
mostrava moderna, febril e “máscula.”
Documentando, guardando e relatando fatos que ajudaram formar a história de uma cidade,
cumpri-se com ato de cidadania. Segundo Maia (2003) através da educação patrimonial o
homem passa a integrar-se nesse entendimento, através de um processo em ele entende o
contexto em que está inserido, elevando sua auto-estima e à conseqüência valorização de
sua cultura.
Considerando a afirmativa de Huyssen (2000), " [...] quanto mais rápido somos empurrados
para o futuro global que não nos inspira confiança, mais forte é o nosso desejo de ir mais
devagar e mais voltamos para as memórias em busca de conforto". Esse encontro pode ser
assimilado com o pertencimento, em que proporciona a relação entre o indivíduo e o
espaço, criando uma essência na vida das pessoas e no espaço onde elas vivem,
consolidando a história deste grupo social através da memória social.
Dessa forma, objetiva-se abordar a importância do patrimônio dentro do meio no qual está
inserido, especificamente na cidade de Juiz de Fora, MG. Ao tratarmos de patrimônio
cultural, nos referimos ao conjunto de bens dos diferentes grupos sociais dentro desse
contexto comunitário, a cidade. Além disso, busca-se relacionar as atividades de
preservação ao planejamento estratégico do município. Este, que possui um conjunto
Dessa forma, essa pesquisa não pretende, ainda, expor proposições e possíveis resultados
para serem alcançados, no que se refere a legislação e aplicabilidade de ações de
interferência no patrimônio e no espaço urbano de Juiz de Fora.
A Estrada de Ferro D. Pedro II, chegada em Juiz de Fora em 1870, seguiu como parâmetro
físico, a Estrada União Industria, pois foi implantada paralela a ela e, também, ao Rio
Paraibuna, determinando, o traçado da atual Avenida Francisco Bernardino (SAMPAIO,
2012). Nessa conformação, a Estrada do Paraibuna, atual Avenida Rio Branco, interliga-se
com o córrego Independência, atual Avenida Itamar Franco, e com a citada Avenida
Francisco Bernardino, formando um triângulo na morfologia da cidade. Inserida nesse
triângulo maior, a atual Avenida Getúlio Vargas (parte da Estrada União Indústria) conforma,
juntamente com a Avenida Rio Branco e Avenida Itamar Franco, um triângulo menor e
centralizado. Vide Figura 1, abaixo.
Nessa fase de êxito de Juiz de Fora, no final do século XIX, com destaque nacional na
industrialização, importantes edifícios foram consolidados no perímetro do triângulo, como é
o caso da sede do Banco de Crédito Real (1889), ilustrado na Figura 2 a seguir.
Portanto, Juiz de Fora, no final do século XIX e início do século XX, tinha em seus ideais de
paisagem e espaços públicos reflexos da estética e ideologia europeia, usando-se, de
acordo com Oliveira (1975), estratégias como “ajardinamento inglês” e “boulevard” em sua
morfologia, ou mesmo formalização de projetos elaborados por técnicos estrangeiros.
Segundo Oliveira (1966), considerando as devidas proporções, Juiz de Fora primava pelos
mesmos ideais e parâmetros de modernidade dos grandes centros, principalmente, os que
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
buscavam uma paisagem de inspiração internacional. Para tanto, a aplicação desse ideário
do embelezamento, deu início em sua principal avenida (Figura 3 e 4), atual avenida Rio
Branco, principalmente por abrigar os edifícios importantes na época, como o prédio das
Repartições Municipais, a Igreja Matriz e os casarões da elite juiz-forana.
Partindo nessa análise, pode-se afirmar que a cidade de Juiz de Fora, possui um importante
conjunto arquitetônico de interesse histórico e cultural, que somam edifícios de estilo
eclético e art déco, remanescentes do século XIX e início do século XX, período de
crescimento e expansão da cidade. Dessa composição arquitetônica, de acordo com
Dessa forma, a cidade consegue, materializado na forma de construções, manter vivo todo
caráter intelectual e cultural de civilizações anteriores pois, se torna testemunho tangível de
períodos passados, além de simbolizar características dos costumes, pensamentos e o
próprio cotidiano dessas gerações.
A grande questão que se coloca, quando se preserva estes bens, é a viabilidade em tempos
atuais, de se manter um prédio em suas características originais, que remete à outra época,
outra realidade, dentro de um contexto urbano contemporâneo e tecnologicamente cada vez
mais avançado. Para tanto, o importante papel das autoridades políticas, no que se refere
ao planejamento e execução de projetos de Lei em benefício desses espaços.
O relato da memória, narrado por um individuo que viveu o episódio, vem carregado de
paixões individuais, emoções e entusiasmos que dão veracidade ao conteúdo,
diferentemente do relato histórico pois, este se apoia somente em documentos oficiais,
podendo deixar escapar muitos fatos importantes, desprezados pela racionalização das
ideias. Porém, não pode-se considerar que os relatos individuais substituam a teoria da
história, apenas os complementam, podendo classificá-los assim como “Histórias das
Mentalidades” e “História das Sensibilidades” (BOSI, 2004, p. 15).
Segundo Pacano (2005), a memória pode ser “voluntária” e “involuntária”, a primeira traz as
lembranças do passado para o presente, construindo a história do espaço, já a segunda,
memória involuntária, inconsciente, aquela que traz os costumes, sotaques, que variam de
lugar para lugar, na vivência das pessoas, estruturando-se da memória que passa de
geração para geração.
A memória vem da percepção, esta que pode ser entendida muito além de sua simples
interação do sistema nervoso com o ambiente pois, a percepção, vem carregada de
informações que estão nas lembranças dos indivíduos. É como se a memória fosse o lado
subjetivo do conhecimento do indivíduo sobre as coisas. Portanto,
A tarefa principal a ser contemplada pelas políticas que tratam da preservação e produção
dos patrimônios coletivos é de possibilitar a recriação e re-significação da memória coletiva
no presente, reforçando o significado da participação da sociedade em ações que
fortaleçam a cidadania. Para tanto, reforça-se, que a educação patrimonial torna-se
primordial para o alcance desse objetivo.
A importância de um bem, não tem ligação direta com sua idade e sim, com a memória
coletiva do lugar. A partir do momento em que ele passa a existir, começa a configuração da
história daquela comunidade.
Choay (2006) destaca, que as primeiras noções de patrimônio histórico surgiram durante a
Revolução Francesa pois, ameaçados na época, surge a preocupação pela conservação
dos monumentos históricos nacionais, passando-se a pensar na conservação real desse
patrimônio, objeto e edifícios, que anteriormente dava lugar apenas a sua conservação em
meios iconográficos.
O período entre 1820 e 1964, o monumento histórico passa por sua fase de
consagração. A partir de então, o conceito de monumento histórico entra
numa escala mundial, acelerando o estabelecimento de leis que visassem à
proteção e a realização da restauração como uma disciplina integral. Assim,
constata-se que os procedimentos elaborados nos séculos XIX e XX,
Carvalho (2013) destaca, entre que "as edificações, o traçado da cidade, o desenho dos
passeios, as praças, o paisagismo, as manifestações culturais, os costumes, os saberes,
celebrações e práticas culturais [...]" formam-se referências simbólicas e afetivas para o
indivíduo em relação ao espaço vivido, construindo sua memória e identidade, tornando
coletiva ou pessoal. A autora, ainda afirma: "desse modo, a preservação das heranças
patrimoniais deixadas por nossos antepassados constitui a essência da memória de um
povo, é justamente esse legado que nos torna participantes da formação de nossa
identidade".
Preservar é uma atualização constante da memória e dos valores que definiram aquele
objeto ou expressão cultural como representativos e patrimônio da coletividade.
A Lei n.º 10.777, de 15 de julho de 2004, com alterações pela Lei 11.000, de 06 de outubro
de 2005, dispõe sobre a proteção do Patrimônio Cultural do Município de Juiz de Fora e dá
outras providências.
Ainda de acordo com Lei n.º 10.777 (2004), no município de Juiz de Fora, a política de
preservação do Patrimônio Cultural é estabelecida pelo COMPPAC (Conselho Municipal de
Preservação do Patrimônio Cultural), órgão vinculado à FUNALFA (Fundação Cultural
Alfredo Ferreira Lage), subordinada à Diretoria de Política Social.
O Plano Estratégico de 2000, para cidade de Juiz de Fora, segundo Sampaio (2012), alterou
os paradigmas dos Planos Diretores, inspirado nas experiências de outras cidades,
principalmente do Rio de Janeiro. Em Minas Gerais, Juiz de Fora foi precursora, onde o foco
do plano está nas situações pontuais e específicas, de maneira a fortalecer o desempenho
da cidade como pólo regional da Zona da Mata. O autor destaca, as melhorias na
mobilidade urbana, revisão das legislações vigentes e a execução de projetos âncora, como
fundamentais para o alcance do objetivo do plano. Ainda relata, "entretanto, em linhas
gerais, estes projetos repetem as propostas dos planos diretores, porém descolados da
visão de estruturação global do espaço urbano da cidade".
No Artigo 4º, para cumprir o objetivo do PDDU 2000, são estabelecidas estratégias e
táticas. No que se refere ao patrimônio, a Lei propõe: "a promoção e o incentivo ao turismo
como fator de desenvolvimento econômico e social, valorizando os patrimônios cultural e
natural do município, de forma a reforçar o sentimento de cidadania".
O que se nota, na proposta preliminar para revisão do Plano Diretor Participativo de Juiz de
Fora (2015), é uma especificidade detalhada e embasada, quando se trata o patrimônio
pois, o documento já faz alusão à memória, pertencimento, polifuncionalidade, entre outros
temas relacionados a preservação do patrimônio cultural.
Para tanto, na proposta preliminar para revisão do Plano Diretor Participativo de Juiz de
Fora (2015), no Art. 9º do Título I (dos princípios fundamentais, diretrizes e objetivos) são
objetivos da Política de Desenvolvimento Urbano e Territorial e do Plano Diretor: proteger
patrimônio histórico, cultural e religioso, valorizar a memória, o sentimento de pertencimento
dos cidadãos com relação à cidade e a diversidade; recuperar, reabilitar e requalificar a área
central da cidade de modo a preservar e potencializar sua função residencial e sua
As Diretrizes Setoriais
Já na proposta preliminar para revisão do Plano Diretor Participativo de Juiz de Fora (2015),
o documento faz menção à compatibilização das políticas de desenvolvimento urbano e
territorial com as políticas de preservação, portanto, prevê diversas interfaces importantes,
que seguem resumidamente explanadas: buscar as condições para a configuração da
identidade cultural do Município, pensando na tradição e continuidade criativa; articular os
sistemas de gestão cultural e ordenação territorial, objetivando a valorização patrimonial e
Legislação vigente
Sampaio (2012) explica, que isso se deve ao fato destes prédios terem sido construídos
com programas arquitetônicos da época, em que os hábitos, costumes e, até mesmo, as
formas de se projetar e construir eram diferentes dos padrões atuais, para a mesma
tipologia. O autor ainda destaca, "[...] as maiores dificuldades de se aplicar a legislação
vigente em obras de conservação se correlacionam com os parâmetros de iluminação,
ventilação, áreas mínimas de compartimentos, previsões de escada, garagens, itens de
segurança contra incêndio e pânico, entre outros".
A cidade de Juiz de Fora, conforme pode ser analisado na descrição de suas leis e planos
de desenvolvimento urbano, nos parágrafos acima, possui sua política patrimonial e os
planos urbanos de acordo com a contemporaneidade. A cidade, soube desenvolver as
premissas e leis, entretanto, na aplicabilidade, muito trabalho ainda deve ser executado.
Esse trabalho, pode ser no incentivo a participação social nos projetos e decisões, ao
incentivo fiscal e busca por investimentos, além da iniciativa na valorização das áreas de
interesse cultural, refletindo o que a Lei define, como o apoio nas atividades nos bens
patrimoniais, considerando o lazer e o turismo, por exemplo.
A discussão acerca das áreas urbanas, discorrida nas Recomendação de Nairóbi, afirma a
necessária harmonia entre passado e presente, através de projetos de intervenções, de
maneira a constituir-se de ações integradas entre poder público, iniciativa privada e a
população (CARVALHO, 2013).
Em Juiz de Fora, seu núcleo central possui um conjunto arquitetônico relativamente íntegro
e, segundo Sampaio (2012), "portador de valores artísticos, históricos e afetivos notáveis
que requerem instrumentos de proteção, estratégias de conservação e de desenvolvimento
urbano apropriadas [...]" Para o autor, digno de um projeto de Conservação de Áreas
Urbana, guardadas as devidas proporções, aos moldes do projeto aplicado na cidade do Rio
de Janeiro.
O conjunto arquitetônico da área central de Juiz de Fora, consolidado no final do século XIX,
possui diversidade de estilos arquitetônicos, compondo a paisagem urbana da área. As
edificações presentes nesse contexto, expressam e representam a identidade e memória da
cidade, passando pelos momentos ímpares da história de Juiz de Fora. Entretanto, o valor
de conjunto é dado, principalmente, pelas edificações modestas, conforme classificação da
Carta de Veneza (1964).
Contudo, o grande desafio para Juiz de Fora, seria vencer a falta de instrumentação e
planejamento, no que se refere a proteção de áreas urbanas, no campo do saber da
conservação e da literatura especializada no tema.
Referências
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Fontes,1995.
BOSI, Ecléa. O tempo vivo da memória: ensaios de psicologia social. 2. ed. São Paulo:
Ateliê Editorial, 2003.
JUIZ DE FORA. LEI Nº 11.000, de 06 de outubro de 2005. Altera o art. 50 da Lei nº 10.777,
de 15 de julho de 2004, que “Dispõe sobre a proteção do patrimônio cultural do Município de
Juiz de Fora e dá outras providências”. Juiz de Fora, MG: Prefeitura Municipal 2005.
JUIZ DE FORA. LEI N.º 9811, de 27 de junho de 2000. Institui o Plano Diretor de
Desenvolvimento Urbano de Juiz de Fora. Juiz de Fora, MG: Prefeitura Municipal 2000.
JUIZ DE FORA. Proposta Preliminar para o Plano Diretor Participativo. Dispõe sobre a
Política de Desenvolvimento Urbano e Territorial, o Sistema Municipal de Planejamento do
Território e a revisão do Plano Diretor Participativo de Juiz de Fora conforme o disposto na
Constituição Federal e no Estatuto da Cidade, e dá outras providências. Juiz de Fora, MG:
Prefeitura Municipal 2015.
LAGE, O. V. B. & ESTEVES, A. (orgs.). Álbum do município de Juiz de Fora. 3. ed. Juiz
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PACANO, Fábio Augusto. History, Memory and Identify. Dialogus, Ribeirão Preto, v.1, n.1,
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IPHAN, 2012. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/rj/noticias/detalhes/3304/artigo-
triangulo-da-memoria-de-juiz-de-fora>. Acesso em: 01 jun. 2017.
CARNEIRO, CAMILLA M. (1); STEPHAN, ÍTALO (2); REIS, LUIZ FERNANDO (3).
RESUMO
Este artigo trata das memórias de Barra Longa, uma das mais antigas cidades de Minas Gerais,
localizada na Zona da Mata mineira e que ainda possui um importante acervo arquitetônico e cultural.
Ele surgiu da necessidade de registrar as memórias da cidade, guardadas por pessoas que, em sua
história de vida, mantêm consigo valiosas informações que não foram divulgadas e/ou registradas
publicamente. Neste trabalho, a memória é tratada como principal instrumento de preservação da
cultura, pois ela é fonte de registro das vivências, capaz de resguardar a identidade local, visto que há
uma grande dificuldade em encontrar documentos que auxiliem no entendimento da história de Barra
Longa. A Monografia Histórica do município, escrita pelo Cônego Raimundo Otávio da Trindade em
1917, com sua primeira versão publicada no ano de 1918, é um exemplo dos raros livros que
registram a história da cidade. Exemplo da casualidade, o livro foi encontrado em posse de
moradores de Barra Longa. O documento foi a principal fonte para a redescoberta de uma história
que a população desconhecia e a motivação do aprofundamento da pesquisa. A monografia escrita
pelo Cônego demonstra sua preocupação em registrar a cultura local. No ano em que o livro
completou seu centenário, foi iniciado um trabalho para resgatar seu conteúdo, fazendo com que o
objetivo que o Cônego Raimundo teve, ao escrevê-lo, fosse alcançado: enaltecer o rico valor cultural
da antiga cidade de Barra Longa. O Cônego registrou aspectos físicos e culturais do município, a
partir de documentos e memórias pessoais. Expressa sua opinião, criticando, principalmente, as
perdas patrimoniais que ocorreram durante os anos. Algumas transformações foram registradas em
fotos e documentos, outras encontram-se guardadas nas memórias de pessoas idosas que fazem
relatos importantíssimos que merecem atenção e requerem registro, para que não se percam com o
Este texto trata de Barra Longa, uma das mais antigas cidades de Minas Gerais,
localizada na Zona da Mata mineira, que ainda possui um importante acervo arquitetônico e
cultural. Uma cidade esquecida que só entrou na mídia após o desastre ambiental ocorrido
em novembro de 2015, a partir do rompimento da Barragem de Fundão, administrada pela
Mineradora Samarco, que destruiu parcialmente o que havia nas margens do rio Carmo. A
pesquisa surgiu da necessidade de registrar as memórias de Barra Longa, guardada por
pessoas que, em sua sabedoria de vida, trazem consigo as mais valiosas informações que
não foram divulgadas e/ou registradas publicamente. Esta é uma forma frágil de resguardar
o patrimônio cultural do local, que encontra-se com seus valores culturais latentes. Apesar
das mudanças visíveis, a cidade mantém as peculiaridades do interior, com antigos valores
ainda pertinentes à vida de seus habitantes.
A importância da preservação
Cada cidade tem características que a tornam única. Podem ser singularidades que
se revelam em um complexo conjunto de espaços públicos e particulares, capazes de
provocar as mais variadas sensações a seus habitantes e visitantes. O modo de vida de
cada povo é único e, diante de um contexto de constantes mudanças, as diversas formas de
manifestação de sua cultura necessitam ser preservadas, de maneira a afirmar a identidade
de cada grupo.
A cidade pode estimular nas pessoas, diferentes sensações ligadas à memória. Isso
vai além do físico: cada lugar remete a alguma lembrança, alguma subjetividade. Ela está
em constante transformação: seu traçado adquire novas formas com o passar do tempo e
tudo isso constrói sua história. Algumas mudanças são consideradas melhorias, outras uma
perda impossível de se repor. Para entender melhor o processo de transformação, é preciso
conhecer as memórias individuais e coletivas, que se transformam constantemente.
A cidade não deve ser apenas um ambiente transitório, mas um lugar onde possa
haver trocas de experiências significativas para as pessoas que nela vivem ou a visitam.
Em seu livro intitulado “Memória e Identidade Social” (1992), Pollak mostra quais são
os elementos constitutivos da memória, individual ou coletiva: “Em primeiro lugar, são os
acontecimentos vividos pessoalmente. Em segundo lugar, são os acontecimentos que eu
chamaria de ‘vividos por tabela’, ou seja, acontecimentos vividos pelo grupo ou pela
coletividade à qual a pessoa se sente pertencer.”
Barra Longa possui uma grande riqueza cultural com risco de perda ou
descaracterização. Sendo assim, são necessárias diversas ações efetivas e integradas de
preservação. Algumas ações isoladas de preservação cultural podem ser notadas. Uma
dessas ações é o exercício do ICMS Cultural (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços). Tal exercício é regido pela Lei Estadual 18.030/09, que atribui ao IEPHA a tarefa
de indicar critérios para que os municípios possam obter recursos financeiros, desde que
cumpram uma série de exigências, que incluem, por exemplo, a identificação, o inventário e
o tombamento dos bens que compõem o acervo de Barra Longa. E é justamente a
importância do bem, seja material ou imaterial que definirá a sua inclusão no acervo
patrimonial da cidade e para isso é preciso resgatar a sua história. Nesse sentido, a
pesquisa documental aliada ao estudo das memórias locais convergem para o senso
comum que caracteriza essa importância.
Para melhor resguardar estes documentos, todos eles foram digitalizados a fim de
criar um acervo digital que possa servir de base para outras pesquisas e consultas pela
comunidade. Há registros de muitas décadas, que contam a história de Barra Longa desde a
época em que a cidade tinha uma economia próspera e contava com muitos habitantes.
Registrar os documentos em meio digital se mostra de grande importância tanto para a
conservação quanto para a facilidade de acesso às informações.
Barra Longa, cuja fundação foi em 1701, é considerada a segunda cidade mais
antiga de Minas Gerais, como o Cônego deixa claro em seus escritos. O Coronel Matias
Barbosa, fundador de Barra Longa, foi um revolucionário de Villa Rica em 1720. O nome
Barra Longa originou-se do encontro de dois rios: o Carmo (na época com águas barrentas)
e o Gualaxo (que tinha suas águas claras), que encontravam-se e formavam uma “grande
barra”. A cidade foi construída às margens do Rio Carmo, pois seus primeiros povoadores
ocuparam o território para exploração do ouro e outras pedras preciosas encontradas em
abundância nos rios.
O município faz parte do Caminho dos Diamantes, também conhecido como Rota
dos Diamantes da Estrada Real, criada no século XVIII pela Coroa Portuguesa, com o
propósito de tornar mais rápido o escoamento do ouro e dos diamantes extraídos do norte
de Minas Gerais. A Rota dos Diamantes liga os municípios de Ouro Preto e Diamantina,
formando junto com o Caminho Novo e o Caminho Velho o Circuito turístico da Estrada
Real. O Caminho dos Diamantes é composto por cerca de cinquenta cidades que se
formaram com o desenvolvimento do estado. Entre essas cidades estão a Vila do Ribeirão
do Carmo (atual cidade de Mariana), Catas Altas, Santa Bárbara, Conceição do Mato Dentro
e Vila do Príncipe (atual Serro). Essa região conserva muitas características rurais, pois
pouco cresceu e se industrializou. Assim é Barra Longa, que preserva sua cultura em seus
vários aspectos.
Quadro 1: População Total, por Gênero, Rural/Urbana – Município – Barra Longa – MG Fonte: PNUD,
Ipea, FJP
A Igreja Matriz de São José foi erguida por volta de 1700, com a ajuda de
fazendeiros, pessoas influentes e do Rei de Portugal. A conclusão da obra, porém, demorou
longos anos. Em 1757, Dom José, imperador de Portugal, que tinha suas fazendas nas
minas, ordenou à irmandade do Santíssimo Sacramento (Ouro Preto) que fosse construído
artisticamente a capela mor. Parte da carta do imperador está nos registros do Cônego:
Para localizar a Matriz em sua época de formação e explicar o contexto em que seu
prédio foi erguido, Cônego Raimundo relaciona a parte artística da igreja com outras obras
de arte próximas a Barra Longa, como a ermida da Fazenda Quebra-Canoa (divisa com o
município de Ponte Nova - MG). Algumas evidências, segundo ele, comprovam que ambas
foram construídas no mesmo período. A Ermida foi feita entre 1789 e 1808 pelos donos da
fazenda, os padres irmãos José, João e Joaquim Ferreira de Souza. Ressalta-se que o
último arquiteto que nela trabalhou foi Manoel Dias, que especializou-se em construções
públicas no Rio de Janeiro, a chamado do Conde de Linhares. A memória aponta uma perda
significativa que se estende às fronteiras do município. Essa fazenda já não existe, pois foi
depredada pelo tempo, e o altar vendido pelos proprietários da Fazenda na década de 1960.
De acordo com seus registros, a economia local era mais dinâmica naquela época. O
município contava com muitas fábricas, que refinavam os produtos obtidos com a grande
produção agrícola. A pecuária era trabalhada em larga escala, abastecendo, além do
município, outros municípios vizinhos. O município tinha para exportar: 60 mil arrobas de
açúcar, 30 mil arrobas de café, 500 pipas de aguardente, 40 mil sacas de cereais, 900 a mil
cevados, muito gado, dentre outros produtos.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Com o passar dos anos, os grandes proprietários de terra do país, com a utilização
de máquinas no trabalho com a monocultura, acabaram por dificultar a situação do
trabalhador rural. No município, as pessoas que plantavam seus próprios alimentos (milho,
feijão, arroz...) tanto para o consumo quanto para o comércio nos arredores, não puderam
concorrer com os produtos industrializados. O trabalho nas lavouras passou a ficar difícil e
os agricultores que viviam como meeiros, mudaram-se para cidades maiores em busca de
emprego.
O difícil acesso à cidade foi um fator que contribuiu para a estagnação da economia
e consequente falta de investimentos. Com isso, se deu o aumento da migração de pessoas
para outras cidades mais promissoras. O Cônego também aborda a dificuldade de acesso à
cidade, quando destaca a exclusão de Barra Longa na construção da estrada que liga Ponte
Nova a Mariana, a fim de economizar vinte quilômetros na obra. Pressupõe-se que a partir
daí ocorreu uma grande queda no desenvolvimento municipal e no número de habitantes.
Conclusões
É necessário pensar em políticas públicas que resgatem o interesse das pessoas
pelo local. Isso inclui um competente programa de educação patrimonial, para que a
população conheça suas raízes e dela se sinta parte.
O livro do Cônego Raimundo Trindade, principal fonte de consulta para este estudo,
possibilitou fazer comparações e reconhecer preciosas riquezas preservadas, como por
exemplo, a Igreja Matriz, que apesar das mudanças ocorridas, tem muito valor cultural e
religioso para os barralonguenses.
Todo o trabalho para resgatar o conteúdo do livro foi feito no ano em que o mesmo
completou seu centenário, fazendo com que o objetivo que o Cônego Raimundo teve, ao
escrevê-lo, seja alcançado: enaltecer o rico valor cultural da antiga cidade de Barra Longa e
fazer com que mais pessoas o conheçam.
Referências Bibliográficas:
POLLAK, Michael. Memória e Identidade social. In: Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol.
5, n. 10, 1992, p. 200-212.
MORHY, SAMIA (1); LIMA, JOSÉ JÚLIO (2); PONT VIDAL, CELMA (3)
1. Universidade Federal do Pará. Instituto de Tecnologia, Programa de Pós-Graduação em
Arquitetura e Urbanismo
Rua Augusto Corrêa, 01. Campus Universitário do Guamá, Belém, Pará, Brasil - CEP 66.075.110
samiamorhy@gmail.com
RESUMO
A imposição de leis urbanísticas nas cidades em áreas de valor a preservação pressupõe a regulação
de construção relacionada à proteção do patrimônio. A ação do Estado na condução da gestão
edilícia decorrente das leis insere-se na expressão de um discurso político criado em torno de valores
incorporados nas intenções da política de preservação. A introdução da modernização como ideário
político lançada inicialmente na capital paraense na era do Intendente municipal Antônio Lemos
(1902–1912) e consolidada no governo de Getúlio Vargas (1937–1945) incentivou uma mudança nos
hábitos sociais dos moradores de classe alta em termos de local da moradia. Com efeito direto sobre
o Centro Histórico de Belém, protegido por legislação específica federal em 2012 e por legislação
municipal desde 1990, este artigo trata da relação entre o processo de degradação arquitetônica dos
sobrados e casario do bairro da Campina construídos até o início do século XX com os efeitos da
modernidade operados em dois períodos de centralização política e limitações no regime de direitos
democráticos. Ainda que marcadamente ligados a elites econômicas, a modernidade enquanto
discurso contrapõe-se a uma compreensão subjetiva de sua casualidade. Para a compreensão da
subjetivação dos fatos relativos à modernização no bairro da Campina, no início do XX, este artigo
constrói um discurso historiográfico sobre a modernização em Belém durante o período lemista e, em
seguida, durante o Estado Novo varguista, buscando revelar as relações entre as historiografias dos
dois momentos de poder político centralizador e a modernização sobre o local de morar, o qual
estaria associado, contraditoriamente, a um processo de degradação do estoque edificado de um
bairro histórico de Belém. A partir destes dois momentos, o trabalho busca articular em uma terceira
parte, na qual, por meio do discurso historiográfico construído, associar a modernidade presente na
mudança cultural e nos hábitos sociais da camada da população de alta renda, ligados ao poder
político em vigor, com a introdução da modernização do local e na forma de morar, aguçando o
sentido da modernidade como fator relevante de status social, sob pena de perder o patrimônio
arquitetônico eclético. Ressalta-se que a população residente no Centro Histórico de Belém,
conforme Censos do IBGE de 2000–2010 aumentou 7.5%, mesmo sem nenhuma política
incentivadora ao uso habitacional, o que leva a sugerir políticas de retorno da moradia ao Centro. Ao
final do artigo, há a indicação de políticas habitacionais, por meio de ações governamentais ou civis.
Com destaque para maior participação social nos projetos, uma vez que este item é uma das
conquistas democráticas recentes no planejamento urbano, bem como, que sejam capazes de
fomentar uma mudança cultural e nos hábitos da sociedade local visando aguçar seu interesse de
retornar a moradia nos sobrados ecléticos do tombado núcleo urbano de Belém e minimizar sua
degradação.
Palavras-chave: modernização, modernidade, moradia, ruínas, Centro Histórico de Belém/PA
O paper busca construir aquilo que é sugerido por Dias e Chaves (2015, p. 6), quando
mencionam que “a pesquisa historiográfica, irremediavelmente recai numa ressignificação
subjetiva dos fatos”. Assim, para compreender a subjetivação dos fatos relativos à
modernização no bairro da Campina, no início do XX, este artigo constrói um discurso
historiográfico sobre a modernização em Belém durante o período de Antônio Lemos e em
seguida, a modernização durante o Estado Novo do presidente Getúlio Vargas. A partir
destes dois momentos, o trabalho busca articular em uma terceira parte, as relações entre
as historiografias dos dois momentos com a degradação arquitetônica atualmente expressa
na ocorrência de ruínas, no bairro da Campina.
Durante o século XIX o núcleo urbano de Belém se expandiu e desenvolveu através das
atividades atacadistas da zona portuária, passando a atrair o comércio a varejo, serviços
especializados, indústrias, os principais estabelecimentos administrativos e religiosos
formando o centro comercial tradicional de Belém, além das residenciais das camadas mais
abastadas da sociedade. Para o centro convergiam as principais vias e meios de transportes
coletivos, tornando-se a centralidade urbana de maior acessibilidade.
Entre os anos de 1902 a 1945 a cidade de Belém foi governada por líderes políticos que
introduziram ideais de modernização na cidade. O primeiro, senador Antônio Lemos, buscou
motivação e modelo na Europa, posteriormente, o governador Magalhães Barata cumprindo
ordens nacionais do programa político do Presidente Vargas para modernizar o país (PONT
VIDAL, 2008a).
Segundo Sarges (2000) o governo de Antônio Lemos foi marcado por políticas de
reordenamento urbano, higienização e embelezamento da cidade, cujo modelo estava
embasado no urbanismo vigente na França e pretendia transformar Belém em uma pequena
réplica de cidade europeia. Dias e Chaves (2015, p.3) chamaram de Paris Tropical à
semelhança de Belém com a capital francesa pretendida por Lemos com as remodelações
urbanas e arquitetônicas de ideais haussmanianos. No período ocorreram projetos de
monumentalização com alargamento e abertura de vias. Como exemplos, no primeiro caso,
a Avenida 15 de Agosto, atual Avenida Presidente Vargas e, no segundo caso, o processo
de aterramento da região litorânea e a construção da Boulevard da República, atual
Boulevard Castilhos França, cujas vias estão dentro do bairro da Campina (CHAVES, 2011).
Transformar Belém em uma cidade europeia significava, tanto para o governante quanto
para os moradores, modernizá-la. E essa modernização não estava restrita a melhorias
urbanas, incluía o “modo de vida” das pessoas. Ou seja, a modernização era ao mesmo
tempo concreta – aplicada na cidade – e abstrata – transformando a cultura da população.
Gorelik (1999) diferencia modernização de modernidade ao explicar que modernização são
processos duros que continuam transformando o mundo, motivados por representações
culturais de modernismo, expressas pelo modo de vida e organização social.
Derenji (1987, p.150) complementa que “o Ecletismo, que será o símbolo, a representação
arquitetônica das mudanças de comportamento trazidas pela riqueza do ciclo da borracha,
usará esse neoclássico tardio como mais uma opção de escolha de estilos”.
Em virtude das novas leis implantadas por Antônio Lemos acrescido com os rendimentos
que a economia da borracha rendia aos cofres públicos, nos últimos anos do século XIX e
primeiros do XX, Belém expandiu além dos dois tradicionais bairros, da Cidade (atual
Cidade Velha) e da Campina, com a implantação de grandes novos bairros planejados,
transformando os arredores ou subúrbio da cidade, com vias largas, lotes com dimensões
maiores, novos palacetes construídos ao longo da Estrada de Nazaré, atual Avenida
Nazaré, do Umarizal e da Estrada de Bragança, atual Avenida Almirante Barroso (COELHO,
2007).
Tais transformações iniciam uma nova era de modernização da cidade que podem ter
influenciando na cultura e hábitos sociais dos moradores da classe alta do núcleo urbano
deixando seus sobrados e casario e preferindo ir morar em palacetes, chalés e bangalôs em
outras áreas da cidade, como as avenidas Nazaré (Figura 2) e Braz de Aguiar.
Os novos bairros localizados nos arredores dos bairros da Cidade Velha e Campina
possuíam vantagens locacionais: (i) por estarem próximos do núcleo urbano, portanto, da
centralidade das atividades de comércio e serviço; (ii) por estarem afastados do “burburinho”
causados pelo fluxo de pessoas e veículos atraídos pela centralidade; e, (iii) por
Este processo de valorização da modernidade estaria incluído na relação feita por Bordieu
entre o espaço simbólico e o espaço social. Para o autor (1990, p. 160), “o espaço social
tende a funcionar como um espaço simbólico, um espaço de estilos de vida e de grupos de
estatuto, caracterizados por diferentes estilos de vida”. O poder do simbólico estaria ligado à
modernização do espaço físico enquanto que, o espaço social seria o desejo, a ambição, a
mentalidade de modernidade desejada pela riqueza da época.
A expansão da cidade, na era lemista, se deu através da via Travessa dos Mirandas que,
após seu alargamento e intervenções urbanísticas, tais como, construção do Teatro da Paz
e da Praça da República, passou a se chamar Avenida 15 de Agosto, sendo o principal eixo
de integração do núcleo urbano inicial com os novos bairros da cidade. Localizada no bairro
da Campina, a Avenida 15 de Agosto, durante o governo Getúlio Vargas, passa a se chamar
Avenida Presidente Vargas por simbolizar o ideal modernista da época, sob pena de perder
o patrimônio arquitetônico eclético. Conforme Belém (1999, p. 64):
[...] a avenida passa a se constituir em um novo centro comercial da cidade,
concentrando as atividades comerciais mais sofisticadas como hotéis,
escritórios de companhias de navegação, consulados, bares, cafés,
restaurantes, lojas e cinemas. Essas atividades, associadas à presença de
edifícios residenciais, proporcionavam um movimento, inclusive à noite, ao
contrário do centro comercial antigo.
O regime do Estado Novo instaurado em 1937, pelo Presidente Getúlio Vargas, defendia a
modernização como ideário, que segundo Chaves e Santos (2013, p. 3) “[...] o símbolo mais
eficaz dessa modernidade que precisava ser empregado era o edifício em altura, novo
conceito de moradia e ícone das ideologias divulgadas e disseminadas pelo “Estilo
Internacional” [...]” incentivando a verticalização no Brasil, “[...] condizendo com os novos
ares que Vargas tentaria implantar no novo Brasil industrializado” (MELLO, 2007, p.68).
Para Chaves e Santos (2013) para atrair a população mais abastada da cidade a morar nas
alturas era necessário adaptar o novo tipo de moradia aos seus anseios. Para isso,
“percebe-se a permanência de ambientes e formas de organização espaciais que
apresentam características das amplas casas burguesas e palacetes de Belém de outrora”
(p. 14).
Belém (1999, p. 23) descreve que o “bairro da Campina foi logo atingido pelo processo de
decadência econômica, com a deterioração de seu casario, a substituição de um comércio
dinâmico e de qualidade por um comércio popular”. Com a mudança do consumidor de alta
renda para outras áreas da cidade, o centro urbano passou a se especializar em um novo
IX Mestres e Conselheiros - Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG - de 21 a 23/06/2017
perfil de consumidor – o de classe baixa. Para este consumidor o que mais importa é o
preço baixo e a variedade das mercadorias e não a aparência ou as características
arquitetônicas e das instalações físicas das lojas. Por isso, e em função dos próprios custos
elevados de conservação de prédios antigos, dentre outros motivos, os comerciantes locais
deixaram de investir na aparência e na conservação dos imóveis onde ficam suas lojas,
resultando num declínio do conjunto edificado que compõem o centro urbano. Villaça (2001)
enfatiza que, na origem do processo popularmente chamado de “decadência” ou
“deterioração” do centro, está o seu abandono por parte das camadas de alta renda e a sua
tomada pelas camadas populares.
Desde a sua origem, passando pelo seu apogeu até o início do processo de degradação
física, o núcleo urbano inicial de Belém, acumulou um importante patrimônio. As
construções do forte, das igrejas, dos mercados do Ver-o-Peso e de Carne, de fábricas, dos
palácios dos governantes, dos sobrados e casarios com seus revestimentos em azulejos
portugueses, etc. constituem patrimônio arquitetônico, urbanístico, histórico, artístico,
cultural e paisagístico. A preocupação com a preservação deste patrimônio resultou no
tombamento do núcleo urbano como Centro Histórico de Belém (CHB) composto por parte
do bairro da Cidade Velha e todo o bairro da Campina. Atualmente o tombamento do CHB é
regulado pelas três esferas governamentais: pelo Município através da Lei Orgânica do
Município de Belém de 30/03/1990 e pela Lei Municipal nº 7.709 de 18/051994; pelo Estado
com a Lei nº 5.629 de 20/12/1990 e pela União por meio da Portaria nº 54, de 8/05/2012 do
Ministério da Cultura, a qual passa atualmente por revisão visando sua normatização para
atuação do IPHAN na área.
Considerações Finais
Os recursos econômicos disponíveis na era de Lemos possibilitaram a implementação de
obras que transformaram a paisagem do núcleo urbano de Belém como um todo. Ao
contrário da era de Vargas, as finanças da capital paraense estavam limitadas e os
investimentos priorizaram a modernização de uma parte do núcleo urbano através da
verticalização. Vale indagar como estaria o núcleo urbano de Belém se os recursos públicos,
durante o governo de Vargas, estivessem disponíveis para realização dos seus ideais de
modernização? À época não existiam as leis preservacionistas, o que permitiria destruir toda
a massa edificada, de período colonial e eclético, para construção do novo, das edificações
em alturas. No entanto, em virtude da restrita realidade financeira do governo Vargas, a
destruição não foi propriamente na massa edificada e, sim, no abandono das demais áreas
do núcleo urbano, onde se localizava uma parcela significativa de edificações ecléticas da
cidade.
Uma possível solução, diante do quadro apresentado neste trabalho quanto à existência de
ruínas e estacionamentos no CHB, são ações para a reabilitação de imóveis com
investimentos para o retorno de moradias à área. Há estudos de viabilidade técnica e
orçamentária para o caso de Belém, como o conduzido por Norat (2007), os quais
dependem de programas governamentais conforme identificados por Lima, Faria e Andrade
(2002). Este processo mostra-se relevante na medida em que foi detectado um relativo
aumento no número de domicílios no CHB. Conforme os resultados dos Censos do IBGE de
2000 e 2010 aumentou 7.5%, mesmo sem nenhuma política incentivadora ao uso
habitacional. O uso habitacional é potencialmente um propulsor da conservação, pois além
de contribuir para a diminuição do déficit habitacional, pode atrair outras atividades que dão
apoio a moradia, possibilitando a utilização do espaço em horários e períodos que vão além
dos horários comerciais, garantindo o uso ininterrupto do espaço e evitando, com isso,
espaços desertos e inseguros.
Referências Bibliográficas
BOURDIEU, Pierre. Coisas ditas. Tradução Cássia R. da Silveira e Denise Moreno Pegorim.
1. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990.
CHAVES, Túlio A. P. Vasconcellos. Isto não é para nós? um estudo sobre a verticalização
e modernidade em Belém entre as décadas de 1940 e 1950. 2011. 142 f.Dissertação
(Mestrado em História Social da Amazônia) – Universidade Federal do Pará, Belém.
LIMA, José Júlio F.; ANDRADE, Fabiano H. P.; FARIA, Maria Beatriz. Requalificação do
Casario no Projeto Feliz Lusitânia,um laboratório de novos protagonistas. In: III SEMINÁRIO
INTERNACIONAL PATRIMÔNIO E CIDADE CONTEMPORÂNEA, 2002, Salvador.
Anais...Salvador. 2002. p. 1-20.
LOBO, Marco Aurélio; TOURINHO, Helena Lúcia; MORHY, Samia. Razões para Morar em
Centros Históricos: ocaso de Belém (PA, Brasil). Revista do Departamento de Geografia, v.
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MORHY, Samia. Por que morar no centro histórico?análise dos motivos que levaram as
pessoas a escolher morar no centro histórico de Belém. 2015. 86 f.Trabalho Final
(Graduação em Arquitetura e Urbanismo) - Universidade da Amazônia, Belém.
MORHY, Samia; TOURINHO, Helena Lúcia; LOBO, Marco Aurélio. Moradias em centros
históricos: análise do mercado de aluguéis residenciais no centro histórico de
Belém/Pará/Brasil. Fórum Patrimônio: Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável
(UFMG. Online), v. 8, p. 1-23, n. 1. 2015. Disponível em:
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NORAT, Roseane C.C. Moradia como meio para reabilitação de áreas e prédios históricos.
2007. 237 f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Federal do
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
PONT VIDAL, Celma. Arquitetura, modernização e política entre 1930 e 1945 na cidade de
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REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. 9. ed. São Paulo: Perspectiva,
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VILLAÇA, Flávio. Espaço intra-urbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel: FAPESP; Lincoln
Institute, 2001.
RESUMO
São Leopoldo é um município gaúcho onde foi fundada em 1824 a colônia imperial de mesmo nome.
Os registros deste passado podem ser encontrados na arquitetura da região, onde exemplares de
enxaimel ainda resistem ao tempo, a grande maioria sem nenhuma proteção legal. No ano de 2009, o
poder público municipal lançou o projeto de uma nova prefeitura, no centro histórico local, que seria
construída com a inserção de elementos alusivos a técnica construtiva enxaimel. A reação contrária
da população, liderada pelo movimento estudantil dos cursos de arquitetura e urbanismo da
UNISINOS e FEEVALE, foi tão intensa, que o projeto teve que ser reformulado, sendo adotado um
estilo contemporâneo. A produção desses simulacros de arquitetura por meio de incentivos legais no
plano diretor de São Leopoldo nos oferece possibilidades de interpretações sobre o embate dos
diferentes grupos sociais que compõem a sociedade contemporânea da cidade. Conceitos como
identidade, auto-representação e paisagem são debatidos para buscar compreender o que levou a
sociedade de São Leopoldo a refutar a construção de uma edificação com a importância que uma
prefeitura tem para a imagem da cidade. Para a construção do presente artigo, realizamos uma
análise tendo como base a legislação local e as matérias jornalísticas da imprensa local. Sendo assim
o nosso “corpo documental” é o plano diretor local em seus artigos que promoveram a construção de
simulacros, o projeto arquitetônico da nova prefeitura e a cobertura que a imprensa local deu para o
ocorrido.Por fim, ainda que não definida por seus agentes em seu tempo como tal, uma posterior
análise do ocorrido em São Leopoldo, foi definido pela arquiteta Briane Bicca e pelo arquiteto Carlos
Fernando de Moura Delphim como uma caso de sucesso na defesa não apenas no patrimônio
arquitetônico, mas da paisagem cultural da região de imigração germânica. Os resultados obtidos
foram a desconstrução de ideia de que a sociedade civil em geral não possui a capacidade de
discernir entre um bem cultural edificado e um simulacro, bem como da necessidade de envolvimento
da comunidade em ações que afetem a imagem da cidade. Pelo fato da nova prefeitura enxaimel não
ser fato a demolição de uma edificação histórica, mas sim uma agressão a paisagem do centro
Edificações de uso público são especialmente simbólicas para uma cidade, pelo fato
que usualmente são o resultado do envolvimento coletivo de diferentes agentes daquela
comunidade. Por vezes, o empenho, faz com essas edificações sejam a representação do
apurado senso estético e qualidade arquitetônica. É um exercício de auto-representação, o
prédio público que deliberadamente transmite uma mensagem sobre a função que abriga,
sendo também um documento que atesta os conhecimentos técnicos e a arquitetura do
período em que foi edificado (MEIRA, 2008). Se no passado eram as igrejas que
tradicionalmente recebiam um maior esmero em sua construção, dominando e
hierarquizando a paisagem urbana, agora novos símbolos disputam esse cenário e não é
raro que sejam edificações privadas as que mais se destacam na imagem da cidade
(LYNCH, 2011). Segundo Pound (1991) “uma ‘imagem’ é aquilo que apresenta um
complexo intelectual e emocional em um instante”, isso nos leva a refletir sobre a
importância que uma arquitetura de qualidade tem para uma edificação pública e por
consequência para a imagem da cidade.
Em São Leopoldo, município gaúcho que é reconhecido como berço da imigração
germânica no Brasil (TRESPACH, 2014), as tentativas do poder público em se utilizar da
imagem da arquitetura da imigração alemã como um instrumento de propaganda da cidade
tem promovido uma deformação na paisagem urbana. As reproduções da técnica
construtiva enxaimel em edifícios públicos e privados encontram pouca adesão da
sociedade, gerando inclusive conflitos políticos como o que será abordado neste artigo. No
ano de 2009, o poder público apresentou a comunidade o projeto do novo centro
administrativo municipal, o sítio escolhido está localizado no centro histórico local, nas
proximidades de edificações tombadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico do Estado –
IPHAE. Havia a expectativa que o projeto seria de autoria do arquiteto Marcelo Ferraz, do
escritório Brasil Arquitetura, que havia sido contratado para realizar um projeto de
revitalização de todo o centro histórico da cidade. Entretanto edificação proposta era um
edifício de oito pavimentos, com elementos alusivos ao enxaimel, de autoria do corpo
técnico da prefeitura.
Fonte: IPHAE
Sendo assim, começa-se a obter resposta sobre a intenção de recriar estilo como
sendo uma tentativa de reconstruir um conceito ao território que ao longo das épocas tenha
se perdido, com a intenção de valorização da cultura, retomar a imagem da cidade ou
simplesmente como fonte de turismo. Todavia, a construção de uma edificação, por mais fiel
as técnicas do período, nunca fará parte da sua história e consequentemente não refletirá o
pensamento de sua época do mesmo modo. Por conseguinte, não será constituída uma
identidade a edificação, já que este conceito esta interligado ao período em que a edificação
foi construída, que caracteriza o pensamento da época.
Esse cenário coexiste com o auge do pós-modernismo historicista do Rio Grande do
Sul (CASTELLO, 2001). O autor define que neste período ocorre “[...] a inserção em um
determinado ambiente de imagens alheias ao que é predominante em seu contexto, ao que
é efetivamente real e concreto em sua construção social: foge-se, então, na direção de
representações mais próprias de uma meta-realidade”. A construção dos simulacros tem
como objetivo criar estímulos que artificialmente alterem a percepção das pessoas a
respeito do contexto arquitetônico local. São construções criadas deliberadamente para
iludir e deformar a compreensão que o observador tem da história local. Este é o grande
prejuízo que os simulacros trazem para a sociedade, deformam a memória da população,
fazendo da experiência do viver o espaço urbano em parte uma ilusão.
O acordo construído entre a sociedade civil e o poder público na época não foi
completamente compreendido como uma vitória, mas os desdobramentos que ocorreram
em seguida trouxeram benefícios à sociedade de São Leopoldo que serão apresentados no
capítulo seguinte.
O parecer apontou ainda elementos naturais como o Rio dos Sinos, a vegetação
ribeirinha, além da arquitetura das igrejas Católica e Luterana, as quais alimentam uma série
de superstições na população (DELPHIN, 2010).
O arquiteto concluiu seu parecer com uma série de recomendações à sociedade civil
de São Leopoldo, entre elas que “deveria dirigir ao IPHAN uma solicitação de tombamento
de alguns de seus bens mais expressivos. Dentre eles destaco a Praça do Imigrante com
seu monumento” (DELPHIN, 2010, p.10). A recomendação é estendida ao nível estadual:
“Também o IPHAE deveria ampliar o número de bens tombados em São Leopoldo e, mais
do que isso, em vez de tombar bens isolados, tombar conjuntos com maiores dimensões
como é o caso de suas ruas centrais com valioso casario” (DELPHIN, 2010, p.10).
A recomendação de Delphin direcionada ao IPHAE também contribuiu para a política
municipal de preservação histórica, já que o Instituto, o Ministério Público Estadual e a
prefeitura de São Leopoldo firmaram um Termo de Ajuste de Conduta – TAC para
elaboração de um Inventário Municipal de Bens de Interesse Cultural. A arquiteta Simone
Neutzling, que realizou um estudo semelhante na cidade Jaguarão/RS, foi contratada para
realizar o estudo em 2013 e o finalizou em 2016.
Os estudos desenvolvidos agora no mestrado em arquitetura da UNISINOS buscam
compreender como o centro histórico da cidade de São Leopoldo, já inventariado e em
processo de tombamento federal, se articula com os demais territórios da antiga colônia de
BERTINELLI, Sonia. Centro Administrativo. Jornal Vale dos Sinos, São Leopoldo, dez. 2009.
BERTINELLI, Sonia. Vanazzi promete diálogo sobre fachada do prédio. Jornal Vale dos
Sinos, São Leopoldo, maio 2010.
DELPHIN, Carlos Fernando de Moura [carta] 01 dez. 2010, Rio de Janeiro [para] FILHO,
Dalmo Vieira, Rio de Janeiro.12f. Memorando nº31/10 Parecer sobre o centro histórico de
São Leopoldo/RS.
LOPES, Maíne. O problema da identidade em São Leopoldo. Jornal Vale dos Sinos, São
Leopoldo, abril 2010.
LYNCH, K. A imagem da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 2011, 2011. ISBN:
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MÜLLER, TL. Monumentos em São Leopoldo. São Leopoldo: Rotermund & Co., 1979.
RIBEIRO, RW. Paisagem cultural e patrimônio. Rio de Janeiro: IPHAN, 2007, 2007.
(Pesquisa e documentação do IPHAN). ISBN: 9788573340549.
STOCKER JUNIOR, J. São Leopoldo (RS) está sumindo - "a todo vapor"!. Dzeitrs, jan.
2011. Disponível em: < http://dzeit.blogspot.com.br/2011/01/sao-leopoldo-rs-esta-sumindo-
todo-vapor.html>. Acesso em: 20 jan. 2017.
RESUMO
O trabalho apresentado visa demonstrar a democratização do campo do patrimônio a partir da
participação popular no desenvolvimento do projeto de restauro da Cada de Câmara e Cadeia de
Mariana. A partir da possibilidade de intervenção tornou-se necessário entender as relações sociais
estabelecidas na Câmara e no cenário no qual a instituição está inserida, a Praça Minas Gerais. A
investigação iniciou pelo entendimento dos fatores que tornam a Casa de Câmara e Cadeia de
Mariana relevante sob o aspecto histórico-cultural. O estudo é fundamentado ainda no atual conceito
atribuído ao termo “patrimônio” e na teoria de valores proposta por Aloïs Riegl e reafirmada pela Carta
de Burra do ICOMOS da Austrália. E parte do pressuposto que qualquer processo de intervenção em
um bem patrimonial deve ir além da estrutura física, sendo obrigatório um estudo sobre os valores
atribuídos ao bem por diversos segmentos da sociedade, e não mais apenas pelos técnicos.
A Casa de Câmara e Cadeia de Mariana teve diferentes endereços até que a sede
conhecida atualmente fosse construída. Segundo Fonseca (1998, p. 181) em várias
ocasiões, os camaristas queixaram à Coroa, da precariedade de suas instalações, das
sucessivas enchentes do Ribeirão do Carmo, principalmente as de 1737 e 1743, o que
dificultava ainda mais a escolha de “cazas” que pudessem servir às funções públicas.
O presente estudo dos valores atribuídos à Câmara de Mariana teve início a partir da
percepção da insuficiência do espaço físico para abrigar todas as atividades desenvolvidas
pela instituição e da evidente necessidade de restauro. Com a possibilidade de intervenção
tornou-se necessário entender as relações sociais estabelecidas na Câmara e no cenário no
qual a instituição está inserida, a Praça Minas Gerais.
O estudo realizado de Randall Manson, publicado pelo Getty Conservation Institute, vem
nos auxiliar a realizar a “leitura” dos valores atribuídos a um bem patrimonial. O
planejamento e a gestão encontram um triplo desafio, primeiro em identificar todos os
valores do patrimônio em questão, seguido da descrição destes valores e por fim, como
integrá-los e classificá-los, ou seja, criar uma espécie de ranque de prioridades destes
valores. Vale ressalva, que a maior dificuldade se dá na presença de valores conflitantes, o
que exige o desafio da não sobreposição. A metodologia proposta para avaliar a
significância cultural e os valores subdivide em três etapas, a primeira de identificação e
descrição dos valores que define os objetivos e os agentes envolvidos, ou seja, as partes
interessadas “stakeholders”, culminando em um local de descrição e documentação que se
distribui para a segunda etapa, de avaliação e análise, que considera os condicionantes
físicos, o contexto da gestão e principalmente os significados e valores culturais em um
conjunto integrado para a avaliação; por fim, evoluem para a terceira etapa, as respostas,
que estabelece políticas, fixa objetivos, desenvolve estratégias e sistematiza e prepara o
plano de ação. Esta metodologia envolve o procedimento de acompanhar, revisar e
examinar as etapas descritas durante todo o processo. Desta forma, as tarefas envolvem:
identificar, elaborar/descrever, declarar/revelar, tendo como ferramentas a consulta das
partes interessadas e envolvidas e a busca por métodos de análise (econômicos, culturais,
etc), trabalhos em grupos; onde ambos culminarão na integração das avaliações e
estabelecerão as políticas correlatas entre os valores e os recursos físicos, baseando-se no
princípio da sustentabilidade e, portanto, orientarão as tomadas de decisões.
Atualmente o prédio da Câmara é utilizado pela parte administrativa da Câmara, além dos
serviços de apoio como recepção, faxina, cozinha e gerais. Há ainda uma sala para o
presidente da Casa, com uma antessala para sua secretária. O plenário onde se realizam as
reuniões ordinárias, extraordinárias e sessões solenes, com uma sala anexa, utilizada,
principalmente para as reuniões de comissão e outras reuniões de vereadores.
A limitação do espaço físico permite apenas a sala para o presidente da Câmara; os demais
vereadores não possuem salas dentro do prédio da Câmara. Este fato levou, em 2009, à
decisão de alugar dez imóveis na cidade, para que cada um deles pudesse ser utilizado por
um vereador, como gabinete parlamentar.
Havia ainda outro agravante, uma notificação do Ministério Público, solicitando providências
quanto ao estado físico do prédio e orientando a restauração. Segundo relatório de vistoria
técnica do IPHAN, emitido em 24 de novembro de 2009, o prédio apresenta vários
problemas na sua estrutura. A partir desse cenário e do alto custo da manutenção dos
aluguéis surgiu a ideia, que é o ponto fundamental deste trabalho, de criar uma forma de
reunir todos os vereadores em um só espaço. Essa necessidade já podia ser percebida nas
conversas entre os próprios edis e entre os funcionários da Casa.
Sendo assim, definimos os grupos que deveriam representar a sociedade. Iniciamos por
aqueles que utilizam o prédio como local de trabalho e, portanto, possuem um grande
vínculo com o espaço: os vereadores e funcionários administrativos da Casa. Para esse
grupo definimos o método ZOPP para nos orientar.
O segundo grupo de interesse foi a sociedade de Mariana, representada por três subgrupos:
os moradores do entorno da Câmara, as pessoas que frequentemente acompanham as
reuniões de trabalho da Câmara e o subgrupo que chamamos de agentes de patrimônio,
composto por pessoas que possuem vínculo com a questão do patrimônio, seja através de
estudo ou como forma de trabalho. Para este grupo definimos o método conhecido como
Mapa Mental.
O nosso terceiro grupo selecionado foi composto por turistas, e para estes, trabalhamos
com a aplicação de um questionário com duas perguntas descritivas. Nosso objetivo foi
analisar se o prédio da Câmara é relevante como ponto turístico.
Nesta fase dos trabalhos adotamos o método ZOPP como ferramenta de trabalho. ZOPP é
uma sigla alemã que significa Ziel (objetivos), Orientierte (orientado), Projekt (projeto) e
Planung (planejamento), ou seja, planejamento de projeto orientado por objetivos.
Em síntese, podemos dizer que os problemas levantados durante a realização das oficinas
de diagnóstico podem ser listados e organizados em grupos, o primeiro diz respeito às
condições físicas do prédio da Câmara Municipal de Mariana, aspectos relevantes
apontados pelos participantes apontam: a falta espaço interno do prédio (insuficiente e
inadequado para instalação dos gabinetes dos vereadores); instalações elétricas e
sanitárias danificadas, colocando o edifício em situação de risco principalmente risco de
incêndio; o telhado danificado e infiltrações.
A partir desse consenso foram apresentadas três possibilidades de modificação, com vistas
a solucionar o problema central – inadequação do espaço da Casa de Câmara e Cadeia de
Mariana às necessidades do Poder Legislativo. Nessa fase do trabalho, a orientação
recebida do mediador do grupo, era que a cada sugestão apresentada, os demais
participantes deveriam discutir quatro pontos positivos e quatro pontos negativos inerentes a
ela.
A alternativa dois aponta a mudança dos gabinetes parlamentares para o novo prédio que
está sendo construído para atender a Prefeitura Municipal de Mariana, no bairro São
Cristovão, uma vez que, durante a legislatura 2005-2008 o poder executivo chegou a propor
que os três poderes: legislativo, executivo e judiciário, fossem transferidos para este novo
prédio.
E a alternativa três aponta para a restauração de um dos imóveis que o município possui no
centro histórico para abrigar os gabinetes parlamentares. Os imóveis apontados foram o
Casarão dos Morais localizado na Praça da Sé ou o casarão da Rua Direita.
Ressaltamos ainda que tanto a segunda quanto a terceira alternativas são baseadas no fato
de levar, para esses prédios, os gabinetes parlamentares e realizar a construção de um
auditório maior que o existente no prédio Casa de Câmara e Cadeia. Parte das atividades
administrativas hoje desenvolvidas na Câmara, assim como a sala do Presidente da Casa
continuariam da mesma forma que hoje.
O trabalho de campo foi realizado no período de um mês, quando tivemos contato direto
com os entrevistados. A amostra total é composta por 25 indivíduos segmentados da
seguinte forma: 10 moradores da Rua Dom Silvério (entorno); 10 pessoas que
frequentemente acompanham as reuniões da Câmara e 05 agentes de patrimônio.
Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 130) aponta a metodologia para análise e interpretação
dos mapas mentais que tem como parâmetros: a interpretação quanto à forma de
representação dos elementos na imagem; a distribuição dos elementos da imagem, quanto
à especificação dos ícones (pela representação de elementos da paisagem natural, da
paisagem construída, dos elementos móveis e humanos) e, por último, a apresentação de
outros aspectos ou particularidades. O resultado da aplicação dessas interpretações nos
mapas mentais, aliados a uma abordagem fenomenológica do espaço, revelam uma nova
forma de abordagem, que tem o intuito de contribuir nas análises espaciais, de forma a
compreender a lógica dos atores, desde as aspirações individuais aos sistemas de valores
dos grupos sociais.
Moradores da Frequentadores
Agentes de
Rua Dom das reuniões da TOTAL
Patrimônio
Silvério Câmara
Total
17 56,67% 17 56,67% 7 46,67% 41 54,67%
Geral
A partir da nossa análise, pudemos observar a predominância dos ícones em todos grupos,
seguido da predominância das letras. A representação por meio de mapa foi considerada
pequena; isso se deve ao fato de termos solicitado às pessoas que representassem a Praça
Minas Gerais, diferente de outros trabalhos que utilizam a técnica de mapa mental, mas têm
como objeto de estudo um bairro ou uma cidade, nos quais se espera uma recorrência de
representação de mapas mais significativa.
Neste item Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 136) diz que a partir da forma, verificou-se
que as representações diferiam também quanto à disposição da imagem. Assim identificou
alguns aspectos que classificou:
Nesta interpretação, Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 143) especificou os ícones que
compõem as imagens, em quatro grupos:
São Jorge
Outros
Cemitério 0 0 1 10% 0 0 1 4%
Elementos
móveis
Transporte
0 0 0 0 0 0 0 0
terrestre
Outras formas
0 0 0 0 0 0 0 0
de transporte
Elementos
humanos
Homem, mulher
0 0 0 0 0 0 0 0
e crianças
Tabela 3 Mapas Mentais – Especificação do ícones
Fonte: CARVALHO, 2012, p. 110
Desta forma, podemos observar que poucos foram os ícones que integram o item ‘paisagem
natural’. Esse aspecto foi reforçado durante as entrevistas. Nos depoimentos o foco de
Quanto ao pelourinho, podemos afirmar que sua representatividade, na totalidade, foi baixa
(44%), se comparada com a representação dos outros elementos. Na totalidade, as Igrejas
obtiveram uma representatividade de 96%, a Câmara de 76%, a Praça de 64% e as ruas de
60%. O pelourinho não é original desta Praça, foi montado na Praça em 16 de julho de
1981, segundo texto afixado no monumento.
Interessante analisar ainda que não houve representação de nenhum elemento humano por
nenhum dos entrevistados, apesar de nas entrevistas as pessoas reconhecerem a Praça
como espaço de uso. Porém o uso frequentemente relatado refere-se a datas específicas,
comemorações pelo aniversário da cidade, evento do Dia de Minas e procissões.
Após toda essa análise podemos concluir que há, pelo menos, um traço comum em todas
as entrevistas, independente do grupo de entrevistas a qual pertença: a beleza da Praça
Minas Gerais. Ficou claro, para nós, que a população reconhece esse espaço como
detentor de uma beleza singular. O caráter etéreo do espaço, de algo que eleva
espiritualmente, foi fortemente destacado nas entrevistas.
Para trabalhar o grupo dos turistas, optamos por um questionário com uma pergunta central:
“quais são os pontos turísticos de Mariana?”. Tínhamos por objetivo avaliar a relevância da
Câmara Municipal de Mariana como ponto turístico. Por isso, optamos por uma questão
‘aberta’; entendíamos que a resposta deveria ser fornecida de forma espontânea.
A amostra foi composta por quarenta entrevistados. A aplicação da pesquisa foi realizada no
período de 13 a 15 de janeiro de 2012 sendo, os dias da semana respectivamente, sexta–
feira, sábado e domingo. Os locais de abordagem dos turistas foram: espaço em frente à
Igreja da Sé, na Rua Direita, Praças Minas Gerais e Gomes Freire.
A partir desta percepção surge um novo desafio para o nosso trabalho: como conciliar os
usos dos espaços no projeto de intervenção no prédio?
Transferir as funções da Câmara para outro endereço, como foi aventado no decorrer do
processo, seria o mesmo que esvaziar o prédio de significado, provocando-lhe um corte
abrupto na história.
Porém para garantirmos essa simbologia na sua completude, a atualidade exige algumas
adaptações. Precisamos ampliar a estrutura física da Câmara de forma que o valor
simbólico seja mantido, conciliando os usos – local de trabalho e espaço turístico - e, sem
permitir, no entanto, que a construção atual seja diminuída pela concorrência visual com
novos elementos arquitetônicos ao seu redor.
O projeto de intervenção arquitetônica foi elaborado pelos arquitetos Professor Doutor Flávio
de Lemos Carsalade, Doutor Benedito Tadeu de Oliveira, Mestre Bernardo Nogueira
Capute, Gustavo Kamino, sob a coordenação do Professor Doutor Leonardo Barci Castriota.
Com a transferência de alguns serviços da Câmara, hoje realizados no prédio histórico, para
a nova edificação conseguiremos liberar algumas salas do prédio histórico, principalmente
as salas que já foram as celas da cadeia. Desta forma, atenderemos a outro ponto
levantado durante as entrevistas: o reconhecimento da Câmara como ponto turístico. A
proposta é criar no segundo pavimento do prédio histórico uma exposição permanente que
retrate a história da Câmara, e no primeiro pavimento, uma exposição permanente que
retrate a história da cadeia.
Figura 4 Fachada Principal da Câmara Municipal de Mariana com o 1º pavimento do Anexo ao fundo
CARVALHO, 2012, p. 158
Apesar dos avanços na discussão dos valores no campo do patrimônio cultural para
o Getty Conservation Institute (GCI), citado por Castriota (2009, p. 108 e 109), a
ênfase dada às três perspectivas encontradas no campo do patrimônio, a
“conservação física”, o “contexto de gestão” e a “significância cultural e valores
sociais”, ainda encontram-se em desequilíbrio, com claro predomínio as duas
primeiras. Para o GCI, cabe reconhecer que, infelizmente, as pesquisas na área da
conservação ainda estão centradas no aspecto físico, raramente envolvendo as
discussões dos valores entorno do bem. O presente estudo parte exatamente da
perspectiva que possui menor peso na maioria das outras pesquisas, a “significância
cultural e valores sociais”.
AUSTRALIA ICOMOS. The Burra Charter: The Australia ICOMOS Charter for Places
of Cultural Significance 1999. Burwood, Australia: AUSTRALIA ICOMOS, 2000.
Disponível em < http://australia.icomos.org>. Acesso em 05 de nov. de 2011.
KANTOR, Iris. A Leal Vila de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo. In: TERMO de
Mariana: História e documentação. Mariana: Ed. UFOP, 1998. p. 147 – 148.
RIEGL, Aloïs. O culto moderno dos monumentos: sua essência e sua gênese./ Aloï
Rielg; Tradução Elaine Ribeiro Peixoto e Albertina Vicentine. Goiânia: Ed. UCG,
2006.
RESUMO
O presente trabalho tem a intenção de pesquisar a respeito do processo de desenvolvimento das
politicas públicas de preservação do patrimônio cultural em Colatina, Espirito Santo, especificamente
o patrimônio edificado. Posteriormente averiguar como o desenvolvimento urbano da cidade,
influenciou na condição atual do patrimônio arquitetônico da área central da cidade. Devido as fortes
chuvas que atingiram Colatina entre os anos de 2013 e 2014, grande parte dos registros e
documentações a respeito da história e desenvolvimento da cidade foram perdidos, tornando a coleta
de dados mais árdua. Observa-se, desde então, o aumento dos percalços à obtenção de
informações. Cabe salientar que o trabalho está baseado em análise bibliográfica e sistematização de
informações obtidas através de documentos, material iconográfico, entrevistas e levantamento de
campo. A pesquisa apresenta-se como um campo vasto de possibilidades, uma vez que há pouco
autores e pesquisadores do tema. Nota-se também que a falta de revitalização dos prédios históricos
tem acarretado situações para a desvalorização dos imóveis em nível patrimonial. Por fim, considera-
se que a relevância acadêmica deste trabalho se dá na perspectiva de poder contribuir como fonte
para outras pesquisas voltadas para essa temática.
O município é cortado pelas rodovias ES-080 e BR-259 e pela ferrovia Vitória a Minas, o que
criou condições para a cidade crescer e desenvolver economicamente, como centro regional
de comércio e serviços. Colatina comercializa grande parte da produção cafeeira de
municípios vizinhos, além de possuir um terminal de cargas que integra os modais
ferroviário e rodoviário, dando suporte à produção de rochas ornamentais e eucalipto da
região (IBGE, 2010). Um dos períodos de grande crescimento da cidade foi após a
construção da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM), que propiciou ao município
comunicação direta com a capital do Estado, Vitória.
GÊNESE DO MUNICÍPIO
O Barracão do Rio Santa Maria, que se localizava no atual Bairro Colatina Velha, município
de Colatina, prosperou devido à facilidade no escoamento da produção agrícola, através do
Rio Doce. Esse Barracão serviu para que o Governo conduzisse e alojasse os imigrantes,
logo à sua chegada, e onde, em geral, permaneciam por muitos meses. Posteriormente, o
Barracão, possibilitou a escolha do local da primeira igreja e residências na região, por volta
de 1892. Em 1899, quando já havia um número bastante considerado de casas próximas ao
Barracão do Rio Santa Maria, foi criada a Vila de Colatina, subordinada ao município de
Linhares (Teixeira, 1974).
No início do século XX, a Vila de Mutum era considerada o núcleo mais importante da
região. A Vila de Colatina, entretanto, logo passou a se transformar no principal núcleo,
devido à facilidade do transporte agrícola através do Rio Doce; a Vila também se tornou
referência dos imigrantes no caminho para a colonização das terras ao norte do Estado.
Contudo, segundo Ribeiro (1996), a perda de importância e o declínio da Vila de Mutum
De acordo com Ribeiro (1986), a ligação ferroviária entre o interior de Minas Gerais e o
Porto de Vitória teve origem na segunda metade do século XIX. Em fevereiro de 1902, o
Governo Federal concedeu, através de um Decreto-Lei, a criação da Companhia Estrada de
Ferro Vitória a Minas (CEFVM), e do primeiro trecho ferroviário, que ligava a cidade de
Vitória-ES a Natividade-MG. No início do século XX, a primeira estação ferroviária de
Colatina era inaugurada, mais precisamente em 20 de dezembro de 1906, localizada no
quilômetro 128 da ferrovia, bem próxima à Vila de Colatina, onde hoje se encontra a Praça
Municipal. Inicialmente, as cidades mais beneficiadas com a EFVM foram: Colatina-ES,
Aimorés-MG, Conselheiro Pena-MG e Governador Valadares-MG, locais do surgimento das
primeiras estações ferroviárias.
Antes da construção da ponte, a travessia do Rio Doce era somente feita de canoa, e o
trajeto tinha duração de mais de uma hora. A região à margem norte do Rio era chamada de
Francilvânia, e possuía algumas fazendas, onde habitavam poucos colonos. Aos poucos,
após a construção da ponte, os fazendeiros foram vendendo suas terras para a implantação
de novos loteamentos na cidade (Ribeiro, 1996). A ponte também foi um importante
instrumento que facilitou o escoamento da produção de madeira e, com isso, expandindo
ainda mais esse setor. A produção do café, a partir de então, ganha mais importância no
município, pois se aproveitava também das grandes áreas desmatadas com a produção da
madeira.
Contudo, segundo Ribeiro (1986), somente a partir de 1942, com a criação da Vale, então
Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), diversas melhorias foram realizadas na EFVM. A
primeira melhoria teria ocorrido na década de 40, com a remodelagem do traçado da
ferrovia, entre Vitória e Colatina. Segundo Maduro (1989b), um fato importante ocorrido
nesse período, teria sido a relocação do Rio Santa Maria, através da remoção do “Morro das
Cabritas” (elevação de terra, que existia onde hoje se encontra o Hospital e Maternidade
Doutor Sílvio Ávidos), do centro da cidade. A fim de transpor o Rio, que tinha como leito
natural a passagem pelo centro da Cidade, a CVRD se aproveita das terras formadoras da
elevação montanhosa, levando as águas do Rio para o curso atual. Essa manobra serviu
para encurtar o trecho da ferrovia pelo centro da cidade e na construção de uma área para a
nova estação ferroviária, e, posteriormente, na formação de um novo bairro para a Cidade, o
Esplanada.
Hospital e Maternidade Dr. Sílvio Ávidos Decreto de Lei nº 6.173, de 22 de abril de 2015
Para Lynch (2014), a cidade tem a capacidade de se transformar a cada instante que passa;
estruturada por uma mistura complexa de construções geológicas, biológicas, sociais e
linguísticas que não são mais do que mera acumulação de matérias moldadas e enrijecidas
pela história. O contexto contemporâneo se depara, cada vez mais, com transformações
sociais, econômicas e culturais, gerando uma sobrecarga de informações e percepções de
difícil digestão para a sociedade na compreensão do passado (NARDI, 2015).
CONJUNTO I
A área formada pelo Conjunto abriga o núcleo histórico de fundação da Vila de Colatina. O
Conjunto I possui como principal e único componente a Igreja Nossa Senhora Auxiliadora,
marco inicial da ocupação do solo colatinense, situada no Bairro Colatina Velha, nas
imediações onde fora construído o Barracão do Rio Santa Maria, que abrigou os primeiros
imigrantes italianos, em 1888. Assim como ocorre na maior parte das cidades brasileiras, as
primeiras residências da colônia foram construídas em torno da igreja erguida no final do
século XIX, fato que ocorre também com as edificações públicas que até 1913 estavam
todos situados na então Vila de Colatina, hoje Bairro Colatina Velha (MADURO, 2001).
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Figura 01: Mapeamento do Conjunto I.
Fonte de dados: Prefeitura Municipal de Colatina [PMC] e acervo do autor. Elaborado pelo Autor.
Até 1913 todos os órgãos públicos funcionavam na Vila de Colatina, próximo a Igreja Nossa
Senhora Auxiliadora. Com a expansão territorial da Vila, através da linha férrea e o
desenvolvimento constante do comercio às margens da estação ferroviária, os
equipamentos públicos deixam o núcleo de colonização e partem para o atual Centro da
Cidade, denominando o local de “Colatina Nova”. Assim, por volta de 1913, se inicia a
construção do edifício que servia para abrigar a Comarca de Colatina, e, posteriormente,
serviria para a Câmara Municipal. O lugar escolhido para a construção da edificação foi
exatamente às sombras da estação ferroviária, área bastante movimentada durante as
paradas de trem, e ponto principal na formação do comércio local (MADURO, 1988).
A primeira escola da Vila de Colatina teria sido a “Escola Reunidos”, que ficava localizada
próxima a Igreja Nossa Senhora Auxiliadora. Devido ao crescimento constante da Vila e,
consequentemente, do aumento da demanda por matrículas, em 1918, uma nova escola é
erguida, agora, na Praça Municipal, ao lado da Comarca, o Grupo Escolar Aristides Freires.
No início, a escola contava apenas com quatro salas de aula; mais tarde, foi ampliada e
passou por várias reformas ao longo dos anos para suprir as necessidades do corpo
acadêmico. Apesar das mudanças na edificação, a obra é considerada um importante
patrimônio histórico para a cidade, já que ocupa o posto de uma das primeiras escolas da
Vila de Colatina e única até 1939, quando foi fundado o Ginásio Conde de Linhares
(MADURO, 1989).
Por fim, para encerar o Conjunto, o Iate Clube, obra arquitetônica inaugurada em 1958, que
tem como criador o arquiteto e engenheiro capixaba Marcelo Vivácqua. O clube foi inspirado
na sinuosidade das obras de Oscar Niemeyer e conta com uma casca de concreto – quatro
paraboloides hiperbólicos - com a ausência de vigas, toca o chão em apenas oito pontos,
mostrando a complexidade estrutural da obra de concreto armado, que é seu atrativo
(COSTA, 2015)
CONJUNTO III
A área ocupada pelo Conjunto III representa a expansão da Vila de Colatina, a partir de
1906, com a inauguração da estação ferroviária. Até então, tudo estava concentrado no
núcleo de colonização, em Colatina Velha. A linha férrea propiciou a ocupação de novas
terras, partindo da estação em direção ao Rio Santa Maria. Essa urbanização, às margens
da ferrovia, consequentemente veio a definir a Avenida Getúlio Vargas e, posteriormente, o
centro da cidade. E é no centro que estão as obras formadoras do Conjunto III, que possui
dois dos pontos mais emblemáticos do Município: a Catedral Sagrado Coração de Jesus e o
Hospital e Maternidade Dr. Sílvio Ávidos.
Segundo Maduro (1989), o projeto da Matriz, hoje denominada Catedral, foi criação do
engenheiro Calixto Benedito, o mesmo que teria projetado o Santuário de Aparecida,
localizado em São Paulo. A pedra fundamental foi lançada em 1952, pela mão do então
pároco Geraldo Meyers. Anos depois da construção concluída, no final da década de 80, foi
O edifício da Catedral é a única igreja da cidade que possui uma arquitetura peculiar,
voltada para os princípios do movimento art déco. Suas fachadas são marcadas por traços
fortes, estilizados através de linhas retas e circulares, com formatos geométricos e repetição
de alguns elementos cúbicos. As paredes possuem enormes vãos de janelas, recobertos
por vitrais coloridos, confeccionados e trazidos da Europa, que retratam passagens bíblicas
e outros motivos religiosos.
Segundo Coêlho (2004), outra obra de importância histórica para o Município é o Hospital e
Maternidade Dr. Sílvio Ávidos, localizado no centro da cidade é considerado um dos
primeiros exemplares da arquitetura neocolonial no Estado do Espirito Santo. Inaugurado
em 11 de setembro de 1949, pelo então presidente da República Marechal Eurico Gaspar
Dutra, o hospital foi construído pelo Governo Federal, em parceria com o Governo Estadual
e a Legião Brasileira de Assistência (LBA). Após já ter passado 67 anos de sua
inauguração, atualmente o hospital está vinculado ao Instituto Estadual de Saúde Pública
(IESP).
O hospital está localizado no mesmo local onde existia o Morro das Cabritas, retirado na
década de 40 pela CVRD, durante a relocação do Rio Santa Maria. A fachada principal do
edifício, ainda apresenta as esquadrias originais, de madeira e vidro do tipo de abrir, com
bandeiras em veneziana, com arcos e círculos variáveis. A cobertura é constituída de telhas
cerâmica, que marcam um diferencial entre os anexos que já apresentam telhas de
fibrocimento.
CONJUNTO IV
O Conjunto IV também pode ser chamado de “Conjunto Ferroviário”, devido à sua formação
diretamente ligada à construção da EFVM, especificamente a partir da década de 40, na
remodelagem do trecho que liga Colatina a Vitória, marcando, assim, a história do
desenvolvimento da cidade. Na década de 80, após a retirada dos trilhos de trem do centro
Em 1989, toda a área que pertencia à Vale passa por mudanças no caráter de reforma,
onde foi construída uma área de lazer no pátio da antiga estação ferroviária, que viria a se
chamar Praça Sol Ponte. O projeto inicial contava com a implantação de uma biblioteca
municipal, que foi instalada no antigo armazém de cargas da Vale. Na edificação, foram
preservadas as características originais do armazém em seu exterior; as principais
mudanças foram feitas apenas na estrutura interna do prédio, para adaptá-lo à
funcionalidade da biblioteca (MADURO, 1989).
O antigo vagão, também marco da EFVM no desenvolvimento do município; foi doado pela
Vale à PMC após a retirada dos trilhos, em 1975. Atualmente o vagão encontra-se aos
fundos da biblioteca (exatamente localizado sobre o eixo original da EFVM), e funciona
como um memorial, porem completamente abandonado, servido de abrigo a moradores de
rua.
O Conjunto IV, formado pelas obras consequentes da EFVM, são de importância histórica e
cultural, pois trazem consigo a memórias de uma época que marcou o desenvolvimento e
progresso de Colatina, fazendo parte do contexto histórico, e somente puderam ser
integrados ao município, graças à retirada dos trilhos da ferrovia ao longo da área central da
cidade. Sua arquitetura, como já mencionado, foi pouco modificada, conservando, assim, as
características originais das obras. Porém, nota-se um grande descaso do Poder Público e
da própria sociedade, relacionado à preservação e valorização do Conjunto Férreo, devido a
todas as edificações formadoras desse conjunto terem alguma parte de sua estrutura
comprometida ou deformada.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a inundação ocorrida no fim do ano de 2013 e início de 2014 (que invadiu o centro da
cidade), grande parte dos arquivos públicos relacionados às edificações históricas citadas
nos conjuntos, como a Câmara Municipal, Escola Aristides Freires, Iate Clube, entre outras,
foram perdidos. Desse modo, tornou-se praticamente impossível a obtenção de materiais
originais referentes a essas obras, o que levou, consequentemente, à utilização de
entrevistas a antigos moradores da cidade, na busca de maiores informações. Uma vez que
a cidade não para no tempo estagnando seu progresso, crescimento e desenvolvimento, a
falta de documentação histórica tornou a coleta de dados mais fastidiosa, evidenciando a
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importância das entrevistas ou narrativas na formação do trabalho, a fim de compreender
melhor o contexto histórico do patrimônio.
Nota-se também que a falta de revitalização dos prédios históricos tem acarretado situações
para a desvalorização dos imóveis, em nível de patrimônio; nessas circunstâncias, as leis
que dizem respeito ao assunto precisam ser executadas rigorosamente e coordenadas por
indivíduos que sejam aptos para tal e tenham um comprometimento com a história. Talvez a
falta de esclarecimento sobre a restrição dos bens históricos tenha contribuído para esse
agravante.
Diante de tudo o que foi exposto, podemos concluir que a falta de informações sobre as
obras tornou o trabalho mais árduo, o que reforça a importância da criação de um banco de
informações patrimoniais no Município. Consequentemente, nota-se que o patrimônio
histórico ora apresentado ainda é uma inesgotável fonte de pesquisa social e econômica,
como citado anteriormente, não pelo que somente foi, mais pelo que cada obra representa
atualmente. Principalmente socialmente, pois neles estão inseridas a história colatinense,
atuada com os mais diversificados atores. Porém o que mais tem se destacado é a falta de
preservação desse patrimônio, o bem cultural que tanto representa a sociedade colatinense.
COÊLHO, Wilson (Org.). Hospital Dr. Sílvio Ávidos: 55 anos de história. 1ª ed. Vitória:
Instituto Estadual de Saúde Pública, 2004.
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TEIXEIRA, Fausto. Colatina Ontem e Hoje. Colatina: Edição promovida pela Prefeitura
Municipal de Colatina e Faculdade de Filosofia, Ciência e Letras, 1974.
RESUMO
O artigo tem como propósito analisar e compreender as intervenções publicitárias no patrimônio
arquitetônico da Rua do Comércio localizado na Zona Especial de Preservação 2 (ZEP-2) no Centro
de Maceió, situada no Setor de Preservação Rigorosa 1 (SPR-1) – bem como sua normativa vigente
n° 4.545/1996 que institui normas gerais a respeito da edificação ou conjunto de edificações para as
Zonas Especiais de Preservação (ZEPs) e especifica paramentos para a publicidade em imóveis
situados em área de proteção municipal desde 1997 através da regulamentação do Decreto n°5.700.
A análise abrange a rua após a implementação do Projeto de Requalificação (2001-2009) realizado
pela Secretaria Municipal de Planejamento (SEMPLA), atual Secretaria de Desenvolvimento
Territorial e Meio Ambiente (SEDET).
Para o desenvolvimento do artigo que fundamentou a análise do eixo piloto comercial Rua do
Comércio foram explorados as legislações municipais n°4.545/1996 (Normas gerais de proteção ao
patrimônio ou conjuntos urbanos na qual a ZEP faz parte), lei n° 3.538, de 23 de dezembro de 1985
(Código de Posturas de Maceió), a Lei Municipal 4.954 de 06 de janeiro de 2000 sobre a Veiculação
de propaganda nos logradouros públicos ao ar livre ou em locais com visibilidade dos espaços
públicos e o Plano Diretor de Maceió. Como também foram realizadas percepções diretas que
possibilitou reconhecer as peculiaridades existentes nas edificações como os detalhes dos elementos
arquitetônicos e o modo como os anúncios ou engenhos publicitários (placas e letreiros) interferiam
na visualização das construções.
A partir das informações obtidas in loco, compilaram-se os dados que serviram para mapeamento de
uso e ocupação do solo da rua e comparações de registros fotográficos obtidos das edificações da
Rua do Comércio entre os séculos XX e XXI para investigar o uso atual dos imóveis que permeiam a
rua e analisar as principais modificações na fachada das edificações.
Dessa maneira, buscou-se averiguar/avaliar a atual situação de preservação das edificações da Rua
do Comércio para então propor medidas como uma cartilha e um aplicativo para frear as
descaracterizações do patrimônio edificado com o intuito de possibilitar a melhoria na paisagem
urbana e proporcionar a contemplação das edificações históricas por parte da população e incentivar
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a denúncia às possíveis falhas da fiscalização referente aos anúncios publicitários no patrimônio
arquitetônico. Tendo em vista que o instrumento jurídico é incapaz de manter na integra as
particularidades estilísticas dos exemplares arquitetônicos, pois ela apenas é um meio de nortear as
ações que devem ser seguidas após a sua implementação. Assim, entendendo, acredita-se que um
bom uso e uma boa conservação do imóvel por parte de seu proprietário/inquilino, quer particular,
quer institucional pública, contribua para a preservação do patrimônio edificado.
1 Em decorrência das modificações na gestão pública de Maceió o Setor de Patrimônio que localizava-se na
SEMPLA atualmente integra a SEDET.
O motivo que mais impulsionou esta escolha foi o fato das construções locadas na
Rua do Comércio sofrerem constantemente com reformulações nas fachadas das
edificações por parte de seus proprietários e o abuso da inserção de elementos visuais
como placas e letreiros de modo a mascarar os exemplares arquitetônicos protegidos
em nível municipal (ZEP-2). Tendo em vista que o projeto de qualificação das
edificações fora elaborado há oito anos sentiu-se a necessidade em verificar se a lei
vigente n° 4.545/1996 que foi utilizada durante o projeto de requalificação das
edificações. Também é seguida perante os setores responsáveis pela fiscalização:
Departamento de Fiscalização de Edificações e Urbanismo (DFEU), Departamento de
Fiscalização de Publicidade (DFP) e a Coordenação de Exame de Controle de Alvarás
de Publicidade (CECAP) ambos da SEDET.
Para a construção do artigo, foi necessário traçar objetivos para norteá-lo. A primeira
parte do trabalho, consistiu em pesquisar diversos conceitos fundamentais para o objeto
de estudo, associado a uma sequência de teóricos referente ao assunto. Examinou-se,
também, as interferências publicitárias no espaço público da rua, refletindo sobre sua
relação com as edificações históricas locadas em sítios históricos voltados ao uso
comercial e, como isso, foi refletido em São Paulo e em Maceió. O estudo mais acurado
sobre o uso da publicidade ocultando o patrimônio cultural serviu para compreender a
atual realidade das edificações históricas de cunho comercial no bairro central das
cidades brasileiras e o seu rebatimento no centro “histórico” de Maceió.
DESENVOLVIMENTO
Além do projeto voltado para coibir intervenções no patrimônio arquitetônico não ser
posto em prática o órgão responsável pela fiscalização SEDET e que o órgão
A situação que ocorre no eixo piloto – Rua do Comércio é semelhante aos demais
eixos comerciais das cidades brasileiras: patrimônio edificado, encoberto pelos
engenhos publicitários.
Todavia, na notificação utilizada pelos fiscais durante as idas a campo, consta que
compete ao setor da DFEU atuar e punir com multas os imóveis que se encontram em
desacordo com a lei corrente 4.545/96, fato que os atuais fiscais descordam. Para eles,
o assunto publicidade é competência do DFP. Entretanto, a notificação utilizada por eles
para atuar nas irregularidades consta na lei n° 4.545/1996.
2O código de Posturas (lei n°3.538/1985) evidencia apenas no artigo 193 a proibição de colocar anúncios sobre
as bandeiras nas sacadas, ou saliências de edifícios; mas nada em específico sobre os imóveis tombados ou
ZEP, já que o código antecede a normativa n°4.545/96.
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implantadas e seguidas relatou não ter conhecimento assim como os demais fiscais
recém contratados para lidar, com a publicidade no setor da DFP. E no que diz respeito
às fiscalizações da DFP, eles, atualmente, vem fazendo operações para apreender
placas, letreiros, cartazes em locais inadequados nos bairros de Ponta Verde,
Mangabeiras área nobre da cidade de Maceió. Porém, no Centro de Maceió, nenhuma
operação foi efetuada para coibir a publicidade nas edificações históricas, apenas ações
direcionadas para a remoção de ambulantes.
Outra falha que foi constatada é que; a notificação utilizada pelos fiscais de postura,
não contém nenhuma menção à Lei 4.545 de 1996. Somente menciona o Código de
Posturas (Lei n° 3.538/1985) e Lei Municipal n°4.954/2000. Quer dizer, apenas o setor
DFEU contempla essa normativa, todavia o DFP lida diretamente com a publicidade.
Para isso pensou-se em criar uma cartilha e um aplicativo para que ambos
pudessem colaborar para que a população denunciasse as irregularidades ocasionadas
pela publicidade no patrimônio edificado localizado na ZEP-2 junto às administrações
públicas.
A cartilha foi formulada como uma história em quadrinhos em uma sala de aula do
Centro Educacional de Jovens e Adultos Paulo Freire- CEJA, tendo como público alvo
adolescentes (faixa etária a partir dos 15 anos) e adultos ou profissionais da área. Dessa
forma, além de fornecer informações, diante do patrimônio possibilita, uma maior
comunicação entre a sociedade e os órgãos responsáveis da SEDET: Setor de
Patrimônio e os demais departamentos DFEU, DFP, CECAD, gerando uma
compreensão mais simples da lei 4.545/1996.
Associada à cartilha criou-se o aplicativo: Fiscalize Já. Para que a população possa
denunciar as irregularidades no patrimônio em áreas comerciais formuladas pela
publicidade.
Aplicativo (app)
A princípio, o aplicativo está disponível para celulares com sistema android e para o
funcionamento do aplicativo é necessário está conectado com a internet.
CONCLUSÃO
Outro fator que agrava a situação é que alguns dos imóveis dessa artéria são
alugados, isto interfere na conservação e preservação do patrimônio tendo em vista que
como os inquilinos dos imóveis não são proprietários. Eles não têm interesse em
preservar. Apenas têm o objetivo de utilizar-se do imóvel para atender as necessidades
logísticas, acarretado a isso a publicidade. Nesse processo, atuam como um fator
determinante para identificar o estabelecimento, tornando-o como primeiro plano e,
posteriormente, as fachadas do patrimônio cultural em segundo.
No que diz respeito à legislação para conter essa situação, observa-se que a
normativa específica n° 4.545/1996 não é cumprida pelos proprietários. No entanto,
apesar de estar vigente há vinte anos, vê-se crescente uma descaracterização dos
imóveis localizados no eixo comercial Rua do Comércio que fazem reformulações,
aplicação de anúncios, colocação de elementos na fachada inadequadamente, sem que
exista qualquer consentimento por parte da gestão pública SEDET.
Analisando, com atenção a referida Lei, encontraram-se várias falhas. Uma delas é
que o aporte normativo n° 4.545/1996 não contém nenhum meio punitivo para os
infratores sendo tal situação uma falha gravíssima. Assim se entendeu, já que não existe
uma conscientização preservacionista inata nem ensinada à população. Uma aplicação
de multa seria um recurso viável para preservar o patrimônio, tendo em vista que se o
cidadão não sofre nenhuma punição em realizar determinada intervenção indevida no
patrimônio edificado protegido e não é punido por lei. A tendência é sempre repetir, já
que, a rigor, não foi sequer cobrado no “bolso” com uma sifra vultosa.
Mas, detectou-se, também, que, além dessa legislação, atua na cidade de Maceió o
Código de Posturas de 1985 e a Lei 4.954/2000 gerindo o espaço público e as
edificações referentes à publicidade. Porém, somente a Lei 4.954/2000 cita no artigo 52
prevalece para a ZEP as normas já regulamentadas. Todavia, não salienta qual o
arcabouço legal deve ser seguido para a fiscalização direcionada aos centros históricos.
O modo como está redigido a normativa não especifica, de forma clara, o que
compreende e quais são a ZEP, nem qual é a legislação municipal que as rege.
Dessa maneira, observou-se que um dos meios para minimizar os danos é atualizar
as legislações municipais correntes e interligá-las em fácil compreensão aos
profissionais públicos e à população. Porém, sabe-se que o instrumento jurídico é
incapaz de manter na integra as particularidades estilísticas dos exemplares
arquitetônicos, pois ela apenas é um meio de nortear as ações que devem ser seguidas
após a sua implementação.
Percebe-se que a edificação não pode ser compreendida apenas como um objeto
para contemplação. Assim, entendendo, acredita-se que um bom uso e uma boa
conservação do imóvel por parte de seu proprietário/inquilino, quer particular, quer
institucional pública, contribua para a preservação do patrimônio edificado.
REFERÊNCIAS
VENTURI, Robert; BROWN, Denise ; IZENOUR, Steven. Aprendendo com Las Vegas: o
simbolismo (esquecido) da forma arquitetônica. São Paulo: Cosac Naify, 2003.
Título: Academia x rede social: a rede social como modo de democratização do acesso aos
resultados da dissertação.
RESUMO
Este trabalho consiste na análise da gestão do patrimônio no Estado do Rio Grande do Sul, Brasil,
entre os anos de 1980 e 2010. Partindo dos processos administrativos, estabelecemos categorias de
análise que se traduzem na reconstrução dos procedimentos, motivações e critérios adotados para
proteção oficial dos bens culturais e compreensão do processo oficial de proteção. Os dados foram
organizados em fichas e tabelas para análise, interpretação e crítica das informações. Embora sem
uma política linearmente definida para a preservação do patrimônio cultural, o tombamento
desencadeou uma série de práticas institucionais na interpretação do passado. Entretanto, esta
análise nos permite uma série de questionamentos como, por exemplo, a necessidade da definição
de critérios para a escolha dos exemplares a serem protegidos pelo tombamento e proteção do
entorno dos bens tombados, além das motivações e dos trâmites que nos trouxeram à atual lista que
dispomos.
Introdução
A partir dos dados coletados, estabelecemos algumas categorias de análise como, por
exemplo, o período compreendido entre a data de tombamento e a de inscrição no Livro
Tombo, em uma tentativa de reconstrução do processo e compreensão dos procedimentos
e critérios adotados para a proteção oficial dos bens culturais. O estudo possibilitou
constatar as diferentes motivações da preservação e consequentemente, seus
desdobramentos. Com o cruzamento dos dados coletados, foram obtidos subsídios para a
reconstrução parcial do cenário desafiador das três primeiras décadas de preservação oficial
no Estado do Rio Grande do Sul.
A Lei Nº 7.231/19781, que dispõe sobre o patrimônio cultural do Estado, traduz uma nova
tentativa de resguardar a integridade física dos bens culturais materiais. 2 Em 1979, três
decretos voltam a tratar da questão da cultura. O primeiro decreto de nº 28650/1979 altera a
estrutura organizacional da administração direta, passando a existir a Secretaria de Cultura,
Desporto e Turismo. Na designação de suas competências constam as atividades culturais,
patrimônio histórico, arqueológico, antropológico, científico, artístico e cultural.
1 Legislação Estadual: Lei nº 7231, de 18/12/1978 (dispõe sobre o Patrimônio Cultural do Estado). Art. 2 - "...
aplicam-se no que couber, aos bens integrantes do Patrimônio Cultural do Estado, as disposições do Dec. - Lei
nº 25, de 30/11/1937. Art. 3 -...remete às constituições federal e estadual dos anos de 1988 e 1989,
respectivamente.
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assuntos pertinentes à pesquisa e ao incremento das atividades culturais e ao patrimônio
histórico, arqueológico, antropológico, científico, cultural e artístico no Estado”. Contudo, a
competência e funcionamento dos órgãos deveriam ser regulados em Regimento aprovado
mediante Portaria. A partir de 1979, a Divisão de Cultura Histórica e Artística do Estado
passa a se chamar Coordenadoria do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado - CPHAE.
Após a criação da Secretaria de Estado da Cultura, em 1990, é publicada a portaria n°
11/90, que altera a denominação das coordenadorias, transformando-as em institutos.
Passando assim, o CPHAE, a chamar-se Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do
Estado, o IPHAE.
2A Lei estadual 7231/78 combinada com o Decreto-Lei nº 25/37 no âmbito federal disciplinam os tombamentos
no Rio Grande do Sul através de ato administrativo. Este é de competência da Secretaria de Estado da Cultura.
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A década de 80 foi, portanto, um período de estruturação, uma vez que buscou promover o
envolvimento das entidades locais de preservação com o intuito de apresentar processos de
tombamento com pareceres técnicos mais elaborados. Podemos considerar que um dos
pontos positivos decorrentes da descentralização dos agentes de preservação refere-se à
valorização do bem, ou seja, a partir desse momento o juízo de valores referentes ao
patrimônio passou também a ser de responsabilidade dos agentes locais.
Entre 1990 e 2000, houve uma multiplicação dos agentes envolvidos na proteção. As
preocupações com as justificativas para a valorização não se restringiram aos valores
arquitetônicos e históricos, mas também na busca à relação direta com seu proprietário,
com sua trajetória e com a comunidade onde se localiza, além da preocupação com o
desaparecimento do bem.
Como ponto de partida para a análise, consideramos alguns fatores inerentes ao próprio ato
de preservação oficial como, por exemplo, data de tombamento, inscrição em livro tombo e
portarias de entorno, tendo em vista buscar elementos que pudessem identificar e
corroborar o processo de gestão do patrimônio histórico cultural no Rio Grande do Sul. No
período delimitado, foram tombados 111 bens pelo Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico do Rio Grande do Sul. Destes, um foi posteriormente demolido, trata-se da Casa de
Ramiro Barcelos em Charqueadas. Portanto, podem ser considerados 110 bens tombados
para efeitos de análise. Propusemos a classificação dos bens, o que resultou em: paisagens
notáveis, ou seja, trechos parciais da mata atlântica, parques florestais e matas; bens
móveis; pinturas murais inseridas em interiores de edificações e bens imóveis quantificados
conforme o gráfico 1, abaixo.
A partir da coleta e organização dos dados em fichas para a identificação dos bens
tombados, foi possível dar início à análise e diagnóstico da situação. Entretanto, no
processo de cruzamento dos dados para sua posterior interpretação e diagnóstico, muitas
vezes foi preciso retornar aos processos de tombamentos ou mesmo recolher informações
adicionais na bibliografia. Logo, com a organização dos dados de identificação e históricos
em fichas, tabelas, análise dos processos de tombamento e portarias de entorno foi possível
definir parâmetros para subsidiar a análise dos procedimentos adotados pelo Instituto ao
longo do período proposto. Algumas dessas análises serão descritas a seguir.
Figura 3. Fotografia da Ponte 25 de Julho em São Leopoldo. Fonte: Arquivos do IPHAE. Autor e data
desconhecidos.
Conclusão
A pesquisa, da qual resulta este trabalho, embora ainda não esteja totalmente concluída, já
esta permitindo uma aproximação ao processo de construção e salvaguarda da memória
coletiva e as tentativas de preservação ao longo das últimas décadas no Rio Grande do Sul.
A imersão nos processos de tombamento, principal fonte de pesquisa do estudo, revelou-se
como fonte inesgotável da memória coletiva de nosso Estado.
Da mesma forma, fica ainda em aberto todo um estudo sobre as motivações e solicitações
de tombamentos nas quais participam os mais diferentes atores e depreende-se que há uma
longa jornada a ser percorrida, um aprendizado a ser adquirido. Mas, sobretudo, a grande
necessidade de serem traçadas novas linhas de atuação para a preservação do patrimônio
cultural no que tange a gestão.
Referências Bibliográficas
LOPES, Flavio. Zonas de proteção ao Património Arquitetónico: para que servem? Casal de
Cambra, Portugal: Caledoscópio, 2013
MACEDO, Riopardense de. Relatório. Manuscrito - Arquivos IPHAE. Porto Alegre, 1970. p.
16.
CASTRO, Sônia Rabello de. O Estado na Preservação de Bens Culturais. Rio de Janeiro,
Renovar, 1991.
IPHAE. Patrimônio Edificado – Orientações para sua preservação. Porto Alegre: CORAG –
2009.
RESUMO
O crescimento dos movimentos sociais urbanos, em defesa do patrimônio edificado no Brasil, vem
evidenciando as dificuldades na gestão desse patrimônio pelos órgãos de tutela e a prevalência de
uma hegemonia tecnocrática, expondo a ausência da participação social, seja nas políticas de
preservação ou nos processos decisórios de intervenções na cidade que afetam o coletivo. Apesar da
legitimação da participação e controle social pela Constituição Federal de 1988 e também pelo
Estatuto da Cidade de 2001, cujos instrumentos visam assegurar o pleno exercício da cidadania e a
gestão democrática das cidades, observa-se que a aplicabilidade desses instrumentos está longe de
ser efetiva.
Apresenta-se um conjunto complexo de questões que abrangem: a compreensão de que o patrimônio
cultural possui caráter difuso e coletivo; de que é portador de referência à identidade, à ação e à
memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira; de que há desigualdade na forma
de apropriação pelos cidadãos que são privados muitas vezes do processo de conhecimento, fruição
e valorização do patrimônio; e que comunidades pleiteiam reconhecimento identitário de bens
culturais.
A partir da análise de demandas de movimentos sociais em defesa do patrimônio edificado, e do
contexto brevemente aqui apresentado, propõe-se refletir, neste artigo, se as escalas de interesse de
preservação – nacional, regional e local, ainda que sejam entendidas como uma estrutura de
organização das instituições para uma gestão compartilhada, ao conferirem uma hierarquização de
valores do patrimônio, acabam por promover um caráter distinto desse patrimônio. Essa distinção
pode implicar na distribuição desigual de investimentos para a conservação, em muitos casos na
flexibilização da legislação em favorecimento de empreendimentos imobiliários e no processo de
conhecimento, fruição e valorização do patrimônio cultural. Também se argumenta que pode ser uma
forma excludente de reconhecimento de identidades, uma vez que à luz da Constituição Federal de
1988 o patrimônio cultural brasileiro é caracterizado pela sua diversidade, constituindo-se, portanto,
por múltiplas identidades.
Palavras-chave: Participação; Identidade; Patrimônio.
2. A distinção do patrimônio
A Constituição Federal de 1988, no Art. 23, inc. III, declara que é de competência
comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios a “proteção dos
documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, as paisagens
naturais notáveis e os sítios arqueológicos”. No Art. 30, sobre a competência dos
municípios, afirma no inc. IX que cabe a esse ente “promover a proteção do patrimônio
histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual”.
Segundo Castro (1991, p.21), há dois limites de ação para cada um dos entes
políticos. O primeiro diz respeito aos limites territoriais, e o segundo ao grau de interesse em
relação ao bem protegido que se poderia inferir da norma constitucional. Para essa autora,
“a competência executiva concorrente impõe a necessidade de se avaliar o grau de
interesse”, o que “significa que a União terá competência para proteger bens que tiverem
1 Compromisso de Brasília celebrado por ocasião do 1º Encontro dos governadores de Estado, secretários
estaduais da área cultural, prefeitos de municípios interessados, presidentes e representantes de instituições
culturais, em 1970; Compromisso de Salvador por ocasião do II Encontro de governadores para preservação do
patrimônio histórico, artístico, arqueológico e natural do Brasil, em 1971. Neste último encontro recomendou-se a
criação do Ministério da Cultura, e de secretarias ou fundações de cultura no âmbito estadual (Cury, 2004).
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importância nacional; os Estados, bens que tiverem significado regional; e os Municípios,
aqueles bens de interesse local”.
Para Castro (1991, p.21) é evidente que um bem de importância nacional é também
importante aos níveis regional (estados) e local (municípios), contudo o inverso pode não
ser aplicado. De fato, isso é o que se constitui como habitus2 dentro campo do patrimônio,
remetendo aos conceitos definidos por Bourdieu (1998).
2 Disposição corporal e mental que faz com que os agentes desse universo, se reconheçam e compartilhem
certas práticas e formas de pensar. Notas de aula: Teoria dos Movimentos Sociais Urbanos – IPPUR/UFRJ. Prof.
Orlando Junior.
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diversidade, como a formulação de uma ideia de identidade nacional, entendida aqui como
aquela construída desde 1937, pode excluir determinadas identificações de cultura regional
ou local? E, por que um reconhecido bem cultural local ou regional não pode ser
considerado um bem nacional?
Tem-se então que, nem todos os bens culturais tombados pelo Iphan, ou seja, em
escala nacional, apresentam de fato a memória ou a identidade do que seria de cunho
nacional, tal como construídas no período inicial da patrimonialização no Brasil. Gonçalves
(1996, p. 53) destaca que Aloísio Magalhães descreveu “a política tradicional do Sphan
como parte do que ele chama de velho tapete europeu, que sufoca a diversidade da cultura
brasileira”. Complementa que para Aloísio, a diversidade da cultura é pensada como tão
3 Processo n.º 0833-T-71. Inscrição Nº50, Vol. 1, F.12 do Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e
Paisagístico em 04/07/1972.
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heterogênea quanto oposta àquela concepção homogeneizadora de cultura que teria sido
implantada na política do Sphan, desde sua criação em 1937, através do Decreto-Lei
n.º25/1937.
O patrimônio cultural tem servido para produzir as diferenças entre os grupos sociais
e a hegemonia daqueles que usufruem a produção e a distribuição dos bens, como também
destaca Arantes (2000) ao colocar que o capital cultural forja um futuro privilegiado de zonas
eleitas e reduz o futuro das áreas menos favorecidas, o que nos permite inferir na ampliação
não somente de um patrimônio desigual4, mas da desigualdade social.
Para Canclini (1994) a sociedade não se desenvolve apenas por meio da reprodução
incessante do capital cultural hegemônico, nem o lugar das classes populares se explica
unicamente pela sua posição subordinada. A desigualdade estrutural entre as diferentes
4
Conceito empregado por Scifoni (2015).
Holston (op.cit. p. 28) traça uma análise da trajetória histórica da cidadania brasileira
como uma combinação de dois fatores: a cidadania formal, fundada em princípios de
incorporação ao Estado-nação; e a distribuição substantiva dos direitos, significados,
instituições e práticas envolvidas na afiliação daqueles considerados cidadãos. Argumenta
que a combinação desses fatores geram uma cidadania nacional que, desde o início (da
formação da nação), era universalmente includente na incorporação e maciçamente
desigual na distribuição. Essa formulação de cidadania usa diferenças sociais que não são
as bases da incorporação nacional – sobretudo diferenças, como de educação, propriedade,
raça, gênero e ocupação – para proporcionar tratamentos diferentes para categorias
diferentes de cidadãos. É então gerada uma gradação de direitos entre eles em que a
maioria dos direitos está disponível apenas para tipos específicos de cidadãos e é exercida
como privilégio de categorias sociais específicas.
Para Carracedo (2000, p.26 e 27) a cidadania complexa se constitui como parte de
uma identidade comum fundamental, dentro da legítima diferenciação étnico-cultural
enquanto indivíduos e enquanto grupo, com identidade própria e irrenunciável, podendo
responder as tensões entre pertencimento e participação. Segundo sua visão, o
pertencimento é tratado pela obtenção do reconhecimento pleno dos direitos civis, e na
esfera da participação há uma dimensão sócio-política que supõe a aceitação e a integração
em uma estrutura institucional que permite o cumprimento das obrigações cívicas e o
exercício dos direitos pelos cidadãos. Os direitos não devem ser restritos a bens
a) igualdade de direitos básicos para todos os cidadãos, o que implica uma política
universalista de integrar os mínimos comuns;
Cabe ainda considerar que Carracedo (2000) destaca o cuidado que se deve ter em
relação à assimilação e a homogeneização da cultura hegemônica. Para ele, este diálogo
entre diferentes grupos etnoculturais deve acontecer, mas este diálogo/intercambio não
pode incorporar a assimilação e homogeneização da cultura dominante-hegemônica.
Sobre a identidade, Haesbaert (1999, p.170 e 171) entende que ela pode ressurgir,
no contexto de mercantilização das cidades, como uma forma consciente ou não, de
contraposição ao processo excludente pela globalização. Woodward (2000, p.21) coloca que
a globalização produz diferentes resultados em termos de identidade, onde a:
Haesbaert (1999, p. 175 e 178) afirma que toda identidade só se define em relação a
outras identidades, numa relação complexa de escalas territoriais. As identidades implicam
na busca de reconhecimento que se faz frente à alteridade. Aborda a noção a identidade
socioterritorial, em que um dos aspectos fundamentais para a sua estruturação está na
5 Notas de aula: Teoria dos Movimentos Sociais Urbanos – IPPUR/UFRJ. Prof. Orlando Junior.
Haesbaert (1999, p. 180 e 187) conclui que a importância da identidade decorre mais
de sua eficácia que de sua “realidade”. E considera que, o território pode vincular poderes
simbólicos de múltiplas faces, ora reforçando a segregação, ora viabilizando uma dinâmica
de convívio ou de ativação de múltiplas identidades.
Para Woodward (2000, p.40) as identidades são fabricadas por meio da marcação da
diferença. Essa marcação decorre dos sistemas simbólicos de representação e também
pelas formas de exclusão social. A identidade não seria o oposto da diferença, mas
apresenta uma relação de dependência. Nas relações sociais, as formas de diferença
simbólica e social são estabelecidas por sistemas classificatórios, ao menos em parte. Um
sistema classificatório pode operar um princípio de diferença a uma população de tal forma
que pode ser capaz de dividi-la.
Figs. 04 e 05 – À esquerda, observa-se a edificação da estação ainda íntegra, em fotografia de 2004, de autoria
de Gutierrez L. Coelho. Fonte: Disponível em http://www.estacoesferroviarias.com.br. Acessado em janeiro de
2009. À direita, tem-se a estação em ruínas. Acervo pessoal, 2009.
6
Proc. 2008.00124881. IC 44/2003 (TM-CID).
5. Considerações finais
Pelo caminho teórico percorrido até aqui, entendemos que a produção de escalas
espaciais no sistema de preservação do patrimônio brasileiro incorre no isolamento das
competências e responsabilidades das esferas de proteção patrimonial. Contribui assim, na
fragmentação de identidades coletivas e na exclusão de múltiplas identidades, além, de criar
um caráter distinto de patrimônio, por meio de sua classificação, no qual há bens
supervalorizados e outros desvalorizados em seus capitais simbólicos, o que atribuímos
como uma divisão patrimonial de classe.
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cidade do pensamento único. Desmanchando consensos. Petrópolis: Editora Vozes, 2000.
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SCIFONI, Simone. Cultura e problemática urbana. In: CARLOS, Ana Fani Alessandri (org.). Crise
Urbana. São Paulo: Contexto, 2015.
1. Instituto Federal de Minas Gerais Campus Ouro Preto. Departamento de Conservação e Restauro
Endereço Postal: Rua Pandiá Calógeras, 898, Bauxita, Ouro Preto - MG.
E-mail:tassia.surya@gmail.com
2. Instituto Federal de Minas Gerais Campus Ouro Preto. Departamento de Conservação e Restauro
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4. Instituto Federal de Minas Gerais Campus Ouro Preto. Departamento de Conservação e Restauro
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RESUMO
Nos tempos coloniais, as estradas reais eram as principais vias de acesso à região de Vila Rica. Em
1782 o governador Dom Rodrigo José de Menezes mandou abrir uma nova estrada ligando o Palácio
de Cachoeira ao de Ouro Preto. Esta nova via, que substituiu uma mais antiga (construída no cimo da
serra em 1718), era uma estrutura soberba, com 20Km de extensão, com calçamentos, muros de
arrimo, caneletas de escoamento de água e um belo chafariz (tombado pelo Iphan em 2007). Uma
fantástica obra de engenharia colonial, a estrada de Dom Rodrigo oferece um passeio único pela
imponente serra, outrora chamada Serra da Cachoeira (hoje conhecida como Serra de Ouro Preto).
Por sua incontestável importância histórica, em 2014 iniciou-se um projeto de Pesquisa e Extensão
no IFMG – Ouro Preto com o objetivo de impulsionar instrumentos de proteção patrimonial e garantir,
através dele, o acautelamento das estradas. Cremos, contudo, que mais importante até que os
processos de tombamento e guarda legal, a conscientização da população acerca de seus bens de
valor histórico é de fundamental importância para a manutenção do próprio bem. Nesse sentido,
desenvolver um trabalho de sensibilização e educação patrimonial nas comunidades de São
Bartolomeu, bem como em distritos vizinhos, ligados intrinsecamente à famosa Estrada, foi primordial
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para o sucesso do projeto. Grande foi a participação da comunidade que atuou de forma ativa nas
atividades propostas, sendo protagonistas durante todo o processo. O trabalho de educação
patrimonial proporcionou uma rica experiência de trocas entre a comunidade e academia, mostrando,
dessa forma, que ambas devem caminhar juntas no processo de construção do conhecimento. Houve
contato estabelecido com o IEPHA, para orientar as políticas públicas possíveis de se aplicar nas
estradas, bem como uma parceria com o Ministério Público, a fim de apurar as possibilidades de
acautelamento real frente ao Estado. O fruto principal do projeto foi o início do procedimento de
tombamento da Estrada de Dom Rodrigo, que atualmente está em discussão no Conselho
Patrimonial de Ouro Preto. Cabe frisar que diante da repercussão do trabalho, houve interesse por
parte do IPHAN em obter os dados inventariados da pesquisa para iniciar esse trâmite. Partindo dos
resultados positivos já alcançados, o foco agora é abordar a participação efetiva nos procedimentos
de tombamento junto ao COMPATRI. Tendo em vista também o grande reconhecimento obtido com o
trabalho de educação patrimonial nas escolas de São Bartolomeu e Cachoeira do Campo, recebemos
diversos convites para realização das mesmas atividades em outros distritos. Assim, resolvemos
aprimorar as ações relacionadas à sensibilização junto às comunidades, ampliando esse trabalho
para o distrito de Glaura, sendo esta localidade ligada diretamente com a história da estrada. Espera-
se, sobretudo, que o projeto continue aproximando os moradores ao patrimônio, estimulando assim, a
cidadania ativa e participativa.
Introdução
Dom Rodrigo tomou posse como governador da Capitania das Minas em 20 de fevereiro de
1780, sendo a solenidade realizada na Igreja de Nossa Senhora do Pilar, em Vila Rica,
como era costume. O Conde de Cavaleiros - título nobre e honorífico que Dom Rodrigo
ostentava - veio para as Minas com sua esposa, a condessa Dona Maria José Ferreira
d´Eça.
Dentre estas, cumpre destacar a Estrada de Cachoeira. Esta via era parte essencial e
prolongamento das obras que Dom Rodrigo empreendeu na Casa de Recreio que os
governadores mantinham em Cachoeira do Campo. Depois de várias reformas, a citada
casa foi transformada em um aprazível Palácio de Campo.
Entre as propostas que o dinâmico Conde enviou ao Rei de Portugal, estava a liberdade das
indústrias em Minas (o que era explicitamente proibido). Como a sugestão soasse aos
ouvidos reais quase como heresia foi prontamente negada.
O chafariz, que hoje leva o nome de Dom Rodrigo, continua como testemunha muda de
seus atos, sendo o mais conservado dos monumentos erguidos em sua lembrança.
É o mesmo que matou a sede de Dom Pedro II, no dia dois de abril de 1881, quando seguia
de Ouro Preto para Cachoeira do Campo e do qual ele deixa registro de próprio punho. Sem
dúvida que também saciou a sede dos Inconfidentes de 1789, que cotidianamente usavam
esta estrada, então recém construída.
Localizado a médio caminho entre Cachoeira e Vila Rica, a meia encosta do paredão
rochoso (o qual domina grande parte da Serra da Cachoeira), pelos lados que defronta com
o Vale do Rio das Velhas. A estrada - da qual o chafariz era um útil adorno - se iniciava no
portão de acesso ao Palácio da Cachoeira, atravessava a Ponte do Palácio (sobre o Rio
Maracujá) e seguia pela antiga Rua do Palácio (atual Rua Nossa Senhora Auxiliadora). Dali
atingia a Praça da Matriz de Nazaré (Praça Filipe dos Santos, onde também existe um
chafariz), subindo em seguida pela Rua do Tombadouro. Do Tombadouro ia em direção ao
Padre João (hoje bairro Alto do Beleza), abandonando de vez a área urbana de Cachoeira,
Do Padre João o caminho descia sinuoso até Santo Antônio dos Tabuões (onde existia
pequena ponte de madeira) e daí subia novamente ao Pouso de José Henriques (famosa
hospedaria colonial). De José Henriques tomava-se o trecho principal do caminho aberto por
Dom Rodrigo de Menezes, já aos pés da Serra da Cachoeira - esta parte do caminho foi a
que mais trabalho impôs aos seus construtores, pois foi toda aberta na rocha virgem, em
curva de nível, ziguezagueando a encosta íngreme. O chafariz citado foi edificado aos pés
da pedra que domina a serra. De lá rumava-se até a Pedra de Amolar, descendo depois à
Jacuba e daí entrava-se em Vila Rica pelas Cabeças. Percebe-se que boa parte do caminho
Como se vê, essas estradas têm papel de destaque na história de Ouro Preto. As diversas
cartas régias, que pediam abertura e melhoria das estradas que ligavam Vila Rica aos
principais eixos de conexão do país no século XVIII, também apontam a importância que as
estradas tinham (e ainda tem) para o desenvolvimento local. O processo de tombamento do
Chafariz de Dom Rodrigo também indica essa relevância.
O olhar atento dos viajantes estrangeiros que palmilharam Minas Gerais durante o século
XIX é de especial importância para quem deseja analisar o aspecto das velhas cidades
mineradoras e seus caminhos. Apesar da maioria desses viajantes terem visitado Minas já
no Império, seus relatos, pela proximidade temporal, nos dão uma ideia do período anterior,
da época áurea da capitania. O caminho de Dom Rodrigo de Meneses foi visitado e descrito
por vários viajantes estrangeiros durante o século XIX. Apesar do Chafariz ser ponto
referencial deste caminho, pouca atenção deve ter recebido de nossos visitadores, posto
que são raros os que lhe registram palavra. O mais minucioso relato desta estrada provém
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do Dr. Johann Emanuel Pohl, que por aqui esteve em 1819. É dele também uma
interessante - ainda que breve - descrição do chafariz. O famoso naturalista austríaco
descreve o caminho que percorreu entre Vila Rica e Cachoeira do Campo, onde visitou,
além do Palácio, a casa de um compatriota seu e o Quartel da Cavalaria (pela época, já
transformado na Coudelaria Real).
O relato antigo mais extenso sobre o Chafariz vem, curiosamente, do Imperador Dom Pedro
II, que tinha cuidado de descrever suas viagens num pequeno diário. Transcrevemos
também longo trecho, referente ao passeio e à visita a Cachoeira do Campo:
2 de abril de 1881 (sábado) - (...) Subida da serra que divide águas do rio
Doce de águas do rio das Velhas. Alto da pedra de amolar. Vasta e bela
vista. O caminho é todo muito pitoresco. Descobri ao longe o Rio das
Velhas. Chafariz do tempo do governo de D. Rodrigo de Meneses 1722
creio eu. Arraialzinho dos Taboães com ponte. Cachoeira do Campo arraial
de muitas casas. Almocei; fui orar à Igreja que tem dois altares laterais que
muito me agradaram por seus lavores de talha. Visitei só a coudelaria. Casa
arrumadíssima. O arrendatário fulano Castro não quis responder-me
claramente sobre a extensão das terras e as cabeças de gado por causa de
pequena renda que paga e assim mesmo sem tê-lo feito pontualmente. A
terra da coudelaria é só de meu usufruto mas a fazenda do buraco
igualmente arrendada ao mesmo é minha propriedade. Pensarei em
aproveitá-las para colonos.
Voltei à casa onde vi uma cadeira de forma antiga onde meu Pai se
assentou e um Murta de 88 anos que lhe cuidava dos animais de viagem.
Entreguei as duas cartas de alforria dadas pelo dr. Fernandes Torres a dois
cônjuges ao marido estando ausente a mulher. O arrendatário das duas
fazendas disse-me que cada alqueire já produziu 8 carros de mantimentos.
Dom Pedro acerta o Governador, mas erra a data - 1782 é o ano certo, não 1722.
Certamente a data, gravada em pedra, devia estar coberta de musgo ou semi-apagada, pois
a dúvida é explícita.
De São Bartolomeu partiam caminhos secundários que atingiam o Caraça, Catas Altas do
Mato Dentro, Santa Bárbara (e desta à Comarca do Serro), Casa Branca, além de outras
trilhas que se esgueiravam pela serra em direção à Estrada de Dom Rodrigo: desta, à
esquerda, rumava-se à antiga Vila Rica ou, à direita, ao Arraial da Cachoeira e seus
arredores.
Quais caminhos, porém, existiam a ligar Cachoeira a Vila Rica, antes da obra de Dom
Rodrigo? E qual o impacto da obra da nova estrada para Vila Rica, Cachoeira do Campo e,
sobretudo, São Bartolomeu, que saíra da rota principal de acesso?
Qual a relação estabelecida entre a comunidade de São Bartolomeu e esse caminho hoje?
Esses caminhos, tão importantes para a história colonial mineira, merecem, assim como o
Chafariz (único bem tombado na longa serra), sua proteção efetiva por parte do Estado.
As estradas reais, que nos tempos coloniais exerciam importante função de circulação para
Vila Rica, hoje formam um caminho turístico que retrata um importante período da história
do país. Muitas políticas vem tratando de promover as estradas reais e ações são
desenvolvidas para garantir a preservação do patrimônio histórico existente nesses
caminhos. Como explica Márcio Santos:
Estruturador dos Destinos Turísticos e do Instituto Estrada Real (FIEMG). O projeto estimula
o turismo na Estrada Real, contribui para a economia local e fortalece os laços de identidade
coletiva com as comunidades de entorno. Esse projeto vem apresentando interessantes
resultados positivos, tanto para o turismo, como para a promoção do patrimônio.
Assim, reconhecer de forma sistemática essas estradas entre Vila Rica e Cachoeira do
Campo pode ser uma maneira de estimular a economia local, o turismo cultural e a
preservação. Ademais é preciso lembrar do risco que essa região pode sofrer decorrente
dos impactos ambientais negativos constantes nas atividades extrativas da mineração na
região. O desmatamento, erosão, alteração da paisagem e do solo, fauna e flora podem
comprometer a unidade do conjunto.
Assim, ações que incentivem a redução desses impactos são essenciais. A preservação do
patrimônio arqueológico e histórico dessas estradas são ações de preservação da história
de Minas Gerais.
No entanto, essas ações devem ter por base diretrizes que se amparem na educação e
extensão comunicativa. A educação assume um papel transformador junto ao possível
agente de impacto - o homem - transformando-o num aliado e protetor de suas próprias
heranças culturais. Ações educativas, voltadas para a cidadania com ênfase em
preservação ambiental e cultural e revitalização do meio ambiente local, ajudam a resgatar a
riquíssima memória que envolve a região de São Bartolomeu. Como esclarece Marques:
Material e Metodologia
Resultados e Discussões
Espera-se que o trabalho proposto por este projeto impulsione um dos instrumentos de
proteção patrimonial (aquele que se mostrar mais adequado às necessidades) e garanta,
através dele, a proteção das estradas. O reconhecimento institucionalizado de
patrimonialização do bem é essencial. Espera-se que a comunidade de São Bartolomeu
seja agente ativa nas tomadas de decisão junto aos mediadores e que o trabalho de
educação patrimonial e história oral possam aproximar os moradores do patrimônio e
estimular a cidadania ativa e participativa.
Conclusão
Foram feitas mais de 800 imagens apontando vestígios de materiais em escala, sistemas
construtivos, paisagem construída e ambiental. Dessa maneira, houve o armazenamento
das imagens conforme correspondência as coordenadas. Cada coordenada tirada com o
GPS corresponde a um vestígio material, seja ele um murro normal ou de arrimo,
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calçamento original, paisagem ambiental, referencias geográficas, ou edificadas. Esse
material será utilizado nos trabalhos de extensão e também representa uma ferramenta de
pesquisa e um documento de conservação e proteção da estradas.
Durante esse período, houve a produção de onze mapas, sendo o mapa de localização, de
vestígios materiais, de edificações históricas, de localização municipal, distrital, estadual e
regional, de altimetria, de relevo, de quilometragem e de satélite. Como resultado obteve-se
a parceria entre o projeto e duas escolas para aplicação das atividades extencionistas;
parceria com o Ministério Público, a fim de apurar as possibilidades de acautelamento real
frente ao Estado; contato estabelecido com o IEPHA, para orientar as políticas públicas
possíveis de se aplicar nas estradas.
Vale ressaltar que o presente projeto encontra-se em andamento, portanto, o mesmo ainda
não finalizou. Partindo dos resultados positivos da primeira etapa, abordaremos a partir de
agora a participação efetiva nos procedimentos de tombamento junto ao Conselho
Patrimonial de Ouro Preto. Tendo em vista também o grande reconhecimento obtido com o
trabalho de educação patrimonial nas escolas de São Bartolomeu e Cachoeira do Campo,
recebemos diversos convites para realização das mesmas atividades em outros distritos.
Desta forma, resolvemos aprimorar as ações relacionadas à sensibilização junto às
comunidades, ampliando esse trabalho para o distrito de Glaura, sendo esta localidade
ligada diretamente com a história da estrada.
MARQUES, Daniel Anilton Duarte. Estrada Real: Patrimônio Cultural de Minas Gerais (?)
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BOHRER, Alex Fernandes. Ouro Preto, Um Novo Olhar. São Paulo: Scortecci, 2011.
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RESUMO
O objetivo deste artigo é realizar uma avaliação crítica dos critérios de conservação adotados para as
edificações protegidas pela Área de Proteção do Ambiente Cultural (APAC) do Corredor Cultural do
Rio de Janeiro sob o ponto de vista conceitual, teórico e principalmente sob a ótica do conforto
ambiental. A arquitetura característica do local onde hoje está delimitada esta APAC foi produzida por
muitos séculos como resultado de uma cultura de edificar, que atendia bem às necessidades daquela
população, manipulando as variáveis do meio externo, proporcionando conforto e habitabilidade. Será
apresentado um breve resumo sobre a evolução dos principais pontos relacionados ao conceito de
conservação de bens culturais arquitetônicos. Posteriormente, serão citadas algumas determinações
das várias legislações produzidas para a área, desde o século XIX até os dias atuais. A partir dos
conceitos abordados sobre conservação de edifícios históricos, da análise da evolução da legislação,
será produzida uma reflexão sobre a maneira em que as questões relativas ao conforto do ambiente
construído, tão valorizadas durante o século XIX como forma de proporcionar a higiene dos edifícios
através da adequada iluminação e ventilação, são contempladas na legislação vigente para o
Corredor Cultural.
Inicialmente, o Rio de Janeiro era visto como uma “praça insalubre” (DE PAOLI, 2013, p. 51-
52) sobre um terreno pantanoso aterrado, e considerado uma “cidade apertada”, limitada por
morros, que foi ocupada através de um longo processo de dissecamento de brejos e
mangues (ABREU, 2006, p. 35). Apresentava um traçado viário característico do período
colonial. A partir de 1763, ano e que tornou-se a capital da colônia, começaram a ser
realizadas melhorias tanto no saneamento quanto nos espaços públicos (LIMA CARLOS,
2012, p. 311). Com a chegada da família Real em 1808, as transformações sobre o território
intensificaram-se: esta nova população que vinha habitar a Cidade do Rio de Janeiro
demandava o atendimento de alguns tipos de novas necessidades, exigindo, assim,
mudanças tanto na aparência quanto no conteúdo da cidade (ABREU, 2006, p. 35).
Até 1821, o Rio de Janeiro restringia-se ao que hoje é a Região Administrativa do Centro e à
Região Portuária. A divisão da cidade era realizada por cinco freguesias, sendo a freguesia
da Candelária a mais nobre desde o período colonial. Nela estavam localizados grandes
estabelecimentos comerciais, que constantemente passavam por obras de renovação
arquitetônica. O traçado característico do Brasil colônia persistia nesta área: consistia em
uma trama regular de ruas paralelas e perpendiculares, formando desenho semelhante a um
tabuleiro de xadrez (DE PAOLI, 2013, p. 25).
As construções eram realizadas sobre os limites laterais e frontais dos lotes, conservando
apenas a área dos fundos livre de edificação. Apesar da legislação não prefigurar nenhuma
tipologia de planta, os traços culturais faziam com que todas fossem compartimentadas de
forma muito semelhante (DE PAOLI, 2013, p. 133). O parcelamento característico do
período colonial facilitava a ocorrência desta semelhança. Ao longo do século XIX, a
legislação foi se desenvolvendo, evoluindo de questões de caráter puramente estético para
questões relativas à qualidade do espaço interno das edificações e à salubridade do
ambiente construído.
No ano de 1979 foi proposta a criação do Corredor Cultural, com o objetivo de conservar
partes remanescentes do conjunto arquitetônico da área Central da Cidade (LIMA CARLOS,
2011, p. 17), que continuava seu processo de expansão e renovação. Até então, estes
edifícios que integram a área eram considerados obras modestas que não apresentavam
valor para a preservação, nem mesmo pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional) e INEPAC (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural) (MACEDO, 2004, p.
2).
Metodologia
O ato de conservar não envolve apenas o patrimônio material, como é o caso dos bens
tangíveis; o intangível, a exemplo da preservação de um significado cultural e seus valores,
dos saberes e fazeres de um determinado grupo social também é um aspecto a ser incluído
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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
quando tratamos de conservação. Ao considerarmos a diversidade cultural existente nos
vários grupos sociais ao redor do mundo, podemos perceber que o conceito sobre o
significado da palavra “conservação” é variável. Consequentemente, o significado de
“autenticidade” também varia entre os diferentes contextos culturais.
No caso da arquitetura, trata-se de uma obra de arte utilitária e exposta aos mais variados
tipos de intempéries. Assim, torna-se praticamente impossível evitar sua degradação. Diante
desta questão, para não ferir a autenticidade do objeto, como podemos conservar a
arquitetura?
Um objeto é autêntico quando se encontra íntegro na maior parte dos seus componentes
originais (LIMA CARLOS, 2014, p. 59), porém, os conceitos referentes ao assunto vêm
passando por revisões no século XXI. Segundo Lima Carlos (2014), a autenticidade pode
ser relativizada, pois, a exemplo do que ocorre na arquitetura, ao longo do tempo o objeto
precisa passar por alterações, tanto de manutenção quanto para adaptação às novas
demandas de seus habitantes, e nem por isso o bem perde sua autenticidade. Quando a
demanda por alterações é uma necessidade coletiva real, o patrimônio continua a ser
autêntico, desde que não perca de vista seu caráter histórico e seus significados (LIMA
CARLOS, 2014, p. 59).
A primeira vez que a discussão sobre o conceito de autenticidade surgiu foi na Carta de
Veneza (ICOMOS, 1964), que associava autenticidade à originalidade. Já na Carta de Nara
(ICOMOS, 1994), a autenticidade aparece como principal fator de atribuição de valores, e
leva em consideração aspectos de forma e desenho, materiais e substância, uso e função,
tradições e técnicas, localização e espaço, espírito e sentimento, e outros fatores internos e
externos. Podemos perceber que esta Carta tratava tanto de questões materiais como
imateriais.
Na Carta de Brasília (ICOMOS, 1995), a autenticidade tem seu significado atribuído à ideia
de verdade. Este documento propõe que sejam reconhecidas e valorizadas as tradições
culturais do local onde o patrimônio está inserido, e que as técnicas mais apropriadas sejam
Os traços culturais faziam com que as disposições internas das moradias fossem bastante
semelhantes entre si. A mão-de-obra que realizava estas construções era escrava,
disponível em abundância. Até mesmo nos exemplares mais ricos, de maiores dimensões,
não era produzido um tipo distinto de habitação, apontando que a tendência era sempre
seguir esse padrão cultural. Variações só apareciam em casas situadas nas esquinas. Até
meados do século XIX, apesar de todas as inovações trazidas após a chegada da Corte e
dos novos materiais de construção, a tipologia de planta permaneceu praticamente intacta
(DE PAOLI, 2013, p. 133-135).
O Código de Posturas de 1838 nada dizia sobre a compartimentação dos imóveis, e apesar
da disposição interna muito semelhante, não havia nenhuma legislação que a determinasse.
Neste Código constava no parágrafo 9° apenas alguns parâmetros arquitetônicos referentes
à altura dos pés-direitos e ao tamanho das aberturas das fachadas. Para toda casa com até
8,80 metros de frente que fosse edificada a partir de então, o primeiro pavimento deveria ter
4,40 metros de pé-direito, 4,18 metros no segundo pavimento, 3,96 metros no terceiro,
seguindo sempre a mesma proporção de redução a cada pavimento que fosse
acrescentado. Essas eram as medidas exatas que deveriam apresentar, pois a altura do pé-
direito era considerada até então apenas uma questão de composição das fachadas.
Na segunda metade do século XIX, as construções começaram a ser afastadas dos limites
laterais dos lotes, mas continuavam sobre o alinhamento da via. Geralmente esse recuo
ocorria em apenas um dos lados (REIS FILHO, 1978, apud DE PAOLI, 2013, p. 135),
permitindo que todos os cômodos da casa fossem iluminados. Outra variação da época
foram as casas de porão alto (REIS FILHO, 2006, p. 33). Essas novidades não ocorreram
na área do Centro do Rio de Janeiro onde hoje é o Corredor Cultural, pois, devido à função
comercial do térreo, exigia-se um contato direto do térreo com a rua: portanto, essas
edificações do Centro não sofreram alterações, conservando o mesmo tipo de distribuição
interna do período colonial (DE PAOLI, 2013, p. 138).
O Projeto Corredor Cultural do Rio de Janeiro foi iniciado em 1979, pelo governo municipal,
com o objetivo de preservar e revitalizar áreas do Centro da Cidade (MACEDO, 2004, p. 1).
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A proposta é uma referência mundial quanto à introdução de estratégias de preservação em
escala urbana: foi implantada de forma democrática, sendo discutida e aprovada na câmara
de Vereadores; contou com a participação efetiva da sociedade; foi concebida por uma
equipe multidisciplinar, envolvendo técnicos da Prefeitura Municipal e intelectuais, que
associavam as estratégias de preservação à recreação e revitalização de atividades
culturais (INSTITUTO MUNICIPAL DE ARTE E CULTURA, 2002, p. 6).
Figura 2: Limites do Corredor Cultural, dividido em quatro diferentes áreas. Fonte: Instituto Municipal
de Arte e Cultura, 2002, p. 9.
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No ano seguinte, a aprovação da Lei nº 506, de 17 de Janeiro de 1984, reconhece a criação
da Zona Especial do Corredor Cultural (INSTITUTO MUNICIPAL DE ARTE E CULTURA,
2002, p. 6), visando à proteção paisagística e ambiental do Centro da Cidade. A Zona foi
subdividida em três subzonas: preservação ambiental, reconstituição e renovação urbana.
Figura 3: Sugestão para obra de modificação com acréscimo de pavimento mantendo o uso das
janelas. Fonte: INSTITUTO MUNICIPAL DE ARTE E CULTURA, 2002, p. 46.
As edificações são construídas para modificar o clima e criar um ambiente interno favorável
(HEYWOOD, 2015, p. 6), e a arquitetura, resultado da fusão entre arte e técnica, manipula
as variáveis do meio externo, com a finalidade de proporcionar maior conforto e
habitabilidade. Ao analisarmos a história da arquitetura, podemos perceber que as técnicas
construtivas sempre foram estruturadas em função das necessidades do ser humano,
levando em consideração as particularidades do clima de cada lugar (GONÇALVES, 2011,
p. 26).
No caso do clima tropical úmido característico do Rio de Janeiro, Corbella e Yannas (2009,
p. 39) sugerem que para se obter um bom nível de conforto é necessário, dentre outras
estratégias, remover a umidade em excesso e promover o movimento de ar. Os autores
recomendam que “é sempre desejável, para os edifícios que não terão ar condicionado, uma
grande permeabilidade do envelope para o ar e a luz” (CORBELLA; YANNAS, 2009, p. 170).
A ventilação natural também pode ser usada para outras finalidades, como manter a
qualidade do ar nos ambientes internos, remover a carga térmica adquirida e promover o
resfriamento fisiológico dos usuários (BITTENCOURT; CÂNDIDO, 2010, p. 11). O fluxo de
ventos depende das características do entorno da edificação, e em seu interior, depende da
compartimentação interna e da área das aberturas. A questão da preservação do entorno de
um núcleo histórico urbano, além do caráter estético, inclui também questões de conforto.
5. Conclusões
Tanto na área do Corredor Cultural do Rio de Janeiro como em várias outras áreas
históricas brasileiras encontramos a alteração da disposição e da compartimentação dos
edifícios, visando apenas o maior aproveitamento das áreas construídas sem alteração das
volumetrias, não respeitando o patrimônio ao realizarem adaptações aos usos e costumes
atuais. Segundo Kühl (2008, p. 213), “muitos bens têm sido sistematicamente
descaracterizados, invocando-se razões de uso e afirmam se tratar de preservação”. As
novas utilizações devem ser compatíveis com os interesses histórico-artísticos, e as obras
de adaptação devem ser limitadas ao mínimo, porém, as formas externas devem ser
conservadas e deve-se evitar a alteração das características tipológicas, do organismo
construtivo e da sequência dos percursos internos, conforme recomenda a Carta de
Restauração Italiana (1972 apud BRANDI, 2004, p. 242). Em casos mais graves,
encontramos o patrimônio edificado de valor cultural reduzido à mera cenografia, ao
fachadismo, ignorando todo o conhecimento técnico existente nas edificações antigas e
todas as questões relativas ao conforto do ambiente construído.
Bibliografia
HEYWOOD, Huw. 101 regras básicas para uma arquitetura de baixo consumo
energético. – São Paulo: Gustavo Gili, 2015.
LIMA CARLOS, Claudio Antonio Santos. Aplainando relevos e se afastando das águas: a
ocupação e a expansão do sítio original da cidade do Rio de Janeiro, do século XVIII ao XX,
in GANDARA, Gercinair S. (org), Natureza e Cidades – o viver entre águas doces e
salgadas. Goiânia: Ed. da PUC Goiás, 2012, PP. 308 a 323.
REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da Arquitetura no Brasil. 11. ed. –São Paulo:
Perspectiva, 2006.
RIEGL, Aloïs. O culto moderno dos monumentos: sua essência e sua gênese. Trad.
Elaine Ribeiro Peixoto e Albertina Vicentini. Goiânia: Ed. da UCG, 2006.
SANTOS, Carlos Nelson Ferreira dos. Preservar não é tombar, renovar não é pôr tudo
abaixo. Revista Projeto, São Paulo, n. 86, p. 59-63, 1986.
RESUMO
A gestão da preservação do patrimônio cultural pode revelar a forma que um povo ( o poder
institucional e a comunidade) encara a relevância do seu patrimônio cultural na constituição
da identidade da cultura local. Dessas visões, surgem os embates sobre o que lembrar, o
que esquecer, como preservar, como transmitir.
Para a garantia da preservação do patrimônio cultural, mais que uma legislação avançada e
abrangente, é necessário que ele seja reconhecido como tal por este povo. Mônica Starling
sintetiza essa questão de estabelecimento de reconhecimento e estabelecimento de valor
para o patrimônio:
Este estabelecimento de valor, que deriva da Economia, se dá numa dupla relação entre as
propriedades naturais do objeto e o sujeito que o utiliza. Dessa relação com o sujeito que o
utiliza fica evidente a subjetividade no estabelecimento de valor de um objeto. Transpondo
para o campo do patrimônio cultural, percebemos que a atribuição do valor de um bem
cultural é estabelecida nesse contexto da relação entre ele e a sociedade que o reconhece
como tal. Sendo assim o valor atribuído a um bem cultural é produto da interação dos
diversos atores sociais e um bem cultural pode presentar valores diversos para conjuntos de
atores diversos.
A gestão compartilhada pode contribuir para dar voz a diferentes grupos sociais no que diz
respeito a essa atribuição de valores, possibilita que as discussões “possam refletir a
variada gama de valores culturais representados pelos diferentes grupos sociais”. (Starling,
2011, p.35) E, com essa forma de gestão, o valor atribuído a um bem cultural pode
aproxima-lo dessa sociedade onde ele se encontra.
Fica estabelecido, pela Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1937, que a tutela do
patrimônio histórico e artístico seria de competência das três esferas do Estado – União,
Estados e Municípios.
Antes mesmo de 1988, no entanto, o IEPHA-MG, conforme diz Carlos Henrique Rangel1, já
havia percebido que o órgão estadual não poderia trabalhar sozinho na preservação do
patrimônio cultural do Estado e já pressentia a importância da participação efetiva dos
municípios e também da sociedade civil:
1 Historiador do IEPHA-MG
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Essa questão do município participar era sentida já nos anos 1980. (...) Em
1983 teve um programa de ação comunitária, de tentar fazer com que a
comunidade participasse da preservação e que os prefeitos começassem a
preservar seu patrimônio. Então o IEPHA montou uma cartilha sobre
patrimônio; teve um Caderno Técnico, chamado Caderno Técnico N°1, que
você vai encontrar na nossa gerencia de documentação, que foi um esboço,
isso foi em 1989, que ele foi publicado. (Lage, 2014, p.51)
Monica Starling descreve o ICMS Patrimônio Cultural como uma estratégia bem sucedida de
descentralização da política de proteção do patrimônio cultural em Minas Gerais:
2 Lei N°12.040 – atual Lei N° 13.803 – que “repassa recursos para os municípios que preservam sua
memória e sua produção cultural”.
3 arquiteto, professor da Escola de Arquitetura da UFMG
Carlos Henrique Rangel fala sobreo ICMS Patrimônio Cultural não como uma lei de
incentivo à cultural, mas como um programa de patrimônio e descentralização da proteção
do patrimônio cultural:
Ele não foi feito para dar dinheiro, dinheiro é o que menos interessa. O que
interessa mesmo é o município criando a sua politica de preservação.
[grifo nosso] O dinheiro é uma consequência, o ponto e o dinheiro que vem
com esse ponto é uma consequência. O mais importante é ele [o município]
implantar uma politica cultural. E a gente tem que fazer de tudo para que ele
faça isso e que faça melhor. (Lage, 2014, p 62),
Essa relação entre Estado e municípios, fomentada pelo programa ICMS Patrimônio
Cultural, “pode ter contribuído para a criação e consolidação de estruturas de planejamento
e gestão do patrimônio cultural em âmbito municipal” (Sales, 2012, p. 44-45). Nesse sentido
o movimento de mudança se processa do Estado em direção ao município. Num movimento
contrário, os municípios contribuem para o aprimoramento dos critérios através da sugestão
de mudanças a serem implementadas nos critérios, mudanças essas que são feitas através
de novas deliberações. Mais uma vez aqui podemos notar a relação de diálogo entre as
esferas do Estado, de forma a construírem juntas o planejamento da gestão do patrimônio
cultural.
Uma das preocupações com relação ao ICMS Patrimônio Cultural em Minas Gerais é a sua
continuidade, o comprometimento das diferentes gestões que se sucedem nos municípios
essa continuidade pode ser atribuída, mais à necessidade de atendimento à legislação e à
tradição dessa política no Estado, do que a uma vontade política no sentido de implementar
a proteção do patrimônio cultural. No entanto, Rangel ressalta que “no caso do ICMS
[patrimônio cultural] já virou uma tradição. Não tem jeito, não tem politico que queira acabar
com isso, não é louco. Até porque ela [a lei] está atrelada a outros critérios”. (Lage, 2014,
p.90)
Carsalade, na mesma linha, destaca que o ICMS Cultural tem sobrevivido às mudanças de
gestão:
É, na realidade eu acho até que o ICMS cultural tem sobrevivido bem a isso.
Porque os municípios, mesmo com as mudanças de prefeitos, eles acabam
entregando porque é fonte de recurso. E acaba que os conselhos são feitos
Por outro lado, uma matéria no Jornal Hoje em Dia mostra o descompromisso generalizado
com a continuidade do ICMS Patrimônio Cultural pelas administrações municipais na troca
de gestão.5
Neste ano, estão previstas verbas para 437 municípios, 36% a menos do
que em 2013, quando 689 tiveram direito. A lista de 2014 é baseada em
documentação, postada via Correios, no fim de 2012. (Fonseca, 2014)
Debora Queiroz7 destaca que, em nível municipal, o ICMS Patrimônio Cultural, é uma forma
de avanço no diálogo entre os diversos atores envolvidos com a preservação do patrimônio
cultural:
5 FONSECA, Renato. "Boicote" faz municípios mineiros perderem ICMS Cultural. Hoje em Dia. Belo
Horizonte. 31/01/2014. Disponível em:< http://www.hojeemdia.com.br/minas/boicote-faz-municipios-
mineiros-perderem-icms-cultural-1.213885> Acesso em: 02/02/2014.
6 Historiadora – diretora do IPHAN-MG
7 arquiteta, supervisora da equipe técnica que desenvolve o ICMS Patrimonio Cultural em Ouro Preto.
Aos poucos esses outros atores sociais mostram seu protagonismo na preservação do
patrimônio cultural, pois o Estado sozinho não dá conta das disputas desses diferentes
atores que interagem nesse campo (sentido atribuído por Bourdieu). Nesse sentido,
podemos concluir que entender a ação de cada um dos atores no processo de preservação
e de gestão do patrimônio cultural, perceber a interação entre eles, é o caminho para
avançar nas discussões acerca das politicas de preservação, nas esferas de planejamento e
gestão.
No entanto, o diálogo entre essas três esferas (Federal, Estadual e Municipal) nem sempre
é claro e simples, como no caso de bens que são tombados em mais de uma esfera, como
destaca Catherine Salgarello8:
Dessa complexidade das ações para a preservação do patrimônio cultural decorre que
preservação do patrimônio cultural, planejamento e gestão têm que andar juntos. Cabe aqui
destacar que, erroneamente estes termos, às vezes são usados como intercambiáveis,
embora sejam distintos e complementares. “Planejamento e gestão não são termos
intercambiáveis, por possuírem referencias temporais distintos e, por tabela, por se referirem
a diferentes tipos de atividades.” (Souza, 2013, p.46) Na preservação do patrimônio cultural
o planejamento se baseia na legislação acerca da preservação do patrimônio cultural e na
previsão de condições de um cenário futuro. A gestão, por se tratar de uma soma da
efetivação do planejamento e nos fatores imprevisíveis, e se concretiza na ação dos atores
sociais responsáveis frente às condições apresentadas no momento presente com base nas
condições apresentadas e na legislação acerca do assunto.
A arquiteta Débora da Costa Queiroz fala sobre a forma como o IEPHA-MG conduz a
política do ICMS Patrimônio Cultural: “no meu entendimento a política do IEPHA ela te
empurra para pensar. Ela te obriga a se estruturar, ela te obriga a ter um Conselho [de
Patrimônio] ativo, te obriga a ter uma equipe estruturada, te obriga a uma série de coisas
que vão necessariamente influenciar na reflexão sobre o patrimônio”. (Lage, 2014, p.59)
Sobre gestão do patrimônio cultural, Arroyo enfatiza que a gestão passa mais por definir
diretrizes, analisando caso a caso, do que propriamente a aplicação de leis de forma rígida,
destacando a importância da definição de diretrizes como forma de garantir a preservação
do patrimônio cultural ao invés de uma lei que estabeleça como a proteção do patrimônio
cultural deve ser feita: “Quando elas são diretrizes, ou seja, a atribuição de gestão e
monitoramento é do executivo, lógico que através de conselhos, de discussão com a
comunidade, etc, você tem uma flexibilidade que ela é importante no patrimônio cultural”
(Lage, 2014, p.100).
Essa flexibilidade a qual Arroyo se refere se explica pela diferença entre a temporalidade na
sociedade contemporânea, (caracterizada pelo imediatismo, pela velocidade) e a
temporalidade do patrimônio cultural (que demanda um tempo para o diálogo para a
conciliação de interesses diversos). A consideração dessa diferença de temporalidade é
essencial justamente pelo fato de o patrimônio cultural e a sociedade contemporânea se
desenrolarem no espaço comum no presente, e essa diferença de temporalidade pode gerar
conflitos com relação à gestão do patrimônio cultural pela sociedade contemporânea. Arroyo
exemplifica falando sobre o tempo de discussão para construção de definições para gestão
do patrimônio, dentro dos órgãos, para então coloca-las em pratica: "o tempo do patrimônio
ele é um tempo muito lento. Porque ele demanda muito diálogo entre técnicos, e ai quando
você consolida tudo com os técnicos você tem que mudar tudo depois, na hora que você vai
colocar isso para fora das instituições. (...). Eles não são lineares. Tem umas idas e vindas,
é uma construção. Eu acho que demora”. (Lage, 2014,p.99)
9O termo gestão remete a organizar as ações de grupo de atores sociais, cada um com suas
especificidades, atuando de forma sinergética em torno de um objetivo em comum.
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ela não parta de composições, de acordos, porque é. Você ganha em algumas coisas, perde
em outras. E isso é um processo de amadurecimento”. (Lage, 2014,p.103)
Referencias Bibliográficas
CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade: UNESP, 2006.
FONSECA, Renato. "Boicote" faz municípios mineiros perderem ICMS Cultural. Hoje em
Dia. Belo Horizonte. 31/01/2014. Disponível em:<
http://www.hojeemdia.com.br/minas/boicote-faz-municipios-mineiros-perderem-icms-cultural-
1.213885> Acesso em: 02/02/2014.
LAGE, Flávia de Assis. A Gestão do patrimônio cultural em Minas Gerais. 2014. 273f.
Dissertação. Universidade Federal de Minas Gerais.
SALES, Álvaro Américo Moreira. A (possível) interface entre patrimônio cultural e turismo
nas políticas públicas de Minas Gerais. 2012. Disponível em:
http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/handle/1843/BUOS-8T8LSA. Acesso em:
15/08/2012.
SOUZA, Marcelo Lopes de. Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à
gestão urbana. 9ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013.
RESUMO
Pretende-se apresentar os resultados, até agora obtidos, pelo projeto de conservação preventiva e
digitalização do acervo documental referente ao processo de projetação e construção do conjunto
arquitetônico e paisagístico do Campus Seropédica da UFRRJ, que se deu no período 1938-1948. O
acervo trabalhado possui grande relevância para a memória da arquitetura neocolonial e do paisagismo
brasileiros, cujo valor foi reconhecido pelo tombamento estadual, que se deu de forma provisória, em
1998, e definitiva, em 2001. No período 2013-2015, a iniciativa teve apoio financeiro da Fundação de
Apoio à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e teve como resultados a catalogação e a
digitalização de cerca de 170 plantas arquitetônicas, o equivalente a aproximadamente, 10 % do
acervo. No momento, a iniciativa originou o Laboratório de Conservação de papel, denominado LabDoc
e vinculado à estrutura administrativa da Reitoria da UFRRJ.
Palavras-chave: Patrimônio Arquitetônico; Conservação preventiva; Digitalização
Introdução
O presente artigo relata os resultados obtidos até o momento, do projeto que visa à
identificação, conservação preventiva, pesquisa e a digitalização do acervo de plantas
arquitetônicas referente ao processo de projetação e construção do conjunto arquitetônico e
paisagístico do campus Seropédica da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
(UFRRJ). Trata-se de iniciativa pioneira na Instituição de Ensino Superior (IES), no campo da
preservação do seu patrimônio cultural, que contou com apoio financeiro da Fundação de
Amparo a Pesquisa do Rio de Janeiro – FAPERJ e envolve professores e alunos dos cursos
de Arquitetura e Urbanismo e Belas Artes.
Mediante o exposto, o presente artigo descreve as diversas etapas cumpridas pela iniciativa
de conservação do acervo da IES (Instituição de Ensino Superior), até o momento, que se
iniciou pela descoberta do acervo. Em seguida são citadas as pesquisas subseqüentes, bem
como as dificuldades encontradas até a criação e estruturação do laboratório de conservação.
A última etapa é dedicada ao processo de criação do Laboratório de Conservação de Papel
(LabDoc) vinculado administrativamente ao Centro de Memória da UFFRJ, seu funcionamento
e perspectivas para o futuro.
1º Simpósio Cientifico ICOMOS Brasil
Belo Horizonte, de 10 a 13 de maio de 2017
1. Sobre o Acervo
Os levantamentos nos arquivos da Prefeitura Universitária (PU) do Campus da UFRRJ foram
realizados primeiramente, em 2007, pelo Professor Doutor Cláudio Lima Carlos, no âmbito
das extintas disciplinas de Técnicas Retrospectivas I e II, do Curso de Arquitetura e Urbanismo
da UFRRJ. Os projetos originais do Pavilhão Central, dos prédios dos Institutos de Química e
de Biologia embasaram a confecção de bases digitais utilizadas no mapeamento de danos
das respectivas fachadas.
Em 2013, a pesquisa sobre o referido acervo recebeu o apoio financeiro da FAPERJ que
aprovou um projeto para a sua conservação preventiva e digitalização encaminhado por
professores dos cursos de Arquitetura e Urbanismo e Belas Artes que propôs ações que
visaram:
Além desses objetivos, ao longo do desenvolvimento do projeto surgiu a idéia de inserir todas
as plantas já catalogadas como bens culturais móveis, no âmbito do tombamento estadual do
campus, já existente (1998-2001). A medida caso aprovada pelos órgãos estaduais de
patrimônio cultural, forçaria os administradores da IES a ter atenção especial ao acervo
documental, sob risco de penalizações legais.
Cabe destacar que com relação ao item “c”, o acervo de plantas identificadas e conservadas
preventivamente, como as de autoria de Eugênio de Proença Sigaud (E.P.Sigaud), que já
estão sendo utilizadas como fontes de pesquisa para teses e dissertações de cursos de pós-
graduação da UFRRJ.
O estudo desse acervo permitiu precisar, por exemplo, dados a respeito da autoria do projeto
do campus da UFRRJ que apresentavam divergências de informações nas fontes
bibliográficas especificamente relacionadas à sua construção, como as de autoria de Lima
(2003) e Rumbelapager (2005). Por outro lado, a pesquisa revelou, simultaneamente, o
precário estado de conservação do acervo documental da UFRRJ, explicado pelas condições
extremamente inadequadas de guarda a qual está submetida há anos, na Prefeitura
Universitária e no Centro de Memória da instituição.
Em março de 2014, foi solicitada, à Administração Superior do Campus à cessão de uma das
salas do prédio da PU/UFRRJ, o que foi legitimado por meio de memorando. A citada sala
guardava uma mapoteca metálica de grande porte, sem uso e em excelente estado de
conservação que foi utilizada para a guarda provisória das plantas higienizadas e conservadas
preventivamente. Assim sendo, em função das dificuldades enfrentadas, as atividades do
projeto passaram a se desenvolver nos dois espaços citados: o do Centro de Memória (CM),
1º Simpósio Cientifico ICOMOS Brasil
Belo Horizonte, de 10 a 13 de maio de 2017
localizado no Pavilhão Central (P1) e da PU/UFRRJ, o que demandou muito esforço e
criatividade da equipe executora.
Desta forma, a UFRRJ abrigará o primeiro laboratório dessa natureza na região metropolitana
do Rio de Janeiro, que oferecerá cursos de extensão na área de conservação de papel,
franqueará seu acervo a pesquisadores, tendo como primeira iniciativa, o cadastro efetivo no
Sisgam - sistema online do acervo de museus do Rio de Janeiro; Rede de Museus.
3. Sobre Memória
Para Le Goff (2003), o conceito de memória é referência crucial e possui a “propriedade de
conservar certas informações” (p. 419), que nos remetem “em primeiro lugar a um conjunto
de funções psíquicas, graças às quais o homem pode atualizar impressões ou informações
passadas, ou que ele representa como passadas” (p. 419). Halbwachs (2004) não considera
a memória apenas como um atributo da condição humana, tampouco como algo que é
construído a partir do seu vínculo com o passado, mas sim como resultado de “representações
coletivas construídas no presente” que têm como função manter a sociedade coerente e
unida. Para Halbwachs (2004) a memória tem apenas um adjetivo: coletiva (SANTOS, 2003,
p.21). Le Goff (2003, p.525) afirma que a memória coletiva possui a sua forma científica, a
história, que se aplica em dois tipos de materiais: os documentos e os monumentos.
Assim, a memória é o conjunto de informações passadas, mesmo que o indivíduo não tenha
estado presente, ele pertence a ela pela sua coletividade, que tende, por fim, a privilegiar
determinados dados, em lugar a outros. Segundo Pomian (2000, p. 509):
A análise dos projetos originais de uma edificação nos fornece uma concreta possibilidade de
perceber o que se pretendeu no passado e, por comparação, identificar o que realmente foi
realizado, executado e de que forma foi apropriado no presente. A identificação, a
catalogação, a análise e a divulgação de documentação escrita e iconográfica relacionada à
arquitetura tornam-se ações fundamentais para uma melhor compreensão de sua importância
e trajetória. Trata-se da conservação de um dos pontos que compõem o extenso mosaico de
referências materiais que contribuem para a construção e a manutenção da memória coletiva
de grupos humanos, tendo em vista que as arquiteturas, especialmente as de uso público,
são o ócus de convivência e vivências coletivas. Além da própria edificação, este mosaico é
composto por relatos, lembranças e, sobretudo, pela documentação escrita e iconográfica,
tais como, desenhos, projetos, imagens, textos etc. Santos (2003, p.19) confirma esse
pensamento quando afirma que os objetos e os documentos são capazes de reproduzir parte
do que foi vivenciado no passado.
• registro fotográfico da planta inteira mostrando o original em suas reais proporções e estado
de conservação;
O uso da fotografia para registro das obras e seus processos de degradação é uma ferramenta
indispensável para conservação e restauro. Antes da intervenção registramos a planta como
se encontra para que tenhamos prova concreta do seu estado anterior ao processo de
conservação. Busca-se com a fotografia registrar detalhes que identifiquem o documento,
bem como registre seus danos.
Um dos hábitos e rotinas de trabalho que é preciso ter nos ambientes que possuam arquivo
é a limpeza superficial das obras. O acúmulo de pó, sujidades e xilófagos degradam o suporte
e acelera sua deterioração. Faz-se necessário a utilização de equipamentos corretos como,
trincha de cerda macia, mesa de higienização, aspirador de pó em velocidade mínima e
pessoal capacitado. Segundo o autor:
Nada pior para um conservador/restaurador que encontrar um documento unido por uma fita
adesiva, fato comum nas instituições que não contam com profissionais capacitados. Ao invés
de prolongar a vida do suporte, contribui para a sua rápida extinção. Tudo isso porque o durex,
usado por muitos bibliotecários oxida com o tempo causado manchas irreversíveis e perda de
informação. Segundo Pascual (2005, p. 27) “a fita-cola tende a envelhecer e provoca a
oxidação da cola no suporte, provocando manchas impossíveis de se eliminar por completo”.
A utilização de grampos metálicos e clipes devem ser evitados, pois com o passar do tempo
eles oxidam causando manchas irreversíveis nos suportes. “As manchas de ferrugem podem
ser provocadas pela oxidação de elementos metálicos em contato com o papel ou pela
oxidação dos pigmentos do material de proteção.” (PASCUAL, 2005, p. 27).
Não se sabe ao certo a causa das manchas marrons espalhadas pelo suporte em papel. Sabe-
se que as mesmas ocasionam furos e perda de informação. Segundo Pascual (2005, p.31):
Entre as muitas causas, o amarelecimento do papel ocorre devido à ação da luz que acidifica
o papel tornando-o frágil e sem resistência. (PASCUAL, 2005, p.30)
Com relação à catalogação, optou-se pela preservação da numeração original das plantas,
localizada nas bordas e carimbos, juntamente com uma nova, atribuída para o Banco de
Dados do Centro de Memória (BDCM). Nas planilhas de catalogação e etiquetas foram
colocadas sobre os envelopes de papel com pH neutro, criados para o acondicionamento, as
duas numerações, além de datas e autoria dos desenhos.
A embalagem escolhida para acondicionar as plantas foi a pasta em cruz, feita com papel
filiset neutro acompanhada de uma base protetora embaixo e acima para que a obra não entre
em contato com outros documentos. O papel escolhido é um papel, acid free, por não ser
fabricado pelo processo convencional de colagem ácida.
Este papel tem longa durabilidade por ser resistente a fungos e proliferação de bactérias,
sendo ideal para restauração ou recuperação de documentos e certificados. Seu objetivo é
manter características intrínsecas do documento como sua originalidade e autenticidade. Nas
plantas arquitetônicas maiores foi necessário unir dois ou mais papeis acid-free com cola feita
de carboximetilcelulose – CMC.
Segundo Costa (2003), o acondicionamento tem por objetivo a proteção dos documentos que
não se encontram em boas condições contra agentes externos e ambientais ou para a
proteção daqueles que foram restaurados a favor da manutenção da integridade física da
obra, armazenando-os de forma segura. O acondicionamento protege os documentos da luz,
da migração de acidez de um documento para o outro e dos desastres, como pequenos
incêndios e inundações.
Com relação à digitalização das plantas com maior formato, em função do seu precário estado
de conservação, muitas delas em suportes frágeis de papel manteiga, optou-se por não
digitalizá-las por meio de scanner de tração, para grandes formatos. Para realizar tal
procedimento, seus suportes devem estar estabilizados e perfeitamente restaurados, o que
ainda não ocorreu. Mesmo assim, a tarefa deve ser realizada com bastante cautela com
auxílio de envelopes de acetato.
A digitalização está sendo realizada por fotografia digital, com o auxílio de câmera profissional
acoplada a um suporte especialmente criado pelo Professor Delson de Lima Filho, integrante
da equipe do projeto. O referido suporte de baixíssimo custo foi produzido no próprio
Departamento de Arquitetura e Urbanismo (DAU) e teve grande parte de suas peças (junções,
dobradiças e encaixes) executadas na impressora 3D de propriedade do professor. O referido
aparato pode ser montado na posição vertical ou horizontal. Em função do pouco espaço
disponível, optou-se pela posição vertical, mas estuda-se a possibilidade de utilizar
horizontalmente.
Por meio de suave e contínua sucção feita por pequena bomba de vácuo, o original é
planificado em uma base oca de MDF, com formato A0, possibilitando a execução da
fotografia com luz indireta (ambiente), sem expor os originais à tração, choques térmicos
provenientes da luz ou outras ações que agravassem ainda mais a sua integridade. As fotos
recebem tratamento digital e, em médio prazo, pretende-se disponibilizar parte do acervo em
arquivo com extensão PDF, na página do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFRRJ.
Considerações Finais
O precário estado de conservação e guarda inadequada do acervo de plantas históricas
revela, de maneira inequívoca, décadas de abandono e descaso por parte das sucessivas
administrações da UFRRJ. Por outro lado, a partir da iniciativa de resgate das rotinas
conservacionais empreendida por docentes dos cursos de Arquitetura e Belas Artes pode-se
observar o grande interesse dos discentes envolvidos no projeto que se dedicaram e se
dedicam diariamente às árduas tarefas de salvamento e conservação preventiva da preciosa
documentação.
O estado avançado de degradação e a forma como tão valioso acervo se encontrava e ainda
se encontra, em parte, acondicionado, não deixam dúvidas sobre a sua inevitável perda em
curto prazo, caso as iniciativas não houvessem sido tomadas. Com ele, se perderia além de
informações preciosas, um acervo de plantas de rara beleza e importância para a história
recente da arquitetura brasileira, que apresentam técnicas de desenho e representação
gráfica atualmente pouco utilizadas ou até mesmo perdidas. A experiência proporcionou aos
professores e, principalmente, aos alunos envolvidos, acessar um universo em grande parte
desconhecido de nossa arquitetura, enriquecendo certamente suas formações profissionais.
Atualmente, o projeto conseguiu higienizar cerca de mais de 350 plantas e cadastrar 166
originais relacionados à memória projetual e construtiva do Campus Seropédica da UFRRJ.
Intenciona-se, futuramente, inseri-los no tombamento estadual do campus (2001) como bens
móveis, fato que gerará responsabilidade legal da administração superior, de conservá-los,
garantindo a sua existência e transmissão às gerações futuras.
Referências Bibliográficas
ANGELO, Carla Viviane da Silva. Arquivos e Preservação Documental, in Mestres e Conselheiros:
Manual de atuação dos agentes do Patrimônio Cultural/organização Marcos Paulo de Souza Miranda,
Guilherme Maciel Araújo e Jorge Abdo Askar. – Belo Horizonte: IEDS, 2009, PP. 91-96.
BECK, Ingrid. Armazenagem e manuseio / editado por Sherelyn Ogden; [tradução Elizabeth Larkin
Nascimento, Francisco de Castro Azevedo ; revisão técnica Ana Virginia Pinheiro, Dely Bezerra de
Miranda Santos; revisão final Cássia Maria Mello da Silva, Lena Brasil]. — 2. ed. — Rio de Janeiro:
Projeto Conservação Preventiva em Bibliotecas e Arquivos: Arquivo Nacional, 2001.
BECK, Ingrid. Manual de conservação de documentos. Arquivo Nacional, Rio de Janeiro, 1985.
BRANDI, Cesare. Teoria da Restauração. São Paulo: Ateliê Editorial, 2004.
COSTA, Marilene Fragas Costa. Noções Básicas de Conservação Preventiva de Documentos. Centro
de Informação Científica e Tecnológica Biblioteca de Manguinhos, Laboratório de Conservação
Preventiva de Documentos - CICT. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, set, 2003.
CURY, Isabelle. Cartas Patrimoniais. Iphan, Rio de Janeiro; 3ª edição, 2004.
AZEVEDO, Flávia Lemos Mota de (1); FERREIRA, José Heleno. (2); SANTIAGO,
Samuel José (3).
2.Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG – Unidade Divinópolis – Centro de Memória Profª
Batistina Corgozinho - CEMUD
Av. Paraná, 3001, sala 406. Bairro Jardim Belvedere, Divinópolis – MG – 34.501-170
zeheleno.ferreira@gmail.com
RESUMO
Resumo: Considerando o acervo que vem sendo constituído pelo Centro de Memória
Professora Batistina Corgozinho – CEMUD – UEMG – Unidade Divinópolis desde 2005 e
principalmente pela potencialidade que os mesmos apresentam para novos estudos e
pesquisa e sua crescente expansão criou-se o EmRedes: Portal da Memória do Centro-
Oeste Mineiro para disponibilizar seu acervo história e de memória através da Web. O
EmRedes: Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro – trabalho, religiosidade, cultura e
cotidiano foi lançado em maio de 2015, com o objetivo de se tornar um instrumento
permanente de acesso a todos os cidadãos interessados em realizar pesquisas sobre a
Considerando o acervo que vem sendo constituído pelo Centro de Memória desde
2005 e pela potencialidade que o mesmo apresenta para novos estudos e pesquisa e sua
crescente expansão, o Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro disponibiliza materiais
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audiovisuais (fotos, vídeos e textos) resultantes dos trabalhos desenvolvidos por
profissionais e estudantes da Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG Unidade
Divinópolis, bem como por outros estudiosos e grupos sociais que tenham interesse em
disponibilizar, para o público em geral, os acervos históricos que possuem sobre a região.
Conclusões
Referências Bibliográficas
RESUMO
Por meio da análise das recentes ocupações da rua Sapucaí, no bairro Floresta, em Belo Horizonte,
situada entre dois Conjuntos Urbanos tombados em âmbito municipal: “Conjunto Urbano da av. Assis
Chateaubriand” e “Conjunto Urbano da Praça Rui Barbosa (Praça da Estação)”, o presente trabalho
constitui uma reflexão sobre as políticas patrimoniais brasileiras; seu impacto nos usos e conservação
dos bens culturais de reconhecido valor; e como é possível a recuperação desses lugares, quando
em estado de abandono, por meio de ações de micropolítica advindas da participação da comunidade
local. Por mais de 20 anos grande parte das edificações da rua Sapucaí estiveram abandonadas e
fechadas para uso, o que vem sendo gradualmente modificado com a retomada do uso dessas
edificações num processo recente, desde 2010 (marcado temporal dado pelo primeira ocupação
“Praia da Estação”, em 16 de janeiro de 2010). Através de ações de micropolítica de alguns coletivos
da cidade, como ressonância dos movimentos políticos de ocupação da Praça da Estação nas
adjacências da rua Sapucaí, várias intervenções urbanas foram ocorrendo, primeiro na própria rua,
chamando atenção para a paisagem urbana, (especialmente pela localização da rua, que está logo
acima da Praça da Estação) com ações de ocupação e lazer temporárias, blocos de carnaval etc e,
posteriormente, as edificações foram ganhando novos usos comerciais e de serviços, como
restaurantes, bares, escritórios e locais de entretenimento com exibição de filmes, workshops de
qualificação profissional etc, e, se destaca, sem que as edificações tenham recebido reforma do tipo
Retrofit, mantendo assim a experiência estética de um espaço que estava em abandono e possibilita,
agora, novas experimentações. Neste estudo, opta-se por estabelecer um recorte dentro do
patrimônio cultural, pois, em algum determinado momento o patrimônio tombado, registrado ou
inventariado foi destacado por sua relevância perante a comunidade, sendo assim legitimado como
de importância e destaque à sociedade, estabelecendo algum tipo de singularidade dentro da
paisagem urbana local. É instigante constatar que parte do patrimônio cultural se encontra em estado
precário de conservação ou em estado de abandono. Essas arquiteturas do abandono, esses marcos
monumentais deixados de lado não podem ser lidos e vivenciados como algo que escapa ao controle
biopolítico; que resiste na paisagem e assim resiste enquanto potência? Quais seriam alguns
caminhos possíveis quando o abandono está instaurado nos lugares? E, especialmente, como esses
locais impactam a comunidade local? Essas são algumas das perguntas norteadoras deste trabalho e
que, longe de uma resposta definitiva, abrem espaço para reflexão e contribuição de soluções
coletivas, como poderá ser vislumbrado no artigo completo.
Palavras-chave: Paisagem Urbana, Patrimônio Cultural, Arquitetura, Ocupação.
Nesse sentido, começamos a estabelecer a relação do sujeito com as suas ações cotidianas
e a forma como este se porta distraidamente na cidade. A abordagem sobre o conceito de
vida cotidiana, como pontua Velloso (2010), estabelece a abordagem de um espaço amplo e
irregular, contudo, essencial, pois é justamente isso que permite a profusão das diferenças e
singularidades que o uso dos espaços denotam.
É por meio dessa relação estabelecida entre o sujeito e a “arquitetura urbana”, ou ainda
paisagem urbana, que se cria espaço também para a apropriação imaginária dos espaços
da cidade, reforçando a vida do indivíduo nessa dinâmica urbana. A vivência estética que a
O mundo que surge, a partir dessa experiência, é da ordem do corpo do sujeito, do sensível.
“Experimentar esteticamente diz respeito a mobilizar meu corpo e minhas faculdades
mentais enquanto sou afetada pelos objetos. (...) É pelo corpo que o sentido é percebido:
ele é o peso suportado na experiência que faço das coisas.” (VELLOSO, 2010, p. 137).
Tratar da experiência estética no cotidiano da cidade é ir além da forma e estilo das noções
arquitetônicas. É necessário mergulhar, também, em todas as imperfeições e ocupações
que transcrevem a vida diária. O que se torna intrigante é justamente os restos, os vestígios
deixados por quem de fato ocupa e usufrui. Trata-se de subverter, e trazer à tona, o que foi
planejado, subverter a política vigente, e revelar as práticas sociais capazes de configurar o
próprio espaço. “Vivemos a cidade constantemente pelo seu avesso, atravessando-a e
sendo por ela atravessados” (VELLOSO, 2010, p. 142). É preciso que o corpo sinta o real da
cidade, que não haja pudores e fachadismos; que a cidade, e a experiência dela geminada,
revelem também sua errância, seu flagelo e abandono.
Nós, arquitetos, nunca olhamos para abandonos, existe uma zona cinzenta
que nos faz cegar, ou olhamos para trás, para o passado e analisamos os
acontecimentos desde um ponto de vista histórico cronológico, ou olhamos
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adiante a partir dos processos de revitalização e restauro dos edifícios e
lugares, mas nunca para esse tempo hoje, para aquilo que está ali a nossa
frente. Ao contrário, nessa zona cinza e abandonada subsiste passado e
futuro. (ROCHA, 2010, p. 32).
Refletir sobre uma arquitetura que permanece fora da lógica mercadológica de consumo e
conforto e que assim, talvez, possa atender às estratégias de apropriação espacial, que
sejam de fato algo com a qual a comunidade consiga compartilhar, que escancarem no
cotidiano a obra inacabada, “a atividade criadora inerente a ele, [em que] há fissuras, mas
não princípios; descontinuidades, mas não fins. Intervalos, mas sem atos nem
acontecimentos propriamente ditos” (LEFEBVRE, 1999, p. 143).
O chamado aqui é para as ações cotidianas, experimentadas na vida urbana, que são da
ordem da errância, do equívoco, da ambiguidade e da instabilidade. São espaços e são
corpos. Trata-se essencialmente da experiência estética dada pela mão canhota, como diria
Nuno Ramos1, pela errância, pelo equívoco, onde, através da experiência, o real se faz e
onde entendo ser a forma mais legítima de refletir sobre si e o objeto.
modificar no final do século XIX e início do século XX. As práticas disciplinares utilizadas antes visavam governar
o indivíduo. A biopolítica tem como alvo o conjunto dos indivíduos, a sociedade. Configura-se como a prática de
biopoderes locais. No biopoder, a sociedade é tanto passiva como também instrumento em uma relação de
poder. Dessa forma, os instrumentos que o governo utiliza para obter o atendimento às necessidades e desejos
da população são, essencialmente, a própria população sobre a qual ele age. Em um desdobramento disso,
Peter Pál Pelbart (2007) elabora conceituações acerca da relação entre poder e vida, entre biopoder e vida. Para
ele, a relação entre poder e vida segue, sobretudo, em duas direções principais que caracterizam a sociedade
contemporânea: a primeira, o poder penetrou todas as esferas da existência, e as mobilizou completamente,
colocando-as para trabalhar e, a segunda, aquilo que parece sob controle, isto é, a vida, revela, no próprio
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Edificações e/ou lugares abandonados exercem grande poder imagético no contexto das
cidades e, podem também atuar como catalizador do esvaziamento e degradação de uma
determinada região. Para Eduardo Rocha:
Sendo assim, uma arquitetura do abandono pode conter, inclusive, uma ruptura com a
ordem biopolítica-social vigente, provocando um deslocamento no indivíduo, que Eisenman
(apud Eduardo Rocha, 2010, p. 70-71) categorizou em quatro aspectos: intuição de gosto,
onde me aproximo do edifício abandonado, por curiosidade, ou me afasto, por medo;
duplicidade, onde impele o sujeito pela estrutura e ornamento do edifício, reafirmando o
primeiro aspecto; condição de “estar entre”, onde aparece uma nova sugestão de objeto,
tratando a arquitetura do abandono como uma imagem enfraquecida na cidade;
interioridade, onde se sugere a negação do recinto ou lugar tradicional. Assim,
processo de expropriação, sua potência indomável. Assim, o poder sobre a vida e as potências da vida são
como o avesso um do outro.
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mesmo que momentaneamente, tirando-os do automatismo cotidiano, arquitetura, sujeito e
pensamento” (ROCHA, 2010, p. 79).
Ainda de acordo com Eduardo Rocha (2010), as cidades podem ser pensadas a partir de
seus vazios abandonados, pois quase toda a cidade tem seus vazios, os quais são espaços
que contrastam com a grandiosidade das construções, as quais nos remetem a outras
percepções que não aquelas das telas cheias de imagens e do consumo. Os vazios, ou
lacunas, nas cidades, lembram sua dimensão transitória, advertindo que foram construídas
e não são habitadas. Vazios urbanos têm a propriedade de nos remeter ao homem, ao outro
que habita a cidade. Para Nuno Ramos:
Eduardo Rocha (2010) chama a atenção para o fato de que o primeiro contato com uma
arquitetura do abandono é delicada, por duas razões: a primeira está ligada a atitude afetiva
frente ao edifício, a qual pode ser bastante profunda e romântica, e a segunda se refere à
diversidade de expressão das arquiteturas do abandono. Ressalta-se que uma arquitetura
do abandono é vulnerável, está ali hoje, mas amanhã poderá sucumbir, ou não estar mais,
ou abandonar-se mais ainda.
O espaço do abandono é um lugar onde tudo se escapa, se descontrola, onde as mais ricas
sensações podem emergir. É aí também que mora a singularidade da experiência do
indivíduo, que pode inclusive nunca restar igual, mesmo diante do objeto antes já
vivenciado. As cidades “são imensas máquinas produtoras de subjetividade individual e
coletiva” (GUATARRI, 2000, p. 172).
A vida cotidiana apresenta características de acordo com o indivíduo e seu grupo social,
dessa forma também isso será determinante na sua leitura de mundo e na sua experiência
com os espaços e arquiteturas do abandono. Dessa maneira, a prática cotidiana possui um
especial valor para subverter as formas padronizadas de viver, as quais são impostas pelo
poder dominante, que podem sofrer significativos impactos quando confrontados com
práticas sócias advindas de uma experiência estética não usual como a do abandono.
“Prédios vazios podem ser chamados de orgânicos, pois tudo funciona numa uniformidade
em fluxo, dobrada sobre si mesma” (RAMOS, 2008, p. 159). Endossando Nuno Ramos,
Eduardo Rocha (2010) considera que tudo o que passa sobre um corpo é sempre fluxo.
Uma pessoa abandonada, uma edificação abandonada, qualquer espaço abandonado é
sempre um corte no fluxo. Um abandono é uma chegada e uma partida para a produção e
intersecção de variados fluxos. Dessa maneira:
A destruição e a criação estão sempre conectadas. Nas cidades, grande parte das novas
obras são desenvolvidas após um estado de abandono, em que haja demolição ou
O abandono dado na esfera dos bens culturais possibilita convivências singulares, sob as
quais os laços afetivos, mais que se produzem no momento do contato, eles se libertam.
Dessa forma, há toda uma atmosfera de sensibilidade que entrelaça a relação do sujeito
com o objeto.
Toda essa relação do sujeito com o objeto está sobreposta também à forma como o
indivíduo estabelece seus processos, e também relações, com a própria cidade, com seu
modo de viver. A cidade está em constante mudança, fruto das interatividades pessoais,
propósitos de mercado, interesses políticos etc e mantém em seus marcos simbólicos e
referências, em seu patrimônio urbano, um ponto comum da memória em que seja possível
compartilhar sentido e valor.
O patrimônio cultural urbano, para além do objeto autônomo, trata-se do contexto ao qual o
patrimônio material está inserido, como parte de uma doutrina da urbanização. Segundo
Choay (2006), uma cidade histórica constitui em si um monumento, mas ao mesmo tempo é
um tecido vivo. Dessa forma, ao se pensar em conjunto histórico urbano, deve-se entendê-lo
como parte do presente, como agente ativo das transformações contemporâneas.
Dessa forma, de acordo com Choay (2006), todo fragmento urbano antigo deve ser
integrado em um plano diretor local, regional e territorial, de forma a assegurar ao mesmo
que tenha espaço dentro do caráter técnico e social da produção contemporânea; o
patrimônio deve ser pensando e reinserido em sua atual contexto urbano; e conjuntos
urbanos antigos requerem procedimentos de preservação com mínima intervenção em sua
forma e estilo, considerando que a reabilitação do edifício se dá mais a partir do interior do
mesmo até estabelecer sua relação com o entorno.
As atuais políticas patrimoniais ainda fomentam a importância dos bens patrimoniais como
instrumentos capazes de exercer o papel de um “vasto espelho no qual nós, membros das
sociedades humanas do fim do século XX, contemplaríamos a nossa própria imagem”.
(CHOAY, 2006, p. 240). E, sendo assim, elas não dão conta de abordar e contemplar uma
identidade cultural assumida de forma complexa e dinâmica na contemporaneidade,
“tenderiam a ser substituídas pela autocontemplação passiva e pelo culto de uma identidade
genérica”. (CHOAY, 2006, p. 241).
Sendo assim, tendo a considerar o estado de abandono dos bens culturais como um ponto
da experiência estética possível, capaz de provocar não somente o estado político atual das
questões patrimoniais, mas também o estado letárgico do próprio sujeito. Pensar o elemento
arquitetônico, seja ele a edificação ou o espaço urbano, que está de forma inquietante
implantado no cotidiano é experienciar a cidade para mais além de sua forma e estilo, é
compreendê-la também por sua errância, é a possibilidade de nos permitimos ser
subversivos para além dos poderes de controle instaurados sobre nossas vidas.
Ao poder sobre a vida institui-se também de forma contrária a potência da vida, uma saída
para que de forma legítima a vida se sobressaia sobre a morte. “Seria esta a dimensão
ético-estética que atravessa todos os campos da existência?” (PELBART, 2003, p. 134).
A experiência estética nas cidades que se vivencia, seja ela qual for, deve ser levada a cabo
como momento único e oportuno para que afetos sejam estabelecidos, para que haja real
troca entre os espaços arquitetônicos e os indivíduos.
Não se pode, portanto, dizer que a experiência, seja qual for o momento da
história, tenha sido “destruída”. Ao contrário, faz-se necessário – e pouco
importa a potência do reino e de sua glória, pouco importa a eficácia universal
da ‘sociedade do espetáculo’ –, afirmar que a experiência é indestrutível,
mesmo que se encontre reduzida às sobrevivências e às clandestinidades de
simples lampejos na noite. (DIDI-HUBERMAN, 2011, p. 148).
Por uma estética do abandono, por um retorno do indivíduo naquilo que lhe é mais próprio,
sua condição primeira de corpo que se deixa afetar pelo mundo, especialmente pelo
estranhamento, tem-se também uma retomada da própria arquitetura ao seu lugar,
destituído de forma e impactante em ações sofridas pelo contexto que o guarda.
Ainda sobre esse possível lugar da arquitetura, destituído de uma institucionalização que
tende a ser legitimada pelo poder, a derrelição na arquitetura vem como uma “cratera
monumental na vida” (RAMOS, 2008, p. 171), aparece ainda como um momento em que a
própria edificação volta-se para si mesma, independente de qualquer funcionalidade ou
forma.
Temos todos o direito ao ilegível, o “espelho patrimonial4, travessia dada também corpo a
corpo – corpo do sujeito com o corpo patrimonial – instaurada pelo caminho do abandonado,
escancara nossos vazios individuais, os vazios projetuais e também políticos. É por assim
dizer, a experiência estética máxima a ser percebida nas cidades.
Para melhor entendimento e aplicabilidade das ideias anteriormente discutidas neste artigo,
toma-se como estudo de caso a nova apropriação pela qual estão passando as edificações
da rua Sapucaí, no bairro Floresta, em Belo Horizonte, situada entre dois Conjuntos
Urbanos tombados: “Conjunto Urbano da av. Assis Chateaubriand e adjacências”, tombado
à nível municipal em 1998 e “Conjunto Urbano da Praça Rui Barbosa (Praça da Estação),
tombado à nível estadual e municipal em 1998, que, após logo tempo em esquecimento pela
população belorizontina é hoje referência de cultura e lazer.
Por meio do percurso da rua Sapucaí, ou mesmo ao adentrarmos uma das edificações em
estado regular de conservação, é possível vivenciar uma experiência única de estado de
afetação, seja calorosa ou de repúdio, contudo, independente da aclamação ou repúdio,
afetação ainda em estado de latência. A partir desse momento o indivíduo permanece
sensibilizado a perceber e receber as experiências advindas da cidade, capaz inclusive de
estabelecer uma ruptura ou criar laços ainda mais fortes politicamente com esta, de iniciar
assim um real vínculo com o espaço no qual estabelece suas práticas afetivas.
Referências
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CALVINO, Ítalo. Assunto encerrado: discuros sobre literatura e sociedade. São Paulo:
Companhia das Letras, 2006.
CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade: UNESP, 2006.
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SIGA BH. Entre Centro e Floresta, confira o roteiro da rua Sapucaí. Disponível em
<http://www.sigabh.com.br/#!Entre-Centro-e-Floresta-confira-o-roteiro-da-rua-
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SIMMEL, Georg. A Ruína. In: SOUZA, Jessé e ÖELZE, Berthold. Simmel e a modernidade.
Brasília: UnB. 1998. p. 137-144.
RESUMO
No campo do patrimônio cultural, o inventário é considerado, em geral, como um mapeamento com
registro de informações técnicas que constituem um acervo básico para as políticas de preservação.
No Rio Grande do Sul, os projetos institucionais de inventários do patrimônio cultural foram
desenvolvidos principalmente pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e
pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE). Contudo, não há uma avaliação
crítica dessa trajetória. A pesquisa aqui apresentada teve por objetivo buscar entender os momentos
de inflexão das políticas públicas em relação ao tema dos inventários, os quais são fruto de seleções
e de escolhas dos seus executores – geralmente técnicos. Essa constatação levou à formulação de
algumas perguntas: Que olhares devem participar das escolhas sobre os bens que compõem a nossa
herança cultural? Quem tem legitimidade para escolher os bens que devem ser destacados do
cotidiano, passando a se constituir em patrimônio e por isso, serem passíveis de inventariação? E a
partir da atribuição de quais valores? Atualmente, os inventários têm papel relevante nas políticas de
preservação, constituindo-se, inclusive, em requisito para a documentação dos tombamentos de
áreas urbanas em nível nacional. Esta relevância justifica a busca pelo entendimento da trajetória e
dos diferentes enfoques adotados com a finalidade de aprimorar a aplicação desse instrumento. A
análise dos inventários realizados no RS, a partir de listagem fornecida pelo IPHAE, assim como da
pesquisa nos arquivos e na biblioteca do IPHAN-RS, permitem verificar que, nos últimos anos, houve
uma diversificação dos métodos adotados. Entretanto, o aspecto mais relevante foi a ampliação dos
olhares sobre o patrimônio, incluindo a participação da população na atribuição de valores a bens
edificados que foram reconhecidos em inventários participativos.
Palavras-chave: Inventário; patrimônio arquitetônico; políticas públicas de preservação; sociedade
civil.
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Apresentação
A comunicação aqui apresentada versa sobre uma pesquisa que teve por objetivo entender
os momentos de inflexão das políticas públicas em relação ao tema dos inventários, os
quais são fruto de seleções e de escolhas dos seus executores – geralmente técnicos, como
foi referido acima. Essa constatação levou à formulação de algumas perguntas: Que olhares
devem participar das escolhas sobre os bens que compõem a nossa herança cultural?
Quem tem legitimidade para escolher os bens que devem ser destacados do cotidiano,
passando a se constituir em patrimônio e por isso, serem passíveis de inventariação? E a
partir da atribuição de que tipo de valores? Atualmente, os inventários assumiram relevância
nas políticas de preservação, inclusive se constituindo em requisito para a documentação
dos tombamentos de áreas urbanas em nível nacional, conforme já ocorreu no Rio Grande
do Sul. Essa relevância justifica a busca pelo entendimento da trajetória e dos diferentes
enfoques adotados com a finalidade de aprimorar a aplicação desse instrumento.
A partir dos anos 1960 passaram a ser adotadas novas concepções de patrimônio que
refletiram diretamente no texto da Constituição Federal de 1988 que, no Art. 216,
estabeleceu que o poder público, com a colaboração da comunidade, deve promover e
proteger o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância,
tombamento e desapropriação, entre outras formas de acautelamento e preservação. Sabe-
se que a referência ao inventário não é autoaplicável e, portanto, depende da
regulamentação nos diferentes âmbitos de governo. Essa referência possivelmente
incentivou o desenvolvimento de um planejamento institucional para os inventários no
IPHAN e a criação da Diretoria de Identificação e Documentação – DID nos anos 1990. Com
o tempo, houve um esforço no sentido de promover a sistematização dos bens culturais
materiais por meio de inventários por categorias: bens móveis, bens imóveis, configuração
dos espaços urbanos (INCEU), de artilharia militar, dentre outros.
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Quase dez anos após a referência aos inventários na Constituição Federal, em 1995, no
Encontro de Inventários de Conhecimento do IPHAN, foram definidos os inventários de
Conhecimento como "trabalhos de pesquisa que buscam a identificação e o registro de
novos valores a preservar, através de levantamentos sistemáticos baseados na coleta de
múltiplas informações em campo." (MOTTA; SILVA, 1998, p. 7).
Trajetória no RS
No Estado, durante muito tempo, os inventários isolados refletiram a falta de uma política
institucional sobre o assunto. No caso de Porto Alegre, a primeira reunião de Governadores,
anteriormente mencionada, teve influência decisiva na inclusão do tema do patrimônio
arquitetônico na Lei Orgânica da Câmara Municipal de Vereadores. Esta Lei, em 1970,
determinou ao Governo Municipal a execução de uma listagem dos bens imóveis de valor
histórico e cultural para a cidade, que foi finalizada no ano seguinte e revisada
posteriormente. No final dos anos 1970, foi instituído o Programa de Reavaliação do Plano
Diretor – PROPLAN que realizou nova revisão e listou dezenas de novas edificações com
vistas à sua incorporação no Plano Diretor – PDDU (MEIRA, 2001). A equipe de arquitetos
responsável pelo levantamento foi coordenada pelo também arquiteto Júlio N. B. de Curtis,
diretor do IPHAN regional de 1978 a 1987 (MEIRA, 2008).
O IPHAN, durante os anos de 2006 e 2007 passou por um processo de revisão do sistema
de inventários do patrimônio material. Entre 2008 e 2011 houve o desenvolvimento do
Sistema Integrado de Conhecimento e Gestão do Patrimônio Material (SICG). A partir da
aplicação desta nova ferramenta houve uma diversificação dos inventários temáticos com
base em recortes regionais, étnicos, cronológicos, estéticos, entre outros. O SICG foi
utilizado em áreas urbanas em processo de tombamento como foi o caso das cidades de
Jaguarão e Bagé no Rio Grande do Sul e para subsidiar a gestão urbana municipal no caso
de São Leopoldo.
O aprimoramento que vem sendo desenvolvido, em nível estadual, pelo IPHAE, em relação
aos inventários, culminou no Sistema de Rastreamento Cultural para o inventário dos bens
culturais do Estado. Trata-se de um instrumento para o levantamento de dados abrangendo
diversas esferas do patrimônio cultural. O sistema compõe-se de fichas de inventário
divididas em módulos: Bens Edificados, Bens Imateriais, Comunidades Quilombolas,
Comunidades Indígenas, Comunidades Imigrantes, Sítios Arqueológicos, Sítios
Paleontológicos e Bens Móveis e Integrados. Posteriormente foi acrescentada a ficha
referente aos Bens Móveis e Integrados - Acervos Documentais. (IPHAE, s.d.).
A participação da comunidade
A consciência patrimonial, porém, não é unânime. Nem todos estão vocacionados para o
reconhecimento dos usos do passado. A chave para a proteção do patrimônio de forma
participativa pode ser o ativismo. Sem o ativismo de comunidades, tanto de leigos como de
não-leigos, torna-se mais difícil a defesa do patrimônio. Por meio do ativismo as
comunidades ressignificam o passado e configuram o presente. (McCARTHY, 2008).
A forma como a arqueóloga Linda Derry (2011), em sua experiência no Alabama, define
comunidade, “como um grupo de pessoas reunidas em torno de um bem comum”, pode ser
uma alternativa para o desafio do trabalho com os inúmeros atores participantes do
processo do inventário. Derry afirma que a partir do momento em que as questões se
tornam relevantes e significativas para suas vidas, as pessoas se envolvem naturalmente e
começam a se preocupar com o patrimônio que as cerca. Em 2013, Lúcio Menezes Ferreira,
em seu artigo “Essas coisas não lhes pertencem: relação entre legislação arqueológica,
cultura material e comunidades” sintetiza a relação com a comunidade:
Estas considerações utilizadas pela arqueologia também podem ser aplicadas na arquitetura
para a participação e interação com a comunidade no processo de elaboração dos
inventários do patrimônio histórico, artístico e cultural. O inventário, geralmente elaborado
por técnicos como forma de governabilidade e tecnologia de governo, necessita da
Um ponto de inflexão
Uma interessante iniciativa da sociedade civil para participar das escolhas sobre o
patrimônio foi o projeto dos Inventários Afetivos, proposto pela OSCIP Defender – Defesa
Civil do Patrimônio Histórico, no qual os cidadãos podem inscrever aqueles bens que
consideram detentores de valores. A intenção não é substituir o olhar técnico, mas dar
visibilidade a outros olhares sobre o tema.
Considerações finais
Referências bibliográficas
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Alabama’s Black Belt Region. Archaeologies: Journal of the World Archaeological Congress,
(7): 3, 538-553.
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cidadãos na preservação do patrimônio cultural de Porto Alegre nas décadas de 1970 a 90.
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século XX: atribuição de valores e critérios de intervenção. 2008. 483 p. Tese (Doutorado
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2001.
PESSOA, José. Introdução: o que convém preservar. In:_____ (Org.). Lucio Costa:
documentos de trabalho. Rio de Janeiro: IPHAN, 1999. p.11-19.
RESUMO
O Brasil está entre os 10 países do mundo com o maior PIB, porém, também está na lista dos
10 países com maior desigualdade social. Essa desigualdade muitas vezes é acentuada pela falta de
planejamento urbano e pelo crescimento desordenado das cidades - entre as quais podemos citar
Maceió (AL). A capital alagoana, como muitas cidades litorâneas do Brasil, apresenta a faixa de orla
marítima basicamente ocupada por uma elite financeira que vive, literalmente, de frente para o mar e
de costas para a favela. O crescimento urbano de Maceió se deu principalmente a partir de interesses
privados, que visam atender uma pequena faixa privilegiada da população, em detrimento de uma
urbanização coordenada pelo poder público - que deveria privilegiar o interesse social e a
democratização do uso da cidade. Maceió é uma das cidades que cresceram mais rapidamente nos
últimos anos no Brasil e, atualmente, o foco de sua expansão imobiliária se direciona para o seu
litoral norte. Preocupados com a crescente expansão e verticalização desordenada do litoral norte,
moradores e frequentadores dos bairros de Guaxuma, Garça Torta e Riacho Doce, iniciaram em
2014, uma mobilização social que deu origem ao movimento “Abrace a garça”. Movimento esse que
defende o crescimento urbano sustentável do litoral norte de Maceió e maior participação popular
frente às decisões do poder público sobre a cidade. A pesquisa aqui apresentada propõe maneiras de
garantir o poder de voz da população sobre as decisões do poder público em relação às modificações
do espaço habitado, a partir do estudo do movimento “Abrace a garça”. Tal pesquisa se realizou
através de revisão de literatura sobre participação popular, crescimento urbano, especulação
imobiliária e elaboração de Plano Diretor do Município de Maceió para fundamentação teórica. Por
fim, traça-se um paralelo entre o movimento alagoano o movimento “Ocupe Estelita” - movimento
popular pela defesa do Cais José Estelita (Recife-PE).
Maceió, capital do estado de Alagoas, é uma cidade famosa por suas belezas
naturais, apelidada como “paraíso das águas”. A cidade litorânea apresenta belas praias de
águas mornas e de um azul cristalino. Essas características atraem cada vez mais turistas e
o aumento do turismo influencia diretamente em seu crescimento urbano.
A capital alagoana é uma das cidades que cresceram mais rapidamente nos últimos
anos no Brasil e, como em muitas cidades litorâneas do país, a faixa de orla marítima é
basicamente ocupada por uma elite financeira que vive, literalmente, de frente para o mar e
de costas para a favela. A área à beira-mar apresenta-se como região privilegiada e de alta
especulação imobiliária. Em geral, o crescimento urbano da capital alagoana se deu a partir
dos interesses privados, que visam atender uma pequena faixa privilegiada da população
em detrimento de uma urbanização coordenada pelo poder público que deveria privilegiar
preocupações sociais e a democratização da cidade para o uso da população em geral.
3. Metodologia
O presente trabalho faz um recorte específico dos bairros de Guaxuma, Garça Torta
e Riacho Doce - região de foco do movimento “Abrace a Garça”. Esses são também bairros
que, desde a década de 1970, abrigam intelectuais, artistas, jornalistas e outros
representantes da classe média, que buscaram a região no intuito de desfrutar de um
modelo de vida diferente do modelo estabelecido nos bairros mais centrais da cidade. Um
padrão de vida mais tranquilo, em uma região menos urbanizada, com mais contato com a
natureza e uma relação mais comunitária com a vizinhança.
Figura 3: Praia da Garça Torta com a “cidade” de Maceió ao fundo. Marcação em dois dos novos
empreendimentos imobiliários que já se “destacam” na paisagem.
6. Análise e diagnóstico
O Movimento “Abrace a Garça” continua existindo e se organizando ao longo de
quase três anos, porém, ainda sem muitas conquistas significativas diante das decisões do
As discussões em torno da defesa do cais José Estelita por parte dos urbanistas e
de outros setores da sociedade, foram acirradas em 2008 com a venda do terreno do cais
pertencente à união, em um leilão supostamente fraudulento, para um consórcio de grandes
construtoras. O projeto para o terreno, “Novo Recife”, em sua versão original, previa a
construção de mais de doze torres de luxo, comerciais e residenciais, de até 40 pavimentos.
O projeto descaracteriza a paisagem da região, tende à gentrificação da população local e
privatiza a área, que, sendo originalmente terreno público e de valor histórico, deveria
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atender ao bem comum e social. Foi nesse período que os interessados em defender a
região, formaram o Movimento “Direitos Urbanos”, movimento recifense que defende a
democratização da cidade.
O “Ocupe Estelita” tem dimensões bem maiores que o “Abrace a Garça”, não
necessariamente proporcionais à diferença de tamanho entre as duas cidades. A página do
facebook do “Abrace a Garça” tem um pouco mais de 4 mil curtidas, enquanto a do “Ocupe
Estelita” tem mais de 40 mil. O abaixo assinado contra a especulação imobiliária e
verticalização do litoral norte de Maceió teve aproximadamente 2.700 assinaturas, enquanto
o abaixo assinado contra o projeto Novo Recife conseguiu em sua versão on line mais de 4
mil assinaturas e no total, quase 10 mil. Os eventos culturais realizados em Maceió tiveram
um público de nem 500 pessoas, enquanto os realizados em Recife tiveram quase 10 mil.
Segundo o jornalista Luis Carlos Pinto do Carta Maior, as ações culturais realizadas dentro
da ocupação do cais se tornaram a “(...) experiência política mais virtuosa da cidade para
Dez anos após a elaboração do primeiro Plano Diretor de Maceió deu-se início ao
processo de revisão do mesmo. Momento em que novamente foram realizadas audiências
públicas para que a população pudesse se manifestar em relação às definições urbanísticas
impostas pelo primeiro Plano e avaliar a efetividade das suas determinações nas definições
urbanísticas para Maceió.
8. Referências bibliográficas
BRASIL. Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001. Estatuto da Cidade e Legislação Correlata
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maceio-completa-200-anos.html>. Acesso em: 19/06/2017.
<https://issuu.com/abraceagarca/docs/documento_a-garca-que-quermos-modif>. Acesso
em: 18/05/2017.
<http://g1.globo.com/pernambuco/noticia/2015/11/justica-federal-anula-leilao-do-terreno-do-
cais-jose-estelita-no-recife.html> Acesso em: 18/05/2017.
RESUMO
O reconhecimento do bem perpassa inicialmente pelo seu reconhecimento. O nome que o IPHAN
oficialmente denomina de Centro Histórico e que em alguns momentos é desconhecido, pode ser
considerado um dado interessante como problematizador da questão do valor sobre esse lugar.
Propõe-se fazer reflexões sobre o processo de tombamento do Centro Histórico de Cuiabá, voltando-
se para os conflitos que compuseram suas etapas de tramitação, através da análise das diferentes
narrativas das instituições públicas e dos agentes sociais envolvidos, ou seja, as pessoas que
vivenciam este espaço cotidianamente. Este estudo busca compreender o que foi reconhecido como
portador de valor patrimonial nesse processo.
1.INTRODUÇÃO
O primeiro contato com o Centro Histórico de Cuiabá aconteceu de forma um pouco
inusitada. Estava a caminho do IPHAN/MT, era o meu primeiro dia como aluna do PEP3.
Uma sensação de ansiedade igual a que nos assola no primeiro de dia de aula me
acompanhava. No ponto de ônibus procurei informações sobre qual a condução que me
deixaria no meu destino. Inicialmente perguntava sobre qual ônibus passaria pelo Centro
Histórico4, mas para a minha surpresa algumas pessoas desconheciam esse nome.
Retrucavam “centro o quê”? Decidi então
entrar em um ônibus e discretamente perguntar ao motorista se o Centro Histórico da cidade
fazia parte do itinerário do ônibus. Sem imaginar um turbilhão de murmurinhos iniciou, mas
não consegui resposta. Neste instante, veio a lembrança de um local no centro conhecido
por “Morro da Luz”. A partir disso outra pergunta foi formulada_ “ Este ônibus passa próximo
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ao Morro da Luz?”. Sem maiores dificuldades recebi respostas positivas e que propiciaram
minha chegada ao local desejado.
Apesar dos atropelos foi possível chegar ao IPHAN/MT. Depois de algumas conversas,
estudos sobre esse lugar e boas caminhadas, descobri que a sede da superintendência
encontra-se localizado em uma das primeiras ruas que deram início ao núcleo urbano da
cidade de Cuiabá, Mato Grosso.
A curiosidade pelo fato de não ser somente o motorista a desconhecer aquele lugar como
Centro Histórico, mas pelo desconhecimento de vários passageiros, instigou a necessidade
de se questionar como as pessoas que convivem naquele espaço o denominam. Na busca
dessas denominações existentes se descobriu algumas, como por exemplo, “centro
comercial” ou apenas “centro”.
Comunga-se da afirmação de que o nome do lugar é atribuído pelas relações sociais que
são construídas no cotidiano.
As relações de sociabilidade são aquelas que conseguem dar um nome para o lugar, pois a
1
Secretaria de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional criada em 1937 através da Lei de nº 378.
1946 – O Sphan passa a se denominar Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(Dphan). Em 1970 o Dphan se transforma em Iphan. Nos anos de 1979 o Iphan se divide em Sphan –
órgão normativo - e Fundação Nacional Pró-memória (FNpM) – órgão executivo. Em 1990 é extinta a
Sphan e a FNpM e ocorre a criação do Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural (IBPC). Nos anos de
1994 a Medida Provisória de n° 752 determina que o Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural –
IBPC e o Instituto Brasileiro de Arte e Cultura – IBA passem a denominar-se, respectivamente,
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e Fundação de Artes – FUNARTE. Para fins de
facilitar a leitura será utilizada a nomenclatura IPHAN.
A compreensão de lugar para Massey (1994), não contém um sentido universal que deva
ser acolhido por todos, pois para ela, assim como a identidade não deve ser entendida como
universal ou homogênea, assim também, não deve sê-lo com o entendimento de lugar. A
partir desse entendimento sobre a identidade do lugar podem ser percebidos dois aspectos
encontrados em polos extremos, que em certos momentos apresentam esta disjunção, e em
outro podem ser complementares, são eles os aspectos peculiares do lugar e suas relações
externas. Estes dois aspectos podem oferecer uma visão mais completa da constituição do
lugar.
A autora destaca a importância das práticas sócio espaciais, pois segundo ela, essas
práticas interferem na significação dos lugares. Sincronicamente as práticas socioespaciais
no mesmo instante que assumem o papel de definidoras, são também influenciadas pela
confluência das relações locais com as relações globais. Repercutindo na ampliação das
fronteiras locais, trabalhando com a ideia de extensão imaginada do lugar, por isso justifica-
se a ideia do lugar para além de demarcações territoriais.
Voltando-se o olhar obre a questão das denominações do Centro Histórico de Cuiabá, mais
especificamente envolvendo o processo de tombamento e sua patrimonialização, Ludmila
Brandão na sua dissertação intitulada “O processo de tombamento do Centro Histórico de
Cuiabá: movimento citadino e educação”5, fala sobre a importância da atuação do Instituto
dos Arquitetos do Brasil (IAB/MT) como propiciador do aguçar do olhar sobre o lugar “Centro
Histórico”, destacando a preservação dos patrimônios e a necessidade de manutenção de
“paisagem urbana”, sendo que segundo a autora, esta compreensão de preservação não
possuía afinidade com o entendimento de valoração de imóveis isolados.
Considera-se que tais denominações dadas ao Centro são anteriores aos processos de
tombamento estadual e federal, os quais geraram várias discussões e conflitos nas práticas
sociais desenvolvidas no Centro. Segundo Bonfim (2010, p. 66), os entendimentos desses
arquitetos vindos de outras cidades atribuem valor arquitetônico ao Centro, identificando-o
como “um conjunto arquitetônico
que merecia fazer parte do patrimônio nacional”.
Ressalta-se que a relação das dimensões material e imaterial do patrimônio, sendo elas
inseparáveis, qualquer interferência em uma dimensão se estará interferindo em outra. O
patrimônio cultural tem como suporte os vetores materiais que possuem uma dimensão
imaterial de significado e valor, assim como, o denominado patrimônio imaterial possui uma
dimensão material que lhe permite efetivar-se. A diferença não é de natureza, mas de
operacionalização (MENESES, 2012).
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Essa referência à memória não significa que os significados fossem imanentes às coisas, as
quais apenas detêm-se na conceituação em si, como se fossem significados estáveis, fixos
em si atribuídos aos bens são. O entendimento perpassa com a conceituação da coisa em
si, como entender a singularidade quando se apregoa a universalidade. A coisa tem que ser
entendida na sua singularidade. O conhecimento que temos das coisas são representações
singulares e não conceitos universais.
Segundo Bonfim:
Segundo Elizabeth Madureira9, o IHGMT entre o período de 1919 até 1980 era considerado
uma instituição de referência nos trabalhos de pesquisas relacionados ao estado de Mato
Grosso. A implantação da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) no início dos anos
de 1980 veio ocupar esse espaço que o IHGMT possuía como instituição referência
científica local. Este fato associado às mudanças de paradigmas da Historiografia ocorrida
no final dos anos de 1960 e início dos anos de 1970, propiciaram novos olhares sobre a
compreensão histórica e, consequentemente. Ainda segundo Elizabeth Madureira as leituras
sobre a história local eram diferenciadas entre estas instituições.
Ressalta-se que todas as impugnações com exceção de uma foram feitas seguindo o
mesmo modelo. Em geral o conteúdo das impugnações questionava a forma de notificação.
No mesmo dia da publicação do edital no Diário Oficial, o edital de notificação foi publicado
pelo Diário Oficial do Estado de Mato Grosso na página 57, pelo jornal “O Estado de Mato
Grosso na página 6 e pelo Diário de Cuiabá
na seção geral, página 13. (Processo, p. 141 – 144). Processo volume I-A). Organiza a
proteção do patrimônio histórico e artístico nacional.
considerando que o IPHAN não cumpre com o Decreto lei nº25, de 30 de novembro de1937.
A outra questão levantada refere- se “da aplicação, em âmbito nacional, do Instituto do
tombamento decidir pelo tombamento ao invés de uma política de zoneamento”.
Sobre a forma de notificação o documento diz: “A este respeito cumpre-nos esclarecer que o
Decreto Lei nº 25/37, ao deixar de determinar a forma pela qual os proprietários devem ser
notificados acerca dos tombamentos, trilhou o bom caminho”. A Assessoria Jurídica entende
que a SPHAN escolheu uma forma adequada e que este item faz parte da
discricionariedade concedida ao poder público em geral.
Pelo fato das argumentações de impugnação seguirem o mesmo modelo, a apreciação feita
pela Assessoria Jurídica seguiu a mesmo fundamento na construção argumentativa jurídica
na contra - razão às impugnações, dando o mesmo parecer final do anteriormente exposto.
Neste momento iremos nos deter somente a algumas reflexões sobre o princípio da
monumentalidade, pois durante o processo de análise das argumentações que constam nos
documentos de impugnação feitos pelos moradores e comerciantes é possível observar que
as narrativas parecem estar organizadas em torno deste princípio.
Essa afirmativa pode ser evidenciada nos seguintes tópicos, contidos na solicitação de
impugnação:
Nesse espaço de tempo muitos foram os documentos motivados seja a favor ou contra o
tombamento, além das solicitações de impugnação. Este período foi marcado por conflitos
ideológicos e por ações extremamente divergentes e ausência de políticas de preservação
patrimonial.
A nova gestão do poder executivo municipal, representada pelo prefeito Frederico Soares de
Campos no ofício nº404/89 de 26 de junho de 1989 destinado ao Secretário da SPHAN,
então, Augusto C. da Silva Teles, após encontro em Brasília, solicitava formalmente o envio
de equipe técnica a Cuiabá, com o propósito de “analisar e dar soluções rápidas para os
problemas relacionados com a área tombada pelo SPHAN nesta capital”. (Anexo do
processo. s/n).
Após esse primeiro elo de comunicação, a prefeitura enviou o ofício GP nº 678/89 para o
Ministro da Cultura, na época José Aparecido de Oliveira. Expunha que a prefeitura está
revendo algumas sistêmicas para tentar “colocar a administração municipal, pelo menos,
próxima da dinâmica do crescimento da cidade”. O objetivo do documento era a de solicitar
que o processo de tombamento não fosse homologado. Para isso, fez uso de várias
argumentações no intuito de comprovar que o Centro Histórico não é dotado de
representatividade histórica e arquitetônica, portanto, não merecedor de tombamento.
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Sobre o processo de tombamento o prefeito diz:
Cuiabá dos anos 30, que eu tenho viva na memória, existe apenas
registrada nas fotografias e histórias antigas, já que seu visual colonial fora
totalmente alterado, restando sim a sua construção viária irregular que lhe
assegura a personalidade de cidade antiga. [...]. As casas velhas ligadas ao
passado de filhos ilustres, já foram demolidas, não mais existindo para
reviverem a memória daqueles que escreveram páginas brilhantes da sua
história. (Processo Administrativo nº1180– T – 85 – SPHAN.)
Ainda fazendo uso das referências de Santos (2007) sobre monumentalidade, segundo ele,
no princípio da monumentalidade o passado é figurado como “um todo acabado e perfeito”,
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impedido através de vários prismas, é imóvel, encontrando na tradição o seu elo de
articulação com o presente. Neste universo os personagens são modelos exemplares e
representados por pessoas ilustres e importantes, a memória é vista para ser cultuada,
como informação, e não propiciadora de conhecimentos atuais.
Em resumo, a narrativa épica está articulada por uma ideia não relativizada do passado, e
os personagens que aí se movem e os acontecimentos que se passam são absolutos. O
passado é um todo acabado e perfeito e se comunica com o presente apenas através da
“tradição”. Os personagens agem de modo exemplar, não estão sujeitos às contingências do
cotidiano. Os eventos e personagens das narrativas épicas estarão fora do tempo, estão
congelados. Não se valoriza a experiência pessoal. Valoriza-se a “memória”, e não o
conhecimento. O mundo
do passado épico é um mundo perfeito. Não há incertezas. (SANTOS, 2007, p.145).
Pode-se mencionar a resposta ao ofício nº 678/89 como um dos indicativos desses reflexos.
O documento elaborado pelas técnicas da Coordenadoria de Proteção da SPHAN, a
arquiteta Helena Mendes dos Santos e a historiadora Márcia Regina Romeiro Chuva,
encaminharam o documento Informação nº 066 de 16 de novembro de 1989, o qual
informava, dentre outros esclarecimentos, sobre o estudo do passado como fonte de novos
conhecimentos, ressaltava a importância da apropriação dos elementos culturais para a
formação cidadã e, consequentemente, para a melhoria da qualidade de vida, a preservação
como parâmetro para o planejamento voltado ao cidadão, entre outros apontamentos.
Enfim, o documento apresentava fundamentos que compunham a base teórica do
tombamento.
Sobre o Centro Histórico o documento diz No Centro Histórico como um todo foram
observados os elementos que permaneceram ao longo do tempo registrando formas
características de ocupação, implantação e técnicas construtivas, determinadas pela
estrutura socioeconômica organizada com base nas diferentes classes sociais, criando,
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assim, espaços diversificados dentro do conjunto, que devem ser observados e garantidos.
(Processo nº 1180 – T-85, Ofício nº 678/89).
Devido o processo de tombamento ter levado sete anos para a sua tão esperada
homologação, muitos foram os documentos elaborados e que expressavam os anseios e
reflexões históricas vivenciadas. Por isso nos limitaremos na apreciação apenas dos
documentos a cima citados.
É salutar a demonstração de entusiasmo e alegria desse desfecho com “final feliz” após o
trilhar por uma história longa e cansativa, mas espera-se que ela seja significativa para a
construção de políticas de preservação patrimonial.
4.Considerações Finais
O processo de tombamento foi constituído por conflitos e por uma longa espera de sua
homologação. Marcado por diferentes narrativas, as quais foram construídas em momentos
históricos diferentes, sendo que por vezes se aproximavam e em outros momentos
passavam pelo ponto de clivagem.
Nesse processo de desvendamento do valor atribuído no processo de tombamento, o qual
ainda está sendo apropriado, compreende-se que a dimensão do valor pode ser direcionada
na visão de produção de patrimônios, deixando secundária a discussão e identificação do
bem pelos sujeitos, mas que também pode se dar como um fato extremamente relevante e
participativo. E que as compreensões de valor podem ser fundamentadas levando-se em
consideração a relação indissociável entre as dimensões material e imaterial que constituem
um bem.
VELHO, Gilberto. Patrimônio, negociação e conflito. Mana vol.12 nº.1 Rio de Janeiro Apr.
2006. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-93132006000100009< Acesso em:
<12 de junho de 2015.
RESUMO
Partindo do entendimento de que cultura e patrimônio são conceitos indissociáveis e que ambos
fundamentam as bases de uma sociedade desenvolvida, a Secretaria de Cultura de Pelotas vêm, desde
2013, celebrando no mês de agosto o Dia do Patrimônio. Trata-se de divulgar e promover o Patrimônio
Cultural local através das mais variadas formas de expressão, aproximando e integrando a comunidade
do debate sobre Preservação Patrimonial, percebendo o patrimônio enquanto manifestação cultural que
une passado, presente e futuro em prol da valorização da identidade cultural.
O evento, desde a primeira edição, foi planejado em um formato de participação por adesão, cabendo à
municipalidade o papel de organizador e divulgador, estimulando e incentivando a colaboração da
comunidade, envolvendo instituições públicas e privadas, universidades e artistas locais.
O relato desta experiência ímpar que Pelotas construiu durante os últimos 4 anos reflete a importância
da gestão de politicas públicas de preservação que atuem diretamente junto as comunidade. Pois, sem
dúvida, este tipo de ação tem um alcance bem maior, com resultados em curto, médio e longo prazo.
A celebração ao patrimônio histórico promovida em Pelotas, desde 2013, tem a cada ano
tornado mais evidente a participação da comunidade na constituição da cultura do município.
A diversidade de ações inseridas na programação do evento intitulado “Dia do Patrimônio”,
que ocorre durante um final de semana de agosto, representa uma nova perspectiva em
defesa da preservação do patrimônio. Preservação esta que tem relação com o sentimento de
pertencimento e com a valorização da cultura a partir da comunidade, ou seja, das pessoas.
Inspirações / Precedentes
Nossa principal inspiração tem por base o evento que ocorre no Uruguai desde 1995, quando
se celebra o Día Del Patrimonio no mês de outubro, seguindo ações semelhantes realizadas
em diversos outros países. Os uruguaios comemoram sua cultura e história interagindo em
espaços abertos e abrindo as portas de edificações relevantes para a cultura da sociedade, os
quais abrigam ações dos mais variados tipos, envolvendo artistas, atores, memorialistas,
historiadores e educadores patrimoniais.
Com uma formação étnica muito variada, a partir do processo de colonização por portugueses,
africanos, alemães, pomeranos, italianos, franceses e poloneses, Pelotas constituiu-se
culturalmente com base na diversidade, representada nas mais diversas formas de viver, de
fazer e de saber.
Localizada ao sul do Rio Grande do Sul, Pelotas é hoje considerada um atrativo pólo regional
da metade sul do estado, principalmente na área educacional. Atualmente, com mais de
340.000 habitantes, convive com os problemas recorrentes de uma cidade de porte médio.
Historicamente comprova-se que a formação urbana da cidade de Pelotas foi propiciada pelo
desenvolvimento econômico gerado pela produção do charque, atividade que, até as primeiras
décadas do século XX, passou a ser a principal fonte econômica de desenvolvimento da
região. Estudos realizados por pesquisadores como Mário Osório e Ester Gutierrezi, confirmam
os dados de que, foi a partir do acúmulo de riquezas gerado pela produção do charqueii que o
núcleo urbano se desenvolveu, fortemente influenciado pela tradição eclética da Europa,
adquirindo peculiaridades locais, fato que tornou Pelotas uma cidade valorizada culturalmente,
com identidade própria.
A sinalização das atividades e dos prédios históricos, que também é promovida pela
Secretaria de Cultura, deixa a cidade alegre e atrativa. Todos os bens tombados recebem
bandeirolas coloridas diferenciando os três níveis de tombamento. Os espaços abertos
voltados à realização de atividades culturais ao ar livre também são identificados.
Considerando que Pelotas é uma cidade universitária que acolhe vários cursos de graduação
e pós-graduação voltados à área de preservação patrimonial como: arquitetura, conservação e
restauro, turismo, museologia, memória social e patrimônio, é que o evento buscou um
mecanismo de interagir com esta população que, de certa forma, já encontra-se engajada na
temática. Assim surgiu a figura do Agente do Patrimônio, mediador das atividades
desenvolvidas durante o evento que atua diretamente junto à população monitorando,
apoiando e esclarecendo a comunidade participante.
A organização realiza chamadas dentro das universidades para adesão dos estudantes como
voluntários. O grupo de inscritos passa por um treinamento prévio promovido pela Secretaria
de Cultura com participação de professores universitários e técnicos da área da cultura.
Recebem noções de patrimônio e são inseridos nas temáticas abordadas em cada edição.
Em nossa última edição realizada em 2016, buscando envolver cada vez mais diferentes
camadas da sociedade, as inscrições para agentes abrangeram também estudantes do ensino
médio de escolas públicas municipais e estaduais, ampliando ainda mais a abrangência da
ação, a qual atualmente é entendida como fundamental para o sucesso do evento.
Dando início ao debate, em 2013, o tema proposto trouxe uma indagação, - O que é
Patrimônio? – traduzido em um enfoque que recaiu sobre o conceito de patrimônio. Trazendo
à tona os avanços conceituais do tema e a atual abrangência do significado da palavra
patrimônio. Instigando a população a pensar em uma perspectiva mais atual das relações
entre patrimônio material e imaterial, cultural e ambiental, histórico e contemporâneo.
Estas reflexões tiveram como principal objetivo dar início a um processo de rompimento da
noção de patrimônio, historicamente instituída e fortemente relacionada às camadas elitizadas,
aos vestígios materiais, a herança europeia e aos chamados monumentos, ou seja, as
A primeira edição em 2013 contemplou uma intensa programação com ações em diversos
lugares da cidade, como o Centro Histórico, a Colônia, as Charqueadas, a praia do Laranjal.
Incluiu palestras, exposições, apresentações artísticas, visitas guiadas, degustações e mostras
culturais.
A partir da abordagem desenvolvida no ano anterior, em 2014 a temática foi mais direcionada -
Herança Cultural Africana - enfocando os aspectos das nossas origens culturais. Foi tratado
o caráter da diversidade e da multiplicidade dentro da constituição do patrimônio de uma
sociedade, celebrando a pluralidade étnica e seus reflexos na formação da cultura dos
pelotenses.
Durante os dois dias de evento foram 102 atividades distribuídas em 38 locais, incluindo
atividades culturais, como visitação aos prédios históricos, expressões religiosas,
A terceira edição realizada em 2015 evidenciou o caráter ambiental do patrimônio cultural com
o tema - Pelotas Natural – Patrimônio das Águas. A escolha do tema voltou-se diretamente
à relação com a origem e formação da cidade a partir das charqueadas, estabelecimentos de
perfil industrial onde se produziam carne salgada (charque), cuja implantação foi definida com
base na hidrografia da região. A comunicação com grandes portos possibilitada através do
Arroio Pelotas e Laguna dos Patos permitia o escoamento da produção do charque e a
chegada do açúcar, matéria prima para a produção de doces, atualmente reconhecidos como
Patrimônio Imaterial da cidade. Até mesmo o nome da cidade tem relação com as águas,
originou-se das embarcações de varas de corticeira forradas de couro, usadas para a
travessia dos rios na época das charqueadas, chamadas de “pelota”.
Nesta edição as Conversas do Dia do Patrimônio se consolidaram como ação permanente que
antecede o evento, encontros de aproximação e provocação que instigam o debate e a
interação da comunidade com o tema.
A novidade da edição de 2015 ficou por conta da ampliação dos dias do evento, que passou a
ser realizado a partir da sexta feira, quando a programação foi direcionada as escolas públicas
municipais e estaduais. Esta decisão foi resultado da demanda observada nas edições
anteriores. Muitos professores procuravam participar com seus alunos do evento, mas as
atividades desenvolvidas apenas no final de semana restringiam a participação das escolas.
Na sexta feira uma agenda específica de visitação mediada ao centro histórico foi programada
para receber o público estudantil e, assim, semear a cultura e promover a educação
patrimonial.
A cada edição são produzidos seis postais representativos do evento, a seleção de imagens é
realizada de forma a contemplar a diversidade da cultura dentro da temática proposta para o
evento. Como exemplo citamos a coleção produzida em 2013, quando o evento focou na
indagação “O que é Patrimônio?” e foram escolhidas imagens representativas das diferentes
formas de manifestação do patrimônio: 1) Mercado Central – imagem do patrimônio histórico
edificado, palco de práticas sociais do passado e da atualidade; 2) Zoólito de tubarão (zoo,
animal e lito, pedra) – imagem representativa do patrimônio arqueológico; 3) Theatro Sete de
Abril – imagem representativa do patrimônio material com significados relacionados à arte e à
cultura da sociedade pelotense; 4) Doces de Pelotas – imagem representativa do patrimônio
imaterial, símbolo dos saberes e fazeres da cultura local; 5) Travessia da Pelota no Arroio
Pelotas – imagem representativa do patrimônio ambiental com vinculo à história e a origem da
A Revista do Dia do Patrimônio produzida desde 2014, quando teve início as Conversas do
Dia do Patrimônio, é um material educativo e de divulgação do evento que contempla a
programação das atividades e, principalmente, registra os relatos e as experiências dos
protagonistas das conversas do dia do patrimônio. Trata-se de um material de reflexão sobre o
tema e de registro das ações desenvolvidas antes e durante o evento.
O reconhecimento da Ação
“O dia em que a história deixa de ficar presa nos casarões e vai para as ruas”. Assim a página
do IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - publicou em 22 de setembro
de 2016, notícia sobre as festividades do Dia do Patrimônio em Pelotas. Uma das ações
O projeto foi um dos vencedores da segunda categoria que, segundo o IPHAN, visa
desenvolver iniciativas de excelência em promoção e gestão compartilhada do patrimônio
cultural, envolvendo todos os campos da preservação e oriundas do setor público, do setor
privado e das comunidades.
Em 2015 o Dia do Patrimônio também foi vencedor do prêmio promovido pela FAMURS -
Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul - em parceria com o
Conselho dos Dirigentes Municipais de Cultura do Rio Grande do Sul. O evento foi premiado
na categoria Museus, patrimônio e memória.
Conclusão
Mesmo diante de todas as dificuldades inerentes de uma sociedade brasileira nos dias atuais,
Pelotas buscou, através dos recursos disponíveis, principalmente humanos, um caminho para
valorização da cultura local através das relações da comunidade com seu patrimônio, seja ele
histórico ou contemporâneo, exaltando desde suas origens até as práticas atuais de
reconhecimento cultural.
O relato de nossa experiência representa uma das infinitas possibilidades de atuação pública
na gestão do patrimônio cultural. Cabe a cada comunidade, motivada e apoiada por seus
gestores, se redescobrir através de suas potencialidades e buscar mecanismos que valorizem
sua cultura e dignifiquem suas ações, se reconhecendo como parte da identidade cultural do
seu lugar.
Referências Bibliográficas
MAGALHÃES, Mário Osório. Opulência e cultura na província de São Pedro do Rio Grande do Sul.
Pelotas: Ed.UFPel, 1993.
PELOTAS. “Lei Municipal nº. 4568”, de 07 de julho de 2000. Estabelece áreas da cidade como
zonas de preservação do Patrimônio Cultural de Pelotas – ZPPCs – lista seus bens e dá
outras providencias.
https://www.youtube.com/watch?v=J8pbQZz6d-M
i Mário Osório de Magalhães, historiador, professor da Universidade Federal de Pelotas, já realizou estudos
importantes sobre a história de Pelotas como: “Os passeios da cidade antiga: guia histórico das ruas de Pelotas” e
“Pelotas: século XIX”. Ester Judite Bendjouya Gutierrez, arquiteta e urbanista Doutora em História pela PUC-RS e
Especialista em Gestão do Patrimônio Cultural Integrado ao Planejamento pela UFPE-PE, autora de obras como
“Negros, Charqueadas e Olarias – um estudo sobre o espaço pelotense” e “Barro e Sangue, mão-de obra,
arquitetura e urbanismo em Pelotas (1777-1888).
ii Carne bovina, salgada e seca ao sol em mantas, produzida em estâncias conhecidas por “Charqueadas”.
MIGUEL, ELEUSY N.
RESUMO
2 Pesquisadores atribuem o termo Barroco basicamente a duas hipóteses: a primeira como alusão as pérolas irregulares, e a
segunda, oriunda do italiano “baroco”, que denotaria um desvio no pensamento lógico e elaboração de metáforas.
Fonte: http://paroquiamonserrate.com/index.php?seccao=grupodetalhe&conteudo=193
3. O patrimônio e a sociedade
Trabalhar o patrimônio e fazer com que fique vivo no cotidiano de uma cidade, de
uma localidade ou mesmo em um país, salvo as proporções, faz com que este não seja
esquecido e ultimado, “Assim como a morte definitiva é o fruto último da vontade de
esquecimento, assim a vontade de lembrança poderá perpetuar-nos a vida” (Saramago,
1997, p. 209). Sendo assim, pode ser considerado como uma construção social, o
patrimônio se torna um processo simbólico que legitima os aspectos sociais e culturais de
uma determinada sociedade, seguido por um sentimento coletivo de identidade,
diferenciando dos demais grupos de indivíduos (Da Silva, 2000).
O estudo das torres das igrejas se apresenta como uma boa possibilidade de
apropriação do patrimônio pela sociedade onde estão locadas. Com iniciativas criativas e
envolventes os dados alcançados pela pesquisa científica, esses poderiam ser trabalhados
nos diversos âmbitos das comunidades de Catas Altas e Itabirito, por meio de seminários,
palestras, exposições, documentário, etc; promovendo a história desses monumentos de
cunho religioso e artístico. Dessa maneira, a identidade social seria promovida e a
população, além de enriquecer sua cultura teria mais afinidade e cuidado com esse
patrimônio.
Por fim, podemos concluir que a educação patrimonial e a apropriação dos bens
patrimoniais pela sociedade, especialmente na localidade onde está o bem patrimonial, são
alternativas fundamentais para o crescimento cultural dessa população e de certa medida a
preservação desses bens, uma vez que se sentindo pertencente a tendência é proteger.
"O mundo tem dois hemisférios: um superior e visível, que é o passado, o outro inferior e invisível
que é o futuro, no meio de um e outro hemisfério ficam os horizontes do tempo que são ESTES
instantes do presente que imos vivendo, onde o passado se termina e o futuro começa”.
Pe. Antônio Vieira
ARGAN, G. C.; tradução Pier Luigi Cabra. História da Arte como História da Cidade. – 5*
ed. – São Paulo: Martins Fontes, 2005.
PANOFSKI, E.. Significado nas artes visuais. 3a ed. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2004.
SARAMAGO, J.. Todos os nomes. São Paulo: Companhia das Letras. 1997.
RESUMO
1Esse artigo é uma bifurcação da dissertação em curso intitulada " As diretrizes legais na Evolução Urbana da
Rua Marechal Deodoro (parte baixa): Dos Códigos de Posturas às leis de proteção patrimonial", pelo Programa
em Ambiente Construído da Universidade Federal de Juiz de Fora - MG
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
A contemporaneidade e suas facetas diante do patrimônio cultural
O espaço urbano pode ser definido como um produto referente a todo processo de
interferência do trabalho humano em determinado ambiente. Assim, uma infinidade de
valores advindos dos mais variados tipos de culturas, etnias, técnicas, trabalhadores, entre
outros, convergem numa estrutura de que mescla seus espaços públicos e privados, como
edifícios, praças, ruas e todo sistema de produção e consumo. Esses meios é que
sustentam a cidade como um organismo vivo, mutável e transformável pelos indivíduos que
nela vivem ou transitam. Identificar a formação e proteção da paisagem urbana edificada é
algo que caracteriza um conflito na contemporaneidade, devido às várias formas de ação
sobre determinados bens inseridos no contexto urbano.
Metade dos indivíduos do planeta moram em espaços urbanos, e a cada dia, o processo de
urbanização se acentua progressivamente (SOUZA, 2005, p. 20). Esse aglomerado de
povos, ideias, ideologias, cultura, relações sociais e outras formas de manifestações
humanas, geram uma alta complexidade na organização das cidades, e isso se reflete no
seu tecido urbano. Assim, pode-se observar muitas vezes uma fragmentação na cidade
contemporânea devido a uma somatória de camadas, atingindo uma alta complexidade que
vai ultrapassar os meios de conhecimentos e os instrumentos da ação prática. Henri
Lefebvre nos diz que o tecido urbano não se limita a morfologia, mas é o suporte de um
modo de viver, a sociedade urbana, e é nesse tecido urbano acontecem os fenômenos da
vida social e cultural (LEFEBVRE,1991, p.19). Conforme Carlos (2007, p. 20-21), o espaço e
a sociedade se mostram indissociáveis no processo de produção da espacialidade da
cidade, pois as relações sociais acabam por materializar em um território real e concreto, ou
seja, “a sociedade produz/reproduz um espaço através da prática sócio-espacial”. Dessa
forma, planejamento, desenho, integração e organização espacial são alguns dos
componentes presentes na busca por soluções na realidade pluralista das cidades
contemporâneas, que demandam uma integração de sistemas, agentes sociais e lugares
conflituosos.
Partindo dessas reflexões iniciais sobre identidade, memória e patrimônio cultural, é objeto
de estudo as medidas tomadas pela Prefeitura de Juiz de Fora sobre a Rua Marechal
Deodoro no Inventário do Acervo Cultural da cidade concluído em 1996. Busca-se colaborar
para uma maior discussão dos instrumentos que visam a proteção de bens culturais num
território urbano contemporâneo e seus efeitos sobre a salvaguarda da memória e
identidade. A via supracitada foi eleita como estudo de caso devido a sua importância no
conjunto urbano da cidade, sua identidade relacionada aos serviços/comércio e aos
imigrantes, que ali fizeram esse ramo florescer, e a sua ligação com a Praça da Estação,
local de memória e desenvolvimento da cidade.
O tombamento de bens de interesse cultural tem por objetivo proteger, impedir sua
destruição ou mutilação, além de assegurar que sejam preservados para as gerações
futuras. Já o inventário de conhecimento, diferente do tombamento, tem como objetivo
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identificar, selecionar, classificar, cadastrar e reunir informações substanciais para a
preservação de bens de interesse cultural, e no contexto abordado, edificações, sítios e
conjuntos históricos ou artísticos com vista à sua conservação e valorização.
Em Juiz de Fora, uma série de edificações antigas foram demolidas a partir da década de
1970, vítimas de uma nova perspectiva calcada no progresso e desenvolvimento, que foi
objetivo de algumas camadas da sociedade. Conforme esse tipo de demolição preconizado,
uma parcela da população local sentiu os danos da perda de determinados referenciais
afetando a memória coletiva, com isso causando uma lacuna fundamental de sua identidade
que os identificava socialmente e os nutria culturalmente. Toda a estrutura concreta da
cidade, muitas vezes é relegada a um elemento estático para uma parcela da sociedade,
que podem considerá-la sem valor estético, cultural ou histórico. Mas mesmo diante de tais
observações negativas, certamente tais bens interagem com histórias menos tangíveis, em
um aglomerado de memórias e experiências expurgadas da história social dos lugares,
muitas vezes de vitimas por um pré-conceito, cultura higienista, influência do mercado
imobiliário e financeiro. Conforme a historiadora Fabiana Aparecida de Almeida, a partir da
década de 1970, uma série de manifestações sociais ocorreram em defesa do patrimônio da
cidade, tendo a frente artistas, intelectuais e grupos sociais, em prol da preservação de
imóveis importantes no contexto da consolidação da cidade, mas que estavam ameaçados
de demolição (ALMEIDA, 2012, p.26). Esse período, onde se demonstra um forte
sentimento de uma gama de grupos sociais pela manutenção de seus referenciais de
identidade, demonstra o que Michel Pollak (1992, p. 204) define como memória, a qual seria
um elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual, como coletiva.
Mesmo com esse envolvimento da população, a demolição sistemática contínua, e acaba
por tomar os meios midiáticos, como é demonstrado na manchete “Os casarões aos poucos
vão caindo e a cidade vai perdendo a sua memória histórica”, no jornal Diário Mercantil do
dia 12 de fevereiro de 1978.
O inventário de 1996
Dessa forma, surgiu um Mapa do Mérito Arquitetônico, que integra a parte referente ao
diagnóstico, onde foi feita uma classificação dos graus dos imóveis isolados ou em conjunto:
valor excepcional, relevante, documental, ambiental. Após o cadastramento de 1311
edificações em campo, foram excluídas 169, restando um montante de 1142 edificações.
Esse numero supera em 592 edificações o Pré-inventário de 1981. A área conhecida na
cidade como “núcleo histórico”, que segundo o inventário compreende a área formada pela
Av. Barão de Rio Branco, Av. Getúlio Vargas e pela Rua Espírito Santo, detém o maior
número de edificações ou conjuntos com valores excepcional ou relevante. Vale aqui
ressaltar que esses imóveis inventariados ocupavam uma área de alta especulação
imobiliária, o que acarretaria debates futuros entre poder público e proprietários.
Figura 1- Rua Marechal Deodoro no trecho compreendido entre Av. Getulio Vargas e Av.Rio Branco.
Fonte: Daniel Moratori (2017)
Nesse trecho que foi denominado de Conjunto da Rua Marechal Deodoro (ver fig. 02), foram
inventariadas 29 edificações, mais 1 edificação que serve de galeria com fachadas para
duas ruas, que foi classificada como pertencente ao Conjunto da Rua Halfeld pelo empresa
Século 30, que também entra no estudo devido na a sua importância na rua Marechal
Deodoro. Outra edificação que entrou nesse estudo foi o atual Hotel Rio, que tem uma das
suas três fachadas voltada para a rua desse estudo, e acaba sendo um imóvel que
conforma a espacialidade da via, mas que se encontra localizado na esquina da Av. Getúlio
No trecho restante da rua, que compreende a partir da Av. Barão do Rio Branco até os
limites com o Morro do Imperador, foram inventariadas mais 10 edificações (ver fig. 02).
Dessas edificações, todas seriam do 1º e 2º quartel do século XX, e conforme a sua ficha
catalográfica, seriam 9 edificações com tipologia de Arquitetura Civil de Função Privada e 1
de Arquitetura Religiosa. Dessas 10 edificações, 7 tinham o uso como residência, 2 como
serviço e 1 de caráter religioso. E como proteção proposta, 1 edificação que apresenta
características do estilo neocolonial seria proposto tombamento de fachada e volumetria, e o
templo religioso, que tem influências do neogótico, teria uma proposta de tombamento
integral. As 8 edificações restante seriam apenas para documentação, não sendo proposto
nenhuma sugestão.
2O Parque Halfeld e a Igreja de São Sebastião não entram nesse estudo devido a serem espaços que ocupam
um quarteirão cada, tendo comunicação para quatro ruas diferentes. A igreja tem sua fachada voltada para a rua
São Sebastião e um distanciamento considerável da rua Marechal Deodoro, somente o entorno da mesma
conformando a espacialidade da rua com uma área verde.
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Figura 2 - Edificações inventariadas na rua. Em vermelho a área denominada Núcleo Histórico da
Rua Marechal Deodoro. No círculo em rosa o “Hotel Rio”, incluído neste estudo. Fonte: Mapa
elaborado pelo autor segundo levantamento do inventário de 1996. Daniel Moratori (2017)
Todas essas edificações apresentadas acima tinham em suas fichas catalográficas uma
parte destinada à sua caracterização, onde contém uma descrição referente implantação do
bem construído, detalhes sobre a composição e estilo arquitetônico das fachadas,
ornamentação, platibandas, marquises, vitrais, esquadrias, piso dos pavimentos. Todos os
dados apontados das fichas analisadas levam somente em consideração um viés
arquitetônico. Sendo a rua composta por 134 imóveis com a fachada voltada para a referida
via, as 41 edificações inventariadas correspondem a mais de 1/4 dos bens construídos
nesse espaço urbano. Esses imóveis, locados numa área central, que detém em seus
terrenos um alto valor financeiro, acabam por se tornarem alvos de empresas de construção
civil e do ramo imobiliário, que vêem o inventário como um obstáculo à verticalização do
centro.
Conforme Azevedo & Jabour Junior (2012, p. 44-47), alguns proprietários solicitaram o
alvará de demolição de seus imóveis junto a Prefeitura após o inventário, a qual foi negada
Figura 3 - Edificações ecléticas e art deco na Rua Marechal Deodoro, no trecho compreendido entre
Av. Getúlio Vargas e Av. Francisco Bernardino. Fonte: Daniel Moratori (2017)
RESULTADO
Através da observação do processo de inventario da via, podemos conhecer a forma de
ação do inventário da cidade de Juiz de Fora, que foi uma das ferramentas que auxiliou na
proteção das diversas edificações, mas o fez somente por sua relação de “Mérito
Arquitetônico”. Com toda a relevância e valia que o inventário de 1996 fez para a
preservação das edificações salvaguardadas atualmente na Rua Marechal Deodoro, essa
reflexão de Patrimônio Cultural e identidade faz suscitar um pensamento sobre o
pertencimento da sociedade sobre tal patrimônio, e como o poder público estimulará os
vínculos com o patrimônio local para que a preservação seja algo sustentável.
O caso da Rua Marechal Deodoro deixou claro a forma que essa escolha de edificações a
serem inventariadas, acabou se mostrando uma coleção de objetos exemplares e únicos,
baseado numa abordagem histórica e arquitetônica, mas afastados de um contexto
sociocultural, sem levar em conta a participação ativa da população no processo. Dessa
forma, as políticas voltadas a salvaguarda e valorização do patrimônio cultural necessitam
ser pensadas como políticas urbanas, onde seja captado toda as raízes da construção
social de identidades espaciais locais, que acabam por resultar que tais áreas, objetos,
edificações, bens materiais e imateriais sejam constatado, reconhecidos e representados de
forma própria pela sociedade, com suas particularidades e identidades preservadas. Com o
conceito de patrimônio sendo ampliado, necessita-se que tais ferramentas também estejam
sujeitas a ampliações na forma qualitativa, para que possam absorver toda o significado
cultural, sua ambiência e sua identidade.
E dessa forma, que patrimônio e identidade, que se apresentam como membros de uma
mesma equação, sejam usados de forma conjunta como um recurso primordial para uma
consciência identitária, para que não ocorra uma sensação de não pertencimento e
REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Nilo Lima de. JABOUR JÚNIOR, Wilson Coury. Reflexões e olhares: o
patrimônio cultural de Juiz de Fora. Juiz de Fora: FUNALFA, 2012, 184 p.
BRITO, Joaquim Pais de. Patrimónios e identidades: A difícil construção do presente. In:
PERALTA, Elsa; ANICO, Marta (org). Patrimónios e identidades: Ficções
contemporâneas. Oeiras: Celta Editora, 2006. 217 p.
CARLOS, Ana Fani Alessandri. O Espaço Urbano: Novos Escritos sobre a Cidade. São
Paulo: FFLCH - Departamento de Geografia da USP, 2007. 123 p.
CHOAY, François. Alegoria do patrimônio. 3ª. Ed. Tradução de Luciano Vieira Machado.
São Paulo: Estação Liberdade, 2006. Ed. Unesp, 282 p.
JEUDY, Henry-Pierre. Espelho das cidades. Casa da Palavra. Rio de Janeiro, R.J, 2007, p.
137
JUIZ DE FORA. Lei Municipal nº 7282, de 25 de janeiro de 1988. Dispõe sobre a proteção
do patrimônio cultural do Município de Juiz de Fora e dá outras providências. Juiz de
KOOLHAAS, Rem. Três textos sobre cidade. 1ª Ed. 3ª Impressão. 2014. Editorial Gustavo
Gili. Barcelona. 2014. 111p.
LEFEBVRE, Henry. Direito à cidade. São Paulo: Editora Moraes, 1991, 143 p.
SOUZA, Marcelo Lopes de. ABC do Desenvolvimento Urbano. 2. ed. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2005. 190p.
ZEVI, Bruno. Saber ver a arquitetura. 5.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996
Jornais
AMARAL, João Carlos. “Os casarões aos poucos vão caindo e a cidade vai perdendo a sua
memória histórica”. Diário Mercantil. Juiz de Fora: 13 e 14 de fevereiro de 1978.
1. Instituto Federal de Minas Gerais- Campus Ouro Preto. Coordenadoria de Conservação e Restauro
http://ouropreto.ifmg.edu.br/
amandacosta1095@gmail.com
2. Instituto Federal de Minas Gerais- Campus Ouro Preto. Coordenadoria de Conservação e Restauro
http://ouropreto.ifmg.edu.br/
michelerg01@yahoo.com.br
3. Instituto Federal de Minas Gerais- Campus Ouro Preto. Coordenadoria de Conservação e Restauro
http://ouropreto.ifmg.edu.br/
rodrigo.meniconi@ifmg.edu.br
4. Instituto Federal de Minas Gerais- Campus Ouro Preto. Coordenadoria de Conservação e Restauro
http://ouropreto.ifmg.edu.br/
sarahdepaulab@outlook.com
RESUMO
A preservação dos valores culturais e ambientais caracteriza-se, crescentemente, como uma tendência
da atualidade. A valorização das coisas locais, em contraposição à globalização da economia e da
comunicação, reveste de importância à manutenção de identidades específicas, que garantam às
pessoas a referência do seu lugar. O Projeto Oficina de Restauro Público, iniciado no IFMG - Campus
Ouro Preto como projeto de extensão em 2014, deu prosseguimento à ação executada anteriormente
pela Fundação de Arte de Ouro Preto, FAOP, em parceria com o Instituto, ampliando as possibilidades
de formação de mão de obra qualificada em conservação e restauração de bens imóveis na cidade.
Dessa forma, a atividade de extensão proporciona aos alunos do Curso de Conservação e Restauro,
uma prática aplicada dos conhecimentos adquiridos em sala de aula. À vista disso, a proposta cumpre
um dos princípios definidos pela Política Nacional de Extensão, que define como um dos seus eixos a
interdisciplinaridade, “caracterizada pela interação de modelos e conceitos complementares, de
material analítico e de metodologias, buscando consistência teórica e operacional que estruture o
trabalho dos atores do processo social e que conduza à interinstitucionalidade, construída na interação
e inter-relação de organizações, profissionais e pessoas”. Em parceria com o Escritório Técnico do
IPHAN, cumpre-se a proposta de atender à população de menor poder aquisitivo, residente em
edificações com necessidade de conservação e restauração, condições de realizar as ações
necessárias para manutenção de seus imóveis, disponibilizando dossiês de conservação e restauro.
Na atualidade, especificamente, atende-se às paróquias da cidade de Ouro Preto, responsáveis pelos
bens culturais históricos que demandam apoio para a salvaguarda das edificações referenciais, no
caso: três Passos da Paixão – edificações de pequeno porte que contam os momentos finais da vida
de cristo -, e duas Capelas de pequenas dimensões. Trabalhou também, mentalidades comprometidas
com a preservação do patrimônio cultural, através de ações de educação patrimonial, contribuindo,
consequentemente, para a melhoria da qualidade de vida, para a sustentabilidade e para a valorização
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da cultura. Em conjunto a essas ações, investiga-se sobre as técnicas e materiais construtivos
tradicionais, bem como as causas das patologias encontradas nos objetos estudados.
Palavras-chave: patrimônio, conservação e restauro, cultura.
De acordo com Fernandes (2014), a valorização de Ouro Preto começou antes mesmo da
mudança da Capital, vários projetos foram elaborados visando a preservação e a adaptação
da cidade à uma nova estrutura. O reconhecimento da cidade se inicia, então, quando a
cidade perde sua função política, no fim do século XIX. O prefeito João Veloso, que esteve à
frente da prefeitura na década de 30, foi o primeiro a desenvolver políticas de restauração na
cidade, intervindo em ruas, praças monumentos e proibindo construções em desacordo com
o estilo colonial. Nesse contexto, destaca-se também a atuação do Instituto Histórico de Ouro
Preto, criado por moradores e intelectuais, que empreendeu campanhas e reconhecimento
dos locais da cidade, fizeram também pequenas intervenções e reformas pela cidade. Ainda,
segundo a autora: “A Inspetoria apresentou, em 1935, o “Plano de Restauração de Ouro
Preto”, o primeiro no Brasil, que contemplou a restauração de edificações singulares, igrejas,
pontes e chafarizes”.
Nesse sentido, objetivando a parceria entre academia e órgão preservacionista, com proposito
de fomentar a pratica da preservação em Ouro Preto é criado o Laboratório de Restauro, sob
responsabilidade da FAOP, Fundação de Arte de Ouro Preto, com parceria do IFMG- Campus
Ouro Preto e o IPHAN. Desde sua criação, em 2009, o projeto extensionista, de cunho cultural
e social compromete-se a realizar Dossiês de Conservação e Restauro, possibilitando a
conservação de edificações de valor cultural da população de menor poder aquisitivo, ou
ainda de associações comunitárias responsáveis pelo patrimônio cultural situado nas diversas
localidades da região, uma vez que o projeto objetiva atender também as necessidades
provenientes deste segmento, quando essas instituições demandarem ações relacionadas
aos objetivos propostos. Já em 2014 pretendendo dar prosseguimento às ações
anteriormente executadas sob responsabilidade da FAOP, a Coordenadoria do Curso de
Conservação e Restauro firma o projeto, “Oficina de Restauro Público” como projeto de
extensão vinculado à Diretoria de Pesquisa e Extensão, DIPE, do Instituto.
Ainda seguindo a mesma linha de objetivos e metodologias do projeto anterior, nessa edição
especificamente a Oficina contempla as paroquias da cidade, responsáveis pelos imóveis de
valor cultural, objetos de estudo desse trabalho. Elegido pelo Escritório Técnico do IPHAN de
Ouro Preto, os bens contemplados são: Passo da Ponte Seca, Passo da Rua São José, Passo
do Antônio dias, Capela de Nossa Senhora das Necessidade e Capela de Santa Cruz. As
pequenas edificações, embora de singela arquitetura e ornamentação, desempenham papel
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importante na vida cultural e religiosa da cidade. Os Passos da Paixão possuem participação
importante na icônica Semana Santa da Cidade, são abertos uma vez por ano, somente no
Domingo de Ramos e retratam por meio de imagens de roca, os momentos finais da vida de
Cristo. Já as capelas, situadas em áreas periféricas da cidade, no entanto, de importante valor
cultural, são utilizadas no decorrer do ano para a celebração de pequenos cultos católicos,
como terços e novenas.
Nesse sentido, a Oficina de Restauro Público tem como foco, principalmente, atuar de forma
efetiva na conservação e restauração de imóveis de valor cultural, devolvendo para a
população parte do conhecimento adquiridos em sala de aula. Objetiva, ainda, trabalhar
mentalidades comprometidas com a preservação do patrimônio cultural, através de ações de
educação patrimonial, contribuindo, consequentemente, para a melhoria da qualidade de vida
e para a valorização da cultura.
2. Metodologia
A proposta metodológica do programa de extensão em interface com a pesquisa apresentado
reflete os princípios do Plano do Curso Superior em Conservação e Restauro que define que
“a estruturação do curso (...) permitirá, sobretudo, que os alunos realizem exercícios
acadêmicos, baseados em objetos reais e palpáveis, que integrem a prática projetual a
soluções tecnológicas compatíveis com os preceitos teóricos, legais e contextuais”. O
exercício da análise e da síntese baseado na crítica da realidade, na autonomia das decisões
e na mensuração dos efeitos causados é fundamental para formar profissionais capazes de
intervir em bens imóveis de valor cultural, muitas vezes protegidos por instrumentos legais
municipais, estaduais ou federais e, mais que isto, representantes da identidade social e
merecedores da afetividade de gerações.
Cada etapa de execução do dossiê de restauro tem uma importância única e deve ser
desenvolvida com bastante rigor, visto que o produto final a ser entregue deverá garantir a
salvaguarda do valor cultural desta edificação.
1
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Brasil). Carta do Restauro, 6 de abr. 1972. Disponível em:
<http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20do%20Restauro%201972pdf>. Acesso em 18 jun.
2017.
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Na etapa de levantamento arquitetônico e fotográfico, além de registros fotográficos para
compor o levantamento histórico-contextual e servir de registro, inicialmente é executado
croquis da planta, dos cortes e dos detalhes que se configurarem importantes, a fim de
registrar medidas e cotas altimétricas mensuradas da edificação para a construção dos
desenhos em um software apropriado. O levantamento arquitetônico serve como documento
histórico, indispensável para futuras intervenções.
Em todas estas etapas de execução dos dossiês os alunos são orientados e supervisionados,
respectivamente, diretamente pelo docente responsável e pelo chefe do escritório técnico do
IPHAN. Dessa forma, proporcionam aos alunos uma troca de experiência e aprimoramento
dos trabalhos. Poucos materiais são necessários para a realização dos trabalhos, em suma,
são empregados materiais rotineiros para os alunos de Conservação e Restauro: trena rígida
e eletrônica; prancheta; papel; lápis e borracha; capacete de segurança; máscaras de poeira;
escada para acesso às coberturas e câmera fotográfica. Na etapa de confecção dos
desenhos, mapeamentos de danos, proposta de intervenções, feitos no software apropriado,
posteriormente finalizados e transformados em PDF em pranchas no formato A1.
As pranchas foram concluídas, mantendo o formato A1, convertidas para PDF e entregues
digitalmente ao escritório do IPHAN. E com isso deu-se início ao desenvolvimento do Caderno
de Encargos, ou Especificações de Serviços, que se compõe de partes administrativas que
serão executadas na obra de conservação e restauro dos respectivos bens contemplados. Ao
final do trabalho, os Dossiês serão doados para o Escritório Técnico do IPHAN a fim de
contemplar a efetiva restauração dos bens.
Durante as atividades as bolsistas tiveram auxílio das paróquias responsáveis por cada Passo
ou Capela, para o devido acesso às edificações. No decorrer da construção do dossiê, sendo
supervisionados pelo Escritório Técnico do IPHAN, foram orientadas técnicas para
aprimoramento dos levantamentos, correções e refinamento dos desenhos de acordo com
referências exigidas nos projetos aprovados pelo escritório. Fato esse que muito contribuiu
para a experiência das alunas, visto que os conhecimentos adquiridos em sala estavam sendo
aplicados na realidade e sob supervisão do órgão responsável e que eventualmente aprova
esse tipo de trabalho.
Considerações Finais
BRANDI, Cesare. Teoria da Restauração. 2ª edição. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2004.
RESUMO
Este trabalho objetiva uma explanação histórica sobre o surgimento dos coretos, bem como
seu papel atual na composição do espaço urbano. Os coretos são mobiliários urbanos
frequentemente encontrados em praças, largos e jardins brasileiros. Além da função
ornamental, apresentam grande importância histórica e social. Sua difusão no Brasil esteve
diretamente ligada ao crescimento das organizações musicais e à expansão das linhas férreas
nas regiões interioranas, ocorridos entre os séculos XIX e XX. Atualmente, as apresentações
musicais e os pronunciamentos políticos, realizados dentro ou próximos aos coretos, não mais
fazem parte de uma tradição vívida. Porém, muitos coretos permanecem nas praças sem uso
específico e em situação de abandono, submetidos a todas as formas de degradação. Durante
a pesquisa, foram visitados cinco coretos de técnica construtiva similar – sendo um em Minas
Gerais e quatro no Rio de Janeiro – verificando-se o estado de conservação e as medidas
protetivas existentes. Notou-se que a falta de vínculos entre a população e os coretos torna a
tomada de medidas de preservação mais complexa. Deficiências na gestão do patrimônio
público também são um fator agravante para a recorrente má conservação desses mobiliários.
Contudo, os coretos são testemunhos de antigas tradições e carregam estilos e técnicas
construtivas diversas, as quais podem se perder caso não haja preservação.
Os coretos marcaram a história das praças do Brasil entre os séculos XIX e XX. São
elementos urbanos com função ornamental e de grande importância social. Também
conhecidos como ‘pavilhões de música’, estavam inicialmente ligados às apresentações
públicas de bandas militares, filarmônicas, serestas e às festividades religiosas. Além disso,
os espaços dos coretos costumavam abrigar pronunciamentos políticos para grande número
de pessoas. Tal tradição não é tão vívida nos dias atuais, contudo, muitos coretos
permanecem nas praças sem uso específico. A falta de aproveitamento desses mobiliários
urbanos pode ser uma das causas do mau estado de conservação em que geralmente se
encontram.
Os coretos, tão comuns no Brasil, são uma herança europeia. Portugal foi, de maneira
mais intensa, uma fonte de referências culturais do século XVI ao século XIX. Enquanto
colônia, absorvemos modismos em voga na metrópole, mesmo que tais modismos tenham
sido inspirados em outras culturas. Por outro lado, reinventamos as tendências a partir dos
nossos próprios conceitos e materiais disponíveis. As apresentações de bandas civis e
militares eram uma tradição muito forte em Portugal e, lá podem ser vistos coretos em grande
parte das cidades, assim como no Brasil. Sobre a chegada desses elementos ao país,
abordaremos posteriormente.
A origem dos coretos se confunde, em alguns momentos da história, com os pavilhões
e quiosques de jardim. Os coretos e os pavilhões são estruturalmente similares e
compartilham aplicabilidades, como a ornamentação do local e a contemplação do entorno.
Porém, através de diversas transformações sociais, houve a popularização dos pavilhões, os
quais tornaram-se mobiliário urbano de referência na área musical. (BUTTROS, 2017, p. 13-
15).
A palavra ‘coreto’ surgiu no século XIX em Portugal para denominar os já existentes
‘quiosques’ e ‘pavilhões’. Tal mudança de nome pode estar relacionada a esse novo conceito
de uso do objeto, surgido aos finais do século XVIII. A origem etimológica da palavra remete
ao italiano ‘coretto’, expressão que se associa com ‘tribuna’ e ‘coro da igreja’. Outra linha de
pensamento defende que o sufixo ‘eto’ quer dizer ‘pequeno’, portanto ‘pequeno coro’.
O coro da igreja é um local utilizado para apresentações musicais. A palavra ‘coro’
também remete a ‘canto’. Em francês, o coreto é chamado de ‘kiosque à musique’, que quer
dizer em português ‘quiosque de música’. Em inglês, a palavra usada é ‘bandstand’, na qual
‘band’ significa ‘banda’ e ‘stand’, neste caso, tem a ver com ‘palanque’, ‘pedestal’ ou ‘barraca’.
Vemos, portanto, que a função principal dos coretos é sugerida por seus próprios nomes: a
música. (CARVALHO, 2010, p. 2-6).
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Neste artigo, aborda-se uma breve trajetória do uso de coretos no mundo e no Brasil.
São descritos alguns materiais, modelos e estilos aplicados ao longo desse extenso percurso.
Em seguida, serão explanadas as justificativas aplicáveis para a proteção institucional desses
bens e suas implicações.
Como estudo de caso, tem-se cinco coretos da primeira metade do século XX, sendo
um deles em Ouro Preto – MG e os outros quatro na cidade do Rio de Janeiro. Esses coretos
possuem muitas similaridades estéticas e compartilham da mesma técnica construtiva. Pode-
se dizer que são réplicas com algumas variações de medidas, ornatos e cores. A partir desses
objetos, propõe-se uma análise das áreas de entorno e os tipos de uso feitos pela população.
Paralelamente, será investigada a existência de medidas protetivas institucionais e o estado
de conservação. Por fim, será possível discutir, para tais casos, a eficácia da proteção
institucional para a preservação e também o poder do vínculo das comunidades com os
coretos.
Pavilhões cobertos e com aberturas laterais são vistos desde a história antiga no
oriente. Na China, por exemplo, os grandes espaços assimetricamente ajardinados e a
presença de um quiosque são parte de uma tradição. A difusão desse elemento decorativo
na Europa está ligada a diversos fatores históricos. (RACABULTO, 2005, p. 5-23).
A partir do século XI, as Cruzadas1 - movimentos militares cristãos em direção à atual
Palestina - fizeram com que os europeus tivessem contato com as múltiplas culturas do
oriente. Como resultado, abriram-se rotas comerciais, como a Rota da Seda, a qual a China
era exportadora. A relação comercial entre Europa e Ásia Menor (local hoje majoritariamente
composto pela Turquia) cresceu de forma considerável. É justamente na região da Turquia
onde se observou a adoção de quiosques para áreas de relaxamento a partir do século XV.
Já no século, XVIII a chinoiserie2, evocação de elementos da cultura chinesa como
motivo ornamental, era uma moda na Europa. Um fator importante na propagação do uso de
pavilhões foi o jardim inglês, também chamado de ‘anglo-chinês’. Tal modelo foi levado à
França no final do século XVIII. A construção dos quiosques era feita em madeira ou pedra.
1 As expedições denominadas como ‘Cruzadas’ ocorreram entre os séculos XI e XIII a fim de se expandir o
cristianismo no Oriente.
2 A ‘chinoiserie’, também conhecida como ‘chinesice’ foi aplicada como motivo ornamental pictórico na Europa com
motivos fantásticos que se combinavam bem ao barroco e ao rococó. O Brasil também possui tal influência advinda
de Portugal. (LONGOBARDI, 2011).
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As composições estéticas variavam entre a inspiração tipicamente chinesa e os exemplares
com referências locais. Georges-Louis Le Rouge, arquiteto francês, publicou uma série de
pranchas de jardins anglo-chineses entre 1775 e 1788 num conjunto de 12 livros. Os
desenhos de Le Rouge evidenciam as tendências da época e retratam diversos tipos de
quiosques e pavilhões. (RACABULTO, 2005, p. 24-40).
A construção de jardins com preocupação paisagística e ornamental em residências
nobres tornou-se um costume. Na França, os pavilhões de jardim foram remodelados pela
frequência de uso. Abre-se espaço para as referências arquitetônicas da Grécia Antiga, as
quais sempre estiveram em vigência na história da arte do continente, porém com diferentes
roupagens. As influências do Neoclássico trouxeram os pavilhões circulares com colunatas,
inspirados nos antigos templos gregos e nas construções renascentistas. A função desses
objetos era a contemplação do jardim e o ócio.
O Templo do Amor, ou ‘Temple de l’amour’ é um pavilhão erguido entre 1777 e 1778
no jardim inglês Petit Tiranion do Palácio de Versalhes, na França. Projetado por Richard
Mique, trata-se de uma construção circular com colunas coríntias arrematadas por uma
cúpula. Há uma escultura de um cupido ao centro, clara referência à mitologia grega. Até
então, os pavilhões fixos são praticamente restritos aos jardins nobres de palácios e casarões.
(BUTTROS, 2017, p. 15-18).
A relação dos quiosques artísticos com a música surge na popularização dos modelos
de paisagísticos, sendo estes transferidos aos parques e praças públicas. A criação de novos
hábitos de sociabilidade se torna consequência da Revolução Francesa (1789-1799), a qual
também incentivou o sentimento de pertencimento popular ao local habitado. Através das
revoluções liberais contra as monarquias, os coretos se difundiram por toda a Europa,
inclusive em Portugal. Como resultado, é relatado que os coretos desta época eram móveis
ou desmontáveis, pois os pronunciamentos coletivos e as festividades não eram realizados
num só local. A apreciação musical de diferentes estilos passou a não estar restrita aos teatros
e casas de espetáculo.
A partir do século XIX, a expansão urbana trouxe novas concepções aos espaços
coletivos. O urbanismo enquanto ciência também surge nos oitocentos, após a primeira
Revolução Industrial (1760-1859). Devido às habitações insalubres e vias estreitas sem
saneamento, uma das vertentes buscava evitar aglomerações de edifícios, ampliar as vias e
ajardinar os espaços. Os centros de grandes cidades como Paris foram remodelados. O largo
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ou a praça central - que já havia sido frequentemente utilizada como um marco urbanístico
por muitos povos - agora torna-se um centro de vivência da cidade e é planejada para tal. A
praça passou a brigar atividades acessíveis de lazer, como apresentações musicais e falas
políticas. Criou-se um espaço perfeito para a fruição entre cidade e natureza.
No campo tecnológico, ocorreram avanços na siderurgia que apontaram a segunda
Revolução Industrial (1860-1959). A produção do aço foi uma descoberta que revolucionou o
mercado do transporte. Mais resistente que o ferro, o aço foi empregado na ampliação de
malhas ferroviárias. A aplicação do material permitiu vigas que vencessem grandes vãos na
construção civil, viabilizando obras de extensos galpões. Ademais, através das ferrovias foi
possível transportar elementos para a construção civil pré-fabricados, como escadas, pilares,
gradis, ornatos e coretos. Permitiu-se o acesso a estes equipamentos nas cidades do interior
com mais rapidez.
Produtos pré-fabricados poderiam ser encontrados em catálogos para encomenda.
Isto fez com que houvesse replicação de modelos e difusão rápida da arquitetura do ferro.
Entre os países que se destacaram nesse mercado estão a Bélgica e a Alemanha. Através
da ferrovia, materiais eram transportados para o interior dos continentes, inclusive para toda
a América. Portanto, modernização, dessa vez, não se concentrou apenas nos grandes
centros urbanos.
A primeira banda musical que se tem registro no Brasil surgiu em Mariana em 1774,
regida por Pedro Nolasco da Costa Ataíde. É provável que essa banda não tenha as
configurações como hoje conhecidas, até mesmo porque no período colonial não eram
permitidas organizações do gênero. (BATISTA, 2010).
A transferência da corte portuguesa ao Brasil em 1808 fez com que se ampliasse a
produção cultural. Foi criada a Academia Real Militar e, aos poucos, foram criadas escolas e
universidades. A partir de então, os estudos musicais foram facilitados. As bandas militares e
filarmônicas, tradicionais em Portugal, se formaram na nova sede de governo. Considerando-
se que nessa época ainda não havia sinal de rádio, a apreciação musical poderia ser feita
somente ao vivo (até a invenção do gramofone em 1888).
No município de Ouro Preto, a primeira banda surgiu no distrito de Cachoeira do
Campo em 1856 sob regência de Luís Tibúrcio. A banda Euterpe Cachoeirense, ainda em
atividade, foi fundada por Rodrigo de Figueiredo Murta. Sobre a Euterpe, vale considerar que
é proprietária de um coreto, o único de natureza privada implantado em vias públicas que se
Os coretos, na condição de mobiliários urbanos e parte das praças públicas, têm sua
manutenção sob responsabilidade municipal. As prefeituras, através dos seus setores de
limpeza urbana e obras de infraestrutura, devem exercer esse cuidado. Num caso divergente,
está o coreto do distrito ouro-pretano de Cachoeira do Campo, Minas Gerais. Esse coreto está
implantado no largo principal do distrito, ao lado da Igreja Matriz de Nossa Senhora de Nazaré.
O mobiliário urbano pertence à banda musical Euterpe Cachoeirense, sendo talvez o único
de natureza privada implantado em vias públicas no Brasil.
É sabido que a gestão municipal de bens públicos pode apresentar deficiências. Em
caso de escassez de recursos financeiros por parte das prefeituras, pode-se priorizar a
manutenção de serviços básicos como a educação e a saúde. Esperar que as praças atinjam
um grau elevado de degradação implica numa obra maior de revitalização. Obras grandes
movimentam mais recursos financeiros e podem fazer parte de interesses políticos. (Carta de
Juiz de Fora, 2010, p. 5-7).
A proteção institucionalizada também é aplicável aos coretos. O tombamento, medida
protetiva de bens materiais, consiste no registro legal e do valor de um bem cultural para a
sociedade. O objetivo principal desse ato público é a preservação. Determinam-se
responsabilidades dos poderes públicos (em instâncias municipais, estaduais e federais) em
manter a integridade do bem patrimonial. Isto implica, em tese, numa vigilância maior do bem
tombado e no uso mais frequente de medidas de conservação para a evitar que este seja
destruído ou descaracterizado.
Um caso emblemático foi a ação denominada “tombamento de catorze coretos”
realizado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (INEPAC), no Rio de Janeiro em 1985.
Tratavam-se dos últimos coretos presentes no município, exceto por dois que já possuíam
tombamento, todos no subúrbio carioca. Segundo a documentação disponibilizada pelo
INEPAC, as motivações do tombamento conjunto foram diversas. A primeira delas foi o clamor
da população. À exemplo, a associação do bairro São Cristóvão citou o coreto como
“patrimônio sentimental” em estado de depredação. O tombamento era visto como o primeiro
passo para que o coreto fosse restaurado e voltasse a funcionamento.
Durante o processo, pensou-se que o projeto serviria de incentivo às bandas de música
ainda existentes. Foi ressaltado também que esse elemento urbano era parte da
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caracterização da cidade. Paralelamente, nesta época, a Fundação Rio lançou o projeto
“Balançando o Coreto”. Entre julho e setembro de 1985, ocorreram festas com apresentações
musicais em grande parte dos mobiliários envolvidos. A iniciativa buscava reforçar os vínculos
entre a comunidade e os coretos. (INEPAC, 1985).
Nota-se que, no ano de 1985, já existiam discussões e aplicações do conceito
atualmente conhecido como “paisagem cultural”, adotado pela UNESCO em 1992. O coreto
era um elemento indispensável no imaginário da população em relação às praças e jardins.
Observa-se também que o valor arquitetônico desses coretos foi pouco ressaltado como
justificativa de tombamento. Isto pode ter relação com a falta de estudos sobre as tipologias
de coreto existentes.
Como estudo de caso, escolheu-se cinco coretos. Quatro deles estão localizados na
cidade do Rio de Janeiro: o coreto do Jardim do Méier, os coretos gêmeos do Santuário de
Nossa Senhora da Penha de França e o coreto da Barão da Taquara, no bairro Praça Seca.
O último encontra-se na Praça Cesário Alvim, na cidade de Ouro Preto, Minas Gerais.
Foram realizadas visitas in loco para um levantamento fotográfico detalhado da área
de entorno de cada coreto, bem como dos coretos em si e seus principais danos físicos.
Também mediu-se cada um deles. As visitas ocorreram nos meses de outubro, novembro e
dezembro de 2016. Previamente, pesquisou-se, através de livros e órgãos responsáveis, a
datação de cada objeto e a existência de medidas protetivas institucionais. Na abordagem de
cada coreto, optou-se pela ordem cronológica entre os que estão localizados no Rio de
Janeiro e posteriormente o de Ouro Preto.
Esses coretos partilham muitas semelhanças estéticas e construtivas. São coretos
hexagonais de base elevada em alvenaria argamassada. Há um pilarete em cada vértice da
base. Os pilares são em madeira, assim como o guarda-corpo, o qual é fechado com
“balaústres” recortados. Os ornatos são bem similares, principalmente os círculos com um “x”
ao centro, localizados na parte superior de cada pilar. De cada vértice do forro partem
pequenas hastes com pinhas invertidas e os lambrequins nos beirais têm forma triangular. A
cobertura é feita em chapas metálicas e há arremate com pináculo.
O primeiro coreto é o do Jardim do Méier (zona norte), datado de 1919. No livro “Méier
e Engenho de Dentro”, na série de bairros do Rio de Janeiro da editora Fraiha (2009), o projeto
do coreto (fig. 1) está associado ao nome de Pedro Fernandes Vianna da Silva, engenheiro.
O coreto do Méier reflete as condições de seu jardim. Este não apresentava sujidades
acumuladas, tampouco perda de ornatos. Os danos mais comuns encontrados foram a perda
de camada pictórica em pontos dispersos e deposição de fezes de pombos. Parte da porta da
base estava amassada. De maneira geral, considerou-se um bom estado de conservação
para o objeto.
Os coretos seguintes estão no Santuário de Nossa Senhora da Penha de França (zona
norte), no Largo dos Romeiros, construídos aos pés da escadaria da igreja em 1923. Os
coretos podem ser considerados gêmeos (fig. 2), pois possuem a mesma morfologia, cores e
medidas. Estes não possuem tombamento individual, contudo, o Santuário é tombado pelo
município. A última reforma ocorreu em 2013, realizada pela prefeitura. Os membros da
paróquia mantém os coretos trancados, mesmo sendo públicos. Não é feito uso cotidiano
pelos visitantes do local. Os seguranças responsáveis alegaram perigo para crianças, pois os
coretos têm a base alta (1,83 metros) e estão próximos a um dos mirantes do santuário.
Observou-se perda de camada pictórica generalizada nos pilares dos coretos gêmeos,
assim como o esmaecimento das cores. Um deles estava sendo utilizado como depósito.
Trata-se de um local de atividade religiosa, constante peregrinação e visitação, portanto,
existe vigilância. Contudo, os coretos estão sujeitos à degradação por desuso. Considerou-se
o estado de conservação dos coretos como regular.
A Praça Seca recebeu o coreto que ficava na Praça 11 de Junho ao final de 1928,
durante o processo de ajardinamento que se estende até princípios de 1929 (fig. 3). Portanto,
não se soube a datação precisa desse mobiliário. Este é tombado pelo INEPAC desde 1985,
assim como o coreto do Méier. A última reforma ocorreu em 2008, sendo a mais antiga entre
os coretos analisados. Durante a visita, observou-se pouco uso da praça, a qual possui a
pavimentação e estrutura precários. Em dias de chuva, há acúmulo de poças d’água, o que
dificulta o trânsito de pessoas no local.
À respeito dos danos observados no coreto de Ouro Preto, notou-se perda de camada
pictórica em diversas áreas, esmaecimento da cor, perda de ornatos (balaústres do guarda-
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Carta de Juiz de Fora, a qual aborda os jardins históricos, cita como um dos
principais fatores de degradação desses espaços:
Isto indica que alguns dos fatores condicionantes sobre o estado de conservação das
praças são o vínculo com a comunidade e a manutenção por parte do poder público. As
praças, locais abertos, estão sujeitas às adversidades ambientais e antrópicas. A espera por
um alto nível de degradação para a realização de uma reforma implica em um maior gasto
financeiro e na substituição de peças do mobiliário. A substituição acarreta na perda de
matéria “original”, testemunho do estilo e da técnica construtiva de uma época. As
substituições nem sempre são feitas com peças similares em forma e técnica.
O uso frequente dos jardins e praças é uma forma de pressão ao poder público para
a realização de manutenções. É também uma maneira de exercer vigilância, além dos órgãos
de proteção como polícias e guardas municipais. O vandalismo de mobiliários urbanos
também é um fator de degradação relevante. Os largos, praças e jardins, geralmente espaços
amplos, são de grande interesse público. Muitos desses locais são sacrificados em
modificações de vias urbanas. Empreendimentos imobiliários em seu entorno também podem
deturpar a função do ambiente.
Os coretos, enquanto mobiliários urbanos, estão sujeitos aos fatores de degradação
citados. Um agravante é a falta de uso específico para esse elemento. Herança de uma época
em que as praças abrigavam frequentes eventos de lazer, muitos coretos persistem sem usos
e em estado de conservação ruim.
A partir dos exemplos mencionados, pode-se entender que a eficácia do tombamento
depende da relação social do objeto com a sociedade. O processo de tombamento deve ser
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aberto à comunidade, como citado na Carta de Amsterdã (1975). A vontade coletiva torna
mais provável a ocorrência de manutenções num bem. O uso faz com que o bem precise de
manutenções. Por outro lado, o cuidado por parte dos poderes públicos torna o bem mais
convidativo ao uso.
A bibliografia brasileira sobre coretos é escassa. Revela-se que as peculiaridades
arquitetônicas dos vários coretos precisam ser estudadas e catalogadas como uma das
formas de preservação e valorização desses bens.
RESUMO
O trabalho apresentado visa demonstrar a democratização do campo do patrimônio a partir da
participação popular no desenvolvimento do projeto de restauro da Cada de Câmara e Cadeia de
Mariana. A partir da possibilidade de intervenção tornou-se necessário entender as relações sociais
estabelecidas na Câmara e no cenário no qual a instituição está inserida, a Praça Minas Gerais. A
investigação iniciou pelo entendimento dos fatores que tornam a Casa de Câmara e Cadeia de
Mariana relevante sob o aspecto histórico-cultural. O estudo é fundamentado ainda no atual conceito
atribuído ao termo “patrimônio” e na teoria de valores proposta por Aloïs Riegl e reafirmada pela Carta
de Burra do ICOMOS da Austrália. E parte do pressuposto que qualquer processo de intervenção em
um bem patrimonial deve ir além da estrutura física, sendo obrigatório um estudo sobre os valores
atribuídos ao bem por diversos segmentos da sociedade, e não mais apenas pelos técnicos.
A Casa de Câmara e Cadeia de Mariana teve diferentes endereços até que a sede
conhecida atualmente fosse construída. Segundo Fonseca (1998, p. 181) em várias
ocasiões, os camaristas queixaram à Coroa, da precariedade de suas instalações, das
sucessivas enchentes do Ribeirão do Carmo, principalmente as de 1737 e 1743, o que
dificultava ainda mais a escolha de “cazas” que pudessem servir às funções públicas.
O presente estudo dos valores atribuídos à Câmara de Mariana teve início a partir da
percepção da insuficiência do espaço físico para abrigar todas as atividades desenvolvidas
pela instituição e da evidente necessidade de restauro. Com a possibilidade de intervenção
tornou-se necessário entender as relações sociais estabelecidas na Câmara e no cenário no
qual a instituição está inserida, a Praça Minas Gerais.
O estudo realizado de Randall Manson, publicado pelo Getty Conservation Institute, vem
nos auxiliar a realizar a “leitura” dos valores atribuídos a um bem patrimonial. O
planejamento e a gestão encontram um triplo desafio, primeiro em identificar todos os
valores do patrimônio em questão, seguido da descrição destes valores e por fim, como
integrá-los e classificá-los, ou seja, criar uma espécie de ranque de prioridades destes
valores. Vale ressalva, que a maior dificuldade se dá na presença de valores conflitantes, o
que exige o desafio da não sobreposição. A metodologia proposta para avaliar a
significância cultural e os valores subdivide em três etapas, a primeira de identificação e
descrição dos valores que define os objetivos e os agentes envolvidos, ou seja, as partes
interessadas “stakeholders”, culminando em um local de descrição e documentação que se
distribui para a segunda etapa, de avaliação e análise, que considera os condicionantes
físicos, o contexto da gestão e principalmente os significados e valores culturais em um
conjunto integrado para a avaliação; por fim, evoluem para a terceira etapa, as respostas,
que estabelece políticas, fixa objetivos, desenvolve estratégias e sistematiza e prepara o
plano de ação. Esta metodologia envolve o procedimento de acompanhar, revisar e
examinar as etapas descritas durante todo o processo. Desta forma, as tarefas envolvem:
identificar, elaborar/descrever, declarar/revelar, tendo como ferramentas a consulta das
partes interessadas e envolvidas e a busca por métodos de análise (econômicos, culturais,
etc), trabalhos em grupos; onde ambos culminarão na integração das avaliações e
estabelecerão as políticas correlatas entre os valores e os recursos físicos, baseando-se no
princípio da sustentabilidade e, portanto, orientarão as tomadas de decisões.
Atualmente o prédio da Câmara é utilizado pela parte administrativa da Câmara, além dos
serviços de apoio como recepção, faxina, cozinha e gerais. Há ainda uma sala para o
presidente da Casa, com uma antessala para sua secretária. O plenário onde se realizam as
reuniões ordinárias, extraordinárias e sessões solenes, com uma sala anexa, utilizada,
principalmente para as reuniões de comissão e outras reuniões de vereadores.
A limitação do espaço físico permite apenas a sala para o presidente da Câmara; os demais
vereadores não possuem salas dentro do prédio da Câmara. Este fato levou, em 2009, à
decisão de alugar dez imóveis na cidade, para que cada um deles pudesse ser utilizado por
um vereador, como gabinete parlamentar.
Havia ainda outro agravante, uma notificação do Ministério Público, solicitando providências
quanto ao estado físico do prédio e orientando a restauração. Segundo relatório de vistoria
técnica do IPHAN, emitido em 24 de novembro de 2009, o prédio apresenta vários
problemas na sua estrutura. A partir desse cenário e do alto custo da manutenção dos
aluguéis surgiu a ideia, que é o ponto fundamental deste trabalho, de criar uma forma de
reunir todos os vereadores em um só espaço. Essa necessidade já podia ser percebida nas
conversas entre os próprios edis e entre os funcionários da Casa.
Sendo assim, definimos os grupos que deveriam representar a sociedade. Iniciamos por
aqueles que utilizam o prédio como local de trabalho e, portanto, possuem um grande
vínculo com o espaço: os vereadores e funcionários administrativos da Casa. Para esse
grupo definimos o método ZOPP para nos orientar.
O segundo grupo de interesse foi a sociedade de Mariana, representada por três subgrupos:
os moradores do entorno da Câmara, as pessoas que frequentemente acompanham as
reuniões de trabalho da Câmara e o subgrupo que chamamos de agentes de patrimônio,
composto por pessoas que possuem vínculo com a questão do patrimônio, seja através de
estudo ou como forma de trabalho. Para este grupo definimos o método conhecido como
Mapa Mental.
O nosso terceiro grupo selecionado foi composto por turistas, e para estes, trabalhamos
com a aplicação de um questionário com duas perguntas descritivas. Nosso objetivo foi
analisar se o prédio da Câmara é relevante como ponto turístico.
Nesta fase dos trabalhos adotamos o método ZOPP como ferramenta de trabalho. ZOPP é
uma sigla alemã que significa Ziel (objetivos), Orientierte (orientado), Projekt (projeto) e
Planung (planejamento), ou seja, planejamento de projeto orientado por objetivos.
Em síntese, podemos dizer que os problemas levantados durante a realização das oficinas
de diagnóstico podem ser listados e organizados em grupos, o primeiro diz respeito às
condições físicas do prédio da Câmara Municipal de Mariana, aspectos relevantes
apontados pelos participantes apontam: a falta espaço interno do prédio (insuficiente e
inadequado para instalação dos gabinetes dos vereadores); instalações elétricas e
sanitárias danificadas, colocando o edifício em situação de risco principalmente risco de
incêndio; o telhado danificado e infiltrações.
A partir desse consenso foram apresentadas três possibilidades de modificação, com vistas
a solucionar o problema central – inadequação do espaço da Casa de Câmara e Cadeia de
Mariana às necessidades do Poder Legislativo. Nessa fase do trabalho, a orientação
recebida do mediador do grupo, era que a cada sugestão apresentada, os demais
participantes deveriam discutir quatro pontos positivos e quatro pontos negativos inerentes a
ela.
A alternativa dois aponta a mudança dos gabinetes parlamentares para o novo prédio que
está sendo construído para atender a Prefeitura Municipal de Mariana, no bairro São
Cristovão, uma vez que, durante a legislatura 2005-2008 o poder executivo chegou a propor
que os três poderes: legislativo, executivo e judiciário, fossem transferidos para este novo
prédio.
E a alternativa três aponta para a restauração de um dos imóveis que o município possui no
centro histórico para abrigar os gabinetes parlamentares. Os imóveis apontados foram o
Casarão dos Morais localizado na Praça da Sé ou o casarão da Rua Direita.
Ressaltamos ainda que tanto a segunda quanto a terceira alternativas são baseadas no fato
de levar, para esses prédios, os gabinetes parlamentares e realizar a construção de um
auditório maior que o existente no prédio Casa de Câmara e Cadeia. Parte das atividades
administrativas hoje desenvolvidas na Câmara, assim como a sala do Presidente da Casa
continuariam da mesma forma que hoje.
O trabalho de campo foi realizado no período de um mês, quando tivemos contato direto
com os entrevistados. A amostra total é composta por 25 indivíduos segmentados da
seguinte forma: 10 moradores da Rua Dom Silvério (entorno); 10 pessoas que
frequentemente acompanham as reuniões da Câmara e 05 agentes de patrimônio.
Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 130) aponta a metodologia para análise e interpretação
dos mapas mentais que tem como parâmetros: a interpretação quanto à forma de
representação dos elementos na imagem; a distribuição dos elementos da imagem, quanto
à especificação dos ícones (pela representação de elementos da paisagem natural, da
paisagem construída, dos elementos móveis e humanos) e, por último, a apresentação de
outros aspectos ou particularidades. O resultado da aplicação dessas interpretações nos
mapas mentais, aliados a uma abordagem fenomenológica do espaço, revelam uma nova
forma de abordagem, que tem o intuito de contribuir nas análises espaciais, de forma a
compreender a lógica dos atores, desde as aspirações individuais aos sistemas de valores
dos grupos sociais.
Moradores da Frequentadores
Agentes de
Rua Dom das reuniões da TOTAL
Patrimônio
Silvério Câmara
Total
17 56,67% 17 56,67% 7 46,67% 41 54,67%
Geral
A partir da nossa análise, pudemos observar a predominância dos ícones em todos grupos,
seguido da predominância das letras. A representação por meio de mapa foi considerada
pequena; isso se deve ao fato de termos solicitado às pessoas que representassem a Praça
Minas Gerais, diferente de outros trabalhos que utilizam a técnica de mapa mental, mas têm
como objeto de estudo um bairro ou uma cidade, nos quais se espera uma recorrência de
representação de mapas mais significativa.
Neste item Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 136) diz que a partir da forma, verificou-se
que as representações diferiam também quanto à disposição da imagem. Assim identificou
alguns aspectos que classificou:
Nesta interpretação, Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 143) especificou os ícones que
compõem as imagens, em quatro grupos:
São Jorge
Outros
Cemitério 0 0 1 10% 0 0 1 4%
Elementos
móveis
Transporte
0 0 0 0 0 0 0 0
terrestre
Outras formas
0 0 0 0 0 0 0 0
de transporte
Elementos
humanos
Homem, mulher
0 0 0 0 0 0 0 0
e crianças
Tabela 3 Mapas Mentais – Especificação do ícones
Fonte: CARVALHO, 2012, p. 110
Desta forma, podemos observar que poucos foram os ícones que integram o item ‘paisagem
natural’. Esse aspecto foi reforçado durante as entrevistas. Nos depoimentos o foco de
Quanto ao pelourinho, podemos afirmar que sua representatividade, na totalidade, foi baixa
(44%), se comparada com a representação dos outros elementos. Na totalidade, as Igrejas
obtiveram uma representatividade de 96%, a Câmara de 76%, a Praça de 64% e as ruas de
60%. O pelourinho não é original desta Praça, foi montado na Praça em 16 de julho de
1981, segundo texto afixado no monumento.
Interessante analisar ainda que não houve representação de nenhum elemento humano por
nenhum dos entrevistados, apesar de nas entrevistas as pessoas reconhecerem a Praça
como espaço de uso. Porém o uso frequentemente relatado refere-se a datas específicas,
comemorações pelo aniversário da cidade, evento do Dia de Minas e procissões.
Após toda essa análise podemos concluir que há, pelo menos, um traço comum em todas
as entrevistas, independente do grupo de entrevistas a qual pertença: a beleza da Praça
Minas Gerais. Ficou claro, para nós, que a população reconhece esse espaço como
detentor de uma beleza singular. O caráter etéreo do espaço, de algo que eleva
espiritualmente, foi fortemente destacado nas entrevistas.
Para trabalhar o grupo dos turistas, optamos por um questionário com uma pergunta central:
“quais são os pontos turísticos de Mariana?”. Tínhamos por objetivo avaliar a relevância da
Câmara Municipal de Mariana como ponto turístico. Por isso, optamos por uma questão
‘aberta’; entendíamos que a resposta deveria ser fornecida de forma espontânea.
A amostra foi composta por quarenta entrevistados. A aplicação da pesquisa foi realizada no
período de 13 a 15 de janeiro de 2012 sendo, os dias da semana respectivamente, sexta–
feira, sábado e domingo. Os locais de abordagem dos turistas foram: espaço em frente à
Igreja da Sé, na Rua Direita, Praças Minas Gerais e Gomes Freire.
A partir desta percepção surge um novo desafio para o nosso trabalho: como conciliar os
usos dos espaços no projeto de intervenção no prédio?
Transferir as funções da Câmara para outro endereço, como foi aventado no decorrer do
processo, seria o mesmo que esvaziar o prédio de significado, provocando-lhe um corte
abrupto na história.
Porém para garantirmos essa simbologia na sua completude, a atualidade exige algumas
adaptações. Precisamos ampliar a estrutura física da Câmara de forma que o valor
simbólico seja mantido, conciliando os usos – local de trabalho e espaço turístico - e, sem
permitir, no entanto, que a construção atual seja diminuída pela concorrência visual com
novos elementos arquitetônicos ao seu redor.
O projeto de intervenção arquitetônica foi elaborado pelos arquitetos Professor Doutor Flávio
de Lemos Carsalade, Doutor Benedito Tadeu de Oliveira, Mestre Bernardo Nogueira
Capute, Gustavo Kamino, sob a coordenação do Professor Doutor Leonardo Barci Castriota.
Com a transferência de alguns serviços da Câmara, hoje realizados no prédio histórico, para
a nova edificação conseguiremos liberar algumas salas do prédio histórico, principalmente
as salas que já foram as celas da cadeia. Desta forma, atenderemos a outro ponto
levantado durante as entrevistas: o reconhecimento da Câmara como ponto turístico. A
proposta é criar no segundo pavimento do prédio histórico uma exposição permanente que
retrate a história da Câmara, e no primeiro pavimento, uma exposição permanente que
retrate a história da cadeia.
Figura 4 Fachada Principal da Câmara Municipal de Mariana com o 1º pavimento do Anexo ao fundo
CARVALHO, 2012, p. 158
Apesar dos avanços na discussão dos valores no campo do patrimônio cultural para
o Getty Conservation Institute (GCI), citado por Castriota (2009, p. 108 e 109), a
ênfase dada às três perspectivas encontradas no campo do patrimônio, a
“conservação física”, o “contexto de gestão” e a “significância cultural e valores
sociais”, ainda encontram-se em desequilíbrio, com claro predomínio as duas
primeiras. Para o GCI, cabe reconhecer que, infelizmente, as pesquisas na área da
conservação ainda estão centradas no aspecto físico, raramente envolvendo as
discussões dos valores entorno do bem. O presente estudo parte exatamente da
perspectiva que possui menor peso na maioria das outras pesquisas, a “significância
cultural e valores sociais”.
AUSTRALIA ICOMOS. The Burra Charter: The Australia ICOMOS Charter for Places
of Cultural Significance 1999. Burwood, Australia: AUSTRALIA ICOMOS, 2000.
Disponível em < http://australia.icomos.org>. Acesso em 05 de nov. de 2011.
KANTOR, Iris. A Leal Vila de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo. In: TERMO de
Mariana: História e documentação. Mariana: Ed. UFOP, 1998. p. 147 – 148.
RIEGL, Aloïs. O culto moderno dos monumentos: sua essência e sua gênese./ Aloï
Rielg; Tradução Elaine Ribeiro Peixoto e Albertina Vicentine. Goiânia: Ed. UCG,
2006.
RESUMO
Este trabalho se insere nos estudos que tratam da participação social nas políticas públicas,
especificamente relacionado à preservação de Sítios Históricos Urbanos no Brasil. A participação
social nas políticas públicas é um tema cada vez mais estudado e discutido, num momento de crise
do modelo de representação política que ocorre no contexto nacional e internacional, com
desconfiança por parte dos cidadãos em relação às instituições políticas tradicionais e ao
esvaziamento dos partidos políticos. Ao mesmo tempo, a população reivindica, cada vez mais, seu
direito de participar de decisões que afetam direta ou indiretamente sua vida. Para a preservação do
patrimônio, a participação social é condição indispensável, entretanto, não é efetiva na política
patrimonial do Brasil. A ausência de participação acarreta consequências negativas na preservação
do patrimônio. A população, em geral, não participa do processo, conhece pouco sobre o patrimônio
e, por isso, não se sente comprometida, não se relaciona com o bem tombado e não lhe confere o
valor esperado. Não há instrumentos para participação social definidos na política de proteção
patrimonial, por isso a participação se dá de diferentes formas e com diferentes graus de
envolvimento, a depender de cada projeto e de seus gestores. Nesta pesquisa, estabelece-se como
recorte temporal a Constituição Federal de 1988, por esta ser considerada a Constituição Cidadã, que
possibilita a criação de diversos espaços e instrumentos para participação da sociedade nas decisões
relacionadas às políticas públicas. Como recorte espacial, estabelece-se o Sítio Histórico Urbano, por
ser a cidade o lugar propício ao exercício da democracia e os sítios históricos, por ser interesse do
estudo o patrimônio entendido como conjunto, e não edificações ou monumentos isolados. A
pesquisa objetiva identificar estratégias para participação social na preservação de Sítios Históricos
Urbanos. Para isso, adota o Sítio Histórico de Santa Leopoldina, um dos cinco Sítios Históricos do
estado do Espírito Santo, tombado pelo Conselho Estadual de Cultura em 1983, como objeto
concreto de experimentação de metodologia participativa visando o estabelecimento de estratégias
para participação social na preservação do sítio. Para isso, realiza-se revisão bibliográfica sobre a
participação social, seus instrumentos e metodologias; análise do Sítio Histórico de Santa Leopoldina
no campo urbanístico-ambiental, socioeconômico e da gestão urbana e do sítio histórico. A
participação social nas políticas públicas com qualidade é uma questão complexa e por isso não vai
Trata-se, neste artigo, do sítio histórico urbano, tal como definido na Carta de Petrópolis de
1987, como parte integrante do contexto urbano e em processo de transformação. Para
tratar da participação social, o recorte do urbano justifica-se por ser a cidade o lugar propício
O objetivo geral deste artigo é identificar estratégias para preservação de sítios históricos
urbanos com a participação social, com experimento de metodologia participativa no sítio
histórico de Santa Leopoldina. Metodologicamente, o artigo contempla investigação
bibliográfica a partir de documentos de referência da política patrimonial. Em relação ao sítio
histórico de Santa Leopoldina, analisa-se o processo de tombamento, a resolução que o
regulamenta e a resolução que trata das diretrizes para intervenção na Área de Proteção do
Ambiente Cultural do Sítio e do Plano Diretor Municipal.
Quadro 1- Estratégias para preservação do patrimônio com a participação social identificadas nas
Cartas Patrimoniais
A primeira das estratégias identificada nas cartas patrimoniais é a integração à vida social.
Recomenda-se na Carta de Atenas, de 1931, “[...] que se mantenha uma utilização dos
monumentos, que assegure a continuidade de sua vida, destinando-os sempre a finalidades
que respeitem o seu caráter histórico ou artístico” (Carta de Atenas, 1931, p. 1).
A educação patrimonial é outra estratégia preservação com participação social presente nas
cartas. O Compromisso de Brasília, de 1970, indica a necessidade de inclusão da educação
patrimonial nos currículos escolares de nível primário, médio e superior. Da mesma forma, a
Declaração de Amsterdã, de 1975, ressalta a necessidade da apreciação do patrimônio pelo
Outra estratégia que contribui para a preservação do patrimônio com a participação social é
a informação. A partir da leitura das Normas de Quito (1967), entende-se que a informação
está associada à educação patrimonial e ambas contribuem para a formação cívica
necessária para o interesse social pela revalorização do patrimônio como bem público.
A última das estratégias para preservação do patrimônio com participação social identificada
nas cartas patrimoniais é a integração da preservação ao planejamento urbano. O
Compromisso de Salvador (1971), por exemplo, recomenda que planos diretores urbanos
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que afetam áreas de interesse cultural contem com orientações do IPHAN e dos órgãos
estaduais e municipais da área.
Fonte:
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/9a/EspiritoSanto_Municip_SantaLeopoldina.svg,
acesso em 20/06/2017.
A partir da leitura do processo de tombamento de Santa Leopoldina, destacam-se algumas
informações. O processo é iniciado a partir de Ofício da Prefeitura Municipal de Santa
Leopoldina ao Conselho Estadual de Cultura - CEC/Secult, de 10/04/1980, em que se
Em 2003, o CEC aprova a Resolução nº 003/2010, que “dispõe sobre a regulamentação das
diretrizes para intervenções nos espaços públicos, lotes e edificações integrantes da Área
de Proteção do Ambiente Cultural de Santa Leopoldina” (ESPÍRITO SANTO, 2010, p.1).
Esta resolução delimita a Área de Proteção do Ambiente Cultural – APAC de Santa
Leopoldina, subdividida em “Área de Tombamento”, onde estão localizados os imóveis
tombados; a “Área de Vizinhança do Tombamento”, localizada no entorno do conjunto
tombado, apresentada na Figura 2. A resolução define os tipos de uso permitidos nas áreas
delimitadas e os índices urbanísticos.
Queiroz (2013, p. 74) destaca “[...] que a política de preservação do patrimônio cultural, para
o constituinte, deve ser participativa e aberta a todos os setores da sociedade [...]” e
apresenta tentativas da SECULT de incentivar a participação popular nas ações de
preservação do sítio histórico de Santa Leopoldina, como a realização do “ 1º Seminário de
Educação Patrimonial no Sítio Histórico de Santa Leopoldina” e a segunda edição do evento
em dezembro de 2012. O autor participa dos eventos e observa a baixa participação no
primeiro evento, que conta apenas com três pessoas, e o segundo tem maior participação,
com 20 pessoas. O autor observa, entretanto, que em ambos os eventos a participação da
população restringe-se a ser ouvinte dos palestrantes.
Para o experimento do roteiro metodológico, são constituídos dois grupos para a realização
das atividades, o Grupo Motor, composto por uma equipe mista de pessoas interessadas,
vizinhos, voluntários e técnicos; e a Comissão de Seguimento, composta por representantes
institucionais, associações representativas e os integrantes do Grupo Motor.
Grupo Motor
primeiras primeiras ideias devem ser colocadas no quadro.
ideias
Roteiro para entrevista apresentado no Apêndice
Entrevistas Grupo Motor
A.
Mapeamento dos diferentes atores sociais
Mapa de presentes no território. (Instituições,
Grupo Motor
relações organizações e sociedade não organizada) e das
conexões existentes entre tais atores.
Deriva Grupo Motor Deriva, passeio, realizado com Grupo Motor para
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ouvir dos participantes um pouco das histórias do
sítio histórico de Santa Leopoldina in loco
Comissão Etapa final do diagnóstico. Apresentação dos
Devoluções
do resultados das atividades anteriores
Criativas
Seguimento
Aspectos positivos internos (forças) e externos
Comissão
(oportunidades) e aspectos negativos internos
Matriz FOFA do
(fraquezas) e externos (ameaças). Quadro
Seguimento
apresentado no Apêndice A.
Técnica para construção de propostas que
Matriz satisfaçam um conjunto de ações mais denso e
Grupo Motor
Reflexiva extenso, aglutina realidades grupais com mais
intensidade em torno de um projeto comum.
Técnica das Perguntas que formulamos na hora de intervir
nove Grupo Motor sobre a realidade e que ajudam a elaborar as
questões estratégias. Quadro apresentado no Apêndice A.
Estabelecer eixo principal das estratégias.
Expressar em uma frase que seja capaz de
Propostas
• Linha do tempo
Uma das dificuldades encontradas é a sequência temporal dos acontecimentos. Por isso, os
acontecimentos são divididos em três colunas: fatos considerados antigos, fatos gerais
relacionados ao Sítio Histórico, fatos lembrados como mais recentes.
Percorrendo-se as ruas dos Sítio Histórico, é possível observar in loco e ouvir mais uma vez
dos participantes alguns problemas do local, entre eles o lixo nas ruas, as calçadas
estreitas, os grandes letreiros e fios que causam poluição visual nas fachadas. É possível
confirmar a vivacidade do sítio histórico e que a maior parte dos imóveis se mantêm em uso,
mesmo que algumas edificações com uso residencial tenham apenas uso parcial ou
esporádico.
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No percurso, os participantes também relatam algumas ocasiões em que a manifestação
dos moradores contribui, pontualmente, para a preservação do sítio histórico de Santa
Leopoldina. Como quando empresa concessionária de energia elétrica na cidade, realiza a
instalação de medidores de energia em local exposto da fachada das edificações. Quando
algum morador se manifesta e solicita a instalação em local mais discreto, costuma ser
atendido.
Para a realização da atividade, comparecem apenas três pessoas, dois deles participantes
do Grupo Motor, Francyellen Siller e Jefferson Rodrigues, e um convidado. Mesmo com um
grupo pequeno e a ausência de representantes institucionais, são realizadas as atividades
previstas. O resultado da atividade é apresentado no Quadro 5 em que são reproduzidas as
informações inseridas na matriz e discutidas ao longo da realização da atividade.
Uma das fraquezas identificadas é a falta de participação da comunidade, o que pode ser
exemplificado com o número mínimo de pessoas presentes, mesmo tendo sido convidados
todos os secretários municipais e todos os proprietários de imóveis tombados, além das
pessoas convidadas a participar da atividade pelo Grupo Motor. Os participantes Jefferson e
Francyellen relatam que a única atividade relacionada à preservação do sítio histórico de
Santa Leopoldina em que a comunidade esteve presente e participou foi uma reunião
realizada pela SECULT para divulgação de editais. Segundo eles, houve participação por
haver possibilidade de se obter recursos com os editais. Ainda assim, apesar da presença
de muitas pessoas, poucos submeterem efetivamente projetos para concorrer ao edital.
A etapa de propostas se inicia com três atividades propostas ao Grupo Motor. Com a matriz
reflexiva e a técnica das nove questões pretende-se identificar as estratégias para
preservação do sítio histórico de Santa Leopoldina com participação social e, além disso,
responder questões relacionadas a cada uma das estratégias: O quê? Por quê? Para quê?
Para quem? Onde? Como? Quando? Com que? Quanto?
A secretária relata a dificuldade de fazer com que a população participe de ações relativas a
preservação do sítio histórico e confirma o fato relatado durante a realização da Matriz
FOFA pelos participantes, de que a única atividade relacionada à preservação do sítio
histórico de Santa Leopoldina em que a comunidade esteve presente e participou foi uma
reunião realizada pela SECULT para divulgação de editais.
QUESTÕES
ESTRATÉGIAS
O quê? Por quê? Para quê? Para quem? Onde? Como?
Há grande fluxo
Possibilitar que quem
apenas de
hoje apenas passa
passagem pela
Criar atrativo em Santa pela cidade, pare Visitantes, comércio, Sítio Histórico de
Criar atrativo cidade, que só causa
Leopoldina aqui e fique algum turismo Santa Leopoldina
transtornos e não
tempo, usufrua da
traz ganhos para o
cidade
município
Atualmente grande Para que a
Conscientização sobre a
parte da população população conheça a Município de Santa Cartilha educativa
regulamentação (PDM, APAC, População
desconhece a legislação e passe a Leopoldina para a população
tombamento)
legislação respeitá-la
A educação é uma
Principalmente
das formas Para
estudantes, que
identificadas para conscientização da Escolas do Município
Educação patrimonial propagariam o
conscientização da população sobre o de Santa Leipolidna
conhecimento para
populção sobre o patrimônio da cidade
suas famílias
valor do patrimônio
Para melhorar a
No último edital da
Oficina de capacitação para qualidade dos
SECULT diversas Município de Santa
elaboração de projetos para projetos submetidos População local
projetos foram Leopoldina
editais de cultura e turismo para concorrer a
recusados
recursos de editais
Atualmente a
necessidade de
preservação do Sítio Para que a
Conscientização do poder Histórico de Santa preservação seja Secretários Município de Santa
público sobre a preservação Leopoldina não é uma das diretrizes Municipais Leopoldina
consenso entre os da política pública
secretarios
municipais
De uma forma geral, avalia-se como positivo o experimento realizado em Santa Leopoldina.
É possível aplicar o roteiro metodológico proposto, obtendo-se informações a respeito do
sítio histórico de Santa Leopoldina não registradas nos documentos técnicos institucionais e,
assim, cumpre-se o objetivo principal da realização de experimentação de metodologia
participativa, que é ouvir cidadãos. Os participantes do Grupo Motor são os protagonistas
nas atividades e a mediadora tenta intervir o mínimo possível, com informações técnicas,
realizando somente a condução da atividade.
Uma das hipóteses para a falta de participação social em Santa Leopoldina, levantada
durante as atividades do roteiro metodológico, é a diversidade da população de Santa
Leopoldina. A cidade se constitui a partir de processo de colonização por imigrantes
europeus de diversas procedências, conforme consta no processo de tombamento. Neste
consta que, em 1860, vivem em Santa Leopoldina 232 famílias de colonos, vindos de
diversas regiões.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A defesa da participação social como pressuposto para o alcance efetivo da salvaguarda de
bens patrimoniais, reconhecida nas Cartas Patrimoniais, documentos de referência para
políticas preservacionistas, confirma a hipótese do caráter indispensável da participação
social. Assim, é possível identificar, também nas cartas, as estratégias que podem contribuir
para a efetividade da participação na preservação do patrimônio.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BONDUKU, Nabil. Intervenções urbanas na recuperação de centros históricos. Brasília,
DF: Iphan / Programa Monumenta, 2010.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade: UNESP,
2001.
CIMAS. Observatorio Internacional de Ciudadanía y Medio Ambiente Sostenible.
Metodologías Participativas Manual. Obra Colectiva, Madrid, 2009.
ESPÍRITO SANTO (Estado). Secretaria de Estado da Cultura. Relatório da Análise da
Proteção do Ambiente Cultural de Santa Leopoldina. Vitória, 2008.
ESPÍRITO SANTO (Estado). Conselho Estadual de Cultura. Resolução CEC nº 003, de
01/09/2010. Dispõe sobre a regulamentação das diretrizes para intervenções nos espaços
públicos, lotes e edificações integrantes da Área de Proteção do Ambiente.
Cultural de Santa Leopoldina. Disponível em http://secult.es.gov.br/_midias/pdf/4745-
4c8152c8e803b.pdf, acesso em 27/02/2016.
ESPÍRITO SANTO (Estado). Conselho Estadual de Cultura. Resolução nº 05/83, publicada
no DIOES em 06/08/83, disponível em http://secult.es.gov.br/_midias/pdf/2153-
4a43f1b4bcf2a.pdf, acesso em 18/04/2016.
PORTA, Paula. Política de preservação do patrimônio cultural no Brasil: diretrizes,
linhas de ação e resultados: 2000 / 2010. Brasília – DF: Iphan / Monumenta, 2012.
QUEIROZ, Rodrigo Zotelli. Uso de ferramentas computacionais para análise de
modificações na ambiência urbana de sítio histórico tombado: ensaio em Santa
Leopoldina – ES. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e
Urbanismo. Universidade Federal do Espírito Santo. 2013.
CARTAS PATRIMONIAS:
RESUMO
O aspecto social dessa situação tona-se emblemático, porque nem sempre são
levados em consideração os agentes envolvidos e sobressai sobre eles as regalias
relacionadas ao aspecto financeiro. Tudo isso culmina em uma série de desdobramentos
danosos aos bens, porque em grande medida se trata de um processo de destruição e
desvalorização social, principalmente do patrimônio arqueológico.
Cabe ressaltar que ambos são parte dos estudos iniciados em 2015, para a
Monografia intitulada O Estado Conta o Patrimônio – uma perspectiva arqueológica (Vieira,
2015), onde foram analisados processos do Ministério Público em que foi necessária sua
intervenção em prol da salvaguarda do patrimônio arqueológico. Contudo, trata-se de uma
documentação não publicada e de acesso restrito, condicionada a autorização da
Promotoria; porém, acessível a pesquisadores e profissionais com propósitos declarados.
Por este motivo o abuso das citações textuais foi de extrema importância para apresentação
do conteúdo original destes documentos.
De acordo com esse laudo, a equipe seguiu em direção a uma enorme voçoroca,
tentando identificar a entrada da galeria, contudo foram impedidos em razão da vegetação
interna e do risco de desabamento de terra, o que teria praticamente impedido a análise.
Mas mesmo assim, afirmou que não foram encontrados vestígios de garimpo no interior da
voçoroca. Também sugeriu o aperfeiçoamento das pesquisas arqueológicas na região,
objetivando avaliar criteriosamente seu potencial arqueológico. No laudo foi proposto o
monitoramento da área, com a produção de relatórios mensais e, em caso de novas
descobertas, que seja paralisada imediatamente a obra.
Em 16 de junho de 2012 foi realizada Vistoria Técnica por uma equipe mista,
composta por uma Analista do Ministério Público de Minas Gerais, por um arqueólogo de
confiança do Ministério Público, pelo Diretor de Meio Ambiente e Saúde da UNACCON
(União das Associações Comunitárias de Congonhas), e por um mestrando do MAE/USP
(Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo).
-que a lei seja cumprida com a punição dos que destruíram deliberadamente
o patrimônio arqueológico
-que seja realizado um trabalho como, a lei determina, de pesquisa
(prospecção) e salvamento (se for o caso);
-que os trabalhos de arqueologia sejam acompanhados (fiscalizados) por
arqueólogo de confiança do MP para evitar novas destruições. (LAUDO
TÉCNICO Nº 26/2012. p. 11)
Merece destaque o fato de que o DER é órgão pertencente ao Estado, sendo neste
caso uma representação da urgente necessidade de divulgação a respeito da importância
de tomar medidas preventivas sérias em relação ao Patrimônio Arqueológico, cumprindo
minimamente a legislação. Sendo competência do IPHAN, analisar os vestígios e cuidar de
sua preservação, salvaguardando para o presente e para o futuro, parte do passado (leia-se
identidade) de Congonhas e da história (Ciclo do Ouro) nacional, e não do Ministério
Público.
Em junho de 2015 foi realizada uma nova campanha de campo para averiguar como
ficou a região após a finalização das obras de abertura do novo trecho da rodovia e não
havia nenhum tipo de sinalização a respeito dos vestígios arqueológicos remanescentes.
Figura 2: Fotografia das obras de construção da rodovia (Fonte: Acervo CPPC) e fotografia das obras
da estrada já totalmente concluídas em 2015 (Foto: Carlos Magno)
Nesta vistoria, percorrendo a área que ficava fora dos muros do condomínio,
foi verificada a proximidade do Córrego Goiabeiras com o loteamento e
confirmada a existência de uma antiga “estrada” ou “canal” conforme relatado
na denúncia encaminhada a esta Promotoria. Foi constatado ainda que esta
ocorrência local ficava a poucos metros dos muros do Condomínio
Goiabeiras.
(LAUDO TÉCNICO Nº 68/2012. p. 1-2)
Considerações finais
Referências Bibliográficas
ARANTES, Antonio. O Patrimônio Cultural e seus usos: a dimensão urbana. Em: Habitus,
Goiânia, v. 4, p. 425-435, 2006.
BEZERRA, Marcia. “As moedas dos índios”: um estudo de caso sobre os significados do
patrimônio arqueológico para os moradores da Vila de Joanes, ilha de Marajó, Brasil.
Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v. 6, n. 1, 2011.
SOUZA, Gustavo Neves de. O material lítico polido do interior de Minas Gerais e São Paulo:
entre a matéria e a cultura. Dissertação de mestrado, USP. São Paulo, 2008.
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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
VIEIRA, Flávia C. Costa. O Estado Contra o Patrimônio: uma perspectiva arqueológica.
Monografia de graduação, Universidade Federal de Minas Gerias. UFMG, Belo Horizonte.
2015.
1. rmyrrha@gmail.com
2. arteehistoria@gmail.com
RESUMO:
Com quase duzentos e cinquenta anos da construção do primeiro teatro no Brasil, uma
questão emerge: onde e como está preservada a memória desse patrimônio artístico, sendo
o teatro parte tão representativa da cultura brasileira? Mais especificamente, o que é feito
com o figurino das peças de teatro e espetáculos de ópera e dança após o período de
apresentação? Buscando destrinchar essa última questão, este trabalho apresenta uma
análise do processo de conservação dos figurinos dos espetáculos apresentados em um
dos mais importantes teatros do estado de Minas Gerais: o Palácio das Artes. Com base em
materiais de referência, entrevistas e visitas técnicas realizadas em 2014, foi feito um
diagnóstico do processo de preservação do figurino produzido pela Fundação Clóvis
Salgado - sob responsabilidade e gestão de um de seus equipamentos culturais, o Centro
Técnico de Produção Raul Belém Machado. Através do mapeamento desse processo,
pretende-se incentivar a implantação de projetos voltados para a melhoria da gestão, a
adequação das ferramentas de conservação e do espaço de guarda do acervo, além do
desenvolvimento de regras e políticas de preservação e descarte. Espera-se, também, que
o mapeamento do processo, consolidado em 2014, possibilite não somente a continuação
ABSTRACT:
The first theater in Brazil was built almost two hundred and fifty years ago, but one question
still emerges: where and how has the memory of such a representative part of Brazilian
culture been kept? Particularly, what happens to the costumes used in theater plays and
opera performances after the show is over? In order to address this last question, this paper
presents an analysis of the preservation process of outfits worn on shows performed in one
of the most important theaters in the state of Minas Gerais: the Palácio das Artes. Based on
interviews and technical visits carried out in 2014, a diagnosis was made of the costume
preservation process performed at the Technical Center of Production Raul Belém Machado
(CTP) of the Clóvis Salgado Foundation (FCS). Therefore, this article shall encourage
improvement projects to enhance management practices, as well as adjusting the
conservation tools and the storage area of the CTP, and designing clear rules and policies
concerning this collection. Hopefully, by mapping this preservation process, this study shall
not only contribute to a continued application of the current practice, but also serve as an
example for other Brazilian theatres.
O teatro no Brasil tem suas origens no século XVI com os jesuítas e suas peças de
catequização, “que atraíam aos pátios das escolas e capelas colonos e indígenas, fazendo-
os participar como atores ou simples espectadores de dramatizações ingênuas” (ÁVILA,
1978, p.1). A construção do primeiro espaço para as artes cênicas só foi concretizada em
1770, data de inauguração do “mais antigo prédio teatral da América do Sul”, a Casa da
Ópera de Vila Rica, hoje Teatro Municipal de Ouro Preto (ÁVILA, 1978, p.7). Entretanto, foi
no século XIX que o teatro brasileiro ganhou mais força e visibilidade, advindas de um
movimento cultural ufanista, consequência da presença da corte portuguesa no Brasil, como
revelam as palavras de Sábato Magaldi: “A transferência da corte portuguesa para o Rio, em
1808, trouxe inegável progresso para o teatro, consolidado pela Independência, em 1822, a
que se ligou logo depois o romantismo, de cunho nacionalista” (MAGALDI, 2003, p.1).
Posteriormente, o teatro brasileiro passou por mais dois ciclos de desenvolvimento,
denominados por Wilson Martins de “ciclo do teatro ligeiro” e o “ciclo moderno” (MARTINS,
1963, pp.8-9) até a ditadura militar em 1964. A segunda metade do século XX é descrita
resumidamente por Carolin Ferreira, quando o teatro brasileiro foi, lentamente, se
recuperando dos vinte anos de repressão e censura:
A “diversidade de vertentes” nos anos 1990, observada por Ferreira, foi acompanhada pelo
crescente número de casas de espetáculo e teatros no Brasil. Em um trabalho realizado
pelo arquiteto e cenógrafo José Carlos Serroni em 2002, quase mil teatros em atividade
foram identificados no Brasil e, conforme levantado pelo Ministério da Cultura, em 2010
foram contabilizados 1229 espaços. Assim, considerando tanto os teatros em atividade
quanto os espaços já desativados, pode-se concluir que o teatro brasileiro se configura
como uma considerável fonte de memória cultural. “Os teatros brasileiros têm sido, ao longo
de sua evolução, os depositários de importante parte da cultura urbana das cidades nas
quais foram construídos” (LANFRANCHI, 2002, p.21).
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Froner (2001, p.204) afirma que “Patrimônio Histórico pode ser tudo e qualquer coisa –
material ou imaterial – que mantenha viva a memória de um determinado tempo” ou
conforme explicita Carsalade (2007, pp.171-172) “o conceito de patrimônio é um conceito
múltiplo que abriga diversos outros: herança, tentativa de permanência do homem ou
sobrevivência da cultura, identidade, diversidade, memória, posse pública de bens culturais,
dentre tantos outros”. Considerando essas duas definições e refletindo sobre os quase
trezentos anos da existência dessas casas de espetáculo no Brasil, uma questão emerge:
onde e como está preservada a memória desse patrimônio, sendo o teatro parte tão
representativa da cultura brasileira?
Esse patrimônio das artes cênicas assume diversos formatos, melhor ilustrado por
Françoise Choay quando apresenta de forma sucinta a mudança no conceito de patrimônio
até seu significado contemporâneo:
“Em sua acepção original, “bem de herança que, seguindo as leis, descende dos
pais e mães para seus filhos” (Émile Littré, Dictionnaire de la langue française), a
mais antiga palavra “patrimônio” conhece hoje uma fortuna nova, por uma
transferência metafórica que lhe atribui adjetivos variados: “genético”, “natural”,
“bancário”, etc.” (CHOAY, 2011, p.11)
Dessa forma, pode-se pensar que o patrimônio das artes cênicas abrange tanto seu
patrimônio arquitetônico, na forma dos edifícios teatrais e casas de espetáculo, como seu
patrimônio móvel, isso se consideramos apenas seu patrimônio material. A partir do conceito
criado na Conferência Geral da UNESCO de Paris, em 1978, de que patrimônio móvel pode
ser definido como “todos os bens móveis que são a expressão e testemunho da criação
humana ou da evolução da natureza e que tem um valor arqueológico, histórico, artístico,
científico ou técnico”1 (UNESCO, 1978, tradução nossa) o patrimônio móvel do teatro pode
ser representado por gravações em vídeo, fotografias, libretos, materiais de divulgação,
além do próprio figurino e cenário produzidos. Preservando-se, então, esse patrimônio
móvel do teatro estaremos preservando, não somente os bens móveis, mas mantendo viva
a memória, a identidade, a diversidade e a cultura de uma sociedade em um determinado
momento de sua história.
Refletindo sobre todo esse rico patrimônio, surge uma indagação interessante: que é feito
com esse patrimônio móvel? Mais especificamente, o que é feito com o figurino das peças
de teatro e espetáculos de ópera e dança após o período de apresentação?
1 Tradução das autoras a partir do texto original: All movable objects which are the expression and testimony of
human creation or of the evolution of nature and which are of archaeological, historical, artistic, scientific or
technical value and interest.
Com base em entrevistas, visitas técnicas e materiais de referência, foi feito, então, um
mapeamento do processo de preservação do figurino - sob responsabilidade e gestão do
Centro Técnico de Produção Raul Belém Machado (CTP) - desde o inventário das peças
produzidas até a higienização, arquivamento e catalogação final do acervo devolvido após a
execução do espetáculo. Nesse mapeamento, foram levantadas, também, as condições
ambientais e de infraestrutura dos galpões e instrumentos utilizados para armazenamento
das peças. Adicionalmente, o presente estudo discorre brevemente sobre a história da
conservação do figurino no Palácio das Artes e apresenta alguns usos desse acervo
guardado e preservado.
Desde a sua inauguração em 2004, o Centro Técnico de Produção Raul Belém Machado
está localizado em galpões alugados de uma antiga fábrica de tecidos no sítio histórico de
Marzagão, tombado pelo IEPHA-MG em 2002, no município de Sabará, em Minas Gerais
(ÁVILA, 2009, p.67).
Antes da criação do CTP, uma área específica dentro do Palácio das Artes era destinada à
produção dos cenários e figurinos, além de abrigar uma equipe grande de produção, como
costureiras, cenógrafos, técnicos, produtores, camareiras, e demais profissionais envolvidos.
O figurino estava armazenado em araras, ocupando dois andares do Palácio das Artes.
A ampliação e crescente ocupação dos espaços pela escola de formação, hoje denominada
Centro de Formação Artística e Tecnológica (CEFART), e a utilização de uma cenografia
maior nos espetáculos, com maior utilização de madeira e pinturas, fizeram com que fosse
necessária a mudança do acervo para um espaço mais amplo. Outro fator importante foi a
introdução de elevadores cênicos na reforma de reconstrução após o incêndio que destruiu
parte do Grande Teatro em 1997. As máquinas dos elevadores foram instaladas onde
anteriormente ficavam localizadas as oficinas de produção.
Para construção do mapeamento, foram realizadas duas entrevistas e uma visita técnica ao
Centro Técnico de Produção (CTP). As entrevistas foram efetuadas no mês de abril de 2014
com um membro da Diretoria Artística da Fundação Clóvis Salgado e com a Auxiliar de
Produção do CTP.
A modelagem de processos de negócio, por sua vez, é uma área de conhecimento do BPM
que inclui ferramentas e atividades que auxiliam na construção de modelos dos processos
existentes em uma organização. De acordo com o CBOK, a modelagem “é um conjunto de
atividades envolvidas na criação de representações” e, complementarmente, “os modelos
podem ser matemáticos, gráficos, físicos ou narrativos ou alguma combinação desses
tipos”. (ABPMP BRAZIL, 2013, p.72).
Ao desenhar modelos, uma organização pode melhorar o entendimento dos seus processos
de negócio e aprimorar a comunicação entre os envolvidos no processo. Além disso, o
mapeamento pode ser usado como ferramenta para treinamento de pessoas, para
identificação de melhorias ou para o redesenho e transformação desse processo. No caso
deste estudo, para a modelagem do processo de conservação do figurino foi adotado um
fluxograma - modelo amplamente utilizado que “inclui um conjunto simples e limitado de
símbolos não padronizados; facilita o entendimento rápido do fluxo de um processo”
(ABPMP BRAZIL, 2013, p.79).
A equipe fixa do CTP era composta, por quatro associados de uma associação sem fins
lucrativos, qualificada como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP),
e que mantinha um contrato de termo de parceria com o Governo do Estado de Minas
Gerais: um Gerente Administrativo, um Agente de Higienização, um Auxiliar de Produção e
um Auxiliar de Serviços Gerais, e, quando da execução de espetáculos, mão de obra
especializada era contratada para produção e execução de cada projeto.
Quanto à infraestrutura espacial, os galpões estavam divididos pelas duas principais áreas
de atuação do Centro: produção e armazenamento do acervo. Na área de produção, eram
construídos os cenários, adereços e figurinos a serem utilizados nos espetáculos. Já na
área adjacente ficava armazenado todo o acervo que retornava ao CTP após o período de
apresentação.
O figurino armazenado era destinado a diferentes aplicações, podendo ser reutilizado para
outros espetáculos, utilizado para pesquisas, exposições, acervos museológicos, além de
disponíveis para locação da comunidade em geral. De acordo com a entrevistada, a locação
do figurino garantia, no momento, parte da renda para manutenção do CTP, o que nos leva
a concordar com Viollet-Le-Duc e Riegl quanto à preservação incentivada pela
funcionalidade do objeto de arte. Isto é, podemos estender o que Viollet-Le-Duc disse
especificamente do edifício como objeto de preservação a qualquer objeto de arte em “O
fato é que a melhor maneira de se preservar um edifício é encontrar um uso para ele”2
(VIOLLET-LE-DUC, 1996 [1854], p.317, tradução nossa) ou, como melhor descreve Alois
Riegl:
2 Tradução das autoras a partir do texto original: The fact is that the best of all ways of preserving a building is to
find a use for it.
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desenvolvimento, de tolerar um certo grau de valor do novo em obras modernas e
utilizáveis”3 (RIEGL, 1996 [1928], p.81, tradução nossa)
3 Tradução das autoras a partir do texto original: Practical use value corresponds aesthetically to newness value
as well; for its own sake, the cult of age value will, at least at its present stage of development, have to tolerate a
certain degree of newness value in modern and usable works.
O galpão principal, que pode ser visualizado na figura 2, é classificado por blocos e, cada
bloco, por corredores, ambos identificados por uma letra. Os trajes são separados por
espetáculo – ou repertório – e na entrada de cada corredor é colocada uma placa explicativa
contendo BLOCO – CORREDOR – OBRA – ANO DE PRODUÇÃO – NÚMERO DAS
ARARAS. As araras possuem uma cortina de plástico transparente para proteção e fácil
visualização dos trajes, que por sua vez, são pendurados em cabides. O plástico
transparente que, ao mesmo tempo facilita a identificação dos trajes, possibilita a passagem
de luz que é extremamente danosa aos tecidos. “Deve-se tentar manter as luzes apagadas
o maior tempo possível. A luz causa danos irreversíveis às cores dos tecidos” (VIANA, 2006,
p.30). Quanto à luminosidade, o Manual diz:
“A recomendação é que se não for possível escurecer a sala de forma total, deve-
se guardar próximas à janela as roupas de cor branca, o que fizemos com a
coleção de camisas e roupas de baixo, como saiotes, peças de algodão etc. É
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importante lembrar que o sol ou a luz não vai desgastar o tecido branco, mas se
houver luz incidindo diretamente em cima da roupa, o desgaste da própria fibra do
tecido será inevitável. A luz indireta e leve - e não apenas a luz solar – também
provoca alterações nos tecidos”. (VIANA, 2006, p.31)
Os trajes são suspensos e não tocam o solo para facilitar a ventilação, mas o espaçamento
entre eles é muito pequeno e possibilita que os trajes estraguem com mais facilidade
quando em contato com outro, como pode ser visto na figura 2. “Algumas consequências
e/ou riscos deste contato é a transferência de cor entre as roupas, o possível emaranhado
de um traje no outro, ocasionando a perda de pequenos detalhes ou rasgos, entre outros
incidentes possíveis” (VIANA, 2006, p.23). Como solução, o Manual sugere a separação dos
trajes por uma camada de TNT: “as roupas precisam ser separadas por uma camada de
TNT ao serem guardadas para que não haja transferência de cores entre elas, manchando
os trajes permanentemente” (VIANA, 2006, p.34).
Algumas peças mais delicadas são penduradas em cabides envoltos por uma almofada, o
que vai de acordo com a instrução de Viana: “Os cabides deveriam ser de madeira ou outro
material mais resistente, forrados com espuma e recobertos de tecido inerte (tipo malha
cirúrgica) para que o ajuste a cada peça fosse feito nele” (VIANA, 2006, p.33). Os adereços
dos personagens específicos dos repertórios são colocados em caixas rotuladas acima da
arara correspondente àquele espetáculo. Na sala secundária são armazenadas as peças de
adereço avulsas, que não fazem parte de um repertório fixo.
A condição de cada peça não era registrada em nenhum lugar, o que demonstrava falta de
controle sobre a situação particular de cada item do acervo. Além dessa falta de controle
que pode mascarar uma possível necessidade de intervenção, os critérios para conservação
desse acervo não estavam escritos e não havia nenhum profissional especializado no
quadro de associados do CTP. A preservação do figurino dependia do julgamento de
pessoas não especializadas na área, ou de seus admiradores como coloca Marguerite
Yourcenar: “De todas as mudanças causadas pelo tempo, nenhuma afeta esculturas mais
do que as mudanças no gosto de seus admiradores”4 (YOURCENAR, 1996 [1983], p.215,
tradução nossa).4
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
4 Tradução das autoras a partir do texto original: Of all the changes caused by time, none affects statues more
than the shifts of taste in their admirers
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Quanto ao processo de conservação do figurino no CTP, do ponto de vista técnico, foi
identificado que o acervo do figurino do Palácio das Artes passa por um processo bem
estruturado de preservação, tendo disponível um espaço amplo de armazenamento e
grande parte do seu acervo catalogado. Em todas as etapas, porém, foram identificadas
oportunidades de melhoria, indicando que reformas mais estruturais são necessárias para
proteger o figurino da ação do tempo, como a instalação de um controle de temperatura e
umidade, da ação de animais, que podem transitar livremente no local, ou mesmo pequenos
reparos, como a separação dos trajes por uma camada de TNT.
Como sugestão para um trabalho futuro, além da implantação das melhorias listadas
anteriormente, seria interessante estender a aplicação da metodologia de Gerenciamento de
Processos de Negócio para além do mapeamento do processo, incluindo, assim, a medição
de indicadores, o monitoramento e o controle do processo.
REFERÊNCIAS:
ÁVILA, A. O Teatro em Minas Gerais: Séculos XVIII e XIX. Ouro Preto: Prefeitura
Municipal de Ouro Preto, 1978.
FERREIRA, C.O. Uma Breve História do Teatro Brasileiro Moderno. Revista Nuestra
America, Porto, n.5, p.131-143, jan-jul, 2008.
LANFRANCHI, G. Ensaio – O teatro e seu espelho. In: SERRONI, J.C. Teatros: uma
memória do espaço cênico no Brasil. São Paulo: SENAC, 2002.
SERRONI, J.C. Teatros: uma memória do espaço cênico no Brasil. São Paulo: SENAC,
2002.
VIANA, F. R. P.; GIROTTI, M. Figurino dos Amadores: dos Filodramáticos ao Teatro Lírico
de Equipe. In: COLÓQUIO DE MODA, 6, 2010, São Paulo. (Apresentação de
Trabalho/Comunicação).
YOURCENAR, M. That Mighty Sculptor, Time. In: Historical and Philosophical Issues in
the Conservation Cultural Heritage. Los Angeles: GCI, 1996.
RAMOS, D.M.S.
RESUMO
O objetivo desse trabalho é investigar o papel da complexa relação do patrimônio cultural e os
movimentos sociais no processo histórico da área urbana central da cidade do Rio de Janeiro,
enquanto centralidade (SISSON 2008). Busca-se evidenciar os encontros dos movimentos sociais
com as formas urbanas patrimoniais como meio de ressignificação e propagação de seu caráter
simbólico, desde a modernização da capital carioca no início do século XX até os dias atuais.
Qual e por que determinada edificação ou ambiente urbano tem poder simbólico impregnado capaz
de catalisar grandes concentrações sociais. Proteger o patrimônio de possíveis depredações é: vedá-
lo do contato direto com os manifestantes, ou o oposto, aproximá-lo cada vez mais das vivências do
movimento? Questões que reforçam a inquietação de investigar, de forma mais específica, os
motivos da persistência histórica das manifestações sociais no Rio de Janeiro em determinados
pontos específicos da cidade, como determinantes para sua permanência física nesta área central da
cidade que se apresenta dualmente enquanto centro histórico e centro de negócios.
A reocupação do espaço público urbano carioca está em relevância. A região central da cidade tem
sido frequentemente palco de grandes movimentações políticas e culturais de diversas ordens em
diferentes contextos O recente reencontro da população com a área portuária, até então avesso da
cidade, permitido pela reformulação urbana do Boulevard Olímpico, em 2016, suas descobertas e
apropriação enquanto área de lazer e enorme espaço dedicado a sociedade, desencadearão um
novo solo para manifestações sociais, agregando ainda mais valor simbólico a este recente espaço
de encontros da cidade olímpica. Esta análise de formas, dimensões e atividades e estímulos
propostos a este espaço são importantes mecanismos de reapropriação do espaço público, podendo
inclusive transformar a noção do tecido urbano carioca.
O objeto empírico da pesquisa, a área central da cidade do Rio de Janeiro discutido, por meio de sua
estrutura física, e elemento estimulante às manifestações sociais, evidenciadas por recortes de
jornais, fotografias e crônicas, será importante mecanismo de reflexão sobre os atores, as trocas,
formas, processo e o tempo, fatores fundamentais nas discussões da memória urbana.
Entender os impactos causados na cidade por interferências externas, rompendo a consonância
adquirida a longo dos tempos de vivências empíricas, entre população e ambiente construído, são
fundamentais para compreender as formas de habitar e ocupar a cidade.
Tem-se como hipótese o papel dialético exercido pelas manifestações sociais na ressignificação do
patrimônio cultural da área central carioca. Adota-se o sentido de manifestação não só como ativismo
da sociedade em favor de uma causa, visando expressar publicamente ideias, como considera,
principalmente, a influência do espaço nas transformações impostas à e pela sociedade.
1
O Plano de Reformulação de Paris através de uma reforma urbana foi proposto pelo barão Georges
Eugène Haussmann na França, na época do imperador Napoleão III (nas décadas de 1850 e 1860).
2Kók, 2005, chama atenção para a relação que existe entre o código de condutas e a Revolta da Vacina.
Referências Bibliográficas
RESUMO
Objetiva-se nesse trabalho discorrer sobre as sete igrejas católicas no Centro de Vitória, atual capital
do estado do Espírito Santo, onde as mesmas fazem parte da formação do conjunto de patrimônio
histórico arquitetônico religioso local. Sendo abordado um breve histórico das mesmas desde a
fundação, o uso atual, o papel delas na formação da identidade do povo capixaba, e os agentes que
atuam na conservação da memória do lugar. Na “Cidade alta”, área geograficamente mais elevada
em relação ao nível do mar, local onde estão localizados o palácio do governo, as construções
seculares e as igrejas católicas, objetos de estudo desta pesquisa, sendo elas: a catedral
Metropolitana, a capela de Santa Luzia, o convento de São Francisco, a capela de Nossa Senhora
das Neves, a Igreja de São Gonçalo, o Convento do Carmo e a Igreja do Rosário. As igrejas católicas
do Centro de Vitória são símbolos e marcas de todos os tempos da história capixaba. A mais antiga
data do século XVI, e a mais recente em meados dos anos de 1950 do século passado, onde as
mesmas representam a forte herança da nossa colonização. As construções religiosas do Centro não
exercem somente o papel do aspecto sagrado, mas também exercem o papel de símbolos da
memória, onde a população local identifica nas construções parte da sua história com a da própria
cidade. A busca pela preservação é a busca pela memória social e coletiva do lugar e dos quem a ela
pertence, é a busca pela identidade em um mundo em que a singularidade do lugar perde espaço
para a multipluridade dos novos tempos. No processo de preservação, recuperação e revitalização do
patrimônio, o poder público é o principal ator nas ações de revitalização de centros urbanos, áreas
onde mais se concentram os patrimônios históricos. O “Projeto Visitar”, uma parceria do Instituto Goia
e a Prefeitura de Vitória, através de visitas monitoradas aos patrimônios arquitetônicos e culturais do
Centro, com destaque para as Igrejas Católicas, busca-se mostrar a história da capital e despertar a
curiosidade e a identidade do povo capixaba e a construção de uma memória coletiva. Além das
visitas monitoradas, o Visitar possui uma coleção de livretos, os quais contam a história de cada
espaço onde o projeto atua. Através do poder público, via políticas públicas, como também com a
participação de setores privados e de organizações sem fim lucrativo, entendemos que podem ser
feitos trabalhos visando uma educação patrimonial, a fim de resgatar a memória coletiva da cidade,
ou pelo menos do seu centro histórico, salientando a importância das edificações. Por fim, o foco
dessa pesquisa é descrever sobre essas as Igrejas Católicas do Centro de Vitória e a busca pela
preservação e educação patrimonial mostrando que a conservação dos patrimônios construídos de
uma cidade é muito mais que preservar uma forma arquitetônica, é preservar a história, a memória
coletiva e a identidade de um povo.
A busca pela preservação é a busca pela memória social e coletiva do lugar e dos quem a
ele pertence, é a busca pela identidade em um mundo em que a singularidade do lugar
perde espaço para a multipluridade dos novos tempos.
Nas últimas décadas, o patrimônio arquitetônico das cidades vem recebendo grande
atenção. Preservá-los ao longo do tempo pode manter viva a história de um grupo ou
sociedade. Para Rodrigues (2001, p.16), “o patrimônio representa a identidade local e, por
mais diversa que seja a população, a sua criação serve como uma ponte que resume várias
histórias em uma só”.
De acordo com Bogéa (2007), o patrimônio arquitetônico e cultural é o conjunto de bens que
possuem valores históricos, artísticos e científicos que definem, em diferentes escalas, a
identidade de uma comunidade, uma região ou um país e que devem ser preservados como
legado às gerações futuras.
A identidade está diretamente ligada a um grupo social de um determinado lugar, isto quer
dizer que a formação da identidade de uma sociedade está atrelada à questão da
territorialidade no lugar, e esta identidade se materializa na forma de monumentos, ou seja,
é a materialização do que é à base da sociedade atual, portanto, é um espelho do que foi a
sociedade no princípio. Cordeiro (2011, p. 34) define a identidade como “patrimônio herdado
do passado [...] e como organizador social”.
Para Saquet e Briskievicz (2009, p.8) a identidade é construída pelas múltiplas relações –
territorialidades que estabelecemos todos os dias e isso envolve, necessariamente, as obras
materiais e imateriais que produzimos, como os templos. A identidade se concretiza por
meio de símbolos e são com esses símbolos que a prática se consolida no espaço e nas
relações sociais de determinado grupo. As igrejas do centro da capital capixaba são
símbolos do domínio da Igreja da Católica no começo da colonização do Estado do Espírito
Santo, são os primeiros símbolos da identidade capixaba, ou seja, toda identidade é
construída socialmente e constantemente modificada pelos atores que a formam.
Até o final do século passado o Centro da Cidade era uma das principais pólos de toda
dinâmica do Estado do Espírito Santo, sendo centro comercial, econômico, cultural e
político. O processo de desenvolvimento no geral alterou a dinâmica da cidade, modificando
entre tantas coisas, a identidade de Vitória.
Projeto Visitar
Revitalizar o Centro, não significa renovar e pintar prédios e fachadas, significa revigorar
forças, pessoas, suas relações com o espaço em que vivem, com as instituições em sua
volta e com elas mesmas. (ANJOS e LIMA, 2008).
Paralelamente ao Projeto Revitalizar o Centro surge o “Morar no Centro” que visa dar uma
função social aos imóveis abandonados, além de, ajudar no “repovamento” do Centro e de
diminuir o déficit populacional da cidade de Vitória. De acordo com dados da prefeitura, os
imóveis utilizados para o “Morar no Centro” passarão/passaram por reformas e reabilitação,
gerando assim, uma melhor qualidade de vida e moradia para os atuais e futuros
moradores. Em números, o projeto contará com 134 unidades habitacionais, reduzindo o
déficit habitacional da cidade em 1,8% , conforme dados disponíveis no site da prefeitura de
Vitória.
O Projeto Visitar começou a ser implantado em 2006 pela Prefeitura Municipal de Vitória
(PMV). Nas palavras do coordenador do projeto, Luciano Andrade “após longos estudos de
várias secretárias que apontavam a necessidade de requalificação do Centro Histórico”. Em
2007 surge a parceria com Instituto Goia, que permanece até atualmente. Ainda para
Luciano, “os avanços progressistas atropelaram o que para nós é muito importante hoje, que
são os patrimônios”, de fato, a modernização da capital, a transferência, de boa parte das
atividades que ali eram realizadas, para as novas regiões da cidade, resultaram no
esquecimento desses patrimônios históricos. Então, o Visitar, identifica esse patrimônio
cultural-religioso, que não estava devidamente aproveitado, e utiliza os mesmos como
eduadores patrimoniais. Então, o Visitar passa a trabalhar esses objetos, visando o turismo
cultural.
O projeto conta com monitores em nas sete igrejas católicas do centro e no Theatro Carlos
Gomes, monitores capacitados no próprio instituto que dão toda a assistência ao turista e ao
morador do Centro, que vezes não conhece a própria história. Fazem o resgate da história,
levam ao visitante – local ou turista -, a ideia de formação da identidade Capixaba através
dos monumentos. Apresentando-lhes a própria história, além das visitas monitoradas, o
Visitar possui uma coleção de livretos, os quais contam a história de cada espaço onde o
projeto atua.
A história das igrejas da Cidade Alta se confunde com a história do início da Vila, atual,
cidade de Vitória, onde a pequena vila torna-se cidade em volta das construções sagradas.
Com a resistência à homogeneização que a globalização impõe, a revitalização tem
encontrado no conceito de “lugares de memória” um refúgio, como ponto de apoio para o
convencimento da população acerca da revitalização. A respeito disso, Paes (2009, p.165)
caracteriza como: Os lugares de memória são marcados por dimensões espaciais,
elaborados por imagens e tramas narrativas (produção de monumentos e marcos
paisagístico); por uma dimensão epistemológica (o material e o imaterial) e por uma
dimensão política – as identidades eleitas no planejamento político.
A cidade alta é um lugar de memória. A atmosfera que é criada com a presença das
edificações de um tempo pretérito junto com as igrejas evidencia isso, os símbolos, os
significados, as características singulares que não encontramos em nenhum outro ponto da
Cidade de Vitória. É único, é propriamente o lugar. Lugar que para Carlos (2007, p.14),
”guarda em si e não fora dele o seu significado e as dimensões do movimento da vida,
possível de ser apreendido pela memória, através dos sentidos e do corpo”. Isso nos faz
pensar que o patrimônio de um dado lugar possui valor único, uma identidade que
caracteriza aquele lugar, pois lugar e identidade são indissociáveis. (CARLOS, 2007). Para
Abreu (1998), afirma que a memória urbana é um importante agente da constituição da
identidade de um lugar.
Ilustração 01 – Igrejas Católicas localizadas na Cidade Alta do Centro de Vitória/ES: (A) Convento de
Nossa Senhora do Monte Carmo; (B) Convento de São Francisco; (C) Catedral Metropolitana de Vitória;
(D) Igreja de São Gonçalo Garcia; (E) Capela de Nossa Senhora das Neves; (F) Igreja de Nossa Senhora
do Rosário dos Homens Pretos; (G) Capela de Santa Luzia.
(F) (G)
Fonte: Almeida (2009) adaptado pelo autor, 2017.
De acordo com Almeida (2009) entre os anos de 1910 e 1913 ocorreram modificações na
edificação, sendo o segundo projeto de autoria de André Carloni, onde acrecentou-se um
terceiro pavimento à residência e uma varanda em torno de seu pátio interno, e é executada
uma profunda remodelação estilística. Concentrada no frontispício, essa se expande para
um módulo de transição entre a igreja e a residência. Aí, em substituição às linhas barrocas
precedentes, de ambígua inspiração histórica, o novo traço possui forte vinculação com as
referências românticas das construções medievais. Transitando entre o românico e o gótico,
a linguagem está unificada pela adoção do arco ogival para o arremate dos vãos e
esquadrias de porta e janela, e do frontispício, na forma de delicado rendilhado.
Segundo Almeida (2009) o primeiro projeto, executado da Catedral foirealizado em 1913 por
Paulo Motta, seguindo linhas neogóticas, com fachada composta por torre única, em edifício
de escala modesta. Porém com o início do primeiro conflito mundial, a obra da catedral é
paralisada em 1918, sua retomada se deu apenas em 1930, com um novo projeto,
executado pelo influente construtor André Carloni , o projeto passou a ter nas linhas da
arquitetura gótica, inspirada na Catedral de Colônia, na Alemanha. Sua dimensão é
ampliada e sua fachada alterada e marcada pela projeção de duas torres. Internamente
inaugurada em 1933, a Catedral de Vitória estará definitivamente concluída apenas em
1971, após contínuas paralisações.
A igreja tem sua planta na configuração de cruz latina e referências ao estilo gótico. Possui
nave ampla com cinco acessos, um frontal e quatro laterais. A decoração interna é do
escultor Waldemir Bogfanoff. Os Vitrais foram desenhados pelo artista italiano César
Alexandre Formanti (RODRIGUES, 2010).
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A fachada frontal é uma composição tripartite dominada pela disposição de suas duas
torres, e pela disposição centralizada da entrada principal, uma porta de verga reta e um
vitral, arrematados por modenaturas ogivais. A centralidade desse corpo é reforçada por seu
coroamento em frontão triangular culminado pela imagem de Nossa Senhora Auxiliadora
com o Menino Jesus, e pela disposição bilateral das duas torres onde vãos ogivais
apresentam terminações piramidais ricamente trabalhadas. Essa decoração se repete nas
demais fachadas do edifício. Internamente, o edifício se constitui pela sequência de coro,
nave, transepto, capela-mor, sacristia, e cripta, em construção erguida modernamente com
a utilização da estrutura em concreto armado, empregado à maneira das pedras das
catedrais góticas, e paredes preenchidas por tijolos maciços e vitrais (ALMEIDA, 2009).
De acordo com Almeida (2009) as janelas são maiores e fechadas com basculante de ferro
e vidro na nave, e menores e fechadas com folhas em tabuado de madeira nas demais
fachadas. No coro, uma em cada fachada apresenta sinos. Entre as portas, a de acesso
lateral à nave está ornada com uma moldura argamassada e um pequeno nicho,
posicionados sobre a verga. Internamente constituída por nave, capela-mor, sacristia,
corredores laterais e tribunas, espaços diretamente ligados à experiência da fé, a igreja de
São Gonçalo tem na ampla sala de reuniões o mais evidente vestígio do papel
desempenhado pela irmandade na sua consecução.
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Posicionada sobre a sacristia, e generosamente dotada de seis janelas, a sala de reuniões
se vincula diretamente às tribunas, situação propícia à participação privilegiada de seus
componentes nas missas e rituais. Há ainda, um porão, sob a sacristia, com acessos interno
e externo. Contudo, seus elementos de maior destaque são, seguramente, o retábulo do
altar-mor, acréscimo do século XIX, e a imaginária, especialmente Santo Inácio de Loiola e
São Francisco Xavier, antes posicionados em destaque em nichos da parede da nave,
lateralmente ao arco cruzeiro, e agora colocados no retábulo do altar mor. Antecedido por
guarda-corpo em balaústre de madeira, possivelmente pertencente à demolida matriz de
Nossa Senhora da Vitória, o arco cruzeiro está ornado de maneira a valorizar suas clássicas
proporções. Construtivamente, São Gonçalo é obra sobre fundação de pedra, material
também adotado em suas paredes. a cobertura em telha-francesa só em sua configuração e
na cor lembra as de tipo capacanal (ALMEIDA, 2009).
Durante o mês de agosto de todos os anos, sai pelas ruas do Centro de Vitória a procissão,
levando a imagem de Nossa Senhora da Boa Morte, que é carregada por membros da
Marinha ou do Exército brasileiro segue em direção a Catedral Metropolitana. Após 300
anos de história, a igreja de São Gonçalo continua a realizar missas, casamentos,
batizados, inclusive, uma lenda local conta que quem na igreja de São Gonçalo se casa,
nunca mais separa. Por esse motivo, a igreja é muito procurada para a realização de
casamentos, tendo uma lista de espera que chega há mais de dois anos. Além disso, a
igreja possui uma acústica muito boa, o que faz com que seja muito procurada para
apresentações de corais. A igreja de São Gonçalo também é a única na Grande Vitória a
realizar a Missa Tridentina ou Forma Extraordinária do Rito Romano, que é celebrada em
Latim (SANTOS, 2014).
O desenho arquitetônico da capela tem a planta em cruz grega, em espaço composto por
nave, capela-mor e duas sacristias, o edifício tem sua configuração dominada pela
opacidade de espessas paredes executadas em alvenaria portante de pedra, onde
pequenas janelas estão dispostas de forma equilibrada e simetria dominante. De dimensões
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e escala modestas, o conjunto se destaca em seu entorno pela unidade de sua composição.
Singela e modesta, a capela é uma sequência de brancas superfícies recortadas por janelas
vedadas por esquadrias de madeira em veneziana e vidro, das quais se destaca a fachada
frontal. Em alçado configurado pela disposição de austero, mas imponente, frontão de
volutas singelas, ladeado por dois pináculos, a entrada da pequena capela, uma porta
constituída por folhas secas e bandeira em madeira e vidro, está delineada por cantaria em
arco pleno, por sua vez contornado por moldura de argamassa em acabamento liso. O
telhado, um conjunto de múltiplos planos cobertos com telha de barro capa-canal, tem por
acabamento uma cimalha executada em argamassa que contorna o perímetro superior das
paredes (ALMEIDA, 2009). A imagem era de Nossa Senhora das Neves, pequena, de roca,
teria sido levada para igreja de São Gonçalo, em Vitória, onde permanece.
Hoje, a Capela de Nossa Senhora das Neves, encontra-se aberta para visitação e para
missas aos funcionários da Cúria, missa essa que ocorre apenas em uma segunda-feira de
cada mês. Durante obras de reparo do IPHAN, foram encontrados ossos humanos em uma
das paredes, porém não há identificação de quem poderiam ser esses ossos. Era bastante
comum no século XIX, que pessoas importantes da sociedade fossem enterradas dentro
das Igrejas, mas neste caso, não foram encontrados nenhum tipo de registro do
sepultamento. As obras foram paralisadas e ossos permanecem na parede da capela em
exposição permanente (ALMEIDA, 2009).
No ano de 1765 ficou pronta a construção da igreja de Nossa Senhora do Rosário dos
Pretos. Em terreno doado à Irmandade de Nossa Senhora dosofrimento da escravidão.
(BONICENHA, 2004).
Ao final, a igreja apresenta arquitetura de rígida regularidade apenas interrompida nas linhas
da escada frontal e da laje do piso do coro, onde a inspiração barroca se revela no traço
côncavo-convexo de seus perfis. Assim, a solidez de seus espessos muros pétreos,
recobertos por alva caiação sobre rugoso acabamento, e os extensos planos avermelhados
da cobertura são as expressões dominantes de uma colonial configuração; e é na
movimentada ornamentação do frontispício e, internamente, nos delicados relevos
executados por hábeis mãos, onde se revela uma franca inspiração barroca. Anunciada no
frontão, no caprichoso desenho das volutas e no delicado relevo do tímpano, onde elíptico
óculo foi encimado por uma cruz, a inspiração barroca se acentua em uma proeminente
A irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos já não existe mais desde o
início do século passado e parte dos seus membros agora pertencem à irmandade São
Benedito dos Pretos. No final do século XX, o IPHAN tomba a igreja, passando a ser
patrimônio histórico nacional. Na mesma época, é criado o museu da Irmandade de São
Benedito dos Pretos, museu esse que se encontra desativado por falta de manutenção e
estrutura. No terreno da igreja havia também compra/venda de alforria que, hoje se encontra
abandonada. Hoje, a igreja não exerce mais a função original, ficando apenas aberta para
visitação e com a realização de suas procissões no mês de dezembro de todos os anos em
referência a São Benedito (SANTOS, 2014).
A igreja não possui acessibilidade pela sua entrada principal, pois há uma enorme escadaria
fazendo a ligação da rua com a Igreja, sendo possível apenas dando uma enorme volta,
mesmo para quem não tem problemas com acessibilidade, a chegada até a igreja é
complicada, pois os degraus não são de tamanho uniforme, e como são de pedra, cada um
tem uma altura, dificultando o andar, um problema que poderia ser resolvido caso não
houvesse o impasse entre os membros da confraria responsável pela igreja.
No ano de 1537, o que hoje é a capital do Estado de Espírito Santo, não passava de uma
fazenda, chamada de Ilha de Santo Antônio. O então sesmeiro Duarte Lemos, que recebeu
de Vasco Fernandes Coutinho a posse da fazenda, ordenou que fosse edificada em sua
fazenda uma Capela para que fossem realizados os ofícios religiosos, foi assim que surgiu a
Capela de devoção a Santa Luzia.
As atividades religiosas aconteceram até o ano de 1928 na capela, após esse período a
capela fica em total abandono e descaso, o que levou a deterioração da estrutura. No ano
de 1937 o imóvel é comprado pela União, 6 anos mais tarde é restaurada por André Carloni,
- engenheiro responsável também por obras na Catedral Metropolitana -, após o restauro, é
tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o IPHAN. Após o ano de
1928 e a aquisição pelos órgãos públicos, a Capela de Santa Luzia não teve mais função
religiosa, não há, por exemplo, desde o referido ano a realização de missas.
Na metade do século XX a capela, que também está localizada na Cidade Alta, passa a
abrigar o Museu de Arte Sacra e a partir do ano de 1976, sob custódia da Universidade
Federal do Espírito Santo – UFES. Neste mesmo ano passa a funcionar como galeria de
arte, vindo a preencher uma lacuna até então existente no campo das artes plásticas no
Espírito Santo (BONICENHA, 2004).
Atualmente, a Capela de Santa Luzia funciona apenas para visitação, não possui mais
funções sacras. Ela atrai os visitantes primeiramente por sua história, referente ao período
da colonização, e arquitetura que difere de todas as outras igrejas do Centro.
Considerações Finais
Diante do que foi exposto, constata-se que através do poder público, via políticas públicas,
como também com a participação de setores privados e de organizações sem fins
lucrativos, podem ser feitos trabalhos visando uma educação patrimonial, a fim de resgatar a
memória coletiva da cidade, ou pelo menos do seu centro histórico, salientando a
importância do mesmo. Procurou-se mostrar também que a conservação dos patrimônios
construídos de uma cidade é muito mais que preservar uma forma arquitetônica, é preservar
a história, a memória, a identidade de um povo. No que diz respeito à todas a igrejas
identificadas, percebe-se que a resistência das mesmas, assim como a importância
históricas delas, se deve sobretudo aos usos que os moradores do Centro de Vitória ainda
Referências Bibliográficas
ABREU. Mauricio A. Sobre a Memória das Cidades. Revista da faculdade de Letras – Geografia I
série, Vol. XIV, Porto, 1998, pp. 77-97
ALMEIDA, Renata Hermanny de. Arquitetura patrimônio cultural do Espírito Santo. Vitória:
SECULT, 2009.
ANJOS, Erly E. e LIMA, Mário H. T. Revitalizar o Centro de Vitória (ES): O Que Dizem os
Moradores? In: SINAIS - Revista Eletrônica. Ciências Sociais. Vitória: CCHN, UFES, Edição n.03,
v.1, Junho. 2008. pp.10-26.
BOGÉA, K. B. S. R. Centro Histórico de São Luis Patrimônio Mundial, São Luís. 200
CARNEIRO, V. Demolição de prédio histórico surpreende moradores de Colatina. 2010. Disponível
em: <http://gazetaonline.globo.com/_conteudo/2010/10/677268-
demolicao+de+predio+historico+surpreende+moradores+de+colatina.html>. Acesso em 23 abr. 2017.
CARLOS, Ana Fani Alessandri. O lugar no/do mundo. São Paulo: FFLCH, 2007, 85p.
RODRIGUES, Cláudio. Espírito Santo: aspecto histórico e religioso. Vitória, ES: [s.n.], 2010. 288
p.
RESUMO
O reconhecimento de valores culturais nas paisagens urbanas e a preocupação com a sua
preservação derivam do amadurecimento de discussões sobre o próprio significado de patrimônio
cultural. O contínuo aprofundamento desses debates abriu caminho para a valorização de artefatos
por vezes considerados menores e que passaram a se destacar por suas qualidades compositivas,
além de suas características estéticas e construtivas.
Em compasso com o alargamento do conceito de patrimônio cultural, este artigo é parte de
discussões abordadas na pesquisa de mestrado Para além do centro histórico: valores e sentidos do
patrimônio edificado de Espirito Santo do Pinhal, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em
Arquitetura, Tecnologia e Cidade da Unicamp.
A cidade de Espírito Santo do Pinhal, localizada na divisa entre o estado de São Paulo e o sul
de Minas Gerais, devido à sua importância econômica no período áureo do ciclo do café, é detentora
de conjunto histórico e arquitetônico valorizado pela sua população e tombado em nível estadual.
Os estudos para tombamento do Núcleo Histórico Urbano de Espírito Santo do Pinhal tiveram
início em meados de 1985 e tal iniciativa se configura em ação pioneira entre as cidades paulistas
pelas circunstâncias que ensejaram o pedido de proteção oficial do conjunto. A salvaguarda foi
solicitada ao CONDEPHAAT pela própria população, então representada pela Associação Pinhalense
de Cultura, com o intuito de impedir o desaparecimento de prédios históricos, que à época corriam
riscos de demolição iminente.
O conjunto arquitetônico selecionado pelo órgão estadual corresponde a onze edifícios,
considerados como as maiores expressões do período de desenvolvimento mais significativo da
cidade.
No processo de tombamento consta como documento inicial para a abertura dos estudos uma
listagem produzida pela Associação Pinhalense com 56 imóveis considerados de interesse. Nela
Esse alargamento conceitual foi gradativo, tanto na sua assimilação teórica quanto
nas aplicações práticas, sendo necessárias várias décadas para que o conceito de
patrimônio fosse, de fato, assimilado para além da escala restritiva de monumentos
individuais. O entendimento mais claro do valor cultural dos conjuntos arquitetônicos e
urbanos, bem como os princípios teóricos que atuam sobre eles, são aquisições conceituais
que vieram a ser devidamente contempladas em documentos internacionais do século XX,
principalmente pelas Cartas Patrimoniais2.
1 Dentre essas contribuições destacam-se, de modo geral, principalmente John Ruskin (1819-1900) e Violletle
Duc (1814-1879), quanto às práticas de preservação; Alois Riegl (1858 -1905), na reflexão sobre os valores
outorgados ao monumento; e Gustavo Giovannoni (1873-1947), na formulação de métodos de conservação do
patrimônio considerando a sua dimensão urbana.
2 Em um breve panorama sobre as Cartas patrimoniais, cabe destacar alguns desses documentos. As Cartas de
Atenas (1931) e Carta de Atenas do CIAM (1933) inauguraram os questionamentos sobre a coexistência do
antigo e do novo. Quanto à atuação sobre os monumentos e ambientes históricos, o entendimento das
discussões de restauro foi consolidado com a Carta de Veneza (1964). A Recomendação de Nairobi (1976), por
sua vez, colocou em pauta a posição dos conjuntos arquitetônicos e históricos nas cidades contemporâneas.
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No Brasil, a construção do patrimônio nacional apresenta-se em um cenário
particular, pois é simultânea à disseminação da arquitetura moderna. Foram os arquitetos do
movimento modernista que em 1937 fundaram o IPHAN.
Sabe-se que a maior parte dos tombamentos até meados da década de 1970 recaiu
sobre edificações e conjuntos urbanos do período colonial, reconhecido e valorizado na
época como a arquitetura “original” brasileira e, por isso, símbolo maior da identidade
nacional.
Nesse sentido, afirma Flávia Brito do Nascimento (2012) que, “as exceções a esse
grupo de tombamentos saltam aos olhos, sendo a mais evidente a das obras do movimento
moderno” (NASCIMENTO, 2012, p. 174).
3 Dentre os principais órgãos estaduais de preservação destacam-se: Bahia: IPAC (Instituto do Patrimônio
Artístico e Cultural da Bahia) de 1967; Estado de São Paulo: CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio
Histórico Arqueológico, Artístico e Turístico) criado em 1968; Minas Gerais: IEPHA (Instituto Estadual do
Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais) criado em 1971; Estado do Rio de Janeiro: DPHA (Divisão do
Patrimônio Histórico e Artístico) fundada em 1965.
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corrente, não só no Brasil como também em outros países com forte tradição nesse tipo de
arquitetura.
Para Silvio Zancheti (2014), uma série de fatores contribui para que o consenso
sobre o tombamento e a conservação dos monumentos do modernismo brasileiro não sejam
facilmente alcançados. Dentre eles destacam-se: 1) A arquitetura moderna foi mais
amplamente difundida entre uma comunidade internacional de especialistas (arquitetos e
engenheiros, principalmente) e entre políticos, e a ideia de arquitetura moderna como
sinônimo de progresso não chegou a ser assimilada no senso comum; 2) Em termos
culturais, ainda não ocorreram processos sociais de sedimentação, com tempos históricos
suficientemente longos, para enraizar a ideia de que essa arquitetura é um patrimônio
cultural e como tal merece ser conservada para as gerações futuras.
Nessa perspectiva, para além das grandes estações centrais, por vezes
arquitetonicamente refinadas, que costumam destacar-se dos conjuntos que integram,
interessam também as residências mais singelas dos imigrantes europeus e os grandes
galpões industriais e comerciais. O modelo, implantação e transformações técnicas que
estas edificações engendram – a exemplo do uso de materiais como tijolo, ferro e vidro –,
além de outros modos de morar, testemunham igualmente a evolução tecnológica-social
que marcou o século XX.
4 Ano em que a cidade de Espírito Santo do Pinhal foi fundada, por Romualdo de Souza Brito.
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Mesmo antes do tombamento do núcleo mais antigo de Pinhal (a área central), a
apropriação e identificação que a população demonstrava ter com esse conjunto histórico e
arquitetônico sempre foram essenciais para a sua preservação.
Os pinhalenses, em geral, valorizam sua história. Seja por ações individuais, pela
preservação de imóveis particulares, ou ações coletivas, são os grandes responsáveis pela
manutenção dos registros arquitetônicos representantes do desenvolvimento da cidade ao
longo dos séculos XIX e XX. A Associação Pinhalense de Cultura (APC) deve ser destacada
como a grande promotora da preservação do patrimônio local, sendo responsável pelo
projeto de tombamento que foi encaminhado ao Conselho de Defesa do Patrimônio
Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT) e, anos depois, homologado
por esse órgão estadual.
Apesar das restrições quanto à proposta inicial apresentada pela APC, para o
CONDEPHAAT o tombamento em nível estadual do Núcleo Histórico de Pinhal justificava-se
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principalmente por tratar-se de um “acervo de núcleo urbano da Mogiana5, região de
Patrimônio pouco estudado” que ainda se encontrava preservado nesse “conjunto de
reconhecida importância histórica e suporte de representação significativo da cidade, mais
fáceis de serem reapropriados e reutilizados” (CONDEPHAAT, 26.264/88, p.12-14).
5 Segundo historiadores, a Companhia Mogiana foi a única ferrovia concluída até o final do século a adentrar o
território mineiro tendo seu ponto terminal exatamente no triângulo mineiro. (CONDEPHAAT, 26.264/88, p.13).
6 Os edifícios legalmente protegidos são: Biblioteca e Museu Municipal, Escola Estadual Almeida Vergueiro,
Estação Ferroviária de Pinhal, Cine Theatro Avenida, edifício da atual Delegacia, residência de Arnaldo Florence,
edifício da atual Prefeitura Municipal, antigo comércio Irmãos Sagioratto, antiga residência na Praça da
Independência (atual Cine Casarão), antiga Farmácia Central e edifício do antigo Departamento de Esporte e
Cultura.
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Os trabalhos realizados desde então – seja na consolidação das novas leis,
realização de inventários ou pesquisas acadêmicas – apresentam uma noção de patrimônio
vinculada exclusivamente ao conjunto tombado e pouco consideram a diversidade de outros
exemplares arquitetônicos destacados pela Associação.
Nesse sentido, a pesquisa de mestrado7 na qual este artigo se insere busca analisar
outras áreas e conjuntos que também representam importantes períodos da história e
evolução urbana da cidade que ainda não foram estudadas e cujos conjuntos edificados não
são reconhecidos como parte do patrimônio pinhalense. Em compasso com o alargamento
do conceito de patrimônio cultural, houve interesse em estudar o patrimônio ferroviário e
moderno local, que corresponde aos bairros da Vila Monte Negro e Vila Norma,
respectivamente, que não foram incluídos no perímetro delimitado pelo tombamento.
7 RIBEIRO, Júlia Farah. Para além do centro histórico: valores e sentidos do patrimônio edificado de Espírito
Santo do Pinhal. 2017. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Faculdade de Engenharia Civil,
Arquitetura e Urbanismo, Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP.
8 João Elisário de Carvalho Monte Negro nasceu em Portugal, na cidade de Louzã, e em 1841 imigrou para o
Brasil. Defensor da imigração e do trabalho livre assalariado, o Comendador é lembrado como um homem de
ideias progressistas. Foi proprietário das fazendas de café “Colônia Nova Colômbia”, em Campinas, e “Colônia
de Nova Louzã”, em Pinhal, onde implantou sistema de mão de obra assalariada, em tempos de escravidão.
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Esse terceiro grupo inicialmente se instalou na Vila Monte Negro e, posteriormente,
se espalhou por outras zonas da cidade. Pode-se afirmar que a Vila foi a principal
responsável por criar essa nova classe social em Pinhal.
A maior parte da população desse bairro era composta por portugueses e italianos
que exerciam atividades relacionadas à ferrovia, direta ou indiretamente. Os modos de
morar e de trabalhar dessa população se refletiam na arquitetura pelo predomínio da
construção de duas tipologias principais: 1) Armazéns e estabelecimentos comerciais, 2)
Residências (Figura 1).
A B C
D E F
Figura 1 – Registro fotográfico dos armazéns (A e B), pequenos comércios (C e D) e casas (E e F)
da Vila Monte Negro no início do século XX. Fonte: Álbum de Pinhal, 1903.
A partir do primeiro quartel do século XX, a Vila Monte Negro se firma como um
importante núcleo de atração populacional, aumentando o número de edifícios nela
construídos, incentivando melhorias na infraestrutura da cidade.
A Vila Monte Negro foi responsável pelo crescimento de novos eixos na cidade,
ligando a Igreja Matriz à Estação Ferroviária. A estação torna-se o centro irradiador de ruas
e avenidas, estimulando a ocupação de áreas fora do entorno imediato da Praça da Igreja
Matriz.
Na área central, as residências antigas das classes mais abastadas tiveram suas
fachadas remodeladas pelo uso de elementos do ecletismo na arquitetura do século XIX. Ao
redor da Estação, a Vila Monte Negro ganha forma com edifícios de baixo gabarito (um
pavimento) construídos em alvenaria de tijolos e junto ao alinhamento dos lotes.
Os ornamentos preservados até hoje nos dão a conhecer dados históricos que em
muitos casos não foram registrados ou documentados oficialmente. Em algumas casas da
Vila, as cruzes de malta aplicadas em relevo sobre as aberturas ou nas platibandas são
informações importantes para o reconhecimento da história e da ocupação do bairro.
Além das questões regionais, a Estação Ferroviária faz parte do Ramal de Pinhal,
inaugurado em 1889, do qual também faziam parte as estações de Conselheiro Laurindo,
Nova Louzã e Motta Paes. Este conjunto ainda não foi estudado de maneira associada.
Esta é uma indicação clara de que interessava aos pinhalenses tanto as construções
religiosas, públicas e as residências dos grandes fazendeiros de café como também as
edificações ferroviárias e as representantes de “arquitetura menor” a elas correlacionadas,
considerando a somatória de todas essas tipologias como a melhor representação da
história da cidade.
Costinha, como era mais conhecido na cidade, planejou um bairro em forma circular,
com lote central destinado à Igreja de Santo Antônio, projetada por ele no início da década
de 1960 (Figura 3).
9 Nos arquivos municipais não foram encontrados documentos e informações que precisassem a data original do
projeto da Vila Norma, era sabido apenas que foi construído na década de 1950. No acervo do Arquivo Público
do Estado de São Paulo constam alguns mapas da cidade. Na cartografia de 1952 o bairro ainda não existia,
sendo registrado no mapa do ano seguinte (1953).
10 O Sr. Antônio Costa foi prefeito municipal e também era dono da Construtora Antônio Costa S. A.
A B C
D E
Figura 4 – Residências construídas na Vila Norma. Projetos de José Costa (A, B, C e D) e Carlos
Lemos (E). Fonte: Autora, 2016.
Ao contrário das casas projetadas por arquitetos para famílias mais abastadas, em
geral caracterizadas por volumes prismáticos e composições plásticas equilibradas, as
residências de classe média apresentam sobreposições de vários elementos da arquitetura
moderna, algumas vezes conflitantes em termos compositivos. Tais construções revelam-se
como híbridos dos modelos nos quais se inspiram.
Nas realizações de José Costa, mais do que uma influência, nota-se um processo no
qual a seleção dos elementos formais-construtivos estão em acordo com as expectativas
tanto do arquiteto como de seus clientes. O uso da arquitetura moderna demonstra a
vontade de integrá-los a um contexto mais amplo, extrapolando o cenário local.
11Dentro as inúmeras contribuições de Carlos Alberto Cerqueira Lemos à arquitetura nacional, cumpre destacar
que nos anos 50 dirigiu o escritório paulistano do arquiteto Oscar Niemeyer. No CONDEPHAAT, foi diretor
técnico entre 1968 e 1981, e conselheiro de 1983 a 1989. Foi também conselheiro do IPHAN (1992-2000).
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4. Considerações sobre o patrimônio arquitetônico de Espírito Santo do
Pinhal
Ainda que a cidade Espírito Santo do Pinhal tenha passado por sucessivos
processos de evolução, as permanências da paisagem que resistiram às transformações do
tempo contam a história local e possibilitam entender o seu processo de desenvolvimento
urbano.
ANDRADE JR, Nivaldo Vieira de; ANDRADE, Maria Rosa de Carvalho; FREIRE, Raquel
Neimann da Cunha. O IPHAN e os desafios da preservação do patrimônio moderno: A
aplicação na Bahia do Inventário Nacional da Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo
Modernos. CEP, v. 41, p. 210. 2009.
NASCIMENTO, Flávia Brito do. Preservando a arquitetura do século XX: o IPHAN entre
práticas e conceitos. Cadernos Proarq (Programa de Pós-Graduação em Arquitetura da
UFRJ), Rio de Janeiro, n. 19, p. 172-193. 2012.
TICCIH. Carta de Nizhny Tagil sobre o patrimônio industrial. Nizhny Tagil: TICCIH. 2003.
Disponível em: <http://ticcih.org/wp-content/uploads/2013/04/NTagilPortuguese.pdf>. Acesso
em: cinco de julho de 2016.
RESUMO
A lei, quando se trata de patrimônio cultural ou natural nem sempre é sinônimo de preservação. A
Serra do Curral, ícone dos belo-horizontinos e dos mineiros é um exemplo disso. O presente trabalho
se debruça sobre a pesquisa teórica acerca dos instrumentos legais de preservação vigentes no
entorno do paredão da Serra do Curral, símbolo oficial da capital mineira, localizado entre os
municípios de Belo Horizonte e Nova Lima. Os procedimentos metodológicos adotados neste trabalho
analisam vasto repertório legal existente antes e após a consolidação do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação – SNUC e seus resultados no cenário local, evidenciando as tentativas
legais de preservação desta relevante paisagem mineira. Tal investigação busca o entendimento da
dinâmica legislativa que formata um mosaico de Unidades de Conservação na área em questão. Vale
ressaltar a importância não somente natural, como cultural desta serra para o município no qual se
insere, tornando-a cenário e patrimônio da população belo-horizontina e legitimando todas as
tentativas e conquistas de preservação da biodiversidade e do marco cultural. Nesta discussão,
dentre as unidades legalmente enunciadas, destacam-se os Parques Estaduais da Baleia e
Wenceslau Brás nos quais a discussão dos decretos de criação e/ou autorização ainda permanece no
papel, como proposta efetiva de proteção do relevante patrimônio natural e cultural da serra. Neste
sentido ao entender que a área é fruto de intenções legais conservacionistas, o futuro objetiva além
da efetivação das jurisprudências encontrada. É necessário a criação de uma única unidade de
conservação efetivando assim a preservação de todo um conjunto de relevância inenarrável.
Quanto aos quatorze parques urbanos previstos no Plano Metropolitano de Parques Urbanos do PDIES, até 1982 apenas o
Parque Fernão Dias (Contagem) havia sido implantado. Algumas das áreas indicadas no programa permaneciam ainda
desocupadas, mas sem qualquer proteção quanto à sua futura ocupação pelo uso urbano, enquanto outras já haviam sido
parceladas, decretadas como zonas de expansão urbana, ou mesmo ocupadas (TONUCCI FILHO, 2012, p. 149).
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população metropolitana. Os parques somariam uma área de 5.883 ha, o
que resultaria num índice de 11,6 m² de área de parques urbanos por
habitante em 1990
Fonte: http://www.sinaenco.com.br/downloads/Benicio.pdf
Da proposta inicial foram implantados ao longo das décadas de 1980 e 1990 pelo
Poder Público, apenas cincos Parques Urbanos: Fernão Dias, Lagoa do Nado,
Mangabeiras, Ressaca e Serra Verde. Na década de 2000, porém por iniciativa do poder
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público municipal da Capital Mineira e de Contagem ampliaram-se o número de grandes
parques municipais, localizados em áreas estratégicas e bem próximos da concepção
original do Plano Metropolitano de Parques Urbanos, do PLAMBEL em 1979, o Ageo Pio
Sobrinho, o Américo Renê Giannetti, o Fazenda Lagoa do Nado, Francisco Lins do
Rego, Guilherme de Azevedo Laje, o Oceanógrafo Jacques Cousteau, o Sargento Silvio
Holembach (Fundação Zoobotânica) e o Ursulina de Andrade Melo que somados aos
parques estaduais: Bandeirante Fernão Dias, Fazenda Serra Verde, Presidente
Wenceslau Braz (Serra do Curral/Mangabeiras/Mata da Baleia), Serra do Rola Moça,
Serra do Sobrado, Vale do Sumidouro formam um montante de 14 parques à disposição
da população metropolitana. Estas grandes áreas verdes se contraporiam ao projeto de
expansão de parques industriais e loteamentos adjacentes criando espaços de
civilidade, coletividade e preservação num tecido urbano cada vez mais adensado
(Figura 03). Somente na cidade de Belo Horizonte são mais de sessenta parques, de
diferentes tipologias e variedades: desde praças reconhecidas como parques municipais,
como o Halley Alves Bessa, no Bairro Havaí, região oeste a grandes parques como o
Mangabeiras na zona sul da cidade. Estabelecendo uma relação entre estes espaços e
sua utilização em prol da população local e dos eventuais visitantes (turistas), a
prefeitura da capital mineira oferece atividades educativas e culturais em alguns dos
mais de setenta parques ecológicos da cidade. Muitos destes parques ecológicos
dispõem de alguns equipamentos para estes fins, como: pontos de coleta seletiva de
lixo, nascentes em estado natural, trilhas para caminhada, equipamentos para ginástica,
espaços de convivência, mirantes de contemplação, banheiros, play ground, entre
outros. Ainda sobre o PLAMBEL e suas ações conservacionistas, segundo informações
do PL 2.999 (2015):
No final da década de 1970, o Estado de Minas Gerais, por meio da
autarquia de Planejamento da Região Metropolitana – PLAMBEL –, instituiu
o Programa Metropolitano de Parques Urbanos. Em 1979, o Estado recebeu
em doação uma área de, aproximadamente, 98 ha, que se constituiu no
Parque Fernão Dias, situado no Município de Betim, com uma parte situada
no Município de Contagem. No ato do registro dessa área no Cartório de
Registro de Imóveis da Comarca de Betim, sob a matrícula n° 29.960, em
29 de junho de 1979, ficou gravada sua destinação: "A área se destina
exclusivamente à implantação do Parque Urbano previsto no Programa
Metropolitano de Parques Urbanos".
No início da década de 1980, a Secretaria de Estado do Trabalho e
Assistência Social de Minas Gerais – SETAS –, que passou a administrar o
parque, promoveu a instalação da primeira etapa de um projeto de lazer
elaborado pelo PLAMBEL. Durante a década de 1990, o parque foi
amplamente utilizado pela população dos municípios vizinhos, mas
especialmente pela de Contagem devido à facilidade de acesso à área de
lazer. A partir do ano 2000, as condições de manutenção da área de lazer
do parque se deterioraram, mas, ainda assim, as condições de recuperação
da vegetação natural e das nascentes prevaleceram.
Fonte:
http://www.rmbh.org.br/sites/default/files/Semin%C3%A1rioEstruturadorPDDI_ApresBloco03.pdf
Durante duas décadas, respectivamente 1980 e 1990 foi muito visitado pelas
comunidades adjacentes devido aos muitos atrativos em uma região carente de alternativas
de lazer e entretenimento para a população. Entre o período de 2000 e 2005, foi cedida ao
município de Contagem, ficando sob sua gestão. A área total do parque insere-se 97% no
município de Betim, porém a única portaria encontra-se em Contagem, na Rua Rio
Comprido, nº 5250, no Bairro Conjunto Riacho III próximo ao Centro Industrial de Contagem.
Na luta pela reforma e reabertura do Parque Estadual Fernão Dias, foi criado a ONG
“Amigos do Parque Fernão Dias”, que reúne pessoas na defesa do Parque.
O Parque Fernão Dias, quando de sua inauguração, tinha: 23 quadras
poliesportivas; dois campos de futebol; seis duchas que refrescavam os
visitantes em dias de calor; playground; pista de bicicross; minicidade;
velódromo, que é o único do Estado; mirante; trilhas; uma lagoa; nascentes.
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Com área de 1,3 milhão de metros quadrados, quase 60% da área do
Parque das Mangabeiras que tem 2,350 milhões de metros quadrados, o
Parque Fernão Dias tem 60% de mata nativa e uma fauna que conta com
raposa, mico-estrela, tatu, coelho e vários tipos de pássaros. (DEPUTADA
MARÍLIA CAMPOS, 2016).
A APA permite usos futuros, distintos, que mesmo disciplinados e legalizados podem
comprometer a proteção dos ecossistemas em recuperação ambiental. Por outro lado, o
Executivo na figura do IEF é contrário á criação oficial do parque estadual, por cosiderá-lo
demasiadamente descaracterizado (ALMG, 2016). Segundo os técnicos, a transformação do
espaço em um parque estadual pode proibir o crescimento de atividades instaladas no
entorno, bem como de novos empreendimentos, sendo as categorias propostas são
restritivas e prejudiciais para a comunidade e entorno do parque (ALMG, 2016). São
incisivos alegando que parque estadual poderá trazer restrições e conflitos aos usos
pretendidos para o espaço. Quanto aos aspectos ambientais, afirmam que há grande
interferência humana e descaracterização do ponto de vista biológico, bem como não se
insere em uma área rural conforme exigência da Lei Federal 9.985, inviabilizando zonas de
amortecimento em seu entorno (ALMG, 2016). Concluem dizendo enfaticamente que não
existem no espaço, atributos ambientais para a instituição de uma unidade de conservação
integral da tipologia, parque estadual.
O conhecimento analítico e qualitativo desta área, símbolo oficial de Belo Horizonte se faz
necessário, quando o mesmo, reforça discussões legais, que efetivem a preservação,
conservação e manejo ambiental do Parque localizado aos pés da Serra do Curral, e de
outras unidades de conservação localizadas nas adjacências (SOUZA, PEREIRA &
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ANDRADE, 2007). Ao se perceber a importância do paredão da serra, efetiva-se
cronologicamente uma jurisprudência direcionada à preservação desse relevante patrimônio
cultural e natural do Quadrilátero Ferrífero, entre os municípios de Belo Horizonte e Nova
Lima. Os atuais estudos empreendidos na região permeiam várias áreas do conhecimento e
pesquisa, em especial Ecologia, Geografia e Geologia. Mas áreas como a Antropologia, a
História e a Sociologia trazem novas perspectivas de investigação deste espaço ampliando
discussões (ANDRADE, 2016). A área além de relevância ecológica consolida aspectos
importantes relacionados à História da capital mineira materializando-se no horizonte, como
seu símbolo maior, sua principal paisagem. Segundo a PBH (20165), a região do
Mangabeiras é um espaço de extrema relevância histórico-cultural para a cidade:
Com casas e mansões que ocupam espaços íngremes como que escalando
montanhas, o bairro Mangabeiras, situado na região Centro-Sul é de
recente ocupação, e possui várias belezas naturais. Uma delas é a Serra do
Curral, eleita símbolo de Belo Horizonte através de plebiscito popular
realizado em 1994. Tem ainda o Parque das Mangabeiras, um dos maiores
parques urbanos do País, com 2,3 milhões de metros quadrados, projetado
pelo paisagista Burle Marx e inaugurado em 1982.
A serra do Curral talvez seja um exemplo ímpar em toda Minas Gerais ao associar na
mesma perspectiva de política pública, a possibilidade da preservação de seus diferentes
patrimônios. As múltiplas alternâncias de ambientes e culturas no espaço urbano-industrial
ao longo do tempo e do espaço criou identidades patrimoniais e ambientais próprias da
cidade e que hoje encontram-se inseridas e dinamizadas. Dada sua relevância histórica, o
presente estudo expõe a relevância da pesquisa científica em História, em uma área natural
preservada, como meio interventor positivo, para o cumprimento e execução das leis que a
protege, bem como analisa brevemente mecanismos históricos e instrumentos vigentes de
preservação (ANDRADE, 2016). A complementaridade teórica decorrente do conhecimento
científico exerce extrema importância nos meios legais utilizados para estabelecer uma área
de preservação ambiental, principalmente quando estes se encontram agregado aos
aspectos sociais e às demandas locais, legitimando interesses coletivos (SOUZA, PEREIRA
& ANDRADE, 2007). Baseado na pesquisa enquanto instrumento de efetivação de aparatos
judiciais que garantam direitos coletivos relacionados aos patrimônios cultural e natural
respaldados nos artigos 225 e 226 da Constituição Federal, faz-se necessário pensar no
Parque das Mangabeiras enquanto uma unidade integrada e conectada às outras do
Mas que um recorte espacial, a Serra do Curral Del Rey é um recorte temporal, com
permanências e rupturas. Além de símbolo da cidade é também receptáculo de sua
memória e identidade (ANDRADE, 2016). Assim, todo o conhecimento histórico e
investigação historiográfica se fazem necessários para reforçar as discussões legais até
então adotadas para a efetiva preservação, conservação e manejo ambiental dos
respectivos parques estaduais e entorno. O mesmo se justifica pela necessidade de haver
complementaridade entre sociedade e natureza, no sentido de que os mesmos se inserem
como elementos de uma integração entre essas partes antagônicas. Quando se ressalta a
importância histórica da Serra do Curral, nota-se a pressão humana em seu entorno é
indiscutível a necessidade de um mecanismo de proteção ambiental que resguarde a
proteção de seu inigualável patrimônio cultural e natural, bem como garanta a preservação
da biodiversidade e dos recursos hídricos (ANDRADE, 2016). A serra, eleita símbolo da
capital mineira em 1995 teve parte significativa de sua área transformada em unidades de
Mas o então Parque Estadual Wenceslau Brás nunca foi efetivamente criado e
implantado. Posteriormente na década de 1980, houveram as criações dos Parques
Estadual da Baleia e do Metropolitano das Mangabeiras (ANDRADE, 2016). Nos anos de
1990, a área foi efetivamente protegida através da criação da APA Sul RMBH - Área de
Proteção Ambiental Sul da Região Metropolitana de Belo Horizonte e na década seguinte
com a criação dos Parques Municipais, Paredão da Serra do Curral e Parque Fort
Lauderdale, bem como a efetivação da Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN e
Centro de Pesquisa e Educação Ambiental - CPEA Mata do Jambreiro (FONSECA,
RODRIGUES & ANDRADE, 2013). Sobre o Parque Florestal da Baleia, o Instituto Estadual
de Florestas de Minas Gerais – IEF-MG (1988, p. 2713) alegava que:
9.1 – Criação: Decreto nº 26.162 de 06 de junho de 1988
9.2 – Área: 102,17 hectares
9.3 – Localização: Município de Belo Horizonte, zona sul, bairro Taquaril
9.4 – Levantamento Topográfico: Realizado em 1981, pelo Engenheiro
Agrimensor José Feres Azzi, servidor do IEF
9.5 – Hidrografia: Algumas nascentes e córrego (uma das nascentes
fornece água para o Hospital da Baleia)
9.6 – Flora: Floresta Tropical Atlântica – vegetação rasteira
9.7 – Fauna: Não há levantamento
9.8 – Cerca e aceiro perimetral: Não há
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Deysi Regina Tres; Ademir Reis; Sandro Luis Schlindwein. A construção de cenários da relação
homem-natureza sob uma perspectiva sistêmica para o estudo da paisagem em fazendas
produtoras de madeira no planalto norte catarinense. In: Ambiente e Sociedade. Vol 14, n° 01,
São Paulo, Jan-Jun 2011. Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-753X2011000100009> acesso em 26.
Mai. 2016
GONÇALVES, Júlio César. HOMEM-NATUREZA: uma relação conflitante ao longo da história. In:
Saber Acadêmico - Revista Multidisciplinar UNIESP. Ano n º 06 - Dez. 2008 p. 171
MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS. MPMG aciona Justiça para assegurar a implantação
do Parque Estadual da Baleia em BH. Disponível em https://www.mpmg.mp.br/areas-de-
atuacao/defesa-do-cidadao/meio-ambiente/noticias/mpmg-aciona-justica-para-assegurar-implantacao-
do-parque-estadual-da-baleia-em-bh.htm> Acesso em 26. Mai. 2016
MORIN, E. O método II: a vida da vida. Porto Alegre: Sulina, 2005. 528p.
OST, F. A natureza à margem da Lei: a ecologia à prova do direito. Lisboa: Instituto Piaget, 1995.
PBH - PREFEITURA DE BELO HORIZONTE. Serra do Curral e natureza dão atmosfera especial
ao Mangabeiras. Disponível em: <
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=23731&chPlc=23731>.
Acesso em 26. Mai. 2016
SOUZA, Jorge Batista de. PEREIRA, Adriane Nunes, ANDRADE, Vagner Luciano de. “Pesquisa
científica e preservação ambiental: o caso Parque das Mangabeiras, Serra do Curral, Belo
Horizonte – MG”. In: Resumo do painel V Seminário Cláudio Peres de Práticas de Ensino e
Geografia Aplicada - Tema “Geografias urbanas contemporâneas: espaços, intervenções e
planejamentos”. Belo Horizonte: curso de Geografia da PUC Minas, Campus Coração Eucarístico. 16
a 18 de maio de 2007
VALE. Mata do Jambreiro, área preservada pela Vale em Minas Gerais é aberta à visitação
pública. Disponível em < http://www.vale.com/brasil/pt/aboutvale/news/paginas/mata-jambreiro-area-
preservada-vale-minas-gerais-aberta-visitacao-publica.aspx>. Acesso em 26. Mai. 2016
1. Arquiteta e Urbanista.
Rua Antônio de Castro, 103 Apt. 204, Casa Amarela, Recife, PE. CEP: 52070-080
Telefone: 81 32680210 / 81 997476752
karine_cortez@hotmail.com
RESUMO
O artigo definiu como objetivo analisar o nível de conhecimento técnico das intervenções realizadas
pelos moradores do sítio histórico da Várzea. Como problemas do objeto de estudo foram
detectados, através de inspeção visual e fotográfica: descaracterizações nos materiais dos pisos das
calçadas, das paredes das fachadas e nos tetos das cobertas. Como resultados das
descaracterizações foram constatados que estas são provenientes de: (i) – precário poder de
fiscalização da prefeitura do Recife; ( ii) – falta de ações de educação patrimonial pelas entidades
responsáveis pela preservação; (iii) – inadequado raio de proteção com novos edifícios verticais
interferindo na paisagem do sítio e (iv) – falta de conhecimento por parte dos moradores de
significados técnicos apropriados, bem como desconhecimento dos valores dos imóveis do sítio
histórico como um todo. Como conclusões se constatam que apesar da existência de instrumentos
legais, as aplicações dos mesmos não acontecem de modo que inibam as descaracterizações. Como
sugestões para auxiliar nos problemas são sugeridas: elaboração de um manual de conservação para
o sítio e ações de educação patrimonial junto aos moradores.
Para entendimento do tema e seu objetivo foram selecionados os seguintes conceitos: bem
tombado, descaracterização, especificações dos materiais, fiscalização e reversibilidade.
O termo bem tombado corresponde a um objeto ou edificação que passou por um processo
jurídico de valorização cultural, com registro em algum Livro de Tombo seja federal, estadual
ou municipal (Fundarpe, 2012, p. 12). Tal processo tem “como objetivo preservar, por
intermédio da aplicação de legislação específica, bens de valor histórico, cultural,
arquitetônico, ambiental e também de valor afetivo para a população, impedindo que
venham a ser destruídos ou descaracterizados” (Fundarpe, 2012, p. 12).
2.2 Descaracterização
A expressão descaracterização tem como significado perder suas características que lhe
valorizavam (Ferreira, 1986, p. 443). Quando relacionada com um bem tombado pode estar
relacionada à introdução de materiais que não se harmonizam, a criação de volumetrias que
alterem a original, perda da sua escala em relação ao entorno, além de outras interferências
como aparelhos de ar condicionado, antenas ou outros equipamentos.
2.4 Fiscalização
2.5 Reversibilidade
A área de estudo que correspondente ao atual bairro da Várzea aparece como resultante de
alguns engenhos como o Santo Antônio e o São João, sendo este último, no final do período
holandês, em 1645, pertencente a João Fernandes Vieira (Gaspar, 2009,p.1).
Segundo placa na Igreja Matriz do Rosário, em 1648, ali foi sepultado Dom Antônio Filipe
Camarão (Silva,2009, p.1). Considerando a frequente evolução das capelas em igrejas, a
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Igreja Matriz também é resultado da transformação de capela em Igreja Matriz. Existe ainda
registro que a localidade possuía, em 1746, 18 capelas (Pereira da Costa, 1985, p.171).
Conforme placa de registro histórico a igreja matriz passou por reformas, entre 1868 e 1872,
nada mais restando da primitiva Capela de Nossa Senhora do Rosário (Silva,2009, p.1).
Ainda conforme Silva na Praça da Matriz ao lado da Igreja de Nossa Senhora do Rosário, ao
centro, existe a Igreja de Nossa Senhora do Livramento, que pertencia a uma irmandade de
homens de escravos. Afirma ainda que o prédio de dois pavimentos, ao lado desta
funcionou o Seminário da Várzea (Silva,2009, p.1).
Entre os casarões, vale salientar ao final da Rua Francisco Lacerda a edificação que serve
de sede ao Educandário Magalhães Bastos. Segundo Silva foi construído em 1897 por
Napoleão Duarte e destinava-se conforme placa comemorativa ao "Asilo da Infância
Desvalida, de ambos os sexos, fundado e pelo Com. Antônio José de Magalhães Bastos,
comerciante que foi nesta cidade".
Na área incidem as normas da ABNT de acessibilidade: NBR 9050: 2015, a NBR 15599:
2008 e a Lei federal No 5296 / 2004. Quanto à legislação municipal a Lei No 16.176 / 1996 de
Uso e Ocupação do Solo define uma série de procedimentos.
A ABNT 9050:2015 contempla diretrizes de acessibilidade para edificações, mobiliário,
espaços e equipamentos urbanos. Já a NBR 15599: 2008 define instruções para espaços de
atendimento ao público (ABNT 9050, 2015 e 15599, 2008). As principais recomendações
sobre acessibilidade para as áreas externas são voltadas para rebaixamentos nas calçadas,
pisos antiderrapantes, eliminação de barreiras e informações que contemplem as
diversidades especiais dos diferentes usuários da área (ABNT 9050, 2015 e 15599, 2008).
A Lei federal No 5296 / 2004 regulamentou as Leis No 10.048 / 2000 e No 10.098 / 2000,
quanto ao atendimento e prioridade aos idosos e deficientes e pessoas com mobilidade
reduzida, além de remeter para atendimento das diretrizes da ABNT 9050:2015 (Brasil,
Decreto No 5296, 2004).
Quanto às determinações municipais o destaque é para Lei No 16.176 / 1996 de Uso e
Ocupação do Solo, esta disciplina os aspectos de preservação na área. Conforme esta, o
bairro da Várzea é classificado como Unidade Urbana 19 e Zona de Urbanização
Preferencial 2. Entre as demais Zonas do bairro a do sítio histórico das Igrejas do Rosário e
do Livramento é denominada de Zona Especial de Preservação do Patrimônio Histórico -
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cultural – ZEPH. A ZEPH é subdividida em Setor de Preservação Rigorosa – SPR e Setor
de Preservação Ambiental – SPA ( Lei No 16.176 / 1996 , Art. 15 e 16). A ZEPH 7 do bairro
da Várzea têm dez requisitos especiais para regulamentar a ocupação e intervenções. Os
requisitos especiais compreendem: a) as intervenções de restauração, manutenção dos
imóveis devem levar em conta a aparência do conjunto e ter parecer final da Comissão de
Controle Urbano – CCU; b) as propostas de modificações não permitirão remembramento e
desmembramento de modo a não alterar a volumetria, porém os imóveis podem ser
interligados; c) as alterações internas, novas ou de acréscimos não deverão gerar
remembramento ou desmembramento; f) a marcação do gabarito máximo será no ponto
médio da edificação; h) as condições de conforto (dimensões, iluminação e ventilação) terão
análise especial; l) e m) a partir de análise especial podem ser construídas novas
edificações; p) A taxa de solo natural será de 60% para terrenos construídos; s) os imóveis
podem acomodar qualquer uso, desde que não gere descaracterização, nem interferência
no entorno; t) os imóveis com dois setores de preservação deverá atender as diretrizes mais
restritivas (Lei No 16.176 / 1996, Anexo 11).
6. Referenciais teóricos
Inadequado
Inadequado
Inadequado
Adequado
Adequado
Adequado
1 Igreja Religio Cimentado, Alvenaria, pintura Telha cerâmica Materiais
Matriz do so Pedra rachão em (bege, branco, canal sem
Rosário placas cerâmica, cinza) descarac-
terização
2 Creche Educac Cimentado Concreto e tijolos Telha cerâmica Materiais
i-onal cerâmicos a vista canal sem
descarac-
terização
3 Pórtico Ruína Cimentado Tijolos maciços e Ausente - - Pórtico em
tijolos com furos ruína
4 Casa Habita Cimentado Alvenaria - pintura Materiais
ci-onal sem
descarac-
terização
5 Res- Serviço Placas podotáteis Diversos Telha cerâmica Imóvel
taurante em cimento francesa e descarac-
fibrocimento terizado
6 Casa Habita Cimentado com Alvenaria - pintura Telha cerâmica Descarac-
ci-onal barreiras canal terização
arquitetônicas no piso
com
barreiras
arquitetô-
nicas nas
calçadas e
rua
7 Casa Habita Cimentado Fachada revestida Substituição de Descarac-
ci-onal com cerâmica com telha cerâmica terização
perda dos frisos e canal por da parede
adornos fibrocimento e teto
8 A Vida é Serviço Ladrilho hidráulico Fachada com Telha em Descarac-
Bela pintura que realça fibrocimento terização
os adornos e cor do teto
ao gosto do
inquilino
9 Templo Religio Diversos Fachada Telha em Descarac-
Adven- -so (cimentado com modificada fibrocimento terização
tista pintura e barreiras do piso, da
arquitetônicas na parede e
calçada e via) do teto
10 Super- Comér- Cimentado Paredes revestidas Telha em Descarac-
mercado cio com cerâmica fibrocimento terização
Olho da parede
D’Água e teto
Figura 4 - Vista aérea da Praça com identificação da numeração dos imóveis como na figura 2
Fonte: Google, trabalhado por Silva, T. e Cortez, K. 7 jun. 2017.
A Igreja do Livramento possui placa, mas sem informações sobre a história da mesma e do
conjunto das demais edificações. Por outro lado, a ruína em pórtico está sem nenhuma
informação. Em consulta a dois moradores da Praça do Rosário estes afirmaram que a ruína
foi o que restou de imóvel pertencente a João Fernandes Vieira. Em 17 de agosto de 1645,
João Fernandes Vieira participou da tomada do Engenho Casa Forte dos holandeses e
retornou para o seu Engenho São João, na Várzea (Gaspar, 2009, p.1). Conforme a autora,
após a tomada de Casa Forte ele estabeleceu um sistema de “estâncias militares, espécie
de fortificações onde pudessem estar seguros e guardar pólvora e munições de guerra”
(Gaspar, 2009, p.1). A ruína do pórtico se assemelha aos portais de fortificações.
7. Considerações finais
Pelas modificações até o momento realizadas nos imóveis habitacionais se percebe que
faltam: fiscalização por parte dos órgãos de preservação e ações de educação patrimonial
junto aos moradores do sítio histórico, para frear as descaracterizações. Verifica-se que
existe por parte dos moradores o entendimento que a área possui edifícios históricos com
características monumentais. Mas este entendimento é apenas transmitido pelos bens
religiosos enquanto que as casas representariam um caso à parte, como se não fizessem
parte deste todo. Como conclusões se constatam que apesar da existência de instrumentos
legais, as aplicações dos mesmos não acontecem de modo que inibam as
descaracterizações, bem como os manuais e demais instruções técnicas não são
plenamente acessíveis aos moradores destas áreas históricas, da mesma forma que sem
apoio financeiro, muitas vezes, ações eficazes e benéficas às áreas históricas tornam-se
inviabilizadas pelas condições financeiras de moradores e proprietários. Como sugestões
para auxiliar nos problemas são sugeridas: elaboração de um manual de conservação para
o sítio e ações de educação patrimonial junto aos moradores.
Referências
GASPAR, Lúcia. João Fernandes Vieira. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim
Nabuco, Recife. Disponível em: <http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/>. Acessado
em: 11 jun. 2017.
RECIFE, Prefeitura Municipal do. Lei No 16.176/1996 Lei de Uso do Solo. Disponível em:
https://leismunicipais.com.br/plano-de-zoneamento-uso-e-ocupacao-do-solo-recife-pe.
Acessado em: 5 jun. 2017.
RIZZI, Carlos Alberto. Pressão imobiliária e áreas envoltórias dos patrimônios naturais
urbanos: O caso dos bens naturais tombados do Município de São Paulo. Associação
Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade (ANPPAS). Disponível
em: http://www.anppas.org.br/encontro5/cd/artigos/GT13-380-307-20100802141744.pdf.
Acessado em: 10 jun. 2017.
RESUMO
Considerando-se a expressiva ampliação recentemente verificada em fóruns e publicações
acadêmicas e profissionais da mobilização da pauta da participação social e cidadã nas políticas
patrimoniais, pretendemos com este artigo não só apresentar uma reflexão das armadilhas desse
processo a partir de exemplos exteriores ao campo como propor uma inversão da formulação do próprio
problema, atentando para uma eventual condição inerentemente tecnocrática da ação patrimonial
institucionalizada. Neste sentido, parafraseando a clássica provocação de Susan Sontag sobre a crítica
de arte, refletimos a respeito da necessidade não de uma renovada (e participativa) “hermenêutica” do
patrimônio cultural, mas a respeito das possibilidades de uma ação institucional em torno da “erótica
do patrimônio”. O trabalho, então, assume duas frentes com este objetivo: discute, de um lado, os
problemas da ideia de “participação” a partir da bibliografia consolidada sobre o assunto, ainda que
pouco citada no campo patrimonial, e particularmente posiciona as políticas patrimoniais frente a
clássica “escada da participação” de Sherry Arnstein. De outro lado, questiona a eficácia da abordagem
participativista ante a ação direta de coletivos culturais e grupos organizados que vêm pressionando
de baixo para cima políticas patrimoniais consolidadas e questionando a eficácia dos instrumentos de
preservação e salvaguarda existentes. Conclui argumentando pelo reconhecimento da necessidade
de inverter os instrumentos institucionais disponíveis de ação patrimonial e em particular a prática
consolidada do tombamento.
Palavras-chave: patrimônio cultural, participação, cidadania cultural, patrimonialização.
Em face desta provocação, neste trabalho reunimos apontamentos sobre a tensa e delicada
relação atualmente verificada em uma complexa rede patrimonial brasileira que inclui a
comunidade de profissionais e estudiosos, os bens culturais e a sociedade de um modo geral
(tida como a comunidade “leiga”, ora evocada como vilã, ora evocada como guardiã)
destacando as armadilhas em torno da aplicação da multifacetada ideia de “participação”.
Ainda que se trate de palavra polissêmica, normalmente ela é evocada (sobretudo quando
adjetivada como “participação social”) em campos como o do planejamento urbano e o da
gestão pública como um conjunto de processos e práticas que permitam aos vários grupos
sociais que tomem parte seja na formulação de políticas públicas e/ou em sua implementação.
A incorporação dos grupos sociais atingidos por tais políticas em sua elaboração e execução
as dotaria, portanto, de maior legitimidade, transparência e mesmo, eventualmente, de
eficiência.
Ainda que não se trate, porém, de um desejo recente para a formulação de políticas e projetos
— é célebre a declaração atribuída a Aloísio Magalhães há mais de trinta anos de que "a
comunidade é a melhor guardiã de seu patrimônio" —, é de tal forma notável a multiplicação
de sua presença nos vários discursos patrimoniais mais recentes que mesmo eventos inteiros
(como o corrente Mestres e Conselheiros) dedicam-se a discuti-la como temática principal. O
setor do patrimônio cultural no interior da gestão pública, afinal, no alto de seus oitenta anos
de institucionalização, estaria razoavelmente atrasado em relação a muitos outros campos
(como a saúde, a educação e mesmo o urbanismo) que desde os anos 1980 vêm se
movimentando no sentido de implantar conselhos setoriais populares e de promover projetos
e programas caracterizados pela presença de processos participativos — ainda que,
curiosamente, os órgãos de preservação já se organizem em torno de conselhos ou
colegiados semelhantes que envolvem participação de membros da sociedade civil desde
pelo menos os anos 1960, quando tais instituições começaram a se multiplicar nos estados
e, algum tempo depois, nos municípios, ainda que limitados à presença de membros da
burocracia e das universidades.
1 Grifo nosso.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Este conjunto de perguntas, ainda que pareçam triviais frente à trajetória de reflexões sobre
patrimônio no Brasil e aparentemente já resolvidas de um ponto de vista conceitual e teórico,
revelam-se na prática problemas ainda em aberto no cotidiano das ações dos órgãos de
preservação, nos quais ainda, apesar de tudo, são comuns conflitos entre aqueles que
pretendem lutar pela proteção de bens que supostamente correm o risco de se perder contra
a fúria destruidora seja de uma população que “não conhece” ou “não compreende seu
patrimônio” ou de uma igualmente abstrata fúria do mercado imobiliário, que não respeitaria
aquilo que a tecnocracia patrimonial costuma entender como essencial à identidade e à
memória no país.
Nas páginas seguintes procuro demonstrar como a participação, apesar de ser evocada como
um — necessário, reconheça-se — avanço democrático nas políticas patrimoniais, pode
facilmente se revelar uma armadilha ou panaceia. Para tanto, aproveito-me tanto de reflexões
desenvolvidas no dia-a-dia do trabalho desenvolvido no Centro de Preservação Cultural da
Universidade de São Paulo, onde tentamos desenvolver a temática do patrimônio em uma
perspectiva de cultura e extensão universitária (e, portanto, na qual a dialogicidade constitui
um requisito básico a ser alcançado) como de apontamentos recuperados de meu Trabalho
Final de Graduação, de 2012 — cujo tema, apesar de restrito ao universo da arquitetura,
permite destacar algumas provocações válidas para o universo do patrimônio cultural.
Um recente e já consagrado exemplo deste conflito pode ser ilustrado no caso do processo
de patrimonialização do Cine Belas Artes, localizado na esquina das Avenidas Paulista e
Consolação em São Paulo: como forma de resistência dos frequentadores do cinema —
conhecido por se pautar por uma programação alternativa às salas comerciais — à iminente
interrupção de suas atividades, tal grupo social solicitara ao poder público a patrimonialização
do imóvel como forma de salvaguarda não só da prática cultural que ali tinha lugar como da
própria teia de relações simbólicas estabelecidas entre aqueles sujeitos e aquele artefato
urbano. Por se tratar, porém, de edifício sem as características arquitetônicas “excepcionais”,
“autênticas” ou “raras” usualmente evocadas pelo discurso patrimonial dos profissionais e
acadêmicos, o pedido foi em princípio rechaçado. Independente das muitas questões públicas
relevantes à discussão — que dizem respeito ao eventual privilégio da ação do estado em um
território cultural já privilegiado e frequentado por setores ricos da população — é notável
como o campo institucional do patrimônio não conseguira responder adequadamente não só
ao problema como ao desejo evidente daquele coletivo à participação na formulação de suas
políticas.
Parece-nos ainda que a transformação apontada por Meneses em nosso marco normativo, a
partir de 1988, opera não apenas na esfera da inventariação dos bens culturais mas também
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— e especialmente — na esfera da preservação: ao se reconhecer a matriz do valor como
algo oriundo da relação estabelecida entre os grupos sociais e os seus bens culturais e não
como algo específico da matéria, as ações de conservação e restauro deveriam deixar de
focalizar com tanta intensidade a preservação levada às últimas consequências das
características formais e estilísticas (no caso dos bens materiais, mas também dos processos
e técnicas no caso de bens imateriais) e deveriam direcionar seu olhar para a forma como os
bens são fruídos e continuamente ressignificados, incorporando a participação de seus
fruidores, habitantes e portadores, bem como as mudanças cotidianas e mesmo os eventuais
processos de destruição e transformação de suas características materiais. Na mesma
medida, os processos de valorização e difusão dos bens não deveriam focar as características
documentais normalmente identificadas pelo discurso enunciado por arquitetos, historiadores,
arqueólogos, etc., mas nesses contínuos processos de significação e ressiginificação
cotidianos, nos quais a população participa de forma orgânica alterando elementos materiais,
substituindo-os e atualizando-os.
Neste sentido, qual o papel efetivamente associado aos processos participativos quando o
campo institucional do patrimônio evoca a participação como requisito desejável à formulação
de suas políticas e projetos? Em princípio a cultura patrimonial estabelecida e consagrada vê
na participação um inimigo, já que ela envolveria uma população que não estaria devidamente
informada do que significa algo ser um bem cultural. A preservação, nesta perspectiva, busca
proteger os bens da ação deletéria das pessoas — trata-se, grosso modo, de perspectiva
oposta àquela destacada por Meneses em seu comentário sobre o artigo 216 da Constituição
Federal. De outro lado, em oposição a esta perspectiva já considerada antidemocrática e
tecnocrática, a participação é vista como elemento importante em atribuir legitimação
democrática e popular aos processos de patrimonialização — o que pode torná-la ao mesmo
tempo uma armadilha e uma panaceia.
Ainda que o contexto a que este texto faça referência seja outro, é possível extrair dele
algumas lições para a atual corrente “participativista” verificada em parte das discussões
patrimoniais. Maricato alertava para a transformação da participação em um “fim em si
mesmo”, pelo qual a ação de movimentos sociais e políticos se burocratizava e se esvaziava
pela limitação de sua ação ao campo institucional — os objetivos em princípio alvejados pela
estratégia participativa acabam minimizados pelo esforço próprio em tornar a estratégia
efetiva, ainda que apenas formalmente. Neste sentido — mais uma vez, guardadas as devidas
diferenças de escala e de conteúdo entre o patrimônio cultural e a pauta da reforma urbana
que estava na perspectiva da crítica da autora —, o texto nos ajuda a perceber as armadilhas
de um eventual esforço participativo que, para além de uma meritosa intenção inicial no
envolvimento de diferentes sujeitos em qualquer tipo de empreitada cultural acaba por apenas
tomá-la em uma perspectiva formal (cumprindo ou uma participação protocolar, ou uma
participação direcionada para legitimar interesses prévios). Com efeito, como comentamos
acima, no caso do patrimônio cultural, seria admissível por parte dos profissionais e
acadêmicos da comunidade patrimonial que a população participasse em um processo que
demandasse a destruição de bens culturais protegidos com os quais ela eventualmente
estabelecesse outras formas de apropriação que não a preservação?
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Por outro lado, contra uma ação patrimonial tradicionalmente afastada das pessoas, outros
profissionais e acadêmicos ancoram-se em perspectivas como a da já citada frase atribuída
a Aloísio Magalhães: “A comunidade é a melhor guardiã de seu patrimônio.” Aparentemente
mais progressista e participativista, porém, essa perspectiva pode eventualmente reunir
também sua dose de perversidade. Como lembra Marilena Chauí (2006), os grupos
dominantes das sociedades capitalistas, ao longo do século XX, adotaram eventualmente o
discurso do participativismo não como meio de concessão às classes populares de qualquer
forma de deliberação ou autonomia, mas de capitulação e incorporação de seu trabalho. A
participação aqui, portanto, é tomada em perspectiva evidentemente ideológica. Segundo a
autora (2006: 145–146):
Do ponto de vista das políticas patrimoniais, o que isto significa? De um lado, reconhecer na
participação uma armadilha: ela pode se reduzir a instrumento para direcionamento de
opiniões e processos populares para apenas legitimar decisões já previamente tomadas por
grupos de poder. De outro, evitar tomar a participação como panaceia para a solução dos
problemas de ausência de legitimidade democrática das ações de patrimonialização: para
isto, parece-nos que se revela necessário investir em efetivos canais dialógicos na definição
das ações. Pois, como lembra o educador Paulo Freire (citado por Weyh em Streck et alli,
2008: 302–303):
3. “Poder cidadão”: dividido, por sua vez, em “parceria”, “poder delegado” e “controle
cidadão”.
Como se vê apenas pelos títulos, os dois primeiros graus (“não participação” e “cotismo”)
envolvem em grande medida processos de cooptação de forças populares e capitulação dos
discursos de resistência, resguardando as posições de poder privilegiadas. Será apenas na
superação das medidas inferiores da escada (da “manipulação” à “mediação de conflitos”)
que será realmente possível falar em participação cidadã. À época da produção do artigo, a
autora debatia justamente as possíveis consequências de promoção de projetos ancorados
na perspectiva do “poder cidadão”: os eventuais resultados envolveriam uma indesejável
descentralização de políticas públicas em projetos autônomos fragmentados e a consequente
inefetividade das ações e aumento generalizado de custos e de dispêndio de recursos
públicos. No entanto, a autora concluía seu artigo afirmando enfaticamente que os grupos que
exigiam o “poder cidadão” por meio da autogestão de suas comunidades estavam certos
quando argumentavam que nenhuma outra forma de participação havia de fato obtido
sucesso em superar todos os seus problemas inerentes e limitações.
Em outras palavras: temia-se com o “poder cidadão” que, do ponto de vista institucional da
formulação de políticas públicas, tudo saísse do controle. Do ponto de vista do patrimônio
cultural, porém, talvez seja realmente o caso de estimular situações fora de qualquer controle
— pois, afinal, de que controle falamos quando nos referimos à preservação e salvaguarda
do patirmônio? Práticas patrimoniais institucionais tradicionalmente visam a preservação dos
bens culturais de modo a controlar sua inevitável degradação: esta é a situação ótima
desejável pela maior parte dos profissionais de patrimônio, a situação idealmente “controlada.”
No entanto, como já questionamos acima, ao desviar o foco da ação patrimonial dos bens
para os sujeitos — como destacado por Meneses em sua leitura do texto constitucional —
2 No original: “tokenism”.
3 No original: “placation”.
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não é a situação “idealmente controlada” que talvez interesse à complexa teia de relações
simbólicas que deveria orientar a patrimonialização de bens, mas, ao contrário, o
reconhecimento da contingência e da multiplicidade de distintas narrativas e apropriações
possíveis na relação entre os bens e os sujeitos.
Neste sentido, a fim de evitar tanto a armadilha ideológica do participativismo quanto sua
redução a panaceia, deveríamos nos questionar em última instância se um efetivo “poder
cidadão” não deveria propiciar espaços nos quais os vários grupos sociais pudessem
apresentar suas próprias estratégias — autoproclamadas e autogeridas — de identificação,
salvaguarda e valorização dos bens culturais.
A questão, aliás, não está mais sequer em saber se estamos tombando e preservando apenas
bens das elites ou de alguns traços limitados da memória nacional — como se costuma
lembrar ao criticar o rol patrimonializado brasileiro —, mas em inverter os olhares aos
processos de patrimonialização desses mesmos bens, acrescidos de outros: que outras
presenças são tornadas ausências na fruição cotidiana dos bens e na sua ressignificação e
apropriação?
O autor ainda destaca que foi apenas a publicação do célebre estudo de Phillipe Boudon a
respeito das transformações “vernaculares” na arquitetura de Le Corbusier que fez com que
tais mudanças fossem tomadas seriamente pela academia, ressaltando que “não foi até que
Pierre Bourdieu demonstrasse estatisticamente a base social das preferências de gosto” para
que tal fenômeno viesse a ser reconhecido como prática cultural relevante — ainda que, de
todo modo, tal constatação possa levar ela própria à tentativa de patrimonializar tais
mudanças e a colocá-las em uma redoma de vidro.
Talvez, mais uma vez, em última instância, uma efetivamente participativa política patrimonial
devesse se viabilizar de forma completamente invisível e transparente: deixando as coisas
saírem do controle, evitando colocá-las em redomas de vidro institucionais limitadas por
tombamentos ou registros, mas cooperando com o efetivo “poder cidadão” dos grupos
interessados, reconhecendo sua autonomia como sujeitos produtores de cultura.
Destacamos, em particular, o projeto Trafegar pelos Rios do Bixiga, promovido entre 2013 e
2015: a partir de uma oficina desenvolvida em parceria com os membros do Coletivo Mapa
Xilográfico4 voltada à produção de uma série de intervenções urbanas com foco nos rios
canalizados que conformam o território do Bixiga, onde se encontra a sede do CPC, formou-
se de forma autônoma, entre os participantes da oficina e os muitos interessados que se
incorporaram ao processo ao longo das intervenções, um novo coletivo denominado Bloco
Fluvial do Peixe Seco, que vem atuando no espaço urbano de forma intensamente poética
4 Grupo formado pelos artistas e educadores Diogo Rios, Milene Valentir e Tábata Costa.
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pautando a relação da cidade com seus rios — suas memórias, traços, presenças e
ausências. Desde 2014 o Bloco promove novas intervenções urbanas de forma plenamente
autogestionada, colaborando efetivamente para a patrimonialização da rede hídrica paulista:
identificando-a, debatendo sua salvaguarda (física e simbólica) e valorizando-a. Em 2015 e
2016 todo o processo foi objeto de uma exposição na sede do CPC chamada Hidrofaixas: rios
visíveis do Bixiga, na qual buscamos registrar as práticas do grupo5. Pela sua ação direta,
portanto, tal grupo nos provoca a pensar em outras erotizações possíveis do patrimônio, para
além das ações institucionais consolidadas.
Referências
ARNSTEIN, Sherry. A Ladder of Citizen Participation. Journal of the American Institute of
Planners, v. 35, n. 4, jul/1969, pp. 216–214.
5 Para mais detalhes sobre o processo, verificar o relato que produzimos em Fernandes, 2014.
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CHAUÍ, Marilena. Cidadania cultural. O direito à cultura. São Paulo: Fundação Perseu
Abramo, 2006.
MARICATO, Ermínia. Nunca fomos tão participativos. Carta maior, 26/11/2007, disponível
em <http://www.cartamaior.com.br/?/Opiniao/Nunca-fomos-tao-participativos/20899>
MENESES, Ulpiano Bezerra. O campo do patrimônio cultural. Uma revisão de premissas. In:
Anais do I Fórum Nacional do Patrimônio Cultural. Brasília: IPHAN, 2009.
WEYH, Cênio. Participação. In: STRECK, Danilo; REDIN, Euclides; ZITKOSKI, Jaime
(orgs.). Dicionário Paulo Freire. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.
BOEING, Rafael Antônio Motta (1); COSTA, Graziela Elem Ferreira (1).
RESUMO
O município de Sabará/MG possui seu próprio Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural e Natural
desde o ano de 2006. Composto por representantes da sociedade civil e poder público, este órgão
colegiado se tornou então um dos principais responsáveis pela proteção, conservação e salvaguarda
do patrimônio material e imaterial do município. No presente artigo, os autores pretendem abordar a
importância da participação da sociedade civil como instrumento fundamental para a concretização
deste propósito. Partindo da premissa de que o patrimônio não deve mais ser tratado como assunto
meramente técnico (à maneira das políticas de “pedra e cal”), buscar-se-á refletir sobre medidas para
a consolidação de uma visão mais humana, participativa e democrática para as políticas públicas de
patrimônio, a qual integre, em sua formulação, implantação e avaliação, o máximo da diversidade das
comunidades direta ou indiretamente vinculadas a bens culturais protegidos do município. Para tanto,
analisar-se-á dois casos específicos: a ampliação da representatividade social dentro do Conselho
em questão por meio da reformulação de sua dinâmica interna e o estímulo a uma atuação mais
incisiva e proativa dos conselheiros da sociedade civil através da formação de comissões temáticas,
entre outros espaços direcionados à proposição e mobilização de ações e agentes – de modo a
extrapolar uma participação restrita às plenárias e votações sobre requerimentos e pareceres. Sendo
assim, o artigo se debruçará sobre questões teóricas e práticas relativas à composição,
representação e função do Conselho em questão, levantando possibilidades para melhorar não
apenas sua capacidade deliberativa, mas também propositiva e mobilizadora.
Cabe destacar que esses efeitos foram resultados não apenas da legislação
municipal, mas de um programa do governo estadual: o ICMS Cultural. Inaugurado pela Lei
Estadual nº 12.040/1995, ou Lei Robin Hood, o programa do ICMS Cultural se tornou então
um dos principais indutores da adoção de políticas municipais direcionadas ao patrimônio no
estado de Minas Gerais. Na medida em que estipulou a redistribuição de uma parcela do
Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de
Serviço (ICMS) com base em critérios de preservação dos bens culturais e/ou naturais de
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cada município, o programa veio incentivar diversas Prefeituras a desenvolverem ações de
patrimonialização de bens culturais em nível municipal, sobretudo por meio da atuação de
conselhos gestores das políticas do setor. Embora o ano de 1995 tenha sido o marco inicial,
o programa obteve sua regulamentação básica somente nos anos de 1996 e 1997. Nessa
regulamentação, o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais
(IEPHA/MG) – órgão responsável por orientar os municípios em suas ações
preservacionistas – definiu a existência de “Planejamento e Política Municipal de Proteção
do Patrimônio Cultural” como importante atributo de pontuação dentro do programa. Tal
atributo seria comprovado não apenas através da criação e manutenção de uma legislação
municipal e/ou de uma equipe técnica específica, mas também dos referidos conselhos:
1Cabe destacar que a mais recente Lei de Uso e Ocupação do Solo do município de Sabará, datada do ano de
2015, determina que as construções e reformas a serem feitas em Zonas Especiais de Interesse Cultural (ZEICs,
equivalentes às APCs) estarão sujeitas à análise específica do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural e
Natural de Sabará (Artigo 14, § 3º).
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de outros bairros e cidades com a perspectiva de edificar ali a sua casa própria. Uma
dessas ocupações avançava a partir do bairro Rosário I, por exemplo, região de ocupação
recente sem nenhum vínculo com a história e memória do Centro e com baixíssimo
sentimento de pertencimento ao município como um todo. O tombamento levantou então
uma questão fundamental para conselheiros e agentes do patrimônio em geral: como
trabalhar a salvaguarda do patrimônio com aqueles grupos sociais que sempre estiveram à
margem da história e memória oficialmente reconhecida do município?
No período entre 2007 e 2012, por sua vez, o município desenvolveu um novo
inventário do patrimônio cultural, dessa vez abarcando as mais variadas categorias de bens
e sendo orientado pela divisão territorial do município. Sendo assim, a cada ano, o trabalho
de mapeamento, identificação e pesquisa foi empreendido em uma região diferente, partindo
do Centro/Sede e depois envolvendo os bairros Paciência, Roça Grande e General
Carneiro, a região do Arraial Velho, o distrito de Ravena, o bairro Siderúrgica e o distrito de
Mestre Caetano, levantando em cada território não apenas as estruturas e/ou conjuntos
arquitetônicos e paisagísticos, mas também os bens móveis, integrados, arquivísticos,
arqueológicos e imateriais. A partir desse trabalho, os olhares do Conselho Deliberativo do
Patrimônio foram cada vez mais se voltando também para os bens culturais localizados fora
da Sede do município, levando-o a reconhecer vários deles também pelos mecanismos do
tombamento e do registro. Foi o caso, por exemplo, do tombamento do Núcleo Histórico de
Ravena, ano de 2010, e do registro dos Modos de Fazer dos Pratos e Derivados do Ora-pro-
nobis, focado sobre o distrito de Mestre Caetano, no ano de 2014.
Cabe observar que as reflexões deste artigo foram motivadas pelo fato de que seus
dois autores são, por ocasião de sua escrita, membros do Conselho Deliberativo do
Patrimônio Cultural e Natural de Sabará, representantes do poder público, funcionários da
Secretaria de Cultura, e de que, há algum tempo, vêm reconhecendo, junto com outros
conselheiros, a necessidade de uma revisão e reformulação de seu Regimento Interno.
Como já foi dito, o Regimento Interno do Conselho em questão foi elaborado no ano de
2006, logo em seguida à publicação do decreto que o atribuiu função deliberativa. No
entanto, embora tenha feito uma significativa reforma nas atribuições do órgão colegiado,
seu texto ainda se espelhava bastante no decreto fundante do ano de 1991, sobretudo no
que se refere à composição e representação, mantendo-se, nesses aspectos, bastante
insuficiente. Estabelecendo tão-somente a quantidade de membros efetivos e suplentes, o
Regimento Interno não determinava cadeiras/vagas por órgão, setor e/ou território e
tampouco obrigava a paridade entre representantes do poder público e da sociedade civil.
Pelo contrário, deixava a escolha do formato/composição do Conselho a cargo (e à mercê)
do Prefeito Municipal, responsável pela nomeação dos conselheiros, permitindo que este
definisse livremente os critérios de seleção. Em função disso, a nomeação raramente
ocorreu de forma mais democrática, através de eleições, por exemplo, mas sempre por meio
de indicações feitas pelos gestores públicos ou pelos próprios conselheiros previamente
nomeados, recaída sobre profissionais de “notório saber”, ou não. Essa condição trazia
sempre o risco de que o Conselho se tornasse, a cada mandato, um órgão meramente
reprodutor e/ou corroborante das demandas, vontades e projetos do governo vigente, além
de manter uma dinâmica cada vez mais excludente, na qual apenas determinados atores
conseguissem mobilizar interesses e se organizar politicamente, fazendo predominar suas
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A valorização do bem cultural como tal só é conquistada quando o objeto passa a ser
democratizado e compartilhado, transmitindo-se seu conhecimento e significados. Com esta
valorização, a postura da sociedade se modifica e as ações para conservação e
salvaguarda passam a ser encarados com mais rigidez e cautela. A participação social dos
diversos grupos sociais, culturais, étnico-raciais pertencentes ao município é um ponto
crítico nesse quesito, em que o objeto vem a ser compreendido não somente por um olhar
técnico, mas também se leva em conta a sua parte simbólica de identidade e memória dos
grupos tanto do Centro quanto da Periferia. Por meio desse artigo, buscamos promover a
reflexão sobre alguns caminhos possíveis para a democratização das políticas municipais
de patrimônio em Sabará, discutindo a ampliação da participação social dentro de seu
Conselho e o estímulo a uma atuação mais incisiva e proativa da sociedade civil embasados
pelas novas perspectivas e olhares do campo do patrimônio, os quais vêm abordar os bens
culturais não apenas por critérios estéticos, históricos e materiais, mas também por aspectos
sociais, de meio ambiente, de identidade e das relações entre os bens e a própria
comunidade.
CHUVA, Márcia R.R. Por uma história da noção de patrimônio cultural no Brasil. Revista do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Brasília: IPHAN, n. 34, p.147-165, 2011.
CRUZ E SOUZA, Luciana Christina, MORAES, Nilson Alves de. Preservação do patrimônio
em Minas Gerais: a “Lei Robin Hood” e os conselhos municipais de patrimônio. Revista
Sociais e Humanas. Santa Maria, v. 27, n. 2, 2014.
SANTOS, Cecilia Rodrigues dos. Novas fronteiras e novos pactos para o patrimônio cultural.
São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 15, n. 2, p. 43-48, abr. 2001. Disponível em:
<http://goo.gl/WAAgCm>.
RESUMO
A paisagem urbana pode ser entendida como uma das propriedades de um fenômeno cultural, que
está sempre em movimento e, que o seu formato atual pode não ter sido igual em nenhuma de suas
temporalidades. A partir disso apresentamos a pesquisa que está sendo realizada pelo programa
Laboratório de Educação em Desenvolvimento de Soluções - Leds, em Colatina – Espírito Santo, com
foco na preservação do patrimônio cultural, em busca de salvaguardar informações referentes ao
patrimônio da referida cidade. Patrimônios são valores atribuídos a história de um determinado local,
possuem grande valor para os moradores de seu município e para seu município por assumir valores
de interesses coletivos. Com a ação do tempo, o uso indiscriminado ou, ao contrário, o seu abandono
leva suas propriedades a se deteriorarem, perdendo suas características originais. Contudo, poucos
são os municípios que se preocupam em executar reformas para prolongar sua existência. Com base
nos fatores acima, e as novas políticas que empurram os bens históricos para o círculo da gestão
municipal cresce uma maior busca por meios de preservar o patrimônio cultural. A informática é uma
área que não para de crescer, e atualmente a tecnologia de dados em nuvem está se expandido
rapidamente. Partindo dessa ideia estamos desenvolvendo um sistema para gestão de patrimônios
culturais, que envolve pesquisa e registros virtuais, com divulgação imediata e direta no próprio
monumento. Trata-se do projeto “QR Code Patrimônio, Monumentos Históricos”. O objetivo principal é
desenvolver um sistema online para salvaguardar documentos referentes aos patrimônios culturais no
município de Colatina. Reúnem se opções de cadastro para fotografias gerais e técnicas, modelos em
3D produzidos no software Sketchup, descrições em nível de memorial, dados técnicos, o registro de
localização via Google Maps, banco de comentários, além de contar com a tecnologia QR Code, que
vem estabelecer uma ponte entre o patrimônio virtual e o físico, ou seja, os monumentos terão uma
tarja QR Code que, ao ser acionada por um dispositivo móvel, será redirecionada para o sistema
recebendo conteúdos como a história do patrimônio, trazendo como benefícios o despertar da
curiosidade, educação sobre história e patrimônio em geral, visando a preservação da memória local
e a expansão de suas informações para diversas pessoas em diferentes localidades.
Palavras-chave: Arquitetura; Patrimônio Cultural; QR Code; Salvaguarda; Sistema.
Em Colatina – Espírito Santo, está sendo desenvolvida uma pesquisa com foco no
patrimônio cultural, em busca de armazenar em um ambiente virtual, documentos que
descrevam a história de um determinado monumento. E, manter atualizados os diversos
interesses sobre eles e a cidade, possibilitando acesso rápido, com conteúdo técnico,
histórias orais, permitindo interação dos usuários.
A informática possivelmente foi o ramo que mais influenciou o século XX e XXI. É algo
indispensável para os dias atuais, pois passou a ser parte do nosso cotidiano. Tudo é
informação, ao ligarmos um dispositivo móvel e mandarmos mensagem de texto através de
um Short Message Service(SMS) que em português significa Serviço de Mensagens Curtas
para outro dispositivo estamos fazendo uma troca de informação, isto vale também para
quando estamos enviando um email de um computador para outro.
Atualmente a informática se encontra no seu maior auge devido que, grande parte da
população atual, possui condições financeiras para adquirir um computador, celular, tablet,
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entre outros dispositivos que trocam informação, já que o hardware dos mesmos teve uma
queda considerável de preço. Além disso, hoje é também muito acessível à transmissão da
internet para os computadores e dispositivos móveis pois ouve uma queda nas tarifas que o
usuário necessita para ter tal serviço e isso incentivou ainda mais a popularização da
tecnologia da informação.
Há alguns anos atrás, a troca de mensagens entre as pessoas era mais demorada,
dependia dos serviços de correios, as correspondências que o remetente escrevia levava
dias para chegar ao seu destinatário, agora graças a internet a troca de mensagens e quase
instantânea e simultânea, como afirma CASTELLS:
Atualmente uma tecnologia que faz parte da internet e que está em crescente uso é a
tecnologia de armazenamento de dados em “nuvem”. A computação em “nuvem” dá à
possibilidade de armazenar e executar, alterar e excluir seus dados online, conta com sites
do tipo Dropbox onde é possível salvar seu arquivo e o mesmo disponibiliza um link para o
usuário poder compartilhá-lo para outros usuários.
Fonte: Autor
O projeto é de marketing, foi desenvolvido pela agência MSTF Partners para a Associação
de Valorização do Chiado (AVChiado), com intenção de gerar enorme repercussão, pois
segundo Tomás Froes "coloca o nome de Portugal e do Chiado no mundo", a empresa vai
monitorizando o número de vezes que o código é acedido, especialmente por turistas (P3,
2017).
O resultado foi tão exitoso que seu uso se expandiu para o Brasil. Um QR Code também foi
aplicado no calçadão da praia do Arpoador, na cidade de Rio de Janeiro, este foi construído
utilizando piso de pedras portuguesas. Então, ao apontar o dispositivo móvel que contenha
o software leitor de QR Code para o piso, será redirecionado a um sistema web que
apresentará as informações detalhadas sobre aquele local. Este faz parte do QRio que
possui como intuito instalar QR Codes em mais de 30 pontos da capital carioca, este darão
acesso aos turistas à origem do nome do nome da região e dicas de atividades turísticas,
culturais e gastronômicas (Viagem e Turismo, 2017)
Desenvolvimento
Nossa pesquisa também tem buscado verificar os aspectos físicos e sociais dos sítios e
monumentos. Localizando marcos fragmentados que permaneceram através da memória
dos usuários da cidade na significação dos lugares. Assim, procuramos identificar seu
passado para ver como o mesmo funcionava e com isso buscar um meio de registrar seu
contexto histórico.
Desde sempre se consagra que as melhores leituras das paisagens nas conformações de
espaços em seus aspectos sociais, modis vivendis etc., se faz através da Arquitetura. Um
portfólio de vidas cotidianas em diferentes temporalidades. Ou pelo Urbanismo, que em uma
escala maior investiga os usos e os percursos dos vestígios e das ações sociais em seu
movimentado desenho da paisagem cotidiana (COSTA; GOMES, 2016).
Antes do início do desenvolvimento desse projeto, alguns alunos pesquisadores dos cursos
de Arquitetura e Urbanismo e Sistemas de Informação do Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia do Espírito Santo Campus Colatina participaram de projetos relativos à
preservação dos patrimônios culturais da cidade de Colatina. Os mesmos realizaram
diversas pesquisas em campo para coletar informações relativas aos patrimônios que
estavam pesquisando. Um dos projetos que podemos citar é o da preservação da Antiga
Estação Ferroviária de Colatina.
Há alguns anos atrás, entre 1920 a 1975, pessoas se deslocavam de Colatina para outra
cidade através do trem que se situava no centro urbano do município. Esse meio de
transporte era o mais utilizado, numa época em que o Brasil ainda não havia incorporado ao
seu desenvolvimento o transporte por vias rodoviárias (COSTA; GOMES, 2016).
Assim, procuramos identificar seu passado para ver como o mesmo funcionava e com isso
buscar um meio de registrar seu contexto histórico. Para alcançar tal intento, fizemos um
estudo bibliográfico, concernente às principais referências identificadas na estação
ferroviária de Colatina, onde as fontes de estudo foram: Entrevistas com pessoas que
viveram na época que a mesma existiu, literatura produzida que possam remontar o
contexto histórico da cidade de Colatina, nesse período. Através da coleta de material,
conseguimos perceber como eram os modelos construção da época e assim, reproduzimos
a antiga estação ferroviária de Colatina em um ambiente 3D, utilizando o software SketchUp
(COSTA; GOMES, 2016).
Outro patrimônio cultural que será cadastrado no sistema é o Iate Clube Colatina. A data de
construção se iniciou no ano de 1950. Sua construção só se tornou possível devido que a
administração pública doou uma parte do terreno para um grupo de empresários locais. Foi
projetado pelo arquiteto Marcello Vivacqua inspirado na sinuosidade dos projetos
modernistas de Oscar Niemeyer, o monumento foi cenário de diversos eventos. O Iate
Clube de Colatina desde seus primórdios contava com uma grande adesão da sociedade
colatinense, tornando-se um símbolo e cartão-postal do município (in: REVISTA NOSSA,
1989). Porém o mesmo funcionou até o ano de 2010, por conta de interesses econômicos
do grupo de sócios, proprietários do terreno e da edificação, o mesmo foi demolido.
Além dos citados acima, estão em estudo os seguintes patrimônios culturais: Igreja de
Colatina Velha, Câmara Municipal, sobrado eclético à Ladeira Ribeiro do Rosário e Banco
Itaú (Praça municipal).
Etapas da Pesquisa
Pesquisas foram iniciadas, e assim coletamos uma gama de materiais referentes aos
patrimônios culturais de Colatina e logo percebemos que precisaríamos de uma plataforma
virtual armazenar e compartilhar os dados coletados.
Esse projeto visa produzir um site como inovação, para de alguma forma armazenar dados
referentes aos patrimônios culturais. Através de entrevistas com moradores de Colatina e
visita à biblioteca municipal da cidade, colhemos uma gama de dados. Conseguimos através
disso, informações dos patrimônios e imagens em diferentes épocas do mesmo.
O site é constituído por dois módulos que são: Primeiro módulo é o de gerenciamento, ou
seja, é a parte em que será possível alimentar o sistema com informações relativas aos
patrimônios culturais e o segundo módulo é onde serão somente apresentadas às
informações referentes aos patrimônios culturais, está foi desenvolvida para que o público
em geral possa observar as informações dos patrimônios cadastrados no sistema.
Primeiro Módulo
Logo após, temos Situação Entorno, são entradas as informações referentes à situação do
entorno atual do patrimônio. O próximo é o Modelo 3D, alguns alunos de Arquitetura e
Urbanismo estão modelando em 3D alguns monumentos de Colatina usando o software
SketchUp. Partindo dessa ideia, criamos uma opção para também poder cadastrar modelos
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3D no site, mas para isso, o usuário terá que fazer primeiramente o upload de seu modelo
no site 3dwarehouse.sketchup.com, logo após, será gerado um código embed. Tendo o
código em mãos, bastará o usuário cadastrar o mesmo em nosso site, posteriormente será
explicado melhor como isso funciona. Logo a seguir vem às operações alterar, onde o
usuário poderá atualizar os dados que o mesmo cadastrou no sistema e a opção excluir,
que excluirá todas as informações referentes ao patrimônio que foi selecionado para a
exclusão.
Ao clicar na aba QrCodes Podemos aplicar um nome para o código e referenciar o mesmo
para um dos patrimônios cadastrados. Já na aba Comentários é onde ficam organizados
todos os comentários que os visitantes cadastraram no site, ou seja, no final da página de
cada patrimônio cultural terá um campo para o visitante poder comentar sua opinião
referente a àquele patrimônio, ao comentar, seu texto irá para a sessão de Comentários, e
então, o administrador do sistema terá as opções de Aprovar, reprovar ou excluir os
comentários. Caso o mesmo aprovar, o comentário que o visitante fez ao seu referido
patrimônio aparecerá para que todos os que visitarem o site, caso o administrador reprovar
o comentário, o mesmo não aparecerá para os visitantes do referido patrimônio e em caso
de exclusão, o comentário é deletado do sistema.
O segundo módulo como já foi explicado acima é a parte onde o público em geral visualizará
as informações dos patrimônios culturais cadastrados no primeiro módulo.
Na figura 4 podemos visualizar a tela inicial do segundo módulo. Quando o botão Começar é
acionado, será direcionado ao carrossel contendo diversas imagens. Essas figuras na
verdade são imagens capa dos patrimônios, ou seja, a imagem principal do monumento ou
sítio.
Para visualização das informações de um patrimônio, será necessário apenas clicar sobre
uma das opções acima. Primeiramente aparecerá o título do patrimônio no topo da página,
logo em seguida, as imagens do referido patrimônio, seguindo logo abaixo dos dados
relativos ao patrimônio, tais como: Descrição, Dados Técnicos, Veja o projeto em 3D, se
Como citado anteriormente, serão cadastrados para cada patrimônio um código QR Code e
isso será feito pelo administrador ou usuário comum no primeiro módulo do sistema. Então
esses QR Code serão impressos e colados nos patrimônios materiais. Ou seja, existe um
patrimônio com o nome de Antiga Estação Ferroviária de Colatina cadastrado no sistema,
esse é o patrimônio virtual, então, será impresso o QR Code referente a esse e colado no
local onde atualmente se localizava esse patrimônio. Assim, bastará apenas o apontamento
de um dispositivo móvel para o código e o aplicativo redirecionará para o segundo módulo
do sistema, que contará toda a história do patrimônio.
Considerações Finais
A informática é um ramo da informação que nos ajudou a obter acesso rápido à qualquer
tipo de informação, por esse fator, ficamos acostumados à obter uma pesquisa e obtenção
de dados rápido de uma determinada coisa, então decidimos usar a tecnologia QR Code à
nosso favor para facilitar o rápido acesso aos dados referentes à um determinado patrimônio
cultural.
Referências
COSTA, Ana Lucia Reis Melo Fernandes. Desvendando a Casa Verde Amazônica: A
Anastilose Espacial de Núcleos Seringais no Rio Acre, 1870-1910. 2011. Tese (Doutorado
em Pós-graduação em Desenvolvimento Urbano) - Universidade Federal de Pernambuco.
COSTA, Ana Lucia Reis Melo Fernandes; GOMES, Wellington Gomes, Em Busca da
Paisagem Perdida, p. 2-13, Belo Horizonte, set. 2016.
MADURO, Luiz Carlos. Iate Clube. Revista Nossa. Colatina, v. 1 n.7, p. 33-35, out. 1989.
SAVAZONI, Rodrigo; COHN, Sergio. Rio de Janeiro: Azougue editorial, 2009. Disponível
em : <http://culturadigital.br/wp-content/blogs.dir/1/files/2013/06/cultura-digital-br.pdf>.
Acesso em: 7 fev. 2014.
P3, O primeiro código QR feito em calçada portuguesa. Disponível em: <
http://p3.publico.pt/vicios/hightech/4274/o-primeiro-codigo-qr-feito-em-calcada-portuguesa>.
Acesso em 15 de junho de 2017.
Viagem e Turismo, Rio de Janeiro agora tem QR code no calçadão da praia. Disponível em:
< http://viagemeturismo.abril.com.br/destinos/rio-de-janeiro-agora-tem-qr-code-no-calcadao-
da-praia/ >. Acesso em 15 de junho de 2017.
RESUMO
O estudo da paisagem discute sua formação por meio dos elementos culturais e naturais em todos os
seus aspectos, enquanto o estudo do edifício é compreendido por meio da sua materialidade e
contexto urbano. As teorias da restauração são de suma importância para o desenvolvimento de uma
metodologia específica de análise em obras de intervenção ou restauro em bens de interesse cultural.
Partindo do entendimento das etapas de intervenção em um bem patrimonial arruinado, este artigo
busca analisar questões que envolvam paisagem, monumento, ambiência e técnica em todas as suas
especificidades. Toma como estudo de caso um conjunto de ruínas localizadas no centro histórico de
São João del-Rei (MG), a partir da abordagem de seu histórico, enfatizando as transformações
sofridas ao longo do tempo, até sua conformação atual. O objeto em questão insere-se em um
complexo de construções caracterizadas como fortificações da Guerra dos Emboabas, dentro do
perímetro de entorno de tombamento do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(IPHAN). O interesse pelo estudo dessas ruínas nasce da preocupação com a conservação da
memória que se faz necessárias e consolida em proposta de intervenção apresentada com base nas
teorias do restauro. Em São João del-Rei, os monumentos arruinados não tem sua preservação
assegurada, em parte pela ausência de diretrizes voltadas para esses bens, assim como por atitudes
da própria população que, na maioria das vezes, não entende a importância da proteção de seu
próprio patrimônio. Pretende-se, aqui, despertar o potencial do ambiente analisado como um espaço
de lazer, entretenimento e cultura para moradores, através de proposta projetual, contribuindo para a
valorização da história da cidade e da paisagem urbana.
Palavras-chave: Ruínas; Fortim dos Emboabas; Preservação; São João del-Rei; Patrimônio.
São muitas as visões possíveis relacionadas à ideia de ruína. Por essa razão, buscou-se
aqui trabalhá-la considerando suas inter-relações na história e a formação de sua memória
fragmentada. Segundo Ruskin (2008), “nós podemos viver sem ela [a arquitetura], e orar
sem ela, mas não podemos rememorar sem ela”. E ainda, “quantas páginas de registros
duvidosos não poderíamos nós dispensar, em troca de algumas pedras empilhadas umas
sobre as outras” (RUSKIN, 2008, p. 54).
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Ruskin (2008) ainda nos diz que a importância da preservação da arquitetura e de seu
significado histórico reside no ponto de a obra poder chegar ao seu estado de ruína. A ruína
carrega em si uma beleza que não pode ser comparada a nenhuma outra, tornando se
pitoresca, termo utilizado pelo autor para representar a grandeza do valor histórico e cultural
nela presente. Ao mesmo tempo, Cesari Brandi (2004), teórico contemporâneo, enuncia a
ruína não como uma mera realidade empírica, mas uma qualificação que compete a algo
que deva ser pensado de modo simultâneo sob o ângulo da história e da conservação. Deve
ser concebida não apenas e limitadamente na sua consistência presente, mas no seu
passado, e com vistas ao futuro, para o qual deve ser assegurada como vestígio ou
testemunho da obra humana e ponto de partida do ato de conservação.
A ruína é, pois, “tudo aquilo que é testemunho da história humana, mas com um aspecto
bastante diverso e quase irreconhecível em relação àquele que se revestia antes” (BRANDI,
2004, p.65). Esse conceito está totalmente embasado em estudos de ações e intervenções
em ruínas pelos interesses histórico e estético, considerando-as como o extremo da
preservação da obra de arte. Para o autor, as intervenções em ruínas devem somente
envolver a estabilização das estruturas e conservação de seu contexto.
As ruínas, de acordo com Pontes (2010) são bens que parecem se recusar a serem
esquecidas, caracterizadas por reunir em um único espaço destruição e preservação. A
autora também ressalta a posição de Walter Benjamin em seu livro Origem do Drama
Barroco Alemão:
Pontes (2010) coloca que as alegorias são no reino dos pensamentos o que são as ruínas
no reino das coisas, pois, em meio à representação de uma edificação que não é mais o que
originalmente foi, as ruínas oferecem um teatro caricato, de confusão e visões diferenciadas
conforme o espectador, ou seja, uma multiplicidade de sentidos e interpretações. “Uma
confusão que, curiosamente, possui nexo, pois uma realidade é formada, mesmo que
advinda do despedaçado. Aliás, uma confusão que dá a beleza às ruínas, pela possibilidade
de variadas interpretações” (PONTES, 2010, p.22).
O estudo de ruínas deve advir da preocupação com a conservação da memória que se faz
concreta, memória esta que, em São João del-Rei, não está resguardada pelas legislações
dos órgãos patrimoniais da cidade e/ou pela população que na maioria das vezes não
reconhece a importância da proteção de seu próprio patrimônio.
Sabemos que cada momento histórico preserva o que considera relevante para si. A
preservação, portanto, se comporta como um processo seletivo. Entretanto, ao longo do
tempo, a ideia do que deve ser preservado sofreu uma significativa ampliação, visto que
uma geração não deve privar as gerações futuras de determinados padrões ou modelos que
possam vir a ser considerados de importância histórico-cultural. Hoje, com os constantes
estudos visando o alargamento da noção de patrimônio para bem cultural, os bens
imateriais, assim como os materiais, transmitem conhecimento em vários campos do saber
e assumem um papel memorial ligado à necessidade de permanência. A preservação,
portanto, é um ato cultural e não se restringe a um bem arquitetônico isolado. Um bem
cultural só mantém a sua integridade e sua totalidade quando resguarda todos os legados
materiais, imateriais e naturais que demonstram a cultura que o construiu, como um ciclo
completo de pensamento e de materialidade.
As recentes ampliações do que consideramos como bens culturais estão trazendo grandes
desafios para o campo da restauração. Hoje, compreendemos o patrimônio como um
conjunto de bens culturais ligados ao conhecimento e aos artefatos produzidos pelo homem
que tem importância reconhecida em cada lugar, tempo, região ou país, de formas
diferenciadas. Para Choay (2001), a tripla extensão – tipológica, cronológica e geográfica –
dos bens patrimoniais é acompanhada pelo crescimento exponencial do público. Com isso,
aumentaram também as constantes ameaças em relação as suas perdas, em contrapartida
a um consenso cada vez maior em relação a sua preservação. Neste sentido, vemos
grandes desafios em relação às diretrizes e metodologias para o enfrentamento das
questões práticas que envolvem a sua permanência e garantia de sua transmissão às
gerações futuras.
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Neste sentido buscamos na Teoria da Restauração de Brandi (2004) uma metodologia para
consolidar nossa proposta. Brandi escreveu sua teoria objetivando a interface entre as
disciplinas de história, crítica, estética, teoria e prática do restauro, e consolidou, dentro de
métodos científicos, o reconhecimento da peculiaridade do restauro em relação ao "produto
especial da atividade humana que se dá o nome da obra de arte” (BRANDI, 2004, p.27).
A proposta de Brandi não foi criar uma regra fixa, mas construir princípios gerais e que
podem nortear as intervenções e os meios, que são colocados de forma diferente em cada
obra. As soluções a serem adotadas serão individuais, mas alicerçadas nos
encaminhamentos gerais brandianos. O intuito é que o bem seja transmitido da melhor
maneira para o futuro, sem ser falseado ou transfigurado, para que continue sendo fonte fiel
do conhecimento e da memória coletiva. Assim, a intervenção deverá ser justificada sempre
do ponto de vista das razões pelas quais se preserva.
Segundo Beatriz Kühl (2005), as escolhas operacionais deveriam ser justificadas à luz das
razões e dos objetivos da preservação e feitas como conseqüência da análise dos princípios
de intervenção em relação a cada um dos casos, pois toda obra tem uma configuração que
lhe é própria, assim como seus materiais e seu particular transcurso ao longo do tempo.
Para Brandi (2004), toda a ação prática deve ser encaminhada por um princípio teórico de
restauro. Portanto, deve-se ter rigor metodológico, construindo a análise da obra sobre os
aspectos físicos, formais, e na sua história. Como aponta Beatriz Kühl (2005),
Assim, com base nos conceitos de Brandi (2004), a restauração hoje deve seguir os
seguintes princípios essenciais:
Cesare Brandi trata das ruínas em conjunto com seus estudos sobre restauração. Segundo
o autor, as ruínas também são vistas como uma representação do passado que não existe
mais, em que “ruína será, pois, tudo aquilo que é testemunho da história humana, mas com
um aspecto bastante diverso e quase irreconhecível em relação àquele de que se revestia
antes” (BRANDI, 2004, p.65). É, então, o aspecto incompleto e fragmentado da ruína que a
define. E por este motivo, a mesma pode contar com diversas leituras, uma vez que aquilo
que falta pode ser imaginado, bem como sua trajetória até a composição enquanto ruína.
Brandi ainda explicita que a ruína é “testemunho do tempo humano e se constitui enquanto
resquícios e o testemunho mutilado do monumento e que intrinsecamente conota ações de
conservação que, por sua vez, envolvam nada mais que consolidação e conservação do
contexto do monumento” (BRANDI, 2004, p.65). Para ele, a “restauração, para representar
uma operação legítima, não deverá presumir nem o tempo como reversível, nem a abolição
da história” (BRANDI, 2004, p.61). O tempo entre a construção da obra e seu presente
devem ser respeitados, deste modo, já que é este que a define - enfatizando a importância
do trajeto histórico do monumento.
Analisando a ruína tanto pela instância histórica como pela estética, Brandi (2004) ressalta a
importância histórica da ruína, pelo próprio trajeto temporal que a mesma realizou e por isso
a necessidade de valorização de tal aspecto nas ações de conservação. "De qualquer
modo, a ruína também apresenta valor estético por ser um elemento caracterizador de seu
espaço – tanto que isso faz com que a mesma torne-se válida e completa em seu estado
atual" (BRANDI, 2004, p. 83).
De acordo com Ruskin (2008) a integridade das ruínas, como um conjunto formal e técnico-
construtivo, destaca-se como o bem de maior valor que se poderia legar às novas gerações.
Essa “herança” seria o mecanismo responsável por transferir ao espaço construído os
sentimentos de pertencimento e apropriação de seus valores memoriais. Para o autor, as
edificações deveriam ser obras de valor histórico em potencial. Desta forma deveriam
causar tamanha admiração em seus “herdeiros” a ponto de virar referência cultural,
independentemente de sua excepcionalidade como obra arquitetônica.
Ruskin (2008) compreende a idade como o principal atributo da edificação. À medida que
permanece íntegra ao longo do tempo, a edificação adquire beleza ao sofrer os efeitos da
pátina de passados 400 ou 500 anos, tornando essas qualidades temporais e acidentais
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incompatíveis com os processos de restauração. As ruínas se tornam sublimes a partir dos
estragos, das rachaduras, da vegetação crescente e das cores que o processo de
envelhecimento confere aos materiais da construção. Elas são o testemunho da idade, do
envelhecimento e da memória, podendo, assim, expressar a essência do monumento.
O culto às ruínas se exprime em todo o seu romantismo quando Ruskin (2008) propõe uma
reflexão sobre o valor dos trabalhos de restauração sobre o antigo estado da edificação,
acreditando que aquelas características remanescentes possuíam o encanto do mistério do
que teriam sido e a dúvida do que teria se perdido. A partir disso, considera a restauração
como “a mais total destruição que um edifício possa sofrer: uma destruição no fim da qual
não resta nem ao menos um resto autêntico a ser recolhido, uma destruição acompanhada
da falsa descrição da coisa que destruímos" (RUSKIN, 2008, p.42).
Já para Ruskin (2008), algumas intervenções até são permitidas, porém, apenas para
conservar a edificação. O autor aceita pequenas obras de consolidação. Quando as
mesmas perdiam sua utilidade, ele conformava-se frente à “morte” certa e natural que toda
edificação teria um dia. Assim, defende então a "morte" dos monumentos. Percebe-se com
isso, um aspecto nostálgico em seu pensamento, o que corrobora o seu lado romântico,
induzido-o à poesia e subjetividade na preservação dos monumentos históricos, chegando a
tomar em alguns momentos, atitudes radicais em restaurações. Seu posicionamento é
evidentemente contrário a intervenções, porém essa atitude acaba levar a cabo o que o
próprio Ruskin defende, o valor memorial da arquitetura.
Histórico e características
Figura 1: Ruína do Fortim dos Emboabas, em primeiro plano. Fonte: Arquivo pessoal dos autores,
2016.
Devido à sua localização no alto de uma colina e a proximidade com importantes edificações
ou locais da cidade, tem-se a partir dali, uma vista privilegiada, principalmente de todo
centro histórico, motivo o qual se atribui a essa região a existência de fortificações. Em
decorrência da Guerra dos Emboabas, nasceram as narrativas da existência de uma ou
várias Fortificações Emboabas em territórios pertencentes a São João del-Rei. Antonil
(1982) relata a existência de um forte emboaba no Arraial do Rio das Mortes - uma das
antigas nomeações de São João del-Rei -, que pode ter sido construído no período da
guerra. Segundo ele:
Porém, para alguns autores, a narrativa da construção de edificações como fortificações dos
Emboabas constituem uma lenda urbana, ou um causo criado visando manter a história
viva. A maior parte da população local reconhece a ruína em estudo apenas como um antigo
“casarão” demolido, relatando que poderia ter servido como senzala, ou ter sido de fato
utilizado como apoio para a extração do ouro, pois dentro de suas dependências ainda
existem entradas para betas.
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Como visadas principais, a partir da ruína, têm-se a antiga rua Direita, atual rua Getúlio
Vargas, rua de extrema importância para o crescimento e ordenamento urbano de São João
del-Rei, onde estão localizadas algumas das principais igrejas históricas da cidade: Igreja do
Pilar, Igreja do Rosário e Igreja do Carmo. Uma das lendas contadas em São João del-Rei
diz respeito a uma betas localizadas no terreno do Fortim, que teria como fim o porão de
uma dessas igrejas. Impõe-se a partir da localidade um panorama de edificações de grande
importância, sejam como patrimônio histórico ou como equipamentos públicos: o Hospital
Nossa Senhora das Mercês, a Santa Casa de Misericórdia, o Colégio Nossa Senhora das
Dores, a Estação Ferroviária, a Igreja de São Francisco de Assis, o Prédio da Prefeitura
Municipal e o Campus Santo Antônio da Universidade Federal de São João del-Rei.
Com relação à origem da edificação, até mesmo pelo seu processo de arruinamento, é fato
não poder se afirmar nada a respeito por falta de dados documentais, devido aos
documentos e/ou relatos históricos datarem de aproximadamente 50 anos após a guerra, e
nenhum deles citarem de fato a localização do dito Fortim, e ainda incitarem a existência de
várias fortificações Emboabas na região. Porém, é inegável a importância da edificação para
a história da cidade, visto que ainda hoje encontramos nela vestígios de betas de extração
de ouro - metal que ocasionou o surgimento da vila e depois da cidade-, destacando sua
vital importância para os Emboabas, que eram os responsáveis diretos pela extração do
ouro em São João del-Rei.
O projeto na ruína do Fortim dos Emboabas, área hoje pertencente à Universidade Federal
de São João del-Rei, tem como proposta o atendimento de interesses da Universidade a fim
de potencializar os aspectos culturais e sociais existentes na cidade. Com o objetivo de
manter as oficinas cerâmicas e o Museu do Barro no local, propõe-se a criação de um
espaço de arte e ofício. Edifica-se um objeto arquitetônico com a intenção de propiciar a
construção dos fornos para a queima dos objetos de barro produzidos, com infraestrutura de
banheiros e depósitos. Propõe-se também, um espaço de lazer na ruína, e que pode ser
utilizado como local de exposição e venda de objetos. O projeto transformará a área
atualmente inutilizada em um parque urbano em prol da população.
Um projeto de intervenção e restauração deve ter como base critérios apoiados em teorias
que nos ofereçam segurança no encaminhamento e nas decisões técnicas necessárias.
Sendo assim, entende-se que qualquer intervenção em arquitetura deve ser guiada por uma
discussão crítica e as ações, devem ser respaldadas por fundamentos teóricos coerentes,
com vistas à preservação do monumento. Frente a esses conceitos, os critérios para a
intervenção nas ruínas foram definidos principalmente por meio de um levantamento
cadastral completo, que ofereceu o suporte técnico necessário com relação aos níveis e
reais medidas do estado atual do imóvel, além dos materiais presentes. A partir disso,
trabalhou-se intensamente com o desenho de croquis para estudos de volumetrias, fluxos,
acessos, visadas e diversos outros fatores que muito influenciaram no resultado final do
processo projetual.
A partir dos croquis, partiu-se para a etapa de construção da maquete eletrônica em que se
pôde fazer um estudo da volumetria dos objetos com respeito à composição arquitetônica
existente. As intervenções foram propostas de forma a não prejudicar a leitura do conjunto
pré-existente, tanto no que se refere à planta baixa, quanto nas elevações, como mostra a
Figura 3. O novo programa respeitou os espaços existentes, adaptando os novos usos à
antiga ruína. A última etapa consistiu na representação técnica em diferentes escalas da
proposição final da intervenção, com destaque à Figura 4, que mostra em um corte
esquemático o desnível do terreno e a adaptação da intervenção ao espaço, tornando-o um
mirante para contemplação da paisagem da área central da cidade.
Figura 3: Maquete eletrônica com perspectiva geral do projeto para as ruínas, acompanhando o
terreno. Fonte: Elaborado pelos autores, 2016.
Figura 4: Corte esquemático do projeto de intervenção nas ruínas. Fonte: Elaborado pelos autores,
2016.
Agradecimentos
Referências
BRANDI, Cesare. Teoria da Restauração. Tradução Beatriz Mugayar Kül. 2ª ed. São Paulo:
Ateliê Editorial, 2004.
RUSKIN, Jonh. A lâmpada da memória. Tradução Maria Lúcia Bressan Pinheiro. Cotia:
Ateliê Editorial, 2008.
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil. 3. ed. Belo Horizonte, Itatiaia/Edusp,
1982.
PONTES, Ana Maria de Lira. Entre Fragmentos: os ditos e não ditos das ruínas patrimoniais.
Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Federal da Paraíba.
João Pessoa, 2010. 181p.
RESUMO
O presente artigo aborda o Sítio Histórico de Itapina, que se trata do mais recente a ser tombado
pelo Estado do Espírito Santo. O distrito de Itapina, situa-se às margens do Rio Doce e da atual
Estrada de Ferro Vale do Rio Doce, no município de Colatina, região noroeste do estado do Espírito
Santo. A ocupação da região deu-se por volta de 1866, com a chegada de fluminenses e mineiros.
Posteriormente, a partir de 1889, chegaram os imigrantes italianos e algumas famílias libanesas. As
características arquitetônicas que são evidenciadas nos casarios de Itapina refletem essa mescla de
costumes e culturas, onde predominam-se casas térreas e sobrados nos estilos eclético e proto-
moderno, além, da arquitetura tradicional da imigração e da arquitetura industrial e ferroviária, que
podem ser vislumbradas na antiga estação e nos armazéns de café, ao longo do sítio. O vilarejo
prosperou no período áureo do café, por volta de 1907, com a construção da Estrada de Ferro Vitória-
Minas (EFVM), onde escoava-se toda a produção da região. Porém, com a crise de 1929 e a
erradicação dos cafezais este cenário de prosperidade mudou. Na década de 1940, deu-se o início
do processo de esvaziamento do vilarejo, os comerciantes que ali residiam mudaram-se para outros
núcleos urbanos. No ano de 2013, o Sítio Histórico de Itapina foi tombado em nível estadual, onde ao
todo foram tombados 82 imóveis e outros 43 foram decretados de interesse de preservação para
compor o conjunto. O documento preza pela proteção dos bens culturais e naturais que constituem a
Área de Proteção do Ambiente Cultural (Apac) de Itapina, constituída pelo Sítio Histórico Urbano,
Patrimônio Ambiental Urbano e Paisagem Cultural. Como o tombamento é recente, pouco tem sido
feito efetivamente para garantir o que foi decretado na Resolução 003/2013. A mesma, ainda não faz
parte totalmente do cotidiano do vilarejo, faltando ações que despertem a conscientização e
conhecimento da lei por parte dos moradores e proprietários, sendo que os mesmos não
compreendem a importância do sítio, ocasionando a situação atual de Itapina, que é de
esquecimento, até mesmo no cenário regional ele é desconhecido. Além disso, o cenário da região
está em plena mudança, fator decorrente da forte seca dos últimos meses e da lama de rejeitos que
atingiu o Rio Doce no final de 2015. O fato, é que o vilarejo apresenta marcas da história do
desenvolvimento local e da luta dos imigrantes, onde a relação entre o lugar e as marcas deixadas
pelo homem e sua cultura se fazem presentes e precisam ser preservadas. Isto posto, discutir a
temática sobre a preservação de Itapina através do viés do patrimônio e preservação apresenta-se
como o foco deste artigo, reconhecendo a importância do conjunto, com o intuito de incentivar a
sociedade a preservar a memória do lugar.
O Vilarejo desenvolveu-se no período áureo do café, onde o principal meio de transporte até
então era por meio de animais, logo após iniciou-se através de embarcações que cruzavam
o Rio Doce, em 1907 iniciou-se a construção da ferrovia, ocasionando o aumento
progressivo da escoamento do café que era produzido na região, porém, a maior utilização
da ferrovia pelos produtores, comerciantes e habitantes, de modo geral teve início a partir de
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
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janeiro de 1923, com a inauguração do trecho que ligava Itapina ao município de Itaguaçu.
Com a crise de 1929 o cenário de Itapina muda, a prosperidade oriunda dos cafezais diminui
e começa assim a erradicação dos mesmos. Por volta da década de 1940, tem início o
processo de esvaziamento do vilarejo, os comerciantes que ali residiam se mudam para
outros núcleos urbanos, como o Centro de Colatina, em busca de novas condições de
trabalho, culminando na decadência, abandono e esquecimento do vilarejo. Após os
acontecimentos, a estação ferroviária foi desativada, por volta de 1980, e a ponte, iniciada
no governo de Juscelino Kubitschek, com a intenção de facilitar o acesso à vila, nunca
chegou a ser concluída (CASTIGLIONI, 2010).
O núcleo histórico do distrito de Itapina é constituí-se por casarios construídos entre o final
do século XIX e meados do século XX, sendo casas térreas e sobrados predominantemente
nos estilos eclético e proto-moderno, além da arquitetura tradicional da imigração,
decorrente dos primeiros habitantes de Itapina e da arquitetura industrial e ferroviária,
encontrada na estação e nos armazéns de café ao longo do vilarejo (CASTIGLIONI, 2010).
Com o esvaziamento provocado pela decadência da produção cafeeira, o vilarejo, que antes
possuía uma intensa vida cultural, comercial e econômica nunca mais se recuperou.
Atualmente, a vila possui pequenos comércios locais, como farmácia, sorveteria, mercearias
e bares. A maioria dos moradores trabalha na cidade de Colatina ou na zona rural.
O cenário bucólico de Itapina muda uma vez por ano, durante as fcomemorações do
Festival Nacional de Viola, o popularmente conhecido como ‘Fenaviola’, onde músicos e
violeiros da região se tornam atração centenas de turistas que ocupam as ruas da cidade e
e se hospedam nos casarios que guardam em sua arquitetura a história do vilarejo.
Nas últimas décadas, o patrimônio arquitetônico das cidades vem recebendo grande
atenção. Preservá-los ao longo do tempo pode manter viva a história de um grupo ou
sociedade. Para Rodrigues (2001, p.16), “o patrimônio representa a identidade local e, por
mais diversa que seja a população, a sua criação serve como uma ponte que resume várias
histórias em uma só”.
Dessa forma, foi criado pela Lei de n° 6 de 09 de novembro de 1967, dentro da SECULT, o
Conselho Estadual de Cultura – CEC. Órgão consultivo vinculado a Secretaria de Estado da
Cultura, responsável pela normatização, deliberação que responde a demandas oriundas da
sociedade, procurando integrar as ações de Política Cultural do Estado do Espírito Santo,
como os tombamentos, por exemplo. Como pode ser visto, é o CEC, através do suporte da
SECULT, responsável no Espírito Santo pelas questões de tombamento e fiscalização dos
bens imóveis, logo, dos Sítios Históricos. Para que um imóvel tombado no Estado, seja
submetido a qualquer modificação, deve ser enviado um pedido para avaliação da CEC e,
somente depois de avaliado o pedido é liberado.
Além das normas da SECULT e do CEC que regem o tombamento e a manutenção dos
sítios, instrumentos próprios de cada município, como Plano Diretor Municipal (PDM) e leis
municipais, regulam as intervenções e alterações nesses locais.
Assim, podemos definir o Tombamento como um ato administrativo realizado pelo poder
público com o objetivo de preservar, por intermédio de legislação específica, bens de valor
histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e também de valor afetivo para a população,
impedindo que venham a ser destruídos ou descaracterizados, culminando com o registro
em livros especiais denominados Livros de Tombo. O principal objetivo jurídico do
tombamento, de acordo com Fernandes (2010, p. 28) é a declaração da obrigatoriedade de
conservação do objeto tombado. Outro aspecto importante, segundo o autor, é a
possibilidade de se estender a proteção jurídica à vizinhança ou entorno da coisa tombada,
para a preservação da visibilidade da ambiência.Apesar de estar em vigor há vários anos, a
previsão legal do tombamento ainda é um conceito em evolução, uma vez que são muitos
os problemas de definição do objeto e do entorno a ser protegido (FERNANDES, 2010,
p.29).
De toda forma, para Fernandes (2010, p.29), o principal efeito jurídico do tombamento é,
seguramente, a proibição de mudanças nas características essenciais do bem tombado. O
tombamento tem ainda aplicação em todo tipo de imóveis e móveis, sejam eles públicos ou
privados. Em sua concepção original, transforma o bem em patrimônio cultural sem
promover sua estatização, estabelecendo um regime especial de propriedade. Sendo assim,
o bem tombado não passa a pertencer ao patrimônio público se for de propriedade privada.
A partir do tombamento, passa a existir sobre ele uma “restrição individual ou geral, parcial
ou total, bem como vínculos de disponibilidade, destinação, imodificabilidade e preferência”
(FERNANDES, 2010, p.29).Conforme o Decreto-Lei n° 25/37, o “tombamento” pode ser
realizado de forma voluntária, quando o proprietário solicita ou concorda com a medida, ou
de forma compulsória, quando a proposta não tenha partido do proprietário ou responsável,
independente da natureza pública ou privada dos bens.
O vilarejo de Itapina, além dos imigrantes europeus, recebeu ainda algumas poucas famílias
de libaneses. Com todas estas tradições diferentes, o vilarejo desenvolveu um modo de vida
interessante e até mesmo de intensa atividade cultural para a época, resguardando as
devidas proporções. As características arquitetônicas dos casarios de Itapina refletem esta
mescla de culturas, com referências à arquitetura popular do imigrante e da arquitetura
brasileira da época (CASTIGLIONI, 2010, p. 23).
De acordo com Castiglioni (2010) algumas destas edificações possuem um grande número
de quartos, o que evidência que as famílias que habitavam essas moradias possuiam um
grande número de pessoas, a cozinha é espaçosa e possui um maior afastamento de
fundos,além disso os quintais possuiam jardins, pequenos pomares, além de criação de
animais de pequeno porte, como galinhas. Neste tipo de casa muitas vezes, o primeiro
pavimento era usado como venda e/ou comércio e o segundo como moradia.
Outra característica presente nas edificações do vilarejo é a tipologia das casas tipo “porta e
janela”, se apresentando como as casas térreas mais simplificadas. Elas poderiam variar na
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sequência: janela-porta-janela ou vice-versa; ou janela-janela-porta ou vice-versa, mas
esses três elementos sempre marcavam a fachada da edificação. (CASTIGLIONI, 2010)
De uma forma geral, pode-se perceber que a maior parte do casario está preservado,
porém, sabe-se que a melhor forma de se preservar uma edificação é através do uso da
mesma, e, foi constatado que há um grande número de imóveis que estão fechados e
abandonados, o que pode ocasionar na perda total de sua estrutura.
O Sítio Histórico de Itapina, se apresenta, ainda hoje, como peça fundamental à composição
da memória histórica e social do município. Permanecendo-se como referencial do
município de Colatina e objeto de impacto para a sociedade colatinense.
Através dos inúmeros dados citados é possível notar que a memória histórica e imagem viva
de tempos passados não encontram-se presentes na edifcação, ocasionando a
descaracterização e a destruição do bem herdado das gerações passadas, acarretando o
rompimento da corrente do conhecimento social, físico e histórico da edificação.
A falta de gestão, entendida como crise dos espaços de memória, implica em um processo
de reflexão sobre a informação genética da cidade que sofre ameaças em meio ao caos,
carecendo de restauração e preservação.
Considerações Finais
Diante do que foi exposto constata-se a importância histórica deste sítio no campo da
arquitetura e urbanismo num contexto local e regional, quais características outorgam a ele
valor de singularidade que justifique seu tombamento. E então, comprovada sua importância
histórica, verificar se as ações as quais ele está submetida têm cumprido o papel de manter
suas principais características, se tem permitido a manutenção do ambiente que o justifica
enquanto sítio.
Contudo, devido à uma gestão falha do poder público municipal e estatual, que não promove
ações no sentido de por em prática a legislação existente, o sítio está perdendo importantes
características que compõe seu conjunto. Aponta-se para a necessidade de se aprofundar
as ações de preservação deste sítio, bem como resgatar a autoestima da população local
em geral e orientá-la no sentido de fazê-la compreender que, apesar de o patrimônio
histórico arquitetônico visível na paisagem urbana ser a expressão monumental da condição
dominante em um determinado período do passado, e que esta condição não condiz com a
atualidade, o patrimônio também é resultado da força do trabalho e da arte de seus
antepassados no processo de sua construção e que, portanto, merece ser preservado.
Nota-se ainda a necessidade de intervenções urgentes do poder público, através de ações
relacionadas ao planejamento urbano, Incluindo aí, iniciativas para requalificação,
revitalização e refuncionalização do patrimônio edificado, assim como ações de cunho
educativo, para qualificação da população em relação à educação patrimonial e a
consequente valorização por parte da sociedade, para o conjunto patrimônio edificado.
Referências Bibliográficas
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MORELATO, Andressa da Silveira. Sítio histórico urbano de Santa Leopoldina : uma análise de
sua preservação / Dissertação de Mestrado em Artes. Programa
de Pós-Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2013.
164 f.
RESUMO
Este artigo aborda o processo de construção e transformação da arquitetura em pedra no Piauí,
utilizando como exemplo para análise a vivenda caiçara, uma moradia da década de 1910, situada na
cidade de Capitão de Campos – Piauí, construída por descendentes de escravos. Outro ponto
abordado, é a edificação se apresentar como elemento patrimonial, devido ser um exemplar raro
desta técnica, apesar de não possuir acautelamento por parte de inventário ou tombamento.
A Vivenda Caiçara é uma residência do século XVIII, possui técnica construtiva mista, utilizando-se
de pedra e adobo de barro, constitui um exemplar único pelas técnicas construtivas adotadas e pelas
soluções de conforto térmico aplicadas. A disposição dos cômodos e das aberturas representam bem
as necessidades da família proprietária e das tradições da época, deixando claro a hierarquização e
setorização típicas de uma arquitetura mais tradicional.
A discussão colocada em voga por este artigo, é a de que o conceito de patrimônio precisa ser
democratizado, para que atinja também exemplares que se assemelhem mais aos conceitos de
identidade da população, inserindo a comunidade no processo participativo da escolha do patrimônio.
Faz-se necessário sinalar, os órgãos de preservação, muitas vezes legislam em favor de edificações
com valor arquitetônico mais rebuscado, o que faz com que a arquitetura produzida pelas classes
inferiorizadas passe despercebida.
No final do século XIX e início do século XX, enquanto a nova capital do Estado do
Piauí, Teresina, buscava adquirir características classificadas como urbanas por meio do
financiamento fornecido pela economia extrativista (Sousa, 2008) através da adoção da
Arquitetura Eclética nos padrões construtivos, principalmente na edificações residenciais
das famílias mais abastadas, as regiões mais distantes do centro do poder usufruíam ainda
de técnicas construtivas difundidas durante o período colonial, (aplicada principalmente a
tipologia residencial) estilo arquitetônico atualmente entendido como Arquitetura Tradicional
devido sua predominância mesmo após a instituição do Império e da República Velha.
A arquitetura colonial, apesar de adotar materiais e técnicas regionais adaptadas ao
contexto nacional, e conseguir representar de maneira pertinente e não apenas como réplica
a identidade nacional, esta, ainda assim, se especializou na tentativa de servir aos diversos
cenários existentes dentro de um país continental e com circunstâncias ambientais tão
diferentes, a variar de região para região, como observamos a seguir nas considerações
destacadas quanto ao cenários paulista do século XVIII, nas palavras de Silveira Bicca e
Panitz Bicca (2008, p.76)
[...] tanto as mais antigas, do seiscentos – como a do sítio Santo
Antônio, ou a do padre Inácio, no município de Cotia – quanto as
mais recentes, do século XVIII, como as do sítio Mandu, no município
de Cotia, ou a de Tatuapé, no município de São Paulo, formam um
grupo homogêneo, com características básicas comuns. Nas
frontarias, essas casas tinham sempre alpendre central, vazado,
ladeado pelo quarto para hóspedes e pela capela, cujas paredes
possuíam apenas pequenas aberturas de janela, apresentando belas
proporções em seu conjunto. Os telhados de quatro águas tinham os
beirais com cachorros longos de madeira, apoiados nos frechais
FORNO
Devido aos poucos incentivos à preservação desses imóveis rurais, muitos deles
foram descaracterizados, isso se deve à adoção de outras necessidades ao programa das
pessoas que o habitam. No caso da Vivenda Caiçara, foram adicionados dois banheiros
internos, bem como teve suas fachadas de pedra rebocadas, devido à quantidade de poeira
e insetos que se acumulavam nas paredes, assim pode-se conferir na (Figura 03).
Apesar de ser um exemplar peculiar, este perdeu a sua singularidade, entretanto, isso
se deve muito ao pouco reconhecimento desse tipo de arquitetura por parte dos órgãos
ligados à preservação e sua pouca representatividade social.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O conceito de patrimônio no Brasil, ainda está muito ligado aos exemplares que se
aproximam do modelo europeu, como é o caso da Arquitetura Colonial, que tem sido muito
bem acautelada nos centros históricos brasileiros. Apesar da importância indiscutível desse
REFERÊNCIAS
RESUMO
O Museu da Imagem e do Som de Campinas está localizado em um prédio histórico de grande valor
patrimonial, tendo sido tombado por três esferas de órgãos de preservação do patrimônio cultural, o
IPHAN, o CONDEPHAAT e o CONDEPACC.Por esta característica histórica do edifício, surge
naturalmente uma dicotomia entre o objeto tecnológico do museu e a preservação do patrimônio
arquitetônico.Desde janeiro de 2017, foi iniciado um trabalho de apropriação do espaço do Museu
pelas Universidades da cidade, primeiramente a UNIP, sendo seguida pela PUCC e pela UNICAMP.A
primeira idéia deste trabalho foi a de trazer os alunos da disciplina de técnicas retrospectivas do
Curso de Arquitetura e Urbanismo para fazer um levantamento do prédio histórico e ficar em contato
permanente com o mesmo para apreensão, na prática, das teorias de preservação. No sentido
contrário, estes alunos contribuem para a dinâmica do cotidiano do museu, com carência humana e
estrutural.Esta experiência Universidade/Museu, enriquece ambas instituições, fazendo com que
novas iniciativas e idéias sejam implementadas, como é o caso já ocorrido de atualização de material
expositivo, memória oral do edifício com o processo de educação fonográfica intitulado “de solar à
museu”, procedimentos de restauro e acompanhamento de laudos técnicos por parte dos
estudantes.Desta forma, cria-se um olhar mais apurado dos alunos que irá se transformar em
melhoria da sua formação profissional, ao mesmo tempo que estes estudantes trazem novos olhares
para os funcionários do MIS.Foram entrevistados os estudantes que participaram deste trabalho,
sendo constatados os resultados significativos que esta experiência está trazendo para o Museu e
para a Universidade.
Em 1878 o edifício que hoje é a sede do MIS serviu como duas residências
geminadas para abrigar as famílias do Comendador Joaquim Ferreira Penteado –
futuro Barão de Itatiba - e da sua filha Francisca Ferreira de Camargo Andrade
(Pupo, 1983, p. 35).
A primeira iniciativa para este processo é o projeto de memória oral “De Solar
a Museu”, que visa resgatar a trajetória do edifício até o uso do Museu, que se
transformará em um documentário para apresentar em visitações de escolas no
edifício, antes da apresentação de filmes que ocorrem diariamente no MIS e também
para demais eventos que venham a acontecer no próprio espaço ou em outros
equipamentos da Secretaria Municipal de Cultura.
Conclusão inconclusa
Referências Bibliográficas
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existido”. São Paulo: Tese (Doutorado), Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
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RESUMO
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Educação Patrimonial. Brasília: Iphan; Museu Imperial, 1999.
RESUMO
A “Coletânea Garibaldina” é um acervo formado pelo imigrante suíço Wolfgang Ludwig Rau através
da coleção de objetos relacionados a Anita Garibaldi e seu companheiro Giuseppe. Segundo Rau, a
coleção foi uma forma de retribuição ao Brasil pela receptividade que obteve ao imigrar para o país:
ele almejava o reconhecimento internacional da lagunense como heroína. Em 2001, após 60 anos em
processo de formação, a coleção foi comprada pelo governo do Estado de Santa Catarina com
recursos da Fundação Catarinense de Cultura, após Rau considerar que não haveria mais como
manter a mesma. Em 2015, a FCC transferiu a custódia do acervo para a Universidade do Estado de
Santa Catarina (UDESC), permitindo que o mesmo continuasse na cidade de Laguna e propiciasse
interações com a educação de Arquitetura e Urbanismo, a partir da realização do Programa de
Extensão denominado “Comunidade RETRÔ: MEDIADORES DO PATRIMÔNIO”. Os objetivos do
trabalho são: apresentar o processo de transferência do acervo para a universidade como
oportunidade de educação patrimonial e demonstrar as possibilidades de educação patrimonial nas
iniciativas de preservação, pesquisa e comunicação envolvendo o acervo. Para tanto, os
procedimentos metodológicos utilizados foram a documentação museológica por meio de
arrolamento/inventário, a desinfestação de móveis e documentos, o estudo para propostas de
espaços museológicos para o acervo e elaboração de material didático para escolas públicas. O
trabalho realizado até o presente momento demonstra o potencial do acervo para a educação
patrimonial. Pretende-se despertar o interesse da sociedade lagunense, principalmente das crianças,
tornando o patrimônio acessível e contribuindo para sua preservação.
Laguna é um município situado no sul do Estado de Santa Catarina, que foi cenário de
conflito histórico durante a Revolução Farroupilha, no qual Ana Maria de Jesus Ribeiro, mais
conhecida atualmente como Anita Garibaldi, conheceu o revolucionário Giuseppe. Nesse
contexto, a suposta historia de amor, vivida por ambos, é tratada como parte da identidade
do município, que chega a se apresentar, do ponto de vista turístico, como a Terra de Anita.
A presença do curso superior em Arquitetura e Urbanismo tem levado a iniciativas de
Educação Patrimonial que, além de se voltarem à Preservação do Patrimônio Histórico e
Cultural representado pelas edificações reconhecidas por Tombamento federal, também
propiciem um melhor entendimento sobre o papel dos personagens ditos históricos.
Rau faleceu em 2009. Nas fotos abaixo ( Imagem 01 ), em 1999, com 83 anos, rodeado por
seu acervo e seu mais famoso livro - "Anita Garibaldi, o Perfil de Uma Heroína Brasileira".
Com todo esse conhecimento e interesse na vida de Anita, surgiu algo que pode até ser
considerado um amor do colecionador pela heroína, o que o incentivou ainda mais a
pesquisar e saber sobre ela. Isso é visível quando em documentários Rau fala sobre Anita
com tamanha paixão e carinho.
Segundo Elíbio (2014, p.7), porém, durante várias décadas, os objetos do acervo obtido
foram mantidos no espaço privado da casa do colecionador, não participando da
“constituição de uma memória coletiva”. Rau limitava o acesso ao acervo “que lhe era caro e
precioso”, permitindo a exposição de alguns objetos somente em datas comemorativas. Em
2001, após 60 anos em processo de formação, o acervo foi adquirido pelo governo do
Estado de Santa Catarina, e ficou sob a custódia da Diretoria de Preservação do Patrimônio
Cultural da Fundação Catarinense de Cultura, sendo higienizada e indexada pelo Ateliê de
Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis (ATECOR), também da Fundação.
Ainda de acordo com Elíbio (2014, p.03), a Coletânea Garibaldina foi organizada em seis
grupos (da letra A até a letra F), abrangendo neles: “Obras de Arte”, “Documentos
Fotográficos”, “Material Arqueológico”, “Selos”, “Objetos” e “Documentos”. Tal inventário
seguiu a classificação original dos objetos, seguindo critérios sugeridos pelo colecionador.
Dentre o conteúdo do acervo na época em que foi adquirido pelo governo do Estado, era
possível localizar: pinturas, gravuras, esculturas, utensílios, adornos, documentos
impressos, livros, envelopes, selos, fotografias (avulsas ou em grupos), artefatos
arqueológicos, entre outros. Pode-se perceber desta forma, a variedade no conteúdo da
coleção de Rau, não se limitando apenas a documentos.
A passagem de Rau para o Estado pela qual passou a Coletânea Garibaldina, revela a
importância da coleção para a cultura de uma sociedade, bem como a atuação do
colecionador para o mantimento da história e cultura locais. À vista disso, pretende-se
demonstrar neste trabalho, o potencial educativo e de aproximação entre a comunidade e o
patrimônio, que se tem a partir da realocação do mesmo para as dependências da
Universidade.
Objetivo
5. Registrar e divulgar as iniciativas que vêm ocorrendo sob a forma de extensão para uma
parcela maior da população de Laguna.
Metodologia
Transferência do acervo: No mês de maio de 2016, durante dois dias, alunos bolsistas e
voluntários do Laboratório de Preservação do Patrimônio (LabPPat) da UDESC, juntamente
com o professor coordenador e com auxílio do Ateliê de Conservação e Restauração de
Bens Culturais Móveis (ATECOR) da Fundação Catarinense de cultura, participaram do
processo de transferência da Coletânea Garibaldina da Casa Pinto d’Ulysséa para as
dependências da Universidade do Estado de Santa Catarina, campus de Laguna.
Após embalar todos os objetos com materiais protetores, como plástico-bolha e placas de
isopor, os pacotes foram catalogados e enumerados, recebendo, cada um, uma etiqueta de
identificação em sua embalagem. Os objetos foram colocados em local protegido, em uma
sala de aula na Universidade: suspensos em prateleiras e mesas para que não entrassem
em contato com o chão e paredes.
Imagem 02: Acadêmicas realizando o empacotamento do acervo e fixação das etiquetas nas
embalagens. Crédito da Fotografia: Marcelino Correia / ATECOR / FCC, 2016.
A manutenção desses objetos se dá a cada seis meses, caso não sejam diagnosticados
focos de infestação antes desse prazo. Não há controle ambiental, pois a instituição não
detém de equipamentos climatizadores e de controle de umidade, assim o controle é feito
por meio de aberturas de janelas. O acervo, hoje, está acondicionado em uma única sala,
sem as devidas divisões para Reserva Técnica, Sala de Conservação e Sala de
Quarentena.
Imagem 03: Fumigação dos livros e descupinização de móvel por acadêmicos. Crédito das
Fotografias: Julieta Toledo, 2016.
1. Pátio: área livre existente, incorporada ao “Espaço Rau” como área de lazer e
descanso.
3. Reserva técnica: local de guarda dos materiais em bom estado, e higienização dos
objetos do acervo.
6. Museu: área de exposição dos objetos em bom estado, anexo a um mini auditório.
Outra ação já realizada no Espaço RAU, aconteceu no dia 18 de maio, dia Internacional dos
Museus. Com grande parte do acervo já higienizado e arrolado, o espaço foi organizado
para que se realizasse a primeira pré-exposição da Coletânea Garibaldina. Com o intuito de
impulsionar a visitação dos acadêmicos, pouco frequentes até então, em decorrência do
escasso número de materiais arrolados e higienizados até o início de 2017, realizou-se a
divulgação da exposição em diferentes mídias sociais e também nos murais físicos da
universidade. Na ocasião, houve cerca de 30 visitantes, entre acadêmicos e servidores.
Percebeu-se o grande interesse destas pessoas, em relação ao estado de conservação do
acervo, principalmente dos livros, se os objetos, principalmente as armas, tinham sido
realmente utilizados por Anita, Giuseppe ou até mesmo se já tinham sido utilizadas em
algum momento.
Por serem de temáticas variadas, estes são de grande valia para diferentes áreas de
pesquisa. Até então, estes livros serviam apenas para exposição. Dentro de um espaço
universitário, quando completamente higienizado, esse material poderá auxiliar na geração
de conhecimento.
Resultados e Reflexões
Por fim, as atividades de educação patrimonial, com o almanaque e a visita ao Espaço Rau,
tiveram uma aceitação satisfatória por parte das crianças, que se mostraram sempre muito
curiosas e atentas. Assim, tais atividades se mostraram importantes formas de aprendizado
sobre o patrimônio museológico móvel e sobre a história da Coletânea Garibaldina,
conscientizando sobre as diversas formas de patrimônio existentes na história da cidade de
Laguna.
Não só com escolas, pensa-se também em expandir a educação acerca deste tema, com
pequenos eventos envolvendo o Espaço Rau, aumentando a visibilidade do acervo, tanto
para a população de Laguna quanto para os acadêmicos de uma maneira geral. A partir dos
materiais já disponíveis para exposição, a ideia é começar com exibições temáticas,
tentando relacionar com as datas próximas e que o acervo tenha material para tal, retirando
o máximo e mostrando as suas potencialidades no desenvolvimento da consciência sobre o
tema. Desta forma, ações culturais e de educação patrimonial para com a comunidade
lagunense, envolvendo o acervo da Coletânea Garibaldina, podem demonstrar a riqueza da
história da cidade e desenvolver a autoestima com relação ao patrimônio proveniente de sua
história.
Referências
RESUMO
O presente trabalho tem como propósito analisar e compreender como o ofício de benzedeira
ou rezadeira encontra-se atualmente em parte do estado de Alagoas e região metropolitana – tendo
como suporte o mapeamento realizado pelo Projeto de Salvaguarda do Patrimônio Imaterial que tem
como metodologia o Inventário Nacional de Referências Culturais – INRC (IPHAN) – que consiste em
identificar, documentar e registrar bens culturais, de natureza imaterial, para atender a demanda pelo
reconhecimento de bens representativos da diversidade e pluralidade culturais de grupos formadores
da sociedade brasileira.
Para o desenvolvimento desta atividade, foram compiladas as informações obtidas in loco nos
municípios alagoanos de Marechal Deodoro, Estrela de Alagoas, Dois Riachos e na capital Maceió,
captando as informações por meio de entrevistas e registros audiovisuais a cerca do ofício tomando
por base mapeamentos pré-existentes e bens identificados pelas populações locais junto ao grupo de
pesquisa Nordestanças da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) durante o ano de 2014 à 2015.
Com as informações levantadas, observou-se a necessidade em evidenciar essas mulheres que
utilizam-se da fé para ajudar os enfermos e que praticam esse ofício na contemporaneidade, para
isso foi realizado uma exposição fotográfica em abril de 2017 no Museu da Imagem e do Som (MISA)
em Maceió, como uma forma de aproximar a população desse ofício; além de zelar pelo patrimônio
imaterial e valorizar a cultura popular alagoana, salientando a importância desse ofício que atua como
medicina alternativa.
Palavras–chave: Benzedeiras, cura, cultura popular; medicina alternativa; fé.
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Além disso, as benzedeiras são consideradas como uma cientista popular cuja
possui características próprias de curar: elas unem os misticismos da religião junto os
conhecimentos da medicina popular (OLIVEIRA, 1985).
Se analisarmos historicamente as benzedeiras e o ofício de benzeção remota-se a
Idade Média onde as mulheres que detinham o dom de curar eram perseguidas ou
torturadas e lançadas vivas em fogueiras até a morte, pois a Igreja que detinha o poder
associava as questões sobrenaturais e a bruxaria. Para essa questão, a solução da Igreja
foi criar um Tribunal do Santo Ofício para resolver essas questões, tendo em vista que a
benzeção ia contra aos dogmas da Igreja, e portanto, a Deus (OLIVEIRA, 1985, p.21).
Com o decorrer do tempo, aparecem novos meios de cuidar do corpo e da alma. No
Renascimento, o corpo e a alma começaram a vistos isoladamente. No entanto, com o
surgimento da clínica médica em meados do século XVII, a doença e o contexto técnico
separam-se da visão da magia e bruxaria; resultando na separação entre ciência e cultura.
Fato esse que favoreceu para que o ofício de benzeção fosse incorporado como uma
medicina alternativa.
1
Segundo alguns pesquisadores as benzedeiras/rezadeiras Segundo Loyola (1984, p.94) a benzedeira se limita a
reza em cima da cabeça do enfermo, não receita medicamentos e reza fazendo o sinal da cruz. Já o curandeiro
penetra no sobrenatural, ou seja, consegue se conectar com forças superiores.
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Entretanto, a maioria das rezas presenciadas durante as visitas as residências das
benzedeiras são entremeadas de palavras incompreensíveis, cujo entendimento da reza
torna-se de difícil. Segundo Castro e Melo (2007, p.20) afirmam que essa distorção ocorre
devido às preces serem transmitida oralmente. Salienta-se que as rezas só acontecem no
período diurno devido a presença da luminosidade do sol, geralmente não benzem depois
das 17h, mas se for um caso de urgência a benzedeira Angelita ainda realiza a benzeção no
período noturno.
Os gestos se fazem presente tem toda a benzedura enquanto a reza está sendo
realizada em frente ao enfermo, na maioria das benzedeiras realizam o sinal da cruz com o
ramo na pessoa que está sendo curada; imagem 02. Após a finalização da oração observa-
se se o ramo ou a folha murchou, se ocorrer dela murchar é sinal de que está de mal
olhado, se for do lado direito é feminino e no esquerdo masculino, segundo menciona
Odete em entrevista.
Imagem 02- Benzedeira: Maria Helena (Maceió – bairro: Forene)
A exposição contou com vinte e duas fotografias de cinco benzedeiras que também
subsidiaram esse artigo: Angelita, Maria Augusta, Josefa, Jacira (Lola), Maria Anunciada e
Maria Helena. Com a repercussão da exposição nas mídias sociais e em telejornais
possibilitou que muitos visitantes pudessem adentrar nesse universo tão pouco conhecido e
que é alvo constante de preconceito. Inclusive durante a inauguração da exposição uma das
benzedeiras, Maria Augusta, esteve no museu junto a sua família para mirar o trabalho e ter
a oportunidade de ser reconhecida merecidamente pelo ofício.
Imagem 04- Exposição Entre Panos e Ramos: Olhares sobre as benzedeiras alagoanas e a
benzedeira Maria Augusta.
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Adentrar no mundo das tradições populares de benzeção foi um motivo de grande
satisfação e conhecimento diante do ofício em questão.
Através das entrevistas e de uma pequena, mas imprescindível revisão bibliográfica
acerca do tema, observou-se que o ofício da benzeção ainda constitui um elemento de
estrutura social e cultura para os municípios estudados. O dia a dia das benzedeiras
entrevistadas é composto por rezas, benzeções, ramos, panos e curas. Elas atendem a
qualquer hora sem restrição. E a demanda constante de usuários em frente a residência
dessas mulheres demonstram o quão são úteis para a comunidade.
Como constatado durante as visitas de campo observou-se que as
benzedeiras/rezadeiras são guardiãs de sabedoria e técnicas milenares, como afirmam
Castro e Melo (2007). Elas vivem rodeadas de vunerabilidade, principalmente sua própria
condição de saúde. Enquanto cumpre muitas vezes o papel do Estado na promoção da
saúde daqueles que não dispõem de dinheiro ou não tem acesso aos serviços públicos de
saúde por ausência deles em alguns municípios visitados, são idosas que também
necessitam de cuidados. A eficácia simbólica do ofício já é uma seara indubitável no alcance
da cura nos foros das ciências, haja vista os aspectos psicossomáticos que envolvem a
relação dos humanos com as crenças, medos, desordens culturais e sociais. Corre o risco
de tal saber e técnica desaparecer por questões ligadas às dificuldades de transmissão por
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falta de valorização, visibilidade, credibilidade do ofício frente à frágil e pouco divulgada
compreensão de seus significados.
A elaboração deste artigo gerou a compreensão de que, sem atitudes como a
exposição fotográfica voltada para o reconhecimento desse ofício, não haverá mudanças
significativas no que diz respeito a valoração dessas mulheres detentoras do saber, e o
patrimônio cultural vai sofrendo os reflexos com o passar dos anos, sendo algumas
irreversíveis.
Essas argumentações expostas servem para mostrar como é necessário investir em
ações para que possamos compreender que as benzedeiras/rezadeiras são importantes
cidadãs da contemporaneidade e que carregam consigo uma tradição secular. É importante
salientar também que elas não tem apenas relevância para si, mas pelo que elas tem em
comum: mulheres idosas que dedicam a sua vida ao dom da cura através da fé e no serviço
em prol da comunidade.
REFERÊNCIAS:
AMORIM, José Pimentel. Medicina Popular em Alagoas. 2013.
CASTRO, Bárbara Emanoela da Rocha; MELO, Kelly Cristina Baeta de. Benzedores e
Sentinelas: Idosos são guardiões de tradições milenares. UFAL. 2007.
LOYOLA, Maria Andréa. Médicos e Curandeiros: conflito social e saúde. São Paulo:
DIFEL, 1984.
OLIVEIRA, Elda Rizzo de. O que é benzeção. São Paulo: Brasiliense, 1985.
PINHO, Lucas Fernandes. Benzedeiras, mulheres com dons nas mãos e nas palavras,
um estudo sobre as narrativas da benzedura na cidade de farias brito - ce, final do
século XX e inicio do XXI. Disponível em:
<http://fedathi.multimeios.ufc.br/chec/2015/anais/Eixo8/BENZEDEIRAS,%20MULHERES%2
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 20 a 23/06/2017.
0COM%20DONS%20NAS%20M%C3OS%20E%20NAS%20PALAVRAS,%20UM%20ESTU
DO%20SOBRE%20AS%20NARRATIVAS%20DA%20BENZEDURA%20NA%20CIDADE%2
0DE%20FARIAS%20BRITO%20-%20CE,%20FINAL%20DO%20S%C9CULO%20X.pdf>.
Acesso em 17 de junho de 2017.
2. UEMG. CEDTec
Av. Antônio Carlos, 7545. São Luiz.
nadja2m@gmail.com
3. UEMG. CEDTec
Av. Antônio Carlos, 7545. São Luiz.
mariliadefatimaavilacarvalho@gmail.com
RESUMO
Este artigo busca contextualizar, na região central de Minas Gerais, principalmente na cidade de Belo
Horizonte, a pesquisa sobre os brinquedos e jogos tradicionais que, passando de geração em
geração, foram assumindo versões particulares na produção artesanal. Considera-se a contribuição
dos valores sociais e a importância da preservação da memória cultural dos objetos lúdicos. A
pesquisa se realiza no campo do design afetivo e da memória de um povo, num movimento de
mapear, registrar e preservar objetos biográficos que, em sua mistura de materialidade e
sociabilidade, fazem parte da memória e da identidade dos grupos de brincantes. Apesar de toda a
construção contemporânea em torno das novas tecnologias, constata-se a existência de práticas
lúdicas muito antigas e tradicionais, que se mantêm vivas no patrimônio cultural, deixando fortes
alguns brinquedos na condição de mensageiros de uma memória coletiva. Existe uma harmonia que
pode ser investigada entre os seres humanos e os objetos: as pessoas criam objetos interferindo
inteiramente sobre eles, mas estes objetos também interferem nas formas de viver, de ser e estar no
mundo dos homens. Para a investigação utiliza-se da metodologia de natureza qualitativa, após
abordagem bibliográfica. Apresenta-se nesse artigo uma breve amostragem de artesãos que atuam
na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O levantamento de dados é executado por meio de
feiras e exposições de produtos artesanais, que comercializam brinquedos. Deste modo particular, os
exemplos se apresentam a resistência da cultura de produção artesanal de brinquedos, contrapondo
às novas tecnologias. Alguns brinquedos permanecem na condição de mensageiros de uma memória
coletiva. Preserva-se a relação dos seres humanos com os objetos bibliográficos. As pessoas criam
objetos interferindo inteiramente sobre eles, mas estes objetos também interferem nas formas de
viver, de ser e estar no mundo dos homens. Os brinquedos artesanais ganham relevância afetiva
através da história que se construí como indícios de tradição que passa de geração em geração.
.
Palavras-Chave: Brinquedos biográficos, produção artesanal, memória, design afetivo, práticas
lúdicas.
Eclea Bosi (2003), citando Violette Morin diz que objetos biográficos são aqueles que
envelhecem com o possuidor e se incorporam à sua vida: o relógio da família, o álbum de
fotografias, a medalha do esportista, a máscara do etnólogo, o mapa-múndi do viajante, o
brinquedo preferido das crianças. “Cada um desses objetos representa uma experiência
vivida, uma aventura afetiva do morador”. (BOSI, 2003, p. 26).
A memória dos brinquedos, das experiências de brincar sozinho ou com o outro tem grande
significado para o ser humano. Segundo Bosi (2003), a memória traduzida em palavras e
que transmite uma experiência vivida pode gerar a preservação da cultura local e seus
objetos. Através dela, o ser humano pode ter acesso aos momentos passados, que
permanecem, mesmo que sem que deles se tome consciência, como motivos para o
comportamento presente.
O brinquedo enquanto objeto biográfico é um objeto que traz em si uma realidade cultural, a
experiência vivida, uma visão da criança sobre o mundo e o tempo que vive. Porto (2007)
aponta que, dependendo da matéria-prima de que foi executado o brinquedo – madeira,
espuma, ferro, pano ou vinil; da forma e/ou do desenho – bonecas; do aspecto tátil – bichos
de pelúcia ou de borracha; da cor, do cheiro e dos sons, os brinquedos proporcionam
possibilidades de experiências variadas e reações diferentes.
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Os brinquedos artesanais são formas de demonstração cultural, pois transportam, em sua
história, os variados saberes e fazeres das gerações passadas, sendo necessário valorizá-
los como objetos que contam histórias familiares e sociais de uma comunidade em que são
encontrados. O artesão, conforme Anterio e Gomes da Silva (2012), busca preservar a
técnica e cultura entrelaçada na história dos objetos. Ele exerce o papel de ser construtor de
um contexto cultural, rico em história desde a técnica e a sua marca individual. Entender
assim os métodos de construir e usar esses objetos possibilita constatar como se dão as
trocas culturais, geracionais e consequentemente afetivas entre gerações, entre pais e
filhos.
Em relação aos brinquedos, Benjamin (1984), conta que, antes mesmo dos artesãos
direcionarem seus olhos para a infância e criarem os brinquedos com resíduos das oficinas,
as crianças já se apropriavam dos objetos do mundo adulto e com eles criavam e recriavam
condições cotidianas, preparando toda a fantasia das brincadeiras da infância com
miniaturas de objetos usados pelos adultos. São expressões de hábitos, costumes, valores,
materiais dispostos na região, enfim, características próprias de cada comunidade.
Machado (2009) esclarece que a manufatura do brinquedo artesanal está presente nas
diversas e, principalmente, carentes regiões do Brasil. Contribuem para a identidade
cultural, pois são utilizadas por crianças de diferentes contextos sociais. Assim, segundo
Machado (2009) e Brougère (2000), o brinquedo artesanal, como objeto biográfico, reflete os
traços culturais da região de produção, com histórias e tradições de geração para geração.
Conforme Silva (1984), não se sabe quando surgiram os brinquedos populares, acredita-se
apenas que eles apareceram em todas as sociedades desde as mais remotas épocas.
Caracterizado como produto artesanal, daí também sua classificação enquanto "brinquedo
artesanal popular brasileiro", o brinquedo popular age de forma interativa no mundo de
fantasias da criança, permite avizinhar-se da realidade social em que vive, desenvolvendo
experiências internas e externas ao seu mundo, promovendo melhores contextos afetivos.
O artesanato é uma tradição, uma linhagem de conhecimento que passa de pai para filho,
de mestre para discípulo. Sua história se constitui na trajetória do ser humano, ao reproduzir
bens de consumo e adornos, revelando a capacidade produtiva e criativa. “Os primeiros
artesãos surgiram no período neolítico (6.000 A.C), quando o homem aprendeu a partir a
pedra, a fabricar a cerâmica e a tecer fibras animais e vegetais” (KOHLER; 1996; p. 59).
No Brasil, o artesanato surge juntamente com os índios. Com elementos naturais criaram a
pintura, cestaria, cerâmica e outros. Um outro fato é que as tribos brasileiras sempre tiveram
ampla tradição de fazer brinquedos. “Nas aldeias, curumins e adultos participam juntos de
brincadeiras e jogos, que foram incorporados pelo homem branco” (MENEZES, DAMAZIO,
2007, p.42). Diferentemente das culturas brancas, a atividade de jogar, brincar como
conduta típica de crianças não se aplica ao cotidiano de tribos indígenas. Os adultos
também brincam de peteca, jogos de fio, imitam animais etc. A prática de atirar com arco e
flecha não é tratado como diversão ou brincadeira, é um treino para caça.
Conforme Menezes e Damazio (2007) muitos brinquedos indígenas são usados na infância
do povo brasileiro até os dias atuais. Um dos exemplos é a cama de gato, feita com um fio
da palmeira do buriti para formar figuras ligadas à cultura deles, como morcegos, gaivotas,
peixes, cobras, entre outros. O pião também foi identificado nas tribos indígenas,
confeccionado com frutos rígidos e ocos, nos quais se coloca um furo em um pequeno
O artesanato mineiro é extenso, criativo e muito popular, que garante o sustento de muitas
famílias e comunidades, fazendo parte do folclore e revelando usos, costumes, tradições e
características de cada região.
Na maestria de confeccionar objetos, a criatividade do mineiro sempre foi
ímpar, nas mais variadas regiões culturais mineiras de acordo com o
processo histórico de cada uma, criam-se variados objetos, quem conhece a
história da nossa colonização é capaz de compreender melhor a história
desses objetos, suas respectivas curiosidades e suas características
peculiares as quais traduzem o jeito de ser e a cultura da comunidade de
origem. (FIGUEIREDO, 1997, p. 128).
Na personalidade do artesão já está fixada a ideia de preservar as tradições, sendo que ele
consegue transmitir a característica do regionalismo para as peças que são confeccionadas.
Existe uma imensa satisfação por parte dos artesãos em confeccionar suas peças, porque
as técnicas tradicionais de produção que eram utilizadas por seus antepassados são
resgatadas.
Há também um zelo por parte destes trabalhadores para que essa cultura não se perca,
tendo sempre um cuidado para que todo processo de confecção das peças seja
inteiramente artesanal. Assim, brinquedos confeccionados por artesão trazem essa
característica de preservação cultural.
Assim, junto com a expansão do turismo em cidades mineiras, existe uma demanda
crescente por produtos considerados tradicionais de determinada região. Feitos com palha
de milho, ou esculpidos em pedra, ou moldados em argila há diversos exemplos de
brinquedos artesanais feitos com matérias-primas locais, como palha de bananeira e de
milho, conforme Figura 2.
Benjamin (1984) relata que os brinquedos podem assumir um estilo específico de acordo
com os gostos do público alvo. Não se nega, no entanto, que existam também produtos
mais espontâneos, por assim dizer, como os brinquedos fabricados por artesãos de culturas
específicas, encontrados em feiras locais.
O estilingue e o pião são brinquedos populares que são praticados no espaço exterior da
casa. Sobre o pião, já dizia Câmara Cascudo, no seu Dicionário de folclore brasileiro, é uma
brincadeira que existe desde os tempos remotos da Grécia, onde era conhecido como
“strombo”. Na Itália, em Roma antiga, o pião era chamado “turba”. No Brasil, o pião é um
pequeno objeto feito de madeira, ou metal, tendo na ponta um prego ou ferrão. Com um
cordão ou ponteira enrola-se da ponta ao corpo do pião e impulsiona-o para o chão e este
ao desenrolar-se do impulso, fica a rodopiar. O jogador apara o pião em movimento, usando
os dedos (indicador e médio) em forma de tesoura e deixa-o rodar na palma da mão, onde
ele gira e ou ronca até parar (MACHADO, 2009) e tem a versatilidade de ser brincado
sozinho ou na presença de outro (ANTERIO e GOMES DA SILVA, 2012, p.931).
No interior da loja e na sua calçada externa há mesinhas e cadeiras para pais e filhos
jogarem, lerem e experimentarem os brinquedos criando uma ligação entre a infância de
gerações diferentes de pais e filhos, com produtos que buscam o aconchego, a proximidade
e a interatividade da criança com o adulto:
A ideia da Traquitana tem sua origem nas Artes Plásticas e na Educação, áreas de
formação da proprietária da loja, Ana Luísa, que é formada em Pedagogia e iniciou fazendo
teatro de bonecos. Por isso, naturalmente, o principal foco do seu trabalho na loja são
bonecos, brinquedos, jogos e objetos lúdico-infantis: “Brinquedos para quem aprende, quem
ensina e quem se diverte com as duas coisas, [...] criar uma ponte entre a infância de pais e
filhos. Nossos produtos buscam o aconchego, a proximidade e a interatividade da criança
com o adulto" (ANA LUISA, 2017).
Ana Luisa conta que seus clientes não são apenas crianças. A Traquitana agrada a públicos
diversos que consideram como principais diferenciais o caráter pedagógico, nostálgico e
criativo de seus produtos, os "brinquedos que trazemos na memória". Eles possuem uma
grande diversidade desde aqueles de produção própria a produtos de outros artesãos, que
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compartilham da filosofia de trabalho da loja e, da mesma forma, traduzem em seus
produtos com qualidade estética e intenção de preservação cultural.
A Feira de Artesanato que acontece todo domingo, na extensa Avenida Presidente Afonso
Pena, em Belo Horizonte, possui mais de 2.500 expositores. Ela foi fundada em 1969, e
tornou-se uma das maiores feiras da América Latina, com um público estimando acima de
140 mil visitantes de todos os lugares do Brasil. Hoje, a Feira é considerada um dos grandes
polos de compra da capital e disseminadora da cultura regional para os visitantes.
A Feira de Artesanato está na memória de quem conheceu sua história. No início dos anos
1970, era apenas um grupo de artistas plásticos que se encontravam semanalmente para
colocar à venda seus trabalhos. A Feira de Artesanato era conhecida como Feira Hippie,
nome que até hoje é utilizado carinhosamente pelos moradores da capital. Instalada
originalmente na Praça da Liberdade, com o passar do tempo, devido ao aumento do
número de comerciantes, foi transferida para a Avenida Afonso Pena, em 1991.
A artesã Ione comercializa palhaços coloridos e maleáveis (figura 3). Expor esses
brinquedos na feira, segundo a artesã, além da necessidade de comercialização é uma
atividade prazerosa, ao perceber a admiração das pessoas. Outras gerações já faziam
palhaços e a técnica de produção permanece de geração em geração.
O saber popular e as técnicas de produção passadas de geração a geração são uma prática
comum aos artesãos de brinquedos entrevistados. A feira proporciona produtos variados e o
artesanato tem espaço, dentre o conjunto colorido de formas variadas das barracas dos
feirantes.
Segundo Van Amstel (2017), o Design tem explorado cada vez mais a dimensão estética e
emocional dos artefatos de trabalho e de uso cotidiano. O Design Afetivo é aquele que afeta
nossa constituição psicológica, permitindo que expressemos ou sintamos a emoção de
outras pessoas pelo material do Design. O Design Afetivo busca fazer uma ponte entre
Design, emoção, aprendizagem, junto com a experiência do usuário, daí sua conexão ao
Experience Design, uma forma de Design que lida com o componente afetivo da
subjetividade humana.
O valor experimental do brinquedo – diz respeito àquilo que a criança pode fazer ou
aprender com seu brinquedo – manipulações sensoriomotoras, construções, operações
lógico-matemáticas, experiências científicas, didáticas ou culturais, criatividade.
O valor de estruturação do brinquedo- diz respeito a tudo que concorre para a elaboração
da área afetiva. O Design Afetivo tem explorado cada vez mais a dimensão estética e
emocional dos artefatos de trabalho e de uso cotidiano.
As emoções estão em tudo pelo que optamos. Servem, inclusive, de guia para o nosso
comportamento. Conforme Norman (2008), quem entra em ação nessa hora é o sistema
afetivo – o responsável, em nosso organismo, por julgar o que é bom ou ruim, seguro ou
perigoso.
3. Memória coletiva
Não apenas os seres humanos individualmente lembram-se das coisas, como também
grupos e as mais diversas coletividades. Os modos de recordar são marcantes
culturalmente, variam ao longo do tempo e segundo a formação cultural em que são criados.
O estudo da memória também passou por modificações conceituais a partir da década de
1920. Ao mostrar que a memória é uma construção social, Halbwachs (2006) apontou que
os indivíduos recordam daquilo que consideram importante para seu grupo. Para ele, as
lembranças são sempre coletivas, pois, mesmo que em determinadas circunstâncias se
esteja materialmente só, o indivíduo recorda tendo como referenciais composições
simbólicas e culturais de um grupo social.
A memória coletiva aflora a identidade de um povo, o que (CASTELLS, 2000, pag. 22),
explica, é “[...] a fonte de significado e experiência de um povo. Toda e qualquer identidade
é construída. ” Michael Pollak (1992), reforça esta colocação:
É uma natural intimidade entre o barro, a palha, o tecer e os sentidos, como se o artesão
tomasse o modelo ancestral da criação, pois “Adão foi feito de barro”. Pensamos essa
mesma relação do artesão com o barro, o artesão com o ferro que forja, com a palha que de
milho que transforma em boneca. Corpo e alma, mãos e memória dedicados ao objeto que
cria, por isso, o objeto “têm” uma vida própria, uma alma que lhe foi dada, e é uma espécie
de continuação do artesão, tornando-se objeto de admiração para quem o compra ou
ganha, principalmente se houve contato com o próprio artesão e a feitura do objeto que
adquire. Objetos carregam memória.
Segundo Mello (2007), pode-se afirmar que a interação com o brinquedo pressupõe uma
determinada aprendizagem social, uma vez que as relações estabelecidas nessa ação
demandam captar os signos e significados estabelecidos enquanto elementos da cultura
lúdica, e da cultura em geral.
Para Perrotti (1990), o elemento lúdico é dado como objeto, de modo que, o objeto
(brinquedo) é peça fundamental na constituição da brincadeira, bem como, na incorporação
de valores socioculturais de seu tempo. Segundo o autor, vê-se a produção cultural da
criança ser velozmente substituída por uma produção cultural para a criança. O brinquedo,
objeto de desejo na esfera de consumo, restringe a ação da criança como produtora de
cultura.
4. Considerações finais
A busca e estudo desses objetos, no caso os brinquedos artesanais, pode ser considerada
uma proposta educativa e cultural; uma experiência de transformação do mundo pelo
brinquedo, como vivência de fruição. Destacam-se os brinquedos indígenas, os brinquedos
de artesãos comerciantes da Feira de Artesanato dominical de Belo Horizonte, Minas
Gerais.
A observação dos objetos de memória e dos brinquedos infantis surge pela diversidade ante
as novas realidades econômicas, políticas e culturais, definidoras do mundo contemporâneo
e que identificam, de certa forma, o projeto de modernidade.
Foi observado que a prática de confeccionar brinquedos é uma atividade que perpassa a
própria história da humanidade. Os objetos artesanais estão presentes em todas as
culturas. A relação do homem com os objetivos os tornam bibliográficos, à medida que a
relação emocional se estabelece.
Um objeto que traz memórias do passado, que identifica, conta histórias presentes e que
talvez, deixarão um legado para o futuro. O mesmo foi observado em relação às culturas
indígenas.
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O ser humano estabeleceu as mudanças culturais pela forma como vive. Assim, o fato de
inserir a tecnologia no cotidiano não inibiu a produção dos brinquedos artesanais. Aliás,
passam ter a ter a conotação de populares. A relação do ser humano com esses
brinquedos constitui na preservação das técnicas e das tradições, que assegura a
conservação da cultura.
Referências
ANTERIO, Djavan. GOMES DA SILVA, Pierre Normando. Relação sociocultural dos
brinquedos artesanais vendidos em feiras livres. In: Revista Educação e Liberdade. v. 37.
n. 3. set/ dez 2012. Porto Alegre: Ed. Real, 2012. Disponível em:
<https://www.ufrgs.br/edu_realidade>. Acesso em: 10 jun. 2017.
BONFIM, Gustavo A. Design e Informação. In Design & Interiores, nº49. São Paulo: Arco
Editorial, 1995.
BOSI, Ecléa. O tempo vivo da memória: ensaios de psicologia social. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2003.
CHATEAU, J. O jogo a criança. Tradução Guido de Almeida. São Paulo: Summus, 1987.
DAMAZIO, Vera. Design e Emoção: alguns pensamentos sobre artefatos de memória. In:
7° Congresso de Pesquisa & Desenvolvimento em Design. Paraná: Anais, 2006.
FEIRA HIPPIE. Bem-vindo ao site da Feira Hippie em Belo Horizonte. Disponível em:
<http://www.feirahippiebh.com/v2/index.php/pt-br/>. Acesso em: 08 jun.2017.
FIGUEIREDO, Luciano de Almeida. Barrocas famílias. São Paulo: Editora Hucitec, 1997.
LÖBACH, B. Design industrial: bases para a configuração de produtos. São Paulo: Edgard
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NORMAN, A. Donald. Design emocional: Por que adoramos (ou detestamos) os objetos do
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POLLAK, Michael. Memória e Identidade Social. Rio de Janeiro: Estudos Históricos, vol. 5,
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PORTO, Íris Maria Ribeiro. Brincar é coisa séria? Um estudo do brinquedo na cultura da
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SILVA, Roseane Santos. SILVA, Regio Pierre. V.5, n.1, 2014. Londrina: Projetica, 2014.
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em: 26 mai. 2017.
RESUMO
O Museu da Imagem e do Som de Campinas está localizado em um prédio histórico de grande valor
patrimonial, tendo sido tombado por três esferas de órgãos de preservação do patrimônio cultural, o
IPHAN, o CONDEPHAAT e o CONDEPACC. O MIS está instalado em um palácio (Palácio dos
Azulejos), que foi residência de Joaquim Ferreira Penteado, o Barão de Itatiba, além desta importante
característica arquitetônica, na história, o solar passou a ser utilizado pela prefeitura de Campinas,
posteriormente pela empresa SANASA, após Secretaria Municipal de Cultura e hoje museu. Ao longo
do tempo o palácio, antes ocupado por barões e figuras “importantes” da sociedade, passou a ser
frequentado pelo povo, sendo esta ocupação realizada em diferentes contextos culturais e sociais,
desde as sessões de cineclubes, participações de coletivos e diversos grupos sociais, exposições,
relações com o espaço, parcerias institucionais com diferentes universidades, etc Todas ações
desencadeiam no MIS uma construção de uma atuação de auto gestão, sendo que as proposituras
de atividades são motivadas pelos diferentes atores do museu, do público para o público.O presente
trabalho pretende relatar as diferentes formas de relação com o MIS - Museu da Imagem e do Som
de Campinas, na condição de coordenador do espaço, considerando as tensões, bem como
apresentar as potências da participação do público do museu na construção coletiva da memória.
Como a proposta feita foi como Relato de Experiência, utilizaremos um texto sucinto,
que estabeleça uma relação dialógica com o leitor e permeie o campo da relação
museu/público como potência para construção de uma nova dinâmica na museologia
contemporânea.
Neste relato não abordaremos sobre a história do Palácio dos Azulejos (um bem
tombado por três esferas do PATRIMÔNIO no Brasil, o federal-IPHAN, o estadual-
O programa educativo do MIS é bem ativo e possui várias frentes, temos parcerias
estratégicas que garantem uma diversidade para programação do espaço. Como oficinas de
fotografia, palestras, debates, fóruns, encontros, reuniões, rodas de conversa, etc.
ARGAN, Giulio Carlo. “História da Arte como História da Cidade”. São Paulo: Ed. Martins
Fontes, 1992.
CHAGAS, Mário. Há uma gota de sangue em cada museu – a ótica museológica de MÁRIO
DE ANDRADE. Chapecó: Argos, 2006.
KRAMER, Sonia; LEITE, Maria Isabel Ferraz Pereira (orgs.). Infância e Produção Cultural.
Campinas: Papirus, 1998.
ESTEVÃO, ANA CECÍLIA. (1); SILVA, DAIANE MENDES DA. (2); SILVA,
MATHEUS HENRIQUE ARAUJO; (3) CORGOZINHO, SERGIO HENRIQUE (4);
JORGE, FELIPE BASTOS (5).
RESUMO
De acordo com o CONFEA, são atribuições do profissional de engenharia civil, dentre outras, o
estudo, a consultoria, a orientação técnica e o ensino, e o engenheiro utiliza estas competências, em
síntese, para encontrar soluções de problemas complexos. Entretanto, para tal, não se requer do
profissional apenas habilidades analíticas, mas também sensibilidade para observação das pessoas e
questões múltiplas da sociedade, além de conservar uma visão vasta e conjunta de um assunto,
integrar as preocupações heterogêneas, saber explicar e convencer tornando-se, então, gestor e
técnico. O conhecimento adquirido pelos profissionais da engenharia deve não ser apenas
direcionado para a solução dos problemas propostos, mas sim para a população, como função social
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para o desenvolvimento social e melhoria de condição de vida. Desta forma, a sociedade precisa de
maior envolvimento do engenheiro e da universidade em assuntos comunitários, com respeito às
individualidades de cada comunidade. Educação patrimonial é constituída de processos educativos
que possuem como foco o patrimônio cultural como recurso para compreensão social e histórica, e
que contribui para o reconhecimento, valorização e preservação do bem cultural. Assim, o profissional
da engenharia, ao lançar mão da sua atribuição de ensino, torna-se um agente cultural e social, e
pode, através de seus conhecimentos, promover a educação patrimonial. Dentre os estudantes, tal
papel pode ser realizado por meio da extensão universitária. Desta forma, este trabalho apresenta o
relato de uma experiência de extensão universitária na graduação em Engenharia Civil do CEFET-
MG Campus Curvelo como ferramenta para a educação patrimonial. Através de visitas técnicas
orientadas, o ProTour objetiva desenvolver no futuro profissional da engenharia civil o entendimento
da cidade e seu valor histórico e cultural, relacionado à apropriação efetiva dos espaços pela
comunidade. Busca-se ainda estabelecer a cidade como território vivo nos processos educativos e
que esta ação seja continuada nas práticas de ensino. Através do debate de diversos conceitos
ligados à construção civil, é possível compreender diversos âmbitos da evolução da população.
Assim, por meio desse entendimento, pretende-se ofertar aulas de reforço escolar nas áreas de
história e literatura para alunos dos anos finais do ensino fundamental e médio, com vistas a prepara-
los para processos seletivos em destaque os processos para ingresso nos cursos técnicos ofertados
no CEFET-MG. Para maior vínculo com a sociedade, pretende-se realizar também uma mostra aberta
à comunidade, em uma edificação de destaque cultural e patrimonial no município, com os materiais
resultantes das visitas já realizadas. Desta forma, espera-se que as ações de Educação Patrimonial
atraiam o interesse da população para que esta possa se envolver e reconhecer sua identidade
perante os bens culturais do município de Curvelo/MG.
Introdução
Neto (2011) afirma que o conhecimento adquirido pelos profissionais da engenharia deve
ser direcionado não apenas para a solução de problemas relacionados ao ambiente
construído, deve considerar a população atendida visando o desenvolvimento social e
melhoria de condição de vida da mesma. Ele defende que a sociedade precisa de maior
envolvimento do engenheiro e da universidade em assuntos comunitários, com respeito às
individualidades de cada comunidade.
Para Grunberg (2007), os processos educativos que constituem a educação patrimonial são
recursos para compreensão histórica e social, e contribui para o reconhecimento,
valorização e preservação do bem cultura. Para tal, nos últimos anos diversas iniciativas
educacionais com metodologias e objetivos pedagógicos distintos foram iniciadas. Grunberg
defende que experiências educativas são mais efetivas se integradas às demais dimensões
da vida das pessoas, e se façam percebidas nas práticas diárias. Para ela, a educação
patrimonial não deve apenas preservar lugares, edificações e objetos pelo seu valor em si,
mas associar os bens culturais a vida cotidiana, para a compreensão dos espaços
territoriais, o que fortalece o vínculo das comunidades com seu patrimônio.
Objetivo
Metodologia
Segundo Bulgraen (2010, pg.2), o docente deve atuar como mediador entre o estudante e o
conhecimento, e deve incentivar o desenvolvimento do raciocínio autônomo e questionador,
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para que o aluno não seja apenas um receptor passivo de informações e assuma um papel
central no processo de aprendizagem.
Para Santos (2001, pg.3), ao atuar como protagonista em técnicas de aprendizagem ativas,
o aluno passa a ser o agente do aprendizado, e o professor atua como orientador e
facilitador do processo. Dessa forma, devem-se respeitar as individualidades e a
aprendizagem precisa ser significativa para o estudante.
Neste contexto, a metodologia adotada envolve três etapas: ações anteriores, durante e
pós-visita. Os alunos conduzem todo o processo, desde a escolha da cidade até as ações
de apropriação do conhecimento posteriores à visita.
A segunda etapa ocorre durante a visita durante a qual são realizadas atividades de
educação patrimonial unindo ações de observação, registro, exploração e apropriação. O
eixo central de organização conceitual das visitas parte da disciplina projeto arquitetônico,
com ações interdisciplinares, como por exemplo, com a disciplina Inglês Instrumental, que
envolvem a escrita e a comunicação oral, permitindo o aprendizado e reprodução de termos
técnicos em língua estrangeira, debatidos anteriormente em português durante as
atividades.
O ProTour realizou duas visitas à Ouro Preto-MG, duas à Belo Horizonte - MG, uma à São
Paulo-SP e uma à Diamantina-MG, descritas a seguir:
Esta primeira visita foi realizada no âmbito da disciplina de projeto arquitetônico, no curso de
Engenharia civil. Uma das alunas da turma realizou de forma espontânea uma pesquisa
sobre alguns pontos turísticos da cidade de Ouro Preto levando para discussão em sala 20
edificações que poderiam fazer parte do roteiro da visita técnica.
As edificações foram divididas entre os grupos e foi proposta a confecção de uma Guia
turístico, que trouxesse informações gerais da cidade, de cada uma das edificações e,
principalmente, os estilos arquitetônicos e suas características. Em um formato que
estimulasse o leitor a visitar a cidade.
Dentre os Guias confeccionados foi escolhido aquele que cumpriu melhor as solicitações de
conteúdo e forma. Foi definido o roteiro atendendo a exigências relacionadas ao tempo da
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visita. Para que fosse possível realizar as atividades propostas em cada etapa da
metodologia as edificações precisariam estar próximas fisicamente possibilitando o
deslocamento rápido entre elas. Foram escolhidas sete edificações e quatro atividades
propostas no Manual de Atividades Práticas de Educação Patrimonial, a serem realizadas
nas edificações ou no percurso entre elas. O Guia foi adaptado com as edificações do
roteiro e impresso para ser utilizado no dia da visita.
Na aula imediatamente anterior à visita os alunos assistiram a uma palestra ministrada pela
professora de história do CEFET-MG, Campus Curvelo, com o tema “Cidades Barrocas”. As
edificações a serem visitadas foram analisadas na palestra e situadas no contexto histórico
da cidade.
Ao final foi aplicada entre os alunos uma pesquisa feedback com o objetivo de aferir os
resultados alcançados e melhorar ações futuras.
Como atividade posterior a visita foi realizado um concurso fotográfico. A FIG. 1 mostra o
primeiro e segundo lugares do concurso respectivamente.
Fonte: do Autor.
A segunda visita foi organizada pela equipe do projeto cultural ProTour. No entanto, a
escolha da cidade partiu da turma de participantes da visita. O roteiro definido permaneceu
o mesmo da primeira visita. As atividades anteriores contemplaram a pesquisa sobre o estilo
arquitetônico das edificações a serem visitadas e das técnicas construtivas do período
colonial.
Durante a visita a dinâmica adotada foi intitulada “aluno guia”. A partir da pesquisa prévia
realizada os alunos, durante a visita, atuaram como guias dando informações históricas das
edificações, explicando e demonstrando as características dos estilos arquitetônicos e
apresentando a técnicas construtivas adotadas. No decorrer das atividades as informações
foram complementadas tanto pela professora orientadora do projeto como pelos alunos
parte da equipe organizadora.
Fonte: do Autor.
Para esta visita a equipe do projeto definiu como eixo orientador as obras do arquiteto Oscar
Niemeyer e, portanto, a produção do período moderno na capital mineira. Foram visitadas
edificações de outros períodos, mas o principal destaque foi dado à produção modernista.
Como atividade de apropriação foi proposta a criação de cartões postais dos locais
visitados. A FIG. 3 apresenta um dos cartões postais entregues:
Fonte: do Autor.
O motivador inicial para visita a São Paulo foi conhecer a Mostra Casa Brasileira, no espaço
Caixa Cultural São Paulo. A mostra reuniu mais de 60 obras, algumas inéditas, entre
croquis, plantas, fotografias e ilustrações sobre o jeito brasileiro de morar – as moradias
indígenas, os imensos casarões rurais, as casas térreas iluminadas, os sobrados urbanos e
os edifícios de apartamentos. Apresentando grandes nomes da arquitetura e engenharia,
teve como objetivo explorar as múltiplas experiências do morar e suas peculiaridades no
que diz respeito ao uso dos materiais, referências estéticas e organização dos espaços,
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trazendo a percepção das renovações e das permanências que traduzem a evolução dos
modos de vida e dos valores ao longo dos séculos.
O destaque da visita aconteceu nas obras do estilo moderno, da arquiteta Lina Bo Bardi: A
Casa de Vidro e o Museu de Arte de São Paulo (MASP). Na primeira foi realizada uma visita
educativa que apresentou a sua história pessoal e profissional, bem como as características
arquitetônicas da sua produção. Os alunos manifestaram interesse em uma segunda visita
que contemplasse, como eixo orientador, as obras de Lina Bo Bardi e de outros arquitetos
que fossem seus contemporâneos.
Por fim foram visitadas edificações contemporâneas, na Avenida Brigadeiro Faria Lima.
Uma delas foi o edifício Pátio Victor Malzoni que reúne em sua proposta arquitetônica um
vão de 40,5m de largura e 30m de altura, a preservação de uma construção histórica do
século 17, a Casa Bandeirista, e a meta de obter a certificação Leadership in Energy and
Environmental Design (LEED). Meta alcançada na classificação Core & Shell Prata.
Ainda na Avenida Brigadeiro Faria Lima foi visitado o edifício Faria Lima 3500, edificação
com pré-certificação LEED Core & Shell Gold, em processo de aprovação da certificação.
Um dos diferenciais para a obtenção da certificação é o térreo projetado sob pilotis,
pavimento no qual a proposta arquitetônica foi à integração entre o edifício e a praça pública
térrea. No entanto, durante a visita, não foi possível percorrer a praça pública conforme
planejado pela equipe organizadora da visita. Tal ação deveria ser autorizada pela gerencia
do edifício. Esta situação fomentou a discussão acerca do espaço público e privado, e suas
interseções com a construção de cidades sustentáveis.
Como atividade de apropriação foi proposta a atividade “Cartas para Lina”. Os alunos
participantes deveriam escrever uma carta simulando uma situação de reencontro com a
arquiteta Lina Bo Bardi, como se a mesma fosse uma amiga de infância. Nesta carta deveria
ser relatada a visita à cidade de São Paulo e a percepção individual dos conteúdos
estudados. A seguir é apresentado um trecho de uma das cartas elaboradas:
Mas me deixe atualizar a minha vida para você e te contar uma grande
surpresa que tive.
(...) Mas o que mais quero destacar foi uma visita que um amigo me indicou: a
Casa de Vidro. Só sabia que tinha sido uma arquiteta renomada que a tinha
projetado. Quando o rapaz que cuida da casa disse o nome dela, quase tive
um enfarto! Minha amiga de infância se tornou uma grande arquiteta que
marcou a história do Brasil! Fiquei contagiado pela sua história e obras, e
depois disso não pude deixar de visitar o Museu de Arte de São Paulo. E
ainda tem mais: atuei como tradutor durante a visita a sua antiga casa! :) No
hostel onde fiquei hospedado, conheci Mitch, um canadense que estava de
passagem pelo Brasil. Ele me acompanhou na visita e pudemos partilhar um
pouco de nossas culturas. Foi tudo fantástico!".
A visita à cidade de Diamantina foi a primeira do projeto voltada aos alunos do ensino médio
profissionalizante. A equipe organizadora definiu o roteiro com vistas a discutir o estilo
arquitetônico, a história da cidade e a realização de atividades relacionadas ao desenho
artístico de observação e o desenho técnico de vistas ortogonais.
A atividade anterior à visita foi a leitura do texto “Oscar Niemeyer: Escola pública,
Diamantina. Joia modernista incrustada em território barroco”, de autoria de Adilson
Melendez, publicado na revista Projeto Design.
O roteiro contemplou visita ao Museu Casa Juscelino Kubitscheck, Hotel do Tijuco, Catedral
Metropolitana de Santo Antônio, Largo da Quitanda, Mercado Municipal, Largo do Rosário,
Casa Chica da Silva e Escola Estadual Professora Júlia Kubitscheck. Junto a atividade pré-
visita foi disponibilizado aos alunos participantes textos educativos sobre cada local a ser
visitado.
Posteriormente a visita os grupos deveriam elaborar um PopCard para cada uma das
edificações visitadas, com todas as informações coletadas durante a visita. A FIG. 4
apresenta um dos PopCards entregues:
Fonte: do Autor.
Na segunda visita, a equipe do projeto definiu o Modernismo como temática a ser tratada, e
assim como na primeira visita à cidade, as obras do arquiteto Oscar Niemeyer foram
colocadas em foco. Para complemento da temática e estudo da Arquitetura Contemporânea,
foi realizada uma visita guiada ao estádio Governador Magalhães Pinto, conhecido como
Mineirão. Nesta, foram destacadas, além da estrutura, com as técnicas construtivas
utilizadas, os desafios e atitudes sustentáveis tomadas na reforma do estádio que
possibilitaram a obtenção do selo Leed Platinum, selo ofertado pelo Green Building Council
que representa que a edificação possui requisitos que a tornem diferenciadas quanto à
sustentabilidade perante as demais.
Essas atividades foram realizadas pelos grupos no Museu de Arte da Pampulha e na Casa
Kubistchek.
Foi entregue uma planta baixa da esplanada do Mineirão, em escala reduzida. Os contextos
apresentados aos grupos foram críticas realizadas após a reforma do estádio devido à
quantidade de árvores retiradas para a construção da esplanada e o baixo aproveitamento
da mesma, tendo grande fluxo de pedestres apenas em dias de eventos. Considerando o
potencial econômico da área, com presença de atividades comerciais como setores de
alimentação, deveria ser proposto um projeto de intervenção para melhor utilização do
espaço, que não provoque prejuízos aos objetivos principais, seja seguro e tenha baixo
custo de instalação.
Por fim, foi debatido entre os alunos qual dos dois conceitos é melhor na prática: a
compatibilização de projetos ou a engenharia simultânea.
Verificou-se que esta visita obteve os melhores resultados considerando a participação dos
alunos, debate de conceitos relacionados à engenharia civil e a aplicação da
interdisciplinaridade nas atividades, demonstrando a apropriação dos alunos organizadores,
voluntários no projeto de extensão ProTour, dos conceitos e da metodologia proposta.
O projeto prevê ações de educação patrimonial que relacionem os produtos obtidos nas
visitas e o conhecimento adquirido pelos alunos envolvidos com a população do município
de Curvelo. Nestas atividades pretende-se trazer para dimensão local os conceitos
discutidos em outras cidades e exemplificar a importância do patrimônio cultural para o
desenvolvimento sustentável e, desta forma, contribuir para uma valorização do patrimônio
cultural do município.
Também pretende-se ofertar à alunos dos anos finais do ensino fundamental e médio aulas
de reforço nas áreas de história e literatura, com ensinamento dos conhecimentos obtidos
durante as visitas acerca da evolução da população. Tal ação objetiva a preparação destes
à processos seletivos, em destaque para os cursos ofertados no CEFET-MG Campus
Curvelo. Desta forma, os estudantes vinculados ao projeto poderão vivenciar também a
experiencia de docência.
Considerações finais
Através das visitas é possível trabalhar diferentes conteúdos teóricos e garantir que a
abordagem gere significado ao aluno. Pode-se ainda promover maior proximidade
entre aluno e professor, a cooperação entre alunos, feedback imediato, maior
domínio em relação ao tempo de execução de uma tarefa e o respeito aos diferentes
talentos e formas de aprendizagem.
Além disso, são resultados esperados para as ações a serem desenvolvidas com a
comunidade de Curvelo:
RESUMO
Procurando apontar referências de práticas culturais relevantes para que esses sujeitos se
sintam produtores de cultura e para que se apropriem de suas heranças culturais, as oficinas de
educação patrimonial buscam também a valorização de suas experiências e vivências no cotidiano de
suas comunidades. As atividades são pensadas com o propósito de mostrar a esse indivíduo que no
cotidiano de sua comunidade, de sua escola, de sua cidade e região ocorrem a todo momento
manifestações culturais que representam a história e memória de pessoas comuns. Neste sentido, todo
o arcabouço cultural já apropriado pelos estudantes em sua dia-a-dia é somado ao material do
Para realização das oficinas de educação patrimonial é feito um treinamento com discentes
voluntários de várias áreas de graduação da UEMG – Unidade Divinópolis, para que possam
desenvolver e aplicar as ações extensionistas. A educação acadêmica neste momento também é
pensada além dos muros da universidade, fazendo uma integração entre comunidade, alunos e
professores, e essa participação estudantil multidisciplinar também se mostra muito positiva para
ampliar as possibilidades de alcance do debate patrimonial, pois promove o compartilhamento do
conhecimento e a comunhão de saberes nessas respectivas áreas de atuação. Toda essa preparação é
adequada à recepção do público alvo composto por estudantes do ensino fundamental e médio das
escolas públicas da região, que são convidadas pelo Centro de Memória ou que nos procuram
espontaneamente.
Perceber a compreensão do tema pelos estudantes através de suas próprias produções nos dá a
sensação de que o objetivo das oficinas patrimoniais foi atingido; com o encerramento das atividades
fazemos o arquivamento de todo material produzido, o que nos possibilita fazer essa avaliação
positiva. A transmissão de conhecimento se dá de forma tão rica que é recíproca para ambas as partes
envolvidas, e neste artigo buscaremos compartilhar essa nossa experiência ressaltando a relevância da
educação patrimonial para educadores, educandos e toda a sociedade.
Quando falamos de patrimônio cultural, a ideia inicial que se têm, perpassa por um caminho
construído pela história e tradição, onde apenas monumentos, e objetos doravindos de uma elite possui
significação cultural para a maioria. Ao ensinarmos as dimensões do patrimônio, é necessário
exercitar uma prática onde a cultura comunitária de cada indivíduo, seja o ponto de partida para a
educação, que deve ser muito mais construção coletiva de um saber, que propriamente um conjunto de
teorias verbalizadas por um interlocutor que por uma razão ou outra possui um arcabouço teórico
sobre o tema. As heranças preconceituosas são sem dúvidas um dos principais desafios no que tange o
reconhecimento do patrimônio cultural.
Uma das principais características do ser humano é se realizar enquanto pessoa ao entorno de
uma comunidade de iguais, e nesse sentido, o reconhecimento dessa comunidade como parte da
história individual deve preceder do entendimento teórico das diversas faces do patrimônio. Os atores
sociais devem participar ativamente na identificação do seu patrimônio, que sempre se dá e se constrói
de forma coletiva, na história compartilhada onde indivíduos de um mesmo grupo se identificam
diante daqueles elementos nos quais se faz sua cultura.
É inerente à cultura ocidental ressaltar e privilegiar a história das grandes elites, que por sua
vez construíram grandes monumentos arquitetônicos e ditaram uma cultura vertical. Porém, quando
pensamos no todo do patrimônio cultural, seria injusto não ressaltar as inúmeras manifestações
artísticas, religiosas e celebrativas existentes no seio das mais diversas comunidades, que possuem
inúmeros saberes e muitas vezes não são entendidas como protagonistas na construção do que é
considerado por elas patrimônio.
Quando se pensa o patrimônio e nele é possível vislumbrar a mensagem que alguém quer ou
quis passar, é necessário termos em mente que aquela manifestação faz parte de uma construção
sociocultural que diz respeito à toda comunidade. Reconhecer-se como parte do coletivo que se dá o
patrimônio, é essencial para que ele seja compreendido essencialmente.
O patrimônio cultural tem importância para muita gente, não só para um indivíduo
ou uma família. Dessa maneira, o patrimônio cultural liga as pessoas. É sempre algo
coletivo: uma história compartilhada, um edifício ou lugar que todos acham
importante, uma festa que todos participam, ou qualquer outra coisa em torno da
qual muitas pessoas de um mesmo grupo se identificam. O patrimônio cultural faz
parte da vida das pessoas de uma maneira tão profunda, que algumas vezes elas não
conseguem nem mesmo dizer o quanto ele é importante e por quê. Mas caso elas o
perdessem, sentiriam sua falta. Como, por exemplo, a paisagem do lugar da infância;
o jeito de preparar uma comida; uma dança; uma música; uma brincadeira. (IPHAN,
2013, p.12)
Nesse sentido, a implantação das oficinas vem de encontro a todos os sujeitos que de uma
maneira ou outra constroem também a cultura como um todo. Levar cada indivíduo a refletir o
patrimônio e se entender como parte dele é sem dúvidas o principal papel que a oficina desempenha.
Não é tarefa em sua execução impor ou ditar um ou outro patrimônio, as oficinas são propostas
justamente num caminho contrário, que valoriza o saber do outro e constrói junto com o outro as
dimensões que precisam ser resguardadas no reconhecimento do patrimônio cultural.
O termo “Educação Patrimonial” citado em 1983 no “1o Seminário sobre o Uso Educacional
de Museus e Monumentos” (SIVIERO, 2015, p. 80) denota o início da preocupação em propor, por
parte das instituições de preservação do patrimônio, uma relação mais próxima da sociedade através
da construção coletiva de bens culturais utilizando-se de projetos educacionais compráticas
pedagógicas mais democráticas e plurais. Nunca houve dúvidas sobre o caráter primordial da educação
como política pública para o incentivo à preservação do patrimônio cultural, mas este modo de fazer
vem superando de forma efetiva o viés verticalizado e institucional de transmissão do
conhecimento.Atualmente, discussõessobre patrimônio levantam questões sobre essa tutela do
Estadoque emoldura certo “tipo ideal” de patrimônio e propõem a concepção de valores culturais
socialmente construídos.
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O reconhecimento sobre o campo da educação patrimonial vem se refletindo na inserção desse
conteúdo na prática escolar da educação básica, mas um grande avanço nessa questão é o
entendimento de que essas oficinas podem e devem ser ministradas nos mais diversos ambientes em
que haja comprometimento com a preservação do patrimônio cultural. Essa penetração no campo
social é o que de fato dá sentido à premissa de construção coletiva do saber, e assim o alinhamento
entre teoria e prática resulta satisfatoriamente nos princípios que entendemos como fundamentais
nessa metodologia: instigar na população o sentimento de pertencimento, identidadee cidadania, e
reforçar a autoestima coletiva destes que são legítimos produtores de cultura.
O principal intuito dentro de uma oficina de Ed. Patrimonial é que os alunos compreendam em
seu entorno os bens patrimoniais presentes em seu cotidiano, mas não há como esperar que essa
compreensão seja homogênea. Devemos levar em conta fatores sociais que afetam diretamentea
realidade dessas crianças e adolescentes e que vão impulsionar ou afastar mesmo a assimilação de
conceitos simples. É neste sentido que se faz necessário o trabalho de conceituação durante a oficina,
pois além de servir como base para o desenvolvimento de toda a atividade,em muitos casos este será o
primeiro contato do estudante com o conteúdo.
Mas para além dessa ação prática, devemos pensar nessa defasagem como um problema
estrutural. Os alunos que em seu cotidiano não tem contato com manifestações culturais como a dança,
o teatro, celebrações religiosas, museus etc., são os que mais apresentarão dificuldade na absorção de
conceitos. Quando a criança e o adolescente já tem essa perspectiva cultural bem apropriada, seu
entendimento se dá exponencial e espontaneamente, ao passo que sua desenvoltura pode ser
comprometida pela não compreensão dos saberes que estão no seio de sua família, as celebrações que
são feitas em seu bairro, as formas de expressão que são produzidas em sua cidade ou os conjuntos
arquitetônicos importantes de seu município. Quais as formas de fazer com que a cultura – em seu
sentido mais abrangente e relativista – chegue a todos os lares brasileiros é uma questão que vem
sendo tratada institucionalmente em várias propostas, mas a educação patrimonial vem alertar-nos
para a cultura que não precisa ser “encontrada”, e sim que já se faz presente. Dessa forma, a
É percebendo essa necessidade latente de nossa sociedade que a forma de se trabalhar com
patrimônio vem se aproximando das múltiplas manifestações culturais gerando um contínuo processo
de apropriação e valorização. Esse desafio portanto nos dá um retorno muito satisfatório, pois
trabalhar esse diálogo de apropriação do conhecimento de forma que o estudante se entenda como ser
criador e reprodutor de cultura, resulta no perceptível avanço dos estudantes sobre essa
compreensão.O sujeito que participa de uma oficina como esta, tem seus olhos voltados para as
subjetividades que o mundo nos apresenta, e numa relação antropofágica, ele consome o que é
produzido por outros seres humanos e se entendem comoprodutores de cultura que
serátambémreapropriada. Esse sentimento de identidade, aliado à educação enquanto mediadora é
fundamento imprescindível para a perpetuação desse saber que se desdobra em atitudes de preservação
e valorização dos patrimônios culturais.
Neste sentido, é necessário que seja feito um trabalho cuidadoso e atento as particularidades
do público alvo das oficinas, buscando ressaltar bens culturais relacionados à sua realidade. A
linguagem nessa situação possibilita a reduçãodo distanciamento cultural fomentado pela
institucionalização da preservação que segrega os bens de real significado para a sociedade,
principalmente quando se trata de pequenas comunidades.O modo como trabalhar essa comunicação
deve ser pensado do mesmo modo como em geral tratamos os bens culturais: de forma subjetiva.A
linguagem utilizada com crianças e adolescentes para a abordagem sobre patrimônio, deve ser clara e
adequada a determinado contexto, levando em conta que a própria característica da educação
patrimonial se dá muito mais com os sentidos e com as subjetividades do que por uma orientação
tecnicista e emoldurada.
É preciso que as atividades trabalhem com as diversas capacidades do aluno e que eles sintam
que a sua produção naquela atividade significa tanto quanto o conteúdo teórico da mesma. Trabalhar
educação patrimonial falando sobre celebrações, formas de expressão, lugares e não apresentar isso de
uma forma lúdica e envolvente, impede muitas vezes com que os alunos se apropriem destes
significados. Esse método também supera o conteudismo das aulas que de forma cristalizada e
disciplinatória não dialoga com a realidade e interesse dos estudantes.Usar da música, de ilustrações,
dos seus desejos individuais de preservação e do conhecimentos sobre a cultura local é, portanto,
essencial para que seja feita essa aproximação entre a realidade e os conceitos relativos ao patrimônio.
Uma vez entendidas essas relações durante a apropriação do conhecimento, a reprodução desse
conteúdo e a produção própria de saberes, fazem sentido e fluem com naturalidade.
É preciso frisar também que todos os espaços de socialização tem em sua essência uma
potencialidade educadora e é onde pode ocorrer esse compartilhamento de saberes de forma mais
intrínseca e legítima. A educação patrimonial vem nesse sentindo evidenciar e incentivar o
entendimento sobre essas práticas, ultrapassando o viés pragmático da história e expandindo as
delimitações histórico-sociais numa eterna remodelagem cultural que permeia nossa existência em
espaços e tempos diferentes.
Mapas de percepção
Aplicar os mapas de percepção tem se tornado tarefa fundamental nas oficinas de educação
patrimonial. Levar em conta o conhecimento de cada indivíduo é caráter norteador para uma
construção coletiva e efetiva de saberes.
Por isso mesmo pensar certo coloca ao professor ou, mais amplamente, à escola, o
dever de não só respeitar os saberes com que os educandos, sobretudo os da classes
populares, chegam a ela - saberes socialmente construídos na prática comunitária -
mas também, discutir com os alunos a razão de ser de alguns desses saberes em
relação com o ensino dos conteúdos. Porque não aproveitar a experiência que tem os
alunos de viver em áreas da cidade descuidadas pelo poder público? [...] Porque não
estabelecer uma necessária "intimidade" entre os saberes curriculares fundamentais
aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos? (FREIRE, 2002,
p.16)
Quando se pensa no patrimônio histórico de uma cidade, ou nos bens tombados pelas
instituições de salvaguarda, os indivíduos são levados a perceber a relevância cultural da comunidade
a partir de uma história que não está intimamente ligada com sua trajetória de vida, assimilar o
passado e as manifestações culturais com um olhar de pertencimento não é uma atitude comum em
uma sociedade que protege e registra individualmente o seu patrimônio.
Nesse sentido, quando se introduz a dinâmica dos mapas mentais, o ouvinte é levado a se
entender como parte de um todo que é construído por seus pares, e percebe nessa construção a
interferência que ele próprio é capaz de fazer quando denota àquilo algum significado para si.
Desvendar o mítico olhar que não entende as práticas corriqueiras como saberes dotados de
dignidade permeia a visão que se deve ter na ministração das oficinas. Conscientizar sobre o
patrimônio partindo dos saberes que cada um possuí é uma tarefa fundamental na construção
democrática do reconhecimento de práticas que por sua vez deveriam ser entendidas como parte da
riqueza cultural.
Assim sendo, passemos agora para a análise de quatro mapas mentais selecionados nas
oficinas ministradas pelo Centro de Memória Professora Batistina Corgozinho da Universidade do
Estado de Minas Gerais – Unidade Divinópolis. Tais mapas foram executados na 14ª Semana
Nacional de Museus, realizada entre os dias 16 e 20 de maio de 2016.
Este mapa nos revela um fator interessante citado neste artigo que é a linguagem. Dentre todos
os patrimônios representados, percebemos o tom descontraído que diz sobre a identidade desses
indivíduos e como as atividades patrimoniais podem seguir este mesmo viés. No turbilhão tecnológico
hodierno, o excesso de informação vem de encontro aos anseios informativos inerentes à adolescência.
As redes sociais, bem como os canais de informação online são realidades presentes nos autores deste
mapa. A fala introdutória da oficina somada a esse contingente informacional nos permite analisar o
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bom desempenho no processo de assimilação dessa atividade. É nesse sentido que ao explicar o tema,
usar de exemplificações que aguçam o conhecimento prévio desses jovens, que se obtém um resultado
satisfatório. As diversas informações perpassam pelo pão de queijo, bem cultural presente no cotidiano
dos mineiros; pelas maracas, instrumento que aqui se apresenta de forma muito original; o ônibus
utilizado como transporte público da cidade de Divinópolis; frases e gírias como “carimba que nóis é
top” que também dizem sobre sua identidade cultural.
Árvore do Patrimônio
Passemos agora para a análise de alguns bilhetes que foram afixados na “Árvore do
Patrimônio” selecionados nas oficinas ministradas pelo Centro de Memória Professora Batistina
Corgozinho da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Divinópolis, na 14ª Semana
Nacional de Museus, realizada entre os dias 16 e 20 de maio de 2016.
Neste bilhete está explicita a intenção de preservação do patrimônio linguístico, algo tão caro à
preservação patrimonial. Muitas vezes este tipo de patrimônio passa despercebido para a população,
mesmo que seja tão perceptível nossa variação linguística em um território tão amplo. Nossa língua,
composta por variedades dialéticas, morfológicas e fonéticas identifica as diversas regiões nacionais e
ainda se desdobra em tantos outros dialetos locais que representam o modo de vida de determinada
comunidade. A oralidade vem sendo cada vez mais reconhecida na História como fonte documental de
grande importância, e neste sentido a língua compartilhada por uma sociedade ganha essa mesma
relevânciade registro para a identificação social.
Considerações Finais
A realização das oficinas de Ed. Patrimonial são sem dúvidas um desafio, no entanto seus
resultados nos encorajam a entender a necessidade dessa prática. Quando a escola, o museu ou um
centro de memória entende a necessidade de construir coletivamente políticas de salvaguarda do
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patrimônio, as oficinas são uma excelente ferramenta que possibilita fomentar uma consciência da
importância do seu reconhecimento.
Por fim, fica aqui nosso encorajamento a todos aqueles que se interessam de uma maneira ou
outro pela salvaguarda do patrimônio cultural brasileiro, a realizar oficinas e outras práticas que
auxiliem na sua preservação e manutenção. Ainda, incentivamos aos profissionais de áreas afins a
construir a partir do plural entendimento de patrimônio cultural, uma educação que seja
transdisciplinar e nesse sentido, possamos juntos entender as multifaces para o estabelecimento
profícuo de práticas que proteja e facilite a livre perpetuação de nosso patrimônio cultural.
Referências
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 42ª ed.Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.
RICHTER, Denis. Raciocínio geográfico e mapas mentais: a leitura espacial do cotidiano por alunos
do Ensino Médio. Tese (Doutorado em Geografia). Presidente Prudente: Universidade Estadual
Paulista, 2010
SIVIERO, Fernando Pascuotte. Educação e Patrimônio Cultural: uma encruzilhada nas políticas
públicas de preservação. Revista produção online. [on-line]. n 19. São Paulo: USP, 2015. Disponível
na Internet: <http://www.revistas.usp.br/cpc/article/view/90786>. ISSN 1980 - 4466.
RESUMO
Atento às problemáticas ambientais, presentes no cotidiano, o presente trabalho pautado nos
princípios contemporâneos da sustentabilidade, identifica os valores que a atividade integrada de
turismo pedagógico, interpretação ecológica e educação ambiental em monumentos e sítios
acrescentam à sociedade humana. O objetivo do projeto de pesquisa assenta-se na análise das
possibilidades perceptivas, interpretativas e educativas do Parque Urbano Cemitério do Bonfim,
atualmente administrado pela Fundação de Parques Municipais, localizado na Bacia Hidrográfica do
Córrego do Pastinho, afluente do Ribeirão Arrudas, zona oeste do município de Belo Horizonte,
estado de Minas Gerais. O “Parque” Cemitério do Bonfim possui uma infraestrutura considerável, do
ponto de vista de patrimônio cultural, sendo criado para atender ao público apenas com
equipamentos e infraestrutura para a questão da morte. Sua incorporação ao lazer, entretenimento e
contemplação é uma premissa recente evidenciando novos usos e potencialidades do espaço
público. O processo de pesquisa e levantamento de informações segue o método qualitativo
exploratório com classificação de dados da infraestrutura existente nessa unidade de conservação, e
um trabalho de observação, identificando deficiências, potencialidades e problemas que subsidiem a
elaboração de novas propostas técnicas de intervenção e concilie a área como espaço educativo de
apropriação da comunidade local e demais visitantes e turistas, com vistas a um futuro promissor na
qualidade de vida da região de entorno.
PALAVRAS CHAVE
Interpretação Ambiental, Turismo Pedagógico, Parque Urbano
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
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INTRODUÇÃO
A troca do solo fértil e permeável por coberturas de concreto e asfalto é uma situação cada
vez mais comum nos grandes centros urbanos impedindo a recarga dos mananciais, o
crescimento da vegetação natural e a manutenção dos ecossistemas locais. As raras áreas
no tecido urbano, com remanescentes de vegetação nativa, conservam muitas espécies
ameaçadas e contribuem para o equilíbrio ecológico da cidade privilegiando seus moradores
e/ou visitantes com a possibilidade de contemplação, estudo e reflexão sobre a necessidade
de se preservar de forma consciente e sustentável estes relevantes espaços naturais. Belo
Horizonte, considerada no passado uma das metrópoles mais arborizadas do país e, outrora
com indíces elevados de qualidade vida, encara o desafio atual de manter a antiga imagem
de cidade modelo na área ambiental. Atualmente o municipio, enfrenta o crescimento
populacional, o progresso devastador e a diminuição das áreas naturais, promovendo
inúmeros impactos ambientais. Faz-se necessário compreender que é imprescindível
atender às necessidades de hoje, sem comprometer a capacidade das gerações futuras,
sem o prejuízo de perder o elo com o patrimônio histórico, natural e paisagístico que ainda
resta (OMT, 2003 apud SILVA, 2009). Na atualidade, a educação patrimonial1 e ambiental
aplicada ao turismo de cunho pedagógico agregam novos valores, despertando a população
e os visitantes para a real necessidade de mudanças comportamentais, visando atingir
atitudes mais conscientes e sustentáveis. Almeida (2015, p. 04) alega que:
O cemitério do Bonfim (figura 01) para além do cumprimento de suas
funções habituais ligadas ao culto aos mortos vem sendo cada vez mais
utilizado como lugar de turismo e espaço educativo. O hábito de ministrar
aulas específicas utilizando o espaço cemiterial é atividade pedagógica
recorrentemente praticada entre docentes e, de modo particular, na Escola
de Design da Universidade do Estado de Minas Gerais. Esta ação educativa
vem se realizando através do trabalho de docentes em disciplinas diversas
que são ministradas para os cursos de Design Gráfico, Design de Produto,
Design de Ambientes e Licenciatura em Artes Visuais. De fato, esse uso do
cemitério como um espaço não formal de educação vem se consolidando há
mais de 17 (dezessete anos), na medida em que grupos de estudantes de
diversos níveis acadêmicos são convidados a participar de incursões
pedagógicas, propondo a reflexão sobre a história e a relevância no tocante
à preservação da cultura material e imaterial que envolve aquele lugar.
1 A educação patrimonial é elemento a ser considerado no processo de salvaguarda das referências culturais. ”,
ou seja, é necessário que: [...] os educadores assumam esse compromisso e criem possibilidades de trabalhos
teóricos e de campo para auxiliar a comunidade no processo de interlocução com a memória, com os lugares de
memória, com a história local. É preciso despertar as populações para a percepção e valorização de lugares, de
saberes, de celebrações, por meio de apreensões visuais dos bens da comunidade. PINHEIRO, Áurea da Paz e
PELEGRINI, Sandra C. A. (org.) Tempo, Memória e Patrimônio Cultural. Teresina: EDUFPI, 2010.
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Fonte: https://media-cdn.tripadvisor.com/media/photo-s/0c/3b/60/ab/cemiterio-do-bonfim.jpg
O Turismo realizado por visitantes em apenas um dia, dentro da sua própria região de
destino, é conhecido como excursão, passeio ou simplesmente visita. Esses deslocamentos,
quando acontecem dentro de casa, para o público interno, nesse caso, os moradores do
próprio município, e até mesmo os dos municípios vizinhos, não recebem a denominação de
Turismo, por uma analogia acadêmica com propósitos ultrapassados. Talvez se essa
atividade de passeio ou excursão, dentro da própria região, fosse também chamada de
Turismo, provocaria um interesse maior pela descoberta dos atrativos locais. A estratégia
seria uma convocação dos moradores da cidade para o desafio da descoberta, convidando-
os para reconhecerem o patrimônio histórico e paisagístico da urbe, no caso em especial, as
áreas culturais e naturais, induzindo, estimulando com propostas atraentes, da descoberta
das sensações nunca sentidas em locais tão próximos, localizados praticamente “no quintal
de suas casas”. Esta seria uma excelente maneira de educar também, estimulando nestes
visitantes, a interpretação do patrimônio, desenvolvendo a percepção e incentivando o uso
dos sentidos, a interpretar com novos olhares as imagens não percebidas na correria do
cotidiano, a compreender os signos, significados e significantes, a conhecer os fatos
desencadeados que levaram às mudanças que afetam suas vidas, questões históricas,
geográficas, biológicas, pouco compreendidas, pouco estimuladas dentro de uma sala de
aula e nas até mesmo nas experiências da vida. Assim, a proposta para o desenvolvimento
de atividades de turismo pedagógico de cunho ecológico em áreas culturais e naturais na
cidade, em específico os parques urbanos trazem à discussão, a viabilidade técnica da
implantação desta atividade em Unidades de Conservação. Lamentavelmente, existem
efetivamente poucos projetos desenvolvidos pelo poder público, ONGs, ou empresas
privadas visando um plano estratégico que atraia para essas áreas, visitantes afoitos pelo
conhecimento, sedento pela descoberta do novo, do diferente, do inusitado.
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Sabendo que a cidade possui áreas naturais preservadas transformadas em parques
urbanos, o presente estudo pretende pesquisar as possibilidades do uso de um destes
espaços para desenvolvimento de atividades integradas de turismo pedagógico,
interpretação ecológica e educação ambiental, contemplando em especial, o Cemitério do
Bonfim. Para Almeida (2007, p. 156);
Desde sua inauguração até o final da década de 30 do século passado era
conhecido como “Cemitério Municipal”, o nome Bonfim só aparece nos
mapas, plantas e relatórios oficiais, posteriormente, nos últimos anos da
década de 30 e inícios dos anos 402. Por que Bonfim? Abílio Barreto atribuiu
ao povo da capital a escolha do nome para o novo cemitério da cidade.
Apropriado, diga-se de passagem, pois se refere ao exato instante da morte
do filho de Deus. Entretanto, não há registros documentais que confirmem
ou não de onde partiu esta opção3.
Os parques urbanos devido a sua importância ecológica na região Noroeste (Quadro 01) e
na própria cidade caracterizam-se como áreas naturais bem preservadas, com rica
biodiversidade e paisagens ecológicas quase incomuns em grandes centros urbanos. O
Bonfim foi respectivamente escolhido como objeto deste estudo, pois embora não seja um
parque urbano é um espaço de grande referência para a cidade. Almeida (2007, p. 144-145)
alega que
Proibir novos sepultamentos no adro da Matriz de Nossa Senhora da Boa
Viagem foi uma das primeiras medidas tomadas pela Comissão Construtora
da Nova Capital. A ordem era: os novos enterramentos deveriam ser feitos
no cemitério provisório4 preparado para este fim. Esta medida consta no
relatório dos trabalhos realizados para edificação da nova cidade, altura em
que se menciona: [...] o preparo de um cemitério provisório para impedir que
continuassem os enterramentos a ser feitos no adro da Egreja Matriz, onde
já não se podia abrir cova sem exhumar corpos ainda mal decompostos
[...]5. Além do mais no regulamento que norteou a construção da capital era
determinado: [...] a sua área será dividida em secções, quarteirões e lotes,
com espaços, avenidas e ruas necessárias para a rápida e fácil
communicação dos seus habitantes, boa ventilação e hygiene [...]. Na
mesma planta serão designados os logares destinados para os edifícios
públicos, templos, hospitaes, cemitérios, parques, jardins, matadouros,
mercados, etc. [...]6
2 Panorama de Belo Horizonte: Atlas Histórico. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro/Centro de
Estudos Históricos e Culturais, 1997.
3 BARRETO, Abílio Resumo Histórico de Belo Horizonte (1701-1947). Belo Horizonte: Imprensa
hoje estão situados aos fundos do Orfanato Santo Antônio, na confluência das atuais Ruas dos
Tamoios e Rua São Paulo. Lá foram realizados desde sua instalação até inícios de 1897, duzentos e
oitenta e cinco sepultamentos, tendo sido assim que concluídas as obras do definitivo denominado
“Cemitério Municipal”. (ALMEIDA, 2007, p. 148)
5 Esta medida se deu entre Junho e Julho de 1894. Cf: Commisssão Constructora da Nova Capital
Revista Geral dos Trabalhos sob a direção do Engenheiro - chefe Francisco Bicalho. Rio de Janeiro:
H. Lombaerts & Cia, agosto de 1895. Vol. II. p. 6.
6 Regulamento para as bases do levantamento do Plano Geral da Capital do Estado
A regional Noroeste, em áreas de transição Cerrado/Mata Atlântica, por sua vez é a que tem
menos índice de remanescentes relevantemente preservados, e consecutivamente um
ecossistema urbano pobre em atributos naturais conservados. Os parques ecológicos da
cidade formam o patrimônio cultural e natural, enquanto cernes de um futuro sustentável,
sendo que nesta regional, em especifico, eles precisarão ser ampliados. A possibilidade de
implantação de novas áreas deste âmbito preconiza processos de melhoria da qualidade de
vida urbana. Para propor uma atividade de turismo num espaço deste domínio é necessária
a análise de infraestrutura e equipamentos oferecidos aos visitantes, pretendendo conectar
os recursos disponíveis encontrados com as atividades destinadas ao entretenimento, ao
lazer e a educação ambiental sustentados nos ideais do turismo. A promulgação da Lei
10.655/2013, em 03 de setembro, pelo Prefeito Márcio Lacerda, transformando o Cemitério
do Nosso Senhor do Bonfim em ponto turístico (figura 02) evidencia transformações no
cenário da regional Noroeste:
Inclui o Cemitério do Bonfim nos roteiros turísticos e culturais do
Município.
O Povo do Município de Belo Horizonte, por seus representantes,
decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º - O Cemitério do Bonfim passa a ser ponto turístico e cultural
do Município.
Art. 2º - O Executivo será responsável pelo órgão que fará o
levantamento, o estudo e a identificação das personalidades, dos artistas e
das obras de arte relacionados à história do Cemitério do Bonfim para
serem identificados pelos turistas.
Parágrafo único – VETADO
Art. 3º - VETADO
Parágrafo único - VETADO
Art. 4º - VETADO
Art. 5º - VETADO
I - VETADO
II - VETADO
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III - VETADO
Art. 6º - VETADO
Art. 7º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Belo Horizonte, 02 de setembro de 2013
Marcio Araujo de Lacerda - Prefeito de Belo Horizonte
(Originária do Projeto de Lei nº 15/13, de autoria do vereador Adriano
Ventura)
Fonte: http://i2.wp.com/tudobh.com.br/wp-content/uploads/2017/01/images-8.jpg
Assim, a pesquisa tem como objetivo principal analisar as atividades educativas realizadas
no respectivo cemitério, integrando o visitante ao contexto histórico, paisagístico e natural do
mesmo. Os objetivos específicos da pesquisa pautados nas premissas filosóficas da
ecologia, do turismo e da interpretação ambiental farão à classificação dos equipamentos e
da infraestrutura e o levantamento dos recursos naturais que passam despercebidos e
descompreendidos na visitação. O estudo apresenta possibilidades da aplicação de
atividades perceptivas, interpretativas e educativas neste espaço diferenciado em seu
formato e sua aplicação. A análise dos dados possibilitará entender a implantação de
atividades realizadas dentro de um cemitério, aproveitando sua infraestrutura, equipamentos
e, principalmente, o potencial de educação patrimonial e ambiental evidenciando
perspectivas de turismo sustentável.
METODOLOGIA UTILIZADA
Nesta perspectiva utiliza-se alguns métodos para adquirir conhecimento como: observação da
realidade, experimentação de formas diferentes de agir ou de interpretar os fatos observados. A
metodologia abrangendo a análise das condições oferecidas para visitação de público, bem
como identificando o perfil ecológico, pedagógico e turístico do cemitério, seguiu as
seguintes etapas:
1) levantamento bibliográfico em publicações pertinentes ao assunto;
2) análise documental no local e em fontes diversas;
3) investigação de campo com técnicas de observação;
4) análise dos dados e relatório de observação;
5) registro fotográfico dos pontos e atrativos do tema elencado pelo projeto;
6) categorização da infraestrutura e dos equipamentos disponíveis no cemitério, com
roteiro predefinido;
7) entrevista com o gestor através de roteiro pré-estabelecido;
8) observação e conversa informal com os visitantes e com os funcionários;
9) classificação de atividades recreativas, esportivas e de educação patrimonial e
ambiental nos limites do cemitério e na área imediatamente externa (passeio),
também com roteiro pré-definido;
Fonte: https://www.viagemdigital.com.br/wp-content/uploads/2015/03/Cemit%C3%A9rio-do-Bonfim-
Belo-Horizonte.jpg
As vias internas são em parte cimentadas, da entrada até a guarita e a casa de apoio,
contornando os mesmos se estende até as mesas da área de convivência, chegando até a
central administrativa. A área externa não possui sinalização indicativa de acesso, a não ser
a placa da própria portaria que identifica o nome do mesmo, tornando difícil a chegada até o
local. Marco na paisagem local, as pessoas que moram na região adjacente, identificam de
imediato sua localização exata, e/ou fingem desconhecer sua existência por não identidade
com o mesmo. Estudo de Almeida (2007, p. 154-155) enfatiza que:
A região onde está situado o cemitério é também conhecida como
Lagoinha. A Lagoinha é mais antiga que a própria Belo Horizonte. Situada
na região nordeste, há alusões à sua existência em documentos datados de
1711 como limite da Fazenda do Cercado, tendo ganhado este nome em
decorrência das constantes inundações causadas pelas enchentes do Rio
Arrudas. É uma localidade significativa no espaço geográfico da capital,
mesmo estando localizada fora do perímetro da Avenida do Contorno,
adquiriu ao longo do tempo status emblemático que foi se remodelando ao
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longo dos anos. A princípio, a Lagoinha é área de passagem, de trânsito
dos tropeiros e mercadores que viajavam pela região se deslocando de
Santa Luzia, Venda Nova e adjacências e se deslocavam para o Arraial.
Com a construção da capital e a chegada de muitos imigrantes a Lagoinha
foi “invadida”, em sua maior parte, pelos italianos que ali adquiriram
chácaras e sítios e construíram naquele lugar uma espécie de reduto da
saudosa Itália. Posteriormente tornou-se cenário da boêmia e da vida
noturna, confrontando-se com os mistérios e lendas que envolvem o
cemitério que abriga. Na ocasião da construção da instalação do cemitério,
a Lagoinha, era o lugar mais adequado e aprazível consoante com os
projetos da Comissão Construtora, bem como o discurso médico e
higienista amplamente difundido naquela altura.
Não existe estacionamento interno ou externo para visitantes, mas as ruas imediatamente
próximas à portaria têm largura suficiente para estacionar ônibus e veículos em geral. O
tráfego de veículos no local é relativamente bom, sendo que na porta do cemitério tem uma
vaga definida para PNE – Portador de Necessidades Especiais demonstrando observância a
políticas públicas de inclusão. O acesso por transporte público dispõe de certa facilidade,
com linha de ônibus cujo itinerário atende à rua da portaria com pontos de embarque e/ou
desembarque de passageiros. Devido à proximidade com a Avenida Dom Pedro Segundo,
há inúmeras outras linhas que acarretam certo grau e distância de deslocamento das linhas
que deixam mais próximas do cemitério.
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Uma pesquisa bibliográfica esta sendo elaborada com vistas ao entendimento ambiental,
cultural e educativo dos cemitérios, dimensionando sua simbologia e impactos na paisagem
local. As atividades se voltam também a entender perspectivas e possibilidades de
percepção e análise socioambiental do Cemitério do Bonfim, Belo Horizonte – MG. Para
Almeida (2007, p. 153):
E se havia projetos para os vários espaços a serem ocupados na cidade, o
do cemitério foi, também, pensado. O terreno com área aproximada de
cento e setenta mil e trinta e seis metros quadrados, num local conhecido
como “Menezes”, distante seiscentos e cinqüenta metros do perímetro
urbano foi o ponto escolhido. O lugar era alto e arejado, de solo seco e
argiloso - arenoso, tendo em sua proximidade uma pedreira o que facilitaria
a construção. As obras de preparação dos terrenos e construção do
cemitério e necrotério foram iniciadas tendo como empreiteiro o Conde de
Santa Marinha7. A localização estratégica do cemitério na planta da capital
7 BARRETO, Abílio. Belo Horizonte Memória Histórica (...). p. 602 – 604 Antônio Teixeira Rodrigues
ou Conde de Santa Marinha (18? -1900) era português, construtor e industrial, chegou a Belo
Horizonte em 1894. Iniciou suas atividades com a implantação da rede ferroviária ligando as
pedreiras dos arredores ao local de construção da capital. Tornou-se pioneiro na exploração da linha
férrea urbana e em 1896 trouxe para a cidade à locomotiva Mariquinhas, hoje parte do acervo do
Museu Histórico Abílio Barreto. Tem seu nome ligado a diversas obras na capital, além daquelas
realizadas no cemitério do Bonfim, a saber: fachada do Palácio da Liberdade, construção dos
edifícios da Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais e do Quartel do 1º Batalhão da Polícia
Militar, construção de um palacete para própria residência no Bairro da Floresta, primeira casa da
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nos fornece subsídios para compreendermos as atitudes mentais da época.
O cemitério deveria ser amplo, arejado, a céu aberto, ocupando espaço
suficiente para expansão e abrigo dos mortos que a cidade dos vivos,
naturalmente iria produzir, sem, contudo, perder o caráter de modernidade
sob a qual era engendrada.
Almeida (2015, p. 02) defende que “o cemitério é um lugar privilegiado para se entender
uma cultura”. Para ela, “através da arquitetura, escultura e artes decorativas cristalizam-se
elementos simbólicos que, quando interpretados, permitem uma compreensão da sociedade
na qual estão inseridos”. Lima e Almeida (s/d) alegam que:
Conclui-se que as modificações dos sepultamentos eram reflexos de uma
sociedade, onde os vivos tinham pressa em esquecer seus mortos. Dentro
deste contexto, observa-se que nos espaços destinados aos mortos a
distinção social vivenciada no grande centro urbano mineiro se transpõe ao
cemitério, pessoas com maior ascendência financeira construíam túmulos
em granito, bronze e muitas vezes erguiam capelas sobre as sepulturas,
aos menos abastados restava uma sepultura simples muitas vezes feita
somente de cimento, sem ornamentação. O cemitério não guardava apenas
os mortos ele passou a ser também uma representação da vida social,
dentro da sociedade através de seus túmulos. Há no espaço cemiterial,
múltiplas manifestações devocionais, cabe aqui destacar as devoções
marginais.
área suburbana da capital (1896). Inaugurou, em 1897, uma empresa denominada “Grande Empório
Industrial”. Implantou ao lado de sua casa uma escola industrial com atividades voltadas para a
carpintaria, cantaria, fundição, ferraria, moinhos e torrefação de café. Faleceu na capital federal em
1900.
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Olegário Maciel (político);
Otacílio Negrão de Lima (político);
Padre Eustáquio (religioso);
Raul Soares (político):
Roberto “Batata” Monteiro (atleta).
Silviano Brandão (político);
Fonte: Estado de Minas. Belo Horizonte, 20 de abril de 1997.p. 39 Caderno
Gerais.
Fonte: http://vivapampulha.com.br/wp-content/uploads/2016/10/Bonfim.jpg
Anos depois diante do crescimento da nova capital mineira, foi necessária em 1940, a
construção de outra necrópole, o Saudade, localizada na zona leste. Já em meados da
década de 1960, a cidade ganhou mais dois modernos cemitérios, o Consolação e o Paz,
inspirados na concepção de cemitérios-parques ou cemitérios-jardins, que rompem com a
imagem tradicional das necrópoles com jazigos e monumentos de mármore, substituindo-os
por parques arborizados. Originários dos Estados Unidos onde são conhecidos como
memorial parks, sua principal característica é a paisagem, sem a presença de arte tumular,
onde simples placas de metal, bronze ou granito são colocadas sobre o solo gramado
assinalando o local da sepultura.
Em 1941, o Prefeito Juscelino Kubitschek (1902-1976) inaugurou o
Cemitério da Saudade situado na Rua Juramento s/ n. no bairro que leva o
mesmo nome do cemitério. Este ainda mantinha características
semelhantes às do Bonfim. Em 1967 a prefeitura entregou aos moradores o
Cemitério da paz, já adotando as características de cemitério-parque, sem
túmulos tradicionais, alguns anos adiante o Cemitério da Consolação
situado às margens da Estrada Velha para Santa Luzia era concluído. Estes
são administrados pelo poder público. No início da década de 70 foi
inaugurado o primeiro cemitério - parque de luxo da capital, o Parque da
Colina, construído dentro de linhas modernas, eliminava os túmulos de
grande proporção, objetivando transmitir “amenidade “ e “paz”. Localiza - se
no bairro Nova Cintra. Temos, também, o Cemitério Israelita situado no
bairro Jaraguá e desde a década de 80 o Cemitério Bosque da Esperança
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localizado às margens da Estrada Velha para Santa Luzia. Trata - se na
atualidade de espaço para os mortos com características extremamente
modernas e preferido por aqueles que possuem recursos para nele serem
sepultados. É interessante observar que se contrapõe ao primeiro cemitério
da capital até mesmo em relação ao nome. Enquanto o “Bonfim” faz alusão
à morte como um fim, um ponto final, ainda que bom, entretanto o Cemitério
Bosque da Esperança acena para a possibilidade de vencer a morte através
da esperança, questão que é pertinente ao mundo contemporâneo no qual
a medicina dotada de avançados recursos torna a morte um inimigo menos
perigoso em relação o que foi no passado.
Outra prática comum, pela questão espacial, é a verticalização dos cemitérios, onde
os túmulos são dispostos uns sobre os outros e em andares para as visitações. O modelo
de necrópole também se destaca por apresentar maiores impactos ao meio ambiente em
decorrência da ausência de vegetação que pode ocasionar erosão e com o carreamento do
solo, um posterior assoreamento dos recursos hídricos superficiais do entorno, bem como
ampliar a taxa de impermeabilização local assim por sua concepção paisagística e pela
sustentabilidade o modelo de parque é o mais indicado. Almeida (2015, p. 02) exprime que:
A parte central do cemitério é uma praça redonda ajardinada, tendo a
imagem de Cristo, o Sagrado Coração, esculpida em bronze. Neste local
está sepultado Otacílio Negrão de Lima (1897-1960), ex-prefeito de Belo
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Horizonte, à esquerda da praça, distando cinco quadras, encontra - se o
prédio do necrotério. Trata - se de um prédio pequeno, construído dois anos
antes da inauguração do cemitério. É o único bem tombado pelo patrimônio
histórico naquele espaço. Predominam nas quadras localizadas nas
alamedas principais os mausoléus, as capelas e sepulturas mais
requintadas construídas com material nobre, muitas delas importadas de
São Paulo, Rio de Janeiro e até mesmo do exterior. A maioria dos túmulos
que ocupam estas quadras pertence às famílias influentes e importantes da
capital mineira, bem como os túmulos - monumentos dedicados à nobreza
política do Estado de Minas Gerais. Nas quadras mais afastadas da parte
central e das alamedas encontramos sepulturas mais simples, destituídas
de atributos e alegorias suntuosas.
Os cemitérios tradicionais com seus inúmeros túmulos também contribuem para o aumento
de calor retido em superfícies, fato semelhante ao chamado “ilha de calor” muito comum em
grandes centros urbanos. Superfícies absorvem o calor durante todo o dia, aquecendo-se
consideravelmente e somente no final da tarde e início da noite vão gradativamente
devolvendo calor para a atmosfera. Na contemporaneidade, a prática da cremação, muito
comum no Oriente, permitiu um destino sanitário mais compatível aos corpos humanos,
antes de sua deterioração e putrefação, evitando-se assim a contaminação do solo e lençol
freático com o necrochorume e a otimização de espaço.
PROPOSTAS DE INTERVENÇÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desejo é que essa proposta ultrapasse os limites virtuais e políticos dos municípios,
estados e até nações, agregando valor àqueles que desejem sair da rotina e descobrir
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novas possibilidades. Estender a proposta para outras UCs e parques urbanos, visando
primeiro o desenvolvimento do projeto no município de Belo Horizonte, oferecendo uma
maior diversificação da oferta de atrativos, somando forças no desenvolvimento turístico da
cidade. O desenvolvimento de atividade que movimenta tantos setores da economia, não se
furta ao sucesso, quando os benefícios da atividade alcançam a um número sem limites,
melhorando a infraestrutura do município, em virtude do turista, que beneficia primeiramente
o morador local, e traz mais qualidade para o mesmo, até nas necessidades mais básicas,
como a saúde e educação. A proposta perceptiva direcionada ao Cemitério do Bonfim, tema
do presente estudo seguiu os objetivos propostos e a linha metodológica prevista, buscando
pontuar o levantamento dos dados, trazendo novas soluções.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, Marcelina das Graças de. CEMITÉRIO DO BONFIM: arte, história e patrimônio – debate
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mai. 2017
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In: REVISTA M. vol. 1, n. 1, p. 217-234, jan-jun, 2016. Disponível em http://www.revistam-
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DEVOCIONAL: um estudo sobre a devoção a Irmã Benigna. Disponível em
http://www.abhr.org.br/plura/ojs/index.php/anais/article/viewFile/419/470. Acesso em 16 mai. 2017
GLOBO MINAS. CEMITÉRIO DO BONFIM, EM BELO HORIZONTE, ATRAI TURISTAS: o local é uma aula de
história, arquitetura e arte, bem na região central da cidade. Disponível em
http://redeglobo.globo.com/globominas/terrademinas/noticia/2016/12/cemiterio-do-bonfim-em-belo-
horizonte-atrai-turistas.html. Acesso em 16 mai. 2017
O TEMPO PAMPULHA. CEMITÉRIO DO BONFIM. Local com importância histórica e artística para BH pode ser
opção de lazerhttp://www.otempo.com.br/pampulha/reportagem/patrim%C3%B4nio-1.740104. Acesso
em 16 mai. 2017
VEJA BH. CIDADE: Considerado um museu a céu aberto, Cemitério do Bonfim abre sua temporada
de visitas. Disponível em http://vejabh.abril.com.br/materia/cidade/considerado-museu-ceu-aberto-
cemiterio-bonfim-abre-sua-temporada-visitas/. Acesso em 16 mai. 2017
RESUMO
A presente comunicação tem por finalidade apresentar o programa pioneiro de inclusão social que
desde 2011 é desenvolvido pelo Laboratório Central de Conservação do Museu Nacional da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (MNUFRJ), que vem capacitando jovens na área de
conservação preventiva e conservação de bens culturais. Aqui apresentaremos os resultados obtidos
nos seis anos de projeto.
O Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro é o primeiro museu brasileiro e
também a mais antiga instituição científica do Brasil. Por meio do Programa de Iniciação Cientifica
Junior (PIC-Jr), em parceria com o Colégio Pedro II, proporciona a alunos do ensino médio
capacitação na área de conservação em diversos materiais. São aulas teóricas e práticas realizadas
em seus departamentos e laboratórios com objetivo de integrar profissionais da instituição e jovens
adolescentes, e uma das formas que o museu utiliza para promover a inclusão social numa
sociedade tão desigual como é a brasileira. Acreditamos que a qualificação desses jovens contribua
para despertar vocações, garantir mão-de-obra qualificada para instituições museológica e até
mesmo, colocar no mercado profissionais capazes de realizar trabalhos de forma independente,
abrindo um horizonte muitas vezes desconhecido, além de fortalecer o campo da Preservação
Patrimonial.
1 Introdução
Patrimônio cultural como um fenômeno sociológico refere-se a uma série de ações, não
só no meio acadêmico, mas também na ciência, como um objeto de reflexão e atuação no
âmbito das políticas culturais, sociais e econômicas, enfatizando sua importância e
legitimidade como um dos maiores e mais representativos bens simbólicos de uma
determinada sociedade ou comunidade. Um ícone da identidade que representa o homem
no tempo e no espaço cronológica e historicamente datados.
estudo das ciências naturais e antropologias, organizando coleções e exposições públicas. A partir de 1946 foi
incorporado à Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do rio de Janeiro. Seu acervo é considerado um
dos maiores e mais significativos da América do Sul.
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valores que moldam o desenvolvimento da sociedade contemporânea, na qual a proteção
do patrimônio cultural deve ser marcada. Assim, este artigo pretende apresentar o projeto de
Educação de Patrimonial e os resultados da experiência vivida por alunos secundaristas e o
Laboratório Central de Conservação e Restauração do Museu Nacional nos últimos 6,5
anos.
Nosso projeto tem como uma de suas premissas a integração entre os alunos e a
herança preservada no Museu Nacional. A proposta é, sem precedentes, não apenas para
estabelecer uma parceria com uma escola, mas acima de tudo, permitir aos alunos entrar
em contato com um acervo de valor inestimável, viver na prática com questões
enriquecedoras, discussões e ações que cercam a continuidade e hipóteses envolvendo
bens culturais. Portanto, a Educação Patrimonial é uma ferramenta potente para a
conservação e a gestão do patrimônio cultural em nosso país; instrumento essencial para
promover o conhecimento, particularmente quando imbricamos o patrimônio cultural
brasileiro e jovens, tornando-os multiplicadores de um pensamento.
2 O Programa
Apoiado pelo Museu Nacional, o LCCR vem desde 2011 participando ativa e
ininterruptamente desta iniciativa. Hoje estamos na sétima edição do projeto e recebemos
durante estes anos 30 estagiários, contando com apenas uma desistência. Assim,
estudantes secundaristas interessados na aquisição de conhecimentos, informações e
experiência em práticas de laboratório destinadas os profissionais do patrimônio cultural tem
sido sempre muito benvindos.
3Informações básicas sobre os laboratórios são dadas pela equipe pedagógica no Colégio Pedro II,
no entanto, a maior parte dos alunos que recebemos tem como referência os alunos-estagiários em
exercício no LCCR.
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Os estudantes selecionados têm entre 15 e 18 anos de idade e cursam o segundo ano
do ensino médio. A concessão de bolsas pela FAPERJ está condicionada à verba anual
liderada pelo governo. Alguns anos recebemos bolsas para todos os alunos, mas em outros
o número de bolsas é inferior ao de estudantes. No entanto é comum, eles criarem uma
forma de repartir os valores entre o grupo. Ao final do primeiro ano, eles podem solicitar a
extensão da bolsa por mais um ano, não podendo renovar mais, pois coincide com o
término do curso de nível médio.
Tivemos desde 2011 trinta estagiários iniciantes, sendo que onze deles voltaram para a
fase avançada e dois trabalharam por dois anos no LCCR (um deles como contratado e um
como voluntário) depois de formados no ensino médio. (Tab. 1)
As atividades
Destinamos o mês de novembro à conclusão dos trabalhos técnicos que possam estar
pendentes e à elaboração do projeto museográfico para a montagem da exposição, do
convite virtual e do o aparato que envolva o evento de encerramento dos estágios.
Concluído o projeto museográfico em grupo, eles passam à elaboração do relatório final
(individual e obrigatório).
A partir de 2016 inserimos mais duas ações no projeto: a reprodução de objetos por
moldes e uma micro conferência. No ano passado eles fizeram um réplica em gesso e
madeira da Vênus de Willendorf em oficina ministrada pelo taxidermista do Museu Carlos
Caetano. Na conferência as estagiárias apresentaram individualmente suas pesquisas
durante 10 minutos para uma plateia composta de familiares, servidores do Museu e
convidados. Ao término da conferência o público foi convidado para a abertura da
vernissage e a inauguração de uma vitrine que ficou em exposição por seis meses com
parte dos trabalhos.
3 Considerações Finais
São dez meses que podem e vem mudando a vida de diversos jovens brasileiros
presente na vivência e na troca de experiências e na parceira entre a Universidade, o
Colégio e a FAPERJ, onde o Laboratório, participa de forma integral e comprometida
buscando contribuir na e para a mudança de olhares em relação a preservação do
patrimônio cultural brasileiro. Mais que uma ação, esta pode se tornar uma política pública.
Podemos estender este projeto para outras esferas, realçar seu papel social, pois ao
oferecer ao jovem do Brasil uma possibilidade pouco explorada de trabalhar na área cultural,
temos a consciência da importância da abertura de uma nova porta, que pode abrir
horizontes nunca almejados por esses estudantes, seja pelo desconhecimento ou por
acreditar que esse fica num patamar inalcançável.
Referência bibliográfica
RESUMO
No ano de 2004 o programa de recuperação sustentável do Patrimônio histórico urbano brasileiro,
denominado de “MONUMENTA”, sob tutela federal resultante de contrato de empréstimo entre o BID e
a República, classificou e elegeu o Município de Laranjeiras, no interior do Estado de Sergipe, apto ao
desenvolvimento de ações preservacionistas. Dentre o conjunto de ações proposto, pontuou-se a
possibilidade de implantação de um Campus da Universidade Federal de Sergipe utilizando-se do
conceito de requalificação/reabilitação de antigas edificações históricas. O Campus de Laranjeiras foi
implantado provisoriamente em 2007 numa escola, passou a funcionar a partir de 2008/2009 no
chamado “Quarteirão dos Trapiches” restaurado, com cinco cursos: Arquitetura e Urbanismo;
Arqueologia; Museologia; Teatro e Dança. Frente a comemoração dos dez anos do Campus, ocorrida
em março de 2017, cabem inúmeras reflexões sobre o conceito de educação patrimonial que permutou
a implantação/existência da UFS nos antigos trapiches de Laranjeiras; portanto, este artigo pretende
analisar a trajetória histórica que demonstre a verdadeira representação patrimonial
simbólico/material/funcional do Campus das “Artes”; entender e compreender a atitude científica
patrimonial de pertencimento frente à produção acadêmica de trabalhos de conclusão de curso
realizados neste interstício; bem como, registrar e analisar as condições de conservação e restauro
das edificações “reabilitadas”.
Palavras-chave: Patrimônio; Cultura; Arquitetura; Identidade; Pertencimento.
Apesar do Campus de Laranjeiras ter iniciado suas atividades de forma provisória no Centro
de Atenção Integral a Criança – CAIC, em março de 2007, com cinco cursos: Arquitetura e
Urbanismo (curso integral); Arqueologia; Museologia (cursos diurnos – matutino); Teatro e
Dança (cursos noturnos), efetivamente a implantação do Campus de Laranjeiras da UFS no
Quarteirão dos Trapiches se dá a partir da inauguração da Biblioteca no ano de 2008 (na
edificação conhecida por Teatro Santo Antônio) e em 2009 nas edificações chamadas pelo
senso comum da população local de Trapiches.
No decorrer destes dez anos fatos dos mais variados ocorreram, destacando-se: a falta da
construção de um relacionamento de pertença entre o Campus e os moradores da cidade ao
ponto da grande maioria dos alunos que se matricularam nos cinco cursos que fizeram parte
da proposta acadêmica inicial serem oriundos da capital e de outras cidades do Estado;
processos de violência contra os estudantes que atingiram seu auge em meados de 2014,
que resultaram na suspensão temporária das aulas e na posterior transferência das atividades
dos cursos de Dança e Teatro para a sede da UFS em São Cristóvão; falta de conservação e
restauro técnico-científico das edificações históricas ao ponto do desabamento de um dos
arcos das ruínas das edificações em 2017 e da interdição do sobrado número 117 há
aproximadamente 4 anos.
Frente à comemoração dos dez anos do Campus na cidade, ocorrida no mês de março de
2017, cabem inúmeras reflexões sobre o conceito de educação patrimonial que fundamentou
a implantação/existência da UFS nos antigos trapiches de Laranjeiras; portanto, este artigo
analisa o repositório cultural material e imaterial da cidade que serviu de conceito chave/base
para o projeto de implantação; contabiliza se a produção dos TCCs dos cursos de Arquitetura
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e Urbanismo, Arqueologia e Museologia, neste interstício, refletem a riqueza cultural
patrimonial disponível na cidade e; registra a condição de conservação atual e conceitos de
restauro aplicáveis nas edificações utilizadas/vivenciadas pelos alunos; nestas três condições
busca-se identificar motivos concretos e imaginários deste sentimento presente de que o
Campus de Laranjeiras “não deu certo”.
Para Reis Filho (1968, p. 177 e 181) a implantação de construções religiosas no arraial
significavam o próprio resultado do surgimento das povoações. O caso de Laranjeiras não
fugiria a essa regra estando relacionado à construção da Igreja Matriz do Sagrado Coração
de Jesus; outras igrejas de importância na história da arquitetura da cidade de Laranjeiras
são: Senhor do Bomfim (1836); São Benedito e Nossa Senhora do Rosário (século XIX); Igreja
de Nossa Senhora da Conceição dos Pardos (1834-1860); Capela de Santa Aninha (século
XIX); Igreja de Bom Jesus dos Navegantes (1905); Igreja Jesus, Maria e José (1769) e Igreja
Presbiteriana de Sergipe de 1884.
Os monumentos naturais como a gruta da Pedra Furada usada como refúgio dos índios
durante a colonização portuguesa e a gruta da Matriana usada pelos antigos padres da
Companhia de Jesus para meditações e orações e que têm no seu interior pinturas de Horácio
Hora (celebre pintor Sergipano); representam importante patrimônio natural do Estado.
A estas festas populares somam-se tradições de bandas e filarmônicas como a Banda Santa
Cruz; a União dos Artistas; do Comércio; Nossa Senhora Conceição e Sagrado Coração de
Jesus; todas estas representações patrimoniais perfazem uma riqueza cultural material e
imaterial alicerçado no modo do fazer e saber do povo; o artesanato é representado na
tradição dos oratórios, no fazer de Santos e objetos religiosos; nas procissões; nos terços e
nas Rezadeiras; nos Aguadeiros; na pesca e nos pratos típicos da região (moqueca de
Monjongomes); além dos inúmeros mitos e lendas como a Lopa; O Anjinho; a Mão Fora da
Cova; o Fogo Corredor; etc.
A cidade de Laranjeiras teve seu período de ouro entre 1878 e 1904, entrando em decadência
econômica a partir do início do século XX; esta decadência é explicada por muitos devido à
proximidade da nova capital de Sergipe Aracaju (Oliveira, 1942, p. 204). As poucas atividades
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econômicas e comerciais fizeram com que a cidade passasse por um longo período de
dificuldades acarretando a área histórica da cidade e suas edificações uma série de
degradações; em 1970, novas atividades extrativistas minerais (cimento; produção de adubo)
conduzem novamente a Athenas Sergipana a um renascimento econômico e cultural, este
último alavancado pelo “Encontro Cultural de Laranjeiras” (Figura 1).
Figura 1 – (Acima) – Esquerda: Vista da cidade de Laranjeiras do alto da Torre da Igreja do Bomfim; a
vista geral demonstra o Vale do Cotinguiba com o Rio Cotinguiba no seu centro. Direita: Igreja de Santo
Antônio no Engenho Retiro de 1701 primeira morada dos Jesuítas em Sergipe. (Centro) – Esquerda:
Museu de Arte Sacra em casarão Eclético do início do século XX. Centro: Antigo Hospital São João de
Deus do século XIX; neste local dizem que Lampião foi operado (olho) pelo Dr. Bragança. Direita: Gruta
da Pedra Furada, a população comenta que se liga por um túnel a Igreja de Comandaroba – rota de
fuga para escravos e padres Jesuítas. (Abaixo) – Esquerda – Penitentes. Centro: Moqueca de
Monjongomes. Fonte: Eder Donizeti, abr. de 2012. Direita: Cacumbi. Fonte: Neu Fontes, jun.de 2010.
Ao optar pelos Trapiches o Projeto Monumenta deparou com uma edificação praticamente em
ruínas, sobrando apenas parte das fachadas originais e parte das colunas internas que
serviam originalmente a estrutura destes vãos cobertos; o programa decidiu por uma proposta
de “reconstrução” das fachadas “originais” e parte da edificação consolidando as colunas de
pedra remanescentes; sobre este projeto caberiam inúmeras reflexões críticas, pois vão
desde o mimetismo aplicado na reconstrução das edificações, a falta de cuidado para a
implantação de um novo uso, pois tanto as salas de aula, quanto as instalações, assim como
futuros laboratórios, não foram pensados no projeto de requalificação deste conjunto; fatores
que até os dias de hoje impõe inúmeras restrições ao uso dos espaços.
Em relação ainda à tipologia arquitetônica, materiais e mão de obra que serviram a construção
dos Trapiches em Laranjeiras, predomina uma feição neoclássica, ou melhor, do Segundo
Império (Souza, 1994, p. 32); Nascimento (1981, p. 63) comenta que as edificações de
Laranjeiras sofrem alterações de influência neoclássica a partir da metade do século XIX,
assim como, os sobrados da cidade receberam, no início do XX, influências ecléticas ao estilo
neogótico; em relação aos materiais, a pedra calcária e a argamassa formada por cal, argila
vermelha e melaço de cana de açúcar fabricada pelos escravos e, posteriormente a pedra
granítica, são os elementos construtivos encontrados nas edificações da cidade; a mão de
obra escrava junto com as teorias portuguesas pode ser vista na talha e escultura das pedras
assentes das colunas e alvenarias das igrejas, bem como, no uso de argilas nas argamassas
da taipa a mão ou sebe (Figura 2).
Nos últimos 3 anos o cenário não se modificou, pelo contrário, recrudesceu, ou seja, ocorreu
a saída dos dois cursos para São Cristóvão deixando o Campus com atividades de três cursos
apenas (Arquitetura e Urbanismo; Arqueologia e Museologia); em 28 de março de 2017,
durante as comemorações de aniversário de dez anos da existência do Campus de
Laranjeiras os alunos afirmaram que: “Os estudantes também observam o distanciamento da
comunidade local em relação ao campus e acreditam que é necessário reverter este quadro.
Os alunos destacaram: “Uma constatação é a de que boa parte dos estudantes não é de
Laranjeiras”; em oposição a fala da gestão atual: “O campus de Laranjeiras é também
conhecido como o “Campus das Artes”, por trazer afinidades artísticas, culturais e históricas
condizentes com a tradição do município” (http://www.ufs.br/conteudo/56608-campus-de-
laranjeiras-relembra-as-historias-dos-seus10-anos-de-implantacao> consultado em
17/05/2017); portanto, frente a contraposição das falas, qual seria a verdadeira condição de
permuta patrimonial entre o Campus e a cidade de Laranjeiras?
Para responder se esta relação entre a Cultura e Academia tem ocorrido buscou-se o
levantamento e a identificação de trabalhos de conclusão de cursos (TCCs) realizados pelos
alunos de Arquitetura e Urbanismo; Arqueologia e Museologia (remanescentes), nesta
estatística acredita-se poder encontrar nos temas desenvolvidos nos TCCs, considerados
produtos científicos expressivos de base na formação da relação alunato, conhecimento
específico e universo vivenciado, críticas concretas a construção desta relação Universidade
e Patrimônio local.
Como salienta Chaui (1999, p. 91) “Em nossa sociedade é muito difícil despertar nas pessoas
o desejo de buscar a verdade”; com isso, frente a inúmeras opiniões e informações sobre
questões ocorridas nestes 10 anos de implantação do Campus de Laranjeiras, especialmente
sobre a falta de pertença que existiria entre os alunos, professores, usuários do Campus e a
população local e, especificamente, sobre a relação entre o estudo do patrimônio local como
despertar do conhecimento de permuta entre a Instituição e o objeto cultural (educação
patrimonial); buscou-se um exercício inicial de levantamento de dados sobre a produção dos
Trabalhos de Conclusão de Curso (TCCs) em Arquitetura e Urbanismo; Arqueologia e
Museologia que pudessem iniciar um processo de informação mais do que de desinformação.
Para o curso de Arquitetura e Urbanismo, verificou-se que para um total de 8 (oito) TCCs
registrados no cadastro da Biblioteca de Laranjeiras, apenas 1 (Um) trata do estudo da cidade
com o tema: Proposta de Alojamento Estudantil para o Campus de Laranjeiras; os outros sete
(7) trabalham a cidade de Aracaju (Projetos). Em relação aos dados disponibilizados pelo
Departamento verificou-se que de um total de 101 (cento e um) TCCs apenas 11 (onze)
tiveram como tema a cidade de Laranjeiras, a saber: Definição de diretrizes de recuperação
urbanística e ambiental da área do Quitale – Laranjeiras-SE; Projeto de intervenção nas ruínas
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do antigo teatro São Pedro de Laranjeiras/SE; Relação entre cidade e universidade - Diretrizes
para implantação de novos edifícios do Campus da UFS de Laranjeiras-SE; Intervenção
arquitetônica-paisagística nas ruínas da antiga Estação Ferroviária de Laranjeiras-SE; Projeto
de residência universitária para UFS na ruína do antigo hospital São João de Deus,
Laranjeiras-SE; Estudo da evolução urbana de Laranjeiras: um processo de expansão-
retração; Espaços e saberes do Terreiro Filhos de Obá em Laranjeiras-SE: Análise e
intervenção arquitetônica; Impactos urbanos decorrentes da implantação de Instituições de
nível superior em cidades do interior brasileiro: o caso de Laranjeiras-SE; Residência
universitária: uma proposta de integração com a cidade de Laranjeiras-SE; Concepção de
projeto arquitetônico na contemporaneidade: o caso da Pedreira de Laranjeiras-SE e; Projeto
de requalificação da Pedreira de Laranjeiras-SE.
Os resultados para os TCCs de Arqueologia, como de Arquitetura, apontam para uma baixa
produção de temas voltados para o patrimônio da cidade, deixando ainda por se estudar sítios
arqueológicos potenciais como a Gruta da Matriana, as ligações subterrâneas entre a Gruta
da Pedra Furada e Comandaroba; assim como, ruinas dos mais de 70 engenhos da região
como Santa Aninha e uma variedade muito grande de objetos portadores de patrimonialidade.
Para o curso de Museologia apenas foi verificado um registro de 18 (dezoito) TCCs, sendo
que destes um total de 4 (quatro) se dedicaram ao estudo da cidade de Laranjeiras, a saber:
Museus e ações afirmativas: perspectivas de aplicação da lei federal 10.636/93 no Museu Afro
Brasileiro de Sergipe-MAB; Em busca de Zizinha: vestígios para a musealização da memória
sobre Eufrozina Amélia Guimarães (1872-1964); No compasso da micarême: 75 anos de
alegria em Laranjeiras (memória e musealização); A mulher, a arte e o tempo. Laranjeiras,
Se.
Os outros temas desenvolvidos pelos TCCs em Museologia (14 registros) estiveram voltados
para a identidade e memória; comunicação; ações educativas; políticas de preservação do
patrimônio; tradição e memória; documentação; valorização de objetos patrimoniais; portanto,
apesar de atender a questão histórica e teórica patrimonial, esses trabalhos não estão
diretamente tematizados para a cidade de Laranjeiras.
O repositório da cultura imaterial de Laranjeiras pode ser considerado um dos mais ricos do
Brasil, as danças, as roupas, os objetos, o artesanato, o saber fazer, a religiosidade, o
sincretismo religioso, etc., conformam expressivos produtos que ainda podem e devem ser
estudados pela Museologia; percebe-se, que os temas que foram produzidos (registros
disponíveis) em relação a cultura local ainda requerem a busca de ampliação na relação entre
academia e patrimônio.
Este projeto de pesquisa teve como objetivos executar estudo histórico de argamassas
antigas a base de cal; realizar todo o levantamento das anomalias existentes nas edificações
que compõem o Campus de Laranjeiras; entender/compreender a partir de ensaios
laboratoriais a possibilidade de aditivos nas argamassas de revestimento do Campus visando
a restituição dos locais que se apresentavam com incidência de degradação; o projeto foi
coordenado pelo Prof. Dr. Eder Donizeti da Silva; pela Profa. Dra. Adriana Dantas Nogueira;
teve como colaboradores a técnica laboratorial do CTPR Rosane Greziele Leite dos Santos;
o técnico laboratorial do CTPR Alex Souza Santos; participaram da pesquisa os alunos de
Arquitetura e Urbanismo Josefa Luana Oliveira Freire; Mayra Rayanne Vieira Gonçalves Lima
e Uallison Vinicius Nascimento Castro.
O Sobrado 117 é uma das edificações que apresentam grande problemática estrutural,
inclusive o pavimento superior está interditado a mais de 4 anos; recentemente (2017) foi
interditado o térreo desta edificação; apresenta intensas fissuras (rachaduras) por todas as
paredes internas; umidades ascendentes e descendentes; fungos, liquens e bactérias; na
fachada principal na região da cimalha se verificam grandes áreas com empolamentos,
puvulrulências; perda de material e manchas negras.
A Exatoria, conhecida pelos alunos como auditório apresenta na parte interna intenso ataque
por umidade; manchas esverdeadas nas paredes; bolor, fungos e bactérias; nas paredes
externas o ataque por umidade é ainda mais expressivo, bem como, o ataque por fezes de
animais (pombos) propicia a salinidade por nitratos; apresenta grande quantidade de fissuras
e manchas negras.
Considerações finais
A percepção de algumas variáveis-chave do papel da Educação pode agregar valor ao ensino;
no caso dos últimos dez anos do Campus de Laranjeiras se percebe um desalinhamento
pedagógico em relação a educação patrimonial e a pouca permuta entre o aprendizado
disponibilizado no Campus e o repositório cultural local e a falta de cuidado na conservação
e restauro das edificações.
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2. Bacharel, Mestre e Doutoranda em Geografia (IGC-UFMG) Rua Principal, 231, Bl. 03/Apto 203,
Bernardo de Souza, Vespasiano – MG CEP 33220-000 E-mail: ludimilarodrigues86@gmail.com
RESUMO
O presente trabalho destina-se ao breve entendimento das romarias, das peregrinações e do turismo
religioso no âmbito de apropriação e significação das paisagens geográficas. Compreende análise do
contexto histórico-cultural e potencialidades das localidades rurais de Cemitério do Peixe, no distrito
de Costa Sena, município de Conceição do Mato Dentro-MG e da vila de Mato Grosso, no distrito de
Deputado Augusto Clementino, município de Serro-MG, ambos ao norte metropolitano da capital
mineira. Após a análise da paisagem cultural e da paisagem religiosa/espiritual apresenta-se a
conceituação da mesma, exemplificando romarias, peregrinações e religiosidade no âmbito do
turismo. Apresenta-se como exemplo, a romaria anual empreendida entre as cidades de Carmópolis e
Congonhas, tecendo brevemente a proposta de Circuito Turístico Sete Dores de Maria para o trecho
tradicionalmente percorrido de 100 km ao sul da região metropolitana da capital. Na sequência
explora o universo místico e espiritual das localidades: “fantasmas” de Cemitério do Peixe e Mato
Grosso no âmbito dos contextos histórico e cultural de Conceição do Mato Dentro-MG e Serro-MG,
respectivamente. Assim a partir dos recortes espaciais busca-se entender os mecanismos éticos,
estéticos e epistemológicos que motivam a consolidam a apropriação de lugares e paisagens no
âmbito do turismo místico e religioso. Empreende-se então a partir do lugar e da paisagem a
construção de uma geografia do sagrado, uma geografia da peregrinação, com suas nuances e
projeções.
1No entanto, é importante ressaltar que, no caso das atividades rurais ou no âmbito do espaço rural, mesmo
sendo consideradas como formas de expressão da cultura, em função de sua importância no contexto da
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A definição de turismo cultural está relacionada à motivação do turista,
especificamente, em vivenciar o patrimônio histórico e cultural e eventos
culturais, preservando a integridade desses bens. O que caracteriza este
segmento, segundo Vaz (20012), é a intenção de apreciar e vivenciar obras
de arte, arquitetura, e manifestações culturais seja pelo apelo estético ou
pelo apelo histórico do atrativo. Esta vivência implica duas formas de
relação do turista com a cultura ou algum aspecto cultural: a busca em
aprender e entender o objeto da visitação e as experiências participativas,
contemplativas e de entretenimento, que ocorrem em função da visitação.
Para o MTur (20083), os deslocamentos para fins religiosos, místicos,
esotéricos, de visitação a determinados grupos étnicos (nos quais o atrativo
principal é a identidade e modo de vida de cada um), e atrativos cívicos são
entendidos como recortes do Turismo Cultural e podem constituir outros
segmentos para fins específicos, desde que preservados os princípios da
tipicidade e identidade. Dentre os recortes do turismo cultural podem ser
citados: o turismo cívico, religioso, místico, esotérico e étnico.
formação econômica e histórico-social, são consideradas pelo ministério do turismo um segmento próprio,
definido como turismo rural. Aqui são definidas as caracterizações de alguns nichos de interesse, considerando
aqueles temas e áreas onde a diversidade cultural brasileira apresenta maior potencial.
2 VAZ, Gil Nuno. Marketing Turístico receptivo e Emissivo: um roteiro estratégico para projetos
4 Aqui se entende o conceito de Paisagem Religiosa ou Paisagem Espiritual enquanto “Paisagem como espaço
de afetividade, de revelação e emoção para a escolha de um ponto fixo: um Santuário – um centro aglutinador de
pessoas (PEREIRA, 2016, p. 06)”.
5 ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano. São Paulo. Editora Martins Fontes. 1992.
6 O estudo das paisagens religiosas nos santuários de devoção popular em Teresina – PI, examina como a
religião influencia ou (re)desenha a paisagem de maneira dominante e permanente, abordado no contexto
urbano, espaço de lutas e contradições. O espaço é palco de valores e crenças, caracterizados em formas
arquitetônicas e em rituais que evidenciam a hierarquia do sagrado no espaço e no lugar. Na perspectiva de
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
importância de estudar o cotidiano como forma de compreender os valores subjetivos e
atitudes correlacionadas que as pessoas comuns elaboram a respeito do espaço e do
ambiente em que vivem.
Ao introduzir a dimensão do poder religioso, é oportuno ressaltar que há
distinção no que diz respeito aos seguintes conceitos: igreja, religião,
espiritualidade e fé. A igreja representa a estrutura de poder administrativo,
jurídico e econômico que governa pessoas e recursos a partir das normas e
regras de uma determinada religião. O conjunto de crenças, dogmas e
rituais constituem uma religião. A espiritualidade, por sua vez, diz respeito à
dimensão espiritual do ser humano (o oposto da dimensão material) e
independe de igreja e religião. Finalmente, a fé é a capacidade psíquica do
ser humano em acreditar ou não em algo que pode estar na esfera da
imanência e/ou transcendência, do humano e/ou do divino. Fé tem a ver
com os mecanismos e recursos emocionais do humano para realizar algo
material ou espiritual. Até mesmo a população que se declara sem religião,
agnóstica e ateia tem atitudes carregadas de espiritualidade (RIBEIRO,
2009 apud SANTOS, 2015, p. 08)
O conceito de lugar é apropriado para esse tipo de pesquisa por dizer respeito aos
espaços vivenciados pelas pessoas em suas atividades cotidianas de trabalho, lazer,
estudo, convivência familiar, religiosidade, espiritualidade, dentre outros aspectos
cotidianos, etc. Por esse motivo, a geografia humanista define o lugar como uma forma de
experiência humana, “um tipo especial de vivência do espaço”. Ele tem, portanto, o mesmo
conteúdo que os fenomenologistas atribuem ao conceito de mundo, isto é, o conjunto das
vivências individuais e subjetivas dos sujeitos; aquilo que em primeiro lugar aparece à
consciência. Além de lugar, outra categoria indispensável, a Paisagem que é um resultado
material de todos os processos, naturais e humanizados, de determinado local. Temos dois
tipos de paisagem: natural e humanizada.
A paisagem natural é aquilo que vem de origem da natureza, sem interferência da
mão humana, como a vegetação e formações geológicas. A paisagem humanizada é aquela
que sofreu transformações em resultado da intervenção humana. São exemplos de
ambiente construído, as obras de arquitetura e de paisagismo. Para alguns autores, a
paisagem é a apreensão do mundo de uma forma individual. Um olhar individual que pode
retransmitir para o conceito de paisagem na arte. É o fenômeno espacial no tempo do
indivíduo. A paisagem, por sua vez é:
A interação do ser humano com o espaço faz da paisagem algo em constante
transformação, seja no plano da materialidade das coisas que os seres
humanos constroem/desconstroem e organizam no espaço, seja no plano da
imaterialidade, dos sentidos e significados atribuídos a cada elemento
constituinte da paisagem. A paisagem, portanto, está carregada de elementos
simbólicos, que se baseiam na experiência e leitura de mundo de cada indivíduo
que com ela interage.
compreender a paisagem religiosa, usa-se o termo geossimbólico, pois, segundo Rosendahl (2003), o termo é
uma estrutura visível, refletindo sonhos, crenças, na busca de significados na vida pelo homem.
Neste cenário surge a Filosofia, numa proposta de análise conjunta entre Elementos
bióticos (Ecologia), Elementos abióticos (Geografia) e Elementos antrópicos (História).
A filosofia ambiental é um ramo da filosofia que se ocupa do meio ambiente e do papel do
ser humano dentro dele. A filosofia ambiental inclui a ética ambiental, a estética ambiental,
o ecofeminismo e a teologia ambiental. Nota-se que este último, tem ligações expressas
com a religiosidade e, portanto, com o meio no qual ela se formata e se materializa. Na
relação com o meio e com a paisagem/lugar, situa-se o eu, o outro, a natureza e o sagrado
se misturam e se conectam. É a natureza adquirindo nova concepção e formato ético.
A materialidade simbólica é a realização do ato de impregnar o mundo de
significados de forma duradoura. Sob esta ótica, o edifício do templo, por
exemplo, é um eixo que congrega o espaço construído da religião
indelevelmente presente na paisagem. Neste sentido, segundo Grabar
(19887), o espaço da religião é representado pela imbricação de três valores
solidários:
(i) O espiritual, que congrega os significados místicos e éticos atávicos da
religião que simbolicamente se refletem em forma, imagem e prática social.
(ii) O cultural, que emerge das práticas sociais e dos costumes, conferindo o
seu caráter de representação. Remete a consciência do seu passado e
situação geográfica.
(iii) O estético, que é a forma de expressão e imagem inspirada em valores
religiosos e que possuem uma diversidade devido ao contexto histórico do
lugar (GIL FILHO, 2011, p.03)
7 GRABAR, O. O sentido do Sagrado. O Correio da Unesco, Rio de Janeiro, v. 16 n 10, out. 1988, p.27-31.
O roteiro para o qual se sugere o nome de “Sete Dores de Maria” com cerca de 100
km (Figura 03), possível de ser feito a pé ou de carro, contempla sete cidades/localidades
da região, começando pela Matriz de Nossa Senhora do Carmo, em Carmópolis de Minas.
De lá se percorrem 22 km até Passa Tempo onde visita-se a matriz de Nossa Senhora da
Glória para se concentrar com meditações da 1ª Dor. Na sequência segue-se em direção à
Desterro de Entre-rios, para se refletir sobre a 2ª dor, na Matriz de Nossa Senhora do
Desterro. Continuando o ciclo de orações e espiritualidade caminha-se por mais 18 km para
contemplar a 3ª Dor na Capela de Mata dos Pacheco. Depois serão 16 km de estrada até
Entre-rios de Minas, onde, na Matriz de Nossa Senhora das Brotas, pensar-se-á na mística
da 4ª Dor. Agora serão mais 14 km até São Brás do Suaçui, local perfeito para se imaginar e
se envolver pela 5ª Dor na Matriz dessa cidade. Volta-se à estrada e quando vencidos os 13
km na rodovia para distrito de Alto Maranhão, está a Matriz desse povoado onde se
contempla a 6ª Dor. Fechando o ciclo e retomando rumo à estrada, onde, depois de
vencidos 13 km de peregrinação, chega-se à Matriz de Joaquim Martinho meditando-se na
7ª Dor. Serão mais 05 km apenas até chegar ao Santuário do Bom Jesus do Matozinhos,
em Congonhas do Campo. São paisagens e lugares que se unem ao caminho dos romeiros
construindo uma história subjetiva, introspectiva, fenomenológica, abstrata e existencial.
8 Augusto Clementino da Silva nasceu na cidade do Serro (MG) no dia 18 de julho de 1861, filho de Dario
Clementino da Silva e de Augusta Ferreira. Ingressou em 1872 no Colégio do Caraça, localizado na serra do
Espinhaço (MG), e lá permaneceu até 1875.
(...)
Foi deputado estadual em Minas Gerais entre os anos de 1891 e 1897, e participou assim da Constituinte
mineira, na qual foi um dos líderes da campanha pela transferência da capital do estado, até então sediada em
Ouro Preto.
(...)
Faleceu na cidade do Serro (MG) no dia 19 de setembro de 1952. O antigo povoado de Mato Grosso (MG), após
sua elevação à categoria de distrito, por meio de um acordo entre as prefeituras de Alvorada (MG) e Serro (MG),
passou a ser chamado de vila Deputado Augusto Clementino em homenagem ao médico serrano.
Neste sentido, o cemitério, enquanto elemento histórico da paisagem local faz parte
do roteiro de visitação turística em diversas regiões do mundo, como por exemplo, o Père-
Lachaise, em Paris, onde se encontram os túmulos de Allan Kardec e Auguste Comte. Em
Londres, Inglaterra destaca-se os cemitérios de Kensal Green e Highgate e na Itália, os
cemitérios de Gênova e Milão. No Brasil destaca-se na capital paulista, o Cemitério da
Consolação, fundado em 1858 e em Buenos Aires, Argentina, o cemitério Recoleta.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percebendo elementos de Ética, Estética e Epistemologia na Paisagem vemos a
possibilidade de construção de novos paradigmas que reconstruam a relação entre homem
e natureza e entre as pessoas e seus símbolos maiores materializados nas paisagens e
lugares do cotidiano. A paisagem cultural e a estética ecológica elencam novos paradigmas
moldados pela sustentabilidade, pelo empreendedorismo, pela inclusão e pela
interdisciplinaridade. A construção e concepção de lugares e roteiros sagrados emanam
dessa relação holística do homem com o meio. O sagrado é a materialização dessa
conexão, que se mantém por diversas gerações configurando, dessa maneira, um
patrimônio em sua essência concebido, preservado e sustentado pelas próprias interações e
vivências de suas comunidades. A peregrinação, nesse sentido, retrata não apenas a fé e a
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRADE, Vagner Luciano. CULTURA, IDENTIDADE E LUGAR: a devoção católica ao desterro
no contexto histórico brasileiro e sua relação com toponímias LOCAIS. IN: ST 17 - Cultos, ritos,
narrativas e práticas religiosas: religiões e religiosidades e suas possibilidades nas pesquisas
históricas. VI EPHIS, ENCONTRO DE PESQUISA EM HISTÓRIA. 1º SEMESTRE DE 2017. FAFICH
– UFMG
GIL FILHO, Sylvio Fausto. GEOGRAFIA DA RELIGIÃO: ESTUDOS DA PAISAGEM RELIGIOSA. In:
SCRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DO PARANÁ (2011). Disponível em
http://www.ensinoreligioso.seed.pr.gov.br/arquivos/File/simposio2011/artigo1gil.pdf. Acesso em 18
mai. 2017
PEREIRA, Cláudia Matos. PAISAGEM E HOMEM: O Sagrado no Santuário do Caraça. In: Revista
Santuários, Cultura, Arte, Romarias, Peregrinações, Paisagens e Pessoas (2016). Disponível em
http://www.ccsp.it/web/santuarios2016/programma%20e%20pdf%20vari/pdf_articoli/Pereira%20claudi
a%20matos.pdf. Acesso em 01. Abr 2017
PEREIRA, Edmo da Cunha. A Capital do Norte na Minas Colonial. Rio de Janeiro: Ed. Papel e
Virtual, 2009, (Guia do Serro – Vol. I).
RESUMO
A edificação foi projetada pelo arquiteto Marcello Vivacqua, onde de acordo com Pereira
(2012) o mesmo formou-se na Faculdade Nacional de Arquitetura da Universidade do Brasil,
no Rio de Janeiro e veio para o Espírito Santo em 1952, onde deixou mais de duzentos
projetos construídos. O Iate Club de Colatina possui uma forma arrojada, que conta com
uma casca de concreto – quatro paraboloides hiperbólicos - que com a ausência de vigas,
toca o chão em apenas oito pontos, mostrando a complexidade estrutural da obra, que é seu
atrativo. Toda a estrutura de sua cobertura explora a complexibilidade do concreto armado,
material que foi amplamente utilizado no Brasil na década de 1950, principalmente pelos
projetos de Oscar Niemeyer e Lúcio Costa.
Diante deste impasse, não se pode esquecer que estes clubes enquanto arquitetura são
significativos da produção moderna, linguagem adotada, talvez, por se mostrar adequada
para este tipo edificado que surgia na cidade naquela época. Enquanto registros da
memória coletiva, estes clubes relatam um tempo em que a elite social buscava congregar-
se em torno destas instituições de lazer, desejando incorporar-se a um novo modo de vida e
exibir um status social (AZEVEDO E FILHA, 2010).
Entre o fim do ano de 2013 e início do ano de 2014 a cidade de Colatina passou por um
período histórico, atingindo um de seus maiores picos pluviométricos dos últimos anos. A
chuva proveniente desse fenômeno levou à cidade diversos prejuízos econômicos, sociais e
culturais. Com a inundação ocorrida nesse período, todos os arquivos históricos e
patrimoniais referentes ao Iate Clube de Colatina, assim como de outros objetos foram
perdidos. A ausência de tais documentos pode, ainda, acarretar uma perda progressiva dos
laços culturais que tal obra possui com a cidade. Entretanto, ainda hoje, o edifício
representa a memória coletiva local material e imaterial de Colatina.
Referências Projetuais
O Iate Clube de Colatina foi, ao longo de décadas, palco de diversos eventos, sendo uma
obra arquitetônica singular, não só em seus aspectos sociais mas, principalmente, em sua
característica arquitetônica, onde sua forma é sem dúvidas, o que mais gera apreciação por
parte dos moradores do município de Colatina. Fator que concede um caráter de
monumento único e, de certa forma, mostra a influência do movimento moderno não apenas
em grandes centros urbanos, mas também em cidades do interior.
Ilustração 01 – Mosaico com edificações que inspiraram o arquiteto Marcello Vivacqua na construção
do Iate Club de Colatina.
A Igreja de São Francisco de Assis, em Belo Horizonte, faz parte de um conjunto de obras
solicitadas a Oscar Niemeyer pelo então prefeito da cidade, Juscelino Kubitschek. Onde
Niemeyer utiliza a plasticidade inerente à técnica do concreto armado possibilitando a
elaboração das obras da Pampulha, sobretudo da construção da Igreja, onde a
característica mais acentuada da Igreja está na sua expressão estrutural. Cascas
parabólicas alçam da terra, numa ousadia técnico-construtiva que impressiona, onde a
estrutura define os espaços internos a partir de suas formas. Macedo (2008) explica que as
abóbadas parabólicas da igreja da Pampulha são um conjunto de cascas de concreto que,
por sua forma, funcionam como um cabo que transmite apenas esforços de compressão nos
seus apoios. Contudo, para que isso ocorra, as cargas devem estar uniformemente
distribuídas para que sua geometria se aproxime da linha neutra, submetendo-a apenas a
esforços tangenciais à sua superfície.
O Restaurante Los Manantiales foi projetado por Felix Candela e construído às margens do
canal de jardins flutuantes de Xochimilco, no México, em 1958. O edifício de formato
octogonal assemelha-se a uma flor flutuante, já que seus apoios gerados pelas quatro
intersecções hiperbólicas praticamente não tocam o solo. Com bordas curvas e inclinadas, o
Restaurante Los Manantiales é uma casca fina, contínua, graciosa e muito leve. O edifício
possui exatamente a mesma quantidade de parabolóides hiperbólicos que o Iate Clube,
sendo quatro, que são apenas rotacionados e interseccionados em seu centro.
Nos quatro casos: Igreja da Pampulha, Praça de Esportes, Restaurante Los Manantiales e
Iate Clube de Colatina, o uso dos arcos e das parábolas de concreto armado é uma
constante, embora empregadas de formas variadas e em diferentes escalas.
O Iate Clube de Colatina foi implantado em um terreno de esquina, com frente para a Praça
Municipal e para a Avenida Rio Doce, que na época ainda não estava construída. Sua
localização privilegiada está inserida na malha urbana do centro da cidade. O projeto
elaborado em 1959, contempla um edifício principal destinado ao salão de danças, um
restaurante com área de apoio e cozinha, além de piscina, vestiários e uma garagem para
barcos.
O salão conecta-se ao restaurante e aos vestiários por uma laje plana recortada pela
interseção de uma série de arcos e tangentes. A parede curva revestida pelo colorido das
pastilhas cerâmicas no painel confeccionado pelo artista plástico Raphael Samú, recebe os
convidados no saguão, disposto entre o salão de danças e o restaurante. Ela serve ainda
como pano de fundo para acesso aos banheiros e vestiários que atendem todo o conjunto.
Neste espaço se concentra também a entrada principal, a chapelaria e a escada circular que
vem do subsolo, coberta por uma laje plana retorcida (PEREIRA, 2012).
Sob uma cúpula de concreto, situa-se o restaurante espaço iluminado pelos painéis de
vidro que permitem desfrutar da vista para o rio e para a piscina. O bloco em formato de “T”
acomoda a cozinha, a administração e os serviços, intercepta a cúpula, conectando-se
dessa forma ao bar, no interior do restaurante. Com telhado embutido de apenas uma água
e fachada cega revestida de pedras voltada para a Praça Municipal, este bloco é o único
elemento completamente ortogonal, fazendo um contraponto ao jogo de arcos e curvas do
restante do conjunto. Os acessos acontecem por meio de rampas, sendo que foi projetada
uma entrada de serviços pela Travessa Toledo e outro pela Praça Municipal, onde se dá por
uma rampa que chega ao saguão ou pela pista de veículos, que contorna por baixo do salão
de danças e permite acesso à escada circular (PEREIRA, 2012).
De acordo com Pereira (2012) com o tempo, várias modificações e acréscimos foram
realizados. Os muros cresceram e bloquearam a vista para o rio e o contato com o entorno,
construiu-se um palco anexo ao salão de danças, que apagou parte da expressividade e
autonomia da “flor”, os grandes painéis de vidro cederam lugar às esquadrias fixas de vidro
e os cobogós foram fechados . Além disso, um fator externo contribuiu para a falta de
conservação do conjunto. À época da construção, o terreno de esquina contornado à
esquerda por uma avenida larga e tendo a sua frente toda a amplitude da Praça, garantia os
espaços livres necessários para que a forma arquitetônica se manifestasse e pudesse ser
apreciada. Porém com o crescimento da cidade e do fluxo viário, parte da praça foi extinta,
dando lugar a novas ruas, e o Iate foi sendo “espremido” no lote, entre os muros. Novas
Nas últimas décadas, o patrimônio arquitetônico das cidades vem recebendo grande
atenção. Preservá-los ao longo do tempo pode manter viva a história de um grupo ou
sociedade. Para Rodrigues (2001, p.16), “o patrimônio representa a identidade local e, por
mais diversa que seja a população, a sua criação serve como uma ponte que resume várias
histórias em uma só”.
De acordo com Bogéa (2007), o patrimônio arquitetônico e cultural é o conjunto de bens que
possuem valores históricos, artísticos e científicos que definem, em diferentes escalas, a
identidade de uma comunidade, uma região ou um país e que devem ser preservados como
legado às gerações futuras.
A história do Iate Club de Colatina está diretamente relacionada com a história da cidade, e
consequentemente da população, a partir do momento que se deseja guardá-la, pretende-se
guardar a história dos indivíduos. A memória coletiva através da edificação resulta na
paisagem da cidade e na forma como ela cresce, ordenadamente ou não.
O espaço do Iate Clube colatinense abrigava eventos que englobavam desde casamentos a
apresentações musicais de bandas de rock regionais, apresentações de músicos da jovem
guarda e de orquestras sinfônicas, além de ser considerado como ponto de encontro da
juventude colatinense (MADURO, 1989). O Iate soube espelhar os anos dourados das
décadas de 60 e 70, tanto pelo aspecto formal e arquitetônico, quanto pelos usos e
apropriações sociais locais (Ilustração 03).
Ilustração 03 – Mosaico com fotografias do Iate Club de Colatina nos seus primeiros anos de uso.
A estrutura principal do Iate Clube consiste em uma cúpula com oito pétalas. Essa estrutura,
que é uma casca de concreto armado, foi feita sem vigas e colunas, sendo considerada
ousada para a época.O fechamento dessas pétalas era por meio de elementos vazados na
parte superior e vidro na parte inferior, internamente a estrutura continua aparente. Há
ainda, em uma das paredes de alvenaria, uma paisagem feita de pastilhas de louça.
No ano de 1979 aconteceu na cidade de Colatina uma catástrofe natural. A cheia do rio
Doce, que banha a cidade, foi maior que a esperada causou alagamento em suas margens.
Por estar próximo do rio, o Iate sofreu grandes danos em suas estruturas, como as vigas de
sustentação que ficaram rachadas o que resultou no seu comprometimento. Com isso, sua
utilização entrou em decadência.
Somente no final nos anos de 1980, em comemoração pelos 30 anos de construção e sob
uma nova diretoria, que o Iate foi reformado. Para reparar o estrago foi necessário retirar
uma grande quantidade de terra do salão principal e para expor suas vigas e colunas. A
nova fundação passou a ter quinze colunas e quinze vigas que são sustentadas por uma
coluna central com 4,5 metros de diâmetro. Além disso, foram feitas reformas nas partes
elétricas e hidráulicas, cozinha, banheiros e palco com camarim (In: Revista Nossa, 1989).
A intenção da diretoria à época da reforma era voltar o clube realmente para o interesse
dos associados e convidados, pois além de servir aos seus sócios, o Iate era cedido para
reuniões e eventuais acontecimentos sociais como casamentos, aniversários, encontros
políticos, lançamentos de livros, entre outros (PEREIRA, 2012).
No final de 2013, a justiça anulou a doação para os sócios dos terrenos em que o Iate está
localizado, retornando a área para o poder público. Segundo o engenheiro da prefeitura
João Goldner, a intenção é preservar as características iniciais do Iate, reavendo
Considerações Finais
Referências Bibliográficas
AZEVEDO, M. H. de A.; FILHA, M. B. M. Decrépitos espaços de fantasias: a memória dos clubes
sociais da cidade de João Pessoa. In: 3° DOCOMOMO Norte Nordeste, João Pessoa, 2010.
Disponível em: <http://www.docomomonortenordeste.com.br/artigos/TC_SEC1_5. pdf>. Acesso em:
15 abr. 2017.
BOGÉA, K. B. S. R. Centro Histórico de São Luis Patrimônio Mundial, São Luís. 200
CARNEIRO, V. Demolição de prédio histórico surpreende moradores de Colatina. 2010. Disponível
em: <http://gazetaonline.globo.com/_conteudo/2010/10/677268-
demolicao+de+predio+historico+surpreende+moradores+de+colatina.html>. Acesso em 23 abr. 2017.
GAZETA ONLINE. Dispõe sobre a demolição do Iate Clube na cidade de Colatina. Disponível em:
<http://gazetaonline.globo.com/_conteudo/2010/10/677314-
parte+da+historia+de+colatina+e+demolida.html > Acesso em: 23 mai. 2017.
IATE Clube – 30 anos. Revista Nossa, Colatina, ano 07, n° 45, p. 33 a 35, out. 1989.
MADURO, Luiz Carlos. Iate Clube. Revista Nossa. Colatina, v. 1 n.7, p. 33-35, out. 1989.
PEREIRA, T.V. Iate Clube de Colatina - Resgate da História e da Memória. 2012. TCC (Trabalho
de Conclusão de Curso em Arquitetura e Urbanismo) – Centro de Artes, Universidade Federal do
Espírito Santo, Vitória. 2012.
SIM NOTÍCIAS. Dispõe sobre a devolução do terreno do Iate Clube de Colatina para a
prefeitura. Disponível em: <http://simnoticias.com.br/site/index.php/municipios/item/9964-iate-clube-
de-colatina-justica-da-decisao-favoravel-ao-municipio/9964-iate-clube-de-colatina-justica-da-decisao-
favoravel-ao-municipio> Acesso em: 28 mai. 2017.
UFSM/ Prédio 74 – Sala 2182; Faixa de Camobi, Km 09- Campus Universitário / CEP
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Atualmente, na grande maioria das legislações nacionais consta o preceito de que é dever
do Estado preservar o patrimônio histórico e artístico. Dentre algumas instituições
possuidoras destes patrimônios, é destacado neste artigo as instituições Museológicas
como salva guardadoras de patrimônios e a sua função imprescindível de disseminação
cultural para a sociedade. Conforme o Conselho Internacional de Museus (ICOM), o museu
é uma instituição permanente, sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e de seu
desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva, estuda, expõe e transmite o
patrimônio material e imaterial da humanidade e do seu meio, com fins de estudo, educação
e deleite. A adesão da sociedade, dos diferentes grupos sociais, à prática da preservação
de bens culturais tem sido considerada o grande desafio a ser enfrentado no século XXI.
Pequenos museus podem ser os mais frágeis e vulneráveis, aqueles que não possuem um
planejamento claro e de conhecimento de toda a sua equipe estão ainda mais vulneráveis.
Com o intuito de cativar o público este artigo tem relata algumas ações educativas que
podem ser desenvolvida no Museu Educativo Gama D’Eça e Victor Berssani, instituição
pertencente à Universidade Federal de Santa Maria. O prédio caracterizado por seu
decorativismo é exemplo da arquitetura magnificente de tendência eclética do centro
histórico de Santa Maria. As coleções do Museu da Universidade Federal de Santa Maria
estão abrigadas no palacete desde o ano de 1985. A preservação só faz sentido para a
sociedade se está relacionada a necessidades e interesses do momento presente, na busca
constante de um ponto de equilíbrio entre permanência e mudança. Desse modo, os
museus e os patrimônios, assim como diversos outros elementos simbólicos, precisam ser
vistos como dispositivos de criação e invenção de representação, narrativas, imagens sobre
o passado e a memória. Com este trabalho pretende-se abordar metodologias que visem
preparar as instituições Museológicas para tomada de decisões para maior captação e
público, tais medidas têm como objetivo aproximar o público do patrimônio salvaguardado
pela instituição, como também chamar atenção para a própria sede da mesma, um exemplar
histórico da arquitetura eclética da cidade. Cabe ressaltar que as ações identificadas podem
ser adaptadas para o Museu visto que em geral são ofertadas por grandes instituições
museológicas e podem não representar a atual realidade do Museu. Desse modo, os
museus e os patrimônios, assim como diversos outros elementos simbólicos, precisam ser
vistos como dispositivos de criação e invenção de representação, narrativas, imagens sobre
o passado e a memória.
Por isso enfoca que os museus encontram-se abertos a todos, porém, inacessíveis à
maioria da população, visto que a educação formal deficitária não desperta a necessidade
cultural do grande público. Esse fator, relacionado ao baixo capital cultural, artístico e
simbólico de significativa parcela dos brasileiros, contribui para a inacessibilidade destes à
cultura e, em especial, aos museus. Para que um visitante apreenda o capital simbólico
contido em um acervo exposto, ele necessita dos capitais cultural e artístico, embasadores
dessa compreensão. (BINA, p.78, 2015)
O Estado deve reconhecer que os museus podem ser atores económicos na sociedade e
contribuir para atividades geradoras de receita. Além disso, estes participam na economia
do turismo e em projetos produtivos que contribuem para a qualidade de vida das
comunidades e das regiões onde se localizam. De um modo mais amplo, estes podem
também aumentar a inclusão social de populações vulneráveis. (UNESCO, 2015)
Museu é definido como uma “instituição permanente sem fins lucrativos, ao serviço da
sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva, investiga,
comunica e expõe o património material e imaterial da humanidade e do seu meio
envolvente com fins de educação, estudo e deleite” . São instituições que procuram
representar a diversidade cultural e natural da humanidade, assumindo um papel essencial
na proteção, preservação e transmissão do património. (UNESCO, 2015)
Os museus contam com mais de dois séculos de história no Brasil e, ao longo desse
período, o seu papel educativo vem-se consolidando e fortalecendo. No Brasil, os recursos
financeiros destinados para museus foram sempre escassos (CAZELLI, 2005 apud
MARANDINO, 2008).
O recinto museu ganhou diversas formas através dos tempos. Passou a acompanhar as
novas tecnologias, avançando por essa via a sua comunicação com o público, seja por meio
de exposições dinâmicas – procurando um público ativo e não passivo –, seja via Internet,
com o seu marketing, a sua programação, divulgação, debates, ou através de CD ROMs
(Lévy, 1999: 23 apud OLIVEIRA, 2012).
A cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, apesar de ser conhecida como cidade
cultura, realiza poucas atividades em seus museus, de um modo geral os próprios
moradores da cidade acabam por pouco utilizar estes espaços de cultura. Podemos dizer
que a preocupação em conhecer os artefatos que fazem parte da história e da memória do
povo é imprescindível para que a sociedade se reconheça e faça parte das políticas
culturais.
O papel social dos museus é, sem dúvida, o de formação do indivíduo. Sob a óptica
educativa, o museu deve, como uma de suas principais funções, permitir a esse indivíduo
tornar-se sujeito de sua aprendizagem. Nesse contexto, as ações realizadas pelas
instituições, no sentido da comunicação museológica, adquiriram caráter de educação não-
formal, pois tratam da apropriação de conhecimento científico pela sociedade fora do
espaço escolar. (MARANDINO, p.28, 2008).
Como palco para algumas ações educativas, apresentadas neste artigo, será utilizado o
Museu Educativo Gama D’Eça, pertencente a Universidade Federal de Santa Maria –
UFSM. Sediado no palacete Dr. Astrogildo de Azevedo localizado na Rua do Acampamento,
primeira rua da cidade, em uma área central e histórica.
Datado do ano de 1913, a edificação foi construída para abrigar a residência e o escritório
médico do Dr. Astrogildo Cezar de Azevedo, médico influente na cidade embora natural de
Porto Alegre. Foi delegado estadual de higiene e fundou o primeiro hospital da cidade, o
Hospital de Caridade, no ano de 1903. Como intendente Municipal de 1916-1918, tentou
resolver o problema de saneamento básico, promoveu abertura de ruas, novos traçados e
Com uma área de 537 m² o palacete atualmente possui a seguinte disposição: Térreo-Hall e
portaria, sala de exposições temporárias, sala Memorial/UFSM, sala dedicada à Mariano da
Rocha, intitulada de “A trajetória de Vida de José Mariano da Rocha Filho”, sala de
Arqueologia e Etmologia, sala de Numismática, coleção Victor Bresani, gabinete da Direção,
secretária, cozinha e dois banheiros, no segundo pavimento Reserva Técnica, duas salas de
Paleontologia, Sala de Amarias e três salas de Zoologia.
O Gama d’Eça tem um acervo com mais de 13 mil peças durante o ano são realizadas
visitas mediadas, cursos, oficinas e palestras, e há o atendimento especial aos grupos
escolares e as exposições itinerantes. Existe uma preocupação constante do Museu em
educar, no ano de 2012 foram recebidas 46 escolas, contabilizando mais de 8,7 mil
visitantes, número expressivo, porém que poderia ser maior através da implementação de
mais e diversas medidas e ações educativas.
Metodologia
As ações educativas
Não basta criar ou melhorar as instituições museológicas, tal ação deve ser acompanhada
de uma política de gestão efetiva que reconheça as necessidades dos espaços de memória,
sobretudo, de reconhecimento e utilização da instituição por parte da sociedade. Fazendo
com que a mesma aceite e faça do espaço como seu, tanto para usufruir quanto para
salvaguardar.
“Sem dúvida que o Patrimônio Cultural é um recurso não contemplado quando se fala em
desenvolvimento do turismo, a visão que se tem é que somente os recursos naturais, festas
e eventos são a maior atração para o turismo. Desenvolver ações de Educação Patrimonial
no sentido de se apropriar do Patrimônio Cultural por todos os níveis da população
(população local, vereadores, prefeitos, governadores etc.) e incorporar o mesmo nos
planos e programas de desenvolvimento econômico dos Municípios, Estados e da União é
um caminho para que a riqueza e variedades dos bens culturais se transformem em fator de
melhoria de vida para a população e para as regiões, principalmente aquelas onde as
condições econômicas são deficitárias.” Afirma a Educadora e Arquiteta Evelina Grunberg,
autora do Guia Básico de Educação Patrimonial (1999) e do Manual de Atividades Práticas
Esta dinâmica foi baseada nas experiências vivenciadas no Gerdau Museu das Minas e do
Metal de Belo Horizonte, Minas Gerais, tendo uma boa aceitação e participação do público.
Técnicas e dicas básicas para fotografar com celular ou tablet são apresentadas ao público,
estimulando para que ao conhecerem o acervo do museu, as fotos também sejam um
estimulo para a descoberta do museu como espaço. Observar o próprio palacete de uma
forma diferente, a olhar “pela janela”, observar o entorno do museu e desenvolver o “olhar”
fotográfico para o registro de paisagens e ambientes externos, como também para os
próprios detalhes construtivos guardados sob uma ótica diferente em seu interior.
Sessões em família
Pais, crianças, adolescentes, avós e amigos, pequenos grupos no qual as crianças e jovens
são acompanhados por adultos com os quais possuem vínculos afetivos, independente do
grau de parentesco, se houver. Elaboradas a partir delas as propostas educativas buscam
ressaltar e valorizar as memórias e as experiências prévias dos participantes. Esta ação
favorece o conhecimento mútuo, resultando no estreitamento dos vínculos familiares.
Oficina de Criação
Fazer com que os visitantes expressem a criatividade a partir da visita e dos aprendizados
que obtiveram com a mesma. Aproxima o visitante à arte e a cultura, transmite de forma
lúdica os conceitos da arte e do que se pode realizar a partir da exposição assim como dos
detalhes da edificação.
VideoMapping
Esta técnica de projeção usada para transformar qualquer superfície, mesmo a mais
irregular, numa tela de vídeo dinâmica, tais como fachadas de edifícios sem qualquer
distorção. Neste caso seria projetar a história da cidade e do palacete, assim como demais
projeções artísticas que a cidade possa vir a receber.
Conclusão
É preciso ressaltar que de modo geral as ações, são ofertadas por grandes instituições
museológicas brasileiras. Elas não representam a realidade dos museus com menos público
e dimensões no Brasil.
Referências
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Concepções e Apropriações, Mouseion (ISSN 1981-7207), Canoas, n.19 dez 2014.
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informação e virtualidade. Revista do Programa de Pós-Graduação em Ciência da
Informação da Universidade de Brasília Vol.1, nº1, jan/jul de 2012
VILARINO, Leoniza Mac Ginity. Nossas ruas...nossa história. Santa Maria: Pallotti, 2004.
WEIMER, Günter. Arquitetos e Construtores no Rio Grande do Sul: 1892/1945. Santa Maria:
UFSM, 2004.
Para citações no corpo de texto, deverá ser utilizado o seguinte modelo: (autor, data, p.XX).
Ex: (Santos, 1996, p.58).
RESUMO
A ocupação do polígono desenhado, em 1895, pelo engenheiro Aarão Reis (1853-1936) para abrigar
a zona urbana da nova capital do estado (1895/7) tem sido tratada em análises historiográficas
generalistas. Estas focam, grosso modo, a contraposição entre o espaço interno do perímetro da
antiga avenida 17 de dezembro, hoje avenida do Contorno, e o espaço externo a ela; e a ruptura do
modelo da cidade positivista com o avanço da urbanização de Belo Horizonte, ao longo do tempo. Há
poucas análises pontuais que tratem casos específicos de concessão de lotes e projetos de
construção, nos primeiros anos da nova capital.
A oportunidade de estudar a história de uma propriedade dentro do perímetro da avenida do
Contorno, desde o contexto da inauguração da cidade até os dias de hoje, traz a oportunidade de
analisar no nível micro como se deu a apropriação desse fragmento do território urbano da cidade.
A casa da rua Bernardo Guimarães, 441, ainda existente e conservada, situa-se nos Funcionários,
bairro edificado para abrigar preferencialmente os ex-proprietários e o funcionalismo público vindo de
Ouro Preto. A casa foi objeto de recente pesquisa cartorial e arquivística – tanto do Arquivo Público
da Cidade de Belo Horizonte quanto do arquivo da família de seus atuais proprietários desde 1940,
além de prospecção da legislação pertinente. A pesquisa chegou até o ano de 1912 e pôde
esclarecer os meandros de facilitação conferidos pelo Estado aos primeiros proprietários do terreno
onde anos mais tarde, em 1931, se edificaria a primeira planta arquitetônica da casa estudada.
A edição de um pequeno livreto ilustrado com imagens de arquivo com a narrativa sobre a história da
casa da rua Bernardo Guimarães 441 se fez, em 2016, na perspectiva de oferecer um instrumento de
educação patrimonial sobre a história da cidade.
O estudo da história do lote e da casa da rua Bernardo Guimarães, 441, no bairro Funcionários, em
Belo Horizonte, se fez em 2016, quando os proprietários alteraram seu uso de residencial para
comercial, mas ainda sob ocupação da família. Nesta adaptação, procuraram manter intacta a
arquitetura do bem, assim como parte de seu mobiliário e elementos decorativos. Neste momento de
transição, se acentuou o interesse em conhecer melhor a história da casa.
A Planta Geral da Cidade de Minas, de 1895, já trazia um projeto de distribuição dos lotes, conforme
determinado pelo decreto estadual n. 803 de 11 de janeiro daquele ano. Segundo estudo da arquiteta
e geógrafa, Alícia Duarte Pena:
Segundo o decreto acima, os quarteirões e lotes reservados ao Estado de Minas Gerais poderiam ser
vendidos somente dez anos depois da instalação da nova capital (1897). Provavelmente, em 1907?
A peculiaridade do presente estudo é que o primeiro proprietário particular dos lotes 17 e 18, em
1912, era listado como proprietário de Ouro Preto com direito a lote na nova capital em 1895. Faria,
portanto, jus a um lote, mas não nos quarteirões reservados ao estado de Minas Gerais. Não era
funcionário público estadual, razão pela qual não teria direito a um lote nos quarteirões marcados com
a letra R. Na realidade, era funcionário público federal. Trata-se de Domingos Fernandes Monteiro,
um servidor do Tesouro Nacional em Minas Gerais. A ele e sua família foram conferidos privilégios
tanto em âmbito municipal quanto estadual e federal. Não nos anos imediatos à inauguração de Belo
Horizonte, mas a partir de 1912. Os favores visaram tanto à aquisição do lote – ou lotes – quanto à
futura edificação.
Para melhor se compreender as facilidades conferidas a este funcionário federal, está-se dividindo
este tópico em dois itens. Um pertinente à aquisição do lote e outro à edificação – etapa que não se
sabe chegou a ser efetivada pela viúva de Domingos Fernandes, em razão do seu falecimento em 12
de fevereiro de 1913.1
Na “Relação dos proprietários de casas em Ouro Preto com direito a lotes de terreno para
construcção na futura capital do estado, conforme a lei n. 3 de 17 de dezembro de 1893”, publicada
no jornal oficial, consta o nome de Domingos Fernandes Monteiro (MINAS GERAIS, 30 jul. 1895).
Mas, ao que parece, não foi sob tal condição que ele se interessaria futuramente em adquirir um lote
na nova Capital.
A lei n. 24 de 14 de fevereiro de 1907 determinava aos funcionários federais dos Correios privilégios
que mais tarde se estenderiam aos servidores do Tesouro Nacional de Minas Gerais. Ambos os
segmentos poderiam ganhar um lote gratuito e comprar outro contíguo, desde que já fossem
beneficiários do direito ao empréstimo para construção. Curiosamente, favorecimentos públicos para
a construção precederam aqueles que seria conferidos para aquisição dos lotes. Diz a lei referida:
Fica o Prefeito auctorizado a conceder aos funccionarios federaes que tiverem auxilio do
governo federal, para construcção de casa, dois lotes de terreno, sendo um gratuito e
outro contiguo, pelo preço estabelecido, que será pago em prestações mensaes. (BELO
HORIZONTE, Lei n. 24/1907) (grifos nossos)
Segundo o códice, o valor do lote n. 17, equivalente a 200 contos de réis e “não 300 contos como, por
engano, foi escriputado”, foi pago “conforme talão n. 55 de 2 de abril de 1913”. Foi quitado, portanto,
logo após o falecimento de Domingos Fernandes, em 12 de fevereiro daquele ano.
O lote 18 valia “300 réis e não 200 réis como, por engano, foi escripturado”. Em março de 1913, este
lote foi concedido gratuitamente a D. Virgínia, já viúva, pela anulação do débito da compra de 21 de
setembro de 1912, em razão da lei n. 39 do Conselho Deliberativo, conforme informação do códice.
Ou seja, o lote mais caro foi dado gratuitamente à viúva. Infelizmente, não se localizou a lei citada.
A lei n. 88 de 8 de fevereiro de 1915 conferia aos proprietários de lotes concedidos, que ainda não
houvessem neles edificado, a possibilidade de prorrogação do prazo de seis meses, e assim
sucessivamente por três vezes, desde que pagassem as devidas taxas. Findo esse prazo de 24
meses, a concessão cairia em caducidade e o lote iria à hasta pública. Como se verá, estes prazos
foram sucessivamente esticados.
A compra do lote 17 e 18 em 1912 no quarteirão 5 da VI seção urbana não foi, entretanto, um fato
isolado. Curiosamente, dos 26 lotes que compõem este quarteirão, 22 (84%) deles foram vendidos
pela primeira vez em 1912, segundo prospecção ao Índice dos Registros Urbanos de Lotes Urbanos
– AI. 06.00.00, do fundo do APCBH. Não se identificaram na mesma listagem dados sobre os quatro
lotes do mesmo quarteirão não vendidos em 1912.
A Edificação
Privilégios aos funcionários da Delegacia Fiscal ou Tesouro Nacional de Minas Gerais, em Belo
Horizonte, para construção de casas na nova cidade, já haviam sido objeto da lei federal n. 2.356 de
31 de dezembro de 1910:
As condições do empréstimo para construção das casas para os funcionários do Tesouro Nacional
em Minas Gerais seguiam, portanto, as mesmas já conferidas pelo governo federal aos servidores
2 No Almanak Laemmert, ele figura como primeiro escripturário da Delegacia Fiscal do Tesouro Federal, em 1904
e 1905, como contador da mesma repartição pública, em 1906, 1907, 1908, 1909, 1911 e 1913. Pelo decreto n
1.789/1907 do Presidente Afonso Pena, ele foi licenciado por um ano, além da prorrogação na qual já se
encontrava, para tratamento de saúde, com direito ao ordenado.
Esta última prerrogativa é de especial interesse para este estudo, haja vista que com o falecimento de
Domingos Fernandes Monteiro, em 12 de fevereiro de 1913, d. Virgínia passou a gerir os lotes.
Neste mesmo mês, no dia 26, o decreto federal n. 10.094 determinava abertura de crédito para
atender aos servidores da Delegacia Fiscal federal para construção de suas casas em Belo
Horizonte, a título de empréstimo:
Entre 1915 e 1918, Dona Virgínia foi beneficiada por três leis municipais que estenderam o prazo
para início da edificação nos lotes.
Pela lei n. 99/1915, ela foi citada nominalmente no artigo 4º como beneficiária da isenção de
impostos, referente aos lotes da rua Ceará. A menção a esta rua decorre do lote 17 estar na
confluência entre esta rua e a rua Bernardo Guimarães:
Ela também é citada, junto com outros, entre eles José Francisco Macedo, o “Zé dos Lotes”, na lei n.
128/1917 que determinou em seu artigo 1º:
Art. 1º - Fica o Prefeito auctorizado a prorrogar os prazos para construção nos lotes de
terrenos urbanos de propriedade dos srs. Benjamin Moraes, d. Virginia Fernandes
Monteiro, capitão Christiano Alves Pinto, Domingos Fleury da Rocha, José Francisco de
Macedo e dr. José Fellipe de Santa Cecilia, cobrando as respectivas taxas. (BELO
HORIZONTE, lei n. 128/1917) (grifos nossos)
A lei n. 137/1917, do prefeito Cornélio Vaz de Mello, dispôs sobre a possibilidade de prorrogação dos
prazos daqueles que não conseguissem edificar nos lotes concedidos desde que pagassem impostos
equivalentes a um prédio de 15 contos de réis. Tanto a lei n. 88/1915 quanto a n. 137/1917 foram
revogadas, entretanto, pela lei n. 161 de 31 de outubro de 1918, assinada pelo mesmo prefeito. Esta
Antes, portanto, de findo o prazo, o decreto federal n. 3.504 de 29 de janeiro de 1918 do Congresso
Nacional autorizou o Presidente da República a adiantar por empréstimo “a D. Virginia Fernandes
Monteiro, viuva do contador da Delegacia Fiscal do Thesouro Nacional em Minas Geraes, a quantia
de 10:000$, para a construcção de uma casa”. No ano seguinte, o decreto federal n. 13.561 de 22 de
abril de 1919 determinou a abertura do crédito especial de dez contos de réis destinado ao
empréstimo para construção de uma casa, “à viúva do contador da Delegacia Federal do Tesouro
Nacional em Minas Gerais”, conforme disposto no decreto de 1918. Se o empréstimo chegou a ser
efetivado, não se sabe.
Mas ao que sugerem as fontes, apesar dos decretos federais, um de 1918 e outro de 1919,
autorizando empréstimo à viúva, D. Virginia, a casa dos lotes 17 e 18 não teria sido edificada até a
venda dos lotes em 1921 – data da primeira planta arquitetônica identificada no APCBH, já em nome
do novo proprietário: engenheiro Dr. José da Silva Brandão. O códice do APCBH não menciona
nenhuma edificação nos lotes nesta data.
Data de 1921, a primeira planta arquitetônica idealizada para os lotes, encontrada no fundo do
mesmo arquivo. O título do documento é: “Prédio projetado para os lotes n. 17 e 18, do quarteirão nº
5 da 6ª secção urbana – propriedade do Sr. Engenheiro José da Silva Brandão”.
Não se sabe se exatamente esta casa projetada chegou a ser construída, apesar de indícios nas
fontes posteriores, de 1923, de que havia uma edificação nos lotes mencionados. Mas não há como
comprovar tratar-se da mesma residência desenhada na planta arquitetônica de 1921.
O curioso é que D. Virgínia figuraria, em 27 de dezembro de 1929, como proprietária também do lote
10 do quarteirão 27 de V seção urbana, conforme Índice dos Registros Urbanos de Lotes Urbanos –
AI. 06.00.00, do fundo do APCBH. Este endereço fica à rua Paraíba, entre rua Bernardo Guimarães e
rua Gonçalves Dias, também no bairro Funcionários.
Segundo o “Novo Dicionário Biográfico de Minas Gerais: 300 anos de história” (ICAM, 2013), o
engenheiro José da Silva Brandão exerceu em algum momento de sua vida profissional a função de
diretor da Diretoria de Obras da Secretaria de Agricultura, e em outro momento, a de diretor-geral do
José da Silva Brandão (Ouro Preto 1881 – Belo Horizonte 1935) era construtor e
engenheiro de minas e civil, formado pela Escola de Minas de Ouro Preto (1907). Foi
professor catedrático da Escola de Engenharia de Belo Horizonte. Trabalhou como
engenheiro residente da construção da Estrada de Ferro Sabará a Santa Bárbara (1907-
1908). No setor público, foi engenheiro do estado (1908-10), designado a instalar e dirigir
interinamente a Seção Temática da Diretoria de Obras da Secretaria da Agricultura
(1909-10). Teve matrícula registrada na Diretoria de Obras Públicas da Prefeitura de
Belo Horizonte (1921-1932). Atuou como diretor-geral do Tesouro, no Governo Olegário
Maciel e, posteriormente, secretário interino de Finanças [...]. (ICAM, 2013, p. 78) (grifos
nossos)
A ligação entre José da Silva Brandão e o governo de Olegário Maciel (de 04/08/1924 até
21/12/1924; de 07/09/1930 até 05/09/1933) teria ocorrido posteriormente, entretanto, a 1921, ano da
compra dos lotes aqui estudados, pelo engenheiro.
A planta de 1921 da casa foi desenhada pelo arquiteto Dario Renault Coelho filho do também
arquiteto Edgard Nascentes Coelho (1853-1917). Segundo o Almanak Laemmert, tanto o pai quanto o
filho eram funcionários da Directoria de Viação, Obras Públicas e Indústria da Secretaria de
Agricultura do Estado de Minas Gerais, entre 1915 e 1917. O primeiro como desenhista arquiteto e o
segundo como desenhista. Naqueles mesmos anos, Dr. José da Silva Brandão figurava como
engenheiro do estado nesta mesma diretoria, segundo o Almanak mencionado.
No Índice do Registro de Lotes Urbanos, organizado pelo Arquivo Público da Cidade de Belo
Horizonte, José da Silva Brandão consta como proprietário de 12 lotes, entre 1922 e 1924, conforme
apresentado no Quadro seguinte, além dos dois lotes, objeto do presente estudo.
22/02/1922 13 26 X
10/10/1922 1 13 X
19/10/1922 9 13 X
11/11/1922 5 13 X
23/10/1924 9, 11, 13 e 15 4 II
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Fonte: Índice dos Registros de Lotes Urbanos. AI. 06.00.00. Arquivo Público da Cidade de Belo
Horizonte.
O quadro acima indica a inequívoca vocação de especulação imobiliária do engenheiro José da Silva
Brandão, nos anos citados.
A Planta Geral da Cidade de Belo Horizonte de 1923 e a de 1928/1929 já não traziam a letra R sobre
o quarteirão cinco da VI seção urbana – indício de que os lotes originalmente reservados ao Estado já
havia sido distribuídos? A última Planta Geral traz uma edificação no lote 17.
Em 1923, Joaquim Telles de Carvalho e sua mulher Maria Ubaldina de Carvalho compraram o prédio
n. 1.264 da rua Ceará e os lotes 17 e 18 de José da Silva Brandão e sua mulher, como se confirma
pelo registro de 5 de setembro, do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Belo Horizonte.
Em 1928, os lotes 17 e 18 e o prédio da rua Ceará foram vendidos a Antonio Luciano Pereira e d.
Olympia de Rezende Pereira, pais do polêmico especulador imobiliário de Belo Horizonte, Antonio
Luciano Pereira Filho (1913-1990). Provavelmente a partir de 1928, os lotes que somavam 1.089m²
foram divididos em três porções não exatamente idênticas e passaram a abrigar três edificações
distintas. A planta de uma delas, a do lado direito da casa aqui estudada, de 1925, de propriedade do
Sr. Elton Guimarães está sob a guarda do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte.
A casa da Bernardo Guimarães 441, figurará a partir de então ora em parte do lote 17 ora em parte
do lote 18, somando apenas 375m². O Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte guarda o projeto
de construção para o lote 17, datado de 28 de agosto de 1931, elaborado pelo arquiteto Caetano de
Franco, para Antonio Luciano Pereira. Supõe-se desta data, portanto, a estrutura arquitetônica básica
da atual casa da rua Bernardo Guimarães, 441. É a primeira documentação encontrada nas fontes
que traz esse endereço.
Em 1938 houve um “projecto para modificação e acréscimo na casa existente em parte do lote n. 17,
do quarteirão 5 da 6ª seção urbana” de propriedade de Antonio Luciano Pereira. O projeto era do
arquiteto e desenhista italiano Francisco Farinelli. 3
3 Segundo Dicionário Biográfico dos Construtores e Artistas de Belo Horizonte de 1894 a 1940 (IEPHA, 1997),
Francisco Farinelli em 1923 teve matrículas como desenhista e mestre de obras registradas na Diretoria de
Obras Públicas da Prefeitura de Belo Horizonte. Entre seus projetos, destacam-se no bairro Funcionários: antiga
residência de Pelegrino Antonini (1932/1935); à avenida Getúlio Vargas n. 167 esquina com rua Maranhão, que
ainda resiste; e residência de Ernestina B. Martins Vieira (1939) na rua Ceará n. 1.323.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Por escritura lavrada em 19 de setembro de 1940, no 4º Ofício de Notas de Belo Horizonte, o
advogado Homero Costa adquiriu de Antonio Luciano Pereira a casa e parte do lote n. 17.
Em 1951 houve acréscimo e modificação de parte do lote n. 18 (há uma alteração do número),
através de planta do arquiteto Cláudio Jorge Gomes e Souza.
Em 1958, o advogado Túlio Vieira da Costa se mudou para a casa, junto com sua família, mas só
viria efetivar a compra feita a seus pais, Homero e Olavina, através da escritura de compra e venda
de 28 de março de 1962, registrada no Cartório do 2º Ofício de Notas.
Em 1964, a casa sofreu uma reforma radical, através do projeto do escritório “Arquitetos Associados
Mardônio S. Guimarães e João A. Bethonico”. Esta estrutura, com algumas modificações pouco
expressivas, permanece até hoje.
Considerações Finais
A prospecção da história da casa evidenciou facilitações do Estado para que o primeiro proprietário
dos lotes 17 e 18, funcionário público federal do Tesouro Nacional em Minas Gerais, os adquirissem
em 1912 e sua viúva, posteriormente, neles pudesse edificar. Um dos lotes foi dado gratuitamente;
várias isenções de impostos municipais foram conferidas; prazos de construção foram prorrogados;
crédito em âmbito federal foi autorizado para edificação. O curioso é que muitos desses decretos e
leis, nas três esferas do Poder, foram feitos para beneficiar nominalmente D. Virgínia, viúva do
funcionário público federal.
Apesar dos fartos favores, não se sabe se dona Virgínia tenha conseguido edificar nos lotes
estudados, uma vez não ter-se encontrado no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte nenhuma
planta arquitetônica dos lotes atinente a esta proprietária. Sugestiva também é a informação de que o
proprietário que a sucedeu, em 1921, era engenheiro com vínculos anteriores com a Secretaria de
Agricultura, Indústria, Terras, Viação e Obras Públicas, e futuramente viria a ser presidente do
Tesouro Nacional em Minas Gerais. Além desses dois lotes, adquiridos em 1921, tornou-se
proprietário de 12 lotes urbanos entre 1922 e 1924 em Belo Horizonte. Vínculos com a mesma
Secretaria tinha o arquiteto que viria a elaborar a planta arquitetônica de 1921.
A elaboração de um livreto, em 2016, com texto, fotografias do arquivo da família desde 1940 até
2016 e imagens da documentação encontrada em cartórios e no Arquivo Público da Cidade de Belo
Horizonte pretendeu, dentro de suas limitações, servir como um instrumento de educação patrimonial
sobre a apropriação de fração de um dos quarteirões reservados para o Estado na Planta Geral da
Cidade Minas, em 1895.
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terreno para construcção na futura capital do estado, conforme a lei n. 3 de 17 de dezembro de 1893.
Ouro Preto, 30 jul. 1895. Disponível em:
http://memoria.bn.br/pdf/291536/per291536_1895_00203.pdf. Acesso em: 07 jun. 2017.
DARIO RENAULT COELHO. Predio projectado para os lotes nºs 17 e 18, do quarteirão nº 5, da 6ª
seção urbana. 1921.
DOCUMENTOS CARTORIAIS
RESUMO
Este trabalho visa apresentar o projeto de um museu capaz de atuar como ferramenta de educação
patrimonial em Teresina, Piauí, Brasil, tendo como objeto de intervenção uma residência eclética do
início do século XX, edificada no bairro Centro. A abordagem faz-se em torno da problemática que
envolve a crescente perda da memória arquitetônica teresinense, fruto da especulação imobiliária e
principalmente do desinteresse do poder público e da pouca familiarização da sociedade civil com o
tema. Dessa forma, o projeto arquitetônico intitulado Museu do Silêncio, cujas decisões projetuais são
pautadas nos escritos de teóricos do patrimônio como Alois Riegl, Violet Le Duc, Camillo Boito e nas
diversas cartas patrimoniais, se constitui como um manifesto pela salvaguarda do patrimônio
arquitetônico perdido, silenciosamente, no dia a dia da vida urbana. O desabamento recente do
objeto estudado confirmou a urgência de políticas para a proteção dos bens construídos e a
necessidade de meios para a promoção da educação patrimonial.
Teresina, sítio desta pesquisa, está entre as quatro capitais brasileiras com o menor
número de museus, de acordo com dados do Guia dos Museus Brasileiros, de 2011,
realizado pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). Partindo deste dado, e levando em
conta a função educacional intrínseca aos museus, fez-se necessário pôr em discussão as
diversas ocorrências de cunho negativo que têm permeado o cenário do patrimônio
arquitetônico em Teresina (evidenciando a falta de interesse por parte dos órgãos gestores
e a quase inexistente relação de pertencimento da sociedade civil), trazendo o foco à
criação de museus que sejam instrumento de mudança deste cenário.
O bairro Centro da capital piauiense, um dos mais antigos da cidade, abriga a maior
parte do acervo patrimonial, incluindo exemplares de estilo eclético e neocolonial,
especialmente em antigas residências. Contudo, o rápido e desordenado crescimento da
capital causou a diminuição desse acervo e vem ameaçando outras perdas. Um exemplo
disso é o evento pelo qual passou a residência de Dona Madalena, exemplar da arquitetura
neocolonial em Teresina, em julho de 2015. Construída em 1938, na Rua Félix Pacheco, a
residência sofria com os reflexos da especulação imobiliária. Ali foi iniciada uma demolição
silenciosa, que causou danos a elementos característicos das construções tradicionais como
o ladrilho hidráulico e as esquadrias com almofadas e venezianas, para dar lugar a uma
nova construção (provavelmente uma clínica médica). No entanto, graças à mobilização de
um grupo de estudantes e demais integrantes da sociedade civil, com o movimento
nomeado Viva Madalena, a demolição total deste exemplar não se concretizou. O grupo
ocupou a residência durante duas semanas com oficinas, exposições, saraus, debates e
palestras, além de ações voltadas à salvaguarda do patrimônio arquitetônico, dando
visibilidade a este exemplar.
Outro caso de perda de memória bastante conhecido pelos teresinenses foi o ocorrido
a um antigo casarão onde residiu o ex-governador do Piauí, Antonino Freire, localizada na
avenida que leva o mesmo nome e é um dos cartões postais da cidade. A residência foi
O OBJETO
Figura 1 - Residência do Sr. Gozozo à esquerda. Teresina Meu Amor, séc. XX (data estimada).
Com quatro planos de queda d’água, a cobertura volta-se parte para o interior do lote
e parte para o espaço público. Neste último caso, os beirais são escondidos por platibandas
com detalhes em baixo relevo; as tubulações metálicas nas fachadas tinham a função de
escoamento das águas. Tendo sua estrutura feita em troncos de carnaúba (espécie vegetal
bastante encontrada no Estado) e telhas cerâmicas, a cobertura é apenas um dos
elementos presentes na construção que evidenciam as várias técnicas construtivas
tradicionais piauienses que foram aplicadas neste exemplar.
A casa está há muito tempo sem qualquer uso, mas ainda assim guarda histórias da
época em que ali funcionava a mercearia do Sr. Gozozo, transmitidas por aqueles que
frequentavam o espaço. Dessa forma, o edifício se apresenta como cenário aos episódios
que, transformados em memórias, permanecem no imaginário de parte da população como
patrimônio imaterial deste povo.
MUSEU DO SILÊNCIO
O visitante será levado por um percurso que fala e grita de diferentes formas,
colocando-o frente a notícias, fotografias, sons, ilustrações e maquetes que o inquietam
para que ele perceba a importância do patrimônio arquitetônico que tem sido perdido ao
longo dos anos em Teresina. Dessa maneira, ao final de todo o percurso, feito para que o
silêncio seja priorizado e, por consequência, haja uma reflexão, o visitante será capaz de
gritar de diferentes formas, ecoando a “voz” silenciada ao longo da experiência.
O intuito é fazer deste exemplar o ponto de partida de várias rotas a serem percorridas
por todo o Centro, fazendo surgir um sistema de bens patrimoniais que, mesmo que não
fossem protegidos institucionalmente, passariam a ser reconhecidos pela população,
estabelecendo assim uma rede de proteção patrimonial a partir da formação de uma relação
de identidade.
O novo edifício deve, portanto, ser locado no terreno de modo a interferir minimamente
na edificação existente e sem criar qualquer conflito com as fachadas ecléticas. Sendo
assim, a edificação seria recuada ao máximo em relação às duas fachadas que estão no
limite do lote, de forma que ela se localizaria no ponto mais a sudeste do terreno.
Optou-se pela criação do acesso principal através da Rua Areolino de Abreu, acesso
que se dará por um jardim de formas simplificadas e funcionará como área de estar e
eventos. Foi necessário, portanto, subtrair parte da vedação lateral da antiga construção
para que se criasse um amplo acesso à recepção, que ocupa a primeira parte do que antes
era a varanda.
As novas portas em vidro que ocuparão este espaço possibilitam, desde a parte
externa, a visualização da esquadria em madeira com singular trabalho na execução de
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venezianas que formam um interessante jogo de luz no interior e valorizam ainda mais esse
elemento bastante utilizado na arquitetura piauiense.
Figura 3: Implantação e planta baixa do pavimento térreo do Museu do Silêncio. Autoras, 2017.
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Porém, para que todas as necessidades do museu pudessem ser atendidas, surgiu o
novo edifício que contará com 4 (quatro) pavimentos nos quais estarão distribuídas salas de
exposição permanente, toda a área administrativa, biblioteca, sala de conferências e salas
de apoio técnico ao museu (docas para recebimento de peças, oficina de restauro e reserva
técnica). A planta se desenvolveu em torno de um jardim seco com pé direito triplo, fechado
na sua parte superior por uma claraboia de vidro que é o centro de 3 (três) dos 4 (quatro)
pavimentos do novo volume. A claraboia foi pensada de modo a tornar-se um elemento focal
no interior da edificação. Além da iluminação que proporciona, foi pensado também em um
jogo de formas com as passarelas que dão acesso às salas centrais, a proposta é obter
efeito semelhante ao que é visto no pátio da Pinacoteca de São Paulo, projeto do arquiteto
Paulo Mendes da Rocha.
Para Brandi (2004, p. 47 apud KÜHL, 2007, p.198), teórico italiano acerca do restauro,
a “integração deverá ser invisível à distância de que a obra de arte deve ser observada, mas
reconhecível de imediato”, é dessa forma que os edifícios se apresentam: os volumes são
complementares, continuidade que se dá pela materialidade, mas é facilmente percebida a
nova construção. O novo edifício difere do original e surge na tentativa de facilitar a leitura
do objeto arquitetônico preexistente sem se sobrepor (Figura 4). Aqui a restauração se
constitui como ato crítico pregado na teoria brandiana, o elemento novo abre mão do caráter
estético em vistas a dar voz à arquitetura eclética.
CONCLUSÃO
No dia 11 de janeiro de 2017, por volta das 14 h e 30 min, ainda durante o processo
de concepção deste projeto, o edifício alvo da intervenção sofreu a perda parcial de uma de
suas fachadas, onde já havia sido verificada uma rotação na parte superior da parede.
A residência (Rua Areolino de Abreu, nº 1186) possuía sua fachada protegida pela Lei
Complementar nº 3563 de 20 de outubro de 2006, do município de Teresina, que dá
incentivos fiscais como não pagamento de IPTU para que os proprietários realizem de forma
periódica reformas de manutenção nos bens amparados por ela exigindo, neste caso, que
sejam “mantidas as características arquitetônicas, artísticas e decorativas das fachadas
voltadas para logradouros públicos e [...] também a sua volumetria incluindo o telhado.”
Grande parte dos imóveis protegidos pela lei encontra-se fechada, abandonada pelos
proprietários que não veem vantagens em manter a edificação para que ela permaneça ao
longo do tempo, tanto como um bem imaterial, na memória popular, quanto material, como
elemento testemunha de diferentes estilos arquitetônicos e métodos construtivos.
REFERÊNCIAS
CUNHA, Claudia dos Reis e. Alois Riegl e o culto moderno dos monumentos. Resenhas
Online, São Paulo, ano 05, n. 054.02, Vitruvius, jun. 2006
<http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/05.054/3138>. Acesso em: 20 abr.
2017.
IBRAM. Guia dos Museus Brasileiros. Brasília: Instituto Brasileiro de Museus, 2011. 591 p.
ITALIA. Ministero della Pubblica Istruzione. Circolare n°117, del 6 aprile 1972.
KÜHL, Beatriz M. Cesare Brandi e a Teoria do Restauração. Pós, São Paulo, n. 21, jun.
2007. p. 198. <www.revistas.usp.br/posfau/article/download/43516/47138>.
RESUMO
A Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), ao longo dos seus 45 anos de existência, recebeu e
acumulou uma série de objetos bastante representativos das suas relações interinstitucionais, que
formam o seu patrimônio histórico. Objetivou, por meio da organização e do tratamento desse
patrimônio, democratizar o acesso a coleção de objetos com os quais os reitores foram presenteados
e, assim, contribuir para a Educação Patrimonial, na instituição. Metodologicamente, foram realizadas
as seguintes etapas: 1) levantamento de todos os objetos recebidos pelos reitores, ao longo da
história da universidade; 2) inventário dos objetos a partir de premissas museológicas, o que
envolveu sua descrição física, sua descrição temática, sua descrição tipológica e seu registro
fotográfico; 3) desenvolvimento de um catálogo digital dos objetos. Resultou um total de 115 objetos
diversificados. Alguns desses objetos contêm informações escritas sobre premiações,
reconhecimentos, alianças e agradecimentos, referentes tanto à figura do reitor quanto à universidade
como instituição.
Palavras-chave: Coleções Históricas; Memória Institucional; Educação patrimonial
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Introdução
As instituições de ensino superior, ao longo de sua trajetória, recebem e acumulam
uma série de objetos bastante representativos das suas relações interinstitucionais, que
formam o seu patrimônio histórico. Esses objetos compõem, naturalmente, as coleções
históricas, que em certo grau, refletem a sua memória institucional. A Universidade Federal
de São Carlos (UFSCar), ao longo dos seus 45 anos de existência, acumulou um
significativo número de objetos, recebidos pelos reitores. Esses objetos representam, à luz
das ciências sociais, as relações diplomáticas construídas entre os atores sociais, bem
como a circulação de saberes. Eles passam a representar as relações de sociabilidade,
reciprocidade, fidelidade e gratidão, e estão associados a um determinado momento, de um
encontro ou estada do reitor em algum lugar, ou representam uma passagem de alguma
outra personalidade pelo ambiente acadêmico.
Esses objetos são bastante representativos das suas relações interinstitucionais, que
formam o seu patrimônio histórico. Podemos pensar esse patrimônio histórico dos reitores
como resultado de determinadas formas de comportamento e convenções sociais que
circundam a alta hierarquia universitária. Esses objetos arquivados na UFSCar podem ser
vistos como produtos culturais que materializam uma prática social, e mais do que isso,
materializam toda uma história de uma prática social. Os objetos são formados por
presentes diplomáticos, esses são peças de valor estético e, às vezes, incomuns, que
materializam as relações estabelecidas com lideranças, personalidades públicas e outros
atores sociais. Esses objetos carregam significados e simbologias que estão agregados em
si.
Nesse sentido, (UFSCAR, 2017) as contribuições das áreas de Antropologia,
Sociologia e Ciência da Informação nos permite trabalhar esta questão de forma a contribuir
teoricamente para o entendimento das relações que são estabelecidas entre esses atores
institucionais, entre demais outras instituições. Nos estudos de Marcel Mauss (2003), o seu
conceito de “dádiva”, nos permite um entendimento da constituição da vida social por
processos que se materializam no cotidiano das dádivas, os atos de "dar" e de "retribuir". De
formas distintas, as trocas variam de acordo com o tempo/época e ambientes, o que vemos
refletidos nos objetos obtidos pelos reitores.
No campo da sociologia, podemos realizar um diálogo com os conceitos de capital
social, cultural e simbólico propostos por Bourdieu (2008), esses, que de certa forma, estão
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agregados ao longo do tempo na história da UFSCar. Assim, como também os conceitos de
sociabilidade, reciprocidade, fidelidade e gratidão, propostos por Simmel (1983 & 2004).
Simmel (2004) discute o papel que a fidelidade adquire nas relações sociais, como
um papel duplo: por um lado, a fidelidade complementa outros sentimentos; de outro lado
ela também sustenta relações e condições sociais. Segundo o autor, a fidelidade pode ser
vista como um estado psíquico e sociológico, capaz de preservar as relações sociais ao
longo do tempo, para além das forças que originaram essas relações (SIMMEL, 2004, p.
32).
Por essa razão, os patrimônios históricos podem ser vistos como formas de
expressão da fidelidade entre variadas instituições ou atores sociais e a UFSCar. Essa
fidelidade nos revela outros sentimentos, como gratidão e reciprocidade, desses atores
sociais para com a universidade, o que, por sua vez, pode revelar momentos de atuação da
UFSCar na sociedade ou na integração com outras instituições.
Nos estudos da Ciência da Informação, Paul Otlet (1937), um dos estudiosos
centrais da área da Documentação, o papel do documento é informar, organizar e
disseminar a informação contida em qualquer tipo de suporte. Logo, os objetos
tridimensionais enquanto documentos informacionais também são classificados como
documentos. De forma geral, como apontado por Litton (1976), a necessidade de
documentar a pesquisa vai além de registrar os dados para as populações futuras. A
documentação tem o papel de registrar novas informações, assim como classificar os
dados. No contexto desta pesquisa, a documentação visa informar e educar o usuário da
informação por meio da descrição física, ou seja, da representação descritiva e da
explicitação das relações que foram estabelecidas ao longo dos anos por certos atores
sociais, da universidade ou advindos de outros lugares, reconstituindo, assim, parte da
memória da instituição.
O conceito de memória se torna relevante para este estudo, e é básico para
possibilitar a reflexão sobre o conceito de memória institucional. Um primeiro ponto a ser
observado é que a ideia de memória pode ser pensada a partir de diferentes enfoques.
A memória é mais ampla que as lembranças de um único indivíduo, podendo ser
associada ao resgate e à preservação do passado social, um passado vivido coletivamente
(HALBAWACS, 2006). No entanto, a memória não está ligada apenas ao passado, ela pode
ser associada também ao presente e ao futuro. A memória, afinal, influencia quem nós
Educação Patrimonial
Reunião desses objetos não só agrega valor como explicita a sua história e sua
importância para o desenvolvimento da instituição o que reflete, positivamente, em seu
ambiente interno e externo.
Pode-se dizer que a construção da identidade é dada por um conjunto de crenças e
costumes que foram herdados por um determinado grupo. Sua preservação forma a
memória e esta é refletida por meio do patrimônio cultural. O patrimônio pode ser inventado
ou reinventado de várias formas, de acordo com o que o grupo determina ou preserve como
um patrimônio que os represente enquanto uma comunidade. O patrimônio histórico
institucional informa as características sociais, a sua historia, os costumes predominantes, e
as ideias que circulam em determinados períodos. No caso desta pesquisa, os objetos
informam os acordos, as alianças, as amizades que foram construídas ao longo dos anos de
existência da instituição. Segundo Soares (2007), o objeto não é criado para ser um
patrimônio, ao longo do tempo pela sua identificação com determinado grupo, suas
características, enquadra-se em um determinado contexto histórico, diferenciando dos
demais grupos pelas suas particularidades.
Patrimônio pode ser definido como um conjunto de bens materiais e imateriais
herdados dos antepassados. Ele está associado à lembrança e é uma fonte para a
construção da memória de uma determinada sociedade, comunidade. Ele representa a
identidade e as diferenças étnicas em relação a outros grupos, ou seja, as particularidades e
especificidades de um local, região da sociedade (SOARES; KLAMT, 2004) que pode ser
representado por objetos, documentos, edifícios, conjuntos urbanos, sítios de valor histórico,
criações cientificas, artísticas e tecnológicas, bem como todo objeto ou manifestação
compartilhada que diga respeito a identidade e a memória de um grupo.
O patrimônio pode ser reconhecido em uma crença, um costume, um objeto, dentre
tantas outras possibilidades. A noção de conservação e preservação do patrimônio cultural é
fundamental para as futuras gerações como elemento da construção da própria história e da
Objetivo
A presente pesquisa objetivou, por meio da organização e do tratamento desse
patrimônio, democratizar o acesso a coleção de objetos com os quais os reitores foram
presenteados e, assim, contribuir para a Educação Patrimonial, na instituição. Visando
operacionalizar esse projeto, haviam sido estabelecidos os seguintes objetivos específicos:
a) reunir todos os objetos recebidos pelos reitores da UFSCar, ao longo da história
da universidade;
b) proceder à higienização dos objetos;
c) organizar as séries de objetos compostas por placas, troféus, flâmulas, canecas,
bandejas, entre outros;
d) elaborar descrições, de acordo com as informações constantes dos objetos.
Metodologia
Resultados
Contextualização do Patrimônio
Conclusão
Referências
BOURDIEU, Pierre. Um mundo à parte. In: Para uma Sociologia da Ciência. Lisboa:
Ediçoes 70, 2008. P. 51-117.
MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a dádiva. In: MAUSS, Marcel. Sociologia e Antropologia.
São Paulo: Cosac Naify, 2003.
NOGUEIRA, Maria Alice, CATANI, Afrânio (Orgs). Pierre Bourdieu: escritos de educação.
Petrópolis: Vozes, 2010.
SIMMEL, Georg. Fidelidade e Gratidão e Outros Textos. Lisboa: Relógio D’água Editores,
2004.
SIMMEL, Georg. Sociologia: Grandes Cientistas Sociais. São Paulo: Ática, 1983.
SOARES, André L. R. (Org.). Educação Patrimonial: teoria e prática. Santa Maria: Ed. da
UFSM, 2007.
RESUMO
Os estudos deste artigo, originalmente desenvolvidos para um Trabalho de Conclusão de Curso para
o curso de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal de Juiz de Fora, apresentam uma
proposta de um projeto piloto de educação patrimonial urbana que tem como objetivo principal
conduzir a população de Juiz de Fora (MG) ao entendimento de parte de sua própria história através
do reconhecimento de seu patrimônio arquitetônico tombado. O projeto piloto propõe para a Rua
Halfeld, importante via do município que destaca-se por diversos motivos, a criação de um percurso
orientado através de placas com a história, data de surgimento e curiosidades sobre os bens
tombados. Dessa forma, o indivíduo inicia o percurso a partir de uma das extremidades da via e a
percorre aprendendo, ponto a ponto, um pouco da formação da cidade e o papel que cada bem
tombado representa. Diretrizes são aplicadas de forma a auxiliar o percurso, garantindo melhor
visibilidade, e que as intervenções feitas no local possam contribuir para sua valorização, ou, no
mínimo, se comportar de forma neutra, sem trazer prejuízo ou danos, não só para os bens, mas para
toda a história que estes carregam. Por fim, a requalificação vem para garantir acessibilidade,
visibilidade dos bens, conforto e segurança para o pedestre. Com esta pesquisa, verifica-se a
possibilidade de um processo efetivo de educação e valorização patrimonial e de um projeto de
requalificação do percurso estudado, com a criação de diretrizes próprias de preservação. A intenção
é que o projeto piloto para a Rua Halfeld em Juiz de Fora possa servir de base para um projeto ainda
maior de conscientização e valorização da cultura local, e que possa ser estendido para todos os
pontos de interesse patrimonial da cidade.
Sabe-se que um dos principais fatores que provoca danos ao patrimônio edificado
diz respeito à sua desqualificação como fonte de referência para a identidade local,
constituindo, quase sempre, resultado do desconhecimento de sua importância. Por este
motivo, justifica-se o desenvolvimento de um processo pedagógico que reconheça a
educação na perspectiva de apreensão de conhecimentos sobre o espaço urbano, que deve
ocorrer através da reflexão constante, do pensamento crítico, criativo e da ação
transformadora do sujeito, conformando-se como uma atividade condicionada histórica e
socialmente.
Para este propósito, a educação patrimonial é vista como um processo educativo que
tem como objeto central o patrimônio cultural, voltada para valores e comportamentos que
assegurem seu reconhecimento, valorização e preservação. Em outras palavras, a
educação patrimonial é um processo que busca levar a população à identificação,
reconhecimento, apropriação e valorização da sua herança cultural, possibilitando um
melhor usufruto destes bens, e proporcionando a geração e a produção de novos
conhecimentos para a continuidade do desenvolvimento cultural.
Substancialmente, esta expressão nos leva a refletir sobre o papel que os ambientes
de ensino tem nesse processo, levando-se em consideração aspectos fundamentais de
convivência, além de apresentarem conhecimentos sistematizados e oferecerem subsídios
para debates e discussões em torno de questões sociais e culturais, como por exemplo o
convívio democrático no espaço público.
Juiz de Fora teve sua expansão territorial iniciada através das concessões de
sesmarias nas primeiras décadas do século XVIII ao longo do Caminho Novo. Em função da
construção de hospedarias e armazéns, em 1820 foi criado o povoado de Santo Antônio do
Paraibuna, o qual daria origem, mais tarde, à cidade de Juiz de Fora. Em 1865, a Vila
passou a ser definitivamente “Juiz de Fora”. (ALBERTO ET AL, 2016, p. 25). Braida assinala
que a construção da cidade teve como base a mistura de grupos imigrantes a qual
configurou uma sociedade plural e diversificada (BRAIDA, 2011, p. 82). À esta constatação,
cumpre afirmar que grande parte do patrimônio edificado no centro da cidade é proveniente
de construtoras fundadas por imigrantes alemães e italianos, como por exemplo, a
Companhia Indústria e Construtora Pantaleoni Arcuri.
O núcleo inicial da cidade pode ser descrito como um triângulo conformado pela Av.
Rio Branco, pela Av. Getúlio Vargas e pela Av. Itamar Franco. No centro deste triângulo,
está a Rua Halfeld, que é delimitada à leste pelo Morro São Bernardo, à oeste pelo Morro do
Imperador.
Por todo o seu significado e a representação que possui tanto atualmente, quanto já
tivera no passado, bem como pela grande quantidade e variedade de bens tombados
presentes em seu entorno e em seu percurso, a Rua Halfeld foi escolhida como para sediar
a proposta de projeto piloto de valorização patrimonial idealizado nesta pesquisa.
Foi feito o diagnóstico de todo o percurso, com foco na relação entre o patrimônio
edificado e o espaço urbano. Na análise foram identificados diversos fatores que
comprometem a visibilidade e a legibilidade das edificações, e consequentemente dificultam
a compreensão da história contada através dos mesmos. Embora os problemas possam ser
encontrados em toda extensão da área estudada, é possível identificar áreas que
necessitam de maior atenção em relação a determinado problema. Denomina-se neste
estudo a primeira área como “calçadão”, que compreende o trecho entre a Avenida Rio
Branco e a Avenida Getúlio Vargas, e como “parte baixa” o trecho entre a Avenida Getúlio
Vargas e a Praça Doutor João Penido.
Além dos problemas específicos de cada área, ainda é possível encontrar aqueles
que se repetem com frequência ao longo de todo o percurso, como a obstrução da
visibilidade dos bens através de letreiros. Estes últimos retratam o uso abusivo de
publicidade, sem o devido respeito às edificações, escondendo elementos importantes das
mesmas. Os aparelhos de ar-condicionado e antenas constituem outro inconveniente para a
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identificação do patrimônio edificado pois são colocados indevidamente nas fachadas,
atravessam as furam as esquadrias e a alvenaria, quebrando a harmonia e a estética das
construções.
5.1. Iluminação
Devido a forte influência que exercem na paisagem, tanto por se repetir ao longo do
percurso implantado, os postes de iluminação possuem grande influência na percepção do
espaço analisado. Sendo assim, propõe-se para o calçadão a colocação de novos postes,
com design contemporâneo e inovador, contribuindo também como marco de um novo
momento da história, chamando a atenção da população para a requalificação que está
sendo proposta para Rua Halfeld. Inserir-se-à, portanto, de forma mais harmônica do que o
poste existente atualmente, sem criar falso histórico, já que marca bem a época de sua
inserção.
Já para a parte baixa, propõe-se postes com um design dinâmico, estética leve e
agradável, com a utilização de fiação subterrânea, garantindo uma limpeza visual, com
tecnologia não expõe a fiação e os disjuntores, além de ser mais segura, pois protege os
fios de agentes externos, e embora sua aplicação seja mais cara, possui menor custo de
manutenção e longa durabilidade.
O Conjunto de totens informativos tem como objetivo mostrar aos transeuntes que é
possível conhecer a história da cidade através de seus edifícios. Esta simples intervenção é
capaz de estimular o sentimento de pertencimento e conseguir conquistar a valorização do
patrimônio e da cultura de Juiz de Fora, fazendo com que a população local compreenda a
necessidade de preservação e possa contribuir para tal, além de incentivar o turismo na
região. Sendo assim, os totens são colocados ao longo da Rua Halfeld, desde a Praça
Doutor João Penido até o Parque Halfeld, podendo o percurso ser iniciado em qualquer uma
das extremidades. Alguns dos pontos específicos são:
O Ed. Clube Juiz de Fora teve sua volumetria e fachada tombadas em 25 de julho de
2002, e posteriormente o edifício como um todo em 24 de outubro de 2002. Inseridos nele, o
Galeria Pio X
Cine Palace
6. Diretrizes
7. Considerações Finais
Partindo do princípio que as ações de educação patrimonial devem ser construídas
através de diversificadas áreas de conhecimento complementares, o percurso proposto
cumpre um papel não isolado, mas como parte de um conjunto de ações a serem
desenvolvidas paralelamente pelas demais áreas. Seu objetivo é destacar e ressaltar para
as pessoas que circulam no local quais são as edificações tombadas existentes no percurso,
e sua importância histórica e cultural, motivo de seu tombamento. A colocação dos totens
físicos torna isso possível chamando atenção e despertando a curiosidade.
A intenção é que o projeto piloto para a Rua Halfeld, Juiz de Fora (MG), possa servir
de base para um projeto ainda maior de conscientização e valorização da cultura local, e
que possa ser estendido para todos os pontos de interesse patrimonial da cidade.
Referências
CANDAU, Joël. Memória e Identidade. Tradução: Maria Letícia Ferreira Mazzucchi. São
Paulo: Contexto, 2011.
NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Projeto História.
Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de História
da PUC-SP, n. 10. São Paulo, dez. 1993.
RESUMO
Com o intuito de fortalecer os sentimentos de identidade e de cidadania da população cuiabana, a
Superintendência Estadual do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Mato Grosso –
SE/IPHAN-MT, através de uma postura mais educativa, de diálogo, de reconhecimento e de proteção
do patrimônio cultural, promoveu ações de educação patrimonial paralelamente às suas frentes de
atuação. Dentro de um contexto dinâmico, de trocas de experiências, de vivências, de
experimentações e de esclarecimentos à sociedade, a Superintendência iniciou no mês de março de
2017, um evento denominado Roteiro pelos Templos Sagrados do Centro Histórico de Cuiabá/MT.
Essa atividade faz parte de uma série de ações em comemoração ao aniversário de oitenta anos do
Instituto, neste ano de 2017 e tem como objetivo, a apresentação e a visitação das principais
construções religiosas que se encontram dentro da poligonal de tombamento do Centro Histórico de
Cuiabá – MT e de seu entorno, são elas: Igreja do Rosário e Capela São Benedito, Igreja do Nosso
Senhor dos Passos, Igreja da Boa Morte, Basílica do Senhor Bom Jesus de Cuiabá e a Igreja
Presbiteriana de Cuiabá. Esses lugares cujo seus usos atribuem significado. A importância desses
lugares repousa na compreensão de que eles são importantes na vida social de grupos de habitantes
da cidade e por fazerem parte de círculos simbólicos que os definem por representarem a
espiritualidade, ou seja, a proximidade com o divino representada por essas construções religiosas.
O roteiro histórico dos templos sagrados da capital localizados dentro da área tombada do
Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico de Cuiabá e de seu entorno foi lançado
em abril de 2017, em comemoração aos 298 anos da cidade. O material gráfico
compartilhado nessa edição do evento foi elaborado pelos estagiários em Arquitetura e
Urbanismo do IPHAN/MT. O modelo do percurso, a exemplo de dois outros roteiros também
aplicados pela Superintendência, baseou-se na narrativa da história da cidade contada a
partir de exemplares arquitetônicos e do traçado urbano remanescente.
A divulgação e a inscrição do evento foram realizadas em meio virtual. Para isso, foi
disponibilizado às instituições de ensino ou de classe interessadas, um formulário eletrônico
vinculado à um endereço de e-mail utilizado durante o evento. Pelo formulário, o participante
efetuava sua inscrição online e posteriormente recebia a confirmação de sua inscrição por e-
mail, juntamente com o roteiro digitalizado. Feita e confirmada a inscrição, o interessado
comparecia ao local no horário e na data previamente marcados para iniciar o itinerário
histórico e conhecer parte da arquitetura religiosa cuiabana.
A aplicação do roteiro iniciou-se por uma rápida palestra sobre a instituição e um resumo
histórico sobre o surgimento da cidade e dos espaços sagrados, objetos da visitação. Essa
apresentação foi realizada na sede da Superintendência de Mato Grosso, em Cuiabá. Para
elaborar a apresentação do histórico das construções, realizou-se um levantamento
bibliográfico de publicações de autores locais e de documentos do arquivo da
Superintendência. Feita a construção textual e documental do material, gerou-se um arquivo
digital do roteiro para distribuição aos participantes via e-mail. Finalizada a parte teórica do
produto, os participantes foram convidados a percorrer trecho do centro histórico cuiabano
até os templos selecionados, dos quais 2 são tombados pela União – um em conjunto e
outro isoladamente, na capital mato-grossense e os demais encontram-se na área de
entorno do conjunto tombado. Para visitar o interior das igrejas e dos templos, a
Superintendência realizou contato prévio formal com as suas respectivas administrações, a
fim de obter a autorização para acessar o espaço. A proximidade entre esses imóveis e a
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sede da Superintendência foi um fator decisivo para a aplicação do roteiro. Durante o
percurso, o participante caminhava por diversos casarões de diferentes períodos históricos e
logradouros públicos que contam parte de história de formação da cidade.
Finalizado o trajeto inicial, a primeira parada feita pelo grupo foi na Igreja do Rosário e
Capela São Benedito, localizada na Praça do Rosário e considerada um dos cartões postais
da cidade, especialmente por ser o primeiro templo religioso edificado em solo mato-
grossense, construído na década de 1730. O imóvel já passou por diversas reformas, que
lhe atribuíram mudanças de estilo arquitetônico desde a época de sua construção, sendo a
mais recente delas ocorrida no ano de 1975, quando foram resgatadas as suas
características barrocas originais. O prédio permanece assim até os dias atuais. Foi também
no ano de 1975, que a igreja foi tombada isoladamente pela União. Sendo o primeiro
tombamento federal na capital.
A segunda igreja visitada foi a Igreja do Nosso Senhor dos Passos, cujo primeiro registro
que se tem notícia data de 1816. O imóvel apresenta características construtivas do período
colonial, tais como alvenaria de terra crua, piso de ladrilhos hidráulicos, cobertura de telha
de barro, ou telha de coxa, como é conhecida popularmente.
A próxima construção religiosa visitada durante o roteiro foi a Basílica do Senhor Bom Jesus
de Cuiabá, outro símbolo da cidade. Originalmente, a atual basílica, era uma capela de pau
a pique no momento de sua construção em 1722. Passou por cinco modificações completas
até ser totalmente demolida em 1968 (demolição esta que até os dias de hoje dói nos
corações cuiabanos). O atual prédio foi inaugurado em 1973.
A visita foi finalizada na Igreja Presbiteriana de Cuiabá, prédio construído no século XX, cuja
fachada revestida de tijolos aparentes se destaca em meio aos prédios comerciais
espremidos da rua 13 de Junho.
De se esclarecer que embora o roteiro contemple a Igreja da Boa Morte, o acesso ao local
não foi autorizado pela administração, pois a igreja só abre durante a realização das missas,
em um ou dois dias da semana, no período matutino. Nos demais dias, não havia
disponibilidade de pessoal para abrir o local e acompanhar o grupo.
O público desta vez era diferente, compostos por estudantes de faixa etária inferior ao
primeiro grupo, cujo interesse e a percepção do espaço, dos lugares e da arquitetura eram
muito particulares, talvez pelo pouco conhecimento que se tinha sobre os objetos e a
cidade. O grupo, subdividido em outros pequenos grupos se dispersaram dentro dos
espaços, cada qual, fazendo sua própria apropriação e experimentação do lugar.
A Unidade, por fim, promoveu o diálogo com seus pares e seus colaboradores, a partir da
troca de conhecimentos e de parcerias para a proteção e valorização desses bens no
estado de Mato Grosso.
Não se sabe a data exata de sua construção. É provável que seja da década de 1730. O
seu primeiro registro iconográfico aparece no prospecto da Villa do Bom Jesus de Cuiabá de
1790. No início do século XX o templo passou por reformas, com a terminação da torre em
uma cúpula de meia laranja. Na década de 1920, foi acrescentada uma fachada neogótica.
Entretanto, com o tombamento federal em 1975, sua fachada foi reconstruída baseada em
imagens iconográficas anteriores, representando a torre em forma de ogiva.
E ainda, quando menciona a construção de das três primeiras igrejas em Cuiabá, Lacerda
(2008, p. 78) diz que
O documento oficial mais antigo que trata da construção desse templo data de 5 de maio de
1792, sendo concluída somente em 1816, com a planta típica das igrejas do período
colonial. Segundo Conte (2006, p. 268)
A história de sua construção é muito peculiar. Conta-se que Joaquim Moutinho, cidadão
cuiabano, após ser acometido por um ataque de catalepsia, foi considerado morto e
sepultado, mas levantou-se da sua cova com suas vestes mortuárias. Devoto do Senhor dos
Passos, o cidadão passou a angariar fundos para a construção da atual igreja.
Abaixo, na Figura 02, a fachada principal da Igreja Nosso Senhor dos Passos.
Figura 02: Igreja Nosso Senhor dos Passos. Fonte: IPHAN-MT, 2017.
Conforme Mendonça (1978, p. 21) “Mais tarde a capela do senhor dos Passos foi reformada
e ampliada pelo Bispo Dom Carlos Luiz d’Amour. Nessa Igreja está sepultado o Padre Wanir
Delfino César, que foi presidente da Academia Mato-grossense de Letras, falecido em
Cuiabá, no dia 13 de Julho de 1972.”
Figura 03. Basílica Nosso Senhor Bom Jesus de Cuiabá. Fonte: Hirata, A. 2016.
[...] possui paredes estruturais em taipa de pilão, com espessuras entre 0,20
e 1,00m. Posteriormente foram utilizados adobes em algumas partes. Seu
alicerce é em pedra canga. A fachada frontal, com conformação típica das
igrejas barrocas, foi remodelado, assumindo característica de estilo
neoclássico, com linhas retas pilastras salientes e poucos elementos
decorativos. Apresenta cimalhas, que juntamente com as pilastras delimitam
os espaços em três partes: o corpo central, formado pela nave e as laterais
formadas pelos corredores.
Já Mendonça (1978, p.25) descreve que “possui a igreja três altares, sendo o altar-mor todo
novo, feito de madeira e pintado de branco a óleo, com frisos dourados. Foi acabada em
1864 por meio de esmolas que pediu a irmandade.”
Segundo Conte (2005, p36), “Situada a Rua 13 de Junho, foi o primeiro templo evangélico
de Cuiabá. Teve sua pedra fundamental lançada a 7 de Setembro de 1921. Gracioso templo
de tijolos a vista, encontra-se sufocada pelas grandes construções de seu entorno.”
Considerações Finais
Ao aliar atividades de rotina da área finalística com um passeio educativo e histórico pelo
casario, ruas e igrejas históricas de Cuiabá, a Superintendência Estadual do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Mato Grosso buscou meios para atender um
anseio local de atividade cultural ao tempo em que trabalhou a divulgação e a promoção da
história e da memória da arquitetura religiosa da capital.
A oportunidade de dialogar com os atores dentro de um espaço, que só pelo fato de existir,
é capaz de narrar a aspectos da história local, resultou em democratização e socialização
de conhecimento, ampliação do olhar sobre a arquitetura dos espaços públicos, coletivos.
Compreende-se que o patrimônio cultural deve ser pensado sob a ótica do acolhimento dos
mais diversos tipos de público, a fim de trabalhar com a perspectiva da interpretação
(fruição0 para a educação do patrimônio com fins de preservação.
A consciência histórica para Meneses (1984) seria uma forma de se esclarecer o caráter
ambíguo existente entre os termos identidade e memória, a partir dela a noção de
identidade rompe com a rigidez “Ter consciência histórica não é informar-se das coisas
outrora acontecidas, mas perceber o universo social como algo submetido a um processo
ininterrupto e direcionado de formação e reorganização [...]” (MENESES, 1984, p. 34).
Referências Bibliográficas
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demolição.Cuiabá: KCM, 2005. 160p.
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128f. Monografia. Departamento de Arquitetura e Urbanismo, UFMT, 2002.
SIQUEIRA, E.M. [et al.] (org.). Cuiabá: de vila a metrópole nascente. Cuiabá: Entrelinhas,
2006.
1. Belo Horizonte/MG
janumurta@gmail.com
RESUMO
Texto do resumo: Para o título ‘RESUMO’, use fonte Arial de tamanho 10 em negrito com espaço
simples. Para o texto do resumo, use fonte Arial tamanho 10, com espaçamento entre linhas simples,
sem parágrafos, fórmulas ou referências bibliográficas.
Os ofícios tradicionais relacionam-se diretamente com hábitos tradicionais, com (re) significação e (re)
valorização por meio de sua perpetuação. No município de Araújos, por exemplo, o saber fazer o
chapéu de palha de cambaúba sofre com escasseamento da produção, e possível extinção. Além da
dificuldade de encontrar a espécie de bambuzinho, a cambaúba, a principal representante do ofício
faleceu no ano de 2012. Relacionado diretamente com a memória afetiva coletiva local, o ofício é
rememorativo uma vez que remete a tempos idos, resguardando ainda conhecimentos populares
acerca da produção da palha, como o processo de trançar, moldar, costurar. Remete a civilizações
passadas, com significâncias que remetem ao valor cultural, social, político, individual, sendo ainda
forma de comunicação (poder, sedução, intimidação), além da parte funcional (proteção de batalhas,
mau tempo, sol, chuvas, etc) e simbólica (resguarda a parte mais importante do corpo, a cabeça, o
pensamento, resguardando-o de forças hostis, ou reafirmando-o ao deixa-lo em destaque). Na região
citada, outro saber pode também ser citado, esse que interfere significativamente na paisagem local:
as caieiras e olarias. Espaços erguidos em tijolos cerâmicos maciços, com sistema de aquecimento
de remete ao conhecimento egípcio, passam por processo de abandono e ausência de proposições
de novos usos. Além de documentar, como propiciar a perpetuação de tais saberes?
Pode-se afirmar que patrimônio cultural é tudo que referencia o lugar onde vivemos, e este
propicia às gerações futuras conhecer seu passado, tradições, histórias, costumes, cultura.
Referencial de identidade, o poder de posse de narrar a própria história é essencial para a
associação e reconhecimento do lugar, que concedem ferramentas contra o esquecimento,
além de possibilitar, por meio da memória coletiva, coesão do grupo e sentimento de
pertença.
O presente artigo enfoca saberes tradicionais do território mineiro - o saber fazer o chapéu
de palha, tijolos e telhas cerâmicas, e cal – que correm risco de extinção frente
principalmente às mudanças tecnológicas, com possibilidade da alteração da paisagem
cultural existente. Esforços foram feitos para registro, proteção e preservação, mas como
transmitir e salvaguardar tal legado?
Desde a Era Neolítica cobrir a cabeça era costume, primitivamente em palha, servia para se
proteger do sol - apesar de tal material não perdurar, as provas do uso podem ser
verificadas em pinturas e demais representações. Há fontes que citam o surgimento do
chapéu - do latim, ‘cappa’/’capucho’, cobrir a cabeça – por volta de 4.000 a.C. no antigo
Egito, Babilônia e Grécia, como “faixas que prendiam e protegiam o cabelo”. Turbantes,
tiaras e coroas, símbolos de status social, foram usados por nobres, sacerdotes e guerreiros
– nos dias atuais algumas atividades ainda expressam o status por meio do chapéu, como
soldados, marinheiros e clero. (Martini, 201-). No caso do clero, a mitra, tiara, gorro, quepe e
o camauro são formas de cobertura, significando a ideia de Deus sobre a cabeça do
homem. (HISTÓRIA DO CHAPÉU, sd). Ainda referente ao status, escravos romanos eram
proibidos de usar o acessório e, quando libertos, chapéu cônico. Já na Idade Média, a
religião impunha às mulheres que cobrissem os cabelos, tornando o acessório obrigatório.
(Martini, 201-).
Todas as áreas delicadas do corpo deveriam ser protegidas e, por mais que o chapéu
tivesse inicialmente a função prática de proteção – proteger de batalhas, maus tempos, frio,
calor, etc -, possuíam a função simbólica de preservar ‘a parte mais nobre do homem, a
cabeça, o pensamento’. A cabeça, no contexto simbólico, é abrigo da alma e da vida,
possuidora de qualidades mágicas e o gesto de cobri-la pode expressar a necessidade de
protegê-la das ‘forças hostis’, ou mesmo enfatizá-la, dar visibilidade (talvez atrair a atenção
divina). (HISTÓRIA DO CHAPÉU, sd).
Amplamente conhecido, vale ressaltar o chapéu Panamá, de 1906, feito de palhas finas de
folhas secas de palmeira da espécie Ludovica que cresce na América Central.
Passado de geração a geração, Maria Rita de Lima, falecida em 07/03/2012, era a principal
representante executora do ofício e, por mais que existam conhecedores herdeiras do
saber, os chapéus não são mais fabricados.
O ofício está relacionado diretamente com a memória afetiva local, rememorativo de tempos
passados, bem como da antiga forma de sustento. Apesar de ainda valorizado, a morte da
principal mantenedora desestimulou os demais executores, com contribuição ainda da
dificuldade de obtenção da matéria prima – não há mais farta oferta de cambaúba, e a
produção controlada não concedeu bons resultados -, dificuldade de venda – anteriormente
as encomendas, essas de variadas regiões do Brasil, eram feitas presencialmente, assim
como a entrega, não havendo qualquer tentativa de modernização de tal processo que se
mostra defasado.
Além dos fatores supracitados, a industrialização pode ser citada como uma das
responsáveis pelo desaparecimento do ofício. Desde a segunda metade do século XIX tal
fator é apresentado como ameaça, tendo ainda como figura importante as mudanças
observadas nos principais usuários do artefato, os ‘roceiros’ e os violeiros. No segundo
caso, um chapéu adaptado, em uma das versões, deu origem à viola: ao visitar o menino
Jesus, um camponês lançou mão de uma casca de jacarandá usada como chapéu, e de fios
do rabo de seu jumento, criando o instrumento. (Sombra; Lobo, 2015) Os primeiros
compositores e artistas do gênero caipira utilizavam-se do chapéu de palha, como Jararaca
e Ratinho, Tião Carreiro e Tonico e Tinoco. Já na década de 1980, a figura do roceiro foi
substituída pela do cawboy, surgindo também a figura de Almir Sater, encarnado
comumente pela dramaturgia como a “figura do violeiro”, este usuário de chapéu pantaneiro.
Talvez daí derive um desinteresse pelo artefato em palha, contribuindo para o
desparecimento de tal saber. Existiriam meios de incentivar a confecção e uso de tal
acessório?
A produção de artigos de barro pode ser considerada tão antiga quanto a humanidade,
sendo a oficina oleira uma das indústrias mais antigas, possivelmente oriunda do Período
Neolítico, com vestígios da queima do barro/terra de 7.500 a.C. (SEBRAE, 201-; PORTAL
DA ARQUEOLOGIA IBÉRICA, 200-; EBA/UFMG, 2015; CHAGAS, 2009a).
No mês de abril de 2010 a produção parou devido à dificuldade de conseguir matéria prima
(terra e lenha), mão de obra inconstante, e tecnologia defasada (atualmente há sistemas
automatizados mais eficazes). Apesar da cessão da produção, a estrutura é mantida.
Entretanto há uma preocupação acerca do destino da mesma, uma vez que o proprietário,
Ivo Amaral de Souza, faleceu em abril de 2017. Além da importância para a conformação da
localidade, a antiga fábrica de cerâmicas é parte da ocupação do território, referenciais
ainda da paisagem – imponentes, são identificadores coletivos. Locados na zona rural do
município de Moema, quais ações poderiam levar à efetiva preservação da estrutura, já sem
uso?
Os fornos, de planta circular com base mais larga que o topo, contavam com abertura
superior para saída de fumos. O forno era construído em desnível de terreno para possuir
duas aberturas: a inferior para permitir alimentar a fogueira, e a superior para entrada da
pedra. A pedra, após extração da pedreira, era limpa e partida com uso de martelos até
formarem blocos menores. (Cardoso, 2013).
CONCLUSÃO
Há ainda a questão da ambiência: o contexto no qual está inserido molda o jeito de ser e
estar no mundo. A aprendizagem perpassa, então, a incorporação da cultura, ‘como domínio
de modos culturais de agir, pensar, de se relacionar com outros e consigo mesmo.’ É
sensato afirmar, portanto, que a educação patrimonial é importante ferramenta na
afirmação de identidades. (Cadernos do patrimônio cultural: educação patrimonial, 2015).
Ainda conforme Santos (1998), defrontar com um local estranho, que não ajudou a criar,
cuja história desconhece, suja memória lhe é estranha, tal lugar é sede de alienação.
Importantes para a paisagem cultural, as estruturas supracitadas são parte da memória
coletiva das localidades em que estão inseridas, que abarcam cultura, simbologias, valores
afetivos, e ideologias. A destruição de elementos com tal significância retira do sujeito
fatores que o identificam e o representam em determinado local, desvinculado o lugar do
sujeito e consequentemente tornando um lugar comum, sem interesse. A paisagem, além de
possuir elementos identificadores de um povo, caracteriza-se pela sobreposição de vários
momentos históricos, transformando em documento da própria historia da cidade e dos que
ali passaram.
Questiona-se por fim como preservar tais bens culturais aqui citados. Se, a priori, não existe
preservação do patrimônio cultural sem vinculá-lo à difusão, transmissão e apropriação,
devemos assumir que não temos maneiras concretas de propiciar tal proteção? E na
tentativa de manter as estruturas remanescentes, impor usos dispersos pela zona rural
culminaria com uma real e efetiva possibilidade de preservação e permanência?
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RESUMO
Desde a situação geográfica da cidade – uma faixa de terra entre o mar e a lagoa, até sua toponímia
que significa “o que tapou o alagadiço” - Maceió, capital de Alagoas, carrega em sua paisagem fortes
marcas que envolvem o espaço natural. Um dia, no seu começo, essa atmosfera foi repelida pelos
princípios higienistas. Mais tarde, justo o oposto, a orla marítima passou a ser apropriada pela
especulação imobiliária e pela Indústria do Turismo que fizeram dos traços geográficos uma marca
construída pelo Marketing. Nesse processo, alguns cantos, por um tempo, se mantiveram salvos das
interferências drásticas da urbanização, se construindo a partir de gestos lentos, que rendeu a
permanência de casas de farinha, de ruas desencaminhadas e despavimentadas - como os bairros
Garça Torta e Riacho Doce, a 10 km da capital no sentido de seu litoral Norte. Nas últimas décadas,
esses parênteses urbanos têm atraído um outro habitante, o que percorre o lugar em busca de um
ambiente distinto da “cidade grande” e de sua feição padronizada. Diante desse contexto, este artigo
consiste na apresentação de uma experiência lúdica como método para acessar a história do lugar,
visando o registro e a socialização de um conhecimento baseado na empiria e na oralidade de
famílias de moradores que por gerações participaram da construção daquela paisagem com suas
próprias naturezas. Tal experiência consistiu em uma contribuição para a historiografia de dois bairros
no limiar de drásticas mudanças em suas feições físicas e, por extensão, em suas relações
cotidianas. Além disso, os produtos da pesquisa constituem-se, especialmente, um resultado de
exercício de outros mecanismos de identificação de um rico conteúdo silencioso e invisível,
funcionando como uma ferramenta incitante de relações de pertencimento entre os habitantes e o
próprio lugar que ele habita, na medida em que favorece o compartilhamento de histórias e
memórias, com potencial de uso enquanto instrumento de patrimonialização.
Dentro deste contexto de expansão, situa-se o seu Litoral Norte. Região da Cidade
onde as áreas próximas ao mar ainda costumam apresentar hábitos tradicionais voltados
para a subsistência, além de conter fragmentos de paisagens não urbanizadas, como as
praias margeadas por coqueiros, fozes de rios e riachos e manguezais. É comumente
conhecido como uma área distanciada do centro urbano, provida de praias de águas claras
e mornas nas marés baixas, pelas práticas pesqueiras e artesanais exercidas nos povoados
situados entre as extensas faixas de coqueirais à beira-mar e as grandes glebas de árvores
frutíferas às margens da Rodovia AL 101 Norte.
A cidade muda. Dentre as mudanças mais visíveis está a expansão. Muitas delas
são lentas e associadas ao próprio movimento dos habitantes de um lugar. Outras
acontecem de forma bastante bruta e, na maioria das vezes, é resultado de iniciativas
externas à dinâmica local. No cerne dessa última situação encontra-se a especulação
imobiliária, que, aliada a uma aparente ausência de orientação ou fiscalização pública
acerca das questões paisagísticas, se impõe no espaço tendendo a atuar isoladamente e,
assim, desconsiderar formas de viver que o caracteriza. Nesse processo, o lugar consiste no
meio de interação e propagação das atividades humanas, o qual se modifica pelas ações
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humanas e, em outros momentos, é o próprio homem que se adapta a este, continuando
relações estreitas entre ambos. Sendo objetos de um complexo sistema, o lugar acaba por
refletir a cultura e fazendo parte de suas criações.
O contato com a literatura acerca da memória indicou não apenas modos de acessá-
las, mas também de aproximar de discursos sobre Narrativas. Na obra O Narrador, Walter
Benjamin (1994, p. 201) apresenta o papel das narrativas como uma forma de transmitir
experiências, seja a sua própria ou a relatada por outros.
No campo das narrativas foram reconhecidas duas maneiras por meio das quais as
experiências poderiam ser transmitidas: da palavra (oral ou escrita) e da imagem. De acordo
com o quadrinista Norte Americano Will Eisner, “uma ‘imagem’ é a memória de um objeto ou
experiência gravada pelo narrador fazendo uso de um meio mecânico (fotografia) ou manual
(desenho)”. (1996, p. 19) Sua referência é fortemente ligada às histórias em quadrinhos, que
normalmente utilizam o recurso da representação gráfica para facilitar o entendimento da
narrativa.
Então, acessar o passado, a memória de um lugar, é também uma ação para o futuro,
especialmente no contexto da contemporaneidade em que impera o indivíduo enquanto
consumidor de coisas e paisagens sem o interesse em realmente percebê-las:
Benjamin (1994) fala sobre a falta de tédio e em como estamos perdendo o dom de ouvir
nas grandes cidades, no nosso estilo de vida repleto de entretenimentos. Então, para
acessar é preciso observar, silenciar e ouvir.
O objeto foi composto por depoimentos, sínteses gráficas e escritas das impressões
das experiências e de material audiovisual coletado durante imersões nos bairros, o qual
trata de registros da paisagem natural e edificada e também dos movimentos dos
habitantes, bem como das próprias entrevistas. Foram considerados neste estudo seis
depoentes que nasceram entre os anos de 1920 a 1945 e dez entre os anos de 1955 a
1975. As entrevistas com os habitantes do primeiro grupo, nascidos entre 1920 a 1940,
foram feitas de forma livre e não cronometradas, apenas foi perguntado sobre as memórias
mais antigas e marcantes que eles têm do lugar e deixou-se que os assuntos fluírem. Quase
todas as conversas foram feitas em coletivo, grupos de três ou duas pessoas dialogando
sobre as lembranças do passado. Todas as conversas foram registradas através de áudio
ou vídeo.
Para o grupo dos habitantes nascidos entre 1955 a 1975 algumas entrevistas e
conversas aconteceram a partir da mostra de uma representação da base cartográfica dos
dois bairros para que eles pudessem apontar ou representar graficamente as suas
memórias espacialmente. Nesse segundo grupo, dentre os 10 entrevistados só três
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utilizaram a referência da base cartográfica, alguns preferiram registrar suas lembranças às
margens do mapa ou nele discretamente interferir como setas e marcas, outras, com maior
entusiasmo, preferiram voluntariamente desenhar e anotar suas memórias com mais
detalhes. O registro dessas memórias mostrou o quanto os bairros foram modificados ao
longo dos anos. Pois, muitos dos aspectos ambientais e sociais descritos nos seus relatos,
hoje só existem por meio das lembranças compartilhadas.
Como dar forma com esse emaranhado de dados? Como torná-los audíveis? Como
num movimento de bordado, foram feitas, para tanto, ponto a ponto, costuras entre as
conversas, entre as memórias, entre os desenhos, os retratos e os textos, relacionando
similaridades e destacando peculiaridades, fatos curiosos e descrições recorrentes. Assim,
esses bordados englobam os lugares - os que persistiram no tempo e aqueles que já não
são mais mencionados -, as pessoas e seus costumes, os cânticos, as brincadeiras, as
danças, os festejos, as tradições: experiências para compartilhar e divulgar as memórias de
habitantes dos bairros de Garça Torta e Riacho Doce.
“Na Pitombeira era o pessoal do César. Joca, tio Dé. Joca, era tudo dele.
Depois era da Maria César. Depois vinha o seu Zunga, era depois da
minha mãe. Da minha mãe até o tio Dé, entrada da balança por ali, era
do meu pessoal, dos irmãos da minha avó. Tio Joca, tio Dé.” - João
Batista Barbosa, aos 89 anos, 2016.
As descrições sobre os habitantes dos bairros foram seguidas por descrições sobre suas
moradias, entre as casas de taipa e palha, os chalés e os casarões. Os detalhes descritos e
os desenhos acessados ajudaram a compor não só na localização das informações na
síntese gráfica, mas também na criação dos ícones e dos traços para representá-los.
“As casas eram bem simples: Taipa, palha e uma ou outra de tijolo. Rua
São Pedro era de barro, mas não havia esgoto a céu aberto, as pessoas
cuidavam da frente de suas casas e dava prazer passear e/ou brincar na
rua. Época de grande satisfação. As crianças brincavam naquela rua de
minha infância com tranquilidade (esconde-esconde, queimado, pega,
etc). […] A comunidade de Garça Torta já contava com a Igreja São
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Pedro, onde participavam das missas, dos terços, das novenas e da
organização da procissão. ” Verônica da Silva Barbosa Pereira, aos 54
anos, 2016.
Figura 02 - Colagem de fotografias das sínteses escritas e gráficas construídas para a socialização
dos conteúdos acessados por meio das memórias dos habitantes dos bairros de Garça Torta e
Riacho Doce. Fonte: Acervo autoral, 2017.
Figura 03 - Colagem de fotografias da primeira experiência dos Bordados. Fonte: Acervo autoral,
2017.
Essa experiência permitiu-nos perceber que uma mesma lembrança vai ter sempre
uma duração e sons variados: o ritmo e o tom do Narrador. Algumas memórias vão soar
altas, claras, ecoar. Outras vão soar baixinho, tímidas. Nessa primeira experiência, em
nenhum momento foi mencionado algo sobre competição, mas quem estava mais cartas era
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o “ganhador”, quem estava com menos “estava ficando para trás”. O interessante é que o
fato de ter em mãos uma quantidade inferior de Cartas do que os demais participantes criou
um ar de competitividade. Ao mesmo tempo em que durante toda a experiência eles
ajudaram-se muito: a encontrar os Pontos, a pregar o alfinete, a passar a linha, a pronunciar
corretamente as palavras desconhecidas, entre outros.
Portanto, essa experiência em muito contribuiu para dissolver ideias binárias tais
como natural e edificado, velho e novo, material e imaterial, temas cuja conceituação vem
sendo um exercício constante das ações do Iphan, o qual tem se mostrado cada vez mais
atento ao desafio de como compatibilizar as inevitáveis mudanças da paisagem e preservar
a sua dinâmica particularizada, a exemplo das ações de educação patrimonial e das
inúmeras ações voltadas para o mapeamento das referências culturais.
__________, Walter. Excavation and Memory. In:_________. Selected Writings: Vol. 2, part
2 (1931–1934). Tradução de Rodney Livingstone. Edição por Marcus Bullock, Michael W
Jennings, Howard Eiland e Gary Smith. Cambridge, Massachusetts: The Belknap Press of
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Memories of Refugees. [S.l.: s.n]. Disponível em:
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Diretor de Maceió, Maceió. 2015. Disponível em:
<https://issuu.com/abraceagarca/docs/documento_a-garca-que-quermos-modif>. Acesso
em: 15 jan. 2017.
SILVA, Maria. Solicitação De Tombamento De Trecho Dos Bairros De Garça Torta e Riacho
Doce. Maceió: [s.n.], 2015.
1. UDESC - Universidade do Estado de Santa Catarina. Centro de Educação Superior do Alto Vale do
Itajaí - CEAVI. Departamento de Engenharia Sanitária. Rua Dr. Getúlio Vargas, 2822 - Bela Vista -
Ibirama - SC CEP: 89.140-000
E-mail : 1. helenne.geissler@udesc.br , 2. mara-ju@hotmail.com , 3. marlene666@gmail.com
RESUMO
Ibirama integra a região do Alto Vale do Itajaí no Estado de Santa Catarina. Localiza-se a uma
latitude 27º03'25" Sul e a uma longitude 49º31'04" Oeste e 150 metros acima do nível médio do mar.
Foi colonizada a partir do final do século XIX, mas também recebeu muito imigrantes durante o século
XX. O município preserva na arquitetura, na culinária, no artesanato, no idioma, esportes, música,
folclore, costumes, hábitos, dentre outros o legado dos imigrantes alemães, austríacos, italianos,
poloneses, dentre outros, através de seus descendentes. A antiga colônia Hammonia, que já foi
distrito de Blumenau possui uma áreas de 247,3 m² e possui cerca de dezoito mil habitantes. Situa-se
encravada em vales com declividade acentuada, sendo entrecortada por rios caudalosos com
corredeiras e razoável extensão de florestas nativas preservadas. Há diversas comunidades
abrangendo patrimônio cultural preservado (arquitetura enxaimel), habitantes fluentes nos idiomas de
seus ancestrais a exemplo de Sellin, Dalbergia, Rafael, Ribeirão das Pedras e outras. Neste contexto,
pratica-se caminhadas ao ar livre na floresta (wandern), ciclismo, tirolesa, rapel, raffting, dentre outros
esportes radicais. Permanecem ainda os clubes de caça e tiro amadores, clubes de bolão, corais,
grupos folclóricos adulto e infantil bandas musicais.Merecem ser valorizados os conhecimentos dos
habitantes e documentá-los, seja a memória, os saberes e suas diversas interfaces, o idioma e os
dialetos, as canções, as receitas, fabricação dos produtos caseiros, Kuchen (bolos), geléias,
conservas como Sauerkraut (chucrute), cervejarias artesanais, cultivo de uva e produção de suco e
de vinho, o artesanato, os lugares, métodos construtivos, conhecimentos de restauro de edificações
enxaimel, energias limpas como as rodas d´água, engenhos e moinhos, nas festas, nos pic-nics, os
bailes, cultivo de trutas e outros. A ideia é de que os saberes se propaguem e se perpetuem no
tempo e que sejam replicadas através das gerações e para os turistas. A proposta visa resgatar e
valorizar o legado cultural através da gastronomia, da arquitetura, valorizar o idioma, esportes,
música, folclore, costumes, hábitos, dentre outros aspectos. A metodologia inclui pesquisa
bibliográfica, trabalhos em campo, entrevistas e reuniões com as comunidades no meio urbano e no
rural, registros fotográficos das ações, registro do modo de fazer documentando os saberes
tradicionais dos habitantes. Espera-se gerar materiais de divulgação e publicações, promover oficinas
com crianças, adolescentes, adultos e idosos visando integrar as diversas gerações, promover a
educação patrimonial e gerar multiplicadores do patrimônio.
1. Introdução
2. Referencial Teórico
Para IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (2017) consiste em bens
culturais e referem-se a práticas e domínios da vida social, cuja manifestação abrange
saberes, ofícios e modos de fazer; celebrações; formas de expressão cênicas, plásticas,
musicais ou lúdicas; lugares (mercados, feiras e santuários onde ocorram práticas culturais
da coletividade). Os artigos 215 e 216 da Constituição Federal de 1988 ampliaram a noção
de patrimônio cultural ao reconhecerem bens culturais materiais e imateriais.
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2.1 Patrimônio Imaterial
As ações do IPHAN neste contexto incluem meios para reconhecer, registrar e preservar
bens culturais Imateriais, inclusive a nível lingüístico e identidade de grupos.
O IPHAN (2017) protege o conjunto de bens culturais conforme natureza, quatro Livros do
Tombo: arqueológico, paisagístico e etnográfico; histórico; belas artes; e artes aplicadas. Os
supracitados artigos 215 e 216 da Constituição Federal de 1988 expandiram a noção de
patrimônio cultural, reconhecendo bens culturais materiais e imateriais e contemplou outras
formas de preservação a exemplo do Registro e do Inventário, além do Tombamento, vide
Decreto-Lei nº. 25, de 30 de novembro de 1937, adequado para proteger de edificações,
paisagens e conjuntos históricos urbanos.
3. Método
No nível Inicial ocorre a alfabetização na língua alemã, possibilitando em nível básico a ler,
ouvir, entender e melhorar a comunicação. Na fase intermediária do curso foca-se no ensino
comunicativo, e o material didático é dividido em lições que trabalham todas as habilidades:
HÖREN-SPRECHEN-LESEN-VERSTEHEN-SCHREIBEN,nos moldes dos formatos das
questões do exame mencionado acima. O papel do professor neste processo é ser
MEDIADOR, como enfatizou Vygostsky: ' sujeito é interativo, pois adquire conhecimentos
com base nas relaçoes INTER e INTRApessoais de troca com o meio, por intermédio de um
processo chamado mediação.' o professor é aquele que defende mais experiência, intervém
e media a relação do aluno com saberes socialmente construídos.
O curso atual é uma ampliação da proposta inicial, sendo dirigida a viagens ao exterior,
composto de sete unidades que revisam estruturas e vocabulário básico para programar
uma viagem ao exterior, fazer sugestões de roteiros, planos de viagem, pedir informações
sobre localização de pontos turísticos, hospedagem, ler horários de trens, folhetos de
agências de viagem, verificar conexões de trens. Visa fornecer condições para pedir e
entender informações sobre o tempo, turísticas, preenchimento de formulários em
aeroportos e hotéis, escrever SMS simples, conseguir expressar-se sobre estado de saúde,
em emergências, preferências e resumir viagem a colegas, cantar músicas.
O curso também visa preparar os alunos para a Prova de nível A1 e nível A2 do Goethe
Institut, Test DaF - Deutsch als Fremdsprache (Teste de alemão como língua estrangeira).
Ibirama integra a região do Alto Vale do Itajaí no Estado de Santa Catarina. Localiza-se a
uma latitude 27º03'25" Sul e a uma longitude 49º31'04" Oeste e 150 metros acima do nível
médio do mar. Foi colonizada a partir do final do século XIX, mas também recebeu muito
imigrantes durante o século XX. A antiga colônia Hammonia, já foi distrito de Blumenau
possui uma áreas de 247,3 m² e possui cerca de dezoito mil habitantes. Situa-se encravada
em vales com declividade acentuada, sendo entrecortada por rios caudalosos com
corredeiras e razoável extensão de florestas nativas preservadas. Há diversas comunidades
4. Resultados preliminares
4.1 Paisagem
O verde era uma tônica. Havia o pasto sempre verde associado a casa e o jardim como
complemento com valor era o visual magnífico. Paisagem, florestas e pastagens verdes
Este foi o retrato do Vale do Itajaí no século XIX na visão do médico e escritor húngaro
Alexander Lanard imigrado para a região e que durante muitos anos redigiu o livro Die Kuh
auf dem Bast (A Vaca no Pasto), Alexander Lanard apud Wiese (2007).
Andreas Kinas (1997) concorda que a flora era muito exuberante. A região do Alto Vale do
Itajaí avicinava-se com as florestas, que tinham inclusive muito animais selvagens.
Wiese (2007) descreve que para os imigrantes europeus havia muito a aprender com os
silvos, cantos, pios, enfim a música da floresta. Ao mesmo tempo, verifica-se desde esta
época iniciativas para conhecer a dinâmica das águas, uso do solo, ventos,
acompanhamento das condições meteorológicas.
Oberacker (1985) apud Wiese (2007) citam que no entorno das casas, sobretudo, as alemãs
havia pomar com árvores frutíferas, horta caseira e belissimos jardins com flores. A floresta
virgem contrastava com as flores silvestres, cujas cores e perfumes eram fora do comum e,
também, pelas flores provenientes da Europa que britaram e floresceram de sementes
trazidas da Alemanha. Nas proximidades, seja na lateral ou fundos das residências haviam
estrebarias. Os imigrantes criavam gado. Aliás, esta atividade persiste até a atualidade e
alimenta o setor leiteiro, frigoríficos e curtumes, dentre outras.
Otto Wille (1994) reitera as descrições de Wiese (2007) mostrando que em 1905 havia
muitas dificuldades os imigrantes tiveram que aprender a construir, abater árvores e produzir
tábuas. Faziam a taipa com barro, palha que eram lançada em trama feita com folhas de
palmeiras, tranças de taquaras e cipós. A pintura disponível era a argila branca. Usava-se
assoalho em tábuas de madeira.
As casas dos imigrantes alemães utilizavam em geral o sistema construtivo enxaimel, mas
também alvenaria. No enxaimel as vedações podiam ser de alvenaria de tijolos sem o
reboco, ou alvenaria caiada, cobertura com tabuinhas, telhas ou chapas de zinco.
Oberacker (1985) apud Wiese (2007) por outro lado, as famílias de imigrantes cuja etnia era
italiana e suas casas possuiam características diferenciadas, em geral de madeira. Tinham
estufa de fumo e rancho para o gado. Em termos de uso o sótãos era utilizado para
dormitórios de filhos do sexo masculino, pois as famílias eram numerosas. Guardava-se
ainda objetos e móveis fora de uso.
Conforme Seyferth (2016) uma parte dos colonos assentados pela Hanseática vinha das
regiões coloniais mais antigas. Eram reimigrados de colônias mais antigas, seja do Rio
Grande do Sul. Piazza (1994, 1983) relata que também imigraram austríacos.
Wiese (2007) descreve que dentre os falantes do alemão vieram alemães, suiços, imigrados
para Ibirama vieram de regiões ao norte da Alemanha. Para Piazza (1994, 1969) os italianos
vieram do norte da Itália, em geral, das províncias do Trentino, Lombardia e Veneto. Vieram
também russos, tchecoslovacos e poloneses.
4.2 Gastronomia
De acordo com Wiese (2007) os imigrantes que chegaram a Hammonia no século XIX se
defrontaram com uma realidade diferente dos seus países de origem.
O primeiro impacto sentido em termos de gastronomia foi de que os pratos típicos não
podiam mais ser preparados como suas receitas originais. Isto se deve a diversas razões,
ou não havia disponibilidade de ingredientes, ou não tinham dinheiro para adquiri-los.
Couto, Heneault e Aguiar (2017) mostram que a gastronomia do norte da Alemanha abrange
muitos estados cuja economia há muito tempo é baseada na agropecuária e na pesca. a
costa do Mar do Norte e do Mar Báltico. O turismo é atividade relativamente recente e como
tal utiliza muito os peixes e frutos do mar no cardápio. Destacam-se pratos típicos do Norte,
como o Frinkenwender scholle (peixe da família do linguado marinado no sumo de limão e
frito) e a famosa Aalsuppe (sopa de enguia defumada).
O modo de preparação dos pratos depende da região de origem. A Aalsuppe pode ser
preparada com batatas em caldo de carne, cebolas em purê, cenoura e salsão em tiras e
filés de enguia defumada, servindo-se com folhas de manjerona na Ilha de Rügen. A mesma
sopa em Hamburgo inclui ameixas e damascos secos, vinho branco, bouquet garni,
aspargos, ervilhas e também toucinho.
Há outras receitas típicas da região como Birnen, bohnen und speck: do Estado de
Schleswig-Holstein (presunto defumado e temperado servido com ervilhas, peras com
batatas salteadas. O Frinkenwender scholle de Hamburgo (peixe marinado frito
acompanhado de bacon, cebola e batata cozida. Gefüllter kohlkopf (couve-portuguesa ou
branca recheada com carne de porco moída ou bacon cozida com temperos, servida com
molho branco, batatas cozidas e miolo da couve. Pfannfisch (omelete de pedaços de peixes
com carne branca, ou bacalhau ou salmão com servidos com cebolas douradas na manteiga
e batatas na frigideira e com picles de pepino.
Outros pratos são o Lammrücken mit kräuterkrutse (lombo de cordeiro com crosta de ervas),
o Heidschnuckenkeule in sahen (lombo de cordeiro com molho cremoso) e o Gefüllte
Heidschnuckenhaxen (pernil de cordeiro recheado) típico da Frísia no extremo norte de
Schleswig-Holstein, Schwarzsauer von Gänsenklien ganso ensopado com peras no prato,
Gänseleber im Steintopf mit Sauerkraut ganso com fígado cozido com chucrute típicos da
Pomerânia, pratos com peixes de água salgada, enguia, arenque, linguado e salmão e
frutos do mar, como ostras, camarões, lagostas e conchas diversas na região de Bremen e
Cuxhaven, Baixa-Saxônia, Kiel, Schleswig-Holstein e Hamburgo.
Houve reações dos imigrantes, que não adaptando-se ao cardápio brasileira conforme relata
Kinas (1997) começaram a buscar outras fontes de proteínas através da caça. A carne de
caça de vários animais foram incluídas nas aventuras na floresta, que tinha flora e fauna
muito abundantes. As caçadas incrementaram a culinária com abundância e variedade de
pratos elaborados com a carne de mamíferos e de aves, a exemplo, de macacos, pacas,
tatus, javalis, veados, antas macucos, principalmente as grandes como a jacutinga.
Dentre os imigrantes cujo idioma fosse o alemão era a bebida mais apreciada. Ao mesmo
tempo consumia-se cento e cinquenta mil garrafas de cerveja ao ano, ainda que a situação
econômica fosse difícil. Por outro lado, os imigrantes falantes do idioma italiano apreciavam
mais o vinho. No entanto, o vinho era escasso, pois não havia vinícolas próprias. A
alternativa que ocorreu foi a produção e consumo de cachaça.
As receitas típicas trazidas dos países de origem retornaram ao cardápio quando a colônia
estabilizou-se financeiramente. Tais saberes estavam registrados nos cadernos e livros de
receitas guardados em baús trazido pelos imigrantes. Em geral, os pratos típicos da
Apreciava-se muito o Kassler (bisteca de porco defumada e fritas na manteiga com vinho
branco servidas com Sauerkraut (chucrute repolho azedo), purê de batatas e ervilhas. O
Sauerbraten, elaborado com tatu carne verde, que permanecia de molho durante dias com
cebola, pimenta, toucinho e folhas de louro e coberta com leite azedo. Após a carne é
assada em panela e servida com gnocchi.
O IPHAN (2007) constata que a proporção da etnia alemã constitui o grupo mais
representativo no Estado de Santa Catarina e perfaz quase 40% dos descendentes. Os
descendentes de imigrantes italianos constituem quase 30% da população. Os
descendentes de imigrantes poloneses são quase 5% da população. O dossiê reconhece
que muitos dados podem ter sido sub-quantificados nos dados oficiais a respeito da
imigração, o que deve inevitavelmente ter implicado em erros.
Para Wiese (2007) os imigrantes de cada etnia forneceram a sua contribuição com outros
hábitos. Percebe-se que russos, tchecoslovacos e suiços estiveram muito integrados à
cultura alemã, por questões históricas européias.
Ferreira da Silva (1972) constatou que do fim do ano de 1874 em diante a imigração italiana
foi a preponderante. Muitos imigrantes aportaram. A origem dos mesmos a priori era do Tirol
austríaco, cujo idioma era italiano e alemão. Tais imigrantes chegaram motivados pelas
novas políticas governamentais brasileiras e por contratos com outros países. No entanto,
percebe-se que a imigração de italianos em um meio já fora previamente colonizado por
imigrantes alemães não ocorreu de maneira pacífica, gerando inúmeros conflitos.
Conforme Richter (1986) houve mais afluxo de imigrantes com a criação da Sociedade
Colonizadora Hanseática e convênio com o Governo de Santa Catarina. Tal convênio criou
quatro novos distritos coloniais integrando a Colônia Hansa, dentre estas; o distrito de Itajaí-
Hercílio: o maior e mais importante, situado no município de Blumenau. O referido distrito
cuja sede era Hammonia, nos dias atuais é o município de Ibirama.
Vieira (2008) aponta que ocorreu ainda migração interna no Brasil de imigrantes alemães e
italianos, que haviam se estabelecido em colônias em crise no estado de Santa Catarina e
dos estados do Paraná e Rio Grande do Sul, que mudaram-se para o vale do Itajaí.
Para Wiese (2007) ao contrário dos alemães os imigrantes italianos tinham outros hábitos,
por exemplo, fazer polenta com fubá de milho e a produção do vinho. Os italianos não
consumiam muito pão, ao contrário dos alemães. A polenta italiana era preparada com
queijo, linguiça e ovos. Havia também a menestra (mistura de feijão e arroz). O café da
tarde incluia bolinhos de trigo ou fubá cozido na banha e molhado no vinho, principalmente
se houvesse casamentos. Os imigrantes contribuiram muito com técnicas de conservação
dos alimentos, como as compotas, desidratação de frutas, salga e secagem de carnes ao
sol e também através de defumação. Quase todas as partes do porco eram defumadas,
gerando toucinho, costelinha, Eisbein. Costumava-se assar a carne e guardá-la na banha de
porco para conservar, manter a qualidade nutricional e o sabor.
4.3 Idioma
Wiese (2007) descreve que desde o início da colonização no século XIX, durante todo o
século XX e até os dias atuais o idioma alemão continua sendo uma língua falada, lida e
Nem todos os imigrantes teutos eram agricultores na Europa. Havia famílias que vinham
com recursos financeiros para investimentos e que podiam contratar mão-de-obra luso-
brasileira. O contato com o idioma português foi advindo do contato com nativos, caboclos e
brasileiros. As conversas iniciais entre idiomas tão distintos ocorreu através da mímica, após
aprendeu-se nomes de objetos, alimentos, locais, atividades, cores, dentre outros.
O modo de falar em Hammonia contribuiu para gerar neologismo regional da fusão entre o
idioma alemão e o português. Em geral, este fenômeno ocorre quando assimila-se muito o
idioma, a cultura, usos e costumes. Isto corroborou para unificar a linguagem, seja o
imigrante mais simples até o mais culto. Estes fatos contribuiram para formar o "germanês"
ou língua teuto-catarinense, Katarinnen deutsch conforme descrevem outros estudiosos.
Para Wiese (2007) as canções folclóricas tanto dos imigrantes alemães, quanto dos italianos
tem muita relevância no vale do Itajaí. As manifestações musicais aconteciam em família ou
durante reuniões festivas. As cantorias e música amenizavem a saudade do pais de origem,
da família e amigos que permaneceram na Europa. A música mostrava a sensibilidade
artística e poética dos imigrantes.
O jornal der Hansabote de 1905 citado pelo mesmo autor revela que as cantorias eram
regadas a ponche, cachaça e alimentos. Cantava-se e tocava-se instrumentos musicais. A
trilha sonora era composta de Hino da Alemanha, Der gute Kamerade (O bom camarada),
Der Abendstern (A estrela vespertina), Frühlingsbotschaft (Mensagem da primavera),
Abendlied (Canção da noite), Der Nachtigall Antwort (A resposta do rouxinol), Sonntag
(Domingo), Wanderlied (Canção do viajante), Abschied von der Heimat (Despedida da
pátria), Nach der Heimat moecht ich wieder (Para a pátria eu gostaria de voltar), Der
Havia, ainda, as canções infantis às quais tinham muita importância, Gott der Allwiessende
(Deus que sabe de tudo), Weist Du wie viel Sterne stehen (Sabes quantas estrelinhas).
Cantavam, ainda, quando queimava-se a roça. No entanto a prática foi extinta, por risco de
danos aos agricultores e a fertilidade do solo.
Está sendo realizado um inventário do patrimônio cultural material com ênfase na arquitetura
e no sistema construtivo enxaimel. Até o momento identificaram-se e realizaram-se o
levantamento fotográfico de quarenta e cinco casas enxaimel no município de Ibirama.
Paralelamente, realizou-se o levantamento de medição com trena e reconstituição do
esquema do projeto arquitetônico de seis edificações, vide Figura 01.
O Käsekuchen (bolo de queijo), vide figura 02, é uma receita original da região central da
Alemanha. Aprender sobre essa receita requer uma pesquisa mais aprofundada, já que
ao longo da historia ela teve variações regionais. Explicam-se as especificidades, pois o
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local foi colonizado por imigrantes europeus, em sua maioria alemães do norte da
Alemanha. Há várias versões da receitas do bolo de queijo, vide Figura 03 e 04. A base da
receita leva ovos, farinha, açúcar, leite,nata e queijinho branco sem sal. Algumas receitas
tem adição de frutas como ameixa, framboesa, cereja, uvas passas. Estudos realizados
pela equipe mostram que o tipo de fruta utilizada parece estar ligado a região de origem do
imigrante. O Estado de Santa Catarina recebeu muitos imigrantes de várias regiões da
Alemanha, que estabeleceram-se na região do Alto Vale do Itajai e outras.
A proposta visa resgatar e valorizar o Patrimônio Cultural Material e Imaterial como um todo
o que sugere abranger "um pouco de cada" do legado cultural, valorizando o idioma, a
gastronomia, da arquitetura, esportes, música, folclore, costumes, hábitos, dentre outros
aspectos e manifestações.
Atuar na divulgação em conjunto com a população para que atuem as ações tenham
continuidade no tempo e espaço. Contribuir para a que hajam multplicadores do Patrimônio.
6. Referências Bibliográficas
CERAN. Cia. Energética Rio das Antas. Patrimônio histórico e cultural : Massas
Alimentícias, Um pouco de tudo - Receitas, Depoimento, Santos Camponeses, Legenda das
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
fotos. disp.: <http://www.ceran.com.br/session/viewPage/pageId/74/language/pt_BR/>
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WIESE, Harry. Terra da fartura: história da colonização de Ibirama. Ibirama : Edigrave, 2007.
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WILLE, Otto. Minha imigração para Hansa-Hamônia hoje Ibirama no ano de 1904. in:
Blumenau em Cadernos. no; 05, maio, 1994.
7. Agradecimentos
RESUMO
Uma rua de muitos lugares corresponde a uma ação de educação patrimonial direcionada
inicialmente à elaboração de uma proposta de roteiro de visitação que foi trabalhada pelo
Iphan/MT no Centro Histórico de Cuiabá. A proposta do roteiro originou-se das observações
feitas durante algumas visitações de grupos de estudantes da educação básica e do ensino
superior pelo Centro Histórico de Cuiabá. A partir destas observações constatou-se a falta de
uma sistemática na forma de trabalhar os conteúdos durante a visitação, pois, os lugares
visitados eram trabalhados de forma isolada não havendo a associação entre as informações e
sua relação com a dinâmica da cidade. A segunda observação relaciona-se à ausência de
material de apoio como suporte para apresentação dos locais visitados e bem como para a
realização de consultas. Por fim, identificou-se a inexistência de clareza sobre o propósito da
atividade de visitação, o que contribui, no nosso entendimento, na limitação da reflexão sobre
a importância do Centro Histórico para a cidade. A realização do roteiro vislumbrou
inicialmente promover uma ação de educação patrimonial que aproximasse os participantes,
os habitantes da cidade do Centro Histórico de Cuiabá, sendo que a partir da construção
desse primeiro elo de aproximação, iniciar um trabalho de associação entre os aspectos
históricos, culturais e simbólicos dos locais visitados, desenvolvendo, dessa forma, uma ação
que incentive e contribua para a formação de agentes sociais interessados na valorização e
proteção do patrimônio local. Dessa forma, a visitação ao Centro Histórico vai além da simples
visualização de locais, volta-se para o florescimento, para a apreciação, o aguçar do olhar,
descortinar os detalhes do lugar, do patrimônio ali contido, e assim, propiciar a ampliação da
visão para além do objeto em si, direcionando para a perspectiva mais ampla em relação à sua
valorização, conservação e preservação
Nesse processo de participação das visitações foram feitas algumas observações, as quais
contribuíram para a realização de algumas reflexões e, para o amadurecimento da
elaboração da proposta de roteiro aqui apresentada. Dentre as observações feitas, alguns
aspectos envolvem questões de metodologia e de conteúdo.
Choay (2006), diz que o monumento histórico possui sua fase de consagração a partir do
ano de 1820 tendo o seu término ocorrido na década dos anos de 1960. Ao longo desse
período esse conceito vai predominar no embasamento das principais práticas e discussões
no campo do patrimônio cultural, tendo nele o seu auge. Contudo, isso não quer dizer que a
partir da década de 1960 a adoção dessa perspectiva se extingue. Ela deixa de ser
predominante, de modo que outras perspectivas e, por consequência, outros tipos de bens
passem a serem observados pela ação preservacionista (CHOAY, 2006:125). Segundo a
A expressão “poder mágico” (2008:98), é utilizada pela autora para expressar que esta
noção desenvolvida nesse contexto, abarcava toda uma representatividade que
contemplava várias categorias representadas em diferentes contextos históricos. Uma
constituição de um mosaico de representações patrimoniais que transcendiam as barreiras
do tempo e do “gosto”.
Ainda sobre esse processo de valoração, as obras consideradas recentes no século XVIII
adquirem os significados históricos afetivo das antiguidades nacionais. O conceito de
patrimônio, ainda segundo a autora “induz então a uma homogeneização do sentido dos
valores” (CHOAY, 2011:99). A autora ainda destaca que esta perspectiva de
homogeneidade se apresentou de forma diferenciada em diferentes momentos. No período
da Segunda Guerra Mundial, por exemplo, houve a valorização de estilos diferentes
representados pela arquitetura dos séculos XIX e XX, quando estes foram considerados
monumentos históricos.
O roteiro foi utilizado durante os anos de 2014 até 2016 pela Superintendência do
IPHAN/MT e esta proposta inicial, vem inspirado a elaboração de novas propostas de
visitação pelo Centro Histórico, como também, pela área de entorno.
Figura 1: Roteiro ‘Uma rua de muitos lugares”. Alunos do Colégio O Centro de educação de jovens e
Ressalta-se que a atividade aqui proposta vislumbrou inicialmente promover uma ação de
Educação Patrimonial que aproxime os participantes do Centro Histórico de Cuiabá, e a
partir da construção desse primeiro elo de aproximação, buscou-se associar os aspectos
históricos, culturais e simbólicos dos locais visitados, desenvolvendo, dessa forma, uma
ação que envolva a valorização e proteção do patrimônio local.
Dessa forma, a visitação ao Centro Histórico vai além da simples visualização de locais,
volta-se para o florescimento, para a apreciação, o aguçar do olhar, descortinar os detalhes
do lugar, do patrimônio ali contido, e assim, propiciar a ampliação da visão para além do
objeto em si, direcionando para a perspectiva mais ampla em relação à sua valorização,
conservação e preservação. Para Miranda, “A interpretação do patrimônio é a arte de
revelar in situ o significado do legado natural, cultural ou histórico, ao público que visita
esses lugares (....) ”.( LONDRES, 2003, p.65.)
Comunga-se da ideia que o lugar se torna realidade, a partir da nossa familiaridade com o
espaço, não necessitando, entretanto, ater-se a uma definição fixa. Sendo que esse
processo de familiarização se constrói de formas diferenciadas.
Massey (2000), no artigo “Um sentido global de lugar”, cita um exemplo dessa construção
de relações com o lugar relatando sua experiência de residir em Kilburn High Road1. Relata
algumas impressões sobre o lugar:
Nesse exemplo percebe-se que a autora quer demonstrar a visão equivocada entre a
identificação dos termos lugar com “comunidade”, pois é possível existir comunidades sem
necessariamente compartilharem do mesmo lugar, mas através do compartilhamento das
referências culturais que o lugar possui. Ainda segundo a autora, “o que dá a um lugar sua
especificidade não é uma história longa internalizada, mas o fato de que ele se constrói a
partir de uma constelação particular de relações sociais, que se encontram e se entrelaçam
num lócus particular” (MASSEY, 2000:185).
Segundo a autora o lugar é compreendido não somente pelas suas delimitações territoriais,
ele não se encontra comprimido nas demarcações fronteiriças, o que lhe garante sua
existência não são suas delimitações precisas, mas o processo construído das
singularidades de relações sociais e simbólicas. Dessa forma pode-se comungar da ideia de
que o sentido do lugar passa por constantes conexões sociais, sua especificidade não se
origina de uma unicidade ou modelo fechado de representações, mas deriva das inter-
Ainda conforme a autora a singularidade do lugar não se encontra na sua existência em si, é
construída a partir das diferentes relações sociais e, consequentemente, geográficas que se
faz com esse lugar, envolvendo as comunidades locais, entendidas aqui como diversas
(MASSEY, 2000:184).
Entende-se que a forma como as pessoas usam e interagem nos lugares é um caráter muito
forte e difícil de conhecer, perceber e trabalhar com ele. Este capítulo busca compreender o
valor atribuído ao Centro Histórico, tendo em vista as políticas públicas culturais de
preservação e os agentes sociais que ali compartilharam este espaço.
Em Vianna os símbolos compõem a cultura, sendo que tais símbolos não estão isolados,
pois fazem parte de uma estrutura ampla, que se constrói e reconstrói a partir de
movimentos internos e externos seja proveniente do esquecimento ou da apropriação de
novas simbologias. Assim, memória e esquecimento antes de serem expressões
antagônicas, vêm se mostrando mais próximas, até mesmo, complementares nessa
dinamicidade histórica. (VIANNA, Hermano, 2005, p.302-315).
A atividade de roteiro aqui proposta possui como objeto de estudo o Centro Histórico de
Cuiabá, compreendendo suas transformações e sua análise atual, voltando-se deste modo,
para a percepção de que ele não é um espaço isolado, mas um espaço imbuído de
memórias, possuidor de um hibridismo tanto nos seus traços arquitetônicos, apresentando
características coloniais e ecléticas, como, nas suas representatividades culturais.
O espaço, uno e múltiplo, por suas diversas parcelas, e através do seu uso,
é um conjunto de mercadorias, cujo valor individual é função do valor que a
sociedade, em um dado momento, atribui a cada pedaço de matéria, isto é,
cada fração da paisagem. (Ibidem).
Esse amplo material subsidiou a realização de algumas etapas, dentre elas, cita-se: a
elaboração de um texto guia do roteiro contendo a sistematização das informações
pesquisadas; o levantamento fotográfico da área do roteiro; a realização de reuniões de
avaliação para aperfeiçoar a forma e o conteúdo do roteiro; pesquisa sobre os locais,
ressaltando a perspectiva do imaginário cuiabano; e, o levantamento bibliográfico,
iconográfico e documental sobre os locais que fazem parte do roteiro e elaboração de um
folder contendo as imagens e informações.
Segundo Ulpiano Toledo Bezerra de Meneses (2006, p. 36), “A imagem que os habitantes
fazem da cidade ou de fragmentos seus é fundamental para a prática da cidade”. Esse olhar
direcionado ao habitante é significativo, pois, seu papel é fundamental na criação de
sentidos e valores que se constroem nas práticas sociais cotidianas. O mesmo autor
também define a origem do termo “habitante”:
Utilizou-se como metodologia também a história oral, inicialmente por considerá-la como um
procedimento capaz de produzir novas referências. Segundo Lozano (2005:17), “Fazer
história oral significa, portanto, produzir conhecimentos históricos, científicos, e não
simplesmente fazer um relato ordenado da vida e das experiências dos ‘outros’ ”.
A partir das compreensões de Lozano (2005) sobre história oral, e sua classificação de
estilos e técnicas, será utilizado o que ela nomeia de “estilo do analista completo”. Durante o
processo de desenvolvimento do trabalho há de se considerar a “fonte oral em si mesma”,
por isso, foram feitas análises, interpretações e contextualização histórica dos depoimentos
e as evidências orais, e, também, a complementação dos depoimentos com outras fontes
documentais.
Além das considerações já citadas sobre a metodologia da história oral, Lozano (2005:24),
ainda afirma que “A história oral é vista como um método particular, mas não
exclusivamente isso, já que também pode ser considerada uma forma de estabelecimento
de relações de maior qualidade e profundidade com as pessoas entrevistadas”. O trabalho
envolvendo a história oral exige além de postura crítica no trato do material produzido, a
receptividade e delicadeza no vínculo que se cria com as pessoas envolvidas.
Outro ponto importante de salientar sobre a história oral se refere ao fato dela envolver a
esfera simbólica.
Considerações finais
Considera-se que essa proposta de trabalho foi importante porque possibilitou uma primeira
leitura sobre o Centro Histórico, leitura ao mesmo tempo despretensiosa, como uma espécie
de “começo de namoro”, mas que nutriu o início de levantamento e diagnóstico sobre as
ações educativas realizadas no Centro Histórico. Especificamente a atividade de visitação,
sem distanciar do entendimento do sentido do patrimônio materializado. Segundo Françoise
Choay “ a arquitetura é a única arte cujas obras exigem ser materialmente percorridas. Só
Ressalta-se que os produtos a partir das considerações feitas podem ser considerados
como experiências educativas, pois eles fizeram parte das atividades de Educação
Patrimonial desenvolvidas pelo IPHAN/MT, ultrapassaram o espaço da superintendência,
foram trabalhados em algumas instituições universitárias e serviram de material para a
produção de novos conhecimentos.
O olhar voltado ao Centro Histórico não se iniciou a partir de uma reflexão sistemática, mas
de uma vontade de escrever sobre o que se vê e o que se esconde nos vínculos das formas
de sua apropriação social e como esse caminho pode ser trilhado com a reflexão a partir
das ferramentas da área da educação.
ALENCASTRO, Aníbal. Cuyabá histórias, crônicas e lendas. São Paulo: Yangraf, 2003.
Cuiabá Cultura Viva. Apud. MENDES Moisés Martins Junior - Revendo e reciclando a
cultura cuiabana - 2ª Edição - 2006 - Ed. Janina. Disponível em <
http://www.cuiaba.mt.gov.br/secretaria?s=21&v=Cuiab%E1%20Cultura%20Viva> Acesso em
13 de Janeiro de 2014.
GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008, p.03-21.
BOTELHO, Miriam. Nas praças, uma reverência à história. Diário de Cuiabá. Edição nº
11216 15/05/2005. Disponível em<
http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=218624> Acesso em Dezembro de
2013.
MÜLLER, Maria de Arruda; RODRIGUES, Dunga. Cuiabá ao longo de 100 anos. Editora
Eletrônica. 1994.
PAIVA, Eduardo França. História & imagens. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.
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SIQUEIRA, Elizabeth Madureira. Bairro do Porto. In: SIQUEIRA, Elizabeth Madureira, et al.
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VIANNA, Hermano. Tradição da mudança: a rede das festas populares brasileiras. Revista
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Brasília, IPHAN, n. 32, p.302-315, 2005.
Resumo: Considerando o acervo que vem sendo constituído pelo Centro de Memória
Professora Batistina Corgozinho – CEMUD – UEMG – Unidade Divinópolis desde 2005 e
principalmente pela potencialidade que os mesmos apresentam para novos estudos e
pesquisa e sua crescente expansão criou-se o EmRedes: Portal da Memória do Centro-
Oeste Mineiro para disponibilizar seu acervo história e de memória através da Web.
O EmRedes: Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro – trabalho, religiosidade,
cultura e cotidiano foi lançado em maio de 2015, com o objetivo de se tornar um instrumento
permanente de acesso a todos os cidadãos interessados em realizar pesquisas sobre a
região, no qual está disponíveis um banco de dados com mais de 70.000 documentos
digitais. O acervo do Portal conta com documentos escritos diversos (jornais, panfletos,
cartas, notas, documentos oficias), fotos e vídeos de diferentes grupos, a polifonia da
memória é um princípio da reunião do acervo, privilegiando especialmente aqueles registros
que não fazem parte das vozes oficiais, aqueles que pouco preservamos. A importância do
uso da tecnologia digital está ligada não só ao fato de preservar indiretamente o patrimônio
documental como principalmente democratizar o seu acesso. A digitalização dos
documentos garante sua permanência virtual, mesmo que o suporte de acessibilidade aos
mesmos se modifique. A preservação digital não impede o processo de degeneração dos
documentos. A integridade física dos mesmos exige a adoção de outros procedimentos
tecnológicos e condições de acomodação adequadas e específicas que são observadas no
trabalho do Centro de Memória. A iniciativa de construção do Portal da Memória do Centro-
Oeste Mineiro – EmRedes representa um passo para que este instrumento de estudos e
pesquisa seja apropriado pelos cidadãos interessados em pesquisar e conhecer mais a
história da região. Nesse sentido, o Portal da Memória convida e mais do que isso, solicita a
todos a contribuição para que este espaço seja sempre mais dinâmico, oferecendo
informações e reflexões sobre os aspectos culturais e históricos do Centro-Oeste mineiro.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG - de 21 a 23/06/2017.
O Portal também funciona como um centro de referência regional que possibilita a
coleta de dados, fixação e produção de informações, atende as demandas locais para
formação, capacitação e confecção de material informativo e formativo. Dessa forma, o
Portal deve sistematizar e arquivar as produções e, na medida do possível, produzir novos
materiais por iniciativa própria ou demanda de escolas e organizações sociais. Nesse
sentido, ele se constitui enquanto um acervo de informações e as produz; atende a
demanda formativa de comunidades e é formado pelas informações cedidas pelas mesmas.
A administração do Portal é realizada pela equipe de profissionais do Centro de Memória
Professora Batistina Corgozinho – CEMUD – UEMG – Unidade Divinópolis, cabendo aos
mesmos receber, catalogar, disponibilizar e analisar acervos sobre a memória e a história do
centro-oeste mineiro.
Autores: Flávia Lemos Mota de Azevedo; José Heleno Ferreira; Samuel José Santiago
Resumo
O evento, desde a primeira edição, foi planejado em um formato de participação por adesão,
cabendo a municipalidade o papel de organizador e divulgador, estimulando e incentivando
a colaboração da comunidade, envolvendo instituições públicas e privadas, universidades e
artistas locais. A cada ano o evento foi desenvolvido permeando uma temática específica,
em 2013, para abrir o debate o tema escolhido foi: “O que é Patrimônio?”; em 2014 a
abordagem focou em nossas raízes culturais tendo como tema: “A herança cultural Africana;
em 2015 foi abordado o caráter ambiental do patrimônio com o tema: “Pelotas patrimônio
das Águas; já em 2016 o enfoque foi baseado no papel da mulher na constituição do
patrimônio, tendo como tema: “A Ocupação Feminina”.
A primeira edição do evento que ocorreu nos dias 17 e 18 de agosto de 2013, superou a
expectativa da organização e foi sem dúvida uma ação cultural de grande repercussão na
comunidade local e regional. Em 2014 a novidade no formato do evento foi a inserção da
ação intitulada “Conversas do Dia do Patrimônio”; reuniões semanais realizadas durante os
meses de junho e julho, às quartas feiras, nas quais palestrantes e comunidade expõem e
debatem sobre o tema proposto, resultando na publicação de uma revista com textos sobre
os temas abordados. Já em 2015, a inovação foi a ampliação do evento que teve início na
sexta-feira, quando a programação é direcionada ao público escolar da rede pública
municipal e estadual.
Um dos principais destaques do evento, desde sua primeira edição, é a participação de
estudantes, principalmente universitários, das mais variadas áreas do conhecimento que
atuam como Agentes do Patrimônio. Após treinamento, são eles que figuram juntamente
com a equipe de técnicos da Secretaria de Cultura na receptividade da comunidade e na
organização das atividades culturais como: exposições, oficinas, palestras e danças que
ocorrem em espaços abertos e nos prédios históricos sinalizados com bandeirolas coloridas
e abertos para visitação.
A experiência acumulada durante as primeiras edições nos honrou, em 2017, com o Prêmio
Rodrigo Melo Franco de Andrade, fato que nos permitiu compreender a dimensão e o
alcance do evento, percebendo o quanto as ações desenvolvidas afloraram o debate sobre
a identidade cultural local e despertaram na população uma nova perspectiva, mais
participativa, sobre nossa cultura e patrimônio.
Autores:
Secretaria do Evento
Orientações para envio de Resumos:
O Comitê Científico do evento fará uma seleção de trabalhos a partir dos resumos enviados a partir do formulário, que
tem a seguinte organização e conteúdo:
Área Temática: Eixo 1 – Do técnico à população: a democratização do campo do patrimônio
Resumo:
A análise realizada nesta pesquisa resultará do estudo do processo de tombamento e de usucapião da Vila Vicentina da Estância localizada em Fortaleza, Ceará. A vila possui cerca de 40 casas populares e uma
capela, além de ampla área de convivência comum aos moradores, e foi construída na década de 1940 inicialmente para idosos. Fortaleza apresentou, no último século, intensa expansão territorial em seu processo de
urbanização. A cidade passou por um rápido crescimento demográfico decorrente, sobretudo, pelos fluxos migratórios campo-cidade induzidos pelas constantes secas no interior do estado e pela concentração de
investimentos e infraestrutura na capital. Em Fortaleza, as primeiras ações de assistência aos que moravam precariamente na cidade foram implementadas pelas comunidades religiosas do município e, posteriormente,
incentivos governamentais para a construção de vilas operárias. Parte dessas construções ainda existem no município de Fortaleza, tendo havido modificações progressivas de maior ou menor intensidade, mas que
retratam um modo de morar de uma parcela da população carente. Na contramão da instalação de conjuntos habitacionais periféricos em bairros dormitórios ou gasto excessivo com aluguel, a Vila Vicentina da
Estância encontra-se em uma região, hoje, central e sem custo de aluguel. Com a expansão urbana da capital, essa área tornou-se extremamente valorizada. Há meses, os moradores da Vila Vicentina da estância vêm
sendo assediados para deixar o local, pressionados pelo mercado imobiliário. Acontece que a Vila Vicentina da Estância é uma Zona Especial de Interesse Social – ZEIS, conforme determinado pelo Plano Diretor
Participativo de Fortaleza (lei 062/2009). Sendo ZEIS, a área está protegida para regularização fundiária da comunidade que lá habita através de investimento do poder público, e o caso está sendo acompanhado pela
Comissão dos Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, Ministério Púbico, conselhos estaduais e municipais de proteção aos idosos, além de órgãos da Prefeitura, como Habitafor, Seuma e Iplanfor. Contudo, no
segundo semestre de 2016, foi iniciada a demolição de parte das casas por determinação da justiça, tendo o processo de demolição parado apenas com a solicitação de tombamento do conjunto.
Palavras-Chave (Separadas por vírgula): Patrimônio; Zonas especiais de interesse social; arquitetura; Vila Vicentina da Estância.
Autores:
Resumo
Este trabalho apresenta um relato da experiência desenvolvida no âmbito da Oficina Escola de Manguinhos (OEM) que integra o Núcleo de Educação Patrimonial (NEP) do
Departamento de Patrimônio Histórico (DPH) da Casa de Oswaldo Cruz (COC). O objetivo da OEM é formar e capacitar pessoas para os ofícios tradicionais de construção e de arte
integrada, para atuação em conservação e restauração de bens culturais, em especial o patrimônio arquitetônico, contribuindo para a preservação desse acervo dentro e fora da
instituição que a abriga: a Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz.
A Fiocruz, cuja fundação data do ano de 1900, tem em seu acervo construído diversos edifícios tombados e com interesse para preservação, destacando-se os conjuntos eclético,
construído nas duas primeiras décadas do séc.20 a partir do projeto do arquiteto português Luis Moraes Junior, e modernista, construído nas décadas de 1940/50 projetados
pelos arquitetos da Divisão de Obras do Ministério da Educação e Saúde, em Manguinhos, na cidade do Rio de Janeiro. Recentemente, outros bens passaram a integrar o acervo
sob responsabilidade da instituição, como o Palácio Itaboraí e edificações anexas em Petrópolis, e parte do Colônia Juliano Moreira em Jacarepaguá, ambos em áreas que a
Fiocruz recebeu por cessão na década de 1990. Razão pela qual essa instituição investe, desde a década de 1980, na preservação de seu patrimônio arquitetônico por meio de seu
Departamento de Patrimônio Histórico, tanto com ações diretas de conservação e restauração quanto com a formação e capacitação de artífices para atuação em obras e serviços
dessa natureza, seja das equipes locais que atuam na Fiocruz seja da população em geral, por meio da OEM desde 2007, ano em que iniciou suas atividades de formação. Essas
ações somadas às ações de valorização do patrimônio cultural da saúde são pautadas em estudos e pesquisas desenvolvidas em caráter contínuo no Departamento e na Casa de
Oswaldo Cruz como um todo. A OEM vem, assim, contribuindo para a construção de um processo permanente e sistemático de trabalho educacional centrado no patrimônio
cultural por meio da criação de um espaço onde alunos e educadores (mestres e auxiliares) compartilham experiências de construção conhecimentos, por meio da apropriação e
valorização da cultura, contribuindo para o acesso e a difusão de conhecimentos relacionados à técnica e à arte, bem como um processo contínuo de formação e revalorização do
trabalho manual.
Esta experiência se baseia num processo educativo que busca estimular nos educandos, a leitura do mundo, propiciando a compreensão do universo sócio-cultural e do contexto
histórico em que eles estão inseridos. Consideramos que os processos de aprendizagem devem levar em consideração o seu papel na emancipação social e, nesse sentido,
ressaltamos que a democratização das práticas sociais requer também a democratização dos saberes.
RITO:
O menino do rancho
- Aldeia Jeripankó
ALMEIDA, Luiz Sávio de, et al. Resistência, memória, etnografia. Maceió. EDUFAL.
2007.
VIEIRA, Jorge Luiz Gonzaga. Povos do Sertão de Alagoas: confinamento, diás pora e
reterritorialização.2010.