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Anais do IX Mestres e

Conselheiros - Agentes
Multiplicadores do Patrimônio

21/06/2017
Belo Horizonte/MG
• ANAIS •
ISSN 2176-2783

Anais do IX Mestres e
Conselheiros - Agentes
Multiplicadores do
Patrimônio

9º edição

Belo Horizonte/MG 2017


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

AN532 Anais do IX Mestres e Conselheiros - Agentes Multiplicadores do


Patrimônio. Anais...Belo Horizonte(MG) CAD II - UFMG, 2017

Disponível em <www.even3.com.br/anais/mestreseconselheiros2017>

ISSN: 2176-2783

1. Arquitetura

CAD II - UFMG CDD - 370

Ficha catalográfica elaborada por Even3 – Sistema de Gestão de Eventos


CORPO EDITORAL

COORDENADOR GERAL
PROF. DR. LEONARDO BARCI CASTRIOTA (UFMG)

COMISSÃO CIENTIFICA
PROFESSORA DOUTORA ANA MEIRA (UNISINOS)
PROFESSORA DOUTORA BEATRIZ COUTO D´AMARAL (UFMG)
PROFESSORA DOUTORA MARIETA CARDOSO MACIEL (UFMG)
PROFESSOR DOUTOR LEANDRO BRUSADIN (UFOP)
PROFESSOR DOUTOR LEONARDO BARCI CASTRIOTA (UFMG)
PROFESSORA DOUTORA MARIA CRISTINA VILLEFORT (UFMG)
PROFESSORA DOUTORA MARGARETH PIMENTA (UFSC)

COMISSÃO ORGANIZADORA
ANDREA LANNA MENDES NOVAIS (MPE)
ARLETE SOARES DE OLIVEIRA (IEDS)
CARLA VIVIANE DA SILVA ÂNGELO (IEDS)
DANIELLE BARROSO CALDEIRA (IEDS)
GUILHERME MACIEL ARAÚJO (PPG-ACPS)
LUCIANA ROCHA FÉRES (PPG-ACPS)
VALÉRIA SÁVIA TOMÉ FRANÇA (IEDS)
VILMAR PEREIRA DE SOUSA (IEDS)

PATROCÍNIO
CONSELHO REGIONAL DE ARQUITETURA E URBANISMO – MINAS GERAIS-
CAU-MG
CAPES
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – PROGRAMA PAIE
INSTITUTO DE ARQUITETOS DO BRASIL – IAB/MG
RESUMO
1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

#VIVAMADALENA: A INTERVENÇÃO DA POPULAÇÃO NA 1


PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL DE
TERESINA.
A CASA DA FAMÍLIA REGO E A IMPORTÂNCIA DO TOMBAMENTO 3
DAS EDIFICAÇÕES RESIDENCIAIS NA CIDADE DE OEIRAS-PIPAT
A DESTIPIFICAÇÃO DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO 4
RESIDENCIAL DE TERESINA: O CASO DO ENTORNO DA PRAÇA
LANDRI SALES.
A IMAGEM DO ESTADO MODERNO DE JUSCELINO KUBITSCHEK 5
ATRAVÉS DA ARQUITETURA DE OSCAR NIEMEYER
A IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO DA ARQUITETURA MODERNA 7
INSTITUCIONAL DE TERESINA: O CASO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DO PIAUÍ
A IMPORTÂNCIA DO PATRIMÔNIO CULTURAL PARA A CIDADE: 8
IDENTIDADE SOCIAL E PLANOS URBANOS
A MEMÓRIA COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO 10
CULTURAL: BARRA LONGA-MG
A MODERNIZAÇÃO NOS GOVERNOS DE ANTONIO LEMOS (1902- 12
1912) E GETÚLIO VARGAS (1937-1945): A MUDANÇA CULTURAL DO
LOCAL DA MORADIA E SEU REFLEXO NO PROCESSO DE
DEGRADAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE BELÉM/PA
A NOVA PREFEITURA ENXAIMEL DE SÃO LEOPOLDO 14
A PARTICIPAÇÃO POPULAR DESDE A CONCEPÇÃO DO PROJETO 16
DE RESTAURO: O CASO DA CASA DE CÂMARA E CADEIA DE
MARIANA
A PERSPECTIVA DA PATRIMONIALIZAÇÃO DA CAPOEIRA NA VISÃO 18
DOS MESTRES ANGOLEIROS DE BELO HORIZONTE
A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR NA CONCEPÇÃO E EXECUÇÃO DE 20
PROJETOS CULTURAIS: O CASO DO MUSEU MILITAR DA ESCOLA
DE SARGENTOS DAS ARMAS
A PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO EDIFICADO EM COLATINA E 22
SUA TRAJETÓRIA.
A PROTEÇÃO LEGAL É SUFICIENTE?. ENGENHOS PUBLICITÁRIOS: 23
UMA AMEAÇA AO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO DO EIXO PILOTO
COMERCIAL RUA DO COMÉRCIO - CENTRO DE MACEIÓ.
AS DISTINÇÕES DA PATRIMONIALIZAÇÃO NO BRASIL: UMA 25
REFLEXÃO SOBRE IDENTIDADES MÚLTIPLAS NÃO
RECONHECIDAS.
AS ESTRADAS DE VILA RICA À CACHOEIRA DO CAMPO: DOS 27
ANTIGOS CAMINHOS À ESTRADA DE DOM RODRIGO JOSÉ DE
MENEZES
AS TRANSFORMAÇÕES URBANÍSTICAS E ARQUITETÔNICAS 29
OCORRIDAS NA PRAÇA D. PEDRO II DESDE SUA FUNDAÇÃO ATÉ
OS DIAS ATUAIS
CENTRO DE ARTES DA UFF: EDIFÍCIO-EMBLEMA DA MEMÓRIA 31
URBANA E CULTURAL DE NITERÓI-RJ.
CIDADE, MEMÓRIA, PATRIMÔNIO E MUSEOLOGIA SOCIAL: UMA 33
ANÁLISE SOBRE A RELAÇÃO ENTRE ESPAÇO URBANO, MUSEUS
COMUNITÁRIOS E ALTERNATIVAS DE RESISTÊNCIA.
CONFORTO AMBIENTAL EM EDIFICAÇÕES PROTEGIDAS: ANÁLISE 35
DA LEGISLAÇÃO DO CORREDOR CULTURAL DO RIO DE JANEIRO
CONJUNTO URBANO DA PRAÇA PEDRO II EM TERESINA - PIAUÍ: 37
VULNERABILIDADE LEGAL
CONSELHOS MUNICIPAIS DE PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO NO 39
PARANÁ
CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS NA ATUAÇÃO DOS AGENTES 41
DO PATRIMÔNIO
CRIAÇÃO DO LABORATÓRIO DE CONSERVAÇÃO DE DOCUMENTOS 43
DA UFRRJ (LABDOC/UFRRJ) MEMÓRIA, CONSERVAÇÃO E
PRODUÇÃO DE CONHECIMENTOS
DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO À MEMÓRIA E HISTÓRIA REGIONAL: 45
RELATO DA EXPERIÊNCIA DO PORTAL EMREDES
DIREITO AO ILEGÍVEL: OCUPAÇÕES EM ÁREAS DE RECONHECIDO 47
VALOR CULTURAL
ENTRE MEMÓRIAS, ETNOGRAFIAS E TERRITÓRIOS: TEMPO, 49
ESPAÇO E EPISTEME NA CONGADA
INOVAÇÃO E TRADIÇÃO DOS BENS CULTURAIS IMATERIAIS: A 51
PATRIMONIALIZAÇÃO DO QUEIJO CANASTRA EM MINAS GERAIS
INVENTÁRIO PARTICIPATIVO DO PATRIMÔNIO CULTURAL DAS 53
COMUNIDADES REMANESCENTES DO QUILOMBO MESQUITA
INVENTÁRIOS ARQUITETÔNICOS NO RIO GRANDE DO SUL: DO 55
PODER PÚBLICO AO PODER DO PÚBLICO
MOVIMENTO “ABRACE A GARÇA” (MACEIÓ-AL) E POSSIBILIDADES 57
DE AÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA NA LUTA PELA
DEMOCRATIZAÇÃO DA CIDADE
O ART DECÓ COMO TIPOLOGIA DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO 59
RESIDENCIAL PARNAIBANO:O EXEMPLAR DA AV. PRESIDENTE
GETÚLIO VARGAS, Nº 590
O CENTRO HISTÓRICO DE CUIABÁ: EM BUSCA DO VALOR 61
ATRIBUÍDO
O CRESCIMENTO DAS AÇÕES DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO 63
IMATERIAL
O ESTUDO DE ELEMENTOS DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO AO 65
ALCANCE DA SOCIEDADE: A RELAÇÃO DAS OBRAS RELIGIOSAS
ENTRE PORTUGAL E BRASIL. QUAIS ELEMENTOS
ARQUITETÔNICOS DEMONSTRAM ESSA INFLUENCIA
PORTUGUESA?
O INVENTÁRIO COMO INSTRUMENTO DE CONHECIMENTO, 67
PROTEÇÃO E VALORIZAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL DE
BARÃO DE COCAIS
O MUSEU DOM PAULO LIBÓRIO E A SALVAGUARDA DO 69
PATRIMÔNIO RESIDENCIAL TERESINENSE
O PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO DE TERESINA – PI ATRAVÉS DA 71
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL DO ENGENHEIRO LUIZ MENDES
RIBEIRO GONÇALVES.
O PATRIMÔNIO CULTURAL MATERIAL E OS DESAFIOS DA 72
CONSERVAÇÃO PREVENTIVA EM MARIANA-MG
O PATRIMÔNIO HISTÓRICO ARQUITETÔNICO DA CIDADE DE 74
FLORIANO- PI: CARACTERIZAÇÃO E PRESERVAÇÃO
O RECONHECIMENTO DO CONJUNTO MODERNO DA PAMPULHA 75
COMO PATRIMÔNIO CULTURAL DA HUMANIDADE: REVISÃO
URBANA E AMBIENTAL SOBRE A ADAPTAÇÃO PERIMETRAL DA
UNESCO
O TERRITÓRIO URBANO CONTEMPORÂNEO E A SALVAGUARDA DA 77
MEMÓRIA: O INVENTÁRIO E SEUS REFLEXOS NA RUA MARECHAL
DEODORO - JUIZ DE FORA/MG.
O URBANISMO TÁTICO NA PRODUÇÃO DA FORMA URBANA DAS 79
CIDADES CONTEMPORÂNEAS: A REAFIRMAÇÃO E
REAPROPRIAÇÃO DOS ESPAÇOS PATRIMONIAIS A PARTIR DA
PARTICIPAÇÃO POPULAR
OBRAS DE REQUALIFICAÇÃO NO ENTORNO DO ESPAÇO 81
CULTURAL BARROQUINHA, SALVADOR-BA: ANÁLISE SOBRE
ACESSIBILIDADE PARA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
OFICINA DE RESTAURO PÚBLICO 82
OS CORETOS: A PERMANÊNCIA DO MOBILIÁRIO URBANO SEM 84
USO ESPECÍFICO
PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA PRESERVAÇÃO DE SÍTIOS HISTÓRICOS 86
URBANOS. EXPERIMENTO METODOLÓGICO NO SÍTIO HISTÓRICO
DE SANTA LEOPOLDINA – ES
PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO E IDENTIDADE: A IMPORTÂNCIA DO 88
RECONHECIMENTO NO PROCESSO DE SALVAGUARDA
PATRIMÔNIO CULTURAL NO CONTEXTO DO GRANDE PROJETO 90
URBANO PORTO MARAVILHA NO RIO DE JANEIRO: PRESERVAÇÃO
OU AMEAÇA?
PATRIMÔNIO IMATERIAL COMO INSTRUMENTO DE CONSERVAÇÃO 92
DA MEMÓRIA DE UM BAIRRO: O CASO DO BAIRRO DE CAMPINAS E
A TORCIDA DO ATLÉTICO CLUBE GOIANIENSE.
PATRIMÔNIO PULSANTE: A ÁREA CENTRAL CARIOCA E AS 94
MANIFESTAÇÕES SOCIAIS
PATRIMÔNIO, MEMÓRIA E IDENTIDADE: UM ESTUDO SOBRE AS 96
IGREJAS CATÓLICAS DO CENTRO DE VITÓRIA/ES
PENSANDO A PRESERVAÇÃO ARQUITETÔNICA E URBANA DE 98
ESPÍRITO SANTO DO PINHAL: UM PATRIMÔNIO AINDA A
CONHECER
PERSPECTIVAS E DESAFIOS PARA A GESTÃO DE BENTO 100
RODRIGUES: POR UMA PROPOSTA DE CONSTRUÇÃO DE
CONSENSO
PISO, PAREDE, TETO: A (DES)CARACTERIZAÇÃO DOS MATERIAIS 102
NAS INTERVENÇÕES REALIZADAS PELOS PROPRIETÁRIOS DE
BENS PROTEGIDOS
PIXAÇÃO E PATRIMÔNIO HISTÓRICO NA CIDADE DE TERESINA-PI. 104
POR UMA ERÓTICA DO PATRIMÔNIO: ALTERNATIVAS À 105
TRANSFORMAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO CIDADÃ EM PANACEIA DAS
POLÍTICAS PATRIMONIAIS
POR UMA VISÃO HUMANA DO PATRIMÔNIO: REPENSANDO O 107
CONSELHO DELIBERATIVO DO PATRIMÔNIO CULTURAL E
NATURAL DE SABARÁ/MG
PROPOSTA DE NORMATIVA TÉCNICA PARA PREVENÇÃO E 109
COMBATE A INCÊNDIO E PÂNICO EM BENS CULTURAIS
PROTEGIDOS
RUÍNAS DO FORTIM DOS EMBOABAS: ENTREMEANDO MEMÓRIA, 111
AMBIÊNCIA E PRESERVAÇÃO EM SÃO JOÃO DEL-REI (MG)
SÍTIO HISTÓRICO DE ITAPINA/ES: O PATRIMÔNIO ENQUANTO 113
MONUMENTO A SER PRESERVADO E A SUA PROBLEMÁTICA
ATUAL DE PRESERVAÇÃO.
UMA REFLEXÃO SOBRE AS PRIMEIRAS DÉCADAS DA PROTEÇÃO 115
DO PATRIMÔNIO NO RIO GRANDE DO SUL
VIVENDA CAIÇARA: UM EXEMPLAR DA ARQUITETURA EM PEDRA 117
PIAUIENSE

2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 – EDUCAÇÃO


PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

“ALÉM DOS MUROS DO INHOTIM” : EDUCAÇÃO PATRIMONIAL, 119


IDENTIDADE E CIDADANIA EM BRUMADINHO / MG
“RESGATE HISTÓRICO CULTURAL DO DISTRITO DE MONSENHOR 121
HORTA-MARIANA MG PARA IMPLANTAÇÃO DA ATIVIDADE
TURÍSTICA”
A “CASA DO IMPERADOR” EM PÃO DE AÇÚCAR (AL) 123
A CIDADE E A IMAGEM: ESSE TRABALHO DARÁ ÊNFASE A 124
MANUTENÇÃO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS, O SABER FAZER DO
ARTÍFICE SAPATEIRO.
A COLETÂNEA GARIBALDINA E A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EM 126
LAGUNA, SC
A CURA PELA FÉ: UM OLHAR SOBRE AS 128
BENZEDEIRAS/REZADEIRAS ALAGOANAS
A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL ALÉM DA SALA DE AULA 130
A PRAÇA COMO ESPAÇO DE COMPREENSÃO DA PAISAGEM 132
CULTURAL URBANA. ESTUDO DE CASO: FLORIANÓPOLIS, SÃO
JOSÉ E LAGUNA / SC.
A PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL A PARTIR DA 134
LITERATURA INFANTOJUVENIL
BRINQUEDOS BIOGRÁFICOS: MEMÓRIA DE PRÁTICAS LÚDICAS 136
CASARÃO DO BECO ALTO: UM ESBOÇO ARQUITETÔNICO 138
CEMITÉRIO DO BONFIM, ARTE, HISTÓRIA E EDUCAÇÃO 140
PATRIMONIAL – UMA AÇÃO EDUCATIVA EM CURSO
CENÁRIO HISTÓRICO ESQUECIDO: PRAÇA NEREU RAMOS, 142
CRICIÚMA/SC
CENTRO DE REFERENCIA DA MODA: UM OLHAR 144
INTERDISCIPLINAR
EDIFICIO ANEXO AO CASARÃO TOMBADO DO MUSEU DA IMAGEM 146
E SOM DE BH
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL ATRAVÉS DA EXTENSÃO 148
UNIVERSITÁRIA NA ENGENHARIA CIVIL: UM ESTUDO DE CASO EM
CURVELO/MG.
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA: O CASO 150
DA ELABORAÇÃO DO DOSSIÊ DE TOMBAMENTO DO BAIRRO
SANTA TEREZA EM BELO HORIZONTE.
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL, O OLHAR DO OUTRO COMO 152
PERSPECTIVA FUNDAMENTAL NA CONSTRUÇÃO DE SABERES
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: UM CAMINHO PARA O INÍCIO DA 154
FORMAÇÃO EM PRESERVAÇÃO PATRIMONIAL. PROGRAMA
APLICADO A JOVENS SECUNDARISTAS
EDUCAR DESEDUCANDO: 10 ANOS DE IMPLANTAÇÃO DA UFS 156
NOS ANTIGOS TRAPICHES DE LARANJEIRAS/SE.
FAVELA, LUGAR DE EDUCAÇÃO PARA O PATRIMÔNIO CULTURAL 158
FEIRA DO PATRIMÔNIO – O LUGAR DA COLABORAÇÃO E DA 160
PARTILHA
IATE CLUB DE COLATINA/ES: MEMÓRIA E PATRIMÔNIO HISTÓRICO, 162
CULTURAL E ARQUITETÔNICO.
JOGOS SONOROS COMO PRÁTICA PEDAGÓGICA DE 164
RECONHECIMENTO DE TERRITÓRIOS SONOROS
MEDIDAS EDUCATIVAS, AÇÕES PARA O PERTENCIMENTO DO 166
MUSEU EDUCATIVO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA
MARIA MUSEU GAMA D’EÇA
MEMÓRIA URBANA DE BELO HORIZONTE: A CASA DA RUA 168
BERNARDO GUIMARÃES, 441
MUSEU DO SILÊNCIO: O MUSEU COMO FERRAMENTA DE 170
EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PATRIMONIAL
MUSEU E ARQUIVOS: O PAPEL DA UNIVERSIDADE NA EDUCAÇÃO 171
PATRIMONIAL
O DIREITO À CIDADE 173
O PERCURSO URBANO COMO EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: 175
PROJETO PILOTO PARA A RUA HALFELD EM JUIZ DE FORA (MG)
O PROJETO MUSEOGRÁFICO DO MUSEU DO PIAUÍ COMO 177
INSTRUMENTO DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL.
O TEATRO PATRIMONIAL COMO INSTRUMENTO DE PARTICIPAÇÃO 178
E CIDADANIA
OLHARES DO PATRIMÔNIO: A VALORIZAÇÃO E PRESERVAÇÃO DO 179
PATRIMÔNIO CULTURAL ATRAVÉS DA FOTOGRAFIA
OS SABERES DA FOLIA: APRENDIZAGENS EM CONTEXTOS NÃO 181
ESCOLARES
PATRIMÔNIO ARTÍSTICO DO PALÁCIO DAS ARTES: UM ESTUDO DO 182
PROCESSO DE PRESERVAÇÃO DO FIGURINO DOS ESPETÁCULOS
PRODUZIDOS PELA FUNDAÇÃO CLÓVIS SALGADO
PRAÇA RAUL SOARES APÓS A REFORMA E A RETOMADA DE SEU 184
USO COMO PRAÇA
RESIGNIFICAR O MUSEU: PARCERIA UNIVERSIDADE X 186
INSTITUIÇÃO MUSEAL PÚBLICA
REVELANDO MEU BAIRRO, MEU PATRIMÔNIO 188
ROTEIRO PELAS IGREJAS DO CENTRO HISTÓRICO DE CUIABÁ – 190
UM PASSEIO PELOS LOCAIS SAGRADOS
SABERES TRADICIONAIS: DESAPARECIMENTO E PERPETUAÇÃO 192
UM CANTO DA CIDADE: PAISAGEM, MEMÓRIA E 194
PATRIMONIALIZAÇÃO DE GARÇA TORTA A RIACHO DOCE,
MACEIÓ-ALAGOAS.
UM POUCO DE CADA 196
UM REGISTRO ARQUITETÔNICO DA FAZENDA ORIENTE 198
UMA RUA DE MUITOS LUGARES: ROTEIRO PELO CENTRO 200
HISTÓRICO DE CUIABÁ
VIVENDO O PATRIMÔNIO: O MEMORIAL ZUMBI DOS PALMARES, 202
TERESINA-PI.

ARTIGO FINAL
1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A DESTIPIFICAÇÃO DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO 203


RESIDENCIAL DE TERESINA: O CASO DO ENTORNO DA PRAÇA
LANDRI SALES
A IMAGEM DO ESTADO MODERNO DE JUSCELINO KUBITSCHEK 215
ATRAVÉS DA ARQUITETURA DE OSCAR NIEMEYER
A IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO DA ARQUITETURA MODERNA 225
INSTITUCIONAL DE TERESINA: O CASO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DO PIAUÍ.
A IMPORTÂNCIA DO PATRIMÔNIO CULTURAL PARA A CIDADE: 237
IDENTIDADE SOCIAL E PLANOS URBANOS
A MEMÓRIA COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO 256
CULTURAL: BARRA LONGA-MG
A MODERNIZAÇÃO NOS GOVERNOS DE ANTONIO LEMOS (1902- 271
1912) E GETÚLIO VARGAS (1937-1945): A MUDANÇA CULTURAL DO
LOCAL DA MORADIA E SEU REFLEXO NO PROCESSO DE
DEGRADAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE BELÉM/PA
A NOVA PREFEITURA ENXAIMEL DE SÃO LEOPOLDO 290
A PARTICIPAÇÃO POPULAR DESDE A CONCEPÇÃO DO PROJETO 309
DE RESTAURO: O CASO DA CASA DE CÂMARA E CADEIA DE
MARIANA
A PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO EDIFICADO EM COLATINA E 333
SUA TRAJETÓRIA
A PROTEÇÃO LEGAL É SUFICIENTE?. ENGENHOS PUBLICITÁRIOS: 351
UMA AMEAÇA AO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO DO EIXO PILOTO
COMERCIAL RUA DO COMÉRCIO - CENTRO DE MACEIÓ.
ACADEMIA X REDE SOCIAL: A REDE SOCIAL COMO MODO DE 369
DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO AOS RESULTADOS DA
DISSERTAÇÃO
ANÁLISE PARCIAL DA PRESERVAÇÃO NO ESTADO DO RIO 371
GRANDE DO SUL
AS DISTINÇÕES DA PATRIMONIALIZAÇÃO NO BRASIL: UMA 385
REFLEXÃO SOBRE IDENTIDADES MÚLTIPLAS NÃO RECONHECIDAS
AS ESTRADAS DE VILA RICA À CACHOEIRA DO CAMPO: DOS 403
ANTIGOS CAMINHOS À ESTRADA DE DOM RODRIGO JOSÉ DE
MENEZES. INSTRUMENTOS DE SALVAGUARDA E SUAS
INTERFACES COM A MEMÓRIA DE SÃO BARTOLOMEU, OURO
PRETO.
CONFORTO AMBIENTAL EM EDIFICAÇÕES PROTEGIDAS: ANÁLISE 415
DA LEGISLAÇÃO DO CORREDOR CULTURAL DO RIO DE JANEIRO
CONVERGENCIAS E DIVERGENCIAS NA ATUAÇÃO DOS AGENTES 429
DO PATRIMONIO
CRIAÇÃO DO LABORATÓRIO DE CONSERVAÇÃO DE DOCUMENTOS 441
DA UFRRJ (LABDOC/UFRRJ)):MEMÓRIA, CONSERVAÇÃO E
PRODUÇÃO DE CONHECIMENTOS
DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO À MEMÓRIA E HISTÓRIA REGIONAL: 458
RELATO DA EXPERIÊNCIA DO PORTAL EMREDES
DIREITO AO ILEGÍVEL: OCUPAÇÕES EM ÁREAS DE RECONHECIDO 471
VALOR CULTURAL
INVENTÁRIOS ARQUITETÔNICOS NO RIO GRANDE DO SUL: DO 485
PODER PÚBLICO AO PODER DO PÚBLICO
MOVIMENTO “ABRACE A GARÇA” (MACEIÓ-AL): POSSIBILIDADES 499
DE AÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA NA LUTA PELA
DEMOCRATIZAÇÃO DA CIDADE
O CENTRO HISTÓRICO DE CUIABÁ: EM BUSCA DO VALOR 516
ATRIBUÍDO
O DIA DO PATRIMÔNIO EM PELOTAS: UMA CELEBRAÇÃO DE 533
APROXIMAÇÃO DA COMUNIDADE COM SUA CULTURA.
O ESTUDO DE ELEMENTOS DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO AO 546
ALCANCE DA SOCIEDADE: A RELAÇÃO DAS OBRAS RELIGIOSAS
ENTRE PORTUGAL E BRASIL, A INFLUENCIA PORTUGUESA
O TERRITÓRIO URBANO CONTEMPORÂNEO E A SALVAGUARDA DA 558
MEMÓRIA: O INVENTÁRIO E SEUS REFLEXOS NA RUA MARECHAL
DEODORO - JUIZ DE FORA/MG
OFICINA DE RESTAURO PÚBLICO 574
OS CORETOS: A PERMANÊNCIA DO MOBILIÁRIO URBANO SEM 586
USO ESPECÍFICO
PARTICIPAÇÃO POPULAR DESDE A CONCEPÇÃO DO PROJETO DE 602
RESTAURO: O CASO DA CASA DE CÂMARA E CADEIA DE MARIANA
PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA PRESERVAÇÃO DE SÍTIOS HISTÓRICOS 626
URBANOS. EXPERIMENTO METODOLÓGICO NO SÍTIO HISTÓRICO
DE SANTA LEOPOLDINA – ES
PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO E IDENTIDADE: A IMPORTÂNCIA DO 648
RECONHECIMENTO NO PROCESSO DE SALVAGUARDA
PATRIMÔNIO ARTÍSTICO DO PALÁCIO DAS ARTES: UM ESTUDO DO 667
PROCESSO DE PRESERVAÇÃO DO FIGURINO DOS ESPETÁCULOS
PRODUZIDOS PELA FUNDAÇÃO CLÓVIS SALGADO
PATRIMÔNIO PULSANTE: A ÁREA CENTRAL CARIOCA E AS 683
MANIFESTAÇÕES SOCIAIS
PATRIMÔNIO, MEMÓRIA E IDENTIDADE: UM ESTUDO SOBRE AS 696
IGREJAS CATÓLICAS DO CENTRO DE VITÓRIA/ES
PENSANDO A PRESERVAÇÃO ARQUITETÔNICA E URBANA DE 710
ESPÍRITO SANTO DO PINHAL: UM PATRIMÔNIO AINDA A
CONHECER
PERCEBENDO A IMPORTÂNCIA DO PARQUE ESTADUAL DA SERRA 729
DO CURRAL, SÍMBOLO OFICIAL DE BELO HORIZONTE: A
JURISPRUDÊNCIA NA PRESERVAÇÃO DE UM RELEVANTE
PATRIMÔNIO CULTURAL E NATURAL DO QUADRILÁTERO
FERRÍFERO
PISO, PAREDE, TETO: A (DES)CARACTERIZAÇÃO DOS MATERIAIS 745
NAS INTERVENÇÕES REALIZADAS PELOS PROPRIETÁRIOS DOS
BENS PROTEGIDOS.
POR UMA ERÓTICA DO PATRIMÔNIO: ALTERNATIVAS À 760
TRANSFORMAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO CIDADÃ EM PANACEIA DAS
POLÍTICAS PATRIMONIAIS
POR UMA VISÃO HUMANA DO PATRIMÔNIO: REPENSANDO O 775
CONSELHO DELIBERATIVO DO PATRIMÔNIO CULTURAL E
NATURAL DE SABARÁ/MG
REGISTROS VIRTUAIS EM PATRIMÔNIOS CULTURAIS 791
RUÍNAS DO FORTIM DOS EMBOABAS: ENTREMEANDO MEMÓRIA, 805
AMBIÊNCIA E PRESERVAÇÃO EM SÃO JOÃO DEL-REI (MG)
SÍTIO HISTÓRICO DE ITAPINA/ES: O PATRIMÔNIO ENQUANTO 820
MONUMENTO A SER PRESERVADO E A SUA PROBLEMÁTICA
ATUAL DE PRESERVAÇÃO
VIVENDA CAIÇARA: UM EXEMPLAR DA ARQUITETURA EM PEDRA 833
PIAUIENSE

2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 – EDUCAÇÃO


PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

(RE) SIGNIFICAR O MUSEU: PARCERIA UNIVERSIDADE X 845


INSTITUIÇÃO MUSEAL PÚBLICA
“ALÉM DOS MUROS DO INHOTIM”: EDUCAÇÃO PATRIMONIAL, 856
IDENTIDADE E CIDADANIA EM BRUMADINHO / MG
A COLETÂNEA GARIBALDINA E A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EM 865
LAGUNA, SC
A CURA ATRAVÉS DA FÉ: UM OLHAR SOBRE AS 878
BENZEDEIRAS/REZADEIRAS ALAGOANAS
BRINQUEDOS BIOGRÁFICOS: MEMÓRIA DE PRÁTICAS LÚDICAS 891
CINECLUBE, EDUCAÇÃO, PATRIMÔNIO, RESISTÊNCIA, MEMÓRIA: 909
DESAFIOS E POTÊNCIAS NA EDUCAÇÃO MUSEAL
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL ATRAVÉS DA EXTENSÃO 916
UNIVERSITÁRIA NA ENGENHARIA CIVIL: UM ESTUDO DE CASO EM
CURVELO/MG.
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL, O OLHAR DO OUTRO COMO 934
PERSPECTIVA FUNDAMENTAL NA CONSTRUÇÃO DE SABERES
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL, PERCEPÇÃO E INTERPRETAÇÃO 948
AMBIENTAL EM MONUMENTOS E SÍTIOS: POSSIBILIDADES
TURÍSTICAS E EXPERIÊNCIAS DO CEMITÉRIO DO BONFIM, BELO
HORIZONTE – MG
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: UM CAMINHO PARA O INÍCIO DA 965
FORMAÇÃO EM PRESERVAÇÃO PATRIMONIAL. PROGRAMA
APLICADO A JOVENS SECUNDARISTAS
EDUCAR DESEDUCANDO: 10 ANOS DE IMPLANTAÇÃO DA UFS NOS 977
ANTIGOS TRAPICHES DE LARANJEIRAS/SE
ÉTICA E ESTÉTICA DAS PAISAGENS CULTURAIS: ROMARIAS, 995
PEREGRINAÇÃO, RELIGIOSIDADE E TURISMO NA LOCALIDADE
RURAL DE CEMITÉRIO DO PEIXE, DISTRITO DE COSTA SENA
(CONCEIÇÃO DO MATO DENTRO - MINAS GERAIS)
IATE CLUB DE COLATINA/ES: MEMÓRIA E PATRIMÔNIO HISTÓRICO, 1010
CULTURAL E ARQUITETÔNICO
MEDIDAS EDUCATIVAS, AÇÕES PARA O PERTENCIMENTO: CASO 1024
DO MUSEU EDUCATIVO UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA
MARIA MUSEU GAMA D’EÇA
MEMÓRIA URBANA DE BELO HORIZONTE: A CASA DA RUA 1038
BERNARDO GUIMARÃES, 441
MUSEU DO SILÊNCIO: O MUSEU COMO FERRAMENTA DE 1051
EDUCAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO PATRIMONIAL
MUSEU E ARQUIVOS: O PAPEL DA UNIVERSIDADE NA EDUCAÇÃO 1065
PATRIMONIAL
O PERCURSO URBANO COMO EDUCAÇÃO PATRIMONIAL 1080
ROTEIRO DAS IGREJAS DO CENTRO HISTÓRICO DE CUIABÁ: UM 1095
PASSEIO PELO SAGRADO
SABERES TRADICIONAIS: DESAPARECIMENTO E PERPETUAÇÃO 1108
UM CANTO DA CIDADE: PAISAGEM, MEMÓRIA E 1122
PATRIMONIALIZAÇÃO DE GARÇA TORTA A RIACHO DOCE,
MACEIÓ-ALAGOAS.
UM POUCO DE CADA 1138
UMA RUA DE MUITOS LUGARES 1158

APRESENTAÇÃO DE EXPERIÊNCIA
1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO À MEMÓRIA E HISTÓRIA REGIONAL: 1171


RELATO DA EXPERIÊNCIA DO PORTAL EMREDES
O DIA DO PATRIMÔNIO EM PELOTAS: UMA CELEBRAÇÃO DE 1173
APROXIMAÇÃO DA COMUNIDADE COM SUA CULTURA.
O PATRIMÔNIO COLONIAL DA VILA DO PRÍNCIPE AO SERRO DE 1175
HOJE
TOMBAMENTO DA VILA VICENTINA DA ESTÂNCIA 1176

2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 – EDUCAÇÃO


PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

CINECLUBE, EDUCAÇÃO, PATRIMÔNIO, RESISTÊNCIA, MEMÓRIA: 1177


DESAFIOS E POTÊNCIAS NA EDUCAÇÃO MUSEAL
OFICINA ESCOLA DE MANGUINHOS : UMA REFLEXÃO SOBRE A 1179
EXPERIÊNCIA COM EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E FORMAÇÃO DE
ARTÍFICES NOS OFÍCIOS TRADICIONAIS DE CONSTRUÇÃO E ARTE
RITO: O MENINO DO RANCHO - ALDEIA JERIPANKÓ 1180
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

#VIVAMADALENA: A INTERVENÇÃO DA POPULAÇÃO NA


PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL DE
TERESINA.

Larah Jéssica Santos Brito (larahbto@gmail.com)


Nivea Veras Machado (nivea_veras@hotmail.com)

RESUMO

Em 01 de julho de 2015, iniciou-se a ocupação da residência de número 1799,


localizada na Rua Félix Pacheco, no centro da cidade de Teresina - Piauí, com
o propósito de impedir a demolição da casa que pertenceu a Sra. Madalena (in
memorian), ato este que tinha por finalidade a construção de um
estacionamento.

A casa mencionada é um dos principais exemplares de arquitetura eclética que


existe em Teresina, marcando um estilo muito utilizado durante o século XX.
Assim, manter viva a memória da residência da Sra. Madalena é crucial, pois
esta carrega grandes significados da história de desenvolvimento da cidade.

Este artigo tem como objetivo discutir sobre a intervenção da população na


preservação do patrimônio histórico e cultural na cidade de Teresina,
analisando o caso do movimento "#VivaMadalena", para isso utilizou-se fonte
bibliográficas e orais, entrevistas com os participantes da ação e análise de
matérias exibidas nos jornais locais como metodologia de desenvolvimento.

O diferencial do movimento "#VivaMadalena" foi a participação popular, pois


observou-se o sentimento de identidade dos ocupantes com o local que se
visava a proteção. Grande parte das antigas residências históricas de Teresina
sofreram alterações indevidas e acabaram tornando-se estacionamentos, lojas,
lanchonetes ou clínicas.

O movimento "#VivaMadalena" teve grande importância no âmbito de início das


discussões sobre esses atos, que apesar de por vezes não serem ilegais,
acarretam prejuízos inimagináveis para a cultura da cidade. O que se defende
neste artigo não se refere a estagnação da obra arquitetônica no tempo, mas
sim a concepção da sua dinâmica através da constituição de novos usos que
proporcionem vitalidade à obra, e ainda sim preservando sua identidade
eclética.

De acordo com Carsalade (2007, p. 359) a dimensão do uso no restauro está


ligada à possibilidade de se tornar o patrimônio presente, manejável, utilizável,
ou seja, na sua adequação temporal. Logo, o movimento "#VivaMadalena"
mostrou-se como um exemplar desse tipo de intervenção contemporânea, pois
ao mesmo tempo que instigava a população a reconhecer, conhecer e
preservar sua identidade cultural, mostrava que novos usos associados a
manutenção da integridade da obra eram novas formas de proporcionar
vitalidade à residência.

Salienta-se que a participação popular revela-se, de acordo com o panorama


delineado no presente artigo, imprescindível para a solidificação de um
ambiente urbano vocacionado a preservar suas raízes históricas e um
conseguinte sentimento de pertencer à cidade. Movimentos como o
"#VivaMadalena" são importantes propulsores das discussões patrimoniais e
enaltecem a identidade cultural de um povo.

Palavras-chave: Participação Popular, Preservação, Memória, Patrimônio.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A CASA DA FAMÍLIA REGO E A IMPORTÂNCIA DO TOMBAMENTO DAS


EDIFICAÇÕES RESIDENCIAIS NA CIDADE DE OEIRAS-PIPAT

Ravena Da Silva Portela (ravenaportela2012@hotmail.com)


Sávia De Paula Araújo Leite (savialeite14@gmail.com)
Amanda Moreira (amandacmoreira@hotmail.com)

RESUMO

Situada na região sudeste do Piauí, a primeira capital do estado – Oeiras, têm


o seu centro histórico tombado pelo IPHAN desde o ano de 2011, o que, nesse
caso, resultou em exemplares arquitetônicos com características mais
preservadas do que as edificações de outros sítios históricos da região. Como
parte desse contexto, neste artigo analisa-se uma edificação residencial da
cidade – a casa da família Rego, considerando sua importância por vários
aspectos, incluindo a possibilidade de ilustrar os aspectos técnicos e
construtivos correntes da época e também perceber, através do uso da
edificação, como era o cotidiando de uma família comum na cidade de Oeiras.
Discute-se ainda a atuação dos instrumentos de proteção do patrimônio
nesses exemplares, o que fez-se a partir de uma metodologia que engloba
levantamentos bibliográficos, levantamentos documentais e levantamentos
físicos in loco e entrevistas, resultando na percepção da impôrtancia destes
para a manutenção das suas características.

Palavras-chave: Patrimônio arquitetônico, preservação, Oeiras


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A DESTIPIFICAÇÃO DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO RESIDENCIAL DE


TERESINA: O CASO DO ENTORNO DA PRAÇA LANDRI SALES.

Carliene Lima E Silva (carlienelimaesilva@gmail.com)


Taianne Vanne Neco De Sousa (taianneneco@gmail.com)
Wanderson Luis Spusa E Silva (wandersonluiz-05@hotmail.com)
Amanda Moreira (amandacmoreira@hotmail.com)

RESUMO

O centro histórico da cidade de Teresina-PI tem sido descaracterizado


significativamente no decorrer das últimas décadas, especialmente pela
transformação quase que total dessa área - que originalmente abrigava
principalmente os usos comerciais, intitucionais e residenciais - em uma zona
majoritariamente comercial e institucional. Diante desta percepção, neste artigo
abordamos essa transformação e sua relação com a fragilidade dos
instrumentos de proteção a partir do caso da Rua Barroso, no quarteirão que
ladeia a Praça Landri Sales, logradouro de grande destaque na cidade,
especialmente pela sua estreita relação com a história e a memória da cidade
de Teresina. Por intermédio de estudo temporal das mudanças e reconstituição
do perfil de uso das edificações, através de fontes documentais, bibliográficas e
entrevistas, constatou-se a extrema descaracterização dessas edificações,
resultando em profunda mudança da paisagem urbana, sobretudo na
substituição da tipologia residencial por distintas funções.

Palavras-chave: Patrimônio arquitetônico, Residências de Teresina-PI, Rua


Barroso, Praça Landri Sales.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A IMAGEM DO ESTADO MODERNO DE JUSCELINO KUBITSCHEK


ATRAVÉS DA ARQUITETURA DE OSCAR NIEMEYER

Camila Silva Morais (morais.camila@gmail.com)

RESUMO

No Brasil, considera-se que o estilo moderno arquitetônico foi inaugurado em


meados da década de 1930, com a construção do prédio do Ministério da
Educação e Cultura, em equipe liderada por Lúcio Costa e consultoria de Le
Corbusier. Contudo, esse estilo arquitetônico ganha impulso e se consolida no
país sob a figura do político Juscelino Kubitschek e sua parceria com o
arquiteto Oscar Niemeyer, que, ressalta-se, também foi membro da equipe que
trabalhou no projeto do Ministério da Educação e Saúde, em 1936.

O modernismo pretendeu a construção de um mundo público e comum em


relação ao seu passado contíguo, constituindo novos procedimentos, práticas e
referenciais teóricos. Relacionar bases sociais, teoria, prática e materiais
fornecidos pela revolução intelectual, científica e técnica foi o manifesto da
arquitetura moderna e é também aquilo que conecta a obra de Niemeyer não
apenas a outros lugares do início do século XX, como também a outros lugares
da história.

Pensados dentro da trama do modernismo brasileiro, os edifícios projetados


por Niemeyer, especialmente dentre as décadas de 1940 e 1960, desde a
Pampulha até Brasília, ambas reconhecidamente patrimônio cultural, adquirem
sentido a partir do diálogo que o arquiteto procura estabelecer entre seus
projetos e o processo histórico global e que ele traduz no interior de sua
disciplina e seu exercício profissional.

A síntese entre tecnologia e forma, característica das obras de Niemeyer,


ganha expressão durante os principais anos de política de Juscelino
Kubitschek, a saber, como Prefeito da capital Belo Horizonte (1940-1945),
como governador de Minas Gerais (1951-1955) e como Presidente da
República (1956-1961); bem como Juscelino encontra a expressão de
progresso e modernidade, para o desenvolvimento dos lugares por onde
passou como político, nas obras do arquiteto.

Por meio de uma arquitetura monumental, vinculada ao poder político,


Juscelino diminuía o papel do indivíduo enquanto participação política na
cidade, reforçando que a modernização do país era o principal e, para tal, o
sujeito deveria fazer parte da massa, sem se sobrepor a esta. Criando um
cenário da espetacularização através de uma arquitetura imponente, Juscelino
também conseguiu tirar o foco dos problemas econômicos advindos do
endividamento estatal bem como da disparidade social que se configurava
junto com o Estado Moderno. O país crescia economicamente a duras penas,
mas crescia, e junto a isso foi consolidando uma imagem da arquitetura do
poder em suas principais cidades.

Dessa forma, o Estado é o principal propulsor das principais propostas


arquitetônicas renovadoras desde a década de 1930, que modificam nossas
imagens sobre o conjunto da produção da cidade e da paisagem. Do mesmo
modo que a arquitetura se consolida como uma importante peça no cenário
político, fazendo parte da compreensão dos processos de reestruturação
nacional, especialmente nos processos de modernização e produção.

Palavras-chave: Modernismo, Política, Arquitetura, Poder, Patrimônio Cultural.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO DA ARQUITETURA MODERNA


INSTITUCIONAL DE TERESINA: O CASO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO
ESTADO DO PIAUÍ

Emanuelle De Aragão Arrais (emanuelle_aragao_arrais@hotmail.com)


Ana Virgínia Alvarenga Andrade (anavirginia@uninovafapi.edu.br)
Amanda Moreira (amandacmoreira@hotmail.com)

RESUMO

O artigo trata do edifício-sede do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí (1972),


situado na cidade de Teresina-PI e projetado pelo arquiteto carioca Acácio Gil
Borsói durante o Governo de Alberto Tavares Silva (1971-1975), período
correspondente ao surgimento das primeiras obras arquitetônicas com estilo
brutalista na cidade de Teresina. Tem como principal objetivo como discutir a
preservação desta edificação, pela sua relevância histórica e arquitetônica para
a cidade e fornecer o diagnóstico do estado atual da obra estudada quanto à
conservação e proteção do patrimônio, evidenciando a fragilidade dos seus
instrumentos de proteção atualmente. Justifica-se pela necessidade de
estimular a implementação de políticas mais incisivas de proteção deste
importante exemplar e tem como fontes o próprio objeto arquitetônico, tratado
como documento pertinente para a elaboração da pesquisa, publicações a
respeito do tema e entrevistas com agentes que lidam com sua preservação
nas mais diversas esferas.

Palavras-chave: Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, Patrimônio Moderno,


Acácio Gil Borsói, Arquitetura Brutalista.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A IMPORTÂNCIA DO PATRIMÔNIO CULTURAL PARA A CIDADE:


IDENTIDADE SOCIAL E PLANOS URBANOS

Ana Carla Carvalho Schirru (ana.carla@doctum.edu.br)

RESUMO

Entende-se por Patrimônio Cultural, o conjunto de bens materiais e imateriais


que fazem parte da cultura de determinado povo. A cultura por sua vez é
construída através das gerações num processo de transmissão de significados,
conhecimentos, crenças e modo de viver.

Ao tratarmos de patrimônio cultural, destaca-se sua função e referências à


identidade, a ação e a memória de diferentes grupos sociais. Este,
materializado na forma de construções, mantém vivo todo caráter intelectual e
cultural de civilizações anteriores pois, se torna testemunho vivo e tangível de
períodos passados.

Numa sociedade extremamente dinâmica, em que determinados bens se


tornam obsoletos num rápido intervalo de tempo e, onde o conhecimento é
globalizado, a preservação do patrimônio é a garantia de que a história de
determinada sociedade se preserve, valorize e seja divulgada para as gerações
futuras, através da atuação dos poderes governamentais e dos cidadãos.

Segundo Argan (1995), os monumentos desempenham um papel informativo


em sistema de comunicação, com uma função cultural e educativa, ou seja,
didática pois, compartilham a história das cidades, porém em uma perspectiva
ideológica. Na contemporaneidade, o patrimônio cultural desempenha, além de
sua função didática, memorial e identitária, uma importante estratégia
urbanística, onde o patrimônio passa a inserir-se num contexto turístico e
consequentemente, econômico.

Um trabalho multidisciplinar entre distintos profissionais, de diversos campos


de conhecimento, pode garantir uma melhor interpretação do comportamento
das pessoas, entendendo melhor a formação da memória e identidade, a
configuração espacial da paisagem, a importância de sua manutenção, dentre
outros aspectos envolvidos com a cidade.

Dessa forma, objetiva-se abordar a importância do patrimônio dentro do meio


no qual está inserido, especificamente na cidade de Juiz de Fora, MG. Pois, ao
tratarmos de patrimônio cultural, nos referimos ao conjunto de bens dos
diferentes grupos sociais dentro desse contexto comunitário, a cidade. Além
disso, busca-se relacionar as atividades de preservação ao planejamento
estratégico do município, analisando sua função social e econômica.

O método de pesquisa se aplica na revisão bibliográfica, apoiada na leitura


sobre memória e identidade social, no estudo das políticas de preservação do
patrimônio e, no estudo de caso da cidade de Juiz de Fora. Esta, que possui
um conjunto arquitetônico eclético e art déco importante no cenário local e
regional, que apesar de protegidos, ainda não possuem uma valorização
cultural que atinja todos os aspectos da paisagem, enquanto cidade e social,
enquanto cidadania.

Considera-se que na contemporaneidade, as políticas e premissas patrimoniais


encontram-se estabelecidas. Porém, há trabalho a executar, no que diz
respeito a conscientização e valorização social, esta, associada a educação
patrimonial e as políticas públicas. Assim, o trabalho deve ser na relação
indivíduo e sociedade.

Palavras-chave: memória, identidade, cidade, políticas


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A MEMÓRIA COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO


CULTURAL: BARRA LONGA-MG

Camilla Magalhães Carneiro (camilla.15.magalhaes@gmail.com)


Ítalo Itamar Caixeiro Stephan (urbanismo.stephan@ufv.br)
Luiz Fernando Reis (lfreis@ufv.br)

RESUMO

Este artigo trata das memórias de Barra Longa, uma das mais antigas cidades
de Minas Gerais, localizada na Zona da Mata mineira e que ainda possui um
importante acervo arquitetônico e cultural. Ele surgiu da necessidade de
registrar as memórias da cidade, guardadas por pessoas que, em sua história
de vida, mantêm consigo valiosas informações que não foram divulgadas e/ou
registradas publicamente. Neste trabalho, a memória é tratada como principal
instrumento de preservação da cultura, pois ela é fonte de registro das
vivências, capaz de resguardar a identidade local, visto que há uma grande
dificuldade em encontrar documentos que auxiliem no entendimento da história
de Barra Longa. A Monografia Histórica do município, escrita pelo Cônego
Raimundo Otávio da Trindade em 1917, com sua primeira versão publicada no
ano de 1918, é um exemplo dos raros livros que registram a história da cidade.
Exemplo da casualidade, o livro foi encontrado em posse de moradores de
Barra Longa. O documento foi a principal fonte para a redescoberta de uma
história que a população desconhecia e a motivação do aprofundamento da
pesquisa. A monografia escrita pelo Cônego demonstra sua preocupação em
registrar a cultura local. No ano em que o livro completou seu centenário, foi
iniciado um trabalho para resgatar seu conteúdo, fazendo com que o objetivo
que o Cônego Raimundo teve, ao escrevê-lo, fosse alcançado: enaltecer o rico
valor cultural da antiga cidade de Barra Longa. O Cônego registrou aspectos
físicos e culturais do município, a partir de documentos e memórias pessoais.
Expressa sua opinião, criticando, principalmente, as perdas patrimoniais que
ocorreram durante os anos. Algumas transformações foram registradas em
fotos e documentos, outras encontram-se guardadas nas memórias de pessoas
idosas que fazem relatos importantíssimos que merecem atenção e requerem
registro, para que não se percam com o tempo. As duas principais igrejas, que
são uns dos poucos remanescentes da arquitetura colonial, sofreram grandes
alterações físicas. São necessárias ações de preservação em Barra Longa
para que seu patrimônio cultural permaneça, e para que não se perca no tempo
por falta de registros. A ausência de um órgão de proteção e de catalogação do
seu acervo faz com que grande parte dos registros não seja resguardada. A
descontinuidade do interesse por parte dos gestores pelo patrimônio é um dos
fatores que colocam em risco a sua conservação. As peculiaridades de uma
cidadezinha do interior, com traços culturais bem típicos, precisam ser
cuidadosamente preservadas. A memória de um povo pode ser retratada
através de registros orais, que passam de geração a geração, mas para que
sobreviva e não perca sua especificidade, torna-se necessário o registro
adequado e um competente programa de educação patrimonial.

Palavras-chave: Memória, preservação do patrimônio cultural, Barra Longa-


MG, Cônego Raimundo Otávio da Trindade.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A MODERNIZAÇÃO NOS GOVERNOS DE ANTONIO LEMOS (1902-1912) E


GETÚLIO VARGAS (1937-1945): A MUDANÇA CULTURAL DO LOCAL DA
MORADIA E SEU REFLEXO NO PROCESSO DE DEGRADAÇÃO DO
CENTRO HISTÓRICO DE BELÉM/PA

Samia Saady Morhy (samiamorhy@gmail.com)


José Júlio Lima (jjlimaufpa@gmail.com)
Celma (celma_chaves@hotmail.com)

RESUMO

A imposição de leis urbanísticas nas cidades em áreas de valor a preservação


pressupõe a regulação de construção relacionada à proteção do patrimônio. A
ação do Estado na condução da gestão edilícia decorrente das leis insere-se
na expressão de um discurso político criado em torno de valores incorporados
nas intenções da política de preservação. A introdução da modernização como
ideário político lançada inicialmente na capital paraense na era do Intendente
municipal Antônio Lemos (1902–1912) e consolidada no governo de Getúlio
Vargas (1937–1945) incentivou uma mudança nos hábitos sociais dos
moradores de classe alta em termos de local da moradia. Com efeito direto
sobre o Centro Histórico de Belém, protegido por legislação específica federal
em 2012 e por legislação municipal desde 1990, este artigo trata da relação
entre o processo de degradação arquitetônica dos sobrados e casarios do
bairro da Campina construídos até o início do século XX com os efeitos da
modernidade operados em dois períodos de centralização política e limitações
no regime de direitos democráticos. Ainda que marcadamente ligados a elites
econômicas, a modernidade enquanto discurso contrapõe-se a uma
compreensão subjetiva de sua casualidade. Para a compreensão da
subjetivação dos fatos relativos à modernização no bairro da Campina, entre o
fim do século XIX e início do XX, este artigo constrói um discurso historiográfico
sobre a modernização em Belém durante o período lemista e, em seguida,
durante o Estado Novo varguista, buscando revelar as relações entre as
historiografias dos dois momentos de poder político centralizador e a
modernização sobre o local de morar, o qual estaria associado,
contraditoriamente, a um processo de degradação do estoque edificado de um
bairro histórico de Belém. A partir destes dois momentos, o trabalho busca
articular em uma terceira parte, na qual, por meio do discurso historiográfico
construído, associar a modernidade presente na mudança cultural e nos
hábitos sociais da camada da população de alta renda, ligados ao poder
político em vigor, com a introdução da modernização do local e na forma de
morar, aguçando o sentido da modernidade como fator relevante de status
social, sob pena de perder o patrimônio arquitetônico eclético. Ressalta-se que
a população residente no Centro Histórico de Belém, conforme Censos do
IBGE de 2000–2010 aumentou 7.5%, mesmo sem nenhuma política
incentivadora ao uso habitacional, o que leva a sugerir políticas de retorno da
moradia ao Centro. Ao final do artigo, há a indicação de políticas habitacionais,
por meio de ações governamentais ou civis. Com destaque para maior
participação social nos projetos, uma vez que este item é uma das conquistas
democráticas recentes no planejamento urbano, bem como, que sejam
capazes de fomentar uma mudança cultural e nos hábitos da sociedade local
visando aguçar seu interesse de retornar a moradia nos sobrados ecléticos do
tombado núcleo urbano de Belém e minimizar sua degradação.

Palavras-chave: democracia, modernização, modernidade, moradia, ruínas,


Centro Histórico de Belém/PA
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A NOVA PREFEITURA ENXAIMEL DE SÃO LEOPOLDO

Leonardo Corá (leonardocora@yahoo.com.br)


Carolina Kempfer (carol.vza@gmail.com)

RESUMO

São Leopoldo é um município gaúcho onde foi fundada em 1824 a colônia


imperial de mesmo nome. Os registros deste passado podem ser encontrados
na arquitetura da região, onde exemplares de enxaimel ainda resistem ao
tempo, a grande maioria sem nenhuma proteção. No ano de 2009, o poder
público municipal lançou o projeto de uma nova prefeitura, no centro histórico
local, que seria construída com a inserção de elementos alusivos a técnica
construtiva enxaimel. A reação contrária da população, liderada pelo
movimento estudantil dos cursos de arquitetura e urbanismo da UNISINOS e
FEEVALE, foi tão intensa, que o projeto teve que ser reformulado, sendo
adotado um estilo contemporâneo. A produção desses simulacros de
arquitetura por meio de incentivos legais no plano diretor de São Leopoldo nos
oferece possibilidades de interpretações sobre o embate dos diferentes grupos
sociais que compõem a sociedade contemporânea da cidade. Conceitos como
identidade, auto-representação e paisagem são debatidos para buscar
compreender o que levou a sociedade de São Leopoldo a refutar a construção
de uma edificação com a importância que uma prefeitura tem para a imagem
da cidade. Para a construção do presente artigo, realizamos uma análise de
conteúdo, que é definida como um conjunto de instrumentos de cunho
metodológico em constante aperfeiçoamento, que se aplicam a discursos
extremamente diversificados. Sendo assim o nosso “corpo documental” é o
plano diretor local em seus artigos que promoveram a construção de
simulacros, o projeto arquitetônico da nova prefeitura e a cobertura que a
imprensa local deu para o ocorrido. A análise das referidas fontes se deu
através de questões temáticas, nas quais são:
representação/autodeterminação, territorialidade e contribuição para a
paisagem cultural. Em cada questão temática foi desenvolvida uma hipótese,
um objetivo geral e índices norteadores que serão utilizados para refletir,
relacionar, comparar, contrapor os diversos artigos que tratam a proteção do
patrimônio cultural. Por fim, ainda que não definida por seus agentes em seu
tempo como tal, uma posterior análise do ocorrido em São Leopoldo, foi
definido pela arquiteta Briane Bicca e pelo arquiteto Carlos Fernando de Moura
Delphim como uma caso de sucesso na defesa não apenas no patrimônio
arquitetônico, mas da paisagem cultural da região de imigração germânica.

Os resultados obtidos foram a desconstrução de ideia de que a sociedade civil


em geral não possui a capacidade de discernir entre um bem cultural edificado
e um simulacro, bem como da necessidade de envolvimento da comunidade
em ações que afetem a imagem da cidade. Pelo fato da nova prefeitura
enxaimel não ser fato a demolição de uma edificação histórica, mas sim uma
agressão a paisagem do centro histórico, conclui-se que sociedade em geral
quando bem instruída, já esta pronta para compreender o conceito de
paisagem.

Palavras-chave: Centro Histórico, São Leopoldo, Enxaimel, Paisagem Cultural


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A PARTICIPAÇÃO POPULAR DESDE A CONCEPÇÃO DO PROJETO DE


RESTAURO: O CASO DA CASA DE CÂMARA E CADEIA DE MARIANA

Fernanda Trindade De Carvalho (ftrindadecarvalho@yahoo.com.br)

RESUMO

Baseado na temática “Patrimônio e participação”, proposta pelo IX Mestres e


Conselheiros, e no eixo I “Do técnico à população: a democratização do campo
do patrimônio” proponho submeter a experiência vivida na elaboração do
projeto de restauro e readequação física do espaço da Casa de Câmara e
Cadeia de Mariana.

O trabalho visa demonstrar a democratização do campo do patrimônio a partir


da participação popular no desenvolvimento do projeto de restauro da Cada de
Câmara e Cadeia de Mariana. A partir da possibilidade de intervenção tornou-
se necessário entender as relações sociais estabelecidas na Câmara e no
cenário no qual a instituição está inserida, a Praça Minas Gerais. A
investigação iniciou pelo entendimento dos fatores que tornam a Casa de
Câmara e Cadeia de Mariana relevante sob o aspecto histórico-cultural.

O estudo é fundamentado ainda no atual conceito atribuído ao termo


“patrimônio” e na teoria de valores proposta por Aloïs Riegl e reafirmada pela
Carta de Burra do ICOMOS da Austrália. E parte do pressuposto que qualquer
processo de intervenção em um bem patrimonial deve ir além da estrutura
física, sendo obrigatório um estudo sobre os valores atribuídos ao bem por
diversos segmentos da sociedade, e não mais apenas pelos técnicos.
Utilizamos a ‘caixa de ferramentas’ proposta por Randall Manson, publicado
pelo Getty Conservation Institute. Selecionamos os atores nos seguintes
grupos: vereadores e funcionário da Câmara; moradores do entorno e agentes
do patrimônio; turistas. Para cada grupo adotamos uma metodologia, sendo
elas: método ZOPP, Mapa Mental e questionário respectivamente.

Através da aplicação dos métodos conseguimos desenvolver de maneira


coletiva uma proposta de intervenção para a Casa de Câmara e Cadeia de
Mariana, de forma que os valores reconhecidos pela população fossem
mantidos e problemas de uso do espaço apontados no grupo de vereadores e
funcionários fossem solucionados.

O mais relevante foi perceber que é possível ter a participação popular de


maneira verdadeira em um projeto de restauro e reutilização de um bem
patrimonial, do qual comprovamos também sua relevância como bem
patrimonial para todos os envolvidos.

Palavras-chave: participação popular, patrimônio, atores, valores


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A PERSPECTIVA DA PATRIMONIALIZAÇÃO DA CAPOEIRA NA VISÃO


DOS MESTRES ANGOLEIROS DE BELO HORIZONTE

Caroline Césari Oliveira (carolinecesari07@gmail.com)

RESUMO

Em 2008 a Capoeira se tornou patrimônio cultural nacional. Foi registrada a


Roda de Capoeira na categoria "Forma de Expressão", e o ofício dos mestres
de capoeira na categoria "Saberes". Nesse processo, muitos agentes - técnicos
do patrimônio, sociedade civil, simpatizantes, acadêmicos e capoeiristas- se
envolveram com as discussões promovidas dentro e fora do IPHAN- Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, instituição responsável pelo
registro dos bens culturais nacionais. Muitos seminários foram produzidos e
encontros realizados, porém os conflitos existentes no âmbito das diferenças
inerentes que envolvem as práticas, visões de mundo e rituais distintos entre
as várias escolas da Capoeira ficaram evidentes neste diálogo coletivo. O
próprio dossiê de registro da Capoeira, assim como o IPHAN o publicou em
seu site na rede mundial de computadores foi um documento que apresentou
muitos problemas do ponto de vista metodológico, já que tendeu a tornar
homogêneo formas distintas de fazer e pensar a Capoeira, que para os
praticantes é muito evidente, mas que no dossiê pareceu muito sutil e em
alguns momentos irrelevante. A produção do documento foi feita baseada nos
pareceres da equipe técnica responsável pelas pesquisas. Mas ao longo do
texto, percebe-se que a visão dos mestres não foi contemplada, pois erros em
questões fundamentais desta arte, como no relato sobre os berimbaus, ficaram
evidentes, pelo menos para os capoeiristas. Isso deixou claro que poucos
mestres da Capoeira foram realmente consultados na produção do documento.
Tampouco sua visão sobre o universo da Capoeira foi contemplada. Esse
artigo traz um pouco desta reflexão, acerca do processo de patrimonialização
da Capoeira, e do grau de participação dos reais detentores desse saber-fazer:
os mestres. Trazemos apenas um panorama desse diálogo, numa perspectiva
pontual, mas abrangente dos mestres da Capoeira Angola de Belo Horizonte
que foram entrevistados por ocasião da realização da minha dissertação de
mestrado intitulada: "A Capoeira Angola e o processo de patrimonialização da
Capoeira como bem imaterial brasileiro", defendida junto ao Departamento de
Antropologia Social da Universidade Federal de Minas Gerais, com orientação
do professor Dr. Leonardo Hipólito Figoli, no final do ano de 2013.

Palavras-chave: Capoeira Angola; patrimonialização; mestres


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A PRÁTICA INTERDISCIPLINAR NA CONCEPÇÃO E EXECUÇÃO DE


PROJETOS CULTURAIS: O CASO DO MUSEU MILITAR DA ESCOLA DE
SARGENTOS DAS ARMAS

Marcelle Dutra (arqmarcelledutra@gmail.com)


Edgley Pereira De Paula (edgleydepaula@hotmail.com)

RESUMO

Da concepção do projeto cultural ao detalhamento arquitetônico, propõe-se


expor a relevância da interdisciplinaridade no processo de intervenção no
patrimônio e, como as especificidades locais, a problemática envolvida na
construção do espaço museológico, considerando as dinâmicas de produção
de projetos ainda persistentes e sua relação o tempo disponível, produziram
em contexto militar uma base de referência empírica para projetos culturais.

A integração indispensável entre arquitetura, história e museologia para a


proteção do patrimônio é exposta com o caso do Museu Militar da Escola de
Sargentos das Armas, objeto de discussão do impacto discurso expositivo e da
relação da instituição com o seu acervo e os públicos, interno e externo. Expor
as percepções na construção do repertório individual e coletivo que incidem na
identidade da proposta de projeto, as relações recíprocas entre o espaço e
aqueles que nele se inserem, em mútua influência e por mais que pareça
antagônico, produzindo singularidades. Delinear a importância da execução
deste tipo de projeto com base na investigação empírica, na inovação e no
desenvolvimento de estratégias eficazes de comunicação.
Palavras-chave: patrimônio militar, projetos culturais, interdisciplinaridade,
concepção, base empírica
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO EDIFICADO EM COLATINA E SUA


TRAJETÓRIA.

Alexandre Valbuza Almeida (alexandrevalmeida@gmail.com)

RESUMO

O presente trabalho tem a intenção de pesquisar a respeito do processo de


desenvolvimento das politicas públicas de preservação do patrimônio cultural
em Colatina, Espirito Santo, especificamente o patrimônio edificado.
Posteriormente averiguar como o desenvolvimento urbano da cidade,
influenciou na condição atual do patrimônio arquitetônico da área central da
cidade. Devido as fortes chuvas que atingiram Colatina entre os anos de 2013
e 2014, grande parte dos registros e documentações a respeito da história e
desenvolvimento da cidade foram perdidos, tornando a coleta de dados mais
árdua. Observa-se, desde então, o aumento dos percalços à obtenção de
informações. Cabe salientar que o trabalho está baseado em análise
bibliográfica e sistematização de informações obtidas através de documentos,
material iconográfico, entrevistas e levantamento de campo. A pesquisa
apresenta-se como um campo vasto de possibilidades, uma vez que há pouco
autores e pesquisadores do tema. Nota-se também que a falta de revitalização
dos prédios históricos tem acarretado situações para a desvalorização dos
imóveis em nível patrimonial. Por fim, considera-se que a relevância acadêmica
deste trabalho se dá na perspectiva de poder contribuir como fonte para outras
pesquisas voltadas para essa temática.

Palavras-chave: patrimônio, historia, memoria, cultura, arquitetura.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

A PROTEÇÃO LEGAL É SUFICIENTE?. ENGENHOS PUBLICITÁRIOS: UMA


AMEAÇA AO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO DO EIXO PILOTO
COMERCIAL RUA DO COMÉRCIO - CENTRO DE MACEIÓ.

Karla Calheiros (karlaarachel@hotmail.com)

RESUMO

O artigo tem como propósito analisar e compreender as intervenções


publicitárias no patrimônio arquitetônico da Rua do Comércio localizado na
Zona Especial de Preservação 2 (ZEP-2) no Centro de Maceió, situada no
Setor de Preservação Rigorosa 1 (SPR-1) – bem como sua normativa vigente
n° 4.545/1996 que institui normas gerais a respeito da edificação ou conjunto
de edificações para as Zonas Especiais de Preservação (ZEPs) e especifica
paramentos para a publicidade em imóveis situados em área de proteção
municipal desde 1997 através da regulamentação do Decreto n°5.700. A
análise abrange a rua após a implementação do Projeto de Requalificação
(2001-2009) realizado pela Secretaria Municipal de Planejamento (SEMPLA),
atual Secretaria de Desenvolvimento Territorial e Meio Ambiente (SEDET).

Para o desenvolvimento do artigo que fundamentou a análise do eixo piloto


comercial Rua do Comércio foram explorados as legislações municipais
n°4.545/1996 (Normas gerais de proteção ao patrimônio ou conjuntos urbanos
na qual a ZEP faz parte), lei n° 3.538, de 23 de dezembro de 1985 (Código de
Posturas de Maceió), a Lei Municipal 4.954 de 06 de janeiro de 2000 sobre a
Veiculação de propaganda nos logradouros públicos ao ar livre ou em locais
com visibilidade dos espaços públicos e o Plano Diretor de Maceió. Como
também foram realizadas percepções diretas que possibilitou reconhecer as
peculiaridades existentes nas edificações como os detalhes dos elementos
arquitetônicos e o modo como os anúncios ou engenhos publicitários (placas e
letreiros) interferiam na visualização das construções.

A partir das informações obtidas in loco, compilaram-se os dados que serviram


para mapeamento de uso e ocupação do solo da rua e comparações de
registros fotográficos obtidos das edificações da Rua do Comércio entre os
séculos XX e XXI para investigar o uso atual dos imóveis que permeiam a rua e
analisar as principais modificações na fachada das edificações.

Dessa maneira, buscou-se averiguar/avaliar a atual situação de preservação


das edificações da Rua do Comércio para então propor medidas como uma
cartilha e um aplicativo para frear as descaracterizações do patrimônio
edificado com o intuito de possibilitar a melhoria na paisagem urbana e
proporcionar a contemplação das edificações históricas por parte da população
e incentivar a denúncia às possíveis falhas da fiscalização referente aos
anúncios publicitários no patrimônio arquitetônico. Tendo em vista que o
instrumento jurídico é incapaz de manter na integra as particularidades
estilísticas dos exemplares arquitetônicos, pois ela apenas é um meio de
nortear as ações que devem ser seguidas após a sua implementação. Assim,
entendendo, acredita-se que um bom uso e uma boa conservação do imóvel
por parte de seu proprietário/inquilino, quer particular, quer institucional pública,
contribua para a preservação do patrimônio edificado.

Palavras-chave: Patrimônio arquitetônico, anúncios publicitários, lei,


fiscalização, aplicativo.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

AS DISTINÇÕES DA PATRIMONIALIZAÇÃO NO BRASIL: UMA REFLEXÃO


SOBRE IDENTIDADES MÚLTIPLAS NÃO RECONHECIDAS.

Eliana Miranda Araujo Da Silva Soares (elianamass@gmail.com)

RESUMO

O crescimento dos movimentos sociais urbanos, em defesa do patrimônio


edificado no Brasil, vem evidenciando as dificuldades na gestão desse
patrimônio pelos órgãos de tutela e a prevalência de uma hegemonia
tecnocrática, expondo a ausência da participação social, seja nas políticas de
preservação ou nos processos decisórios de intervenções na cidade que
afetam o coletivo. Apesar da legitimação da participação e controle social pela
Constituição Federal de 1988 e também pelo Estatuto da Cidade de 2001,
cujos instrumentos visam assegurar o pleno exercício da cidadania e a gestão
democrática das cidades, observa-se que a aplicabilidade desses instrumentos
está longe de ser efetiva.

Apresenta-se um conjunto complexo de questões que abrangem: a


compreensão de que o patrimônio cultural possui caráter difuso e coletivo; de
que é portador de referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes
grupos formadores da sociedade brasileira; de que há desigualdade na forma
de apropriação pelos cidadãos que são privados muitas vezes do processo de
conhecimento, fruição e valorização do patrimônio; e que comunidades
pleiteiam reconhecimento identitário de bens culturais.
A partir da análise de demandas de movimentos sociais em defesa do
patrimônio edificado, e do contexto brevemente aqui apresentado, propõe-se
refletir, neste artigo, se as escalas de interesse de preservação – nacional,
regional e local, ainda que sejam entendidas como uma estrutura de
organização das instituições para uma gestão compartilhada, ao conferirem
uma hierarquização de valores do patrimônio, acabam por promover um caráter
distinto desse patrimônio. Essa distinção pode implicar na distribuição desigual
de investimentos para a conservação, em muitos casos na flexibilização da
legislação em favorecimento de empreendimentos imobiliários e no processo
de conhecimento, fruição e valorização do patrimônio cultural. Também
argumenta-se que pode ser uma forma excludente de reconhecimento de
identidades, uma vez que, à luz da Constituição Federal de 1988, o patrimônio
cultural brasileiro é caracterizado pela sua diversidade, constituindo-se,
portanto, por múltiplas identidades.

Palavras-chave: Movimentos sociais; Identidade; Patrimônio.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

AS ESTRADAS DE VILA RICA À CACHOEIRA DO CAMPO: DOS ANTIGOS


CAMINHOS À ESTRADA DE DOM RODRIGO JOSÉ DE MENEZES

Tássia Christina Torres Rocha (tassia.surya@gmail.com)


Jefferson Alexandre Da Cruz (jefalexcruz@yahoo.com.br)
Alex Fernandes Bohrer (alex.bohrer@ifmg.edu.br)
Joao Vitor Carvalho Batisteli (joaovitor.batisteli@gmail.com)

RESUMO

Nos tempos coloniais, as estradas reais eram as principais vias de acesso à


região de Vila Rica. Em 1782 o governador Dom Rodrigo José de Menezes
mandou abrir uma nova estrada ligando o Palácio de Cachoeira ao de Ouro
Preto. Esta nova via, que substituiu uma mais antiga (construída no cimo da
serra em 1718), era uma estrutura soberba, com 20Km de extensão, com
calçamentos, muros de arrimo, caneletas de escoamento de água e um belo
chafariz (tombado pelo Iphan em 2007). Uma fantástica obra de engenharia
colonial, a estrada de Dom Rodrigo oferece um passeio único pela imponente
serra, outrora chamada Serra da Cachoeira, hoje conhecida como Serra de
Ouro Preto. Por sua incontestável importância histórica, em 2014 iniciou-se um
projeto de Pesquisa e Extensão no IFMG – Ouro Preto com o objetivo de
impulsionar instrumentos de proteção patrimonial e garantir, através dele, o
acautelamento das estradas. Cremos, contudo, que mais importante até que os
processos de tombamento e guarda legal, a conscientização da população
acerca de seus bens de valor histórico é de fundamental importância para a
manutenção do próprio bem. Nesse sentido, desenvolver um trabalho de
sensibilização e educação patrimonial nas comunidades de São Bartolomeu,
bem como em distritos vizinhos, ligados intrinsecamente à famosa Estrada, foi
primordial para o sucesso do projeto. Grande foi a participação da comunidade
que atuou de forma ativa nas atividades propostas, sendo protagonistas
durante todo o processo. O trabalho de educação patrimonial proporcionou
uma rica experiência de trocas entre a comunidade e academia, mostrando,
dessa forma, que ambas devem caminhar juntas no processo de construção do
conhecimento. Houve contato estabelecido com o IEPHA, para orientar as
políticas públicas possíveis de se aplicar nas estradas, bem como uma parceria
com o Ministério Público, a fim de apurar as possibilidades de acautelamento
real frente ao Estado. O fruto principal do projeto foi o início do procedimento
de tombamento da Estrada de Dom Rodrigo, que atualmente está em
discussão no Conselho Patrimonial de Ouro Preto. Cabe frisar que diante da
repercussão do trabalho, houve interesse por parte do IPHAN em obter os
dados inventariados da pesquisa para iniciar esse trâmite. Partindo dos
resultados positivos já alcançados, o foco agora é abordar a participação
efetiva nos procedimentos de tombamento junto ao COMPATRI. Tendo em
vista também o grande reconhecimento obtido com o trabalho de educação
patrimonial nas escolas de São Bartolomeu e Cachoeira do Campo, recebemos
diversos convites para realização das mesmas atividades em outros distritos.
Assim, resolvemos aprimorar as ações relacionadas à sensibilização junto às
comunidades, ampliando esse trabalho para o distrito de Glaura, sendo esta
localidade ligada diretamente com a história da estrada. Espera-se, sobretudo,
que o projeto continue aproximando os moradores ao patrimônio, estimulando
assim, a cidadania ativa e participativa.

Palavras-chave: Tombamento, Estrada, Educação Patrimonial, Preservação.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

AS TRANSFORMAÇÕES URBANÍSTICAS E ARQUITETÔNICAS


OCORRIDAS NA PRAÇA D. PEDRO II DESDE SUA FUNDAÇÃO ATÉ OS
DIAS ATUAIS

Mariana Rios Da Silva (mariana_riosds@hotmail.com)

RESUMO

A cidade de São Luís é inicialmente habitada por índios tupinambás e tem seu
direito de exploração concedido a Portugal pelo Tratado de Tordesilhas,
contudo sua fundação só é reconhecida com a ocupação francesa em 1612 e
edificação do Forte São Luís. A escolha do local para a implantação do forte foi
cuidadosamente realizada, visando facilitar a defesa do solo. Essa área
consiste no núcleo embrionário da cidade e corresponde a uma das praças
mais importantes da cidade atual, conhecida como Praça Dom Pedro II. Este
trabalho objetivou pesquisar as transformações urbanísticas, arquitetônicas e
as funções exercidas por esse espaço ao longo da história de São Luís. Para
tanto estudou-se brevemente sobre a história da cidade e, posteriormente, fez-
se um recorte histórico na área de estudo e uma análise tipológica das
principais edificações que compõe o conjunto arquitetônico na praça, entre
elas: Igreja da Sé, Palácio dos Leões, Palácio de La Ravardière, edifício João
Goulart, entre outras. O espaço, inicialmente denominada Avenida
Maranhense, teve seu nome atual instituído em 1925, através da Resolução
n.340, de 30 de novembro. A Praça D. Pedro II passou por diversas
intervenções que transformaram significativamente seu aspecto ao longo dos
anos, operações que alteraram desde disposição dos canteiros até a
pavimentação e iluminação. De forma menos significativa, pequenas
intervenções foram realizadas, buscando conservar a estrutura existente. A
análise tipológica se propôs a ilustrar como as modificações em cada edifício
afetam a paisagem da Praça Pedro II. Como exemplo a Igreja da Sé, sua data
de construção, 1622, aproxima-se a da fundação da cidade. Inicialmente uma
construção em pedra e cal, teve seu modelo original demolido e reconstruído
em 1680. Apesar das diversas intervenções realizadas, a mais importante é a
de 1922, na qual teve sua fachada modificada. A análise propriamente dita é
feita através da divisão da fachada de cada edificação em níveis horizontais e
verticais, onde se faz a identificação de cada elemento, indo desde o número
de esquadrias até elementos ornamentais observados, especificando, quando
possível, qual o estilo e material apresentado por cada um. As informações
obtidas permitem concluir que a história da Praça Pedro II se entrelaça à da
cidade, estando presente desde sua fundação e acompanhando seu
crescimento. As diversas funções exercidas pela praça revelaram-se no
desenvolvimento da pesquisa, exercendo desde o papel de núcleo embrionário
até funções militares, como forte da cidade em sua fundação; políticas, sendo a
sede do poder administrativo estadual e municipal; religiosas, abrigando a
Catedral de São Luís; e, mais recentemente, de turismo, com hotéis e também
como rota dos passeios que ocorrem no centro histórico. Esse espaço mostrou-
se de suma importância para a cidade colonial e se mantém preservado para a
cidade moderna.

Palavras-chave: Praça D. Pedro II, Arquitetura, Urbanismo


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

CENTRO DE ARTES DA UFF: EDIFÍCIO-EMBLEMA DA MEMÓRIA URBANA


E CULTURAL DE NITERÓI-RJ.

Ricardo José Brügger Cardoso (ricardojbcardoso@hotmail.com)

RESUMO

A presente pesquisa pretende contribuir para a área de conhecimento que


envolve o conceito de Centros Culturais, destacando algumas análises
particulares relativas às edificações culturais universitárias. Para tanto, optou-
se pelo desenvolvimento de um estudo de caso sobre o contexto histórico,
arquitetônico e urbanístico do Centro de Artes da Universidade Federal
Fluminense em Niterói, no Estado do Rio de Janeiro, prédio erguido no bairro
de Icaraí e que está simbolicamente representado pela paisagem balneária da
Baía da Guanabara e pela vista panorâmica da cidade do Rio de Janeiro. Um
dos objetivos deste trabalho é procurar estabelecer as inter-relações entre
arquitetura teatral, cidade e cultura, por meio de uma abordagem
interdisciplinar, e que tem como tema central a produção de edifícios culturais
na contemporaneidade. Considerados como um dos mais importantes
equipamentos urbanos contemporâneos, ao serem vistos e construídos em
inúmeras cidades brasileiras e estrangeiras, os Centros de Arte e Cultura
constituem a temática central deste estudo. Nesse sentido, o Centro de
Artes/UFF constitui-se como o principal objeto de análise desta investigação
acadêmica, sendo proposta aqui a apresentação de parte inicial do trabalho,
mais especificamente sobre a descaracterização arquitetônica sofrida pelo
antigo prédio de estilo "art déco", bem como de outras intervenções ocorridas
em todo o conjunto e em seu interior. No passado, o prédio fora erguido para
abrigar o antigo Casino Icarahy, num programa arquitetônico que abarcava o
hotel, o grill e o salão de jogos, onde grandes nomes da música brasileira e
latino-americana se apresentaram em noites memoráveis. Com a proibição dos
jogos no país, estabelecida em Decreto de Lei 9.215 de 1946, o Casino Icarahy
foi fechado, passando a funcionar apenas como hotel, restaurante e com a
inclusão, posteriormente, do Teatro Cassino. Em 1969, o prédio passou a
abrigar a Reitoria da UFF e o seu Centro de Artes, principal objeto de análise
dessa pesquisa.

Palavras-chave: Equipamento Cultural, Centro de Artes da UFF, Cidade de


Niterói.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

CIDADE, MEMÓRIA, PATRIMÔNIO E MUSEOLOGIA SOCIAL: UMA


ANÁLISE SOBRE A RELAÇÃO ENTRE ESPAÇO URBANO, MUSEUS
COMUNITÁRIOS E ALTERNATIVAS DE RESISTÊNCIA.

Robson De Santana (robson-historia@hotmail.com)

RESUMO

A referida pesquisa trata do surgimento dos museus comunitários nos últimos


anos como uma possível alternativa à política hegemônica do capital e que
encontra no espaço urbano um palco de conflitos e de resistência. A cidade do
Recife, em Pernambuco, sofre um dos maiores índices de segregação social e
territorial do Brasil, configurando-se como uma cidade dividida em zonas
nobres e periféricas. Os setores periféricos da cidade passaram a ser foco dos
interesses dos grandes consórcios imobiliários, que com a ajuda dos governos
locais, expulsam os moradores dessas regiões para a efetivação de seus
projetos que atendem às classes mais abastadas da cidade. A comunidade do
Coque, localizada no setor central do Recife, vem há anos sendo assediada
pelo poder público municipal, aliado aos conglomerados empresariais. Resistir
a essa especulação tem sido um desafio traçado por parte da comunidade, que
através de diversas manifestações tentam reafirmar o direito que possuem de
morar naquele território. É nesse contexto que surge o projeto do Museu da
Beira da Linha do Coque, tendo como objetivo reconstruir a memória local
através de um acervo áudio-visual, ganhando notoriedade junto a outros
movimentos contra a especulação imobiliária que ameaçam territórios vizinhos,
como o do Cais José Estelita. Através do projeto “Contadores e Contadoras de
História do Coque” e com apoio do FUNCULTURA – PE (Fundo
Pernambucano de Incentivo à Cultura), foi lançado o site do Museu
(www.museudabeiradalinhadocoque.org) onde estão sendo armazenados
fotografias e depoimentos de diversos moradores. É a comunidade falando por
ela mesma, desmitificando as narrativas de fora que sempre a intitularam como
violenta e inabitável. Utilizando uma metodologia na qual se vem pesquisando
sobre Museologia Social, Museus Comunitários, Identidade, Memória,
Patrimônio e Poder, tal pesquisa tem como objetivo relacionar teoria e prática
na convivência junto à comunidade. O estudo de caso do projeto do Museu da
Beira da Linha do Coque atrela-se a questões como: a urbanização da cidade
do Recife; suas relações com os processos de patrimonialização/musealização;
as representações identitárias estabelecidas nesses novos espaços museais e
o grau de autonomia que essas comunidades possuem em relação à
construção de suas memórias e identidades e como tal projeto comunitário é
encarado pelos órgãos legitimadores do campo da Museologia e do Patrimônio,
fazendo uma releitura sobre o papel da instituição Museu na sociedade e seu
caráter dualista, tanto como instrumento de autonomia, representações e
resistência, como de hegemonia e autoridade. Trabalhar o conceito de
Museologia Social, relacionando-o com o que o museu comunitário vem
construindo do ponto de vista de serem ou não alternativas às políticas do
capital e da própria museologia/patrimonialização, articulando isso ao espaço
urbano no qual muitos desses museus se encontram é o principal objetivo
deste trabalho.

Palavras-chave: Cidade; Comunidade; Memória; Museologia Social;


Patrimônio; Resistência.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

CONFORTO AMBIENTAL EM EDIFICAÇÕES PROTEGIDAS: ANÁLISE DA


LEGISLAÇÃO DO CORREDOR CULTURAL DO RIO DE JANEIRO

Fernanda Medeiros Calháu Soares (fernandacalhau.arq@gmail.com)

RESUMO

O objetivo deste artigo é realizar uma avaliação crítica dos critérios de


conservação adotados para as edificações protegidas pela Área de Proteção
do Ambiente Cultural (APAC) do Corredor Cultural do Rio de Janeiro sob o
ponto de vista conceitual, teórico e principalmente sob a ótica do conforto
ambiental. A arquitetura característica do local onde hoje está delimitada esta
APAC foi produzida, por muitos séculos, como resultado de uma cultura de
edificar, que atendia bem às necessidades daquela população, manipulando as
variáveis do meio externo, proporcionando conforto e habitabilidade. Será
apresentado um breve resumo sobre a evolução dos principais pontos
relacionados ao conceito de conservação de bens culturais arquitetônicos.
Posteriormente, serão citadas algumas determinações das várias legislações
produzidas para a área, desde o século XIX até os dias atuais. A partir dos
conceitos abordados sobre conservação de edifícios históricos, da análise da
evolução da legislação, será produzida uma reflexão sobre a maneira em que
as questões relativas ao conforto ambiental do ambiente construído, tão
valorizadas durante o século XIX como forma de proporcionar a higiene dos
edifícios através da adequada iluminação e ventilação, são contempladas na
legislação vigente para o Corredor Cultural.
Palavras-chave: Corredor Cultural – Rio de Janeiro, Conforto Ambiental,
Legislação e Patrimônio
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

CONJUNTO URBANO DA PRAÇA PEDRO II EM TERESINA - PIAUÍ:


VULNERABILIDADE LEGAL

Karina Maria Ferraz Dos Santos Cadena (karinaf.arq@gmail.com)


Isis Meireles Rodrigues (isismeireles@uninovafapi.edu.br)
Marcos Fernando De Sousa Filho (marcosfernandoarq@gmail.com)
Pâmela Brenda Monteiro Abreu (pambrendaa@hotmail.com)

RESUMO

Este artigo tem como objeto de estudo do conjunto urbano da Praça Pedro II
em Teresina, capital do Estado do Piauí e configura mais um produto da
Pesquisa do Patrimônio histórico urbano e arquitetônico do entorno da Avenida
Antonino Freire e da Praça Pedro II: memória e usos do Núcleo de Estudos da
Arquitetura Piauiense – NEAPI do Centro Universitário UNINOVAFAPI.

O artigo objetivou a revisão dos instrumentos legais nas esferas municipais e


estaduais, que incidem na salvaguarda do Conjunto Urbano da Praça Pedro II.
Neste, também foram analisados os efeitos transformadores promovidos pelas
legislações nos usos e a preservação das edificações do entorno da Praça e as
modificações ocorridas ambiência do local. Foram realizados levantamentos de
campo e análises comparativas dos poucos registros da época da formação da
Praça Pedro II e dados coletados em 1999 e 2017. Realizou-se a verificação
dos instrumentos legais de proteção ao patrimônio no âmbito estadual e
municipal, a fim de se atingir os objetivos da pesquisa e a ampliação a
inteligibilidade das formas urbanas e arquitetônicas.
Não há registros históricos quanto a fundação da Praça Pedro II. A sua
consolidação se dá a partir da instalação dos edifícios mais relevantes no
entorno da praça; o Teatro 4 de Setembro (1894), o Clube dos Diários (1927) e
o Cine Rex (1939). Outras atividades como a Sorveteria Americana e o Bar
Carnaubinha (1952), serviam de ponto de encontro para frequentadores. Todos
estes equipamentos contribuíram para que esta área se tornasse o “coração”
cultural de Teresina. A praça possui um caráter fundamental e simbólico para a
identidade da cidade de Teresina e de seus habitantes.

Com a densificação da zona leste, o centro de Teresina perde população e


infraestrutura necessária a função habitacional. O processo de modernização
aliado ao ideário antigo/atrasado e moderno/desenvolvido, contribuíram
sobremaneira para a perda da sua vitalidade.

O Governo do Estado do Piauí promoveu três tombamento no seu entorno,


mas percebe-se não haver raios de influência dos mesmos, ficando de maneira
subjetiva o perímetro de proteção nesta área. Os decretos de tombamentos
não mencionam que edificações está sob sua influência. A má interpretação e
delimitação dos mesmos, possibilita a substituição e transformação do
conjunto. As medidas tomadas pelo poder público, se mostram ineficientes, as
ações de tombamentos não asseguraram a manutenção da paisagem urbana e
nem a ambiência do conjunto urbano.

As legislações que regulamentam na atualidade as ações sobre o conjunto


urbano da praça são: a Lei Estadual n° 4515/92 e as Leis Municipais n°
3602/06, n° 3563/06 e n° 3562/06. Tendo em vista as legislações analisadas, a
Praça Pedro II e seu entorno estão ameaçados.

A vulnerabilidade que o conjunto urbano da Praça Pedro II se apresenta


decorre de muitos fatores principalmente por pressões econômicas decorrentes
da supervalorização do terreno em detrimento ao edifício.

Palavras-chave: Teresina, Patrimônio, Legislação


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

CONSELHOS MUNICIPAIS DE PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO NO


PARANÁ

Kissia Stein Do Nascimento (kissiastein@yahoo.com.br)

RESUMO

Este artigo investiga a participação de atores sociais relacionados à proteção


do patrimônio cultural através do estabelecimento de Conselhos Municipais de
Preservação do Patrimônio no Paraná. Considera a importância da
colaboração da comunidade junto ao poder público para a promoção e
proteção do patrimônio cultural brasileiro, como preconizado na Constituição
Federal. Alinha-se à teoria contemporânea da conservação e às teorias de
democracia representativa e participativa. A pesquisa emprega técnicas quanti-
qualitativas de análise, realizando o levantamento de documentos
disponibilizados em mídia virtual, acompanhado de verificação de vigência e
regulamentação de legislação. Ressalta o caráter e atribuições dos conselhos,
a composição e a forma de escolha de representantes, assim como as formas
previstas para publicização das ações desenvolvidas. A análise do desenho
institucional dos conselhos contribui para a compreensão das práticas
participativas e dos efeitos da experiência dessa participação. A identificação
dos segmentos da sociedade envolvidos com a preservação contribui para
ampliar o debate sobre a interação e o interesse da população na preservação
do patrimônio. Nas considerações finais salienta-se a potencialidade da
temática do patrimônio cultural como um campo de formulação e
implementação de políticas públicas associado à gestão das cidades. São
ponderados os desafios e as oportunidades encontrados no processo de
construção e operacionalização da arquitetura participativa nos conselhos
analisados, associando-os a necessidade de um sistema municipal de
preservação do patrimônio cultural.

Palavras-chave: Conselhos Municipais de Preservação do Patrimônio Cultural.


Gestão local do patrimônio cultural. Agentes de preservação. Participação
Democrática.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS NA ATUAÇÃO DOS AGENTES DO


PATRIMÔNIO

Flavia De Assis Lage (flavia_lage_arq@hotmail.com)


Luciana De Assis Lage (luciana_lage_arq@hotmail.com)

RESUMO

No âmbito da preservação do patrimônio cultural devemos destacar a


importância de todos os atores sociais envolvidos _ órgãos de preservação nas
esferas federal, estadual e municipal, profissionais que trabalham com a
preservação, acadêmicos que se dedicam ao estudo do patrimônio, membros
do corpo profissional das prefeituras, membros dos conselhos municipais, além
da sociedade civil como um todo.

Certamente, a importância da atuação desses agentes se iguala ou sobrepõe à


importância da legislação, uma vez que eles são os instrumentos de aplicação
das leis existentes, para garantir a preservação do patrimônio cultural através
da implementação de ações para planejamento e gestão do patrimônio cultural,
onde estejam integradas as ações das três esferas _municipal, estadual e
federal, e dos demais atores sociais envolvidos na temática da preservação.

O objetivo deste artigo é apresentar algumas das percepções desses agentes


acerca da preservação para, em seguida, estabelecer pontos divergentes e
convergentes de modo a lançar uma luz sobre a importância de cada um
desses atores no processo de preservação e de gestão do patrimônio cultural,
no sentido de avançar nas discussões acerca das politicas de preservação, nas
esferas de planejamento e gestão.

Para a obtenção dos dados sobre a percepção dos diversos agentes sociais
envolvidos na preservação do patrimônio serão utilizadas entrevistas
realizadas, por Flavia de Assis Lage, para elaboração da dissertação cujo titulo
é “A Gestão do Patrimônio Cultural em Minas Gerais: novas dimensões e
paradoxos”, transcritas nos anexos desse trabalho.

Os questionamentos que pretendem ser esclarecidos com as entrevistas são


os seguintes: (1) aos órgãos de preservação no nível federal e estadual caberia
prioritariamente a normatização das políticas de preservação, cabendo às
administrações municipais a formulação e operacionalização dessas políticas
de preservação do patrimônio cultural, levando em conta as especificidades de
cada município, (2) a importância do envolvimento da sociedade civil para a
Preservação do Patrimônio, por exemplo, de forma representativa através dos
Conselhos Municipais de Preservação do Patrimônio, como forma de haver
maior legitimidade das politicas de preservação do patrimônio e,
consequentemente, maior empenho da população tanto em cumprir as
determinações das politicas de preservação, quanto na cobrança de ações pelo
poder publico na implementação das politicas de preservação.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural; Preservação; Gestão


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

CRIAÇÃO DO LABORATÓRIO DE CONSERVAÇÃO DE DOCUMENTOS DA


UFRRJ (LABDOC/UFRRJ) MEMÓRIA, CONSERVAÇÃO E PRODUÇÃO DE
CONHECIMENTOS

Priscila Marcondes (priscilamarcondesba@hotmail.com)


Claudio Antonio Santos Lima Carlos (claudio.limacarlos@gmail.com)
Thalles Yvson Alves De Souza (tyvson@hotmail.com)

RESUMO

Pretende-se apresentar os resultados, até agora obtidos, pelo projeto inovador


e pioneiro, no âmbito administrativo da Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro (UFRRJ), que propõe a conservação da memória documental da
Instituição de Ensino Superior (IES). A iniciativa propõe a identificação, a
conservação preventiva, a pesquisa e a digitalização do acervo documental
referente ao processo de projetação e construção do conjunto arquitetônico e
paisagístico do Campus Seropédica da UFRRJ, que se deu no período 1938-
1948.

O acervo trabalhado possui grande relevância para a memória da arquitetura


neocolonial e do paisagismo brasileiros, cujo valor foi reconhecido pelo
tombamento estadual, que se deu de forma provisória, em 1998, e definitiva,
em 2001. Trata-se de conjunto de projetos arquitetônicos, perspectivas,
detalhes construtivos, de mobiliário, fotografias, dentre outros, referentes a um
universo ainda pouco explorado que inclui edificações desaparecidas, soluções
arquitetônicas não executadas, bem como a atuação de arquitetos e firmas de
destaque nacional pouco ou não citadas por autores identificados com a
historiografia da construção do campus da UFRRJ.

Com o objetivo de conservar a memória histórica da UFRRJ, o projeto teve o


apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de
Janeiro (FAPERJ), de 2013 à 2015, que possibilitou a compra de equipamentos
e materiais para a construção do primeiro laboratório de Conservação e
Restauro Documental da UFRRJ. No entanto, a sua origem se deu no ano de
2007, com o desenvolvimento de trabalhos curriculares relacionados às
disciplinas “Técnicas Retrospectivas I e II”, do curso de Arquitetura e
Urbanismo da UFRRJ, quando foi possível constatar a degradação e o precário
acondicionamento do acervo em questão. Em função da descoberta, em 2008,
o Professor Dr. Claudio Antonio Lima Carlos deu início a um projeto de
iniciação científica chamado: “Descobrindo o Campus da UFRRJ através do
seu Patrimônio Documental” que teve a duração de dois anos. Este projeto de
pesquisa possibilitou outro, que objetivou o desenho e a comparação entre
soluções projetadas e efetivamente construídas.

No período 2013-2015 obteve-se como resultados a catalogação e a


digitalização de cerca de 170 plantas arquitetônicas, o equivalente a
aproximadamente, 10 % do acervo. No momento, a iniciativa se depara com
dificuldades orçamentais para compra de materiais. Por outro lado, a equipe
envolvida dá continuidade às pesquisas, com vistas à criação de base de
dados que possibilite o acesso de pesquisadores da IES ou externos na
produção de conhecimento em trabalhos lato e stricto sensu.

Palavras-chave: Patrimônio Arquitetônico; Conservação preventiva;


Digitalização
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO À MEMÓRIA E HISTÓRIA REGIONAL:


RELATO DA EXPERIÊNCIA DO PORTAL EMREDES

Flavia Lemos Mota De Azevedo (flavia.azevedo@uemg.br)


José Heleno Ferreira (zeheleno.ferreira@gmail.com)
Samuel José Santiago (samujsantiago@gmail.com)

RESUMO

Considerando o acervo que vem sendo constituído pelo Centro de Memória


Professora Batistina Corgozinho – CEMUD – UEMG – Unidade Divinópolis
desde 2005 e principalmente pela potencialidade que os mesmos apresentam
para novos estudos e pesquisa e sua crescente expansão criou-se o EmRedes:
Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro para disponibilizar seu acervo
história e de memória através da Web.

O EmRedes: Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro – trabalho,


religiosidade, cultura e cotidiano foi lançado em maio de 2015, com o objetivo
de se tornar um instrumento permanente de acesso a todos os cidadãos
interessados em realizar pesquisas sobre a região, no qual está disponíveis um
banco de dados com mais de 70.000 documentos digitais. O acervo do Portal
conta com documentos escritos diversos (jornais, panfletos, cartas, notas,
documentos oficias), fotos e vídeos de diferentes grupos, a polifonia da
memória é um princípio da reunião do acervo, privilegiando especialmente
aqueles registros que não fazem parte das vozes oficiais, aqueles que pouco
preservamos. A importância do uso da tecnologia digital está ligada não só ao
fato de preservar indiretamente o patrimônio documental como principalmente
democratizar o seu acesso. A digitalização dos documentos garante sua
permanência virtual, mesmo que o suporte de acessibilidade aos mesmos se
modifique. A preservação digital não impede o processo de degeneração dos
documentos. A integridade física dos mesmos exige a adoção de outros
procedimentos tecnológicos e condições de acomodação adequadas e
específicas que são observadas no trabalho do Centro de Memória. A iniciativa
de construção do Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro – EmRedes
representa um passo para que este instrumento de estudos e pesquisa seja
apropriado pelos cidadãos interessados em pesquisar e conhecer mais a
história da região. Nesse sentido, o Portal da Memória convida e mais do que
isso, solicita a todos a contribuição para que este espaço seja sempre mais
dinâmico, oferecendo informações e reflexões sobre os aspectos culturais e
históricos do Centro-Oeste mineiro.

O Portal também funciona como um centro de referência regional que


possibilita a coleta de dados, fixação e produção de informações, atende as
demandas locais para formação, capacitação e confecção de material
informativo e formativo. Dessa forma, o Portal deve sistematizar e arquivar as
produções e, na medida do possível, produzir novos materiais por iniciativa
própria ou demanda de escolas e organizações sociais. Nesse sentido, ele se
constitui enquanto um acervo de informações e as produz; atende a demanda
formativa de comunidades e é formado pelas informações cedidas pelas
mesmas. A administração do Portal é realizada pela equipe de profissionais do
Centro de Memória Professora Batistina Corgozinho – CEMUD – UEMG –
Unidade Divinópolis, cabendo aos mesmos receber, catalogar, disponibilizar e
analisar acervos sobre a memória e a história do centro-oeste mineiro.

Palavras-chave: Digitalização de acervos, democratização e acesso, memória


e história regional, Portal EmRedes
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

DIREITO AO ILEGÍVEL: OCUPAÇÕES EM ÁREAS DE RECONHECIDO


VALOR CULTURAL

Camila Silva Morais (morais.camila@gmail.com)

RESUMO

Novo título: Conjuntos urbanos da Avenida Assis Chateaubriand e Praça da


Estação: ocupações para reavivar a cena política e cultural Belorizontina

Por meio da análise das recentes ocupações da rua Sapucaí, no bairro


Floresta, em Belo Horizonte, situada entre dois Conjuntos Urbanos tombados
em âmbito municipal: “Conjunto Urbano da av. Assis Chateaubriand” e
“Conjunto Urbano da Praça Rui Barbosa (Praça da Estação)”, o presente
trabalho constitui uma reflexão sobre as políticas patrimoniais brasileiras; seu
impacto nos usos e conservação dos bens culturais de reconhecido valor; e
como é possível a recuperação desses lugares, quando em estado de
abandono, por meio de ações de micropolítica advindas da participação da
comunidade local.

Por muitos anos parte das edificações da rua Sapucaí estiveram abandonadas
e fechadas para uso, o que vem sendo gradualmente modificado com a
retomada do uso dessas edificações num processo recente, desde 2010.
Através de ações de micropolítica de alguns coletivos da cidade, como
ressonância dos movimentos políticos de ocupação da Praça da Estação nas
adjacências da rua Sapucaí, várias intervenções urbanas foram ocorrendo,
primeiro na própria rua, chamando atenção para a paisagem urbana, com
ações de ocupação e lazer temporárias, blocos de carnaval etc e,
posteriormente, as edificações foram ganhando novos usos comerciais e de
serviços, como restaurantes, bares, escritórios e locais de entretenimento com
exibição de filmes, workshops de qualificação profissional etc, e, se destaca,
sem que as edificações tenham recebido reforma do tipo Retrofit, mantendo
assim a experiência estética de um espaço que estava em abandono e
possibilita, agora, novas experimentações.

Neste estudo, opta-se por estabelecer um recorte dentro do patrimônio cultural,


pois, em algum determinado momento o patrimônio tombado, registrado ou
inventariado foi destacado por sua relevância perante a comunidade, sendo
assim legitimado como de importância e destaque à sociedade, estabelecendo
algum tipo de singularidade dentro da paisagem urbana local. É instigante
constatar que parte do patrimônio cultural se encontra em estado precário de
conservação ou em estado de abandono. Essas arquiteturas do abandono,
esses marcos monumentais deixados de lado não podem ser lidos e
vivenciados como algo que escapa ao controle biopolítico; que resiste na
paisagem e assim resiste enquanto potência? Quais seriam alguns caminhos
possíveis quando o abandono está instaurado nos lugares? Como seria
possível um resgate dessas arquiteturas e desses espaços abandonados, e
novamente inseri-los na dinâmica urbana, sem que o período de abandono seja
apagado e resida agora como parte da memória? E, especialmente, como
esses locais impactam a comunidade local? Essas são algumas das perguntas
norteadoras deste trabalho e que, longe de uma resposta definitiva, abrem
espaço para reflexão e contribuição de soluções coletivas, como poderá ser
vislumbrado no artigo completo.

Palavras-chave: Paisagem Urbana, Patrimônio Cultural, Arquitetura,


Ocupação.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

ENTRE MEMÓRIAS, ETNOGRAFIAS E TERRITÓRIOS: TEMPO, ESPAÇO E


EPISTEME NA CONGADA

Luana Carla Martins Campos Akinruli (luanacampos@insod.org)


Samuel Ayobami Akinruli (ayobami@insod.org)

RESUMO

Esta comunicação se propõe a fazer uma discussão sobre os territórios da


memória associados às práticas congadeiras no município de Passos, Minas
Gerais. Por meio da experiência etnográfica e das confrontações com a
documentação de memorialistas, apontam-se nesse texto as tensões
existentes entre os diversos agentes e agências envolvidos com a
manifestação da Congada. Os diálogos entre as diversas temporalidades e
territorialidades dos saberes considerados tradicionais e as formas de gestão
da Festa de Congado permitem vislumbrar as mudanças e permanências da
cultura, seu lastro de pertencimento identitário, além das políticas públicas
culturais relacionadas às tradições afro-brasileiras.

Em que pese a importância das referências de pesquisa utilizadas, esse texto


se fundamentará na análise dos dados etnográficos e na construção da
narrativa que priorizará, em um primeiro momento, a contextualização da
história do congado e da Festa em Passos frente aos registros de memória
desta tradição para que, em um segundo momento, seja discorrido o processo
de disputas e agenciamentos de espaços da prática congadeira, de modo a
serem contrastados os aspectos das tradições congadeiras frente ao discurso
memorialista e a experiência etnográfica, que expressam como as fortes
referências do lugar e do território constroem identidades étnicas na cidade.

Palavras-chave: Congadas; Território; Identidade; Patrimônio; Etnografia


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

INOVAÇÃO E TRADIÇÃO DOS BENS CULTURAIS IMATERIAIS: A


PATRIMONIALIZAÇÃO DO QUEIJO CANASTRA EM MINAS GERAIS

Samuel Ayobami Akinruli (ayobami@insod.org)


Luana Carla Martins Campos Akinruli (luanacampos@insod.org)

RESUMO

Esta comunicação se propõe a fazer uma discussão sobre a patrimonizalização


de um bem de natureza imaterial: o Queijo Canastra de Minas Gerais. No ano
de 2008, o Modo Artesanal de Fazer Queijo de Minas foi declarado e registrado
como patrimônio cultural imaterial brasileiro, quando tal prática cultural foi
inscrita no Livro dos Saberes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (IPHAN). Desde então, a valoração cultural do queijo como bem
cultural imaterial nacional alterou significativamente as práticas,
conhecimentos, saberes-fazeres, agentes e agências envolvidos, de forma a
promover (dis)tensões nas dinâmicas de criação e ressignificação dos
conhecimentos tradicionais.

Por meio da experiência etnográfica, buscar-se-á promover uma reflexão a


respeito dos critérios de elegibilidade e diferenciação dos produtos inscritos na
categoria artesanal, bem como dos produtores, das estruturas produtivas e do
sistema de comercialização no contexto atual, realidade pesquisada na região
da Serra da Canastra quase 10 anos depois do Registro. É ainda interesse
buscar problematizar de que forma a chancela patrimonial promove as
mudanças ou permanências da cultura no que diz respeito às complexas
associações entre natureza, tradição, saberes e práticas; e reposiciona a
atuação da gestão pública nos aspectos de reconhecimento, salvaguarda,
preservação e divulgação dos bens culturais.

Palavras-chave: Patrimônio Imaterial; Etnografia; Registro; Políticas Culturais


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

INVENTÁRIO PARTICIPATIVO DO PATRIMÔNIO CULTURAL DAS


COMUNIDADES REMANESCENTES DO QUILOMBO MESQUITA

Mariane Paulino (marianepaulino@hotmail.com)


Liza Maria Souza De Andrade (lizamsa@gmail.com)

RESUMO

As Comunidades Remanescentes de Quilombos ainda colhem as agruras do


passado recente, onde problemáticas socioeconômicas e raciais estruturam um
contexto que estigmatiza e marginaliza esta população. Dado o processo de
estruturação social, dificuldades de acesso à terra, infraestrutura e
equipamentos públicos são situações comumente intrínsecas a comunidades
neste contexto periférico, onde a ineficiência de políticas públicas e ações
afirmativas que fortaleçam a identidade e memória quilombola, aliada aos
demais fatores, corroboram com este contexto de invisibilidade social.

Em 1988, a Constituição Federal Brasileira reconhece os sítios detentores de


reminiscências quilombolas como patrimônio cultural brasileiro e o Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, artigo 68, determina que a
propriedade definitiva das terras historicamente ocupadas por comunidades
remanescentes de quilombo deve ser reconhecida. Sendo o objeto específico
de estudo deste trabalho, o Quilombo Mesquita – localizado no estado do
Goiás – através da Fundação Cultural Palmares, obteve sua certificação como
território remanescente de Quilombo em 2006, contudo, até a presente data,
suas terras ainda não foram certificadas pelo INCRA. Isto acarreta, entre outros
fatores, a ausência de delimitação territorial, onde este sítio patrimonial tem
parte da sua extensão ocupada por condomínios irregulares, propriedades
rurais agrícolas e demais residentes que não são parte desta reminiscência
quilombola.

Ao tratar do Quilombo Mesquita é indissociável pensar a questão do acesso à


terra as suas tradições, a questão produtiva à questão identitária, como as
tradições e o modo de vida se estruturam a partir da terra e dela se espraiam
seus bens materiais e imateriais. Nesta comunidade o elemento cultural
principal é o cultivo do marmelo e a produção da marmelada, de onde originam
suas principais festividades: a Festa do Marmelo e a Corrida do Marmelo. A
relação com o território consolida as relações sociais, laborais, econômicas e
culturais.

Por isso, este trabalho tem como objetivo apresentar esta comunidade a partir
de seu processo histórico de estruturação, associando a construção de
tradições e cultura através da sua relação com o território – seus saberes e
modo de viver. Envolvendo os membros da comunidade como atores deste
processo, pretende-se demonstrar a identificação dos patrimônios culturais
com base na metodologia de Inventário Participativo (IPHAN) a fim de gerar
subsídios para a construção do processo de educação patrimonial.

Observou-se que a preservação deste patrimônio com a participação social,


por meio da identificação para o resgate das tradições e modos de viver se
estrutura como um processo de valorização e construção cultural, fortalecendo
as questões de identidade destas comunidades evitando a fragmentação de
seus bens – imateriais e materiais – e de seu território, para um processo
efetivo de salvaguarda e manutenção de um patrimônio vivo.

Palavras-chave: patrimônio negro; comunidade quilombolas; povos


tradicionais
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

INVENTÁRIOS ARQUITETÔNICOS NO RIO GRANDE DO SUL: DO PODER


PÚBLICO AO PODER DO PÚBLICO

Simone Rassmussen Neutzling (simoneneutzling@gmail.com)


Ana Lúcia Goelzer Meira (algmeira@gmail.com)

RESUMO

No campo do patrimônio cultural, inventário é definido, em geral, como o


registro de informações técnicas que constitui um acervo básico para as
políticas de preservação. No Rio Grande do Sul, os projetos institucionais de
inventários do patrimônio cultural arquitetônico foram desenvolvidos
principalmente pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(IPHAN) e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE).
Contudo, não há uma avaliação crítica dessa trajetória. A comunicação aqui
apresentada versa sobre uma pesquisa parcial que teve por objetivo entender
os momentos de inflexão das políticas públicas em relação ao tema dos
inventários, os quais são fruto de seleções e de escolhas dos seus executores
– geralmente técnicos. Essa constatação levou à formulação de algumas
perguntas: Que olhares devem participar das escolhas sobre os bens que
compõem a nossa herança cultural? Quem tem legitimidade para escolher os
bens que devem ser destacados do cotidiano, passando a se constituir em
patrimônio e por isso, serem passível de inventariação? E a partir da atribuição
de que tipo de valores? Atualmente, os inventários assumiram relevância nas
políticas de preservação, inclusive se constituindo em requisito para a
documentação dos tombamentos de áreas urbanas em nível nacional. Esta
relevância justifica a busca pelo entendimento da trajetória e os diferentes
enfoques adotados com a finalidade de aprimorar a aplicação desse
instrumento. A análise dos temas e dos métodos dos inventários realizados no
RS, a partir da listagem fornecida pelo IPHAE, assim como da pesquisa nos
arquivos e na biblioteca do IPHAN-RS, permitem verificar que, nos últimos
anos, houve uma diversificação de métodos. Entretanto, o aspecto mais
relevante foi a ampliação dos olhares sobre o patrimônio, incluindo a
participação da população atribuindo valores à bens edificados que foram
reconhecidos através de registro e valorização em inventários participativos.

Palavras-chave: inventário, patrimônio arquitetônico, políticas públicas de


preservação, sociedade civil
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

MOVIMENTO “ABRACE A GARÇA” (MACEIÓ-AL) E POSSIBILIDADES DE


AÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA NA LUTA PELA
DEMOCRATIZAÇÃO DA CIDADE

Marina Milito (marinamilito@yahoo.com)


Maurilio Neemias Dos Santos (maurilioneemias2010@gmail.com)

RESUMO

O Brasil está entre os 10 países no mundo com o maior PIB, porém, também
está na lista dos 10 países com maior desigualdade social. Essa desigualdade
muitas vezes é acentuada pela falta de planejamento urbano e pelo
crescimento desordenado das cidades - entre as quais podemos citar Maceió-
AL. A capital alagoana, como muitas cidades litorâneas do Brasil, apresenta a
faixa de orla marítima basicamente ocupada por uma elite financeira. Seu
crescimento urbano se dá principalmente a partir dos investimentos privados,
que visam atender uma pequena faixa privilegiada da população, em
detrimento de uma urbanização coordenada pelo poder público - que deveria
privilegiar o interesse social e a democratização do uso da cidade.

Maceió é uma das cidades que cresceram mais rapidamente nos últimos anos
no Brasil e, atualmente, o foco de sua expansão imobiliária se direciona para o
seu litoral norte. O Zoneamento apresentado no Plano Diretor de Maceió
(2005) e no Código de Urbanismo e Edificações do Município de Maceió (2007)
permite a construção de edifícios verticais com até 20 pavimentos, na faixa
litorânea iniciada no bairro de Jacarecica até parte do bairro de Riacho Doce
(excetuando o pequeno trecho da ZIAP 6 - Foz do rio Jacarecica).
Preocupados com a crescente expansão e verticalização desordenada
do litoral norte, moradores e frequentadores dos bairros de Guaxuma, Garça
Torta e Riacho Doce, iniciaram, em 2014, uma mobilização social que deu
origem ao movimento “Abrace a garça”. Movimento que defende o crescimento
urbano sustentável do litoral norte e maior participação popular frente às
decisões do poder público sobre a cidade. O movimento propõe a
implementação de políticas públicas pautadas no interesse social e não do
mercado imobiliário.

A pesquisa aqui apresentada pretende propor maneiras de garantir o


poder de voz da população sobre as decisões do poder público em relação às
modificações do espaço habitado, a partir da experiência do movimento
“Abrace a garça”. Tal pesquisa, se realiza através de revisão de literatura sobre
participação popular, crescimento urbano, especulação imobiliária e elaboração
de Plano Diretor para fundamentação teórica. Serão realizadas também
entrevistas com integrantes do “Abrace a garça”, no intuito de entender o
processo de motivação e organização das ações realizadas pelo movimento e
avaliar o impacto e as conquistas dessas ações.

Utiliza-se a hipótese de que o “Abrace a garça” ainda não obteve conquistas


relevantes e que algumas ações realizadas pelo movimento “Ocupe Estelita” -
movimento popular pela defesa do Cais José Estelita (Recife-PE), podem servir
como referência para o movimento alagoano. O movimento recifense obteve
importantes conquistas como a suspensão do alvará que autorizava a
demolição dos galpões localizados no cais e o cancelamento do leilão
fraudulento em que o terreno do cais, pertencente à união, foi vendido para um
grupo de grandes construtoras.

Palavras-chave: Maceió, Especulação imobiliária, Organização civil,


Participação popular
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O ART DECÓ COMO TIPOLOGIA DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO


RESIDENCIAL PARNAIBANO:O EXEMPLAR DA AV. PRESIDENTE
GETÚLIO VARGAS, Nº 590

Amanda Oliveira Coelho (amandacoelho90@hotmail.com)


Gabriella Viana Amorim (gabsviana.7@gmail.com)
Rafael Alencar (rafalencar_vale@hotmail.com)
Amanda Moreira (amandacmoreira@hotmail.com)

RESUMO

A casa é um ambiente produtor de experiências e interrelações entreseus


usuários, pelo conjunto de valores sociais e culturais que são desenvolvidos,
constituindo um acervo de memórias para a formação do patrimônio. No
presente artigo se encontra uma abordagem da influência da arquitetura
artdecó nas residências parnaibanas, através do estudo de caso de um
exemplar localizado na Avenida Presidente Getúlio Vargas, nº 590 e da
discussão dos instrumentos para a proteção desse patrimônio. A edificação
que se destaca por suas singularidades em relação ao entorno devido à sua
volumetria e suas grandes proporções, hoje faz parte do Conjunto Histórico e
Paisagístico de Parnaíba, como um dos patrimônios materiais tombados pelo
IPHAN-PI. O estilo abordado, por ser de transição entre o ecletismo e o
movimento moderno arquitetônico, traz consigo inovações estéticas verificados
na casa através da avaliação das plantas-baixas,da implantação no lote e dos
materiais.Para isso, tomou-se por base registros teóricos, orais e fotográficos,
resultando em um estudo indispensável para o entendimento do contexto
histórico sociocultural na primeira metade do século XX.

Palavras-chave: Palavras chave: ArtDecó; Residência; Patrimônio parnaíbano.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O CENTRO HISTÓRICO DE CUIABÁ: EM BUSCA DO VALOR ATRIBUÍDO

Lúcia Lobato (lf_lobato@yahoo.com.br)

RESUMO

O tema deste trabalho tem como enfoque uma leitura sobre o processo de
tombamento do Centro Histórico de Cuiabá a partir de pesquisas em busca do
valor atribuído, propondo fazer reflexões sobre o processo de tombamento e
também, sobre o seu processo de patrimonialização, voltando-se para os
conflitos que compuseram esse processo, através da análise das diferentes
narrativas das instituições sociais da esfera municipal, estadual, federal e
comunidade. Procurando entender de que forma estes agentes interagiram não
somente no campo das ações, mas dos debates estabelecidos durante o
processo de tombamento. Que tipo de valor foi atribuído? O que foi
reconhecido como portador de valor naquele processo?A cidade tem os seus
usos e suas relações estabelecidas. Entende-se que a forma como as pessoas
usam e interagem é um caráter muito forte e difícil de conhecer, perceber e
trabalhar com ele. Observou-se que a denominação Centro Histórico é pouco
reconhecida pela comunidade que frequenta esse lugar. Acredita-se que o
nome do lugar é atribuído pelas relações que as pessoas possuem. A questão
do nome é significativa, afinal “o que as palavras significam e o que o outro
atribui aquela palavra que eu uso?”. Além de Centro Histórico quais as outras
denominações usadas, e quais os seus valores? Propõe-se também
compreender sobre o envolvimento da comunidade nesse processo de
patrimonialização, visto que o contexto histórico que permeava o processo de
tombamento do Centro Histórico de Cuiabá estava passando por um processo
de democratização nacional. Tal contexto apresentava como marco a
Constituição Federal de 1988, a qual, numa perspectiva específica de
patrimonialização, além de ampliar o conceito de patrimônio, postulava sobre a
maior abertura da participação de outros atores sociais nas políticas de
preservação. Busca-se identificar quais os instrumentos usados ou não no
processo de mediação entre as atuações dos órgãos públicos envolvidos e a
sociedade. Perceber se a atribuição de valor da população, o que ela
valorizava ou não foi incluso como variável nesse processo.

Palavras-chave: Centro Histórico; valor; patrimônio; Cuiabá


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O CRESCIMENTO DAS AÇÕES DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO


IMATERIAL

Monique A. Damaso (madikka@yahoo.com.br)

RESUMO

A política de proteção do patrimônio cultural no Brasil começou juntamente com


a criação do Serviço de Proteção do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(SPHAN) em 1937, através do Decreto-Lei 25 que além de instituir o SPHAN
(atual IPHAN) criou o Tombamento que era o mecanismo de proteção para o
conceito de patrimônio vigente à época.

Ao longo dos anos o conceito de patrimônio foi se difundindo e percebeu-se a


necessidade de aprimoramento de novas medidas de proteção. Assim a
instituição do Registro e do inventário pode ser vista como amadurecimento
das políticas patrimoniais.

A criação de uma Lei nacional nos anos 2000 para a preservação do


patrimônio imaterial fez com que se potencializasse um súbito crescimento de
ações protetoras para estes bens nas instâncias estaduais e municipais.
Gerando reconhecimento e apropriação maior da população com as questões
patrimoniais, passando em muitos casos os próprios detentores do saber a
procurar instituições públicas para a preservação de suas manifestações
culturais.
O trabalho tem como objetivo mapear o crescimento das ações de proteção do
patrimônio cultural imaterial no estado de Minas Gerais, dentro da política
pública do ICMS Patrimônio Cultural, nos últimos 10 (dez anos).

Palavras-chave: manifestações culturais, imaterial, proteção do patrimônio


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O ESTUDO DE ELEMENTOS DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO AO


ALCANCE DA SOCIEDADE: A RELAÇÃO DAS OBRAS RELIGIOSAS
ENTRE PORTUGAL E BRASIL. QUAIS ELEMENTOS ARQUITETÔNICOS
DEMONSTRAM ESSA INFLUENCIA PORTUGUESA?

Eleusy Natalia Miguel (eleusym@gmail.com)

RESUMO

Um dos instrumentos privilegiados para agenciar memórias e identidades, o


patrimônio no contexto contemporâneo, o conceito de patrimônio é
caracterizado pela fragmentação e pela contingência, bem como pela mudança
de sentido das noções de identidade e lugar.

A apropriação da sociedade do bem patrimonial se dá quando são elaboradas


estratégias que ofereçam possibilidades para a comunicação, a informação, o
aprendizado, a relação dialética e dialógica educando/educador, a construção
da cidadania e o entendimento do que seja identidade. Assim, a compromisso
social e educacional das instituições envolvidas com a produção cultural e
patrimonial da cada localidade, devem refletir em todas as suas áreas de
atuação. Ao refletimos acerca da construção dessas identidades estamos
levando em consideração a permanente negociação entre o individual e o
coletivo. Dessa maneira, desenvolvendo esses conceitos numa sociedade, esta
abarcará todas as manifestações como sua, apropriando o bem a seu
cotidiano.
Um bom exercício para essa temática seria trazer luz um estudo científico
acerca de elementos arquitetônicos, como apresentado a seguir:

Motivadas pelas promissoras descobertas de minas de ouro muitas pessoas


migraram para Vila Rica e arredores. De diferentes etnias e ofícios, esses
indivíduos difundiram seus conhecimentos e influenciaram a cultura artística
nas Minas Gerais colonial. Dentre a diversidade de imigrantes notam-se
arquitetos, construtores, engenheiros militares advindos da Europa Central,
Lisboa Portugal.

Partindo desse pressuposto, o tema se descortina, a arquitetura religiosa dessa


etapa da historia mineira. Especificando um pouco mais, obviamente dentro da
temática, o foco desse estudo se finda nas torres das Igrejas Matrizes de Catas
Altas e Itabirito, sugerindo uma conexão com igrejas localizadas no norte de
Portugal.

Baseando nas considerações, do patrimônio e da pesquisa, observa-se que o


presente trabalho tem por objeto principal estudar como um estudo específico
sobre patrimônio numa versão técnica e direcionada a área científica, poderia
chegar ao alcance da população. Evidente que para tal, será necessário
entender a produção arquitetônica religiosa mineira, com intuito de enriquecer
os conhecimentos sobre a cerca as cidades e matrizes. Especificamente
elencar dispositivos que atinjam a sociedade onde estão inseridas as igrejas,
de forma criativa e eficiente. Outros objetivos relativos ao estudo das igrejas
são: traçar um breve panorama sobre o estilo colonial no Brasil; desenvolver
um estudo sobre Torres como elementos arquitetônicos e pesquisar a
semelhança física das torres das igrejas, e correlaciona-las a Igrejas do Norte
de Portugal.

Por fim, podemos concluir que a educação patrimonial e a apropriação da


sociedade, especialmente na localidade onde está o bem patrimonial são
alternativas fundamentais para o crescimento população e de certa medida a
preservação desses bens, uma vez que se sentindo pertencente a tendência é
proteger.

Palavras-chave: Arquitetura religiosa, Patrimônio arquitetônico, População e


patrimônio.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O INVENTÁRIO COMO INSTRUMENTO DE CONHECIMENTO, PROTEÇÃO


E VALORIZAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL DE BARÃO DE COCAIS

Carolina Costa Moreira Dos Santos (carolmoreira1000@gmail.com)

RESUMO

Barão de Cocais é um dos municípios signatários do ICMS Patrimônio Cultural,


atendendo diretrizes do CONEP desde 2005, conforme Lei nº 18.030 de 12 de
janeiro de 2009, que dispõe sobre a distribuição da parcela da receita do
produto da arrecadação do ICMS, Critério Patrimônio Cultural. Em 2006, o
município iniciou o cadastro de seu acervo cultural, encaminhando o Plano de
Inventário ao IEPHA/MG. A partir de 2007, o inventário foi iniciado tendo como
objetivo inicial, os bens culturais em avançado processo de arruinamento. O
Conselho Municipal de Patrimônio Cultural foi grande aliado do processo de
conhecimento do acervo, direcionando os trabalhos de campo e pesquisas da
equipe técnica contratada. Foi no Povoado de Socorro, em 2007, através do
inventário da Igreja de Mãe Augusta do Socorro e da Imagem da padroeira,
que foram feitos os primeiros tombamentos, com respectivos restauros. Em
2008, o NHU Cocais recebeu tombamento e inventário de todas as edificações
inseridas no perímetro de proteção. Nesta etapa, se deu o inventário do antigo
Sobrado do Cartório de Cocais – edificação em péssimo estado de
conservação, que necessitava de intervenção emergencial. Foi a partir do
inventário que o Sobrado foi adquirido pelo poder público, recebendo
escoramento, tombamento e posterior restauro. Foi também o inventário que
trouxe o reconhecimento do importante acervo da Capela de São Gonçalo, no
povoado de Rio Acima, de autoria de Francisco Viera Servas. Após o
inventário, a Capela também recebeu tombamento e encontra-se em restauro.
Por fim, o inventário do “Modo de Fazer Goiabada Cascão” e posterior Registro
trouxe o reconhecimento e valorização das detentoras deste saber,
contribuindo ainda, para a preservação do NHU Cocais enquanto paisagem
cultural por meio da apropriação dos quintais frutíferos.

O presente artigo visa expor a aplicação dos instrumentos e diretrizes do ICMS


Patrimônio cultural tendo o inventário como propulsor da proteção, valorização
e reconhecimento do acervo local.

Palavras-chave: Inventário, ICMS Cultural, Proteção, Valorização,


Salvaguarda.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O MUSEU DOM PAULO LIBÓRIO E A SALVAGUARDA DO PATRIMÔNIO


RESIDENCIAL TERESINENSE

Hariell Halenn (harielltorress@gmail.com)


Rayra Nerissa (rayracastro@hotmail.com)

RESUMO

1) RESUMO

A cidade de Teresina sofre um contínuo processo de descaracterização do se


patrimônio histórico arquitetônico, sendo a tipologia residencial mais afetada
por este. Na contramão desse processo está a edificação que hoje abriga o
Museu Dom Paulo Libório, construída no início do século XX segundo a
tipologia residencial. Diante da implantação do Museu nesse exemplar e sua
estreita relação com a manutenção de suas características, este artigo tem
como principal objetivo discutir a importância deste no cenário da preservação
da arquitetura local; além de apresentar as características arquitetônicas do
mesmo. Baseia-se em metodologia que engloba levantamentos bibliográficos,
físicos in loco e documentais, além de entrevistas com antigos moradores,
ressaltando um ponderoso registro deste importante patrimônio histórico local.

2) ABSTRACT

The city of Teresina undergoes a continuous process of de-characterization of


the historical architectural patrimony, being the residential typology more
affected by it. Contrary to this process is the building that now houses the Dom
Paulo Libório Museum, built at the beginning of the 20th century according to
the residential typology. In view of the implantation of the Museum in this
example and its close relation with the maintenance of its characteristics, this
article has as main objective to discuss the importance of this in the scenario of
the preservation of the local architecture; Besides presenting the architectural
features of it. It is based on a methodology that includes bibliographical,
physical and documentary surveys, as well as interviews with former residents,
highlighting a powerful record of this important local historical heritage.

Palavras-chave: PALAVRAS-CHAVE: Patrimônio, Residência, Museu.


KEYWORDS: Patrimony, Residence, Museum.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO DE TERESINA – PI ATRAVÉS DA


TRAJETÓRIA PROFISSIONAL DO ENGENHEIRO LUIZ MENDES RIBEIRO
GONÇALVES.

Amanda Moreira (amandacmoreira@hotmail.com)

RESUMO

Analisa e discute a trajetória profissional do engenheiro Luís Mendes Ribeiro


Gonçalves, com foco na sua atuação na cidade de Teresina-Piauí, abordando
seus edifícios e influências como importantes constituintes do patrimônio
histórico arquitetônico local. Retrata ainda o atual uso e preservação dos
edifícios ainda existentes, evidenciando os instrumentos relativos à sua
preservação. O piauiense Luís Mendes Ribeiro Gonçalves teve larga atuação
profissional em Teresina, sendo este um dos mais importantes profissionais
nas primeiras décadas do Século XX, e os vários documentos que registraram
suas obras evidenciaram o pioneirismo do engenheiro e sua relevância no
cenário local, além do seu papel como difusor da arquitetura brasileira
contemporânea à sua atuação na capital do Piauí, especialmente a partir dos
prédios institucionais que projetou e/ou construiu. O artigo evidencia a
importância do estudo e da análise de sua trajetória profissional e contribui
para o alargamento da historiografia da arquitetura do Piauí, revelando a
necessidade da discussão dos instrumentos que protegem a sua produção.

Palavras-chave: Luís Mendes Ribeiro Gonçalves. Trajetória profissional.


Arquitetura de Teresina-Piauí. Arquitetura brasileira.Patrimônio.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O PATRIMÔNIO CULTURAL MATERIAL E OS DESAFIOS DA


CONSERVAÇÃO PREVENTIVA EM MARIANA-MG

Flora Del Rei Lopes Passos (floralopespassos@gmail.com)


Mariana Freitas Priester (maripriester@gmail.com)

RESUMO

A partir da apresentação de um panorama do estado de conservação do


patrimônio material tombado pelo Instituto Histórico e Artístico Nacional
(IPHAN) no município de Mariana-MG, e das ações empreendidas atualmente
nestes bens, o presente artigo busca refletir sobre os desafios e possíveis
caminhos para a salvaguarda do patrimônio cultural material e para o
fortalecimento do papel do IPHAN nas “pontas”, especificamente, nos
escritórios técnicos implantados em sítios urbanos protegidos a nível federal.
Nota-se nos últimos anos um crescente envelhecimento do quadro de
servidores do Instituto que conta com números reduzidos de agentes
fiscalizadores nas unidades centrais (superintendências), situação que se
agrava ainda mais nos escritórios técnicos. Além de traçar um diagnóstico da
situação atual do conjunto arquitetônico e urbanístico tombado e dos principais
enfrentamentos relacionados ao uso e ocupação da terra urbana, propõe-se o
levantamento da situação dos bens tombados isoladamente, constituídos em
sua maioria por templos religiosos de propriedade da Arquidiocese de Mariana,
muitos destes interditados devido ao mau estado de conservação em que se
encontram. Apontamentos sobre as estruturas e agentes a nível local com
atuação neste campo – Escritório Técnico do IPHAN em Mariana, Prefeitura
Municipal de Mariana, Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Mariana
(COMPAT), Arquidiocese e paróquias, etc. – também servem de embasamento
para entender a importância de uma atuação em rede de maneira cooperativa
não apenas na execução de ações, mas no fortalecimento da luta por mais
investimentos na área. Percebe-se que a conservação e manutenção de bens
tombados ainda hoje não são entendidas de forma preventiva para uma grande
parcela da população e de proprietários que, muitas vezes, adotam uma
postura passiva atribuindo a programas do governo a função de restaurá-los e
mantê-los, permitindo a deterioração de tais bens, quando na verdade são
atores chaves na salvaguarda dos bens tombados. Assim, quando o estado
dos bens é precário a ponto de serem imprescindíveis obras de restauração,
tais obras devem estar envolvidas em programas mais abrangentes,
participativas e colaborativas, que promovam a disseminação das ideias de
pertencimento, valorização e apropriação do patrimônio cultural e ainda
incentivem a conservação preventiva entre os moradores. Sob essa
perspectiva, defende-se a mobilização social e práticas de educação
patrimonial e participação popular enquanto meios fundamentais para
processos de gestão e planejamento mais democráticos e justos.

Palavras-chave: patrimônio material, conservação, restauração, IPHAN,


Mariana-MG
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O PATRIMÔNIO HISTÓRICO ARQUITETÔNICO DA CIDADE DE FLORIANO-


PI: CARACTERIZAÇÃO E PRESERVAÇÃO

Bruna Maria M. Barradas (brunammbarradas@hotmail.com)


Licianny Da Costa Sousa (liciannydacostasousa@hotmail.com)
Natalya Keiko Minagawa (keiko.minagawa@hotmail.com)
Amanda Moreira (amandacmoreira@hotmail.com)

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo geral apresentar o sítio histórico da cidade
de Floriano, situada ao sul do estado do Piauí, a partir de uma abordagem que
evidencia dois aspectos principais: as características arquitetônicas
predominantes nas diversas tipoligas da cidade, como: residências, igrejas,
casarões, escolas e hospitais; seguida de uma reflexão acerca dos
instrumentos e agentes para a proteção do patrimônio da preservação do
patrimônio nível nacional, estadual e principalmente municipal. Desenvolveu-se
a partir da percepção da crescente descaracterização da arquitetura histórica
da cidade, como uma das consequências da fragilidade e/ou inexistência de
instrumentos de proteção em algumas das esferes de proteção, e baseou-se
em uma metodologia que se utiliza de levantamentos físicos in loco,
levantamentos bibliográficos e documentais. Resulta na percepção da
necessidade do estabelecimento de políticas de proteção para a salvaguarda
desse importante patrimônio, que são referências que caracterizam e fazem
parte da história desse município.

Palavras-chave: Patrimônio, arquitetura, Floriano, preservação.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O RECONHECIMENTO DO CONJUNTO MODERNO DA PAMPULHA COMO


PATRIMÔNIO CULTURAL DA HUMANIDADE: REVISÃO URBANA E
AMBIENTAL SOBRE A ADAPTAÇÃO PERIMETRAL DA UNESCO

Andre Jacomini (ajacomini@ymail.com)

RESUMO

O Conjunto Moderno da Pampulha foi reconhecido pelo Comitê do Patrimônio


Mundial da UNESCO como Patrimônio Cultural da Humanidade. O título foi
concedido a partir dos critérios da Convenção do Patrimônio Mundial de 1972,
que se referem à capacidade de representar obras primas do gênio criativo
humano, exibir o intercâmbio entre valores que impactaram o desenvolvimento
da arquitetura, arte, urbanismo e paisagismo e ser um exemplar excepcional de
um conjunto que ilustra um estágio histórico significativo. A Pampulha é
expoente dos critérios supracitados ao integrar nomes cruciais do fazer
arquitetônico e paisagístico nacional para valorizar a obra e a paisagem cultural
como um todo frente à significância da unidade. A Paisagem Cultural é lida
como relação dos ambientes naturais com os edificados e ocupados e com as
atividades socioculturais, que tem por desdobramento a formação identitária e
enaltecimento do conjunto frente à relação complementar. Assim, é
compreendida como construção simbólica e sustentada pela especificidade da
sociedade e realidades socioeconômicas, culturais e ambientais. O Conjunto já
nasceu tombado, ao passo que não foi concebido só para influenciar a
produção arquitetônica mundial, mas também para conceituar a brasileira. Com
essa sumarização, a intenção era projetar o Brasil no cenário internacional para
afirmação, de caráter identitário, da consolidação do país como independente e
desvinculado do passado colonial, simbolizando um período de afirmação dos
países latinoamericanos com a constituição de novas repúblicas e busca da
autonomia cultural. Em suma, a concepção e histórico local são capazes de
classificar o potencial e o valor representativo que a Pampulha tem em diversos
âmbitos, entretanto o conflito estudado se refere à gestão empregada para sua
preservação. A poluição e degradação atual do espelho d’água foram alguns
dos maiores desafios para a obtenção do título de Patrimônio Cultural da
Humanidade e configuram hodiernamente a problemática principal para sua
manutenção. Assim, este trabalho foi estruturado compreendendo a motivação
para o reconhecimento da UNESCO e sua importância para a sociedade,
entretanto objetiva discutir as razões das adaptações do perímetro do
reconhecimento e a projeção de áreas de amortecimento, relacionando com as
incompatibilidades de gestão. Problemática esta que elenca a Pampulha como
um dos expoentes da cultura brasileira, mas que não desprende políticas
públicas capazes de atender demandas mínimas de habitabilidade urbana e
ambiental da região excluída ou lindeira ao perímetro. Ademais, a lagoa, além
de marco simbólico no imaginário popular, também possui caráter articulador
dos edifícios da orla, reforçando as inter-relações. Dessa forma, sendo um
elemento tão crucial quanto às edificações, a lagoa e a região do entorno são
integrantes da paisagem cultural do conjunto e demandam, por conseguinte,
medidas proporcionais e contextualizadas com as potencialidades e restrições
locais.

Palavras-chave: Pampulha, Paisagem Cultural, Patrimônio Cultural da


Humanidade, UNESCO.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O TERRITÓRIO URBANO CONTEMPORÂNEO E A SALVAGUARDA DA


MEMÓRIA: O INVENTÁRIO E SEUS REFLEXOS NA RUA MARECHAL
DEODORO - JUIZ DE FORA/MG.

Daniel De Almeida Moratori (danielmoratori@hotmail.com)

RESUMO

Identificar a forma de construção e proteção da paisagem urbana edificada é


algo que caracteriza um conflito na contemporaneidade, devido às varias
formas de ação sobre determinados bens inseridos no contexto urbano. Esse
artigo tem como objetivo buscar uma reflexão sobre identidade e patrimônio
cultural, e partir dessa definição, fazer um dialogo com as medidas tomadas
pela Prefeitura de Juiz de Fora sobre a Rua Marechal Deodoro no Inventário do
Acervo Cultural da cidade de 1996. Tal rua é uma das principais da cidade,
devido a sua localização central, como também por seu histórico, sendo uma
via voltada ao comércio desde seus primórdios, fruto dos imigrantes. Esse
estudo busca colaborar para uma maior discussão dos instrumentos que visão
a proteção de bens culturais num território urbano contemporâneo e a
salvaguarda da memória e identidade. Observando que a refuncionalização ou
remodelação de uso de um bem protegido muitas vezes pode ocasionar uma
nova organização sócio-espacial do espaço que o cerca, seguindo uma lógica
atual negativa da globalização, a identificação de uma edificação somente por
suas relações arquitetônicas, de forma especifica e individualizada, sem levar
em conta suas relações de identidade, afetividade e memória coletiva e suas
diversas espacialidades, pode acelerar fatores como degradação, gentrificação
e outras formas nocivas ao contexto, além de um certo descompromisso com o
passado, devido a um afastamento com a comunidade local. O caso da Rua
Marechal Deodoro demonstra a forma de ação do inventário da cidade de Juiz
de Fora, que foi umas das ferramentas que auxiliou na proteção das diversas
edificações, mas o fez somente por sua relação de “Mérito Arquitetônico”. Com
toda a relevância e valia que o inventário de 1996 fez para a preservação das
edificações salvaguardadas atualmente na Rua Marechal Deodoro, essa
reflexão de Patrimônio Cultural e identidade faz suscitar uma reflexão sobre o
fortalecimento de uma identidade e pertencimento da sociedade sobre tal
patrimônio, e como o poder publico estimulará os vínculos com o patrimônio
local para que a preservação seja algo sustentável.

Palavras-chave: Inventário, Paisagem cultural, Juiz de Fora


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

O URBANISMO TÁTICO NA PRODUÇÃO DA FORMA URBANA DAS


CIDADES CONTEMPORÂNEAS: A REAFIRMAÇÃO E REAPROPRIAÇÃO
DOS ESPAÇOS PATRIMONIAIS A PARTIR DA PARTICIPAÇÃO POPULAR

Andre Jacomini (ajacomini@ymail.com)

RESUMO

A qualificação urbana pode ser abordada em diversas escalas de poder, tanto


governamentais, quanto de micro escala, realizada pelos cidadãos. Uma
alternativa é o Urbanismo Tático, que envolve processos de baixo orçamento
para intervir em pequena escala. Esse se apresenta como uma maneira de
humanizar e reapropriar espaços, inclusive patrimoniais, objetivando uso de
sítios residuais ou agregar valor às áreas ocupadas. Nesta pesquisa, o termo
patrimônio foi classificado como sumarização das relações culturais e políticas
no espaço e tempo, que imprime valores e potencialidades da sociedade.
Portanto, é o registro identitário, que desempenha um papel sentimental de
memória e pertencimento às gerações futuras. Dessa forma, adentra o escopo
patrimonial ao se apresentar como instrumento de expressão legítima das
relações frente às materializações das memórias e identidade, servindo como
processo de formação urbana na micro escala. A forma urbana é a conclusão
dinâmica dos impactos da vida no espaço, sendo palco dos processos sociais
de estagnação ou progresso. A relação se estabelece pluralmente, em virtude
da abrangência e ação dos agentes de constituição do núcleo, e, usualmente,
menosprezando o impacto e relevância da apropriação dos espaços
patrimoniais para a fisionomia urbana que corrobora com a saúde e vitalidade
urbana e social. O trabalho foi estruturado a partir da concepção supracitada
como manifestação quando as instâncias institucionais não abordam as
demandas sociais. Porém é complexo, demandando planejamento e
compreensão das dinâmicas municipais, a fim de abordar intervenções que
reafirmem as escalas humanas e as distintas interações sociais. A aplicação
deste estudo é realizada sobre a Capela São Domingos de Gusmão, marco
histórico em Contagem (MG), que sofreu um processo de tombamento
municipal. Foi inicialmente apoiado pela sociedade, que reverteu o apoio ao
compreender como o tombamento seria carreado e que suas demandas,
principalmente de restauro, não seriam atendidas pela chancela. Foi criada
uma comissão autônoma e popular responsável pela atuação na Capela que
executou os reparos e arcou com as despesas, a partir de doações. O caso é
exemplo do entendimento da comunidade como agente social de afirmação
patrimonial que reapropria e resignifica os espaços. A noção de urbanismo em
voga rege a mentalidade num estado de inércia, concretizado pela supremacia
ideológica da relação desproporcional do automóvel e do cidadão, o que
resulta na formulação de cidades impessoais. A ideologia imposta é sustentada
por um instrumentário massivo e burocrático, que objetiva o controle excessivo
sobre as manifestações urbanas. Controle que se reflete na gestão patrimonial
ao distanciar e segregar os bens das novas demandas e apropriações,
deixando-os estanques frente às dinâmicas urbanas. As ações táticas,
portanto, detém caráter de revolta contra as incapacidades estatais e afirmação
direta da participação popular nos campos da concepção cidadã.

Palavras-chave: Urbanismo Tático, Paisagem Cultural, Patrimônio, Cidadania


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

OBRAS DE REQUALIFICAÇÃO NO ENTORNO DO ESPAÇO CULTURAL


BARROQUINHA, SALVADOR-BA: ANÁLISE SOBRE ACESSIBILIDADE
PARA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

Ana Cecília Chaves Silva (cecilia.ufrj@gmail.com)


Patricia Dorneles (patricia.dorneles.ufrj@gmail.com)
Marina Helena Silva (marina_helenasilva@hotmail.com)

RESUMO

Este artigo tem como objetivo apresentar uma parte da monografia de final de
curso de especialização em Acessibilidade Cultural, promovido pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro em parceria com o Ministério da
Cultura. Este trabalho pretende problematizar a questão das obras no entorno
do Espaço Cultural Barroquinha, situado no Centro Histórico de Salvador (BA).
Como questão principal se as mesmas atendem aos critérios de acessibilidade
necessárias para que as pessoas com deficiência possam desfrutar do direito à
cultura. Para tanto, o trabalho apresenta uma contextualização e atualização
das legislações vigentes de Patrimônio Cultural e Acessibilidade, um panorama
histórico sobre o bairro da Barroquinha, pontuando a direito cidade e situando
os mais pobres e as pessoas com deficiência; e por fim apresentação do
Espaço Cultural Barroquinha e avaliação de acessibilidade da Ladeira da
Barroquinha (utilizando parte do instrumento desenvolvido pelo Núcleo de
Design Gráfico Ambiental da Universidade Federal do Rio Grande do Sul).

Palavras-chave: pessoa com deficiência, acessibilidade, patrimônio histórico,


direito à cidade.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

OFICINA DE RESTAURO PÚBLICO

Sarah De Paula Basílio (sarahdepaulab@outlook.com)


Amanda Kelly Da Costa (amandacosta1095@gmail.com)
Michele Regina Gonzaga (michelerg01@yahoo.com.br)
Rodrigo Otávio De Marco Meniconi (rodrigo.meniconi@ifmg.edu.br)

RESUMO

A preservação dos valores culturais e ambientais caracteriza-se,


crescentemente, como uma tendência da atualidade. A valorização das coisas
locais, em contraposição à globalização da economia e da comunicação,
reveste de importância à manutenção de identidades específicas, que
garantam às pessoas a referência do seu lugar. O Projeto Oficina de Restauro
Público, iniciado no IFMG - Campus Ouro Preto como projeto de extensão em
2014, deu prosseguimento à ação executada anteriormente pela Fundação de
Arte de Ouro Preto, FAOP, em parceria com o Instituto, ampliando as
possibilidades de formação de mão de obra qualificada em conservação e
restauração de bens imóveis na cidade. Dessa forma, a atividade de extensão
proporciona aos alunos do Curso de Conservação e Restauro, uma prática
aplicada dos conhecimentos adquiridos em sala de aula. À vista disso, a
proposta cumpre um dos princípios definidos pela Política Nacional de
Extensão, que define como um dos seus eixos a interdisciplinaridade,
“caracterizada pela interação de modelos e conceitos complementares, de
material analítico e de metodologias, buscando consistência teórica e
operacional que estruture o trabalho dos atores do processo social e que
conduza à interinstitucionalidade, construída na interação e inter-relação de
organizações, profissionais e pessoas”. Em parceria com o Escritório Técnico
do IPHAN, cumpre-se a proposta de atender à população de menor poder
aquisitivo, residente em edificações com necessidade de conservação e
restauração, condições de realizar as ações necessárias para manutenção de
seus imóveis, disponibilizando dossiês de conservação e restauro. Na
atualidade, especificamente, atende-se às paróquias da cidade de Ouro Preto,
responsáveis pelos bens culturais históricos que demandam apoio para a
salvaguarda das edificações referenciais, no caso: três Passos da Paixão –
edificações de pequeno porte que contam os momentos finais da vida de cristo
-, e duas Capelas de pequenas dimensões. Trabalhou também, mentalidades
comprometidas com a preservação do patrimônio cultural, através de ações de
educação patrimonial, contribuindo, consequentemente, para a melhoria da
qualidade de vida, para a sustentabilidade e para a valorização da cultura. Em
conjunto a essas ações, investiga-se sobre as técnicas e materiais construtivos
tradicionais, bem como as causas das patologias encontradas nos objetos
estudados.

Palavras-chave: Patrimônio, conservação e restauro, cultura.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

OS CORETOS: A PERMANÊNCIA DO MOBILIÁRIO URBANO SEM USO


ESPECÍFICO

Savilly Aimée Teixeira Buttros (sbuttros@gmail.com)

RESUMO

Este trabalho objetiva uma explanação histórica sobre o surgimento dos


coretos, bem como seu papel atual na composição do espaço urbano. Os
coretos são mobiliários urbanos frequentemente encontrados em praças, largos
e jardins brasileiros. Além da função ornamental, apresentam grande
importância histórica e social. Sua difusão no Brasil esteve diretamente ligada
ao crescimento das organizações musicais e à expansão das linhas férreas nas
regiões interioranas, ocorridas entre os séculos XIX e XX. Atualmente, as
apresentações musicais e os pronunciamentos políticos, realizados dentro ou
próximos aos coretos, não mais fazem parte de uma tradição vívida. Porém,
muitos coretos permanecem nas praças sem uso específico e em situação de
abandono, submetidos a todas as formas de degradação. Durante a pesquisa,
foram visitados cinco coretos de técnica construtiva similar – sendo um em
Minas Gerais e quatro no Rio de Janeiro – verificando-se o estado de
conservação e as medidas protetivas existentes. Notou-se que a falta de
vínculos entre a população e os coretos torna a tomada de medidas de
preservação mais complexa. Deficiências na gestão do patrimônio público
também são um fator agravante para a recorrente má conservação desses
mobiliários. Contudo, os coretos são testemunhos de antigas tradições e
carregam estilos e técnicas construtivas diversas, as quais podem se perder
caso não haja preservação.

Palavras-chave: coreto, praças, urbanismo, patrimônio público, preservação


patrimonial
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA PRESERVAÇÃO DE SÍTIOS HISTÓRICOS


URBANOS. EXPERIMENTO METODOLÓGICO NO SÍTIO HISTÓRICO DE
SANTA LEOPOLDINA – ES

Letícia Nunes Barcellos (leticiabarcellos.au@gmail.com)


Renata Hermanny De Almeida (renatahermanny@gmail.com)

RESUMO

Este trabalho se insere nos estudos que tratam da participação social nas
políticas públicas, especificamente relacionado à preservação de Sítios
Históricos Urbanos no Brasil. A participação social nas políticas públicas é um
tema cada vez mais estudado e discutido, num momento de crise do modelo de
representação política que ocorre no contexto nacional e internacional, com
desconfiança por parte dos cidadãos em relação às instituições políticas
tradicionais e ao esvaziamento dos partidos políticos. Ao mesmo tempo, a
população reivindica, cada vez mais, seu direito de participar de decisões que
afetam direta ou indiretamente sua vida. Para a preservação do patrimônio, a
participação social é condição indispensável, entretanto, não é efetiva na
política patrimonial do Brasil. A ausência de participação acarreta
consequências negativas na preservação do patrimônio. A população, em
geral, não participa do processo, conhece pouco sobre o patrimônio e, por isso,
não se sente comprometida, não se relaciona com o bem tombado e não lhe
confere o valor esperado. Não há instrumentos para participação social
definidos na política de proteção patrimonial, por isso a participação se dá de
diferentes formas e com diferentes graus de envolvimento, a depender de cada
projeto e de seus gestores. Nesta pesquisa, estabelece-se como recorte
temporal a Constituição Federal de 1988, por esta ser considerada a
Constituição Cidadã, que possibilita a criação de diversos espaços e
instrumentos para participação da sociedade nas decisões relacionadas às
políticas públicas. Como recorte espacial, estabelece-se o Sítio Histórico
Urbano, por ser a cidade o lugar propício ao exercício da democracia e os
sítios históricos, por ser interesse do estudo o patrimônio entendido como
conjunto, e não edificações ou monumentos isolados. A pesquisa objetiva
identificar estratégias para participação social na preservação de Sítios
Históricos Urbanos. Para isso, adota o Sítio Histórico de Santa Leopoldina, um
dos cinco Sítios Históricos do estado do Espírito Santo, tombado pelo Conselho
Estadual de Cultura em 1983, como objeto concreto de experimentação de
metodologia participativa visando o estabelecimento de estratégias para
participação social na preservação do sítio. Para isso, realiza-se revisão
bibliográfica sobre a participação social, seus instrumentos e metodologias;
análise do Sítio Histórico de Santa Leopoldina no campo urbanístico-ambiental,
socioeconômico e da gestão urbana e do sítio histórico. A participação social
nas políticas públicas com qualidade é uma questão complexa e por isso não
vai se tornar efetiva rapidamente, mas, para que seja um dia alcançada, é
necessário começar colocá-la em prática.

Palavras-chave: Participação social; Preservação; Gestão urbana.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO E IDENTIDADE: A IMPORTÂNCIA DO


RECONHECIMENTO NO PROCESSO DE SALVAGUARDA

Flávia Cristina Costa Vieira (flaviaccostavieira@gmail.com)

RESUMO

O trabalho consiste no estudo de casos à luz da legislação patrimonial


brasileira, demonstrando como o Estado, em sua configuração centralizada e
federalizada atual, age contra a determinação de salvaguardar o patrimônio
arqueológico. O primeiro caso apresenta o ocorrido com os vestígios
arqueológicos encontrados durante a realização de obras pelo Departamento
de Estradas e Rodagens, DER, para abertura de uma rodovia no Distrito de
Alto Maranhão, em Congonhas, MG. O segundo descreve a situação dos
vestígios arqueológicos identificados na região do empreendimento
Condomínio Residencial Goiabeiras, por ocasião de sua implantação no
município de Congonhas, MG. O terceiro trata do arsenal descoberto durante
as obras de restauração e adequação do antigo edifício da Secretaria de
Segurança Pública, atual Centro Cultural Banco do Brasil, em Belo Horizonte,
MG.

Em todos os casos, agentes de órgãos governamentais e profissionais liberais


lançaram mão das políticas de preservação patrimonial nas esferas municipal,
estadual e federal na tentativa de salvaguardar o patrimônio. Nestes termos, os
debates acerca da importância da atualização desses instrumentos legais e do
próprio conceito de patrimônio ganham força nas necessárias deliberações
sobre o tema dentro da municipalidade, afinal, no universo da massa de dados
recebida por um órgão federal cada caso é apenas mais um número de
protocolo, mas para o município é parte de sua identidade. Tendo em vista que
em todos os casos a esfera federal atuou de modo a, em alguma medida,
desconsiderar a importância do patrimônio arqueológico, a esfera municipal
seguiu, na maioria das vezes, na contramão, tentando defender e demonstrar a
importância do patrimônio para a manutenção da identidade local.

Palavras-chave: IPHAN; arqueologia; patrimônio arqueológico; salvaguarda;


destruição
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PATRIMÔNIO CULTURAL NO CONTEXTO DO GRANDE PROJETO


URBANO PORTO MARAVILHA NO RIO DE JANEIRO: PRESERVAÇÃO OU
AMEAÇA?

Maria Lucia Borges De Faria (arq.lborges@gmail.com)

RESUMO

O presente artigo pretende refletir sobre políticas, práticas e instrumentos de


preservação e conservação do patrimônio cultural urbano na cidade do Rio de
Janeiro na perspectiva da ampliação da noção de patrimônio, da evolução das
políticas públicas e da participação social. Para tal se utiliza, por um lado, de
breve revisão do debate internacional nas suas cartas e recomendações, bem
como, sob influência dessas, dos instrumentos legais e ações na esfera
governamental. Por outro, considera o contexto sócio-político que ampara as
relações do patrimônio com a população local, a partir das últimas décadas do
século passado.

No esforço de responder a questão: “Patrimônio cultural no contexto do grande


projeto urbano Porto Maravilha no Rio de Janeiro: preservação ou ameaça?”
considera-se como referência de análise o confronto da cidade idealizada e
concebida na racionalidade dos planos e projetos com a ‘cidade vivida’, aqui
identificada como espaço dos coletivos culturais locais que cotidianamente
criam e recriam seus vínculos identitários. (PASSOS e SANCHÉZ, 2012)
O atual modelo de produção do espaço urbano, pautado no capitalismo
neoliberal, vem acirrando processos de espetacularização das cidades, de
especulação no mercado imobiliário e de gentrificação em áreas dotadas de
patrimônio cultural. A transformação das cidades e da vida urbana em
mercadorias tem se tornado um fenômeno cada vez mais presente nas ultimas
décadas e, segundo alguns autores, fator de despolitização na esfera social.
Nesse contexto, a cultura, dotada de valor simbólico, é estrategicamente
apropriada como aliada desse modelo de intervenção urbana. Os projetos de
“revitalização” operam a cultura “para consumo” e fazem dessa sua âncora
(ARANTES, 2011; VAINER, 2011; SANCHEZ,2010; KARA-JOSÉ,2007; VAZ e
JACQUES, 2006; VAZ, 2004).

Alinhado nesse modelo de gestão, a partir de 2009, no âmbito da preparação


dos jogos olímpicos de 2016, na região portuária da cidade, instalou-se o
grande projeto urbano Porto Maravilha. Tal região compreende um conjunto de
bairros dotados de excepcional conteúdo cultural, relacionado à formação da
cidade e seu povo, expresso na paisagem, no traçado das vias, nos conjuntos
edificados, bem como nos seus vários territórios culturais, resultado da
coexistência de diferentes grupos sociais e etnias ao longo de sua história.

Examinam-se no contexto desse grande projeto, os instrumentos operados na


proteção do patrimônio cultural e os espaços de participação conquistados
pelos coletivos sociais locais na defesa desse patrimônio, adotando como
objeto de estudo o cais do Valongo.

Como resultado pretende-se reconhecer nas disputas de sentidos atribuídos ao


bem, nas tensões ou convergências que se estabelecem entre os agentes do
projeto hegemônico e os coletivos sociais integrantes da ‘cidade vivida’,
possíveis contribuições à efetiva preservação do patrimônio. (FARIA, 2016;
VASSALLO,2015; GUIMARÃES, 2014; MOTTA, 2000).

Palavras-chave: Patrimônio cultural, Porto Maravilha-Rio de Janeiro,


participação e patrimônio.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PATRIMÔNIO IMATERIAL COMO INSTRUMENTO DE CONSERVAÇÃO DA


MEMÓRIA DE UM BAIRRO: O CASO DO BAIRRO DE CAMPINAS E A
TORCIDA DO ATLÉTICO CLUBE GOIANIENSE.

Cristina Maria Costa Prado (cristinaprado.cp@gmail.com)


Adriana Mara Vaz De Oliveira (amvoliveira@uol.com.br)

RESUMO

Diante da discussão sobre patrimônio cultural, cheia de facetas, que ora


contribuem para o universo da conservação de bens e modos de fazer, ora
geram polêmica quanto ao tombamento, à espetacularização do patrimônio
(JACQUES, 2003), o que dizer sobre o descaso em relação ao bairro mais
tradicional de Goiânia, região de pouca idade, mas que possui o setor
Campinas, com 206 anos de existência, referência na história da capital,
carregado de memórias, histórias, lembranças, marcas sociais? Hoje o bairro
foi tomado por usuários de drogas, o que tem gerado alto índice de violência.
Isso tem afugentado as pessoas e aumentado substancialmente as placas de
“vende-se” ou “aluga-se”, criando zonas de abandono. O presente artigo se
propõe a discutir, brevemente, a questão do patrimônio imaterial como
instrumento para manter-se a memória de um bairro, ou como lugar de
memória (POLLAK, 1992), observando de que forma as políticas de
preservação do patrimônio cultural têm sido aplicadas ao bairro, talvez como o
meio mais eficiente de proteger as raízes dos campineiros e paradoxalmente, o
modo mais torpe de salvaguardar essas memórias. Focaremos no âmbito
imaterial, onde as discussões são mais recentes, mas que já estão inseridas no
trabalho de patrimonialização, onde os critérios também são questionáveis
(assim como no âmbito material), a atribuição de valor aos objetos patrimoniais
gera dúvidas, relegando aos menos favorecidos de conhecimento e forças
políticas, ao abandono. O que se busca aqui, não é defender o tombamento do
bairro de Campinas como única alternativa possível para exercer os cuidados
necessários, mas “dar voz” a essas memórias dos campineiros tradicionais,
tentando entender a relação de identidade entre moradores e antigos
moradores com Campinas. Entretanto, a discussão será direcionada a um
grupo específico de campineiros, eleitos nesse trabalho, como representantes
da memória do bairro, a torcida do primeiro time da capital Goiânia e que é
parte das memórias coletivas e também da identidade de Campinas: a torcida
do Atlético Clube Goianiense, clube fundado em 02 de Abril de 1937, por uma
turma de rapazes, entre eles, Antônio Accioly, o qual foi homenageado dando
nome ao Estádio (TELES, 2005).

Palavras-chave: Patrimônio imaterial, Goiânia, Campinas, Futebol, Torcida,


Atlético Clube Goianiense.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PATRIMÔNIO PULSANTE: A ÁREA CENTRAL CARIOCA E AS


MANIFESTAÇÕES SOCIAIS

Diego Ramos (arq.urb.diegoramos@gmail.com)

RESUMO

O objetivo desse trabalho é investigar o papel da complexa relação do


patrimônio cultural e os movimentos sociais no processo histórico da área
urbana central da cidade do Rio de Janeiro, enquanto centralidade (SISSON
2008). Busca-se evidenciar os encontros dos movimentos sociais com as
formas urbanas patrimoniais como meio de ressignificação e propagação de
seu caráter simbólico, desde a modernização da capital carioca no início do
século XX até os dias atuais.

Qual e por que determinada edificação ou ambiente urbano tem poder


simbólico impregnado capaz de catalisar grandes concentrações sociais.
Proteger o patrimônio de possíveis depredações é: vedá-lo do contato direto
com os manifestantes, ou o oposto, aproximá-lo cada vez mais das vivências
do movimento? Questões que reforçam a inquietação de investigar, de forma
mais específica, os motivos da persistência histórica das manifestações sociais
no Rio de Janeiro em determinados pontos específicos da cidade, como
determinantes para sua permanência física nesta área central da cidade que se
apresenta dualmente enquanto centro histórico e centro de negócios.
A reocupação do espaço público urbano carioca está em relevância. A região
central da cidade tem sido frequentemente palco de grandes movimentações
políticas e culturais de diversas ordens em diferentes contextos O recente
reencontro da população com a área portuária, até então avesso da cidade,
permitido pela reformulação urbana do Boulevard Olímpico, em 2016, suas
descobertas e apropriação enquanto área de laser e enorme espaço dedicado
a sociedade, desencadearão um novo solo para manifestações sociais,
agregando ainda mais valor simbólico a este recente espaço de encontros da
cidade olímpica. Esta análise de formas, dimensões e atividades e estímulos
propostos a este espaço são importantes mecanismos de reapropriação do
espaço público, podendo inclusive transformar a noção do tecido urbano
carioca.

O objeto empírico da pesquisa, a área central da cidade do Rio de Janeiro


discutido, por meio de sua estrutura física, e elemento estimulante às
manifestações sociais, evidenciadas por recortes de jornais, fotografias e
crônicas, será importante mecanismo de reflexão sobre os atores, as trocas,
formas, processo e o tempo, fatores fundamentais nas discussões da memória
urbana.

Entender os impactos causados na cidade por interferências externas,


rompendo a consonância adquirida a longo dos tempos de vivências empíricas,
entre população e ambiente construído, são fundamentais para compreender
as formas de habitar e ocupar a cidade.

Tem-se como hipótese o papel dialético exercido pelas manifestações sociais


na ressignificação do patrimônio cultural da área central carioca. Adota-se o
sentido de manifestação não só como ativismo da sociedade em favor de uma
causa, visando expressar publicamente ideias, como considera, principalmente,
a influência do espaço nas transformações impostas à e pela sociedade.

Palavras-chave: patrimônio, morfologia urbana, manifestações sociais


cariocas
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PATRIMÔNIO, MEMÓRIA E IDENTIDADE: UM ESTUDO SOBRE AS


IGREJAS CATÓLICAS DO CENTRO DE VITÓRIA/ES

Douglas Gomes Silva (arqui_douglas@hotmail.com)

RESUMO

Objetiva-se nesse trabalho discorrer sobre as sete igrejas católicas no Centro


de Vitória, atual capital do estado do Espírito Santo, onde as mesmas fazem
parte da formação do conjunto de patrimônio histórico arquitetônico religioso
local. Sendo abordado um breve histórico das mesmas desde a fundação, o
uso atual, o papel delas na formação da identidade do povo capixaba, e os
agentes que atuam na conservação da memória do lugar. Na “Cidade alta”,
área geograficamente mais elevada em relação ao nível do mar, local onde
estão localizados o palácio do governo, as construções seculares e as igrejas
católicas, objetos de estudo desta pesquisa, sendo elas: a catedral
Metropolitana, a capela de Santa Luzia, o convento de São Francisco, a capela
de Nossa Senhora das Neves, a Igreja de São Gonçalo, o Convento do Carmo
e a Igreja do Rosário. As igrejas católicas do Centro de Vitória são símbolos e
marcas de todos os tempos da história capixaba. A mais antiga data do século
XVI, e a mais recente em meados dos anos de 1950 do século passado, onde
as mesmas representam a forte herança da nossa colonização. As construções
religiosas do Centro não exercem somente o papel do aspecto sagrado, mas
também exercem o papel de símbolos da memória, onde a população local
identifica nas construções parte da sua história com a da própria cidade. A
busca pela preservação é a busca pela memória social e coletiva do lugar e
dos quem a ela pertence, é a busca pela identidade em um mundo em que a
singularidade do lugar perde espaço para a multipluridade dos novos tempos.
No processo de preservação, recuperação e revitalização do patrimônio, o
poder público é o principal ator nas ações de revitalização de centros urbanos,
áreas onde mais se concentram os patrimônios históricos. O “Projeto Visitar”,
uma parceria do Instituto Goia e a Prefeitura de Vitória, através de visitas
monitoradas aos patrimônios arquitetônicos e culturais do Centro, com
destaque para as Igrejas Católicas, busca-se mostrar a história da capital e
despertar a curiosidade e a identidade do povo capixaba e a construção de
uma memória coletiva. Além das visitas monitoradas, o Visitar possui uma
coleção de livretos, os quais contam a história de cada espaço onde o projeto
atua. Através do poder público, via políticas públicas, como também com a
participação de setores privados e de organizações sem fim lucrativo,
entendemos que podem ser feitos trabalhos visando uma educação
patrimonial, a fim de resgatar a memória coletiva da cidade, ou pelo menos do
seu centro histórico, salientando a importância das edificações. Por fim, o foco
dessa pesquisa é descrever sobre essas as Igrejas Católicas do Centro de
Vitória e a busca pela preservação e educação patrimonial mostrando que a
conservação dos patrimônios construídos de uma cidade é muito mais que
preservar uma forma arquitetônica, é preservar a história, a memória coletiva e
a identidade de um povo.

Palavras-chave: Patrimônio religioso, preservação, conservação, educação


patrimonial
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PENSANDO A PRESERVAÇÃO ARQUITETÔNICA E URBANA DE


ESPÍRITO SANTO DO PINHAL: UM PATRIMÔNIO AINDA A CONHECER

Júlia Farah Ribeiro (julia.farah@gmail.com)


Regina Andrade Tirello (rtirello@gmail.com)

RESUMO

O reconhecimento de valores culturais nas paisagens urbanas e a preocupação


com sua preservação derivam do amadurecimento de discussões sobre o
próprio significado de patrimônio cultural. O contínuo aprofundamento desses
debates abriu caminho para a valorização de artefatos por vezes considerados
menores e que passaram a se destacar por suas qualidades compositivas,
além de suas características estéticas e construtivas.

Em compasso com o alargamento do conceito de patrimônio cultural, este


artigo é parte de discussões abordadas na pesquisa de mestrado intitulada
Para além do centro histórico: valores e sentidos do patrimônio edificado de
Espirito Santo do Pinhal, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em
ATC-Unicamp.

A cidade de Espírito Santo do Pinhal (localizada na divisa entre o estado de


São Paulo e o sul de Minas Gerais), devido à sua importância econômica no
período áureo do ciclo do café, é detentora de conjunto histórico e arquitetônico
valorizado por sua população e tombado em nível estadual.

Os estudos para tombamento do Núcleo Histórico Urbano de Espírito Santo do


Pinhal tiveram início em 1985 e tal iniciativa se configura em ação pioneira
entre as cidades paulistas pelas circunstâncias que ensejaram o pedido de
proteção oficial do conjunto. A salvaguarda foi solicitada ao CONDEPHAAT
pela própria população, então representada pela Associação Pinhalense de
Cultura, com o intuito de impedir o desaparecimento de prédios históricos, que
à época corriam riscos de demolição iminente.

O conjunto arquitetônico selecionado pelo órgão estadual corresponde a 11


(onze) edifícios, considerados como as maiores expressões do período de
desenvolvimento mais significativo da cidade.

No processo de tombamento consta como documento inicial para a abertura


dos estudos uma listagem produzida pela Associação Pinhalense com 56
(cinquenta e seis) imóveis considerados de interesse. Nela foram arrolados
bens de épocas e tipologias variadas, relacionados a diversos grupos sociais e
ocorrências históricas.

A diversidade de tipologias arquitetônicas constante na lista da Associação


demonstra que já no inicio da década de 1980 interessava aos pinhalenses a
preservação de exemplares arquitetônicos que expressassem o conjunto da
sociedade local em diferentes períodos.

Nessa perspectiva, buscando aprofundar questões relativas à inter-relação da


preservação arquitetônica com o desenvolvimento urbano de Pinhal, este
trabalho apresenta o estudo de dois bairros representativos de importantes
movimentos de ampliação da malha urbana de Pinhal, nomeadamente: Vila
Monte Negro e Vila Norma. Tais bairros hoje configuram, respectivamente, o
patrimônio ferroviário e moderno pinhalense.

Acredita-se que os conjuntos identificados são representantes de extratos da


sociedade pinhalense que ainda não são efetivamente valorizados ou
reconhecidos, mas que foram fundamentais para a transformação da cidade e
que, por isso, merecem integrar o acervo dos bens culturais de Pinhal.

Palavras-chave: Preservação arquitetônica e urbana, Espírito Santo do Pinhal,


tombamento, patrimônio ferroviário, patrimônio moderno.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PERSPECTIVAS E DESAFIOS PARA A GESTÃO DE BENTO RODRIGUES:


POR UMA PROPOSTA DE CONSTRUÇÃO DE CONSENSO

Luciana Rocha Feres (lurferes@gmail.com)


Guilherme Maciel Araujo (guilhermemacara@gmail.com)
Samantha De Oliveira Nery (samnery@gmail.com)

RESUMO

O sub distrito de Bento Rodrigues tem recebido enorme visibilidade tanto no


Brasil como em outros países do mundo, desde o rompimento da Barragem de
Fundão, em novembro de 2015, que se configurou como o maior desastre
ambiental do país e teve impactos profundos na vida de seus habitantes.

Neste contexto se encontram fortes divergências relativas ao uso do território


de Bento, que envolvem questões jurídicas, fundiárias, econômicas, sociais,
políticas e mesmo culturais, revelando diferenças de interesses e valores, de
acordo com os agentes envolvidos, em um ambiente complexo no qual se
entrelaçam várias demandas conflitantes.

O presente trabalho tem como objetivo discutir e avaliar as possibilidades e os


desdobramentos da aplicação da metodologia de resolução de conflitos,
denominada Consensus Building (Construção de Consenso) na gestão do
patrimônio de Bento Rodrigues. A metodologia do Consensus Building se
diferencia de outras formas de gestão patrimonial que alcançam seus objetivos
unilateralmente, porque considera e busca acordos entre os interesses e
necessidades dos diferentes grupos envolvidos.
Difere-se especialmente dos processos que se baseiam na gestão pelo poder e
na gestão legal do bem, cada qual privilegiando apenas uma das partes
interessadas. Em sua base estão teorias e princípios da negociação e
resolução de conflitos, com foco no diálogo. Ao longo do processo são
realizadas algumas etapas para a construção coletiva do consenso e o objetivo
final é constituir um processo onde todos os interessados possam ganhar de
alguma maneira, preferencialmente respeitando-se os valores centrais e as
identidades de cada grupo. Identifica-se inicialmente quais são as partes
interessadas no caso e suas respectivas funções e planeja-se como será o
processo colaborativo. Na etapa seguinte, fatos e questões são esclarecidos,
bem como seus interesses e valores centrais, buscando-se alternativas e
opções potenciais que possam alcançar acordos. Por fim, as disputas devem
ser resolvidas, através de ações implementadas e de aprendizados que
deverão ser alcançados durante a negociação.

A partir desta proposta, avalia-se como seria uma gestão consensual do


patrimônio de Bento Rodrigues, apontando-se alguns dos principais
interessados, tais como: a Mineradora, sua Fundação, a população de Bento, o
Ministério Público, a Prefeitura e o Conselho de Patrimônio Municipal de
Mariana, entre outros, identificando alguns de seus principais interesses e
valores, ainda em caráter preliminar, e avaliando se o método do Consensus
Building seria adequado para este caso.

Palavras-chave: Gestão do Patrimônio, Bento Rodrigues, Construção de


consenso.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PISO, PAREDE, TETO: A (DES)CARACTERIZAÇÃO DOS MATERIAIS NAS


INTERVENÇÕES REALIZADAS PELOS PROPRIETÁRIOS DE BENS
PROTEGIDOS

Karine Maria Gonçalves Cortez (karine_cortez@hotmail.com)


Terezinha De Jesus Pereira Da Silva (terezinha_psilva@hotmail.com)
Sérgio Motta Bittencourt (bitcac@gmail.com)
Isabela Dos Santos Silva (isabela_ssilva@hotmail.com)

RESUMO

As práticas de manutenção, ampliação e até mesmo “modernização” realizadas


pela maioria dos proprietários em áreas de sítios históricos, como em Olinda,
Igarassu e na Várzea, em Pernambuco, são frequentemente criticadas pelas
descaracterizações que provocam não somente no bem, que sofreu as
intervenções, mas também no entorno. As aplicações indevidas dos materiais
provocam desde mudanças das superfícies, geração de novas volumetrias,
introdução de equipamentos (antenas, condensadores,etc.), até a perda de
visibilidade de paisagens e bens. Tais situações refletem : i – precário poder de
fiscalização das prefeituras; ii – falta de ações de educação patrimonial pelas
entidades responsáveis pela preservação e iii – falta de conhecimento por parte
dos moradores de significados técnicos apropriados. Os bens culturais e seus
entornos devem preservar as ambiências dos testemunhos dos contextos que
foram criados (Marchesan, 2006, p. 166). Também na mesma linha de
preservação do contexto histórico do ambiente está a Carta de Veneza (Carta
de Veneza, 2005, Art. 70 e 80). Por sua vez, a mãe das legislações de
proteção do entorno e visibilidade também ampara tal situação (Decreto No 25
de 1937, Art.18). Desse modo, os novos usos e condições de conforto
precisam ser trabalhados junto aos usuários e com respostas mais rápidas
pelas instituições que têm as responsabilidades de fiscalização. Considerando
tais questões o artigo definiu como objetivo analisar o nível de conhecimento
técnico das intervenções realizadas pelos moradores do sítio histórico da
Várzea . Os objetos de estudo compreenderão as edificações e moradores do
entorno das Igrejas do Rosário e do Livramento, no bairro da Várzea, Recife,
Pernambuco. O lugar é considerado como Unidade Urbana 19 da Zona de
Urbanização Preferencial 2 e faz parte da Zona Especial de Preservação do
Patrimônio Histórico - Cultural – ZEPH( Recife, Lei No 16.176/1996, Anexo 2A).
Como conteúdos de desenvolvimento serão abordados: 1 – conceituação dos
termos; 2 – Histórico da área; 3 – normas e legislações incidentes na área; 4 –
Diagnóstico da área; 5 – referenciais teóricos; 6 - resultados e 7 considerações
finais. Como conclusões parciais se constatam que apesar da existência de
instrumentos legais, as aplicações dos mesmos não acontecem de modo que
inibam as descaracterizações, bem como os manuais e demais instruções
técnicas não são plenamente acessíveis aos moradores destas áreas
históricas, da mesma forma que sem apoio financeiro, muitas vezes, ações
eficazes e benéficas as áreas históricas tornam-se inviabilizadas pelos
moradores e proprietários.

Palavras-chave: Intervenções, Materiais, Sítios Históricos


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PIXAÇÃO E PATRIMÔNIO HISTÓRICO NA CIDADE DE TERESINA-PI.

Aline Queiroz Bezerra (ninaqb11@hotmail.com)


Letycia Dos Santos Sousa (letyciasantos59@gmail.com)
Pâmela Franco (pamelafranco@hotmail.com)
Ana Virgínia Alvarenga Andrade (anavirginia@uninovafapi.edu.br)

RESUMO

O presente artigo discute a pichação teresinense a partir da sua relação com o


patrimônio histórico arquitetônico local, assim também como sua relação com a
sociedade, e destas para com a paisagem urbana. Aborda a diferença entre
pichação do grafite, analisando a situação atual dos edifícios de importância
arquitetônica e histórica em relação à paisagem visual. Investiga as possíveis
explicações para a pichação como meio de comunicação urbana, suas
consequências e impacto social, assim também como medidas adotadas sobre
a mesma. Diante disso, foram explicitados os resultados com base na
problemática abordada, a fim de entender os motivos pela prática de tal ato e
levar a conhecer a visão dos pichadores, da sociedade e dos governantes. Tal
estudo foi realizado por meio do levantamento fotográfico, documentários,
legislação e revisão bibliográfica, como também apropriação da visão política e
teorias levantadas por Flavio Morgenstem, Luciano Spinelli e Mikhail Bakhtin,
resultando em uma discussão importante para a preservação e significação do
patrimônio histórico local.

Palavras-chave: Pixação, Patrimônio histórico, Teresina.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

POR UMA ERÓTICA DO PATRIMÔNIO: ALTERNATIVAS À


TRANSFORMAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO CIDADÃ EM PANACEIA DAS
POLÍTICAS PATRIMONIAIS

Gabriel De Andrade Fernandes (gaf.arq@gmail.com)

RESUMO

Considerando-se a expressiva ampliação recentemente verificada em fóruns e


publicações acadêmicas e profissionais da mobilização da pauta da
participação social e cidadã nas políticas patrimoniais, pretendemos com este
artigo não só apresentar uma reflexão das armadilhas desse processo a partir
de exemplos exteriores ao campo como propor uma inversão da formulação do
próprio problema, atentando para uma eventual condição inerentemente
tecnocrática da ação patrimonial institucionalizada. Neste sentido,
parafraseando a clássica provocação de Susan Sontag sobre a crítica de arte,
refletimos a respeito da necessidade não de uma renovada (e participativa)
“hermenêutica” do patrimônio cultural, mas a respeito das possibilidades de
uma ação institucional em torno da “erótica do patrimônio”. O trabalho, então,
assume duas frentes com este objetivo: discute, de um lado, os problemas da
ideia de “participação” a partir da bibliografia consolidada sobre o assunto,
ainda que pouco citada no campo patrimonial, e particularmente posiciona as
políticas patrimoniais frente a clássica “escada da participação” de Sherry
Arnstein. De outro lado, questiona a eficácia da abordagem participativista ante
a ação direta de coletivos culturais e grupos organizados que vêm
pressionando de baixo para cima políticas patrimoniais consolidadas e
questionando a eficácia dos instrumentos de preservação e salvaguarda
existentes. Conclui argumentando pelo reconhecimento da necessidade de
inverter os instrumentos institucionais disponíveis de ação patrimonial e em
particular a prática consolidada do tombamento.

Palavras-chave: Participação social, Escada da participação, Patrimônio


cultural
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

POR UMA VISÃO HUMANA DO PATRIMÔNIO: REPENSANDO O


CONSELHO DELIBERATIVO DO PATRIMÔNIO CULTURAL E NATURAL DE
SABARÁ/MG

Graziela Elem Ferreira Costa (grazielaelem@yahoo.com.br)


Rafael Boeing (boeingrafael@gmail.com)

RESUMO

O município de Sabará/MG possui seu próprio Conselho Deliberativo do


Patrimônio Cultural e Natural desde o ano de 2006. Composto por
representantes da sociedade civil e poder público, este órgão colegiado se
tornou então um dos principais responsáveis pela proteção, conservação e
salvaguarda do patrimônio material e imaterial do município. No presente
artigo, os autores pretendem abordar a importância da participação da
sociedade civil como instrumento fundamental para a concretização deste
propósito. Partindo da premissa de que o patrimônio não deve mais ser tratado
como assunto meramente técnico (à maneira das políticas de “pedra e cal”),
buscar-se-á refletir sobre medidas para a consolidação de uma visão mais
humana, participativa e democrática para as políticas públicas de patrimônio, a
qual integre, em sua formulação, implantação e avaliação, o máximo da
diversidade das comunidades direta ou indiretamente vinculadas a bens
culturais protegidos do município. Para tanto, analisar-se-á dois casos
específicos: a ampliação da representatividade social dentro do Conselho em
questão por meio da reformulação de sua dinâmica interna e o estímulo a uma
atuação mais incisiva e proativa dos conselheiros da sociedade civil a da
formação de comissões temáticas, entre outros espaços direcionados à
proposição e mobilização de ações e agentes – de modo a extrapolar uma
participação restrita às plenárias e votações sobre requerimentos e pareceres.
Sendo assim, o artigo se debruçará sobre questões teóricas e práticas relativas
à composição, representação e função do Conselho em questão, levantando
possibilidades para melhorar não apenas sua capacidade deliberativa, mas
também propositiva e mobilizadora.

Palavras-chave: Patrimônio, Participação, Conselho, Representação,


Mobilização
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

PROPOSTA DE NORMATIVA TÉCNICA PARA PREVENÇÃO E COMBATE A


INCÊNDIO E PÂNICO EM BENS CULTURAIS PROTEGIDOS

Thiago Ferreira (thiago_s_ferreir@yahoo.com.br)


Marcelo Santana Silvino (marcelo@exempla.com.br)
Paulo Gustavo Von Kuger (paulovonkruger@gmail.com)
Leonardo Barreto De Oliveira (barretoleonardo6@gmail.com)

RESUMO

O presente artigo apresenta os principais tópicos da proposta de Normativa


Técnica referente à prevenção e combate a incêndio e pânico em edificações,
conjuntos urbanos e sítios históricos, restringindo, como objeto de aplicação, os
bens protegidos pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional –
IPHAN, autarquia especializada vinculada ao Ministério da Cultura, responsável
pelo acautelamento de bens culturais que conferem significado e permitem a
compreensão da trajetória do povo brasileiro, enquanto seres humanos em
interação com o meio ambiente natural. A proposta foi desenvolvida pelo
IGNIS, Grupo de Pesquisa em Tecnologia e Ciência do Incêndio, vinculado a
Universidade Federal de Minas Gerais e formado por uma equipe
interdisciplinar. Esta normativa surgiu devido aos imensuráveis danos ao
patrimônio cultural, decorrentes de incêndios, fartamente registrados ao longo
da história do Brasil. Lamentáveis ocorrências que indicam não estarem estes
bens adequadamente protegidos contra este tipo de sinistro. Importante
salientar que, em caso de perda, os bens culturais se caracterizam de forma
diversa de outros danos materiais, na medida em que as informações ali
contidas não podem ser recuperadas na sua integralidade. Uma vez que seu
valor original e sua autenticidade estarão para sempre perdidas, bem como
informações ali contidas, que pelo nosso estágio tecnológico ainda não
puderam ser apreendidas. Espera-se que esta normativa sirva de referência
para outros órgãos de preservação, sempre com o objetivo de preservar o
patrimônio cultural.

Palavras-chave: Incêndio, Patrimônio Cultural, Prevenção


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

RUÍNAS DO FORTIM DOS EMBOABAS: ENTREMEANDO MEMÓRIA,


AMBIÊNCIA E PRESERVAÇÃO EM SÃO JOÃO DEL-REI (MG)

Diego Nogueira Dias (diegofletcher@hotmail.com)


Alisson Silveira Souza (alisson.silveira.souza@gmail.com)

RESUMO

O estudo da paisagem discute sua formação por meio dos elementos culturais
e naturais em todos os seus aspectos, enquanto o estudo do edifício é
compreendido por meio da sua materialidade e contexto urbano. As teorias da
restauração são de suma importância para o desenvolvimento de uma
metodologia específica de análise em obras de intervenção ou restauro em
bens de interesse cultural. Dessa forma este artigo parte do entendimento das
etapas de intervenção em um bem patrimonial arruinado, analisando questões
que envolvam paisagem, monumento, ambiência e técnica em todas as suas
especificidades. Toma como estudo de caso um conjunto de ruínas localizadas
no centro histórico de São João del-Rei (MG), a partir da abordagem de seu
histórico, enfatizando as transformações sofridas ao longo do tempo, até sua
conformação atual. O objeto em questão insere-se em um complexo de
construções caracterizadas como fortificações da Guerra dos Emboabas,
dentro do perímetro de entorno de tombamento do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). O interesse pelo estudo dessas ruínas
nasce da preocupação com a conservação da memória que se faz necessária
e se consolida em proposta de intervenção apresentada com base nas teorias
do restauro. A ruína é o testemunho da idade, do envelhecimento e da
memória, podendo nela estar expressa a essência do monumento, fazendo-se
imprescindível sua permanente conservação. Em São João del-Rei, os
monumentos arruinados não tem sua preservação assegurada, em parte pela
ausência de diretrizes voltadas para esses bens, assim como por atitudes da
própria população que, na maioria das vezes, não entende a importância da
proteção de seu próprio patrimônio. Pretende-se, aqui, despertar o potencial do
ambiente analisado como um espaço de lazer, entretenimento e cultura para
moradores, através de proposta projetual, contribuindo para a valorização da
história da cidade e da paisagem urbana.

Palavras-chave: Ruínas, Fortim dos Emboabas, São João del-Rei.


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

SÍTIO HISTÓRICO DE ITAPINA/ES: O PATRIMÔNIO ENQUANTO


MONUMENTO A SER PRESERVADO E A SUA PROBLEMÁTICA ATUAL DE
PRESERVAÇÃO.

Douglas Gomes Silva (arqui_douglas@hotmail.com)

RESUMO

O presente artigo aborda o Sítio Histórico de Itapina, que se trata do mais


recente a ser tombado pelo Estado do Espírito Santo. O distrito de Itapina,
situa-se às margens do Rio Doce e da atual Estrada de Ferro Vale do Rio
Doce, no município de Colatina, região noroeste do estado do Espírito Santo. A
ocupação da região deu-se por volta de 1866, com a chegada de fluminenses e
mineiros. Posteriormente, a partir de 1889, chegaram os imigrantes italianos e
algumas famílias libanesas. As características arquitetônicas que são
evidenciadas nos casarios de Itapina refletem essa mescla de costumes e
culturas, onde predominam-se casas térreas e sobrados nos estilos eclético e
proto-moderno, além, da arquitetura tradicional da imigração e da arquitetura
industrial e ferroviária, que podem ser vislumbradas na antiga estação e nos
armazéns de café, ao longo do sítio. O vilarejo prosperou no período áureo do
café, por volta de 1907, com a construção da Estrada de Ferro Vitória-Minas
(EFVM), onde escoava-se toda a produção da região. Porém, com a crise de
1929 e a erradicação dos cafezais este cenário de prosperidade mudou. Na
década de 1940, deu-se o início do processo de esvaziamento do vilarejo, os
comerciantes que ali residiam mudaram-se para outros núcleos urbanos. No
ano de 2013, o Sítio Histórico de Itapina foi tombado em nível estadual, onde
ao todo foram tombados 82 imóveis e outros 43 foram decretados de interesse
de preservação para compor o conjunto. O documento preza pela proteção dos
bens culturais e naturais que constituem a Área de Proteção do Ambiente
Cultural (Apac) de Itapina, constituída pelo Sítio Histórico Urbano, Patrimônio
Ambiental Urbano e Paisagem Cultural. Como o tombamento é recente, pouco
tem sido feito efetivamente para garantir o que foi decretado na Resolução
003/2013. A mesma, ainda não faz parte totalmente do cotidiano do vilarejo,
faltando ações que despertem a conscientização e conhecimento da lei por
parte dos moradores e proprietários, sendo que os mesmos não compreendem
a importância do sítio, ocasionando a situação atual de Itapina, que é de
esquecimento, até mesmo no cenário regional ele é desconhecido. Além disso,
o cenário da região está em plena mudança, fator decorrente da forte seca dos
últimos meses e da lama de rejeitos que atingiu o Rio Doce no final de 2015. O
fato, é que o vilarejo apresenta marcas da história do desenvolvimento local e
da luta dos imigrantes, onde a relação entre o lugar e as marcas deixadas pelo
homem e sua cultura se fazem presentes e precisam ser preservadas. Isto
posto, discutir a temática sobre a preservação de Itapina através do viés do
patrimônio e preservação apresenta-se como o foco deste artigo,
reconhecendo a importância do conjunto, com o intuito de incentivar a
sociedade a preservar a memória do lugar.

Palavras-chave: Sítio histórico, patrimônio, preservação, concientização,


ferrovia.
RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

UMA REFLEXÃO SOBRE AS PRIMEIRAS DÉCADAS DA PROTEÇÃO DO


PATRIMÔNIO NO RIO GRANDE DO SUL

Luísa Cassol Pasqualotto (luisac.pasqualotto@gmail.com)


Maria Beatriz Medeiros Kother (beatrizkother@gmail.com)
Luís Zucco (luis.zzucco@gmail.com)

RESUMO

Este trabalho consiste na análise da gestão do patrimônio entre os anos de


1980 e 2010 pelo IPHAE – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do
Estado do Rio Grande do Sul. Partindo dos processos administrativos,
estabelecemos categorias de análise que se traduzem na reconstrução dos
procedimentos, motivações e critérios adotados para proteção oficial dos bens
culturais e compreensão do processo oficial de proteção. A imersão nos
processos de tombamento, principal fonte de pesquisa do estudo, revelou-se
como fonte inesgotável da memória coletiva de nosso Estado. A partir da coleta
e organização dos dados em fichas para a identificação dos bens tombados, foi
possível dar início à análise e diagnóstico da situação. Observa-se claramente
que, embora sem uma política linear definida para a preservação do patrimônio
cultural, através dos processos de tombamento, foi desencadeada uma série
de práticas institucionais na interpretação do passado, tendo em vista a sua
preservação e a cultura rio-grandense. Os dados foram organizados em fichas
e tabelas para análise, interpretação e crítica das informações. Esta análise
nos permite uma série de questionamentos como, por exemplo, os critérios
para a escolha dos exemplares a serem protegidos pelo tombamento e a
proteção do entorno dos bens tombados.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural, Tombamento, Gestão


RESUMO - 1 - PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO: EIXO 1 – DO TÉCNICO À
POPULAÇÃO: A DEMOCRATIZAÇÃO DO CAMPO DO PATRIMÔNIO EIXO 2
– OS AGENTES DO PATRIMÔNIO: CONSELHOS, MOVIMENTOS SOCIAIS,
ONGS,... EIXO 3 – INSTRUMENTOS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO
EIXO 4 – PATRIMÔNIO, DEMOCRACIA E AS CIDADES EIXO 5 –
RESISTÊNCIA CIVIL E OCUPAÇÕES: A AÇÃO DIRETA NO CAMPO DO
PATRIMÔNIO

VIVENDA CAIÇARA: UM EXEMPLAR DA ARQUITETURA EM PEDRA


PIAUIENSE

Camila De Sousa Ferreira (camilasfg@live.com)


Vitoria Gomes Moreira Rufino Borges (vitoriagomes.b@gmail.com)

RESUMO

Este artigo aborda o processo de construção e transformação da arquitetura


em pedra no Estado do Piauí, utilizando como exemplo a Vivenda Caiçara,
construída em 1920 por uma família descendente de escravos. Outro ponto a
ser abordado, é a edificação se apresentar como elemento patrimonial, devido
ser um exemplar raro desta técnica, apesar de não possui acautelamento por
parte de inventário ou tombamento.

A vivenda caiçara é residência do século XVIII , possui técnica construtiva


mista, utilizando-se de pedra e adobo de barro, constitui um exemplar único
pelas técnicas construtivas adotadas e pelas soluções de conforto térmico
aplicadas. A disposição dos cômodos e das aberturas representam bem as
necessidades da família proprietária e das tradições da época, deixando claro a
hierarquização e setorização típicas de uma arquitetura tradicional e
interiorana.
A discussão colocada em voga por este artigo, é a de que o conceito de
patrimônio precisa ser democratizado, para que atinja também exemplares que
se assemelhem mais aos conceitos de identidade da população, inserido a
comunidade no processo participativo de escolha do patrimônio.

Faz-se necessário sinalar que os órgãos de preservação, muitas vezes


legislam em favor de edificações com valor arquitetônico mais rebuscado, o
que faz com que a arquitetura produzida pelas classes inferiorizadas passe
despercebido.

Em destaque, a Arquitetura produzida no Nordeste do País, longe das capitais,


é desconsiderada, ficando a mercê dos proprietários que nem sempre possuem
relevante educação patrimonial. Tal descaso, contribui para a descontinuidade
da memória da cidade e da comunidade, tornando a população ainda mais
distante e alheia ao seu patrimônio.

Palavras-chave: Patrimônio, Arquitetura de pedra, Leis patrimoniais.


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

“ALÉM DOS MUROS DO INHOTIM” : EDUCAÇÃO PATRIMONIAL,


IDENTIDADE E CIDADANIA EM BRUMADINHO / MG

Webert Fernandes De Souza (webertdouglas@hotmail.com)


Pedro Henrique Da Silva (pedro.turismobrumadinho@gmail.com)

RESUMO

O presente trabalho busca abordar as ações e impactos do programa de


educação patrimonial em Brumadinho/MG. A expressão “além dos muros do
Inhotim”, surgiu do primeiro programa de educação patrimonial da cidade
denominado “Redescobrindo Brumadinho”, criado em 2014 pelo setor de
Patrimônio Histórico de Brumadinho e apoiado pelo Conselho Municipal de
Patrimônio Histórico, Natural e Paisagístico de Brumadinho o programa surge
da necessidade de trabalhar o patrimônio cultural brumadinhense como algo
maior do que apenas o proposto pelo Instituto no seu espaço museológico.

“Além dos muros do Inhotim” é uma expressão que representa o universo


multicultural existente em Brumadinho que estão muito além do Instituto
Cultural Inhotim. Surgido da necessidade de trabalhar políticas públicas
voltadas para a promoção e salvaguarda do patrimônio cultural brumadinhense,
o programa nasce com a perspectiva de conscientizar os brumadinhenses
sobre o seu patrimônio cultural, suas memórias e claro resgatar sua história.
Compreendendo o patrimônio cultural da cidade como algo amplo e
heterogêneo, incorporando nessa noção de pertencimento coletivo municipal
os bens culturais materiais, patrimoniais ou não, os bens imateriais, as
histórias, saberes e vivencias de moradores, inclui socialmente nas suas ações
atores além do espaço escolar, como o Centro de Referência de Assistência
Social (CRAS), Centro de Referência Especializado de Assistência Social
(CREAS), Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), APAE e asilos.

Realizando as ações de educação patrimonial em todos os âmbitos, tais como


museus, bibliotecas, arquivos, praças, nos bens patrimoniais, nos contadores
de história, nos manifestantes de bens culturais, nas escolas para que as
ações possam ser realizadas de maneira continuada. Tornando esses sujeitos
ativos e conscientes, atentos com o seu entorno, no “mundo e com o mundo”
exercendo de fato sua cidadania. Proporcionando aos brumadinhenses um
reconhecimento de sua herança cultural, deixando de ser espectador, como na
proposta tradicional, para tornar-se sujeito, valorizando a busca de novos
saberes e conhecimentos, provocando conflitos e versões. O foco desse
trabalho é apresentar as ações que estão sendo executadas nas políticas
públicas de salvaguarda do patrimônio cultural de Brumadinho por meio das
ações do programa de educação patrimonial Redescobrindo Brumadinho.
Compreendendo que a construção da identidade coletiva brumadinhense,
passa pelo pressuposto de sentir parte de um grupo e assim compartilhar
ideias e comportamentos. Nesse sentido, o conhecimento sobre o patrimônio
levará aos brumadinhenses a reforçar seus laços com a comunidade e ver-se
como membro ativo desta. Objetivo que aliás está em consonância com a
formação dos cidadãos. O que faz do presente trabalho algo de suma
importância nas futuras propostas de construção, seleção e apropriação da
memória coletiva contidas nos bens culturais de Brumadinho.

Palavras-chave: Inhotim, educação, identidade, cidadania


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

“RESGATE HISTÓRICO CULTURAL DO DISTRITO DE MONSENHOR


HORTA-MARIANA MG PARA IMPLANTAÇÃO DA ATIVIDADE TURÍSTICA”

Tatiane Alves Da Silva Soares (tatianeasilva84@yahoo.com.br)

RESUMO

Área Temática:Os desafios de Educação patrimonial

Título:

“Resgate histórico cultural do distrito de Monsenhor Horta-Mariana MG para


implantação da atividade Turística”

Resumo :

O envolvimento da comunidade, alunos e escola é primordial para o processo


de resgate histórico cultural, para a implantação de uma atividade remunerada
para a população nativa , na qual através do trabalho coletivo divulgará a
história a que pertence .

O Objetivo Geral é resgatar a cultura local em todos seus âmbitos, mostrar a


população nativa a importância de conhecerem o local que pertencem e sua
própria história, enquanto sujeitos. Este trabalho despertar com o zelo e
cuidados de preservação poder mostrar para futuras gerações e divulgar para o
mundo as riquezas culturais proeminentes do distrito, gerando rendimentos .
Este trabalho vem sendo realizado na Escola Estadual Cônego Braga no
distrito de Monsenhor Horta da Cidade de Mariana MG com alunos do
Programa Novo Mais Educação - Educação Integral e Integrada -,da faixa
etária entre 7 a 16 anos.

Algumas etapas foram iniciadas:

• Mostrar a importância do cuidado com o primeiro patrimônio: o próprio


sujeito e sua família.

• Dinâmicas, reflexões sobre estes cuidados. Brincadeira que abordam o


patrimônio Individual, através do mural da família, árvore genealógica
,autorretrato e retrato de família

O objetivo esperado é que patrimônio cultural material e imaterial (resgate de


memórias do distrito. As ações propostas são: caixa de memórias dos alunos ,
dos trabalhos realizados, pesquisa de campo com a comunidade e dos
diversos tipos de patrimônios ,elaborando uma ficha catalográfica,oficinas
ministradas pela própria comunidade ,trabalho de observação e registro , como
oficina de fotografia,na parceria com a Universidade local do Curso de
Jornalismo, entrevistas, visitas ao órgão Iphan para conhecer parte do arquivo
da cidade de Mariana para a culminância do projeto ser apresentado numa
feira cultural da Escola e a instalação de um museu de memórias na
Comunidade , na qual poderá gerar rendimentos locais com a atividade
turística mais participativa.

Palavras-Chave (Separadas por vírgula): Patrimônio


Coletivo,Comunidade,Resgate de memórias,Atividade Turística

Autor:Tatiane Alves da Silva Soares

Ano 2017

Palavras-chave: resgate de memórias,comunidade, escola , atividade turísica


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

A “CASA DO IMPERADOR” EM PÃO DE AÇÚCAR (AL)

João Henrique Dos Santos (joaohenrique@fau.ufrj.br)


Maria Aline Lima (mariaaline1977@yahoo.com)

RESUMO

O Objetivo deste estudo é o uso de metodologias de ensino-aprendizagem,


sobre o patrimônio histórico, da cidade de Pão de Açúcar-AL, e tem como
proposta a educação patrimonial, para minimizar a falta de conscientização da
população local, a proposta não é somente sensibilizar a população para a
valorização e preservação, e sim educar e conscientizar sobre sua própria
cultura, desenvolvendo assim, métodos e resoluções de problemas, dentre elas
a preservação da casa onde pernoitou o Imperador Dom Pedro II, na cidade
nos dias 17 e 22 de outubro de 1859, Em seu diário de viagem, depositado no
Museu Imperial, D. Pedro tece elogios à vila: "A vista do Pão de Açúcar é
bonita". Casa essa que faz parte da historia de uma pequena vila que se tornou
cidade, no entanto se encontra em ruínas e esquecida por sua população.

Desta forma, propõe-se a realização de um levantamento do estado


preservacional do imóvel ao mesmo tempo em que se tratará da relação dos
moradores da cidade, especialmente as crianças em idade escolar, com o
mesmo, e quais as perspectivas de, mediante a educação patrimonial, formar-
lhes a consciência da importância do patrimônio histórico e da sua
preservação.

Palavras-chave: Patrimônio, Pão de Açúcar, Educação Patrimonial


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

A CIDADE E A IMAGEM: ESSE TRABALHO DARÁ ÊNFASE A


MANUTENÇÃO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS, O SABER FAZER DO
ARTÍFICE SAPATEIRO.

Neuza Maria De Oliveira Dos Santos (neuzaoliveira@yahoo.com.br)

RESUMO

Eixo 9- Educação patrimonial e trabalho: os ofícios tradicionais

A proposta desse ensaio é conhecer as particularidades de um espaço, que


fora pensado e atrelado a ideia de conforto, praticidade, a manutenção de
serviços em momento histórico da construção do edifício JK, como também,
sua imagem em contexto socioeconômico e cultural. Esse trabalho dará ênfase
a manutenção e prestação de serviços do fazer com as mãos do artífice
sapateiro.

O edifício JK se apresenta como monumento, ora pelo tamanho, ora pela


característica de imagens ícones e atrações turísticas, que se destaca também
por ser tem o mais avançado em questão urbana de sua época. Dentre esses
serviços, o ensaio vai dedicar-se a decodificar um dos ofícios dos artífices, em
especial, ao fazer com as mãos do sapateiro, que, demonstra, habilidades
através dos movimentos, do tato, criando uma harmonia entre os dedos,
coordenando a mão e a cabeça, que por sua vez, nos oferece um olhar em
perspectiva no manejo dos objetos ou na forma de pinça-los com os dedos e
pegar com as mãos, até mesmo em gestos cooperados, voluntários, que nos
faz pensar o cotidiano. (BENJAMIN 1994; BRESCIANI, 2005; SIMMEL, 1903)

Tratando do desenvolvimento desse trabalho, na cidade de Belo Horizonte, fui


a campo conhecer a atividade de alguns artífices, em suas oficinas
trabalhando. Para depois, serem transcritos em integridade ao corpo do
trabalho, respeitando a história, o tempo e a memória dos entrevistados
participantes dessa pesquisa. Aqui, segue o registro de três artífices, o
primeiro artífice sapateiro foi o Sr. Zezinho, no ofício e prestação de serviços no
Conjunto Governador Juscelino Kubitschek. A segunda oficina, foi a
reformadora de calçados “Passo a passo”, me encontrei com o artífice
sapateiro Sr. Nadir, e também em sua oficina, o artífice Sr. Wilson do Carmo.
Os dados obtidos na pesquisa de campo serão analisados à luz das teorias
previamente apresentadas.

Para tanto, as referências teóricas estudadas serão, “O Artífice” que trata dos
trabalhos artesanais e suas habilidades, associando o trabalho feito à mão,
com o trabalho da mente, “As grandes cidades e a vida dos espíritos” e
“Passagens”. Serão analisadas a partir do estudo das obras seminais de
Richard Sennett (1943), Walter Benjamin (1994), Stella Bresciani (2005) e
Simmel, (1903). Os dados obtidos na pesquisa de campo serão analisados à
luz das teorias previamente apresentadas.

Palavras-chave: Palavras-chave: Artes Ofícios, Intangível, Memória,


Sapateiro.
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

A COLETÂNEA GARIBALDINA E A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EM


LAGUNA, SC

Isabela Bardini (isabelabardini@hotmail.com)


Julieta Toledo (julieta.toledo@hotmail.com)
Douglas Heidtmann Jr. (douglasemerson@gmail.com)
Renata Bogo (bogo.renata@gmail.com)

RESUMO

A “Coletânea Garibaldina” é um acervo formado pelo imigrante suíço Wolfgang


Ludwig Rau através da coleção de objetos relacionados a Anita Garibaldi e seu
companheiro Giuseppe. Segundo Rau, a coleção foi uma forma de retribuição
ao Brasil pela receptividade que obteve ao imigrar para o país: ele almejava o
reconhecimento internacional da lagunense como heroína. Em 2001, após 60
anos em processo de formação, a coleção foi comprada pelo governo do
Estado de Santa Catarina com recursos da Fundação Catarinense de Cultura,
após Rau considerar que não haveria mais como manter a mesma. Em 2015,
a FCC transferiu a custódia do acervo para a Universidade do Estado de Santa
Catarina (UDESC), permitindo que o acervo continuasse na cidade de Laguna
e propiciasse interações com a educação de Arquitetura e Urbanismo, a partir
da realização do Programa de Extensão denominado “Comunidade RETRÔ:
MEDIADORES DO PATRIMÔNIO”. Os objetivos do trabalho são: apresentar o
processo de transferência do acervo para a universidade como oportunidade
de educação patrimonial e demonstrar as possibilidades de educação
patrimonial nas iniciativas de preservação, pesquisa e comunicação
envolvendo o acervo. Para tanto, os procedimentos metodológicos utilizados
foram a documentação museológica por meio de arrolamento/inventário, a
desinfestação de móveis e documentos, o estudo para propostas de espaços
museológicos para o acervo e elaboração de material didático para escolas
públicas. O trabalho realizado até o presente momento demonstra o potencial
do acervo para a educação patrimonial. Pretende-se despertar o interesse da
sociedade lagunense, principalmente, das crianças tornando o patrimônio
acessível e contribuindo para sua preservação.

Palavras-chave: Educação Patrimonial, Museu, Coletânea Garibaldina,


Wolfgang Ludwig Rau
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

A CURA PELA FÉ: UM OLHAR SOBRE AS BENZEDEIRAS/REZADEIRAS


ALAGOANAS

Karla Calheiros (karlaarachel@hotmail.com)

RESUMO

O presente trabalho tem como propósito analisar e compreender como o ofício


de benzedeira ou rezadeira encontra-se atualmente em parte do estado de
Alagoas e região metropolitana – tendo como suporte o mapeamento realizado
pelo Projeto de Salvaguarda do Patrimônio Imaterial que tem como
metodologia o Inventário Nacional de Referências Culturais – INRC (IPHAN) –
que consiste em identificar, documentar e registrar bens culturais, de natureza
imaterial, para atender a demanda pelo reconhecimento de bens
representativos da diversidade e pluralidade culturais de grupos formadores da
sociedade brasileira.

Para o desenvolvimento desta atividade, foram copiladas as informações


obtidas in loco nos municípios alagoanos de: Marechal Deodoro, Estrela de
Alagoas, Dois Riachos e na capital Maceió –– captando as informações por
meio de entrevistas e registros audiovisuais a cerca do ofício tomando por base
mapeamentos pré-existentes e bens identificados pelas populações locais junto
ao grupo de pesquisa Nordestanças durante o ano de 2015 à 2016.

Com as informações levantadas, observou-se a necessidade em evidenciar


essas mulheres que utilizam-se da fé para ajudar os enfermos e que praticam
esse ofício na contemporaneidade, para isso foi realizado uma exposição
fotográfica em 2017 no Museu da Imagem e do Som (MISA) em Maceió, como
uma forma de aproximar a população desse ofício; além de zelar pelo
patrimônio imaterial e valorizar a cultura popular alagoana, salientando a
importância desse ofício que atua como medicina alternativa.

Palavras-chave: Benzedeira, rezadeira; cultura popular, cura, fé, mulheres,


fotografia
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL ALÉM DA SALA DE AULA

Monique A. Damaso (madikka@yahoo.com.br)

RESUMO

Para se pensar em patrimônio é necessário a compreensão da sua


diversidade. Patrimônio nos remete a ideia do legado, da apropriação, de
pertencimento, algo que de alguma maneira nos é próximo.

Um dos mecanismos mais relevantes e importantes na esfera patrimonial


depois da proteção do acervo é a educação patrimonial. Além de trazer
conhecimento à determinado grupo através dela pode se criar laços afetivos e
identitários. Realizado assim o papel mais importante da educação patrimonial
que é criar um elo de ligação da população na defesa de seu acervo. Os
desafios da educação patrimonial são múltiplos. Vencer os entraves da
educação nas escolas que consiste na maioria das vezes na ausência de
material didático, professores pouco envolvidos com o tema, desinteresse dos
alunos, didáticas pouco convidativas.

Assim, contatamos a necessidade de estabelecer um processo lúdico, inovador


que tenha força e capacidade de despertar o interesse dos alunos que possa
transgredir as dificuldades resultando em conhecimento e trocas de
experiências no âmbito da educação patrimonial.

O texto abordará algumas experiências de projetos de educação patrimonial


desenvolvidos em algumas cidades de Minas através da captação do ICMS
Patrimônio Cultural.
Palavras-chave: educação patrimonial; escolas; patrimônio
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

A PRAÇA COMO ESPAÇO DE COMPREENSÃO DA PAISAGEM CULTURAL


URBANA. ESTUDO DE CASO: FLORIANÓPOLIS, SÃO JOSÉ E LAGUNA /
SC.

Ana Alice Miranda Duarte (ana.duarte3@unisul.br)


Adriana Fabre Dias (diasarq@hotmail.com)

RESUMO

Este artigo é um estudo de caso, composto por considerações iniciais sobre as


relações urbanas submetidas nos últimos séculos nas cidades do litoral sul de
Santa Catarina: Florianópolis, São José e Laguna, através do estudo
morfológico do espaço público da praça e as transformações ocorridas na
paisagem cultural do entorno. O objetivo do artigo é abordar exemplos que nos
possibilita mostrar a relação entre as características morfológicas dos traçados
urbanos para as praças no sul do Brasil e as transformações morfológicas
contemporâneas, como forma de compreensão da transformação da paisagem
cultural urbana.

As primeiras povoações do litoral de Santa Catarina, ocorridas no século XVII,


foram resultado da preocupação dos portugueses em ocupar a Região Sul do
Brasil. Havia a necessidade de assegurar a continuidade do Império Português
até o Rio da Prata, já que se tornava mais acirrada a disputa com os
Espanhóis. São Francisco do Sul, Desterro, São José da Terra Firme e Laguna
foram os primeiros núcleos colonizados a ser fundados pelos então “Bandeiras
de Povoação” de São Vicente - São Paulo. Como verdadeiros testemunhos
vivos, a formação do tecido colonial urbano compreendendo a igreja, a praça e
alguns exemplares da arquitetura civil luso-brasileira, nos proporciona um
entendimento da concepção básica da implantação das primeiras cidades no
litoral do estado de Santa Catarina, da apropriação do território pelo homem e
da legislação colonial em vigor na época. As relações tão importantes no
passado, consolidadas na estruturação de um partido urbano constituído pela
praça, igreja e o mar tem se transformado pelas ações contemporâneas.

A metodologia abordada será:

1) Revisão bibliográfica a respeito do tema de patrimônio histórico, memória e


identidade. Revisão histórica e urbana das cidades pesquisadas.

2) Levantar a campo as relações urbanas atuais do espaço publico das praças.

3) Comparar as transformações ocorridas nos últimos séculos através de


imagens e desenhos esquemáticos.

4) Realizar uma tabela com os dados obtidos e gerar uma comparação entre as
transformações ocorridas entre as três cidades envolvidas.

A preservação e a revitalização do patrimônio devem ser vistos como parte de


uma luta, visando resguardar seus significados culturais, que testemunham o
modo de vida e as experiências onde se materializam as relações sociais, que
interagem no espaço da cidade funcionando como elemento de identidade. A
defesa do antigo, através da personificação da praça e a intensificação da
produção arquitetônica e urbana contemporânea são dois lados de uma
mesma moeda: são ações paralelas que devem coexistir e sobrepor-se com a
firme intenção de melhorar a qualidade do espaço urbano e conseqüentemente
da população envolvida. As ações de preservação e conservação deste legado
podem vir a ser um importante meio de desenvolvimento turístico para a região.

Palavras-chave: Praça, Cidade, Paisagem Cultural


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

A PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL A PARTIR DA


LITERATURA INFANTOJUVENIL

Anna De Grammont (annagrammont@yahoo.com)

RESUMO

A preservação do Patrimônio Cultural continua sendo um desafio para os sítios


históricos. Em relação ao Patrimônio Edificado, mudanças na dinâmica de
desenvolvimento urbano, provocadas por diversos fatores, têm
descaracterizado os acervos arquitetônicos e suas paisagens urbanas. Os
instrumentos de preservação têm sido insuficientes para impedi-las ou não têm
conseguido ser efetivamente implementados.

Este artigo se propõe a tratar de um destes instrumentos de preservação: a


educação patrimonial. A proposta é trabalhar o tema através de um livro
infantojuvenil que possa ser utilizado em processos educativos formais e
informais de reconhecimento, valorização e preservação do Patrimônio Cultural
material (IPHAN, 2014).

A escassez e muitas vezes a ausência de instrumentos de apoio que trate


especificamente da preservação do patrimônio são um grande entrave para
iniciativas de educação patrimonial. Professores, pais e mesmo
administradores, interessados na preservação e no uso sustentável dos bens
históricos, têm dificuldade de encontrar material de informação e sensibilização
das comunidades onde estão inseridos.

A busca de formas de suprir uma parte desta demanda é o tema deste artigo,
relatando parte do desenvolvimento e do processo de elaboração de um livro
infantil e juvenil sobre características da arquitetura civil e da paisagem urbana
das cidades históricas como um instrumento de Preservação do Patrimônio
Cultural Edificado.

O problema colocado é a reflexão sobre como produzir um livro infantil e juvenil


sobre acervo arquitetônico do passado e a paisagem urbana nas cidades e
vilas coloniais que funcione como ferramenta pedagógica e tenha a
possibilidade/capacidade de despertar e sensibilizar crianças, jovens e suas
famílias sobre o assunto.

Para alcançar este intento, é preciso informar sobre o acervo arquitetônico e a


paisagem urbana nas cidades e vilas coloniais e as diretrizes para sua
manutenção e preservação. É necessário ainda provocar reflexões sobre os
câmbios progressivos a que as cidades históricas estão submetidas, sobre as
implicações positivas e negativas do desenvolvimento econômico e turístico
para a preservação e sobre os principais problemas que os sítios históricos
enfrentam, tais como a constante pressão de crescimento populacional, a falta
de planejamento urbano e seu desastroso impacto no tráfego e na manutenção
das áreas verdes.

Dentro deste entendimento, a elaboração do livro que este artigo pretende


relatar envolve questões relacionadas ao conteúdo do livro, em temas relativos
ao que já foi disposto, e a questões relativas à transmissão deste conteúdo, em
aspectos relacionados à pedagogia, à literatura infanto-juvenil, aos livros
ilustrados (como opção adotada) e ainda à construção dos personagens em
aspectos subjetivos que estão intrinsicamente relacionados à história brasileira.
Outro objetivo, e um desafio ainda maior, é encontrar formas literárias e lúdicas
de tratar estes temas.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural, Educação Patrimonial, Literatura infanto-


juvenil, Arquitetura Civil Colonial.
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

BRINQUEDOS BIOGRÁFICOS: MEMÓRIA DE PRÁTICAS LÚDICAS

Ana Célia Carneiro Oliveira (anaceliadesign@gmail.com)


Nadja Maria Mourão (nadja2m@gmail.com)
Marília De Fátima Dutra De Ávila Carvalho.
(mariliadefatimaavilacarvalho@gmail.com)

RESUMO

Este artigo apresenta uma análise crítica bibliográfica que teve como objetivo
contextualizar, em uma região de Minas Gerais, a pesquisa sobre os
brinquedos e jogos tradicionais que, passando de geração em geração, foram
assumindo versões particulares na produção artesanal. A finalidade é verificar
a presença e dessa forma registrar e preservar a memória de objetos lúdicos
que podem estar fadados à extinção. Defende-se a realização desta
investigação no campo do design afetivo e da memória de um povo, num
movimento de mapear, registrar e preservar objetos biográficos que, em sua
mistura de materialidade e socialidade, fazem parte da memória e da
identidade dos grupos de brincantes. Apesar de toda a construção
contemporânea em torno das novas tecnologias, constata-se que há práticas
lúdicas muito antigas e tradicionais que se mantêm vivas no patrimônio cultural,
deixando fortes alguns brinquedos na condição de mensageiros de uma
memória coletiva. Para Latour (2001), há uma simetria a ser explorada entre
sujeitos e objetos: os humanos criam objetos interferindo inteiramente sobre
eles, mas estes objetos também interferem nas formas de viver, de ser e estar
no mundo dos homens, pois a vida do ser humano não transcorre isoladamente
da ação que os objetos exercem sobre eles. Nesta primeira etapa do projeto,
para seguir o desenho deixado por estes objetos, foram realizadas
observações deste estudo no sentido de fundamentar a entrada no campo para
a verificação das práticas artesanais vigentes na região. Entende-se que essa
pesquisa de design afetivo, em torno dos brinquedos artesanais que ganharam
relevância afetiva através da história e se constituíram como indícios de
tradição que passa de geração em geração, pode trazer às crianças a
possibilidade de conhecer e atualizar, em suas práticas lúdicas, aquelas que
fazem parte da memória de seus grupos de pertença, de seus fazeres e
interações com materiais.

Palavras-chave: Brinquedos biográficos, memória de um povo, design afetivo,


pertencimento.
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

CASARÃO DO BECO ALTO: UM ESBOÇO ARQUITETÔNICO

Francisco De Assis Pereira De Araújo (dassispb@hotmail.com)


Raiany Narla Soares Da Cruz Souza (raiany_narla@hotmail.com)

RESUMO

O artigo apresenta detalhes com descrições e análises sobre as características


arquitetônicas de um importante casarão edificado em terra crua, localizado no
centro histórico da cidade de Cuiabá-MT. Precisamente na área tombada a
nível federal pelo IPHAN, com frente para íngreme escadaria do Beco Alto que
empresta o nome ao popularmente conhecido Casarão do Beco Alto.

Exemplar significativo da estética arquitetônica, que se desenvolveu no Brasil


durante o Período Colonial, utilizando-se de técnicas construtivas próprias da
época e materiais da região. Não é possível afirmar a data da construção,
contudo sua tipologia indica o período correspondente ao século XVIII ou inicio
do XIX, evidenciado com base em mapas, ilustrações e fotografias históricas. O
imóvel foi propriedade de Antônio Pedro Alves de Barros era Capitão de mar e
guerra, sendo esta uma designação da alta patente de oficial superior na
Marinha Portuguesa e na Marinha do Brasil, sendo equivalente ao de coronel
no Exército e na Força Aérea. No local funcionou ainda uma pensão e escola
particular. Atualmente desocupado o imóvel passou por recentes obra de
estabilização estrutural executado pelo IPHAN. O casarão se apresenta com
um conjunto imponente e elegante, fortemente marcado pela predominância
dos cheios sobre os vazios, enquadrado no ano de 1800 na famosa sequência
de fachadas elaboradas pelo arquiteto e urbanista Lúcio Costa, com o intuído
de registrar uma evolução na arquitetura brasileira.
Este estudo oferece contribuições para a sociedade, em especial no campo da
educação patrimonial, porque é evidenciado as particularidades, tanto de
técnicas construtivas quanto da história de um casarão que guarda elementos
da tipologia colonial utilizado na arquitetura da cidade no período inicial da
formação urbana.

Palavras-chave: Patrimônio, Arquitetura, Memória.


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

CEMITÉRIO DO BONFIM, ARTE, HISTÓRIA E EDUCAÇÃO PATRIMONIAL –


UMA AÇÃO EDUCATIVA EM CURSO

Marcelina Das Graças De Almeida (almeidamarcelina@gmai.com)

RESUMO

O Cemitério do Bonfim, situado na cidade de Belo Horizonte, capital mineira,


tem despertado cada vez o interesse para o seu potencial como espaço
educativo. A prática recorrente de ministrar aulas específicas utilizando o
espaço fúnebre tem transformado o lugar em um ambiente relevante para
realização de atividades de pesquisa que se concretizam em disciplinas
diversas que são ofertadas para os cursos de Design Gráfico, Design de
Produto, Design de Ambientes e Licenciatura em Artes Visuais da Universidade
do Estado de Minas Gerais e em decorrência dessa atividade, desde junho de
2012, através de uma ação extensionista realizada em parceria com Fundação
de Parques Municipais, FPM e o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e
Artístico, IEPHA, visitas mensais ao cemitério, movidas pelo propósito em
instigar e despertar o interesse para o espaço bem como a promoção da
educação patrimonial. Estas atividades têm, a cada dia, incrementado, de
modo considerável a visibilidade naquilo que se refere à necrópole e
consequentemente tem possibilitado necessidade de ampliação do
conhecimento do acervo e história daquele lugar, resultando na abertura de
novos campos de pesquisa e investigação para os pesquisadores. Percebe-se
que a realização da visitas tem permitido a reabilitação do espaço cemiterial
resultando em experiências diversificadas que incentivam a preservação do
espaço, integrando áreas de conhecimento como história, artes visuais,
arquitetura, turismo, design dentre outras, além de sensibilizar o poder público
e privado para promoção de ações de zelo pelo patrimônio histórico e cultural
que nele se abriga.

Palavras-chave: Cemitério,história,arte,memória,educação patrimonial


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

CENÁRIO HISTÓRICO ESQUECIDO: PRAÇA NEREU RAMOS,


CRICIÚMA/SC

Aline Eyng Savi (arquiteta.alinesavi@gmail.com)


Beatriz Rocha Dos Anjos (beatriz.dosanjos@hotmail.com)
Gabriela Mauricio (gabrielamauricio_@hotmail.com)

RESUMO

Todo lugar tem um começo e é através do patrimônio arquitetônico e urbano


que se percebe quando surgiu, quando sofreram alterações, a interferência dos
edifícios na paisagem e uma série de outros fatores que mostram a
continuação da cidade. Nesse cenário, os espaços públicos e entre eles, as
praças são parte do cenário vivo e muitos núcleos urbanos são construídos e
se desenvolvem ao redor delas. Nesses casos, além de centralizar a cidade,
sendo ponto de encontro e passagem, a praça faz parte da história e tem
caráter simbólico para seus moradores, sendo necessária a sua preservação.
Em sua origem, o local onde é situada a praça Nereu Ramos, em Criciúma, sul
de Santa Catarina, servia de ponto de parada para os tropeiros que ali
passavam. A estrada que cortava a vila de Criciúma, ligava os municípios de
Urussanga à Araranguá que eram núcleos coloniais importantes. Os
colonizadores que por ali percorriam obrigatoriamente passavam pela vila e
consequente pela praça, na época um terreiro e área de descanso e trocas.
Por volta de 1930, houve o ajardinamento, mas não a descaracterização de
seu entorno de moradias e comércio. Desde então, a praça passou por
diversas alterações. Uma das mais marcantes foi a retirada do chafariz e a
remoção da pavimentação em pedra portuguesa. Essa atitude gerou diversos
comentários contrários dos cidadãos e órgãos de classe como arquitetos, visto
que ambos faziam parte da identidade urbana do recorte. O entorno da praça
também se alterou ao longo dos anos, saíram as moradias mas manteve-se o
comércio. A arquitetura com referências ítalo-coloniais também deu espaço na
década de 1930 para o estilo art decó, considerado representante da
modernidade. Todavia atualmente, percebe-se a precariedade na manutenção
desses edifícios, que nem tombados são. Muitos deles estão “escondidos”
atrás das placas publicitárias, colaborando para o esquecimento da história do
local. Registra-se que o perímetro da praça forma um conjunto significativo de
dezessete edifícios, que pouco são vistos e reconhecidos, fruto da falta de
educação patrimonial e iniciativas para que o conjunto volte a dialogar com o
cenário urbano, não somente pelo uso mas principalmente pelo interesse
histórico e patrimonial. Para quem não conhece a história da praça, a mesma é
completamente despercebida como cenário urbano, arquitetônico e
paisagístico histórico. A transformação da praça desde sua inauguração até os
dias atuais é natural, pois os usuários vão se diversificando e a cidade
expandindo, contudo as propostas de intervenção urbana deveriam valorizar e
relacionar o patrimônio consolidado e promover diálogos com as novas
edificações, de modo que a ligação desses equipamentos ocorra através de
diferentes estratégias, entre elas os corredores culturais que estimulando às
relações sociais e intensificam as atividades criativas. Todos os esforços
possíveis devem ser feitos para preservar a cultura e a história do local.

Palavras-chave: Espaço Público, Memória, Educação Patrimonial


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

CENTRO DE REFERENCIA DA MODA: UM OLHAR INTERDISCIPLINAR

Kelly Juliane Dutra (kellyjdutra@gmail.com)


Claudia Rocha Guidi (claudiarguidi@gmail.com)
Neuza Maria De Oliveira Dos Santos (neuzaoliveira@yahoo.com.br)

RESUMO

Esse trabalho tem por objetivo fazer um exercício de interdisciplinaridade. Na


formação da equipe as autoras, com suas experiências profissionais
multidisciplinares elegeram como objeto de pesquisa O Centro de Referencia
da Moda. O CRModa se tornará em dezembro de 2016 o primeiro Museu da
Moda do Brasil, esse fato foi um dos motivos que levou a escolha do objeto.
Localizado no centro de Belo Horizonte, o Museu da Moda tem por objetivo
fazer com a capital mineira tenha mais um equipamento turístico para contribuir
com o fomento da atividade. O conceito atual de museu de acordo com a Lei nº
11.904, de 14 de janeiro de 2009, é um local dinâmico e não somente de
exposição de objetos, o museu tem entre suas finalidades, educar, ser local de
pesquisa, ser acessível a vários públicos (BRASIL, 2009). Na visita feita ao
Centro ao de Referencia pode-se observar que o mesmo, já apresenta algumas
dessas características. A interdisciplinaridade é um fator evidente no Museu da
Moda, até pelo seu caráter museológico, além de ser fator relevante e que
precisa ser levado em consideração nas atividades de Educação para o
Patrimônio Cultural. A proposta de fazer um exercício de interdisciplinaridade
passa nesse ensaio pelo olhar de uma arquiteta, uma pedagoga com
experiência em moda e por uma turismóloga, com o primeiro objetivo de
observar como o olhar de cada uma é lançado sobre o espaço e de como é
importante a multiplicidade dessas percepções para a construção do objeto
Museu da Moda. Usada uma metodologia simples baseada em um primeiro
dialogo seguida da visita ao museu, e finalizada com descrição do que foi
percebido por cada uma. Foi feito também um embasamento teórico que
auxiliou na condução do trabalho.Pôde-se analisar ao final do trabalho como
cada uma das envolvidas enxerga os espaços do Museu da Moda e como
enxergam as contribuições das suas áreas de atuação na melhoria dos
espaços físicos e de suas utilizações.

Palavras-chave: Interdisciplinaridade, Turismo, Moda, Arquitetura, Patrimônio


Cultural
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

EDIFICIO ANEXO AO CASARÃO TOMBADO DO MUSEU DA IMAGEM E


SOM DE BH

Igor Cavalcanti Brant (igorcavalcantibrant@yahoo.com.br)

RESUMO

Em 1995, gestores públicos criam o Centro de Referência Audiovisual - CRAV.


Nos seus vinte e dois anos, a instituição vem desenvolvendo um papel
importante na preservação e disponibilização de acervos fílmicos. Como
também no incentivo à produção audiovisual e cinematográfica no Município de
Belo Horizonte. O CRAV ocupa, desde 2008, um casarão tombado no Hiper-
centro, área de maior destaque e extremo valor arquitetônico, histórico e
cultural da cidade e do Estado de Minas Gerais. Estão inseridos num raio de
aproximadamente 5 km bibliotecas, museus, galerias de arte, teatros, cinemas,
auditórios, parques e praças (como o complexo cultural da Praça da
Liberdade), igrejas, templos e inúmeros outros locais e edificações que
agregam cultura, historia para o local. E atrai profissionais de distintos ramos e
eventos de diversas finalidades para a cidade. Será construído, posteriormente
(conforme o plano museológico original para a posse do referido casarão) um
prédio anexo no terreno dos fundos, que possui mais que o dobro da área do
imóvel tombado. O edifício possui sistemas construtivos, funcionais e estéticos
próprios e particulares, com o objetivo de interferir o mínimo no casarão. Tanto
na inserção e na paisagem urbana em relação ao imóvel tombado, durante a
construção do anexo, como também no período pós ocupação do
empreendimento. A execução do prédio impactará de forma significativa a
paisagem urbana do entorno imediato, da região central da cidade, bem como
de toda a capital mineira. E irá atrair importantes recursos culturais,
educacionais, históricos, arquitetônicos – materiais e imateriais, e também
financeiros. Destacando ainda mais a capital mineira na área de turismo de
negócios, eventos nacionais e internacionais, cinematográficos, como também
em referência arquitetônica e cultural mundial. O trabalho foi apresentado em
diversos fóruns, seminários, congressos, colóquios, mostras, participando
ainda de prêmios e concursos a nível internacional. Apresentar-se-á no “IX
Mestres e Conselheiros”, em Belo Horizonte, Minas Gerais, o projeto
arquitetônico do prédio anexo. E também o Plano Diretor e o Planejamento
Estratégico, visando às próximas décadas de atuação e funcionamento do
Museu da Imagem e Som - MIS/BH - de Belo Horizonte.

Palavras-chave: ANEXO, MIS BH


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

EDUCAÇÃO PATRIMONIAL ATRAVÉS DA EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA NA


ENGENHARIA CIVIL: UM ESTUDO DE CASO EM CURVELO/MG.

Matheus Henrique (matheus7l12@gmail.com)


Ana Cecília Estevão (anacestevao@yahoo.com.br)
Daiane Mendes (daianemendesmendes@gmail.com)
Sergio Henrique Corgozinho Ribeiro Araújo (serginhoh12@hotmail.com)

RESUMO

De acordo com o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia, são


atribuições do profissional de engenharia civil, dentre outras, o estudo, a
consultoria, a orientação técnica e o ensino, e o engenheiro utiliza estas
competências, em síntese, para encontrar soluções de problemas complexos
em temas afins. Entretanto, para tal, não se requer do profissional apenas
habilidades analíticas, mas também sensibilidade para observação das
pessoas e questões múltiplas da sociedade, além de conservar uma visão
vasta e conjunta de um assunto, integrar as preocupações heterogêneas, saber
explicar e convencer tornando-se, então, gestor e técnico. O conhecimento
adquirido pelos profissionais da engenharia deve não ser apenas direcionado
para a solução dos problemas propostos, mas sim para a população, como
função social para o desenvolvimento social e melhoria de condição de vida.
Desta forma, a sociedade precisa de maior envolvimento do engenheiro e da
universidade em assuntos comunitários, com respeito às individualidades de
cada comunidade. Educação patrimonial é constituída de processos educativos
que possuem como foco o patrimônio cultural como recurso para compreensão
social e histórica, e que contribui para o reconhecimento, valorização e
preservação do bem cultural. Assim, o profissional da engenharia, ao lançar
mão da sua atribuição de ensino, torna-se um agente cultural e social, e pode,
através de seus conhecimentos, promover a educação patrimonial. Dentre os
estudantes, tal papel pode ser realizado por meio da extensão universitária.
Desta forma, este trabalho apresenta o relato de uma experiência de extensão
universitária na graduação em Engenharia Civil do CEFET-MG Campus
Curvelo como ferramenta para a educação patrimonial. Através de visitas
técnicas orientadas, o ProTour objetiva desenvolver no futuro profissional da
engenharia civil o entendimento da cidade e seu valor histórico e cultural,
relacionado à apropriação efetiva dos espaços pela comunidade. Busca-se
ainda estabelecer a cidade como território vivo nos processos educativos e que
esta ação seja continuada nas práticas de ensino. Através do debate de
diversos conceitos ligados à construção civil, é possível compreender diversos
âmbitos da evolução da população. Assim, por meio desse entendimento,
pretende-se ofertar aulas de reforço escolar nas áreas de história e literatura
para alunos dos anos finais do ensino fundamental e médio, com vistas a
prepara-los para processos seletivos em destaque os processos para ingresso
nos cursos técnicos ofertados no CEFET-MG. Para maior vínculo com a
sociedade, pretende-se realizar também uma mostra aberta à comunidade, em
uma edificação de destaque cultural e patrimonial no município, com os
materiais resultantes das visitas já realizadas. Desta forma, espera-se que as
ações de Educação Patrimonial atraiam o interesse da população para que
esta possa se envolver e reconhecer sua identidade perante os bens culturais
do município de Curvelo/MG.

Palavras-chave: Educação Patrimonial, Engenharia Civil, ProTour.


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA: O CASO DA


ELABORAÇÃO DO DOSSIÊ DE TOMBAMENTO DO BAIRRO SANTA
TEREZA EM BELO HORIZONTE.

Bernardo Nogueira Capute (bcapute@gmail.com)


Sandra Lemos Coelho Bontempo (sandra.bontempo@izabelahendrix.edu.br)
Félix Aragão (felixaragaoneto@gmail.com)
Lucas Inácio Reis (lucasinacioreis@gmail.com)

RESUMO

Este projeto de extensão busca, através de um levantamento de dados,


elaborar dossiês específicos dos bens culturais indicados pelo “Dossiê do
Conjunto Urbano Bairro Santa Tereza”. Os objetivos específicos são
promover, estimular e difundir ações junto à população comprometidas
com a qualidade de vida; conhecer o patrimônio material e colaborar na
proteção do Bairro Santa Tereza; elaborar um levantamento de dados dos
imóveis; colaborar para elaboração dos dossiês desses imóveis a fim de
subsidiar a proposta de tombamento dos imóveis junto ao Conselho
Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte. Em seu
Projeto Pedagógico, o Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro
Universitário Metodista Izabela Hendrix contem disciplinas envolvidas com os
conceitos fundamentais relacionados ao patrimônio histórico cultural
arquitetônico e urbanístico: preservação, proteção, conservação, restauração,
adaptação, revitalização, reconstrução, reciclagem, conjunto urbano e bem
tombado, inventário urbano em áreas de interesse de preservação, elaboração
de levantamento, diagnóstico, definição de critérios e diretrizes de intervenção.
O Bairro Santa Tereza nasceu como um dos primeiros bairros residenciais para
os operários que trabalharam na construção da Nova Capital - Belo Horizonte.
Posteriormente, vieram os outros moradores atraídos pela possibilidade de
morar próximo ao centro da cidade em lotes de grandes proporções. O bairro
testemunhou o início da capital e ainda preserva uma parte da história da
cidade e o modo de habitar da sociedade, conferindo ao bairro um ambiente
interiorano. Além de sua importância histórica e sociocultural, trata-se de um
bairro que ainda confere qualidade de vida urbana aos habitantes. Esta
qualidade está diretamente ligada à preservação da ambiência urbana. Nos
últimos anos, entretanto, esse panorama tem-se modificado, principalmente em
função da especulação imobiliária. Nesse sentido, a pedido dos próprios
moradores do bairro, através da “Associação dos Moradores do Bairro Santa
Tereza”, bem como do movimento “Salve Santa Tereza” o Conselho
Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte elaborou
um “Dossiê de tombamento do Bairro Santa Tereza” a fim de proteger o
patrimônio material e imaterial desse rico bairro da cidade. Esse foi o primeiro
passo, mas para que realmente esse instrumento seja eficaz, torna-se
necessário a realização dos dossiês dos bens culturais específicos, ou seja,
dos 293 imóveis indicados para o tombamento. A metodologia empregada
conta com visitas no bairro Santa Tereza; entrevista com o proprietário para
conhecimento do histórico do bem cultural; levantamento fotográfico de
fachadas e interior; coleta de dados complementares nos arquivos
competentes; sistematização dos documentos relativos às edificações com
interesse de proteção, listadas no perímetro de tombamento do Bairro de Santa
Tereza; e elaboração de dossiê dos bens culturais.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural, Comunidade, Bairro Santa Tereza,


Dossiê, Tombamento.
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

EDUCAÇÃO PATRIMONIAL, O OLHAR DO OUTRO COMO PERSPECTIVA


FUNDAMENTAL NA CONSTRUÇÃO DE SABERES

Samuel José Santiago (samueljsantiago@hotmail.com)


Flavia Lemos Mota De Azevedo (flavia.azevedo@uemg.br)
José Heleno Ferreira (zeheleno.ferreira@gmail.com)

RESUMO

Este trabalho relata a experiência que o Centro de Memória Prof. Batistina


Corgozinho (CEMUD) da UEMG – Divinópolis vem adquirindo em suas oficias
de Ed. Patrimonial. O reconhecimento e valorização do patrimônio cultural na
construção de cidadãos conscientes de suas referências e potencialidades
culturais se faz necessário quando pensamos na salvaguarda e perpetuação
do patrimônio. Quando a escola, o museu ou um centro de memória entende a
necessidade de construir políticas de salvaguarda do patrimônio, as oficinas
são uma excelente ferramenta que fomenta uma consciência da importância de
tal reconhecimento. Levar cada indivíduo a refletir o patrimônio e se entender
como parte dele é o principal papel que a oficina desempenha. Não é tarefa em
sua execução impor ou ditar um ou outro patrimônio, as oficinas são propostas
justamente num caminho contrário, que valoriza o saber do outro e constrói
junto com o outro as dimensões que precisam ser resguardadas no
reconhecimento do patrimônio cultural. As atividades são pensadas com o
propósito de mostrar a esse indivíduo que no cotidiano de sua comunidade, de
sua escola, de sua cidade e região ocorrem a todo momento manifestações
culturais que representam a história e memória das pessoas. As oficinas
aconteceram entre maio e novembro de 2015, e maio a novembro de 2016,
atingindo um número total de 1.716 alunos da Educação Básica e do Ensino
Superior e nos possibilitou na prática educativa mecanismos de salvaguarda
patrimonial. Ministrar oficinas de Ed. Patrimonial é um caminho de fazer com
que a cultura – em seu sentido mais abrangente e relativista – chegue ao
máximo de pessoas possíveis. A educação patrimonial vem alertar-nos para a
cultura que não precisa ser “encontrada”, e sim que já se faz presente. Dessa
forma, a conscientização da própria identidade se torna aparato essencial para
a apreensão de conceitos, e é esse tipo de ação que tentamos trazer à tona em
nossas atividades. O sujeito que participa de uma oficina como esta, tem seus
olhos voltados para as subjetividades que o mundo nos apresenta, e numa
relação antropofágica, ele consome o que é produzido por outros seres
humanos e se entendem como produtores de cultura que será também
reapropriada em sua vivência particular. Esse sentimento de identidade, aliado
à educação enquanto mediação é fundamento imprescindível para a
perpetuação desse saber que se desdobra em atitudes de preservação e
valorização dos patrimônios culturais. Por fim, entendemos na realização
dessas oficinas uma direção irreversível para a perpetuação do patrimônio
cultural, onde é possível possibilitar caminhos de compreensão da cultura, e
consequentemente gerar uma consciência muito mais completa sobre ser e
estar em um ambiente cultural.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural, Educação Patrimonial, Cultura,


Patrimônio
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: UM CAMINHO PARA O INÍCIO DA


FORMAÇÃO EM PRESERVAÇÃO PATRIMONIAL. PROGRAMA APLICADO
A JOVENS SECUNDARISTAS

Marcia Valeria De Souza (mvalleriana@gmail.com)

RESUMO

Esse artigo tem por finalidade apresentar o projeto de Educação Patrimonial e


os resultados alcançados nos últimos 06 anos. Essa atividade é uma ação de
Extensão da Universidade proposta pelo Laboratório, contribuindo para uma
efetiva participação da instituição na sociedade, pois a extensão é definida no
Plano Nacional de Extensão como: “processo educativo, cultural e científico
que articula o Ensino e a Pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação
transformadora entre universidade e sociedade”, e tem como um dos seus
objetivos desenvolver atividades voltadas para o desenvolvimento, produção e
preservação cultural e artística como relevantes para a afirmação do caráter
nacional e de suas manifestações regionais.

O Projeto de Educação Patrimonial tem como uma de suas premissas buscar a


maior integração entre os alunos de nível médio e o patrimônio preservado no
Museu Nacional. A proposta inédita, não só no sentido de estabelecer uma
parceria com uma escola de nível médio, mas principalmente por possibilitar
aos estudantes o contato com um acervo de valor inestimável, convivendo na
prática com as temáticas relativas ao patrimônio, aplicabilidade e as discussões
que permeam à sua continuidade, sua segurança e os pressupostos que
envolvem os bens culturais. Nesse sentido, a Educação Patrimonial se constitui
uma forte ferramenta para a preservação e gestao do patrimônio cultural em
nosso país, e de modo concreto, forma e capacita alunos-cidadãos mais
conscientes, principalmente em relação ao acervo cultural brasileiro e eles
passam a ser multiplicadores dessa ideia.

Palavras-chave: Educação Patrimonial, Formação, Conservação-Restauração,


Preservação Patrimonial, Ensino Médio
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

EDUCAR DESEDUCANDO: 10 ANOS DE IMPLANTAÇÃO DA UFS NOS


ANTIGOS TRAPICHES DE LARANJEIRAS/SE.

Eder Donizeti Da Silva (eder@infonet.com.br)


Adriana Dantas Nogueira (adnogueira@gmail.com)
Rosane Greziele Leite Dos Santos (greiceleite2006@hotmail.com)

RESUMO

No ano de 2004 o programa de recuperação sustentável do Patrimônio


histórico urbano brasileiro, denominado de “MONUMENTA”, sob tutela federal
resultante de contrato de empréstimo entre o BID e a República, conforme lista
de prioridades de conservação elaborada pela Comissão Especial do Ministério
da Cultura em outubro de 2000, classificou e elegeu o Município de Laranjeiras,
no interior do Estado de Sergipe, apto ao desenvolvimento de ações
preservacionistas.

Dentre o conjunto de ações propostos pontuou-se a possibilidade de


implantação de um Campus da Universidade Federal de Sergipe utilizando-se
do conceito de requalificação/reabilitação de antigas edificações históricas;
entre estas edificações, o conjunto que mais chamava a atenção foram os
sobrados comerciais construídos no século XIX e XX denominados de
“Quarteirão dos Trapiches” (Armazéns/Depósitos de açúcar).

Apesar do Campus de Laranjeiras ter iniciado suas atividades de forma


provisória no Centro de Atenção Integral a Criança – CAIC, em março de 2007
com cinco cursos: Arquitetura e Urbanismo (curso integral); Arqueologia;
Museologia (cursos diurnos – matutino); Teatro e Dança (cursos noturnos),
efetivamente a implantação do Campus de Laranjeiras da UFS no Quarteirão
dos Trapiches se dá a partir da inauguração da Biblioteca no ano de 2008 (na
edificação conhecida por Teatro Santo Antônio) e em 2009 nas edificações
chamadas pelo senso comum da população local de Trapiches.

No decorrer destes dez anos fatos dos mais variados ocorreram destacando-
se: a falta da construção de um relacionamento de pertença entre o Campus e
os moradores da cidade ao ponto da grande maioria dos alunos que se
matricularam nos cinco cursos que fizeram parte da proposta acadêmica inicial
serem oriundos da capital e de outras cidades do Estado; processos de
violência contra os estudantes que atingiram seu auge em meados de 2014
que resultaram na suspensão temporária das aulas e na posterior transferência
das atividades dos cursos de Dança e Teatro para a sede da UFS em São
Cristóvão; falta de conservação e restauro técnico científico das edificações
históricas ao ponto do desabamento de um dos arcos das ruinas das
edificações em 2017 e da interdição do sobrado número 117 a
aproximadamente 4 anos.

Frente a comemoração dos dez anos do Campus na cidade, ocorrida no mês


de março deste ano de 2017, cabem inúmeras reflexões sobre o conceito de
educação patrimonial que permutou a implantação/existência da UFS nos
antigos trapiches de Laranjeiras; portanto, esta comunicação pretende analisar
a trajetória histórica a partir de fatores positivos e negativos que demonstrem a
verdadeira representação patrimonial simbólico/material/funcional do Campus
das “Artes”; entender e compreender a atitude cientifica patrimonial de
pertencimento frente a produção acadêmica de trabalhos de conclusão de
curso realizados neste interstício; bem como, registrar e analisar as condições
de conservação e restauro das edificações “reabilitadas”.

Palavras-chave: Patrimônio; Arquitetura; Identidade; Pertencimento.


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

FAVELA, LUGAR DE EDUCAÇÃO PARA O PATRIMÔNIO CULTURAL

Evandro Carvalho (evandrolcarvalho@gmail.com)


Sergio Linhares Miguel De Souza (sergiolinharesmiguel@gmail.com)

RESUMO

Este artigo parte de uma experiência realizada na favela da Rocinha no âmbito


do Programa de Educação para o Patrimônio Cultural, realizado pelo Inepac –
Instituto Estadual do Patrimônio Cultural e da Secretaria de Estado de Cultura
do Rio de Janeiro.

A favela da Rocinha, formada em meados dos anos 1950, é um espaço que


abriga uma população estimada em, aproximadamente, 100 mil pessoas.
Imigrantes nordestinos, operários trabalhadores das obras de abertura dos
túneis Dois Irmãos e Rebouças e descendentes dos antigos imigrantes
portugueses e espanhóis da década de 1930, compõem um mosaico cultural
estabelecido no território, ampliado por novos moradores vindos de todo o
Brasil. Ao realizar o curso “Patrimônio Cultural - Memória nas Favelas”, os
técnicos do Inepac, juntamente com os agentes culturais estabelecidos na
comunidade, puderam constatar a grande carência de espaços de reflexão
sobre memória e patrimônio na comunidade. Ao mesmo tempo, ficaram
evidenciados os inúmeros lugares de memória que são referência para a
população local. Este “vazio memorial” ensejou a presente reflexão sobre os
bens oficialmente reconhecidos como patrimônio pelos órgãos de tutela, que
não contemplam a comunidade, e a percepção da população sobre seus
espaços de referência histórica e memorial.
A problematização da dicotomia entre a monumentalidade e excepcionalidade
do patrimônio, e a importância das narrativas das comunidades locais que
operam suas memórias a partir de objetos, lugares, celebrações e hábitos
calcados na cotidianidade foi objeto de reflexão e fundamentaram as ações de
educação para o patrimônio cultural do Inepac.

Deslocando o eixo de discussão dos órgãos técnicos para a comunidade,


percebeu-se a importância da população local como principal ator na formação
da consciência sobre a preservação do patrimônio cultural. A partir da
afirmação de seu próprio território como lugar de memória reconhecido e
valorizado, percebe-se que a educação para o patrimônio cultural não pode
prescindir de uma escuta atenta e participante da comunidade envolvida.

Palavras-chave: Patrimônio, Educação, Favela, Lugar de Memória


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

FEIRA DO PATRIMÔNIO – O LUGAR DA COLABORAÇÃO E DA PARTILHA

Aurea Da Paz Pinheiro (aureapazpinheiro@gmail.com)

RESUMO

Tratam-se neste documento de apresentar o Projeto da Feira do Patrimônio


2017 (2ª edição), uma iniciativa do Programa de Pós-graduação em Artes,
Patrimônio e Museologia, Mestrado Profissional, da Universidade Federal do
Piauí´, Parnaíba. Ao longo da Feira, foram realizadas ações educativas,
culturais e sociais, com objetivos de sensibilização da comunidade residente,
de agentes públicos e privados do Meio Norte do Brasil, nomeadamente da
cidade de Parnaíba e entorno, como o fito de preservar e salvaguardar a rica e
complexa paisagem cultural da cidade e do delta do Parnaíba, imersa em uma
Área de Proteção Ambiental. Os Patrimônios (cultural e natural), as Artes e os
Museus atravessaram os diálogos e discussões ao longo das diversas
atividades decorridas de 17 a 20 de maio. A Feira do Patrimônio é uma
proposta única no Piauí´ e no Brasil, e foi realizada no Centro Histórico da
Cidade de Parnaíba, que tem o seu Conjunto Histórico e Paisagístico Tombado
pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Iphan, desde 2008. A
Feira do Patrimônio teve o apoio em sua realização do Serviço Social do
Comércio – SESC, Regional do Piauí. Desde a 1ª Edição, em 2015, foi possível
integrar empresas, escritórios de arquitetura/design, operadores turísticos,
projetos de base territorial, empresas de conservação e restauro e de
reabilitação urbana, universidades e centros de formação especializada,
artistas, artesãos, dentre outros. A Feira do Patrimônio destina-se ao público
em geral e a todos os que se interessam pelas matérias relacionadas aos
patrimônios, museus, turismo, empreendedorismos e outros negócios. Trata-se
de uma Feira Livre, um espaço de sociabilidade que tem revelado a paisagem
cultural da cidade de Parnaíba e das comunidades ribeirinhas, praieiras e Delta
do Parnaíba, o único a desaguar em mar aberto das Américas entre os Estados
do Piauí´ e do Maranhão.

Em 2016, a 1ª edição da Feira do Patrimônio, contou com um público estimado


de mais de 3.000 pessoas na Universidade Federal do Piauí; em 2017, a 2ª
edição, no Centro Histórico de Parnaíba, teve um público estimado de mais de
5.000 pessoas, o que nos permite afirmar que o evento é capaz de estabelecer
conexões entre a Universidade, as Comunidades e Agentes Públicos e
Privados, de forma a permitir o conhecimento e reconhecimento da paisagem
cultural, formar públicos capazes de se sensibilizarem para conhecer,
reconhecer, divulgar e salvaguardar; atribuir sentidos e significados à
diversidade cultural e paisagística do território. Em 2017, a Feira do Patrimônio
ampliou suas atividades de educação e ação cultural, de natureza patrimonial e
ambiental, forma realizadas exposições, comércio justo de produtos artesanais
(renda de bilro e trançados em palha), apresentação de projetos dos jovens
mestres em patrimônio e museologia, conversas de palco (na rua, aberta a
todos os transeuntes), intervenções artísticas de grupos locais, a exemplo
capoeira e bumba-meu-boi etc.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural, Educação, Ação Cultural,


Empreendedorismo, Sustentabilidade.
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

IATE CLUB DE COLATINA/ES: MEMÓRIA E PATRIMÔNIO HISTÓRICO,


CULTURAL E ARQUITETÔNICO.

Douglas Gomes Silva (arqui_douglas@hotmail.com)

RESUMO

Objetiva-se nesse artigo destacar a necessidade da conservação e


preservação de uma edificação modernista na cidade de Colatina, no estado
do Espírito Santo, o Iate Clube, erguido na década de 50 do século XX. A sua
construção foi possibilitada pela doação do terreno pela administração pública
a um grupo de empresários locais, a edificação do Iate visava à criação de um
espaço voltado ao lazer da sociedade colatinense. Localizado no centro de
Colatina, o Iate foi cenário de diversos eventos e atrações ao longo de quase
cinco décadas, e, historicamente, é lembrado por moradores como uma das
principais opções de lazer da cidade. De caractér modernista, tem o invólucro
com uma casca de concreto, sem vigas ou colunas aparentes, permitindo a
observação de traços arquitetônicos ousados e vanguardistas à época.
Contudo, em outubro do ano de 2010, parte da obra foi, clandestinamente,
demolida. A derrubada parcial do Iate ocorreu durante o período noturno, para
atender apenas os interesses econômicos do capital privado, desconsiderando,
dessa forma, os valores histórico, social e cultural do bem edificado. Os
moradores locais, que se opuseram à destruição da edificação, denunciaram a
demolição ao poder público, que embargou o ato. Atualmente, cerca de 70% da
estrutura do Iate se apresenta em grau razoável de conservação, levand o-se
em conta a ausência total de manutenção desde sua demolição. Por isso,
podem ser observados danos estruturais e estéticos na edificação. Ainda em
virtude do abandono, este objeto histórico constitui, hoje, ruínas que abrigam
pontos de uso de drogas e ocupação transitória de moradores de rua. Os
problemas relacionados com a edificação conseguem ficar disfarçados, em
função dos poucos estudos na área, onde a falta de informação torna o
trabalho mais árduo, é que a medida que há poucos elementos que manifestam
ou denunciam o descaso com o patrimônio, o que reforça a importância da
criação de um banco de informações patrimoniais no município e que se a ação
de preservação da edificação não for realizada em tempo hábil, isso pode
ocasionar a perda de uma parte da história da cidade. Entretanto, muitas
coisas podem ser feitas para reverter essa situação, e uma delas seria uma
maior conscientização da sociedade em geral e a concretização de políticas
públicas para a valorização do patrimônio arquitetônico, urbanístico e
paisagístico. Uma possível requalificação da edificação proporcionaria à
população da cidade de Colatina a reutilização deste patrimônio, objeto de
lazer, cultura e socialização do município, ratificando a relevância da
manutenção de elementos que compõem a identidade local.

Palavras-chave: arquitetura moderna, patrimônio, preservação.


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

JOGOS SONOROS COMO PRÁTICA PEDAGÓGICA DE


RECONHECIMENTO DE TERRITÓRIOS SONOROS

Marcela Alvares Maciel (marcela.maciel@uffs.edu.br)


Anelise Dlugokenski (anelise_dki@hotmail.com)
Greicielen Paloma Ribeiro Dacampo (greici-dacampo@hotmail.com)
Paula Soares (soares_paula18@hotmail.com)

RESUMO

O patrimônio imaterial está vinculado ao cotidiano das comunidades e ao seu


território, incluindo suas condições materiais. Neste contexto, destaca-se o
conceito de territórios sonoros como uma abordagem teórico-metodológica que
contempla a compreensão da paisagem sonora enquanto patrimônio imaterial
das cidades, contribuindo para o fortalecimento da noção de pertencimento de
indivíduos a um lugar. Uma tarefa prática da abordagem de territórios sonoros
é direcionar sua atenção para os marcos sonoros de destaque, e, se houver
uma boa razão para isso, lutar pela sua preservação. Assim, no presente
trabalho propõe-se a desenvolver jogos sonoros para identificação, registro e
salvaguarda de territórios sonoros onde se concentram e reproduzem práticas
culturais coletivas em Erechim (RS). Em termos metodológicos, foram
utilizadas estratégias de design thinking adaptadas à produção de arte sonora,
contemplando etapas de ideação, prototipagem e teste. É importante destacar
que neste trabalho entende-se por arte sonora o som organizado no espaço,
em contraposição a música como som organizado no tempo. O processo de
ideação utiliza-se como marco teórico Schafer (2011), partindo da premissa do
jogo como artefato pedagógico para a escuta urbana. Para tanto, o
desenvolvimento do jogo sonoro contempla as quatro categorias propostos por
Callois (2001) em sua teoria dos jogos, sendo, Agon, Alea, Ilinx e Mimicry. A
prototipagem do jogo sonoro envolveu a realização da Oficina de Escuta
Acusmática, com o objetivo de desenvolver o sentido auditivo como articulador
da experiência urbana, possibilitando conhecer a cidade através dos seus
sons. A oficina foi desenvolvida utilizando como referência o exercício de
educação sonora Caça ao Tesouro Sonoro. A partir de uma área de
intervenção dada, definiu-se pontos de referência, para fins de associar
eventos sonoros característicos do local. Utilizando técnicas de brainstorming ,
são definidas dicas sonoras e dicas visuais para posterior identificação dos
objeto sonoros na área de intervenção. Por último, na etapa de teste, foi
utilizado como referência o exercício de educação sonora denominado Móbile
Sonoro. A partir de uma lista de pontos de referência ou jogadores deveriam
procurar pelos objetos sonoros a partir de dicas visuais ou sonoras. Para cada
objeto sonoro encontrado o jogador recebe um cupom, sendo vencedor o
jogador que encontrar todos os objetos sonoros em menor tempo. Portanto, a
proposta de jogo sonoro apresenta-se como uma para prática pedagógica
promissora para o reconhecimento territórios sonoros.

Palavras-chave: Paisagem Sonora, Patrimônio Imaterial, Arte Sonora


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

MEDIDAS EDUCATIVAS, AÇÕES PARA O PERTENCIMENTO DO MUSEU


EDUCATIVO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA MUSEU
GAMA D’EÇA

Mariana Deboni Blaya (marianablay@gmail.com)


Denise De Souza Saad (dssaad1@gmail.com)

RESUMO

Atualmente, na grande maioria das legislações nacionais consta o preceito de


que é dever do Estado preservar o patrimônio histórico e artístico. Dentre
algumas instituições possuidoras destes patrimônios, é destacado neste artigo
as instituições Museológicas como salva guardadoras de patrimônios e a sua
função imprescindível de disseminação cultural para a sociedade. Conforme o
Conselho Internacional de Museus (ICOM), o museu é uma instituição
permanente, sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e de seu
desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva, estuda, expõe e
transmite o patrimônio material e imaterial da humanidade e do seu meio, com
fins de estudo, educação e deleite.

A adesão da sociedade, dos diferentes grupos sociais, à prática da


preservação de bens culturais tem sido considerada o grande desafio a ser
enfrentado no século XXI.

Pequenos museus podem ser os mais frágeis e vulneráveis, aqueles que não
possuem um planejamento claro e de conhecimento de toda a sua equipe
estão ainda mais vulneráveis.
Com o intuito de cativar o público este artigo tem relata algumas ações
educativas que podem ser desenvolvida no Museu Educativo Gama D’Eça e
Victor Berssani, instituição pertencente à Universidade Federal de Santa Maria.

. O prédio caracterizado por seu decorativismo, é exemplo da arquitetura


magnificente de tendência eclética do centro histórico de Santa Maria. As
coleções do Museu da Universidade Federal de Santa Maria estão abrigadas
no palacete desde o ano de 1985.

A preservação só faz sentido para a sociedade se está relacionada a


necessidades e interesses do momento presente, na busca constante de um
ponto de equilíbrio entre permanência e mudança.

Desse modo, os museus e os patrimônios, assim como diversos outros


elementos simbólicos, precisam ser vistos como dispositivos de criação e
invenção de representação, narrativas, imagens sobre o passado e a memória.

Com este trabalho pretende-se abordar metodologias que visem preparar as


instituições Museológicas para tomada de decisões para maior captação e
público, tais medidas têm como objetivo aproximar o público do patrimônio
salvaguardado pela instituição, como também chamar atenção para a própria
sede da mesma, um exemplar histórico da arquitetura eclética da cidade.

Cabe ressaltar que as ações identificadas podem ser adaptadas para o Museu
visto que em geral são ofertadas por grandes instituições museológicas e
podem não representar a atual realidade do Museu. Desse modo, os museus e
os patrimônios, assim como diversos outros elementos simbólicos, precisam
ser vistos como dispositivos de criação e invenção de representação,
narrativas, imagens sobre o passado e a memória.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural, Museus, Ações Educativas, Preservação


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

MEMÓRIA URBANA DE BELO HORIZONTE: A CASA DA RUA BERNARDO


GUIMARÃES, 441

Maria Lúcia Prado Costa (luciaprado@biosconsultoria.com.br)

RESUMO

Memória Urbana de Belo Horizonte: a casa da rua Bernardo Guimarães, 441

A ocupação do polígono desenhado, em 1895, pelo engenheiro Aarão Reis


(1853-1936) para abrigar a zona urbana da nova capital do estado (1895/7) tem
sido tratada em análises historiográficas generalistas. Estas focam, grosso
modo, a contraposição entre o espaço interno do perímetro da antiga avenida
17 de dezembro, hoje avenida do Contorno, e o espaço externo a ela; e a
ruptura do modelo da cidade positivista com o avanço da urbanização de Belo
Horizonte, ao longo do tempo. Há poucas análises pontuais que tratem casos
específicos de concessão de lotes e projetos de construção, nos primeiros
anos da nova capital até o tempo presente.

A oportunidade de estudar a história de uma propriedade dentro do perímetro


da avenida do Contorno, desde o contexto da inauguração da cidade até os
dias de hoje, traz a oportunidade de analisar no nível micro como se deu a
apropriação desse fragmento do território urbano da cidade.

A casa da rua Bernardo Guimarães, 441, ainda existente e bem conservada,


situa-se no bairro Funcionários, edificado para abrigar preferencialmente os
ex-proprietários e o funcionalismo público vindo de Ouro Preto. A casa foi
objeto de recente pesquisa cartorial e arquivística – tanto do Arquivo Público da
Cidade de Belo Horizonte quanto do arquivo da família de seus atuais
proprietários. A pesquisa chegou até o ano de 1912 e pôde esclarecer os
meandros de facilitação conferidos pelo Estado aos primeiros proprietários do
terreno onde anos mais tarde se edificaria a casa estudada.

A perspectiva de elucidação da história desse bem possibilita a


contextualização da política pública de uso e ocupação do solo pelo Estado no
nível micro nos primeiros anos da nova capital e seus desdobramentos
posteriores.

A edição de um pequeno livreto ilustrado com imagens de arquivo e plantas


das edificações pretéritas e da atual com a narrativa sobre a história da casa
da rua Bernardo Guimarães 441 se fez na perspectiva de oferecer um
instrumento de educação patrimonial sobre a história da cidade.

Palavras-chave: Belo Horizonte - educação patrimonial - uso e ocupação do


solo
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

MUSEU DO SILÊNCIO: O MUSEU COMO FERRAMENTA DE EDUCAÇÃO E


CONSCIENTIZAÇÃO PATRIMONIAL

Jéssica Maria Ferreira Cavalcante Sousa (jessica_maria_19@hotmail.com)


Bruna Gabrielle Da Costa E Silva Negreiros (brunaneg.fotos@gmail.com)

RESUMO

Este trabalho visa apresentar o projeto de um museu capaz de atuar como


ferramenta de educação patrimonial em Teresina, Piauí, Brasil, tendo como
objeto de intervenção uma residência eclética do início do século XX, edificada
no bairro Centro. A abordagem faz-se em torno da problemática que envolve a
crescente perda da memória arquitetônica teresinense, fruto da especulação
imobiliária e principalmente do desinteresse do poder público e da pouca
familiarização da sociedade civil com o tema. Dessa forma, o projeto
arquitetônico intitulado Museu do Silêncio, cujas decisões projetuais são
pautadas nos escritos de teóricos do patrimônio como Alois Riegl, Violet Le
Duc, Camillo Boito e nas diversas cartas patrimoniais, se constitui como um
manifesto pela salvaguarda do patrimônio arquitetônico perdido,
silenciosamente, no dia a dia da vida urbana. O desabamento recente do
objeto estudado confirmou a urgência de políticas para a proteção dos bens
construídos e a necessidade de meios para a promoção da educação
patrimonial.

Palavras-chave: museu, educação patrimonial, salvaguarda, patrimônio


arquitetônico
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

MUSEU E ARQUIVOS: O PAPEL DA UNIVERSIDADE NA EDUCAÇÃO


PATRIMONIAL

Samanta Do Prado (samanta_prado@hotmail.com)


Profª Drªluzia Sigoli Fernandes Costa (luziasigoli@gmail.com)
Profªdrª Luciana De Souza Gracioso (lugracioso@yahoo.com.br)
Profªdrª Zaira Regina Zafalon (zzafalon@gmail.com)

RESUMO

As instituições de ensino superior recebem e acumulam objetos representativos


de relações interinstitucionais e formam seu patrimônio histórico. Esses objetos
compõem as coleções históricas que refletem a memória institucional. No caso
da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), ao longo dos seus 45 anos,
os objetos recebidos pelos reitores podem ser compreendidos, por uma ótica
simbólica, como fruto das alianças, cooperações e das relações sociais e
diplomáticas estabelecidas entre a universidade e outros atores sociais,
representantes públicos e instituições. Esta pesquisa objetivou, por meio da
organização e do tratamento desse patrimônio, democratizar o acesso à
coleção de objetos com os quais os reitores foram presenteados e, assim,
contribuir para a Educação Patrimonial na instituição. Metodologicamente
realizou-se um mapeamento e a disponibilização do patrimônio por meio do
cumprimento de etapas: 1) levantamento dos objetos recebidos pelos reitores,
ao longo da história da universidade; 2) inventário dos objetos, a partir de
premissas museológicas, o que envolveu a descrição física, a descrição
temática, a descrição tipológica e o seu registro fotográfico; 3) desenvolvimento
de um catálogo digital dos objetos identificados, com descrição dos mesmos e
dos registros fotográficos. Resultou do mapeamento desse patrimônio, o
tratamento e a organização de 115 objetos, tais como troféus, moedas, placas
comemorativas, bottons, flâmula, certificados e objetos de decoração. Esse
objetos apresentam diversos formatos, volumetria e configurações estéticas.
Alguns se destacam pelo seu significado de representação de relações e
reconhecimentos que marcaram a história da UFSCar, entre elas: relações
internacionais com instituições acadêmicas, relações com outras organizações
e universidades do país e demonstrações de gratidão de grupos da
comunidade para com a instituição e ou seu representante. Esses significados
contribuíram para a construção da memória institucional da UFSCar e
possibilitaram, numa perspectiva da Educação Patrimonial, maior visibilidade e
a devida valorização desses bens, tanto pelos gestores e comunidade interna
quanto pela comunidade externa à UFSCar. No caso da comunidade interna
entende-se que estudos dessa natureza podem contribuir para a construção da
identidade institucional a partir do reconhecimento do seu patrimônio. Para a
comunidade externa esse patrimônio representa o reconhecimento cultural e
científico da instituição e contribui para a compreensão sociocultural da cidade
em que se insere. Em última instância este estudo contribui com a promoção
de ações, exposições, publicações e outras atividades que venham a propiciar
melhor percepção histórico-temporal dos eventos ou acontecimentos,
lembrados por meio de objetos e coleções históricas que, por sua vez,
contribuem para a educação patrimonial, num sentido mais amplo, na medida
em que esses fazem parte da trajetória de conhecimento, saberes e da
memória da comunidade.

Palavras-chave: Coleções Históricas, Patrimônio Cultural, Memória


Institucional, Educação Patrimonial.
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

O DIREITO À CIDADE

José Heleno Ferreira (zeheleno.ferreira@gmail.com)


Flavia Lemos Mota De Azevedo (flavia.azevedo@uemg.br)
Samuel José Santiago (samujsantiago@gmail.com)

RESUMO

O Centro de Memória Profª Batistina Corgozinho (CEMUD), da Universidade do


Estado de Minas Gerais (UEMG) – Unidade Divinópolis, ao trabalhar a
memória a e a história do Centro-Oeste mineiro, tem dedicado-se à educação
patrimonial buscando, neste processo, dialogar com as unidades escolares da
educação básica das redes públicas – estadual e municipal. Entre as diversas
atividades que vêm sendo realizadas pelo CEMUD, destacam-se as “visitas
guiadas ao patrimônio histórico da cidade de Divinópolis – MG”.

Considerando que o pertencimento à cidade precisa ser construído e a


importância de conhecer para comprometer-se com a preservação do
patrimônio, as visitas guiadas com crianças e adolescentes do ensino
fundamental e do ensino médio por roteiros previamente estabelecidos
procuram apresentar a cidade – a história oficial, os apagamentos e
silenciamentos da história e suas marcas nas ruas e prédios e rios – àqueles e
àquelas que a ela têm direito.

As visitas guiadas que vêm se realizando desde 2015 a pontos diversos da


cidade encantam os meninos e meninas que moram na cidade, mas nem
sempre a veem, que transitam por ruas e avenidas sem perceber os processos
de modificação das estruturas edificadas que contam algumas histórias e
silenciam outras tantas. Além disso, por trabalhar preferencialmente com
crianças e adolescentes das escolas situadas nos bairros periféricos, muitos
são os meninos e meninas que têm, através destas atividades, a oportunidade
de, pela primeira vez, conhecer o centro urbano do município, bem como suas
estruturas de lazer, os espaços dedicados às manifestações culturais, os
centros comerciais, enfim, os espaços públicos, negados à grande parte do
público. Nestas “visitas”, busca-se também problematizar a história dos bens
materiais reconhecidos legalmente como patrimônio histórico-cultural e outros
tantos que não têm esse reconhecimento. No debate com adolescentes e
crianças, tem-se a oportunidade de discutir os bens materiais das regiões em
que moram e que são considerados, por eles e elas, como patrimônio histórico,
embora, na maioria das vezes, não tenham esse reconhecimento por parte do
poder público.

Ancoram esse debate o trabalho de Alessandro de Melo e Poliana F. Cardozo


(2015) e a reflexão do patrimônio cultural como resultado da ação humana,
marcada por convicções ideológicas e interesses políticos e econômicos, nem
sempre explicitados, além da contribuição de Le Goff (1988) acerca do
processo de construção das cidades. No que diz respeito à educação, trabalha-
se com a certeza de que as velhas gerações têm como tarefa apresentar o
mundo – e, por extensão, a cidade – às novas gerações (ARENDT, 1978),
além do compromisso com o “novo” que, como nos diz a filósofa alemã, é o
ponto central do processo educativo e o momento em que decidimos se
amamos o bastante nossas crianças para abandoná-las ao mundo ou
apresentá-las à história que herdarão.

Palavras-chave: educação patrimonial, direito à cidade, pertencimento,


educação
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

O PERCURSO URBANO COMO EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: PROJETO


PILOTO PARA A RUA HALFELD EM JUIZ DE FORA (MG)

Tales Medeiros Pravato (tales.mp@live.com)


Jéssica De Fátima Rossone Alves (jessica_rossone@hotmail.com)

RESUMO

Os estudos deste artigo, originalmente desenvolvidos para um TCC para o


curso de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal de Juiz de Fora,
apresentam uma proposta de projeto piloto de educação patrimonial urbana
que tem como objetivo principal conduzir a população de Juiz de Fora (MG) ao
entendimento de parte de sua própria história através de seu patrimônio. Para
isto, identifica-se e apresenta-se sistematicamente o patrimônio arquitetônico
tombado, conforme Lei municipal 10.777 de 15 de julho de 2004, localizado na
Rua Halfeld, importante via do município que destaca-se por diversos motivos,
dentre eles o seu significado histórico e cultural e seu caráter de centralidade.

Compreende-se que o patrimônio arquitetônico de uma cidade comporta-se


como um forte elemento de identidade, e consequentemente, representativo de
uma coletividade. E apesar da sua presença, nem sempre a sua composição
no contexto urbano é fator decisivo para sua preservação. Neste sentido, os
processos de reconhecimento e atribuição de valor ao patrimônio arquitetônico
são fundamentais. Somente a partir da identificação dos indivíduos e do seu
sentimento de pertencimento em relação à arquitetura é que esta se torna
patrimônio, e então é vista como digna de preservação. Ressalta-se que um
dos principais fatores de degradação do patrimônio arquitetônico diz respeito à
sua desqualificação como referência para a identidade local, constituido quase
sempre como resultado do desconhecimento de sua importância.

O caminho teórico-metodológico busca resgatar o surgimento e processo de


construção histórica da cidade de Juiz de Fora e suas múltiplas determinações,
afirmando o valor da educação patrimonial como importante fator de
preservação e valorização do patrimônio, condição fundamental para assegurar
aos indivíduos a condição de cidadãos.

O projeto piloto propõe para a Rua Halfeld a criação de um percurso orientado


através de placas com a história, data de surgimento e curiosidades sobre os
bens tombados. Dessa forma, o indivíduo inicia o percurso a partir de uma das
extremidades da via e a percorre aprendendo, ponto a ponto, sobre a formação
da cidade e o papel de cada bem tombado. As diretrizes são aplicadas de
forma a auxiliar o percurso, garantindo melhor visibilidade e que as
intervenções feitas no local possam contribuir para sua valorização sem trazer
prejuízo ou danos, não só para os bens, mas para toda a história que estes
carregam. Por fim, a requalificação vem para garantir acessibilidade,
visibilidade dos bens, conforto e segurança para o transeunte.

Verifica-se a possibilidade efetiva de educação patrimonial e de requalificação


do percurso estudado, com a criação de diretrizes próprias de preservação. A
intenção é que o projeto piloto para a Rua Halfeld, Juiz de Fora (MG), possa
servir de base para um projeto ainda maior de conscientização e valorização da
cultura local, que possa ser estendido para todos os pontos de interesse
patrimonial da cidade.

Palavras-chave: educação patrimonial, preservação, patrimônio arquitetônico,


Juiz de Fora
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

O PROJETO MUSEOGRÁFICO DO MUSEU DO PIAUÍ COMO


INSTRUMENTO DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL.

Marlandy Késia Bezerra De Souza (marlandykesia@outlook.com)


Rayanne Saraiva Barbosa (rayannesb_@hotmail.com)
Isabela Costa Nunes (bellanunes8@hotmail.com)
Lara Citó Lopes (laracito@gmail.com)

RESUMO

O presente artigo tem como objeto de estudo o projeto museográfico do Museu


do Piauí, desenvolvido pelo arquiteto Paulo Vasconcelos e concluído no ano
de 2017. Desenvolveu-se uma descrição dos elementos museográficos de
destaque de cada um dos ambientes que sofreram alteração com o projeto e a
análise desta intervenção que resultou na reformulação do roteiro cenográfico
do museu, tendo como objetivo principal a modernização e a inserção da
educação patrimonial. Como referencial teórico foram utilizados os autores
Hugues de Varine, Flávio de Lemos Carsalade, André Desvallés e François
Mairesse, como parte de uma metodologia que englobou ainda levantamentos
documentais e físicos in loco. Tal projeto foi de grande relevância para a
valorização do patrimônio cultural piauiense, pois meio dele é narrada toda a
história do desenvolvimento dessa população, tanto da elite quanto das classe
populares, desde a pré-história até os dias atuais, sendo assim um importante
e valoroso instrumento de educação patrimonial para a cidade de Teresina.

Palavras-chave: Projeto Museográfico; Museu do Piauí; Educação


Patrimonial.
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

O TEATRO PATRIMONIAL COMO INSTRUMENTO DE PARTICIPAÇÃO E


CIDADANIA

Éverlan Stutz (stutz_mg@yahoo.com.br)

RESUMO

Experimentar as múltiplas possibilidades pedagógicas do teatro para estimular


o envolvimento comunitário em torno de ações

preservacionistas é uma alternativa capaz de garantir significavas mudanças


na percepção da população diante da realidade social, repleta de conflitos
inerentes à condição humana que faz e se desfaz de artefatos com a mesma
velocidade avassaladora da revolução digital que, na maioria das vezes, é
legitimada pela exclusão social em épocas de muitas virtualidades e poucas
ações afirmativas. O teatro patrimonial é articulado no desenvolvimento de
jogos teatrais nos lugares de memória e de identidade cultural da cidade
enquanto uma estrutura educativa e dinâmica. O conceito abrange pesquisas
relacionadas ao teatro como instrumento da educação patrimonial e como meio
capaz de estimular a participação da sociedade em torno da salvaguarda de
seus bens culturais. O objetivo do artigo é mostrar como práticas, que
associam o teatro à educação patrimonial, podem contribuir para ampliar o
sentimento de pertencimento e de apropriação da comunidade. A partir das
memórias subterrâneas, confrontadas por POLLAK, pretende-se também
evidenciar como a memória oral pode ser registrada e ampliada por meio do
teatro de rua, uma arte pública e participativa.

Palavras-chave: Teatro, memória, participação, cidadania, jogos


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

OLHARES DO PATRIMÔNIO: A VALORIZAÇÃO E PRESERVAÇÃO DO


PATRIMÔNIO CULTURAL ATRAVÉS DA FOTOGRAFIA

Rafael Pereira Santos (rafilski@hotmail.com)

RESUMO

O projeto de educação patrimonial "Olhares do Patrimônio: a valorização e


preservação do patrimônio cultural através da fotografia", realizado no Museu
de Artes e Ofícios - MAO, premiado no 6º Prêmio Ibero-americano de
Educação em Museus, consistiu numa ação elaborada a partir da tensão
latente de se fotografar (n)o MAO, por parte dos alunos, durante as visitas
educativas. Observou-se que os alunos sentem a necessidade de utilizar o
celular para registrar de forma muito intensa o acervo do MAO, por vezes
deixando de lado a fruição do acervo.

Assim, buscou-se transformar o celular em um instrumento que fizesse com


que os alunos se conectassem ao universo do patrimônio cultural, histórico,
artístico e com universo dos ofícios, além de propor uma reflexão sobre o fazer
fotográfico e sobre a fotografia.

O projeto usou a fotografia como ponte entre o indivíduo e o meio que o


envolve, condensando seu potencial de expressão visual, artística, e registro
da memória e do tempo, configurando-se em um mecanismo excepcional de
interação entre os alunos, a escola, Museu, a sociedade e seu patrimônio
cultural. Procurou-se estimular a percepção narrativa das imagens, contribuir
para sensibilização do olhar estético e possibilitar aos alunos uma leitura e
interpretação das fotografias não apenas sob o prisma do gesto automatizado e
do imediatismo midiático, vivenciando o fazer fotográfico como uma experiência
lúdica, sensível e cognitiva.

Para realizar o projeto com resultados efetivos, foram adotadas


estratégias para envolver os alunos e professores, dando subsídios e
instigando a participação dos mesmos, sempre atuando de forma dialógica em
todas as etapas que o envolveram como: uma palestra sobre novas mídias na
educação, uma oficina de introdução à fotografia para professores
interessados, visita da equipe do Museu nas escolas; visando qualificar a
atividade e o estreitamento das relações com os alunos e aproximação com o
tema da fotografia e do patrimônio.

No MAO os alunos foram instigados a conhecerem o tema dos ofícios, e


explorarem o acervo fotográfico das galerias como forma de leitura,
observando as imagens junto aos educadores, suscitando detalhes e
levantando hipóteses e reflexões a respeito do seu conteúdo, contribuindo para
a compreensão do acervo e as possibilidades estéticas de exploração e
representação narrativa-visual.

Após a visita, os grupos foram convidados a registrarem suas fotografias


de forma espontânea e criativa, aproveitando o celular e os recursos que ele
disponibiliza, mas tendo como mote a preservação e valorização do patrimônio
através dos olhares destes estudantes.

Foram recebidas quase 500 fotografias, e a experiência se traduziu em


uma exposição com as 50 mais significativas que apontaram como os jovens
se relacionam com a cidade, a depredação do patrimônio, as artes de rua, os
trabalhadores e seus ofícios, os museus e a natureza.

A mostra, inaugurada em Novembro de 2016, recebeu mais de 4000 visitantes.

Palavras-chave: Fotografia, Museu, Patrimônio, Educação


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

OS SABERES DA FOLIA: APRENDIZAGENS EM CONTEXTOS NÃO


ESCOLARES

Soraia Freitas Dutra (soraiafreitasdutra@yahoo.com.br)


Lorena Dias Martins (lorenadiasmartins@gmail.com)

RESUMO

Esse artigo apresenta resultados iniciais do projeto de extensão e pesquisa


intitulado Os meninos e o Boi desenvolvido na Escola Fundamental do Centro
Pedagógico em parceria com a ONG Vokuim e o Ponto de Cultura Folias da
Cultura em Rubim-MG. Esse projeto analisa os processos de aprendizagem
que ocorrem no contexto da festa da Folia de Reis e do Boi de Janeiro em que
crianças e jovens da comunidade participam da recriação desta festa popular
realizada na cidade há mais de 70 anos. Em Rubim, cidade localizada no
nordeste de Minas Gerais na região do baixo Jequitinhonha, há muitos anos,
diferentes gerações de crianças e jovens organizam grupos de Boizinhos de
Janeiro, que saem pelas ruas da cidade encenando a festa do Boi de Janeiro
no contexto da Folias de Reis – festa do Ciclo Natalino. Os dados
apresentados nesse artigo derivam da análise das entrevistas individuais e
coletivas e nos permitem identificar as motivações das crianças e jovens a
participarem de forma ativa na recriação da festa; as habilidades mobilizadas
e/ou aprendidas contexto da festa, bem como, a natureza das trocas
geracionais que permitem a “transmissão” da tradição da festa da Folia de
Reis.

Palavras-chave: Folia de Reis; aprendizagens, cultura.


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

PATRIMÔNIO ARTÍSTICO DO PALÁCIO DAS ARTES: UM ESTUDO DO


PROCESSO DE PRESERVAÇÃO DO FIGURINO DOS ESPETÁCULOS
PRODUZIDOS PELA FUNDAÇÃO CLÓVIS SALGADO

Rachel Myrrha De Paula E Silva Neves (rmyrrha@gmail.com)


Vânia Myrrha De Paula E Silva (doutoradoed@gmail.com)

RESUMO

O teatro no Brasil tem suas origens no século XVI com Padre Anchieta e suas
peças de catequização, mas a construção do primeiro espaço para as artes
cênicas só foi concretizada em 1770, data de inauguração do mais antigo
teatro brasileiro em Ouro Preto. Com quase trezentos anos da existência
dessas casas de espetáculo no Brasil, uma questão emerge: onde e como está
preservada a memória desse patrimônio artístico, sendo o teatro parte tão
representativa da cultura brasileira? Esse patrimônio das artes cênicas assume
diversos formatos, podendo abranger tanto o patrimônio arquitetônico, na forma
dos edifícios teatrais e casas de espetáculo, como seu patrimônio móvel –
gravações em vídeo, fotografias, libretos, materiais de divulgação, além do
figurino e do cenário produzidos especificamente para cada obra.
Considerando o cenário exposto, surge uma indagação interessante: que é
feito com esse patrimônio móvel? Mais especificamente, o que é feito com o
figurino das peças de teatro e espetáculos de ópera e dança após o período de
apresentação?
Buscando destrinchar essa última questão, este trabalho apresenta uma
análise do processo de conservação dos figurinos produzidos pela Fundação
Clóvis Salgado para espetáculos apresentados em um dos mais importantes
teatros do estado de Minas Gerais: o Palácio das Artes. Com base em
entrevistas, visitas técnicas e materiais de referência, é feito um diagnóstico do
processo de preservação do figurino - sob responsabilidade e gestão de um de
seus equipamentos culturais, o Centro Técnico de Produção (CTP) - desde o
inventário das peças produzidas até a higienização, arquivamento e
catalogação final do acervo devolvido após a execução do espetáculo. Nesse
diagnóstico, são levantadas, também, as condições ambientais e de
infraestrutura dos galpões e instrumentos utilizados para armazenamento das
peças. Além disso, o presente estudo discorre brevemente sobre a história da
conservação do patrimônio móvel artístico no Palácio das Artes e apresenta
algumas aplicações desse figurino guardado e preservado.

Dessa forma, pretende-se incentivar a implantação de projetos voltados para a


melhoria da gestão e da adequação dos instrumentos de preservação e
monitoramento ambiental, além do desenvolvimento de regras e políticas de
conservação e descarte desse rico acervo. Espera-se, também, que o registro
da prática de conservação realizada pela Fundação Clóvis Salgado possibilite,
além da permanência desse trabalho na instituição, o provimento de novas
soluções; que forneça exemplos e mostre caminhos para o fortalecimento
desse tipo de iniciativa nos demais teatros brasileiros.

Palavras-chave: patrimônio artístico, teatro, acervo


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

PRAÇA RAUL SOARES APÓS A REFORMA E A RETOMADA DE SEU USO


COMO PRAÇA

Kelly Juliane Dutra (kellyjdutra@gmail.com)

RESUMO

A praça é um local de convergência tanto fisicamente como de ideias, é ponto


de encontro da comunidade, além de área de lazer. As praças são também
áreas de respiro verde dentro da arquitetura urbana, carregada de concreto de
asfalto. A praça Raul Soares nasce junto com Belo Horizonte e testemunha
todas as transformações que a capital mineira sofre ao longo de mais de cem
anos. No plano piloto a Praça se chamaria 14 de Setembro, e seu desenho era
triangular, mas se concretizou como Praça Raul Soares e com um desenho
circular, convergindo importantes avenidas de Belo Horizonte. Nesse ensaio é
abordado um pouco da historia da Praça Raul Soares ligando principalmente a
história do complexo Juscelino Kubstcheck o JK. A pretensão maior desse
trabalho é chamar a atenção para essa região da capital mineira que durante a
história passou por altos e baixos, sendo supervalorizada e glamorosa na
década de 50 quando se iniciam as obras de implantação do Complexo JK, e
entra em decadência com a paralisação dessas obras. A Praça Raul Soares a
partir da década de 70 e 80 passa a ser marginalizada e frequentada por
prostitutas. Em 2006 porém o carinho e afetividade dos moradores com a praça
faz com que mais uma vez a mesma marque seu lugar na história de Belo
Horizonte sendo citada no primeiro Orçamento Participativo Digital como
prioridade de investimento. Já em 2008 depois de um ano em obras e com
tapumes a Praça Raul Soares foi entregue aos moradores, mas oito anos após
essa entrega, pode se observar em breve pesquisa que a mesma já carecia de
alguns pequenos reparos. Esse trabalho sem a pretensão de conclusões
aprofundadas e ainda que breve, deixa em aberto várias questões que envolve
a Praça Raul Soares para posteriores pesquisas.

Palavras-chave: Praça Raul Soares, Edifício JK, Belo Horizonte, Orçamento


Participativo Digital, Patrimônio Cultural
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

RESIGNIFICAR O MUSEU: PARCERIA UNIVERSIDADE X INSTITUIÇÃO


MUSEAL PÚBLICA

Alexandre Sônego De Carvalho (sonegoproducoes@gmail.com)


Ana Villanueva (anavillanueva11@gmail.com)

RESUMO

O MIS - Museu da Imagem e do Som de Campinas está localizado em um


prédio histórico de grande valor patrimonial, tendo sido tombado por três
esferas de órgãos de preservação do patrimônio cultural, o IPHAN, o
CONDEPHAAT e o CONDEPACC.

Por esta característica histórica do edifício, surge naturalmente uma dicotomia


entre o objeto tecnológico do museu e a preservação do patrimônio
arquitetônico.

Desde janeiro de 2017, foi iniciado um trabalho de apropriação do espaço do


MIS pelas Universidades da cidade, primeiramente a UNIP, sendo seguida pela
PUCC e pela UNICAMP.

A primeira ideia deste trabalho foi a de trazer os alunos da disciplina de


técnicas retrospectivas do Curso de Arquitetura e Urbanismo para fazer um
levantamento do prédio histórico e ficar em contato permanente com o mesmo
para apreensão, na prática, das teorias de preservação.

No sentido contrário, estes alunos contribuem para a dinâmica do cotidiano do


museu, com carência humana e estrutural.
Esta experiência Universidade/Museu, enriquece ambas instituições, fazendo
com que novas iniciativas e ideias sejam implementadas, como é o caso já
ocorrido de atualização de material expositivo, história oral do edifício intitulado
“De Solar a Museu”, procedimentos de restauro e acompanhamento de laudos
técnicos por parte dos estudantes.

Desta forma, cria-se um olhar, mais apurado dos alunos, que irá se transformar
em aprimoramento da sua formação profissional, ao mesmo tempo que, estes
estudantes trazem novos olhares para os funcionários do MIS.

Foram entrevistados os estudantes que participaram deste trabalho, sendo


constatados os resultados significativos que esta experiência está trazendo
para o Museu e para a Universidade.

Palavras-chave: Museu da Imagem e do Som, Patrimônio Cultural, Educação


Patrimonial
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

REVELANDO MEU BAIRRO, MEU PATRIMÔNIO

Virgínia Ribeiro De Souza (virg.ribeiro@yahoo.com.br)

RESUMO

Área Temática: Os desafios da Educação Patrimonial

Título: REVELANDO MEU BAIRRO, meu patrimônio

RESUMO

Tendo como pano de fundo a cidade de Cataguases, reconhecida


nacionalmente como cidade histórica de Minas Gerais pelo rico acervo cultural,
principalmente por suas obras públicas modernistas, concentradas em sítio
histórico tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional/IPHAN, e, sendo ainda, um município de médio porte, com população
estimada de 73.712 (IBGE/2014), reconhecemos que, embora o trabalho de
preservação e manutenção desse acervo ocorre de forma sistemática, ainda é
insipiente.

Apesar de todo esse potencial histórico existia um espaço referente às


manifestações populares/ patrimônios imateriais que necessitavam
urgentemente de atenção, uma vez que não configuravam como cenário
cultural de nossa cidade.

Entendendo que, preservamos apenas o que conhecemos, buscamos


parcerias através das Associações de Moradores e escolas municipais para um
grande “mutirão cultural”, envolvendo toda a população local em ações
cidadãs, culminando no reconhecimento da identidade, memória e história da
valorização da comunidade que pertence.

Preocupados em atingir esta demanda, o projeto REVELANDO MEU BAIRRO,


meu patrimônio é desenvolvido nas sedes das Associações de Moradores com
apoio das escolas municipais e o Departamento Municipal do Patrimônio
Histórico e Artístico de Cataguases/DEMPHAC. Com o intuito de mapear,
registrar e consolidar os suportes material e imaterial de cada comunidade,
acreditando que partir de pequenas ações próximas, poderá atingir toda a
cidade, onde observamos, ao longo dos anos, que os olhares são voltados
apenas para o sítio histórico localizado na região central da cidade.

Considerando a relevância do setor de patrimônio local (DEMPHAC), que


possui como proposta primeira a difusão da preservação do patrimônio deste
sítio histórico, através de programa de Educação Patrimonial existente desde
2008, elaboramos o projeto REVELANDO MEU BAIRRO, meu patrimônio com
objetivo de ampliar a atuação deste setor de patrimônio no que se refere à
valorização, pesquisa e preservação, envolvendo a comunidade, criando
verdadeiramente relação de pertencimento da população com a cidade.

REVELANDO MEU BAIRRO, meu patrimônio apresenta-se, portanto, como um


projeto que visa cuidar de garantir a permanência dos suportes imateriais que
contêm as marcas da história, dando continuidade a produção e preservação
da cultura das comunidades alcançando a cultura da cidade.

Através do Projeto REVELANDO MEU BAIRRO, meu patrimônio esperamos


envolver a população local, exercendo o papel de cidadania, criando uma
sólida relação de pertencimento dos munícipes com sua comunidade.

Palavras-chave: Patrimônio.Associação.Pertencimento
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

ROTEIRO PELAS IGREJAS DO CENTRO HISTÓRICO DE CUIABÁ – UM


PASSEIO PELOS LOCAIS SAGRADOS

Daniel Silva Campos (arqdanielcampos@gmail.com)


Amelia Hirata (amelia.hirata@iphan.gov.br)
Rayane Cristina Carmin (rayane.carmin@iphan.gov.br)
Lúcia Lobato (lf_lobato@yahoo.com.br)

RESUMO

Com o intuito de fortalecer os sentimentos de identidade e cidadania da


população cuiabana, a Superintendência de Mato Grosso do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, através de uma postura
mais educativa, de diálogo, de reconhecimento e de proteção do patrimônio
cultural, busca promover ações de educação patrimonial paralelamente às suas
frentes de ação. Neste contexto dinâmico, de trocas de experiências e
vivências, de experimentações e de esclarecimentos à sociedade, a
Superintendência iniciou no mês de março de 2017, o evento denominado
Roteiro Pelos Templos Sagrados do Centro Histórico de Cuiabá. Esse roteiro é
um produto de uma série de ações comemorativas do aniversário de oitenta
anos do órgão e tem como objetivo, a apresentação e visitação das principais
construções religiosas que se encontram na poligonal de tombamento do
Centro Histórico de Cuiabá – MT, são elas: Igreja do Rosário e Capela São
Benedito, Igreja do Nosso Senhor dos Passos, Igreja da Boa Morte, Basílica do
Senhor Bom Jesus de Cuiabá e Igreja Presbiteriana. Esses lugares sagrados
possuem grande importância para a população cuiabana por se tratarem da
representatividade espiritual que está enraizada nos mesmos, ou seja, a
proximidade com o divino representada por essas construções religiosas.
Desse modo, a Superintendência envolveu a necessidade de criação de um
produto que conectasse a bagagem histórica que as mesmas carregam e a
linguagem arquitetônica que concebem esses espaços sagrados, implantadas
na paisagem da cidade de modo que não deixa que o público passe sem
percebê-las. O roteiro é destinado a todos os públicos, como estudantes,
profissionais de diversas áreas, entusiastas, moradores do Centro Histórico,
entre outros interessados. A dinâmica do roteiro deu-se, primeiramente, por
uma rápida palestra institucional do órgão e um breve resumo histórico da
criação da cidade e dos espaços sagrados visitados, apresentadas no salão da
sede da Superintendência de Mato Grosso. Para que o histórico das
construções fosse apresentado, fez-se necessário o estudo de diversas
bibliografias, publicações de autores locais e documentos do arquivo da
Superintendência. Finalizada a parte teórica do evento, os participantes foram
convidados a percorrer trecho do centro histórico cuiabano até os templos
estudados, os quais são tombados pela União, na capital mato-grossense.
Para que as visitas no interior das igrejas fossem possíveis, contato com as
suas respectivas administrações foram estabelecidos. A proximidade entre eles
e a sede do órgão também foi um fator decisivo para a aplicação do roteiro.
Durante o percurso, o participante caminha por diversos casarões de diferentes
períodos e logradouros públicos cheio de histórias para contar. Ao vivenciar e
apresentar experiências, busca-se, portanto, promover o diálogo
interinstitucional, a troca de conhecimentos e a formação de possíveis
parcerias para a proteção e valorização desses bens no estado.

Palavras-chave: Roteiro, Igrejas, Centro Histórico de Cuiabá


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

SABERES TRADICIONAIS: DESAPARECIMENTO E PERPETUAÇÃO

Januaceli Murta (janumurta@gmail.com)

RESUMO

Os ofícios tradicionais relacionam-se diretamente com hábitos tradicionais, com


(re) significação e (re) valorização por meio de sua perpetuação. No município
de Araújos, por exemplo, o saber fazer o chapéu de palha de cambaúba sofre
com escasseamento da produção, e possível extinção. Além da dificuldade de
encontrar a espécie de bambuzinho, a cambaúba, a principal detentora e
representante do ofício faleceu no ano de 2012. Relacionado diretamente com
a memória afetiva coletiva local, o ofício é rememorativo uma vez que remete a
tempos idos, resguardando ainda conhecimentos populares acerca da
produção da palha, como o processo de trançar, moldar, costurar. Remete a
civilizações passadas, com significâncias que remetem ao valor cultural, social,
político, individual, sendo ainda forma de comunicação (poder, sedução,
intimidação), além da parte funcional (proteção de batalhas, mau tempo, sol,
chuvas, etc) e simbólica (resguarda a parte mais importante do corpo, a
cabeça, o pensamento, resguardando-o de forças hostis, ou reafirmando-o ao
deixa-lo em destaque). Na região citada, outro saber pode também ser citado,
esse que interfere significativamente na paisagem local: as caieiras e olarias.
Espaços erguidos em tijolos cerâmicos maciços, com sistema de aquecimento
de remete ao conhecimento egípcio, passam por processo de abandono e
ausência de proposições de novos usos. Além de documentar, como propiciar
a perpetuação de tais saberes?
Palavras-chave: Patrimônio Imaterial. Ofícios. Chapéu de palha. Cambauba.
Olaria. Caieiras.
RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

UM CANTO DA CIDADE: PAISAGEM, MEMÓRIA E PATRIMONIALIZAÇÃO


DE GARÇA TORTA A RIACHO DOCE, MACEIÓ-ALAGOAS.

Tuanne Monteiro De Carvalho (tuannemdc@gmail.com)


Roseline Oliveira (roselineoliveira@gmail.com)

RESUMO

Quando uma cidade vai se fazendo no sítio, várias são as razões de ser de
seus gestos urbanos. Dentre elas, situa-se a relação do homem com a
natureza e, no contexto em que se insere a cidade de Maceió, ela tem
aparecido determinante no processo de sua apropriação física e imagética.
Desde a situação geográfica da cidade – uma faixa de terra entre o mar e a
lagoa, até sua toponímia que significa “o que tapou o alagadiço”. Um dia, no
seu começo, essa atmosfera foi repelida pelos princípios higienistas e a cidade
buscou vencer seu destino de ilha. Mais tarde, outro movimento moderniza a
cidade, balizado pela sedução da feição original do lugar. A orla marítima
passou a ser apropriada pela especulação imobiliária e pela Indústria do
Turismo que fizeram dos traços geográficos uma marca construída pelo
Marketing. Nesse processo, devido ao distanciamento do centro urbano, alguns
cantos, por um tempo, se mantiveram salvos das interferências drásticas da
urbanização. Cantos da cidade de Maceió que nem se viam parte dela e que,
por isso, puderam se construir a partir de gestos lentos, ao passo da rotina da
convivência – como os bairros Garça Torta e Riacho Doce, a 10 km do centro
da capital no sentido de seu litoral Norte. Nas últimas décadas, esses
parênteses urbanos têm atraído um outro habitante, o que percorre o lugar em
busca de um ambiente distinto da “cidade grande”. Tem seduzido também, por
meio da propaganda, outros que querem ser dali moradores e buscam uma
atmosfera paradisíaca reforçada pelos novos panfletos de venda de edifícios
de 20 andares. Contudo, habitantes fixos e fluxos, parecem estar às margens
do conteúdo, dos processos, das dinâmicas e memórias daquele lugar que
justificam seus próprios aspectos atraentes. A ideia desta proposta de artigo é
apresentar o processo de estudo que tomou a experiência lúdica como método
de acessar a história do lugar, visando o registro e a socialização de um
conhecimento baseado na empiria e na oralidade de famílias de moradores que
por gerações participaram da construção daquela paisagem com suas próprias
naturezas. Tal experiência consistiu em uma contribuição para a historiografia
de dois bairros no limiar de drásticas mudanças em suas feições físicas e, por
extensão, em suas relações cotidianas. Além disso, os produtos da pesquisa
constituem-se, especialmente, um resultado de exercício de outros
mecanismos de identificação de um rico conteúdo silencioso e invisível,
funcionando como uma ferramenta incitante de relações de pertencimento
entre os habitantes e o próprio lugar que ele habita, na medida em que
favorece o compartilhamento de histórias e memórias. O trabalho, portanto,
aborda percursos subjetivos de um canto da cidade, ou seja, de relações
cotidianas hoje ameaçadas que se deram à beira de mar, de rio e de morro,
que foram reformatadas na linguagem de um objeto de cunho extensionista
com potencial de uso enquanto instrumento de patrimonialização.

Palavras-chave: patrimônio paisagístico, memória, experiência lúdica.


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

UM POUCO DE CADA

Helenne Jungblut Geissler (helenne.geissler@udesc.br)


Diomar Caetano (mara-ju@hotmail.com)
Marlene Siegle Schonrock (marlene666@gmail.com)

RESUMO

Ibirama integra a região do Alto Vale do Itajaí no Estado de Santa Catarina.


Localiza-se a uma latitude 27º03'25" Sul e a uma longitude 49º31'04" Oeste e
150 metros acima do nível médio do mar. Foi colonizada a partir do final do
século XIX, mas também recebeu muito imigrantes durante o século XX. O
município preserva na arquitetura, na culinária, no artesanato, no idioma,
esportes, música, folclore, costumes, hábitos, dentre outros o legado dos
imigrantes alemães, austríacos, italianos, poloneses, dentre outros, através de
seus descendentes.

A antiga colônia Hammonia, que já foi distrito de Blumenau possui uma áreas
de 247,3 m² e possui cerca de dezoito mil habitantes. Situa-se encravada em
vales com declividade acentuada, sendo entrecortada por rios caudalosos com
corredeiras e razoável extensão de florestas nativas preservadas. Há diversas
comunidades abrangendo patrimônio cultural preservado (arquitetura
enxaimel), habitantes fluentes nos idiomas de seus ancestrais a exemplo de
Sellin, Dalbergia, Rafael, Ribeirão das Pedras e outras. Neste contexto, pratica-
se caminhadas ao ar livre na floresta (wandern), ciclismo, tirolesa, rapel,
raffting, dentre outros esportes radicais. Permanecem ainda os clubes de caça
e tiro amadores, clubes de bolão, corais, grupos folclóricos adulto e infantil
bandas musicais.
Merecem ser valorizados os conhecimentos dos habitantes e documentá-los,
seja a memória, os saberes e suas diversas interfaces, o idioma e os dialetos,
as canções, as receitas, fabricação dos produtos caseiros, bolos (Kuchen),
geléias, conservas como sauerkraut (chucrute), cervejarias artesanais, cultivo
de uva e produção de suco e de vinho, o artesanato, os lugares, métodos
construtivos, conhecimentos de restauro de edificações enxaimel, energias
limpas como as rodas d´água, engenhos e moinhos, nas festas, nos pic-nics,
os bailes, cultivo de trutas e outros. A ideia é de que os saberes se propaguem
e se perpetuem no tempo e que sejam replicadas através das gerações e para
os turistas.

A proposta visa resgatar e valorizar o legado cultural através da gastronomia,


da arquitetura, valorizar o idioma, esportes, música, folclore, costumes, hábitos,
dentre outros aspectos. A metodologia inclui pesquisa bibliográfica, trabalhos
em campo, entrevistas e reuniões com as comunidades no meio urbano e no
rural, registros fotográficos das ações, registro do modo de fazer
documentando os saberes tradicionais dos habitantes. Espera-se gerar
materiais de divulgação e publicações, promover oficinas com crianças,
adolescentes, adultos e idosos visando integrar as diversas gerações,
promover a educação patrimonial e gerar multiplicadores do patrimônio.

Palavras-chave: imigrantes, legado, patrimônio cultural


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

UM REGISTRO ARQUITETÔNICO DA FAZENDA ORIENTE

Francisco De Assis Pereira De Araújo (dassispb@hotmail.com)


Raiany Narla Soares Da Cruz Souza (raiany_narla@hotmail.com)

RESUMO

O artigo apresenta detalhes com descrições e análises sobre as características


arquitetônicas de um importante sobrado, sede da Fazenda Oriente, localizado
na cidade de Condado-PB, nas imediações do Açude Engenheiro Arco Verde,
inaugurado em 1936. Mesmo ano em que o proprietário Dr. Ageu de Castro
passou a residir no imóvel. Este foi dentista, advogado (rábula), jornalista e
importante politico da Paraíba, foi Major-Comandante da Força Revolucionária
de 1930 e participou da Assembleia Constituinte do Estado da Paraíba em
1947. Foi um dos pioneiros do município e que contribuiu para a emancipação
politica da cidade de Condado.

O sobrado é um exemplar significativo e peculiar, tendo em sua tipologia


marcas características de influências do estilo Art Décor, que se desenvolveu
no Brasil a partir inicio do século XX. Chama atenção à escala, elementos e
detalhes construtivos e o requinte desta edificação construída no sertão
paraibano em local estratégico com acesso facilitado para o núcleo urbano da
cidade de Condado e para Vila de Itajubatiba, comumente chamada de Mina do
Ouro, local rico nesse minério, pertence ao município de Catingueira, onde o
Dr. Ageu tinha negócios.

Atualmente o imóvel encontra-se desocupado, com sua estrutura física


preservada, necessitando de serviços de estabilização e de uso com o intuito
de manter esse local que no passado, contribuiu para o desenvolvimento da
região. Esta pesquisa oferece contribuições para a sociedade no campo da
educação patrimonial, visto é evidenciado às particularidades, tanto de técnicas
construtivas quanto da história de um sobrado que guarda elementos da
tipologia Art Décor utilizado no sertão paraibano, período inicial da formação da
cidade de Condado.

Palavras-chave: Educação Patrimônal, Arquitetura, Memória.


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

UMA RUA DE MUITOS LUGARES: ROTEIRO PELO CENTRO HISTÓRICO


DE CUIABÁ

Lúcia Lobato (lf_lobato@yahoo.com.br)

RESUMO

Área Temática: Eixo 8 _ A cidade, lugar da educação patrimonial

Título: Uma rua de muitos lugares: roteiro pelo Centro Histórico de Cuiabá

RESUMO

Uma rua de muitos lugares corresponde à elaboração de uma proposta de


roteiro de visitação que foi trabalhada pelo Iphan/MT no Centro Histórico de
Cuiabá. A proposta do roteiro originou-se das observações feitas durante
algumas visitações de grupos de estudantes da educação básica e do ensino
superior pelo Centro Histórico da cidade. A partir destas observações,
constatou-se a falta de uma sistemática na forma de trabalhar os conteúdos
históricos, antropológicos e arquitetônicos durante a visitação, pois, os lugares
visitados eram trabalhados de forma isolada não havendo a associação entre
as informações e sua relação com a dinâmica da cidade. A segunda
observação relaciona-se à ausência de material de apoio como suporte para
apresentação dos locais visitados e para a realização de consultas. Por fim,
identificou-se a inexistência de clareza sobre o propósito da atividade de
visitação, o que contribui, no nosso entendimento, na limitação da reflexão
sobre a importância do Centro Histórico para a cidade. A realização do roteiro
vislumbrou inicialmente promover uma ação de educação patrimonial que
aproximasse os participantes, os habitantes da cidade com o Centro Histórico
de Cuiabá, sendo que a partir da construção desse primeiro elo de
aproximação, iniciar um trabalho de associação entre os aspectos históricos,
culturais e simbólicos dos locais visitados, desenvolvendo, dessa forma, uma
ação que incentivasse e contribuísse na a formação de agentes sociais
interessados na valorização e proteção do patrimônio local. Dessa forma, a
visitação ao Centro Histórico vai além da simples visualização de locais, volta-
se para o florescimento, para a apreciação, o aguçar do olhar, descortinar os
detalhes do lugar, do patrimônio ali contido, e assim, propiciar a ampliação da
visão para além do objeto em si, direcionando para a perspectiva mais ampla
em relação à sua valorização, conservação e preservação

Autores: Ma. FERREIRA, LUCIA DE FÁTIMA LOBATO

Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Superintendência de Mato


Grosso

Rua 7 de Setembro, nº 390, Bairro Centro Norte, Cuiabá/MT

lf_lobato@yahoo.com.br

Palavras-chave: Centro Histórico; patrimônio; Cuiabá.


RESUMO - 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: EIXO 6 –
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA ESCOLA EIXO 7 – MUSEUS, ARQUIVOS E
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EIXO 8 – A CIDADE, LUGAR DA EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL EIXO 9 – EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E TRABALHO: OS
OFÍCIOS TRADICIONAIS EIXO 10 – COMUNIDADES: PARTICIPANTES
EFETIVAS DAS AÇÕES EDUCATIVAS

VIVENDO O PATRIMÔNIO: O MEMORIAL ZUMBI DOS PALMARES,


TERESINA-PI.

Jayanara Dar´C De Oliveira (jayanaradarc@hotmail.com)


Cláudio Valentim Leal (claudiovrleal@hotmail.com)
Ana Virgínia Alvarenga Andrade (anavirginia@uninovafapi.edu.br)

RESUMO

A cidade de Teresina tem como uma das várias marcas da sua paisagem
urbana a variedade de edificações com feições neocoloniais, sendo as
construções originalmente residenciais predominantes nesse contexto. Um
exemplar distinto dessa produção é o Memorial Zumbi dos Palmares,
inaugurado no dia 25 de julho de 2007, que abrigou originalmente uma escola,
construída como parte de um esforço comum no âmbito nacional para a difusão
da educação e muito importante, durante muitos anos, para a cidade de
Teresina. Diante disso, o presente artigo objetiva apresentar as características
dessa edificação como parte do cenário local e discutir o seu uso como um
importante recurso de educação patrimonial na cidade, além da relação deste
com a preservação das características do prédio. Baseia-se em uma
metodologia que englobou principalmente levantamentos bibliográficos,
documentais e físicos in loco, resultando em uma discussão sobre educação
patrimonial e preservação do patrimônio edificado teresinense.

Palavras-chave: Memorial Zumbi dos Palmares, Educação Patrimonial,


Preservação.
A DESTIPIFICAÇÃO DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO
RESIDENCIAL DE TERESINA: O caso do entorno da praça Landri
Sales

SILVA, CARLIENE LIMA E (1); SILVA, WANDERSON LUIS SOUSA E (2); SOUSA,
TAIANNE VANNE NECO (3); MOREIRA, AMANDA CAVALCANTE (4).

1. Universidade Federal do Piauí (UFPI). Centro de Tecnologia.


Av. Universitária, 1310, Campus da Ininga, TROPEN, Teresina (PI), CEP: 64049-550
carlienelimaesilva@gmail.com

2. Universidade Federal do Piauí (UFPI). Centro de Tecnologia.


Av. Universitária, 1310, Campus da Ininga, TROPEN, Teresina (PI), CEP: 64049-550
wandersonluis-05@hotmail.com

3. Universidade Federal do Piauí (UFPI). Centro de Tecnologia.


Av. Universitária, 1310, Campus da Ininga, TROPEN, Teresina (PI), CEP: 64049-550
taianneneco@gmail.com

4. Universidade de São Paulo (USP). Instituto de Arquitetura e Urbanismo.


Av. Trab. São-Carlense, 400, Centro, São Carlos (SP), CEP: 13566-590
amandacmoreira@usp.br

RESUMO
O centro histórico da cidade de Teresina-PI tem sido descaracterizado significativamente no decorrer
das últimas décadas, especialmente pela transformação quase que total dessa área que, originalmente,
abrigava principalmente os usos residenciais, comerciais e institucionais em uma zona, atualmente, de
serviço, comercial e institucional. Diante desta percepção, neste artigo abordamos essa transformação
e sua relação com a fragilidade dos instrumentos de proteção a partir do caso da Rua Barroso, no
quarteirão que ladeia a Praça Landri Sales, logradouro de grande destaque na cidade, especialmente
pela sua estreita relação com a história e a memória da cidade de Teresina. Por intermédio de estudo
temporal das mudanças e reconstituição do perfil de uso das edificações, através de fontes
documentais, bibliográficas e entrevistas, constatou-se a extrema descaracterização dessas
edificações, resultando em profunda mudança da paisagem urbana, sobretudo na substituição da
tipologia residencial por distintas funções.
Palavras-chave: patrimônio arquitetônico, residências de Teresina-PI, Rua Barroso, Praça Landri
Sales.

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Introdução
Teresina foi fundada para se tornar a nova capital para o estado do Piauí, planejada a fim de
atender as necessidades que o sistema exigia.

Antônio Conselheiro Saraiva decide por uma planície, às margens do rio


Parnaíba, com cota acima do mesmo para evitar o risco de futuras
inundações. A partir da decisão do espaço, foi criado um plano urbanístico
que era influenciado pelos modelos europeus, principalmente o português.
Linhas retas, rigidez geométrica, ritmo e a concentração dos poderes em
torno de praças compõem o partido do Plano. (CHAVES, 2008)

Assim, em seu primeiro plano urbanístico, Teresina, que segundo Brandim, “já nasceu sob os
auspícios do discurso moderno”, demonstrava cuidado com os espaços livres ao delimitar
sete espaços para futuras praças. A Praça Landri Sales só foi construída em 1955 – apesar
de ter sido incluída no plano Saraiva de 1855 –, durante o governo de Agenor Barbosa de
Almeida (1955 – 1959).

A área de 8.271,23m² era conhecida antigamente como Baixa da Égua – por


ser um ótimo ponto de pastagem. Ainda antes da construção da praça, o local
já era utilizado durante o verão como campo de futebol e hospedagem dos
circos que visitavam Teresina. (GARCIA, 2000)

O projeto de autoria e execução de Raimundo Nonato Portela de Melo foi concebido, segundo
MARQUES (2005, p. 12) “em estilo eclético, com lago, fonte com elementos decorativos, arco
em pedra, gruta e balaustradas neocoloniais em semicírculos, e alguns elementos do estilo
moderno como canteiros geométricos desestruturados distribuídos de forma orgânica”.

Nesse período, a praça atraía uma população diversa desde crianças a idosos, estudantes do
Liceu Piauiense, comerciantes – o que ocorre até hoje. “Com o passar dos anos a praça sofreu
fortes descaracterizações em seu espaço. E, no final da década de 1970, o lago, a fonte e a
gruta foram extintos por se tornarem foco de contaminação e refúgio para marginais”
(MARQUES, 2005). A Praça também sofreu com o processo de mutação dos usos daquela
área. Além da desfiguração ocorrida por falta de manutenção em seu mobiliário e
equipamentos, a mudança do uso residencial para outros usos (comercial, institucional ou
serviço) no entorno afetou a sua utilização. Só após uma reforma realizada em 2006, a praça
recupera ar de espaço público.

Da mesma maneira, a história da Rua Barroso, em termos de evolução do urbanismo e


modernização da capital do Piauí, se confunde, ora sendo agente modificador da paisagem
por ser uma via de grande importância – ligando a zona Sul à zona Norte através do centro –,
ora como consequência do crescimento da cidade partindo do seu centro histórico. A rua,
apesar de ter sido menos estimada em detrimento de outras vias como a Rua Rui Barbosa, já
foi uma área muito valorizada da cidade. Após o período de urbanização e desenvolvimento
da capital a partir de seu centro histórico, assim como ocorreu e ocorre em diversas cidades,
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Teresina e a Rua Barroso, consequentemente, sofreram um processo de depreciação. Este
processo teve seu início nos anos 1970 com a tentativa de desenvolvimento de uma
“pseudometrópole”.

Teresina, cidade de médio porte, foi centro da política de modernização posta


em prática em consonância com o modelo nacional de desenvolvimento
adotado nos anos 1970 (...). As intervenções foram no sentido de dotar a
cidade de infraestrutura, sistema de abastecimento de água e luz regulares,
desobstrução do tráfego de veículos – com abertura ou duplicação de ruas e
avenidas, as quais estavam recebendo cobertura asfáltica –, mas também de
criar símbolos modernizadores da presença do poder público, como a reforma
de logradouros públicos, construções de grande porte, passando aos
habitantes a sensação que a cidade mudara sua configuração, adquirira
novos ares de acordo com os novos tempos. (MONTE, 2009)

Visto este contexto e a aplicação dos novos códigos urbanos, Teresina passou por uma
‘cirurgia’ para dar lugar a novos tipos de moradia nas demais zonas da cidade, sofrendo,
segundo Lima, um progressivo e irreversível processo de verticalização, com o crescente
aumento de enormes edifícios que passavam a ocupar, intensamente, espaços vazios, em
áreas nobres da cidade, conjugando a construção de conjuntos habitacionais nos lugares
mais longínquos da periferia, alterando sensivelmente a paisagem.

A valorização dessas novas áreas residenciais em detrimento do centro da cidade, além do


desenvolvimento contínuo e acelerado do comércio e da economia, fez com que a área central
da cidade de Teresina – e por consequência, seu centro histórico – se tornasse quase
exclusivamente um local de atividades diurnas, perdendo sua tipologia de moradia.

Diante desse processo, nosso objeto de estudo, localizado na Rua Barroso, são as
construções pertencentes ao quarteirão que ladeia a praça Landri Sales, em seu lado
esquerdo, no sentido norte-sul.

A metodologia deste trabalho utilizou o método de pesquisas em acervos públicos, fontes


documentais, como o Inventário de Proteção do Acervo Cultural de Teresina e Inventário
pertencente ao SEMPLAN-PI, registros de imóveis de algumas construções pertencentes ao
recorte geográfico trabalhado nesse artigo cedido por proprietários das edificações, entrevista
cedida por uma das moradoras remanescentes da região supracitada, além do uso de
diversas fontes bibliográficas, sendo elas livros, jornais da época, fotografias cedidas por
antigos moradores e artigos científicos que já pesquisaram sobre algum dos aspectos desse
artigo.

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Figura 01: Localização dos objetos de estudo no bairro Centro, Teresina (PI) – Brasil.
Edição: Carliene Lima, 2017.

Imóvel 664
Datada como a construção mais antiga dentre as estudadas, a atual sede do Conselho
Municipal de Educação do Piauí (CME-PI) – demarcada como o lote 1 (Figura 01) possui um
dos edifícios com as características formais mais bem preservada do quarteirão.

A casa foi construída pela família do dono original, o clínico Agenor Barbosa de Almeida, figura
importante na sociedade piauiense da época por ter exercido vários cargos públicos de
destaque, tendo sido também prefeito da cidade de Teresina entre 1955 e 1959, construindo
durante seu mandato a praça Landri Sales (1955), que se localiza em frente sua antiga
residência.

Durante um longo período, depois de Agenor e sua família se mudarem para o Rio de Janeiro,
a casa permaneceu abandonada, permanecendo assim até o início dos anos 2000, quando
funcionou na edificação um estabelecimento comercial por nome de JC Livros Usados – que
ocupou o estabelecimento até 2009. A antiga residência é alugada, atualmente, para a
Prefeitura de Teresina, sob jurisdição da Secretaria Municipal de Educação e Cultura
(SEMEC) desde 2010. Entretanto, somente a partir de 2014, o edifício passou a servir de sede
para o CME-PI.

De meados do século XX, este edifício de 2 pavimentos possui características construtivas


coerentes ao Código de Postura de 3 de abril de 1939 que prega: “As paredes dos prédios
serão construídas com alvenaria de pedra, tijolo, concreto simples ou armado, ou qualquer
material existente, seco, incombustível e imputrescível, suficientemente refratário à umidade
e ao calor”. Sendo assim, o prédio apresenta alvenaria em tijolo, forro em laje de concreto,
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
telha cerâmica (telhado 1/2 cana artesanal) e vergas retas. Em termos de características
formais, o edifício apresenta certos elementos pertencentes ao Estilo Missões – uma
arquitetura não originada no Brasil, mas, que aqui, encontrou campo e foi desenvolvido.

Iniciado no período posterior à Guerra México – Estados Unidos (1846 e


1848) significou, num primeiro momento, a atribuição de novas interpretações
aos presídios, aos ranchos e às missões da California, do New Mexico e do
Texas, mais afinados com os pressupostos político-sociais estadunidenses.
Segundo apontou o historiador urbano Robert Lint Saragena, com essa
atitude intentava-se apagar as marcas da dominação mexicana, ocorrida
entre 1821 – ano da independência do México, da Espanha – e 1848 – ano
do início do domínio dos Estados Unidos. A ideia era transformar a recém
incorporada região em uma idealizada “Arcádia Espanhola”. ATIQUE (2007,
p. 287)

Dos elementos arquitetônicos notados nesta construção que podem ser caracterizados como
pertencentes ao Estilo Missões são: poucos andares, uso de telha cerâmica do tipo capa
canal, alpendres com arcos plenos, guarda-corpo com balaustrada de alvenaria e o
revestimento rústico das fachadas com reboco grosso em relevo ou com texturas e desenhos
informais e variados – no caso do edifício, reboco ondulado que remete a escamas de peixe
com pintura impermeável. A maioria das características do Mission Style foi amplamente
utilizada em Teresina, mas é importante destacar que o pátio interno praticamente não existiu
nos exemplares encontrados na cidade, sendo essa uma das principais singularidades locais.

Por fim, segundo o Inventário de Proteção do Acervo Cultura de Teresina (IPAC) de 1998, o
estado de conservação do imóvel é classificado como bom com descaracterização reversível
– classificação esta que perdura até hoje.

Imóvel 658/650
Adjacente a propriedade supracitada, localiza-se o imóvel que pertencia a Domingos Fortes
Castelo Branco e foi adquirido em 1944 por Armênio Braz da Cruz, que residiu na mesma
moradia até o seu falecimento e era conhecido como um hábil alfaiate. A residência foi
construída inicialmente como uma única edificação e posteriormente bipartida. Atualmente,
as residências geminadas são habitadas por duas de suas filhas. No número 658, habita
Teresinha Reverdosa e no número 650, Conceição Nobrega.

Estes são os únicos imóveis que permaneceram com tipologia residencial e mantiveram bem
conservadas as suas características construtivas. Segundo o inventário do IPAC de 1998, as
casas possuem alvenaria em tijolo, revestido em pintura impermeável, cobertura em telha
cerâmica (telhado 1/2 cana artesanal), vedações em venezianas e vidro, vergas retas, beiral
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
externo em cimalha e bica, beiral interno em bica simples, ferragens em grades de ferro,
soleiras e pisos internos em cerâmica esmaltada. Destacando que, ocorreram apenas
algumas alterações, notadas externamente, visando segurança e conforto térmico.

Imóvel 646/642
A casa seguinte é a de número 646, de propriedade do casal Pedro Falcão Lopes e esposa
Zelina de Assunção Silva, pais do Desembargador aposentado Augusto Falcão Lopes. Os
cônjuges residiram o imóvel contemporaneamente ao senhor Armênio Braz de Cruz. A
residência sofreu o mesmo processo notado na limitante direita. Em janeiro de 1981, segundo
o IPAC, as casas já constituíam dois núcleos independentes.

Apresentava ainda em 1998, segundo o IPAC, uso residencial; porém, no presente, o número
646, funciona como o Escritório Ednan Soares Coutinho Advogados Associados, fundado em
2003; e o número 642 é um estabelecimento do ramo alimentício com denominação de Casa
Grill Self-Service.

Também obedecendo ao Código de 1939, esta edificação apresenta alvenaria em tijolo,


revestimento de reboco caiado, cobertura em telha cerâmica (telhado 1/2 cana artesanal),
vergas retas e vedações em venezianas e vidro.

Figura 02: Fachadas do Imóvel 646/642 em 1998 (1); Fachadas do Imóvel 646/642 em 2017 (2).
Autor: Wanderson Luis, 2017.

Segundo o IPAC, em 1998, o estado de conservação era classificado como bom com
pequenas alterações; no entanto, atualmente constata-se um quadro bem diferente do
apresentado, onde as duas atuais fachadas encontram-se totalmente descaracterizadas. Das
citadas no estudo, esta é a edificação que mais sofreu alterações em sua fachada e
volumetria, sendo perceptível a adição de mais um pavimento e uso de material
contemporâneo no escritório de advocacia contrastando com a edificação geminada, Casa
Grill – que, por sua vez, tenta recriar, de modo infeliz, elementos arquitetônicos de fachadas
ecléticas.

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Imóvel 632
Contiguamente, a casa 632, foi construída na década de 1930 e pertenceu à Odilon Nunes,
natural de Amarante, um notável historiador, membro da Academia Piauiense de Letras,
professor e diretor da Escola Normal Oficial do Estado e do Liceu Piauiense, este último
localizado próximo a residência. Homenageado, nomeia, entre outros, o Museu do Piauí –
Casa Odilon Nunes, localizado em frente à Praça da Bandeira. Em 1944, a residência foi
vendida à Wilson de Andrade Brandão, um estimado advogado, professor universitário,
escritor e político brasileiro, que exerceu o mandato de Deputado Estadual do Piauí por 6
mandatos, entre 1967 e 1991, e pai do também político Wilson Nunes Brandão.

Assim como a primeira casa citada, de Agenor Barbosa, a edificação caracteriza-se por seguir
os moldes do Estilo Missões, ressaltando a presença de: torreão de planta circular coberto
por telhado cônico, telhado movimentado coberto com telhas de capa canal, a quase
inexistência de beirais, alpendres com arcos plenos, revestimentos rústicos das fachadas com
reboco grosso em relevo.

Segundo Moreira (2016, p. 347), é possível ressaltar “que, nesse momento, popularizou-se
uma tendência já sinalizada no período anterior: a repetição de padrões, onde residências
com características extremamente semelhantes foram construídas em pontos distintos da
cidade.”, sendo possível deparar-se com diversos exemplares no centro histórico de Teresina.

O imóvel esteve por um período sendo alugado e posteriormente foi comprado pela
Associação do Pessoal da Caixa Econômica Federal - APCEF, em 1996, que precisou fazer
algumas reformas no telhado, piso e pintura, melhoramentos para promover a acessibilidade,
incluindo uma rampa de acesso na fachada principal e a criação de salas com o uso de
paredes de gesso, mantendo a edificação ainda muito bem conservada no modo como foi
construída.

Figura 03: Imóvel 632.


Autor: Wanderson Luis, 2017.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Imóvel 620
Por último, O edifício, de número 620, localizado na esquina da rua Barroso com a rua
Desembargador Freitas, atualmente ocupado pelo SEST/SENAT, é o único edifício de cunho
não residencial no recorte histórico deste artigo, sendo isso um dos seus diferenciais.

A construção, inicialmente, pertencia à família Campos, onde possuíam a Mercearia


Esperantina e a residência da família – de acordo com Reverdosa (2017). Posteriormente, o
edifício foi comprado e reformado, segundo o documento Habite-Se, pela construtora
Mafrense entre 1983 e 1986, adquirindo sua configuração e formato atual com 3 pavimentos.
A própria construtora Mafrense funcionou no local a partir de 1986, paralelamente ao aluguel
de salas para o funcionamento da extinta VARIG - Viação Aérea Rio-Grandense. Em 04 de
abril de 1996, o edifício foi comprado em sua totalidade pelo SEST/SENAT. Feitas as
alterações internas na construção, a instituição começou a funcionar em 18 de abril de 1997.

O edifício de 3 pavimentos se destaca em meio aos exemplos estudados neste artigo tanto
por seu uso já comercial quanto por suas características formais modernistas. Dentre alguns
elementos arquitetônicos modernos presentes no edifício, podemos citar: uso de formas
geométricas, ausência de ornamentação, panos de vidros contínuos nas fachadas e uso de
brise-soleils. Além disso, também utiliza materiais construtivos característicos do movimento
moderno como o concreto armado, o vidro e o ferro.

Perfis de uso
Resultando das informações colhidas, estudadas e analisadas neste escrito, os perfis de usos
elaborados dentro de um recorte temporal de 20 anos – de 1997 a 2017 – evidenciam não
somente a descaracterização física de algumas das edificações que ladeiam o quarteirão da
praça Landri Sales, na rua Barroso, como também argumentam a favor a conservação de
exemplares representativos de estilos arquitetônicos relevantes. Todavia, a custódia e
sobrevivência do patrimônio arquitetônico físico, de certo modo, não percorre o mesmo
caminho da atribuição do ofício dessas construções. No que se confrontam patrimônio
arquitetônico e usos, a tendência é uma separação imediata dos dois termos, porém, esses
perfis esboçam uma certa relação entre os dois; onde, ora o uso dita a manutenção da estética
do edifício, ora a relevância arquitetônica da obra dificulte certas funções. Choay (2001, p.
230) diz que a arquitetura é a única, entre as artes maiores, cujo uso faz parte de sua essência
e mantém uma relação complexa com suas finalidades estética e simbólica.

Dentro desse recorte temporal, é notória a alternância de uso das edificações – queira elas
tenham sido resguardadas fisicamente ou não. Ao passo que a paisagem urbana foi alterada
juntamente às necessidades de uma nova vida citadina, as moradias se fizeram menos
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presentes, desenrolando uma nova malha para a cidade e proporcionando o ingresso de
novas funções.

Ponderando sobre os dois cenários retratados, descobre-se um certo equilíbrio entre os novos
usos de serviço e institucional, além da perpétua coexistência com o comércio – contexto
comum à região. Ao mesmo tempo, as residências são esquecidas em detrimento da aparição
destas novas tipologias de uso. Tal qual observa-se na ilustração (Figura 04), apenas dois
quintos dos imóveis investigados foi capaz de perdurar seu uso residencial primitivo, enquanto
que os demais se transformaram no decorrer dos anos.

Figura 04: Usos em 1997 (1); Usos em 2017 (2). Autor: Carliene Lima, 2017.

Conclusão
Cada cidade traz parte de sua história contada pelas edificações que compõem seu cenário
urbano. Esse conjunto é a lembrança viva e palpável da cultura e dos costumes daqueles que
estruturaram a configuração dos espaços que conhecemos hoje, sendo inegável a
necessidade de proteger esse acervo. Segundo Lemos (1981, pg.19)

Devemos então, de qualquer maneira, garantir a compreensão de nossa


memória social, preservando o que for significativo dentro do nosso vasto
repertório de elementos componentes do Patrimônio Cultural.
Os centros urbanos têm, majoritariamente, um caráter histórico e de preservação, o que cria
um vínculo com os usuários do espaço e congrega muitos elementos que habitam a memória
afetiva da sua população. A cidade de Teresina não foge à regra.
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Os centros das cidades têm sido identificados como o lugar mais dinâmico da
vida urbana, animados pelo fluxo de pessoas, veículos e mercadorias
decorrentes da marcante presença de atividades terciárias, transformando-
se no referencial simbólico das cidades. Historicamente eleitos para a
localização de diversas instituições políticas e religiosas, os centros têm a sua
centralidade fortalecida pela somatória de todas essas atividades, e seu
significado, por vezes, extrapola o limite da cidade. (Vargas e Castilho. 2009,
p.1)

Só a partir da década de 1970, de acordo com Pedrazani (2009), foi institucionalizado o


patrimônio, a partir de ações regulamentadas, reconhecendo a necessidade de proteção dos
bens culturais. Na década seguinte, tais leis e instituições passam a ter algum grau de
relevância no Estado, sendo salvaguardado por leis e instituições especificas de proteção.
Essa missão será desempenhada por três entidades: a FUNDAC, criada em 1975, o IPHAN,
instituição federal implantada no estado do Piauí em 1984 e a Fundação Cultural Monsenhor
Chaves (FCMC), fundada em 1986.

Contudo, devido as diretivas sustentadoras das décadas anteriores no que tange à


arquitetura, nota-se um afastamento do ideário preservacionista.

O fato de, tanto o CEC quanto a FUNDAC e o seu Departamento de


Patrimônio, terem suas atividades iniciadas dentro de um processo
transitório, ao nível da política cultural nacional, os levará a difícil missão de
ter que voltar seus olhares não só para o “novo”, mas também para o
patrimônio tradicional, chamado de “pedra e cal”, pois pouco se havia feito
em favor deste. Isto justifica o Conselho ter apreciado muitos processos de
tombamento da década de 1980, principalmente de monumentos,
acautelados isoladamente, reforçando a tendência histórica advinda da
política de preservação nacional desde os anos de 1930 de se preservarem
o monumental e o excepcional em detrimento dos demais bens.
Observou-se então, no espaço que compreende o Centro de Teresina, por ser possuidor dos
edifícios mais antigos, a descaracterização, através de pequenas reformas, quando não da
destruição completa de construções antigas para a edificação de novas construções, que
antedessem as novas necessidades manifestadas naquela área, que vinha tendo uma
mudança de uso, saindo de um ambiente outrora residencial para se transformar no centro
comercial e de serviços que temos hoje. “A falta de uma cultura preservacionista de nossa
sociedade continua a ser um dos principais obstáculos a ser vencido”, diz o texto intitulado:
Clube dos Diários poderá ser desapropriado, publicado na Revista Impacto, de Teresina, em
setembro de 1991.

O recorte estudado, demonstra perfeitamente essa situação. A medida que o centro assume
as características atuais, as residências, uma a uma, assumem outro uso. Entretanto, no
desenrolar desse processo, observam-se dois comportamentos distintos no que se refere a
edificação pré-existente. A primeira situação aparece nos edifícios do SEST/SENAT, n. 620,
e nos Escritório de Advocacia, n. 646, e Casa Grill, n.642. Existe uma completa omissão com
a construção original. Isso se deve, normalmente, a necessidade de negar à arquitetura
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existente uma nova função. Demolição, alteração do gabarito e descaracterização das plantas
baixas e de fachadas de forma irreversível são algumas das alterações observadas nesses
lotes. Em contrapartida, outras construções, como a atual CMEI, n.664, e APCEF, n.632,
entendem que a ideia de mudança de uso não necessariamente precisa estar atrelada a
alterações significativas na estrutura e/ou estética original do edifício. Esse comportamento,
no que diz respeito as intervenções nos bens arquitetônicos, foi publicado em um documento
denominado Carta de Veneza, conhecido no II Congresso Internacional de Arquitetos e
Técnicos dos Monumentos Históricos em 1964.

Artigo 5º - A conservação dos monumentos é sempre favorecida por sua


destinação a uma função útil à sociedade; tal destinação é, portanto,
desejável, mas não pode nem deve alterar a disposição ou a decoração dos
edifícios. É somente dentro destes limites que se deve conceber e se podem
autorizar as modificações exigidas pela evolução dos usos e costumes.
(ICOMOS, 1964).
Assim, as duas instituições conseguiram, de maneira harmônica e não agressiva, incorporar
novas funções em construções já existentes sem a precisão de grandes transformações. Isso
demonstra a formação de uma consciência individual, proposital ou não, na relação
construção/memória, na medida em que os usuários entendem que a aplicação de uma nova
utilidade não está estritamente ligada a destruição do pré-existente. Nos últimos anos, o
interesse pelo patrimônio construído aumentou consideravelmente, por motivos como o
entendimento do seu valor histórico, especulação imobiliária e exploração turismóloga. Isso
mostra, que, é possível recuperar e inserir novos usos na medida em que exista uma
integração entre esses dois processos. É, somente, a partir disso que teremos uma
conservação completa do patrimônio edificado.

“É tempo de dar um basta neste processo criminoso de dilapidação de tudo


o que diz respeito à nossa história, ao nosso passado, às nossas tradições,
às nossas raízes, enfim, à nossa memória artística e histórica. ” (Jesualdo
Cavalcanti, Secretário da Cultura, Desporto e Turismo)

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Referências
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– PI. Teresina, Universidade Federal do Piauí, 2007.

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Acesso em: 30 jan. 2017.

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aspectos históricos e paisagísticos, 2005, 27p. Trabalho de conclusão de Curso
(Especialização em Paisagismo) – Instituto Camilo Filho, Teresina, 2005.

MOREIRA, Amanda Cavalcante. Teresina e as moradias da região central da cidade


(1852-1952). Dissertação (Mestrado). São Carlos, 2016.

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REVERDOSA, Teresinha. A vizinhança no século XX na praça do Liceu. Entrevista


concedida a Taianne Neco. Teresina, 5 jan. 2017.

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TOLLSTADIUS, Larissa Lira. Preservação do Centro de Teresina: A construção de um


objeto. Rio de Janeiro: Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 2013.
Dissertação apresentada ao curso de Mestrado Profissional do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional, Rio de Janeiro, 2013.

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A IMAGEM DO ESTADO MODERNO DE JUSCELINO KUBITSCHEK
POR MEIO DA ARQUITETURA DE OSCAR NIEMEYER

MORAIS, CAMILA S. (1)


1. Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
Mestrado em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável – MACPS
morais.camila@gmail.com

RESUMO
No Brasil, considera-se que o estilo moderno arquitetônico foi inaugurado em meados da década de
1930, com a construção do prédio do Ministério da Educação e Cultura, em equipe liderada por Lúcio
Costa e consultoria de Le Corbusier. Contudo, esse estilo arquitetônico ganha impulso e se consolida
no país sob a figura do político Juscelino Kubitschek e sua parceria com o arquiteto Oscar Niemeyer.
O modernismo pretendeu a construção de um mundo público e comum em relação ao seu passado
contíguo, constituindo novos procedimentos, práticas e referenciais teóricos. Relacionar bases
sociais, teoria, prática e materiais fornecidos pela revolução intelectual, científica e técnica foi o
manifesto da arquitetura moderna e é também aquilo que conecta a obra de Niemeyer não apenas a
outros lugares do início do século XX, como também a outros lugares da história.
Pensados dentro da trama do modernismo brasileiro, os edifícios projetados por Niemeyer,
especialmente dentre as décadas de 1940 e 1960, desde a Pampulha até Brasília, ambas
reconhecidamente patrimônio cultural, adquirem sentido a partir do diálogo que o arquiteto procura
estabelecer entre seus projetos e o processo histórico global e que ele traduz no interior de sua
disciplina e seu exercício profissional.
A síntese entre tecnologia e forma, característica das obras de Niemeyer, ganha expressão durante
os principais anos de política de Juscelino Kubitschek, a saber, como Prefeito da capital Belo
Horizonte (1940-1945), como governador de Minas Gerais (1951-1955) e como Presidente da
República (1956-1961); bem como Juscelino encontra a expressão de progresso e modernidade, para
o desenvolvimento dos lugares por onde passou como político, nas obras do arquiteto.
Por meio de uma arquitetura monumental, vinculada ao poder político, Juscelino diminuía o papel do
indivíduo enquanto participação política na cidade, reforçando que a modernização do país era o
principal e, para tal, o sujeito deveria fazer parte da massa, sem se sobrepor a esta. Criando um
cenário da espetacularização através de uma arquitetura imponente, Juscelino também conseguiu
tirar o foco dos problemas econômicos advindos do endividamento estatal bem como da disparidade
social que se configurava junto com o Estado Moderno. O país crescia economicamente a duras
penas, mas crescia, e junto a isso foi consolidando uma imagem da arquitetura do poder em suas
principais cidades.
Dessa forma, o Estado é o principal propulsor das principais propostas arquitetônicas renovadoras
desde a década de 1930, que modificam nossas imagens sobre o conjunto da produção da cidade e
da paisagem. Do mesmo modo que a arquitetura se consolida como uma importante peça no cenário
político, fazendo parte da compreensão dos processos de reestruturação nacional, especialmente nos
processos de modernização e produção.
Palavras-chave: Modernismo; Política; Arquitetura; Poder; Patrimônio Cultural.

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A imagem do Estado Moderno de Juscelino Kubitschek por meio da
arquitetura de Oscar Niemeyer
De modo geral, desde fins do século XIX, e mais efetivamente a partir do século XX, o
espaço urbano e a arquitetura passaram por constantes mudanças, especialmente em
função do advento do concreto armado e à utilização de novos materiais na construção civil,
devido ao avanço industrial em âmbito mundial. Assim, objetivando uma reestruturação
arquitetônica do espaço habitado, muito influenciada também pela nova era de
produtividade da modernidade, com características universalizantes, a arquitetura moderna
se manifesta enquanto surgimento de um viés para um novo mundo e para um novo
indivíduo.

No Brasil, considera-se que o estilo moderno arquitetônico foi inaugurado em meados da


década de 1930, com a construção do prédio do Ministério da Educação e Cultura, na
cidade do Rio de Janeiro, em equipe liderada por Lúcio Costa e consultoria de Le Corbusier.
Contudo, esse estilo arquitetônico ganha impulso e se consolida no país sob a figura do
político Juscelino Kubitschek e sua parceria com o arquiteto Oscar Niemeyer. Arquiteto este
que, ressalta-se, também foi membro da equipe que trabalhou com Lúcio Costa no projeto
do Ministério da Educação e Saúde, em 1936.

A síntese entre tecnologia e forma, característica das obras de Niemeyer, ganha expressão
durante os principais anos de política de Juscelino Kubitschek, a saber, como Prefeito da
capital Belo Horizonte (1940-1945), como governador de Minas Gerais (1951-1955) e como
Presidente da República (1956-1961); bem como Juscelino encontra a expressão de
progresso e modernidade, para o desenvolvimento dos lugares por onde passou como
político, nas obras do arquiteto.

O racionalismo arquitetônico apresentado por Niemeyer, na aliança entre arte e tecnologia,


não pretende notabilizar-se em seu caráter singular, mas na medida em que se insere
dentro de uma mesma estratégia projetual que a aproxima de uma pesquisa de amplitude
internacional. “Essa solidariedade internacional, própria de uma comunidade universal que
tem problemas comuns e procura soluções coletivas, é uma dos aspectos mais
propriamente políticos dessa arquitetura” que entrelaça Juscelino e Oscar (BRANDÃO,
2002, p. 70).

Destaca-se que, a internalização da política na narrativa construtiva é um dos objetivos de


todos os projetos de Oscar Niemeyer, o que contradiz pontuações críticas superficiais que
veem a sua arquitetura como isolada e mesmo contraposta à sua ideologia e ação política.

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Pensando em termos de processo, a arquitetura modernista desviou o seu
olhar das entidades ou ocorrências individuais e das causas singulares e
específicas para depositá-lo também sobre a história, o contexto e a ação
humana supra-individual. Só dentro desse panorama mais vasto as obras
adquirem seu significado. Por isso, o juízo a ser feito das obras de Niemeyer
e JK [Juscelino Kubitschek] deve levar em conta esse ambiente e processo
histórico global onde elas travam seu diálogo, não se confinando aos
contextos locais nos quais elas se inserem. Antes de cair num burocratismo
estético e na repetição de fórmulas, o modernismo apropriou-se das novas
bases técnicas e intelectuais, no sentido de alicerçar um universo material e
uma linguagem artística e construtiva capaz de atender ao ethos cívico, o que
pode ser verificado até em proposições arrojadas e visionárias, como as
contidas no construtivismo russo que a arquitetura contemporânea revisitou.
(BRANDÃO, 2002, p.73).

O modernismo pretendeu a construção de um mundo público e comum em relação ao seu


passado contíguo, constituindo novos procedimentos, práticas e referenciais teóricos, além
de se servir da “apresentação e promoção dos processos do presente para conceber as
imagens do futuro” (BRANDÃO, 2002, p. 76). Relacionar bases sociais, teoria, prática e
materiais fornecidos pela revolução intelectual, científica e técnica foi o manifesto da
arquitetura moderna e é também aquilo que conecta a obra de Niemeyer não apenas a
outros lugares do início do século XX, como também a outros lugares da história. Segundo
Rita Velloso, “a arquitetura é a evidência mais importante da mitologia latente de uma
sociedade, dizia Benjamin. É a imagem com a qual uma sociedade produtora de
mercadorias representa a si mesma, e acredita compreender-se” (VELLOSO, s/d, p. 03).

Pensados dentro da trama do modernismo brasileiro, os edifícios projetados por Niemeyer,


especialmente dentre as décadas de 1940 e 1960, adquirem sentido a partir do diálogo que
o arquiteto procura estabelecer entre seus projetos e o processo histórico global e que ele
traduz no interior de sua disciplina e seu exercício profissional.

Na ordem própria da arquitetura, Niemeyer clama por manter esse mundo


público comum em nosso horizonte, mesmo em ambientes e momentos mais
adversos, em que todo sentido se ausenta e o homem é comprimido na
massa. A arquitetura moderna passou, mas permanece o seu clamor:
identificar as tiranias de nosso tempo e projetar contra elas. (BRANDÃO,
2002, p.88).

Durante o período de 1940-1945, Juscelino Kubitschek assume a prefeitura da capital Belo


Horizonte, quando começam a surgir as primeiras edificações modernistas no centro urbano
da cidade, reflexo da verticalização do mesmo iniciada ainda na década de 1930 e que
possuíam a priori estilo art decó.

Na década de 1940, Juscelino evidencia seus anseios desenvolvimentistas e


modernizadores ao firmar parceria com o então jovem arquiteto, já com tendências
modernas, Oscar Niemeyer. O início dessa união, que acompanharia a sucessão da carreia
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política de Juscelino, objetivava a construção do complexo modernista da Lagoa da
Pampulha na tradicional capital mineira e estabelecia, também, o início de um “mecenato
estatal na arquitetura brasileira, que culminaria mais tarde com Brasília” (PEREIRA, 1997, p.
84). Para Danilo Macedo:

Juscelino incorporava (...) a tarefa de modernizar a cidade através de feitos


simbolicamente marcantes. Em Pampulha, nasce definitivamente para a
arquitetura um ritual tipicamente brasileiro de colaboração política,
econômica, intelectual e artística no qual um pequeno grupo de homens
poderosos uniram forças numa tentativa de mudar a história com um marco
de desenvolvimento arquitetônico executado em tempo recorde. Este ritual
brasileiro é parte fundamental da política de JK, conforme ele mesmo nos
conta de sua passagem pela prefeitura de Belo Horizonte: “Posso dizer, sem
vaidade, que criei mesmo um novo estilo de administração, tanto pela
audácia dos meus empreendimentos, como pela velocidade com que os levei
a bom termo.” De fato, este ritual marcaria todas as passagens de Juscelino
por cargos públicos executivos, sempre associado a Oscar: como prefeito,
com a Pampulha; como governador, com do Conjunto Governador
Kubitschek; e, claro, como presidente da republica, com Brasília. (MACEDO,
2008, p. 217-218).

Ainda na década de 1940, com as obras construídas da Pampulha – Cassino, Casa do


Baile, Iate Clube, Igreja de São Francisco de Assis e a residência de Juscelino Kubitschek –,
Oscar Niemeyer alcança visibilidade internacional, demonstrando com formas livres,
pautadas nas curvas, que pode ser considerada “a linguagem cosmopolita brasileira”
(CAVALCANTI, 2001, p. 385), as possibilidades do concreto armado, destoantes da
linguagem corrente da arquitetura racionalista de então, onde os traços retilíneos eram
predominantes.

A mentalidade moderna chegou à Capital Mineira no início dos anos 1940,


sob a égide de dois marcos fundamentais: a montagem da Cidade Industrial
em Contagem e a construção do complexo de lazer Pampulha, ambos
durante a administração municipal de Juscelino Kubitschek (1940-1945). O
projeto da Pampulha, concebido por Oscar Niemeyer e um grupo de artistas,
resultou numa obra de perfeita integração plástica, inaugurando uma nova
linguagem dentro da evolução urbana de Belo Horizonte. (CANDIDA, p. 14
apud Registro Histórico Documental do Banco Mineiro da Produção, 2000).

De acordo com Danilo Macedo (2008, p.239), o contato entre Juscelino e Niemeyer
frutificaria e se consolidaria com a repercussão nacional e internacional de Pampulha. De
fato, durante a passagem de Juscelino pelo Governo de Minas Gerais (1951-1955),
praticamente todas as obras realizadas por Oscar no Estado de Minas Gerais devem-se ao
contato com o estadista; quer seja pela contratação direta do estado para a realização de
obras publicas, quer seja através de relações com membros destacados da elite política e
econômica mineira.

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A primeira metade dos anos 1950 traria a Niemeyer mais que o dobro de
obras no estado de Minas Gerais. Temos, primeiramente, diversos projetos
encomendados pelo governo estadual:

 Em Diamantina: Hotel Tijuco (1951); Escola Júlia Kubitschek, (1951);


Praça de Esportes (1950); Faculdade de Odontologia;

 Em Juiz de Fora: a sede do Banco do Brasil;

 Em Belo Horizonte: Banco Mineiro da Produção (1953); Colégio


Estadual Central (1954); Biblioteca Publica Estadual (1955).

 Temos ainda três projetos encomendados pela iniciativa privada em


Belo Horizonte: Conjunto Governador Juscelino Kubitschek (1951);
Residência de Alberto Dalva Simão (1954); Edifício residencial na
Praça da Liberdade (1954), hoje chamado Edifício Niemeyer.
(MACEDO, 2008, p. 239-240).

Durante toda a década de 1950, momento de maturação do Movimento Moderno brasileiro


que se situa politicamente logo após o Estado Novo e antecede o Regime Militar, há uma
grande preocupação por parte dos arquitetos em explicar o conteúdo social da arquitetura
brasileira. Período esse que propicia, em Belo Horizonte, a maior realização de Oscar
Niemeyer com iniciativa público-privada, o Conjunto Governador Kubitschek (1951), e
também alavanca o ideário econômico que viabilizaria a construção de Brasília, poucos
anos mais tarde.

A construção do Conjunto Governador Kubitschek evidencia alguns conflitos de interesses


entre os três pilares envolvidos: “o arquiteto desejoso de levar a cabo as utopias de
renovação social a que o movimento moderno aspirava, o governador desejoso de uma obra
que simbolizasse sua passagem pela administração do Estado e o empreendedor desejoso
do maior retorno financeiro” (MACEDO, 2008, p. 246). O projeto tratava-se de um grandioso
empreendimento na área central de Belo Horizonte, no nó viário da praça Raul Soares, que
conforme Danilo Macedo:

O incorporador, Joaquim Rolla, (...) solicitara ao arquiteto [Oscar Niemeyer] a


solução de um programa ainda mais complexo: habitações coletivas, hotel,
instalações para departamentos públicos, uma estação rodoviária e um centro
comercial. Os apartamentos foram projetados de modo a oferecer, à escolha,
sete tipos diferentes. Somam-se ainda as dificuldades de implantação em
pleno centro urbano, amenizado que fosse pela praça [Raul Soares]
adjacente. Nesse sentido, o apoio governamental de Kubitschek era
fundamental, defendendo na Assembléia aprovação de uma lei específica
concedendo o direito a construção do conjunto. No projeto, o valor do terreno,
que pertencia ao Estado, seria pago em frações ideais de área construída,
destinadas a órgãos públicos. Essa proposta, diz, Juscelino em sua
mensagem à Assembléia, dispensaria a necessidade de concorrência
pública. O empreendimento, portanto, era um misto de iniciativa publica e
privada. (MACEDO, 2008, p. 245).

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O Conjunto Governador Kubitschek incorporava a utopia moderna de modificação do modo
de vida da sociedade, devidamente amenizada pela diversificação dos tipos de
apartamentos e incluindo espaços de lazer e comércio, que permitissem, de certa forma, a
autossuficiência dos apartamentos e seus moradores, usuários.

Em 1953, com a tríade: projeto de Oscar Niemeyer, construção de Joaquim Rolla e


financiamento de Juscelino Kubitschek, o projeto de 1951 tem sua construção iniciada. De
acordo com Carlos Teixeira:

A saga do Conjunto começa publicamente em fevereiro de 1952, quando o


jornal “Tribuna de Minas” publica na íntegra o discurso proferido pelo
governador Juscelino Kubitschek, por ocasião do primeiro aniversário de sua
administração. Kubitschek anunciava, entre outras obras, “a construção de
monumental realização arquitetônica” que, localizada na Praça Raul Soares,
“irá destacar Belo Horizonte na admiração de todos os brasileiros”. O
governador, tratado pela imprensa como o administrador que tinha projetado
mundialmente a capital de Minas com a construção da Pampulha, voltava a
atuar modificando a fisionomia provinciana da cidade. “O conjunto
caracterizará a silhueta da cidade e já se prediz que constituirá ele, nos
impressos e na tradição oral, a marca registrada de Belo Horizonte, ou seja, o
que é a Torre Eiffel para Paris ou o Rockefeller Center para Nova York”.
(TEIXEIRA, 1999, p. 212).

As torres do Conjunto foram praticamente construídas conforme o projeto original de


Niemeyer, tendo sido simplificada a configuração das plataformas do pilotis I, formando um
conjunto final com a torre mais alta com 36 andares e a mais baixa com 26 andares e quase
120 metros de extensão horizontal. Contudo, todo o resto previsto, como área de lazer,
hotel, espaços públicos, clube, cinema, teatro, terminal rodoviário etc não foram
concretizados, nem mesmo a utilização das torres correspondeu ao designado pelo
arquiteto, como a utilização coletiva de área de serviço e refrigeradores, cabendo aos
moradores a adequação dessas funções dentro dos próprios apartamentos. Ainda, para
Carlos Teixeira:

A “cidade dentro da cidade” marcava e ainda marca presença como objeto


estranho que se estabeleceu sem ser convidado e que propunha um
programa totalmente diverso de tudo já existente. Seus riscos eram
proporcionais às possibilidades imprevisíveis de desfecho da aventura, e
aqueles que moram em BH conhecem o final de ímã arquitetônico: um
edifício que representa toda a ingenuidade, o otimismo e o exagero de seu
tempo; uma minicidade que abriga espécies sociais variadíssimas – e que
definitivamente não coincidem com a classe-alvo do projeto, a classe média
então emergente. Hoje Niemeyer o despreza, Juscelino quis esquecê-lo, a
história da arquitetura brasileira tenta ignorá-lo, mas a presença incômoda
desse monstro jamais passará despercebida pela cidade. (TEIXEIRA, 1999,
p. 213).

O “fracasso” desse projeto evidencia uma arquitetura voltada para enaltecer uma forma de
poder associada ao Estado e até mesmo à própria arquitetura. A intenção de se criar uma
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imagem forte para a cidade, com intenção de também elevar uma imagem de progresso,
futuro e melhores condições, desconsiderou as características da sociedade aristocrata
mineira à época, ainda muito tradicional e que prezava, dentre outras coisas, pela
propriedade da terra, conforto e consumo e, assim, não se subjugaria a um projeto de
moradia como o Conjunto Governador Kubitschek.

De destaque na década de 1950, para consolidação da imagem de Belo Horizonte como


uma cidade moderna, há três grandes torres projetadas por Oscar Niemeyer, configurando
marcos monumentais na cidade e endossando que “o movimento moderno se firmara
provando sua habilidade em criar monumentos na construção de grandes obras”
(CAVALCANTI, 2002, p.94).

A primeira delas, de 1951, foi o Conjunto Governador Kubitschek, que segundo Danilo
Macedo, se tratava

(...) de um grande empreendimento no centro de Belo Horizonte defronte ao


nó viário da praça Raul Soares – uma das poucas do plano original da cidade.
O incorporador, Joaquim Rolla, solicitara ao arquiteto a solução de um
programa ainda mais complexo: habitações coletivas, hotel, instalações para
departamentos públicos, uma estação rodoviária e um centro comercial. Os
apartamentos foram projetados de modo a oferecer, à escolha, sete tipos
diferentes. Somam-se ainda as dificuldades de implantação em pleno centro
urbano, amenizado que fosse pela praça adjacente. Nesse sentido, o apoio
governamental de Kubitschek era fundamental, defendendo na Assembleia a
aprovação de uma lei específica concedendo o direito a construção do
conjunto. O empreendimento, portanto, era um misto de iniciativa publica e
privada (MACEDO, 2008, p.245).

Tendo sido as torres praticamente construídas conforme o planejamento inicial. É importante


ressaltar aqui que, nessa mesma época, em 1951, Niemeyer projeta o Edifício Copan, para
se localizar no centro urbano da capital São Paulo, encomendado para o IV Centenário da
cidade, que se configura como uma grande torre, que possui um grande centro comercial e
de lazer, como também possui residências. Durante os anos de 1950, 1960 e 1970, o Copan
representa a “São Paulo moderna”.

Em 1953, em Belo Horizonte, Niemeyer projeta outra importante torre no centro da cidade o,
então, edifício sede do Banco Mineiro da Produção. Conforme Danilo Macedo (2008, p.
247), este edifício está disposto no nó viário mais importante do centro de Belo Horizonte, a
praça Sete de Setembro.

A terceira torre de Oscar em Belo Horizonte, projetada em 1954, é o edifício de


apartamentos que acabou levando seu próprio nome – Edifício Niemeyer –, localizado na

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Praça da Liberdade, que durante anos representou o centro do poder da cidade,
concentrando o Palácio do Governador e as secretarias estaduais.

Figura 1: Conjunto Governador Figura 2: Antigo Banco Mineiro da


Figura 3: Edifício Niemeyer (1954).
Kubitschek (1951) Produção (1953)

Fonte: Site Arch Daily. Fonte: Acervo da autora. Fonte: Site Descubra Minas.

De fato, as três edificações mencionadas, apresentam o destacamento do edifício junto às


principais ruas que dão acesso a eles e se expressam na conformação predominantemente
vertical, para a perspectiva dos pedestres das vias adjacentes, guardando assim um
aspecto mais encorpado e horizontalizado para o observador situado no entorno dos
mesmos e denotando um estilo muito característico do arquiteto para o período em
específico, assinando o que se tornariam imagens fundamentais de referência na cidade.

Por fim, como último grande período da parceria Juscelino Kubitschek e Oscar Niemeyer
tem-se os anos de 1956 a 1961, quando Juscelino se torna Presidente da República e o
plano da construção de uma nova capital para o país é executado, sob os projetos
arquitetônicos de Niemeyer e projeto urbanístico do também modernista Lúcio Costa.
Ressalta-se ainda que,

ao decidir construir a nova sede no centro do Brasil, Juscelino Kubitschek


chamou Oscar Niemeyer para fazer os prédios e o projeto urbanístico.
Reeditava a bem sucedida parceria da Pampulha (...). Niemeyer preferiu,
entretanto, se encarregar somente da parte arquitetônica, sugerindo o
estabelecimento de um concurso para a escolha do plano urbanístico
(CAVALCANTI, 2002, p. 91-92).

Ainda, de acordo com Lauro Cavalcanti (2002, p. 94), “o jeito moderno brasileiro de fazer
monumentos conseguira conciliar economia e luxo, simplicidade e imponência”, nascendo
assim, sob o pretexto de desenvolvimento do interior do país e integração nacional, a nova
capital do Brasil: Brasília. Para o planejamento de Brasília houve um harmônico
entrosamento entre os desenhos de Lúcio Costa, os edifícios de Niemeyer, o paisagismo de
Burle-Marx e os artistas convidados para realizar as esculturas públicas.
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Ademais, Niemeyer teve em Brasília a oportunidade de consolidar, em larga escala, uma
linguagem pessoal que vinha se delineando em projetos isolados há quase duas décadas.
Nos palácios da nova capital e centro político nacional, o arquiteto atingiu uma composição
espetacular através de simplificação e ousadia nas formas exteriores, conseguindo, assim,
de forma simultânea, criar monumentos e símbolos nacionais. O projeto de Brasília era,
concomitantemente, arquitetônico e social e contribuiria para definitivamente eternizar os
nomes de Juscelino e Niemeyer nas páginas da história da política e da arquitetura, em
âmbito nacional e internacional.

Por meio dessa arquitetura monumental, vinculada ao poder político, Juscelino diminuía o
papel do indivíduo enquanto participação política na cidade, reforçando que a modernização
do país era o principal e, para tal, o sujeito deveria fazer parte da massa, sem se sobrepor a
esta. Criando um cenário da espetacularização através de uma arquitetura imponente,
Juscelino também conseguiu tirar o foco dos problemas econômicos advindos do
endividamento estatal bem como da disparidade social que se configurava junto com o
Estado Moderno. O país crescia economicamente a duras penas, mas crescia, e junto a isso
foi consolidando uma imagem da arquitetura do poder em suas principais cidades. De
acordo com Darcy Ribeiro (1985):

(...) isso porque Juscelino acatou as novas regras do jogo do mundo


capitalista, que eram as de abertura do país à internacionalização de sua
economia e ao endividamento. No plano interno ele acelera também,
temerariamente, o processo inflacionário. (RIBEIRO, 1985 apud PEREIRA,
1997, p. 88).

Dessa forma, o Estado é o principal propulsor das principais propostas arquitetônicas


renovadoras desde a década de 1930, que modificam nossas imagens sobre o conjunto da
produção da cidade e da paisagem. Do mesmo modo que a arquitetura se consolida como
uma importante peça no cenário político, fazendo parte da compreensão dos processos de
reestruturação nacional, especialmente nos processos de modernização e produção.

Referências

BRANDÃO, Carlos Antônio Leite. A política na arquitetura de Niemeyer. In: MIRANDA,


Wander Melo (Org.). Anos JK: margens da modernidade. São Paulo: Imprensa oficial do
Estado; Rio de Janeiro: Casa de Lucio Costa, 2002. p. 69-90

CAVALCANTI, Lauro. Quando o Brasil era moderno: guia de Arquitetura 1928-1960. Rio de
Janeiro: Aeroplano, 2001.

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___________. Brasília: a construção de um exemplo. In: MIRANDA, Wander Melo (Org.).
Anos JK: margens da modernidade. São Paulo: Imprensa oficial do Estado; Rio de Janeiro:
Casa de Lucio Costa, 2002. p. 91-106.

GORELIK, Adrián. Das vanguardas a Brasília: cultura urbana e arquitetura na América


Latina. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005.

MACEDO, Danilo Matoso. Da matéria à invenção: as obras de Oscar Niemeyer em Minas


Gerais – 1938-1955. Disponível em < http://www2.camara.leg.br/documentos-e-
pesquisa/edicoes/paginas-individuais-dos-livros/da-materia-a-invencao-as-obras-de-oscar-
niemeyer-em-minas-gerais-1939-1955>. Acessado em 03 de maio de 2016.

MIRANDA, Wander Melo (Org.). Anos JK: margens da modernidade. São Paulo: Imprensa
oficial do Estado; Rio de Janeiro: Casa de Lucio Costa, 2002.

PEREIRA, Miguel Alves. Arquitetura, texto e contexto: o discurso de Oscar Niemeyer.


Brasília: Editora UNB, 1997.

PUPPI, Lionello. A arquitetura de Oscar Niemeyer. Tradução de Mario Gazzaneo. Rio de


Janeiro: Revan, 1988.

REGISTRO HISTÓRICO DOCUMENTAL DO BANCO MINEIRO DA PRODUÇÃO. Prédio à


Rua Rio de Janeiro, nº 471, Centro, Belo Horizonte, Minas Gerais. Belo Horizonte: Banco do
Estado de Minas Gerais, 2000.

TEIXEIRA, Carlos M. Em obras: história do vazio em Belo Horizonte. São Paulo: Cosac &
Naify Edições, 1999.

VELLOSO, Rita de Cássia Lucena. Imagem dialética na cidade. s/d. Disponível em

<http://www.academia.edu/10895962/imagem_dial%C3%A9tica_na_cidade>. Acesso em
maio de 2015.

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A IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO DA ARQUITETURA
MODERNA INSTITUCIONAL DE TERESINA: O caso do Tribunal de
Justiça do Estado do Piauí.

ARRAIS, Emanuelle de Aragão. (1); MOREIRA, Amanda Cavalcante. (2);


ANDRADE, Ana Virgínia Alvarenga. (3)

1. CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINOVAFAPI. DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E


URBANISMO.
R. Morungaba, 2612. Lourival Parente. 64023-360. Teresina/PI
E-mail: emanuelle_aragão_arrais@hotmail.com

2. CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINOVAFAPI. DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E


URBANISMO.
Rua Vitorino Orthiges Fernandes, 6123 – Uruguai. 64073-505. Teresina/PI
E-mail amandacmoreira@hotmail.com

3. CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINOVAFAPI. DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E


URBANISMO.
Rua José Paulino, 1271. Bairro de Fátima. CEP: 64043-360. Teresina/PI
E-mail: anavirginia@uninovafapi.edu.br

RESUMO
O artigo trata do edifício-sede do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí (1972), situado na cidade de
Teresina-PI e projetado pelo arquiteto Acácio Gil Borsói durante o Governo de Alberto Tavares Silva
(1971-1975), período correspondente ao surgimento das primeiras obras arquitetônicas com estilo
brutalista na cidade de Teresina. Tem como principal objetivo como discutir a preservação desta
edificação, pela sua relevância histórica e arquitetônica para a cidade e fornecer o diagnóstico do
estado atual da obra estudada quanto à conservação e proteção do patrimônio, evidenciando a
fragilidade dos seus instrumentos de proteção atualmente. Justifica-se pela necessidade de estimular
a implementação de políticas mais incisivas de proteção deste importante exemplar e tem como
fontes o próprio objeto arquitetônico, tratado como documento pertinente para a elaboração da
pesquisa, publicações a respeito do tema e entrevistas com agentes que lidam com sua preservação
nas mais diversas esferas

Palavras-chave: Tribunal de Justiça do Estado do Piauí; Patrimônio Moderno; Acácio Gil Borsói;
Arquitetura Brutalista.

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Introdução
O presente trabalho, intitulado “A IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO DA ARQUITETURA
MODERNA INSTITUCIONAL DE TERESINA: O caso do Tribunal de Justiça do Estado do
Piauí”, trata do problema na questão da preservação do patrimônio moderno no cenário
atual do Tribunal de Justiça, localizado na capital do Estado do Piauí, na Praça
Desembargador Edgar Nogueira.

Possui como objeto de estudo o espaço delimitado pela Praça Desembargador Edgar
Nogueira, seu prédio principal e sua configuração no mesmo, desde o período de sua
construção até os dias atuais, que se consolidou como um dos ícones da arquitetura
moderna brutalista.

O objetivo geral desse estudo é investigar as transformações arquitetônicas inferidas no


Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, com recorte temporal entre a década de 70 até a
atualidade. Os objetivos específicos são identificar essas alterações morfológicas e analisá-
las, não apenas na perspectiva histórica, mas também, através de um olhar estilístico,
arquitetônico.

Justifica-se a pesquisa pela inquietação, enquanto cidadãs teresinenses, de compreender e


conhecer melhor as alterações de um cenário constantemente visto nos noticiários e
narrado por seus conterrâneos. Buscou-se, dessa forma, compreender as relações entre o
desenvolvimento formal, funcional, e simbólico do Tribunal de Justiça no período estudado,
na medida em que este integra a Paisagem Arquitetônica Moderna da cidade de Teresina e
possui um potencial econômico e político.

A pesquisa possibilita dar maior visibilidade ao Tribunal de Justiça do Estado do Piauí e as


edificações modernas do seu entorno, inserindo-as no cenário das discussões sobre as
relações entre poder, arquitetura, preservação do patrimônio e sociedade, numa perspectiva
histórica e arquitetônica.

Cenário político e social da época

O Estado do Piauí fica localizado na região nordeste do país, sendo sua atual capital
Teresina. Teve como primeira capital a cidade de Oeiras, até o ano de 1852 quando a sede
do estado foi transferida para Teresina, cidade que foi estrategicamente projetada para
abrigar a capital piauiense por causa de proximidade com os rios Parnaíba e Poty, o que
possibilitava boas condições de navegabilidade na época e por estar perto da cidade de

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Caxias no estado do Maranhão, cidade importante no desenvolvimento econômico do
período. (FAÇANHA, 1998).

A cidade de Teresina está localizada na mesorregião Centro-Norte Piauiense e está


conurbada com o município maranhense de Timon. A cidade possui clima tropical
semiúmido com estação de verão e inverno bastante marcantes pelo tempo quente e
chuvoso, respectivamente. E tem como base de economia a indústria têxtil, os serviços e a
construção civil. (IBGE, 2015).

No início da década de 70, o engenheiro Alberto Silva assume o governo do Piauí por meio
de eleições indiretas. Esse primeiro mandado é marcado por grandes obras como a reforma
do Hospital Getúlio Vargas, construção de estradas e da primeira etapa do estádio Albertão.
No entanto, apesar da gestão modernizadora de Silva, impulsionado pela a época do
milagre econômico brasileiro, a pobreza e a concentração de renda continuavam a aumentar
na capital piauiense. (REIS, 2013).

Na década de 1970, Teresina encontra-se entre as capitais brasileiras com elevadas taxas
de crescimento populacional, em um cenário urbano recheado de problemas, contradições e
desigualdades de ordem econômica e social. Pode-se listar entre as questões mais graves a
falta de moradia ou a moradia em condições inadequadas, casas construídas às margens
da estrada de ferro que cortava a cidade, às margens dos rios Poti e Parnaíba, no leito de
ruas.

Muitas são as razões que sustentam a saída dos trabalhadores rurais do campo para a
cidade. Eles sofrem muitas influências, o “atraso da agricultura tradicional” baseada na
agricultura familiar e de subsistência, em sua grande maioria não remunerada, sujeitas às
intempéries do clima, irregularidade na distribuição das chuvas, com períodos prolongados
de estiagens, aliados ainda à concentração de terras nas mãos de poucos, formando
imensos latifúndios, o que dificultava o acesso à terra aos pequenos produtores, obrigando-
os a trabalhar em sistemas agrícolas desfavoráveis para esses segmentos, comuns no
sertão do Nordeste, nos quais os trabalhadores rurais utilizam a terra de terceiros para o
cultivo e pagam com parte da produção, minguando ainda mais os escassos recursos do
homem do campo.

O Censo Demográfico de 1970 indica que a população urbana brasileira tinha ultrapassado
pela primeira vez a população rural. O processo de industrialização, o rápido processo de
urbanização em curso no país, somados ao formato da estrutura fundiária que imperava em
todo o território, fato que, no geral, provocava péssimas condições de vida do homem no
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campo, foram apontados como os principais responsáveis pelo deslocamento de milhares
de famílias para a zona urbana. O Piauí, acompanhando o que estava acontecendo em
outras partes do país, teve crescimento de sua população urbana, mas o fenômeno
concentrou-se nas principais cidades: Teresina, Parnaíba, Floriano e Picos, cidades que
concentravam 84,2% de toda a população urbana do estado. Acrescente-se que os dados
colhidos junto ao IBGE dão conta que o Piauí contava com apenas 32% da população
vivendo nas cidades. (IBGE, 2015)

Acácio Gil Borsói

Acácio entrou no curso de Arquitetura de Belas Artes da Universidade do Brasil por


conselho do pai, já que ele já possuía uma base artística e uma grande percepção espacial
e representativa.

Formou –se aos 25 anos em 1949, e junto com alguns colegas montou um escritório na
Avenida Rio Branco no Rio de Janeiro, iniciando a sua produção de edifícios com
características modernas, tendo como base os arquitetos Le Corbusier, Oscar Niemeyer e o
paisagista Roberto Burle Marx. Em 1951, com vontade de mudar Borsói vai à Recife para
ser professor na Escola de Belas Artes, o que mais tarde se transformaria em Ateliê de
Arquitetura, e que no futuro se tornaria a Faculdade de Arquitetura da UFPE, que está
bastante ligada a arquitetura regional, voltadas ao lugar onde está inserida.

Na década de 50, os trabalhos tinham base racionalista funcionalista do modernismo


brasileiro, as transformações e modificações propostas por Borsói se dá por meio de uma
continuidade espacial, forma pura, livre, com um controle de luminosidade natural, e
principalmente pela sua adequação ao clima do Nordeste.

Durante as décadas de 60 e 70, ocorre uma outra interpretação da tradição moderna


racionalista, mencionada por Marco Antônio Borsói em 1984. “O arquiteto define uma
arquitetura mais individual, com o domínio claro da estrutura, dos conceitos de construção e
composição. ”. E definindo a sua produção:

“Em minha produção sempre procurei pôr em prática, conceitos de arquitetura como
obra acabada- como condição para sua plena realização – diferentemente de um
‘projeto’, mas, assumindo o controle da construção, da tecnologia e da
responsabilidade na condução do processo criativo. ” (Borsói, 1984.)

Borsói se baseia em um trabalho que na maioria das vezes relaciona a pesquisa e a


construção. Por isso ele constrói uma identidade arquitetônica única, aliado aos princípios
modernistas.

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A linguagem arquitetônica brutalista no Brasil

O brutalismo brasileiro foi amplamente influenciado por Le Corbusier e inicia-se em meados


da década de 50 concomitantes com o concurso para a construção de Brasília embora
tenha maior destaque na década de 60 com a repercussão deste modelo para o resto da
nação brasileira. Por ser o centro financeiro e industrial do país, São Paulo foi o percursor
no desenvolvimento desta tendência no Brasil.

A linguagem brutalista difundida pela escola paulista, que tem como mestre o arquiteto
Vilanova Artigas talvez representasse uma referência na busca de uma continuidade por
uma assimilação entre a cultura paulista. Não negligenciamos esses fluxos, que se davam
entre arquitetos, governantes, e empresários do setor privado. A estética brutalista estava
associada não somente a principal capital economia do país, mas como uma tipologia das
grandes obras, fartamente encomendada por vários Estados, muitas já conhecidas por meio
do avanço das comunicações. Embora a técnica do concreto moldado in loco fosse nesse
momento uma ótima resolução para tipos de megaestruturas ou edifícios de grande porte,
havia uma imagem difundida pela nova arquitetura brasileira, que tinha fora do âmbito
erudito, sinuosidades representativas em cada camada social, ou popular.

A linguagem brutalista da escola carioca foi internacionalmente consagrada no pós-2ª


Guerra, graças à excelente qualidade de suas obras e à sua oportuna divulgação,
potencializada pelo vazio daquele momento de reconstrução. No início dos anos 1950
alguns de seus arquitetos já começam a propor obras que sinalizam novos rumos, podendo-
se considerar aquela década como um momento de transformação: seja nas propostas de
volumetrias mais simples e taxativas desenvolvidas pelo arquiteto Oscar Niemeyer (n.1907)
a partir do projeto do Parque do Ibirapuera (1951-53), seja principalmente no exemplo de
Affonso Eduardo Reidy (1909-1964) no uso precoce de grandes estruturas em concreto
aparente, como na Escola Brasil-Paraguai (Assunção, Paraguai, 1952) e no MAM-RJ (Rio
de Janeiro, 1953), obras de linguagem brutalista empregando pórticos transversais externos
em concreto aparente.

O conceito de arquitetura brutalista, vem sendo trabalhado por diversos autores, dentre eles
está Ruth Zein, que afirma:

"Termo de cunhagem relativamente recente, entretanto não é fácil definir-se o


brutalismo de maneira acurada e isenta. Tão usado quanto esnobado pela literatura
arquitetônica da segunda metade do século XX, está longe de configurar um
conceito unânime, as diferentes acepções que lhe são atribuídas superpondo-se de
maneira pouco clara, parecendo ser uma só quando são muitas, e para deslindá-las
é necessária certa paciência de detetive." (ZEIN, 2006)

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Sendo assim, alguns autores classificam o brutalismo em dois momentos: o primeiro
brutalismo e o novo brutalismo.

Como explica Zein (2006), o primeiro brutalismo foi utilizado pela primeira vez, em 1947, por
Le Corbusier, na obra da Unidade habitacional de Marselha na França, que adotou a
linguagem em demais produções até os anos 60, por meio de um conjunto característico de
pequenos e macro detalhes.

O novo brutalismo surgiu na Inglaterra, nos anos 50, com a produção da família Smithson
para um concurso de uma escola em Hunstanton-Norfolk, na qual foi empregada a solução
pela "honesta manifestação de estrutura de materiais" (FUÃO, 2000).

Fuão não concorda com a afirmativa de ter sido a obra da Escola em Hunstanton-Norfolk a
primeira a adotar o estilo brutalista, pois concorda com Reyner Banham, em: "O Brutalismo
em arquitetura, ética ou estética?", quando este autor cita que de fato, o primeiro edifício
que levou o título de Brutalismo, foi o Instituto de Illinois (1945-47) projetado pelo arquiteto
alemão Mies van der Rohe.

Através destas análises bibliográficas, se observou que se começaram a ser produzidas


obras inaugurais do estilo Brutalista pelo mundo, tendo o Brasil também acolhido o estilo,
guardando entre si importantes aproximações formais, construtivas e plásticas.

A adoção da linguagem arquitetônica brutalista na capital do


Estado do Piauí

No Piauí, as obras de caráter moderno aconteceram na década de 50 e 60 na cidade de


Teresina com produções edificadas ao longo da Avenida Frei Serafim, na época Avenida
Getúlio Vargas com exemplares de arquitetura moderna. Antes a este período a cidade era
provinciana e com poucas obras públicas dominado predominantemente pela a arquitetura
eclética.

No final da década de 1960, chegam à cidade arquitetos diplomados como Antônio Luiz
Dutra de Araújo, Miguel Dib Caddah e Raimundo Dias. Antônio Luiz destacou-se com a
elaboração de diversos exemplares modernistas como o Ministério da Fazenda, na Praça da
Bandeira; o edifício Palácio do Comércio, na rua Senador Teodoro Pacheco; a matriz do
Banco do Estado do Piauí; a sede municipal da Caixa Econômica Federal, na Rua Areolino
de Abreu; e a sede da CEPISA, na Avenida Maranhão esta última com caráter brutalista.
Além de várias residências e outros edifícios em Teresina, Parnaíba e cidades no

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Maranhão. O arquiteto Miguel Caddah sobressaiu-se na produção da arquitetura
educacional já que na ocasião trabalhava na Secretaria Estadual de Educação. Entre suas
obras estão também a Igreja da Santíssima Trindade localizada no Bairro Primavera (SILVA,
2006)

Na capital piauiense, as obras modernas brutalistas destacam-se a partir da década de 70,


com o governo de Alberto Silva. Nesta época, Teresina se rendia ao desenvolvimento e
começava o processo de instalação e organização da infraestrutura administrativa dos
governos locais. Entre os exemplos relevantes das obras brutalistas em Teresina pode se
citar: o Tribunal Judiciário e a Assembléia Legislativa projetadas por Acácio Gil Borsói na
década de 70 e 80 respectivamente; o Albertão e a CEPISA inaugurados em 1973, o Centro
Administrativo e o Terminal Rodoviário, de elaboração do arquiteto Raimundo Dias de 1976
e 1983 respectivamente. (SILVA, 2006).

Tribunal de Justiça do Estado do Piauí (1972)

O projeto está implantado na Praça Desembargador Edgar Nogueira, no bairro Cabral, zona
periférica ao centro de Teresina, sendo concebido como " um marco inscrito no tecido
geográfico, paisagístico e cultural da região", segundo colocou Marco Antônio Borsói
(BORSOI, 2006), que complementa: "Nele, os artifícios arquitetônicos do rigor geométrico
da composição, traçados reguladores, proporção, ritmo, escala e sentido monumental
reagem, dialeticamente, com a natureza livre e informal à sua volta." Além de ser um
exemplar ideal da arquitetura bioclimática, este edifício vem a ser uma das mais importantes
obras brutalista de Teresina, devido às suas soluções projetuais e construtivas.

A construção de todas as peças e a sua montagem foi criteriosamente desenhado e


estudado, baseava-se em materiais locais, de fácil obtenção, como o concreto, pedra, tijolo
e madeira. Toda a estrutura da edificação foi realizada in loco, como os pilares, vigas, lajes
e as grandes lâminas verticais, todos ressaltam as características das formas
confeccionadas no canteiro de obras. No caso especial dos brises, exibindo com clareza
sentido do corte e encaixes da madeira destas formas, trazem ao observador a sensação ou
ilusão de maior verticalização do prédio.

A utilização das técnicas bioclimáticas, utilizando-se de brises em volta de toda planta


básica, só foi possível pela criação da estrutura de concreto independente, tornando a
planta livre. As futuras e diversas modificações e adaptações já realizadas no prédio, foram
possíveis com grande facilidade por conta da liberdade estrutural.

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A necessidade de utilização de aparelhos de refrigeração, estes dispostos de maneira
inconstante interferindo visualmente as instalações do prédio, não tem relação com o projeto
de Borsói, mas, sim da urbanização realizada muito rapidamente e sem organização de
prédios residenciais e comerciais do entorno do prédio. Teresina já possui ventos
dominantes sudeste no período da manhã, de fraca intensidade, e estes foram
consequentemente barrados por prédios de grande gabarito e grande proximidade com o
Tribunal de Justiça.

A coberta do Tribunal de Justiça é delgada, e aparentemente solta, se colocando de


maneira delicada a edificação. A proporção, a escala que fascina Borsói, o ritmo, o traçado
regular, o rigor geométrico, e a utilização da luz e sombra tornam a composição completa,
justificando a palavras de Borsói (Borsói, 1984): ”Para Aristóteles, a beleza reside na ordem,
e Platão na relação dos números, em ambos, algo é belo quando tem o caráter e harmonia.
Para mim, só é arquitetura, quando sentimos emoção, e dá aquele friozinho na espinha. ”

Em 2001 foi construído um anexo ao edifício, que dialoga com o edifício principal, utilizando
o sistema de pré-fabricados, que foi construído em apenas cinco meses.

A questão do anexo (2016)

Na contrapartida das valorosas características desta edificação, o presidente do Tribunal de


Justiça do Estado do Piauí entre 2014-2016 Raimundo Eufrásio, tinha como proposta ao
encerrar a sua gestão a construção de um novo anexo, para resolver os problemas de
espaço para os gabinetes dos desembargadores e assessores (cada desembargador tem
cerca de dez assessores). Em janeiro de 2016, as obras começaram. Em abril de 2016, a
24ª e a 30ª Promotorias de Justiça de Teresina, ambas especializadas na defesa do meio
ambiente e do patrimônio histórico e cultural, ajuizaram ação civil pública com o objetivo de
impedir a descaracterização do Palácio da Justiça do Estado do Piauí, localizado no Centro
Cívico da capital. A atuação do Ministério Público tem o suporte do Conselho de Arquitetura
e Urbanismo do Piauí (CAU), que também subscreveu a ação. O prédio possui
inquestionável valor histórico e paisagístico, já tinham sido iniciadas obras para a construção
de um anexo que ocultaria quase que completamente a edificação original, além de impedir
a circulação de ar e a entrada de luz natural.

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e a Fundação Cultural


Monsenhor Chaves (FCMC) já realizaram a abertura do processo de tombamento do
Palácio, como patrimônio histórico e cultural do povo piauiense. De acordo com a lei, a
abertura do processo já inclui o imóvel no mesmo regime de preservação do bem tombado.
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Um dos efeitos da proteção é a proibição de se construir qualquer obra que impeça ou
reduza a visibilidade sem a prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional.

A problemática na preservação da arquitetura moderna piauiense

A ideia de reconhecer a arquitetura moderna como patrimônio ainda é atual, o que


definitivamente só se substanciou com o desempenho de organizações como o ICOMOS, a
partir de Paris, em 1985, e o próprio DOCOMOMO, criado no final dá década de 1980, tendo
sua primeira conferência em 1990, como corrobora Pádua (2013).

Nesse sentido, observa-se uma grande diversidade de ações nos edifícios modernistas pelo
potencial como patrimônio cultural. Entende-se as obras modernas como patrimônio cultual
tendo por base os escritos de fruição e apropriação da arquitetura como cultura material
descrito por Piñon:

[...]a noção de arquitetura como patrimônio arquitetônico tem uma dimensão pública
que é inerente à sua essência: a não ser que seja reduzido ao seu mero valor
econômico – em cujo caso seria suficiente para lhe conferir credibilidade – tanto no
seu aspecto afetivo e simbólico com no estritamente estético, o patrimônio requer
uma base social que o aprecie e lhe confira sentido histórico. (PIÑON, 2006)

De acordo com Argan (1991), não se deve haver na cidade uma diferenciação entre área
“histórica” e área “moderna”, para ele uma sociedade que não dá valor a sua história e tem
as obras de arte como peças do passado, fora de um momento contemporâneo, fazem com
que se conceba como obras de arte o que está nos museus, e assim se perca a noção de
fatos urbanos como fatos artísticos. Argan afirma que a cidade é obra humana, testemunho
de memórias, e, portanto, fato artístico. A distinção entre área “histórica” e área “moderna”
gera sentimento anti-histórico à zona nova da cidade e um caráter somente histórico à zona
antiga, assim, a cidade moderna cresce e a cidade histórica se estagna, refletindo na falta
de uso e de preservação discutida por Rossi.

Considerações Finais

Quanto ao prédio aqui apresentado, está vinculado espacial e visualmente com o seu
entorno e para onde há visão. O Tribunal, foi construído em 1972, e está implantado num
local com cotas mais altas e suas varandas dão uma visão da cidade de Teresina. A sua
topografia acidentada foi bem aproveitada, já que o edifício foi alocado aproveitando os
desníveis e se adequando aos mesmos, um dos motivos para que o primeiro pavimento seja
menor que os demais, enquanto isso o segundo pavimento tem ligação direta com a Praça
Des. Edgar Nogueira, pois estão na mesma cota.
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Borsói sempre sensível ao espaço, coloca o prédio aberto e ao mesmo tempo protegido, o
que convida ao público em geral para entrar e usufruir.

Nota-se que a obra de Borsói utiliza –se de peças que tem papel estrutural, com um número
de elementos conciso do jeito que ele planejava, sempre evitando os gastos supérfluos em
seus projetos.

Isto acontece, de modo muito objetivo, como na escolha de materiais como o concreto, a
madeira, o vidro, como na quantidade de peças para montagem, desenhadas e detalhadas
pelo arquiteto. A economia não tornou o prédio simples e sim um representante do
movimento brutalista no Estado do Piauí.

Apesar de terem utilizado materiais pesados, a estrutura traz uma busca pela leveza, afinal
Borsói sempre nos lembra que seus edifícios são feitos de materiais sólidos, apoiados e
fincado no solo.

Acácio tirou partido dos materiais eleitos para projetar soluções bioclimáticas para este
edifício, que é um outro ponto fundamental na arquitetura produzida no Piauí. O Estado tem
altas temperaturas e uma alta taxa de insolação, e requer soluções bioclimáticas para a sua
produção arquitetônica, e observou-se que neste exemplar, o edifício possui um bom
conforto térmico, não o mesmo que se tinha na época, mas ainda é satisfatório.

De acordo com Marco Antônio Borsói, as soluções arquitetônicas divergem do simples


produto arquitetônico, e busca uma simbologia com referências às necessidades funcionais,
chegando a se criar um monumento.

A necessidade de um inventário relativo à arquitetura teresinense mais abrangente ganha


fundamentação com o episódio do Tribunal de Justiça do Piauí que passou por um processo
de tentativa de construção de um anexo, cuja estrutura e paisagem iriam sofrer intensos
riscos de modificação. Como exposto no texto, na atualidade, o prédio do TJ apresenta
problemas de preservação, por não fazer parte do inventário de proteção patrimonial e/ou
necessitar de instrumentos de proteção mais incisivos, correndo o risco de ser
descaracterizado, como vimos anteriormente, demolido ou abandonado. É sabido que
associado a necessidade material de registro arquitetônico nas nossas cidades é necessário
uma base de ensino e cultura do patrimônio, o que se espera que se desperte o quanto
antes por este trabalho.

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A IMPORTÂNCIA DO PATRIMÔNIO CULTURAL PARA A CIDADE:
Identidade Social e Planos Urbanos

SCHIRRU, ANA CARLA C. (1)

1. Instituto Ensinar Brasil - Doctum. Curso de Arquitetura e Urbanismo


Estrada Dom Orione, s/n. Dom Bosco, Juiz de Fora - MG
ana.carla@doctum.edu.br

RESUMO
Entende-se por Patrimônio Cultural, o conjunto de bens materiais e imateriais que fazem parte da
cultura de determinado povo. A cultura por sua vez é construída através das gerações num processo
de transmissão de significados, conhecimentos, crenças e modo de viver. Ao tratarmos de patrimônio
cultural, destaca-se sua função e referências à identidade, a ação e a memória de diferentes grupos
sociais. Este, materializado na forma de construções, mantém vivo todo caráter intelectual e cultural
de civilizações anteriores pois, se torna testemunho vivo e tangível de períodos passados. Numa
sociedade extremamente dinâmica, em que determinados bens se tornam obsoletos num rápido
intervalo de tempo e, onde o conhecimento é globalizado, a preservação do patrimônio é a garantia
de que a história de determinada sociedade se preserve, valorize e seja divulgada para as gerações
futuras, através da atuação dos poderes governamentais e dos cidadãos. Segundo Argan (1995), os
monumentos desempenham um papel informativo em sistema de comunicação, com uma função
cultural e educativa, ou seja, didática pois, compartilham a história das cidades, porém em uma
perspectiva ideológica. Na contemporaneidade, o patrimônio cultural desempenha, além de sua
função didática, memorial e identitária, uma importante estratégia urbanística, onde o patrimônio
passa a inserir-se num contexto turístico e consequentemente, econômico. Um trabalho
multidisciplinar entre distintos profissionais, de diversos campos de conhecimento, pode garantir uma
melhor interpretação do comportamento das pessoas, entendendo melhor a formação da memória e
identidade, a configuração espacial da paisagem, a importância de sua manutenção, dentre outros
aspectos envolvidos com a cidade. Dessa forma, objetiva-se abordar a importância do patrimônio
dentro do meio no qual está inserido, especificamente na cidade de Juiz de Fora, MG. Pois, ao
tratarmos de patrimônio cultural, nos referimos ao conjunto de bens dos diferentes grupos sociais
dentro desse contexto comunitário, a cidade. Além disso, busca-se relacionar as atividades de
preservação ao planejamento estratégico do município. O método de pesquisa se aplica na revisão
bibliográfica, apoiada na leitura sobre memória e identidade social, no estudo das políticas de
preservação do patrimônio e, no estudo de caso da cidade de Juiz de Fora. Esta, que possui um
conjunto arquitetônico eclético e art déco importante no cenário local e regional, que apesar de
protegidos, ainda não possuem uma valorização cultural que atinja todos os aspectos da paisagem,
enquanto cidade e social, enquanto cidadania. Considera-se que na contemporaneidade, as políticas
e premissas patrimoniais encontram-se estabelecidas. Porém, há trabalho a executar, no que diz
respeito a conscientização e valorização social, esta, associada a educação patrimonial e as políticas
públicas. Assim, o trabalho deve ser na relação indivíduo e sociedade.
Palavras-chave: Memória; Preservação; Planos Urbanos.

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Introdução
A manutenção dos objetos portadores da memória é um direito de todos os cidadãos, nesse
entendimento que, a importância da preservação do patrimônio torna-se essencial. Esse
patrimônio cultural, material e imaterial, configura-se como testemunho da herança de
gerações passadas, dando origem e significado ao que se tem no presente, proporcionando
aos seus descendentes uma identidade.

O patrimônio cultural na paisagem, conta a história daquela comunidade, com os edifícios,


pela forma que eles foram construídos, pelas praças, onde eventos importantes ocorreram e
pelas igrejas, que mantinham um papel importante nos agrupamentos sociais. Para tanto, a
relevância da preservação desses bens, estes que documentam e transmitem às gerações
por vir, as referências de um tempo e de um espaço singular, que jamais serão revividos,
mas revisitados, quando lhes atribuímos determinados valores.

A preservação é dever do Estado e direito da comunidade, que deve ver registrada de forma
a manter viva a memória, como documento de fatos e valores culturais de seu povo. Em
Juiz de Fora, recorte desse estudo, mantém viva a memória de sua existência, através do
conjunto arquitetônico que, faz reluzir sua trajetória e história marcante. Musse (2007)
afirma: "[...] uma cidade que era próxima à antiga “Côrte”, no início do século XX, se
mostrava moderna, febril e “máscula.”

Documentando, guardando e relatando fatos que ajudaram formar a história de uma cidade,
cumpri-se com ato de cidadania. Segundo Maia (2003) através da educação patrimonial o
homem passa a integrar-se nesse entendimento, através de um processo em ele entende o
contexto em que está inserido, elevando sua auto-estima e à conseqüência valorização de
sua cultura.

Considerando a afirmativa de Huyssen (2000), " [...] quanto mais rápido somos empurrados
para o futuro global que não nos inspira confiança, mais forte é o nosso desejo de ir mais
devagar e mais voltamos para as memórias em busca de conforto". Esse encontro pode ser
assimilado com o pertencimento, em que proporciona a relação entre o indivíduo e o
espaço, criando uma essência na vida das pessoas e no espaço onde elas vivem,
consolidando a história deste grupo social através da memória social.

Dessa forma, objetiva-se abordar a importância do patrimônio dentro do meio no qual está
inserido, especificamente na cidade de Juiz de Fora, MG. Ao tratarmos de patrimônio
cultural, nos referimos ao conjunto de bens dos diferentes grupos sociais dentro desse
contexto comunitário, a cidade. Além disso, busca-se relacionar as atividades de
preservação ao planejamento estratégico do município. Este, que possui um conjunto

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arquitetônico eclético e art déco importante no cenário local e regional, que apesar de
protegidos, ainda não possuem uma valorização cultural que atinja todos os aspectos da
paisagem, enquanto cidade e social, enquanto cidadania.

O método de pesquisa se aplica na revisão bibliográfica, apoiada na leitura sobre


memória/identidade social e, no estudo das políticas de preservação do patrimônio,
inseridas e aplicadas na cidade de Juiz de Fora, MG. Para tanto, essa pesquisa se
caracteriza como uma análise embrionária, em que, baseada na revisão bibliográfica,
apenas explana e traduz o espaço de estudo (a paisagem de Juiz de Fora) e, discorre sobre
as políticas em desenvolvimento e aplicabilidade no município.

Dessa forma, essa pesquisa não pretende, ainda, expor proposições e possíveis resultados
para serem alcançados, no que se refere a legislação e aplicabilidade de ações de
interferência no patrimônio e no espaço urbano de Juiz de Fora.

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Juiz de Fora: construção da paisagem
A cidade de Juiz de Fora passou por três períodos históricos significativos para sua
formação. O primeiro, no início do século XVIII, quando denominada de "Caminho Novo",
configurava-se como território de passagem para exploração aurífera da colônia, marcando
o surgimento de seus primeiros povoados (LAGE; ESTEVES, 2008). O segundo, que vai do
início do século XIX até 1930, retrata o período de expansão cafeeira, destacando-se como
uma importante região de produção e, segundo Oliveira (1966), pela construção da Estrada
do Paraibuna, que deu início a formação do núcleo urbano. O terceiro, é o momento da
industrialização (final do século XIX), marcado pela construção da Estrada União Indústria,
idealizada pelo então comendador Mariano Procópio. "Construída dentro do que havia de
mais avançado em tecnologias de pavimentação em países como Estados Unidos, este
novo caminho facilitou sobremaneira a ligação do Rio de Janeiro com Minas Gerais
(OLIVEIRA, 1966)".

A Estrada de Ferro D. Pedro II, chegada em Juiz de Fora em 1870, seguiu como parâmetro
físico, a Estrada União Industria, pois foi implantada paralela a ela e, também, ao Rio
Paraibuna, determinando, o traçado da atual Avenida Francisco Bernardino (SAMPAIO,
2012). Nessa conformação, a Estrada do Paraibuna, atual Avenida Rio Branco, interliga-se
com o córrego Independência, atual Avenida Itamar Franco, e com a citada Avenida
Francisco Bernardino, formando um triângulo na morfologia da cidade. Inserida nesse
triângulo maior, a atual Avenida Getúlio Vargas (parte da Estrada União Indústria) conforma,
juntamente com a Avenida Rio Branco e Avenida Itamar Franco, um triângulo menor e
centralizado. Vide Figura 1, abaixo.

Figura 1: Recorte do Mapa de Juiz de Fora


Fonte: Sampaio, 2012. Modificado pelo autor desse artigo

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O triângulo maior, conforma a centralidade do município, onde está inserido um conjunto
arquitetônico relevante para a configuração da cidade, consolidado nas duas últimas
décadas do século XIX. Esse conjunto, em grande parte, são heranças da fase cafeeira e
industrial do município, configurando-se atualmente como patrimônio cultural e área de
interesse histórico para a cidade.

Nessa fase de êxito de Juiz de Fora, no final do século XIX, com destaque nacional na
industrialização, importantes edifícios foram consolidados no perímetro do triângulo, como é
o caso da sede do Banco de Crédito Real (1889), ilustrado na Figura 2 a seguir.

Figura 2: Banco do Crédito Real - Avenida Getúlio Vargas


Fonte: Sampaio, 2012.
São muitos os edifícios relevantes para a conformação urbana e histórica de Juiz de Fora, a
maioria com estilo eclético e art déco, valorizados na época, seguindo as influências
europeias. Pode-se citar, entre diversos exemplares, as instituições de ensino (Grupos
Centrais e Escola Normal), o Teatro Central, o Centro Cultural Bernando Mascarenhas e a
Estação Central, que servia à Estrada de Ferro D. Pedro II. Deste modo, no início do século
XX, o município possui uma imagem de um importante centro econômico, caracterizado
especialmente pela industrialização.

Portanto, Juiz de Fora, no final do século XIX e início do século XX, tinha em seus ideais de
paisagem e espaços públicos reflexos da estética e ideologia europeia, usando-se, de
acordo com Oliveira (1975), estratégias como “ajardinamento inglês” e “boulevard” em sua
morfologia, ou mesmo formalização de projetos elaborados por técnicos estrangeiros.

Segundo Oliveira (1966), considerando as devidas proporções, Juiz de Fora primava pelos
mesmos ideais e parâmetros de modernidade dos grandes centros, principalmente, os que
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buscavam uma paisagem de inspiração internacional. Para tanto, a aplicação desse ideário
do embelezamento, deu início em sua principal avenida (Figura 3 e 4), atual avenida Rio
Branco, principalmente por abrigar os edifícios importantes na época, como o prédio das
Repartições Municipais, a Igreja Matriz e os casarões da elite juiz-forana.

Figura 1: Avenida Rio Branco (Rua Direita) em 1872.


Fonte: ARQUIVO DE SÉRGIO BRASIL, Álbum da União e Indústria (CONCER).
Disponível em: <http://www.mariadoresguardo.com.br/2009_12_23_archive.html>. Acesso em: 30
abr. 2017.

Figura 2: Avenida Rio Branco (Rua Direita) em 1900.


Fonte: ARQUIVO DE RAMON BRANDÃO.
Disponível em: <http://www.mariadoresguardo.com.br/2009_12_23_archive.html>. Acesso em: 30
abr. 2017.
Assim, a partir do contexto histórico apresentado, através da trajetória do desenho da cidade
e da herança arquitetônica, faz-se um diagnóstico positivo, no que se refere a área central já
explanada pois, a cidade ainda possui condições de homogeneidade e integridade das
edificações, estas, atualmente protegidas como patrimônio histórico e artístico.

Partindo nessa análise, pode-se afirmar que a cidade de Juiz de Fora, possui um importante
conjunto arquitetônico de interesse histórico e cultural, que somam edifícios de estilo
eclético e art déco, remanescentes do século XIX e início do século XX, período de
crescimento e expansão da cidade. Dessa composição arquitetônica, de acordo com

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Prefeitura Municipal de Juiz de Fora (2017), estão protegidos por lei, através do
tombamento, 172 bens culturais.

Dessa forma, a cidade consegue, materializado na forma de construções, manter vivo todo
caráter intelectual e cultural de civilizações anteriores pois, se torna testemunho tangível de
períodos passados, além de simbolizar características dos costumes, pensamentos e o
próprio cotidiano dessas gerações.

A grande questão que se coloca, quando se preserva estes bens, é a viabilidade em tempos
atuais, de se manter um prédio em suas características originais, que remete à outra época,
outra realidade, dentro de um contexto urbano contemporâneo e tecnologicamente cada vez
mais avançado. Para tanto, o importante papel das autoridades políticas, no que se refere
ao planejamento e execução de projetos de Lei em benefício desses espaços.

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Memória Social, identidade e valorização patrimonial
Entende-se que a memória individual é a memória de um agente social, este, inserido em
uma sociedade onde são compartilhados, sentimentos, comportamentos, linguagens e
experiências, portanto, a memória é acima de tudo “memória social”. Entretanto, a memória
de um indivíduo depende do seu relacionamento familiar, da classe social em que está
inserido, escolaridade, ritos, profissão, ou seja, com os grupos de referências desse
indivíduo. Dessa forma, memória é social, porém não é geral.

O relato da memória, narrado por um individuo que viveu o episódio, vem carregado de
paixões individuais, emoções e entusiasmos que dão veracidade ao conteúdo,
diferentemente do relato histórico pois, este se apoia somente em documentos oficiais,
podendo deixar escapar muitos fatos importantes, desprezados pela racionalização das
ideias. Porém, não pode-se considerar que os relatos individuais substituam a teoria da
história, apenas os complementam, podendo classificá-los assim como “Histórias das
Mentalidades” e “História das Sensibilidades” (BOSI, 2004, p. 15).

Segundo Pacano (2005), a memória pode ser “voluntária” e “involuntária”, a primeira traz as
lembranças do passado para o presente, construindo a história do espaço, já a segunda,
memória involuntária, inconsciente, aquela que traz os costumes, sotaques, que variam de
lugar para lugar, na vivência das pessoas, estruturando-se da memória que passa de
geração para geração.

A memória vem da percepção, esta que pode ser entendida muito além de sua simples
interação do sistema nervoso com o ambiente pois, a percepção, vem carregada de
informações que estão nas lembranças dos indivíduos. É como se a memória fosse o lado
subjetivo do conhecimento do indivíduo sobre as coisas. Portanto,

Pela memória não só o passado vem à tona das águas presentes,


misturando com as percepções imediatas, como também empurra, “desloca”
estas últimas, ocupando o espaço todo da consciência. A memória aparece
como força subjetiva ao mesmo tempo profunda e ativa, latente e
penetrante, oculta e invasora (BOSI, 2004, p.36).

Depois de tantas classificações e identificações da memória com a experiência, com a


percepção e com a sociedade, podemos entender, acima de tudo, que a memória avança
sem cessar para o futuro, sendo a percepção, a interseção do corpo com o mundo e, a
memória, a conservação que o espírito faz de si mesmo, do espaço onde vive e da história
de seu grupo. Na história de vida, perder o tempo é perder a “identidade”, é perder-se a si
mesmo.

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No processo de construção da memória há uma ligação direta com o sentimento de
identidade. Assim sendo, pode-se definir que a memória cultural atua preservando a
herança simbólica institucionalizada, onde as pessoas recorrem para construir suas próprias
identidades e para se afirmarem como parte de um grupo. Dessa forma, o patrimônio
cultural de uma cidade, faz reluzir as vivências de um povo, contribuindo para preservação
de uma sociedade.

A tarefa principal a ser contemplada pelas políticas que tratam da preservação e produção
dos patrimônios coletivos é de possibilitar a recriação e re-significação da memória coletiva
no presente, reforçando o significado da participação da sociedade em ações que
fortaleçam a cidadania. Para tanto, reforça-se, que a educação patrimonial torna-se
primordial para o alcance desse objetivo.

Numa sociedade extremamente dinâmica, em que determinados bens se tornam obsoletos


num rápido intervalo de tempo e, onde o conhecimento é globalizado, a preservação do
patrimônio é a garantia de que a história de determinada sociedade se preserve, valorize e
seja divulgada para as gerações futuras, através da atuação dos poderes governamentais e
dos cidadãos.

A importância de um bem, não tem ligação direta com sua idade e sim, com a memória
coletiva do lugar. A partir do momento em que ele passa a existir, começa a configuração da
história daquela comunidade.

A herança do patrimônio cultural para a cidade/sociedade é destaca na carta de Veneza:

Portadoras de mensagem espiritual do passado, as obras monumentais de


cada povo perduram no presente como o testemunho vivo de suas tradições
seculares. A humanidade, cada vez mais consciente da unidade dos valores
humanos, as considera um patrimônio comum e, perante as gerações
futuras, se reconhece solidariamente responsável por preservá-las, impondo
a si mesma o dever de transmiti-las na plenitude de sua autenticidade
(CARTA DE VENEZA, 1964).

Choay (2006) destaca, que as primeiras noções de patrimônio histórico surgiram durante a
Revolução Francesa pois, ameaçados na época, surge a preocupação pela conservação
dos monumentos históricos nacionais, passando-se a pensar na conservação real desse
patrimônio, objeto e edifícios, que anteriormente dava lugar apenas a sua conservação em
meios iconográficos.

O período entre 1820 e 1964, o monumento histórico passa por sua fase de
consagração. A partir de então, o conceito de monumento histórico entra
numa escala mundial, acelerando o estabelecimento de leis que visassem à
proteção e a realização da restauração como uma disciplina integral. Assim,
constata-se que os procedimentos elaborados nos séculos XIX e XX,

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atualmente se transformaram em documentos e posturas legais de proteção
ao monumento histórico (CHOAY, 2006).

Um trabalho multidisciplinar, embasados por diferentes profissionais e em diversos campos


de conhecimento, garante uma melhor interpretação do comportamento das pessoas, no
que refere a formação da memória e identidade, na configuração espacial da cidade e na
importância de sua manutenção (CARVALHO, 2013).

Carvalho (2013) destaca, entre que "as edificações, o traçado da cidade, o desenho dos
passeios, as praças, o paisagismo, as manifestações culturais, os costumes, os saberes,
celebrações e práticas culturais [...]" formam-se referências simbólicas e afetivas para o
indivíduo em relação ao espaço vivido, construindo sua memória e identidade, tornando
coletiva ou pessoal. A autora, ainda afirma: "desse modo, a preservação das heranças
patrimoniais deixadas por nossos antepassados constitui a essência da memória de um
povo, é justamente esse legado que nos torna participantes da formação de nossa
identidade".

Preservar é uma atualização constante da memória e dos valores que definiram aquele
objeto ou expressão cultural como representativos e patrimônio da coletividade.

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Políticas de preservação e planejamentos urbanos em Juiz de Fora

Proteção de bens patrimoniais

A Lei n.º 10.777, de 15 de julho de 2004, com alterações pela Lei 11.000, de 06 de outubro
de 2005, dispõe sobre a proteção do Patrimônio Cultural do Município de Juiz de Fora e dá
outras providências.

No Capítulo I, do Patrimônio Cultural do Município de Juiz de Fora, o artigo 1º, engloba


como patrimônio a merecer proteção do Poder Público Municipal: as formas de expressão;
os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras,
objetos, documentos e edificações cuja conservação seja do interesse público, quer por sua
vinculação a fatos memoráveis da história do Município, do Estado ou do País, quer por seu
valor cultural, histórico, etnológico, paleontológico, bibliográfico, artístico, arquitetônico,
paisagístico e; os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, arquitetônico, paisagístico,
artístico, paleontológico, ecológico e cientifico.

No parágrafo único, do artigo 2º, destaca-se que estímulo à participação da comunidade na


preservação do Patrimônio Cultural, deve ser promovido pelo Município.

Ainda de acordo com Lei n.º 10.777 (2004), no município de Juiz de Fora, a política de
preservação do Patrimônio Cultural é estabelecida pelo COMPPAC (Conselho Municipal de
Preservação do Patrimônio Cultural), órgão vinculado à FUNALFA (Fundação Cultural
Alfredo Ferreira Lage), subordinada à Diretoria de Política Social.

Compete ao COMPPAC: definir as bases da política de preservação, proteção e valorização


dos bens culturais integrantes do Patrimônio Cultural do Município; opinar sobre o
tombamento de bens e proceder a estudos que conduzam à criação de instrumentos
destinados a defesa do Patrimônio; elaborar normas ordenadoras e disciplinadoras da
preservação e manutenção dos bens culturais; diligenciar no sentido de obter recursos para
a execução de programas de valorização e revitalização dos bens culturais; solicitar e
acompanhar os trabalhos realizados pelo corpo técnico da FUNALFA, visando a proteção,
preservação, vigilância, desenvolvimento de inventários, projetos, pareceres, atividades que
objetivem a educação patrimonial e eventos culturais relacionados com o Patrimônio
Cultural do Município; analisar e aprovar projetos de restauração e/ou reforma em bens
culturais integrantes do Patrimônio Cultural do Município, bem como emitir parecer sobre
demolições de imóveis.

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Plano Diretor

O Plano Estratégico de 2000, para cidade de Juiz de Fora, segundo Sampaio (2012), alterou
os paradigmas dos Planos Diretores, inspirado nas experiências de outras cidades,
principalmente do Rio de Janeiro. Em Minas Gerais, Juiz de Fora foi precursora, onde o foco
do plano está nas situações pontuais e específicas, de maneira a fortalecer o desempenho
da cidade como pólo regional da Zona da Mata. O autor destaca, as melhorias na
mobilidade urbana, revisão das legislações vigentes e a execução de projetos âncora, como
fundamentais para o alcance do objetivo do plano. Ainda relata, "entretanto, em linhas
gerais, estes projetos repetem as propostas dos planos diretores, porém descolados da
visão de estruturação global do espaço urbano da cidade".

O Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano, o PDDU 2000, em suas diretrizes do capítulo


I, dos princípios, objetivos e estratégias, já indicava no Artigo 3º: "objetivo do PDDU é
orientar o pleno desenvolvimento da função social da cidade, buscando atender o direito de
acesso do cidadão a moradia, ao transporte, aos serviços e equipamentos urbanos e à
preservação, proteção e recuperação dos patrimônios ambiental, arquitetônico e cultural.

No Artigo 4º, para cumprir o objetivo do PDDU 2000, são estabelecidas estratégias e
táticas. No que se refere ao patrimônio, a Lei propõe: "a promoção e o incentivo ao turismo
como fator de desenvolvimento econômico e social, valorizando os patrimônios cultural e
natural do município, de forma a reforçar o sentimento de cidadania".

A preservação, proteção e recuperação do patrimônio, no PDDU 2000, ainda aparece nas


estratégias da Lei de maneira incipiente, considerando o patrimônio em meio aos outros
objetivos, sem suas devidas especificações singulares. O que se destaca, é a tentativa em
associar o patrimônio cultural ao desenvolvimento turístico do município.

O que se nota, na proposta preliminar para revisão do Plano Diretor Participativo de Juiz de
Fora (2015), é uma especificidade detalhada e embasada, quando se trata o patrimônio
pois, o documento já faz alusão à memória, pertencimento, polifuncionalidade, entre outros
temas relacionados a preservação do patrimônio cultural.

Para tanto, na proposta preliminar para revisão do Plano Diretor Participativo de Juiz de
Fora (2015), no Art. 9º do Título I (dos princípios fundamentais, diretrizes e objetivos) são
objetivos da Política de Desenvolvimento Urbano e Territorial e do Plano Diretor: proteger
patrimônio histórico, cultural e religioso, valorizar a memória, o sentimento de pertencimento
dos cidadãos com relação à cidade e a diversidade; recuperar, reabilitar e requalificar a área
central da cidade de modo a preservar e potencializar sua função residencial e sua

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atratividade comercial, de prestação de serviços e de manifestações populares em seus
espaços públicos.

As Diretrizes Setoriais

As Diretrizes Setoriais de Desenvolvimento, documentadas no PDDU 2000, faz referência


ao desenvolvimento, proteção e recuperação dos patrimônios ambiental, paisagístico e
cultural da cidade. Possui como diretrizes, relativas ao patrimônio cultural e paisagístico: a
revisão da legislação vigente até aquele período, relativa à proteção do patrimônio histórico
e cultural com a criação do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural, atual COMPPAC;
formular e executar projetos que visem preservar, revitalizar e ou reabilitar as áreas de
interesse arquitetônico, urbanístico e/ou paisagístico;formular, executar e incentivar projetos
e atividades que visem a recuperação e a preservação dos bens móveis e
integrados;estimular projetos e atividades que visem resgate e a perpetuação da cultura
regional, através da preservação dos bens imateriais; estimular o uso das áreas e prédios a
serem preservados para a instalação de espaços públicos destinados a atividades culturais
e artísticas; apoiar também a instalação de atividades comerciais e/ou de serviços, que
possibilitem a conservação e a preservação do bem tombado;estabelecer critérios de
flexibilização de usos para os bens tombados; promover a desobstrução visual da paisagem,
dos bens e dos conjuntos de elementos de interesse histórico e arquitetônico; promover a
conscientização da população quanto aos valores do patrimônio cultural do Município,
através de programas educacionais e de divulgação nas escolas e nos meios de
comunicação; promover e apoiar as iniciativas que visem suprir o mercado de trabalho dos
recursos humanos necessários à preservação e a difusão do patrimônio cultural; lutar pela
preservação, recuperação e revitalização dos patrimônios culturais e paisagísticos,
utilizando os instrumentos jurídicos e administrativos existentes, além dos recursos
tradicionalmente usados, inclusive o tombamento do bem e seu entorno; promover ação
conjunta com a Universidade Federal de Juiz de Fora, bem como com as outras instituições
de ensino público ou privado, com o objetivo de identificar e cadastrar os arquivos e acervos
- públicos e privados, considerando sua importância para a pesquisa histórica da cidade e
região.

Já na proposta preliminar para revisão do Plano Diretor Participativo de Juiz de Fora (2015),
o documento faz menção à compatibilização das políticas de desenvolvimento urbano e
territorial com as políticas de preservação, portanto, prevê diversas interfaces importantes,
que seguem resumidamente explanadas: buscar as condições para a configuração da
identidade cultural do Município, pensando na tradição e continuidade criativa; articular os
sistemas de gestão cultural e ordenação territorial, objetivando a valorização patrimonial e

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visando a proteção desde os edifícios aos espaços e estruturas que dão suporte ao
patrimônio imaterial; estimular os usos e atividades nos bens patrimoniais (já referenciado
no PDDU 2000), compatíveis com sua preservação; desenvolver estudos para a proteção;
reconhecer o valor do patrimônio cultural das localidades rurais; implementar uma gestão
compartilhada de preservação e valorização patrimonial, entre diversas instituições e os
diversos entes dos três esferas poder público e da sociedade civil; fomentar a participação
social; desenvolver programas de educação patrimonial (esboçado, de maneira incipiente no
PDDU 2000); inventariar os bens de todas as categorias que compõe os bens patrimoniais
do município e; desenvolver os Planos de Preservação das ADEs Cultura (Áreas de
Diretrizes Especiais da Cultura).

Legislação vigente

As legislações vigentes que interferem nas características arquitetônicas e/ou urbanísticas,


de uso e ocupação do solo, as Leis 6909 e 6910, respectivamente, ambas promulgadas em
31 de maio de 1986, possuem antagonismos com as tipologias do conjunto de edificações
tombadas da cidade. Entretanto, estas acompanham uma tendência possivelmente mundial.

Sampaio (2012) explica, que isso se deve ao fato destes prédios terem sido construídos
com programas arquitetônicos da época, em que os hábitos, costumes e, até mesmo, as
formas de se projetar e construir eram diferentes dos padrões atuais, para a mesma
tipologia. O autor ainda destaca, "[...] as maiores dificuldades de se aplicar a legislação
vigente em obras de conservação se correlacionam com os parâmetros de iluminação,
ventilação, áreas mínimas de compartimentos, previsões de escada, garagens, itens de
segurança contra incêndio e pânico, entre outros".

A cidade de Juiz de Fora, conforme pode ser analisado na descrição de suas leis e planos
de desenvolvimento urbano, nos parágrafos acima, possui sua política patrimonial e os
planos urbanos de acordo com a contemporaneidade. A cidade, soube desenvolver as
premissas e leis, entretanto, na aplicabilidade, muito trabalho ainda deve ser executado.
Esse trabalho, pode ser no incentivo a participação social nos projetos e decisões, ao
incentivo fiscal e busca por investimentos, além da iniciativa na valorização das áreas de
interesse cultural, refletindo o que a Lei define, como o apoio nas atividades nos bens
patrimoniais, considerando o lazer e o turismo, por exemplo.

Nas Recomendações de Nairóbi (1976), o documento já destaca:

Considerando que os conjuntos históricos ou tradicionais constituem


através das idades os testemunhos mais tangíveis da riqueza e da
diversidade das criações culturais, religiosa e sociais da humanidade

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e que sua salvaguarda e integração na vida contemporânea são
elementos fundamentais na planificação das áreas urbanas e do
planejamento físico-territorial.

Conservação de áreas urbanas

A conservação de áreas urbanas integra-se cada vez mais às políticas


urbanas das cidades. Desde as precursoras investigações de Gustavo
Giovannoni na década de 1910, passando pelas criações das legislações de
proteção dos anos 60 na Europa e Estados Unidos, até as experiências
práticas e as discussões interdisciplinares no meio acadêmico, muito se
avançou na consolidação de princípios, critérios e normas que formam as
tramas conceituais e metodológicas a serem utilizadas em locais que ainda
não contam com instrumentos de proteção e de conservação desta
natureza (SAMPAIO, 2012).

As cartas patrimoniais configuraram-se como a principal fonte de referência para a teoria de


conservação de áreas urbanas, baseando-se nas fundamentações e articulações. As
definições e proposições das cartas patrimoniais, possuem abrangência internacional e
relevância institucional, pois são documentos publicados pelo ICOMOS e UNESCO, como
por exemplo: as Recomendações de Nairóbi (UNESCO, 1976), Cartas de Washington
(ICOMOS, 1987) e de Petrópolis (ICOMOS Brasil, 1987).

A discussão acerca das áreas urbanas, discorrida nas Recomendação de Nairóbi, afirma a
necessária harmonia entre passado e presente, através de projetos de intervenções, de
maneira a constituir-se de ações integradas entre poder público, iniciativa privada e a
população (CARVALHO, 2013).

Choay (2000) ressalta, ainda explanando sobre as Recomendação de Nairóbi, a


argumentação relativa a não exposição museal da área de preservação inserida nas malhas
urbanas contemporâneas.

No Brasil, ainda são incomuns as pesquisas de conservação de áreas urbanas, ou seja,


pouco representativas. Contudo, a Cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, através do
Projeto Corredor Cultural, 1979, passou por relevantes experiências na proteção e na
conservação de áreas urbanas, tornando-se modelo nacional, para políticas de valorização
do patrimônio cultural, inseridas nas diretrizes do plano diretor da cidade. Sampaio (2012)
afirma que parte do sucesso do projeto, deve-se à participação financeira dos proprietários,
locatários e concessionários, que disponibilizaram recursos para obras de conservação das
edificações protegidas.

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O objetivo das políticas de conservação e preservação nas áreas urbanas é caracterizar a
polifuncionalidade, como por exemplo, valorizar a inserção residencial nesses núcleos. No
entanto, o que se percebe na aplicação são os critérios de proteção fachadista e
coberturista (SAMPAIO, 2012). Isso pode ser explicado, pelas políticas aplicadas, em que as
prefeituras muitas vezes divulgam financiamento de obras de restauração, mas que de fato,
o único apoio é a isenção do IPTU para os usuários.

Em Juiz de Fora, seu núcleo central possui um conjunto arquitetônico relativamente íntegro
e, segundo Sampaio (2012), "portador de valores artísticos, históricos e afetivos notáveis
que requerem instrumentos de proteção, estratégias de conservação e de desenvolvimento
urbano apropriadas [...]" Para o autor, digno de um projeto de Conservação de Áreas
Urbana, guardadas as devidas proporções, aos moldes do projeto aplicado na cidade do Rio
de Janeiro.

Em Juiz de Fora, o tombamento ainda é pontual, restringindo-se ao edifício. No que se


refere ao projeto de conservação de áreas urbanas, temas como polifuncionalidade,
revitalização física, social, econômica, entre outras, precisariam ter aplicabilidade.

Em sua configuração espacial e social, o centro da cidade de Juiz de Fora, apesar de


manter ainda um caráter residencial, mesmo que em declínio, é formada principalmente por
comércio, que se divide visualmente e fisicamente, em parte baixa e alta, pela linha divisória
da Avenida Getúlio Vargas. Na parte baixa, formou-se o principal centro comercial popular
da cidade.

O conjunto arquitetônico da área central de Juiz de Fora, consolidado no final do século XIX,
possui diversidade de estilos arquitetônicos, compondo a paisagem urbana da área. As
edificações presentes nesse contexto, expressam e representam a identidade e memória da
cidade, passando pelos momentos ímpares da história de Juiz de Fora. Entretanto, o valor
de conjunto é dado, principalmente, pelas edificações modestas, conforme classificação da
Carta de Veneza (1964).

Assim sendo, pode-se considerar que a metodologia de aplicação para a valorização de


áreas urbanas, segundo Sampaio (2012), especialmente na área central da cidade, "[...]
consolidaria a política de conservação do patrimônio cultural local e criaria um selo, um
símbolo da história e da memória local no molde do que foi e ainda é a marca Corredor
Cultural para o Rio".

Contudo, o grande desafio para Juiz de Fora, seria vencer a falta de instrumentação e
planejamento, no que se refere a proteção de áreas urbanas, no campo do saber da
conservação e da literatura especializada no tema.

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Considerações Finais
A conservação patrimonial é necessária para mantermos vivos os elementos de
determinado momento no fluxo da história. Mas as cidades não devem ser pensadas
imutáveis, em prol da conservação e sim manter sua dinâmica. Ao longo dos anos, a
arquitetura teve suas variações, do romano ao gótico ou do neoclássico ao moderno, por
exemplo, seguindo o rumo da história e de seu tempo. Dessa forma conclui-se que a cidade
deriva da diversidade estilística de suas arquiteturas.

Pode-se concluir, utilizando-se de trecho das Recomendações de Nairóbi (1976), onde o


texto afirma que, o patrimônio, testemunho vivo de épocas passadas, adquire uma
importância vital, tanto para o indivíduo, quanto para os locais que neles expressam sua
cultura e sua identidade, visto a despersonalização e uniformização das expressões da
contemporaneidade.

Entende-se que, a obtenção de recursos e a valorização da memória coletiva, podem refletir


na história em busca de um futuro de melhor qualidade urbana, fazendo do Patrimônio
Histórico um elemento de inclusão social em face dos desafios de uma contemporaneidade
líquida.

Segundo Argan (1995), os monumentos desempenham um papel informativo em sistema de


comunicação, com uma função cultural e educativa, ou seja, didática pois, compartilham a
história das cidades, porém em uma perspectiva ideológica.

Portanto, após o estudo no município de Juiz de Fora, conclui-se que as políticas e


premissas patrimoniais já se encontram estabelecidas. Porém, há trabalho a executar, no
que diz respeito a conscientização e valorização social, esta, associada a educação
patrimonial e as políticas públicas. Assim, o trabalho deve ser na relação indivíduo e
sociedade.

Referências

ARGAN, Giulio Carlo. História da arte como história da cidade. São Paulo: Martins
Fontes,1995.

BOSI, Ecléa. O tempo vivo da memória: ensaios de psicologia social. 2. ed. São Paulo:
Ateliê Editorial, 2003.

CARVALHO, Ana Carla de. Convergências Contemporâneas nas Cidades Tombadas: A


Ascensão Turística e o Tráfego na Cidade de Tiradentes-Mg. Dissertação de Mestrado. Belo
Juiz de Fora: Universidade Federal de Juiz de Fora, 2013.

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CHOAY, Françoise. A Alegoria do Patrimônio. Tradução Luciano Vieira Machado. 3. ed.
São Paulo, SP: Estação Liberdade; UNESP, 2006.

HUYSSEN, Andréas. Seduzidos pela memória: arquitetura, monumentos, mídia. Rio de


Janeiro: Aeroplano, 2000.

ICOMOS. Cartas Patrimoniais. Disponível em: <http://www.icomos.org.br/ >. Acesso em:


03 jun. 2017.

IPHAN. Carta de Veneza. II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos de


Monumentos Históricos, 1964. Disponível em:
<http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=236>. Acesso em: 28 mai. 2017.

IPHAN. Recomendação de Nairóbi.19ª Sessão da UNESCO, 1976. Disponível em:


<http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=249>. Acesso em: 02 jun. 2017.

JUIZ DE FORA. Lei nº 10777, de 15 de julho de 2004. Dispõe sobre a proteção do


Patrimônio Cultural do Município de Juiz de Fora e dá outras providências. Juiz de Fora,
MG: Prefeitura Municipal 2004.

JUIZ DE FORA. LEI Nº 11.000, de 06 de outubro de 2005. Altera o art. 50 da Lei nº 10.777,
de 15 de julho de 2004, que “Dispõe sobre a proteção do patrimônio cultural do Município de
Juiz de Fora e dá outras providências”. Juiz de Fora, MG: Prefeitura Municipal 2005.

JUIZ DE FORA. LEI N.º 9811, de 27 de junho de 2000. Institui o Plano Diretor de
Desenvolvimento Urbano de Juiz de Fora. Juiz de Fora, MG: Prefeitura Municipal 2000.

JUIZ DE FORA. Proposta Preliminar para o Plano Diretor Participativo. Dispõe sobre a
Política de Desenvolvimento Urbano e Territorial, o Sistema Municipal de Planejamento do
Território e a revisão do Plano Diretor Participativo de Juiz de Fora conforme o disposto na
Constituição Federal e no Estatuto da Cidade, e dá outras providências. Juiz de Fora, MG:
Prefeitura Municipal 2015.

LAGE, O. V. B. & ESTEVES, A. (orgs.). Álbum do município de Juiz de Fora. 3. ed. Juiz
de Fora: Funalfa Edições, 2008 [1915].

MAIA, Felícia Assmar. Direito à memória: o patrimônio histórico, artístico e cultural e o


poder econômico. Belém: Movendo Idéias, v8, n.13, jun 2003.

MUSSE, Christina Ferraz. A imprensa e a memória do lugar: Juiz de Fora (1870/1940).


In.: XII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação da Região Sudeste. Juiz de Fora,
2007.

OLIVEIRA, P. de. História de Juiz de Fora. Juiz de Fora, 1966.

_____. Efemérides Juizforanas. Juiz de Fora: Universidade Federal de Juiz de Fora, 1975.

PACANO, Fábio Augusto. History, Memory and Identify. Dialogus, Ribeirão Preto, v.1, n.1,
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PREFEITURA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA. Conselho Municipal de Patrimônio. Juiz


de Fora, 2017. Disponível em: <https://www.pjf.mg.gov.br/conselhos/patrimonio_cultural/>.
Acesso em: 01 jun. 2017.
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PREFEITURA MUNICIPAL DE JUIZ DE FORA. Fundação Cultural Alfredo Ferreira Lage -
FUNALFA. Juiz de Fora, 2017. Disponível em:
<https://www.pjf.mg.gov.br/administracao_indireta/funalfa/>. Acesso em: 01 jun. 2017.

SAMPAIO, Julio Cesar Ribeiro. Triângulo da Memória de Juiz De Fora. Rio de Janeiro:
IPHAN, 2012. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/rj/noticias/detalhes/3304/artigo-
triangulo-da-memoria-de-juiz-de-fora>. Acesso em: 01 jun. 2017.

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A MEMÓRIA COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO DO
PATRIMÔNIO CULTURAL: Barra Longa-MG

CARNEIRO, CAMILLA M. (1); STEPHAN, ÍTALO (2); REIS, LUIZ FERNANDO (3).

1. Graduanda em Arquitetura e Urbanismo (Universidade Federal de Viçosa)


E-mail: camilla.15.magalhaes@gmail.com

2. Doutor (FAU-USP). Departamento de Arquitetura e Urbanismo (Universidade Federal de


Viçosa)
E-mail: italostephan@gmail.com

3. Doutor (PROARQ-UFRJ). Departamento de Arquitetura e Urbanismo (Universidade Federal de


Viçosa)
E-mail: lfreis@ufv.br

RESUMO
Este artigo trata das memórias de Barra Longa, uma das mais antigas cidades de Minas Gerais,
localizada na Zona da Mata mineira e que ainda possui um importante acervo arquitetônico e cultural.
Ele surgiu da necessidade de registrar as memórias da cidade, guardadas por pessoas que, em sua
história de vida, mantêm consigo valiosas informações que não foram divulgadas e/ou registradas
publicamente. Neste trabalho, a memória é tratada como principal instrumento de preservação da
cultura, pois ela é fonte de registro das vivências, capaz de resguardar a identidade local, visto que há
uma grande dificuldade em encontrar documentos que auxiliem no entendimento da história de Barra
Longa. A Monografia Histórica do município, escrita pelo Cônego Raimundo Otávio da Trindade em
1917, com sua primeira versão publicada no ano de 1918, é um exemplo dos raros livros que
registram a história da cidade. Exemplo da casualidade, o livro foi encontrado em posse de
moradores de Barra Longa. O documento foi a principal fonte para a redescoberta de uma história
que a população desconhecia e a motivação do aprofundamento da pesquisa. A monografia escrita
pelo Cônego demonstra sua preocupação em registrar a cultura local. No ano em que o livro
completou seu centenário, foi iniciado um trabalho para resgatar seu conteúdo, fazendo com que o
objetivo que o Cônego Raimundo teve, ao escrevê-lo, fosse alcançado: enaltecer o rico valor cultural
da antiga cidade de Barra Longa. O Cônego registrou aspectos físicos e culturais do município, a
partir de documentos e memórias pessoais. Expressa sua opinião, criticando, principalmente, as
perdas patrimoniais que ocorreram durante os anos. Algumas transformações foram registradas em
fotos e documentos, outras encontram-se guardadas nas memórias de pessoas idosas que fazem
relatos importantíssimos que merecem atenção e requerem registro, para que não se percam com o

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tempo. As duas principais igrejas, que são uns dos poucos remanescentes da arquitetura colonial,
sofreram grandes alterações físicas. São necessárias ações de preservação em Barra Longa para
que seu patrimônio cultural permaneça, e para que não se perca no tempo por falta de registros. A
ausência de um órgão de proteção e de catalogação do seu acervo faz com que grande parte dos
registros não seja resguardada. A descontinuidade do interesse por parte dos gestores pelo
patrimônio é um dos fatores que colocam em risco a sua conservação. As peculiaridades de uma
cidadezinha do interior, com traços culturais bem típicos, precisam ser cuidadosamente preservadas.
A memória de um povo pode ser retratada através de registros orais, que passam de geração a
geração, mas para que sobreviva e não perca sua especificidade, torna-se necessário o registro
adequado e um competente programa de educação patrimonial.

Palavras-chave: memória, preservação do patrimônio cultural, Barra Longa-MG, Cônego Raimundo


Otávio da Trindade.

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Introdução

Ao longo do tempo, constrói-se a história de um povo, presente na sua cultura.


Existem riquezas culturais tanto na arquitetura de uma cidade como no modo de vida das
pessoas que nela vivem. Dessa forma, é necessário a preservação do patrimônio cultural
como um todo, de forma a garantir a manutenção das peculiaridades locais. Segundo Choay
(1992): “o patrimônio expressa a identidade histórica e as vivências de um povo. O
Patrimônio contribui para manter e preservar a identidade de uma nação, daí o conceito de
identidade nacional, de um grupo étnico, comunidade religiosa, tribo, clã, família.”

Essa preocupação se amplia quando há um iminente perigo de perda das memórias


nas cidades em que se verificam falhas de gestão, aqui entendido como aplicação deficiente
da política pública de proteção ao patrimônio cultural, que demanda conhecimento técnico
para utilizar adequadamente os instrumentos existentes (conselho, inventário, ações de
educação patrimonial, tombamentos, registros, além de outras ações de proteção) e o
reconhecimento pela população do que deve ser preservado, seja pelos membros do
conselho ou pela população em geral.

Este texto trata de Barra Longa, uma das mais antigas cidades de Minas Gerais,
localizada na Zona da Mata mineira, que ainda possui um importante acervo arquitetônico e
cultural. Uma cidade esquecida que só entrou na mídia após o desastre ambiental ocorrido
em novembro de 2015, a partir do rompimento da Barragem de Fundão, administrada pela
Mineradora Samarco, que destruiu parcialmente o que havia nas margens do rio Carmo. A
pesquisa surgiu da necessidade de registrar as memórias de Barra Longa, guardada por
pessoas que, em sua sabedoria de vida, trazem consigo as mais valiosas informações que
não foram divulgadas e/ou registradas publicamente. Esta é uma forma frágil de resguardar
o patrimônio cultural do local, que encontra-se com seus valores culturais latentes. Apesar
das mudanças visíveis, a cidade mantém as peculiaridades do interior, com antigos valores
ainda pertinentes à vida de seus habitantes.

Quanto ao patrimônio cultural de Barra Longa, de acordo com o IEPHA/MG (Instituto


Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais, 2016), há nove bens tombados
pelo município (Capela Nossa Senhora do Rosário, Conjunto da Fazenda Nossa Senhora da
Conceição das Corvinas, o encontro dos Rios Carmo e Gualaxo do Norte, o Hotel Xavier, a
Igreja Matriz de São José, Imagem de Nossa Senhora do Rosário, as Residências de
Antônio Mariano Trindade, Sr. Antônio Modesto de Freitas Filho e irmãos e a do Sr. José
Lanna). Existem mais de duzentos bens inventariados, entre os quais estão incluídos
fazendas, capelas, residências e imagens sacras. Na área rural encontram-se diversas
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fazendas coloniais de grande porte, em processo de tombamento. Outra riqueza cultural que
persiste no município são as bandas musicais São José e Nossa Senhora do Carmo, que
sempre exerceram influência na cultura municipal.

A importância da preservação

Neste trabalho optou-se pela utilização da memória como instrumento de


preservação da cultura, pois ela é a principal fonte de registro das vivências, capaz de
resguardar a identidade local (manifestada pelas falas e costumes que dão forma aos meios
urbano e rural), e evocar o sentimento de pertencimento. A memória é construída a partir de
aspectos históricos e culturais que os moradores têm em comum e que os representam.
Tais aspectos unem as pessoas e fazem com que suas vivências temporais tornem-se
eternas e possam ser herdadas pelas gerações futuras. Isso é essencial na construção da
identidade de um povo que tem raízes no passado, mesmo que os costumes sejam
moldáveis com o passar do tempo.

“Em suma, não é muito comum encontrar-se vestígios materiais do passado


nas cidades brasileiras, mesmo naquelas que já existem há bastante tempo.
Há, entretanto, algo novo acontecendo em todas elas. Independentemente de
qual tenha sido o estoque de materialidades históricas que tenham
conseguido salvar da destruição, as cidades do país vêm hoje engajando-se
decisivamente num movimento de preservação do que sobrou de seu
passado, numa indicação flagrante de que muita coisa mudou na forma como
a sociedade brasileira se relaciona com as suas memórias.” (Abreu, 1998,
p.80).

Cada cidade tem características que a tornam única. Podem ser singularidades que
se revelam em um complexo conjunto de espaços públicos e particulares, capazes de
provocar as mais variadas sensações a seus habitantes e visitantes. O modo de vida de
cada povo é único e, diante de um contexto de constantes mudanças, as diversas formas de
manifestação de sua cultura necessitam ser preservadas, de maneira a afirmar a identidade
de cada grupo.

Entretanto, nem sempre houve a valorização do passado. Há tempos, havia o hábito


de se cultuar apenas o que era novo, já que isso estava relacionado à ideia de progresso.
Com o passar do tempo, percebeu-se que as características essenciais de formação da
cidade estavam se perdendo, de forma que, a necessidade de preservá-las tornou-se
importante como forma de se ter no presente os valores do passado para a construção do
futuro da cidade.

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É notável, em uma mesma cidade, a existência de diferentes memórias. Porém,
muitas delas desaparecem com o tempo. É preciso registrá-las, para que não se perca o
vínculo com o passado, tão importante para a identidade de um lugar. Diante da
impossibilidade de se conseguir uma fonte que abarque a história do local em sua
totalidade, os documentos e relatos, orais e/ou escritos, são complementares, para que se
tenha uma visão ampliada dessa história. Eles demonstram a visão do que a população
entende como sendo mais valioso.

A cidade pode estimular nas pessoas, diferentes sensações ligadas à memória. Isso
vai além do físico: cada lugar remete a alguma lembrança, alguma subjetividade. Ela está
em constante transformação: seu traçado adquire novas formas com o passar do tempo e
tudo isso constrói sua história. Algumas mudanças são consideradas melhorias, outras uma
perda impossível de se repor. Para entender melhor o processo de transformação, é preciso
conhecer as memórias individuais e coletivas, que se transformam constantemente.

A necessidade de escrever a história de um período, de uma sociedade e até


mesmo de uma pessoa só desperta quando elas já estão bastante distantes
no passado para que ainda se tenha por muito tempo a chance de encontrar
em volta diversas testemunhas que conservam alguma lembrança. Quando a
memória de uma sequência de acontecimentos não tem mais por suporte um
grupo, [...] então o único meio de preservar essas lembranças é fixá-las por
escrito em uma narrativa, pois os escritos permanecem, enquanto as palavras
e os pensamentos morrem. (Halbwachs, 2006, p.101)

Para a preservação da memória de um povo, é importante pensar a cidade não só


em seu aspecto físico atual, mas também nas memórias que se fazem presentes. Nesse
sentido, é preciso que todas as gerações se preocupem em manter suas memórias, para
que se crie uma relação entre passado, presente e futuro, capaz de tornar o sentimento de
identidade mais vivo a cada dia.

Quando se retorna a uma cidade, as percepções auxiliam a reconstituir algo que já


se havia esquecido, como diz Halbwachs em seu livro “A Memória Coletiva”. Assim, se
recorre às memórias, coletivas e individuais, pois as duas se complementam e são
convergentes. “Nossas lembranças permanecem coletivas e nos são lembradas por outros,
ainda que se trate de eventos em que somente nós estivemos envolvidos e objetos que
somente nós vimos.” (Halbwachs, 2008, p. 30).

A cidade não deve ser apenas um ambiente transitório, mas um lugar onde possa
haver trocas de experiências significativas para as pessoas que nela vivem ou a visitam.

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“O passado só permanece “vivo” através de trabalhos de síntese da
memória, que nos dão a oportunidade de revivê-lo a partir do momento em
que o indivíduo passa a compartilhar suas experiências, tornando com isso
a memória “viva”. (ALBERTI, 2004, p. 15).

Em seu livro intitulado “Memória e Identidade Social” (1992), Pollak mostra quais são
os elementos constitutivos da memória, individual ou coletiva: “Em primeiro lugar, são os
acontecimentos vividos pessoalmente. Em segundo lugar, são os acontecimentos que eu
chamaria de ‘vividos por tabela’, ou seja, acontecimentos vividos pelo grupo ou pela
coletividade à qual a pessoa se sente pertencer.”

Barra Longa: memórias vivas

Barra Longa possui uma grande riqueza cultural com risco de perda ou
descaracterização. Sendo assim, são necessárias diversas ações efetivas e integradas de
preservação. Algumas ações isoladas de preservação cultural podem ser notadas. Uma
dessas ações é o exercício do ICMS Cultural (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços). Tal exercício é regido pela Lei Estadual 18.030/09, que atribui ao IEPHA a tarefa
de indicar critérios para que os municípios possam obter recursos financeiros, desde que
cumpram uma série de exigências, que incluem, por exemplo, a identificação, o inventário e
o tombamento dos bens que compõem o acervo de Barra Longa. E é justamente a
importância do bem, seja material ou imaterial que definirá a sua inclusão no acervo
patrimonial da cidade e para isso é preciso resgatar a sua história. Nesse sentido, a
pesquisa documental aliada ao estudo das memórias locais convergem para o senso
comum que caracteriza essa importância.

Diante da importância da memória para o resgate do Patrimônio Cultural foram


buscadas fontes que ajudassem nesta pesquisa. A partir delas, foram encontradas
memórias registradas por moradores em documentos de posse da Secretaria Municipal de
Cultura e em livros pouco conhecidos, com raros exemplares guardados por moradores
comuns. Afinal, conforme afirma Aloísio Magalhães, diretor da Secretaria do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) no período de 1979 a 1982: “a comunidade é a
melhor guardiã de seu patrimônio”. (Preservação do Patrimônio Cultural, 1993, p.22).

Houve, no desenrolar da pesquisa, uma grande dificuldade em encontrar


documentos que auxiliassem no entendimento da história de Barra Longa. A inexistência de
um órgão de proteção e de catalogação do seu acervo permitiu que grande parte dos
registros se perdesse. Não existisse, por parte dos gestores pelo patrimônio, uma

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continuidade de ações de proteção ao patrimônio, o que constitui um fator que coloca em
risco a sua conservação. Por outro lado, os moradores desconhecem ou não dão
importância aos documentos, porque não têm consciência ou entendimento do seu valor ou
do seu significado.

Através da conscientização sobre a importância desses “documentos” sobre o


passado e de possíveis registros para resguardá-los, será possível reforçar a identidade do
local e resgatar a memória histórico-cultural da sociedade barralonguense. Essa é uma
iniciativa que pode despertar nos cidadãos o desejo de preservar o patrimônio cultural da
cidade, além de estimular novas pesquisas na área.

A Monografia Histórica de Barra Longa, escrita pelo Cônego Raimundo Otávio da


Trindade, com sua primeira versão publicada no ano de 1918, é um exemplo dos raros livros
que registram a história da cidade. O autor era natural de Barra Longa, sendo sacerdote na
cidade e em outras quatro cidades vizinhas. Foi vereador na cidade de Ponte Nova, cônego
da Catedral de Mariana, diretor do Museu da Inconfidência em Ouro Preto, chegando a ser
nomeado Camareiro Secreto pelo Papa João XXIII em 1960.

Exemplo da casualidade, o livro escrito pelo Cônego Raimundo foi encontrado em


posse de pessoas que vivem há décadas em Barra Longa. Porém, os exemplares estavam
suscetíveis ao desaparecimento, visto que eram poucas as pessoas que os possuíam, sem
cuidados necessários para mantê-los em perfeitas condições por muito tempo. O documento
foi a principal fonte para a descoberta de uma história que a população desconhecia, e a
motivação do aprofundamento desta pesquisa.

A monografia escrita pelo Cônego demonstra sua preocupação em registrar a


cultura local, em um texto intitulado Liminar, datado do ano de 1917, que serviu como
introdução para sua obra, a “Monographia de Barra Longa”:

“Pouco que valha este livrinho acceitem-no os Barra-Longuenses como


testemunho de quanto nos merece a sua terra, que é um boccado a nossa
propria terra por ser a de nossos avós; acceitem-no ainda como modesta
recordação do bicentenário da freguezia. Entendémos que a leitura destas
notas seria, senão de proveito, interessante aos filhos desta terra, e para
elles, por isso, decidimo-nos a tirar á lume o opusculo sem embargo do seu
apoucado ou nullo merecimento.” (Trindade, 1917, p.8).

O texto do Cônego é a mais completa fonte de conhecimento memorial encontrada, e


um dos poucos registros formais sobre a cidade. Sendo assim, ele se mostra essencial para

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a recuperação das memórias que, na maioria das vezes, é repassada através de relatos
orais. O resgate desses escritos e sua divulgação permitirão com que mais barralonguenses
conheçam a cultura local e dela se sintam parte, sendo estimulados a construir um presente
com raízes no passado. Essa recuperação é fundamental para o empoderamento da
população barralonguense, rica em valores culturais, mas que carece de meios de
ressignificá-la no presente.

Apesar de dispor de poucos recursos, Barra Longa necessita de política pública de


patrimônio cultural eficiente e contínua. Esta só será bem sucedida se também envolver a
população, detentora de muitos registros.

Além dos documentos pertencentes aos cidadãos comuns, há aqueles em posse da


Prefeitura Municipal, como antigos recortes de jornais (incluindo parte de um jornal que
circulava na cidade em 1946), cartas e fotos que contam parte do cotidiano dos
barralonguenses daquela época. Entretanto, a ausência de medidas de salvaguarda dos
registros documentais nos últimos anos fez com que o acervo ficasse com sua integridade
comprometida. O livro escrito pelo Cônego, por exemplo, conta com poucos exemplares em
estado de conservação crítico.

Para melhor resguardar estes documentos, todos eles foram digitalizados a fim de
criar um acervo digital que possa servir de base para outras pesquisas e consultas pela
comunidade. Há registros de muitas décadas, que contam a história de Barra Longa desde a
época em que a cidade tinha uma economia próspera e contava com muitos habitantes.
Registrar os documentos em meio digital se mostra de grande importância tanto para a
conservação quanto para a facilidade de acesso às informações.

Monographia de Barra Longa: a ponte entre o século XVIII e o XXI

Barra Longa, cuja fundação foi em 1701, é considerada a segunda cidade mais
antiga de Minas Gerais, como o Cônego deixa claro em seus escritos. O Coronel Matias
Barbosa, fundador de Barra Longa, foi um revolucionário de Villa Rica em 1720. O nome
Barra Longa originou-se do encontro de dois rios: o Carmo (na época com águas barrentas)
e o Gualaxo (que tinha suas águas claras), que encontravam-se e formavam uma “grande
barra”. A cidade foi construída às margens do Rio Carmo, pois seus primeiros povoadores
ocuparam o território para exploração do ouro e outras pedras preciosas encontradas em
abundância nos rios.

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Figura 01: Vista parcial de Barra Longa. Disponível em:
<http://www.pousoeprosa.com.br/site/cidade/30> Acesso em: 15 jan 2017.

Antes de tornar-se um município (em 1938), Barra Longa pertenceu a Mariana e


Ponte Nova, municípios vizinhos. Os rios que banham o município nascem em Ouro Preto e
passam por Mariana, onde eram muito explorados pela abundante existência do ouro em
suas margens e em seu leito. Por esse motivo, os bandeirantes foram margeando os rios
até chegar no território barralonguense. Assim, a história e a cultura local tem aspectos bem
semelhantes às de Ouro Preto e Mariana, inclusive em aspectos geográficos, pois a cidade
foi construída entre as montanhas que margeiam os rios, próximo às duas cidades. Em
termos de arquitetura colonial, as edificações prevalecentes se assemelham.

O município faz parte do Caminho dos Diamantes, também conhecido como Rota
dos Diamantes da Estrada Real, criada no século XVIII pela Coroa Portuguesa, com o
propósito de tornar mais rápido o escoamento do ouro e dos diamantes extraídos do norte
de Minas Gerais. A Rota dos Diamantes liga os municípios de Ouro Preto e Diamantina,
formando junto com o Caminho Novo e o Caminho Velho o Circuito turístico da Estrada
Real. O Caminho dos Diamantes é composto por cerca de cinquenta cidades que se
formaram com o desenvolvimento do estado. Entre essas cidades estão a Vila do Ribeirão
do Carmo (atual cidade de Mariana), Catas Altas, Santa Bárbara, Conceição do Mato Dentro
e Vila do Príncipe (atual Serro). Essa região conserva muitas características rurais, pois
pouco cresceu e se industrializou. Assim é Barra Longa, que preserva sua cultura em seus
vários aspectos.

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O município possui uma pequena população, que vem diminuindo ao longo das
décadas, conforme registros dos Censos Demográficos (Quadro 1). Entre 2000 e 2010,
houve uma queda de 2,05% ao ano, passando de 7.554 para 6.143 habitantes. A taxa de
urbanização também teve alteração no mesmo período. A população urbana em 2000
representava 29,71% e em 2010 aumentou, passando a representar 37,65% do total. Havia,
em 2010, 2.313 habitantes residentes na área urbana e 3.830 habitantes na área rural.

População População % do total População % do total População % do total

(1991) (1991) (2000) (2000) (2010) (2010)

População total 8.902 100,00 7.554 100,00 6.143 100,00

População residente 4.594 51,61 3.822 50,60 3.022 49,19


masculina

População residente 4.308 48,39 3.732 49,40 3.121 50,81


feminina

População urbana 2.198 24,69 2.244 29,71 2.313 37,65

População rural 6.704 75,31 5.310 70,29 3.830 62,35

Quadro 1: População Total, por Gênero, Rural/Urbana – Município – Barra Longa – MG Fonte: PNUD,
Ipea, FJP

Segundo o Jornal do Povo, publicado em 28 de maio de 1939, o município possuía


cerca de 30 mil habitantes naquela época. A economia, no passado, segundo o Cônego
Raimundo, era baseada em venda de “madeira de lei", agricultura (milho, cana de açúcar,
café, algodão, árvores frutíferas e floricultura), pecuária, comércio, pequenas indústrias e
extração do ouro no leito dos rios.

Existem na parochia cerca de 60 engenhos ou fabricas de assucar,


aguardente e rapaduras de superior qualidade. Fabricão-se queijos em alta
escala, requeijões e manteiga[...] muito azeite de mamona, sabão, fumo
acreditadíssimo, farinha de milho, polvilho de mandioca[...]. Existem teares de
mão, onde se preparão cobertores de lã e de algodão, [...] toalhas, lençóes,
roupas brancas [...]. Há duas padarias montadas caprichosamente [...],
offícios mechanicos se exercem sobejamente na parochia. Há excellentes
officinas de ourives, alfaiates, selleiros, sapateiros, ferreiros, caldeireiros [...],
officinas de carpinteiro, marcineiro e pedreiro; boas modistas e floristas
delicadas. [...] Muitas lojas e vendas sortidas. (Trindade, 1917, p.93).

A exploração do ouro em Barra Longa ocorreu em duas etapas: a primeira, pelos


colonizadores, na época da fundação da cidade, e a segunda, com seu período mais
intenso, nas décadas de 1930 e 1940, com o ouro de aluvião.

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No município, há uma série de bens importantes para a sua história. A transmissão
de crenças, significados e valores faz com que cada um destes bens tenha sua importância
e reconhecimento pela população. Exemplo disso é a Igreja Matriz, que tornou-se o cartão
postal da cidade, devido à sua exuberante arquitetura em destaque no centro da cidade e
pela grande influência que a religião católica sempre exerceu na vida das pessoas.

A Igreja Matriz de São José foi erguida por volta de 1700, com a ajuda de
fazendeiros, pessoas influentes e do Rei de Portugal. A conclusão da obra, porém, demorou
longos anos. Em 1757, Dom José, imperador de Portugal, que tinha suas fazendas nas
minas, ordenou à irmandade do Santíssimo Sacramento (Ouro Preto) que fosse construído
artisticamente a capela mor. Parte da carta do imperador está nos registros do Cônego:

“Como governador e perpétuo adminstrador que sou do mestrado, cavalaria e


Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo, faço saber a vós Provedor de minha real
fazenda das Minas Gerais que, atendendo ao que me representaram os
moradores do Ribeirão das Minas do Ouro Preto sôbre que sendo eu servido
fazer-lhes mercê mandar fabricar a Capela-Mor da Igreja do Senhor São José
da Barra Longa, [...] freguesia novamente erigida, para o que lhe mandei passar
provisão a vós cometida em dezessete de fevereiro de mil setecentos e
cinquenta e sete não entenderes que nela se compreendia tão bem o retábulo e
sacristia e por isso não mandavas pôr a lanços e porque certamente era de
minha real intenção que aquela obra de todo se completasse pois de outra
sorte vinha a ficar sem o devido efeito por se não poder celebrar os sacrifícios e
administrar os sacramentos aos paroquianos me pedirem lhes fizesse mercê
mandar se puzesse tão bem em lanços o retábulo e sacristia da Capela-Mor da
Igreja, o que visto e respostas que deram os Procuradores de minha real
fazenda e o Geral das Ordens.” (Trindade, 1917, p. 26).

Pelas imagens obtidas nos registros do Cônego, em sua Monografia, percebe-se


claramente a alteração da fachada, originalmente barroca, da igreja. A torre edificada do
lado esquerdo do prédio principal foi demolida, foram construídos alguns anexos nas
laterais, como os espaços que abrigam a capela do Santíssimo Sacramento e a Sacristia.

A matriz que mui mediocremente tem soffrido as injurias do tempo, tem no


entanto sentido bastante a incompetencia artística dos que a têm tratado. No
tecto da capella-mór, tomando-o inteiramente, havia até poucos annos, uma
primorosa pintura a oleo, representando os quatro evangelistas, que se foi sob
o pincel estupido de um furioso iconoclasta. Recentemente outro artista
vulgar, sem direção segura, inundou as paredes interiores de um detestavel
amarelo que é um atestado esplendido de máo gosto e de insufficiencia
profissional. As torres, prejudicadas as dimensões do edificio, foram
diminuídas na sua altura e agora mutiladas, sem beiraes no seu grosseiro
telhado, lembram qualquer coisa de grotesco e ridiculo. (Trindade, 1917,
p.103).

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Figura 02: Igreja Matriz de Barra Longa com sua Figura 03: Igreja Matriz de Barra
fachada original. Fonte: Segunda Versão da Longa atualmente. Fonte: arquivo
Monografia da Paróquia de São José da Barra pessoal de Camilla Carneiro.
Longa, 1961.

Para localizar a Matriz em sua época de formação e explicar o contexto em que seu
prédio foi erguido, Cônego Raimundo relaciona a parte artística da igreja com outras obras
de arte próximas a Barra Longa, como a ermida da Fazenda Quebra-Canoa (divisa com o
município de Ponte Nova - MG). Algumas evidências, segundo ele, comprovam que ambas
foram construídas no mesmo período. A Ermida foi feita entre 1789 e 1808 pelos donos da
fazenda, os padres irmãos José, João e Joaquim Ferreira de Souza. Ressalta-se que o
último arquiteto que nela trabalhou foi Manoel Dias, que especializou-se em construções
públicas no Rio de Janeiro, a chamado do Conde de Linhares. A memória aponta uma perda
significativa que se estende às fronteiras do município. Essa fazenda já não existe, pois foi
depredada pelo tempo, e o altar vendido pelos proprietários da Fazenda na década de 1960.

Em seu livro, o Cônego registrou aspectos físicos e culturais do município, a partir de


documentos e memórias pessoais. Expressa sua opinião, criticando, principalmente, as
perdas patrimoniais que ocorreram durante os anos.

De acordo com seus registros, a economia local era mais dinâmica naquela época. O
município contava com muitas fábricas, que refinavam os produtos obtidos com a grande
produção agrícola. A pecuária era trabalhada em larga escala, abastecendo, além do
município, outros municípios vizinhos. O município tinha para exportar: 60 mil arrobas de
açúcar, 30 mil arrobas de café, 500 pipas de aguardente, 40 mil sacas de cereais, 900 a mil
cevados, muito gado, dentre outros produtos.
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Com o passar dos anos, os grandes proprietários de terra do país, com a utilização
de máquinas no trabalho com a monocultura, acabaram por dificultar a situação do
trabalhador rural. No município, as pessoas que plantavam seus próprios alimentos (milho,
feijão, arroz...) tanto para o consumo quanto para o comércio nos arredores, não puderam
concorrer com os produtos industrializados. O trabalho nas lavouras passou a ficar difícil e
os agricultores que viviam como meeiros, mudaram-se para cidades maiores em busca de
emprego.

O difícil acesso à cidade foi um fator que contribuiu para a estagnação da economia
e consequente falta de investimentos. Com isso, se deu o aumento da migração de pessoas
para outras cidades mais promissoras. O Cônego também aborda a dificuldade de acesso à
cidade, quando destaca a exclusão de Barra Longa na construção da estrada que liga Ponte
Nova a Mariana, a fim de economizar vinte quilômetros na obra. Pressupõe-se que a partir
daí ocorreu uma grande queda no desenvolvimento municipal e no número de habitantes.

Conclusões
É necessário pensar em políticas públicas que resgatem o interesse das pessoas
pelo local. Isso inclui um competente programa de educação patrimonial, para que a
população conheça suas raízes e dela se sinta parte.

O livro do Cônego Raimundo Trindade, principal fonte de consulta para este estudo,
possibilitou fazer comparações e reconhecer preciosas riquezas preservadas, como por
exemplo, a Igreja Matriz, que apesar das mudanças ocorridas, tem muito valor cultural e
religioso para os barralonguenses.

Todo o trabalho para resgatar o conteúdo do livro foi feito no ano em que o mesmo
completou seu centenário, fazendo com que o objetivo que o Cônego Raimundo teve, ao
escrevê-lo, seja alcançado: enaltecer o rico valor cultural da antiga cidade de Barra Longa e
fazer com que mais pessoas o conheçam.

Também foram encontrados arquivos valiosos, disponibilizados com presteza pelos


responsáveis. Mediante a análise de documentos escritos, foi possível perceber que há uma
escassez de registros da antiguidade. Muitos foram perdidos pelas condições inapropriadas
de guarda. Os documentos históricos são pouco vistos e alguns até mesmo ignorados pela
maioria da população.

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Percebe-se que há uma preocupação por parte do gestor atual com a preservação
do acervo cultural municipal. É urgente que se faça um registro histórico, para que as futuras
gerações tenham acesso a essa riqueza. É preciso atentar-se para a necessidade melhorar
gestão da política urbana e de preservação do patrimônio cultural municipal, criando
condições nos aspectos de recursos humanos e físicos.

Preservar requer conscientização e cuidado. A memória de um povo pode ser


retratada através de registros orais, que passam de geração a geração, mas para que
sobreviva e não perca sua especificidade, torna-se necessário um registro formal,
catalogado, que não permita cair no esquecimento, além de um competente programa de
educação patrimonial. As peculiaridades de uma cidadezinha do interior, com traços
culturais bem típicos, precisam ser cuidadosamente preservadas. É mais que investimento,
é pertencimento, é cuidado com a própria identidade.

O acervo concebido com a digitalização dos documentos é uma fonte de


informações que pode ajudar outras pessoas que quiserem entender mais sobre Barra
Longa e sua formação, bem como seus aspectos culturais.

Referências Bibliográficas:

ABREU, Maurício de Almeida. Sobre a memória das cidades. Revista da Faculdade de


Letras – Geografia, Porto, I serie, v. 14, p. 79-97, 1998.

ATLAS DO DESENVOLVIMENTO HUMANO NO BRASIL. Barra Longa, MG: perfil.


Disponível em: <http://www.atlasbrasil.org.br/2013/pt/perfil_m/barra-longa_mg< Acesso em:
23 mar 2017.

CHOAY, F. A Alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade: Editora UNESP,


2001.

HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2006.

LE GOFF, Jacques. Patrimônio histórico, cidadania e identidade cultural: o direito à


memória. In: BITTENCOURT, Circe (Org.) O saber histórico na sala de aula. São Paulo:
Contexto, 1997.

POLLAK, Michael. Memória e Identidade social. In: Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol.
5, n. 10, 1992, p. 200-212.

Preservação do Patrimônio Cultural. Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural. 10º


Coordenação regional. Curitiba, 1993.
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TRINDADE, Raimundo Otávio. Monografia da Paróquia de São José da Barra Longa
(1729-1961). 2 ed. Belo Horizonte: Editora Bernardo Álvares S. A., 1962.

TRINDADE, Raimundo Otávio. Monographia de Barra Longa. 1 ed.

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A MODERNIZAÇÃO NOS GOVERNOS DE
ANTONIO LEMOS (1902-1912) E GETÚLIO VARGAS (1937-1945):
a mudança cultural do local da moradia e seu reflexo no processo
de degradação do Centro Histórico de Belém/PA

MORHY, SAMIA (1); LIMA, JOSÉ JÚLIO (2); PONT VIDAL, CELMA (3)
1. Universidade Federal do Pará. Instituto de Tecnologia, Programa de Pós-Graduação em
Arquitetura e Urbanismo
Rua Augusto Corrêa, 01. Campus Universitário do Guamá, Belém, Pará, Brasil - CEP 66.075.110
samiamorhy@gmail.com

2. Universidade Federal do Pará. Instituto de Tecnologia, Programa de Pós-Graduação em


Arquitetura e Urbanismo
Rua Augusto Corrêa, 01. Campus Universitário do Guamá, Belém, Pará, Brasil - CEP 66.075.110
jjlimaufpa@gmail.com

3. Universidade Federal do Pará. Instituto de Tecnologia, Programa de Pós-Graduação em


Arquitetura e Urbanismo
Rua Augusto Corrêa, 01. Campus Universitário do Guamá, Belém, Pará, Brasil - CEP 66.075.110
celma_chaves@hotmail.com

RESUMO
A imposição de leis urbanísticas nas cidades em áreas de valor a preservação pressupõe a regulação
de construção relacionada à proteção do patrimônio. A ação do Estado na condução da gestão
edilícia decorrente das leis insere-se na expressão de um discurso político criado em torno de valores
incorporados nas intenções da política de preservação. A introdução da modernização como ideário
político lançada inicialmente na capital paraense na era do Intendente municipal Antônio Lemos
(1902–1912) e consolidada no governo de Getúlio Vargas (1937–1945) incentivou uma mudança nos
hábitos sociais dos moradores de classe alta em termos de local da moradia. Com efeito direto sobre
o Centro Histórico de Belém, protegido por legislação específica federal em 2012 e por legislação
municipal desde 1990, este artigo trata da relação entre o processo de degradação arquitetônica dos
sobrados e casario do bairro da Campina construídos até o início do século XX com os efeitos da
modernidade operados em dois períodos de centralização política e limitações no regime de direitos
democráticos. Ainda que marcadamente ligados a elites econômicas, a modernidade enquanto
discurso contrapõe-se a uma compreensão subjetiva de sua casualidade. Para a compreensão da
subjetivação dos fatos relativos à modernização no bairro da Campina, no início do XX, este artigo
constrói um discurso historiográfico sobre a modernização em Belém durante o período lemista e, em
seguida, durante o Estado Novo varguista, buscando revelar as relações entre as historiografias dos
dois momentos de poder político centralizador e a modernização sobre o local de morar, o qual
estaria associado, contraditoriamente, a um processo de degradação do estoque edificado de um
bairro histórico de Belém. A partir destes dois momentos, o trabalho busca articular em uma terceira
parte, na qual, por meio do discurso historiográfico construído, associar a modernidade presente na
mudança cultural e nos hábitos sociais da camada da população de alta renda, ligados ao poder
político em vigor, com a introdução da modernização do local e na forma de morar, aguçando o
sentido da modernidade como fator relevante de status social, sob pena de perder o patrimônio
arquitetônico eclético. Ressalta-se que a população residente no Centro Histórico de Belém,
conforme Censos do IBGE de 2000–2010 aumentou 7.5%, mesmo sem nenhuma política
incentivadora ao uso habitacional, o que leva a sugerir políticas de retorno da moradia ao Centro. Ao
final do artigo, há a indicação de políticas habitacionais, por meio de ações governamentais ou civis.
Com destaque para maior participação social nos projetos, uma vez que este item é uma das
conquistas democráticas recentes no planejamento urbano, bem como, que sejam capazes de
fomentar uma mudança cultural e nos hábitos da sociedade local visando aguçar seu interesse de
retornar a moradia nos sobrados ecléticos do tombado núcleo urbano de Belém e minimizar sua
degradação.
Palavras-chave: modernização, modernidade, moradia, ruínas, Centro Histórico de Belém/PA

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Introdução
O objeto deste artigo é a relação entre o processo de degradação arquitetônica dos
sobrados e casario do bairro da Campina construídos até o início do século XX com a
introdução da modernização como ideário político lançada na capital paraense nas eras do
Intendente Antônio Lemos (1902–1912) no plano local e no plano federal, de Getúlio Vargas
(1937–1945), nas quais mudanças nos hábitos sociais dos moradores de classe alta podem
ser associadas a alterações nos locais de moradia, sucessivamente, em cada uma das
épocas, as famílias passaram a ocupar imóveis fora do núcleo inicial da cidade.

Ao associar dois períodos históricos distintos a alterações espaciais de uma camada


específica da população, este trabalho busca contribuir para o desenvolvimento mais
rigoroso da pesquisa histórica, constituído pela historiografia dos anos ’20 da Escola dos
Annales, na França. Segundo o qual busca-se construir um discurso mais amplo e
diversificado com base teórica e conceitual que sustente e legitime a interpretação sobre o
objeto pesquisado. No caso da historiografia da arquitetura, conforme Waisman (2013,
p.11), “o objeto pesquisado existe no presente por si mesmo e o trabalho do historiador tem
que partir dessa realidade presente”. No caso deste artigo, o objeto pesquisado aborda a
compreensão subjetiva de uma casualidade – edificações em ruínas – para entender como
a modernização e modernidade sobre o local de morar estaria associada ao processo de
degradação do estoque edificado de um bairro histórico de Belém.

O paper busca construir aquilo que é sugerido por Dias e Chaves (2015, p. 6), quando
mencionam que “a pesquisa historiográfica, irremediavelmente recai numa ressignificação
subjetiva dos fatos”. Assim, para compreender a subjetivação dos fatos relativos à
modernização no bairro da Campina, no início do XX, este artigo constrói um discurso
historiográfico sobre a modernização em Belém durante o período de Antônio Lemos e em
seguida, a modernização durante o Estado Novo do presidente Getúlio Vargas. A partir
destes dois momentos, o trabalho busca articular em uma terceira parte, as relações entre
as historiografias dos dois momentos com a degradação arquitetônica atualmente expressa
na ocorrência de ruínas, no bairro da Campina.

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2) Modernização em Belém no início do século XX
A fundação da cidade Belém associa-se à construção do Forte do Presépio, pelos
portugueses, em 1616, que serviu como “estratégia de defesa e marco da ocupação das
terras da Coroa Portuguesa na Amazônia” (BRITO, 2007, p. 50). A partir do forte, localizado
na confluência do rio Guamá e da baía do Guajará, iniciou a formação e a expansão do
embrião urbano da cidade. A princípio formado pelo bairro da Cidade, atual Cidade Velha,
posteriormente, a cidade cresceu dando origem ao bairro da Campina, foco de análise deste
trabalho.

Durante o século XIX o núcleo urbano de Belém se expandiu e desenvolveu através das
atividades atacadistas da zona portuária, passando a atrair o comércio a varejo, serviços
especializados, indústrias, os principais estabelecimentos administrativos e religiosos
formando o centro comercial tradicional de Belém, além das residenciais das camadas mais
abastadas da sociedade. Para o centro convergiam as principais vias e meios de transportes
coletivos, tornando-se a centralidade urbana de maior acessibilidade.

2.1) Modernização de Antônio Lemos (1902 - 1912)

Entre os anos de 1902 a 1945 a cidade de Belém foi governada por líderes políticos que
introduziram ideais de modernização na cidade. O primeiro, senador Antônio Lemos, buscou
motivação e modelo na Europa, posteriormente, o governador Magalhães Barata cumprindo
ordens nacionais do programa político do Presidente Vargas para modernizar o país (PONT
VIDAL, 2008a).

Durante a intendência de Lemos, no início do século XX, a paisagem urbana de Belém


sofreu modificações decorrentes do apogeu da economia do ciclo da borracha (1879 a
1912). Obras de infraestruturas foram realizadas, como a criação de novas vias, de
boulevards, expansão da malha viária, além da construção de palacetes residenciais,
praças, quiosques, cafés, bosques, entre outras. Conforme Brito (2007, p. 55), “Belém irá
refletir um maior desenvolvimento urbano, marcado pela modernização e embelezamento da
cidade com vistas a atender às exigências da sociedade abastada da época”. Chaves e
Silva (2013, p.2) comentam que “Belém viveu o esplendor resultante dos lucros do caucho
no final do século XIX e início do XX. A cidade possuía o que havia de mais moderno, como
bondes elétricos, diversos palacetes residenciais e suntuosos edifícios”.

Mesquita e Cardoso (2008) registram que no período do ciclo da borracha houve a


introdução de consideráveis melhorias infraestruturais, tais como: a iluminação a gás
substituída pela iluminação pública elétrica, a modernização do sistema de abastecimento

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de água e esgoto, o calçamento das ruas com paralelepípedos de granito importado, além
do incremento do sistema de comunicação com o telégrafo, tudo proporcionado por estreitas
relações comerciais com os países europeus. Brito (2007) complementa que no governo de
Lemos foi construído o porto (1908–1913), que alterou, significativamente, a paisagem da
orla de Belém.

Segundo Sarges (2000) o governo de Antônio Lemos foi marcado por políticas de
reordenamento urbano, higienização e embelezamento da cidade, cujo modelo estava
embasado no urbanismo vigente na França e pretendia transformar Belém em uma pequena
réplica de cidade europeia. Dias e Chaves (2015, p.3) chamaram de Paris Tropical à
semelhança de Belém com a capital francesa pretendida por Lemos com as remodelações
urbanas e arquitetônicas de ideais haussmanianos. No período ocorreram projetos de
monumentalização com alargamento e abertura de vias. Como exemplos, no primeiro caso,
a Avenida 15 de Agosto, atual Avenida Presidente Vargas e, no segundo caso, o processo
de aterramento da região litorânea e a construção da Boulevard da República, atual
Boulevard Castilhos França, cujas vias estão dentro do bairro da Campina (CHAVES, 2011).

Transformar Belém em uma cidade europeia significava, tanto para o governante quanto
para os moradores, modernizá-la. E essa modernização não estava restrita a melhorias
urbanas, incluía o “modo de vida” das pessoas. Ou seja, a modernização era ao mesmo
tempo concreta – aplicada na cidade – e abstrata – transformando a cultura da população.
Gorelik (1999) diferencia modernização de modernidade ao explicar que modernização são
processos duros que continuam transformando o mundo, motivados por representações
culturais de modernismo, expressas pelo modo de vida e organização social.

O autor comenta que:


[...] na América, a modernidade foi um caminho para chegar à
modernização, não sua conseqüência; a modernidade se impôs como parte
de uma política deliberada para conduzir à modernização e nessa política a
cidade foi o objeto privilegiado (GORELIK, 1999, p. 59).
As modificações no modo de morar relacionam-se a medidas adotadas por Lemos, quando
em 1901, implementa o Código de Polícia Municipal de Belém. O Código além de instituir
posturas a serem respeitadas e cumpridas pelos cidadãos regulamenta uma série de
restrições às residências urbanas. Conforme explica Coelho (2007, p. 93) “por meio desta
lei, [...] Antônio José Lemos, [...] procurava garantir que a cidade fosse, aos poucos,
reconstruída segundo inspiração europeia”.

A regulamentação voltada para as residências, tanto às novas construções quanto às


construídas, passavam por um processo de “ecletização” (Figura 1), que segundo Coelho

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(idem, ibid) “a forma externa da residência teria que ser adequada aos padrões de ordem e
estéticos impostos, conforme observa-se na figura 1, as edificações deveriam deixar de
apresentar coberturas com beirais aparentes. No lugar, o Código instituía
compulsoriamente a platibanda como medida estética e de saúde pública, pois seu uso
evitaria o escoamento de água dos telhados diretamente nas calçadas.

Figura 1: Em primeiro plano, edificações coloniais que sofreriam adaptações segundo


regulamentação da aparência (ecletização). Em segundo plano, o edifício eclético do Grêmio
Literário e Recreativo Português localizado no bairro da Campina, em Belém.
Fonte: http://portalmatsunaga.xpg.uol.com.br/InicioXX2.html. (Acesso: 5 jun. 2017)

Além das posturas, há definições de cunho urbanístico no Código de Polícia Municipal, de


1901. Os capítulos – Construção e Reconstrução de Prédios, Casas para Habitação e
Casas Comerciais – tratam, respectivamente, das construções urbanas e da
regulamentação da aparência dos novos edifícios, especialmente os residenciais e
comerciais, assim como, sobre as obras e outras questões técnicas. Sobre a aparência dos
edifícios, que resultou na ecletização dos mesmos, o Código regulamenta, no artigo 21:

É completamente arbitrario o estylo architectural, uma vez observadas as


regras d’arte, havendo o maximo cuidado em estabelecer as proporções
das diversas partes componentes da construção, isto é, as pilastras,
cornijas, platibandas, etc (BELÉM, 1897-1902, p.56).

Vale ressaltar que a ecletização das novas construções e reconstruções dependiam,


conforme explica Reis Filho (2000, p. 155) “de materiais importados, tanto para elementos
estruturais como para acabamentos”. O autor complementa (idem, 159) que engenheiros e
arquitetos “conseguiam dominar com eficiência as principais técnicas de construção [...] e

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orgulhavam-se de imitar com perfeição [...] os estilos de todas as épocas, que fossem
valorizados pela cultura europeia”.

A modernização da cidade através do aprimoramento do sistema de abastecimento de água


e de esgoto permitiu segundo Reis Filho (idem, p. 164) a “instalação de serviços
domiciliares, que conduziam a formas mais evoluídas de funcionamento das habitações [...]
Data dessa época, a inclusão dos banheiros, como peças definitivas no programa”. Segundo
o autor (idem, p. 155) “as mudanças sócio-econômicas e tecnológicas ocorridas a partir da
segunda metade do século XIX, implicaram, no Brasil, em profundas transformações nos
modos de habitar e construir”. De uma maneira geral, ocorrem grandes alterações, conforme
observado por Derenji (1987, p. 150):

A maioria das casas velhas e desmanteladas cedera lugar a belos edifícios


construídos acima do nível da rua, com extensas e elegantes sacadas no
primeiro andar. [...] parecendo que os paraenses procuravam agora imitar
os costumes das nações do norte da Europa, ao invés dos da mãe-pátria.
A associação da modernização, através da implementação de infraestruturas e construção
de belos edifícios, e a modernidade, com a imitação de novos costumes europeus, presente
no comentário de Derenji, é mais um exemplo das conseqüências que as transformações
concretas realizadas na cidade influenciam na mudança dos hábitos sociais da população.

Derenji (1987, p.150) complementa que “o Ecletismo, que será o símbolo, a representação
arquitetônica das mudanças de comportamento trazidas pela riqueza do ciclo da borracha,
usará esse neoclássico tardio como mais uma opção de escolha de estilos”.

Em virtude das novas leis implantadas por Antônio Lemos acrescido com os rendimentos
que a economia da borracha rendia aos cofres públicos, nos últimos anos do século XIX e
primeiros do XX, Belém expandiu além dos dois tradicionais bairros, da Cidade (atual
Cidade Velha) e da Campina, com a implantação de grandes novos bairros planejados,
transformando os arredores ou subúrbio da cidade, com vias largas, lotes com dimensões
maiores, novos palacetes construídos ao longo da Estrada de Nazaré, atual Avenida
Nazaré, do Umarizal e da Estrada de Bragança, atual Avenida Almirante Barroso (COELHO,
2007).

Tais transformações iniciam uma nova era de modernização da cidade que podem ter
influenciando na cultura e hábitos sociais dos moradores da classe alta do núcleo urbano
deixando seus sobrados e casario e preferindo ir morar em palacetes, chalés e bangalôs em
outras áreas da cidade, como as avenidas Nazaré (Figura 2) e Braz de Aguiar.

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Figura 2: Palacete Faciola, em 1908, à Avenida Nazaré.
Fonte: https://fauufpa.files.wordpress.com/2011/07/p-faciola.jpg. (Acesso: 5 jun. 2017)

Os chalés ou “edifícios importados” conforme conceituou Reis Filho (2000) expressavam um


fenômeno completamente novo na arquitetura, pois eram produtos industrializados
produzidos nos países europeus e transportados desmontados nos porões dos navios para
o Brasil. O autor (idem, p. 155) destaca que a “importação era completa, pois compreendiam
de estruturas e vedações até coberturas, escadas e peças de acabamento, que aqui eram
montadas, conforme as instruções e desenhos que as acompanhavam”. Chalés em ferro
fundido, por exemplo, eram escolhidos por meio de catálogos que apresentavam os
modelos disponíveis, retratando uma modernização tanto na forma de construir e morar
quanto de comprar o imóvel. Coelho (2007, p. 108) comenta,
Não é de se admirar que em dado momento as famílias proprietárias destas
casas no centro histórico tenham-nas vendido para construir ou comprar
casas nos novos bairros da cidade, onde a vida prometia ser mais “chique”
e “charmosa”. As casas e palacetes construídos nos bairros novos de
Belém a essa época é que seguiam, então, os preceitos de afastamentos
dos limites do lote, com novos esquemas de cobertura e sistemas
construtivos modernos, como por exemplo, o concreto armado.
Percebe-se, no comentário do autor Coelho, que a modernização de Belém na era Lemos -
expressa, dentre outras formas, com a criação de novos bairros com padrões urbanísticos
diferenciados - aguçou o desejo da população mais abastada de sair do bairro da Campina
para morar em áreas mais “chique” e “charmosa”, mostrando o poder da modernidade sobre
a cultura das pessoas.

Os novos bairros localizados nos arredores dos bairros da Cidade Velha e Campina
possuíam vantagens locacionais: (i) por estarem próximos do núcleo urbano, portanto, da
centralidade das atividades de comércio e serviço; (ii) por estarem afastados do “burburinho”
causados pelo fluxo de pessoas e veículos atraídos pela centralidade; e, (iii) por

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disponibilizarem moradias modernas amplas, em vias mais largas, em lotes maiores,
ajardinados e com recuos.

Durante o governo de Antônio Lemos, a modernização da cidade de Belém agregou valor ao


bairro da Campina através das obras e investimentos já mencionados. Nesta época, o bairro
da Campina possuía comércio sofisticado e serviços especializados, além de residências da
camada de alta renda. O bairro, naquela altura, não evidenciava sinais de degradação
arquitetônica com a saída de moradores mais abastados atraídos pela cultura da
modernidade, motivados a residir nos palacetes, bangalôs e chalés nos novos bairros de
Belém, periféricos a seu núcleo urbano.

Este processo de valorização da modernidade estaria incluído na relação feita por Bordieu
entre o espaço simbólico e o espaço social. Para o autor (1990, p. 160), “o espaço social
tende a funcionar como um espaço simbólico, um espaço de estilos de vida e de grupos de
estatuto, caracterizados por diferentes estilos de vida”. O poder do simbólico estaria ligado à
modernização do espaço físico enquanto que, o espaço social seria o desejo, a ambição, a
mentalidade de modernidade desejada pela riqueza da época.

A mentalidade de modernidade, que influenciou a cultura e os hábitos sociais da burguesia


em relação ao local da moradia, despertava o desejo de mudar para residências com
varandas, em lotes maiores, com recuos e jardins, localizadas em vias largas, bem
diferentes das atuais moradias no núcleo urbano consolidado, com vias e lotes estreitos,
edificações sem recuos, uma ao lado da outra. O que não era encontrado nos bairros mais
antigos, pois expressavam um padrão de moradia que fosse condizente com a mentalidade
de modernidade e, consequentemente, com o status social do grupo abastado. Ou seja,
modernidade era morar nos palacetes, bangalôs e chalés dos novos bairros.

A expansão da cidade, na era lemista, se deu através da via Travessa dos Mirandas que,
após seu alargamento e intervenções urbanísticas, tais como, construção do Teatro da Paz
e da Praça da República, passou a se chamar Avenida 15 de Agosto, sendo o principal eixo
de integração do núcleo urbano inicial com os novos bairros da cidade. Localizada no bairro
da Campina, a Avenida 15 de Agosto, durante o governo Getúlio Vargas, passa a se chamar
Avenida Presidente Vargas por simbolizar o ideal modernista da época, sob pena de perder
o patrimônio arquitetônico eclético. Conforme Belém (1999, p. 64):
[...] a avenida passa a se constituir em um novo centro comercial da cidade,
concentrando as atividades comerciais mais sofisticadas como hotéis,
escritórios de companhias de navegação, consulados, bares, cafés,
restaurantes, lojas e cinemas. Essas atividades, associadas à presença de
edifícios residenciais, proporcionavam um movimento, inclusive à noite, ao
contrário do centro comercial antigo.

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A avenida torna-se, além de eixo integrador, uma linha limítrofe entre o novo centro
comercial e o antigo centro comercial. O antigo e o novo separado por uma “cortina”
construída pela concentração da verticalização erguida durante as décadas de 1940, 50 e
60 ao longo da avenida e seu entorno, que conforme Brito (2007, p. 57) “contribuíram para a
descaracterização do bairro da Campina”. O antigo, visto como atrasado, é
descaracterizado, muitas vezes, destruído, em detrimento do novo e do moderno, conceitos
associados com o progresso.

2.2) Modernização em Belém na era Vargas (1937 a 1945)

O regime do Estado Novo instaurado em 1937, pelo Presidente Getúlio Vargas, defendia a
modernização como ideário, que segundo Chaves e Santos (2013, p. 3) “[...] o símbolo mais
eficaz dessa modernidade que precisava ser empregado era o edifício em altura, novo
conceito de moradia e ícone das ideologias divulgadas e disseminadas pelo “Estilo
Internacional” [...]” incentivando a verticalização no Brasil, “[...] condizendo com os novos
ares que Vargas tentaria implantar no novo Brasil industrializado” (MELLO, 2007, p.68).

Conforme análise de Chaves e Santos (2013) as ações de remodelação e “embelezamento”


da cidade, condizentes ao programa político de Vargas para modernizar o país, estavam
dentro das limitações do orçamento determinado pela decadência do clico da borracha,
aliada pela depressão de 1929 que abateu a economia dos Estados Unidos. As autoras
(idem, p. 14) observaram que a fragilidade econômica fazia com que os governantes
focalizassem seus esforços na modernização, através da verticalização, para uma avenida,
pois era impossível verticalizar toda a cidade. As transformações que a cidade de Belém
passou na era Vargas estão focadas no processo de verticalização no centro da cidade,
principalmente na Avenida 15 de Agosto, atual Presidente Vargas.

Segundo Chaves (2011) a gradativa construção dos primeiros arranha-céus concentrados


na avenida dava um ar de metrópole inspirado no processo de verticalização norte-
americano, que passou a ser, segundo Pont Vidal (2008a, p.5), “[...] uma vitrine das
modernas tendências arquitetônicas”. Chaves e Santos (2013) registram que os primeiros
edifícios - residenciais, de escritórios, hotéis e institucionais - foram planejados e
construídos na Avenida 15 de Agosto, considerada, segundo as autoras (idem, p. 1) “desde
a década de 1920, uma das mais importantes vias da cidade, beneficiada pela proximidade
com o porto e os eixos de crescimento urbano”. Enquanto a modernização da era de Lemos
foi inspirada pelas capitais europeias, a da era de Vargas teve origem nas principais cidades
estadunidenses. Daí a relação de modernização com verticalização.

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Puppi (1998, p. 10) comenta que:
[...] retratam o ecletismo como uma forma de projetar (e construir)
inadequada ao progresso e à modernidade material, ao qual [...] deveria
opor-se uma nova arquitetura, alinhada aos novos tempos e capaz de
expressá-lo culturalmente.
Novamente, os conceitos de modernização através dos processos duros de transformações
físicas na cidade estão associados com alterações de hábitos, a modernidade, com
mudanças na cultura da sociedade, conforme Gorelik (1999) diferenciou os conceitos de
modernização e modernidade.

O processo de verticalização abrangia a moradia, os escritórios de serviços especializados e


as instituições públicas. Pont Vidal (2008a) explica que o incentivo à verticalização foi
regulamentado através da Lei 3.450 de 6 de Outubro de 1956 que determinou a altura
mínima de 12 pavimentos para os novos edifícios da Avenida 15 de Agosto e para ruas do
entorno, altura mínima de 10 pavimentos.

A associação de morar em edifício com a ideia de progresso era evidenciada nas


propagandas de lançamento dos empreendimentos para atrair a camada da população com
demanda solvável para adquirir o novo modo de morar. A modernidade e tradição estavam
presentes nos edifícios residenciais, representados, segundo Chaves (2011, p. 71) “pela
sobriedade das arquiteturas, nos amplos apartamentos, nas recepções revestidas em
mármores finos, adornadas com lustres de cristal e mobiliários de formas clássicas”. Esse
mote se fazia necessário para superar o obstáculo do desconhecido, “o novo hábito de viver
em altura e a consequente resistência em sair de suas casas ajardinadas e amplas que
caracterizava o modo de viver da burguesia local” (PONT VIDAL, 2008a, p. 147).

Para Chaves e Santos (2013) para atrair a população mais abastada da cidade a morar nas
alturas era necessário adaptar o novo tipo de moradia aos seus anseios. Para isso,
“percebe-se a permanência de ambientes e formas de organização espaciais que
apresentam características das amplas casas burguesas e palacetes de Belém de outrora”
(p. 14).

Pont Vidal (2008a) esclarece que as novas composições de moradias – em edifícios e em


residências que incorporavam elementos e soluções da arquitetura moderna brasileira -
expressavam o sentido de modernidade dos grupos sociais em ascensão, como médicos,
advogados, engenheiros, comerciantes e empresários. Para a autora (idem, p. 145) “à
medida que esses grupos adquiriam novos hábitos, e se identificavam com uma nova
cultura urbana, os bangalôs ecléticos se tornavam anacrônicos para suas necessidades
funcionais e simbólicas”.

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Segundo Chaves (2011), a partir de 1932 foram construídos 20 edifícios na Avenida 15 de
Agosto, entre eles, edifícios comerciais, residenciais, institucionais, de uso misto e hotéis,
com altura variando entre 3 e 25 o número de pavimentos. Dos 20 edifícios localizados na
avenida, 11 contemplavam o uso residencial. Chaves e Santos (2013) observam que os
edifícios construídos ao longo da avenida “contribuíram para sua progressiva transformação,
a mudança do modo de morar da população e a criação do status de cidade moderna” (p.
14). Na era de Vargas, modernidade era morar em apartamentos e residências com
elementos e traços da arquitetura moderna.

Penteado (1968) registrou a mudança da paisagem urbana do bairro. A figura 3 apresenta


uma fotografia do autor intitulada de “o tradicional e o moderno na cidade de Belém”. A
imagem apresenta a hierarquização dos tipos de arquitetura ainda encontrada no bairro da
Campina: em primeiro plano a fachada da igreja das Mercês, do século XVIII; em segundo
plano, sobrados reformados pelas correntes modernistas e sobrado eclético preservado; e,
em terceiro plano, um arranha-céu construído sobre edificações ecléticas destruídas.

Figura 3: Avenida 15 de Novembro. Fonte: Penteado, 1968, p. 177

O processo de verticalização iniciado na era de Vargas destruiu antigos sobrados e casario


no bairro da Campina para dar lugar a edifícios, ou simplesmente, para produzir espaços
vazios. Este processo vem ao encontro da degradação já em curso desde os anos de 1920,
quando as famílias começaram a transferir suas residências para os bairros “modernos”.
Além da destruição para verticalização ou para produção de espaços vazios, alguns
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sobrados foram reformados para ganhar novos traços arquitetônicos em suas fachadas,
visando, com isso, a modernização, o que, também, influenciou no processo de degradação
física desses imóveis. Assim como as edificações coloniais adaptaram-se à ecletização da
era Lemos, alguns imóveis modernizaram suas fachadas na era Vargas, visando
acompanhar o progresso, transformando os arcos das aberturas em linhas retas, retirando
os gradis de ferro do guarda-corpo das janelas inteiras, introduzindo marquise em concreto
armado como proteção, eliminando as platibandas com balaustres, ou seja, retirando os
elementos ecléticos que remetiam ao antigo.

3. A degradação arquitetônica após os ideais da modernização


Conforme observa (Brito, 2007) os bairros da Campina e Cidade Velha são,
respectivamente, “marcada inicialmente pelo uso residencial e, hoje, pelos usos residencial,
comercial e de serviços” (p. 66) e “de uso original residencial e comercial e, atualmente,
destacam-se os usos comercial e de serviço” (p.68). Percebe-se que o uso residencial
cedeu, aos poucos, para os usos de comércio e serviço, os quais necessitaram de
adaptações estruturais nas edificações, como, demolições de partições internas, aberturas e
fechamentos de vãos nas fachadas, descaracterizando sua arquitetura original. Para Belém
(1999, p. 73) “a intervenção nas fachadas [...] e a interferência visual da propaganda
comercial descontrolada [...]” são alguns dos sérios conflitos que o bairro da Campina
apresenta por concentrar a maior densidade de uso comercial do CHB. Vargas e Castilhos
(2006) associam deterioração e degradação urbana com “a perda de sua função, ao dano
ou à ruína das estruturas físicas [...] de um determinado lugar” (p. 3). Ou seja, a degradação
física não se restringe ao estado de conservação da edificação, mas também, na perda das
características da arquitetura original dos mesmos.

O início da degradação física do estoque edificado do bairro da Campina está associado,


conforme visto acima, a partir dos anos de 1940, com a saída dos moradores de alta renda
do bairro, incentivados pela expansão do setor imobiliário e pela modernização das novas
formas de morar (PONT VIDAL, 2008a, 2008b), assim como, observou Brito (2007, p. 61) a
partir da década de 1970, Belém se expandiu através da “aceleração do processo de
urbanização, configurado por um movimento de periferização urbana” incentivada, entre
outros fatores, pela descentralização das atividades públicas e privadas do núcleo urbano.

Belém (1999, p. 23) descreve que o “bairro da Campina foi logo atingido pelo processo de
decadência econômica, com a deterioração de seu casario, a substituição de um comércio
dinâmico e de qualidade por um comércio popular”. Com a mudança do consumidor de alta
renda para outras áreas da cidade, o centro urbano passou a se especializar em um novo
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perfil de consumidor – o de classe baixa. Para este consumidor o que mais importa é o
preço baixo e a variedade das mercadorias e não a aparência ou as características
arquitetônicas e das instalações físicas das lojas. Por isso, e em função dos próprios custos
elevados de conservação de prédios antigos, dentre outros motivos, os comerciantes locais
deixaram de investir na aparência e na conservação dos imóveis onde ficam suas lojas,
resultando num declínio do conjunto edificado que compõem o centro urbano. Villaça (2001)
enfatiza que, na origem do processo popularmente chamado de “decadência” ou
“deterioração” do centro, está o seu abandono por parte das camadas de alta renda e a sua
tomada pelas camadas populares.

Desde a sua origem, passando pelo seu apogeu até o início do processo de degradação
física, o núcleo urbano inicial de Belém, acumulou um importante patrimônio. As
construções do forte, das igrejas, dos mercados do Ver-o-Peso e de Carne, de fábricas, dos
palácios dos governantes, dos sobrados e casarios com seus revestimentos em azulejos
portugueses, etc. constituem patrimônio arquitetônico, urbanístico, histórico, artístico,
cultural e paisagístico. A preocupação com a preservação deste patrimônio resultou no
tombamento do núcleo urbano como Centro Histórico de Belém (CHB) composto por parte
do bairro da Cidade Velha e todo o bairro da Campina. Atualmente o tombamento do CHB é
regulado pelas três esferas governamentais: pelo Município através da Lei Orgânica do
Município de Belém de 30/03/1990 e pela Lei Municipal nº 7.709 de 18/051994; pelo Estado
com a Lei nº 5.629 de 20/12/1990 e pela União por meio da Portaria nº 54, de 8/05/2012 do
Ministério da Cultura, a qual passa atualmente por revisão visando sua normatização para
atuação do IPHAN na área.

Apesar do processo de degradação física, o bairro da Campina, localizado no CHB, é a


maior centralidade urbana do município e da Região Metropolitana de Belém (RMB), pois
concentra grande número de atividades de comércio e serviço da região, além de atrair
expressivo número de empregos e consumidores. A centralidade observada no CHB é
expressão da concentração, em determinada área da cidade, de um enorme mercado de
trabalho, atraindo para esta área uma série de atividades terciárias e fluxo de pessoas
(CORRÊA, 1995).

O processo de degradação arquitetônica que o bairro da Campina apresenta atualmente é


resultado das modificações econômicas e no modo de vida da população. Como tratado
anteriormente, suas marcas, infelizmente, são encontradas no casario construído há mais
de um século, presentemente em estado de conservação ruim ou em ruínas e mesmo
utilizados como estacionamentos. Ressalta-se que é considerada edificação em ruína,
segundo o órgão municipal responsável pela cobrança de tributos imobiliários por meio do
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Cadastro Técnico Multifinalitário, CTM o “terreno onde se localiza uma edificação em
péssimo estado de conservação, abandonada e já desabando, aqueles casos de extrema
precariedade” (BELÉM, 2000, p. 39).

A quantidade de edificações em ruínas no bairro da Campina teve um aumento


considerável. A figura 4 apresenta mapas com 15 ruínas no bairro da Campina em 2000,
constantes do CTM (BELÉM, 2000), assim como, outras 104 ruínas identificadas em 2013,
pela pesquisa “Mercado Imobiliário em Centros Históricos de Cidades Brasileiras (MICH)".
Considerando que, em 2000, o bairro possuía 2.096 lotes, 0.71% do universo eram ruínas e,
após 13 anos, o percentual passou para 4.96%. Os dados constantes da pesquisa MICH
foram obtidos a partir do projeto coordenado pela Profa. Dra. Helena Lúcia Zagury Tourinho
pela Universidade da Amazônia, 2013 e incluídas em: Morhy (2015), Morhy et al (2015) e
Lobo et al (2016). Ainda na figura 4 estão destacados os imóveis protegidos pela legislação
federal e estadual.

Figura 4: Ocorrências de ruínas, estacionamentos, verticalização e imóveis protegidos nos


bairros da Cidade Velha e Campinas no CHB. Fonte: Elaboração própria

Entende-se que diversos fatores contribuíram ao aumento da degradação arquitetônica, no


entanto, a pesquisa aponta que com a introdução da modernização do local e na forma de
morar, aguçando o sentido da modernidade como fatores relevantes de status social

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estariam associados ao início do processo de degradação do estoque edificado do bairro da
Campina em Belém, retificando a tese de Harvey (2011) da cidade como mercadoria, tendo
como lógica a desvalorização de áreas em detrimento da valorização de outras, em um ciclo
onde uma alimenta a outra.

Considerações Finais
Os recursos econômicos disponíveis na era de Lemos possibilitaram a implementação de
obras que transformaram a paisagem do núcleo urbano de Belém como um todo. Ao
contrário da era de Vargas, as finanças da capital paraense estavam limitadas e os
investimentos priorizaram a modernização de uma parte do núcleo urbano através da
verticalização. Vale indagar como estaria o núcleo urbano de Belém se os recursos públicos,
durante o governo de Vargas, estivessem disponíveis para realização dos seus ideais de
modernização? À época não existiam as leis preservacionistas, o que permitiria destruir toda
a massa edificada, de período colonial e eclético, para construção do novo, das edificações
em alturas. No entanto, em virtude da restrita realidade financeira do governo Vargas, a
destruição não foi propriamente na massa edificada e, sim, no abandono das demais áreas
do núcleo urbano, onde se localizava uma parcela significativa de edificações ecléticas da
cidade.

Uma possível solução, diante do quadro apresentado neste trabalho quanto à existência de
ruínas e estacionamentos no CHB, são ações para a reabilitação de imóveis com
investimentos para o retorno de moradias à área. Há estudos de viabilidade técnica e
orçamentária para o caso de Belém, como o conduzido por Norat (2007), os quais
dependem de programas governamentais conforme identificados por Lima, Faria e Andrade
(2002). Este processo mostra-se relevante na medida em que foi detectado um relativo
aumento no número de domicílios no CHB. Conforme os resultados dos Censos do IBGE de
2000 e 2010 aumentou 7.5%, mesmo sem nenhuma política incentivadora ao uso
habitacional. O uso habitacional é potencialmente um propulsor da conservação, pois além
de contribuir para a diminuição do déficit habitacional, pode atrair outras atividades que dão
apoio a moradia, possibilitando a utilização do espaço em horários e períodos que vão além
dos horários comerciais, garantindo o uso ininterrupto do espaço e evitando, com isso,
espaços desertos e inseguros.

O discurso historiográfico construído associa a mudança na cultura e nos hábitos sociais da


camada da população de alta renda com a introdução da modernização do local e na forma
de morar, aguçando o sentido da modernidade da nova moradia, como fator relevante para
o status social. Faz-se necessário a elaboração de políticas habitacionais, por meio de
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ações governamentais ou civis - com destaque para maior participação social nos projetos,
uma vez que este item é uma das conquistas democráticas recentes no planejamento
urbano - que sejam capazes de fomentar uma mudança cultural e nos hábitos da sociedade
local visando aguçar seu interesse de retornar a moradia nos sobrados ecléticos do
tombado núcleo urbano de Belém e minimizando, com isso, sua degradação.

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A Nova Prefeitura Enxaimel de São Leopoldo

SILVA, LEONARDO ALBERTO CORÁ; KEMPFER, CAROL

1. UNISINOS. Mestrado em Arquitetura e Urbanismo


Rua Marechal Mascarenhas de Moraes, 333, Gravataí
leonardocora@yahoo.com.br

2. UNIRITTER. Bacharelado em Arquitetura e Urbanismo


Rua Marechal Mascarenhas de Moraes, 333, Gravataí
carolinakempfer@gmail.com

RESUMO
São Leopoldo é um município gaúcho onde foi fundada em 1824 a colônia imperial de mesmo nome.
Os registros deste passado podem ser encontrados na arquitetura da região, onde exemplares de
enxaimel ainda resistem ao tempo, a grande maioria sem nenhuma proteção legal. No ano de 2009, o
poder público municipal lançou o projeto de uma nova prefeitura, no centro histórico local, que seria
construída com a inserção de elementos alusivos a técnica construtiva enxaimel. A reação contrária
da população, liderada pelo movimento estudantil dos cursos de arquitetura e urbanismo da
UNISINOS e FEEVALE, foi tão intensa, que o projeto teve que ser reformulado, sendo adotado um
estilo contemporâneo. A produção desses simulacros de arquitetura por meio de incentivos legais no
plano diretor de São Leopoldo nos oferece possibilidades de interpretações sobre o embate dos
diferentes grupos sociais que compõem a sociedade contemporânea da cidade. Conceitos como
identidade, auto-representação e paisagem são debatidos para buscar compreender o que levou a
sociedade de São Leopoldo a refutar a construção de uma edificação com a importância que uma
prefeitura tem para a imagem da cidade. Para a construção do presente artigo, realizamos uma
análise tendo como base a legislação local e as matérias jornalísticas da imprensa local. Sendo assim
o nosso “corpo documental” é o plano diretor local em seus artigos que promoveram a construção de
simulacros, o projeto arquitetônico da nova prefeitura e a cobertura que a imprensa local deu para o
ocorrido.Por fim, ainda que não definida por seus agentes em seu tempo como tal, uma posterior
análise do ocorrido em São Leopoldo, foi definido pela arquiteta Briane Bicca e pelo arquiteto Carlos
Fernando de Moura Delphim como uma caso de sucesso na defesa não apenas no patrimônio
arquitetônico, mas da paisagem cultural da região de imigração germânica. Os resultados obtidos
foram a desconstrução de ideia de que a sociedade civil em geral não possui a capacidade de
discernir entre um bem cultural edificado e um simulacro, bem como da necessidade de envolvimento
da comunidade em ações que afetem a imagem da cidade. Pelo fato da nova prefeitura enxaimel não
ser fato a demolição de uma edificação histórica, mas sim uma agressão a paisagem do centro

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histórico, conclui-se que sociedade em geral quando bem instruída, já esta pronta para compreender
o conceito de paisagem.

Palavras-chave: Patrimônio; Paisagem; Simulacro; Gestão Democrática.

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INTRODUÇÃO

Edificações de uso público são especialmente simbólicas para uma cidade, pelo fato
que usualmente são o resultado do envolvimento coletivo de diferentes agentes daquela
comunidade. Por vezes, o empenho, faz com essas edificações sejam a representação do
apurado senso estético e qualidade arquitetônica. É um exercício de auto-representação, o
prédio público que deliberadamente transmite uma mensagem sobre a função que abriga,
sendo também um documento que atesta os conhecimentos técnicos e a arquitetura do
período em que foi edificado (MEIRA, 2008). Se no passado eram as igrejas que
tradicionalmente recebiam um maior esmero em sua construção, dominando e
hierarquizando a paisagem urbana, agora novos símbolos disputam esse cenário e não é
raro que sejam edificações privadas as que mais se destacam na imagem da cidade
(LYNCH, 2011). Segundo Pound (1991) “uma ‘imagem’ é aquilo que apresenta um
complexo intelectual e emocional em um instante”, isso nos leva a refletir sobre a
importância que uma arquitetura de qualidade tem para uma edificação pública e por
consequência para a imagem da cidade.
Em São Leopoldo, município gaúcho que é reconhecido como berço da imigração
germânica no Brasil (TRESPACH, 2014), as tentativas do poder público em se utilizar da
imagem da arquitetura da imigração alemã como um instrumento de propaganda da cidade
tem promovido uma deformação na paisagem urbana. As reproduções da técnica
construtiva enxaimel em edifícios públicos e privados encontram pouca adesão da
sociedade, gerando inclusive conflitos políticos como o que será abordado neste artigo. No
ano de 2009, o poder público apresentou a comunidade o projeto do novo centro
administrativo municipal, o sítio escolhido está localizado no centro histórico local, nas
proximidades de edificações tombadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico do Estado –
IPHAE. Havia a expectativa que o projeto seria de autoria do arquiteto Marcelo Ferraz, do
escritório Brasil Arquitetura, que havia sido contratado para realizar um projeto de
revitalização de todo o centro histórico da cidade. Entretanto edificação proposta era um
edifício de oito pavimentos, com elementos alusivos ao enxaimel, de autoria do corpo
técnico da prefeitura.

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A reação contrária ao projeto por parte dos alunos dos cursos de arquitetura da
Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS e da Federação de Estabelecimentos
de Ensino Superior em Novo Hamburgo - FEEVALE levantou um debate na cidade sobre a
pertinência de construir edificações públicas com elementos característicos de períodos do
passado. Este movimento recebeu apoio do Instituto dos Arquitetos do Brasil – IAB e do
Conselho Internacional de Monumentos e Sítios - ICOMOS. Ademais, a convite do Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, o arquiteto Carlos Fernando de Moura
Delphin, especializado em paisagens culturais e jardins históricos, emitiu um parecer sobre
o centro histórico local, o qual proporcionou diretrizes para a política pública municipal de
preservação histórica (DELPHIN, 2010). Foram realizadas audiências públicas, em que a
comunidade teve a oportunidade de ser manifestar e por fim com o auxílio do Conselho
Municipal de Patrimônio Cultural – COMPAC, foi possível convencer o poder público a
refazer o projeto, construindo uma edificação contemporânea (BERTINELLI, 2010).
Questões como identidade e auto-representação tiveram um papel decisivo neste
conflito e o envolvimento de Delphin trouxe a reflexão sobre paisagem cultural, uma
categoria de valorização do território ainda recente na época, tendo a chancela da paisagem
cultural brasileira sido instituída no ano anterior por meio da Portaria nº127 do IPHAN. A
decisão da sociedade de São Leopoldo de refutar o projeto com imagem historicista, e optar
por uma edificação contemporânea, demonstra que a sociedade civil quando esclarecida
compreende o papel da arquitetura como um documento de seu tempo e de sua cultura.

1. O CENTRO HISTÓRICO DE SÃO LEOPOLDO

São Leopoldo é um município de médio porte, localizado na região metropolitana de


Porto Alegre, sua origem é a vila de mesmo nome, sede da colônia de imigrantes de origem
teuto fundada em 1824 pelo império brasileiro. Há um questionamento se a cidade seria de
fato o “berço da colonização germânica no Brasil”, já que ocorreram iniciativas anteriores de
colonização com imigrantes teutos no estado da Bahia, onde foram fundadas algumas
colônias privadas (TRESPACH, 2014) e em Nova Friburgo/RJ. Segundo o autor, é possível
afirmar é que a experiência ocorrida em território gaúcho foi à primeira de sucesso
capitaneada pelo império brasileiro, e que se distinguia do modelo existente de ocupação do

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território ao propor o minifúndio, a proibição do colono possuir mão-de-obra escrava (ainda
que os registros demonstrem que esta ocorreu) e a criação de um centro urbano com uma
nova elite branca. Nessa perspectiva, para Trespach (2014) o título de berço da colonização
está relacionado não ao pionerismo, mas a transformação que o modelo de ocupação do
solo em São Leopoldo produziu na sociedade brasileira.
O sítio escolhido para a implantação do novo centro administrativo municipal teve um
papel determinante nos desdobramentos do embate que este artigo analisa. O espaço em
questão é definido por Müller (1979) como a paisagem oficial do município, sendo um
território com a presença de bens de patrimônio cultural e natural (Figura 1). A localização
atual do centro da cidade de São Leopoldo coincide com o da antiga Vila de São Leopoldo,
sendo que os traçados das vias remetem ao um plano-piloto de 1833 (HARRES, 2009).

Figura 1 – Passagem do Zepellim por São Leopoldo

Fonte: Museu Histórico Visconde de São Leopoldo (1934).

O Rio dos Sinos é o elemento natural estruturador da paisagem local, a cidade se


desenvolveu em suas margens, sendo o rio o primeiro canal de comunicação entre o
povoado e a capital Porto Alegre - o clico de cheias foi determinante para a configuração da
cidade, sendo que a relação foi por vezes conflituosa (MOEHLECKE, 2011). O ser humano
transformou este espaço, conferindo a ele singularidade, a arquitetura das edificações

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próximas ao rio constitui a principal imagem de São Leopoldo, na figura 01 é possível ver a
Igreja Católica Matriz Nossa Senhora da Conceição (1860-1870), o antigo colégio São José
(1884) e o antigo Ginásio Conceição (1900). Somado a isso, este lugar é apontado pela
historiografia de São Leopoldo como o local em que os casais de colonizadores germânicos
desembarcaram em 1824, conferindo a este espaço um significado a toda a comunidade.
A construção da ponte de ferro 25 de Julho (1871-1876), o monumento ao centenário
da imigração (1924), o antigo seminário evangélico (1926), a urbanização da praça do
centenário (1934), foram obras que contribuíram para a vitalidade daquele espaço urbano
(Figura 2). As edificações que abrigaram os dois colégios, São José e Conceição, se
tornaram na década de 1960 a UNISINOS (HARRES, 2009), centro de São Leopoldo era
conhecido por uma efervescência cultural, em muito devido à presença da universidade.
As ações de proteção do patrimônio cultural de São Leopoldo iniciaram-se a partir da
década de 1980, em resposta a intenção da prefeitura municipal de demolir a ponte 25 de
Julho e o Antigo Seminário Evangélico, popularmente conhecido como Castelinho. Ambas
edificações foram tombadas pelo IPHAE, sendo que o tombamento da ponte foi o primeiro
realizado pelo órgão de proteção no estado do Rio Grande do Sul (RODRIGUES, 2010).

Figura 2 – Ponte 25 de Julho e Castelinho

Fonte: IPHAE

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No ano de 1981 o prédio do antigo Colégio Conceição (Figura 1), que na época
abrigava a UNISINOS, foi destruído em um incêndio e é este terreno que será escolhido no
ano de 2009 para receber o centro administrativo municipal.
Durante a década de 1980, a sociedade civil conseguiu preservar por meio do
tombamento duas edificação simbólicas existentes no centro histórico, entretanto a
transferências dos usos que garantiam a vitalidade ao espaço urbano, aliada a perda de um
significativo bem cultural em um incêndio, levaram a um crescente abandono do centro
histórico local. Podemos incluir neste processo, a poluição do Rio dos Sinos, que margeia o
centro, a qual desestimulou a prática de esportes aquáticos e acabou como balneabilidade
do rio.
Na década de 1990 começaram a surgir ações contrárias a este abandono, como
projetos de revitalização urbana, mas que por suas origens estarem baseadas na indústria
do turismo, os resultados obtidos foram insuficientes para recuperar a vitalidade que o
espaço um dia possuiu, como veremos no capítulo a seguir.

2. O “BRANDISMO” DAS CIDADES GAÚCHAS

Um dos fenômenos característicos da década de 1990 nas cidades gaúchas foi a


tentativa de desenvolver a indústria do turismo. O sucesso da cidade de Gramado, como um
importante destino turístico do Brasil, levou a criação de projetos como o Rota Romântica,
no ano de 1994, ao qual São Leopoldo faz parte. Este itinerário inicia-se em São Leopoldo,
planície do Vale do Rio dos Sinos, e percorre a encosta da Serra Geral Gaúcha, atingindo o
Planalto onde está localizada Gramado. São ao total quatorze municípios, sendo que
destes, dez são oriundos de distritos emancipados da antiga Colônia de São Leopoldo. O
rota Romântica teve como principal influência a rota de mesmo nome existente na Alemanha
e foi implantado na Serra Gaúcha com a seguinte característica: a construção de edificações
que remetam a arquitetura dos Alpes Europeus.
A idéia de um itinerário cultural percorrendo a paisagem da colonização germânica
do Rio Grande do Sul é instigante. Pois, o itinerário cultural é uma das morfologias que a
Paisagem Cultural pode apresentar (CASTRIOTA E CARDOSO, 2012). É correto identificar

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que esses municípios possuam laços identitários que justificam a análise da sua paisagem
cultural como um elemento que ignora divisões administrativas.
Entretanto a construção de edificações que remetem a uma imagem da arquitetura
européia tem promovido uma deformação na paisagem cultural da região. Ao buscar
reproduzir estilos e técnicas construtivas do passado, ocorre a produção de simulacros. A
diferenciação entre a simulação e o simulacro ocorre que a primeira busca reproduzir algum
elemento que fato existiu, o simulacro não. Por exemplo, o simulacro é o que possibilita a
proposta de uma edificação de multipavimentos em “estilo enxaimel”, quando sabemos que
no Rio Grande de Sul as construções enxaimel eram sobrados, portanto o simulacro não
busca reproduzir algo do passado, ele produz algo que nunca existiu (ARAÚJO, 2007). O
autor aponta que como a arquitetura e a paisagem servem como referencial para a
construção das identidades da sociedade, a deformação causada pelos simulacros
transforma a experiência do viver em algo inconsistente.
O fenômeno de mercantilização das cidades foi denominado por Castello (2001)
como brandização da serra gaúcha. Brand é um termo utilizado pelo design que em sua
origem significa “marcar a ferro” ou “estigmatizar”. A exemplo disto, pode-se citar a criação
de uma marca, que associa um símbolo ao nome de uma empresa e seu conceito. Sendo
assim, quando há essa associação, todos que conhecem este desenho no mesmo instante
sabem a mensagem que está sendo transmitida, e quem não conhece, a partir do momento
que entra em contato com o símbolo passará sempre associá-lo a mesma mensagem.
A partir da década de 1990, muitas comunidades, passam a desejar serem
estigmatizadas, e surgem então as alcunhas que cada cidade adotou: “Nova Petrópolis o
jardim da Serra Gaúcha”, “Estância Velha, capital dos Cortumes”, “Bom Princípio, Terra do
Moranguinho”, e assim por diante. São claramente exercícios de auto-representação,
entretanto redutivos em definir toda a complexidade que uma sociedade possui. A
transposição desses brands se manifesta na paisagem urbana fazendo utilização dos
simulacros.
Em São Leopoldo, o brand criado foi “berço da imigração alemã no Brasil”, não
compreendido como o papel histórico deste território para a conformação da sociedade
defendido por Trespach (2014), mas sim em uma série de caracterizações que este território
deveria possuir. Ações foram tomadas tanto no campo da arquitetura, do planejamento
urbano, como nas festividades locais. Incentivada pelo sucesso de eventos como a

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Oktoberfest de Blumenau/SC, a cidade extinguiu sua festa popular “A Festa do Colono”, que
acontecia anualmente desde a década de 1920, e a substitui pela São Leopoldo Fest, um
evento ancorado na visão caricaturesca do imigrante (WEBER, 2006).
No campo da arquitetura e do planejamento urbano a principal proposta foi a de
oferta de índices construtivos para edificações que fizessem alusão a estilos arquitetônicos
do passado. A Lei 2.785/1984 em seu primeiro artigo definia que seria concedido à
população “o incentivo para a construção de prédios residenciais, comerciais e demais,
visando dotar a cidade de um aspecto eminentemente tradicional as suas origens, que
lembre a história dos primeiros imigrantes alemães de nosso Município” (SÃO LEOPOLDO,
1984). Para os proprietários que assim o fizessem, era garantido cinco anos de isenção de
IPTU a contar da data do habite-se. A lei fazia menção a plantas e fachadas explicativas
sobre o que seria “um estilo de construção que se assemelha a prédios de origem dos
imigrantes alemães”.
Seguindo esse mesmo sentido, outro legislação municipal que buscou alterar a
imagem da cidade de São Leopoldo foi a Lei 4.577/1998, que propôs revitalizar toda uma
região histórica da cidade, criando o Projeto Neustadt, (cidade nova em alemão). Em seu
artigo sétimo, a lei previa o seguinte “Haverá incentivo à construção de prédios
caracterizadamente em estilos arquitetônicos que evoquem o passado cultural do
Município”.Cozen (2009) aponta que, junto às demolições isoladas, são os projetos de
renovação urbana os que oferecem maiores riscos à paisagem cultural urbana. Os projetos
definidos como “arrasa quarteirões” foram por décadas adotados com o objetivo de
higienização urbana, destruindo tecidos tradicionais e conjuntos arquitetônicos com o
objetivo de remover extratos sociais que não eram bem vistos pelas parcelas dominantes da
sociedade. O projeto Neustadt foi abandonado pela municipalidade de São Leopoldo no
início dos anos 2000, sem atingir os objetivos do poder público municipal, mas no período
em que o projeto existiu ocorreu um uma perda a paisagem cultural da cidade, o poder
público não apenas permitiu a demolição da capela do convento do Carmo, construída por
volta de 1910, como deu incentivos urbanísticos para a construção de um Shopping Center
em “estilo enxaimel” em seu lugar, no centro histórico da cidade. Segundo Cozen (2009, p.
53):

A progressiva destruição da paisagem urbana histórica representada pela


perda cultural irreparável para a comunidade tem sido direta ou

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indiretamente reconhecida pela sociedade moderna que tem promovido
sucessivas tentativas de reconstruir no mesmo lugar um centro histórico
semelhante ao que foi demolido

Sendo assim, começa-se a obter resposta sobre a intenção de recriar estilo como
sendo uma tentativa de reconstruir um conceito ao território que ao longo das épocas tenha
se perdido, com a intenção de valorização da cultura, retomar a imagem da cidade ou
simplesmente como fonte de turismo. Todavia, a construção de uma edificação, por mais fiel
as técnicas do período, nunca fará parte da sua história e consequentemente não refletirá o
pensamento de sua época do mesmo modo. Por conseguinte, não será constituída uma
identidade a edificação, já que este conceito esta interligado ao período em que a edificação
foi construída, que caracteriza o pensamento da época.
Esse cenário coexiste com o auge do pós-modernismo historicista do Rio Grande do
Sul (CASTELLO, 2001). O autor define que neste período ocorre “[...] a inserção em um
determinado ambiente de imagens alheias ao que é predominante em seu contexto, ao que
é efetivamente real e concreto em sua construção social: foge-se, então, na direção de
representações mais próprias de uma meta-realidade”. A construção dos simulacros tem
como objetivo criar estímulos que artificialmente alterem a percepção das pessoas a
respeito do contexto arquitetônico local. São construções criadas deliberadamente para
iludir e deformar a compreensão que o observador tem da história local. Este é o grande
prejuízo que os simulacros trazem para a sociedade, deformam a memória da população,
fazendo da experiência do viver o espaço urbano em parte uma ilusão.

(...) corremos o risco de habituar-nos à idéia de “viver em um cartão-postal”,


ou até mesmo desejar que isso aconteça. São imagens as quais [...] são
percebidas mais como um cenário chapado do que um ambiente capaz de
acolher e envolver o humano enquanto presença do passado e expectativa
de futuro. Edificações cujas imagens, na maior parte das vezes, não
parecem provenientes ou resultantes de processos construtivos, programas,
expectativas. Em conjunto, são imagens que poderiam ser consideradas
como a arquitetura ou cenário dos filmes [..] que, no decorrer da
narrativa,desvendam-se como “cartão-postal” ( ROCHA, 2003, p.55).

Percebemos que enquanto a sociedade leopoldense buscava a preservação de seu


patrimônio histórico original com o auxílio do IPHAE e a utilização do instrumento legal do

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tombamento, o poder público municipal criava leis e projetos com o intuito de promover uma
“nova cidade” com a utilização de simulacros da arquitetura do período da imigração. Estes
projetos além de prejudicarem a paisagem urbana, promoveram a demolição de bens
culturais e sua substituição por novas edificações que buscavam imitar estilos do passado.
Entretanto será com o lançamento do projeto do novo centro administrativo que a
sociedade civil local irá se organizar e se posicionar opostamente ao processo de perda de
bens culturais e sua substituição por simulacros.

3. O PROJETO DA NOVA PREFEITURA E A REAÇÃO DA


SOCIEDADE

Com a chegada ao poder municipal do Partido dos Trabalhados – PT, na gestão de


Ary Vanazzi no ano de 2004, foi criada pela primeira vez uma Secretaria de Cultura para o
município. O fortalecimento da pasta da cultura promoveu algumas ações concretas no
campo do patrimônio cultural. Foi neste governo que ocorreu primeira ação de proteção dos
bens culturais edificados, com a publicação do Decreto nº. 4.428 em 2006, que lista os
imóveis de interesse de preservação.
Em 2009 o arquiteto Marcelo Ferraz, do escritório Brasil Arquitetura foi contratado
para elaborar um projeto de revitalização para o Centro Histórico de São Leopoldo. O
escopo do projeto de Ferraz era construção de uma orla para a cidade, que reaproximasse a
população ao Rio dos Sinos, assim como a construção de dois museus (um de arqueologia
e um herbário). Previa-se também a utilização do terreno que um dia foi ocupado pelo
Ginásio Conceição, destruído no incêndio de 1981, mas não havia no momento da
contratação a definição de qual uso deveria ser dado ao lote.
Em dezembro de 2009 a prefeitura municipal de São Leopoldo contraiu um
financiamento de 10 milhões de reais junto ao banco Banrisul para a construção da nova
sede (BERTINELLI, 2009). O anteprojeto propôs um prédio de oito mil metros quadrados
distribuídos em sete andares, localizado no centro histórico no terreno do antigo ginásio,
com obras previstas para iniciar em abril de 2010. Um elemento que chamou a atenção
foram as travessas de argamassa propostas na fachada, alusivos ao enxaimel (Figura 3).

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Figura 3 – Projeto da prefeitura “enxaimel”

Fonte: Stocker Junior (2010).

Em 30 de dezembro de 2009 foi apresentada a Câmara de Vereadores uma maquete


do centro histórico local, pela coordenadora do curso de História da UNISINOS, Marluza
Harres. A reportagem do jornal da época relatava que desde agosto um grupo de pesquisa
de alunos dos cursos de arquitetura, história e design trabalhavam em levantamentos de
dados da região, tendo realizado um inventário de bens culturais do entorno da ponte 25 de
Julho. A notícia relata que as conclusões dessa pesquisa seriam encaminhadas ao arquiteto
Marcelo Ferraz, da Brasil Arquitetura, que havia sido contratado pela prefeitura municipal de
São Leopoldo para coordenar um projeto de revitalização do centro. Havia expectativa que
projeto elaborado por Ferraz fosse persuadir o poder público a desistir do projeto proposto
na Figura 3.
A primeira manifestação contrária a edificação foi publicada no jornal Vale do Sinos
com o título “O problema da Identidade em São Leopoldo”, de autoria da então mestranda
de História Maíne Barbosa Lopes em 14 de abril de 2010. Segundo Lopes (2010) o prefeito
Ary Vanazzi defende a construção da edificação em “estilo” enxaimel, por ser característico
das edificações de origem construídas pelos colonizados germânicos. A autora chama a

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atenção para a existência de poucas construções em enxaimeis no estado, a maioria em
precário estado de conservação, e para a existência de edificações contemporâneas que
fazem referencia a esta técnica, como o shopping center da cidade, já citado em este artigo.

Não esqueçamos que os monumentos – talvez, pelas características da


nova prefeitura, possamos chamá-la de monumento - têm o poder de
celebrar uma determinada memória e, principalmente, de preservá-la para o
futuro (LOPES, 2010, p.01)

Segundo Lopes (2010) a construção de um prédio público como a sede da nova


prefeitura, funcionaria como um monumento para a cidade. A autora é crítica a proposta de
incluir elementos alusivos a imigração germânica por compreender que isso seria uma
representação de apenas uma das etnias que compõem a sociedade de São Leopoldo. Ao
propor a construção de um monumento a germanidade, a municipalidade estaria valorizando
uma etnia em relação às demais:

Nem a produção, nem a leitura de paisagens são inocentes. Ambas são


políticas no sentido mais amplo do termo, uma vez que são
inextricavelmente ligadas aos interesses materiais das várias classes e
posições de poder dentro da sociedade. (DUNCAN apud RIBEIRO, 2007, p.
23)

Em maio de 2010, o escritório Brasil Arquitetura apresentou o seu projeto de


qualificação do centro histórico bem como um anteprojeto para abrigar o centro
administrativo. A proposta de Ferraz pode ser definida como um modernismo revisado, com
muitos dos princípios estilísticos do estilo, mas com a adição de materiais e tecnologias
contemporâneos. Sua forma era a de um prisma retangular envidraçado de dois pavimentos,
sob um pavimento inferior de pilotis. A aparência era discreta o suficiente para ser inserida
no centro histórico local sem causar nenhum tipo de conflito com a edificação vizinha, o
antigo Colégio São José. Este projeto foi recusado, já que segundo Bertinelli (2010), o
prefeito entendia que apenas uma edificação vertical de sete pavimentos teria o espaço
necessário para abrigar as funções desejadas para a edificação.
Em quatro de maio, os estudantes de arquitetura da UNISINOS, FEEVALE e a
Associação de Arquitetos e Engenheiros do Vale dos Sinos - AEA protocolaram um abaixo-
assinado com aproximadamente 1.200 assinaturas solicitando que a edificação da nova
prefeitura fosse em um estilo contemporâneo (BERTINELLI, 2010).

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Em 10 de junho de 2010 foi realizada uma audiência pública na Câmara de
Vereadores de São Leopoldo, onde os representantes do movimento estudantil, da AEA, do
IAB e do ICOMOS apresentaram a população os motivos pelos quais as entidades ligadas à
arquitetura e a preservação histórica se opunham ao projeto apresentado pela prefeitura
municipal (Figura 3). Ao fim da audiência pública houve o encaminhamento que a
municipalidade apresentaria um novo projeto para a construção, sem a presença de
elementos alusivos ao passado. Entretanto a proposta do escritório Brasil Arquitetura
permaneceu descartada e a prefeitura manteve a quantidade de pavimentos que desejava.

Figura 4 – Prefeitura da Municipal de São Leopoldo executada

Fonte: Autor (2015).

O acordo construído entre a sociedade civil e o poder público na época não foi
completamente compreendido como uma vitória, mas os desdobramentos que ocorreram
em seguida trouxeram benefícios à sociedade de São Leopoldo que serão apresentados no
capítulo seguinte.

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4. A PAISAGEM CULTURAL DA ANTIGA COLÔNIA DE SÃO
LEOPOLDO

Cozen (2009) define que é possível observar nas paisagens urbanas


contemporâneas uma série de camadas que compuseram as paisagens culturais no
passado. Ao analisar a cidade, compreende-se que diferentes paisagens constituem sua
identidade. A identidade de um núcleo urbano ou edificação está conectada a sua história,
isto remete ao período em que foi construída, englobando as técnicas utilizadas, o estilo
seguido e o sentimento da época. Todavia, as constantes transformações do pensamento e
valores fazem com que este conceito esteja sempre em modificação.
Para desenvolver o sentimento de pertencimento a um local, é necessário
compreender sua cultura, história e costumes ou simplesmente identificá-los, assim, a
preservação de bens com o tombamento de edificações e definições de patrimônios
históricos tem como função garantir que o indivíduo reconheça uma temporalidade na
paisagem urbana, com o novo e antigo criando uma ambiência afirmando o caráter do
território inserido. Por estes motivos reforça-se a defesa da prevalência das edificações,
como história imutável, acompanhado as modificações do homem de acordo com seu
tempo, podendo sofrer adaptações, porém permanecendo a essência. Entretanto, quando
se opta por recriar estilos do passado em edificações novas gera o que ficou conhecido
como simulacros, abrindo o questionamento para a que ponto essa reconstrução agrega na
identidade urbana, considerando que arquitetura está inteiramente ligada ao contexto em
que foi construída.
O memorando nº 31/10, autoria de Delphim, então na condição de Coordenador-
Geral de Patrimônio Natural do Departamento de Patrimônio Material do IPHAN e
endereçado ao arquiteto Dalmo Vieira Filho – Diretor do Departamento de Patrimônio
material e Fiscalização – DEPAM/IPHAN, com vistas à instrução do Inquérito Civil 32/10 da
Promotoria Pública de Justiça Especializada de São Leopoldo, é um documento importante
para compreender as contribuições que debate arquitetônico em torno da construção da
nova prefeitura trouxeram para a cidade.
Neste memorando foi anexado um “parecer sobre o centro histórico de São
Leopoldo, RS”, de autoria de Delphim: Diz ele que “nunca havia entrado em São Leopoldo,

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que me parecia uma simples cidade de beira de estrada, sem qualquer atrativo especial. Ali,
entretanto, fui surpreendido por lugares originais e encantadores, com uma identidade
própria” (DELPHIN, 2010, p.1). O parecer redigido por Delphim orientou uma resolução do
COMPAC que solicitou ao IPHAN, no ano de 2012, o tombamento em nível nacional da
Praça do Imigrante, embasada na seguinte descrição feita pelo arquiteto citado (DELPHIN,
2010, p. 03):

A Praça do Imigrante com o traçado perfeitamente preservado e com o


monumento comemorativo da chegada dos primeiros alemães, em 1824,
erigido cem anos depois. Trata-se de um importante jardim histórico
nacional, a exigir medidas de proteção, conservação e valorização.
Infelizmente, a placa que deveria explicar o sentido do monumento foi
retirada, ficando o visitante sem saber a que se refere o importante marco
da história do país.

O parecer apontou ainda elementos naturais como o Rio dos Sinos, a vegetação
ribeirinha, além da arquitetura das igrejas Católica e Luterana, as quais alimentam uma série
de superstições na população (DELPHIN, 2010).
O arquiteto concluiu seu parecer com uma série de recomendações à sociedade civil
de São Leopoldo, entre elas que “deveria dirigir ao IPHAN uma solicitação de tombamento
de alguns de seus bens mais expressivos. Dentre eles destaco a Praça do Imigrante com
seu monumento” (DELPHIN, 2010, p.10). A recomendação é estendida ao nível estadual:
“Também o IPHAE deveria ampliar o número de bens tombados em São Leopoldo e, mais
do que isso, em vez de tombar bens isolados, tombar conjuntos com maiores dimensões
como é o caso de suas ruas centrais com valioso casario” (DELPHIN, 2010, p.10).
A recomendação de Delphin direcionada ao IPHAE também contribuiu para a política
municipal de preservação histórica, já que o Instituto, o Ministério Público Estadual e a
prefeitura de São Leopoldo firmaram um Termo de Ajuste de Conduta – TAC para
elaboração de um Inventário Municipal de Bens de Interesse Cultural. A arquiteta Simone
Neutzling, que realizou um estudo semelhante na cidade Jaguarão/RS, foi contratada para
realizar o estudo em 2013 e o finalizou em 2016.
Os estudos desenvolvidos agora no mestrado em arquitetura da UNISINOS buscam
compreender como o centro histórico da cidade de São Leopoldo, já inventariado e em
processo de tombamento federal, se articula com os demais territórios da antiga colônia de

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São Leopoldo, em algo que poderia ser compreendido como a paisagem cultural da antiga
colônia de São Leopoldo.
A participação da sociedade civil foi determinante para que a produção de simulacros
com o incentivo do poder público municipal fosse interrompida na cidade, e chamou a
atenção dos Institutos de preservação, nacional e estadual, para a necessidade de proteger
os bens relativos à imigração germânica na cidade.

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A PARTICIPAÇÃO POPULAR DESDE A CONCEPÇÃO DO PROJETO
DE RESTAURO: O caso da Casa de Câmara e Cadeia de Mariana

CARVALHO, FERNANDA TRINDADE DE

1. Universidade Federal de Minas Gerais. Escola de Arquitetura, Ambiente Construído e Patrimônio


Sustentável
Rua Paraíba, 697. Bairro Funcionários, Belo Horizonte, MG. CEP: 30.130-140
macps@arq.ufmg.br

RESUMO
O trabalho apresentado visa demonstrar a democratização do campo do patrimônio a partir da
participação popular no desenvolvimento do projeto de restauro da Cada de Câmara e Cadeia de
Mariana. A partir da possibilidade de intervenção tornou-se necessário entender as relações sociais
estabelecidas na Câmara e no cenário no qual a instituição está inserida, a Praça Minas Gerais. A
investigação iniciou pelo entendimento dos fatores que tornam a Casa de Câmara e Cadeia de
Mariana relevante sob o aspecto histórico-cultural. O estudo é fundamentado ainda no atual conceito
atribuído ao termo “patrimônio” e na teoria de valores proposta por Aloïs Riegl e reafirmada pela Carta
de Burra do ICOMOS da Austrália. E parte do pressuposto que qualquer processo de intervenção em
um bem patrimonial deve ir além da estrutura física, sendo obrigatório um estudo sobre os valores
atribuídos ao bem por diversos segmentos da sociedade, e não mais apenas pelos técnicos.

Palavras-chave: participação popular, patrimônio, atores, valores

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1. A Casa de Câmara e Cadeia de Mariana
Este trabalho tem como ponto de partida a discussão sobre os valores atribuídos à Casa de
Câmara e Cadeia de Mariana, Minas Gerais. Para entender tais valores agrupamos a
população da seguinte forma: moradores do entorno, frequentadores das reuniões, agentes
do patrimônio e turistas.

Segundo Barreto (1949, p. 2 e 3) o “Domus Municipalis” era a sede da administração e da


justiça, sempre construído em um local nobre da cidade, na praça central ou do mercado.
Em geral, os traços marcantes das casas municipais eram os pórticos destinados a feiras e
mercados em algumas delas, em outras são as escadarias na entrada do edifício ou, então,
as varandas para pregões. Ao centro do edifício, geralmente, colocava-se a torre de sinos.
Sinos estes que controlam a vida da cidade, com o toque de recolher, o anúncio de mortes,
de celebrações dentre outros acontecimentos. Barreto ainda salienta que o “Domus
Municipalis” contém a cadeia, o arsenal de milícias, as salas de reuniões para os
magistrados, algumas vezes com outras salas também e uma capela. A câmara tinha
atribuições administrativas e judiciais tanto cíveis quanto criminais.

Segundo transcrição da ata da eleição, contida na revista do Arquivo Público Mineiro


(1897,II, pp. 82-83), no dia 4 de abril de 1711 convocou-se a junta para se preparar a
eleição da nova Câmara de Vila do Carmo. Exatamente três meses depois, dia 4 de julho,
ocorreu no Palácio em que morava o Governador e Capitão Geral Antônio de Albuquerque
Coelho de Carvalho, a primeira eleição livre do Estado de Minas Gerais e, no dia seguinte,
tomaram posse os eleitos.

A Casa de Câmara e Cadeia de Mariana teve diferentes endereços até que a sede
conhecida atualmente fosse construída. Segundo Fonseca (1998, p. 181) em várias
ocasiões, os camaristas queixaram à Coroa, da precariedade de suas instalações, das
sucessivas enchentes do Ribeirão do Carmo, principalmente as de 1737 e 1743, o que
dificultava ainda mais a escolha de “cazas” que pudessem servir às funções públicas.

Em 1747, o Governador, o Ouvidor Geral de Vila Rica e os componentes da Câmara de


Mariana enviaram carta ao rei respondendo a sua ordem de que analisassem os terrenos da
cidade. Escreveram:

...assentaram que era o mais adequado e congruente para a praça, cadeia,


e mais edifícios públicos della, o sitio onde se achão os quartéis, demolido-
se os mesmos [...], sitio não acessível aos excessos e fúrias do córrego e
Rio no tempo das agoas.. (FONSECA, 1998, p. 42)

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Definia-se, assim, o local onde seria construída duas décadas depois a nova Casa de
Câmara e Cadeia. A escolha do terreno se deu devido as suas dimensões e da segurança
que o mesmo oferecia. (FONSECA, 1998, p. 42).

Na década de 60 dos setecentos começaram a ser construídos os três edifícios que


compõem um dos mais belos conjuntos arquitetônicos do Brasil: a Casa de Câmara e
Cadeia, e as Igrejas das Ordens Terceiras de São Francisco de Assis e de Nossa Senhora
do Carmo. Essa praça, pensada para ser o núcleo civil da cidade teve, portanto, seu caráter
modificado. “O mesmo logradouro passava a congregar os símbolos da justiça e dos
poderes civis e religiosos, ilustrando magnificamente o ‘casamento’ dessas instituições, e
apontando as elites que moldaram este espaço urbano.” (FONSECA, 1998, p. 55)

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2. Identificando os valores, os atores e a metodologia a ser
utilizada no processo de conservação de um bem patrimonial

O presente estudo dos valores atribuídos à Câmara de Mariana teve início a partir da
percepção da insuficiência do espaço físico para abrigar todas as atividades desenvolvidas
pela instituição e da evidente necessidade de restauro. Com a possibilidade de intervenção
tornou-se necessário entender as relações sociais estabelecidas na Câmara e no cenário no
qual a instituição está inserida, a Praça Minas Gerais.

O estudo realizado de Randall Manson, publicado pelo Getty Conservation Institute, vem
nos auxiliar a realizar a “leitura” dos valores atribuídos a um bem patrimonial. O
planejamento e a gestão encontram um triplo desafio, primeiro em identificar todos os
valores do patrimônio em questão, seguido da descrição destes valores e por fim, como
integrá-los e classificá-los, ou seja, criar uma espécie de ranque de prioridades destes
valores. Vale ressalva, que a maior dificuldade se dá na presença de valores conflitantes, o
que exige o desafio da não sobreposição. A metodologia proposta para avaliar a
significância cultural e os valores subdivide em três etapas, a primeira de identificação e
descrição dos valores que define os objetivos e os agentes envolvidos, ou seja, as partes
interessadas “stakeholders”, culminando em um local de descrição e documentação que se
distribui para a segunda etapa, de avaliação e análise, que considera os condicionantes
físicos, o contexto da gestão e principalmente os significados e valores culturais em um
conjunto integrado para a avaliação; por fim, evoluem para a terceira etapa, as respostas,
que estabelece políticas, fixa objetivos, desenvolve estratégias e sistematiza e prepara o
plano de ação. Esta metodologia envolve o procedimento de acompanhar, revisar e
examinar as etapas descritas durante todo o processo. Desta forma, as tarefas envolvem:
identificar, elaborar/descrever, declarar/revelar, tendo como ferramentas a consulta das
partes interessadas e envolvidas e a busca por métodos de análise (econômicos, culturais,
etc), trabalhos em grupos; onde ambos culminarão na integração das avaliações e
estabelecerão as políticas correlatas entre os valores e os recursos físicos, baseando-se no
princípio da sustentabilidade e, portanto, orientarão as tomadas de decisões.

A avaliação completa de valores do patrimônio vai exigir um conjunto diversificado de


métodos e uma abordagem flexível, o que Manson define como ‘caixa de ferramentas’. O
objetivo da abordagem ‘caixa de ferramenta’ é considerar todos os valores patrimoniais
relevantes sobre a mesa, construir o balanço mais praticável possível para informar a

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formulação de políticas e tomada de decisão utilizando para isso uma variedade de
ferramentas na sua avaliação.

Para a identificação dos valores além da necessidade de definição do método de pesquisa a


ser aplicado devemos também nos atentar, conforme apontado por Manson, em definir
quem são os atores que se relacionam com o bem em questão para que estes participem
dos grupos de estudo. Assim, identificando os grupos de interessados, que sejam capazes
de representar o todo, e empregando métodos destinados a alcançar e ouvi-los à luz de seu
caráter particular e capacidade são necessários em qualquer metodologia para avaliação do
valor do patrimônio. Para garantir a melhoria tanto no processo como no resultado,
circunscrição análise e identificação das partes interessadas é tarefa extremamente
importante.

O estudo é fundamentado ainda no atual conceito atribuído ao termo “patrimônio” e na teoria


de valores proposta por Aloïs Riegl e reafirmada pela Carta de Burra do ICOMOS da
Austrália. E parte do pressuposto que qualquer processo de intervenção em um bem
patrimonial deve ir além da estrutura física, sendo obrigatório um estudo sobre os valores
atribuídos ao bem por diversos segmentos da sociedade, e não mais apenas pelos técnicos.

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3. Os atores, os valores e os métodos aplicados

3.1 O uso e seus conflitos

Atualmente o prédio da Câmara é utilizado pela parte administrativa da Câmara, além dos
serviços de apoio como recepção, faxina, cozinha e gerais. Há ainda uma sala para o
presidente da Casa, com uma antessala para sua secretária. O plenário onde se realizam as
reuniões ordinárias, extraordinárias e sessões solenes, com uma sala anexa, utilizada,
principalmente para as reuniões de comissão e outras reuniões de vereadores.

A limitação do espaço físico permite apenas a sala para o presidente da Câmara; os demais
vereadores não possuem salas dentro do prédio da Câmara. Este fato levou, em 2009, à
decisão de alugar dez imóveis na cidade, para que cada um deles pudesse ser utilizado por
um vereador, como gabinete parlamentar.

Havia ainda outro agravante, uma notificação do Ministério Público, solicitando providências
quanto ao estado físico do prédio e orientando a restauração. Segundo relatório de vistoria
técnica do IPHAN, emitido em 24 de novembro de 2009, o prédio apresenta vários
problemas na sua estrutura. A partir desse cenário e do alto custo da manutenção dos
aluguéis surgiu a ideia, que é o ponto fundamental deste trabalho, de criar uma forma de
reunir todos os vereadores em um só espaço. Essa necessidade já podia ser percebida nas
conversas entre os próprios edis e entre os funcionários da Casa.

Sendo assim, definimos os grupos que deveriam representar a sociedade. Iniciamos por
aqueles que utilizam o prédio como local de trabalho e, portanto, possuem um grande
vínculo com o espaço: os vereadores e funcionários administrativos da Casa. Para esse
grupo definimos o método ZOPP para nos orientar.

O segundo grupo de interesse foi a sociedade de Mariana, representada por três subgrupos:
os moradores do entorno da Câmara, as pessoas que frequentemente acompanham as
reuniões de trabalho da Câmara e o subgrupo que chamamos de agentes de patrimônio,
composto por pessoas que possuem vínculo com a questão do patrimônio, seja através de
estudo ou como forma de trabalho. Para este grupo definimos o método conhecido como
Mapa Mental.

O nosso terceiro grupo selecionado foi composto por turistas, e para estes, trabalhamos
com a aplicação de um questionário com duas perguntas descritivas. Nosso objetivo foi
analisar se o prédio da Câmara é relevante como ponto turístico.

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3.2 A Câmara no imaginário dos edis e funcionários

Nesta fase dos trabalhos adotamos o método ZOPP como ferramenta de trabalho. ZOPP é
uma sigla alemã que significa Ziel (objetivos), Orientierte (orientado), Projekt (projeto) e
Planung (planejamento), ou seja, planejamento de projeto orientado por objetivos.

Através desse método é possível gerenciar o desenvolvimento de projetos de grande


complexidade por terem múltiplas dimensões. O ZOPP utiliza instrumentos de forma
participativa, para isso são aplicadas técnicas de trabalho chamadas "moderação", que
permitem a maior compreensão dos conteúdos trabalhados, especialmente através de
visualização em oficinas e, com isso, melhor comunicação entre os envolvidos. Sua
característica mais importante encontra-se na efetiva participação dos atores envolvidos,
facilitada por uma boa comunicação, e, quando a participação funciona, as decisões são
mais facilmente compreendidas e compartilhadas o que, por sua vez, leva a maior
compromisso com o projeto.

Em síntese, podemos dizer que os problemas levantados durante a realização das oficinas
de diagnóstico podem ser listados e organizados em grupos, o primeiro diz respeito às
condições físicas do prédio da Câmara Municipal de Mariana, aspectos relevantes
apontados pelos participantes apontam: a falta espaço interno do prédio (insuficiente e
inadequado para instalação dos gabinetes dos vereadores); instalações elétricas e
sanitárias danificadas, colocando o edifício em situação de risco principalmente risco de
incêndio; o telhado danificado e infiltrações.

Quanto ao funcionamento do prédio, destacamos a falta de espaço adequado para abrigar


os gabinetes dos vereadores, espaço do plenário reduzido, acessibilidade limitada com
predominância de escadas ou acessos com obstáculos.

O prédio da Câmara Municipal não tem sistema de segurança patrimonial e o


estacionamento não atende as necessidades dos vereadores e funcionários da Câmara.

A manutenção dos gabinetes dos vereadores em casas particulares alugadas, em diferentes


endereços na cidade, além de ter um custo elevado, dificulta o atendimento aos cidadãos e
a possibilidade de prestar serviços coletivos à cidade. Os custos de manutenção dos
gabinetes contrariam as orientações do Tribunal de Contas e do Ministério Público.

Os participantes apontaram a falta de espaço para a preservação da memória da cidade e


da Câmara como um problema sério, e junto com esta preocupação demonstraram

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interesse de recuperar o arquivo do Legislativo, hoje, sob controle da Universidade Federal
de Ouro Preto.

Apontaram a reforma (restauro) do prédio da Câmara Municipal como prioridade e, na


mesma ordem, a necessidade de se construir um espaço adequado para abrigar a Câmara
Municipal e os gabinetes dos vereadores.

Sendo assim, chegamos às representações que seguem para a árvore de problemas e


árvore de objetivos:

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Figura 1 Árvore de objetivos
Fonte: CARVALHO, 2012. p. 82

Entre todos os participantes, vereadores e funcionários, foi unanimidade o fato de que o


atual prédio da Câmara não pode perder, pelo menos por completo, a função de abrigar o
legislativo, uma vez que a Câmara de Mariana é a primeira Câmara de Minas Gerais e,

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dentre as Câmaras fundadas em 1711 – Mariana, Ouro Preto e Sabará – é a única ainda em
funcionamento no primeiro prédio construído com o propósito de abrigá-la.

A partir desse consenso foram apresentadas três possibilidades de modificação, com vistas
a solucionar o problema central – inadequação do espaço da Casa de Câmara e Cadeia de
Mariana às necessidades do Poder Legislativo. Nessa fase do trabalho, a orientação
recebida do mediador do grupo, era que a cada sugestão apresentada, os demais
participantes deveriam discutir quatro pontos positivos e quatro pontos negativos inerentes a
ela.

A alternativa um aponta para a construção do anexo nos fundos do prédio histórico da


Câmara para abrigar os gabinetes parlamentares, arquivo histórico da Câmara e outras
funções administrativas, liberando espaço no prédio principal para abrigar o centro de
Memória do Legislativo Municipal.

A alternativa dois aponta a mudança dos gabinetes parlamentares para o novo prédio que
está sendo construído para atender a Prefeitura Municipal de Mariana, no bairro São
Cristovão, uma vez que, durante a legislatura 2005-2008 o poder executivo chegou a propor
que os três poderes: legislativo, executivo e judiciário, fossem transferidos para este novo
prédio.

E a alternativa três aponta para a restauração de um dos imóveis que o município possui no
centro histórico para abrigar os gabinetes parlamentares. Os imóveis apontados foram o
Casarão dos Morais localizado na Praça da Sé ou o casarão da Rua Direita.

Ressaltamos ainda que tanto a segunda quanto a terceira alternativas são baseadas no fato
de levar, para esses prédios, os gabinetes parlamentares e realizar a construção de um
auditório maior que o existente no prédio Casa de Câmara e Cadeia. Parte das atividades
administrativas hoje desenvolvidas na Câmara, assim como a sala do Presidente da Casa
continuariam da mesma forma que hoje.

Nessa fase, obtivemos unanimidade referente a uma questão: independente da solução


adotada, o prédio da Casa de Câmara e Cadeia de Mariana precisa passar por um processo
de restauro.

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3.3 A Câmara no imaginário da população Marianense

Os mapas mentais representam como determinado lugar é vivido e compreendido pelos


cidadãos. “No mapa mental, a representação do saber percebido, o lugar se apresenta tal
como ele é, com sua forma, histórias concretas e simbólicas, cujo imaginário é reconhecido
como uma forma de apreensão do lugar” (Nogueira apud OLIVEIRA, 20--, p. 2).

A partir do momento em que, em um projeto de intervenção em um monumento, o foco


principal deixa de ser a materialidade do edifício e passa a ser os valores atribuídos ao
monumento, valores esses atribuídos pela sociedade e não mais por técnicos apenas, a
técnica de ‘mapa mental’ vem de encontro à questão deste trabalho. Essa é a metodologia
que irá nos permitir fazer a leitura dos valores atribuídos, pela sociedade, à Câmara de
Mariana.

O trabalho de campo foi realizado no período de um mês, quando tivemos contato direto
com os entrevistados. A amostra total é composta por 25 indivíduos segmentados da
seguinte forma: 10 moradores da Rua Dom Silvério (entorno); 10 pessoas que
frequentemente acompanham as reuniões da Câmara e 05 agentes de patrimônio.

Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 130) aponta a metodologia para análise e interpretação
dos mapas mentais que tem como parâmetros: a interpretação quanto à forma de
representação dos elementos na imagem; a distribuição dos elementos da imagem, quanto
à especificação dos ícones (pela representação de elementos da paisagem natural, da
paisagem construída, dos elementos móveis e humanos) e, por último, a apresentação de
outros aspectos ou particularidades. O resultado da aplicação dessas interpretações nos
mapas mentais, aliados a uma abordagem fenomenológica do espaço, revelam uma nova
forma de abordagem, que tem o intuito de contribuir nas análises espaciais, de forma a
compreender a lógica dos atores, desde as aspirações individuais aos sistemas de valores
dos grupos sociais.

A - Interpretação quanto à forma de representação dos elementos na imagem

Com relação à forma de representação dos elementos na imagem Kozel (apud


KASHIWAGI, 2004, p. 130) observa, numa primeira análise das representações, uma
diversidade de formas representativas, que são identificadas por ícones ou formas de
representação gráfica por meio de desenho; letras, isto é, palavras complementando as

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representações gráficas; e mapas, formas de representação cartográfica que evidenciam a
espacialização do lugar.

Moradores da Frequentadores
Agentes de
Rua Dom das reuniões da TOTAL
Patrimônio
Silvério Câmara

Número Porcenta- Número Porcenta- Número Porcenta- Número Porcenta-


Absoluto gem Absoluto gem Absoluto gem Absoluto gem

Ícone 10 100% 9 90% 5 100% 24 96%

Letra 4 40% 6 60% 1 20% 11 44%

Mapa 3 30% 2 20% 1 20% 6 24%

Total
17 56,67% 17 56,67% 7 46,67% 41 54,67%
Geral

Tabela 1 Mapas Mentais - Forma de apresentação da imagem


Fonte: CARVALHO, 2012, p. 102

A partir da nossa análise, pudemos observar a predominância dos ícones em todos grupos,
seguido da predominância das letras. A representação por meio de mapa foi considerada
pequena; isso se deve ao fato de termos solicitado às pessoas que representassem a Praça
Minas Gerais, diferente de outros trabalhos que utilizam a técnica de mapa mental, mas têm
como objeto de estudo um bairro ou uma cidade, nos quais se espera uma recorrência de
representação de mapas mais significativa.

B – Interpretação quanto à distribuição dos elementos da imagem

Neste item Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 136) diz que a partir da forma, verificou-se
que as representações diferiam também quanto à disposição da imagem. Assim identificou
alguns aspectos que classificou:

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Moradores da Frequentadores
Agentes de
Rua Dom das reuniões da TOTAL
Patrimônio
Silvério Câmara
Número Porcenta- Número Porcenta- Número Porcenta- Número Porcenta-
Absoluto gem Absoluto gem Absoluto gem Absoluto gem
Perspectiva 1 10% 1 10% 0 0 2 8%
Horizontal 1 10% 0 0 1 20% 2 8%
Circular 1 0 0 0 0 0 1 4%
Quadros e
5 50% 7 70% 2 40% 14 56%
quadras
Dispersa 4 40% 0 0 2 40% 6 24%
Isolada 1 10% 0 0 1 20% 2 8%
Total Geral 13 21,67% 8 13,33% 6 20% 27 18%
Tabela 2 Mapas Mentais – Distribuição da imagem
Fonte: CARVALHO, 2012, p. 104

Observamos que a forma predominante de distribuição dos elementos da imagem foi a


representação em quadros, tanto no somatório geral, quanto se considerarmos a
representação por grupos, tendo maior peso no grupo dos frequentadores das reuniões de
Câmara. Observamos ainda que a representação de forma dispersa teve o mesmo peso
tanto no grupo dos moradores da Rua Dom Silvério, quanto no grupo dos agentes de
patrimônio. No grupo dos frequentadores das reuniões da Câmara não há nenhuma
representação de forma dispersa. Tivemos apenas um registro de representação circular
feito por um representante do grupo dos moradores da Rua Dom Silvério. Interessante
perceber que nas duas representações feitas em perspectiva, os autores são artistas
plásticos que trabalham com esculturas entalhadas na madeira.

C – Interpretação quanto à especificação dos ícones

Nesta interpretação, Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 143) especificou os ícones que
compõem as imagens, em quatro grupos:

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Moradores da Frequentadores
Agentes de
Rua Dom das reuniões da TOTAL
Patrimônio
Silvério Câmara
Número Porcenta Número Porcenta- Número Porcenta No
%
Absoluto -gem Absoluto gem Absoluto -gem .
Paisagem
Natural
Montanha 0 0 0 0 0 0 0 0
Sol, lua e
0 0 0 0 1 20% 1 4%
nuvens
Flores e jardins 0 0 1 10% 1 20% 2 8%
Árvores 1 10% 0 0 0 0 1 4%
Paisagem
construída
Casas 4 40% 3 30% 1 20% 8 32%
Ruas e
6 60% 6 60% 3 60% 15 60%
calçadas
Eq. Transporte 0 0 0 0 0 0 0 0
Parques e
8 80% 6 60% 2 40% 16 64%
Praças
Igrejas 10 100% 9 90% 5 100% 24 96%
Câmara 6 60% 9 90% 4 80% 19 76%
Pelourinho 6 60% 4 40% 1 20% 11 44%
Capela de
1 10% 0 0 0 0 1 4%
equipamentos

São Jorge
Outros

Escadas 3 30% 3 30% 0 0 6 24%

Cemitério 0 0 1 10% 0 0 1 4%
Elementos
móveis
Transporte
0 0 0 0 0 0 0 0
terrestre
Outras formas
0 0 0 0 0 0 0 0
de transporte
Elementos
humanos
Homem, mulher
0 0 0 0 0 0 0 0
e crianças
Tabela 3 Mapas Mentais – Especificação do ícones
Fonte: CARVALHO, 2012, p. 110

Desta forma, podemos observar que poucos foram os ícones que integram o item ‘paisagem
natural’. Esse aspecto foi reforçado durante as entrevistas. Nos depoimentos o foco de

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atenção maior é das Igrejas e da Câmara. Porém, apesar da baixa incidência de elementos
naturais, o item aparece em todos os subgrupos.

Quanto aos elementos da ‘paisagem construída’ percebemos que os ícones de maior


representatividade são as Igrejas. Na sequência, observamos a Câmara como segundo
elemento da paisagem construída mais representado nos desenhos. Em seguida, o ícone de
maior representação foi a Praça. Vale ressaltar que consideramos o elemento ‘praça’ em
todos os desenhos que o contorno da Praça Minas Gerais foi evidenciado. E a incidência de
pessoas que fizeram referência às ruas foi constante (60%) nos três subgrupos.

Quanto ao pelourinho, podemos afirmar que sua representatividade, na totalidade, foi baixa
(44%), se comparada com a representação dos outros elementos. Na totalidade, as Igrejas
obtiveram uma representatividade de 96%, a Câmara de 76%, a Praça de 64% e as ruas de
60%. O pelourinho não é original desta Praça, foi montado na Praça em 16 de julho de
1981, segundo texto afixado no monumento.

Interessante analisar ainda que não houve representação de nenhum elemento humano por
nenhum dos entrevistados, apesar de nas entrevistas as pessoas reconhecerem a Praça
como espaço de uso. Porém o uso frequentemente relatado refere-se a datas específicas,
comemorações pelo aniversário da cidade, evento do Dia de Minas e procissões.

Após toda essa análise podemos concluir que há, pelo menos, um traço comum em todas
as entrevistas, independente do grupo de entrevistas a qual pertença: a beleza da Praça
Minas Gerais. Ficou claro, para nós, que a população reconhece esse espaço como
detentor de uma beleza singular. O caráter etéreo do espaço, de algo que eleva
espiritualmente, foi fortemente destacado nas entrevistas.

A proposta deste trabalho é justamente entender todos esses valores e integrá-los em um


projeto de intervenção arquitetônica que vise solucionar os problemas vivenciados no dia-a-
dia da Câmara, apontados durante a pesquisa com os vereadores e funcionários, sem
perder de vista os valores atribuídos ao conjunto arquitetônico da Praça Minas Gerais como
um todo. Uma vez que o prédio da Câmara integra este espaço e qualquer intervenção
neste bem poderia refletir na Praça. Procuramos uma proposta que pudesse reforçar esses
valores, não poderíamos entrar em conflito com os valores apontados durante as
entrevistas.

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3.4 A Câmara no imaginário dos turistas que a visitam

Para trabalhar o grupo dos turistas, optamos por um questionário com uma pergunta central:
“quais são os pontos turísticos de Mariana?”. Tínhamos por objetivo avaliar a relevância da
Câmara Municipal de Mariana como ponto turístico. Por isso, optamos por uma questão
‘aberta’; entendíamos que a resposta deveria ser fornecida de forma espontânea.

A amostra foi composta por quarenta entrevistados. A aplicação da pesquisa foi realizada no
período de 13 a 15 de janeiro de 2012 sendo, os dias da semana respectivamente, sexta–
feira, sábado e domingo. Os locais de abordagem dos turistas foram: espaço em frente à
Igreja da Sé, na Rua Direita, Praças Minas Gerais e Gomes Freire.

Quando questionados sobre os pontos turísticos de Mariana, 42,5% dos entrevistados


responderam as Igrejas, sem citar especificadamente qual Igreja. A segunda resposta de
maior relevância, representando 27,5% dos entrevistados, é a referência à Igreja de São
Francisco de Assis e ao Santuário Nossa Senhora do Carmo. Em terceiro lugar,
representando 25% dos entrevistados, o ponto turístico apontado é a Casa de Câmara e
Cadeia de Mariana. Em seguida, empatados com a mesma representatividade nas
respostas, 22,5% dos entrevistados, apontaram a Igreja da Sé e Praça Minas Gerais.
Seguidos de 20% dos entrevistados que indicaram a Igreja de São Pedro e 12,5% dos
entrevistados indicaram os Museus. Os demais pontos turísticos apareceram como menos
significativos na visão dos entrevistados e seguem representados no gráfico abaixo:

Gráfico 1 Indicação espontânea dos pontos turísticos em Mariana


Fonte: CARVALHO, 2012, p. 146
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É interessante perceber que os itens elencados segundo, terceiro, quarto e quinto lugar-
Santuário de Nossa Senhora do Carmo (as pessoas, em geral, utilizam o termo Igreja do
Carmo), Igreja de São Francisco de Assis, Praça Minas Gerais e Casa de Câmara, estão
inseridos em um mesmo espaço. A Praça Minas Gerais engloba as Igrejas e a Casa de
Câmara.

A partir desta percepção surge um novo desafio para o nosso trabalho: como conciliar os
usos dos espaços no projeto de intervenção no prédio?

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4. O PROJETO PROPOSTO
Baseados nos métodos de pesquisa aplicados conseguimos comprovar que o prédio da
Casa de Câmara e Cadeia é reconhecidamente um símbolo do poder civil valorizado,
principalmente, pela beleza arquitetônica da construção e testemunho da história de Minas
Gerais, atribuindo-lhe também a função de ponto turístico.

A localização da Câmara, na Praça Minas Gerais, juntamente com as igrejas – Igreja do


Carmo e Igreja de São Francisco de Assis - caracteriza uma conformação urbana única no
Brasil. E torna este largo um palco de celebrações cívicas e religiosas relevantes para a
população local, conforme apontado nas entrevistas. Temos, a um só tempo, as
representações dos poderes civil e religioso, que permanecem, até hoje, ‘vivos’, exercendo
a mesma função que lhes foi atribuída no passado, desde as suas construções.

Transferir as funções da Câmara para outro endereço, como foi aventado no decorrer do
processo, seria o mesmo que esvaziar o prédio de significado, provocando-lhe um corte
abrupto na história.

Porém para garantirmos essa simbologia na sua completude, a atualidade exige algumas
adaptações. Precisamos ampliar a estrutura física da Câmara de forma que o valor
simbólico seja mantido, conciliando os usos – local de trabalho e espaço turístico - e, sem
permitir, no entanto, que a construção atual seja diminuída pela concorrência visual com
novos elementos arquitetônicos ao seu redor.

O projeto de intervenção arquitetônica foi elaborado pelos arquitetos Professor Doutor Flávio
de Lemos Carsalade, Doutor Benedito Tadeu de Oliveira, Mestre Bernardo Nogueira
Capute, Gustavo Kamino, sob a coordenação do Professor Doutor Leonardo Barci Castriota.

Ao propormos que a Câmara continue funcionando no mesmo endereço, avaliamos que o


edifício principal consegue continuar absorvendo algumas atividades da Câmara: o plenário
atende às reuniões de menor porte; a sala do presidente e sua secretária, o que contribuirá
para manter o caráter solene do prédio, além de conseguir manter algumas estruturas
administrativas, como a assessoria jurídica próxima ao plenário, por exemplo. O desafio de
readequação do uso reúne três aspectos principais: ausência dos gabinetes dos vereadores;
necessidade de ampliação do espaço para o apoio administrativo e espaço limitado do
plenário para as reuniões mais concorridas. Somado a isso, temos a necessidade de
melhoria no conforto básico e de garantir a acessibilidade.

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Para atender a tais necessidades, mantendo a Câmara em funcionamento no mesmo sítio,
faz-se necessário uma ampliação na sua estrutura física. Porém tal ampliação deve ocorrer
de maneira ‘solta’ ao edifício principal. Um acréscimo na estrutura existente comprometeria
drasticamente as características do edifício atual. A proposta de intervenção preza ainda por
não criar novos elementos que possam competir com a magnitude do prédio existente,
retirando-lhe a primazia no espaço ou que venha a competir visualmente.

Propõe a ampliação de modo discreto e utilizando os espaços disponíveis: a área abaixo do


estacionamento e a porção de terreno, em declive, atrás da capela e armazém. O espaço do
subsolo, abaixo do espaço do estacionamento, será utilizado para a criação de um auditório
para 150 pessoas, conforme necessidade apontada nas reuniões com vereadores e
funcionários. O segundo espaço disponível a ser utilizado é um filete de terreno em desnível
descendente, localizado atrás das construções históricas identificadas como “Capela de São
Jorge” e “Armazém”, e limitado por um extenso muro. Neste espaço será inserida uma
construção para abrigar quinze gabinetes para vereadores no primeiro piso e nas
extremidades do segundo piso serão criadas salas de trabalho para atender as reuniões das
comissões da Câmara e demais reuniões internas. O acesso à Capela será respeitado e no
espaço do antigo armazém será criada uma recepção alternativa de acesso aos gabinetes,
permitindo assim que as pessoas circulem também por ali. Caso tivéssemos apenas o
acesso pelo prédio principal, provocaríamos uma forte tendência das pessoas se
esquecerem das construções históricas dos fundos, principalmente aquelas pessoas que
não fizessem o uso do estacionamento. Os acessos buscam atender a dois princípios:
acessibilidade universal e valorização.

Com a transferência de alguns serviços da Câmara, hoje realizados no prédio histórico, para
a nova edificação conseguiremos liberar algumas salas do prédio histórico, principalmente
as salas que já foram as celas da cadeia. Desta forma, atenderemos a outro ponto
levantado durante as entrevistas: o reconhecimento da Câmara como ponto turístico. A
proposta é criar no segundo pavimento do prédio histórico uma exposição permanente que
retrate a história da Câmara, e no primeiro pavimento, uma exposição permanente que
retrate a história da cadeia.

A proposta de ampliação da Câmara Municipal de Mariana é um ato de respeito à


continuidade da história, à vitalidade urbana do trecho protegido e ao patrimônio material e
intangível, personificados no edifício que, dignamente, atravessa os tempos, integrando, em
um único logradouro, todas as atividades relacionadas à Câmara, contando ainda com um

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espaço voltado à pesquisa e divulgação da história desta instituição que representa o início
das atividades legislativas em Minas Gerais.

Figura 2 Planta do 1º pavimento do Anexo da Câmara Municipal de Mariana


CARVALHO, 2012, p. 157

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Figura 3 Planta do nível do subsolo do Anexo da Câmara Municipal de Mariana
CARVALHO, 2012, p. 158

Figura 4 Fachada Principal da Câmara Municipal de Mariana com o 1º pavimento do Anexo ao fundo
CARVALHO, 2012, p. 158

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na proposta apresentada acreditamos que estamos priorizando o contexto


urbanístico no qual o prédio da Casa de Câmara e Cadeia está inserido, levando em
consideração a dinâmica da cidade e do próprio bem que necessita passar por uma
ampliação do espaço físico a fim de comportar toda a estrutura administrativa, e
adquirir novos recursos de trabalho; espaços projetados que visem melhor
desempenho profissional; infraestrutura tal como banheiros, auditório, salas de
reunião, gabinetes parlamentares.

O projeto de intervenção no prédio da Casa de Câmara e Cadeia está baseado no


estudo de percepção deste bem sob o ponto de vista dos moradores e usuários do
espaço, no intuito de conhecer quais os valores estas pessoas atribuem ao prédio
através da forma como eles utilizam e valorizam o espaço. Garantindo que o projeto
de intervenção conserve, em primeiro lugar, os valores atribuídos ao bem. Além
disso, a projeto de construção do anexo foi elaborado juntamente com os usuários
principais do prédio: vereadores e funcionários.

Paralelamente a essa ampliação [do conceito de patrimônio], hoje percebe-


se, muito mais que no passado, que o fim último da conservação não vai ser
a manutenção dos bens materiais por si mesmos, mas muito mais a
manutenção (e a promoção) dos valores incorporados pelo patrimônio,
sendo as intervenções ou tratamentos físicos aplicados a esses bens
apenas um entre muitos meios para se obter este fim. (CASTRIOTA, 2009,
p. 101)

O projeto apresentado para solucionar o problema da insuficiência do espaço físico


da Câmara de Mariana vai de encontro ao conceito apresentado pelo professor
Castriota, a proposta vai além da conservação apenas do bem material,
representado pelo edifício, propõe a manutenção e a promoção dos valores
incorporados, uma vez que a atividade legislativa desenvolvida nesse prédio será
mantida e, através da construção do novo anexo, ganhará ainda mais força.
Conseguiremos unir todos os edis e funcionários em um só local, além e promover a
valorização da história da instituição através da criação do centro de memória do
legislativo.

As políticas públicas na área do patrimônio se baseiam, ou pelo menos deveriam se


basear, no processo de escuta da comunidade. Se o tombamento é fundamentado

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por defender que o direito da coletividade está acima do direito privado da
propriedade, nada mais justo que em um processo de restauro a população
detentora do bem seja convocada e tenha voz ativa nas escolhas deste processo. O
Estado não pode mais ser o único responsável, ou o único a ter direito de decisão,
em um processo de restauração um bem patrimonial de uso coletivo.

Apesar dos avanços na discussão dos valores no campo do patrimônio cultural para
o Getty Conservation Institute (GCI), citado por Castriota (2009, p. 108 e 109), a
ênfase dada às três perspectivas encontradas no campo do patrimônio, a
“conservação física”, o “contexto de gestão” e a “significância cultural e valores
sociais”, ainda encontram-se em desequilíbrio, com claro predomínio as duas
primeiras. Para o GCI, cabe reconhecer que, infelizmente, as pesquisas na área da
conservação ainda estão centradas no aspecto físico, raramente envolvendo as
discussões dos valores entorno do bem. O presente estudo parte exatamente da
perspectiva que possui menor peso na maioria das outras pesquisas, a “significância
cultural e valores sociais”.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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%20NilzaApdaSilvaOliveira.ED2I.b.pdf>. Acesso em: 05 nov. 2011.

REVISTA DO ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO. Creação de villas no Periodo Colonial.


Ouro Preto, ano 2, fascículo 1, pp. 81-83, jan/mar 1897. Disponível em
<http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/modules/rapm/brtacervo.php?cid=51>. Acesso
em: 11 ago. 2011.

RIEGL, Aloïs. O culto moderno dos monumentos: sua essência e sua gênese./ Aloï
Rielg; Tradução Elaine Ribeiro Peixoto e Albertina Vicentine. Goiânia: Ed. UCG,
2006.

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
A PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO EDIFICADO EM COLATINA E
SUA TRAJETÓRIA

ALMEIDA, ALEXANDRE VALBUZA

Arquiteto e Urbanista formado pelo Centro Universitário do Espirito Santo (UNESC)


alexandrevalmeida@gmail.com

RESUMO
O presente trabalho tem a intenção de pesquisar a respeito do processo de desenvolvimento das
politicas públicas de preservação do patrimônio cultural em Colatina, Espirito Santo, especificamente
o patrimônio edificado. Posteriormente averiguar como o desenvolvimento urbano da cidade,
influenciou na condição atual do patrimônio arquitetônico da área central da cidade. Devido as fortes
chuvas que atingiram Colatina entre os anos de 2013 e 2014, grande parte dos registros e
documentações a respeito da história e desenvolvimento da cidade foram perdidos, tornando a coleta
de dados mais árdua. Observa-se, desde então, o aumento dos percalços à obtenção de
informações. Cabe salientar que o trabalho está baseado em análise bibliográfica e sistematização de
informações obtidas através de documentos, material iconográfico, entrevistas e levantamento de
campo. A pesquisa apresenta-se como um campo vasto de possibilidades, uma vez que há pouco
autores e pesquisadores do tema. Nota-se também que a falta de revitalização dos prédios históricos
tem acarretado situações para a desvalorização dos imóveis em nível patrimonial. Por fim, considera-
se que a relevância acadêmica deste trabalho se dá na perspectiva de poder contribuir como fonte
para outras pesquisas voltadas para essa temática.

Palavras-chave: Patrimônio, historia, memoria, cultura, arquitetura.

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CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Colatina é um município localizado na região Noroeste do Estado do Espírito Santo, com


uma população estimada em aproximadamente 120 mil habitantes. A sede do município
está situada no Vale do Rio Doce, aproximadamente 135 quilômetros da capital, Vitória. O
surgimento de Colatina remonta ao final do século XIX, com a chegada de colonizadores
italianos à região. Mas foi somente em 1921 que a então Vila de Colatina foi promovida a
município. Atualmente, Colatina é polo regional de referência no Estado, com destaque nas
áreas de saúde e educação. Destaca-se, também, na economia do município, a indústria do
vestuário, seguida pela indústria moveleira. A agricultura tem o café conilon como seu
principal produto, além da fruticultura e hortigranjeira (IBGE, 2010).

O município é cortado pelas rodovias ES-080 e BR-259 e pela ferrovia Vitória a Minas, o que
criou condições para a cidade crescer e desenvolver economicamente, como centro regional
de comércio e serviços. Colatina comercializa grande parte da produção cafeeira de
municípios vizinhos, além de possuir um terminal de cargas que integra os modais
ferroviário e rodoviário, dando suporte à produção de rochas ornamentais e eucalipto da
região (IBGE, 2010). Um dos períodos de grande crescimento da cidade foi após a
construção da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM), que propiciou ao município
comunicação direta com a capital do Estado, Vitória.

A aceleração do processo de urbanização e de adensamento das áreas urbanas, em função


do capital imobiliário, faz com que os bens históricos se percam em meio ao crescimento
urbano, favorecendo a descaracterização, abandono e até mesmo a perda do patrimônio
histórico da maioria das cidades, bem como Colatina. Este trabalho tem como objetivo
compreender a origem e formação do patrimônio histórico, artístico e cultural colatinense e
posteriormente, averiguando o estado de conservação e originalidade do patrimônio
arquitetônico apresentado.

Em termos metodológicos, o trabalho está fundamentado em pesquisa bibliográfica sobre o


tema abordado, levantamento e sistematização de informações obtidas através de pesquisa
em documentos e periódicos da época, material iconográfico, entrevistas e levantamento de
campo. As informações obtidas foram estruturadas segundo o tema, que norteia o objetivo
do trabalho: a preservação do patrimônio edificado em Colatina e sua trajetória. Partindo
dessa premissa, buscou-se analisar o patrimônio histórico enquanto fenômeno na formação
e desenvolvimento da cidade.

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A relevância acadêmica deste trabalho se dá na perspectiva de poder contribuir como fonte
para outras pesquisas voltadas para essa temática. Dentro da relevância social, destaca-se
a possibilidade de ser feita uma divulgação à sociedade em geral, via digital ou impressa,
levando as pessoas a terem outro olhar, interesse e curiosidade a respeito do
desenvolvimento de Colatina e seu patrimônio.

GÊNESE DO MUNICÍPIO

A história do desbravamento do município de Colatina está intimamente ligada às tentativas


de colonização do Vale do Rio Doce e à retirada das aldeias indígenas dessa região. A
presença dos primeiros imigrantes italianos na região de Colatina começou a ocorrer em
1889, e foi essencial para que as ocupações dessas terras ocorressem efetivamente.
Segundo Teixeira (1974), na área hoje ocupada pelo distrito de Boapaba, antiga Vila de
Mutum, estava localizado o núcleo colonial Senador Antônio Prado, criado pelo Governo
Imperial, a fim de receber os primeiros imigrantes italianos. A partir desse núcleo colonial, as
seções começaram a se desenvolver; no entanto, uma prosperou mais que as outras: o
chamado Barracão ou Arraial do Rio Santa Maria.

Quanto à formação da Vila de Colatina, seu início se deu principalmente em


1888 com a chegada do vapor Adria, que trouxe os primeiros colonos
italianos. Os vapores eram praticamente os únicos meios de transporte para
a nascente Vila de Colatina, encravada na localidade denominada Arraial de
Santa Maria, hoje bairro Colatina Velha (MADURO, 2001, p. 13).

O Barracão do Rio Santa Maria, que se localizava no atual Bairro Colatina Velha, município
de Colatina, prosperou devido à facilidade no escoamento da produção agrícola, através do
Rio Doce. Esse Barracão serviu para que o Governo conduzisse e alojasse os imigrantes,
logo à sua chegada, e onde, em geral, permaneciam por muitos meses. Posteriormente, o
Barracão, possibilitou a escolha do local da primeira igreja e residências na região, por volta
de 1892. Em 1899, quando já havia um número bastante considerado de casas próximas ao
Barracão do Rio Santa Maria, foi criada a Vila de Colatina, subordinada ao município de
Linhares (Teixeira, 1974).

No início do século XX, a Vila de Mutum era considerada o núcleo mais importante da
região. A Vila de Colatina, entretanto, logo passou a se transformar no principal núcleo,
devido à facilidade do transporte agrícola através do Rio Doce; a Vila também se tornou
referência dos imigrantes no caminho para a colonização das terras ao norte do Estado.
Contudo, segundo Ribeiro (1996), a perda de importância e o declínio da Vila de Mutum

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ocorreram, principalmente, com a chegada da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM), em
1906. O escoamento da produção do café tornou-se mais viável pelo trem, que tinha parada
na Vila de Colatina.

A CHEGADA DA MARIA FUMAÇA

De acordo com Ribeiro (1986), a ligação ferroviária entre o interior de Minas Gerais e o
Porto de Vitória teve origem na segunda metade do século XIX. Em fevereiro de 1902, o
Governo Federal concedeu, através de um Decreto-Lei, a criação da Companhia Estrada de
Ferro Vitória a Minas (CEFVM), e do primeiro trecho ferroviário, que ligava a cidade de
Vitória-ES a Natividade-MG. No início do século XX, a primeira estação ferroviária de
Colatina era inaugurada, mais precisamente em 20 de dezembro de 1906, localizada no
quilômetro 128 da ferrovia, bem próxima à Vila de Colatina, onde hoje se encontra a Praça
Municipal. Inicialmente, as cidades mais beneficiadas com a EFVM foram: Colatina-ES,
Aimorés-MG, Conselheiro Pena-MG e Governador Valadares-MG, locais do surgimento das
primeiras estações ferroviárias.

No dia imediato, ordenamos a roçada da capoeira e locamos a estação. A


Vila edificada aquém, no espigão à margem direita do rio Doce, desde então
passou a chamar-se Colatina Velha e a que, rapidamente, foi nascendo nas
vizinhanças da estação, denominou-se Colatina Nova. A 20 de dezembro
daquele ano de 1906, inaugurou-se o novo trecho construído ali (ALMEIDA,
apud, MADURO, 2001, p. 10).

A Vila de Colatina começa a se desenvolver a partir de 1906, com a inauguração da Estação


Ferroviária e da EFVM, que propiciou à Vila comunicação direta com a capital do Estado,
por meio de transporte rápido e barato para sua produção, principalmente de madeira e
café. O desenvolvimento econômico acelerado da Vila acabou abalando diretamente o
município de Linhares, fazendo com que todo o comércio de grande parte de Minas Gerais e
do Espírito Santo, que era feito em Linhares, passasse a ser feito em Colatina. Tal fato
contribuiu para que, em 1907, a Vila de Colatina se transformasse na sede do município de
Linhares. Essa situação dura até 1921, quando foi criado o município de Colatina,
compreendendo todo o território que pertencia a Linhares, que passou a ser uma Vila,
subordinada a Colatina (Ribeiro, 1996).

Outra importante ferramenta no desenvolvimento da cidade foi a construção da Ponte


Florentino Ávidos, inaugurada em 1928, determinante na expansão norte de Colatina. A
construção da ponte, segundo Teixeira (1974), estava prevista no plano de construção de

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uma estrada de ferro, que deveria fazer a ligação entre Colatina e o município de São
Mateus, uma área até então pouco explorada no norte do Estado. Diante do malogro da
implantação da estrada de ferro, a ponte passou a ser utilizada por pedestres, e,
posteriormente para circulação rodoviária.

Antes da construção da ponte, a travessia do Rio Doce era somente feita de canoa, e o
trajeto tinha duração de mais de uma hora. A região à margem norte do Rio era chamada de
Francilvânia, e possuía algumas fazendas, onde habitavam poucos colonos. Aos poucos,
após a construção da ponte, os fazendeiros foram vendendo suas terras para a implantação
de novos loteamentos na cidade (Ribeiro, 1996). A ponte também foi um importante
instrumento que facilitou o escoamento da produção de madeira e, com isso, expandindo
ainda mais esse setor. A produção do café, a partir de então, ganha mais importância no
município, pois se aproveitava também das grandes áreas desmatadas com a produção da
madeira.

Contudo, segundo Ribeiro (1986), somente a partir de 1942, com a criação da Vale, então
Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), diversas melhorias foram realizadas na EFVM. A
primeira melhoria teria ocorrido na década de 40, com a remodelagem do traçado da
ferrovia, entre Vitória e Colatina. Segundo Maduro (1989b), um fato importante ocorrido
nesse período, teria sido a relocação do Rio Santa Maria, através da remoção do “Morro das
Cabritas” (elevação de terra, que existia onde hoje se encontra o Hospital e Maternidade
Doutor Sílvio Ávidos), do centro da cidade. A fim de transpor o Rio, que tinha como leito
natural a passagem pelo centro da Cidade, a CVRD se aproveita das terras formadoras da
elevação montanhosa, levando as águas do Rio para o curso atual. Essa manobra serviu
para encurtar o trecho da ferrovia pelo centro da cidade e na construção de uma área para a
nova estação ferroviária, e, posteriormente, na formação de um novo bairro para a Cidade, o
Esplanada.

Na intenção de melhorar as condições da linha férrea, em 1951, a CVRD inaugurou a nova


Estação Ferroviária no Bairro Esplanada. A primeira estação localizada na Praça Municipal
é desativada e demolida, abrindo caminho para o desenvolvimento no centro da Cidade,
juntamente com a nova área criada (Ribeiro, 1986). Com o crescimento e desenvolvimento
da cidade, a passagem do trem passa a ser prejudicial para os moradores e comerciantes
locais, devido ao crescimento do fluxo de automóveis na região central, não dimensionada
para o tráfego crescente, além do incômodo do pó de minério; passa-se, então, a cogitar de
uma nova modificação na trajetória da EFVM em Colatina.

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Assim em 24 de outubro de 1975, a CVRD, em parceria com o Município, retira os trilhos da
EFVM do interior da cidade, levando a ferrovia para uma variante pela região sul, longe do
centro de Colatina, que já se encontrava “asfixiado”. A relocação da ferrovia teve como
principal objetivo o alisamento do território para a passagem dos fluxos da produção local.
Sem dúvidas, a EFVM promoveu um grande desenvolvimento econômico em Colatina e
além disso, o crescimento da cidade. Porem esse crescimento teria sido desordenado, sem
qualquer planejamento urbanístico que projetasse a abertura de novas vias e a localização
de áreas públicas, como praças (MADURO, 1985)

O DESAFIO DA PRESERVAÇÃO PATRIMONIAL COLATINENSE

De acordo com Choay (2010), a importância de se fazer o resgate cultural, incluindo-se aí os


valores e as tradições de determinada localidade se dão pela possibilidade de manter ativas
as referências de identidade de um grupo social. A compreensão da história, de modo geral,
está ligada às intervenções do homem com os bens considerados “patrimônio históricos”, no
sentido de preservar, fazendo com que o passado interaja com o presente.

Para se preservar, é necessário, de antemão, delimitar, definir e esclarecer o que compunha


o patrimônio histórico colatinense; para tal, foi aprovado o Decreto-Lei nº 5.257, de 14 de
dezembro de 2006, onde ficaria criado o Conselho Municipal de Patrimônio Histórico,
Artístico, Ambiental e Cultural, com a finalidade de promover, em todo território municipal, a
permanência, o tombamento, a conservação, o enriquecimento e o conhecimento do
patrimônio histórico e artístico.

Desde então, a política de proteção patrimonial municipal, veio se intensificando ao longo


dos anos e consolidou-se com a elaboração de estudos, documentos, orientações jurídicas
administrativas, além do efetivo uso dos diversos instrumentos de acautelamento
disponíveis e previstos nas Leis Estaduais e Federais, que resultaram na elaboração de
diversas leis preservacionistas ao longo dos anos.

Atualmente, a cidade já possui homologados, em esfera municipal, cerca de dez Decretos


de Leis que declaram como patrimonial histórico, cultural e artístico, a preservação de áreas
e edificações urbanas, que, de algum modo, caracterizarão a sociedade colatinense em seu
contexto existencial.

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Quadro 1: Patrimônio Histórico e Arquitetônico de Colatina.

EDIFICAÇÃO LEI DE PRESERVAÇÃO

Catedral Sagrado Coração de Jesus Decreto de Lei nº 5.246, de 25 de outubro de 2006

Câmara Municipal Decreto de Lei nº 5.915, de 18 de dezembro de 2012

Escola Aristides Freire Decreto de Lei nº 5.915, de 18 de dezembro de 2012

Iate Clube Decreto de Lei nº 5.915, de 18 de dezembro de 2012

Estátua do Cristo Redentor Decreto de Lei nº 6.167, de 07 de abril de 2015

Igreja Nossa Senhora Auxiliadora Decreto de Lei nº 6.168, de 07 de abril de 2015

Casario da Avenida Getúlio Vargas Decreto de Lei nº 6.172, de 22 de abril de 2015

Hospital e Maternidade Dr. Sílvio Ávidos Decreto de Lei nº 6.173, de 22 de abril de 2015

Ponte de Ferro Agenor Alves Decreto de Lei nº 6.174, de 27 de abril de 2015

Biblioteca Municipal Decreto de Lei nº 6.175, de 27 de abril de 2015

Antiga Estação Ferroviária Decreto de Lei nº 6.176, de 27 de abril de 2015

Antigo Vagão de Trem Decreto de Lei nº 6.183, de 20 de maio de 2015

Fonte de dados: Prefeitura Municipal de Colatina (PMC). Elaborado pelo Autor.

Apesar da preocupação da política público municipal, relacionado a preservação do


patrimônio histórico, Colatina em seu âmbito jurídico não possui oficialmente nenhum
patrimônio tombada, em todo seu território urbano. Porém, deve-se ressaltar que, em 2013,
é criada a Resolução CEC nº 003 Estadual, que determina como Área de Proteção
Ambiental e Cultural (APAC), a constituída formada pelo Sítio Histórico Urbano de Itapina e
áreas de entorno, que se encontram no distrito de Itapina, que dista aproximadamente 36
km da sede do município de Colatina. O vilarejo possui um conjunto histórico e paisagístico,
resultante dos tempos áureos do café, que foi implantado ao longo do Rio Doce,
apresentando casario em sua maioria datado da primeira metade do século XX, com
relevante importância para a história capixaba (SECULT, 2016).

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QUATRO CONJUNTOS HISTÓRICOS E ALGO A MAIS

Para Lynch (2014), a cidade tem a capacidade de se transformar a cada instante que passa;
estruturada por uma mistura complexa de construções geológicas, biológicas, sociais e
linguísticas que não são mais do que mera acumulação de matérias moldadas e enrijecidas
pela história. O contexto contemporâneo se depara, cada vez mais, com transformações
sociais, econômicas e culturais, gerando uma sobrecarga de informações e percepções de
difícil digestão para a sociedade na compreensão do passado (NARDI, 2015).

As edificações abordadas a seguir, representam as obras arquitetônicas que


testemunharam a evolução histórica e urbana de Colatina. O patrimônio arquitetônico, está
dividido em conjuntos, baseadas na proximidade entre os edifícios e no critério histórico de
cada um. Importante ressaltar que é possível aumentar o grau de importância histórica de
uma edificação quando a tratamos como um componente de um conjunto arquitetônico.
Colatina não possui um patrimônio construído com apelo ou valor arquitetônico nacional, e
poucos possuem um destaque estadual, a formação de conjuntos aumenta a importância
dessas edificações isoladas.

O Conjunto I é formado pelas edificações resultantes da colonização do Município e se


localiza no Bairro Colatina Velha. O Conjunto II traz consigo os edifícios formados a partir
dos arredores da primeira Estação Ferroviária, inaugurada em 1906, que ficava localizada
na Praça Municipal, representante da expansão territorial da Vila de Colatina. Já o Conjunto
III, localizado no centro da Cidade, representa a expansão do Município a partir da Linha
Férrea, que, posteriormente, deu origem à Avenida Getúlio Vargas e, consequentemente, à
formação do comercio e novas edificações. O Conjunto IV marca a importância que a EFVM
teve no desenvolvimento da cidade, servindo, assim, como um memorial, situado na Praça
Sol Poente.

CONJUNTO I

A área formada pelo Conjunto abriga o núcleo histórico de fundação da Vila de Colatina. O
Conjunto I possui como principal e único componente a Igreja Nossa Senhora Auxiliadora,
marco inicial da ocupação do solo colatinense, situada no Bairro Colatina Velha, nas
imediações onde fora construído o Barracão do Rio Santa Maria, que abrigou os primeiros
imigrantes italianos, em 1888. Assim como ocorre na maior parte das cidades brasileiras, as
primeiras residências da colônia foram construídas em torno da igreja erguida no final do
século XIX, fato que ocorre também com as edificações públicas que até 1913 estavam
todos situados na então Vila de Colatina, hoje Bairro Colatina Velha (MADURO, 2001).
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Figura 01: Mapeamento do Conjunto I.
Fonte de dados: Prefeitura Municipal de Colatina [PMC] e acervo do autor. Elaborado pelo Autor.

Como já mencionado, na década de 40 ocorreu uma remodelagem no traçado da EFVM, em


todo o trecho que cortava o centro da cidade de Colatina. Durante as melhorias da ferrovia,
ocorreram constantes explosões de rochas, na área próxima à Igreja, devido às
necessidades de locação da linha férrea. As explosões acabaram por acarretar o
comprometimento da estrutura da Igreja Nossa Senhora Auxiliadora, construída no final do
século XIX. Em meados do século XX, o templo religioso foi completamente demolido
devido às suas más condições estruturais. Na década de 1950, se inicia a construção de
uma nova igreja, erguida no mesmo local, porém com a fachada principal não mais voltada
para o Rio Doce e com partido arquitetônico mais moderno, quando comparada com a
antecessora (MADURO, 1988).

Apesar de a igreja não ser a mesma construída no início da congregação da Vila de


Colatina, e não possuir o mesmo valor histórico de sua antecessora, o templo atual
representa o marco da iniciação do núcleo de colonização, que, posteriormente, deu origem
ao município.
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CONJUNTO II

Fruto do desenvolvimento econômico da Vila de Colatina, o Conjunto II começa a ser


formado a partir das imediações da estação ferroviária, inaugurada em 1906. Com Colatina
se tornando oficialmente a sede municipal de Linhares, em 1907, a Câmara Municipal, bem
como a Comarca e todo o aparelhamento judiciário, são transferidos para o Vilarejo, que
exercia comunicação direta com a capital do Estado através da EFVM (RIBEIRO, 1996).

Figura 02: Mapeamento do Conjunto II.


Fonte de dados: PMC e acervo do autor. Elaborado pelo Autor.

Até 1913 todos os órgãos públicos funcionavam na Vila de Colatina, próximo a Igreja Nossa
Senhora Auxiliadora. Com a expansão territorial da Vila, através da linha férrea e o
desenvolvimento constante do comercio às margens da estação ferroviária, os
equipamentos públicos deixam o núcleo de colonização e partem para o atual Centro da
Cidade, denominando o local de “Colatina Nova”. Assim, por volta de 1913, se inicia a
construção do edifício que servia para abrigar a Comarca de Colatina, e, posteriormente,
serviria para a Câmara Municipal. O lugar escolhido para a construção da edificação foi
exatamente às sombras da estação ferroviária, área bastante movimentada durante as
paradas de trem, e ponto principal na formação do comércio local (MADURO, 1988).

O edifício da Câmara Municipal representa a introdução do ecletismo à Vila de Colatina,


sendo um dos mais belos exemplares arquitetônicos da cidade, que se encontra em bom
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estado de conservação e originalidade. Sua fachada exuberante traz, em si, a marca do
ecletismo através de alguns elementos decorativos, como: coluna dórica, balaústre,
molduras, concha, rocalha, voluta, cachorro, entre outros.

A partir de 1913, começou a se formar, nos redores da estação ferroviária, um importante


conjunto histórico, que teve como origem o edifício da antiga estação ferroviária,
posteriormente, a edificação da Câmara Municipal. Com a instalação da Comarca na nova
edificação construída, outras obras públicas também foram erguidas ao redor da estação,
como a Escola Aristides Freires.

A primeira escola da Vila de Colatina teria sido a “Escola Reunidos”, que ficava localizada
próxima a Igreja Nossa Senhora Auxiliadora. Devido ao crescimento constante da Vila e,
consequentemente, do aumento da demanda por matrículas, em 1918, uma nova escola é
erguida, agora, na Praça Municipal, ao lado da Comarca, o Grupo Escolar Aristides Freires.
No início, a escola contava apenas com quatro salas de aula; mais tarde, foi ampliada e
passou por várias reformas ao longo dos anos para suprir as necessidades do corpo
acadêmico. Apesar das mudanças na edificação, a obra é considerada um importante
patrimônio histórico para a cidade, já que ocupa o posto de uma das primeiras escolas da
Vila de Colatina e única até 1939, quando foi fundado o Ginásio Conde de Linhares
(MADURO, 1989).

Por fim, para encerar o Conjunto, o Iate Clube, obra arquitetônica inaugurada em 1958, que
tem como criador o arquiteto e engenheiro capixaba Marcelo Vivácqua. O clube foi inspirado
na sinuosidade das obras de Oscar Niemeyer e conta com uma casca de concreto – quatro
paraboloides hiperbólicos - com a ausência de vigas, toca o chão em apenas oito pontos,
mostrando a complexidade estrutural da obra de concreto armado, que é seu atrativo
(COSTA, 2015)

Devido a sua localizado de grande valor comercial, no centro da cidade, em outubro de


2010, um grupo de associados do clube, decidiram durante a madrugada, demolir
clandestinamente a construção, ocasionando a destruição de duas das oito pétalas que
formam a cúpula principal. Tal fato ocorreu devido a um acordo firmado entre a Prefeitura e
os antigos sócios, durante a construção do Clube, cujo terreno pertencente ao município, e
foi doado para os associados, a fim de manter a obra para uso público. Logo após a
tentativa de demolição do edifício, foi elaborado um projeto de tombamento do imóvel, o
Decreto-Lei n. º 62/2010, porém este não foi aprovado, devido aos problemas judiciais que o
edifício vem sofrendo desde então.

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O Clube é o mais importante exemplar do movimento moderno no município, devido ao seu
aspecto formal singular; porem ele se encontra num estado de grande deterioração, devido
ao processo de demolição. Percebe-se que a degradação e abandono da obra, representa a
degradação da memória sociocultural e patrimonial de Colatina, privando a população do
usufruto de todas as possibilidades oferecidas pelo local.

CONJUNTO III

A área ocupada pelo Conjunto III representa a expansão da Vila de Colatina, a partir de
1906, com a inauguração da estação ferroviária. Até então, tudo estava concentrado no
núcleo de colonização, em Colatina Velha. A linha férrea propiciou a ocupação de novas
terras, partindo da estação em direção ao Rio Santa Maria. Essa urbanização, às margens
da ferrovia, consequentemente veio a definir a Avenida Getúlio Vargas e, posteriormente, o
centro da cidade. E é no centro que estão as obras formadoras do Conjunto III, que possui
dois dos pontos mais emblemáticos do Município: a Catedral Sagrado Coração de Jesus e o
Hospital e Maternidade Dr. Sílvio Ávidos.

Figura 03: Mapeamento do Conjunto III.


Fonte de dados: PMC e acervo do autor. Elaborado pelo Autor.

Segundo Maduro (1989), o projeto da Matriz, hoje denominada Catedral, foi criação do
engenheiro Calixto Benedito, o mesmo que teria projetado o Santuário de Aparecida,
localizado em São Paulo. A pedra fundamental foi lançada em 1952, pela mão do então
pároco Geraldo Meyers. Anos depois da construção concluída, no final da década de 80, foi

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criada a Diocese de Colatina e a então igreja matriz passou a ser chamada Catedral do
Sagrado Coração de Jesus.

O edifício da Catedral é a única igreja da cidade que possui uma arquitetura peculiar,
voltada para os princípios do movimento art déco. Suas fachadas são marcadas por traços
fortes, estilizados através de linhas retas e circulares, com formatos geométricos e repetição
de alguns elementos cúbicos. As paredes possuem enormes vãos de janelas, recobertos
por vitrais coloridos, confeccionados e trazidos da Europa, que retratam passagens bíblicas
e outros motivos religiosos.

Segundo Coêlho (2004), outra obra de importância histórica para o Município é o Hospital e
Maternidade Dr. Sílvio Ávidos, localizado no centro da cidade é considerado um dos
primeiros exemplares da arquitetura neocolonial no Estado do Espirito Santo. Inaugurado
em 11 de setembro de 1949, pelo então presidente da República Marechal Eurico Gaspar
Dutra, o hospital foi construído pelo Governo Federal, em parceria com o Governo Estadual
e a Legião Brasileira de Assistência (LBA). Após já ter passado 67 anos de sua
inauguração, atualmente o hospital está vinculado ao Instituto Estadual de Saúde Pública
(IESP).

O hospital está localizado no mesmo local onde existia o Morro das Cabritas, retirado na
década de 40 pela CVRD, durante a relocação do Rio Santa Maria. A fachada principal do
edifício, ainda apresenta as esquadrias originais, de madeira e vidro do tipo de abrir, com
bandeiras em veneziana, com arcos e círculos variáveis. A cobertura é constituída de telhas
cerâmica, que marcam um diferencial entre os anexos que já apresentam telhas de
fibrocimento.

A partir das necessidades que surgiam de modernização dos equipamentos e instalações


hospitalares, o edifício acabou passando por uma série de adaptações, tendo a de maior
contraste visual ocorrido em 1954, na instalação do anexo para abrigar o pronto socorro,
que já apresentava um estilo modernista com tendências para o funcional, destacando-se da
mais antiga, em estilo neocolonial (COÊLHO, 2004).

CONJUNTO IV

O Conjunto IV também pode ser chamado de “Conjunto Ferroviário”, devido à sua formação
diretamente ligada à construção da EFVM, especificamente a partir da década de 40, na
remodelagem do trecho que liga Colatina a Vitória, marcando, assim, a história do
desenvolvimento da cidade. Na década de 80, após a retirada dos trilhos de trem do centro

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da cidade, a Vale, então Companhia Vale do Rio Doce, doa ao município de Colatina toda a
área pertencente a ela, bem como os edifícios da antiga estação, o terminal de cargas, a
ponte Agenor Alves e um antigo vão de trem, que formam, assim, o Conjunto Histórico
Ferroviário.

Figura 04: Mapeamento do Conjunto IV.


Fonte de dados: PMC e acervo do autor. Elaborado pelo Autor.

Em 1989, toda a área que pertencia à Vale passa por mudanças no caráter de reforma,
onde foi construída uma área de lazer no pátio da antiga estação ferroviária, que viria a se
chamar Praça Sol Ponte. O projeto inicial contava com a implantação de uma biblioteca
municipal, que foi instalada no antigo armazém de cargas da Vale. Na edificação, foram
preservadas as características originais do armazém em seu exterior; as principais
mudanças foram feitas apenas na estrutura interna do prédio, para adaptá-lo à
funcionalidade da biblioteca (MADURO, 1989).

Já o edifício da antiga estação ferroviária, apresenta algumas das características do


movimento moderno, encontrados facilmente na fachada da edificação como a utilização de
formas simples, geométricas, e desprovida de ornamentação, traçado retilíneo como ideal
de industrialização, uso estrutural de concreto armado, panos de vidro contínuos nas
fachadas em vez de janelas tradicionais. Ao longo dos anos, a edificação, já servil de apoio
a diversas atividades do setor públicas, ocorrendo a última de 2002 a 2015, sendo um
Centro Regional de Educação Aberto a Distância (CREAAD), que era coordenado pela

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Universidade Federal do Espirito Santo (UFES). Hoje, a edificação encontra-se abandonada,
e recentemente foi interditado pela Defesa Civil, devido as, mas condições da estrutura do
edifício.

Outros dois elementos remanescentes da EFVM, que estão inseridas no Conjunto


Ferroviário são a Ponte Agenor Alves e o antigo vagão de trem, também doações feitas pela
Vale ao município. A ponte Agenor Alves, que transpõe o rio Santa Maria, é a terceira ponte
construída pela Companhia Vale do Rio Doce na cidade. Feita em 1949 para a remodelação
da nova ferrovia juntamente com a construção da estação e do terminal de cargas, a ponte
com mais de 60 anos, vem sofrendo por um processo continuo de correção em toda sua
estrutura, devido a falta de manutenção da obra.

O antigo vagão, também marco da EFVM no desenvolvimento do município; foi doado pela
Vale à PMC após a retirada dos trilhos, em 1975. Atualmente o vagão encontra-se aos
fundos da biblioteca (exatamente localizado sobre o eixo original da EFVM), e funciona
como um memorial, porem completamente abandonado, servido de abrigo a moradores de
rua.

O Conjunto IV, formado pelas obras consequentes da EFVM, são de importância histórica e
cultural, pois trazem consigo a memórias de uma época que marcou o desenvolvimento e
progresso de Colatina, fazendo parte do contexto histórico, e somente puderam ser
integrados ao município, graças à retirada dos trilhos da ferrovia ao longo da área central da
cidade. Sua arquitetura, como já mencionado, foi pouco modificada, conservando, assim, as
características originais das obras. Porém, nota-se um grande descaso do Poder Público e
da própria sociedade, relacionado à preservação e valorização do Conjunto Férreo, devido a
todas as edificações formadoras desse conjunto terem alguma parte de sua estrutura
comprometida ou deformada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a inundação ocorrida no fim do ano de 2013 e início de 2014 (que invadiu o centro da
cidade), grande parte dos arquivos públicos relacionados às edificações históricas citadas
nos conjuntos, como a Câmara Municipal, Escola Aristides Freires, Iate Clube, entre outras,
foram perdidos. Desse modo, tornou-se praticamente impossível a obtenção de materiais
originais referentes a essas obras, o que levou, consequentemente, à utilização de
entrevistas a antigos moradores da cidade, na busca de maiores informações. Uma vez que
a cidade não para no tempo estagnando seu progresso, crescimento e desenvolvimento, a
falta de documentação histórica tornou a coleta de dados mais fastidiosa, evidenciando a
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importância das entrevistas ou narrativas na formação do trabalho, a fim de compreender
melhor o contexto histórico do patrimônio.

O trabalho abordou a contemporaneidade e a relação que está exerce ao patrimônio


histórico de Colatina, que muito se modificou ao longo de seu surgimento e crescimento. A
ocupação do Município originou-se pela busca de novas terras produtivas na região norte do
Espírito Santo, no final do século XIX, e o desenvolvimento da cidade foi impulsionado pela
construção da ferrovia EFVM, em 1906, e da Ponte sobre o Rio Doce, em 1928, como
fatores de seu crescimento disperso, determinado pelas vias de transporte.

A pesquisa revelou que os estilos arquitetônicos, bem como os traçados geométricos


presentes nas fachadas dos edifícios históricos remetentes à formação e crescimento do
município, parte tem desaparecido de forma lenta e gradativa de algumas obras. Outros têm
passado por total ou parcial descaracterização, causando, naqueles que já aprenderam a
preservar, um sentimento de perda visual da história local.

Nota-se também que a falta de revitalização dos prédios históricos tem acarretado situações
para a desvalorização dos imóveis, em nível de patrimônio; nessas circunstâncias, as leis
que dizem respeito ao assunto precisam ser executadas rigorosamente e coordenadas por
indivíduos que sejam aptos para tal e tenham um comprometimento com a história. Talvez a
falta de esclarecimento sobre a restrição dos bens históricos tenha contribuído para esse
agravante.

Infelizmente, na Prefeitura Municipal de Colatina, não há ainda, órgãos, setores ou


instituições, responsáveis pelos registros documentais, recuperação, repristinação,
catalogação, mapeamento, restauro ou manutenção do patrimônio municipal, aplicando-se a
gravidade das ausências documentais de edificações ou quaisquer identificadores culturais
da cidade, prejudicando a manutenção da memória cultural local.

Diante de tudo o que foi exposto, podemos concluir que a falta de informações sobre as
obras tornou o trabalho mais árduo, o que reforça a importância da criação de um banco de
informações patrimoniais no Município. Consequentemente, nota-se que o patrimônio
histórico ora apresentado ainda é uma inesgotável fonte de pesquisa social e econômica,
como citado anteriormente, não pelo que somente foi, mais pelo que cada obra representa
atualmente. Principalmente socialmente, pois neles estão inseridas a história colatinense,
atuada com os mais diversificados atores. Porém o que mais tem se destacado é a falta de
preservação desse patrimônio, o bem cultural que tanto representa a sociedade colatinense.

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Instituto Estadual de Saúde Pública, 2004.

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preservação e proteção do patrimônio histórico, artístico, ambiental e cultural do município
de Colatina e dá outras providencias. Prefeitura Municipal de Colatina.

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repristinação. In. SEMINÁRIO IBERO-AMERICANO, 4, 2015, Belo Horizonte. Arquitetura e
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A PROTEÇÃO LEGAL É SUFICIENTE?. ENGENHOS
PUBLICITÁRIOS: UMA AMEAÇA AO PATRIMÔNIO
ARQUITETÔNICO DO EIXO PILOTO COMERCIAL RUA DO
COMÉRCIO - CENTRO DE MACEIÓ.

CALHEIROS, KARLA RACHEL JARSEN DE MELO.

1. Universidade Federal de Alagoas – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo


Rua Deputado José Lages n°658 – Maceió/AL
karlaarachel@hotmail.com

RESUMO
O artigo tem como propósito analisar e compreender as intervenções publicitárias no patrimônio
arquitetônico da Rua do Comércio localizado na Zona Especial de Preservação 2 (ZEP-2) no Centro
de Maceió, situada no Setor de Preservação Rigorosa 1 (SPR-1) – bem como sua normativa vigente
n° 4.545/1996 que institui normas gerais a respeito da edificação ou conjunto de edificações para as
Zonas Especiais de Preservação (ZEPs) e especifica paramentos para a publicidade em imóveis
situados em área de proteção municipal desde 1997 através da regulamentação do Decreto n°5.700.
A análise abrange a rua após a implementação do Projeto de Requalificação (2001-2009) realizado
pela Secretaria Municipal de Planejamento (SEMPLA), atual Secretaria de Desenvolvimento
Territorial e Meio Ambiente (SEDET).

Para o desenvolvimento do artigo que fundamentou a análise do eixo piloto comercial Rua do
Comércio foram explorados as legislações municipais n°4.545/1996 (Normas gerais de proteção ao
patrimônio ou conjuntos urbanos na qual a ZEP faz parte), lei n° 3.538, de 23 de dezembro de 1985
(Código de Posturas de Maceió), a Lei Municipal 4.954 de 06 de janeiro de 2000 sobre a Veiculação
de propaganda nos logradouros públicos ao ar livre ou em locais com visibilidade dos espaços
públicos e o Plano Diretor de Maceió. Como também foram realizadas percepções diretas que
possibilitou reconhecer as peculiaridades existentes nas edificações como os detalhes dos elementos
arquitetônicos e o modo como os anúncios ou engenhos publicitários (placas e letreiros) interferiam
na visualização das construções.

A partir das informações obtidas in loco, compilaram-se os dados que serviram para mapeamento de
uso e ocupação do solo da rua e comparações de registros fotográficos obtidos das edificações da
Rua do Comércio entre os séculos XX e XXI para investigar o uso atual dos imóveis que permeiam a
rua e analisar as principais modificações na fachada das edificações.

Dessa maneira, buscou-se averiguar/avaliar a atual situação de preservação das edificações da Rua
do Comércio para então propor medidas como uma cartilha e um aplicativo para frear as
descaracterizações do patrimônio edificado com o intuito de possibilitar a melhoria na paisagem
urbana e proporcionar a contemplação das edificações históricas por parte da população e incentivar
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a denúncia às possíveis falhas da fiscalização referente aos anúncios publicitários no patrimônio
arquitetônico. Tendo em vista que o instrumento jurídico é incapaz de manter na integra as
particularidades estilísticas dos exemplares arquitetônicos, pois ela apenas é um meio de nortear as
ações que devem ser seguidas após a sua implementação. Assim, entendendo, acredita-se que um
bom uso e uma boa conservação do imóvel por parte de seu proprietário/inquilino, quer particular,
quer institucional pública, contribua para a preservação do patrimônio edificado.

Palavras-chave: Patrimônio Arquitetônico; anúncios publicitários; fiscalização; aplicativo; cartilha

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INTRODUÇÃO

O presente artigo focaliza anúncios publicitários no patrimônio edificado da Rua do


Comércio, após a implementação do Projeto de Requalificação (2001-2009) do Centro
de Maceió, realizado pela antiga Secretaria Municipal de Planejamento1 (SEMPLA). O
trabalho visa averiguar o cumprimento das normativas n° 4.545/1996 (Normas gerais
sobre as Zonas Especiais de Preservação), lei n°4.954/2000 (Norma sobre os veículos
de divulgação) e a lei n° 3.538/1985 Código de Posturas por parte do setor de
fiscalização atual Secretaria de Desenvolvimento Territorial e Meio Ambiente (SEDET).

O interesse pelo tema surgiu a partir da observação de como as edificações em


áreas centrais comerciais brasileiras estão encobertas pela publicidade. Gradativamente,
essa situação foi se estabelecendo devido ao processo de industrialização que se
desencadeou no Brasil a partir dos anos 1950 e 1960. As edificações localizadas em
áreas centrais deixaram de ser atrativas para a habitação da classe média que buscava
outras formas para morar e, mediante essa situação, houve um deslocamento
populacional do Centro o que somou para o esvaziamento das áreas centrais brasileiras,
instauradas entre o uso comercial e de serviços nas edificações. A maioria das
edificações passou então a sofrer modificações em trechos das ruas que, por
conseguinte, descaracterizavam a paisagem urbana existente (NOBREGA; PEREIRA,
2016). Estas ocorrências acarretaram alguns questionamentos quanto à participação do
poder público em coibir as interferências no patrimônio edificado diante das normativas
existentes para a proteção do bem imóvel em prol da preservação de construções
históricas para a sociedade alagoana.

Como uma tentativa de controle a esta circunstância em Maceió, alcançada por


grande degradação do patrimônio cultural na sua área central do comércio, foi
implantado o Projeto de requalificação das edificações do Centro de Maceió instituída
pela Prefeitura de Maceió, em 2009 que, entre outras, especificou propostas para
higienização das fachadas no eixo piloto Rua do Comércio, que detém um “acervo
relevante enquanto conjunto edificado” e posteriormente, em outro trecho e edificações
do bairro.

1 Em decorrência das modificações na gestão pública de Maceió o Setor de Patrimônio que localizava-se na
SEMPLA atualmente integra a SEDET.

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A Rua do Comércio foi escolhida como objeto de estudo por corresponder ao centro
histórico da cidade e contemplar um acervo arquitetônico secular edificado entre meados
do século XIX e XX e, ainda, por fazer parte da Zona Especial de Preservação 2 (ZEP)
instituída através do Decreto Municipal 5.700/1997 e inserido no Plano Diretor de Maceió
em 2005.

O motivo que mais impulsionou esta escolha foi o fato das construções locadas na
Rua do Comércio sofrerem constantemente com reformulações nas fachadas das
edificações por parte de seus proprietários e o abuso da inserção de elementos visuais
como placas e letreiros de modo a mascarar os exemplares arquitetônicos protegidos
em nível municipal (ZEP-2). Tendo em vista que o projeto de qualificação das
edificações fora elaborado há oito anos sentiu-se a necessidade em verificar se a lei
vigente n° 4.545/1996 que foi utilizada durante o projeto de requalificação das
edificações. Também é seguida perante os setores responsáveis pela fiscalização:
Departamento de Fiscalização de Edificações e Urbanismo (DFEU), Departamento de
Fiscalização de Publicidade (DFP) e a Coordenação de Exame de Controle de Alvarás
de Publicidade (CECAP) ambos da SEDET.

Dessa maneira, buscou-se averiguar/avaliar a atual situação de preservação das


edificações da Rua do Comércio para então propor medidas para frear as
descaracterizações do patrimônio edificado com o intuito de possibilitar a melhoria na
paisagem urbana e proporcionar a contemplação das edificações históricas por parte da
população.

Para a construção do artigo, foi necessário traçar objetivos para norteá-lo. A primeira
parte do trabalho, consistiu em pesquisar diversos conceitos fundamentais para o objeto
de estudo, associado a uma sequência de teóricos referente ao assunto. Examinou-se,
também, as interferências publicitárias no espaço público da rua, refletindo sobre sua
relação com as edificações históricas locadas em sítios históricos voltados ao uso
comercial e, como isso, foi refletido em São Paulo e em Maceió. O estudo mais acurado
sobre o uso da publicidade ocultando o patrimônio cultural serviu para compreender a
atual realidade das edificações históricas de cunho comercial no bairro central das
cidades brasileiras e o seu rebatimento no centro “histórico” de Maceió.

A fase subsequente buscou conhecer o local de estudo. Isso ocorreu através do


estudo do bairro e da própria Rua do Comércio, observação do espaço, pesquisa em
órgãos públicos, entrevistas com antigos moradores, frequentadores e profissionais

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vinculados ao patrimônio e à fiscalização dos engenhos publicitários, como também
realizou-se registros fotográficos e vídeos da área em questão.

Além dos itens mencionados foram realizados questionários, previamente


estabelecidos, para profissionais arquitetos e fiscais dos setores responsáveis pela
fiscalização da SEDET no que diz respeito à edificação e a publicidade. Foram
contactados os respectivos setores para a entrevista: Departamento de Fiscalização de
Edificações e Urbanismo (DFEU), Departamento de Fiscalização de Publicidade (DFP) e
a Coordenação de Exame de Controle de Alvarás de Publicidade (CECAP). O
questionário contou com quinze perguntas abertas tendo como tema: A publicidade nas
edificações localizadas na ZEP-2.

Após as informações copiladas sobre os engenhos publicitários no patrimônio


arquitetônico da Rua do Comércio, foi possível propor instrumentos que pudesse
minimizar as constantes intervenções nos imóveis do centro comercial de Maceió dentre
elas a confecção de um aplicativo e uma cartilha educativa.

DESENVOLVIMENTO

Perante o crescimento, desenvolvimento e visando melhorias na infraestrutura do


Centro Comercial de Maceió iniciaram-se no ano de 2001 os estudos preliminares a
cerca do “Projeto de Requalificação do Centro de Maceió” tendo como corpo técnico
Gardência Caetano ex arquiteta da antiga Secretaria Municipal de Planejamento e
Desenvolvimento (SEMPLA) junto com as arquitetas e urbanistas Adeciany Souza
(responsável pelo setor de Patrimônio da SEMPLA) e Edith Nogueira além do arquiteto,
urbanista e professor Leonardo Bittencourt da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

O objetivo do Projeto era revitalizar o Centro de Maceió a fim de proporcionar


melhorias para a população e solucionar os principais problemas na área central, entre
eles: ordenação do trânsito; melhoria dos espaços públicos do Centro; reparos na
drenagem, rede elétrica, rede de telefonia e esgotamento sanitário; transferência dos
camelôs para o Shopping Popular; criação da casa de passagem masculina e feminina;
formação de um centro ambulatorial para tratamento de dependentes químicos;
reestruturação da legislação a fim de conter as intervenções irregulares no patrimônio
edificado; projeto de Urbanização (reordenamento das calçadas, vias e calçadões,
padronização das bancas de revistas, melhorias na iluminação pública (nova posteação),
nova paginação de piso, paisagismo, mobiliários urbanos).

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A principio, as etapas que iniciaram em 2005 focaram principalmente a infraestrutura
como modernização das instalações elétrica subterrânea, quatro anos após a realização
da primeira etapa (trecho Rua do Comércio) a SEMPLA iniciou-se, em 2009, a proposta
de higienização das fachadas intitulada “Projeto de Qualificação das Edificações”, a fim
de ordenar os veículos de divulgação nos estabelecimentos comerciais locados na ZEP-
2 que estivessem obstruindo o patrimônio cultural edificado.

Na tentativa de evidenciar o excesso de vedações publicitárias nas fachadas das


edificações da Rua do Comércio, foi solicitada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
(FAU-UFAL) a realização de um inventário das platibandas da Rua do Comércio, qual foi
elaborado durante as atividades da disciplina Prática de Restauro da FAU/UFAL no ano
de 2008 a 2009, coordenada pela arquiteta e urbanista, docente Josemary Omena
Passos Ferrare.

A partir do inventário realizado, foi possível averiguar os imóveis históricos que se


encontravam encobertos por placas e letreiros em desacordo com o padrão estabelecido
mediante as leis de preservação (lei 4.545/1996; capítulo V). Dessa forma, foram
escolhidas quatro quadras (65, 66, 77 e 78 na Rua do Comércio e parte da quadra 49 na
Rua 2 de Dezembro; contemplando cerca de 73 imóveis) que ainda continham um
conjunto de imóveis que poderiam sofrer intervenções nas suas fachadas como pode ser
visto na imagem 1:

Imagem 1– Fotografia aérea da Rua do Comércio e Mapa da rua com as quadras


selecionadas durante o inventário das platibandas.

Fonte: Acervo Pessoal.

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A arquiteta e urbanista responsável por propor o projeto foi Maria Adeciany André de
Souza (Diretora de patrimônio cultural da SEMPLA). Durante o estudo como uma forma
de conscientizar os comerciantes e proprietários, foram realizadas oficinas sobre o
Patrimônio Cultural na área do Centro, no ano de 2008. Com as palestras ministradas
por docentes da FAU-UFAL, e obteve-se, junto à sociedade e Associação Comercial dos
Retalhistas uma relação mais próxima com os proprietários e informando-os sobre o
patrimônio.

O intuito do projeto era promover a apropriação do patrimônio cultural existente na


área central – comercial pela população e frequentadores do Centro que estavam
ocultados pelos veículos de comunicação visual, postos de maneira inadequada,
impossibilitando a contemplação do conjunto urbano – histórico da cidade.

Contudo na comparação dos registros fotográficos dos imóveis após o projeto de


qualificação das edificações em 2009, notou-se que na Rua do Comércio se destaca em
primeiro plano os anúncios publicitários seguidos das edificações que atuam como um
suporte para a comunicação visual. Ou seja, na prática o projeto voltado para proteger o
bem material dos engenhos publicitários não foi implantado na prática.

Observa-se então que as edificações passaram a ser consideradas mais um meio de


informação do que espaço, onde a publicidade ocupa os elementos arquitetônicos e a
paisagem urbana. Nas palavras de Venturi “a Arquitetura não é suficiente, uma vez que
as relações espaciais são feitas mais por símbolos do que por formas. A arquitetura,
nessa paisagem, se torna mais símbolo no espaço do que forma no espaço” (2003,
p.40), ou seja, a Arquitetura torna-se segundo plano, enquanto que os anúncios
publicitários estão em primeiro, pois são mais valorizados do que a Arquitetura, como
pode ser observado nas imagens abaixo.

Imagem 2- Fachada dos imóveis da Rua do Comércio

Fonte: Acervo Pessoal.

Além do projeto voltado para coibir intervenções no patrimônio arquitetônico não ser
posto em prática o órgão responsável pela fiscalização SEDET e que o órgão

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responsável pela fiscalização não está cumprindo a lei municipal (n° 4.545/1996)
designada para os imóveis locados nas ZEP.

Mediante as constatações realizadas verificou-se que nos dez trechos da Rua do


Comércio, a maioria das edificações que deveriam ter sua arquitetura preservada por
está localizada em área de proteção municipal ZEP-2 e SPR-1 encontra-se ocultada por
placas e letreiros, além de conter um número excessivo de publicidade nas fachadas,
tendo em vista que a normativa n° 4.545/1996 permite apenas um anúncio publicitário
por imóvel e/ou estabelecimento.

A situação que ocorre no eixo piloto – Rua do Comércio é semelhante aos demais
eixos comerciais das cidades brasileiras: patrimônio edificado, encoberto pelos
engenhos publicitários.

No caso da Rua do Comércio – Centro de Maceió – essa situação agrava-se, na


prática, devido ao descumprimento das legislações vigentes referentes ao patrimônio
n°4.545/1996 e aos veículos de divulgação lei n° 4.954/2000 e lei n°3.538/1985 (Código
de Posturas).

Analisando as legislações mencionadas, constatou-se que ambas não estabelecem


uma relação entre si, ou seja, não existe uma complementação de fácil entendimento
para com as normativas; que corresponde à lei 4.954/2000 que dispõe sobre a
veiculação de propaganda nos logradouros públicos e ao ar livre. A publicidade nessa
legislação é tratada, especificadamente, no artigo 52 “Nas Zonas Especiais de
Preservação, ou qualquer Zona especial que dispuser de normas próprias para
instalação de engenhos publicitários prevalecem as normas regulamentadas nessas
Zonas”. Isto é, não faz menção ao arcabouço legal n°4.545/96 que menciona os
parâmetros adequados a serem seguidos para a publicidade em construções inseridas
nas ZEP. Como consequência, o artigo 52 acaba passando despercebido por parte da
gestão pública e de seus respectivos profissionais da SEDET junto aos departamentos
responsáveis (DFEU, DFP e CECAP) por fiscalizar as irregularidades patrimônio
edificado.

No Código de Posturas (lei n°3.538/1985) de Maceió, também não consta nenhum


artigo específico no que diz respeito à publicidade na ZEP. Apenas convêm medidas e

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padrões para a publicidade de maneira mais ampla. Percebe-se também, que o código2
supracitado não sofreu nenhuma alteração ou complemento em seus artigos para inserir
as normativas municipais que tratam da publicidade nos imóveis locados na ZEP até o
ano de 2016. Mas em entrevista a arquiteta e urbanista Adeciany Souza responsável
pelo setor de Patrimônio da antiga SEMPLA, foi elaborada a revisão do Código de
Posturas e contempladas as áreas históricas da cidade de Maceió, porém ainda se
encontram ainda nos trâmites legais para posteriormente ser regulamentado.

No entanto, o problema dos anúncios publicitários não se resume apenas à falta de


compatibilização entre as leis existentes, mas também à não execução do Projeto de
Qualificação das Edificações (SEMPLA- 2009), à não implantação de multas para
reprimir as irregularidades dos anúncios nos imóveis da ZEP-2 conforme os padrões
estabelecidos na lei n° 4.545/1996 e o desconhecimento do arcabouço legal por parte do
órgão responsável pela fiscalização (SEDET- setores DFEU/DFP/CECAP) em relação
aos engenhos publicitários em sítios históricos na qual a lei 4.545/1996 engloba o eixo
piloto Rua do Comércio.

Em entrevista realizada aos profissionais do setor DFEU, para adquirir informações,


acerca da fiscalização, constatou-se que eles desconhecem a normativa n° 4.545/96 a
qual especifica diretrizes e parâmetros para os engenhos publicitários na ZEP contidas
no capítulo V, no aporte normativo citado.

Todavia, na notificação utilizada pelos fiscais durante as idas a campo, consta que
compete ao setor da DFEU atuar e punir com multas os imóveis que se encontram em
desacordo com a lei corrente 4.545/96, fato que os atuais fiscais descordam. Para eles,
o assunto publicidade é competência do DFP. Entretanto, a notificação utilizada por eles
para atuar nas irregularidades consta na lei n° 4.545/1996.

Assim como o setor DFEU desconhece a legislação, o setor DFP também


desconhece a normativa 4.545/1996. Em entrevista realizada em 6 de maio de 2016 com
o Diretor do CECAP, Manoel Francisco de Santos, fiscal há 35 anos no setor de
publicidade da SEDET, esclareceu não ter conhecimento da normativa referente à
publicidade na ZEP existente. Apenas sabia da existência da ZEP, porque na Lei
4.954/2000 consta o artigo 52, mas em relação a medidas e diretrizes a serem

2O código de Posturas (lei n°3.538/1985) evidencia apenas no artigo 193 a proibição de colocar anúncios sobre
as bandeiras nas sacadas, ou saliências de edifícios; mas nada em específico sobre os imóveis tombados ou
ZEP, já que o código antecede a normativa n°4.545/96.
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implantadas e seguidas relatou não ter conhecimento assim como os demais fiscais
recém contratados para lidar, com a publicidade no setor da DFP. E no que diz respeito
às fiscalizações da DFP, eles, atualmente, vem fazendo operações para apreender
placas, letreiros, cartazes em locais inadequados nos bairros de Ponta Verde,
Mangabeiras área nobre da cidade de Maceió. Porém, no Centro de Maceió, nenhuma
operação foi efetuada para coibir a publicidade nas edificações históricas, apenas ações
direcionadas para a remoção de ambulantes.

Outra falha que foi constatada é que; a notificação utilizada pelos fiscais de postura,
não contém nenhuma menção à Lei 4.545 de 1996. Somente menciona o Código de
Posturas (Lei n° 3.538/1985) e Lei Municipal n°4.954/2000. Quer dizer, apenas o setor
DFEU contempla essa normativa, todavia o DFP lida diretamente com a publicidade.

Diante do exposto, constata-se que os setores DFEU e DFP não possuem o


conhecimento da legislação, favorecendo que não sejam efetivadas as medidas para
conter danos ao patrimônio cultural da Rua do Comércio e demais imóveis localizados
na ZEP no que diz respeito aos engenhos publicitários. Fato esse comprovado com a
realização das entrevistas nos órgãos DFEU, DFP e CECAD. Diante dos itens
explanados, nota-se que os setores não atuam simultaneamente em prol da fiscalização,
o que dificulta um maior entendimento e contribuição para que as vistorias ocorram
adequadamente nos imóveis tombados em nível municipal.

É necessário salientar, também, que essa situação ocorre devido à falta de


reconhecimento do patrimônio cultural por parte da população e dos gestores públicos,
fato esse constatado através das entrevistas realizadas no setor DFEU onde as
denúncias e irregularidades feitas ao órgão da SEDET são direcionadas, na maioria às
construções irregulares, enquanto as denúncias ao patrimônio edificado, ocorrem em
menor frequência e geralmente os que denunciam são os alunos ou profissionais que
atuam na área de Arquitetura e Urbanismo. Porém, foi verificado, in loco, que as
denúncias em relação às intervenções publicitárias em fachadas históricas não
costumam ocorrer na SEDET.

Contudo, visando a reverter a situação dos anúncios publicitários nas edificações no


eixo piloto – Rua do Comércio – Centro de Maceió e aproximar a sociedade do
patrimônio cultural, buscaram-se desenvolver meios que pudessem contribuir para que a
população interagisse junto ao órgão público SEDET em prol da preservação das
edificações, denunciando e fiscalizando.

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Tendo em vista a atual situação dos anúncios publicitários no patrimônio cultural
localizados na ZEP-2, Rua do Comércio – Centro de Maceió – averiguou-se a
necessidade em cooperar, em parceria com a SEDET e seus setores, na
conscientização da população e dos profissionais responsáveis pelo setor de
fiscalização sobre a importância da preservação do patrimônio edificado para a cidade.

Para isso pensou-se em criar uma cartilha e um aplicativo para que ambos
pudessem colaborar para que a população denunciasse as irregularidades ocasionadas
pela publicidade no patrimônio edificado localizado na ZEP-2 junto às administrações
públicas.

No caso específico da Cartilha informativa intitulada: Zeca e Alice : Entendendo o


patrimônio, Um olhar sobre os anúncios publicitários em imóveis no Centro de Maceió.
Buscou-se estimular o aprendizado e a importância sobre o patrimônio arquitetônico e o
mascaramento de edificações por parte dos anúncios publicitários no Centro de Maceió-
Rua do Comércio. Além de instruir ao público meios de auxiliar a gestão municipal
SEDET na fiscalização das intervenções publicitárias nos imóveis de valor histórico
arquitetônico cultural.

A cartilha foi formulada como uma história em quadrinhos em uma sala de aula do
Centro Educacional de Jovens e Adultos Paulo Freire- CEJA, tendo como público alvo
adolescentes (faixa etária a partir dos 15 anos) e adultos ou profissionais da área. Dessa
forma, além de fornecer informações, diante do patrimônio possibilita, uma maior
comunicação entre a sociedade e os órgãos responsáveis da SEDET: Setor de
Patrimônio e os demais departamentos DFEU, DFP, CECAD, gerando uma
compreensão mais simples da lei 4.545/1996.

Tratando-se da impressão gráfica da cartilha dirigida à população pensou-se em


imprimir em dois modelos: ambos em folha A5, sendo um em preto e branco para que os
alunos possam colorir e outro já colorido para que despertasse o interesse dos adultos e
profissionais em ler a história.

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Imagem 3- Cartilha educativa.

Fonte: Acervo Pessoal, 2016.

Associada à cartilha criou-se o aplicativo: Fiscalize Já. Para que a população possa
denunciar as irregularidades no patrimônio em áreas comerciais formuladas pela
publicidade.

Aplicativo (app)

O fácil acesso ao aplicativo permite ao usuário, antes de realizar a denúncia,


encontrar um resumo da lei n° 4.545 de 1996 que dispõe de medidas para a divulgação
de comunicação visual, ambas ilustradas com desenhos para maior compreensão do
usuário.

O aplicativo possibilita identificar o tipo de irregularidade, descrever, localizar o ponto


de referência, endereço e foto do local da denúncia, de forma rápida e anônima. As
informações registradas passam para ambos setores da SEDET onde são recebidas –
via correio eletrônico – e passam por um processo de triagem e posteriormente segue
para as equipes responsáveis pela fiscalização, no o setor SEDET (DFEU e DFP, Setor
de Patrimônio). Como também, serão expostas maiores informações acerca do tema e
contato dos órgãos responsáveis e endereços eletrônicos do local onde a população
pode adquirir a legislação.

Para os usuários, o aplicativo facilita a comunicação e a relação da sociedade com a


gestão pública. Como os smatrsphones estão sendo mais utilizados pela população, é
uma forma de interagir com os cidadãos alagoanos tendo em vista que ambos os lados

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ganham com essa interação. Nas palavras de Aloisio de Magalhães; “a comunidade é a
melhor guardiã de seu patrimônio” (MAGALHÃES, 1985, p.67).

A princípio, o aplicativo está disponível para celulares com sistema android e para o
funcionamento do aplicativo é necessário está conectado com a internet.

Imagem 4- Interface do aplicativo Fiscalize Já

Fonte: Acervo Pessoal.

CONCLUSÃO

Como podemos observar, ao longo da construção desta monografia, as ruas são


espaços públicos onde prevalece o uso coletivo e que incorpora, no decorrer dos
séculos, as transformações sociais, econômicas e políticas vigentes, além de serem
detendoras de uma comunicação própria de seus usos que evidencia, de forma
identidária, os percursos que definem o espaço na qual interferem diretamente no modo
de vida dos seus habitantes.

Com o advento e consolidação da industrialização e do capitalismo, em meados de


1950 e 1960, nota-se que ocorreram mudanças no modo como a sociedade mantém
uma relação com a rua e os bens de consumo, ou seja, o homem que era visto como
um ser social passou a ser um consumidor perante a demanda capitalista. Fato esse que
não ocorria anteriormente em meados do século XIX e início dos XX. A forma como a
rua e as edificações, casa térrea e sobrados característicos do período colonial, eram
concebidas favorecia e reforçava o padrão existente como a contemplação da
arquitetura e do espaço. A publicidade era pintada geralmente acima das vergas no
pavimento térreo ou era posta uma placa perpendicular à fachada sem interferir na
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observação, bem como os encontros espontâneos de pessoas oriundas de outras
localidades, manifestações políticas, atividades de cunho cultural

Nesse segmento, com a solidificação da industrialização, ruas e seus respectivos


eixos pilotos localizados em áreas centrais que detinham uso misto (comercial e
residencial) passaram a abrigar o comércio varejista e de serviços, usos os quais exigem
uma nova organização fato esse que contribuiu para o deslocamento da população para
outras localidades da cidade tornando a área central das cidades brasileiras estritamente
comercial. Como consequência da contemporaneidade, a era do movimento, as ruas dos
centros urbanos das áreas centrais voltadas ao uso comercial passam a não se
organizar em favor das relações sociais existentes, mas a criação de espaços e
construções atrativas para a população consumidora, interferindo dessa maneira, na
relação urbana entre homem e o espaço, ou seja, os símbolos utilizados pelos anúncios
passaram a ser mais a atenção do que a forma das construções.

Acarretando a essas modificações das atividades comerciais e de serviços, exigirem


uma nova organização em que as novas tecnologias, dentre elas a publicidade, passam
a interferir no cotidiano da população como também na forma de se comunicar com o
espaço. Dessa forma, observou-se que tantos as ruas como as edificações passaram a
contemplar elementos visuais como placas e letreiros que, em muitos casos, ocultam as
construções, gerando poluisão visual na paisagem urbana, como é o caso do objeto de
estudo eixo piloto Rua do Comércio – Centro de Maceió.

Através das pesquisas realizadas, identificou-se que, no âmbito municipal a


normativa que regulamenta a gestão da preservação dos centros históricos da cidade de
Maceió é a Lei 4.545 de 1996, criada junto ao projeto de revitalização do bairro de
Jaraguá (1996), sendo o único arcabouço legal que instituiu norma de proteção
especifica para as Zonas Especiais de Preservação e estabelece diretrizes próprias para
divulgação de publicidade em imóveis localizados em área de proteção municipal. No
caso do da Rua do Comércio– Centro de Maceió, está inserido na ZEP-2 e no Setor de
Preservação Rigorosa 1 (SPR-1) desde 1997 através do Decreto n°5.700.

A partir da observação, in loco, após o Projeto de Qualificação das Edificações


realizado pela SEMPLA (2008-2009), observa-se que o projeto, na prática, não foi
realizado. Nota-se que os exemplares arquitetônicos locados na Rua do Comércio
encontram-se encobertos pelos anúncios publicitários parcial ou totalmente, interferindo
na visualização dos imóveis e seus elementos.

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Os anúncios, na maioria, são fixados defronte às edificações da via supracitada e
servem para identificar os estabelecimentos e camuflar os condensadores de ar
condicionado que são postos na fachada frontal dos estabelecimentos. Em todos os
trechos da via, em questão. Além disso, grande parte das edificações possui dois
anúncios publicitários por estabelecimento sendo um paralelo e outro perpendicular ao
imóvel, configurando a irregularidade conforme o que a legislação n° 4.545/1996
estabelece. Consta na própria legislação que para cada ponto comercial localizado na
ZEP é permitido apenas um veículo de divulgação sendo ele perpendicular ou paralelo;
exceto os imóveis de esquina que podem conter dois anúncios. Em alguns casos
verificados em campo, perceberam-se fachadas contendo até três publicidades em um
mesmo imóvel.

Essa situação acarreta não apenas o agravamento da poluição visual na paisagem


urbana, mas, como também mascara o patrimônio cultural (arquitetônico) que todos os
cidadãos alagoanos têm o direito de contemplar e observar.

No entanto, como constatado durante as visitas realizadas na artéria, Rua do


Comércio, a modificação nas fachadas não se delimita à inserção de engenhos
publicitários, mas como nas adequações decorrentes de atualizações estilísticas
vigentes como abertura de porta larga no pavimento térreo, marquises, alteração no
número de vãos, adesão de novas esquadrias e a utilização da porta meia cana para
fechamento, criando lojas com arquitetura arrojada e vitrines mais elaboradas,
incorporando uma nova linguagem arquitetônica. Em casos mais graves, observa-se que
os empresários e/ou proprietários não alteram apenas a volumetria do imóvel como
também são demolidos para a construção de um novo imóvel.

Outro fator que agrava a situação é que alguns dos imóveis dessa artéria são
alugados, isto interfere na conservação e preservação do patrimônio tendo em vista que
como os inquilinos dos imóveis não são proprietários. Eles não têm interesse em
preservar. Apenas têm o objetivo de utilizar-se do imóvel para atender as necessidades
logísticas, acarretado a isso a publicidade. Nesse processo, atuam como um fator
determinante para identificar o estabelecimento, tornando-o como primeiro plano e,
posteriormente, as fachadas do patrimônio cultural em segundo.

Nesse caso, a arquitetura passa a ser vista como “representação da construção”


(PEIXOTO, 1990, p.361) e não como uma construção. Ou seja, o edifício passa a ser
função de comunicação para a publicidade. Diante das necessidades e tendências do
uso comercial, verifica-se que não há nenhuma relação de pertencimento com as
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edificações e seus significados para com a cidade. Por isso, o que teria de ser
preservado sofre um processo contrário. O descaso por parte dos proprietários/inquilinos
que optam pela destruição das construções se destruam ao decorrer do tempo, do que
realizar os reparos e reformas precisas. E não se deparam com a importância de deter o
descaso de um patrimônio de relevância para a arquitetura e história alagoana.

Por esses motivos é que existem imóveis fechados, em arruinamento, na Rua


anteriormente mencionada. Essa situação é evidenciada em toda a Rua do Comércio,
gerando assim, uma divergência entre a política de preservação do patrimônio edificado
contida na normativa n° 4.545/1996.

No que diz respeito à legislação para conter essa situação, observa-se que a
normativa específica n° 4.545/1996 não é cumprida pelos proprietários. No entanto,
apesar de estar vigente há vinte anos, vê-se crescente uma descaracterização dos
imóveis localizados no eixo comercial Rua do Comércio que fazem reformulações,
aplicação de anúncios, colocação de elementos na fachada inadequadamente, sem que
exista qualquer consentimento por parte da gestão pública SEDET.

Analisando, com atenção a referida Lei, encontraram-se várias falhas. Uma delas é
que o aporte normativo n° 4.545/1996 não contém nenhum meio punitivo para os
infratores sendo tal situação uma falha gravíssima. Assim se entendeu, já que não existe
uma conscientização preservacionista inata nem ensinada à população. Uma aplicação
de multa seria um recurso viável para preservar o patrimônio, tendo em vista que se o
cidadão não sofre nenhuma punição em realizar determinada intervenção indevida no
patrimônio edificado protegido e não é punido por lei. A tendência é sempre repetir, já
que, a rigor, não foi sequer cobrado no “bolso” com uma sifra vultosa.

Mas, detectou-se, também, que, além dessa legislação, atua na cidade de Maceió o
Código de Posturas de 1985 e a Lei 4.954/2000 gerindo o espaço público e as
edificações referentes à publicidade. Porém, somente a Lei 4.954/2000 cita no artigo 52
prevalece para a ZEP as normas já regulamentadas. Todavia, não salienta qual o
arcabouço legal deve ser seguido para a fiscalização direcionada aos centros históricos.
O modo como está redigido a normativa não especifica, de forma clara, o que
compreende e quais são a ZEP, nem qual é a legislação municipal que as rege.

Tal situação prejudica a efetividade da lei e o desconhecimento da Legislação


n°4.545/1996 por parte do setor responsável pela fiscalização SEDET (setores: DFEU,
DFP e CODAC) que influencia diretamente nas ações para coibir os danos dos anúncios

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publicitários ao patrimônio. Durante realização das entrevistas com os fiscais,
constatou-se que não existe interesse por parte dos profissionais em vistoriar os bens
patrimoniais, sobretudo os que estão locados na área central da cidade. Os fiscais
responsáveis da DFEU atentam apenas para as inadequações de obras, alvarás,
obstrução de passeio público e barreira arquitetônica, mas nada em especifico ao
patrimônio edificado e a publicidade, ou seja, as atividades de fiscalização municipal não
impedem que as transformações constadas que descaracterizam o patrimônio cultural
da Rua do Comércio ocorram, mesmo depois da regulamentação da área estudada
como zona especial de preservação desde 1997.

Dessa maneira, observou-se que um dos meios para minimizar os danos é atualizar
as legislações municipais correntes e interligá-las em fácil compreensão aos
profissionais públicos e à população. Porém, sabe-se que o instrumento jurídico é
incapaz de manter na integra as particularidades estilísticas dos exemplares
arquitetônicos, pois ela apenas é um meio de nortear as ações que devem ser seguidas
após a sua implementação.

Percebe-se que a edificação não pode ser compreendida apenas como um objeto
para contemplação. Assim, entendendo, acredita-se que um bom uso e uma boa
conservação do imóvel por parte de seu proprietário/inquilino, quer particular, quer
institucional pública, contribua para a preservação do patrimônio edificado.

Contudo, observa-se através legislação n° 4.545/1996 da política de preservação, a


estreita relação entre os departamentos da SEDET para com o patrimônio cultural. As
ações que geram o patrimônio são discutidas sem articulação diretas entre os setores e
departamento responsáveis. Dessa forma, cada setor acaba restringindo as atividades
específicas, favorecendo para que não exista uma troca de informações para que ambos
dialoguem e integrem o patrimônio cultural junto ao planejamento urbano e durante os
projetos de requalificação.

Com base no caso concreto averiguado, gostaríamos de sugerir ações


esclarecedoras e educativas para serem pensadas/aplicadas como palestras, oficinas,
pesquisas, cartilhas (Alice e Zeca: Entendendo o patrimônio, Um olhar sobre os
anúncios publicitários em imóveis no Centro de Maceió, aplicativos (Fiscalize Já)
dirigidos aos profissionais que lidam com as edificações locadas na ZEP, para que exista
a conscientização da importância da preservação do patrimônio edificado. A execução
dessa pesquisa gerou a compreensão de que, sem atitudes voltadas à instrução
patrimonial, não haverá mudanças no centro histórico de Maceió, notadamente na Rua
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do Comércio, e o patrimônio histórico cultural vai sofrendo os reflexos com o passar dos
anos.

Essas argumentações expostas servem para mostrar como é complicado esclarecer


o que contempla o interesse de determinados bens para a sociedade, no sentido de
preservar, o que conservar, o que destruir e o que intervir.

REFERÊNCIAS

MACEIÓ. Decreto n° 5.700, 02 de outubro de 1997. Institui a Zona Especial de


Preservação 2 (ZEP-2) e dá outras providências. Diário Oficial do Município.

MACEIÓ. Lei Municipal n°3.538, de 23 de dezembro de 1985. Altera o código de posturas


de Maceió, instituída pela lei n° 2.585, de 08 de junho de 1979. Diário Oficial do
Município.

MACEIÓ. Lei Municipal n° 4.954, de 06 de janeiro de 2000. Dispõe sobre a veiculação de


propaganda nos logradouros públicos ao ar livre ou em locais com visibilidade dos
espaços públicos. Diário Oficial do Município.

MACEIÓ. Lei Municipal n° 4.545, de 14 de novembro de 1996. Institui normas gerais de


proteção a edificação ou conjunto de edificações, cujas expressões arquitetônicas ou
constituam o Patrimônio Cultural Edificado de Maceió, disciplina a preservação
desses bens e dá outras providências. Diário Oficial do Município.

MACEIÓ. Plano Diretor. 2005.

MAGALHÃES, Aloísio. E Triunfo? A questão dos bens culturais no Brasil. Rio de


Janeiro: Nova Fronteira; Brasília: Fundação Nacional Pró-Memória, 1985, p.67.

PEIXOTO, N.B. Paisagens urbanas: São Paulo: SENAC. 1990.

VENTURI, Robert; BROWN, Denise ; IZENOUR, Steven. Aprendendo com Las Vegas: o
simbolismo (esquecido) da forma arquitetônica. São Paulo: Cosac Naify, 2003.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Área Temática: Eixo 1 – Do técnico à população: a democratização do campo do patrimônio.

Título: Academia x rede social: a rede social como modo de democratização do acesso aos
resultados da dissertação.

Resumo (Mínimo: 1000 e Máximo: 3000 caracteres):

Um dos desafios encontrados pelos pesquisadores na academia é a dificuldade em


transmitir para a população os resultados das pesquisas realizadas. Este artigo tem como
objetivo relatar a experiência realizada através da seguinte dissertação de mestrado: Sob as
contas do Rosário: objetos e lugares da Festa em Louvor a Nossa Senhora do Rosário de
Catalão, Goiás. Esta dissertação foi defendida no programa de pós-graduação em Ambiente
Construído e Patrimônio Sustentável que pertence a Escola de Arquitetura e Design da
Universidade Federal de Minas Gerais. A defesa da pesquisa foi realizada no segundo
semestre de 2016 e um dos principais desafios encontrados durante a mesma foi o de
transmitir os resultados da melhor forma possível para a comunidade, a principal
interessada nesses resultados. Durante a pesquisa de campo a grande reclamação da
comunidade Catalana foi a de que eles não tinham acesso aos resultados das pesquisas
acadêmicas realizadas na cidade sobre a Festa do Rosário. Assim, a rede social facebook
passou a ser utilizada como meio de divulgação desses resultados. Foi criada uma página
dentro da rede social, no início da pesquisa, e a mesma continua em pleno funcionamento
após a defesa da dissertação. No começo a página era gerenciada apenas pela
pesquisadora responsável pela dissertação e com o tempo passaram a gerenciar a página
diversos membros da comunidade e da Irmandade. Desse modo, pesquisador e
comunidade trabalham juntos na manutenção e divulgação de uma importante manifestação
cultural.

Palavras-Chave: rede social; Catalão; Festa.

Autores: MESQUITA, Janaina Faleiro Lucas; REZENDE, Marco Antônio Penido de

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Belo Horizonte/MG - de 21 a 23/06/2017.
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ANÁLISE PARCIAL DA PRESERVAÇÃO NO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL

KOTHER, MARIA BEATRIZ MEDEIROS. (1); PASQUALOTTO, LUÍSA CASSOL.


(2); ZUCCO, LUÍS ANTÔNIO. (3);

1. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – PUCRS. Departamento de Teoria e História


Av. Ipiranga, 6681 – CEP 90.619-900 Porto Alegre - RS
beatrizkother@gmail.com

2. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – PUCRS. Departamento de Teoria e História


Av. Ipiranga, 6681 – CEP 90.619-900 Porto Alegre - RS
luisac.pasqualotto@gmail.com

3. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – PUCRS. Departamento de Teoria e História


Av. Ipiranga, 6681 – CEP 90.619-900 Porto Alegre - RS
luis.zzucco@gmail.com

RESUMO
Este trabalho consiste na análise da gestão do patrimônio no Estado do Rio Grande do Sul, Brasil,
entre os anos de 1980 e 2010. Partindo dos processos administrativos, estabelecemos categorias de
análise que se traduzem na reconstrução dos procedimentos, motivações e critérios adotados para
proteção oficial dos bens culturais e compreensão do processo oficial de proteção. Os dados foram
organizados em fichas e tabelas para análise, interpretação e crítica das informações. Embora sem
uma política linearmente definida para a preservação do patrimônio cultural, o tombamento
desencadeou uma série de práticas institucionais na interpretação do passado. Entretanto, esta
análise nos permite uma série de questionamentos como, por exemplo, a necessidade da definição
de critérios para a escolha dos exemplares a serem protegidos pelo tombamento e proteção do
entorno dos bens tombados, além das motivações e dos trâmites que nos trouxeram à atual lista que
dispomos.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural; Tombamento; Rio Grande do Sul; IPHAE; Gestão.

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


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ANÁLISE PARCIAL DA PRESERVAÇÃO NO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL

Introdução

No cenário brasileiro a preservação do patrimônio arquitetônico constitui um grande desafio.


Coexiste em um contexto urbano relativamente jovem, somando as dificuldades e
desigualdades culturais, sociais e econômicas com as demandas do mercado imobiliário. Os
desafios da gestão e, consequentemente, as decisões sobre os rumos da preservação
recaem sobre instituições atreladas ao poder público em suas esferas administrativas.

O trabalho consistiu em revisitar a história da preservação no Rio Grande do Sul


considerando a importância de sua arquitetura enquanto testemunho de uma época. Os
processos de tombamento e as portarias de entorno disponíveis no Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Estado - IPHAE foram importantes fontes para o entendimento do
processo de gestão da preservação. Propusemos um recorte temporal com mapeamento de
informações referentes ao período de 1980 a 2010.

A partir dos dados coletados, estabelecemos algumas categorias de análise como, por
exemplo, o período compreendido entre a data de tombamento e a de inscrição no Livro
Tombo, em uma tentativa de reconstrução do processo e compreensão dos procedimentos
e critérios adotados para a proteção oficial dos bens culturais. O estudo possibilitou
constatar as diferentes motivações da preservação e consequentemente, seus
desdobramentos. Com o cruzamento dos dados coletados, foram obtidos subsídios para a
reconstrução parcial do cenário desafiador das três primeiras décadas de preservação oficial
no Estado do Rio Grande do Sul.

A construção da preservação no Estado do Rio Grande do Sul

A preservação no Brasil estrutura-se oficialmente com o Decreto Lei nº 25 de 1937 que,


além da criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - SPHAN, define em
seu Artigo 1º o que deverá ser entendido como patrimônio histórico e artístico nacional. Na
continuação, o decreto institui a criação de quatro Livros Tombo nos quais esses deverão
ser inscritos. Inicia-se, portanto, a oficialização da preservação no Brasil.

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No Estado do Rio Grande do Sul, a preocupação com a preservação remonta a um gesto
pioneiro do então Presidente do Estado Dr. Antônio Augusto Borges de Medeiros que,
sensível à sugestão de alguns intelectuais, determinou que deveriam ser mantidos no
domínio público ou trazidos para este e devidamente conservados os lugares notabilizados
por fatos assinalados na evolução do Estado, registrado no regulamento de Terras do
Estado do Rio Grande do Sul. Segundo Riopardense de Macedo (1970), toda vez que o
interessado pela defesa dos bens culturais do sul do Brasil recorria ao SPHAN, ouvia
sempre as mesmas queixas e a sugestão de que as diversas regiões nacionais criassem
seus próprios serviços para cuidar das peças de interesse regional. Conclui-se que as
iniciativas ainda dispersas esbarram em dificuldades.

Em 1961, foi organizado na Faculdade de Arquitetura da UFRGS o Iº Seminário para Estudo


e Defesa do Patrimônio Cultural do Rio Grande do Sul. Além da conscientização de um
grupo de estudiosos, como resultado, foi criada uma comissão, em 20 de fevereiro de 1964,
para estudo de um projeto de lei que criasse a Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico
Estadual - DPHAE e seu regimento interno.

O decreto lei nº 17.018, assinado em 15 de dezembro de 1964, criou na Divisão de Cultura


da Secretaria de Estado dos Negócios da Educação e Cultura, a Diretoria do Patrimônio
Histórico e Artístico do Estado, incumbida da defesa do patrimônio histórico e artístico. Tinha
como finalidade inventariar, tombar e conservar obras e documentos de valor histórico e
artístico, monumentos, paisagens e locais dotados de particular beleza. Legalmente, este foi
o impulso necessário para as primeiras ações.

Dentre a ampla competência da Diretoria, era estabelecida a promoção, catalogação


sistemática e proteção dos arquivos estaduais, municipais, particulares ou eclesiásticos
cujos acervos fossem de interesse à história regional e à história da arte no Estado. Da
mesma forma, previa medidas para promover o enriquecimento do patrimônio histórico e
artístico, proteção e fiscalização dos bens tombados, coordenação e orientação de museus
estaduais que lhe ficassem subordinados, além de estimular e orientar a organização de
novos quer pela iniciativa pública ou privada e a divulgar através da promoção de
exposições temporárias, publicações ou qualquer outro empreendimento.

Os decretos da época que buscavam implantar e normatizar a preservação não tiveram o


efeito necessário. Consequentemente a preservação no Rio Grande do Sul seguia apenas
como intenção. Riopardense de Macedo (1970, p. 16), em relatório apresentado ao
Governador, diz que: “é claro que se o Governo criou, em 1965, a Diretoria do Patrimônio
Histórico e Artístico do Estado, a conselho do atual Instituto do Patrimônio Nacional, é
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porque sentia já naquela época a necessidade daquele órgão para bem cuidar de uma área
que era sua atribuição. Mas o fato de não ter conseguido, nestes oito anos, nem sequer se
preocupado em montá-lo, revela que não houve, por parte dos governantes, a necessária
sensibilidade, ficando o gesto da criação apenas na letra fria do decreto”. O descaso em que
se encontrava o patrimônio no Rio Grande do Sul traduzia a pouca atenção dada ao tema
da preservação e, embora houvesse esforço para criar leis e decretos específicos, esses
não podiam entrar em funcionamento pela falta orçamentária ou mesmo pela inexistência de
liberação de verbas eventuais para serem aplicadas nesse sentido.

Na tentativa de superar esse problema, em 7 junho de 1971, com o Decreto 21.147, o


Governador Euclides Triches criou uma Comissão Especial para tratar do patrimônio cultural
do Rio Grande do Sul. Tratava-se de reunir e classificar os bens culturais do Estado,
relacionando e estruturando as instituições responsáveis, públicas ou privadas. A situação
do patrimônio histórico e artístico do Estado encontrava-se em um momento difícil, não
somente por falta de regulamentação, mas por motivos econômicos, os quais refletiam na
dura realidade em que se encontravam os acervos das principais instituições museográficas
do Estado. Neste momento, a preocupação era ainda restrita a um grupo de intelectuais, os
quais se preocupavam em incentivar a regionalização da cultura com o desenvolvimento das
expressões que restaram do processo cultural de cada região, considerando que a defesa
dos bens culturais é um imperativo da nacionalidade.

A Lei Nº 7.231/19781, que dispõe sobre o patrimônio cultural do Estado, traduz uma nova
tentativa de resguardar a integridade física dos bens culturais materiais. 2 Em 1979, três
decretos voltam a tratar da questão da cultura. O primeiro decreto de nº 28650/1979 altera a
estrutura organizacional da administração direta, passando a existir a Secretaria de Cultura,
Desporto e Turismo. Na designação de suas competências constam as atividades culturais,
patrimônio histórico, arqueológico, antropológico, científico, artístico e cultural.

Entretanto, somente com o Decreto 28709/1979 foram transferidos para a Secretaria de


Cultura, Desporto e Turismo os órgãos da Secretaria de Educação da qual essa é originada.
Os assuntos culturais, os acervos bibliográficos, artísticos, históricos e a documentação
passam oficialmente a constituir obrigação da nova secretaria. Faltava, entretanto, oficializar
a sua organização, o que ocorre com o Decreto 29195/1979. Essa organização previa três
departamentos e dentre eles o Departamento de Cultura que deveria “incumbir-se dos

1 Legislação Estadual: Lei nº 7231, de 18/12/1978 (dispõe sobre o Patrimônio Cultural do Estado). Art. 2 - "...
aplicam-se no que couber, aos bens integrantes do Patrimônio Cultural do Estado, as disposições do Dec. - Lei
nº 25, de 30/11/1937. Art. 3 -...remete às constituições federal e estadual dos anos de 1988 e 1989,
respectivamente.
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assuntos pertinentes à pesquisa e ao incremento das atividades culturais e ao patrimônio
histórico, arqueológico, antropológico, científico, cultural e artístico no Estado”. Contudo, a
competência e funcionamento dos órgãos deveriam ser regulados em Regimento aprovado
mediante Portaria. A partir de 1979, a Divisão de Cultura Histórica e Artística do Estado
passa a se chamar Coordenadoria do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado - CPHAE.
Após a criação da Secretaria de Estado da Cultura, em 1990, é publicada a portaria n°
11/90, que altera a denominação das coordenadorias, transformando-as em institutos.
Passando assim, o CPHAE, a chamar-se Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do
Estado, o IPHAE.

A preservação no Rio Grande do Sul avança com a Lei Estadual do Desenvolvimento


Urbano nº 10.116/1994 importante nas questões de preservação permanente e áreas de
entorno. Este marco legal aborda o tema da volumetria e ambiência dos elementos de
proteção ou de preservação, balizando o primeiro passo para a obrigatoriedade de
planejamento municipal com diretrizes para os Planos Diretores, mas, sobretudo
preocupando-se com a integridade do entorno do patrimônio cultural edificado.

As três primeiras décadas de preservação

Na década de 1980, foram realizados 65 tombamentos, além de algumas complementações


na legislação do Estado com o intuito de promover a preservação. A recente
redemocratização do Brasil pode ter sido um dos fatores determinantes para o número de
tombamentos da década de 80. Ao organizar as atividades de preservação do patrimônio
cultural foi regulamentada com o Decreto Estadual nº 31.049. Foi uma tentativa para
estimular, através do envolvimento de todos os órgãos do governo e demais instituições
públicas e privadas voltadas para o desenvolvimento cultural, o estudo, a pesquisa, a
seleção, a divulgação, a catalogação, o tombamento, a fruição, a conservação e a
preservação do patrimônio cultural do Rio Grande do Sul. Busca também permanente
atualização do inventário, orientação de pessoas quanto à importância da valorização dos
bens culturais, aprimorar os critérios de análise e ampliar a gama de bens compreendidos
como patrimônio cultural. A partir desta última medida, podemos destacar um importante
ponto que surge pela primeira vez em um decreto: a preservação de monumentos naturais,
sítios e paisagens “de feição notável”, que mereçam ser preservados por motivos
“preservacionistas, educacionais, científicos ou de lazer públicos”.

2A Lei estadual 7231/78 combinada com o Decreto-Lei nº 25/37 no âmbito federal disciplinam os tombamentos
no Rio Grande do Sul através de ato administrativo. Este é de competência da Secretaria de Estado da Cultura.
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A década de 80 foi, portanto, um período de estruturação, uma vez que buscou promover o
envolvimento das entidades locais de preservação com o intuito de apresentar processos de
tombamento com pareceres técnicos mais elaborados. Podemos considerar que um dos
pontos positivos decorrentes da descentralização dos agentes de preservação refere-se à
valorização do bem, ou seja, a partir desse momento o juízo de valores referentes ao
patrimônio passou também a ser de responsabilidade dos agentes locais.

Na década de 90, os tombamentos concentraram-se, quase que em sua totalidade, nos


cinco primeiros anos. Em 1990, foi criada a Secretaria de Estado da Cultura (SEDAC) com a
finalidade de estimular a cultura em suas múltiplas manifestações. Foram alteradas as
denominações das coordenadorias, transformando-as em Institutos, passando assim, o
CPHAE, a chamar-se Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado - IPHAE. As
ações relativas aos tombamentos foram centralizadas e as justificativas que embasaram as
instruções dos processos priorizaram os valores relativos à historicidade e relevância
arquitetônica, além de atestarem o estado de conservação, fornecendo diretrizes para fins
de restauração e definição do entorno.

Uma justificativa recorrente para a realização dos tombamentos na década de 90 foram os


bens que pertenceram a personagens relacionados à história política do Rio Grande do Sul.
De certa forma, pode ser considerado como uma necessidade de valorizar os personagens
políticos. Foi um período marcado por eleições diretas à presidência e, consequentemente,
conformando relações sociopolíticas diferenciadas do período anterior. Cabe destacar nessa
década o grande número de tombamentos de residências pertencentes a personagens
políticos no Estado.

Entre 1990 e 2000, houve uma multiplicação dos agentes envolvidos na proteção. As
preocupações com as justificativas para a valorização não se restringiram aos valores
arquitetônicos e históricos, mas também na busca à relação direta com seu proprietário,
com sua trajetória e com a comunidade onde se localiza, além da preocupação com o
desaparecimento do bem.

Na década de 2000, a inovação em relação aos bens tombados aconteceu com a


proposição de proteção de um exemplar da arquitetura moderna: a Casa do Povo em
Vacaria, projeto de autoria do arquiteto Oscar Niemeyer datado de 1985 (Figura 1). Cabe
salientar que o pedido de tombamento partiu da Prefeitura de Vacaria. Entretanto a gestão
do patrimônio continuou enfrentando dificuldades geradas pelas dificuldades econômicas
além de sofrer as pressões do mercado imobiliário.

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Figura 1. Croqui de autoria do Arquiteto Oscar Niemeyer, 1985. Fonte: Arquivos do IPHAE.

Coletando e organizando os dados

Como ponto de partida para a análise, consideramos alguns fatores inerentes ao próprio ato
de preservação oficial como, por exemplo, data de tombamento, inscrição em livro tombo e
portarias de entorno, tendo em vista buscar elementos que pudessem identificar e
corroborar o processo de gestão do patrimônio histórico cultural no Rio Grande do Sul. No
período delimitado, foram tombados 111 bens pelo Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico do Rio Grande do Sul. Destes, um foi posteriormente demolido, trata-se da Casa de
Ramiro Barcelos em Charqueadas. Portanto, podem ser considerados 110 bens tombados
para efeitos de análise. Propusemos a classificação dos bens, o que resultou em: paisagens
notáveis, ou seja, trechos parciais da mata atlântica, parques florestais e matas; bens
móveis; pinturas murais inseridas em interiores de edificações e bens imóveis quantificados
conforme o gráfico 1, abaixo.

Gráfico 1. Classificação e quantificação geral dos bens tombados. Fonte: Os autores.

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Os dados compilados foram organizados em fichas, em uma primeira etapa, com as
seguintes informações, conforme a Figura 2: denominação do bem; endereço do bem;
cidade em que se localiza; proprietário atual; número e data da portaria de tombamento;
número do processo de tombamento e data de sua publicação em diário oficial; data de
inscrição no livro tombo; se possuía ou não portaria de delimitação de entorno; uso original;
uso atual; estado de conservação; data de construção e linguagem arquitetônica, no caso
dos bens imóveis. As informações assim organizadas permitiram uma melhor visualização
do cenário existente.

Figura 2. Dados das Fichas catalográficas. Fonte: Os autores.


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No decorrer da coleta de dados para mapeamento dos bens tombados, foi constatada a
necessidade e a importância da construção de fichas técnicas dos bens tombados, uma vez
que estes dados geralmente encontram-se inseridos nos processos de tombamento e, em
alguns casos, nas portarias de entorno. Os processos de tombamento conformam, sem
sombra de dúvida, um acervo rico e uma fonte de dados muito interessante para uma
pesquisa. Neles encontramos materiais como, por exemplo, cópias de escrituras, jornais
antigos, pareceres, correspondências, fotografias antigas e entrevistas.

A partir da coleta e organização dos dados em fichas para a identificação dos bens
tombados, foi possível dar início à análise e diagnóstico da situação. Entretanto, no
processo de cruzamento dos dados para sua posterior interpretação e diagnóstico, muitas
vezes foi preciso retornar aos processos de tombamentos ou mesmo recolher informações
adicionais na bibliografia. Logo, com a organização dos dados de identificação e históricos
em fichas, tabelas, análise dos processos de tombamento e portarias de entorno foi possível
definir parâmetros para subsidiar a análise dos procedimentos adotados pelo Instituto ao
longo do período proposto. Algumas dessas análises serão descritas a seguir.

Proteção oficial e entorno: uma abordagem necessária

Importante salientar que, durante o processo de estudo e análise dos processos de


tombamento, foram levados em consideração alguns fatores inerentes ao próprio ato de
preservação oficial como, por exemplo, data de tombamento, inscrição em livro tombo e
portarias de entorno. Estes dados foram escolhidos tendo em vista que a pesquisa busca
elementos que possam identificar e corroborar o processo de gestão do patrimônio histórico
cultural no Rio Grande do Sul. A disparidade na formatação dos processos de tombamento,
no aspecto a que se refere a coleta de documentações e pareceres, além das motivações,
subsidia o diagnóstico de ausência de parâmetros, não apenas na escolha dos bens a
serem protegidos pelo tombamento, mas também com relação a documentação que deve
compor o referido processo.

Entretanto, nos processos de tombamento da última década que foram analisados, a


inclusão de pareceres de expertos e estudiosos independentes dos técnicos do Instituto e o
aumento da preocupação com uma certa uniformização dos documentos se faz perceber de
forma significativa. Outro aspecto importante a ser salientado é a inclusão dos estudos de
entorno nos últimos tombamentos. Segundo Lopes (2013, 29), em seu estudo sobre as
zonas de proteção do patrimônio que “a valorização do monumento, que é do interesse

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público, não fica completa sem a garantia de seu desafogo, pois este é condição essencial
da sua fruição estética”. Consideramos as zonas de entorno fundamental para a proteção do
patrimônio.

O processo de proteção não ocorre de forma linear. Na década de 1980, transcorridos


dezesseis anos da criação do DPHAE, motivado por um protesto da população ocorre o
primeiro tombamento em setembro de 1980, a Ponte 25 de Julho, em São Leopoldo (Figura
3). O primeiro tombamento não define exatamente o inicio de um processo de gestão do
patrimônio, mas ocorre sim uma resposta à revolta da população local e aos protestos
organizados pelos estudantes de arquitetura da UNISINOS, uma vez que o poder público e
os empresários tinham a intenção de destruí-la. Os tombamentos que irão suceder a esse
não seguem exatamente a um padrão, seja temporal ou relacionado a ocupação do território
ou mesmo às questões da arquitetura.

Figura 3. Fotografia da Ponte 25 de Julho em São Leopoldo. Fonte: Arquivos do IPHAE. Autor e data
desconhecidos.

Da mesma forma em relação aos procedimentos, tanto de tombamento como o de inscrição


em Livro Tombo, constata-se que estes também não seguem um padrão. No caso do
edifício da Prefeitura Municipal de Lajeado, o tombamento foi publicado em Diário Oficial em
16 de agosto de 1984 e, sua inscrição no Livro Tombo somente em 01 de agosto de 1984,

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tendo, entretanto, ocorrido ambos no mesmo mês e ano. Em algumas situações, o intervalo
de tempo entre a publicação em Diário Oficial do seu tombamento e a inscrição no Livro
Tombo não segue nenhum parâmetro perceptível, como é o caso, por exemplo, do Fórum
de Jaguarão, que teve a publicação de seu tombamento em Diário Oficial em 23 de
dezembro de 1986 e sua inscrição em Livro Tombo em 17 de setembro de 1981.

Outro ponto importante no processo de proteção são as portarias de entorno. Ao nos


referirmos ao entorno de um bem tombado, consideramos a área localizada na vizinhança
do bem e que deve ser delimitada para preservar a sua ambiência. Nesse sentido, as
portarias que delimitam o entorno dos bens tombados são muito importantes. São,
fundamentalmente, diretrizes para o tratamento do espaço público e privado em uma
poligonal resultante do levantamento e diagnóstico de área periférica ao bem tombado. O
levantamento considera o histórico, o levantamento fotográfico, os perfis e os cortes da
área. Estes estudos irão subsidiar o diagnóstico que definirá as visuais de interesse e as
edificações com valor arquitetônico histórico e/ou paisagístico. Portanto, a definição da
altura das edificações que poderão vir a ser construídas e/ou as áreas que não poderão ser
edificadas dentro desta poligonal. Estas diretrizes passam a ter validade a partir do
momento em que ocorre a sua publicação em Diário Oficial.

Considerando o exposto, analisamos os processos de tombamento e constatamos que 34%


dos bens imóveis tombados possuíam portaria de entorno até o ano de 2010. Este fato
acaba por deixar a descoberto a proteção de um perímetro imediato ao bem que,
eventualmente, poderá ser importante para sua ambiência. Devemos considerar, entretanto,
que neste universo surgem casos com soluções diferenciadas, como, por exemplo, o Sítio
Ferroviário de Santa Maria (Figura 4), em que a delimitação de entorno está contida na
Portaria de Tombamento n°30/00, Publicação D.O. 14/11/2000, p.46. Nesse caso, o próprio
objeto de tombamento merece uma atenção especial, pois se constitui da estação férrea, do
Colégio Manoel Ribas e dos prédios da Cooperativa dos Funcionários da Ferrovia além da
Vila Belga, com 40 casas geminadas, o que por si só resulta em um caso complexo, o qual
deveria ter uma regulamentação complementar específica, ao nosso entender.

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Figura 4. Implantação da Vila Belga em Santa Maria. Fonte: Arquivos do IPHAE. Autor e data
desconhecidos.

Conclusão

A pesquisa, da qual resulta este trabalho, embora ainda não esteja totalmente concluída, já
esta permitindo uma aproximação ao processo de construção e salvaguarda da memória
coletiva e as tentativas de preservação ao longo das últimas décadas no Rio Grande do Sul.
A imersão nos processos de tombamento, principal fonte de pesquisa do estudo, revelou-se
como fonte inesgotável da memória coletiva de nosso Estado.

Quando analisamos as motivações que levaram ao tombamento dos bens se observou


claramente a inexistência de diretrizes na escolha dos bens a serem tombados. Entretanto
mesmo sem uma política linear definida para a preservação do patrimônio cultural, através
dos processos de tombamento, foi desencadeada uma série de práticas institucionais na
interpretação do passado, tendo em vista a sua preservação e a cultura rio-grandense.

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Considerando a falta de diretrizes questionamos, por exemplo, a necessidade da definição
de critérios na escolha dos exemplares a serem protegidos pelo tombamento.
Independentemente das motivações e dos trâmites que resultaram na atual lista que
dispomos dos bens tombados, observamos que as arquiteturas referentes aos diferentes
momentos da ocupação do território, ou mesmo exemplares significativos representantes do
desenvolvimento dos núcleos urbanos, não foram consideradas. Este fato gerou uma lacuna
na escolha das arquiteturas mais representativas das diversas linguagens nos referidos
períodos. Acreditamos que um ponto importante é a seleção de exemplares arquitetônicos
que ilustrem a história, além de representarem importantes momentos e linguagens.

Da mesma forma, fica ainda em aberto todo um estudo sobre as motivações e solicitações
de tombamentos nas quais participam os mais diferentes atores e depreende-se que há uma
longa jornada a ser percorrida, um aprendizado a ser adquirido. Mas, sobretudo, a grande
necessidade de serem traçadas novas linhas de atuação para a preservação do patrimônio
cultural no que tange a gestão.

Referências Bibliográficas

LOPES, Flavio. Zonas de proteção ao Património Arquitetónico: para que servem? Casal de
Cambra, Portugal: Caledoscópio, 2013

MACEDO, Riopardense de. Relatório. Manuscrito - Arquivos IPHAE. Porto Alegre, 1970. p.
16.

Decreto Federal de Lei nº 25, de 30 de novembro de 1937.

Decreto Estadual de Lei nº 28709, de 1979.

Decreto Estadual de Lei nº 17.018, de 1964.

Decreto Estadual de Lei nº 21.147, de 1971.

Decreto Estadual de Lei nº 7.231, de 1978.

Decreto Estadual de Lei nº 29195, de 1979.

Decreto Estadual de Lei nº 28650, de 1979.

Decreto Estadual de Lei nº 31.049, de 1983.

Decreto Estadual de Lei nº 7231, de 1978.

Portaria de Tombamento n°30/00 – IPHAE – Rio Grande do Sul.

Lei Estadual do Desenvolvimento Urbano nº 10.116, de 1994.

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Bibliografia Consultada

CASTRO, Sônia Rabello de. O Estado na Preservação de Bens Culturais. Rio de Janeiro,
Renovar, 1991.

CURY, Isabelle (organizadora). Cartas Patrimoniais (Edições do patrimônio). 2ª edição. Rio


de Janeiro: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 2000.

FONSECA, Maria Cecília Londres. O Patrimônio em Processo. Rio de Janeiro: Ed.


UFRJ/Minc - IPHAN, 1997.

IPHAE. Patrimônio Edificado – Orientações para sua preservação. Porto Alegre: CORAG –
2009.

KOTHER, M. Beatriz; Ferreira, Mario; Bregatto, Paulo Ricardo – org. Arquitetura e


Urbanismo: Posturas, Tendências e Reflexões. Porto Alegre: Edipucrs, 2006.

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AS DISTINÇÕES DA PATRIMONIALIZAÇÃO NO BRASIL: uma
reflexão sobre identidades múltiplas não reconhecidas.

MIRANDA A. S. SOARES, ELIANA (1);


1. Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN e Doutoranda do Programa de Pós-
Graduação em Planejamento Urbano e Regional – IPPUR/Universidade Federal do Rio de Janeiro –
UFRJ, Brasil, elianamass@gmail.com.

RESUMO
O crescimento dos movimentos sociais urbanos, em defesa do patrimônio edificado no Brasil, vem
evidenciando as dificuldades na gestão desse patrimônio pelos órgãos de tutela e a prevalência de
uma hegemonia tecnocrática, expondo a ausência da participação social, seja nas políticas de
preservação ou nos processos decisórios de intervenções na cidade que afetam o coletivo. Apesar da
legitimação da participação e controle social pela Constituição Federal de 1988 e também pelo
Estatuto da Cidade de 2001, cujos instrumentos visam assegurar o pleno exercício da cidadania e a
gestão democrática das cidades, observa-se que a aplicabilidade desses instrumentos está longe de
ser efetiva.
Apresenta-se um conjunto complexo de questões que abrangem: a compreensão de que o patrimônio
cultural possui caráter difuso e coletivo; de que é portador de referência à identidade, à ação e à
memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira; de que há desigualdade na forma
de apropriação pelos cidadãos que são privados muitas vezes do processo de conhecimento, fruição
e valorização do patrimônio; e que comunidades pleiteiam reconhecimento identitário de bens
culturais.
A partir da análise de demandas de movimentos sociais em defesa do patrimônio edificado, e do
contexto brevemente aqui apresentado, propõe-se refletir, neste artigo, se as escalas de interesse de
preservação – nacional, regional e local, ainda que sejam entendidas como uma estrutura de
organização das instituições para uma gestão compartilhada, ao conferirem uma hierarquização de
valores do patrimônio, acabam por promover um caráter distinto desse patrimônio. Essa distinção
pode implicar na distribuição desigual de investimentos para a conservação, em muitos casos na
flexibilização da legislação em favorecimento de empreendimentos imobiliários e no processo de
conhecimento, fruição e valorização do patrimônio cultural. Também se argumenta que pode ser uma
forma excludente de reconhecimento de identidades, uma vez que à luz da Constituição Federal de
1988 o patrimônio cultural brasileiro é caracterizado pela sua diversidade, constituindo-se, portanto,
por múltiplas identidades.
Palavras-chave: Participação; Identidade; Patrimônio.

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1. Introdução

Propõe-se refletir, neste artigo, se as escalas de interesse de preservação –


nacional, regional e local, acabam por promover um caráter distinto do patrimônio ao
conferirem uma hierarquização de valores do patrimônio, ainda que sejam entendidas como
uma estrutura de organização das instituições para uma gestão compartilhada. Essa
distinção pode implicar na distribuição desigual de investimentos para a conservação, em
muitos casos na flexibilização da legislação em favorecimento de empreendimentos
imobiliários e no processo de conhecimento, fruição e valorização do patrimônio cultural.
Também se argumenta que pode ser uma forma excludente de reconhecimento de
identidades, uma vez que à luz da Constituição Federal de 1988 o patrimônio cultural
brasileiro é caracterizado pela sua diversidade, constituindo-se, portanto, por múltiplas
identidades.

O patrimônio cultural, como portador de referência à identidade, à ação e à memória


dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, tal como expresso pelo Art.216
da Constituição Federal de 1988, passa a ser considerado, conforme Mourão (2009, p. 76),
um bem difuso podendo ser definido pelas seguintes propriedades: a transindividualidade,
que ocorre quando o direito transcende o indivíduo, ultrapassando o limite da esfera de
direitos e obrigações de cunho individual; a indivisibilidade, em que não há como cindir o
direito difuso, por conta de sua natureza indivisível, pois a todos nós pertence e, ao mesmo
tempo, ninguém em específico o possui; e a titularidade, em que os interesses ou direitos
difusos possuem titulares indeterminados, estando os indivíduos interligados pela mesma
circunstância fática, sendo afetados pelos malefícios e benefícios oriundos de uma dada
situação.

A preservação do patrimônio cultural está incluída no Direito à Cidade, o qual


segundo Cavalazzi (2010, p.130) compõe-se por um feixe de direitos, como o direito à
moradia, à educação, ao trabalho, à saúde, aos serviços públicos, ao lazer, segurança, ao
meio ambiente equilibrado, entre outros, sendo o Direito à Cidade, um direito coletivo, um
direito social, e principalmente humano.

O Estatuto da Cidade (Lei Federal n.º10.257/2001), para Miranda (2012, p.282)


demonstrou a preocupação em assegurar o envolvimento e a participação da comunidade
na definição dos rumos da política urbana, com o fim de alcançar a chamada gestão
democrática da cidade. O elemento fundamental para a sua concretização é a participação
de representantes da sociedade civil nos processos decisórios, de maneira que se assegure

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a voz e a vez ao cidadão, constituindo-se assim espaços públicos de negociação dos
interesses distintos presentes na sociedade.

No contexto definido pelo Estatuto da Cidade, “devem ser considerados o


tombamento e seus desejáveis efeitos na perspectiva da função social da cidade”
(Cavalazzi, 2010, p.138) e como também consideramos, outras formas de acautelamento
tendo em vista o exposto pela Constituição Federal de 1988. Para Cavalazzi (2010, p. 133)
proteger o patrimônio cultural é não separar os valores que grupos sociais uniram por meio
da identidade, da ação e da memória. Entendemos assim, que uma vez separados ou
alterados esses valores, ocorrerá uma mudança na interpretação do bem cultural, podendo
incorrer em sua descaracterização.

2. A distinção do patrimônio

A Constituição Federal de 1988, no Art. 23, inc. III, declara que é de competência
comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios a “proteção dos
documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, as paisagens
naturais notáveis e os sítios arqueológicos”. No Art. 30, sobre a competência dos
municípios, afirma no inc. IX que cabe a esse ente “promover a proteção do patrimônio
histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual”.

Observa-se, no nosso entendimento, que a Constituição não trata claramente de


grau de interesse para preservação, tal como se estabeleceu no sistema de preservação
brasileiro a partir do final da década de 1960 e início de 70, quando os órgãos estaduais de
preservação do patrimônio começaram a ser criados para a proteção de bens de valor
regional. No início da década de 1970 os Compromissos1 de Brasília e Salvador
recomendaram a criação de órgãos de preservação nas diferentes instâncias, tanto estados
quanto municípios, sendo que estes últimos vieram a ocorrer na década de 1980.

Segundo Castro (1991, p.21), há dois limites de ação para cada um dos entes
políticos. O primeiro diz respeito aos limites territoriais, e o segundo ao grau de interesse em
relação ao bem protegido que se poderia inferir da norma constitucional. Para essa autora,
“a competência executiva concorrente impõe a necessidade de se avaliar o grau de
interesse”, o que “significa que a União terá competência para proteger bens que tiverem

1 Compromisso de Brasília celebrado por ocasião do 1º Encontro dos governadores de Estado, secretários
estaduais da área cultural, prefeitos de municípios interessados, presidentes e representantes de instituições
culturais, em 1970; Compromisso de Salvador por ocasião do II Encontro de governadores para preservação do
patrimônio histórico, artístico, arqueológico e natural do Brasil, em 1971. Neste último encontro recomendou-se a
criação do Ministério da Cultura, e de secretarias ou fundações de cultura no âmbito estadual (Cury, 2004).
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importância nacional; os Estados, bens que tiverem significado regional; e os Municípios,
aqueles bens de interesse local”.

A atuação dessas esferas ou entes políticos são concorrentes e suas competências


serão definidas por outros princípios legais. Em razão disso, o ato de proteção de qualquer
um deles não obsta o de outro ente político, podendo haver mais de um ato de proteção, e
até mesmo pelos três. No entanto, conforme o entendimento de Castro (op.cit, p.23), se os
efeitos de cada ação forem diversos, mas compatíveis, incidirão todas as restrições, e
cumprindo a mais restritiva, as demais estariam sendo cumpridas. Mas se cada ente político
tiverem determinações diferentes e incompatíveis entre si, “aplicar-se-á o principio do maior
interesse, prevalecendo as exigências de ente federal sobre o estadual e, desse último
sobre o municipal”.

Fig. 01 – À esquerda: Teatro Municipal do Rio de


Janeiro, tombado pelos três entes políticos. Fonte:
disponível em www.apontador.com.br. Acessado em
junho de 2017.
Fig. 02 – Acima: Fazenda Mantiquera em Quissamã/RJ
em arruinamento. Tombada pelo estado - Inepac.
Encontra-se aberto processo de instrução para
tombamento no Iphan desde 1976. Fonte: disponível no
avaaz.org. Acessado em junho de 2017.

Para Castro (1991, p.21) é evidente que um bem de importância nacional é também
importante aos níveis regional (estados) e local (municípios), contudo o inverso pode não
ser aplicado. De fato, isso é o que se constitui como habitus2 dentro campo do patrimônio,
remetendo aos conceitos definidos por Bourdieu (1998).

Tem-se aí um elemento complicador, que ao nosso ver, se choca com os atuais


debates sobre cidadania e identidade, que veremos adiante, além da própria definição de
patrimônio cultural pela Constituição Federal de 1988. Se a proteção patrimonial no Brasil é
feita com base no interesse de preservação dos entes políticos, se o patrimônio cultural
brasileiro é entendido como o somatório das culturas regionais e locais, o que constitui sua

2 Disposição corporal e mental que faz com que os agentes desse universo, se reconheçam e compartilhem
certas práticas e formas de pensar. Notas de aula: Teoria dos Movimentos Sociais Urbanos – IPPUR/UFRJ. Prof.
Orlando Junior.
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diversidade, como a formulação de uma ideia de identidade nacional, entendida aqui como
aquela construída desde 1937, pode excluir determinadas identificações de cultura regional
ou local? E, por que um reconhecido bem cultural local ou regional não pode ser
considerado um bem nacional?

Considera-se ainda, que, é justamente no nível local que se estabelecem as relações


mais próximas com o objeto e onde se dá a identificação, a reconstituição das memórias e
os laços afetivos pelo indivíduo e por uma comunidade. Menezes (2006, p.40) considera
exatamente isso quando afirma que o município é o locus privilegiado da fruição concreta,
aprofundada e diversificada da cidade como bem cultural, e não o estado, a região, o país, o
mundo.

Permite-se no presente artigo, empregar o exercício de desnaturalização de


verdades “universais” e partir do entendimento de Bourdieu (1998), de que, é a posse do
capital simbólico que está em disputa no campo e que há sempre verdades-duplas. Há uma
troca de verdade-dupla pelos agentes em um determinado universo social, sendo que essa
troca não é transparente, envolvendo uma mistificação, que não é um material objetivo, mas
um capital simbólico. Boudieu (1998) formula a idéia de que a maior parte dos agentes não
é marcada pela intencionalidade, mas pelo habitus.

Buscando traduzir esse entendimento na prática da preservação patrimonial, vemos


que muitos dos tombamentos nacionais, a exemplo daqueles localizados na cidade do Rio
de Janeiro, como o Cristo Redentor, Pão de Açúcar, Arcos da Lapa, Jardim Botânico, Teatro
Municipal são apropriados como patrimônio, através de um capital simbólico, que não
somente remete à cidade, mas também ao país, ao se constituírem em imagens exploradas
comercialmente e exportadas para fins de atração e incremento da indústria do turismo.
Acredita-se que não se pode dizer o mesmo de outros tantos bens tombados, que se
encontram esquecidos e degradados pelo território nacional.

Fig.03 - Casa grande da antiga Fazenda de


São Bento, tombada pelo Iphan em 1957,
no município de Duque de Caxias/RJ,
encontrando-se atualmente em péssimo
estado de conservação e sem uso.
Processo de tombamento: 0564-T-57.
Integra o roteiro de visitação do Museu Vivo
de São Bento, como forma de preservação
da memória caxiense.
Fonte: Disponível em:
http://www.museusdorio.com.br. Acessado
em junho de 2017.

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Passamos a perceber outras questões importantes para discussão. O capital
simbólico valorizado pela proteção patrimonial nacional é realmente comum a todos
indivíduos ou grupos sociais da nação? Todos detêm a mesma capacidade de fruição
desses bens? E esse capital simbólico valorizado é distribuído igualmente a todos os bens
culturais? Avaliamos que há uma dominação simbólica, tal como Bourdieu coloca ao refletir
sobre o exercício do poder simbólico (1998).

Cabe ainda acrescentar outra problemática à formulação da ideia identidade nacional


que advém desde 1937. Quando não existiam os órgãos de preservação estaduais ou
municipais, o Iphan (antigo Sphan) promoveu tombamentos no intuito de proteger um
determinado bem, por entender que havia valores relevantes intrínsecos a ele, mas ao
mesmo tempo, considerando que esses valores poderiam ser atribuídos apenas em escala
regional ou local, e não em um contexto ou identidade nacional. Tal atitude era tomada
quando havia disputas pelo espaço, muitas vezes motivadas pelo interesse em demolição
ou descaracterização através de grandes reformas, a exemplo do tombamento da Praça
Getúlio Vargas em Nova Friburgo, conforme parecer3 de Lúcio Costa em 20/01/1971:

“Conquanto normalmente a proteção solicitada devesse caber ao governo


do estado, a circunstância de ainda não haver serviço protetor do acervo
histórico e artístico estadual, bem como o fato histórico de essa primeira
colônia européia ter sido fundada em 1818, por iniciativa do próprio D. João
VI, acrescido do pormenor significativo do plantio dos eucaliptos haver sido
obra pessoal do paisagista Glaziou, criador também do Parque São
Clemente, que visava então com isto não apenas a futura ambientação
paisagística condigna do logradouro, mas igualmente secar o brejo ali
existente, julgo cabível a DPHAN intervir mo sentido de garantir a proteção
solicitada pelos ilustres assinantes da petição. Tanto mais assim quando se
considera que, tendo o barbarismo partido do poder público (municipal),
compete a esse mesmo poder, já agora em instância federal – uma vez que
o governo estadual não dispõe de meios de o fazer – corrigir a inépcia e dar
ao mesmo público a devida satisfação”.

Tem-se então que, nem todos os bens culturais tombados pelo Iphan, ou seja, em
escala nacional, apresentam de fato a memória ou a identidade do que seria de cunho
nacional, tal como construídas no período inicial da patrimonialização no Brasil. Gonçalves
(1996, p. 53) destaca que Aloísio Magalhães descreveu “a política tradicional do Sphan
como parte do que ele chama de velho tapete europeu, que sufoca a diversidade da cultura
brasileira”. Complementa que para Aloísio, a diversidade da cultura é pensada como tão

3 Processo n.º 0833-T-71. Inscrição Nº50, Vol. 1, F.12 do Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e
Paisagístico em 04/07/1972.
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heterogênea quanto oposta àquela concepção homogeneizadora de cultura que teria sido
implantada na política do Sphan, desde sua criação em 1937, através do Decreto-Lei
n.º25/1937.

Conforme Gonçalves (apud Magalhães 1985; 1986, p. 54) as diferentes formas de


cultura popular são vistas como a fonte mesma de uma “autêntica” identidade nacional.
Aloísio enfatiza na década de 1970, o papel desempenhado por diferentes grupos e seus
respectivos patrimônios culturais na sociedade brasileira. Essa visão pluralista e de certo
modo, “antropológica” do Brasil, é, então, concebida por ele e seus colaboradores como
instrumento fundamental no processo de democratização política e sócio cultural da
sociedade brasileira.

2.1 A desigualdade na forma de apropriação do patrimônio

Há uma distribuição desigual dos agentes nos espaços de tomadas de posição


política. O campo político tal qual como é gerido, cria o despossessamento da capacidade
política das classes populares, que é traduzido no desinteresse pela ação política. E,
aqueles que possuem maior capacidade de fazer política, irão se interessar mais pela
política.

Segundo Canclini (1994, p.96) o “patrimônio cultural expressa a solidariedade que


une os que compartilham um conjunto de bens e prática que os identifica, mas também
costuma ser um lugar de cumplicidade social” e faz um importante reflexão, cuja discussão
tornou-se fundamental na questão da preservação do patrimônio no século XXI, no que trata
a formação e a apropriação desigual do patrimônio, além do reconhecimento como lugar de
luta material e simbólica entre as classes, etnias e grupos.

O patrimônio cultural tem servido para produzir as diferenças entre os grupos sociais
e a hegemonia daqueles que usufruem a produção e a distribuição dos bens, como também
destaca Arantes (2000) ao colocar que o capital cultural forja um futuro privilegiado de zonas
eleitas e reduz o futuro das áreas menos favorecidas, o que nos permite inferir na ampliação
não somente de um patrimônio desigual4, mas da desigualdade social.

Para Canclini (1994) a sociedade não se desenvolve apenas por meio da reprodução
incessante do capital cultural hegemônico, nem o lugar das classes populares se explica
unicamente pela sua posição subordinada. A desigualdade estrutural entre as diferentes

4
Conceito empregado por Scifoni (2015).

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classes na formação e apropriação do patrimônio deve ser considerada dentro do espaço de
disputa econômica, política e simbólica ao qual o patrimônio é colocado, sendo este
atravessado pela ação de três tipos de agentes: o setor privado, o Estado e os movimentos
sociais. Acrescentamos aqui outros sujeitos que têm assumido papéis importantes nesse
século XXI no Brasil – a sociedade civil, na representação e participação pelos meios
formais e o Ministério Público (federal e estadual) no exercício muitas vezes de mediações
entre a sociedade civil e a sociedade política. Da interação entre esses agentes surgem as
contradições no uso do patrimônio, sendo que essa “desigualdade estrutural impede que se
reúnam todos os requisitos indispensáveis para que intervenha plenamente no
desenvolvimento desse patrimônio dentro das sociedades complexas” (Op.cit, 1994).

A seleção do que se preserva e a destinação dos investimentos aos que merecem


ser conservados são feitas pelos setores dominantes, que dispõem dos meios econômicos e
intelectuais para a realização dessas tarefas. A sociedade e a política brasileiras, conforme
Santos (2002, p. 458), são essencialmente caracterizadas pela predominância do Estado
sobre a sociedade civil e pelos obstáculos enormes à construção da cidadania, ao exercício
dos direitos e à participação popular autônoma, sendo um país marcado por profundas
desigualdades sociais.

A noção de patrimônio, ampliada nos anos 1980, passa a considerar, conforme


Canclini (1994) não apenas os monumentos históricos, o desenho urbanístico e outros bens
físicos, mas a experiência vivida que também se dá através de linguagens, conhecimentos,
tradições imateriais, modos de usar os bens e os espaços físicos. A seleção do que se
preserva e a maneira de fazê-lo devem ser decididas através de um processo democrático
em que os interessados intervenham, trazendo para o debate seus hábitos e opiniões. A
participação social tornar-se, portanto, o recurso-chave para se evitar os efeitos mais
frequentes decorrentes do empreendedorismo urbano, ao criar uma cidade-museu ou uma
cidade elitizada – áreas apropriadas para uma elite de artistas, intelectuais, burgueses e
sobretudo especuladores, que vêem nesses conjuntos urbanos um modo de sublinhar sua
distinção.

2.2 A produção de escalas espaciais e da diferença geográfica

Harvey (2004, p.107 e 108) a cerca de seus estudos sobre desenvolvimentos


geográficos desiguais e direitos universais, discute a produção das escalas espaciais e a
produção da diferença geográfica. Ele sugere que a reprodução de escalas espaciais tem
relação com o modo como os seres humanos organizam a sua vida e sua reprodução social,
como os lares, comunidades e nações. E intui que no mundo de hoje o caráter das coisas se
afigura distintos quando analisado nas escalas global, continental, nacional, regional, local
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ou do lar/pessoal. Considera que as escalas não são imutáveis ou totalmente naturais. São
produtos sistêmicos de mudanças tecnológicas, formas de organização dos seres humanos
e das lutas políticas.

Harvey (op.cit, p. 110) argumenta que a produção da escala exerce um papel


fundamental nos aspectos vitais de toda a teoria dos desenvolvimentos geográficos
desiguais. A globalização trouxe uma mudança nas escalas hierárquicas em que as
atividades humanas estão se organizando, diferentemente do que ocorria há três décadas.
O exame do mundo em qualquer escala particular revela de imediato toda uma série de
efeitos e processos que produzem diferenças geográficas nos modos e padrões de vida,
usos de recursos, nas relações com o ambiente e nas formas políticas e culturais. A longa
geografia histórica da ocupação humana da superfície da terra e da evolução distintiva de
formas sociais (línguas, instituições políticas, valores, crenças religiosas) inseridas
integralmente em lugares com qualidades todas suas, tem produzido um extraordinário
mosaico geográfico de ambientes e modos de vida sociológicos, que se traduz em um
“palimpseto”:

“composto de acréscimos históricos de legados parciais sobrepostos em


múltiplas camadas um sobre os outros, tal como ocorre com as diferentes
contribuições arquitetônicas de diferentes períodos que se distribuem em
camadas nos ambientes construídos de cidades contemporâneas de origem
antiga” (op.cit, p. 111).

Contudo, essas diferenças geográficas são mais do que legados histórico-


geográficos, elas são perpetuamente reproduzidas, sustentadas, solapadas e
reconfiguradas por meio de processos político-econômicos e sociológicos que ocorrem
atualmente. Ainda que as variações geográficas reflitam e incorporem legados materiais,
históricos, culturais e políticos do passado, para Harvey (op.cit, p. 112), seria um erro supor
que elas sejam relativamente estáticas, para não falar de imutáveis. O mosaico geográfico
estaria sempre em movimento em toda e qualquer escala.

No entendimento de Harvey (op.cit. p. 112), deve-se pensar em diferenciações,


interações e relações tanto interescalares como intra-escalares. Considera ser um erro
comum de compreensão analítica e de ação política, nosso aprisionamento numa dada
escala de pensamento, tratando então as diferenças nessa escala como a linha fundamental
de clivagem política.

A produção da diferença geográfica não está associada à desigualdade social, cabe


dizer, na ótica de Harvey. Trata-se da afirmação da diferença. Comunidades podem ter
direito de produzir suas escalas e diferenças geográficas, o que está relacionado a um

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processo de emancipação e não de dominação. Mas deve-se ter em mente que toda escala
é produzida e que as concepções de escala refletem certas concepções de vida.

Ao aplicarmos essa teoria de Harvey no sistema de preservação do patrimônio


brasileiro, temos condições de refletir que a reprodução das escalas espaciais, pensadas
como relação de poder – nacional, regional e local – promovem a fragmentação do
patrimônio, ao fragmentar a própria identidade coletiva, anulando muitas vezes as relações
entre as próprias escalas, acabando por excluir determinadas identidades, além de criar um
caráter distinto de patrimônio, no qual há bens supervalorizados e outros desvalorizados em
seus capitais simbólicos, como colocamos anteriormente.

Menezes (2006, p. 41) avalia que as legislações, as instituições e as práticas na


política de preservação deveriam “operar tendo como quadro o território da cidade e seus
atributos diferenciais e, como alvo, criar condições favoráveis para qualificar as práticas de
seus cidadãos”. Contudo, na realidade, “obedece a outras coordenadas que tornam
dificilmente comunicáveis as tarefas de preservação e de ordenação urbana”. Argumenta
também, que as contradições e as tênues fronteiras entre preservação e zoneamento
urbano, que é de competência municipal, apresentam um descompasso essencial, pois
nunca poderia ser resolvidas por uma legislação de patrimônio cultural autônoma e
independente de uma legislação de uso e ocupação do solo. Cumpre destacar que o uso
dos bens culturais, conforme Menezes (op.cit, p.41), constitui uma das principais
justificativas da proteção que o poder público, nos três níveis, é obrigado a fomentar.

3. Os debates sobre cidadania complexa e identidade

Se tratamos de gestão democrática das cidades e do direito à cidade, é importante


buscar compreender a relação que se estabelece entre Estado e sociedade, definido pela
cidadania. Holston (2013, p. 34) analisa as constituições de cidadania para revelar essa
intricada relação que motiva o surgimento ou a redução de movimentos sociais. Para ele, a
formulação brasileira de cidadania iguala as diferenças sociais no que se refere à afiliação
nacional, porém legaliza alguma dessas diferenças como bases para distribuir de maneira
diferenciada direitos e privilégios entre os cidadãos.

Conforme Holston (2013, p.21) as democracias prometem cidadanias mais


igualitárias e, conseguinte mais justiça e dignidade na organização das diferenças. Na
prática, porém, considera que a maioria das democracias vivencia intensos conflitos entre
seus cidadãos, na medida em que seus princípios entram em choque com preconceitos
quanto aos termos da incorporação nacional e da distribuição de direitos. A insurgência
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mundial de cidadania democrática ocorrida nas últimas décadas, em razão da
democratização e urbanização do século XX, rompeu com fórmulas estabelecidas de
governo e privilégio nas mais diversas sociedades. Holston conclui que o resultado disso é
“um emaranhado entre a democracia e seus opositores em que novos tipos de cidadãos
surgem para expandir a cidadania democrática, ao mesmo tempo que novas formas de
violência e exclusão a corroem.”

Holston (op.cit. p. 28) traça uma análise da trajetória histórica da cidadania brasileira
como uma combinação de dois fatores: a cidadania formal, fundada em princípios de
incorporação ao Estado-nação; e a distribuição substantiva dos direitos, significados,
instituições e práticas envolvidas na afiliação daqueles considerados cidadãos. Argumenta
que a combinação desses fatores geram uma cidadania nacional que, desde o início (da
formação da nação), era universalmente includente na incorporação e maciçamente
desigual na distribuição. Essa formulação de cidadania usa diferenças sociais que não são
as bases da incorporação nacional – sobretudo diferenças, como de educação, propriedade,
raça, gênero e ocupação – para proporcionar tratamentos diferentes para categorias
diferentes de cidadãos. É então gerada uma gradação de direitos entre eles em que a
maioria dos direitos está disponível apenas para tipos específicos de cidadãos e é exercida
como privilégio de categorias sociais específicas.

Importante acionar o repertório de Carracedo (2000), que analisa conceitos de


cidadanias integrada e diferenciada, buscando perceber em que medida essas concepções
permitem atender as reivindicações por reconhecimento de diferentes grupos sociais.
Defende que o reconhecimento das diferenças não precisa traduzir-se em desigualdade.
Concebe, portanto, a idéia de cidadania complexa, como aquela capaz de melhor traduzir e
conciliar as questões de pertencimento e participação. Afirma que sem o reconhecimento de
pertencimento não há condições objetivas para a participação política, e que a participação
democrática requer uma educação política adequada, que começa da percepção cidadã do
bem público comum.

Para Carracedo (2000, p.26 e 27) a cidadania complexa se constitui como parte de
uma identidade comum fundamental, dentro da legítima diferenciação étnico-cultural
enquanto indivíduos e enquanto grupo, com identidade própria e irrenunciável, podendo
responder as tensões entre pertencimento e participação. Segundo sua visão, o
pertencimento é tratado pela obtenção do reconhecimento pleno dos direitos civis, e na
esfera da participação há uma dimensão sócio-política que supõe a aceitação e a integração
em uma estrutura institucional que permite o cumprimento das obrigações cívicas e o
exercício dos direitos pelos cidadãos. Os direitos não devem ser restritos a bens

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econômicos, a bens primários, a bens sociais, mas devem incluir também, além das
liberdades fundamentais, o direito de todo o individuo à sua identidade cultural, como direito
irrenunciável, portanto, tanto pertencente a uma maioria, como também a uma minoria.

Carracedo (op.cit. p.28) estabelece que o conceito de cidadania complexa atende a


uma tripla exigência, quais sejam:

a) igualdade de direitos básicos para todos os cidadãos, o que implica uma política
universalista de integrar os mínimos comuns;

b) os direitos diferenciais de todos os grupos, maioria e minoria, que compõe a


estrutura organizacional do Estado (todo Estado é em menor ou maior grau,
multissocial e multicultural);

c) condições mínimas de igualdade para a dialética ou diálogo livre e aberto dos


grupos sócio-culturais.

Cabe ainda considerar que Carracedo (2000) destaca o cuidado que se deve ter em
relação à assimilação e a homogeneização da cultura hegemônica. Para ele, este diálogo
entre diferentes grupos etnoculturais deve acontecer, mas este diálogo/intercambio não
pode incorporar a assimilação e homogeneização da cultura dominante-hegemônica.

Toda cidadania expressa um padrão da administração da tensão entre igualdade e


diferença, e toda cidadania é um padrão da administração entre qual diferença se afirma e
qual igualdade é enunciada5.

Sobre a identidade, Haesbaert (1999, p.170 e 171) entende que ela pode ressurgir,
no contexto de mercantilização das cidades, como uma forma consciente ou não, de
contraposição ao processo excludente pela globalização. Woodward (2000, p.21) coloca que
a globalização produz diferentes resultados em termos de identidade, onde a:

“homogeneidade cultural promovida pelo mercado global pode levar ao


distanciamento da identidade relativamente à comunidade e à cultura local.
De forma alternativa, pode levar a uma resistência que pode fortalecer e
reafirmar algumas identidades nacionais e locais ou levar a o surgimento de
novas posições de identidade”.

Haesbaert (1999, p. 175 e 178) afirma que toda identidade só se define em relação a
outras identidades, numa relação complexa de escalas territoriais. As identidades implicam
na busca de reconhecimento que se faz frente à alteridade. Aborda a noção a identidade
socioterritorial, em que um dos aspectos fundamentais para a sua estruturação está na

5 Notas de aula: Teoria dos Movimentos Sociais Urbanos – IPPUR/UFRJ. Prof. Orlando Junior.

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alusão ou referência de um território. Elas somente são territoriais quando sua estruturação
depende, sobretudo, da apropriação simbólica no território. Como parte fundamental do
processo de simbolização, destacado por Haesbaert (apud Da Matta, p. 1983, p. 180), tem-
se as condições pelas quais o objeto é transmutado em símbolo “pois se a sociedade
classifica, ela também opera e manipula as classificações”.

Uma das características mais importantes da identidade territorial, para Haesbaert


(op.cit, p.180) é que ela recorre a uma dimensão histórica, do imaginário social, de modo
que o “espaço que serve de referência condense a memória do grupo, a exemplo dos
monumentos históricos nacionais. A (re) construção imaginária da identidade envolve
portanto uma escolha, entre múltiplos eventos e lugares do passado”. É o que consideramos
que Otília Arantes (2000) chama de identidade seletiva.

Haesbaert (1999, p. 180 e 187) conclui que a importância da identidade decorre mais
de sua eficácia que de sua “realidade”. E considera que, o território pode vincular poderes
simbólicos de múltiplas faces, ora reforçando a segregação, ora viabilizando uma dinâmica
de convívio ou de ativação de múltiplas identidades.

Em relação à identidade nacional, Kathryn Woodward traz uma abordagem que


mexe com a lógica construída pelo Sphan a partir de 1937 e que ainda persiste. Para
Woodward (2000, p.25) as identidades que são construídas pela cultura são contestadas
sob formas particulares no mundo contemporâneo, pós-colonial, cujo período é
caracterizado pelo colapso das velhas certezas e pela produção de novas formas de
posicionamento. As mudanças e transformações globais nas estruturas políticas e
econômicas no mundo contemporâneo colocam em relevo as questões de identidade e as
lutas pela afirmação e manutenção das identidades nacionais e étnicas. A questão que se
impõe no momento é como a chamada identidade nacional permanece sendo construída no
Brasil a partir da seleção de identidades socialmente e territorialmente reconhecidas.

Para Woodward (2000, p.40) as identidades são fabricadas por meio da marcação da
diferença. Essa marcação decorre dos sistemas simbólicos de representação e também
pelas formas de exclusão social. A identidade não seria o oposto da diferença, mas
apresenta uma relação de dependência. Nas relações sociais, as formas de diferença
simbólica e social são estabelecidas por sistemas classificatórios, ao menos em parte. Um
sistema classificatório pode operar um princípio de diferença a uma população de tal forma
que pode ser capaz de dividi-la.

4. O papel das mobilizações e dos movimentos sociais urbanos

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Os movimentos sociais são agentes coletivos, que se constituem por serem
contrários ao poder simbólico, e apresentam uma intencionalidade, um objetivo. Reivindicam
direitos que estão sendo negados por uma estrutura de dominação, ou ainda, podem
acionar a insurgência para a demanda de algo que não está estabelecido ou
institucionalizado, podendo romper com o habitus.

A título de ilustração, vemos a mobilização contínua pela preservação e conservação


da Estação Ferroviária de Visconde de Imbé, no município de Trajano de Moraes/RJ pela
Associação de Moradores e Amigos de Visconde de Imbé – AMAVI e o Movimento de
Preservação do Patrimônio Histórico Cultural do Município de Trajano de Moraes, que
perdura há mais de 25 anos. A mobilização centrou-se na proteção da estação através de
tombamento, para realização de obras de conservação e na utilização da edificação como
espaço cultural.

Em 1996 ocorreu um plebiscito, no qual a população demonstrou ser contrária a


demolição da estação e, em 2000, foi realizado um abraço simbólico ao seu redor. No
entanto, desde que se iniciou o movimento, muito da estação havia se perdido, chegando
em 2014 a sua total demolição, ainda que o objetivo final tenha sido a sua reconstrução a
partir de um projeto executado pela prefeitura municipal, cuja obra teve início no ano de
2015 e que até o momento não foi concluída. Ainda que as obras sejam concluídas, a
estação não será mais a mesma. Os valores intrínsecos a ela e sua autenticidade já foram
perdidos.

De acordo com as informações da prefeitura não há um uso ainda definido ao local,


podendo abrigar sala digital, centro cultural ou uma agência de correios, sendo a obra
executada através de uma parceria com o Governo do Estado.

Figs. 04 e 05 – À esquerda, observa-se a edificação da estação ainda íntegra, em fotografia de 2004, de autoria
de Gutierrez L. Coelho. Fonte: Disponível em http://www.estacoesferroviarias.com.br. Acessado em janeiro de
2009. À direita, tem-se a estação em ruínas. Acervo pessoal, 2009.

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Figs. 06 e 07 – À esquerda, observa-se a sua total demolição em 2014, pela fotografia de Geraldo Carvalho.
Fonte: http://trajanodemoraes.rj.gov.br/obras-estacao-visconde. Acessado em agosto de 2016. À direita, observa-
se a sua reconstrução em concreto armado. Fonte: http://trajanodemoraes.rj.gov.br/obras-estacao-visconde/.
Acessado em agosto de 2016.

Importa avaliar nesse caso, é que embora a comunidade local pleiteasse o


reconhecimento da estação como bem cultural aos três entes políticos, não conseguiu a
proteção requerida, ainda que com a instauração de inquérito civil pelo Ministério Público do
Estado do Rio de Janeiro – MPRJ. Todas as vias para a proteção foram acionadas, porém,
as vozes da comunidade trajanense não foram ouvidas.

As propostas do poder público local, ao longo do tempo, sempre se mostraram no


interesse da demolição e posterior reconstrução, apesar de manifestação contrária do órgão
de proteção estadual – o Inepac e de todas as recomendações e orientações que tratam da
preservação e conservação do patrimônio edificado. Mesmo estando em processo de
arruinamento, era possível restaurá-la, recuperando e reforçando sua estrutura.

Do Inquérito Civil6 instaurado pelo MPRJ destacamos o pronunciamento do Inepac


em 2004, às fls. 46 e 47 que demonstra interesse no tombamento e afirma que “o
tombamento da Estação Visconde de Imbé se justifica dentro desse contexto do
tombamento do conjunto da rede, buscando, inclusive, fortalecer e viabilizar as medidas
para a sua preservação efetiva”, pois:
“Há muito o Inepac vem recolhendo informações para elaboração de
estudos de reconhecimento e proteção do complexo ferroviário existente no
Estado do Rio de Janeiro. Esse patrimônio representa, efetivamente,
marcos materiais do processo econômico, social e industrial, iniciado no
século XIX em território nacional, cujos “vestígios” se distribuem ao longo da
antiga malha ferroviária fluminense, hoje desativada, através das
construções que compunham seu sistema.”

6
Proc. 2008.00124881. IC 44/2003 (TM-CID).

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Em contraposição, ainda no Inquérito Civil acha-se encaminhamento da
Superintendência do Iphan no Rio de Janeiro, em 2003, às fls. 44, informando que a “antiga
Estação Ferroviária de Visconde de Imbé não apresenta valores que justifiquem seu
tombamento em âmbito federal” (...). Mas alerta:

“que a proposta de demolição da antiga estação, para construção de outra


no mesmo estilo, não é recomendável por nenhum dos instrumentos
internacionais que estabelecem os princípios para a preservação de bens
culturais, devendo ser empreendidos todos os esforços para a manutenção
do bem, com obras de conservação e restauração que permitam reconhecê-
lo como um monumento autêntico”.

Contudo, recai dramaticamente à Estação de Visconde de Imbé o descompasso


entre os entes políticos de proteção, conforme vimos através de Menezes (2006), quando é
editada a Lei Federal n.º11.483 de 31/05/2007 que dispõe sobre a revitalização do setor
ferroviário, e o Iphan passou a ser o responsável por receber e administrar os bens móveis e
imóveis de valor artístico e cultural oriundos da extinta RFFSA e zelar pela sua guarda e
manutenção. Desde então o Iphan avalia dentro de todo o acervo quais os bens são
detentores de valor histórico, artístico e cultural7. E assim, o Inepac passou a continuidade
dos estudos de reconhecimento ao Iphan, que não valorou o bem.

5. Considerações finais

Pelo caminho teórico percorrido até aqui, entendemos que a produção de escalas
espaciais no sistema de preservação do patrimônio brasileiro incorre no isolamento das
competências e responsabilidades das esferas de proteção patrimonial. Contribui assim, na
fragmentação de identidades coletivas e na exclusão de múltiplas identidades, além, de criar
um caráter distinto de patrimônio, por meio de sua classificação, no qual há bens
supervalorizados e outros desvalorizados em seus capitais simbólicos, o que atribuímos
como uma divisão patrimonial de classe.

A ausência de participação social na gestão desse patrimônio pelos órgãos de tutela


e a prevalência de uma hegemonia tecnocrática, nas políticas de preservação ou nos
processos decisórios de intervenções na cidade que afetam o coletivo, anulam a voz das
comunidades e expõem os mecanismos de reprodução da desigualdade social, o que
consideramos ter também reflexo direto nas políticas de preservação do patrimônio cultural.

7 Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/127. Acessado em dezembro de 2016.

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Os movimentos sociais urbanos e as mobilizações são fundamentais para promover
resistências e insurgências ao exercerem a cidadania na luta pelo direito à cidade. Assim
como a construção de valores ligados à memória coletiva e à identidade define o bem
cultural, a identidade e suas referências associativas constituem um grupo e estas vão ser a
condição objetiva comum para a mobilização desse grupo em torno de demandas de
proteção patrimonial.

Referências bibliográficas
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cidade do pensamento único. Desmanchando consensos. Petrópolis: Editora Vozes, 2000.
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AS ESTRADAS DE VILA RICA À CACHOEIRA DO CAMPO: DOS
ANTIGOS CAMINHOS À ESTRADA DE DOM RODRIGO JOSÉ DE
MENEZES. INSTRUMENTOS DE SALVAGUARDA E SUAS
INTERFACES COM A MEMÓRIA DE SÃO BARTOLOMEU, OURO
PRETO.

ROCHA, Tássia Christina Torres.(1); CRUZ, Jefferson Alexandre da.(2);


BOHRER, Alex Fernandes.(3); BATISTELI, João Vitor.(4).

1. Instituto Federal de Minas Gerais Campus Ouro Preto. Departamento de Conservação e Restauro
Endereço Postal: Rua Pandiá Calógeras, 898, Bauxita, Ouro Preto - MG.
E-mail:tassia.surya@gmail.com

2. Instituto Federal de Minas Gerais Campus Ouro Preto. Departamento de Conservação e Restauro
Endereço Postal: Rua Pandiá Calógeras, 898, Bauxita, Ouro Preto - MG.
E-mail:jefferson.alecruz@gmail.com

3. Instituto Federal de Minas Gerais Campus Ouro Preto. Departamento de História


Endereço Postal: Rua Pandiá Calógeras, 898, Bauxita, Ouro Preto - MG.
E-mail:alex_f_bohrer@hotmail.com

4. Instituto Federal de Minas Gerais Campus Ouro Preto. Departamento de Conservação e Restauro
Endereço Postal: Rua Pandiá Calógeras, 898, Bauxita, Ouro Preto - MG.
E-mail:joaovitor.batistele@gmail.com

RESUMO
Nos tempos coloniais, as estradas reais eram as principais vias de acesso à região de Vila Rica. Em
1782 o governador Dom Rodrigo José de Menezes mandou abrir uma nova estrada ligando o Palácio
de Cachoeira ao de Ouro Preto. Esta nova via, que substituiu uma mais antiga (construída no cimo da
serra em 1718), era uma estrutura soberba, com 20Km de extensão, com calçamentos, muros de
arrimo, caneletas de escoamento de água e um belo chafariz (tombado pelo Iphan em 2007). Uma
fantástica obra de engenharia colonial, a estrada de Dom Rodrigo oferece um passeio único pela
imponente serra, outrora chamada Serra da Cachoeira (hoje conhecida como Serra de Ouro Preto).
Por sua incontestável importância histórica, em 2014 iniciou-se um projeto de Pesquisa e Extensão
no IFMG – Ouro Preto com o objetivo de impulsionar instrumentos de proteção patrimonial e garantir,
através dele, o acautelamento das estradas. Cremos, contudo, que mais importante até que os
processos de tombamento e guarda legal, a conscientização da população acerca de seus bens de
valor histórico é de fundamental importância para a manutenção do próprio bem. Nesse sentido,
desenvolver um trabalho de sensibilização e educação patrimonial nas comunidades de São
Bartolomeu, bem como em distritos vizinhos, ligados intrinsecamente à famosa Estrada, foi primordial
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para o sucesso do projeto. Grande foi a participação da comunidade que atuou de forma ativa nas
atividades propostas, sendo protagonistas durante todo o processo. O trabalho de educação
patrimonial proporcionou uma rica experiência de trocas entre a comunidade e academia, mostrando,
dessa forma, que ambas devem caminhar juntas no processo de construção do conhecimento. Houve
contato estabelecido com o IEPHA, para orientar as políticas públicas possíveis de se aplicar nas
estradas, bem como uma parceria com o Ministério Público, a fim de apurar as possibilidades de
acautelamento real frente ao Estado. O fruto principal do projeto foi o início do procedimento de
tombamento da Estrada de Dom Rodrigo, que atualmente está em discussão no Conselho
Patrimonial de Ouro Preto. Cabe frisar que diante da repercussão do trabalho, houve interesse por
parte do IPHAN em obter os dados inventariados da pesquisa para iniciar esse trâmite. Partindo dos
resultados positivos já alcançados, o foco agora é abordar a participação efetiva nos procedimentos
de tombamento junto ao COMPATRI. Tendo em vista também o grande reconhecimento obtido com o
trabalho de educação patrimonial nas escolas de São Bartolomeu e Cachoeira do Campo, recebemos
diversos convites para realização das mesmas atividades em outros distritos. Assim, resolvemos
aprimorar as ações relacionadas à sensibilização junto às comunidades, ampliando esse trabalho
para o distrito de Glaura, sendo esta localidade ligada diretamente com a história da estrada. Espera-
se, sobretudo, que o projeto continue aproximando os moradores ao patrimônio, estimulando assim, a
cidadania ativa e participativa.

Palavras-chave: Tombamento; Estrada; Educação Patrimonial; Preservação.

Introdução

Após o esmagamento da Revolta de Filipe dos Santos, em 1720, o Conde de Assumar


propôs que se construíssem em Cachoeira do Campo um quartel e uma residência para os
governadores de Minas, tendo em vista o ponto estratégico que o arraial era por excelência.
O quartel seria construído já em 1720 e reconstruído em 1779. O Palácio dos Governadores
foi construído em 1730 e ampliado em 1782 por Dom Rodrigo José de Meneses.

Dom Rodrigo tomou posse como governador da Capitania das Minas em 20 de fevereiro de
1780, sendo a solenidade realizada na Igreja de Nossa Senhora do Pilar, em Vila Rica,
como era costume. O Conde de Cavaleiros - título nobre e honorífico que Dom Rodrigo
ostentava - veio para as Minas com sua esposa, a condessa Dona Maria José Ferreira
d´Eça.

Homem de visão, dotado de verdadeiro tino administrativo e espírito empreendedor, tomou


como primeira providência a reforma dos caminhos que condiziam à capital, todos, então,
em precário estado de conservação e intransitáveis nos meses de chuva. Ainda no começo
da década de 1780, Dom Rodrigo, além de melhorar os acessos, deliberou também
construir pelo menos mais três vias, todas obras louváveis da engenharia, dotadas de
pontes, muros de arrimo, chafarizes e obras de arte. São as três: a Estrada entre Vila Rica e

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Mariana, a Estrada da Soledade (a qual rumava ao Rodeio, no atual distrito de Miguel
Burnier) e a Estrada da Cachoeira.

Dentre estas, cumpre destacar a Estrada de Cachoeira. Esta via era parte essencial e
prolongamento das obras que Dom Rodrigo empreendeu na Casa de Recreio que os
governadores mantinham em Cachoeira do Campo. Depois de várias reformas, a citada
casa foi transformada em um aprazível Palácio de Campo.

Entre as propostas que o dinâmico Conde enviou ao Rei de Portugal, estava a liberdade das
indústrias em Minas (o que era explicitamente proibido). Como a sugestão soasse aos
ouvidos reais quase como heresia foi prontamente negada.

O chafariz, que hoje leva o nome de Dom Rodrigo, continua como testemunha muda de
seus atos, sendo o mais conservado dos monumentos erguidos em sua lembrança.

É o mesmo que matou a sede de Dom Pedro II, no dia dois de abril de 1881, quando seguia
de Ouro Preto para Cachoeira do Campo e do qual ele deixa registro de próprio punho. Sem
dúvida que também saciou a sede dos Inconfidentes de 1789, que cotidianamente usavam
esta estrada, então recém construída.

Localizado a médio caminho entre Cachoeira e Vila Rica, a meia encosta do paredão
rochoso (o qual domina grande parte da Serra da Cachoeira), pelos lados que defronta com
o Vale do Rio das Velhas. A estrada - da qual o chafariz era um útil adorno - se iniciava no
portão de acesso ao Palácio da Cachoeira, atravessava a Ponte do Palácio (sobre o Rio
Maracujá) e seguia pela antiga Rua do Palácio (atual Rua Nossa Senhora Auxiliadora). Dali
atingia a Praça da Matriz de Nazaré (Praça Filipe dos Santos, onde também existe um
chafariz), subindo em seguida pela Rua do Tombadouro. Do Tombadouro ia em direção ao
Padre João (hoje bairro Alto do Beleza), abandonando de vez a área urbana de Cachoeira,
Do Padre João o caminho descia sinuoso até Santo Antônio dos Tabuões (onde existia
pequena ponte de madeira) e daí subia novamente ao Pouso de José Henriques (famosa
hospedaria colonial). De José Henriques tomava-se o trecho principal do caminho aberto por
Dom Rodrigo de Menezes, já aos pés da Serra da Cachoeira - esta parte do caminho foi a
que mais trabalho impôs aos seus construtores, pois foi toda aberta na rocha virgem, em
curva de nível, ziguezagueando a encosta íngreme. O chafariz citado foi edificado aos pés
da pedra que domina a serra. De lá rumava-se até a Pedra de Amolar, descendo depois à
Jacuba e daí entrava-se em Vila Rica pelas Cabeças. Percebe-se que boa parte do caminho

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está inserido no distrito de São Bartolomeu, onde a passagem obrigatória como única
estrada de acesso à sede criou memórias diversas naquela comunidade.

Como se vê, essas estradas têm papel de destaque na história de Ouro Preto. As diversas
cartas régias, que pediam abertura e melhoria das estradas que ligavam Vila Rica aos
principais eixos de conexão do país no século XVIII, também apontam a importância que as
estradas tinham (e ainda tem) para o desenvolvimento local. O processo de tombamento do
Chafariz de Dom Rodrigo também indica essa relevância.

As estradas reais, abertas a mando ou sob a concessão da Coroa


Portuguesa, constituíram-se as vias principais de acesso à região das
minas e ao ouro que impulsionava a metrópole. Do encontro entre o
“caminho velho” e o caminho novo” originou-se um emaranhado de
entroncamentos, caminhos secundários que buscavam a sede da capitania,
Vila Rica de Ouro Preto.

A principal destas vias foi construída durante o governo de Dom Rodrigo


José de Menezes, entre Cachoeira do Campo e Ouro Preto, passando pelo
distrito de São Bartolomeu. Obra notável da engenharia colonial, grande
parte do seu percurso se faz em curva de nível al longo da Serra de Ouro
Preto, tornando-a caminho preferencial, pois, menos árido, sinuoso e
cansativo que a antiga estrada que corria no cimo da montanha. A meio
caminho entre Cachoeira e Ouro Preto, como marco da inauguração da
estrada, foi construído um chafariz, hoje conhecido como Chafariz de Dom
Rodrigo de Menezes.

Mais que um elegante monumento, o chafariz constitui registro precioso da


vitalidade econômica e social daqueles séculos, quando a demando pelo
ouro e pelas oportunidades de ascensão social movimentavam os caminhos
da capitania. Ponte de para, descanso e refazimento, o chafariz dá
testemunho do espírito empreendedor, moderno, que animava o então
governador da capitania, Dom Rodrigo de Menezes: à necessidade da
estrada mais segura para os muitos viajantes, associa-se o elemento
funcional e simbólico que informa e atravessa os tempos, servindo, ainda,
hoje, como ponto de referência. (Prefeitura de Ouro Preto. Ação de
Tombamento do Chafariz Dom Rodrigo de Menezes, 2007).

O olhar atento dos viajantes estrangeiros que palmilharam Minas Gerais durante o século
XIX é de especial importância para quem deseja analisar o aspecto das velhas cidades
mineradoras e seus caminhos. Apesar da maioria desses viajantes terem visitado Minas já
no Império, seus relatos, pela proximidade temporal, nos dão uma ideia do período anterior,
da época áurea da capitania. O caminho de Dom Rodrigo de Meneses foi visitado e descrito
por vários viajantes estrangeiros durante o século XIX. Apesar do Chafariz ser ponto
referencial deste caminho, pouca atenção deve ter recebido de nossos visitadores, posto
que são raros os que lhe registram palavra. O mais minucioso relato desta estrada provém
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do Dr. Johann Emanuel Pohl, que por aqui esteve em 1819. É dele também uma
interessante - ainda que breve - descrição do chafariz. O famoso naturalista austríaco
descreve o caminho que percorreu entre Vila Rica e Cachoeira do Campo, onde visitou,
além do Palácio, a casa de um compatriota seu e o Quartel da Cavalaria (pela época, já
transformado na Coudelaria Real).

Diminuto, todavia revelador, é o trecho referente ao Chafariz: “chegamos a uma fonte


murada, obra de um ex-governador [certamente Dom Rodrigo], que estava ameaçada de
ficar sepultada por um desmoronamento.” Vê-se, desta forma, que os problemas do Chafariz
não datam de hoje - por localizar-se sob um paredão de pedras, por várias vezes deve ter
sido ameaçado.

O relato antigo mais extenso sobre o Chafariz vem, curiosamente, do Imperador Dom Pedro
II, que tinha cuidado de descrever suas viagens num pequeno diário. Transcrevemos
também longo trecho, referente ao passeio e à visita a Cachoeira do Campo:

2 de abril de 1881 (sábado) - (...) Subida da serra que divide águas do rio
Doce de águas do rio das Velhas. Alto da pedra de amolar. Vasta e bela
vista. O caminho é todo muito pitoresco. Descobri ao longe o Rio das
Velhas. Chafariz do tempo do governo de D. Rodrigo de Meneses 1722
creio eu. Arraialzinho dos Taboães com ponte. Cachoeira do Campo arraial
de muitas casas. Almocei; fui orar à Igreja que tem dois altares laterais que
muito me agradaram por seus lavores de talha. Visitei só a coudelaria. Casa
arrumadíssima. O arrendatário fulano Castro não quis responder-me
claramente sobre a extensão das terras e as cabeças de gado por causa de
pequena renda que paga e assim mesmo sem tê-lo feito pontualmente. A
terra da coudelaria é só de meu usufruto mas a fazenda do buraco
igualmente arrendada ao mesmo é minha propriedade. Pensarei em
aproveitá-las para colonos.

Voltei à casa onde vi uma cadeira de forma antiga onde meu Pai se
assentou e um Murta de 88 anos que lhe cuidava dos animais de viagem.
Entreguei as duas cartas de alforria dadas pelo dr. Fernandes Torres a dois
cônjuges ao marido estando ausente a mulher. O arrendatário das duas
fazendas disse-me que cada alqueire já produziu 8 carros de mantimentos.

Fui ver as aulas de meninos e de meninas. Casas acanhadas. Naquela os


alunos estavam ausentes, porém nesta achei meninas interrogando a uma
e a professora irmã de um Modestino discípulo de preparatórios da Escola
de Minas pareceu-me muito inteligente.

Partida às 1 ½ e chegada à Casa Branca às 4. Caminho sempre belo. Vi


bem a Serra de Capanema e sua garganta. Foi por aí que nasceu o barão
de Capanema. Orei na igreja. Jantar. Concerto, leitura dos diários do Rio de
30 - última data. Deitar às 9 h. (Diário do Imperador Dom Pedro II, vol.24.)

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O relato do Imperador, cheio de curiosidades e num português mais despojado, ainda
agrada e fala por si só. Chama atenção seu elogio do caminho (“muito pitoresco”) e a
referência: “Chafariz do tempo do governo de D. Rodrigo de Meneses 1722 creio eu.”

Dom Pedro acerta o Governador, mas erra a data - 1782 é o ano certo, não 1722.
Certamente a data, gravada em pedra, devia estar coberta de musgo ou semi-apagada, pois
a dúvida é explícita.

De São Bartolomeu partiam caminhos secundários que atingiam o Caraça, Catas Altas do
Mato Dentro, Santa Bárbara (e desta à Comarca do Serro), Casa Branca, além de outras
trilhas que se esgueiravam pela serra em direção à Estrada de Dom Rodrigo: desta, à
esquerda, rumava-se à antiga Vila Rica ou, à direita, ao Arraial da Cachoeira e seus
arredores.

Quais caminhos, porém, existiam a ligar Cachoeira a Vila Rica, antes da obra de Dom
Rodrigo? E qual o impacto da obra da nova estrada para Vila Rica, Cachoeira do Campo e,
sobretudo, São Bartolomeu, que saíra da rota principal de acesso?

Qual a relação estabelecida entre a comunidade de São Bartolomeu e esse caminho hoje?

Esses caminhos, tão importantes para a história colonial mineira, merecem, assim como o
Chafariz (único bem tombado na longa serra), sua proteção efetiva por parte do Estado.

As estradas reais, que nos tempos coloniais exerciam importante função de circulação para
Vila Rica, hoje formam um caminho turístico que retrata um importante período da história
do país. Muitas políticas vem tratando de promover as estradas reais e ações são
desenvolvidas para garantir a preservação do patrimônio histórico existente nesses
caminhos. Como explica Márcio Santos:

Tem-se falado com frequência de um antigo caminho conhecido como


Estrada Real, que percorria vasta área no centro-sul do Brasil, tendo como
destino principal a região das minas de ouro e diamante da capitania de
Minas Gerais. O tema tem atraído o interesse dos mais diversos setores,
sendo alvo de iniciativas de agências e órgãos governamentais, empresas
privadas, organizações não governamentais e pesquisadores individuais.
Ações tem sido desenvolvidas para que se possa recuperar e conservar o
que restou da antiga via, garantindo a preservação do patrimônio histórico
existente no seu leito e no seu entorno e preparando-a para se tornar um
produto turístico. (SANTOS, 2001).

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Voltando-se para o uso sustentável do potencial histórico, cultural e natural, um dos
programas atuais de divulgação das estradas reais é digno de nota: trata-se do Projeto

Estruturador dos Destinos Turísticos e do Instituto Estrada Real (FIEMG). O projeto estimula
o turismo na Estrada Real, contribui para a economia local e fortalece os laços de identidade
coletiva com as comunidades de entorno. Esse projeto vem apresentando interessantes
resultados positivos, tanto para o turismo, como para a promoção do patrimônio.

A relação entre turismo e patrimônio é legitima e altamente explorada como recurso


econômico e incentivo à valorização do bem. A atuação do turismo para o patrimônio é tão
benéfica quanto o oposto: do patrimônio para o turismo. Evidente que esse embate pode
gerar conflito motivado pela exploração do turismo se as ações de conservação não
estiverem em sintonia, mas é preciso incorporar as ações turísticas como recurso positivo
para a proteção do bem. Segundo Choay, o patrimônio apresenta atualmente dupla função:
é um bem à disposição de todos, para propiciar saber, e ao mesmo tempo é um produto
cultural, criado para o consumo. (CLOAY, 2001). De acordo com a UNESCO o “turismo é
principalmente uma forma de desenvolvimento econômico que tem recursos culturais em
seus alicerces”. (UNESCO, 2006).

Assim, reconhecer de forma sistemática essas estradas entre Vila Rica e Cachoeira do
Campo pode ser uma maneira de estimular a economia local, o turismo cultural e a
preservação. Ademais é preciso lembrar do risco que essa região pode sofrer decorrente
dos impactos ambientais negativos constantes nas atividades extrativas da mineração na
região. O desmatamento, erosão, alteração da paisagem e do solo, fauna e flora podem
comprometer a unidade do conjunto.

Assim, ações que incentivem a redução desses impactos são essenciais. A preservação do
patrimônio arqueológico e histórico dessas estradas são ações de preservação da história
de Minas Gerais.

No entanto, essas ações devem ter por base diretrizes que se amparem na educação e
extensão comunicativa. A educação assume um papel transformador junto ao possível
agente de impacto - o homem - transformando-o num aliado e protetor de suas próprias
heranças culturais. Ações educativas, voltadas para a cidadania com ênfase em
preservação ambiental e cultural e revitalização do meio ambiente local, ajudam a resgatar a
riquíssima memória que envolve a região de São Bartolomeu. Como esclarece Marques:

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A participação é um instrumento norteador das estratégias para resolução
de assuntos de interesse público, é um fenômeno de ação coletiva que
provoca integração social e diálogo entre a comunidade e o governo. Para
efetivar a participação, os indivíduos precisam romper as barreiras da
assimetria de poder e da assimetria de informação, de forma a ter acesso
pleno e consciente às instâncias decisórias. A participação é uma premissa
para as políticas patrimoniais. (MARQUES, 2009).

Marques relata a participação popular nos processos de tombamento de Diamantina e


Serro. Segundo o autor, o diálogo com a comunidade diretamente afetada pelo tombamento
é essencial para a relação de proteção. Na medida em que a comunidade participa das
tomadas de decisão são naturalmente colocados em uma situação diferenciada de reflexão,
a qual nunca antes exercitaram. Esse distanciamento provocado pela reflexão é que gerará
nos agentes as ações preservacionistas. Nesse caso, as políticas patrimoniais de educação
aparecem como mediadoras entre a comunidade e o Estado. Assim é fundamental que os
mediadores se amparem nas necessidades da comunidade. Camargo reforça essa ideia ao
lembrar que a sensibilização com a comunidade atingida é que garantirá a preservação do
bem.

Ao contrário do que se pode imaginar, os moradores locais, embora


possuindo afetividade por elementos do patrimônio constituído ou
potencialmente a construir, não têm geralmente condições para distinguir
sua importância enquanto tal. Os objetos estão incorporados ao seu
cotidiano. É preciso um afastamento e estudo para superar tal desafio,
compreendendo que aquilo que as pessoas têm diante de si apresenta
diferenças que não podem ser conhecidas intuitivamente. Portanto, são os
habitantes da localidade e do entorno imediato os primeiros a ser
sensibilizados, com apoio na efetividade, para valorizar o patrimônio. São as
comunidades e grupos locais que irão garantir sua preservação,
formalmente por intermédio das escolas ou informalmente por intermédio do
lazer (CAMARGO, 2002 apud MARQUES, 2009).

É preciso atenção redobrada dos mediadores nesta sensibilização. Os bolsistas precisam


saber que os bens simbólicos a serem apreendidos têm obrigatoriamente uma relação de
memória previamente estabelecida, que no caso refere-se aos moradores de São
Bartolomeu. Conforme o diagnóstico com a comunidade for evoluindo, por meio das ações
de extensão, as medidas e instrumentos preservacionistas deverão surgir como opções de
proteção coletiva e corresponsável entre as partes (comunidade e governo). Só por meio
dessa troca é possível que se extraia a melhor forma de acautelamento. Como confirma
Bourdieu: “os bens simbólicos só podem ser apreendidos e possuídos como tais (...) por

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aqueles que detém o código que permite decifra-los. Em outros termos, a apropriação
destes bens supõe a posse prévia dos instrumentos de apropriação”. (BOURDIEU, 1992).

Essas estradas representam um conjunto de estruturas de incrível tecnologia e engenharia e


de significativa importância histórica. Rota de mineração e dos Inconfidentes, e intercâmbio
entre áreas distintas, contribuiu para a formação de uma cultura singular, como a de São
Bartolomeu. Some-se a isso a natureza espetacular do território que garante um diferencial
maior à paisagem.

Portanto, um trabalho que reúna a iniciativa da produção de um material de proteção da


estrada, como garantia de sua salvaguarda, aliado ao trabalho de extensão, essencial para
uma abordagem democrática, é importantíssimo para que as políticas de preservação sejam
utilizadas de maneira coletiva e responsável.

O projeto visa contribuir para a proteção e salvaguarda do Patrimônio Histórico de Ouro


Preto; - Promover a valorização da História e do Patrimônio da cidade; - Colaborar para os
estudos referentes às estradas reais; - Incentivar a cidadania ativa, participativa e
corresponsável. Objetivos Específicos: - Desenvolver pesquisas e estudos sobre os
instrumentos de salvaguarda de paisagem cultural e natural e buscar amparo nas políticas
públicas aplicáveis para grandes áreas, como o objeto de estudo exige; - Produzir
documento de dossiê de Tombamento, Chancela de Paisagem Cultural ou outro instrumento
que garanta a proteção das estradas; - Desenvolver, através da extensão comunicativa com
a comunidade de São Bartolomeu, material audiovisual ligado a história oral e relatos da
comunidade São Bartolomeu referentes às antigas estradas de acesso à sede do município;
Incluir a comunidade nas tomadas de decisão quanto à forma ideal de proteção e
salvaguarda do bem.

Material e Metodologia

As ações de pesquisa compreendem o estudo de conceitos como educação patrimonial,


processo de tombamento e processo de chancela da paisagem cultural. As reuniões de
estudo programadas para os bolsistas explorarão a bibliografia acerca dos temas. Além
disso, cabe ao bolsista pesquisador (sob orientação do professor proponente) montar o
documento de proteção (seja chancela ou tombamento). Já à extensão cabem as ações
junto à comunidade de São Bartolomeu, com a aplicação de pedagogia adequada para o
levantamento das histórias dos moradores e reuniões para discutir as tomadas de decisão
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quanto ao produto final de proteção. Para isso serão promovidos seminários junto às
comunidades, demonstrando a importância histórica da estrada de Dom Rodrigo e a
relevância de salvaguardá-la enquanto patrimônio cultural e natural. Realizaremos palestras
de educação patrimonial no sentido de sensibilizar as crianças e jovens, valorizando o papel
individual e coletivo na preservação do patrimônio, imbuindo neles o sentimento de
pertencimento e identidade local. Serão Produzidos também material educativo que inclua
os resultados das palestras e seminários, lembrando que essas publicações não constituirão
um fim em si mesmos, ao contrário, serão fundamentais na composição do processo
educativo. Nesse sentido incluiremos a comunidade nas tomadas de decisão referentes ao
patrimônio.

Aplicação de questionários, encontros culturais, coleta de entrevistas e tratamento de todo


o material serão responsabilidade do bolsista extensionista. Solicitamos, para tanto, três
bolsistas, sendo que dois trabalharão na extensão e um na pesquisa. Contudo, esse
número, apesar de ideal, não é condicionante para realização do projeto. A concessão de
somente um bolsista de extensão ainda torna o projeto viável, sendo que, nesse caso, as
atividades do bolsista 2 serão englobadas no plano de trabalho do bolsista 1 (vide Anexo
VI). Nesse quadro hipotético de somente dois bolsistas, teremos um na extensão e outro na
pesquisa.

Resultados e Discussões

Espera-se que o trabalho proposto por este projeto impulsione um dos instrumentos de
proteção patrimonial (aquele que se mostrar mais adequado às necessidades) e garanta,
através dele, a proteção das estradas. O reconhecimento institucionalizado de
patrimonialização do bem é essencial. Espera-se que a comunidade de São Bartolomeu
seja agente ativa nas tomadas de decisão junto aos mediadores e que o trabalho de
educação patrimonial e história oral possam aproximar os moradores do patrimônio e
estimular a cidadania ativa e participativa.

Conclusão

Foram feitas mais de 800 imagens apontando vestígios de materiais em escala, sistemas
construtivos, paisagem construída e ambiental. Dessa maneira, houve o armazenamento
das imagens conforme correspondência as coordenadas. Cada coordenada tirada com o
GPS corresponde a um vestígio material, seja ele um murro normal ou de arrimo,
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calçamento original, paisagem ambiental, referencias geográficas, ou edificadas. Esse
material será utilizado nos trabalhos de extensão e também representa uma ferramenta de
pesquisa e um documento de conservação e proteção da estradas.

Durante esse período, houve a produção de onze mapas, sendo o mapa de localização, de
vestígios materiais, de edificações históricas, de localização municipal, distrital, estadual e
regional, de altimetria, de relevo, de quilometragem e de satélite. Como resultado obteve-se
a parceria entre o projeto e duas escolas para aplicação das atividades extencionistas;
parceria com o Ministério Público, a fim de apurar as possibilidades de acautelamento real
frente ao Estado; contato estabelecido com o IEPHA, para orientar as políticas públicas
possíveis de se aplicar nas estradas.

Realizamos também a produção de material de apoio para aplicação na comunidade. Nas


escolas será instrumento passiveis de serem utilizados como instrumento protetivo das
estradas. Aplicou-se um quebra cabeças com várias imagens feitas na etapa do
levantamento fotográfico. Um roteiro para a realização de entrevista foi produzida para ser
aplicada com alguns moradores de São Bartolomeu. Dessa forma através da abordagem do
tombamento, chancela da paisagem cultural e registro de lugar como instrumentos mais
interessantes.

Vale ressaltar que o presente projeto encontra-se em andamento, portanto, o mesmo ainda
não finalizou. Partindo dos resultados positivos da primeira etapa, abordaremos a partir de
agora a participação efetiva nos procedimentos de tombamento junto ao Conselho
Patrimonial de Ouro Preto. Tendo em vista também o grande reconhecimento obtido com o
trabalho de educação patrimonial nas escolas de São Bartolomeu e Cachoeira do Campo,
recebemos diversos convites para realização das mesmas atividades em outros distritos.
Desta forma, resolvemos aprimorar as ações relacionadas à sensibilização junto às
comunidades, ampliando esse trabalho para o distrito de Glaura, sendo esta localidade
ligada diretamente com a história da estrada.

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Referências

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CALAES, Gilberto Dias; FERREIRA, Gilson Ezequiel. A Estrada Real e a Transferência da


Corte Portuguesa. Programa Rumys – Projeto Estrada Real / Eds. Gilberto Dias Calaes;
Gilson Ezequiel Ferreira - Rio de Janeiro: CETEM / MCT / CNPq / CYTED, 2009.

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Estado da Cultura de Minas Gerais, 1989. Curso de Capacitação Diretrizes para a Proteção
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TELLES, Antônio A. Queiroz. Tombamento e seu regime jurídico. São Paulo: Editora dos
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CONFORTO AMBIENTAL EM EDIFICAÇÕES PROTEGIDAS: Análise
da Legislação do Corredor Cultural do Rio de Janeiro

SOARES, FERNANDA MEDEIROS CALHÁU.

Mestranda em Projeto e Patrimônio – Programa de Pós-Graduação em Arquitetura – Faculdade de


Arquitetura e Urbanismo – Universidade Federal do Rio de Janeiro
Rua Raimundo Corrêa, nº 90/102 – 27250-815
fernandacalhau.arq@gmail.com

RESUMO
O objetivo deste artigo é realizar uma avaliação crítica dos critérios de conservação adotados para as
edificações protegidas pela Área de Proteção do Ambiente Cultural (APAC) do Corredor Cultural do
Rio de Janeiro sob o ponto de vista conceitual, teórico e principalmente sob a ótica do conforto
ambiental. A arquitetura característica do local onde hoje está delimitada esta APAC foi produzida por
muitos séculos como resultado de uma cultura de edificar, que atendia bem às necessidades daquela
população, manipulando as variáveis do meio externo, proporcionando conforto e habitabilidade. Será
apresentado um breve resumo sobre a evolução dos principais pontos relacionados ao conceito de
conservação de bens culturais arquitetônicos. Posteriormente, serão citadas algumas determinações
das várias legislações produzidas para a área, desde o século XIX até os dias atuais. A partir dos
conceitos abordados sobre conservação de edifícios históricos, da análise da evolução da legislação,
será produzida uma reflexão sobre a maneira em que as questões relativas ao conforto do ambiente
construído, tão valorizadas durante o século XIX como forma de proporcionar a higiene dos edifícios
através da adequada iluminação e ventilação, são contempladas na legislação vigente para o
Corredor Cultural.

Palavras-chave: Corredor Cultural – Rio de Janeiro; Conforto Ambiental; Legislação e Patrimônio.

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Introdução
As cidades possuem a capacidade de “falar” (SANTOS, 1986, p. 59-60), e são formadas
através do somatório de ações de indivíduos sobre um determinado território. A partir do
momento em que são fundadas, nunca podem ser consideradas produtos prontos, pois se
refazem dia após dia, seja através da adição de edifícios, pelas ações de seus habitantes,
mudanças, rupturas, descontinuidades e continuidades. A cultura de um povo é formada
através destas diversas formas de interação e intervenção num território.

Inicialmente, o Rio de Janeiro era visto como uma “praça insalubre” (DE PAOLI, 2013, p. 51-
52) sobre um terreno pantanoso aterrado, e considerado uma “cidade apertada”, limitada por
morros, que foi ocupada através de um longo processo de dissecamento de brejos e
mangues (ABREU, 2006, p. 35). Apresentava um traçado viário característico do período
colonial. A partir de 1763, ano e que tornou-se a capital da colônia, começaram a ser
realizadas melhorias tanto no saneamento quanto nos espaços públicos (LIMA CARLOS,
2012, p. 311). Com a chegada da família Real em 1808, as transformações sobre o território
intensificaram-se: esta nova população que vinha habitar a Cidade do Rio de Janeiro
demandava o atendimento de alguns tipos de novas necessidades, exigindo, assim,
mudanças tanto na aparência quanto no conteúdo da cidade (ABREU, 2006, p. 35).

Até 1821, o Rio de Janeiro restringia-se ao que hoje é a Região Administrativa do Centro e à
Região Portuária. A divisão da cidade era realizada por cinco freguesias, sendo a freguesia
da Candelária a mais nobre desde o período colonial. Nela estavam localizados grandes
estabelecimentos comerciais, que constantemente passavam por obras de renovação
arquitetônica. O traçado característico do Brasil colônia persistia nesta área: consistia em
uma trama regular de ruas paralelas e perpendiculares, formando desenho semelhante a um
tabuleiro de xadrez (DE PAOLI, 2013, p. 25).

As construções eram realizadas sobre os limites laterais e frontais dos lotes, conservando
apenas a área dos fundos livre de edificação. Apesar da legislação não prefigurar nenhuma
tipologia de planta, os traços culturais faziam com que todas fossem compartimentadas de
forma muito semelhante (DE PAOLI, 2013, p. 133). O parcelamento característico do
período colonial facilitava a ocorrência desta semelhança. Ao longo do século XIX, a
legislação foi se desenvolvendo, evoluindo de questões de caráter puramente estético para
questões relativas à qualidade do espaço interno das edificações e à salubridade do
ambiente construído.

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Durante a administração do Prefeito Francisco Pereira Passos (1902-1906) foram
produzidas muitas reformas nesta área mais nobre do Centro, como demolições,
construções, reconstruções e acréscimos, mas segundo De Paoli (2013, p. 36), muitas
edificações provenientes do período colonial sobrevivem até os dias atuais, portanto,
resistiram ao período de reformas de Pereira Passos.

A partir de 1920, iniciavam-se os processos de verticalização da cidade, de especulação do


solo, e aqueles sobrados começavam a disputar espaço com outras tipologias. A população
residente do local começou a migrar em direção à Zona Sul, até que, depois de várias
restrições surgidas de forma gradativa, a função residencial foi proibida definitivamente
através do Decreto nº 322, de Março de 1976 (LIMA CARLOS, 1998, p. 40).

No ano de 1979 foi proposta a criação do Corredor Cultural, com o objetivo de conservar
partes remanescentes do conjunto arquitetônico da área Central da Cidade (LIMA CARLOS,
2011, p. 17), que continuava seu processo de expansão e renovação. Até então, estes
edifícios que integram a área eram considerados obras modestas que não apresentavam
valor para a preservação, nem mesmo pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional) e INEPAC (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural) (MACEDO, 2004, p.
2).

Metodologia

Este artigo é parte da pesquisa produzida para a dissertação do curso de Mestrado


Profissional em Projeto e Patrimônio da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A
metodologia utilizada consiste, primeiramente, na definição dos conceitos de conservação e
autenticidade no patrimônio histórico. A partir de então, serão apresentadas as principais
características da arquitetura da APAC (Área de Preservação do Ambiente Cultural) do
Corredor Cultural do Rio de Janeiro e as legislações produzidas para esta área desde o
século XIX até os dias atuais. Com base nestas informações, possibilita-se a realização de
uma avaliação sobre a maneira que as questões relativas ao conforto do ambiente
construído são contempladas na legislação atualmente em vigor para a área.

1. Conservação de edificações protegidas e o conceito de


autenticidade

O ato de conservar não envolve apenas o patrimônio material, como é o caso dos bens
tangíveis; o intangível, a exemplo da preservação de um significado cultural e seus valores,
dos saberes e fazeres de um determinado grupo social também é um aspecto a ser incluído
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quando tratamos de conservação. Ao considerarmos a diversidade cultural existente nos
vários grupos sociais ao redor do mundo, podemos perceber que o conceito sobre o
significado da palavra “conservação” é variável. Consequentemente, o significado de
“autenticidade” também varia entre os diferentes contextos culturais.

Choay (RIEGL, 2006, p. 9) questiona se o ato da conservação não esteriliza a criação e a


inovação, mas logo em seguida questiona o quanto perderíamos com a não-conservação.
Para a autora, é impossível tudo conservar, principalmente no caso da arquitetura. O que
decide o que deve ou não ser conservado é o juízo de valor a respeito de uma obra. As
necessidades e tecnologias das diferentes gerações exigem adaptações dos edifícios, e o
uso é um fator essencial para garantir a preservação de um patrimônio arquitetônico.

No caso da arquitetura, trata-se de uma obra de arte utilitária e exposta aos mais variados
tipos de intempéries. Assim, torna-se praticamente impossível evitar sua degradação. Diante
desta questão, para não ferir a autenticidade do objeto, como podemos conservar a
arquitetura?

Um objeto é autêntico quando se encontra íntegro na maior parte dos seus componentes
originais (LIMA CARLOS, 2014, p. 59), porém, os conceitos referentes ao assunto vêm
passando por revisões no século XXI. Segundo Lima Carlos (2014), a autenticidade pode
ser relativizada, pois, a exemplo do que ocorre na arquitetura, ao longo do tempo o objeto
precisa passar por alterações, tanto de manutenção quanto para adaptação às novas
demandas de seus habitantes, e nem por isso o bem perde sua autenticidade. Quando a
demanda por alterações é uma necessidade coletiva real, o patrimônio continua a ser
autêntico, desde que não perca de vista seu caráter histórico e seus significados (LIMA
CARLOS, 2014, p. 59).

A primeira vez que a discussão sobre o conceito de autenticidade surgiu foi na Carta de
Veneza (ICOMOS, 1964), que associava autenticidade à originalidade. Já na Carta de Nara
(ICOMOS, 1994), a autenticidade aparece como principal fator de atribuição de valores, e
leva em consideração aspectos de forma e desenho, materiais e substância, uso e função,
tradições e técnicas, localização e espaço, espírito e sentimento, e outros fatores internos e
externos. Podemos perceber que esta Carta tratava tanto de questões materiais como
imateriais.

Na Carta de Brasília (ICOMOS, 1995), a autenticidade tem seu significado atribuído à ideia
de verdade. Este documento propõe que sejam reconhecidas e valorizadas as tradições
culturais do local onde o patrimônio está inserido, e que as técnicas mais apropriadas sejam

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estudadas, de forma a garantir a continuidade da transmissão das informações, sem que a
essência e o equilíbrio da obra sejam transformados. Também estabelece uma relação entre
a materialidade do patrimônio histórico edificado e o conceito de autêntico.

Na Declaração de San Antonio, produzida no Texas em Março de 1996, foi discutida a


questão da autenticidade nas Américas, que apresenta uma diversidade cultural muito
diferente da encontrada em outros continentes. Este documento enfatiza a importância dos
valores atribuídos pelas comunidades na definição de autenticidade, e exemplifica alguns
aspectos que podem servir como marcadores de valores para a conservação e “provas de
autenticidade”: reflexão sobre o verdadeiro valor (se o elemento reflete uma história
significativa, se restam traços da condição de sua criação), integridade (o que foi perdido e
quais elementos foram adicionados), contexto e/ou desenvolvimento, identidade, uso e
função.

A partir dessas definições e conceitos apresentados, podemos começar a tentar estabelecer


uma relação entre autenticidade e a preservação das características morfológicas de um
núcleo urbano histórico, no caso, do Corredor Cultural.

2. Arquitetura característica do Centro do Rio de Janeiro e a


Legislação

No período colonial, geralmente as técnicas construtivas empregadas apresentavam um


caráter bastante primitivo (REIS FILHO, 2006, p. 24-26). As construções mais simples eram
realizadas em materiais como adobe, pau-a-pique ou taipa de pilão; nas obras de maior
importância, utilizava-se pedra e barro. Reis Filho (2006) descreve que em casos mais
raros, eram empregados tijolos ou uma mistura de pedra e cal. Segundo Lemos (1996, p.
30-31), “a casa popular urbana dos tempos coloniais praticamente teve a mesma planta pelo
Brasil em geral”. O engenheiro francês Vauthier, que visitou o Brasil entre 1840 e 1846,
pode afirmar que quem viu uma casa brasileira da época, viu quase todas (DE PAOLI, 2013,
p. 133-134). Carlos Lemos (1996, p. 32) descreve as construções da época:

[...] as construções eram geminadas e levantadas em terrenos estreitos e


profundos. Assim, todas as moradias possuíam cômodos encarreirados. O
da frente, com janela no alinhamento da rua, quase sempre era a sala de
recepção, quando não abrigava alguma oficina de artesanato ou mesmo
uma loja. Os cômodos intermediários, acessíveis por corredor lateral, eram
os dormitórios, naquele tempo chamados de camarinhas, alcovas ou “casas
de dormir”. Nos fundos, fechava a fila a cozinha, a varanda alpendrada que

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dava acesso ao quintal, onde sempre havia um arremedo de instalação
sanitária (LEMOS, 1996, p. 32).

Os traços culturais faziam com que as disposições internas das moradias fossem bastante
semelhantes entre si. A mão-de-obra que realizava estas construções era escrava,
disponível em abundância. Até mesmo nos exemplares mais ricos, de maiores dimensões,
não era produzido um tipo distinto de habitação, apontando que a tendência era sempre
seguir esse padrão cultural. Variações só apareciam em casas situadas nas esquinas. Até
meados do século XIX, apesar de todas as inovações trazidas após a chegada da Corte e
dos novos materiais de construção, a tipologia de planta permaneceu praticamente intacta
(DE PAOLI, 2013, p. 133-135).

Figura 1: Corte esquemático demonstrativo do esquema de funcionamento das casas urbanas


coloniais. Fonte: REIS FILHO, 2006, p. 31.

O Código de Posturas de 1838 nada dizia sobre a compartimentação dos imóveis, e apesar
da disposição interna muito semelhante, não havia nenhuma legislação que a determinasse.
Neste Código constava no parágrafo 9° apenas alguns parâmetros arquitetônicos referentes
à altura dos pés-direitos e ao tamanho das aberturas das fachadas. Para toda casa com até
8,80 metros de frente que fosse edificada a partir de então, o primeiro pavimento deveria ter
4,40 metros de pé-direito, 4,18 metros no segundo pavimento, 3,96 metros no terceiro,
seguindo sempre a mesma proporção de redução a cada pavimento que fosse
acrescentado. Essas eram as medidas exatas que deveriam apresentar, pois a altura do pé-
direito era considerada até então apenas uma questão de composição das fachadas.

A partir da Postura de 1892, as alcovas começaram a passar por um processo de


eliminação, pois passaram a ser consideradas insalubres. A Partir deste documento, “a
edificação passava a ser considerada em seu todo, e não apenas como uma fachada” (DE
PAOLI, 2013, p. 119). Através desta Postura, começaram a prevalecer questões relativas à
higiene do ambiente construído, a fim de garantir a salubridade das edificações, em
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detrimento de questões puramente estéticas e formais. Esta higiene seria obtida através da
adequada iluminação e ventilação dos ambientes componentes do edifício e de seus
equipamentos sanitários. Uma solução encontrada para eliminação das alcovas naqueles
terrenos estreitos e profundos foi a previsão de áreas internas com finalidade de iluminar e
ventilar os cômodos. Também era prevista a existência de uma área descoberta nos fundos,
que deveria apresentar uma profundidade de três metros. Os pés-direitos também passaram
por alterações.

Quanto às questões de iluminação e ventilação, o Decreto n° 391, de 1903, não


apresentava mudanças significativas em relação à Postura de 1892. Determinava que o pé-
direito mínimo das construções seria de “quatro metros no primeiro pavimento, três metros e
oitenta centímetros no segundo e três metros e sessenta centímetros nos demais” (DE
PAOLI, 2013, p. 131). Em edifícios de mais de oito metros de largura, os pés-direitos eram
maiores. Esses pés-direitos eram vistos como questões de higiene, contribuindo tanto para
o arejamento dos cômodos quanto para o conforto e bem-estar dos ocupantes da
construção.

Na segunda metade do século XIX, as construções começaram a ser afastadas dos limites
laterais dos lotes, mas continuavam sobre o alinhamento da via. Geralmente esse recuo
ocorria em apenas um dos lados (REIS FILHO, 1978, apud DE PAOLI, 2013, p. 135),
permitindo que todos os cômodos da casa fossem iluminados. Outra variação da época
foram as casas de porão alto (REIS FILHO, 2006, p. 33). Essas novidades não ocorreram
na área do Centro do Rio de Janeiro onde hoje é o Corredor Cultural, pois, devido à função
comercial do térreo, exigia-se um contato direto do térreo com a rua: portanto, essas
edificações do Centro não sofreram alterações, conservando o mesmo tipo de distribuição
interna do período colonial (DE PAOLI, 2013, p. 138).

Este patrimônio cultural constituído pelos exemplares de arquitetura modesta da área em


análise são representações de tradições, técnicas, materiais, formas, desenho, espaço,
função, espírito e sentimento que constituem testemunhos de um período da história da
cidade e, até mesmo, das características do país. São resultado de interações sociais, das
ações humanas sobre o território e do processo de construção do Rio de Janeiro,
expressando a cultura local.

3. O Projeto Corredor Cultural

O Projeto Corredor Cultural do Rio de Janeiro foi iniciado em 1979, pelo governo municipal,
com o objetivo de preservar e revitalizar áreas do Centro da Cidade (MACEDO, 2004, p. 1).
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A proposta é uma referência mundial quanto à introdução de estratégias de preservação em
escala urbana: foi implantada de forma democrática, sendo discutida e aprovada na câmara
de Vereadores; contou com a participação efetiva da sociedade; foi concebida por uma
equipe multidisciplinar, envolvendo técnicos da Prefeitura Municipal e intelectuais, que
associavam as estratégias de preservação à recreação e revitalização de atividades
culturais (INSTITUTO MUNICIPAL DE ARTE E CULTURA, 2002, p. 6).

Após as intensas modificações ocorridas entre o período de Reformas Urbanas durante a


gestão de Pereira Passos, iniciado em 1904, até o fim dos anos 1970, quando ocorreram
diversas obras viárias, ainda restavam muitas edificações de interesse para a preservação
na área do Centro. Estas apresentavam características coloniais, neoclássicas e ecléticas.
Localizadas próximo à Área Central de Negócios, até o final da década de 1970, ainda não
eram protegidas por nenhum órgão de patrimônio. Nesta época, a política de
desenvolvimento urbano do Rio de Janeiro passou a adotar a ideia do desenvolvimento
aliado à preservação de antigas estruturas urbanas (MACEDO, 2004,p. 1).

Em 14 de Julho de 1983, o Decreto nº 4141, em seu Artigo 1°, aprovou o PA (Projeto de


Alinhamento) 10.290 e o PAL (Projeto Aprovado de Loteamento) 38.871, que tratam do
Plano de Preservação Paisagística e Ambiental, visando preservar e revitalizar áreas do
Centro da Cidade. Estas áreas, que apresentavam interesse histórico e arquitetônico,
receberam neste decreto a denominação de Corredor Cultural.

Figura 2: Limites do Corredor Cultural, dividido em quatro diferentes áreas. Fonte: Instituto Municipal
de Arte e Cultura, 2002, p. 9.
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No ano seguinte, a aprovação da Lei nº 506, de 17 de Janeiro de 1984, reconhece a criação
da Zona Especial do Corredor Cultural (INSTITUTO MUNICIPAL DE ARTE E CULTURA,
2002, p. 6), visando à proteção paisagística e ambiental do Centro da Cidade. A Zona foi
subdividida em três subzonas: preservação ambiental, reconstituição e renovação urbana.

A partir da Lei nº 1139 de 16 de Dezembro de 1987, a Zona Especial do Corredor Cultural


passou a ser subdividida em apenas duas subzonas, eliminando a zona de reconstituição, e
passando a ser integrada apenas pela subzona de Preservação Ambiental e subzona de
Preservação Urbana. Na subzona de Preservação Ambiental, determina-se que todas as
características artísticas e decorativas componentes do conjunto das fachadas e coberturas
dos prédios desta área devem ser mantidas, incluindo as claraboias e suas projeções. Já os
elementos que comprometem a morfologia original das edificações, como empachamento e
marquises, devem ser eliminados. Um dos maiores problemas da Lei nº 1139 é que a partir
do momento em que entrou em vigor, passaram a ser permitidas modificações internas nos
edifícios componentes da subzona de Preservação Ambiental, sob a condição de garantirem
acessibilidade às janelas e sacadas dos mesmos, conforme sugestão apresentada na figura
3. Não havia a preocupação com os impactos que essa modificação na legislação poderia
acarretar, principalmente a respeito da qualidade do ambiente construído, da autenticidade
do patrimônio, da espacialidade original das obras e das questões relativas ao conforto
ambiental. Na subzona de Preservação Urbana, permanece a exigência da integração do
projeto ao conjunto arquitetônico ao qual pertence e o respeito das alturas definidas no PAA
10.600 e PAL 41632.

Figura 3: Sugestão para obra de modificação com acréscimo de pavimento mantendo o uso das
janelas. Fonte: INSTITUTO MUNICIPAL DE ARTE E CULTURA, 2002, p. 46.

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Através do Decreto n° 13808, de 5 de Abril de 1995, é atribuída à Secretaria Municipal de
Cultura a competência para fixar as políticas de preservação e conservação, visando a
proteção do ambiente cultural da Zona do Corredor Cultural.

Em 13 de Janeiro de 2000, através da Lei nº 2997, as competências atribuídas ao Grupo


Executivo do Corredor Cultural, Conselho Consultivo do Corredor Cultural e Escritório
Técnico do Corredor Cultural passaram a ser exercidos pelo Departamento Geral de
Patrimônio Cultural, órgão pertencente à Secretaria Municipal de Cultura.

4. Questões relativas ao conforto ambiental em edificações de valor


patrimonial

As edificações são construídas para modificar o clima e criar um ambiente interno favorável
(HEYWOOD, 2015, p. 6), e a arquitetura, resultado da fusão entre arte e técnica, manipula
as variáveis do meio externo, com a finalidade de proporcionar maior conforto e
habitabilidade. Ao analisarmos a história da arquitetura, podemos perceber que as técnicas
construtivas sempre foram estruturadas em função das necessidades do ser humano,
levando em consideração as particularidades do clima de cada lugar (GONÇALVES, 2011,
p. 26).

No caso do clima tropical úmido característico do Rio de Janeiro, Corbella e Yannas (2009,
p. 39) sugerem que para se obter um bom nível de conforto é necessário, dentre outras
estratégias, remover a umidade em excesso e promover o movimento de ar. Os autores
recomendam que “é sempre desejável, para os edifícios que não terão ar condicionado, uma
grande permeabilidade do envelope para o ar e a luz” (CORBELLA; YANNAS, 2009, p. 170).

A ventilação natural também pode ser usada para outras finalidades, como manter a
qualidade do ar nos ambientes internos, remover a carga térmica adquirida e promover o
resfriamento fisiológico dos usuários (BITTENCOURT; CÂNDIDO, 2010, p. 11). O fluxo de
ventos depende das características do entorno da edificação, e em seu interior, depende da
compartimentação interna e da área das aberturas. A questão da preservação do entorno de
um núcleo histórico urbano, além do caráter estético, inclui também questões de conforto.

Para o escoamento do ar no interior de um edifício é necessário haver diferenças de


pressão entre as superfícies. Esse escoamento pode ser produzido pela pressão dinâmica
(gerada pela força exercida pelo vento), ou por diferenças de temperatura (pressão
estática). Essa diferença de temperatura, que consequentemente acarreta uma diferença de
densidade do ar entre interior e exterior da construção, produz o “efeito chaminé”, fazendo
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com que o ar aquecido, mais leve que o ar circundante, apresente tendência a subir,
provocando um ciclo contínuo de movimentação do ar (BITTENCOURT; CÂNDIDO, 2010, p.
30).

Segundo Bittencourt e Cândido (2010, p. 33)

considera-se que, em construções de altura reduzida, o termo gravitacional


é insignificante e a densidade do ar é constante, exceto quando ocorrem
grandes variações de temperatura em relação à temperatura do ar exterior
(BITTENCOURT; CÂNDIDO, 2010, p. 33)

A partir dessas considerações, percebemos, primeiramente, a importância da eliminação


das alcovas a partir da Postura de 1892, pois permitiu, além de melhores condições de
iluminação natural dos ambientes internos, melhores condições para ocorrer a ventilação.
Outra questão a ser apontada é a eficiência da determinação da altura dos pés-direitos de
cada pavimento, favorecendo a ocorrência de diferença de densidade do ar dos ambientes e
promovendo a sua movimentação.

5. Conclusões

O processo de evolução da legislação proposta para a área do Corredor Cultural do Rio de


Janeiro representa um retrocesso quando analisado sob os pontos de vista da autenticidade
do patrimônio, da legislação urbana e da qualidade do ambiente construído. No século XIX,
já haviam começado a fazer parte das leis de edificações a preocupação com a qualidade
do interior dos ambientes, na época, sob o pretexto de garantir a higiene e salubridade.

Na área de estudo escolhida para a elaboração deste artigo, os exemplares arquitetônicos


eram construídos de forma que fossem adequados ao clima do Rio de Janeiro, assim
persistindo ao longo de mais de um século, até o início do fornecimento de energia elétrica.
Essas edificações “funcionavam” bem, eram pertencentes à cultura de uma população, e
caracterizavam o modo de construir de um período histórico. A partir de então, com o passar
dos anos, as inovações tecnológicas que vieram junto com o fornecimento de eletricidade
permitiram ao ser humano controlar o clima e os níveis de iluminação no interior dos
edifícios. Preocupações relativas à materialidade de coberturas, esquadrias, envoltórias, às
dimensões dos vãos, à disposição dos cômodos e em relação aos pés-direitos dos edifícios
foram se perdendo durante o ato de projetar, principalmente quando se trata de patrimônio
histórico.

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Ao contrário do que ocorre hoje, onde são fixados os gabaritos máximos que os edifícios
devem possuir, a legislação do século XIX fixava o limite mínimo de altura das edificações
(DE PAOLI, 2013, p. 115). Encontramos na área do Corredor Cultural alguns exemplares
que, apesar de seguirem o que a legislação vigente determina, descaracterizam
completamente a essência do patrimônio. Com freqüência, mais pavimentos são
construídos, dentro de uma “casca” com valor patrimonial. As questões relativas à
iluminação e ventilação muitas vezes são desprezadas e solucionadas de maneira
“artificial”, criando uma dependência de energia elétrica para o bom funcionamento do
edifício.

Tanto na área do Corredor Cultural do Rio de Janeiro como em várias outras áreas
históricas brasileiras encontramos a alteração da disposição e da compartimentação dos
edifícios, visando apenas o maior aproveitamento das áreas construídas sem alteração das
volumetrias, não respeitando o patrimônio ao realizarem adaptações aos usos e costumes
atuais. Segundo Kühl (2008, p. 213), “muitos bens têm sido sistematicamente
descaracterizados, invocando-se razões de uso e afirmam se tratar de preservação”. As
novas utilizações devem ser compatíveis com os interesses histórico-artísticos, e as obras
de adaptação devem ser limitadas ao mínimo, porém, as formas externas devem ser
conservadas e deve-se evitar a alteração das características tipológicas, do organismo
construtivo e da sequência dos percursos internos, conforme recomenda a Carta de
Restauração Italiana (1972 apud BRANDI, 2004, p. 242). Em casos mais graves,
encontramos o patrimônio edificado de valor cultural reduzido à mera cenografia, ao
fachadismo, ignorando todo o conhecimento técnico existente nas edificações antigas e
todas as questões relativas ao conforto do ambiente construído.

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CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS NA ATUAÇÃO DOS AGENTES DO
PATRIMÔNIO

LAGE, Flavia de Assis (1); LAGE, Luciana de Assis (2)

1. Escola de Arquitetura da UFMG. MACPS


Rua Paraíba, 697 – sala 201
luciana_lage_arq@hotmail.com

2. Escola de Arquitetura da UFMG. NPGAU


Rua Paraíba, 697 – sala 301
flavia_lage_arq@hotmail.com

RESUMO

No âmbito da preservação do patrimônio cultural devemos destacar a importância de todos os atores


sociais envolvidos _ órgãos de preservação nas esferas federal, estadual e municipal, profissionais
que trabalham com a preservação, acadêmicos que se dedicam ao estudo do patrimônio, membros
do corpo profissional das prefeituras, membros dos conselhos municipais, além da sociedade civil
como um todo.
Certamente, a importância da atuação desses agentes se iguala ou sobrepõe à importância da
legislação, uma vez que eles são os instrumentos de aplicação das leis existentes, para garantir a
preservação do patrimônio cultural através da implementação de ações para planejamento e gestão
do patrimônio cultural, onde estejam integradas as ações das três esferas _municipal, estadual e
federal, e dos demais atores sociais envolvidos na temática da preservação.
O objetivo deste artigo é apresentar algumas das percepções desses agentes acerca da preservação
para, em seguida, estabelecer pontos divergentes e convergentes de modo a lançar uma luz sobre a
importância de cada um desses atores no processo de preservação e de gestão do patrimônio
cultural, no sentido de avançar nas discussões acerca das politicas de preservação, nas esferas de
planejamento e gestão.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural; Preservação; Gestão

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A temática do patrimônio cultural é relevante, não somente pelos objetos materiais ou
imateriais que o constituem, mas principalmente por se constituir “num elemento revelador,
negligenciado, mas brilhante, de uma condição da sociedade e das questões que ela
encerra”. (Choay, 2006,p.12)

A gestão da preservação do patrimônio cultural pode revelar a forma que um povo ( o poder
institucional e a comunidade) encara a relevância do seu patrimônio cultural na constituição
da identidade da cultura local. Dessas visões, surgem os embates sobre o que lembrar, o
que esquecer, como preservar, como transmitir.

Para a garantia da preservação do patrimônio cultural, mais que uma legislação avançada e
abrangente, é necessário que ele seja reconhecido como tal por este povo. Mônica Starling
sintetiza essa questão de estabelecimento de reconhecimento e estabelecimento de valor
para o patrimônio:

Cabe lembrar que, para garantir sua existência, é necessário que o


patrimônio seja reconhecido. Em outras palavras, é necessário que lhe seja
conferido valor. Esse juízo de valor é formulado no contexto das relações
sociais e simbólicas tecidas em torno do objeto em questão. A escolha de
um bem como patrimônio cultural envolve todo um sistema de valores e de
sujeitos que o legitimem como tal. Essa relatividade do processo de seleção
do bem patrimonial reflete, pois, os conflitos e os recursos de poder entre os
representantes dos diversos setores sociais: o Estado, as elites, as
comunidades, a mídia e o capital. Assim, o valor patrimonial não está
apenas no objeto, mas também na compreensão que as sociedades têm
sobre ele. (Starling, 2011, p.35)

Este estabelecimento de valor, que deriva da Economia, se dá numa dupla relação entre as
propriedades naturais do objeto e o sujeito que o utiliza. Dessa relação com o sujeito que o
utiliza fica evidente a subjetividade no estabelecimento de valor de um objeto. Transpondo
para o campo do patrimônio cultural, percebemos que a atribuição do valor de um bem
cultural é estabelecida nesse contexto da relação entre ele e a sociedade que o reconhece
como tal. Sendo assim o valor atribuído a um bem cultural é produto da interação dos
diversos atores sociais e um bem cultural pode presentar valores diversos para conjuntos de
atores diversos.

A gestão compartilhada pode contribuir para dar voz a diferentes grupos sociais no que diz
respeito a essa atribuição de valores, possibilita que as discussões “possam refletir a
variada gama de valores culturais representados pelos diferentes grupos sociais”. (Starling,
2011, p.35) E, com essa forma de gestão, o valor atribuído a um bem cultural pode
aproxima-lo dessa sociedade onde ele se encontra.

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As politicas de preservação do patrimônio se efetivam quando da sua apropriação pelos
atores envolvidos.

A preservação do patrimônio cultural no Brasil

No Brasil, a articulação da preservação do patrimônio começou por iniciativa do Estado _ a


busca da identidade nacional fez com que o Estado se envolvesse na questão da
preservação do patrimônio. Um marco do movimento de preservação do patrimônio histórico
e artístico nacional, no século XX, no Brasil, foi a valorização da cultura nacional defendida
pelos intelectuais e artistas organizados da Semana de Arte Moderna de 1922. A Semana
de Arte Moderna e a ascensão de boa parte de seus integrantes no campo politico “foram
fundamentais no processo de institucionalização de uma ação estatizada de proteção do
patrimônio histórico e artístico nacional”. (Chuva, 2009, p.92)

Fica estabelecido, pela Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1937, que a tutela do
patrimônio histórico e artístico seria de competência das três esferas do Estado – União,
Estados e Municípios.

Meio século mais tarde, a Constituição de 1988 apresentou um avanço, mantendo a


competência da tutela do patrimônio cultural nas três esferas do Estado mas com a ideia de
descentralização (fiscal, administrativa e politica). E ela foi além, com a inclusão da
comunidade (sociedade civil) como corresponsável pela proteção do patrimônio cultural
brasileiro.

Antes mesmo de 1988, no entanto, o IEPHA-MG, conforme diz Carlos Henrique Rangel1, já
havia percebido que o órgão estadual não poderia trabalhar sozinho na preservação do
patrimônio cultural do Estado e já pressentia a importância da participação efetiva dos
municípios e também da sociedade civil:

1 Historiador do IEPHA-MG
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Essa questão do município participar era sentida já nos anos 1980. (...) Em
1983 teve um programa de ação comunitária, de tentar fazer com que a
comunidade participasse da preservação e que os prefeitos começassem a
preservar seu patrimônio. Então o IEPHA montou uma cartilha sobre
patrimônio; teve um Caderno Técnico, chamado Caderno Técnico N°1, que
você vai encontrar na nossa gerencia de documentação, que foi um esboço,
isso foi em 1989, que ele foi publicado. (Lage, 2014, p.51)

A partir da descentralização fiscal, administrativa e politica, preconizada pela Constituição


de 1988, O ICMS Patrimônio Cultural2, iniciado em 1995, a partir da promulgação da Lei n°
12.040, foi extremamente útil para promover a municipalização das ações de proteção do
patrimônio cultural em Minas Gerais. No caso de Minas Gerais, essa descentralização é
considerada de extrema eficácia uma vez que, pela extensão do Estado de Minas Gerais e
pela grande quantidade de Municípios, torna-se difícil a centralização das ações de proteção
do patrimônio cultural num órgão estadual. Após mais de 20 anos de seu inicio, o ICMS
Patrimônio Cultural segue sendo realizado e aprimorado.

Monica Starling descreve o ICMS Patrimônio Cultural como uma estratégia bem sucedida de
descentralização da política de proteção do patrimônio cultural em Minas Gerais:

A implementação de ações de proteção ao patrimônio no estado de Minas


Gerais, a partir da segunda metade dos anos de 1990, foi marcada pela
adoção de uma estratégia bem sucedida de descentralização da política.
(...) a municipalização das ações de patrimônio cultural obedeceu a uma
estratégia de indução coordenada pelo governo estadual que envolveu
incentivos capazes de estimular a adesão dos municípios e a orientação
quanto à implantação de um desenho de política participativo e deliberativo.
Essa estratégia consistiu no repasse de recursos do ICMS para aqueles
municípios que aderissem à política e se adequassem à agenda de
atuações para o setor, que incluía: estruturação de um aparato institucional,
instituição de uma legislação de proteção ao patrimônio e utilização de
instrumentos de preservação, capacitação de gestores e criação de
instâncias participativas com processos deliberativos de tomadas de
decisões. (Starling, 2011, p.135)

Leonardo Castriota3 falando sobre o ICMS Patrimônio Cultural em Minas Gerais:

a gente tem que destacar que a experiência mineira é uma experiência


impar, Minas conseguiu uma coisa que grande parte dos Estados não
conseguiu, que é criar uma política de municipalização. Isso através de uma
estratégia que eu considero muito inteligente, que é uma estratégia de
estímulo, estimulo fiscal. Eles utilizaram aquela possibilidade que a
Constituição dava, que é de você fazer parte do repasse do ICMS por
critérios qualitativos, e um dos critérios foi o patrimônio. (Lage, 2014, p. 52 )

Flavio Carsalade4 falando sobre os méritos do ICMS Patrimônio Cultural na valorização do


patrimônio cultural: “cidades que nunca pensavam na questão de patrimônio cultural, agora

2 Lei N°12.040 – atual Lei N° 13.803 – que “repassa recursos para os municípios que preservam sua
memória e sua produção cultural”.
3 arquiteto, professor da Escola de Arquitetura da UFMG

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já está na agenda delas. E muitas, muitas cidades, setecentas e tantas cidades num
universo aí de 853”. (Lage, 2014, p.61), O simples fato da questão do patrimônio cultural
estar na agenda desses municípios já foi um avanço.

Carlos Henrique Rangel fala sobreo ICMS Patrimônio Cultural não como uma lei de
incentivo à cultural, mas como um programa de patrimônio e descentralização da proteção
do patrimônio cultural:

Ele não foi feito para dar dinheiro, dinheiro é o que menos interessa. O que
interessa mesmo é o município criando a sua politica de preservação.
[grifo nosso] O dinheiro é uma consequência, o ponto e o dinheiro que vem
com esse ponto é uma consequência. O mais importante é ele [o município]
implantar uma politica cultural. E a gente tem que fazer de tudo para que ele
faça isso e que faça melhor. (Lage, 2014, p 62),

Essa relação entre Estado e municípios, fomentada pelo programa ICMS Patrimônio
Cultural, “pode ter contribuído para a criação e consolidação de estruturas de planejamento
e gestão do patrimônio cultural em âmbito municipal” (Sales, 2012, p. 44-45). Nesse sentido
o movimento de mudança se processa do Estado em direção ao município. Num movimento
contrário, os municípios contribuem para o aprimoramento dos critérios através da sugestão
de mudanças a serem implementadas nos critérios, mudanças essas que são feitas através
de novas deliberações. Mais uma vez aqui podemos notar a relação de diálogo entre as
esferas do Estado, de forma a construírem juntas o planejamento da gestão do patrimônio
cultural.

Uma das preocupações com relação ao ICMS Patrimônio Cultural em Minas Gerais é a sua
continuidade, o comprometimento das diferentes gestões que se sucedem nos municípios
essa continuidade pode ser atribuída, mais à necessidade de atendimento à legislação e à
tradição dessa política no Estado, do que a uma vontade política no sentido de implementar
a proteção do patrimônio cultural. No entanto, Rangel ressalta que “no caso do ICMS
[patrimônio cultural] já virou uma tradição. Não tem jeito, não tem politico que queira acabar
com isso, não é louco. Até porque ela [a lei] está atrelada a outros critérios”. (Lage, 2014,
p.90)

Carsalade, na mesma linha, destaca que o ICMS Cultural tem sobrevivido às mudanças de
gestão:

É, na realidade eu acho até que o ICMS cultural tem sobrevivido bem a isso.
Porque os municípios, mesmo com as mudanças de prefeitos, eles acabam
entregando porque é fonte de recurso. E acaba que os conselhos são feitos

4 arquiteto, professor da Escola de Arquitetura da UFMG

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por pessoas mais ligadas a isso, eles mudam com as mudanças de
prefeituras, mas sempre mantém alguns. (...) se a administração municipal
tem um funcionário que está trabalhando com isso, normalmente ele
também se mantem. Ele pode até sofrer pressões diferentes, para conduzir
diferentemente, mas às vezes se mantém. Mas isso não tem muito jeito: a
gente tem gente que é comprometido com a ideia e gente que não é. Tem
Secretario de Cultura que fala: “ah, esse negocio de preservação é uma
bobagem”. E é secretario de cultura e entrega o dossiê. (Lage, 2014, p. 89)

Por outro lado, uma matéria no Jornal Hoje em Dia mostra o descompromisso generalizado
com a continuidade do ICMS Patrimônio Cultural pelas administrações municipais na troca
de gestão.5

A troca de gestão nas cidades mineiras após as eleições municipais de


2012 compromete a captação de recursos para o patrimônio histórico dois
anos depois. No último pleito, mais de 80% das prefeituras no Estado
passaram por mudanças de comando. Com a alteração, houve queda no
número de municípios que terão direito a repasses do Imposto sobre a
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do Patrimônio Cultural de
Minas, o ICMS Cultural.

Neste ano, estão previstas verbas para 437 municípios, 36% a menos do
que em 2013, quando 689 tiveram direito. A lista de 2014 é baseada em
documentação, postada via Correios, no fim de 2012. (Fonseca, 2014)

A interação entre os atores sociais

Michelle Arroyo6 destaca a importância da sociedade civil na preservação do patrimônio


cultural, falando sobre gestão do patrimônio cultural: ”a gestão do patrimônio cultural tem
esse caráter educativo que é um pouco de escutar a cidade, os agentes envolvidos, pensar
nas diretrizes de proteção, dar retorno em relação a essas diretrizes e ter esse dialogo
aberto, essa escuta aberta da cidade” (Lage, 2014, p 36).

Arroyo também fala sobre a atuação da Diretoria de Patrimônio Cultural, do município de


Belo Horizonte como um “espaço de legitimação dessa politica, no sentido de fazer ela
funcionar e fazer a interrelação entre todos os agentes interessados e envolvidos de alguma
forma com o Conselho do Patrimônio. (...)”(Lage, 2014,p 36)

Debora Queiroz7 destaca que, em nível municipal, o ICMS Patrimônio Cultural, é uma forma
de avanço no diálogo entre os diversos atores envolvidos com a preservação do patrimônio
cultural:

5 FONSECA, Renato. "Boicote" faz municípios mineiros perderem ICMS Cultural. Hoje em Dia. Belo
Horizonte. 31/01/2014. Disponível em:< http://www.hojeemdia.com.br/minas/boicote-faz-municipios-
mineiros-perderem-icms-cultural-1.213885> Acesso em: 02/02/2014.
6 Historiadora – diretora do IPHAN-MG
7 arquiteta, supervisora da equipe técnica que desenvolve o ICMS Patrimonio Cultural em Ouro Preto.

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O que eu sei te dizer é que, ao longo dos anos, houve um grande avanço,
tanto para a sociedade quanto para a equipe técnica, que aprendeu a
pensar, aprendeu a ouvir os atores. Quando você tomba você vai nas
comunidades, você cria as politicas pensando nessas comunidades – faz
audiências, convida para a reunião de conselho. (...) Eu acho o instrumento
do ICMS maravilhoso. Eu acho que a gente ainda não soube usar, e eu
acho que precisa estar em constante evolução pelo IEPHA. Mas você tem
que estar preparado para assumir as consequências dessa politica. (Lage,
2014, p. 60)

Os reflexos do protagonismo do Estado na iniciativa do movimento de preservação do


patrimônio cultural no Brasil podem ser sentidos até os dias atuais, quando observamos o
pouco engajamento da sociedade civil nas questões relativas à proteção do patrimônio
cultural. Apesar dos primeiros movimentos no sentido da preservação do patrimônio cultural
terem acontecido nos anos de 1920, somente no final dos anos de 1988 a sociedade civil foi
reconhecida como parte integrante da preservação e se colocar como protagonista nesse
processo.

Aos poucos esses outros atores sociais mostram seu protagonismo na preservação do
patrimônio cultural, pois o Estado sozinho não dá conta das disputas desses diferentes
atores que interagem nesse campo (sentido atribuído por Bourdieu). Nesse sentido,
podemos concluir que entender a ação de cada um dos atores no processo de preservação
e de gestão do patrimônio cultural, perceber a interação entre eles, é o caminho para
avançar nas discussões acerca das politicas de preservação, nas esferas de planejamento e
gestão.

A importância da atuação desses agentes se iguala ou sobrepõe à importância da


legislação, uma vez que eles são os instrumentos de aplicação das leis existentes. A
garantia da preservação do patrimônio cultural através da implementação de ações de
planejamento e gestão do patrimônio cultural, devem integrar as ações das três esferas
_municipal, estadual e federal, e dos demais atores sociais envolvidos na temática da
preservação. Arroyo cita o exemplo da Pampulha, em Belo Horizonte:

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se a gente fala em Belo Horizonte, a Pampulha tem tombamento federal,
estadual e municipal. Agora a forma de fazer a gestão desses espaços, os
interesses em relação a esses espaços, o mérito da proteção, ele é
diferente em cada uma dessas instancias. Tem momentos em que se
convergem, tem, então nós temos que identificar quais esses momentos. E
saber delegar, de certa forma, também, pra os outros o que cabe aos
outros. (Lage, 2014, p.37)

No entanto, o diálogo entre essas três esferas (Federal, Estadual e Municipal) nem sempre
é claro e simples, como no caso de bens que são tombados em mais de uma esfera, como
destaca Catherine Salgarello8:

às vezes tem [conflito], tem a falta de comunicação. Aí a comunicação


aumenta a escala e com certeza dificulta. Em termos de conflito, bom... os
tombamentos federais... acaba que os tombamentos hoje, os municipais
eles são mais detalhados. (...) Então, você tem um tombamento federal que,
na pratica, (...), porque ele não estabelece nenhuma diretriz, nenhum
impedimento. Então, você pega os tombamentos federais e tem uma folha,
falando lá que tombou, o que é, mas e ai? Pode fazer o que? Significa o
que? (...)(Lage, 2014,p. 36):

Dessa complexidade das ações para a preservação do patrimônio cultural decorre que
preservação do patrimônio cultural, planejamento e gestão têm que andar juntos. Cabe aqui
destacar que, erroneamente estes termos, às vezes são usados como intercambiáveis,
embora sejam distintos e complementares. “Planejamento e gestão não são termos
intercambiáveis, por possuírem referencias temporais distintos e, por tabela, por se referirem
a diferentes tipos de atividades.” (Souza, 2013, p.46) Na preservação do patrimônio cultural
o planejamento se baseia na legislação acerca da preservação do patrimônio cultural e na
previsão de condições de um cenário futuro. A gestão, por se tratar de uma soma da
efetivação do planejamento e nos fatores imprevisíveis, e se concretiza na ação dos atores
sociais responsáveis frente às condições apresentadas no momento presente com base nas
condições apresentadas e na legislação acerca do assunto.

Falando-se em planejamento e gestão do patrimônio cultural no âmbito nacional, a primeira


questão que vem à mente é a dificuldade em se planejar e gerir, justamente pela dimensão
continental do Brasil. Mas existe ainda a questão dos valores envolvidos na preservação do
patrimônio cultural – valores esses que são bem diferentes nas diversas regiões do país
(diversidade cultural) e possibilidade de relação entre os diversos atores sociais envolvidos.
Uma forma de encarar essas dificuldades é a efetivação do planejamento e gestão
compartilhados entre as diferentes instâncias estatais, atuando em conjunto, cada uma nas
suas especificidades.

8 arquiteta, consultora para elaboração de ICMS Patrimônio Cultural em diversas prefeituras


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Michele Arroyo destaca que o principal desafio do Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional _ IPHAN _ é construir uma gestão compartilhada do patrimônio,
justamente porque “a lógica de gestão de um órgão federal, seja pela questão territorial,
espacial mesmo, seja pela questão de valores, a possibilidade de relação com todos esses
agentes, ela é diferente” (Lage, 2014,p.97). Numa situação ideal de gestão compartilhada da
preservação do patrimônio cultural, uma das atribuições que caberia ao IPHAN como órgão
gestor do patrimônio cultural seria a de estabelecer diretrizes para a preservação do
patrimônio cultural, sendo que caberia aos Estados e Municípios estabelecerem suas
políticas de preservação do patrimônio, a partir dessas diretrizes, mas observando as
especificidades da sua realidade. Segundo Arroyo, um dos papeis do IPHAN seria o de
“ajudar as prefeituras a se organizarem nesse sentido, a compor equipes que façam o
acompanhamento do patrimônio cultural, a pensar em projetos públicos que promovam a
articulação, por exemplo a questão de planos diretores, de lei de uso e ocupação do solo”
(Lage, 2014.p. 97).

Leonardo Castriota destaca a ação do Instituto Estadual de Patrimônio Histórico e Artístico _


IEPHA _ nesse mesmo sentido: o IEPHA “desempenha aquele papel que eu acho que deve
ser da instância do Estado, que é muito mais de normatizar uma ação do que de agir
diretamente”. (Lage, 2014, p.98)

A arquiteta Débora da Costa Queiroz fala sobre a forma como o IEPHA-MG conduz a
política do ICMS Patrimônio Cultural: “no meu entendimento a política do IEPHA ela te
empurra para pensar. Ela te obriga a se estruturar, ela te obriga a ter um Conselho [de
Patrimônio] ativo, te obriga a ter uma equipe estruturada, te obriga a uma série de coisas
que vão necessariamente influenciar na reflexão sobre o patrimônio”. (Lage, 2014, p.59)

Conforme podemos perceber, quando pensamos na preservação do patrimônio cultural,


necessariamente devemos pensar em gestão9, justamente pela especificidade do tema, que
tem atores diversos e consequentemente demandas e interesses diversos. Como um
exemplo da necessidade da gestão, mais que da existência e aplicação da legislação, temos
o tombamento, como instrumento de proteção _ o simples fato de aplicar a legislação, ou
seja, tombar o bem, pode não garantir sua preservação do bem. Rangel destaca a
importância da gestão para a preservação do patrimônio cultural: “Gestão pra mim não é
tombar (...) proteger é você ter um plano de ação para aquele bem” (Lage, 2014, p.105). Ele
destaca ainda que “A questão da gestão sempre foi ainda um problema no IEPHA, também,
que é você ter um planejamento para cuidar dos bens” (Lage, 2014, p.106)

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Arroyo, falando sobre a politica de preservação do patrimônio cultural do estado de Minas
Gerais, critica a pouca autonomia dada aos municípios pelo IEPHA na gestão do patrimônio
cultural quando cita que “o Estado tem a politica do ICMS, que ela é interessante por um
lado, mas por outro lado ela é muito restritiva em relação à autonomia dos municípios, em
fazer uma gestão municipal do patrimônio. (...) acaba incorrendo num equivoco que
empobrece o patrimônio cultural”. (Lage, 2014, p.107)

Sobre gestão do patrimônio cultural, Arroyo enfatiza que a gestão passa mais por definir
diretrizes, analisando caso a caso, do que propriamente a aplicação de leis de forma rígida,
destacando a importância da definição de diretrizes como forma de garantir a preservação
do patrimônio cultural ao invés de uma lei que estabeleça como a proteção do patrimônio
cultural deve ser feita: “Quando elas são diretrizes, ou seja, a atribuição de gestão e
monitoramento é do executivo, lógico que através de conselhos, de discussão com a
comunidade, etc, você tem uma flexibilidade que ela é importante no patrimônio cultural”
(Lage, 2014, p.100).

Essa flexibilidade a qual Arroyo se refere se explica pela diferença entre a temporalidade na
sociedade contemporânea, (caracterizada pelo imediatismo, pela velocidade) e a
temporalidade do patrimônio cultural (que demanda um tempo para o diálogo para a
conciliação de interesses diversos). A consideração dessa diferença de temporalidade é
essencial justamente pelo fato de o patrimônio cultural e a sociedade contemporânea se
desenrolarem no espaço comum no presente, e essa diferença de temporalidade pode gerar
conflitos com relação à gestão do patrimônio cultural pela sociedade contemporânea. Arroyo
exemplifica falando sobre o tempo de discussão para construção de definições para gestão
do patrimônio, dentro dos órgãos, para então coloca-las em pratica: "o tempo do patrimônio
ele é um tempo muito lento. Porque ele demanda muito diálogo entre técnicos, e ai quando
você consolida tudo com os técnicos você tem que mudar tudo depois, na hora que você vai
colocar isso para fora das instituições. (...). Eles não são lineares. Tem umas idas e vindas,
é uma construção. Eu acho que demora”. (Lage, 2014,p.99)

A gestão do patrimônio é resultado de uma composição de interesses, onde existirão


perdas, por ser impossível atender de forma integral às demandas dos diversos agentes
envolvidos, mas sempre com o objetivo de promover a preservação do patrimônio cultural
da melhor forma possível, tomando por base as condições existentes no momento histórico.
Nas palavras de Arroyo: “Não tem como a gente falar que uma gestão do patrimônio cultural

9O termo gestão remete a organizar as ações de grupo de atores sociais, cada um com suas
especificidades, atuando de forma sinergética em torno de um objetivo em comum.
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ela não parta de composições, de acordos, porque é. Você ganha em algumas coisas, perde
em outras. E isso é um processo de amadurecimento”. (Lage, 2014,p.103)

Sempre haverão conflitos de interesses quando esta envolvida a questão da preservação do


patrimônio cultural. Flavio Carsalade cita o exemplo do conflito de interesses de atores
sociais quando fala sobre imóveis tombados, levando encontra a função social da
propriedade e o direito privado: “todo mundo adora patrimônio cultural, adora o tombamento,
desde que o bem tombado não seja o dele próprio”. (Lage, 2014,p.104)

Cabe aqui destacar a importância da apropriação das politicas de preservação do patrimônio


cultural pelos atores da administração pública e também pela sociedade, justamente para
garantir a continuidade dessas politicas num cenário onde mudam-se os prefeitos, os
governadores, enfim, os interesses institucionais com relação à importância do patrimônio
cultural. Com relação à participação da sociedade civil neste processo cabe destacar a
importância dos Conselhos Municipais de Patrimônio, mais ou menos atuantes, mais ou
menos independentes.

Olga Tukoff10, falando sobre o Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Mariana _


COMPAT destaca que “o atual Conselho é extremamente atuante, não se limitando ao
acompanhamento das ações encetadas pelos poderes públicos, mas desenvolvendo
também as suas próprias iniciativas no aspecto patrimonial”. (Lage, 2014.p. 143) Tukoff
destaca a necessidade de reconhecimento, por parte da sociedade civil, do conselho como
um espaço de representatividade e participação: “o Conselho é, antes de tudo, uma ponte
entre os órgãos públicos e a população”. (Lage, 2014, p.147)

José Mauricio de Carvalho11 descreve a atuação do Conselho Municipal de Proteção do


Patrimônio Cultural de São João Del Rei _ CMPPC: “Posso dizer que o Conselho é bastante
atuante, cobra da Prefeitura, leva casos pendentes à justiça, aprova rapidamente os projetos
para ele encaminhados, denuncia as construções irregulares, apoia ações de cultura. Talvez
fosse necessário fazer mais, mas há condições que complicam. Seus membros fazem
trabalho voluntário e sua atuação não é frequentemente prestigiada pela Prefeitura.” (Lage,
2014, p.145). Podemos notar, no entanto, que o conselho parece atuar de forma menos
proativa e independente que o de Mariana: “O CMPPC atua no nível municipal como órgão
de assessoramento da Prefeitura” (Lage, 2014, p.144).

10 presidente do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Mariana


11 presidente do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de São João Del Rei

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Para o avanço da discussão e implementação das politicas de preservação do patrimônio
cultural cada vez mais podemos notar a importância da participação de todos os atores
sociais envolvidos no processo, desde os institucionais até a sociedade civil. E mais,
podemos perceber que somente uma legislação avançada e abrangente nesse campo não
garante a efetiva preservação, a apropriação do patrimônio cultural e das politicas de gestão
por parte do conjunto da sociedade é de vital importância para o sucesso da gestão do
patrimônio cultural.

Referencias Bibliográficas

CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade: UNESP, 2006.

CHUVA, Marcia Regina Romeiro. Os arquitetos da memória: sociogênese das práticas de


preservação do patrimônio cultural no Brasil (anos 1930-1940). Rio de Janeiro: UFRJ, 2009.

FONSECA, Renato. "Boicote" faz municípios mineiros perderem ICMS Cultural. Hoje em
Dia. Belo Horizonte. 31/01/2014. Disponível em:<
http://www.hojeemdia.com.br/minas/boicote-faz-municipios-mineiros-perderem-icms-cultural-
1.213885> Acesso em: 02/02/2014.

LAGE, Flávia de Assis. A Gestão do patrimônio cultural em Minas Gerais. 2014. 273f.
Dissertação. Universidade Federal de Minas Gerais.

SALES, Álvaro Américo Moreira. A (possível) interface entre patrimônio cultural e turismo
nas políticas públicas de Minas Gerais. 2012. Disponível em:
http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/handle/1843/BUOS-8T8LSA. Acesso em:
15/08/2012.

SOUZA, Marcelo Lopes de. Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à
gestão urbana. 9ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013.

STARLING, Mônica Barros de Lima. Política de Patrimônio Cultural - É possível


democratizá-la? O papel dos conselhos municipais de patrimônio cultural de Minas Gerais.
2011. 280f. Tese (Doutorado em Ciência Política). Universidade Federal de Minas Gerais.
FAFICH, 2011.

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CRIAÇÃO DO LABORATÓRIO DE CONSERVAÇÃO DE
DOCUMENTOS DA UFRRJ (LABDOC/UFRRJ)):
Memória, Conservação e Produção de Conhecimentos

SILVA, PRISCILA M.(1); CLAUDIO, ANTONIO S. L. C.(2); SOUZA, THALLES Y. A.


(3)

1. UFRRJ. Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Instituto Multidisciplinar


UFRRJ BR-465, Km 7 Seropédica-Rio de Janeiro - Centro de Memória CEP. 23.897-000
priscilamarcondesba@gmail.com

2. UFRRJ. Departamento de Arquitetura e Urbanismo Instituto de Tecnologia


UFRRJ BR-465, Km 7 Seropédica-Rio de Janeiro - Centro de Memória CEP. 23.897-000
claudio.limacarlos@gmail.com

3. UFRRJ. Departamento de Artes Instituto de Ciências Sociais e Humanas


UFRRJ BR-465, Km 7 Seropédica-Rio de Janeiro - Centro de Memória CEP. 23.897-000
tyvson@hotmail.com

RESUMO
Pretende-se apresentar os resultados, até agora obtidos, pelo projeto de conservação preventiva e
digitalização do acervo documental referente ao processo de projetação e construção do conjunto
arquitetônico e paisagístico do Campus Seropédica da UFRRJ, que se deu no período 1938-1948. O
acervo trabalhado possui grande relevância para a memória da arquitetura neocolonial e do paisagismo
brasileiros, cujo valor foi reconhecido pelo tombamento estadual, que se deu de forma provisória, em
1998, e definitiva, em 2001. No período 2013-2015, a iniciativa teve apoio financeiro da Fundação de
Apoio à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e teve como resultados a catalogação e a
digitalização de cerca de 170 plantas arquitetônicas, o equivalente a aproximadamente, 10 % do
acervo. No momento, a iniciativa originou o Laboratório de Conservação de papel, denominado LabDoc
e vinculado à estrutura administrativa da Reitoria da UFRRJ.
Palavras-chave: Patrimônio Arquitetônico; Conservação preventiva; Digitalização
Introdução
O presente artigo relata os resultados obtidos até o momento, do projeto que visa à
identificação, conservação preventiva, pesquisa e a digitalização do acervo de plantas
arquitetônicas referente ao processo de projetação e construção do conjunto arquitetônico e
paisagístico do campus Seropédica da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
(UFRRJ). Trata-se de iniciativa pioneira na Instituição de Ensino Superior (IES), no campo da
preservação do seu patrimônio cultural, que contou com apoio financeiro da Fundação de
Amparo a Pesquisa do Rio de Janeiro – FAPERJ e envolve professores e alunos dos cursos
de Arquitetura e Urbanismo e Belas Artes.

Este acervo é de grande importância para a memória da arquitetura e do paisagismo


brasileiros, especialmente no que diz respeito ao movimento artístico denominado
Neocolonial, cujas características marcaram as fachadas e interiores das edificações do
citado campus, protegido pelo tombamento estadual provisoriamente, em 1998, e,
definitivamente, em 2001.

No entanto, apesar da sua indiscutível importância artística e documental, o acervo


encontrava-se em sua totalidade em estado de extremo abandono, evidenciado pelas
condições bastante precárias de guarda, falta de conservação e organização do corpus de
plantas que o compõe. Elas se encontravam (parte ainda se encontra) acondicionadas
precariamente numa mapoteca vertical de madeira em precário estado de conservação,
expostas à umidade e à incidência de luz solar. O quadro constatado poderia comprometer
gravemente, em curto prazo, a transmissão do acervo para as gerações futuras, caso as
medidas urgentes empreendidas pelo projeto, ora apresentado, não fossem desenvolvidas e
implementadas.

A conservação preventiva e acondicionamento apropriado, inicialmente, de um conjunto de


cerca de 200 plantas e desenhos, no entanto, não esgotou o acervo existente correspondendo
cerca de 10% do mesmo, que se encontra parte ainda na citada mapoteca de madeira e parte
disperso em diversas outras mapotecas horizontais situadas nas dependências do prédio da
Prefeitura Universitária.

Mediante o exposto, o presente artigo descreve as diversas etapas cumpridas pela iniciativa
de conservação do acervo da IES (Instituição de Ensino Superior), até o momento, que se
iniciou pela descoberta do acervo. Em seguida são citadas as pesquisas subseqüentes, bem
como as dificuldades encontradas até a criação e estruturação do laboratório de conservação.
A última etapa é dedicada ao processo de criação do Laboratório de Conservação de Papel
(LabDoc) vinculado administrativamente ao Centro de Memória da UFFRJ, seu funcionamento
e perspectivas para o futuro.
1º Simpósio Cientifico ICOMOS Brasil
Belo Horizonte, de 10 a 13 de maio de 2017
1. Sobre o Acervo
Os levantamentos nos arquivos da Prefeitura Universitária (PU) do Campus da UFRRJ foram
realizados primeiramente, em 2007, pelo Professor Doutor Cláudio Lima Carlos, no âmbito
das extintas disciplinas de Técnicas Retrospectivas I e II, do Curso de Arquitetura e Urbanismo
da UFRRJ. Os projetos originais do Pavilhão Central, dos prédios dos Institutos de Química e
de Biologia embasaram a confecção de bases digitais utilizadas no mapeamento de danos
das respectivas fachadas.

Esse acervo documental comporta uma surpreendente riqueza e quantidade de exemplares.


São cerca de aproximadamente 500 pranchas com projetos arquitetônicos, detalhes
construtivos e de mobiliário, que revelam, como citado anteriormente, parte de um universo
até então pouco investigado. A sua pesquisa e análise contribui para a reconstrução de
elementos da memória da instituição, resgatando a atuação de arquitetos e firmas pouco ou
não citadas em estudos anteriores, e apontando inclusive para as alterações efetuadas na
execução dos projetos originais e também soluções arquitetônicas projetadas e não
executadas.

Posteriormente, no período 2009-2011, as análises do acervo foram aprofundadas no projeto


de iniciação científica (PIBIC) intitulado “Descobrindo o Campus da UFRRJ através do seu
Patrimônio Documental”, quando foi possível verificar a presença, não apenas, de projetos
arquitetônicos, mas também de detalhes construtivos, de mobiliário, dentre outros, referentes
a um universo pouco investigado que inclui edificações desaparecidas, soluções
arquitetônicas não executadas, bem como a atuação de arquitetos e firmas de destaque
nacional pouco ou não citadas por autores identificados com a historiografia da construção do
campus.

Em 2013, a pesquisa sobre o referido acervo recebeu o apoio financeiro da FAPERJ que
aprovou um projeto para a sua conservação preventiva e digitalização encaminhado por
professores dos cursos de Arquitetura e Urbanismo e Belas Artes que propôs ações que
visaram:

a. promover a identificação e a pesquisa do acervo por parte de professores e alunos bolsistas


da UFRRJ;

b. promover a conservação preventiva do acervo;

c. disponibilizar o acervo para pesquisa (reserva técnica) e, ulteriormente, para visitação


(exposição);
d. equipar o laboratório de restauração do Centro de Memória da UFRRJ de forma a garantir
a continuidade das práticas iniciadas pelo projeto, pelo prazo de 24 meses proposto para o
seu desenvolvimento;

e. estimular a pesquisa e a produção científica de alunos bolsistas e professores envolvidos


na iniciativa.

Além desses objetivos, ao longo do desenvolvimento do projeto surgiu a idéia de inserir todas
as plantas já catalogadas como bens culturais móveis, no âmbito do tombamento estadual do
campus, já existente (1998-2001). A medida caso aprovada pelos órgãos estaduais de
patrimônio cultural, forçaria os administradores da IES a ter atenção especial ao acervo
documental, sob risco de penalizações legais.

Cabe destacar que com relação ao item “c”, o acervo de plantas identificadas e conservadas
preventivamente, como as de autoria de Eugênio de Proença Sigaud (E.P.Sigaud), que já
estão sendo utilizadas como fontes de pesquisa para teses e dissertações de cursos de pós-
graduação da UFRRJ.

O estudo desse acervo permitiu precisar, por exemplo, dados a respeito da autoria do projeto
do campus da UFRRJ que apresentavam divergências de informações nas fontes
bibliográficas especificamente relacionadas à sua construção, como as de autoria de Lima
(2003) e Rumbelapager (2005). Por outro lado, a pesquisa revelou, simultaneamente, o
precário estado de conservação do acervo documental da UFRRJ, explicado pelas condições
extremamente inadequadas de guarda a qual está submetida há anos, na Prefeitura
Universitária e no Centro de Memória da instituição.

2. A busca por espaço para o desenvolvimento da pesquisa e a


criação do LabDoc
Com relação ao espaço para as atividades de conservação das plantas históricas, o grupo
envolvido no projeto encontro diversas dificuldades administrativas, ao longo dos quatro
últimos anos, até que em 2016, obteve-se a permissão administrativa de ocupação da sala da
antiga mapoteca de madeira que ainda abriga plantas originais do campus Seropédica pelo
LabDoc.

Em março de 2014, foi solicitada, à Administração Superior do Campus à cessão de uma das
salas do prédio da PU/UFRRJ, o que foi legitimado por meio de memorando. A citada sala
guardava uma mapoteca metálica de grande porte, sem uso e em excelente estado de
conservação que foi utilizada para a guarda provisória das plantas higienizadas e conservadas
preventivamente. Assim sendo, em função das dificuldades enfrentadas, as atividades do
projeto passaram a se desenvolver nos dois espaços citados: o do Centro de Memória (CM),
1º Simpósio Cientifico ICOMOS Brasil
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localizado no Pavilhão Central (P1) e da PU/UFRRJ, o que demandou muito esforço e
criatividade da equipe executora.

Ao longo do ano de 2015, a Pró-Reitora de Assuntos Administrativos a convite do Professor


Cláudio, visitou o CM e tomou conhecimento do projeto em curso. Na ocasião, foi solicitada a
criação de dois cargos efetivos de Técnico em Restauração, nos quadros funcionais da
UFRRJ, com vistas à atuação a frente da organização e gerência do laboratório de
restauração em processo de criação. No mesmo ano, obras de reforma das instalações
elétricas e cobertura foram realizadas no prédio da Prefeitura Universitária (PU/UFRRJ),
livrando a sala onde se localiza a mapoteca de madeira original, de goteiras e umidade.

Em 2016, a reestruturação da PU/UFRRJ deixou ociosa a sala da mapoteca de madeira


localizada no segundo andar do prédio, que foi ocupada pelos equipamentos do laboratório
de conservação que estavam sem uso na sala do Centro de Memória (CM), localizado no
Pavilhão Central (Figura 1). De posse do espaço, com um técnico especialista contratado e
equipamentos, os professores iniciaram junto à Administração Superior tratativas para criação
administrativa, na estrutura do Centro de memória, do Laboratório de Conservação de Papel
(LabDoc).

Figura 1. Mapa da UFRRJ.


Fonte: https://www.google.com.br/maps/@-22.7730469,-43.6840432
acesso em 01/06/2017

Desta forma, a UFRRJ abrigará o primeiro laboratório dessa natureza na região metropolitana
do Rio de Janeiro, que oferecerá cursos de extensão na área de conservação de papel,
franqueará seu acervo a pesquisadores, tendo como primeira iniciativa, o cadastro efetivo no
Sisgam - sistema online do acervo de museus do Rio de Janeiro; Rede de Museus.

3. Sobre Memória
Para Le Goff (2003), o conceito de memória é referência crucial e possui a “propriedade de
conservar certas informações” (p. 419), que nos remetem “em primeiro lugar a um conjunto
de funções psíquicas, graças às quais o homem pode atualizar impressões ou informações
passadas, ou que ele representa como passadas” (p. 419). Halbwachs (2004) não considera
a memória apenas como um atributo da condição humana, tampouco como algo que é
construído a partir do seu vínculo com o passado, mas sim como resultado de “representações
coletivas construídas no presente” que têm como função manter a sociedade coerente e
unida. Para Halbwachs (2004) a memória tem apenas um adjetivo: coletiva (SANTOS, 2003,
p.21). Le Goff (2003, p.525) afirma que a memória coletiva possui a sua forma científica, a
história, que se aplica em dois tipos de materiais: os documentos e os monumentos.

O termo latino documentun deriva de docere, “ensinar” e assume o significado de “papel


justificativo” – domínio policial – e também, a partir da virada do século XIX para o XX, para a
corrente positivista, de “fundamento do fato histórico”, “prova histórica”. (Le Goff, 2003, p.
526). Ocorre que, em 1929, segundo Le Goff (2003, p. 530), os fundadores da revista Annales
d´Histoire Économique et Sociale e pioneiros de uma história nova, ampliaram a noção e o
sentido de documento que passou a abranger aqueles escritos, ilustrados, transmitidos pelo
som, imagens, desenhos ou qualquer outra maneira. Estes vinculam a sua existência a da
própria história, ou seja, “não há história sem documentos”. (LE GOFF, 2003, p.531)

Assim, a memória é o conjunto de informações passadas, mesmo que o indivíduo não tenha
estado presente, ele pertence a ela pela sua coletividade, que tende, por fim, a privilegiar
determinados dados, em lugar a outros. Segundo Pomian (2000, p. 509):

“(...) Na prática, esta arte da memória é uma arte da linguagem: ensina a


conservar as narrativas e permite, pois, a um indivíduo torna-se o depositário
das recordações daqueles a quem nunca conheceu. (...) a memória colectiva
era constituída por uma sucessão de memórias individuais, cada uma delas
recebendo as recordações das outras e conservando-as como suas.”
(POMIAN, 2000, p. 509).

Em se tratando de patrimônio como categoria de pensamento, Gonçalves (2003) estabelece


um caráter “extremamente importante para a vida social e mental de qualquer coletividade
humana” (p.26). Uma vez que o acumulo de bens documentais constitui a formação deste
patrimônio. Mas não podemos associar tão somente a materialidade do objeto em si, a
informação contida é de suma importância para a preservação da história e da memória,
tornando assim, um “patrimônio cultural”. (GONÇALVES, 2007, p. 239)

Quando se trata de arquitetura, a documentação histórica é uma relevante fonte de


conhecimentos e informações que permitem, dentre outros, a reconstituição precisa das
intenções e sentimentos dos respectivos idealizadores (empreendedores e arquitetos).
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Segundo o Dicionário Hoauiss (2001), projetar possui diversos significados, desde atirar,
arremessar à distância, até fazer um projeto, planejar. O termo relaciona-se com algo que
lançamos ou vislumbramos a frente. No caso do projeto arquitetônico, há uma nítida revelação
de uma intenção futura, ou seja, permite a visualização prévia e em escala reduzida, do
edifício que se pretende construir.

A análise dos projetos originais de uma edificação nos fornece uma concreta possibilidade de
perceber o que se pretendeu no passado e, por comparação, identificar o que realmente foi
realizado, executado e de que forma foi apropriado no presente. A identificação, a
catalogação, a análise e a divulgação de documentação escrita e iconográfica relacionada à
arquitetura tornam-se ações fundamentais para uma melhor compreensão de sua importância
e trajetória. Trata-se da conservação de um dos pontos que compõem o extenso mosaico de
referências materiais que contribuem para a construção e a manutenção da memória coletiva
de grupos humanos, tendo em vista que as arquiteturas, especialmente as de uso público,
são o ócus de convivência e vivências coletivas. Além da própria edificação, este mosaico é
composto por relatos, lembranças e, sobretudo, pela documentação escrita e iconográfica,
tais como, desenhos, projetos, imagens, textos etc. Santos (2003, p.19) confirma esse
pensamento quando afirma que os objetos e os documentos são capazes de reproduzir parte
do que foi vivenciado no passado.

No caso específico das entidades públicas, os arquivos assumem grande importância no


processo de perpetuação das respectivas memórias, representando verdadeiros repositórios
que testemunham fatos vividos no passado. Os conjuntos de documentos neles guardados,
independente de suporte, inequivocamente, são fruto de acumulação proveniente de
atividades dessas entidades ocorridas em diversas épocas e sob diferentes contextos
culturais e políticos. Após terem cumprido a sua função original (instrumentos de trabalho),
transformam-se em evidências do passado, guardando a memória de fatos ou intenções
concretizadas ou não (Cf. Angelo, 2009, p.92).

Em nível mundial, a importância da memória documental foi primeiramente destacada em


1931, na “Carta de Atenas”. O documento materializou consenso de ideias e conceitos entre
nações participantes da Sociedade das Nações sobre a conservação do patrimônio cultural.
Seu texto enfatizou no subitem “c”, do item VII (A Conservação dos Monumentos e a
Colaboração Internacional) a utilidade de uma “documentação internacional” sobre
monumentos. Dentre outros pontos, recomendou a importância da publicação de documentos
relacionados aos monumentos, bem como a iniciativa de cada Estado membro de constituir
arquivos “onde serão reunidos todos os documentos relativos a seus monumentos históricos”
(CURY, 2004, p.16).
A preocupação com a guarda e a publicação de documentos acerca de bens culturais foi
reafirmada, em 1956, no documento conclusivo da 9ª Sessão da Conferência Geral da
Unesco, ocorrida em Nova Delhi acerca do patrimônio arqueológico. Em 1964, a “Carta de
Veneza” (Carta Internacional sobre conservação e restauração de monumentos e sítios),
redigida após o II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos
Históricos, recomendou que toda a documentação gerada a partir de intervenções de
conservação em bens culturais deveria ser publicada e/ou disponibilizada em arquivos de
órgãos públicos, de forma a ser acessível aos pesquisadores atuantes na área. No Brasil, a
Constituição Federal, estabeleceu, em 1988, a obrigatoriedade de órgãos públicos, no tocante
ao patrimônio cultural e na forma da lei, na viabilização de meios de gestão da documentação
governamental, bem como as providências cabíveis para franquear sua consulta a quantos
dela necessitem.

A importância da salvaguarda de documentação primária, especialmente aquela relacionada


à arquitetura, também é comprovada por meio da existência, em diversas cidades brasileiras,
de edificações projetadas e construídas especialmente para esse fim. Pode-se citar como
exemplo, na cidade do Rio de Janeiro, dentre outras, o caso do Arquivo Geral da Cidade
(AGCRJ) que guarda conjunto documental de cerca de 50.000 processos de licença de obras,
que contam parte da evolução urbana da cidade, desde 1792. Segundo Beck (2002, p.33), o
citado acervo do AGCRJ “possui grande valor informativo, seja para fins de pesquisa
acadêmica, seja para teses de graduação e pós-graduação (Engenharia, Arquitetura, História,
Jornalismo etc.)”.

No caso do acervo de plantas relacionadas à memória projetual do campus Seropédica da


UFRRJ, observa-se uma infinidade de intenções não concretizadas – não executadas – ou
diversificadas. Estas informações permitem constatar os ambiciosos objetivos do Estado Novo
de Vargas no intuito de criar um centro acadêmico de excelência nas ciências agrárias, capaz
de proporcionar autonomia aos produtores brasileiros do setor. O apuro dos detalhes
arquitetônicos e do mobiliário especialmente projetado para os interiores transmite requinte e
apuro formal ao conjunto. Por outro lado, também nos permite comparar criticamente soluções
projetadas com as executadas, bem como as apropriações contemporâneas dos espaços
projetados no passado.

4. Desenvolvimento e método das práticas laboratoriais


A teoria da conservação do patrimônio cultural indica sempre a conservação preventiva como
ação primordial no sentido de evitar-se a restauração. Para o Dicionário de Terminologia
Arquivística (1996, p.18, 61), a conservação é o “conjunto de procedimentos e medidas
destinadas a assegurar a proteção física dos arquivos contra agentes de destruição”, e
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preservação é “função arquivística destinada a assegurar as atividades de acondicionamento,
armazenamento, conservação e restauração de documentos”.

Mediante essas premissas e os iminentes riscos de perda acima descritos, as iniciativas do


projeto priorizaram a conservação preventiva das plantas do acervo e a retirada gradativa dos
originais da mapoteca de madeira, onde estão suspensas por “orelhas de papel” grampeadas
aos originais, bem como do ambiente nocivo da sala do prédio da Prefeitura Universitária
(PU), no qual se encontram que é caracterizado pela umidade, exposição excessiva à luz e
muita poeira.

Em função do grande risco de perda do acervo, optou-se pelas ações de conservação


preventiva do acervo que se restringiram basicamente, ao controle do ambiente interno e à
higienização. Essas etapas foram executadas na referida sala da Prefeitura Universitária,
onde está localizada a mapoteca original em madeira.

Desta forma, foram seguidos os seguintes passos:

• registro fotográfico do carimbo da planta, possibilitando a visualização do seu número


original de registro, autoria, data de execução e tema;

• registro fotográfico da planta inteira mostrando o original em suas reais proporções e estado
de conservação;

• registro fotográfico das patologias detectadas.

O uso da fotografia para registro das obras e seus processos de degradação é uma ferramenta
indispensável para conservação e restauro. Antes da intervenção registramos a planta como
se encontra para que tenhamos prova concreta do seu estado anterior ao processo de
conservação. Busca-se com a fotografia registrar detalhes que identifiquem o documento,
bem como registre seus danos.

Após essas etapas, providenciou-se o exame organoléptico (análise minuciosa de toda a


planta), para em seguida preencher-se a ficha de registro especialmente criada para o projeto.
Terminado o preenchimento da ficha, iniciaram-se as medidas básicas de conservação
curativa, tais como, higienização – feita com trincha e na mesa de higienização – e remoção
de grampos e orelhas de papelão. As plantas higienizadas foram transferidas para a mapoteca
em aço localizada na sala no primeiro andar do prédio da PU/UFRRJ, após a mesma ter sido
rigorosamente limpa.
Figura 2: Mesa higienizadora
Fotografia de Cláudio Lima Carlos, 2015.

Outra atividade desenvolvida foi o controle climático do laboratório e da sala da mapoteca.


Utilizou-se o aparelho denominado termo higrômetro para medir a temperatura mínima,
máxima e a umidade relativa (UR), duas vezes ao dia, para atestar se a plantas não sofreriam
um choque de diferença climática (umidade e luminosidade) com o transporte para outro
ambiente, o que prejudicaria a sua conservação. Uma vez higienizados e livres de elementos
agravantes do seu estado de conservação, as plantas foram acondicionadas em “pastas em
cruz”, feitas com papel filiset neutro.

5. Patologias encontradas no acervo e o ambiente interno


Assim como os seres humanos, a obra de arte também precisa ser diagnosticada antes de
sofrer qualquer processo de conservação. Tão importante como conhecer a composição do
material a ser trabalhado é entender suas causas e suas patologias.

Um dos hábitos e rotinas de trabalho que é preciso ter nos ambientes que possuam arquivo
é a limpeza superficial das obras. O acúmulo de pó, sujidades e xilófagos degradam o suporte
e acelera sua deterioração. Faz-se necessário a utilização de equipamentos corretos como,
trincha de cerda macia, mesa de higienização, aspirador de pó em velocidade mínima e
pessoal capacitado. Segundo o autor:

A sujidade, ou seja, as partículas depositadas sobre a peça distorcem o seu


aspecto geral e alteram a sua leitura e observação, ao mesmo tempo em que
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mostram um aspecto descuidado. Este agente favorece o aparecimento e a
aceleração de determinadas deteriorações. (Pascual, 2005, p.26)
Os papéis são suportes frágeis que precisam de manipulação adequada para que não
ocorram rasgos e rupturas. Devido ao tempo, sua fragilidade é realçada, acarretando em
possíveis problemas maiores. Os rasgos deixam à vista as fibras do material, fragmentado
suas margens (“barbas”). Eles não implicam em perda de material e podem ser reparados,
unindo-os através de um restauro adequado. Se não se intervier, podem evoluir e romper-se
totalmente, assim, perdendo parte do suporte. “As rupturas são produzidas quando o papel
se rasga em vários pedaços, alguns dos quais chegando até a perder-se.” (PASCUAL, 2005,
p. 29).

Nada pior para um conservador/restaurador que encontrar um documento unido por uma fita
adesiva, fato comum nas instituições que não contam com profissionais capacitados. Ao invés
de prolongar a vida do suporte, contribui para a sua rápida extinção. Tudo isso porque o durex,
usado por muitos bibliotecários oxida com o tempo causado manchas irreversíveis e perda de
informação. Segundo Pascual (2005, p. 27) “a fita-cola tende a envelhecer e provoca a
oxidação da cola no suporte, provocando manchas impossíveis de se eliminar por completo”.

A utilização de grampos metálicos e clipes devem ser evitados, pois com o passar do tempo
eles oxidam causando manchas irreversíveis nos suportes. “As manchas de ferrugem podem
ser provocadas pela oxidação de elementos metálicos em contato com o papel ou pela
oxidação dos pigmentos do material de proteção.” (PASCUAL, 2005, p. 27).

Não se sabe ao certo a causa das manchas marrons espalhadas pelo suporte em papel. Sabe-
se que as mesmas ocasionam furos e perda de informação. Segundo Pascual (2005, p.31):

O Foxing é uma deterioração que se caracteriza pelo aparecimento de


inúmeras manchas castanhas no papel. Desconhece-se sua origem e os
agentes que participam de seu aparecimento. Alguns investigadores pensam
tratar-se de microrganismos, mas outros defendem que se deve ao processo
de oxidação das impurezas metálicas contidas no papel.
Isso ocasiona acondicionamento indevido que resulta em marcas de dobras e pregas nos
suportes em papel. “As dobras ou pregas provocam um sulco no papel que o torna frágil na
zona onde foi produzido, dando origem a rasgões ou a rupturas. São muito difíceis de corrigir”
(PASCUAL, 2005, p. 29).

Entre as muitas causas, o amarelecimento do papel ocorre devido à ação da luz que acidifica
o papel tornando-o frágil e sem resistência. (PASCUAL, 2005, p.30)

Conforme anteriormente citado, os agentes biológicos são protagonistas em matéria de


destruição, por isso precisa de uma atenção redobrada na vistoria dos espaços físicos que
abrigam os acervos. Os insetos, tais como os fungos, encontram alimento nas substancias
que constituem o papel. “(...) Os insetos xilófagos também se alimentam de celulose e
encontram o habitat ideal no interior dos livros e dos documentos ou em grandes acumulações
de papel.” (PASCUAL, 2005, p. 32).

6. Ações de Planificação, catalogação, nova embalagem e


acondicionamento
No período agosto-dezembro de 2015, as atividades do projeto se concentraram na confecção
de novas embalagens para o acondicionamento das plantas arquitetônicas, a planificação de
alguns originais onde foi detectada a necessidade dessa intervenção, e a catalogação.

A planificação é um processo que consiste em retirar ondulações e marcas no papel. A planta


arquitetônica é colocada entre papeis mata-borrão com um peso por cima, mantido por 24
horas. Caso não seja suficiente, aplica-se, com borrifador, água deionizada e deixa-se por
dez minutos, repetindo o processo por três vezes.

Com relação à catalogação, optou-se pela preservação da numeração original das plantas,
localizada nas bordas e carimbos, juntamente com uma nova, atribuída para o Banco de
Dados do Centro de Memória (BDCM). Nas planilhas de catalogação e etiquetas foram
colocadas sobre os envelopes de papel com pH neutro, criados para o acondicionamento, as
duas numerações, além de datas e autoria dos desenhos.

A embalagem escolhida para acondicionar as plantas foi a pasta em cruz, feita com papel
filiset neutro acompanhada de uma base protetora embaixo e acima para que a obra não entre
em contato com outros documentos. O papel escolhido é um papel, acid free, por não ser
fabricado pelo processo convencional de colagem ácida.

Figura 3 Modelo de embalagem pasta em cruz


Fotografia de Cláudio Lima Carlos, 2015

Os desenhos arquitetônicos, plantas, cartazes e amostras de papel de parede incluem-se


entre os materiais de grandes dimensões. Estes materiais ficam melhor armazenados em
mapotecas ou em caixas grandes de boa qualidade. Os materiais devem ser colocados em

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pastas alcalinas, em formatos que se acomodem ao tamanho da gaveta ou da caixa. (BECK,
2001, p.11).

O agente de colagem é sintético e processado em meio neutro, não levando em sua


fabricação o sulfato de alumínio, cujo resíduo libera ácido sulfúrico que atacam as fibras de
celulose danificando o documento.

Este papel tem longa durabilidade por ser resistente a fungos e proliferação de bactérias,
sendo ideal para restauração ou recuperação de documentos e certificados. Seu objetivo é
manter características intrínsecas do documento como sua originalidade e autenticidade. Nas
plantas arquitetônicas maiores foi necessário unir dois ou mais papeis acid-free com cola feita
de carboximetilcelulose – CMC.

Segundo Costa (2003), o acondicionamento tem por objetivo a proteção dos documentos que
não se encontram em boas condições contra agentes externos e ambientais ou para a
proteção daqueles que foram restaurados a favor da manutenção da integridade física da
obra, armazenando-os de forma segura. O acondicionamento protege os documentos da luz,
da migração de acidez de um documento para o outro e dos desastres, como pequenos
incêndios e inundações.

Os tratamentos dispendiosos e complicados de conservação têm pouca serventia se os


objetos tratados são posteriormente devolvidos a ambientes que lhe são prejudiciais. Ao
proporcionar o melhor armazenamento possível, damos o primeiro e mais importante passo
para a preservação de nossa herança cultural. (MENDES, 2011, p. 83)

O trabalho de planificação e acondicionamento é um trabalho demorado que precisa ser feito


com cuidado e atenção. Conseguimos alcançar alguns objetivos como encontrar o melhor
modelo para fazer os envelopes e a escolha do papel. Os resultados obtidos foram
satisfatórios levando em conta a espera da compra de materiais e a chegada dos mesmos.

A ficha de Registro é um documento que contém informações sobre todo o processo de


conservação e restauro do documento incluindo testes, analises patologias, e as propostas
de tratamento. É a sua memória, capaz de registrar e informar a qualquer pesquisador ou
restaurador por quais processos de conservação o documento passou, assim como quais
ainda deve passar. Foram estabelecidos campos que dão informações desde o registro e a
localização, exames realizados, patologias encontradas, até tratamentos realizados e a serem
realizados. Até janeiro de 2016, foram preenchidas 166 fichas de registro das plantas
conservadas preventivamente.

Ao conhecer o acervo documental mais detalhadamente, observou-se a existência de


diversas plantas de detalhes arquitetônicos, ornatos e mobiliário em tamanhos pequenos,
menores que o formato A3 da ABNT. Em função disso e também do estado de conservação
razoável em que se apresentavam alguns deles, os trabalhos de digitalização dessa
documentação foram desenvolvidos em scanner de mesa tamanho A3.

Com relação à digitalização das plantas com maior formato, em função do seu precário estado
de conservação, muitas delas em suportes frágeis de papel manteiga, optou-se por não
digitalizá-las por meio de scanner de tração, para grandes formatos. Para realizar tal
procedimento, seus suportes devem estar estabilizados e perfeitamente restaurados, o que
ainda não ocorreu. Mesmo assim, a tarefa deve ser realizada com bastante cautela com
auxílio de envelopes de acetato.

A digitalização está sendo realizada por fotografia digital, com o auxílio de câmera profissional
acoplada a um suporte especialmente criado pelo Professor Delson de Lima Filho, integrante
da equipe do projeto. O referido suporte de baixíssimo custo foi produzido no próprio
Departamento de Arquitetura e Urbanismo (DAU) e teve grande parte de suas peças (junções,
dobradiças e encaixes) executadas na impressora 3D de propriedade do professor. O referido
aparato pode ser montado na posição vertical ou horizontal. Em função do pouco espaço
disponível, optou-se pela posição vertical, mas estuda-se a possibilidade de utilizar
horizontalmente.

Por meio de suave e contínua sucção feita por pequena bomba de vácuo, o original é
planificado em uma base oca de MDF, com formato A0, possibilitando a execução da
fotografia com luz indireta (ambiente), sem expor os originais à tração, choques térmicos
provenientes da luz ou outras ações que agravassem ainda mais a sua integridade. As fotos
recebem tratamento digital e, em médio prazo, pretende-se disponibilizar parte do acervo em
arquivo com extensão PDF, na página do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFRRJ.

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Figura 4 Planta sobre suporte produzido no DAU
Fotografia de Cláudio Lima Carlos, 2015.

Considerações Finais
O precário estado de conservação e guarda inadequada do acervo de plantas históricas
revela, de maneira inequívoca, décadas de abandono e descaso por parte das sucessivas
administrações da UFRRJ. Por outro lado, a partir da iniciativa de resgate das rotinas
conservacionais empreendida por docentes dos cursos de Arquitetura e Belas Artes pode-se
observar o grande interesse dos discentes envolvidos no projeto que se dedicaram e se
dedicam diariamente às árduas tarefas de salvamento e conservação preventiva da preciosa
documentação.

O estado avançado de degradação e a forma como tão valioso acervo se encontrava e ainda
se encontra, em parte, acondicionado, não deixam dúvidas sobre a sua inevitável perda em
curto prazo, caso as iniciativas não houvessem sido tomadas. Com ele, se perderia além de
informações preciosas, um acervo de plantas de rara beleza e importância para a história
recente da arquitetura brasileira, que apresentam técnicas de desenho e representação
gráfica atualmente pouco utilizadas ou até mesmo perdidas. A experiência proporcionou aos
professores e, principalmente, aos alunos envolvidos, acessar um universo em grande parte
desconhecido de nossa arquitetura, enriquecendo certamente suas formações profissionais.

O lugar de guarda das plantas é tão importante quanto os processos de conservação,


realizado no lugar que elas passaram o resto dos seus dias, portanto as plantas higienizadas
e envelopadas primeiramente foram guardadas na citada mapoteca metálica. Porém, em
2015, em função das citadas obras de conservação no prédio, elas foram transferidas para as
dependências do Centro de Memória onde estão guardadas, provisoriamente, em mapotecas
horizontais em aço.

Atualmente, o projeto conseguiu higienizar cerca de mais de 350 plantas e cadastrar 166
originais relacionados à memória projetual e construtiva do Campus Seropédica da UFRRJ.
Intenciona-se, futuramente, inseri-los no tombamento estadual do campus (2001) como bens
móveis, fato que gerará responsabilidade legal da administração superior, de conservá-los,
garantindo a sua existência e transmissão às gerações futuras.

Há também em processo, a disponibilização das informações relacionadas ao acervo da


UFRRJ no Sistema de Gerenciamento de Acervos Museológicos – SISGAM, do Estado do
Rio de Janeiro, por intermédio do cadastramento do Centro de Memória da UFRRJ. Os
contatos entre membros da equipe do projeto e da Secretaria Estadual de Cultura foram
iniciados no dia 5/8/2015. As iniciativas incluem um acordo de cooperação técnica com a
Escola de Museologia da UFF, com vistas à obtenção de bolsistas para a catalogação do
acervo conforme normas estabelecidas pelo sistema, bem como a disponibilização em rede
para consulta das fichas cadastrais das plantas, já em grande número elaboradas. Espera-se
em curto médio prazo, disponibilizar e divulgar o acervo de plantas da UFRRJ para
pesquisadores em geral. Busca-se a divulgação LabDoc entre docentes e discentes da
UFRRJ, bem como a estruturação de cursos de extensão, estabelecimento de linha editorial
e regularização de cobrança por cópia de documentos fornecida aos pesquisadores (internos
e Externos), com vista a estabelecer fontes de recurso para o laboratório.

Referências Bibliográficas
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ZAKIA, Silvia A. Palazzi. Brazil builds em campinas: uma ferramenta simbólica da estratégia de
legitimação de implantação do plano de melhoramentos urbanos, in pós v.17 n.27, São Paulo, junho
2010, disponível em file:///C:/Users/Claudio/Downloads/43679-52138-1-PB.pdf , acessado em
12/12/2015.
DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO À MEMÓRIA E HISTÓRIA
REGIONAL: RELATO DA EXPERIÊNCIA DO PORTAL EMREDES

AZEVEDO, Flávia Lemos Mota de (1); FERREIRA, José Heleno. (2); SANTIAGO,
Samuel José (3).

1. Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG – Unidade Divinópolis – Centro de Memória


Profª Batistina Corgozinho - CEMUD
Av. Paraná, 3001, sala 406. Bairro Jardim Belvedere, Divinópolis – MG – 34.501-170
flavia.azevedo@uemg.br

2.Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG – Unidade Divinópolis – Centro de Memória Profª
Batistina Corgozinho - CEMUD
Av. Paraná, 3001, sala 406. Bairro Jardim Belvedere, Divinópolis – MG – 34.501-170
zeheleno.ferreira@gmail.com

3. Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG – Unidade Divinópolis – Centro de Memória


Profª Batistina Corgozinho - CEMUD
Av. Paraná, 3001, sala 406. Bairro Jardim Belvedere, Divinópolis – MG – 34.501-170
samujsantiago@gmail.com

RESUMO
Resumo: Considerando o acervo que vem sendo constituído pelo Centro de Memória
Professora Batistina Corgozinho – CEMUD – UEMG – Unidade Divinópolis desde 2005 e
principalmente pela potencialidade que os mesmos apresentam para novos estudos e
pesquisa e sua crescente expansão criou-se o EmRedes: Portal da Memória do Centro-
Oeste Mineiro para disponibilizar seu acervo história e de memória através da Web. O
EmRedes: Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro – trabalho, religiosidade, cultura e
cotidiano foi lançado em maio de 2015, com o objetivo de se tornar um instrumento
permanente de acesso a todos os cidadãos interessados em realizar pesquisas sobre a

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


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região, no qual está disponíveis um banco de dados com mais de 70.000 documentos
digitais. O acervo do Portal conta com documentos escritos diversos (jornais, panfletos,
cartas, notas, documentos oficias), fotos e vídeos de diferentes grupos, a polifonia da
memória é um princípio da reunião do acervo, privilegiando especialmente aqueles registros
que não fazem parte das vozes oficiais, aqueles que pouco preservamos. A importância do
uso da tecnologia digital está ligada não só ao fato de preservar indiretamente o patrimônio
documental como principalmente democratizar o seu acesso. A digitalização dos
documentos garante sua permanência virtual, mesmo que o suporte de acessibilidade aos
mesmos se modifique. A preservação digital não impede o processo de degeneração dos
documentos. A integridade física dos mesmos exige a adoção de outros procedimentos
tecnológicos e condições de acomodação adequadas e específicas que são observadas no
trabalho do Centro de Memória. A iniciativa de construção do Portal da Memória do Centro-
Oeste Mineiro – EmRedes representa um passo para que este instrumento de estudos e
pesquisa seja apropriado pelos cidadãos interessados em pesquisar e conhecer mais a
história da região. Nesse sentido, o Portal da Memória convida e mais do que isso, solicita a
todos a contribuição para que este espaço seja sempre mais dinâmico, oferecendo
informações e reflexões sobre os aspectos culturais e históricos do Centro-Oeste mineiro. O
Portal também funciona como um centro de referência regional que possibilita a coleta de
dados, fixação e produção de informações, atende as demandas locais para formação,
capacitação e confecção de material informativo e formativo. Dessa forma, o Portal deve
sistematizar e arquivar as produções e, na medida do possível, produzir novos materiais por
iniciativa própria ou demanda de escolas e organizações sociais. Nesse sentido, ele se
constitui enquanto um acervo de informações e as produz; atende a demanda
formativa de comunidades e é formado pelas informações cedidas pelas mesmas. A
administração do Portal é realizada pela equipe de profissionais do Centro de Memória
Professora Batistina Corgozinho – CEMUD – UEMG – Unidade Divinópolis, cabendo aos
mesmos receber, catalogar, disponibilizar e analisar acervos sobre a memória e a história do
centro-oeste mineiro.

Palavras-chave: Digitalização de acervos, democratização e acesso, memória e história


regional, Portal EmRedes

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DEMOCRATIZAÇÃO E ACESSO À MEMÓRIA E HISTÓRIA
REGIONAL: RELATO DA EXPERIÊNCIA DO PORTAL EMREDES

O Centro de Memória foi instituído em abril de 2005, através da Resolução da


Fundação Educacional de Divinópolis – FUNEDI, nº 06, para atender às demandas regionais
e da comunidade acadêmica no que diz respeito à promoção e à integração de
investigações sobre questões relacionadas à memória, à história oral, tradições e patrimônio
cultural, bem como realização de estudos e pesquisas no seu campo de atuação. Nesse
sentido, realiza pesquisas sobre questões relacionadas à memória, patrimônio e tradições
culturais do Centro-Oeste Mineiro em relação à sociedade, educação, cidade, imprensa,
cultura, tradições, patrimônio, acervos e política; disponibiliza para a comunidade acadêmica
e geral, um banco de imagens de documentos históricos e fotografias que vem sendo
coletados e digitalizados desde o ano 2002; promove eventos acadêmicos com a
participação da comunidade e de alunos dos diferentes cursos oferecidos em Divinópolis,
Cláudio e Abaeté; interage com os cursos de graduação, pós-graduação e com o Centro de
Referência Técnica em Pesquisa e Extensão, realizando atividades, pesquisas e acolhendo
alunos em iniciação científica e pós-graduação; promove a realização de estudos e
pesquisas interdisciplinares voltados à reconstrução da memória, das tradições e do
patrimônio histórico e sociocultural. Em 2014 quando houve a estadualização da FUNEDI, o
Centro de Memória passou a incorporar a estrutura da Universidade do Estado de Minas
Gerais – UEMG – Unidade Divinópolis e também passou a se chamar Centro de Memória
Profª Batistina Corgozinho – CEMUD.

A iniciativa de criação do CEMUD surgiu a partir da execução do projeto “Uso da


Tecnologia Digital na preservação da Memória Histórico-Cultural de Divinópolis”,
coordenado pela Profª Batistina Maria de Sousa Corgozinho, desenvolvido no período de
2001 a 2003, dentro do Programa de Preservação sob forma digital da Memória Histórico-
Cultural de Minas Gerais, criado pela Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia de
Minas Gerais. Esse projeto foi desenvolvido com financiamento da Fundação de Amparo à
Pesquisa de Minas Gerais – FAPEMIG. O projeto contou com a parceria entre a Fundação
Educacional de Divinópolis e Secretaria Municipal de Cultura com o objetivo de digitalizar

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parte do acervo de documentos históricos sob a guarda do Arquivo Público Municipal de
Divinópolis e envolveu alunos dos cursos de diferentes cursos de graduação.

O CEMUD coloca à disposição da comunidade acadêmica sua infraestrutura e o


acesso aos conjuntos documentais sob sua guarda. Aberto à participação de professores
interessados em desenvolver projetos de pesquisa sobre a memória enquanto tema
transversal que, assim considerado, diz respeito a todas as áreas do conhecimento, está
aberto também a alunos que estejam desenvolvendo projetos de pesquisa de iniciação
científica e à população em geral. Entre seus acervos, constam coleções de fotografias de
Divinópolis e coleção de jornais editados em Divinópolis na primeira metade do século XX,
acervo fotográfico e outros documentos (digitalizados) do Museu Histórico de Divinópolis e
Arquivo Público Municipal e outros, a lista dos acervos atualmente disponíveis são: Arquivo
Público Municipal de Divinópolis; Ary Alvarenga; Coleção Luís Fernandes de Souza ;Diretório
Acadêmico (D.A.) do Instituto de Ensino Superior e Pesquisa (INESP); Divinópolis Tênis Club
(DTC); Dona Cacilda; Edite Silva e Iris Moreira; Eventos Centro de Memória 2015; Exposição Nossa
História, Sua Memória: 50 Anos da FUNEDI; Ferreira de Sousa; Fundação Educacional de
Divinópolis (FUNEDI); Halim Souki; Jornais; José Gomes Viana; José Valério; Mapas Mentais.

Dentre os resultados desse trabalho durante o período de 2002/2017, destaca-se a criação de


um banco de imagens digitais de documentos históricos, com aproximadamente 70.000 imagens,
disponibilizados para o público através do Portal da Memória.

Desenvolver a levantamento e catalogação dos documentos, organizando-os em


arquivos digitais para disponibilização no EmRedes, portanto, é o objetivo desse projeto,
que articula também o envolvimento de outras organizações governamentais e não-
governamentais que trabalham com a pesquisa sobre o tema, ampliando, assim, o seu
acervo e as possibilidades de contribuição para a realização de estudos sobre a memória do
centro-oeste.

O trabalho desenvolvido por uma equipe de professores e estudantes bolsistas tem


transformado o CEMUD numa referência importante para os estudos e pesquisas sobre o
Centro-Oeste mineiro.

Considerando o acervo que vem sendo constituído pelo Centro de Memória desde
2005 e pela potencialidade que o mesmo apresenta para novos estudos e pesquisa e sua
crescente expansão, o Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro disponibiliza materiais
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audiovisuais (fotos, vídeos e textos) resultantes dos trabalhos desenvolvidos por
profissionais e estudantes da Universidade do Estado de Minas Gerais – UEMG Unidade
Divinópolis, bem como por outros estudiosos e grupos sociais que tenham interesse em
disponibilizar, para o público em geral, os acervos históricos que possuem sobre a região.

O Portal da Memória do Centro Oeste Mineiro –EmRedes é um instrumento


permanente de acesso a todos os cidadãos interessados em realizar pesquisas sobre a
região, no qual estarão disponíveis diversos trabalhos, entre eles, aqueles aqui
apresentados. O Portal também funciona como um centro de referência regional que
possibilite a coleta de dados, fixação e produção de informações, bem como o atendimento
a demandas locais para formação, capacitação de pessoal e confecção de material
informativo e formativo. Dessa forma, o Portal sistematiza e arquiva as produções e, na
medida do possível, produz novos materiais por iniciativa própria ou demanda de escolas e
organizações sociais. Nesse sentido, ele se constitui enquanto um acervo de informações e
as produz; atende a demanda formativa de comunidades e é formado pelas informações
cedidas pelas mesmas. A administração do Portal estará a cargo da equipe de profissionais
do Centro de Memória Profª Batistina Corgozinho (CEMUD), da UEMG Unidade Divinópolis,
cabendo aos mesmos receber e analisar as contribuições vindas de diversos grupos de
estudo e pesquisa sobre o Centro-Oeste Mineiro.

A manutenção desse portal é de responsabilidade do CEMUD, buscando o


envolvimento de outras organizações governamentais e não-governamentais que trabalhem
com a pesquisa sobre o tema, ampliando, assim, o seu acervo e as possibilidades de
contribuição para a realização de estudos sobre a memória do Centro-Oeste.
Acredita-se, pois, que este trabalho busca estimular a educação através da pesquisa e a
construção identitária da população divinopolitana e do Centro-Oeste de Minas Gerais,
tornando-se um espaço virtual em que sejam divulgados os resultados de estudos sobre o
tema, incentivando a realização de outros trabalhos nessa mesma área.

A criação do Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro é adequada aos propósitos


da Universidade do Estado de Minas Gerais, que se empenha em disponibilizar sua
produção técnico-científica para uso da comunidade, colocando sua estrutura a serviço do
desenvolvimento regional, incluindo como parte desse desenvolvimento a valorização da
memória e do patrimônio histórico.
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Os documentos são a base para atividades de pesquisa e extensão desenvolvidas
em diversos temas e tipos de profissionais. O arquivamento e organização de objetos e
representações é uma atividade imprescindível para que, a partir da memória, ou até
mesmo da história, o homem se desenvolva em sua realidade. Com a expansão da
ocupação e crescimento populacional, houve o incremento do volume e diversificação de
documentos, em que muitos podem ser relevantes para se analisar a realidade a partir das
informações que nele estão disponíveis. As inovações nas tecnologias da informação e
comunicação vieram possibilitar uma maior sistematização, agilidade e ampliação da
possibilidade de acesso e disseminação desses dados para todo o globo, digitalizando-se
esses documentos.

A partir do momento em que todo meio, texto, imagem ou som é codificado


num formato único convertível para uma sequência de bits, todos os
diferentes tipos de informação podem ser tratados da mesma maneira e
pelo mesmo tipo de equipamentos. (FLUCKIGER, 1995, p.21 apud
SALARELLI, 2008, p.11).

As possibilidades tecnológicas, associadas aos serviços disponíveis de acesso físico


a documentação, demonstram a relevância de se digitalizar e possibilitar a disseminação
dessas informações para um público amplo de cidadãos. A conservação e disseminação
dos acervos históricos e das próprias instituições arquivísticas devem ser consideradas
prioridades, ao se pensar ações e políticas públicas de preservação do patrimônio histórico
e da memória. Com as novas tecnologias, reduzem-se o desgaste do suporte original, além
de se possibilitar a reprodução dessa informação indefinidamente (quer para difusão, quer
para armazenamento de segurança), assim como seu acesso, por rede, em outras
localidades de forma remota, “a capacidade de um documento digital sobreviver no tempo é
diretamente proporcional à sua fácil reprodutibilidade e inversamente proporcional à
instabilidade dos suportes até hoje utilizados”. (SALARELLI, 2008, p.16)

A preservação digital não impede o processo de degeneração dos documentos. A


integridade física dos mesmos exige a adoção de outros procedimentos tecnológicos e
condições de acomodação adequadas e específicas. De qualquer modo, mesmo quando os
acervos são preservados devidamente, o seu acesso deve ser feito de forma digital, a não
ser que o uso dos documentos fique restrito a alguns poucos pesquisadores. Portanto, a
importância do uso da tecnologia digital está ligada não só ao fato de preservar
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indiretamente o patrimônio documental como principalmente democratizar o seu acesso. A
digitalização dos documentos garante sua permanência virtual, mesmo que o suporte de
acessibilidade aos mesmos se modifique.

Essas ações de preservação e disponibilização do acervo representam para a UEMG


Unidade Divinópolis sua contribuição para a criação de um Museu Virtual dinâmico e
disponível democraticamente para todos os interessados em conhecer ou pesquisar a
memória do Centro-Oeste Mineiro, aberto continuamente às novas contribuições e, dessa
forma, contribuindo para sua preservação e valorização, evidenciando a cultura, a forma de
vida, a economia, conhecimentos e saberes populares típicos dessa extensa região genuína
de Minas Gerais.

Por se tratar de um portal da memória da região centro-oeste, é uma iniciativa


importante por consolidar espaços de ancoragem, muitas vezes fluídos e pulverizados,
para a história regional e local. Plataforma importante para a construção da identidade e
cultura locais, em que podem ser estimuladas articulações e parcerias, visando o
desenvolvimento regional, área foco de atuação da unidade, inclusive por seu programa
de mestrado. Dessa forma, há uma grande demanda visando a consolidação e
valorização dos patrimônios materiais e imateriais de diversos municípios da região, cuja
possibilidade de higienização, organização, catalogação e disponibilização em conteúdos
digitais desses referentes, contribui para o desenvolvimento econômico, social, cultural e
político desses diversos territórios.
A Universidade cumpre também, assim, o seu papel de estimular e desenvolver
redes colaborativas que aperfeiçoem o atendimento à população e aos pesquisadores,
com atividades que permitam aprimorar o estudo e conhecimento da história local, assim
como viabilizar esse tipo de prestação de serviço à população.
Com o recebimento do prêmio Ponto de Memória, a continuidade da digitalização
dos documentos segue com maior impulso, principalmente na atualização e manutenção
dos importantes acervos já digitalizados, em processo, e que se digitalizarão nos fluxos
de rotina do Centro de Memória. Como ferramenta, os acervos digitalizados, além de
permitirem maior restrição do manuseio e, portanto, preservação dos documentos
originais, possibilita o acesso à distância, por vários usuários simultaneamente,
associando e cruzando com informações e dados, referentes ao próprio documento ou
em intertexto a ele, que podem ser valiosos, seja para os pesquisadores acadêmicos ou
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diletantes, para os interessados, ou até para os que buscam informações com diversos
motivos ao navegarem pela web.
Ao atualizar os princípios e métodos de arquivologia no processo de digitalização,
também a catalogação, organização dos arquivos e disponibilização no portal para acesso
precisa estar em consonância com essa dinâmica – proposta deste projeto de pesquisa.
Toda a infraestrutura para o processo estão disponíveis no Centro de Memória. As etapas
podem ser sintetizadas na seguinte sequência: • a) Campanhas e orientações com a
valorização dos documentos da história e memória locais • b) Recepção de coleções e
documentos, por meio de convênios, cessões, doações e outros; • c) Arquivamento e
acomodação dos documentos trabalhados • d) Higienização • e) Organização e
preparação dos documentos • f) Catalogação, • g) Digitalização, • h) Tratamento das
imagens, • i) Organização dos arquivos digitais em servidor, • j) Upload para nuvem no
servidor externo do portal, • k) Realização dos backups, • l) Disponibilização dos
documentos no sistema do portal com inserção das informações catalográficas do
documento • m) Acréscimo de tags e palavras-chave para se favorecer os mecanismos de
busca • n) Divulgação das atividades arquivísticas e dos documentos identificados
considerados de relevância para a comunidade local

Difusão e Divulgação do Portal EmRedes

O aprimoramento constante da tecnologia, principalmente dos produtos eletrônicos,


busca entremear serviços, visando conforto, comunicação e velocidade. Essa inovação
tecnológica abre possibilidade para a criação de novos meios de comunicação que estão
cada vez mais presentes e acessíveis das mais diversas formas. Nunca antes fora tão fácil
se expressar em público. Redes sociais, correios eletrônicos, aplicativos de mensagens
instantâneas e correios de voz, permitem, a seus usuários, um leque variado de opções de
diálogos e meios de se expressar, discutir e discursar em público. Os meios de
comunicação, principalmente emissoras de televisão, rádio, jornais e revistas se mostram
cada vez mais aptos a se adaptar a essa inovação tecnológica, nos dias atuais é possível
enviar comentários, sugestões, críticas e opiniões com apenas alguns cliques.

A partir dessa inovação nos meios de comunicação, o Centro de Memória


Professora Batistina Corgozinho buscou meios para dialogar com o público, que está cada
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vez mais conectado à internet e as redes sociais. Orientados a interagir com o publico a
partir de redes sociais, decidimos começar pelo Facebook, a maior rede social do mundo.
Para divulgar o Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro, os projetos e eventos
desenvolvidos no CEMUD criamos a página do Facebook do Portal EmRedes para dialogar
e atingir o grande público.

O Facebook é a maior rede social do mundo. Possui mais 80 milhões de usuários no


Brasil e, ao todo, cerca de 1,19 bilhão de usuários mundialmente. Uma das funções do site é
a de permitir com que o usuário busque conteúdos de seu interesse a partir de páginas que
informam sobre o tema pesquisado. Essas páginas são administradas pelos próprios
usuários da rede e assim empresas, eventos e organizações podem dialogar com o público
e assim divulgar seu trabalho, fazer pesquisas de opinião e outros recursos.
A página do Facebook do Portal EmRedes foi criada no dia 30 de junho e divulgada
aos usuários no dia 13 de julho. A página tem como objetivo mostrar ao público o Portal
EmRedes e as atividades desenvolvidas pelo Centro de Memória, divulgando seu acervo
digitalizado, eventos realizados e os produtos dos projetos desenvolvidos no CEMUD. As
principais publicações da página são retiradas do próprio acervo e contam com fotografias
antigas da paisagem e cotidiano da cidade de Divinópolis e região, páginas e artigos de
jornais e panfletos digitalizados e conteúdos produzidos pelo Centro de Memória.
Os documentos publicados normalmente relacionam-se com alguma data
comemorativa, lugares, costumes ou são curiosos artigos publicados nos jornais, tais
publicações tem como objetivo mostrar as transformações que aconteceram na região,
tanto em sua paisagem quanto nos hábitos e comportamentos, causando interesse no
publico e dando maior visibilidade ao nosso site. Todas as publicações são referentes ao
acervo do Portal EmRedes e redirecionam o visitante ao site, divulgando assim o conteúdo
virtual do Centro de Memória Professora Batistina Corgozinho, que atualmente conta com
mais de 70.000 documentos e está em pleno crescimento.
Os documentos são selecionados diretamente do portal, a descrição feita para a
publicação é desenvolvida a partir da descrição localizada na página da foto ou por meio
de reconhecimento. Para integridade dos documentos, a logomarca do Emredes em
formato marca d’agua é posicionada no canto inferior direito de todas as publicações,
caso o usuário queira ter acesso ao documento original, ele deve acessar o link
disponibilizado na publicação, que o redirecionará para a página onde o documento está

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hospedado no portal. Além de preservar o acervo disponibilizado, esse recurso faz com
que o visitante conheça o portal, sendo um importante recurso de divulgação do mesmo.
Paralelamente, constituímos a Mostra Virtual DIVINÓPOLIS ONTEM E HOJE,
EXPOSIÇÃO VIRTUAL, cujo objetivo é aproximar a Comunidade divinopolitana de sua
memória, através de fotos comparativas que ressaltam as transformações ocorridas na
paisagem cultural da cidade, trazendo ao público uma nova perspectiva dos principais
elementos que constituem a sua história. O fragmento de seu título, “ONTEM E HOJE”, é
reflexo do intento de seus idealizadores de propiciar ao público um referencial para
comparações, permitindo que a lacuna entre o “ontem” e o “hoje” fale por si mesma,
demonstrando o movimento das transformações que culminaram na Divinópolis atual. Na
Mostra Virtual, a metodologia usada foi a seleção de temáticas como forma de
apresentar e viabilizar o acesso ao acervo do Portal.
Atualmente a página conta com 1637 curtidas, mais de 1200 publicações e nossas
postagens tem alcance total de mais de 90.000 usuários. A página continua em amplo
desenvolvimento, suas publicações são monitoradas a partir da ferramenta de
informações que o Facebook disponibiliza. Essa ferramenta permite que bolsista avalie a
recepção das publicações e percebam o interesse do publico, para que assim possam
trazer novos conteúdos e aprimorar a experiência dos usuários, da página e sua relação
com o portal.

Esses dados evidenciam a importância do Facebook como ferramenta de


divulgação dos trabalhos do CEMUD e do Portal EmRedes. A interação com o público
também é um fator a ser destacado. O alcance das publicações faz com que muitos
visitantes identifiquem parentes, contem histórias ou passem informações que contribuem
para a descrição do acervo. O diálogo proporcionado enriquece o EmRedes e resgata
parte da história do Centro Oeste Mineiro.

Também para acompanhar a apropriação do Portal por parte da Comunidade


Interna/Externa, com ênfase na segunda, utilizamos de ferramentas de “análise de
tráfego”, como o “Google Analytics”, que possibilita analisar o tráfego e intensificar o
acesso com estratégias de desenvolvimento de conteúdo, além da criação e definição do
melhor layout e ferramentas, considerando aspectos facilitadores a fim de enriquecer a
experiência do público no acesso da página, em especial as singularidades do público não
acadêmico. Ao utilizarmos essa ferramenta foi possível acompanhar também como o

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Portal subiu no ranking do Google, e atualmente quando pesquisamos pela palavra
emredes ele já é o primeiro resultado oferecido, o que demonstra o envolvimento com a
página. Nos primeiros meses do projeto, a página do Portal não figurava nem na primeira
página de resultados do Google. Também a partir das ferramentas do Facebook foi
possível perceber o envolvimento do público, e quando fazíamos ações de divulgação e
impulsionar a página podemos observar o excelente resultado, demonstrando a potência
da ferramenta.

Conclusões

Por se tratar de um portal da memória da região centro-oeste, é uma iniciativa


importante por consolidar espaços de ancoragem, muitas vezes fluídos e pulverizados,
para a história regional e local. Com foco voltado para a divulgação do acervo do Centro
de Memória Profª. Batistina Corgozinho, o projeto visa movimentar e facilitar o acesso ao
mesmo, e sua importância é demonstrada prioritariamente na expansão de sua
divulgação além campus, possibilitando e incentivando o acesso ao acervo por toda
comunidade.

Precisamos nos adaptar as novas tecnologias e levar a História para o grande


público, que está cada vez mais conectado. Para isso, é necessário conhecer os novos
recursos e usar seu potencial ao máximo para que assim consigamos interagir e dialogar
com esses novos meios de comunicação. A relação entre o Facebook e o Portal está no
inicio e a partir dos relatórios oferecidos tanto do Facebook quanto do Google Analytics,
podemos evidenciar o crescimento dos acessos ao portal a partir da criação da página no
Facebook. A partir dela o usuário visitante da página pode conhecer o portal, interagir com
seu conteúdo e buscar meios de contato e diálogo. Portanto, devemos frisar a importância
da manutenção da página como um importante meio de divulgação do Centro de Memória
Professora Batistina Corgozinho e de suas produções.

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IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
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CONJUNTOS URBANOS DA PRAÇA DA ESTAÇÃO E DA AVENIDA
ASSIS CHATEAUBRIAND: OCUPAÇÕES PARA REAVIVAR A CENA
POLÍTICA E CULTURAL BELORIZONTINA

MORAIS, CAMILA S. (1)


1. Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG
Mestrado em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável – MACPS
morais.camila@gmail.com

RESUMO
Por meio da análise das recentes ocupações da rua Sapucaí, no bairro Floresta, em Belo Horizonte,
situada entre dois Conjuntos Urbanos tombados em âmbito municipal: “Conjunto Urbano da av. Assis
Chateaubriand” e “Conjunto Urbano da Praça Rui Barbosa (Praça da Estação)”, o presente trabalho
constitui uma reflexão sobre as políticas patrimoniais brasileiras; seu impacto nos usos e conservação
dos bens culturais de reconhecido valor; e como é possível a recuperação desses lugares, quando
em estado de abandono, por meio de ações de micropolítica advindas da participação da comunidade
local. Por mais de 20 anos grande parte das edificações da rua Sapucaí estiveram abandonadas e
fechadas para uso, o que vem sendo gradualmente modificado com a retomada do uso dessas
edificações num processo recente, desde 2010 (marcado temporal dado pelo primeira ocupação
“Praia da Estação”, em 16 de janeiro de 2010). Através de ações de micropolítica de alguns coletivos
da cidade, como ressonância dos movimentos políticos de ocupação da Praça da Estação nas
adjacências da rua Sapucaí, várias intervenções urbanas foram ocorrendo, primeiro na própria rua,
chamando atenção para a paisagem urbana, (especialmente pela localização da rua, que está logo
acima da Praça da Estação) com ações de ocupação e lazer temporárias, blocos de carnaval etc e,
posteriormente, as edificações foram ganhando novos usos comerciais e de serviços, como
restaurantes, bares, escritórios e locais de entretenimento com exibição de filmes, workshops de
qualificação profissional etc, e, se destaca, sem que as edificações tenham recebido reforma do tipo
Retrofit, mantendo assim a experiência estética de um espaço que estava em abandono e possibilita,
agora, novas experimentações. Neste estudo, opta-se por estabelecer um recorte dentro do
patrimônio cultural, pois, em algum determinado momento o patrimônio tombado, registrado ou
inventariado foi destacado por sua relevância perante a comunidade, sendo assim legitimado como
de importância e destaque à sociedade, estabelecendo algum tipo de singularidade dentro da
paisagem urbana local. É instigante constatar que parte do patrimônio cultural se encontra em estado
precário de conservação ou em estado de abandono. Essas arquiteturas do abandono, esses marcos
monumentais deixados de lado não podem ser lidos e vivenciados como algo que escapa ao controle
biopolítico; que resiste na paisagem e assim resiste enquanto potência? Quais seriam alguns
caminhos possíveis quando o abandono está instaurado nos lugares? E, especialmente, como esses
locais impactam a comunidade local? Essas são algumas das perguntas norteadoras deste trabalho e
que, longe de uma resposta definitiva, abrem espaço para reflexão e contribuição de soluções
coletivas, como poderá ser vislumbrado no artigo completo.
Palavras-chave: Paisagem Urbana, Patrimônio Cultural, Arquitetura, Ocupação.

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Conjuntos urbanos da Praça da Estação e da Avenida Assis
Chateaubriand: ocupações para reavivar a cena política e cultural
belorizontina
Pensar a cidade como um espaço singular no qual uma série de experiências se tornam
possíveis, seja de forma coletiva ou individual, significa que, tomar a cidade como objeto de
experiência estética institui considerar que “tudo o que constitui a cidade em sua
materialidade, sua humanidade, mas também seus imaginários, é produtor de uma estética
intrínseca” (DEVEL apud STARLING, 2009, p. 36). Sendo assim, infere-se também que, a
reverberação dos elementos que compõem a estética da cidade exerce um fator de
multiplicação e ampliação das experiências sensoriais dos indivíduos.

A cidade, como objeto passível de ser experimentado esteticamente, reúne


uma profusão de signos em constante multiplicação. Nos dizeres de Henri
Pierre Jeudy (2005), a cidade excede a representação que cada pessoa faz
dela, se oferecendo ou se retraindo segundo a maneira como é apreendida,
convidando o cidadão a criar seus próprios modos de leitura e a proceder a
uma apropriação imaginária do espaço. [ao passo que essa apropriação
também interfere no sujeito]. (STARLING, 2009, p. 36).

Nesse sentido, começamos a estabelecer a relação do sujeito com as suas ações cotidianas
e a forma como este se porta distraidamente na cidade. A abordagem sobre o conceito de
vida cotidiana, como pontua Velloso (2010), estabelece a abordagem de um espaço amplo e
irregular, contudo, essencial, pois é justamente isso que permite a profusão das diferenças e
singularidades que o uso dos espaços denotam.

Para o objeto da relação entre determinadas estratégias cotidianas de uso da arquitetura em


âmbito urbano, que acaba por gerar uma discussão da dupla recepção da obra arquitetônica
(meios táteis e óticos), Rita Velloso o nomeia como

‘arquitetura urbana’, a qual, em suas raízes, de signa uma particular


experiência do espaço e do tempo que está além do olhar superficial,
desenhada no modo de olhar ‘à segunda vista’ de que falava Blanchot ao
definir o cotidiano. É preciso desacelerar para perceber uma cidade em seus
humores cambiáveis, só assim se pode reparar nas árvores nuas sorvendo a
luz nas manhãs ainda geladas de um começo de primavera, nos edifícios
desabitados à margem de avenidas rápidas, parecendo ainda mais desolados
sob o mormaço do verão, ou nas ruas se enchendo de gente e promessas
com o nascer do dia. É quando a cidade dá-se como acontecimento, pondo
em curso uma descrição fenomênica da vida urbana, que pressupõe
encontros, confronto das diferenças, conhecimentos e reconhecimentos
recíprocos. (VELLOSO, 2010, p. 141).

É por meio dessa relação estabelecida entre o sujeito e a “arquitetura urbana”, ou ainda
paisagem urbana, que se cria espaço também para a apropriação imaginária dos espaços
da cidade, reforçando a vida do indivíduo nessa dinâmica urbana. A vivência estética que a

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cidade proporciona aparece junto com a presença do sujeito na mesma. “Mesmo se ele [o
sujeito] se quer como puro olhar, ele não é insensível às solicitações que lhe vêm das coisas
e de seu próprio corpo misturado com elas” (DUFRENNE, apud STARLING, 2010, p. 38).

O mundo que surge, a partir dessa experiência, é da ordem do corpo do sujeito, do sensível.
“Experimentar esteticamente diz respeito a mobilizar meu corpo e minhas faculdades
mentais enquanto sou afetada pelos objetos. (...) É pelo corpo que o sentido é percebido:
ele é o peso suportado na experiência que faço das coisas.” (VELLOSO, 2010, p. 137).

Tratar da experiência estética no cotidiano da cidade é ir além da forma e estilo das noções
arquitetônicas. É necessário mergulhar, também, em todas as imperfeições e ocupações
que transcrevem a vida diária. O que se torna intrigante é justamente os restos, os vestígios
deixados por quem de fato ocupa e usufrui. Trata-se de subverter, e trazer à tona, o que foi
planejado, subverter a política vigente, e revelar as práticas sociais capazes de configurar o
próprio espaço. “Vivemos a cidade constantemente pelo seu avesso, atravessando-a e
sendo por ela atravessados” (VELLOSO, 2010, p. 142). É preciso que o corpo sinta o real da
cidade, que não haja pudores e fachadismos; que a cidade, e a experiência dela geminada,
revelem também sua errância, seu flagelo e abandono.

Ao tratar a “arquitetura urbana” como objeto da experiência estética, é importante salientar


os processos de abandono, ou a forma como esses processos são ignorados, impactam
diretamente a maneira pela qual o indivíduo percebe o ambiente no qual se insere, ou até
mesmo como esse ambiente marginalizado interfere no indivíduo. As intervenções
meramente estetizantes do espaço urbano, focadas em forma e estilo, ao não considerarem
a complexidade dinâmica da vida e políticas públicas, em sua plenitude, são fadadas ao
esvaziamento das experiências estéticas, que atingem, também, de forma direta, as
tessituras afetivas criadas entre o sujeito e os espaços da cidade.

Procurar entender a cidade a partir de seus espaços e de suas arquiteturas abandonadas é


olhar para a vida em sua plenitude, em seu momento real de acontecimento, sem véus, sem
tratamentos. É expor as imperfeições de todo o sistema e também as nossas. É tratar das
ocupações e das subversões da política e da lei. “Trata-se de compreender a cidade pelo
avesso do que foi desenhado pelo urbanismo moderno, descrevendo-a através das práticas
sociais que se revelam sob as superfícies de concreto, asfalto, vidro e aço” (VELLOSO,
2010, p. 142). Segundo Eduardo Rocha:

Nós, arquitetos, nunca olhamos para abandonos, existe uma zona cinzenta
que nos faz cegar, ou olhamos para trás, para o passado e analisamos os
acontecimentos desde um ponto de vista histórico cronológico, ou olhamos
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adiante a partir dos processos de revitalização e restauro dos edifícios e
lugares, mas nunca para esse tempo hoje, para aquilo que está ali a nossa
frente. Ao contrário, nessa zona cinza e abandonada subsiste passado e
futuro. (ROCHA, 2010, p. 32).

Refletir sobre uma arquitetura que permanece fora da lógica mercadológica de consumo e
conforto e que assim, talvez, possa atender às estratégias de apropriação espacial, que
sejam de fato algo com a qual a comunidade consiga compartilhar, que escancarem no
cotidiano a obra inacabada, “a atividade criadora inerente a ele, [em que] há fissuras, mas
não princípios; descontinuidades, mas não fins. Intervalos, mas sem atos nem
acontecimentos propriamente ditos” (LEFEBVRE, 1999, p. 143).

O chamado aqui é para as ações cotidianas, experimentadas na vida urbana, que são da
ordem da errância, do equívoco, da ambiguidade e da instabilidade. São espaços e são
corpos. Trata-se essencialmente da experiência estética dada pela mão canhota, como diria
Nuno Ramos1, pela errância, pelo equívoco, onde, através da experiência, o real se faz e
onde entendo ser a forma mais legítima de refletir sobre si e o objeto.

Um edifício é uma máquina, um abandono é uma máquina tão potente


quando um edifício habitado. Quando encontro um abandono, que produz em
mim determinados afetos – linhas de fuga. O que nos afeta, que produz em
mim dependerá do que eu o faça como parte de mim, de nós – as nossas
experiências, ideias, o que estamos lendo, as imagens que vemos, as
músicas que escutamos, tudo que chama atenção para os abandonos. Todos
os parasitas que transitam e chamam a atenção para as arquiteturas do
abandono. Parte desta bagagem é pessoal. Talvez me lembre à construção
de um lugar. Então o abandono pode produzir em mim poderosos afetos
como parte de minha resposta real – algo que possa acelerar o meu pulso,
quase hipertensivo – poderia ser uma resposta esmagadora, algo que se
explique por minhas preocupações, mas não é só isso. Tudo é mais amplo.
(ROCHA, 2010, p. 387-388).

Através da “arquitetura urbana”2 abandonada, a experiência estética pode estar relacionada


à diversas situações e reações do indivíduo, tais como, angústia, tristeza, ou até mesmo,
liberdade, amor etc. Pela experiência dada pelo viés do abandono o indivíduo se torna
menos susceptível à ordem biopolítica3 já pré-estabelecida.

1 Ver Ramos, 2008, p. 111-124.


2 Ver Velloso, 2010, p. 139-147.
3 O termo biopolítica começa a ser cunhado por Foucault para designar a forma na qual o poder tende a se

modificar no final do século XIX e início do século XX. As práticas disciplinares utilizadas antes visavam governar
o indivíduo. A biopolítica tem como alvo o conjunto dos indivíduos, a sociedade. Configura-se como a prática de
biopoderes locais. No biopoder, a sociedade é tanto passiva como também instrumento em uma relação de
poder. Dessa forma, os instrumentos que o governo utiliza para obter o atendimento às necessidades e desejos
da população são, essencialmente, a própria população sobre a qual ele age. Em um desdobramento disso,
Peter Pál Pelbart (2007) elabora conceituações acerca da relação entre poder e vida, entre biopoder e vida. Para
ele, a relação entre poder e vida segue, sobretudo, em duas direções principais que caracterizam a sociedade
contemporânea: a primeira, o poder penetrou todas as esferas da existência, e as mobilizou completamente,
colocando-as para trabalhar e, a segunda, aquilo que parece sob controle, isto é, a vida, revela, no próprio
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Edificações e/ou lugares abandonados exercem grande poder imagético no contexto das
cidades e, podem também atuar como catalizador do esvaziamento e degradação de uma
determinada região. Para Eduardo Rocha:

Os abandonos ejetados, sejam eles arquiteturas ou não, acabam por formar


uma série de expulsões, seja pela vontade de esconder o que “não presta”
longe dos nossos olhos ou pela simples implosão, a morte. Dessa forma,
nossa olhar vê as casa dos ricos impecáveis, limpas de qualquer resíduo ou
resto. E as casas dos pobres como lugares do abandono, da sujeira. Vazios,
cheios de nossos resíduos. Nada é vazio, nada é inútil, nem esconderijos são
desocupados. Tudo é usado. (ROCHA, 2010, p.47).

A experiência estética na cidade pelo abandono acontece também no indivíduo pela


sensação de estranhamento. Um edifício, um resto, que marca um espaço urbano com sua
presença, causa também indignação, ou surpresa, quando algo se instaura ali e faz com
que essa edificação desperte interesse no sujeito. É perceptível, no entanto, que onde o
abandono já se instaurou é necessária uma ação externa para que haja novamente
comunicação entre este objeto e o sujeito.

Sendo assim, uma arquitetura do abandono pode conter, inclusive, uma ruptura com a
ordem biopolítica-social vigente, provocando um deslocamento no indivíduo, que Eisenman
(apud Eduardo Rocha, 2010, p. 70-71) categorizou em quatro aspectos: intuição de gosto,
onde me aproximo do edifício abandonado, por curiosidade, ou me afasto, por medo;
duplicidade, onde impele o sujeito pela estrutura e ornamento do edifício, reafirmando o
primeiro aspecto; condição de “estar entre”, onde aparece uma nova sugestão de objeto,
tratando a arquitetura do abandono como uma imagem enfraquecida na cidade;
interioridade, onde se sugere a negação do recinto ou lugar tradicional. Assim,

podemos vislumbrar (...) uma mudança no pensamento da arquitetura, que


nos leva a pensar num abandono muito mais amplo, incontrolável. Nem
arquiteto, nem usuário pode controlar uma arquitetura do abandono. Também
um edifício abandonado nem sempre precisa ser feio, disforme ruinoso.
(ROCHA, 2010, p. 71).

A complexa dinâmica das grandes cidades bombardeia o indivíduo com a simultaneidade


dos acontecimentos, a cidade e suas singularidades tornam-se opacas dentro da vida
cotidiana. Dessa forma, atentar-se para uma arquitetura abandonada tornar-se algo que
foge à rotina, requer tempo, dedicação, subversão de uma ordem de poder vigente e já
assimilada. “Quando olhamos para as arquiteturas dos abandonos o roteiro da cidade se
altera, muda o ângulo de visão e novos atores se descortinam aos olhos do espectador,

processo de expropriação, sua potência indomável. Assim, o poder sobre a vida e as potências da vida são
como o avesso um do outro.
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mesmo que momentaneamente, tirando-os do automatismo cotidiano, arquitetura, sujeito e
pensamento” (ROCHA, 2010, p. 79).

Ainda de acordo com Eduardo Rocha (2010), as cidades podem ser pensadas a partir de
seus vazios abandonados, pois quase toda a cidade tem seus vazios, os quais são espaços
que contrastam com a grandiosidade das construções, as quais nos remetem a outras
percepções que não aquelas das telas cheias de imagens e do consumo. Os vazios, ou
lacunas, nas cidades, lembram sua dimensão transitória, advertindo que foram construídas
e não são habitadas. Vazios urbanos têm a propriedade de nos remeter ao homem, ao outro
que habita a cidade. Para Nuno Ramos:

(...) há talvez em cada construção vazia um fundo solene, intocado,


esperando desvelamento, alguma coisa para sempre adiada. Por isso não
deviam ser inauguradas nunca, ou ainda: seria preciso inaugurá-las
precisamente para que ficassem vazias, com cerimônia de cortar a fita,
orquestra sinfônica, fotógrafos de colunas sociais, prefeito, secretário de
cultura, artistas, mas todos do lado de fora, olhando de longe um espaço que
não os receberia. Isso talvez desse à arquitetura alguma coisa
verdadeiramente sua, inútil e despropositada, uma ambientação de paredes
para paredes, aparentemente tão desumana quanto cheia de significado para
os homens. E quando criticassem o investimento, o despropósito do gasto
público, responderíamos com o silêncio do próprio prédio, até que todos
entendessem. (RAMOS, 2008, 160-161).

Evocando a tríade de Mikel Duffrenne (2004) para a experiência estética: presença,


representação e sentimento, entendemos que prédios e construções abandonadas, muitas
vezes, desaparecem em meio à dinâmica da cidade. “Cada cidadão faz associações com
alguma parte da cidade. E cada imagem está repleta de memórias e significados” (LYNCH
apud ROCHA, 2010, p. 131), portanto, cada experiência é única, mesmo que o objeto seja o
mesmo.

Eduardo Rocha (2010) chama a atenção para o fato de que o primeiro contato com uma
arquitetura do abandono é delicada, por duas razões: a primeira está ligada a atitude afetiva
frente ao edifício, a qual pode ser bastante profunda e romântica, e a segunda se refere à
diversidade de expressão das arquiteturas do abandono. Ressalta-se que uma arquitetura
do abandono é vulnerável, está ali hoje, mas amanhã poderá sucumbir, ou não estar mais,
ou abandonar-se mais ainda.

Há ainda, de grosso modo, dois tipos de arquiteturas do abandono, que interferem


diretamente na interface do indivíduo com a mesma e na sua forma de experiência:

As arquiteturas do abandono que nitidamente, imageticamente, apresentam-


se como abandonos. Logo de início e sem dificuldades esses edifícios nos
contam seus abandonos, sus necessidade de amor, seu estado de
insegurança, suas angustias. Tem seus sintomas aparentes, como
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rachaduras, lixo, infiltrações, falta de elementos, devassidão. E as
arquiteturas do abandono que não tem aparência de abandono. Esses
abandonos são bem mais complicados, porque não aparentam estarem
abandonados, muitas vezes, apenas estão fechados, mas visivelmente estão
intactos. Arquiteturas que ainda defendem-se, enganam por sua aparência.
(ROCHA, 2010, p. 140).

O espaço do abandono é um lugar onde tudo se escapa, se descontrola, onde as mais ricas
sensações podem emergir. É aí também que mora a singularidade da experiência do
indivíduo, que pode inclusive nunca restar igual, mesmo diante do objeto antes já
vivenciado. As cidades “são imensas máquinas produtoras de subjetividade individual e
coletiva” (GUATARRI, 2000, p. 172).

A vida cotidiana apresenta características de acordo com o indivíduo e seu grupo social,
dessa forma também isso será determinante na sua leitura de mundo e na sua experiência
com os espaços e arquiteturas do abandono. Dessa maneira, a prática cotidiana possui um
especial valor para subverter as formas padronizadas de viver, as quais são impostas pelo
poder dominante, que podem sofrer significativos impactos quando confrontados com
práticas sócias advindas de uma experiência estética não usual como a do abandono.

“Prédios vazios podem ser chamados de orgânicos, pois tudo funciona numa uniformidade
em fluxo, dobrada sobre si mesma” (RAMOS, 2008, p. 159). Endossando Nuno Ramos,
Eduardo Rocha (2010) considera que tudo o que passa sobre um corpo é sempre fluxo.
Uma pessoa abandonada, uma edificação abandonada, qualquer espaço abandonado é
sempre um corte no fluxo. Um abandono é uma chegada e uma partida para a produção e
intersecção de variados fluxos. Dessa maneira:

É preciso tomar a vida cotidiana de modo a transpor suas hierarquias e


formas de controle, e, assim, avançar através da opacidade. Se cada
momento da experiência de um lugar arquitetônico resultar em apreensões
diversas, articuladas entre si, seja pela reversão ou confirmação das
expectativas, a recepção desses lugares no mundo da vida pode se tornar
fértil e não somente repetitiva (VELLOSO, 2010, p. 144).

Tem-se assim, através da estética do abandono, do impacto diante de uma arquitetura em


estado de descuido, não somente o resgate de uma experiência singular, mas também um
tangenciamento com algo primário da dor há muito historicamente soterrado, um chamado a
rememorar essa condição de corpo afetado e, mais adiante, de um estranhamento que pode
levar inclusive a um confronto acerca das estruturas vigentes e operantes na vida do sujeito,
seja da ordem pessoal ou biopolítica.

A destruição e a criação estão sempre conectadas. Nas cidades, grande parte das novas
obras são desenvolvidas após um estado de abandono, em que haja demolição ou

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sobreposição da estrutura instaurada ali anteriormente. Contudo, diante de uma arquitetura
ou espaço urbano legitimados como representativos de um determinado valor cultural,
mesmo estando em estado de abandono, sua demolição não é uma ação diretamente
viável, restando assim, ações de sobreposição, que recuperem a visibilidade deste objeto. É
importante aqui ressaltar que, tal recuperação deve se dar, também, de forma a promover
novos usos para a edificação, assegurando sua estabilidade estrutural, sem,
necessariamente, inferir que esta arquitetura deva passar por um processo de completo
restauro, muitas vezes inviáveis devido ao elevado custo econômico.

O prazer do objeto partido é o segredo de um amor pela impossível


reconstituição? Muitos objetos e locais permanecem em ruínas, abandonados
a natureza ou ao seu destino de resíduos. Eles se arruinaram a força de
funcionar e se decompõe ao sabor do tempo, vítimas, aparentemente, do
arbitrário das escolhas da conservação. (JEUDY apud ROCHA, 2010, p. 101-
102).

O abandono dado na esfera dos bens culturais possibilita convivências singulares, sob as
quais os laços afetivos, mais que se produzem no momento do contato, eles se libertam.
Dessa forma, há toda uma atmosfera de sensibilidade que entrelaça a relação do sujeito
com o objeto.

Toda essa relação do sujeito com o objeto está sobreposta também à forma como o
indivíduo estabelece seus processos, e também relações, com a própria cidade, com seu
modo de viver. A cidade está em constante mudança, fruto das interatividades pessoais,
propósitos de mercado, interesses políticos etc e mantém em seus marcos simbólicos e
referências, em seu patrimônio urbano, um ponto comum da memória em que seja possível
compartilhar sentido e valor.

Viver num ambiente urbano, em cidades que crescem e se transformam de


modo extremamente rápido, onde milhões encontraram seu próprio mundo da
vida, que é radicalmente diferente das gerações que os precederam, é
trafegar entre a tradição e o horizonte posto por seus novos habitats, suas
novas situações. (VELLOSO, 2010, p. 146).

O patrimônio cultural urbano, para além do objeto autônomo, trata-se do contexto ao qual o
patrimônio material está inserido, como parte de uma doutrina da urbanização. Segundo
Choay (2006), uma cidade histórica constitui em si um monumento, mas ao mesmo tempo é
um tecido vivo. Dessa forma, ao se pensar em conjunto histórico urbano, deve-se entendê-lo
como parte do presente, como agente ativo das transformações contemporâneas.

Pensando no estado de arruinamento em que se encontra o patrimônio cultural urbano,


especialmente aqueles em reponsabilidade da esfera pública, pode-se considerá-los como o
recorte legítimo para a experiência do sujeito contemporâneo, que possibilite uma volta para
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si e que estabeleça conexões que o confrontem sobre a atual perspectiva desde indivíduo
do esvaziamento, do consumo e do modos operandi ditado pela lógica do poder instaurado.

Dessa forma, de acordo com Choay (2006), todo fragmento urbano antigo deve ser
integrado em um plano diretor local, regional e territorial, de forma a assegurar ao mesmo
que tenha espaço dentro do caráter técnico e social da produção contemporânea; o
patrimônio deve ser pensando e reinserido em sua atual contexto urbano; e conjuntos
urbanos antigos requerem procedimentos de preservação com mínima intervenção em sua
forma e estilo, considerando que a reabilitação do edifício se dá mais a partir do interior do
mesmo até estabelecer sua relação com o entorno.

Entre o espetáculo da catástrofe e a doçura nostálgica, elas invocam os


desafios e desenlaces de uma filosofia comum. Essa extraordinária liberdade
por elas oferecida de poder repensar a história sob o prisma de uma
intersubjetividade, subverte a ordem prévia de um conhecimento histórico.
(JEUDY apud ROCHA, 2010, p. 102).

As atuais políticas patrimoniais ainda fomentam a importância dos bens patrimoniais como
instrumentos capazes de exercer o papel de um “vasto espelho no qual nós, membros das
sociedades humanas do fim do século XX, contemplaríamos a nossa própria imagem”.
(CHOAY, 2006, p. 240). E, sendo assim, elas não dão conta de abordar e contemplar uma
identidade cultural assumida de forma complexa e dinâmica na contemporaneidade,
“tenderiam a ser substituídas pela autocontemplação passiva e pelo culto de uma identidade
genérica”. (CHOAY, 2006, p. 241).

Sendo assim, tendo a considerar o estado de abandono dos bens culturais como um ponto
da experiência estética possível, capaz de provocar não somente o estado político atual das
questões patrimoniais, mas também o estado letárgico do próprio sujeito. Pensar o elemento
arquitetônico, seja ele a edificação ou o espaço urbano, que está de forma inquietante
implantado no cotidiano é experienciar a cidade para mais além de sua forma e estilo, é
compreendê-la também por sua errância, é a possibilidade de nos permitimos ser
subversivos para além dos poderes de controle instaurados sobre nossas vidas.

Agora imagine, depois de tanto tempo fechado [o prédio vazio], a pureza de


cada metro em seu interior, como um pórtico do sono, um museu do
esquecimento. Ali é que seriam veladas, sem que ninguém soubesse, as
mortes inúteis, o verdadeiro soldado desconhecido, sujo túmulo outro túmulo
engoliu, e ainda o pobre diabo que poderia ter sido o que não foi. Ali é que
secaria a ferida de cada desvalido e seriam refeitos, um a um, cada escolha
equivocada e cada desastre imerecido. Ali, entre as quinas brancas de
paredes antigas, de que ninguém mais lembra, iluminadas de cima (são altas,
e unem-se em ângulos agudos), ali um pouco da derrisão faria sentido, e
cada faminto, aleijão, imbecil, teria seu nome e história grafados na camada
espessa de poeira acumulada. (RAMOS, 2008, p.162-163).

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Pensando também nesse poder, instaurado e de controle invisível de nossas vidas, em sua
forma molecular que incide sobre nossa maneira de pensar, sentir, perceber, criar, amar,
reagir, que se instaura como, segundo Pelbart (2013), o rebaixamento global da existência,
de depreciação da vida, sua redução à sobrevida, que é o último estágio do niilismo
contemporâneo, faz-se importante discutir a retomada do corpo do indivíduo naquilo que lhe
é mais próprio – sua condição de corpo afetado pelo mundo, pela experiência cotidiana, pelo
estranhamento, pela estética do abandono. Discussão que confronte, inclusive, o atual
posicionamento da sociedade, justamente passando pela estética do abandono, aqui,
especificamente, patrimonial.

Ao poder sobre a vida institui-se também de forma contrária a potência da vida, uma saída
para que de forma legítima a vida se sobressaia sobre a morte. “Seria esta a dimensão
ético-estética que atravessa todos os campos da existência?” (PELBART, 2003, p. 134).

A experiência estética nas cidades que se vivencia, seja ela qual for, deve ser levada a cabo
como momento único e oportuno para que afetos sejam estabelecidos, para que haja real
troca entre os espaços arquitetônicos e os indivíduos.

Não se pode, portanto, dizer que a experiência, seja qual for o momento da
história, tenha sido “destruída”. Ao contrário, faz-se necessário – e pouco
importa a potência do reino e de sua glória, pouco importa a eficácia universal
da ‘sociedade do espetáculo’ –, afirmar que a experiência é indestrutível,
mesmo que se encontre reduzida às sobrevivências e às clandestinidades de
simples lampejos na noite. (DIDI-HUBERMAN, 2011, p. 148).

Por uma estética do abandono, por um retorno do indivíduo naquilo que lhe é mais próprio,
sua condição primeira de corpo que se deixa afetar pelo mundo, especialmente pelo
estranhamento, tem-se também uma retomada da própria arquitetura ao seu lugar,
destituído de forma e impactante em ações sofridas pelo contexto que o guarda.

Ainda sobre esse possível lugar da arquitetura, destituído de uma institucionalização que
tende a ser legitimada pelo poder, a derrelição na arquitetura vem como uma “cratera
monumental na vida” (RAMOS, 2008, p. 171), aparece ainda como um momento em que a
própria edificação volta-se para si mesma, independente de qualquer funcionalidade ou
forma.

Mas é então que alguma coisa escondida na verdadeira arquitetura pode


mostrar sua face, (...) porque o prédio de lajes inúteis, de carpetes mofados,
de alumínio oxidado, cheio de infiltrações, o prédio de salas sem luz onde
nossos pés ficam frios, voltado para o lado errado do poente, já terá cavado
sua pergunta, sua irredutível inadequação (...) (RAMOS, 2008, p.170-171).

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É importante destacar que, mesmo nessas arquiteturas em estado de abandono existe algo
ainda que permanece como núcleo rígido ali, duradouro, que foi instaurado na própria
arquitetura. É da ordem da resistência e também da sobrevivência. Olhar para essas
arquiteturas, é passar pela experiência de se manter em estado de latência, de potência.

Temos todos o direito ao ilegível, o “espelho patrimonial4, travessia dada também corpo a
corpo – corpo do sujeito com o corpo patrimonial – instaurada pelo caminho do abandonado,
escancara nossos vazios individuais, os vazios projetuais e também políticos. É por assim
dizer, a experiência estética máxima a ser percebida nas cidades.

Mesmo que a maré da utilidade coíba sempre esse desejo de desperdício e


de perda de função, é preciso, no entanto, confessar que em inúmeros
lugares essas edificações despropositadas já foram inauguradas, sob a vista
e o conhecimento de todos. Espalham-se, na verdade, por todas as grandes
cidades do mundo: ilhas no centro de estradas de muitas pistas, lajes de
obras públicas abandonadas, degraus de arquibancadas vistos de baixo,
pedágios fechados, carrocerias sem carga, repartições aos domingos, caixas
eletrônicas quebradas, pontes sem acesso a pedestres, áreas em torno de
pistas de decolagem, salas de espera de modo geral, cinemas com a luz
acesa, escadas rolantes paradas, quartos de hotel assim que saímos deles,
pilares de viadutos e de pontes, maca de onde se levantou um doente, o topo
de torres de alta tensão ou de celular, são todos troféus da ausência
completa (...). Nestes locais a noção de espaço público não cabe mais, mas a
de aconchego, de proteção ainda não chegou. (RAMOS, 2008, p. 169-170).

Pela experiência estética do abandono há um caminho no qual o percurso se torna


construção. Passar pelo arruinamento é ainda possibilitar que algo renasça, mesmo que de
forma frágil, há algo nessa experiência que fica para sempre instaurado, resistente, que
permanece para o estranhamento e o confronto, para o questionamento. É a comunidade
possível advinda da instauração de uma casa-ruína, que recupera um espaço subjetivo e de
inscrição.

Para melhor entendimento e aplicabilidade das ideias anteriormente discutidas neste artigo,
toma-se como estudo de caso a nova apropriação pela qual estão passando as edificações
da rua Sapucaí, no bairro Floresta, em Belo Horizonte, situada entre dois Conjuntos
Urbanos tombados: “Conjunto Urbano da av. Assis Chateaubriand e adjacências”, tombado
à nível municipal em 1998 e “Conjunto Urbano da Praça Rui Barbosa (Praça da Estação),
tombado à nível estadual e municipal em 1998, que, após logo tempo em esquecimento pela
população belorizontina é hoje referência de cultura e lazer.

Por mais de 20 anos as edificações da rua Sapucaí estiveram abandonadas e fechadas


para uso, o que vem sendo gradualmente modificado com a retomada do uso dessas

4 Ver mais em “O espelho do patrimônio”, em Choay (2006, p. 240-247).


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edificações num processo recente, com menos de 10 anos. Através de ações de
micropolítica de alguns coletivos da cidade, várias intervenções urbanas foram ocorrendo,
primeiro na própria rua, chamando atenção para a paisagem urbana, (especialmente pela
localização da rua, que está logo acima da Praça da Estação) com ações de ocupação e
lazer temporárias, blocos de carnaval etc e, posteriormente, as edificações foram ganhando
novos usos comerciais e de serviços, como restaurantes, bares, escritórios e locais de
entretenimento com exibição de filmes, workshops de qualificação profissional etc, sem que
as edificações tenham recebido projetos de ‘Retrofit’5, mantendo assim a experiência
estética de um espaço que estava em abandono e possibilita, agora, novas
experimentações.

A Benfeitoria – um dos espaços reapropriados na rua Sapucaí. Fonte: facebook.com/abenfeitoria

Por meio do percurso da rua Sapucaí, ou mesmo ao adentrarmos uma das edificações em
estado regular de conservação, é possível vivenciar uma experiência única de estado de
afetação, seja calorosa ou de repúdio, contudo, independente da aclamação ou repúdio,
afetação ainda em estado de latência. A partir desse momento o indivíduo permanece
sensibilizado a perceber e receber as experiências advindas da cidade, capaz inclusive de
estabelecer uma ruptura ou criar laços ainda mais fortes politicamente com esta, de iniciar
assim um real vínculo com o espaço no qual estabelece suas práticas afetivas.

5 Reformar, customizar, adaptar e melhorar os equipamentos, conforto e possibilidades de uso de um antigo


edifício. Mas porque reformar ao invés de fazer um prédio novo? Bem, há várias coisas a serem consideradas.
Disponível em <http://www.forumdaconstrucao.com.br/conteudo.php?a=22&Cod=60>, acessado em 24/03/2016.

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Visadas da paisagem urbana de Belo Horizonte, a partir da rua Sapucaí. Fonte: Imagens da autora.

Referências
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IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
INVENTÁRIOS ARQUITETÔNICOS NO RIO GRANDE DO SUL:
do poder público ao poder do público

MEIRA, Ana Lúcia G. (1); NEUTZLING, Simone R. (2)

1. Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Curso de Arquitetura e Urbanismo.


Av. Unisinos, 950
algmeira@gmail.com

2. Universidade Federal de Pelotas. Programa de Pós-Graduação em


Memória Social e Patrimônio Cultural
Rua Lobo da Costa, 1877
simoneneutzling@gmail.com

RESUMO
No campo do patrimônio cultural, o inventário é considerado, em geral, como um mapeamento com
registro de informações técnicas que constituem um acervo básico para as políticas de preservação.
No Rio Grande do Sul, os projetos institucionais de inventários do patrimônio cultural foram
desenvolvidos principalmente pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e
pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE). Contudo, não há uma avaliação
crítica dessa trajetória. A pesquisa aqui apresentada teve por objetivo buscar entender os momentos
de inflexão das políticas públicas em relação ao tema dos inventários, os quais são fruto de seleções
e de escolhas dos seus executores – geralmente técnicos. Essa constatação levou à formulação de
algumas perguntas: Que olhares devem participar das escolhas sobre os bens que compõem a nossa
herança cultural? Quem tem legitimidade para escolher os bens que devem ser destacados do
cotidiano, passando a se constituir em patrimônio e por isso, serem passíveis de inventariação? E a
partir da atribuição de quais valores? Atualmente, os inventários têm papel relevante nas políticas de
preservação, constituindo-se, inclusive, em requisito para a documentação dos tombamentos de
áreas urbanas em nível nacional. Esta relevância justifica a busca pelo entendimento da trajetória e
dos diferentes enfoques adotados com a finalidade de aprimorar a aplicação desse instrumento. A
análise dos inventários realizados no RS, a partir de listagem fornecida pelo IPHAE, assim como da
pesquisa nos arquivos e na biblioteca do IPHAN-RS, permitem verificar que, nos últimos anos, houve
uma diversificação dos métodos adotados. Entretanto, o aspecto mais relevante foi a ampliação dos
olhares sobre o patrimônio, incluindo a participação da população na atribuição de valores a bens
edificados que foram reconhecidos em inventários participativos.
Palavras-chave: Inventário; patrimônio arquitetônico; políticas públicas de preservação; sociedade
civil.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Apresentação

No campo do patrimônio cultural, inventário é entendido como o registro de informações


técnicas que constituem um mapeamento de conhecimentos básicos, os quais subsidiam as
políticas de preservação. Etimologicamente, deriva do latim inventarium, que significa
elencar, relacionar. Em relação ao patrimônio cultural material, pode ser definido como um
“estudo que vise conhecer o universo de bens culturais de determinada região (...) ou
relacionados com determinado tema (...), que identifique e cadastre as ocorrências materiais
ainda existentes...” (IPHAN, 2017a). De modo geral, é reconhecida a importância e a
necessidade desse instrumento de reconhecimento que serve de ponto de partida para
políticas públicas de preservação do patrimônio. Contudo, os inventários não são isentos,
imparciais, neutros. São fruto de escolhas e de seleções feitas a partir dos seus
realizadores.

A comunicação aqui apresentada versa sobre uma pesquisa que teve por objetivo entender
os momentos de inflexão das políticas públicas em relação ao tema dos inventários, os
quais são fruto de seleções e de escolhas dos seus executores – geralmente técnicos, como
foi referido acima. Essa constatação levou à formulação de algumas perguntas: Que olhares
devem participar das escolhas sobre os bens que compõem a nossa herança cultural?
Quem tem legitimidade para escolher os bens que devem ser destacados do cotidiano,
passando a se constituir em patrimônio e por isso, serem passíveis de inventariação? E a
partir da atribuição de que tipo de valores? Atualmente, os inventários assumiram relevância
nas políticas de preservação, inclusive se constituindo em requisito para a documentação
dos tombamentos de áreas urbanas em nível nacional, conforme já ocorreu no Rio Grande
do Sul. Essa relevância justifica a busca pelo entendimento da trajetória e dos diferentes
enfoques adotados com a finalidade de aprimorar a aplicação desse instrumento.

Breve trajetória no Brasil

No Brasil, é do conhecimento geral as iniciativas que remontam à década de 1920,


relevantes no sentido de documentar elementos que revelassem a brasilidade de um país
cuja nacionalidade estava em construção. Mário de Andrade, juntamente com outros
pesquisadores promoveram viagens ao interior do país em busca de canções, danças e
costumes populares, nos legando, assim, importante documentação etnográfica. Também
arquitetos documentaram a arquitetura tradicional brasileira com a finalidade de produzir
registros que pudessem servir ao desenvolvimento dos seus projetos neocoloniais. Em
1924, Lucio Costa fez uma famosa viagem a Minas Gerais, cuja simplicidade da arquitetura

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tradicional lhe despertou atenção. Simplicidade que nortearia seu posterior interesse pela
arquitetura moderna. Não se tratava, porém, de registros organizados como nos inventários
da atualidade. (SLADE, 2002). Sylvio de Vasconcellos, professor na Faculdade de
Arquitetura da UFMG foi a campo e realizou um inventário da cidade de Ouro Preto –
Monumento Nacional desde 1933.

Rodrigo Melo Franco de Andrade, o primeiro diretor do IPHAN, discorrendo sobre os


trabalhos da recém-criada Instituição, destacava que: “[...] serão necessários muitos anos de
esforço esclarecido e paciente para inventariar as coisas desse gênero cuja preservação se
imponha no interesse da nossa coletividade.” (ANDRADE, 1987, p. 52). Essa declaração do
Dr. Rodrigo, bem como as manifestações de Lucio Costa sobre a necessidade de um
inventário sistemático (PESSÔA, 1999) destacam a importância da realização de
levantamentos desde o começo da institucionalização das práticas de preservação no Brasil.
Até meados da década de 1960, foram valorizados imóveis, sítios e objetos por suas
qualidades arquitetônicas e artísticas e pela vinculação a fatos memoráveis da história
(MOTTA, 2016).

No início da década de 1970, as Reuniões dos Governadores em Brasília e Salvador,


visando ao compartilhamento das ações de preservação entre a União, os estados e os
municípios incentivaram as ações regionais e influenciaram diretamente as políticas públicas
de preservação na capital Porto Alegre. Nessa década, houve o desenvolvimento de
importantes inventários regionais, como o Inventário de Proteção do Acervo Cultural do
Governo do Estado da Bahia – IPAC/BA, que se tornou referencial, os inventários da
Fundação para o Desenvolvimento da Região Metropolitana do Recife - FIDEM e do
Instituto Estadual do Patrimônio Cultural – Inepac/Rio de Janeiro.

A partir dos anos 1960 passaram a ser adotadas novas concepções de patrimônio que
refletiram diretamente no texto da Constituição Federal de 1988 que, no Art. 216,
estabeleceu que o poder público, com a colaboração da comunidade, deve promover e
proteger o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância,
tombamento e desapropriação, entre outras formas de acautelamento e preservação. Sabe-
se que a referência ao inventário não é autoaplicável e, portanto, depende da
regulamentação nos diferentes âmbitos de governo. Essa referência possivelmente
incentivou o desenvolvimento de um planejamento institucional para os inventários no
IPHAN e a criação da Diretoria de Identificação e Documentação – DID nos anos 1990. Com
o tempo, houve um esforço no sentido de promover a sistematização dos bens culturais
materiais por meio de inventários por categorias: bens móveis, bens imóveis, configuração
dos espaços urbanos (INCEU), de artilharia militar, dentre outros.
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Quase dez anos após a referência aos inventários na Constituição Federal, em 1995, no
Encontro de Inventários de Conhecimento do IPHAN, foram definidos os inventários de
Conhecimento como "trabalhos de pesquisa que buscam a identificação e o registro de
novos valores a preservar, através de levantamentos sistemáticos baseados na coleta de
múltiplas informações em campo." (MOTTA; SILVA, 1998, p. 7).

Trajetória no RS

No estado, os projetos institucionais de inventários do patrimônio cultural, que apesar da


denominação abrangente restringiram-se aos bens arquitetônicos, foram desenvolvidos
principalmente pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e pelo
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE). Contudo, não há uma
avaliação crítica dessa trajetória. A análise dos temas e dos métodos dos inventários
realizados no RS, a partir da listagem fornecida pelo IPHAE/RS, assim como da pesquisa
nos arquivos e na biblioteca do IPHAN/RS, permite verificar que, nos últimos anos, houve
uma diversificação da metodologia empregada. Entretanto, o aspecto mais relevante foi a
ampliação dos olhares sobre o patrimônio, incluindo a participação da população.

No Estado, durante muito tempo, os inventários isolados refletiram a falta de uma política
institucional sobre o assunto. No caso de Porto Alegre, a primeira reunião de Governadores,
anteriormente mencionada, teve influência decisiva na inclusão do tema do patrimônio
arquitetônico na Lei Orgânica da Câmara Municipal de Vereadores. Esta Lei, em 1970,
determinou ao Governo Municipal a execução de uma listagem dos bens imóveis de valor
histórico e cultural para a cidade, que foi finalizada no ano seguinte e revisada
posteriormente. No final dos anos 1970, foi instituído o Programa de Reavaliação do Plano
Diretor – PROPLAN que realizou nova revisão e listou dezenas de novas edificações com
vistas à sua incorporação no Plano Diretor – PDDU (MEIRA, 2001). A equipe de arquitetos
responsável pelo levantamento foi coordenada pelo também arquiteto Júlio N. B. de Curtis,
diretor do IPHAN regional de 1978 a 1987 (MEIRA, 2008).

Nesta mesma época, a Universidade de Caxias do Sul iniciou “modestamente” (RIBEIRO;


POZENATO, 2004, p. 16) a implantação do Projeto ECIRS – Elementos Culturais das
Antigas Colônias Italianas no Nordeste do RS, um dos mais importantes inventários
desenvolvidos no Estado. Além do patrimônio edificado nas antigas colônias, foram
registradas músicas, danças, dialetos, modos de fazer, gastronomia e outras manifestações,
em uma iniciativa de abrangência pioneira.

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Seguiram-se, a partir daí, registros com grande diversidade de métodos e sem explicitação
de conceitos, geralmente a partir de inventários temáticos: áreas de imigração alemã e
italiana no RS (IPHAN e Governo do RS), estatuária missioneira (IPHAN), estudos sobre o
Caminho das Tropas (IPHAN), inventário da região de Santa Maria (Instituto de Preservação
da Memória Cultural - IPREMEC da Universidade Federal de Santa Maria), entre outros.
Em 1986, foi elaborado um projeto piloto de inventariação dos bens culturais denominado,
inicialmente, de Projeto Caçapava, com fichas de campo que registraram os bens culturais
imóveis, urbanos e rurais, daquele município. A partir desse projeto, capitaneado pelo
governo estadual, através da Secretaria de Cultura, surgiu o atual Inventário dos bens
culturais do RS. (MOTTA; SILVA, 1998). O "Projeto Ecclesia", destinado a inventariar os
bens religiosos do estado, somou-se ao de Caçapava para estabelecer o desenvolvimento
do inventário dos bens culturais do Rio Grande do Sul, por meio de uma parceria entre
IPHAN e IPHAE, mas com um conceito de patrimônio cultural restrito ao arquitetônico.

No final do século XX, intensificaram-se os inventários do patrimônio edificado, com


destaque para o inventário realizado pela EPAHC em Porto Alegre, abrangendo, pouco a
pouco, os diversos bairros da cidade. No começo dos anos 2000, o IPHAE desenvolveu o
Inventário do Patrimônio Ferroviário do Rio Grande do Sul: estações férreas 1874 – 1959. A
partir dele, foram realizados vários tombamentos de espaços ferroviários e habitações de
trabalhadores. Trata-se de um exemplo em que o inventário foi desenvolvido com o fim de
proteger os bens mais relevantes e que corriam risco de desaparecimento. No caso, aqueles
representativos da extinta RFFSA, inclusive para responder a demandas de tombamentos
por parte dos municípios. Posteriormente o IPHAN-RS ampliou o inventário, coerente com o
esforço nacional de preservar os bens ferroviários mais representativos.

Algumas universidades, pesquisadores autônimos e prefeituras, com destaque para os


municípios pertencentes à 4ª Colônia Italiana, também realizaram projetos de inventário. A
Universidade de Caxias do Sul desenvolveu o inventário da Arquitetura Modernista na Serra
Gaúcha. Também na Serra Gaúcha, na cidade de Antônio Prado, iniciou-se a aplicação dos
INCEU - Inventário Nacional de Configuração Urbana do IPHAN, introduzindo a percepção
dos usuários dos centros históricos como um olhar privilegiado.

A partir da análise da listagem de inventários finalizados e em andamento no RS (IPHAE,


2017), foi possível constatar que 93 dos municípios gaúchos utilizaram este instrumento
para registro, identificação e preservação de seu patrimônio cultural edificado (Figura 1).
Este número de municípios inventariados representa 19% do total de municípios do estado.
Outro dado analisado foi a relação entre os municípios que elaboraram inventários e os

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municípios que possuem bens tombados em nível estadual. Dos 93 que possuem algum tipo
de inventário, somente 59 possuem bens tombados em nível estadual. Este fato reforça o
papel do inventário como instrumento de trabalho necessário para a identificação e seleção
de bens passíveis de proteção, mas também como instrumento de gestão e preservação do
patrimônio cultural.

Fig. 1 - Mapa dos munícipios inventariados no RS

Fonte: IPHAE (2017), editado pelas autoras.

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Cabe acrescentar que, no Brasil, a primeira iniciativa legislativa sobre os inventários é a Lei
Estadual nº 10.116, de 1994, do Estado do Rio Grande do Sul, que tratou do inventário
como instrumento de preservação do patrimônio cultural e disciplinou sucintamente, mas de
forma importante, a sua abrangência nos seguintes termos:

Art. 40 - Prédios, monumentos, conjuntos urbanos, sítios de valor histórico,


artístico, arquitetônico, paisagístico, arqueológico, antropológico,
paleontológico, científico, de proteção ou preservação permanente,
portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes
grupos formadores da sociedade brasileira, não poderão, no, todo ou em
parte, ser demolidos, desfigurados ou modificados sem autorização.
§ 1º - Para identificação dos elementos a que se refere este artigo, os
municípios, com o apoio e a orientação do Estado e da União, realizarão o
inventário de seus bens culturais.
§ 2 - O plano diretor ou as diretrizes gerais de ocupação do território fixarão
a volumetria das edificações localizadas na área de vizinhança ou
ambiência dos elementos de proteção ou de preservação permanente,
visando a sua integração com o entorno.
§ 3º - O Estado realizará o inventário dos bens culturais de
interesse regional ou estadual (Miranda, 2008, p. 18).

Ampliação dos olhares na escala nacional e estadual

O texto da Constituição Federal de 1988 elencou nas práticas de preservação novos


sujeitos, objetos e referências que deveriam “estar presentes nos processos de identificação
e de atribuição de valor aos bens como patrimônio cultural”. Com esta ampliação dos
olhares sobre o patrimônio, foi necessário desenvolver novos “procedimentos e
metodologias de inventariação adequados à compreensão dos bens como detentores de
referência cultural” (MOTTA, 2016).

O IPHAN, durante os anos de 2006 e 2007 passou por um processo de revisão do sistema
de inventários do patrimônio material. Entre 2008 e 2011 houve o desenvolvimento do
Sistema Integrado de Conhecimento e Gestão do Patrimônio Material (SICG). A partir da
aplicação desta nova ferramenta houve uma diversificação dos inventários temáticos com
base em recortes regionais, étnicos, cronológicos, estéticos, entre outros. O SICG foi
utilizado em áreas urbanas em processo de tombamento como foi o caso das cidades de
Jaguarão e Bagé no Rio Grande do Sul e para subsidiar a gestão urbana municipal no caso
de São Leopoldo.

O desenvolvimento do SICG visa integrar dados sobre o patrimônio cultural material:


“cidades históricas, bens móveis e integrados, edificações, paisagens, arqueologia,
patrimônio ferroviário e outras ocorrências do patrimônio cultural brasileiro.” (IPHAN, 2017).
Através do Sistema, busca propor método unificado de documentação, inventário e cadastro
de bens culturais utilizando georreferenciamento e classificação com vistas a criar uma
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cartografia do patrimônio. O SICG foi pensado para ser, além de uma ferramenta de
documentação, um instrumento de gestão do patrimônio cultural que facilite as decisões e a
formulação de planos, projetos, normas e ações. (IPHAN, 2017). Nos sítios protegidos,
especialmente nas áreas urbanas, deve ser considerado o caráter dinâmico das cidades,
buscando a conciliação entre a preservação e as demandas e necessidades da população
atual. Nesse sentido, a Carta de Novo Hamburgo reflete sobre a necessidade do patrimônio

"[...] ser visto como um fator de desenvolvimento – humano e econômico – e


não como um entrave aos anseios dos moradores e proprietários de bens
tombados. Por isso, os estudos para normatização dos centros históricos
devem ir muito além do estabelecimento de regras, mas, a partir da
compreensão da dinâmica das cidades, propor alternativas viáveis para a
compatibilização entre preservação e desenvolvimento urbano” (Carta de
Novo Hamburgo, 2012, p.1).

Com a chegada do século XXI, o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial do IPHAN


desenvolveu o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC), instrumento utilizado
para implementação das políticas de identificação do patrimônio cultural imaterial. O INRC é
uma metodologia de pesquisa que tem por objetivo subsidiar “a identificação dos sentidos
de identidade associados a edificações, lugares, celebrações, formas de expressão e
ofícios, visando à produção de registros textuais e audiovisuais que sejam sensíveis aos
aspectos dinâmicos e contextuais das realidades consideradas” (Corsino, 2000, p.24).

Após a implementação da metodologia do INRC, dezenas de inventários de referências


culturais (referentes a práticas e valores que estão sendo constantemente produzidos e
reelaborados) foram realizados no Brasil. No RS, foram seis experiências, que iniciaram
pela abordagem de culturas tradicionalmente excluídas das políticas públicas de patrimônio:
a afrodescendente e a indígena. Os Inventários Nacionais de Referências Culturais
elaborados no RS foram os seguintes: M'Byá Guarani (Missões); Porongos (Pinheiro
Machado); Referências Culturais (Santa Tereza); Talián (Serra Gaúcha); Lidas Campeiras
(Bagé, Hulha Negra e Aceguá); Região Doceira (Pelotas); e Estudo Referente à Culinária
(Antônio Prado).

Na elaboração do inventário do patrimônio histórico artístico e cultural realizado na cidade


de São Leopoldo, com a base SICG/IPHAN, optou-se por aplicar a atribuição de valores
culturais desenvolvida pelo IPHAE. Foram estabelecidos valores de seleção aos bens
inventariados através da classificação em seis grupos de instâncias: cultural, morfológica,
funcional, técnica, paisagística e legal. Cada um destes grupos contendo classificação
pormenorizada em subitens, agrupados em temas referentes a fatos e marcos históricos;
qualidades formais; usos tradicional ou peculiar; raridade na técnica construtiva e emprego

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de materiais; relação com a paisagem urbana e incidência de legislação protetiva.
(GUTIERREZ; NEUTZLING, 2016).

O aprimoramento que vem sendo desenvolvido, em nível estadual, pelo IPHAE, em relação
aos inventários, culminou no Sistema de Rastreamento Cultural para o inventário dos bens
culturais do Estado. Trata-se de um instrumento para o levantamento de dados abrangendo
diversas esferas do patrimônio cultural. O sistema compõe-se de fichas de inventário
divididas em módulos: Bens Edificados, Bens Imateriais, Comunidades Quilombolas,
Comunidades Indígenas, Comunidades Imigrantes, Sítios Arqueológicos, Sítios
Paleontológicos e Bens Móveis e Integrados. Posteriormente foi acrescentada a ficha
referente aos Bens Móveis e Integrados - Acervos Documentais. (IPHAE, s.d.).

No âmbito nacional, atualmente, o IPHAN realiza um esforço institucional para


compatibilização do INRC ao SICG, retomando a necessária relação entre os bens materiais
e as referências culturais presentes na diversidade cultural brasileira. Além destes dois
sistemas, o Instituto também desenvolve o Inventário Nacional da Diversidade Linguística
(INDL). Segundo Lia Motta (2016) o SICG está sendo desenvolvido para absorver a
totalidade das categorias de bens culturais, incluindo os de natureza imaterial, devendo
reunir em uma base única as “informações sobre cidades históricas, bens móveis e
integrados, edificações, paisagens, arqueologia, patrimônio ferroviário, saberes,
celebrações, formas de expressão e lugares, que formam o Patrimônio Cultural do Brasil”
(IPHAN, 2015a).

A participação da comunidade

O Estado, como ator protagonista na preservação do patrimônio cultural estabelece o que


será inventariado através do seu olhar técnico. Este olhar técnico vem sendo lapidado com a
introdução de novos conceitos e critérios, o que tem resultado na ampliação daquilo que é
considerado como patrimônio (GUTIERREZ; NEUTZLING, 2016). O IPHAE, em sua
metodologia de inventário, estabeleceu um critério referente à atribuição de valores culturais
a cada um dos bens inventariados. Esta valoração cultural tem por objetivo identificar
claramente qual a importância do bem inventariado e quais razões fundamentaram sua
escolha.

Para a compreensão do patrimônio cultural, material e imaterial, em sua totalidade o


inventário precisa ser elaborado com a contribuição de duas óticas: a leitura formal e a
leitura simbólica do lugar. A leitura formal é realizada pelos técnicos enquanto a simbólica só
poderá ocorrer com a participação da comunidade. O inventário realizado somente com o
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olhar técnico não consegue perceber outros significados, valores e questões, diretamente
relacionados com o patrimônio imaterial, sem o olhar da comunidade. A Carta de Pelotas de
1978, através da afirmação de que “só se protege o que se ama, mas só se ama o que se
conhece” demostra claramente como é fundamental a participação das comunidades na
preservação do patrimônio cultural.

A consciência patrimonial, porém, não é unânime. Nem todos estão vocacionados para o
reconhecimento dos usos do passado. A chave para a proteção do patrimônio de forma
participativa pode ser o ativismo. Sem o ativismo de comunidades, tanto de leigos como de
não-leigos, torna-se mais difícil a defesa do patrimônio. Por meio do ativismo as
comunidades ressignificam o passado e configuram o presente. (McCARTHY, 2008).

O desafio é encontrar a forma de promover o ativismo e a participação da comunidade sobre


o patrimônio, uma vez que no inventário a participação da comunidade é bastante complexa.
São muito atores envolvidos, com interesses diversos. Devido à extensão territorial onde o
inventário é realizado, a comunidade é formada por vários grupos distintos: moradores,
usuários, agentes imobiliários, defensores do patrimônio.

A forma como a arqueóloga Linda Derry (2011), em sua experiência no Alabama, define
comunidade, “como um grupo de pessoas reunidas em torno de um bem comum”, pode ser
uma alternativa para o desafio do trabalho com os inúmeros atores participantes do
processo do inventário. Derry afirma que a partir do momento em que as questões se
tornam relevantes e significativas para suas vidas, as pessoas se envolvem naturalmente e
começam a se preocupar com o patrimônio que as cerca. Em 2013, Lúcio Menezes Ferreira,
em seu artigo “Essas coisas não lhes pertencem: relação entre legislação arqueológica,
cultura material e comunidades” sintetiza a relação com a comunidade:

Não é o arqueólogo que educa, unilateralmente, a comunidade, mas,


sim, é ele quem aprende com ela: no trabalho etnográfico, ele dialoga
sobre os anseios identitários da comunidade; descobre (descobrir na
dupla acepção de inventariar e inventar) a pluralidade de significados
que as comunidades atribuem aos artefatos e sítios arqueológicos. A
etnografia arqueológica, assim, tem fundamento simultaneamente
político e epistemológico. Ela provoca a pensar a diversidade cultural
como relação indestrinçável entre o presente e o passado e, ainda,
sobre as tecnologias de governo promovidas pela ativação do
patrimônio cultural. (Ferreira, 2013, p. 95).

Estas considerações utilizadas pela arqueologia também podem ser aplicadas na arquitetura
para a participação e interação com a comunidade no processo de elaboração dos
inventários do patrimônio histórico, artístico e cultural. O inventário, geralmente elaborado
por técnicos como forma de governabilidade e tecnologia de governo, necessita da

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participação da comunidade para que o patrimônio cultural seja elencado como uma “cultura
viva”, resultado dos processos de significação e apropriação deste patrimônio pelas
comunidades. O desafio que se apresenta é como trabalhar com a participação da
comunidade no caso dos inventários.

Um ponto de inflexão

Quanto à participação da comunidade nos inventários, um ponto de inflexão ocorreu quando


a Prefeitura Municipal de Viamão/RS desenvolveu o Inventário Participativo do Município.
Pela primeira vez, legitimou-se oficialmente o olhar da população sobre os bens
patrimoniais. Segundo Vitor Ortiz (2001), coordenador da pesquisa,

[...] a concepção de Inventário Participativo tem por trás de si o debate


sobre o ‘direito de decidir o que é e o que não é possível de preservação e,
portanto, merece todos os esforços do poder público para a sua valorização,
difusão e preservação’, o que evidentemente deve ser de todos, questão
esta colocada primeiramente pela Constituição Cidadã de 1988. E ainda
uma outra, consequência natural desta participação ampla, desta abertura
no direito de valorar os bens patrimoniais que é o evocamento de bens de
natureza diversas, tangíveis e intangíveis, móveis e imóveis, documentais,
memória de vidas, sítios arqueológicos, ecológicos e paisagísticos.

A diversidade dos bens inventariados em Viamão demonstra a necessidade da


diversificação dos olhares sobre o patrimônio. Bens aos quais são atribuídos sentidos pela
população e que passariam incólumes nos registros dos técnicos puderam ser registrados,
como foi o caso das singelas bicas d’água nos espaços públicos da cidade. Além disso,
houve a diversificação de temas: o inventário participativo abrangeu bens arquitetônicos
consagrados, documentos, fotos, além de memórias individuais com relevância coletiva.
(ORTIZ, 2001).

Uma interessante iniciativa da sociedade civil para participar das escolhas sobre o
patrimônio foi o projeto dos Inventários Afetivos, proposto pela OSCIP Defender – Defesa
Civil do Patrimônio Histórico, no qual os cidadãos podem inscrever aqueles bens que
consideram detentores de valores. A intenção não é substituir o olhar técnico, mas dar
visibilidade a outros olhares sobre o tema.

Considerações finais

Na trajetória das instituições de preservação do patrimônio nacional e estadual, IPHAN e


IPHAE, os inventários foram muito importantes. Não somente como ferramenta de trabalho
necessária para a identificação e seleção de bens passíveis de proteção, mas também

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como instrumento de gestão e preservação do patrimônio cultural. Os diversos tipos de
inventário adotados ou concebidos pela instituição refletem também as variadas concepções
nela presentes sobre os objetivos e os significados da proteção aos bens culturais
(THOMPSON, 2014).

As formas de elaboração dos inventários acompanharam a evolução do conceito de


patrimônio na sociedade: de uma listagem de edificações isoladas a um sistema integrado
de informações sobre uma determinada região. Ao concluir o relato desta pesquisa, que
teve por objetivo entender os momentos de inflexão das políticas públicas em relação ao
tema dos inventários no RS, foi possível perceber a ampliação e inclusão de novos olhares
sobre o patrimônio, com a participação da população atribuindo valores à bens edificados
que foram reconhecidos através de registro e valorização em inventários participativos.

A participação da comunidade, mesmo sendo praticamente uma unanimidade conforme


apresentam Scifoni (2016), Menezes (2012) e Varine (2013), precisa ser efetivamente
implementada. Torna-se claro que a complexidade do processo de elaboração do inventário
do patrimônio cultural é amenizada quando se envolve a comunidade local neste processo.
Com a participação da comunidade, se torna mais fácil interpretar a cidade e
consequentemente conservar as raízes culturais do lugar sem que haja uma ruptura entre a
visão dos técnicos e da população.

A questão que se coloca agora é: como promover a efetiva participação da comunidade na


elaboração dos inventários? A pesquisa aqui apresentada deverá ser continuada com o
objetivo de detalhar as experiências de participação da comunidade na elaboração do
inventário cultural. Através dela poderemos contribuir com a discussão a respeito da efetiva
participação da comunidade nas decisões sobre a importância e relevância do patrimônio
cultural, agindo de forma direta e efetiva no processo de construção das identidades locais,
regionais e nacionais. A intenção é tentar ampliar a metodologia dos inventários para que
estes possam trabalhar com a perspectiva de não-exclusão, privilegiando as diferenças e a
pluralidade que se apresentam na vida de cada cidade.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
MOVIMENTO “ABRACE A GARÇA” (MACEIÓ-AL): possibilidades de
ações da sociedade civil organizada na luta pela democratização da
cidade

MEDEIROS, MARINA MILITO (1); SANTOS, MAURILIO (2)


1 e 2 Universidade Federal de Alagoas. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Av. Lourival Melo Mota, S/N - Tabuleiro do Martins, Maceió - AL, 57072-900
marinamilito@yahoo.com; maurilioneemias2010@gmail.com

RESUMO
O Brasil está entre os 10 países do mundo com o maior PIB, porém, também está na lista dos
10 países com maior desigualdade social. Essa desigualdade muitas vezes é acentuada pela falta de
planejamento urbano e pelo crescimento desordenado das cidades - entre as quais podemos citar
Maceió (AL). A capital alagoana, como muitas cidades litorâneas do Brasil, apresenta a faixa de orla
marítima basicamente ocupada por uma elite financeira que vive, literalmente, de frente para o mar e
de costas para a favela. O crescimento urbano de Maceió se deu principalmente a partir de interesses
privados, que visam atender uma pequena faixa privilegiada da população, em detrimento de uma
urbanização coordenada pelo poder público - que deveria privilegiar o interesse social e a
democratização do uso da cidade. Maceió é uma das cidades que cresceram mais rapidamente nos
últimos anos no Brasil e, atualmente, o foco de sua expansão imobiliária se direciona para o seu
litoral norte. Preocupados com a crescente expansão e verticalização desordenada do litoral norte,
moradores e frequentadores dos bairros de Guaxuma, Garça Torta e Riacho Doce, iniciaram em
2014, uma mobilização social que deu origem ao movimento “Abrace a garça”. Movimento esse que
defende o crescimento urbano sustentável do litoral norte de Maceió e maior participação popular
frente às decisões do poder público sobre a cidade. A pesquisa aqui apresentada propõe maneiras de
garantir o poder de voz da população sobre as decisões do poder público em relação às modificações
do espaço habitado, a partir do estudo do movimento “Abrace a garça”. Tal pesquisa se realizou
através de revisão de literatura sobre participação popular, crescimento urbano, especulação
imobiliária e elaboração de Plano Diretor do Município de Maceió para fundamentação teórica. Por
fim, traça-se um paralelo entre o movimento alagoano o movimento “Ocupe Estelita” - movimento
popular pela defesa do Cais José Estelita (Recife-PE).

Palavras-Chave: Especulação imobiliária; Organização civil; Participação popular.

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1. Introdução

Maceió, capital do estado de Alagoas, é uma cidade famosa por suas belezas
naturais, apelidada como “paraíso das águas”. A cidade litorânea apresenta belas praias de
águas mornas e de um azul cristalino. Essas características atraem cada vez mais turistas e
o aumento do turismo influencia diretamente em seu crescimento urbano.

A capital alagoana é uma das cidades que cresceram mais rapidamente nos últimos
anos no Brasil e, como em muitas cidades litorâneas do país, a faixa de orla marítima é
basicamente ocupada por uma elite financeira que vive, literalmente, de frente para o mar e
de costas para a favela. A área à beira-mar apresenta-se como região privilegiada e de alta
especulação imobiliária. Em geral, o crescimento urbano da capital alagoana se deu a partir
dos interesses privados, que visam atender uma pequena faixa privilegiada da população
em detrimento de uma urbanização coordenada pelo poder público que deveria privilegiar
preocupações sociais e a democratização da cidade para o uso da população em geral.

Percebe-se uma privatização das praias brasileiras, em especial das praias


alagoanas. Em Maceió a orla urbana principal da cidade, que engloba os bairros de
Pajuçara, Ponta Verde e Jatiúca é basicamente ocupada por prédios de luxo, casas
suntuosas e grandes hotéis. E, a alguns quarteirões da orla, observam-se bairros
extremamente populares, edificados a partir de construções informais, como é o caso do
bairro da Ponta da Terra, que fica posterior à Pajuçara. E de prédios populares, construídos
pela antiga Companhia de Habitação (COHAB) na Jatiúca e no Santo Eduardo. Somente no
bairro da Ponta Verde, preferido pela elite alagoana, é que já observamos praticamente todo
o território ocupado por uma classe média ou classe média alta.

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Figura 1: Foto aérea dos bairros de Ponta Verde, Pajuçara e Ponta da Terra

Fonte: Reprodução/ Jornal Hoje – disponível em:


<http://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/2015/12/de-cidade-provinciana-destino-turistico-maceio-
completa-200-anos.html>.

A globalização acabou intensificando as desigualdades sociais, saindo do âmbito


apenas local para um âmbito global: “O processo de globalização cria a unificação do
espaço mundial onde a organização se produz a partir de uma hierarquia de estados que
vão do centro à periferia a partir de relações de dominação-subordinação que tem como
elemento dessa articulação o mercado mundial.” (CARLOS, 2007, p. 22). Esse modelo
hierárquico observado no âmbito global se repete no âmbito local.

O espaço deixa de ser um direito para se tornar uma mercadoria. Na lógica


capitalista só tem direito ao espaço quem tem dinheiro para comprá-lo. Porém, essa lógica
de mercado vai contra direitos constitucionais brasileiros e contra o Estatuto da Cidade que
prevê: “Para todos os efeitos, esta Lei, denominada Estatuto da Cidade, estabelece normas
de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do
bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio
ambiental.” (BRASIL, 2002, p.17)

Em 2005, como resposta às exigências do Estatuto da Cidade, que determina que


todas as cidades com mais de 20 mil habitantes devem ter um Plano Diretor elaborado pelo
poder público com a participação da sociedade civil, Maceió elabora o seu primeiro Plano
Diretor. O plano foi elaborado com a “participação popular”, porém, com o seguinte modelo:
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Na realidade, foram realizadas 12 oficinas com representantes do
setor público e integrantes da estratégia de participação social.
Enfatiza-se que estas foram oficinas por segmentos, e que em
apenas duas delas houve a participação de associações
comunitárias e ongs, visto que não eram divulgadas na imprensa e
que só compareceram àqueles que foram convidados. Em várias
destas oficinas foi enfatizado que as formas de comunicação entre o
poder público e a sociedade são insuficientes, que existe falta de
credibilidade na gestão pública e que a população em geral é
desinformada e despolitizada. Outro ponto a ser destacado é que a
maior participação nestas oficinas, além dos técnicos da Prefeitura e
do IBAM, foi do setor imobiliário, sempre presente, informado e “em
busca de seus interesses”. O resultado desta etapa aparece nos
relatórios de acompanhamento entregues pelo IBAM. (PEREIRA e
RODRIGUES, 2005, p.8)

Podemos observar que mesmo quando há a participação popular em relação às


definições de legislação sobre o uso do espaço urbano, inclusive garantida pelo poder
público, essa participação está mais no discurso do que na prática. É um setor muito restrito
da sociedade que toma conhecimento dessas ações e participa ativamente reivindicando a
democratização do espaço público. O que deveria ser um direito da população acaba sendo
privilégio de poucos. Permitindo a manipulação por parte de “civis” que na verdade estão
representando os interesses de grandes construtoras e do setor imobiliário em geral.

2. Especulação imobiliária do litoral norte de Maceió

Na faixa litorânea do Pontal da Barra (extremo sul de Maceió) até o bairro de


Jacarecica (litoral norte) a urbanização garante o acesso da população à praia, apesar do
povoamento seguir o modelo acima citado de estratificação social. Na faixa litorânea sul da
cidade, do bairro de Jaraguá ao Pontal da Barra, o interesse imobiliário é pequeno, devido
aos altos índices de poluição da praia da Avenida e praia do Sobral e também ao complexo
cloroquímico instalado na área litorânea do Pontal da Barra, criando uma área de risco
ambiental em seu entorno e restringindo o crescimento urbano da cidade em direção ao
litoral sul.

Quando observamos a faixa litorânea norte, depois do bairro de Jacarecica, em que


o poder público ainda não implementou uma urbanização, quase toda região à beira-mar é
dominada por propriedades privadas que restringem o acesso à praia pela população em
geral. Com poucas exceções, como o bairro de Guaxuma e a praia da Sereia.

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O litoral norte apresenta grandes terrenos disponíveis para a construção de grandes
edifícios verticais, natureza exuberante e ainda preservada e legislação adequada ao
interesse dos investidores. Portanto, os interesses da especulação imobiliária na capital
alagoana se voltam para a região.

Muitas discussões urbanísticas e ambientais começaram a surgir a partir do aumento


da especulação imobiliária dessa região pois, segundo o zoneamento do Código de
Urbanismo e Edificações de Maceió (2007), é permitido a construção de prédios verticais
com até 20 pavimentos, inclusive em terrenos que terminam na faixa de areia da praia.

O crescimento extremamente acelerado da região litorânea norte vem se dando a


partir de um pacote de ações do setor público e privado. No âmbito público tivemos a
expansão e urbanização da avenida litorânea norte, do bairro de Cruz das Almas até o
bairro de Jacarecica, implantação das avenidas Josefa de Melo e Márcio Canuto e o início
das obras da Ecovia Norte (que liga o bairro do Benedito Bentes a Guaxuma) e da
duplicação da AL-101 Norte. No âmbito privado observamos a implantação do Parque
Shopping Maceió e da Leroy Merlin no bairro de Cruz das Almas e o surgimento de diversos
condomínios verticais com grandes torres e apartamentos com padrão luxo ou alto luxo.
Empreendimentos que vendem o conceito de morar em um bairro tranquilo, próximo à
natureza e claro, próximo ao Shopping Center (o grande referencial de “lazer” da sociedade
contemporânea).

Nesse contexto, o presente trabalho pretende propor maneiras de garantir a


acessibilidade da população às decisões do poder público em relação às modificações do
espaço habitado, a partir da experiência do movimento “Abrace a garça” - movimento da
sociedade civil organizada em defesa dos bairros de Guaxuma, Garça Torta e Riacho Doce.

3. Metodologia

A presente pesquisa foi realizada através de revisão de literatura sobre participação


popular, crescimento urbano, especulação imobiliária e elaboração de Plano Diretor de
Maceió para fundamentação teórica - incluindo fontes jornalísticas e científicas. Foram
também realizadas pesquisas bibliográficas em fontes jornalísticas e na internet sobre as
ações dos movimentos “Abrace a Garça” e “Ocupe Estelita”. Por último, foram realizadas
entrevistas com integrantes do movimento “Abrace a garça” no intuito de entender o

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processo de motivação e organização das ações realizadas pelo movimento e avaliar o
impacto e as conquistas dessas ações, bem como resultados alcançados pelo movimento.

4. Seleção e caracterização da área de estudo

O litoral norte de Maceió é uma área de grandes belezas naturais e diversidade de


ecossistemas ainda preservados. Suas praias ainda são pouco urbanizadas e seus bairros
têm baixa densidade populacional. A região apresenta importante patrimônio paisagístico,
cultural e arquitetônico e grande potencial turístico. O litoral norte de Maceió engloba os
bairros de Cruz das Almas, Jacarecica, Guaxuma, Garça Torta, Riacho Doce e Ipioca.

O presente trabalho faz um recorte específico dos bairros de Guaxuma, Garça Torta
e Riacho Doce - região de foco do movimento “Abrace a Garça”. Esses são também bairros
que, desde a década de 1970, abrigam intelectuais, artistas, jornalistas e outros
representantes da classe média, que buscaram a região no intuito de desfrutar de um
modelo de vida diferente do modelo estabelecido nos bairros mais centrais da cidade. Um
padrão de vida mais tranquilo, em uma região menos urbanizada, com mais contato com a
natureza e uma relação mais comunitária com a vizinhança.

5. Movimento “Abrace a Garça”

“Abrace a Garça” é um movimento de moradores e visitantes dos bairros do litoral


norte de Maceió, Guaxuma, Garça Torta e Riacho Doce. O movimento surge oficialmente
em outubro de 2014 e nasce do desejo de seus integrantes de preservar e valorizar o
patrimônio ambiental, paisagístico e cultural da região e de mudar a lógica da expansão
urbana até então estabelecida para a mesma. O movimento, não coincidentemente, surge
no período de revisão do Plano Diretor de Maceió, elaborado em 2005 e que prevê sua
revisão a cada 10 anos.

As primeiras ações do movimento foram a realização de cinco oficinas com a


população local para descobrir “qual a garça que queremos”. As oficinas foram realizadas na
Balança de pescadores da Graça Torta, na Grota do Andraujo, na Jurubeba, na Praça São
Pedro e na Escola Estadual Eduardo de Almeida, localizada na rua de São Pedro (principal
rua da Garça Torta depois da AL 101 - rodovia que corta o bairro e liga a cidade de Maceió
às demais cidades localizadas ao norte na região litorânea do Estado). As oficinas
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resultaram no projeto “A garça que queremos” (disponível em:
https://issuu.com/abraceagarca/docs/documento_a-garca-que-quermos-modif), em que são
apresentados os principais problemas do bairro e a proposta dos moradores para a
urbanização ideal da região.

Entre os principais problemas elencados no projeto está a carência de serviços


básicos como, água, saneamento, energia, transporte e áreas de lazer. Segundo o projeto,
75% da população dessa região tem seu abastecimento de água oriundo de poços
artesanais e os lençóis freáticos da região já apresentam altos níveis de salinização. Além
disso, como a região não apresenta saneamento básico e os dejetos são destinados às
fossas sanitárias, com pouca ou nenhuma fiscalização, correm-se grandes riscos de
contaminação dos lençóis freáticos pelas fossas. Esses são problemas já existentes na
área, que não apresenta grande adensamento populacional e onde as edificações são
prioritariamente horizontais. Um dos questionamentos do movimento é justamente: se não
se tem proposta de expansão de infraestruturas básicas para o litoral norte, não há
possibilidade de crescimento urbano para a região. Estudos realizados em 2007 salientam a
problemática ambiental do adensamento habitacional do litoral norte, que tem apenas se
intensificado nos últimos dez anos:

(...) esta região encontra-se ainda desprovida de infra-estrutura capaz de


suprir um adensamento urbano que se desenvolve com velocidade
considerável. Caso isso aconteça sem um planejamento adequado, sem
proporcionar a distribuição dos serviços públicos de acordo com as
demandas das construções que irão se instalar, as consequências poderão
ser graves com relação à degradação do meio natural. (NASCIMENTO,
2007, P. 5)

Para defender o litoral norte da crescente verticalização, o “Abrace a Garça”


elaborou um documento com “Propostas para Revisão do Plano Diretor de Maceió”, com 31
reivindicações de alterações do Plano Diretor. O documento foi assinado também pela
Associação dos Moradores e Proprietários do Loteamento Ipiópolis, pela Associação dos
Moradores e Amigos da Grota do Andraújo em Garça Torta, pelo Movimento de Luta nos
Bairros, Vilas e Favelas e pela Associação de Moradores do Conj. Jacarecica (AMORJAC).
Entre as reivindicações estão, a criação da ZEP Guaxuma-Ipioca - uma Zona Especial de
Preservação, restringindo o crescimento urbano da região no intuito de preservar seu
patrimônio natural e cultural e a criação de ZEIS - Zona especial de interesse social, nas
regiões do Poeirão de Guaxuma, Coreia, Grota do Andraújo e Alto do Cruzeiro. Segundo o
Plano Diretor (2005), as ZEIS são: “áreas públicas ou privadas, regiões destinadas a

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segmentos da população em situação de vulnerabilidade social, caracterizadas no artigo 96
desta Lei, prioritárias no atendimento a programas e projetos habitacionais.” (MACEIÓ,
2005, p.43).

O documento foi entregue aos representantes do poder público na primeira audiência


pública de revisão do Plano Diretor de Maceió, realizada no dia 13 de Outubro 2015. Foi
entregue também o projeto “A garça que queremos” - projeto mais detalhado que mapeia os
atuais problemas da região e explicita os desejos dos moradores em relação à
reurbanização da mesma. E o abaixo assinado com 2.700 assinaturas contra a definição da
urbanização da região pelos empreendimentos do setor privado. Abaixo listamos algumas
das reivindicações do abaixo-assinado:

NÃO À CONSTRUÇÃO DE ESPIGÕES NO LITORAL NORTE DE


MACEIÓ! PELO TOMBAMENTO CULTURAL DE GARÇA TORTA E
RIACHO DOCE! PELA PRESERVAÇÃO DA VIDA MARINHA NO
LITORAL NORTE DE MACEIÓ! POR MAIS INFRAESTRUTURA
NAS COMUNIDADES PESQUEIRAS! PELO DESENVOLVIMENTO
DE UM PROJETO DE TURISMO BASEADO NA EXPERIÊNCIA DO
LUGAR! (Disponível em:
https://secure.avaaz.org/po/petition/Poder_Publico_Ministerio_
Publico_Orgaos_Ambientais_e_Iphan_EM_DEFESA_DOS_BA
IRROS_DO_LITORAL_NORTE_DE_MACEIO/?preview=live )

O movimento também tem um representante no Conselho Municipal do Plano


Diretor, elaborou um blog e uma página no facebook para divulgar suas ações e propostas,
buscou apoio de artistas e realizou eventos culturais, tanto para chamar atenção da mídia,
quanto para conscientizar a população e conseguir o seu apoio. Foi elaborado e distribuído
um panfleto informativo sobre as reivindicações do movimento para informar a população
sobre sua luta. Além disso, seus membros têm participado ativamente das audiências
públicas de revisão do Plano Diretor e realizam reuniões periódicas para definir suas
próximas ações e avaliar as ações já realizadas.

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Figura 2: Em visita à praia de Garça Torta, em 2015, o sambista Diogo Nogueira tirou foto
em apoio ao “Abrace a Garça”. A foto foi publicada na fanpage do movimento e gerou matéria na
imprensa local.

Fonte: Disponível em: <http://gazetaweb.globo.com/portal/noticia-old.php?c=386133&e=13>.

No final do ano de 2015 o governo estadual anunciou o início das obras de


duplicação da AL-101 Norte. Mais uma vez, a obra foi definida sem a consulta popular e
sem a preocupação de democratização da cidade. A preocupação urbanística está
basicamente em beneficiar os novos e futuros grandes empreendimentos imobiliários da
região - como o Parque shopping (2013) e os grandes prédios residenciais de luxo já em
fase de construção. Representantes do “Abrace a Garça” estiveram na audiência pública
realizada nos últimos dias do ano de 2015 sobre a duplicação da rodovia. A reivindicação do
movimento em relação à obra é de que, antes de duplicar a via, deveriam ser feitas obras
mais básicas de infraestrutura, como, por exemplo, o saneamento e esgotamento básico,
que ainda não existe na região.

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A audiência sobre as obras de duplicação foi basicamente uma ação para o
cumprimento da “participação popular”, mas não passou de uma apresentação informativa à
população das obras a serem realizadas que já estavam definidas e que já estão sendo
executadas. Quanto à revisão do Plano Diretor de Maceió, segundo definições legais,
deveria ter sido concluída ainda no ano de 2015. Porém, a quinta e última audiência pública
aconteceu no dia 12 de Março 2016 e até o presente momento não se tem o novo Plano
definido. E nesse meio tempo os empreendimentos imobiliários no litoral norte seguem
crescendo, tendo como referência os padrões estabelecidos no Código de Urbanismo e
Edificações de 2007, padrões totalmente oposto às reivindicações do “Abrace a Garça”.
Enquanto as leis tramitam, os grandes investidores privatizam nossas belezas naturais e
verticalizam nossas praias.

Figura 3: Praia da Garça Torta com a “cidade” de Maceió ao fundo. Marcação em dois dos novos
empreendimentos imobiliários que já se “destacam” na paisagem.

Fonte: Autores, 2017.

6. Análise e diagnóstico
O Movimento “Abrace a Garça” continua existindo e se organizando ao longo de
quase três anos, porém, ainda sem muitas conquistas significativas diante das decisões do

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poder público. Apesar das diversas ações realizadas, segundo o próprio movimento, em
publicação realizada em sua fanpage no dia 30 de Março do corrente ano, o movimento não
obteve grandes conquistas objetivas. Porém, a proposta de revisão do Plano Diretor 2005,
apresentada pela empresa Porto Marinho, contratada para uma consultoria nesse processo
de revisão, foi uma proposta bastante coerente e que coaduna com os interesses do
“Abrace a Garça”. A proposta apresentada na 5a. e última audiência pública de revisão do
Plano, realizada no dia 13 de Março de 2016, apresentava a revisão a partir do conceito de
“cidade compacta e menos desigual”, com propostas coerentes com os princípios do
Estatuto da Cidade e de um crescimento urbano voltado para o interesse social. Segundo a
integrante do movimento, Lara Tapety, diversas das propostas do movimento foram
acatadas no projeto apresentado pela Porto Marinho:
Foram acatadas as seguintes propostas: Nova definição do gabarito
para as áreas, o escalonamento (prédios mais altos a medida em que
se afastam da orla marítima), a reserva do solo natural, a ocupação
dos espaços consolidados e com infraestrutura urbana, cotas de
solidariedade para grandes construções, proibição do
remembramento a fim de coibir a especulação imobiliária etc., e
ainda, que o PD e o Código de Edificações sejam sintetizados em um
mesmo documento. (TAPETY, Lara. Entrevista cedida por escrito aos
autores)

A questão que os integrantes do movimento levantam na citada publicação de Março


deste ano é justamente: “O que será feito com o projeto apresentado para a sociedade em
Março de 2016?”. Mais de um ano depois da última audiência pública, nada se ouviu falar
em relação à revisão do Plano Diretor ou de quais alterações foram ou serão feitas no
projeto antes da revisão ser aprovada. Vemos novamente um modelo de
“pseudoparticipação” popular - termo utilizado por MENEZES e LINS ao se referirem à
participação popular na elaboração do Plano Diretor de Maceió (2005).

Apresentaremos a seguir alguns dados comparativos entre o movimento “Abrace a


Garça” e o movimento “Ocupe Estelita” - movimento em defesa do Cais José Estelita em
Recife-PE. E sugestões de ações realizadas pelo movimento pernambucano que poderiam
servir de referência para o movimento alagoano.

As discussões em torno da defesa do cais José Estelita por parte dos urbanistas e
de outros setores da sociedade, foram acirradas em 2008 com a venda do terreno do cais
pertencente à união, em um leilão supostamente fraudulento, para um consórcio de grandes
construtoras. O projeto para o terreno, “Novo Recife”, em sua versão original, previa a
construção de mais de doze torres de luxo, comerciais e residenciais, de até 40 pavimentos.
O projeto descaracteriza a paisagem da região, tende à gentrificação da população local e
privatiza a área, que, sendo originalmente terreno público e de valor histórico, deveria
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atender ao bem comum e social. Foi nesse período que os interessados em defender a
região, formaram o Movimento “Direitos Urbanos”, movimento recifense que defende a
democratização da cidade.

Em 2012 iniciou-se “oficialmente” o movimento “Ocupe Estelita”, organizado,


principalmente por integrantes do movimento “Direitos Urbanos”. Na madrugada do dia 21
de Maio de 2014 as construtoras do consórcio “Novo Recife” iam dar início à demolição dos
galpões do cais, quando os mesmos foram literalmente ocupados por ativistas do “Ocupe
Estelita”.

As principais ações realizadas pelo movimento, além da ocupação, foram:


elaboração da fanpage no facebook e blog; Elaboração de abaixo assinado contra o projeto
“Novo Recife”; Realização de eventos culturais no cais José Estelita; Realização de curtas
metragens para divulgação das reivindicações do movimento; Participação nas audiências
públicas para adequação do Projeto Novo Recife;

O movimento tem o apoio e participação de importantes urbanistas e pensadores da


cidade, entre eles o geógrafo David Harvey e a arquiteta e urbanista Raquel Rolnik. E
também de diversos artistas como Irandhir Santos, Ney Matogrosso, Karina Bhur, Otto,
Lirinha, entre outros. Essas participações acabaram aumentando a visibilidade do
movimento e angariando mais simpatizantes e integrantes.

As ações do movimento pernambucano e do alagoano são muito parecidas, porém,


apontam-se algumas características/ações do movimento em Recife que acreditamos ser
diferenciais e podem servir de referência para mobilização popular em Alagoas: 1 -
Dimensão e alcance; 2 - Realização de ações de enfrentamento contundentes; 3 -
Tramitação das reivindicações por meios jurídicos; 4 - Representatividade de seus ativistas.

O “Ocupe Estelita” tem dimensões bem maiores que o “Abrace a Garça”, não
necessariamente proporcionais à diferença de tamanho entre as duas cidades. A página do
facebook do “Abrace a Garça” tem um pouco mais de 4 mil curtidas, enquanto a do “Ocupe
Estelita” tem mais de 40 mil. O abaixo assinado contra a especulação imobiliária e
verticalização do litoral norte de Maceió teve aproximadamente 2.700 assinaturas, enquanto
o abaixo assinado contra o projeto Novo Recife conseguiu em sua versão on line mais de 4
mil assinaturas e no total, quase 10 mil. Os eventos culturais realizados em Maceió tiveram
um público de nem 500 pessoas, enquanto os realizados em Recife tiveram quase 10 mil.
Segundo o jornalista Luis Carlos Pinto do Carta Maior, as ações culturais realizadas dentro
da ocupação do cais se tornaram a “(...) experiência política mais virtuosa da cidade para

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pensar sobre ela mesma nos últimos tempos.” (Disponível em :
<http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Ocupe-Estelita-o-movimento-de-uma-
cidade-contra-as-empreiteiras/4/31086>)

Acredita-se que uma das ações mais impactantes do movimento pernambucano


tenha sido a própria ocupação do cais, que começou como uma ação emergencial para
impedir a demolição dos galpões e acabou tomando grandes proporções, tendo a duração
total de 58 dias. Mesmo os ativistas sofrendo uma violenta ação de reintegração de posse
do terreno por parte da polícia, a ocupação continuou nas calçadas ao lado de fora. Essa
ação teve tanto impacto que o movimento conseguiu o cancelamento do alvará de
demolição dos galpões. Sendo essa a primeira grande conquista do “Ocupe Estelita”.

Outro grande diferencial do movimento pernambucano é ter conseguido se articular


no âmbito judicial, obtendo conquistas relevantes. O movimento tem o acompanhamento
legal da advogada e professora de Direito da UFPE, Liana Cirne Lins. E têm tramitado com
suas reivindicações judicialmente. Segundo reportagem do G1:

Cinco ações tramitam questionando o Novo Recife: uma civil pública do


Ministério Público estadual, uma do Ministério Público federal e três ações
populares. As ações populares pedem a nulidade do ato administrativo do
Conselho de Desenvolvimento Urbano (CDU), que aprovou a proposta
imobiliária no fim de 2012. (Disponível em:
<http://g1.globo.com/pernambuco/noticia/2015/11/justica-federal-anula-leilao-
do-terreno-do-cais-jose-estelita-no-recife.html>)

Em 2015, o “Ocupe Estelita” conseguiu a anulação do leilão de venda do terreno do


cais, considerado fraudulento, segundo investigações da polícia federal. Porém, o consórcio
Novo Recife recorreu a essa decisão e as ações seguem tramitando na justiça, hora com
ganho de causa para o movimento popular, hora para os grandes investidores. E,
provavelmente, enquanto houver possibilidades de recurso, ambos os lados seguirão
lutando por seus interesses.

O movimento pernambucano, segundo sua advogada, também conta com o apoio da


maioria dos professores da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFPE, seguimento da
sociedade civil com bastante representatividade diante das decisões sobre a urbanização da
cidade pelo poder público.

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7. Conclusão

O cenário dos movimentos estudados em Maceió e em Recife é bem parecido, ou


seja, a região da qual os movimentos populares reivindicam a defesa são regiões de grande
interesse social, cultural e paisagístico e alvo da especulação imobiliária por suas
características e localizações estratégicas. Assim como em Maceió, o cais José Estelita fica
localizado em uma importante área que tem visto os interesses imobiliários crescentes
devido a diversos investimentos em infraestrutura de grande porte na região, tanto do setor
público como do setor privado: a instalação de um shopping de luxo, o aterramento de parte
do mangue para a construção da via mangue, construção das Torres Gêmeas, entre outros
empreendimentos para a elite na região central da cidade.

As capitais vizinhas têm índices de violência e desigualdade social muito próximos e


seguem o mesmo modelo de urbanização, que só acentua a segregação e a desigualdade
social. Maceió parece a irmã mais nova de Recife, seguindo os maus exemplos da irmã
mais velha. As regras de urbanização da orla alagoana eram referência nacional até 2007,
pela limitação das construções verticais. Porém, no Código de Urbanismo e Edificações de
2007 foram liberadas construção de prédios de até 20 pavimentos em uma ampla região
litorânea da cidade. O modelo alagoano segue o ultrapassado modelo de urbanização
aplicado em Recife e na maioria das capitais litorâneas do Brasil.

Dez anos após a elaboração do primeiro Plano Diretor de Maceió deu-se início ao
processo de revisão do mesmo. Momento em que novamente foram realizadas audiências
públicas para que a população pudesse se manifestar em relação às definições urbanísticas
impostas pelo primeiro Plano e avaliar a efetividade das suas determinações nas definições
urbanísticas para Maceió.

Segundo MENEZES e LINS, a participação popular na elaboração do primeiro Plano


Diretor de Maceió foi muito pequena, uma participação mais figurativa do que efetiva. E,
ainda segundo as autoras, muitos dos representantes de bairros ou líderes comunitários que
deveriam defender os interesses da sociedade civil, estavam comprometidos com políticos,
que, em sua maioria, defendem os interesses dos grandes empresários que financiaram
suas campanhas. As autoras afirmam que a participação popular na elaboração do plano foi
uma “pseudoparticipação”:

Entretanto, a falta dos movimentos sociais, ou ainda de representações


organizadas da sociedade para além daquelas específicas dos setores
imobiliário e da construção civil, especificamente preparados para atuar na
elaboração do Plano, e a conduta política observada durante o processo do

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Plano Diretor de Maceió podem ter influenciado a consolidação da
“pseudoparticipação” na sua elaboração. (MENEZES e LINS, 2008, p. 132)

Para MENEZES e LINS essa “pseudoparticipação” da sociedade na elaboração do


Plano Diretor já foi um avanço, uma vez que pelo menos o espaço de participação da
sociedade foi conquistado, mesmo que de maneira ainda pouco efetiva. Agora, no processo
de revisão do Plano Diretor, vemos outro pequeno avanço, que é a maior participação de
movimentos sociais e representações organizadas da sociedade civil. Além do movimento
“Abrace a Garça”, podemos citar a participação do movimento “Bicicletada” e da Associação
dos Deficientes Físicos de Alagoas (ADEFAL).

Segundo MENEZES e LINS e também segundo o arquiteto e urbanista, Pablo


Fernandes, integrante do “Abrace a Garça” em entrevista, uma das maiores dificuldades da
participação popular em Maceió é justamente a falta da cultura de participação por parte da
população. Segundo Fernandes, o alagoano tem o mau hábito de exigir seus direitos, porém
sem cumprir com os seus deveres. Tomando o caso estudado como referência, o dever do
cidadão seria o de participar ativamente dos espaços oferecidos pelo poder público para a
participação da sociedade. Porém, para que essa participação seja efetiva e democrática, é
importante que o cidadão participante se informe sobre a temática a qual está sendo
consultado. É importante uma reflexão embasada em estudos, para que o indivíduo tenha
claro que ações ele vai defender e quais os possíveis impactos dessas ações na
estruturação da cidade e de suas consequentes relações sociais.

Talvez a diferença essencial entre o movimento alagoano e o pernambucano seja o


próprio referencial cultural de cada um dos Estados. Pernambuco é referência nacional na
valorização de sua cultura tradicional. Um povo que conhece e valoriza sua cultura se
apropria de suas origens e se coloca como protagonista em sua história. Talvez por essa
apropriação cultural pernambucana o movimento “Ocupe Estelita” tenha mais voz e
representatividade - o povo quer ter o poder de decidir sobre as modificações na estrutura
da sua cidade.

Apesar das poucas conquistas “concretas” do “Abrace a Garça”, concordamos com


Fernandes, de que talvez, uma das maiores conquistas do movimento seja o próprio
movimento. No contexto sócio-cultural de Alagoas é uma vitória termos um movimento da
sociedade civil organizada do porte do “Abrace a Garça”. Movimento que há quase três anos
se mobiliza pelo direito de voz da população alagoana sobre as importantes alterações
urbanísticas da cidade.
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Mais de dez anos depois da aprovação do Plano Diretor de Maceió, tivemos uma
primeira conquista em relação à falta de participação de movimentos populares na
elaboração do Plano apontada por MENEZES e LINS. No processo de revisão do Plano
(iniciado em 2015), observamos a participação de diversos seguimentos da sociedade civil
organizada. A sociedade conseguiu começar a se organizar e usufruir de seu direito de voz.
A pergunta que fica é: qual deve ser o próximo passo para que a voz da sociedade, que
abraçou o seu direito de falar, passe a ser ouvida?

8. Referências bibliográficas
BRASIL. Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001. Estatuto da Cidade e Legislação Correlata
– 2ª. Ed, atual – Brasília: Senado federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2002.

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MACEIÓ, Lei 5.486. Plano Diretor Maceió – Alagoas. Maceió, Alagoas, Brasil. 30 de
Dezembro de 2005.

MACEIÓ, Lei 5.593. Código de urbanismo e edificações do município de Maceió –


Alagoas. Maceió, Alagoas, Brasil. 08 de Fevereiro de 2007.

MENEZES, Karina Rossana de Oliveira; LINS, Regina Dulce Barbosa. O Estatuto da Cidade
e os aspectos da participação na elaboração de planos diretores: a experiência de Maceió.
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NASCIMENTO, Frederika Araújo. Estudo da capacidade de adensamento urbano do


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Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio ambiente, Universidade Federal de Alagoas,
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PEREIRA, Flávia; RODRIGUES, Tácio. Uma análise do capítulo do meio ambiente no novo
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2005. Mesa 3.
Disponível em:
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8.1. Sites acessados

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Acesso em: 20/04/2017.

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cais-jose-estelita-no-recife.html> Acesso em: 18/05/2017.

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O CENTRO HISTÓRICO DE CUIABÁ: em busca do valor atribuído

FERREIRA, LÚCIA DE FÁTIMA LOBATO

1. Secretaria Estadual de Educação do Pará


Travessa Humaitá, Pass. Paraná, 10, 66085-400. Belém- Parál
lf_lobato@yahoo.com.brE-mail

RESUMO
O reconhecimento do bem perpassa inicialmente pelo seu reconhecimento. O nome que o IPHAN
oficialmente denomina de Centro Histórico e que em alguns momentos é desconhecido, pode ser
considerado um dado interessante como problematizador da questão do valor sobre esse lugar.
Propõe-se fazer reflexões sobre o processo de tombamento do Centro Histórico de Cuiabá, voltando-
se para os conflitos que compuseram suas etapas de tramitação, através da análise das diferentes
narrativas das instituições públicas e dos agentes sociais envolvidos, ou seja, as pessoas que
vivenciam este espaço cotidianamente. Este estudo busca compreender o que foi reconhecido como
portador de valor patrimonial nesse processo.

Palavras-chave: Centro Histórico; Patrimônio; Valor.Fonte

1.INTRODUÇÃO
O primeiro contato com o Centro Histórico de Cuiabá aconteceu de forma um pouco
inusitada. Estava a caminho do IPHAN/MT, era o meu primeiro dia como aluna do PEP3.
Uma sensação de ansiedade igual a que nos assola no primeiro de dia de aula me
acompanhava. No ponto de ônibus procurei informações sobre qual a condução que me
deixaria no meu destino. Inicialmente perguntava sobre qual ônibus passaria pelo Centro
Histórico4, mas para a minha surpresa algumas pessoas desconheciam esse nome.
Retrucavam “centro o quê”? Decidi então
entrar em um ônibus e discretamente perguntar ao motorista se o Centro Histórico da cidade
fazia parte do itinerário do ônibus. Sem imaginar um turbilhão de murmurinhos iniciou, mas
não consegui resposta. Neste instante, veio a lembrança de um local no centro conhecido
por “Morro da Luz”. A partir disso outra pergunta foi formulada_ “ Este ônibus passa próximo
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ao Morro da Luz?”. Sem maiores dificuldades recebi respostas positivas e que propiciaram
minha chegada ao local desejado.
Apesar dos atropelos foi possível chegar ao IPHAN/MT. Depois de algumas conversas,
estudos sobre esse lugar e boas caminhadas, descobri que a sede da superintendência
encontra-se localizado em uma das primeiras ruas que deram início ao núcleo urbano da
cidade de Cuiabá, Mato Grosso.
A curiosidade pelo fato de não ser somente o motorista a desconhecer aquele lugar como
Centro Histórico, mas pelo desconhecimento de vários passageiros, instigou a necessidade
de se questionar como as pessoas que convivem naquele espaço o denominam. Na busca
dessas denominações existentes se descobriu algumas, como por exemplo, “centro
comercial” ou apenas “centro”.

2. O Centro Histórico de Cuiabá e suas denominações.


Considera-se interessante a curiosidade em saber o que as palavras atribuem como
significado, e, além disso, refletir sobre o que o outro atribui à palavra que eu uso. Essas
reflexões mostram os detalhes que compõem as discussões de valor. Afinal como se irá
valorar algo que não se conhece?

O nome que o IPHAN1 oficialmente denomina de Centro Histórico e que em alguns


momentos é desconhecido, pode ser considerado um dado interessante como
problematizador da questão do valor.

Comunga-se da afirmação de que o nome do lugar é atribuído pelas relações sociais que
são construídas no cotidiano.
As relações de sociabilidade são aquelas que conseguem dar um nome para o lugar, pois a

1
Secretaria de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional criada em 1937 através da Lei de nº 378.
1946 – O Sphan passa a se denominar Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(Dphan). Em 1970 o Dphan se transforma em Iphan. Nos anos de 1979 o Iphan se divide em Sphan –
órgão normativo - e Fundação Nacional Pró-memória (FNpM) – órgão executivo. Em 1990 é extinta a
Sphan e a FNpM e ocorre a criação do Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural (IBPC). Nos anos de
1994 a Medida Provisória de n° 752 determina que o Instituto Brasileiro do Patrimônio Cultural –
IBPC e o Instituto Brasileiro de Arte e Cultura – IBA passem a denominar-se, respectivamente,
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e Fundação de Artes – FUNARTE. Para fins de
facilitar a leitura será utilizada a nomenclatura IPHAN.

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singularidade do lugar não se encontra na sua existência em si, é construída a partir das
diferentes relações sociais e geográficas que se faz com esse lugar, envolvendo as
comunidades locais, entendidas aqui como diversas.

A compreensão de lugar para Massey (1994), não contém um sentido universal que deva
ser acolhido por todos, pois para ela, assim como a identidade não deve ser entendida como
universal ou homogênea, assim também, não deve sê-lo com o entendimento de lugar. A
partir desse entendimento sobre a identidade do lugar podem ser percebidos dois aspectos
encontrados em polos extremos, que em certos momentos apresentam esta disjunção, e em
outro podem ser complementares, são eles os aspectos peculiares do lugar e suas relações
externas. Estes dois aspectos podem oferecer uma visão mais completa da constituição do
lugar.

Para Massey, a identidade do lugar é fruto da construção, da relação entre a aproximação


das características peculiares do lugar e suas relações externas. (MASSEY,1994,p.184).

A autora destaca a importância das práticas sócio espaciais, pois segundo ela, essas
práticas interferem na significação dos lugares. Sincronicamente as práticas socioespaciais
no mesmo instante que assumem o papel de definidoras, são também influenciadas pela
confluência das relações locais com as relações globais. Repercutindo na ampliação das
fronteiras locais, trabalhando com a ideia de extensão imaginada do lugar, por isso justifica-
se a ideia do lugar para além de demarcações territoriais.

Voltando-se o olhar obre a questão das denominações do Centro Histórico de Cuiabá, mais
especificamente envolvendo o processo de tombamento e sua patrimonialização, Ludmila
Brandão na sua dissertação intitulada “O processo de tombamento do Centro Histórico de
Cuiabá: movimento citadino e educação”5, fala sobre a importância da atuação do Instituto
dos Arquitetos do Brasil (IAB/MT) como propiciador do aguçar do olhar sobre o lugar “Centro
Histórico”, destacando a preservação dos patrimônios e a necessidade de manutenção de
“paisagem urbana”, sendo que segundo a autora, esta compreensão de preservação não
possuía afinidade com o entendimento de valoração de imóveis isolados.

As compreensões conceituais do Centro Histórico são urgidas a partir do tecer de tramas de


entendimentos que aos poucos contribuíram na composição sobre o Centro Histórico para o
processo de tombamento. Sendo que esse movimento de construção, esse percurso de
construção de entendimento sobre o Centro Histórico não se desenvolve de forma
harmoniosa, vários conflitos emergem a partir da diversidade de atribuições de valores
expressos pelos diversos grupos sociais.
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A visão do centro da cidade como um conjunto arquitetônico foi expressa pela arquiteta
Rachel Rezende, no ano de 1979 quando na sua vinda à cidade, apresentou suas
considerações sobre a “preservação da memória cuiabana”, através de um artigo publicado
no “Diário de
Cuiabá”. Este artigo enfatizava a importância de preservação da memória cuiabana, pois
segundo ela, esta se expressava nos bens patrimoniais existentes no Centro Histórico de
Cuiabá, denominados de “Patrimônio Arquitetônico”. E, também, fez alusão ao Centro de
Cuiabá como um “Patrimônio em um sentido amplo, não se tratando apenas de imóveis
isolados”. (Brandão, 1993, p.105).
Brandão (1993) ainda cita que neste mesmo ano a cidade recebeu uma comissão de
arquitetos da Universidade de Brasília (UNB), a qual durante a realização do levantamento e
registro dos monumentos históricos da região, através de um representante, expressou as
seguintes impressões sobre o Centro Histórico de Cuiabá:

Cada quarteirão da cidade esconde uma surpresa histórica: uma


avenida inteiramente larga termina em uma rua tortuosa e estreita;
casas em estilo moderno se misturam com residências antigas; são
verdadeiros patrimônios históricos. (BRANDÃO, 1996, p.)

Considera-se que tais denominações dadas ao Centro são anteriores aos processos de
tombamento estadual e federal, os quais geraram várias discussões e conflitos nas práticas
sociais desenvolvidas no Centro. Segundo Bonfim (2010, p. 66), os entendimentos desses
arquitetos vindos de outras cidades atribuem valor arquitetônico ao Centro, identificando-o
como “um conjunto arquitetônico
que merecia fazer parte do patrimônio nacional”.

Entende-se que a fala da arquiteta Rachel Rezende relaciona que as edificações


consideradas no seu conjunto em nenhum momento expõem a ideia de monumentos, ao
contrário, expõem uma representação patrimonial da cidade associada com a simbologia do
lugar, quando faz referência à memória. Sua fala expressa a indissociabilidade entre a
materialidade e imaterialidade de um bem patrimonial urbano.

Ressalta-se que a relação das dimensões material e imaterial do patrimônio, sendo elas
inseparáveis, qualquer interferência em uma dimensão se estará interferindo em outra. O
patrimônio cultural tem como suporte os vetores materiais que possuem uma dimensão
imaterial de significado e valor, assim como, o denominado patrimônio imaterial possui uma
dimensão material que lhe permite efetivar-se. A diferença não é de natureza, mas de
operacionalização (MENESES, 2012).
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Essa referência à memória não significa que os significados fossem imanentes às coisas, as
quais apenas detêm-se na conceituação em si, como se fossem significados estáveis, fixos
em si atribuídos aos bens são. O entendimento perpassa com a conceituação da coisa em
si, como entender a singularidade quando se apregoa a universalidade. A coisa tem que ser
entendida na sua singularidade. O conhecimento que temos das coisas são representações
singulares e não conceitos universais.

A experiência estética vivenciada por esses arquitetos em visita à Cuiabá propiciou


construir significados sobre esse lugar, e, para, além disso, contribuiu para aguçar, junto aos
grupos sociais, a ideia de patrimonialização do Centro Histórico. Pessoas externas com
instantes de proximidade conseguiram intercambiar suas impressões desse lugar e
colaborar para a ampliação da discussão sobre a patrimonialização do centro na sociedade
local.

3.Fundamentação teórica do tombamento


O processo de tombamento do “Conjunto Arquitetônico e Urbanístico de Cuiabá” foi
aberto sob o nº 1.180 – T- 85 pela SPHAN8. A solicitação do tombamento do Centro
Histórico de Cuiabá originou-se de uma solicitação, via ofício nº 263/85/FNPM/BSB, da 8ª
DR, sendo a sua abertura oficialmente feita no dia 25 de setembro de 1985.
Inicialmente o embasamento teórico do processo de tombamento tinha como pilar as
pesquisas do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso (IHGMT), mas a partir de
análises dos documentos que compõem o processo de tombamento, acredita-se que no
percorrer do processo, outras fundamentações convergiram nessa tessitura de
fundamentações contribuindo para uma trama de significados diferentes sobre esse lugar,
contemplando outras categorias de valor.

As justificativas para o tombamento abarcam desde referências consideradas por


BONFIM (2010), como uma “história produzida pelo Instituto Histórico de Mato Grosso”
(IHGMT), abrangendo uma “perspectiva relativizadora” sobre o Centro Histórico de Cuiabá,
abarcando também, novas leituras e análises que compõem e acompanham as próprias
mudanças ocorridas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).

Segundo Bonfim:

[...] Os aspectos políticos e econômicos da colonização portuguesa


apareciam nesse estudo como determinantes na conformação urbana da
cidade. Uma histórica centrada na ação portuguesa, em que os aspectos

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políticos e econômicos se sobressaíam mais do que os aspectos culturais e
sociais, fundamentou o tombamento. (BONFIM, 2010, p.87).

No documento Informação nº104- A, que compõe o processo de tombamento aqui estudado,


a IPHAN apresenta como justificativa do tombamento a ideia de “fato histórico”. Este
considerado como “processo gerado num tempo e espaço determinados, gerador de
consequências e/ou mudanças”. No caso específico de Cuiabá, a formação do núcleo foi
entendida como fato histórico porque produziu entre outras consequências, o avanço da
América portuguesa sobre a espanhola, constituindo-se em um polo irradiador para a
ocupação do interior e demarcação futura do território brasileiro. (Processo de tombamento
nº 1.180 – T- 85, Informação nº104-A).

Pode-se evidenciar que esta forma de conceber o processo de formação da cidade,


especificamente o seu núcleo, são analisados primando unicamente sua materialidade, sem
fazer referência a toda composição cultural do lugar.

Segundo Elizabeth Madureira9, o IHGMT entre o período de 1919 até 1980 era considerado
uma instituição de referência nos trabalhos de pesquisas relacionados ao estado de Mato
Grosso. A implantação da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) no início dos anos
de 1980 veio ocupar esse espaço que o IHGMT possuía como instituição referência
científica local. Este fato associado às mudanças de paradigmas da Historiografia ocorrida
no final dos anos de 1960 e início dos anos de 1970, propiciaram novos olhares sobre a
compreensão histórica e, consequentemente. Ainda segundo Elizabeth Madureira as leituras
sobre a história local eram diferenciadas entre estas instituições.

As mudanças de diretrizes de fundamentação por parte do IPHAN podem ser evidenciadas


em alguns documentos internos. No comunicado interno de nº 070/90, elaborado pelo
arquiteto Ítalo Campofiorito destinado à professora Lilian Barreto – inventariante FNPM
(Fundação Nacional Pró- Memória) contém informações sobre o processo de tombamento.

No item: 8 – a justificativa do tombamento efetivado baseia-se, por sua vez, em


metodologia renovada – face à tradição cinquentenária da Casa (IPHAN) – e longamente
explicitada no processo; não se trataria mais de valor vinculado “a fatos memoráveis da
história do Brasil”, mas sim, de uma leitura da cidade enquanto “documento histórico”, numa
perspectiva relativizadora”, de um ponto de vista, por assim dizer, antropológico – o que
levou a uma “conceituação amplificada” da noção de Centro Histórico como “representação
da heterogeneidade que caracteriza a evolução histórica da cidade”, no “adensamento
principal do centro urbano”.

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Através dessas citações é possível perceber a importância dada para as práticas sociais
desenvolvidas no Centro Histórico de Cuiabá.
No documento identificado como Informação nº 032/87 a ideia de diversidade é presente,
percebe-se a existência de uma leitura do Centro Histórico como cenário “representativo de
diferentes épocas”, como se ele fosse capaz de propiciar informações sobre a dinâmica
construída historicamente nesse lugar.

Definimos como CH de Cuiabá aquilo que representa a heterogeneidade que caracteriza a


cidade, levando-se em conta as diferentes relações socioculturais expressas num espaço
bastante definido historicamente, que veio se solidificando, ao longo do tempo, como núcleo
urbano e, por isso mesmo, como realidade complexa. [...]O que estamos identificando
enquanto centro histórico é a forma urbana (trama urbana, ocupação, casario) que
permaneceu testemunhando o passado; este espaço foi apropriado socialmente,
apresentando, por isso, as transformações provocadas pelo homem ao longo da história. (nº
1180 – T-85,p.110).

A partir dessas considerações contidas nos documentos acima citados identifica-se um


deslocamento de prismas sobre as diretrizes da fundamentação do tombamento, como
também, o florescer de outra categoria de valor do Centro Histórico de Cuiabá, o qual seja, o
valor antropológico. Durante as análises da documentação do tombamento, o aspecto do
valor antropológico esteve silenciado nos documentos oficiais.

4. Análise sobre as solicitações de impugnação do processo de tombamento


Na realização do estudo sobre o valor atribuído ao Centro Histórico de Cuiabá buscou- se
como uma das fontes principais o processo de tombamento do Centro Histórico de Cuiabá
nº1.180-T/SPHAN/FNPM.

Para analisar as concepções de valor contidas nesse lugar, as visões conflituosas ou


harmônicas que foram sendo construídas, entender como tais visões emergiram, buscando
compreender os vários contextos históricos que refletiram as várias .Por isso considera-se
significativo historiar o processo, principalmente nos tópicos
referentes aos pareceres que justificam o tombamento, os pedidos de impugnação feitos
pelos moradores e comerciantes, e os caminhos jurídicos – burocráticos que o constituem.

A análise do processo irá ser desenvolvida a partir do aspecto cronológico, a fim de


possibilitar as concepções de valor das esferas federal, estadual e municipal; dos moradores

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e comerciantes do CH. Em outros momentos optaremos em resenhar informações
consideradas significativas para a discussão sobre o valor, de acordo com a necessidade de
apresentá-los na íntegra.

As notificações sobre o tombamento ocorreram no dia 01/10/1987 através de publicação no


Diário Oficial da União, Seção 1-16209, contendo a publicação de edital de Notificação aos
proprietários informando-os do tombamento do Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e
Paisagístico da cidade de Cuiabá.
O documento inicialmente declara o perímetro a ser tombado e na parte seguinte cita sobre
suas implicações:

O presente edital implica o tombamento dos bens, logradouros e paisagem


inseridos no perímetro retrocitado que passam, por conseguinte, a ser
tutelados pela proteção especial do Poder Público Federal, o qual, por
intermédio do
IPHAN, valerá para que os efeitos previstos em suas normas disciplinador a
ser adiante especificadas, sejam devidamente respeitados, no interesse
geral da coletividade.

Os proprietários de tais bens terão o prazo de 15 dias (quinze dias) a contar


da publicação, para comprovando o seu título e domínio, impugnarem, se
assim convier, o tombamento. Caso transcorra “in albis” o prazo assim
referido, entender-se-á que ocorreu anuência tácita dos proprietários.

Ficam igualmente sujeitos à prévia análise do órgão federal os projetos


relacionados à vizinhança (entorno) da área tombada, a fim de se proteger a
sua visibilidade e ambiência. (nº 1180 – T-85 _ Vol. I, folha 137).

O documento ainda contém as especificações sobre os motivos que o compõem, sendo


referendados os valores histórico, arquitetônico e paisagístico.
Ressalta-se que a notificação feita aos proprietários se estendeu a outros veículos de
comunicação de ampla divulgação no município.

A prefeitura da cidade recebeu no dia 02/20/1987, o ofício de nº 306, da SPHAN, o qual


tinha como assunto “Dá conhecimento de processo de tombamento “Centro Histórico de
Cuiabá– MT”. O referido documento informava a delimitação da área tombada, e também,
expunha a
importância do papel da prefeitura na expedição de licenças de obras, construções e
demolições. No entanto, ressaltava a necessidade da manifestação e aprovação prévias da
8ª Diretoria Regional, representada na pessoa do Diretor Arquiteto Antônio Marco Galvão
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para apreciação dos projetos a serem licenciados para o referido conjunto e para os bens
localizados na área de
entorno afins com os critérios estabelecidos na portaria nº 10/86_ SPHAN.
O Decreto Lei 25 de 30/11/193712 especifica no seu artigo 9º sobre o prazo de quinze dias
para a realização de impugnações.

No memorando nº 117 IPHSN/FNPM/BSB, de 22 de outubro de 1987, encaminhado do


Diretor da 8ª DR IPHAN/ FNPM para a Assessoria Jurídica FNPM/ Rio são relacionados os
pedidos de impugnação. Devido às especificidades jurídicas os pareceres foram feitos
respeitando essas especificidades.

Ressalta-se que todas as impugnações com exceção de uma foram feitas seguindo o
mesmo modelo. Em geral o conteúdo das impugnações questionava a forma de notificação.
No mesmo dia da publicação do edital no Diário Oficial, o edital de notificação foi publicado
pelo Diário Oficial do Estado de Mato Grosso na página 57, pelo jornal “O Estado de Mato
Grosso na página 6 e pelo Diário de Cuiabá
na seção geral, página 13. (Processo, p. 141 – 144). Processo volume I-A). Organiza a
proteção do patrimônio histórico e artístico nacional.
considerando que o IPHAN não cumpre com o Decreto lei nº25, de 30 de novembro de1937.
A outra questão levantada refere- se “da aplicação, em âmbito nacional, do Instituto do
tombamento decidir pelo tombamento ao invés de uma política de zoneamento”.

Sobre essas duas questões a assessoria jurídica em resposta às impugnações elabora o


documento Informação nº 038 de 30 de outubro de 1987, tendo como assunto “Contra-
razões às impugnações interpostas por proprietários de imóveis situados no Conjunto
Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico de Cuiabá- Mato Grosso”. O conteúdo do
documento imputa matéria de natureza técnica e jurídica.

Sobre a forma de notificação o documento diz: “A este respeito cumpre-nos esclarecer que o
Decreto Lei nº 25/37, ao deixar de determinar a forma pela qual os proprietários devem ser
notificados acerca dos tombamentos, trilhou o bom caminho”. A Assessoria Jurídica entende
que a SPHAN escolheu uma forma adequada e que este item faz parte da
discricionariedade concedida ao poder público em geral.

A discricionariedade administrativa encontra fundamento e justificativa na


complexidade e variedade dos problemas que o Poder Público tem que
solucionar a cada passo e para os quais a lei, por mais casuística que fosse, não
poderia prever todas as soluções, ou pelo menos a mais vantajosa para cada caso
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corrente. (Processo Administrativo nº 1180 – T – 85 – SPHAN de 15 de outubro
de 1987, Informação nº 38, p. 368 apud MEIRELLES, Helly Lopes. p. 143-144).

Em relação ao tombamento o documento expõe que a SPHAN é instituição legalmente


investida no seu poder dever de proteção e que os estudos técnicos realizados respaldam a
solicitação de tombamento. Além disso, por ser um ato administrativo: “a valoração dos
motivos e a escolha do objeto constituem o chamado mérito
administrativo, segundo o qual é atribuído ao Poder Público, investido de
competência, decidir acerca da conveniência, oportunidade e justiça para a
realização de um determinado ato”. (Processo Administrativo nº 1180 – T – 85 –
SPHAN de 15 de outubro de 1987processo, informação nº 38, p 369).

Ainda sobre a proposta de zoneamento o documento expõe que o tombamento e a política


de zoneamento são medidas que podem ser efetivados harmonicamente, convergindo para
uma política de preservação patrimonial envolvendo a União e o município vislumbrando
“um melhor aproveitamento das funções urbanísticas elementares, quais sejam: trabalho,
circulação, habitação e recreação”.

A partir do exposto a assessoria jurídica forma juízo sobre as impugnações, contudo


considera não lhes dar prosseguimento visto que as argumentações contidas nas
impugnações não possuírem fundamento jurídico que desmereça a eficácia do ato
administrativo praticado pela IPHAN.

Pelo fato das argumentações de impugnação seguirem o mesmo modelo, a apreciação feita
pela Assessoria Jurídica seguiu a mesmo fundamento na construção argumentativa jurídica
na contra - razão às impugnações, dando o mesmo parecer final do anteriormente exposto.

O documento Informação nº 40 de 30 de outubro de 1987, possui como assunto:


“Impugnação interposta por proprietários aparentes de imóveis situados no Conjunto
Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico de Cuiabá – Mato Grosso”. A apreciação das
solicitações de impugnação do tombamento, as argumentações em oposição serão aqui
consideradas como narrativas. Justifica-se a utilização desse entendimento apoiando-se na
noção de discurso forjada por José Reinaldo, no artigo “Monumentalidade e cotidiano: os
patrimônios culturais como gênero de discurso”13, quando o termo é concebido como
“formas de ação, entendida para o autor, no “sentido em que o que falamos ou escrevemos
tem efeitos sobre as situações que vivemos”. O autor ainda aborda que as narrativas
contidas nos discursos podem ser organizadas a partir do princípio da “monumentalidade”,

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como também, do princípio do “cotidiano”. Ainda segundo ele, esses princípios se opõem
dialogicamente ou podem fazer parte de uma mesma narrativa.

Neste momento iremos nos deter somente a algumas reflexões sobre o princípio da
monumentalidade, pois durante o processo de análise das argumentações que constam nos
documentos de impugnação feitos pelos moradores e comerciantes é possível observar que
as narrativas parecem estar organizadas em torno deste princípio.

Nas justificativas dos moradores e comerciantes contrários ao tombamento apresenta-se


evidente as argumentações de inexpressividade arquitetônica e a ausência da importância
nacional, acentuando o não reconhecimento do Centro Histórico de Cuiabá como lugar
merecedor de tombamento.

Essa afirmativa pode ser evidenciada nos seguintes tópicos, contidos na solicitação de
impugnação:

25 – Não haveria de negar ou desconhecer o efetivo valor histórico do local,


mas, quando muito, e muito mesmo, no âmbito da história de Mato Grosso;
26 – Diz a lenda que, dentro do sítio demarcado pelo Edital acima referido,
teriam tido lugar as primeiras explorações de garimpo e edificações da vila
de mineração que mais tarde se chamaria Cuiabá, desconhecia a autora
desta, que tal fato seja tão relevante a nível nacional para merecer Edital de
tombamento da SPHAN;[...]

30 – Mesmo ao observador desavisado e pouco afeito à apreciação da


arquitetura colonial brasileira, ou de qualquer outro estiolo, surpreenderia o
número diminuto de prédios com algum significado arquitetônico, e, desafia-
se a localização de qualquer um desses prédios, que mantenha sua fachada
intacta para não dizer seu interior;[...]
32 – Destarte, os imóveis, não só o da autora, mas a imensamente grande
maioria, e mesmo a totalidade deles, excetuando as igrejas, já não tem
nenhum
valor arquitetônico, até para Cuiabá, quanto mais nacionalmente; [...]
37 - Porém, sabe por acreditar ser perceptível aos olhos de leigos, que o
sítio em processo de tombamento, de maneira alguma, sob qualquer
sistema referencial ou de critérios, não é aquele de “feição notável” pela
ação da natureza, ou da indústria humana, de que fala o Decreto Lei nº
25/3714.

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A partir da leitura do documento e analisando estes e outros tópicos algumas conclusões
podem ser feitas. Percebe-se a existência de vinculação entre bens tombados aos fatos
memoráveis da história do Brasil; o não reconhecimento dos valores histórico e arquitetônico
do Centro Histórico; o tombamento é visto como um entrave, uma espécie de obstáculo para
o desenvolvimento das atividades comerciais; a preocupação com a preservação é vista
como um ato de nostalgia; proposição de uma política de zoneamento, mas não de
tombamento é defendida nas impugnações.

Durante a análise da documentação do processo de tombamento considerando as etapas


do edital, este ocorrido em 01 de outubro de 1987, no período entre a data da Reunião do
Conselho Consultivo ocorrida em 01 de agosto de 1988 até a data da homologação do
processo, pelo Ministério da Cultura em 04 de novembro de 1992, percebe-se que durante
um período de tempo significativo, ocorreram dissidências internas na instituição SPHAN;
divergências entre as esferas municipal e federal sobre o tombamento, resultantes de
mudança de gestão, divergências de concepções de patrimônio; ausência da esfera
estadual nesse processo de discussão, apresentando uma postura tímida no
desenvolvimento de ações e políticas públicas de preservação.

Nesse espaço de tempo muitos foram os documentos motivados seja a favor ou contra o
tombamento, além das solicitações de impugnação. Este período foi marcado por conflitos
ideológicos e por ações extremamente divergentes e ausência de políticas de preservação
patrimonial.

A nova gestão do poder executivo municipal, representada pelo prefeito Frederico Soares de
Campos no ofício nº404/89 de 26 de junho de 1989 destinado ao Secretário da SPHAN,
então, Augusto C. da Silva Teles, após encontro em Brasília, solicitava formalmente o envio
de equipe técnica a Cuiabá, com o propósito de “analisar e dar soluções rápidas para os
problemas relacionados com a área tombada pelo SPHAN nesta capital”. (Anexo do
processo. s/n).

Após esse primeiro elo de comunicação, a prefeitura enviou o ofício GP nº 678/89 para o
Ministro da Cultura, na época José Aparecido de Oliveira. Expunha que a prefeitura está
revendo algumas sistêmicas para tentar “colocar a administração municipal, pelo menos,
próxima da dinâmica do crescimento da cidade”. O objetivo do documento era a de solicitar
que o processo de tombamento não fosse homologado. Para isso, fez uso de várias
argumentações no intuito de comprovar que o Centro Histórico não é dotado de
representatividade histórica e arquitetônica, portanto, não merecedor de tombamento.
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Sobre o processo de tombamento o prefeito diz:

No afã da preservação criou-se o edital de tombamento abrangendo


justamente todo o perímetro em que pulsa o comércio da cidade onde as
alterações foram as
mais radicais tudo por conta do respeito a um passado já destruído, gerando
sim, complexos problemas a administração pública cerceada de suas
atribuições. O
conflito entre o antigo, que realmente não é histórico, e os objetivos
modernos que são compatíveis com o desenvolvimento econômico e social
da cidade existe hoje de maneira muito séria e que nos leva a apelar por
providências junto a Vossa Excelência. (Processo Administrativo nº 1180 –
T –85–IPHAN. Ofício GP nº 678/89).

O documento ainda menciona sobre o intenso crescimento demográfico da cidade, o qual


acaba “acarretando sérios problemas ao carente Executivo Municipal, além da rápida e
inexorável alteração das suas primitivas características urbanas”.
O prefeito expõe que a:

Cuiabá dos anos 30, que eu tenho viva na memória, existe apenas
registrada nas fotografias e histórias antigas, já que seu visual colonial fora
totalmente alterado, restando sim a sua construção viária irregular que lhe
assegura a personalidade de cidade antiga. [...]. As casas velhas ligadas ao
passado de filhos ilustres, já foram demolidas, não mais existindo para
reviverem a memória daqueles que escreveram páginas brilhantes da sua
história. (Processo Administrativo nº1180– T – 85 – SPHAN.)

O prefeito expressa também que as ideias de preservação patrimonial de alguns jovens da


cidade são louváveis, mas que existe nestas ideias a presença do idealismo, pois segundo
ele a cidade de Cuiabá não pode ser comparada com as cidades de Olinda, Ouro Preto e
parte de Salvador.

A partir do conteúdo existente neste documento, há uma nítida presença do não


reconhecimento do valor arquitetônico do Centro Histórico pelo prefeito, acompanhada de
uma visão arraigada pelo princípio da monumentalidade, dando ênfase aos filhos ilustres da
cidade, acentuando a valoração patrimonial apenas a um grupo restrito de construções
suntuosas e que fazem referência a alguns acontecimentos significativos da história local.

Ainda fazendo uso das referências de Santos (2007) sobre monumentalidade, segundo ele,
no princípio da monumentalidade o passado é figurado como “um todo acabado e perfeito”,
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impedido através de vários prismas, é imóvel, encontrando na tradição o seu elo de
articulação com o presente. Neste universo os personagens são modelos exemplares e
representados por pessoas ilustres e importantes, a memória é vista para ser cultuada,
como informação, e não propiciadora de conhecimentos atuais.

Em resumo, a narrativa épica está articulada por uma ideia não relativizada do passado, e
os personagens que aí se movem e os acontecimentos que se passam são absolutos. O
passado é um todo acabado e perfeito e se comunica com o presente apenas através da
“tradição”. Os personagens agem de modo exemplar, não estão sujeitos às contingências do
cotidiano. Os eventos e personagens das narrativas épicas estarão fora do tempo, estão
congelados. Não se valoriza a experiência pessoal. Valoriza-se a “memória”, e não o
conhecimento. O mundo
do passado épico é um mundo perfeito. Não há incertezas. (SANTOS, 2007, p.145).

Considera-se que esse documento é representativo, por apresentar conteúdos que


evidenciam as políticas patrimoniais desenvolvidas na cidade, ou melhor, a ausência dessas
políticas pela gestão municipal. Clarifica os entendimentos que a prefeitura tinha sobre os
conceitos de patrimônio e valor. Além disso, incita o surgimento de novas argumentações
por parte da SPHAN e da sociedade civil organizada local em expor suas apreciações sobre
o tombamento. Segundo Brandão (1997, p. 143) o fato do prefeito se pronunciar contrário ao
tombamento e solicitar ao Ministro da Cultura a não homologação deste ato administrativo
teve reflexos no interior da IPHAN.

Pode-se mencionar a resposta ao ofício nº 678/89 como um dos indicativos desses reflexos.
O documento elaborado pelas técnicas da Coordenadoria de Proteção da SPHAN, a
arquiteta Helena Mendes dos Santos e a historiadora Márcia Regina Romeiro Chuva,
encaminharam o documento Informação nº 066 de 16 de novembro de 1989, o qual
informava, dentre outros esclarecimentos, sobre o estudo do passado como fonte de novos
conhecimentos, ressaltava a importância da apropriação dos elementos culturais para a
formação cidadã e, consequentemente, para a melhoria da qualidade de vida, a preservação
como parâmetro para o planejamento voltado ao cidadão, entre outros apontamentos.
Enfim, o documento apresentava fundamentos que compunham a base teórica do
tombamento.

Sobre o Centro Histórico o documento diz No Centro Histórico como um todo foram
observados os elementos que permaneceram ao longo do tempo registrando formas
características de ocupação, implantação e técnicas construtivas, determinadas pela
estrutura socioeconômica organizada com base nas diferentes classes sociais, criando,
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assim, espaços diversificados dentro do conjunto, que devem ser observados e garantidos.
(Processo nº 1180 – T-85, Ofício nº 678/89).

O tópico apresentado no documento que envolve a fundamentação do tombamento


apresenta a seguinte percepção A avaliação do tombamento do CH de Cuiabá se baseia na
visão da história que se propõe a compreender as relações sociais e as modalidades de
suas transformações ao longo do tempo, esclarecendo os mecanismos e as formas de
organização das sociedades, a partir do entendimento da formação do núcleo urbano, isto
é, do processo de produção, uso e transformação do homem sobre a natureza, para o
resgate deste processo como fato histórico. Desta forma, interessa à História e, também, à
preservação, não o fato isolado, descritivo e estanque, mas todo o processo gerado num
tempo e espaço determinados e gerador de consequências e/ou mudanças. É como
decorrência do conhecimento desse processo que se dá a construção da história e da
cultura de determinada sociedade. O conhecimento do passado, só tem sentido a partir do
momento em que o homem do presente apropria-se dele como constitutivo de sua própria
cultura. (Informação nº 066, de 16 de novembro de 1989).

Percebe-se que essa citação se opõe as considerações da prefeitura. Acentua a valorização


das práticas cotidianas, suprimindo a visão da História que privilegiava a perspectiva visão
luso - brasileira. Esta argumentação se apropria de uma nova compreensão do patrimônio,
agora associada com o urbano e também, às representações culturais cotidianas.

Devido o processo de tombamento ter levado sete anos para a sua tão esperada
homologação, muitos foram os documentos elaborados e que expressavam os anseios e
reflexões históricas vivenciadas. Por isso nos limitaremos na apreciação apenas dos
documentos a cima citados.

Finalmente no dia 06 de novembro de 1992, é publicada no Diário Oficial da União, a


Portaria nº 10 de 04 de novembro de novembro de 1992, a qual homologa o Tombamento
do Centro Histórico de Cuiabá.

O arquiteto José Leme Galvão Jr. após a homologação do tombamento expressou:

Como deixar de considerar tamanha epopeia?


Nós do IBPC, que já fomos SPHAN e PRÓ- MEMÓRIA, estamos orgulhosos
por Cuiabá, Patrimônio Cultural dos Brasileiros.
Certo, tontos de orgulho, mas permitam-nos a justa embriagues da vitória na
qual somos todos ganhadores, ainda que sobrevenham trabalho e grandes
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dificuldades. E não queremos ser intrusos, pois se a Cuiabania é o caráter
mais telúrico dos que aqui vivem, compõe na verdade o mosaico da
cidadania brasileira, agora com a distinção meritória nos livros de tombo dos
monumentos nacionais. Discipulus prioris est posterior dies (das Sentenças
de Publilio Siro)(O futuro aprende com o passado) ( GALVÃO JR, José
Leme. A propósito do tombamento. O Estado de Mato Grosso. Caderno 2.
Cuiabá, 25/11/1992. Apud BRANDÃO, 1993, p. 161.)

É salutar a demonstração de entusiasmo e alegria desse desfecho com “final feliz” após o
trilhar por uma história longa e cansativa, mas espera-se que ela seja significativa para a
construção de políticas de preservação patrimonial.

A heterogeneidade da sociedade complexa moderno-contemporânea, manifestada


dramaticamente nas grandes cidades e nas áreas metropolitanas, aponta para as
dificuldades e as limitações de uma ação pública responsável pela defesa e pela proteção
de um patrimônio cuja escolha e definição implicam necessariamente arbítrio e, em algum
nível, exercício do poder. Voltamos à velha questão de saber se sempre há vencedores e
perdedores, ou seja, em cada caso e situação é preciso estar atento para procurar avaliar os
custos e os ganhos das decisões que são tomadas e dos valores que as sustentam.

4.Considerações Finais

O processo de tombamento foi constituído por conflitos e por uma longa espera de sua
homologação. Marcado por diferentes narrativas, as quais foram construídas em momentos
históricos diferentes, sendo que por vezes se aproximavam e em outros momentos
passavam pelo ponto de clivagem.
Nesse processo de desvendamento do valor atribuído no processo de tombamento, o qual
ainda está sendo apropriado, compreende-se que a dimensão do valor pode ser direcionada
na visão de produção de patrimônios, deixando secundária a discussão e identificação do
bem pelos sujeitos, mas que também pode se dar como um fato extremamente relevante e
participativo. E que as compreensões de valor podem ser fundamentadas levando-se em
consideração a relação indissociável entre as dimensões material e imaterial que constituem
um bem.

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5.Referências Bibliográficas

Bonfim, Márcia. As Engrenagens da cidade: centralidade e poder em Cuiabá na segunda


metade do século XX. Cuiabá: EdUFMT: Carlini & Caniato, 2010.
GONÇALVES, José Reginaldo Santos. Antropologia dos objetos: coleções, museus e
patrimônios / José Reginaldo Santos Gonçalves. - Rio de Janeiro, 2007.
TUAN, Yi-Fu (1983). Espaço e lugar: a perspectiva da experiência; tradução de Lívia de
Oliveira. São Paulo: DIFEL. Disponível em:< http://geocult.blogspot.com.br/. Acesso em:
01/06/2015.
SANTOS, Carlos Nelson F. dos. A Cidade como um Jogo de Cartas. Niterói: Universidade
Federal Fluminense: EDUFF; São Paulo: Projeto editores, 1988.

VELHO, Gilberto. Patrimônio, negociação e conflito. Mana vol.12 nº.1 Rio de Janeiro Apr.
2006. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-93132006000100009< Acesso em:
<12 de junho de 2015.

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O DIA DO PATRIMÔNIO EM PELOTAS: uma celebração de
aproximação da comunidade com sua cultura.

ALMEIDA, LICIANE M. (1); FRATTINI, GISELA DE A. (2)

(1) (2) Secretaria Municipal de Cultura de Pelotas. Gerência Memória e Patrimônio.


Praça Coronel Pedro Osório, nº 02.
liciane_machado@hotmail.com
giselafrattini@hotmail.com

RESUMO

Partindo do entendimento de que cultura e patrimônio são conceitos indissociáveis e que ambos
fundamentam as bases de uma sociedade desenvolvida, a Secretaria de Cultura de Pelotas vêm, desde
2013, celebrando no mês de agosto o Dia do Patrimônio. Trata-se de divulgar e promover o Patrimônio
Cultural local através das mais variadas formas de expressão, aproximando e integrando a comunidade
do debate sobre Preservação Patrimonial, percebendo o patrimônio enquanto manifestação cultural que
une passado, presente e futuro em prol da valorização da identidade cultural.
O evento, desde a primeira edição, foi planejado em um formato de participação por adesão, cabendo à
municipalidade o papel de organizador e divulgador, estimulando e incentivando a colaboração da
comunidade, envolvendo instituições públicas e privadas, universidades e artistas locais.
O relato desta experiência ímpar que Pelotas construiu durante os últimos 4 anos reflete a importância
da gestão de politicas públicas de preservação que atuem diretamente junto as comunidade. Pois, sem
dúvida, este tipo de ação tem um alcance bem maior, com resultados em curto, médio e longo prazo.

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A cada ano o evento foi desenvolvido permeando uma temática específica, em 2013, para abrir o
debate o tema escolhido foi: “O que é Patrimônio?”; em 2014 a abordagem focou em nossas raízes
culturais tendo como tema: “A herança cultural Africana”; em 2015 foi abordado o caráter ambiental do
patrimônio com o tema: “Pelotas Natural - Patrimônio das Águas”; já em 2016 o enfoque foi baseado no
papel da mulher na constituição do patrimônio, tendo como tema: “A Ocupação Feminina”.
A primeira edição do evento que ocorreu nos dias 17 e 18 de agosto de 2013 superou a expectativa da
organização e foi sem dúvida uma ação cultural de grande repercussão na comunidade local e regional.
Em 2014 a novidade no formato do evento foi a inserção da ação intitulada “Conversas do Dia do
Patrimônio”; reuniões semanais realizadas durante os meses de junho e julho, às quartas feiras, nas
quais palestrantes e comunidade expõem e debatem sobre o tema proposto, resultando na publicação
de uma revista com textos sobre os temas abordados. Já em 2015, a inovação foi a ampliação do
evento que teve início na sexta-feira, quando a programação é direcionada ao público escolar da rede
pública municipal e estadual.
Um dos principais destaques do evento, desde sua primeira edição, é a participação de estudantes,
principalmente universitários, das mais variadas áreas do conhecimento que atuam como Agentes do
Patrimônio. Após treinamento, são eles que figuram juntamente com a equipe de técnicos da Secretaria
de Cultura na receptividade da comunidade e na organização das atividades culturais como:
exposições, oficinas, palestras e danças que ocorrem em espaços abertos e nos prédios históricos
sinalizados com bandeirolas coloridas e abertos para visitação.
A experiência acumulada durante as primeiras edições nos honrou, em 2017, com o Prêmio Rodrigo
Melo Franco de Andrade, fato que nos permitiu compreender a dimensão e o alcance do evento,
percebendo o quanto as ações desenvolvidas afloraram o debate sobre a identidade cultural local e
despertaram na população uma nova perspectiva, mais participativa, sobre nossa cultura e patrimônio.

Palavras-chave: Patrimônio; cultura; apropriação; comunidade.

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Introdução

A celebração ao patrimônio histórico promovida em Pelotas, desde 2013, tem a cada ano
tornado mais evidente a participação da comunidade na constituição da cultura do município.
A diversidade de ações inseridas na programação do evento intitulado “Dia do Patrimônio”,
que ocorre durante um final de semana de agosto, representa uma nova perspectiva em
defesa da preservação do patrimônio. Preservação esta que tem relação com o sentimento de
pertencimento e com a valorização da cultura a partir da comunidade, ou seja, das pessoas.

A proposta tem como principal objetivo aproximar a comunidade do, já reconhecido,


Patrimônio Cultural da Cidade, proporcionando um novo olhar sobre a identidade e a cultura
local a partir das mais variadas formas de manifestações artísticas representativas da
comunidade pelotense.

“O Patrimônio Cultural de uma nação, de uma região ou de uma


comunidade é composto de todas as expressões materiais e espirituais
que lhe constituem, incluindo o meio ambiente natural.”

(Declaração de Caracas, 1992)

Inspirações / Precedentes

Nossa principal inspiração tem por base o evento que ocorre no Uruguai desde 1995, quando
se celebra o Día Del Patrimonio no mês de outubro, seguindo ações semelhantes realizadas
em diversos outros países. Os uruguaios comemoram sua cultura e história interagindo em
espaços abertos e abrindo as portas de edificações relevantes para a cultura da sociedade, os
quais abrigam ações dos mais variados tipos, envolvendo artistas, atores, memorialistas,
historiadores e educadores patrimoniais.

Já no Brasil, a data comemorativa ao patrimônio ocorre no dia 17 de agosto, aniversário de


Rodrigo Melo Franco de Andrade, advogado e jornalista mineiro, contemporâneo de Manuel
Bandeira, Portinari, Mario de Andrade, e Sergio Buarque de Holanda. Fundou e comandou o
Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN, atual IPHAN), desde sua
fundação em 1937 até 1967.

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Pelotas, Patrimônio - Contextualização histórico-cultural.

Com uma formação étnica muito variada, a partir do processo de colonização por portugueses,
africanos, alemães, pomeranos, italianos, franceses e poloneses, Pelotas constituiu-se
culturalmente com base na diversidade, representada nas mais diversas formas de viver, de
fazer e de saber.

Localizada ao sul do Rio Grande do Sul, Pelotas é hoje considerada um atrativo pólo regional
da metade sul do estado, principalmente na área educacional. Atualmente, com mais de
340.000 habitantes, convive com os problemas recorrentes de uma cidade de porte médio.

Historicamente comprova-se que a formação urbana da cidade de Pelotas foi propiciada pelo
desenvolvimento econômico gerado pela produção do charque, atividade que, até as primeiras
décadas do século XX, passou a ser a principal fonte econômica de desenvolvimento da
região. Estudos realizados por pesquisadores como Mário Osório e Ester Gutierrezi, confirmam
os dados de que, foi a partir do acúmulo de riquezas gerado pela produção do charqueii que o
núcleo urbano se desenvolveu, fortemente influenciado pela tradição eclética da Europa,
adquirindo peculiaridades locais, fato que tornou Pelotas uma cidade valorizada culturalmente,
com identidade própria.

Atualmente o grande acervo histórico remanescente representativo dos períodos de formação


da cidade, desde as típicas charqueadas do período colonial e imperial brasileiro, até as
edificações de características protomodernas do final dos anos 20, passando pelos típicos
casarões urbanos ecléticos que ocupam o centro histórico de Pelotas, fazem parte do rico
patrimônio arquitetônico que resguarda a memória dos saberes e fazeres do passado. A
cidade conta com 25 bens tombados em nível federal, estadual e municipal, além de 1.700
imóveis integrantes do Inventário do Patrimônio Histórico protegidos por legislação municipal –
Lei 4568/2000, base das políticas de preservação que tiveram início no município, ainda na
década de oitenta.

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O perfil e a organização do Evento

Somando-se à tradição cultural de valorização e reconhecimento do patrimônio histórico, que


vem por longas décadas construindo uma política local de gestão voltada à preservação
patrimonial, que o evento Dia do Patrimônio surgiu em 2013. Trata-se de um evento aberto a
toda comunidade, tomado como uma ação de sensibilização, na qual toda e qualquer atividade
cultural, seja em grupo ou individual, seja de instituição pública ou privada, seja no centro ou
no bairro, é benvinda à participação e interação com as diferentes temáticas e abordagens em
torno do tema Patrimônio Histórico.

Cabe à municipalidade, através da Secretaria de Cultura, o papel de organizador e divulgador


do evento, estimulando e incentivando a adesão da comunidade. Cada participante encaminha
suas propostas de atividades efetivando sua inscrição no evento e inserindo-se
automaticamente na programação geral. As ações são gradativamente alocadas nos prédios
históricos disponibilizados para visitação e nos espaços abertos.

A sinalização das atividades e dos prédios históricos, que também é promovida pela
Secretaria de Cultura, deixa a cidade alegre e atrativa. Todos os bens tombados recebem
bandeirolas coloridas diferenciando os três níveis de tombamento. Os espaços abertos
voltados à realização de atividades culturais ao ar livre também são identificados.

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Fig. 01 – Atividades e Ações realizadas – fonte: SECULT - Pelotas / RS

A figura dos agentes

Considerando que Pelotas é uma cidade universitária que acolhe vários cursos de graduação
e pós-graduação voltados à área de preservação patrimonial como: arquitetura, conservação e
restauro, turismo, museologia, memória social e patrimônio, é que o evento buscou um
mecanismo de interagir com esta população que, de certa forma, já encontra-se engajada na
temática. Assim surgiu a figura do Agente do Patrimônio, mediador das atividades
desenvolvidas durante o evento que atua diretamente junto à população monitorando,
apoiando e esclarecendo a comunidade participante.

A organização realiza chamadas dentro das universidades para adesão dos estudantes como
voluntários. O grupo de inscritos passa por um treinamento prévio promovido pela Secretaria
de Cultura com participação de professores universitários e técnicos da área da cultura.
Recebem noções de patrimônio e são inseridos nas temáticas abordadas em cada edição.

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Além de contribuírem na dinâmica das atividades durante o evento, após o treinamento, os
agentes configuram-se como multiplicadores e divulgadores, transmitindo para os mais
variados grupos a iniciativa em prol do patrimônio local.

Em nossa última edição realizada em 2016, buscando envolver cada vez mais diferentes
camadas da sociedade, as inscrições para agentes abrangeram também estudantes do ensino
médio de escolas públicas municipais e estaduais, ampliando ainda mais a abrangência da
ação, a qual atualmente é entendida como fundamental para o sucesso do evento.

Fig. 02 - Treinamento e atuação dos Agentes do Patrimônio – fonte: SECULT - Pelotas / RS

As temáticas abordadas em cada edição

Dando início ao debate, em 2013, o tema proposto trouxe uma indagação, - O que é
Patrimônio? – traduzido em um enfoque que recaiu sobre o conceito de patrimônio. Trazendo
à tona os avanços conceituais do tema e a atual abrangência do significado da palavra
patrimônio. Instigando a população a pensar em uma perspectiva mais atual das relações
entre patrimônio material e imaterial, cultural e ambiental, histórico e contemporâneo.

Estas reflexões tiveram como principal objetivo dar início a um processo de rompimento da
noção de patrimônio, historicamente instituída e fortemente relacionada às camadas elitizadas,
aos vestígios materiais, a herança europeia e aos chamados monumentos, ou seja, as

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grandes edificações, os casarões, ignorando as outras inúmeras parcelas também
representativas do patrimônio histórico e cultural local.

Foram atualizadas as discussões a cerca do tema no sentido de abarcar uma infinidade de


outros aspectos representativos das demais etnias além das tradicionais, como os indígenas,
os diversos povos africanos, os imigrantes, os quilombos, as vilas, bem como as formas de
viver, as lendas, as histórias, a arte, e todos os aspectos materiais e imateriais produzidos
pelas pessoas e sua cultura.

A primeira edição em 2013 contemplou uma intensa programação com ações em diversos
lugares da cidade, como o Centro Histórico, a Colônia, as Charqueadas, a praia do Laranjal.
Incluiu palestras, exposições, apresentações artísticas, visitas guiadas, degustações e mostras
culturais.

A partir da abordagem desenvolvida no ano anterior, em 2014 a temática foi mais direcionada -
Herança Cultural Africana - enfocando os aspectos das nossas origens culturais. Foi tratado
o caráter da diversidade e da multiplicidade dentro da constituição do patrimônio de uma
sociedade, celebrando a pluralidade étnica e seus reflexos na formação da cultura dos
pelotenses.

Diante da complexidade do tema a organização do evento sentiu a necessidade de um debate


diretamente com a comunidade, inaugurando assim as “Conversas do Dia do Patrimônio”.
Encontros semanais, abertos à comunidade, realizados as quartas feiras durante os meses
que antecedem o evento, nos quais personalidades envolvidas com o tema são chamadas
para depoimentos e palestras.

O evento em 2014, segundo o secretário de cultura Giorgio Ronna, representou um mergulho


no processo de construção da paisagem humana da cidade. Os encontros realizados durante
treze quartas-feiras ininterruptas com personalidades da cultura afro e a população pelotense
apresentaram aspectos da historicidade, memórias, visões de mundo, crenças e tradições dos
africanos e afrodescendentes.

Durante os dois dias de evento foram 102 atividades distribuídas em 38 locais, incluindo
atividades culturais, como visitação aos prédios históricos, expressões religiosas,

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manifestações artísticas ao ar livre, oficinas étnicas, ações de educação patrimonial, vivência
griô, dança afro, hip hop, capoeira e mostra fotográfica.

A terceira edição realizada em 2015 evidenciou o caráter ambiental do patrimônio cultural com
o tema - Pelotas Natural – Patrimônio das Águas. A escolha do tema voltou-se diretamente
à relação com a origem e formação da cidade a partir das charqueadas, estabelecimentos de
perfil industrial onde se produziam carne salgada (charque), cuja implantação foi definida com
base na hidrografia da região. A comunicação com grandes portos possibilitada através do
Arroio Pelotas e Laguna dos Patos permitia o escoamento da produção do charque e a
chegada do açúcar, matéria prima para a produção de doces, atualmente reconhecidos como
Patrimônio Imaterial da cidade. Até mesmo o nome da cidade tem relação com as águas,
originou-se das embarcações de varas de corticeira forradas de couro, usadas para a
travessia dos rios na época das charqueadas, chamadas de “pelota”.

Nesta edição as Conversas do Dia do Patrimônio se consolidaram como ação permanente que
antecede o evento, encontros de aproximação e provocação que instigam o debate e a
interação da comunidade com o tema.

A novidade da edição de 2015 ficou por conta da ampliação dos dias do evento, que passou a
ser realizado a partir da sexta feira, quando a programação foi direcionada as escolas públicas
municipais e estaduais. Esta decisão foi resultado da demanda observada nas edições
anteriores. Muitos professores procuravam participar com seus alunos do evento, mas as
atividades desenvolvidas apenas no final de semana restringiam a participação das escolas.
Na sexta feira uma agenda específica de visitação mediada ao centro histórico foi programada
para receber o público estudantil e, assim, semear a cultura e promover a educação
patrimonial.

Em 2016 a abordagem ficou em torno da representatividade do papel da mulher na


constituição histórica e cultural de Pelotas com o tema – Ocupação Feminina, evidenciando
as mulheres célebres e anônimas que nasceram ou viveram no município e que fizeram de
Pelotas uma cidade múltipla, dinâmica, cultural. As Conversas do Dia do Patrimônio
desenvolvidas em torno do tema trouxeram à tona um debate sobre questões bem atuais que
envolvem discriminação social, violência e participação feminina em todos os setores da
sociedade.

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Para este ano de 2017 a municipalidade, através da Secretaria de Cultura, propõe um novo
desafio com a temática – Territórios daqui: identidades e pertencimento, quando se
pretende levar para as comunidades dos bairros a reflexão sobre suas raízes e identidade,
identificando as características peculiares de cada lugar, valorizando os espaços e suas
representatividades. Será uma forma de auto reconhecimento e interlocução direta com as
comunidades através de reuniões, que já estão ocorrendo, junto às associações de bairro.

Fig. 03 - As temáticas abordadas em cada ano – fonte: SECULT

Material de promoção do evento

A cada edição são produzidos seis postais representativos do evento, a seleção de imagens é
realizada de forma a contemplar a diversidade da cultura dentro da temática proposta para o
evento. Como exemplo citamos a coleção produzida em 2013, quando o evento focou na
indagação “O que é Patrimônio?” e foram escolhidas imagens representativas das diferentes
formas de manifestação do patrimônio: 1) Mercado Central – imagem do patrimônio histórico
edificado, palco de práticas sociais do passado e da atualidade; 2) Zoólito de tubarão (zoo,
animal e lito, pedra) – imagem representativa do patrimônio arqueológico; 3) Theatro Sete de
Abril – imagem representativa do patrimônio material com significados relacionados à arte e à
cultura da sociedade pelotense; 4) Doces de Pelotas – imagem representativa do patrimônio
imaterial, símbolo dos saberes e fazeres da cultura local; 5) Travessia da Pelota no Arroio
Pelotas – imagem representativa do patrimônio ambiental com vinculo à história e a origem da

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cidade; Regional Avendano Júnior – imagem representativa da cultura popular manifestada
através da musicalidade.

A Revista do Dia do Patrimônio produzida desde 2014, quando teve início as Conversas do
Dia do Patrimônio, é um material educativo e de divulgação do evento que contempla a
programação das atividades e, principalmente, registra os relatos e as experiências dos
protagonistas das conversas do dia do patrimônio. Trata-se de um material de reflexão sobre o
tema e de registro das ações desenvolvidas antes e durante o evento.

As quatro coleções de postais e as três edições da revista produzidas até o momento


representam um testemunho da história do evento, são 24 imagens e três documentos que
registram os marcos culturais das temáticas abordadas anualmente.

Outra forma de divulgação e promoção do evento é a padronização da equipe de organização


e dos agentes do patrimônio com camisetas personalizadas. Também são investidos recursos,
dentro das possibilidades financeiras do município, na produção de material de educação
patrimonial, como folheteria, banner e folders.

Fig. 04 – Amostra das coleções de postais – 2013 a 2016 – fonte: SECULT

O reconhecimento da Ação

“O dia em que a história deixa de ficar presa nos casarões e vai para as ruas”. Assim a página
do IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - publicou em 22 de setembro
de 2016, notícia sobre as festividades do Dia do Patrimônio em Pelotas. Uma das ações

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vencedoras da 29º Edição do Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, entre as 60 propostas
apresentadas de vários estados do Brasil.

O projeto foi um dos vencedores da segunda categoria que, segundo o IPHAN, visa
desenvolver iniciativas de excelência em promoção e gestão compartilhada do patrimônio
cultural, envolvendo todos os campos da preservação e oriundas do setor público, do setor
privado e das comunidades.

A cerimônia de premiação ocorreu no dia 20 de outubro de 2016 no Teatro Castro Alves, em


Salvador, na Bahia, consolidando a importância do evento como política de gestão patrimonial.

Em 2015 o Dia do Patrimônio também foi vencedor do prêmio promovido pela FAMURS -
Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul - em parceria com o
Conselho dos Dirigentes Municipais de Cultura do Rio Grande do Sul. O evento foi premiado
na categoria Museus, patrimônio e memória.

Conclusão

Mesmo diante de todas as dificuldades inerentes de uma sociedade brasileira nos dias atuais,
Pelotas buscou, através dos recursos disponíveis, principalmente humanos, um caminho para
valorização da cultura local através das relações da comunidade com seu patrimônio, seja ele
histórico ou contemporâneo, exaltando desde suas origens até as práticas atuais de
reconhecimento cultural.

O relato de nossa experiência representa uma das infinitas possibilidades de atuação pública
na gestão do patrimônio cultural. Cabe a cada comunidade, motivada e apoiada por seus
gestores, se redescobrir através de suas potencialidades e buscar mecanismos que valorizem
sua cultura e dignifiquem suas ações, se reconhecendo como parte da identidade cultural do
seu lugar.

A celebração ao Dia do Patrimônio, em Pelotas, consolidou-se como uma ação permanente da


gestão das políticas públicas do município e representa hoje um elo entre o público e o
privado, entre o centro e o bairro, entre o histórico e o contemporâneo, enfim, entre as

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pessoas e a diversidade cultural, perpetuando a história da cidade de maneira ativa na
dinâmica atual da sociedade.

Referências Bibliográficas

ARRIADA, Eduardo. O processo de urbanização pelotense, 1780-1835. Dissertação (Mestrado em


História) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul, 1992.

FONSECA, Maria Cecília Londres. O patrimônio em processo: trajetória da política federal de


preservação no Brasil. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro – IPHAN, 1997.

GUTIERREZ, Éster Bendjouya. Barro e Sangue: mão-de-obra, arquitetura e urbanismo em Pelotas.


(1777-1888). Pelotas: Editora da UFPEL, 2004.

MAGALHÃES, Mário Osório. Opulência e cultura na província de São Pedro do Rio Grande do Sul.
Pelotas: Ed.UFPel, 1993.

PELOTAS. “Lei Municipal nº. 4568”, de 07 de julho de 2000. Estabelece áreas da cidade como
zonas de preservação do Patrimônio Cultural de Pelotas – ZPPCs – lista seus bens e dá
outras providencias.

https://www.youtube.com/watch?v=J8pbQZz6d-M

i Mário Osório de Magalhães, historiador, professor da Universidade Federal de Pelotas, já realizou estudos
importantes sobre a história de Pelotas como: “Os passeios da cidade antiga: guia histórico das ruas de Pelotas” e
“Pelotas: século XIX”. Ester Judite Bendjouya Gutierrez, arquiteta e urbanista Doutora em História pela PUC-RS e
Especialista em Gestão do Patrimônio Cultural Integrado ao Planejamento pela UFPE-PE, autora de obras como
“Negros, Charqueadas e Olarias – um estudo sobre o espaço pelotense” e “Barro e Sangue, mão-de obra,
arquitetura e urbanismo em Pelotas (1777-1888).
ii Carne bovina, salgada e seca ao sol em mantas, produzida em estâncias conhecidas por “Charqueadas”.

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O ESTUDO DE ELEMENTOS DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO AO
ALCANCE DA SOCIEDADE: A RELAÇÃO DAS OBRAS RELIGIOSAS
ENTRE PORTUGAL E BRASIL, A INFLUENCIA PORTUGUESA.

MIGUEL, ELEUSY N.

1. Universidade Federal de Viçosa


eleusy.miguel@ufv.br

RESUMO

O patrimônio é um dos elementos mais relevantes para reger identidades e memórias. A


apropriação da sociedade do bem patrimonial se dá quando são elaboradas estratégias que ofereçam
possibilidades para a comunicação, a informação e o aprendizado, a relação entre os técnicos e os
cidadãos, nas escolas, na participação civil nas tomadas de decisão junto aos governantes, e em
qualquer interação que promova um diálogo acerca do patrimônio. O Estudo de caso sobre o
patrimônio arquitetônico enriquece a discussão aqui proposta. A sociedade colonial mineira fascinava
e atraía muitos migrantes para suas terras com a promessa de enriquecimento. Neste cenário as
construções do século XVIII se colocam como a mais expressiva produção arquitetônica e artística da
sociedade mineradora. O presente trabalho tem por objeto principal aferir como um estudo específico
sobre patrimônio numa versão técnica e direcionada a área científica, poderia chegar ao alcance da
população. Especificamente pretende-se elencar dispositivos que atinjam a sociedade onde estão
inseridas as igrejas, de forma criativa e eficiente. Outros objetivos relativos ao estudo das igrejas são:
traçar um brevíssimo panorama sobre o estilo colonial no Brasil e sobre o elemento arquitetônico:
torre, e por fim, correlaciona-las às construções desses mesmos elementos nas Igrejas do Norte de
Portugal. O percurso metodológico utilizado para atender aos objetivos foi: pesquisar fontes
bibliográficas e analisar fontes primárias; levantamento das teorias e estudos que regem esta
discussão sobre arquitetura religiosa colonial mineira e o estudo sobre patrimônio e sociedade.
Conclui-se, no tocante ao estudo de caso que as torres sineiras estudadas foram influenciadas, de
alguma forma, pela cultura árabe, que por sua vez, tem forte influência na península ibérica, o que
justifica esse alcance de elementos forjados ao gosto arábico. Com relação ao patrimônio, entendeu-
se que é preciso que haja exposição e acesso ao patrimônio, material e imaterial, de forma clara, para
que este seja apropriado pelos integrantes de uma sociedade.

Palavras-chave: População e patrimônio; Arquitetura religiosa; Patrimônio arquitetônico; Identidade


cultural.

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1. Introdução

O patrimônio é um dos elementos mais relevantes para reger identidades e


memórias. Para o censo comum, patrimônio é considerado como um conjunto
de bens, direitos e obrigações vinculado a uma pessoa ou a uma entidade. Já no espectro
técnico científico, patrimônio abarca mais especificidades como todas as “formas de
expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações
artístico-culturais; os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e científico” (Portal do IPHAN, 2017). Pode-se
considerar também que, na contemporaneidade, esse conceito é forjado em função da
identidade e do lugar onde está estabelecido.
A apropriação da sociedade do bem patrimonial se dá quando são elaboradas
estratégias que ofereçam possibilidades para a comunicação, a informação e o aprendizado,
a relação entre os técnicos e os cidadãos, nas escolas, na participação civil nas tomadas de
decisão junto aos governantes, e em qualquer interação que promova um diálogo acerca do
patrimônio. Nessa perspectiva, se desenvolve a construção da cidadania e o entendimento
do que seja identidade. Faz-se necessário então, uma reflexão por parte dos interessados
nesse processo em todas as áreas de atuação, do que é individual no que se torna coletivo,
em suma, há uma constante transação entre coletivo e individual resultando numa
construção de identidade, afinal, “referências identitárias são construídas e desconstruídas
num processo dialético, fazendo com que ocorra uma transformação, um deslocamento de
identificações no contato com o outro e com as mais diversas influências externas” (Munaier
e Dias, 2013, p. 10).
As instituições imbuídas de compromisso social e educacional promovem a
produção patrimonial e cultural de forma a alcançar o cidadão. Dessa maneira,
desenvolvendo esses conceitos numa sociedade, esta abarcará todas as manifestações
como sua, apropriando o bem (material ou imaterial) a seu cotidiano.
Se comportando como ponto de entrecorte desse trabalho, o estilo colonial brasileiro,
especialmente o barroco, é um campo frutífero de pesquisas e análises, em especial na
região da então capitania das Minas Gerais. Partindo desse pressuposto, é que o tema
escolhido se descortina, a arquitetura religiosa dessa etapa da historia mineira.
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Especificando um pouco mais, o foco desse artigo é o estudo de um patrimônio, as torres
das Igrejas Matrizes de Catas Altas e Itabirito em Minas e a conexão com igrejas localizadas
no norte de Portugal, e como esse espoco poderia chegar ao alcance da população, como
seria possível essa apropriação perpassando do científico (o estudo técnico), ao acesso
desse material produzido, pela comunidade que utiliza esses templos cotidianamente.
Baseando nas considerações, do patrimônio e da pesquisa, o presente trabalho tem
por objeto principal aferir como um estudo específico sobre patrimônio numa versão técnica
e direcionada a área científica, poderia chegar ao alcance da população. Especificamente
pretende-se elencar dispositivos que atinjam a sociedade onde estão inseridas as igrejas, de
forma criativa e eficiente. Outros objetivos relativos ao estudo das igrejas são: traçar um
brevíssimo panorama sobre o estilo colonial no Brasil e sobre o elemento arquitetônico:
torre, e por fim, correlaciona-las às construções desses mesmos elementos nas Igrejas do
Norte de Portugal.
O percurso metodológico a ser utilizado para atender aos objetivos propostos, foi:
pesquisar fontes bibliográficas e analisar fontes primárias; levantamento das teorias e
estudos que regem esta discussão sobre arquitetura religiosa colonial mineira e o vasto
estudo sobre patrimônio e sociedade.

2. O caso das torres mineiras

No transcurso da humanidade, os povos imprimem suas marcas no tempo de


diversas formas: na ciência, na teologia, na tecnologia e em especial na arte. Todo signo
(verbal, plástico, musical, gestual, físico) é uma imagem exterior de imagens mentais, logo,
metáfora da metáfora (Hansen, 2006). Essas marcas conferem ao homem o diferencial
entre os animais, ou seja, [...] “é o único animal que deixa registro atrás de si, pois é o único
animal cujos produtos chamam à mente uma ideia que se distingue da existência material
destes” (Panofsky, 1991, p. 23).
Na arquitetura não é diferente, essas marcas impressas por civilizações deixam
pistas da forma que existiram e como viveram o que era realmente relevante àquela
determinada sociedade, suas atribuições político-econômicas, religiosas e culturais, de
forma física no ambiente onde se viveu, por meio das construções e formações urbanísticas
como arruamento, pontes, largos, etc.
Ao realizar atividades - na sua lida diária de “ser-no-mundo” -, o homem faz
acontecer no espaço (especializa) as suas intenções, os seus desejos.
Nesse processo, ele dispõe objetos, sinais e marcas, para adequar o
ambiente àquilo que ele quer especializar; assim ele cria lugares, dando
forma física às suas intenções, aos seus desejos. A disposição dos objetos
e dos sinais, bem como a marcação do ambiente não são feitas
aleatoriamente. Elas são intencionais; são para um fim específico, um
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propósito e, por isso, elas possuem um significado. É dessa maneira que o
homem cria os lugares e significativos: os lugares arquitetônicos. Como as
intenções têm fundamento no desejo, o que foi criado para a manifestação
das intenções contém os significados do desejo. Pode-se dizer, então, que
o espaço arquitetônico é a espacialização do desejo (Malard, 2006, p 36-
37).

Dessa maneira, os muitos estilos arquitetônicos se manifestam dentro da arte,


complementando as demais artes e explicitando seus valores, suas atribuições inseridas a
sociedade e a época pertencente, assim, delegam ao tempo suas muitas interpretações.

[...] A peculiaridade da arquitetura não pode ser imaginação formal, porque,


nesse caso, não se distinguiria da pintura ou da poesia; e não pode ser a
lógica e a técnica da construção, que se encontram em outros artefatos que
não são arquitetura. Típico da arquitetura é o projeto das formas tendo em
vista a execução, ou seja, a operação de projetar (Argan, 2005, p 199).

O barroco é considerado um desses estilos1 artísticos. É importante buscar entendê-


lo, o período dito barroco, por meio das formas que se configuraram a sociedade, sugerindo
um diálogo da cultura com a sociedade em questão. Faz-se necessário então, considerar
uma mistura artística de várias sociedades primando por um produto com formas
universalizadas (BOHRER, 2007; FERNANDES, 2005). À luz desse enfoque, “o barroco2 só
é explicável pelo contexto histórico que o fomentou” (BOHRER, 2007, p. 25).
A sociedade colonial brasileira era subordinada às leis da igreja e da política,
todavia, a representação artística que esta repressão gerava é de certa forma antagônica,
assim o questionamento das aparências por meio de uma representação teatral colocando o
fantástico no quotidiano, a reflexão sobre a fugacidade da vida, a ornamentação excessiva,
e a possibilidade de múltiplas leituras, todos estes aspectos podem ser encontrados nas
manifestações barrocos de Minas Gerais (GOULÃO, 1996).
Os arquitetos e engenheiros eram influenciados pelos tratados e neles se balizavam,
tratados os quais, eram muito claras as normas estabelecidas para os projetos das
determinadas construções, dentre elas, as igrejas. Assim. “A arte religiosa se portava como
canal de propagação dos dogmas católicos ao maior número possível de fiéis, para encantá-
los e convencê-los de seu esplendor e riqueza” (Garcia, 2005, p. 22), dessa maneira fica

1 Sabe-se o quão polêmico e contraditório é o uso do termo ‘estilo’.

2 Pesquisadores atribuem o termo Barroco basicamente a duas hipóteses: a primeira como alusão as pérolas irregulares, e a
segunda, oriunda do italiano “baroco”, que denotaria um desvio no pensamento lógico e elaboração de metáforas.

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explícita a importância da arquitetura religiosa na colônia. Havia um rigor na ordem, o
projeto deveria ser adequado com conformidades às normas, as regras, essa ordem não
seria simplesmente um atributo apenas, e sim um princípio.
Motivadas pelas promissoras descobertas de minas de ouro, muitas pessoas
migraram para Vila Rica e arredores. De diferentes etnias e ofícios, esses indivíduos
difundiram seus conhecimentos e influenciaram a cultura artística nas Minas Gerais colonial.
Dentre a diversidade de imigrantes, notam-se arquitetos, construtores, engenheiros militares
advindos da Europa Central, Lisboa Portugal.
O período do Barroco em Minas Gerais foi regido por imensa efervescência artística,
mesmo sendo decorosa onde à imitação era a premissa, e com cunho abastado, ou seja,
havia fontes que financiavam essa expectativa religiosa imprimida na arquitetura, o
resultado disso foi o conjunto primoroso de obras da época. As matrizes das cidades de
Catas Altas e Itabirito podem ser consideradas fruto dessa produção.
O elemento chamado de torre na arquitetura tem sua relevância na estrutura
compositiva dos edifícios, no sentido de, conferir harmonia a obra arrematando a, ou as,
laterais do frontispício. Esse componente atribui simbolismo também à cultura local onde
está inserido, uma vez que, é nele que se dispõem o sino das igrejas. Elemento este, o sino,
fundamental no período colonial por se tratar do meio de comunicação das localidades. Era
por meio dos tipos de toque de sino que se anunciava falecimentos, desastres, chegada de
ilustres, festas religiosas dente outros acontecimentos. Esse “costume” ainda pode ser visto
hoje em dia, especialmente nas cidades ditas históricas e é um considerado um bem
imaterial cultural.
Nas igrejas, esse ponto de partida caminhava junto aos detalhes de
aparência militar: as torres, como aquelas da guarda e observação, foram
num primeiro momento suprimidas para que o sino ganhasse destaque.
Este era colocado em armações de madeira ou em suportes sobre a
fachada, denotando à torre o símbolo de hierarquia que era próprio às
igrejas matrizes. (Garcia, 2005, p. 30-31).

As figuras 01 e 02 foram elaboradas pela autora com fotografias do seu arquivo


pessoal. Elas pretendem fazer uma análise dos elementos compositivos das torres das duas
igrejas em questão, e especialmente chamar a atenção para o formato bubônico, ao estilo
mouro, que coroam as mesmas.

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Figuras 01: Igreja Nossa Senhora da Conceição, Catas Altas - MG

Figuras 02: Igreja Nossa Senhora da Boa Viagem, Itabirito - MG

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Com base nas imagens acima, pode-se inferir que, a semelhança das torres de
ambas as igrejas é nítida. Apesar de contarem com materiais distintos, as formas se
aproximam muito uma da outra.
As torres são iniciadas em secção quadrada; possuem três partes (base, meio e
término com coroamento); possuem cimalhas e coruchéu em pedra; são emolduradas em
cantaria, tanto as laterais quanto as aberturas que os sinos e relógio são dispostos; os
pináculos piramidais levemente curvos são finalizados em bulbos alongados; esses
pináculos são encimados por cruzes latinas.
A região norte de Portugal é composta pelos distritos3: Viana do Castelo, Braga,
Porto, Vila Real, Bragança, Viseu e Aveiro. Essa região é considerada o ponto inicial da
formação do país e é responsável por um dos produtos mais característicos e que mais
representa seu povo, o Vinho do Porto.
A produção artística, arquitetônica e cultural dessa região também merece destaque
por sua exuberância e grande riqueza cultural. È importante lembrar para que tenhamos
uma conexão mais apurada com as torres dos dois países, que, dessa região migraram para
o Brasil muitos portugueses para que a coroa efetivasse a ocupação do território então
descoberto e conquistado. Dessa maneira, conhecimentos e influencias obviamente
acompanharam estes imigrantes e se explicitaram na cultura e no patrimônio construído no
período colonial.
A igreja portuguesa disposta a seguir, figuras 03 e 04, é um exemplo concreto da
semelhança das características mouras com as torres das igrejas de Catas Altas e Itabirito
em Minas Gerais, Brasil. É válido salientar que há uma gama considerável de igrejas com o
mesmo formato de torre na região norte de Portugal: o Santuário do Senhor do Socorro na
freguesia de Labruja; a Igreja de Santo Antônio na freguesia de Arcozelo da Torre; a Igreja
de Aguiã na freguesia de Gondoriz; a Igreja de Nossa Senhora da Conceição Arcos de
Valdevez na freguesia de Miranda; a Igreja do Divino Espírito Santo no distrito de Viana do
Castelo; o Mosteiro de Santo Martinho de Tibães, antiga sede da Congregação Beneditina
portuguesa, em Braga. É conveniente salientar que nem todas as igrejas, com essa
característica árabe, foram aqui elencadas. A região norte de Portugal é bastante extensa e
possui uma produção religiosa e arquitetônica também muito extensa.
O foco do observador doravante é a parte superior da edificação religiosa, é para o
coroamento, a forma e os adornos da torre.
A Paróquia Nossa Senhora de Monserrate é uma comunidade da freguesia de
Monteserrate na cidade de Viana do Castelo.

3 Os Distritos em Portugal correspondem aos estados no Brasil.

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Figuras 03 e 04: Igreja Nossa Senhora da Agonia

Fonte: http://paroquiamonserrate.com/index.php?seccao=grupodetalhe&conteudo=193

Como se pode notar, a igreja portuguesa supracitada é dotadas de torre com


finalização muito próxima às mineiras, com angulação e ornamentos diferentes, entretanto,
com a forma bulbosa em comum, obedecendo a essa premissa.

Ademais, o que realmente pode-se extrair dessa breve apreciação da igreja


portuguesa, com foco central em sua torre, é que, sem sombra de dúvida, essa tem
semelhança considerável com as torres das igrejas de Catas Altas e Itabirito, levando a crer
na transposição, por algum meio de conhecimento e ou comunicação da Coroa para a
Colônia, do desenho e técnica de feitura dessas torres sineiras brasileiras. Confirmando a
suspeita inicial desse estudo, a influência portuguesa, especificamente do norte daquele
país, na produção arquitetônica de cidades mineiras pertencentes ao ciclo do ouro.

3. O patrimônio e a sociedade

Pode-se entender por sociedade, de forma simplista é claro, um agrupamento de


seres que convivem em estado gregário e em colaboração mútua. Em relação ao âmbito
humano, constituiria em um grupo humano que habita em certo período de tempo e espaço,
seguindo um padrão comum; coletividade. Esse agrupamento de indivíduos que
reverenciam um estatuto ou regulamento comum seria a gênese de uma sociedade cultural.
Silva (2000) faz uma consideração nesse sentido,

O património não é só o legado que é herdado, mas o legado que, através


de uma selecção consciente, um grupo significativo da população deseja
legar ao futuro. Ou seja, existe uma escolha cultural subjacente à vontade
de legar o património cultural a gerações futuras. E existe também uma
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noção de posse por parte de um determinado grupo relativamente ao
legado que é colectivamente herdado (Da Silva, 2000, p. 218).

No que tange à participação do indivíduo na sociedade, é o momento de inclusão e


atuação desse indivíduo ao tomar para si direitos e deveres de cidadão. Essa postura é fruto
de um processo dinâmico na construção tanto da sociedade quanto do indivíduo enquanto
cidadão, nessa perspectiva, à formação patrimonial segue a mesma linha de raciocínio. É
preciso que haja exposição e acesso ao patrimônio, material e imaterial, de forma clara,
para que este seja apropriado pelos integrantes de uma sociedade. É preciso a construção
de uma identidade social para captar o patrimônio, “e, assim, a cultura seria o meio pelo
qual um grupo estabelece marcações de fronteiras para sua identidade, estruturando assim
discursos na e pela cidade” (Bittencourt e Coellho, 2010, p.16).

Para tal, é preciso algumas ações de instituições detentoras da promoção do


patrimônio como coordenação, regulação e fomento, a exemplo o próprio IPHAN. Dessa
maneira as ações relativas a essa promoção se tornam mais efetivas, articuladas e
fortalecidas. E a base desse desenvolvimento perpassa pela informação, que afeta
diretamente essa promoção, como evidencia Munaier e Dias, (2013):

De qualquer maneira, o acesso à informação provê o direito ao exercício da


democracia e da cidadania, assim como de uma coletividade mais
igualitária, baseada dentre outras perspectivas, nas possibilidades
tecnológicas. Uma sociedade munida de conhecimento e cultura é capaz de
tomar decisões sábias e proveitosas para serem aplicadas no meio em que
vivem” (Munaier e Dias, 2013, p. 6).

O patrimônio é definido na Carta Magna Brasileira e abrange toda manifestação de


cultura, como registra a página do Portal do IPHAN:

A Constituição Federal de 1988, em seu Artigo 216, ampliou o conceito de


patrimônio estabelecido pelo Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937,
substituindo a nominação Patrimônio Histórico e Artístico, por Patrimônio
Cultural Brasileiro. Essa alteração incorporou o conceito de referência
cultural e a definição dos bens passíveis de reconhecimento, sobretudo os
de caráter imaterial. A Constituição estabelece ainda a parceria entre o
poder público e as comunidades para a promoção e proteção do Patrimônio
Cultural Brasileiro, no entanto mantém a gestão do patrimônio e da
documentação relativa aos bens sob responsabilidade da administração
pública. O Artigo 216 da Constituição conceitua patrimônio cultural como
sendo os bens “de natureza material e imaterial, tomados individualmente
ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória
dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira” (Portal IPHAN,
2017).

O imaginário social decorre das condutas relacionadas ao patrimônio cultural. Esse


conjunto de imagens produzidas pelo homem por meio de suas ações no mundo, na forma
material e também na forma comportamental, “o imaginário permite o reconhecimento da

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realidade – o mundo – e sua representação desse mundo e de sua tradução em discurso”
(Bittencourt e Coelho, 2010, p.13).
A acessibilidade no sentido amplo do conceito, ou seja, acesso independente de
condição física, econômica, cultural ou social se mostra um dos pontos fortes na
disseminação do patrimônio cultural, “ao existir Património acessível e inclusivo permite-se
que as pessoas vivam experiências únicas e personalizadas respeitando a sua
individualidade e diferença admitindo que possam usufruir do espaço e informação de uma
forma confortável, autónoma e segura” (Lima, 2016, p. 51). É também fundamental ter em
vista, dentro desse pensamento de acessibilidade o cumprimento da legislação que abarca
os valores e as identidades das diversas culturas e segmentos populacionais, assim como a
legislação das instituições responsáveis pelo patrimônio de forma geral. Nessa perspectiva,
a circulação do cultural por meio de formas de comunicação legitima sua identidade e
fortalece o patrimônio como pertencente de uma determinada localidade:
“É através da comunicação que se forma uma rede de relações interativas
dos interlocutores entre si e material simbólico. A identidade se constrói a
partir da tentativa de criação de blocos sociais coesos, através do
reconhecimento de fatores em comum como valores, linguagem, símbolos,
pertencimento e memória, que representam a personalidade de uma
população” (Munaier e Dias, p. 14, 2013).

Trabalhar o patrimônio e fazer com que fique vivo no cotidiano de uma cidade, de
uma localidade ou mesmo em um país, salvo as proporções, faz com que este não seja
esquecido e ultimado, “Assim como a morte definitiva é o fruto último da vontade de
esquecimento, assim a vontade de lembrança poderá perpetuar-nos a vida” (Saramago,
1997, p. 209). Sendo assim, pode ser considerado como uma construção social, o
patrimônio se torna um processo simbólico que legitima os aspectos sociais e culturais de
uma determinada sociedade, seguido por um sentimento coletivo de identidade,
diferenciando dos demais grupos de indivíduos (Da Silva, 2000).
O estudo das torres das igrejas se apresenta como uma boa possibilidade de
apropriação do patrimônio pela sociedade onde estão locadas. Com iniciativas criativas e
envolventes os dados alcançados pela pesquisa científica, esses poderiam ser trabalhados
nos diversos âmbitos das comunidades de Catas Altas e Itabirito, por meio de seminários,
palestras, exposições, documentário, etc; promovendo a história desses monumentos de
cunho religioso e artístico. Dessa maneira, a identidade social seria promovida e a
população, além de enriquecer sua cultura teria mais afinidade e cuidado com esse
patrimônio.

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4. A guisa de conclusão

Pode-se atribuir ao período barroco uma considerável produção de espaços amplos


e artisticamente cuidados. Nesse sentido, a arte mourisca contribuiu na suntuosidade
ornamental dos espaços arquitetônicos, em especial os religiosos.
Há fortes indícios de que havia uma circulação de riscos, ou mesmo de algum tipo de
manual com orientações nas diversas feituras arquitetônicas, desde ornamentos até
técnicas construtivas, frontispícios e claro, torres sineiras. Assim, pode-se inferir a relação
das torres das igrejas aqui estudadas, Nossa senhora da Conceição em Catas Altas e
Nossa Senhora da Boa Viagem em Itabirito. Há uma importante semelhança no formato do
coroamento, mesmo sendo de estruturas diferentes, uma em alvenaria e outra em cantaria
de granito. É singular em relação às demais igrejas erigidas em Minas Gerais, o formato
bulboso é comum apenas a estas duas matrizes. Essa possibilidade de circulação de riscos
explicaria então “coincidência arquitetônica”.
Esse estudo de caso traz luz à importância de se desenvolver estratégias que
promovam o patrimônio local, onde o indivíduo se sinta pertencente e tenha a tutela do
cuidado com ele. O acesso ao conhecimento e aos bens patrimoniais, materiais e imateriais,
faz com que os laços entre a sociedade e o patrimônio se estreitem e formem pontes entre
as gerações. É preciso que haja exposição e acesso ao patrimônio, de forma clara, para que
este seja apropriado pelos integrantes da sociedade.

Por fim, podemos concluir que a educação patrimonial e a apropriação dos bens
patrimoniais pela sociedade, especialmente na localidade onde está o bem patrimonial, são
alternativas fundamentais para o crescimento cultural dessa população e de certa medida a
preservação desses bens, uma vez que se sentindo pertencente a tendência é proteger.

"O mundo tem dois hemisférios: um superior e visível, que é o passado, o outro inferior e invisível
que é o futuro, no meio de um e outro hemisfério ficam os horizontes do tempo que são ESTES
instantes do presente que imos vivendo, onde o passado se termina e o futuro começa”.
Pe. Antônio Vieira

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O TERRITÓRIO URBANO CONTEMPORÂNEO E A SALVAGUARDA
DA MEMÓRIA: o inventário e seus reflexos na Rua Marechal
Deodoro - Juiz de Fora/Mg.

MORATORI, DANIEL DE ALMEIDA

Universidade Federal de Juiz De Fora - UFJF. Programa de pós-graduação em Ambiente Construído,


Faculdade de Engenharia.
Rua José Lourenço Kelmer, s/n. Campus Universitário – São Pedro 36036-330. Juiz de Fora – MG
E-mail: danielmoratori@hotmail.com

RESUMO

Identificar a forma de construção e proteção da paisagem urbana edificada caracteriza um conflito na


contemporaneidade, devido às varias formas de ação sobre determinados bens inseridos no contexto
urbano. Esse artigo tem como objetivo refletir sobre identidade e patrimônio cultural, e partindo dessa
definição, dialogar com as medidas tomadas pela Prefeitura de Juiz de Fora sobre a Rua Marechal
Deodoro no Inventário do Acervo Cultural da cidade de 1996. A Rua Marechal Deodoro é uma das
principais vias da cidade de Juiz de Fora - MG, devido a sua localização central, tanto como por seu
histórico, sendo voltada ao comércio desde seus primórdios. Esse estudo busca colaborar para uma
maior discussão dos instrumentos que visão a proteção de bens culturais num território urbano
contemporâneo e a salvaguarda da memória e identidade. Observando que a refuncionalização ou
remodelação de uso de um bem protegido muitas vezes pode ocasionar uma nova organização sócio-
espacial do entorno, seguindo uma lógica atual negativa da globalização, a identificação de uma
edificação somente por suas relações arquitetônicas, de forma especifica e individualizada, sem levar
em conta suas relações de identidade, afetividade e memória coletiva além de suas diversas
espacialidades, pode acelerar fatores como degradação, gentrificação e outras formas nocivas ao
contexto, realçando descompromisso com o passado, devido a um afastamento com a comunidade
local. O caso da Rua Marechal Deodoro demonstra a forma de ação do inventário da cidade de Juiz
de Fora, que foi umas das ferramentas que auxiliou na proteção das diversas edificações, mas o fez
somente por sua relação de “Mérito Arquitetônico”. Com toda a relevância e valia que o inventário de
1996 fez para a preservação das edificações salvaguardadas atualmente na rua, a atual linha de se
pensar as dimensões de Patrimônio Cultural e identidade nos suscita uma reflexão sobre o
fortalecimento do pertencimento da sociedade com tal patrimônio, que extrapola as dimensões da
materialidade dos bens, e nos faz questionar como o poder publico estimulará os vínculos com o
patrimônio local para que a preservação seja sustentável.1
Palavras-chave: Inventário; Paisagem cultural; Juiz de Fora.

1Esse artigo é uma bifurcação da dissertação em curso intitulada " As diretrizes legais na Evolução Urbana da
Rua Marechal Deodoro (parte baixa): Dos Códigos de Posturas às leis de proteção patrimonial", pelo Programa
em Ambiente Construído da Universidade Federal de Juiz de Fora - MG
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A contemporaneidade e suas facetas diante do patrimônio cultural

O espaço urbano pode ser definido como um produto referente a todo processo de
interferência do trabalho humano em determinado ambiente. Assim, uma infinidade de
valores advindos dos mais variados tipos de culturas, etnias, técnicas, trabalhadores, entre
outros, convergem numa estrutura de que mescla seus espaços públicos e privados, como
edifícios, praças, ruas e todo sistema de produção e consumo. Esses meios é que
sustentam a cidade como um organismo vivo, mutável e transformável pelos indivíduos que
nela vivem ou transitam. Identificar a formação e proteção da paisagem urbana edificada é
algo que caracteriza um conflito na contemporaneidade, devido às várias formas de ação
sobre determinados bens inseridos no contexto urbano.

Metade dos indivíduos do planeta moram em espaços urbanos, e a cada dia, o processo de
urbanização se acentua progressivamente (SOUZA, 2005, p. 20). Esse aglomerado de
povos, ideias, ideologias, cultura, relações sociais e outras formas de manifestações
humanas, geram uma alta complexidade na organização das cidades, e isso se reflete no
seu tecido urbano. Assim, pode-se observar muitas vezes uma fragmentação na cidade
contemporânea devido a uma somatória de camadas, atingindo uma alta complexidade que
vai ultrapassar os meios de conhecimentos e os instrumentos da ação prática. Henri
Lefebvre nos diz que o tecido urbano não se limita a morfologia, mas é o suporte de um
modo de viver, a sociedade urbana, e é nesse tecido urbano acontecem os fenômenos da
vida social e cultural (LEFEBVRE,1991, p.19). Conforme Carlos (2007, p. 20-21), o espaço e
a sociedade se mostram indissociáveis no processo de produção da espacialidade da
cidade, pois as relações sociais acabam por materializar em um território real e concreto, ou
seja, “a sociedade produz/reproduz um espaço através da prática sócio-espacial”. Dessa
forma, planejamento, desenho, integração e organização espacial são alguns dos
componentes presentes na busca por soluções na realidade pluralista das cidades
contemporâneas, que demandam uma integração de sistemas, agentes sociais e lugares
conflituosos.

Os projetos urbanos possuem a responsabilidade de balancear essa diversidade, agindo em


diferentes escalas, e um dos elementos mais valiosos agregados ao tecido é a arquitetura.
Assim, “cada edifício tem a liberdade de escrever histórias econômicas da arquitetura,
histórias sociais, técnicas e volumétricas“ (ZEVI. 1996, p.26). Uma infinidade de visões e
conceitos distintos a respeito dos mesmos fenômenos nos dá uma visão de como pode ser
feita a leitura sobre contemporaneidade. Nessa ebulição de idéias e conflitos, o ser humano
tem a memória e sua relação com o tempo como um dos aportes para a construção de uma
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identidade cultural, capaz de criar sentido, organização social e uma unidade em
determinado grupo, fazendo que o mesmo se sustente quando ligado à referencias
simbólicos (POLLAK, 1992). Ao passo que a preservação de tais referenciais ativa nossa
memória, isso acaba por nutrir a nossa identidade cultural. E essa memória individual,
conforme afirma o célebre Maurice Halbwachs (2004, p. 57-59), existe a partir de uma
coletividade, uma memória coletiva, sempre com a interação entre a sociedade, seus grupos
e instituições, sempre ordenada por uma relação de continuidade, ao representar o que se
mantém vivo de um determinado grupo. Nesse caso, observa-se que preservar
determinados fragmentos é fundamental para a manutenção presente e futura da identidade
de uma comunidade. Esses fragmentos estão sempre em profundo movimento,
necessitando de uma contextualização no seu espaço, nas suas paisagens e na
sociabilidade envolvida, pois o mesmo recebe todas transformações que são decorrentes da
intervenção de uma gama de sujeitos sociais. Surge uma indispensabilidade de se pensar
os espaços não de forma isolada, mas como produzido e transformado pela ação de
diversos grupos sociais.

O patrimônio edificado, que é materialização feita por um grupo, usufrui de incontáveis


relações e apropriações com a identidade local, fundamental para a construção da
identidade sociocultural da comunidade. Conforme Brito (2006, p.44), a relação entre
identidade e patrimônio sempre vai supor sujeitos que não podem ser linearmente
detectados e que estão em constante movimentação e substituição em torno desses bens.
No campo do urbano, a espetacularização das cidades contemporâneas possui dois
aspectos que se contrastam e entram em conflito, acarretando esvaziamento do conceito de
cultura do seu caráter identitário, afetando a apropriação de determinados espaços. Dentre
vários exemplos, o pensamento de Rem Koolhaas (2014) sobre a cidade genérica, é bem
enfático sobre a relação com a identidade e sua monumentalidade:

A cidade genérica é a cidade liberada do cativeiro central, da camisa de


força da identidade [...] ela é nada senão uma reflexão da presente
necessidade e da presente habilidade. É a cidade sem história. É grande o
suficiente para todos. É fácil. Não precisa de manutenção. Se fica muito
pequena, simplesmente se expande. Se fica muito velha, simplesmente se
auto destrói e se renova. É igualmente excitante e não excitante em
qualquer parte. “É superficial” - como um estúdio de Hollywood, podendo
produzir uma nova identidade a cada manhã. (KOOLHAAS, 2014, p.35-36)

Numa outra ponta, podemos citar a questão referente a patrimonialização em massa, o


“dever de memória” (JEUDY, 2005, p.15), a inflação patrimonial (CHOAY, 2006, p.15) ou a
questão da cidade-museu (HUSSEIN, 1996), a museificação, insere um contexto de
congelamento nas suas edificações, em um desejo contínuo de profusão de locais de

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memória. O ambiente construído necessita ser protegido e conservado não unicamente
como objeto de viés econômico ou transformando a própria cidade em um museu, mas que
se destaque a importância enquanto bem cultural referente à identidade de indivíduos e
grupos, possuidores de uma memória e identidade. Necessita-se de que a sociedade seja
envolvida nos processos de preservação, não ficando o mesmo somente para órgãos
públicos e especialistas. Com a apropriação dos bens culturais, por meio de seu uso efetivo
e através de uma relação de afetividade com o mesmo, a sociedade colabora para um
processo contínuo de pertencimento.

A inserção da produção arquitetônica que se baseia na reprodutividade e repetição, como a


demonstrado pelo conceito das cidades genéricas, ou a utilização do patrimônio como
somente ferramenta mercadológica ou em detrimento ao bem salvaguardado, age em
detrimento a visão atual do patrimônio cultural edificado, que mostra-se importante como
ancoragem da memória, provido de significados, e cargas simbólicas de identificação
apropriados pelas comunidades. Conforme a colocação de Pesavento (2008, p.10), nesse
viés de ver e vivenciar os espaços das cidades, as centralidades urbanas, as quais são
objetos de retomada de resgate como espaços privilegiados por uma série de estudiosos,
entram em conflito com a especulação imobiliária, como também com os processos de
enriquecimento e empobrecimento das sociedades contemporâneas. Com isso, torna-se
necessário que se faça sempre um estudo a respeito dos instrumentos de preservação, para
sua eventual atualização, para que o mesmo não se torne arcaico perante a sociedade,
agindo de forma inversa ao que é realmente sua finalidade.

Partindo dessas reflexões iniciais sobre identidade, memória e patrimônio cultural, é objeto
de estudo as medidas tomadas pela Prefeitura de Juiz de Fora sobre a Rua Marechal
Deodoro no Inventário do Acervo Cultural da cidade concluído em 1996. Busca-se colaborar
para uma maior discussão dos instrumentos que visam a proteção de bens culturais num
território urbano contemporâneo e seus efeitos sobre a salvaguarda da memória e
identidade. A via supracitada foi eleita como estudo de caso devido a sua importância no
conjunto urbano da cidade, sua identidade relacionada aos serviços/comércio e aos
imigrantes, que ali fizeram esse ramo florescer, e a sua ligação com a Praça da Estação,
local de memória e desenvolvimento da cidade.

Demolições sistemáticas e a perda de referenciais de memória em Juiz de Fora

O tombamento de bens de interesse cultural tem por objetivo proteger, impedir sua
destruição ou mutilação, além de assegurar que sejam preservados para as gerações
futuras. Já o inventário de conhecimento, diferente do tombamento, tem como objetivo
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identificar, selecionar, classificar, cadastrar e reunir informações substanciais para a
preservação de bens de interesse cultural, e no contexto abordado, edificações, sítios e
conjuntos históricos ou artísticos com vista à sua conservação e valorização.

Em Juiz de Fora, uma série de edificações antigas foram demolidas a partir da década de
1970, vítimas de uma nova perspectiva calcada no progresso e desenvolvimento, que foi
objetivo de algumas camadas da sociedade. Conforme esse tipo de demolição preconizado,
uma parcela da população local sentiu os danos da perda de determinados referenciais
afetando a memória coletiva, com isso causando uma lacuna fundamental de sua identidade
que os identificava socialmente e os nutria culturalmente. Toda a estrutura concreta da
cidade, muitas vezes é relegada a um elemento estático para uma parcela da sociedade,
que podem considerá-la sem valor estético, cultural ou histórico. Mas mesmo diante de tais
observações negativas, certamente tais bens interagem com histórias menos tangíveis, em
um aglomerado de memórias e experiências expurgadas da história social dos lugares,
muitas vezes de vitimas por um pré-conceito, cultura higienista, influência do mercado
imobiliário e financeiro. Conforme a historiadora Fabiana Aparecida de Almeida, a partir da
década de 1970, uma série de manifestações sociais ocorreram em defesa do patrimônio da
cidade, tendo a frente artistas, intelectuais e grupos sociais, em prol da preservação de
imóveis importantes no contexto da consolidação da cidade, mas que estavam ameaçados
de demolição (ALMEIDA, 2012, p.26). Esse período, onde se demonstra um forte
sentimento de uma gama de grupos sociais pela manutenção de seus referenciais de
identidade, demonstra o que Michel Pollak (1992, p. 204) define como memória, a qual seria
um elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual, como coletiva.
Mesmo com esse envolvimento da população, a demolição sistemática contínua, e acaba
por tomar os meios midiáticos, como é demonstrado na manchete “Os casarões aos poucos
vão caindo e a cidade vai perdendo a sua memória histórica”, no jornal Diário Mercantil do
dia 12 de fevereiro de 1978.

E essa busca através da manutenção e preservação de tais referenciais durante a década


de 1970, ocasionou efeito no órgão municipal, mesmo que a custas de várias edificações
demolidas nesse processo. Foi-se criado uma relação pela Fundação Cultural Alfredo
Ferreira Lage (FUNALFA) dos "Monumentos Históricos e Arquitetônicos ora existentes na
cidade de Juiz de Fora", que continha 32 imóveis e 5 conjuntos arquitetônicos (PASSAGLIA,
1982, p. 19). Mas somente com a criação do pré-inventário que se concretizaria uma ação
de forte intensidade pela prefeitura no meio local. Em 1981, o poder público municipal
autoriza a realização do Pré-Inventário do Acervo Cultural na cidade, elaborado pelo
Instituto de Pesquisa e Planejamento (IPPLAN). Esse pré-inventário teve como objetivo a
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construção de uma compilação de edificações que pudesse contar sobre a produção
arquitetônica em Juiz de Fora até a data de realização do mesmo. O arquiteto Alberto Luiz
Alberto do Prado Passaglia, que coordenou tal projeto, cita a importância do levantamento
feito para a preservação do patrimônio que tinham relação com o passado histórico
existente da cidade, mas que também serviria para evitar que essa amnésia social
progredisse com maior intensidade no município, já que várias áreas da cidade perderam
bens culturais de grau significativo (PASSAGLIA, 1982, p. 9). No levantamento e
identificação de bens de interesse cultural, foram cadastrados aproximadamente 550
imóveis. Neste trabalho, o Pré-inventário de 1981 não será objeto de estudo, somente o
Inventário de 1996, que abarca diversas edificações que foram levantadas em 1981, além
de outros imóveis que não foram cadastrados na época. Mesmo sabendo da importância do
pré-inventário como uma ação que ajudou a formular um pensamento da preservação na
cidade, foi feito um recorte temporal pós 1996, com o inventário feito pela empresa Século
30.

O inventário de 1996

Após o pré-inventário, em 13 de janeiro de 1982, sob a lei nº 6108, o Poder Executivo


Municipal definiu parâmetros para a proteção do patrimônio cultural da cidade. A lei
autorizou a implantar o tombamento dos bens culturais situados no município, móveis e
imóveis, a abrir a possibilidade de isenções fiscais a proprietários de imóveis tombados,
além de criar a Comissão Permanente Técnico-Cultural de preservação dos bens culturais e
o Conselho Consultivo. Em 1988, a lei nº 7282 reforça as disposições da lei anterior sobre a
proteção do patrimônio cultural do município. Nesta lei, no art. 5, inciso IV diz que competirá
a Comissão Permanente Técnico-Cultural:

"IV - Inventariar os bens considerados de valor histórico, etnográfico,


paleográfico, bibliográfico, artísticos, arquitetônico ou ambiental, existentes
no Município e cuja conservação for de interesse público, e propor o seu
tombamento ou proteção." (JUIZ DE FORA, 1988)

O inventário feito pela empresa “Século 30 Arquitetura e Restauro”, intitulado “Inventário do


Patrimônio Cultural de Juiz de Fora – Arquitetura e Urbanismo”, foi finalizado em julho de
1996, sendo realizado 15 anos após o pré-inventário de 1981, reforçando um progressivo
comprometimento do poder público municipal com a questão de salvaguarda da memória da
cidade, que já tinha leis municipais supracitadas. Teve como objetivo principal o
conhecimento dos bens culturais, como também a criação de condições para promoção
desses bens catalogados, com um intuito de preservação desejável. Conforme descrição do
próprio inventário (PJF, 1996, p.10), o método utilizado foi extraído dos Inventários de

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Proteção do Acervo Cultural da Bahia e de Pernambuco, que adotaram procedimentos
recomendados pela Unesco, na “Recomendação de Palma” (Maiorca), fixou o esquema
metodológico para o Inventário de Proteção do Patrimônio Cultural Europeu (IPCE). O
inventário ficou restrito a arquitetura e urbanismo, e muitas das informações que acabaram
por auxiliar tal trabalho foram retiradas do Pré-Inventário de 1981.

Foram adotadas 6 classificações tipológicas para as edificações, que seriam divididas em


arquitetura religiosa, funerária, militar, civil de função pública, civil de função privada,
industrial, além das praças que seriam classificadas com o termo sítio urbano.

Foi feito uma classificação valorativa do acervo inventariado, onde níveis de


representatividade das edificações

“...foram apoiados na avaliação da qualidade da expressão arquitetônica e


no significado histórico dos elementos componentes do acervo. O mérito
arquitetônico e a integridade física das edificações foram itens que tiveram
peso na classificação do acervo principalmente na área do “núcleo histórico”
(PJF, 1996, p. 51-52)

Dessa forma, surgiu um Mapa do Mérito Arquitetônico, que integra a parte referente ao
diagnóstico, onde foi feita uma classificação dos graus dos imóveis isolados ou em conjunto:
valor excepcional, relevante, documental, ambiental. Após o cadastramento de 1311
edificações em campo, foram excluídas 169, restando um montante de 1142 edificações.
Esse numero supera em 592 edificações o Pré-inventário de 1981. A área conhecida na
cidade como “núcleo histórico”, que segundo o inventário compreende a área formada pela
Av. Barão de Rio Branco, Av. Getúlio Vargas e pela Rua Espírito Santo, detém o maior
número de edificações ou conjuntos com valores excepcional ou relevante. Vale aqui
ressaltar que esses imóveis inventariados ocupavam uma área de alta especulação
imobiliária, o que acarretaria debates futuros entre poder público e proprietários.

Colocou-se na forma de sugestão 4 tipo de propostas para proteção, e como é enfatizado


pela empresa Século 30, estão embasadas à classificação por mérito arquitetônico (PJF,
1996, p.56), abaixo descritas:

 Grupo 1 - Proteção direta - Através de tombamentos integrais - Edificações de valor


excepcional.

 Grupo 2 - Proteção direta - Através de tombamentos de fachadas e de volumetrias -


Edificações de valor relevante.

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 Grupo 3 - Proteção Ambiental - Edificações que podem ser demolidas ou alteradas
desde que as novas não contrastem com o ambiente que as circunda.

 Grupo 4 - Proteção documental - Edificações que podem ser demolidas ou alteradas,


submetendo-se as novas edificações às restrições impostas pela Lei de Uso e
Ocupação do Solo e Códigos de Obras Municipais. (PJF, 1996, p. 56)

Foram identificados 8 conjuntos arquitetônicos, por sua representatividade no tecido urbano,


seu valor histórico arquitetônico e o grau de caracterização das unidades. E entre esses
conjuntos identificados, o Conjunto da Rua Marechal Deodoro foi definido com os limites
compreendidos da Praça da Estação até a Av. Rio Branco (PJF, 1996, p.57).

A Rua Marechal Deodoro e o inventário de 1996

Inicialmente, convém determinar os limites compreendidos nesse estudo; a Rua Marechal


Deodoro tem seus limites compreendidos entre o Morro do Imperador (após a rua Olegário
Maciel) e a av. Francisco Bernardino/Praça Dr. João Penido (Praça da Estação). Essa rua é
uma das primeiras a ajudar a formar e estruturar o conjunto urbano de Juiz de Fora/MG,
tendo com isso a Marechal Deodoro uma grande importância na consolidação da paisagem
cultural juizforana, devido a uma variedade de edificações que remontam desde o final do
séc. XIX, que perpassam manifestações estilísticas do ecletismo, à construções
contemporâneas, formando uma paisagem construída que detém uma forte impressão da
passagem do tempo em seu perfil construtivo.

Sua centralidade e proximidade com a Estação Ferroviária colocam a Rua Marechal


Deodoro em importante visibilidade com a população local, o que refletiria diretamente no
seu histórico. Esse posicionamento na paisagem, entre o morro do Imperador e o limite da
linha férrea, cortando o triângulo central que marca o desenho urbano local, fomentou o
setor voltado ao comércio desde os primórdios da rua, uma gama de imigrantes elegeram a
via para instalação de seus comércios, devido à proximidade a estação, e que rendeu a
alcunha de "a rua do comércio". O grande fluxo de pessoas e a permanência dos
comerciantes na via gerando e circulando renda, gerou uma produção arquitetônica no local,
de exemplares de edificações que dispunham de uma estética mais contemporânea a
época. Vale destacar que o grupo de imigrantes sírios libaneses foi essencial para a
sociabilidade ocorrida na rua, trabalhando no ramo de tecidos.

Atualmente, é uma rua com característica mista, com residências e comércios/serviços,


onde a concentração do comércio/serviços se encontra no trecho que vai da Av. Barão do

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Rio Branco até a Av. Francisco Bernardino, dentro dessa área conformada do triângulo da
cidade. No trecho restante, que vai até os limites do Morro do Imperador, existe uma
predominância de edificações uso residencial. Partindo para uma análise mais profunda
sobre os impactos do inventário sobre a rua Marechal Deodoro, podemos observar
inicialmente a identificação de um conjunto, mesmo que não contemple a vida toda. Essa
identificação de conjunto se mostra algo importante, visto que o chamado núcleo histórico é
cortado por diversas vias, cada qual com suas características, sua história e sua identidade
própria. Em toda sua extensão, a via tem 134 edificações construídas, que vão conformar
seu espaço urbano.

Figura 1- Rua Marechal Deodoro no trecho compreendido entre Av. Getulio Vargas e Av.Rio Branco.
Fonte: Daniel Moratori (2017)

Nesse trecho que foi denominado de Conjunto da Rua Marechal Deodoro (ver fig. 02), foram
inventariadas 29 edificações, mais 1 edificação que serve de galeria com fachadas para
duas ruas, que foi classificada como pertencente ao Conjunto da Rua Halfeld pelo empresa
Século 30, que também entra no estudo devido na a sua importância na rua Marechal
Deodoro. Outra edificação que entrou nesse estudo foi o atual Hotel Rio, que tem uma das
suas três fachadas voltada para a rua desse estudo, e acaba sendo um imóvel que
conforma a espacialidade da via, mas que se encontra localizado na esquina da Av. Getúlio

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Vargas com Rua Batista de Oliveira. Dessa forma, considerando-o importante, ele foi
colocado em análise.2

Assim, nessa extensão, 31 imóveis foram inventariados, com manifestações estilísticas do


ecletismo, art déco e modernismo. As edificações são do 2º e 3º quartel do século XX, e
conforme a sua ficha catalográfica seriam 2 edificações com tipologia Arquitetura Civil de
Função Pública e 29 de Arquitetura Civil de Função Privada. Dessas 31 edificações, 30 são
destinadas a comércios e serviços, e uma edificação voltada a área de saúde, como Posto
de Atendimento Médico Publico. Um total de 10 edificações já estavam com processos de
tombamento em aberto, sendo 9 delas referente ao Entorno da Praça da Estação (processo.
nº 5310/89) e 1 como edificação isolada (processo nº 3510/90). A Galeria Pio X, classificada
pela empresa Século 30 como pertencente a outro conjunto urbano, mas que tem uma das
fachadas voltada para a via em estudo, tinha um processo de Declaração de Interesse
Cultural (processo nº 6706/90). As outras 21 restantes não tinham proteção alguma foram
sugeridas propostas da seguinte forma: 18 edificações com tombamento da fachada e
volumetria e 3 edificações com limitação de gabarito para novas edificações.

No trecho restante da rua, que compreende a partir da Av. Barão do Rio Branco até os
limites com o Morro do Imperador, foram inventariadas mais 10 edificações (ver fig. 02).
Dessas edificações, todas seriam do 1º e 2º quartel do século XX, e conforme a sua ficha
catalográfica, seriam 9 edificações com tipologia de Arquitetura Civil de Função Privada e 1
de Arquitetura Religiosa. Dessas 10 edificações, 7 tinham o uso como residência, 2 como
serviço e 1 de caráter religioso. E como proteção proposta, 1 edificação que apresenta
características do estilo neocolonial seria proposto tombamento de fachada e volumetria, e o
templo religioso, que tem influências do neogótico, teria uma proposta de tombamento
integral. As 8 edificações restante seriam apenas para documentação, não sendo proposto
nenhuma sugestão.

2O Parque Halfeld e a Igreja de São Sebastião não entram nesse estudo devido a serem espaços que ocupam
um quarteirão cada, tendo comunicação para quatro ruas diferentes. A igreja tem sua fachada voltada para a rua
São Sebastião e um distanciamento considerável da rua Marechal Deodoro, somente o entorno da mesma
conformando a espacialidade da rua com uma área verde.
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Figura 2 - Edificações inventariadas na rua. Em vermelho a área denominada Núcleo Histórico da
Rua Marechal Deodoro. No círculo em rosa o “Hotel Rio”, incluído neste estudo. Fonte: Mapa
elaborado pelo autor segundo levantamento do inventário de 1996. Daniel Moratori (2017)

Todas essas edificações apresentadas acima tinham em suas fichas catalográficas uma
parte destinada à sua caracterização, onde contém uma descrição referente implantação do
bem construído, detalhes sobre a composição e estilo arquitetônico das fachadas,
ornamentação, platibandas, marquises, vitrais, esquadrias, piso dos pavimentos. Todos os
dados apontados das fichas analisadas levam somente em consideração um viés
arquitetônico. Sendo a rua composta por 134 imóveis com a fachada voltada para a referida
via, as 41 edificações inventariadas correspondem a mais de 1/4 dos bens construídos
nesse espaço urbano. Esses imóveis, locados numa área central, que detém em seus
terrenos um alto valor financeiro, acabam por se tornarem alvos de empresas de construção
civil e do ramo imobiliário, que vêem o inventário como um obstáculo à verticalização do
centro.

Conforme Azevedo & Jabour Junior (2012, p. 44-47), alguns proprietários solicitaram o
alvará de demolição de seus imóveis junto a Prefeitura após o inventário, a qual foi negada

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pelo mesmo estar inscrito no referido documento. Isso ocasionou um debate entre
Prefeitura, Ministério Publico e Poder Judiciário sobre a questão do inventário, do direito de
propriedade e da concessão da Autorização para Demolição. O poder Judiciário vai contra a
Prefeitura, decidindo que a mera inclusão da edificação no inventário não limitaria o
proprietário de usufruto do bem a sua vontade. Saindo a Prefeitura derrotada do mesmo, ela
iria fazer um tombamento em massa pela cidade um ano depois, em 1997, e que iria
abarcar diversas edificações da Rua Marechal Deodoro. O preservar, nesse momento, se
identificava com a palavra tombar. Devido à questão gerada pelo inventário, o tombamento
se mostrou à época uma ferramenta de caráter único para se resguardar as edificações
diante do conflituoso momento que ameaçava a cidade novamente de uma amnésia social e
perda de seus bens edificados.

Figura 3 - Edificações ecléticas e art deco na Rua Marechal Deodoro, no trecho compreendido entre
Av. Getúlio Vargas e Av. Francisco Bernardino. Fonte: Daniel Moratori (2017)

Conforme pode ser observado, no inventário ocorreu o levantamento do que poderíamos


chamar de patrimônio arquitetônico, que levou em conta somente com representantes
significativos do passado, se baseando em determinadas características e atipicidade das
edificações, observados tanto seu valor histórico como estético. Isso acabou ocorrendo por
uma limitação da própria lei nº 7282, que não incluindo no Art. 5, inciso VI a questão
referente dimensões socioculturais do patrimônio cultural, em uma visão mais dinâmica.
Com isso, pode-se observar que tal inventário não busca uma caracterização sócio espacial,
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nem como demonstra estudo sobre a apropriação dos espaços analisados. Mesmo com o
conceito de patrimônio na forma contemporânea em sua exponencial abrangência, o
inventário ficou relegado a questão arquitetônica e urbana. A empresa Século 30 faz suas
recomendações baseadas no mérito arquitetônico, e faz um adendo referente ao
instrumento de tombamento, ressaltando que o mesmo, por si só, não garante a proteção; e
observa que inclusão de outros instrumentos, como jurídicos, financeiros, de planejamento e
de informação precisam ser somados, acentuando o envolvimento afetivo da comunidade
(PJF, 1996, p. 58-59).

RESULTADO
Através da observação do processo de inventario da via, podemos conhecer a forma de
ação do inventário da cidade de Juiz de Fora, que foi uma das ferramentas que auxiliou na
proteção das diversas edificações, mas o fez somente por sua relação de “Mérito
Arquitetônico”. Com toda a relevância e valia que o inventário de 1996 fez para a
preservação das edificações salvaguardadas atualmente na Rua Marechal Deodoro, essa
reflexão de Patrimônio Cultural e identidade faz suscitar um pensamento sobre o
pertencimento da sociedade sobre tal patrimônio, e como o poder público estimulará os
vínculos com o patrimônio local para que a preservação seja algo sustentável.

A arquitetura como agente modificador da cidade, além de se apresentar em caráter


monumental, mostra-se presente na conformação da ambiência urbana, trazendo uma
identidade espacial ao ambiente construído, percebido, vivenciado e lembrado. Dentre toda
essa gama de edificações erigidas, alguns exemplares ou conjuntos são utilizados como
ponto de apoio para salvaguarda de uma memória coletiva. Conforme Paul Ricoeur, “a
memória é o melhor que temos para dar significado a algo que tenha acontecido”
(RICOEUR, 2007, p. 40). Assim, o patrimônio cultural edificado mostra-se importante como
um ponto de ancoragem da memória, provido de significados, cargas simbólicas que os
diferencie, identifiquem e se tornem apropriados pela comunidade. Assim, a “cidade tem
uma história; ela é a obra de uma história, isto é, de pessoas e de grupos bem determinados
que realizam essa obra nas condições históricas” (LEFEBVRE, 1991, p. 52).

Faz-se necessário compreender as articulações que as pessoas em seu cotidiano fazem do


patrimônio cultural, ao mesmo tempo em que também constituem seus próprios patrimônios
e lugares de memórias. Dessa forma não se deve conscientizar ou ensinar o que é
patrimônio, mas refletir o que também é patrimônio e como este liga os indivíduos a uma
coletividade. Observando que a refuncionalização ou remodelação de uso de um bem
protegido muitas vezes pode ocasionar uma nova organização sócio-espacial do espaço

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que o cerca, seguindo uma lógica atual negativa da globalização, a identificação de uma
edificação somente por suas relações arquitetônicas, de forma específica e individualizada,
sem levar em conta suas relações de identidade, afetividade e memória coletiva e suas
diversas espacialidades, pode acelerar fatores como degradação, gentrificação e outras
formas nocivas ao contexto, além de certo descompromisso com o passado, devido a um
afastamento com a comunidade local.

O caso da Rua Marechal Deodoro deixou claro a forma que essa escolha de edificações a
serem inventariadas, acabou se mostrando uma coleção de objetos exemplares e únicos,
baseado numa abordagem histórica e arquitetônica, mas afastados de um contexto
sociocultural, sem levar em conta a participação ativa da população no processo. Dessa
forma, as políticas voltadas a salvaguarda e valorização do patrimônio cultural necessitam
ser pensadas como políticas urbanas, onde seja captado toda as raízes da construção
social de identidades espaciais locais, que acabam por resultar que tais áreas, objetos,
edificações, bens materiais e imateriais sejam constatado, reconhecidos e representados de
forma própria pela sociedade, com suas particularidades e identidades preservadas. Com o
conceito de patrimônio sendo ampliado, necessita-se que tais ferramentas também estejam
sujeitas a ampliações na forma qualitativa, para que possam absorver toda o significado
cultural, sua ambiência e sua identidade.

O inventário de 1996, mesmo que usando somente a definição do "mérito arquitetônico",


conseguiu ser o aporte para as futuras edificações que entrariam em processo de
tombamento em 1997, e acabou sendo usado pela Prefeitura para auxiliar que uma série de
demolições não fossem efetivadas. Mas essa ferramenta só alcança seus objetivos se forem
capazes de contar com a participação da comunidade. A preocupação agora é a absorção
da comunidade local por seu patrimônio em todas as esferas, para que não ocorra um
processo de degradação, distanciamento e não pertencimento dos bens que necessitam ser
protegidos. E que a identidade da referida via, que se mostrou altamente carregada de uma
sociabilidade entre seus moradores e comerciantes, em sua maioria imigrantes sírios
libaneses, seja tratada com o respeito que merece. Se cada espaço contém a sua memória,
a mesma pode se tornar um caminho para que ocorra a preservação e valorização dos bens
culturais, onde atribui sentido ao patrimônio. Ademais, o vínculo entre sociedade e os bens
edificados com valor cultural vai interferir na sua conservação.

E dessa forma, que patrimônio e identidade, que se apresentam como membros de uma
mesma equação, sejam usados de forma conjunta como um recurso primordial para uma
consciência identitária, para que não ocorra uma sensação de não pertencimento e

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afastamento do bem pela população, gerando a degradação do patrimônio e situações como
a gentrificação. Que assim, o patrimônio cultural e a identidade não se transformem em um
produto de mercado. Que futuros inventários na rua, possam utilizar mais do que a simples
função de produção de um registro dos bens culturais a qual se deseja proteção, mas que
consiga um diagnóstico com interdisciplinaridade com informações mais seguras do local
analisado, como metodologias de análise e compreensão que visem a ação e a realização
de políticas públicas mais eficazes, utilizando das características e identidades locais para
seu próprio proveito, em uma busca de um desenvolvimento sustentável. Com isso, evitar
que ocorra o efeito tão comum da espetacularização das cidades contemporâneas,
descartando ou degradando toda uma identidade construída e a vida sociocultural existente
no local.

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OFICINA DE RESTAURO PÚBLICO

DA COSTA, AMANDA KELLY (1); GONZAGA, MICHELE REGINA. (2); MENICONI,


RODRIGO OTÁVIO DE MARCO (3); BASÍLIO, SARAH DE PAULA (4).

1. Instituto Federal de Minas Gerais- Campus Ouro Preto. Coordenadoria de Conservação e Restauro
http://ouropreto.ifmg.edu.br/
amandacosta1095@gmail.com

2. Instituto Federal de Minas Gerais- Campus Ouro Preto. Coordenadoria de Conservação e Restauro
http://ouropreto.ifmg.edu.br/
michelerg01@yahoo.com.br

3. Instituto Federal de Minas Gerais- Campus Ouro Preto. Coordenadoria de Conservação e Restauro
http://ouropreto.ifmg.edu.br/
rodrigo.meniconi@ifmg.edu.br

4. Instituto Federal de Minas Gerais- Campus Ouro Preto. Coordenadoria de Conservação e Restauro
http://ouropreto.ifmg.edu.br/
sarahdepaulab@outlook.com

RESUMO
A preservação dos valores culturais e ambientais caracteriza-se, crescentemente, como uma tendência
da atualidade. A valorização das coisas locais, em contraposição à globalização da economia e da
comunicação, reveste de importância à manutenção de identidades específicas, que garantam às
pessoas a referência do seu lugar. O Projeto Oficina de Restauro Público, iniciado no IFMG - Campus
Ouro Preto como projeto de extensão em 2014, deu prosseguimento à ação executada anteriormente
pela Fundação de Arte de Ouro Preto, FAOP, em parceria com o Instituto, ampliando as possibilidades
de formação de mão de obra qualificada em conservação e restauração de bens imóveis na cidade.
Dessa forma, a atividade de extensão proporciona aos alunos do Curso de Conservação e Restauro,
uma prática aplicada dos conhecimentos adquiridos em sala de aula. À vista disso, a proposta cumpre
um dos princípios definidos pela Política Nacional de Extensão, que define como um dos seus eixos a
interdisciplinaridade, “caracterizada pela interação de modelos e conceitos complementares, de
material analítico e de metodologias, buscando consistência teórica e operacional que estruture o
trabalho dos atores do processo social e que conduza à interinstitucionalidade, construída na interação
e inter-relação de organizações, profissionais e pessoas”. Em parceria com o Escritório Técnico do
IPHAN, cumpre-se a proposta de atender à população de menor poder aquisitivo, residente em
edificações com necessidade de conservação e restauração, condições de realizar as ações
necessárias para manutenção de seus imóveis, disponibilizando dossiês de conservação e restauro.
Na atualidade, especificamente, atende-se às paróquias da cidade de Ouro Preto, responsáveis pelos
bens culturais históricos que demandam apoio para a salvaguarda das edificações referenciais, no
caso: três Passos da Paixão – edificações de pequeno porte que contam os momentos finais da vida
de cristo -, e duas Capelas de pequenas dimensões. Trabalhou também, mentalidades comprometidas
com a preservação do patrimônio cultural, através de ações de educação patrimonial, contribuindo,
consequentemente, para a melhoria da qualidade de vida, para a sustentabilidade e para a valorização
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da cultura. Em conjunto a essas ações, investiga-se sobre as técnicas e materiais construtivos
tradicionais, bem como as causas das patologias encontradas nos objetos estudados.
Palavras-chave: patrimônio, conservação e restauro, cultura.

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Introdução

A preservação e valorização de bens culturais tornou-se assunto crescente na gestão de


centros urbanos de valor cultural. Atualmente, é possível identificar na formulação de políticas
públicas das cidades a preocupação e criação de normativas que contemplam a preservação
de seu patrimônio material e imaterial. Entretanto, uma parte significativa dessas legislações
e medidas preservacionistas, é voltada e efetivada em bens monumentais. Todavia, nas
cidades ditas coloniais, com grande acervo de valor cultural, encontram-se também casarios
de valor histórico e arquitetônico, inserindo-se, muitas vezes, na paisagem e na historiografia
dos centros tombados.

As ideias preservacionistas, elaboradas pelos grandes teóricos do restauro, vêm desde o


século XIX trazendo novas discussões e práticas acerca da salvaguarda e gestão do
patrimônio cultural. Bem como, as cartas patrimoniais, formuladas desde o século XX com o
intuito de formular medidas, novos conceitos e diretrizes na preservação e conservação
desses bens. Nesse sentido, a interdisciplinaridade e a interinstitucionalidade transfigura-se
como fator crucial e determinante na elaboração e efetivação dessas políticas nos centros
urbanos a serem preservados.

A partir desse viés e surgimento de novos conceitos de medidas de proteção, a Declaração


de Amsterdã, elaborada em 1975, dita a respeito da interdisciplinaridade, como uma
comunicação mutua entre conservador e urbanista, visando o planejamento urbano
concomitante à preservação do acervo cultural arquitetônico. A respeito dos deveres do poder
público, perante a organização do ambiente construído pelo homem, a carta cita:

Para fazer face aos custos de restauração, planejamento e conservação das


construções e sítios de interesse arquitetônico ou histórico, uma ajuda
financeira adequada deve ser colocada à disposição dos poderes locais e de
proprietários particulares; além disso, para estes últimos, incentivos fiscais
deverão ser previstos. (Declaração de Amsterdã, 1975).
Nessa perspectiva, em 2007 iniciou-se um projeto inovador no Brasil, o PAC- Plano de
Aceleração para as Cidades Históricas-, por uma iniciativa do governo federal coordenada
pelo Ministério do Planejamento. O projeto visa o planejamento e execução de grandes obras
de infraestrutura social, urbana, logística e energética do país. Em 2013 com um novo plano
de gestão, o Ministério do Planejamento autorizou a criação de uma temática voltada para as
cidades históricas protegidas pelo IPHAN. Nessa concepção de implantação de uma nova
política de preservação, Ouro Preto foi uma das cidades comtempladas no programa. Com o
foco nos monumentos religiosos da região, o PAC financiou a restauração da Matriz de Nossa
Senhora da Conceição, o Paço da Misericórdia que abrigará o novo Centro de Artes e Fazeres
da cidade, bem como vinte e dois chafarizes em cantaria espalhados pelo centro histórico. À
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vista disso, o Escritório Técnico do IPHAN de Ouro Preto, planeja destinar uma parte da verba
para três Passos da Paixão e duas Capelas de pequenas dimensões, todos localizados na
Área de Preservação Especial, assim denominada segundo a Portaria nº 312, de 20 de
outubro de 2010 que visa a normatização de diretrizes mais rígidas e especificas para a
preservação dessa área.

Diante das questões contemporâneas a respeito do patrimônio cultural, a cidade de Ouro


Preto, declarada Monumento Nacional em 1933, tombada pelo IPHAN em 1938 por seu
conjunto arquitetônico e urbanístico, e, declarada pela UNESCO como patrimônio mundial em
de 1980, se torna palco e laboratório de discussão de muitas dessas políticas
preservacionistas. Desde sua valorização, quando modernistas e intelectuais visitaram a
cidade a fim de levantar seu acervo artístico e histórico, políticas urbanas de preservação
foram elaboradas, visando à defesa de seus bens país, sobretudo, materiais. Obviamente,
essas diretrizes abrangiam todo o patrimônio nacional, criando também novos conceitos no
âmbito federal.

No artigo 314 da Constituição Federal de 1937, patrimônio foi considerado


como “os monumentos históricos, artísticos e naturais, assim como as
paisagens ou os locais particularmente dotados pela natureza”. No governo
Vargas, a partir do Estado Novo (1937-1945), ocorreu a criação de novas
instituições com a finalidade de preservar, documentar, difundir e mesmo
produzir diretamente bens culturais, transformando o Governo Federal no
principal responsável pelo setor. (FERNANDES, 2014, p.26).

De acordo com Fernandes (2014), a valorização de Ouro Preto começou antes mesmo da
mudança da Capital, vários projetos foram elaborados visando a preservação e a adaptação
da cidade à uma nova estrutura. O reconhecimento da cidade se inicia, então, quando a
cidade perde sua função política, no fim do século XIX. O prefeito João Veloso, que esteve à
frente da prefeitura na década de 30, foi o primeiro a desenvolver políticas de restauração na
cidade, intervindo em ruas, praças monumentos e proibindo construções em desacordo com
o estilo colonial. Nesse contexto, destaca-se também a atuação do Instituto Histórico de Ouro
Preto, criado por moradores e intelectuais, que empreendeu campanhas e reconhecimento
dos locais da cidade, fizeram também pequenas intervenções e reformas pela cidade. Ainda,
segundo a autora: “A Inspetoria apresentou, em 1935, o “Plano de Restauração de Ouro
Preto”, o primeiro no Brasil, que contemplou a restauração de edificações singulares, igrejas,
pontes e chafarizes”.

Diante da necessidade de preservação do acervo cultural, da identidade material e imaterial,


bem como do desenvolvimento social sustentável da cidade, é identificado a carência de mão
de obra especializada em conservação e restauro na construção civil (SIMÃO, 2010). Nesse
viés, em 2006 é criado em Ouro Preto o Curso Superior de Tecnologia em Conservação e
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Restauro, sob inciativa do antigo Centro Federal de Ciência e Tecnologia de Minas Gerais,
hoje IFMG. Dessa forma, Cristina Simão cita as atribuições e objetivos dessa formação
profissional, pioneira, no âmbito do patrimônio cultural.

Tem como objetivo assegurar a formação de profissionais tecnólogos de nível


superior, com capacitação técnico-tecnológica e projetual para o
cumprimento das atividades de conservação e restauração de imóveis,
priorizando a compreensão dos processos tecnológicos e da metodologia de
intervenção em bens culturais imóveis, com visão crítica, abrangente e
multidisciplinar, capazes de interagir com ampla gama de profissionais afetos
às questões da construção civil, valorizando o patrimônio construído e
utilizando, de forma racional, os recursos disponíveis. (SIMÃO, 2010, p 450)
A ação das instituições de ensino é fundamental para a manutenção desse patrimônio, através
da qualificação profissional e de atuação direta no processo de reconhecimento, identificação,
cadastramento, inventário, planejamento de obras e intervenções de conservação e restauro.
Importante registrar que o papel da preservação do patrimônio cultural nacional extrapola,
hoje, os limites da história e da memória, uma vez que começa a cumprir um papel econômico
e social. Pesquisar sobre a preservação cultural e compreendê-la implica em desvendar não
somente as características culturais mas, sobretudo, em avaliar possibilidades de ampliar o
leque de atividades econômicas dos núcleos urbanos possuidores de acervo cultural.

Nesse sentido, objetivando a parceria entre academia e órgão preservacionista, com proposito
de fomentar a pratica da preservação em Ouro Preto é criado o Laboratório de Restauro, sob
responsabilidade da FAOP, Fundação de Arte de Ouro Preto, com parceria do IFMG- Campus
Ouro Preto e o IPHAN. Desde sua criação, em 2009, o projeto extensionista, de cunho cultural
e social compromete-se a realizar Dossiês de Conservação e Restauro, possibilitando a
conservação de edificações de valor cultural da população de menor poder aquisitivo, ou
ainda de associações comunitárias responsáveis pelo patrimônio cultural situado nas diversas
localidades da região, uma vez que o projeto objetiva atender também as necessidades
provenientes deste segmento, quando essas instituições demandarem ações relacionadas
aos objetivos propostos. Já em 2014 pretendendo dar prosseguimento às ações
anteriormente executadas sob responsabilidade da FAOP, a Coordenadoria do Curso de
Conservação e Restauro firma o projeto, “Oficina de Restauro Público” como projeto de
extensão vinculado à Diretoria de Pesquisa e Extensão, DIPE, do Instituto.

Ainda seguindo a mesma linha de objetivos e metodologias do projeto anterior, nessa edição
especificamente a Oficina contempla as paroquias da cidade, responsáveis pelos imóveis de
valor cultural, objetos de estudo desse trabalho. Elegido pelo Escritório Técnico do IPHAN de
Ouro Preto, os bens contemplados são: Passo da Ponte Seca, Passo da Rua São José, Passo
do Antônio dias, Capela de Nossa Senhora das Necessidade e Capela de Santa Cruz. As
pequenas edificações, embora de singela arquitetura e ornamentação, desempenham papel
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importante na vida cultural e religiosa da cidade. Os Passos da Paixão possuem participação
importante na icônica Semana Santa da Cidade, são abertos uma vez por ano, somente no
Domingo de Ramos e retratam por meio de imagens de roca, os momentos finais da vida de
Cristo. Já as capelas, situadas em áreas periféricas da cidade, no entanto, de importante valor
cultural, são utilizadas no decorrer do ano para a celebração de pequenos cultos católicos,
como terços e novenas.

Nesse sentido, a Oficina de Restauro Público tem como foco, principalmente, atuar de forma
efetiva na conservação e restauração de imóveis de valor cultural, devolvendo para a
população parte do conhecimento adquiridos em sala de aula. Objetiva, ainda, trabalhar
mentalidades comprometidas com a preservação do patrimônio cultural, através de ações de
educação patrimonial, contribuindo, consequentemente, para a melhoria da qualidade de vida
e para a valorização da cultura.

2. Metodologia
A proposta metodológica do programa de extensão em interface com a pesquisa apresentado
reflete os princípios do Plano do Curso Superior em Conservação e Restauro que define que
“a estruturação do curso (...) permitirá, sobretudo, que os alunos realizem exercícios
acadêmicos, baseados em objetos reais e palpáveis, que integrem a prática projetual a
soluções tecnológicas compatíveis com os preceitos teóricos, legais e contextuais”. O
exercício da análise e da síntese baseado na crítica da realidade, na autonomia das decisões
e na mensuração dos efeitos causados é fundamental para formar profissionais capazes de
intervir em bens imóveis de valor cultural, muitas vezes protegidos por instrumentos legais
municipais, estaduais ou federais e, mais que isto, representantes da identidade social e
merecedores da afetividade de gerações.

A Oficina de Restauro Público caracteriza-se por elaborar dossiês de restauro de edificações


de valor cultural em estado de deterioração do município de Ouro Preto - MG, sob a
responsabilidade de população de menor poder aquisitivo ou a de associações comunitárias
ou similares. A partir de uma seleção ou atendendo às demandas do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, elabora-se o dossiê de restauro, composto de etapas
bastante definidas.

Cada etapa de execução do dossiê de restauro tem uma importância única e deve ser
desenvolvida com bastante rigor, visto que o produto final a ser entregue deverá garantir a
salvaguarda do valor cultural desta edificação.

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Os procedimentos metodológicos utilizados seguem o que prescreve o manual sobre dossiês
elaborado pelo IPHAN, o que propõe as Cartas Patrimoniais sobre restauro de bens históricos,
em específico sobre bens imóveis, tendo como base principal a Carta do Restauro, 1972, que
afirma, “a realização do projeto para restauração de uma obra arquitetônica deverá ser
precedida de um exaustivo estudo sobre o monumento, elaborado de diversos pontos de vista
(...), relativos à obra original”1. Também como um dos principais eixos para a desenvolvimento
os preceitos do teórico Italiano Cesare Brandi que defendia “a restauração constitui o
momento metodológico do reconhecimento da obra de arte, na sua consistência física e na
dúplice polaridade estética e histórica, com vistas à sua transmissão para o futuro” (BRANDI,
2004, p.30). A partir desse conceito Brandi sintetizou dois axiomas que são fundamentais
durante as tomadas de decisão na etapa de proposta de intervenção em um dossiê de
restauro, sendo eles:

Axioma 1: “Restaura-se somente a matéria da obra de arte.” (BRANDI, 2004,


p.31)

Axioma 2: “A restauração deve visar ao restabelecimento da unidade


potencial da obra de arte, desde que isto seja possível sem cometer um falso
artístico ou um falso histórico, e sem cancelar nenhum traço de passagem da
obra de arte no tempo.” (BRANDI, 2004, p.33).

A partir desses critérios metodológicos, realizam-se visitas de campo e pesquisas


bibliográficas, a fim de buscar informações sobre a edificação a ser trabalhada, realizando a
primeira etapa, o levantamento histórico-contextual, que consiste em:

“Tentar reconstruir a história do bem arquitetônico em estudo, cujo


procedimento iniciar-se-á pela coleta de dados da edificação primitiva
levando-se em conta a época de construção, o uso original, o autor do projeto
e o encomendante. Seguindo então a pesquisa sobre as intervenções
sofridas ao longo do tempo, tais como reformas, acréscimos e intervenções
restaurativas, até chegar ás informações da edificação em seu estado atual.
São fontes possíveis para essa etapa os acervos locais de períodos e de
material iconográfico de instituições públicas ou de particulares, bibliografia
dedicada ao bem ou à época em estudo, visitas de campo e, quando possível,
entrevistas com pessoas que tenham vivenciado a época em que a edificação
foi construída.”(CHAVES, FILHA, 2007, p.3).
Concomitante a etapa de levantamento histórico-contextual, é de suma importância identificar
os sistemas e materiais construtivos com o objetivo de conhecer a tecnologia usada na época,
ajudando na fase da elaboração do diagnóstico.

1
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Brasil). Carta do Restauro, 6 de abr. 1972. Disponível em:
<http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20do%20Restauro%201972pdf>. Acesso em 18 jun.
2017.
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Na etapa de levantamento arquitetônico e fotográfico, além de registros fotográficos para
compor o levantamento histórico-contextual e servir de registro, inicialmente é executado
croquis da planta, dos cortes e dos detalhes que se configurarem importantes, a fim de
registrar medidas e cotas altimétricas mensuradas da edificação para a construção dos
desenhos em um software apropriado. O levantamento arquitetônico serve como documento
histórico, indispensável para futuras intervenções.

Todas as informações levantadas nas etapas anteriores ajudarão na elaboração do


mapeamento de danos e diagnóstico, em que é realizado uma análise do estado de
conservação e identificados os danos encontrados na edificação. Todas as patologias são
representadas nas plantas, cortes, fachadas, com cores e de formas diferentes sendo
devidamente legendados, ademais são medidos a proporção dos danos fundamentando
assim a proposta de intervenção.

Na proposta de intervenção se encontra as recomendações e propósitos justificado em um


memorial descritivo teórico-conceitual, e precedido das especificações dos serviços
detalhados que serão feitos em um caderno de encargos.

Em todas estas etapas de execução dos dossiês os alunos são orientados e supervisionados,
respectivamente, diretamente pelo docente responsável e pelo chefe do escritório técnico do
IPHAN. Dessa forma, proporcionam aos alunos uma troca de experiência e aprimoramento
dos trabalhos. Poucos materiais são necessários para a realização dos trabalhos, em suma,
são empregados materiais rotineiros para os alunos de Conservação e Restauro: trena rígida
e eletrônica; prancheta; papel; lápis e borracha; capacete de segurança; máscaras de poeira;
escada para acesso às coberturas e câmera fotográfica. Na etapa de confecção dos
desenhos, mapeamentos de danos, proposta de intervenções, feitos no software apropriado,
posteriormente finalizados e transformados em PDF em pranchas no formato A1.

Paralelamente à construção do Dossiê de restauro, são realizadas ações de informação e


educação da população envolvida, tendo em vista que as ações do programa se dão, em
grande parte do tempo, dentro das residências dos participantes. Assim, o contato dos alunos
e professores com a população acontece cotidianamente, possibilitando uma troca de
informações e experiência de grande riqueza.

Outro ponto importante no processo avaliativo é a mensuração da integração das diversas


variáveis que constituem a realidade estudada, abrangendo disciplinas diversas - história da
arquitetura, tecnologias da construção, dossiê de restauro, teoria da restauração, gestão e
planejamento de obras - repercutindo no processo de formação e qualificação do aluno, pois
ele reconhece na prática os processos estudados na teoria, possibilitando clareza e nitidez na
sistematização de conhecimentos.
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3. Resultados e Discussões
Visando a consolidação da “Oficina de Restauro Público” no projeto realizado em 2015/2016
as atividades realizadas em 2017 objetivaram dar prosseguimento às que não foram
concluídas nos projetos passados e ainda seriam passíveis de continuidade. Sendo assim, foi
realizada a organização sistematizada de todos os antigos projetos sob coordenação da
FAOP, bem como de seus pareceres técnicos. Esses constituem-se de Dossiês de
Conservação e Restauro, elaborados desde a criação da Oficina, das edificações da
população de baixa renda da cidade de Ouro Preto.

Entretanto, por questões de desinteresse do proprietário e/ou mudanças drásticas na situação


de conservação de alguns imóveis, uma parte dos processos antigos foram arquivados na
Oficina. Nesse sentido, em parceria oficial com o Escritório Técnico do IPHAN, foi solicitado à
Oficina para efetivarmos uma parceria com objetivo de realizar os levantamentos,
diagnósticos e respectivos dossiês de conservação e restauro de 03 Passos da Paixão e 02
Capelas de pequeno porte (Passo da Ponte Seca, Passo da Rua São José, Passo do Antônio
Dias, Capela de Santa Cruz e Capela de Nossa Senhora das Necessidades) localizadas em
distintas regiões da cidade de Ouro Preto. Esses consistem em pequenas edificações de valor
cultural que pela importância nas manifestações religiosas e o valor cultural que possuem,
justificam a intervenção. Assim, atendemos ao público especificado, pois estes bens culturais
são de responsabilidade final das comunidades que os utilizam. Neste caso, os bens se
encontram sob responsabilidade das paróquias de cada bairro, que atualmente não
possuiriam recursos para a efetiva restauração das Capelas.

Figura 1: Capela de Santa Cruz. Figura 2: Passo do Antônio Dias.


FONTE: Natália Morita, 2016. FONTE: Natália Rodrigues, 2016.

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Figura 3: Passo da Rua São José. Figura 4: Passo da Ponte Seca.
FONTE: Edilaini Raquel, 2016. FONTE: Natália Rodrigues, 2016.

De acordo com a metodologia definida para dossiês, cumpriram-se os procedimentos


habituais. Objetivando a otimização do cronograma definido para os editais de pesquisa e
extensão da instituição, o levantamento histórico foi realizado de forma simplificada. Foram
buscados os seus Inventários na Secretária de Patrimônio da cidade, a fim de compreender
o histórico das edificações, bem como suas técnicas construtivas e intervenções realizadas
ao longo do tempo. Dessa forma, as demais etapas elaboradas no Dossiê de Conservação e
Restauro dos Passos e Capelas tiveram como baliza a tipologia e historiografia de cada bem.

Para a etapa de levantamento fotográfico e arquitetônico, foram realizadas visitas em duplas


e trios, a fim de executar a medição das edificações. O período de duração foi de nove
meses, tendo como resultados as plantas baixas, plantas faladas, planta de cobertura, cortes
e fachadas. Após a execução minuciosa e detalha das características e dimensões de cada
imóvel foi elaborado o mapeamento de danos, contendo cada patologia identificada e
representada em pranchas no formato A1. Esses levantamentos tiveram como base modelos
recomendados pelo IPHAN e realizados de acordo com os Cadernos Técnicos do Programa
Monumenta, elaborados para consolidar e transmitir os conceitos, normas e preceitos que
orientam a preservação do Patrimônio Histórico e Artístico protegido pela União (Decreto Lei
nº 25).

Após a conclusão do mapeamento de danos, elabora-se a proposta de intervenção


estruturada de acordo com as patologias identificadas nos levantamentos. As propostas foram
elaboradas de acordo com as especificações estipuladas pela portaria nº 312, de 20 de
outubro de 2010, onde estão estabelecidos os parâmetros para intervenções e novas

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construções a serem executadas em cada área da cidade de acordo com o zoneamento e
diretrizes.

As pranchas foram concluídas, mantendo o formato A1, convertidas para PDF e entregues
digitalmente ao escritório do IPHAN. E com isso deu-se início ao desenvolvimento do Caderno
de Encargos, ou Especificações de Serviços, que se compõe de partes administrativas que
serão executadas na obra de conservação e restauro dos respectivos bens contemplados. Ao
final do trabalho, os Dossiês serão doados para o Escritório Técnico do IPHAN a fim de
contemplar a efetiva restauração dos bens.

Durante as atividades as bolsistas tiveram auxílio das paróquias responsáveis por cada Passo
ou Capela, para o devido acesso às edificações. No decorrer da construção do dossiê, sendo
supervisionados pelo Escritório Técnico do IPHAN, foram orientadas técnicas para
aprimoramento dos levantamentos, correções e refinamento dos desenhos de acordo com
referências exigidas nos projetos aprovados pelo escritório. Fato esse que muito contribuiu
para a experiência das alunas, visto que os conhecimentos adquiridos em sala estavam sendo
aplicados na realidade e sob supervisão do órgão responsável e que eventualmente aprova
esse tipo de trabalho.

Considerações Finais

As atividades da Oficina de Restauro Público consistem em um mecanismo de importante


formação aos alunos do Curso de Conservação e Restauro; isso justifica a necessidade de
consolidação da Oficina como um programa definitivo do curso. O projeto de extensão atua
como um verdadeiro laboratório de aplicação das teorias e práticas aprendidas em sala,
possibilitando aos alunos ampliar a visão como profissionais da área de patrimônio cultural,
subsidiado pelo contato direto com a comunidade e o IPHAN, órgão responsável pela
preservação e conservação dos bens culturais. Desenvolvido dentro de um curso de
tecnologia, o projeto devolve à sociedade um produto direto do investimento aplicado à
Instituição e lança no mercado um profissional mais capacitado com as questões cotidianas
da preservação. Visto que os profissionais dessa área ainda possuem pouco reconhecimento
no mercado, a vivência prática propiciada pelo projeto agregará de forma positiva, ampliando
sua visibilidade junto ao campo profissional.

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Referências bibliográficas

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<http://www.prac.ufpb.br/anais/IXEnex/iniciacao/documentos/anais/2.CULTURA/2CTDAMT0
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Danos/Recomendações Básicas. Jorge Eduardo Lucena Tinoco. Textos para discussão-
Vol 43.2009, 23p.

CHAVES, C. M.; FILHA, M. B. M. Metodologias de inventário para restauro de edificações


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<http://www.prac.ufpb.br/anais/IXEnex/iniciacao/documentos/anais/2.CULTURA/2CTDAMT0
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CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade: Editora


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Fernandes, Simone Monteiro Silvestre.Reflexões para ações educativas em conjuntos


urbanos tombados: Ouro Preto / Simone Monteiro Silvestre Fernandes – Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 2014.

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de Elaboração de Projetos de Preservação do Patrimônio Cultural. Cadernos Técnicos -
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MUÑOZ VIÑAS, Salvador. Teoría Contemporánea de la Restauración. 1.ed. Madrid:


Sintesis. 2003. 205p.

PORTARIA DO IPHAN Nº 312, DE 20 DE OUTUBRO DE 2010

SIMÃO, Maria Cristina Rocha. A formação profissional como Instrumento de preservação


do patrimônio cultural. In: FERNANDES, Edésio; ALFONSIN, Betânia (Coord.). Revisitando
o Instituto do tombamento. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 443-461.

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OS CORETOS: A permanência do mobiliário urbano sem uso
específico

BUTTROS, SAVILLY A. T. (1)

1. Instituto Federal de Minas Gerais. Departamento de Conservação e Restauro.


Rua Othon Guimarães, 97, Barra – Ouro Preto. CEP: 35400-000
sbuttros@gmail.com

RESUMO

Este trabalho objetiva uma explanação histórica sobre o surgimento dos coretos, bem como
seu papel atual na composição do espaço urbano. Os coretos são mobiliários urbanos
frequentemente encontrados em praças, largos e jardins brasileiros. Além da função
ornamental, apresentam grande importância histórica e social. Sua difusão no Brasil esteve
diretamente ligada ao crescimento das organizações musicais e à expansão das linhas férreas
nas regiões interioranas, ocorridos entre os séculos XIX e XX. Atualmente, as apresentações
musicais e os pronunciamentos políticos, realizados dentro ou próximos aos coretos, não mais
fazem parte de uma tradição vívida. Porém, muitos coretos permanecem nas praças sem uso
específico e em situação de abandono, submetidos a todas as formas de degradação. Durante
a pesquisa, foram visitados cinco coretos de técnica construtiva similar – sendo um em Minas
Gerais e quatro no Rio de Janeiro – verificando-se o estado de conservação e as medidas
protetivas existentes. Notou-se que a falta de vínculos entre a população e os coretos torna a
tomada de medidas de preservação mais complexa. Deficiências na gestão do patrimônio
público também são um fator agravante para a recorrente má conservação desses mobiliários.
Contudo, os coretos são testemunhos de antigas tradições e carregam estilos e técnicas
construtivas diversas, as quais podem se perder caso não haja preservação.

Palavras-chave: coreto; praças; urbanismo; patrimônio público; preservação.

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INTRODUÇÃO

Os coretos marcaram a história das praças do Brasil entre os séculos XIX e XX. São
elementos urbanos com função ornamental e de grande importância social. Também
conhecidos como ‘pavilhões de música’, estavam inicialmente ligados às apresentações
públicas de bandas militares, filarmônicas, serestas e às festividades religiosas. Além disso,
os espaços dos coretos costumavam abrigar pronunciamentos políticos para grande número
de pessoas. Tal tradição não é tão vívida nos dias atuais, contudo, muitos coretos
permanecem nas praças sem uso específico. A falta de aproveitamento desses mobiliários
urbanos pode ser uma das causas do mau estado de conservação em que geralmente se
encontram.
Os coretos, tão comuns no Brasil, são uma herança europeia. Portugal foi, de maneira
mais intensa, uma fonte de referências culturais do século XVI ao século XIX. Enquanto
colônia, absorvemos modismos em voga na metrópole, mesmo que tais modismos tenham
sido inspirados em outras culturas. Por outro lado, reinventamos as tendências a partir dos
nossos próprios conceitos e materiais disponíveis. As apresentações de bandas civis e
militares eram uma tradição muito forte em Portugal e, lá podem ser vistos coretos em grande
parte das cidades, assim como no Brasil. Sobre a chegada desses elementos ao país,
abordaremos posteriormente.
A origem dos coretos se confunde, em alguns momentos da história, com os pavilhões
e quiosques de jardim. Os coretos e os pavilhões são estruturalmente similares e
compartilham aplicabilidades, como a ornamentação do local e a contemplação do entorno.
Porém, através de diversas transformações sociais, houve a popularização dos pavilhões, os
quais tornaram-se mobiliário urbano de referência na área musical. (BUTTROS, 2017, p. 13-
15).
A palavra ‘coreto’ surgiu no século XIX em Portugal para denominar os já existentes
‘quiosques’ e ‘pavilhões’. Tal mudança de nome pode estar relacionada a esse novo conceito
de uso do objeto, surgido aos finais do século XVIII. A origem etimológica da palavra remete
ao italiano ‘coretto’, expressão que se associa com ‘tribuna’ e ‘coro da igreja’. Outra linha de
pensamento defende que o sufixo ‘eto’ quer dizer ‘pequeno’, portanto ‘pequeno coro’.
O coro da igreja é um local utilizado para apresentações musicais. A palavra ‘coro’
também remete a ‘canto’. Em francês, o coreto é chamado de ‘kiosque à musique’, que quer
dizer em português ‘quiosque de música’. Em inglês, a palavra usada é ‘bandstand’, na qual
‘band’ significa ‘banda’ e ‘stand’, neste caso, tem a ver com ‘palanque’, ‘pedestal’ ou ‘barraca’.
Vemos, portanto, que a função principal dos coretos é sugerida por seus próprios nomes: a
música. (CARVALHO, 2010, p. 2-6).
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Neste artigo, aborda-se uma breve trajetória do uso de coretos no mundo e no Brasil.
São descritos alguns materiais, modelos e estilos aplicados ao longo desse extenso percurso.
Em seguida, serão explanadas as justificativas aplicáveis para a proteção institucional desses
bens e suas implicações.
Como estudo de caso, tem-se cinco coretos da primeira metade do século XX, sendo
um deles em Ouro Preto – MG e os outros quatro na cidade do Rio de Janeiro. Esses coretos
possuem muitas similaridades estéticas e compartilham da mesma técnica construtiva. Pode-
se dizer que são réplicas com algumas variações de medidas, ornatos e cores. A partir desses
objetos, propõe-se uma análise das áreas de entorno e os tipos de uso feitos pela população.
Paralelamente, será investigada a existência de medidas protetivas institucionais e o estado
de conservação. Por fim, será possível discutir, para tais casos, a eficácia da proteção
institucional para a preservação e também o poder do vínculo das comunidades com os
coretos.

1. A ORIGEM DOS CORETOS

Pavilhões cobertos e com aberturas laterais são vistos desde a história antiga no
oriente. Na China, por exemplo, os grandes espaços assimetricamente ajardinados e a
presença de um quiosque são parte de uma tradição. A difusão desse elemento decorativo
na Europa está ligada a diversos fatores históricos. (RACABULTO, 2005, p. 5-23).
A partir do século XI, as Cruzadas1 - movimentos militares cristãos em direção à atual
Palestina - fizeram com que os europeus tivessem contato com as múltiplas culturas do
oriente. Como resultado, abriram-se rotas comerciais, como a Rota da Seda, a qual a China
era exportadora. A relação comercial entre Europa e Ásia Menor (local hoje majoritariamente
composto pela Turquia) cresceu de forma considerável. É justamente na região da Turquia
onde se observou a adoção de quiosques para áreas de relaxamento a partir do século XV.
Já no século, XVIII a chinoiserie2, evocação de elementos da cultura chinesa como
motivo ornamental, era uma moda na Europa. Um fator importante na propagação do uso de
pavilhões foi o jardim inglês, também chamado de ‘anglo-chinês’. Tal modelo foi levado à
França no final do século XVIII. A construção dos quiosques era feita em madeira ou pedra.

1 As expedições denominadas como ‘Cruzadas’ ocorreram entre os séculos XI e XIII a fim de se expandir o
cristianismo no Oriente.
2 A ‘chinoiserie’, também conhecida como ‘chinesice’ foi aplicada como motivo ornamental pictórico na Europa com
motivos fantásticos que se combinavam bem ao barroco e ao rococó. O Brasil também possui tal influência advinda
de Portugal. (LONGOBARDI, 2011).
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As composições estéticas variavam entre a inspiração tipicamente chinesa e os exemplares
com referências locais. Georges-Louis Le Rouge, arquiteto francês, publicou uma série de
pranchas de jardins anglo-chineses entre 1775 e 1788 num conjunto de 12 livros. Os
desenhos de Le Rouge evidenciam as tendências da época e retratam diversos tipos de
quiosques e pavilhões. (RACABULTO, 2005, p. 24-40).
A construção de jardins com preocupação paisagística e ornamental em residências
nobres tornou-se um costume. Na França, os pavilhões de jardim foram remodelados pela
frequência de uso. Abre-se espaço para as referências arquitetônicas da Grécia Antiga, as
quais sempre estiveram em vigência na história da arte do continente, porém com diferentes
roupagens. As influências do Neoclássico trouxeram os pavilhões circulares com colunatas,
inspirados nos antigos templos gregos e nas construções renascentistas. A função desses
objetos era a contemplação do jardim e o ócio.
O Templo do Amor, ou ‘Temple de l’amour’ é um pavilhão erguido entre 1777 e 1778
no jardim inglês Petit Tiranion do Palácio de Versalhes, na França. Projetado por Richard
Mique, trata-se de uma construção circular com colunas coríntias arrematadas por uma
cúpula. Há uma escultura de um cupido ao centro, clara referência à mitologia grega. Até
então, os pavilhões fixos são praticamente restritos aos jardins nobres de palácios e casarões.
(BUTTROS, 2017, p. 15-18).

2. A DIFUSÃO DO USO DOS CORETOS

A relação dos quiosques artísticos com a música surge na popularização dos modelos
de paisagísticos, sendo estes transferidos aos parques e praças públicas. A criação de novos
hábitos de sociabilidade se torna consequência da Revolução Francesa (1789-1799), a qual
também incentivou o sentimento de pertencimento popular ao local habitado. Através das
revoluções liberais contra as monarquias, os coretos se difundiram por toda a Europa,
inclusive em Portugal. Como resultado, é relatado que os coretos desta época eram móveis
ou desmontáveis, pois os pronunciamentos coletivos e as festividades não eram realizados
num só local. A apreciação musical de diferentes estilos passou a não estar restrita aos teatros
e casas de espetáculo.
A partir do século XIX, a expansão urbana trouxe novas concepções aos espaços
coletivos. O urbanismo enquanto ciência também surge nos oitocentos, após a primeira
Revolução Industrial (1760-1859). Devido às habitações insalubres e vias estreitas sem
saneamento, uma das vertentes buscava evitar aglomerações de edifícios, ampliar as vias e
ajardinar os espaços. Os centros de grandes cidades como Paris foram remodelados. O largo
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ou a praça central - que já havia sido frequentemente utilizada como um marco urbanístico
por muitos povos - agora torna-se um centro de vivência da cidade e é planejada para tal. A
praça passou a brigar atividades acessíveis de lazer, como apresentações musicais e falas
políticas. Criou-se um espaço perfeito para a fruição entre cidade e natureza.
No campo tecnológico, ocorreram avanços na siderurgia que apontaram a segunda
Revolução Industrial (1860-1959). A produção do aço foi uma descoberta que revolucionou o
mercado do transporte. Mais resistente que o ferro, o aço foi empregado na ampliação de
malhas ferroviárias. A aplicação do material permitiu vigas que vencessem grandes vãos na
construção civil, viabilizando obras de extensos galpões. Ademais, através das ferrovias foi
possível transportar elementos para a construção civil pré-fabricados, como escadas, pilares,
gradis, ornatos e coretos. Permitiu-se o acesso a estes equipamentos nas cidades do interior
com mais rapidez.
Produtos pré-fabricados poderiam ser encontrados em catálogos para encomenda.
Isto fez com que houvesse replicação de modelos e difusão rápida da arquitetura do ferro.
Entre os países que se destacaram nesse mercado estão a Bélgica e a Alemanha. Através
da ferrovia, materiais eram transportados para o interior dos continentes, inclusive para toda
a América. Portanto, modernização, dessa vez, não se concentrou apenas nos grandes
centros urbanos.

2.1. Os coretos no Brasil

A primeira banda musical que se tem registro no Brasil surgiu em Mariana em 1774,
regida por Pedro Nolasco da Costa Ataíde. É provável que essa banda não tenha as
configurações como hoje conhecidas, até mesmo porque no período colonial não eram
permitidas organizações do gênero. (BATISTA, 2010).
A transferência da corte portuguesa ao Brasil em 1808 fez com que se ampliasse a
produção cultural. Foi criada a Academia Real Militar e, aos poucos, foram criadas escolas e
universidades. A partir de então, os estudos musicais foram facilitados. As bandas militares e
filarmônicas, tradicionais em Portugal, se formaram na nova sede de governo. Considerando-
se que nessa época ainda não havia sinal de rádio, a apreciação musical poderia ser feita
somente ao vivo (até a invenção do gramofone em 1888).
No município de Ouro Preto, a primeira banda surgiu no distrito de Cachoeira do
Campo em 1856 sob regência de Luís Tibúrcio. A banda Euterpe Cachoeirense, ainda em
atividade, foi fundada por Rodrigo de Figueiredo Murta. Sobre a Euterpe, vale considerar que
é proprietária de um coreto, o único de natureza privada implantado em vias públicas que se

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tem conhecimento na região. O coreto do século XX situa-se no largo principal do distrito, ao
lado da Igreja Matriz de Nossa Senhora de Nazaré. (BATISTA, 2010).
No século XIX, principalmente sob o governo do imperador Dom Pedro II, ocorreu no
Brasil uma expansão das linhas ferroviárias. Visava-se o transporte de mercadorias e pessoas
entre o interior do país e o Rio de Janeiro, então capital federal. Era um período de avanços
tecnológicos na siderurgia. Países europeus como Bélgica e Alemanha se destacaram como
produtores e exportadores de produtos em ferro.
A ciência urbanística e as grandes reformas também chegaram ao Brasil na virada do
século XIX para o século XX, ofertando novos materiais e conceitos. A Proclamação da
República em 1889, marcando o fim do Império, foi um incentivo à mudança urbanística.
Ocorreram grandes reformas nos grandes centros, como foi empreendido pelo prefeito Pereira
Passos no Rio de Janeiro, alargando-se as vias. Os cortiços que existiam no centro da cidade
foram destruídos e seus habitantes, a maioria e pobres, forçadamente se dirigiram às
periferias. As praças eram apreciadas como espaços de convívio social. O ajardinamento dos
espaços refletia a sensação de domínio do homem sobre a natureza, com canteiros
demarcados formando desenhos e ornamentais. O coreto fazia parte desse cenário
romântico, assim como as bandas musicais, indispensáveis em festividades. (LEME, 1999).
O movimento do Ecletismo estava em voga no período. No Brasil, de meados do
século XIX ao XX, é possível observar tais tendências. As tipologias arquitetônicas para
residências já transpunham novas concepções, como os afastamentos laterais e frontais no
terreno do edifício para facilitar a ventilação (evitando-se construções geminadas). Sobre as
referências estéticas, houve retomada e mistura de elementos de diversos estilos. Os
chamados “neo”, que do grego quer dizer ‘novo’, descreviam novas abordagens de estilos já
existentes. Era comum que se adotasse o estilo neoclássico para edifícios públicos, o
neogótico para a construção de igrejas (em referência às emblemáticas catedrais góticas que
estavam sendo revalorizadas na Europa) e o neomourisco para palacetes e até coretos.
Em 1922, o sinal de rádio chega ao Brasil, mas a difusão do aparelho em todas as
classes sociais demorou alguns anos. Ainda assim, as apresentações musicais em praças
eram uma oportunidade de ser ver e ouvir pessoalmente os músicos. A atividade era uma das
formas mais comuns de convívio social. O papel dos coretos era fundamental, pois sua base
elevada auxiliava na visibilidade dos músicos pelo público. A praça que possuísse tal
mobiliário tornava-se mais agradável e receptiva para o entretenimento da população.
Sobre as referências estéticas e construtivas no Brasil, é possível encontrar coretos
da chamada “arquitetura ferroviária” (inserida no ecletismo), com elementos metálicos
ornamentados. Há também exemplos em madeira, em alvenaria, ou com misturas de
materiais. Muitos apresentam referências orientais, repletos de arabescos, ou são

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simplificados, com predominância de linhas retas. Todos estes partilham um saudosismo
romântico carregado de valores culturais.

3. O CENÁRIO DA PRESERVAÇÃO DOS CORETOS NO BRASIL

Os coretos, na condição de mobiliários urbanos e parte das praças públicas, têm sua
manutenção sob responsabilidade municipal. As prefeituras, através dos seus setores de
limpeza urbana e obras de infraestrutura, devem exercer esse cuidado. Num caso divergente,
está o coreto do distrito ouro-pretano de Cachoeira do Campo, Minas Gerais. Esse coreto está
implantado no largo principal do distrito, ao lado da Igreja Matriz de Nossa Senhora de Nazaré.
O mobiliário urbano pertence à banda musical Euterpe Cachoeirense, sendo talvez o único
de natureza privada implantado em vias públicas no Brasil.
É sabido que a gestão municipal de bens públicos pode apresentar deficiências. Em
caso de escassez de recursos financeiros por parte das prefeituras, pode-se priorizar a
manutenção de serviços básicos como a educação e a saúde. Esperar que as praças atinjam
um grau elevado de degradação implica numa obra maior de revitalização. Obras grandes
movimentam mais recursos financeiros e podem fazer parte de interesses políticos. (Carta de
Juiz de Fora, 2010, p. 5-7).
A proteção institucionalizada também é aplicável aos coretos. O tombamento, medida
protetiva de bens materiais, consiste no registro legal e do valor de um bem cultural para a
sociedade. O objetivo principal desse ato público é a preservação. Determinam-se
responsabilidades dos poderes públicos (em instâncias municipais, estaduais e federais) em
manter a integridade do bem patrimonial. Isto implica, em tese, numa vigilância maior do bem
tombado e no uso mais frequente de medidas de conservação para a evitar que este seja
destruído ou descaracterizado.
Um caso emblemático foi a ação denominada “tombamento de catorze coretos”
realizado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (INEPAC), no Rio de Janeiro em 1985.
Tratavam-se dos últimos coretos presentes no município, exceto por dois que já possuíam
tombamento, todos no subúrbio carioca. Segundo a documentação disponibilizada pelo
INEPAC, as motivações do tombamento conjunto foram diversas. A primeira delas foi o clamor
da população. À exemplo, a associação do bairro São Cristóvão citou o coreto como
“patrimônio sentimental” em estado de depredação. O tombamento era visto como o primeiro
passo para que o coreto fosse restaurado e voltasse a funcionamento.
Durante o processo, pensou-se que o projeto serviria de incentivo às bandas de música
ainda existentes. Foi ressaltado também que esse elemento urbano era parte da
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caracterização da cidade. Paralelamente, nesta época, a Fundação Rio lançou o projeto
“Balançando o Coreto”. Entre julho e setembro de 1985, ocorreram festas com apresentações
musicais em grande parte dos mobiliários envolvidos. A iniciativa buscava reforçar os vínculos
entre a comunidade e os coretos. (INEPAC, 1985).
Nota-se que, no ano de 1985, já existiam discussões e aplicações do conceito
atualmente conhecido como “paisagem cultural”, adotado pela UNESCO em 1992. O coreto
era um elemento indispensável no imaginário da população em relação às praças e jardins.
Observa-se também que o valor arquitetônico desses coretos foi pouco ressaltado como
justificativa de tombamento. Isto pode ter relação com a falta de estudos sobre as tipologias
de coreto existentes.

4. O caso dos coretos do Rio de Janeiro e Ouro Preto - MG

Como estudo de caso, escolheu-se cinco coretos. Quatro deles estão localizados na
cidade do Rio de Janeiro: o coreto do Jardim do Méier, os coretos gêmeos do Santuário de
Nossa Senhora da Penha de França e o coreto da Barão da Taquara, no bairro Praça Seca.
O último encontra-se na Praça Cesário Alvim, na cidade de Ouro Preto, Minas Gerais.
Foram realizadas visitas in loco para um levantamento fotográfico detalhado da área
de entorno de cada coreto, bem como dos coretos em si e seus principais danos físicos.
Também mediu-se cada um deles. As visitas ocorreram nos meses de outubro, novembro e
dezembro de 2016. Previamente, pesquisou-se, através de livros e órgãos responsáveis, a
datação de cada objeto e a existência de medidas protetivas institucionais. Na abordagem de
cada coreto, optou-se pela ordem cronológica entre os que estão localizados no Rio de
Janeiro e posteriormente o de Ouro Preto.
Esses coretos partilham muitas semelhanças estéticas e construtivas. São coretos
hexagonais de base elevada em alvenaria argamassada. Há um pilarete em cada vértice da
base. Os pilares são em madeira, assim como o guarda-corpo, o qual é fechado com
“balaústres” recortados. Os ornatos são bem similares, principalmente os círculos com um “x”
ao centro, localizados na parte superior de cada pilar. De cada vértice do forro partem
pequenas hastes com pinhas invertidas e os lambrequins nos beirais têm forma triangular. A
cobertura é feita em chapas metálicas e há arremate com pináculo.
O primeiro coreto é o do Jardim do Méier (zona norte), datado de 1919. No livro “Méier
e Engenho de Dentro”, na série de bairros do Rio de Janeiro da editora Fraiha (2009), o projeto
do coreto (fig. 1) está associado ao nome de Pedro Fernandes Vianna da Silva, engenheiro.

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O mobiliário é tombado pelo INEPAC desde 1985. Este recebeu a última intervenção em 2012,
assim como toda a praça. Notou-se que o Jardim do Méier é diariamente utilizado pela
população do bairro. O espaço é limpo e proporciona atividades de lazer, como mesas para
jogos de tabuleiro, brinquedos para crianças e também aparelhos para atividade física.

FIGURA 1- Coreto do Jardim do Méier.


Fonte: Savilly Buttros, 2016.

O coreto do Méier reflete as condições de seu jardim. Este não apresentava sujidades
acumuladas, tampouco perda de ornatos. Os danos mais comuns encontrados foram a perda
de camada pictórica em pontos dispersos e deposição de fezes de pombos. Parte da porta da
base estava amassada. De maneira geral, considerou-se um bom estado de conservação
para o objeto.
Os coretos seguintes estão no Santuário de Nossa Senhora da Penha de França (zona
norte), no Largo dos Romeiros, construídos aos pés da escadaria da igreja em 1923. Os
coretos podem ser considerados gêmeos (fig. 2), pois possuem a mesma morfologia, cores e
medidas. Estes não possuem tombamento individual, contudo, o Santuário é tombado pelo
município. A última reforma ocorreu em 2013, realizada pela prefeitura. Os membros da
paróquia mantém os coretos trancados, mesmo sendo públicos. Não é feito uso cotidiano
pelos visitantes do local. Os seguranças responsáveis alegaram perigo para crianças, pois os
coretos têm a base alta (1,83 metros) e estão próximos a um dos mirantes do santuário.

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FIGURA 2- Os coretos gêmeos do Santuário de Nossa Senhora da Penha de França.
Fonte: Savilly Buttros, 2016.

Observou-se perda de camada pictórica generalizada nos pilares dos coretos gêmeos,
assim como o esmaecimento das cores. Um deles estava sendo utilizado como depósito.
Trata-se de um local de atividade religiosa, constante peregrinação e visitação, portanto,
existe vigilância. Contudo, os coretos estão sujeitos à degradação por desuso. Considerou-se
o estado de conservação dos coretos como regular.
A Praça Seca recebeu o coreto que ficava na Praça 11 de Junho ao final de 1928,
durante o processo de ajardinamento que se estende até princípios de 1929 (fig. 3). Portanto,
não se soube a datação precisa desse mobiliário. Este é tombado pelo INEPAC desde 1985,
assim como o coreto do Méier. A última reforma ocorreu em 2008, sendo a mais antiga entre
os coretos analisados. Durante a visita, observou-se pouco uso da praça, a qual possui a
pavimentação e estrutura precários. Em dias de chuva, há acúmulo de poças d’água, o que
dificulta o trânsito de pessoas no local.

FIGURA 3- Coreto da Praça Barão da Taquara ou "Praça Seca".


Fonte: Savilly Buttros, 2016.
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O coreto da Praça Seca apresentava sujidades generalizadas, perdas pontuais de
camada pictórica, perda de ornatos (balaústres do guarda-corpo), pichações e mau cheiro.
Considerou-se o estado de conservação do coreto como ruim. Foi visto que a Praça Seca, de
forma geral, não estava convidativa ao uso. Porém, há uma escola municipal à frente dela e
duas outras escolas no mesmo quarteirão. Há também pontos de ônibus na própria calçada
da praça. Existe um potencial de uso frequente que pode não estar ocorrendo por conta do
mau estado de conservação da praça e do coreto e também pela ausência de um projeto
paisagístico no local.
O coreto da Praça Cesário Alvim, em Ouro Preto, é datado de 1925 (fig. 4). Foi
encomendado pelo engenheiro residente Tertuliano Lessa para aformoseamento da praça, à
frente da Estação Ferroviária de Ouro Preto. O mobiliário não possui tombamento individual,
este encontra-se incluído no perímetro de tombamento da cidade de Ouro Preto. A última
reforma ocorreu em 2010. (IPAC, 2010). A praça é deslocada do eixo das vias de circulação
e sua iluminação é precária (fator agravante para a incidência de vandalismos). O uso
exclusivamente turístico dos trens na Estação Ferroviária também pode contribuir para a falta
de vínculos da população ouro-pretana com a praça e o coreto.

FIGURA 4- Coreto da Praça Cesário Alvim, Ouro Preto - MG.


Fonte: Savilly Buttros, 2017.

À respeito dos danos observados no coreto de Ouro Preto, notou-se perda de camada
pictórica em diversas áreas, esmaecimento da cor, perda de ornatos (balaústres do guarda-

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corpo), pichações, perda da porta da base e ocupação do porão com entulhos. O estado de
conservação do coreto foi considerado ruim.

4.1. Os resultados da análise comparativa

Entre os coretos que possuem tombamento individual – o do Méier e o da Praça Seca


– foram observadas situações bem distintas. Ambos são protegidos pelo mesmo órgão, o
INEPAC, e se encontram em estados de conservação muito diferentes. Além disso, a
Prefeitura do Rio de Janeiro dispõe dos mesmos serviços de limpeza urbana em ambas as
praças. Isto pode atestar que, apenas o tombamento, por si só, não foi eficaz. São muitos os
fatores condicionantes para a eficácia dessa medida protetiva.
Considerando-se o caso do Méier como mais eficaz, a infraestrutura do entorno e a
identificação da comunidade com o local são fatores fundamentais. A boa infraestrutura do
Jardim do Méier e a importância do local para as pessoas do bairro são evidentes. O espaço
é convidativo ao uso.
Por outro lado, a Praça Seca, em seu mau estado de conservação, não se demonstrou
convidativa ao uso. O estado agravado de degradação em que a praça chegou é
responsabilidade dos poderes municipais. Outra variável a se considerar é que: a falta de
usos faz com que menos pressão seja exercida sobre os órgãos responsáveis pela
manutenção do local. O coreto é o grande foco da praça. A revitalização da Praça Seca seria
o primeiro passo para evitar a sua obsolescência e, consequentemente, a restauração do
coreto.
Os coretos de Ouro Preto e do Santuário da Penha estão inseridos em zonas
protegidas, mas não possuem tombamento individual. Ambos estão sujeitos à degradação
por um fator comum: a falta de usos.
O coreto mineiro está submetido à mais agentes de degradação, como o vandalismo.
A Praça Cesário Alvim possui algumas deficiências em sua estrutura que impedem seu uso
noturno, como a iluminação precária. Mas ainda assim, é uma praça convidativa ao lazer. A
falta de medidas de conservação preventiva, como manutenção periódica, é uma das
explicações possíveis para o grau avançado de degradação do coreto.
No Santuário da Penha, não foram mitigados os riscos da altura para que os coretos
sejam frequentados pelos visitantes do local. O aumento da grade do mirante, por exemplo,
ou a implantação da condição de que as crianças estejam acompanhadas por adultos para
subir nos coretos. O impedimento do uso pode tornar as manutenções periódicas
desnecessárias, o que se torna um fator de degradação eminente.
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Deve-se considerar também que o coreto do Meier pode estar sujeito à menos fatores
e agentes de degradação e, portanto, sua necessidade de conservação preventiva pode ser
menos frequente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Carta de Juiz de Fora, a qual aborda os jardins históricos, cita como um dos
principais fatores de degradação desses espaços:

- Ausência de educação do cidadão sobre a necessidade de respeito


às áreas livres das cidades, guiado sobretudo pelo exemplo da
administração municipal que, ao invés de mantê-las cuidadas de forma
exemplar, sujeita-as a todas as formas de pressão. (Carta de Juiz de
Fora, pp. 6, 2010).

Isto indica que alguns dos fatores condicionantes sobre o estado de conservação das
praças são o vínculo com a comunidade e a manutenção por parte do poder público. As
praças, locais abertos, estão sujeitas às adversidades ambientais e antrópicas. A espera por
um alto nível de degradação para a realização de uma reforma implica em um maior gasto
financeiro e na substituição de peças do mobiliário. A substituição acarreta na perda de
matéria “original”, testemunho do estilo e da técnica construtiva de uma época. As
substituições nem sempre são feitas com peças similares em forma e técnica.
O uso frequente dos jardins e praças é uma forma de pressão ao poder público para
a realização de manutenções. É também uma maneira de exercer vigilância, além dos órgãos
de proteção como polícias e guardas municipais. O vandalismo de mobiliários urbanos
também é um fator de degradação relevante. Os largos, praças e jardins, geralmente espaços
amplos, são de grande interesse público. Muitos desses locais são sacrificados em
modificações de vias urbanas. Empreendimentos imobiliários em seu entorno também podem
deturpar a função do ambiente.
Os coretos, enquanto mobiliários urbanos, estão sujeitos aos fatores de degradação
citados. Um agravante é a falta de uso específico para esse elemento. Herança de uma época
em que as praças abrigavam frequentes eventos de lazer, muitos coretos persistem sem usos
e em estado de conservação ruim.
A partir dos exemplos mencionados, pode-se entender que a eficácia do tombamento
depende da relação social do objeto com a sociedade. O processo de tombamento deve ser
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aberto à comunidade, como citado na Carta de Amsterdã (1975). A vontade coletiva torna
mais provável a ocorrência de manutenções num bem. O uso faz com que o bem precise de
manutenções. Por outro lado, o cuidado por parte dos poderes públicos torna o bem mais
convidativo ao uso.
A bibliografia brasileira sobre coretos é escassa. Revela-se que as peculiaridades
arquitetônicas dos vários coretos precisam ser estudadas e catalogadas como uma das
formas de preservação e valorização desses bens.

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REFERÊNCIAS

ÁVILA, Affonso & GONTIJO, J. Barroco Mineiro - Glossário de Arquitetura e Ornamentação.


Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, 1980.
BATISTA, Nylton G. Banda de música: a alma da comunidade. São Paulo: Sortecci, 2010.
BUTTROS, Savilly A. T. O coreto da Praça Cesário Alvim: Análise histórica, estilística e
construtiva. 2017. 79 f. Monografia (Tecnologia em Conservação e Restauro) –
Instituto Federal de Minas Gerais Campus Ouro Preto, Ouro Preto.
CARVALHO, Delmar D. de. Os coretos de Leiria. Lisboa: INATEL, 2006.
CARVALHO, Delmar D. de. Origem etimológica de CORETO e denominações noutros
idiomas. Lisboa: Meloteca, 2006.
CHOAY, Françoise. O urbanismo. 5ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2003.
DEÁK, C.; SCHIFFER, S. R. (org.). O processo de urbanização no Brasil. São Paulo: EdUSP,
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RACABULTO, Bruno. Les kiosques à musique de la Ville de Geneve: Etude historique et
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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
<http://oglobo.globo.com/rio/os-coretos-historicos-que-ainda-balancam-as-pracas-encantam-
os-cariocas-13785535> Acesso em: 22 de março de 2017.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
A PARTICIPAÇÃO POPULAR DESDE A CONCEPÇÃO DO PROJETO
DE RESTAURO: O caso da Casa de Câmara e Cadeia de Mariana

CARVALHO, FERNANDA TRINDADE DE

1. Universidade Federal de Minas Gerais. Escola de Arquitetura, Ambiente Construído e Patrimônio


Sustentável
Rua Paraíba, 697. Bairro Funcionários, Belo Horizonte, MG. CEP: 30.130-140
macps@arq.ufmg.br

RESUMO
O trabalho apresentado visa demonstrar a democratização do campo do patrimônio a partir da
participação popular no desenvolvimento do projeto de restauro da Cada de Câmara e Cadeia de
Mariana. A partir da possibilidade de intervenção tornou-se necessário entender as relações sociais
estabelecidas na Câmara e no cenário no qual a instituição está inserida, a Praça Minas Gerais. A
investigação iniciou pelo entendimento dos fatores que tornam a Casa de Câmara e Cadeia de
Mariana relevante sob o aspecto histórico-cultural. O estudo é fundamentado ainda no atual conceito
atribuído ao termo “patrimônio” e na teoria de valores proposta por Aloïs Riegl e reafirmada pela Carta
de Burra do ICOMOS da Austrália. E parte do pressuposto que qualquer processo de intervenção em
um bem patrimonial deve ir além da estrutura física, sendo obrigatório um estudo sobre os valores
atribuídos ao bem por diversos segmentos da sociedade, e não mais apenas pelos técnicos.

Palavras-chave: participação popular, patrimônio, atores, valores

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1. A Casa de Câmara e Cadeia de Mariana
Este trabalho tem como ponto de partida a discussão sobre os valores atribuídos à Casa de
Câmara e Cadeia de Mariana, Minas Gerais. Para entender tais valores agrupamos a
população da seguinte forma: moradores do entorno, frequentadores das reuniões, agentes
do patrimônio e turistas.

Segundo Barreto (1949, p. 2 e 3) o “Domus Municipalis” era a sede da administração e da


justiça, sempre construído em um local nobre da cidade, na praça central ou do mercado.
Em geral, os traços marcantes das casas municipais eram os pórticos destinados a feiras e
mercados em algumas delas, em outras são as escadarias na entrada do edifício ou, então,
as varandas para pregões. Ao centro do edifício, geralmente, colocava-se a torre de sinos.
Sinos estes que controlam a vida da cidade, com o toque de recolher, o anúncio de mortes,
de celebrações dentre outros acontecimentos. Barreto ainda salienta que o “Domus
Municipalis” contém a cadeia, o arsenal de milícias, as salas de reuniões para os
magistrados, algumas vezes com outras salas também e uma capela. A câmara tinha
atribuições administrativas e judiciais tanto cíveis quanto criminais.

Segundo transcrição da ata da eleição, contida na revista do Arquivo Público Mineiro


(1897,II, pp. 82-83), no dia 4 de abril de 1711 convocou-se a junta para se preparar a
eleição da nova Câmara de Vila do Carmo. Exatamente três meses depois, dia 4 de julho,
ocorreu no Palácio em que morava o Governador e Capitão Geral Antônio de Albuquerque
Coelho de Carvalho, a primeira eleição livre do Estado de Minas Gerais e, no dia seguinte,
tomaram posse os eleitos.

A Casa de Câmara e Cadeia de Mariana teve diferentes endereços até que a sede
conhecida atualmente fosse construída. Segundo Fonseca (1998, p. 181) em várias
ocasiões, os camaristas queixaram à Coroa, da precariedade de suas instalações, das
sucessivas enchentes do Ribeirão do Carmo, principalmente as de 1737 e 1743, o que
dificultava ainda mais a escolha de “cazas” que pudessem servir às funções públicas.

Em 1747, o Governador, o Ouvidor Geral de Vila Rica e os componentes da Câmara de


Mariana enviaram carta ao rei respondendo a sua ordem de que analisassem os terrenos da
cidade. Escreveram:

...assentaram que era o mais adequado e congruente para a praça, cadeia,


e mais edifícios públicos della, o sitio onde se achão os quartéis, demolido-
se os mesmos [...], sitio não acessível aos excessos e fúrias do córrego e
Rio no tempo das agoas.. (FONSECA, 1998, p. 42)

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Definia-se, assim, o local onde seria construída duas décadas depois a nova Casa de
Câmara e Cadeia. A escolha do terreno se deu devido as suas dimensões e da segurança
que o mesmo oferecia. (FONSECA, 1998, p. 42).

Na década de 60 dos setecentos começaram a ser construídos os três edifícios que


compõem um dos mais belos conjuntos arquitetônicos do Brasil: a Casa de Câmara e
Cadeia, e as Igrejas das Ordens Terceiras de São Francisco de Assis e de Nossa Senhora
do Carmo. Essa praça, pensada para ser o núcleo civil da cidade teve, portanto, seu caráter
modificado. “O mesmo logradouro passava a congregar os símbolos da justiça e dos
poderes civis e religiosos, ilustrando magnificamente o ‘casamento’ dessas instituições, e
apontando as elites que moldaram este espaço urbano.” (FONSECA, 1998, p. 55)

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2. Identificando os valores, os atores e a metodologia a ser
utilizada no processo de conservação de um bem patrimonial

O presente estudo dos valores atribuídos à Câmara de Mariana teve início a partir da
percepção da insuficiência do espaço físico para abrigar todas as atividades desenvolvidas
pela instituição e da evidente necessidade de restauro. Com a possibilidade de intervenção
tornou-se necessário entender as relações sociais estabelecidas na Câmara e no cenário no
qual a instituição está inserida, a Praça Minas Gerais.

O estudo realizado de Randall Manson, publicado pelo Getty Conservation Institute, vem
nos auxiliar a realizar a “leitura” dos valores atribuídos a um bem patrimonial. O
planejamento e a gestão encontram um triplo desafio, primeiro em identificar todos os
valores do patrimônio em questão, seguido da descrição destes valores e por fim, como
integrá-los e classificá-los, ou seja, criar uma espécie de ranque de prioridades destes
valores. Vale ressalva, que a maior dificuldade se dá na presença de valores conflitantes, o
que exige o desafio da não sobreposição. A metodologia proposta para avaliar a
significância cultural e os valores subdivide em três etapas, a primeira de identificação e
descrição dos valores que define os objetivos e os agentes envolvidos, ou seja, as partes
interessadas “stakeholders”, culminando em um local de descrição e documentação que se
distribui para a segunda etapa, de avaliação e análise, que considera os condicionantes
físicos, o contexto da gestão e principalmente os significados e valores culturais em um
conjunto integrado para a avaliação; por fim, evoluem para a terceira etapa, as respostas,
que estabelece políticas, fixa objetivos, desenvolve estratégias e sistematiza e prepara o
plano de ação. Esta metodologia envolve o procedimento de acompanhar, revisar e
examinar as etapas descritas durante todo o processo. Desta forma, as tarefas envolvem:
identificar, elaborar/descrever, declarar/revelar, tendo como ferramentas a consulta das
partes interessadas e envolvidas e a busca por métodos de análise (econômicos, culturais,
etc), trabalhos em grupos; onde ambos culminarão na integração das avaliações e
estabelecerão as políticas correlatas entre os valores e os recursos físicos, baseando-se no
princípio da sustentabilidade e, portanto, orientarão as tomadas de decisões.

A avaliação completa de valores do patrimônio vai exigir um conjunto diversificado de


métodos e uma abordagem flexível, o que Manson define como ‘caixa de ferramentas’. O
objetivo da abordagem ‘caixa de ferramenta’ é considerar todos os valores patrimoniais
relevantes sobre a mesa, construir o balanço mais praticável possível para informar a

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formulação de políticas e tomada de decisão utilizando para isso uma variedade de
ferramentas na sua avaliação.

Para a identificação dos valores além da necessidade de definição do método de pesquisa a


ser aplicado devemos também nos atentar, conforme apontado por Manson, em definir
quem são os atores que se relacionam com o bem em questão para que estes participem
dos grupos de estudo. Assim, identificando os grupos de interessados, que sejam capazes
de representar o todo, e empregando métodos destinados a alcançar e ouvi-los à luz de seu
caráter particular e capacidade são necessários em qualquer metodologia para avaliação do
valor do patrimônio. Para garantir a melhoria tanto no processo como no resultado,
circunscrição análise e identificação das partes interessadas é tarefa extremamente
importante.

O estudo é fundamentado ainda no atual conceito atribuído ao termo “patrimônio” e na teoria


de valores proposta por Aloïs Riegl e reafirmada pela Carta de Burra do ICOMOS da
Austrália. E parte do pressuposto que qualquer processo de intervenção em um bem
patrimonial deve ir além da estrutura física, sendo obrigatório um estudo sobre os valores
atribuídos ao bem por diversos segmentos da sociedade, e não mais apenas pelos técnicos.

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3. Os atores, os valores e os métodos aplicados

3.1 O uso e seus conflitos

Atualmente o prédio da Câmara é utilizado pela parte administrativa da Câmara, além dos
serviços de apoio como recepção, faxina, cozinha e gerais. Há ainda uma sala para o
presidente da Casa, com uma antessala para sua secretária. O plenário onde se realizam as
reuniões ordinárias, extraordinárias e sessões solenes, com uma sala anexa, utilizada,
principalmente para as reuniões de comissão e outras reuniões de vereadores.

A limitação do espaço físico permite apenas a sala para o presidente da Câmara; os demais
vereadores não possuem salas dentro do prédio da Câmara. Este fato levou, em 2009, à
decisão de alugar dez imóveis na cidade, para que cada um deles pudesse ser utilizado por
um vereador, como gabinete parlamentar.

Havia ainda outro agravante, uma notificação do Ministério Público, solicitando providências
quanto ao estado físico do prédio e orientando a restauração. Segundo relatório de vistoria
técnica do IPHAN, emitido em 24 de novembro de 2009, o prédio apresenta vários
problemas na sua estrutura. A partir desse cenário e do alto custo da manutenção dos
aluguéis surgiu a ideia, que é o ponto fundamental deste trabalho, de criar uma forma de
reunir todos os vereadores em um só espaço. Essa necessidade já podia ser percebida nas
conversas entre os próprios edis e entre os funcionários da Casa.

Sendo assim, definimos os grupos que deveriam representar a sociedade. Iniciamos por
aqueles que utilizam o prédio como local de trabalho e, portanto, possuem um grande
vínculo com o espaço: os vereadores e funcionários administrativos da Casa. Para esse
grupo definimos o método ZOPP para nos orientar.

O segundo grupo de interesse foi a sociedade de Mariana, representada por três subgrupos:
os moradores do entorno da Câmara, as pessoas que frequentemente acompanham as
reuniões de trabalho da Câmara e o subgrupo que chamamos de agentes de patrimônio,
composto por pessoas que possuem vínculo com a questão do patrimônio, seja através de
estudo ou como forma de trabalho. Para este grupo definimos o método conhecido como
Mapa Mental.

O nosso terceiro grupo selecionado foi composto por turistas, e para estes, trabalhamos
com a aplicação de um questionário com duas perguntas descritivas. Nosso objetivo foi
analisar se o prédio da Câmara é relevante como ponto turístico.

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3.2 A Câmara no imaginário dos edis e funcionários

Nesta fase dos trabalhos adotamos o método ZOPP como ferramenta de trabalho. ZOPP é
uma sigla alemã que significa Ziel (objetivos), Orientierte (orientado), Projekt (projeto) e
Planung (planejamento), ou seja, planejamento de projeto orientado por objetivos.

Através desse método é possível gerenciar o desenvolvimento de projetos de grande


complexidade por terem múltiplas dimensões. O ZOPP utiliza instrumentos de forma
participativa, para isso são aplicadas técnicas de trabalho chamadas "moderação", que
permitem a maior compreensão dos conteúdos trabalhados, especialmente através de
visualização em oficinas e, com isso, melhor comunicação entre os envolvidos. Sua
característica mais importante encontra-se na efetiva participação dos atores envolvidos,
facilitada por uma boa comunicação, e, quando a participação funciona, as decisões são
mais facilmente compreendidas e compartilhadas o que, por sua vez, leva a maior
compromisso com o projeto.

Em síntese, podemos dizer que os problemas levantados durante a realização das oficinas
de diagnóstico podem ser listados e organizados em grupos, o primeiro diz respeito às
condições físicas do prédio da Câmara Municipal de Mariana, aspectos relevantes
apontados pelos participantes apontam: a falta espaço interno do prédio (insuficiente e
inadequado para instalação dos gabinetes dos vereadores); instalações elétricas e
sanitárias danificadas, colocando o edifício em situação de risco principalmente risco de
incêndio; o telhado danificado e infiltrações.

Quanto ao funcionamento do prédio, destacamos a falta de espaço adequado para abrigar


os gabinetes dos vereadores, espaço do plenário reduzido, acessibilidade limitada com
predominância de escadas ou acessos com obstáculos.

O prédio da Câmara Municipal não tem sistema de segurança patrimonial e o


estacionamento não atende as necessidades dos vereadores e funcionários da Câmara.

A manutenção dos gabinetes dos vereadores em casas particulares alugadas, em diferentes


endereços na cidade, além de ter um custo elevado, dificulta o atendimento aos cidadãos e
a possibilidade de prestar serviços coletivos à cidade. Os custos de manutenção dos
gabinetes contrariam as orientações do Tribunal de Contas e do Ministério Público.

Os participantes apontaram a falta de espaço para a preservação da memória da cidade e


da Câmara como um problema sério, e junto com esta preocupação demonstraram

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interesse de recuperar o arquivo do Legislativo, hoje, sob controle da Universidade Federal
de Ouro Preto.

Apontaram a reforma (restauro) do prédio da Câmara Municipal como prioridade e, na


mesma ordem, a necessidade de se construir um espaço adequado para abrigar a Câmara
Municipal e os gabinetes dos vereadores.

Sendo assim, chegamos às representações que seguem para a árvore de problemas e


árvore de objetivos:

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Figura 1 Árvore de objetivos
Fonte: CARVALHO, 2012. p. 82

Entre todos os participantes, vereadores e funcionários, foi unanimidade o fato de que o


atual prédio da Câmara não pode perder, pelo menos por completo, a função de abrigar o
legislativo, uma vez que a Câmara de Mariana é a primeira Câmara de Minas Gerais e,

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dentre as Câmaras fundadas em 1711 – Mariana, Ouro Preto e Sabará – é a única ainda em
funcionamento no primeiro prédio construído com o propósito de abrigá-la.

A partir desse consenso foram apresentadas três possibilidades de modificação, com vistas
a solucionar o problema central – inadequação do espaço da Casa de Câmara e Cadeia de
Mariana às necessidades do Poder Legislativo. Nessa fase do trabalho, a orientação
recebida do mediador do grupo, era que a cada sugestão apresentada, os demais
participantes deveriam discutir quatro pontos positivos e quatro pontos negativos inerentes a
ela.

A alternativa um aponta para a construção do anexo nos fundos do prédio histórico da


Câmara para abrigar os gabinetes parlamentares, arquivo histórico da Câmara e outras
funções administrativas, liberando espaço no prédio principal para abrigar o centro de
Memória do Legislativo Municipal.

A alternativa dois aponta a mudança dos gabinetes parlamentares para o novo prédio que
está sendo construído para atender a Prefeitura Municipal de Mariana, no bairro São
Cristovão, uma vez que, durante a legislatura 2005-2008 o poder executivo chegou a propor
que os três poderes: legislativo, executivo e judiciário, fossem transferidos para este novo
prédio.

E a alternativa três aponta para a restauração de um dos imóveis que o município possui no
centro histórico para abrigar os gabinetes parlamentares. Os imóveis apontados foram o
Casarão dos Morais localizado na Praça da Sé ou o casarão da Rua Direita.

Ressaltamos ainda que tanto a segunda quanto a terceira alternativas são baseadas no fato
de levar, para esses prédios, os gabinetes parlamentares e realizar a construção de um
auditório maior que o existente no prédio Casa de Câmara e Cadeia. Parte das atividades
administrativas hoje desenvolvidas na Câmara, assim como a sala do Presidente da Casa
continuariam da mesma forma que hoje.

Nessa fase, obtivemos unanimidade referente a uma questão: independente da solução


adotada, o prédio da Casa de Câmara e Cadeia de Mariana precisa passar por um processo
de restauro.

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3.3 A Câmara no imaginário da população Marianense

Os mapas mentais representam como determinado lugar é vivido e compreendido pelos


cidadãos. “No mapa mental, a representação do saber percebido, o lugar se apresenta tal
como ele é, com sua forma, histórias concretas e simbólicas, cujo imaginário é reconhecido
como uma forma de apreensão do lugar” (Nogueira apud OLIVEIRA, 20--, p. 2).

A partir do momento em que, em um projeto de intervenção em um monumento, o foco


principal deixa de ser a materialidade do edifício e passa a ser os valores atribuídos ao
monumento, valores esses atribuídos pela sociedade e não mais por técnicos apenas, a
técnica de ‘mapa mental’ vem de encontro à questão deste trabalho. Essa é a metodologia
que irá nos permitir fazer a leitura dos valores atribuídos, pela sociedade, à Câmara de
Mariana.

O trabalho de campo foi realizado no período de um mês, quando tivemos contato direto
com os entrevistados. A amostra total é composta por 25 indivíduos segmentados da
seguinte forma: 10 moradores da Rua Dom Silvério (entorno); 10 pessoas que
frequentemente acompanham as reuniões da Câmara e 05 agentes de patrimônio.

Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 130) aponta a metodologia para análise e interpretação
dos mapas mentais que tem como parâmetros: a interpretação quanto à forma de
representação dos elementos na imagem; a distribuição dos elementos da imagem, quanto
à especificação dos ícones (pela representação de elementos da paisagem natural, da
paisagem construída, dos elementos móveis e humanos) e, por último, a apresentação de
outros aspectos ou particularidades. O resultado da aplicação dessas interpretações nos
mapas mentais, aliados a uma abordagem fenomenológica do espaço, revelam uma nova
forma de abordagem, que tem o intuito de contribuir nas análises espaciais, de forma a
compreender a lógica dos atores, desde as aspirações individuais aos sistemas de valores
dos grupos sociais.

A - Interpretação quanto à forma de representação dos elementos na imagem

Com relação à forma de representação dos elementos na imagem Kozel (apud


KASHIWAGI, 2004, p. 130) observa, numa primeira análise das representações, uma
diversidade de formas representativas, que são identificadas por ícones ou formas de
representação gráfica por meio de desenho; letras, isto é, palavras complementando as

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representações gráficas; e mapas, formas de representação cartográfica que evidenciam a
espacialização do lugar.

Moradores da Frequentadores
Agentes de
Rua Dom das reuniões da TOTAL
Patrimônio
Silvério Câmara

Número Porcenta- Número Porcenta- Número Porcenta- Número Porcenta-


Absoluto gem Absoluto gem Absoluto gem Absoluto gem

Ícone 10 100% 9 90% 5 100% 24 96%

Letra 4 40% 6 60% 1 20% 11 44%

Mapa 3 30% 2 20% 1 20% 6 24%

Total
17 56,67% 17 56,67% 7 46,67% 41 54,67%
Geral

Tabela 1 Mapas Mentais - Forma de apresentação da imagem


Fonte: CARVALHO, 2012, p. 102

A partir da nossa análise, pudemos observar a predominância dos ícones em todos grupos,
seguido da predominância das letras. A representação por meio de mapa foi considerada
pequena; isso se deve ao fato de termos solicitado às pessoas que representassem a Praça
Minas Gerais, diferente de outros trabalhos que utilizam a técnica de mapa mental, mas têm
como objeto de estudo um bairro ou uma cidade, nos quais se espera uma recorrência de
representação de mapas mais significativa.

B – Interpretação quanto à distribuição dos elementos da imagem

Neste item Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 136) diz que a partir da forma, verificou-se
que as representações diferiam também quanto à disposição da imagem. Assim identificou
alguns aspectos que classificou:

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Moradores da Frequentadores
Agentes de
Rua Dom das reuniões da TOTAL
Patrimônio
Silvério Câmara
Número Porcenta- Número Porcenta- Número Porcenta- Número Porcenta-
Absoluto gem Absoluto gem Absoluto gem Absoluto gem
Perspectiva 1 10% 1 10% 0 0 2 8%
Horizontal 1 10% 0 0 1 20% 2 8%
Circular 1 0 0 0 0 0 1 4%
Quadros e
5 50% 7 70% 2 40% 14 56%
quadras
Dispersa 4 40% 0 0 2 40% 6 24%
Isolada 1 10% 0 0 1 20% 2 8%
Total Geral 13 21,67% 8 13,33% 6 20% 27 18%
Tabela 2 Mapas Mentais – Distribuição da imagem
Fonte: CARVALHO, 2012, p. 104

Observamos que a forma predominante de distribuição dos elementos da imagem foi a


representação em quadros, tanto no somatório geral, quanto se considerarmos a
representação por grupos, tendo maior peso no grupo dos frequentadores das reuniões de
Câmara. Observamos ainda que a representação de forma dispersa teve o mesmo peso
tanto no grupo dos moradores da Rua Dom Silvério, quanto no grupo dos agentes de
patrimônio. No grupo dos frequentadores das reuniões da Câmara não há nenhuma
representação de forma dispersa. Tivemos apenas um registro de representação circular
feito por um representante do grupo dos moradores da Rua Dom Silvério. Interessante
perceber que nas duas representações feitas em perspectiva, os autores são artistas
plásticos que trabalham com esculturas entalhadas na madeira.

C – Interpretação quanto à especificação dos ícones

Nesta interpretação, Kozel (apud KASHIWAGI, 2004, p. 143) especificou os ícones que
compõem as imagens, em quatro grupos:

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Moradores da Frequentadores
Agentes de
Rua Dom das reuniões da TOTAL
Patrimônio
Silvério Câmara
Número Porcenta Número Porcenta- Número Porcenta No
%
Absoluto -gem Absoluto gem Absoluto -gem .
Paisagem
Natural
Montanha 0 0 0 0 0 0 0 0
Sol, lua e
0 0 0 0 1 20% 1 4%
nuvens
Flores e jardins 0 0 1 10% 1 20% 2 8%
Árvores 1 10% 0 0 0 0 1 4%
Paisagem
construída
Casas 4 40% 3 30% 1 20% 8 32%
Ruas e
6 60% 6 60% 3 60% 15 60%
calçadas
Eq. Transporte 0 0 0 0 0 0 0 0
Parques e
8 80% 6 60% 2 40% 16 64%
Praças
Igrejas 10 100% 9 90% 5 100% 24 96%
Câmara 6 60% 9 90% 4 80% 19 76%
Pelourinho 6 60% 4 40% 1 20% 11 44%
Capela de
1 10% 0 0 0 0 1 4%
equipamentos

São Jorge
Outros

Escadas 3 30% 3 30% 0 0 6 24%

Cemitério 0 0 1 10% 0 0 1 4%
Elementos
móveis
Transporte
0 0 0 0 0 0 0 0
terrestre
Outras formas
0 0 0 0 0 0 0 0
de transporte
Elementos
humanos
Homem, mulher
0 0 0 0 0 0 0 0
e crianças
Tabela 3 Mapas Mentais – Especificação do ícones
Fonte: CARVALHO, 2012, p. 110

Desta forma, podemos observar que poucos foram os ícones que integram o item ‘paisagem
natural’. Esse aspecto foi reforçado durante as entrevistas. Nos depoimentos o foco de

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atenção maior é das Igrejas e da Câmara. Porém, apesar da baixa incidência de elementos
naturais, o item aparece em todos os subgrupos.

Quanto aos elementos da ‘paisagem construída’ percebemos que os ícones de maior


representatividade são as Igrejas. Na sequência, observamos a Câmara como segundo
elemento da paisagem construída mais representado nos desenhos. Em seguida, o ícone de
maior representação foi a Praça. Vale ressaltar que consideramos o elemento ‘praça’ em
todos os desenhos que o contorno da Praça Minas Gerais foi evidenciado. E a incidência de
pessoas que fizeram referência às ruas foi constante (60%) nos três subgrupos.

Quanto ao pelourinho, podemos afirmar que sua representatividade, na totalidade, foi baixa
(44%), se comparada com a representação dos outros elementos. Na totalidade, as Igrejas
obtiveram uma representatividade de 96%, a Câmara de 76%, a Praça de 64% e as ruas de
60%. O pelourinho não é original desta Praça, foi montado na Praça em 16 de julho de
1981, segundo texto afixado no monumento.

Interessante analisar ainda que não houve representação de nenhum elemento humano por
nenhum dos entrevistados, apesar de nas entrevistas as pessoas reconhecerem a Praça
como espaço de uso. Porém o uso frequentemente relatado refere-se a datas específicas,
comemorações pelo aniversário da cidade, evento do Dia de Minas e procissões.

Após toda essa análise podemos concluir que há, pelo menos, um traço comum em todas
as entrevistas, independente do grupo de entrevistas a qual pertença: a beleza da Praça
Minas Gerais. Ficou claro, para nós, que a população reconhece esse espaço como
detentor de uma beleza singular. O caráter etéreo do espaço, de algo que eleva
espiritualmente, foi fortemente destacado nas entrevistas.

A proposta deste trabalho é justamente entender todos esses valores e integrá-los em um


projeto de intervenção arquitetônica que vise solucionar os problemas vivenciados no dia-a-
dia da Câmara, apontados durante a pesquisa com os vereadores e funcionários, sem
perder de vista os valores atribuídos ao conjunto arquitetônico da Praça Minas Gerais como
um todo. Uma vez que o prédio da Câmara integra este espaço e qualquer intervenção
neste bem poderia refletir na Praça. Procuramos uma proposta que pudesse reforçar esses
valores, não poderíamos entrar em conflito com os valores apontados durante as
entrevistas.

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3.4 A Câmara no imaginário dos turistas que a visitam

Para trabalhar o grupo dos turistas, optamos por um questionário com uma pergunta central:
“quais são os pontos turísticos de Mariana?”. Tínhamos por objetivo avaliar a relevância da
Câmara Municipal de Mariana como ponto turístico. Por isso, optamos por uma questão
‘aberta’; entendíamos que a resposta deveria ser fornecida de forma espontânea.

A amostra foi composta por quarenta entrevistados. A aplicação da pesquisa foi realizada no
período de 13 a 15 de janeiro de 2012 sendo, os dias da semana respectivamente, sexta–
feira, sábado e domingo. Os locais de abordagem dos turistas foram: espaço em frente à
Igreja da Sé, na Rua Direita, Praças Minas Gerais e Gomes Freire.

Quando questionados sobre os pontos turísticos de Mariana, 42,5% dos entrevistados


responderam as Igrejas, sem citar especificadamente qual Igreja. A segunda resposta de
maior relevância, representando 27,5% dos entrevistados, é a referência à Igreja de São
Francisco de Assis e ao Santuário Nossa Senhora do Carmo. Em terceiro lugar,
representando 25% dos entrevistados, o ponto turístico apontado é a Casa de Câmara e
Cadeia de Mariana. Em seguida, empatados com a mesma representatividade nas
respostas, 22,5% dos entrevistados, apontaram a Igreja da Sé e Praça Minas Gerais.
Seguidos de 20% dos entrevistados que indicaram a Igreja de São Pedro e 12,5% dos
entrevistados indicaram os Museus. Os demais pontos turísticos apareceram como menos
significativos na visão dos entrevistados e seguem representados no gráfico abaixo:

Gráfico 1 Indicação espontânea dos pontos turísticos em Mariana


Fonte: CARVALHO, 2012, p. 146
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É interessante perceber que os itens elencados segundo, terceiro, quarto e quinto lugar-
Santuário de Nossa Senhora do Carmo (as pessoas, em geral, utilizam o termo Igreja do
Carmo), Igreja de São Francisco de Assis, Praça Minas Gerais e Casa de Câmara, estão
inseridos em um mesmo espaço. A Praça Minas Gerais engloba as Igrejas e a Casa de
Câmara.

A partir desta percepção surge um novo desafio para o nosso trabalho: como conciliar os
usos dos espaços no projeto de intervenção no prédio?

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4. O PROJETO PROPOSTO
Baseados nos métodos de pesquisa aplicados conseguimos comprovar que o prédio da
Casa de Câmara e Cadeia é reconhecidamente um símbolo do poder civil valorizado,
principalmente, pela beleza arquitetônica da construção e testemunho da história de Minas
Gerais, atribuindo-lhe também a função de ponto turístico.

A localização da Câmara, na Praça Minas Gerais, juntamente com as igrejas – Igreja do


Carmo e Igreja de São Francisco de Assis - caracteriza uma conformação urbana única no
Brasil. E torna este largo um palco de celebrações cívicas e religiosas relevantes para a
população local, conforme apontado nas entrevistas. Temos, a um só tempo, as
representações dos poderes civil e religioso, que permanecem, até hoje, ‘vivos’, exercendo
a mesma função que lhes foi atribuída no passado, desde as suas construções.

Transferir as funções da Câmara para outro endereço, como foi aventado no decorrer do
processo, seria o mesmo que esvaziar o prédio de significado, provocando-lhe um corte
abrupto na história.

Porém para garantirmos essa simbologia na sua completude, a atualidade exige algumas
adaptações. Precisamos ampliar a estrutura física da Câmara de forma que o valor
simbólico seja mantido, conciliando os usos – local de trabalho e espaço turístico - e, sem
permitir, no entanto, que a construção atual seja diminuída pela concorrência visual com
novos elementos arquitetônicos ao seu redor.

O projeto de intervenção arquitetônica foi elaborado pelos arquitetos Professor Doutor Flávio
de Lemos Carsalade, Doutor Benedito Tadeu de Oliveira, Mestre Bernardo Nogueira
Capute, Gustavo Kamino, sob a coordenação do Professor Doutor Leonardo Barci Castriota.

Ao propormos que a Câmara continue funcionando no mesmo endereço, avaliamos que o


edifício principal consegue continuar absorvendo algumas atividades da Câmara: o plenário
atende às reuniões de menor porte; a sala do presidente e sua secretária, o que contribuirá
para manter o caráter solene do prédio, além de conseguir manter algumas estruturas
administrativas, como a assessoria jurídica próxima ao plenário, por exemplo. O desafio de
readequação do uso reúne três aspectos principais: ausência dos gabinetes dos vereadores;
necessidade de ampliação do espaço para o apoio administrativo e espaço limitado do
plenário para as reuniões mais concorridas. Somado a isso, temos a necessidade de
melhoria no conforto básico e de garantir a acessibilidade.

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Para atender a tais necessidades, mantendo a Câmara em funcionamento no mesmo sítio,
faz-se necessário uma ampliação na sua estrutura física. Porém tal ampliação deve ocorrer
de maneira ‘solta’ ao edifício principal. Um acréscimo na estrutura existente comprometeria
drasticamente as características do edifício atual. A proposta de intervenção preza ainda por
não criar novos elementos que possam competir com a magnitude do prédio existente,
retirando-lhe a primazia no espaço ou que venha a competir visualmente.

Propõe a ampliação de modo discreto e utilizando os espaços disponíveis: a área abaixo do


estacionamento e a porção de terreno, em declive, atrás da capela e armazém. O espaço do
subsolo, abaixo do espaço do estacionamento, será utilizado para a criação de um auditório
para 150 pessoas, conforme necessidade apontada nas reuniões com vereadores e
funcionários. O segundo espaço disponível a ser utilizado é um filete de terreno em desnível
descendente, localizado atrás das construções históricas identificadas como “Capela de São
Jorge” e “Armazém”, e limitado por um extenso muro. Neste espaço será inserida uma
construção para abrigar quinze gabinetes para vereadores no primeiro piso e nas
extremidades do segundo piso serão criadas salas de trabalho para atender as reuniões das
comissões da Câmara e demais reuniões internas. O acesso à Capela será respeitado e no
espaço do antigo armazém será criada uma recepção alternativa de acesso aos gabinetes,
permitindo assim que as pessoas circulem também por ali. Caso tivéssemos apenas o
acesso pelo prédio principal, provocaríamos uma forte tendência das pessoas se
esquecerem das construções históricas dos fundos, principalmente aquelas pessoas que
não fizessem o uso do estacionamento. Os acessos buscam atender a dois princípios:
acessibilidade universal e valorização.

Com a transferência de alguns serviços da Câmara, hoje realizados no prédio histórico, para
a nova edificação conseguiremos liberar algumas salas do prédio histórico, principalmente
as salas que já foram as celas da cadeia. Desta forma, atenderemos a outro ponto
levantado durante as entrevistas: o reconhecimento da Câmara como ponto turístico. A
proposta é criar no segundo pavimento do prédio histórico uma exposição permanente que
retrate a história da Câmara, e no primeiro pavimento, uma exposição permanente que
retrate a história da cadeia.

A proposta de ampliação da Câmara Municipal de Mariana é um ato de respeito à


continuidade da história, à vitalidade urbana do trecho protegido e ao patrimônio material e
intangível, personificados no edifício que, dignamente, atravessa os tempos, integrando, em
um único logradouro, todas as atividades relacionadas à Câmara, contando ainda com um

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espaço voltado à pesquisa e divulgação da história desta instituição que representa o início
das atividades legislativas em Minas Gerais.

Figura 2 Planta do 1º pavimento do Anexo da Câmara Municipal de Mariana


CARVALHO, 2012, p. 157

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Figura 3 Planta do nível do subsolo do Anexo da Câmara Municipal de Mariana
CARVALHO, 2012, p. 158

Figura 4 Fachada Principal da Câmara Municipal de Mariana com o 1º pavimento do Anexo ao fundo
CARVALHO, 2012, p. 158

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na proposta apresentada acreditamos que estamos priorizando o contexto


urbanístico no qual o prédio da Casa de Câmara e Cadeia está inserido, levando em
consideração a dinâmica da cidade e do próprio bem que necessita passar por uma
ampliação do espaço físico a fim de comportar toda a estrutura administrativa, e
adquirir novos recursos de trabalho; espaços projetados que visem melhor
desempenho profissional; infraestrutura tal como banheiros, auditório, salas de
reunião, gabinetes parlamentares.

O projeto de intervenção no prédio da Casa de Câmara e Cadeia está baseado no


estudo de percepção deste bem sob o ponto de vista dos moradores e usuários do
espaço, no intuito de conhecer quais os valores estas pessoas atribuem ao prédio
através da forma como eles utilizam e valorizam o espaço. Garantindo que o projeto
de intervenção conserve, em primeiro lugar, os valores atribuídos ao bem. Além
disso, a projeto de construção do anexo foi elaborado juntamente com os usuários
principais do prédio: vereadores e funcionários.

Paralelamente a essa ampliação [do conceito de patrimônio], hoje percebe-


se, muito mais que no passado, que o fim último da conservação não vai ser
a manutenção dos bens materiais por si mesmos, mas muito mais a
manutenção (e a promoção) dos valores incorporados pelo patrimônio,
sendo as intervenções ou tratamentos físicos aplicados a esses bens
apenas um entre muitos meios para se obter este fim. (CASTRIOTA, 2009,
p. 101)

O projeto apresentado para solucionar o problema da insuficiência do espaço físico


da Câmara de Mariana vai de encontro ao conceito apresentado pelo professor
Castriota, a proposta vai além da conservação apenas do bem material,
representado pelo edifício, propõe a manutenção e a promoção dos valores
incorporados, uma vez que a atividade legislativa desenvolvida nesse prédio será
mantida e, através da construção do novo anexo, ganhará ainda mais força.
Conseguiremos unir todos os edis e funcionários em um só local, além e promover a
valorização da história da instituição através da criação do centro de memória do
legislativo.

As políticas públicas na área do patrimônio se baseiam, ou pelo menos deveriam se


basear, no processo de escuta da comunidade. Se o tombamento é fundamentado

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por defender que o direito da coletividade está acima do direito privado da
propriedade, nada mais justo que em um processo de restauro a população
detentora do bem seja convocada e tenha voz ativa nas escolhas deste processo. O
Estado não pode mais ser o único responsável, ou o único a ter direito de decisão,
em um processo de restauração um bem patrimonial de uso coletivo.

Apesar dos avanços na discussão dos valores no campo do patrimônio cultural para
o Getty Conservation Institute (GCI), citado por Castriota (2009, p. 108 e 109), a
ênfase dada às três perspectivas encontradas no campo do patrimônio, a
“conservação física”, o “contexto de gestão” e a “significância cultural e valores
sociais”, ainda encontram-se em desequilíbrio, com claro predomínio as duas
primeiras. Para o GCI, cabe reconhecer que, infelizmente, as pesquisas na área da
conservação ainda estão centradas no aspecto físico, raramente envolvendo as
discussões dos valores entorno do bem. O presente estudo parte exatamente da
perspectiva que possui menor peso na maioria das outras pesquisas, a “significância
cultural e valores sociais”.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BARRETO, Paulo Thedim. Casas de Câmara e Cadeia. 1949. 157f. Tese –


Faculdade Nacional de Arquitetura, Universidade do Brasil, Rio de Janeiro, 1949.

CARVALHO, Fernanda Trindade de. Atores e valores: o processo de readequação


física da Casa de Câmara e Cadeia de Mariana. 193f. Tese – Universidade Federal
de Minas Gerais, Minas Gerais, 2012.

CASTRIOTA, Leonardo Barci. Patrimônio Cultural: conceitos, políticas e


instrumentos. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: IEDS, 2009.

FONSECA, Cláudia Damasceno. A Casa de Câmara e Cadeia de Mariana: algumas


considerações. In: TERMO de Mariana: História e documentação. Mariana, MG: Ed.
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KANTOR, Iris. A Leal Vila de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo. In: TERMO de
Mariana: História e documentação. Mariana: Ed. UFOP, 1998. p. 147 – 148.

KOZEL, Salete. Mapas Mentais – uma forma de linguagem: perspectivas


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RIEGL, Aloïs. O culto moderno dos monumentos: sua essência e sua gênese./ Aloï
Rielg; Tradução Elaine Ribeiro Peixoto e Albertina Vicentine. Goiânia: Ed. UCG,
2006.

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PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA PRESERVAÇÃO DE SÍTIOS
HISTÓRICOS URBANOS: Experimento metodológico no sítio
histórico de Santa Leopoldina – ES

BARCELLOS, LETÍCIA NUNES. (1); ALMEIDA, RENATA HERMANNY DE (2)

1. Universidade Federal do Espírito Santo. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo


Avenida Fernando Ferrari, 514, Goiabeiras, 29075-973 - Vitoria, ES – Brasil
leticiabarcellos.au@gmail.com

2. Universidade Federal do Espírito Santo. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo


Avenida Fernando Ferrari, 514, Goiabeiras, 29075-973 - Vitoria, ES – Brasil
renatahermanny@gmail.com

RESUMO
Este trabalho se insere nos estudos que tratam da participação social nas políticas públicas,
especificamente relacionado à preservação de Sítios Históricos Urbanos no Brasil. A participação
social nas políticas públicas é um tema cada vez mais estudado e discutido, num momento de crise
do modelo de representação política que ocorre no contexto nacional e internacional, com
desconfiança por parte dos cidadãos em relação às instituições políticas tradicionais e ao
esvaziamento dos partidos políticos. Ao mesmo tempo, a população reivindica, cada vez mais, seu
direito de participar de decisões que afetam direta ou indiretamente sua vida. Para a preservação do
patrimônio, a participação social é condição indispensável, entretanto, não é efetiva na política
patrimonial do Brasil. A ausência de participação acarreta consequências negativas na preservação
do patrimônio. A população, em geral, não participa do processo, conhece pouco sobre o patrimônio
e, por isso, não se sente comprometida, não se relaciona com o bem tombado e não lhe confere o
valor esperado. Não há instrumentos para participação social definidos na política de proteção
patrimonial, por isso a participação se dá de diferentes formas e com diferentes graus de
envolvimento, a depender de cada projeto e de seus gestores. Nesta pesquisa, estabelece-se como
recorte temporal a Constituição Federal de 1988, por esta ser considerada a Constituição Cidadã, que
possibilita a criação de diversos espaços e instrumentos para participação da sociedade nas decisões
relacionadas às políticas públicas. Como recorte espacial, estabelece-se o Sítio Histórico Urbano, por
ser a cidade o lugar propício ao exercício da democracia e os sítios históricos, por ser interesse do
estudo o patrimônio entendido como conjunto, e não edificações ou monumentos isolados. A
pesquisa objetiva identificar estratégias para participação social na preservação de Sítios Históricos
Urbanos. Para isso, adota o Sítio Histórico de Santa Leopoldina, um dos cinco Sítios Históricos do
estado do Espírito Santo, tombado pelo Conselho Estadual de Cultura em 1983, como objeto
concreto de experimentação de metodologia participativa visando o estabelecimento de estratégias
para participação social na preservação do sítio. Para isso, realiza-se revisão bibliográfica sobre a
participação social, seus instrumentos e metodologias; análise do Sítio Histórico de Santa Leopoldina
no campo urbanístico-ambiental, socioeconômico e da gestão urbana e do sítio histórico. A
participação social nas políticas públicas com qualidade é uma questão complexa e por isso não vai

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se tornar efetiva rapidamente, mas, para que seja um dia alcançada, é necessário começar a colocá-
la em prática.

Palavras-chave: Participação social; Preservação; Gestão urbana.

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1. INTRODUÇÃO
Edificações constituintes do patrimônio histórico têm grande relevância para a sociedade
seja por serem referência memorial individual e coletiva dos cidadãos; seja por serem
expressão estética ou tecnológica, arquitetônica e urbanística. Entretanto, sua efetiva
preservação é dependente de condicionantes de diversas ordens – econômicos, políticos,
sociais, técnicos, por exemplo. Dentre esses, interessa a esse artigo discutir a relevância da
participação social para a efetividade de ações direcionadas à preservação patrimonial.

No Brasil, o tombamento é o instrumento de salvaguarda mais conhecido e utilizado;


entretanto, a sua instituição não é capaz de garantir a preservação do patrimônio. De acordo
com Porta (2012), a partir da década de 2000, são instituídos marcos de uma nova política
de preservação do patrimônio pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional –
IPHAN. Um destes marcos é o Programa Monumenta, considerado por Bonduki (2010), um
avanço em relação à política de preservação do patrimônio desenvolvida no país até então.

Neste programa, o planejamento das intervenções se dá a partir da construção pactuada de


uma estratégia de ação pressupondo o desenvolvimento local. O programa realiza, entre
2000 e 2012, intervenções na perspectiva de gerar impactos econômicos, urbanos, sociais e
culturais, de forma a garantir a sustentabilidade do processo de preservação. O patrimônio,
além de ser protegido, deve ser incorporado à vida cotidiana da cidade.

As Cartas Patrimoniais, documentos de referência para reflexão e ação direcionadas à


preservação, tratam da necessidade de participação social para a preservação do
patrimônio. Identifica-se nestes documentos seis estratégias que contribuem para a
preservação do patrimônio com participação social: integração à vida social, educação
patrimonial, participação social, informação, descentralização da preservação e integração
da preservação ao planejamento urbano.

A população é o principal agente protetor do patrimônio, mas, historicamente, no Brasil, na


maioria dos casos, é excluída do processo de tombamento, além de ter pouco conhecimento
a respeito do assunto. Como consequência, não se sente comprometida, não se relaciona
com o bem tombado e não confere ao mesmo o valor esperado.

Trata-se, neste artigo, do sítio histórico urbano, tal como definido na Carta de Petrópolis de
1987, como parte integrante do contexto urbano e em processo de transformação. Para
tratar da participação social, o recorte do urbano justifica-se por ser a cidade o lugar propício

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ao exercício da democracia. Além disso, trata-se de sítios históricos por ser interesse do
estudo o patrimônio entendido como conjunto, e não edificações ou monumentos isolados.

O objetivo geral deste artigo é identificar estratégias para preservação de sítios históricos
urbanos com a participação social, com experimento de metodologia participativa no sítio
histórico de Santa Leopoldina. Metodologicamente, o artigo contempla investigação
bibliográfica a partir de documentos de referência da política patrimonial. Em relação ao sítio
histórico de Santa Leopoldina, analisa-se o processo de tombamento, a resolução que o
regulamenta e a resolução que trata das diretrizes para intervenção na Área de Proteção do
Ambiente Cultural do Sítio e do Plano Diretor Municipal.

Para elaboração do roteiro metodológico participativo, visando experimento no sítio histórico


de Santa Leopoldina, utiliza-se como referência principal a metodologia desenvolvida e
aplicada pela Red CIMAS. Adota-se, como referência principal para a elaboração do roteiro
metodológico, o Manual Metodologias Participativas da Red Cimas, por este ter sido
desenvolvido a partir da experiência de mais de dez anos da atuação dos profissionais da
rede e, além disso, por este manual apresentar diversas possibilidades de atividades
participativas, para cada uma das fases do processo participativo, sendo possível selecionar
as atividades mais adequadas ao lugar e ao tema e fazer as adaptações necessárias ao
caso específico.

2. ESTRATÉGIAS PARA PARTICIPAÇÃO SOCIAL SEGUNDO AS


CARTAS PATRIMONIAIS
A leitura das Cartas Patrimoniais, documentos de referência para a elaboração de legislação
e de políticas de preservação do patrimônio, subsidia a hipótese de que a participação social
é condição indispensável para a efetiva preservação do patrimônio. Com a leitura das
cartas, é possível confirmar tal hipótese, pois a participação social é defendida como
mecanismo de preservação em diversos destes documentos.

Nas Cartas Patrimoniais, identifica-se seis estratégias contribuintes em processos de


preservação do patrimônio com a participação social: integração à vida social, educação
patrimonial, participação social, informação, descentralização da preservação e integração
da preservação ao planejamento urbano. A partir da leitura das cartas elabora-se o Quadro
1, em que se apresenta um resumo das estratégias para preservação do patrimônio com a
participação social observadas em cada uma das Cartas Patrimoniais.

Quadro 1- Estratégias para preservação do patrimônio com a participação social identificadas nas
Cartas Patrimoniais

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Estratégia para
Integração
preservação Integração
Educação Participação Descentra ao planeja-
com à vida Informação
patrimonial social lização mento
participação social
urbano
social
Carta de
X X
Atenas (1931)
Carta de
X
Veneza (1964)
Normas de
X X X
Quito (1967)
Compromisso
de Brasília X X X
(1970)
Compromisso
de Salvador X X
(1971)
Declaração de
Amsterdã X X X X X X
(1975)
Manifesto de
Amsterdã X X
(1975)
Recomendaçõ
es de Nairóbi X X X X
(1976)
Carta de
Machu Pichu X
(1977)
Carta de
Washington X X
(1986)
Carta de
Petrópolis X X X X
(1987)
Carta de Cabo
X
Frio (1989)
Declaração de
X X
Sofia (1996)
Carta de Nova
X X
Olinda (2009)
Fonte: BARCELLOS (2017)

A primeira das estratégias identificada nas cartas patrimoniais é a integração à vida social.
Recomenda-se na Carta de Atenas, de 1931, “[...] que se mantenha uma utilização dos
monumentos, que assegure a continuidade de sua vida, destinando-os sempre a finalidades
que respeitem o seu caráter histórico ou artístico” (Carta de Atenas, 1931, p. 1).

A educação patrimonial é outra estratégia preservação com participação social presente nas
cartas. O Compromisso de Brasília, de 1970, indica a necessidade de inclusão da educação
patrimonial nos currículos escolares de nível primário, médio e superior. Da mesma forma, a
Declaração de Amsterdã, de 1975, ressalta a necessidade da apreciação do patrimônio pelo

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público para sua sobrevivência e, para isso, os programas de educação, em todos os níveis,
deveriam se preocupar com a matéria.

A participação social propriamente dita é a terceira das estratégias para a preservação do


patrimônio com participação social discutida nas cartas patrimoniais. Ela é identificada pela
primeira vez nas Normas de Quito (1967) e das estratégias identificadas, é a que mais se
repete na leitura das cartas.

A Carta de Petrópolis, de 1987, considera fundamental a participação da comunidade


interessada nas decisões de planejamento da preservação dos sítios históricos urbanos,
como forma de pleno exercício da cidadania e recomenda a realização de inventário com a
participação da comunidade, o que proporciona o conhecimento do valor atribuído ao
patrimônio pela comunidade e o fortalecimento de seus vínculos com o patrimônio.

Outra estratégia que contribui para a preservação do patrimônio com a participação social é
a informação. A partir da leitura das Normas de Quito (1967), entende-se que a informação
está associada à educação patrimonial e ambas contribuem para a formação cívica
necessária para o interesse social pela revalorização do patrimônio como bem público.

De acordo com a Declaração de Amsterdã (1975), as informações precisam ser claras e


acessíveis, pois são elas a base para as decisões que devem ser tomadas com a
participação da população. Os poderes locais devem comunicar suas experiências e
instaurar uma troca constante de informações e ideias. Deve também explicar à população o
valor histórico e arquitetônico das edificações a serem conservadas e fornecer indicações
sobre regulamentos e normas.

A descentralização é outra estratégia considerada relevante para a preservação do


patrimônio com a participação social, pois possibilita a atuação na proteção do patrimônio
por instâncias municipais e até locais, o que aproxima a matéria da população. O
Compromisso de Brasília (1970) indica a necessidade de descentralização da preservação
do patrimônio, pela ação de estados e municípios, junto à atuação federal, para a proteção
dos bens culturais de valor nacional. E também a orientação técnica de órgãos federais aos
estados e municípios para proteção dos bens culturais de valor regional. Para isso o
compromisso recomenda a criação de órgãos estaduais e municipais de preservação, onde
ainda não há.

A última das estratégias para preservação do patrimônio com participação social identificada
nas cartas patrimoniais é a integração da preservação ao planejamento urbano. O
Compromisso de Salvador (1971), por exemplo, recomenda que planos diretores urbanos
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que afetam áreas de interesse cultural contem com orientações do IPHAN e dos órgãos
estaduais e municipais da área.

Destaca-se os principais trechos em que as Cartas Patrimoniais demonstram a necessidade


da participação social, confirmando a hipótese da necessidade de participação para a
efetiva preservação.

3. SÍTIO HISTÓRICO DE SANTA LEOPOLDINA


O Sítio Histórico de Santa Leopoldina é um dos cinco sítios históricos do estado do Espírito
Santo, tombado pelo Conselho Estadual de Cultura (CEC) através da resolução nº 05/83. Na
Figura 1 apresenta-se a localização de Santa Leopoldina no Espírito Santo.

Figura 1 - Localização Santa Leopoldina

Fonte:
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/9a/EspiritoSanto_Municip_SantaLeopoldina.svg,
acesso em 20/06/2017.
A partir da leitura do processo de tombamento de Santa Leopoldina, destacam-se algumas
informações. O processo é iniciado a partir de Ofício da Prefeitura Municipal de Santa
Leopoldina ao Conselho Estadual de Cultura - CEC/Secult, de 10/04/1980, em que se

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solicita o tombamento da cidade, em função da cidade ser uma das mais antigas do Espírito
Santo, ter sido o maior empório comercial do estado em seu auge e abrigar o Museu do
Colono, com peças que retratam o berço da civilização da cidade.

Além deste ofício, no processo, consta solicitação do diretor executivo da TV Gazeta,


veículo de comunicação do estado, ao CEC, de 17/06/1980, de tombamento da rua principal
da sede do município de Santa Leopoldina, pelo que representa da memória da colonização
do Espírito Santo. Acrescenta-se a isso, segundo o documento, o fato de a TV Gazeta e o
jornal a Gazeta receberem com frequência sugestões e solicitações neste sentido. Com o
tombamento, acredita-se que a memória histórica do estado será resguardada.

A partir de tais solicitações, o processo é enviado ao arquiteto Jayme Henrique Emery


Brandão, para elaboração de parecer técnico. Em seu parecer, o arquiteto argumenta que o
conjunto global dos imóveis situados na rua principal de Santa Leopoldina “agrada a vista,
possuindo valor artístico e histórico para nosso Estado, e vale o esforço para o seu
tombamento” (ESPÍRITO SANTO, 2009, folha 10).

O tombamento é aprovado em reunião ordinária do CEC. Em despacho do chefe da Divisão


de Patrimônio Histórico e Cultural (DPHC) do Departamento Estadual de Cultura (DEC),
ressalta-se que além do tombamento pretende-se “[...] sensibilizar a comunidade local para
a importância da preservação daquele patrimônio cultural [...]”. (ESPÍRITO SANTO, 2009,
folha 11, verso).

A partir da leitura do processo, nota-se, em diversos momentos, a preocupação dos técnicos


com a necessidade da participação da população local para a preservação do sítio histórico
de Santa Leopoldina. Tal preocupação é expressa também pelo prefeito da cidade, à época,
em reportagem de A Gazeta de 02 de dezembro de 1981. Entretanto não há no processo
informações para afirmar se tal participação é efetiva.

Em 2003, o CEC aprova a Resolução nº 003/2010, que “dispõe sobre a regulamentação das
diretrizes para intervenções nos espaços públicos, lotes e edificações integrantes da Área
de Proteção do Ambiente Cultural de Santa Leopoldina” (ESPÍRITO SANTO, 2010, p.1).
Esta resolução delimita a Área de Proteção do Ambiente Cultural – APAC de Santa
Leopoldina, subdividida em “Área de Tombamento”, onde estão localizados os imóveis
tombados; a “Área de Vizinhança do Tombamento”, localizada no entorno do conjunto
tombado, apresentada na Figura 2. A resolução define os tipos de uso permitidos nas áreas
delimitadas e os índices urbanísticos.

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Figura 2 - Delimitação feita na resolução CEC nº 003/2010 para as áreas de Tombamento, de
Vizinhança e non aedificandi de Santa Leopoldina.

Fonte: ESPIRITO SANTO (2010)

Queiroz (2013) analisa os principais aspectos da legislação e da gestão do patrimônio no


sítio histórico de Santa Leopoldina. A Câmara Municipal aprova em 1982 a Lei n. 516, que
define o perímetro da Zona de Interesse Histórico (ZIH) e segundo o autor a lei tem uma
visão bastante atual pois preconiza o “[...] compartilhamento das responsabilidades sobre a
preservação do patrimônio, estabelecendo que a análise e aprovação dos projetos sejam
feitas em conjunto pelo Município e pelo Estado” (QUEIROZ, 2013, p. 64). O autor observa,
entretanto, que a lei não é empregada de maneira eficiente e é constantemente
descumprida pela falta de fiscalização.

O Plano Diretor Municipal de Santa Leopoldina (Lei Complementar n. 1223/2007) estabelece


Zonas Especiais de Interesse Histórico-Cultural (ZEIHC). Neste caso, o autor aponta como
deficiência da legislação a inexistência de uma definição clara dos limites da zona, que é
descrito em um dos anexos da lei de forma pouco específica.

Conforme relatório da APAC, a presença do poder público é fundamental e é necessário que


sua atribuição vá além da fiscalização, devendo oferecer orientação para as obras no Sítio
Histórico, treinamento de mão de obra para serviços específicos de restauração, entre
outros. Uma indicação importante do relatório da APAC é a criação de um “Conselho Gestor

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do sítio histórico de Santa Leopoldina constituído por representantes do poder público, dos
imóveis tombados e da sociedade local.” (ESPÍRITO SANTO, 2008, p. 89).

Queiroz (2013, p. 74) destaca “[...] que a política de preservação do patrimônio cultural, para
o constituinte, deve ser participativa e aberta a todos os setores da sociedade [...]” e
apresenta tentativas da SECULT de incentivar a participação popular nas ações de
preservação do sítio histórico de Santa Leopoldina, como a realização do “ 1º Seminário de
Educação Patrimonial no Sítio Histórico de Santa Leopoldina” e a segunda edição do evento
em dezembro de 2012. O autor participa dos eventos e observa a baixa participação no
primeiro evento, que conta apenas com três pessoas, e o segundo tem maior participação,
com 20 pessoas. O autor observa, entretanto, que em ambos os eventos a participação da
população restringe-se a ser ouvinte dos palestrantes.

4. EXPERIMENTO DE METODOLOGIA PARTICIPATIVA NO SÍTIO


HISTÓRICO DE SANTA LEOPOLDINA

4.1. Roteiro Metodológico

A partir do estudo de metodologias para participação social, tendo como referência


atividades desenvolvidas pela Red Cimas e seu Manual para Metodologias Participativas,
elabora-se o roteiro metodológico a ser aplicado, apresentado no Quadro 2.

Para o experimento do roteiro metodológico, são constituídos dois grupos para a realização
das atividades, o Grupo Motor, composto por uma equipe mista de pessoas interessadas,
vizinhos, voluntários e técnicos; e a Comissão de Seguimento, composta por representantes
institucionais, associações representativas e os integrantes do Grupo Motor.

Quadro 2 - Roteiro Metodológico proposto pela pesquisa


Fase Atividade Participantes Descrição
Linha do tempo dos acontecimentos
Linha do considerados importantes pelo Grupo Motor,
Grupo Motor
tempo relacionados ao sítio histórico de Santa
Leopoldina.
Matriz de A atividade reúne o que sabemos ou intuímos
perguntas e sobre o sítio histórico de Santa Leopoldina e as
Diagnóstico

Grupo Motor
primeiras primeiras ideias devem ser colocadas no quadro.
ideias
Roteiro para entrevista apresentado no Apêndice
Entrevistas Grupo Motor
A.
Mapeamento dos diferentes atores sociais
Mapa de presentes no território. (Instituições,
Grupo Motor
relações organizações e sociedade não organizada) e das
conexões existentes entre tais atores.
Deriva Grupo Motor Deriva, passeio, realizado com Grupo Motor para
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ouvir dos participantes um pouco das histórias do
sítio histórico de Santa Leopoldina in loco
Comissão Etapa final do diagnóstico. Apresentação dos
Devoluções
do resultados das atividades anteriores
Criativas
Seguimento
Aspectos positivos internos (forças) e externos
Comissão
(oportunidades) e aspectos negativos internos
Matriz FOFA do
(fraquezas) e externos (ameaças). Quadro
Seguimento
apresentado no Apêndice A.
Técnica para construção de propostas que
Matriz satisfaçam um conjunto de ações mais denso e
Grupo Motor
Reflexiva extenso, aglutina realidades grupais com mais
intensidade em torno de um projeto comum.
Técnica das Perguntas que formulamos na hora de intervir
nove Grupo Motor sobre a realidade e que ajudam a elaborar as
questões estratégias. Quadro apresentado no Apêndice A.
Estabelecer eixo principal das estratégias.
Expressar em uma frase que seja capaz de
Propostas

Ideia Força Grupo Motor


motivar a população a partir das redes de sua
vida cotidiana
Estratégias Após o trabalho de diagnóstico e estudo de
para propostas, estabelecer as estratégias para
preservação preservação do sítio histórico de Santa
do sítio Leopoldina com a participação social
Comissão
histórico de
do
Santa
Seguimento
Leopoldina
com a
participação
social
Fonte: BARCELLOS (2017)

4.2. Experimento da metodologia no sítio histórico de Santa Leopoldina

• Linha do tempo

A primeira atividade realizada é a “Linha do Tempo”. Além da atividade, é feita uma


apresentação da pesquisa e do roteiro metodológico. Para realização da “Linha do Tempo”,
solicita-se que os participantes relatem fatos que consideram importantes, relacionados ao
sítio histórico de Santa Leopoldina, ocorridos ao longo do tempo, separando-os em fatos
positivos e negativos.

Uma das dificuldades encontradas é a sequência temporal dos acontecimentos. Por isso, os
acontecimentos são divididos em três colunas: fatos considerados antigos, fatos gerais
relacionados ao Sítio Histórico, fatos lembrados como mais recentes.

Os participantes do Grupo Motor se mostram conhecedores do sítio histórico de Santa


Leopoldina, interessados em sua preservação e apreciadores da cidade. Chama a atenção

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os participantes identificarem a necessidade de educação para conscientização da
população em relação à importância da preservação do patrimônio e considerarem um fato
positivo do sítio histórico de Santa Leopoldina ser utilizado.

Figura 3 - Linha do tempo

Fonte: BARCELLOS (2017)

• Matriz de Perguntas e Primeiras Ideias

A segunda atividade desenvolvida é a “Matriz de Perguntas e Primeiras Ideias”. São


explicados os aspectos do sítio histórico de Santa Leopoldina a serem analisados – urbano,
ambiental, social, econômico, gestão e história e identidade – e as questões – O que
sabemos? O que não sabemos? O que intuímos? e O que queremos?. O resultado da
atividade é apresentado no Quadro 3 e Quadro 4, em que são reproduzidas as informações
inseridas no quadro e discutidas ao longo da realização da atividade.

A questão “O que não sabemos” é de difícil entendimento e resposta. As respostas oscilam


em torno da falta de informação e de interesse da população, para os aspectos que são
possíveis de serem respondidos e para outros o quadro fica em branco.

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Quadro 3 - Matriz de perguntas e primeiras ideias, parte 1

Fonte: BARCELLOS (2017)

Quadro 4 - Matriz de perguntas e primeiras ideias, parte 2

MATRIZ DE PERGUNTAS E PRIMEIRAS IDEIAS


PRESERVAÇÃO DO SÍTIO HISTÓRICO DE SANTA LEOPOLDINA
Econômico (atividade econômica e 
  recursos financeiros) Gestão História e Identidade
- Turismo nas cachoeiras; - Secretaria de Cultura – SECULT – - Há algum tempo havia nas escolas
- Comércio movimentado também inibe a descaracterização, mas não estudos sobre a história da cidade;
pelas pessoas do interior; consegue controlar o suficiente; - Falta identificação das novas
O que sabemos?
- Falta de serviços públicos acarreta - Prefeitura Municipal em geral não gerações com a cidade;
(problemas, boas
fuga do comércio local – compras investe em cultura; - Histórias de família contribuem para
práticas, etc)
ocorrem nas cidades vizinhas onde - Associação Amigos do Colono já foi a ligação e interesse pela história da
existe a oferta de serviços públicos; atuante na área cultural. cidade.
- Falta oportunidade de trabalho,
O que não - Se ainda há nas escolas estudos
sabemos? sobre a história da cidade.
- Potencial turístico do Sítio Histórico - Formação de uma associação de - Se a história de Santa Leopoldina
de Santa Leopoldina; moradores poderia contribuir para a não for propagada para as novas
- Inclusão de Santa Leopoldina na melhoria da gestão, fortaleceria a gerações a identidade com a cidade
O que intuímos? região metropolitana de Vitória, com comunidade; vai acabar;
(hipóteses) integração ao sistema de transporte - Consultoria de técnicos da SECULT - Teatro como forma de contar a
metropolitano – facilitaria a mobilidade, para realização de reformas. história da cidade e conscientizar.
possibilitaria a transformação da
cidade.
- Dinheiro circulasse em Santa - Consultoria da Secult; - Conscientização em relação à
Leopoldina, atualmente deixam de - Cobrança maior da Secult à história da cidade nas escolas, em
consumir em Santa Leopoldina para Prefeitura; atividades culturais do Museu do
O que queremos?
consumir em outros municípios - Educação Patrimonial; Colono.
próximos. - Civismo;
- Valorização das datas importantes.
Fonte: BARCELLOS (2017)

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• Mapa de Relações

A terceira atividade desenvolvida é o “Mapa de Relações”, com o objetivo de mapear os


diferentes atores sociais presentes no território, separando-os nos grupos de instituições,
organizações e sociedade não organizada, de acordo com o nível de poder simbólico, e, em
seguida, identificar as conexões existentes entre tais atores. Os atores e as respectivas
relações identificadas entre eles são apresentadas na Figura 4 - Mapa de relaçõesFigura 4.

Figura 4 - Mapa de relações

Fonte: BARCELLOS (2017)


• Deriva

A quarta atividade é uma Deriva. Estão presentes três participantes e realiza-se um


percurso no Sítio Histórico, partindo da Praça da Independência, próximo à casa Paroquial,
até a Prefeitura Municipal.

Percorrendo-se as ruas dos Sítio Histórico, é possível observar in loco e ouvir mais uma vez
dos participantes alguns problemas do local, entre eles o lixo nas ruas, as calçadas
estreitas, os grandes letreiros e fios que causam poluição visual nas fachadas. É possível
confirmar a vivacidade do sítio histórico e que a maior parte dos imóveis se mantêm em uso,
mesmo que algumas edificações com uso residencial tenham apenas uso parcial ou
esporádico.
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No percurso, os participantes também relatam algumas ocasiões em que a manifestação
dos moradores contribui, pontualmente, para a preservação do sítio histórico de Santa
Leopoldina. Como quando empresa concessionária de energia elétrica na cidade, realiza a
instalação de medidores de energia em local exposto da fachada das edificações. Quando
algum morador se manifesta e solicita a instalação em local mais discreto, costuma ser
atendido.

• Devoluções Criativas e Matriz FOFA

As últimas atividades da etapa de diagnóstico proposta no roteiro metodológico são as


Devoluções Criativas e a Matriz FOFA. O objetivo das Devoluções Criativas é a
apresentação dos resultados das atividades desenvolvidas anteriormente com o Grupo
Motor para um grupo mais amplo da sociedade e para representantes institucionais.

Com a realização da Matriz FOFA, pretende-se identificar conjuntamente, população e


instituições, os aspectos positivos internos (forças) e externos (oportunidades) e aspectos
negativos internos (fraquezas) e externos (ameaças relacionadas à preservação do sítio
histórico de Santa Leopoldina). A partir da construção da matriz, na fase de propostas, é
possível estabelecer as estratégias de forma a manter as forças, desenvolver as
potencialidades, corrigir ou compensar as fraquezas e enfrentar as ameaças.

Para a realização da atividade, comparecem apenas três pessoas, dois deles participantes
do Grupo Motor, Francyellen Siller e Jefferson Rodrigues, e um convidado. Mesmo com um
grupo pequeno e a ausência de representantes institucionais, são realizadas as atividades
previstas. O resultado da atividade é apresentado no Quadro 5 em que são reproduzidas as
informações inseridas na matriz e discutidas ao longo da realização da atividade.

Uma das fraquezas identificadas é a falta de participação da comunidade, o que pode ser
exemplificado com o número mínimo de pessoas presentes, mesmo tendo sido convidados
todos os secretários municipais e todos os proprietários de imóveis tombados, além das
pessoas convidadas a participar da atividade pelo Grupo Motor. Os participantes Jefferson e
Francyellen relatam que a única atividade relacionada à preservação do sítio histórico de
Santa Leopoldina em que a comunidade esteve presente e participou foi uma reunião
realizada pela SECULT para divulgação de editais. Segundo eles, houve participação por
haver possibilidade de se obter recursos com os editais. Ainda assim, apesar da presença
de muitas pessoas, poucos submeterem efetivamente projetos para concorrer ao edital.

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Quadro 5 - Matriz FOFA

PRESERVAÇÃO DO SÍTIO HISTÓRICO DE SANTA LEOPOLDINA:


O sítio histórico de Santa Leopoldina é protegido por tombamento estadual. Considera-se que
para que o sítio histórico seja efetivamente preservado é necessário que haja participação social
na preservação.
ASPECTOS POSITIVOS ASPECTOS NEGATIVOS (fatores de
(fatores de êxito) risco)
FORÇAS FRAQUEZAS
- Utilidade – manutenção do - Relação do rio com a cidade – hoje a
sítio histórico em uso; cidade dá as costas para o rio, acesso
- Patrimônio familiar – passa na às margens do rio é difícil;
família; - Trânsito, falta de estacionamento,
- Concentração do patrimônio – fluxo de transporte pesado;
imóveis formam um conjunto, - Influência do fluxo de veículos nos
estão próximos, formam um imóveis;
corredor histórico; - Quebra-molas – frenagem e retorno à
- Mecanismo de proteção de velocidade afetam ainda mais as
áreas ambientais – sumidouro edificações;
do funil e outras áreas; - Construção desordenada –
- sítio histórico não está descumprimento das leis;
CIRCUNSTÂNCIAS
inserido em uma grande cidade; - Existência de imóveis importantes que
INTERNAS
- Existência de áreas livres não são tombados;
(o que depende de
- Proximidade da capital – - Poluição visual – placas, fios,
nossas
facilidade para o turismo; anúncios;
possibilidades)
- História relevante da cidade; - Poluição sonora causada pelo fluxo
- Asfalto – menor influência da de veículos;
vibração dos veículos nas - Mal-uso das áreas livres existentes;
edificações - Falta de aproveitamento de
- PDM – regulamentação do oportunidades como os editais da
uso do solo na cidade, com SECULT – falta de iniciativa;
comissão para aprovação de - Falta de conexão entre os imóveis
projetos; tombados;
- Isenção do IPTU para imóveis - Falta de conscientização e de
preservados. identidade cultural da população;
- Falta de política de preservação
municipal;
- Falta de participação da comunidade.
OPORTUNIDADES AMEAÇAS
- Possibilidade do desvio do - Fluxo intenso de passagem para
fluxo de veículos do centro; outras cidades;
- Presença da SECULT; - Enchentes;
- Atrativos existentes na cidade - Falta de emendas parlamentares ou
– rio, casario histórico, outros recursos – para projetos que
CIRCUNSTÂNCIAS oportunidade de exploração precisariam de grandes investimentos,
EXTERNAS turística, com visitas guiadas; como o desvio do fluxo de veículos;
(o que depende de - Criação de um roteiro histórico - Pavimentação da rodovia – aumenta
fatores que não turístico; o tráfego pesado;
controlamos) - Pavimentação da rodovia – - Falta de projetos para Editais
aumenta o fluxo turístico; nacionais relacionados à cultura, lei
- Presença dos imigrantes, Rouanet
Cônsul, oportunidade de captar
investimentos do exterior;
- Editais nacionais relacionados
à cultura, lei Rouanet
Fonte: BARCELLOS (2017)

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• Matriz Reflexiva e Técnica das nove questões

A etapa de propostas se inicia com três atividades propostas ao Grupo Motor. Com a matriz
reflexiva e a técnica das nove questões pretende-se identificar as estratégias para
preservação do sítio histórico de Santa Leopoldina com participação social e, além disso,
responder questões relacionadas a cada uma das estratégias: O quê? Por quê? Para quê?
Para quem? Onde? Como? Quando? Com que? Quanto?

Observa-se, durante a realização da atividade, que as perguntas “Quando? Com que?


Quanto?” são muito específicas, para serem respondidas num momento de identificação de
estratégias. Sendo assim, das nove questões, restaram seis a serem respondidas e, ainda
assim, algumas delas ficam sem respostas para algumas estratégias, conforme Quadro 6.

• Estratégias para preservação do sítio histórico de Santa Leopoldina com a


participação social

A última atividade proposta a ser realizada com a Comissão do Seguimento no roteiro


metodológico é uma apresentação das Estratégias para Preservação do sítio histórico de
Santa Leopoldina. A atividade é realizada apenas com a presença dos participantes do
Grupo Motor e a secretária de Desenvolvimento, Cultura e Turismo, Sra. Rosângela Rauta.

A secretária relata a dificuldade de fazer com que a população participe de ações relativas a
preservação do sítio histórico e confirma o fato relatado durante a realização da Matriz
FOFA pelos participantes, de que a única atividade relacionada à preservação do sítio
histórico de Santa Leopoldina em que a comunidade esteve presente e participou foi uma
reunião realizada pela SECULT para divulgação de editais.

Considerando o pequeno grupo presente, opta-se por dar continuidade à elaboração da


Matriz Reflexiva e da Técnica das Nove Questões, como forma de avaliar e complementar a
atividade desenvolvida no âmbito do Grupo Motor. Como resultado da atividade, elabora-se
o Quadro 6, com a Matriz Reflexiva com as principais estratégias e as questões que foram
discutidas na realização da atividade.

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Quadro 6 - Matriz Reflexiva

QUESTÕES
ESTRATÉGIAS
O quê? Por quê? Para quê? Para quem? Onde? Como?
Há grande fluxo
Possibilitar que quem
apenas de
hoje apenas passa
passagem pela
Criar atrativo em Santa pela cidade, pare Visitantes, comércio, Sítio Histórico de
Criar atrativo cidade, que só causa
Leopoldina aqui e fique algum turismo Santa Leopoldina
transtornos e não
tempo, usufrua da
traz ganhos para o
cidade
município
Atualmente grande Para que a
Conscientização sobre a
parte da população população conheça a Município de Santa Cartilha educativa
regulamentação (PDM, APAC, População
desconhece a legislação e passe a Leopoldina para a população
tombamento)
legislação respeitá-la
A educação é uma
Principalmente
das formas Para
estudantes, que
identificadas para conscientização da Escolas do Município
Educação patrimonial propagariam o
conscientização da população sobre o de Santa Leipolidna
conhecimento para
populção sobre o patrimônio da cidade
suas famílias
valor do patrimônio

Para melhorar a
No último edital da
Oficina de capacitação para qualidade dos
SECULT diversas Município de Santa
elaboração de projetos para projetos submetidos População local
projetos foram Leopoldina
editais de cultura e turismo para concorrer a
recusados
recursos de editais

Atualmente a
necessidade de
preservação do Sítio Para que a
Conscientização do poder Histórico de Santa preservação seja Secretários Município de Santa
público sobre a preservação Leopoldina não é uma das diretrizes Municipais Leopoldina
consenso entre os da política pública
secretarios
municipais

Fonte: BARCELLOS (2017)

4.3. Avaliação do Experimento

De uma forma geral, avalia-se como positivo o experimento realizado em Santa Leopoldina.
É possível aplicar o roteiro metodológico proposto, obtendo-se informações a respeito do
sítio histórico de Santa Leopoldina não registradas nos documentos técnicos institucionais e,
assim, cumpre-se o objetivo principal da realização de experimentação de metodologia
participativa, que é ouvir cidadãos. Os participantes do Grupo Motor são os protagonistas
nas atividades e a mediadora tenta intervir o mínimo possível, com informações técnicas,
realizando somente a condução da atividade.

Muitos fatores são positivos no experimento do roteiro metodológico. Os participantes do


Grupo Motor, apesar de não estarem integrados, anteriormente, na realização de alguma
atividade específica, como para a constituição do Grupo Motor, para este experimento, se
conhecem, o que facilita a comunicação e a interação dos participantes na realização das
atividades. Além disso, são pessoas interessadas na preservação do sítio histórico de Santa
Leopoldina e que têm uma relação de afetividade forte com a cidade, demonstrada sempre
em sua fala, ao longo da realização das atividades. Esses participantes têm ainda bastante
conhecimento sobre a cidade, acompanham as ações da gestão municipal e estadual na
preservação do Sítio Histórico.

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O Grupo Motor tem uma composição de um pequeno número de pessoas, com o número
máximo de cinco participantes na realização das atividades e, além disso, algumas
atividades são realizadas na ausência de alguns dos membros. Segundo os participantes, a
população de Santa Leopoldina, em geral, não tem consciência e não valoriza o sítio
histórico da cidade. Além das pessoas presentes nas atividades, são lembrados apenas
outros poucos nomes de pessoas da cidade que se interessam pela preservação do sítio.
Segundo os participantes, grande parte da população tem uma visão de necessidade de
renovação da cidade e que a preservação do sítio histórico e do casario atrasa a cidade.

Em geral, nas atividades realizadas, necessita-se fazer pequenos ajustes, em relação à


proposta metodológica inicial, em função de especificidades e da dinâmica do grupo. Tais
alterações são consideradas normais e inerentes ao experimento metodológico participativo,
que está condicionado ao comportamento dos participantes e por isso deve ser dinâmico.

A partir do experimento do roteiro metodológico, pode-se confirmar a hipótese de que


inexiste participação social na preservação do sítio histórico de Santa Leopoldina. A falta de
participação da comunidade é relatada em diversos momentos e é também confirmada pelo
pequeno número de pessoas presentes nas atividades do roteiro metodológico. Este é um
problema identificado pelos participantes e também pelo poder público; entretanto, com o
grupo presente na realização das atividades, não é possível entender a razão desta falta de
participação e, tampouco, uma forma de alterar esta situação.

A secretária de Desenvolvimento, Cultura e Turismo, Sra. Rosângela Rauta, considera ser


necessário ir até a população, principalmente aos proprietários de imóveis tombados, e não
os convidar para participar de reuniões, já que eles não comparecem. Entretanto, para o
roteiro metodológico proposto, essa dinâmica não se aplica, pois, o objetivo é que a
população seja autora das propostas e que estas sejam pensadas coletivamente, sendo,
portanto, necessário a reunião dos interessados para a tomada de decisões conjuntamente.

Uma das hipóteses para a falta de participação social em Santa Leopoldina, levantada
durante as atividades do roteiro metodológico, é a diversidade da população de Santa
Leopoldina. A cidade se constitui a partir de processo de colonização por imigrantes
europeus de diversas procedências, conforme consta no processo de tombamento. Neste
consta que, em 1860, vivem em Santa Leopoldina 232 famílias de colonos, vindos de
diversas regiões.

Considera-se que a inclusão no roteiro metodológico de atividades de integração do grupo,


além das atividades específicas relacionadas ao sítio histórico, pode contribuir para maior
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interação entre os participantes e, consequentemente, um melhor resultado nas atividades
do roteiro.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A defesa da participação social como pressuposto para o alcance efetivo da salvaguarda de
bens patrimoniais, reconhecida nas Cartas Patrimoniais, documentos de referência para
políticas preservacionistas, confirma a hipótese do caráter indispensável da participação
social. Assim, é possível identificar, também nas cartas, as estratégias que podem contribuir
para a efetividade da participação na preservação do patrimônio.

A partir do estudo de metodologias participativas e do contexto de aplicação da metodologia,


o sítio histórico de Santa Leopoldina, é possível elaborar e realizar um experimento de um
roteiro metodológico participativo na cidade. Na elaboração de tal roteiro e na realização das
atividades busca-se adaptar as atividades à realidade local e ao comportamento dos
participantes, o que é indispensável em um processo participativo, em que a população local
é protagonista nas atividades.

Especificamente, com o experimento metodológico em Santa Leopoldina, confirma-se a


hipótese da ausência de participação social no sítio histórico de Santa Leopoldina, tanto
pela leitura do processo de tombamento, que apesar de haver diversas menções à
necessidade de participação da população, pouco há de participação efetiva da mesma ou
até manifestação de interesse por parte da população relativo à preservação; pelo número
mínimo de pessoas que compareceram nas atividades, mesmo aquelas em que o convite foi
reforçado pela secretaria municipal de desenvolvimento, cultura e turismo; e ainda pelo
relato das pessoas presentes nas atividades, de que a população de Santa Leopoldina, em
geral, pouco valoriza o sítio histórico e, principalmente os proprietários de imóveis
tombados, rejeitam a preservação.

Considera-se a possibilidade de aplicação deste mesmo roteiro metodológico em outros


sítios históricos urbanos, com as adaptações necessárias em função das circunstâncias
concretas de cada lugar e em função de como as atividades se desenvolvem, como o grupo
se comporta e interage na realização das atividades. Tal necessidade de adaptação e
flexibilidade é necessária em qualquer aplicação de metodologia participativa, por estar
condicionada à uma dinâmica muito específica do grupo e do lugar.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BONDUKU, Nabil. Intervenções urbanas na recuperação de centros históricos. Brasília,
DF: Iphan / Programa Monumenta, 2010.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade: UNESP,
2001.
CIMAS. Observatorio Internacional de Ciudadanía y Medio Ambiente Sostenible.
Metodologías Participativas Manual. Obra Colectiva, Madrid, 2009.
ESPÍRITO SANTO (Estado). Secretaria de Estado da Cultura. Relatório da Análise da
Proteção do Ambiente Cultural de Santa Leopoldina. Vitória, 2008.
ESPÍRITO SANTO (Estado). Conselho Estadual de Cultura. Resolução CEC nº 003, de
01/09/2010. Dispõe sobre a regulamentação das diretrizes para intervenções nos espaços
públicos, lotes e edificações integrantes da Área de Proteção do Ambiente.
Cultural de Santa Leopoldina. Disponível em http://secult.es.gov.br/_midias/pdf/4745-
4c8152c8e803b.pdf, acesso em 27/02/2016.
ESPÍRITO SANTO (Estado). Conselho Estadual de Cultura. Resolução nº 05/83, publicada
no DIOES em 06/08/83, disponível em http://secult.es.gov.br/_midias/pdf/2153-
4a43f1b4bcf2a.pdf, acesso em 18/04/2016.
PORTA, Paula. Política de preservação do patrimônio cultural no Brasil: diretrizes,
linhas de ação e resultados: 2000 / 2010. Brasília – DF: Iphan / Monumenta, 2012.
QUEIROZ, Rodrigo Zotelli. Uso de ferramentas computacionais para análise de
modificações na ambiência urbana de sítio histórico tombado: ensaio em Santa
Leopoldina – ES. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e
Urbanismo. Universidade Federal do Espírito Santo. 2013.

CARTAS PATRIMONIAS:

Carta de Atenas, 1931. Disponível em


http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Atenas%201931.pdf,
acesso em 05/06/2016.
Carta de Veneza, 1964. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Veneza%201964.pdf,
acesso em 05/06/2016.
Normas de Quito, 1967. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Normas%20de%20Quito%201967.pdf,
acesso em 05/06/2016.
Compromisso de Brasília, 1970. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Compromisso%20de%20Brasilia%20197
0.pdf, acesso em 05/06/2016.
Compromisso de Salvador, 1971. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Compromisso%20de%20salvador%2019
71.pdf, acesso em 05/06/2016.
Declaração de Amsterdã, 1975. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Declaracao%20de%20Amsterda%CC%8
3%201975.pdf, acesso em 05/06/2016.
Manifesto de Amsterdã, 1975. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Manifesto%20Amsterda%CC%83%2019
75.pdf, acesso em 05/06/2016.
Recomendações de Nairóbi, 1976. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Recomendacao%20de%20Nairobi%2019
76.pdf, acesso em 05/06/2016.
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Carta de Machu Pichu, 1977. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Machu%20Picchu%201
977.pdf, acesso em 05/06/2016.
Carta de Washington, 1986. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Washington%201986.pd
f, acesso em 05/06/2016.
Carta de Petrópolis, 1987. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Petropolis%201987.pdf,
acesso em 05/06/2016.
Carta de Cabo Frio, 1989. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Cabo%20Frio%201989.
pdf, acesso em 05/06/2016.
Declaração de Sofia, 1996. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Declaracao%20de%20Sofia%201996.pdf
, acesso em 05/06/2016.
Carta de Nova Olinda, 2009. Disponível em
http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Nova%20Olinda.pdf,
acesso em 05/06/2016.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO E IDENTIDADE: A Importância do
Reconhecimento no Processo de Salvaguarda

VIEIRA, FLÁVIA C. COSTA

UFMG, Departamento de Antropologia e Arqueologia


flaviaccostavieira@gmail.com

RESUMO

A salvaguarda do patrimônio é tema de disputas, dependendo do valor social do bem em debate e


carrega consigo aspectos de caráter político e ideológico. O conhecimento do passado está
ameaçado pela ignorância acerca do patrimônio; pelo não reconhecimento da relação entre as
pessoas e o patrimônio do passado no presente e pelo não incentivo de criação desses laços entre o
patrimônio e as pessoas. Os dois estudos de caso pretendem demonstrar como o processo de
reconhecimento foi fundamental para as tentativas de proteção e salvaguarda do patrimônio
arqueológico, demonstrando como o Estado age de maneira contraditória e como é importante a
Arqueologia se debruçar sobre o papel dos vestígios no sistema sociocultural e sua agência na vida
cotidiana de comunidades locais.

Palavras-chave: IPHAN; Arqueologia; Patrimônio Arqueológico; Salvaguarda; Identidade.

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Patrimônio Arqueológico e Salvaguarda
A salvaguarda do patrimônio é tema de disputas, dependendo do valor social do bem
em debate e, de acordo com Lima (2007), carrega consigo aspectos de caráter político e
ideológico, assumindo proporções globais de modo a incentivar a coesão social através do
fortalecimento de identidades, sendo inclusive mecanismo de emancipação. Em outras
situações, ao extroverter o passado de uma região, por exemplo, a arqueologia traz à tona
informações essenciais a respeito de comunidades que ali residiram no passado – e não
necessariamente permanecem até hoje.

O aspecto social dessa situação tona-se emblemático, porque nem sempre são
levados em consideração os agentes envolvidos e sobressai sobre eles as regalias
relacionadas ao aspecto financeiro. Tudo isso culmina em uma série de desdobramentos
danosos aos bens, porque em grande medida se trata de um processo de destruição e
desvalorização social, principalmente do patrimônio arqueológico.

O valor social do patrimônio está ligado ao processo de autoidentificação que


a sociedade apresenta com ele; e uma educação patrimonial bem estruturada
torna possível sua preservação. O não reconhecimento do patrimônio
favorece o tráfico ilegal, que cresce vertiginosamente ao longo do tempo.
Essa atitude causa danos irreversíveis ao patrimônio, sendo alimentada por
personagens, como saqueadores, arqueólogos profissionais de formação
deficiente ou eticamente duvidosa, que facilitam a rede do tráfico. Porém,
essa é uma questão multifacetada, pois o eticamente correto em determinado
local pode ser moralmente condenável em outro (VIEIRA, 2015, p. 62).

A responsabilidade de mediar o campo da preservação é do Estado-nação, que


precisa articular essa multivocalidade e associar o contexto no qual está inserido esse
patrimônio com a comunidade ou agentes que lidam diretamente com ele. A reflexão sobre
como as sociedades, no decorrer de sua existência, manejam o ambiente e como essas
modificações permitem o entendimento de suas próprias trajetórias, assim como a
reconstituição dos caminhos seguidos e os motivos para isso são aspectos tão singulares
quanto a compreensão de sua história particular.

Buscar as causas e como as mudanças integraram as sociedades pretéritas é o


ponto de intersecção no qual está inserida a arqueologia ao lidar com essas reminiscências
da vida, “assim, a principal ‘ferramenta’ que nos permite acesso a esse passado é a
arqueologia, e com ela as buscas enveredam por outras áreas do conhecimento” (SOUZA,
2008, p. 06).
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Valorização e desvalorização tem orientado as políticas de proteção ao patrimônio
arqueológico no Brasil, resultando num descompasso de relações que não acontecem entre
iguais, “nessa relação, ‘devorar e não ser devorado’ são intenções concorrentes”
(BEZERRA, 2011, p. 68). No âmbito do patrimônio o que acontece não é diferente, porque
ele vai desde instrumento de coerção na elaboração de identidades nacionais, até a
legitimação de identidades étnicas.

Os conflitos têm sua gênese na própria ideia de patrimônio – uma categoria


inventada pelo Estado – e que é, por essência, contrária aos processos de
autorreconhecimento e de atribuição de identidades. O discurso do
‘patrimônio’ indica o que é patrimônio e elege os seus ‘herdeiros’. O
desenvolvimento de projetos que priorizem o diálogo entre “horizontes
semânticos” distintos (Cardoso de Oliveira, 1998, p. 24) contribui para o
descentramento das tomadas de decisão sobre a gestão do patrimônio
arqueológico e para a legitimação do passado (BEZERRA, 2011, p. 68).

O conhecimento do passado está ameaçado pela ignorância acerca do patrimônio,


pelo não reconhecimento da relação entre as pessoas e o patrimônio (do passado) no
presente, e pela não promoção e/ou incentivo de criação desses laços entre o patrimônio e
as pessoas, como se fosse possível mantê-lo dissociado da realidade. Os dois estudos de
caso a seguir pretendem demonstrar como o processo de reconhecimento nos vestígios
arqueológicos foi fundamental para as tentativas de proteção e salvaguarda do patrimônio,
demonstram como a figura do Estado age de maneira contraditória às suas premissas de
órgão responsável pela gestão desse patrimônio e como a arqueologia pode ser um aspecto
importante no que diz respeito a manutenção de identidades locais, seja por afirmação ou
negação.

Cabe ressaltar que ambos são parte dos estudos iniciados em 2015, para a
Monografia intitulada O Estado Conta o Patrimônio – uma perspectiva arqueológica (Vieira,
2015), onde foram analisados processos do Ministério Público em que foi necessária sua
intervenção em prol da salvaguarda do patrimônio arqueológico. Contudo, trata-se de uma
documentação não publicada e de acesso restrito, condicionada a autorização da
Promotoria; porém, acessível a pesquisadores e profissionais com propósitos declarados.
Por este motivo o abuso das citações textuais foi de extrema importância para apresentação
do conteúdo original destes documentos.

O caso da Estrada Alto Maranhão, em Congonhas, Minas Gerais

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Consiste nos vestígios descobertos durante as obras para abertura de uma rodovia
no Distrito de Alto Maranhão, em Congonhas, pelo Departamento de Estradas e Rodagens
(DER). A rodovia faz a ligação entre a BR-040 e os municípios de Jeceaba e São Brás do
Suaçuí.

Conforme o breve levantamento histórico produzido pela Promotoria Estadual de


Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico, do Ministério Público de Minas Gerais - MPMG,
para o Laudo Técnico Nº 26/2012, o Distrito de Alto Maranhão é um dos mais antigos de
Minas (Barbosa, 1995) e foi fundado no início do século XVIII. A princípio denominado
Arraial do Redondo, em razão do nome de seu fundador João da Silva Redondo, em 1718.
Em 1918 o Distrito de Redondo, pertencente a Conselheiro Lafaiete, passou a se chamar
Alto Maranhão, em 1943 foi transferido para Congonhas.

Em 17 de maio de 2012 a Promotoria Estadual de Defesa do Patrimônio Cultural e


Turístico recebeu um e-mail do diretor do Departamento de Patrimônio Histórico de
Congonhas (DPHI), denunciando a descoberta de um túnel de mineração antiga, junto com
documentação fotográfica sobre o achado, descoberto em virtude das obras do DER no
distrito de Alto Maranhão.

Em 18 de maio de 2012, enviou outro e-mail relatando que a empresa Cowan,


responsável pela construção da rodovia, na presença da Guarda Municipal e da Polícia
Militar, foi notificada para que as obras fossem totalmente paralisadas, porém grande parte
dos túneis já havia sido destruído.

Cópia da notificação expedida pelo DPHI dirigida ao engenheiro responsável


técnico da empresa Cowan, foi juntada aos autos. A empresa Cowan foi
notificada “a paralisar imediatamente as obras no trecho situado entre as
estacas 077 e 335 e qualquer obra secundária na área definida pelo círculo
de raio 2 (dois), a partir da estaca 183, até que as especialistas e técnicos
dos institutos de preservação do patrimônio histórico e artístico procedam os
estudos necessários e demais providências cabíveis ao caso”. (LAUDO
TÉCNICO Nº 26/2012. p. 3)

Em 22 de maio de 2012 o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional


(IPHAN) foi ao local e elaborou um Relatório de Vistoria. Este foi encaminhado para a
Promotoria relatando que as obras estavam paralisadas e que restava apenas um trecho da
galeria preservado, além disso, descrevia a existência de marcas de ferramentas simples na
galeria, que provavelmente teria sido escavada à mão. Segundo o Relatório, poderia haver
ligação entre os indícios ainda preservados do sítio e a exploração de ouro na região “uma
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vez que na direção da galeria há uma grande voçoroca que pode ter sido cava de
mineração” (LAUDO TÉCNICO Nº 26/2012. p. 3).

O Relatório de Vistoria produzido pelo IPHAN mostrou-se deveras contraditório,


porque afirmou que a vegetação densa não permitiu a verificação total da área e que ela
deveria ser objeto de pesquisa arqueológica para a investigação de outros vestígios. Mas na
conclusão informou que a galeria é o único vestígio arqueológico da região que se encontra
em risco em razão da realização das obras, e que após os trabalhos arqueológicos, “não
haveria impedimentos técnicos para continuidade da construção da rodovia. Segundo o
IPHAN a possível cava de mineração existente nas proximidades não seria diretamente
afetada pelo empreendimento” (LAUDO TÉCNICO Nº 26/2012. p. 3-4). Ao permitir de
antemão que a obra prossiga logo após a realização dos trabalhos, o IPHAN está
automaticamente afirmando que nenhum vestígio de relevância será detectado e isso
implica que mesmo que seja, poderá ser destruído pelo avanço da obra com sua anuência.

O órgão, baseado na argumentação de que a região possui um vasto patrimônio


arqueológico, propôs o monitoramento integral das obras por uma equipe de arqueologia e a
avaliação de outros trechos já afetados. O empreendimento possuía irregularidades no
processo do licenciamento ambiental, porque não havia recebido solicitação da
SUPRAM/FEAM para a realização de pesquisas relativas ao patrimônio cultural da região e
o embargo apenas seria suspenso após o protocolo da documentação técnica no IPHAN.
Apesar disso, o DER/MG respondeu afirmando estar de posse de todas as licenças
ambientais sem condicionantes e anexou um laudo técnico feito por uma arqueóloga (sem
data de elaboração), relatando que os vestígios arqueológicos estavam parcialmente
assoreados em razão de chuvas e que consistia no segmento final de uma galeria de mina,
cujas marcas de ferramentas utilizadas ainda eram visíveis.

De acordo com esse laudo, a equipe seguiu em direção a uma enorme voçoroca,
tentando identificar a entrada da galeria, contudo foram impedidos em razão da vegetação
interna e do risco de desabamento de terra, o que teria praticamente impedido a análise.
Mas mesmo assim, afirmou que não foram encontrados vestígios de garimpo no interior da
voçoroca. Também sugeriu o aperfeiçoamento das pesquisas arqueológicas na região,
objetivando avaliar criteriosamente seu potencial arqueológico. No laudo foi proposto o
monitoramento da área, com a produção de relatórios mensais e, em caso de novas
descobertas, que seja paralisada imediatamente a obra.

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Figura 1: Fotografia do túnel logo após a descoberta e fotografia de detalhe de suas paredes internas
(Fonte: Acervo CPPC)

Em 16 de junho de 2012 foi realizada Vistoria Técnica por uma equipe mista,
composta por uma Analista do Ministério Público de Minas Gerais, por um arqueólogo de
confiança do Ministério Público, pelo Diretor de Meio Ambiente e Saúde da UNACCON
(União das Associações Comunitárias de Congonhas), e por um mestrando do MAE/USP
(Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo).

As primeiras imagens a que tivemos acesso mostram um túnel de


considerável proporção, permitindo visualizar diferentes colorações, bem
como marcas de ferramentas rudimentares em suas paredes internas. A partir
destas evidências foi levantada a hipótese de que possa se tratar de galeria
remanescente de mineração antiga, possivelmente de ouro (LAUDO
TÉCNICO Nº 26/2012. p. 4-5).

As conclusões decorrentes dessa Vistoria Técnica conjunta demonstraram que “no


local de obras para construção da rodovia houve intensa movimentação de terra. A empresa
responsável pelo empreendimento da rodovia utilizou máquinas pesadas para realização da
terraplenagem do terreno, sem se preocupar com os impactos que poderiam ser
provocados”, e ainda afirma que “um dia após a divulgação da descoberta, os túneis
estavam quase que totalmente cobertos” (LAUDO TÉCNICO Nº 26/2012. p. 6). Resultando
na destruição de parte substancial dos vestígios, de maneira que a diferença entre as
imagens divulgadas no dia da descoberta e o cenário encontrado no dia da Vistoria Técnica

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demonstram o desrespeito em relação ao patrimônio arqueológico do município de
Congonhas.

Na área de entorno do achado arqueológico, verificou-se a existência de


linhas de transmissão de energia elétrica que cortam cavas de mineração
antiga, bem como placas da Gasmig indicando a passagem de gasoduto pela
região. A obra de construção da rodovia seria mais um fator de ameaça ao
patrimônio arqueológico na região que, segundo informações orais, também
será área de passagem de um mineroduto da empresa Ferrous.
Percorrendo área adjacente às obras da rodovia, foi possível identificar a
ocorrência de diversos vestígios arqueológicos, tais como canais e estradas
antigas que se encontram protegidos pela cobertura vegetal. A presença de
cavas de mineração antiga também foi identificada, mostrando que a área
apresenta alto potencial arqueológico que, infelizmente, não foi considerado
para realização das diversas intervenções ocorridas na região (LAUDO
TÉCNICO Nº 26/2012. p. 7-8).

Nessa Vistoria Técnica também foram identificados outros vestígios, anteriormente


não encontrados nem pela arqueóloga e sua equipe e nem pelos técnicos do IPHAN que
vistoriaram a área.

- a destruição da galeria foi propositada quando já se sabia de sua existência


e da possível importância no contexto arqueológico. Informações orais e fotos
(além de matérias veiculadas pela imprensa) mostram que houve o intuito de
destruir o vestígio, para evitar as implicações que sua existência poderia
trazer para o andamento da construção da estrada;
-a área impactada pela construção tem importantes vestígios da atividade
mineraria desenvolvida no século XVIII durante o denominado Ciclo do Ouro;
-o contexto impactado tem uma grande cava antiga de mineração que teve
uma de suas extremidades impactadas pela construção da estrada;
-como tais vestígios arqueológicos nunca ocorrem separadamente é evidente
que grande número de outras ocorrências serão descobertos se uma
pesquisa sistemática for realizada ao longo de todo o trajeto da estrada em
construção. Na realidade as ocorrências constituem sistemas hidráulicos que
podem ser identificados por arqueólogos com experiência em arqueologia
histórica do período em questão;
-a conclusão do técnico do Iphan de que a galeria destruída é o único vestígio
em risco na área não tem fundamento considerando os outros vestígios
identificados e o impacto que os mesmos já sofreram (LAUDO TÉCNICO Nº
26/2012. p. 8-9).

Evidências como as galerias e a antiga cava de mineração não ocorrem de modo


isolado e nem são únicas em seus contextos, participando de um complexo hidráulico maior
e identificáveis. Assim o esperado, tanto dos técnicos do IPHAN que vistoriaram a área,
quanto a arqueóloga que fez o laudo e sua equipe, é que deveriam estar aptos para
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identificar essa potencialidade do local. Vale destacar que ambas as avaliações elaboradas
são contraditórias.

A arqueóloga argumenta que em virtude da vegetação interna e o risco de


desabamento da voçoroca não foi possível empreender uma avaliação mais criteriosa. Essa
justificativa abre margem para o questionamento a respeito de que maneira o risco de
desabamento da voçoroca foi identificado se não foi possível investigá-la por dentro por
causa da vegetação. Cabe destacar, inclusive, que justamente o crescimento da vegetação
da parte interna da cava é o que lhe dá sustentação e exclui quaisquer tipos de riscos desse
gênero.

A necessidade de aprofundamento de pesquisas sistemáticas na região é de grande


importância, haja vista que, conforme o Laudo Técnico Nº 26/2012 já foram construídas
linhas de transmissão de energia elétrica e gasoduto sem os devidos estudos de impacto
ambiental, contrariando a legislação vigente no país. Dentre as recomendações propostas
pela Promotoria Estadual de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico, solicita-se

-que a lei seja cumprida com a punição dos que destruíram deliberadamente
o patrimônio arqueológico
-que seja realizado um trabalho como, a lei determina, de pesquisa
(prospecção) e salvamento (se for o caso);
-que os trabalhos de arqueologia sejam acompanhados (fiscalizados) por
arqueólogo de confiança do MP para evitar novas destruições. (LAUDO
TÉCNICO Nº 26/2012. p. 11)

Merece destaque o fato de que o DER é órgão pertencente ao Estado, sendo neste
caso uma representação da urgente necessidade de divulgação a respeito da importância
de tomar medidas preventivas sérias em relação ao Patrimônio Arqueológico, cumprindo
minimamente a legislação. Sendo competência do IPHAN, analisar os vestígios e cuidar de
sua preservação, salvaguardando para o presente e para o futuro, parte do passado (leia-se
identidade) de Congonhas e da história (Ciclo do Ouro) nacional, e não do Ministério
Público.

É notável a preocupação do diretor do DPHI de Congonhas, responsável pela


denúncia, e dos profissionais da Promotoria Estadual de Defesa do Patrimônio Cultural e
Turístico, Ministério Público responsáveis pelo encaminhamento de ações em resposta à
denúncia. Esse último é uma instância de recorrência, logo, suas ações foram desejáveis e
dentro do esperado para área de atuação do órgão, trata-se da única parcela do Estado que

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está fora do contexto regional e que demonstrou cautela no trato com os impactos ocorridos
na região de Alto Maranhão.

A iniciativa de denúncia partir do diretor de um Departamento Patrimônio Histórico do


município é sintomática, na medida em que demonstra claramente como sua preocupação
se insere num contexto regional. A atenção dispensada à preservação e salvaguarda do
patrimônio regional é alicerçada pelos conhecimentos prévios a respeito do grande potencial
arqueológico e do passado de ocupação intensa da região.

Em junho de 2015 foi realizada uma nova campanha de campo para averiguar como
ficou a região após a finalização das obras de abertura do novo trecho da rodovia e não
havia nenhum tipo de sinalização a respeito dos vestígios arqueológicos remanescentes.

Figura 2: Fotografia das obras de construção da rodovia (Fonte: Acervo CPPC) e fotografia das obras
da estrada já totalmente concluídas em 2015 (Foto: Carlos Magno)

A destruição de parte considerável dos vestígios arqueológicos foi também a


destruição de parte da identidade e do passado do município de Congonhas. Conforme
destacado houve intencionalidade na destruição das galerias, haja vista que de acordo com
as fotografias da denúncia do DPHI, elas ainda estavam em perfeitas condições de
preservação e seriam capazes de fornecer dados sobre a dinâmica da mineração de ouro
antiga na área. Esse aspecto reitera a importância da área impactada para os estudos no
âmbito do Ciclo do Ouro.

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O caso do Condomínio Residencial Goiabeiras, em Congonhas,
Minas Gerais

Consiste nos vestígios arqueológicos identificados na região do empreendimento


Condomínio Residencial Goiabeiras, por ocasião de sua implantação no município de
Congonhas, MG.

De acordo com o Dicionário Histórico-Geográfico de Minas Gerais, o município foi


fundado em 1734 e desde o início era um importante pólo de mineração. Em 1746 chegou a
ter dez moradores da freguesia de Congonhas entre os mais abastados da capitania, à
época ainda termo de Vila Rica.

Em 1938 foi criado o município de Congonhas do Campo, e em 1948, teve o nome


alterado para Congonhas. Está situado a setenta quilômetros de Belo Horizonte e é formado
pelo distrito de Congonhas (distrito-sede), Alto Maranhão e Lobo Leite.

De acordo com o Laudo Técnico Nº 68/2012, elaborado pela Promotoria Estadual de


Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico, do Ministério Público de Minas Gerais - MPMG, a
respeito de irregularidades no processo das obras do Condomínio Residencial Goiabeiras,
em junho de 2012 foi feita uma denúncia de que as obras foram iniciadas sem a realização
de pesquisas arqueológicas na área e mencionava a possibilidade da existência de uma
mina de pedra-sabão trabalhada por escravos exatamente no perímetro de localização do
empreendimento.

Com base na denúncia foi instaurado um Inquérito Civil, na 1ª Promotoria de Justiça


de Congonhas. Em 14 de agosto foi realizada uma Vistoria Técnica, por uma Analista do
Ministério Público, com vistas à identificação desses vestígios arqueológicos na área do
empreendimento.

Nesta vistoria, percorrendo a área que ficava fora dos muros do condomínio,
foi verificada a proximidade do Córrego Goiabeiras com o loteamento e
confirmada a existência de uma antiga “estrada” ou “canal” conforme relatado
na denúncia encaminhada a esta Promotoria. Foi constatado ainda que esta
ocorrência local ficava a poucos metros dos muros do Condomínio
Goiabeiras.
(LAUDO TÉCNICO Nº 68/2012. p. 1-2)

Mesmo após as recomendações contidas no laudo de vistoria, em 09 e 10 de


outubro de 2012 foram encaminhadas novas fotografias denunciando a retomada das obras
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pelo Condomínio Goiabeiras, “estas obras estariam atingindo diretamente o entorno do
antigo canal apontado na denúncia. Através das imagens, foi verificada a presença de
caminhões e máquinas pesadas que estavam executando o trabalho para duplicação da
Rua Vito Gaggiato que circunda o condomínio.” (LAUDO TÉCNICO Nº 68/2012, p. 2). Em 11
de outubro de 2012 a Prefeitura Municipal de Congonhas embargou as obras de duplicação
da Rua Vito Gaggiato, por meio de um Auto de Notificação.

Em 23 de outubro de 2012 um representante do condomínio protocolou um “Laudo


Arqueológico Não Interventivo”, elaborado por um arqueólogo contratado, informando que
foram realizados caminhamentos sistemáticos em toda a extensão da área do
empreendimento e que o local apresenta baixíssimo potencial arqueológico, porque não
foram encontrados vestígios arqueológicos. A Promotoria elaborou “algumas considerações
sobre o laudo acima mencionado, destacando pontos que envolvem a questão arqueológica
e urbanística do empreendimento.” (LAUDO TÉCNICO Nº 68/2012, p. 3). Este mesmo
“Laudo Arqueológico Não Interventivo” foi protocolado no IPHAN, e em 25 de outubro de
2012, o órgão manifestou sua aprovação, sem nenhuma ressalva, afirmando que não
haveria impedimentos para a continuidade das obras, porque “não havia bens culturais
envolvidos” (LAUDO TÉCNICO Nº 68/2012, p. 3).

Em 29 de outubro de 2012 um representante do condomínio compareceu à


Promotoria Estadual de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico e, baseando-se no Laudo
e no Ofício do IPHAN, reafirmou que não existiam vestígios arqueológicos na área. Com
vistas à esclarecer quaisquer dúvidas com relação à existência ou não de vestígios no local
foi realizada uma nova Vistoria Técnica, em 31 de outubro de 2012, por uma Analista do
Ministério Público, acompanhada de um arqueólogo de confiança do órgão, o representante
do condomínio e o arqueólogo autor do Laudo.

Inicialmente, foi percorrida a Rua Vito Gaggiato, localizada entre o Córrego


Goiabeiras e o condomínio. Verificou-se grande alteração na paisagem da
via, com a realização de obras para seu alargamento. A diferença entre a
paisagem que existia em agosto, quando da primeira visita ao local, e o atual
aspecto da via evidencia o grande impacto sofrido. Verificou-se que as
atividades de movimentação de terra ocorreram de forma intensa e que já
houve a retirada de grande parte da vegetação existente ao longo da via.
Enormes blocos de pedra decorrentes destas atividades encontram-se
acumulados na área.
Percorrendo a mesma via, foi constatada a presença de cavas
remanescentes de mineração antiga que já foram muito impactadas e estão
sendo utilizados como depósitos de lixo e de materiais decorrentes das obras
do condomínio.
Foi comprovado que o canal, objeto da denúncia, ainda mantinha sua
estrutura parcialmente preservada, tratando-se de uma importante ocorrência
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arqueológica remanescente de mineração antiga. Como tais vestígios
arqueológicos não costumam ocorrer isoladamente, este segmento de canal
é como apenas um dos elementos integrantes de um complexo sistema
hidráulico bem maior.
A grande movimentação de terra praticada na área comprometeu a
integridade e o contexto de inserção do vestígio arqueológico que se encontra
em situação de risco imediato.
A existência de um sistema hidráulico na área foi reforçada ainda pela
identificação de outros vestígios de canais. A água era indispensável na
exploração aurífera e, uma vez que a captação poderia ficar em local distante
da lavra, sua canalização era comum na região e paisagem mineradora. O
Córrego Goiabeiras certamente teve grande relevância para o
desenvolvimento da mineração em Congonhas durante o Ciclo do Ouro.
Foi confirmada também a presença de montes de rejeito de mineração em
vários pontos do terreno, evidenciando o desenvolvimento da atividade na
área.
Foram identificados indícios que podem indicar a presença de um segmento
de estrada calçada na área, embora a vegetação que cobre o local esteja
dificultando sua visibilidade.
No interior do condomínio, cuja paisagem já foi totalmente alterada pelas
obras, foi possível identificar, no local destinado à área verde do
empreendimento, ocorrências arqueológicas que evidenciam a prática de
atividades minerárias na área. (LAUDO TÉCNICO Nº 68/2012. p. 3-8)

O representante do condomínio e o arqueólogo argumentaram que o laudo


elaborado não abrangeu o local onde se localiza o antigo canal, objeto da denúncia.

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Figura 3: Fotografias da Rua Vito Gaggiato em agosto de 2012, e detalhe da cerca do condomínio e
de um galpão ao fundo como referências de localização (A, B). Fotografias dos mesmos pontos da
Rua Vito Gaggiato em outubro de 2012, e detalhe da cerca do condomínio e de um galpão ao fundo
como referências de localização (C, D) (Fonte: Acervo CPPC)

De acordo com o Laudo Técnico Nº 68/2012, ao contrário do afirmado pelo


representante do Condomínio, pelo arqueólogo contratado e pelo próprio IPHAN, a presença
de vestígios arqueológicos comprova a existência de mineração de ouro na região, além da
presença de remanescentes de um sistema hidráulico e de antigas cavas. Também reflete
que outros vestígios provavelmente foram destruídos por ocasião da implantação do
Condomínio Goiabeiras, o que configura uma perda irreparável para o patrimônio
arqueológico do município de Congonhas, haja vista que não houve estudos preliminares.
Propõe que seja realizada uma pesquisa sistemática na área para evidenciar outras
ocorrências arqueológicas remanescentes e que elas deverão ser preservadas.

-A [recomendação de] realização de diagnóstico interventivo em toda área do


empreendimento condomínio Goiabeiras, após autorização do IPHAN, com
produção de relatório conclusivo sobre a natureza e extensão dos vestígios
arqueológicos e adoção das providências cabíveis para divulgação científica
dos resultados obtidos. [...]
-Transformação de toda área remanescente ainda não impactada em área
verde do condomínio, vedado o seu parcelamento. (LAUDO TÉCNICO Nº
68/2012. p. 12)

Novamente temos o Ministério Público agindo em prol da preservação do patrimônio


arqueológico, em resposta à denúncia realizada por moradores locais. E, após essa breve
apresentação da sucessão dos acontecimentos, fica evidente como a postura do IPHAN é
contraditória, haja vista sua atuação neste caso. Nesse sentido, o Laudo Técnico elaborado
pela Promotoria se mostra mais interessado na execução de pesquisas arqueológicas que o
próprio IPHAN, porque está respondendo aos anseios locais de salvaguarda do patrimônio.

-A área impactada pela construção do condomínio Goiabeiras possui


importantes vestígios de atividades minerárias antigas. Documentos dos
séculos XIX e XX comprovam a existência de mineradoras de ouro na região.
A constatação da presença de vestígios arqueológicos de um sistema
hidráulico na área, bem como de antigas áreas de cava, contraria o afirmado
pelos técnicos de empreendimento Condomínio Goiabeiras e do IPHAN.
- Como os vestígios arqueológicos não ocorrem isoladamente é certo que
grande número de outras ocorrências tenham sido destruídas com a
implantação do Condomínio Goiabeiras, causando danos irreversíveis ao
patrimônio arqueológico de Congonhas.
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-A realização de uma pesquisa sistemática na área do empreendimento vai
permitir a descoberta de ocorrências arqueológicas remanescentes que
deverão ser preservadas.
-Segundo constatado, o arqueólogo contratado não vistoriou a área que
apresenta os vestígios arqueológicos (LAUDO TÉCNICO Nº 68/2012. p. 12).

Novamente a intervenção do Ministério Público demonstra a importância do


reconhecimento no processo de salvaguarda do patrimônio, caso os moradores e lideranças
locais não reconhecessem a importância daqueles vestígios, nem mesmo a denúncia, que
iniciou toda mobilização, teria sido realizada. A atuação do Ministério Público se revela mola
inicial de um processo que, em condições normais, deveria ter sido tema de projeto
submetido para apreciação pelo IPHAN antes mesmo do início das obras. Infelizmente a
atuação do órgão oficialmente destinado à proteção e salvaguarda do patrimônio nacional
também deixou a desejar no que diz respeito à averiguação dos vestígios e solicitação de
realização da pesquisa arqueológica. Em junho de 2015, assim como no caso da Estrada
de Alto Maranhão, foi realizada uma campanha de campo para averiguar como ficou a
região após as recomendações de vedar o parcelamento das áreas não impactadas, em
área verde do condomínio. Além da inexistência de sinalização a respeito dos vestígios
arqueológicos remanescentes, essa recomendação não foi acatada e as obras, tanto de
loteamento, quanto de construção de casas, já estava em estágio bastante avançado.

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Figura 4: Fotografia do condomínio, com destaque para duas casas sendo construídas e fotografia
de detalhe para as duas casas. Já é possível observar a pavimentação das ruas internas e
distribuição de postes de iluminação em toda área (Foto: Carlos Magno)

Considerações finais

Os aspectos levantados a partir da apresentação dos dois estudos de caso permitem


que diversos pontos sejam discutidos sobre como a própria atuação do Estado é
contraditória no que diz respeito à aplicação da legislação por ele mesma construída e
instituída. Segundo Arantes (2006), os fatos da memória são elaborados, transmitidos e
realimentados pelos atores sociais, em suas redes de relações sociais, contudo, o
patrimônio é uma categoria instituída pelo Estado. E, de acordo com Bezerra (2011), o
discurso do ‘patrimônio’ o define e elege os seus ‘herdeiros’.

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Viramos reféns de uma legislação que preza pela preservação do patrimônio,
mas que não conseguiu, até hoje, barrar um único empreendimento com base
na legislação vigente e argumentos de que o patrimônio arqueológico é mais
importante do que o próprio empreendimento e seus inúmeros impactos,
irreversíveis no caso do patrimônio cultural. Um agravo constitui-se no fato de
que em muitos casos, não há como mitigar ou compensar a perda do meio de
vida e de memória de populações atuais que tem em marcos geográficos
específicos ou mesmo em sítios arqueológicos – sobrepostos a locais
sagrados – a gravação de sua história que raramente está escrita (ROCHA et
al, 2013, p. 132).

As pesquisas arqueológicas englobam sítios pré-históricos e sítios históricos, e os


resultados desses estudos reúnem informações sobre o passado (remoto e recente) que
estão acessíveis por meio da cultura material, restos alimentares, construções, manejo de
paisagem, dentre outros. Tudo isso carrega consigo pistas para o entendimento acerca da
forma como as pessoas no presente se relacionam e ainda revela partes do passado pré-
colonial e recente da história não oficial.

Entendemos que, como arqueólogos, podemos dar voz às minorias, aos


esquecidos, aqueles que foram silenciados pela história oficial e, até mesmo,
às maiorias, alijadas do processo desenvolvimentista e, se ainda assim
preferirmos nos calar, devemos ter consciência do que fizemos e deixamos
de fazer com as oportunidades que criamos, nos foram dadas ou oferecidas.
Não há uma posição que possa ser confortável. Mesmo quando silenciamos,
ao considerar que nosso papel enquanto cientistas pode ser neutro e objetivo,
estamos compactuando com a situação que se apresenta. E este é talvez o
aspecto mais grave: o uso que tem sido dado ao nosso conhecimento, sem
que tenhamos a noção do comprometimento assumido ao realizar as
pesquisas arqueológicas em grandes obras, sejam públicas ou privadas. O
que fazemos não é apenas exercer a ciência e produzir conhecimento
(MONTICELLI, 2005, p. 339-340).

Nestes termos, torna-se fundamental considerar os desdobramentos da atuação de


arqueólogas e arqueólogos, haja vista que, de acordo com Prous (1992), é possível
considerar vestígios arqueológicos quaisquer indícios da presença ou atividade humana em
determinado local e, para inserir tais vestígios no contexto ecológico (clima, vegetação,
fauna, proximidade da água), é preciso estar atento aos vestígios indiretamente ligados à
presença humana, e que revelam as condições em que se estava vivendo. Segundo
Bezerra (2011) a natureza interventiva dos trabalhos da arqueologia tem impactos desde a
chegada da equipe de profissionais ao local onde será a pesquisa de campo, até as
interpretações dos vestígios arqueológicos e a consequente construção de uma narrativa
sobre o passado. Nessa perspectiva, a denominada Arqueologia Pública tem papel
importante na medida em que se torna um instrumento de ação política e social, porque
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propõe não somente o reconhecimento do “outro”, mas sua participação em todas as etapas
do trabalho de investigação, e no próprio gerenciamento comunitário do patrimônio
arqueológico.

Arqueologia Pública é uma vertente da Arqueologia preocupada em


compreender as relações entre distintas comunidades e o patrimônio
arqueológico, considerando o impacto do discurso acadêmico em sua visão
de mundo, o lugar de suas narrativas na construção do passado e a gestão
comunitária dos bens arqueológicos. Como se vê, a Arqueologia Pública é, ao
mesmo tempo, produto e vetor de reflexões acadêmicas, de ações políticas e
de estratégias de gestão (...)
Assim, entendo que a Arqueologia Pública é uma forma de praticar a
Arqueologia e que compreende o fazer arqueológico dentro de uma
perspectiva circular, na qual as narrativas locais sobre o passado são
consideradas na construção e na reorientação das pesquisas acadêmicas; e
não como um conjunto de ações para o público, entendido de maneira
genérica (BEZERRA, 2011, p. 62-63).

Esse envolvimento da comunidade local nos trabalhos, além de difundir o


conhecimento, proporciona que tracem vínculos de proximidade com os vestígios e as
paisagens, de modo a reconhecerem uma identidade, “em lugar de preservar lugares,
edificações e objetos pelo seu valor em si mesmo, em um processo de reificação, as
políticas públicas na área deveriam associar continuamente os bens culturais e a vida
cotidiana, como criação de símbolos e circulação de significados” (IPHAN, 2014, p. 21).
Cabe destacar, que esse processo pode ser tanto de autoafirmação, quanto de negação em
relação à identidade reconhecida. O ponto em questão é o ato de reconhecimento em si -
seja para se auto afirmar como próximo ou como distante em relação àquele patrimônio.

Na medida em que se aprofunda nos aspectos que envolvem os processos de


reconhecimento e, por conseguinte, de salvaguarda de patrimônio, surgem proposições de
reflexões alternativas, que buscam novos pontos de vista para antigos dilemas. De modo
análogo ao realizado por Bezerra (2011; 2015), é factível colocar em prática o exercício de
repensar a própria noção de preservação a partir de estudos etnográficos das relações entre
as comunidades residentes no entorno de sítios arqueológicos, buscando compreender a
dinâmica e a interação existentes. Assim, os discursos acerca de patrimônio devem
considerar as pessoas que convivem com ele e como ele é ressignificado nas narrativas
locais.

O passado está ameaçado mais que somente pela ignorância a respeito do


patrimônio, mas pelo que se ignora das relações. Priorizar esse tipo de diálogo “contribui

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para o descentramento das tomadas de decisão sobre a gestão do patrimônio arqueológico
e para a legitimação do passado de pequenas comunidades” (BEZERRA, 2011, p. 68).
Entender o papel dos vestígios nesse sistema sociocultural e sua agência na vida cotidiana,
é um compromisso político, ligado à trabalhos de arqueologia preocupados em relação ao
passado e ao presente das comunidades locais, possibilitando que patrimônio arqueológico
e identidade se constituam como elementos importantes para o reconhecimento no
processo de salvaguarda.

Referências Bibliográficas

ARANTES, Antonio. O Patrimônio Cultural e seus usos: a dimensão urbana. Em: Habitus,
Goiânia, v. 4, p. 425-435, 2006.

BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário Histórico-Geográfico de Minas Gerais. Belo


Horizonte-Rio de Janeiro: Editora Itatiaia Ltda. 1995.

BEZERRA, Marcia. “As moedas dos índios”: um estudo de caso sobre os significados do
patrimônio arqueológico para os moradores da Vila de Joanes, ilha de Marajó, Brasil.
Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v. 6, n. 1, 2011.

BEZERRA, Marcia. Na beira da cava: Arqueologia, Educação Patrimonial e Direitos


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Coordenadoria das Promotorias do Patrimônio Cultural. Promotoria Estadual de Defesa do


Patrimônio Cultural e Turístico. LAUDO TÉCNICO Nº 26/2012. Estrada Alto Maranhão.
MPMG: Belo Horizonte, 2012. Não publicado.

Coordenadoria das Promotorias do Patrimônio Cultural. Promotoria Estadual de Defesa do


Patrimônio Cultural e Turístico. LAUDO TÉCNICO Nº 68/2012. Condomínio Residencial
Goiabeiras. MPMG: Belo Horizonte, 2012. Não publicado.

IPHAN. Educação Patrimonial: Histórico, conceito e processos, 2014.

LIMA, Tânia Andrade. Um passado para o presente: preservação arqueológica em questão.


Revista IPHAN, v. 33, 2007.

MONTICELLI, Gislene. Arqueologia em obras de engenharia no Brasil: Uma crítica aos


contextos. Tese de doutorado, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. PUC-
RS, Porto Alegre, 2005.

PROUS, Andre. Arqueologia Brasileira. Ed. UnB. Brasília. 1992.

ROCHA et al. Arqueologia pelas Gentes: um Manifesto - Constatações e Posicionamentos


Críticos sobre a Arqueologia Brasileira em Tempos de PAC. Em: Revista da SAB, V. 26, Nº
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SOUZA, Gustavo Neves de. O material lítico polido do interior de Minas Gerais e São Paulo:
entre a matéria e a cultura. Dissertação de mestrado, USP. São Paulo, 2008.
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VIEIRA, Flávia C. Costa. O Estado Contra o Patrimônio: uma perspectiva arqueológica.
Monografia de graduação, Universidade Federal de Minas Gerias. UFMG, Belo Horizonte.
2015.

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PATRIMÔNIO ARTÍSTICO DO PALÁCIO DAS ARTES:
Um estudo do processo de preservação do figurino dos
espetáculos produzidos pela Fundação Clóvis Salgado

NEVES, RACHEL M.P.S (1); MYRRHA, VÂNIA P.S. (2)

Universidade do Estado de Minas Gerais. Escola de Design


Av. Antônio Carlos, 7545 - São Luiz
Belo Horizonte/MG - CEP 31270-010

1. rmyrrha@gmail.com

2. arteehistoria@gmail.com

RESUMO:

Com quase duzentos e cinquenta anos da construção do primeiro teatro no Brasil, uma
questão emerge: onde e como está preservada a memória desse patrimônio artístico, sendo
o teatro parte tão representativa da cultura brasileira? Mais especificamente, o que é feito
com o figurino das peças de teatro e espetáculos de ópera e dança após o período de
apresentação? Buscando destrinchar essa última questão, este trabalho apresenta uma
análise do processo de conservação dos figurinos dos espetáculos apresentados em um
dos mais importantes teatros do estado de Minas Gerais: o Palácio das Artes. Com base em
materiais de referência, entrevistas e visitas técnicas realizadas em 2014, foi feito um
diagnóstico do processo de preservação do figurino produzido pela Fundação Clóvis
Salgado - sob responsabilidade e gestão de um de seus equipamentos culturais, o Centro
Técnico de Produção Raul Belém Machado. Através do mapeamento desse processo,
pretende-se incentivar a implantação de projetos voltados para a melhoria da gestão, a
adequação das ferramentas de conservação e do espaço de guarda do acervo, além do
desenvolvimento de regras e políticas de preservação e descarte. Espera-se, também, que
o mapeamento do processo, consolidado em 2014, possibilite não somente a continuação

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dessa prática na instituição, mas que também sirva de exemplo e mostre caminhos para o
fortalecimento desse tipo de iniciativa nos demais teatros brasileiros.

Palavras-chave: patrimônio artístico; teatro; acervo

ABSTRACT:

The first theater in Brazil was built almost two hundred and fifty years ago, but one question
still emerges: where and how has the memory of such a representative part of Brazilian
culture been kept? Particularly, what happens to the costumes used in theater plays and
opera performances after the show is over? In order to address this last question, this paper
presents an analysis of the preservation process of outfits worn on shows performed in one
of the most important theaters in the state of Minas Gerais: the Palácio das Artes. Based on
interviews and technical visits carried out in 2014, a diagnosis was made of the costume
preservation process performed at the Technical Center of Production Raul Belém Machado
(CTP) of the Clóvis Salgado Foundation (FCS). Therefore, this article shall encourage
improvement projects to enhance management practices, as well as adjusting the
conservation tools and the storage area of the CTP, and designing clear rules and policies
concerning this collection. Hopefully, by mapping this preservation process, this study shall
not only contribute to a continued application of the current practice, but also serve as an
example for other Brazilian theatres.

Keywords: artistic heritage; theater; collection

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INTRODUÇÃO:

O teatro no Brasil tem suas origens no século XVI com os jesuítas e suas peças de
catequização, “que atraíam aos pátios das escolas e capelas colonos e indígenas, fazendo-
os participar como atores ou simples espectadores de dramatizações ingênuas” (ÁVILA,
1978, p.1). A construção do primeiro espaço para as artes cênicas só foi concretizada em
1770, data de inauguração do “mais antigo prédio teatral da América do Sul”, a Casa da
Ópera de Vila Rica, hoje Teatro Municipal de Ouro Preto (ÁVILA, 1978, p.7). Entretanto, foi
no século XIX que o teatro brasileiro ganhou mais força e visibilidade, advindas de um
movimento cultural ufanista, consequência da presença da corte portuguesa no Brasil, como
revelam as palavras de Sábato Magaldi: “A transferência da corte portuguesa para o Rio, em
1808, trouxe inegável progresso para o teatro, consolidado pela Independência, em 1822, a
que se ligou logo depois o romantismo, de cunho nacionalista” (MAGALDI, 2003, p.1).
Posteriormente, o teatro brasileiro passou por mais dois ciclos de desenvolvimento,
denominados por Wilson Martins de “ciclo do teatro ligeiro” e o “ciclo moderno” (MARTINS,
1963, pp.8-9) até a ditadura militar em 1964. A segunda metade do século XX é descrita
resumidamente por Carolin Ferreira, quando o teatro brasileiro foi, lentamente, se
recuperando dos vinte anos de repressão e censura:

“Durante a ditadura, o teatro politizou-se e desenvolveu através do Teatro de Arena


e do Teatro de Oficina linguagens cénicas e dramaturgias próprias. Mas repressão,
censura e auto-censura, bem como a incapacidade de renovação impossibilitaram
que este caminho fosse seguido. Enquanto os anos 1980 eram caracterizadas por
um balanço desses impedimentos e por uma retomada hesitante, os anos 1990 já
demonstraram uma diversidade de vertentes, estilos e temas que prometem um
complexo e interessante panorama teatral para este século XXI que está
começando” (FERREIRA, 2008, p.142).

A “diversidade de vertentes” nos anos 1990, observada por Ferreira, foi acompanhada pelo
crescente número de casas de espetáculo e teatros no Brasil. Em um trabalho realizado
pelo arquiteto e cenógrafo José Carlos Serroni em 2002, quase mil teatros em atividade
foram identificados no Brasil e, conforme levantado pelo Ministério da Cultura, em 2010
foram contabilizados 1229 espaços. Assim, considerando tanto os teatros em atividade
quanto os espaços já desativados, pode-se concluir que o teatro brasileiro se configura
como uma considerável fonte de memória cultural. “Os teatros brasileiros têm sido, ao longo
de sua evolução, os depositários de importante parte da cultura urbana das cidades nas
quais foram construídos” (LANFRANCHI, 2002, p.21).
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Froner (2001, p.204) afirma que “Patrimônio Histórico pode ser tudo e qualquer coisa –
material ou imaterial – que mantenha viva a memória de um determinado tempo” ou
conforme explicita Carsalade (2007, pp.171-172) “o conceito de patrimônio é um conceito
múltiplo que abriga diversos outros: herança, tentativa de permanência do homem ou
sobrevivência da cultura, identidade, diversidade, memória, posse pública de bens culturais,
dentre tantos outros”. Considerando essas duas definições e refletindo sobre os quase
trezentos anos da existência dessas casas de espetáculo no Brasil, uma questão emerge:
onde e como está preservada a memória desse patrimônio, sendo o teatro parte tão
representativa da cultura brasileira?

Esse patrimônio das artes cênicas assume diversos formatos, melhor ilustrado por
Françoise Choay quando apresenta de forma sucinta a mudança no conceito de patrimônio
até seu significado contemporâneo:

“Em sua acepção original, “bem de herança que, seguindo as leis, descende dos
pais e mães para seus filhos” (Émile Littré, Dictionnaire de la langue française), a
mais antiga palavra “patrimônio” conhece hoje uma fortuna nova, por uma
transferência metafórica que lhe atribui adjetivos variados: “genético”, “natural”,
“bancário”, etc.” (CHOAY, 2011, p.11)

Dessa forma, pode-se pensar que o patrimônio das artes cênicas abrange tanto seu
patrimônio arquitetônico, na forma dos edifícios teatrais e casas de espetáculo, como seu
patrimônio móvel, isso se consideramos apenas seu patrimônio material. A partir do conceito
criado na Conferência Geral da UNESCO de Paris, em 1978, de que patrimônio móvel pode
ser definido como “todos os bens móveis que são a expressão e testemunho da criação
humana ou da evolução da natureza e que tem um valor arqueológico, histórico, artístico,
científico ou técnico”1 (UNESCO, 1978, tradução nossa) o patrimônio móvel do teatro pode
ser representado por gravações em vídeo, fotografias, libretos, materiais de divulgação,
além do próprio figurino e cenário produzidos. Preservando-se, então, esse patrimônio
móvel do teatro estaremos preservando, não somente os bens móveis, mas mantendo viva
a memória, a identidade, a diversidade e a cultura de uma sociedade em um determinado
momento de sua história.

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“A importância 1de se manter este acervo teatral se justifica no que ele carrega em
si enquanto documento: sua costura, corte, etiquetas, interferências da moda,
tecidos, opções dos figurinistas, relação do ator com o traje e diversas outras
práticas de encenação. Permanecerá o registro do traje como informação sobre
uma arte- ainda que efêmera” (VIANA, 2010, p.9).

Refletindo sobre todo esse rico patrimônio, surge uma indagação interessante: que é feito
com esse patrimônio móvel? Mais especificamente, o que é feito com o figurino das peças
de teatro e espetáculos de ópera e dança após o período de apresentação?

Buscando destrinchar a questão colocada, este trabalho apresenta uma análise e


esquematiza o processo de conservação dos figurinos produzidos pela Fundação Clóvis
Salgado para espetáculos apresentados em um dos mais importantes teatros do estado de
Minas Gerais: o Palácio das Artes.

A Fundação Clóvis Salgado, ou FCS, é uma entidade de direito público vinculada à


Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais cuja finalidade é apoiar a criação cultural e
fomentar, produzir e difundir as artes e a cultura no Estado. É uma instituição responsável
pela gestão de três Corpos Artísticos: a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, o Coral Lírico
de Minas Gerais e a Cia. de Dança Palácio das Artes. É também responsável pela gestão
de importantes espaços culturais em Belo Horizonte, como o Centro de Formação Artística,
a Serraria Souza Pinto, o Centro de Arte Contemporânea e Fotografia, o Centro Técnico de
Produção, ou CTP, e o Palácio das Artes - composto pelo Grande Teatro, a Sala João
Ceschiatti e a Sala Juvenal Dias.

Quanto ao processo de conservação do figurino na FCS, imediatamente pensamos no


acervo de um dos seus principais espaços, o acervo do Grande Teatro do Palácio das Artes.
Inaugurado em 1971, o teatro é um equipamento cultural com 1707 lugares, capaz de
abrigar concertos, espetáculos de artes cênicas, apresentações musicais e montagens
operísticas. Comporta espetáculos líricos e concertos corais sinfônicos de grande porte,
tendo sido palco das mais de setenta óperas produzidas pela Fundação Clóvis Salgado
como, por exemplo, Tosca, Nabucco, La Bohème, A Viúva Alegre, Turandot, Aida e La
Traviatta. Entretanto, todo o trabalho de conservação dos trajes e adereços é realizado no
Centro Técnico de Produção, outro equipamento cultural da FCS, onde são executadas

1 Tradução das autoras a partir do texto original: All movable objects which are the expression and testimony of
human creation or of the evolution of nature and which are of archaeological, historical, artistic, scientific or
technical value and interest.

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ações de produção, guarda e preservação de cenários e figurinos dos espetáculos
realizados.

Com base em entrevistas, visitas técnicas e materiais de referência, foi feito, então, um
mapeamento do processo de preservação do figurino - sob responsabilidade e gestão do
Centro Técnico de Produção Raul Belém Machado (CTP) - desde o inventário das peças
produzidas até a higienização, arquivamento e catalogação final do acervo devolvido após a
execução do espetáculo. Nesse mapeamento, foram levantadas, também, as condições
ambientais e de infraestrutura dos galpões e instrumentos utilizados para armazenamento
das peças. Adicionalmente, o presente estudo discorre brevemente sobre a história da
conservação do figurino no Palácio das Artes e apresenta alguns usos desse acervo
guardado e preservado.

BREVE HISTÓRICO DO PROCESSO DE PRESERVAÇÃO DO FIGURINO

A partir da primeira entrevista, ocorrida em 3 de abril de 2014 com um membro da Diretoria


Artística da Fundação Clóvis Salgado, foi possível mapear a história da conservação do
figurino produzido para peças de teatro e espetáculos de ópera e dança do Palácio das
Artes.

Desde a sua inauguração em 2004, o Centro Técnico de Produção Raul Belém Machado
está localizado em galpões alugados de uma antiga fábrica de tecidos no sítio histórico de
Marzagão, tombado pelo IEPHA-MG em 2002, no município de Sabará, em Minas Gerais
(ÁVILA, 2009, p.67).

Antes da criação do CTP, uma área específica dentro do Palácio das Artes era destinada à
produção dos cenários e figurinos, além de abrigar uma equipe grande de produção, como
costureiras, cenógrafos, técnicos, produtores, camareiras, e demais profissionais envolvidos.
O figurino estava armazenado em araras, ocupando dois andares do Palácio das Artes.

A ampliação e crescente ocupação dos espaços pela escola de formação, hoje denominada
Centro de Formação Artística e Tecnológica (CEFART), e a utilização de uma cenografia
maior nos espetáculos, com maior utilização de madeira e pinturas, fizeram com que fosse
necessária a mudança do acervo para um espaço mais amplo. Outro fator importante foi a
introdução de elevadores cênicos na reforma de reconstrução após o incêndio que destruiu
parte do Grande Teatro em 1997. As máquinas dos elevadores foram instaladas onde
anteriormente ficavam localizadas as oficinas de produção.

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Dessa forma, a partir da criação da superprodução ‘Aída’ em 2001, foi necessário o aluguel
de galpões fora das instalações do Palácio das Artes. Em 2003, foi alugado o primeiro
galpão em Marzagão, que passou a abrigar o que foi recuperado dos outros galpões, além
do cenário da ópera ‘O Barbeiro de Sevilha’. Em 2004, foi então criado o CTP, quando mais
dois outros galpões foram alugados para acolher o setor de figurinos e o setor de cenários,
designando, assim, um espaço para produção, guarda e preservação de cenários e
figurinos, além de atividades de capacitação.

METODOLOGIA DE MAPEAMENTO DO PROCESSO DE PRESERVAÇÃO

Para construção do mapeamento, foram realizadas duas entrevistas e uma visita técnica ao
Centro Técnico de Produção (CTP). As entrevistas foram efetuadas no mês de abril de 2014
com um membro da Diretoria Artística da Fundação Clóvis Salgado e com a Auxiliar de
Produção do CTP.

Um modelo do processo foi elaborado conforme o método de Gerenciamento de Processos


de Negócio, ou Business Process Management (BPM), utilizando-se como base o Business
Process Management Common Body of Knowledge (BPM CBOK), um guia publicado pela
Associação Internacional dos Profissionais de Gerenciamento de Processos de Negócio
(ABPMP) que apresenta as melhores práticas para identificação, desenho, execução,
documentação, medição, monitoramento e controle de processos de negócio de uma
organização.

Para melhor entendimento da metodologia utilizada, alguns esclarecimentos quanto às


definições de processos de negócio, Gerenciamento de Processos de Negócio e
Modelagem de Processos de Negócio são necessários.

Processos de negócio, de forma simplificada, são atividades executadas de forma


sequencial por humanos e/ou por máquinas que servem um mesmo propósito, ou seja, que
buscam alcançar um objetivo comum. Uma definição mais completa pode ser encontrada no
BPM CBOK:

“Processo é uma agregação de atividades e comportamentos executados por


humanos ou máquinas para alcançar um ou mais resultados. Processos são
compostos por atividades inter-relacionadas que solucionam uma questão
específica. Essas atividades são governadas por regras de negócio e vistas no
contexto de relacionamento com outras atividades para fornecer uma visão de
sequência e fluxo” (ABPMP BRAZIL, 2013, p.35)

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Gerenciamento de Processos de Negócio, ou BPM, é uma metodologia para identificação,
desenho, monitoramento e controle desses processos de negócio visando o alcance e
melhoria de resultados de uma organização. Aplicar o BPM em uma organização
proporciona processos internos mais eficientes, mais eficazes e mais ágeis, e que, por fim,
oferecem maior retorno a todas as partes interessadas. (ABPMP BRAZIL, 2013, p.19)

“Gerenciamento de Processos de Negócio (Business Process Management - BPM)


é uma disciplina gerencial que integra estratégias e objetivos de uma organização
com expectativas e necessidades de cliente, por meio do foco em processos ponta
a ponta. BPM engloba estratégias, objetivos, cultura, estruturas organizacionais,
papeis, políticas, métodos e tecnologias para analisar, desenhar, implementar,
gerenciar desempenho, transformar e estabelecer a governança de processos”
(ABPMP BRAZIL, 2013, p.40)

A modelagem de processos de negócio, por sua vez, é uma área de conhecimento do BPM
que inclui ferramentas e atividades que auxiliam na construção de modelos dos processos
existentes em uma organização. De acordo com o CBOK, a modelagem “é um conjunto de
atividades envolvidas na criação de representações” e, complementarmente, “os modelos
podem ser matemáticos, gráficos, físicos ou narrativos ou alguma combinação desses
tipos”. (ABPMP BRAZIL, 2013, p.72).

Ao desenhar modelos, uma organização pode melhorar o entendimento dos seus processos
de negócio e aprimorar a comunicação entre os envolvidos no processo. Além disso, o
mapeamento pode ser usado como ferramenta para treinamento de pessoas, para
identificação de melhorias ou para o redesenho e transformação desse processo. No caso
deste estudo, para a modelagem do processo de conservação do figurino foi adotado um
fluxograma - modelo amplamente utilizado que “inclui um conjunto simples e limitado de
símbolos não padronizados; facilita o entendimento rápido do fluxo de um processo”
(ABPMP BRAZIL, 2013, p.79).

Em relação às questões de conservação têxtil, foi utilizado um manual desenvolvido a partir


do Projeto Traje em Cena, que possibilitou a catalogação de figurinos teatrais do Theatro
Municipal de São Paulo. Coordenado pelo Prof. Dr. Fausto Viana, da Escola de
Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, o Breve Manual de Conservação de
Trajes Teatrais contribuiu, então, para este artigo como referência técnica.

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O PROCESSO DE CONSERVAÇÃO DE FIGURINOS

Em visita técnica ao Centro Técnico de Produção Raul Belém Machado, realizada em 16 de


abril de 2014, foi possível registrar com fotos a estrutura destinada à conservação dos
figurinos, assim como, a partir de uma entrevista com a Auxiliar de Produção do CTP,
esquematizar e detalhar o processo de conservação desde a etapa de inventário das peças
produzidas até a aplicação desse figurino guardado e preservado.

A equipe fixa do CTP era composta, por quatro associados de uma associação sem fins
lucrativos, qualificada como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP),
e que mantinha um contrato de termo de parceria com o Governo do Estado de Minas
Gerais: um Gerente Administrativo, um Agente de Higienização, um Auxiliar de Produção e
um Auxiliar de Serviços Gerais, e, quando da execução de espetáculos, mão de obra
especializada era contratada para produção e execução de cada projeto.

Quanto à infraestrutura espacial, os galpões estavam divididos pelas duas principais áreas
de atuação do Centro: produção e armazenamento do acervo. Na área de produção, eram
construídos os cenários, adereços e figurinos a serem utilizados nos espetáculos. Já na
área adjacente ficava armazenado todo o acervo que retornava ao CTP após o período de
apresentação.

O figurino armazenado era destinado a diferentes aplicações, podendo ser reutilizado para
outros espetáculos, utilizado para pesquisas, exposições, acervos museológicos, além de
disponíveis para locação da comunidade em geral. De acordo com a entrevistada, a locação
do figurino garantia, no momento, parte da renda para manutenção do CTP, o que nos leva
a concordar com Viollet-Le-Duc e Riegl quanto à preservação incentivada pela
funcionalidade do objeto de arte. Isto é, podemos estender o que Viollet-Le-Duc disse
especificamente do edifício como objeto de preservação a qualquer objeto de arte em “O
fato é que a melhor maneira de se preservar um edifício é encontrar um uso para ele”2
(VIOLLET-LE-DUC, 1996 [1854], p.317, tradução nossa) ou, como melhor descreve Alois
Riegl:

“O valor do uso prático corresponde esteticamente, também, a um novo valor; pelo


seu próprio bem, o culto ao valor da idade terá, pelo menos em seu estágio atual de

2 Tradução das autoras a partir do texto original: The fact is that the best of all ways of preserving a building is to
find a use for it.
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desenvolvimento, de tolerar um certo grau de valor do novo em obras modernas e
utilizáveis”3 (RIEGL, 1996 [1928], p.81, tradução nossa)

O processo de preservação e conservação do figurino executado pelo Centro Técnico de


Produção se inicia com o inventário das peças produzidas. Para cada espetáculo é criada
uma Lista Final de Produção, onde são relacionados todos os objetos de figurino com uma
breve descrição, a quantidade, o personagem que utiliza a peça e a cena em que ele a
utiliza. O figurino é, então, transportado ao Palácio das Artes e fica armazenado nas
dependências do teatro até a data da estreia da ópera, espetáculo de teatro ou dança. Em
uma data previamente agendada, fotógrafos profissionais tiram fotos dos artistas vestidos
com os figurinos, antes que eles entrem em cena, para registro.

Após o período de apresentação, todo o cenário é desmontado e o figurino e os adereços


são recolhidos e transportados de volta ao Centro Técnico de Produção, onde todo o
material entregue é conferido tendo como base a Lista Final de Produção. Os trajes e
adereços são, então, analisados pelo Agente de Higienização que os separa por tipo de
higienização e, enfim, são higienizadas de acordo com a classificação previamente
efetuada. O processo se encerra quando as peças são transportadas para os galpões de
armazenamento e, finalmente, cadastradas em um sistema virtual de catalogação.

De forma simplificada, um esquema do processo de preservação e conservação do figurino


pode ser visualizado na figura 1 abaixo:

3 Tradução das autoras a partir do texto original: Practical use value corresponds aesthetically to newness value
as well; for its own sake, the cult of age value will, at least at its present stage of development, have to tolerate a
certain degree of newness value in modern and usable works.

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Figura 1 - Esquema do processo de conservação do figurino do Palácio das Artes, desde o inventário
das peças até a catalogação do acervo no Centro Técnico de Produção.

Detalhando um pouco mais a etapa de arquivamento, são dois os galpões de


armazenamento de figurino: um maior destinado principalmente ao armazenamento de
trajes e um segundo menor destinado ao armazenamento de adereços. O espaço destinado
à guarda do acervo é amplo, arejado e bem cuidado. Porém, por se tratar de uma região
rural e como os galpões não foram projetados para esse fim, morcegos são vistos com
frequência sobrevoando o acervo, sujando o local. Além disso, os galpões não são
climatizados e não há qualquer controle de temperatura e umidade em nenhum deles.

O galpão principal, que pode ser visualizado na figura 2, é classificado por blocos e, cada
bloco, por corredores, ambos identificados por uma letra. Os trajes são separados por
espetáculo – ou repertório – e na entrada de cada corredor é colocada uma placa explicativa
contendo BLOCO – CORREDOR – OBRA – ANO DE PRODUÇÃO – NÚMERO DAS
ARARAS. As araras possuem uma cortina de plástico transparente para proteção e fácil
visualização dos trajes, que por sua vez, são pendurados em cabides. O plástico
transparente que, ao mesmo tempo facilita a identificação dos trajes, possibilita a passagem
de luz que é extremamente danosa aos tecidos. “Deve-se tentar manter as luzes apagadas
o maior tempo possível. A luz causa danos irreversíveis às cores dos tecidos” (VIANA, 2006,
p.30). Quanto à luminosidade, o Manual diz:

“A recomendação é que se não for possível escurecer a sala de forma total, deve-
se guardar próximas à janela as roupas de cor branca, o que fizemos com a
coleção de camisas e roupas de baixo, como saiotes, peças de algodão etc. É
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importante lembrar que o sol ou a luz não vai desgastar o tecido branco, mas se
houver luz incidindo diretamente em cima da roupa, o desgaste da própria fibra do
tecido será inevitável. A luz indireta e leve - e não apenas a luz solar – também
provoca alterações nos tecidos”. (VIANA, 2006, p.31)

Os trajes são suspensos e não tocam o solo para facilitar a ventilação, mas o espaçamento
entre eles é muito pequeno e possibilita que os trajes estraguem com mais facilidade
quando em contato com outro, como pode ser visto na figura 2. “Algumas consequências
e/ou riscos deste contato é a transferência de cor entre as roupas, o possível emaranhado
de um traje no outro, ocasionando a perda de pequenos detalhes ou rasgos, entre outros
incidentes possíveis” (VIANA, 2006, p.23). Como solução, o Manual sugere a separação dos
trajes por uma camada de TNT: “as roupas precisam ser separadas por uma camada de
TNT ao serem guardadas para que não haja transferência de cores entre elas, manchando
os trajes permanentemente” (VIANA, 2006, p.34).

Figura 2 - Galpão de armazenamento de figurino no Centro Técnico de Produção – Marzagão,


Sabará. Fotos: Rachel Neves, 16 de abril de 2014

Algumas peças mais delicadas são penduradas em cabides envoltos por uma almofada, o
que vai de acordo com a instrução de Viana: “Os cabides deveriam ser de madeira ou outro
material mais resistente, forrados com espuma e recobertos de tecido inerte (tipo malha
cirúrgica) para que o ajuste a cada peça fosse feito nele” (VIANA, 2006, p.33). Os adereços
dos personagens específicos dos repertórios são colocados em caixas rotuladas acima da
arara correspondente àquele espetáculo. Na sala secundária são armazenadas as peças de
adereço avulsas, que não fazem parte de um repertório fixo.

A catalogação do figurino é realizada em um sistema, onde cada traje/peça é classificado


quanto à obra, temporada (ano), figurinista, quantidade de peças disponíveis no acervo,
preço de custo de cada peça, nome do personagem, período histórico, nome do intérprete e
as fotos dos artistas utilizando os trajes. Além disso, são alimentados a situação (disponível
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para aluguel e pesquisa, apenas para pesquisa, apenas para exposição, acervo de
repertório, acervo museológico) e o valor do aluguel.

O acervo que foi cadastrado no sistema estava disponível, no momento do levantamento em


2014, online para a comunidade e podia ser acessado através de uma página na internet da
associação parceira da FCS e que estava responsável pela gestão do CTP à época. Vinte e
nove espetáculos foram cadastrados no sistema até 2014, que, conforme mencionado na
entrevista, estava desatualizado e não sendo alimentado com a frequência necessária. A
catalogação estava sendo realizada em planilhas de Excel e, como o sistema exigia uma
quantidade maior de dados para cadastro, as informações dos espetáculos mais recentes
estavam mais incompletas.

A condição de cada peça não era registrada em nenhum lugar, o que demonstrava falta de
controle sobre a situação particular de cada item do acervo. Além dessa falta de controle
que pode mascarar uma possível necessidade de intervenção, os critérios para conservação
desse acervo não estavam escritos e não havia nenhum profissional especializado no
quadro de associados do CTP. A preservação do figurino dependia do julgamento de
pessoas não especializadas na área, ou de seus admiradores como coloca Marguerite
Yourcenar: “De todas as mudanças causadas pelo tempo, nenhuma afeta esculturas mais
do que as mudanças no gosto de seus admiradores”4 (YOURCENAR, 1996 [1983], p.215,
tradução nossa).4

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

O presente trabalho apresenta uma análise do processo de conservação do figurino do


Grande Teatro do Palácio das Artes no ano de 2014, quando foi possível responder à
pergunta: onde e como está preservada a memória de seu patrimônio artístico, mais
especificamente o figurino das peças de teatro e espetáculos de ópera e dança após o
período de apresentação?

A fim de contextualização, o presente estudo discorre brevemente sobre a história da


conservação do patrimônio móvel (figurino e cenário) artístico no Palácio das Artes, onde é
possível ressaltar que a preocupação com a guarda e preservação desse acervo se
intensificou no início do século XXI, com a criação das superproduções, que exigiam um
espaço maior, e posterior criação do Centro Técnico de Produção.

4 Tradução das autoras a partir do texto original: Of all the changes caused by time, none affects statues more
than the shifts of taste in their admirers
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Quanto ao processo de conservação do figurino no CTP, do ponto de vista técnico, foi
identificado que o acervo do figurino do Palácio das Artes passa por um processo bem
estruturado de preservação, tendo disponível um espaço amplo de armazenamento e
grande parte do seu acervo catalogado. Em todas as etapas, porém, foram identificadas
oportunidades de melhoria, indicando que reformas mais estruturais são necessárias para
proteger o figurino da ação do tempo, como a instalação de um controle de temperatura e
umidade, da ação de animais, que podem transitar livremente no local, ou mesmo pequenos
reparos, como a separação dos trajes por uma camada de TNT.

Do ponto de vista de gestão, deve-se ressaltar a importância do mapeamento desse


processo de ponta a ponta, desde o inventário das peças produzidas até a higienização,
arquivamento e catalogação final do acervo, para um melhor entendimento desse processo.
Além disso, o fluxograma elaborado pode contribuir para aprimorar a comunicação entre os
envolvidos no processo e ser utilizado como ferramenta para treinamento de pessoas ou
como ferramenta para reestruturação e inovação do processo.

As melhorias foram levantadas neste trabalho com o intuito de incentivar a implantação de


projetos voltados para o aprimoramento da gestão e da adequação dos instrumentos de
preservação e monitoramento ambiental, além do desenvolvimento de regras e políticas de
conservação e descarte desse rico acervo.

Como sugestão para um trabalho futuro, além da implantação das melhorias listadas
anteriormente, seria interessante estender a aplicação da metodologia de Gerenciamento de
Processos de Negócio para além do mapeamento do processo, incluindo, assim, a medição
de indicadores, o monitoramento e o controle do processo.

Espera-se, também, que o registro da prática de conservação realizada pela Fundação


Clóvis Salgado possibilite, além da permanência desse trabalho na instituição, o provimento
de novas soluções e que forneça exemplos e mostre caminhos para o fortalecimento desse
tipo de iniciativa para os demais teatros brasileiros.

REFERÊNCIAS:

ABPMP BRAZIL Guia para o Gerenciamento de Processos de Negócio – Corpo Comum


de Conhecimento ABPMP BPM CBOK V3.0. Brasil: Association of Business Process
Management Professionals, 2013.

ÁVILA, A. O Teatro em Minas Gerais: Séculos XVIII e XIX. Ouro Preto: Prefeitura
Municipal de Ouro Preto, 1978.

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ÁVILA, R.P. A centralidade do trabalho na formação social da Vila de Marzagão. Revista
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CARSALADE, F.L. Desenho Contextual: Uma abordagem fenomenológico- existencial


ao problema da intervenção e restauro em lugares especiais feitos pelo homem. 2007.
475 f. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) - Faculdade de Arquitetura,
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FERREIRA, C.O. Uma Breve História do Teatro Brasileiro Moderno. Revista Nuestra
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FRONER, Yacy-Ara. Os domínios da memória - um estudo sobre a construção do


pensamento preservacionista nos campi da Museologia, Arqueologia e Ciência da
Conservação. 2001. 461 f. Tese (Doutorado em História) - Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo.

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Acesso em: 18 jun.2017.

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Edição. Brasília: MINC, 2010. Disponível em: < http://www. http://culturadigital.br/>. Acesso
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em: < http://www.unesco.org/>. Acesso em: 19 jun.2017.

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VIOLLET-LE-DUC, E.E. Restoration. In: Historical and Philosophical Issues in the


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the Conservation Cultural Heritage. Los Angeles: GCI, 1996.

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PATRIMÔNIO PULSANTE:
A área central carioca e as manifestações sociais

RAMOS, D.M.S.

1. UFF – Universidade Federal Fluminense. PPGAU – Programa de Pós Graduação em Arquitetura e


Urbanismo
Rua Passo da Pátria nº156 bloco D sala 541
São Domingos-Niterói/RJ
Cep:24210- 240
E-mail: arq.urb.diegoramos@gmail.com / parq.uff@gmail.com

RESUMO
O objetivo desse trabalho é investigar o papel da complexa relação do patrimônio cultural e os
movimentos sociais no processo histórico da área urbana central da cidade do Rio de Janeiro,
enquanto centralidade (SISSON 2008). Busca-se evidenciar os encontros dos movimentos sociais
com as formas urbanas patrimoniais como meio de ressignificação e propagação de seu caráter
simbólico, desde a modernização da capital carioca no início do século XX até os dias atuais.
Qual e por que determinada edificação ou ambiente urbano tem poder simbólico impregnado capaz
de catalisar grandes concentrações sociais. Proteger o patrimônio de possíveis depredações é: vedá-
lo do contato direto com os manifestantes, ou o oposto, aproximá-lo cada vez mais das vivências do
movimento? Questões que reforçam a inquietação de investigar, de forma mais específica, os
motivos da persistência histórica das manifestações sociais no Rio de Janeiro em determinados
pontos específicos da cidade, como determinantes para sua permanência física nesta área central da
cidade que se apresenta dualmente enquanto centro histórico e centro de negócios.
A reocupação do espaço público urbano carioca está em relevância. A região central da cidade tem
sido frequentemente palco de grandes movimentações políticas e culturais de diversas ordens em
diferentes contextos O recente reencontro da população com a área portuária, até então avesso da
cidade, permitido pela reformulação urbana do Boulevard Olímpico, em 2016, suas descobertas e
apropriação enquanto área de lazer e enorme espaço dedicado a sociedade, desencadearão um
novo solo para manifestações sociais, agregando ainda mais valor simbólico a este recente espaço
de encontros da cidade olímpica. Esta análise de formas, dimensões e atividades e estímulos
propostos a este espaço são importantes mecanismos de reapropriação do espaço público, podendo
inclusive transformar a noção do tecido urbano carioca.
O objeto empírico da pesquisa, a área central da cidade do Rio de Janeiro discutido, por meio de sua
estrutura física, e elemento estimulante às manifestações sociais, evidenciadas por recortes de
jornais, fotografias e crônicas, será importante mecanismo de reflexão sobre os atores, as trocas,
formas, processo e o tempo, fatores fundamentais nas discussões da memória urbana.
Entender os impactos causados na cidade por interferências externas, rompendo a consonância
adquirida a longo dos tempos de vivências empíricas, entre população e ambiente construído, são
fundamentais para compreender as formas de habitar e ocupar a cidade.
Tem-se como hipótese o papel dialético exercido pelas manifestações sociais na ressignificação do
patrimônio cultural da área central carioca. Adota-se o sentido de manifestação não só como ativismo
da sociedade em favor de uma causa, visando expressar publicamente ideias, como considera,
principalmente, a influência do espaço nas transformações impostas à e pela sociedade.

Palavras-chave: patrimônio; morfologia urbana; manifestações sociais cariocas

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Patrimônio Pulsante: Atração e dispersão de massas
A atualidade do tema evidencia-se pela série de publicações recentes a respeito
das manifestações sociais. A reunião de autores e artigos que pensam o Brasil e o mundo
no livro "Cidades Rebeldes: Passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil"
(Maricato, 2013), lançado ainda em meio aos rescaldos dos movimentos, em julho, e tinha
como desafio analisar os movimentos ainda em curso. Esta coletânea organizada por
Maricato tem grande relevância por tratar de questões e atos que ainda não tinham
explícitas suas motivações objetivas e subjetivas, mas já ocupavam massivamente as
cidades, analisando um processo ainda em curso. Autores, imprensa, acadêmicos e
políticos encontravam-se atônitos com as chamadas "Marchas de Junho". Esta obra
endossa o desafio de investigar o papel dialético das manifestações sociais em relação ao
patrimônio, no que tange a formulação de análises de um processo ainda não tratado
diretamente e que ainda está em curso.
O recente investimento para cercar as edificações e os bens culturais em atos
sociais, sejam eles políticos ou apropriações culturais (como o carnaval), deflagra certa
culpa aos movimentos pelas depredações à cidade. Existe uma solução prévia adotada
atualmente a cidade, de se vedar os patrimônios dos atos sociais transcorridos nas ruas. O
que em uma análise preliminar apontaria para um futuro esvaziamento simbólico, na
vivência urbana destes atos, enfraquecendo na memória da cidade o contato entre
edificação e manifesto da sociedade, o que poderia sim, culminar na temida depredação
patrimonial.
O entendimento prático do conceito da vitalidade, no sentido de Lynch,
estimulada por políticas públicas de apropriação das áreas urbanas é
fundamental para propiciar a permanência da ocupação por parte da
população, não enquanto evento transitório. Para se transformar um local
em um ambiente vital lendo-o como meio adequado para a vida, é
necessário reunir características que proporcionam melhor condição de
habitar o espaço. (Lynch, 1981)
As formas urbanas devem ser entendidas, não como elementos tangentes ou
cenários dos movimentos, mas como primordiais para atração e realização destas
concentrações sociais. Aprofundar a importância desta vivência: edificação e população,
para construção do conceito de "locus", enquanto espaço impregnado (Rossi, 2001) e para
consolidação da imagem da cidade.
Os movimentos sociais aparecem como ações conjuntas que reivindicam algo
imposto pela sociedade dominante vigente perante o modelo político econômico, sendo o
cenário destes eventos as grandes cidades, ou aparecem como propagação por manifestos
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de valores culturais. No entanto, é preciso entender as questões formais e tipológicas que
envolvem a configuração do espaço urbano construído além de um cenário ou contexto
onde as ações sociais se desenrolam, podendo serem estes os impulsionadores para que
determinados movimentos se intensifiquem ou mesmo surjam em determinadas localidades.
É preciso imprimir o papel ativo que o urbanismo e o patrimônio podem exercer nestas
manifestações urbanas.
A cidade do Rio de Janeiro do início do século XX figurava como instrumento para
inserção internacional, a medida que apresentava-se como Capital Federal, no Brasil, então,
republicano, tendo que adequar suas formas, proporções e posturas sociais aos padrões
estabelecidos no âmbito mundial. Estas imposições na trama urbana e nas relações e
costumes da cidade acarretaram crescentes atos revoltosos na área central em
transformação. A noção de capitalidade projetava à imagem de um país próspero, vista
mundialmente enquanto vitrine do progresso.
A forma de apropriação de espaços é mais do que uma questão meramente
estética, trata-se de um entendimento complexo a cerca da ambiência dos conjuntos
urbanos. Diagnosticar a formação da segunda maior cidade brasileira implica entender as
rupturas, imposições, problemas sociais enquanto bagagens urbanas, mas também, falar
em melhorias e em progresso. É preciso atinar para a dualidade das políticas urbanas
aplicadas a sociedade.

Tensão e cooperação: Formas Urbanas e Manifestações sociais

Importante se reaproximar as edificações, mesmo durante o ápice dos atos sociais,


a população, como meio de reforçar os simbolismos culturais. Ainda que este contato, em
um primeiro instante, possa gerar algum dano ao patrimônio, é preciso entender que esta
prática ocorrerá enquanto os vínculos urbanos não forem reestabelecidos na cidade.
Na realização do estudo sobre a relação estabelecida entre as formas urbanas e as
manifestações sociais e suas apropriações espaciais é imprescindível recorrer às noções de
morfologia urbana, entendendo os conceitos implícitos em patrimônio e detalhando as
questões sociais, objetivando a compreensão formal e assimilação pela sociedade.
Nos últimos anos, o mundo, e principalmente, as grandes cidades tem impactado
uma série crescente de ocupações à cidade, integradas sobretudo por jovens embasados
por ideais políticos democráticos, reforçados talvez pelas redes virtuais de informação.
Existem por trás desta luta os ideais iluministas que pregam a razão, historicamente no
período de 1650 a 1700, uma abordagem conceitual diferenciada entendendo o homem no
centro das transformações, e não mais o divino como centro. A Revolução Francesa de
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1789 tendo os burgueses diretamente influenciados por estas ideias de Liberdade,
Igualdade e Fraternidade caminham favoráveis a tomada e derrubada da Bastilha e do
poder da França através da ocupação territorial. A razão para a aplicação deste exemplo
supremo do movimento social francês está diretamente ligado a indagação da existência de
espaços projetados com a finalidade de agregar ou dispersar massas.
Aponta-se então, para as percepções de Lefebvre não apenas em seus espaços
vividos, concebidos e representados como descrito em "La Production de l'Espace", mas
sobretudo, no que se refere a concepção dos grandes e largos Boulevares de Haussmann
na pós-comuna de Paris, considerados, em seu livro: "O Direito a Cidade", como uma forma
urbana projetada para conter manifestações e movimentos populares, permitindo a
passagem de cavalos e tanques em rápido deslocamento. Esta tipologia urbana muito foi
aplicada no Brasil, principalmente no Rio de Janeiro do início do século XX que inspirava-se
em Paris.
Baseando-se nos estudos já efetuados, Pereira Passos, apresenta um plano para
reurbanização da então capital, a cidade do Rio de Janeiro, inspirado na reforma de Paris1.
Impondo, ao traçado existente, diversas ruas retilíneas. Pretendia-se abrir “bulevares”, como
a Avenida Central, mesmo que para isso fosse necessário extinguir moradias inteiras
populares, situadas no centro da cidade e expulsar antigos moradores para outras regiões
menos estratégicas para o governo da cidade. Propõe-se a construção de um moderno
centro urbano, por um plano de grandes intervenções na cidade do Rio de Janeiro; a
eliminação das habitações coletivas, comuns e vistas como verdadeiras fontes de doenças e
polos de reunião de marginais e revoltas. O perímetro central submetia-se a um rigoroso
plano de saneamento e de descriminalização. Redistribuindo a população e reformulando a
memória urbana.
A razão sanitária para existência dos bulevares nos projetos era aceitável e
caminhava junto com as novas exigências para circulação urbana estabelecida pelas
grandes indústrias. Mas, o historiador de artes Giulio Carlo Argan define a reforma de
Haussmann, como a “intervenção do poder sobre a imagem e funcionalidade urbana.”
Podendo apresentar como, consequente finalidade, a facilidade de repressão a
manifestações populares, devido ao fácil e rápido deslocamento das tropas na via. Outro
fator relevante é que atendia as necessidades da elite francesa, para melhoria do fluxo do
trânsito, o que no Rio de Janeiro, com poucos veículos era desconsiderado, e

1
O Plano de Reformulação de Paris através de uma reforma urbana foi proposto pelo barão Georges
Eugène Haussmann na França, na época do imperador Napoleão III (nas décadas de 1850 e 1860).

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embelezamento, em padrões burgueses europeus, aspiração recorrente junto as elites
republicanas. Fato é que as dimensões avantajadas associada a construções de “mansões”
institucionais e culturais, parecem ter servido bem como forma de atrair as multidões para a
avenida, em diversos eventos, desde sua inauguração, passando pelo Regime Militar e
presenciando a tomada das ruas pela geração das “redes sociais”.
Os boulevares franceses, suas grandes dimensões e alinhamento de edificações,
iluminação e arborização controladas, apareceram como uma forma de controle social aos
atos não reconhecidos pelo poder dominante. A tipologia imposta facilitaria seu controle. No
entanto, a apropriação da população nos espaços explicitou o viés agregador e massificador
dos movimentos, dando visibilidade, projeção e poder de concentração e diálogo.
Reproduzido em várias partes do mundo, foi ganhando formas e sendo acolhidos e
ressignificados.
Assim, podemos dizer que a preparação urbana de infraestrutura da Avenida
Central com sua vasta preocupação sanitária, imposta social e urbanisticamente pelo
princípio do higienismo e por uma valorização de embelezamento dos espaços criou um
dinamismo próprio que favoreceu condições de permanência e conforto no local pela
população elitizada. O projeto lançou mão de alguns dispositivos espaciais como:
infraestrutura básica; acessibilidade à via, construção de edificações institucionais, cultura;
serviços; visibilidade internacional às fachadas; e preocupação com disposições formais do
local, além de um rigoroso código de condutas imposto à cidade, que em outro momento,
relacionar-se-ia a Revolta da Vacina 2(1904). Aos poucos, no entanto, estes boulevares
foram sendo incorporado por toda a população da área central, que reconhecia ali o espaço
para expor seus hábitos e questões. A Elite criou o símbolo e desfilou pelo espaço e esta
ideia foi absorvida pelas massas sociais, apropriando-se também dela, fugindo a destinação
inicial.
As manifestações sociais devem ser entendidas como uma prática sócio-espacial
dos habitantes, principalmente das grandes cidades. As formas dialogando no espaço
urbano com as práticas sociais. O mesmo cenário vibrante de comemorações de títulos,
carnavais e atos artísticos e que acolhe, também, desfiles militares, marchas de resistência,
performances, funerais, e decisões políticas. Na capital Fluminense foi assim desde o início,
há pouco mais de um século. Surgida do desmonte parcial e depois integral de parte da
história da fundação da cidade do Rio de Janeiro, cidade colonial e Morro do Castelo, a
avenida Central, boulevard carioca, estreou já com o controle de costumes populares e

2Kók, 2005, chama atenção para a relação que existe entre o código de condutas e a Revolta da Vacina.

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obrigatoriedade de atos (vacinação da varíola), públicos que se espalharam pela cidade,
que acabou por gerar uma revolta social.
Neste sentido, justifica-se recorrer à história da evolução urbana da cidade
observando a repercussão do lugar na vida da cidade e da cidade no lugar, para entender o
significado da sua representação. Resgatando, assim, a memória de uma cidade, mas,
sobretudo de um povo que atravessou intensas modificações em relativo pouco tempo,
sobressaltando a relevância da composição do eixo linear, de grande escala, como palco
fomentador de uma sociedade que precisava se afirmar, mas sobretudo de um centro
histórico que sofreu uma série de intervenções formais urbanas de grande escala, para se
enquadrar em um padrão tipológico mundial, que neste momento estava em ebulição social
e amplo controle. O Rio de Janeiro, de cidade colonial a capital federal e posteriormente
polo cultural/turístico do país, teve que aprender a absorver e responder bem as grandes e
seguidas intervenções urbanas e sociais feitas na cidade, visando refletir sinais de
progresso do país.
A ambiência das grandes cidades entendida através da sucessão de tipologias na
evolução histórica de seus centros representa não apenas enquanto uma imagem do
passado, mas sobretudo a associação de lugares e experiências. A vitalidade implícita,
muitas vezes, no tecido que relaciona os elementos arquitetônicos que a propiciaram.
Para tratar de morfologia, me referencio inicialmente a Meneses,1996, remetendo a
três questões: cidade, morfologia (urbana) e imagem (de cidade). O autor ao falar sobre este
conceito afirma que não se pode considerar a morfologia como se fosse realidade
autônoma, que encontrasse em si mesma sua própria natureza e atributos. Assim, quer se
trate de padrões gerais de organização do espaço, quer de elementos pontuais que o
mobilizam, é preciso ir além do puro nível empírico, visual. (Meneses, 1996, p.148)
A morfologia urbana pode ser entendida como o estudo das formas urbanas,
associadas ao seu conteúdo e processos formadores (Pereira, 2007). Na mesma
perspectiva, Assen de Oliveira (1992) registra que a verificação da morfologia permite a
apreensão da estrutura formal, das permanências e alterações, identifica os tipos de
mudanças e delimita os processos e relações na localidade. A morfologia urbana é
condicionada e, ao mesmo tempo condiciona as formas de desenvolvimento espacial.
Considerados como constantes por Lamas (2000), é através do modo como se estruturam e
se organizam os elementos morfológicos que se estabelece uma comunicação estética por
sua arquitetura. O mesmo autor ainda diz que os elementos morfológicos são “aqueles que
constituem as unidades ou partes físicas, que, associadas e estruturadas constituem a
forma” (Lamas, 2000, p.46).

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Consciente de que a sociedade urbana era o caminho para a humanidade, o crítico
ativo da sociedade capitalista, Henri Lefebvre publicou enquanto manifesto, em Paris (1968),
o livro "O direito à cidade". A cidade vista como forma superior do direito. “A individualização
na sociedade” e a liberdade, vistos como direito do cidadão urbano. “Deve ser garantido o
direito à vida urbana - transformada e renovada”. (Lefebvre, 1968, p. 154-155). O caráter
complexo dos movimentos sociais atuais transborda em diversos debates sobre: as grandes
mídias e as redes sociais, o próprio direito a cidade, os problemas urbanos, a criminalização
das manifestações e seus conteúdos (quem foi às ruas? Por quê?). O estopim das "Marchas
de Junho", o Movimento Passe Livre, São Paulo (MPL-SP), que justamente abre o livro
"Cidades Rebeldes", é interpretado não como um fato novo, mas tendo como base a
histórica luta contra o aumento das passagens, as condições urbanas e o direito de ir e vir,
indo além.
O conceito clássico de cidade, abordado a realidade social, é fonte de muitas
controvérsias. Entendida em polis, palavra oriunda dos gregos antigos, derivam a política e
a polícia (representação, propagação e controle de princípios e direitos). E a urbe e civitas,
para os romanos antigos, enquanto conceito de: urbano, urbanidade, urbanização e
urbanismo (meios de comportamento civilizado). É preciso entender a abrangência dos
conceitos, e da aplicação dos mesmos na sociedade. Sob essa ótica é que se enquadra a
discussão do direito a cidade.
O direito à cidade entendido sob três óticas principais: a gestão democrática da
urbe, o exercício pleno da cidadania e a propriedade enquanto função social, são essas
questões que nos levam a ver a maneira em que os morros, estradas, espaços públicos têm
sido ocupados: desordenadamente. Marcado pela desigualdade social muitos lutam para
garantir a sua inclusão, mesmo que ilegal, na cidade. Esta leitura, fomentou e instigou, ainda
mais, meu interesse no campo do urbanismo antropológico. A cidade vista como meio
central de organização, através de suas políticas, das funções sociais, garantindo o direito
de seus cidadãos a uma cidade, também, funcional, autossustentável. Onde o saneamento
urbano, sua infraestrutura global, o transporte, os serviços públicos, trabalhos, a moradia e
mesmo o lazer estejam marcados, priorizados em suas conformações e prioridades. Visão
definida pelo Estatuto em seu 2º Artigo para a comunidade presente e futuras gerações.
Este seria o real papel da política urbana. Perceber os mecanismos capazes de
correlacionar a interface público x privado: as vias, os espaços públicos e os parcelamentos
e transições, entre outros, são fundamentais. (Panerai, 2006)
O Estado percebido como o lugar do pecado e a sociedade o lugar da virtude,
parece uma simples analogia, distanciada das massas sociais. No entanto, em sua
aplicação prática geram uma descrença nos agentes públicos, ou mesmo, no

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enfraquecimento do sistema de construção pública. “Daí a frase tantas vezes pronunciada,
“todos os políticos são iguais” – leia-se “corruptos”. Esta construção aposta no declínio da
vida pública. A esfera pública se fragilizou e, ao mesmo tempo, ganharam força narrativas
tão simplórias quanto perigosas, como a do locutor que – dedo em riste – aponta
reiteradamente para o agente público que supõe corrompido sem jamais mencionar o
agente privado que o corrompeu.” (Rovati, 2010)
Abafando conflitos e evitando debates, a política acaba taxada como desprezível.
Muitos problemas, não somente urbanos, acabam não sendo enfrentados, fazendo com que
muitos brasileiros sigam sem acesso ao seu “direito base” – a moradia. Estar a margem
social, ilegal para o governo, e ainda por cima, silenciado (para que não sejam percebidos e
removidos). Muitos nunca terão de fato acesso a real “cidade” de direitos – acesso à
educação, assistência médica, segurança, transporte público, lazer. O desafio eminente diz
respeito a criação de uma sociedade equalizada, menos segregada e segregadora; menos
desigual e mesmo que diversa culturalmente, acolhedora e interativa. É preciso lutar na
formação de um consenso. Este é o verdadeiro desafio; lutar por um projeto de cidade
menos agressivo, onde seus cidadãos entendam que espaços e ambiências desejam e lhes
são adequadas e assim, lutem de fato por uma cidade de direitos. E não pelos seus direitos
à cidade. É preciso incorporal a noção de bem coletivo a sociedade para que a mesma
cuide dele, como de sua moradia. A rua não sendo apenas espaço de todos, mas sobretudo
um bem também individualizável. Precisamos buscar a justiça social visando construir
atores coletivos capazes de dialogar com os agentes públicos que interferem nas formas
urbanas; onde munidos de informações possam alimentar o conflito social, enriquecer o
tecido urbano, preservar e manter os bens públicos, qualificando os debates políticos. O
acesso a informação como elemento chave na busca individual pelos direitos coletivos.
Fundamental dialogar arquitetura e o urbanismo em suas frentes tipológicas e
técnicas e projetuais, a outros campos de interesse na cidade – História, Geografia e
Sociologia. Aprofundando sua discussão nos fatos urbanos, e evidenciando a arquitetura
como elemento concreto constituído, como técnica construtiva, ao longo do tempo e do
espaço, Rossi apresenta a cidade, em seu livro: "A Arquitetura da Cidade", como arte ou
artefato exigindo um profundo conhecimento das relações dos homens e reconhecendo os
históricos como meios de, através da Geografia e Sociologia, compreender o que
efetivamente estrutura os fatores urbanos.
“Entendo a arquitetura em sentido positivo, como uma criação inseparável
da vida civil e da sociedade em que se manifesta; ela é por natureza
coletiva. Do mesmo modo que os primeiros homens construíram habitações
e na sua primeira construção tendiam a realizar um ambiente mais favorável
à sua vida, a construir um clima artificial, também construíram de acordo
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com uma intencionalidade estética. Iniciaram a arquitetura ao mesmo tempo
em que os primeiros esboços das cidades; a arquitetura é, assim,
inseparável da formação da civilização e é um fato permanente, universal e
necessário” (Rossi, 2001, págs. 1 e 2).
Rossi fundamenta sua proposta de compreensão de área, aplicando este conceito
diretamente ao urbanismo. Reconhecida como invenção social e/ou como elemento primário
(nos monumentos), quando estudada individualizada pode ser definida como um bairro. E
ao coletivizarmos este processo constitui-se na forma de cidade. Este método é eficiente
para compreensão dos fatos urbanos uma vez que ao entendermos os monumentos como
elementos primários podem evidenciar que as cidades se desenvolvem através de um
núcleo agregador definido pela dinâmica urbana. Estas centralidades tratam-se de algo
elaborado, construído, que perdura e que se apresenta como marca determinante de um
lugar.
No interior de uma estrutura urbana existem elementos que aceleram ou retardam
seu desenvolvimento. Constituída através do tempo a cidade necessita de uma verificação
para garantir sua continuidade espacial. O método de estudo da cidade é a definição de
uma porção da mesma, observando suas esferas políticas, sociais e econômicas.
Aparecendo a residência como fato urbano primordial, significativo e caracterizador da
cidade e de seus comportamentos e hábitos.
Sendo assim, evidenciamos que o processo de desenvolvimento urbano é não
somente caracterizado pelos elementos físicos. A cidade pode ter seu crescimento
acelerado devido a um acontecimento, a qualquer ocorrido capaz de sustentar este
desenvolvimento.
O produto apresentado será o trabalho analítico de uma produção inédita, escrita e
gráfica, associando o caráter objetivo e subjetivo dos movimentos sociais e as edificações
patrimoniais. Agregando a tese, cartografias capazes de recontar a consolidação urbana da
área central mediante essa atuação dialética.

Dialogar autores de formas urbanas, patrimônio cultural, história urbana e questões


sociais é a grande virtude deste trabalho que pretende evidenciar as interrelações
estabelecidas entre estes campos, não setorizando as análises mas buscando paralelos e
coexistências.
A pesquisa revela sua pertinência ao apresentar uma abordagem diferenciada da
evolução histórica da área central da cidade do Rio de Janeiro, focando no papel
desempenhado pelas formas urbanas como elementos articuladores das ações sociais e
manifestações ocorridas na região, e vice-versa, confrontando com os movimentos ocorridos
em grande(s) cidade(s) do mundo.
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Diversos trabalhos acadêmicos e artigos científicos já foram publicados sobre o
assunto voltados, prioritariamente, para o patrimônio construído e a história da formação da
cidade, a partir da expansão territorial e da compreensão política do papel do urbanismo.
Muito se relatou sobre os principais eixos da área central ou focado em regiões de grande
importância patrimonial, ou mesmo das transformações espaciais ocorridas no território para
configuração da cidade atual. Esta pesquisa busca aprofundar-se em um viés ainda pouco
explorado deste tema: a vocação aglomeradora ou dispersora de massas provocada por
certas conformações espaciais e, ou patrimoniais da cidade e suas resultantes. E ir além ao
tratar o papel dialético na memória urbana das manifestações sociais enquanto
ressignificadores do patrimônio tanto reforçando o caráter simbólico quanto propiciando seu
esvaziamento.
Depurando as bases cartográficas existentes do Rio de Janeiro, objetiva-se
desenvolver uma revisão gráfica por meio de mapas que permitam melhor compreender e
explicitar o papel desempenhado pelo arquiteto e urbanista na história das manifestações
sociais da cidade, podendo servir como instrumento de estudo da ambiência urbana e como
critérios de projetos arquitetônicos e urbanos.
O estudo permite evidenciar a leitura das formas urbanas como ato político. A
releitura e construção de um novo mapa, a partir dos documentos cartográficos, históricos
em geral, ganha maior relevância quando articulada a um dos objetivos da pesquisa: criar
um acervo de apropriações urbano-sociais, enquanto mecanismo de vincular experiências
urbanas as formas que a propiciaram ou contextualizaram e reconectar os agentes
envolvidos nos movimentos da cidade. Assim, garantir a ambiência urbana, relacionada ao
passado, mas sem estar estagnada. A pesquisa visa com esta proposta apresentar
possíveis soluções para o desafio de se construir uma cidade contemporânea munida dos
significados e significantes do passado que a determinaram, reestreitando os vínculos e
conectando as edificações e seus limites aos cidadãos que a percebem e reconhecem.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
PATRIMÔNIO, MEMÓRIA E IDENTIDADE: um estudo sobre as
igrejas católicas do Centro de Vitoria/ES

SILVA, DOUGLAS GOMES

1. Instituto Federal do Espírito Santo, Campus Colatina. Coordenadoria de Arquitetura e Urbanismo.


Avenida Arino Gomes Leal, 1700, Santa Margarida, Colatina-ES, 29700-660
arqui_douglas@hotmail.com

RESUMO
Objetiva-se nesse trabalho discorrer sobre as sete igrejas católicas no Centro de Vitória, atual capital
do estado do Espírito Santo, onde as mesmas fazem parte da formação do conjunto de patrimônio
histórico arquitetônico religioso local. Sendo abordado um breve histórico das mesmas desde a
fundação, o uso atual, o papel delas na formação da identidade do povo capixaba, e os agentes que
atuam na conservação da memória do lugar. Na “Cidade alta”, área geograficamente mais elevada
em relação ao nível do mar, local onde estão localizados o palácio do governo, as construções
seculares e as igrejas católicas, objetos de estudo desta pesquisa, sendo elas: a catedral
Metropolitana, a capela de Santa Luzia, o convento de São Francisco, a capela de Nossa Senhora
das Neves, a Igreja de São Gonçalo, o Convento do Carmo e a Igreja do Rosário. As igrejas católicas
do Centro de Vitória são símbolos e marcas de todos os tempos da história capixaba. A mais antiga
data do século XVI, e a mais recente em meados dos anos de 1950 do século passado, onde as
mesmas representam a forte herança da nossa colonização. As construções religiosas do Centro não
exercem somente o papel do aspecto sagrado, mas também exercem o papel de símbolos da
memória, onde a população local identifica nas construções parte da sua história com a da própria
cidade. A busca pela preservação é a busca pela memória social e coletiva do lugar e dos quem a ela
pertence, é a busca pela identidade em um mundo em que a singularidade do lugar perde espaço
para a multipluridade dos novos tempos. No processo de preservação, recuperação e revitalização do
patrimônio, o poder público é o principal ator nas ações de revitalização de centros urbanos, áreas
onde mais se concentram os patrimônios históricos. O “Projeto Visitar”, uma parceria do Instituto Goia
e a Prefeitura de Vitória, através de visitas monitoradas aos patrimônios arquitetônicos e culturais do
Centro, com destaque para as Igrejas Católicas, busca-se mostrar a história da capital e despertar a
curiosidade e a identidade do povo capixaba e a construção de uma memória coletiva. Além das
visitas monitoradas, o Visitar possui uma coleção de livretos, os quais contam a história de cada
espaço onde o projeto atua. Através do poder público, via políticas públicas, como também com a
participação de setores privados e de organizações sem fim lucrativo, entendemos que podem ser
feitos trabalhos visando uma educação patrimonial, a fim de resgatar a memória coletiva da cidade,
ou pelo menos do seu centro histórico, salientando a importância das edificações. Por fim, o foco
dessa pesquisa é descrever sobre essas as Igrejas Católicas do Centro de Vitória e a busca pela
preservação e educação patrimonial mostrando que a conservação dos patrimônios construídos de
uma cidade é muito mais que preservar uma forma arquitetônica, é preservar a história, a memória
coletiva e a identidade de um povo.

PALAVRAS-CHAVES: Patrimônio religioso, preservação, conservação, educação patrimonial


Introdução
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
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Os lugares nos contam histórias, nos levam ao passado e nos fazem pensar que o que
temos hoje é fruto desse passado. As construções são marcas dessa história, dessa
memória do lugar. E essas construções tornam-se a materialização da memória do lugar,
denunciando a passagem do tempo, através dos estilos e materiais.

A busca pela preservação é a busca pela memória social e coletiva do lugar e dos quem a
ele pertence, é a busca pela identidade em um mundo em que a singularidade do lugar
perde espaço para a multipluridade dos novos tempos.

Nas últimas décadas, o patrimônio arquitetônico das cidades vem recebendo grande
atenção. Preservá-los ao longo do tempo pode manter viva a história de um grupo ou
sociedade. Para Rodrigues (2001, p.16), “o patrimônio representa a identidade local e, por
mais diversa que seja a população, a sua criação serve como uma ponte que resume várias
histórias em uma só”.

De acordo com Bogéa (2007), o patrimônio arquitetônico e cultural é o conjunto de bens que
possuem valores históricos, artísticos e científicos que definem, em diferentes escalas, a
identidade de uma comunidade, uma região ou um país e que devem ser preservados como
legado às gerações futuras.

Fonseca (2005) discorre sobre a importância do patrimônio. Além de possuir um valor


histórico, artístico e etnográfico, dentre outros, há também um sentimento de pertencimento
a comunidade ou a uma nação, dependendo do tipo de bem.

Para Scheiner (2004), o patrimônio é um reconhecimento no tempo e espaço de


determinado fio condutor que liga a um lugar, por meio de sinais que são construídos. Esse
fio condutor é a memória e os sinais são bens culturais, mas também os resíduos e
vestígios presentes na cidade e que resistiram, fazendo parte de um imaginário. Percebe-se,
assim, que o patrimônio é importante tanto para uma noção coletiva quanto individual de
pertencimento àquele lugar e àquela cultura.

A identidade está diretamente ligada a um grupo social de um determinado lugar, isto quer
dizer que a formação da identidade de uma sociedade está atrelada à questão da
territorialidade no lugar, e esta identidade se materializa na forma de monumentos, ou seja,
é a materialização do que é à base da sociedade atual, portanto, é um espelho do que foi a
sociedade no princípio. Cordeiro (2011, p. 34) define a identidade como “patrimônio herdado
do passado [...] e como organizador social”.

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Ainda sobre identidade, Alves (2012, p.235) reflete: “identidade é a fonte de significado e
experiência de um povo. As experiências e vivências do sujeito [...] a identidade surge não
tanto da plenitude da identidade que já está dentro de nós como indivíduos”.

Para Saquet e Briskievicz (2009, p.8) a identidade é construída pelas múltiplas relações –
territorialidades que estabelecemos todos os dias e isso envolve, necessariamente, as obras
materiais e imateriais que produzimos, como os templos. A identidade se concretiza por
meio de símbolos e são com esses símbolos que a prática se consolida no espaço e nas
relações sociais de determinado grupo. As igrejas do centro da capital capixaba são
símbolos do domínio da Igreja da Católica no começo da colonização do Estado do Espírito
Santo, são os primeiros símbolos da identidade capixaba, ou seja, toda identidade é
construída socialmente e constantemente modificada pelos atores que a formam.

Até o final do século passado o Centro da Cidade era uma das principais pólos de toda
dinâmica do Estado do Espírito Santo, sendo centro comercial, econômico, cultural e
político. O processo de desenvolvimento no geral alterou a dinâmica da cidade, modificando
entre tantas coisas, a identidade de Vitória.

Projeto Visitar
Revitalizar o Centro, não significa renovar e pintar prédios e fachadas, significa revigorar
forças, pessoas, suas relações com o espaço em que vivem, com as instituições em sua
volta e com elas mesmas. (ANJOS e LIMA, 2008).

O Projeto “Revitalizar o Centro” faz parte da gestão 1997–2000 do poder municipal de


Vitória, tinha como objetivos principais minimizar o esvaziamento e a desvalorização da
região, criando condições para a permanência da população, e evidenciar a identidade local,
fortalecendo a ligação e a participação dos moradores com os patrimônios culturais e
arquitetônicos. De acordo com a revisão do Plano Estratégico da Cidade 1996 – 2010, o
projeto teria, como objetivo principal repensar a vocação do centro de Vitória, ou seja, quais
as possibilidades e as potencialidades do Centro. Entre uma das vocações constatadas pelo
Plano Estratégico, consta o patrimônio histórico e arquitetônico como grande potencialidade
da região.

A revitalização do Centro significa recuperar a sua história e humanizá-lo retomando a sua


função e formas originais, incentivando, ao mesmo tempo, sua modernização. Criou-se
então a proposta de um corredor cultural, com o intuito de criar uma identidade cultural e
potencialidade turísticas, dando vida a esta parte significativa da cidade – Do Saldanha da
Gama, passando pela Casa Porto, Escola de Música, Escola de Teatro e Dança Fafi, Museu

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de Artes Plásticas, Teatro Carlos Gomes, Cine Teatro Glória, igrejas e conjunto
arquitetônico da Cidade Alta. (REVISÃO DO PLANO ESTRATÉGICO, 2002).

No Plano de Desenvolvimento Sustentável do Turismo da Cidade de Vitória 2000-2008, o


Projeto Revitalizar o Centro, tem com objetivo revitalização e valorização do patrimônio
histórico e cultural, além de fazer um trabalho de conscientização da população através de
folhetos e cartilhas, recuperar o patrimônio, promover visitação a imóveis de interesse
turístico, entre outros. É neste momento que o projetos como o Visitar começam a ser
pensados como forma de viabilizar esse interesse turístico.

Paralelamente ao Projeto Revitalizar o Centro surge o “Morar no Centro” que visa dar uma
função social aos imóveis abandonados, além de, ajudar no “repovamento” do Centro e de
diminuir o déficit populacional da cidade de Vitória. De acordo com dados da prefeitura, os
imóveis utilizados para o “Morar no Centro” passarão/passaram por reformas e reabilitação,
gerando assim, uma melhor qualidade de vida e moradia para os atuais e futuros
moradores. Em números, o projeto contará com 134 unidades habitacionais, reduzindo o
déficit habitacional da cidade em 1,8% , conforme dados disponíveis no site da prefeitura de
Vitória.

O Projeto Visitar começou a ser implantado em 2006 pela Prefeitura Municipal de Vitória
(PMV). Nas palavras do coordenador do projeto, Luciano Andrade “após longos estudos de
várias secretárias que apontavam a necessidade de requalificação do Centro Histórico”. Em
2007 surge a parceria com Instituto Goia, que permanece até atualmente. Ainda para
Luciano, “os avanços progressistas atropelaram o que para nós é muito importante hoje, que
são os patrimônios”, de fato, a modernização da capital, a transferência, de boa parte das
atividades que ali eram realizadas, para as novas regiões da cidade, resultaram no
esquecimento desses patrimônios históricos. Então, o Visitar, identifica esse patrimônio
cultural-religioso, que não estava devidamente aproveitado, e utiliza os mesmos como
eduadores patrimoniais. Então, o Visitar passa a trabalhar esses objetos, visando o turismo
cultural.

O projeto conta com monitores em nas sete igrejas católicas do centro e no Theatro Carlos
Gomes, monitores capacitados no próprio instituto que dão toda a assistência ao turista e ao
morador do Centro, que vezes não conhece a própria história. Fazem o resgate da história,
levam ao visitante – local ou turista -, a ideia de formação da identidade Capixaba através
dos monumentos. Apresentando-lhes a própria história, além das visitas monitoradas, o
Visitar possui uma coleção de livretos, os quais contam a história de cada espaço onde o
projeto atua.

As Igrejas da Cidade Alta


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O passado histórico, a origem dos objetos, dos lugares, das construções que guardam parte
da memória da cidade é primordial para se entender o presente. A história das igrejas, tanto
como construções ou como a trajetória dos usos e dos papéis que as mesmas representam
é primordial para saber os rumos e as influências que ainda hoje permeiam o imaginário e a
vivência da população capixaba. Além disso, elas representam marcas que delineiam o
processo de transformação do espaço urbano.

A história das igrejas da Cidade Alta se confunde com a história do início da Vila, atual,
cidade de Vitória, onde a pequena vila torna-se cidade em volta das construções sagradas.
Com a resistência à homogeneização que a globalização impõe, a revitalização tem
encontrado no conceito de “lugares de memória” um refúgio, como ponto de apoio para o
convencimento da população acerca da revitalização. A respeito disso, Paes (2009, p.165)
caracteriza como: Os lugares de memória são marcados por dimensões espaciais,
elaborados por imagens e tramas narrativas (produção de monumentos e marcos
paisagístico); por uma dimensão epistemológica (o material e o imaterial) e por uma
dimensão política – as identidades eleitas no planejamento político.

A cidade alta é um lugar de memória. A atmosfera que é criada com a presença das
edificações de um tempo pretérito junto com as igrejas evidencia isso, os símbolos, os
significados, as características singulares que não encontramos em nenhum outro ponto da
Cidade de Vitória. É único, é propriamente o lugar. Lugar que para Carlos (2007, p.14),
”guarda em si e não fora dele o seu significado e as dimensões do movimento da vida,
possível de ser apreendido pela memória, através dos sentidos e do corpo”. Isso nos faz
pensar que o patrimônio de um dado lugar possui valor único, uma identidade que
caracteriza aquele lugar, pois lugar e identidade são indissociáveis. (CARLOS, 2007). Para
Abreu (1998), afirma que a memória urbana é um importante agente da constituição da
identidade de um lugar.

No Centro da cidade estão localizadas as construções religiosas mais relevantes. Hoje, a


área denominada popularmente como “Cidade Alta, conta com 7 (sete) destas construções
entre conventos, igrejas e capelas (Ilustração 01).

Ilustração 01 – Igrejas Católicas localizadas na Cidade Alta do Centro de Vitória/ES: (A) Convento de
Nossa Senhora do Monte Carmo; (B) Convento de São Francisco; (C) Catedral Metropolitana de Vitória;
(D) Igreja de São Gonçalo Garcia; (E) Capela de Nossa Senhora das Neves; (F) Igreja de Nossa Senhora
do Rosário dos Homens Pretos; (G) Capela de Santa Luzia.

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(A) (B)

(C) (D) (E)

(F) (G)
Fonte: Almeida (2009) adaptado pelo autor, 2017.

Convento de Nossa Senhora do Monte Carmo

O Complexo do convento de Nossa Senhora do Carmo, ou o convento das carmelitas, era


compreende, em origem, residência, igreja conventual e capela da Ordem Terceira, em
configuração praticamente inalterada até o início do século XX. Tem sua data de fundação
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no Século XVII e foi construído pela Ordem das Carmelitas Calçados. A Ordem chegou ao
Estado do Espírito Santo em meados do ano de 1682, construíram o convento, a igreja
central e uma capela, sendo administrados pelo Frei Agostinho de Jesus, considerado por
vários historiadores como seu primeiro prior (BONICENHA, 2004).

De acordo com Almeida (2009) entre os anos de 1910 e 1913 ocorreram modificações na
edificação, sendo o segundo projeto de autoria de André Carloni, onde acrecentou-se um
terceiro pavimento à residência e uma varanda em torno de seu pátio interno, e é executada
uma profunda remodelação estilística. Concentrada no frontispício, essa se expande para
um módulo de transição entre a igreja e a residência. Aí, em substituição às linhas barrocas
precedentes, de ambígua inspiração histórica, o novo traço possui forte vinculação com as
referências românticas das construções medievais. Transitando entre o românico e o gótico,
a linguagem está unificada pela adoção do arco ogival para o arremate dos vãos e
esquadrias de porta e janela, e do frontispício, na forma de delicado rendilhado.

Na fachada principal, elemento compreendido pelo tombamento estadual, a porta de acesso


à igreja, guarnecida por arquitrave ornada por pequenas torres reforça o aspecto medieval
do conjunto. Ainda de direta vinculação com o caráter do edifício, pequenas capelas
encimadas por cruzeiros e pináculos de perfil denteado percorrem o perfil triangular do
frontão e a torre sineira. Nota-se ainda na edificação um ar medieval na composição,
estando presente na rusticação dos cunhais da fachada por meio de reboco imitando pedras
naturais. Um elemento linguisticamente dissonante, a escadaria de acesso, também
remodelada pela intervenção do início do século XX, possui nítidas conexões com
composição de inspiração barroca de origem italiana, presente em alinhamento curvilíneo e
fechamento lateral em balaustrada (ALMEIDA, 2009).

Atualmente há realização de missas na Igreja, e está aberta a visitação. Nos fundos da


igreja existe em funcionamento um seminário, o seminário Milícias de Cristo, e o espaço do
Colégio, abriga hoje, uma escola municipal de ensino fundamental. O convento do Carmo
passou por várias modificações ao longo de sua história. Sendo a fachada da Igreja, o único
item tombado pelo IPHAN.

Convento de São Francisco

Os primeiros frades franciscanos chegaram a Vitória no ano de 1589, vindos através do


convite do donatário Vasco Fernandes Coutinho Filho, recebidos pela donatária Luísa
Grimaldi, pois seu então marido havia falecido. Luísa sabia do desejo do marido de ter em
terras capixabas um monastério franciscano, então doou aos frades um terreno para que o

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desejo do donatário fosse sanado. No ano de 1591, começaram as obras de construção do
convento franciscano, sendo interrompidas e reiniciada 3 (três) anos mais tarde, ficando
pronto no ano de 1597, sendo realizada a primeira missa na igreja conventual, que foi
dedicada a São Francisco, pelo Frei Antônio das Chagas. Segundo (BONICENHA, 2004) o
convento possuía além da igreja, o claustro com dependências necessárias ao monastério e
a Capela da Venerável Ordem Terceira da Penitência. A igreja conventual possuía três
altares ornados de talha executados entre 1617 e 1620. O altar- mor com São Francisco,
padroeiro, ladeado por Santo Antônio e São Benedito, e dois altares laterais com as
imagens de Nossa da Conceição e São Boaventura.

Atualmente, do antigo convento de São Francisco, pouco resta, o frontispício, que é


tombado como Patrimônio Histórico e Artístico Estadual, foi restaurado em convênio entre a
cúria metropolitana, o estado e com a empresa Vale, as paredes da Capela Conventual e
alguns paredões ainda resistem aos 416 anos de história. A fachada do convento de São
Francisco é grandiosa e imponente. Hoje, com as funções apenas administrativas da Igreja
no Estado do Espírito Santo, sendo a Cúria Metropolitana, sem a realização de missas ou
de qualquer outro evento aberto à comunidade.

A Catedral Metropolitana de Vitória

A construção imponente da Catedral Metropolitana de Vitória, localiza-se na área mais


central da Cidade Alta. No lugar do grande templo, existiu outra igreja, a Igreja Matriz de
Nossa Senhora da Vitória, não tão grande, e que, por não suportar o crescente número de
fieis, a falta de conservação, e o desejo da elite local de modernizar a Capital, foi demolida
para dar lugar, a que hoje, conhecemos como Catedral Metropolitana de Vitória.

Segundo Almeida (2009) o primeiro projeto, executado da Catedral foirealizado em 1913 por
Paulo Motta, seguindo linhas neogóticas, com fachada composta por torre única, em edifício
de escala modesta. Porém com o início do primeiro conflito mundial, a obra da catedral é
paralisada em 1918, sua retomada se deu apenas em 1930, com um novo projeto,
executado pelo influente construtor André Carloni , o projeto passou a ter nas linhas da
arquitetura gótica, inspirada na Catedral de Colônia, na Alemanha. Sua dimensão é
ampliada e sua fachada alterada e marcada pela projeção de duas torres. Internamente
inaugurada em 1933, a Catedral de Vitória estará definitivamente concluída apenas em
1971, após contínuas paralisações.

A igreja tem sua planta na configuração de cruz latina e referências ao estilo gótico. Possui
nave ampla com cinco acessos, um frontal e quatro laterais. A decoração interna é do
escultor Waldemir Bogfanoff. Os Vitrais foram desenhados pelo artista italiano César
Alexandre Formanti (RODRIGUES, 2010).
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A fachada frontal é uma composição tripartite dominada pela disposição de suas duas
torres, e pela disposição centralizada da entrada principal, uma porta de verga reta e um
vitral, arrematados por modenaturas ogivais. A centralidade desse corpo é reforçada por seu
coroamento em frontão triangular culminado pela imagem de Nossa Senhora Auxiliadora
com o Menino Jesus, e pela disposição bilateral das duas torres onde vãos ogivais
apresentam terminações piramidais ricamente trabalhadas. Essa decoração se repete nas
demais fachadas do edifício. Internamente, o edifício se constitui pela sequência de coro,
nave, transepto, capela-mor, sacristia, e cripta, em construção erguida modernamente com
a utilização da estrutura em concreto armado, empregado à maneira das pedras das
catedrais góticas, e paredes preenchidas por tijolos maciços e vitrais (ALMEIDA, 2009).

Atualmente, a Catedral Metropolitana de Vitória atua com função original: o sagrado. Há a


celebração de missas diariamente, realizadas pelo Arcebispo de Vitória e pelos Bispos
auxiliares. Dentre as sete igrejas do Centro Histórico da capital, a Catedral Metropolitana é
mais frequentava.

Igreja de São Gonçalo Garcia

Construída pelas irmandades de Nossa Senhora do Amparo e Boa Morte e Assunção no


ano de 1715 dedicada a São Gonçalo Garcia, a igreja foi implantada em “chão de terra”, a
podendo ser acessada por diferentes caminhos. Dotada de três portas de entrada, sendo a
do meio, mais alta, situação rara nas igrejas do Espírito Santo anteriores ao século XIX.
Delineada por cunhais de discreto relevo, a fachada frontal apresenta três janelas sobre o
coro, sobrepostas por cornija de base do movimentado frontão. Um conjunto centralizado a
partir de óculo redondo, mas com três lóbulos internos, de perfil reforçado por cordões
salientes de onde se elevam dois pináculos e um crucifixo, o frontão é o principal ornamento
da fachada frontal, e o mais claro indício de uma barroquizante atualização sobriedade,
próprias da arquitetura religiosa colonial, se apresentam na dominante opacidade das
alvenarias, apenas pontualmente interrompida pelas portas e janelas, e no perfil curvo de
suas vergas (ALMEIDA, 2009).

De acordo com Almeida (2009) as janelas são maiores e fechadas com basculante de ferro
e vidro na nave, e menores e fechadas com folhas em tabuado de madeira nas demais
fachadas. No coro, uma em cada fachada apresenta sinos. Entre as portas, a de acesso
lateral à nave está ornada com uma moldura argamassada e um pequeno nicho,
posicionados sobre a verga. Internamente constituída por nave, capela-mor, sacristia,
corredores laterais e tribunas, espaços diretamente ligados à experiência da fé, a igreja de
São Gonçalo tem na ampla sala de reuniões o mais evidente vestígio do papel
desempenhado pela irmandade na sua consecução.
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Posicionada sobre a sacristia, e generosamente dotada de seis janelas, a sala de reuniões
se vincula diretamente às tribunas, situação propícia à participação privilegiada de seus
componentes nas missas e rituais. Há ainda, um porão, sob a sacristia, com acessos interno
e externo. Contudo, seus elementos de maior destaque são, seguramente, o retábulo do
altar-mor, acréscimo do século XIX, e a imaginária, especialmente Santo Inácio de Loiola e
São Francisco Xavier, antes posicionados em destaque em nichos da parede da nave,
lateralmente ao arco cruzeiro, e agora colocados no retábulo do altar mor. Antecedido por
guarda-corpo em balaústre de madeira, possivelmente pertencente à demolida matriz de
Nossa Senhora da Vitória, o arco cruzeiro está ornado de maneira a valorizar suas clássicas
proporções. Construtivamente, São Gonçalo é obra sobre fundação de pedra, material
também adotado em suas paredes. a cobertura em telha-francesa só em sua configuração e
na cor lembra as de tipo capacanal (ALMEIDA, 2009).

Durante o mês de agosto de todos os anos, sai pelas ruas do Centro de Vitória a procissão,
levando a imagem de Nossa Senhora da Boa Morte, que é carregada por membros da
Marinha ou do Exército brasileiro segue em direção a Catedral Metropolitana. Após 300
anos de história, a igreja de São Gonçalo continua a realizar missas, casamentos,
batizados, inclusive, uma lenda local conta que quem na igreja de São Gonçalo se casa,
nunca mais separa. Por esse motivo, a igreja é muito procurada para a realização de
casamentos, tendo uma lista de espera que chega há mais de dois anos. Além disso, a
igreja possui uma acústica muito boa, o que faz com que seja muito procurada para
apresentações de corais. A igreja de São Gonçalo também é a única na Grande Vitória a
realizar a Missa Tridentina ou Forma Extraordinária do Rito Romano, que é celebrada em
Latim (SANTOS, 2014).

Capela de Nossa Senhora das Neves

A capela é edificada na primeira metade do século XIX, no interior do cemitério do Convento


de São Francisco, e de 1860 a 1905 a capela passa funcionar como capela mortuária para
velórios (RODRIGUES, 2010). Após a transferência do cemitério, a capela passou a abrigar
famílias “sem – teto” até meados de 1940. Já da década seguinte até o ano 1970, a capela
de Nossa Senhora das Neves, foi palco de um pequeno museu da Comissão Espírito –
Santense de Folclore. Já no final da década de 1990 a capela fica em estado de abandono.

O desenho arquitetônico da capela tem a planta em cruz grega, em espaço composto por
nave, capela-mor e duas sacristias, o edifício tem sua configuração dominada pela
opacidade de espessas paredes executadas em alvenaria portante de pedra, onde
pequenas janelas estão dispostas de forma equilibrada e simetria dominante. De dimensões
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e escala modestas, o conjunto se destaca em seu entorno pela unidade de sua composição.
Singela e modesta, a capela é uma sequência de brancas superfícies recortadas por janelas
vedadas por esquadrias de madeira em veneziana e vidro, das quais se destaca a fachada
frontal. Em alçado configurado pela disposição de austero, mas imponente, frontão de
volutas singelas, ladeado por dois pináculos, a entrada da pequena capela, uma porta
constituída por folhas secas e bandeira em madeira e vidro, está delineada por cantaria em
arco pleno, por sua vez contornado por moldura de argamassa em acabamento liso. O
telhado, um conjunto de múltiplos planos cobertos com telha de barro capa-canal, tem por
acabamento uma cimalha executada em argamassa que contorna o perímetro superior das
paredes (ALMEIDA, 2009). A imagem era de Nossa Senhora das Neves, pequena, de roca,
teria sido levada para igreja de São Gonçalo, em Vitória, onde permanece.

Hoje, a Capela de Nossa Senhora das Neves, encontra-se aberta para visitação e para
missas aos funcionários da Cúria, missa essa que ocorre apenas em uma segunda-feira de
cada mês. Durante obras de reparo do IPHAN, foram encontrados ossos humanos em uma
das paredes, porém não há identificação de quem poderiam ser esses ossos. Era bastante
comum no século XIX, que pessoas importantes da sociedade fossem enterradas dentro
das Igrejas, mas neste caso, não foram encontrados nenhum tipo de registro do
sepultamento. As obras foram paralisadas e ossos permanecem na parede da capela em
exposição permanente (ALMEIDA, 2009).

Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos

No ano de 1765 ficou pronta a construção da igreja de Nossa Senhora do Rosário dos
Pretos. Em terreno doado à Irmandade de Nossa Senhora dosofrimento da escravidão.
(BONICENHA, 2004).

Ao final, a igreja apresenta arquitetura de rígida regularidade apenas interrompida nas linhas
da escada frontal e da laje do piso do coro, onde a inspiração barroca se revela no traço
côncavo-convexo de seus perfis. Assim, a solidez de seus espessos muros pétreos,
recobertos por alva caiação sobre rugoso acabamento, e os extensos planos avermelhados
da cobertura são as expressões dominantes de uma colonial configuração; e é na
movimentada ornamentação do frontispício e, internamente, nos delicados relevos
executados por hábeis mãos, onde se revela uma franca inspiração barroca. Anunciada no
frontão, no caprichoso desenho das volutas e no delicado relevo do tímpano, onde elíptico
óculo foi encimado por uma cruz, a inspiração barroca se acentua em uma proeminente

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cimalha sobre a qual irrompem dois pináculos marcando a prumada de decorados cunhais.
Esses de maneira singular, relativamente às edificações religiosas de Vitória, ao formarem
chanfros, reforçam o inquieto desenho da fachada do Rosário. Entre eles, uma porta de
entrada e três janelas posicionadas no coro complementam a composição (ALMEIDA,
2009).

A irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos já não existe mais desde o
início do século passado e parte dos seus membros agora pertencem à irmandade São
Benedito dos Pretos. No final do século XX, o IPHAN tomba a igreja, passando a ser
patrimônio histórico nacional. Na mesma época, é criado o museu da Irmandade de São
Benedito dos Pretos, museu esse que se encontra desativado por falta de manutenção e
estrutura. No terreno da igreja havia também compra/venda de alforria que, hoje se encontra
abandonada. Hoje, a igreja não exerce mais a função original, ficando apenas aberta para
visitação e com a realização de suas procissões no mês de dezembro de todos os anos em
referência a São Benedito (SANTOS, 2014).

A igreja não possui acessibilidade pela sua entrada principal, pois há uma enorme escadaria
fazendo a ligação da rua com a Igreja, sendo possível apenas dando uma enorme volta,
mesmo para quem não tem problemas com acessibilidade, a chegada até a igreja é
complicada, pois os degraus não são de tamanho uniforme, e como são de pedra, cada um
tem uma altura, dificultando o andar, um problema que poderia ser resolvido caso não
houvesse o impasse entre os membros da confraria responsável pela igreja.

Capela de Santa Luzia.

No ano de 1537, o que hoje é a capital do Estado de Espírito Santo, não passava de uma
fazenda, chamada de Ilha de Santo Antônio. O então sesmeiro Duarte Lemos, que recebeu
de Vasco Fernandes Coutinho a posse da fazenda, ordenou que fosse edificada em sua
fazenda uma Capela para que fossem realizados os ofícios religiosos, foi assim que surgiu a
Capela de devoção a Santa Luzia.

Construída sobre um afloramento de pedra, a pequena edificação emerge em delicado


equilíbrio resultante da adaptação às irregularidades da sua base granítica, condição
determinante de uma particular presença no conjunto urbano da rua José Marcelino. Como
nas mais primitivas construções religiosas, Santa Luzia é uma pequena “caixa de pedra”,
destacada pela branca continuidade dos muros da alvenaria de pedra, coberta por telhas
capa-canal de barro. Seguindo a forma de sua base, ela foi posicionada com o altar-mor
orientado para o lado do nascente, situação repetida na totalidade das igrejas situadas nos
limites do pequeno platô escolhido para instalar a vila de Vitória. Na fachada, a atualização
se faz evidente no movimentado perfil de dois delicados frontões, um sobre a portada e
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outro sobre a sineira. Apoiados em cimalhas modeladas com diferentes perfis, os dois
frontões estão igualmente ladeados por coruchéus. O maior correspondente à entrada, é o
mais ornado, recebendo relevos em forma de coroa e ramos, simetricamente dispostos
sobre a empena, e um delicado crucifixo no vértice superior. O menor está situado sobre a
sineira. Essa, justaposta e com prumada seguindo o paramento da fachada, está delineada
por falsos cunhais ressaltados por discreta rusticação (ALMEIDA, 2009).

A capela de Santa Luzia é a única edificação com características da arquitetura colonial


brasileira, sendo assim, a mais antiga edificação do Centro de Vitória (RODRIGUES, 2010).

As atividades religiosas aconteceram até o ano de 1928 na capela, após esse período a
capela fica em total abandono e descaso, o que levou a deterioração da estrutura. No ano
de 1937 o imóvel é comprado pela União, 6 anos mais tarde é restaurada por André Carloni,
- engenheiro responsável também por obras na Catedral Metropolitana -, após o restauro, é
tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o IPHAN. Após o ano de
1928 e a aquisição pelos órgãos públicos, a Capela de Santa Luzia não teve mais função
religiosa, não há, por exemplo, desde o referido ano a realização de missas.

Na metade do século XX a capela, que também está localizada na Cidade Alta, passa a
abrigar o Museu de Arte Sacra e a partir do ano de 1976, sob custódia da Universidade
Federal do Espírito Santo – UFES. Neste mesmo ano passa a funcionar como galeria de
arte, vindo a preencher uma lacuna até então existente no campo das artes plásticas no
Espírito Santo (BONICENHA, 2004).

Atualmente, a Capela de Santa Luzia funciona apenas para visitação, não possui mais
funções sacras. Ela atrai os visitantes primeiramente por sua história, referente ao período
da colonização, e arquitetura que difere de todas as outras igrejas do Centro.

Considerações Finais
Diante do que foi exposto, constata-se que através do poder público, via políticas públicas,
como também com a participação de setores privados e de organizações sem fins
lucrativos, podem ser feitos trabalhos visando uma educação patrimonial, a fim de resgatar a
memória coletiva da cidade, ou pelo menos do seu centro histórico, salientando a
importância do mesmo. Procurou-se mostrar também que a conservação dos patrimônios
construídos de uma cidade é muito mais que preservar uma forma arquitetônica, é preservar
a história, a memória, a identidade de um povo. No que diz respeito à todas a igrejas
identificadas, percebe-se que a resistência das mesmas, assim como a importância
históricas delas, se deve sobretudo aos usos que os moradores do Centro de Vitória ainda

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fazem. Missas, casamentos, visitas, festas e outras atividades relacionadas à rotina católica,
dinamizam e se transformam na razão do existir dessas igrejas.

Referências Bibliográficas
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SCHEINER, Tereza Cristina. Imagens do Não Lugar: Comunicação e os Novos Patrimônios.


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PENSANDO A PRESERVAÇÃO ARQUITETÔNICA E URBANA DE
ESPÍRITO SANTO DO PINHAL: UM PATRIMÔNIO AINDA A
CONHECER
RIBEIRO, Júlia Farah; TIRELLO, Regina Andrade.
1. 1. Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura, Tecnologia e Cidade.
Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Unicamp.
Av. Albert Einstein, 951. Barão Geraldo. CEP: 13083-852 - Campinas, SP – Brasil.
julia.farah@gmail.com
1. 2. Professora Doutora da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da
Unicamp.
Av. Albert Einstein, 951. Barão Geraldo. CEP: 13083-852 - Campinas, SP – Brasil.
rtirello@gmail.com

RESUMO
O reconhecimento de valores culturais nas paisagens urbanas e a preocupação com a sua
preservação derivam do amadurecimento de discussões sobre o próprio significado de patrimônio
cultural. O contínuo aprofundamento desses debates abriu caminho para a valorização de artefatos
por vezes considerados menores e que passaram a se destacar por suas qualidades compositivas,
além de suas características estéticas e construtivas.
Em compasso com o alargamento do conceito de patrimônio cultural, este artigo é parte de
discussões abordadas na pesquisa de mestrado Para além do centro histórico: valores e sentidos do
patrimônio edificado de Espirito Santo do Pinhal, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em
Arquitetura, Tecnologia e Cidade da Unicamp.
A cidade de Espírito Santo do Pinhal, localizada na divisa entre o estado de São Paulo e o sul
de Minas Gerais, devido à sua importância econômica no período áureo do ciclo do café, é detentora
de conjunto histórico e arquitetônico valorizado pela sua população e tombado em nível estadual.
Os estudos para tombamento do Núcleo Histórico Urbano de Espírito Santo do Pinhal tiveram
início em meados de 1985 e tal iniciativa se configura em ação pioneira entre as cidades paulistas
pelas circunstâncias que ensejaram o pedido de proteção oficial do conjunto. A salvaguarda foi
solicitada ao CONDEPHAAT pela própria população, então representada pela Associação Pinhalense
de Cultura, com o intuito de impedir o desaparecimento de prédios históricos, que à época corriam
riscos de demolição iminente.
O conjunto arquitetônico selecionado pelo órgão estadual corresponde a onze edifícios,
considerados como as maiores expressões do período de desenvolvimento mais significativo da
cidade.
No processo de tombamento consta como documento inicial para a abertura dos estudos uma
listagem produzida pela Associação Pinhalense com 56 imóveis considerados de interesse. Nela

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foram arrolados bens de épocas e tipologias variadas, relacionados a diversos grupos sociais e
ocorrências históricas.
A diversidade de tipologias arquitetônicas constante na lista da Associação demonstra que já
no inicio da década de 1980 interessava aos pinhalenses a preservação de exemplares arquitetônicos
que expressassem o conjunto da sociedade local em diferentes períodos.
Nessa perspectiva, buscando aprofundar questões relativas à inter-relação da preservação
arquitetônica com o desenvolvimento urbano de Pinhal, este trabalho apresenta o estudo de dois
bairros representativos de importantes movimentos de ampliação da malha urbana de Pinhal,
nomeadamente: Vila Monte Negro e Vila Norma. Tais bairros hoje configuram, respectivamente, o
patrimônio ferroviário e moderno pinhalense.
Acredita-se que os conjuntos identificados são representantes de extratos da sociedade
pinhalense que ainda não são efetivamente valorizados ou reconhecidos, mas que foram
fundamentais para a transformação da cidade e que, por isso, merecem integrar o acervo dos bens
culturais de Pinhal.

Palavras-chave: Espírito Santo do Pinhal; Tombamento; Preservação arquitetônica; Patrimônio


ferroviário; Patrimônio moderno.

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Pensando a preservação arquitetônica e urbana de Espírito Santo
do Pinhal: um patrimônio ainda a conhecer

Entre os séculos XIX e XX, diversas contribuições teóricas relacionadas à apreensão


dos valores ligados aos objetos patrimoniais permitiram a gradativa valorização das
especificidades do ambiente urbano antigo1.

Manoela Rossinetti Rufinoni (2013) afirma que “o processo de contínuo


aprofundamento desse debate abriu caminho para a valorização de artefatos até então
considerados ‘menores’” (RUFINONI, 2013, p. 17) (dentre eles a chamada “arquitetura de
base”), que configuravam edifícios e conjuntos arquitetônicos não monumentais e que
passaram a ser reconhecidos por suas qualidades compositivas, além de suas
características estéticas e construtivas.

Esse alargamento conceitual foi gradativo, tanto na sua assimilação teórica quanto
nas aplicações práticas, sendo necessárias várias décadas para que o conceito de
patrimônio fosse, de fato, assimilado para além da escala restritiva de monumentos
individuais. O entendimento mais claro do valor cultural dos conjuntos arquitetônicos e
urbanos, bem como os princípios teóricos que atuam sobre eles, são aquisições conceituais
que vieram a ser devidamente contempladas em documentos internacionais do século XX,
principalmente pelas Cartas Patrimoniais2.

Essas discussões profícuas tiveram entre suas mais importantes contribuições “o


alargamento do conceito de bem cultural e a abertura de novos caminhos interpretativos
para a seleção de tombamentos e a ação prática de tutela” (RUFINONI, 2013, p. 178),
proporcionando a expansão do conceito de patrimônio cultural para um conjunto de artefatos
cada vez maior e mais variado.

Em compasso com o alargamento do patrimônio cultural, nas últimas décadas


passaram a interessar também outras categorias de preexistências arquitetônicas, a
exemplo das edificações ferroviárias e modernas.

1 Dentre essas contribuições destacam-se, de modo geral, principalmente John Ruskin (1819-1900) e Violletle
Duc (1814-1879), quanto às práticas de preservação; Alois Riegl (1858 -1905), na reflexão sobre os valores
outorgados ao monumento; e Gustavo Giovannoni (1873-1947), na formulação de métodos de conservação do
patrimônio considerando a sua dimensão urbana.
2 Em um breve panorama sobre as Cartas patrimoniais, cabe destacar alguns desses documentos. As Cartas de

Atenas (1931) e Carta de Atenas do CIAM (1933) inauguraram os questionamentos sobre a coexistência do
antigo e do novo. Quanto à atuação sobre os monumentos e ambientes históricos, o entendimento das
discussões de restauro foi consolidado com a Carta de Veneza (1964). A Recomendação de Nairobi (1976), por
sua vez, colocou em pauta a posição dos conjuntos arquitetônicos e históricos nas cidades contemporâneas.
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No Brasil, a construção do patrimônio nacional apresenta-se em um cenário
particular, pois é simultânea à disseminação da arquitetura moderna. Foram os arquitetos do
movimento modernista que em 1937 fundaram o IPHAN.

Sabe-se que a maior parte dos tombamentos até meados da década de 1970 recaiu
sobre edificações e conjuntos urbanos do período colonial, reconhecido e valorizado na
época como a arquitetura “original” brasileira e, por isso, símbolo maior da identidade
nacional.

Nesse sentido, afirma Flávia Brito do Nascimento (2012) que, “as exceções a esse
grupo de tombamentos saltam aos olhos, sendo a mais evidente a das obras do movimento
moderno” (NASCIMENTO, 2012, p. 174).

No dizer de Nivaldo de Andrade Jr.(2009), nos primeiros tombamentos de imóveis do


Movimento Moderno predominaram as inscrições de edificações cujos autores eram
importantes arquitetos brasileiros. A proteção dessa documentação edificada garantia não
só a permanência desses projetos para as gerações futuras como também a afirmação da
própria arquitetura brasileira (ANDRADE JR, 2009).

Por serem recentes, à época dos tombamentos, o reconhecimento de atributos


estilísticos e históricos significativos na arquitetura moderna ficou a cargo de ações pontuais
viabilizadas pelo IPHAN, notando-se certa falta de visibilidade histórica, ou distanciamento
histórico.

Percebe-se também que a sua consagração como parte do patrimônio nacional


tendia ao destaque da produção da chamada “escola carioca”. Somente a partir da década
de 1930 é que as ações preservacionistas demonstram alcançar novos limites, preservando
exemplares construídos em outros estados do Brasil.

Reflexo da criação dos órgãos de preservação estaduais3, na década de 1990 foram


feitos estudos e tombamentos de exemplares da arquitetura moderna por todo o país,
especialmente nos Estados de São Paulo e Minas Gerais.

Sem esquecer as importantes evoluções pelas quais o patrimônio arquitetônico


passou, o tombamento de edifícios do movimento moderno ainda hoje não é prática

3 Dentre os principais órgãos estaduais de preservação destacam-se: Bahia: IPAC (Instituto do Patrimônio
Artístico e Cultural da Bahia) de 1967; Estado de São Paulo: CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio
Histórico Arqueológico, Artístico e Turístico) criado em 1968; Minas Gerais: IEPHA (Instituto Estadual do
Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais) criado em 1971; Estado do Rio de Janeiro: DPHA (Divisão do
Patrimônio Histórico e Artístico) fundada em 1965.
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corrente, não só no Brasil como também em outros países com forte tradição nesse tipo de
arquitetura.

Para Silvio Zancheti (2014), uma série de fatores contribui para que o consenso
sobre o tombamento e a conservação dos monumentos do modernismo brasileiro não sejam
facilmente alcançados. Dentre eles destacam-se: 1) A arquitetura moderna foi mais
amplamente difundida entre uma comunidade internacional de especialistas (arquitetos e
engenheiros, principalmente) e entre políticos, e a ideia de arquitetura moderna como
sinônimo de progresso não chegou a ser assimilada no senso comum; 2) Em termos
culturais, ainda não ocorreram processos sociais de sedimentação, com tempos históricos
suficientemente longos, para enraizar a ideia de que essa arquitetura é um patrimônio
cultural e como tal merece ser conservada para as gerações futuras.

Para a preservação de um bem, independente da época ou do estilo, a identificação


e o reconhecimento de seus valores culturais são pré-requisitos indispensáveis. Nesse
sentido, para ZANCHETI (2014) “os valores culturais que ganham importância em uma
sociedade são aqueles criados por processos intersubjetivos, realizados em períodos
relativamente longos, portanto, ganham certa estabilidade na cultura da sociedade, mas não
podem ser considerados definitivos” (ZANCHETI, 2014, p.5).

Em âmbito internacional, o interesse pela preservação do patrimônio industrial, por


sua vez, é relativamente recente se comparado com a preocupação por outros tipos de
manifestação cultural e “deve ser entendido dentro do contexto de ampliação daquilo que é
considerado bem cultural” (KUHL, 2008, p. 37).

Por patrimônio industrial entende-se não apenas os vestígios remanescentes da


Revolução Industrial, mas também todos aqueles que refletem crescente especialização
técnica, capacidade produtiva intensificada e distribuição e consumo para além dos
mercados locais, marcas registradas da ascensão da industrialização. O patrimônio
industrial ainda inclui o planejamento, elaboração de políticas e práticas necessárias à
gestão desses vestígios históricos inseridos nas sociedades atuais.

Os conjuntos arquitetônicos ferroviários paulistas vão de encontro às definições de


patrimônio industrial constantes na Carta de Nizhny Tagil, publicada em 2003. Essa
recomendação considera que a industrialização em larga escala e o transporte ferroviário
são partes integrantes de um mesmo processo. A industrialização “associa-se diretamente a
esse meio de transporte, pois impulsionou as ferrovias e, por sua vez, foi por elas
impulsionada” (KUHL, 2008, p. 40).
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Este documento destaca que os conjuntos arquitetônicos que compõem o patrimônio
industrial, mesmo que não sejam detentores de características arquitetônicas singulares ou
excepcionais, representam e testemunham atividades que propiciaram profundas
transformações históricas nas sociedades em que ocorreram, justificando assim sua
proteção.

Nessa perspectiva, para além das grandes estações centrais, por vezes
arquitetonicamente refinadas, que costumam destacar-se dos conjuntos que integram,
interessam também as residências mais singelas dos imigrantes europeus e os grandes
galpões industriais e comerciais. O modelo, implantação e transformações técnicas que
estas edificações engendram – a exemplo do uso de materiais como tijolo, ferro e vidro –,
além de outros modos de morar, testemunham igualmente a evolução tecnológica-social
que marcou o século XX.

Na cidade de Espírito Santo do Pinhal os lotes arquitetônicos modernos e ferroviários


correspondem a bairros inteiros. A preservação de tais conjuntos edificados, para além de
sua importância formal intrínseca, corrobora para a compreensão do processo de
desenvolvimento social e urbano local.

1. Tombamento do Núcleo Histórico Urbano de Espírito Santo do


Pinhal: a trajetória da preservação arquitetônica na cidade

A cidade de Espírito Santo do Pinhal está localizada na região nordeste do Estado de


São Paulo, próxima à divisa com o sul do Estado de Minas Gerais, e tem sua história e
desenvolvimento influenciados pelo crescimento da produção cafeeira em suas terras.

Devido à sua importância econômica entre as cidades paulistas no período áureo do


ciclo do café, Pinhal é detentora de um conjunto histórico e arquitetônico de relevância
regional. Os edifícios construídos a partir de 18494 no entorno da Igreja Matriz delimitaram
os primeiros traçados urbanos e hoje destacam a evolução arquitetônica local, uma vez que
a partir do início do século XX os antigos edifícios passaram a incorporar traços do
ecletismo.

Ainda hoje as residências dos fazendeiros de café, os edifícios públicos e religiosos


construídos na área central circunscrevem conjunto edificado bem preservado ao qual a
população atribui valores identitários de cultura e que se integram à vida da cidade, tombado
em nível estadual.

4 Ano em que a cidade de Espírito Santo do Pinhal foi fundada, por Romualdo de Souza Brito.
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Mesmo antes do tombamento do núcleo mais antigo de Pinhal (a área central), a
apropriação e identificação que a população demonstrava ter com esse conjunto histórico e
arquitetônico sempre foram essenciais para a sua preservação.

Os pinhalenses, em geral, valorizam sua história. Seja por ações individuais, pela
preservação de imóveis particulares, ou ações coletivas, são os grandes responsáveis pela
manutenção dos registros arquitetônicos representantes do desenvolvimento da cidade ao
longo dos séculos XIX e XX. A Associação Pinhalense de Cultura (APC) deve ser destacada
como a grande promotora da preservação do patrimônio local, sendo responsável pelo
projeto de tombamento que foi encaminhado ao Conselho de Defesa do Patrimônio
Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (CONDEPHAAT) e, anos depois, homologado
por esse órgão estadual.

O processo de tombamento do centro histórico teve início em meados de 1985,


motivado por anseios dos pinhalenses pela preservação de sua memória edificada, que, à
época, corria sérios riscos em razão de “constantes demolições de antigos casarões, que
vêm dando lugar a edifícios de apartamentos, maculando assim o expressivo Centro
Histórico Pinhalense” (CONDEPHAAT, 26.264/88, p. 2).

No intuito da manutenção da memória da cidade, a Associação Pinhalense


apresentou para a abertura dos estudos de tombamento um arrolamento de 56 (cinquenta e
seis) edifícios considerados como representativos dos vários grupos sociais que conformam
a história e a identidade dos pinhalenses e, por isso, interessantes à preservação. Além da
listagem, foi produzido levantamento fotográfico e ficha semelhante ao Inventário de
Proteção do Acervo Cultural da Bahia (IPAC-Bahia) para a coleta de dados dos imóveis
listados.

A abrangência e a metodologia adotada no estudo apresentado foram destacadas


pelo CONDEPHAAT como avanços em comparação aos pedidos de tombamento da época.
Contudo, a inexistência de pesquisa histórica que relatasse o processo de ocupação urbana,
o critério exclusivamente arquitetônico apresentado nos campos das fichas (que em muitos
casos estavam pouco preenchidas) e a quantidade de imóveis propostos para tombamento
impuseram dificuldades para a realização dos estudos necessários à preservação legal.
Portanto, sem negar a relevância do acervo em causa, o órgão estadual concluiu que era
preciso fazer uma seleção a partir da proposta inicial.

Apesar das restrições quanto à proposta inicial apresentada pela APC, para o
CONDEPHAAT o tombamento em nível estadual do Núcleo Histórico de Pinhal justificava-se
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principalmente por tratar-se de um “acervo de núcleo urbano da Mogiana5, região de
Patrimônio pouco estudado” que ainda se encontrava preservado nesse “conjunto de
reconhecida importância histórica e suporte de representação significativo da cidade, mais
fáceis de serem reapropriados e reutilizados” (CONDEPHAAT, 26.264/88, p.12-14).

Na conclusão dos estudos o CONDEPHAAT ponderou que se tratava de uma área


cuja “trama principal não foi descaracterizada ou modificada neste século” (CONDEPHAAT,
26.264/88, p.260). No ano de 1992 foi tombado o Núcleo Histórico Urbano de Espírito Santo
do Pinhal, formado por conjunto de 11 (onze) edifícios6 construídos no núcleo histórico entre
os anos de 1880 e 1920.

Para Juliana Mendes Prata (2009), em seus estudos sobre processos de


tombamento de sítios históricos urbanos no Estado de São Paulo, identifica-se que tanto em
Pinhal como em Amparo, outra cidade paulista que também preserva conjunto arquitetônico
do ciclo do café, “em ambos os casos tombam-se imóveis ‘bens culturais’ e se
regulamentam as áreas envoltórias, que conformam a área” (PRATA, 2009, p. 69).

A partir das potencialidades e as fragilidades levantadas, o tombamento estabelece


medidas para a conservação física das construções, delimitando perímetro a ser regido por
diretrizes mais rígidas para novas ocupações e reformas, já que, à época, já estavam sendo
construídas nesta área edificações com altos gabaritos.

Dada a abrangência do conjunto identificado inicialmente pela Associação


Pinhalense, a preservação dos edifícios contemplados pelo tombamento estadual visava, de
acordo com a historiadora Ana Luiza Martins (CONDEPHAAT, 26.264/88, p.14), dar início a
uma ação conjunta do município e do CONDEPHAAT, para que se viabilizasse a correta
seleção dos bens configuradores das imagens da cidade. Tratava-se, então, de um
processo de reconhecimento do patrimônio pinhalense que deveria, ao longo do tempo,
envolver não só o Estado, como também o município e sua população.

Passados mais de vinte anos do tombamento, o município pouco avançou nas


práticas de reconhecimento e preservação patrimonial. Ainda hoje a proteção legal em nível
estadual caracteriza-se como a iniciativa preservacionista mais significativa.

5 Segundo historiadores, a Companhia Mogiana foi a única ferrovia concluída até o final do século a adentrar o
território mineiro tendo seu ponto terminal exatamente no triângulo mineiro. (CONDEPHAAT, 26.264/88, p.13).
6 Os edifícios legalmente protegidos são: Biblioteca e Museu Municipal, Escola Estadual Almeida Vergueiro,

Estação Ferroviária de Pinhal, Cine Theatro Avenida, edifício da atual Delegacia, residência de Arnaldo Florence,
edifício da atual Prefeitura Municipal, antigo comércio Irmãos Sagioratto, antiga residência na Praça da
Independência (atual Cine Casarão), antiga Farmácia Central e edifício do antigo Departamento de Esporte e
Cultura.
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Os trabalhos realizados desde então – seja na consolidação das novas leis,
realização de inventários ou pesquisas acadêmicas – apresentam uma noção de patrimônio
vinculada exclusivamente ao conjunto tombado e pouco consideram a diversidade de outros
exemplares arquitetônicos destacados pela Associação.

Nesse sentido, a pesquisa de mestrado7 na qual este artigo se insere busca analisar
outras áreas e conjuntos que também representam importantes períodos da história e
evolução urbana da cidade que ainda não foram estudadas e cujos conjuntos edificados não
são reconhecidos como parte do patrimônio pinhalense. Em compasso com o alargamento
do conceito de patrimônio cultural, houve interesse em estudar o patrimônio ferroviário e
moderno local, que corresponde aos bairros da Vila Monte Negro e Vila Norma,
respectivamente, que não foram incluídos no perímetro delimitado pelo tombamento.

2. A Vila Monte Negro e a arquitetura ferroviária pinhalense

A chegada da ferrovia causou sucessivos impactos positivos nas cidades brasileiras.


Independente do estágio de desenvolvimento alcançado por cada localidade, as linhas do
trem mudaram todas as áreas pelas quais os trilhos passaram. As atividades econômicas
apresentaram substancial crescimento, seja na intensificação da produção agrícola ou na
proliferação do comércio.

Em Espírito Santo do Pinhal, a inauguração da Estação Ferroviária de Pinhal, em 30


de setembro de 1889, por iniciativa do Comendador Monte Negro8, marca o nascimento da
Vila Monte Negro, a primeira “vila” a romper o núcleo inicial.

O aparato ferroviário construído no bairro (edifício da estação, armazéns, comércios,


prestação de serviços e residências) deu à cidade condições econômicas e sociais para
estruturar o seu crescimento, baseando-se na valorização da técnica e do trabalho
remunerado.

Com a instalação das linhas férreas em Pinhal, a estrutura social da cidade


reorganizou-se radicalmente. Além da elite cafeeira (formada pelas famílias luso-brasileiras
mais antigas), passaram a participar da dinâmica urbana também os negros libertos e os
imigrantes europeus.

7 RIBEIRO, Júlia Farah. Para além do centro histórico: valores e sentidos do patrimônio edificado de Espírito
Santo do Pinhal. 2017. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Faculdade de Engenharia Civil,
Arquitetura e Urbanismo, Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP.
8 João Elisário de Carvalho Monte Negro nasceu em Portugal, na cidade de Louzã, e em 1841 imigrou para o

Brasil. Defensor da imigração e do trabalho livre assalariado, o Comendador é lembrado como um homem de
ideias progressistas. Foi proprietário das fazendas de café “Colônia Nova Colômbia”, em Campinas, e “Colônia
de Nova Louzã”, em Pinhal, onde implantou sistema de mão de obra assalariada, em tempos de escravidão.
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Esse terceiro grupo inicialmente se instalou na Vila Monte Negro e, posteriormente,
se espalhou por outras zonas da cidade. Pode-se afirmar que a Vila foi a principal
responsável por criar essa nova classe social em Pinhal.

A maior parte da população desse bairro era composta por portugueses e italianos
que exerciam atividades relacionadas à ferrovia, direta ou indiretamente. Os modos de
morar e de trabalhar dessa população se refletiam na arquitetura pelo predomínio da
construção de duas tipologias principais: 1) Armazéns e estabelecimentos comerciais, 2)
Residências (Figura 1).

EDIFÍCIOS DA VILA MONTE NEGRO NO INÍCIO DO SÉCULO XX

A B C

D E F
Figura 1 – Registro fotográfico dos armazéns (A e B), pequenos comércios (C e D) e casas (E e F)
da Vila Monte Negro no início do século XX. Fonte: Álbum de Pinhal, 1903.

O assentamento proposto pelo Comendador para o bairro foi concebido com um


traçado racional, contendo uma via principal larga e arborizada que separava as áreas das
residências das zonas fabris e produtivas, onde foram construídos armazéns, oficinas e
comércios às margens da linha férrea (Figura 2). Além dos armazéns de estocagem e
beneficiamento de café, dentre os estabelecimentos comerciais sabe-se que havia
alfaiatarias, funilarias, sapatarias, selarias, armazéns de secos e molhados, padarias, uma
fábrica de borrachas, hotel, entre outros.

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Legenda
Residencial Comercial/Industrial
Figura 2 – Mapa com projeto original da Vila Monte Negro. Fonte: Autora, 2016 (desenvolvido a
partir de mapa encontrado por FREITAS, 2013).

A partir do primeiro quartel do século XX, a Vila Monte Negro se firma como um
importante núcleo de atração populacional, aumentando o número de edifícios nela
construídos, incentivando melhorias na infraestrutura da cidade.

A Vila Monte Negro foi responsável pelo crescimento de novos eixos na cidade,
ligando a Igreja Matriz à Estação Ferroviária. A estação torna-se o centro irradiador de ruas
e avenidas, estimulando a ocupação de áreas fora do entorno imediato da Praça da Igreja
Matriz.

Além de influenciar o crescimento urbano, a Vila Monte Negro impulsionou a


assimilação de importantes transformações na arquitetura local, com a chegada de nova
mão de obra, do enriquecimento da classe dominante e dos novos materiais e técnicas
resultantes da industrialização.

Na área central, as residências antigas das classes mais abastadas tiveram suas
fachadas remodeladas pelo uso de elementos do ecletismo na arquitetura do século XIX. Ao
redor da Estação, a Vila Monte Negro ganha forma com edifícios de baixo gabarito (um
pavimento) construídos em alvenaria de tijolos e junto ao alinhamento dos lotes.

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As residências da Vila foram construídas variando entre duas soluções de
implantação principais: as construídas no alinhamento dos lotes e as desvinculadas dos
alinhamentos laterais e frontais.

Ao mesmo tempo em que os sistemas de implantação usuais iam evoluindo,


mudavam também as características estéticas. Para FABRIS (1993, p. 138), “mesmo as
camadas menos abastadas, que não podem se pautar pela monumentalidade, optam,
entretanto, pelo ornamento, qualificando as fachadas de suas habitações com detalhes
decorativos”.

Os ornamentos preservados até hoje nos dão a conhecer dados históricos que em
muitos casos não foram registrados ou documentados oficialmente. Em algumas casas da
Vila, as cruzes de malta aplicadas em relevo sobre as aberturas ou nas platibandas são
informações importantes para o reconhecimento da história e da ocupação do bairro.

Após quase um século de sua fundação, em 1980 foi construído um terminal


rodoviário na Vila Monte Negro. A implantação do sistema rodoviário, aliada às políticas de
modernização da economia da época, deu início a uma série de mudanças nas formas de
ocupação dessa área.

Percebe-se que o adensamento populacional impulsionou dois movimentos distintos:


1) A modernização do bairro, observada na construção de novas residências e criação de
novos estabelecimentos comerciais; 2) A valorização da memória associada às relações de
trabalho e aos modos de vida que caracterizavam tanto o bairro como a cidade até a
primeira metade do século XX e que se encontravam em risco.

Não por acaso, em 1985, a Associação Pinhalense de Cultura pede ao


CONDEPHAAT a abertura do processo de tombamento do núcleo urbano histórico de
Espírito Santo do Pinhal, colocando em pauta a problemática da manutenção de conjuntos
arquitetônicos do século XIX e XX e, consequentemente, a preservação da paisagem
ferroviária.

Nos estudos técnicos que integram o processo de tombamento do CONDEPHAAT,


em sua avaliação de mérito, está claramente indicada a necessidade da ampliação do
universo de estudos para qualificação da memória tangível pinhalense. Para além da
classificação arquitetônica formal, recomenda-se que a análise das edificações se vincule a
outras referências históricas e valores simbólicos.

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Os prédios rústicos que distinguem a área ferroviária testemunham também
especificidades das relações econômicas regionais e intermunicipais. Assim como em
outras cidades da região, a Estação Ferroviária de Pinhal e o bairro da Vila Monte Negro
(onde a estação está implantada) se constituem como parte do acervo arquitetônico
resultante do desenvolvimento urbano e econômico impulsionado pelas linhas férreas da
Companhia Mogiana.

Portanto, pode-se afirmar que a materialidade do patrimônio ferroviário possibilita a


compreensão das rotas de circulação de mercadoria, capital e informações no século
passado, possibilitando a construção de claros nexos conectores entre a escala
arquitetônica, urbana e regional. Sobre o patrimônio da “região da Mogiana”, Ana Luiza
Martins (CONDEPHAAT, 26.264/88, p. 11) relata que:

(...) Curiosamente foram dois núcleos da Mogiana, região menos assistida


pelo CONDEPHAAT em relação às demais da trajetória cafeeira,
exatamente Amparo e Pinhal, que nos últimos meses, revelando uma
maturidade na percepção de seu patrimônio, enviaram a este Colegiado
estudos densos que viabilizam a correta atuação do Estado, isentando-o do
tradicional paternalismo e permitindo desde logo à comunidade que de
inicio, efetive a apropriação social do patrimônio da qual ela é usuária.
(CONDEPHAAT, 26.264/88, p. 11)

Além das questões regionais, a Estação Ferroviária faz parte do Ramal de Pinhal,
inaugurado em 1889, do qual também faziam parte as estações de Conselheiro Laurindo,
Nova Louzã e Motta Paes. Este conjunto ainda não foi estudado de maneira associada.

Nessa perspectiva, há de se considerar que a listagem organizada na época pela


Associação Pinhalense, mesmo que de forma assistemática, atribuía valores memorais a
uma série de edificações que permaneceram fora da circunscrição do núcleo histórico.

Esta é uma indicação clara de que interessava aos pinhalenses tanto as construções
religiosas, públicas e as residências dos grandes fazendeiros de café como também as
edificações ferroviárias e as representantes de “arquitetura menor” a elas correlacionadas,
considerando a somatória de todas essas tipologias como a melhor representação da
história da cidade.

3. Vila Norma: o bairro moderno de Pinhal

O florescimento da indústria paulista decorre do abalo sofrido pela economia cafeeira


no início dos anos 30. Não só a capital, mas também as cidades do interior se modificaram
profundamente. As condições geradas pelo café na fase anterior (ou seja, até 1930)
garantiram a extensão das atividades industriais por todo Estado.
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Espírito Santo do Pinhal, na segunda metade do século XX, já havia acumulado
algumas indústrias de pequeno e médio porte ligadas à produção e exportação de café,
constituindo o seu parque industrial.

O êxodo rural, decorrente da redução na produção cafeeira nas áreas rurais e a


chegada das atividades industriais, resultou no crescimento populacional e,
consequentemente, na necessidade de novos empreendimentos imobiliários. Novos bairros,
loteamentos e conjuntos habitacionais começam a ocupar antigas chácaras no entorno da
cidade.

Assim, a partir da década de 1950, os limites urbanos de Pinhal são rompidos


novamente. A urbanização de área rural mais próxima ao centro da cidade foi a Vila Norma,
no ano de 19539.

Este novo bairro, de caráter exclusivamente residencial, passou a ocupar parte de


antiga chácara do Sr. Antônio Costa10, localizada na zona sudeste da cidade. O projeto do
loteamento ficou a cargo de seu irmão, José Costa.

Costinha, como era mais conhecido na cidade, planejou um bairro em forma circular,
com lote central destinado à Igreja de Santo Antônio, projetada por ele no início da década
de 1960 (Figura 3).

9 Nos arquivos municipais não foram encontrados documentos e informações que precisassem a data original do
projeto da Vila Norma, era sabido apenas que foi construído na década de 1950. No acervo do Arquivo Público
do Estado de São Paulo constam alguns mapas da cidade. Na cartografia de 1952 o bairro ainda não existia,
sendo registrado no mapa do ano seguinte (1953).
10 O Sr. Antônio Costa foi prefeito municipal e também era dono da Construtora Antônio Costa S. A.

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Figura 3 – Implantação original da Vila Norma. Fonte: Secretaria de Obras da Prefeitura
Municipal de Espírito Santo do Pinhal.

A ocupação da Vila Norma se deu inicialmente com o estabelecimento de famílias da


classe média. Eram, em geral, profissionais liberais em ascensão (médicos e advogados),
funcionários de casas bancárias ou industriais vindos de outras cidades da região, além de
algumas famílias de pinhalenses que procuravam se mudar da área central.

As primeiras casas do bairro, localizadas no Largo de Santo Antônio, foram


projetadas por Costinha, entre os anos de 1955 e 1956. Esses projetos se destacam por
incorporar elementos da arquitetura moderna brasileira (Figura 4).

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RESIDÊNCIAS DA VILA NORMA

A B C

D E

Figura 4 – Residências construídas na Vila Norma. Projetos de José Costa (A, B, C e D) e Carlos
Lemos (E). Fonte: Autora, 2016.

Este conjunto de casas evidencia a disseminação da ideia de identidade modernista


propagada no Brasil principalmente pela arquitetura, e que no interior está associada às
“residências de classe média que reapropriaram, revisaram e reaplicaram elementos da
estética modernista ao longo dos anos de 1950” (LARA, 2005, p.173). Em Pinhal, a
apropriação de elementos do modernismo está associada principalmente às residências
projetadas por Costinha na Vila Norma.

Não se tratam, as obras de José Costa, da “autêntica” arquitetura moderna, mas de


uma assimilação de repertório de formas utilizadas nos edifícios planejados por grandes
arquitetos brasileiros da época. A possibilidade de realizar frequentes viagens a São Paulo e
o contato com os periódicos de arquitetura lhe proporcionaram referências de projetos que
foram utilizados em suas propostas residenciais.

Ao contrário das casas projetadas por arquitetos para famílias mais abastadas, em
geral caracterizadas por volumes prismáticos e composições plásticas equilibradas, as
residências de classe média apresentam sobreposições de vários elementos da arquitetura
moderna, algumas vezes conflitantes em termos compositivos. Tais construções revelam-se
como híbridos dos modelos nos quais se inspiram.

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Além das obras de José Costa, na Vila Norma encontra-se também uma residência
projetada pelo renomado arquiteto paulista Carlos Alberto Cerqueira Lemos11.

Em comparação com o projeto de Lemos, as casas de Costinha denotam mais um


uso de elementos estéticos do modernismo do que uma apropriação das suas técnicas
construtivas e das questões de funcionalidades (expressas na distribuição interna dos
espaços no edifício). Tal fato tende a colocar nesses projetos, a grosso modo, um valor
inferior.

Enquanto as fachadas se aproximam de montagens de inspiração modernista, na


maioria dessas casas as plantas ainda são muito semelhantes àquelas usadas em períodos
anteriores, reflexo de uma estrutura familiar e modos de habitar que ainda não haviam
evoluído completamente. As principais transformações e modernizações, portanto,
restringem-se às fachadas. As plantas de suas casas são similares entre si.

Nas realizações de José Costa, mais do que uma influência, nota-se um processo no
qual a seleção dos elementos formais-construtivos estão em acordo com as expectativas
tanto do arquiteto como de seus clientes. O uso da arquitetura moderna demonstra a
vontade de integrá-los a um contexto mais amplo, extrapolando o cenário local.

O conjunto de residências da Vila Norma e o patrimônio arquitetônico moderno de


Espírito Santo do Pinhal ainda não foram objetos de estudos. Apesar de não possuírem
inovações ou características arquitetônicas especiais, as construções desse bairro são
testemunhos do desenvolvimento urbano, econômico e social de Pinhal. Refletem a
superação da crise da economia cafeeira que atingiu a cidade, o crescimento da área
urbanizada e a evolução arquitetônica.

Trata-se de um espaço destacado na paisagem urbana devido à sua concentração


de residências de inspiração modernista, inseridas numa cidade onde apenas as
construções em arquitetura historicista dos séculos XIX e XX são reconhecidas como
formadoras da identidade local. Assim como afirma Silvio Zancheti (2014), talvez ainda não
tenha havido tempo suficiente para que esse tipo de arquitetura seja assimilado e valorizado
pela população como parte da sua história, e que merece ser preservado. Portanto, o estudo
desse conjunto é instrumento necessário para que futuramente sua história e características
especiais sejam conhecidas pelos pinhalenses.

11Dentro as inúmeras contribuições de Carlos Alberto Cerqueira Lemos à arquitetura nacional, cumpre destacar
que nos anos 50 dirigiu o escritório paulistano do arquiteto Oscar Niemeyer. No CONDEPHAAT, foi diretor
técnico entre 1968 e 1981, e conselheiro de 1983 a 1989. Foi também conselheiro do IPHAN (1992-2000).
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4. Considerações sobre o patrimônio arquitetônico de Espírito Santo do
Pinhal

As mudanças conceituais sofridas pelo patrimônio cultural refletem diferentes


tratamentos dados à questão, tanto pela sociedade quanto pelas estruturas administrativas
que trabalham para a sua preservação. Da mesma forma, estas mudanças implicam,
consequentemente, renovações das práticas de proteção, tombamentos, inventários, e
tantos outros instrumentos.

Ainda que a cidade Espírito Santo do Pinhal tenha passado por sucessivos
processos de evolução, as permanências da paisagem que resistiram às transformações do
tempo contam a história local e possibilitam entender o seu processo de desenvolvimento
urbano.

O estudo de arquiteturas ainda pouco consagradas no campo da preservação,


entretanto, requer uma série de preocupações. Se por um lado esta questão evidencia as
potencialidades de determinadas áreas, por outro, prescinde de embasamento teórico e
documental extenso.

Ao se destacar conjuntos edificados que até o momento não foram efetivamente


reconhecidos e valorizados como parte do patrimônio cultural de Pinhal, afirma-se a
necessidade de se articular o tecido urbano antigo com ações atuais de salvaguarda, por
meio de seus instrumentos (tais como o tombamento e o inventário de bens edificados).

Os imóveis que circunscrevem os bairros aqui apresentados não são detentores de


grandes inovações, tanto esteticamente quanto em seus programas ou técnicas
construtivas, mas, quando considerados como conjuntos representantes do patrimônio
ferroviário e moderno, permitem a compreensão mais abrangente e completa da história e
da produção arquitetônica de Pinhal, não se restringindo à área central já tombada.

O acervo edificado na Vila Monte Negro, que configura conjunto arquitetônico


ferroviário, integra uma parcela do patrimônio paulista que vem sendo cada vez mais
valorizado e protegido legalmente. Sua preservação pode se justificar tanto na escala
municipal quanto estadual, uma vez que integrava o patrimônio da região da Mogiana. Já as
residências erigidas na Vila Norma, apesar de não serem exemplares arquitetônicos
detentores de características especiais, devem ser valorizadas por representar a
assimilação de elementos da arquitetura moderna em Pinhal, estilo que não foi amplamente
aplicado na cidade e por isso destaca-se com caráter de exceção.

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BIBLIOGRAFIA

ANDRADE JR, Nivaldo Vieira de; ANDRADE, Maria Rosa de Carvalho; FREIRE, Raquel
Neimann da Cunha. O IPHAN e os desafios da preservação do patrimônio moderno: A
aplicação na Bahia do Inventário Nacional da Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo
Modernos. CEP, v. 41, p. 210. 2009.

FABRIS, Annateresa. Arquitetura eclética no Brasil: o cenário da modernização. Anais do


Museu Paulista, Nova série, v.1, p.131-143. 1993.

KÜHL, Beatriz Mugayar. Preservação do patrimônio arquitetônico da industrialização:


problemas teóricos do restauro, Cotia – SP: Ateliê Editorial. 2008.

LARA, Fernando Luiz Camargo. Modernismo Popular: elogio ou imitação?. Cadernos de


Arquitetura e Urbanismo, Belo Horizonte, v.12, nº13, p.171-184, dezembro de 2005.

NASCIMENTO, Flávia Brito do. Preservando a arquitetura do século XX: o IPHAN entre
práticas e conceitos. Cadernos Proarq (Programa de Pós-Graduação em Arquitetura da
UFRJ), Rio de Janeiro, n. 19, p. 172-193. 2012.

PRATA, Juliana Mendes. Patrimônio Cultural e Cidade: práticas de preservação em São


Paulo. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2009.

RUFINONI, Manoela Rossinetti. Preservação e restauro urbano: intervenções em sítios


históricos industriais. São Paulo: Fap-Unifesp: Edusp. 2013.

SÃO PAULO (SP). Secretaria da Cultura. CONDEPHAAT. Estudo de tombamento do


Núcleo Histórico Urbano de Espírito Santo do Pinhal. Processo nº 26.264/88. São Paulo.
1988.

TICCIH. Carta de Nizhny Tagil sobre o patrimônio industrial. Nizhny Tagil: TICCIH. 2003.
Disponível em: <http://ticcih.org/wp-content/uploads/2013/04/NTagilPortuguese.pdf>. Acesso
em: cinco de julho de 2016.

ZANCHETI, Sílvio Mendes; HIDAKA, Lúcia Tone Ferreira. A declaração de significância de


exemplares da arquitetura moderna. Textos para discussão. v.57, p. 02-15. 2014.

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PERCEBENDO A IMPORTÂNCIA DO PARQUE ESTADUAL
DA SERRA DO CURRAL, SÍMBOLO OFICIAL DE BELO
HORIZONTE: a jurisprudência na preservação de um
relevante patrimônio cultural e natural do Quadrilátero
Ferrífero

ANDRADE, VAGNER L. DE (1)

1.Guia de Turismo e graduando em História - Licenciatura pelo UNCESUMAR – Centro Universitário


de Maringá. Agente Voluntário da Rede Ação Ambiental. Praça 14 Bis, 130/Apto 906 – Bela Vista,
São Paulo/SP CEP 03240-400. E-mail: trezeagosto@yahoo.com.br

RESUMO

A lei, quando se trata de patrimônio cultural ou natural nem sempre é sinônimo de preservação. A
Serra do Curral, ícone dos belo-horizontinos e dos mineiros é um exemplo disso. O presente trabalho
se debruça sobre a pesquisa teórica acerca dos instrumentos legais de preservação vigentes no
entorno do paredão da Serra do Curral, símbolo oficial da capital mineira, localizado entre os
municípios de Belo Horizonte e Nova Lima. Os procedimentos metodológicos adotados neste trabalho
analisam vasto repertório legal existente antes e após a consolidação do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação – SNUC e seus resultados no cenário local, evidenciando as tentativas
legais de preservação desta relevante paisagem mineira. Tal investigação busca o entendimento da
dinâmica legislativa que formata um mosaico de Unidades de Conservação na área em questão. Vale
ressaltar a importância não somente natural, como cultural desta serra para o município no qual se
insere, tornando-a cenário e patrimônio da população belo-horizontina e legitimando todas as
tentativas e conquistas de preservação da biodiversidade e do marco cultural. Nesta discussão,
dentre as unidades legalmente enunciadas, destacam-se os Parques Estaduais da Baleia e
Wenceslau Brás nos quais a discussão dos decretos de criação e/ou autorização ainda permanece no
papel, como proposta efetiva de proteção do relevante patrimônio natural e cultural da serra. Neste
sentido ao entender que a área é fruto de intenções legais conservacionistas, o futuro objetiva além
da efetivação das jurisprudências encontrada. É necessário a criação de uma única unidade de
conservação efetivando assim a preservação de todo um conjunto de relevância inenarrável.

PALAVRAS-CHAVE: Gestão Pública, Investigação Científica, Proteção do Patrimônio.

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INTRODUÇÃO

A história humana deflagra um embate no mínimo, emblemático: a dicotomia entre


homem e natureza. Neste contexto, a contemporaneidade é caracterizada pela busca
incessante por dados científicos concisos que direcionem e legitimem práticas
conservacionistas de elementos bióticos e abióticos ameaçados por ações humanas
(SOUZA, PEREIRA & ANDRADE, 20071). Neste contexto, a Ciência preenche demandas e
lacunas socioambientais antes ignoradas pontuando novas práticas e manejos específicos
que equilibrem e/ou recuperem o meio natural, visando sua efetiva preservação enquanto
elemento e equipamento cultural (SOUZA, PEREIRA & ANDRADE, 2007). Assim, a
investigação científica, relevante instrumento utilizado para a análise dos elementos
culturais e naturais, torna-se primordial, quando da mesma, provêm dados que
complementem atos, leis e propensões socioambientais e preservacionistas (SOUZA,
PEREIRA & ANDRADE, 2007). Este embate histórico precisa ser superado. Sobre esta
complexidade, Gonçalves2 (2008, p. 171) contextualiza que:
Entre questionamentos e respostas, tentamos analisar, do ponto de
vista histórico, as interações humanas em seu meio ambiente (entenda por
meio ambiente não apenas os aspectos naturais, mas também o espaço de
relações entre os homens). Não é de hoje que ouvimos falar das grandes
ameaças que o planeta vem sofrendo por conta da interferência direta do
ser humano na natureza com fins na extração de recursos naturais, matéria-
prima e pela obtenção de alguma vantagem. Da mesma forma que tal
interferência não é nova, a relação homem-natureza também não o é, pelo
contrário, é tão antiga quanto à própria existência humana na Terra. O que
se pode perceber é a ocorrência de uma mudança na visão-de-mundo do
homem no decorrer da história e, por conseqüência, de sua ação no meio
natural, uma vez que a natureza não está dissociada da história da
humanidade nem tampouco das manifestações culturais que a cerca, se
entendermos por cultura, grosso modo, a intervenção humana no que é
natural.

Neste sentido, a Ciência Histórica e a Historiografia, através do método investigativo


tem sido primordial para a relevante análise dos elementos culturais e naturais do planeta
transpondo didaticamente resultados que conscientizem sobre a importância dos mesmos e
sua complementaridade. Recentes estudos interdisciplinares dos meios físico e social têm
sido realizados no entorno do Parque das Mangabeiras, unidade de conservação na Serra
do Curral Del Rey, no município de Belo Horizonte, Minas Gerais (figura 01), área de
formação natural, em constante processo reabilitativo, desde os tempos do Curral Del Rey
(SOUZA, PEREIRA & ANDRADE, 2007). O local se materializa no âmbito da cidade através
de significativas transformações na paisagem ocasionada pelo embate homem-natureza,

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decorrente da contínua exploração socioeconômica, de caráter extrativista-mineral, além da
expansão urbana. De um passado degradador minerário a ícone simbólico dos
belorizontinos, a serra do Curral se consolidada no cenário histórico-geográfico mineiro.
Figura 01

Fonte: ANDRADE (20163)

OS PARQUES METROPOLITANOS NA RMBH: relato de viabilizações e


inviabilizações

O parque Presidente Wenceslau Brás corre o risco de se tornar o Fernão Dias, um


recente caso de inviabilização de parque estadual que não pode passar desapercebido. Os
parques metropolitanos são uma relevante discussão que se perdeu no âmbito do poder
público estadual e que precisa ser resgatada envolvendo esforços federais, estaduais e
municipais. Em 08 de junho de 1973 foi através da Lei Complementar Federal nº 14, criada
a Região Metropolitana de Belo Horizonte – RMBH, constituindo-se de treze municípios no
entorno da capital mineira (Figura 01): Betim, Caeté, Contagem, Ibirité, Lagoa Santa, Nova
Lima, Pedro Leopoldo, Raposos, Ribeirão das Neves, Rio Acima, Sabará, Santa Luzia e
Vespasiano (TONUCCI FILHO, 2012, p. 112). Visando ordenar o processo de gestão
metropolitana, foi posteriormente criado através da Lei estadual nº 6.303, de 30/04/1974, o
órgão de planejamento da Região Metropolitana de Belo Horizonte, denominado PLAMBEL
(TONUCCI FILHO, 2012, p. 114).

Figura 01 – RMBH, Região Metropolitana de Belo Horizonte em 1973 e em 2003

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Fonte: http://www.geocities.ws/ongs.rmbh/

Visando amortecer a expansão da zona urbana, o PLAMBEL concebeu em 1979, o


Plano Metropolitano de Parques Urbanos, que definiu na RMBH, a necessidade de
implantação de quatorzes4 parques metropolitanos (Quadro I) totalizando mais de quatro
mil hectares de preservação ambiental (Figura 02): Cachoeira (Santa Luzia) com área de
205 hectares, General Carneiro com área de 200 hectares, Fernão Dias com área de 98
hectares, Hugo Werneck com área de 925 hectares, Jardim Canadá com área de 705
hectares, Lagoa do Nado com área de 30 hectares, Lagoa Ibirité com área de 195
hectares, Mangabeiras com área de 236 hectares, Pampulha Norte sem mensuração de
área total, Ressaca com 82 hectares de área de mata nativa, Serra Verde com área de
235 hectares, Trevo BR 040 com área de 108 hectares, Várzea das Flores com área de
1.150 hectares. Tonucci Filho (2012, 143-144) alega que:
Quanto aos equipamentos recreacionais e turísticos, recomendou-se a
criação de Complexos Recreacionais Metropolitanos e Parques Urbanos,
levando-se em conta principalmente a população de baixa renda. Os
Complexos Recreacionais seriam áreas de grande parte que, além de
atender a um público amplo e diversificado, deveriam cumprir funções
complementares de proteção ambiental, contribuindo para o re-equilibrio
ecológico da região. Propôs-se a criação de quatro Complexos:
Pampulha, Vargem das Flores, Lagoa Santa e Jardim Canadá. O Plano
propôs também a criação de doze parques urbanos na RMBH,
envolvidos ou em linhas de contigüidade com as áreas urbanizadas da
aglomeração metropolitana: Parque da Pampulha, da Ressaca, de
Contagem, de Ibirité, de Santa Luzia, de Sabará, da Serra do Curral, de
Venda Nova, de Nova Lima, Vargem das Flores, Lagoa do Nado e Hugo
Werneck. Essas áreas precisariam ser incorporadas ao patrimônio
público estadual ou municipal, e devidamente equipadas para atender à

Quanto aos quatorze parques urbanos previstos no Plano Metropolitano de Parques Urbanos do PDIES, até 1982 apenas o
Parque Fernão Dias (Contagem) havia sido implantado. Algumas das áreas indicadas no programa permaneciam ainda
desocupadas, mas sem qualquer proteção quanto à sua futura ocupação pelo uso urbano, enquanto outras já haviam sido
parceladas, decretadas como zonas de expansão urbana, ou mesmo ocupadas (TONUCCI FILHO, 2012, p. 149).
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população metropolitana. Os parques somariam uma área de 5.883 ha, o
que resultaria num índice de 11,6 m² de área de parques urbanos por
habitante em 1990

Quadro I - Relação dos parques metropolitanos planejados no âmbito do PLAMBEL


Parque Urbano Localização Situação
Parque da Lagoa do Mata dos Gianetti Parque municipal
Nado
Parque da Pampulha Trevo e Enseada das Área parcelada com parques
Garças municipais menores
Parque da Ressaca Ursulina de Andrade Parque municipal
Melo
Parque da Serra do Mangabeiras Parque municipal
Curral
Parque da Vargem das Tupã e Icaivera Declarada APE e APA
Flores
Parque de Contagem Fernão Dias Parque estadual
Parque de Ibirité Lagoa Ibirité Não implantado
Parque de Nova Lima Jardim Canadá Parque estadual
Parque de Sabará General Carneiro Não implantado
Parque de Santa Luzia Cachoeira BR 262 Não implantado
Parque de Venda Nova Serra Verde Parque estadual
Parque Hugo Werneck Granja Werneck Área será parcelada com
parques municipais menores
Fonte: adaptado de Tonucci Filho (2012)

Figura 02 - Planejamento da Região Metropolitana de Belo Horizonte

Fonte: http://www.sinaenco.com.br/downloads/Benicio.pdf

Da proposta inicial foram implantados ao longo das décadas de 1980 e 1990 pelo
Poder Público, apenas cincos Parques Urbanos: Fernão Dias, Lagoa do Nado,
Mangabeiras, Ressaca e Serra Verde. Na década de 2000, porém por iniciativa do poder
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público municipal da Capital Mineira e de Contagem ampliaram-se o número de grandes
parques municipais, localizados em áreas estratégicas e bem próximos da concepção
original do Plano Metropolitano de Parques Urbanos, do PLAMBEL em 1979, o Ageo Pio
Sobrinho, o Américo Renê Giannetti, o Fazenda Lagoa do Nado, Francisco Lins do
Rego, Guilherme de Azevedo Laje, o Oceanógrafo Jacques Cousteau, o Sargento Silvio
Holembach (Fundação Zoobotânica) e o Ursulina de Andrade Melo que somados aos
parques estaduais: Bandeirante Fernão Dias, Fazenda Serra Verde, Presidente
Wenceslau Braz (Serra do Curral/Mangabeiras/Mata da Baleia), Serra do Rola Moça,
Serra do Sobrado, Vale do Sumidouro formam um montante de 14 parques à disposição
da população metropolitana. Estas grandes áreas verdes se contraporiam ao projeto de
expansão de parques industriais e loteamentos adjacentes criando espaços de
civilidade, coletividade e preservação num tecido urbano cada vez mais adensado
(Figura 03). Somente na cidade de Belo Horizonte são mais de sessenta parques, de
diferentes tipologias e variedades: desde praças reconhecidas como parques municipais,
como o Halley Alves Bessa, no Bairro Havaí, região oeste a grandes parques como o
Mangabeiras na zona sul da cidade. Estabelecendo uma relação entre estes espaços e
sua utilização em prol da população local e dos eventuais visitantes (turistas), a
prefeitura da capital mineira oferece atividades educativas e culturais em alguns dos
mais de setenta parques ecológicos da cidade. Muitos destes parques ecológicos
dispõem de alguns equipamentos para estes fins, como: pontos de coleta seletiva de
lixo, nascentes em estado natural, trilhas para caminhada, equipamentos para ginástica,
espaços de convivência, mirantes de contemplação, banheiros, play ground, entre
outros. Ainda sobre o PLAMBEL e suas ações conservacionistas, segundo informações
do PL 2.999 (2015):
No final da década de 1970, o Estado de Minas Gerais, por meio da
autarquia de Planejamento da Região Metropolitana – PLAMBEL –, instituiu
o Programa Metropolitano de Parques Urbanos. Em 1979, o Estado recebeu
em doação uma área de, aproximadamente, 98 ha, que se constituiu no
Parque Fernão Dias, situado no Município de Betim, com uma parte situada
no Município de Contagem. No ato do registro dessa área no Cartório de
Registro de Imóveis da Comarca de Betim, sob a matrícula n° 29.960, em
29 de junho de 1979, ficou gravada sua destinação: "A área se destina
exclusivamente à implantação do Parque Urbano previsto no Programa
Metropolitano de Parques Urbanos".
No início da década de 1980, a Secretaria de Estado do Trabalho e
Assistência Social de Minas Gerais – SETAS –, que passou a administrar o
parque, promoveu a instalação da primeira etapa de um projeto de lazer
elaborado pelo PLAMBEL. Durante a década de 1990, o parque foi
amplamente utilizado pela população dos municípios vizinhos, mas
especialmente pela de Contagem devido à facilidade de acesso à área de
lazer. A partir do ano 2000, as condições de manutenção da área de lazer
do parque se deterioraram, mas, ainda assim, as condições de recuperação
da vegetação natural e das nascentes prevaleceram.

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Figura 03 – RMBH, Região Metropolitana de Belo Horizonte: projeções de expansão urbana
sobre áreas verdes

Fonte:
http://www.rmbh.org.br/sites/default/files/Semin%C3%A1rioEstruturadorPDDI_ApresBloco03.pdf

Resgatar o Parque Fernão Dias é buscar as origens preservacionistas do final da


década de 1970 elencadas pelo PLAMBEL, dentre os quais o Parque Urbano Várzea das
Flores. Situada entre os municípios de Contagem e Betim, a Barragem Vargem das Flores
(chamada de Várzea das Flores pelo betinenses) foi construída em função da expansão
industrial da Região Metropolitana de Belo Horizonte e do abastecimento de água.
Inaugurada em 1972, possui capacidade de armazenamento de até 44 milhões de metros
cúbicos de água. Em 1979 foi definida pelo Governo Estadual, através do PLAMBEL para a
implantação do Parque Estadual, que nao se efetivou. Hoje é um dos pontos mais
frequentados para atividades de lazer e esportes aquáticos
Esta ação é necessária, pois o parque, por sua vez não dispõe de zona de
amortecimento, dada à pressão urbana de seu entorno, outro argumento utilizado como
contrário à criação de um parque estadual a ser administrado pelo IEF. O IEF administra em
Belo Horizonte, o Parque Estadual da Serra Verde, um parque municipal estadualizado
como compensação ambiental pela construção da Cidade Administrativa. Trata-se de uma
área bastante descaracterizada, pequena e cercada por intenso adensamento urbano no
entorno, sem zona de amortecimento como exige a lei. O IEF também já transferiu inúmeros
outros parques estaduais às administrações municipais como o Baleia, em Belo Horizonte e
o Anhumas em Itajubá. Outra demanda deve-se pensar em várias portarias para facilitar a
apropriação e visitação dos muitos moradores de seu entorno.

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A situação do Parque Fernão Dias, principal parque urbano da cidade, mais antigo e o
maior em extensão, foi destacado pela deputada Marília Campos (2016): “o Parque Fernão
Dias, localizado na divisa entre os municípios de Contagem e Betim, é uma das maiores
áreas verdes em região urbana da Grande Belo Horizonte”. Em 1979, a área do parque foi
doada ao Estado de Minas Gerais pela Agropecuária Laluar S.A. e, planejado pela
PLAMBEL foi inaugurado pelo governo estadual em 1980 como uma espécie de “parque do
trabalhador” dada à essência industrial da região em que se insere.

Figura 05 – O Parque Fernão Dias, na divisa entre Betim e Contagem.

Fonte: Diário de Contagem (2016)

Durante duas décadas, respectivamente 1980 e 1990 foi muito visitado pelas
comunidades adjacentes devido aos muitos atrativos em uma região carente de alternativas
de lazer e entretenimento para a população. Entre o período de 2000 e 2005, foi cedida ao
município de Contagem, ficando sob sua gestão. A área total do parque insere-se 97% no
município de Betim, porém a única portaria encontra-se em Contagem, na Rua Rio
Comprido, nº 5250, no Bairro Conjunto Riacho III próximo ao Centro Industrial de Contagem.
Na luta pela reforma e reabertura do Parque Estadual Fernão Dias, foi criado a ONG
“Amigos do Parque Fernão Dias”, que reúne pessoas na defesa do Parque.
O Parque Fernão Dias, quando de sua inauguração, tinha: 23 quadras
poliesportivas; dois campos de futebol; seis duchas que refrescavam os
visitantes em dias de calor; playground; pista de bicicross; minicidade;
velódromo, que é o único do Estado; mirante; trilhas; uma lagoa; nascentes.
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Com área de 1,3 milhão de metros quadrados, quase 60% da área do
Parque das Mangabeiras que tem 2,350 milhões de metros quadrados, o
Parque Fernão Dias tem 60% de mata nativa e uma fauna que conta com
raposa, mico-estrela, tatu, coelho e vários tipos de pássaros. (DEPUTADA
MARÍLIA CAMPOS, 2016).

Atualmente o Parque Estadual Fernão Dias, o mais importante dos parques


ecológicos está interditado e abandonado. A única notícia boa é que a vegetação do local
composta de 60% de eucaliptos e 40% de mata nativa e as trilhas apresentam bom estado
de conservação dos ecossistemas. Mas em relação aos outros atrativos a situação é de
completo abandono. Urge sua reinstalação e abertura à população metropolitana, incluindo
a possibilidade de sua ampliação na direção da BR 381, sentido Refinaria Gabriel Passos,
objetivando atender a população dos bairros Alvorada, Amazonas, Capelinha, Granja Verde,
Jardim Piemonte e Renascer. Há projetos visando sua requalificação e consecutiva
disponibilização à população contagense.

A APA permite usos futuros, distintos, que mesmo disciplinados e legalizados podem
comprometer a proteção dos ecossistemas em recuperação ambiental. Por outro lado, o
Executivo na figura do IEF é contrário á criação oficial do parque estadual, por cosiderá-lo
demasiadamente descaracterizado (ALMG, 2016). Segundo os técnicos, a transformação do
espaço em um parque estadual pode proibir o crescimento de atividades instaladas no
entorno, bem como de novos empreendimentos, sendo as categorias propostas são
restritivas e prejudiciais para a comunidade e entorno do parque (ALMG, 2016). São
incisivos alegando que parque estadual poderá trazer restrições e conflitos aos usos
pretendidos para o espaço. Quanto aos aspectos ambientais, afirmam que há grande
interferência humana e descaracterização do ponto de vista biológico, bem como não se
insere em uma área rural conforme exigência da Lei Federal 9.985, inviabilizando zonas de
amortecimento em seu entorno (ALMG, 2016). Concluem dizendo enfaticamente que não
existem no espaço, atributos ambientais para a instituição de uma unidade de conservação
integral da tipologia, parque estadual.

PARQUE ESTADUAL DA SERRA DO CURRAL: caracterização histórico-


geográfica

O conhecimento analítico e qualitativo desta área, símbolo oficial de Belo Horizonte se faz
necessário, quando o mesmo, reforça discussões legais, que efetivem a preservação,
conservação e manejo ambiental do Parque localizado aos pés da Serra do Curral, e de
outras unidades de conservação localizadas nas adjacências (SOUZA, PEREIRA &
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ANDRADE, 2007). Ao se perceber a importância do paredão da serra, efetiva-se
cronologicamente uma jurisprudência direcionada à preservação desse relevante patrimônio
cultural e natural do Quadrilátero Ferrífero, entre os municípios de Belo Horizonte e Nova
Lima. Os atuais estudos empreendidos na região permeiam várias áreas do conhecimento e
pesquisa, em especial Ecologia, Geografia e Geologia. Mas áreas como a Antropologia, a
História e a Sociologia trazem novas perspectivas de investigação deste espaço ampliando
discussões (ANDRADE, 2016). A área além de relevância ecológica consolida aspectos
importantes relacionados à História da capital mineira materializando-se no horizonte, como
seu símbolo maior, sua principal paisagem. Segundo a PBH (20165), a região do
Mangabeiras é um espaço de extrema relevância histórico-cultural para a cidade:
Com casas e mansões que ocupam espaços íngremes como que escalando
montanhas, o bairro Mangabeiras, situado na região Centro-Sul é de
recente ocupação, e possui várias belezas naturais. Uma delas é a Serra do
Curral, eleita símbolo de Belo Horizonte através de plebiscito popular
realizado em 1994. Tem ainda o Parque das Mangabeiras, um dos maiores
parques urbanos do País, com 2,3 milhões de metros quadrados, projetado
pelo paisagista Burle Marx e inaugurado em 1982.

A Praça da Bandeira se configura como outro ponto importante da região.


Reinaugurada em 12 de dezembro de 1997, como parte das comemorações
dos 100 anos da capital mineira, a praça é um espaço aberto e
contemplativo, onde se encontra o Marco Cívico do Centenário. Há ainda no
local a Rua do Amendoim, que integra o folclore turístico da cidade, quando
por ilusão de ótica os veículos desligados, sobem, ao invés de descerem,
uma suave ladeira

A serra do Curral talvez seja um exemplo ímpar em toda Minas Gerais ao associar na
mesma perspectiva de política pública, a possibilidade da preservação de seus diferentes
patrimônios. As múltiplas alternâncias de ambientes e culturas no espaço urbano-industrial
ao longo do tempo e do espaço criou identidades patrimoniais e ambientais próprias da
cidade e que hoje encontram-se inseridas e dinamizadas. Dada sua relevância histórica, o
presente estudo expõe a relevância da pesquisa científica em História, em uma área natural
preservada, como meio interventor positivo, para o cumprimento e execução das leis que a
protege, bem como analisa brevemente mecanismos históricos e instrumentos vigentes de
preservação (ANDRADE, 2016). A complementaridade teórica decorrente do conhecimento
científico exerce extrema importância nos meios legais utilizados para estabelecer uma área
de preservação ambiental, principalmente quando estes se encontram agregado aos
aspectos sociais e às demandas locais, legitimando interesses coletivos (SOUZA, PEREIRA
& ANDRADE, 2007). Baseado na pesquisa enquanto instrumento de efetivação de aparatos
judiciais que garantam direitos coletivos relacionados aos patrimônios cultural e natural
respaldados nos artigos 225 e 226 da Constituição Federal, faz-se necessário pensar no
Parque das Mangabeiras enquanto uma unidade integrada e conectada às outras do

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mosaico de unidades de conservação existente na área (FONSECA, RODRIGUES &
ANDRADE, 20136). Em questão, é indiscutível e emergencial que as pesquisas sobre o
patrimônio da serra contribuam para resgatar as discussões e mobilizações populares em
torno dos decretos de criação dos Parques Estaduais da Baleia e Wenceslau Brás, que
permaneceram somente no papel. Sobre esta dívida histórica para com a serra, O Ministério
Público de Minas Gerais - MPMG (20167):
ajuizou Ação Civil Pública (ACP) contra o estado, Instituto Estadual de
Florestas (IEF), município de Belo Horizonte e Fundação Municipal de
Parques requerendo que o Parque Estadual Florestal da Baleia, situado em
uma área de 102 hectares na Serra do Curral, seja, de fato, implantado. O
MPMG aponta que a unidade de conservação, a primeira da capital, não
passa de um “parque de papel”, totalmente desprovido de infraestrutura
para cumprir com seus objetivos, entre os quais proteger uma das maiores
áreas verdes da cidade.
“Incêndios, invasões, desmatamento, poluição das águas são apenas
alguns dos problemas que vitimam uma unidade de conservação estadual
que deveria contribuir para a preservação do meio ambiente em nosso
estado”, analisam os promotores de Justiça que assinam a ACP. De acordo
com os representantes do MPMG, convênios, termos de cooperação e
outros instrumentos celebrados entre as partes “apenas encobrem a
irresponsabilidade e a incompetência no trato da coisa pública, pois nada de
efetivo é feito”.
Diante da omissão dos responsáveis e do risco de ocorrência de mais
danos ao local, o MPMG requer à Justiça a concessão de tutela antecipada
para obrigar os entes, sob pena de multa diária de R$ 5 mil, a criar, em 180
dias, um conselho consultivo do parque e a elaborar plano de prevenção e
combate a incêndio; a disponibilizar, em até 30 dias, um gerente e quatro
guarda-parques, com veículos e equipamentos necessários ao desempenho
das funções; a implantar, no prazo de 180 dias, guaritas para o controle e
fiscalização de acesso ao parque, bem como colocação de cercas e de
sinalização de todo o perímetro do local.

Esses parques de papel efetivam resgates significativos para a memória e a


identidade da capital mineira. Resgatar esta história do final dos anos 1970 e início dos anos
1980 consolida-se como proposta efetiva de proteção do relevante patrimônio cultural e
natural da serra no entorno das Mangabeiras criando corredores ecológicos efetivamente
preservados e contribuindo assim para preservar áreas geológicas, geomorfológicas,
ecológicas para fins de pesquisa cientifica no futuro (FONSECA, RODRIGUES &
ANDRADE, 2013). O presente objetiva principalmente, expor a importância da investigação
cientifica interdisciplinar para a busca da proteção integral da biota local, contribuindo para a
imediata execução das leis que protegem a mesma (ANDRADE, 2016). Mas não se atém
apenas aos elementos ambientais, pois historicamente demanda por maiores estudos no
que se refere à sua dimensão humana e, portanto, cultural (FONSECA, RODRIGUES &
ANDRADE, 2013). E neste aspecto, a História se agrega às abordagens ecológicas,

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geográficas e geológicas empreendendo novos caminhos e abordagens. Diante dos
desafios, dilemas, a serra passa a ser percebida como um território histórico-geográfico, e
ainda como uma paisagem síntese. Nas palavras de Três, Reis e Schlindwein (20118):
As relações que se estabelecem entre o homem e a natureza revelam-se
em características da dialética. O homem como ser vivo é gerador e sujeito
de uma história, autor e destinatário de regras. Homem e natureza têm um
vínculo, sem que, no entanto, se possam reduzir um ao outro. Esse é o
principal fundamento da idéia do vínculo e do limite das relações do homem
com a natureza defendido por Ost (19959).
A crise da relação homem-natureza, vivenciada no processo histórico da
evolução da humanidade, tem como pano de fundo a busca pelo sentido do
vínculo e do limite. A crise do vínculo ocorre, pois o homem perde a
capacidade de identificar o que o liga ao animal, ao que é vivo, à natureza.
Já a crise do limite é determinada pela incapacidade de percepção do que
na natureza se diferencia dele. O homem é um pedaço da natureza, e em
contrapartida, a natureza produz a hominização. O homem guia e segue
simultaneamente a natureza, nas palavras de Morin (2005 10).
A questão histórica nos leva a refletir sobre o tipo de relação que
estabelecemos com a natureza, incluindo a nossa própria natureza. Nesse
sentido, a paisagem deve ser entendida como realidade física ou como
construção social? Em constante transformação, dos costumes sociais de
um determinado local, a paisagem evoluiu entre natureza e sociedade; ela é
simultaneamente natureza-objeto e natureza-sujeito. Nesse sentido, a
paisagem revela uma dialética entre uma realidade de ordem física e
ecológica e enquanto construção social (BERTRAND, 197811). Como
propriedade emergente das interações homem-natureza, a paisagem, onde
o homem se movimenta e vive, não pode deixar de ser discutida como um
resultado da sua presença. Presença essa que interfere no ambiente,
criando novas situações e exigindo cada vez mais recursos do território,
gerando desproporção entre a maneira de se viver e de se ocupar o espaço.

Mas que um recorte espacial, a Serra do Curral Del Rey é um recorte temporal, com
permanências e rupturas. Além de símbolo da cidade é também receptáculo de sua
memória e identidade (ANDRADE, 2016). Assim, todo o conhecimento histórico e
investigação historiográfica se fazem necessários para reforçar as discussões legais até
então adotadas para a efetiva preservação, conservação e manejo ambiental dos
respectivos parques estaduais e entorno. O mesmo se justifica pela necessidade de haver
complementaridade entre sociedade e natureza, no sentido de que os mesmos se inserem
como elementos de uma integração entre essas partes antagônicas. Quando se ressalta a
importância histórica da Serra do Curral, nota-se a pressão humana em seu entorno é
indiscutível a necessidade de um mecanismo de proteção ambiental que resguarde a
proteção de seu inigualável patrimônio cultural e natural, bem como garanta a preservação
da biodiversidade e dos recursos hídricos (ANDRADE, 2016). A serra, eleita símbolo da
capital mineira em 1995 teve parte significativa de sua área transformada em unidades de

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conservação, mas há muito o ser feito (FONSECA, RODRIGUES & ANDRADE, 2013). A
história de sua preservação inicia-se com os Processos de Tombamento do Paredão pelo
IPHAN na década de 1960 e prosseguiu com a autorização governamental de criação do
Parque Wenceslau Brás12.
Autoriza o Poder Executivo a criar o Parque Estadual "Presidente
Wenceslau Brás" localizado na Serra do Curral, no Município de Nova Lima.
O Povo do Estado de Minas Gerais, por seus representantes,
decretou e eu, em seu nome, sanciono a seguinte Lei.
Art. 1º - Fica o Poder Executivo autorizado a criar nas terras em que
se localiza a Mata do Jambreiro, na Serra do Curral, Município de Nova
Lima, com área de 1.146 hectares, o Parque Estadual "Presidente
Wenceslau Brás".
Parágrafo único - O órgão referido no artigo destina-se à
preservação de recursos naturais representados pela flora, pela fauna e
riqueza geológica da região, e sua proteção para o turismo do Estado.
Art.2º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 3º - Revogam-se as disposições em contrário.
Mando, portanto, a todas as autoridades, a quem o conhecimento e
execução desta Lei pertencer, que a cumpram e façam cumprir, tão
inteiramente como nela se contém.
Dada no Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, aos 19 de julho
de 1977.
ANTÔNIO AURELIANO CHAVES DE MENDONÇA
Márcio Manoel Garcia Vilela
Agripino Abranches Viana

Mas o então Parque Estadual Wenceslau Brás nunca foi efetivamente criado e
implantado. Posteriormente na década de 1980, houveram as criações dos Parques
Estadual da Baleia e do Metropolitano das Mangabeiras (ANDRADE, 2016). Nos anos de
1990, a área foi efetivamente protegida através da criação da APA Sul RMBH - Área de
Proteção Ambiental Sul da Região Metropolitana de Belo Horizonte e na década seguinte
com a criação dos Parques Municipais, Paredão da Serra do Curral e Parque Fort
Lauderdale, bem como a efetivação da Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN e
Centro de Pesquisa e Educação Ambiental - CPEA Mata do Jambreiro (FONSECA,
RODRIGUES & ANDRADE, 2013). Sobre o Parque Florestal da Baleia, o Instituto Estadual
de Florestas de Minas Gerais – IEF-MG (1988, p. 2713) alegava que:
9.1 – Criação: Decreto nº 26.162 de 06 de junho de 1988
9.2 – Área: 102,17 hectares
9.3 – Localização: Município de Belo Horizonte, zona sul, bairro Taquaril
9.4 – Levantamento Topográfico: Realizado em 1981, pelo Engenheiro
Agrimensor José Feres Azzi, servidor do IEF
9.5 – Hidrografia: Algumas nascentes e córrego (uma das nascentes
fornece água para o Hospital da Baleia)
9.6 – Flora: Floresta Tropical Atlântica – vegetação rasteira
9.7 – Fauna: Não há levantamento
9.8 – Cerca e aceiro perimetral: Não há

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Transcorridos, 28 anos, o Parque Estadual da Baleia ainda não se efetivou.
Preservada também pela APA Sul e localizada na encosta sul da Serra do Curral Del Rey,
em Nova Lima, a RPPN CPEA Mata do Jambreiro é a mais importante área preservada da
serra (ANDRADE, 2016). Localizada em ambientes de transição entre Cerrado e Mata
Atlântica, com 912 hectares, o equivalente a 9,12 milhões de metros quadros, trata-se de
importante área verde remanescente metropolitana se tornou bandeira do movimento
ecológico mineiro, desde o início da década de 1970, quando começou a MBR - Minerações
Brasileiras Reunidas começou a operar a Mina de Águas Claras (ANDRADE, 2016). Tendo
ficado sob a responsabilidade do IEF-MG durante 20 anos como reserva biológica, foi
reconhecida em dezembro de 1999, como RPPN retornando ao controle, tutela e manejo da
MBR, hoje integrante do Grupo Vale.14
A população da Região Metropolitana de Belo Horizonte conta, agora, com
visitas guiadas em grupo à Mata do Jambreiro, Reserva Particular do
Patrimônio Natural (RPPN) de 912 hectares inteiramente preservados pela
Vale. Localizada em Nova Lima, a área abriga o Centro de Proteção e
Educação Ambiental da Mata do Jambreiro (CPEA), criado pela empresa.
O Centro já recebeu mais de 10 mil visitantes, com destaque para alunos de
mais de 20 escolas da região. O espaço oferece atividades de educação
ambiental, além de proporcionar uma alternativa de lazer e contato com a
exuberante natureza da Mata do Jambreiro, umas das mais importantes
áreas verdes preservadas do entorno da capital mineira.
Os visitantes podem fazer trilhas ecológicas para apreciar animais e plantas
comuns nas áreas de transição entre o Cerrado e a Mata Atlântica, como
murici, caxeta, pau-jacaré, braúna-preta, copaíba, bicuíba e samambaiuçu.
A comunidade também pode usar o espaço para a elaboração de pesquisas
escolares e acadêmicas, já que o CPEA conta com uma minibiblioteca e
com a Sala Verde, onde é possível observar e se aprofundar no
conhecimento de insetos e sementes da biodiversidade local. Existe ainda a
opção de se fazer um passeio pelo Jardim Sensorial, que abriga plantas
medicinais e ornamentais, e pelo orquidário, entre outros espaços

A RPPN CPEA Mata do Jambreiro, além da riqueza da fauna e da flora,


abriga nascentes de diversos córregos contribuintes da Bacia Hidrográfica do Rio
das Velhas. Todas elas garantem a manutenção do ecossistema local: árvores
como braúnas, cedros, ipês, jacarandás, jequitibás e perobas; mamíferos como
cotia, capivara, esquilo caxinguelê, gambá, gato mourisco, jaguatirica, macaco
prego, mico estrela, ouriço caixeiro, paca e tamanduá mirim. Estudo realizado
mostrou que, do início da década de 1970 até hoje, a Mata do Jambreiro acolheu 66
novas espécies de aves, que fazem dali o seu habitat, totalizando 174 espécies de
pássaros (ANDRADE, 2016). A mata também registra elementos históricos
relacionados aos antigos caminhos entre Curral Del Dey, Campos de Congonhas e
Sabarabuçu, estradas que conectavam a região à capital Ouro Preto e ao Rio de

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Janeiro. Devidos aos aspectos ecológicos que se conectam às perspectivas
melhores de qualidade de vida, a mata é pressionada por inúmeros
empreendimentos urbanos, com destaque para os condomínios fechados. O site
Bens de Raiz Imóveis (201615) destaca que:
O Bosque do Jambreiro fica a 6 km do BH Shopping, margeado pelo
condomínio Ville de Montagne. Lançado na década de 80 tem como
característica principal a segurança, localizado exatamente ao lado
da barreira da Policia Federal.
Com uma maravilhosa vista para a intocável Mata do Jambreiro e a
Serra do Curral, são 327 lotes, c/ áreas a partir de 900 m².
Como infraestrutura, conta com, portaria e vigilância 24h, água da
Copasa, ruas asfaltadas, praças urbanizadas, centro de convivência
c/ lazer completo, salão de festas, quadra poliesportiva, playground,
academia ao ar livre e trilhas ecológicas, como a Trilha da
Cascatinha.

Diante de uma riqueza ambiental e cultural inenarrável, fazem-se necessárias


políticas públicas de proteção dos ecossistemas situados nos sítios naturais e de
reabilitação permanente das áreas mineradas como Águas Claras e Taquaril. Assim
deve-se anexar todas as unidades de conservação no entorno do Parque
Mangabeiras, implantadas ou não, sob um único formato preservando elementos
culturais e naturais da projeção de novos impactos socioeconômicos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pensando na importância biológica, histórica e cultural da Serra do Curral faz-se


necessário mobilizações para a criação do parque estadual já autorizado pela lei estadual nº
7.041 de 19 de julho de 1977, entre os municípios de Belo Horizonte, Nova Lima e Sabará,
com aproximadamente 1250 hectares. Assim localizar-se-á em suas áreas perimetrais
meios de efetiva apropriação seja por pesquisadores que já atuam na área, seja da
população metropolitana da Grande BH efetivando-o como espaço de ecologia, cultura e
cidadania. Quando se pensa num parque de âmbito estadual e metropolitano, que perpassa
limites municipais faz-se necessário pensar a experiência de sucesso dos parques estaduais
paulista que se organizam em núcleos e Portarias de acesso. No caso da área em questão
pensa-se em onze núcleos e dez portais (ANDRADE, 2016)

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ANDRADE, Vagner Luciano de. PRESERVAÇÃO DAS PAISAGENS CULTURAIS E DO
PATRIMÔNIO NATURAL DA SERRA DO CURRAL, BORDA NORTE DO QUADRILÁTERO
FERRÍFERO, MG: estudos ecológicos, geográficos, históricos e turísticos para a criação do
Parque Estadual Presidente Wenceslau Brás (197 f.). Dissertação (Mestrado em Direção e
Consultoria Turística). Universidad Europea Del Atlántico, Santander (Espanha) 2016

ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS. Lei 7.041/1977. Disponível em: <


http://www.siam.mg.gov.br/sla/download.pdf?idNorma=2171>. Acesso em 26. Mai. 2016.

BENS DE RAIZ IMÓVEIS. Condomínio Bosque do Jambreiro. Disponível em


http://bensderaiz.com.br/condominios/detalhes/bosque-do-jambreiro*8 acesso em 26. Mai. 2016

BERTRAND, G. Le paysage entre la nature et la société. Revué Géographique des Pyrénées et du


Sud-Ouest, v. 49, p. 16-26, 1978.

Deysi Regina Tres; Ademir Reis; Sandro Luis Schlindwein. A construção de cenários da relação
homem-natureza sob uma perspectiva sistêmica para o estudo da paisagem em fazendas
produtoras de madeira no planalto norte catarinense. In: Ambiente e Sociedade. Vol 14, n° 01,
São Paulo, Jan-Jun 2011. Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-753X2011000100009> acesso em 26.
Mai. 2016

FONSECA, Charles de Oliveira. RODRIGUES, Ludimila de Miranda. ANDRADE, Vagner Luciano de


Andrade. Por uma percepção ampliada do Quadrilátero ferrífero. Disponível em
https://www.ufmg.br/boletim/bol1833/2.shtml>. Acesso em 26. Mai. 2016

GONÇALVES, Júlio César. HOMEM-NATUREZA: uma relação conflitante ao longo da história. In:
Saber Acadêmico - Revista Multidisciplinar UNIESP. Ano n º 06 - Dez. 2008 p. 171

INSTITUTO ESTADUAL DE FLORESTAS. Unidades de Conservação do DIPRE/IEF - Diretoria de


Parques e Reservas Equivalentes – Belo Horizonte, julho/1988 – p. 27

MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS. MPMG aciona Justiça para assegurar a implantação
do Parque Estadual da Baleia em BH. Disponível em https://www.mpmg.mp.br/areas-de-
atuacao/defesa-do-cidadao/meio-ambiente/noticias/mpmg-aciona-justica-para-assegurar-implantacao-
do-parque-estadual-da-baleia-em-bh.htm> Acesso em 26. Mai. 2016

MORIN, E. O método II: a vida da vida. Porto Alegre: Sulina, 2005. 528p.

OST, F. A natureza à margem da Lei: a ecologia à prova do direito. Lisboa: Instituto Piaget, 1995.

PBH - PREFEITURA DE BELO HORIZONTE. Serra do Curral e natureza dão atmosfera especial
ao Mangabeiras. Disponível em: <
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/contents.do?evento=conteudo&idConteudo=23731&chPlc=23731>.
Acesso em 26. Mai. 2016

SOUZA, Jorge Batista de. PEREIRA, Adriane Nunes, ANDRADE, Vagner Luciano de. “Pesquisa
científica e preservação ambiental: o caso Parque das Mangabeiras, Serra do Curral, Belo
Horizonte – MG”. In: Resumo do painel V Seminário Cláudio Peres de Práticas de Ensino e
Geografia Aplicada - Tema “Geografias urbanas contemporâneas: espaços, intervenções e
planejamentos”. Belo Horizonte: curso de Geografia da PUC Minas, Campus Coração Eucarístico. 16
a 18 de maio de 2007

VALE. Mata do Jambreiro, área preservada pela Vale em Minas Gerais é aberta à visitação
pública. Disponível em < http://www.vale.com/brasil/pt/aboutvale/news/paginas/mata-jambreiro-area-
preservada-vale-minas-gerais-aberta-visitacao-publica.aspx>. Acesso em 26. Mai. 2016

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PISO, PAREDE, TETO: a (des)caracterização dos materiais nas
intervenções realizadas pelos proprietários dos bens protegidos

CORTEZ, KARINE M. G. (1); SILVA, TEREZINHA J. P. (2); BITTENCOURT,


SÉRGIO MOTTA (3); SILVA, ISABELA S. (4)

1. Arquiteta e Urbanista.
Rua Antônio de Castro, 103 Apt. 204, Casa Amarela, Recife, PE. CEP: 52070-080
Telefone: 81 32680210 / 81 997476752
karine_cortez@hotmail.com

2. UFPE / Arquiteta Docente do Departamento de Arquitetura e Urbanismo


Rua Mário Pederneiras, 65- Várzea, Recife, PE. CEP: 50741-300
Telefone: 81 34533835 / 81 999394143
terezinha_psilva@hotmail.com

3. UFPE / Arquiteto Docente do Departamento de Arquitetura e Urbanismo


Rua Dona Uzinha Nunes 66, apto. 1601, Boa Viagem, Recife, PE. CEP: 51030-400
Telefone: 81 30345641 / 81 999762666 bitcac@gmail.com

4. UNICAP – Estudante de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Católica de Pernambuco


Rua Mário Pederneiras, 65 - Várzea, Recife, PE. CEP: 50741-300
Telefone: 81 34533835 / 81 995986638
Isabela_ssilva@hotmail.com

RESUMO
O artigo definiu como objetivo analisar o nível de conhecimento técnico das intervenções realizadas
pelos moradores do sítio histórico da Várzea. Como problemas do objeto de estudo foram
detectados, através de inspeção visual e fotográfica: descaracterizações nos materiais dos pisos das
calçadas, das paredes das fachadas e nos tetos das cobertas. Como resultados das
descaracterizações foram constatados que estas são provenientes de: (i) – precário poder de
fiscalização da prefeitura do Recife; ( ii) – falta de ações de educação patrimonial pelas entidades
responsáveis pela preservação; (iii) – inadequado raio de proteção com novos edifícios verticais
interferindo na paisagem do sítio e (iv) – falta de conhecimento por parte dos moradores de
significados técnicos apropriados, bem como desconhecimento dos valores dos imóveis do sítio
histórico como um todo. Como conclusões se constatam que apesar da existência de instrumentos
legais, as aplicações dos mesmos não acontecem de modo que inibam as descaracterizações. Como
sugestões para auxiliar nos problemas são sugeridas: elaboração de um manual de conservação para
o sítio e ações de educação patrimonial junto aos moradores.

Palavras-chave: Bens tombados; Várzea; Recife.

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1. Introdução
A proposta do tema “Piso, parede, teto: a (des)caracterização dos materiais nas
intervenções realizadas pelos proprietários dos bens protegidos” surgiu a partir da pesquisa
desenvolvida na Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, denominada: O estudo das
lojas de materiais de construção, em Recife, como apoio didático à disciplina Oficina 3A
Detalhes.
Conforme notícias divulgadas pela imprensa, o Tribunal de Contas do Estado de
Pernambuco – TCE tem registrado intervenções descaracterizadoras em vários imóveis das
áreas históricas de Pernambuco (Olinda, Recife, Igarassu, Goiana, Rio Formoso, Brejo da
Madre de Deus, entre outras). Tais intervenções são provenientes de: solicitações de
conforto, demandas de conservação dos imóveis realizadas por meio de reformas, pinturas
inadequadas, introdução de equipamentos, com perda dos seus aspectos arquitetônicos
(Jornal do Commercio, 2017, p.1). Observa-se que as práticas de manutenção, ampliação e
até mesmo “modernização” realizadas pela maioria dos proprietários em áreas de sítios
históricos, são frequentemente criticadas, pois provocam alterações não somente no bem,
que sofreu as intervenções, mas também no entorno. As aplicações indevidas dos materiais
provocam desde mudanças das superfícies, geração de novas volumetrias, diminuição das
áreas verdes, introdução de equipamentos (antenas, unidades condensadoras, etc.), até a
perda de visibilidade de paisagens e bens. Tais situações se refletem por conta dos
seguintes aspectos: (i) – precário poder de fiscalização das prefeituras; (ii) – falta de ações
de educação patrimonial pelas entidades responsáveis pela preservação (iii) – inadequado
raio de proteção com novos edifícios verticais interferindo na paisagem do sítio e (iv) – falta
de conhecimento por parte dos moradores de significados técnicos apropriados, bem como
desconhecimento dos valores dos imóveis do sítio histórico como um todo. Os bens culturais
e seus entornos devem preservar as ambiências dos testemunhos dos contextos que foram
criados (Marchesan, 2006, p. 166).
Considerando tais questões o artigo definiu como objetivo analisar o nível de conhecimento
técnico das intervenções realizadas pelos moradores do sítio histórico da Várzea. Os
objetos de estudo compreenderam as edificações e moradores do entorno das Igrejas do
Rosário e do Livramento, na Rua Francisco Lacerda, trecho denominado de Praça do
Rosário, no bairro da Várzea, Recife, Pernambuco.
A estruturação de desenvolvimento do artigo se baseia nos seguintes itens: conceituação
dos termos; localização do objeto de estudo; histórico da área; normas e legislações
incidentes na área; referenciais teóricos; diagnóstico e resultados do objeto de estudo;
considerações finais e referências.

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2. Conceituação dos termos

Para entendimento do tema e seu objetivo foram selecionados os seguintes conceitos: bem
tombado, descaracterização, especificações dos materiais, fiscalização e reversibilidade.

2.1 Bem tombado

O termo bem tombado corresponde a um objeto ou edificação que passou por um processo
jurídico de valorização cultural, com registro em algum Livro de Tombo seja federal, estadual
ou municipal (Fundarpe, 2012, p. 12). Tal processo tem “como objetivo preservar, por
intermédio da aplicação de legislação específica, bens de valor histórico, cultural,
arquitetônico, ambiental e também de valor afetivo para a população, impedindo que
venham a ser destruídos ou descaracterizados” (Fundarpe, 2012, p. 12).

2.2 Descaracterização

A expressão descaracterização tem como significado perder suas características que lhe
valorizavam (Ferreira, 1986, p. 443). Quando relacionada com um bem tombado pode estar
relacionada à introdução de materiais que não se harmonizam, a criação de volumetrias que
alterem a original, perda da sua escala em relação ao entorno, além de outras interferências
como aparelhos de ar condicionado, antenas ou outros equipamentos.

2.3 Especificações de materiais

A Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT estabelece como especificação: “Tipo


de norma destinada a fixar as características, condições ou requisitos exigíveis para
matérias-primas, produtos semifabricados, elementos de construção, materiais ou produtos
industriais semiacabados” (ABNT 6492 / 1994, p.2). Já quando se menciona especificações
de materiais relacionadas aos demais imóveis próximos aos bens tombados, estas
compreendem usar preferencialmente os mesmos materiais, de modo a preservar a
unidade, bem como, suas cores relacionadas ou neutras, para evitar descaracterizações.

2.4 Fiscalização

O termo fiscalização compreende realizar vigilância ou verificação sobre determinada


situação ou objeto (Ferreira, 1986, p. 631). No caso dos bens tombados ou com proteções a
fiscalização visa acompanhar as condições de manutenção do bem tombado, pois os
mesmos não podem ser: modificados, mutilados, demolidos ou destruídos sem autorização
dos órgãos de patrimônio, sob pena de multa (Brasil, Decreto No 25 / 1937, Art. 17).

2.5 Reversibilidade

O termo reversível está associado à possibilidade de se retornar ao estado inicial do


elemento (Ferreira, 1986, p.1233). Nas intervenções arquitetônicas com proteções o
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conceito de reversibilidade passa pelo emprego de materiais ou outro elemento utilizado de
modo que seja o menos invasivo possível, não comprometa as intervenções posteriores e
dê continuidade as suas formas (Icomos, 2004, p.9 e Carta de Veneza, 1964, Art. 15).

3. Localização do objeto de estudo

Os imóveis da Praça do Rosário / Rua Francisco Lacerda, localizados no bairro da Várzea,


compreendem edificações com alturas de um pavimento para as residências e dois
pavimentos para as edificações religiosas, figuras 1 e 2. Tais dimensões e posições geram
uma polarização dos imóveis em relação aos demais.

Figura 1 –Localização do bairro da Várzea no Recife.


Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/V%C3%A1rzea_(Recife)

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Figura 2 – Localização dos imóveis da Praça.
Legenda: Sequência dos imóveis 1 a 17 em vermelho
Fonte: ESIG Prefeitura do Recife
4. Histórico da área

A área de estudo que correspondente ao atual bairro da Várzea aparece como resultante de
alguns engenhos como o Santo Antônio e o São João, sendo este último, no final do período
holandês, em 1645, pertencente a João Fernandes Vieira (Gaspar, 2009,p.1).

O surgimento do bairro está associado à criação do distrito de Santo Antônio, em 25 de


agosto de 1789, por meio de alvará, sendo anexado a vila do Recife ( IBGE,2005, p.1).
Corroborando com a sua evolução Silva afirma que:

“A Várzea foi sede de uma pequena povoação do século XVI, originária do


Engenho Santo Antônio ali fundado nos primeiros anos da colonização por
Diogo Gonçalves, em torno do qual gravitavam 16 outras fábricas de açúcar
que juntas formavam a chamada Várzea do Capibaribe” (Silva,2009, p.1).

Segundo placa na Igreja Matriz do Rosário, em 1648, ali foi sepultado Dom Antônio Filipe
Camarão (Silva,2009, p.1). Considerando a frequente evolução das capelas em igrejas, a
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Igreja Matriz também é resultado da transformação de capela em Igreja Matriz. Existe ainda
registro que a localidade possuía, em 1746, 18 capelas (Pereira da Costa, 1985, p.171).

Conforme placa de registro histórico a igreja matriz passou por reformas, entre 1868 e 1872,
nada mais restando da primitiva Capela de Nossa Senhora do Rosário (Silva,2009, p.1).

Ainda conforme Silva na Praça da Matriz ao lado da Igreja de Nossa Senhora do Rosário, ao
centro, existe a Igreja de Nossa Senhora do Livramento, que pertencia a uma irmandade de
homens de escravos. Afirma ainda que o prédio de dois pavimentos, ao lado desta
funcionou o Seminário da Várzea (Silva,2009, p.1).

Entre os casarões, vale salientar ao final da Rua Francisco Lacerda a edificação que serve
de sede ao Educandário Magalhães Bastos. Segundo Silva foi construído em 1897 por
Napoleão Duarte e destinava-se conforme placa comemorativa ao "Asilo da Infância
Desvalida, de ambos os sexos, fundado e pelo Com. Antônio José de Magalhães Bastos,
comerciante que foi nesta cidade".

As conformações espacial e volumétrica da Praça do Rosário / Rua Francisco Lacerda


aparecem registradas nas figuras 2 e 4.

5. Normas e legislações incidentes na área

Na área incidem as normas da ABNT de acessibilidade: NBR 9050: 2015, a NBR 15599:
2008 e a Lei federal No 5296 / 2004. Quanto à legislação municipal a Lei No 16.176 / 1996 de
Uso e Ocupação do Solo define uma série de procedimentos.
A ABNT 9050:2015 contempla diretrizes de acessibilidade para edificações, mobiliário,
espaços e equipamentos urbanos. Já a NBR 15599: 2008 define instruções para espaços de
atendimento ao público (ABNT 9050, 2015 e 15599, 2008). As principais recomendações
sobre acessibilidade para as áreas externas são voltadas para rebaixamentos nas calçadas,
pisos antiderrapantes, eliminação de barreiras e informações que contemplem as
diversidades especiais dos diferentes usuários da área (ABNT 9050, 2015 e 15599, 2008).
A Lei federal No 5296 / 2004 regulamentou as Leis No 10.048 / 2000 e No 10.098 / 2000,
quanto ao atendimento e prioridade aos idosos e deficientes e pessoas com mobilidade
reduzida, além de remeter para atendimento das diretrizes da ABNT 9050:2015 (Brasil,
Decreto No 5296, 2004).
Quanto às determinações municipais o destaque é para Lei No 16.176 / 1996 de Uso e
Ocupação do Solo, esta disciplina os aspectos de preservação na área. Conforme esta, o
bairro da Várzea é classificado como Unidade Urbana 19 e Zona de Urbanização
Preferencial 2. Entre as demais Zonas do bairro a do sítio histórico das Igrejas do Rosário e
do Livramento é denominada de Zona Especial de Preservação do Patrimônio Histórico -
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cultural – ZEPH. A ZEPH é subdividida em Setor de Preservação Rigorosa – SPR e Setor
de Preservação Ambiental – SPA ( Lei No 16.176 / 1996 , Art. 15 e 16). A ZEPH 7 do bairro
da Várzea têm dez requisitos especiais para regulamentar a ocupação e intervenções. Os
requisitos especiais compreendem: a) as intervenções de restauração, manutenção dos
imóveis devem levar em conta a aparência do conjunto e ter parecer final da Comissão de
Controle Urbano – CCU; b) as propostas de modificações não permitirão remembramento e
desmembramento de modo a não alterar a volumetria, porém os imóveis podem ser
interligados; c) as alterações internas, novas ou de acréscimos não deverão gerar
remembramento ou desmembramento; f) a marcação do gabarito máximo será no ponto
médio da edificação; h) as condições de conforto (dimensões, iluminação e ventilação) terão
análise especial; l) e m) a partir de análise especial podem ser construídas novas
edificações; p) A taxa de solo natural será de 60% para terrenos construídos; s) os imóveis
podem acomodar qualquer uso, desde que não gere descaracterização, nem interferência
no entorno; t) os imóveis com dois setores de preservação deverá atender as diretrizes mais
restritivas (Lei No 16.176 / 1996, Anexo 11).

6. Referenciais teóricos

Entre as referências buscadas sobre preservação com envolvimento das comunidades


foram identificadas: Tomaz, KnacK, Ghirardello e Spisso, Colasante e Oliveira, além das
instruções das Cartas de Cracóvia e a de Veneza.
Quando se aborda o tema preservação do patrimônio histórico, não é raro o entendimento
pela população do significado restrito apenas a manutenção dos imóveis em seu estado
físico original, com intuito de preservá-los para as gerações futuras.
Cada edificação carrega em si não apenas o material de que é composto, mas toda uma
gama de significados e vivências ali experimentados (Tomaz, 2010, p.2). O patrimônio
edificado está intimamente associado à materialização da cultura de um determinado local,
a história do lugar e de sua população. Não pode ser compreendido de uma forma isolada,
apenas sob o prisma de seu valor estético e material, pois ele é vetor da transmissão do
conhecimento ao longo dos anos, para a formação da identidade de um povo.
A cultura não é apenas o objeto produzido, mas o significado atribuído a ele pela sociedade,
bem como a técnica, a arte que o produziram (Knack, 2007, p. 15).
As edificações estão diretamente atreladas a história evolutiva de uma comunidade, suas
técnicas construtivas dentro de um contexto histórico, sua continuidade, identidade cultural,
enfim a memória coletiva da localidade que a posiciona dentro de um determinado momento
cultural. A noção de patrimônio deve ir além de mera concepção de ser apenas uma coleção
estática de objetos, documentos e edificações, visto estar fundamentada em processos

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sociais mais amplos, envolvendo até mesmo a concepção de história e a antropologia
(Françoise Choay apud Tomaz, 2010, p.3).
Para a sustentabilidade do processo de preservação do patrimônio histórico é necessária a
conscientização da comunidade através dos meios de comunicação mostrando a
importância de uma mobilização popular com vista à preservação da cultura local. A co-
responsabilidade e a cumplicidade atribuem valor agregado de inestimável qualidade no
resultado final da defesa e preservação do patrimônio (Ghirardello e Spisso, 2008, p. 21).
O entendimento pela comunidade local do valor do patrimônio histórico, que não pode ser
confundido, de forma pejorativa, como uma coisa velha, onde o novo é o melhor, propicia
um maior engajamento e mobilização para preservação dos bens culturais.
Enquanto a comunidade local não se apropriar da importância de preservação, exercendo
um poder fiscalizador contra a destruição, mutilação e descaracterização do patrimônio
histórico edificado, o poder público por si só terá muita dificuldade na preservação desse
patrimônio.
Através de uma gestão integrada entre o poder público e os cidadãos, se tornaria possível
interromper o descompasso entre o que as leis de preservação estabelecem, e o que de fato
ocorre, as dificuldades de fiscalização e controle das construções alavancada pela falta de
compreensão da importância da preservação do patrimônio pela população.
Impedir o avanço da expansão urbana, que utiliza o pretexto da modernidade para
descaracterizar o patrimônio histórico requer uma significativa mudança no olhar daqueles
que enxergam com desprezo as construções antigas. O entendimento míope que considera
esse patrimônio ultrapassado e carente de modernidade precisa ser contrariado e
reeducado, para vislumbrar todo potencial cultural e econômico de sua particularidade.
A atuação do poder público como órgão promotor da preservação do patrimônio histórico
atuando através de renúncia fiscal de IPTU e leis de incentivo cultural, que envolvam o
estado, e, estimulem a iniciativa privada a participar como parceiros dos proprietários é um
caminho a ser buscado, não só para patrocínio da preservação de bens isolados de
relevante apelo turístico, mas também para edificações menores e menos relevantes, que
compõem conjuntos que valorizam e propiciam diversidade à paisagem das cidades, e
guardam em si um legado inestimável.
Um planejamento é essencial para que haja um contraponto entre a conservação do
patrimônio como referencial identitário da população e como recurso econômico, o que nem
sempre ocorre (Colasante e Oliveira, 2011, p. 2).
O entendimento da cultura como instrumento de desenvolvimento econômico é uma
estratégia para estímulo à preservação de conjuntos históricos, e a apropriação desses
conjuntos pelo turismo possibilitaria a valorização de cada um dos imóveis, transformando o

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seu potencial cultural e histórico em valor econômico. A utilização dos próprios imóveis
como atrativos turísticos permite a atração de público e estímulo ao comércio local.
O uso do patrimônio histórico como gerador de vantagens econômicas para a comunidade
funciona como elemento propulsor de sua preservação e desestímulo à descaracterização,
atuando como prolongador da salvaguarda desse patrimônio.
As intervenções em edifícios de valor histórico e cultural, muitas vezes com intuito de
modernização, conservação, ou mesmo facilitação de manutenção, quando não são
realizados com critérios técnicos apropriados, e sem considerar os condicionantes que dão
identidade a um determinado espaço urbano e sua história podem mutilar o edifício de forma
irreparável, não só o edifício, mas todo o conjunto urbano no qual ele está inserido.
Ao conceituar o termo Conservação, Ghirardello e Spisso citam que são processos que
visam à manutenção do patrimônio sem alteração de suas características, de modo a
preservar seu significado cultural, e complementa ao falar das estruturas e materiais, não
pretendendo retornar o objeto ao estado original (Ghirardello e Spisso, 2008, p. 26).
Intervenções em edifícios históricos onde se pretende dar um “ar modernizante” só
contribuem para sua descaracterização e perda de identidade do edifício, diferente de ações
que buscam valorizá-lo mantendo a harmonia com o conjunto a que ele pertence.

A Carta de Cracóvia, nos itens 2, 3, 6 e 7, coloca a importância da elaboração de um projeto


de restauro que leve em conta: o estudo dos materiais tradicionais e novos, as identidades
do conjunto, a manutenção dos adornos, pessoas qualificadas para a sua execução, além
de registros gráficos, históricos e sócio-culturais para não descaracterizar os patrimônios
(Carta de Cracóvia, 2000). Também na mesma linha de preservação do contexto histórico
do ambiente está a Carta de Veneza (Iphan, Carta de Veneza, 2005, Art. 70 e 80). Por sua
vez, a mãe das legislações de proteção do entorno e visibilidade também ampara tal
situação (Decreto No 25 de 1937, Art.18).

Considerando as referências expostas, percebem-se a importância de divulgar junto aos


moradores a elaboração de estudos prévios, a acomodação das demandas por novos usos
e condições de conforto, de modo a se dar respostas mais rápidas, principalmente pelas
instituições que têm as responsabilidades de orientação e fiscalização.

7. Diagnóstico e resultados do objeto de estudo

Para a análise do nível de conhecimento técnico das intervenções realizadas pelos


moradores no objeto de estudo, Praça do Rosário / Rua Francisco Lacerda, procedeu-se a
um levantamento, in loco, realizado no dia 7 de junho de 2017, sobre os imóveis voltados

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para a Praça, conforme identificação na figura 2 e com elementos de análise sintetizados no
quadro 1.
Em relação ao emprego dos revestimentos dos pisos nas calçadas dos imóveis se constatou
uma predominância/unidade de materiais, equivalendo a 82% e 18% com materiais
inadequados, que geram barreiras arquitetônicas. Cabe destacar a área verde no meio da
Praça do Rosário com piso intertravado cinza e rebaixamentos para cadeirantes. Todas as
vias de rolamento são em paralelepípedos. Quanto às paredes 59% apresentam
revestimentos não descaracterizadores e 41% descaracterizadores. Conforme entrevista
com a proprietária do imóvel No 398 (No 7, no quadro 1 e em vermelho na figura 2) a decisão
de substituições dos revestimentos da fachada voltada para a Praça e da coberta foram
acertadas com um pedreiro, sem conhecimento, orientação ou aprovação da Prefeitura do
Recife. Por ter sido executada, a reforma caracteriza a falta de fiscalização na residência, no
restaurante Pense Leve, como também nos imóveis remembrados (Nos 10 e 11, em
vermelho, na figura 2), utilizados como supermercado. O Supermercado apresenta
revestimentos descaracterizadores nas paredes e cobertas, construção de mais um
pavimento, além da instalação de unidades condensadoras suspensas sobre a calçada. Tais
imóveis são os elementos mais descaracterizados de todo o conjunto, figuras 3 e 4.
Quanto ao teto / coberta 41% dos imóveis não apresentam mudanças na cobertura em
telhas cerâmicas canal ou francesa, já os imóveis com alterações representaram 59%,
caracterizadas por cobertura em telhas de fibrocimento. Por outro lado, apesar dos
percentuais de mudanças nas coberturas serem expressivos, proporcionalmente no
conjunto, quando comparado as extensões e volumetrias dos imóveis religiosos são
menores, figuras 3 e 4.
Constatou-se que as dificuldades de reposição de telhas, com dimensões atualmente
inexistentes no mercado, levaram alguns moradores a substituir as mesmas por materiais e
cores diferentes. Quanto aos revestimentos de alvenaria pintadas substituídos por
revestimentos cerâmicos estes foram realizados para facilitar a manutenção, com a redução
das despesas com pintura, sem a preocupação de descaracterização.
Ainda no quadro 1 se percebe que as mudanças de usos dos imóveis habitacionais por
comércio e serviços, sem as devidas orientações técnicas por parte dos órgãos
competentes têm levado a tais situações de alterações. Verifica-se ainda o baixo percentual
de imóveis com uso habitacional, corresponde a apenas 24%. O entorno da área está
começando a receber uma série de conjuntos habitacionais que pelas alturas permitidas
começaram a aparecer em alguns ângulos de visadas internas da paisagem da Praça, ou
seja, o mercado imobiliário vai se apropriando do entorno do patrimônio (Rizzi, 2010, p.1).

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Quadro 1- Relação dos materiais externos por imóveis na Praça do Rosário
Materiais
No imóvel Uso Síntese
Piso - calçada Parede- externa Teto - coberta

Tipo Tipo Tipo

Inadequado

Inadequado

Inadequado
Adequado

Adequado

Adequado
1 Igreja Religio Cimentado, Alvenaria, pintura Telha cerâmica Materiais
Matriz do so Pedra rachão em (bege, branco, canal sem
Rosário placas cerâmica, cinza) descarac-
terização
2 Creche Educac Cimentado Concreto e tijolos Telha cerâmica Materiais
i-onal cerâmicos a vista canal sem
descarac-
terização
3 Pórtico Ruína Cimentado Tijolos maciços e Ausente - - Pórtico em
tijolos com furos ruína
4 Casa Habita Cimentado Alvenaria - pintura Materiais
ci-onal sem
descarac-
terização
5 Res- Serviço Placas podotáteis Diversos Telha cerâmica Imóvel
taurante em cimento francesa e descarac-
fibrocimento terizado
6 Casa Habita Cimentado com Alvenaria - pintura Telha cerâmica Descarac-
ci-onal barreiras canal terização
arquitetônicas no piso
com
barreiras
arquitetô-
nicas nas
calçadas e
rua
7 Casa Habita Cimentado Fachada revestida Substituição de Descarac-
ci-onal com cerâmica com telha cerâmica terização
perda dos frisos e canal por da parede
adornos fibrocimento e teto
8 A Vida é Serviço Ladrilho hidráulico Fachada com Telha em Descarac-
Bela pintura que realça fibrocimento terização
os adornos e cor do teto
ao gosto do
inquilino
9 Templo Religio Diversos Fachada Telha em Descarac-
Adven- -so (cimentado com modificada fibrocimento terização
tista pintura e barreiras do piso, da
arquitetônicas na parede e
calçada e via) do teto
10 Super- Comér- Cimentado Paredes revestidas Telha em Descarac-
mercado cio com cerâmica fibrocimento terização
Olho da parede
D’Água e teto

11 Super- Comér- Cimentado Paredes com Telha em Descarac-


mercado cio revestimento fibrocimento terização
Olho cerâmico da parede
D’Água acompanhando os e teto
adornos
12 Casa Habita Cimentado Paredes revestidas Telha cerâmica Descarac-
ci-onal com cerâmica canal terização
das
paredes
13 Casa Serviço Cimentado Diversos materiais Telha cerâmica Descarac-
Sorvete- canal e terização
ria fibrocimento da parede
e teto
14 Casa Habita Cimentado Diversos materiais Telha cerâmica Materiais
ci-onal canal sem
descarac-
terização
15 Habita Cimentado Alvenaria - pintura Telha cerâmica Materiais
Portaria ci-onal canal sem
Condo- descarac-
mínio terização
Cidade
Universi-
tária
16 Casa Habita Cimentado Alvenaria - pintura Telha cerâmica Materiais
Paro-quial ci-onal francesa sem
e apoio descarac-
religios terização
o
17 Igreja Religi- Cimentado Alvenaria - pintura Telha cerâmica Materiais
de N. Sra. oso francesa sem
do Livra- descarac-
mento terização

Percentuais % 82 18 Percentuais % 59 41 Percentuais % 41 59


100 100 100
Legenda: cinza claro = situação adequada, cinza escuro = descaracterização
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Fonte: Autores

Figura 3 - Intervenções descaracterizadoras do Supermercado (imóveis 10 e 11)


Fonte: Silva, T. 7 jun. 2017.

Figura 4 - Vista aérea da Praça com identificação da numeração dos imóveis como na figura 2
Fonte: Google, trabalhado por Silva, T. e Cortez, K. 7 jun. 2017.

Outro aspecto que merece destaque é a restrita quantidade de informações


comunicacionais na área, como recomenda a ABNT 9050/2015. Somente a Igreja Matriz
possui placa de identificação, também em Braile, contendo:

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“Igreja de Nossa Senhora do Rosário – Matriz da Várzea. Remonta à
primeira freguesia suburbana do Recife. No templo reformado entre 1868 –
1872 foi sepultado Felipe Camarão um dos Chefes da Batalha dos
Guararapes. A Coroa Imperial na fachada vem o título de Capela Imperial”.

A Igreja do Livramento possui placa, mas sem informações sobre a história da mesma e do
conjunto das demais edificações. Por outro lado, a ruína em pórtico está sem nenhuma
informação. Em consulta a dois moradores da Praça do Rosário estes afirmaram que a ruína
foi o que restou de imóvel pertencente a João Fernandes Vieira. Em 17 de agosto de 1645,
João Fernandes Vieira participou da tomada do Engenho Casa Forte dos holandeses e
retornou para o seu Engenho São João, na Várzea (Gaspar, 2009, p.1). Conforme a autora,
após a tomada de Casa Forte ele estabeleceu um sistema de “estâncias militares, espécie
de fortificações onde pudessem estar seguros e guardar pólvora e munições de guerra”
(Gaspar, 2009, p.1). A ruína do pórtico se assemelha aos portais de fortificações.

7. Considerações finais

Pelas modificações até o momento realizadas nos imóveis habitacionais se percebe que
faltam: fiscalização por parte dos órgãos de preservação e ações de educação patrimonial
junto aos moradores do sítio histórico, para frear as descaracterizações. Verifica-se que
existe por parte dos moradores o entendimento que a área possui edifícios históricos com
características monumentais. Mas este entendimento é apenas transmitido pelos bens
religiosos enquanto que as casas representariam um caso à parte, como se não fizessem
parte deste todo. Como conclusões se constatam que apesar da existência de instrumentos
legais, as aplicações dos mesmos não acontecem de modo que inibam as
descaracterizações, bem como os manuais e demais instruções técnicas não são
plenamente acessíveis aos moradores destas áreas históricas, da mesma forma que sem
apoio financeiro, muitas vezes, ações eficazes e benéficas às áreas históricas tornam-se
inviabilizadas pelas condições financeiras de moradores e proprietários. Como sugestões
para auxiliar nos problemas são sugeridas: elaboração de um manual de conservação para
o sítio e ações de educação patrimonial junto aos moradores.

Referências

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
POR UMA ERÓTICA DO PATRIMÔNIO:
Alternativas à transformação da participação cidadã em panaceia
das políticas patrimoniais

FERNANDES, GABRIEL DE A. (1)

1. Universidade de São Paulo. Centro de Preservação Cultural.


Rua Major Diogo, 353, Bela Vista, São Paulo, 01324-001
gaf.arq@usp.br

RESUMO
Considerando-se a expressiva ampliação recentemente verificada em fóruns e publicações
acadêmicas e profissionais da mobilização da pauta da participação social e cidadã nas políticas
patrimoniais, pretendemos com este artigo não só apresentar uma reflexão das armadilhas desse
processo a partir de exemplos exteriores ao campo como propor uma inversão da formulação do próprio
problema, atentando para uma eventual condição inerentemente tecnocrática da ação patrimonial
institucionalizada. Neste sentido, parafraseando a clássica provocação de Susan Sontag sobre a crítica
de arte, refletimos a respeito da necessidade não de uma renovada (e participativa) “hermenêutica” do
patrimônio cultural, mas a respeito das possibilidades de uma ação institucional em torno da “erótica
do patrimônio”. O trabalho, então, assume duas frentes com este objetivo: discute, de um lado, os
problemas da ideia de “participação” a partir da bibliografia consolidada sobre o assunto, ainda que
pouco citada no campo patrimonial, e particularmente posiciona as políticas patrimoniais frente a
clássica “escada da participação” de Sherry Arnstein. De outro lado, questiona a eficácia da abordagem
participativista ante a ação direta de coletivos culturais e grupos organizados que vêm pressionando
de baixo para cima políticas patrimoniais consolidadas e questionando a eficácia dos instrumentos de
preservação e salvaguarda existentes. Conclui argumentando pelo reconhecimento da necessidade
de inverter os instrumentos institucionais disponíveis de ação patrimonial e em particular a prática
consolidada do tombamento.
Palavras-chave: patrimônio cultural, participação, cidadania cultural, patrimonialização.

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Introdução
“No lugar de uma hermenêutica da arte, precisamos de uma erótica da arte.” Assim Susan
Sontag concluía em 1964 seu clássico ensaio Against Interpretation. Embora o foco do
trabalho de Sontag estivesse na crítica de arte, a expressiva força de sua sentença nos seduz
a aplicar sua proposição a outros campos da cultura: a provocação dos anos 1960 parece
hoje, aliás, oportunamente adequada à discussão contemporânea sobre patrimônio cultural,
campo ainda profundamente amarrado a discussões sobre as características de significância
e de construção de significado dos bens culturais que seus entusiastas e estudiosos insistem
em tentar proteger de supostas ameaças externas. Com efeito, a provocação é de tal forma
adequada e estimulante que a vimos aplicando em trabalhos e em reflexões recentes: ainda
que cientes do risco de cair em um anacronismo rasteiro ou de descontextualizar a reflexão
artística da autora, parece-nos interessante explorar a possibilidade de aplicar tal provocação
aos problemas contemporâneos de formulação de políticas e ações patrimoniais no Brasil.

Em face desta provocação, neste trabalho reunimos apontamentos sobre a tensa e delicada
relação atualmente verificada em uma complexa rede patrimonial brasileira que inclui a
comunidade de profissionais e estudiosos, os bens culturais e a sociedade de um modo geral
(tida como a comunidade “leiga”, ora evocada como vilã, ora evocada como guardiã)
destacando as armadilhas em torno da aplicação da multifacetada ideia de “participação”.
Ainda que se trate de palavra polissêmica, normalmente ela é evocada (sobretudo quando
adjetivada como “participação social”) em campos como o do planejamento urbano e o da
gestão pública como um conjunto de processos e práticas que permitam aos vários grupos
sociais que tomem parte seja na formulação de políticas públicas e/ou em sua implementação.
A incorporação dos grupos sociais atingidos por tais políticas em sua elaboração e execução
as dotaria, portanto, de maior legitimidade, transparência e mesmo, eventualmente, de
eficiência.

Com efeito, vimos verificando no discurso de parte da comunidade profissional ligada ao


patrimônio cultural o recurso ao tema da participação popular como uma espécie de
ferramenta necessária à melhor formulação e aplicação de suas políticas setoriais. Da mesma
forma, a participação vem sendo apontada como um requisito necessário a uma ação
patrimonial menos engessada ou marcada pelos seus tradicionais conflitos: ora, após tantos
anos de uma reconhecida e consolidada ação patrimonial normalmente tida como
tecnocrática e tocada quase exclusivamente por especialistas ou burocratas — especialmente
no campo do patrimônio material —, a presença ativa dos vários grupos populares (ainda que
tomados por vezes de forma abstrata) por meio de processos participativos traria ao campo

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do patrimônio uma desejável legitimidade democrática, seja na identificação e valorização dos
bens, seja em sua preservação e salvaguarda.

Ainda que não se trate, porém, de um desejo recente para a formulação de políticas e projetos
— é célebre a declaração atribuída a Aloísio Magalhães há mais de trinta anos de que "a
comunidade é a melhor guardiã de seu patrimônio" —, é de tal forma notável a multiplicação
de sua presença nos vários discursos patrimoniais mais recentes que mesmo eventos inteiros
(como o corrente Mestres e Conselheiros) dedicam-se a discuti-la como temática principal. O
setor do patrimônio cultural no interior da gestão pública, afinal, no alto de seus oitenta anos
de institucionalização, estaria razoavelmente atrasado em relação a muitos outros campos
(como a saúde, a educação e mesmo o urbanismo) que desde os anos 1980 vêm se
movimentando no sentido de implantar conselhos setoriais populares e de promover projetos
e programas caracterizados pela presença de processos participativos — ainda que,
curiosamente, os órgãos de preservação já se organizem em torno de conselhos ou
colegiados semelhantes que envolvem participação de membros da sociedade civil desde
pelo menos os anos 1960, quando tais instituições começaram a se multiplicar nos estados
e, algum tempo depois, nos municípios, ainda que limitados à presença de membros da
burocracia e das universidades.

Expressão polissêmica como já ressaltamos, contudo, os sentidos atribuídos à palavra


“participação” escondem por vezes desejos e intenções diametralmente opostas quando
aplicados ao campo do patrimônio: trata-se, afinal, de uma participação limitada à colaboração
nas ações de preservação dos bens previamente identificados pelo Estado? Ou, ao contrário,
trata-se de fato de um reconhecimento do papel ativo dos vários sujeitos sociais na
identificação e reconhecimento dos bens? Tais sujeitos apenas participam em tal identificação
ou efetivamente deliberam? Ou, tomando o problema de outra mirada, a participação envolve
a definição de qual preservação e salvaguarda se está falando ou se limita à indicação do que
deve ser preservado, ficando tal método submetido às técnicas consagradas da ciência da
conservação? Ou, ainda em outra perspectiva, deve a população apenas atuar passivamente
na valorização de tais bens já identificados e preservados? Afinal, como sugere uma leitura
rápida do parágrafo primeiro do artigo 216 da Constituição Federal — “o Poder Público, com
a colaboração da comunidade,1 promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por
meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas
de acautelamento e preservação” —, estaria a população dita “leiga” limitada a colaborar em
ações dirigidas por outrem na preservação de bens?

1 Grifo nosso.
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Este conjunto de perguntas, ainda que pareçam triviais frente à trajetória de reflexões sobre
patrimônio no Brasil e aparentemente já resolvidas de um ponto de vista conceitual e teórico,
revelam-se na prática problemas ainda em aberto no cotidiano das ações dos órgãos de
preservação, nos quais ainda, apesar de tudo, são comuns conflitos entre aqueles que
pretendem lutar pela proteção de bens que supostamente correm o risco de se perder contra
a fúria destruidora seja de uma população que “não conhece” ou “não compreende seu
patrimônio” ou de uma igualmente abstrata fúria do mercado imobiliário, que não respeitaria
aquilo que a tecnocracia patrimonial costuma entender como essencial à identidade e à
memória no país.

Nas páginas seguintes procuro demonstrar como a participação, apesar de ser evocada como
um — necessário, reconheça-se — avanço democrático nas políticas patrimoniais, pode
facilmente se revelar uma armadilha ou panaceia. Para tanto, aproveito-me tanto de reflexões
desenvolvidas no dia-a-dia do trabalho desenvolvido no Centro de Preservação Cultural da
Universidade de São Paulo, onde tentamos desenvolver a temática do patrimônio em uma
perspectiva de cultura e extensão universitária (e, portanto, na qual a dialogicidade constitui
um requisito básico a ser alcançado) como de apontamentos recuperados de meu Trabalho
Final de Graduação, de 2012 — cujo tema, apesar de restrito ao universo da arquitetura,
permite destacar algumas provocações válidas para o universo do patrimônio cultural.

Artigo 216: ainda uma exceção


Em 2009 o professor Ulpiano Bezerra de Meneses abria o I Fórum Nacional do Patrimônio
Cultural: em sua conferência, ao invés de abordar temas complexos relacionados aos mais
avançados e recentes estudos referentes ao campo, o reconhecido especialista preferiu
abordar um tema básico e comentar justamente o artigo 216 de nossa Constituição Federal,
marco normativo elementar do trabalho de qualquer profissional de patrimônio brasileiro. No
que já se tornou um texto clássico para o campo do patrimônio no Brasil, a fala de Meneses
atentara a um aspecto normalmente menosprezado em leituras desatentas do citado texto
constitucional, tão referenciado por todos ligados ao campo: mais do que a introdução e
reconhecimento do patrimônio imaterial como elemento constituinte das políticas públicas
patrimoniais, Meneses lembra que a grande inovação na Constituição foi a localização da
matriz do processo de atribuição de valor dos bens culturais nos grupos sociais que os
enunciam e não nas características materiais dos bens em questão.

A mudança, lembra Meneses, representa uma alteração substancial na base conceitual de


qualquer ação patrimonial: mais do que salvaguardar elementos normalmente associados aos

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discursos usuais dos profissionais de patrimônio sobre os bens culturais (como os aspectos
estético-estilísticos de bens materiais, por exemplo), o desafio que se estabelece a partir de
1988 é o de propiciar, do ponto de vista das políticas públicas, espaços para o reconhecimento
dos valores reconhecidos pelos diferentes grupos presentes na sociedade a respeito de bens
que não necessariamente são aqueles identificados pelos técnicos.

O alerta de Meneses diz respeito, portanto, ao trabalho elementar do profissional de


patrimônio: reconhecer os processos de significação dos bens culturais desenvolvido pelos
mais diversos grupos sociais. Contudo, ainda que se trate de constatação básica e do fato
desse texto vir sendo bastante citado nos últimos anos, tal constatação parece ainda não ter
revolucionado devidamente as práticas de patrimonialização brasileira: insiste-se em legitimar
pedidos de patrimonialização (sobretudo tombamentos, mas também registros) a partir de
uma análise técnica de profissionais de patrimônio — não raro ancorada em argumentos de
autoridade acadêmica perante os populares — que busca nos bens em questão
características documentais ou monumentais que não necessariamente respondem às
variadas formas de apropriação e significação promovidas no cotidiano vivido pelos grupos
sociais aos quais tais bens se relacionam. Em última instância, caso se perca o vínculo
simbólico entre os habitantes/portadores/usuários dos bens culturais e os próprios bens —
muitas vezes devido aos efeitos de engessamento de práticas de uso e fruição decorrentes
de ações de conservação — o próprio sentido da preservação e salvaguarda se perde.

Um recente e já consagrado exemplo deste conflito pode ser ilustrado no caso do processo
de patrimonialização do Cine Belas Artes, localizado na esquina das Avenidas Paulista e
Consolação em São Paulo: como forma de resistência dos frequentadores do cinema —
conhecido por se pautar por uma programação alternativa às salas comerciais — à iminente
interrupção de suas atividades, tal grupo social solicitara ao poder público a patrimonialização
do imóvel como forma de salvaguarda não só da prática cultural que ali tinha lugar como da
própria teia de relações simbólicas estabelecidas entre aqueles sujeitos e aquele artefato
urbano. Por se tratar, porém, de edifício sem as características arquitetônicas “excepcionais”,
“autênticas” ou “raras” usualmente evocadas pelo discurso patrimonial dos profissionais e
acadêmicos, o pedido foi em princípio rechaçado. Independente das muitas questões públicas
relevantes à discussão — que dizem respeito ao eventual privilégio da ação do estado em um
território cultural já privilegiado e frequentado por setores ricos da população — é notável
como o campo institucional do patrimônio não conseguira responder adequadamente não só
ao problema como ao desejo evidente daquele coletivo à participação na formulação de suas
políticas.

Parece-nos ainda que a transformação apontada por Meneses em nosso marco normativo, a
partir de 1988, opera não apenas na esfera da inventariação dos bens culturais mas também
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— e especialmente — na esfera da preservação: ao se reconhecer a matriz do valor como
algo oriundo da relação estabelecida entre os grupos sociais e os seus bens culturais e não
como algo específico da matéria, as ações de conservação e restauro deveriam deixar de
focalizar com tanta intensidade a preservação levada às últimas consequências das
características formais e estilísticas (no caso dos bens materiais, mas também dos processos
e técnicas no caso de bens imateriais) e deveriam direcionar seu olhar para a forma como os
bens são fruídos e continuamente ressignificados, incorporando a participação de seus
fruidores, habitantes e portadores, bem como as mudanças cotidianas e mesmo os eventuais
processos de destruição e transformação de suas características materiais. Na mesma
medida, os processos de valorização e difusão dos bens não deveriam focar as características
documentais normalmente identificadas pelo discurso enunciado por arquitetos, historiadores,
arqueólogos, etc., mas nesses contínuos processos de significação e ressiginificação
cotidianos, nos quais a população participa de forma orgânica alterando elementos materiais,
substituindo-os e atualizando-os.

Neste sentido, qual o papel efetivamente associado aos processos participativos quando o
campo institucional do patrimônio evoca a participação como requisito desejável à formulação
de suas políticas e projetos? Em princípio a cultura patrimonial estabelecida e consagrada vê
na participação um inimigo, já que ela envolveria uma população que não estaria devidamente
informada do que significa algo ser um bem cultural. A preservação, nesta perspectiva, busca
proteger os bens da ação deletéria das pessoas — trata-se, grosso modo, de perspectiva
oposta àquela destacada por Meneses em seu comentário sobre o artigo 216 da Constituição
Federal. De outro lado, em oposição a esta perspectiva já considerada antidemocrática e
tecnocrática, a participação é vista como elemento importante em atribuir legitimação
democrática e popular aos processos de patrimonialização — o que pode torná-la ao mesmo
tempo uma armadilha e uma panaceia.

Participação: panaceia ou armadilha democrática


Para ajudar a responder a pergunta formulada acima, verifiquemos a presença do discurso
participativista em outros campos próximos ao do patrimônio cultural. Há dez anos vem
circulando com impacto considerável, tanto entre setores da esquerda quanto entre
pesquisadores e grupos ligados à academia, um texto da urbanista Ermínia Maricato com o
sugestivo título “Nunca fomos tão participativos.” Com efeito, a autora destaca que nunca
antes viveu-se tão efervescente clima de participação democrática no Brasil, marcada por
inúmeros conselhos, conferências e eventos públicos para formulação e discussão de
políticas estatais. Porém, segundo a autora (2007):
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Do Banco Mundial, passando pela Banco Itaú e um número incontável
de ONGs, a participação democrática está em todas as agendas
envolvendo, de preferência, também os pobres da periferia.

No World Urban Forum, que teve lugar em Vancouver, em 2006, a


representante do Banco Mundial foi uma das mais fervorosas
defensoras da participação democrática em uma mesa redonda
denominada Poverty Alliviation and Participation. Certamente, a
diretora do Bird se referia à participação dos moradores na busca de
soluções para aplicar de forma eficiente, e sem corrupção, os parcos
recursos destinados a melhorar a rua, a casa ou o bairro, local de
moradia da comunidade. Não passava pela sua cabeça incentivar a
participação dos pobres urbanos no debate sobre a gigantesca
transferência de recursos públicos para a esfera financeira por meio
do pagamento de juros da dívida pública, como acontece em países
periféricos como o nosso. […]

Mas essa possibilidade, de debater temas estruturais, é longínqua não


apenas para a diretora do Bird, mas também para a maior parte dos
movimentos sociais e ONGs que se multiplicam no Brasil e no mundo,
guiados pela hegemonia do “participativismo”.

Ainda que o contexto a que este texto faça referência seja outro, é possível extrair dele
algumas lições para a atual corrente “participativista” verificada em parte das discussões
patrimoniais. Maricato alertava para a transformação da participação em um “fim em si
mesmo”, pelo qual a ação de movimentos sociais e políticos se burocratizava e se esvaziava
pela limitação de sua ação ao campo institucional — os objetivos em princípio alvejados pela
estratégia participativa acabam minimizados pelo esforço próprio em tornar a estratégia
efetiva, ainda que apenas formalmente. Neste sentido — mais uma vez, guardadas as devidas
diferenças de escala e de conteúdo entre o patrimônio cultural e a pauta da reforma urbana
que estava na perspectiva da crítica da autora —, o texto nos ajuda a perceber as armadilhas
de um eventual esforço participativo que, para além de uma meritosa intenção inicial no
envolvimento de diferentes sujeitos em qualquer tipo de empreitada cultural acaba por apenas
tomá-la em uma perspectiva formal (cumprindo ou uma participação protocolar, ou uma
participação direcionada para legitimar interesses prévios). Com efeito, como comentamos
acima, no caso do patrimônio cultural, seria admissível por parte dos profissionais e
acadêmicos da comunidade patrimonial que a população participasse em um processo que
demandasse a destruição de bens culturais protegidos com os quais ela eventualmente
estabelecesse outras formas de apropriação que não a preservação?
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Por outro lado, contra uma ação patrimonial tradicionalmente afastada das pessoas, outros
profissionais e acadêmicos ancoram-se em perspectivas como a da já citada frase atribuída
a Aloísio Magalhães: “A comunidade é a melhor guardiã de seu patrimônio.” Aparentemente
mais progressista e participativista, porém, essa perspectiva pode eventualmente reunir
também sua dose de perversidade. Como lembra Marilena Chauí (2006), os grupos
dominantes das sociedades capitalistas, ao longo do século XX, adotaram eventualmente o
discurso do participativismo não como meio de concessão às classes populares de qualquer
forma de deliberação ou autonomia, mas de capitulação e incorporação de seu trabalho. A
participação aqui, portanto, é tomada em perspectiva evidentemente ideológica. Segundo a
autora (2006: 145–146):

Na linguagem da socialdemocracia e do liberalismo, a participação


torna-se sinônimo de lobby (quando se trata da classe dominante) e
reivindicação ou demanda (quando se trata da classe trabalhadora). A
participação é vista como pressão sobre os órgãos públicos de poder.
Na versão da democracia cristã, não se trata de reivindicação nem de
demanda, mas da realização de uma ação que suprima uma carência.
A participação é o mutirão. Temos, assim, duas apropriações do
conceito de participação e da sua prática: ou fica reduzida a formas
variadas de pressão ou se reduz ao trabalho popular coletivo e
voluntário.

De onde vêm essas concepções de participação? Do lado liberal e


social-democrata, da ênfase dada à ideia de representação — a
participação é uma pressão ou um jogo de influências sobre
representantes eleitos; refere-se a interesses. Do lado da democracia
cristã, da ênfase dada à ideia da pobreza — a participação é a luta do
povo de Deus contra a miséria; refere-se a carências. Essas
concepções e práticas encontram justificativa na afirmação de que,
nas sociedades de massa modernas, a democracia participativa é
impossível, pois é impossível a participação política de todos nas
deliberações e decisões. Ou seja, a participação é tomada nos sentido
numérico, demográfico, quantitativo e não em seu significado
propriamente político.

A mesma autora, ao comentar o programa desenvolvido quando de sua gestão na Secretaria


de Cultura do Município de São Paulo, entre 1989 e 1992, reforça a necessidade de, do ponto
de vista da formulação de políticas culturais, estabelecer esforços para superar não só o mero

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acesso aos bens culturais como também a participação nos bens: o direito à cultura, na
perspectiva do que se chamava “cidadania cultural”, deve propiciar condições para que os
cidadãos vejam a si mesmos não só como consumidores de cultura mas como sujeitos
produtores de cultura, dotados da autonomia necessária para tal. Neste sentido, a política
cultural deveria prever o acesso aos bens, a participação na formulação de políticas mas
também, e sobretudo, a possibilidade de que os cidadãos produzissem cultura.

Do ponto de vista das políticas patrimoniais, o que isto significa? De um lado, reconhecer na
participação uma armadilha: ela pode se reduzir a instrumento para direcionamento de
opiniões e processos populares para apenas legitimar decisões já previamente tomadas por
grupos de poder. De outro, evitar tomar a participação como panaceia para a solução dos
problemas de ausência de legitimidade democrática das ações de patrimonialização: para
isto, parece-nos que se revela necessário investir em efetivos canais dialógicos na definição
das ações. Pois, como lembra o educador Paulo Freire (citado por Weyh em Streck et alli,
2008: 302–303):

Para nós, a participação não pode ser reduzida a uma pura


colaboração que setores populacionais devessem e pudessem dar à
administração pública. […] Implica, por parte das classes populares,
um “estar presente na história e não simplesmente nela estar
representadas”. Implica a participação política das classes populares
através de suas representações ao nível das opções, das decisões e
não só do fazer o já programado. […] Participação popular para nós
não é um slogan, mas a expressão e, ao mesmo tempo, o caminho da
realização democrática da cidade.

Escada da participação na patrimonialização


Sherry Arnstein celebrizou em 1969, em seu artigo “A Ladder of Citizen Participation”, a ideia
de uma gradação de possibilidades de participação cidadã na formulação e execução de
políticas públicas. Ainda que seu argumento estivesse bastante ligado ao contexto específico
no qual a autora estava trabalhando (particularmente o da gestão de projetos comunitários
em bairros considerados problemáticos de Nova Iorque), Arnstein estabelecera um
interessante modelo de averiguação do grau de poder efetivo exercido pelos cidadãos em
processos que se pretendiam democráticos. Ainda que tal metrificação da participação
pudesse mais tarde, eventualmente, colaborar para a burocratização das práticas
participativas, visto que estabelece margens de manobra para a mediação de conflitos de
poder, o modelo foi relevante como forma de ilustrar o quão pouco democrático pode ser um
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processo participativo cuja intenção seja a de mascarar a concentração do poder decisório
nas mãos de grupos dominantes quando da concessão de migalhas de poder a grupos de
resistência.

A autora estabelece três graus de envolvimento da população nos processos de formulação


e execução de políticas públicas:

1. “Não participação”: marcado pelos degraus de “manipulação” e de “terapia”

2. “Cotismo”2: dividido pelos degraus de “informação”, “consulta” e “mediação de conflitos”3

3. “Poder cidadão”: dividido, por sua vez, em “parceria”, “poder delegado” e “controle
cidadão”.

Como se vê apenas pelos títulos, os dois primeiros graus (“não participação” e “cotismo”)
envolvem em grande medida processos de cooptação de forças populares e capitulação dos
discursos de resistência, resguardando as posições de poder privilegiadas. Será apenas na
superação das medidas inferiores da escada (da “manipulação” à “mediação de conflitos”)
que será realmente possível falar em participação cidadã. À época da produção do artigo, a
autora debatia justamente as possíveis consequências de promoção de projetos ancorados
na perspectiva do “poder cidadão”: os eventuais resultados envolveriam uma indesejável
descentralização de políticas públicas em projetos autônomos fragmentados e a consequente
inefetividade das ações e aumento generalizado de custos e de dispêndio de recursos
públicos. No entanto, a autora concluía seu artigo afirmando enfaticamente que os grupos que
exigiam o “poder cidadão” por meio da autogestão de suas comunidades estavam certos
quando argumentavam que nenhuma outra forma de participação havia de fato obtido
sucesso em superar todos os seus problemas inerentes e limitações.

Em outras palavras: temia-se com o “poder cidadão” que, do ponto de vista institucional da
formulação de políticas públicas, tudo saísse do controle. Do ponto de vista do patrimônio
cultural, porém, talvez seja realmente o caso de estimular situações fora de qualquer controle
— pois, afinal, de que controle falamos quando nos referimos à preservação e salvaguarda
do patirmônio? Práticas patrimoniais institucionais tradicionalmente visam a preservação dos
bens culturais de modo a controlar sua inevitável degradação: esta é a situação ótima
desejável pela maior parte dos profissionais de patrimônio, a situação idealmente “controlada.”

No entanto, como já questionamos acima, ao desviar o foco da ação patrimonial dos bens
para os sujeitos — como destacado por Meneses em sua leitura do texto constitucional —

2 No original: “tokenism”.
3 No original: “placation”.
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não é a situação “idealmente controlada” que talvez interesse à complexa teia de relações
simbólicas que deveria orientar a patrimonialização de bens, mas, ao contrário, o
reconhecimento da contingência e da multiplicidade de distintas narrativas e apropriações
possíveis na relação entre os bens e os sujeitos.

Neste sentido, a fim de evitar tanto a armadilha ideológica do participativismo quanto sua
redução a panaceia, deveríamos nos questionar em última instância se um efetivo “poder
cidadão” não deveria propiciar espaços nos quais os vários grupos sociais pudessem
apresentar suas próprias estratégias — autoproclamadas e autogeridas — de identificação,
salvaguarda e valorização dos bens culturais.

A forma de inventariar necessariamente muda: ao invés de buscarmos “elementos da


arquitetura eclética em São Paulo”, por exemplo, talvez nos interesse identificar e dialogar
com as mudanças cotidianamente produzidas pelos moradores dessas (e de outras)
arquiteturas como traço cultural específico de seu morar.

A forma de preservar e salvaguardar muda: ao invés de “estancar a sangria” promovida por


“adições espúrias” e “descaracterizações estilísticas”, talvez nos interesse salvaguardar
justamente as práticas do morar materializadas por essas mudanças cotidianas. Promover
processos participativos de preservação talvez signifique, em última instância, renunciar
completamente à cultura conservacionista de matriz franco-italiana que tanto evocamos em
nossos eventos e publicações sobre patrimônio para incorporar métodos etnográficos pelos
quais outra forma de conservar e de destruir se explicitem e para que outros métodos sejam
enunciados pelos próprios sujeitos participantes.

A forma de divulgar e valorizar o patrimônio muda: ao invés de evocar a excepcionalidade e


autenticidade dos bens, talvez trate-se de explorar os encontros, desejos e anseios de seus
diferentes fruidores e promover diálogos e confrontos com aqueles que os desconhecem.

A questão, aliás, não está mais sequer em saber se estamos tombando e preservando apenas
bens das elites ou de alguns traços limitados da memória nacional — como se costuma
lembrar ao criticar o rol patrimonializado brasileiro —, mas em inverter os olhares aos
processos de patrimonialização desses mesmos bens, acrescidos de outros: que outras
presenças são tornadas ausências na fruição cotidiana dos bens e na sua ressignificação e
apropriação?

A título de ilustração, pensemos no caso clássico da Cité Frugés de Le Corbusier, conjunto


urbanístico construído em Pessac e inaugurado em 1924. Aos olhos da cultura patrimonial
tradicional, trata-se de um exemplar “autêntico” e “excepcional” da arquitetura moderna,
“relíquia” do mestre franco-suíço dotado de todos os valores arquitetônicos usualmente
associados à preservação do patrimônio e portanto digno de ser tombado. As alterações
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cotidianas feitas pelos seus moradores ao longo de quase um século, contudo, teriam tornado
o conjunto “descaracterizado”. Segundo Blundell-Jones (2005: 133):

Os habitantes (da Cité Frugés) tomaram a provisão de 1926 do mestre


como uma base para improvisações posteriores e bricolage,
preenchendo espaços caracterizados como pilotis, substituindo
fenetres en longuer por janelas tradicionais, adicionando telhados
inclinados, decoração, etc. Os edifícios se provaram
maravilhosamente conversíveis, mas as mudanças minaram
completamente a teoria Purista de Corbusier, sua “estética primária”
de bom gosto universal que se supunha repousar em formas
geométricas puras e em cores primárias. O povo de Pessac não
estava preparado para viver sob esta imagem mas a refez ao seu
modo, de acordo com seus valores.

O autor ainda destaca que foi apenas a publicação do célebre estudo de Phillipe Boudon a
respeito das transformações “vernaculares” na arquitetura de Le Corbusier que fez com que
tais mudanças fossem tomadas seriamente pela academia, ressaltando que “não foi até que
Pierre Bourdieu demonstrasse estatisticamente a base social das preferências de gosto” para
que tal fenômeno viesse a ser reconhecido como prática cultural relevante — ainda que, de
todo modo, tal constatação possa levar ela própria à tentativa de patrimonializar tais
mudanças e a colocá-las em uma redoma de vidro.

Talvez, mais uma vez, em última instância, uma efetivamente participativa política patrimonial
devesse se viabilizar de forma completamente invisível e transparente: deixando as coisas
saírem do controle, evitando colocá-las em redomas de vidro institucionais limitadas por
tombamentos ou registros, mas cooperando com o efetivo “poder cidadão” dos grupos
interessados, reconhecendo sua autonomia como sujeitos produtores de cultura.

Por uma erótica do patrimônio


Tomando por perspectiva as reflexões produzidas acima, chegamos enfim a um ciclo vicioso
aparentemente insolúvel. Apesar dos avanços gigantescos verificados em anos recentes
(sobretudo pela incorporação de métodos etnográficos nos inventários nacionais de
referências culturais, especialmente nos casos em que as fronteiras entre o patrimônio
material e imaterial se diluem) a perspectiva permanece a da legitimação da ação popular
pela fala do técnico ou do acadêmico — que, por sua vez, depende da “participação” popular
para dotar sua fala de legitimidade democrática.

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12
De um lado técnicos e acadêmicos buscando prover de legitimidade sobretudo por meio da
“hermenêutica” bens enunciados por grupos populares e de outro grupos populares tendo
seus discursos capturados pela retórica erudita daqueles a fim de legitimá-los. Provocamos
no início deste texto a necessidade de abandonar toda a hermenêutica do patrimônio em prol
de uma nova erótica. Até aqui concentramo-nos, porém, na problematização da inserção de
práticas participativas na perspectiva dos formuladores das políticas públicas e das iniciativas
estatais de patrimonialização — esfera em que a citada erotização da ação patrimonial parece
ingênua ou impossível. Talvez seja, contudo, nas recentes iniciativas do tipo “de baixo para
cima” que tal erotização seja não só possível como inerente à ação estética e política de
coletivos e sujeitos que promovem práticas de patrimonialização independentes do campo
institucional. Tal erotização promovida por tais grupos ultrapassa os limites engessados dos
instrumentos institucionais disponíveis, como o tombamento ou o registro de bens,
incorporando diferentes práticas performáticas que potencializam os laços simbólicos
possíveis e existentes entre sujeitos e bens. Já são célebres casos como o do Cais Estelita
(Recife/PE), dos movimentos pela reapropriação da Fábrica de Perus, do Parque Augusta, do
Largo da Batata e da Casa Amarela (São Paulo/SP), entre outros. Ainda que cada um desses
grupos e movimentos apresente pautas variadas e repletas de eventuais contradições
internas, é inegável a força poética — cada um a seu modo — com que práticas, artefatos,
monumentos e paisagens são mobilizadas por diferentes sujeitos em uma teia cultural cada
vez mais complexa e fascinante.

O potencial transformador dessa força poética como elemento fundamental na construção de


processos autogestionários (e, portanto, eminentemente “participativos”) de patrimonialização
nos foi alertada por uma série de trabalhos desenvolvidos ao longo de nossa atuação no
Centro de Preservação Cultural da USP (CPC): justamente por se tratar de espaço
institucional não voltado diretamente à formulação de políticas públicas de patrimônio — visto
que tratamos do assunto na perspectiva da cultura e extensão universitária — pudemos testar,
em parceria com alguns grupos, formas outras de dialogar com os bens culturais.

Destacamos, em particular, o projeto Trafegar pelos Rios do Bixiga, promovido entre 2013 e
2015: a partir de uma oficina desenvolvida em parceria com os membros do Coletivo Mapa
Xilográfico4 voltada à produção de uma série de intervenções urbanas com foco nos rios
canalizados que conformam o território do Bixiga, onde se encontra a sede do CPC, formou-
se de forma autônoma, entre os participantes da oficina e os muitos interessados que se
incorporaram ao processo ao longo das intervenções, um novo coletivo denominado Bloco
Fluvial do Peixe Seco, que vem atuando no espaço urbano de forma intensamente poética

4 Grupo formado pelos artistas e educadores Diogo Rios, Milene Valentir e Tábata Costa.
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pautando a relação da cidade com seus rios — suas memórias, traços, presenças e
ausências. Desde 2014 o Bloco promove novas intervenções urbanas de forma plenamente
autogestionada, colaborando efetivamente para a patrimonialização da rede hídrica paulista:
identificando-a, debatendo sua salvaguarda (física e simbólica) e valorizando-a. Em 2015 e
2016 todo o processo foi objeto de uma exposição na sede do CPC chamada Hidrofaixas: rios
visíveis do Bixiga, na qual buscamos registrar as práticas do grupo5. Pela sua ação direta,
portanto, tal grupo nos provoca a pensar em outras erotizações possíveis do patrimônio, para
além das ações institucionais consolidadas.

Com a devida licença poética e cientes do anacronismo envolvido, permitamo-nos então


concluir parafraseando o clássico texto de Sontag (1964):

Nossa tarefa não é encontrar a máxima quantidade de conteúdo em


um bem cultural (uma obra de arte), muito menos espremer mais
conteúdo de um bem (de uma obra) que já está lá. Nossa tarefa é
cortar o conteúdo de tal forma que possamos ver a coisa de fato.

O objetivo de todo comentário sobre o patrimônio cultural (sobre arte)


deveria se concentrar em tornar os bens culturais (obras de arte) — e,
por analogia, nossa própria experiência —, mais, ao invés de menos,
reais para nós. A função da crítica deveria estar em mostrar como ele
é o que ele é, mesmo em que ele é o que ele é, ao invés de mostrar o
que ele significa.

Ao invés de uma hermenêutica, precisamos de uma erótica do


patrimônio (da arte).

Referências
ARNSTEIN, Sherry. A Ladder of Citizen Participation. Journal of the American Institute of
Planners, v. 35, n. 4, jul/1969, pp. 216–214.

BLUNDELL-JONES, Peter. Sixty-eigth and after. In: BLUNDELL-JONES, Peter;


PETRESCU, Doina; TILL, Jeremy (orgs.). Architecture and Participation. Nova Iorque: Taylor
and Francis, 2005, pp. 127–140.

5 Para mais detalhes sobre o processo, verificar o relato que produzimos em Fernandes, 2014.
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14
CHAUÍ, Marilena. Cidadania cultural. O direito à cultura. São Paulo: Fundação Perseu
Abramo, 2006.

FERNANDES, Gabriel. Práticas patrimoniais entre a formação e a ideologia. Contribuição ao


debate a partir das práticas do Centro de Preservação Cultural da Universidade de São
Paulo. Anais do VI Fórum Mestres e Conselheiros, 2014.

MARICATO, Ermínia. Nunca fomos tão participativos. Carta maior, 26/11/2007, disponível
em <http://www.cartamaior.com.br/?/Opiniao/Nunca-fomos-tao-participativos/20899>

MENESES, Ulpiano Bezerra. O campo do patrimônio cultural. Uma revisão de premissas. In:
Anais do I Fórum Nacional do Patrimônio Cultural. Brasília: IPHAN, 2009.

SONTAG, Susan. Against Interpretation. Disponível em <http://shifter-magazine.com/wp-


content/uploads/2015/10/Sontag-Against-Interpretation.pdf>

WEYH, Cênio. Participação. In: STRECK, Danilo; REDIN, Euclides; ZITKOSKI, Jaime
(orgs.). Dicionário Paulo Freire. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.

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POR UMA VISÃO HUMANA DO PATRIMÔNIO: Repensando o
Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural e Natural de
Sabará/MG

BOEING, Rafael Antônio Motta (1); COSTA, Graziela Elem Ferreira (1).

1. Prefeitura de Sabará. Secretaria Municipal de Cultura


Rua Dom Pedro II, 72, Centro, Sabará/MG
cultura@sabara.mg.gov.br

RESUMO
O município de Sabará/MG possui seu próprio Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural e Natural
desde o ano de 2006. Composto por representantes da sociedade civil e poder público, este órgão
colegiado se tornou então um dos principais responsáveis pela proteção, conservação e salvaguarda
do patrimônio material e imaterial do município. No presente artigo, os autores pretendem abordar a
importância da participação da sociedade civil como instrumento fundamental para a concretização
deste propósito. Partindo da premissa de que o patrimônio não deve mais ser tratado como assunto
meramente técnico (à maneira das políticas de “pedra e cal”), buscar-se-á refletir sobre medidas para
a consolidação de uma visão mais humana, participativa e democrática para as políticas públicas de
patrimônio, a qual integre, em sua formulação, implantação e avaliação, o máximo da diversidade das
comunidades direta ou indiretamente vinculadas a bens culturais protegidos do município. Para tanto,
analisar-se-á dois casos específicos: a ampliação da representatividade social dentro do Conselho
em questão por meio da reformulação de sua dinâmica interna e o estímulo a uma atuação mais
incisiva e proativa dos conselheiros da sociedade civil através da formação de comissões temáticas,
entre outros espaços direcionados à proposição e mobilização de ações e agentes – de modo a
extrapolar uma participação restrita às plenárias e votações sobre requerimentos e pareceres. Sendo
assim, o artigo se debruçará sobre questões teóricas e práticas relativas à composição,
representação e função do Conselho em questão, levantando possibilidades para melhorar não
apenas sua capacidade deliberativa, mas também propositiva e mobilizadora.

Palavras-chave: Participação, Patrimônio, Conselho, Representação, Mobilização

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INTRODUÇÃO

O município de Sabará conta atualmente com 126.269 habitantes, (IBGE, 2010) e é


a cidade histórica mais próxima da capital Belo Horizonte. Falar de Sabará é reportar a um
passado vivo e a uma história relevante em nível nacional. Isso se evidencia no acervo
histórico cultural que a cidade possui. O casario em estilo colonial, as igrejas e capelas
construídas no ciclo do ouro, o imaginário popular manifestado através das lendas, causos,
festas populares, religiosidade, arte e artesanato, constituem um amplo acervo.

No discurso dos centros históricos em especial, há de se considerar a relação entre


modernidade e tradição. O ritmo das transformações engendradas pelo Capital gera uma
sensação de desterritorialização e falta de identidade nas gerações atuais e por isso a
necessidade de se buscar referências culturais da memória individual e coletiva, tendo como
ferramenta as políticas de proteção ao patrimônio cultural, que se articulam para valorizar o
passado em um processo de estreitamento com o presente.

Ressaltando como preocupação maior a ambiência, o significado e a forma como a


população vivenciou e vivencia a cidade, a abordagem priorizada abrangerá sobretudo as
inter-relações entre os bens de origem material, imaterial e natural, em suas variadas
manifestações e suportes, inclusive aqueles que vão além dos critérios estilísticos,
arquitetônicos e históricos. Portanto, “o patrimônio supera a abordagem histórico-estilística e
passa a ser trabalhado dentro de uma concepção que integra as questões socioeconômicas,
técnicas, estéticas e ambientais” (Castriota, 2009, p. 87). Prosseguiria-se dessa forma
tangendo noções referentes à cultura local (a casa, os espaços públicos e o mobiliário; os
instrumentos de trabalho e técnicas de uso; os cultivos e alimentação locais; a flora e fauna
nativas), assim como questões imateriais (a oratória, os saberes do ofício, as festas
tradicionais, crenças, manifestações religiosas) a fim de recuperar a autoestima da
comunidade e concientizá-la da importância de se preservar o patrimônio por meio do
resgate da memória coletiva, dos modos de fazer e da percepção e reconhecimento dos
valores culturais locais.

HISTÓRICO DAS POLÍTICAS MUNICIPAIS DE PATRIMÔNIO DE SABARÁ

O município de Sabará/MG vem trabalhando em prol da implementação de políticas


municipais para a salvaguarda de seu patrimônio cultural desde pelo menos o ano de 1991.
Esta data constituiu um marco histórico da formulação dessas políticas, uma vez que, nela,

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dois instrumentos legais fundantes, vigentes até hoje, foram publicados, quais sejam: a Lei
Municipal nº 423/1991 e o Decreto nº 217/1991. A Lei Municipal nº 423/1991 estabeleceu a
proteção de bens culturais e naturais dotados de valor histórico, artístico, filosófico ou
científico através do mecanismo do tombamento na esfera municipal, bem como autorizou o
Poder Executivo a instituir, por decreto, um conselho consultivo – na qualidade de “órgão de
assessoria da Prefeitura” – com a atribuição de zelar pela preservação dos bens em
questão. O Decreto nº 217/1991, por sua vez, veio instituir o Conselho Consultivo Municipal
do Patrimônio Cultural e Natural de Sabará, determinando-lhe a quantidade de membros,
sua forma de nomeação, a duração dos mandatos, a estrutura organizativa e as atribuições
específicas. Inicialmente, porém, nenhum dos dois instrumentos foi efetivamente posto em
execução – tanto o mecanismo do tombamento quanto a atuação de um conselho na esfera
municipal foram propostas que se mantiveram tão-somente no papel. À exceção do
tombamento municipal da Capela de Nossa Senhora da Soledade, feito ainda sem a
existência de um Conselho, no ano de 1992, não existem registros de que o município tenha
aplicado a Lei Municipal nº 423/91 durante o período entre 1991 e 1998. Somente no ano de
1998 é que os instrumentos em questão começaram a gerar seus primeiros efeitos. A
nomeação dos primeiros membros, a lavragem da primeira ata e a inscrição dos primeiros
tombamentos do Conselho Consultivo do Patrimônio é datada dessa época. Cumprindo o
Decreto nº 217/1991, o Conselho foi formado por sete membros efetivos e seus respectivos
suplentes, designados pelo então Prefeito por sua “reputação ilibada e competência em
assuntos compreendidos nos objetivos” da Lei nº 423/1991, além de ter sido dotado, logo de
imediato, da responsabilidade de propor à Prefeitura o tombamento de bens culturais e
naturais. Nos anos imediatamente subsequentes à sua ativação, o Conselho estudou,
propôs e aprovou (por meio da homologação do Chefe do Executivo) o tombamento de
dezenas de bens culturais do município, com destaque para aqueles inseridos no território
de sua Sede e que, dotados de valor histórico, ainda não haviam sido tombados em nível
federal ou estadual, tais como as Pontes Ferroviárias sobre o Rio das Velhas e o Rio Gaia,
as Capelas do Senhor Bom Jesus e de Nossa Senhora do Bom Despacho, os Chafarizes da
Confraria e do Corte Real, as Praças Melo Viana e Santa Rita, entre outros.

Cabe destacar que esses efeitos foram resultados não apenas da legislação
municipal, mas de um programa do governo estadual: o ICMS Cultural. Inaugurado pela Lei
Estadual nº 12.040/1995, ou Lei Robin Hood, o programa do ICMS Cultural se tornou então
um dos principais indutores da adoção de políticas municipais direcionadas ao patrimônio no
estado de Minas Gerais. Na medida em que estipulou a redistribuição de uma parcela do
Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de
Serviço (ICMS) com base em critérios de preservação dos bens culturais e/ou naturais de
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cada município, o programa veio incentivar diversas Prefeituras a desenvolverem ações de
patrimonialização de bens culturais em nível municipal, sobretudo por meio da atuação de
conselhos gestores das políticas do setor. Embora o ano de 1995 tenha sido o marco inicial,
o programa obteve sua regulamentação básica somente nos anos de 1996 e 1997. Nessa
regulamentação, o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais
(IEPHA/MG) – órgão responsável por orientar os municípios em suas ações
preservacionistas – definiu a existência de “Planejamento e Política Municipal de Proteção
do Patrimônio Cultural” como importante atributo de pontuação dentro do programa. Tal
atributo seria comprovado não apenas através da criação e manutenção de uma legislação
municipal e/ou de uma equipe técnica específica, mas também dos referidos conselhos:

As fontes apontam que a partir do ano de 1999 o instituto incluiu, entre as


suas exigências, a criação de conselho municipal de patrimônio cultural
como parte integrante de um aparato institucional fundamental ao trato com
os bens culturais. Desde então os municípios, para se credenciarem ao
repasse do ICMS pelo critério do patrimônio, precisariam atestar a
existência desses conselhos, lançando mão de uma série de documentos
que comprovassem a execução das atividades daquelas instâncias (Cruz e
Souza; Moraes; 2014, p. 135).

É curioso observar que essa exigência do IEPHA/MG dialogava com as tendências


daquela época em se buscar a ampliação da participação social na configuração das
políticas públicas. De certo modo, ela fazia juz ao que foi disposto no Artigo 216 da então
recente Constituição Federal, cujo Parágrafo 1º determinava:

§ 1º. O poder público, com a colaboração da comunidade, promoverá e


protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros,
vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de
acautelamento e preservação (Brasil, 1988).

No seu intuito de potencializar “os resultados do processo descentralizador através


do incentivo financeiro à execução de ações locais” (Cruz e Souza; Moraes, 2014, p.133), as
regulamentações do programa do ICMS Cultural puseram os conselhos em destaque como
uma parte fundamental da configuração da política cultural local. Sendo assim, sua
existência assumiu o papel de modelo de ação do IEPHA no sentido de municipalizar as
políticas patrimoniais. Nas palavras de Luciana Christina Cruz e Souza e Nilson Alves de
Moraes “a existência dos conselhos concretiza um programa de municipalização das
políticas [...], tendo os conselhos a função de possibilitar a participação da sociedade na
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configuração das políticas” (2014, p.137).

Sendo assim, no plano teórico tais instâncias seriam capazes de expressar


diferentes interesses e constituiriam uma arena adequada à seleção de
bens culturais a serem institucionalizados como patrimônio, uma vez que
traduziriam as demandas públicas – de interesse comum – pela proteção de
bens de valor simbólico, capazes de evocar memórias e (re) definir
identidades sociais (Cruz e Souza; Moraes; 2014, p. 137).

Um dos documentos responsáveis por consolidar essa diretriz do programa foi a


Resolução nº 01/1997, a qual repercutiu diretamente justo sobre os trabalhos durante o ano
de 1998, ocasião em que o Conselho Consultivo Municipal do Patrimônio Cultural e Natural
de Sabará enfim foi posto em funcionamento. O município de Sabará, porém, se antecipou à
determinação, pelo IEPHA/MG, da obrigatoriedade desse elemento da política cultural local,
a qual ocorreu somente no ano de 1999. Os primórdios de sua existência foram, inclusive,
caracterizados por uma atuação bastante intensa dos conselheiros e de modo algum podem
ser reduzidos a um mero reflexo do programa do ICMS Cultural, limitado ao cumprimento do
protocolo exigido para a arrecadação da verba disponibilizada pela legislação estadual.

No período entre 1998 e 2002, em apenas cinco anos de funcionamento, o Conselho


foi responsável pelo tombamento de 25 (vinte e cinco) bens imóveis na esfera municipal,
além de ter contribuído para a produção de um amplo inventário de estruturas e conjuntos
arquitetônicos e urbanísticos do município e ter trabalhado pela proteção, conservação e/ou
restauração de muitos dos bens em questão, independente de quais fossem suas esferas
de tombamento. Inicialmente restrita à materialidade do patrimônio, a atuação do Conselho
não tardou em expandir sua perspectiva e direcionar seu olhar também para os bens
culturais de natureza imaterial existentes no município. Na esteira dos recém criados
programas de Patrimônio Imaterial nas esferas federal e estadual, o município de Sabará
instituiu o seu próprio Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial ou Intangível através
do Decreto Municipal nº 410/2002. Logo em seguida, no ano de 2003, o Conselho propôs,
instruiu e aprovou o seu primeiro registro, direcionado ao Modo de Fazer da Renda Turca de
Bicos de Sabará. Paralelamente, a categoria dos bens imateriais foi incluída no
planejamento e execução do inventário do patrimônio cultural do município, levando outros
saberes, celebrações e lugares a serem mapeados, identificados e fichados. Assim como a
maior parte dos tombamentos, porém, a experiência inicial de registro (juntamente com os
inventários de bens materiais ou imateriais) esteve focada sobre o patrimônio da Sede do

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município, desconsiderando as inúmeras contribuições dos Distritos e Regionais para a
formação da comunidade sabarense.

O período entre 2004 e 2006 representou um importante momento de transição,


consolidação e amadurecimento das políticas municipais de salvaguarda do patrimônio,
marcado tanto pelos avanços em sua legislação específica, quanto pela expansão das
funções, competências e responsabilidades do Conselho. No ano de 2004, o município
aprovou uma nova Lei de Uso e Ocupação do Solo, cujo zoneamento determinou uma
proteção específica para as “áreas comprometidas com a preservação da história do
município”, chamadas de Áreas de Proteção do Patrimônio Cultural (APCs). Na relação de
edificações, conjuntos e lugares definidos como APC, foram incluídos bens culturais não
apenas da Sede/Centro do município, mas de todos os seus três Distritos. O instrumento
não fazia referência direta ao Conselho Consultivo do Patrimônio, mas exigia que
construções ou reformas acima de 50% nessas áreas deveriam antes “ouvir” o “órgão
municipal responsável pela proteção e defesa do patrimônio histórico e cultural”. No ano de
2005, por sua vez, o município criou oficialmente, através da Lei Municipal nº 1.323/05, o
seu primeiro Programa de Educação Patrimonial, com o objetivo de promover a valorização
do patrimônio histórico e natural dentro das escolas da rede municipal de ensino. No ano de
2006, foi a vez de se criar um Programa de Revitalização do Patrimônio Cultural do
Município, formalizado pela Lei Municipal nº 1.374/06, de 17 de janeiro de 2006, e
regulamentado pelo Decreto Municipal nº 888/06, de 17 de fevereiro de 2006. Diretamente
vinculado ao Conselho, o programa consistia em auxílio técnico e financeiro prestado pelo
município de Sabará a proprietários de bens imóveis tombados, inventariados ou de
interesse histórico-cultural e destinado à sua conservação por meio de reforma de cobertura,
estrutura, fundação, instalações, esquadrias, além de imunização e pintura. Para obtê-lo, os
proprietários deveriam preencher os requisitos estabelecidos pela legislação e apresentar
um projeto da intervenção necessária, ou desejada, para análise e aprovação do então
Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural e Natural de Sabará.

A criação do Programa de Revitalização do Patrimônio esteve, de certo modo,


diretamente associada com uma significativa expansão das funções do Conselho Consultivo
do Patrimônio. Pouco antes da publicação da Lei nº 1.374/06, este “órgão de assessoria da
Prefeitura” teve sua denominação alterada pelo Decreto Municipal nº 1.366/05, de 28 de
dezembro de 2005, tornando-se então um conselho deliberativo e adquirindo, com isso, uma
nova função. O órgão não se limitaria mais à competência de assessorar o governo no
processo de formulação das políticas em questão, respondendo consultas, propondo
medidas, mas adquiria também o poder de estabelecer diretrizes para as mesmas políticas,
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bem como de aprovar recursos, orçamentos, planos, decidindo em instância final sobre
várias questões importantes. Logo em seguida, em 17 de janeiro de 2006, o agora Conselho
Deliberativo do Patrimônio elaborou o seu primeiro Regimento Interno. Em seu texto, as
atribuições específicas do órgão, definidas inicialmente pelo Decreto nº 217/91 em número
de 06 (seis), foram quadruplicadas, tornando-se 24 (vinte e quatro). Dialogando com os
novos instrumentos legais das políticas municipais de patrimônio, o Regimento estabeleceu,
por exemplo, as competências de propor a adoção de medidas obrigando os proprietários
de bens tombados a conservá-los em bom estado, bem como formas de incentivo e
estímulo à mesma conservação; de deliberar sobre o veto e cassação de concessões de
alvarás de construção, de demolição ou de reforma de imóveis protegidos; de estimular o
planejamento urbano como meio de alcançar os objetivos da preservação do patrimônio
cultural; de conceder autorização prévia para pintura, restauração ou outras intervenções
em bens tombados, bem como para a realização de construção ou colocação de anúncios
na vizinhança destes1; de determinar, em caso de urgência, a elaboração de projetos e a
execução de obras de conservação ou reparação de qualquer bem tombado, a expensas do
Município; entre outras.

Desde o ano de 2007, novos avanços das políticas municipais do patrimônio se


sucederam no sentido de ampliar o rol de bens culturais passíveis de serem reconhecidos
como patrimônio do município. Novas categorias de bens foram aos poucos sendo incluídas
no planejamento e execução dos inventários do patrimônio cultural, ao mesmo tempo em
que esse trabalho de mapeamento, identificação e pesquisa começou a ser realizado em
outros territórios para além do Centro ou Sede do município, direcionando o olhar
patrimonialista também para os seus Distritos e Regionais.

No próprio ano de 2007, o Conselho aprovou o seu primeiro tombamento de conjunto


paisagístico – o Conjunto Paisagístico do Morro de São Francisco. Embora localizado nas
imediações do Centro Histórico de Sabará, este bem cultural e natural representou um
importante passo no sentido de reconhecer a necessidade de se pensar o entorno, de
atentar para o crescimento de bairros periféricos, de cuidar da habitação a fim se conseguir
uma efetiva salvaguarda da história e memória de um município. Além de constituir a própria
moldura do Centro, o Morro de São Francisco continha em seu território dois sítios
arqueológicos diretamente relacionados à história da formação de Sabará, ao mesmo tempo
em que vinha sendo ocupado de forma irregular por diversas famílias de baixa renda vindas

1Cabe destacar que a mais recente Lei de Uso e Ocupação do Solo do município de Sabará, datada do ano de
2015, determina que as construções e reformas a serem feitas em Zonas Especiais de Interesse Cultural (ZEICs,
equivalentes às APCs) estarão sujeitas à análise específica do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural e
Natural de Sabará (Artigo 14, § 3º).
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de outros bairros e cidades com a perspectiva de edificar ali a sua casa própria. Uma
dessas ocupações avançava a partir do bairro Rosário I, por exemplo, região de ocupação
recente sem nenhum vínculo com a história e memória do Centro e com baixíssimo
sentimento de pertencimento ao município como um todo. O tombamento levantou então
uma questão fundamental para conselheiros e agentes do patrimônio em geral: como
trabalhar a salvaguarda do patrimônio com aqueles grupos sociais que sempre estiveram à
margem da história e memória oficialmente reconhecida do município?

No período entre 2007 e 2012, por sua vez, o município desenvolveu um novo
inventário do patrimônio cultural, dessa vez abarcando as mais variadas categorias de bens
e sendo orientado pela divisão territorial do município. Sendo assim, a cada ano, o trabalho
de mapeamento, identificação e pesquisa foi empreendido em uma região diferente, partindo
do Centro/Sede e depois envolvendo os bairros Paciência, Roça Grande e General
Carneiro, a região do Arraial Velho, o distrito de Ravena, o bairro Siderúrgica e o distrito de
Mestre Caetano, levantando em cada território não apenas as estruturas e/ou conjuntos
arquitetônicos e paisagísticos, mas também os bens móveis, integrados, arquivísticos,
arqueológicos e imateriais. A partir desse trabalho, os olhares do Conselho Deliberativo do
Patrimônio foram cada vez mais se voltando também para os bens culturais localizados fora
da Sede do município, levando-o a reconhecer vários deles também pelos mecanismos do
tombamento e do registro. Foi o caso, por exemplo, do tombamento do Núcleo Histórico de
Ravena, ano de 2010, e do registro dos Modos de Fazer dos Pratos e Derivados do Ora-pro-
nobis, focado sobre o distrito de Mestre Caetano, no ano de 2014.

De todas essas experiências de patrimonialização de bens culturais de Distritos ou


Regionais, um caso excepcional foi, no ano de 2015, o primeiro registro de uma forma de
expressão – as Guardas de Marujos de Sabará. Tradição congadeira vinda de fora, através
da migração de famílias do interior do estado para a região metropolitana de Belo Horizonte,
as Guardas de Marujos de Sabará constituem uma forma de expressão própria de bairros
periféricos do município, não se fazendo presente no Centro, mas sim no distrito de Ravena
e nas regionais de Roça Grande e General Carneiro. Até então, essa manifestação só havia
sido inventariada no distrito de Ravena, porém através de uma iniciativa da própria
sociedade civil, no âmbito do recém-criado Ponto de Cultura Congado Sabarense, ela veio a
ser pesquisada em todos os seus territórios e, logo em seguida, foi oficialmente reconhecida
pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio por seu valor não apenas histórico, mas,
sobretudo, de identidade – atribuído por grupos étnico-raciais historicamente excluídos
daquilo que se convencionou nomear religião, cultura ou mesmo patrimônio.

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A expansão das políticas municipais de patrimônio em Sabará trouxeram, sem
dúvida, muitos benefícios, mas com eles vieram também novos problemas e/ou desafios.
Para o intuito desse artigo cabe elencarmos duas questões principais.

A primeira questão se refere às funções, competências e responsabilidades


assumidas pelo Conselho através da Lei de Uso e Ocupação do Solo, do Programa de
Revitalização do Patrimônio ou mesmo de seu Regimento Interno. Na medida em que o
Conselho se tornou um órgão deliberativo não apenas quanto à identificação, seleção e
nomeação de patrimônios (por meio do inventário, tombamento e registro), mas também
quanto à emissão de pareceres sobre construções, reformas e quaisquer outras
intervenções em lugares previamente reconhecidos e/ou protegidos (por meio da análise e
aprovação de projetos), ele ficou sujeito ao risco de atuar como instância meramente
técnica, com reuniões sobrecarregadas pela demanda de análise e aprovação de projetos e,
consequentemente, escassas em ocasiões para debate e reflexão sobre as políticas
setoriais em questão. Nos períodos em que não foram bem geridas, essas novas
competências vieram a ameaçar, inclusive, o potencial do Conselho enquanto ambiente de
participação social e de interlocução entre Estado e sociedade civil. A predominância de
discussões muito específicas do campo da arquitetura e do urbanismo levou muitos
conselheiros, sobretudo os representantes da sociedade civil, a se sentirem desmotivados
em participar das reuniões, uma vez que as pautas ficavam sempre muito distantes de sua
realidade cotidiana. Desse modo, ao invés de ser estimulada, a iniciativa e/ou pró-atividade
dos conselheiros – atributo essencial de um conselho propositivo e/ou mobilizador, que
tenha efetiva repercussão sobre as políticas e os cidadãos – foi posta de lado em favor de
uma agenda flutuante, pontual e, muitas vezes, estéril.

A segunda questão se refere à sustentação da representatividade do Conselho


diante da amplitude, diversidade e complexidade das realidades trazidas pelos novos
levantamentos de bens culturais do município, bem como da patrimonialização de muitos
deles. Uma vez que a atuação e/ou o olhar do Conselho deixou de ficar restrito às estruturas
e conjuntos arquitetônicos e urbanísticos da Sede do município, sua composição não
poderia mais ficar limitada à presença de historiadores, arquitetos, restauradores,
museólogos, entre outros técnicos, ou de representantes da Igreja Católica, todos eles
indicados pelo Chefe do Executivo ou Secretário de Cultura. Qual seria a legitimidade de um
Conselho com esse perfil para tomar decisões sobre investimentos a serem feitos para a
salvaguarda de uma cultura popular presente em um bairro periférico, por exemplo?

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REPENSANDO O CONSELHO DELIBERATIVO DO PATRIMÔNIO

Com base no princípio de que os conselhos de patrimônio devem ser ambientes


constituídos por diferentes sujeitos com múltiplas experiências políticas (logo, com variadas
concepções de mundo, demandas e crenças) – constituindo assim uma esfera pública na
qual os indivíduos possam discutir os interesses da sociedade em prol de decisões
consensuais sobre o patrimônio –, nos propomos então discutir alguns caminhos a serem
seguidos para que o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural e Natural de Sabará
venha contemplar um maior número de segmentos da sociedade e, com isso, mobilizar
forças para a salvaguarda de patrimônios que sejam representativos da diversidade cultural
do município.

Essa diversidade abarcada pelos conselheiros apontaria, em tese, para uma


ampliação da participação da sociedade sobre as políticas de preservação,
resultando em impactos mais amplos para todo o município. Nessa
perspectiva, Luciana Tatagiba (2010) afirma que os princípios que assentam
as formações dessas arenas é que lhes atribui uma potência
democratizante: seja por sua composição plural e paritária, pela natureza
pública dos acordos ou por sua competência em interferir nas ações
governamentais (Cruz e Souza; Moraes; 2014, p. 137).

As instâncias colegiadas como os conselhos de patrimônio são fundamentais para


refletir a diversidade de atores sociais que constituem uma sociedade. É fundamental ter em
mente que os conselhos não lidam somente com manuais, compêndios conceituais ou
normas rígidas e frias, nem tão-somente com valoração e definição do que seja passível de
ser institucionalizado como patrimônio em âmbito municipal. Há outra dinâmica que rege a
atuação dos conselhos de patrimônio e que deve fazer parte da nossa reflexão e se refere à
própria noção do seu real papel.

As políticas municipais de salvaguarda do patrimônio cultural não devem apenas


servir para proteger e promover qualquer memória, definida unilateralmente, posto que isto
pode servir para reforçar e reiterar certa visão de mundo ou aprofundar distorções acerca da
memória local. Exatamente aí que entra o papel de gestão compartilhada dos conselhos de
patrimônio, que devem atuar de modo a criar critérios para a promoção da memória local
sem o caráter excludente.

Nesse sentido, é preciso, inicialmente, combater a visão dos conselhos de patrimônio


como instâncias somente técnicas, através de uma nova perspectiva sobre esse setor das
políticas municipais que não seja a de olhar apenas para os bens culturais em si mesmos.
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Devemos afirmar as políticas de patrimônio enquanto políticas para o ser humano, sua vida,
suas práticas, suas memórias, sua identidade. Elas interferem sim nos monumentos, nas
edificações e nos conjuntos que venham a ser tombados, ou no que tiver registro como
patrimônio imaterial, por exemplo, mas o centro da salvaguarda do patrimônio cultural deve
ser o ser humano. A respeito disso, cabe sempre lembrar que há muito vem

(...) deixando de ser simplesmente herdado para ser estudado, discutido,


compartilhado e até reivindicado. Ultrapassam-se a monumentalidade, a
excepcionalidade e mesmo a materialidade como parâmetros de proteção,
para abranger o vernacular, o cotidiano, a imaterialidade [...] Passa-se a
valorizar não somente os vestígios de um passado distante, mas também a
contemporaneidade, os processos, a produção (Santos, 2001, p.43).

Cabe observar que as reflexões deste artigo foram motivadas pelo fato de que seus
dois autores são, por ocasião de sua escrita, membros do Conselho Deliberativo do
Patrimônio Cultural e Natural de Sabará, representantes do poder público, funcionários da
Secretaria de Cultura, e de que, há algum tempo, vêm reconhecendo, junto com outros
conselheiros, a necessidade de uma revisão e reformulação de seu Regimento Interno.
Como já foi dito, o Regimento Interno do Conselho em questão foi elaborado no ano de
2006, logo em seguida à publicação do decreto que o atribuiu função deliberativa. No
entanto, embora tenha feito uma significativa reforma nas atribuições do órgão colegiado,
seu texto ainda se espelhava bastante no decreto fundante do ano de 1991, sobretudo no
que se refere à composição e representação, mantendo-se, nesses aspectos, bastante
insuficiente. Estabelecendo tão-somente a quantidade de membros efetivos e suplentes, o
Regimento Interno não determinava cadeiras/vagas por órgão, setor e/ou território e
tampouco obrigava a paridade entre representantes do poder público e da sociedade civil.
Pelo contrário, deixava a escolha do formato/composição do Conselho a cargo (e à mercê)
do Prefeito Municipal, responsável pela nomeação dos conselheiros, permitindo que este
definisse livremente os critérios de seleção. Em função disso, a nomeação raramente
ocorreu de forma mais democrática, através de eleições, por exemplo, mas sempre por meio
de indicações feitas pelos gestores públicos ou pelos próprios conselheiros previamente
nomeados, recaída sobre profissionais de “notório saber”, ou não. Essa condição trazia
sempre o risco de que o Conselho se tornasse, a cada mandato, um órgão meramente
reprodutor e/ou corroborante das demandas, vontades e projetos do governo vigente, além
de manter uma dinâmica cada vez mais excludente, na qual apenas determinados atores
conseguissem mobilizar interesses e se organizar politicamente, fazendo predominar suas

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escolhas referentes ao patrimônio a ser preservado. Nas palavras de Cruz e Souza e
Moraes, “grupos hegemônicos podem influenciar em grande medida as decisões sobre as
políticas de preservação, decisões essas que vão traduzir um corpo de valores e de códigos
a serem compartilhados socialmente” (2014, p. 139).

Visando promover a ampliação da participação social dentro do Conselho


Deliberativo do Patrimônio, os autores levaram então aos conselheiros uma proposta de um
novo Regimento Interno, a qual foi intensamente discutida em diversas reuniões feitas ao
longo do primeiro semestre de 2017. Em reunião extraordinária do dia 10 de maio de 2017,
o texto foi enfim revisado em todas as suas minúcias, aprovado e, logo em seguida,
encaminhado ao setor jurídico da Prefeitura para publicação de decreto municipal. Diante da
amplitude, diversidade e complexidade dos patrimônios existentes nos vários territórios do
município de Sabará, houve um acordo entre os conselheiros sobre a necessidade de
possibilitar que uma gama cada vez maior de atores se fizesse presente nas reuniões do
Conselho, vindo representar os variados interesses, demandas e perspectivas a respeito do
patrimônio no município. Vale observar que, nesta reunião, uma preocupação bastante
recorrente entre os conselheiros se referia ao baixo ou mesmo ausente sentimento de
pertencimento dos moradores de Distritos e Regionais com o município de Sabará. Para
eles, um dos motivos para essa situação tinha a ver justo com a falta de inclusão política e
cultural desses cidadãos, a qual se expressa sob variadas formas, mas que optamos por
resumir em dois sentidos básicos da relação entre Centro e Periferia. Primeiro, no sentido
Centro-Periferia, isto é, daquilo que se pensa, se faz e se cria no Centro e que afeta direta
ou indiretamente a Periferia. Nesse caso, nos referimos ao acesso dos moradores de bairros
periféricos aos instrumentos, projetos e eventos da política municipal de patrimônio, ou de
cultura, normalmente engendrados dentro da Prefeitura e, logo, no âmbito da Sede do
município. A recorrente falta de acesso se traduz, em geral, no baixo envolvimento,
mobilização, participação desses grupos sociais marginalizados nas esferas públicas
constituídas para a formulação, implementação e avaliação das políticas em questão, a
exemplo dos próprios conselhos. Segundo, no sentido Periferia-Centro, isto é, daquilo que
existe ou surge na Periferia e que pode vir a afetar ou não o Centro. Nesse caso, nos
referimos ao valor atribuído às práticas, fazeres, saberes dos bairros periféricos. A baixa
auto-estima de seus recriadores muitas vezes está associada à falta de reconhecimento
delas enquanto objetos dignos de serem considerados pelas políticas municipais de
patrimônio, ou de cultura, justo por conta de uma atuação restritiva e fechada das instâncias
responsáveis por selecionar aquilo que é mais representativo da identidade do município.

Essa preocupação dos conselheiros se manifestou em três alterações fundamentais


IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
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no texto do Regimento Interno do Conselho. Primeiro, o quadro do órgão colegiado foi
ampliado de 07 (sete) para 10 (dez) membros, a serem dispostos em uma composição
necessariamente paritária entre poder público e sociedade civil. Na ata da reunião
extraordinária, utilizou-se a justificativa de que “com essa nova estrutura o Município obterá
maior representação territorial, incluindo seus bairros e regiões periféricas” (SABARÁ,
2017). Segundo, a representação de órgãos, setores e territórios foi determinada em
cadeiras/vagas específicas – quatro delas para Secretarias Municipais, uma para a Câmara
Municipal, uma para as Paróquias do Centro Histórico, uma para a Cultura Popular,
Tradicional e/ou de Matriz Africana e três para os Distritos de Ravena, Mestre Caetano e
Carvalho de Brito. Nesse quesito, o principal avanço se referiu justo à representação
territorial. Os conselheiros optaram por reservar três vagas específicas para essa
representação, com o intuito de envolver lideranças de cada um dos Distritos e, em longo
prazo, contribuir para pautas, agendas e políticas não tão focadas sobre a Sede. A
representação setorial, por sua vez, ficou um pouco comprometida com a escolha, mas, de
certo modo, recaiu justo sobre dois setores bastante opostos e independentes entre si – de
um lado, a cultura erudita da arquitetura, artes plásticas e dos arquivos presentes nas
igrejas do Centro Histórico e, de outro, a cultura popular das festividades, das manifestações
e dos ofícios recorrentes nas ruas e casas do Centro Histórico e todo o município. Terceiro,
a escolha de membros para o Conselho foi subordinada a algumas regras/critérios, entre
elas, a necessidade de que a designação de representantes da sociedade civil seja feita por
meio da indicação das entidades diretamente relacionadas ao setor ou território
(associações culturais ou comunitárias), ou através de eleições feitas junto à população
diretamente afetada pela cadeira em questão (nas sedes das Regionais ou da própria
Secretaria de Cultura).

Paralelamente a essas alterações, o texto do novo Regimento Interno inseriu um


capítulo específico direcionado para a formação de comissões temáticas no âmbito do
Conselho Deliberativo do Patrimônio. Ciente de que não bastaria tornar a escolha dos
representantes da sociedade civil mais democrática para obter uma efetiva participação
social, o Conselho reconheceu nas comissões um relevante instrumento para estimular uma
atuação mais incisiva e proativa de seus membros. Como já foi dito, na medida em que
acumulava uma série de competências técnicas, relativas principalmente à análise e
aprovação de projetos, o Conselho muitas vezes ficava sem tempo hábil, em suas reuniões,
para pautar uma agenda permanente, isto é, discutir temas fundamentais para o
desenvolvimento das políticas municipais do patrimônio, os quais se referissem diretamente
a todos os membros, e não a apenas uma parte deles. De certo modo, esse fato levava
aqueles que esperavam discutir um plano de investimentos do município sobre o patrimônio
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associado ao seu setor ou ao seu território, por exemplo, a se sentirem desmotivados e,
com isso, não se envolverem de fato com a formulação de políticas, deixando que os
representantes do poder público tomassem as suas próprias iniciativas. Por causa disso,
muitas vezes o Conselho funcionou como espaço onde o poder público informava sobre
suas ações e não necessariamente solicitava o envolvimento dos conselhos na
“deliberação” das prioridades, por exemplo, prevalecendo a “sensação de participar”, ao
invés de participação efetiva. A formação de comissões temáticas foi então pensada justo
para criar novos espaços de debate, voltados especificamente para a proposição de ações e
a mobilização de agentes em prol de causas mais problemáticas. Objetivando o “estudo de
temas específicos, transversais ou emergenciais relacionados ao campo do patrimônio, de
modo a fornecer subsídios às tomadas de decisão do Conselho e/ou encaminhar as
medidas cabíveis” (SABARÁ, 2017), essas comissões ficariam abertas à participação de
não-conselheiros, incluindo nestes outros membros da sociedade civil que estivessem
diretamente relacionados ao assunto em questão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A valorização do bem cultural como tal só é conquistada quando o objeto passa a ser
democratizado e compartilhado, transmitindo-se seu conhecimento e significados. Com esta
valorização, a postura da sociedade se modifica e as ações para conservação e
salvaguarda passam a ser encarados com mais rigidez e cautela. A participação social dos
diversos grupos sociais, culturais, étnico-raciais pertencentes ao município é um ponto
crítico nesse quesito, em que o objeto vem a ser compreendido não somente por um olhar
técnico, mas também se leva em conta a sua parte simbólica de identidade e memória dos
grupos tanto do Centro quanto da Periferia. Por meio desse artigo, buscamos promover a
reflexão sobre alguns caminhos possíveis para a democratização das políticas municipais
de patrimônio em Sabará, discutindo a ampliação da participação social dentro de seu
Conselho e o estímulo a uma atuação mais incisiva e proativa da sociedade civil embasados
pelas novas perspectivas e olhares do campo do patrimônio, os quais vêm abordar os bens
culturais não apenas por critérios estéticos, históricos e materiais, mas também por aspectos
sociais, de meio ambiente, de identidade e das relações entre os bens e a própria
comunidade.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
REFERÊNCIAS

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CASTRIOTA, Leonardo Barci. Patrimônio cultural: conceitos, políticas, instrumentos. São


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CRUZ E SOUZA, Luciana Christina, MORAES, Nilson Alves de. Preservação do patrimônio
em Minas Gerais: a “Lei Robin Hood” e os conselhos municipais de patrimônio. Revista
Sociais e Humanas. Santa Maria, v. 27, n. 2, 2014.

FONSECA, Maria C. Londres. Referências culturais: base para novas políticas de


patrimônio. Boletim de Políticas Setoriais. Brasília: IPEA, n. 02, 2001, p.110-120.

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SABARÁ. Lei Complementar nº 005 de 27 de dezembro de 2004. Sabará: Câmara


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SABARÁ. Lei Complementar nº 032 de 27 de novembro de 2015. Sabará: Câmara


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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
SABARÁ. Lei nº 410 de 06 de maio de 1991. Sabará: Câmara Municipal, 1991. Disponível
em: <http://www.sabara.mg.gov.br/>.

SABARÁ. Lei nº 1.323 de 20 de setembro de 2005. Sabará: Câmara Municipal, 2005.


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Disponível em: <http://www.sabara.mg.gov.br/>.

SABARÁ. Lei nº 1.374 de 17 de janeiro de 2006. Sabará: Câmara Municipal, 2006. .

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SABARÁ. Regimento Interno do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural e Natural de


Sabará. Sabará: Prefeitura Municipal, 2006. Disponível em: <http://www.sabara.mg.gov.br/>.

SANTOS, Cecilia Rodrigues dos. Novas fronteiras e novos pactos para o patrimônio cultural.
São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 15, n. 2, p. 43-48, abr. 2001. Disponível em:
<http://goo.gl/WAAgCm>.

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REGISTROS VIRTUAIS EM PATRIMÔNIOS CULTURAIS

SILVA, WELLINGTON GOMES

Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Espírito Santo. Campus Colatina


Av. Arino Gomes Leal, 1700 - Santa Margarida, Colatina - ES, 29700-660
wellingtongsgs@gmail.com

RESUMO
A paisagem urbana pode ser entendida como uma das propriedades de um fenômeno cultural, que
está sempre em movimento e, que o seu formato atual pode não ter sido igual em nenhuma de suas
temporalidades. A partir disso apresentamos a pesquisa que está sendo realizada pelo programa
Laboratório de Educação em Desenvolvimento de Soluções - Leds, em Colatina – Espírito Santo, com
foco na preservação do patrimônio cultural, em busca de salvaguardar informações referentes ao
patrimônio da referida cidade. Patrimônios são valores atribuídos a história de um determinado local,
possuem grande valor para os moradores de seu município e para seu município por assumir valores
de interesses coletivos. Com a ação do tempo, o uso indiscriminado ou, ao contrário, o seu abandono
leva suas propriedades a se deteriorarem, perdendo suas características originais. Contudo, poucos
são os municípios que se preocupam em executar reformas para prolongar sua existência. Com base
nos fatores acima, e as novas políticas que empurram os bens históricos para o círculo da gestão
municipal cresce uma maior busca por meios de preservar o patrimônio cultural. A informática é uma
área que não para de crescer, e atualmente a tecnologia de dados em nuvem está se expandido
rapidamente. Partindo dessa ideia estamos desenvolvendo um sistema para gestão de patrimônios
culturais, que envolve pesquisa e registros virtuais, com divulgação imediata e direta no próprio
monumento. Trata-se do projeto “QR Code Patrimônio, Monumentos Históricos”. O objetivo principal é
desenvolver um sistema online para salvaguardar documentos referentes aos patrimônios culturais no
município de Colatina. Reúnem se opções de cadastro para fotografias gerais e técnicas, modelos em
3D produzidos no software Sketchup, descrições em nível de memorial, dados técnicos, o registro de
localização via Google Maps, banco de comentários, além de contar com a tecnologia QR Code, que
vem estabelecer uma ponte entre o patrimônio virtual e o físico, ou seja, os monumentos terão uma
tarja QR Code que, ao ser acionada por um dispositivo móvel, será redirecionada para o sistema
recebendo conteúdos como a história do patrimônio, trazendo como benefícios o despertar da
curiosidade, educação sobre história e patrimônio em geral, visando a preservação da memória local
e a expansão de suas informações para diversas pessoas em diferentes localidades.
Palavras-chave: Arquitetura; Patrimônio Cultural; QR Code; Salvaguarda; Sistema.

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Introdução

Retomando a busca pelo registro do patrimônio cultural, reafirmamos que, a paisagem


urbana pode ser entendida como uma das propriedades de um fenômeno cultural, uma vez
que como produto está sempre em movimento e, que o seu formato atual pode não ter sido
igual em nenhuma de suas temporalidades (COSTA; GOMES, 2016).

O espaço urbano pode ser considerado como um movimento de apreensão historicamente


condicionado, no qual o desenvolvimento é induzido e impulsionado através dos planos e
instrumentos. A produção do espaço urbano, ‘e nele incluído o Patrimônio Cultural’, nada
mais é do que uma reconstrução de "um objeto de modo a manifestar nessa reconstituição
as regras de funcionamento desse objeto" (Dosse, 2007).

Patrimônios culturais são atribuídos a história de um determinado local, possuem grande


valor para os moradores de seu município e para seu município por assumir valores de
interesses coletivos. Com a ação do tempo, com o decorrer do processo de ocupação do
uso do solo urbano, o uso indiscriminado ou, ao contrário, o seu abandono leva suas
propriedades a se deteriorarem, perdendo suas características originais. Segundo Estado de
Minas:

Ao circular pelas cidades do interior do país, observa-se, com


freqüência, a degradação de inúmeros imóveis seculares, de valor
artístico e cultural, de propriedade particular ou pública, que
lamentavelmente dão lugar a outras edificações (Estado de Minas,
2017).

Em Colatina – Espírito Santo, está sendo desenvolvida uma pesquisa com foco no
patrimônio cultural, em busca de armazenar em um ambiente virtual, documentos que
descrevam a história de um determinado monumento. E, manter atualizados os diversos
interesses sobre eles e a cidade, possibilitando acesso rápido, com conteúdo técnico,
histórias orais, permitindo interação dos usuários.

A informática possivelmente foi o ramo que mais influenciou o século XX e XXI. É algo
indispensável para os dias atuais, pois passou a ser parte do nosso cotidiano. Tudo é
informação, ao ligarmos um dispositivo móvel e mandarmos mensagem de texto através de
um Short Message Service(SMS) que em português significa Serviço de Mensagens Curtas
para outro dispositivo estamos fazendo uma troca de informação, isto vale também para
quando estamos enviando um email de um computador para outro.

Atualmente a informática se encontra no seu maior auge devido que, grande parte da
população atual, possui condições financeiras para adquirir um computador, celular, tablet,
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entre outros dispositivos que trocam informação, já que o hardware dos mesmos teve uma
queda considerável de preço. Além disso, hoje é também muito acessível à transmissão da
internet para os computadores e dispositivos móveis pois ouve uma queda nas tarifas que o
usuário necessita para ter tal serviço e isso incentivou ainda mais a popularização da
tecnologia da informação.

Há alguns anos atrás, a troca de mensagens entre as pessoas era mais demorada,
dependia dos serviços de correios, as correspondências que o remetente escrevia levava
dias para chegar ao seu destinatário, agora graças a internet a troca de mensagens e quase
instantânea e simultânea, como afirma CASTELLS:

A comunicação entre computadores criou um novo sistema de redes


de comunicação global e horizontal que, pela primeira vez na historia,
permite que as pessoas se comuniquem sem utilizar os canais
criados pelas instituições da sociedade para a comunicação
socializante. (CASTELLS, 2005, p.24).

Os usuários criam arquivos do tipo documentos de textos, planilhas, apresentação de slides,


fotos, entre outros e deixam armazenados em seus computadores ou dispositivos móveis e
para executarem seus arquivos precisam dos arquivos e o software responsável por fazer
sua interpretação e execução assim poderem visualizar seus dados, tornando os dados
restritos para somente este usuário, já que seus dados estão armazenados localmente.

Atualmente uma tecnologia que faz parte da internet e que está em crescente uso é a
tecnologia de armazenamento de dados em “nuvem”. A computação em “nuvem” dá à
possibilidade de armazenar e executar, alterar e excluir seus dados online, conta com sites
do tipo Dropbox onde é possível salvar seu arquivo e o mesmo disponibiliza um link para o
usuário poder compartilhá-lo para outros usuários.

Figura 1: Exemplo de QR Code

Fonte: Autor

Na Figura 1 podemos visualizar o exemplo de um QR Code. QR (quick response) Code é


um código de barras bidimensional, que pode ser escaneado utilizando um dispositivo
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móvel. Esse código é comumente utilizado para registrar endereços Uniform Resource
Locator (URL), que foi traduzido para a língua portuguesa como Localizador Uniforme de
Recursos. QR Code será o tema principal do nosso trabalho, pois graças a este será
possível estabelecer uma ponte entre o patrimônio cultural e material com o patrimônio
virtual.

Anteriormente ao início desse projeto, já foram desenvolvidos estudos com QR Code.


Podemos citar como exemplo o projeto "O primeiro código QR feito em calçada portuguesa".
Sua aplicação possui como objetivo gerar informações rápidas o sobre turismo e comércio e
sobre a oferta cultural, gastronômica, hoteleira e de comércio do Chiado. Na Rua Garrett, no
Chiado, em Lisboa, foi aplicado em uma calçada, um código QR Code. Uma equipe de
calceteiros ficou responsável por montar o quebra-cabeça na calçada do Chiado, o código
inserido possui a área de um metro quadrado (P3, 2017).

O projeto é de marketing, foi desenvolvido pela agência MSTF Partners para a Associação
de Valorização do Chiado (AVChiado), com intenção de gerar enorme repercussão, pois
segundo Tomás Froes "coloca o nome de Portugal e do Chiado no mundo", a empresa vai
monitorizando o número de vezes que o código é acedido, especialmente por turistas (P3,
2017).

O resultado foi tão exitoso que seu uso se expandiu para o Brasil. Um QR Code também foi
aplicado no calçadão da praia do Arpoador, na cidade de Rio de Janeiro, este foi construído
utilizando piso de pedras portuguesas. Então, ao apontar o dispositivo móvel que contenha
o software leitor de QR Code para o piso, será redirecionado a um sistema web que
apresentará as informações detalhadas sobre aquele local. Este faz parte do QRio que
possui como intuito instalar QR Codes em mais de 30 pontos da capital carioca, este darão
acesso aos turistas à origem do nome do nome da região e dicas de atividades turísticas,
culturais e gastronômicas (Viagem e Turismo, 2017)

Nossa pesquisa se inspirou no projeto de extensão que os alunos e professores da Pró-


Reitoria de Extensão e Cultura da Universidade Federal de Pelotas RS-Brasil (UFPEL)
estavam desenvolvendo, trata-se do QRCODE Patrimônio. Segundo informações do site
Wp:

O patrimônio cultural edificado da UFPel ocupa área extensa,


caracteristicamente inserida na malha urbana e que se encontra, em
grande parte, aguardando intervenção. Algumas fachadas dos
exemplares patrimonializados foram isoladas com tapumes, por
questões de segurança (Wp, 2017).

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O objetivo desse projeto é aplicar QR Codes nos edifícios, monumentos considerados
patrimônios culturais, que estão protegidos por fachadas ou painéis e utilizando um
dispositivo móvel com tecnologia de leitor de QR Code, acessar informações referentes aos
mesmos. Segundo informações do site Wp:

Outras fachadas estão recebendo intervenções aleatórias frequentes


no cenário urbano contemporâneo, mas que podem, dependendo do
modo como são feitas, reverter em danos para o reboco dos edifícios.
Deste modo, ou as fachadas ficam guardadas atrás de amplos
painéis ou, eventualmente, são preenchidas com grafites. Este projeto
intenciona reverter esta circunstância, ocupando os tapumes e
fachadas, bem como gerar outros, com intervenção artística da
comunidade acadêmica e comunidade externa, anexando neste
espaço um QR code para cada edifício. Anela-se à proposta a criação
deste site e, como decorrência, outras ações de registro e divulgação
do patrimônio cultural da UFPel (Wp, 2017).

Desenvolvimento

Nossa pesquisa também tem buscado verificar os aspectos físicos e sociais dos sítios e
monumentos. Localizando marcos fragmentados que permaneceram através da memória
dos usuários da cidade na significação dos lugares. Assim, procuramos identificar seu
passado para ver como o mesmo funcionava e com isso buscar um meio de registrar seu
contexto histórico.

Foram feitas pesquisas bibliográficas concernente às principais referências identificadas nos


patrimônios culturais de Colatina, com fontes de estudo que foram: Entrevistas orais com os
cidadãos para levantamentos e recolhimentos de dados e documentos referentes aos
patrimônios culturais. Nas visitas às Instituições municipais e acervos particulares estão
sendo montados os fragmentos em bricoleur.

Desde sempre se consagra que as melhores leituras das paisagens nas conformações de
espaços em seus aspectos sociais, modis vivendis etc., se faz através da Arquitetura. Um
portfólio de vidas cotidianas em diferentes temporalidades. Ou pelo Urbanismo, que em uma
escala maior investiga os usos e os percursos dos vestígios e das ações sociais em seu
movimentado desenho da paisagem cotidiana (COSTA; GOMES, 2016).

A informática está utilizada em nosso trabalho para facilitar o gerenciamento e


compartilhamento dos documentos dos patrimônios culturais. Segundo MANEVY:

Alguns tratam a cultura digital só como uma tecnologia, só como uma


técnica, como uma novidade [...]. [...] se pensarmos como cultura e
não como só como suporte, acredito que captamos a essência desta
transformação, que é a cultura das redes, do compartilhamento, da
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criação coletiva, da convergência. São processos vivos de
articulação, processos políticos e sociais, que impactam nosso modo
de vida, de construção e formulação. (MANEVY, 2009, p.35).

Antes do início do desenvolvimento desse projeto, alguns alunos pesquisadores dos cursos
de Arquitetura e Urbanismo e Sistemas de Informação do Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia do Espírito Santo Campus Colatina participaram de projetos relativos à
preservação dos patrimônios culturais da cidade de Colatina. Os mesmos realizaram
diversas pesquisas em campo para coletar informações relativas aos patrimônios que
estavam pesquisando. Um dos projetos que podemos citar é o da preservação da Antiga
Estação Ferroviária de Colatina.

Há alguns anos atrás, entre 1920 a 1975, pessoas se deslocavam de Colatina para outra
cidade através do trem que se situava no centro urbano do município. Esse meio de
transporte era o mais utilizado, numa época em que o Brasil ainda não havia incorporado ao
seu desenvolvimento o transporte por vias rodoviárias (COSTA; GOMES, 2016).

Assim, procuramos identificar seu passado para ver como o mesmo funcionava e com isso
buscar um meio de registrar seu contexto histórico. Para alcançar tal intento, fizemos um
estudo bibliográfico, concernente às principais referências identificadas na estação
ferroviária de Colatina, onde as fontes de estudo foram: Entrevistas com pessoas que
viveram na época que a mesma existiu, literatura produzida que possam remontar o
contexto histórico da cidade de Colatina, nesse período. Através da coleta de material,
conseguimos perceber como eram os modelos construção da época e assim, reproduzimos
a antiga estação ferroviária de Colatina em um ambiente 3D, utilizando o software SketchUp
(COSTA; GOMES, 2016).

Outro patrimônio cultural que será cadastrado no sistema é o Iate Clube Colatina. A data de
construção se iniciou no ano de 1950. Sua construção só se tornou possível devido que a
administração pública doou uma parte do terreno para um grupo de empresários locais. Foi
projetado pelo arquiteto Marcello Vivacqua inspirado na sinuosidade dos projetos
modernistas de Oscar Niemeyer, o monumento foi cenário de diversos eventos. O Iate
Clube de Colatina desde seus primórdios contava com uma grande adesão da sociedade
colatinense, tornando-se um símbolo e cartão-postal do município (in: REVISTA NOSSA,
1989). Porém o mesmo funcionou até o ano de 2010, por conta de interesses econômicos
do grupo de sócios, proprietários do terreno e da edificação, o mesmo foi demolido.

Também será cadastrado o Hospital e Maternidade Silvio Ávidos. Construído em terreno


doado pela Prefeitura Municipal de Colatina, pelo Governo Federal, em parceria com o

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Governo Estadual e a Legião Brasileira de Assistência – LBA, tendo sido inaugurado em
11.09.1949. Continua em funcionamento desde então. Os tipos de atendimento prestado
são: Urgência e Emergência (1º atendimento) maternidade, cirurgia eletiva, Pronto Socorro
(consultas de urgência, emergência e ambulatorial) (Saúde, 2017).

A Biblioteca Pública Municipal está localizada no centro do município. Atualmente funciona


no antigo armazém da antiga estação ferroviária, da área da Estrada de Ferro Vitória a
Minas, o armazém foi doado pela Companhia Vale do Rio Doce na década de 1980. Conta
com um acervo de 20 mil volumes, composto por livros didáticos, infantis dicionário, revistas
e jornais nacionais e internacionais (Colatina, 2017).

Além dos citados acima, estão em estudo os seguintes patrimônios culturais: Igreja de
Colatina Velha, Câmara Municipal, sobrado eclético à Ladeira Ribeiro do Rosário e Banco
Itaú (Praça municipal).

Etapas da Pesquisa

Pesquisas foram iniciadas, e assim coletamos uma gama de materiais referentes aos
patrimônios culturais de Colatina e logo percebemos que precisaríamos de uma plataforma
virtual armazenar e compartilhar os dados coletados.

Esse projeto visa produzir um site como inovação, para de alguma forma armazenar dados
referentes aos patrimônios culturais. Através de entrevistas com moradores de Colatina e
visita à biblioteca municipal da cidade, colhemos uma gama de dados. Conseguimos através
disso, informações dos patrimônios e imagens em diferentes épocas do mesmo.

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Figura 2: Tela principal do gerenciamento do sistema

Fonte: Leds Colatina

Na figura 2 podemos observar a tela principal de gerenciamento do site, os pontos


marcados em vermelho no mapa são os lugares onde os patrimônios culturais cadastrados
no sistema estão localizados. Logo acima, podemos observar dados relativo à estatística,
totalidades de patrimônios cadastrados, ilustrações, modelos 3D, comentários e QrCodes.

O site é constituído por dois módulos que são: Primeiro módulo é o de gerenciamento, ou
seja, é a parte em que será possível alimentar o sistema com informações relativas aos
patrimônios culturais e o segundo módulo é onde serão somente apresentadas às
informações referentes aos patrimônios culturais, está foi desenvolvida para que o público
em geral possa observar as informações dos patrimônios cadastrados no sistema.

Primeiro Módulo

No lado esquerdo possui um menu descrevendo todas funcionalidades da parte de


gerenciamento do site. Ao clicar na aba Início, é direcionado à tela principal de
gerenciamento do site. Ao clica na aba Patrimônios são apresentados os itens de menu
Cadastro de Patrimônios e Listar Patrimônios. Ao clicar em Cadastro de Patrimônios são

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apresentados os campos: Localidade (bairro e município), Nome, Descrição, Imagem Capa,
Localização(via Google Maps), Descrição Técnica, Código, Proprietário Inicial, Proprietário
Atual, Uso Original, Uso Atual e Data de Construção, estes são os dados que serão salvos
no sistema.

Figura 3: Tela de listagem dos patrimônios

Fonte: Leds Colatina

Ao clicar no item de menu Listar Patrimônios, podemos ver as informações de alguns


campos dos patrimônios cadastrados, não são exibidos todos, pois, caso contrário à tabela
iria ficar muito extensa. São exibidos os campos ID que é um identificador do patrimônio no
sistema, Foto que será a imagem principal do patrimônio e Descrição do patrimônio. A
coluna seguinte é a de Ações, ou seja, a partir desta será possível cadastrar os informações
do patrimônio como: Imagens Gerais, que são fotografias tiradas do patrimônio, Imagens
Técnicas que são imagens que possui algum tipo de informação mais complexa, como
imagens criadas em software do tipo AutoCad.

Logo após, temos Situação Entorno, são entradas as informações referentes à situação do
entorno atual do patrimônio. O próximo é o Modelo 3D, alguns alunos de Arquitetura e
Urbanismo estão modelando em 3D alguns monumentos de Colatina usando o software
SketchUp. Partindo dessa ideia, criamos uma opção para também poder cadastrar modelos
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3D no site, mas para isso, o usuário terá que fazer primeiramente o upload de seu modelo
no site 3dwarehouse.sketchup.com, logo após, será gerado um código embed. Tendo o
código em mãos, bastará o usuário cadastrar o mesmo em nosso site, posteriormente será
explicado melhor como isso funciona. Logo a seguir vem às operações alterar, onde o
usuário poderá atualizar os dados que o mesmo cadastrou no sistema e a opção excluir,
que excluirá todas as informações referentes ao patrimônio que foi selecionado para a
exclusão.

Ao clicar na aba QrCodes Podemos aplicar um nome para o código e referenciar o mesmo
para um dos patrimônios cadastrados. Já na aba Comentários é onde ficam organizados
todos os comentários que os visitantes cadastraram no site, ou seja, no final da página de
cada patrimônio cultural terá um campo para o visitante poder comentar sua opinião
referente a àquele patrimônio, ao comentar, seu texto irá para a sessão de Comentários, e
então, o administrador do sistema terá as opções de Aprovar, reprovar ou excluir os
comentários. Caso o mesmo aprovar, o comentário que o visitante fez ao seu referido
patrimônio aparecerá para que todos os que visitarem o site, caso o administrador reprovar
o comentário, o mesmo não aparecerá para os visitantes do referido patrimônio e em caso
de exclusão, o comentário é deletado do sistema.

A próxima aba é a de Usuários, clicando no item de menu Cadastro de Usuários o


administrador poderá adicionar, lista, alterar alguns dados e excluir os usuários. O sistema
contará com dois tipos de usuários: o administrador que terá o poder criar novos usuários e
o usuário comum que não poderá criar novas contas, mas poderá alterar somente seus
dados e total acesso às outras funcionalidades do sistema.

Os alunos de Sistemas de Informação que fazem parte do Leds Colatina ficaram


responsável pela construção do sistema, e os alunos e professores do curso de Arquitetura
e Urbanismo ficaram responsável por alimentar o sistema com informações relativas à
patrimônios culturais. Ao término do primeiro módulo foi realizado uma reunião com os
clientes, ou seja, alunos e professores de Arquitetura e Urbanismo, com o objetivo de que os
mesmos pudessem acessar as suas funcionalidades, e também com o intuito de ouvir a
opinião dos mesmos acerca do sistema. Ao longo da reunião foram explicados
detalhadamente cada função do sistema e registrado os itens que precisavam ser corrigidos,
retirados ou acrescentados.

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Segundo Módulo

O segundo módulo como já foi explicado acima é a parte onde o público em geral visualizará
as informações dos patrimônios culturais cadastrados no primeiro módulo.

Figura 4: Tela principal do segundo módulo

Fonte: Leds Colatina

Na figura 4 podemos visualizar a tela inicial do segundo módulo. Quando o botão Começar é
acionado, será direcionado ao carrossel contendo diversas imagens. Essas figuras na
verdade são imagens capa dos patrimônios, ou seja, a imagem principal do monumento ou
sítio.

Para visualização das informações de um patrimônio, será necessário apenas clicar sobre
uma das opções acima. Primeiramente aparecerá o título do patrimônio no topo da página,
logo em seguida, as imagens do referido patrimônio, seguindo logo abaixo dos dados
relativos ao patrimônio, tais como: Descrição, Dados Técnicos, Veja o projeto em 3D, se

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possuir um link do embed do modelo 3D desse patrimônio cadastrado no primeiro módulo,
será apresentado o modelo em 3 Dimensão, Proprietários, Uso e Construção e Localização
(via Google Maps). Depois segue a listagem de comentários que foram aprovados pelo
administrador do sistema. E logo abaixo o link Escreva seu Comentário, que quando clicado
aparecerá um formulário e o visitante poderá cadastrar um comentário com a sua opinião
referente ao patrimônio acima.

Como citado anteriormente, serão cadastrados para cada patrimônio um código QR Code e
isso será feito pelo administrador ou usuário comum no primeiro módulo do sistema. Então
esses QR Code serão impressos e colados nos patrimônios materiais. Ou seja, existe um
patrimônio com o nome de Antiga Estação Ferroviária de Colatina cadastrado no sistema,
esse é o patrimônio virtual, então, será impresso o QR Code referente a esse e colado no
local onde atualmente se localizava esse patrimônio. Assim, bastará apenas o apontamento
de um dispositivo móvel para o código e o aplicativo redirecionará para o segundo módulo
do sistema, que contará toda a história do patrimônio.

Considerações Finais

Este trabalho é um esforço inicial referente à preservação de patrimônios, um esforço que


abrangeu a interdisciplinaridade das áreas de informática com a de arquitetura. Esperamos
que o acervo virtual seja um almanaque de informação, possibilitando o entendimento e
possíveis estudos acadêmicos, além de ações investigativas nos mesmo, nosso objetivo
também é que as informações provoquem reflexões sobre o município.

A informática é um ramo da informação que nos ajudou a obter acesso rápido à qualquer
tipo de informação, por esse fator, ficamos acostumados à obter uma pesquisa e obtenção
de dados rápido de uma determinada coisa, então decidimos usar a tecnologia QR Code à
nosso favor para facilitar o rápido acesso aos dados referentes à um determinado patrimônio
cultural.

O foco principal do nosso trabalho não é só confeccionar um sistema para salvaguardar


dados de patrimônios culturais de Colatina, ou seja, criar apenas um sistema para deixar
todas as informações salvas caso o mesmo se deteriore com o passar dos anos, mas sim
usar a tecnologia da informação e principalmente a internet para ajudar a levar o conteúdo
para outras partes do mundo, para lugares onde as pessoas não possuem condições para

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de se deslocar até os patrimônios culturais, trazendo como benefícios o despertar da
curiosidade, educação sobre história e patrimônio em geral.

Referências

CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede: do conhecimento à acção política. Lisboa:


Imprensa Nacional- Casa da Moeda, 2005. Disponível em:
<http://biblio.ual.pt/Downloads/REDE.pdf>. Acesso em: 7 fev. 2014.

Colatina, BIBLIOTECA PÚBLICA MUNICIPAL. Disponível em: <


http://www.colatina.es.gov.br/acidade/?pagina=turismo&item=5>. Acesso em 15 de junho de
2017.

COSTA, Ana Lucia Reis Melo Fernandes. Desvendando a Casa Verde Amazônica: A
Anastilose Espacial de Núcleos Seringais no Rio Acre, 1870-1910. 2011. Tese (Doutorado
em Pós-graduação em Desenvolvimento Urbano) - Universidade Federal de Pernambuco.

COSTA, Ana Lucia Reis Melo Fernandes; GOMES, Wellington Gomes, Em Busca da
Paisagem Perdida, p. 2-13, Belo Horizonte, set. 2016.

DOSSE, François. História do Estruturalismo: o campo de signo – 1945/1966. São Paulo:


Edusc, 2007, v. 1.

Estado de Minas, O papel de cada um na preservação do patrimônio cultural. Disponível em:


<http://estadodeminas.lugarcerto.com.br/app/noticia/colunas/o3l-
arquitetura/2013/04/09/interna_o3larquitetura,47129/o-papel-de-cada-um-na-preservacao-
do-patrimonio-cultural.shtml >. Acesso em 15 de junho de 2017.

MADURO, Luiz Carlos. Iate Clube. Revista Nossa. Colatina, v. 1 n.7, p. 33-35, out. 1989.

MANEVY, Alfredo. Entrevista: política da cultura digital. In: Cultura digital.br.

SAVAZONI, Rodrigo; COHN, Sergio. Rio de Janeiro: Azougue editorial, 2009. Disponível
em : <http://culturadigital.br/wp-content/blogs.dir/1/files/2013/06/cultura-digital-br.pdf>.
Acesso em: 7 fev. 2014.
P3, O primeiro código QR feito em calçada portuguesa. Disponível em: <
http://p3.publico.pt/vicios/hightech/4274/o-primeiro-codigo-qr-feito-em-calcada-portuguesa>.
Acesso em 15 de junho de 2017.

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Saúde, Hospital e Maternidades Silvio Ávidos – HMSA. Disponível em: <
http://saude.es.gov.br/hospital-e-maternidades-silvio-avidos-hmsa >. Acesso em 15 de junho
de 2017.

Viagem e Turismo, Rio de Janeiro agora tem QR code no calçadão da praia. Disponível em:
< http://viagemeturismo.abril.com.br/destinos/rio-de-janeiro-agora-tem-qr-code-no-calcadao-
da-praia/ >. Acesso em 15 de junho de 2017.

Wp, PROJETO. Disponível em: < http://wp.ufpel.edu.br/patrimonio/projeto/>. Acesso em 15


de junho de 2017.

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RUÍNAS DO FORTIM DOS EMBOABAS: entremeando memória,
ambiência e preservação em São João del-Rei (MG)

DIAS, Diego N. (1); SOUZA, Alisson S. (2)

1. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura


Avenida Pedro Calmon, 550 - Cidade Universitária, Rio de Janeiro - RJ
diegofletcher@hotmail.com

2. Universidade Federal de São João del-Rei. Departamento de Arquitetura e Urbanismo e Artes


Aplicadas
Avenida Visconde do Rio Preto, S/N - Colônia do Bengo, São João del-Rei - MG
alisson.silveira.souza@gmail.com

RESUMO
O estudo da paisagem discute sua formação por meio dos elementos culturais e naturais em todos os
seus aspectos, enquanto o estudo do edifício é compreendido por meio da sua materialidade e
contexto urbano. As teorias da restauração são de suma importância para o desenvolvimento de uma
metodologia específica de análise em obras de intervenção ou restauro em bens de interesse cultural.
Partindo do entendimento das etapas de intervenção em um bem patrimonial arruinado, este artigo
busca analisar questões que envolvam paisagem, monumento, ambiência e técnica em todas as suas
especificidades. Toma como estudo de caso um conjunto de ruínas localizadas no centro histórico de
São João del-Rei (MG), a partir da abordagem de seu histórico, enfatizando as transformações
sofridas ao longo do tempo, até sua conformação atual. O objeto em questão insere-se em um
complexo de construções caracterizadas como fortificações da Guerra dos Emboabas, dentro do
perímetro de entorno de tombamento do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(IPHAN). O interesse pelo estudo dessas ruínas nasce da preocupação com a conservação da
memória que se faz necessárias e consolida em proposta de intervenção apresentada com base nas
teorias do restauro. Em São João del-Rei, os monumentos arruinados não tem sua preservação
assegurada, em parte pela ausência de diretrizes voltadas para esses bens, assim como por atitudes
da própria população que, na maioria das vezes, não entende a importância da proteção de seu
próprio patrimônio. Pretende-se, aqui, despertar o potencial do ambiente analisado como um espaço
de lazer, entretenimento e cultura para moradores, através de proposta projetual, contribuindo para a
valorização da história da cidade e da paisagem urbana.

Palavras-chave: Ruínas; Fortim dos Emboabas; Preservação; São João del-Rei; Patrimônio.

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Introdução

Quando se levantam caminhos norteadores para uma possível intervenção em um bem


patrimonial, é essencial a análise das etapas de projeto sempre vinculadas aos elementos
paisagem, monumento, ambiência e técnica, e todas especificidades pertinentes a cada um.
O estudo da paisagem discute sua formação por meio dos elementos culturais e naturais em
todos os seus aspectos, privilegiando aqueles em detrimento destes. Já o estudo do edifício
é compreendido através de toda a sua materialidade e contexto urbano. Para isso, as
teorias da restauração são de suma importância no desenvolvimento de uma metodologia
específica de intervenção. No projeto aqui apresentado, fruto das disciplinas Teoria do
Restauro e Preservação de Bens Culturais, do curso de Pós-graduação em Arquitetura da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (Brasil), e Intervenções no Patrimônio, do curso de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de São João del-Rei (Brasil), buscou-se
treinar a percepção visual, de forma a reconhecer especificamente o ambiente estudado,
utilizando o desenho como instrumento de investigação e exercício de análise crítica.

A partir de toda a análise teórica e discussão dos processos de produção de arquitetura na


atualidade foi elaborado o referido projeto de intervenção em uma ruína na cidade de São
João del-Rei, Minas Gerais, tendo como referência sua inserção na paisagem. Foram
realizados levantamentos históricos, documentais e atualizados cadastramentos métricos e
fotográficos do objeto de estudo. Após análises desses dados foi realizado o mapeamento e
diagnóstico de patologias presentes na ruína, seguido do exercício projetual embasado nos
princípios de restauro e intervenção aqui discutidos.

Assim, apresentam-se a seguir um breve histórico do monumento, as discussões que


permeiam as teorias que embasaram a intervenção, as diretrizes do processo projetual e a
proposição espacial final, por meio de representação técnica e apresentação gráfica,
visando aplicar a teoria discutida em intervenções que ao mesmo tempo valorizem o bem e
despertem a importância da sua preservação na população local.

Quando a arquitetura se torna ruína: conceito

São muitas as visões possíveis relacionadas à ideia de ruína. Por essa razão, buscou-se
aqui trabalhá-la considerando suas inter-relações na história e a formação de sua memória
fragmentada. Segundo Ruskin (2008), “nós podemos viver sem ela [a arquitetura], e orar
sem ela, mas não podemos rememorar sem ela”. E ainda, “quantas páginas de registros
duvidosos não poderíamos nós dispensar, em troca de algumas pedras empilhadas umas
sobre as outras” (RUSKIN, 2008, p. 54).
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Ruskin (2008) ainda nos diz que a importância da preservação da arquitetura e de seu
significado histórico reside no ponto de a obra poder chegar ao seu estado de ruína. A ruína
carrega em si uma beleza que não pode ser comparada a nenhuma outra, tornando se
pitoresca, termo utilizado pelo autor para representar a grandeza do valor histórico e cultural
nela presente. Ao mesmo tempo, Cesari Brandi (2004), teórico contemporâneo, enuncia a
ruína não como uma mera realidade empírica, mas uma qualificação que compete a algo
que deva ser pensado de modo simultâneo sob o ângulo da história e da conservação. Deve
ser concebida não apenas e limitadamente na sua consistência presente, mas no seu
passado, e com vistas ao futuro, para o qual deve ser assegurada como vestígio ou
testemunho da obra humana e ponto de partida do ato de conservação.

A ruína é, pois, “tudo aquilo que é testemunho da história humana, mas com um aspecto
bastante diverso e quase irreconhecível em relação àquele que se revestia antes” (BRANDI,
2004, p.65). Esse conceito está totalmente embasado em estudos de ações e intervenções
em ruínas pelos interesses histórico e estético, considerando-as como o extremo da
preservação da obra de arte. Para o autor, as intervenções em ruínas devem somente
envolver a estabilização das estruturas e conservação de seu contexto.

As ruínas, de acordo com Pontes (2010) são bens que parecem se recusar a serem
esquecidas, caracterizadas por reunir em um único espaço destruição e preservação. A
autora também ressalta a posição de Walter Benjamin em seu livro Origem do Drama
Barroco Alemão:

Para Benjamin, a ruína apresenta-se enquanto alegoria, sendo esta um


espaço fragmentado e suscetível a variadas interpretações através dos
resquícios – partes – que representam o que a mesma um dia foi, mas que,
contudo, não o é mais. A alegoria da ruína é, assim, produzida pelo
fragmentado, pelo incompleto do edifício que não existe mais. E, da lacuna,
a ruína ganha múltiplos conceitos e visões, o que expõe sua confusão
barroca. (PONTES, 2010, p.21)

Pontes (2010) coloca que as alegorias são no reino dos pensamentos o que são as ruínas
no reino das coisas, pois, em meio à representação de uma edificação que não é mais o que
originalmente foi, as ruínas oferecem um teatro caricato, de confusão e visões diferenciadas
conforme o espectador, ou seja, uma multiplicidade de sentidos e interpretações. “Uma
confusão que, curiosamente, possui nexo, pois uma realidade é formada, mesmo que
advinda do despedaçado. Aliás, uma confusão que dá a beleza às ruínas, pela possibilidade
de variadas interpretações” (PONTES, 2010, p.22).

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De forma geral, podemos considerar a ruína como arquitetura fragmentada que representa a
memória concretizada de parte da história e da cultura do local onde está inserida. Sua
memória fragmentada promove poeticidade à medida que permite a imaginação e a
interpretação das pessoas do que pode ou não ter sido aquele objeto arquitetônico. Diante
de uma ruína, vemos o restante do passado sobrevivendo no tempo presente, relutando
contra sua futura inexistência.

O estudo de ruínas deve advir da preocupação com a conservação da memória que se faz
concreta, memória esta que, em São João del-Rei, não está resguardada pelas legislações
dos órgãos patrimoniais da cidade e/ou pela população que na maioria das vezes não
reconhece a importância da proteção de seu próprio patrimônio.

Princípios da Teoria Brandiana e sua aplicação

Sabemos que cada momento histórico preserva o que considera relevante para si. A
preservação, portanto, se comporta como um processo seletivo. Entretanto, ao longo do
tempo, a ideia do que deve ser preservado sofreu uma significativa ampliação, visto que
uma geração não deve privar as gerações futuras de determinados padrões ou modelos que
possam vir a ser considerados de importância histórico-cultural. Hoje, com os constantes
estudos visando o alargamento da noção de patrimônio para bem cultural, os bens
imateriais, assim como os materiais, transmitem conhecimento em vários campos do saber
e assumem um papel memorial ligado à necessidade de permanência. A preservação,
portanto, é um ato cultural e não se restringe a um bem arquitetônico isolado. Um bem
cultural só mantém a sua integridade e sua totalidade quando resguarda todos os legados
materiais, imateriais e naturais que demonstram a cultura que o construiu, como um ciclo
completo de pensamento e de materialidade.

As recentes ampliações do que consideramos como bens culturais estão trazendo grandes
desafios para o campo da restauração. Hoje, compreendemos o patrimônio como um
conjunto de bens culturais ligados ao conhecimento e aos artefatos produzidos pelo homem
que tem importância reconhecida em cada lugar, tempo, região ou país, de formas
diferenciadas. Para Choay (2001), a tripla extensão – tipológica, cronológica e geográfica –
dos bens patrimoniais é acompanhada pelo crescimento exponencial do público. Com isso,
aumentaram também as constantes ameaças em relação as suas perdas, em contrapartida
a um consenso cada vez maior em relação a sua preservação. Neste sentido, vemos
grandes desafios em relação às diretrizes e metodologias para o enfrentamento das
questões práticas que envolvem a sua permanência e garantia de sua transmissão às
gerações futuras.
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Neste sentido buscamos na Teoria da Restauração de Brandi (2004) uma metodologia para
consolidar nossa proposta. Brandi escreveu sua teoria objetivando a interface entre as
disciplinas de história, crítica, estética, teoria e prática do restauro, e consolidou, dentro de
métodos científicos, o reconhecimento da peculiaridade do restauro em relação ao "produto
especial da atividade humana que se dá o nome da obra de arte” (BRANDI, 2004, p.27).

A proposta de Brandi não foi criar uma regra fixa, mas construir princípios gerais e que
podem nortear as intervenções e os meios, que são colocados de forma diferente em cada
obra. As soluções a serem adotadas serão individuais, mas alicerçadas nos
encaminhamentos gerais brandianos. O intuito é que o bem seja transmitido da melhor
maneira para o futuro, sem ser falseado ou transfigurado, para que continue sendo fonte fiel
do conhecimento e da memória coletiva. Assim, a intervenção deverá ser justificada sempre
do ponto de vista das razões pelas quais se preserva.

Segundo Beatriz Kühl (2005), as escolhas operacionais deveriam ser justificadas à luz das
razões e dos objetivos da preservação e feitas como conseqüência da análise dos princípios
de intervenção em relação a cada um dos casos, pois toda obra tem uma configuração que
lhe é própria, assim como seus materiais e seu particular transcurso ao longo do tempo.

Para Brandi (2004), toda a ação prática deve ser encaminhada por um princípio teórico de
restauro. Portanto, deve-se ter rigor metodológico, construindo a análise da obra sobre os
aspectos físicos, formais, e na sua história. Como aponta Beatriz Kühl (2005),

devemos entender as raízes que motivam a preservação de monumentos


históricos para voltar a entender por que, para quem, o que e como
preservá-los, preservando escrupulosamente seus aspectos documentais,
sua configuração, sua materialidade, seu transcorrer ao longo do tempo,
para que desse modo, continuem a serem documentos fidedignos, que
possa transmitir o conhecimento de forma plena e não deformada, e para
que sirvam como efetivos elementos de rememoração e suportes da
memória coletiva. (KÜHL, 2005, p.10)

Assim, com base nos conceitos de Brandi (2004), a restauração hoje deve seguir os
seguintes princípios essenciais:

- Distinguibilidade: o processo de intervenção não propõe o passar do tempo como


reversível. O que sobreviveu à história é o que deve ser mantido, não existe a possibilidade
de voltar à edificação original uma vez que ela arruinou-se. Não se pode induzir os
observadores ao engano; para isso, a própria ruína deve ser o documento de si própria,
registrando o passar dos anos e os processos pelos quais passou até que chegasse a esse
estado.
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- Reversibilidade: o processo de intervenção em ruínas deve ser feito de forma a
permitir uma posterior remoção da intervenção de modo a manter o bem original intacto em
sua totalidade, destacando-se a obra em sua substância, intervindo de modo respeitoso e
bem fundamentado conceitualmente.

- Mínima Intervenção: a intervenção não pode danificar o documento histórico nem a


obra como imagem figurada, criando-se espaços cenográficos ou falsos, mas sim, valorizá-
la tal como se apresenta atualmente, em todos os seus processos de arruinamento e
degradação com o passar dos anos; a intervenção não pode ofuscar a ruína pré-existente,
devendo-se consolidar-se como um pano de fundo da mesma.

- Compatibilidade de técnicas e materiais: deve-se levar em conta a consistência física


do objeto para que a intervenção não o arruíne ainda mais, tratando-o com técnicas e
materiais compatíveis e não nocivos.

Mais especificamente com relação à importância da preservação de ruínas como patrimônio


histórico, a cada dia nos deparamos com diversas situações onde monumentos arruinados
são deixados à mercê do esquecimento e, ao longo dos anos, acabam por perderem
peculiaridades que os caracterizam como tais. A literatura sobre ruínas é vasta e apresenta
diferentes visões relativas à sua conceituação. De fato, é necessário considerar as relações
entre a historiografia e a construção da memória cultural diante de problemáticas como
edificações em fase de escombros e a importância de sua preservação para a coletividade,
deixando de lado a interpretação individual que o técnico pode ter, que, na maioria dos
casos, muda o sentido do bem intervido.

Para Ruskin (2008), a importância da preservação da arquitetura e de seu significado


histórico reside, em grande parte, no fato de um monumento conseguir chegar ao seu
estado de ruínas, carregando consigo uma beleza que não pode ser comparada a nenhuma
outra, tornando-se “pitoresca”, termo utilizado pelo autor no sentido de algo distintamente
gracioso.

Cesare Brandi trata das ruínas em conjunto com seus estudos sobre restauração. Segundo
o autor, as ruínas também são vistas como uma representação do passado que não existe
mais, em que “ruína será, pois, tudo aquilo que é testemunho da história humana, mas com
um aspecto bastante diverso e quase irreconhecível em relação àquele de que se revestia
antes” (BRANDI, 2004, p.65). É, então, o aspecto incompleto e fragmentado da ruína que a
define. E por este motivo, a mesma pode contar com diversas leituras, uma vez que aquilo
que falta pode ser imaginado, bem como sua trajetória até a composição enquanto ruína.

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Além disso, numa visão romantizada, nos faz pensar sobre a própria fragilidade da vida, da
memória, a precedência da morte, aliada à contraditória sobrevivência do bem – que
mesmo em aspecto fragilizado, permanece e conota por si próprio a necessidade de
preservação ante a iminência da sua destruição.

Brandi ainda explicita que a ruína é “testemunho do tempo humano e se constitui enquanto
resquícios e o testemunho mutilado do monumento e que intrinsecamente conota ações de
conservação que, por sua vez, envolvam nada mais que consolidação e conservação do
contexto do monumento” (BRANDI, 2004, p.65). Para ele, a “restauração, para representar
uma operação legítima, não deverá presumir nem o tempo como reversível, nem a abolição
da história” (BRANDI, 2004, p.61). O tempo entre a construção da obra e seu presente
devem ser respeitados, deste modo, já que é este que a define - enfatizando a importância
do trajeto histórico do monumento.

Analisando a ruína tanto pela instância histórica como pela estética, Brandi (2004) ressalta a
importância histórica da ruína, pelo próprio trajeto temporal que a mesma realizou e por isso
a necessidade de valorização de tal aspecto nas ações de conservação. "De qualquer
modo, a ruína também apresenta valor estético por ser um elemento caracterizador de seu
espaço – tanto que isso faz com que a mesma torne-se válida e completa em seu estado
atual" (BRANDI, 2004, p. 83).

O conceito de Brandi está totalmente embasado em estudos de ações de intervenções em


ruínas pelos interesses histórico e estético, considerando-as como o extremo da
preservação da obra de arte. Para o autor, as intervenções em ruínas devem somente
envolver a estabilização das estruturas e conservação de seu contexto. Dessa forma, a
ruína nunca deve ser restaurada ou reconstruída, mas sim consolidada.

De acordo com Ruskin (2008) a integridade das ruínas, como um conjunto formal e técnico-
construtivo, destaca-se como o bem de maior valor que se poderia legar às novas gerações.
Essa “herança” seria o mecanismo responsável por transferir ao espaço construído os
sentimentos de pertencimento e apropriação de seus valores memoriais. Para o autor, as
edificações deveriam ser obras de valor histórico em potencial. Desta forma deveriam
causar tamanha admiração em seus “herdeiros” a ponto de virar referência cultural,
independentemente de sua excepcionalidade como obra arquitetônica.

Ruskin (2008) compreende a idade como o principal atributo da edificação. À medida que
permanece íntegra ao longo do tempo, a edificação adquire beleza ao sofrer os efeitos da
pátina de passados 400 ou 500 anos, tornando essas qualidades temporais e acidentais
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incompatíveis com os processos de restauração. As ruínas se tornam sublimes a partir dos
estragos, das rachaduras, da vegetação crescente e das cores que o processo de
envelhecimento confere aos materiais da construção. Elas são o testemunho da idade, do
envelhecimento e da memória, podendo, assim, expressar a essência do monumento.

O culto às ruínas se exprime em todo o seu romantismo quando Ruskin (2008) propõe uma
reflexão sobre o valor dos trabalhos de restauração sobre o antigo estado da edificação,
acreditando que aquelas características remanescentes possuíam o encanto do mistério do
que teriam sido e a dúvida do que teria se perdido. A partir disso, considera a restauração
como “a mais total destruição que um edifício possa sofrer: uma destruição no fim da qual
não resta nem ao menos um resto autêntico a ser recolhido, uma destruição acompanhada
da falsa descrição da coisa que destruímos" (RUSKIN, 2008, p.42).

Para Ruskin (2008), é impossível restabelecer um monumento que foi grandioso e


carregado de beleza, pois sua alma jamais poderia ser devolvida. Ele afirma que outra
época dá à edificação outro espírito, transformando-a em outra obra. O autor considera,
ainda, o restauro uma "necessidade destrutiva" e acredita que se preservássemos nossos
edifícios tal restauração não se faria necessária. Esse processo resultaria em uma imitação
da arquitetura passada, carregando em si uma réplica e um falso histórico, já que essa nova
faceta pertenceria a uma nova época e tudo isso afetaria sua autenticidade, seus valores
evocativos e poéticos.

Já para Ruskin (2008), algumas intervenções até são permitidas, porém, apenas para
conservar a edificação. O autor aceita pequenas obras de consolidação. Quando as
mesmas perdiam sua utilidade, ele conformava-se frente à “morte” certa e natural que toda
edificação teria um dia. Assim, defende então a "morte" dos monumentos. Percebe-se com
isso, um aspecto nostálgico em seu pensamento, o que corrobora o seu lado romântico,
induzido-o à poesia e subjetividade na preservação dos monumentos históricos, chegando a
tomar em alguns momentos, atitudes radicais em restaurações. Seu posicionamento é
evidentemente contrário a intervenções, porém essa atitude acaba levar a cabo o que o
próprio Ruskin defende, o valor memorial da arquitetura.

É notória a importância da preservação das edificações de épocas passadas, e também a


importância de construímos novas edificações visando sua permanência estendida,
facilitando, assim, a preservação futura de nossa história atual. Pois como já notou Ruskin
(2008) ainda no século XIX, estamos cada vez mais construindo apenas para nossa
geração, quase em uma cultura do descartável e passageiro, esquecendo-nos do valor
histórico que devemos transmitir aos que virão.
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Estudo de caso: ruínas do Fortim dos Emboabas

Histórico e características

A ruína do Fortim dos Emboabas, apresentada na Figura 1, estudo de caso aqui


apresentado, insere-se do conjunto de edificações consideradas fortificações da Guerra dos
Emboabas, e está localizada no bairro Alto das Mercês (Figura 2), em São João del-Rei,
uma das principais cidades históricas de Minas Gerias (Brasil), que teve seu conjunto
arquitetônico e urbanístico tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (IPHAN), em 1938. Entretanto, como o perímetro de tombamento da cidade só foi
definido em 1947, constituindo-se nas áreas onde se localizam as igrejas, capelas, pontes e
os passos da paixão, poucos foram os imóveis localizados fora desse perímetro a serem
tombados individualmente ou municipalmente, como é o caso da área que compreende o
Fortim dos Emboabas. As ruínas aqui analisadas não possuem qualquer tipo de proteção,
apenas estão no entorno da edificação do Fortim que foi tombada pelo IPHAN.

Figura 1: Ruína do Fortim dos Emboabas, em primeiro plano. Fonte: Arquivo pessoal dos autores,
2016.

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Figura 2: Mapa esquemático de localização do local de intervenção com as principais edificações de
seu entorno imediato. Fonte: Elaborado pelos autores, 2016.

Devido à sua localização no alto de uma colina e a proximidade com importantes edificações
ou locais da cidade, tem-se a partir dali, uma vista privilegiada, principalmente de todo
centro histórico, motivo o qual se atribui a essa região a existência de fortificações. Em
decorrência da Guerra dos Emboabas, nasceram as narrativas da existência de uma ou
várias Fortificações Emboabas em territórios pertencentes a São João del-Rei. Antonil
(1982) relata a existência de um forte emboaba no Arraial do Rio das Mortes - uma das
antigas nomeações de São João del-Rei -, que pode ter sido construído no período da
guerra. Segundo ele:

Da segunda roça do senhor Bispo, fazem uma jornada pequena à Borda do


Campo, à roça do coronel Domingos Rodrigues da Fonseca. Quem vai para
o Rio das Mortes, passa desta roça à de Alberto Dias, daí à de Manuel de
Araújo, que chamam de Ressaca, e desta à Ponta do Morro, que é arraial
bastante, com muitas lavras, donde se tem tirado grande cópia de ouro, e aí
está um fortim com trincheiras e fosso, que fizeram os emboabas no
primeiro levantamento. Deste lugar se vai jantar ao arraial do rio das Mortes.
(ANTONIL, 1982, p.79)

Porém, para alguns autores, a narrativa da construção de edificações como fortificações dos
Emboabas constituem uma lenda urbana, ou um causo criado visando manter a história
viva. A maior parte da população local reconhece a ruína em estudo apenas como um antigo
“casarão” demolido, relatando que poderia ter servido como senzala, ou ter sido de fato
utilizado como apoio para a extração do ouro, pois dentro de suas dependências ainda
existem entradas para betas.
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Como visadas principais, a partir da ruína, têm-se a antiga rua Direita, atual rua Getúlio
Vargas, rua de extrema importância para o crescimento e ordenamento urbano de São João
del-Rei, onde estão localizadas algumas das principais igrejas históricas da cidade: Igreja do
Pilar, Igreja do Rosário e Igreja do Carmo. Uma das lendas contadas em São João del-Rei
diz respeito a uma betas localizadas no terreno do Fortim, que teria como fim o porão de
uma dessas igrejas. Impõe-se a partir da localidade um panorama de edificações de grande
importância, sejam como patrimônio histórico ou como equipamentos públicos: o Hospital
Nossa Senhora das Mercês, a Santa Casa de Misericórdia, o Colégio Nossa Senhora das
Dores, a Estação Ferroviária, a Igreja de São Francisco de Assis, o Prédio da Prefeitura
Municipal e o Campus Santo Antônio da Universidade Federal de São João del-Rei.

Pouco se sabe sobre a história da ruína ou mesmo da edificação. Apesar de estar em


processo de tombamento municipal, não existe um levantamento histórico do que poderia
ter havido ali. É perceptível, entretanto, uma clara intervenção provavelmente do século
passado, a qual ocupa quase um terço da área da ruína. De acordo com um morador das
proximidades, essa intervenção era uma casa em arquitetura vernacular, demolida ao final
da década de 1990; já com relação à base da ruína, mais antiga, nenhum dado foi
encontrado. Para uma afirmação mais sólida sobre sua origem seria necessário um estudo
feito por profissionais específicos de diferentes áreas, como arqueólogos, historiadores e
geógrafos.

Com relação à origem da edificação, até mesmo pelo seu processo de arruinamento, é fato
não poder se afirmar nada a respeito por falta de dados documentais, devido aos
documentos e/ou relatos históricos datarem de aproximadamente 50 anos após a guerra, e
nenhum deles citarem de fato a localização do dito Fortim, e ainda incitarem a existência de
várias fortificações Emboabas na região. Porém, é inegável a importância da edificação para
a história da cidade, visto que ainda hoje encontramos nela vestígios de betas de extração
de ouro - metal que ocasionou o surgimento da vila e depois da cidade-, destacando sua
vital importância para os Emboabas, que eram os responsáveis diretos pela extração do
ouro em São João del-Rei.

O projeto de intervenção nas ruínas do Fortim dos Emboabas

O processo de construção de projetos em ruínas deve tratá-las como parte do campo


disciplinar da Conservação e do Restauro, onde é tema recorrente na atuação projetual e
assunto debatido por diversos teóricos em diferentes épocas. Brandi (2004) apresenta a
análise da ruína a partir da ótica fenomenológica. Em sua teoria, a matéria original é o
elemento principal a ser considerado em qualquer intervenção onde a reconstrução se torna
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um falso histórico e falso estético, por tentar chegar a um aspecto de inteireza jamais
atingido originalmente. O autor apresenta a questão da necessidade de respeito à ruína,
tendo como principal objetivo prezar a autenticidade da obra, sem dizer que não podemos
utilizá-la. Esta postura serve como referência projetual para as intervenções
contemporâneas que mantém a matéria original e ruína, somando a ela novas intervenções
que conferem usabilidade aos edifícios, não se tornando tais intervenções apenas
elementos que qualificam o paisagismo das áreas pelo estado em ruína que apresentam.

O projeto na ruína do Fortim dos Emboabas, área hoje pertencente à Universidade Federal
de São João del-Rei, tem como proposta o atendimento de interesses da Universidade a fim
de potencializar os aspectos culturais e sociais existentes na cidade. Com o objetivo de
manter as oficinas cerâmicas e o Museu do Barro no local, propõe-se a criação de um
espaço de arte e ofício. Edifica-se um objeto arquitetônico com a intenção de propiciar a
construção dos fornos para a queima dos objetos de barro produzidos, com infraestrutura de
banheiros e depósitos. Propõe-se também, um espaço de lazer na ruína, e que pode ser
utilizado como local de exposição e venda de objetos. O projeto transformará a área
atualmente inutilizada em um parque urbano em prol da população.

A intenção é ocupar o espaço apropriando-se da ruína existente e atender aos interesses


dos moradores e da Universidade. Para isso, faz-se necessária a declaração do terreno da
ruína como área de interesse público. Atualmente, o espaço está à venda com declínio no
valor monetário. Portanto, tendo em vista os diversos interesses fica clara a pertinência do
projeto e a melhoria a ser promovida por ele tanto na esfera social, quanto educacional e
turística.

Um projeto de intervenção e restauração deve ter como base critérios apoiados em teorias
que nos ofereçam segurança no encaminhamento e nas decisões técnicas necessárias.
Sendo assim, entende-se que qualquer intervenção em arquitetura deve ser guiada por uma
discussão crítica e as ações, devem ser respaldadas por fundamentos teóricos coerentes,
com vistas à preservação do monumento. Frente a esses conceitos, os critérios para a
intervenção nas ruínas foram definidos principalmente por meio de um levantamento
cadastral completo, que ofereceu o suporte técnico necessário com relação aos níveis e
reais medidas do estado atual do imóvel, além dos materiais presentes. A partir disso,
trabalhou-se intensamente com o desenho de croquis para estudos de volumetrias, fluxos,
acessos, visadas e diversos outros fatores que muito influenciaram no resultado final do
processo projetual.

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Partiu-se da premissa que se deve conhecer a história do monumento, assim como suas
técnicas construtivas e materiais antes de qualquer intervenção. Sendo assim, a opção
pelos croquis serviu de grande auxilio para que as intervenções propostas não ferissem a
antiga construção. Foram levadas em consideração as técnicas e materiais construtivos
atuais de maneira que todas as modificações apresentem-se facilmente para que seja
evidente cada elemento novo incorporado ao conjunto de ruínas.

A partir dos croquis, partiu-se para a etapa de construção da maquete eletrônica em que se
pôde fazer um estudo da volumetria dos objetos com respeito à composição arquitetônica
existente. As intervenções foram propostas de forma a não prejudicar a leitura do conjunto
pré-existente, tanto no que se refere à planta baixa, quanto nas elevações, como mostra a
Figura 3. O novo programa respeitou os espaços existentes, adaptando os novos usos à
antiga ruína. A última etapa consistiu na representação técnica em diferentes escalas da
proposição final da intervenção, com destaque à Figura 4, que mostra em um corte
esquemático o desnível do terreno e a adaptação da intervenção ao espaço, tornando-o um
mirante para contemplação da paisagem da área central da cidade.

Figura 3: Maquete eletrônica com perspectiva geral do projeto para as ruínas, acompanhando o
terreno. Fonte: Elaborado pelos autores, 2016.

Figura 4: Corte esquemático do projeto de intervenção nas ruínas. Fonte: Elaborado pelos autores,
2016.

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Considerações

Ao se intervir em sítios históricos muitas vezes os arquitetos, ao se depararem com ruínas,


realizam intervenções que as danificam e as deterioram, geralmente pela pouca
compreensão de seu significado e da sua representatividade. As ruínas fazem parte da
paisagem cultural das cidades, sendo testemunhas do tempo e patrimônio cultural da
população. Por meio delas é possível ter o entendimento e a perspectiva de vários aspectos
da arquitetura e do urbanismo.

A proposta de intervenção na ruína do Fortim dos Emboabas promove a transformação da


ruína em um espaço de lazer, entretenimento e cultura para moradores e turistas, visando
potencializar as vistas, ambiência e consequentemente a memória do lugar. Por meio do
projeto torna-se possível discutir e colocar em prática a intervenção vinculada à paisagem e
ao patrimônio edificado da cidade de São João del-Rei, a fim de concretizar a memória da
ruína que tanto contribui na caracterização da paisagem local e na história de formação da
cidade. O objetivo é promover a valorização das ruínas por meio de intervenção embasada
em discussões de teóricos contemporâneos, integrando teoria e prática, e despertando na
população a importância da valorização de seu patrimônio.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior


(CAPES) pelo apoio na concessão de bolsa de mestrado.

Referências

BRANDI, Cesare. Teoria da Restauração. Tradução Beatriz Mugayar Kül. 2ª ed. São Paulo:
Ateliê Editorial, 2004.

RUSKIN, Jonh. A lâmpada da memória. Tradução Maria Lúcia Bressan Pinheiro. Cotia:
Ateliê Editorial, 2008.

CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. Tradução de Luciano Vieira Machado. São


Paulo: Estação Liberdade/Editora da UNESP, 2001.

KÜHL, Beatriz Mugayar. Ética e responsabilidade social na preservação do patrimônio


cultural. In: Revista CPC, São Paulo, v. 1., n.1, p.16-40, 2005.

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KÜHL, Beatriz Mugayar. Qutremère de Quincy e os verbetes Restauração, Restaurar,
Restituição e Ruínas da sua enciclopédia méthidique. In: Rotunda. n.2, 2005, p.100-106.
Disponível em <www.iar.unicamp.br>. Acesso em 30 maio 2017.

ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil. 3. ed. Belo Horizonte, Itatiaia/Edusp,
1982.

PONTES, Ana Maria de Lira. Entre Fragmentos: os ditos e não ditos das ruínas patrimoniais.
Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Federal da Paraíba.
João Pessoa, 2010. 181p.

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SÍTIO HISTÓRICO DE ITAPINA/ES: o patrimônio enquanto
monumento a ser preservado e a sua problemática atual de
preservação

SILVA, DOUGLAS GOMES

1. Instituto Federal do Espírito Santo, Campus Colatina. Coordenadoria de Arquitetura e Urbanismo.


Avenida Arino Gomes Leal, 1700, Santa Margarida, Colatina-ES, 29700-660
arqui_douglas@hotmail.com

RESUMO
O presente artigo aborda o Sítio Histórico de Itapina, que se trata do mais recente a ser tombado
pelo Estado do Espírito Santo. O distrito de Itapina, situa-se às margens do Rio Doce e da atual
Estrada de Ferro Vale do Rio Doce, no município de Colatina, região noroeste do estado do Espírito
Santo. A ocupação da região deu-se por volta de 1866, com a chegada de fluminenses e mineiros.
Posteriormente, a partir de 1889, chegaram os imigrantes italianos e algumas famílias libanesas. As
características arquitetônicas que são evidenciadas nos casarios de Itapina refletem essa mescla de
costumes e culturas, onde predominam-se casas térreas e sobrados nos estilos eclético e proto-
moderno, além, da arquitetura tradicional da imigração e da arquitetura industrial e ferroviária, que
podem ser vislumbradas na antiga estação e nos armazéns de café, ao longo do sítio. O vilarejo
prosperou no período áureo do café, por volta de 1907, com a construção da Estrada de Ferro Vitória-
Minas (EFVM), onde escoava-se toda a produção da região. Porém, com a crise de 1929 e a
erradicação dos cafezais este cenário de prosperidade mudou. Na década de 1940, deu-se o início
do processo de esvaziamento do vilarejo, os comerciantes que ali residiam mudaram-se para outros
núcleos urbanos. No ano de 2013, o Sítio Histórico de Itapina foi tombado em nível estadual, onde ao
todo foram tombados 82 imóveis e outros 43 foram decretados de interesse de preservação para
compor o conjunto. O documento preza pela proteção dos bens culturais e naturais que constituem a
Área de Proteção do Ambiente Cultural (Apac) de Itapina, constituída pelo Sítio Histórico Urbano,
Patrimônio Ambiental Urbano e Paisagem Cultural. Como o tombamento é recente, pouco tem sido
feito efetivamente para garantir o que foi decretado na Resolução 003/2013. A mesma, ainda não faz
parte totalmente do cotidiano do vilarejo, faltando ações que despertem a conscientização e
conhecimento da lei por parte dos moradores e proprietários, sendo que os mesmos não
compreendem a importância do sítio, ocasionando a situação atual de Itapina, que é de
esquecimento, até mesmo no cenário regional ele é desconhecido. Além disso, o cenário da região
está em plena mudança, fator decorrente da forte seca dos últimos meses e da lama de rejeitos que
atingiu o Rio Doce no final de 2015. O fato, é que o vilarejo apresenta marcas da história do
desenvolvimento local e da luta dos imigrantes, onde a relação entre o lugar e as marcas deixadas
pelo homem e sua cultura se fazem presentes e precisam ser preservadas. Isto posto, discutir a
temática sobre a preservação de Itapina através do viés do patrimônio e preservação apresenta-se
como o foco deste artigo, reconhecendo a importância do conjunto, com o intuito de incentivar a
sociedade a preservar a memória do lugar.

PALAVRAS-CHAVES: Sítio histórico, patrimônio, preservação, concientização, ferrovia.

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Introdução
Atualmente, o Estado do Espírito Santo (Ilustração 01), possui cinco sítios históricos
tombados pelo Conselho Estadual de Cultura: Porto de São Mateus (Resolução CEC n°
001/1976); São Pedro do Itabapoana (Resolução CEC n° 002/1987); Santa Leopoldina
(Resolução CEC n° 003/2010), Muqui (Resolução CEC n° 002/2012) e Itapina (Resolução
CEC n° 003/2013) o mais recente a ser tombado. O Sítio Histórico de Itapina localiza-se no
município de Colatina, região noroeste do estado do Espírito Santo, distante a 165 km da
capital do estado Vitória, situando-se às margens do Rio Doce e da Estrada de Ferro Vitória-
Minas.

Ilustração 01 – Localização esquemática do estado do Espírito Santo no mundo.

Fonte: Elaboração do autor, 2017.

O Vilarejo desenvolveu-se no período áureo do café, onde o principal meio de transporte até
então era por meio de animais, logo após iniciou-se através de embarcações que cruzavam
o Rio Doce, em 1907 iniciou-se a construção da ferrovia, ocasionando o aumento
progressivo da escoamento do café que era produzido na região, porém, a maior utilização
da ferrovia pelos produtores, comerciantes e habitantes, de modo geral teve início a partir de
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janeiro de 1923, com a inauguração do trecho que ligava Itapina ao município de Itaguaçu.
Com a crise de 1929 o cenário de Itapina muda, a prosperidade oriunda dos cafezais diminui
e começa assim a erradicação dos mesmos. Por volta da década de 1940, tem início o
processo de esvaziamento do vilarejo, os comerciantes que ali residiam se mudam para
outros núcleos urbanos, como o Centro de Colatina, em busca de novas condições de
trabalho, culminando na decadência, abandono e esquecimento do vilarejo. Após os
acontecimentos, a estação ferroviária foi desativada, por volta de 1980, e a ponte, iniciada
no governo de Juscelino Kubitschek, com a intenção de facilitar o acesso à vila, nunca
chegou a ser concluída (CASTIGLIONI, 2010).

O núcleo histórico do distrito de Itapina é constituí-se por casarios construídos entre o final
do século XIX e meados do século XX, sendo casas térreas e sobrados predominantemente
nos estilos eclético e proto-moderno, além da arquitetura tradicional da imigração,
decorrente dos primeiros habitantes de Itapina e da arquitetura industrial e ferroviária,
encontrada na estação e nos armazéns de café ao longo do vilarejo (CASTIGLIONI, 2010).

Com o esvaziamento provocado pela decadência da produção cafeeira, o vilarejo, que antes
possuía uma intensa vida cultural, comercial e econômica nunca mais se recuperou.
Atualmente, a vila possui pequenos comércios locais, como farmácia, sorveteria, mercearias
e bares. A maioria dos moradores trabalha na cidade de Colatina ou na zona rural.

O cenário bucólico de Itapina muda uma vez por ano, durante as fcomemorações do
Festival Nacional de Viola, o popularmente conhecido como ‘Fenaviola’, onde músicos e
violeiros da região se tornam atração centenas de turistas que ocupam as ruas da cidade e
e se hospedam nos casarios que guardam em sua arquitetura a história do vilarejo.

O Museu Virgínia Tamanini foi inaugurado recentemente, em homenagem a uma das


moradoras mais ilustres da vila Dona Virgínia, como era conhecida na região foi uma
escritora capixaba, autora do romance Karina (1964) que narra a trajetória de imigrantes
italianos na região, e era a principal responsável pelas atividades artísticas e culturais
durante o período áureo do café em Itapina. Apesar destas atividades pontuais, é preciso
fazer muito mais para que o vilarejo possa crescer preservando sua história e memória
(CASTIGLIONI, 2010).

Nas últimas décadas, o patrimônio arquitetônico das cidades vem recebendo grande
atenção. Preservá-los ao longo do tempo pode manter viva a história de um grupo ou
sociedade. Para Rodrigues (2001, p.16), “o patrimônio representa a identidade local e, por
mais diversa que seja a população, a sua criação serve como uma ponte que resume várias
histórias em uma só”.

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De acordo com Bogéa (2007), o patrimônio arquitetônico e cultural é o conjunto de bens que
possuem valores históricos, artísticos e científicos que definem, em diferentes escalas, a
identidade de uma comunidade, uma região ou um país e que devem ser preservados como
legado às gerações futuras.

Fonseca (2005) discorre sobre a importância do patrimônio. Além de possuir um valor


histórico, artístico e etnográfico, dentre outros, há também um sentimento de pertencimento
a comunidade ou a uma nação, dependendo do tipo de bem.

Para Scheiner (2004), o patrimônio é um reconhecimento no tempo e espaço de


determinado fio condutor que liga a um lugar, por meio de sinais que são construídos. Esse
fio condutor é a memória e os sinais são bens culturais, mas também os resíduos e
vestígios presentes na cidade e que resistiram, fazendo parte de um imaginário. Percebe-se,
assim, que o patrimônio é importante tanto para uma noção coletiva quanto individual de
pertencimento àquele lugar e àquela cultura.
A história do Sítio Histórico de itapina está diretamente relacionada com a história do
município de Colatina, e consequentemente com a história da população, a partir do
momento que se deseja guardá-la, pretende-se guardar a história dos indivíduos. Com o
intuito de proteger este patrimônio cultural local e estadual, o Conselho Estadual de Cultura,
através da Resolução n° 003/2013, decretou o tombamento do conjunto histórico e
paisagístico de Itapina. O documento preza pela proteção dos bens culturais e naturais que
constituem a Área de Proteção do Ambiente Cultural (APAC) de Itapina, constituída pelo
Sítio Histórico Urbano, Patrimônio Ambiental Urbano e Paisagem Cultural. Ao todo foram
tombados 82 imóveis e outros 43 foram decretados de interesse de preservação para
compor o conjunto.

“A Poligonal de Tombamento de Itapina está diretamente relacionada com a


gênese da ocupação e evolução urbana de Itapina, ocorrida no contexto do
ciclo cafeeiro, da navegação do Rio Doce e interiorização tardia do Espírito
Santo ao final do século XIX e começo do século XX, e que ainda guardam,
de modo geral, as marcas físicas que representam sua história. Na Poligonal
de Tombamento as edificações de relevância histórica e/ou arquitetônica
estão protegidas contra descaracterizações nas suas características
volumétricas e formais, nestas últimas incluindo-se os vãos de janelas e
portas, ornatos, apliques, coberturas, seus materiais constitutivos, os
elementos artísticos e outras ocorrências. Considera-se também a
necessidade de se preservar o traçado urbano existente, a configuração dos
quarteirões e sua subdivisão em lotes, o arruamento, becos e vielas, e suas
características de pavimentação e inclinação, os passeios, as áreas verdes,
incluindo nestas últimas, parques, praças públicas, e jardins com seus
elementos artísticos, assim como, as encostas, os remanescentes de mata
nativa, a mata reflorestada, e a vegetação arbustiva e arbórea das ruas e de
áreas privadas, incluindo-se nesta preservação a relação que todas as
edificações estabeleceram com o entorno ambiental, paisagístico e cultural da
cidade” (RESOLUÇÃO CEC 003/2013).

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Como pode-se notar, o tombamento é recente, realizado no ano de 2013, sendo assim
constata-se que pouco tem sido feito efetivamente para garantir o que foi decretado na
Resolução 003/2013, onde a mesma, ainda não faz parte do cotidiano dos moradores do
vilarejo, de modo que muitos não compreenderam o que o processo de tombamento
acarreta na realidade.

A tombamento e a preservação do patrimônio histórico no Brasil dá-se através do Instituto


do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) que foi criado a partir do Decreto-Lei
nº25 de 1937 e é o órgão responsável pela proteção do patrimônio a nível federal e há mais
de sessenta anos, tem realizado um importante trabalho com ações de conservação do
patrimônio, realizando atividades como a fiscalização, proteção, identificação, restauração,
preservação e revitalização dos monumentos, sítios e bens móveis do país. Atualmente o
Brasil conta com mais de vinte e um mil edifícios e setenta e nove centros e conjuntos
urbanos tombados pelo instituto, além de um grande acervo de sítios arqueológicos
cadastrados, objetos, volumes bibliográficos, documentação arquivística e registros
fotográficos, cinematográficos e videográficos, além do Patrimônio Mundial protegidos, seja
por cadastro ou tombamento.

Este patrimônio é administrado por meio de diretrizes, planos, instrumentos de preservação


e relatórios que informam a situação dos bens, o que está sendo feito e o que ainda
necessita ser realizado. Dentre as preocupações do instituto, está a elaboração de
programas e projetos, que integrem a sociedade civil com seus próprios objetivos, bem
como a busca de linhas de financiamento e parcerias para auxiliar na execução das ações
planejadas. Além disso o IPHAN ainda busca realizar ações de preservação com o apoio
das comunidades, dos governos municipais e estaduais, do Ministério Público e de
instituições públicas e privadas.

Desde 2007, o IPHAN tem entre suas prioridades, a construção e implementação do


Sistema Nacional do Patrimônio Cultural (SNPC) e desde então, foram empreendidas
diversas iniciativas para este fim. Em novembro de 2007 foi realizada a reorganização da
Associação Brasileira de Cidades Históricas, por meio do IPHAN, que contou com a
presença de diversos prefeitos e estados. Ainda em dezembro de 2007, o IPHAN
apresentou sua proposta de construção do SNPC ao Fórum Nacional de Secretários e
Dirigentes Estaduais de Cultura e pactuou com o Fórum a estratégia para a construção do
Sistema Nacional de Patrimônio Cultural. Em março de 2008, promoveu a primeira reunião
entre o IPHAN e os órgãos estaduais de gestão do patrimônio cultural desde 1971, no qual
estiveram presentes órgãos estaduais e superintendências regionais do IPHAN, bem como
a direção nacional do Instituto. Deste encontro, ficou determinado o empenho de todos para

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o reconhecimento das estruturas estaduais para que, após este reconhecimento, pudessem
ser pensadas as diretrizes e políticas necessárias. Para tanto foi formado um grupo de
trabalho composto por um órgão estadual de cada região e o IPHAN.

A Carta de Cracóvia (2000) fala sobre a importância da preservação do patrimônio como


forma de preservar a memória e identidade coletiva:

“Cada comunidade tem em conta sua memória coletiva e consciente de seu


passado, é responsável pela identificação, assim como da gestão de seu
patrimônio. Os elementos individuais deste patrimônio são portadores de
muitos valores, os quais podem mudar com o tempo. Esta mudança
devalores específicos nos elementos define a particularidade de cada
patrimônio”.
No Espírito Santo de acordo com Morelato (2013) o órgão responsável pela formulação, o
planejamento e a implementação de políticas públicas estaduais para a área da cultura e do
patrimônio histórico é a Secretaria Estadual de Cultura – SECULT. Esta, entre outras ações,
de acordo com a Lei de n° 391/2007, deve realizar a proteção, vigilância, restauração,
manutenção e conservação da memória e do patrimônio histórico, artístico e cultural do
Estado do Espírito Santo.

Dessa forma, foi criado pela Lei de n° 6 de 09 de novembro de 1967, dentro da SECULT, o
Conselho Estadual de Cultura – CEC. Órgão consultivo vinculado a Secretaria de Estado da
Cultura, responsável pela normatização, deliberação que responde a demandas oriundas da
sociedade, procurando integrar as ações de Política Cultural do Estado do Espírito Santo,
como os tombamentos, por exemplo. Como pode ser visto, é o CEC, através do suporte da
SECULT, responsável no Espírito Santo pelas questões de tombamento e fiscalização dos
bens imóveis, logo, dos Sítios Históricos. Para que um imóvel tombado no Estado, seja
submetido a qualquer modificação, deve ser enviado um pedido para avaliação da CEC e,
somente depois de avaliado o pedido é liberado.

Além das normas da SECULT e do CEC que regem o tombamento e a manutenção dos
sítios, instrumentos próprios de cada município, como Plano Diretor Municipal (PDM) e leis
municipais, regulam as intervenções e alterações nesses locais.

Ainda referindo-se no contexto de conceituação relacionado à preservação do patrimônio,


deparamonos com a questão do tombamento. Atualmente, o Brasil conta com inúmeras
medidas legais de preservação do patrimônio que abrange desde registro de sítios e
vestígios arqueológicos, modos de fazer, saberes, lugares simbólicos, expressões musicais,
artísticas e folclóricas, línguas, assim como inventário e “tombamento” de coleções de arte
erudita e popular, acervos públicos e particulares, bens móveis e imóveis, conjuntos urbanos
e rurais, parques, florestas, paisagens, dentre outros (MORELATO, 2013).

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Porém, coube ao “tombamento”, instituído pelo Decreto-Lei n° 25, de 30 de novembro de
1937, que também estabelecia as competências do SPHAN, a tarefa de proteger legalmente
parte do que seria considerada a “herança nacional”, formalizada e organizada sob o
títulode “Patrimônio Histórico e Artístico Nacional”. Em vigência até os dias de hoje, a
medida do “tombamento” tem como finalidade salvaguardar bens culturais cujos valores
histórico-sociais são considerados de interesse à memória e identidade nacionais. Através
da proteção do suporte físico (ou material) dos bens pretende-se preservar o significado
simbólico dos mesmos, visto que o objeto da preservação não é o “objeto” em si, aqui
entendida na perspectiva jurídica, mas o “valor cultural que ela representa” (PEREIRA,
2009, p.13).

Assim, podemos definir o Tombamento como um ato administrativo realizado pelo poder
público com o objetivo de preservar, por intermédio de legislação específica, bens de valor
histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e também de valor afetivo para a população,
impedindo que venham a ser destruídos ou descaracterizados, culminando com o registro
em livros especiais denominados Livros de Tombo. O principal objetivo jurídico do
tombamento, de acordo com Fernandes (2010, p. 28) é a declaração da obrigatoriedade de
conservação do objeto tombado. Outro aspecto importante, segundo o autor, é a
possibilidade de se estender a proteção jurídica à vizinhança ou entorno da coisa tombada,
para a preservação da visibilidade da ambiência.Apesar de estar em vigor há vários anos, a
previsão legal do tombamento ainda é um conceito em evolução, uma vez que são muitos
os problemas de definição do objeto e do entorno a ser protegido (FERNANDES, 2010,
p.29).

De toda forma, para Fernandes (2010, p.29), o principal efeito jurídico do tombamento é,
seguramente, a proibição de mudanças nas características essenciais do bem tombado. O
tombamento tem ainda aplicação em todo tipo de imóveis e móveis, sejam eles públicos ou
privados. Em sua concepção original, transforma o bem em patrimônio cultural sem
promover sua estatização, estabelecendo um regime especial de propriedade. Sendo assim,
o bem tombado não passa a pertencer ao patrimônio público se for de propriedade privada.
A partir do tombamento, passa a existir sobre ele uma “restrição individual ou geral, parcial
ou total, bem como vínculos de disponibilidade, destinação, imodificabilidade e preferência”
(FERNANDES, 2010, p.29).Conforme o Decreto-Lei n° 25/37, o “tombamento” pode ser
realizado de forma voluntária, quando o proprietário solicita ou concorda com a medida, ou
de forma compulsória, quando a proposta não tenha partido do proprietário ou responsável,
independente da natureza pública ou privada dos bens.

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No caso do tombamento a nível federal, após ser encaminhada ao (ou feita pelo) IPHAN, a
indicação para o “tombamento” é transformada em um processo administrativo, denominado
processo de tombamento, que recebe numeração própria e a data de sua abertura. Ao
pedido inicial são agregados outros documentos tais como, informações produzidas pelos
interessados no tombamento, laudos técnicos de vistoria, plantas, fotografias,
correspondências, estudos técnicos, inventários, memorandos, informações internas,
contestação do proprietário (quando houver), dentre outras. Nesse processo documental
encontram-se também os “pareceres de tombamento”, elaborados pelos funcionários do
Instituto, com as justificativas para a indicação, ou não, do bem cultural à proteção legal. Por
fim, o processo de tombamento é remetido ao Conselho Consultivo do IPHAN, responsável
por dar o parecer conclusivo, e, após esta apreciação, segue para o Ministro da Cultura. Em
vigência até os dias atuais, a Lei n° 6.292 de 1975, conhecida como Lei da Homologação,
transferiu a deliberação final do “tombamento” para o Ministro da Cultura ao impor a
necessidade de sua homologação para efetivar a medida (PEREIRA, 2009, p. 14).

Caracterização Arquitetônica e Urbana

A arquitetura do Sítio Histórico de Itapina reflete o período de prosperidade que o vilarejo


viveu durante o período do café e pela construção da Estrada de Ferro Vitória-Minas, atual
Estrada de Ferro Vale do Rio Doce. As edificações apresentam predominantemente
características ecléticas e protomodernas, além da arquitetura popular do imigrante a da
arquitetura tradicional brasileira. Estes imigrantes trouxeram consigo a sua cultura, seu
modo de vida e de trabalho. Onde a necessidade de adaptação ao novo meio, e a de
preservação da cultura da terra natal se faz presente na arquitetura por eles difundida.

O vilarejo de Itapina, além dos imigrantes europeus, recebeu ainda algumas poucas famílias
de libaneses. Com todas estas tradições diferentes, o vilarejo desenvolveu um modo de vida
interessante e até mesmo de intensa atividade cultural para a época, resguardando as
devidas proporções. As características arquitetônicas dos casarios de Itapina refletem esta
mescla de culturas, com referências à arquitetura popular do imigrante e da arquitetura
brasileira da época (CASTIGLIONI, 2010, p. 23).

Com relação às tipologias encontradas em Itapina, pode-se destacar a arquitetura


residencial constituída por casas térreas, a arquitetura residencial formada por sobrados, a
arquitetura de uso misto composta pelo térreo destinado ao uso comercial e ao primeiro
pavimento para o uso residencial, a arquitetura industrial formada pela estação ferroviária e
pelos armazéns onde se guardava o café e por fim a arquitetura religiosa (Ilustração 02).
Ilustração 02 – Mosaico com croquis de edificações do Sítio histórico de Itapina/ES.
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Fonte: Elaboração do autor, 2017.

As edificações presentes no vilarejo não apresentam afastamento frontal, seguindo a


tradição da arquitetura colonial brasileira. Mas, algumas já apresentam características
incorporadas nos grandes centros brasileiros no final do século XIX, como a presença de
varandas e afastamentos laterais. Outro destaque que pode-se considerar na arquitetura de
Itapina é a preocupação com a estética das edificações, seja pela utilização de adornos,
platibandas cuidadosamente acabadas, modenaturas, ou simplesmente pelo rigor
geométrico na distribuição dos vãos.

De acordo com Castiglioni (2010) algumas destas edificações possuem um grande número
de quartos, o que evidência que as famílias que habitavam essas moradias possuiam um
grande número de pessoas, a cozinha é espaçosa e possui um maior afastamento de
fundos,além disso os quintais possuiam jardins, pequenos pomares, além de criação de
animais de pequeno porte, como galinhas. Neste tipo de casa muitas vezes, o primeiro
pavimento era usado como venda e/ou comércio e o segundo como moradia.

Outra característica presente nas edificações do vilarejo é a tipologia das casas tipo “porta e
janela”, se apresentando como as casas térreas mais simplificadas. Elas poderiam variar na
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sequência: janela-porta-janela ou vice-versa; ou janela-janela-porta ou vice-versa, mas
esses três elementos sempre marcavam a fachada da edificação. (CASTIGLIONI, 2010)

A arquitetura ferroviária marca presença através da estação de Itapina, desativada em 1980,


com a saída da população do vilarejo e a queda da produção do café. Trata-se de uma
construção simples, com um grande galpão fazendo parte do seu corpo principal, telhado
em duas águas, prolongado e sustentado por mãos francesas de madeira para cobrir parte
da plataforma. Como a estação escontra-se desativada, atualmente foi construído um ponto
de parada ao lado, para os passageiros embarcarem no trem, tendo em vista que os trilhos
permanecem cortando Itapina.

De uma forma geral, pode-se perceber que a maior parte do casario está preservado,
porém, sabe-se que a melhor forma de se preservar uma edificação é através do uso da
mesma, e, foi constatado que há um grande número de imóveis que estão fechados e
abandonados, o que pode ocasionar na perda total de sua estrutura.

O Sítio Histórico de Itapina, se apresenta, ainda hoje, como peça fundamental à composição
da memória histórica e social do município. Permanecendo-se como referencial do
município de Colatina e objeto de impacto para a sociedade colatinense.

Conclui-se, acerca da relação da sociedade colatinense com o vilarejo, a real dinâmica de


utilização e concretização. Pode-se perceber, assim, que a degradação das edificações
pertencentes ao mesmo representa e se entrelaça, também, à degradação da memória
sociocultural e patrimonial do município, privando os moradores do usufruto de todas as
possibilidades oferecidas pelo local.

Diante da constatada apropriação e ligação socioafetiva da população local à obra, observa-


se, ainda, os percalços encontrados no que diz respeito a reformas, reusos, repristinações e
quaisquer outras ações recuperativas, devido à ausência de acompanhamento público, além
da dificuldade em dar novos usos as edificações. Percebe-se, portanto, que a recuperação e
preservação do Sítio Histórico de Itapina representa não somente a recuperação material de
um marco pontual da cidade, mas também na valorização e recuperação social, cultural e
patrimonial da memória histórica colatinense.

Com o desuso e abandono do vilarejo, observa-se a presença de manifestações de


deteriorações causadas com as interferências da ação humana e do tempo, que alteraram
as características das edificações e estão comprometendo o desempenho dos elementos
construtivos e a funcionalidade das mesmas, tais como: oxidação do material em aço,
desprendimento do revestimento e reboco, recalque, pátina, trincas, rachaduras, mofo,
dilatação das juntas com perda de revestimento, fiação exposta, dentre outros.

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Desta forma, a realidade atual de Itapina é de esquecimento, até mesmo no cenário regional
ele é desconhecido. Porém, é um lugar de uma história riquíssima, suas edificações
demonstram um tempo de prosperidade para o vilarejo. Além da arquitetura, sua relação
com o Rio Doce e com a Estrada de Ferro Vitória-Minas, o tornam um lugar único.

Através dos inúmeros dados citados é possível notar que a memória histórica e imagem viva
de tempos passados não encontram-se presentes na edifcação, ocasionando a
descaracterização e a destruição do bem herdado das gerações passadas, acarretando o
rompimento da corrente do conhecimento social, físico e histórico da edificação.

A falta de gestão, entendida como crise dos espaços de memória, implica em um processo
de reflexão sobre a informação genética da cidade que sofre ameaças em meio ao caos,
carecendo de restauração e preservação.

Considerações Finais
Diante do que foi exposto constata-se a importância histórica deste sítio no campo da
arquitetura e urbanismo num contexto local e regional, quais características outorgam a ele
valor de singularidade que justifique seu tombamento. E então, comprovada sua importância
histórica, verificar se as ações as quais ele está submetida têm cumprido o papel de manter
suas principais características, se tem permitido a manutenção do ambiente que o justifica
enquanto sítio.

Contudo, devido à uma gestão falha do poder público municipal e estatual, que não promove
ações no sentido de por em prática a legislação existente, o sítio está perdendo importantes
características que compõe seu conjunto. Aponta-se para a necessidade de se aprofundar
as ações de preservação deste sítio, bem como resgatar a autoestima da população local
em geral e orientá-la no sentido de fazê-la compreender que, apesar de o patrimônio
histórico arquitetônico visível na paisagem urbana ser a expressão monumental da condição
dominante em um determinado período do passado, e que esta condição não condiz com a
atualidade, o patrimônio também é resultado da força do trabalho e da arte de seus
antepassados no processo de sua construção e que, portanto, merece ser preservado.
Nota-se ainda a necessidade de intervenções urgentes do poder público, através de ações
relacionadas ao planejamento urbano, Incluindo aí, iniciativas para requalificação,
revitalização e refuncionalização do patrimônio edificado, assim como ações de cunho
educativo, para qualificação da população em relação à educação patrimonial e a
consequente valorização por parte da sociedade, para o conjunto patrimônio edificado.

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Diante disso, a intenção é levantar questões como intuito de promover a preservação do
Sítio Histórico de Itapina e mostrar a importância do mesmo dentro do território do Estado do
Espírito Santo.

Referências Bibliográficas
BOGÉA, K. B. S. R. Centro Histórico de São Luis Patrimônio Mundial, São Luís. 200.

CARNEIRO, V. Demolição de prédio histórico surpreende moradores de Colatina. 2010.


Disponível em: <http://gazetaonline.globo.com/_conteudo/2010/10/677268-
demolicao+de+predio+historico+surpreende+moradores+de+colatina.html>. Acesso em 23 abr. 2017.

Carta de Cracóvia. 2000. Disponível em: <www.mcu.es/museos/docs/CartaDeCracovia.pdf>.


Acesso em: 05 Jun. 2017.

CASTIGLIONI, Lorena de Andrade. Trajetória de um Vilarejo [Itapina]. Projeto de Graduação,


Arquitetura e Urbanismo, Centro de Artes, Universidade Federal do Espírito Santo, 2010.

FERNANDES, Edésio. Do Tombamento ao Planejamento Territorial e à Gestão Urbana. In:


Revisitando o Instituto do Tombamento / organização Edésio Fernandes, Betânia
Alfonsin – Belo Horizonte: Fórum, 2010.

FONSECA, Maria Cecília Londres. O patrimônio em processo: trajetória da política federal de


preservação no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; IPHAN, 2005. 294 p.

MORELATO, Andressa da Silveira. Sítio histórico urbano de Santa Leopoldina : uma análise de
sua preservação / Dissertação de Mestrado em Artes. Programa
de Pós-Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2013.
164 f.

PEREIRA, Juliana Wagner. O Tombamento: de instrumento a processo na construção


de narrativas da nação. Dissertação de Mestrado em Museologia e Patrimônio. Programa
de Pós-Graduação da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,
2009.

RESOLUÇÃO CEC n° 003/2013. Disponível em:


<http://secult.es.gov.br/_midias/pdf/resolucao_tombamento_itapina-8969-52b2e43b16cb0.pdf>
Acesso em 19 de jul. de 2017.

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<http://www.secult.es.gov.br/files/upload/092015/108-Documento-1441977278-Resolucao-CEC-01-
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<http://www.secult.es.gov.br/files/upload/092015/109-Documento-1441977387-Resolucao-CEC-02-
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RESOLUÇÃO CEC n° 002/2012. Disponível em:


<http://secult.es.gov.br/_midias/pdf/resolucao_cec_02_2012_tombamento_muqui_does-8995-
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RODRIGUES, M. Imagens do Passado. A Instituição do Patrimônio em São Paulo. São Paulo:
Unesp; Imesp; Condephaat, 2001.

SCHEINER, Tereza Cristina. Imagens do Não Lugar: Comunicação e os Novos Patrimônios.


Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura, UFRJ, 2004.

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VIVENDA CAIÇARA: UM EXEMPLAR DA ARQUITETURA EM
PEDRA PIAUIENSE

VIVENDA CAIÇARA: um exemplar da arquitetura em pedra


piauiense

FERREIRA, CAMILA S. (1); BORGES, VITÓRIA G. (2)

Universidade Federal do Piauí. Departamento Construção Civil e Arquitetura


www.ufpi.br
camilasfg@live.com; vitoriagomes.b@gmail.com.

RESUMO
Este artigo aborda o processo de construção e transformação da arquitetura em pedra no Piauí,
utilizando como exemplo para análise a vivenda caiçara, uma moradia da década de 1910, situada na
cidade de Capitão de Campos – Piauí, construída por descendentes de escravos. Outro ponto
abordado, é a edificação se apresentar como elemento patrimonial, devido ser um exemplar raro
desta técnica, apesar de não possuir acautelamento por parte de inventário ou tombamento.

A Vivenda Caiçara é uma residência do século XVIII, possui técnica construtiva mista, utilizando-se
de pedra e adobo de barro, constitui um exemplar único pelas técnicas construtivas adotadas e pelas
soluções de conforto térmico aplicadas. A disposição dos cômodos e das aberturas representam bem
as necessidades da família proprietária e das tradições da época, deixando claro a hierarquização e
setorização típicas de uma arquitetura mais tradicional.

A discussão colocada em voga por este artigo, é a de que o conceito de patrimônio precisa ser
democratizado, para que atinja também exemplares que se assemelhem mais aos conceitos de
identidade da população, inserindo a comunidade no processo participativo da escolha do patrimônio.

Faz-se necessário sinalar, os órgãos de preservação, muitas vezes legislam em favor de edificações
com valor arquitetônico mais rebuscado, o que faz com que a arquitetura produzida pelas classes
inferiorizadas passe despercebida.

Em destaque, a Arquitetura produzida no Nordeste do País, principalmente em regiões interioranas,


longe das capitais, é desconsiderada, ficando a mercê dos proprietários que nem sempre possuem
relevante educação patrimonial. Tal descaso, contribui para a descontinuidade da memória da cidade
e da comunidade, tornando a população ainda mais distante e alheia ao seu patrimônio.

Palavras-chave: Vernacula; Patrimônio; Carnaúba; Pedra; Barro;

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Introdução
No decorrer da colonização da então chamada Terra de Santa Cruz, dentre os
costumes e hábitos inseridos na sociedade em formação, o ‘modo de morar’ se constituiu de
maneira peculiar. A arquitetura, em destaque, devido às condições sociais, econômicas e
climáticas, restringiu-se apenas à aparência em decorrência do uso de materiais
semelhantes, das técnicas construtivas adaptadas (e muitas vezes ignorada em prol da
estética) e da tentativa de repetir os modismos do reino. Em foco, a arquitetura residencial
rural apresentou divagações interessantes que contribuíram para a formulação da entendida
Arquitetura Vernácula, como define Lemos (1925, p.15)
[...] Aquela feita pelo povo, por uma sociedade qualquer, com seu
limitado repertório de conhecimentos num meio ambiente definido,
que fornece determinados materiais ou recursos em condições
climáticas bem características. Com seu próprio e exclusivo “saber
fazer” (...) A casa vernácula é, portanto uma expressão cultural
(LEMOS, 1925, p.15)

No final do século XIX e início do século XX, enquanto a nova capital do Estado do
Piauí, Teresina, buscava adquirir características classificadas como urbanas por meio do
financiamento fornecido pela economia extrativista (Sousa, 2008) através da adoção da
Arquitetura Eclética nos padrões construtivos, principalmente na edificações residenciais
das famílias mais abastadas, as regiões mais distantes do centro do poder usufruíam ainda
de técnicas construtivas difundidas durante o período colonial, (aplicada principalmente a
tipologia residencial) estilo arquitetônico atualmente entendido como Arquitetura Tradicional
devido sua predominância mesmo após a instituição do Império e da República Velha.
A arquitetura colonial, apesar de adotar materiais e técnicas regionais adaptadas ao
contexto nacional, e conseguir representar de maneira pertinente e não apenas como réplica
a identidade nacional, esta, ainda assim, se especializou na tentativa de servir aos diversos
cenários existentes dentro de um país continental e com circunstâncias ambientais tão
diferentes, a variar de região para região, como observamos a seguir nas considerações
destacadas quanto ao cenários paulista do século XVIII, nas palavras de Silveira Bicca e
Panitz Bicca (2008, p.76)
[...] tanto as mais antigas, do seiscentos – como a do sítio Santo
Antônio, ou a do padre Inácio, no município de Cotia – quanto as
mais recentes, do século XVIII, como as do sítio Mandu, no município
de Cotia, ou a de Tatuapé, no município de São Paulo, formam um
grupo homogêneo, com características básicas comuns. Nas
frontarias, essas casas tinham sempre alpendre central, vazado,
ladeado pelo quarto para hóspedes e pela capela, cujas paredes
possuíam apenas pequenas aberturas de janela, apresentando belas
proporções em seu conjunto. Os telhados de quatro águas tinham os
beirais com cachorros longos de madeira, apoiados nos frechais

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corridos ao longo de todo o perímetro da edificação.(BICCA; BICCA,
2008, p.76)

Em meio aos acontecimentos paulistas, no nordeste do País, mais especificamente no


Estado do Piauí, há 144 Km da capital, Teresina, na fazenda Jovita de Sousa Barros, onde
inicialmente se configurou o núcleo urbano que no final da década de 50 deu origem a
cidade de Capitão de Campos, destacamos como exemplar da Arquitetura Tradicional
Vernácula a casa da Dona Alemã. Datada do final do século XIX, construída em alvenaria
de pedra com argamassa de barro e madeiramento do telhado em carnaúba. A obra acima
pode ser apontada como referência para o que era produzido no sertão piauiense entre os
séculos XIX e XX, por ser um arquétipo tão genuíno. A edificação foi tombada pela
Secretaria de Cultura do Estado do Piauí no ano de 1992, entretanto, encontra-se
atualmente já bastante descaracterizada e possui indícios de breve desmoronamento.
No mesmo município, ressalta-se o objeto de estudo deste artigo, a Vivenda Caiçara.
A casa foi construída na localidade Caiçara, e as terras recebiam esse nome pela
proximidade com os rios Corrente e Sambito. Com obra iniciada por volta da década de
1910, possui estrutura mista em alvenaria de pedra e adobo de barro e estrutura de
cobertura em carnaúba. A vivenda pertence à família Gomes e Livramento, composta por
muitos filhos e que tinha como principal atividade a pecuária e a agricultura de subsistência
e possui ainda origem escravocrata. A edificação resulta desta maneira de um processo
cultural formada pela junção de saberes tradicionais e técnicas experimentais.
[...] qualquer evidência material ou manifestação cultural, seja um
objeto ou conjunto de bens, um monumento ou um sítio histórico ou
arqueológico, uma paisagem natural, um parque ou uma área de
proteção ambiental, um centro histórico urbano ou uma comunidade
de área rural, uma manifestação popular de caráter folclórico ou
ritual, um processo de produção industrial ou artesanal, tecnologias e
saberes populares, e qualquer outra expressão resultante da relação
entre indivíduos e seu meio ambiente (HORTA; GRUNBERG;
MONTEIRO, 1999, p.6)
Por meio de entrevista, levantamento arquitetônico e remonte histórico, pautou-se a
metodologia para construção do trabalho. A fundamentação teórica colheu dos escritos de
Carlos Lemos sobre à casa brasileira, na vivência de J.N.B. de Curtis, considerações de
Roberth Smith e nos estudos de Olavo Pereira da Silva Filho sobre a arquitetura vernácula
do Piauí. A partir desse arcabouço, analisar-se-à configuração espacial e as técnicas
construtivas adotadas, bem como as alterações sofridas ao longo dos anos.

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DETALHES CONSTRUTIVOS: AS TÉCNICAS APLICADAS NA
CONSTRUÇÃO DA VIVENDA CAIÇARA

Sob a perspectiva de Curtis (2003), o expressionalismo da arquitetura nordestina fez


com que este se destacasse na produção brasileira, principalmente no que diz respeito à
arquitetura residencial. Assim coloca em sua redação:
O Nordeste conduziu a arquitetura, através da complexa
ocupação de sua área, para arranjos bastantes diversificados(...)
Duas subáreas caracterizam, desde logo, esta vasa região: o
Nordeste seco e o Nordeste úmido. O primeiro utilizando o gado
como válvula de escape(...)(CURTIS, 2003, p.108)

Sob análise de Pietro M Bardi (1980, p.45), destacamos ainda que:


No início do século XVII, desenvolveu-se no Nordeste e na
região de São Paulo uma arquitetura espontânea, sempre
caracterizada pela adaptação às condições climáticas do país. (...)
Nos latifúndios da região setentrional, pelo que se pode julgar por
algumas pinturas de Frans Post, não existia uniformidade
arquitetônica, mas uma série de variações em torno dos modelos
portugueses de casa rural. Não se sabe se foi adotada uma
organização espacial precisa para as construções destinas à
produção do açúcar, às habitações dos escravos e à casa senhorial.
O único elemento comum parece ter sido os pórticos da fachada
principal, onde algumas vezes domina um pequeno alpendre, que
poderia ter sido inspirado nas capelas bangalôs da Índia ou que,
segundo alguns estudiosos, teria sido inspirado nas capelas rurais da
península Ibérica. Nas mais ricas propriedades agrícolas do planalto
paulista, ao contrário, era usual um tipo de complexo arquitetônico,
caracterizado pela casa patronal, de planta retangular, com alpendre
reentrante na fachada; a capela da família de um lado e os hóspedes
do outro, cem como o paiol de milho, casas de farinha, as cozinhas,
cavalariças e as casas de “negros” ( ou seja, os escravos).(BARDI,
1980, p.45)

Por meio da implantação de fazendas de gados no território nacional, as terras


interioranas foram sendo desbravadas, à medida em que havia a necessidade de expandir
os rebanhos. Deste modo, o território piauiense foi explorado, tendo como ponto de partida a
região próxima ao Estado da Bahia, em direção ao extremo Norte. Também através da
atividade pecuária foram feitas as primeiras instalações que serviam de abrigo onde
posteriormente se configurariam na Vivenda Caiçara. Por meio da vivência e experiência
empírica, a casa foi construída com um programa espaçoso e materiais locais disponíveis,
com o intuito de atender às necessidades de uma família grande que sobrevivia sobretudo
da agricultura de subsistência, o que justifica a disposição de diversos depósitos na casa.
Como afirma Pietro M Bardi (1980, p. 95)

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A arquitetura caracterizava-se por uma adaptação dos modelos
portugueses às exigências do clima e à disponibilidade de materiais.
As primeiras edificações tinham geralmente planta retangular com
teto em plano inclinado (para que a chuva escorresse melhor),
formado por toras cilíndricas de madeira recobertas de palha, folhas
de coqueiro e sapé. Para as paredes usava-se a tradicional taipa
portuguesa – terra misturada com folhas esmigalhadas. Usava-se
também pedra e uma espécie de cal obtida dos sambaquis,
depósitos de esqueletos e conchas da época pré-hitórica, situados
ao longo do litoral.(BARDI, 1980, p.95)

A planta baixa se configura por possuir implantação estratégica conforme a (Figura


01), a orientação Norte e Sul, considerada a melhor, pois evita o sol nascente e poente
incida sobre quartos e salas, tendo sido erguidas essas fachadas em pedra de lajeiro, tais
pedras foram retiradas dos rios nas proximidades. Considerando as circunstâncias
climáticas locais, ressaltamos a implantação como ferramenta importante na contribuição de
um melhor conforto térmico no interior da edificação.
Figura 01: Planta baixa original

QUARTO SALA 01 QUARTO

DEPÓSITO SALA 02 SALA 03


COZINHA

FORNO

QUARTO DEPÓSITO COZINHA

Fonte: Ferreira, Borges, 2017

As disposições Leste e Oeste recebiam os depósitos e as cozinhas, estas foram


erguidas em adobo de barro, uma solução que admitiria maior conforto térmico dentro da
edificação, pelo fato do barro ser um material poroso, deixando o ambiente mais frio. Outro
ponto a se ressaltar, ainda em nível de planta baixa, é que o forno de barro foi construído
em anexo à edificação, de acordo com Lemos (1925), trata-se de uma adaptação dos
costumes europeus às condições climáticas, bem como uma herança indígena.

As paredes internas além de delimitar os cômodos foram aprumadas no estilo: “meia


parede”, uma técnica muito comum no Nordeste, onde as vedações não atingem o nível do
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telhado, deixando com que o ambiente fique mais arejado devido a possibilidade de
circulação do ar. Essa estratégia é mais uma técnica de comodidade térmica, pois permite a
evacuação do ar quente. Essa alternativa fazia com que o telhado viesse com apoios nas
paredes, permitindo a criação de uma cumeeira alta e águas bem inclinadas.
O material utilizado no telhado foi a carnaúba e o sabiá, árvores típicas do serrado
piauiense e encontradas em abundância. Devido à resistência e porosidade, a carnaúba era
colocada em pontos de maiores esforços de cargas, como no vigamento e apoios da
cobertura. Por ficarem expostas, as peças de carnaúbas também eram utilizadas como
armadores de rede. Nas ripas era utilizado o sabiá, uma madeira de qualidade, mas
entroncamento mais fino, que permitia um corte mais acertado para produção de ripas e
terças.
Para as aberturas, devido ao alto nível de insolação e a pouca arborização do local,
por se tratar de uma zona semiárida, os construtores delimitaram pequenas janelas. Estas
serviam apenas para circulação do ar e eram feitas em madeira de figueira, devido a
resistência a cupins e outras pragas. Averiguam-se as seguintes afirmações nas (Figura 02).
Figura 02: Fachada Norte da Edificação, original

Fonte: Ferreira, 1994


Pela proximidade com os rios, as pedras em lajeiros podiam ser retiradas em grande
quantidade, assim estas também foram aplicadas no piso da casa. Este tipo de piso é
conhecido como “lajota”, e tem sua serventia pela não necessidade de ser rejuntado como
os demais, portando-se, portanto, como item econômico.
Em resumo o partido construtivo adotado pela casa foi de: carnaúba, pedra e barro,
conforme discorre Silva Filho (2007), quando fala da arquitetura produzida no Piauí.
Ressalta-se também, que técnica construtiva aplicada na edificação se dispõe de maneira
peculiar, o que faz abordar a retórica de que talvez fosse importante uma proteção maior
sob este imóvel. Assim se levanta a ideia e abordagem das leis patrimoniais sob as
edificações projetadas pelas classes menos abastadas.

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AS LEIS PATRIMONIAIS E A ARQUITETURA DE PEDRA:
DESVALORIZAÇÃO DA ARQUITETURA VERNÁCULA RURAL

Devido aos poucos incentivos à preservação desses imóveis rurais, muitos deles
foram descaracterizados, isso se deve à adoção de outras necessidades ao programa das
pessoas que o habitam. No caso da Vivenda Caiçara, foram adicionados dois banheiros
internos, bem como teve suas fachadas de pedra rebocadas, devido à quantidade de poeira
e insetos que se acumulavam nas paredes, assim pode-se conferir na (Figura 03).
Apesar de ser um exemplar peculiar, este perdeu a sua singularidade, entretanto, isso
se deve muito ao pouco reconhecimento desse tipo de arquitetura por parte dos órgãos
ligados à preservação e sua pouca representatividade social.

Figura 03: Fachada Norte, modificada

Fonte: Ferreira, 2017

Conforme Ferreira (2010, p.223), o significado antropológico de cultura pode ser


definido por: “conjunto de conhecimentos, costumes, crenças, padrões de comportamento,
adquiridos e transmitidos socialmente, que caracterizam um grupo social”, assim cultura são
as atividades, costumes e instruções que configuram a identidade de um povo, a partir dela
se tem um processo permanente de evolução coletiva (UFRGS, 2007).
A palavra patrimônio, também está intimamente ligada ao significado de cultura,
proveniente do latim patrimonium, é caracterizada como uma herança comum, ou bens de
família. Ambas, cultura e patrimônio, se constituem como instrumentos de caracterização e
pertencimento de grupos sociais. (UFRGS, 2007).
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A união das duas palavras confere o Patrimônio Cultural, como sendo o conjunto de
pressupostos básicos para reconhecimento de uma sociedade, este é dotado ou não de
materialidade, mas possui continuidade histórica dentre as diferentes gerações. Em resumo
o Patrimônio Cultural é a herança dos hábitos e orientações, constituindo-se como o
principal agente de construção de uma memória social. (UFRGS, 2007).
Lemos (2000) afirma que o Patrimônio Cultural é o pecúlio maior que compreende os
diversos tipos de patrimônio, sejam eles: histórico, artístico, arquitetônico, imaterial, etc.
Para De Varine (1975), a classificação dos tipos de patrimônio se dá em três categorias:
[...] primeiramente arrola os elementos pertencentes à natureza
e meio ambiente [...] o segundo grupo de elementos refere-se ao
conhecimento, às técnicas, ao saber e ao saber fazer. São
elementos não tangíveis do patrimônio cultural. Compreende toda a
capacidade sobrevivência do homem em seu meio ambiente [...] o
terceiro grupo de elementos é o mais importante de todos, porque
reúne os chamados bens culturais, que englobam toda sorte de
coisas, objetos, artefatos e construções, obtidas a partir do meio
ambiente e do saber fazer. (DE VARINE, 1975, p.86)

Por suas particularidades, é importante salvaguardar a Vivenda Caiçara como um


exemplar que compõe o Patrimônio Cultural Regional, como detalhamos a seguir seguindo
as considerações de Lemos.
 Elementos Naturais – quando os materiais são encontrados
naturalmente no ambiente, possibilitando as particularidades de cada região,
como observamos na fala de Lemos “...quando a língua virou dialeto e os usos
e costumes quase que se vernacularizaram em novos feitos tão diferentes
daqueles d’além mar.” Salientamos a madeira de carnaúba e sabiá utilizadas
na estrutura da cobertura, o barro utilizado na produção do adobe adotado
como elemento de vedação e das pedras retiradas do rio Corrente também
utilizadas como elemento de vedação autoportante na fachada principal.
 Conhecimento – abrange todas as técnicas e conhecimentos
empíricos que agrupam o ‘saber fazer’ de uma sociedade, como um patrimônio
não tangível, que possibilita “compreender a capacidade de sobrevivência do
homem no seu meio ambiente” (Lemos, 1891). Evidenciamos as técnicas já
não mais adotadas da alvenaria em pedra e em adobe de barro e a estrutura
da cobertura em madeira roliça.
 Bem Cultural – “toda a sorte de coisa obtida a partir do meio ambiente
e do saber fazer algo”, compondo o que Lemos aponta como um artefato como
toda a sua significância preservada, por se tratar de um imóvel, o conjunto de
materiais e técnicas empregadas asseguram a Vivenda Caiçara uma posição
de destaque dentro da cultura local.
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A Constituição Federal Brasileira de 1988, também define o Patrimônio Cultural como
“os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto,
portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores
da sociedade brasileira”. (BRASIL, 1988)
No Brasil, o órgão responsável pelo acautelamento, registro e preservação do
Patrimônio Cultural, a nível federal, é o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
– IPHAN. O órgão foi criado no ano de 1936, com o nome de SPHAN (Secretaria do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), seu idealizador foi Mário de Andrade, sob
encomenda de Gustavo Capanema, o então ministro de cultura da época (1934 – 1945). As
prerrogativas da criação do IPHAN, deram origem ao decreto de Lei Nº 25, de 30 de
novembro de 1937, que organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional até
os dias atuais. (IPHAN, 2014).
Dadas as definições, destaca-se no Brasil o patrimônio arquitetônico, devido ao fato de
ser o grupo com mais visibilidade, reconhecimento e exemplares. (LEMOS, 2000, p. 45). No
Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC), o IPHAN (2013, p.37), classifica as
edificações como: “ construções que não tem necessariamente o valor de bem cultural
edificado, objeto de tombamento, mas são referenciais para a identidade de grupos, sendo
assim, portadores de significado diferenciado”.
Choay (2001), analisa o patrimônio arquitetônico na perspectiva de que todo bem
imóvel é também um monumento histórico, ou seja, não se constitui apenas como um
representante de algumas técnicas construtivas, mas se apresenta como exemplar de um
dado período da História. Lemos (2000), compartilha da mesma opinião quando delimita que
as construções antigas não podem ser desassociadas do seu significado histórico, sendo
sempre, portanto classificadas como patrimônio arquitetônico e histórico.
Por fim, sob a mesma ótica o decreto de Lei Nº 25, de 30 de novembro de 1937,
caracteriza o patrimônio como:
[...] o conjunto de bens móveis e imóveis existentes no país e
cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação
a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional
valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico. (BRASIL,
1937, p. 01)

Nesse entendimento, o patrimônio arquitetônico deve ser tratado como um


monumento, dotado de história, identidade e excepcionalidade. Este, portanto, não é capaz
de se desprender dos demais tipos de patrimônio.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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Ressaltamos que no Brasil o conceito de patrimônio cultural ainda é muito recente,
principalmente quando observado sob a ótica da Europa, dessa forma tem-se uma
população pouco ligada aos bens patrimoniais da nação, o que veio a ocasionar uma
situação de nítida ausência de pertencimento por parte da população, de modo
generalizado, em relação aos bens consolidados. Assim, o conjunto de bens dotados de
interesse e valor cultural fica refém do reconhecimento, por parte de inventários e por parte
do tombo, o que fragiliza a conservação das técnicas tradicionais e com traços realmente
nacionais. Faz-se ainda necessário sinalar, que os órgãos de preservação, muitas vezes
legislam em favor de edificações com valor arquitetônico mais rebuscado, com referência
aos padrões internacionais, em grande parte das vezes sem qualquer relação com as
circunstâncias locais, o que faz com que a arquitetura produzida pelas classes inferiorizadas
passe despercebido.
Em destaque, a Arquitetura produzida no Nordeste do País, principalmente em regiões
interioranas, longe das capitais, é desconsiderada, ficando a mercê dos proprietários que
nem sempre possuem relevante educação patrimonial. Tal descaso, contribui para a
descontinuidade da memória da cidade e da comunidade, tornando a população ainda mais
distante e alheia ao seu patrimônio.
Apesar de ser um exemplar peculiar e de importante relevância na composição do
Patrimônio Cultural e Imaterial local (este através do conhecimento empregado), a Vivenda
Caiçara, é ainda ignorada pelos órgãos públicos de preservação, em prol da valorização das
tendências estrangeiras, sobretudo europeias, contribuindo para a formação de uma “visão
distorcida da memória coletiva social” Lemos (1985), evidenciada maiormente na
inexistência de identificação da população para com os bens assegurados como patrimônio,
configurando uma situação de ausência de pertencimento, favorecendo assim o descaso,
que é ainda mais beneficiado pela precária (quase inexistente) educação patrimonial
empregada no País, como se posiciona Carlos Rodrigues Brandão, 1996:
Não se trata, portanto, de pretender imobilizar, em um tempo
presente, um bem, um legado, uma tradição de nossa cultura, cujo
suposto valor seja justamente a sua condição de ser anacrônico com
o que se cria e o que se pensa e viva agora, ali onde aquilo está ou
existe. Trata-se de buscar, na qualidade de uma sempre presente e
diversa leitura daquilo que é tradicional, o feixe de relações que ele
estabelece com a vida social e simbólica das pessoas de agora. O
feixe de significados que a sua presença significante provoca e
desafia (BRANDÃO, 1996, p.51)

O conceito de patrimônio no Brasil, ainda está muito ligado aos exemplares que se
aproximam do modelo europeu, como é o caso da Arquitetura Colonial, que tem sido muito
bem acautelada nos centros históricos brasileiros. Apesar da importância indiscutível desse

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tipo de arquitetura, se faria importante prezar, pela preservação e conservação de uma
arquitetura mais tradicional e vernácula, esta que se aproxima muito mais do conceito de
identidade social.
Assim pode-se concluir, que a chave para aproximar a população do patrimônio seja
procurar um vínculo de identidade com o mesmo, a fim de permitir que os órgãos
preservacionistas possuam uma boa relação com os setores sociais, bem como a
conservação dos exemplares.

REFERÊNCIAS

- BRASIL. Lei Nº 25, de 30 de Novembro de 1937. Organiza a proteção do patrimônio


histórico e artístico nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/Del0025.htm> Acesso em: 08 abr. 2017.
- BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988.
Dinsponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituição/constituição.htm>.
Acesso: 08 abr. 2017.
- CHOAY, Françoise. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade: Editora
UNESP, 2001.
- SILVA FILHO, Olavo Pereira da. Carnaúba, pedra e barro na Capitania de São José do
Piauhy. Belo Horizonte: Ed. do Autor, 2007. 3v. 361p.
- FERREIRA. Camila de Sousa. Arquivo pessoal. 1994- 2017.
- FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário da língua portuguesa. 5. ed.
Curitiba: Positivo, 2010.
- FERREIRA. Camila de Sousa; BORGES. Vitória Gomes Moreira Rufino. Arquivo pessoal.
2017.
- IPHAN. Ferrovia Transnordestina: Caderno Multiplicador: Polo Brejo Santo. São
Paulo: Zanettini Arqueologia, 2013.
- _______. Educação Patrimonial: histórico, conceitos e processos. Brasília: IPHAN,
2014.
- SMITH, Robert Chester. Robert Smith e o Brasil: cartografia e iconografia. 1.ed.
Brasília, DF: IPHAN, 2012. V. 4, 364p. (Robert Chester Smith: organização, Nestor Goulart
Reis Filho.).

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- CURTIS, Júlio Nicolau Barros de. Vivências com a arquitetura tradicional do Brasil.
1.ed. Porto Alegre: Ed Ritter dos Reis, 2013. V. 1, 496p.
- DE VARINE, Hugues. Patrimônio Cultural – A Experiência Internacional – Notas de
aulas de 12.8.1974. São Paulo: Edição em convênio: Universidade de São Paulo,
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional, 1975.
- LEMOS, Carlos A. C. A casa brasileira. 1.ed. São Paulo: Contexto, 1989. V.1., 81p.
(Repensando a história)
- LEMOS, Carlos A.C. O que é Patrimônio Histórico. São Paulo: Brasiliense, 2000.
- UFRGS. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL. Manuais do patrimônio
histórico edificado da UFRGS: cartas patrimoniais e legislação. Porto Alegre: Editora da
UFRGS, 2007.
- BARDI, M. Pietro. Arte no Brasil. São Paulo: Nova Cultura, 1980.
- IPHAN. Arquitetura na formação do Brasil. 2 ed. Brasília: Unesco, Instituto de
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 2008.
- BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Cultura, educação e interação: observações sobre ritos
de convivência e experiência que aspiram torná-las educativas In: BRANDÃO, Carlos
Rodrigues et al. O difícil espelho: limites e possibilidades de uma experiência de cultura e
educação. Rio de Janeiro: Iphan, 1996.
- HORTA, Maria de Lourdes Parreiras. GRUNBERG, Evelina; MONTEIRO, Adriane Queiroz.
Guia básico de Educação Patrimonial. Brasília: Iphan, Museu Imperial, 1999.

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(RE) SIGNIFICAR O MUSEU: PARCERIA UNIVERSIDADE X
INSTITUIÇÃO MUSEAL PÚBLICA

CARVALHO, Alexandre Sônego de; RODRIGUES, Ana A. Villanueva,


SCARABELLI, Patrícia Ceroni.

1. Museu da Imagem e Som. Prefeitura Municipal de Campinas


Universidade Presbiteriana Mackenzie
prof-alexandresc@bol.com.br

2. Museu da Imagem e Som. Prefeitura Municipal de Campinas


Universidade Paulista – UNIP de Campinas
anavillanueva11@gmail.com

3. Universidade Paulista – UNIP de Campinas


patriciascarabelli@unip.br

RESUMO
O Museu da Imagem e do Som de Campinas está localizado em um prédio histórico de grande valor
patrimonial, tendo sido tombado por três esferas de órgãos de preservação do patrimônio cultural, o
IPHAN, o CONDEPHAAT e o CONDEPACC.Por esta característica histórica do edifício, surge
naturalmente uma dicotomia entre o objeto tecnológico do museu e a preservação do patrimônio
arquitetônico.Desde janeiro de 2017, foi iniciado um trabalho de apropriação do espaço do Museu
pelas Universidades da cidade, primeiramente a UNIP, sendo seguida pela PUCC e pela UNICAMP.A
primeira idéia deste trabalho foi a de trazer os alunos da disciplina de técnicas retrospectivas do
Curso de Arquitetura e Urbanismo para fazer um levantamento do prédio histórico e ficar em contato
permanente com o mesmo para apreensão, na prática, das teorias de preservação. No sentido
contrário, estes alunos contribuem para a dinâmica do cotidiano do museu, com carência humana e
estrutural.Esta experiência Universidade/Museu, enriquece ambas instituições, fazendo com que
novas iniciativas e idéias sejam implementadas, como é o caso já ocorrido de atualização de material
expositivo, memória oral do edifício com o processo de educação fonográfica intitulado “de solar à
museu”, procedimentos de restauro e acompanhamento de laudos técnicos por parte dos
estudantes.Desta forma, cria-se um olhar mais apurado dos alunos que irá se transformar em
melhoria da sua formação profissional, ao mesmo tempo que estes estudantes trazem novos olhares
para os funcionários do MIS.Foram entrevistados os estudantes que participaram deste trabalho,
sendo constatados os resultados significativos que esta experiência está trazendo para o Museu e
para a Universidade.

Palavras-chave: Museu da Imagem e do Som; Patrimônio Cultural; Educação Patrimonial;


Universidade.

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(RE) SIGNIFICAR O MUSEU: PARCERIA UNIVERSIDADE X INSTITUIÇÃO
MUSEAL PÚBLICA

Arquitetura clássica e métodos de ensino

A partir do desenvolvimento da disciplina Técnicas Retrospectivas, pela


autora profa. Dra. Arqta. Ana Villanueva, no Curso de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Paulista, desde 1998 até os dias atuais, verificou-se uma maior
necessidade de integração entre o conhecimento produzido em sala de aula e a
realidade prática da profissão.

No caso da disciplina Técnicas Retrospectivas, alcançar esta integração


sempre foi complexo, pois, por se tratar de uma disciplina de intervenção em prédios
históricos o conhecimento dos mesmos sempre foi dificultado pelas grandes
dimensões dos edifícios e pela dificuldade de acesso ao local de estudo.

Para suprir academicamente estas limitações, foi desenvolvido um método de


levantamento e estudo de “modenaturas” clássicas e ornamentos, de forma
minuciosa, em escala 1:20.

Em breve retrospectiva, pode-se verificar que o estudo do relevo de bens


arquitetônicos de origem clássica incluindo as “modenaturas” teve sua origem na
antiga Academia Imperial de Belas Artes, a partir da chegada da chamada “missão
francesa”, sendo responsável o arquiteto Grandjean de Montigny.

Esta disciplina da Academia Imperial constituía-se no desenho e na prática de


construção de bens de origem clássica, porém, foi excluída do curriculum das
Universidades após a reforma no Ensino realizada por Lúcio Costa em 1930, na
Escola Nacional de Belas Artes (Reis Filho, 1994).

Somente no ano de 1994, através da Portaria 1770 de 21 de dezembro, é que


o Ministério da Educação insere a disciplina Técnicas Retrospectivas no curriculum
obrigatório dos Cursos de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (Farah, 2008, p.3) e
recoloca assim na aprendizagem dos Cursos de Arquitetura o ensino e a valorização
do patrimônio arquitetônico brasileiro incluindo os de origem clássica, notadamente
aquele do século XIX.

Por outro lado, o órgão oficial de preservação do patrimônio cultural – antigo


SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) também presidido por
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Lucio Costa desde 1937, somente valorizava a arquitetura colonial como
“genuinamente brasileira” (Andrade, 1993, p. 116). A primeira revisão crítica deste
conselho federal ocorreu somente em 1987 quando passou a se aceitar no Brasil a
preservação dos edifícios do século XIX (Revista do Patrimônio, 1987, p.34).

Diante deste quadro retrospectivo é possível entender a importância da


disciplina em questão, e as dificuldades encontradas, quer pelo preconceito dos
arquitetos e professores em geral com a arquitetura de origem clássica, também
chamada de neo-clássica, quer pela falta de edifícios a ser estudados e também pelo
desconhecimento do método de ensino.

Neste contexto, entra a disciplina que ministro na Universidade Paulista, que


se propõe a resgatar o conhecimento acima descrito. Para tanto, a profa. Dra. Arqta.
Ana Villanueva fez seus estudas na Itália, em Florença, no ano de 2004 como parte
integrante da bolsa sanduíche concedida pela CAPES, como prof. Dr. Gabrielli
Morolli através de indicação do prof. do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da
UNICAMP Dr. Marcos Tognon.

Este método de relevo, análise e valorização das “modenaturas” na disciplina


Técnicas Retrospectivas, resulta no final do Curso na confecção de maquetes das
fachadas dos edifícios históricos, de origem clássica, na cidade de Campinas, em
escala 1:20 ou 1:10.

A Universidade chega à cidade

O resultado da confecção de maquetes na Universidade sempre resultou em


exposição aberta para alunos e interessados, no sentido de divulgação do trabalho
da disciplina e também na difusão do conhecimento, sempre atraindo grande número
de visitantes.

Em uma dessas exposições, em novembro de 2016, o chefe do Museu da


Imagem e do Som de Campinas, Me. Alexandre Sônego de Carvalho, visitou à
exposição na Universidade Paulista, denominada “Campinas Clássica”, ficando muito
satisfeito com o resultado dos trabalhos, após foi feito o convite para exposição das
mesmas no referido Museu.

A exposição “Campinas Clássica” ocorreu de 10 de fevereiro a 9 de março de


2017, no MIS, com grande público visitante e muito interesse pelos mesmo em
conhecer a história dos edifícios do século XIX de Campinas (Figuras 1 e 2).
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Figura 1 – Montagem da exposição “Campinas Clássica” no MIS

Fevereiro de 2017 – Foto Matheus Velozzo

Figura 2 – Inauguração da exposição “Campinas Clássica no MIS

9 de fevereiro de 2017 – Foto Matheus Velozzo

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Por outro lado, os alunos que participaram da exposição tiveram seu trabalho
reconhecido publicamente, interagindo com a sociedade e levando o conhecimento
de sala de aula para o maior número de pessoas possíveis da sociedade.

No dia da abertura da exposição mais de 200 pessoas prestigiaram os


trabalhos e mais de 2500 pessoas puderam conhecer as produções dos alunos, no
decorrer do período em que ficou aberta para a população.

Esta experiência positiva inicial da exposição de maquetes, incentivou a


profa. Dra. Arqta. Ana Villanueva e o Coordenador do MIS, Me. Alexandre Sônego, a
expandir os trabalhos conjuntos e a elaborar uma parceria entre
Universidade/Prefeitura de Campinas, com a Coordenação do Curso de Arquitetura,
da UNIP, Ma. arqta. Patrícia Scarabelli, para atividades de estudo e projeto no
edifício sede do Museu chamado “Palácio dos Azulejos”.

De Solar à Museu – a trajetória do “Palácio dos Azulejos”

Em 1878 o edifício que hoje é a sede do MIS serviu como duas residências
geminadas para abrigar as famílias do Comendador Joaquim Ferreira Penteado –
futuro Barão de Itatiba - e da sua filha Francisca Ferreira de Camargo Andrade
(Pupo, 1983, p. 35).

No final do século XIX, Campinas se enriquecia com o cultivo e comércio do


café facilitado pela chegada da ferrovia (RODRIGUES, 1997, p. 12), e os barões do
café buscavam a transformação arquitetônica construindo e reformando suas casas
em estilo neoclássico, tendo em vista a influência da corte da cidade do Rio de
Janeiro. Neste contexto, o sobrado do barão de Itatiba marcaria a paisagem da
cidade de Campinas (RODRIGUES, 2010, p. 275).

O sobrado do Barão de Itatiba foi vendido à municipalidade em 1908, e em


1916, foi a leilão a casa contígua, e neste edifício permaneceu o Paço Municipal até
1969, quando mudou-se para uma nova sede – O Palácio dos Jequitibás - deixando
no edifício histórico somente o Departamento de Águas e Esgotos, que transformou-
se na SANASA (Sociedade de Água e Abastecimento de Campinas) e ocupou todo o
prédio (Tonon, Campinas, p. 146).

A SANASA permaneceu no Palácio dos Azulejos até 1996. Quando este


órgão transferiu-se para uma nova sede, o prédio recebeu a Secretaria Municipal de

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Cultura, através de três setores: o Museu da Imagem e Som, a Coordenadoria do
Patrimônio Cultural e o Arquivo Histórico.

Em 2001, o então Prefeito, Antonio da Costa Santos, decidiu instalar parte de


seu gabinete no edifício, o que não foi completado devido a morte do referido
Prefeito.

Entre os anos de 2003 e 2004, o edifício sofreu novas transformações para


adaptação ao uso do Museu da Imagem e Som, sendo transferidos os demais
setores para outros locais, e configurando assim uma sede definitiva para o Museu
(Sarasá, 2004).

O Museu da Imagem e Som (re) significou este edifício, mas ao mesmo


tempo conservou elementos arquitetônicos e históricos existentes. Esta dicotomia é a
própria essência da proposta cultural do Museu: levar o maior número possível de
escolas e público para conhecer um equipamento cultural e tecnológico e também
fazer o papel de difusor do patrimônio histórico e cultural muito importante para
Campinas.

Atualmente o “Palácio dos Azulejos” é considerado Patrimônio Cultural, sendo


tombado pelas três esferas de órgãos de preservação: IPHAN (Federal),
CONDEPHAAT (Estadual) e CONDEPACC (Municipal).

O edifício antigo com novas pessoas

Desde março de 2017, iniciaram-se trabalhos voluntários de estudantes


universitários, no total de 25 pessoas. Pela natureza do encaminhamento deste
projeto, os primeiros alunos foram aqueles da UNIP, já mencionados anteriormente,
porém, na sequência outros se engajaram como é o caso do Curso de Arquitetura e
Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica de Campinas e atualmente tem-se
realizado tratativas junto ao Curso de Arquitetura da UNICAMP. Pretende-se com o
passar do tempo abranger outras áreas de conhecimento e ampliar esta rede de
Universidades, uma vez que existem outros Cursos de Arquitetura na região.

A primeira experiência destes alunos foi a de fazer minunciosamente o


levantamento métrico arquitetônico do edifício, com a técnica do relevo arquitetônico.
Foram iniciados trabalhos de levantamento das fachadas, esquadrias, paginação de
piso e forro, ornamentos e “modenaturas” e planta-baixa. Foi descoberto que o
material já existente no edifício carecia de detalhamento minucioso e que a planta-
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baixa que estava sendo utilizada pelo Museu não correspondia à realidade (Figura
3).

Figura 3 - Relevo do edifício “Palácio dos Azulejos”

Março de 2017 – Foto Rodrigo Bordon

Numa segunda etapa, foram levantadas as patologias do edifício, e os


problemas de manutenção, em especial no telhado, que apresentava algumas falhas
no sistema de telhamento, condutores de água pluvial e também no sistema da rede
elétrica. Tão logo detectado pelos estudantes, foi encaminhado laudo técnico às
estâncias superiores para resolução dos itens destacados.

O Museu também não possuía um levantamento detalhado do seu material


expográfico, o que foi prontamente elaborado pelos estudantes, facilitando a
montagem de exposições.

Atualmente, encontra-se em desenvolvimento pela equipe de estudantes o


projeto arquitetônico para adequação da sala de cinema “Glauber Rocha”, e também
o projeto para novos expositores do MIS e do Museu da Cidade (Figura 4),
ampliando este trabalho para outros Museus da Secretaria Municipal de Cultura

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Figura 4 – Reunião para elaboração dos expositores nos Museus de Campinas

Junho de 2017 – Foto Ana Villanueva

Em decorrência desta atuação física no edifício, verificou-se a necessidade


de algumas iniciativas educativas e de conscientização da sociedade para a
preservação do rico patrimônio que é o “Palácio dos Azulejos”.

A primeira iniciativa para este processo é o projeto de memória oral “De Solar
a Museu”, que visa resgatar a trajetória do edifício até o uso do Museu, que se
transformará em um documentário para apresentar em visitações de escolas no
edifício, antes da apresentação de filmes que ocorrem diariamente no MIS e também
para demais eventos que venham a acontecer no próprio espaço ou em outros
equipamentos da Secretaria Municipal de Cultura.

O projeto de “Solar a Museu” será realizado por funcionários do próprio MIS,


mas com o auxilio dos estudantes de arquitetura, podendo ser ampliado para os de
história, uma vez que visa resgatar a memória oral de um dos mais importantes bens
culturais da cidade de Campinas.

Conclusão inconclusa

O processo de aprendizagem é um constante (re) aprender, e para manter


em transformação esta atividade didática é necessário entender o quanto este
trabalho está sendo absorvido e modificado pelos alunos.

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Para se ter uma visão mais pragmática no final deste semestre estão
acontecendo entrevistas com todos alunos, o que será relatado aqui com a estudante
de arquitetura e urbanismo da UNIP, Juliana Brigo.

A Juliana afirma que está no estágio por gostar de história. Para


aprofundamento no tema acredita ser fundamental ver a realidade do edifício
histórico em seus detalhes, onde pode constatar as diferenças de alinhamento das
paredes, as diversas técnicas construtivas dos edifícios contemporâneos.

Relata ainda que na faculdade já havia estudado os detalhes de prédios


históricos através da disciplina de técnicas retrospectivas, mas que foi através da
experiência no próprio edifício que conseguiu treinar o olhar. Atualmente está curiosa
para saber mais sobre outros prédios históricos e que pretende trabalhar nesta área
depois de formada.

A partir deste relato pode-se constatar que o programa de estágio faz do


próprio edifício um laboratório de aprendizado que os alunos não teriam somente na
sala de aula e concomitantemente acontece um processo de colaboração dos
mesmos com os projetos e manutenção do Museu.

Concluímos assim que é importante para a instituição museológica e para as


universidades esta parceria, tendo em vista que os alunos potencializam a teoria
aprendida nas aulas e a museu recebe esta geração de futuros profissionais que,
além de colaborar com suas ideias relacionadas a sua área de atuação, constroem
uma relação de afeto e percebem a dimensão da rotina de uma instituição
museológica.

Referências Bibliográficas

ANDRADE, Antonio Luiz Dias de. “Um estado completo que pode jamais ter
existido”. São Paulo: Tese (Doutorado), Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de São Paulo – USP, Orientador Prof. Dr. Julio Katinsky, 1993.

COSTA, Lucio. “Arquitetura”. Rio de Janeiro: José Olympio, 2003, 2ª ed.

FARAH, Ana Paula. “Restauro Arquitetônico: a formação do arquiteto no Brasil para


preservação do patrimônio edificado”. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/his/v27n2/a03v27n2.pdf. Acesso em 15 de junho de 2017.
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MOROLLI, Gabriele. “Le membra degli ornamenti. Sussidiario illustrato degli ordini
architettonici com um glossário dei principal termini classici e classicistici”. Firenze:
Alinea Editrice, 1986.

PUPO, Celso Maria de Mello Pupo. “Campinas, Município no Império”. Campinas:


Imprensa Oficial do Estado S.A., 1983.

REIS FILHO, Nestor Goulart. “Algumas raízes: Origens da pesquisa sobre história da
arquitetura, da urbanização e do urbanismo no Brasil”. In: Seminário Nacional O
estudo da história na formação do arquiteto. São Paulo: Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da USP, mesa redonda Arquitetura, Sociedade e História, 1994.

REVISTA do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Rio de Janeiro: número 22,


1987.

RODRIGUES, Ana Aparecida Villanueva. “Preservação como projeto: área do pátio


das antigas estações da Cia Paulista e da Cia Mogiana em Campinas - SP”. São
Paulo: Dissertação (Mestrado), Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de São Paulo – USP, Orientador Prof. Dr. Sylvio Barros Sawaya, 1997.

RODRIGUES, ______________________. “Interdisciplinaridade no Ensino de


Técnicas Retrospectivas”. In: Técnicas Retrospectivas: manutenção e reabilitação da
paisagem construída. Rio de Janeiro: XVII – ENSEA - Encontro Nacional sobre
Ensino de Arquitetura e Urbanismo, organização Editorial: Luciano Rodrigues Torres
e Aloisio Joaquim Rodrigues Junior novembro 2001.

RODRIGUES, ______________________. “Campinas fin-de-siècle”. In: Camillo Sitte


e a circulação das idéias de estética urbana. Europa e América Latina: 1880-1930. I
Congresso Internacional de História Urbana, 7, 8, 9 e 10 de outubro de 2004.

RODRIGUES, ______________________. “Campinas Clássica: A Catedral Nossa


Senhora da Conceição e o Engendramento de uma Arquitetura Monumental Clássica
Urbana no Brasil (1807-1883). Campinas: Tese (Doutorado), Departamento de
História do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP, Orientador Prof.
Dr. Edgar Salvadori de Decca, 2010.

RODRIGUES, Marly. “Imagens do passado: a instituição do patrimônio em São Paulo


– 1969 – 1987”. São Paulo: UNESP: Imprensa Oficial do Estado, CONDEPHAAT,
FAPESP, 2000.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
SARASÁ, Estúdio. “Relatório da 1ª Fase do Restauro”. São Paulo: Relatório
Petrobrás, agosto 2004.

TONON, Maria Joana. “Palacio dos Azulejos : de residência a Paço Municipal (1878-
1968)”. Campinas: Dissertação (Mestrado), Departamento de História do Instituto de
Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP, Orientadora Profa. Dra. Cristina
Meneguello, 2003.

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“ALÉM DOS MUROS DO INHOTIM”: Educação patrimonial,
identidade e cidadania em Brumadinho / MG

FERNANDES DE SOUZA, Webert. (1); SILVA, Pedro Henrique da. (2)

1. Universidade Federal de Minas Gerais. Escola de Arquitetura


Rua: Florisbela Cordeiro dos Santos, Bairro: São Conrado, 134, Brumadinho/MG.
CEP: 35460-000
webertdouglas@hotmail.com

2. Universidade Estadual de Minas Gerais. Faculdade de Políticas Publicas


Rua: Esmeraldas, Bairro: Planalto, 395, Brumadinho/MG.
CEP: 35460-000
pedro.turismobrumadinho@.gmail.com

RESUMO

O presente trabalho busca abordar as ações e os resultados do programa de educação


patrimonial em Brumadinho/MG. A expressão “além dos muros do Inhotim”, surgiu do primeiro
programa de educação patrimonial da cidade: “Redescobrindo Brumadinho”, criado em 2014,
onde foi observado a necessidade de trabalhar o patrimônio cultural brumadinhense como
algo maior do que apenas o proposto pelo Instituo Cultural Inhotim.

Palavras-chave: Educação Patrimonial; Identidade; Cidadania; Inhotim.

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A cidade mineira de Brumadinho está localizada na região sudeste do Estado de
Minas Gerais, mais precisamente na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O município
possui área territorial de aproximadamente 640 km², sendo um dos maiores municípios do
estado. Localizado na Zona Metalúrgica, uma região destacada em atividade mineradora em
Minas Gerais, a cidade conta com um vasto e heterogêneo patrimônio cultural indo de
matrizes, capelas, forte, casarões, estações ferroviárias, guardas de moçambique, folia de
reis, corporações musicais e outros.
Mesmo com todo esse potencial, a cidade em termos de políticas publica até 2014
pouco tinha avançado em práticas efetivas de preservação e salvaguarda do patrimônio
cultural.
Anterior a política de preservação do patrimônio cultural percebia a constante
desvalorização e desconhecimento com relação ao patrimônio cultural.
Desse modo, a experiência no curso de História nos fez refletir sobre a
necessidade de investimento na área de Educação para a valorização desses bens culturais.
Foi então que começamos uma pesquisa sobre a metodologia da Educação Patrimonial no
contexto escolar. Ao desenvolver a pesquisa, podemos considerar que esse tipo de ação
educativa utiliza os bens culturais como fonte primária do conhecimento, gerando um diálogo
permanente entre os indivíduos e os patrimônios culturais. Portanto, suscitando um grau de
pertencimento, fazendo com que o indivíduo adquira o hábito de valorizar e preservar,
O ano de 2014 marca o início de uma política pública exclusiva para o patrimônio
cultural brumadinhense. Ações como a criação e implantação do setor de patrimônio histórico
(2014); a criação do Conselho Municipal de Patrimônio Histórico, Natural e Paisagístico de
Brumadinho (2015); Conselho Gestor do Fundo de Patrimônio Cultural e sua desvinculação
com o fundo de cultura (2015) e com o primeiro programa de educação patrimonial da cidade
o: “Redescobrindo Brumadinho” (2015) várias outras ações formam e estão sendo
desenvolvidas na cidade com o intuito de resgatar a identidade brumadinhense por meio da
conscientização dos seus bens culturais e memória histórica contida neles.
Oriundo das ações do setor de patrimônio histórico e do conselho de patrimônio
histórico a cidade hoje se vê em meio a várias ações que estão visando o resgate da história
coletiva dos brumadinhenses bem como a valorização e preservação dos seus bens culturais
sejam eles materiais e/ou imateriais.
O presente trabalho busca abordar as ações e impactos do programa de educação
patrimonial em Brumadinho/MG. Cujo principal objetivo é conscientizar os brumadinhenses
da sua memória e história por meio de promoção do seu patrimônio cultural. Promoção essa

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que é feita por meio de visitas as escolas, capacitação com professores e alunos, oficinas
sensoriais e visitas aos bens culturais do município. Compreendemos essas ações de
educação patrimonial, enquanto um processo continuo de ensino e aprendizagem que pode
e deve sempre ser dinamizado e ampliado, muito além do ambiente escolar, mas em locais
onde toda a comunidade brumadinhense deve estar envolvida. Proporcionando assim uma
consciência crítica e de responsabilidade para com a preservação e salvaguarda do
patrimônio cultural em toda sua expressão, aliado à sua relação entre esse e a sua identidade
pessoal e cultural. Assim, ao acionarmos a educação patrimonial enquanto ação primordial
estamos conjugando os valores e nos comprometendo na construção de uma comunidade
multicultural.
O “Redescobrindo Brumadinho”, surgiu da necessidade de trabalhar o patrimônio
cultural nas escolas e com a comunidade restabelecendo a relação dos brumadinhenses com
suas heranças culturais e com os bens patrimoniais sejam eles materiais e/ou imateriais,
percebendo sua responsabilidade pela valorização, preservação e salvaguarda do seu
patrimônio, consolidando assim o conceito de cidadania nas pessoas. A educação patrimonial
seja ela formal nas escolas e informal realizadas nos bens materiais apresenta-se como uma
sugestão ainda pouco difundida no município, essa ferramenta pode tornar-se um facilitador
do conhecimento critico por parte das comunidades e indivíduos com relação ao seu
patrimônio cultural, fortalecendo o sentimento de pertencimento e o seu pleno exercício da
cidadania.
A expressão “além dos muros do Inhotim”, surgiu do primeiro programa de
educação patrimonial da cidade o: “Redescobrindo Brumadinho”, criado em 2014, onde foi
observado a necessidade de trabalhar o patrimônio cultural brumadinhense como algo maior
do que apenas o proposto pelo Instituo Cultural Inhotim.
“Além dos muros do Inhotim” é uma expressão que representa o universo
multicultural existente em Brumadinho que estão além do Instituto Cultural Inhotim. Não que
as ações do Instituto Inhotim venham por acaso ofuscar ou cercear a dimensão e
potencialidade dos outros bens em Brumadinho. Mas a falta de políticas públicas,
principalmente voltadas para a promoção e salvaguarda do patrimônio cultural tem relegado
ao desconhecimento e ao esquecimento dos demais bens patrimoniais existentes no
município. A partir disso, constatou-se a necessidade de contribuir para a valorização do
patrimônio cultural brumadinhense, entendido de modo mais amplo, incorporando inclusive
bens culturais imateriais e as vivencias dos moradores.

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Neste sentido, acredito que a prática da educação patrimonial faz necessária em
todos os âmbitos, tais como museus, bibliotecas, arquivos, nos bens patrimoniais, nos
contadores de história, os depoimentos de manifestantes de bens culturais e a efetiva
participação da escola, para que as ações possam ser realizadas de maneira continuada.
Tornando esses sujeitos ativos e conscientes atentos com o seu entorno, mundo e com o
mundo” e, exercendo de fato sua cidadania. Estão sendo evidenciadas ações que propiciem
“uma efetiva articulação entre educação e a consciência da salvaguarda, ou seja, entre escola,
o patrimônio e o exercício da cidadania, recursos capitais para a promoção do direito à
memória e à diversidade cultural (PELLEGRINI, 2009, p.11). Proporcionando aos
brumadinhenses um reconhecimento de sua própria história cultural, deixando de ser
espectador, como na proposta tradicional, para tornar-se sujeito, valorizando a busca de
novos saberes e conhecimentos, provocando conflitos e versões.
Ainda é forte a ideia que o patrimônio é algo externo, de poucos e para poucos e
que Brumadinho é um local sem identidade local. A cidade mineira de Brumadinho possui
inúmeros atrativos naturais, paisagísticos e culturais, sendo o mais conhecido o museu de
Arte Contemporânea e Jardim Botânico o: “Inhotim”. Sendo o mesmo um dos espaços
culturais mais visitados em Minas Gerais e indiscutivelmente o maior indutor de turismo do
município. Inegável o potencial cultural e turístico do Inhotim, bem como os inúmeros
benefícios que direta ou indiretamente ele proporciona a cidade e a sua população. Mas essa
mesma grandiosidade trouxe consigo um desmemoriamento dos outros atrativos culturais
existentes, principalmente quando se trata do conhecimento e reconhecimento dos bens
patrimoniais.
O que em suma seria a porta de entrada para o conhecimento dos visitantes ao
patrimônio cultural brumadinhense e do reconhecimento memorial do brumadinhenses da
grandiosidade e diversidade do município tornou-se o grande segregador. O que tem levado
a um reconhecimento e conhecimento cada vez maior do Inhotim e paralelamente um
desconhecimento dos outros bens culturais. Nota-se uma nítida falta de conhecimento dos
brumadinhenses com sua historicidade contida nos seus monumentos e nas suas
manifestações culturais. Justifico essa “ausência” na falta de políticas públicas permanentes
de promoção do patrimônio cultural local, voltadas para toda população brumadinhense, e os
milhares de visitantes que descobrem as potencialidades do Inhotim, mas não “descobriram
Brumadinho”. Compreendendo que para tal a uma necessidade de programas de educação
patrimonial específicos e direcionados.

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Como bem diz Horta (1999), a educação patrimonial necessita ser realizada
enquanto um processo permanente e sistemático de trabalho educacional centrado no
patrimônio cultural como fonte primária de conhecimento e enriquecimento individual e
coletivo, o que faz dessa ferramenta um poderoso instrumento de promoção e resgate da
memória individual e coletiva, resgatando uma identidade e cultura própria, fazendo dos
indivíduos os principais agentes da salvaguarda do patrimônio cultural, como afirma Horta
conhecimento crítico e a apropriação consciente pelas comunidades do seu patrimônio são
fatores indispensáveis no processo de preservação sustentável desse bens, assim como no
fortalecimento dos sentimentos de identidade e cidadania.
O conceito de usufruir o direito de cidadania e assim diminuir as diferenças e
fortalecer elementos comum não se restringe apenas ao patrimônio cultural. A construção de
uma identidade coletiva, passa pelo pressuposto de sentir parte de um grupo e assim
compartilhar ideias e comportamentos. O que faz do presente trabalho algo de suma
importância nas futuras propostas de construção, seleção e apropriação da memória coletiva
contidas nos bens patrimoniais existentes em Brumadinho.
Afinal, também selecionamos quais elementos devem ser preservados e receber
esse status. Nesse sentido, o conhecimento sobre o patrimônio levará aos brumadinhenses a
reforçar seus laços com a comunidade e ver-se como membro ativo desta. Objetivo que aliás
está em consonância com a formação dos cidadãos. Fundamentando-se a sua cidadania na
sua participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e
sociais adotando, no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio ás injustiças,
respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito (BRASIL, 1997, p.69).
A proposta conta com uma perspectiva metodológica orientada a partir do estudo
de caso dos bens tombados, registrados imaterialmente e inventariados em Brumadinho.
Depoimento dos visitantes dos bens, moradores da região, representantes dos bens
imateriais. Trazendo novo significado a memória coletiva dos bens e a sua salvaguarda por
meio dessa ação.
Viabilizar essa ação é uma das principais formas de promoção do patrimônio
cultural e com isso reencontrar a identidade brumadinhense e principalmente o auto
reconhecimento de sua identidade, valores e memórias, para qual estamos voltando nossa
atenção. Assim sendo, citamos o fator “interlocução entre as partes” como a base de qualquer
ação entre os agentes diretos no patrimônio (sociedade civil, poder público e visitantes) ao
qual o patrimônio em questão se encontra diretamente ou indiretamente vinculado. Sendo
somente a partir dessa postura será possível uma ação coerente e voltada ao real crescimento

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e despertar desse grupo: pela interação, pela troca, pela confiança estabelecida. A educação
patrimonial visando o conhecimento, a informação e promoção dos bens patrimoniais é a fonte
primária de atuação que vem enriquecer e fortalecer o conhecimento individual e coletivo dos
brumadinhenses sobre sua cultura, memória e identidade.
Por meio das ações de promoção e salvaguarda dos bens patrimoniais a serem
realizadas com programas de educação patrimonial. Esse seria o grande veículo de
aproximação, conhecimento, integração e aprendizagem de crianças, jovens, adultos e
idosos, objetivando que os mesmos conheçam e reconheçam, valorizem e principalmente
reapropiem de toda sua herança cultural a que eles pertencem. Sempre proporcionando aos
mesmos uma postura mais crítica e atuante na reconstrução de sua identidade e cidadania
enquanto cidadãos brumadinhenses.
Essa cultura que vem sendo transmitida através de sucessivas gerações, sempre
se renovando e se recriando um, processo vivo e dinâmico, propiciando aos brumadinhenses
a possibilidade de construir sua própria identidade e exercer sua cidadania por meio do
conhecimento, apropriação e uso permanente do valor histórico das memórias dos bens
patrimoniais. Entendendo que esse manifesto da identidade brumadinhense se revela por
inúmeras formas e jeitos, mas claro não se restringe apenas aos bens patrimoniais, sejam
eles materiais e/ou imateriais. O nosso patrimônio vai muito além da materialidade ou “fama”,
como o próprio significado do termo patrimônio diz é a “herança” se fazendo presente em
outras tantas formas de expressões culturais.
Essa herança se manifesta na interação dos brumadinhenses com o ambiente,
com a natureza e com as condições de sua existência representadas pelo seu patrimônio.
Sendo expressa através dos saberes gastronômicos presentes nos nossos festivais da
laranja, jabuticaba, cachaça; das celebrações como as congadas e as corporações musicais;
materializados muitas das vezes no artesanato regional, no modo de fazer, em danças, nos
diversos músicos e festas religiosas. Mas principalmente na sua forma mais comum e popular
de promoção e preservação: “as relações sociais e familiares” que transformam os espaços
públicos, populares, coletivos em autênticos representantes da memória coletiva.
Finalizamos essa explanação aqui presente com o seguinte questionamento que
fundamenta a importância de abordagens como a que se apresenta: Qual o valor e
importância dessa nossa riquíssima diversidade cultural encontrada “além dos muros do
Inhotim”, se não a reconhecemos? Se não aprendemos a respeita-la, como justificar o
investimento na sua preservação? E principalmente qual a relação do conceito de identidade:
“brumadinhense” com a salvaguarda do patrimônio cultural?

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Já não é mais novidade para nenhum estudioso do assunto que uma sociedade
que não se reconhece em seu povo, em suas memórias e em seus bens patrimoniais está
fadada a perda de sua identidade e dos seus valores. Por isso ressalto o envolvimento popular
na construção e reafirmação da sua cultura, sendo essa uma ação fundamental para uma
comunidade consciente e atuante no pleno uso de sua cidadania.
A adoção da educação patrimonial, enquanto instrumento de “alfabetização
cultural”, viabiliza a estruturação de ações pedagógico-culturais orientadas à construção dos
saberes-fazeres enquanto espaços de reflexão e apropriação a respeito dos bens culturais da
comunidade, assim como de sua historicidade, sua relevância social e sua interface com a
dinâmica sócio histórica em construção no presente; afinal, é a partir da interação das
diferentes dimensões espaço-temporais que o passado, o presente e o futuro, bem como o
local e o global e vice-versa, suas especificidades e importância à constituição societária da
cultura, procuram difundir a apropriação dos bens culturais como temas geradores
relacionados ao exercício de fortalecimento da noção de pertencimento e da construção da
cidadania.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Referencias

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A COLETÂNEA GARIBALDINA E A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL EM
LAGUNA, SC

HEIDTMANN, DOUGLAS. (1); BARDINI, ISABELA. (2); BOGO, RENATA. (3);


TOLEDO, JULIETA. (4)

1. Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Departamento de Arquitetura e Urbanismo.


R. Cel. Fernandes Martins, 270 - Progresso, Laguna - SC, 88790-000
douglasemerson@gmail.com

2. Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Departamento de Arquitetura e Urbanismo.


R. Cel. Fernandes Martins, 270 - Progresso, Laguna - SC, 88790-000
isabelabardini@hotmail.com

3. Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Departamento de Arquitetura e Urbanismo.


R. Cel. Fernandes Martins, 270 - Progresso, Laguna - SC, 88790-000
bogo.renata@gmail.com

4. Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Departamento de Arquitetura e Urbanismo.


R. Cel. Fernandes Martins, 270 - Progresso, Laguna - SC, 88790-000
julieta.toledo@hotmail.com

RESUMO
A “Coletânea Garibaldina” é um acervo formado pelo imigrante suíço Wolfgang Ludwig Rau através
da coleção de objetos relacionados a Anita Garibaldi e seu companheiro Giuseppe. Segundo Rau, a
coleção foi uma forma de retribuição ao Brasil pela receptividade que obteve ao imigrar para o país:
ele almejava o reconhecimento internacional da lagunense como heroína. Em 2001, após 60 anos em
processo de formação, a coleção foi comprada pelo governo do Estado de Santa Catarina com
recursos da Fundação Catarinense de Cultura, após Rau considerar que não haveria mais como
manter a mesma. Em 2015, a FCC transferiu a custódia do acervo para a Universidade do Estado de
Santa Catarina (UDESC), permitindo que o mesmo continuasse na cidade de Laguna e propiciasse
interações com a educação de Arquitetura e Urbanismo, a partir da realização do Programa de
Extensão denominado “Comunidade RETRÔ: MEDIADORES DO PATRIMÔNIO”. Os objetivos do
trabalho são: apresentar o processo de transferência do acervo para a universidade como
oportunidade de educação patrimonial e demonstrar as possibilidades de educação patrimonial nas
iniciativas de preservação, pesquisa e comunicação envolvendo o acervo. Para tanto, os
procedimentos metodológicos utilizados foram a documentação museológica por meio de
arrolamento/inventário, a desinfestação de móveis e documentos, o estudo para propostas de
espaços museológicos para o acervo e elaboração de material didático para escolas públicas. O
trabalho realizado até o presente momento demonstra o potencial do acervo para a educação
patrimonial. Pretende-se despertar o interesse da sociedade lagunense, principalmente das crianças,
tornando o patrimônio acessível e contribuindo para sua preservação.

Palavras-chave: Educação Patrimonial; Museu; Coletânea Garibaldina; Wolfgang Ludwig Rau.

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Introdução

O presente artigo apresenta a experiência voltada à Educação Patrimonial da Universidade


do Estado de Santa Catarina, como responsável pela custódia da “Coletânea Garibaldina”,
que vem sendo realizada por meio do Programa de Extensão denominado “Comunidade
RETRÔ: MEDIADORES DO PATRIMÔNIO", no campus de Laguna, o Centro de Educação
Superior da Região Sul.

Educação Patrimonial e a Coletânea Garibaldina

Laguna é um município situado no sul do Estado de Santa Catarina, que foi cenário de
conflito histórico durante a Revolução Farroupilha, no qual Ana Maria de Jesus Ribeiro, mais
conhecida atualmente como Anita Garibaldi, conheceu o revolucionário Giuseppe. Nesse
contexto, a suposta historia de amor, vivida por ambos, é tratada como parte da identidade
do município, que chega a se apresentar, do ponto de vista turístico, como a Terra de Anita.
A presença do curso superior em Arquitetura e Urbanismo tem levado a iniciativas de
Educação Patrimonial que, além de se voltarem à Preservação do Patrimônio Histórico e
Cultural representado pelas edificações reconhecidas por Tombamento federal, também
propiciem um melhor entendimento sobre o papel dos personagens ditos históricos.

A educação patrimonial, conforme conceituada pela museóloga Maria de Lourdes Horta,


trata-se de "um instrumento de alfabetização cultural, que possibilita ao indivíduo fazer a
leitura do mundo que o rodeia, levando-o à compreensão do universo sociocultural e da
trajetória histórico-temporal em que está inserido''. O Programa de Extensão Comunidade
Retro trata a Educação Patrimonial - tema pouco comum no currículo dos ensinos básico e
médio do sistema educacional brasileiro - como uma proposta interdisciplinar de ensino,
tanto o superior quanto o fundamental, que tenha o patrimônio cultural como objeto de
conhecimento, levando estudantes e professores envolvidos a um despertar para o senso
de preservação da memória histórica e o conseqüente interesse pelo tema. No caso da
Coletânea Garibaldina trata-se, portanto, de abordar a educação ( patrimonial ) como um
processo, sem imediatismos e em busca de resultados de longo prazo, na medida em que
se obtenha êxito em difundir a importância da educação, por meio da interpretação dos

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objetos constantes no acervo, para a formação de indivíduos sensíveis às questões que
envolvem a memória e a história, tanto de Anita quanto do próprio Wolfgang Rau.

A Coletânea Garibaldina é uma coleção de objetos relacionados à Anita e ao casal


Garibaldi, que foi formada ao longo de décadas por Wolfgang Ludwig Rau. Wolfgang L. Rau
foi um imigrante de origem suíça que atuou como projetista, escritor e colecionador. Nascido
em Zurique na Suíça em 1916, morou na Alemanha até 1930, quando se mudou para o
Brasil juntamente com a família, devido às ocorrências na Alemanha nazista. Em 1940,
durante a Segunda Guerra Mundial, Rau obteve a naturalização do governo brasileiro e no
ano seguinte prestou o serviço militar, também na capital paranaense. Concluída essa fase
de sua vida, retornou a Lages, onde fixou residência e se casou, tendo atuado como
projetista, sócio e diretor de várias firmas de arquitetura e engenharia. Na década de 1950
mudou-se para Florianópolis, produzindo artigos históricos para jornais locais e das cidades
de Laguna e Porto Alegre. Rau era maçon e membro da Sociedade Literária Luís Delfino,
Associazzione Nazionale Veterani e Reduci Garibaldini e Federazaione Garibaldini da Emilia
Romagna (Itália), tendo recebido medalhas do Mérito Anita Garibaldi (Santa Catarina) e por
pesquisas na Itália e França. Desde pequeno, quando ainda residia na Europa, Rau ouvia
seu pai falar de Giuseppe Garibaldi com grande admiração, porém, este nunca havia
mencionado Anita Garibaldi. Após sua vinda para o Brasil, Rau decidiu pesquisar sobre
Anita, visando contribuir para o reconhecimento internacional da lagunense como heroína,
podendo assim, retribuir de alguma forma a receptividade com que foi recebido pelo povo
brasileiro. Rau refez a trajetória de vida de Anita Garibaldi, visitando os locais em que ela
esteve, tanto na América do latina como nos países da Europa, e assim, juntando
informações e acumulando objetos e documentos durante suas viagens, formando o acervo
que hoje se intitula “Coletânea Garibaldina” (RICHTER, 2016).

Rau faleceu em 2009. Nas fotos abaixo ( Imagem 01 ), em 1999, com 83 anos, rodeado por
seu acervo e seu mais famoso livro - "Anita Garibaldi, o Perfil de Uma Heroína Brasileira".

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Imagem 01: Wolfgang Ludwig Rau, em 1999. Fonte: acervo dos autores.

Com todo esse conhecimento e interesse na vida de Anita, surgiu algo que pode até ser
considerado um amor do colecionador pela heroína, o que o incentivou ainda mais a
pesquisar e saber sobre ela. Isso é visível quando em documentários Rau fala sobre Anita
com tamanha paixão e carinho.

Segundo Elíbio (2014, p.7), porém, durante várias décadas, os objetos do acervo obtido
foram mantidos no espaço privado da casa do colecionador, não participando da
“constituição de uma memória coletiva”. Rau limitava o acesso ao acervo “que lhe era caro e
precioso”, permitindo a exposição de alguns objetos somente em datas comemorativas. Em
2001, após 60 anos em processo de formação, o acervo foi adquirido pelo governo do
Estado de Santa Catarina, e ficou sob a custódia da Diretoria de Preservação do Patrimônio
Cultural da Fundação Catarinense de Cultura, sendo higienizada e indexada pelo Ateliê de
Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis (ATECOR), também da Fundação.

Ainda de acordo com Elíbio (2014, p.03), a Coletânea Garibaldina foi organizada em seis
grupos (da letra A até a letra F), abrangendo neles: “Obras de Arte”, “Documentos
Fotográficos”, “Material Arqueológico”, “Selos”, “Objetos” e “Documentos”. Tal inventário
seguiu a classificação original dos objetos, seguindo critérios sugeridos pelo colecionador.

Dentre o conteúdo do acervo na época em que foi adquirido pelo governo do Estado, era
possível localizar: pinturas, gravuras, esculturas, utensílios, adornos, documentos
impressos, livros, envelopes, selos, fotografias (avulsas ou em grupos), artefatos
arqueológicos, entre outros. Pode-se perceber desta forma, a variedade no conteúdo da
coleção de Rau, não se limitando apenas a documentos.

Em junho de 2002, o acervo foi cedido à Prefeitura de Laguna através de um empréstimo


gratuito pelo governo do Estado. Porém, segundo Richter (2016), foram constatadas
negligências do município de Laguna para com o armazenamento da coleção, colocando a
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mesma em situação de risco. A casa Pinto d'Ulysséa, onde o município de Laguna mantinha
o acervo armazenado, é uma edificação na região do centro de Laguna. Além de ser
pequeno ao armazenamento de tal acervo, o casarão possui grandes janelas, o que permitia
uma incidência de luz muito grande, prejudicial à integridade dos objetos. Também localiza-
se ao lado da Fonte da Carioca, o que implica em uma umidade indesejada aos bens
museológicos, sensíveis a fungos; tal umidade era agravada ainda pelo fato de a edificação
ser revestida de azulejos. Desta maneira, em 2015, a FCC transferiu a custódia do acervo
para a Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), respeitando a vontade de Rau
de que o acervo continuasse estabelecido na cidade de Laguna.

Com o auxílio do ATECOR (Ateliê de Conservação e Restauração de Bens Culturais


Móveis) e da FCC (Fundação Catarinense de Cultura), os acadêmicos empacotaram os
pertences e auxiliaram no carregamento dessas peças. Além disso, a FCC ministrou um
rápido curso com orientações museológicas, como arrolamento, por exemplo, e o ATECOR
fez uma oficina de conservação e limpeza, tanto dos livros e documentos em papel, quando
dos móveis. Iniciou-se, então, o tratamento com arrolamento, fumigação dos livros e
descupinização dos móveis por parte dos acadêmicos integrantes do Programa de
Extensão.

A passagem de Rau para o Estado pela qual passou a Coletânea Garibaldina, revela a
importância da coleção para a cultura de uma sociedade, bem como a atuação do
colecionador para o mantimento da história e cultura locais. À vista disso, pretende-se
demonstrar neste trabalho, o potencial educativo e de aproximação entre a comunidade e o
patrimônio, que se tem a partir da realocação do mesmo para as dependências da
Universidade.

Objetivo

O presente trabalho tem por objetivo demonstrar o potencial de conscientização, a partir do


referido acervo, da importância do patrimônio envolvido na história da cidade de Laguna.
Por meio de ações de envolvimento com a transferência, estudo e recuperação dos objetos,
pretende-se desenvolver a consciência dos acadêmicos da Universidade do Estado de
Santa Catarina, para que possam tornar-se agentes de educação patrimonial para a
população. Objetiva-se propiciar o contato da população com a Coletânea, desenvolvendo a
compreensão para com patrimônio envolvido na história de sua cidade.
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Tendo como principal objetivo a conscientização e reconhecimento das dificuldades
encontradas pelos envolvidos na preservação e na divulgação da Coletânea Garibaldina em
Laguna, buscou-se:

1. Estimular a pensar sobre as questões que envolvem a preservação do patrimônio móvel,


como acervos museológicos, e produzir efeito replicador quanto à postura do cidadão
lagunense e dos estudantes de arquitetura como agentes de preservação;

2. Estimular iniciativas de preocupação para com o acervo dentro da Universidade, como


forma de propiciar o estudo de ambientes adequados ao armazenamento do patrimônio
móvel, e o desenvolvimento dessa consciência por parte de acadêmicos de Arquitetura e
Urbanismo;

3. Desenvolver a sensibilidade e aumentar a vinculação afetiva da população lagunense


com a sua história, especialmente os mais jovens que tanto podem contribuir para a
compreensão futura dos processos de preservação, levando o conhecimento construído
através de atividades de ensino até a comunidade;

4. Realizar atividades de educação patrimonial com alunos do ensino fundamental,


utilizando-se de cartilhas e jogos elaborados pelos acadêmicos, bem como de visitas ao
espaço de exposição na Universidade;

5. Registrar e divulgar as iniciativas que vêm ocorrendo sob a forma de extensão para uma
parcela maior da população de Laguna.

Metodologia

Transferência do acervo: No mês de maio de 2016, durante dois dias, alunos bolsistas e
voluntários do Laboratório de Preservação do Patrimônio (LabPPat) da UDESC, juntamente
com o professor coordenador e com auxílio do Ateliê de Conservação e Restauração de
Bens Culturais Móveis (ATECOR) da Fundação Catarinense de cultura, participaram do
processo de transferência da Coletânea Garibaldina da Casa Pinto d’Ulysséa para as
dependências da Universidade do Estado de Santa Catarina, campus de Laguna.

Na ocasião, todos estavam dotados de equipamento de proteção individual, como luvas,


máscaras, toucas, óculos e jalecos. Os equipamentos se mostraram necessários pelo
estado de degradação em que parte do acervo se encontrava, podendo provocar, ao
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manusear os objetos, alergias ou doenças relacionadas aos fungos presentes nos mesmos.
Durante o tempo em que ficou sob a custódia do Município de Laguna, o acervo ficou
abrigado em uma edificação que, por estar ao lado da principal fonte da cidade, a Fonte da
Carioca, sofre muito com as intempéries. Pela falta de manutenção e adequação do espaço
para receber o acervo, este acabou também sofrendo com a umidade excessiva da
edificação. Quando transferido para a UDESC, grande parte dos objetos do acervo
continham fungos, cupins ou ferrugem.

Após embalar todos os objetos com materiais protetores, como plástico-bolha e placas de
isopor, os pacotes foram catalogados e enumerados, recebendo, cada um, uma etiqueta de
identificação em sua embalagem. Os objetos foram colocados em local protegido, em uma
sala de aula na Universidade: suspensos em prateleiras e mesas para que não entrassem
em contato com o chão e paredes.

Imagem 02: Acadêmicas realizando o empacotamento do acervo e fixação das etiquetas nas
embalagens. Crédito da Fotografia: Marcelino Correia / ATECOR / FCC, 2016.

Arrolamento e manipulação do acervo: No final de 2016, a Fundação Catarinense de


Cultura (FCC) ministrou um rápido curso com orientações sobre a manipulação de acervos
como a Coletânea Garibaldina. Na ocasião, foram passadas instruções sobre como realizar
o arrolamento, que é o processo de documentação do acervo, e quais os cuidados que
devem ser tomados durante a manipulação das peças, limpeza e manutenção das mesmas,
constituídas principalmente por papel, madeira, vidro, metal e tecido. Pacotes com livros e
móveis foram, então, levados a uma sala dedicada ao acervo, no pavimento térreo do
edifício da UDESC, para maior proximidade com os acadêmicos, e posterior abertura à
comunidade. A sala ficou conhecida como “Espaço Rau”, pois a infraestrutura oferecida pela
universidade não atende às recomendações para que seja denominado como um espaço de
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museu, ou seja, a sala não conta com aparelhos de controle de umidade e temperatura e as
áreas mínimas para reserva técnica, exposição e afins, assim conta com o mínimo para que
seja exposto, armazenado e bem tratado. Foram realizados o arrolamento, a fumigação dos
livros e a descupinização dos móveis. No início de 2017, iniciou-se o arrolamento de
materiais do acervo de peças menores, como artigos de cozinha, moedas, medalhas,
chaveiro e artigos bélicos, como espadas e pistolas.

No processo de arrolamento, registra-se o número da embalagem a ser aberta, presente na


etiqueta da mesma. São anotados, então, os códigos dos objetos presentes na embalagem.
Cada objeto recebeu um código pela FCC ainda no período de compra do acervo. Estes
estão registrados em livros. No arrolamento, o código do objeto é conferido com a descrição
do código no livro. Esse processo é repetido com todas as peças, dessa forma é possível
dar baixa nos objetos desaparecidos e registrar possíveis falhas, como códigos onde a peça
não condiz com sua descrição nos livros.

A fumigação é um processo de tratamento químico pelo qual os objetos com fungos ou


marcas de mofo devem passar, a fim de controlar tais pragas. Nos livros, o processo leva
cerca de três dias para ser finalizado, variando com seu tamanho. As páginas do livro
devem ser separadas, colocando-se um palito entre cada folha. Estes livros são fechados
dentro de uma câmara vedada, com prateleiras preferencialmente em tela. Na base da
estrutura, é colocado um copo plástico com algodão, embebido com uma solução de álcool
e melaleuca, substância antifúngica. Essa solução evapora e entra em contato com todas as
folhas do livro, eliminando os fungos presentes no objeto. Após três dias dentro da câmara,
os livros são retirados e higienizados mecanicamente: passa-se um pincel em todas as
folhas e capa, retirando os palitos e resquícios de sujidade. Todo o processo manual é
realizado utilizando-se os equipamentos de proteção individual citados no item anterior.

A descupinização é um serviço de higienização mecânica para controle ou prevenção de


cupins. Deve ser realizada em móveis, molduras e demais objetos de madeira infestados. A
presença de cupins é identificada nos materiais com aspecto oco ou que furam facilmente.
Nesse processo, utilizando-se equipamento de proteção individual, os móveis são
deslocados para um ambiente aberto e arejado. É feita uma solução à base de água e
inseticida ou, se prescrito no rótulo, somente com inseticida, e aplicada em uma pequena
área da madeira. Esse passo é efetuado para prevenir possíveis manchas provocadas pelo
produto. Após o teste, o produto é injetado com seringas em todos os furos abertos por

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cupins. Isto faz com que a solução penetre em todos os caminhos feitos pelo inseto, no
interior da madeira. Em sequência, é feito um pincelamento do produto em toda a superfície
da madeira, que então é embalada em sacos ou lonas e acondicionada na sala de
Conservação. Este processo é refeito após quinze dias, e assim sucessivamente até se
completarem três ciclos, ou até que não se perceba pó de madeira.

A manutenção desses objetos se dá a cada seis meses, caso não sejam diagnosticados
focos de infestação antes desse prazo. Não há controle ambiental, pois a instituição não
detém de equipamentos climatizadores e de controle de umidade, assim o controle é feito
por meio de aberturas de janelas. O acervo, hoje, está acondicionado em uma única sala,
sem as devidas divisões para Reserva Técnica, Sala de Conservação e Sala de
Quarentena.

Imagem 03: Fumigação dos livros e descupinização de móvel por acadêmicos. Crédito das
Fotografias: Julieta Toledo, 2016.

Estudos de espaços museológicos: Atualmente, a instituição não tem condições


necessárias para preservar seu acervo, já que não possui as salas necessárias para
acomodar todas as necessidades recomendadas pela Fundação Catarinense de Cultura. A
partir disso, foram realizadas propostas de adequação do espaço pré-determinado para o
armazenamento do acervo da Coletânea Garibaldina. O trabalho foi realizado por
integrantes do Laboratório de Preservação do Patrimônio (LabPPat) da UDESC, a partir da
medição da sala e projeções tridimensionais com auxílio de programas computacionais.

O complexo de salas e área externa, que abriga o acervo nas dependências da


universidade, foi batizado de “Espaço Rau”. A proposta realizada pelo laboratório leva em
consideração as áreas de reserva e manutenção dos objetos, necessidades primárias para
a conservação de acervos. No projeto, foram definidas áreas dentro da sala existente.

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Estas áreas são marcadas por divisórias, para que haja a possibilidade de alteração do
espaço interno, se necessário, porém ainda evitando o contato direto entre os materiais
contaminados dos demais. Os espaços foram delimitados como:

1. Pátio: área livre existente, incorporada ao “Espaço Rau” como área de lazer e
descanso.

2. Biblioteca e documentação: juntamente com o mini auditório, desenvolvem as


funções de pesquisa, comunicação e educação.

3. Reserva técnica: local de guarda dos materiais em bom estado, e higienização dos
objetos do acervo.

4. Quarentena: sala de guarda temporária do acervo contaminado ou em estado de


degradação avançado.

5. Sala de conservação: espaço para realização da descupinização e fumigação do


acervo.

6. Museu: área de exposição dos objetos em bom estado, anexo a um mini auditório.

Imagem 04: Proposta de adequação do espaço da universidade para o armazenamento da Coletânea


Garibaldina. Fonte: Vinícius Nunes, 2017.

Educação Patrimonial na Comunidade: Os acadêmicos participantes do Programa de


Extensão denominado “Comunidade RETRÔ: MEDIADORES DO PATRIMÔNIO”, já
envolvidos com atividades de educação patrimonial em escolas, puderam incluir, em suas
ações, a temática sobre o patrimônio museológico, a partir da transferência do acervo da
Coletânea Garibaldina para a universidade. Durante o primeiro semestre de 2017, os
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bolsistas e voluntários desenvolveram um almanaque com pequenos textos introdutórios,
abordando temas apresentados às crianças, além de passatempos, como jogos dos 7 erros,
cruzadinha, história em quadrinhos e caça palavras, todos com alguma relação com a
Coletânea, com seu colecionador, Rau ou com Anita Garibaldi. Algumas atividades lúdicas
no almanaque também envolviam as linguagens arquitetônicas das edificações de interesse
histórico e cultural do centro de Laguna. A primeira turma a conhecer o espaço foi um
terceiro ano do ensino fundamental, com crianças de 7 a 9 anos. Na ocasião, de maneira
breve, explicou-se sobre o acervo, quem o fundou, e quem é o objeto de estudo deste. Além
disso, foi falado sobre o funcionamento de um museu, sobre a importância de preservar este
material e ainda ressaltou-se o porquê não se deve mexer nos objetos. . Após a explicação,
foi interessante observar que todos entraram no "Espaço Rau" com as mãos para trás,
sendo visível que eles se importaram com o que foi passado. Percebeu-se um interesse
especial sobre as armas, as moedas e as pedras arqueológicas. No final do passeio, as
crianças receberam o almanaque com atividades, do qual pareceram gostar muito. Além
dessa turma, está programada a visita com alunos do sexto e nono ano para o final do mês
de junho e início do mês de julho.

Outra ação já realizada no Espaço RAU, aconteceu no dia 18 de maio, dia Internacional dos
Museus. Com grande parte do acervo já higienizado e arrolado, o espaço foi organizado
para que se realizasse a primeira pré-exposição da Coletânea Garibaldina. Com o intuito de
impulsionar a visitação dos acadêmicos, pouco frequentes até então, em decorrência do
escasso número de materiais arrolados e higienizados até o início de 2017, realizou-se a
divulgação da exposição em diferentes mídias sociais e também nos murais físicos da
universidade. Na ocasião, houve cerca de 30 visitantes, entre acadêmicos e servidores.
Percebeu-se o grande interesse destas pessoas, em relação ao estado de conservação do
acervo, principalmente dos livros, se os objetos, principalmente as armas, tinham sido
realmente utilizados por Anita, Giuseppe ou até mesmo se já tinham sido utilizadas em
algum momento.

Por serem de temáticas variadas, estes são de grande valia para diferentes áreas de
pesquisa. Até então, estes livros serviam apenas para exposição. Dentro de um espaço
universitário, quando completamente higienizado, esse material poderá auxiliar na geração
de conhecimento.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Imagem 05: Ação de educação patrimonial com crianças: realização de atividades lúdicas e visita ao
Espaço Rau. Crédito das fotografias: Larissa Gazolla, 2017.

Resultados e Reflexões

Durante o decorrer do trabalho realizado desde a transferência do acervo para a UDESC, os


acadêmicos integrantes do Laboratório de Preservação do Patrimônio puderam aprender e
desenvolver a consciência sobre o armazenamento e cuidados com acervos museológicos.
Desta forma, os acadêmicos puderam promover atividades de educação patrimonial para
ensinar um pouco sobre o tema, também divulgando na universidade para receber apoio e
participação dos demais acadêmicos da UDESC na preservação desse patrimônio. No
processo de arrolamento foi possível identificar que alguns objetos estão faltando na
Coletânea e muitos não estão identificados nos livros registros, principalmente folhetos
comemorativos do acervo.

O conhecimento das necessidades de armazenamento de patrimônios móveis como a


Coletânea Garibaldina proporcionou o desenvolvimento de estudos para esses espaços de
armazenamento por integrantes do laboratório, com auxílio de programas computacionais. O
exercício do entendimento de como são, e quais as principais necessidades de espaços
museológicos, bem como de seu funcionamento são fatores importantes para as futuras
proposições arquitetônicas de espaços museológicos.

Por fim, as atividades de educação patrimonial, com o almanaque e a visita ao Espaço Rau,
tiveram uma aceitação satisfatória por parte das crianças, que se mostraram sempre muito
curiosas e atentas. Assim, tais atividades se mostraram importantes formas de aprendizado
sobre o patrimônio museológico móvel e sobre a história da Coletânea Garibaldina,
conscientizando sobre as diversas formas de patrimônio existentes na história da cidade de
Laguna.

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A educação patrimonial no meio escolar teve por finalidade mostrar a importância desses
registros - sendo eles em formas de documentos, objetos, retratos, imagens ou das mais
diversas maneiras - pois, ao aproximar a criança ou o adolescente dessa história, fica mais
fácil explicar a necessidade de se preservar e se perpetuar a informação.

Não só com escolas, pensa-se também em expandir a educação acerca deste tema, com
pequenos eventos envolvendo o Espaço Rau, aumentando a visibilidade do acervo, tanto
para a população de Laguna quanto para os acadêmicos de uma maneira geral. A partir dos
materiais já disponíveis para exposição, a ideia é começar com exibições temáticas,
tentando relacionar com as datas próximas e que o acervo tenha material para tal, retirando
o máximo e mostrando as suas potencialidades no desenvolvimento da consciência sobre o
tema. Desta forma, ações culturais e de educação patrimonial para com a comunidade
lagunense, envolvendo o acervo da Coletânea Garibaldina, podem demonstrar a riqueza da
história da cidade e desenvolver a autoestima com relação ao patrimônio proveniente de sua
história.

Referências

ELÍBIO JÚNIOR, A. M. Do colecionismo privado à Musealização do Objeto: a Trajetória


da Coleção de Wolfgang Ludwig Rau. Revista Memória em Rede, Pelotas, RS, v.4, n.10,
p.1-14, jan./jun. 2014. Disponível em: <2.ufpel.edu.br/ich/memoriaemrede/beta-02-
01/index.php/memoriaemrede> Acesso em: 06 abr. 2016.

HEIDTMANN JUNIOR, Douglas Emerson Deicke. PROPOSTA DE ESPAÇO


MUSEOLÓGICO PARA O ACERVO RAU NA UDESC LAGUNA. ( RELATÓRIO FINAL DE
ESTÁGIO SUPERVISIONADO ). Ateliê de Conservação e Restauração de Bens Culturais
Móveis (Atecor) da Fundação Catarinense de Cultura. 2016. ( não publicado ).
HEIDTMANN JUNIOR, Douglas Emerson Deicke; ROSA, D. C. . Comunidade Retrô: luz,
câmera e valorização do patrimônio cultural de Laguna-SC. Udesc em Ação, v. 8, p. 25,
2014.
HEIDTMANN JUNIOR, Douglas Emerson Deicke; ROSA, D. C. ; SCHMITT, M. ; CORREA,
L. B. Mediadores do patrimônio de Laguna-SC. In: VII FÓRUM DE MESTRES E
CONSELHEIROS, 2015, Belo Horizonte. Anais do VII FÓRUM DE MESTRES E
CONSELHEIROS, 2015.

RICHTER, F. A. Coleção Garibaldina: um Patrimônio para Santa Catarina. In:


ENCONTRO NACIONAL DE HISTÓRIA DA ANPUH, XVI, 2016, Chapecó, SC. (Anais)
Chapecó: Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), 2016. Disponível em: <
http://www.encontro2016.sc.anpuh.org/resources/anais/43/1464530197_ARQUIVO_FABIO_
ANDREAS_RICHTER-ANAIS_ENCONTRO_ANPUHSC-Colecao
_Garibaldina_patrimonio_p_SC.pdf> Acesso em 20 abr. 2017.

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A CURA ATRAVÉS DA FÉ: Um olhar sobre as
benzedeiras/rezadeiras alagoanas

CALHEIROS, KARLA RACHEL JARSEN DE MELO.

1. Universidade Federal de Alagoas – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo


Rua Deputado José Lages n°658 – Maceió/AL
karlaarachel@hotmail.com

RESUMO
O presente trabalho tem como propósito analisar e compreender como o ofício de benzedeira
ou rezadeira encontra-se atualmente em parte do estado de Alagoas e região metropolitana – tendo
como suporte o mapeamento realizado pelo Projeto de Salvaguarda do Patrimônio Imaterial que tem
como metodologia o Inventário Nacional de Referências Culturais – INRC (IPHAN) – que consiste em
identificar, documentar e registrar bens culturais, de natureza imaterial, para atender a demanda pelo
reconhecimento de bens representativos da diversidade e pluralidade culturais de grupos formadores
da sociedade brasileira.
Para o desenvolvimento desta atividade, foram compiladas as informações obtidas in loco nos
municípios alagoanos de Marechal Deodoro, Estrela de Alagoas, Dois Riachos e na capital Maceió,
captando as informações por meio de entrevistas e registros audiovisuais a cerca do ofício tomando
por base mapeamentos pré-existentes e bens identificados pelas populações locais junto ao grupo de
pesquisa Nordestanças da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) durante o ano de 2014 à 2015.
Com as informações levantadas, observou-se a necessidade em evidenciar essas mulheres que
utilizam-se da fé para ajudar os enfermos e que praticam esse ofício na contemporaneidade, para
isso foi realizado uma exposição fotográfica em abril de 2017 no Museu da Imagem e do Som (MISA)
em Maceió, como uma forma de aproximar a população desse ofício; além de zelar pelo patrimônio
imaterial e valorizar a cultura popular alagoana, salientando a importância desse ofício que atua como
medicina alternativa.
Palavras–chave: Benzedeiras, cura, cultura popular; medicina alternativa; fé.
Inserir quebra de página para inicio do artigo.

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INTRODUÇÃO
Reconhecer e ressaltar as tradições é essencial e foi a partir desse intuito que surgiu
o interesse em pesquisar a cultura popular alagoana tendo como base o mapeamento
realizado pelo Projeto de Salvaguarda do Patrimônio Imaterial de Alagoas que tem como
base metodológica o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC) do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). A delimitação do artigo ocorreu após as
visitas em campo onde constatou-se o ofício das benzedeiras/rezadeiras em várias
localidades do território alagoano como no agreste (Arapiraca, Estrela de Alagoas, Palmeira
dos Índios), bacia leiteira (Batalha, Monteirópolis) e sertão (Canapi, Carneiros, Dois Riachos,
Pariconha, Ouro Branco, Senador Rui Palmeira).

O presente artigo focaliza no ofício das benzedeiras/rezadeiras alagoanas que ainda


hoje é praticado. Num misto de fé, prática cultural e medicina popular as benzedeiras
mantêm viva a esperança de cura do corpo e da alma. Munidas de folhas e ervas
medicinais, imagens de santos, rosários, oratórios e a palavras ditas por intercessão de
Deus e do Espírito Santo, elas põem em prática seus conhecimentos, contribuindo, assim,
para a preservação e continuidade desse patrimônio cultural imaterial tão importante para a
nossa cultura.

Para um estudo mais aprofundado sobre o tema escolheu-se os municípios de Dois


Riachos (Odete) e Estrela de Alagoas (Maria Anunciada) visitados em campo pela
pesquisadora durante Projeto de Salvaguarda do Patrimônio Imaterial de Alagoas realizado
entre 2014 e 2015 para compor o artigo. Pela relevância do tema, além das localidades
supracitadas a pesquisadora expandiu-se seus estudos para a região metropolitana de
Maceió nos bairros de: Chã de Bebedouro (Angelita), Forene (Maria Helena), Prado (Maria
Augusta e Verônica), Riacho Doce (Jacira- Lola) e para o município de Marechal Deodoro
(Josefa e Maria José), localizado a 31 quilômetros da capital.

O artigo aborda aspectos referentes à prática da medicina popular, salientando a


cura por meio da fé. Trata ainda de identificar nesse ofício de benzer algumas
características e peculiaridades de cada benzedeira/rezadeira entrevistada.

Para compreender o ofício praticado pelas benzedeiras/rezadeiras surgiu a


necessidade de indagar alguns questionamentos de como acontece a cura; quem a procura;
como desenvolveu o dom em benzer; quais os elementos utilizados para benzer; quais são
as rezas usadas e demais elementos que caracterizem o ofício.

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Para a elaboração deste artigo foram inicialmente realizadas as atividades de campo
que foram estruturadas no que passamos a chamar “andanças”, nas quais se deslocaram
para os municípios e buscou uma aproximação com os moradores através de contatos que
foram se desdobrando em campo a busca de maiores informações sobre o ofício em
questão. As entrevistas deram continuidade ao modelo de questionário estabelecido para as
andanças do projeto de salvaguarda do patrimônio imaterial com método aberto, que tem
como um ponto de partida um tema ou questão pertinente, fluindo naturalmente
possibilitando levantar novas questões do cotidiano das entrevistadas. Além disso, realizou-
se registros fotográficos e audiovisuais das benzedeiras e elementos marcantes que
caracterizam seu ofício como as imagens dos santos e os ramos utilizados para benzer a
fim de registrar a particularidade de cada uma.

A fase subsequente consistiu em pesquisar diversos conceitos fundamentais para o


estudo, associado à leitura sobre teóricos referente ao assunto de benzeção, benzedeiras,
médicos e curandeiras, medicina popular, interligando-os.

Tomando como referência as informações adquiridas sobre as benzedeiras, foi


possível realizar uma exposição fotográfica, no Museu da Imagem e do Som (MISA) em
Maceió, intitulada Entre Panos e Ramos: olhares sobre as benzedeiras alagoanas junto a
outras três participantes e fotógrafas do projeto patrimônio imaterial de Alagoas e do grupo
de pesquisa Nordestanças (UFAL). Compartilhando do mesmo encantamento, decidiram
lançar seus olhares para essas mulheres simples, que fazem uso de seu dom em benefício
dos outros e, através da fotografia, homenageá-las.

Com a exposição buscou-se retratar peculiaridades de cada uma delas e prestigiá-las,


ao mesmo tempo que procurou-se documentar, valorizar e estimular a preservação desse
dom/ofício, a fim de evidenciar para a população alagoana que, apesar de escasso, ainda
existe o ofício em Alagoas e que é necessário a sua proteção.

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DESENVOLVIMENTO
O ofício de benzedeira ou rezadeira encontra-se vigente e íntegro, averiguado em
treze municípios alagoanos (Batalha, Canapi, Carneiros, Dois Riachos, Monteirópolis,
Ouro Branco, Palmeira dos Índios, Pariconha, Tanque D’ Arca, Taquarana, Senador Rui
Palmeira, Arapiraca) alagoanos mapeados pelo grupo Nordestanças em 2014/2015.
Além dos municípios mencionados acima foi constatado a presença do ofício no
município de Dois Riachos (Odete), Estrela de Alagoas (Maria Anunciada), Marechal
Deodoro (Josefa e Maria José) e Maceió (Angelita, Maria Augusta, Jacira, Maria Helena,
Verônica), sendo esses o objeto de estudo para o artigo.

A definição para benzedeira consiste em pessoas que praticam a medicina popular


vinculada à religião, ou seja:
O benzedor(a) é o indivíduo que “trata”, “benze”, “cura”, esconjura,
recorrendo essencialmente a um segredo que lhe foi legado por
um parente, amigo, por meio de leitura ou aparição espiritual. Ele
é, pois, um intermediário entre o homem e o sagrado, devendo
conservar escrupulosamente esse ritual (Laplantine e Rabeyron,
1989, p.52).

Além disso, as benzedeiras são consideradas como uma cientista popular cuja
possui características próprias de curar: elas unem os misticismos da religião junto os
conhecimentos da medicina popular (OLIVEIRA, 1985).
Se analisarmos historicamente as benzedeiras e o ofício de benzeção remota-se a
Idade Média onde as mulheres que detinham o dom de curar eram perseguidas ou
torturadas e lançadas vivas em fogueiras até a morte, pois a Igreja que detinha o poder
associava as questões sobrenaturais e a bruxaria. Para essa questão, a solução da Igreja
foi criar um Tribunal do Santo Ofício para resolver essas questões, tendo em vista que a
benzeção ia contra aos dogmas da Igreja, e portanto, a Deus (OLIVEIRA, 1985, p.21).
Com o decorrer do tempo, aparecem novos meios de cuidar do corpo e da alma. No
Renascimento, o corpo e a alma começaram a vistos isoladamente. No entanto, com o
surgimento da clínica médica em meados do século XVII, a doença e o contexto técnico
separam-se da visão da magia e bruxaria; resultando na separação entre ciência e cultura.
Fato esse que favoreceu para que o ofício de benzeção fosse incorporado como uma
medicina alternativa.

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As benzedeiras detêm um vasto conhecimento de orações e preces. Em sua
maioria apegam-se as imagens religiosas ligadas ao Catolicismo popular e à Igreja
Católica como: Jesus Cristo, Papa João Paulo II, São Jorge, Padre Cícero, Nossa Senhora
Aparecida, Frei Damião, Santa Terezinha, Santa Luzia, Santo Onofre, entres outros. Fato
esse comprovado durante as visitas, além das imagens dos santos verificou-se também a
presença de velas, ramos, terços e altares nas residências das benzedeiras, como pode ser
observado na imagem 1.
Imagem 01- Benzedeiras: Josefa (Marechal Deodoro – Alagoas) e Jacira (Riacho Doce – Maceió)

Fonte: Karla Calheiros e Jessica Conceição, 2017.


Verifica-se também que a religiosidade é forte e vincada na adoração aos santos
(as) do catolicismo popular, pois, através da sua fé e poder de intermediação com o
sagrado é que as mazelas humanas são curadas, contribuindo para obter o equilíbrio do
corpo e da alma. Algumas das entrevistadas relataram que o dom da cura atribuído a elas
para a realização do ofício foi um dom que Deus deu ou ainda através de visões, sonhos
com anjos e vozes; remetendo a outras dimensões. Uma das entrevistadas Maria Helena
mencinou que a benzeção vem de gerações na sua família: sua mãe, avó e avô eram
benzadores e mirando o trabalhos deles ela aprendeu e se dedicou ao ofício.
Porém, nem todas as benzedeiras são de religião católica, algumas estão em contato
com outras religiões especialmente de matriz africana como a Umbanda e Camdomblé, fato
esse que influência diretamente no modelo de ação do ofício.
Durante as pesquisas observou-se uma certa resistência dos parte das benzedeiras
entrevistadas em relatar que são de vertente religiosa de matriz africana em decorrência do
preconceito gerado pela sociedade. Das nove entrevistadas apenas duas Maria Augusta e
Verônica mencionaram que eram de religião de matriz africana Umbanda e Candomblé,
respectivamente, as demais afirmaram ser católicas.
Contudo, apesar de algumas benzedeiras afirmarem que não tem ligação com a
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religião Umbanda ou Candomblé verificou-se na residência de Angelita e Jacira a presença
de elementos que remetem a religião de matriz africana. No caso da residência de Angelita
constatou-se a presença de um o chifre de búfalo, característico do orixá Iansã, como
também um altar em um dos cômodos da residência restrito e escondido por uma cortina
cujo as imagens dos orixás estão expostas como Iemanjá e Ogum. No que diz respeito a
Jacira, encontrou-se arco e flecha de índio e um cartaz com a imagem da Índia Jurema.
Observa-se dessa maneira que essas variações entre os modelos de religião das
benzedeiras são fundamentais para compreender o modo como elas se definem, se
apresentam para os usuários, utilização de recursos terapêuticos, até a questão
remuneração ou não do trabalho realizado (OLIVEIRA, p.31). Através dessa diferenciação
entre elas, possibilitam compreender a forma como elas encaram a vida, constroem sua
visão de mundo e o modo como realizam o ofício de benzer.
O ato de benzer inicia-se com a benzedeira1 fazendo o sinal da Cruz em gestos
compassados e em seguida realizando as orações junto ao doente (criança, adulto ou
animal) e, quando disponível, com um ramo de planta ou ervas como: Vassourinha de
botão, Pinhão Roxo, Agaroba, Pinhão brabo, carrapateira planta da estrada. Segundo as
benzedeiras Maria José (Marechal Deodoro) e Maria Helena (Maceió) o ramos que tiver em
suas residências para benzer elas realizam a benzeção, pois segundo elas o que vale é a
fé; a benzedeira Maria Helena ainda ressalta que “ ... Até com o galho de avenca eu curo.
Mas, se você não tiver fé nem o papa te cura”.
A reza é um dos principais elementos para a cura dos efêmeros para as benzedeiras,
ou seja, é a força da palavra que ao ser pronunciada o mal se distancia naturalmente.
Durante o ato da benzeção é difícil compreender em algumas benzedeiras as palavras que
são ditas ao decorrer da reza, pois são realizadas com rapidez e a voz em tom baixo,
todavia, dentre as entrevistadas Maria Helena, Maria Anunciada, Angelita e Maria José
percebeu-se que as rezas são ditas em tom mais alto tornando compreensível alguns
trechos da reza, como por exemplo, da reza da benzedeira Maria Helena “ Deus é o Sol,
Deus é a Lua, Deus é a claridade e Deus é as três pessoas da santíssima trindade” .
Durante a benzeção segundo a entrevistadas Maria Anunciada (Estrela de Alagoas) e Maria
Helena (Maceió) reza-se o Pai Nosso, Creio em Deus Pai, Ave Maira, Salve Rainha, a
esteira do céu, os sete matrimônios de todas as Igrejas. Além das orações mencionadas
pode-se também rezar o terço, segundo Maria Helena.

1
Segundo alguns pesquisadores as benzedeiras/rezadeiras Segundo Loyola (1984, p.94) a benzedeira se limita a
reza em cima da cabeça do enfermo, não receita medicamentos e reza fazendo o sinal da cruz. Já o curandeiro
penetra no sobrenatural, ou seja, consegue se conectar com forças superiores.
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Entretanto, a maioria das rezas presenciadas durante as visitas as residências das
benzedeiras são entremeadas de palavras incompreensíveis, cujo entendimento da reza
torna-se de difícil. Segundo Castro e Melo (2007, p.20) afirmam que essa distorção ocorre
devido às preces serem transmitida oralmente. Salienta-se que as rezas só acontecem no
período diurno devido a presença da luminosidade do sol, geralmente não benzem depois
das 17h, mas se for um caso de urgência a benzedeira Angelita ainda realiza a benzeção no
período noturno.
Os gestos se fazem presente tem toda a benzedura enquanto a reza está sendo
realizada em frente ao enfermo, na maioria das benzedeiras realizam o sinal da cruz com o
ramo na pessoa que está sendo curada; imagem 02. Após a finalização da oração observa-
se se o ramo ou a folha murchou, se ocorrer dela murchar é sinal de que está de mal
olhado, se for do lado direito é feminino e no esquerdo masculino, segundo menciona
Odete em entrevista.
Imagem 02- Benzedeira: Maria Helena (Maceió – bairro: Forene)

Fonte: Karla Calheiros, 2017.


Entretanto averiguou-se nos municípios pesquisados que a benzeção e a reza é
uma prática desenvolvida, sobretudo pelas mulheres: “A presença da mulher é marcante no
mundo da crendice e é ela, numa maioria quase absoluta, que conhece o segredo das
palavras e dos gestos capazes de exorcizarem o mal” (Gomes & Pereira, 1989, p. 16).
Segundo Castro e Melo (2007, p.19) atualmente essas pessoas que praticam esse
ofício realizam a cura do corpo e da alma (medicina alternativa), todavia em um tempo não
muito distante também velavam e rezavam por defuntos.
Dentre as doenças corriqueiras nas quais as benzedeiras são
consideradas especialistas estão: espinhela caída ou peito aberto, mau olhado, ventre
virado ou caído, benzimento de crianças, dor de cabeça, moleza no corpo, criança com

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indisposição ou mau olhado, ferimentos, câncer, resguardo quebrado, feridas na boca,
contusões, difteria, entre outras. Segundo a benzedeira Maria Anunciada (Estrela de
Alagoas) o problema que mais chega nos adultos que adentram na sua residência para
benzer é o mau olhado, conhecido também por inveja. Nesse caso, segundo ela reza-se
para essa enfermidade o pecador, o Credo em Deus Pai e ofereço a cura a Deus. No que
diz respeito às crianças geralmente as enfermidades mais comuns são febre e problemas no
pulmão, em entrevista Maria Anunciada mencionou que nesses casos quando não surti o
resultado espero que é a cura, a benzedeira aconselha os responsáveis da criança a
levarem para o hospital.
Além das doenças mencionadas anteriormente, as mulheres/homens também
procuram as benzedeiras devido à separação de relacionamentos e para benzer currículos e
outras graças que o cliente deseje almejar, fato esse mencionado pelas benzedeiras
Angelita e Maria Helena de Maceió.
As benzedeiras durante alguns procedimentos utilizam-se de objetos como garrafa
de água, fios de linha e panos/toalhas brancos para detectar o diagnóstico da doença do
cliente que pretende se benzer (Sant’ Ana; Serggiaro, 2008). Entretanto, a benzedeira
Josefa, do município de Marechal Deodoro difere das demais entrevistadas, pois também
usa panos ou toalhas de cor verde, segundo ela não tem problema e não interfere no ofício
pois, a cor verde representar a natureza.
No caso específico da espinhela caída ou peito aberto, conhecida também como
Lumbago é necessário realizar a medição que é tomada da seguinte maneira: com o
pano ou toalha na cor branca ou verde (apenas a benzedeira Josefa relatou usar o pano na
cor verde) mede do dedo anular até o cotovelo. Tomando este tamanho mede-se de ombro
a ombro e se a medida do pano ultrapassar significa dizer que o doente está com a
espinhela caída; fato esse relato nas entrevistas pelas benzedeiras: Maria Anunciada
(Estrela de Alagoas), Odete (Povoado Pai Mané- Dois Riachos), Maria Helena (Maceió-
Forene) e Maria Augusta (Maceió- Prado). Após a confirmação da doença é
realizada a benzeção, que trata primeiro o peito aberto tomando a medida e rezando o Pai
Nosso e oferecendo para Nossa Senhora para fechar o corpo, após o procedimento é
realizado uma nova medição para confirmar se o corpo foi fechado, como mostra a imagem
abaixo da benzedeira Maria Anunciada.
Imagem 03- Maria Anunciada medindo se a criança está com a espinhela caída.

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Fonte: Taísa Theberge, 2015.
Na maioria das benzeções o local onde são feitas as curas e rezas são nas
residências das benzedeiras de fácil localização – todos sabem informar onde encontra-las
(Castro e Melo, 2007, p.19). São construções simples e modestas, com oratório e poucos
móveis, porém em caso de doenças mais graves as benzedeiras se deslocam até a casa do
enfermo. Conforme relato durante as pesquisas in loco as benzedeiras Angelita, Josefa e
Maria José ainda hoje se deslocam para outras localidades para atender os enfermos como
os municípios alagoanos de Boca da Mata, Massagueira, Pão de Açúcar.

O atendimento aos que necessitam é ilimitado, as benzedeiras sempre estão


dispostos a ajudar o outro sem obter retorno financeiro algum, como evidencia a benzedeira
Maria José em uma das frases ditas durante a entrevista “As palavras de Deus ninguém
vende”. No entanto, os usuários que são benzidos levam presentes como velas para o
oratório das benzedeiras ou imagens de santos, segundo Maria Helena “o que Deus tocar
no teu coração é o que eu mereço”.

Ao acompanhar o cotidiano dessas mulheres observou-se uma grande quantidade


de pessoas recorrendo ajuda para obter a cura as benzedeiras chegam a atender vinte
pessoas por dia, fato esse comprovado durante a visita na residência de Angelita em
Maceió.
Constatou-se mediante os fatos aludidos que o intuito delas é de proporcionar a cura
do seu próximo por meio da fé. Fazendo jus a seguinte afirmação: “Quem te cura não sou
eu, quem te cura é Deus”, confirmando que os detentores desse ofício são uma forma de
aproximação entre a divindade e o enfermo.
Após compilar os dados das entrevistas, referências bibliográficas e registros visuais
percebeu-se que o ofício de benzeção que encontra-se em iminência de desaparecimento.

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As benzedeiras ou rezadeiras, não só de acordo com as referências bibliográficas, mas
também se levando em conta do que foi verificado in loco, são todas idosas e grande parte
já faleceram. Outro agravante é que o ofício não está passando as novas gerações por falta
de interesse por parte dos familiares das benzedeiras; exceto o neto da benzedeira Maria
Maria Augusta que aprende as rezas e observa todas as vezes que a avó realiza o ofício.
Tendo em vista a atual situação, averiguou-se a necessidade em valorar essas
mulheres para a sociedade alagoana por meio da fotografia, expondo o a rotina e o dia a dia
de mulheres que acreditam no poder da cura através da reza e crença. Em meios a panos e
ramos, os olhares atentos as fotógrafas Karla Calheiros, Jessica Conceição, Ingryd
Rodrigues e Taísa Theberge capturam momentos singulares que resultaram na exposição
que ocorreu em abril de 2017 no Museu da Imagem e do Som de Maceió. Além de,
contribuir para disseminar na população alagoana e nos visitantes a importância sobre a
preservação desse ofício.

A formação dessa “consciência preservacionista” junto às novas


gerações, é portanto, fundamental para a continuidade da
preservação dos bens culturais, cujo desaparecimento, sabemos
bem, constitui, em geral, uma perda irreparável, seja de um
monumento antigo, seja de conhecimentos e de modos de vida
(IPHAN, 2012, p.15)

A exposição contou com vinte e duas fotografias de cinco benzedeiras que também
subsidiaram esse artigo: Angelita, Maria Augusta, Josefa, Jacira (Lola), Maria Anunciada e
Maria Helena. Com a repercussão da exposição nas mídias sociais e em telejornais
possibilitou que muitos visitantes pudessem adentrar nesse universo tão pouco conhecido e
que é alvo constante de preconceito. Inclusive durante a inauguração da exposição uma das
benzedeiras, Maria Augusta, esteve no museu junto a sua família para mirar o trabalho e ter
a oportunidade de ser reconhecida merecidamente pelo ofício.

Imagem 04- Exposição Entre Panos e Ramos: Olhares sobre as benzedeiras alagoanas e a
benzedeira Maria Augusta.

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Fonte: Karla Calheiros, 2017.
Além das fotografias durante a exposição foi passado um filme sobre uma das
benzedeiras Angelita realizado em curso DocLab promovido pela instituição Serviço Social
de Comércio (Sesc) de Maceió, na qual obteve o tema benzedeiras na qual duas das
fotógrafas Karla Calheiros e Jéssica Conceição participaram na elaboração do documentário
e disponibilizaram na inauguração da exposição uma sessão do filme.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Adentrar no mundo das tradições populares de benzeção foi um motivo de grande
satisfação e conhecimento diante do ofício em questão.
Através das entrevistas e de uma pequena, mas imprescindível revisão bibliográfica
acerca do tema, observou-se que o ofício da benzeção ainda constitui um elemento de
estrutura social e cultura para os municípios estudados. O dia a dia das benzedeiras
entrevistadas é composto por rezas, benzeções, ramos, panos e curas. Elas atendem a
qualquer hora sem restrição. E a demanda constante de usuários em frente a residência
dessas mulheres demonstram o quão são úteis para a comunidade.
Como constatado durante as visitas de campo observou-se que as
benzedeiras/rezadeiras são guardiãs de sabedoria e técnicas milenares, como afirmam
Castro e Melo (2007). Elas vivem rodeadas de vunerabilidade, principalmente sua própria
condição de saúde. Enquanto cumpre muitas vezes o papel do Estado na promoção da
saúde daqueles que não dispõem de dinheiro ou não tem acesso aos serviços públicos de
saúde por ausência deles em alguns municípios visitados, são idosas que também
necessitam de cuidados. A eficácia simbólica do ofício já é uma seara indubitável no alcance
da cura nos foros das ciências, haja vista os aspectos psicossomáticos que envolvem a
relação dos humanos com as crenças, medos, desordens culturais e sociais. Corre o risco
de tal saber e técnica desaparecer por questões ligadas às dificuldades de transmissão por
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falta de valorização, visibilidade, credibilidade do ofício frente à frágil e pouco divulgada
compreensão de seus significados.
A elaboração deste artigo gerou a compreensão de que, sem atitudes como a
exposição fotográfica voltada para o reconhecimento desse ofício, não haverá mudanças
significativas no que diz respeito a valoração dessas mulheres detentoras do saber, e o
patrimônio cultural vai sofrendo os reflexos com o passar dos anos, sendo algumas
irreversíveis.
Essas argumentações expostas servem para mostrar como é necessário investir em
ações para que possamos compreender que as benzedeiras/rezadeiras são importantes
cidadãs da contemporaneidade e que carregam consigo uma tradição secular. É importante
salientar também que elas não tem apenas relevância para si, mas pelo que elas tem em
comum: mulheres idosas que dedicam a sua vida ao dom da cura através da fé e no serviço
em prol da comunidade.

REFERÊNCIAS:
AMORIM, José Pimentel. Medicina Popular em Alagoas. 2013.

CASTRO, Bárbara Emanoela da Rocha; MELO, Kelly Cristina Baeta de. Benzedores e
Sentinelas: Idosos são guardiões de tradições milenares. UFAL. 2007.

GOMES, N. P. de M. & PEREIRA, E. A. Assim se benze em Minas Gerais. Juiz de Fora,


Mazza/EDUFJF, 1989.

Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional- IPHAN. Educação patrimonial:


reflexões e práticas. Átila Bezerra Tolentino (Org.) - João Pessoa: Superintendência do
Iphan da Paraíba, 2012.

LAPLANTINE, F.; RABEYRON, P. Medicinas paralelas. São Paulo: Brasiliense. 1989.

LOYOLA, Maria Andréa. Médicos e Curandeiros: conflito social e saúde. São Paulo:
DIFEL, 1984.

OLIVEIRA, Elda Rizzo de. O que é benzeção. São Paulo: Brasiliense, 1985.

PINHO, Lucas Fernandes. Benzedeiras, mulheres com dons nas mãos e nas palavras,
um estudo sobre as narrativas da benzedura na cidade de farias brito - ce, final do
século XX e inicio do XXI. Disponível em:
<http://fedathi.multimeios.ufc.br/chec/2015/anais/Eixo8/BENZEDEIRAS,%20MULHERES%2
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0COM%20DONS%20NAS%20M%C3OS%20E%20NAS%20PALAVRAS,%20UM%20ESTU
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Acesso em 17 de junho de 2017.

SANT’ ANA, Elma; SEGGIARO, Delizabete. Bezedeiras e Benzeduras. Porto Alegre:


Alcance, 2008.

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BRINQUEDOS BIOGRÁFICOS: memória de práticas lúdicas

OLIVEIRA, ANA CÉLIA C. (1), MOURÃO, NADJA M. (2), CARVALHO, MARÍLIA DE


F. D. DE Á. (3)

1. Universidade do Estado de Minas Gerais. CEDTec – Centro de Estudos em Design e


Tecnologia. Av. Antônio Carlos, 7545. São Luiz.
anaceliadesign@gmail.com

2. UEMG. CEDTec
Av. Antônio Carlos, 7545. São Luiz.
nadja2m@gmail.com

3. UEMG. CEDTec
Av. Antônio Carlos, 7545. São Luiz.
mariliadefatimaavilacarvalho@gmail.com

RESUMO
Este artigo busca contextualizar, na região central de Minas Gerais, principalmente na cidade de Belo
Horizonte, a pesquisa sobre os brinquedos e jogos tradicionais que, passando de geração em
geração, foram assumindo versões particulares na produção artesanal. Considera-se a contribuição
dos valores sociais e a importância da preservação da memória cultural dos objetos lúdicos. A
pesquisa se realiza no campo do design afetivo e da memória de um povo, num movimento de
mapear, registrar e preservar objetos biográficos que, em sua mistura de materialidade e
sociabilidade, fazem parte da memória e da identidade dos grupos de brincantes. Apesar de toda a
construção contemporânea em torno das novas tecnologias, constata-se a existência de práticas
lúdicas muito antigas e tradicionais, que se mantêm vivas no patrimônio cultural, deixando fortes
alguns brinquedos na condição de mensageiros de uma memória coletiva. Existe uma harmonia que
pode ser investigada entre os seres humanos e os objetos: as pessoas criam objetos interferindo
inteiramente sobre eles, mas estes objetos também interferem nas formas de viver, de ser e estar no
mundo dos homens. Para a investigação utiliza-se da metodologia de natureza qualitativa, após
abordagem bibliográfica. Apresenta-se nesse artigo uma breve amostragem de artesãos que atuam
na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O levantamento de dados é executado por meio de
feiras e exposições de produtos artesanais, que comercializam brinquedos. Deste modo particular, os
exemplos se apresentam a resistência da cultura de produção artesanal de brinquedos, contrapondo
às novas tecnologias. Alguns brinquedos permanecem na condição de mensageiros de uma memória
coletiva. Preserva-se a relação dos seres humanos com os objetos bibliográficos. As pessoas criam
objetos interferindo inteiramente sobre eles, mas estes objetos também interferem nas formas de
viver, de ser e estar no mundo dos homens. Os brinquedos artesanais ganham relevância afetiva
através da história que se construí como indícios de tradição que passa de geração em geração.
.
Palavras-Chave: Brinquedos biográficos, produção artesanal, memória, design afetivo, práticas
lúdicas.

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Belo Horizonte/MG - de 21 a 23/06/2017.
1. Introdução

A importância humana de preservar a memória, através do lúdico, da diversão e do lazer, é


também um processo que incentiva a conscientização e aprendizagem. A pesquisa sobre o
brincar contribui para a educação, desenvolvimento e a cultura de um povo. A partir da
infância, a maneira como as brincadeiras e a utilização de brinquedos contribui para o
desenvolvimento psicológico, intelectual, emocional, físico-motor e especialmente, seus
valores sociais como membro da sociedade.

Este artigo busca contextualizar, na região central de Minas Gerais, principalmente na


cidade de Belo Horizonte, a pesquisa sobre os brinquedos e jogos tradicionais. Passando
de geração em geração, os brinquedos e brincadeiras foram assumindo versões particulares
na produção artesanal, que podem ter contribuído para a popularização de alguns desses
brinquedos na sociedade. Considera-se a contribuição dos valores sociais e a importância
da preservação da memória cultural dos objetos lúdicos.

A pesquisa se realiza no campo do design afetivo e da memória de um povo, num


movimento de mapear, registrar e preservar objetos biográficos. O design afetivo, de acordo
com Menezes e Damazio (2007) tem foco no papel das emoções humanas e em sua
influência na maneira em que o ser humano compreende e se relaciona com aos artefatos.
Essa mistura, que envolve a materialidade e sociabilidade, conduz a formação da memória e
da identidade dos grupos de brincantes.

Apesar de toda a construção contemporânea em torno das novas tecnologias, constata-se a


existência de práticas lúdicas muito antigas e tradicionais, que se mantêm vivas no
patrimônio cultural, deixando fortes alguns brinquedos na condição de mensageiros de uma
memória coletiva. Existe uma harmonia que pode ser investigada entre os seres humanos e
os objetos: as pessoas criam objetos interferindo inteiramente sobre eles, mas estes objetos
também interferem nas formas de viver, de ser e estar no mundo dos homens. Conforme de
Damazio (2006), os produtos não existem fora das relações sociais.

Para a investigação utiliza-se da metodologia de natureza qualitativa, após abordagem


bibliográfica. Apresenta-se nesse artigo uma breve amostragem de artesãos que atuam na
Região Metropolitana de Belo Horizonte. O levantamento de dados é executado por meio
de contato com os artesãos em feiras e exposições de produtos artesanais. Contribuições
dos relatos voluntários e análise dos conteúdos são apresentadas no relato das autoras.

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Assim, espera-se que a pesquisa possa contribuir para estudos sobre a preservação das
relações dos seres humanos com os objetos bibliográficos. Le Betron (2009) afirma que o
homem está afetivamente presente no mundo. As pessoas criam objetos interferindo
inteiramente sobre eles, mas estes objetos também interferem nas formas de viver, de ser e
estar no mundo dos homens. A pesquisa, portanto, fundamentada no design afetivo, aborda
alguns brinquedos artesanais que ganharam relevância afetiva através da história e se
constituíram como indícios de tradição popular.

2. Brinquedos artesanais: objetos biográficos

Eclea Bosi (2003), citando Violette Morin diz que objetos biográficos são aqueles que
envelhecem com o possuidor e se incorporam à sua vida: o relógio da família, o álbum de
fotografias, a medalha do esportista, a máscara do etnólogo, o mapa-múndi do viajante, o
brinquedo preferido das crianças. “Cada um desses objetos representa uma experiência
vivida, uma aventura afetiva do morador”. (BOSI, 2003, p. 26).

Os “objetos biográficos” se opõem, segundo Bosi (2003), aos chamados “objetos


protocolares” cujo uso é provisório. Ambos podem ser encontrados nos pertences de muitas
pessoas, sendo que os ditos "protocolares" aqueles que são valorizados pela moda, e não
pela relação particular que estabelecem com seu usuário. Nesse sentido, os brinquedos
artesanais podem ser tanto um quanto outro, mas sempre haverá um brinquedo artesanal
ou brincadeira popular na infância associado à memória afetiva que tenha impactado a vida
de um indivíduo ou grupo familiar.

A memória dos brinquedos, das experiências de brincar sozinho ou com o outro tem grande
significado para o ser humano. Segundo Bosi (2003), a memória traduzida em palavras e
que transmite uma experiência vivida pode gerar a preservação da cultura local e seus
objetos. Através dela, o ser humano pode ter acesso aos momentos passados, que
permanecem, mesmo que sem que deles se tome consciência, como motivos para o
comportamento presente.

O brinquedo enquanto objeto biográfico é um objeto que traz em si uma realidade cultural, a
experiência vivida, uma visão da criança sobre o mundo e o tempo que vive. Porto (2007)
aponta que, dependendo da matéria-prima de que foi executado o brinquedo – madeira,
espuma, ferro, pano ou vinil; da forma e/ou do desenho – bonecas; do aspecto tátil – bichos
de pelúcia ou de borracha; da cor, do cheiro e dos sons, os brinquedos proporcionam
possibilidades de experiências variadas e reações diferentes.
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Os brinquedos artesanais são formas de demonstração cultural, pois transportam, em sua
história, os variados saberes e fazeres das gerações passadas, sendo necessário valorizá-
los como objetos que contam histórias familiares e sociais de uma comunidade em que são
encontrados. O artesão, conforme Anterio e Gomes da Silva (2012), busca preservar a
técnica e cultura entrelaçada na história dos objetos. Ele exerce o papel de ser construtor de
um contexto cultural, rico em história desde a técnica e a sua marca individual. Entender
assim os métodos de construir e usar esses objetos possibilita constatar como se dão as
trocas culturais, geracionais e consequentemente afetivas entre gerações, entre pais e
filhos.

Os brinquedos artesanais “apresentam importantes significados para os feirantes


vendedores desses objetos, principalmente no que se refere ao período de infância vivida,
ao significado intergeracional somado à história cultural do brinquedo e à realidade
educacional dos Sujeitos” (ANTERIO; GOMES DA SILVA, 2012, p. 923).

Em relação aos brinquedos, Benjamin (1984), conta que, antes mesmo dos artesãos
direcionarem seus olhos para a infância e criarem os brinquedos com resíduos das oficinas,
as crianças já se apropriavam dos objetos do mundo adulto e com eles criavam e recriavam
condições cotidianas, preparando toda a fantasia das brincadeiras da infância com
miniaturas de objetos usados pelos adultos. São expressões de hábitos, costumes, valores,
materiais dispostos na região, enfim, características próprias de cada comunidade.

Defende-se a ideia de resgate para os brinquedos artesanais mineiros, construídos a partir


da madeira, da cabaça, do ferro, do pano, da palha de milho e outras fibras encontradas
nesta região central. Com o avanço da indústria no Brasil,

[...] o brinquedo sofreu grandes modificações tecnológicas. Diminuiu a


demanda artesanal e a sociedade passou a consumir os brinquedos
industrializados (e produzidos em massa). [...] apesar do avanço
tecnológico, o brinquedo artesanal continua com a sua identidade cultural,
que encanta as crianças de todas as gerações e classes sociais, ricas e
pobres. O brinquedo artesanal nunca deixou de ser fabricado,
principalmente nas regiões mais pobres do Brasil, onde o artesanato é o
meio de subsistência da maioria da população. (MACHADO, 2009, p.12)

Machado (2009) esclarece que a manufatura do brinquedo artesanal está presente nas
diversas e, principalmente, carentes regiões do Brasil. Contribuem para a identidade
cultural, pois são utilizadas por crianças de diferentes contextos sociais. Assim, segundo
Machado (2009) e Brougère (2000), o brinquedo artesanal, como objeto biográfico, reflete os
traços culturais da região de produção, com histórias e tradições de geração para geração.

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2.1. Brinquedos populares

Conforme Silva (1984), não se sabe quando surgiram os brinquedos populares, acredita-se
apenas que eles apareceram em todas as sociedades desde as mais remotas épocas.
Caracterizado como produto artesanal, daí também sua classificação enquanto "brinquedo
artesanal popular brasileiro", o brinquedo popular age de forma interativa no mundo de
fantasias da criança, permite avizinhar-se da realidade social em que vive, desenvolvendo
experiências internas e externas ao seu mundo, promovendo melhores contextos afetivos.

O artesanato é uma tradição, uma linhagem de conhecimento que passa de pai para filho,
de mestre para discípulo. Sua história se constitui na trajetória do ser humano, ao reproduzir
bens de consumo e adornos, revelando a capacidade produtiva e criativa. “Os primeiros
artesãos surgiram no período neolítico (6.000 A.C), quando o homem aprendeu a partir a
pedra, a fabricar a cerâmica e a tecer fibras animais e vegetais” (KOHLER; 1996; p. 59).

As origens do artesanato remontam à época pré-industrial, ou seja, faz parte da cultura


tradicional dos povos. "O artesanato é a arte e as obras dos artesãos" (Blog CONCEITO.de,
2017). O mesmo conceito se aplicada aos brinquedos artesanais, pois a construção de
brinquedos exige criatividade e habilidade do artesão que, em geral, realiza o trabalho com
ou sem o recurso de maquinário. "[...] observa-se que a construção dos brinquedos envolve
materiais de baixo custo, mas que exige criatividade e habilidade do fabricante" (ANTERIO e
GOMES DA SILVA, 2012p. 933).

No Brasil, o artesanato surge juntamente com os índios. Com elementos naturais criaram a
pintura, cestaria, cerâmica e outros. Um outro fato é que as tribos brasileiras sempre tiveram
ampla tradição de fazer brinquedos. “Nas aldeias, curumins e adultos participam juntos de
brincadeiras e jogos, que foram incorporados pelo homem branco” (MENEZES, DAMAZIO,
2007, p.42). Diferentemente das culturas brancas, a atividade de jogar, brincar como
conduta típica de crianças não se aplica ao cotidiano de tribos indígenas. Os adultos
também brincam de peteca, jogos de fio, imitam animais etc. A prática de atirar com arco e
flecha não é tratado como diversão ou brincadeira, é um treino para caça.

Conforme Menezes e Damazio (2007) muitos brinquedos indígenas são usados na infância
do povo brasileiro até os dias atuais. Um dos exemplos é a cama de gato, feita com um fio
da palmeira do buriti para formar figuras ligadas à cultura deles, como morcegos, gaivotas,
peixes, cobras, entre outros. O pião também foi identificado nas tribos indígenas,
confeccionado com frutos rígidos e ocos, nos quais se coloca um furo em um pequeno

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pedaço de pau fixado com cera negra, soltando o pião sobre uma cesta plana onde rodopia,
produzindo um som seco.

Destacam-se os brinquedos como os piões do Oiapoque, a peteca, e perna de pau dos


Xavantes, conforme figura 1 (MIRIM, 2017).

Figura 1 – Brinquedo de perna de pau da tribo dos xavantes


Fonte: < https://mirim.org/como-vivem/brincadeiras>

O artesanato mineiro é extenso, criativo e muito popular, que garante o sustento de muitas
famílias e comunidades, fazendo parte do folclore e revelando usos, costumes, tradições e
características de cada região.
Na maestria de confeccionar objetos, a criatividade do mineiro sempre foi
ímpar, nas mais variadas regiões culturais mineiras de acordo com o
processo histórico de cada uma, criam-se variados objetos, quem conhece a
história da nossa colonização é capaz de compreender melhor a história
desses objetos, suas respectivas curiosidades e suas características
peculiares as quais traduzem o jeito de ser e a cultura da comunidade de
origem. (FIGUEIREDO, 1997, p. 128).

Na personalidade do artesão já está fixada a ideia de preservar as tradições, sendo que ele
consegue transmitir a característica do regionalismo para as peças que são confeccionadas.
Existe uma imensa satisfação por parte dos artesãos em confeccionar suas peças, porque
as técnicas tradicionais de produção que eram utilizadas por seus antepassados são
resgatadas.

Há também um zelo por parte destes trabalhadores para que essa cultura não se perca,
tendo sempre um cuidado para que todo processo de confecção das peças seja
inteiramente artesanal. Assim, brinquedos confeccionados por artesão trazem essa
característica de preservação cultural.

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A produção artesanal mineira acontece principalmente nas cidades onde foram registrados
importantes fatos históricos, aquelas de popularmente chamamos de “cidades históricas”,
muito embora toda cidade seja histórica. Os centros de visitação turística necessitam
oferecer produtos diferenciados para os visitantes, especialmente peças confeccionadas
pelos habitantes locais com matéria-prima também local.

Assim, junto com a expansão do turismo em cidades mineiras, existe uma demanda
crescente por produtos considerados tradicionais de determinada região. Feitos com palha
de milho, ou esculpidos em pedra, ou moldados em argila há diversos exemplos de
brinquedos artesanais feitos com matérias-primas locais, como palha de bananeira e de
milho, conforme Figura 2.

Figura 2 - Bonecas de palha de milho de Bom Jesus do


Amparo. MG.
Fonte: Acervo da pesquisa, 2017.

Geralmente, o artesão utiliza matérias primas locais, muitas vezes só encontráveis na


sua região. Busca utilizar, “pelo menos em parte, técnicas manuais; e segue
métodos tradicionais, que passam de geração a geração por processos informais de
tradição” (GIANNI, 2003, p.7).

Benjamin (1984) relata que os brinquedos podem assumir um estilo específico de acordo
com os gostos do público alvo. Não se nega, no entanto, que existam também produtos
mais espontâneos, por assim dizer, como os brinquedos fabricados por artesãos de culturas
específicas, encontrados em feiras locais.

Machado (2009) relata que, em diversas localidades no Brasil, os brinquedos populares,

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desde os carrinhos de madeira ou de lata, a bonecas de pano, marionetes, aviãozinho de
papel, pião, estilingue, papagaio ou pipa, peteca, pedagógicos e outros, são também
produtos artesanais para comercialização. São encontrados nas feiras livres, mercados,
mercearias e lojinhas de museus. A autora cita que brinquedos, como por exemplos os
carrinhos, podem ser confeccionados a partir de sucatas industriais como latas, garrafas pet
e outros materiais, dependendo da criatividade do artesão. São miniaturas de veículos em
cores vibrantes e variadas. Destaca-se também o uso de ferramentas diversas para
confecção, que variam de bigornas aos alicates.

O estilingue e o pião são brinquedos populares que são praticados no espaço exterior da
casa. Sobre o pião, já dizia Câmara Cascudo, no seu Dicionário de folclore brasileiro, é uma
brincadeira que existe desde os tempos remotos da Grécia, onde era conhecido como
“strombo”. Na Itália, em Roma antiga, o pião era chamado “turba”. No Brasil, o pião é um
pequeno objeto feito de madeira, ou metal, tendo na ponta um prego ou ferrão. Com um
cordão ou ponteira enrola-se da ponta ao corpo do pião e impulsiona-o para o chão e este
ao desenrolar-se do impulso, fica a rodopiar. O jogador apara o pião em movimento, usando
os dedos (indicador e médio) em forma de tesoura e deixa-o rodar na palma da mão, onde
ele gira e ou ronca até parar (MACHADO, 2009) e tem a versatilidade de ser brincado
sozinho ou na presença de outro (ANTERIO e GOMES DA SILVA, 2012, p.931).

O estilingue é também um brinquedo popular para espaços externos, "não domésticos",


conhecido em alguns lugares por setra, baladeira e atiradeira, e desenvolve a pontaria dos
brincantes. É composto de três partes distintas: a forquilha, o elástico e a malha. A forquilha
é feita preferencialmente de galho de laranjeira, goiabeira ou jabuticabeira. Nas
extremidades das duas hastes da forquilha, amarra-se o elástico diretamente na madeira. O
elástico é feito de duas tiras longas de câmaras-de-ar de pneus de automóveis. A malha é
de couro e dela sai o projétil: pedra, mamona verde ou pelota de barro cozido. (MACHADO,
2009).

2.2. Brinquedos artesanais em Belo Horizonte

A cidade de Belo Horizonte, capital mineira, possui lojas e lugares especializados em


resgatar os brinquedos populares, de produção artesanal com foco na memória afetiva.
Alguns pontos comerciais podem ser citados como: o Museu do Brinquedo, a loja de
artesanato da Associação Mãos de Minas no Palácio das Artes, a Feira dominical de
Artesanato da Avenida Afonso Pena, o Mercado Central e a loja Traquitana.

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No decorrer da pesquisa, alguns pontos de comercialização foram pesquisados. Nesse
artigo, são apresentados dois ambientes de comercialização de brinquedos artesanais
populares, em que se evidencia o contato com os artesãos.

2.2.1. Traquitana e seus brinquedos memoráveis

A Traquitana Brinquedos Bonecos e Livros é uma loja especializada em brinquedos


artesanais e brincadeiras tradicionais, diversão e cultura, comprometidos em resgatar a
criatividade do brincar. Os produtos, conforme entrevistas com os artesãos e proprietários
do negócio reúnem a modernidade e tradição dando asas à imaginação:

[...] criamos um conceito diferenciado de produtos e loja, onde crianças e


adultos desfrutam de um espaço não só para compras, mas também de
diversão e cultura, resgatando um tempo de brinquedos e brincadeiras que
hoje ficaram um pouco esquecidos, perdidos na correria do mundo moderno
(Proprietários da Traquitana, 2017).

No interior da loja e na sua calçada externa há mesinhas e cadeiras para pais e filhos
jogarem, lerem e experimentarem os brinquedos criando uma ligação entre a infância de
gerações diferentes de pais e filhos, com produtos que buscam o aconchego, a proximidade
e a interatividade da criança com o adulto:

Brinquedos e brincadeiras, diversão e cultura. Comprometidos em resgatar


a criatividade do brincar, somos um pouco de tudo isso”, relata a
proprietária. Reunindo modernidade e tradição e dando asas à imaginação,
criam um conceito diferenciado de produtos e loja, onde crianças e adultos
desfrutam de um espaço não só para compras, mas também de diversão e
cultura, resgatando um tempo de brinquedos e brincadeiras que hoje
ficaram um pouco esquecidos, perdidos na correria do mundo moderno
(ANA LUISA, 2017).

A ideia da Traquitana tem sua origem nas Artes Plásticas e na Educação, áreas de
formação da proprietária da loja, Ana Luísa, que é formada em Pedagogia e iniciou fazendo
teatro de bonecos. Por isso, naturalmente, o principal foco do seu trabalho na loja são
bonecos, brinquedos, jogos e objetos lúdico-infantis: “Brinquedos para quem aprende, quem
ensina e quem se diverte com as duas coisas, [...] criar uma ponte entre a infância de pais e
filhos. Nossos produtos buscam o aconchego, a proximidade e a interatividade da criança
com o adulto" (ANA LUISA, 2017).

Ana Luisa conta que seus clientes não são apenas crianças. A Traquitana agrada a públicos
diversos que consideram como principais diferenciais o caráter pedagógico, nostálgico e
criativo de seus produtos, os "brinquedos que trazemos na memória". Eles possuem uma
grande diversidade desde aqueles de produção própria a produtos de outros artesãos, que
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compartilham da filosofia de trabalho da loja e, da mesma forma, traduzem em seus
produtos com qualidade estética e intenção de preservação cultural.

2.2.2. Artesões de brinquedos populares da Feira de Artesanato

A Feira de Artesanato que acontece todo domingo, na extensa Avenida Presidente Afonso
Pena, em Belo Horizonte, possui mais de 2.500 expositores. Ela foi fundada em 1969, e
tornou-se uma das maiores feiras da América Latina, com um público estimando acima de
140 mil visitantes de todos os lugares do Brasil. Hoje, a Feira é considerada um dos grandes
polos de compra da capital e disseminadora da cultura regional para os visitantes.

A Feira de Artesanato está na memória de quem conheceu sua história. No início dos anos
1970, era apenas um grupo de artistas plásticos que se encontravam semanalmente para
colocar à venda seus trabalhos. A Feira de Artesanato era conhecida como Feira Hippie,
nome que até hoje é utilizado carinhosamente pelos moradores da capital. Instalada
originalmente na Praça da Liberdade, com o passar do tempo, devido ao aumento do
número de comerciantes, foi transferida para a Avenida Afonso Pena, em 1991.

Na feira se comercializa objetos de decoração, artes plásticas, bijuterias, artesanato infantil,


móveis, tapeçaria, vestuário e comidas típicas, tudo feito por artesãos e artistas que param o
trânsito de veículos da principal avenida da cidade, a Afonso Pena. Com um colorido
especial, vindo das barraquinhas, a feira tem um artesanato diversificado que chama a
atenção de quem chega a passeio na capital mineira.

Na Feira de Artesanato podem-se encontrar, aos domingos, os brinquedos populares


memoráveis, como os brinquedos de madeira como os carrinhos, piões, violões, jogos
pedagógicos, entre outros. A memória afetiva nasce com o próprio artesão, a exemplo de
Rogério, que desde pequeno ficava ao lado do pai, que fabricava brinquedos de madeira.

Percebe-se o cuidado de Marta ao organizar em sua bancada suas petecas coloridas.


Segundo a artesã, todo o processo é manual o que a faz reconhecida no lugar: “sou a Marta
das petecas, é só perguntar que você me encontra" (MARTA, 2017).

A artesã Ione comercializa palhaços coloridos e maleáveis (figura 3). Expor esses
brinquedos na feira, segundo a artesã, além da necessidade de comercialização é uma
atividade prazerosa, ao perceber a admiração das pessoas. Outras gerações já faziam
palhaços e a técnica de produção permanece de geração em geração.

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Figura 3 - Palhaços da artesã Ione.
Fonte: Equipe da Pesquisa, 2017.

Há outros artesãos que criam brinquedos populares como às bonecas de pano do


Washington e sua tia Ivanilde (Figura 4), que tratam o publico com bom humor. Eles animam
os visitantes, revelam que se identificam com o trabalho e a criação de bonecas.

Figura 4 - Bonecas de pano de Washington e sua tia Ivanilde.


Fonte: Acervo da Pesquisa, 2017.

O saber popular e as técnicas de produção passadas de geração a geração são uma prática
comum aos artesãos de brinquedos entrevistados. A feira proporciona produtos variados e o
artesanato tem espaço, dentre o conjunto colorido de formas variadas das barracas dos
feirantes.

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2.3. Design Afetivo e brinquedos

Segundo Van Amstel (2017), o Design tem explorado cada vez mais a dimensão estética e
emocional dos artefatos de trabalho e de uso cotidiano. O Design Afetivo é aquele que afeta
nossa constituição psicológica, permitindo que expressemos ou sintamos a emoção de
outras pessoas pelo material do Design. O Design Afetivo busca fazer uma ponte entre
Design, emoção, aprendizagem, junto com a experiência do usuário, daí sua conexão ao
Experience Design, uma forma de Design que lida com o componente afetivo da
subjetividade humana.

Os brinquedos desenvolvidos por Designers, ou os brinquedos selecionados por designers


junto a artesãos de brinquedos populares, têm sido utilizados amplamente na ambientação e
na customização de espaços de clínicas de recuperação de saúde, na humanização de
setores hospitalares para crianças em internação prolongada, em quartos de bebês, em play
grounds de shoppings etc. Em tais ambientações se faz a mescla de Design Afetivo, com
Experience Design e com a usabilidade dos brinquedos. Ainda há muito por pesquisar no
campo do Design Afetivo em relação aos brinquedos.

Neste artigo, focalizamos brinquedos artesanais e brinquedos populares enquanto “um


artefato de significativa importância no período da infância” (SILVA e SILVA, 2014). A
aproximação da metodologia do Design de produtos aplicada ao desenvolvimento de
brinquedos requer pesquisas que explorem o universo do brinquedo popular e do brinquedo
de fabricação artesanal, como fontes de inspiração. Texturas, formas, superfícies são
grande campo de testes a serem realizados por designers de brinquedos e estão na base da
configuração de novos brinquedos a serem desenvolvidos (LÖBACH, 2001). Conforme
Löbach, por meio da compreensão dos produtos como artefatos, o desenho industrial deve
ter como ponto de referência os aspectos culturais ligados ao comportamento humano, os
aspectos semióticos, semânticos e psicofisiológicos (cognitivos, psicológicos e subjetivos).

Analisando a contemporaneidade, diversos pesquisadores e estudiosos do brincar e do


brinquedo tem buscado, construir classificações de valores para os brinquedos, como por
exemplo estudos antropológicos e etnológicos das diversas civilizações e suas formas de
brincar, organizados pelo International Council of Children’s Play, entidade criada em Ulm,
Alemanha, em 1959, que elaborou uma classificação a seguir,

 O valor funcional do brinquedo – são as qualidades intrínsecas do brinquedo, ou seja,


sua adaptação ao usuário. Por exemplo, em outros tempos, os primeiros jogos de

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construção eram minúsculos, adaptados à mão da criança, sentada em frente de uma
mesa; hoje, a maioria deles está na escala da mesma criança brincando no chão, com
todo o seu corpo.

 O valor experimental do brinquedo – diz respeito àquilo que a criança pode fazer ou
aprender com seu brinquedo – manipulações sensoriomotoras, construções, operações
lógico-matemáticas, experiências científicas, didáticas ou culturais, criatividade.

 O valor de estruturação do brinquedo- diz respeito a tudo que concorre para a elaboração
da área afetiva. O Design Afetivo tem explorado cada vez mais a dimensão estética e
emocional dos artefatos de trabalho e de uso cotidiano.

As emoções estão em tudo pelo que optamos. Servem, inclusive, de guia para o nosso
comportamento. Conforme Norman (2008), quem entra em ação nessa hora é o sistema
afetivo – o responsável, em nosso organismo, por julgar o que é bom ou ruim, seguro ou
perigoso.

Os brinquedos, mesmo que construídos em série, apresentam sempre contrastes entre si e


não tem nome ou desempenho definido, sua identidade vai sendo criada pela imaginação
afetiva da criança: “a boneca de pano é um conjunto vazio, que só ganha vida através da
relação entre sujeito e objeto, que é única para cada indivíduo, de acordo com sua história,
sua cultura, sua consciência e inconsciência”. O artefato “brinquedo” carrega, assim,
concepções e valores resultantes da leitura do designer sobre a cultura e a sociedade a que
pertence, segundo o designer Bonfim (1995, p. 89).

3. Memória coletiva

Não apenas os seres humanos individualmente lembram-se das coisas, como também
grupos e as mais diversas coletividades. Os modos de recordar são marcantes
culturalmente, variam ao longo do tempo e segundo a formação cultural em que são criados.
O estudo da memória também passou por modificações conceituais a partir da década de
1920. Ao mostrar que a memória é uma construção social, Halbwachs (2006) apontou que
os indivíduos recordam daquilo que consideram importante para seu grupo. Para ele, as
lembranças são sempre coletivas, pois, mesmo que em determinadas circunstâncias se
esteja materialmente só, o indivíduo recorda tendo como referenciais composições
simbólicas e culturais de um grupo social.

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Halbwachs (2006) coloca ainda que a memória coletiva está diretamente relacionada à
história vivida, pois esta se baseia em experiências vivenciadas pelo grupo, que busca
conservar a imagem do seu passado. Ele também caracteriza dois tipos de memória, a
primeira é a lembrança involuntária, provocada por circunstâncias, objetos, pessoas ou
lugares, em cuja experiência passada faça aflorar a recordação; a segunda é o trabalho
consciente e sistemático de recobramento das lembranças; é o processo de rememoração
do que ocorreu no passado. Cada época fabrica seu universo de símbolos e significados,
produz a sua representação do tempo histórico.

A memória coletiva aflora a identidade de um povo, o que (CASTELLS, 2000, pag. 22),
explica, é “[...] a fonte de significado e experiência de um povo. Toda e qualquer identidade
é construída. ” Michael Pollak (1992), reforça esta colocação:

Podemos, portanto, dizer que a memória é um elemento constituinte do


sentimento de identidade, tanto individual como coletiva, na medida em que
ela é também um fator extremamente importante do sentimento de
continuidade e de coerência de uma pessoa ou de um grupo em sua
reconstrução de si [...]. (POLLAK, Michael, 1992, p. 200-212).

É uma natural intimidade entre o barro, a palha, o tecer e os sentidos, como se o artesão
tomasse o modelo ancestral da criação, pois “Adão foi feito de barro”. Pensamos essa
mesma relação do artesão com o barro, o artesão com o ferro que forja, com a palha que de
milho que transforma em boneca. Corpo e alma, mãos e memória dedicados ao objeto que
cria, por isso, o objeto “têm” uma vida própria, uma alma que lhe foi dada, e é uma espécie
de continuação do artesão, tornando-se objeto de admiração para quem o compra ou
ganha, principalmente se houve contato com o próprio artesão e a feitura do objeto que
adquire. Objetos carregam memória.

“A mesma análise (ambivalência) vale para o material. A madeira, por


exemplo, tão procurada hoje por nostalgia afetiva uma vez que tira sua
substância da terra, vive, respira, “trabalha”. (...) conserva o tempo em suas
fibras, é o continente ideal já que todo conteúdo é algo que se quer subtrair
ao tempo. A madeira tem seu odor, envelhece, tem mesmo seus parasitas,
etc. Enfim, esse material é um ser.” (BAUDRILLARD, 2008, p.44).

Apesar de toda a construção contemporânea em torno das novas tecnologias, constata-se


que há práticas lúdicas muito antigas e tradicionais que se mantêm vivas no patrimônio
cultural, deixando fortes alguns brinquedos na condição de mensageiros de uma memória
coletiva. Para Latour (2001), há uma simetria a ser explorada entre sujeitos e objetos: os
humanos criam objetos interferindo inteiramente sobre eles, mas estes objetos também
interferem nas formas de viver, de ser e estar no mundo dos homens, pois a vida do ser

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humano não transcorre isoladamente da ação que os objetos exercem sobre eles.

Chateau (1987) vê o exercício do brincar como o laboratório do espírito e do intelecto onde


ocorrem as necessárias experiências que a criança precisa ter pelo que há de vir e que têm
papel fundamental para a vida na sociedade.

Segundo Mello (2007), pode-se afirmar que a interação com o brinquedo pressupõe uma
determinada aprendizagem social, uma vez que as relações estabelecidas nessa ação
demandam captar os signos e significados estabelecidos enquanto elementos da cultura
lúdica, e da cultura em geral.

Para Perrotti (1990), o elemento lúdico é dado como objeto, de modo que, o objeto
(brinquedo) é peça fundamental na constituição da brincadeira, bem como, na incorporação
de valores socioculturais de seu tempo. Segundo o autor, vê-se a produção cultural da
criança ser velozmente substituída por uma produção cultural para a criança. O brinquedo,
objeto de desejo na esfera de consumo, restringe a ação da criança como produtora de
cultura.

4. Considerações finais

A busca e estudo desses objetos, no caso os brinquedos artesanais, pode ser considerada
uma proposta educativa e cultural; uma experiência de transformação do mundo pelo
brinquedo, como vivência de fruição. Destacam-se os brinquedos indígenas, os brinquedos
de artesãos comerciantes da Feira de Artesanato dominical de Belo Horizonte, Minas
Gerais.

A observação dos objetos de memória e dos brinquedos infantis surge pela diversidade ante
as novas realidades econômicas, políticas e culturais, definidoras do mundo contemporâneo
e que identificam, de certa forma, o projeto de modernidade.

Foi observado que a prática de confeccionar brinquedos é uma atividade que perpassa a
própria história da humanidade. Os objetos artesanais estão presentes em todas as
culturas. A relação do homem com os objetivos os tornam bibliográficos, à medida que a
relação emocional se estabelece.

Um objeto que traz memórias do passado, que identifica, conta histórias presentes e que
talvez, deixarão um legado para o futuro. O mesmo foi observado em relação às culturas
indígenas.
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O ser humano estabeleceu as mudanças culturais pela forma como vive. Assim, o fato de
inserir a tecnologia no cotidiano não inibiu a produção dos brinquedos artesanais. Aliás,
passam ter a ter a conotação de populares. A relação do ser humano com esses
brinquedos constitui na preservação das técnicas e das tradições, que assegura a
conservação da cultura.

Referências
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brinquedos artesanais vendidos em feiras livres. In: Revista Educação e Liberdade. v. 37.
n. 3. set/ dez 2012. Porto Alegre: Ed. Real, 2012. Disponível em:
<https://www.ufrgs.br/edu_realidade>. Acesso em: 10 jun. 2017.

BAUDRILLARD, J. A sociedade de consumo. Portugal: Edições 70, 2008.

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São Paulo: Summus, 1984.

BONFIM, Gustavo A. Design e Informação. In Design & Interiores, nº49. São Paulo: Arco
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<http://www.feirahippiebh.com/v2/index.php/pt-br/>. Acesso em: 08 jun.2017.

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VAN AMSTEL, Frederik. Design afetivo e estética da interação. 2017. Disponível
em:<http://www.usabilidoido.com.br/design_afetivo_e_estetica_da_interacao_.html>. Acesso
em: 26 mai. 2017.

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CINECLUBE, EDUCAÇÃO, PATRIMÔNIO, RESISTÊNCIA, MEMÓRIA:
DESAFIOS E POTÊNCIAS NA EDUCAÇÃO MUSEAL

CARVALHO, Alexandre Sônego de; RODRIGUES, Ana A. Villanueva,

1. Museu da Imagem e Som. Prefeitura Municipal de Campinas


Universidade Presbiteriana Mackenzie
prof-alexandresc@bol.com.br

2. Museu da Imagem e Som. Prefeitura Municipal de Campinas


Universidade Paulista – UNIP de Campinas
anavillanueva11@gmail.com

RESUMO
O Museu da Imagem e do Som de Campinas está localizado em um prédio histórico de grande valor
patrimonial, tendo sido tombado por três esferas de órgãos de preservação do patrimônio cultural, o
IPHAN, o CONDEPHAAT e o CONDEPACC. O MIS está instalado em um palácio (Palácio dos
Azulejos), que foi residência de Joaquim Ferreira Penteado, o Barão de Itatiba, além desta importante
característica arquitetônica, na história, o solar passou a ser utilizado pela prefeitura de Campinas,
posteriormente pela empresa SANASA, após Secretaria Municipal de Cultura e hoje museu. Ao longo
do tempo o palácio, antes ocupado por barões e figuras “importantes” da sociedade, passou a ser
frequentado pelo povo, sendo esta ocupação realizada em diferentes contextos culturais e sociais,
desde as sessões de cineclubes, participações de coletivos e diversos grupos sociais, exposições,
relações com o espaço, parcerias institucionais com diferentes universidades, etc Todas ações
desencadeiam no MIS uma construção de uma atuação de auto gestão, sendo que as proposituras
de atividades são motivadas pelos diferentes atores do museu, do público para o público.O presente
trabalho pretende relatar as diferentes formas de relação com o MIS - Museu da Imagem e do Som
de Campinas, na condição de coordenador do espaço, considerando as tensões, bem como
apresentar as potências da participação do público do museu na construção coletiva da memória.

Palavras-chave: Museu; Educação; Mediação; Participação Popular.

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RELATO DE EXPERIÊNCIA

Tem os museus contribuído para construir um outro olhar, mais do


que para ver? Favorecem a formação estética, incitando a
possibilidade de emocionar-nos, assombrar-nos, indignar-nos? Têm
atuado os museus como lugar de cultura onde, com razão e
sensibilidade, as pessoas encontrem-se com a história e
compreendam-na? A interação com os objetos e com o museu tem
sido uma experiência libertadora ou tem exercido uma função
opressora sobre aquele que visita, observa, contempla? (KRAMER,
1998, p. 211).

Como a proposta feita foi como Relato de Experiência, utilizaremos um texto sucinto,
que estabeleça uma relação dialógica com o leitor e permeie o campo da relação
museu/público como potência para construção de uma nova dinâmica na museologia
contemporânea.

Quem é o MIS? É muito interessante abreviação do nome da instituição, ela


estabelece uma relação de afeto com o espaço. A grande maioria dos frequentadores
preferem dizer “vou ao MIS” ao dizer “vou ao museu”. O popular MIS, é o Museu da Imagem
e do Som de Campinas, uma instituição pública criada em 1975 por meio da Lei Municipal
No. 4576/75, vinculada à Secretaria Municipal de Cultura. Que de acordo com
documentação da instituição tem como missão: reunir, preservar, conservar e difundir seu
acervo, além de promover ações educativas, exposições de longa duração e exposições
temporárias, compreendendo como eixo norteador as produções audiovisuais (em
fotografia, películas, imagem em movimento, animação, cinema, som, etc.). Além de garantir
à democratização dos meios de produção e gestão do patrimônio audiovisual, estimulando,
por intermédio de oficinas e exposições, ações que permitam o conhecimento do audiovisual
como instrumento de registros históricos, de criação artística e documentação da sociedade.

Trata-se de um museu com 42 anos de existência (e resistência). Foi criado por


iniciativa de diversas pessoas, sendo protagonistas o Senhor Henrique de Oliveira Júnior e
Dayz Peixoto Fonseca. A ideia era ter um espaço para reunir e preservar a memória
iconográfica de Campinas e região, além de ser um espaço para ver e debater filmes.

O MIS foi (e continua sendo) muito importante para a formação audiovisual da


população. Por intermédio do cineclubismo que é a força motriz da programação do museu.

Neste relato não abordaremos sobre a história do Palácio dos Azulejos (um bem
tombado por três esferas do PATRIMÔNIO no Brasil, o federal-IPHAN, o estadual-

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CONDEPHAAT e o municipal- CONDEPACC), mas precisamos mencionar somente que
este prédio (oponente) (Fig. 1), foi casa do Barão de Itatiba e sua construção é datada de
1878. O MIS não está neste prédio desde 1975, ao longo da história, seu acervo, seus
funcionários, sua MEMÓRIA foi mudando de um lugar para outro. No Palácio dos Azulejos,
até a chegada do MIS, passou por ali a Prefeitura Municipal de Campinas, a SANASA -
Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento S/A, e a Secretaria Municipal de
Cultura. O MIS ocupa, em 1996, uma parte deste prédio, mas somente em 2004 que museu
conquista o palácio como sede definitiva, por meio do decreto nº 14.844/2004.

Figura 1 – Fachada Atual do MIS – Foto Edis Cruz

As divisões de espaço do museu são bem estabelecidas, sem contudo impedir


alterações (como já houve e podem haver), possuímos algumas salas que mantem nossa
exposição de longa duração (composta por objetos tecnológicos de imagens e som), cinco
espaços para exposições temporárias, duas salas de ações educativas, uma reserva técnica
que mantém o acervo de fotos, filmes, negativos, vídeos, cartazes, slides, discos, fitas, CDs,
DVDs e objetos sobre a história social e cultural da cidade de Campinas e duas salas
adaptadas para exibições de filmes.

Dentre a composição do acervo MIS chamaríamos a atenção para os registros de


história oral, pois por intermédio deles conseguimos compreender a história do município. O
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que é importante destacar neste acervo é que são diferentes vozes que narram a história de
nossa cidade, valorizando os diferentes atores da sociedade, permitindo assim que história
seja conhecida sob diferentes olhares e lugares. Assim, o MIS é local de RESISTÊNCIA
quando garante vez e voz para protagonistas da história, que na ausência de uma instituição
como este não teria sua versão contada dos fatos. Sendo o MIS uma instituição de
salvaguarda desta galeria de “pequenos” personagens de Campinas. E este trabalho não
para, pois é mantido há muito tempo o Programa Pedagogia da Imagem e cursos como o
Doc 360º (Figura 2) que ampliam os registros da história da cidade.

Figura 2 - Aula do curso Doc 360° (Foto: Bárbara Garcia)

O programa educativo do MIS é bem ativo e possui várias frentes, temos parcerias
estratégicas que garantem uma diversidade para programação do espaço. Como oficinas de
fotografia, palestras, debates, fóruns, encontros, reuniões, rodas de conversa, etc.

A área de formação no MIS é pujante, temos vários colaboradores e outros parceiros


que mantém uma agenda rica e plural para o museu. Destacamos algumas parcerias: com
universidades (UNICAMP, PUCCAMP, UNIP, etc), com outras instituições (públicas e
privadas), com coletivos, grupos, com a Secretaria Municipal de Educação, etc.

O MIS tem oferecido para a população cursos/oficinas/estágio (fig. 3) na área de


teatro, dança, moda, música, fotografia, conservação, cinema, animação, arquitetura,
patrimônio, curadoria, artes, acervo, literatura, etc. tendo, o museu, um papel importante na
formação e EDUCAÇÃO de seu público.

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Figura 3 - Educação patrimonial e oficina de fotograma | Crédito: Divulgação MIS

A programação de cinema do MIS é algo que sensibiliza a todos, desde o processo


de curadoria dos filmes (qualidade e diversidade) e pelo debate que é realizado após as
sessões, fazendo do museu um importante espaço para manutenção de CINECLUBES na
cidade. No entanto, mais que manter a tradição dos cineclubes toda programação de
cinema é feita por curadores que não são necessariamente funcionários do museu, desta
forma a participação de diferentes pessoas e diferentes grupos garantem ao MIS uma
programação plural, de qualidade e sem interferência. Claro, que são mantidas o respeito às
legislações, ficando cada curador responsável pela sua programação. Com o
acompanhamento de colaboradores da instituição. Aqui destacaria um em especial,
Professor Orestes Toledo (Fig.4), que além de participar de boa parte da história do museu
é uma pessoa que é reconhecida pelo seu comprometimento, dedicação ao movimento
cineclubista em Campinas e garante a manutenção dessa construção da programação de
forma horizontal com os curadores.

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Fig. 4 Foto: Camila Moreira/AAN

Desta forma, concluímos esta conversa apontando que a manutenção de diferentes


grupos, vozes e concepções é necessário para garantir um fluxo contínuo no museu, para
“oxigenar” sua programação, manter uma relação de proximidade com seu público,
aproveitando sugestões, recebendo com serenidade as críticas, bem como aprimorando a
organização nesta relação instituição x público. Compreendemos assim, que toda ação
desenvolvida no museu é resultado do processo de construção da Educação Museal. A
participação de coletivos, ONGs, cineclubes, curadores, grupos sociais, movimentos
estudantis, outros órgãos públicos, etc. mantém um vínculo importante para a manutenção
das atividades que acontecem no espaço, pois este público não vai somente ao MIS para:
assistir filmes, pesquisar o seu acervo, prestigiar as exposições, participar de reuniões,
oficinas, encontros, mostras de filmes, conhecer o Palácio dos Azulejos, etc eles mantém
uma relação de afeto e de pertencimento com o museu. E os desafios residem dentro
destas potências, seja para garantir a participação popular ou para organizar melhor o
conjunto das atividades, mas isto será o capítulo para uma outra conversa.

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Bibliografia Consultada

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Janeiro: UNI-RIO: FAPERJ: DP&A Editora, 2003.

ARGAN, Giulio Carlo. “História da Arte como História da Cidade”. São Paulo: Ed. Martins
Fontes, 1992.

BRUNO, Maria Cristina Oliveira. Museologia e museus: princípios, problemas e métodos.


Lisboa: Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, 1997. (Cadernos de
sociomuseologia, n. 10).

BRUNO, Maria Cristina Oliveira. Museologia e comunicação. Lisboa: Universidade Lusófona


de Humanidades e Tecnologias, 1996. (Cadernos de sociomuseologia, n. 9).

CHAGAS, Mário. Há uma gota de sangue em cada museu – a ótica museológica de MÁRIO
DE ANDRADE. Chapecó: Argos, 2006.

CUNHA, Marcelo Bernardo da. A exposição museológica como estratégia comunicacional: o


tratamento museológico da herança patrimonial. Revista Magistro, v. 1, n.1, p. 109-120.
2010.

KRAMER, Sonia; LEITE, Maria Isabel Ferraz Pereira (orgs.). Infância e Produção Cultural.
Campinas: Papirus, 1998.

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EDUCAÇÃO PATRIMONIAL ATRAVÉS DA EXTENSÃO
UNIVERSITÁRIA NA ENGENHARIA CIVIL: Um estudo de caso em
Curvelo/MG.

ESTEVÃO, ANA CECÍLIA. (1); SILVA, DAIANE MENDES DA. (2); SILVA,
MATHEUS HENRIQUE ARAUJO; (3) CORGOZINHO, SERGIO HENRIQUE (4);
JORGE, FELIPE BASTOS (5).

1. Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. Departamento de Engenharia civil e


Meio Ambiente.
Rua Santa Rita, 900 - Santa Rita - Curvelo - MG
anacestevao@yahoo.com.br

2. Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. Aluno da graduação em Engenharia


Civil.
Rua Santa Rita, 900 - Santa Rita - Curvelo - MG
matheus7l12@gmail.com

3. Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. Aluna da graduação em Engenharia


Civil.
Rua Santa Rita, 900 - Santa Rita - Curvelo - MG
daianemendesmendes@gmail.com

4. Universidade Federal de Uberlândia. Aluno da graduação em Engenharia de Controle e


Automação.
Rua Santa Rita, 900 - Santa Rita - Curvelo - MG
serginhoh12@hotmail.com

5. Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. Departamento de Engenharia civil e


Meio Ambiente.
Rua Santa Rita, 900 - Santa Rita - Curvelo - MG
felipebjorge@hotmail.com

RESUMO
De acordo com o CONFEA, são atribuições do profissional de engenharia civil, dentre outras, o
estudo, a consultoria, a orientação técnica e o ensino, e o engenheiro utiliza estas competências, em
síntese, para encontrar soluções de problemas complexos. Entretanto, para tal, não se requer do
profissional apenas habilidades analíticas, mas também sensibilidade para observação das pessoas e
questões múltiplas da sociedade, além de conservar uma visão vasta e conjunta de um assunto,
integrar as preocupações heterogêneas, saber explicar e convencer tornando-se, então, gestor e
técnico. O conhecimento adquirido pelos profissionais da engenharia deve não ser apenas
direcionado para a solução dos problemas propostos, mas sim para a população, como função social
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para o desenvolvimento social e melhoria de condição de vida. Desta forma, a sociedade precisa de
maior envolvimento do engenheiro e da universidade em assuntos comunitários, com respeito às
individualidades de cada comunidade. Educação patrimonial é constituída de processos educativos
que possuem como foco o patrimônio cultural como recurso para compreensão social e histórica, e
que contribui para o reconhecimento, valorização e preservação do bem cultural. Assim, o profissional
da engenharia, ao lançar mão da sua atribuição de ensino, torna-se um agente cultural e social, e
pode, através de seus conhecimentos, promover a educação patrimonial. Dentre os estudantes, tal
papel pode ser realizado por meio da extensão universitária. Desta forma, este trabalho apresenta o
relato de uma experiência de extensão universitária na graduação em Engenharia Civil do CEFET-
MG Campus Curvelo como ferramenta para a educação patrimonial. Através de visitas técnicas
orientadas, o ProTour objetiva desenvolver no futuro profissional da engenharia civil o entendimento
da cidade e seu valor histórico e cultural, relacionado à apropriação efetiva dos espaços pela
comunidade. Busca-se ainda estabelecer a cidade como território vivo nos processos educativos e
que esta ação seja continuada nas práticas de ensino. Através do debate de diversos conceitos
ligados à construção civil, é possível compreender diversos âmbitos da evolução da população.
Assim, por meio desse entendimento, pretende-se ofertar aulas de reforço escolar nas áreas de
história e literatura para alunos dos anos finais do ensino fundamental e médio, com vistas a prepara-
los para processos seletivos em destaque os processos para ingresso nos cursos técnicos ofertados
no CEFET-MG. Para maior vínculo com a sociedade, pretende-se realizar também uma mostra aberta
à comunidade, em uma edificação de destaque cultural e patrimonial no município, com os materiais
resultantes das visitas já realizadas. Desta forma, espera-se que as ações de Educação Patrimonial
atraiam o interesse da população para que esta possa se envolver e reconhecer sua identidade
perante os bens culturais do município de Curvelo/MG.

Palavras-chave: Educação Patrimonial; Engenharia Civil; ProTour.

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IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


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EDUCAÇÃO PATRIMONIAL ATRAVÉS DA EXTENSÃO
UNIVERSITÁRIA NA ENGENHARIA CIVIL: Um estudo de caso em
Curvelo/MG.

Introdução

São atribuições do profissional de engenharia civil, dentre outras, o estudo, a consultoria, a


orientação técnica e o ensino. O engenheiro utiliza estas competências para encontrar
soluções de problemas complexos. Entretanto, para tal, não se requer do profissional
apenas habilidades analíticas, mas também sensibilidade para observação das pessoas e
questões múltiplas da sociedade, além de conservar uma visão vasta e conjunta de um
assunto, integrar as preocupações heterogêneas, saber explicar e convencer tornando-se,
então, gestor e técnico (CONFEA, 1973).

Neto (2011) afirma que o conhecimento adquirido pelos profissionais da engenharia deve
ser direcionado não apenas para a solução de problemas relacionados ao ambiente
construído, deve considerar a população atendida visando o desenvolvimento social e
melhoria de condição de vida da mesma. Ele defende que a sociedade precisa de maior
envolvimento do engenheiro e da universidade em assuntos comunitários, com respeito às
individualidades de cada comunidade.

Nesse sentido, o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas


Brasileiras, realizado em 1987, definiu o conceito de extensão universitária como processo
educativo, cultural e científico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e
viabiliza a relação transformadora entre a universidade e a sociedade.

Através da extensão universitária é possível criar espaços de discussão interdisciplinar que


proporcionem uma formação humana consolidada, ao aproximar o estudante de
comunidades com diferentes contextos sociais e econômicos. Concomitante a isso é
possível a aproximação de conteúdos teóricos importantes à formação do profissional, que
adquirem significado ao serem estudados de forma aplicada, em contextos reais. No que diz
respeito à engenharia civil uma das possibilidades para a prática da extensão universitária é
a educação patrimonial.

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) define, em sua cartilha


“Patrimônio Histórico: Histórico, conceitos e processos”, o conceito de Educação Patrimonial
como processo permanente e sistemático, e que tem como objeto de conhecimento
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individual o patrimônio cultural (IPHAN, 2014).

Segundo Horta (1999), a educação patrimonial pode ser aplicada à material ou


manifestação cultural, por meio de bens naturais, históricos ou arqueológicos; comunidade
de determinada área e a manifestações populares, estas sejam por intermédio de processos
de produção, tecnologias e/ou saberes de um povo.

Para Grunberg (2007), os processos educativos que constituem a educação patrimonial são
recursos para compreensão histórica e social, e contribui para o reconhecimento,
valorização e preservação do bem cultura. Para tal, nos últimos anos diversas iniciativas
educacionais com metodologias e objetivos pedagógicos distintos foram iniciadas. Grunberg
defende que experiências educativas são mais efetivas se integradas às demais dimensões
da vida das pessoas, e se façam percebidas nas práticas diárias. Para ela, a educação
patrimonial não deve apenas preservar lugares, edificações e objetos pelo seu valor em si,
mas associar os bens culturais a vida cotidiana, para a compreensão dos espaços
territoriais, o que fortalece o vínculo das comunidades com seu patrimônio.

Este trabalho apresenta o relato de uma experiência de extensão universitária vinculada à


graduação em Engenharia Civil do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas
Gerais (CEFET-MG), unidade Curvelo, intitulada ProTour – visitas técnicas orientadas.
Através de atividades de educação patrimonial são discutidos, no contexto da construção
civil, os conceitos de sustentabilidade ambiental, cultural, social e econômica, a importância
da herança cultural na construção das cidades atuais, a função da continuidade do uso
como estratégia de manutenção das edificações, as certificações ambientais e valorização
do patrimônio arquitetônico e, principalmente, a função do engenheiro civil em todo este
contexto.

Objetivo

Através de visitas técnicas orientadas, o ProTour objetiva desenvolver no futuro profissional


da engenharia civil o entendimento da cidade e seu valor histórico e cultural, relacionado à
apropriação efetiva dos espaços pela comunidade. Busca-se ainda estabelecer a cidade
como território vivo nos processos educativos e que esta ação seja continuada nas práticas
de ensino.

Metodologia

Segundo Bulgraen (2010, pg.2), o docente deve atuar como mediador entre o estudante e o
conhecimento, e deve incentivar o desenvolvimento do raciocínio autônomo e questionador,
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para que o aluno não seja apenas um receptor passivo de informações e assuma um papel
central no processo de aprendizagem.

Para Santos (2001, pg.3), ao atuar como protagonista em técnicas de aprendizagem ativas,
o aluno passa a ser o agente do aprendizado, e o professor atua como orientador e
facilitador do processo. Dessa forma, devem-se respeitar as individualidades e a
aprendizagem precisa ser significativa para o estudante.

Nos procedimentos educativos a cidade aparece como território vivo, constantemente em


interação com seus habitantes. No entendimento do patrimônio histórico os espaços
territoriais são passíveis de leitura e interpretações. As ações educacionais serão mais
efetivas se estiverem ligadas ao cotidiano e as diversas dimensões da vida das pessoas
(MOTTA, 2009 apud HORTA, 1999, pg.).

Neste contexto, a metodologia adotada envolve três etapas: ações anteriores, durante e
pós-visita. Os alunos conduzem todo o processo, desde a escolha da cidade até as ações
de apropriação do conhecimento posteriores à visita.

Na primeira etapa é selecionada a cidade a ser visitada e o roteiro a ser percorrido. As


edificações a serem visitadas são estudadas em relação ao estilo arquitetônico, sistema
construtivo e características sustentáveis, gerando um guia educativo para a visita. Estes
estudos contribuem também para o conhecimento acerca da evolução histórica, geográfica,
linguística e literária no Brasil.

A segunda etapa ocorre durante a visita durante a qual são realizadas atividades de
educação patrimonial unindo ações de observação, registro, exploração e apropriação. O
eixo central de organização conceitual das visitas parte da disciplina projeto arquitetônico,
com ações interdisciplinares, como por exemplo, com a disciplina Inglês Instrumental, que
envolvem a escrita e a comunicação oral, permitindo o aprendizado e reprodução de termos
técnicos em língua estrangeira, debatidos anteriormente em português durante as
atividades.

Na ultima etapa, posterior à visita, são produzidas na instituição mostras de fotografias,


vídeos e/ou cartões postais como estratégia de apropriação criativa do conhecimento.

Na busca do reconhecimento dos conhecimentos adquiridos e desenvolvimento da


característica do futuro quanto a consultoria e ensino, pretende-se realizar uma mostra
aberta à comunidade, em uma edificação de destaque cultural e patrimonial no município,
com os materiais resultantes das visitas já realizadas, baseadas nas orientações do Manual
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de Atividades Práticas de Educação Patrimonial, de publicação do IPHAN, que une ações
de observação, registro, exploração e apropriação. Os materiais a serem apresentados
contemplam croquis a mão livre, que apresentam a visão em perspectiva de bens culturais;
cartões postais, com fotografias e opiniões de usuários dos espaços; propostas de
intervenção em espaços estruturados, que contribuem para a apropriação e debate quanto à
importância da preservação de bens tombados, entre outros. Os materiais apresentam
resultados das ações de educação patrimonial realizadas nos municípios de Ouro Preto e
Belo Horizonte, em Minas Gerais e de São Paulo, capital, visitados anteriormente. Pretende-
se também realizar, durante a exposição, atividades de educação patrimonial que
resultaram nos materiais a serem divulgados, porém nessa oportunidade com a população e
com bens do município de Curvelo/MG.

Devido aos conhecimentos acerca da evolução da população em seus variados âmbitos


obtidos durante os estudos para a realização das visitas, pretende-se ofertar aulas de
reforço escolar nas áreas de história e literatura para alunos dos anos finais do ensino
fundamental e médio, com vistas a prepara-los para processos seletivos, em destaque os
processos para ingresso nos cursos técnicos ofertados no CEFET-MG Campus Curvelo –
Edificações, Eletrotécnica e Meio Ambiente -, bem como para a graduação em Engenharia
Civil. Desta forma, os estudantes poderão vivenciar a experiencia de docência.

O projeto cultural ProTour

O ProTour realizou duas visitas à Ouro Preto-MG, duas à Belo Horizonte - MG, uma à São
Paulo-SP e uma à Diamantina-MG, descritas a seguir:

Primeira visita à cidade de Ouro Preto

Esta primeira visita foi realizada no âmbito da disciplina de projeto arquitetônico, no curso de
Engenharia civil. Uma das alunas da turma realizou de forma espontânea uma pesquisa
sobre alguns pontos turísticos da cidade de Ouro Preto levando para discussão em sala 20
edificações que poderiam fazer parte do roteiro da visita técnica.

As edificações foram divididas entre os grupos e foi proposta a confecção de uma Guia
turístico, que trouxesse informações gerais da cidade, de cada uma das edificações e,
principalmente, os estilos arquitetônicos e suas características. Em um formato que
estimulasse o leitor a visitar a cidade.

Dentre os Guias confeccionados foi escolhido aquele que cumpriu melhor as solicitações de
conteúdo e forma. Foi definido o roteiro atendendo a exigências relacionadas ao tempo da
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visita. Para que fosse possível realizar as atividades propostas em cada etapa da
metodologia as edificações precisariam estar próximas fisicamente possibilitando o
deslocamento rápido entre elas. Foram escolhidas sete edificações e quatro atividades
propostas no Manual de Atividades Práticas de Educação Patrimonial, a serem realizadas
nas edificações ou no percurso entre elas. O Guia foi adaptado com as edificações do
roteiro e impresso para ser utilizado no dia da visita.

Na aula imediatamente anterior à visita os alunos assistiram a uma palestra ministrada pela
professora de história do CEFET-MG, Campus Curvelo, com o tema “Cidades Barrocas”. As
edificações a serem visitadas foram analisadas na palestra e situadas no contexto histórico
da cidade.

Foram visitados o Museu da Inconfidência, as Igrejas Nossa Senhora do Carmo – São


Francisco de Assis – Nossa Senhora da Conceição de Antônio Dias (com atividades nos
percursos entre elas), Palácio dos Governadores, Casa dos Contos e o Chafariz dos
Contos.

No início das atividades foi lançado um concurso de fotografias. Em cada atividade


desenvolvida e local visitado os alunos deveriam fazer um registro fotográfico que
representasse qual foi a sua impressão e aprendizado. As equipes deveriam selecionar uma
foto em cada uma das atividades que iria concorrer como a melhor foto da visita. Através do
concurso de fotografias foi aplicada a etapa apropriação.

Ao final foi aplicada entre os alunos uma pesquisa feedback com o objetivo de aferir os
resultados alcançados e melhorar ações futuras.

Como atividade posterior a visita foi realizado um concurso fotográfico. A FIG. 1 mostra o
primeiro e segundo lugares do concurso respectivamente.

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(a) Primeiro lugar (b) Segundo lugar

Figura 1 – Primeiros colocados no concurso fotográfico.

Fonte: do Autor.

Segunda visita à cidade de Ouro Preto

A segunda visita foi organizada pela equipe do projeto cultural ProTour. No entanto, a
escolha da cidade partiu da turma de participantes da visita. O roteiro definido permaneceu
o mesmo da primeira visita. As atividades anteriores contemplaram a pesquisa sobre o estilo
arquitetônico das edificações a serem visitadas e das técnicas construtivas do período
colonial.

Durante a visita a dinâmica adotada foi intitulada “aluno guia”. A partir da pesquisa prévia
realizada os alunos, durante a visita, atuaram como guias dando informações históricas das
edificações, explicando e demonstrando as características dos estilos arquitetônicos e
apresentando a técnicas construtivas adotadas. No decorrer das atividades as informações
foram complementadas tanto pela professora orientadora do projeto como pelos alunos
parte da equipe organizadora.

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Como atividade de apropriação foi proposta a criação de cartões postais dos locais
visitados. A FIG. 2 apresenta um dos cartões postais entregues:

a) Frente (b) Verso

Figura 2 – Cartão Postal do Museu da Inconfidência – Ouro Preto/MG.

Fonte: do Autor.

Visita à cidade de Belo Horizonte

Para esta visita a equipe do projeto definiu como eixo orientador as obras do arquiteto Oscar
Niemeyer e, portanto, a produção do período moderno na capital mineira. Foram visitadas
edificações de outros períodos, mas o principal destaque foi dado à produção modernista.

Como atividade prévia os alunos participantes realizaram pesquisas sobre algumas


edificações da cidade. Foram elaborados guias educativos e os mesmos foram
apresentados em sala de aula para discussão entre todos os participantes. Nesta pesquisa
foram incluídas edificações que não compuseram o roteiro por questões de logística de
transporte e tempo da visita.

A visita iniciou no conjunto arquitetônico da Pampulha que a época concorria ao título de


Patrimônio Cultural da Humanidade. Foram visitadas a Casa do baile, a Igreja da Pampulha
e a Casa do Juscelino Kubistchek, sendo que, nesta última, foi realizada uma visita
educativa guiada pela equipe do espaço cultural. Foi realizada também a observação
externa do Mineirão.

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A segunda parte da visita contemplou o Edifício Niemeyer e a Biblioteca Pública Estadual
Luiz de Bessa, no Circuito Cultural da Praça da Liberdade. Neste local também foram
visitadas edificações de outros períodos da arquitetura: o Centro Cultural do Banco do Brasil
e o M M Gerdau - Museu das Minas e do Metal, por escolha dos alunos. Além disso,
realizou-se observação externa das demais edificações que compõe o circuito: Arquivo
Público Mineiro, Casa Fiat de Cultura, Cefart Liberdade, Centro de Arte Popular – Cemig,
Espaço do Conhecimento UFMG, Horizonte Sebrae – Casa de Economia Criativa, Memorial
Minas Gerais Vale, Museu Mineiro, Palácio da Liberdade e a Praça da Liberdade.

Como atividade de apropriação foi proposta a criação de cartões postais dos locais
visitados. A FIG. 3 apresenta um dos cartões postais entregues:

Figura 3 – Cartão Postal da Casa do Baile – Belo Horizonte/MG.

Fonte: do Autor.

Visita à cidade de São Paulo

O motivador inicial para visita a São Paulo foi conhecer a Mostra Casa Brasileira, no espaço
Caixa Cultural São Paulo. A mostra reuniu mais de 60 obras, algumas inéditas, entre
croquis, plantas, fotografias e ilustrações sobre o jeito brasileiro de morar – as moradias
indígenas, os imensos casarões rurais, as casas térreas iluminadas, os sobrados urbanos e
os edifícios de apartamentos. Apresentando grandes nomes da arquitetura e engenharia,
teve como objetivo explorar as múltiplas experiências do morar e suas peculiaridades no
que diz respeito ao uso dos materiais, referências estéticas e organização dos espaços,
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trazendo a percepção das renovações e das permanências que traduzem a evolução dos
modos de vida e dos valores ao longo dos séculos.

A partir da Mostra foram visitadas outras edificações de períodos distintos na história da


arquitetura: Catedral da Sé, Mosteiro São Bento e a Pinacoteca, sendo discutidos os estilos
arquitetônicos e sistemas construtivos adotados. Foi visitado no percurso o metrô de São
Paulo, como um exemplar de obra de infraestrutura de grande porte. Foram observadas a
Estação da Sé e a Estação da Luz.

O destaque da visita aconteceu nas obras do estilo moderno, da arquiteta Lina Bo Bardi: A
Casa de Vidro e o Museu de Arte de São Paulo (MASP). Na primeira foi realizada uma visita
educativa que apresentou a sua história pessoal e profissional, bem como as características
arquitetônicas da sua produção. Os alunos manifestaram interesse em uma segunda visita
que contemplasse, como eixo orientador, as obras de Lina Bo Bardi e de outros arquitetos
que fossem seus contemporâneos.

Por fim foram visitadas edificações contemporâneas, na Avenida Brigadeiro Faria Lima.
Uma delas foi o edifício Pátio Victor Malzoni que reúne em sua proposta arquitetônica um
vão de 40,5m de largura e 30m de altura, a preservação de uma construção histórica do
século 17, a Casa Bandeirista, e a meta de obter a certificação Leadership in Energy and
Environmental Design (LEED). Meta alcançada na classificação Core & Shell Prata.

Ainda na Avenida Brigadeiro Faria Lima foi visitado o edifício Faria Lima 3500, edificação
com pré-certificação LEED Core & Shell Gold, em processo de aprovação da certificação.
Um dos diferenciais para a obtenção da certificação é o térreo projetado sob pilotis,
pavimento no qual a proposta arquitetônica foi à integração entre o edifício e a praça pública
térrea. No entanto, durante a visita, não foi possível percorrer a praça pública conforme
planejado pela equipe organizadora da visita. Tal ação deveria ser autorizada pela gerencia
do edifício. Esta situação fomentou a discussão acerca do espaço público e privado, e suas
interseções com a construção de cidades sustentáveis.

Como atividade de apropriação foi proposta a atividade “Cartas para Lina”. Os alunos
participantes deveriam escrever uma carta simulando uma situação de reencontro com a
arquiteta Lina Bo Bardi, como se a mesma fosse uma amiga de infância. Nesta carta deveria
ser relatada a visita à cidade de São Paulo e a percepção individual dos conteúdos
estudados. A seguir é apresentado um trecho de uma das cartas elaboradas:

" Querida Lina,

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Quanto tempo hein, faz anos que não nos vemos!

Me recordo com muita saudade daquela minha viagem a Itália quando


criança, onde meu pai estava viajando a negócios, e numa visita ao parque
nossos pais se encontraram e nos colocaram para brincar no playground. Foi
uma tarde maravilhosa, de muita diversão! Pena que depois desses 45 anos
que se passaram pudemos nos encontrar poucas vezes.

Mas me deixe atualizar a minha vida para você e te contar uma grande
surpresa que tive.

(...) Mas o que mais quero destacar foi uma visita que um amigo me indicou: a
Casa de Vidro. Só sabia que tinha sido uma arquiteta renomada que a tinha
projetado. Quando o rapaz que cuida da casa disse o nome dela, quase tive
um enfarto! Minha amiga de infância se tornou uma grande arquiteta que
marcou a história do Brasil! Fiquei contagiado pela sua história e obras, e
depois disso não pude deixar de visitar o Museu de Arte de São Paulo. E
ainda tem mais: atuei como tradutor durante a visita a sua antiga casa! :) No
hostel onde fiquei hospedado, conheci Mitch, um canadense que estava de
passagem pelo Brasil. Ele me acompanhou na visita e pudemos partilhar um
pouco de nossas culturas. Foi tudo fantástico!".

A partir da visita a São Paulo o ProTour, através da participação do professor de língua


inglesa da instituição e de alunos que possuem fluência na língua, passou a incluir
atividades que visem o desenvolvimento do idioma por todos os alunos envolvidos.

Visita à cidade de Diamantina

A visita à cidade de Diamantina foi a primeira do projeto voltada aos alunos do ensino médio
profissionalizante. A equipe organizadora definiu o roteiro com vistas a discutir o estilo
arquitetônico, a história da cidade e a realização de atividades relacionadas ao desenho
artístico de observação e o desenho técnico de vistas ortogonais.

A atividade anterior à visita foi a leitura do texto “Oscar Niemeyer: Escola pública,
Diamantina. Joia modernista incrustada em território barroco”, de autoria de Adilson
Melendez, publicado na revista Projeto Design.

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Durante a visita os alunos participantes, organizados em grupos, deveriam: fotografar a vista
frontal da edificação visitada, fazer o desenho de observação desta mesma fachada,
escrever um parágrafo que traduzisse a opinião de um morador entrevistado sobre a
importância da edificação para a cidade nos dias atuais e escrever um parágrafo que
traduzisse a opinião do grupo sobre a mesma questão.

O roteiro contemplou visita ao Museu Casa Juscelino Kubitscheck, Hotel do Tijuco, Catedral
Metropolitana de Santo Antônio, Largo da Quitanda, Mercado Municipal, Largo do Rosário,
Casa Chica da Silva e Escola Estadual Professora Júlia Kubitscheck. Junto a atividade pré-
visita foi disponibilizado aos alunos participantes textos educativos sobre cada local a ser
visitado.

Posteriormente a visita os grupos deveriam elaborar um PopCard para cada uma das
edificações visitadas, com todas as informações coletadas durante a visita. A FIG. 4
apresenta um dos PopCards entregues:

Figura 4 – Cartão Postal da Casa JK – Diamantina/MG.

Fonte: do Autor.

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Segunda visita à cidade de Belo Horizonte

Na segunda visita, a equipe do projeto definiu o Modernismo como temática a ser tratada, e
assim como na primeira visita à cidade, as obras do arquiteto Oscar Niemeyer foram
colocadas em foco. Para complemento da temática e estudo da Arquitetura Contemporânea,
foi realizada uma visita guiada ao estádio Governador Magalhães Pinto, conhecido como
Mineirão. Nesta, foram destacadas, além da estrutura, com as técnicas construtivas
utilizadas, os desafios e atitudes sustentáveis tomadas na reforma do estádio que
possibilitaram a obtenção do selo Leed Platinum, selo ofertado pelo Green Building Council
que representa que a edificação possui requisitos que a tornem diferenciadas quanto à
sustentabilidade perante as demais.

Anterior realização da visita, os alunos do projeto realizaram pesquisas sobre o


modernismo, estilo arquitetônico das edificações que compõe o Conjunto arquitetônico da
Pampulha. Formado pelo Cassino, hoje Museu de Arte da Pampulha, a Casa do Baile
transformada em Centro de Referência de Urbanismo, Arquitetura e do Design, a Igreja São
Francisco de Assis e o Iate Tênis Clube, o Conjunto foi reconhecido, em julho de 2016,
como Patrimônio Cultural da Humanidade.

Nesta visita, foram tratados também os conceitos de engenharia simultânea e


compatibilização de projetos. A compatibilização de projetos tem por finalidade minimizar os
conflitos existentes, para que a execução seja simplificada e otimizada. Através da reunião
de resultados parciais de um determinado produto ou projeto, busca-se avaliar se eles estão
compatíveis para o que fora solicitado.

Através deste conceito, foi proposta a Gincana “Desvendando Curvas”. Os participantes da


visita técnica foram subdivididos em quatro grupos. Um dos alunos de cada grupo ficou
responsável pela distribuição das atividades, este aluno foi denominado “compatibilizador”.
Posterior à visita foi realizado um debate e análise das atividades realizadas. O
compatibilizador analisou a necessidade de melhorias nos produtos obtidos para melhor
resultado final.

As seguir são descritas as atividades desenvolvidas pelos alunos de cada grupo e as


orientações que foram passadas para o desenvolvimento das mesmas:

 Croquis de guardanapo: Deve-se escolher uma das edificações a serem visitadas e


se situar em um local cuja paisagem, que inclua a edificação, permita um esboço
frontal da mesma. Desenhar com caneta preta em um guardanapo esse edifício ou

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paisagem. Deve-se fotografar a execução do desenho, a perspectiva do
edifício/paisagem por qual o desenhista se espelhou e do guardanapo com o
desenho finalizado.

 Observação e desenho: Um dos membros do grupo deverá, após visita no espaço,


desenhar um croqui com o máximo de detalhes construtivos possíveis (Portas,
Janelas).

 Apropriação de espaço: No papel de um engenheiro contratado pela Prefeitura de


Belo Horizonte, o participante deverá vistoriar uma das edificações e propor
modificações em seus espaços.

 Controle de Equipe de Projeto: O compatibilizador deverá fotografar as atividades


sendo realizadas e gerenciar a equipe para o melhor resultado possível.

Essas atividades foram realizadas pelos grupos no Museu de Arte da Pampulha e na Casa
Kubistchek.

Na segunda etapa, durante a visita ao Mineirão, foi trabalhado o conceito de engenharia


simultânea:

"Engenharia Simultânea é uma abordagem sistemática para o


desenvolvimento integrado de produtos que enfatiza o atendimento
das expectativas dos clientes. Inclui valores de trabalho em equipe,
tais como cooperação, confiança e compartilhamento, de forma que
as decisões sejam tomadas, no início do processo, em grandes
intervalos de trabalho paralelo incluindo todas as perspectivas do
ciclo de vida, sincronizadas com pequenas modificações para
produzir consenso" (ASHLEY, 1992 apud PRASAD, 1996).

Foi entregue uma planta baixa da esplanada do Mineirão, em escala reduzida. Os contextos
apresentados aos grupos foram críticas realizadas após a reforma do estádio devido à
quantidade de árvores retiradas para a construção da esplanada e o baixo aproveitamento
da mesma, tendo grande fluxo de pedestres apenas em dias de eventos. Considerando o
potencial econômico da área, com presença de atividades comerciais como setores de
alimentação, deveria ser proposto um projeto de intervenção para melhor utilização do
espaço, que não provoque prejuízos aos objetivos principais, seja seguro e tenha baixo
custo de instalação.

Por fim, foi debatido entre os alunos qual dos dois conceitos é melhor na prática: a
compatibilização de projetos ou a engenharia simultânea.

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Conduzida pelo docente da disciplina Inglês instrumental foi desenvolvida uma atividade
relacionada à língua Inglesa. Cada grupo deveria apresentar de forma oral, aos demais
presentes na visita um resumo em inglês sobre aspectos gerais e técnicos observados nos
locais.

Verificou-se que esta visita obteve os melhores resultados considerando a participação dos
alunos, debate de conceitos relacionados à engenharia civil e a aplicação da
interdisciplinaridade nas atividades, demonstrando a apropriação dos alunos organizadores,
voluntários no projeto de extensão ProTour, dos conceitos e da metodologia proposta.

Atividades a serem realizadas

O projeto prevê ações de educação patrimonial que relacionem os produtos obtidos nas
visitas e o conhecimento adquirido pelos alunos envolvidos com a população do município
de Curvelo. Nestas atividades pretende-se trazer para dimensão local os conceitos
discutidos em outras cidades e exemplificar a importância do patrimônio cultural para o
desenvolvimento sustentável e, desta forma, contribuir para uma valorização do patrimônio
cultural do município.

Esta prevista a realização de uma mostra no Museu da Estação, localizado na principal


praça do município de Curvelo, na qual serão expostos os materiais produzidos durante as
visitas. Será realizada uma parceria com um projeto de educação patrimonial realizado por
uma escola pública municipal. A proposta é que a mostra seja realizada no mês de
setembro do ano de 2017. Anteriormente a exposição no Museu da Estação, será
desenvolvida uma atividade de educação patrimonial com alunos de uma escola rural de
Curvelo e os materiais produzidos por eles também serão objetos de exposição da referida
Mostra.

Também pretende-se ofertar à alunos dos anos finais do ensino fundamental e médio aulas
de reforço nas áreas de história e literatura, com ensinamento dos conhecimentos obtidos
durante as visitas acerca da evolução da população. Tal ação objetiva a preparação destes
à processos seletivos, em destaque para os cursos ofertados no CEFET-MG Campus
Curvelo. Desta forma, os estudantes vinculados ao projeto poderão vivenciar também a
experiencia de docência.

Considerações finais

A seguir, são apresentadas algumas considerações finais da experiência aqui relatada:

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 A educação patrimonial é ação fundamental para a formação de Engenheiros Civis
conscientes do seu papel como agente transformador das cidades.

 A proposta metodológica do projeto cultural ProTour se mostra eficiente na medida


em que reconhece o aluno como principal agente na construção do conhecimento.
Seja através da organização das visitas ou da participação nas atividades anteriores,
durante e posteriores à visita, o aluno relaciona seus conhecimentos prévios aos
adquiridos e desta forma constrói de forma ativa e duradoura o conhecimento.

 Através das visitas é possível trabalhar diferentes conteúdos teóricos e garantir que a
abordagem gere significado ao aluno. Pode-se ainda promover maior proximidade
entre aluno e professor, a cooperação entre alunos, feedback imediato, maior
domínio em relação ao tempo de execução de uma tarefa e o respeito aos diferentes
talentos e formas de aprendizagem.

 É possível verificar grande comprometimento dos alunos com o conteúdo estudado.


O ensino se torna dinâmico e é absorvido de forma mais consistente, contribuindo
para um aprendizado eficiente.

Além disso, são resultados esperados para as ações a serem desenvolvidas com a
comunidade de Curvelo:

 Espera-se que as ações de Educação Patrimonial atraiam o interesse da população


para que esta possa se envolver e reconhecer sua identidade perante os bens
culturais do município de Curvelo/MG;

 Deseja-se que as ações realizadas nas escolas do município motivem as crianças e


jovens incentivando o ingresso destes no CEFET-MG, contribuindo para o
desenvolvimento escolar do município;

 Espera-se que, com a exposição para a comunidade, o projeto seja reconhecido, a


fim de formalizar parcerias que possibilitem o prosseguimento do projeto;

 Por fim, espera-se sensibilizar alunos do CEFET-MG e comunidade do município de


Curvelo para importância da preservação do patrimônio cultural para construção de
cidades mais sustentáveis.

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Referências:

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SANTOS, S. C. O Processo de ensino-aprendizagem e a relação professor-aluno: aplicação


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Pesquisas em Administração, São Paulo, v. 08, p. 69-82, 2001.

Universidade Federal de Alagoas. O que é extensão? Disponível em:


<www.ufal.edu.br/estudante/extensao/o-que-e-extensao>. Acesso em: 31 mai. 2017.

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL, O OLHAR DO OUTRO COMO
PERSPECTIVA FUNDAMENTAL NA CONSTRUÇÃO DE SABERES

SANTIAGO, SAMUEL JOSÉ (1); AZEVEDO, FLÁVIA LEMOS (2); FERREIRA,


JOSÉ HELENO (3).

1. Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Divinópolis.


Rua Buenos Aires, 690 - Sagrada Família - Divinópolis - MG
samueljsantiago@hotmail.com

2. Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Divinópolis.


Rua Paraná, 3001 - Jardim Belvedere - Divinópolis- MG
flavia.azevedo@uemg.br

3. Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Divinópolis.


Rua Paraná, 3001 - Jardim Belvedere - Divinópolis- MG
jose.ferreira@uemg.br

RESUMO

O presente artigo trata da relevância do reconhecimento e valorização do patrimônio cultural na construção de


cidadãos conscientes de suas referências e potencialidades culturais. Para isso, abordaremos a Educação
Patrimonial enquanto mediadora desse conhecimento que capacita a autonomia e criticidade do indivíduo em sua
relação particular e subjetiva diante das diversas manifestações culturais em seu entorno, destacando a
necessidade de apropriação desses bens construídos coletivamente no sentido de estimular o engajamento
identitário e preservacionista. Trataremos também da experiência com oficinas de Educação Patrimonial
realizadas no Centro de Memória Professora Batistina Corgozinho UEMG – Unidade Divinópolis (CEMUD),
ressaltando a importância da democratização de espaços que proponham essas práticas pedagógicas, e
apresentaremos um pouco de sua metodologia, objetivos e resultados parciais.

Palavras-chave: Patrimônio; Educação Patrimonial; Cultura; Educação.


INTRODUÇÃO – Oficinas de Educação Patrimonial do CEMUD:
Este trabalho relata a experiência que o Centro de Memória Prof. Batistina Corgozinho
(CEMUD) da UEMG – Divinópolis vem adquirindo em suas oficias de Ed. Patrimonial. O
reconhecimento e valorização do patrimônio cultural na construção de cidadãos conscientes de suas
referências e potencialidades culturais se faz necessário quando pensamos na salvaguarda e
perpetuação do patrimônio. Nesse sentido, a Educação Patrimonial é mediadora desse conhecimento
que capacita a autonomia e criticidade do indivíduo em sua relação particular e subjetiva diante das
diversas manifestações culturais em seu entorno, destacando a necessidade de apropriação desses bens
construídos coletivamente e estimulando o engajamento identitário e preservacionista. Quando a
escola, o museu ou um centro de memória entende a necessidade de construir políticas de salvaguarda
do patrimônio, as oficinas são uma excelente ferramenta que fomenta uma consciência da importância
de tal reconhecimento.

Ao realizarmos oficinas de Ed. Patrimonial, temos o privilégio de conhecer indivíduos dos


mais diversos lugares e entender na simplicidade de cada olhar, um patrimônio que de fato ultrapassa a
intelectualidade dos livros de tombamento e registro. Auxiliar o outro a perceber que sua prática de
vida conta e constrói um patrimônio que se registra e realiza no cotidiano representa um apontamento
que cumpre o papel de auxiliar na perpetuação natural do patrimônio na vida de cada um. A educação
patrimonial vem sendo defendida como uma importante prática pedagógica a ser empregada nos mais
diversos espaços de sociabilização e educação relativas à preservação do patrimônio em conjunto de
ações multidisciplinares. Entendendo a importância dessa temática, no Centro de Memória Professora
Batistina Corgozinho UEMG – Unidade Divinópolis (CEMUD), reconhecido como Ponto de Memória
pelo Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), vem realizando as oficinas desde 2014, atingindo a
marca de 1988 estudantes alcançados e têm como principal objetivo a sensibilização dos estudantes
sobre a importância da preservação do patrimônio histórico, social, político, econômico e cultural do
centro-oeste mineiro e contam com toda uma metodologia que fundamente esta proposição. Neste
artigo buscaremos elucidar sobre a questão patrimonial ressaltando a relevância das práticas
educacionais neste campo e apresentaremos um breve panorama das oficinas realizadas no CEMUD.

Procurando apontar referências de práticas culturais relevantes para que esses sujeitos se
sintam produtores de cultura e para que se apropriem de suas heranças culturais, as oficinas de
educação patrimonial buscam também a valorização de suas experiências e vivências no cotidiano de
suas comunidades. As atividades são pensadas com o propósito de mostrar a esse indivíduo que no
cotidiano de sua comunidade, de sua escola, de sua cidade e região ocorrem a todo momento
manifestações culturais que representam a história e memória de pessoas comuns. Neste sentido, todo
o arcabouço cultural já apropriado pelos estudantes em sua dia-a-dia é somado ao material do

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CEMUD que conta com mais de 60 mil documentos relativos à história do centro-oeste mineiro e se
encontra disponível para toda a comunidade seja no espaço físico do Centro de Memória ou em seu
portal virtual Em Redes (www.emredes.org.br). Outro fator importante desse trabalho, é o de
integração entre memória e educação que assim promove o acesso a esses documentos ao mesmo
tempo em que incentiva novas produções culturais, e a construção mútua de reconhecimento e
valorização da história e da cultura regional entre esses estudantes, professores e a sociedade como um
todo.

Para realização das oficinas de educação patrimonial é feito um treinamento com discentes
voluntários de várias áreas de graduação da UEMG – Unidade Divinópolis, para que possam
desenvolver e aplicar as ações extensionistas. A educação acadêmica neste momento também é
pensada além dos muros da universidade, fazendo uma integração entre comunidade, alunos e
professores, e essa participação estudantil multidisciplinar também se mostra muito positiva para
ampliar as possibilidades de alcance do debate patrimonial, pois promove o compartilhamento do
conhecimento e a comunhão de saberes nessas respectivas áreas de atuação. Toda essa preparação é
adequada à recepção do público alvo composto por estudantes do ensino fundamental e médio das
escolas públicas da região, que são convidadas pelo Centro de Memória ou que nos procuram
espontaneamente.

As oficinas trazem um cronograma de apresentações sobre patrimônio que estão na seguinte


ordem: Apresentação do tema com auxílio de slides, exposição de fotos do acervo do CEMUD no
“Varal da Memória”, confecção dos mapas de percepção e confecção de bilhetes para a “Árvore do
Patrimônio” – ao fim deste artigo apresentaremos a concepção e alguns resultados das dinâmicas dos
mapas e da Árvore. O primeiro momento de exposição consiste na conceituação de patrimônio,
cultura, identidade, e as especificações de patrimônio material e imaterial. A partir disso, a
apresentação de fotos vem no auxílio aos estudantes na apropriação da memória local, e as dinâmicas
práticas dos mapas de percepção e da Árvore de Patrimônio promovem a atuação dos participantes
enquanto produtores e reprodutores de cultura. Depois de realizadas as atividades apresentamos o
portal Em Redes como ferramenta de pesquisa permanente sobre a história e memória do centro-oeste
mineiro. Toda a oficina tem duração média de 2 horas.

Perceber a compreensão do tema pelos estudantes através de suas próprias produções nos dá a
sensação de que o objetivo das oficinas patrimoniais foi atingido; com o encerramento das atividades
fazemos o arquivamento de todo material produzido, o que nos possibilita fazer essa avaliação
positiva. A transmissão de conhecimento se dá de forma tão rica que é recíproca para ambas as partes
envolvidas, e neste artigo buscaremos compartilhar essa nossa experiência ressaltando a relevância da
educação patrimonial para educadores, educandos e toda a sociedade.

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O patrimônio enquanto construção coletiva

Quando falamos de patrimônio cultural, a ideia inicial que se têm, perpassa por um caminho
construído pela história e tradição, onde apenas monumentos, e objetos doravindos de uma elite possui
significação cultural para a maioria. Ao ensinarmos as dimensões do patrimônio, é necessário
exercitar uma prática onde a cultura comunitária de cada indivíduo, seja o ponto de partida para a
educação, que deve ser muito mais construção coletiva de um saber, que propriamente um conjunto de
teorias verbalizadas por um interlocutor que por uma razão ou outra possui um arcabouço teórico
sobre o tema. As heranças preconceituosas são sem dúvidas um dos principais desafios no que tange o
reconhecimento do patrimônio cultural.

Uma das principais características do ser humano é se realizar enquanto pessoa ao entorno de
uma comunidade de iguais, e nesse sentido, o reconhecimento dessa comunidade como parte da
história individual deve preceder do entendimento teórico das diversas faces do patrimônio. Os atores
sociais devem participar ativamente na identificação do seu patrimônio, que sempre se dá e se constrói
de forma coletiva, na história compartilhada onde indivíduos de um mesmo grupo se identificam
diante daqueles elementos nos quais se faz sua cultura.

Quando se pensa na realização de oficinas de educação patrimonial, é necessário antes de tudo


buscar entender o outro como sujeito cultural, construtor e perpetuador do patrimônio. Por mais
adversas que sejam as realidades de cada um, é identidade do ser humano a cultura. Nesse sentido, é
necessário desenvolvermos um olhar apurado sobre o outro, onde a história construída por ele se torne
norte na realização de toda e qualquer intervenção acerca do patrimônio.

É inerente à cultura ocidental ressaltar e privilegiar a história das grandes elites, que por sua
vez construíram grandes monumentos arquitetônicos e ditaram uma cultura vertical. Porém, quando
pensamos no todo do patrimônio cultural, seria injusto não ressaltar as inúmeras manifestações
artísticas, religiosas e celebrativas existentes no seio das mais diversas comunidades, que possuem
inúmeros saberes e muitas vezes não são entendidas como protagonistas na construção do que é
considerado por elas patrimônio.

A cultura se forja no contexto humano, e minimiza-la a determinados grupos provoca uma


espécie de crise identitária no reconhecimento da atuação do homem. Dentre os elementos que
constroem a cultura de uma comunidade, está dentre eles seu patrimônio, e possuirmos um olhar
sensível e comprometido para com o outro é critério fundamental para auxiliá-lo a entender que seus
saberes são dotados de importância e merecem ser resguardados.

As oficinas devem nesse sentido, levar o interlocutor a entender a importância do patrimônio


de uma maneira onde a matéria não supere o saber, onde a valorização do objeto, dos lugares e das
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celebrações não ultrapasse o entendimento que deve antes de tudo protagonizar o sujeito que dá
sentido a tais manifestações culturais. A valorização e conservação do patrimônio deve acontecer
salvaguardando primeiramente os valores e não os bens em si, clarificando assim, que o valor de um
patrimônio se da primeiramente na mensagem que ele passa. O individuo é o único responsável por
dar sentido às práticas culturais e ao patrimônio construído, sem a valorização humana quaisquer
desses não passariam de coisas e atos corriqueiros do decorrer histórico vivido.

Quando se pensa o patrimônio e nele é possível vislumbrar a mensagem que alguém quer ou
quis passar, é necessário termos em mente que aquela manifestação faz parte de uma construção
sociocultural que diz respeito à toda comunidade. Reconhecer-se como parte do coletivo que se dá o
patrimônio, é essencial para que ele seja compreendido essencialmente.

O patrimônio cultural tem importância para muita gente, não só para um indivíduo
ou uma família. Dessa maneira, o patrimônio cultural liga as pessoas. É sempre algo
coletivo: uma história compartilhada, um edifício ou lugar que todos acham
importante, uma festa que todos participam, ou qualquer outra coisa em torno da
qual muitas pessoas de um mesmo grupo se identificam. O patrimônio cultural faz
parte da vida das pessoas de uma maneira tão profunda, que algumas vezes elas não
conseguem nem mesmo dizer o quanto ele é importante e por quê. Mas caso elas o
perdessem, sentiriam sua falta. Como, por exemplo, a paisagem do lugar da infância;
o jeito de preparar uma comida; uma dança; uma música; uma brincadeira. (IPHAN,
2013, p.12)

Nesse sentido, a implantação das oficinas vem de encontro a todos os sujeitos que de uma
maneira ou outra constroem também a cultura como um todo. Levar cada indivíduo a refletir o
patrimônio e se entender como parte dele é sem dúvidas o principal papel que a oficina desempenha.
Não é tarefa em sua execução impor ou ditar um ou outro patrimônio, as oficinas são propostas
justamente num caminho contrário, que valoriza o saber do outro e constrói junto com o outro as
dimensões que precisam ser resguardadas no reconhecimento do patrimônio cultural.

Práticas educativas na Educação Patrimonial

O termo “Educação Patrimonial” citado em 1983 no “1o Seminário sobre o Uso Educacional
de Museus e Monumentos” (SIVIERO, 2015, p. 80) denota o início da preocupação em propor, por
parte das instituições de preservação do patrimônio, uma relação mais próxima da sociedade através
da construção coletiva de bens culturais utilizando-se de projetos educacionais compráticas
pedagógicas mais democráticas e plurais. Nunca houve dúvidas sobre o caráter primordial da educação
como política pública para o incentivo à preservação do patrimônio cultural, mas este modo de fazer
vem superando de forma efetiva o viés verticalizado e institucional de transmissão do
conhecimento.Atualmente, discussõessobre patrimônio levantam questões sobre essa tutela do
Estadoque emoldura certo “tipo ideal” de patrimônio e propõem a concepção de valores culturais
socialmente construídos.
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O reconhecimento sobre o campo da educação patrimonial vem se refletindo na inserção desse
conteúdo na prática escolar da educação básica, mas um grande avanço nessa questão é o
entendimento de que essas oficinas podem e devem ser ministradas nos mais diversos ambientes em
que haja comprometimento com a preservação do patrimônio cultural. Essa penetração no campo
social é o que de fato dá sentido à premissa de construção coletiva do saber, e assim o alinhamento
entre teoria e prática resulta satisfatoriamente nos princípios que entendemos como fundamentais
nessa metodologia: instigar na população o sentimento de pertencimento, identidadee cidadania, e
reforçar a autoestima coletiva destes que são legítimos produtores de cultura.

Partindo da realidade própria do indivíduo, esse sentimento de reconhecimento e preservação


se dá de forma muito mais intrínseca, abrangente e significativa, porém, no nosso trabalho com
crianças e adolescentes nos deparamos sempre com o grande desafio que é a assimilação prévia do
assunto. Já nas etapas iniciais das oficinas, quando fazemos a elucidação do objeto de estudo, essa
dificuldade se apresenta através do desinteresse ou da participação tímida dos envolvidos, exigindo de
nós professores uma orientação mais precisa, envolvente e consequentemente mais instrutiva. A partir
dessa direção mais sistemática é que captamos a gradual apreensão dos alunos e assim se dá o
desenvolvimento das atividades, nos deixando a indagação sobre qual é a razão dessa dificuldade.

O principal intuito dentro de uma oficina de Ed. Patrimonial é que os alunos compreendam em
seu entorno os bens patrimoniais presentes em seu cotidiano, mas não há como esperar que essa
compreensão seja homogênea. Devemos levar em conta fatores sociais que afetam diretamentea
realidade dessas crianças e adolescentes e que vão impulsionar ou afastar mesmo a assimilação de
conceitos simples. É neste sentido que se faz necessário o trabalho de conceituação durante a oficina,
pois além de servir como base para o desenvolvimento de toda a atividade,em muitos casos este será o
primeiro contato do estudante com o conteúdo.

Mas para além dessa ação prática, devemos pensar nessa defasagem como um problema
estrutural. Os alunos que em seu cotidiano não tem contato com manifestações culturais como a dança,
o teatro, celebrações religiosas, museus etc., são os que mais apresentarão dificuldade na absorção de
conceitos. Quando a criança e o adolescente já tem essa perspectiva cultural bem apropriada, seu
entendimento se dá exponencial e espontaneamente, ao passo que sua desenvoltura pode ser
comprometida pela não compreensão dos saberes que estão no seio de sua família, as celebrações que
são feitas em seu bairro, as formas de expressão que são produzidas em sua cidade ou os conjuntos
arquitetônicos importantes de seu município. Quais as formas de fazer com que a cultura – em seu
sentido mais abrangente e relativista – chegue a todos os lares brasileiros é uma questão que vem
sendo tratada institucionalmente em várias propostas, mas a educação patrimonial vem alertar-nos
para a cultura que não precisa ser “encontrada”, e sim que já se faz presente. Dessa forma, a

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conscientização da própria identidade se torna aparato essencial para a apreensão de conceitos e é esse
tipo de ação que devemos trazer à tona em nossas atividades.

É percebendo essa necessidade latente de nossa sociedade que a forma de se trabalhar com
patrimônio vem se aproximando das múltiplas manifestações culturais gerando um contínuo processo
de apropriação e valorização. Esse desafio portanto nos dá um retorno muito satisfatório, pois
trabalhar esse diálogo de apropriação do conhecimento de forma que o estudante se entenda como ser
criador e reprodutor de cultura, resulta no perceptível avanço dos estudantes sobre essa
compreensão.O sujeito que participa de uma oficina como esta, tem seus olhos voltados para as
subjetividades que o mundo nos apresenta, e numa relação antropofágica, ele consome o que é
produzido por outros seres humanos e se entendem comoprodutores de cultura que
serátambémreapropriada. Esse sentimento de identidade, aliado à educação enquanto mediadora é
fundamento imprescindível para a perpetuação desse saber que se desdobra em atitudes de preservação
e valorização dos patrimônios culturais.

Neste sentido, é necessário que seja feito um trabalho cuidadoso e atento as particularidades
do público alvo das oficinas, buscando ressaltar bens culturais relacionados à sua realidade. A
linguagem nessa situação possibilita a reduçãodo distanciamento cultural fomentado pela
institucionalização da preservação que segrega os bens de real significado para a sociedade,
principalmente quando se trata de pequenas comunidades.O modo como trabalhar essa comunicação
deve ser pensado do mesmo modo como em geral tratamos os bens culturais: de forma subjetiva.A
linguagem utilizada com crianças e adolescentes para a abordagem sobre patrimônio, deve ser clara e
adequada a determinado contexto, levando em conta que a própria característica da educação
patrimonial se dá muito mais com os sentidos e com as subjetividades do que por uma orientação
tecnicista e emoldurada.

É preciso que as atividades trabalhem com as diversas capacidades do aluno e que eles sintam
que a sua produção naquela atividade significa tanto quanto o conteúdo teórico da mesma. Trabalhar
educação patrimonial falando sobre celebrações, formas de expressão, lugares e não apresentar isso de
uma forma lúdica e envolvente, impede muitas vezes com que os alunos se apropriem destes
significados. Esse método também supera o conteudismo das aulas que de forma cristalizada e
disciplinatória não dialoga com a realidade e interesse dos estudantes.Usar da música, de ilustrações,
dos seus desejos individuais de preservação e do conhecimentos sobre a cultura local é, portanto,
essencial para que seja feita essa aproximação entre a realidade e os conceitos relativos ao patrimônio.
Uma vez entendidas essas relações durante a apropriação do conhecimento, a reprodução desse
conteúdo e a produção própria de saberes, fazem sentido e fluem com naturalidade.

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A democratização de espaços que se propõem a trabalhar com essa temática é essencial para
que se altere a relação passiva de reconhecimento do patrimônio causada por ritos metodológicos e
conceituais institucionalizados. Assim, ao Estado “caberia criar mecanismos de escuta apurada e
canais que possibilitem a participação da sociedade em todo o processo de preservação e salvaguarda
do seu patrimônio cultural” (SIVIERO, 2015, p. 90), e a estes lugares que podem envolver escolas,
museus, arquivos, centros de memória e de cultura, o papel de promover o empoderamento e
autonomia do cidadão produtor de bens culturais.

É preciso frisar também que todos os espaços de socialização tem em sua essência uma
potencialidade educadora e é onde pode ocorrer esse compartilhamento de saberes de forma mais
intrínseca e legítima. A educação patrimonial vem nesse sentindo evidenciar e incentivar o
entendimento sobre essas práticas, ultrapassando o viés pragmático da história e expandindo as
delimitações histórico-sociais numa eterna remodelagem cultural que permeia nossa existência em
espaços e tempos diferentes.

Mapas de percepção

Aplicar os mapas de percepção tem se tornado tarefa fundamental nas oficinas de educação
patrimonial. Levar em conta o conhecimento de cada indivíduo é caráter norteador para uma
construção coletiva e efetiva de saberes.

Por isso mesmo pensar certo coloca ao professor ou, mais amplamente, à escola, o
dever de não só respeitar os saberes com que os educandos, sobretudo os da classes
populares, chegam a ela - saberes socialmente construídos na prática comunitária -
mas também, discutir com os alunos a razão de ser de alguns desses saberes em
relação com o ensino dos conteúdos. Porque não aproveitar a experiência que tem os
alunos de viver em áreas da cidade descuidadas pelo poder público? [...] Porque não
estabelecer uma necessária "intimidade" entre os saberes curriculares fundamentais
aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos? (FREIRE, 2002,
p.16)

Quando se pensa no patrimônio histórico de uma cidade, ou nos bens tombados pelas
instituições de salvaguarda, os indivíduos são levados a perceber a relevância cultural da comunidade
a partir de uma história que não está intimamente ligada com sua trajetória de vida, assimilar o
passado e as manifestações culturais com um olhar de pertencimento não é uma atitude comum em
uma sociedade que protege e registra individualmente o seu patrimônio.

Nesse sentido, quando se introduz a dinâmica dos mapas mentais, o ouvinte é levado a se
entender como parte de um todo que é construído por seus pares, e percebe nessa construção a
interferência que ele próprio é capaz de fazer quando denota àquilo algum significado para si.

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Desenhar ou escrever mapas de percepção, torna cognoscível o patrimônio que antes era entendido
apenas na distância dos monumentos e na frieza dos ritos tradicionais.

Desvendar o mítico olhar que não entende as práticas corriqueiras como saberes dotados de
dignidade permeia a visão que se deve ter na ministração das oficinas. Conscientizar sobre o
patrimônio partindo dos saberes que cada um possuí é uma tarefa fundamental na construção
democrática do reconhecimento de práticas que por sua vez deveriam ser entendidas como parte da
riqueza cultural.

A conscientização é, neste sentido, um teste de realidade. Quanto mais


conscientização, mais se desvela a realidade, mais se penetra na essência fenomênica
do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-lo. Por esta mesma razão, a
conscientização não consiste em estar frente à realidade assumindo uma posição
falsamente intelectual. A conscientização não pode existir fora da práxis, ou melhor,
sem o ato ação-reflexão. Esta unidade dialética constitui, de maneira permanente, o
modo de ser ou de transformar o mundo que caracteriza os homens. (FREIRE, 2001,
p.30)

Aplicar os mapas de percepção e posteriormente analisa-los requer um extremo cuidado, visto


ser necessário levar em conta o contexto sociocultural dos indivíduos, entendendo que ali há possíveis
respostas para a atuação e construção de novos saberes coletivos.“Os mapas mentais são registros de
uma representação do conhecimento humano ao longo do tempo, que expressa, pela linguagem
cartográfica, suas interpretações sobre o meio que vivem” (RICHTER, 2010, P.121)

Assim sendo, passemos agora para a análise de quatro mapas mentais selecionados nas
oficinas ministradas pelo Centro de Memória Professora Batistina Corgozinho da Universidade do
Estado de Minas Gerais – Unidade Divinópolis. Tais mapas foram executados na 14ª Semana
Nacional de Museus, realizada entre os dias 16 e 20 de maio de 2016.

Análise dos Mapas de Percepção

(Estudantes do ensino médio da E. E. Santo Tomaz de Aquino, Divinópolis – MG)


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Neste mapa percebemos uma valorização de um tema muito importante ressaltado nas
oficinas, que é a paisagem cultural. Há uma mistura entre paisagem, monumento construído e saber,
que juntos dizem sobre toda uma realidade social. Facilmente identificada como uma típica
comunidade rural da região centro-oeste de Minas Gerais, este mapa apresenta uma identificação
daqueles que vivenciam esse ambiente e reconhecem nele o seu patrimônio. A religiosidade
comumente ressaltada nos diversos mapas através da representação de igrejas nos conta muito sobre o
quanto a realidade cultural de tais comunidades parte da atividade promovida por meios religiosos. A
igreja é sinônimo de encontro, partilha e celebração; é ao seu redor que se dá as manifestações
artísticas e culturais da comunidade, desempenhado ali um papel de frutificadora de saberes. Outro
fator essencial a ser notado diz sobre a realidade socioeconômica representada através do animal e do
mercado. Esses saberes e práticas que fazem a economia local girar e que movimentam
intrinsecamente toda a vida dos indivíduos relacionados, justificam fundamentalmente essas atividades
como patrimônio.

(Estudantes do ensino fundamental da E. E. São Vicente de Paula, Divinópolis - MG)

Este mapa nos revela um fator interessante citado neste artigo que é a linguagem. Dentre todos
os patrimônios representados, percebemos o tom descontraído que diz sobre a identidade desses
indivíduos e como as atividades patrimoniais podem seguir este mesmo viés. No turbilhão tecnológico
hodierno, o excesso de informação vem de encontro aos anseios informativos inerentes à adolescência.
As redes sociais, bem como os canais de informação online são realidades presentes nos autores deste
mapa. A fala introdutória da oficina somada a esse contingente informacional nos permite analisar o
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bom desempenho no processo de assimilação dessa atividade. É nesse sentido que ao explicar o tema,
usar de exemplificações que aguçam o conhecimento prévio desses jovens, que se obtém um resultado
satisfatório. As diversas informações perpassam pelo pão de queijo, bem cultural presente no cotidiano
dos mineiros; pelas maracas, instrumento que aqui se apresenta de forma muito original; o ônibus
utilizado como transporte público da cidade de Divinópolis; frases e gírias como “carimba que nóis é
top” que também dizem sobre sua identidade cultural.

Árvore do Patrimônio

Para finalizarmos a oficina de educação patrimonial é essencial estar disposto a absorver a


sensibilidade provocada pela associação de um novo entendimento do patrimônio. Nesse sentido
quando optamos por criar como atividade final a “Árvore do Patrimônio” tivemos como entendimento
primordial que se fazia necessário valer-se da emoção que o novo conhecimento provocara nos
participantes da oficina. Usar da representação simbólica da árvore que muito diz sobre preservação,
conhecimento e a vida em si, facilita que os ouvintes percebam que também o patrimônio faz parte de
um todo, e assim como o conhecimento, a preservação do patrimônio, significa resguardar sua própria
cultura.

A “Árvore do Patrimônio” é construída daquilo que a oficina despertou no participante sobre o


tema. Colocar os anseios em um lugar destinado a eles, provoca uma reação quase mística nos
participantes, onde escrever os sonhos de um futuro que conserve a identidade e a cultura, passa a
fazer sentido em suas vidas. Pensar o futuro do patrimônio somado à experiência sensorial de encostar
no galho da árvore e depositar ali seus desejos provoca em diversos participantes recordações e
memórias que para eles deveriam ser perpetuadas na prática cultural das futuras gerações.

Passemos agora para a análise de alguns bilhetes que foram afixados na “Árvore do
Patrimônio” selecionados nas oficinas ministradas pelo Centro de Memória Professora Batistina
Corgozinho da Universidade do Estado de Minas Gerais – Unidade Divinópolis, na 14ª Semana
Nacional de Museus, realizada entre os dias 16 e 20 de maio de 2016.

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(Estudante do ensino médio da E. E. Vigário José Alexandre, Carmo do Cajuru - MG)

Neste bilhete está explicita a intenção de preservação do patrimônio linguístico, algo tão caro à
preservação patrimonial. Muitas vezes este tipo de patrimônio passa despercebido para a população,
mesmo que seja tão perceptível nossa variação linguística em um território tão amplo. Nossa língua,
composta por variedades dialéticas, morfológicas e fonéticas identifica as diversas regiões nacionais e
ainda se desdobra em tantos outros dialetos locais que representam o modo de vida de determinada
comunidade. A oralidade vem sendo cada vez mais reconhecida na História como fonte documental de
grande importância, e neste sentido a língua compartilhada por uma sociedade ganha essa mesma
relevânciade registro para a identificação social.

(Estudante do ensino fundamental da E. M. Benjamim Constant, comunidade rural de Buritis - MG)

Notamos aqui a representação de um patrimônio imaterial presente em um patrimônio


material. Mas Gabriel ao falar do bolo preparado por sua avó se diferencia do “banco da Dona
Niquita” por não se tratar de um bolo específico, mas da especificidade de um saber. O bolo de sua vó
pode ser reproduzido diversas vezes em situações espaciais e temporais diferentes, mas o saber neste
caso é único e individual. Além disso, esse patrimônio com certeza reflete toda uma sociabilidade que
é criada em seu entorno, como a relação entre familiares, conversas, aprendizados e sensações. É
importante ressaltar que esse bem além de ser compartilhado pela subjetividade, tem a possibilidade
de registro formal para que seja preservado.

Considerações Finais

A realização das oficinas de Ed. Patrimonial são sem dúvidas um desafio, no entanto seus
resultados nos encorajam a entender a necessidade dessa prática. Quando a escola, o museu ou um
centro de memória entende a necessidade de construir coletivamente políticas de salvaguarda do
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patrimônio, as oficinas são uma excelente ferramenta que possibilita fomentar uma consciência da
importância do seu reconhecimento.

Ao realizarmos oficinas de Ed. Patrimonial temos o privilégio de conhecer indivíduos dos


mais diversos lugares e entender na simplicidade de cada olhar curioso, um patrimônio que de fato
ultrapassa a intelectualidade dos livros de tombamento e registro. Auxiliar o outro a perceber que sua
pratica de vida conta e constrói um patrimônio que se registra e realiza no cotidiano representa um
apontamento que cumpre o papel de auxiliar na perpetuação natural do patrimônio na vida de cada um.

Por fim, fica aqui nosso encorajamento a todos aqueles que se interessam de uma maneira ou
outro pela salvaguarda do patrimônio cultural brasileiro, a realizar oficinas e outras práticas que
auxiliem na sua preservação e manutenção. Ainda, incentivamos aos profissionais de áreas afins a
construir a partir do plural entendimento de patrimônio cultural, uma educação que seja
transdisciplinar e nesse sentido, possamos juntos entender as multifaces para o estabelecimento
profícuo de práticas que proteja e facilite a livre perpetuação de nosso patrimônio cultural.

Referências

FREIRE, Paulo. Conscientização: teoria e prática da libertação: uma introdução ao pensamento de


Paulo Freire. 3a ed. São Paulo: Centauro, 2001.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 42ª ed.Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.

RICHTER, Denis. Raciocínio geográfico e mapas mentais: a leitura espacial do cotidiano por alunos
do Ensino Médio. Tese (Doutorado em Geografia). Presidente Prudente: Universidade Estadual
Paulista, 2010

SIVIERO, Fernando Pascuotte. Educação e Patrimônio Cultural: uma encruzilhada nas políticas
públicas de preservação. Revista produção online. [on-line]. n 19. São Paulo: USP, 2015. Disponível
na Internet: <http://www.revistas.usp.br/cpc/article/view/90786>. ISSN 1980 - 4466.

INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL.Departamento de


Identificação e Documentação. Manual de Aplicação – Inventário Nacional de Referências Culturais.
Brasília, 2000.

INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL. Coordenação de


Educação Patrimonial. Educação Patrimonial: Inventários Participativos. Brasília, 2016. Disponível
em: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/InventarioDoPatrimonio_15x21web.pdf.
Acesso em: 06 set. 2016.

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL, PERCEPÇÃO E
INTERPRETAÇÃO AMBIENTAL EM MONUMENTOS E
SÍTIOS: possibilidades turísticas e experiências do
Cemitério do Bonfim, Belo Horizonte – MG

ANDRADE, VAGNER L. (1); PENA, MARIA M. DO N. (2); SILVA, HÉLVECIO C.


DA (3)

1.Guia de Turismo e graduando em História - Licenciatura pelo UNCESUMAR – Centro Universitário


de Maringá. Agente Voluntário da Rede Ação Ambiental. Praça 14 Bis, 130/Apto 906 – Bela Vista,
São Paulo/SP CEP 03240-400. E-mail: trezeagosto@yahoo.com.br

2.Relações Públicas e Historiadora (FAFICH-UFMG). Agente Voluntário da Rede Ação Ambiental.


Rua Jaguari, nº 321 – Bairro do Bonfim, CEP 31210-430, Belo Horizonte – MG. E-mail:
mariareciclona@hotmail.com

3.Bacharel em Turismo (Faculdade Estácio de Sá – Campus Belo Horizonte). Agente Voluntário da


Rede Ação Ambiental. Rua Agílio Cruz de Souza, nº 382/Apto 301 – Bairro do Serrano, CEP 30882-
630. Belo Horizonte – MG. E-mail: helveciocaudio@hotmail.com

RESUMO
Atento às problemáticas ambientais, presentes no cotidiano, o presente trabalho pautado nos
princípios contemporâneos da sustentabilidade, identifica os valores que a atividade integrada de
turismo pedagógico, interpretação ecológica e educação ambiental em monumentos e sítios
acrescentam à sociedade humana. O objetivo do projeto de pesquisa assenta-se na análise das
possibilidades perceptivas, interpretativas e educativas do Parque Urbano Cemitério do Bonfim,
atualmente administrado pela Fundação de Parques Municipais, localizado na Bacia Hidrográfica do
Córrego do Pastinho, afluente do Ribeirão Arrudas, zona oeste do município de Belo Horizonte,
estado de Minas Gerais. O “Parque” Cemitério do Bonfim possui uma infraestrutura considerável, do
ponto de vista de patrimônio cultural, sendo criado para atender ao público apenas com
equipamentos e infraestrutura para a questão da morte. Sua incorporação ao lazer, entretenimento e
contemplação é uma premissa recente evidenciando novos usos e potencialidades do espaço
público. O processo de pesquisa e levantamento de informações segue o método qualitativo
exploratório com classificação de dados da infraestrutura existente nessa unidade de conservação, e
um trabalho de observação, identificando deficiências, potencialidades e problemas que subsidiem a
elaboração de novas propostas técnicas de intervenção e concilie a área como espaço educativo de
apropriação da comunidade local e demais visitantes e turistas, com vistas a um futuro promissor na
qualidade de vida da região de entorno.

PALAVRAS CHAVE
Interpretação Ambiental, Turismo Pedagógico, Parque Urbano
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
INTRODUÇÃO

A troca do solo fértil e permeável por coberturas de concreto e asfalto é uma situação cada
vez mais comum nos grandes centros urbanos impedindo a recarga dos mananciais, o
crescimento da vegetação natural e a manutenção dos ecossistemas locais. As raras áreas
no tecido urbano, com remanescentes de vegetação nativa, conservam muitas espécies
ameaçadas e contribuem para o equilíbrio ecológico da cidade privilegiando seus moradores
e/ou visitantes com a possibilidade de contemplação, estudo e reflexão sobre a necessidade
de se preservar de forma consciente e sustentável estes relevantes espaços naturais. Belo
Horizonte, considerada no passado uma das metrópoles mais arborizadas do país e, outrora
com indíces elevados de qualidade vida, encara o desafio atual de manter a antiga imagem
de cidade modelo na área ambiental. Atualmente o municipio, enfrenta o crescimento
populacional, o progresso devastador e a diminuição das áreas naturais, promovendo
inúmeros impactos ambientais. Faz-se necessário compreender que é imprescindível
atender às necessidades de hoje, sem comprometer a capacidade das gerações futuras,
sem o prejuízo de perder o elo com o patrimônio histórico, natural e paisagístico que ainda
resta (OMT, 2003 apud SILVA, 2009). Na atualidade, a educação patrimonial1 e ambiental
aplicada ao turismo de cunho pedagógico agregam novos valores, despertando a população
e os visitantes para a real necessidade de mudanças comportamentais, visando atingir
atitudes mais conscientes e sustentáveis. Almeida (2015, p. 04) alega que:
O cemitério do Bonfim (figura 01) para além do cumprimento de suas
funções habituais ligadas ao culto aos mortos vem sendo cada vez mais
utilizado como lugar de turismo e espaço educativo. O hábito de ministrar
aulas específicas utilizando o espaço cemiterial é atividade pedagógica
recorrentemente praticada entre docentes e, de modo particular, na Escola
de Design da Universidade do Estado de Minas Gerais. Esta ação educativa
vem se realizando através do trabalho de docentes em disciplinas diversas
que são ministradas para os cursos de Design Gráfico, Design de Produto,
Design de Ambientes e Licenciatura em Artes Visuais. De fato, esse uso do
cemitério como um espaço não formal de educação vem se consolidando há
mais de 17 (dezessete anos), na medida em que grupos de estudantes de
diversos níveis acadêmicos são convidados a participar de incursões
pedagógicas, propondo a reflexão sobre a história e a relevância no tocante
à preservação da cultura material e imaterial que envolve aquele lugar.

Figura 01 – vista parcial do Cemitério do Bonfim

1 A educação patrimonial é elemento a ser considerado no processo de salvaguarda das referências culturais. ”,
ou seja, é necessário que: [...] os educadores assumam esse compromisso e criem possibilidades de trabalhos
teóricos e de campo para auxiliar a comunidade no processo de interlocução com a memória, com os lugares de
memória, com a história local. É preciso despertar as populações para a percepção e valorização de lugares, de
saberes, de celebrações, por meio de apreensões visuais dos bens da comunidade. PINHEIRO, Áurea da Paz e
PELEGRINI, Sandra C. A. (org.) Tempo, Memória e Patrimônio Cultural. Teresina: EDUFPI, 2010.
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Fonte: https://media-cdn.tripadvisor.com/media/photo-s/0c/3b/60/ab/cemiterio-do-bonfim.jpg

O Turismo realizado por visitantes em apenas um dia, dentro da sua própria região de
destino, é conhecido como excursão, passeio ou simplesmente visita. Esses deslocamentos,
quando acontecem dentro de casa, para o público interno, nesse caso, os moradores do
próprio município, e até mesmo os dos municípios vizinhos, não recebem a denominação de
Turismo, por uma analogia acadêmica com propósitos ultrapassados. Talvez se essa
atividade de passeio ou excursão, dentro da própria região, fosse também chamada de
Turismo, provocaria um interesse maior pela descoberta dos atrativos locais. A estratégia
seria uma convocação dos moradores da cidade para o desafio da descoberta, convidando-
os para reconhecerem o patrimônio histórico e paisagístico da urbe, no caso em especial, as
áreas culturais e naturais, induzindo, estimulando com propostas atraentes, da descoberta
das sensações nunca sentidas em locais tão próximos, localizados praticamente “no quintal
de suas casas”. Esta seria uma excelente maneira de educar também, estimulando nestes
visitantes, a interpretação do patrimônio, desenvolvendo a percepção e incentivando o uso
dos sentidos, a interpretar com novos olhares as imagens não percebidas na correria do
cotidiano, a compreender os signos, significados e significantes, a conhecer os fatos
desencadeados que levaram às mudanças que afetam suas vidas, questões históricas,
geográficas, biológicas, pouco compreendidas, pouco estimuladas dentro de uma sala de
aula e nas até mesmo nas experiências da vida. Assim, a proposta para o desenvolvimento
de atividades de turismo pedagógico de cunho ecológico em áreas culturais e naturais na
cidade, em específico os parques urbanos trazem à discussão, a viabilidade técnica da
implantação desta atividade em Unidades de Conservação. Lamentavelmente, existem
efetivamente poucos projetos desenvolvidos pelo poder público, ONGs, ou empresas
privadas visando um plano estratégico que atraia para essas áreas, visitantes afoitos pelo
conhecimento, sedento pela descoberta do novo, do diferente, do inusitado.
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Sabendo que a cidade possui áreas naturais preservadas transformadas em parques
urbanos, o presente estudo pretende pesquisar as possibilidades do uso de um destes
espaços para desenvolvimento de atividades integradas de turismo pedagógico,
interpretação ecológica e educação ambiental, contemplando em especial, o Cemitério do
Bonfim. Para Almeida (2007, p. 156);
Desde sua inauguração até o final da década de 30 do século passado era
conhecido como “Cemitério Municipal”, o nome Bonfim só aparece nos
mapas, plantas e relatórios oficiais, posteriormente, nos últimos anos da
década de 30 e inícios dos anos 402. Por que Bonfim? Abílio Barreto atribuiu
ao povo da capital a escolha do nome para o novo cemitério da cidade.
Apropriado, diga-se de passagem, pois se refere ao exato instante da morte
do filho de Deus. Entretanto, não há registros documentais que confirmem
ou não de onde partiu esta opção3.

Os parques urbanos devido a sua importância ecológica na região Noroeste (Quadro 01) e
na própria cidade caracterizam-se como áreas naturais bem preservadas, com rica
biodiversidade e paisagens ecológicas quase incomuns em grandes centros urbanos. O
Bonfim foi respectivamente escolhido como objeto deste estudo, pois embora não seja um
parque urbano é um espaço de grande referência para a cidade. Almeida (2007, p. 144-145)
alega que
Proibir novos sepultamentos no adro da Matriz de Nossa Senhora da Boa
Viagem foi uma das primeiras medidas tomadas pela Comissão Construtora
da Nova Capital. A ordem era: os novos enterramentos deveriam ser feitos
no cemitério provisório4 preparado para este fim. Esta medida consta no
relatório dos trabalhos realizados para edificação da nova cidade, altura em
que se menciona: [...] o preparo de um cemitério provisório para impedir que
continuassem os enterramentos a ser feitos no adro da Egreja Matriz, onde
já não se podia abrir cova sem exhumar corpos ainda mal decompostos
[...]5. Além do mais no regulamento que norteou a construção da capital era
determinado: [...] a sua área será dividida em secções, quarteirões e lotes,
com espaços, avenidas e ruas necessárias para a rápida e fácil
communicação dos seus habitantes, boa ventilação e hygiene [...]. Na
mesma planta serão designados os logares destinados para os edifícios
públicos, templos, hospitaes, cemitérios, parques, jardins, matadouros,
mercados, etc. [...]6

2 Panorama de Belo Horizonte: Atlas Histórico. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro/Centro de
Estudos Históricos e Culturais, 1997.
3 BARRETO, Abílio Resumo Histórico de Belo Horizonte (1701-1947). Belo Horizonte: Imprensa

Oficial, 1950. p.196.


4 O Cemitério provisório foi preparado pela Comissão Construtora da Nova Capital nos terrenos que

hoje estão situados aos fundos do Orfanato Santo Antônio, na confluência das atuais Ruas dos
Tamoios e Rua São Paulo. Lá foram realizados desde sua instalação até inícios de 1897, duzentos e
oitenta e cinco sepultamentos, tendo sido assim que concluídas as obras do definitivo denominado
“Cemitério Municipal”. (ALMEIDA, 2007, p. 148)
5 Esta medida se deu entre Junho e Julho de 1894. Cf: Commisssão Constructora da Nova Capital

Revista Geral dos Trabalhos sob a direção do Engenheiro - chefe Francisco Bicalho. Rio de Janeiro:
H. Lombaerts & Cia, agosto de 1895. Vol. II. p. 6.
6 Regulamento para as bases do levantamento do Plano Geral da Capital do Estado

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Quadro I – situação ecológica das áreas naturais na area urbana da Regional Noroeste
Denominação oficial parque Localização/ Situação do parque urbano
ecológico Nome do Bairro(s)
Parque Cemitério da Paz Aparecida Cemitério na modalidade parque
Parque Cemitério do Bonfim Bonfim Cemitério na modalidade necrópole
Parque da Estação Alípio de Melo Alípio de Melo Criado por lei e não implantado
Parque da Fazenda São José Jardim São José Criado por lei e não implantado
Parque de Lazer do Bairro Caiçara Caiçara Parque implantado e aberto
Parque do Anfiteatro Parnaíba Prado Lopes Área reservada na Pedreira
Parque do Aterro Sanitário Filadélfia Parque em estudo
Parque do Jardim Montanhês Alvorada Parque implantado e aberto
Parque do Mirante Camargos Camargos Reconhecido como praça
Parque do Trevo BR 040 Califórnia Criado por lei e não implantado
Parque Ecológico do CEVAE Coqueiros Parque implantado e aberto
Parque Jardins de São José Jardim São José Parque em implantação
Parque Maria do Socorro Moreira Progresso Parque implantado e aberto
Parque Pedro Machado Santa Maria Parque implantado e aberto
Parque Professor Correa Neto São Cristóvão Reconhecido como praça
Parque Vencesli Firmino da Silva Alípio de Melo Parque implantado e aberto

A regional Noroeste, em áreas de transição Cerrado/Mata Atlântica, por sua vez é a que tem
menos índice de remanescentes relevantemente preservados, e consecutivamente um
ecossistema urbano pobre em atributos naturais conservados. Os parques ecológicos da
cidade formam o patrimônio cultural e natural, enquanto cernes de um futuro sustentável,
sendo que nesta regional, em especifico, eles precisarão ser ampliados. A possibilidade de
implantação de novas áreas deste âmbito preconiza processos de melhoria da qualidade de
vida urbana. Para propor uma atividade de turismo num espaço deste domínio é necessária
a análise de infraestrutura e equipamentos oferecidos aos visitantes, pretendendo conectar
os recursos disponíveis encontrados com as atividades destinadas ao entretenimento, ao
lazer e a educação ambiental sustentados nos ideais do turismo. A promulgação da Lei
10.655/2013, em 03 de setembro, pelo Prefeito Márcio Lacerda, transformando o Cemitério
do Nosso Senhor do Bonfim em ponto turístico (figura 02) evidencia transformações no
cenário da regional Noroeste:
Inclui o Cemitério do Bonfim nos roteiros turísticos e culturais do
Município.
O Povo do Município de Belo Horizonte, por seus representantes,
decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º - O Cemitério do Bonfim passa a ser ponto turístico e cultural
do Município.
Art. 2º - O Executivo será responsável pelo órgão que fará o
levantamento, o estudo e a identificação das personalidades, dos artistas e
das obras de arte relacionados à história do Cemitério do Bonfim para
serem identificados pelos turistas.
Parágrafo único – VETADO
Art. 3º - VETADO
Parágrafo único - VETADO
Art. 4º - VETADO
Art. 5º - VETADO
I - VETADO
II - VETADO
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III - VETADO
Art. 6º - VETADO
Art. 7º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Belo Horizonte, 02 de setembro de 2013
Marcio Araujo de Lacerda - Prefeito de Belo Horizonte
(Originária do Projeto de Lei nº 15/13, de autoria do vereador Adriano
Ventura)

Figura 01 – ações educativas e turísticas no cemitério do Bonfim

Fonte: http://i2.wp.com/tudobh.com.br/wp-content/uploads/2017/01/images-8.jpg

Assim, a pesquisa tem como objetivo principal analisar as atividades educativas realizadas
no respectivo cemitério, integrando o visitante ao contexto histórico, paisagístico e natural do
mesmo. Os objetivos específicos da pesquisa pautados nas premissas filosóficas da
ecologia, do turismo e da interpretação ambiental farão à classificação dos equipamentos e
da infraestrutura e o levantamento dos recursos naturais que passam despercebidos e
descompreendidos na visitação. O estudo apresenta possibilidades da aplicação de
atividades perceptivas, interpretativas e educativas neste espaço diferenciado em seu
formato e sua aplicação. A análise dos dados possibilitará entender a implantação de
atividades realizadas dentro de um cemitério, aproveitando sua infraestrutura, equipamentos
e, principalmente, o potencial de educação patrimonial e ambiental evidenciando
perspectivas de turismo sustentável.

METODOLOGIA UTILIZADA

As pesquisas no campo da ecologia urbana, abrangendo o fenômeno turístico se revestem


de um olhar interpretativo das questões urbano-ambientais. Este fato estimula
pesquisadores de diversas áreas da ciência a buscarem respostas que ordenem a prática
sustentável das atividades urbanas, pontualmente no que tange a interferência humana em
ambientes culturais e naturais. Este projeto de pesquisa caracteriza-se pela pesquisa
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qualitativa exploratória, com levantamento das informações pertinentes ao estudo do turismo
cemiterial e de turismo pedagógico em cemitérios, no qual se pretende através de análise
interpretativa, reorientar a proposta inicial de intervenção para o objeto de estudo,
respondendo a objetivos pré-definidos. Ou seja, evidencia aspectos e elementos ecológicos
no âmbito do patrimônio cultural do Cemitério do Bonfim evidenciando novas abordagens
em educação patrimonial com ênfase no patrimônio natural remanescente. Segundo a OMT
(1995, p. 245) a metodologia turística é definida como o conjunto de métodos empíricos
experimentais, com procedimentos, técnicas e respectivas táticas objetivando conhecimento
cientifico, técnico ou prático dos fatos turísticos. Para Dencker (1998), a metodologia
científica estuda os métodos e processos que serão utilizados para o desenvolvimento da
ciência, observando-se como se processa o conhecimento científico. A metodologia é a
forma de concretizar a busca do conhecimento, adquirindo o conhecimento desejado de
forma racional, de maneira eficiente.
O método especifica o procedimento a ser seguido na busca do
conhecimento. Na medida em que o método normaliza os procedimentos
científicos, ele não é um instrumento de descoberta. O emprego do método,
entretanto, é necessário para reduzir a interferência do pesquisador nos
resultados (DENCKER, 1998, p. 21).

Nesta perspectiva utiliza-se alguns métodos para adquirir conhecimento como: observação da
realidade, experimentação de formas diferentes de agir ou de interpretar os fatos observados. A
metodologia abrangendo a análise das condições oferecidas para visitação de público, bem
como identificando o perfil ecológico, pedagógico e turístico do cemitério, seguiu as
seguintes etapas:
1) levantamento bibliográfico em publicações pertinentes ao assunto;
2) análise documental no local e em fontes diversas;
3) investigação de campo com técnicas de observação;
4) análise dos dados e relatório de observação;
5) registro fotográfico dos pontos e atrativos do tema elencado pelo projeto;
6) categorização da infraestrutura e dos equipamentos disponíveis no cemitério, com
roteiro predefinido;
7) entrevista com o gestor através de roteiro pré-estabelecido;
8) observação e conversa informal com os visitantes e com os funcionários;
9) classificação de atividades recreativas, esportivas e de educação patrimonial e
ambiental nos limites do cemitério e na área imediatamente externa (passeio),
também com roteiro pré-definido;

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O primeiro passo foi o levantamento de livros, documentos, artigos, dissertações, que
fornecessem informações sobre o cemitério e bases teóricas sobre o assunto abordado.
Desenvolveu-se no trabalho de campo, um roteiro para coleta de informações úteis para o
entendimento de sinalização indicativa para chegar ao local (atrativo); infraestrutura de
apoio turístico; equipamentos e infraestrutura interna do cemitério; o tipo de vegetação e
animais predominantes; a área ocupada pela vegetação, à possibilidade de trilhas
interpretativas ecológicas embasadas em referências da Ecologia Urbana; o levantamento
das informações sobre impactos do necrochorume em nascentes, cursos d’água e lagos e
sua quantidade; levantamento das atividades pedagógicas que o cemitério promove;
descoberta do número de ONGs e associações ligadas ao cemitério; e o levantamento de
pessoal/ funcionários (diretos e indiretos) que trabalham nesta Unidade de Conservação.
Os dados coletados com o gestor serão feitos por meio da entrevista semiestruturada a ser
aplicada.

Parte do levantamento documental buscou recursos e respostas na própria sede do


cemitério; na associação de bairro; nos jornais e revistas locais sobre históricos e
informações da UC; com os primeiros dados colhidos, outros foram levantados, como a
existência de ONGs; empresas atuantes em atividade ligada ao cemitério. Foram utilizados
os recursos de câmera fotográfica, gravador de áudio e papel para anotações, além da
percepção e observação do olhar. As fotos e os dados levantados foram instrumentos para
análise e interpretação das deficiências e potencialidades do parque, pautando as ações
nos moldes do desenvolvimento sustentável.

EXPOSIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS PARCIAIS

A educação patrimonial e a interpretação ambiental são práticas a serem pensadas,


planejadas e viabilizadas ou não, dentro da perspectiva do turismo, que por sua vez é uma
base filosófica e não uma prática. Logo uma caminhada ecológica, uma observação de
pássaros, répteis ou indivíduos arbóreos ser ou não uma prática turística, dependendo de
sua concepção (SILVA, 2009). O “parque” cemitério possui apenas uma portaria de acesso,
a mobilidade fica comprometida por ser estreita, dificultando a acessibilidade que limita a
entrada e saída de pessoas.
A despeito das diferenças locais, regionais e estruturais, os cemitérios
construídos em meados do século XIX em diversas capitais do império
brasileiro contêm elementos de interseção. São resultados da mentalidade
do período: as medidas médico-sanitaristas que orientavam acerca do
melhor e mais adequado método para inumação dos corpos; traduzem
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desejos de vaidade, poder, glória, por meio das construções tumulares; e,
neste sentido, são depositários de um acervo que traduz valor histórico e
estético, que destacam os cemitérios oitocentistas como espaços
singulares. São lugares de memória, do cultivo da memória individual e
coletiva e traduzem um eloquente desejo de perpetuação e lembrança. É
com esta perspectiva que se vislumbra o Cemitério do Bonfim, o mais antigo
e tradicional da capital mineira. Erguido em 1897 fora do perímetro urbano
da capital mineira, o cemitério absorveu em seu projeto e concepção o
mesmo referencial da cidade construída. O planejamento de sua localização
implicava também projetar sua linguagem estética e arquitetônica. Para
tanto, a equipe de arquitetos e desenhistas da Comissão Construtora da
Nova Capital de Minas (CCNCM) elaborou projetos que definiam os
aspectos básicos do local, desde o portão principal, a casa do zelador até o
necrotério. Trabalharam nos projetos o arquiteto, engenheiro e geógrafo
José de Magalhães (1851-1899), chefe da Seção de Arquitetura da
mencionada comissão; além de outros profissionais que deixaram seu
registro em vários espaços da capital mineira, dentre eles o espaço dos
mortos (Almeida, 1997; 2004 e 2007).

Figura 03 – prédio do Necrotério

Fonte: https://www.viagemdigital.com.br/wp-content/uploads/2015/03/Cemit%C3%A9rio-do-Bonfim-
Belo-Horizonte.jpg

As vias internas são em parte cimentadas, da entrada até a guarita e a casa de apoio,
contornando os mesmos se estende até as mesas da área de convivência, chegando até a
central administrativa. A área externa não possui sinalização indicativa de acesso, a não ser
a placa da própria portaria que identifica o nome do mesmo, tornando difícil a chegada até o
local. Marco na paisagem local, as pessoas que moram na região adjacente, identificam de
imediato sua localização exata, e/ou fingem desconhecer sua existência por não identidade
com o mesmo. Estudo de Almeida (2007, p. 154-155) enfatiza que:
A região onde está situado o cemitério é também conhecida como
Lagoinha. A Lagoinha é mais antiga que a própria Belo Horizonte. Situada
na região nordeste, há alusões à sua existência em documentos datados de
1711 como limite da Fazenda do Cercado, tendo ganhado este nome em
decorrência das constantes inundações causadas pelas enchentes do Rio
Arrudas. É uma localidade significativa no espaço geográfico da capital,
mesmo estando localizada fora do perímetro da Avenida do Contorno,
adquiriu ao longo do tempo status emblemático que foi se remodelando ao
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longo dos anos. A princípio, a Lagoinha é área de passagem, de trânsito
dos tropeiros e mercadores que viajavam pela região se deslocando de
Santa Luzia, Venda Nova e adjacências e se deslocavam para o Arraial.
Com a construção da capital e a chegada de muitos imigrantes a Lagoinha
foi “invadida”, em sua maior parte, pelos italianos que ali adquiriram
chácaras e sítios e construíram naquele lugar uma espécie de reduto da
saudosa Itália. Posteriormente tornou-se cenário da boêmia e da vida
noturna, confrontando-se com os mistérios e lendas que envolvem o
cemitério que abriga. Na ocasião da construção da instalação do cemitério,
a Lagoinha, era o lugar mais adequado e aprazível consoante com os
projetos da Comissão Construtora, bem como o discurso médico e
higienista amplamente difundido naquela altura.

Não existe estacionamento interno ou externo para visitantes, mas as ruas imediatamente
próximas à portaria têm largura suficiente para estacionar ônibus e veículos em geral. O
tráfego de veículos no local é relativamente bom, sendo que na porta do cemitério tem uma
vaga definida para PNE – Portador de Necessidades Especiais demonstrando observância a
políticas públicas de inclusão. O acesso por transporte público dispõe de certa facilidade,
com linha de ônibus cujo itinerário atende à rua da portaria com pontos de embarque e/ou
desembarque de passageiros. Devido à proximidade com a Avenida Dom Pedro Segundo,
há inúmeras outras linhas que acarretam certo grau e distância de deslocamento das linhas
que deixam mais próximas do cemitério.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Uma pesquisa bibliográfica esta sendo elaborada com vistas ao entendimento ambiental,
cultural e educativo dos cemitérios, dimensionando sua simbologia e impactos na paisagem
local. As atividades se voltam também a entender perspectivas e possibilidades de
percepção e análise socioambiental do Cemitério do Bonfim, Belo Horizonte – MG. Para
Almeida (2007, p. 153):
E se havia projetos para os vários espaços a serem ocupados na cidade, o
do cemitério foi, também, pensado. O terreno com área aproximada de
cento e setenta mil e trinta e seis metros quadrados, num local conhecido
como “Menezes”, distante seiscentos e cinqüenta metros do perímetro
urbano foi o ponto escolhido. O lugar era alto e arejado, de solo seco e
argiloso - arenoso, tendo em sua proximidade uma pedreira o que facilitaria
a construção. As obras de preparação dos terrenos e construção do
cemitério e necrotério foram iniciadas tendo como empreiteiro o Conde de
Santa Marinha7. A localização estratégica do cemitério na planta da capital

7 BARRETO, Abílio. Belo Horizonte Memória Histórica (...). p. 602 – 604 Antônio Teixeira Rodrigues
ou Conde de Santa Marinha (18? -1900) era português, construtor e industrial, chegou a Belo
Horizonte em 1894. Iniciou suas atividades com a implantação da rede ferroviária ligando as
pedreiras dos arredores ao local de construção da capital. Tornou-se pioneiro na exploração da linha
férrea urbana e em 1896 trouxe para a cidade à locomotiva Mariquinhas, hoje parte do acervo do
Museu Histórico Abílio Barreto. Tem seu nome ligado a diversas obras na capital, além daquelas
realizadas no cemitério do Bonfim, a saber: fachada do Palácio da Liberdade, construção dos
edifícios da Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais e do Quartel do 1º Batalhão da Polícia
Militar, construção de um palacete para própria residência no Bairro da Floresta, primeira casa da
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nos fornece subsídios para compreendermos as atitudes mentais da época.
O cemitério deveria ser amplo, arejado, a céu aberto, ocupando espaço
suficiente para expansão e abrigo dos mortos que a cidade dos vivos,
naturalmente iria produzir, sem, contudo, perder o caráter de modernidade
sob a qual era engendrada.

Em Belo Horizonte, as quatro necrópoles públicas são administradas pela Fundação de


Parques Municipais, que também se dedica à gestão e manejo de mais de 80 parques
urbanos em toda a cidade. Assim, indiretamente o cemitério do Bonfim é um parque. Lima e
Almeida (s/d) evidenciam que:
O tema da morte é provocador de inúmeras discussões que envolvem
aspectos diversos, múltiplos naquilo que se refere ao ser humano. Um dos
temas esta ligado ao culto aos mortos e conseqüentemente aos cemitérios e
as maneiras como são utilizados estes espaços. Em Minas Gerais os
enterramentos continuaram sendo feitos nas igrejas até final do século XIX.
A religiosidade era um fator muito presente na cultura mineira, que após
muita resistência, aceita a transferência de seus mortos para um local
distante das igrejas.

Almeida (2015, p. 02) defende que “o cemitério é um lugar privilegiado para se entender
uma cultura”. Para ela, “através da arquitetura, escultura e artes decorativas cristalizam-se
elementos simbólicos que, quando interpretados, permitem uma compreensão da sociedade
na qual estão inseridos”. Lima e Almeida (s/d) alegam que:
Conclui-se que as modificações dos sepultamentos eram reflexos de uma
sociedade, onde os vivos tinham pressa em esquecer seus mortos. Dentro
deste contexto, observa-se que nos espaços destinados aos mortos a
distinção social vivenciada no grande centro urbano mineiro se transpõe ao
cemitério, pessoas com maior ascendência financeira construíam túmulos
em granito, bronze e muitas vezes erguiam capelas sobre as sepulturas,
aos menos abastados restava uma sepultura simples muitas vezes feita
somente de cimento, sem ornamentação. O cemitério não guardava apenas
os mortos ele passou a ser também uma representação da vida social,
dentro da sociedade através de seus túmulos. Há no espaço cemiterial,
múltiplas manifestações devocionais, cabe aqui destacar as devoções
marginais.

O primeiro cemitério belo-horizontino, o Bonfim surgiu ainda em tempos da mudança de


capital, sendo inaugurado em 1894. Nele estão os túmulos (figura 04) de:
Bernardo Monteiro (político);
Irmã Benigna (religiosa);
João Amadeu Mucchiut (escultor);
Júlia Kubitschek (mãe de Juscelino Kubistchek);
Marco Antônio Araújo (músico);
Mausoléu dos heróis de 1930 mortos em combate na Revolução;
Mausoléu dos soldados do fogo (bombeiros);
Menina Marlene (milagreira);

área suburbana da capital (1896). Inaugurou, em 1897, uma empresa denominada “Grande Empório
Industrial”. Implantou ao lado de sua casa uma escola industrial com atividades voltadas para a
carpintaria, cantaria, fundição, ferraria, moinhos e torrefação de café. Faleceu na capital federal em
1900.
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Olegário Maciel (político);
Otacílio Negrão de Lima (político);
Padre Eustáquio (religioso);
Raul Soares (político):
Roberto “Batata” Monteiro (atleta).
Silviano Brandão (político);
Fonte: Estado de Minas. Belo Horizonte, 20 de abril de 1997.p. 39 Caderno
Gerais.

Figura 04 – Tumulo de Raul Soares

Fonte: http://vivapampulha.com.br/wp-content/uploads/2016/10/Bonfim.jpg

Anos depois diante do crescimento da nova capital mineira, foi necessária em 1940, a
construção de outra necrópole, o Saudade, localizada na zona leste. Já em meados da
década de 1960, a cidade ganhou mais dois modernos cemitérios, o Consolação e o Paz,
inspirados na concepção de cemitérios-parques ou cemitérios-jardins, que rompem com a
imagem tradicional das necrópoles com jazigos e monumentos de mármore, substituindo-os
por parques arborizados. Originários dos Estados Unidos onde são conhecidos como
memorial parks, sua principal característica é a paisagem, sem a presença de arte tumular,
onde simples placas de metal, bronze ou granito são colocadas sobre o solo gramado
assinalando o local da sepultura.
Em 1941, o Prefeito Juscelino Kubitschek (1902-1976) inaugurou o
Cemitério da Saudade situado na Rua Juramento s/ n. no bairro que leva o
mesmo nome do cemitério. Este ainda mantinha características
semelhantes às do Bonfim. Em 1967 a prefeitura entregou aos moradores o
Cemitério da paz, já adotando as características de cemitério-parque, sem
túmulos tradicionais, alguns anos adiante o Cemitério da Consolação
situado às margens da Estrada Velha para Santa Luzia era concluído. Estes
são administrados pelo poder público. No início da década de 70 foi
inaugurado o primeiro cemitério - parque de luxo da capital, o Parque da
Colina, construído dentro de linhas modernas, eliminava os túmulos de
grande proporção, objetivando transmitir “amenidade “ e “paz”. Localiza - se
no bairro Nova Cintra. Temos, também, o Cemitério Israelita situado no
bairro Jaraguá e desde a década de 80 o Cemitério Bosque da Esperança
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localizado às margens da Estrada Velha para Santa Luzia. Trata - se na
atualidade de espaço para os mortos com características extremamente
modernas e preferido por aqueles que possuem recursos para nele serem
sepultados. É interessante observar que se contrapõe ao primeiro cemitério
da capital até mesmo em relação ao nome. Enquanto o “Bonfim” faz alusão
à morte como um fim, um ponto final, ainda que bom, entretanto o Cemitério
Bosque da Esperança acena para a possibilidade de vencer a morte através
da esperança, questão que é pertinente ao mundo contemporâneo no qual
a medicina dotada de avançados recursos torna a morte um inimigo menos
perigoso em relação o que foi no passado.

O primeiro cemitério-jardim criado no Brasil, datado de 1965 é o Cemitério da Paz localizado


no bairro do Morumbi, em São Paulo. A maioria dos cemitérios particulares construídos hoje
no país é na modalidade cemitérios-jardim. Em São Paulo são instalados em cidades da
Região Metropolitana como Cotia, Embu, Guarulhos, Mairiporã, Taboão, geralmente
próximos às rodovias para promover um fácil acesso. Esses cemitérios aparentemente
promovem a igualdade entre os homens, sem discriminação econômica. Porém, a ausência
de ostentação e a representação simbólica da riqueza não retiram o caráter de desigualdade
gerado pela concessão privada do jazigo. Para Almeida (2015, p. 03):
Na contemporaneidade não é hábito investir na confecção de túmulos
grandiosos, predomina a lápide de granito com o nome do falecido e às
vezes uma cruz encimando a cabeceira da lápide. Na realidade a opção é
pelo afastamento em relação a este tipo de cemitério. A maior parte dos
habitantes da capital prefere o sepultamento em outros espaços e em razão
disto, muitas sepulturas estão abandonadas, algumas semi-destruídas,
revelando não apenas uma mudança de concepção mental em relação à
morte e o morrer, mas também um desprezo em relação à história, memória
e preservação do patrimônio cultural da capital. As opções em relação aos
espaços da morte foram ampliadas na capital mineira a partir da década de
40 e a preferência por ambientes “menos carregados" de imagens e
lembranças fúnebres está mais de acordo com a concepção que se possui
da morte no momento atual. Entretanto o Cemitério do Bonfim se destaca
no cenário da cidade pela sua arquitetura, arte e história. Trata-se de um
espaço significativo para se compreender Belo Horizonte e a educação
patrimonial e ações de sensibilização da população acerca desta
importância é uma ação pertinente para a preservação da memória e do
patrimônio material e imaterial que compõe o acervo do espaço fúnebre.

Outra prática comum, pela questão espacial, é a verticalização dos cemitérios, onde
os túmulos são dispostos uns sobre os outros e em andares para as visitações. O modelo
de necrópole também se destaca por apresentar maiores impactos ao meio ambiente em
decorrência da ausência de vegetação que pode ocasionar erosão e com o carreamento do
solo, um posterior assoreamento dos recursos hídricos superficiais do entorno, bem como
ampliar a taxa de impermeabilização local assim por sua concepção paisagística e pela
sustentabilidade o modelo de parque é o mais indicado. Almeida (2015, p. 02) exprime que:
A parte central do cemitério é uma praça redonda ajardinada, tendo a
imagem de Cristo, o Sagrado Coração, esculpida em bronze. Neste local
está sepultado Otacílio Negrão de Lima (1897-1960), ex-prefeito de Belo
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Horizonte, à esquerda da praça, distando cinco quadras, encontra - se o
prédio do necrotério. Trata - se de um prédio pequeno, construído dois anos
antes da inauguração do cemitério. É o único bem tombado pelo patrimônio
histórico naquele espaço. Predominam nas quadras localizadas nas
alamedas principais os mausoléus, as capelas e sepulturas mais
requintadas construídas com material nobre, muitas delas importadas de
São Paulo, Rio de Janeiro e até mesmo do exterior. A maioria dos túmulos
que ocupam estas quadras pertence às famílias influentes e importantes da
capital mineira, bem como os túmulos - monumentos dedicados à nobreza
política do Estado de Minas Gerais. Nas quadras mais afastadas da parte
central e das alamedas encontramos sepulturas mais simples, destituídas
de atributos e alegorias suntuosas.

Os cemitérios tradicionais com seus inúmeros túmulos também contribuem para o aumento
de calor retido em superfícies, fato semelhante ao chamado “ilha de calor” muito comum em
grandes centros urbanos. Superfícies absorvem o calor durante todo o dia, aquecendo-se
consideravelmente e somente no final da tarde e início da noite vão gradativamente
devolvendo calor para a atmosfera. Na contemporaneidade, a prática da cremação, muito
comum no Oriente, permitiu um destino sanitário mais compatível aos corpos humanos,
antes de sua deterioração e putrefação, evitando-se assim a contaminação do solo e lençol
freático com o necrochorume e a otimização de espaço.

PROPOSTAS DE INTERVENÇÃO

A realização das intervenções nasce da vontade de mudar, pois, os caminhos se abrem


quando se apropriam dessa força poderosa. Da pesquisa de gabinete à de campo,
passando pelos relatos dos funcionários e frequentadores do Cemitério do Bonfim,
investiga-se as reais necessidades de intervenção na respectiva UC, percebendo
potencialidades latentes nesse espaço simbólico, e a necessidade de desenvolver um
planejamento turístico capaz de criar meios para que a atividade se torne sustentável,
servido de modelo para outras intervenções perenes. Para os problemas levantados existem
soluções viáveis e acessíveis, até mesmo economicamente é possível encontrar soluções
alternativas, que gerem pouco ou nenhum custo em determinados casos. A pesquisa
ecológica demonstra a possibilidade do desenvolvimento da atividade de turismo
pedagógico e interpretação ambiental, latentes na respectiva área, o que demonstrou ser
extremamente apropriada. A falta de alguns equipamentos não representa empecilho ao
desenvolvimento da atividade perceptiva, sendo alocados na implantação do projeto, que
por sua vez se subdivide em três grupos de trabalho.
 BO – Biodiversidade e Organização: agrega os estudos geográficos, ecológicos e
ambientais, bem como a estruturação social do entorno;

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 NF – Novas Formas e Formatos: avalia novos usos e possibilidades turísticas e
educativas para o patrimônio cemiterial;
 IM – Integração e Mobilização: enfatiza a mobilização em prol de melhorias, bem
como a integração do cemitério no contexto regional e da cidade.
As atividades voltadas ao aprendizado educacional, sensibilização e interpretação
ambiental, fora dos padrões formais, busca conhecer os problemas que afetam ao ser
humano, e dos quais eles os verdadeiros causadores. O turismo educativo a partir da
ecologia urbana foca o bem-estar das comunidades citadinas, com a preservação ambiental,
com a flexibilização das questões econômicas, elevando o potencial educativo, de
percepção e de sensibilidade dos praticantes, multiplicando a consciência ecológica, saindo
dos padrões pré-estabelecidos, gerando benefícios com criatividade e inovação. Assim,
compreender para encontrar soluções viáveis de desenvolvimento humano sem maior
prejuízo para o meio ambiente será a força motriz que pontuará pequenas mudanças locais
que reflitam positivamente no todo e na cidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma proposta de intervenção com o intuito de implantar atividades de ecologia urbana,


turismo pedagógico, educação patrimonial e interpretação ambiental em cemitérios, não é
algo pretensioso, pois a maior pretensão está em fazer com que as pessoas saiam de suas
casas, da vida monótona à qual se veem constrangidos pela dinâmica urbana. O turismo em
áreas urbanas, utilizando e apropriando-se de espaços culturais e naturais proporciona uma
gama de sensações inesperadas, permitindo a redescoberta dos sentidos, percebendo o
estranho, o novo, o diferente, o inesperado olhando para “o seu quintal” enxergando o que
está lá fora, fazendo uso destes espaços disponíveis, proporcionando algo mais além, como
renovar energias, equilibrar corpo, mente e emoções. A prática de atividades educativas
mescladas com lazer e entretenimento será um estimulo a descoberta. O ganho de divisas
com a implementação desse projeto virá em médio prazo, com um plano bem elaborado que
não deixe de fora a rede entre o poder público, a iniciativa privada e a comunidade local,
pois estes últimos, além do papel importante no desenvolvimento de todo o processo, serão
os potenciais divulgadores desta modalidade que abranger visitantes mais distantes
dispostos a pagar pra ver, para descobrir, para conhecer a qualidade desse
empreendimento que certamente alcançará fronteiras mais longínquas.

O desejo é que essa proposta ultrapasse os limites virtuais e políticos dos municípios,
estados e até nações, agregando valor àqueles que desejem sair da rotina e descobrir
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novas possibilidades. Estender a proposta para outras UCs e parques urbanos, visando
primeiro o desenvolvimento do projeto no município de Belo Horizonte, oferecendo uma
maior diversificação da oferta de atrativos, somando forças no desenvolvimento turístico da
cidade. O desenvolvimento de atividade que movimenta tantos setores da economia, não se
furta ao sucesso, quando os benefícios da atividade alcançam a um número sem limites,
melhorando a infraestrutura do município, em virtude do turista, que beneficia primeiramente
o morador local, e traz mais qualidade para o mesmo, até nas necessidades mais básicas,
como a saúde e educação. A proposta perceptiva direcionada ao Cemitério do Bonfim, tema
do presente estudo seguiu os objetivos propostos e a linha metodológica prevista, buscando
pontuar o levantamento dos dados, trazendo novas soluções.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Uma interpretação acerca dos cemitérios oitocentistas situados nas cidades do Porto e Belo
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MORTE. IN: IV Encontro Nacional de Estudos da Imagem I Encontro Internacional de Estudos da
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BELOTUR. Visitas Guiadas ao Cemitério do Bonfim. Disponível em


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IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
ESCOLA DE DESIGN. Professora da ED divulga pesquisas sobre o Cemitério do Bonfim em eventos
científicos nacionais. Disponível em http://www.ed.uemg.br/noticias/2015/08/professora-da-ed-
divulga-pesquisas-sobre-o-cemiterio-do-bonfim-em-eventos-cientificos-nacionais. Acesso em 16 mai.
2017

ESTADO DE MINAS. CEMITÉRIO DO BONFIM, O MAIS ANTIGO DE BELO HORIZONTE, TERÁ


VISITAS GUIADAS NO DOMINGO.
http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2012/06/19/interna_gerais,300922/cemiterio-do-bonfim-o-
mais-antigo-de-belo-horizonte-tera-visitas-guiadas-no-domingo.shtml. Acesso em 16 mai. 2017

GLOBO MINAS. CEMITÉRIO DO BONFIM, EM BELO HORIZONTE, ATRAI TURISTAS: o local é uma aula de
história, arquitetura e arte, bem na região central da cidade. Disponível em
http://redeglobo.globo.com/globominas/terrademinas/noticia/2016/12/cemiterio-do-bonfim-em-belo-
horizonte-atrai-turistas.html. Acesso em 16 mai. 2017

O TEMPO PAMPULHA. CEMITÉRIO DO BONFIM. Local com importância histórica e artística para BH pode ser
opção de lazerhttp://www.otempo.com.br/pampulha/reportagem/patrim%C3%B4nio-1.740104. Acesso
em 16 mai. 2017

PREFEITURA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. História, cultura e arte no Cemitério do Bonfim.


Disponível em
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/noticia.do?evento=portlet&pAc=not&idConteudo=200447&pIdPlc=
&app=salanoticias Acesso em 16 mai. 2017

TAVARES, Fábio Liberato de Faria. BREVE HISTÓRICO DAS FORMAS DE SEPULTAMENTO EM


MINAS GERAIS. In: Revista Historiador Número 9. Ano 9. Fevereiro 2017. Disponivel em
http://www.historialivre.com/revistahistoriador/nove/fabiotavares.pdf. Acesso em 16 mai. 2017

VEJA BH. CIDADE: Considerado um museu a céu aberto, Cemitério do Bonfim abre sua temporada
de visitas. Disponível em http://vejabh.abril.com.br/materia/cidade/considerado-museu-ceu-aberto-
cemiterio-bonfim-abre-sua-temporada-visitas/. Acesso em 16 mai. 2017

VIAJE DIGITAL. CEMITÉRIO DO BONFIM: HISTÓRIA E ARTE DE BELO HORIZONTE. Disponível


em https://www.viagemdigital.com.br/cemiterio-bonfim-belo-horizonte/ Acesso em 16 mai. 2017.
Acesso em 16 mai. 2017

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: um caminho para o início da formação em
preservação patrimonial. Programa aplicado a jovens secundaristas

SOUZA, MÁRCIA VALÉRIA DE

1. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Museu Nacional/LCCR


Quinta da Boa Vista s/n
marciasouza@mn.ufrj.br

RESUMO
A presente comunicação tem por finalidade apresentar o programa pioneiro de inclusão social que
desde 2011 é desenvolvido pelo Laboratório Central de Conservação do Museu Nacional da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (MNUFRJ), que vem capacitando jovens na área de
conservação preventiva e conservação de bens culturais. Aqui apresentaremos os resultados obtidos
nos seis anos de projeto.
O Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro é o primeiro museu brasileiro e
também a mais antiga instituição científica do Brasil. Por meio do Programa de Iniciação Cientifica
Junior (PIC-Jr), em parceria com o Colégio Pedro II, proporciona a alunos do ensino médio
capacitação na área de conservação em diversos materiais. São aulas teóricas e práticas realizadas
em seus departamentos e laboratórios com objetivo de integrar profissionais da instituição e jovens
adolescentes, e uma das formas que o museu utiliza para promover a inclusão social numa
sociedade tão desigual como é a brasileira. Acreditamos que a qualificação desses jovens contribua
para despertar vocações, garantir mão-de-obra qualificada para instituições museológica e até
mesmo, colocar no mercado profissionais capazes de realizar trabalhos de forma independente,
abrindo um horizonte muitas vezes desconhecido, além de fortalecer o campo da Preservação
Patrimonial.

Palavras-Chave: Educação Patrimonial; Formação; Inclusão social.

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: um caminho para o início da formação em
preservação patrimonial. Programa aplicado a jovens secundaristas.

1 Introdução

Patrimônio cultural como um fenômeno sociológico refere-se a uma série de ações, não
só no meio acadêmico, mas também na ciência, como um objeto de reflexão e atuação no
âmbito das políticas culturais, sociais e econômicas, enfatizando sua importância e
legitimidade como um dos maiores e mais representativos bens simbólicos de uma
determinada sociedade ou comunidade. Um ícone da identidade que representa o homem
no tempo e no espaço cronológica e historicamente datados.

Nesta perspectiva, o Laboratório Central de Conservação e Restauração1 (LCCR) do


Museu Nacional2 da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em colaboração com o Colégio
Pedro II, localizados no Rio de Janeiro desenvolve um programa de conservação com foco
em Educação Patrimonial. A iniciativa decorre da ausência de práticas voltadas para a
valorização e consequentemente a preservação do patrimônio cultural nas escolas
brasileiras. Surgi daí, a necessidade de revelarmos aos alunos do ensino médio a
importância do aprendizado acerca dos valores moldados no desenvolvimento da sociedade
contemporânea, sob os quais a égide do patrimônio cultural se constrói.

A falta de instituições de ensino dedicadas à questão do imenso patrimônio cultural do


Brasil é lastimavelmente um fato real. Alberga todos os níveis, resultando no
irreconhecimento destes patrimônios como heranças da sociedade, dos povos, das cidades,
de todos nós. Por isso, torna-se relevante investir na formação de profissionais
comprometidos com a preservação e salvaguarda dos estoques patrimoniais, com vistas a
assegurar o prolongamento e a integridade física, realçar sua função social e, acima de
tudo, garantir o valor cultural e simbólico de(os) elemento(s) que garantam a nossa
identidade na produção de um único mosaico cultural. Partindo deste principio, acreditamos
que ser fundamental para os estudantes do ensino médio, compreender e aprender sobre os

1 O Laboratório Central de Conservação e restauração é um novo setor do Museu Nacional da UFRJ.


Reinaugurado em 2010, tem por missão: atuar em prol da conservação e preservação de bens culturais de forma
preventiva e/ou curativa, buscar e compartilhar conhecimento interdisciplinar, elaborar e realizar projetos
concernentes a preservação patrimonial e contribuir de forma individual ou coletivamente na tentativa de
amenizar/suprimir as lacunas existentes no campo da preservação.
2Criado em 06 de junho de 1818, tem por finalidade coligir, classificar e conservar material de interesse ao

estudo das ciências naturais e antropologias, organizando coleções e exposições públicas. A partir de 1946 foi
incorporado à Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do rio de Janeiro. Seu acervo é considerado um
dos maiores e mais significativos da América do Sul.
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valores que moldam o desenvolvimento da sociedade contemporânea, na qual a proteção
do patrimônio cultural deve ser marcada. Assim, este artigo pretende apresentar o projeto de
Educação de Patrimonial e os resultados da experiência vivida por alunos secundaristas e o
Laboratório Central de Conservação e Restauração do Museu Nacional nos últimos 6,5
anos.

Esta atividade é uma ação de extensão universitária proposta pelo Laboratório,


contribuindo para a participação efetiva da instituição na sociedade, porque a extensão é
definida no plano nacional de educação como processo educativo, cultural e científico que
articula o ensino e a pesquisa indissoluvelmente e permite a fabricação de relacionamento
entre a Universidade e a sociedade e tem como um dos seus objetivos promover atividades
que visam o desenvolvimento, a produção artística e cultural, conservação que são
relevantes para a afirmação de caráter nacional e de suas manifestações regionais.

Nosso projeto tem como uma de suas premissas a integração entre os alunos e a
herança preservada no Museu Nacional. A proposta é, sem precedentes, não apenas para
estabelecer uma parceria com uma escola, mas acima de tudo, permitir aos alunos entrar
em contato com um acervo de valor inestimável, viver na prática com questões
enriquecedoras, discussões e ações que cercam a continuidade e hipóteses envolvendo
bens culturais. Portanto, a Educação Patrimonial é uma ferramenta potente para a
conservação e a gestão do patrimônio cultural em nosso país; instrumento essencial para
promover o conhecimento, particularmente quando imbricamos o patrimônio cultural
brasileiro e jovens, tornando-os multiplicadores de um pensamento.

Neste sentido, acreditamos ser fundamental para estudantes de ensino médio


compreender e aprender sobre os valores que moldam o desenvolvimento da sociedade
contemporânea, na qual a proteção do patrimônio cultural deve estar marcada.

2 O Programa

O Projeto de Educação Patrimonial é um conjunto de ações desenvolvidas por


profissionais de conservação-restauração do LCCR destinadas a iniciar alunos do ensino
médio do Colégio Pedro II nas práticas de conservação patrimonial. A aliança estabelecida
no ano de 2000 entre a Universidade Federal do Rio de Janeiro e do Colégio Pedro II
resultou na participação do concurso para o Programa de Iniciação Científica Júnior (PIC-
Jr), da Fundação de Amparo à Pesquisa Carlos Chagas Filho do Rio de Janeiro (FAPERJ).

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Através deste programa, a FAPERJ - instituição de fomento, incentiva, apoia e promove a
participação de estudantes do ensino médio na pesquisa em instituições de ensino e
atividades de investigação.

O Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro ao instituir este Programa


segue no seu pioneirismo, pois é o primeiro museu brasileiro e também a mais antiga
instituição cientifica do Brasil. Ao analisarmos o perfil dos profissionais da área de
conservação-restauração de bens móveis no Brasil, percebe-se que a maioria advém de
outras formações, ou seja, a área ligada a preservação patrimonial é geralmente uma
segunda opção, levada muitas vezes pela necessidade de salvaguardar um acervo, pois
ainda são poucas as escolas que formam mão de obra especializada em preservação
patrimonial. Temos desde a década passada cerca de seis cursos de nível superior e
algumas pós-graduações. Poucos ou nenhum curso de nível médio o que representa uma
lacuna a ser preenchida por estes jovens, pois entendemos ser este um espaço
fundamental para despertar vocações e direcionar aqueles interessados na área.

Apoiado pelo Museu Nacional, o LCCR vem desde 2011 participando ativa e
ininterruptamente desta iniciativa. Hoje estamos na sétima edição do projeto e recebemos
durante estes anos 30 estagiários, contando com apenas uma desistência. Assim,
estudantes secundaristas interessados na aquisição de conhecimentos, informações e
experiência em práticas de laboratório destinadas os profissionais do patrimônio cultural tem
sido sempre muito benvindos.

A parceria entre a Universidade, o Colégio e o aporte da FAPERJ, é uma proposta bem


sucedida, pois assegura um conhecimento diferenciado para alunos do ensino médio, bem
como descortina um novo olhar a partir das teorias aprendidas e que estão normalmente
incluídas na vida cotidiana. Estimulamos o jovem para além das práticas laboratoriais e
procedimentos técnicos a percorrer o caminho da reflexão, da interpretação e de ações
futuras em prol da nossa cultura que possibilite o entendimento do significado de Patrimônio
e desperte o sentimento de apropriação, o prazer pela preservação, a imersão, a
profissionalização o fortalecimento da área.

O sucesso do nosso projeto de Educação Patrimonial é garantido pela articulação de


instituições das esferas federal e estadual. Esta interinstitucionalidade tem assegurado a
continuidade do projeto, que se enquadra dentro de uma política da Universidade
preocupada com a inclusão social de jovens.

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2.1 Metodologia

Os laboratórios do Museu na sua programação anual sinaliza a possibilidade de aceitar


alunos do Programa de Iniciação Científica (PIC-Jr), definindo o número de vagas, as
atividades vinculadas às ações que deverão efetuar, bem como o corpo técnico
(profissionais) que ficarão responsáveis pela formação dos estagiários.

O calendário do Programa de Iniciação Cientifica (PIC-Jr) é anual. Entre os meses de


setembro e outubro a equipe de educação pedagógica do Colégio Pedro II leva ao Museu,
grupos de alunos para visitar os laboratórios e setores, previamente escolhidos3 pelos
mesmos, com o propósito de conhecerem o funcionamento destes locais. Após a visita os
alunos preenchem um questionário, especificando o laboratório que eles têm interesse de
estagiar. Caso seja selecionado e dentro das vagas existentes no local escolhido, começa o
programa no Museu. (Fig. 1)

Fig.1 - Visita dos estudantes para a escolha do estágio

3Informações básicas sobre os laboratórios são dadas pela equipe pedagógica no Colégio Pedro II,
no entanto, a maior parte dos alunos que recebemos tem como referência os alunos-estagiários em
exercício no LCCR.
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Os estudantes selecionados têm entre 15 e 18 anos de idade e cursam o segundo ano
do ensino médio. A concessão de bolsas pela FAPERJ está condicionada à verba anual
liderada pelo governo. Alguns anos recebemos bolsas para todos os alunos, mas em outros
o número de bolsas é inferior ao de estudantes. No entanto é comum, eles criarem uma
forma de repartir os valores entre o grupo. Ao final do primeiro ano, eles podem solicitar a
extensão da bolsa por mais um ano, não podendo renovar mais, pois coincide com o
término do curso de nível médio.

Tivemos desde 2011 trinta estagiários iniciantes, sendo que onze deles voltaram para a
fase avançada e dois trabalharam por dois anos no LCCR (um deles como contratado e um
como voluntário) depois de formados no ensino médio. (Tab. 1)

Tab. 1 – Total de alunos até 2016

As atividades

O estágio, sempre às quartas-feiras, em dois turnos de quatro horas, começa em março


e termina na segunda semana de dezembro de cada ano. A eles são apresentados os
conceitos de Conservação, Restauração, Conservação Preventiva, Patrimônio e também
procedimentos técnicos básicos para tratamento de bens culturais móveis, com vistas ao
aprendizado, bem como a expansão de seus olhares à observação, análise e interpretação
crítica, de forma a promover a inclusão destes jovens na preservação do nosso patrimônio.

Durante o estágio, os estudantes são orientados acerca das práticas de conservação e


sua inserção no mundo do trabalho. A metodologia abrange desde a utilização obrigatória

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do documento de identificação para circulação dentro do Museu, passando por informes a
respeito do compromisso profissional, assiduidade, ética, a importância do EPI
(Equipamento de Proteção Individual), conceitos e teorias da conservação-restauração,
procedimentos técnicos básicos e as visitas técnicas anuais a Museus, Arquivos, Centros
Culturais e Bibliotecas. Ainda aprendem sobre planejamento, divisão de tarefas, trabalho em
equipe e outros determinantes essenciais ao pretenso sucesso profissional. (Fig. 2)

Fig. 2 – Estagiária preparando a capa de um livro.

No primeiro encontro falamos sobre o LCCR, as normas, os materiais, os equipamentos


e seus usos corretos. Após uma hora e meia, juntos vamos percorrer a exposição, agora
não mais como visitantes, mas como aprendizes de preservação patrimonial. Neste
momento, nosso objetivo é apresentar parte do acervo exposto e ressaltar as condições de
exposição. Nesta visita propomos aleatoriamente pesquisas individuais sobre os objetos,
personalidades em destaque e a história do Museu, na intenção de ilustrar o funcionamento
de nosso trabalho.

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Fig.3 – Higienização de uma fotografia e documento plano

Durante a visita à exposição falamos sobre temperatura, umidade relativa,


acondicionamento danos na estrutura física do prédio, luz, segurança do acervo, possíveis
sinistros, o entorno do Museu. Esta atividade pretende instigar o estagiário a entender o
patrimônio como um conceito mais amplo do que meramente a materialidade, mas como um
objeto repleto de signos, aura, historicidade e a representatividade inerente aos objetos
museais. Ou seja, nesta etapa, queremos alertá-los par a multiplicidade de funções do
profissional de conservação. Ressaltar que, tão importante quanto proceder tecnicamente é
ampliar sua visão para além da técnica. Detectando, observando, analisando, refletindo
sobre o todo de cada contexto. Tomando consciência do fio que costura nosso patrimônio.
Concebendo o objeto como um elemento indissociável da trama que o prende. Uma parte
de uma história, uma existência, a origem, o agente produtor.

Ao final do primeiro dia os estudantes são orientados sobre o calendário do estágio e as


etapas de trabalho. Para a primeira etapa (Papel) pedimos que tragam um livro e um
documento plano (certidões, carteira de vacina, cartas antigas) para o tratamento técnico -
Registro fotográfico, documentação técnica, higienização, pequenos reparos e
reconstituições, planificação e acondicionamento. Vale informar que no primeiro ano de
estágio os estudantes só trabalham com peças pessoais (livros, documentos, objetos de
madeira ou telas trazidos de casa). Não sendo permitido aprender no acervo do Museu.
Nesta etapa também começamos introduzindo os conceitos básicos: Conservação
Preventiva, Conservação, Restauração, Patrimônio, Bem cultural, Acervo. Ao mesmo tempo,
durante o primeiro mês eles fazem pesquisas individuais sobre temas apontados na visita à
exposição. Exemplo: Dom Pedro II e cultura, fósseis, dinossauros, a história do Museu,
Marques de Pombal, Cabeças Jívaros. (Fig. 3)

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Na segunda etapa o suporte será madeira. Eles trarão um pequeno objeto pessoal ou da
família em madeira para ser tratado e repetirão o procedimento técnico - Registro
fotográfico, documentação técnica, higienização, reconstituições e acabamento. Na terceira
etapa eles trabalham com uma tela adotando basicamente o mesmo processo - Registro
fotográfico, documentação técnica, higienização, reconstituição pictórica e finalização. Cada
etapa dura de dois a três meses. Ao longo destes meses fazemos duas visitas técnicas a
instituições que tenham acervos e laboratórios de conservação-restauração.

Destinamos o mês de novembro à conclusão dos trabalhos técnicos que possam estar
pendentes e à elaboração do projeto museográfico para a montagem da exposição, do
convite virtual e do o aparato que envolva o evento de encerramento dos estágios.
Concluído o projeto museográfico em grupo, eles passam à elaboração do relatório final
(individual e obrigatório).

Finalmente, na primeira semana de dezembro iniciamos os preparativos para a


montagem da exposição dos objetos tratados pelos estagiários no ano letivo (1 livro, 1
documento plano, 1 objeto de madeira, 1 tela). Um dia antes da “Vernissage” iniciamos os
arranjos dos objetos conservados pelos alunos no LCCR ao longo do ano, posicionando-os
em bases pintadas de preto e tecidos que terminado o evento são lavados, higienizados e
guardados para os próximos anos. Sobre as bases, cada objeto recebe um etiqueta de
identificação com o nome do estagiário e as informações referentes aos procedimentos
técnicos. Em 2015, conseguimos junto a Comissão de Exposição autorização para expor o
trabalho anual dos alunos do Colégio Pedro II em uma sala logo na entrada da exposição do
Museu Nacional. (Fig. 5)

A partir de 2016 inserimos mais duas ações no projeto: a reprodução de objetos por
moldes e uma micro conferência. No ano passado eles fizeram um réplica em gesso e
madeira da Vênus de Willendorf em oficina ministrada pelo taxidermista do Museu Carlos
Caetano. Na conferência as estagiárias apresentaram individualmente suas pesquisas
durante 10 minutos para uma plateia composta de familiares, servidores do Museu e
convidados. Ao término da conferência o público foi convidado para a abertura da
vernissage e a inauguração de uma vitrine que ficou em exposição por seis meses com
parte dos trabalhos.

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Fig.4 - Exposição no Centro Cultura Pedro II

3 Considerações Finais

São dez meses que podem e vem mudando a vida de diversos jovens brasileiros
presente na vivência e na troca de experiências e na parceira entre a Universidade, o
Colégio e a FAPERJ, onde o Laboratório, participa de forma integral e comprometida
buscando contribuir na e para a mudança de olhares em relação a preservação do
patrimônio cultural brasileiro. Mais que uma ação, esta pode se tornar uma política pública.
Podemos estender este projeto para outras esferas, realçar seu papel social, pois ao
oferecer ao jovem do Brasil uma possibilidade pouco explorada de trabalhar na área cultural,
temos a consciência da importância da abertura de uma nova porta, que pode abrir
horizontes nunca almejados por esses estudantes, seja pelo desconhecimento ou por
acreditar que esse fica num patamar inalcançável.

Vista de maneira descompromissada nossa amostra parece relativa, 30 alunos em seis


anos. Se perguntados “O que seriam 30 jovens de 15 a 18 anos no contexto brasileiro?”
Qual o retorno? Os resultados? Certamente responderia que este número é bastante
expressivo pois o LCCR é provavelmente o mais novo laboratório de conservação-
restauração do Rio de Janeiro e consequentemente um dos mais novos do país. Nossa
equipe até três anos atrás totalizava 3 servidoras. Em 2012, por questões internas não
abrimos novas vagas. O que de certa forma impacta o programa, pois os estagiários são
nossos grandes divulgadores. Em contrapartida destes trinta estagiários, considerando o
primeiro ano de estágio temos a nosso favor o retorno de 11 deles nos anos subsequentes.
Ou seja, quase 40% deles retornaram para o segundo ano de estágio. Ademais, seis dos
ex-estagiários que atualmente estão cursando a graduação optaram pela área de
Conservação ou cursos afins, quais sejam: Conservação e Restauração de Bens Culturais/
Universidade Federal do Rio de Janeiro; Museologia/Universidade Federal do Estado do Rio
de Janeiro; Arquitetura/ Universidade Federal do Rio de Janeiro e Universidade Federal
Fluminense; Belas Artes/ Universidade Federal do Rio de Janeiro e Arquivologia/
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Dois continuaram trabalhando conosco depois de
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terminarem o nível médio e duas depois de apresentarem um projeto de pesquisa são
agora bolsistas da FAPERJ como graduandas da Escola de Belas Artes da UFRJ e
trabalham LCCR sob nossa orientação.

Surpreendentemente a carga de responsabilidade atribuída ao conservador-


restaurador de patrimônio cultural poderia parecer pesada quando nos deparamos com as
dificuldades, carências e obstáculos comuns à área patrimonial, ao contexto
socioeconômico e às limitações institucionais no país. No entanto, acreditamos que iniciar
ações possíveis, darmos os primeiros passos tornou-se essencial diante de tantas barreiras
que assolam a valorização da nosso patrimônio, obstruem o acesso às informações que
garantam a formação do cidadão. Cidadão, sim possuidor de identidade, de memória,
agente produtor do patrimônio material ou imaterial, dos nossos bens culturais, das histórias
locais, regionais ou nacionais. Muitos são os desafios, mas motivados pelo direito de
acessar nossos costumes, objetos, hábitos, fazeres e saberes investimos na Educação
Patrimonial como um recurso acessível ao profissional da preservação em concomitância
com o despertar da noção de identidade, cidadania em alunos secundaristas sempre
focando o patrimônio e as formas de preservação dele e da memória cultural.

Tendo em vista, o exposto seguramente podemos afirmar que adotar um projeto


pertinente a realidade de uma instituição é importante e possível. A Educação Patrimonial
ainda tímida no Brasil representa uma alternativa factível para a transmissão de
conhecimento e conscientização do valor do patrimônio cultural. Nossa experiência é real,
salutar, palatável, verdadeira, possível. E, para além do Colégio Pedro II que é uma
referência no Brasil, gostaríamos de estender essa experiência para outras instituições
culturais e escolas, pois o nosso trabalho não se caracteriza pela utilização da mão de obra
dos estudantes enquanto guias ou monitores de eventos, que geralmente é dissociado de
práticas pedagógicas e principalmente da científica, acreditamos que estamos formando e
capacitando cidadãos críticos comprometidos com seu tempo, espaço, história e sua cultura,
caminhando na perspectiva de Pedro que ao possibilitar em seu tempo a criação da
instituição de ensino como a Universidade e o Colégio incentivou a formação do brasileiro.

Referência bibliográfica

ABREU, Regina; CHAGAS, Mário. Memória e patrimônio – ensaios contemporâneos. Rio


de Janeiro: UNI-RIO: FAPERJ: DP&A Editora, 2003
HORTA, Maria de Lourdes Parreiras. Guia básico de educação patrimonial. Brasília:
IPHAN, 1999.
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SANTOS, José Luiz dos. O que é cultura? Brasiliense: São Paulo, 2006
SOARES, André L.R; KLAMPT, Sérgio C. (orgs). Educação Patrimonial: teoria e prática.
Santa Maria: Ed. da UFSM, 2007
ABREU, Regina; CHAGAS, Mário (orgs). Memória e patrimônio: ensaios contemporâneos.
Rio de Janeiro: DP&A, 2003.
BOITO. Camilo. Os restauradores. Cotia(SP): Ateliê Editorial, 2002.
BRANDI, Cesare. Teoria da Restauração. Cotia(SP): Atelié Editorial, 2004.
CHUVA, Márcia (org). A invenção do patrimônio: continuidade e ruptura na constituição
de uma política oficial de preservação no Brasil. Rio de Janeiro: IPHAN, 1995.

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EDUCAR DESEDUCANDO: 10 anos de implantação da UFS nos
antigos Trapiches de Laranjeiras/SE

SILVA, EDER D. da. (1); NOGUEIRA, ADRIANA D. (2); SANTOS, ROSANE G. L.


dos (3)

1. Universidade Federal de Sergipe. Departamento de Arquitetura e Urbanismo


Rua Samuel de Oliveira, s/n. Laranjeiras/SE
eder@infonet.com.br

2. Universidade Federal de Sergipe. Departamento de Artes e Design


Cidade Universitária Prof. José Aloísio de Campos. São Cristóvão/SE
adnogueira@gmail.com

3. Universidade Federal de Sergipe. Centro de Tecnologia da Preservação e Restauro


Rua Samuel de Oliveira, s/n. Laranjeiras/SE
Gleiceleite2006@hotmail.com

RESUMO
No ano de 2004 o programa de recuperação sustentável do Patrimônio histórico urbano brasileiro,
denominado de “MONUMENTA”, sob tutela federal resultante de contrato de empréstimo entre o BID e
a República, classificou e elegeu o Município de Laranjeiras, no interior do Estado de Sergipe, apto ao
desenvolvimento de ações preservacionistas. Dentre o conjunto de ações proposto, pontuou-se a
possibilidade de implantação de um Campus da Universidade Federal de Sergipe utilizando-se do
conceito de requalificação/reabilitação de antigas edificações históricas. O Campus de Laranjeiras foi
implantado provisoriamente em 2007 numa escola, passou a funcionar a partir de 2008/2009 no
chamado “Quarteirão dos Trapiches” restaurado, com cinco cursos: Arquitetura e Urbanismo;
Arqueologia; Museologia; Teatro e Dança. Frente a comemoração dos dez anos do Campus, ocorrida
em março de 2017, cabem inúmeras reflexões sobre o conceito de educação patrimonial que permutou
a implantação/existência da UFS nos antigos trapiches de Laranjeiras; portanto, este artigo pretende
analisar a trajetória histórica que demonstre a verdadeira representação patrimonial
simbólico/material/funcional do Campus das “Artes”; entender e compreender a atitude científica
patrimonial de pertencimento frente à produção acadêmica de trabalhos de conclusão de curso
realizados neste interstício; bem como, registrar e analisar as condições de conservação e restauro
das edificações “reabilitadas”.
Palavras-chave: Patrimônio; Cultura; Arquitetura; Identidade; Pertencimento.

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Considerações iniciais
No ano de 2004, o programa de recuperação sustentável do Patrimônio histórico urbano
brasileiro, denominado de “MONUMENTA”, sob tutela federal resultante de contrato de
empréstimo entre o BID e a República, conforme lista de prioridades de conservação
elaborada pela Comissão especial do Ministério da Cultura em outubro de 2000, classificou e
elegeu o Município de Laranjeiras, no interior do Estado de Sergipe, apto ao desenvolvimento
de ações preservacionistas.

Dentre o conjunto de ações proposto, pontuou-se a possibilidade de implantação de um


Campus da Universidade Federal de Sergipe utilizando-se do conceito de
requalificação/reabilitação de antigas edificações históricas; entre estas edificações, o
conjunto que mais chamava a atenção foram os sobrados comerciais construídos no século
XIX e XX denominados de “Quarteirão dos Trapiches” (nome dado aos Armazéns e/ou
Depósitos de açúcar no universo urbano/rural colonial do Nordeste).

Apesar do Campus de Laranjeiras ter iniciado suas atividades de forma provisória no Centro
de Atenção Integral a Criança – CAIC, em março de 2007, com cinco cursos: Arquitetura e
Urbanismo (curso integral); Arqueologia; Museologia (cursos diurnos – matutino); Teatro e
Dança (cursos noturnos), efetivamente a implantação do Campus de Laranjeiras da UFS no
Quarteirão dos Trapiches se dá a partir da inauguração da Biblioteca no ano de 2008 (na
edificação conhecida por Teatro Santo Antônio) e em 2009 nas edificações chamadas pelo
senso comum da população local de Trapiches.

No decorrer destes dez anos fatos dos mais variados ocorreram, destacando-se: a falta da
construção de um relacionamento de pertença entre o Campus e os moradores da cidade ao
ponto da grande maioria dos alunos que se matricularam nos cinco cursos que fizeram parte
da proposta acadêmica inicial serem oriundos da capital e de outras cidades do Estado;
processos de violência contra os estudantes que atingiram seu auge em meados de 2014,
que resultaram na suspensão temporária das aulas e na posterior transferência das atividades
dos cursos de Dança e Teatro para a sede da UFS em São Cristóvão; falta de conservação e
restauro técnico-científico das edificações históricas ao ponto do desabamento de um dos
arcos das ruínas das edificações em 2017 e da interdição do sobrado número 117 há
aproximadamente 4 anos.

Frente à comemoração dos dez anos do Campus na cidade, ocorrida no mês de março de
2017, cabem inúmeras reflexões sobre o conceito de educação patrimonial que fundamentou
a implantação/existência da UFS nos antigos trapiches de Laranjeiras; portanto, este artigo
analisa o repositório cultural material e imaterial da cidade que serviu de conceito chave/base
para o projeto de implantação; contabiliza se a produção dos TCCs dos cursos de Arquitetura
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e Urbanismo, Arqueologia e Museologia, neste interstício, refletem a riqueza cultural
patrimonial disponível na cidade e; registra a condição de conservação atual e conceitos de
restauro aplicáveis nas edificações utilizadas/vivenciadas pelos alunos; nestas três condições
busca-se identificar motivos concretos e imaginários deste sentimento presente de que o
Campus de Laranjeiras “não deu certo”.

A Cidade, o Trapiche e a Universidade


A colonização da região do Cotinguiba e, especialmente, a origem do povoado de Laranjeiras
são relatados em algumas estórias e histórias, a mais romântica descreve que a cidade
nasceu de uma bela flor simbolizando a virgindade das noivas como esposa do rio que corta
o Vale da Pedra Branca (Oliveira, 1942, p. 35). Oliveira ainda conta que na margem esquerda
do rio Cotinguiba existia uma laranjeira, debaixo da qual os primitivos habitantes cantavam ao
som da viola seus amores, descansando do sol vigoroso aguardando a hora das viagens.

Associa-se à romântica história da fundação de Laranjeiras a ela ter se tornado o berço da


cultura da Província e do Estado e com o tempo ser alcunhada de Athenas Sergipana (História
dos Municípios: CINFORM Municípios, junho de 2002, p. 126 a 128). Laranjeiras está situada
entre seis morros: Alto do Bomfim; Colina de Bom Jesus dos Navegantes; Cruzeiro do Século;
Boa Vista; Oiteiro do Horto e Pedra Furada e, que a data de sua origem não pode ser
determinada, devido a lentidão de sua implantação; sendo que alguns consideram que o
núcleo urbano vai surgir por volta de 1794 (Laranjeiras: sua história, sua cultura, sua
gente/Prefeitura Municipal de Laranjeiras, Laranjeiras: SEMEC, 2000, p. 24).

Um dos elementos de maior importância para a fundação do povoado de Laranjeiras foram


os Engenhos de Açúcar; Nascimento (1981, p. 34 e 63) descreve que havia no Vale do
Cotinguiba mais de trezentos engenhos; bem como, a implantação do povoado esteve
associada aos Jesuítas que construíram a Igreja do Retiro em 1701 em devoção a Santo
Antônio e a Igreja de Comandaroba (feijão verde na língua Tupi) entre 1731 e 1734 em
devoção a Nossa Senhora da Conceição.

Para Reis Filho (1968, p. 177 e 181) a implantação de construções religiosas no arraial
significavam o próprio resultado do surgimento das povoações. O caso de Laranjeiras não
fugiria a essa regra estando relacionado à construção da Igreja Matriz do Sagrado Coração
de Jesus; outras igrejas de importância na história da arquitetura da cidade de Laranjeiras
são: Senhor do Bomfim (1836); São Benedito e Nossa Senhora do Rosário (século XIX); Igreja
de Nossa Senhora da Conceição dos Pardos (1834-1860); Capela de Santa Aninha (século
XIX); Igreja de Bom Jesus dos Navegantes (1905); Igreja Jesus, Maria e José (1769) e Igreja
Presbiteriana de Sergipe de 1884.

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Em relação aos monumentos civis, destacam-se o Museu de Arte Sacra de Laranjeiras; o
Centro de Tradições (localizado em um dos antigos trapiches da cidade); o Museu Afro-
Brasileiro de Sergipe que registra a presença marcante dos negros nesta comunidade; a Casa
de Cultura João Ribeiro; a Escola Zizinha Guimarães; o Teatro Santo Antônio (atual Biblioteca
do Campus); o Mercado Municipal de 1895; o Paço Imperial que recebeu a visita de D. Pedro
II em 1860; a ponte Nova de 1842; o Antigo Teatro São Pedro (ruinas); o Cine Teatro Iris; o
Hospital São João de Deus (Lampião foi operado do olho neste local); também merece
destaque o patrimônio arquitetônico composto por casarões do século XIX, como a Vila
Maroca.

Os monumentos naturais como a gruta da Pedra Furada usada como refúgio dos índios
durante a colonização portuguesa e a gruta da Matriana usada pelos antigos padres da
Companhia de Jesus para meditações e orações e que têm no seu interior pinturas de Horácio
Hora (celebre pintor Sergipano); representam importante patrimônio natural do Estado.

Em relação à formação da população local, os afrodescendentes são maioria e suas tradições


e superstições nas suas invocações, como a Santa Barbara influenciaram a formação da
cidade e sua implantação, chegando até nossos dias como um conjunto patrimonial imaterial
de importância impar e sem igual na cultura nacional; representado no Reisado (dança de
origem portuguesa); Guerreiros (os personagens usam chapéus enfeitados com fitas que vão
até os joelhos); Lambe Sujos e Caboclinhos (combate entre negros e índios na época da
escravidão); Cacumbi (negro que almeja a liberdade); Taieira (dança de origem africana de
caráter religioso); Samba de Parelha (do povoado Mussuca); Dança de São Gonçalo (cantava
e tocava para as prostitutas); Batalhão 10 de São João (grupo de mulheres); Chegança
Almirante Tamandaré (ciclo natalino); Penitentes (quaresma nos cemitérios depois da meia
noite).

A estas festas populares somam-se tradições de bandas e filarmônicas como a Banda Santa
Cruz; a União dos Artistas; do Comércio; Nossa Senhora Conceição e Sagrado Coração de
Jesus; todas estas representações patrimoniais perfazem uma riqueza cultural material e
imaterial alicerçado no modo do fazer e saber do povo; o artesanato é representado na
tradição dos oratórios, no fazer de Santos e objetos religiosos; nas procissões; nos terços e
nas Rezadeiras; nos Aguadeiros; na pesca e nos pratos típicos da região (moqueca de
Monjongomes); além dos inúmeros mitos e lendas como a Lopa; O Anjinho; a Mão Fora da
Cova; o Fogo Corredor; etc.

A cidade de Laranjeiras teve seu período de ouro entre 1878 e 1904, entrando em decadência
econômica a partir do início do século XX; esta decadência é explicada por muitos devido à
proximidade da nova capital de Sergipe Aracaju (Oliveira, 1942, p. 204). As poucas atividades
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econômicas e comerciais fizeram com que a cidade passasse por um longo período de
dificuldades acarretando a área histórica da cidade e suas edificações uma série de
degradações; em 1970, novas atividades extrativistas minerais (cimento; produção de adubo)
conduzem novamente a Athenas Sergipana a um renascimento econômico e cultural, este
último alavancado pelo “Encontro Cultural de Laranjeiras” (Figura 1).

Figura 1 – (Acima) – Esquerda: Vista da cidade de Laranjeiras do alto da Torre da Igreja do Bomfim; a
vista geral demonstra o Vale do Cotinguiba com o Rio Cotinguiba no seu centro. Direita: Igreja de Santo
Antônio no Engenho Retiro de 1701 primeira morada dos Jesuítas em Sergipe. (Centro) – Esquerda:
Museu de Arte Sacra em casarão Eclético do início do século XX. Centro: Antigo Hospital São João de
Deus do século XIX; neste local dizem que Lampião foi operado (olho) pelo Dr. Bragança. Direita: Gruta
da Pedra Furada, a população comenta que se liga por um túnel a Igreja de Comandaroba – rota de
fuga para escravos e padres Jesuítas. (Abaixo) – Esquerda – Penitentes. Centro: Moqueca de
Monjongomes. Fonte: Eder Donizeti, abr. de 2012. Direita: Cacumbi. Fonte: Neu Fontes, jun.de 2010.

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Com a renovação econômica da cidade de Laranjeiras a partir do final de 1970,
vagarosamente vão sendo revistos planos e projetos visando a requalificação/revitalização da
área histórica urbana da cidade (Azevedo, 1974); entretanto, somente em 2004 a partir do
Programa Monumenta ocorre a possibilidade de implantação de um Campus da Universidade
Federal de Sergipe; contudo, a grande questão era: quais seriam as edificações mais
indicadas para a materialização desta empreitada?

Entre as inúmeras edificações degradadas no conjunto urbano de Laranjeiras chamava a


atenção da Unidade Executora de Projetos do Programa Monumenta e 80 S.R. IPHAN/SE o
conjunto denominado de “Quarteirão dos Trapiches” constituído pelos imóveis: Trapiche
Santo Antônio; Sobrado 117; Exatoria; Casarão 159; Ruinas ao lado do Casarão 159 e ruinas
em frente ao Mercado. Dentre este conjunto destaca-se o Trapiche Santo Antônio
(denominação para armazéns ou depósitos de açúcar). A construção de trapiches na cidade
de Laranjeiras utilizando pedras calcárias é citada por Nascimento (1981, p. 63), a partir de
meados de 1848; bem como, sua arquitetura se caracteriza por grandes vãos cobertos por
estruturas de madeiras grossas e tesouras largas e planta baixa de formato retangular.

Ao optar pelos Trapiches o Projeto Monumenta deparou com uma edificação praticamente em
ruínas, sobrando apenas parte das fachadas originais e parte das colunas internas que
serviam originalmente a estrutura destes vãos cobertos; o programa decidiu por uma proposta
de “reconstrução” das fachadas “originais” e parte da edificação consolidando as colunas de
pedra remanescentes; sobre este projeto caberiam inúmeras reflexões críticas, pois vão
desde o mimetismo aplicado na reconstrução das edificações, a falta de cuidado para a
implantação de um novo uso, pois tanto as salas de aula, quanto as instalações, assim como
futuros laboratórios, não foram pensados no projeto de requalificação deste conjunto; fatores
que até os dias de hoje impõe inúmeras restrições ao uso dos espaços.

Em relação ainda à tipologia arquitetônica, materiais e mão de obra que serviram a construção
dos Trapiches em Laranjeiras, predomina uma feição neoclássica, ou melhor, do Segundo
Império (Souza, 1994, p. 32); Nascimento (1981, p. 63) comenta que as edificações de
Laranjeiras sofrem alterações de influência neoclássica a partir da metade do século XIX,
assim como, os sobrados da cidade receberam, no início do XX, influências ecléticas ao estilo
neogótico; em relação aos materiais, a pedra calcária e a argamassa formada por cal, argila
vermelha e melaço de cana de açúcar fabricada pelos escravos e, posteriormente a pedra
granítica, são os elementos construtivos encontrados nas edificações da cidade; a mão de
obra escrava junto com as teorias portuguesas pode ser vista na talha e escultura das pedras
assentes das colunas e alvenarias das igrejas, bem como, no uso de argilas nas argamassas
da taipa a mão ou sebe (Figura 2).

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Figura 2 – (Acima) – Situação anterior a “reabilitação” do Quarteirão dos Trapiches” no ano de 2004.
Fonte: ROCHA e SILVA in Nogueira e Donizeti da Silva (org.) 2009, p. 155. (Centro) – Vista
do ”Quarteirão dos Trapiches” após a intervenção do Programa Monumenta em 2009. Fonte: Eder
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Donizeti, jan. de 2009. (Abaixo) – Esquerda: Sobrado 117, visto da parte interna do “Quarteirão dos
Trapiches” antes da intervenção - 2005. Fonte: ROCHA e SILVA in Nogueira e Donizeti da Silva (org.)
2009, p. 166. Direita: Sobrado 117 depois da intervenção em 2012. Fonte: Eder Donizeti, jan. de 2012.

A implantação e operacionalização do Campus da UFS em Laranjeiras, o qual, desde de cedo,


foi denominado de “Campus da Cultura e Arte” a partir do Termo de Cooperação N0 01/2006
(Termo de Convênio N0 1161.066/2006-UFS) ocorreu em três etapas: 10 - Os cursos
(Arquitetura e Urbanismo; Arqueologia; Teatro; Dança e Museologia) começaram a funcionar
em instalações provisórias a partir de 2007 (CAIC – Centro de Atenção Integral a Criança),
local que não oferecia condições pedagógicas a seu funcionamento, assim como, os
professores eram voluntários oriundos do Campus de São Cristóvão; apenas no segundo
semestre do início das aulas foi efetivado um professor e os outros eram todos substitutos; 20
- Inauguração da Biblioteca do Campus em 2008 no Edifício denominado pelo Programa
Monumenta de Casarão do Oitão (Teatro Santo Antônio); a edificação também não atende
satisfatoriamente a um programa arquitetônico para esta finalidade; especialmente no que
concerne a mobilidade e acessibilidade; 30 – Inauguração da sede definitiva em 12 de junho
2009 no “Quarteirão dos Trapiches” – salas de aula, administração e auditório; não foram
previstos espaços para laboratórios específicos aos cursos, bem como, locais que
possibilitassem atividades pedagógicas adequadas; os espaços sempre foram utilizados de
forma improvisada; este improviso foi reforçado em 2013 pela implantação em um local em
separado (mini shopping da cidade) de dois containers para atender a demanda da falta de
salas de aula.

Os cursos do Campus de Laranjeiras seguiram sua trajetória de 2009 a 2014 sempre


enfrentando problemáticas que refletiam a falta de planejamento de sua implantação e a
inadequação do espaço as atividades universitárias propostas; contudo, o fator mais
expressivo comentado pelos usuários do Campus e moradores da cidade de Laranjeiras era
a falta de relacionamento entre eles; ou a pouca ou inexistente relação de
identidade/pertencimento entre Instituição e cultura local. Estas dificuldades de
relacionamento entre população e UFS Campus de Laranjeiras se revelaram com intensidade
em meados de 2014, quando diante da insegurança e medo que os estudantes viviam as
atividades do campus foram suspensas temporariamente até que providências fossem
tomadas (<http://g1.globo.com/se/sergipe/noticia/2014/05/onda-d-violencia-suspende-aulas-
da-ufs-em-laranjeiras-se.html> consultado em 10/05/2017).

Em carta publicada em 04 de junho de 2014 por um dos professores do Campus na internet


(<http://www.jornaldodiase.com.br/noticias_ler.php?id=10873> consultado em 10/05/2017)
pode-se perceber a angustia que então professores, alunos e usuários do Campus viviam:
“Agora vejo a universidade federal na figura de sua gestão maior virar as costas à cidade, vejo
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colegas e alunos falando em "Laranjeiras nunca mais!" como se fosse essa a solução para
uma violência anunciada que foi crescendo em um contexto de muitos responsáveis”. Neste
desabafo o(a) docente continua: Quantos professores de todos os cursos realmente
preocuparam-se em conhecer a comunidade como eu conheci? Quantos dedicaram-se à
projetos de extensão na comunidade?... Quantos alunos saíram de suas salas para integrar-
se à comunidade?...”; finalizando com uma previsão que depois se tornou real (saída dos
cursos de Dança e de Teatro): “Choramos porque os cursos desmembrados irão para São
Cristóvão como "retirantes" de uma "seca violenta de cérebros pensantes e solidários"
(<http://www.ufs.br/conteudo/14299-aulas-do-campus-de-laranjeiras> consultado em
17/05/2017).

Nos últimos 3 anos o cenário não se modificou, pelo contrário, recrudesceu, ou seja, ocorreu
a saída dos dois cursos para São Cristóvão deixando o Campus com atividades de três cursos
apenas (Arquitetura e Urbanismo; Arqueologia e Museologia); em 28 de março de 2017,
durante as comemorações de aniversário de dez anos da existência do Campus de
Laranjeiras os alunos afirmaram que: “Os estudantes também observam o distanciamento da
comunidade local em relação ao campus e acreditam que é necessário reverter este quadro.
Os alunos destacaram: “Uma constatação é a de que boa parte dos estudantes não é de
Laranjeiras”; em oposição a fala da gestão atual: “O campus de Laranjeiras é também
conhecido como o “Campus das Artes”, por trazer afinidades artísticas, culturais e históricas
condizentes com a tradição do município” (http://www.ufs.br/conteudo/56608-campus-de-
laranjeiras-relembra-as-historias-dos-seus10-anos-de-implantacao> consultado em
17/05/2017); portanto, frente a contraposição das falas, qual seria a verdadeira condição de
permuta patrimonial entre o Campus e a cidade de Laranjeiras?

Para responder se esta relação entre a Cultura e Academia tem ocorrido buscou-se o
levantamento e a identificação de trabalhos de conclusão de cursos (TCCs) realizados pelos
alunos de Arquitetura e Urbanismo; Arqueologia e Museologia (remanescentes), nesta
estatística acredita-se poder encontrar nos temas desenvolvidos nos TCCs, considerados
produtos científicos expressivos de base na formação da relação alunato, conhecimento
específico e universo vivenciado, críticas concretas a construção desta relação Universidade
e Patrimônio local.

Crítica à produção acadêmica


O sentindo da certeza científica perpassa pelo descortinar de conhecimento concreto sobre
os objetos e elementos que se buscam, desvinculados de opiniões e crenças particularizadas;
a incerteza é o mecanismo que nos faz acreditar que nossas ideias são portadoras de
verdades que demonstram realidades, contudo, é nessa incerteza e nas falhas sobre aquilo
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que acreditamos que surge a possibilidade de reflexão sobre o fato concreto almejado (Chaui,
1999, p. 90).

Como salienta Chaui (1999, p. 91) “Em nossa sociedade é muito difícil despertar nas pessoas
o desejo de buscar a verdade”; com isso, frente a inúmeras opiniões e informações sobre
questões ocorridas nestes 10 anos de implantação do Campus de Laranjeiras, especialmente
sobre a falta de pertença que existiria entre os alunos, professores, usuários do Campus e a
população local e, especificamente, sobre a relação entre o estudo do patrimônio local como
despertar do conhecimento de permuta entre a Instituição e o objeto cultural (educação
patrimonial); buscou-se um exercício inicial de levantamento de dados sobre a produção dos
Trabalhos de Conclusão de Curso (TCCs) em Arquitetura e Urbanismo; Arqueologia e
Museologia que pudessem iniciar um processo de informação mais do que de desinformação.

Os dados levantados tiveram como fonte de origem os TCCs cadastrados da Biblioteca do


Campus de Laranjeiras (PERGAMUM - Sistema Integrado de Bibliotecas) entre os anos de
2009 e 2014; sendo que de um total de 144 títulos/exemplares cadastrados e registrados, 95
eram TCCs; 8 estavam relacionados ao curso de Arquitetura e Urbanismo; 64 ao curso de
Arqueologia e 18 ao curso de Museologia; perfazendo um total de 90 TCCs cadastrados; o
levantamento apontou o registro de alguns títulos (5) para o curso de Dança e nenhum para
o de Teatro; acreditamos que esta falta de registros possa estar relacionado a estes dois
cursos não terem mais nenhuma atividade de ensino no Campus de Laranjeiras, aspecto que
nos direcionou neste momento a exclusão de suas análises, entretanto, esta
afirmação/posicionamento requer aprofundamento/aprimoramento da investigação.

Sabendo que o curso de Arquitetura e Urbanismo do Campus de Laranjeiras é o que possui


maior número de alunos matriculados, buscou-se complementar este levantamento com
informações dos TCCs realizados e cadastrados no Departamento do semestre de 2013-2 ao
2016-2 (dados disponíveis); que totalizam 101 trabalhos de conclusão de curso; estes dados
junto com o registro da Biblioteca, mesmo em se admitindo percentuais de erros, já
conformam uma informação mais científica sobre os TCCs em Arquitetura e Urbanismo que
buscaram estudos relacionados ao patrimônio cultural da cidade de Laranjeiras.

Para o curso de Arquitetura e Urbanismo, verificou-se que para um total de 8 (oito) TCCs
registrados no cadastro da Biblioteca de Laranjeiras, apenas 1 (Um) trata do estudo da cidade
com o tema: Proposta de Alojamento Estudantil para o Campus de Laranjeiras; os outros sete
(7) trabalham a cidade de Aracaju (Projetos). Em relação aos dados disponibilizados pelo
Departamento verificou-se que de um total de 101 (cento e um) TCCs apenas 11 (onze)
tiveram como tema a cidade de Laranjeiras, a saber: Definição de diretrizes de recuperação
urbanística e ambiental da área do Quitale – Laranjeiras-SE; Projeto de intervenção nas ruínas
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do antigo teatro São Pedro de Laranjeiras/SE; Relação entre cidade e universidade - Diretrizes
para implantação de novos edifícios do Campus da UFS de Laranjeiras-SE; Intervenção
arquitetônica-paisagística nas ruínas da antiga Estação Ferroviária de Laranjeiras-SE; Projeto
de residência universitária para UFS na ruína do antigo hospital São João de Deus,
Laranjeiras-SE; Estudo da evolução urbana de Laranjeiras: um processo de expansão-
retração; Espaços e saberes do Terreiro Filhos de Obá em Laranjeiras-SE: Análise e
intervenção arquitetônica; Impactos urbanos decorrentes da implantação de Instituições de
nível superior em cidades do interior brasileiro: o caso de Laranjeiras-SE; Residência
universitária: uma proposta de integração com a cidade de Laranjeiras-SE; Concepção de
projeto arquitetônico na contemporaneidade: o caso da Pedreira de Laranjeiras-SE e; Projeto
de requalificação da Pedreira de Laranjeiras-SE.

Os outros temas de TCCs em Arquitetura e Urbanismo estiveram ligados, na maioria, a


projetos e urbanismo, ou seja, 40 (quarenta) têm como tema a cidade de Aracaju/SE; contudo,
se levarmos em conta o papel dos Campi na interiorização do conhecimento, 16 (dezesseis)
TCCs foram realizados com temas de cidades do interior, sendo sobre Sergipe 14 TCCs;
contudo a maioria voltada para projeto e urbanismo; o restante 34 (trinta e quatro) estiveram
direcionados para temas relacionados à teoria do projeto e, diminutamente, a questões do
patrimônio cultural.

Neste levantamento de TCCs em Arquitetura e Urbanismo os resultados demonstraram uma


relação muito incipiente entre produção acadêmica e patrimônio local, pois, a grande maioria
dos objetos patrimoniais da cidade, representado por Igrejas de importância nacional como
Comandaroba, bem como, técnicas construtivas (saber fazer), desenho patrimonial, conjuntos
urbanos históricos, etc., ainda não foi alvo de estudos.

Para o curso de Arqueologia foram verificados nos registros da Biblioteca do Campus de


Laranjeiras um total de 64 TCCs; sendo que, dentre estes apenas 9 (nove) tiveram como tema
a cidade de Laranjeiras: O espaço entre o sagrado e o profano em Laranjeiras;
Zooarqueologia histórica: abordagens teóricas na panificação Barroso; Um novo uso atribuído
ao patrimônio arqueológico: o Quarteirão dos Trapiches - Laranjeiras/SE; Entre panelas e
batuques: arqueologia da diáspora e relações de gênero e poder em Laranjeiras/SE (século
XX); "Atenas sergipana": arqueologia da paisagem urbana da cidade de Laranjeiras; Abate e
preparo da carne: uma questão cultural-trabalho de zooarqueologia em Laranjeiras-Sergipe-
Brasil; Análise tecnológica dos instrumentos líticos provenientes do Sítio Pilar (Mussuca,
Laranjeiras, Sergipe); Saveiro de Laranjeiras-SE: relatos do ponto vista arqueológico,
econômico, social e portuário no Vale do Cotinguiba-SE; A Memória na construção do
passado do sítio Ruínas do Teatro São Pedro, Laranjeiras, Sergipe.

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Os outros temas desenvolvidos em Arqueologia (55) apontam para áreas da etnoarqueologia;
zooarqueologia; bioarqueologia; paleopatologia; estudos líticos-cerâmicos e etc; sendo que
destes, também se pode destacar o papel da interiorização dos Campi, tendo propostas de
estudos (TCCs) para as cidades sergipanas de Maruim; Graccho Cardoso; Frei Paulo; Santa
Luzia do Itanhi; São Cristóvão; Japaratuba; Rachuelo; Santo Amaro das Brotas; Divina
Pastora; Areia Branca e, especialmente, para Canindé do São Francisco.

Os resultados para os TCCs de Arqueologia, como de Arquitetura, apontam para uma baixa
produção de temas voltados para o patrimônio da cidade, deixando ainda por se estudar sítios
arqueológicos potenciais como a Gruta da Matriana, as ligações subterrâneas entre a Gruta
da Pedra Furada e Comandaroba; assim como, ruinas dos mais de 70 engenhos da região
como Santa Aninha e uma variedade muito grande de objetos portadores de patrimonialidade.

Para o curso de Museologia apenas foi verificado um registro de 18 (dezoito) TCCs, sendo
que destes um total de 4 (quatro) se dedicaram ao estudo da cidade de Laranjeiras, a saber:
Museus e ações afirmativas: perspectivas de aplicação da lei federal 10.636/93 no Museu Afro
Brasileiro de Sergipe-MAB; Em busca de Zizinha: vestígios para a musealização da memória
sobre Eufrozina Amélia Guimarães (1872-1964); No compasso da micarême: 75 anos de
alegria em Laranjeiras (memória e musealização); A mulher, a arte e o tempo. Laranjeiras,
Se.

Os outros temas desenvolvidos pelos TCCs em Museologia (14 registros) estiveram voltados
para a identidade e memória; comunicação; ações educativas; políticas de preservação do
patrimônio; tradição e memória; documentação; valorização de objetos patrimoniais; portanto,
apesar de atender a questão histórica e teórica patrimonial, esses trabalhos não estão
diretamente tematizados para a cidade de Laranjeiras.

O repositório da cultura imaterial de Laranjeiras pode ser considerado um dos mais ricos do
Brasil, as danças, as roupas, os objetos, o artesanato, o saber fazer, a religiosidade, o
sincretismo religioso, etc., conformam expressivos produtos que ainda podem e devem ser
estudados pela Museologia; percebe-se, que os temas que foram produzidos (registros
disponíveis) em relação a cultura local ainda requerem a busca de ampliação na relação entre
academia e patrimônio.

Desta forma, a partir do levantamento realizado, chega-se à conclusão que os Trabalhos de


Conclusão de Curso (TCCs) que até o momento foram produzidos no Campus de Laranjeiras
expressam a pouca permuta de relacionamento entre a Academia/alunato e Patrimônio local
necessitando ações pedagógicas educativas patrimoniais para que esta deficiência seja
resolvida (Figura 3).

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Figura 3 – Gráficos sobre quantitativo e temáticas dos Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) do
Campus de Laranjeiras (Arquitetura e Urbanismo; Arqueologia; Museologia) da Universidade Federal
de Sergipe. Fonte: Adriana Nogueira, mai. de 2017.

Complementando o questionamento sobre falta de permuta patrimonial entre o Campus e a


cidade, outra questão necessita de reflexão, ou seja, como um aluno que ingressa em um
Campus constituído por edificações históricas e com cursos voltados para o conhecimento
patrimonial vivencia ações de intervenções nas edificações diferentes do que lhe é ensinado
teoricamente; portanto, a crítica à conservação/restauro das edificações que compõem o
Campus de laranjeiras se torna fundamental.
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Crítica à conservação e restauro das edificações históricas
No ano de 2015, as edificações que compõe o Campus de Laranjeiras – “Quarteirão dos
Trapiches” – após vários anos sem manutenção preventiva, apresentavam inúmeras
degradações nos revestimentos das paredes (argamassa de revestimento – reboco/emboço);
na parte estrutural (stress mecânico em várias paredes); na cobertura (vários locais de
infiltrações por umidade); os remanescentes de pedra, colunas e paredes, apresentavam
locais com perda de material; frente a esta problematização foi submetido um projeto de
pesquisa referente ao EDITAL Nº 02/2015/POSGRAP/COPES/UFS Código: PVF3752-2015
Título: O PÓ CERÂMICO E A ESCÓRIA DE ACIARIA COMO ALTERNATIVAS NO
RESTAURO DO PATRIMÔNIO CULTURAL.

Este projeto de pesquisa teve como objetivos executar estudo histórico de argamassas
antigas a base de cal; realizar todo o levantamento das anomalias existentes nas edificações
que compõem o Campus de Laranjeiras; entender/compreender a partir de ensaios
laboratoriais a possibilidade de aditivos nas argamassas de revestimento do Campus visando
a restituição dos locais que se apresentavam com incidência de degradação; o projeto foi
coordenado pelo Prof. Dr. Eder Donizeti da Silva; pela Profa. Dra. Adriana Dantas Nogueira;
teve como colaboradores a técnica laboratorial do CTPR Rosane Greziele Leite dos Santos;
o técnico laboratorial do CTPR Alex Souza Santos; participaram da pesquisa os alunos de
Arquitetura e Urbanismo Josefa Luana Oliveira Freire; Mayra Rayanne Vieira Gonçalves Lima
e Uallison Vinicius Nascimento Castro.

No concernente à verificação das patologias de degradação (anomalias), o edifício da


Biblioteca do Campus (Teatro Santo Antônio) apresentou expressivo ataque por manchas
negras provocadas pela contaminação por gás carbônico nas suas fachadas; bem como, uma
série de descascamentos da pintura e perda do reboco; ataque de vegetação aérea; na parte
interna ocorre perda intensa do reboco na escada de acesso aos pavimentos superiores; a
algeroz está danificada provocando intensa penetração de águas das chuvas inundando
vários cômodos do casarão; uma grande fissura (rachadura) localizada no 2º pavimento
requer urgência de restauro.

A edificação de maior importância no conjunto do “Quarteirão dos Trapiches” é o Trapiche


Santo Antônio; a pesquisa revelou ser um dos locais com maior incidência de degradações;
ocorre uma grande perda de material (reboco) na sua fachada principal e lateral; as paredes
de pedra da lateral demonstram ataque por sais (cloreto e sulfato); várias rachaduras; ataque
por insetos (cupins); as paredes de pedra também demonstram um ataque biológico por
bactérias que precisa ser mais estudado e têm provocado grande perda de material (emboço

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entre as pedras); ataque por fungos e liquens; crosta negra; etc, são outros agentes
patológicos neste local.

O Sobrado 117 é uma das edificações que apresentam grande problemática estrutural,
inclusive o pavimento superior está interditado a mais de 4 anos; recentemente (2017) foi
interditado o térreo desta edificação; apresenta intensas fissuras (rachaduras) por todas as
paredes internas; umidades ascendentes e descendentes; fungos, liquens e bactérias; na
fachada principal na região da cimalha se verificam grandes áreas com empolamentos,
puvulrulências; perda de material e manchas negras.

A Exatoria, conhecida pelos alunos como auditório apresenta na parte interna intenso ataque
por umidade; manchas esverdeadas nas paredes; bolor, fungos e bactérias; nas paredes
externas o ataque por umidade é ainda mais expressivo, bem como, o ataque por fezes de
animais (pombos) propicia a salinidade por nitratos; apresenta grande quantidade de fissuras
e manchas negras.

O casarão 159 conhecido como administração do Campus (Direção e coordenação de cursos)


é uma edificação com uma das mais severas patologias entre as edificações, ou seja,
apresenta no vão da escada de acesso ao pavimento superior grandes rachaduras, que ao
serem observadas ao longo desses anos têm se mostrado a cada período com uma
preocupante evolução de suas dimensões; na parte externa ocorre perda de material,
fissuramento; manchas negras e uma série de ataques por umidade e salinidade.

As Ruinas ao lado do Casarão 159 e ruinas em frente ao Mercado sofrem de todas as


anomalias que já foram descritas nas outras edificações; quanto a parte interna, uma das
degradações mais severas se deu com o desmoronamento de um dos arcos ocorrido a
apenas três dias das comemorações dos dez anos do Campus, este arco já apresentava
problemas estruturais desde de o ano de 2010; quando então foram colocadas escoras de
madeira para que ele não arruinasse, contudo a falta de um procedimento de conservação e
restauro ao longo destes anos provocou sua queda e, devido à pouca cientificidade na recolha
do material a impossibilidade de sua restituição futura.

A crítica à conservação das edificações se estabelece no pouco cuidado científico na


prevenção destas patologias; bem como, nas ações inadequadas de intervenções que
podemos chamar de “reformas”, ou seja, uso de tintas modernas inapropriadas; uso de
argamassas a base de cimento nas paredes históricas; falta de uma intervenção aplicando o
conhecimento da tecnologia da conservação e restauro; estas situações, dentro de um
Campus criado com a finalidade do ensino patrimonial, acarretam inúmeras distorções
educacionais de como se deva agir frente aos objetos culturais de valor histórico e artístico
(Figura 4).
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Figura 4 – (Acima) – Esquerda: Biblioteca de Laranjeiras em junho de 2016. Centro: Trapiche Santo
Antônio em junho de 2016. Direita: Estado de degradação do Trapiche Santo Antônio, em junho de
2016. (Centro) – Esquerda: Vista da degradação na fachada lateral do Trapiche Santo Antônio em
junho de 2016. Centro: Degradações do Sobrado 117, em junho de 2016. Direita: Degradações na
Exatoria em junho de 2016. (Abaixo) – Esquerda: Sobrado 159, vista das degradações nas fachadas,
em junho de 2016. Centro: Arco, em 2010, já com problemas estruturais e desmoronamento do mesmo
Arco, em março de 2017. Direita: Uso inadequado de cimento por todas as paredes do Campus, em
2017. Fonte: Eder Donizeti.

Quanto à crítica ao restauro promovido pelo Programa Monumenta, há de se elencar a falta


de convite a população local para verificar as propostas de intervenções; a falta de convite
participativo aos professores e alunos na época para conhecer e opinar sobre os
procedimentos de intervenções, o que acarretou um distanciamento entre a instituição e a
futura edificação a ser habitada; procedimento de “restauro” em que não observou critérios
referentes a teoria da conservação e restauro, uma vez que, não se sabe ou não se participou
à comunidade acadêmica da época como seriam os espaços ofertados aos cursos; sobre a
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decisão de se implantar cursos específicos não se tem notícia de ter existido um levantamento
e discussão com a população sobre suas necessidades ou anseios mercadológicos
profissionais; com uma intervenção “restaurativa mimética” apenas a partir de possibilidades
de visualizações de algumas lacunas a serem preenchidas e invenções da maioria das
fachadas, com exceção do Sobrado 117 (o mais íntegro na ocasião) a reabilitação das
edificações não atendeu por completo a teoria da conservação e restauro.

Considerações finais
A percepção de algumas variáveis-chave do papel da Educação pode agregar valor ao ensino;
no caso dos últimos dez anos do Campus de Laranjeiras se percebe um desalinhamento
pedagógico em relação a educação patrimonial e a pouca permuta entre o aprendizado
disponibilizado no Campus e o repositório cultural local e a falta de cuidado na conservação
e restauro das edificações.

Os resultados de levantamento dos temas dos TCCs demonstraram concretamente que


nestes últimos dez anos ocorreu diminuta preocupação com a essência patrimonial/cultural
que norteou a criação do Campus, assim como, o alunato ao vivenciar ações de intervenções
nas edificações que não condizem com a teoria da conservação e restauro ministrada,
construíram um imaginário de que ao se tentar educar mais se tem deseducado.

Referências Bibliográficas
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de restauração e renovação arquitetônica. Salvador: FAU-UFBA, 1974.

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1981.

IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio


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OLIVEIRA, Philadelpho Jonatas de. Registro de fatos históricos de Laranjeiras. Aracaju:
Casa Avila, 1942.

REIS FILHO, Nestor Goulart. Contribuição ao Estudo da Evolução Urbana no Brasil


(1500/1720). São Paulo: Pioneira, 1968.

ROCHA, Luciana Machado Ribeiro e; SILVA, Cynara Ramos. Trapiche: Projeto e Obra. in
Nogueira, Adriana Dantas e Donizeti da Silva, Eder (org.) O Despertar do Conhecimento na
Colina Azulada. V. II. São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe, 2009, 200 p.

SAÍDA DOS CURSOS DE LARANJEIRAS <http://www.ufs.br/conteudo/14299-aulas-do-


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SOUZA, Alberto. Arquitetura neoclássica brasileira: um reexame. São Paulo: Pini, 1994.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
ÉTICA E ESTÉTICA DAS PAISAGENS CULTURAIS: Romarias,
peregrinação, religiosidade e turismo na localidade rural de
Cemitério do Peixe, Distrito de Costa Sena (Conceição do Mato
Dentro - Minas Gerais)

ANDRADE, VAGNER LUCIANO DE (1); SILVA, LUDIMILA DE MIRANDA


RODRIGUES (2)
1. Guia de Turismo e graduando em História - Licenciatura pelo UNCESUMAR – Centro Universitário
de Maringá. Agente Voluntário da Rede Ação Ambiental. Praça 14 Bis, 130/Apto 906 – Bela Vista,
São Paulo/SP CEP 03240-400. E-mail: trezeagosto@yahoo.com.br

2. Bacharel, Mestre e Doutoranda em Geografia (IGC-UFMG) Rua Principal, 231, Bl. 03/Apto 203,
Bernardo de Souza, Vespasiano – MG CEP 33220-000 E-mail: ludimilarodrigues86@gmail.com

RESUMO
O presente trabalho destina-se ao breve entendimento das romarias, das peregrinações e do turismo
religioso no âmbito de apropriação e significação das paisagens geográficas. Compreende análise do
contexto histórico-cultural e potencialidades das localidades rurais de Cemitério do Peixe, no distrito
de Costa Sena, município de Conceição do Mato Dentro-MG e da vila de Mato Grosso, no distrito de
Deputado Augusto Clementino, município de Serro-MG, ambos ao norte metropolitano da capital
mineira. Após a análise da paisagem cultural e da paisagem religiosa/espiritual apresenta-se a
conceituação da mesma, exemplificando romarias, peregrinações e religiosidade no âmbito do
turismo. Apresenta-se como exemplo, a romaria anual empreendida entre as cidades de Carmópolis e
Congonhas, tecendo brevemente a proposta de Circuito Turístico Sete Dores de Maria para o trecho
tradicionalmente percorrido de 100 km ao sul da região metropolitana da capital. Na sequência
explora o universo místico e espiritual das localidades: “fantasmas” de Cemitério do Peixe e Mato
Grosso no âmbito dos contextos histórico e cultural de Conceição do Mato Dentro-MG e Serro-MG,
respectivamente. Assim a partir dos recortes espaciais busca-se entender os mecanismos éticos,
estéticos e epistemológicos que motivam a consolidam a apropriação de lugares e paisagens no
âmbito do turismo místico e religioso. Empreende-se então a partir do lugar e da paisagem a
construção de uma geografia do sagrado, uma geografia da peregrinação, com suas nuances e
projeções.

PALAVRAS-CHAVE: Paisagens de Romarias; Geografia da Peregrinação; Turismo Religioso.

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CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente trabalho inicia-se com as seguintes indagações: o que é ética? O que é
estética? O que é epistemologia? O que elas têm haver com a paisagem? Mais do que
nunca são questionamentos emergentes que se posicionam contra o modelo
socioeconômico vigente. O homem dos tempos atuais busca entender questões sobre o
“paradigma”, como os paradigmas atuam em nossas vidas, se são positivos ou negativos. É
impossível negar o conflito entre o paradigma cartesiano e a busca por um paradigma
contemporâneo, digamos mais “holístico”. Assim empreendido numa constate reflexão sobre
aspectos positivos e negativos, buscam-se novas ações que mudem o paradigma outrora
consolidado e em visível desgaste. Partindo da ideia de holismo, ou seja, da interação entre
as partes compõem o todo, nota-se que o mundo precisa de pensamentos sistêmicos e
globais que propiciem soluções a problemáticas locais. Assim, uma visão “ampla” dos
elementos físicos, naturais, sociais e culturais que fazem parte do sistema no qual estamos
inseridos se torna o eixo a conduzir novas propostas para o projeto de sociedade. Mas o
paradigma não se refere apenas ao projeto de sociedade, mas sobretudos à simbologia de
suas projeções, suas permanências e rupturas. Há um paradigma simbólico, existencial,
espiritual, religioso que se alterna na paisagem. Nesta discussão acerca do paradigma
evidencia-se a paisagem local com suas nuances e projeções. A paisagem e o lugar
empreendidos a partir de suas realidades culturais especificamente subjetivas. A paisagem
entendida como um elo de conexão com o sagrado. A paisagem enquanto condicionante da
prática turística. A paisagem sagrada, a religiosidade e o turismo religioso. As romarias e
peregrinações a lugares e paisagens que adquiriam força e expressividade. Uma ética para
com estes lugares.

A PAISAGEM CULTURAL ESPIRITUAL: conceituação, romarias,


peregrinações e turismo religioso
Quando se fala de paisagem religiosa, fala-se em paisagem cultural. No âmbito do
turismo, a paisagem cultural é aquela classificada em áreas de interesse turístico específico
que abarca potencialidades e nichos para o desenvolvimento do turismo cultural. Dentro da
dimensão, da configuração e caracterização do turismo cultural, existem formas de
expressão da cultura local que demandam viagens com motivação própria, com aspectos
locais relacionados à religião, ao misticismo e o esoterismo, aos grupos étnicos, a
gastronomia, as cidades, as atividades rurais1, entre outros (BRASIL, 2009, p.14).

1No entanto, é importante ressaltar que, no caso das atividades rurais ou no âmbito do espaço rural, mesmo
sendo consideradas como formas de expressão da cultura, em função de sua importância no contexto da
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A definição de turismo cultural está relacionada à motivação do turista,
especificamente, em vivenciar o patrimônio histórico e cultural e eventos
culturais, preservando a integridade desses bens. O que caracteriza este
segmento, segundo Vaz (20012), é a intenção de apreciar e vivenciar obras
de arte, arquitetura, e manifestações culturais seja pelo apelo estético ou
pelo apelo histórico do atrativo. Esta vivência implica duas formas de
relação do turista com a cultura ou algum aspecto cultural: a busca em
aprender e entender o objeto da visitação e as experiências participativas,
contemplativas e de entretenimento, que ocorrem em função da visitação.
Para o MTur (20083), os deslocamentos para fins religiosos, místicos,
esotéricos, de visitação a determinados grupos étnicos (nos quais o atrativo
principal é a identidade e modo de vida de cada um), e atrativos cívicos são
entendidos como recortes do Turismo Cultural e podem constituir outros
segmentos para fins específicos, desde que preservados os princípios da
tipicidade e identidade. Dentre os recortes do turismo cultural podem ser
citados: o turismo cívico, religioso, místico, esotérico e étnico.

O turismo cívico é o conjunto total das atividades turísticas para conhecer


monumentos, acompanhar ou rememorar fatos históricos, observar ou participar em eventos
cívicos, que representem a situação presente ou da memória política e histórica de
determinados locais, como o dia Sete de Setembro, por exemplo. Os monumentos cívicos
remetem a um momento, personagem ou símbolo marcante da história de uma determinada
comunidade, seja distrito, municipalidade, estado ou país. Os fatos históricos ou eventos
cívicos são os rituais coletivos e as programações temporárias em que o estado, seus
símbolos e suas datas são lembrados, celebrados e evocam o espírito cívico de toda a
nação: comemorações, feriados, posses de cargos majoritários no executivo, legislativo e
judiciário (deputados, governadores, juízes, prefeitos, presidentes, procuradores,
promotores, senadores, vereadores). A visita à cidade de Ouro Preto formata-se como uma
espécie de turismo cultural cívico ao apresentar diferentes espaços e monumentos que
remontam ao Brasil Colônia. Destaca-se por seu inigualável patrimônio, descrito acordo com
Brasil (2009, p. 74):
Consideram-se patrimônio histórico e cultural os bens de natureza material
e imaterial que expressam ou revelam a memória e a identidade das
populações e comunidades. São bens culturais de valor histórico, artístico,
científico, simbólico, passíveis de se tornarem atrações turísticas: arquivos,
edificações, conjuntos urbanísticos, sítios arqueológicos, ruínas, museus e
outros espaços destinados à apresentação ou contemplação de bens
materiais e imateriais, manifestações como música, gastronomia, artes
visuais e cênicas, festas e celebrações. Os eventos culturais englobam as
manifestações temporárias, enquadradas ou não na definição de
patrimônio, incluindo-se nessa categoria os eventos gastronômicos,
religiosos, musicais, de dança, de teatro, de cinema, exposições de arte, de
artesanato e outros.

formação econômica e histórico-social, são consideradas pelo ministério do turismo um segmento próprio,
definido como turismo rural. Aqui são definidas as caracterizações de alguns nichos de interesse, considerando
aqueles temas e áreas onde a diversidade cultural brasileira apresenta maior potencial.
2 VAZ, Gil Nuno. Marketing Turístico receptivo e Emissivo: um roteiro estratégico para projetos

mercadológicos públicos e privados. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2001.


3 BRASIL, Ministério do Turismo. Turismo Cultural: Orientações Básicas. Brasília, 2008.

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O turismo religioso são os eventos de natureza religiosa e respectivos
deslocamentos motivados e/ou decorrentes da prática espiritual e da busca religiosa em
espaços4 variados, independentemente da origem étnica ou do credo, e caracterizam-se
pelas múltiplas atividades turísticas em locais relacionados às religiões institucionalizadas
para participação em diferentes eventos: apresentações artísticas; comemorações,
encontros e celebrações correlacionados; festas de caráter religioso, peregrinações e
romarias; roteiros de cunho religioso; retiros espirituais; visitação a espaços e edificações
religiosas, etc.
As paisagens religiosas são, neste sentido, as expressões imediatas das
religiões e sua sucessão no mundo perceptual. Isso revela padrões de
diversificação que podem ser verificados em diferentes processos culturais
vivenciados pelas comunidades de adeptos. Os elementos proeminentes da
paisagem religiosa são: os templos, os locais de culto, a natureza
religiosamente resignificada, o lugar destinado aos mortos, a ação social da
religião através de escolas e hospitais, os santuários, os locais de
peregrinação, as festas religiosas, as expressões culturais das comunidades
e instituições religiosas e os locais de reprodução da vida religiosa (GIL
FILHO, 2011, p. 04).

No entanto, num contexto de evangelismo de um lado e fiéis de diferentes credos, do


outro, pode-se observar situações de intolerância e fanatismo. Assim, quando a motivação é
empreendida apenas pelo interesse cultural ou pela apreciação estética do fenômeno ou de
espaços religiosos, sem motivações religiosas, são consideradas simplesmente como
turismo cultural. Exemplos tradicionalmente conhecidos como Aparecida do Norte (SP), o
Santuário Bom Jesus do Matozinhos - em Congonhas do Campo (Minas Gerais), Bom Jesus
da Lapa (BA), as cidades de Fátima (Portugal), Lourdes (França), Vaticano (estado
independente inserido dentro do Território de Roma, Itália) e Jerusalém (Israel/Palestina). O
turismo religioso conecta-se à idéia de lugar ou paisagem sagrada definida em estudos de
Pereira (2016, p. 09):
Para Mircea Eliade5 (1992, p. 17-76) seja qual for o grau de dessacralização
do mundo, o Homem que opta por uma vida profana não consegue abolir
completamente o comportamento religioso, para ele “até a existência mais
dessacralizada conserva ainda traços de uma valorização religiosa do
mundo”. Como exemplo desta experiência do “espaço de qualidade única”
do Homem que se diz não religioso, estes são os “lugares sagrados” do se
universo particular: “a paisagem natal ou os sítios dos primeiros amores, ou
certos lugares na primeira cidade estrangeira visitada na juventude”. É
necessário salientar, que “uma vida profana jamais se encontra no estado
puro”. Mesmo no Extremo Oriente, como ressalta o autor, o que se define
como “emoção estética” entre os estudiosos, ainda sim, mantém uma
dimensão religiosa.

4 Aqui se entende o conceito de Paisagem Religiosa ou Paisagem Espiritual enquanto “Paisagem como espaço
de afetividade, de revelação e emoção para a escolha de um ponto fixo: um Santuário – um centro aglutinador de
pessoas (PEREIRA, 2016, p. 06)”.
5 ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano. São Paulo. Editora Martins Fontes. 1992.

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(...)
Segundo Mircea Eliade (1992, p. 59) “para o Homem religioso, a Natureza
nunca é exclusivamente ‘natural’: está sempre carregada de um valor
religioso”. Compreende-se com facilidade, pois para o autor, “o Cosmos é
uma criação divina” que “sai das mãos dos deuses” e “o Mundo fica
impregnado de sacralidade”. Desta forma, toda a Paisagem adquire outro
nível de significação, tanto para o Homem religioso, quanto para aqueles
que o circundam e que partilham de suas vivências, narrativas e
sensibilidade. Para o Homem religioso, o “sobrenatural” está intimamente
ligado ao “natural” e a Natureza sempre revela algo que a transcende.
Como exemplo, Mircea Eliade (1992, p. 59) afirma que “se uma pedra
sagrada é venerada porque é sagrada e não porque é pedra; é a
sacralidade manifestada pelo modo de ser da pedra que revela sua
verdadeira essência”. Por este motivo o autor comenta que não se deve
designar como “naturismo” ou “religião natural” no “sentido atribuído a estas
palavras no século XIX”, pois “é a ‘sobrenatura’ que se deixa manifestar ao
homem religioso por meio dos aspectos ‘naturais’ do Mundo”.

Figura 1: distribuição religiosa entre a população brasileira 1980-2010


FONTE: MIRCEA (1992)

Nesse sentido, o turismo místico e esotérico é o deslocamento solitário e/ou coletivo


de pessoas em busca do autoconhecimento e da espiritualidade, sendo que suas práticas
se dão, muitas vezes, concomitantemente. Na busca de uma resignificação da religiosidade
comum e tradicionalmente alicerçada na sociedade contemporânea, apresentam um
conjunto de crenças, práticas e rituais considerados alternativas e relacionadas às novas
formas de expressão da religiosidade e da diversidade cultural.
A diversidade religiosa, por outro lado, revela visões de mundo
diferenciadas como estruturas estruturantes de realidades religiosas
diversas, mas com uma mesma funcionalidade simbólica. A variabilidade de
práticas e crenças das religiões implica em distribuições regionais
diversificadas. De acordo com a escala, essa distribuição regional,
demonstra em grande parte o caráter majoritário do sistema religioso
dominante: o mundial e regional, em detrimento do local. Sob esse aspecto,
a escala local aponta uma diversidade religiosa não percebida na escala
regional. Existe um intrínseco localismo das religiões a partir da vida das
comunidades, muito embora a representação da religião seja universal GIL
FILHO, 2011, p. 04).

Este nicho especificamente caracteriza-se pelo deslocamento decorrente para


contatar e vivenciar práticas, conhecimentos e estilos de vida, configurando assim um

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aspecto cultural diferenciado dos demais destinos turísticos. Entre as atividades típicas
desse tipo de turismo citam-se as caminhadas de cunho espiritual e místico, as práticas de
meditação e de energização, entre outras, geralmente concebidos em lugares de
excepcional natureza preservada. Como exemplo, destaca-se São Tomé das Letras, no sul
de Minas Gerais, as chapadas Diamantina (BA), Guimarães (MT) e Veadeiros (GO) e a
cidade de Macchu Picchu, no Peru. O Caminho de Santiago de Compostela na Espanha é
outro exemplo notório. Outro conceito importante é o de turismo étnico que seguindo Brasil
(2009, p. 20):
(...) constitui-se de atividades turísticas envolvendo a vivência de
experiências autênticas e o contato direto com os modos de vida e a
identidade de grupos étnicos. O conceito clássico de etnia remete à noção
de origem, cultura, práticas sociais e raça, em que se considera o
patrimônio histórico e cultural como elemento de identidade e diferenciação
de um determinado grupo, bem como as interações sociais que ocorrem
entre este grupo e a sociedade em seu entorno. Esse tipo de turismo
envolve as comunidades representativas dos processos imigratórios
europeus e asiáticos, as comunidades indígenas, as comunidades
quilombolas e outros grupos sociais que preservam seus legados étnicos
como valores norteadores de seu modo de vida, saberes e fazeres. O turista
busca, neste caso, estabelecer um contato próximo com a comunidade
anfitriã, participar de suas atividades tradicionais, observar e aprender sobre
suas expressões culturais, estilos de vida e costumes singulares. Muitas
vezes, tais atividades podem articular-se como uma busca pelas próprias
origens do visitante, em um retorno às tradições de seus antepassados. As
comunidades são as protagonistas dos produtos neste nicho, mas nem
sempre elas estão preparadas para a atividade turística, isso exige um
exercício de envolvimento e sensibilização. Em muitos casos, é necessário
o trabalho de identificação e resgate de sua identidade, de suas tradições e
formas de expressão; e coletivamente, é construído o produto turístico, o
que e como mostrar. a gastronomia e o artesanato são ótimas opções para
agregar valor e para gerar renda adicional. Uma refeição típica preparada à
moda tradicional, com ingredientes locais e degustada no ambiente da
comunidade é sempre uma experiência valorizada pelo visitante e um
símbolo de hospitalidade. Igualmente estimulantes são as atividades de
observação da produção artesanal, com possibilidade para a participação
do turista no ato de fazer, é uma experiência que permite a compreensão do
verdadeiro valor do produto artesanal naquela comunidade.

A ROMARIA CARMÓPOLIS/CONGONHAS: o Lugar e proposta de


Circuito Turístico Sete Dores de Maria
Para se entender o contexto do turismo religioso faz-se necessário entender o
conceito de paisagem cultural. A geografia humanista foi a primeira vertente da geografia a
fazer uso da categoria lugar como um conceito científico. De fato, esse foi um dos conceitos
fundamentais para os propósitos dessa corrente, interessada em pesquisar as relações
subjetivas do homem com o espaço6 e o ambiente. Os geógrafos humanistas destacam a

6 O estudo das paisagens religiosas nos santuários de devoção popular em Teresina – PI, examina como a
religião influencia ou (re)desenha a paisagem de maneira dominante e permanente, abordado no contexto
urbano, espaço de lutas e contradições. O espaço é palco de valores e crenças, caracterizados em formas
arquitetônicas e em rituais que evidenciam a hierarquia do sagrado no espaço e no lugar. Na perspectiva de
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importância de estudar o cotidiano como forma de compreender os valores subjetivos e
atitudes correlacionadas que as pessoas comuns elaboram a respeito do espaço e do
ambiente em que vivem.
Ao introduzir a dimensão do poder religioso, é oportuno ressaltar que há
distinção no que diz respeito aos seguintes conceitos: igreja, religião,
espiritualidade e fé. A igreja representa a estrutura de poder administrativo,
jurídico e econômico que governa pessoas e recursos a partir das normas e
regras de uma determinada religião. O conjunto de crenças, dogmas e
rituais constituem uma religião. A espiritualidade, por sua vez, diz respeito à
dimensão espiritual do ser humano (o oposto da dimensão material) e
independe de igreja e religião. Finalmente, a fé é a capacidade psíquica do
ser humano em acreditar ou não em algo que pode estar na esfera da
imanência e/ou transcendência, do humano e/ou do divino. Fé tem a ver
com os mecanismos e recursos emocionais do humano para realizar algo
material ou espiritual. Até mesmo a população que se declara sem religião,
agnóstica e ateia tem atitudes carregadas de espiritualidade (RIBEIRO,
2009 apud SANTOS, 2015, p. 08)

O conceito de lugar é apropriado para esse tipo de pesquisa por dizer respeito aos
espaços vivenciados pelas pessoas em suas atividades cotidianas de trabalho, lazer,
estudo, convivência familiar, religiosidade, espiritualidade, dentre outros aspectos
cotidianos, etc. Por esse motivo, a geografia humanista define o lugar como uma forma de
experiência humana, “um tipo especial de vivência do espaço”. Ele tem, portanto, o mesmo
conteúdo que os fenomenologistas atribuem ao conceito de mundo, isto é, o conjunto das
vivências individuais e subjetivas dos sujeitos; aquilo que em primeiro lugar aparece à
consciência. Além de lugar, outra categoria indispensável, a Paisagem que é um resultado
material de todos os processos, naturais e humanizados, de determinado local. Temos dois
tipos de paisagem: natural e humanizada.
A paisagem natural é aquilo que vem de origem da natureza, sem interferência da
mão humana, como a vegetação e formações geológicas. A paisagem humanizada é aquela
que sofreu transformações em resultado da intervenção humana. São exemplos de
ambiente construído, as obras de arquitetura e de paisagismo. Para alguns autores, a
paisagem é a apreensão do mundo de uma forma individual. Um olhar individual que pode
retransmitir para o conceito de paisagem na arte. É o fenômeno espacial no tempo do
indivíduo. A paisagem, por sua vez é:
A interação do ser humano com o espaço faz da paisagem algo em constante
transformação, seja no plano da materialidade das coisas que os seres
humanos constroem/desconstroem e organizam no espaço, seja no plano da
imaterialidade, dos sentidos e significados atribuídos a cada elemento
constituinte da paisagem. A paisagem, portanto, está carregada de elementos
simbólicos, que se baseiam na experiência e leitura de mundo de cada indivíduo
que com ela interage.

compreender a paisagem religiosa, usa-se o termo geossimbólico, pois, segundo Rosendahl (2003), o termo é
uma estrutura visível, refletindo sonhos, crenças, na busca de significados na vida pelo homem.

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O ser religioso, dotado de experiências com o sagrado, é capaz de valorar os
elementos sagrados e profanos que se manifestam na paisagem. Contudo, tais
valores dependem de suas experiências e de suas convicções religiosas. As
experiências contribuem para a construção e/ou reafirmação da identidade
religiosa, englobando nesse processo percepções e memórias de cada
indivíduo e do grupo. (TORRES, 2013, p. XX)

Neste cenário surge a Filosofia, numa proposta de análise conjunta entre Elementos
bióticos (Ecologia), Elementos abióticos (Geografia) e Elementos antrópicos (História).
A filosofia ambiental é um ramo da filosofia que se ocupa do meio ambiente e do papel do
ser humano dentro dele. A filosofia ambiental inclui a ética ambiental, a estética ambiental,
o ecofeminismo e a teologia ambiental. Nota-se que este último, tem ligações expressas
com a religiosidade e, portanto, com o meio no qual ela se formata e se materializa. Na
relação com o meio e com a paisagem/lugar, situa-se o eu, o outro, a natureza e o sagrado
se misturam e se conectam. É a natureza adquirindo nova concepção e formato ético.
A materialidade simbólica é a realização do ato de impregnar o mundo de
significados de forma duradoura. Sob esta ótica, o edifício do templo, por
exemplo, é um eixo que congrega o espaço construído da religião
indelevelmente presente na paisagem. Neste sentido, segundo Grabar
(19887), o espaço da religião é representado pela imbricação de três valores
solidários:
(i) O espiritual, que congrega os significados místicos e éticos atávicos da
religião que simbolicamente se refletem em forma, imagem e prática social.
(ii) O cultural, que emerge das práticas sociais e dos costumes, conferindo o
seu caráter de representação. Remete a consciência do seu passado e
situação geográfica.
(iii) O estético, que é a forma de expressão e imagem inspirada em valores
religiosos e que possuem uma diversidade devido ao contexto histórico do
lugar (GIL FILHO, 2011, p.03)

Ética ambiental é um conceito que amplia o conceito de ética, enquanto forma de


agir do homem em seu meio social, pois se refere também à sua maneira de agir em relação
à verdadeira natureza. É considerada necessária, pois a conservação da vida humana é
hoje compreendida como inserida na conservação da vida de todos os seres. O conceito de
ética ambiental relaciona-se assim como o conceito de ética ecocêntrica (de OIKOS, casa
em grego). Por esse conceito, o comportamento do homem deve ser considerado em
relação a si mesmo e em relação a todos os seres vivos. Por esse conceito, todos os seres
são iguais. O homem, apesar de imbuído de razão, não pode continuar a ver outros seres
como inferiores e, portanto, não pode agir de forma predatória em relação aos mesmos. O
homem deixa de ser "dono" da natureza para voltar a ser parte da Natureza. Busca-se, com
a ética ambiental, criar-se uma nova ordem mundial, onde o Homem não mais satisfaz
apenas seus desejos imediatos, mas, ao agir, busca atender seus desejos, limitados pelas
necessidades de outros seres vivos, bem como os desejos de gerações futuras. A natureza

7 GRABAR, O. O sentido do Sagrado. O Correio da Unesco, Rio de Janeiro, v. 16 n 10, out. 1988, p.27-31.

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tem conteúdos reafirmados em diferentes tradições e religiões. Sem desprezar as demais
formas de religiosidade, destacam-se as paisagens religiosas, no âmbito do cristianismo.
Rituais e crenças se fazem e desfazem por lugares e paisagens distintos.
Através de uma hermenêutica das paisagens religiosas e a conseqüente
inteligibilidade de suas representações a leitura geográfica da mediação
entre o contingente e o transcendente nas religiões torna-se possível.
Vários elementos da paisagem evocam uma especificidade propriamente
religiosa que transita entre uma espacialidade perceptual e da ação e uma
espacialidade das representações. No presente trabalho foi destacado o
templo como elemento proeminente da paisagem religiosa, pois esse se
apresenta como expressão quase imediata do seu caráter religioso.
Contudo, a materialidade e arquitetura do templo seriam formas vazias se
não houvesse a vida da comunidade de adeptos que o anima. A paisagem
religiosa é, portanto, sintética onde expressão e sentido são reunidos em
uma totalidade estrutural. Sendo assim, a paisagem religiosa é tanto
possibilidade como projeção da ação humana. Ela pode ser criada e
recriada provocando renovadas impressões e representações revelando a
dinâmica religiosa do ser humano (GIL FILHO, 2011, p.12).

No Campo das Vertentes destaca-se a Romaria anualmente realizada entre Sete e


Quatorze de Setembro entre as Cidades de Carmópolis e Congonhas. Os romeiros saem à
pé de Carmópolis de Minas, localizada na BR 381/Rodovia Fernão Dias e prosseguem pela
Rodovia MG 270 (Figura 02) até alcançarem a BR 040 e terminarem no Santuário Bom
Jesus de Matozinhos, complexo religioso do final do século XVIII. Esta fundamentação
encontra-se atrelada às devoções locais a Nossa Senhora das Dores, a Nossa Senhora da
Piedade e a Nossa Senhora das Necessidades, respectivamente padroeiras de Itaguara,
Piedade dos Gerais e Piracema. Com base nesta tradição religiosa pode-se se dedicar à
peregrinação na região do Campo das Vertentes e Centro-oeste do estado de Minas
potencializando o Turismo Religioso. Sobre esta realidade, o Estado de Minas (2015)
registra que:
Passava das 11h30 de 8 de setembro quando um grupo surgiu caminhando
depois de uma curva da rodovia MG-270, próximo a Entre Rios de Minas, na
Região do Campo das Vertentes, guiado por um homem que carregava uma
cruz, a exemplo de Jesus Cristo. Aos poucos, chegavam outras pessoas,
totalizando 83 peregrinos que, duas noites antes, haviam saído em romaria
de Carmópolis de Minas, no Centro-Oeste mineiro, rumo a Congonhas, na
Região Central do estado. O destino era o Jubileu do Bom Jesus de
Matosinhos, em um trajeto de 122 quilômetros, que só seria completado na
manhã seguinte. Mesmo calçada, a maioria tinha os pés cheios de bolhas –
alguns já os traziam enfaixados. Como pagadores de promessa, os
romeiros, visivelmente exaustos, participavam da longa caminhada em
agradecimento pelas graças pedidas e alcançadas, ou simplesmente
rogavam por forças para enfrentar as agruras da vida.

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Figura 2: roteiro religioso pela Rodovia MG 270 entre Carmópolis e Congonhas
FONTE: Estado de Minas (2015)

O roteiro para o qual se sugere o nome de “Sete Dores de Maria” com cerca de 100
km (Figura 03), possível de ser feito a pé ou de carro, contempla sete cidades/localidades
da região, começando pela Matriz de Nossa Senhora do Carmo, em Carmópolis de Minas.
De lá se percorrem 22 km até Passa Tempo onde visita-se a matriz de Nossa Senhora da
Glória para se concentrar com meditações da 1ª Dor. Na sequência segue-se em direção à
Desterro de Entre-rios, para se refletir sobre a 2ª dor, na Matriz de Nossa Senhora do
Desterro. Continuando o ciclo de orações e espiritualidade caminha-se por mais 18 km para
contemplar a 3ª Dor na Capela de Mata dos Pacheco. Depois serão 16 km de estrada até
Entre-rios de Minas, onde, na Matriz de Nossa Senhora das Brotas, pensar-se-á na mística
da 4ª Dor. Agora serão mais 14 km até São Brás do Suaçui, local perfeito para se imaginar e
se envolver pela 5ª Dor na Matriz dessa cidade. Volta-se à estrada e quando vencidos os 13
km na rodovia para distrito de Alto Maranhão, está a Matriz desse povoado onde se
contempla a 6ª Dor. Fechando o ciclo e retomando rumo à estrada, onde, depois de
vencidos 13 km de peregrinação, chega-se à Matriz de Joaquim Martinho meditando-se na
7ª Dor. Serão mais 05 km apenas até chegar ao Santuário do Bom Jesus do Matozinhos,
em Congonhas do Campo. São paisagens e lugares que se unem ao caminho dos romeiros
construindo uma história subjetiva, introspectiva, fenomenológica, abstrata e existencial.

Figura 3: proposta de Caminho Religioso das Sete Dores de Maria Santíssima


FONTE: ANDRADE (2017)

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Esta rota tradicionalmente apropriada por peregrinos sugere paisagens e lugares
como símbolos do sagrado e de sua sacralização. Neste contexto, a paisagem materializa-
se como uma proposição filosófica, ao atuar como mediadora terrestre do homem, e,
portanto, como concepção humana da “Mãe Terra”. Numa dança continua entre natureza e
cultura consolidam-se os limites da paisagem como identidade e como caminho. Há assim a
dupla articulação na qual natureza e cultura se entrelaçam fazendo com que o ecúmeno,
amplie seu significado existencial, tendo a paisagem como a relação a partir da qual se tece
a história humana. A Paisagem Religiosa, ou Paisagem Sagrada, exprime, nesse sentido,
conteúdos de Ética, de Estética e de Epistemologia.

As localidades de Cemitério do Peixe (Conceição do Mato Dentro-


MG) e Mato Grosso (Serro-MG): Contexto histórico e cultural
A paisagem e o lugar têm conotações mais subjetivas de familiaridade e conexão,
enquanto território denota idéia de poder. A paisagem, entendida filosoficamente como lugar
onde céu e terra se tocam é uma categoria de alternâncias entre natureza, campo e cidade
e entre diferentes conceitos de ambiente. A paisagem é um conceito para o futuro, ao
legitimar no tempo e no espaço, permanências e rupturas ente a paisagem local e a
paisagem global. As teorias atuais da paisagem vertem para uma filosofia da paisagem,
para uma ética da paisagem. É preciso apreciar a paisagem reencontrando o estatuto do
belo e do natural. É preciso apreciar a natureza como se aprecia a arte. Mas, sobretudo, é
preciso apreciar a natureza nos seus próprios termos. Nesta concepção de percepção
integrada da natureza e da cultura, a ética se materializa no:
 Ver (o olhar): princípio de gestão do impacto
 Analisar (processar): princípio de gestão do diagnóstico
 Agir (sentindo-se parte do meio): princípio de gestão da mobilização
O pensamento “paisageiro” sugere uma aproximação mesológica entre estética e
ética. Sobre a função do estético na sociedade moderna, o futuro da paisagem entremeia-se
na estética. No lugar de uma estética contemporânea e do desprezo pela beleza natural,
surge à estética da arte e a natureza, evidenciando tessituras do profano ao sagrado. A
apreciação estética da natureza conduz a uma a estética da paisagem e dos lugares.
Lugares impares, lugares únicos, lugares de espiritualidade diária, de subjetividade, de
intensidade. E nos eventuais problemas de uma estética da paisagem, surge a
epistemologia da paisagem trazendo reflexões sobre condutas adequadas ou não. A
ecologia então dita às regras para a conservação da paisagem humanamente natural e
naturalmente humana. O “paraíso” é reencontrado e novamente perdido.

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A questão de uma geografia conectada as questões de existencialidade e
espiritualidade conduzem a uma nova discussão das relações entre estética e ambiente. A
estética da bela natureza conduz a busca pelo lugar sagrado, entendido como uma estética
da natureza e dos homens. É preciso interpretar os lugares e suas paisagens singulares
antes que o futuro as levem à destruição. Apropriar-se de patrimônios ameaçados. As
localidades de Cemitério do Peixe (Conceição do Mato Dentro-MG) e Mato Grosso8 (Serro-
MG) são exemplos relevantes de patrimônio histórico e cultural associados a eventos
culturais de cunho religioso/espiritual.
Com lindas serras, trilhas, rios e cachoeiras, o Distrito de Deputado Augusto
Clementino, a 16 quilômetros da cidade de Serro, está às margens da
MG10, antiga rota da Estrada Real. É local de fé e peregrinação, no Jubileu
de Nossa Senhora das Dores, do 2º ao 3º domingo do mês de julho. A vila é
composta de dois núcleos urbanos: o núcleo central da Vila, onde ficam a
capela de São Sebastião, em local de destaque, e estabelecimentos
públicos de ensino, esporte e saúde; e o Núcleo da Capelinha. Localizada
bem no topo de uma grande pedra, a Capelinha de Nossa Senhora das
Dores é rodeada por dezenas de pequenas casinhas, desertas durante todo
o ano. Mas, chegando o Jubileu, todas são cuidadosamente limpas e
decoradas, e a população do distrito se muda toda para lá, a fim de fazer a
celebração anual da fé. A economia local desenvolve-se especialmente
com base na agricultura familiar, com destaque para atividades de produção
de cachaça, farinha e grãos, embora o Distrito abrigue fazendas
tradicionais, com clássicas atividades da pecuária, sendo digno de nota o
fato de que a Vila sempre ofereceu mão de obra para a construção civil,
notadamente para as fazendas de pau-a-pique (PEREIRA, 2009, p.85-86).

Historicamente, os cemitérios compõem junto com outros elementos humanos e


naturais a paisagem de um determinado lugar. Como componente dessa paisagem carrega
consigo um emaranhado de contextos socioculturais, alternando permanências e rupturas,
espacialidades e temporalidades. Cemitério, necrópole ou sepulcrário é o lugar onde
se sepultam os cadáveres e destaca-se pelo além de seus objetivos iniciais, pela
complexidade de seu simbolismo alicerçado na humanidade. Data da pré-história, o início do
sepultado humano, carregado de sentidos e significados existenciais diante do mistério da
morte e a impotência perante a efemeridade da vida. Etimologicamente, a palavra origina-
se do latim tardio coemeterium, derivado do grego κοιμητήριον [kimitírion], a partir do verbo
κοιμάω [kimáo] "pôr a jazer" ou "fazer deitar" e foi dada pelos primeiros cristãos aos terrenos

8 Augusto Clementino da Silva nasceu na cidade do Serro (MG) no dia 18 de julho de 1861, filho de Dario
Clementino da Silva e de Augusta Ferreira. Ingressou em 1872 no Colégio do Caraça, localizado na serra do
Espinhaço (MG), e lá permaneceu até 1875.
(...)
Foi deputado estadual em Minas Gerais entre os anos de 1891 e 1897, e participou assim da Constituinte
mineira, na qual foi um dos líderes da campanha pela transferência da capital do estado, até então sediada em
Ouro Preto.
(...)
Faleceu na cidade do Serro (MG) no dia 19 de setembro de 1952. O antigo povoado de Mato Grosso (MG), após
sua elevação à categoria de distrito, por meio de um acordo entre as prefeituras de Alvorada (MG) e Serro (MG),
passou a ser chamado de vila Deputado Augusto Clementino em homenagem ao médico serrano.

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sagrados destinados à sepultura de seus mortos. Algumas das grandes civilizações da
Antiguidade foram conhecidas e decodificadas através de seus túmulos e monumentos
mortuários.
Isso faz com que na maioria dos casos, os cemitérios sejam lugares de práticas
espirituais e/ou religiosas. Em muitas cidades existem necrópoles onde os rituais funerários
são cumpridos de acordo com a respectiva religião ou fraternidade bem como também
existem casos de cemitérios nacionais para o sepultamento de chefes militares e figuras
notáveis da vida pública. Ligados diretamente á questão da sacralidade, originaram-se
termos e expressões como “campo santo”. Os cemitérios ficavam geralmente fora dos
muros das cidades, longe das igrejas e respectivos adros, pois a prática do enterro nestes
espaços era desconhecida nos primórdios da era cristã. Posteriormente passou-se a
vincular os sepultamentos nos adros das igrejas por uma crença religiosa de que facilitaria a
continuidade da vida religiosa no além, bem como a garantia de morada celestial. A partir do
século XVIII, criaram-se sérios problemas de insalubridade nas proximidades dos templos
decorrentes da falta de espaço: os esquifes se acumulavam, causando poluição e
transmissão de doenças. Uma lei inglesa de 1855, ampliada posteriormente em escala
mundial, regulou os sepultamentos, os direcionando para fora dos perímetros urbanos.

Culturalmente, os cemitérios, verdadeiros “museus a céu aberto” sempre foram


visitados, prática atualmente denominada de turismo cemiterial, nos quais são identificados
nos túmulos, elementos históricos e arquitetônicos que demonstram a vida social e artística,
através das estátuas, das obras, das fotos, dos epitáfios e dos símbolos valorizando e
exaltando sua preservação enquanto patrimônio. Na Europa existem diversas necrópoles
medievais, que quando escavados, fornecem fontes históricas para a compreensão de
certos hábitos alimentares, doenças e anatomia do homem da Idade média. Atualmente os
cemitérios são locais de pesquisa das crenças religiosas, formação étnica, estudos
genealógicos, perspectivas e modos de vida, ideologias políticas, gostos artísticos, e,
portanto, indispensáveis à preservação da memória familiar e coletiva.

Neste sentido, o cemitério, enquanto elemento histórico da paisagem local faz parte
do roteiro de visitação turística em diversas regiões do mundo, como por exemplo, o Père-
Lachaise, em Paris, onde se encontram os túmulos de Allan Kardec e Auguste Comte. Em
Londres, Inglaterra destaca-se os cemitérios de Kensal Green e Highgate e na Itália, os
cemitérios de Gênova e Milão. No Brasil destaca-se na capital paulista, o Cemitério da
Consolação, fundado em 1858 e em Buenos Aires, Argentina, o cemitério Recoleta.

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É preciso entendimento imediato da paisagem cultural e de sua ética, estética e
epistemologia. Às paisagens rurais de Cemitério do Peixe (Conceição do Mato Dentro-MG)
e Mato Grosso (Serro-MG) encontram-se ameaçadas por negócios minerários e projetos
agroflorestais. A área em questão localiza-se ao norte do Quadrilátero Ferrífero que tem
como limites leste, a Serra do Gandarela, ao sul, Ouro Branco, e a oeste, a Rola Moça.
Região potencialmente vocacionada para o ecoturismo devido à excepcional estética da
paisagem natural.
O vilarejo, conhecido como Cemitério do Peixe, é cercado por fazendas e
pertence à cidade de Conceição do Mato Dentro. O pequeno vilarejo – com
duzentas casas, uma pequena Igreja Católica e um cemitério – chama
atenção pelo fato de contar com apenas três moradores. Embora todos os
anos, na primeira quinzena de agosto, receba milhares de pessoas dentre
romeiros, turistas e festeiros que vão celebrar e festejar o jubileu de São
Miguel e Almas. Já no dia 29 de setembro ocorre o “Peixinho”, festa
semelhante ao Jubileu, mas em uma menor proporção com menos dias de
festa e menos pessoas. O Cemitério do Peixe é uma pequena vila integrada
ao mundo rural contendo suas particularidades históricas, culturais e sociais
(TAVARES, 2014, p. 31).

Figura 4: vilarejo do Cemitério do Peixe, distrito de Costa Sena, Conceição do Mato


Dentro - MG
FONTE: https://biophocus.wordpress.com/

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percebendo elementos de Ética, Estética e Epistemologia na Paisagem vemos a
possibilidade de construção de novos paradigmas que reconstruam a relação entre homem
e natureza e entre as pessoas e seus símbolos maiores materializados nas paisagens e
lugares do cotidiano. A paisagem cultural e a estética ecológica elencam novos paradigmas
moldados pela sustentabilidade, pelo empreendedorismo, pela inclusão e pela
interdisciplinaridade. A construção e concepção de lugares e roteiros sagrados emanam
dessa relação holística do homem com o meio. O sagrado é a materialização dessa
conexão, que se mantém por diversas gerações configurando, dessa maneira, um
patrimônio em sua essência concebido, preservado e sustentado pelas próprias interações e
vivências de suas comunidades. A peregrinação, nesse sentido, retrata não apenas a fé e a

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disposição de caminhar reestabelecendo essas conexões com o sagrado, como também de
apropriação e manifestação da cultura e dos saberes de um povo.

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no contexto histórico brasileiro e sua relação com toponímias LOCAIS. IN: ST 17 - Cultos, ritos,
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Turismo/Estruturação de produto turístico / Ministério do Turismo. – [Brasília]: o Ministério:
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Disponível em
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morte. Dissertação- Mestrado em Ciências da Religião, Juiz de Fora, 2014, 118 p.

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IATE CLUB DE COLATINA/ES: memória e patrimônio histórico,
cultural e arquitetônico

SILVA, DOUGLAS GOMES

1. Instituto Federal do Espírito Santo, Campus Colatina. Coordenadoria de Arquitetura e Urbanismo.


Avenida Arino Gomes Leal, 1700, Santa Margarida, Colatina-ES, 29700-660
arqui_douglas@hotmail.com

RESUMO

Objetiva-se nesse artigo destacar a necessidade da conservação e preservação de uma edificação


modernista na cidade de Colatina, no estado do Espírito Santo, o Iate Clube, erguido na década de
50 do século XX. A sua construção foi possibilitada pela doação do terreno pela administração pública
a um grupo de empresários locais, a edificação do Iate visava à criação de um espaço voltado ao
lazer da sociedade colatinense. Localizado no centro de Colatina, o Iate foi cenário de diversos
eventos e atrações ao longo de quase cinco décadas, e, historicamente, é lembrado por moradores
como uma das principais opções de lazer da cidade. De caractér modernista, tem o invólucro com
uma casca de concreto, sem vigas ou colunas aparentes, permitindo a observação de traços
arquitetônicos ousados e vanguardistas à época. Contudo, em outubro do ano de 2010, parte da obra
foi, clandestinamente, demolida. A derrubada parcial do Iate ocorreu durante o período noturno, para
atender apenas os interesses econômicos do capital privado, desconsiderando, dessa forma, os
valores histórico, social e cultural do bem edificado. Os moradores locais, que se opuseram à
destruição da edificação, denunciaram a demolição ao poder público, que embargou o ato.
Atualmente, cerca de 70% da estrutura do Iate se apresenta em grau razoável de conservação,
levand o-se em conta a ausência total de manutenção desde sua demolição. Por isso, podem ser
observados danos estruturais e estéticos na edificação. Ainda em virtude do abandono, este objeto
histórico constitui, hoje, ruínas que abrigam pontos de uso de drogas e ocupação transitória de
moradores de rua. Os problemas relacionados com a edificação conseguem ficar disfarçados, em
função dos poucos estudos na área, onde a falta de informação torna o trabalho mais árduo, é que a
medida que há poucos elementos que manifestam ou denunciam o descaso com o patrimônio, o que
reforça a importância da criação de um banco de informações patrimoniais no município e que se a
ação de preservação da edificação não for realizada em tempo hábil, isso pode ocasionar a perda
de uma parte da história da cidade. Entretanto, muitas coisas podem ser feitas para reverter essa
situação, e uma delas seria uma maior conscientização da sociedade em geral e a concretização de
políticas públicas para a valorização do patrimônio arquitetônico, urbanístico e paisagístico. Uma
possível requalificação da edificação proporcionaria à população da cidade de Colatina a reutilização
deste patrimônio, objeto de lazer, cultura e socialização do município, ratificando a relevância da
manutenção de elementos que compõem a identidade local.

PALAVRAS-CHAVE: arquitetura moderna, patrimônio, preservação.

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Introdução

As cidades são o resultado das ações do homem no espaço, um conjunto de


transformações e apropriações, que constituem objetos sociais, que formam paisagens
urbanas, que expressam a relação com o tempo através das constantes modificações. A
cidade tem a potencialidade de reconstruir o sentido da vida, a condição atual, através da
memória como um ato de resgatar resíduos que permite reviver uma experiência vivida
(BAESSE, 2004, p. 105).

A história pertence a todos, se liga as continuidades temporais, às evoluções e as relações


das coisas. A memória é, por natureza, múltipla e desacelerada, coletiva, plural e
individualizada, suas raízes atingem o espaço, o gesto, a imagem, o objeto, a paisagem e as
relações sociais. Mas, “não há memória coletiva nem história que não se desenvolva num
quadro espacial” (HALBWACHS, 1990, p. 143).

O patrimônio histórico e cultural de um município influencia diretamente na dinâmica


urbanística, social, e na identidade local de sua região de implantação (RABELO, 2010).
Colatina é um município localizado na região noroeste do estado do Espírito Santo, tendo
cerca de 111.788 habitantes (IBGE, 2010), sua economia basea-se em comércio e serviços,
sendo caracterizada como uma cidade com grande número de população flutuante, devido
aos hospitais e fábricas existentes na cidade. O crescimento urbano do município, deu-se na
década de 1950, onde a cidade logrou seu período de desenvolvimento urbano
intensificado, marcado pela expansão do mercado cafeeiro e a chegada dos trilhos da
Estrada de Ferro Vitória Minas (EFVM).

Nesse período de desenvolvimento econômico do município, contemporâneo ao movimento


modernista brasileiro, surgiram algumas edificações singulares em Colatina, que se
destacaram pela incorporação de elementos, sejam formais ou funcionais, oriundas de
diretrizes disseminadas pelo modernismo, destacando-se a construção do Iate Clube de
Colatina nas proximidades do acesso à Ponte Florentino Avidos. Sua construção foi
implantada em um terreno doado pela administração pública a um grupo de empresários da
cidade através das Leis n° 930 de 13 de janeiro de 1959 e 1994, e de 14 de agosto de 1968.
Situa-se na mesma quadra onde estão edifícios de grande importância histórica para a
cidade, como a Câmara Municipal e o tradicional Colégio Aristides Freire. Além disso, sua
entrada principal está voltada para um complexo de praças, local onde se iniciou, de fato, o
processo de desenvolvimento da cidade.

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O início de sua construção deu-se em 1959 e foi inaugurado em 31 de dezembro de 1964,
quando recebeu este nome, por situar-se às margens do Rio Doce. Construído com o intuito
de trazer para a cidade um local destinado ao lazer e à cultura para a sociedade
colatinense, sendo um espaço destinado a eventos, atrações e apresentações. No final da
década de 1970, o clube passa a perder associados e sua estrutura começa a apresentar
problemas. De acordo com a Revista Nossa (1989, p. 35), “O Iate sempre esteve em
atividade, mas nos últimos anos, aos poucos foi diminuindo sua programação social,
principalmente depois da catastrófica enchente de 1979, quando teve sua estrutura
seriamente comprometida.”

A edificação foi projetada pelo arquiteto Marcello Vivacqua, onde de acordo com Pereira
(2012) o mesmo formou-se na Faculdade Nacional de Arquitetura da Universidade do Brasil,
no Rio de Janeiro e veio para o Espírito Santo em 1952, onde deixou mais de duzentos
projetos construídos. O Iate Club de Colatina possui uma forma arrojada, que conta com
uma casca de concreto – quatro paraboloides hiperbólicos - que com a ausência de vigas,
toca o chão em apenas oito pontos, mostrando a complexidade estrutural da obra, que é seu
atrativo. Toda a estrutura de sua cobertura explora a complexibilidade do concreto armado,
material que foi amplamente utilizado no Brasil na década de 1950, principalmente pelos
projetos de Oscar Niemeyer e Lúcio Costa.

Entretanto, por conta de interesses econômicos do grupo de sócios proprietários do terreno,


em 12 de outubro de 2010 parte da construção foi, de forma clandestina, demolida. Tal
acontecimento se deu no período noturno, já que, por conta de sua constatada valorização
social e apropriação por parte dos moradores locais, seria o horário menos passivo de
intervenção pelos mesmos. Ainda assim, a demolição foi denunciada ao poder público, que
embargou o ato. A derrubada contradizia os interesses culturais e sociais da comunidade e
da Lei 5273, de 12 de março de 2007, que, pelo Plano Diretor Municipal da cidade, garante,
no seu artigo 7º, parágrafo VI, a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente
natural e do patrimônio histórico, cultural e paisagístico (COLATINA, 2007).

Diante deste impasse, não se pode esquecer que estes clubes enquanto arquitetura são
significativos da produção moderna, linguagem adotada, talvez, por se mostrar adequada
para este tipo edificado que surgia na cidade naquela época. Enquanto registros da
memória coletiva, estes clubes relatam um tempo em que a elite social buscava congregar-
se em torno destas instituições de lazer, desejando incorporar-se a um novo modo de vida e
exibir um status social (AZEVEDO E FILHA, 2010).

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Percebe-se então a importância que o edifício possui na cidade de Colatina, sendo o
pioneiro no que diz respeito a edificações modernistas na cidade com o objetivo de
promover à população seu uso, indo além do aspecto estético e arquitetônico, levando à
população o sentimento de pertencimento da identidade local da obra.

Entre o fim do ano de 2013 e início do ano de 2014 a cidade de Colatina passou por um
período histórico, atingindo um de seus maiores picos pluviométricos dos últimos anos. A
chuva proveniente desse fenômeno levou à cidade diversos prejuízos econômicos, sociais e
culturais. Com a inundação ocorrida nesse período, todos os arquivos históricos e
patrimoniais referentes ao Iate Clube de Colatina, assim como de outros objetos foram
perdidos. A ausência de tais documentos pode, ainda, acarretar uma perda progressiva dos
laços culturais que tal obra possui com a cidade. Entretanto, ainda hoje, o edifício
representa a memória coletiva local material e imaterial de Colatina.

Referências Projetuais

O Iate Clube de Colatina foi, ao longo de décadas, palco de diversos eventos, sendo uma
obra arquitetônica singular, não só em seus aspectos sociais mas, principalmente, em sua
característica arquitetônica, onde sua forma é sem dúvidas, o que mais gera apreciação por
parte dos moradores do município de Colatina. Fator que concede um caráter de
monumento único e, de certa forma, mostra a influência do movimento moderno não apenas
em grandes centros urbanos, mas também em cidades do interior.

Na década de em 1930, Eduardo Torroja tornou-se o pioneiro no desenvolvimento das


teorias para a aplicabilidade do concreto armado em estruturas com formato de cascas, mas
foi Félix Candela, entre as décadas de 1950 e 1970, o inspirador de projetistas ao redor
mundo em relação à aplicação das cascas de concreto armado em projetos arquitetônicos,
devido às diversas formas que eram possíveis de serem obtidas e a beleza das mesmas.
Candela conseguia, através da complexa geometria do parabolóide hiperbólico, diversas
possibilidades formais, aliadas a conceitos estruturais.

As formas em parabolóides hiperbólicos passaram a ser bastante utilizadas naquela época


em vários estados brasileiros. Geralmente, esse tipo de estrutura é aplicada em projetos que
permitem grandes vãos, como estádios, ginásios, centros culturais, dentre outros. Suas
singularidades vão desde à espessura, que é extremamente menor que suas dimensões,
até sua estrutura, que é altamente resistente à compressão.

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Com o intuito de caracterizar melhor o objeto de estudo, convém antes, apresentar alguns
estudos de casos que possivelmente influenciaram a proposta de Marcello Vivacqua para a
sede do Iate Clube em Colatina devido, principalmente, às semelhanças de ordem
estrutural. São eles: a Igreja de São Francisco de Assis na Pampulha e a Sede da Praça de
Esportes em Diamantina de Oscar Niemeyer, ambos construídos antes de 1959, quando da
construção do Iate Clube. No entanto, o projeto de Felix Candela para o Restaurante Los
Manantiales construído em 1958 no México, é a prova mais concreta das influências
externas buscadas por Vivacqua e a constatação do quanto ele estava vinculado ao que
vinha sendo construído não só no Brasil, mas também no mundo. Apenas um ano após a
construção do Los Manantiales, Vivacqua projeta o salão de danças do Iate Clube
semelhante à “flor flutuante” de Felix Candela, o que reforça a importância dessa obra
dentro do contexto da arquitetura moderna brasileira (Ilustração 01).

Ilustração 01 – Mosaico com edificações que inspiraram o arquiteto Marcello Vivacqua na construção
do Iate Club de Colatina.

Fonte: Adaptado pelo autor de Pereira (2012).

A Igreja de São Francisco de Assis, em Belo Horizonte, faz parte de um conjunto de obras
solicitadas a Oscar Niemeyer pelo então prefeito da cidade, Juscelino Kubitschek. Onde
Niemeyer utiliza a plasticidade inerente à técnica do concreto armado possibilitando a
elaboração das obras da Pampulha, sobretudo da construção da Igreja, onde a
característica mais acentuada da Igreja está na sua expressão estrutural. Cascas
parabólicas alçam da terra, numa ousadia técnico-construtiva que impressiona, onde a
estrutura define os espaços internos a partir de suas formas. Macedo (2008) explica que as
abóbadas parabólicas da igreja da Pampulha são um conjunto de cascas de concreto que,
por sua forma, funcionam como um cabo que transmite apenas esforços de compressão nos
seus apoios. Contudo, para que isso ocorra, as cargas devem estar uniformemente
distribuídas para que sua geometria se aproxime da linha neutra, submetendo-a apenas a
esforços tangenciais à sua superfície.

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A Praça de Esportes, projetada em 1950 por Oscar Niemeyer junto ao engenheiro Werner
Müller, organizava basicamente a sede social de um conjunto poliesportivo já existente no
local. De acordo com Macedo (2008), o conjunto implantado na parte superior do terreno é
constituído por três elementos formais diferenciados: uma laje apoiada sobre um arco e a
partir dele avançando em balanço para ambos os lados; uma abóbada curva em concreto
apoiada sobre um par de arcos perimetrais que chegam independentes até o solo
sobrepondo-se ao primeiro elemento e cobrindo parte do terraço acima; e um pequeno
prisma trapezoidal anexo, ligado por um corredor ao outro conjunto. Os arcos da cobertura
vencem vãos de 40m, e a abóbada propriamente dita vence o vão de 14,5m de largura entre
os arcos.

O Restaurante Los Manantiales foi projetado por Felix Candela e construído às margens do
canal de jardins flutuantes de Xochimilco, no México, em 1958. O edifício de formato
octogonal assemelha-se a uma flor flutuante, já que seus apoios gerados pelas quatro
intersecções hiperbólicas praticamente não tocam o solo. Com bordas curvas e inclinadas, o
Restaurante Los Manantiales é uma casca fina, contínua, graciosa e muito leve. O edifício
possui exatamente a mesma quantidade de parabolóides hiperbólicos que o Iate Clube,
sendo quatro, que são apenas rotacionados e interseccionados em seu centro.

Nos quatro casos: Igreja da Pampulha, Praça de Esportes, Restaurante Los Manantiales e
Iate Clube de Colatina, o uso dos arcos e das parábolas de concreto armado é uma
constante, embora empregadas de formas variadas e em diferentes escalas.

Análise Arquitetônica e Urbanística

O Iate Clube de Colatina foi implantado em um terreno de esquina, com frente para a Praça
Municipal e para a Avenida Rio Doce, que na época ainda não estava construída. Sua
localização privilegiada está inserida na malha urbana do centro da cidade. O projeto
elaborado em 1959, contempla um edifício principal destinado ao salão de danças, um
restaurante com área de apoio e cozinha, além de piscina, vestiários e uma garagem para
barcos.

Segundo Pereira (2012) o sistema construtivo basea-se em concreto armado moldado em


fôrmas de madeira. No salão de danças, executou-se uma cinta de contorno, sob a qual se
apóia a laje de piso que funciona como travamento para combater os esforços produzidos
pelo conjunto de quatro arcos com 18 metros de vão livre e altura máxima de 4,55 metros.

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Sapatas isoladas abrigadas no solo arenoso recebem os pilares que sustentam os arcos.
Em planta, o salão de danças corresponde a uma “flor de oito pétalas”, que se transformam
em parábolas quando vistas na fachada. Impressionam tanto pela ousada configuração
formal como pelo arrojado sistema estrutural em concreto armado. O interior do salão
“dança” no ritmo dos arcos que compõem o espaço, banhado pela luz natural filtrada pelos
grandes painéis de vidro e pelos cobogós na parte superior.

O salão conecta-se ao restaurante e aos vestiários por uma laje plana recortada pela
interseção de uma série de arcos e tangentes. A parede curva revestida pelo colorido das
pastilhas cerâmicas no painel confeccionado pelo artista plástico Raphael Samú, recebe os
convidados no saguão, disposto entre o salão de danças e o restaurante. Ela serve ainda
como pano de fundo para acesso aos banheiros e vestiários que atendem todo o conjunto.
Neste espaço se concentra também a entrada principal, a chapelaria e a escada circular que
vem do subsolo, coberta por uma laje plana retorcida (PEREIRA, 2012).

Sob uma cúpula de concreto, situa-se o restaurante espaço iluminado pelos painéis de
vidro que permitem desfrutar da vista para o rio e para a piscina. O bloco em formato de “T”
acomoda a cozinha, a administração e os serviços, intercepta a cúpula, conectando-se
dessa forma ao bar, no interior do restaurante. Com telhado embutido de apenas uma água
e fachada cega revestida de pedras voltada para a Praça Municipal, este bloco é o único
elemento completamente ortogonal, fazendo um contraponto ao jogo de arcos e curvas do
restante do conjunto. Os acessos acontecem por meio de rampas, sendo que foi projetada
uma entrada de serviços pela Travessa Toledo e outro pela Praça Municipal, onde se dá por
uma rampa que chega ao saguão ou pela pista de veículos, que contorna por baixo do salão
de danças e permite acesso à escada circular (PEREIRA, 2012).

De acordo com Pereira (2012) com o tempo, várias modificações e acréscimos foram
realizados. Os muros cresceram e bloquearam a vista para o rio e o contato com o entorno,
construiu-se um palco anexo ao salão de danças, que apagou parte da expressividade e
autonomia da “flor”, os grandes painéis de vidro cederam lugar às esquadrias fixas de vidro
e os cobogós foram fechados . Além disso, um fator externo contribuiu para a falta de
conservação do conjunto. À época da construção, o terreno de esquina contornado à
esquerda por uma avenida larga e tendo a sua frente toda a amplitude da Praça, garantia os
espaços livres necessários para que a forma arquitetônica se manifestasse e pudesse ser
apreciada. Porém com o crescimento da cidade e do fluxo viário, parte da praça foi extinta,
dando lugar a novas ruas, e o Iate foi sendo “espremido” no lote, entre os muros. Novas

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edificações de grande porte foram construídas no entorno, como a rodoviária Alderico
Tedoldi e, posteriormente, na porção que correspondia à Praça, ergueu-se o Camelódromo.

O subsolo, que possivelmente foi construído na reforma de 1989, continua aproveitando a


pista sob o salão de danças, mas incorpora também um salão de jogos com dois banheiros
e depósitos. Outro elemento agregado posteriormente ao conjunto é a torre circular da caixa
d’água, com altura de aproximadamente dez metros, além da construção do campo de
bochas, em nível um pouco mais abaixo que o restante do conjunto e a cobertura na área
antes destinada às piscinas, que se conectou diretamente ao bar com a remoção dos
painéis de vidro que delimitavam a área do restaurante. Inseriu-se ainda um telhado sobre a
laje plana do saguão e reorganizaram-se os banheiros e vestiários, destinando parte do
espaço a uma cantina. Com isso, percebe-se que as modificações impostas ao edifício não
respeitam o conceito do projeto, modificando sua relação com o entorno e prejudicando a
conexão entre os diferentes elementos que compõem o conjunto (Ilustração 02).

Ilustração 02 – Mosaico com croquis da implantação, planta-baixa e fachadas do Iate Club de


Colatina.

Fonte: Elaboração do autor, 2017.

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Significância Social

Nas últimas décadas, o patrimônio arquitetônico das cidades vem recebendo grande
atenção. Preservá-los ao longo do tempo pode manter viva a história de um grupo ou
sociedade. Para Rodrigues (2001, p.16), “o patrimônio representa a identidade local e, por
mais diversa que seja a população, a sua criação serve como uma ponte que resume várias
histórias em uma só”.

De acordo com Bogéa (2007), o patrimônio arquitetônico e cultural é o conjunto de bens que
possuem valores históricos, artísticos e científicos que definem, em diferentes escalas, a
identidade de uma comunidade, uma região ou um país e que devem ser preservados como
legado às gerações futuras.

Fonseca (2005) discorre sobre a importância do patrimônio. Além de possuir um valor


histórico, artístico e etnográfico, dentre outros, há também um sentimento de pertencimento
a comunidade ou a uma nação, dependendo do tipo de bem.

Para Scheiner (2004), o patrimônio é um reconhecimento no tempo e espaço de


determinado fio condutor que liga a um lugar, por meio de sinais que são construídos. Esse
fio condutor é a memória e os sinais são bens culturais, mas também os resíduos e
vestígios presentes na cidade e que resistiram, fazendo parte de um imaginário. Percebe-se,
assim, que o patrimônio é importante tanto para uma noção coletiva quanto individual de
pertencimento àquele lugar e àquela cultura.

A história do Iate Club de Colatina está diretamente relacionada com a história da cidade, e
consequentemente da população, a partir do momento que se deseja guardá-la, pretende-se
guardar a história dos indivíduos. A memória coletiva através da edificação resulta na
paisagem da cidade e na forma como ela cresce, ordenadamente ou não.

Desse modo, mantendo a memória do espaço construído e com significância, reflete-se na


maneira como cada pessoa identifica-se nesse espaço. A região que encontra-se o clube,
apesar de estar abandonada pelo Poder Público e por parte da população, ainda permanece
como espaço de permanência na cidade, mesmo que sua infraestrutura limite tal ocupação.

O Iate Clube da cidade de Colatina, se apresenta como peça fundamental à composição da


memória histórica e social do município, interferindo diretamente na conjuntura sociocultural
da região. Observa-se, numericamente, a proporcionalidade da influência na dinâmica social
do município através da análise histórica da membresia do clube na zona urbana da cidade.
Sabe-se que, desde os primórdios de sua construção, o Iate Clube de Colatina que,
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inicialmente, contava com cerca de 250 sócios-fundadores e, que em seu fechamento, no
fim da década de 80, era composto de, aproximadamente, 700 sócios em seus quadro de
usuários, o que refletia a ampla adesão social de seus moradores à obra, caracterizando,
desde então, um dos símbolos e cartões-postais marcantes do município (MADURO, 1989).

O espaço do Iate Clube colatinense abrigava eventos que englobavam desde casamentos a
apresentações musicais de bandas de rock regionais, apresentações de músicos da jovem
guarda e de orquestras sinfônicas, além de ser considerado como ponto de encontro da
juventude colatinense (MADURO, 1989). O Iate soube espelhar os anos dourados das
décadas de 60 e 70, tanto pelo aspecto formal e arquitetônico, quanto pelos usos e
apropriações sociais locais (Ilustração 03).

Ilustração 03 – Mosaico com fotografias do Iate Club de Colatina nos seus primeiros anos de uso.

Fonte: Adaptado pelo autor de Pereira (2012).

O atual prefeito da cidade de Colatina, Sérgio Meneguelli , quando ocupava o cargo de


presidente da câmara de vereadores de Colatina, elaborou o projeto de lei 62/2010 para
tombamento do imóvel como patrimônio histórico e paisagístico, sendo este aprovado em
2014, relatou que mais de 95% da população fora contra a tentativa de demolição do Iate
Clube de Colatina, alegando ser o ato uma afronta a história dos colatinenses (CARNEIRO,
2010). Observa-se, assim mais um nicho social de percepção apropriativa, pela
representatividade numérica dos moradores que se opuseram à derrubada do Iate clube.
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Aspectos Físicos de Conservação

A estrutura principal do Iate Clube consiste em uma cúpula com oito pétalas. Essa estrutura,
que é uma casca de concreto armado, foi feita sem vigas e colunas, sendo considerada
ousada para a época.O fechamento dessas pétalas era por meio de elementos vazados na
parte superior e vidro na parte inferior, internamente a estrutura continua aparente. Há
ainda, em uma das paredes de alvenaria, uma paisagem feita de pastilhas de louça.

No ano de 1979 aconteceu na cidade de Colatina uma catástrofe natural. A cheia do rio
Doce, que banha a cidade, foi maior que a esperada causou alagamento em suas margens.
Por estar próximo do rio, o Iate sofreu grandes danos em suas estruturas, como as vigas de
sustentação que ficaram rachadas o que resultou no seu comprometimento. Com isso, sua
utilização entrou em decadência.

Somente no final nos anos de 1980, em comemoração pelos 30 anos de construção e sob
uma nova diretoria, que o Iate foi reformado. Para reparar o estrago foi necessário retirar
uma grande quantidade de terra do salão principal e para expor suas vigas e colunas. A
nova fundação passou a ter quinze colunas e quinze vigas que são sustentadas por uma
coluna central com 4,5 metros de diâmetro. Além disso, foram feitas reformas nas partes
elétricas e hidráulicas, cozinha, banheiros e palco com camarim (In: Revista Nossa, 1989).

A intenção da diretoria à época da reforma era voltar o clube realmente para o interesse
dos associados e convidados, pois além de servir aos seus sócios, o Iate era cedido para
reuniões e eventuais acontecimentos sociais como casamentos, aniversários, encontros
políticos, lançamentos de livros, entre outros (PEREIRA, 2012).

Em 2010, a demolição parcial e ilegal da edificação, cerca de 30%, da estrutura ficou


comprometida, porém o restante da edificação que ainda se mantém é recuperável. Após
um ano de impasse na justiça, a prefeitura de Colatina conseguiu a posse legal do Iate até o
fim do processo. Assim, as obras para recuperação do monumento se iniciaram com a
limpeza do local, como o corte do matagal que já que havia crescido, retirada do acúmulo de
água da piscina que estava se tornando um foco de várias doenças, reparos nas partes
hidráulica e elétrica e construção de um muro de arrimo, uma vez que se corria o risco de
cair a estrutura (Reportagem TV GAZETA, 2012).

No final de 2013, a justiça anulou a doação para os sócios dos terrenos em que o Iate está
localizado, retornando a área para o poder público. Segundo o engenheiro da prefeitura
João Goldner, a intenção é preservar as características iniciais do Iate, reavendo

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inicialmente a parte estrutural, resgatando toda a arquitetura que foi criada na década de
1950 (In:SIM NOTÍCIAS, 2014).

Ilustração 04 – Mosaico com fotografias do atual estado do Iate Club de Colatina.

Fonte: Autor, 2017.

Considerações Finais

Diante dos fatos aqui expostos, evidencia-se a necessidade da implementação de trabalhos


de reconfiguração do Iate Club de Colatina, no que diz respeito aos aspectos físicos,
formais, identitários e sociais originais da edificação modernista . A ausência de ações do
poder público tem sido responsável pela decadência do patrimônio e da transformação da
paisagem em seu entorno, causando prejuízos sociais e econômicos, visto que serão
necessários recursos para recuperá-los. Faz-se necessário a escolha de um método de

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intervenção apropriado é demasiadamente importante, pois o objeto é um exemplar recente
da arquitetura modernista. Percebeu-se, que os problemas relacionados com o Iate
conseguem ficar disfarçados, em função dos poucos estudos na área, onde a falta de
informação torna o trabalho mais árduo, é que a medida que há poucos elementos que
manifestam ou denunciam o descaso com o patrimônio, o que reforça a importância da
criação de um banco de informações patrimoniais no município e que se a ação de
preservação da edificação não for realizada em tempo hábil, poderá ocasionar a perda de
uma parte da história da cidade.

Referências Bibliográficas
AZEVEDO, M. H. de A.; FILHA, M. B. M. Decrépitos espaços de fantasias: a memória dos clubes
sociais da cidade de João Pessoa. In: 3° DOCOMOMO Norte Nordeste, João Pessoa, 2010.
Disponível em: <http://www.docomomonortenordeste.com.br/artigos/TC_SEC1_5. pdf>. Acesso em:
15 abr. 2017.

BAESSE, C. Estação Ferroviária de Araguari. Um ícone de transformação do modus vivendi de


um povo através dos tempos. In: COELHO, G. N. Seminário Ferrovia: 150 anos de arquitetura e
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BOGÉA, K. B. S. R. Centro Histórico de São Luis Patrimônio Mundial, São Luís. 200
CARNEIRO, V. Demolição de prédio histórico surpreende moradores de Colatina. 2010. Disponível
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COLATINA (Município). Lei nº 5 273, de 12 de março de 2007. Dispõe sobre a garantia de


preservação dos bens patrimoniais da cidade de Colatina. Disponível em:
<http://www.legislacaoonline.com.br/colatina/> Acesso em: 23 mai. 2017.

FONSECA, Maria Cecília Londres. O patrimônio em processo: trajetória da política federal de


preservação no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; IPHAN, 2005. 294 p.

GAZETA ONLINE. Dispõe sobre a demolição do Iate Clube na cidade de Colatina. Disponível em:
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HALBWACHS, M. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2003.

IATE Clube – 30 anos. Revista Nossa, Colatina, ano 07, n° 45, p. 33 a 35, out. 1989.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Censo Demográfico 2010.


Disponível em <www.ibge.gov.br>. Acesso em: 25 mai. 2017.
MACEDO, D. M. Da matéria à invenção: as obras de Oscar Niemeyer em Minas Gerais 1938-
1955. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2008. 528 p.

MADURO, Luiz Carlos. Iate Clube. Revista Nossa. Colatina, v. 1 n.7, p. 33-35, out. 1989.

PEREIRA, T.V. Iate Clube de Colatina - Resgate da História e da Memória. 2012. TCC (Trabalho
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RABELO, C. N. IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 2014.

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RODRIGUES, M. Imagens do Passado. A Instituição do Patrimônio em São Paulo. São Paulo:
Unesp; Imesp; Condephaat, 2001

SCHEINER, Tereza Cristina. Imagens do Não Lugar: Comunicação e os Novos Patrimônios.


Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura, UFRJ, 2004.

SIM NOTÍCIAS. Dispõe sobre a devolução do terreno do Iate Clube de Colatina para a
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de-colatina-justica-da-decisao-favoravel-ao-municipio/9964-iate-clube-de-colatina-justica-da-decisao-
favoravel-ao-municipio> Acesso em: 28 mai. 2017.

VIVACQUA, M. D. A vida e a Arquitetura de Marcello Vivacqua. 2000. Monografia (graduação em


arquitetura e urbanismo). Departamento de Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal do
Espírito Santo, Vitória, 2000.

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MEDIDAS EDUCATIVAS, AÇÕES PARA O PERTENCIMENTO: Caso
do Museu Educativo Universidade Federal De Santa Maria Museu
Gama D’eça

BLAYA, MARIANA DEBONI (1); SAAD, DENISE DE SOUZA. (2)

1. Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. Programa de Pós-Graduação


Profissionalizante em Patrimônio Cultural.

UFSM/ Prédio 74 – Sala 2182; Faixa de Camobi, Km 09- Campus Universitário / CEP
97015-900 - Santa Maria -RS

marianablay@gmail.com

2. Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. Programa de Pós-Graduação


Profissionalizante em Patrimônio Cultural.

UFSM/ Prédio 74 – Sala 2182; Faixa de Camobi, Km 09- Campus Universitário / CEP
97015-900 - Santa Maria -RS

dssaad1@gmail.com

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RESUMO

Atualmente, na grande maioria das legislações nacionais consta o preceito de que é dever
do Estado preservar o patrimônio histórico e artístico. Dentre algumas instituições
possuidoras destes patrimônios, é destacado neste artigo as instituições Museológicas
como salva guardadoras de patrimônios e a sua função imprescindível de disseminação
cultural para a sociedade. Conforme o Conselho Internacional de Museus (ICOM), o museu
é uma instituição permanente, sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e de seu
desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva, estuda, expõe e transmite o
patrimônio material e imaterial da humanidade e do seu meio, com fins de estudo, educação
e deleite. A adesão da sociedade, dos diferentes grupos sociais, à prática da preservação
de bens culturais tem sido considerada o grande desafio a ser enfrentado no século XXI.
Pequenos museus podem ser os mais frágeis e vulneráveis, aqueles que não possuem um
planejamento claro e de conhecimento de toda a sua equipe estão ainda mais vulneráveis.
Com o intuito de cativar o público este artigo tem relata algumas ações educativas que
podem ser desenvolvida no Museu Educativo Gama D’Eça e Victor Berssani, instituição
pertencente à Universidade Federal de Santa Maria. O prédio caracterizado por seu
decorativismo é exemplo da arquitetura magnificente de tendência eclética do centro
histórico de Santa Maria. As coleções do Museu da Universidade Federal de Santa Maria
estão abrigadas no palacete desde o ano de 1985. A preservação só faz sentido para a
sociedade se está relacionada a necessidades e interesses do momento presente, na busca
constante de um ponto de equilíbrio entre permanência e mudança. Desse modo, os
museus e os patrimônios, assim como diversos outros elementos simbólicos, precisam ser
vistos como dispositivos de criação e invenção de representação, narrativas, imagens sobre
o passado e a memória. Com este trabalho pretende-se abordar metodologias que visem
preparar as instituições Museológicas para tomada de decisões para maior captação e
público, tais medidas têm como objetivo aproximar o público do patrimônio salvaguardado
pela instituição, como também chamar atenção para a própria sede da mesma, um exemplar
histórico da arquitetura eclética da cidade. Cabe ressaltar que as ações identificadas podem
ser adaptadas para o Museu visto que em geral são ofertadas por grandes instituições
museológicas e podem não representar a atual realidade do Museu. Desse modo, os
museus e os patrimônios, assim como diversos outros elementos simbólicos, precisam ser
vistos como dispositivos de criação e invenção de representação, narrativas, imagens sobre
o passado e a memória.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural, Museus, Ações Educativas.

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Introdução

Muito já se questionou sobre o termo Educação Patrimonial e se propôs falar em educação


para o patrimônio, educação com o patrimônio, patrimônio e educação. De todo modo, o
termo educação patrimonial carrega o peso da abordagem institucional, centrada em bens
materiais e relacionada aos fatos de uma determinada memoria nacional. Hoje, entendemos
como fundamental a reflexão a respeito da relação patrimonial com foco no sujeito ao
mesmo tempo produto e produtor de cultura. (GIL e POSSAMAI, 2014).

“uma proposta metodológica e um tipo de ação social, de


‘microação’, como diria Habermas, que procura tomar os bens
culturais como fonte primária de um trabalho de ativação da
memória social, recuperando conexões e tramas perdidas,
provocando a afetividade bloqueada, promovendo a apropriação
pelas comunidades de sua herança cultural, resgatando e/ou
reforçando a autoestima e a capacidade de identificação dos
valores culturais ameaçados de extinção... desenvolvida na escola,
nos sistemas de educação formal e não-formal, com crianças e
adultos [...]” (HORTA, 2000, p. 35)

“Reafirmar e ampliar a capacidade educativa dos museus e do patrimônio cultural como


estratégias de transformação da realidade social” (IBRAM, 2015). Constitui na premissa
norteadora para o desenvolvimento de ações educativas, que ofereçam ao público visitante
uma fruição mais adequada, prazerosa e profunda de seus espaços expositivos.

Por isso enfoca que os museus encontram-se abertos a todos, porém, inacessíveis à
maioria da população, visto que a educação formal deficitária não desperta a necessidade
cultural do grande público. Esse fator, relacionado ao baixo capital cultural, artístico e
simbólico de significativa parcela dos brasileiros, contribui para a inacessibilidade destes à
cultura e, em especial, aos museus. Para que um visitante apreenda o capital simbólico
contido em um acervo exposto, ele necessita dos capitais cultural e artístico, embasadores
dessa compreensão. (BINA, p.78, 2015)

Os patrimônios históricos, após o processo de selecionar, guardar, conservar e transmitir se


caracteriza por uma dimensão mais ampla, necessariamente coletiva, que integra o modo
como os grupos sociais organizam sua memória. A preservação só faz sentido para a

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sociedade se está relacionada a necessidades e interesses do momento presente, na busca
constante de um ponto de equilíbrio entre permanência e mudança. Somado a isso, na
medida em que as histórias já construídas pela humanidade são levadas a comunidade por
meio do museu, instiga-se no público a vontade de se fazer ator social e de construir suas
próprias histórias. (RIBEIRO, ROSSINI, 2010).

Para “consumir” esses bens em muitos casos não é necessário


dispor de poder de compra, nem de conhecimentos especializados.
Eles estão acessíveis aos sentidos e à contemplação, e, por seu
valor insubstituível como testemunhos do passado, constituem
recursos valiosos para o conhecimento da história e para a fruição
estética. Explorar esse recurso ainda tão pouco aproveitado no
Brasil, visando a aproximar a população dos testemunhos de nossa
história, descentralizar, delegar e motivar a sociedade para preservar
o que de fato lhe pertence, é o grande desafio, neste século, para as
políticas de patrimônio. (LONDRES, 2005 p.171)

A ação educativa muitas vezes resume-se a técnicas e metodologias que façam os


educandos desenvolverem habilidades tornando-se assim uma ação técnica. As ações
educativas analisadas neste artigo tem como intuito constituírem procedimentos que
promovem a educação no museu, tendo o acervo e a edificação como centro de suas
atividades.

O Estado deve reconhecer que os museus podem ser atores económicos na sociedade e
contribuir para atividades geradoras de receita. Além disso, estes participam na economia
do turismo e em projetos produtivos que contribuem para a qualidade de vida das
comunidades e das regiões onde se localizam. De um modo mais amplo, estes podem
também aumentar a inclusão social de populações vulneráveis. (UNESCO, 2015)

Pode estar voltada para a transmissão de conhecimento dogmático, resultando na


participação, reflexão critica e transformação da realidade social. Assim, ser entendida como
uma ação também cultural, permitindo que o público compreenda, o que é bem cultural,
desenvolvendo uma consciência crítica da realidade que o cerca. Os resultados destas
intervenções deve assegurar a ampliação das possibilidades de expressão dos indivíduos e
grupos nas diversas esferas da vida social. Assim as ações educativas nos museus
promovem sempre beneficio para a sociedade, como também para o próprio museu.

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Objetivos

Ao definir os objetivos educativos da atividade, ao selecionar os conteúdos que serão


enfatizados, ao planejar as formas e estratégias usadas na visita e durante a mediação, ao
definir os papéis do mediador, do público, e dos demais participantes da ação e como se
relacionam, estaremos fazendo opções que remetem a determinadas concepções
pedagógicas. Ao definir os objetivos educativos da atividade, ao selecionar os conteúdos
que serão enfatizados, ao planejar as formas e estratégias usadas na visita e durante a
mediação, ao definir os papéis do mediador, do público, do professor ou dos demais
participantes da ação e como se relacionam, estaremos fazendo opções que remetem a
determinadas concepções pedagógicas.

Museu é definido como uma “instituição permanente sem fins lucrativos, ao serviço da
sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva, investiga,
comunica e expõe o património material e imaterial da humanidade e do seu meio
envolvente com fins de educação, estudo e deleite” . São instituições que procuram
representar a diversidade cultural e natural da humanidade, assumindo um papel essencial
na proteção, preservação e transmissão do património. (UNESCO, 2015)

Os museus contam com mais de dois séculos de história no Brasil e, ao longo desse
período, o seu papel educativo vem-se consolidando e fortalecendo. No Brasil, os recursos
financeiros destinados para museus foram sempre escassos (CAZELLI, 2005 apud
MARANDINO, 2008).

O recinto museu ganhou diversas formas através dos tempos. Passou a acompanhar as
novas tecnologias, avançando por essa via a sua comunicação com o público, seja por meio
de exposições dinâmicas – procurando um público ativo e não passivo –, seja via Internet,
com o seu marketing, a sua programação, divulgação, debates, ou através de CD ROMs
(Lévy, 1999: 23 apud OLIVEIRA, 2012).

Aplicada a museus existem também a museologia, que estuda a relação entre o


homem/sujeito e o objeto/bem cultural num espaço denominado museu (ou fora dele), tudo
isso participando de uma mesma realidade em transformação, o museu é espaço de
relações. E que, com base nas relações possíveis entre os seres humanos, mediadas por

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um discurso que articula os bens culturais o museu pode ser concebido como meio de
comunicação e campo de educação (CHAGAS, 1998 apud TOLENENTINO, 2012).

A avaliação, prática já consolidada nos grandes museus do mundo, é fundamental para o


aprimoramento permanente, tanto dos produtos desenvolvidos quanto dos processos de
comunicação e educação. Como levantamento sistemático de informações úteis à tomada
de decisão, os processos de avaliação permitem não apenas medir a adequação das ações
da instituição aos objetivos, como também conhecer qual a leitura e experiência do público.
(TOLENENTINO, 2012).

Museu Gama D’eça palco de Intervenções

A cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, apesar de ser conhecida como cidade
cultura, realiza poucas atividades em seus museus, de um modo geral os próprios
moradores da cidade acabam por pouco utilizar estes espaços de cultura. Podemos dizer
que a preocupação em conhecer os artefatos que fazem parte da história e da memória do
povo é imprescindível para que a sociedade se reconheça e faça parte das políticas
culturais.

O papel social dos museus é, sem dúvida, o de formação do indivíduo. Sob a óptica
educativa, o museu deve, como uma de suas principais funções, permitir a esse indivíduo
tornar-se sujeito de sua aprendizagem. Nesse contexto, as ações realizadas pelas
instituições, no sentido da comunicação museológica, adquiriram caráter de educação não-
formal, pois tratam da apropriação de conhecimento científico pela sociedade fora do
espaço escolar. (MARANDINO, p.28, 2008).

Como palco para algumas ações educativas, apresentadas neste artigo, será utilizado o
Museu Educativo Gama D’Eça, pertencente a Universidade Federal de Santa Maria –
UFSM. Sediado no palacete Dr. Astrogildo de Azevedo localizado na Rua do Acampamento,
primeira rua da cidade, em uma área central e histórica.

Datado do ano de 1913, a edificação foi construída para abrigar a residência e o escritório
médico do Dr. Astrogildo Cezar de Azevedo, médico influente na cidade embora natural de
Porto Alegre. Foi delegado estadual de higiene e fundou o primeiro hospital da cidade, o
Hospital de Caridade, no ano de 1903. Como intendente Municipal de 1916-1918, tentou
resolver o problema de saneamento básico, promoveu abertura de ruas, novos traçados e

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praças além da melhoria de serviços públicos como iluminação, água e limpeza (VILARINO,
2004, p.36-7).

O histórico palacete foi projetado pelo arquiteto Alemão Theodor Wiederspahh e a


execução da obra ficou ao encargo do engenheiro Henrique Scütz (FOLETTO, 2008). Esta é
considerada uma das obras mais expressivas elaboradas por Wiederspahn, ao todo o
arquiteto foi responsável por 28 em todo o estado, destas restam apenas 14, destas apenas
sete estão tombadas ou sob guarda. O palacete em questão não é tombado, mas se
encontra sob posse da UFSM e foi adaptado para atividades de cunho cultural.

Com uma área de 537 m² o palacete atualmente possui a seguinte disposição: Térreo-Hall e
portaria, sala de exposições temporárias, sala Memorial/UFSM, sala dedicada à Mariano da
Rocha, intitulada de “A trajetória de Vida de José Mariano da Rocha Filho”, sala de
Arqueologia e Etmologia, sala de Numismática, coleção Victor Bresani, gabinete da Direção,
secretária, cozinha e dois banheiros, no segundo pavimento Reserva Técnica, duas salas de
Paleontologia, Sala de Amarias e três salas de Zoologia.

O Gama d’Eça tem um acervo com mais de 13 mil peças durante o ano são realizadas
visitas mediadas, cursos, oficinas e palestras, e há o atendimento especial aos grupos
escolares e as exposições itinerantes. Existe uma preocupação constante do Museu em
educar, no ano de 2012 foram recebidas 46 escolas, contabilizando mais de 8,7 mil
visitantes, número expressivo, porém que poderia ser maior através da implementação de
mais e diversas medidas e ações educativas.

Metodologia

Como metodologia se sobrepôs três movimentos que, embora executados ordenadamente,


pensados simultaneamente, impondo que as demandas de uma etapa fossem respeitadas
pelas demais:

1. pesquisa: os pesquisadores da equipe se utilizaram das referências teóricas e


metodológicas de diferentes áreas do conhecimento para abordar as relações entre
educação, memória e patrimônio.

2. comunicação: após pesquisa inicial as informações foram transformadas em


informações capazes de serem incorporadas à exposição museológica e as ações a
serem criadas e aplicadas.

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3. programa educativo: tanto no momento da pesquisa das ações que podem ser
aplicadas, é necessário que se tenha consciência que o material exposto também é
objeto da ação educativa. O planejamento dessa ação visa potencializar os
significados da exposição e potencializar o valor histórico do patrimônio e da
memória coletiva.

As ações educativas

Não basta criar ou melhorar as instituições museológicas, tal ação deve ser acompanhada
de uma política de gestão efetiva que reconheça as necessidades dos espaços de memória,
sobretudo, de reconhecimento e utilização da instituição por parte da sociedade. Fazendo
com que a mesma aceite e faça do espaço como seu, tanto para usufruir quanto para
salvaguardar.

O patrimônio cultural é o conjunto de manifestações e representações de um grupo. É,


portanto, algo construído por esse grupo e é exatamente por isso que se faz necessário o
envolvimento da sociedade. É a sociedade quem define o que é importante para si, o que
detêm valor para determinado grupo. É necessária a identidade do grupo com os seus bens
culturais, caso contrário estes bens se perderão com o passar do tempo e com a alternância
das gerações. (TOLENENTINO, 2012).

Para que ocorra a identificação e o apoderamento do espeço museológicos pelo público,


ações educativas devem ser tomadas, sendo assim foram selecionados alguns exemplos de
medidas educativas aplicadas em outras localidades que resultaram de forma positiva na
valorização patrimonial.

“Sem dúvida que o Patrimônio Cultural é um recurso não contemplado quando se fala em
desenvolvimento do turismo, a visão que se tem é que somente os recursos naturais, festas
e eventos são a maior atração para o turismo. Desenvolver ações de Educação Patrimonial
no sentido de se apropriar do Patrimônio Cultural por todos os níveis da população
(população local, vereadores, prefeitos, governadores etc.) e incorporar o mesmo nos
planos e programas de desenvolvimento econômico dos Municípios, Estados e da União é
um caminho para que a riqueza e variedades dos bens culturais se transformem em fator de
melhoria de vida para a população e para as regiões, principalmente aquelas onde as
condições econômicas são deficitárias.” Afirma a Educadora e Arquiteta Evelina Grunberg,
autora do Guia Básico de Educação Patrimonial (1999) e do Manual de Atividades Práticas

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de Educação Patrimonial (2007) do Instituto do Patrimônio Histórico e Artistico Nacional -
IPHAN, pioneira nos estudos, no desenvolvimento e na aplicação da metodologia no Brasil.

Oficina – Uma “Selfie” no Museu

Esta dinâmica foi baseada nas experiências vivenciadas no Gerdau Museu das Minas e do
Metal de Belo Horizonte, Minas Gerais, tendo uma boa aceitação e participação do público.
Técnicas e dicas básicas para fotografar com celular ou tablet são apresentadas ao público,
estimulando para que ao conhecerem o acervo do museu, as fotos também sejam um
estimulo para a descoberta do museu como espaço. Observar o próprio palacete de uma
forma diferente, a olhar “pela janela”, observar o entorno do museu e desenvolver o “olhar”
fotográfico para o registro de paisagens e ambientes externos, como também para os
próprios detalhes construtivos guardados sob uma ótica diferente em seu interior.

Sessões em família

Pais, crianças, adolescentes, avós e amigos, pequenos grupos no qual as crianças e jovens
são acompanhados por adultos com os quais possuem vínculos afetivos, independente do
grau de parentesco, se houver. Elaboradas a partir delas as propostas educativas buscam
ressaltar e valorizar as memórias e as experiências prévias dos participantes. Esta ação
favorece o conhecimento mútuo, resultando no estreitamento dos vínculos familiares.

Oficina de Criação

No Museu Oscar Niemeyer, localizado em Curitiba as oficinas de criação, são vinculadas ao


teor das exposições. O principal objetivo delas é fazer com que o visitante se expresse
criativamente a partir do que viu e aprendeu. Também é uma forma de aproximar o visitante
da obra de arte, transmitindo de maneira lúdica conceitos da arte e da exposição em
questão.

Fazer com que os visitantes expressem a criatividade a partir da visita e dos aprendizados
que obtiveram com a mesma. Aproxima o visitante à arte e a cultura, transmite de forma
lúdica os conceitos da arte e do que se pode realizar a partir da exposição assim como dos
detalhes da edificação.

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Bate Papo no Jardim

O uso da história oral em museu pode contribuir para o enriquecimento da compreensão


histórica dos visitantes, se exibe a finalidade de estimular habilidades mentais do sujeito,
significados e também habilidades emocionais, psicológicas e sociais necessárias aos
diferentes tipos de questionamento, analise e síntese históricos. A história oral nos museus
pode facilitar ou obstar nosso diálogo com o passado, especialmente se temos o objetivo de
estar envolvidos nesse diálogo em termos históricos. (RIBEIRO e ROSSONI, 2010)

O palacete em questão possui um jardim histórico, com espécies nativas e espaços de


ornamentação como também de contemplação, a proposta desta medida é fazer com que o
público após a visitação debata os momentos e conhecimentos adquiridos que foram mais
impactantes em um ambiente externo que proporciona uma fuga do cotidiano. Quando
houverem grupos de crianças esta ação podem ser complementada pela criação e
interpretação de uma história a partir das experiências compartilhadas pelos visitantes.

VideoMapping

O videomapping é a técnica utilizada para mapear superfícies com um único projetor,


possibilitando a realização de obras complexas com múltiplas camadas de vídeo, em tempo
real e independente entre si, mesclando imagens com sons, musicas e ritmos. As duas
técnicas possibilitam alternativas à produção convencional em audiovisual, e oferecem um
amplo campo de expressão com diversas possibilidades de inserção no meio artístico.
(SESC, 2014)

Esta técnica de projeção usada para transformar qualquer superfície, mesmo a mais
irregular, numa tela de vídeo dinâmica, tais como fachadas de edifícios sem qualquer
distorção. Neste caso seria projetar a história da cidade e do palacete, assim como demais
projeções artísticas que a cidade possa vir a receber.

Conclusão

Museus são responsáveis por gerenciar e articular as demandas sociais em prol do


patrimônio cultural, e para atingir este objetivo é necessário que a instituição, e
principalmente, seus visitantes o reconhecerem como local patrimonial.

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Para Alice Bemvenuti (2004, p. 345), o panorama das ações educativas nos museus do
Brasil, abrangem concepções teóricas diferentes: por um lado, as ações educativas
contemplam ações isoladas, como a monitoria informativa, ou um programa de ação
educativa que não instiga o espectador a refletir sobre o registro realizado pelo artista; por
outro lado, existem setores organizados desenvolvendo pesquisa e atividades relacionadas
à leitura de obras em que podemos observar ações educativas sistematizadas.

É preciso ressaltar que de modo geral as ações, são ofertadas por grandes instituições
museológicas brasileiras. Elas não representam a realidade dos museus com menos público
e dimensões no Brasil.

Para serem implementadas, e principalmente aprimoradas pelos visitantes, o setor


educativo da instituição deve ser organizado, ou possuir uma equipe de funcionários
preparados para prestar este tipo de serviço. A ausência de monitores, mediadores ou
atendentes em museus é um fato concreto.

Apesar da carência, e da falta de identificação do publico com o patrimônio e sua localidade,


as práticas educativas desenvolvidas, aplicadas neste caso, tem como intuito de contribuir
para a difusão dos bens culturais. Entretanto, não basta garantir a democratização do
acesso aos bens culturais, é preciso formar um público que seja capaz de construir e
desconstruir discursos no campo do patrimônio.

Referências

ÁTILA BEZERRA TOLENTINO ORG; IPHAN na Paraíba; Educação patrimonial: reflexões e


práticas; João Pessoa, 2012

BEMVENUTI, Alice. Museus e educação em museus: história, metodologias e projetos. Com


análises de caso: museus de arte contemporânea de São Paulo, Niterói e Rio Grande do
Sul. Dissertação de Mestrado – PPGAVI/UFRGS, 2004.

BINA, Ellene Dourado. Museus: Espaços de comunicação, interação e mediação cultural,


2015. Actas do I Seminário de Investigação em Museologia dos Países de Língua
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RIBEIRO, Aragonêz; ROSSONI, Sirlei. Repensando a ação educativa no museu: formação


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WEIMER, Günter. Arquitetos e Construtores no Rio Grande do Sul: 1892/1945. Santa Maria:
UFSM, 2004.

Configuração do corpo do texto

 Fonte: Arial, tamanho 11, parágrafo justificado.

 Espaçamento entre caracteres e palavras: simples.

 Espaçamento entre linhas: 1,5 linhas.

 Espaçamento entre parágrafos (antes / depois): 6 pt

 Número de palavras: mínimo de 4.000 e máximo de 6.000 palavras, incluindo


bibliografia e notas de rodapé.

 Número máximo de ilustrações: 4 (utilizar o formato “jpg” com resolução de 96dpi).


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 Tabelas, quadros, ilustrações e gráficos: Utilizar legendas com fonte Arial em
tamanho 10.

 Notas: Devem ser evitadas ao máximo as notas de rodapé ou de fim de página.


Quando absolutamente necessárias devem ser utilizadas notas de rodapé, com a
seguinte formatação: fonte Arial, tamanho 9, parágrafo justificado.

 Tamanho do arquivo: Máximo 3Mb.

Normas para as Referências Bibliográficas

As referências bibliográficas devem seguir obrigatoriamente as recomendações da ABNT.

Confira as normas da ABNT em:


http://dgi.unifesp.br/sites/comunicacao/pdf/entreteses/guia_biblio.pdf

Para citações no corpo de texto, deverá ser utilizado o seguinte modelo: (autor, data, p.XX).
Ex: (Santos, 1996, p.58).

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MEMÓRIA URBANA DE BELO HORIZONTE: A CASA DA RUA
BERNARDO GUIMARÃES 441

(1) COSTA, MARIA LÚCIA PRADO .

(2) (COSTA, MARIA DE LUJAN SEABRA DE CARVALHO)

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2. Bios Consultoria Ambiental


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lujan@biosconsultoria.com.br

RESUMO
A ocupação do polígono desenhado, em 1895, pelo engenheiro Aarão Reis (1853-1936) para abrigar
a zona urbana da nova capital do estado (1895/7) tem sido tratada em análises historiográficas
generalistas. Estas focam, grosso modo, a contraposição entre o espaço interno do perímetro da
antiga avenida 17 de dezembro, hoje avenida do Contorno, e o espaço externo a ela; e a ruptura do
modelo da cidade positivista com o avanço da urbanização de Belo Horizonte, ao longo do tempo. Há
poucas análises pontuais que tratem casos específicos de concessão de lotes e projetos de
construção, nos primeiros anos da nova capital.
A oportunidade de estudar a história de uma propriedade dentro do perímetro da avenida do
Contorno, desde o contexto da inauguração da cidade até os dias de hoje, traz a oportunidade de
analisar no nível micro como se deu a apropriação desse fragmento do território urbano da cidade.
A casa da rua Bernardo Guimarães, 441, ainda existente e conservada, situa-se nos Funcionários,
bairro edificado para abrigar preferencialmente os ex-proprietários e o funcionalismo público vindo de
Ouro Preto. A casa foi objeto de recente pesquisa cartorial e arquivística – tanto do Arquivo Público
da Cidade de Belo Horizonte quanto do arquivo da família de seus atuais proprietários desde 1940,
além de prospecção da legislação pertinente. A pesquisa chegou até o ano de 1912 e pôde
esclarecer os meandros de facilitação conferidos pelo Estado aos primeiros proprietários do terreno
onde anos mais tarde, em 1931, se edificaria a primeira planta arquitetônica da casa estudada.
A edição de um pequeno livreto ilustrado com imagens de arquivo com a narrativa sobre a história da
casa da rua Bernardo Guimarães 441 se fez, em 2016, na perspectiva de oferecer um instrumento de
educação patrimonial sobre a história da cidade.

Palavras-chave: memória urbana; Belo Horizonte; política pública

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Casa da Rua Bernardo Guimarães, 441

O estudo da história do lote e da casa da rua Bernardo Guimarães, 441, no bairro Funcionários, em
Belo Horizonte, se fez em 2016, quando os proprietários alteraram seu uso de residencial para
comercial, mas ainda sob ocupação da família. Nesta adaptação, procuraram manter intacta a
arquitetura do bem, assim como parte de seu mobiliário e elementos decorativos. Neste momento de
transição, se acentuou o interesse em conhecer melhor a história da casa.

A pesquisa pretendia levantar o histórico das transações de compra e venda da propriedade,


notadamente no período anterior a 1940, quando a família a adquiriu. O foco principal, entretanto, era
tentar identificar a primeira concessão da propriedade feita supostamente pelo Estado de Minas
Gerais a particulares. Isto porque na Planta Geral da Cidade de Minas de 1895, o quarteirão 5 da VI
seção urbana, onde está a casa, era marcado com a letra R, uma vez estar reservado ao Estado de
Minas Gerais.

A Planta Geral da Cidade de Minas, de 1895, já trazia um projeto de distribuição dos lotes, conforme
determinado pelo decreto estadual n. 803 de 11 de janeiro daquele ano. Segundo estudo da arquiteta
e geógrafa, Alícia Duarte Pena:

Em 11 de janeiro de 1895, [...], o estado, expede o Decreto n. 803, autorizando a venda


e a revenda dos terrenos compreendidos dentro do perímetro da nova capital,
excetuando-se os necessários à construção dos edifícios públicos, os concedidos aos
funcionários públicos estaduais e aos proprietários em Ouro Preto e os permutados com
os antigos proprietários do Arraial do Curral d’El Rey. Reserva-se, ainda, ao estado,
alguns quarteirões e lotes a serem vendidos somente dez anos depois da instalação da
nova capital. (PENA, 1997) (grifos nossos)

Segundo o decreto acima, os quarteirões e lotes reservados ao Estado de Minas Gerais poderiam ser
vendidos somente dez anos depois da instalação da nova capital (1897). Provavelmente, em 1907?

A peculiaridade do presente estudo é que o primeiro proprietário particular dos lotes 17 e 18, em
1912, era listado como proprietário de Ouro Preto com direito a lote na nova capital em 1895. Faria,
portanto, jus a um lote, mas não nos quarteirões reservados ao estado de Minas Gerais. Não era
funcionário público estadual, razão pela qual não teria direito a um lote nos quarteirões marcados com
a letra R. Na realidade, era funcionário público federal. Trata-se de Domingos Fernandes Monteiro,
um servidor do Tesouro Nacional em Minas Gerais. A ele e sua família foram conferidos privilégios
tanto em âmbito municipal quanto estadual e federal. Não nos anos imediatos à inauguração de Belo
Horizonte, mas a partir de 1912. Os favores visaram tanto à aquisição do lote – ou lotes – quanto à
futura edificação.

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Privilégios Concedidos a Funcionário do Tesouro Nacional em Minas Gerais:
Domingos Fernandes Monteiro e sua Mulher, D. Virgínia: 1912

Para melhor se compreender as facilidades conferidas a este funcionário federal, está-se dividindo
este tópico em dois itens. Um pertinente à aquisição do lote e outro à edificação – etapa que não se
sabe chegou a ser efetivada pela viúva de Domingos Fernandes, em razão do seu falecimento em 12
de fevereiro de 1913.1

A Compra dos Lotes

Na “Relação dos proprietários de casas em Ouro Preto com direito a lotes de terreno para
construcção na futura capital do estado, conforme a lei n. 3 de 17 de dezembro de 1893”, publicada
no jornal oficial, consta o nome de Domingos Fernandes Monteiro (MINAS GERAIS, 30 jul. 1895).
Mas, ao que parece, não foi sob tal condição que ele se interessaria futuramente em adquirir um lote
na nova Capital.

A lei n. 24 de 14 de fevereiro de 1907 determinava aos funcionários federais dos Correios privilégios
que mais tarde se estenderiam aos servidores do Tesouro Nacional de Minas Gerais. Ambos os
segmentos poderiam ganhar um lote gratuito e comprar outro contíguo, desde que já fossem
beneficiários do direito ao empréstimo para construção. Curiosamente, favorecimentos públicos para
a construção precederam aqueles que seria conferidos para aquisição dos lotes. Diz a lei referida:

Fica o Prefeito auctorizado a conceder aos funccionarios federaes que tiverem auxilio do
governo federal, para construcção de casa, dois lotes de terreno, sendo um gratuito e
outro contiguo, pelo preço estabelecido, que será pago em prestações mensaes. (BELO
HORIZONTE, Lei n. 24/1907) (grifos nossos)

A primeira referência aos lotes 17 e 18 do quarteirão 5 da VI seção urbana – sobre os quais se


edificariam posteriormente a casa e as duas residências vizinhas – nas fontes consultadas, data de
1912. Trata-se de uma anotação feita no livro 8 de Registros de Lotes Urbanos (1912-1914), do fundo
do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH). Nela se lê, na página 61, que ambos os
lotes teriam sido adquiridos por Domingos Fernandes Monteiro (1948-1913) e sua mulher, D. Virgínia
Fernandes Monteiro (1856-1936), pela escritura de 21 de setembro daquele ano, documento passado
no Cartório do 2º Ofício. Esta escritura, contudo, não consta do Livro de Registro de Escrituras
daquele ano do fundo do APCBH.

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Em 1912, Domingos Fernandes Monteiro era contador da Delegacia Fiscal do Tesouro Nacional em
Minas Gerais, onde trabalhou, em diversas funções, desde 1904 até 1913, segundo o Almanak
Laemmert2.

Segundo o códice, o valor do lote n. 17, equivalente a 200 contos de réis e “não 300 contos como, por
engano, foi escriputado”, foi pago “conforme talão n. 55 de 2 de abril de 1913”. Foi quitado, portanto,
logo após o falecimento de Domingos Fernandes, em 12 de fevereiro daquele ano.

O lote 18 valia “300 réis e não 200 réis como, por engano, foi escripturado”. Em março de 1913, este
lote foi concedido gratuitamente a D. Virgínia, já viúva, pela anulação do débito da compra de 21 de
setembro de 1912, em razão da lei n. 39 do Conselho Deliberativo, conforme informação do códice.
Ou seja, o lote mais caro foi dado gratuitamente à viúva. Infelizmente, não se localizou a lei citada.

A lei n. 88 de 8 de fevereiro de 1915 conferia aos proprietários de lotes concedidos, que ainda não
houvessem neles edificado, a possibilidade de prorrogação do prazo de seis meses, e assim
sucessivamente por três vezes, desde que pagassem as devidas taxas. Findo esse prazo de 24
meses, a concessão cairia em caducidade e o lote iria à hasta pública. Como se verá, estes prazos
foram sucessivamente esticados.

A compra do lote 17 e 18 em 1912 no quarteirão 5 da VI seção urbana não foi, entretanto, um fato
isolado. Curiosamente, dos 26 lotes que compõem este quarteirão, 22 (84%) deles foram vendidos
pela primeira vez em 1912, segundo prospecção ao Índice dos Registros Urbanos de Lotes Urbanos
– AI. 06.00.00, do fundo do APCBH. Não se identificaram na mesma listagem dados sobre os quatro
lotes do mesmo quarteirão não vendidos em 1912.

A Edificação

Privilégios aos funcionários da Delegacia Fiscal ou Tesouro Nacional de Minas Gerais, em Belo
Horizonte, para construção de casas na nova cidade, já haviam sido objeto da lei federal n. 2.356 de
31 de dezembro de 1910:

Art. 96 - Aos funccionarios da Delegacia Fiscal, em Bello Horizonte, será concedido o


favor constante do n. XII do art. 35 da lei nº 1.617, de 30 de dezembro de 1906.
(Corrigido pelo Decreto nº 2.447, de 1911). (BRASIL, Lei n. 2.356/1910) (grifos nossos)

As condições do empréstimo para construção das casas para os funcionários do Tesouro Nacional
em Minas Gerais seguiam, portanto, as mesmas já conferidas pelo governo federal aos servidores

2 No Almanak Laemmert, ele figura como primeiro escripturário da Delegacia Fiscal do Tesouro Federal, em 1904
e 1905, como contador da mesma repartição pública, em 1906, 1907, 1908, 1909, 1911 e 1913. Pelo decreto n
1.789/1907 do Presidente Afonso Pena, ele foi licenciado por um ano, além da prorrogação na qual já se
encontrava, para tratamento de saúde, com direito ao ordenado.

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dos Correios de Ouro Preto, descritas na lei n. 1.617 de 1906. Em síntese, eram as seguintes: (i)
empréstimo pelo prazo de dez anos até a quantia de 489 contos de réis: (ii) pagamento em três
parcelas, uma no início, outra no meio e a terceira depois de concluída a edificação; (iii) casa e
terreno sob hipoteca do Governo Federal até a quitação total do empréstimo; (iv) opção pela
continuidade do contrato pelos herdeiros, em caso de falecimento do funcionário.

Esta última prerrogativa é de especial interesse para este estudo, haja vista que com o falecimento de
Domingos Fernandes Monteiro, em 12 de fevereiro de 1913, d. Virgínia passou a gerir os lotes.

Neste mesmo mês, no dia 26, o decreto federal n. 10.094 determinava abertura de crédito para
atender aos servidores da Delegacia Fiscal federal para construção de suas casas em Belo
Horizonte, a título de empréstimo:

Abre ao Ministerio da Fazenda o credito de 164:000$ para occorrer á despeza com os


adeantamentos a que teem direito os funccionarios da Delegacia Fiscal em Bello
Horizonte, a titulo de emprestimo para construcção de casas. (BRASIL, Decreto n.
10.094/2013) (grifos nossos)

Entre 1915 e 1918, Dona Virgínia foi beneficiada por três leis municipais que estenderam o prazo
para início da edificação nos lotes.

Pela lei n. 99/1915, ela foi citada nominalmente no artigo 4º como beneficiária da isenção de
impostos, referente aos lotes da rua Ceará. A menção a esta rua decorre do lote 17 estar na
confluência entre esta rua e a rua Bernardo Guimarães:

Art. 4º - Será concedido a d. Virginia Geraldina Fernandes Monteiro, durante o anno de


1916, a isenção das taxas de que trata o art. 2.º, da lei n.88, e referente aos lotes que
possue á rua Ceará. (BELO HORIZONTE, lei n. 99/1915) (grifos nossos)

Ela também é citada, junto com outros, entre eles José Francisco Macedo, o “Zé dos Lotes”, na lei n.
128/1917 que determinou em seu artigo 1º:

Art. 1º - Fica o Prefeito auctorizado a prorrogar os prazos para construção nos lotes de
terrenos urbanos de propriedade dos srs. Benjamin Moraes, d. Virginia Fernandes
Monteiro, capitão Christiano Alves Pinto, Domingos Fleury da Rocha, José Francisco de
Macedo e dr. José Fellipe de Santa Cecilia, cobrando as respectivas taxas. (BELO
HORIZONTE, lei n. 128/1917) (grifos nossos)

A lei n. 137/1917, do prefeito Cornélio Vaz de Mello, dispôs sobre a possibilidade de prorrogação dos
prazos daqueles que não conseguissem edificar nos lotes concedidos desde que pagassem impostos
equivalentes a um prédio de 15 contos de réis. Tanto a lei n. 88/1915 quanto a n. 137/1917 foram
revogadas, entretanto, pela lei n. 161 de 31 de outubro de 1918, assinada pelo mesmo prefeito. Esta

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lei perdoava o débito dos proprietários junto à Prefeitura e estendia o prazo de início da construção
por mais um ano, ou seja, outubro de 1919.

Antes, portanto, de findo o prazo, o decreto federal n. 3.504 de 29 de janeiro de 1918 do Congresso
Nacional autorizou o Presidente da República a adiantar por empréstimo “a D. Virginia Fernandes
Monteiro, viuva do contador da Delegacia Fiscal do Thesouro Nacional em Minas Geraes, a quantia
de 10:000$, para a construcção de uma casa”. No ano seguinte, o decreto federal n. 13.561 de 22 de
abril de 1919 determinou a abertura do crédito especial de dez contos de réis destinado ao
empréstimo para construção de uma casa, “à viúva do contador da Delegacia Federal do Tesouro
Nacional em Minas Gerais”, conforme disposto no decreto de 1918. Se o empréstimo chegou a ser
efetivado, não se sabe.

Mas ao que sugerem as fontes, apesar dos decretos federais, um de 1918 e outro de 1919,
autorizando empréstimo à viúva, D. Virginia, a casa dos lotes 17 e 18 não teria sido edificada até a
venda dos lotes em 1921 – data da primeira planta arquitetônica identificada no APCBH, já em nome
do novo proprietário: engenheiro Dr. José da Silva Brandão. O códice do APCBH não menciona
nenhuma edificação nos lotes nesta data.

Data de 1921, a primeira planta arquitetônica idealizada para os lotes, encontrada no fundo do
mesmo arquivo. O título do documento é: “Prédio projetado para os lotes n. 17 e 18, do quarteirão nº
5 da 6ª secção urbana – propriedade do Sr. Engenheiro José da Silva Brandão”.

Não se sabe se exatamente esta casa projetada chegou a ser construída, apesar de indícios nas
fontes posteriores, de 1923, de que havia uma edificação nos lotes mencionados. Mas não há como
comprovar tratar-se da mesma residência desenhada na planta arquitetônica de 1921.

O curioso é que D. Virgínia figuraria, em 27 de dezembro de 1929, como proprietária também do lote
10 do quarteirão 27 de V seção urbana, conforme Índice dos Registros Urbanos de Lotes Urbanos –
AI. 06.00.00, do fundo do APCBH. Este endereço fica à rua Paraíba, entre rua Bernardo Guimarães e
rua Gonçalves Dias, também no bairro Funcionários.

José da Silva Brandão: 1921

Na história da casa, há coincidências curiosas. A primeira é a conexão entre os dois primeiros


proprietários com o Tesouro Nacional de Minas Gerais, em algum momento de suas biografias. A
segunda é a conexão entre personagens ligados à casa e a Secretaria d’Agricultura, Comércio e
Obras Públicas, que sucedeu à Comissão Construtora, extinta em 1898.

Segundo o “Novo Dicionário Biográfico de Minas Gerais: 300 anos de história” (ICAM, 2013), o
engenheiro José da Silva Brandão exerceu em algum momento de sua vida profissional a função de
diretor da Diretoria de Obras da Secretaria de Agricultura, e em outro momento, a de diretor-geral do

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Tesouro Federal em Minas Gerais. Na data da compra dos lotes, 1921, tinha matrícula na Diretoria de
Obras Públicas de Belo Horizonte:

José da Silva Brandão (Ouro Preto 1881 – Belo Horizonte 1935) era construtor e
engenheiro de minas e civil, formado pela Escola de Minas de Ouro Preto (1907). Foi
professor catedrático da Escola de Engenharia de Belo Horizonte. Trabalhou como
engenheiro residente da construção da Estrada de Ferro Sabará a Santa Bárbara (1907-
1908). No setor público, foi engenheiro do estado (1908-10), designado a instalar e dirigir
interinamente a Seção Temática da Diretoria de Obras da Secretaria da Agricultura
(1909-10). Teve matrícula registrada na Diretoria de Obras Públicas da Prefeitura de
Belo Horizonte (1921-1932). Atuou como diretor-geral do Tesouro, no Governo Olegário
Maciel e, posteriormente, secretário interino de Finanças [...]. (ICAM, 2013, p. 78) (grifos
nossos)

A ligação entre José da Silva Brandão e o governo de Olegário Maciel (de 04/08/1924 até
21/12/1924; de 07/09/1930 até 05/09/1933) teria ocorrido posteriormente, entretanto, a 1921, ano da
compra dos lotes aqui estudados, pelo engenheiro.

A planta de 1921 da casa foi desenhada pelo arquiteto Dario Renault Coelho filho do também
arquiteto Edgard Nascentes Coelho (1853-1917). Segundo o Almanak Laemmert, tanto o pai quanto o
filho eram funcionários da Directoria de Viação, Obras Públicas e Indústria da Secretaria de
Agricultura do Estado de Minas Gerais, entre 1915 e 1917. O primeiro como desenhista arquiteto e o
segundo como desenhista. Naqueles mesmos anos, Dr. José da Silva Brandão figurava como
engenheiro do estado nesta mesma diretoria, segundo o Almanak mencionado.

No Índice do Registro de Lotes Urbanos, organizado pelo Arquivo Público da Cidade de Belo
Horizonte, José da Silva Brandão consta como proprietário de 12 lotes, entre 1922 e 1924, conforme
apresentado no Quadro seguinte, além dos dois lotes, objeto do presente estudo.

Quadro – Lotes de Propriedade de José da Silva Brandão

Data Lotes Quarteirão Seção

22/02/1922 13 26 X

10/10/1922 1 13 X

19/10/1922 9 13 X

11/11/1922 5 13 X

27/06/1923 1e2 22 VII

29/08/1923 6e8 25 VII

23/10/1924 9, 11, 13 e 15 4 II
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Fonte: Índice dos Registros de Lotes Urbanos. AI. 06.00.00. Arquivo Público da Cidade de Belo
Horizonte.

O quadro acima indica a inequívoca vocação de especulação imobiliária do engenheiro José da Silva
Brandão, nos anos citados.

A Planta Geral da Cidade de Belo Horizonte de 1923 e a de 1928/1929 já não traziam a letra R sobre
o quarteirão cinco da VI seção urbana – indício de que os lotes originalmente reservados ao Estado já
havia sido distribuídos? A última Planta Geral traz uma edificação no lote 17.

Joaquim Telles de Carvalho e sua mulher Maria Ubaldina: 1923

Em 1923, Joaquim Telles de Carvalho e sua mulher Maria Ubaldina de Carvalho compraram o prédio
n. 1.264 da rua Ceará e os lotes 17 e 18 de José da Silva Brandão e sua mulher, como se confirma
pelo registro de 5 de setembro, do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Belo Horizonte.

Antonio Luciano Pereira e sua mulher Olympia: 1928

Em 1928, os lotes 17 e 18 e o prédio da rua Ceará foram vendidos a Antonio Luciano Pereira e d.
Olympia de Rezende Pereira, pais do polêmico especulador imobiliário de Belo Horizonte, Antonio
Luciano Pereira Filho (1913-1990). Provavelmente a partir de 1928, os lotes que somavam 1.089m²
foram divididos em três porções não exatamente idênticas e passaram a abrigar três edificações
distintas. A planta de uma delas, a do lado direito da casa aqui estudada, de 1925, de propriedade do
Sr. Elton Guimarães está sob a guarda do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte.

A casa da Bernardo Guimarães 441, figurará a partir de então ora em parte do lote 17 ora em parte
do lote 18, somando apenas 375m². O Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte guarda o projeto
de construção para o lote 17, datado de 28 de agosto de 1931, elaborado pelo arquiteto Caetano de
Franco, para Antonio Luciano Pereira. Supõe-se desta data, portanto, a estrutura arquitetônica básica
da atual casa da rua Bernardo Guimarães, 441. É a primeira documentação encontrada nas fontes
que traz esse endereço.

Em 1938 houve um “projecto para modificação e acréscimo na casa existente em parte do lote n. 17,
do quarteirão 5 da 6ª seção urbana” de propriedade de Antonio Luciano Pereira. O projeto era do
arquiteto e desenhista italiano Francisco Farinelli. 3

Homero Costa e sua mulher Olavina: 1940

3 Segundo Dicionário Biográfico dos Construtores e Artistas de Belo Horizonte de 1894 a 1940 (IEPHA, 1997),
Francisco Farinelli em 1923 teve matrículas como desenhista e mestre de obras registradas na Diretoria de
Obras Públicas da Prefeitura de Belo Horizonte. Entre seus projetos, destacam-se no bairro Funcionários: antiga
residência de Pelegrino Antonini (1932/1935); à avenida Getúlio Vargas n. 167 esquina com rua Maranhão, que
ainda resiste; e residência de Ernestina B. Martins Vieira (1939) na rua Ceará n. 1.323.
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Por escritura lavrada em 19 de setembro de 1940, no 4º Ofício de Notas de Belo Horizonte, o
advogado Homero Costa adquiriu de Antonio Luciano Pereira a casa e parte do lote n. 17.

Em 1951 houve acréscimo e modificação de parte do lote n. 18 (há uma alteração do número),
através de planta do arquiteto Cláudio Jorge Gomes e Souza.

Túlio Vieira da Costa e sua mulher Teresinha: 1962

Em 1958, o advogado Túlio Vieira da Costa se mudou para a casa, junto com sua família, mas só
viria efetivar a compra feita a seus pais, Homero e Olavina, através da escritura de compra e venda
de 28 de março de 1962, registrada no Cartório do 2º Ofício de Notas.

Em 1964, a casa sofreu uma reforma radical, através do projeto do escritório “Arquitetos Associados
Mardônio S. Guimarães e João A. Bethonico”. Esta estrutura, com algumas modificações pouco
expressivas, permanece até hoje.

A casa hoje pertence a seus filhos e neto.

Considerações Finais

A prospecção da história da casa evidenciou facilitações do Estado para que o primeiro proprietário
dos lotes 17 e 18, funcionário público federal do Tesouro Nacional em Minas Gerais, os adquirissem
em 1912 e sua viúva, posteriormente, neles pudesse edificar. Um dos lotes foi dado gratuitamente;
várias isenções de impostos municipais foram conferidas; prazos de construção foram prorrogados;
crédito em âmbito federal foi autorizado para edificação. O curioso é que muitos desses decretos e
leis, nas três esferas do Poder, foram feitos para beneficiar nominalmente D. Virgínia, viúva do
funcionário público federal.

Apesar dos fartos favores, não se sabe se dona Virgínia tenha conseguido edificar nos lotes
estudados, uma vez não ter-se encontrado no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte nenhuma
planta arquitetônica dos lotes atinente a esta proprietária. Sugestiva também é a informação de que o
proprietário que a sucedeu, em 1921, era engenheiro com vínculos anteriores com a Secretaria de
Agricultura, Indústria, Terras, Viação e Obras Públicas, e futuramente viria a ser presidente do
Tesouro Nacional em Minas Gerais. Além desses dois lotes, adquiridos em 1921, tornou-se
proprietário de 12 lotes urbanos entre 1922 e 1924 em Belo Horizonte. Vínculos com a mesma
Secretaria tinha o arquiteto que viria a elaborar a planta arquitetônica de 1921.

A elaboração de um livreto, em 2016, com texto, fotografias do arquivo da família desde 1940 até
2016 e imagens da documentação encontrada em cartórios e no Arquivo Público da Cidade de Belo
Horizonte pretendeu, dentro de suas limitações, servir como um instrumento de educação patrimonial
sobre a apropriação de fração de um dos quarteirões reservados para o Estado na Planta Geral da
Cidade Minas, em 1895.

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Referências Consultadas

ALMANAK LAEMMERT, Delegacia Fiscal do Tesouro Nacional. Disponível em:


http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=313394&pagfis=76915&url=http://me
moria.bn.br/docreader#. Acesso em: 24 mai. 2017

______. Directoria de Viação, Obras Públicas e Industrias. Secção technica. 1915, 1916, 1917.
Disponível em:
http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=313394&pagfis=59338&url=http://me
moria.bn.br/docreader#. Acesso em: 22 mai. 2017

BELO HORIZONTE, Lei n. 1.617, de 30 de dezembro de 1906. Fixa a despeza geraI da Republica
dos Estados Unidos do Brazil para o exercicio de 1907, e dá outras providencias. Disponível:
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1900-1909/lei-1617-30-dezembro-1906-582004-
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______. Lei n. 24 de 14 de fevereiro de 1907. Concede auxílio financeiro. Disponível em:


https://leismunicipais.com.br/a/mg/b/belo-horizonte/lei-ordinaria/1907/2/24/lei-ordinaria-n-24-1907-
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______. Lei n. 88 de 8 de fevereiro de 1915. Concede prazos para construção. Disponível em:
https://leismunicipais.com.br/a/mg/b/belo-horizonte/lei-ordinaria/1915/8/88/lei-ordinaria-n-88-1915-
concede-prazo-para-construcao. Acesso em: 19 mai. 2017.

______. Lei n. 99 de 13 de outubro de 1915. Concede exoneração de impostos. Disponível em:


https://cm-belo-horizonte.jusbrasil.com.br/legislacao/239354/lei-99-15. Acesso em: 19 mai. 2017.
______. Lei n. 128 de 3 de abril de 1917. Prorroga prazos para construção nos lotes de terrenos
urbanos que especifica. Disponível em: https://cm-belo-
horizonte.jusbrasil.com.br/legislacao/239329/lei-128-17. Acesso em: 22 mai. 2017.

______. Lei n. 137 de 11 de outubro de 1917. Dispõe sobre caso que poderão ser relevados da pena
de caducidade. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/a/mg/b/belo-horizonte/lei-
ordinaria/1917/13/137/lei-ordinaria-n-137-1917-dispoe-sobre-caso-que-poderao-ser-relevados-da-
pena-de-caducidade. Acesso em: 19 mai. 2017.

______. Lei n. 161 de 31 de outubro de 1918. Dispõe sobre a vigência do art. 6º da lei nº 139/17, e dá
outras providências. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/a/mg/b/belo-horizonte/lei-

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outras-providencias. Acesso em: 19 mai. 2017.

BRASIL, Lei n. 1.617, de 30 de dezembro de 1906. Fixa a despeza geraI da Republica dos Estados
Unidos do Brazil para o exercicio de 1907, e dá outras providencias. Disponível em:
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publicacaooriginal-104708-pl.html. Acesso em: 19 mai. 2017.

Decreto n 1.789 de 5 de dezembro de 1907. Autoriza o Presidente da Republica a conceder um anno


de licença, com ordenado, ao contador da Delegacia Fiscal do Thesouro Federal em Minas Geraes
Domingos Fernandes Monteiro. Disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1900-
1909/decreto-1789-5-dezembro-1907-582421-publicacaooriginal-105218-pl.html. Acesso em: 19 mai.
2017.

______. Lei n 2.356 de 31 de dezembro de 1910. Fixa a despeza geral da Republica dos Estados
Unidos do Brazil para o exercicio de 1911 e dá outras providencias. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1901-1929/L2356.htm. Acesso em: 26 mai. 2017.

______. Decreto n. 10.194 de 26 de fevereiro de 1913. Abre ao Ministerio da Fazenda o credito de


164:000$ para occorrer á despeza com os adeantamentos a que teem direito os funccionarios da
Delegacia Fiscal em Bello Horizonte, a titulo de emprestimo para construcção de casas. Disponível
em: http://www.lexml.gov.br/urn/urn:lex:br:federal:decreto:1913-02-26;10094. Acesso em: 26 mai.
2017.

______. Decreto n. 3. 504 de 29 de janeiro de 1918. Autoriza o adeantamento de 10:000$ a D.


Virginia Fernandes Monteiro, viuva do contador da Delegacia Fiscal do Thesouro Nacional em Minas
Geraes. Disponível em:
http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=33091&norma=48740. Acesso em:
19 mai. 2017
______. Decreto n. 13.561 de 23 de abril de 1919. Abre, ao Ministerio da Fazenda, o credito especial
de 10:000$, destinado ao emprestimo para construcção de uma casa, ao qual tem direito a viuva do
contador da Delegacia Fiscal do Thesouro Nacional em Minas Geraes, Domingos Fernandes
Monteiro. Disponível em:
http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=34128&norma=49787. Acesso em:
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INSTITUTO CULTURAL AMILCAR MARTINS (ICAM). Novo Dicionário Biográfico de Minas Gerais:
300 anos de história. Belo Horizonte: ICAM, 2013.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
INSTITUTO ESTADUAL DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO (IEPHA). Dicionário Biográfico
de Construtores e Artistas de Belo Horizonte – 1894/1940. Belo Horizonte. 1997.
GENEAMINAS. Família Monteiro. Disponível em: http://geneaminas.com.br/genealogia-
mineira/restrita/enlace.asp?codenlace=1359095. Acesso em: 07 jun. 2017.

PENA, Alícia Duarte. Belo Horizonte: um espaço infiel. VARIA HISTORIA, Belo Horizonte, nº 18,
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62214570325/07_Penna%2C+Alicia+Duarte.pdf. Acesso: 12 jun. 2017.

MINAS GERAIS. Decreto n. 803, de 11 de janeiro de 1895. Estabelece as bases para o levantamento
do Plano Geral da Capital do Estado, em construção no distrito de Belo Horizonte, desmembrado
para esse fim do município de Sabará, e bem assim para as concessões, vendas e distribuições de
lotes urbanos e suburbanos para construções naquele distrito. Disponível em:
http://www.lexml.gov.br/urn/urn:lex:br;minas.gerais:estadual:decreto:1895-01-11;803. Acesso em: 6
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MINAS GERAIS (JORNAL). Relação dos proprietários de casas em Ouro Preto com direito a lotes de
terreno para construcção na futura capital do estado, conforme a lei n. 3 de 17 de dezembro de 1893.
Ouro Preto, 30 jul. 1895. Disponível em:
http://memoria.bn.br/pdf/291536/per291536_1895_00203.pdf. Acesso em: 07 jun. 2017.

CÓDICES DO ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE BELO HORIZONTE

DARIO RENAULT COELHO. Predio projectado para os lotes nºs 17 e 18, do quarteirão nº 5, da 6ª
seção urbana. 1921.

CAETANO DE FRANCO. Projeto de construção para o lote n. 17 – quart. N. 5 da VI Seção Urbana.


28 ago. 1931.

Livro n. 8. Registro de Lotes Urbanos (1912-1914). Códice

Índice dos Registros de Lotes Urbanos. AI. 06.00.00. Arquivo em Excel.

DOCUMENTOS CARTORIAIS

Cartório do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Belo Horizonte. Certidão de 29 de junho de 2016.

Cartório do 2º Ofício de Notas de Belo Horizonte. Escritura de compra e venda de 28 de março de


1962.
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Serviço Notarial do 3º Ofício de Belo Horizonte. Escriptura de compra e venda registrada em 31 de
dezembro de 1928.

Serviço Notarial do 4º Ofício de Belo Horizonte. Escritura de compra e venda registrada em 5 de


setembro de 1940.

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MUSEU DO SILÊNCIO: O museu como ferramenta de educação e
conscientização patrimonial

NEGREIROS, BRUNA GABRIELLE C. S. (1); SOUSA, JÉSSICA MARIA F. C. (2)

1. Universidade Federal do Piauí. Departamento de Construção Civil e Arquitetura


Rua Gov. Arthur de Vasconcelos, 3695, Real Copagre. CEP 64006-185. Teresina, Piauí, Brasil.
brunaneg.fotos@gmail.com

2. Universidade Federal do Piauí. Departamento de Construção Civil e Arquitetura


Rua Luísa Amélia Brandão, 979, São Cristóvão. CEP 64056-170. Teresina, Piauí, Brasil.
jessica_maria_19@hotmail.com

RESUMO
Este trabalho visa apresentar o projeto de um museu capaz de atuar como ferramenta de educação
patrimonial em Teresina, Piauí, Brasil, tendo como objeto de intervenção uma residência eclética do
início do século XX, edificada no bairro Centro. A abordagem faz-se em torno da problemática que
envolve a crescente perda da memória arquitetônica teresinense, fruto da especulação imobiliária e
principalmente do desinteresse do poder público e da pouca familiarização da sociedade civil com o
tema. Dessa forma, o projeto arquitetônico intitulado Museu do Silêncio, cujas decisões projetuais são
pautadas nos escritos de teóricos do patrimônio como Alois Riegl, Violet Le Duc, Camillo Boito e nas
diversas cartas patrimoniais, se constitui como um manifesto pela salvaguarda do patrimônio
arquitetônico perdido, silenciosamente, no dia a dia da vida urbana. O desabamento recente do
objeto estudado confirmou a urgência de políticas para a proteção dos bens construídos e a
necessidade de meios para a promoção da educação patrimonial.

Palavras-chave: museu; educação patrimonial; salvaguarda; patrimônio arquitetônico.

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INTRODUÇÃO

Museus são instituições que testemunham a história, são espaços de memória,


preservação e comunicação. De acordo com a definição encontrada nos estatutos do
Conselho Internacional de Museus (ICOM) adotada pela 22ª Assembleia Geral de Viena,
Áustria (2007), museu é uma instituição “[...] que adquire, conserva, investiga, comunica e
expõe o patrimônio material e imaterial da humanidade, com fins de educação, estudo e
deleite.”

Teresina, sítio desta pesquisa, está entre as quatro capitais brasileiras com o menor
número de museus, de acordo com dados do Guia dos Museus Brasileiros, de 2011,
realizado pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). Partindo deste dado, e levando em
conta a função educacional intrínseca aos museus, fez-se necessário pôr em discussão as
diversas ocorrências de cunho negativo que têm permeado o cenário do patrimônio
arquitetônico em Teresina (evidenciando a falta de interesse por parte dos órgãos gestores
e a quase inexistente relação de pertencimento da sociedade civil), trazendo o foco à
criação de museus que sejam instrumento de mudança deste cenário.

O bairro Centro da capital piauiense, um dos mais antigos da cidade, abriga a maior
parte do acervo patrimonial, incluindo exemplares de estilo eclético e neocolonial,
especialmente em antigas residências. Contudo, o rápido e desordenado crescimento da
capital causou a diminuição desse acervo e vem ameaçando outras perdas. Um exemplo
disso é o evento pelo qual passou a residência de Dona Madalena, exemplar da arquitetura
neocolonial em Teresina, em julho de 2015. Construída em 1938, na Rua Félix Pacheco, a
residência sofria com os reflexos da especulação imobiliária. Ali foi iniciada uma demolição
silenciosa, que causou danos a elementos característicos das construções tradicionais como
o ladrilho hidráulico e as esquadrias com almofadas e venezianas, para dar lugar a uma
nova construção (provavelmente uma clínica médica). No entanto, graças à mobilização de
um grupo de estudantes e demais integrantes da sociedade civil, com o movimento
nomeado Viva Madalena, a demolição total deste exemplar não se concretizou. O grupo
ocupou a residência durante duas semanas com oficinas, exposições, saraus, debates e
palestras, além de ações voltadas à salvaguarda do patrimônio arquitetônico, dando
visibilidade a este exemplar.

Outro caso de perda de memória bastante conhecido pelos teresinenses foi o ocorrido
a um antigo casarão onde residiu o ex-governador do Piauí, Antonino Freire, localizada na
avenida que leva o mesmo nome e é um dos cartões postais da cidade. A residência foi

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demolida “às pressas” em outubro de 1986 quando os proprietários souberam da realização
de levantamento e inventário do imóvel pela Fundação Cultural do Piauí (FUNDAC), que
pretendia realizar o tombamento da edificação histórica, que à época (maio de 1986)
encontrava-se em situação de abandono. Hoje, o local onde se encontrava este exemplar da
arquitetura eclética desenvolvida na cidade é ocupado por mais um estacionamento.

Inquietas por casos de desabamentos e perdas da memória arquitetônica teresinense,


as autoras pretendem, a partir de um projeto de intervenção em uma antiga residência
eclética do séc. XX, localizada no bairro Centro, apresentar um museu que atue como uma
das ferramentas para a educação patrimonial em Teresina.

Em vista disso, a fim de realizar de modo adequado uma intervenção no edifício


eclético, foi feito o levantamento de material bibliográfico pertinente à temática de estudo, de
importância fundamental para o embasamento teórico das alterações previstas. A proposta
aqui apresentada terá suas decisões pautadas em teorias de restauro e intervenção
patrimonial de nomes como Alois Riegl, Cesare Brandi e Viollet Le Duc, e na Carta de
Restauro Italiana, de 1972.

Além disso, foram realizadas visitas à edificação, foto-registros do exemplar e análises


de plantas arquitetônicas, modelos volumétricos e levantamento do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Somente com essas informações foi possível partir
para um projeto que tem como diretriz a educação patrimonial na criação de relações de
pertencimento e formação de identidade entre um povo e seus bens construídos, de forma a
tornar a sociedade sensível à questão da salvaguarda do patrimônio arquitetônico de
Teresina.

O OBJETO

O edifício localizado no cruzamento das ruas Barroso e Areolino de Abreu, no Centro


de Teresina, destaca-se como um importante exemplar da arquitetura eclética desenvolvida
na capital piauiense durante o séc. XX. No bairro, estão alguns dos mais significativos
edifícios da capital, como as Igrejas Nossa Senhora das Dores, São Benedito e a antiga
Casa do Barão de Gurguéia (que hoje abriga o museu Casa da Cultura). Além disso, a
alguns quarteirões da residência estão duas praças que se configuram como complexos de
grande potencial arquitetônico na cidade de Teresina: a Praça Marechal Deodoro da
Fonseca (onde está a Igreja Nossa Senhora do Amparo, marco inicial da construção da
capital) e a Praça João Luís Ferreira, com exemplares neoclássicos, ecléticos, art déco, e
modernos.
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Ao analisar a edificação estudada no âmbito do seu entorno imediato e em conjunto
com as outras edificações que compõem a quadra, observa-se que na fachada da Rua
Areolino de Abreu já não se tem registro de edificações ecléticas, enquanto na fachada da
Rua Barroso a composição é dada pelo casarão analisado e outro, na esquina oposta, que
possui mesma configuração de fachada e mesmos ornamentos.

De posse do Sr. Gozozo, a edificação possuía, além da função residencial (que se


desenvolvia nos cômodos mais internos), a comercial, característica bastante presente nas
construções da época e que conferia aos imóveis um maior número de aberturas para o
logradouro público (Figura 1).

Figura 1 - Residência do Sr. Gozozo à esquerda. Teresina Meu Amor, séc. XX (data estimada).

A planta desenvolveu-se em L, em torno de uma ampla varanda que servia ao


convívio e lazer dos moradores. A partir dela se tinha acesso aos quartos (com aberturas
que permitiam a direta comunicação entre eles), ao corredor (através do qual era possível
chegar à sala) e à cozinha. O banheiro, como era comum, estava à parte da construção
principal.

Com quatro planos de queda d’água, a cobertura volta-se parte para o interior do lote
e parte para o espaço público. Neste último caso, os beirais são escondidos por platibandas
com detalhes em baixo relevo; as tubulações metálicas nas fachadas tinham a função de
escoamento das águas. Tendo sua estrutura feita em troncos de carnaúba (espécie vegetal
bastante encontrada no Estado) e telhas cerâmicas, a cobertura é apenas um dos
elementos presentes na construção que evidenciam as várias técnicas construtivas
tradicionais piauienses que foram aplicadas neste exemplar.

O sistema construtivo adotado para as alvenarias foi o de tijolos de barro com


argamassa também à base de barro, material encontrado em abundância nessas terras. Os
pisos internos foram trabalhados em ladrilho de barro cozido e, em alguns pontos, em
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madeira. Já as esquadrias, com grandes alturas (que evidenciavam os grandes pés-direitos
erguidos como estratégia para as altas temperaturas da cidade), eram em madeira com
almofadas decorativas em alto relevo, além de possuírem bandeiras também almofadadas
que fechavam o arco pleno sobre as portas e janelas.

A partir de visitas técnicas e levantamento fotográfico foi possível identificar patologias


originadas de causas diversas, tais como deterioração da madeira das portas e janelas,
rotação de parte da parede da fachada norte, pichações, perda de ornamento integrado,
mancha por escorrimento de águas da chuva, fissuras, perda de reboco, desintegração de
pintura, infiltrações, fungos e mofo.

A casa está há muito tempo sem qualquer uso, mas ainda assim guarda histórias da
época em que ali funcionava a mercearia do Sr. Gozozo, transmitidas por aqueles que
frequentavam o espaço. Dessa forma, o edifício se apresenta como cenário aos episódios
que, transformados em memórias, permanecem no imaginário de parte da população como
patrimônio imaterial deste povo.

MUSEU DO SILÊNCIO

A proposta do museu do silêncio é de levar o público a uma experiência única de


imersão em espaços-histórias pelos quais ele passa despercebido na velocidade do dia a
dia. A ideia deste espaço cultural (que deve ocupar o edifício eclético e um novo volume
anexo a ele) é de estreitar a relação homem-locus para que o visitante seja capaz de estar
sensível a problemas que antes lhe pareciam irrelevantes e, a partir de então, exercer papel
de agente na proteção dos bens patrimoniais de modo geral.

O visitante será levado por um percurso que fala e grita de diferentes formas,
colocando-o frente a notícias, fotografias, sons, ilustrações e maquetes que o inquietam
para que ele perceba a importância do patrimônio arquitetônico que tem sido perdido ao
longo dos anos em Teresina. Dessa maneira, ao final de todo o percurso, feito para que o
silêncio seja priorizado e, por consequência, haja uma reflexão, o visitante será capaz de
gritar de diferentes formas, ecoando a “voz” silenciada ao longo da experiência.

O intuito é fazer deste exemplar o ponto de partida de várias rotas a serem percorridas
por todo o Centro, fazendo surgir um sistema de bens patrimoniais que, mesmo que não
fossem protegidos institucionalmente, passariam a ser reconhecidos pela população,
estabelecendo assim uma rede de proteção patrimonial a partir da formação de uma relação
de identidade.

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CONCEITO E PARTIDO

O silêncio, elemento fundamental para o êxito da experiência proposta no museu,


deve se refletir também no espaço através de uma arquitetura sutil, predominantemente
monocromática e discreta, com a qual se pretende instigar o visitante a uma reflexão sobre
qual o real sentido da nova construção proposta, que é, neste caso, valorizar o principal
elemento arquitetônico ali existente: o edifício eclético. A nova arquitetura é silenciosa para
que a existente fale mais ao visitante.

A arquitetura silenciosa surge em resposta às mirabolantes formas propostas pela


arquitetura contemporânea e ao caos urbano de nossa época, de forma que, a falsa
impressão de uma arquitetura simplificada permite que o olhar mais atento perceba o que é
essencial ao edifício, passando assim de uma relação de contemplação para um ato de
participação e troca entre homem e construção.

Inspirado em exemplares de arquitetos como Tadao Ando e Álvaro Siza, surge um


edifício sensível ao seu complementar historicista, com forma e volume puros, que passa a
abrigar uma experiência silenciosa de aproximação entre a tão negligenciada produção
arquitetônica de uma cidade e seu povo.

O novo edifício deve, portanto, ser locado no terreno de modo a interferir minimamente
na edificação existente e sem criar qualquer conflito com as fachadas ecléticas. Sendo
assim, a edificação seria recuada ao máximo em relação às duas fachadas que estão no
limite do lote, de forma que ela se localizaria no ponto mais a sudeste do terreno.

DE EDIFÍCIO ECLÉTICO A MUSEU

Para realização da intervenção, foram identificadas, inicialmente, todas as alterações


não pertencentes à construção original. O teórico austríaco Alois Riegl (1984 apud CUNHA,
2006) acreditava que os valores não eram intactos de modo que a sociedade poderia
escolher os elementos a serem preservados. Dessa maneira, o projeto1 prevê a retirada
dessas construções por não seguirem os métodos construtivos do edifício original, além de

1 O material completo do projeto de intervenção, elaborado na disciplina de Técnicas Retrospectivas, do


Curso de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Piauí (UFPI), está disponível em
<https://drive.google.com/open?id=0B_lbB3FlT6WtOUl1MHBjbFNqZ1E>. É possível ter acesso a mapa
de danos das fachadas (pranchas 01 e 02), projeto de reforma (prancha 3), projeto do edifício anexo
(pranchas 03, 04, 05 e 06) e planta da rota de visitação (prancha 05).

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não se constituírem exemplares do estilo arquitetônico que se pretende preservar (ver
Figura 2).

Figura 2 – Planta de levantamento e demolição com indicação das alterações realizadas na


residência. Autoras, 2017.

Na edificação eclética do século XX as alterações devem ser mínimas, de modo a não


interferirem na estrutura portante da edificação, para que, conforme propõe a Carta de
Restauro Italiana de 1972, em seu artigo 8º, no futuro, possam ser feitas novas intervenções
sem prejuízo ao edifício.

Optou-se pela criação do acesso principal através da Rua Areolino de Abreu, acesso
que se dará por um jardim de formas simplificadas e funcionará como área de estar e
eventos. Foi necessário, portanto, subtrair parte da vedação lateral da antiga construção
para que se criasse um amplo acesso à recepção, que ocupa a primeira parte do que antes
era a varanda.

As novas portas em vidro que ocuparão este espaço possibilitam, desde a parte
externa, a visualização da esquadria em madeira com singular trabalho na execução de
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venezianas que formam um interessante jogo de luz no interior e valorizam ainda mais esse
elemento bastante utilizado na arquitetura piauiense.

A segunda parte da antiga varanda abrigará a sala de apresentação da exposição e ali


serão recriadas as mesmas esquadrias que podem ser vistas na recepção de modo a
conferir maior unidade e possibilitar aos usuários deste espaço de espera uma vista
agradável do jardim externo.

Sendo assim, a varanda dará espaço à recepção, balcão de informações, guarda


volumes e sala de apresentação da exposição, os quartos passarão a ser salas de
exposição temporária, a cozinha dará lugar à bateria sanitária e a área onde funcionava a
mercearia terá sua função comercial mantida, passando a abrigar a loja de artigos do museu
e um café (para abrigar confortavelmente as duas funções, foi proposto o acréscimo de um
mezanino, de estrutura metálica facilmente diferenciada da estrutura original do edifício), de
forma que, a antiga sala se transformará em cozinha e depósito para apoio ao espaço
comercial (Figura 3).

Figura 3: Implantação e planta baixa do pavimento térreo do Museu do Silêncio. Autoras, 2017.
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Porém, para que todas as necessidades do museu pudessem ser atendidas, surgiu o
novo edifício que contará com 4 (quatro) pavimentos nos quais estarão distribuídas salas de
exposição permanente, toda a área administrativa, biblioteca, sala de conferências e salas
de apoio técnico ao museu (docas para recebimento de peças, oficina de restauro e reserva
técnica). A planta se desenvolveu em torno de um jardim seco com pé direito triplo, fechado
na sua parte superior por uma claraboia de vidro que é o centro de 3 (três) dos 4 (quatro)
pavimentos do novo volume. A claraboia foi pensada de modo a tornar-se um elemento focal
no interior da edificação. Além da iluminação que proporciona, foi pensado também em um
jogo de formas com as passarelas que dão acesso às salas centrais, a proposta é obter
efeito semelhante ao que é visto no pátio da Pinacoteca de São Paulo, projeto do arquiteto
Paulo Mendes da Rocha.

O RESPEITO NO CROMATISMO E NA FORMA

As técnicas de restauro, de fundamental importância para a adequada manutenção de


edificações históricas, foram aqui adotadas a fim de prolongar a vida do edifício. Neste caso,
como dito anteriormente, foram elaborados mapas de danos a partir da análise das
fachadas do edifício, com os quais foi possível entender o seu estado atual e identificar
patologias originadas de causas diversas. As soluções para estes problemas foram retiradas
do Manual de Conservação Preventiva elaborado pelo IPHAN, que dá orientações básicas
para a conservação do patrimônio construído.

Tendo resolvido problemas de natureza estrutural e construtiva, pode-se partir para a


definição cromática das fachadas, sem que isso resulte na descaracterização da construção.
Para isso, foram realizadas pesquisas em documentos e levantamentos fotográficos pelas
autoras, embasadas pela metodologia do teórico Viollet-le-Duc (embora apresentasse uma
forma dogmática de atuação, Viollet-le-Duc muito contribuiu para o restauro, utilizando uma
metodologia que destacava a importância dos levantamentos detalhados do edifício e
defendia o tratamento diferenciado para cada situação). A partir daí foi possível perceber
que, ao longo dos anos, a casa, que passou por inúmeras reformas, recebeu novas
colorações em cada época. Dentre as imagens encontradas, a mais antiga (ver Figura 1),
com data provável do inicio do século XX (próximo à data de construção da residência),
serviu de base para a alteração da pintura das fachadas da antiga residência, bem como
das esquadrias.

Já a nova edificação não possui muitos elementos que a transformem em um objeto


de contemplação: as aberturas são mínimas e apenas as necessárias para o adequado
funcionamento do edifício (a abertura vista no pavimento superior foi rotacionada de forma
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que aproveitasse bem a luz natural, mas que o próprio edifício funcionasse como elemento
de proteção da abertura); os volumes surgem da disposição dos espaços em planta, de
modo que a caixa de elevadores se une ao volume formado pela casa de máquinas do
elevador e a caixa d’água, tornando-se destaque na fachada; as esquadrias de iluminação e
ventilação dos banheiros emolduram os painéis de divulgação das exposições do museu.
Cromaticamente e materialmente as fachadas se constituem em três elementos: a alvenaria
na cor branca, o vidro das aberturas e o aço corten, elemento que, por sua cor
amarronzada, aproxima visualmente as duas edificações.

Para Brandi (2004, p. 47 apud KÜHL, 2007, p.198), teórico italiano acerca do restauro,
a “integração deverá ser invisível à distância de que a obra de arte deve ser observada, mas
reconhecível de imediato”, é dessa forma que os edifícios se apresentam: os volumes são
complementares, continuidade que se dá pela materialidade, mas é facilmente percebida a
nova construção. O novo edifício difere do original e surge na tentativa de facilitar a leitura
do objeto arquitetônico preexistente sem se sobrepor (Figura 4). Aqui a restauração se
constitui como ato crítico pregado na teoria brandiana, o elemento novo abre mão do caráter
estético em vistas a dar voz à arquitetura eclética.

Figura 4: Fachada principal da proposta para o Museu do Silêncio. Autoras, 2017.

ROTA DE VISITAÇÃO: EDUCAÇÃO PATRIMONIAL

Neste tipo de museu “o documento (objeto/bem cultural) é o próprio espaço/cenário (o


edifício)” (CABRAL, 2006), dessa forma, ele se configura como ferramenta de educação
patrimonial ao passo que é entendido como espaço de reflexão e estímulo ao pensamento
crítico. A rota de visitação aqui proposta (Quadro 1) se dividirá em três momentos distintos:
o primeiro, em que o visitante adquire o ingresso e recebe informações gerais sobre o
museu e as exposições; o segundo, percurso de exposições permanentes que se
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desenvolve no 1° pavimento; e o terceiro, das exposições temporárias, que acontecerá no
pavimento térreo. Nestes dois últimos se desenvolverá a experiência de reflexão e imersão
proposta. Ao final, é livre a escolha do visitante, que poderá acessar a biblioteca no 2°
pavimento, a loja e a cafeteria ou o jardim externo.

Espaço Setor Nome Descrição

1 Apoio e Recepção A rota de visitação se inicia no edifício antigo,


Infraestrutura o visitante se depara a primeiro momento
com o balcão de informação, onde já tem
contato com as venezianas originais e com a
estrutura aparente da cobertura em tronco de
carnaúba.

2e3 Apoio e Acesso Área de acesso onde o visitante adquire


Infraestrutura ingressos e recebe material de áudio (2) e
guarda seus pertencentes em um guarda
volumes (3) que poderá ser acessado
novamente ao final da visita.

4 Apoio e Sala de Local destinado à apresentação da


Infraestrutura Grupos exposição, onde o visitante recebe pequenos
mapas com a rota da visita e algumas
recomendações.

5 e 13 Circulação O acesso entre o térreo e o pavimento


- Vertical superior, pode ocorrer através de elevador ou
escada, a critério do visitante.

6 Re(conhecimento) A casa conta O primeiro espaço da ala de exposição conta


sua história aos visitantes como se deram as alterações
no edifício que abriga o museu ao longo do
tempo a partir de depoimentos em vídeo e
fotografias de pessoas que viveram
experiências naquele lugar em diferentes
contextos temporais.

7 Re(conhecimento) Ala do Aqui o visitante conhece quais são e um

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conhecimento pouco da história dos exemplares
arquitetônicos mais significativos da cidade
de Teresina, além de aprenderem, de forma
didática, sobre os estilos arquitetônicos aos
quais pertencem.

8 Re(conhecimento) Noticiário de Um espaço completamente visual e auditivo


denúncia onde o visitante é “bombardeado” por
notícias extraídas de jornais, revistas, livros,
documentários e entrevistas acerca de atos
contra a preservação do patrimônio local, de
forma a inquietá-lo e torná-lo sensível à
causa patrimonial.

9 Interativo InterAGIR Um espaço dedicado a estreitar laços entre


público e patrimônio através de uma série de
atividades interativas e jogos que questionam
“onde fica esse edifício?” ou “em que se
transformou esse edifício?”, a fim de que aos
poucos o visitante esteja mais familiarizado a
diferentes espaços da cidade.

10 Ações Quem se Mostra de trabalhos acadêmicos e ações de


importa? profissionais da área (arquitetos e urbanistas,
historiadores, professores, entre outros) e de
instituições que têm atuado na salvaguarda
do patrimônio arquitetônico piauiense, de
forma que o público perceba que existe uma
mobilização em torno das questões do
patrimônio.

11 Ações O processo Laboratório de restauro e pesquisa na área


de restauro patrimonial com amplas vitrines que
possibilitem maior contato do público com os
métodos científicos, melhorando a
compreensão acerca do trabalho do
restaurador.

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12 Expressão Grite! Sala que possibilita ao visitante diversas
maneiras de expressar o seu protesto ao final
de toda a experiência museográfica proposta
(mensagens escritas nas próprias paredes ou
gravadas em vídeo e/ou áudio para
divulgação nas plataformas do museu,
hashtags, megafones, microfones, cadernos
de protesto).

14, 15 Exposições Salas de Estas salas dedicam-se a receber as


e 16 temporárias exposição exposições temporárias. Além disso, elas
temporária fazem uma ligação com o que já havia sido
mostrado no espaço 6 e através de placas
indicativas são evidenciados alguns detalhes
construtivos originais.

Quadro 1 - Descrição da rota de visitação do museu. Autoras, 2017.

CONCLUSÃO

No dia 11 de janeiro de 2017, por volta das 14 h e 30 min, ainda durante o processo
de concepção deste projeto, o edifício alvo da intervenção sofreu a perda parcial de uma de
suas fachadas, onde já havia sido verificada uma rotação na parte superior da parede.

A residência (Rua Areolino de Abreu, nº 1186) possuía sua fachada protegida pela Lei
Complementar nº 3563 de 20 de outubro de 2006, do município de Teresina, que dá
incentivos fiscais como não pagamento de IPTU para que os proprietários realizem de forma
periódica reformas de manutenção nos bens amparados por ela exigindo, neste caso, que
sejam “mantidas as características arquitetônicas, artísticas e decorativas das fachadas
voltadas para logradouros públicos e [...] também a sua volumetria incluindo o telhado.”

Grande parte dos imóveis protegidos pela lei encontra-se fechada, abandonada pelos
proprietários que não veem vantagens em manter a edificação para que ela permaneça ao
longo do tempo, tanto como um bem imaterial, na memória popular, quanto material, como
elemento testemunha de diferentes estilos arquitetônicos e métodos construtivos.

O acontecimento confirma a urgência de políticas patrimoniais no que tange aos bens


construídos localizados no centro da capital e a necessidade de equipamentos e órgãos que

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atuem de maneira ativa na preservação do patrimônio edificado, como o projeto do Museu
do Silêncio aqui apresentado, aproximando a população da história do lugar em que vivem e
estabelecendo relações de pertencimento e identidade.

Ao projeto concebido para a residência do Sr. Gozozo que abrigaria o Museu do


Silêncio resta, portanto, o papel de manifesto símbolo da busca pela salvaguarda do
patrimônio arquitetônico perdido, silenciosamente, no dia a dia da vida urbana; e, ainda, o
de modelo de instituição para futuras intervenções de mesmo objetivo.

REFERÊNCIAS

CABRAL, Magaly. Educação em Museus Casas Históricas. 2006, 6 p. Disponível em:


<http://www.casaruibarbosa.gov.br/paracriancas/arquivos/file/arq_textos/Educacao_em_Mus
eus.pdf>. Acesso em: 21 abr. 2017.

CUNHA, Claudia dos Reis e. Alois Riegl e o culto moderno dos monumentos. Resenhas
Online, São Paulo, ano 05, n. 054.02, Vitruvius, jun. 2006
<http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/05.054/3138>. Acesso em: 20 abr.
2017.

IBRAM. Guia dos Museus Brasileiros. Brasília: Instituto Brasileiro de Museus, 2011. 591 p.

ITALIA. Ministero della Pubblica Istruzione. Circolare n°117, del 6 aprile 1972.

KÜHL, Beatriz M. Cesare Brandi e a Teoria do Restauração. Pós, São Paulo, n. 21, jun.
2007. p. 198. <www.revistas.usp.br/posfau/article/download/43516/47138>.

PUCCIONI, Silvia e LACERDA, Ana Maria Cavalheiro de. Manual de Conservação


Preventiva para Edificações. Programa Monumenta - MinC/BID/UNESCO, IPHAN - Grupo
Tarefa.1999. 236 p. Acesso em: 20 abr. 2017.

SANTOS, Ana Carolina Melaré dos. Viollet-le-Duc e o conceito moderno de


restauração. Resenhas Online, São Paulo, ano 04, n. 044.01, Vitruvius, ago. 2005
<http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/04.044/3153>. Acesso em: 20 abr.
2017.

TERESINA. Lei Complementar nº 3.563, de 20 de outubro de 2006.

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MUSEU E ARQUIVOS: O papel da universidade na educação
patrimonial

PRADO, SAMANTA. (1); COSTA, LUZIA S. F. (2); GRACIOSO, LUCIANA S. (3);


ZAFALON, ZAÍRA R. (4).

1. Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Ciência da Informação


Rod. Washington Luís
km 235 - SP-310 - São Carlos
CEP 13565-905
samanta_prado@hotmail.com

2. Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Ciência da Informação


Rod. Washington Luís
km 235 - SP-310 - São Carlos
CEP 13565-905
E-mail: luziasigoli@gmail.com

3. Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Ciência da Informação


Rod. Washington Luís
km 235 - SP-310 - São Carlos
CEP 13565-905
luciana@ufscar.br

4. Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Ciência da Informação


Rod. Washington Luís
km 235 - SP-310 - São Carlos
CEP 13565-905
zaira@ufscar.br

RESUMO
A Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), ao longo dos seus 45 anos de existência, recebeu e
acumulou uma série de objetos bastante representativos das suas relações interinstitucionais, que
formam o seu patrimônio histórico. Objetivou, por meio da organização e do tratamento desse
patrimônio, democratizar o acesso a coleção de objetos com os quais os reitores foram presenteados
e, assim, contribuir para a Educação Patrimonial, na instituição. Metodologicamente, foram realizadas
as seguintes etapas: 1) levantamento de todos os objetos recebidos pelos reitores, ao longo da
história da universidade; 2) inventário dos objetos a partir de premissas museológicas, o que
envolveu sua descrição física, sua descrição temática, sua descrição tipológica e seu registro
fotográfico; 3) desenvolvimento de um catálogo digital dos objetos. Resultou um total de 115 objetos
diversificados. Alguns desses objetos contêm informações escritas sobre premiações,
reconhecimentos, alianças e agradecimentos, referentes tanto à figura do reitor quanto à universidade
como instituição.
Palavras-chave: Coleções Históricas; Memória Institucional; Educação patrimonial
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Introdução
As instituições de ensino superior, ao longo de sua trajetória, recebem e acumulam
uma série de objetos bastante representativos das suas relações interinstitucionais, que
formam o seu patrimônio histórico. Esses objetos compõem, naturalmente, as coleções
históricas, que em certo grau, refletem a sua memória institucional. A Universidade Federal
de São Carlos (UFSCar), ao longo dos seus 45 anos de existência, acumulou um
significativo número de objetos, recebidos pelos reitores. Esses objetos representam, à luz
das ciências sociais, as relações diplomáticas construídas entre os atores sociais, bem
como a circulação de saberes. Eles passam a representar as relações de sociabilidade,
reciprocidade, fidelidade e gratidão, e estão associados a um determinado momento, de um
encontro ou estada do reitor em algum lugar, ou representam uma passagem de alguma
outra personalidade pelo ambiente acadêmico.
Esses objetos são bastante representativos das suas relações interinstitucionais, que
formam o seu patrimônio histórico. Podemos pensar esse patrimônio histórico dos reitores
como resultado de determinadas formas de comportamento e convenções sociais que
circundam a alta hierarquia universitária. Esses objetos arquivados na UFSCar podem ser
vistos como produtos culturais que materializam uma prática social, e mais do que isso,
materializam toda uma história de uma prática social. Os objetos são formados por
presentes diplomáticos, esses são peças de valor estético e, às vezes, incomuns, que
materializam as relações estabelecidas com lideranças, personalidades públicas e outros
atores sociais. Esses objetos carregam significados e simbologias que estão agregados em
si.
Nesse sentido, (UFSCAR, 2017) as contribuições das áreas de Antropologia,
Sociologia e Ciência da Informação nos permite trabalhar esta questão de forma a contribuir
teoricamente para o entendimento das relações que são estabelecidas entre esses atores
institucionais, entre demais outras instituições. Nos estudos de Marcel Mauss (2003), o seu
conceito de “dádiva”, nos permite um entendimento da constituição da vida social por
processos que se materializam no cotidiano das dádivas, os atos de "dar" e de "retribuir". De
formas distintas, as trocas variam de acordo com o tempo/época e ambientes, o que vemos
refletidos nos objetos obtidos pelos reitores.
No campo da sociologia, podemos realizar um diálogo com os conceitos de capital
social, cultural e simbólico propostos por Bourdieu (2008), esses, que de certa forma, estão
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agregados ao longo do tempo na história da UFSCar. Assim, como também os conceitos de
sociabilidade, reciprocidade, fidelidade e gratidão, propostos por Simmel (1983 & 2004).
Simmel (2004) discute o papel que a fidelidade adquire nas relações sociais, como
um papel duplo: por um lado, a fidelidade complementa outros sentimentos; de outro lado
ela também sustenta relações e condições sociais. Segundo o autor, a fidelidade pode ser
vista como um estado psíquico e sociológico, capaz de preservar as relações sociais ao
longo do tempo, para além das forças que originaram essas relações (SIMMEL, 2004, p.
32).
Por essa razão, os patrimônios históricos podem ser vistos como formas de
expressão da fidelidade entre variadas instituições ou atores sociais e a UFSCar. Essa
fidelidade nos revela outros sentimentos, como gratidão e reciprocidade, desses atores
sociais para com a universidade, o que, por sua vez, pode revelar momentos de atuação da
UFSCar na sociedade ou na integração com outras instituições.
Nos estudos da Ciência da Informação, Paul Otlet (1937), um dos estudiosos
centrais da área da Documentação, o papel do documento é informar, organizar e
disseminar a informação contida em qualquer tipo de suporte. Logo, os objetos
tridimensionais enquanto documentos informacionais também são classificados como
documentos. De forma geral, como apontado por Litton (1976), a necessidade de
documentar a pesquisa vai além de registrar os dados para as populações futuras. A
documentação tem o papel de registrar novas informações, assim como classificar os
dados. No contexto desta pesquisa, a documentação visa informar e educar o usuário da
informação por meio da descrição física, ou seja, da representação descritiva e da
explicitação das relações que foram estabelecidas ao longo dos anos por certos atores
sociais, da universidade ou advindos de outros lugares, reconstituindo, assim, parte da
memória da instituição.
O conceito de memória se torna relevante para este estudo, e é básico para
possibilitar a reflexão sobre o conceito de memória institucional. Um primeiro ponto a ser
observado é que a ideia de memória pode ser pensada a partir de diferentes enfoques.
A memória é mais ampla que as lembranças de um único indivíduo, podendo ser
associada ao resgate e à preservação do passado social, um passado vivido coletivamente
(HALBAWACS, 2006). No entanto, a memória não está ligada apenas ao passado, ela pode
ser associada também ao presente e ao futuro. A memória, afinal, influencia quem nós

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somos, o que fazemos e como agimos no mundo, portanto ela influencia na construção do
nosso futuro. Isso ressalta a importância dos estudos da memória nos mais diversos meios
sociais.
Conhecer a história da UFSCar por meio do estudo dos objetos reunidos, conhecer
os convênios que foram firmados entre a instituição e outros órgãos, os tipos de alianças
que foram formadas, as vivências que os mimos proporcionaram para estes atores, como a
criação de laços voltados para o desenvolvimento da educação, de incentivo a programas
educacionais, entre outros, é um movimento importante para a construção da memória da
universidade.
Neste projeto, utilizamos o termo “memória institucional” com a justificativa de que a
análise de um conjunto de objetos pode contribuir para a construção da história da UFSCar.
Pensando a universidade como uma instituição de conhecimento, de saberes, que é
legitimada e sustentada pela sociedade, sua memória se torna um elemento importante para
a comunidade e para o processo de construção da própria instituição.
Icléia Thiesen (1997) afirma que as instituições existem na sociedade em constante
relação umas com as outras, elas formam uma rede, limitando-se mutuamente. Por essa
razão, as informações necessárias para a construção da memória institucional devem ser
buscadas não apenas nas fontes internas, mas também nas fontes externas.
Segundo Netto (2007), “a questão da memória coletiva só se viabiliza nos processos
sociais de transferência da informação, onde se utilizam artefatos, monumentos/documentos
(LE GOFF, 1994) como instrumentos de representação de identidades culturais e
reafirmação de cidadania”. Por essa razão, a reunião e o estudo desses objetos vinculados
à história da UFSCar, mais do que a construção de uma memória coletiva, pode significar
uma contribuição para a percepção da identidade da instituição.
Como destaca Netto (2007), a identidade pode ser pensada como singular
(identidade pessoal) ou coletiva (identidade social). Uma forma de identidade coletiva que
faz sentido pensar para esta pesquisa é o que poderia ser denominada identidade
institucional.
A relação entre memória coletiva e as identidades culturais é uma relação
fundamental para a Ciência da Informação, e a cultura material pode ser pensada como
importante elo entre elas. Netto destaca que:
A presença do homem no processo informacional pode estar relacionada à
visão da Informação considerada como artefato no sentido de ser um
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produto de confecção humana, sem existência própria na natureza, já que
ela é uma ferramenta, produzida e/ou percebida pelo homem, como um dos
elementos necessários para a construção do conhecimento. Como artefato,
a Informação só tem existência quando é percebida como tal, e só é
estabelecida esta percepção quando, de algum modo, em alguma
circunstância, é criada uma relação de significação. (Pacheco, 1995 apud
Netto, 2007, p. 5).
No trecho acima, percebe-se o sentido da informação como criação humana e,
portando, seu vínculo entre informação e cultura.. A informação é uma produção social de
significados. E como a informação implica geração de significados, ela está ligada ao
processo de formação de identidade. No caso da UFSCar podemos apontar para a
formação de uma identidade institucional.
É pela inserção na História (LE GOFF, 1994), e pelo registro no tempo de um evento
sociocultural, que os signos (representações) são inseridos em sua dinâmica de uso, ou
recuperam uma dinâmica de uso do passado por meio da memória. Os significados são
produzidos a partir do uso social dos signos e também dos contextos dos usuários. No caso
da coleção de mimos recebidos pelos reitores ao longo da história da UFSCar, esses
objetos podem ser pensados como elementos materiais que recuperam os contextos das
relações sociais e diplomáticas vivenciados pela universidade.
Uma ideia importante a se considerar, quando se estuda representação, e
particularmente as relações entre memória, identidade e cultura material, é a ideia de que as
representações não são apenas descrições dos objetos. Elas são também uma expressão
do comportamento humano.
Esses significados, além de contribuírem para a construção da memória institucional
da UFSCar, possibilitaram, numa perspectiva da Educação Patrimonial, uma maior
visibilidade e a devida valorização desses bens patrimoniais, tanto pelos próprios gestores e
comunidade interna quanto pela comunidade externa à UFSCar. Esses objetos, travestidos
de caráter cultural e social passaram a ter, não só o acesso facilitado pelas comunidades,
como também um maior entendimento sobre a importância da preservação desse
patrimônio para a memória institucional.
Para a comunidade externa, esse patrimônio pode representar que houve um
reconhecimento cultural e científico da instituição e, por conseguinte, para a compreensão
sociocultural da cidade, em que se insere. Em última instância, este estudo contribui com
ações, exposições, publicações e outras que venham a promover uma melhor percepção
histórico-temporal dos eventos ou acontecimentos, que são lembrados por meio dos objetos

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e coleções históricas, que por sua vez contribuem para a educação patrimonial, num sentido
mais amplo, na medida em que esses fazem parte da trajetória de conhecimento, saberes e
da memória da comunidade interna e externa.

Educação Patrimonial

Reunião desses objetos não só agrega valor como explicita a sua história e sua
importância para o desenvolvimento da instituição o que reflete, positivamente, em seu
ambiente interno e externo.
Pode-se dizer que a construção da identidade é dada por um conjunto de crenças e
costumes que foram herdados por um determinado grupo. Sua preservação forma a
memória e esta é refletida por meio do patrimônio cultural. O patrimônio pode ser inventado
ou reinventado de várias formas, de acordo com o que o grupo determina ou preserve como
um patrimônio que os represente enquanto uma comunidade. O patrimônio histórico
institucional informa as características sociais, a sua historia, os costumes predominantes, e
as ideias que circulam em determinados períodos. No caso desta pesquisa, os objetos
informam os acordos, as alianças, as amizades que foram construídas ao longo dos anos de
existência da instituição. Segundo Soares (2007), o objeto não é criado para ser um
patrimônio, ao longo do tempo pela sua identificação com determinado grupo, suas
características, enquadra-se em um determinado contexto histórico, diferenciando dos
demais grupos pelas suas particularidades.
Patrimônio pode ser definido como um conjunto de bens materiais e imateriais
herdados dos antepassados. Ele está associado à lembrança e é uma fonte para a
construção da memória de uma determinada sociedade, comunidade. Ele representa a
identidade e as diferenças étnicas em relação a outros grupos, ou seja, as particularidades e
especificidades de um local, região da sociedade (SOARES; KLAMT, 2004) que pode ser
representado por objetos, documentos, edifícios, conjuntos urbanos, sítios de valor histórico,
criações cientificas, artísticas e tecnológicas, bem como todo objeto ou manifestação
compartilhada que diga respeito a identidade e a memória de um grupo.
O patrimônio pode ser reconhecido em uma crença, um costume, um objeto, dentre
tantas outras possibilidades. A noção de conservação e preservação do patrimônio cultural é
fundamental para as futuras gerações como elemento da construção da própria história e da

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memória institucional.
O conceito de Educação Patrimonial constitui-se de um campo de ação inter e
transdisciplinar, pois envolve as áreas de Pedagogia, Artes, Arqueologia, História e
Geografia, além de outras.
A “educação patrimonial é uma proposta metodológica que procura tornar os bens
culturais como fonte primária de um trabalho de preservação de memória coletiva e
individual. É um instrumento chave para a leitura do mundo” (Horta, 2000, p. 35). A partir
desse conceito pode-se pensar a “educação patrimonial” como uma proposta de
alfabetização cultural ou sociocultural de uma coletividade.

Objetivo
A presente pesquisa objetivou, por meio da organização e do tratamento desse
patrimônio, democratizar o acesso a coleção de objetos com os quais os reitores foram
presenteados e, assim, contribuir para a Educação Patrimonial, na instituição. Visando
operacionalizar esse projeto, haviam sido estabelecidos os seguintes objetivos específicos:
a) reunir todos os objetos recebidos pelos reitores da UFSCar, ao longo da história
da universidade;
b) proceder à higienização dos objetos;
c) organizar as séries de objetos compostas por placas, troféus, flâmulas, canecas,
bandejas, entre outros;
d) elaborar descrições, de acordo com as informações constantes dos objetos.

Metodologia

Tendo em vista esse objetivo, metodologicamente, foi realizado um mapeamento e


disponibilização desse patrimônio por meio do cumprimento das seguintes etapas:
1) levantamento de todos os objetos recebidos pelos reitores, ao longo da história da
universidade;
2) inventário dos objetos a partir de premissas museológicas, o que envolveu a descrição
física do objeto, do seu conteúdo informacional e registro fotográfico;

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3) desenvolvimento de um catálogo digital dos objetos identificados, com descrição dos
objetos e dos registros fotográficos.

Resultados

A pesquisa (UFSCAR, 2017) resultou no mapeamento desse patrimônio o tratamento


e organização de um total de 115 objetos diversificados tais como: certificados, fotos,
flamulas, objetos de decoração, broches, placas, suportes de copo, pratos, moedas
comemorativas, bottom, copos, moedas, tapeçarias, medalhas, abridores de cartas, troféus,
esculturas, entre outros. Esses objetos apresentam diversos formatos, volumetria e
configurações estéticas. Ou seja, percebe-se que a diversidade de objetos reunidos equivale
também para os tamanhos, cores, origens, especificidades do objeto e sua colaboração
para entendimento da história da UFSCar. Alguns desses objetos se destacam por pelo seu
significado de representação de relações e reconhecimentos que marcaram a história da
UFSCar, entre elas: relações internacionais com instituições acadêmicas, relações com
outras organizações e universidades do país e demonstrações de gratidão de grupos da
comunidade para com a instituição e ou seu representante.
Para a descrição dos objetos foi criado um Modelo de Ficha de Descrição, visto
abaixo, com os seguintes metadados: tipo de objeto, título, autoria, descrição intrínseca e
extrínseca, quando couber, dimensões, tipo do material, eventuais observações e data,
quando informada.

Contextualização do Patrimônio

No decorrer da pesquisa, alguns objetos se destacaram pelos significados e relações


que representam para a história da UFSCar. Alguns desses objetos contêm informações
escritas sobre premiações, reconhecimentos, alianças e agradecimentos, referentes tanto à
figura do reitor quanto à universidade como instituição. Nesses casos, geralmente
verificados na forma de certificados e placas, foi possível estabelecer os significados de
cada mimo com clareza a partir dos objetos em si.
Em outros casos, os mimos trazem informações mais breves, identificando apenas
os nomes das instituições com as quais a UFSCar estabeleceu relações, e eventuais datas
comemorativas. Esse grupo de mimos, do qual fazem parte diversas moedas e medalhas
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comemorativas, e objetos afins, por um lado é mais restrito no que se refere às informações
apresentadas nos objetos, por outro possibilita a demarcação de significados de uma forma
indireta. Essa leitura indireta dos significados geralmente aconteceu no sentido de perceber
as relações que a UFSCar trava com outras instituições.
Foi possível identificar alguns significados dominantes presentes na coleção aqui
analisada. No âmbito dos reconhecimentos e premiações, destacam-se os sentidos
relacionados ao ensino, à pesquisa e à extensão universitária, ou seja, as três funções
sociais básicas da universidade. No âmbito das alianças e parcerias, destacam-se diversas
ligações entre a UFSCar e outras universidades ou instituições, sejam elas do quadro
nacional ou internacional, representadas por meio de intercâmbios, parcerias de pesquisa, e
presentes referentes a datas comemorativas.
Um primeiro exemplo é o certificado oferecido à UFSCar pela Associação de
Capacitação, Orientação e Desenvolvimento do Excepcional (ACORDE), em 2011. Esse
certificado (Figura a Esquerda) reconhece a contribuição da universidade em um projeto
social educativo, inserido na comunidade de São Carlos, revelando uma forma de
cooperação entre a academia e a sociedade. Os sentidos de extensão e compromisso social
estão presentes aqui. Outro exemplo é o diploma recebido do Ministério da Ciência e
Tecnologia e do Sindicato Nacional da Indústria de Máquinas, em 1990. Este (Figura a
Direita) reconhece os esforços despendidos pela UFSCar em pesquisa e desenvolvimento
tecnológico. Nesse caso, o sentido da pesquisa aparece expressando os benefícios da
mesma para setores da sociedade.

Figura 1 - Cooperação acadêmica e a sociedade

Fonte: elaborada pela autora


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A placa recebida em 2008 da Associação Pró Casa do Pinhal, vinculada à Fazenda
do Pinhal (patrimônio histórico nacional localizado no município de São Carlos), faz uma
homenagem à UFSCar pelo apoio à conservação e manutenção da memória. Ela também
faz menção ao papel da universidade para a educação patrimonial. Este mimo simboliza
outra forma de engajamento da universidade com seu entorno, atendendo a uma demanda
social, e coerente com os valores e conhecimentos acadêmicos relacionados com a
preservação da memória e dos patrimônios culturais.

Figura 2 - UFSCar e educação patrimonial

Fonte: elaborada pela autora

Já a placa direcionada à figura do reitor, por parte da primeira turma do curso de


Graduação em Gerontologia, de 2012, reconhece a competência do reitor na gestão da
universidade. Pode-se dizer que este mimo focaliza o reconhecimento na figura profissional
do reitor e carrega um significado vinculado ao ensino, uma vez que expressa a gratidão de
uma turma de formandos da instituição. Algo semelhante pode ser observado por meio da
placa da turma de formandos do curso de Pedagogia da UFSCar de 2013, pois esta faz um
agradecimento ao reitor e a todos os servidores docentes e técnico-administrativos da
instituição. Este objeto, que também expressa uma relação de gratidão, deixa mais explícito
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o reconhecimento do reitor enquanto representante de toda a comunidade da UFSCar. A
cumbuca, presente da comunidade indígena da UFSCar, é um exemplo da participação de
grupos étnicos diversos na universidade. Esse objeto representa os valores de inclusão e
diversidade cultural, defendidos historicamente pela UFSCar, e pode ser relacionado com a
política das Ações Afirmativas, bem estabelecida nessa instituição, a qual possibilita essa
inclusão. Por fim, faz sentido dar destaque a um mimo que é considerado um “xodó” do
reitor. Trata-se de um cartão de Natal, recebido da comunidade de alunos estrangeiros que
estudaram na UFSCar, oriundos de diversos países, como Peru, Espanha, Colômbia,
Paraguai, México, Guiné-Bissau, Haiti, Argentina, Congo, São Tomé e Príncipe, Venezuela
e Chile. Segundo relato oral da atual Chefe de Gabinete da Reitoria, esse cartão é tratado
com carinho pelo reitor, com uma estima especial. Pode-se dizer que esse mimo é também
uma expressão das relações internacionais que fazem parte do cotidiano da UFSCar, por
meio de intercâmbios e abertura para os estudantes estrangeiros. Além disso, esse mimo
representa uma forte relação de gratidão dessa comunidade para com o reitor e a
instituição.

Figura 3 - UFSCar e comunidade interna

Fonte: elaborada pela autora

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Alguns objetos, (UFSCAR, 2017) demarcam a presença de relações internacionais
estabelecidas ao longo da história da UFSCar. São exemplos que se destacam nesse
grupo: o prato da Universidade Nacional de Entre Rios (Argentina), o prato da Universidade
de Aveiro (Portugal), a moeda da Universidade do Minho (Portugal), o abridor de cartas da
Università degli Studi di Padova (Itália), a faixa do Timor Leste e a placa da Associação de
Universidades do Grupo Montevideo (AUGM). Esses patrimônios são evidências da
inserção da UFSCar no cenário internacional, a partir de eventuais alianças, convenções,
intercâmbios e parcerias com universidades, grupos, associações e estudantes de outros
países. Isso demonstra que as relações de troca superam os limites das fronteiras
nacionais.

Figura 4 - UFSCar no cenário internacional

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Fonte: elaborada pela autora

Conclusão

Nesta pesquisa foi realizado primeiramente um estudo teórico. Nesse estudo,


verificamos a possibilidade de combinar diferentes perspectivas teóricas para se construir
um olhar para os objetos de uma coleção. Entre elas, contribuições dos Estudos Culturais,
das Ciências Sociais e da Ciência da Informação e da Documentação podem ser
consideradas.
O modelo de ficha de descrição adotado foi adequado para a descrição da coleção.
Verifica-se que a quantidade e a qualidade das informações obtidas variam em função do
tipo do objeto, de suas características e de suas condições de conservação. Isso nos sugere
uma reflexão importante. Essa pesquisa nos ensina que, para que seja possível preservar
memórias por meio de coleções de objetos, é fundamental que sejam realizados um registro
cuidadoso da história de cada item e um bom processo de conservação ao longo do tempo.
Por fim, foi possível identificar alguns significados que se destacaram entre os
objetos da coleção da reitoria da UFSCar. Alguns objetos representam relações nacionais,
ou seja, vínculos entre a UFSCar e outras universidades brasileiras. Esses vínculos entre
universidades, expressos por meio dos mimos, podem ser interpretados como relações
diplomáticas travadas entre instituições da mesma natureza, ou seja, atuantes em um
mesmo setor da sociedade. Por essa razão, é natural que essas instituições estabeleçam
parcerias e cooperações, e celebrem essas parcerias por meio de presentes que simbolizam
momentos de sua história ou datas comemorativas.
Do mesmo modo, alguns itens da coleção representam relações internacionais, da
UFSCar com universidades de outros países, ou mesmo com associações de pesquisa
internacionais. De forma semelhante, essas instituições compartilham o setor social no qual
atuam, ou seja, compartilham metas, objetivos, formas de atuação e eventualmente
recursos humanos. Associações, cooperações, intercâmbios e articulações de pesquisa são
exemplos dos vínculos possíveis entre elas. Nesse sentido, a troca de mimos pode ser vista
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como um ritual social que reforça os vínculos institucionais estabelecidos.
Ambas as formas acima descritas, ou seja, tanto as relações nacionais como as
internacionais, podem ser interpretadas à luz dos conceitos de sociabilidade, reciprocidade e
fidelidade institucional, por exemplo.
Outro grupo importante de mimos foi aquele associado ao significado de relações de
gratidão. Nesse caso, na coleção que analisamos, podemos citar os certificados com
mensagens de gratidão de turmas de formandos para com a figura do reitor e/ou para com
toda a instituição UFSCar. Também é válido destacar o cartão de Natal assinado por vários
membros da comunidade de estudantes estrangeiros da UFSCar, a cumbuca indígena, o
certificado da associação ACORDE e a placa da Fazenda Pinhal. Esses são exemplos de
expressão de gratidão, por parte de diversos grupos, tanto da comunidade interna da
UFSCar quanto da comunidade externa local. A gratidão pode estar associada, portanto, às
contribuições da UFSCar em suas diferentes áreas de atuação, como a pesquisa, o ensino e
a extensão.
Por fim, podemos dizer que esse processo de descrição dos objetos e identificação
dos significados nos fornece alguns elementos interessantes que fazem parte da Memória
Institucional da UFSCar.
Vale lembrar aqui o trabalho de Costa (1997), que destaca que a Memória
Institucional é aquela vinculada não só aos aspectos internos de uma instituição, mas
também e principalmente à atuação dessa instituição na sociedade, suas relações com
outras instituições e com os grupos sociais aos quais ela serve. Nesse sentido, os
significados associados aos mimos aqui analisados claramente fazem referência a aspectos
da Memória Institucional da UFSCar.

Referências
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Ediçoes 70, 2008. P. 51-117.

COSTA, Icléia. T. M. Memória institucional: a construção conceitual numa abordagem


teórico-metodológica. 1997. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - IBICT-UFRJ, Rio
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HORTA, Maria L. P. Fundamentos de Educação Patrimonial. Ciências e Letras, Porto

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Alegre, n.27, p. 25-35, jan. /jun., 2000.

LE GOFF, Jacques. História e memória. Campinas: Ed. Unicamp, 1994.

LITTON, Gaston. A documentação. São Paulo, McGraw-Hill do Brasil, 1976.

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NOGUEIRA, Maria Alice, CATANI, Afrânio (Orgs). Pierre Bourdieu: escritos de educação.
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OTLET, Paul. Documentos e documentação. In: CONGRESSO MUNDIAL DA


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<http://www.conexaorio.com/biti/otlet/>. Acesso em: 16. mai. 2017.

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Universidade Federal de São Carlos. (2017). Congresso de Iniciação Científica e


Tecnológica. Disponível em: http://eventweb.com.br/cict2016/home-
event/schedule.php?area=1182. Acesso em: 10 jun. 2017.

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O PERCURSO URBANO COMO EDUCAÇÃO PATRIMONIAL

PRAVATO, TALES M. (1); ALVES, JÉSSICA F. R. (2)


1. Universidade Federal de Juiz de Fora. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Rua José Lourenço Kelmer, Campus Universitário, s/n. Martelos, Juiz de Fora (MG)
tales.mp@live.com

2. Universidade Federal de Juiz de Fora. Programa de Pós-Graduação em Ambiente Construído


Rua José Lourenço Kelmer, Campus Universitário, s/n. Martelos, Juiz de Fora (MG)
jessica_rossone@hotmail.com

RESUMO

Os estudos deste artigo, originalmente desenvolvidos para um Trabalho de Conclusão de Curso para
o curso de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Federal de Juiz de Fora, apresentam uma
proposta de um projeto piloto de educação patrimonial urbana que tem como objetivo principal
conduzir a população de Juiz de Fora (MG) ao entendimento de parte de sua própria história através
do reconhecimento de seu patrimônio arquitetônico tombado. O projeto piloto propõe para a Rua
Halfeld, importante via do município que destaca-se por diversos motivos, a criação de um percurso
orientado através de placas com a história, data de surgimento e curiosidades sobre os bens
tombados. Dessa forma, o indivíduo inicia o percurso a partir de uma das extremidades da via e a
percorre aprendendo, ponto a ponto, um pouco da formação da cidade e o papel que cada bem
tombado representa. Diretrizes são aplicadas de forma a auxiliar o percurso, garantindo melhor
visibilidade, e que as intervenções feitas no local possam contribuir para sua valorização, ou, no
mínimo, se comportar de forma neutra, sem trazer prejuízo ou danos, não só para os bens, mas para
toda a história que estes carregam. Por fim, a requalificação vem para garantir acessibilidade,
visibilidade dos bens, conforto e segurança para o pedestre. Com esta pesquisa, verifica-se a
possibilidade de um processo efetivo de educação e valorização patrimonial e de um projeto de
requalificação do percurso estudado, com a criação de diretrizes próprias de preservação. A intenção
é que o projeto piloto para a Rua Halfeld em Juiz de Fora possa servir de base para um projeto ainda
maior de conscientização e valorização da cultura local, e que possa ser estendido para todos os
pontos de interesse patrimonial da cidade.

Palavras-Chave: educação patrimonial; percurso urbano; preservação; patrimônio arquitetônico; Juiz


de Fora

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1. Introdução
Juiz de Fora é uma cidade que se caracteriza como um forte polo regional da Zona da
Mata Mineira, conformando-se como um grande receptor migratório, e tendo como atrativos
oportunidades e serviços, sobretudo nas áreas de educação – ensino médio, ensino superior e
cursos profissionalizantes, e de saúde. Tais características resultam em uma cidade de
população heterogênea e parcialmente flutuante, configurando por si só parte de sua identidade.
É considerada como uma cidade de médio porte e sua população está estimada em pouco mais
de 500.000 habitantes. A cidade ocupa uma área de 1.439 km2 (BRAIDA, 2011, p. 83).

O município apresenta-se como uma cidade universitária, na qual algumas


particularidades podem tornar-se desafios quando se trata de idenficação e sentimento de
pertencimento em relação ao espaço urbano. Ao considerar este espaço como transitório,
muitos de seus habitantes não identificam-se com o seu patrimônio edificado, o que resulta na
formação de um grupo desassociado que desconhece parte da história da arquitetura local.

Compreendendo que o patrimônio edificado de uma cidade comporta-se como um


forte elemento de identidade, e consequentemente, representativo de uma coletividade, foi
identificada a necessidade de sinalizar a população juizforana – flutuante ou não – para
aquilo que de fato lhes pertence. Mesmo fundamentada por leis, a preservação do
patrimônio edificado no Brasil expressa no Decreto-lei nº 25, de 1937, e mais
especificamente em Juiz de Fora expressa na Lei municipal 10.777 de 2004, não alcançou
ainda o devido reconhecimento, uma vez que grande parte dos indivíduos não identificam o
seu valor ou então enxergam nele outras possibilidades, fatos que explicam o caráter ainda
incipiente das discussões em torno desta temática.

Na maioria dos casos, a materialidade do patrimônio está presente e à vista de


todos, mas nem sempre a sua composição no contexto urbano é fator decisivo para sua
preservação. Neste sentido, os processos de reconhecimento e atribuição de valor ao
patrimônio arquitetônico são fundamentais. Somente a partir da identificação dos indivíduos
e do seu sentimento de pertencimento em relação à arquitetura é que esta se torna
patrimônio, e então é vista como digna de preservação. Ressalta-se que um dos principais
fatores de degradação do patrimônio arquitetônico diz respeito à sua desqualificação como
fonte de referência para a identidade local, constituido quase sempre como resultado do
desconhecimento de sua importância.

Os estudos deste artigo apresentam uma proposta de projeto piloto de educação


patrimonial urbana que tem como objetivo principal conduzir a população de Juiz de Fora

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(MG) ao entendimento de parte de sua própria história através do reconhecimento de seu
patrimônio arquitetônico tombado. Neste sentido, evidencia-se o papel do espaço urbano
como lugar de educação patrimonial.

O caminho teórico-metodológico busca resgatar o surgimento e o processo de


construção histórica da cidade de Juiz de Fora e suas múltiplas determinações, afirmando o
valor da educação patrimonial como importante fator de preservação e valorização do
patrimônio, condição fundamental para assegurar aos indivíduos a condição de cidadãos.
Para isto, identifica-se, mapeia-se e apresenta-se sistematicamente o patrimônio
arquitetônico tombado, localizado na Rua Halfeld, importante via do município que destaca-
se por diversos motivos, dentre eles o seu significado histórico e cultural e seu caráter de
centralidade.

A pesquisa histórica compreendeu a revisão de literatura referente à temática


escolhida, cujos autores adotados apontam para as determinações políticas e econômicas,
e para os diversos grupos formadores da cultura da população de Juiz de Fora. Em face da
perspectiva pedagógica que esta proposta encerra, desenvolveu-se investigação teórica
sobre os conceitos fundamentais sobre educação patrimonial e aplicação. Também foi
realizado levantamento dos bens, juntamente com a pesquisa documental envolvendo as
justificativas legais do tombamento, projetos já consolidados e registros fotográficos dos
bens tombados localizados na Rua Halfeld e no entorno dos pólos de conformação, o
Parque Halfeld e Praça Doutor João Penido.

O projeto propõe a criação de um percurso orientado através de placas com a


história, data de surgimento e curiosidades sobre os bens tombados. Dessa forma, o
indivíduo inicia o percurso a partir de uma das extremidades da via e a percorre
aprendendo, ponto a ponto, um pouco da formação da cidade e o papel que cada bem
tombado representa nessa história. Diretrizes são aplicadas de forma a auxiliar o percurso,
garantindo melhor visibilidade e que as intervenções feitas no local possam contribuir para
sua valorização.

Por fim, verifica-se a possibilidade de um processo efetivo de educação e valorização


patrimonial através de um projeto de requalificação do percurso estudado, garantindo a
acessibilidade, a visibilidade dos bens, o conforto e a segurança para os transeuntes.

2. Educação patrimonial como estratégia de salvaguarda no


espaço urbano

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A crescente valorização do patrimônio cultural em espaços urbanos tem sido motivo
de diversos estudos nas últimas décadas. Pesquisadores de diferentes áreas como
antropologia, história e arquitetura, têm interpretado as cidades para construir suas análises.
De acordo com Maurício Abreu (1998), vive-se um período de ruptura e transição, marcado
pela globalização, em que coexistem e interagem os tempos, surgindo incertezas e
angústias, e em que naturalmente as atenções se voltam para a memória como explicação.

Neste período de transição aparecem reflexões teóricas, dentre os quais destacam-


se os estudos de Aldo Rossi na Arquitetura, Martin Heidegger na Filosofia, Pierre Nora na
História e Joël Candau na Antropologia. Frequentemente, estes teóricos se debruçaram em
questões como identidade e pertencimento. Uma preocupação constante são as diferentes
maneiras de como sociedade e setores intelectualizados traçaram estratégias para
salvaguardar suas memórias.

Neste artigo, investiga-se a atual realidade brasileira em relação à salvaguarda de


sua memória e identidade especificamente relacionada ao patrimônio arquitetônico, bem
como papel da educação patrimonia no espaço urbano e para a salvaguarda do mesmo.

Sabe-se que um dos principais fatores que provoca danos ao patrimônio edificado
diz respeito à sua desqualificação como fonte de referência para a identidade local,
constituindo, quase sempre, resultado do desconhecimento de sua importância. Por este
motivo, justifica-se o desenvolvimento de um processo pedagógico que reconheça a
educação na perspectiva de apreensão de conhecimentos sobre o espaço urbano, que deve
ocorrer através da reflexão constante, do pensamento crítico, criativo e da ação
transformadora do sujeito, conformando-se como uma atividade condicionada histórica e
socialmente.

Para este propósito, a educação patrimonial é vista como um processo educativo que
tem como objeto central o patrimônio cultural, voltada para valores e comportamentos que
assegurem seu reconhecimento, valorização e preservação. Em outras palavras, a
educação patrimonial é um processo que busca levar a população à identificação,
reconhecimento, apropriação e valorização da sua herança cultural, possibilitando um
melhor usufruto destes bens, e proporcionando a geração e a produção de novos
conhecimentos para a continuidade do desenvolvimento cultural.

Nesta perspectiva, a apropriação dos bens pelas comunidades se torna fundamental


no processo não só de preservação, mas como no exercício da cidadania, apresentando-se
como um mecanismo de defesa do patrimônio histórico e artístico brasileiro, este último

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defendido desde os anos 1920 por Mário de Andrade, podendo se caracterizar como um
processo de alfabetização cultural.

Substancialmente, esta expressão nos leva a refletir sobre o papel que os ambientes
de ensino tem nesse processo, levando-se em consideração aspectos fundamentais de
convivência, além de apresentarem conhecimentos sistematizados e oferecerem subsídios
para debates e discussões em torno de questões sociais e culturais, como por exemplo o
convívio democrático no espaço público.

A reflexão vai além quando percebe-se que o processo de sistematização do ensino


seleciona o conteúdo e exclui tópicos importantes para a compreensão da formação da
identidade nacional, descaracterizando fatos históricos e mostrando, muitas vezes, uma
visão deturpada dos mesmos. Não são raras as exclusões formais das minorias. Desse
modo, conhecimentos fundamentais das áreas sociais e humanas, como por exemplo,
história, geografia, sociologia e antropologia, são fadados ao esquecimento conforme em
Pollak (1989).
O ensino nas mais variadas disciplinas está bastante voltado à formalidade dos fatos.
Este é um aspecto que dificulta abordagens como a do patrimônio cultural, em decorrência
da falta de reflexão teórica, contribuindo para que leis como a de tombamento pareçam
irrelevantes e desprovidas de sentido.

No entanto, o processo de educação patrimonial não precisa estar necessariamente


nas salas de aula. Ele pode ser inserido em todas as realidades e locais, com diferentes
formas e abordagens, desde que forneça a compreensão do contexto sociocultural e
histórico-temporal em que se está inserido, reforçando a autoestima de uma comunidade
com a valorização da sua cultura. Diversos espaços, como sítios históricos ou
arqueológicos, parques ou áreas de proteção ambiental, paisagens naturais, centros
históricos urbanos ou comunidades em áreas rurais, entre tantos outros, podem ser palco do
processo de educação patrimonial.

O processo educativo implica, ainda, na interação entre os diversos sujeitos sociais


que compõem a comunidade: escola, família, instituições, associações, etc., os quais
constituem elementos ativos. Estas interações se dão em diferentes espaços. Logo, faz
parte desse processo, também, a utilização de lugares de memória conforme Nora (1993),
que são vestígios deixados pelo passado, como por exemplo, museus, monumentos
históricos, arquivos e construções.

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Neste momento, percebe-se que o espaço urbano e o patrimônio edificado são,
dentre outras, umas das mais significativas formas de resistência que podem contribuir para
a construção de uma identidade cultural. E sendo assim, são espaços propícios para a
introdução da educação patrimonial, utilizando para isso diferentes abordagens.

3. Educação patrimonial no espaço urbano de Juiz de Fora

Juiz de Fora teve sua expansão territorial iniciada através das concessões de
sesmarias nas primeiras décadas do século XVIII ao longo do Caminho Novo. Em função da
construção de hospedarias e armazéns, em 1820 foi criado o povoado de Santo Antônio do
Paraibuna, o qual daria origem, mais tarde, à cidade de Juiz de Fora. Em 1865, a Vila
passou a ser definitivamente “Juiz de Fora”. (ALBERTO ET AL, 2016, p. 25). Braida assinala
que a construção da cidade teve como base a mistura de grupos imigrantes a qual
configurou uma sociedade plural e diversificada (BRAIDA, 2011, p. 82). À esta constatação,
cumpre afirmar que grande parte do patrimônio edificado no centro da cidade é proveniente
de construtoras fundadas por imigrantes alemães e italianos, como por exemplo, a
Companhia Indústria e Construtora Pantaleoni Arcuri.

A história e a evolução urbana de Juiz de Fora são frequentemente descritas e


analisadas a partir de fatos determinantes para o surgimento e desenvolvimento da cidade.
Ao considerar o que atual centro da cidade permanece no lugar se seu centro original, é
importante abordar e ressaltar os elementos formadores deste contexto urbano (FONSECA,
2016, p.47).

O núcleo inicial da cidade pode ser descrito como um triângulo conformado pela Av.
Rio Branco, pela Av. Getúlio Vargas e pela Av. Itamar Franco. No centro deste triângulo,
está a Rua Halfeld, que é delimitada à leste pelo Morro São Bernardo, à oeste pelo Morro do
Imperador.

Na atualidade, a Rua Halfeld é palco de importantes passeatas e grandes


manifestações. Repleta de comércios e serviços, por onde passam milhares de pessoas
diariamente, a rua estrutura o traçado do centro histórico e financeiro de Juiz de Fora e, em
conjunto com inúmeras galerias, conecta e dá fluidez à região central da cidade. O
cruzamento da Rua Halfeld com a Av. Rio Branco é considerado o ponto nevrálgico do
coração da cidade (BRAIDA, 2011, p. 86).

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Manifestação no cruzamento da Rua Halfeld com a Av. Rio Branco em 2014. Fonte: os autores

Por todo o seu significado e a representação que possui tanto atualmente, quanto já
tivera no passado, bem como pela grande quantidade e variedade de bens tombados
presentes em seu entorno e em seu percurso, a Rua Halfeld foi escolhida como para sediar
a proposta de projeto piloto de valorização patrimonial idealizado nesta pesquisa.

4. Diagnóstico da Rua Halfeld

O total de bens tombados localizados nos arredores da Rua Halfeld no momento da


pesquisa era 35. São eles: 1) Parque Halfeld; 2) Rua Marechal Deodoro, 700 – Igreja
Metodista Central; 3) Rua Halfeld, s/n – Edifício do Antigo Fórum, atual Câmara Municipal;
4) Av. Barão do Rio Branco, 2234 – Repartições Municipais; 5) Rua Halfeld, 828, com Av.
Barão do Rio Branco, 2189 – Painel de Azulejos “As Quatro Estações” e “Cavalos” – Ed.
Clube Juiz de Fora; 6) Galeria Pio X, Rua Halfeld, 720/743 e Rua Marechal Deodoro,
461/481; 7) Rua Halfeld, 692/698/704/710/716 – Ed. Sulacap; 8) Rua Halfeld, 703/711/715;
9) Rua Halfeld, 695/697; 10) Praça Dr. João Pessoa, s/n – Cine Theatro Central; 11) Rua
Halfeld, 675; 12) Rua Halfeld, 581, com Rua Batista de Oliveira – Cine Palace; 13) Rua
Halfeld, 559, com Rua Batista de Oliveira, 561/563;14) Rua Halfeld, 533/547; 15) Rua
Halfeld, 504, com Av. Gatúlio Vargas – Banco de Créito Real (inclusive Museu e arquivos)
Pinturas decorativas parietais; 16) Rua Halfeld, 487/517; 17) Rua Halfeld, 450 – Banco do
Brasil; 1) Rua Halfeld, 397/399/403/405;19) Rua Halfeld 383/ 387/ 395; 20) Rua Halfeld,
365/369; 21) Rua Halfeld, 350/354/360/364/368; 22) Rua Halfeld, 342; 23) Rua Halfeld, 332;
24) Rua Halfeld, 322/324; 25) Rua Halfeld, 306/310/316/320; 26) Rua Halfeld, 284/288;
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27) Praça Dr. João Penido, 74; 28) Rua Halfeld, 259/261/267/273 e 283 (fachadas voltadas
para a Rua Halfeld e Paulo de Frontin) (Hotel Capri); 29) Rua Halfeld, 229/235 – Edifício
Wagner Pereira; 30) Rua Halfeld, 213 – Cine São Luiz; 31) Rua Halfeld, 199/203/207;
32) Praça Dr. João Penido 22; 33) Praça Dr. João Penido 44; 34) Praça Dr. João Penido,
52/56 – Associação Comercial; 35) Praça Dr. João Penido, s/n – Prédio da Estação da
RFFSA.

Foi feito o diagnóstico de todo o percurso, com foco na relação entre o patrimônio
edificado e o espaço urbano. Na análise foram identificados diversos fatores que
comprometem a visibilidade e a legibilidade das edificações, e consequentemente dificultam
a compreensão da história contada através dos mesmos. Embora os problemas possam ser
encontrados em toda extensão da área estudada, é possível identificar áreas que
necessitam de maior atenção em relação a determinado problema. Denomina-se neste
estudo a primeira área como “calçadão”, que compreende o trecho entre a Avenida Rio
Branco e a Avenida Getúlio Vargas, e como “parte baixa” o trecho entre a Avenida Getúlio
Vargas e a Praça Doutor João Penido.

O calçadão se encontra em melhor estado de conservação e está menos


descaracterizado do que a parte baixa. Os problemas de maior destaque encontrados foram
os postes de iluminação fora do contexto, colocados na primeira década do século XXI, sem
corresponder ao contexto histórico da cidade e à composição do conjunto já existente; e a
deformação da pavimentação, onde embora tenham sido observadas canaletas de captação
de água da chuva, existem irregularidades no direcionamento das águas pluviais, causando
seu acúmulo ao longo do calçamento.

A parte baixa da via encontra-se mais degradada. Os postes de iluminação se


mostram de forma agressiva aos bens tombados do local, sendo possível encontrar até
mesmo postes perfurando marquises de edifícios. Sua fiação aérea compromete a
visibilidade do bem e a leitura do conjunto. A iluminação proporcionada por estes são
ineficientes para o pedestre. Além disso, as calçadas possuem largura insuficiente, e sçao
necessárias mais faixas de pedestres.

Além dos problemas específicos de cada área, ainda é possível encontrar aqueles
que se repetem com frequência ao longo de todo o percurso, como a obstrução da
visibilidade dos bens através de letreiros. Estes últimos retratam o uso abusivo de
publicidade, sem o devido respeito às edificações, escondendo elementos importantes das
mesmas. Os aparelhos de ar-condicionado e antenas constituem outro inconveniente para a
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identificação do patrimônio edificado pois são colocados indevidamente nas fachadas,
atravessam as furam as esquadrias e a alvenaria, quebrando a harmonia e a estética das
construções.

5. O projeto piloto para intervenção na Rua Halfeld

O projeto piloto propõe para a Rua Halfeld intervenções na iluminação e no


calçamento do percurso, um conjunto de totens informativos e a indicação de um percurso
cultural. As diretrizes são aplicadas de forma a auxiliar o percurso, garantindo melhor
visibilidade, e que as intervenções feitas no local possam contribuir para sua valorização,
ou, no mínimo, se comportar de forma neutra, sem trazer prejuízo ou danos, não só para os
bens, mas para toda a história que estes carregam.

5.1. Iluminação
Devido a forte influência que exercem na paisagem, tanto por se repetir ao longo do
percurso implantado, os postes de iluminação possuem grande influência na percepção do
espaço analisado. Sendo assim, propõe-se para o calçadão a colocação de novos postes,
com design contemporâneo e inovador, contribuindo também como marco de um novo
momento da história, chamando a atenção da população para a requalificação que está
sendo proposta para Rua Halfeld. Inserir-se-à, portanto, de forma mais harmônica do que o
poste existente atualmente, sem criar falso histórico, já que marca bem a época de sua
inserção.
Já para a parte baixa, propõe-se postes com um design dinâmico, estética leve e
agradável, com a utilização de fiação subterrânea, garantindo uma limpeza visual, com
tecnologia não expõe a fiação e os disjuntores, além de ser mais segura, pois protege os
fios de agentes externos, e embora sua aplicação seja mais cara, possui menor custo de
manutenção e longa durabilidade.

5.2. Calçamento e faixas da via

Compondo a paisagem, a pavimentação da Rua Halfeld, no calçadão, em que se


destaca o desenho feito pelas pedras portuguesas, conformou-se como um importante
elemento de caracterização da rua, para a população. Sendo assim, é fundamental sua
preservação e manutenção. Portanto, propõe-se apenas um reajuste do nivelamento da rua,
para que não haja o acúmulo de água em períodos de chuva, e o reassentamento das
pedras irregulares. Para a parte baixa propõe-se a remoção de uma das pistas de

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estacionamento, mantendo apenas uma de rolamento e uma de carga e descarga
juntamente com a ampliação das calçadas, favorecendo o percurso e a visibilidade para os
pedestres.

5.3. Conjunto de totens informativos

O Conjunto de totens informativos tem como objetivo mostrar aos transeuntes que é
possível conhecer a história da cidade através de seus edifícios. Esta simples intervenção é
capaz de estimular o sentimento de pertencimento e conseguir conquistar a valorização do
patrimônio e da cultura de Juiz de Fora, fazendo com que a população local compreenda a
necessidade de preservação e possa contribuir para tal, além de incentivar o turismo na
região. Sendo assim, os totens são colocados ao longo da Rua Halfeld, desde a Praça
Doutor João Penido até o Parque Halfeld, podendo o percurso ser iniciado em qualquer uma
das extremidades. Alguns dos pontos específicos são:

Parque Halfeld e arredores

O Parque Halfeld possui significado histórico, paisagístico, urbanístico e ecológico.


Criado em 1854, conhecido como Largo do Conselho ou Largo Municipal, sua importância
cívica deu-se com a elevação de Juiz de Fora a categoria de Vila. Em 1880 foi transformado
em jardim público, quando a Câmara encarregou Miguel Antônio Lallemond de fazer o
projeto para o ajardinamento da Praça. Por volta de 1901-2 foi feita uma nova remodelação
quando passara a ser conhecida como Parque Halfeld. Atualmente mantém sua importância
urbanística já que este é um dos poucos espaços públicos arborizados de Juiz de Fora.

Nele também estão inseridos edifícios de grande importância histórica e cultural. O


edifício do Antigo Fórum, atual Câmara Municipal tombado em 19/ de janeiro 1983, é da
época da criação da Comarca e compõem com junto com o edifício das "Repartições
Municipais", um conjunto arquitetônico que reporta à constituição do núcleo institucional da
administração, do legislativo e da justiça em Juiz de Fora. O edifício das Repartições
Municipais, tombado em 19 de janeiro de 1983 é uma referencia histórica do local onde
funcionou a Câmara Municipal a partir da elevação do povoado a Vila, até então
denominada "Santo Antônio do Paraibuna",

Edifício Clube Juiz de Fora

O Ed. Clube Juiz de Fora teve sua volumetria e fachada tombadas em 25 de julho de
2002, e posteriormente o edifício como um todo em 24 de outubro de 2002. Inseridos nele, o

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Painel de Azulejos “As Quatro Estações” e o “Cavalos” já haviam sido tombados em 07 de
marco de 1997. Os painéis estão entre os quatorze criados em azulejos pelo pintor Cândido
Portinari existentes no Brasil e compõem esteticamente a arquitetura do Edifício Clube Juiz
de Fora, referência da presença da arquitetura moderna em Juiz de Fora, cujo projeto é de
autoria do arquiteto Francisco Bolonha. Encontra-se na volumetria e na fachada elementos
representantes da arquitetura modernista, tais como estrutura pendente em concreto,
janelas horizontais e "brises-soleil".

Galeria Pio X

A Galeria Pio X, tombada em 16 de junho de 2009, foi a primeira galeria construída


em Juiz de Fora, conforme projeto original aprovado em 21 de dezembro de 1923, o que
veio a estimular o surgimento de uma rede de galerias no centro da cidade.

Cine Theatro Central e arredores

O Cine Theatro Central, tombado em 19 de janeiro de 1983, recebe grandes eventos


culturais em Juiz de Fora, tais como peças teatrais, danças, apresentações musicais, entre
outros, e ainda abriga um dos principais exemplares de pintura mural do pintor Angelo Biggi.
Os edifícios da Halfeld nº 695/697, tombado em 28 de junho de 2000, e o nº 675, tombado
em 26 de dezembro de 2000, com o estilo "art déco" e formas harmônicas, compõem o
cenário do conjunto histórico e arquitetônico da Praça João Pessoa, juntamente o Cine
Teatro Central, palco de inúmeros eventos culturais.

Cine Palace

O edifício Cine Palace, tombado parte em 10 de abril de 1992 e parte em 28 de maio


de 2004, possui importância devido ao seu caráter de lazer e cultura, abrigando um cinema
na área central da cidade. Sua linguagem Art-Deco, marcou um período, em que este
princípio estético foi difundido pela indústria cinematográfica.

Museu do Crédito Real

O edifício-sede do Banco de Crédito Real foi tombado em 29 de dezembro de 1992,


e seus bens integrados, em 28 de maio de 2004. Trata-se do mais antigo banco de Minas
Gerais, e um dos mais antigos do país, sendo fundado em 05 de setembro de 1889. Este
possui um papel crucial na história do desenvolvimento de Minas Gerais, sobretudo da
região da Zona da Mata. Do ponto de vista arquitetônico, projetado pelo engenheiro-
arquiteto Luiz Signorelli, apresenta um uma linguagem erudita, marcada pelo ecletismo,
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além de sua execução feita pela Construtora Pantaleone Arcuri. Já do ponto de vista
urbanístico, o edifício se encontra na união de duas vias centrais de grande importância
econômica, a Av. Getúlio Vargas e a Rua Halfeld, cruzamento este que posteriormente veio
a receber os edifícios-sedes do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. O edifício
ainda abriga o Museu e Arquivo Histórico que está entre os seis primeiros museus
especializados sobre a história das instituições bancárias do mundo. Por fim, também conta
com as pinturas ornamentais parietais, do artista italiano Ângelo Biggi, também responsável
pelas pinturas parietais do Cine Teatro Central e da sede da Associação Comercial.

Antiga Estação Ferroviária

O Prédio da Estação da RFFSA, tombado em 16 de junho de 1999, representa a


composição arquitetônica marcante do século XIX, devido ao seu extenso volume horizontal,
a alta torre lateral que quebra a simetria, a harmonia e o ritmo das aberturas dos vãos, os
elementos decorativos, a cúpula semiesférica vazada, a quantidade de ornamentação no
interior do edifício, os pisos com diversos ladrilhos hidráulicos decorados, entre outros
fatores. Possui ainda uma gare com estrutura metálica, gradil, catraca e mobiliário, e a
passarela sobre a passagem de nível, construída em 1928.

5.4. Indicação do Percurso Cultural

Complementando o projeto de intervenção, foi feito um levantamento dos espaços


com potencial para oferecer eventos de caráter cultural e de valorização da cultura. A
intenção é que possa acontecer no percurso, ao longo do ano, circuitos em que esses
espaços participem criando um cronograma em conjunto, oferecendo tais atividades, e
convidando a população para conhecer e até mesmo fazer parte dos eventos que podem
envolver dança, música, pintura, fotografia, artesanato, feiras, filmes, palestras, peças
teatrais entre tantas outras contribuições para a valorização e reconhecimento desses
espaços da cidade. Os locais indicados foram o Parque Halfeld, a Funalfa, o Edíficio Clube
Juiz de Fora, O Banco do Brasil, a Praça João Pessoa, o Cine-Theatro Central, o Cinearte
Palace, a Escola de Dança Misailiadis, o Museu do Crédito Real, a Praça Doutor João
Penido e a Antiga Estação Ferroviária.

6. Diretrizes

6.1. Norma para colocação de placas e letreiros

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Os letreiros paralelos à fachada deverão ser fixados nos vãos das portas faceando a
parte inferior das vergas, sem se projetar além do alinhamento da fachada.
Deverão permitir uma altura livre mínima de 2,20m, do piso à face inferior do letreiro. Sua
altura poderá se estender até o vão máximo da porta, e não poderão encobrir elementos
construtivos que façam parte da morfologia original da fachada, tais como: colunas, gradis,
portas de madeira, e vergas em cantaria. Serão permitidas somente no pavimento térreo,
em material acrílico ou similar quando o cumprimento do anúncio ultrapassar a 2,00m e
chapas de madeira, vidro ou metal para vãos de qualquer dimensão.
Os letreiros perpendiculares à fachada deverão ser fixados na parede, desde que
respeite uma altura livre de 2,40m, medida do passeio à face inferior do anúncio. Terão
dimensões máximas de 0,80m de comprimento, 0,50m de altura, e 0,20m de espessura,
devendo deixar um espaço de no máximo 0,15m do alinhamento das fachadas. Deverão
permitir uma distância livre de 1,00m do meio-fio da calçada, quando se tratar de vias de
tráfego de veículos. Quando a fachada for revestida de algum material em que a colocação
de letreiros possa trazer prejuízo irrecuperável (pedras, azulejos, ou algum material de
relevância histórica), os anúncios deverão ser fixados na bandeira dos vãos de abertura,
observando-se um afastamento de 0,15m da face das paredes e uma altura livre mínima de
2,20m. Serão permitidos somente no pavimento térreo e será permitida a utilização de
material acrílico ou similar e chapas de madeira, vidro ou metal.

6.2. Manutenção de fachadas

Quanto às pinturas para edificações ecléticas, os frisos e ornatos devem se destacar


do fundo com utilização de tonalidades mais claras. Os gradis devem ser pintados com
cores mais escuras do que as esquadrias, sendo elas: verde colonial, grafite, marrom ou
preto, embora o preto deva ser evitado nos gradis de ferro fundido, de barras grossas. Caso
haja porta de enrolar, esta deverá receber a mesma cor dos gradis. As cantarias devem
permanecer no seu estado natural, sem receber tinta ou verniz.
A pintura para edificações em estilo art déco deverá manter o contraste de cores
entre frisos e fundo. Os revestimentos em pó de pedra deverão ter suas características
naturais preservadas.
Os aparelhos de ar-condicionado, aquecimento e similares não devem ser expostos
na fachada frontal. Quando houver a necessidade da sua colocação na fachada frontal,
deve-se evitar sua visibilidade, por exemplo, colocando-os abaixo de toldos, atrás de brises,
em cima de marquises ou medidas similares para que não fiquem a mostra aos olhos do

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pedestre. Deve-se também adotar mecanismos que causem o menor dano físico possível, e
de preferência serem reversíveis.

6.3. Novas edificações

As novas edificações projetadas ao longo do percurso deverão ter o limite máximo de


altura igual ao menor daquela do edifício imediatamente vizinho.

6.4. Feiras livres

As feiras deverão seguir a padronização de barracas para feirantes ao longo do


percurso, utilizando o mesmo modelo adotado no Parque Halfeld.

7. Considerações Finais
Partindo do princípio que as ações de educação patrimonial devem ser construídas
através de diversificadas áreas de conhecimento complementares, o percurso proposto
cumpre um papel não isolado, mas como parte de um conjunto de ações a serem
desenvolvidas paralelamente pelas demais áreas. Seu objetivo é destacar e ressaltar para
as pessoas que circulam no local quais são as edificações tombadas existentes no percurso,
e sua importância histórica e cultural, motivo de seu tombamento. A colocação dos totens
físicos torna isso possível chamando atenção e despertando a curiosidade.

A intenção é que o projeto piloto para a Rua Halfeld, Juiz de Fora (MG), possa servir
de base para um projeto ainda maior de conscientização e valorização da cultura local, e
que possa ser estendido para todos os pontos de interesse patrimonial da cidade.

Sendo assim, tanto o projeto-piloto quanto as medidas paralelas que o projeto


permite, podem reforçar o laço dos seus habitantes com a cidade, sua história e sua cultura,
e assim contribuir para que a própria população reconheça a importância e ajude na
preservação do patrimônio local.

Referências

ABREU, Maurício de Almeida. Sobre a memória das cidades. Revista da Faculdade de


Letras: Geografia, Porto, v. 14, n. 1, jan. 1998.

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ALBERTO ET AL. Arquitetura e Urbanismo em Juiz de Fora: habitação, comércio, saúde
e educação. Juiz de Fora: Funalfa, Ed. UFJF, 2016.

BRAIDA, Frederico. Passagens em Rede: a dinâmica das galerias comerciais e dos


calçadões nos centros de Juiz de Fora e Buenos Aires. Juiz de Fora: Funalfa: Ed. UFJF,
2011.

BRASIL. Decreto-Lei n. 25, de 30 de novembro de 1937. Organiza a proteção do patrimônio


histórico e artístico nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/Del0025.htm> Acesso em: 15 jun. 2017.

CANDAU, Joël. Memória e Identidade. Tradução: Maria Letícia Ferreira Mazzucchi. São
Paulo: Contexto, 2011.

FONSECA, Fábio. A supremacia do pedestre: os calçadões e a qualidade urbana na área


central de Juiz de Fora. Juiz de Fora: Funalfa, Ed. UFJF, 2016.

INSTITUTO MUNICIPAL DE ARTE E CULTURA (Rio de Janeiro, RJ). Corredor Cultural:


como recuperar, reformar ou construir seu imóvel/RIOARTE, IPP. 4 ED. RIO DE
JANEIRO:PREFEITURA DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, 2002. 23

NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Projeto História.
Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de História
da PUC-SP, n. 10. São Paulo, dez. 1993.

POLLAK, Michael. Memória, esquecimento, silêncio. In. Estudos Históricos. CPDOC/


Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, vol.2, nº. 3, 1989.

PREFEITURA DE JUIZ DE FORA. Lista de bens imóveis tombados. Disponóvel em:


<https://www.pjf.mg.gov.br/administracao_indireta/funalfa/patrimonio/arquivos/imoveis_tomb
ados_300317.pdf> Acesso em: 14 jun 2017.

______. Lei nº 10.777, de 15 de julho de 2004. Dispõe sobre a proteção do patrimônio


cultural do Município de Juiz de Fora e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.jflegis.pjf.mg.gov.br/c_norma.php?chave=0000026190> Acesso em 14 jun.
2017.

ROSSI, Aldo. A arquitetura da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

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ROTEIRO DAS IGREJAS DO CENTRO HISTÓRICO DE CUIABÁ: UM
PASSEIO PELO SAGRADO

CAMPOS, DANIEL SILVA. (1); CARMIN, RAYANE. (2) FERREIRA, LUCIA DE


FÁTIMA LOBATO. (3), HIRATA, AMÉLIA (4)

1. Superintendência Estadual do IPHAN em Mato Grosso


Rua 7 de Setembro, nº 390, Centro Norte, Cuiabá/MT
daniel.campos@iphan.gov.br

2. Superintendência Estadual do IPHAN em Mato Grosso


Rua 7 de Setembro, nº 390, Centro Norte, Cuiabá/MT
rayane.carmin@iphan.gov.br

3. Secretaria Executiva de Educação do Estado do Pará


Travessa Humaitá, Passa. Paraná, 10.
lf_lobato@yahoo.com.br

4. Superintendência Estadual do IPHAN em Mato Grosso


Rua 7 de Setembro, nº 390, Centro Norte, Cuiabá/MT
amelia.hirata@iphan.gov.br

RESUMO
Com o intuito de fortalecer os sentimentos de identidade e de cidadania da população cuiabana, a
Superintendência Estadual do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Mato Grosso –
SE/IPHAN-MT, através de uma postura mais educativa, de diálogo, de reconhecimento e de proteção
do patrimônio cultural, promoveu ações de educação patrimonial paralelamente às suas frentes de
atuação. Dentro de um contexto dinâmico, de trocas de experiências, de vivências, de
experimentações e de esclarecimentos à sociedade, a Superintendência iniciou no mês de março de
2017, um evento denominado Roteiro pelos Templos Sagrados do Centro Histórico de Cuiabá/MT.
Essa atividade faz parte de uma série de ações em comemoração ao aniversário de oitenta anos do
Instituto, neste ano de 2017 e tem como objetivo, a apresentação e a visitação das principais
construções religiosas que se encontram dentro da poligonal de tombamento do Centro Histórico de
Cuiabá – MT e de seu entorno, são elas: Igreja do Rosário e Capela São Benedito, Igreja do Nosso
Senhor dos Passos, Igreja da Boa Morte, Basílica do Senhor Bom Jesus de Cuiabá e a Igreja
Presbiteriana de Cuiabá. Esses lugares cujo seus usos atribuem significado. A importância desses
lugares repousa na compreensão de que eles são importantes na vida social de grupos de habitantes
da cidade e por fazerem parte de círculos simbólicos que os definem por representarem a
espiritualidade, ou seja, a proximidade com o divino representada por essas construções religiosas.

Palavras-chave: Roteiro; Igrejas; Centro Histórico de Cuiabá.

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O roteiro e o contexto histórico

A Superintendência Estadual do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional –


SE/IPHAN-MT desenvolve e acompanha inúmeras ações da sua área finalística que busca,
entre uma atividade e outra, divulgar ações de educação patrimonial. Muito embora, essa
não seja uma atividade frequente, dada a quantidade diminuta de servidores, nos últimos
anos, no entanto, a partir de subsequentes solicitações de colaboradores, de estudantes, de
visitantes, o ato de receber o público e dialogar com ele, ganhou espaço na Unidade local.
Vislumbrou-se nessa demanda de trocas, uma oportunidade de criar um produto que
estabelecesse uma conexão entre a bagagem histórica que esse público carrega consigo e
a linguagem arquitetônica que concebeu os espaços sagrados, implantados na paisagem da
cidade, especialmente no Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico de Cuiabá.
Dessa perspectiva surgiu um roteiro, destinado a todos os públicos que anseiam conhecer
um pouco da história da cidade, a partir do viés da construção dos templos religiosos.

A curiosidade, a crescente procura por atividades educacionais e culturais gratuitas e a


participação dos estudantes de graduação das instituições de ensino em outras ações
oferecidas pelo Instituto à comunidade impulsionaram a divulgação da atividade, que não é
muito comum e acessível na capital.

A proposta de visitação foi construída a partir de um recorte histórico, que contempla a


tipologia dos imóveis remanescentes do antigo núcleo urbano da capital e de suas ruas
estreitas e tortuosas nas quais estão implantados esses bens. Há exemplares do casario
dos séculos XVIII, XIX e XX, que retratam a evolução urbana da cidade, desde a sua
fundação até os dias atuais. Essa construção do itinerário, utilizando a cidade como
narrativa, abraçou o cenário urbano de forma ampla e seguiu para os templos religiosos em
um contexto mais detalhado e particular.

Dessa forma, o trajeto escolhido para a viagem no Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e


Paisagístico de Cuiabá, tombado em 1987 pela União e homologado em 1992, percorre as
principais e mais antigas vias do conjunto até chegar as igrejas e os templos. Para além do
percurso, busca-se aguçar o olhar do participante para o elemento arquitetônico, para as
edificações construídas ao longo do trajeto no centro histórico da cidade, isto é, para os
exemplares modificados ou intactos que permitem ao observador conhecer as intervenções
sofridas pelo núcleo urbano antigo através das características arquitetônicas e seus
acréscimos nas fachadas dos bens.

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Ainda que o itinerário não compreenda todo o centro histórico de Cuiabá com seus 400
imóveis tombados em conjunto, as igrejas localizam-se em pontos de destaque dentro
desse núcleo urbano, ora em pontos de topografia mais elevada, ora nos espaços de poder,
sempre criando conexões com a comunidade.

A experiência de aplicação do roteiro

O roteiro histórico dos templos sagrados da capital localizados dentro da área tombada do
Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico de Cuiabá e de seu entorno foi lançado
em abril de 2017, em comemoração aos 298 anos da cidade. O material gráfico
compartilhado nessa edição do evento foi elaborado pelos estagiários em Arquitetura e
Urbanismo do IPHAN/MT. O modelo do percurso, a exemplo de dois outros roteiros também
aplicados pela Superintendência, baseou-se na narrativa da história da cidade contada a
partir de exemplares arquitetônicos e do traçado urbano remanescente.

A divulgação e a inscrição do evento foram realizadas em meio virtual. Para isso, foi
disponibilizado às instituições de ensino ou de classe interessadas, um formulário eletrônico
vinculado à um endereço de e-mail utilizado durante o evento. Pelo formulário, o participante
efetuava sua inscrição online e posteriormente recebia a confirmação de sua inscrição por e-
mail, juntamente com o roteiro digitalizado. Feita e confirmada a inscrição, o interessado
comparecia ao local no horário e na data previamente marcados para iniciar o itinerário
histórico e conhecer parte da arquitetura religiosa cuiabana.

A aplicação do roteiro iniciou-se por uma rápida palestra sobre a instituição e um resumo
histórico sobre o surgimento da cidade e dos espaços sagrados, objetos da visitação. Essa
apresentação foi realizada na sede da Superintendência de Mato Grosso, em Cuiabá. Para
elaborar a apresentação do histórico das construções, realizou-se um levantamento
bibliográfico de publicações de autores locais e de documentos do arquivo da
Superintendência. Feita a construção textual e documental do material, gerou-se um arquivo
digital do roteiro para distribuição aos participantes via e-mail. Finalizada a parte teórica do
produto, os participantes foram convidados a percorrer trecho do centro histórico cuiabano
até os templos selecionados, dos quais 2 são tombados pela União – um em conjunto e
outro isoladamente, na capital mato-grossense e os demais encontram-se na área de
entorno do conjunto tombado. Para visitar o interior das igrejas e dos templos, a
Superintendência realizou contato prévio formal com as suas respectivas administrações, a
fim de obter a autorização para acessar o espaço. A proximidade entre esses imóveis e a
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sede da Superintendência foi um fator decisivo para a aplicação do roteiro. Durante o
percurso, o participante caminhava por diversos casarões de diferentes períodos históricos e
logradouros públicos que contam parte de história de formação da cidade.

Finalizado o trajeto inicial, a primeira parada feita pelo grupo foi na Igreja do Rosário e
Capela São Benedito, localizada na Praça do Rosário e considerada um dos cartões postais
da cidade, especialmente por ser o primeiro templo religioso edificado em solo mato-
grossense, construído na década de 1730. O imóvel já passou por diversas reformas, que
lhe atribuíram mudanças de estilo arquitetônico desde a época de sua construção, sendo a
mais recente delas ocorrida no ano de 1975, quando foram resgatadas as suas
características barrocas originais. O prédio permanece assim até os dias atuais. Foi também
no ano de 1975, que a igreja foi tombada isoladamente pela União. Sendo o primeiro
tombamento federal na capital.

A segunda igreja visitada foi a Igreja do Nosso Senhor dos Passos, cujo primeiro registro
que se tem notícia data de 1816. O imóvel apresenta características construtivas do período
colonial, tais como alvenaria de terra crua, piso de ladrilhos hidráulicos, cobertura de telha
de barro, ou telha de coxa, como é conhecida popularmente.

A próxima construção religiosa visitada durante o roteiro foi a Basílica do Senhor Bom Jesus
de Cuiabá, outro símbolo da cidade. Originalmente, a atual basílica, era uma capela de pau
a pique no momento de sua construção em 1722. Passou por cinco modificações completas
até ser totalmente demolida em 1968 (demolição esta que até os dias de hoje dói nos
corações cuiabanos). O atual prédio foi inaugurado em 1973.

A visita foi finalizada na Igreja Presbiteriana de Cuiabá, prédio construído no século XX, cuja
fachada revestida de tijolos aparentes se destaca em meio aos prédios comerciais
espremidos da rua 13 de Junho.

De se esclarecer que embora o roteiro contemple a Igreja da Boa Morte, o acesso ao local
não foi autorizado pela administração, pois a igreja só abre durante a realização das missas,
em um ou dois dias da semana, no período matutino. Nos demais dias, não havia
disponibilidade de pessoal para abrir o local e acompanhar o grupo.

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Os visitantes

O número de inscritos na primeira edição do roteiro foi de aproximadamente 30 pessoas,


entre estudantes, profissionais da área de turismo e curiosos. As vagas disponibilizadas
contemplavam até 25 participantes por visita. O evento foi divulgado apenas com 2 dias de
antecedência e as vagas foram preenchidas neste intervalo de tempo, o que resultou na
retirada do formulário de inscrição, um dia antes de sua realização. Dos inscritos,
aproximadamente 40% souberam da existência do roteiro por um amigo ou colega, pouco
mais de 30%, pela internet e 12,5% pelo aplicativo whatsapp.

Dos inscritos, cerca de 20 participantes compareceram à SE/IPHAN-MT para percorrer o


centro histórico, conhecer a história das igrejas e templos e visita-los. Alguns, conforme
próprio relato, entraram pela primeira vez em uma igreja antiga. Trata-se de uma
oportunidade rara, visto que a maioria das igrejas em Cuiabá só abre em dias de missa,
durante o horário da celebração, o que inviabiliza a visita por turistas e estudantes no
decorrer da semana, em horários alheios às celebrações.

Diante da boa receptividade dessa atividade pelo público envolvido, a Superintendência


recebeu mais pedidos de aplicação do roteiro, o que gerou uma segunda edição do evento
para um grupo maior e fechado. Desta vez, o roteiro contou com aproximadamente 40
inscritos, alunos de nível médio de uma escola pública da capital. O grupo acompanhado de
2 professores percorreram as ruas antigas de Cuiabá, ouviram histórias sobre as
singularidades do centro histórico e das igrejas e templos religiosos cuiabanos.

O público desta vez era diferente, compostos por estudantes de faixa etária inferior ao
primeiro grupo, cujo interesse e a percepção do espaço, dos lugares e da arquitetura eram
muito particulares, talvez pelo pouco conhecimento que se tinha sobre os objetos e a
cidade. O grupo, subdividido em outros pequenos grupos se dispersaram dentro dos
espaços, cada qual, fazendo sua própria apropriação e experimentação do lugar.

Em todo o caso, a experiência da troca e a divulgação de conhecimento na área de


conservação e preservação do patrimônio histórico atendeu ao objetivo da atividade, que
nada mais é do que vivenciar história local pela narrativa construída pelos lugares, espaços
e memórias.

A Unidade, por fim, promoveu o diálogo com seus pares e seus colaboradores, a partir da
troca de conhecimentos e de parcerias para a proteção e valorização desses bens no
estado de Mato Grosso.

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A Igreja do Rosário e Capela de São Benedito

Não se sabe a data exata de sua construção. É provável que seja da década de 1730. O
seu primeiro registro iconográfico aparece no prospecto da Villa do Bom Jesus de Cuiabá de
1790. No início do século XX o templo passou por reformas, com a terminação da torre em
uma cúpula de meia laranja. Na década de 1920, foi acrescentada uma fachada neogótica.
Entretanto, com o tombamento federal em 1975, sua fachada foi reconstruída baseada em
imagens iconográficas anteriores, representando a torre em forma de ogiva.

Lacerda (2008, p. 29) relata que

No Brasil, com orações simples, a devoção do Rosário se aproximaria, de


certa forma, dos rituais africanos de canto e reza, numa doce e monótona
cadência. A imagem seria logo adotada como padroeira dos homens pretos.
Assim como em outras localidades do Brasil, a sua Igreja e irmandade
estavam vinculadas aos escravos e forros, sendo sua irmandade em Cuiabá
conhecida nos séculos anteriores como de Nossa Senhora do Rosário dos
pretos.

E ainda, quando menciona a construção de das três primeiras igrejas em Cuiabá, Lacerda
(2008, p. 78) diz que

[...] Senhor Bom Jesus, Nossa Senhora do Bom Despacho e Nossa


Senhora do Rosário – apresentam características que não são casuais, quer
em ocupação dos espaços das suas edificações, quer nas técnicas
construtivas utilizadas nas suas construções. Além disso, essas três igrejas
foram edificadas nos pontos mais elevados da vila, formando um triângulo
religioso. No ápice está a Igreja do Senhor Bom Jesus, Orago-mor da
religião católica, por isso a principal, e na base estão as outras duas, ambas
devoções Mariana. Observa-se que todas elas estavam localizadas o
entorno do córrego da Prainha

A seguir, na Figura 01 a Igreja do Rosário e São Benedito:

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Figura 01: Igreja Nosso Senhor dos Passos. Fonte: Hirata, A. 2016.

A Igreja do Nosso Senhor dos Passos

O documento oficial mais antigo que trata da construção desse templo data de 5 de maio de
1792, sendo concluída somente em 1816, com a planta típica das igrejas do período
colonial. Segundo Conte (2006, p. 268)

Na segunda metade do século XVIII os devotos do Senhor dos Passos


resolveram mandar buscar uma imagem para ser venerada na Matriz, visto
que as prescrições reais não permitiam a construção de uma capela própria.
Entretanto, depois que a imagem veio, os mesmos devotos não ficaram
satisfeitos e aos poucos foram construindo a capela do Senhor dos Passos
e somente em 1792 trataram de legalizar a construção. O documento oficial
mais antigo que temos desse tempo é o processo em que se pede
legalização da construção do templo em 5 de maio de 1792.

A história de sua construção é muito peculiar. Conta-se que Joaquim Moutinho, cidadão
cuiabano, após ser acometido por um ataque de catalepsia, foi considerado morto e
sepultado, mas levantou-se da sua cova com suas vestes mortuárias. Devoto do Senhor dos
Passos, o cidadão passou a angariar fundos para a construção da atual igreja.

Ainda de acordo com Conte (2006, p. 271):

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Quanto as técnicas construtivas, estas refletem a bicentenária história
da igreja. Paredes em taipa de pilão, adobes, pedra canga, tijolos
maciços e estrutura em concreto com tijolos furados... as paredes
laterais da capela mor e de fundos da igreja, assim como a torre são
todas em alvenaria de pedra canga. Sendo as restantes em taipa de
pilão ou adobes. A Fachada principal, neoclássica e construída em
1898, é em alvenaria de tijolos maciços. Os pisos são ladrilhos
hidráulicos, quadrados e hexagonais e granilite no térreo, e madeira
no pavimento superior. Os forros são todos em madeira.

Abaixo, na Figura 02, a fachada principal da Igreja Nosso Senhor dos Passos.

Figura 02: Igreja Nosso Senhor dos Passos. Fonte: IPHAN-MT, 2017.

Conforme Mendonça (1978, p. 21) “Mais tarde a capela do senhor dos Passos foi reformada
e ampliada pelo Bispo Dom Carlos Luiz d’Amour. Nessa Igreja está sepultado o Padre Wanir
Delfino César, que foi presidente da Academia Mato-grossense de Letras, falecido em
Cuiabá, no dia 13 de Julho de 1972.”

A Igreja Matriz de Nosso Senhor Bom Jesus de Cuiabá

Trata-se de originalmente de uma capela construída de pau-a-pique erguida em 1722 e


reconstruída em taipa de pilão pelo Padre João Caetano em 1739. Em 1771 foi erigida a
primeira torre da catedral em forma de pirâmide. Já em 1868, sofreu alterações na fachada

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e na torre conduzidos pelo arquiteto italiano Tortorolli. Reformas sofridas no final da década
de 1920 acrescentaram-lhe outra torre e mudanças na fachada. Foi totalmente demolida em
1968 e substituída por uma nova igreja inaugurada em 1973, que se mantém até hoje.

Mendonça (1978, p.7) menciona que

Barbosa de Sá registra na crônica do Cuiabá as seguintes informações:


“neste mesmo ano 1722 levantou o capitão-mor Jacinto Barbosa Lopes, à
sua custa a igreja Matriz, coberta de palha, no mesmo local em que se acha
a que existe hoje, dando-lhe o título de Igreja do Senhor Bom Jesus de
Cuiabá, adonde celebrou a primeira missa seu irmão frei Pacífico dos Anjos
religioso franciscano.”

Abaixo, a atual igreja matriz na Figura 03:

Figura 03. Basílica Nosso Senhor Bom Jesus de Cuiabá. Fonte: Hirata, A. 2016.

A Igreja da Nossa Senhora da Boa Morte

A Igreja da Boa Morte é tombada em nível estadual e localiza-se na área de entorno do


Conjunto Arquitetônico, Urbanístico e Paisagístico de Cuiabá, setor Boa Morte. Era um
templo destinado aos pardos. Construída por volta de 1810, sofreu uma série de reformas
no século XX, mas mantém suas características principais preservadas.

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Velasco (1985, p. 78) menciona que foi “A oitava igreja a ser construída em Cuiabá. Diz-se
que, construída, ali reinou uma associação de homens só de cor parda: pretos e brancos
não podiam fazer parte dela”.

Segundo Lüdke (2002, p. 48)

[...] as características arquitetônicas da Igreja vão de encontro à definição


do estilo barroco que ávila nos coloca... equilíbrio diagonal dos vãos, torres
em telhado piramidal com bordas apagoadas. A planta baixa se desenvolve
dentro de um risco retangular básico.

[...] possui paredes estruturais em taipa de pilão, com espessuras entre 0,20
e 1,00m. Posteriormente foram utilizados adobes em algumas partes. Seu
alicerce é em pedra canga. A fachada frontal, com conformação típica das
igrejas barrocas, foi remodelado, assumindo característica de estilo
neoclássico, com linhas retas pilastras salientes e poucos elementos
decorativos. Apresenta cimalhas, que juntamente com as pilastras delimitam
os espaços em três partes: o corpo central, formado pela nave e as laterais
formadas pelos corredores.

Já Mendonça (1978, p.25) descreve que “possui a igreja três altares, sendo o altar-mor todo
novo, feito de madeira e pintado de branco a óleo, com frisos dourados. Foi acabada em
1864 por meio de esmolas que pediu a irmandade.”

A fachada atual da igreja é apresentada na Figura 04, a seguir:

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Figura 04. Igreja Nossa Senhora da Boa Morte. Fonte: Hirata, A. 2016.

A Igreja Presbiteriana de Cuiabá

Foi o primeiro templo evangélico de Cuiabá. É também de chamada de Igreja Protestante.


Foi construída em 1921. Os cultos locais acontecem aos domingos. Antes ali funcionou o
Cine Mundial, primeiro cinema da capital. Sinhá Libânia, personagem conhecida por fazer
doce de mamão foi zeladora tanto tempo, desse templo.

Segundo Conte (2005, p36), “Situada a Rua 13 de Junho, foi o primeiro templo evangélico
de Cuiabá. Teve sua pedra fundamental lançada a 7 de Setembro de 1921. Gracioso templo
de tijolos a vista, encontra-se sufocada pelas grandes construções de seu entorno.”

Considerações Finais

Ao aliar atividades de rotina da área finalística com um passeio educativo e histórico pelo
casario, ruas e igrejas históricas de Cuiabá, a Superintendência Estadual do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Mato Grosso buscou meios para atender um
anseio local de atividade cultural ao tempo em que trabalhou a divulgação e a promoção da
história e da memória da arquitetura religiosa da capital.

A oportunidade de dialogar com os atores dentro de um espaço, que só pelo fato de existir,
é capaz de narrar a aspectos da história local, resultou em democratização e socialização
de conhecimento, ampliação do olhar sobre a arquitetura dos espaços públicos, coletivos.

Compreende-se que o patrimônio cultural deve ser pensado sob a ótica do acolhimento dos
mais diversos tipos de público, a fim de trabalhar com a perspectiva da interpretação
(fruição0 para a educação do patrimônio com fins de preservação.

A presente proposta de roteiro caracteriza-se pela presença do pensamento interdisciplinar


quando acolhe como conteúdo as questões históricas, arquitetônicas e simbólicas.
Preocupando-se não apenas com a participação de um número quantitativo de
participantes, mas voltando-se para a ampliação do aproveitamento do bem cultural.

Todavia, saber ver, sentir e viver o lugar e o espaço compreendem as experiências


particulares, que podem contribuir para o fortalecimento da comunidade, da identidade e do
significado coletivo, ainda que com uma interpretação singular, que o patrimônio possui.
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Meneses (1984), referindo-se ao entendimento do termo identidade esclarece que:

O conceito de identidade implica semelhança a si próprio, formulada como


condição de vida psíquica e social. Nessa linha, está muito mais próximo
dos processos de reconhecimento, do que de conhecimento. A busca de
uma identidade se alia mal a conteúdos novos, pois o novo constitui uma
ameaça, sempre. Ao contrário, ela se alimenta do ritmo, que é repetição –
portanto, segurança. Trata-se, em suma, de atitude conservadora, que
privilegia o reforço em detrimento da mudança. (MENESES, 1984, p. 33)

Segundo o autor, a Antropologia e a Sociologia contribuíram para o entendimento da noção


de identidade seja no aspecto individual ou social, os processos de sua constituição ocorrem
no campo social. Ela é constituída na dinâmica histórica, o indivíduo alcança a consciência
de ser passível às mudanças. A ideia de singularidade individual é uma noção cultural que
alimenta a ideia de oposição entre o indivíduo e a sociedade, uma oposição ilusória, pois a
condição social é base da existência do indivíduo. Realiza uma leitura do passado como que
se contrapõe à visão de conjunto de eventos homogêneos, pensamentos cristalizados e vê
o passado como “um interlocutor que o interroga criticamente”. (MENESES, 1984:34).

A memória, esta considerada Mecanismo de retenção de informações, conhecimento,


experiência, quer em nível individual, quer social e, por isso mesmo, é eixo de atribuições,
que articula categoriza os aspectos multiformes de realidade, dando-lhes lógica e
inteligibilidade [...] (MENESES, 1984:33). Na análise do autor seria um dos suportes
essenciais para a identidade. Ainda segundo ele, são duas características existentes. A
memória é seletiva, esta característica possibilita o registro, sendo que este registro não
necessariamente aflora à consciência. A outra característica remete a memória a ser
suscetível à indução. Esta memória pode ser constituída com medidas artificiais, no sentido
da legitimação do passado, que tem o viés de manutenção de hierarquia, privilégios e de
determinadas configurações sociais.

A consciência histórica para Meneses (1984) seria uma forma de se esclarecer o caráter
ambíguo existente entre os termos identidade e memória, a partir dela a noção de
identidade rompe com a rigidez “Ter consciência histórica não é informar-se das coisas
outrora acontecidas, mas perceber o universo social como algo submetido a um processo
ininterrupto e direcionado de formação e reorganização [...]” (MENESES, 1984, p. 34).

Os reflexos da consciência histórica na compreensão da memória atribuem o sentido de


“força viva do presente”, no sentido de nutrir uma plataforma de referência que dá base para

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análises e criação de novas premissas, base histórica que auxilia na compreensão da
dimensão temporal do homem.

Referências Bibliográficas

CONTE, C.Q. e FREIRE, M.V.D. Centro Histórico de Cuiabá Patrimônio do Brasil.


Cuiabá, Entrelinhas, 2005.

CONTE, C. Q. A Igreja Senhor dos Passos em Cuiabá. Territórios e Fronteiras – Revista


do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Mato Grosso,
v. 7, n. 1, p. 267- 276, jan. /jun. 2006 – Cuiabá-MT.

FREITAS, M.A. Cuiabá: imagens da cidade: dos primeiros registros à década de 1960.
Cuiabá/MT: Entrelinhas, 2011.

LACERDA, L. B. de. Catedral do Senhor Bom Jesus de Cuiabá: um olhar sobre a sua
demolição.Cuiabá: KCM, 2005. 160p.

LACERDA, L. B. Igreja de Nossa Senhora do Rosário e Capela de São Benedito: um


diálogo entre a história e a arquitetura. Cuiabá, MT : Entrelinhas, 2008.

LÜDKE, C.R. Restauração da Igreja Nossa Senhora da Boa Morte. Cuiabá:MT, 2002,
128f. Monografia. Departamento de Arquitetura e Urbanismo, UFMT, 2002.

MENDONÇA, R. Igrejas e Sobrados de Cuiabá. Cuiabá, Prefeitura Municipal de Cuiabá –


Cadernos Cuiabanos, 1978.

MENESES, Ulpiano Toledo Bezerra de. Premissas para a formulação de políticas


públicas em Arqueologia. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, nº20, 1984.

SIQUEIRA, E.M. [et al.] (org.). Cuiabá: de vila a metrópole nascente. Cuiabá: Entrelinhas,
2006.

VELASCO, M. SILVA, O. J. A verde Cuiabá. Cuiabá, Fundação Cultural de Mato Grosso,


1985. BCBM-FR/MT 204.

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SABERES TRADICIONAIS: desaparecimento e perpetuação

MURTA, JANUACELI FELIZARDO.

1. Belo Horizonte/MG
janumurta@gmail.com

RESUMO
Texto do resumo: Para o título ‘RESUMO’, use fonte Arial de tamanho 10 em negrito com espaço
simples. Para o texto do resumo, use fonte Arial tamanho 10, com espaçamento entre linhas simples,
sem parágrafos, fórmulas ou referências bibliográficas.

Os ofícios tradicionais relacionam-se diretamente com hábitos tradicionais, com (re) significação e (re)
valorização por meio de sua perpetuação. No município de Araújos, por exemplo, o saber fazer o
chapéu de palha de cambaúba sofre com escasseamento da produção, e possível extinção. Além da
dificuldade de encontrar a espécie de bambuzinho, a cambaúba, a principal representante do ofício
faleceu no ano de 2012. Relacionado diretamente com a memória afetiva coletiva local, o ofício é
rememorativo uma vez que remete a tempos idos, resguardando ainda conhecimentos populares
acerca da produção da palha, como o processo de trançar, moldar, costurar. Remete a civilizações
passadas, com significâncias que remetem ao valor cultural, social, político, individual, sendo ainda
forma de comunicação (poder, sedução, intimidação), além da parte funcional (proteção de batalhas,
mau tempo, sol, chuvas, etc) e simbólica (resguarda a parte mais importante do corpo, a cabeça, o
pensamento, resguardando-o de forças hostis, ou reafirmando-o ao deixa-lo em destaque). Na região
citada, outro saber pode também ser citado, esse que interfere significativamente na paisagem local:
as caieiras e olarias. Espaços erguidos em tijolos cerâmicos maciços, com sistema de aquecimento
de remete ao conhecimento egípcio, passam por processo de abandono e ausência de proposições
de novos usos. Além de documentar, como propiciar a perpetuação de tais saberes?

Palavras-chave: Patrimônio Imaterial; Ofícios; Chapéu de palha; Olaria; Caieiras.

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INTRODUÇÃO

Pode-se afirmar que patrimônio cultural é tudo que referencia o lugar onde vivemos, e este
propicia às gerações futuras conhecer seu passado, tradições, histórias, costumes, cultura.
Referencial de identidade, o poder de posse de narrar a própria história é essencial para a
associação e reconhecimento do lugar, que concedem ferramentas contra o esquecimento,
além de possibilitar, por meio da memória coletiva, coesão do grupo e sentimento de
pertença.

A imagem que as pessoas têm de si mesmas, sua auto-imagem, se baseia


em um sentido de própria competência e influi na imagem que tem de seu
meio ambiente, de sua interação com ele e de sua avaliação. Tudo isto se
refere à implicação no meio, ao papel das imagens na interação homem-
meio, às atividades e à conduta, e à função simbólica de meio físico ao
estabelecer a identidade de grupo e a percepção e cognição ambientais do
meio urbano. (Rapoport, 1978, p. 326).

A memória coletiva é responsável pela construção da consciência das características de


determinada comunidade, daquilo que as diferencia e as iguala, com reconhecimento da
identidade do grupo e fortalecimento do sentimento de permanência e continuidade. (Lévi-
Strauss, 1977). Dentre as várias categorias de patrimônio, o imaterial abarca ‘práticas,
representações, expressões, conhecimentos e técnicas’ que são reconhecidas, por
comunidades, grupos ou mesmo indivíduos, como parte de seu patrimônio cultural.
Repassado de geração a geração, é constantemente recriado reforçando o sentimento de
identidade e continuidade, promovendo, de alguma forma, sua proteção. (CONEP, 2016,
p.39).

O presente artigo enfoca saberes tradicionais do território mineiro - o saber fazer o chapéu
de palha, tijolos e telhas cerâmicas, e cal – que correm risco de extinção frente
principalmente às mudanças tecnológicas, com possibilidade da alteração da paisagem
cultural existente. Esforços foram feitos para registro, proteção e preservação, mas como
transmitir e salvaguardar tal legado?

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OS SABERES TRADICIONAIS: HISTÓRIA E DESAPARECIMENTO

O chapéu de palha: Maria Rita de Lima

Desde a Era Neolítica cobrir a cabeça era costume, primitivamente em palha, servia para se
proteger do sol - apesar de tal material não perdurar, as provas do uso podem ser
verificadas em pinturas e demais representações. Há fontes que citam o surgimento do
chapéu - do latim, ‘cappa’/’capucho’, cobrir a cabeça – por volta de 4.000 a.C. no antigo
Egito, Babilônia e Grécia, como “faixas que prendiam e protegiam o cabelo”. Turbantes,
tiaras e coroas, símbolos de status social, foram usados por nobres, sacerdotes e guerreiros
– nos dias atuais algumas atividades ainda expressam o status por meio do chapéu, como
soldados, marinheiros e clero. (Martini, 201-). No caso do clero, a mitra, tiara, gorro, quepe e
o camauro são formas de cobertura, significando a ideia de Deus sobre a cabeça do
homem. (HISTÓRIA DO CHAPÉU, sd). Ainda referente ao status, escravos romanos eram
proibidos de usar o acessório e, quando libertos, chapéu cônico. Já na Idade Média, a
religião impunha às mulheres que cobrissem os cabelos, tornando o acessório obrigatório.
(Martini, 201-).

[...] O primeiro documento que certifica a existência de uma União de


Artesãos Chapeleiros data de 1280, em Veneza, mas foi somente no
período pós-cidades-livres, entre 1400 e 1500, que se desenvolveram as
associações independentes. [...]
A chapelaria era um patrimônio precioso passado de geração em
geração de pais a filhos com suas logomarcas e insígnias. Nos anos
1700 os chapeleiros eram cercados de uma aura de respeito. Possuíam
conhecimento prático que encontrava expressão nos artesanatos
constantemente aperfeiçoados, obras de engenhosidade e habilidade
manual.
[...]
A segunda metade dos anos 1800 foi caracterizada por uma progressiva
industrialização e entusiasta defesa do profissionalismo de chapeleiros,
ameaçados pela automação. (HISTÓRIA DO CHAPÉU, sd). [grifo nosso]

Todas as áreas delicadas do corpo deveriam ser protegidas e, por mais que o chapéu
tivesse inicialmente a função prática de proteção – proteger de batalhas, maus tempos, frio,
calor, etc -, possuíam a função simbólica de preservar ‘a parte mais nobre do homem, a
cabeça, o pensamento’. A cabeça, no contexto simbólico, é abrigo da alma e da vida,
possuidora de qualidades mágicas e o gesto de cobri-la pode expressar a necessidade de
protegê-la das ‘forças hostis’, ou mesmo enfatizá-la, dar visibilidade (talvez atrair a atenção
divina). (HISTÓRIA DO CHAPÉU, sd).

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Durante o século XVII a peruca transforma o chapéu em acessório para cumprimentos,
perdendo muito de seu uso costumeiro, até o ápice da forma cilíndrica das cartolas no
século XIX, e da conotação política recebida no século XX – socialistas usavam chapéu
arredondados com pequena aba.

Em abril de 1907 foi inaugurado o couraçado Roma, e na ocasião


apareceram os chapéus de verão. Os chapéus de palha se tornaram glória
da Itália desde a época em que a indústria de palha cresceu em Toscana no
final dos anos 1700. Eram também chamados Maggiostrina porque era no
mês de maio que as pessoas começavam a usá-los e depois, removidos
com a temperatura amena de outono, época da colheita.
Entretanto, este chapéu firme, oval e de base espessa alcançou sua
consagração artística nas pinturas impressionistas francesas. Manet e
Renoir representaram as imagens dos cavalheiros do início do século sobre
os barcos nos rios e em passeios usando o que chamavam de Canotier.
(HISTÓRIA DO CHAPÉU, sd). [grifo nosso]

Amplamente conhecido, vale ressaltar o chapéu Panamá, de 1906, feito de palhas finas de
folhas secas de palmeira da espécie Ludovica que cresce na América Central.

Parte de um código corporal, capaz de enviar mensagens de poder, sedução, intimidação,


está presente em todas as civilizações, símbolo de valor cultural e social, podendo
representar até mesmo uma visão de mundo. Especificamente em Araújos, o chapéu é
confeccionado desde tempos imemoráveis, parte do sustento de inúmeras famílias – sabe-
se que o sustento era tirado inteiramente do ofício.

Passado de geração a geração, Maria Rita de Lima, falecida em 07/03/2012, era a principal
representante executora do ofício e, por mais que existam conhecedores herdeiras do
saber, os chapéus não são mais fabricados.

O saber anteriormente era dividido em cortar e preparar a cambaúba – espécie de


‘bambuzinho’ encontrado nos campos -, trançar, confeccionar e costurar o chapéu. Para a
extração da cambaúba é indicado os meses de abril e maio, após o período de chuva,
estando esse mais macio. Todo material para confecção dos chapéus durante todo o ano
era retirado apenas em tal período.

Os bambuzinhos são raspados com a faca (raspa-se a casca externa),


deixa-se ao sol para clarear e alvejar (15 dias), e são retirados os nós, e o
material é cortado ao meio. A parte interna é raspada – segundo as
executoras, a parte interna, assim como a externa, deve ser retirada para
não cortar a mão -, restando um trecho mais grosso da matéria interna da
cambaúba. O material é colocado de molho em água por cerca de uma
hora, e posteriormente, com a faca, são retiradas tiras finas que serão
trançadas. A trança das tiras geram as fitas, sendo que cada fita é
composta por 7 pares de tiras - fita grossa ou fina será determina pela
espessura das tiras. As fitas são enroladas e guardadas envoltas em pano,
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para manter a palha ‘clarinha’, mantendo estoque de matéria prima para
confecção do chapéu durante todo o ano.
Antes da confecção do chapéu, as fitas passam pelo descaroçador, a fim de
deixar a espessura mais uniforme. Para cada chapéu são utilizadas “15
braças” (aproximadamente 15 metros) de fita. A fase da costura que molda
o chapéu: a linha deve ser grossa de algodão e um pouco antes do uso
recebe cera de abelha. A abertura do chapéu (tamanho da cabeça) é
medida por pedaço de madeira (não se sabe de onde veio tal medida) que,
girando, cria a parte curva: inicia-se com a dobra da ponta da fita, que deve
ficar para o exterior do chapéu, e a fita é costurada em movimento circular
(espiral) até adquirir o diâmetro da madeira – com esse processo, forma-se
a coroa, parte superior do chapéu. Após alcançar o diâmetro, a costura
mantém o diâmetro, formando o cone, corpo do chapéu e, após a altura
desejada (geralmente é usado um molde que permite que todos os chapéus
tenham mesmo tamanho de coroa, cone e aba), é confeccionada a aba.
Para a guarda os mesmos são empilhados e, por serem resistentes, não
amassam fácil. (Prefeitura Municipal de Araújos, 2016).

O ofício está relacionado diretamente com a memória afetiva local, rememorativo de tempos
passados, bem como da antiga forma de sustento. Apesar de ainda valorizado, a morte da
principal mantenedora desestimulou os demais executores, com contribuição ainda da
dificuldade de obtenção da matéria prima – não há mais farta oferta de cambaúba, e a
produção controlada não concedeu bons resultados -, dificuldade de venda – anteriormente
as encomendas, essas de variadas regiões do Brasil, eram feitas presencialmente, assim
como a entrega, não havendo qualquer tentativa de modernização de tal processo que se
mostra defasado.

Além dos fatores supracitados, a industrialização pode ser citada como uma das
responsáveis pelo desaparecimento do ofício. Desde a segunda metade do século XIX tal
fator é apresentado como ameaça, tendo ainda como figura importante as mudanças
observadas nos principais usuários do artefato, os ‘roceiros’ e os violeiros. No segundo
caso, um chapéu adaptado, em uma das versões, deu origem à viola: ao visitar o menino
Jesus, um camponês lançou mão de uma casca de jacarandá usada como chapéu, e de fios
do rabo de seu jumento, criando o instrumento. (Sombra; Lobo, 2015) Os primeiros
compositores e artistas do gênero caipira utilizavam-se do chapéu de palha, como Jararaca
e Ratinho, Tião Carreiro e Tonico e Tinoco. Já na década de 1980, a figura do roceiro foi
substituída pela do cawboy, surgindo também a figura de Almir Sater, encarnado
comumente pela dramaturgia como a “figura do violeiro”, este usuário de chapéu pantaneiro.
Talvez daí derive um desinteresse pelo artefato em palha, contribuindo para o
desparecimento de tal saber. Existiriam meios de incentivar a confecção e uso de tal
acessório?

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Chapéu de palha de cambaúba – Araújos/MG

Fonte: da autora, nov. 2016.

Tijolos e telhas: chaminés como referencial paisagístico

A produção de artigos de barro pode ser considerada tão antiga quanto a humanidade,
sendo a oficina oleira uma das indústrias mais antigas, possivelmente oriunda do Período
Neolítico, com vestígios da queima do barro/terra de 7.500 a.C. (SEBRAE, 201-; PORTAL
DA ARQUEOLOGIA IBÉRICA, 200-; EBA/UFMG, 2015; CHAGAS, 2009a).

Nas Américas, a técnica já era de conhecimento dos aborígenes, cabendo


aos colonos portugueses apenas estruturar e concentrar a mão de obra. A
modernização coube aos padres jesuítas que seriaram a produção e, para
tanto, introduziram novas ferramentas/maquinários. (Prefeitura Municipal de
Moema, 2016).

No território de Moema, especificamente, apesar da ausência de registros, é de


conhecimento a existência de uma fábrica de cerâmicas anterior à década de 1950, pois a
mesma doou tijolos para a construção da capela do distrito de Chapada, carregados em
mutirão de carros de boi.

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A fábrica cuja estrutura existe nos dias atuais, a “Cerâmicas Irmãos Amaral”, foi inaugurada
em 1973: “basicamente é feito um buraco, depois vários arcos, e o forno é erguido em cima
da citada estrutura. O piso possui crivos (buracos), e túneis ligam à chaminé.” (Prefeitura
Municipal de Moema, 2016.). O forno é composto por domo em tijolos cerâmicos maciços,
com partido arquitetônico em cruz, sendo cada uma das extremidades saídas das câmaras
de combustão. Tal sistema remete ao sistema da Grécia antiga.

Telhas cerâmicas francesas (planas) eram prensadas e impressas – recebiam o nome da


fábrica -, e posteriormente passavam pelo processo de “rebarbar” (tirar os excessos
deixados pela prensa). Tijolos passavam pelo mesmo processo, com confecção de tijolos de
6, 8 e 12 furos. Em tese, após a vedação do forno para queima, o fogo deveria subir pelos
crivos, e sair pelos túneis.

As peças prontas eram dispostas em prateleiras gradeadas, e secas em


temperatura ambiente por sete dias, para só então ser queimada. Três dias
antes da queima, embaixo do forno, eram colocadas 20 metros de lenha
grossa para queimar. As peças eram empilhadas dentro do forno, e a boca
era ‘barreada’ (fechada com barro), durando 10 horas o processo de queima
das telhas. [...] (Prefeitura Municipal de Moema, 2016).

No mês de abril de 2010 a produção parou devido à dificuldade de conseguir matéria prima
(terra e lenha), mão de obra inconstante, e tecnologia defasada (atualmente há sistemas
automatizados mais eficazes). Apesar da cessão da produção, a estrutura é mantida.
Entretanto há uma preocupação acerca do destino da mesma, uma vez que o proprietário,
Ivo Amaral de Souza, faleceu em abril de 2017. Além da importância para a conformação da
localidade, a antiga fábrica de cerâmicas é parte da ocupação do território, referenciais
ainda da paisagem – imponentes, são identificadores coletivos. Locados na zona rural do
município de Moema, quais ações poderiam levar à efetiva preservação da estrutura, já sem
uso?

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Antiga fábrica de cerâmicas – Moema/MG

Fonte: da autora, set. 2016.

Caieiras: estética e técnica construtiva

Também na zona rural de Moema, em Minas Gerais, a exploração de calcário e produção


de cal acompanha toda a história da localidade. A estrutura em enfoque foi erguida de
maneira manual-artesanal na década de 1970, em tijolos de terra e pedras das
proximidades.

O funcionamento do forno consistia em encher a fornalha com pedra


calcário pela abertura superior, com controle do fogo pelas aberturas
inferiores, e o processo demorava “3 dias e 3 noites” [...] Entre as pedras
criava-se uma espécie de ‘caverna’ para o fogo ter espaço para ‘trabalhar’.
Acredita-se que tal forno possuiu cobertura em terra na parte superior, para
que este ficasse restrito unicamente no interior do elemento. (Prefeitura
Municipal de Moema, 2014).

Os fornos, de planta circular com base mais larga que o topo, contavam com abertura
superior para saída de fumos. O forno era construído em desnível de terreno para possuir
duas aberturas: a inferior para permitir alimentar a fogueira, e a superior para entrada da
pedra. A pedra, após extração da pedreira, era limpa e partida com uso de martelos até
formarem blocos menores. (Cardoso, 2013).

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Primeiro colocavam-se as pedras de maior dimensão, para fazer a
“enforma”, que é a construção de uma abóbada de modo a permitir manter a
fogueira no seu interior. Depois desta abóbada feita com as pedras maiores,
acabava-se de encher o forno com as restantes pedras até à abertura
superior. Para o forno ficar mais estável, a pedra mais pequena era
depositada junto às paredes do forno. De modo a permitir alimentar o fogo,
mantinha-se uma passagem na “enforma” para a abertura inferior. A
abertura superior era tapada com barro amassado para conservar o calor no
interior do forno. O forno precisava de ser aquecido muito lentamente para
as pedras calcárias não rebentarem, ficando estas inicialmente com uma cor
negra (operação de “defumação da pedra”). Com o aumento gradual da
temperatura, as pedras calcárias passam a apresentar um tom vermelho
vivo (a pedra está em “calda”). Quando a pedra passa a ficar com um
aspeto mais amarelado, o fogo já pode ser aumentado porque a amálgama
de pedra recém-caldeada, já suporta temperaturas superiores. Quando o
fumo que saía pelos orifícios superiores passava da cor negra para o
branco, significava que a pedra estava cozida e o fogo não precisava mais
de ser alimentado. Normalmente a “fornada” demorava três dias e três
noites em que era necessária uma constante manutenção do fogo. O
arrefecimento do forno demorava cerca de um dia. (Cardoso, 2013).

Após o processo de queima as pedras de cal virgem eram hidratadas e vendidas


principalmente para as usinas açucareiras da região – a cal é usada para a clarificação do
açúcar. (Cardoso, 2011). Com métodos mais eficientes de produção da cal, a indústria foi
fechada no ano de 1994, com posterior venda em 2004. O proprietário faleceu em 2010 e
não há informações acerca do destino e uso da estrutura. Importante para a construção
econômica da região, as estruturas que abrigavam tal ofício são parte da ambiência local,
constituindo marcos estéticos, técnico-construtivos e paisagísticos. Tal qual as olarias, ainda
não há menção à ações que possam preservar a estrutura, sabendo-se que o ofício, ao
menos em Moema, encontra-se praticamente extinto.

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Antigo forno (caieira) – Moema/MG

Fonte: da autora, out. 2014.

CONCLUSÃO

Os saberes aqui enfocados, repassados de geração em geração, tiveram principalmente na


industrialização obstáculo que impedem de certa forma sua continuidade. No caso das
olarias e caieiras, as estruturas remanescentes relacionam-se com as técnicas construtivas
que contribuíram para a conformação e construção da localidade, mas só são completas
frente ao conhecimento dos mestres de ofícios. Os mestres, responsáveis pela perpetuação
da prática, deparam com a produção em larga escala das modernas indústrias, perdendo
espaço no mercado formal.

Inicialmente, medida urgente e acessível, deu-se a documentação dos saberes e estruturas


vinculadas como forma de identificar, conhecer, e registar. Quanto à valorização, o resgaste
dos detentores de tais conhecimentos e sua transmissão, apesar de existir nas intenções
das municipalidades, inexiste, até o momento, ações palpáveis que permitem tal feito. O
rápido processo de globalização ameaça de desparecimento tais saberes e estruturas,
apesar do processo inverso de reconhecimento da necessidade de preservação do

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patrimônio edificado, que, novamente, enfrenta o embate acerca dos possíveis usos e
aplicações de tais bens culturais.

Sabendo que tais processos, no caso em específico, em nada se aproximam da


sustentabilidade, seria indicado o incentivo a cursos de formações oficiais de tais saberes e
técnicas? Paradigmas imobilizadores para a preservação integral das estruturas que
atualmente resistem?

Há ainda a questão da ambiência: o contexto no qual está inserido molda o jeito de ser e
estar no mundo. A aprendizagem perpassa, então, a incorporação da cultura, ‘como domínio
de modos culturais de agir, pensar, de se relacionar com outros e consigo mesmo.’ É
sensato afirmar, portanto, que a educação patrimonial é importante ferramenta na
afirmação de identidades. (Cadernos do patrimônio cultural: educação patrimonial, 2015).
Ainda conforme Santos (1998), defrontar com um local estranho, que não ajudou a criar,
cuja história desconhece, suja memória lhe é estranha, tal lugar é sede de alienação.
Importantes para a paisagem cultural, as estruturas supracitadas são parte da memória
coletiva das localidades em que estão inseridas, que abarcam cultura, simbologias, valores
afetivos, e ideologias. A destruição de elementos com tal significância retira do sujeito
fatores que o identificam e o representam em determinado local, desvinculado o lugar do
sujeito e consequentemente tornando um lugar comum, sem interesse. A paisagem, além de
possuir elementos identificadores de um povo, caracteriza-se pela sobreposição de vários
momentos históricos, transformando em documento da própria historia da cidade e dos que
ali passaram.

Questiona-se por fim como preservar tais bens culturais aqui citados. Se, a priori, não existe
preservação do patrimônio cultural sem vinculá-lo à difusão, transmissão e apropriação,
devemos assumir que não temos maneiras concretas de propiciar tal proteção? E na
tentativa de manter as estruturas remanescentes, impor usos dispersos pela zona rural
culminaria com uma real e efetiva possibilidade de preservação e permanência?

Agradecimentos: À Maria Imaculada Amaral e família, especialmente ao Senhor Ivo


Amaral (in memorian); à família de Maria Rita de Lima; à Carolina Moreira e ao escritório
Mindêllo Arquitetos Associados; à Prefeitura Municipal de Araújos, e Prefeitura Municipal de
Moema.

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UM CANTO DA CIDADE: paisagem, memória e patrimonialização de
Garça Torta a Riacho Doce, Maceió-Alagoas.

CARVALHO, TUANNE M. (1); OLIVEIRA, ROSELINE S. (2)


1. Universidade Federal de Alagoas. Estudante de Arquitetura e Urbanismo.
tuannemdc@gmail.com

2. Universidade Federal de Alagoas. Profa. Doutora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo.


roselineoliveira@gmail.com

RESUMO

Desde a situação geográfica da cidade – uma faixa de terra entre o mar e a lagoa, até sua toponímia
que significa “o que tapou o alagadiço” - Maceió, capital de Alagoas, carrega em sua paisagem fortes
marcas que envolvem o espaço natural. Um dia, no seu começo, essa atmosfera foi repelida pelos
princípios higienistas. Mais tarde, justo o oposto, a orla marítima passou a ser apropriada pela
especulação imobiliária e pela Indústria do Turismo que fizeram dos traços geográficos uma marca
construída pelo Marketing. Nesse processo, alguns cantos, por um tempo, se mantiveram salvos das
interferências drásticas da urbanização, se construindo a partir de gestos lentos, que rendeu a
permanência de casas de farinha, de ruas desencaminhadas e despavimentadas - como os bairros
Garça Torta e Riacho Doce, a 10 km da capital no sentido de seu litoral Norte. Nas últimas décadas,
esses parênteses urbanos têm atraído um outro habitante, o que percorre o lugar em busca de um
ambiente distinto da “cidade grande” e de sua feição padronizada. Diante desse contexto, este artigo
consiste na apresentação de uma experiência lúdica como método para acessar a história do lugar,
visando o registro e a socialização de um conhecimento baseado na empiria e na oralidade de
famílias de moradores que por gerações participaram da construção daquela paisagem com suas
próprias naturezas. Tal experiência consistiu em uma contribuição para a historiografia de dois bairros
no limiar de drásticas mudanças em suas feições físicas e, por extensão, em suas relações
cotidianas. Além disso, os produtos da pesquisa constituem-se, especialmente, um resultado de
exercício de outros mecanismos de identificação de um rico conteúdo silencioso e invisível,
funcionando como uma ferramenta incitante de relações de pertencimento entre os habitantes e o
próprio lugar que ele habita, na medida em que favorece o compartilhamento de histórias e
memórias, com potencial de uso enquanto instrumento de patrimonialização.

Palavras-chave: patrimônio paisagístico, memória, experiência lúdica, patrimonialização.

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Um Canto da Cidade
A cidade de Maceió, Alagoas, 178 anos após sua elevação como cidade e capital,
apresenta cerca de um milhão de habitantes que ocupam oito regiões administrativas,
cinquenta bairros, centenas de avenidas, ruas, travessas, praças, mirantes, becos e muitos
outros incontáveis cantos. Nos últimos anos, sua expansão urbana tem sido balizada por
investimentos com interesses em áreas marcadas por recursos naturais.

Dentro deste contexto de expansão, situa-se o seu Litoral Norte. Região da Cidade
onde as áreas próximas ao mar ainda costumam apresentar hábitos tradicionais voltados
para a subsistência, além de conter fragmentos de paisagens não urbanizadas, como as
praias margeadas por coqueiros, fozes de rios e riachos e manguezais. É comumente
conhecido como uma área distanciada do centro urbano, provida de praias de águas claras
e mornas nas marés baixas, pelas práticas pesqueiras e artesanais exercidas nos povoados
situados entre as extensas faixas de coqueirais à beira-mar e as grandes glebas de árvores
frutíferas às margens da Rodovia AL 101 Norte.

Contudo, essas relações de distância e não pertencimento à Maceió vem mudando


bastante nos últimos anos. A região já vem apresentando muitos equipamentos de
recreação e turismo, como clubes desportivos e associações, hotéis e pousadas,
restaurantes às margens da rodovia e bares à beira-mar, assim como, alguns condomínios
de veraneio. É bastante perceptível uma acelerada inserção de novos padrões construtivos,
como condomínios residenciais de habitações unifamiliares e multifamiliares de grande
porte.

Além dos interesses contemporâneos pela moradia em ambientes paradisíacos,


como bem vem sendo divulgado pelo marketing imobiliário, o direcionamento da expansão
urbana para essa região também foi provocado por um antigo projeto urbano de duplicação
da Rodovia AL 101 Norte o que renderia benefícios à cidade em termos de escoamento do
trânsito. De fato, se pensarmos que a maioria dos núcleos urbanos dos referidos bairros
estão dispostos às margens da rodovia é inevitável que qualquer intervenção aplicada a ela
irá alterar as características físicas e dinâmicas cotidianas de suas imediações.

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Figura 01 - Primeiras torres de edifícios multifamiliares construídas no litoral Norte de Maceió. Fonte:
fotonoar.com.br (modificado pelas autoras), 2017.

A autonomia dos municípios praianos do Nordeste com palmeiras,


colônias de pescadores e a epopeia cabocla dos jangadeiros, encontra-
se ameaçada pela marcha implacável das falanges de cimento e ferro,
dos edifícios, sob o comando do lucro. A nada respeitam, tradição
pitoresca, beleza natural, comunidades primitivas locais, folclore, cozinha
regional, cânticos, mãos rústicas, remendando redes ao sol, - a tudo
derrubam para porem de pé seus monótonos edifícios. (RAMALHETE,
1981 apud KRELL, 2008, p.7)

A cidade muda. Dentre as mudanças mais visíveis está a expansão. Muitas delas
são lentas e associadas ao próprio movimento dos habitantes de um lugar. Outras
acontecem de forma bastante bruta e, na maioria das vezes, é resultado de iniciativas
externas à dinâmica local. No cerne dessa última situação encontra-se a especulação
imobiliária, que, aliada a uma aparente ausência de orientação ou fiscalização pública
acerca das questões paisagísticas, se impõe no espaço tendendo a atuar isoladamente e,
assim, desconsiderar formas de viver que o caracteriza. Nesse processo, o lugar consiste no
meio de interação e propagação das atividades humanas, o qual se modifica pelas ações
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humanas e, em outros momentos, é o próprio homem que se adapta a este, continuando
relações estreitas entre ambos. Sendo objetos de um complexo sistema, o lugar acaba por
refletir a cultura e fazendo parte de suas criações.

Nessa perspectiva, a ideia desse artigo é a de indagar sobre como podemos


conhecer um lugar e, como isso, considerá-lo com mais profundidade, como salvaguardar
seus interesses e mesmo através de modificações decorrentes, respeitar uma determinada
forma de viver marcada por gestos lentos, construídos ao passo da dinâmica da
convivência. Esse artigo é fruto de uma colaboração para a compreensão do percurso
histórico dos bairros de Garça Torta e Riacho Doce, por meio do embarque nas memórias
de seus habitantes. É também um exercício de aprendizagem sobre patrimonialização, bem
como a historiadora brasileira, Sandra Pesavento, sintetizou nestas palavras:

A patrimonialização do passado da cidade implicaria em assumir a


cidade como propriedade cultural partilhada, o que demanda uma
aprendizagem. Reconhecer uma história comum inscrita no espaço da
cidade, entender como sua uma memória social, saber ver no traçado
das ruas e nos prédios e praças lugares, dotados de sentido, endossar
um pertencimento, reconhecendo territórios e temporalidades urbanas, é
tarefa que deve ser assumida pelas instâncias pelas quais se socializa
uma atitude desejada, indo da mídia ao ensino, do governo à iniciativa
privada. Isto implicaria em criar responsabilidades, em educar o olhar e
as sensibilidades para saber ver e reconhecer a cidade como um
patrimônio herdado. (PESAVENTO, 2005, p. 16)

Para avançar no entendimento dessas questões, algumas referências foram


tomadas, a exemplo do trabalho de Irene Klokkari, Memories of Famagusta: Recapturing the
Image of the City through the Memories of Refugees. Klokkari, que buscou recriar a imagem
de uma avenida majoritariamente destruída após a invasão de tropas turcas à cidade de
Famagusta na ilha de Chipre, por meio das memórias dos seus habitantes, hoje refugiados.
Esse estudo não reproduziu o passado daquele lugar, mas criou experiências a partir das
memórias dos habitantes de acordo com processo apresentado por Walter Benjamin (1932).
Crítico e pensador alemão, Walter Benjamin, traz em seu livro Selected Writing a passagem
Excavation and Memory, na qual ele explica o processo de “escavação da memória”. Para
ele, a memória não seria apenas um instrumento a ser utilizado para acessarmos o

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passado, mas um meio no qual deveríamos construir experimentações.

Ao fazer analogia com um escavador em busca de tesouros, Benjamin (1932)


descreve que não se deve temer a fadiga de ir e voltar exaustivas vezes ao mesmo assunto
enquanto se tenta construir uma comunicação entre as diferentes memórias. Pois, muitas
vezes as lembranças por elas mesmas são apenas fragmentos de momentos, mas se
analisarmos minuciosamente seus conteúdos buscando aproximar as suas similaridades
podemos alcançar uma legibilidade. Ainda de acordo com o processo de “escavação”, para
se obter memórias autênticas deve ser menos importante que o investigador faça um relato
sobre elas, do que aquilo que ele consegue identificar ao encontrá-las.

O contato com a literatura acerca da memória indicou não apenas modos de acessá-
las, mas também de aproximar de discursos sobre Narrativas. Na obra O Narrador, Walter
Benjamin (1994, p. 201) apresenta o papel das narrativas como uma forma de transmitir
experiências, seja a sua própria ou a relatada por outros.

Outra referência que se mostrou pertinente no estudo sobre a memória de Garça


Torta e de Riacho Doce foi o texto de Neiva Vieira da Cunha (2013) intitulado “Memória,
narrativas e identidades sociais: histórias de moradores de favelas da Grande Tijuca, no Rio
de Janeiro”, o qual reitera o discurso do papel das narrativas para divulgação de
experiências advindas de processos de construção da memória coletiva. Também inspirada
pelo discurso de Benjamin, Cunha afirma que, ao compartilharem as memórias coletivas, os
moradores da área em estudo começaram a elaborar narrativas e reconstituir trajetórias
através de um acervo de lembranças comum a todos. Nesse pensamento, a narrativa figura-
se como um dos produtos do processo coletivo de recordação.

No campo das narrativas foram reconhecidas duas maneiras por meio das quais as
experiências poderiam ser transmitidas: da palavra (oral ou escrita) e da imagem. De acordo
com o quadrinista Norte Americano Will Eisner, “uma ‘imagem’ é a memória de um objeto ou
experiência gravada pelo narrador fazendo uso de um meio mecânico (fotografia) ou manual
(desenho)”. (1996, p. 19) Sua referência é fortemente ligada às histórias em quadrinhos, que
normalmente utilizam o recurso da representação gráfica para facilitar o entendimento da
narrativa.

Esses discursos foram tomados como ferramentas auxiliares no processo de


construção da forma de abordar a memória do lugar, qual seja, a realização de experiências
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e construção de narrativas. No campo da memória, inspirando-se principalmente nas
indicações de Walter Benjamin (1932), encontrou-se um sentido no processo, na beleza de
conhecer o passado através das lembranças de outrem através de inúmeras imersões
individuais e coletivas.

Percebeu-se, por exemplo, que embarcar na memória de lugar através da oralidade


de seus habitantes requer revestir os ouvidos de delicadeza e carinho para escutar um
passado que está a cada dia mais mudo: os registros das memórias de algumas vozes que
viveram em tempos de outrora em um lugar que hoje é um presente em acelerada mudança.
Através do perguntar, do escutar, do ver, do sentir, perceber, rememorar, imaginar, foi
possível mapear a dinâmica dos bairros e, por extensão, de sua própria espacialidade. Os
depoentes não apenas falaram de suas experiências, mas expuseram registros dessas
memórias, a exemplo de prosas, textos, cartas, livros e retratos do passado.

Para além do acesso ao passado, os referenciais de Benjamin (1994) e Cunha


(2013) também deram pistas de como transformar essas narrativas em outras narrativas na
perspectiva de sua transmissão e divulgação, pois,

Mas para que a experiência vivida possa se elaborar como conhecimento


por meio do discurso narrativo, esse saber precisa encontrar quem
queira ouvi-lo. Desse modo, a arte da narrativa está, em sua origem,
profundamente vinculada ao dom de ouvir. O narrador é aquele que
conta histórias, e contar histórias implica a existência de uma
comunidade de ouvintes que queira ouvi-las, para depois, mais uma vez
reconta-las. Demanda uma audiência que possa esquecer-se de si
mesma, enquanto guarda profundamente o sentido daquilo que é
contado, outra maneira de dizer que a narrativa enquanto forma de
elaboração da experiência vivida sempre aponta para uma relação
dialógica, sendo esse um de seus traços distintos. Tal elaboração
consiste fundamentalmente em refazer, para si e para outrem, o caminho
percorrido em uma determinada existência. (CUNHA, 2013, p. 181)

Então, acessar o passado, a memória de um lugar, é também uma ação para o futuro,
especialmente no contexto da contemporaneidade em que impera o indivíduo enquanto
consumidor de coisas e paisagens sem o interesse em realmente percebê-las:

Se o sono é o ponto mais alto da distensão física, o tédio é o ponto mais

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alto da distensão psíquica. O tédio é o pássaro de sonho que choca os
ovos da experiência. O menor sussurro nas folhagens o assusta. Seus
ninhos - as atividades intimamente associadas ao tédio - já se
extinguiram na cidade e estão em vias de extinção no campo. Com isso,
desaparece o dom de ouvir, e desaparece a comunidade dos ouvintes.
Contar histórias sempre foi a arte de contá-las de novo, e ela se perde
quando as histórias não são mais conservadas. Ela se perde porque
ninguém mais fia ou tece enquanto ouve a história. (BENJAMIN, 1994, p.
204)

Benjamin (1994) fala sobre a falta de tédio e em como estamos perdendo o dom de ouvir
nas grandes cidades, no nosso estilo de vida repleto de entretenimentos. Então, para
acessar é preciso observar, silenciar e ouvir.

Nesse sentido, nos depararmos com o desafio de acessar o passado através da


história oral, e nos colocar na posição de ouvinte e atentar para o fato de que muito mais
importante do que achar um forma ideal para narrar a memória é encontrar quem a queira
escutar, ou seja, encontrar os ouvintes. Nesse sentido, este estudo é corresponde à
narrativas e a um objeto através do qual elas podem ser acessadas.

O objeto foi composto por depoimentos, sínteses gráficas e escritas das impressões
das experiências e de material audiovisual coletado durante imersões nos bairros, o qual
trata de registros da paisagem natural e edificada e também dos movimentos dos
habitantes, bem como das próprias entrevistas. Foram considerados neste estudo seis
depoentes que nasceram entre os anos de 1920 a 1945 e dez entre os anos de 1955 a
1975. As entrevistas com os habitantes do primeiro grupo, nascidos entre 1920 a 1940,
foram feitas de forma livre e não cronometradas, apenas foi perguntado sobre as memórias
mais antigas e marcantes que eles têm do lugar e deixou-se que os assuntos fluírem. Quase
todas as conversas foram feitas em coletivo, grupos de três ou duas pessoas dialogando
sobre as lembranças do passado. Todas as conversas foram registradas através de áudio
ou vídeo.

Para o grupo dos habitantes nascidos entre 1955 a 1975 algumas entrevistas e
conversas aconteceram a partir da mostra de uma representação da base cartográfica dos
dois bairros para que eles pudessem apontar ou representar graficamente as suas
memórias espacialmente. Nesse segundo grupo, dentre os 10 entrevistados só três
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utilizaram a referência da base cartográfica, alguns preferiram registrar suas lembranças às
margens do mapa ou nele discretamente interferir como setas e marcas, outras, com maior
entusiasmo, preferiram voluntariamente desenhar e anotar suas memórias com mais
detalhes. O registro dessas memórias mostrou o quanto os bairros foram modificados ao
longo dos anos. Pois, muitos dos aspectos ambientais e sociais descritos nos seus relatos,
hoje só existem por meio das lembranças compartilhadas.

Dentre as surpresas da investigação, foram encontrados alguns versos recheados de


descrições acerca da vida cotidiana dos bairros no início dos anos de 1900, registrado em
diários de antigos moradores. O livro, escrito por um antigo morador, Carlos Galdino,
intitulado “As Memórias de Dom Galdino” (1985), também é bastante rico em detalhes nas
suas descrições sobre a sua infância no bairro de Riacho Doce, assim como, a vasta
literatura disponível sobre a exploração de petróleo que aconteceu nos dois bairros nos
primeiros anos do século XX. Foram encontradas também informações sobre cartas entre
um engenheiro alemão que morou no bairro de Riacho Doce na década de 1930 com o
escritor Monteiro Lobato. (CHIARADIA, 2008)

Como dar forma com esse emaranhado de dados? Como torná-los audíveis? Como
num movimento de bordado, foram feitas, para tanto, ponto a ponto, costuras entre as
conversas, entre as memórias, entre os desenhos, os retratos e os textos, relacionando
similaridades e destacando peculiaridades, fatos curiosos e descrições recorrentes. Assim,
esses bordados englobam os lugares - os que persistiram no tempo e aqueles que já não
são mais mencionados -, as pessoas e seus costumes, os cânticos, as brincadeiras, as
danças, os festejos, as tradições: experiências para compartilhar e divulgar as memórias de
habitantes dos bairros de Garça Torta e Riacho Doce.

Nessa dinâmica, o primeiro desafio enfrentado para elaborar o produto socializador


dessas memórias foi o de organizar grande quantidade de informações, as quais foram
sistematizados por tema de maneira a não engessar seus conteúdos. Dentre os variados
temas suscitados, cinco foram selecionados como principais: a religiosidade, os fazeres, os
lugares, as pessoas e os festejos, podendo as informações dos depoimentos permear um
ou mais de um dos temas citados. Dentre eles foram selecionados trinta e cinco conteúdos
considerando a recorrência nos depoimentos, relevância histórica da informação e pela ideia
de ter trechos de memórias da maioria dos depoentes. As cores utilizadas em cada um dos

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pontos correspondem à temática que o mesmo foi disposto.

Na base do jogo e com o auxílio das linhas-temas coloridas, os conteúdos foram


entrelaçando as memórias narradas pelos habitantes com os retratos, desenhos e os
demais documentos acessados no Embarque. Assim, foram construídas as Cartas das
Memórias, que são a junção de trechos de lembranças, de diversos moradores e ex-
moradores dos bairros de Garça Torta e Riacho Doce, com retratos ou desenhos. Cada
carta corresponde a um dos pontos citados anteriormente, algumas delas têm mais de um
trecho de memória e narradores plurais. O recorte temporal das histórias relembradas pelos
habitantes varia entre a década de 1920 e a década de 1990. As memórias são
acompanhadas dos nomes de seus narradores, a idade dos mesmo e o ano em que foi feito
o registro.

Paralelamente a criação dos Pontos e das Cartas da Memória, as lembranças dos


habitantes foram sendo cartografadas e, tomando um plano bidimensional como base,
ícones e traços representam elementos e características descritos nos registros e
depoimentos. Para a construção da síntese gráfica alguns aspectos foram bastante
inspiradores como, por exemplo, o quanto os lugares são os seus habitantes e o quanto os
habitantes são o lugar, como indica o depoimento abaixo:

“Na Pitombeira era o pessoal do César. Joca, tio Dé. Joca, era tudo dele.
Depois era da Maria César. Depois vinha o seu Zunga, era depois da
minha mãe. Da minha mãe até o tio Dé, entrada da balança por ali, era
do meu pessoal, dos irmãos da minha avó. Tio Joca, tio Dé.” - João
Batista Barbosa, aos 89 anos, 2016.

As descrições sobre os habitantes dos bairros foram seguidas por descrições sobre suas
moradias, entre as casas de taipa e palha, os chalés e os casarões. Os detalhes descritos e
os desenhos acessados ajudaram a compor não só na localização das informações na
síntese gráfica, mas também na criação dos ícones e dos traços para representá-los.

“As casas eram bem simples: Taipa, palha e uma ou outra de tijolo. Rua
São Pedro era de barro, mas não havia esgoto a céu aberto, as pessoas
cuidavam da frente de suas casas e dava prazer passear e/ou brincar na
rua. Época de grande satisfação. As crianças brincavam naquela rua de
minha infância com tranquilidade (esconde-esconde, queimado, pega,
etc). […] A comunidade de Garça Torta já contava com a Igreja São
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Pedro, onde participavam das missas, dos terços, das novenas e da
organização da procissão. ” Verônica da Silva Barbosa Pereira, aos 54
anos, 2016.

A tarefa seguinte foi associar os Ponto a Ponto e as Cartas da Memória à síntese


gráfica, no mapeamento das memórias. Enumerados de 01 a 35, os conteúdos foram
distribuídos de forma aleatória, pois para a experiência proposta nos Bordados, mais
importante do que seguir uma sequência lógica para acesso dos conteúdos, e fazer uma
busca atenta por cada um deles nos Tecidos de memórias.

Figura 02 - Colagem de fotografias das sínteses escritas e gráficas construídas para a socialização
dos conteúdos acessados por meio das memórias dos habitantes dos bairros de Garça Torta e
Riacho Doce. Fonte: Acervo autoral, 2017.

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Com o Ponto a Ponto selecionado e as Cartas e os Tecidos de memórias
construídos, restava apenas uma coisa para compor os Bordados: as Linhas - a construção
de um caminho para acessar e compartilhar memórias, uma experiência para narrar e ouvir
histórias. Assim, nos Bordados, as Linhas são os narradores e os ouvintes, ao mesmo
tempo. As Linhas são aqueles que se permitem experimentar Ponto a Ponto o Tecido das
memórias e fazer assim Bordados coletivos de histórias entre dois riachos. Os Bordados são
experiências e as Linhas são os experimentadores.

Esse protótipo, enquanto meio de patrimonialização, foi posto em teste na varanda


de uma das casas de Garça Torta, onde moradores adolescentes puderam experimentar e
conhecer as histórias dos bairros.

Figura 03 - Colagem de fotografias da primeira experiência dos Bordados. Fonte: Acervo autoral,
2017.

Essa experiência permitiu-nos perceber que uma mesma lembrança vai ter sempre
uma duração e sons variados: o ritmo e o tom do Narrador. Algumas memórias vão soar
altas, claras, ecoar. Outras vão soar baixinho, tímidas. Nessa primeira experiência, em
nenhum momento foi mencionado algo sobre competição, mas quem estava mais cartas era
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o “ganhador”, quem estava com menos “estava ficando para trás”. O interessante é que o
fato de ter em mãos uma quantidade inferior de Cartas do que os demais participantes criou
um ar de competitividade. Ao mesmo tempo em que durante toda a experiência eles
ajudaram-se muito: a encontrar os Pontos, a pregar o alfinete, a passar a linha, a pronunciar
corretamente as palavras desconhecidas, entre outros.

Alguns participantes também acrescentaram informações à experiência, compartilhando


com os outros participantes o que os pais ou demais familiares já haviam contado para eles
sobre os dois bairros. Surgiram algumas curiosidades também. - “Na época deles será que
existia negócio, existia cuscuz?” Perguntou Guilherme. - “Ah, tinha não.”- Respondeu
Marcos, nesse diálogo entre os dois.

Ademais, chegou um momento em que os participantes começaram a torcer pela


Carta que queriam narrar, pelo Ponto que queriam ir. O fato de folhear todas as Cartas
enquanto procuravam a que correspondesse ao Ponto determinado pelo dado, fez com que
alguns títulos chamassem a atenção e os participantes passaram a decorar o número e a
localização do Ponto no Tecido. - “Quero ler o Cinema São Vicente!”- Disse Júlia, cruzando
os dedos para que ninguém tirasse um número no dado para alcançar o Ponto primeiro.

Após 1h e 40 minutos de muitas cartas apresentadas e memórias narradas, o


Bordados Nº 01 foi criado, se mostrando um mecanismo eficiente e interessante para
divulgar as histórias escutadas e registradas dos dois bairros. O processo de criação dos
Bordados passou por muitas reformulações e teve muitos incentivos e inspirações que
surgiram ao longo do caminho. A ideia dos participantes construírem as próprias narrativas
abre a possibilidade, por exemplo, de ampliar a construção desse produto para outras
perspectivas, outras mãos, outras palavras...

Neiva Cunha diz que “a narrativa enquanto forma de elaboração da experiência


vivida sempre aponta para uma relação dialógica” (2013) e que “consiste fundamentalmente
em refazer, para si e para outrem, o caminho percorrido em uma determinada existência.”
(2013). Assim, a ideia de promover uma experiência, ainda que dentro de algumas
limitações, dá margem para compreender a relação dialógica citada por Cunha (2013). A
ideia dos Bordados Nº 01 apresentou-se como uma experiência valiosa de meio de
patrimonialização não apenas por registrar as memórias e histórias de habitantes que fazem
de um bairro ser um lugar, mas de provocar a vivacidade de memórias que estavam

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adormecidas através da troca lúdica de lembranças.

Figura 04 - Fotografia da construção de narrativas após a experiência Bordados, na qual cada


participante foi convidado a registrar suas impressões acerca da dinâmica. Fonte: Acervo autoral,
2017.

Portanto, essa experiência em muito contribuiu para dissolver ideias binárias tais
como natural e edificado, velho e novo, material e imaterial, temas cuja conceituação vem
sendo um exercício constante das ações do Iphan, o qual tem se mostrado cada vez mais
atento ao desafio de como compatibilizar as inevitáveis mudanças da paisagem e preservar
a sua dinâmica particularizada, a exemplo das ações de educação patrimonial e das
inúmeras ações voltadas para o mapeamento das referências culturais.

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UM POUCO DE CADA

GEISSLER, HELENNE JUNGBLUT. (1); CAETANO, DIOMAR. (2);


SCHONROCK, MARLENE SIEGLE. (3)

1. UDESC - Universidade do Estado de Santa Catarina. Centro de Educação Superior do Alto Vale do
Itajaí - CEAVI. Departamento de Engenharia Sanitária. Rua Dr. Getúlio Vargas, 2822 - Bela Vista -
Ibirama - SC CEP: 89.140-000
E-mail : 1. helenne.geissler@udesc.br , 2. mara-ju@hotmail.com , 3. marlene666@gmail.com

RESUMO
Ibirama integra a região do Alto Vale do Itajaí no Estado de Santa Catarina. Localiza-se a uma
latitude 27º03'25" Sul e a uma longitude 49º31'04" Oeste e 150 metros acima do nível médio do mar.
Foi colonizada a partir do final do século XIX, mas também recebeu muito imigrantes durante o século
XX. O município preserva na arquitetura, na culinária, no artesanato, no idioma, esportes, música,
folclore, costumes, hábitos, dentre outros o legado dos imigrantes alemães, austríacos, italianos,
poloneses, dentre outros, através de seus descendentes. A antiga colônia Hammonia, que já foi
distrito de Blumenau possui uma áreas de 247,3 m² e possui cerca de dezoito mil habitantes. Situa-se
encravada em vales com declividade acentuada, sendo entrecortada por rios caudalosos com
corredeiras e razoável extensão de florestas nativas preservadas. Há diversas comunidades
abrangendo patrimônio cultural preservado (arquitetura enxaimel), habitantes fluentes nos idiomas de
seus ancestrais a exemplo de Sellin, Dalbergia, Rafael, Ribeirão das Pedras e outras. Neste contexto,
pratica-se caminhadas ao ar livre na floresta (wandern), ciclismo, tirolesa, rapel, raffting, dentre outros
esportes radicais. Permanecem ainda os clubes de caça e tiro amadores, clubes de bolão, corais,
grupos folclóricos adulto e infantil bandas musicais.Merecem ser valorizados os conhecimentos dos
habitantes e documentá-los, seja a memória, os saberes e suas diversas interfaces, o idioma e os
dialetos, as canções, as receitas, fabricação dos produtos caseiros, Kuchen (bolos), geléias,
conservas como Sauerkraut (chucrute), cervejarias artesanais, cultivo de uva e produção de suco e
de vinho, o artesanato, os lugares, métodos construtivos, conhecimentos de restauro de edificações
enxaimel, energias limpas como as rodas d´água, engenhos e moinhos, nas festas, nos pic-nics, os
bailes, cultivo de trutas e outros. A ideia é de que os saberes se propaguem e se perpetuem no
tempo e que sejam replicadas através das gerações e para os turistas. A proposta visa resgatar e
valorizar o legado cultural através da gastronomia, da arquitetura, valorizar o idioma, esportes,
música, folclore, costumes, hábitos, dentre outros aspectos. A metodologia inclui pesquisa
bibliográfica, trabalhos em campo, entrevistas e reuniões com as comunidades no meio urbano e no
rural, registros fotográficos das ações, registro do modo de fazer documentando os saberes
tradicionais dos habitantes. Espera-se gerar materiais de divulgação e publicações, promover oficinas
com crianças, adolescentes, adultos e idosos visando integrar as diversas gerações, promover a
educação patrimonial e gerar multiplicadores do patrimônio.

Palavras-chave: imigrantes, legado, patrimônio cultural

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IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Um pouco de cada

1. Introdução

O artigo constitui uma síntese de discussões e da proposta, cuja abordagem é multi e


interdisciplinar de profissionais e visa resgatar e valorizar a memória em suas esferas
afetiva, social e cultural, e das histórias de vida das pessoas, o patrimônio imaterial e
material. A equipe inclui integrantes docente Arquiteta e Urbanista e docente de língua
alemã, além de estudante de graduação em Engenharia Sanitária, que cursa
simultaneamente a graduação de Gastronomia. A equipe envolve diversas ações e busca
parcerias para viabilizar a proposta idealizada.

A proposta é compor diversos ações de extensão já em desenvolvimento; Paisagem Cultural


do Alto Vale e Curso de Alemão básico e avançado a outros aspectos indissociáveis, que
vem sendo incluídos. O programa é composto de três ações, cadastramento de patrimônio
cultural material (casas enxaimel, dentre outros), mapeamento de patrimônio natural
(cachoeiras) e ações educacionais em escolas púbicas, envolvendo a coordenadora Profa.
Helenne (Arquiteta), dois bolsistas e voluntária (estudantes de graduação. O curso de
alemão é ministrado voluntariamente pela Profa Marlene (graduada em Letras) e já ocorre
há oito anos, tendo iniciado em 2009. Oferta-se 50 vagas anuais no curso.

A ideia central é envolver as diversas facetas do Patrimônio Cultural Material e Imaterial


buscando fortalecer iniciativas na preservação do Patrimônio arquitetônico, na culinária, no
artesanato, no idioma, esportes, música, folclore, costumes, hábitos, dentre outros, que
constituem o legado dos imigrantes alemães, perpetuando-o através de seus descendentes.
Para tanto, utiliza como estratégias envolver a população de diversas faixas etárias,
crianças, jovens, adultos e idosos e interligar ações para fornecer mais visibilidade ao
Patrimônio, conscientizar os atores sociais acerca dos bens imateriais e materiais. Visa
resgatar e valorizar tais bens e despertar a população como replicadora dos processos.

2. Referencial Teórico

Para IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (2017) consiste em bens
culturais e referem-se a práticas e domínios da vida social, cuja manifestação abrange
saberes, ofícios e modos de fazer; celebrações; formas de expressão cênicas, plásticas,
musicais ou lúdicas; lugares (mercados, feiras e santuários onde ocorram práticas culturais
da coletividade). Os artigos 215 e 216 da Constituição Federal de 1988 ampliaram a noção
de patrimônio cultural ao reconhecerem bens culturais materiais e imateriais.
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2.1 Patrimônio Imaterial

Transmite-se o patrimônio imaterial de geração a geração e recria-se o mesmo recriado


através das comunidades e ambiente, de interação e da história. Gera-se e enfatiza-se o
sentimento de identidade e continuidade, possibilitando fomentar o respeito à diversidade
cultural e à criatividade humana, (IPHAN, 2017).

Ao mesmo tempo a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a


Cultura (UNESCO) conceitua patrimônio imaterial "as práticas, representações, expressões,
conhecimentos e técnicas – com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais que
lhes são associados - que as comunidades, os grupos e, em alguns casos os indivíduos,
reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural."

As ações do IPHAN neste contexto incluem meios para reconhecer, registrar e preservar
bens culturais Imateriais, inclusive a nível lingüístico e identidade de grupos.

2.2 Patrimônio Material

O IPHAN (2017) protege o conjunto de bens culturais conforme natureza, quatro Livros do
Tombo: arqueológico, paisagístico e etnográfico; histórico; belas artes; e artes aplicadas. Os
supracitados artigos 215 e 216 da Constituição Federal de 1988 expandiram a noção de
patrimônio cultural, reconhecendo bens culturais materiais e imateriais e contemplou outras
formas de preservação a exemplo do Registro e do Inventário, além do Tombamento, vide
Decreto-Lei nº. 25, de 30 de novembro de 1937, adequado para proteger de edificações,
paisagens e conjuntos históricos urbanos.

Os bens tombados materiais consistem em um leque de variedades de imóveis, cidades


históricas, sítios arqueológicos e paisagísticos e bens individuais; ou móveis, como coleções
a exemplo das arqueológicas, acervos museológicos, documentais, bibliográficos,
arquivísticos, videográficos, fotográficos e cinematográficos.

3. Método

A metodologia inclui pesquisa bibliográfica, cartográfica e em documentos, trabalhos em


campo, levantamentos de medição, levantamentos para fins registrais e inventariais,
entrevistas e reuniões com as comunidades no meio urbano e no rural, registros fotográficos
e através de videos das ações, registro das memórias e do modo de fazer documentando os
saberes tradicionais dos habitantes, sejam eles imigrantes ou descendentes.

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O curso de "Comunicando-se em alemão", que ocorre desde 2009 consiste em ensinar o
idioma alemão em nível básico e nível intermediário A2 - B1. Estes cursos tem sido
ministrado pela Profa. Marlene e coordenados pela Profa. Helenne, que busca unir diversas
ações para resgatar e valorizar a cultura dos imigrantes desde 2014.

O ponto de partida para o planejamento do ensino é o levantamento das necessidades dos


alunos, seguidos de definição de objetivos, seleção e organização dos conteúdos, seleção
de procedimentos metodológicos e processos de avaliação da aprendizagem e do ensino.

No nível Inicial ocorre a alfabetização na língua alemã, possibilitando em nível básico a ler,
ouvir, entender e melhorar a comunicação. Na fase intermediária do curso foca-se no ensino
comunicativo, e o material didático é dividido em lições que trabalham todas as habilidades:
HÖREN-SPRECHEN-LESEN-VERSTEHEN-SCHREIBEN,nos moldes dos formatos das
questões do exame mencionado acima. O papel do professor neste processo é ser
MEDIADOR, como enfatizou Vygostsky: ' sujeito é interativo, pois adquire conhecimentos
com base nas relaçoes INTER e INTRApessoais de troca com o meio, por intermédio de um
processo chamado mediação.' o professor é aquele que defende mais experiência, intervém
e media a relação do aluno com saberes socialmente construídos.

O curso atual é uma ampliação da proposta inicial, sendo dirigida a viagens ao exterior,
composto de sete unidades que revisam estruturas e vocabulário básico para programar
uma viagem ao exterior, fazer sugestões de roteiros, planos de viagem, pedir informações
sobre localização de pontos turísticos, hospedagem, ler horários de trens, folhetos de
agências de viagem, verificar conexões de trens. Visa fornecer condições para pedir e
entender informações sobre o tempo, turísticas, preenchimento de formulários em
aeroportos e hotéis, escrever SMS simples, conseguir expressar-se sobre estado de saúde,
em emergências, preferências e resumir viagem a colegas, cantar músicas.

O curso também visa preparar os alunos para a Prova de nível A1 e nível A2 do Goethe
Institut, Test DaF - Deutsch als Fremdsprache (Teste de alemão como língua estrangeira).

Os estudantes de toda comunidade e faixas etárias contribuem ativamente com saberes,

Há inúmeras práticas no sentido de registrar e documentar o patrimônio cultural, seja ele


imaterial e material. Este artigo utilizou a abordagem de CERAN - Cia. Energética Rio das
Antas (2017) realizou um trabalho muito interessante no Estado do Rio Grande do Sul. O
Programa de Salvamento do Patrimônio Histórico gerou a produção do documentário

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“Travessias: Memórias do Rio das Antas”, acervo fotográfico, documentação de entrevistas
temáticas que ocorreram nos municípios da área de influência do Complexo Ceran.

Os levantamentos envolvendo o Patrimônio Material incluem contato com proprietários de


edificações, convidando-os a participar das ações. Procede-se a triagem e seleção de casas
e demais obras, levantamento utilizando câmera fotográfica digital, levantamentos:
medições de edificações usando trena, registros em campo com esboços e croquis a mão
livre, reconstituição de rascunhos em papel usando prancheta e instrumentos de desenho e
reconstituição de esquemas de projeto arquitetônico no meio computacional usando licença
educacional do software AutoCAD da empresa Autodesk gerando modelagem 2D e 3D,
plantas baixas, fachadas, telhado e detalhamento). Há contribuição de população, que
contribui com memória oral e pode fornecer informações e detalhes de aspectos históricos.
A participação ativa dos moradores e principalmente dos idosos nas ações tem sido vital,
pois são eles que acrescentam suas experiências e histórias de vida às iniciativas.

Os levantamentos de Patrimônio Imaterial são compostos de pesquisa documental de


receitas e contatos com a população buscando detectar quem detem o conhecimento e/ou
registro das receitas que são originais. A participação ativa das pessoas no processo é
essencial para o desenvolvimento das atividades. Enfatiza-se principalmente a importância
da contribuição dos idosos que detem os conhecimentos e a memória oral mais remotos
acerca das tradições e raízes culturais. A aproximação do público é importante para
possibilitar o acesso a informações como costumes, hábitos, dentre outros. No que se refere
à gastronomia as famílias de imigrantes e de descendentes tem contribuido compartilhando
os seus saberes repassados por seus ancestrais, mostrando e emprestando cadernos de
receitas e livros de receitas, fazendo demonstração da preparação de pratos. Os estudos
gastrônomicos geram a reconstituição de receitas e inserção da prática culinária, das
memórias ou do material em meio analógico para o meio digital.

3.1 Área de estudos

Ibirama integra a região do Alto Vale do Itajaí no Estado de Santa Catarina. Localiza-se a
uma latitude 27º03'25" Sul e a uma longitude 49º31'04" Oeste e 150 metros acima do nível
médio do mar. Foi colonizada a partir do final do século XIX, mas também recebeu muito
imigrantes durante o século XX. A antiga colônia Hammonia, já foi distrito de Blumenau
possui uma áreas de 247,3 m² e possui cerca de dezoito mil habitantes. Situa-se encravada
em vales com declividade acentuada, sendo entrecortada por rios caudalosos com
corredeiras e razoável extensão de florestas nativas preservadas. Há diversas comunidades

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abrangendo patrimônio cultural preservado (arquitetura enxaimel), habitantes fluentes nos
idiomas de seus ancestrais no rio Sellin, Dalbergia, Rafael, Ribeirão das Pedras e outras.

Neste contexto, pratica-se wandern (caminhadas ao ar livre na floresta), ciclismo, tirolesa,


rapel, raffting, dentre outros esportes radicais. Permanecem ainda os clubes de caça e tiro
amadores, clubes de bolão, corais, grupos folclóricos adulto e infantil bandas musicais.

4. Resultados preliminares

Realizou-se inicialmente síntese bibliográfica que tratam da história de Ibirama,


principalmente a partir de livro do autor Harry Wiese (2007). Paralelamente, realizaram-se
desde 2014 entrevistas com moradores e o processo de cadastro de saberes, registro da
gastronomia local e reconstituição de receitas originais e elaboração de pratos da culinária
dos imigrantes. Já haviam sendo realizados os levantamentos de medição de patrimônio
arquitetônico e reconstituição esquemática dos projetos de edificações.

4.1 Paisagem

O verde era uma tônica. Havia o pasto sempre verde associado a casa e o jardim como
complemento com valor era o visual magnífico. Paisagem, florestas e pastagens verdes
Este foi o retrato do Vale do Itajaí no século XIX na visão do médico e escritor húngaro
Alexander Lanard imigrado para a região e que durante muitos anos redigiu o livro Die Kuh
auf dem Bast (A Vaca no Pasto), Alexander Lanard apud Wiese (2007).

Andreas Kinas (1997) concorda que a flora era muito exuberante. A região do Alto Vale do
Itajaí avicinava-se com as florestas, que tinham inclusive muito animais selvagens.

Wiese (2007) descreve que para os imigrantes europeus havia muito a aprender com os
silvos, cantos, pios, enfim a música da floresta. Ao mesmo tempo, verifica-se desde esta
época iniciativas para conhecer a dinâmica das águas, uso do solo, ventos,
acompanhamento das condições meteorológicas.

Oberacker (1985) apud Wiese (2007) citam que no entorno das casas, sobretudo, as alemãs
havia pomar com árvores frutíferas, horta caseira e belissimos jardins com flores. A floresta
virgem contrastava com as flores silvestres, cujas cores e perfumes eram fora do comum e,
também, pelas flores provenientes da Europa que britaram e floresceram de sementes
trazidas da Alemanha. Nas proximidades, seja na lateral ou fundos das residências haviam
estrebarias. Os imigrantes criavam gado. Aliás, esta atividade persiste até a atualidade e
alimenta o setor leiteiro, frigoríficos e curtumes, dentre outras.

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Percebe-se que houve diversas fases da tipologia habitacional dos imigrantes. Na chegada
eram recebidos no rancho dos imigrantes, que consistia em uma habitação coletiva. De fato,
era uma choupana edificada com materiais da floresta. Após árduas dificuldades os
imigrantes construiam casas mais confortáveis. Os estilos arquitetônicos variavam bastante.

Otto Wille (1994) reitera as descrições de Wiese (2007) mostrando que em 1905 havia
muitas dificuldades os imigrantes tiveram que aprender a construir, abater árvores e produzir
tábuas. Faziam a taipa com barro, palha que eram lançada em trama feita com folhas de
palmeiras, tranças de taquaras e cipós. A pintura disponível era a argila branca. Usava-se
assoalho em tábuas de madeira.

As casas dos imigrantes alemães utilizavam em geral o sistema construtivo enxaimel, mas
também alvenaria. No enxaimel as vedações podiam ser de alvenaria de tijolos sem o
reboco, ou alvenaria caiada, cobertura com tabuinhas, telhas ou chapas de zinco.

Oberacker (1985) apud Wiese (2007) por outro lado, as famílias de imigrantes cuja etnia era
italiana e suas casas possuiam características diferenciadas, em geral de madeira. Tinham
estufa de fumo e rancho para o gado. Em termos de uso o sótãos era utilizado para
dormitórios de filhos do sexo masculino, pois as famílias eram numerosas. Guardava-se
ainda objetos e móveis fora de uso.

Conforme Seyferth (2016) uma parte dos colonos assentados pela Hanseática vinha das
regiões coloniais mais antigas. Eram reimigrados de colônias mais antigas, seja do Rio
Grande do Sul. Piazza (1994, 1983) relata que também imigraram austríacos.

Wiese (2007) descreve que dentre os falantes do alemão vieram alemães, suiços, imigrados
para Ibirama vieram de regiões ao norte da Alemanha. Para Piazza (1994, 1969) os italianos
vieram do norte da Itália, em geral, das províncias do Trentino, Lombardia e Veneto. Vieram
também russos, tchecoslovacos e poloneses.

4.2 Gastronomia

De acordo com Wiese (2007) os imigrantes que chegaram a Hammonia no século XIX se
defrontaram com uma realidade diferente dos seus países de origem.

O primeiro impacto sentido em termos de gastronomia foi de que os pratos típicos não
podiam mais ser preparados como suas receitas originais. Isto se deve a diversas razões,
ou não havia disponibilidade de ingredientes, ou não tinham dinheiro para adquiri-los.

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A Kolonisations Verein von 1849, in Hamburg (Sociedade Colonizadora de 1849 de
Hamburgo) que promoveu no Estado de Santa Catarina a colonização da colônia Dona
Francisca (atual município de Joinville) e do vale do Itajaí (que anteriormente consistia em
Blumenau e diversos distritos e hoje abrange diversos municípios, dentre os quais Ibirama)
situada no norte da Alemanha, trouxe imigrantes das proximidades, de outras regiões da
Alemanha e até de outros países.

Couto, Heneault e Aguiar (2017) mostram que a gastronomia do norte da Alemanha abrange
muitos estados cuja economia há muito tempo é baseada na agropecuária e na pesca. a
costa do Mar do Norte e do Mar Báltico. O turismo é atividade relativamente recente e como
tal utiliza muito os peixes e frutos do mar no cardápio. Destacam-se pratos típicos do Norte,
como o Frinkenwender scholle (peixe da família do linguado marinado no sumo de limão e
frito) e a famosa Aalsuppe (sopa de enguia defumada).

O modo de preparação dos pratos depende da região de origem. A Aalsuppe pode ser
preparada com batatas em caldo de carne, cebolas em purê, cenoura e salsão em tiras e
filés de enguia defumada, servindo-se com folhas de manjerona na Ilha de Rügen. A mesma
sopa em Hamburgo inclui ameixas e damascos secos, vinho branco, bouquet garni,
aspargos, ervilhas e também toucinho.

Há outras receitas típicas da região como Birnen, bohnen und speck: do Estado de
Schleswig-Holstein (presunto defumado e temperado servido com ervilhas, peras com
batatas salteadas. O Frinkenwender scholle de Hamburgo (peixe marinado frito
acompanhado de bacon, cebola e batata cozida. Gefüllter kohlkopf (couve-portuguesa ou
branca recheada com carne de porco moída ou bacon cozida com temperos, servida com
molho branco, batatas cozidas e miolo da couve. Pfannfisch (omelete de pedaços de peixes
com carne branca, ou bacalhau ou salmão com servidos com cebolas douradas na manteiga
e batatas na frigideira e com picles de pepino.

Outros pratos são o Lammrücken mit kräuterkrutse (lombo de cordeiro com crosta de ervas),
o Heidschnuckenkeule in sahen (lombo de cordeiro com molho cremoso) e o Gefüllte
Heidschnuckenhaxen (pernil de cordeiro recheado) típico da Frísia no extremo norte de
Schleswig-Holstein, Schwarzsauer von Gänsenklien ganso ensopado com peras no prato,
Gänseleber im Steintopf mit Sauerkraut ganso com fígado cozido com chucrute típicos da
Pomerânia, pratos com peixes de água salgada, enguia, arenque, linguado e salmão e
frutos do mar, como ostras, camarões, lagostas e conchas diversas na região de Bremen e
Cuxhaven, Baixa-Saxônia, Kiel, Schleswig-Holstein e Hamburgo.

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Wiese (2007) mostra que o cardápio dos imigrantes nas colônias no Estado de Santa
Catarina foi suplantado quase que totalmente. O pão preparado com trigo na Europa,
passou a ser feito com fubá de milho. Alimentos tais quais ao feijão, farinha de mandioca,
carne seca a cachaça eram completamente desconhecidos para os imigrantes, mas, pelas
dificuldades passaram a ser o alimento diário para todas as refeições, almoço e jantar.

Houve reações dos imigrantes, que não adaptando-se ao cardápio brasileira conforme relata
Kinas (1997) começaram a buscar outras fontes de proteínas através da caça. A carne de
caça de vários animais foram incluídas nas aventuras na floresta, que tinha flora e fauna
muito abundantes. As caçadas incrementaram a culinária com abundância e variedade de
pratos elaborados com a carne de mamíferos e de aves, a exemplo, de macacos, pacas,
tatus, javalis, veados, antas macucos, principalmente as grandes como a jacutinga.

A colônia Hammonia possuiam indústrias de bebidas, a exemplo, da cervejaria da familia


Klemz e da cervejaria Köpsel que produzia também gasosa, havia destilarias como a
drogaria Vanselow que produzia licores e conhaques e vinho de laranja.

Dentre os imigrantes cujo idioma fosse o alemão era a bebida mais apreciada. Ao mesmo
tempo consumia-se cento e cinquenta mil garrafas de cerveja ao ano, ainda que a situação
econômica fosse difícil. Por outro lado, os imigrantes falantes do idioma italiano apreciavam
mais o vinho. No entanto, o vinho era escasso, pois não havia vinícolas próprias. A
alternativa que ocorreu foi a produção e consumo de cachaça.

Para Wiese (2007) os alimentos que atravessaram a história de Hammonia e continuram


através do tempo foram o Pfefferkuchen (bolacha com semente de anis) e o Salzgurken
(pepino em conserva), frutas desidratadas no sol sobre pano ou formas e Kuchen (cucas).
Não havia muitas árvores frutíferas no início do século XX.

À medida que os imigrantes conseguiram criar e manter pecuária leiteira, começou a


produção de queijo branco, Schmierkaehse (mistura amassada com garfo de queijo branco
com nata. O queijo branco feito com leite coalhado do qual deixou-se escorrer o soro.
Consumia-se pão com doce, mel ou melado ou geléia de frutas e o Schmierkaehse.
Utilizava-se também bastante a nata e manteiga. Tais produtos passaram a ser muito
consumidos. Persistiu o hábito de tomar café trazido da Alemanha.

As receitas típicas trazidas dos países de origem retornaram ao cardápio quando a colônia
estabilizou-se financeiramente. Tais saberes estavam registrados nos cadernos e livros de
receitas guardados em baús trazido pelos imigrantes. Em geral, os pratos típicos da

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culinária eram elaborados aos domingos. Preparava-se sopa de galinha engrossada com
arroz, batata ou ovo batido com trigo, sopa de ervilhas, Gebratene ente (marreco recheado)
ou pato recheado. Os acompanhamentos das aves assadas, seja marreco ou pato,
consistiam em repolho roxo, Apfel Püree (purê de maçã), batatas inglesas, ou aipim frito
com toucinho de porco. Utilizava-se também a batata doce.

Apreciava-se muito o Kassler (bisteca de porco defumada e fritas na manteiga com vinho
branco servidas com Sauerkraut (chucrute repolho azedo), purê de batatas e ervilhas. O
Sauerbraten, elaborado com tatu carne verde, que permanecia de molho durante dias com
cebola, pimenta, toucinho e folhas de louro e coberta com leite azedo. Após a carne é
assada em panela e servida com gnocchi.

Dentre os doces destacavam-se o Weihnachtskuchen (doces de Natal) e o Stolle.Trata-se


de um Kuchen (bolo, cuca com massa especial incrementada com amêndoas, nozes,
avelãs, castanhas, passas, frutas cristalizadas, cravo moído e noz moscada. A mistura era
moldada e assada em forno e pincelada com manteiga e coberta por glacê. Outros doces
tradicionais são doces com mel, Traubenkuchen (cucas de uvas), orelhas de gato, torta de
queijo dentre outras.

O IPHAN (2007) constata que a proporção da etnia alemã constitui o grupo mais
representativo no Estado de Santa Catarina e perfaz quase 40% dos descendentes. Os
descendentes de imigrantes italianos constituem quase 30% da população. Os
descendentes de imigrantes poloneses são quase 5% da população. O dossiê reconhece
que muitos dados podem ter sido sub-quantificados nos dados oficiais a respeito da
imigração, o que deve inevitavelmente ter implicado em erros.

Para Wiese (2007) os imigrantes de cada etnia forneceram a sua contribuição com outros
hábitos. Percebe-se que russos, tchecoslovacos e suiços estiveram muito integrados à
cultura alemã, por questões históricas européias.

Ferreira da Silva (1972) constatou que do fim do ano de 1874 em diante a imigração italiana
foi a preponderante. Muitos imigrantes aportaram. A origem dos mesmos a priori era do Tirol
austríaco, cujo idioma era italiano e alemão. Tais imigrantes chegaram motivados pelas
novas políticas governamentais brasileiras e por contratos com outros países. No entanto,
percebe-se que a imigração de italianos em um meio já fora previamente colonizado por
imigrantes alemães não ocorreu de maneira pacífica, gerando inúmeros conflitos.

O mesmo autor constata que a imigração de cidadãos italianos e tiroleses espelhou-se em


conseqüências no âmbito da arquitetura, religião, hábitos alimentares e outros aspectos da
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cultura local. Houve uma mistura enriquecida da cultura dos alemães, italianos e tiroleses.
Contata-se que houve vinda de grande quantidade de imigrantes trentinos, mas temabém de
de imigrantes provindos de Verona, Cremona, Brescia, Treviso, Lombardia e do Vêneto e de
muitas outras áreas da península itálica.

Conforme Richter (1986) houve mais afluxo de imigrantes com a criação da Sociedade
Colonizadora Hanseática e convênio com o Governo de Santa Catarina. Tal convênio criou
quatro novos distritos coloniais integrando a Colônia Hansa, dentre estas; o distrito de Itajaí-
Hercílio: o maior e mais importante, situado no município de Blumenau. O referido distrito
cuja sede era Hammonia, nos dias atuais é o município de Ibirama.

A Sociedade Colonizadora Hanseática formou-se da fusão entre Kolonisations Verein von


1849, in Hamburg (Sociedade Colonizadora de 1849 de Hamburgo) consistia num consórcio
das mais importantes companhias de navegação da Alemanha e também de importantes
casas comerciais. Tal convênio forneceu suporte para a colonização em larga escala, sendo
assinado em 28 de maio de 1895, em Florianópolis entre o Governo de Santa Catarina na
administração de Hercílio Pedro da Luz, e Carl Fabri representando os alemães.

Vieira (2008) aponta que ocorreu ainda migração interna no Brasil de imigrantes alemães e
italianos, que haviam se estabelecido em colônias em crise no estado de Santa Catarina e
dos estados do Paraná e Rio Grande do Sul, que mudaram-se para o vale do Itajaí.

Para Wiese (2007) ao contrário dos alemães os imigrantes italianos tinham outros hábitos,
por exemplo, fazer polenta com fubá de milho e a produção do vinho. Os italianos não
consumiam muito pão, ao contrário dos alemães. A polenta italiana era preparada com
queijo, linguiça e ovos. Havia também a menestra (mistura de feijão e arroz). O café da
tarde incluia bolinhos de trigo ou fubá cozido na banha e molhado no vinho, principalmente
se houvesse casamentos. Os imigrantes contribuiram muito com técnicas de conservação
dos alimentos, como as compotas, desidratação de frutas, salga e secagem de carnes ao
sol e também através de defumação. Quase todas as partes do porco eram defumadas,
gerando toucinho, costelinha, Eisbein. Costumava-se assar a carne e guardá-la na banha de
porco para conservar, manter a qualidade nutricional e o sabor.

4.3 Idioma

Wiese (2007) descreve que desde o início da colonização no século XIX, durante todo o
século XX e até os dias atuais o idioma alemão continua sendo uma língua falada, lida e

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escrita. O autor citou Ursula Albersheim que mostra que numa vez que a colônia Hansa
Neues Deutschland era uma empresa alemã cujos todos os funcionários eram alemães.

Nem todos os imigrantes teutos eram agricultores na Europa. Havia famílias que vinham
com recursos financeiros para investimentos e que podiam contratar mão-de-obra luso-
brasileira. O contato com o idioma português foi advindo do contato com nativos, caboclos e
brasileiros. As conversas iniciais entre idiomas tão distintos ocorreu através da mímica, após
aprendeu-se nomes de objetos, alimentos, locais, atividades, cores, dentre outros.

Do ponto de vista lingüístico um ou dois anos de convívio entre alemães e nativos


enriqueciam o vocabulário de ambos, mas persistiam as dificuldades de comunicação e da
pronúncia. O contato dos imigrantes com os indígenas também atuou contribuindo para
incrementar a cultura. Os hábitos de caça, pesca e coleta, e o conhecimento mateiro de
substâncias e espécies animais e vegetais úteis, comestíveis, medicinais, com resistência
mecânica adequada, seja de mel silvestre, frutos nativos, tubérculos, palmito, palmeiras,
folhas, talos, flores contribuiram no estabelecimento da colônia.

O modo de falar em Hammonia contribuiu para gerar neologismo regional da fusão entre o
idioma alemão e o português. Em geral, este fenômeno ocorre quando assimila-se muito o
idioma, a cultura, usos e costumes. Isto corroborou para unificar a linguagem, seja o
imigrante mais simples até o mais culto. Estes fatos contribuiram para formar o "germanês"
ou língua teuto-catarinense, Katarinnen deutsch conforme descrevem outros estudiosos.

4.4 Música, dança, dentre outros

Para Wiese (2007) as canções folclóricas tanto dos imigrantes alemães, quanto dos italianos
tem muita relevância no vale do Itajaí. As manifestações musicais aconteciam em família ou
durante reuniões festivas. As cantorias e música amenizavem a saudade do pais de origem,
da família e amigos que permaneceram na Europa. A música mostrava a sensibilidade
artística e poética dos imigrantes.

O jornal der Hansabote de 1905 citado pelo mesmo autor revela que as cantorias eram
regadas a ponche, cachaça e alimentos. Cantava-se e tocava-se instrumentos musicais. A
trilha sonora era composta de Hino da Alemanha, Der gute Kamerade (O bom camarada),
Der Abendstern (A estrela vespertina), Frühlingsbotschaft (Mensagem da primavera),
Abendlied (Canção da noite), Der Nachtigall Antwort (A resposta do rouxinol), Sonntag
(Domingo), Wanderlied (Canção do viajante), Abschied von der Heimat (Despedida da
pátria), Nach der Heimat moecht ich wieder (Para a pátria eu gostaria de voltar), Der

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wanderer in der Sägermühle (O viajante no moinho), Soldaten Morgenlied (Canção matinal
do soldado) e outras. Muitas musicas do compositor Wolfgang Amadeus Mozart eram
tocadas, a exemplo de, Nach dem Mai e Der Landmann seinen Sohn (O filho mais velho do
camponês, Heidenröslein (Rosinha silvestre), cuja letra era de Johann Wolfgang von Goethe
e musicada por Werner.

Havia, ainda, as canções infantis às quais tinham muita importância, Gott der Allwiessende
(Deus que sabe de tudo), Weist Du wie viel Sterne stehen (Sabes quantas estrelinhas).
Cantavam, ainda, quando queimava-se a roça. No entanto a prática foi extinta, por risco de
danos aos agricultores e a fertilidade do solo.

Das canções folclóricas dos imigrantes italianos sobressaem-se, La Montanara, Hino ao


Trentino, Lá Mèrica, e outros. Os cantores e a população cantavam com muita alegria em
rodas de amizade e acompanhadas de vinho.

Houve tendência do povo cantar mesmos as canções em idioma alemão e italiano. Há os


corais,grupo folclórico Neu Bremen Volkstanzgruppe, instrumentais e vocais, mas não há
preocupação em resgatar e manter as tradições das diversas etnias de imigrantes, exceto
iniciativas do poder público municipal.

4.5 Patrimônio Natural e Cultural

No ano de 2014 iniciou-se o mapeamento de patrimônio natural, tendo como foco o


potencial cênico na paisagem, cachoeiras e edificações antigas, construídas pelos
imigrantes, principalmente edificações, que pertençam ao sistema construtivo enxaimel e
outras construções significativas e obras de engenharia como pontes de aço, instalações
que realizam o aproveitamento de energia hidráulica, como rodas d´água, moinhos e outros.

4.6 Patrimônio Arquitetônico

Está sendo realizado um inventário do patrimônio cultural material com ênfase na arquitetura
e no sistema construtivo enxaimel. Até o momento identificaram-se e realizaram-se o
levantamento fotográfico de quarenta e cinco casas enxaimel no município de Ibirama.
Paralelamente, realizou-se o levantamento de medição com trena e reconstituição do
esquema do projeto arquitetônico de seis edificações, vide Figura 01.

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Figura 01 - Fachwerkhaus bei der Universität. Casa enxaimel na Universidade

4.7 Receitas típicas

Selecionou-se uma receita representativa para a cultura Gastronômica da região muito


utilizada. Há muitas expectativas para que possa ser preservada a história, identidade e
singularidade local e regional. É vital que as novas gerações possam identificar a si mesmas
e contribuir ativamente no futuro perpetuando no tempo saberes tradicionais herdados dos
antepassados imigrantes. Se faz necessário resgatar e valorizar os saberes familiares
trazido e sua riqueza cultural intangível contribuindo para as muitas gerações a posteriori.
A receita que apresenta-se a seguir, ainda que simples, foi cuidadosamente selecionada.
Sendo assim, remete a historias de vida, cultura, saberes, herança cultural que merece ser
preservada como acervo no patrimônio cultural imaterial da nossa região.

O Käsekuchen (bolo de queijo), vide figura 02, é uma receita original da região central da
Alemanha. Aprender sobre essa receita requer uma pesquisa mais aprofundada, já que
ao longo da historia ela teve variações regionais. Explicam-se as especificidades, pois o
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local foi colonizado por imigrantes europeus, em sua maioria alemães do norte da
Alemanha. Há várias versões da receitas do bolo de queijo, vide Figura 03 e 04. A base da
receita leva ovos, farinha, açúcar, leite,nata e queijinho branco sem sal. Algumas receitas
tem adição de frutas como ameixa, framboesa, cereja, uvas passas. Estudos realizados
pela equipe mostram que o tipo de fruta utilizada parece estar ligado a região de origem do
imigrante. O Estado de Santa Catarina recebeu muitos imigrantes de várias regiões da
Alemanha, que estabeleceram-se na região do Alto Vale do Itajai e outras.

Figura 02 - Käsekuchen. Bolo de queijo, receita elaborada por Diomar Caetano.

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Figura 03 - Käsekuchen rezept. Receita de bolo de queijo

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Figura 04 - Käsekuchen rezept. Receita de bolo de queijo

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5. Resultados esperados

A ideia é de que os saberes se propaguem e se perpetuem no tempo e que sejam


replicadas através das gerações e para os turistas. Busca-se evitar o que Seyferth (2017) e
CERAN (2017) descrevem como processos de aculturação dos imigrantes e seus
descendentes, possibilitando que usos e costumes possam ter continuidade no tempo.

Busca-se resgatar e valorizar o conhecimento e a memória oral da população e dos


principais protagonistas do processo de imigração, ou seja os próprios idosos, que detem as
memórias mais remotas.

A proposta visa resgatar e valorizar o Patrimônio Cultural Material e Imaterial como um todo
o que sugere abranger "um pouco de cada" do legado cultural, valorizando o idioma, a
gastronomia, da arquitetura, esportes, música, folclore, costumes, hábitos, dentre outros
aspectos e manifestações.

Espera-se gerar materiais de divulgação e publicações, promover oficinas com crianças,


adolescentes, adultos e idosos visando integrar as diversas gerações, promover a educação
patrimonial e gerar multiplicadores do patrimônio.

Valorizar os conhecimentos dos habitantes e documentá-los, seja a memória, os saberes e


suas diversas interfaces, o idioma e os dialetos, as canções, as receitas, fabricação dos
produtos caseiros, Kuchen (bolos), geléias, conservas como Sauerkraut (chucrute),
cervejarias artesanais, cultivo de uva e produção de suco e de vinho, o artesanato, os
lugares, métodos construtivos, conhecimentos de restauro de Fachwerkhäuser (edificações
enxaimel), energias limpas como as rodas d´água, engenhos e moinhos, nas festas, nos pic-
nics, os bailes, cultivo de trutas e outros.

Atuar na divulgação em conjunto com a população para que atuem as ações tenham
continuidade no tempo e espaço. Contribuir para a que hajam multplicadores do Patrimônio.

Contribuir para a geração de renda das famílias através incremento do turismo e da


comercialização de produtos caseiros.

6. Referências Bibliográficas

CERAN. Cia. Energética Rio das Antas. Patrimônio histórico e cultural : Massas
Alimentícias, Um pouco de tudo - Receitas, Depoimento, Santos Camponeses, Legenda das
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fotos. disp.: <http://www.ceran.com.br/session/viewPage/pageId/74/language/pt_BR/>
acesso em 12 de maio de 2015.

COUTO, Cristiana ; HENEAULT, Eric ; AGUIAR, Viviane. Hamburgo e Extremo Norte.


Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental e Schleswig-Holstein juntam-se a Hamburgo para criar
uma região com forte tradição pesqueira. Disponível em : <
http://comida.ig.com.br/pelomundo/hamburgo-e-extremo-
norte/4fd6328063a8bb36eb418583.html> acesso em 20 de junho de 2017.

HINSCH, Richard. A colônia Hansa. in: Blumenau em cadernos Blumenau, no. 08. agosto,
1999.

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_____.. Patrimônio imaterial. disponível em :


<http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/276> acesso em 19 de junho de 2017

KINAS, Andreas. Minha vida. In: Blumenau em cadernos. Blumenau, no. 08. agosto, 1997.
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OBERACKER, Carlos H. Jr. A contribuição teuto à formação da nação brasileira. Rio de


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PIAZZA, Walter F. A Colonização de Santa Catarina. Florianópolis: Lunardelli, 1994.

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RICHTER, K. A Sociedade Colonizadora Hanseática de 1897 e a colonização do interior de


Joinville e Blumenau. Florianópolis: UFSC; Blumenau: FURB, 1986.

SEYFERTH, Giralda. Uma história de sucesso - A imigração alemã em Santa Catarina


Disponível em : < http://www.brasilalemanha.com.br/novo_site/noticia/uma-historia-de-
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SILVA, José Ferreira da. História de Blumenau. Florianópolis: Edeme, 1972.

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VIEIRA, Sílvia Bittencourt Spricigo. Panorama da Implantação Urbana e Arquitetônica das
Colônias de Imigração Italiana em Santa Catarina. Dissertação de Mestrado. Programa de
Pós- Graduação em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade. Florianópolis : UFSC,
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WILLE, Otto. Minha imigração para Hansa-Hamônia hoje Ibirama no ano de 1904. in:
Blumenau em Cadernos. no; 05, maio, 1994.

7. Agradecimentos

A UDESC, Direção de Extensão, Professores, funcionários, verba e bolsas. A população, as


famílias Köpsel, Larsen, Schäfer, Cacilda Lunelli, Veronica Stoll, a Maki retalhos, Prefeitura.
As bolsistas que já participaram das ações Barbara de Souza Kayser, Anne Rocha e Patricia
F. de Andrade, Ariane dos Santos e aos que participam e Marcio Junior de Oliveira, Thais
Ferreira e Michelly Eduarda Baasch e outros.

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UMA RUA DE MUITOS LUGARES

1.FERREIRA, LUCIA DE FÁTIMA LOBATO 2. ARAÚJO, FRANCISCO DE ASSIS


PEREIRA DE

1. SECRETARIA EXECUTIVA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DO PARÁ


Trav. Humaitá, Pass. Paraná, 10, 66085-400
Belém – PA lf_lobato@yahoo.com.br
2. FAIPE. Faculdade de Tecnologia do Ipê Avenida das Flores, nº 75, Jardim Cuiabá, 78.043-172,
Cuiabá-MT dassispb@hotmail.com

RESUMO

Uma rua de muitos lugares corresponde a uma ação de educação patrimonial direcionada
inicialmente à elaboração de uma proposta de roteiro de visitação que foi trabalhada pelo
Iphan/MT no Centro Histórico de Cuiabá. A proposta do roteiro originou-se das observações
feitas durante algumas visitações de grupos de estudantes da educação básica e do ensino
superior pelo Centro Histórico de Cuiabá. A partir destas observações constatou-se a falta de
uma sistemática na forma de trabalhar os conteúdos durante a visitação, pois, os lugares
visitados eram trabalhados de forma isolada não havendo a associação entre as informações e
sua relação com a dinâmica da cidade. A segunda observação relaciona-se à ausência de
material de apoio como suporte para apresentação dos locais visitados e bem como para a
realização de consultas. Por fim, identificou-se a inexistência de clareza sobre o propósito da
atividade de visitação, o que contribui, no nosso entendimento, na limitação da reflexão sobre
a importância do Centro Histórico para a cidade. A realização do roteiro vislumbrou
inicialmente promover uma ação de educação patrimonial que aproximasse os participantes,
os habitantes da cidade do Centro Histórico de Cuiabá, sendo que a partir da construção
desse primeiro elo de aproximação, iniciar um trabalho de associação entre os aspectos
históricos, culturais e simbólicos dos locais visitados, desenvolvendo, dessa forma, uma ação
que incentive e contribua para a formação de agentes sociais interessados na valorização e
proteção do patrimônio local. Dessa forma, a visitação ao Centro Histórico vai além da simples
visualização de locais, volta-se para o florescimento, para a apreciação, o aguçar do olhar,
descortinar os detalhes do lugar, do patrimônio ali contido, e assim, propiciar a ampliação da
visão para além do objeto em si, direcionando para a perspectiva mais ampla em relação à sua
valorização, conservação e preservação

Palavras-chave: Centro Histórico; Cuiabá; Educação Patrimonial.

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“Uma rua de muitos lugares” é o primeiro produto apresentado e corresponde a uma ação
de educação patrimonial direcionada inicialmente à elaboração de uma proposta de roteiro
de visitação trabalhada pelo Iphan/MT no Centro Histórico de Cuiabá

Durante as experiências vivenciadas na superintendência, buscou-se, preliminarmente,


perceber as necessidades da instituição, assim como, alguns dos anseios da comunidade
em relação à superintendência. Em relação a essas necessidades percebeu-se que a
visitação ao Centro Histórico é uma atividade frequentemente solicitada, seja por instituições
públicas ou privadas e pela sociedade civil.

A partir da identificação dessa atividade solicitada desenvolvemos interesse em participar de


visitações realizadas ao Centro Histórico de Cuiabá, tanto aquelas promovidas pela
superintendência como por outras instituições como uma forma de analisar as dinâmicas
utilizadas durante essas visitações.

Nesse processo de participação das visitações foram feitas algumas observações, as quais
contribuíram para a realização de algumas reflexões e, para o amadurecimento da
elaboração da proposta de roteiro aqui apresentada. Dentre as observações feitas, alguns
aspectos envolvem questões de metodologia e de conteúdo.

A primeira observação refere-se à ausência de uma sistemática na forma de trabalhar os


conteúdos durante a visitação, pois, os lugares visitados são trabalhados de forma isolada
não havendo a associação entre as informações e sua relação com a dinâmica da cidade.
As escolhas dos locais reafirmam a visão de patrimônio como monumento, pois os lugares
visitados são os que pertenciam às famílias ilustres.

Choay (2006), diz que o monumento histórico possui sua fase de consagração a partir do
ano de 1820 tendo o seu término ocorrido na década dos anos de 1960. Ao longo desse
período esse conceito vai predominar no embasamento das principais práticas e discussões
no campo do patrimônio cultural, tendo nele o seu auge. Contudo, isso não quer dizer que a
partir da década de 1960 a adoção dessa perspectiva se extingue. Ela deixa de ser
predominante, de modo que outras perspectivas e, por consequência, outros tipos de bens
passem a serem observados pela ação preservacionista (CHOAY, 2006:125). Segundo a

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autora, este período envolveu um conjunto de fatos, acontecimentos e diferenças nas
posições em defesa dos monumentos históricos.

Alguns aspectos contribuíram no predomínio da perspectiva monumentalista durante esse


período de tempo, como por exemplo, a unidade soberana que através do seu poder
impunha o reconhecimento juntamente com as ideias de coerência e estabilidade, e o status
adquirido com a era industrial, a qual indicava determinações novas e essenciais que
ocasionavam uma “hierarquia de valores” (CHOAY, 2006:126). No caso específico de
Cuiabá, os resquícios dessa racionalidade estavam presentes na década de 1980 e 1990,
como pode ser observado na documentação relativa aos pedidos de impugnação ao
tombamento.

Segundo a autora, inicialmente as reflexões anteriores sobre o valor de patrimônio


encontravam-se diretamente associado ao valor econômico, ligado à noção de propriedade,
de herança. As ações iniciais de tombamento do patrimônio expressas nos primeiros atos
jurídicos da Constituinte no ano de 1789 indicavam a dispor os bens do clero para a nação.
Neste processo, o valor atribuído aos bens se encontrava diretamente associado ao
nacionalismo. No entanto, ainda segundo ela, a integração das antiguidades nacionais com
o “discurso da nacionalização” ocasionou por relacionar-se em valores de troca, sendo que
o discurso de sua manutenção acolhia intenções de se evitar “prejuízos financeiros”,
ultrapassando, desta forma, a intenção de uma conservação iconográfica, da representação
e aproximando-se de fins políticos.

A expressão “poder mágico” (2008:98), é utilizada pela autora para expressar que esta
noção desenvolvida nesse contexto, abarcava toda uma representatividade que
contemplava várias categorias representadas em diferentes contextos históricos. Uma
constituição de um mosaico de representações patrimoniais que transcendiam as barreiras
do tempo e do “gosto”.

Ainda sobre esse processo de valoração, as obras consideradas recentes no século XVIII
adquirem os significados históricos afetivo das antiguidades nacionais. O conceito de
patrimônio, ainda segundo a autora “induz então a uma homogeneização do sentido dos
valores” (CHOAY, 2011:99). A autora ainda destaca que esta perspectiva de
homogeneidade se apresentou de forma diferenciada em diferentes momentos. No período
da Segunda Guerra Mundial, por exemplo, houve a valorização de estilos diferentes
representados pela arquitetura dos séculos XIX e XX, quando estes foram considerados
monumentos históricos.

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A segunda observação relaciona-se à ausência de material de apoio como suporte para
apresentação dos locais visitados e, bem como, para a realização de consultas. Por fim,
identificou-se a ausência de clareza sobre o propósito da atividade de visitação, o que
consideramos que tal fato contribui na limitação da reflexão sobre a importância do Centro
Histórico de Cuiabá ser visto como um bem cultural.

A partir das observações realizadas e de alguns questionamentos feitos para as pessoas


responsáveis pelas visitações, pode-se afirmar que o roteiro pode ser considerado como a
primeira proposta de visitação sistematizada no Centro Históroico de Cuiabá.

O roteiro foi utilizado durante os anos de 2014 até 2016 pela Superintendência do
IPHAN/MT e esta proposta inicial, vem inspirado a elaboração de novas propostas de
visitação pelo Centro Histórico, como também, pela área de entorno.

O público atingiu um público bastante diverso. Foram atendidos alunos de universidades


públicas e particulares dos cursos de Arquitetura e História, alunos da modalidade Educação
de Jovens e Adultos, estudantes do ensino fundamental, alunos do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia (IFMT) e durante algumas visitações, contamos com a
presença de moradores de rua, os quais demonstraram interesse em saber um pouco mais
sobre o lugar onde moravam.

Figura 1: Roteiro ‘Uma rua de muitos lugares”. Alunos do Colégio O Centro de educação de jovens e

adultos Antônio Casagrande do município de Tangará da Serra Fonte: acervo pessoal.

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Compreende-se que uma proposta que envolva a educação patrimonial, que trabalhe com o
patrimônio cultural deve voltar-se para uma perspectiva que contemple os mais diversos
tipos de público, no intuito de democratizar o acesso aos bens culturais, como também,
realizar uma proposta de trabalho voltada para a interpretação, no sentido da fruição, para a
contemplação de uma proposta de educação patrimonial com fins de preservação.

Ressalta-se que a atividade aqui proposta vislumbrou inicialmente promover uma ação de
Educação Patrimonial que aproxime os participantes do Centro Histórico de Cuiabá, e a
partir da construção desse primeiro elo de aproximação, buscou-se associar os aspectos
históricos, culturais e simbólicos dos locais visitados, desenvolvendo, dessa forma, uma
ação que envolva a valorização e proteção do patrimônio local.

Em relação ao processo de proteção, para Londres, “é necessário que a ação de ‘“proteger”’


seja precedida pelas ações de ‘“identificar”’ e ‘“documentar”’ - bases para a seleção do que
deve ser protegido -, seguidas pelas ações de ‘“promover”’ e, que viabilizam a reapropriação
simbólica”. (LONDRES, 2003.p.65).

Dessa forma, a visitação ao Centro Histórico vai além da simples visualização de locais,
volta-se para o florescimento, para a apreciação, o aguçar do olhar, descortinar os detalhes
do lugar, do patrimônio ali contido, e assim, propiciar a ampliação da visão para além do
objeto em si, direcionando para a perspectiva mais ampla em relação à sua valorização,
conservação e preservação. Para Miranda, “A interpretação do patrimônio é a arte de
revelar in situ o significado do legado natural, cultural ou histórico, ao público que visita
esses lugares (....) ”.( LONDRES, 2003, p.65.)

Comunga-se da ideia que o lugar se torna realidade, a partir da nossa familiaridade com o
espaço, não necessitando, entretanto, ater-se a uma definição fixa. Sendo que esse
processo de familiarização se constrói de formas diferenciadas.

Massey (2000), no artigo “Um sentido global de lugar”, cita um exemplo dessa construção
de relações com o lugar relatando sua experiência de residir em Kilburn High Road1. Relata
algumas impressões sobre o lugar:

[...] Primeiramente, embora Kilburn possa ter uma característica própria,


não se trata absolutamente de uma identidade coesa, coerente de um
sentido particular do lugar, partilhado por todos. Nada poderia ser mais

1 Lugar localizado no noroeste do centro de Londres.

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diferente disso. O itinerário das pessoas pelo lugar, seus refúgios e as
conexões que realizam (fisicamente, pelo telefone, pelo correio ou na
memória e na imaginação) entre esse lugar e o resto do mundo variam
muito. Se se reconhece que as pessoas têm identidades múltiplas, pode-
se dizer a mesma coisa dos lugares. Ademais, essas identidades múltiplas
podem ser uma fonte de riqueza ou de conflito, ou ambas. (MASSEY,
2000:183).

Nesse exemplo percebe-se que a autora quer demonstrar a visão equivocada entre a
identificação dos termos lugar com “comunidade”, pois é possível existir comunidades sem
necessariamente compartilharem do mesmo lugar, mas através do compartilhamento das
referências culturais que o lugar possui. Ainda segundo a autora, “o que dá a um lugar sua
especificidade não é uma história longa internalizada, mas o fato de que ele se constrói a
partir de uma constelação particular de relações sociais, que se encontram e se entrelaçam
num lócus particular” (MASSEY, 2000:185).

Além dessas reflexões a autora discorre sobre a raridade da existência de “comunidades” e


questiona sobre essa singularidade, pois mesmo que a comunidade se relacione a uma
representatividade dita homogênea, elas possuem “estrutura interna”, pois as formas de se
relacionar com o espaço, os seus elos representativos sobre os lugares, as conexões
construídas são diferenciadas.

[...] Assim, em vez de pensar os lugares como áreas com fronteiras ao


redor, pode-se imaginá-los como momentos articulados em redes de
relações e entendimentos sociais, mas onde uma grande proporção dessas
relações, experiências e entendimentos sociais se constroem numa escala
muito maior do que costumávamos definir para esse momento como lugar
em si, seja uma rua, uma região ou um continente. Isso, por sua vez,
permite um sentido do lugar que é extrovertido, que inclui uma consciência
de suas ligações com o mundo mais amplo, que integra de forma positiva o
global e o local. (MASSEY, 2000, p.184).

Segundo a autora o lugar é compreendido não somente pelas suas delimitações territoriais,
ele não se encontra comprimido nas demarcações fronteiriças, o que lhe garante sua
existência não são suas delimitações precisas, mas o processo construído das
singularidades de relações sociais e simbólicas. Dessa forma pode-se comungar da ideia de
que o sentido do lugar passa por constantes conexões sociais, sua especificidade não se
origina de uma unicidade ou modelo fechado de representações, mas deriva das inter-

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relações sociais cotidianas. Sendo que tais relações devem ser consideradas nos campos
globais e locais, nos fluxos internos e externos.

A globalização proporciona por um lado a disjunção entre o local e o global, causando a


necessidade de se buscar as particularidades do local na crença de sua homogeneidade
contida na comunidade, recaindo na interpretação de se entender a comunidade constituída
de homogeneidade, buscando ressaltar suas características verdadeiras. E também,
segundo Massey (2000:184), a globalização das relações sociais pode ser considerada
como uma “fonte de reprodução” da singularidade por propiciar diferentes formas de
relações geográficas. A formação de grupos diversos que são gerados da globalização das
relações sociais isso garante a dinâmica do processo de construção de valores.

Ainda conforme a autora a singularidade do lugar não se encontra na sua existência em si, é
construída a partir das diferentes relações sociais e, consequentemente, geográficas que se
faz com esse lugar, envolvendo as comunidades locais, entendidas aqui como diversas
(MASSEY, 2000:184).

Entende-se que a forma como as pessoas usam e interagem nos lugares é um caráter muito
forte e difícil de conhecer, perceber e trabalhar com ele. Este capítulo busca compreender o
valor atribuído ao Centro Histórico, tendo em vista as políticas públicas culturais de
preservação e os agentes sociais que ali compartilharam este espaço.

Além dessa análise, envolvendo a apropriação do patrimônio, é interessante analisar a sua


“prática social”, expressão cunhada por Arantes, que expõe como essa dimensão dada ao
patrimônio envolve um processo de interpretação da cultura como produção material e
simbólica. (ARANTES, 1989, p.2-16).

Em Vianna os símbolos compõem a cultura, sendo que tais símbolos não estão isolados,
pois fazem parte de uma estrutura ampla, que se constrói e reconstrói a partir de
movimentos internos e externos seja proveniente do esquecimento ou da apropriação de
novas simbologias. Assim, memória e esquecimento antes de serem expressões
antagônicas, vêm se mostrando mais próximas, até mesmo, complementares nessa
dinamicidade histórica. (VIANNA, Hermano, 2005, p.302-315).

Considera-se que a apropriação e a interpretação do patrimônio, assim como a sua


produção, se desenvolvam também na cotidianidade. Para Geertz, a compreensão feita
sobre o aspecto público da cultura encontra-se no fato das ações sociais realizadas no
cotidiano se desenvolverem naturalmente nas relações sociais, na construção do

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conhecimento empírico. Este sentido do público possibilita o entendimento de que a
transmissão da cultura é de responsabilidade do próprio grupo social que a produz, que é
seu detentor. (GEERTZ, 2008, p. 21-30)

A atividade de roteiro aqui proposta possui como objeto de estudo o Centro Histórico de
Cuiabá, compreendendo suas transformações e sua análise atual, voltando-se deste modo,
para a percepção de que ele não é um espaço isolado, mas um espaço imbuído de
memórias, possuidor de um hibridismo tanto nos seus traços arquitetônicos, apresentando
características coloniais e ecléticas, como, nas suas representatividades culturais.

A interação do patrimônio material com o imaterial – interação que se


concretiza de modo privilegiado no lugar e na paisagem – contribui para a
sedimentação de uma noção mais ampla e dinâmica de patrimônio cultural,
enquanto síntese dessas dimensões. Uma não faz sentido sem a outra, e
uma não pode ser completamente apreendida sem a outra, embora a
salvaguarda de cada uma delas demande instrumentos e abordagens
distintos. (SANT’ANNA, 2011, p.197).

Compreende-se que as dimensões materiais e imateriais que envolvem o patrimônio são


indissociáveis, pois as intervenções realizadas no local ocasionam reflexos na forma de sua
fruição e na base social que referencia a sua apropriação civil. Os bens materiais
manifestam além de sua concretude, fruto de uma cultura material, a dinamicidade de
construções simbólicas contextualizadas.

Considera-se o Centro Histórico de Cuiabá como um espaço contextualizado e que possui a


dinâmica da cidade. Segundo Santos, “O espaço é um sistema de valores, que se
transformam permanentemente”. (SANTOS, 2008, p. 114). E ainda:

O espaço, uno e múltiplo, por suas diversas parcelas, e através do seu uso,
é um conjunto de mercadorias, cujo valor individual é função do valor que a
sociedade, em um dado momento, atribui a cada pedaço de matéria, isto é,
cada fração da paisagem. (Ibidem).

Para auxiliar na elaboração dessa atividade, utilizou-se o levantamento iconográfico, por


acreditar nas suas contribuições da análise histórica das representatividades dos valores e,
dos elementos que compõem a identidade cultural cuiabana. As representações
iconográficas, segundo Paiva “nos possibilita ainda, por meio de outros valores, interesses,
problemáticas, técnicas e olhares, compreender, enfim, essas construções históricas”.
(PAIVA, 2006. p. 13).

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O roteiro “Uma rua de muitos lugares” vislumbrou realizar ações de educação patrimonial
numa abordagem que considere a diversidade de estilos arquitetônicos e as simbologias
dos locais visitados e a formação de novos agentes sociais, influenciadores na valorização
do patrimônio de Cuiabá, a partir do envolvimento e acesso à interpretação do patrimônio.

A elaboração do roteiro contou com pesquisa em acervo bibliográfico de escritores locais,


sendo direcionada ao estudo de narrativas sobre o cotidiano cuiabano dos habitantes do
Centro Histórico, informações históricas, características arquitetônicas e de levantamento de
relatos de pessoas sobre suas impressões do Centro Histórico.

Esse amplo material subsidiou a realização de algumas etapas, dentre elas, cita-se: a
elaboração de um texto guia do roteiro contendo a sistematização das informações
pesquisadas; o levantamento fotográfico da área do roteiro; a realização de reuniões de
avaliação para aperfeiçoar a forma e o conteúdo do roteiro; pesquisa sobre os locais,
ressaltando a perspectiva do imaginário cuiabano; e, o levantamento bibliográfico,
iconográfico e documental sobre os locais que fazem parte do roteiro e elaboração de um
folder contendo as imagens e informações.

Segundo Ulpiano Toledo Bezerra de Meneses (2006, p. 36), “A imagem que os habitantes
fazem da cidade ou de fragmentos seus é fundamental para a prática da cidade”. Esse olhar
direcionado ao habitante é significativo, pois, seu papel é fundamental na criação de
sentidos e valores que se constroem nas práticas sociais cotidianas. O mesmo autor
também define a origem do termo “habitante”:

[...] do latim habeo, possuindo o significado de “ter”, manter uma relação


constante com algo; o sufixo “it” (habito) aprofunda e reitera esta relação.
Hábito, habitar, portanto, expressam um grau superior e constante de
apropriação. Essa relação contínua, permanente, cotidiana, demorada e
que o tempo adensa, é que cria as condições mais favoráveis para a fruição
do patrimônio ambiental urbano. (MENESES, 2006, p. 39).

O trabalho envolvendo o imaginário urbano não se limita a ideia de lembranças isoladas,


mas de compreendê-lo como uma composição importante na compreensão das relações de
sociabilidade que são construídas, pois elas contribuem para a leitura do lugar. Para
Meneses o imaginário urbano é entendido como:

[...] modalidade específica do fenômeno mais amplo das representações


sociais – suponho imagens estruturadas e operadas a partir de grupos
sociais e práticas espaciais específicas e não simples conjuntos de imagens

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refugiadas nas mentes ou na consciência dos indivíduos. (MENESES, 2006,
p. 36).

Utilizou-se como metodologia também a história oral, inicialmente por considerá-la como um
procedimento capaz de produzir novas referências. Segundo Lozano (2005:17), “Fazer
história oral significa, portanto, produzir conhecimentos históricos, científicos, e não
simplesmente fazer um relato ordenado da vida e das experiências dos ‘outros’ ”.

A partir das compreensões de Lozano (2005) sobre história oral, e sua classificação de
estilos e técnicas, será utilizado o que ela nomeia de “estilo do analista completo”. Durante o
processo de desenvolvimento do trabalho há de se considerar a “fonte oral em si mesma”,
por isso, foram feitas análises, interpretações e contextualização histórica dos depoimentos
e as evidências orais, e, também, a complementação dos depoimentos com outras fontes
documentais.

Além das considerações já citadas sobre a metodologia da história oral, Lozano (2005:24),
ainda afirma que “A história oral é vista como um método particular, mas não
exclusivamente isso, já que também pode ser considerada uma forma de estabelecimento
de relações de maior qualidade e profundidade com as pessoas entrevistadas”. O trabalho
envolvendo a história oral exige além de postura crítica no trato do material produzido, a
receptividade e delicadeza no vínculo que se cria com as pessoas envolvidas.

Outro ponto importante de salientar sobre a história oral se refere ao fato dela envolver a
esfera simbólica.

[...] Abordar o fenômeno da oralidade é ver-se defronte e aproximar-se


bastante de um aspecto central da vida dos seres humanos: o processo da
comunicação, o desenvolvimento da linguagem, a criação de uma parte
muito importante da cultura e da esfera simbólica humana. (LAZANO, 2005:
15).

Considerações finais

Considera-se que essa proposta de trabalho foi importante porque possibilitou uma primeira
leitura sobre o Centro Histórico, leitura ao mesmo tempo despretensiosa, como uma espécie
de “começo de namoro”, mas que nutriu o início de levantamento e diagnóstico sobre as
ações educativas realizadas no Centro Histórico. Especificamente a atividade de visitação,
sem distanciar do entendimento do sentido do patrimônio materializado. Segundo Françoise
Choay “ a arquitetura é a única arte cujas obras exigem ser materialmente percorridas. Só

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ela exige visitas, percursos, desvios que implicam o investimento do corpo inteiro e que a
percepção visual apenas pode substituir”. (CHOAY, 2006:201),

O roteiro permitiu a elaboração de uma proposta de trabalho voltado para as


ressignificações dos espaços, aspecto fundamental no processo ensino-aprendizagem. A
atividade de visitação ao Centro Histórico exige um envolvimento do corpo, das sensações
dos olhares, de toda uma relação subjetiva.

Ressalta-se que os produtos a partir das considerações feitas podem ser considerados
como experiências educativas, pois eles fizeram parte das atividades de Educação
Patrimonial desenvolvidas pelo IPHAN/MT, ultrapassaram o espaço da superintendência,
foram trabalhados em algumas instituições universitárias e serviram de material para a
produção de novos conhecimentos.

O olhar voltado ao Centro Histórico não se iniciou a partir de uma reflexão sistemática, mas
de uma vontade de escrever sobre o que se vê e o que se esconde nos vínculos das formas
de sua apropriação social e como esse caminho pode ser trilhado com a reflexão a partir
das ferramentas da área da educação.

Considera-se que as etapas de observação, pesquisa bibliográfica, entrevistas e as


experimentações pessoais envolvidas nos processos de elaboração e efetivação dos
produtos, somados às atividades cotidianas de trabalho e, também, as de lazer, de
encontrar pessoas involuntariamente, foram situações que favoreceram a realização de um
diagnóstico prévio para a leitura das dinâmicas sociais do Centro Histórico e identificar o que
se tem feito (e como) sobre a Educação Patrimonial. Através de observações, entrevistas e
filmagens foi possível transitar pelo Centro Histórico, conhecer detalhes, histórias de alguns
habitantes do lugar. Tais experiências favoreceram também a construção de um olhar
crítico, investigativo sobre este bem cultural.

A proposta do roteiro almejou realizar um trabalho que propiciasse uma atmosfera de


aproximação dos moradores do Centro Histórico de Cuiabá e de seus visitantes ao
conhecimento, reencontro e reescrita da história de sua cidade e, que inspirasse e
fomentasse a realização de outras atividades de educação patrimonial em outros espaços,
pois segundo Miranda, “A finalidade da interpretação do patrimônio (natural e cultural) é
produzir mudanças nos âmbitos cognitivos, afetivos e comportamentais do visitante”.
(MIRANDA, 2002.p.96).

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Referências Bibliográficas

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cultura cuiabana - 2ª Edição - 2006 - Ed. Janina. Disponível em <
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Disponível em < http://67.210.115.11/detalhe.php?cod=400033> Acesso em Janeiro de


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Contemporâneas do patrimônio. EDUFBA, 2011.

LONDRES, Maria Cecília. In ABREU, Regina. CHAGAS. Mário. Memória e Patrimônio:


ensaios contemporâneos. Rio de Janeiro: DP&A; 2003.

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Belo Horizonte: Ed.UGMG; território Brasilis, 2002.

MENDONÇA, Rubens de. Ruas de Cuiabá. Editora Cinco de Março. 1969.

BOTELHO, Miriam. Nas praças, uma reverência à história. Diário de Cuiabá. Edição nº
11216 15/05/2005. Disponível em<
http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=218624> Acesso em Dezembro de
2013.

MÜLLER, Maria de Arruda; RODRIGUES, Dunga. Cuiabá ao longo de 100 anos. Editora
Eletrônica. 1994.

PAIVA, Eduardo França. História & imagens. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

Praça da Mandioca. Da redação. Mídia News. 08-02-2013. Disponível em<


http://midianews.com.br/conteudo.php?sid=260&cid=149488> Acesso em Janeiro de 2014.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Prefeitura vai revitalizar calçadões do Centro Histórico. Diário de Cuiabá, Da assessoria.
19/03/2008. Disponível em< http://67.210.115.11/detalhe.php?cod=312166> Acesso em
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SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. 4ed. São
Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008.

SIQUEIRA, Elizabeth Madureira. Bairro do Porto. In: SIQUEIRA, Elizabeth Madureira, et al.
(Org.). Cuiabá: de vila a metrópole. Mato Grosso: Arquivo Público de Mato Grosso,

SIQUEIRA, Elizabeth Madureira. História de Mato Grosso. Da ancestralidade aos dias


atuais. Cuiabá: Entrelinhas, 2002.

VIANNA, Hermano. Tradição da mudança: a rede das festas populares brasileiras. Revista
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Brasília, IPHAN, n. 32, p.302-315, 2005.

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Belo Horizonte/MG de 21 a 23/06/2017.
Área Temática: Patrimônio e Participação - Eixo 1 – Do técnico à população: a
democratização do campo do patrimônio

Título: Democratização e acesso à memória e história regional: relato da experiência do


Portal EmRedes

Resumo: Considerando o acervo que vem sendo constituído pelo Centro de Memória
Professora Batistina Corgozinho – CEMUD – UEMG – Unidade Divinópolis desde 2005 e
principalmente pela potencialidade que os mesmos apresentam para novos estudos e
pesquisa e sua crescente expansão criou-se o EmRedes: Portal da Memória do Centro-
Oeste Mineiro para disponibilizar seu acervo história e de memória através da Web.
O EmRedes: Portal da Memória do Centro-Oeste Mineiro – trabalho, religiosidade,
cultura e cotidiano foi lançado em maio de 2015, com o objetivo de se tornar um instrumento
permanente de acesso a todos os cidadãos interessados em realizar pesquisas sobre a
região, no qual está disponíveis um banco de dados com mais de 70.000 documentos
digitais. O acervo do Portal conta com documentos escritos diversos (jornais, panfletos,
cartas, notas, documentos oficias), fotos e vídeos de diferentes grupos, a polifonia da
memória é um princípio da reunião do acervo, privilegiando especialmente aqueles registros
que não fazem parte das vozes oficiais, aqueles que pouco preservamos. A importância do
uso da tecnologia digital está ligada não só ao fato de preservar indiretamente o patrimônio
documental como principalmente democratizar o seu acesso. A digitalização dos
documentos garante sua permanência virtual, mesmo que o suporte de acessibilidade aos
mesmos se modifique. A preservação digital não impede o processo de degeneração dos
documentos. A integridade física dos mesmos exige a adoção de outros procedimentos
tecnológicos e condições de acomodação adequadas e específicas que são observadas no
trabalho do Centro de Memória. A iniciativa de construção do Portal da Memória do Centro-
Oeste Mineiro – EmRedes representa um passo para que este instrumento de estudos e
pesquisa seja apropriado pelos cidadãos interessados em pesquisar e conhecer mais a
história da região. Nesse sentido, o Portal da Memória convida e mais do que isso, solicita a
todos a contribuição para que este espaço seja sempre mais dinâmico, oferecendo
informações e reflexões sobre os aspectos culturais e históricos do Centro-Oeste mineiro.
IX Mestres e Conselheiros Agentes Multiplicadores do Patrimônio
Belo Horizonte/MG - de 21 a 23/06/2017.
O Portal também funciona como um centro de referência regional que possibilita a
coleta de dados, fixação e produção de informações, atende as demandas locais para
formação, capacitação e confecção de material informativo e formativo. Dessa forma, o
Portal deve sistematizar e arquivar as produções e, na medida do possível, produzir novos
materiais por iniciativa própria ou demanda de escolas e organizações sociais. Nesse
sentido, ele se constitui enquanto um acervo de informações e as produz; atende a
demanda formativa de comunidades e é formado pelas informações cedidas pelas mesmas.
A administração do Portal é realizada pela equipe de profissionais do Centro de Memória
Professora Batistina Corgozinho – CEMUD – UEMG – Unidade Divinópolis, cabendo aos
mesmos receber, catalogar, disponibilizar e analisar acervos sobre a memória e a história do
centro-oeste mineiro.

Palavras-Chave: Digitalização de acervos, democratização e acesso, memória e história


regional, Portal EmRedes

Autores: Flávia Lemos Mota de Azevedo; José Heleno Ferreira; Samuel José Santiago

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Belo Horizonte/MG de 20 a 23/06/2017.
RESUMO DE EXPERIÊNCIA

Área Temática: PATRIMÔNIO E PARTICIPAÇÃO - EIXO 1 – Do técnico à população: A


democratização do campo do patrimônio.

Título: O Dia do Patrimônio em Pelotas: uma celebração de aproximação da comunidade


com sua cultura.

Resumo

Partindo do entendimento de que cultura e patrimônio são conceitos indissociáveis e que


ambos fundamentam as bases de uma sociedade desenvolvida, a Secretaria de Cultura de
Pelotas vêm, desde 2013, celebrando no mês de agosto o Dia do Patrimônio, Trata-se de
divulgar e promover o Patrimônio Cultural local através das mais variadas formas de
expressão, aproximando e integrando a comunidade do debate sobre Preservação
Patrimonial, percebendo o patrimônio enquanto manifestação cultural que une passado,
presente e futuro em prol da valorização da identidade cultural.

O evento, desde a primeira edição, foi planejado em um formato de participação por adesão,
cabendo a municipalidade o papel de organizador e divulgador, estimulando e incentivando
a colaboração da comunidade, envolvendo instituições públicas e privadas, universidades e
artistas locais. A cada ano o evento foi desenvolvido permeando uma temática específica,
em 2013, para abrir o debate o tema escolhido foi: “O que é Patrimônio?”; em 2014 a
abordagem focou em nossas raízes culturais tendo como tema: “A herança cultural Africana;
em 2015 foi abordado o caráter ambiental do patrimônio com o tema: “Pelotas patrimônio
das Águas; já em 2016 o enfoque foi baseado no papel da mulher na constituição do
patrimônio, tendo como tema: “A Ocupação Feminina”.
A primeira edição do evento que ocorreu nos dias 17 e 18 de agosto de 2013, superou a
expectativa da organização e foi sem dúvida uma ação cultural de grande repercussão na
comunidade local e regional. Em 2014 a novidade no formato do evento foi a inserção da
ação intitulada “Conversas do Dia do Patrimônio”; reuniões semanais realizadas durante os
meses de junho e julho, às quartas feiras, nas quais palestrantes e comunidade expõem e
debatem sobre o tema proposto, resultando na publicação de uma revista com textos sobre
os temas abordados. Já em 2015, a inovação foi a ampliação do evento que teve início na
sexta-feira, quando a programação é direcionada ao público escolar da rede pública
municipal e estadual.
Um dos principais destaques do evento, desde sua primeira edição, é a participação de
estudantes, principalmente universitários, das mais variadas áreas do conhecimento que
atuam como Agentes do Patrimônio. Após treinamento, são eles que figuram juntamente
com a equipe de técnicos da Secretaria de Cultura na receptividade da comunidade e na
organização das atividades culturais como: exposições, oficinas, palestras e danças que
ocorrem em espaços abertos e nos prédios históricos sinalizados com bandeirolas coloridas
e abertos para visitação.

A experiência acumulada durante as primeiras edições nos honrou, em 2017, com o Prêmio
Rodrigo Melo Franco de Andrade, fato que nos permitiu compreender a dimensão e o
alcance do evento, percebendo o quanto as ações desenvolvidas afloraram o debate sobre
a identidade cultural local e despertaram na população uma nova perspectiva, mais
participativa, sobre nossa cultura e patrimônio.

Palavras-Chave: Patrimônio, cultura, apropriação, comunidade.

Autores:

Liciane Almeida; Arquiteta e Urbanista, Mestre em Memória Social e Patrimônio Cultural.

Gisela Frattini; Engenheira Civil, Especialista em Patrimônio Cultural.

Secretaria do Evento
Orientações para envio de Resumos:

O Comitê Científico do evento fará uma seleção de trabalhos a partir dos resumos enviados a partir do formulário, que
tem a seguinte organização e conteúdo:
Área Temática: Eixo 1 – Do técnico à população: a democratização do campo do patrimônio

Título: O patrimônio colonial da Vila do Príncipe ao Serro de hoje


Resumo (Mínimo: 1000 e Máximo: 3000 caracteres):
O Serro, como outros focos de exploração aurífera no atual estado de Minas Gerais, surgiu da descoberta do ouro e pedras
preciosas no início do século XVIII. Durante esse século, o intenso afluxo populacional e a consolidação do povoado
garantiu a criação de um núcleo urbano considerável, com edifícios majestosos tais como as igrejas e prédios públicos,
assim como o casario colonial. Com o passar dos anos viria ainda a se desenvolver uma cultura artística e musical ímpar, o
modo de fazer do famoso queijo do Serro, além da conservação de uma religiosidade profunda manifestada ainda hoje nas
procissões e festividades. Embora grande parte do centro histórico tenha sido foco de tombamento pelo IPHAN, isso não
garantiu a sua inteira preservação. A parte de incêndios e acidentes, que muitas vezes são inevitáveis, a falta de
manutenção e conservação do casario colonial no centro histórico do Serro, vêm se apresentando como uma depreciação
da memória histórica desta cidade, descaracterizando cada vez mais a teatral paisagem, tão celebrada por Saint Hilaire no
começo do século XIX. A partir dados coletados no arquivo do IPHAN/ Serro e entrevistas com os próprios moradores da
cidade, pretendemos discutir questões relativas ao estado atual de conservação dos imóveis coloniais no centro histórico
do Serro, bem como da consciência e participação citadina na manutenção dos mesmos. Abordaremos, em especial, o
debate acerca de obtenção de fundos para preservação dos edifícios públicos e privados e a influência da participação da
comunidade diante de todos os problemas recorrentes. Este trabalho apresenta-se então como uma proposta de debate
acerca do patrimônio colonial, nossa responsabilidade sobre ele e as possibilidades de impacto que temos, a partir do
caso específico da cidade do Serro.
Palavras-Chave (Separadas por vírgula): preservação, comunidade local, impacto social
Autores: Natalia Casagrande Salvador
Secretaria do Evento
Área Temática: 5 -Resistência civil e ocupações: a ação direta no campo do patrimônio

Título: Tombamento da Vila Vicentina da Estância

Resumo:

A análise realizada nesta pesquisa resultará do estudo do processo de tombamento e de usucapião da Vila Vicentina da Estância localizada em Fortaleza, Ceará. A vila possui cerca de 40 casas populares e uma
capela, além de ampla área de convivência comum aos moradores, e foi construída na década de 1940 inicialmente para idosos. Fortaleza apresentou, no último século, intensa expansão territorial em seu processo de
urbanização. A cidade passou por um rápido crescimento demográfico decorrente, sobretudo, pelos fluxos migratórios campo-cidade induzidos pelas constantes secas no interior do estado e pela concentração de
investimentos e infraestrutura na capital. Em Fortaleza, as primeiras ações de assistência aos que moravam precariamente na cidade foram implementadas pelas comunidades religiosas do município e, posteriormente,
incentivos governamentais para a construção de vilas operárias. Parte dessas construções ainda existem no município de Fortaleza, tendo havido modificações progressivas de maior ou menor intensidade, mas que
retratam um modo de morar de uma parcela da população carente. Na contramão da instalação de conjuntos habitacionais periféricos em bairros dormitórios ou gasto excessivo com aluguel, a Vila Vicentina da
Estância encontra-se em uma região, hoje, central e sem custo de aluguel. Com a expansão urbana da capital, essa área tornou-se extremamente valorizada. Há meses, os moradores da Vila Vicentina da estância vêm
sendo assediados para deixar o local, pressionados pelo mercado imobiliário. Acontece que a Vila Vicentina da Estância é uma Zona Especial de Interesse Social – ZEIS, conforme determinado pelo Plano Diretor
Participativo de Fortaleza (lei 062/2009). Sendo ZEIS, a área está protegida para regularização fundiária da comunidade que lá habita através de investimento do poder público, e o caso está sendo acompanhado pela
Comissão dos Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, Ministério Púbico, conselhos estaduais e municipais de proteção aos idosos, além de órgãos da Prefeitura, como Habitafor, Seuma e Iplanfor. Contudo, no
segundo semestre de 2016, foi iniciada a demolição de parte das casas por determinação da justiça, tendo o processo de demolição parado apenas com a solicitação de tombamento do conjunto.

Palavras-Chave (Separadas por vírgula): Patrimônio; Zonas especiais de interesse social; arquitetura; Vila Vicentina da Estância.

Autores:

Kelma Pinheiro Leite

Julia Santos Miyasaki

Ingrid de Queiroz Lopes

Isadora Rêgo Cid


Área Temática: 2 - OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
Eixo 10 – Comunidades: participantes efetivas das ações educativas
Título: Cineclube, Educação, Patrimônio, Resistência, Memória: Desafios e Potências na Educação Museal
O Museu da Imagem e do Som de Campinas está localizado em um prédio histórico de grande valor patrimonial, tendo sido tombado por três esferas de órgãos
de preservação do patrimônio cultural, o IPHAN, o CONDEPHAAT e o CONDEPACC.
O MIS está instalado em um palácio (Palácio dos Azulejos), que foi residência de Joaquim Ferreira Penteado, o Barão de Itatiba, além desta importante
característica arquitetônica, na história, o solar passou a ser utilizado pela prefeitura de Campinas, posteriormente pela empresa SANASA, após Secretaria
Municipal de Cultura e hoje museu.
Ao longo do tempo o palácio, antes ocupado por barões e figuras “importantes” da sociedade, passou a ser frequentado pelo povo, sendo esta ocupação
realizada em diferentes contextos culturais e sociais, desde as sessões de cineclubes, participações de coletivos e diversos grupos sociais, exposições, relações
com o espaço, parcerias institucionais com diferentes universidades, etc Todas ações desencadeiam no MIS uma construção de uma atuação de auto gestão ,
sendo que as proposituras de atividades são motivadas pelos diferentes atores do museu, do público para o público.
O presente trabalho pretende relatar as diferentes formas de relação com o MIS - Museu da Imagem e do Som de Campinas, na condição de coordenador do
espaço, considerando as tensões, bem como apresentar as potências da participação do público do museu na construção coletiva da memória.

AUTORES: Alexandre Sônego de Carvalho e Ana A. Villanueva Rodrigues


OFICINA ESCOLA DE MANGUINHOS : UMA REFLEXÃO SOBRE A EXPERIÊNCIA COM EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E FORMAÇÃO DE ARTÍFICES
NOS OFÍCIOS TRADICIONAIS DE CONSTRUÇÃO E ARTE
Autores:
Maria Cristina Coelho Duarte Palavras-chave: Educação patrimonial, patrimônio cultural, patrimônio imaterial, ofícios tradicionais.

Adriana Maria Assumpção


Débora dos Santos Lopes
Carolina Moreira

Resumo
Este trabalho apresenta um relato da experiência desenvolvida no âmbito da Oficina Escola de Manguinhos (OEM) que integra o Núcleo de Educação Patrimonial (NEP) do
Departamento de Patrimônio Histórico (DPH) da Casa de Oswaldo Cruz (COC). O objetivo da OEM é formar e capacitar pessoas para os ofícios tradicionais de construção e de arte
integrada, para atuação em conservação e restauração de bens culturais, em especial o patrimônio arquitetônico, contribuindo para a preservação desse acervo dentro e fora da
instituição que a abriga: a Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz.
A Fiocruz, cuja fundação data do ano de 1900, tem em seu acervo construído diversos edifícios tombados e com interesse para preservação, destacando-se os conjuntos eclético,
construído nas duas primeiras décadas do séc.20 a partir do projeto do arquiteto português Luis Moraes Junior, e modernista, construído nas décadas de 1940/50 projetados
pelos arquitetos da Divisão de Obras do Ministério da Educação e Saúde, em Manguinhos, na cidade do Rio de Janeiro. Recentemente, outros bens passaram a integrar o acervo
sob responsabilidade da instituição, como o Palácio Itaboraí e edificações anexas em Petrópolis, e parte do Colônia Juliano Moreira em Jacarepaguá, ambos em áreas que a
Fiocruz recebeu por cessão na década de 1990. Razão pela qual essa instituição investe, desde a década de 1980, na preservação de seu patrimônio arquitetônico por meio de seu
Departamento de Patrimônio Histórico, tanto com ações diretas de conservação e restauração quanto com a formação e capacitação de artífices para atuação em obras e serviços
dessa natureza, seja das equipes locais que atuam na Fiocruz seja da população em geral, por meio da OEM desde 2007, ano em que iniciou suas atividades de formação. Essas
ações somadas às ações de valorização do patrimônio cultural da saúde são pautadas em estudos e pesquisas desenvolvidas em caráter contínuo no Departamento e na Casa de
Oswaldo Cruz como um todo. A OEM vem, assim, contribuindo para a construção de um processo permanente e sistemático de trabalho educacional centrado no patrimônio
cultural por meio da criação de um espaço onde alunos e educadores (mestres e auxiliares) compartilham experiências de construção conhecimentos, por meio da apropriação e
valorização da cultura, contribuindo para o acesso e a difusão de conhecimentos relacionados à técnica e à arte, bem como um processo contínuo de formação e revalorização do
trabalho manual.
Esta experiência se baseia num processo educativo que busca estimular nos educandos, a leitura do mundo, propiciando a compreensão do universo sócio-cultural e do contexto
histórico em que eles estão inseridos. Consideramos que os processos de aprendizagem devem levar em consideração o seu papel na emancipação social e, nesse sentido,
ressaltamos que a democratização das práticas sociais requer também a democratização dos saberes.
RITO:
O menino do rancho
- Aldeia Jeripankó

Autora: Karla Calheiros


LOCALIZAÇÃO MUNICÍPIO DE PARICONHA.
Vídeo do ritual
VÍDEO GRAVADO DURANTE O RITUAL.
Ninguém é suficiente perfeito, que não possa aprender com o outro e
ninguém é totalmente destituído de valores que não possa ensinar algo
ao seu irmão (São Francisco de Assis).
Respeita teu próprio ritmo. Respeita o espaço sagrado de teu coração
onde teu mestre mora. Respeita o ritmo dos demais (Desconhecido)
Sempre observa primeiro, com o coração e a mente quietos, e então
aprenderás (Lakota).
A sabedoria dos índios é o ensinamento
para o homem (Fernando Ferreira).
Fotos da exposição
RESULTADOS
- Divulgação da acultura indígena
alagoana
- Valorização do patrimônio imaterial
- Aproximação da população com
costumes religiosos indígenas
DISCURSO DO ÍNDIO KARIRI XOCÓ RYACONAN PEDINDO RESPEITO PARA OS
POVOS INDÍGENAS DURANTE A EXPOSIÇÃO.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ALMEIDA, Luiz Sávio de, et al. Resistência, memória, etnografia. Maceió. EDUFAL.
2007.

LOPES, José Adelson. Menino do Rancho, Ritual de Passagem Jiripankó e forma de


linguagem comunicacional. 2013.

VIEIRA, Jorge Luiz Gonzaga. Povos Indígenas. Maceió. 2015.

VIEIRA, Jorge Luiz Gonzaga. Povos do Sertão de Alagoas: confinamento, diás pora e
reterritorialização.2010.

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