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80 VISORS Ha POLI TIEA possivel numa reptiblica’, Todavia, na minha opiniae, antes de chegarmos a uma conclusdo dessas, deveremos primeiro conce ber a hipdtese de termos compreendido mal as suas afirmagaes Asim, se analisarmos bem tados os comenton em a ae repubblica surge, descobrimos que para Maquiavel esse conceito pode ser utilizado para indicar qualquer forma de governo sob © qual as leis protegem o bem comum. Consequentemente, a questio de saber se uma monarquia pode ser uma repubblica nao € para Maquiavel um paradoxo um problema profuando que diz respeito arte de goxernar A i {io esté em saber se deveremos esperar que os reis aprovern apenas leis que visem o bem comum, Isto permite-nos fazer uma outra leitura: Maquiavel esté a dizer-nos que, no tempo de Romulo dos seus sucessores, as leis de Roma serviam 0 bem comum, de tal que forma que esses governos, embora monarquicos na sua configuracao, eram um excmplo de uma repudblica. Uma ver que isto nus permite superar a contradigio anterior, de minha opir . prelerir esta interpretagao. Mas e se a contradigao inicial tiver resistido aos nossos esfor- 508 re-interprctativos? J dei antes a minha resposta: nesse caso, teremos de admitir que nao consegui ¢ 108 saber aquilo em que Maquiavel acreditava. Antes de desistrmos, no entanto,€ preci é preciso te Se for esse 0 Caso, no nos resta outa alternativa sendo admitir que nao € possivel conhecer verdadciramente as crengas que estamos a estudar. Endo devemos sentir por isso que poderiamos ter feito tnelhor, Procurar encontrar uma inteligibilidade absoluta significa adoptar uma vis tera certeza de que estamos realmente num beco sem saf excessivamente optimista acerca daquilo que somos capazes de resgatar do passado, Veia-se, por exemplo, Colish, 197, midade» de Maquiavel neste ponto, . ‘com 4 ficagao ¢ compreensao na histori das ideias” A misao do historiador das ideias!€ estudar ¢interprctar wn canone de textos classicos, E a importancia de escrever ese tele h religido ¢ outras formas de pensamento conterem uma «sibel sais’. Em resultado t6ria reside no facto de os textos clissicos sobre moral, politic ria intemporals! expressa em «ideias univ disso, torna-se possivel aprender e beneficiar directamente dt investigacao desses «elementos intemporais» uma ver que cles posstiem uma relevancia perene'. Isto suger, por sa ve, pte 4 melhor maneira de abordar esses textos € caicrnthariny nw que cada um deles dis* sobre us «conceites funebamentare’ «9 quests recorrentes» da moraliclade, da politica, da trlate + da vida social,’ Por outras palavras, elevemns estar pre paral "Sabre a enor e confusa variedade de femas através das qua esta Faye io fndel tem sido utlizada, veja-se Mandebaum, 1965 Cai, 1950, px Blut, 1965, p13 Meek, 1967, . 3 Jaspers, 1963; Nelson, 1962, pp. 52-53. CF; Muh, 1951p. x sobre a necesita de hos concentrarmos nauilo que Pat disses Ryan, 1965, p-219, sobre a neces * MeCox, 1963, p. 7 Sobre as qustées erecoremtese¢«peteness veja-s¢ Morgenthau, 1958, p. 1: Sibles 195k, p. £83; Strauss € Cropsey, 1963, Puccio, Sabre a¥ questbesperenes come a (nica) garantn da teevdinciae seats csscos, wea se Hacker, 1954, McCloskey 1957, Para wn expsigio mats recente de wea psig simi ease Bev, 12%, @FPEULBLALCALALAARARERALEA RCARRREARA ELA KAEREL STF TSU RU UR LU RRR U A # VISOES DA POLETICA para ler cada um dos textos clissicos «como se tivessem sinks escritos por um contemporaneo nosso»! E sem duivida essencial abordé-los dessa maneira, concentrando-nos simplesmente to argumentos apresentados ¢ examinando aquilo ¢ nos dizer acerca «los temas eternos. Mas se, n vez disso, envere: darmos por uma anilise das co igdes sociais ou dos contextos intelectuais em que esses textos foram escritos, seremos inca pazes de descortinar a sua ‘abedoria imemorial e, dese modo, perderemos a nocio da sua importincia ¢ daquilo que nos levou a estudi-los? Estas sio as proposiges que pretendo discutir, erticar e, se possivel, eejeitar liminarmente. A crenga de que é suposto os pensailores clissicos terem reflectido sobre um determinado con. junto de «conceitos fiundamentais» deu origem, parece-me, a uma sitie de confusdes ¢ de disparates excyétivus que hd muito vem sswinbrando a histéria das ideias. Todavia, nao € facil perceber Me «que ponto essa crenga tem sido enganadora, facil criticd-ta do-a um «erro fatal’, mas a0 mesmo tempo € dificil negar que os histo! sempre utilizeram terminologias relativamente adores de diferentes tradigées intelectuais cis. Mesmo se aceitarmos o argumento, discutivel, segundo 0 qual s6 somos capazes de definir e distinguir diferentes actividades devido a certas analogias que nos sio familiares, precisare (os sempre de encontrar alguns cr ios © regras de uso corrente de for idlentificar devidamente certos actos ¢ a excluir outros como exemplos de uma dada actividade. De outro modo, nao teremos provavelmente forma de justificar que as histérias do pensamento cuce ou politico dizem respeito a actividades reconhecidas, Ea etensi de que todas as actividades possiem alguns conceitos arseteristicos que me parece estar na origem de certas confit- sives. Se témn de existir algumas semelhangas que ligam todos os "oy, 180, p28 ack, 1954; Bll, 1965 em particular ap. 3 Mactyje, 1966.2. nse Woln, 1961, pp. 11-17 acerca do secu da sofia politi SIGNIEICAGAO E COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS | 83 momentos de uma actividade, que teremos primero de saber quais sio de forma a conseguir e impossivel considera algumas ideias preconcebidlas sobre 0 que nos reconhecer a propria actividhule, vorna 1 qualquer actividade, ou qualquer momento dela, sen iremos encontrar. ‘A elevincia dest dima para »histria das teias = € om a © riadores se deve particular para a pretensdo de que os histo : aqjuilo que 0s textos clissicos disem sobre os temas fo € possivel sera agora mais ficil de pereeber. N: aquilo que um escritor dise (especialmente numa ponha cm causa as nossas estudar apenas ; cultura que nos é estranha) sem que tal préprias expectativas € 0s nossos preconceitos acerca do que eles estaric a dizer. Este dilema é bem conhecido pelos psicélogos ¢ pante do quadro mental do obser- cla passat SOMOS THOTT é considerado o factor determ Jrador. Aravés da nossa exper aspectos dle um cert mianicieas, ¢assinn intcrpretar determinados ; que esse quadro de referencia esté definide, estar preparado para perceber ou reagir de uma certs 0 dilema daf resultante pode ser apresentala, tend rim canta sigue sequins a etal Arata se apenas ol meus objectives, em termos de uma prop los modelos e os preconceitos que incvitavelmente organ Zan ¢ ajustam as nossas percepgdes € pensamentos tenderio a tinar cerminantes daquilo que pensamos © aprech demos, Para compreender precisamos de classificar ¢ s6 podemos classificar 0 que nao nos é familiar atrav familiar’. O perigo recorrente, nas nossas tenta 'o historia, € que as nossas expectativas cabario por determinar como factores det daquilo que nos € tivas de alargar a nossa compreen: acerca do que alguém estard a dizer ou a fazer a ; a nossa compreensio, levando-nos a afirmar que o agente esté a fazer algo que ele nfo accitaria como sendo uma descricéo da quilo que ele estava a fazer. Allport, 1995, em particular pp. ‘argumenta de que ito resulta necessar 20. jacncnte numa hist concebida era termes 2) filosicos é desenvolvid ‘dos noson pripioscritétios interesses (de quem mais?) i Jesenvol sobejamente em Dunn, 1980, pp. 13-28 PRLARARALLALLECCEELLAARIE LEER VISOFS Da POLETICA Esta ideia da prioridade dos paradigmas jf foi explorada, com sucesso, pela historia da arte!, e deu orige uma histéria essen cialmente historicista acerca do descnvolvimento do ilusionismo para dar lugar a1uma histéria que procura identificar as mudangas nas inteng es € nas convengées, Mais recentemente, uma andlise similar tem sido conduzida também com sticesso na historia da ciencia’. A minha intengio é aplicar aqui uma série de considera Goes similares 8 hist6ria das ideias. E 0 procedimento dat decor rente vai no sentido de tentar perceber até que ponto a actual unilise hist6rica da ética, da potitica, da religido ¢ de outras formas de penisamento est contaminada pela aplicagao inconsciente de paradigmas cuja familiaridade, para o historiador, dissimula uma incapacidace de os aplicar ao passado, Nio pretendo, como é [obter bons resultados. No entanto, parece-me importante chamarl steno para as varias formas como o estudo daquilo que cada Jsutor clissice wfirmsa corre inevitavelmente o perigo de cair em }itios tipos de absurdo histérico e, ao mesmo tempo, pretendo analisar as diferentes maneiras através das quais 0s resultados podem + clasificados como histérias mas, mais apropria- jas mas, propria amente, como mitologias. in Vejnse Kubo, 199, i pactculor pp 43-51, ond ‘ pasticular pp. 43-51, onde w ator apresenta a nugio de «pio ridade de paradigaase, CE a insstacia semelhante em Collingwoad, 1940, em par ticular pp. UH, seu segs ‘qual o pensamenta de qualqucr pe & organizado clas de pressuposicdes absolutase. Para uma anslisevalioss da teria da cénca de Kuhn cas suas pte Hollinger, 1985, pp. 129. 4 SIGNIFICAG AUF COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS 85 1 los 1emas considerados constitutivos da disci doutrina acer fembora incons andado para cair ( plina. O quc é meio eaminho andado p Cicntemente) no paradigma de tentar «encontrar» a doutrina de um dado autor em todas as suas alirmagdes. A discussio d resultante pode ser rotulada como mitologia das doutrinas ‘As mitologias assumem diversas formas. Em primeiro lugar, existe o perigo de converter algumas observagoes dispersas ou fortuitas de um autor clissico na sua «doutrinay acerca de um dos temas que € suposto cle ter desenvolvido. Isto, por sua ve7, acaba por gerar dois tipos particulares de absurdo historico, Um E inais caracteristico das biogr sindpticas do pensamento, nas quais a atengio est pensador individual (ou num conjunto de pensadores). O outro ico das «histérias das ideiase, nas quais 0 loco fias intelectuais ¢ das historias entrada 0 & mais caracteristi da ateagio esti voltado para o desenvolvimento de uma videia © perigo mais recorrente com a biografia intelectual é 0 lo anacronismo. Pode ter-se descobertor que um dado autor de fendeu uma perspectiva, devido a um acaso de semethangt 14 minoldgica, sobre um argumento que cle nie tinh em nests Marsilius de Pédua, por exemplo, a dada altura do seu Defer » tipicamente aristotélica acres Pacis avanga com uma observa do papel exccutivo dos governantes legislative do povo!. Um comentador moderno que se depare fa passagem estaré familiarizado com a doutrina, impor mm contraste com 0 papel na teoria e na pritica constitucional desde a Revolugiv segundo a qual uma das condigdes da liberdade poli o do poder exccutivo e do poder legiskativ ‘Americana tica reside na sepai [As origens desta doutrina podem ser identificadas na proposigi ica (avancada pela primeira vez cerca dle dois séculos apés a morte de Marsilius) de que a passagem da Repiiblica Romana a um Império exemplifica © perigo que representa para as conferir poder politico centralizado a0 a liberdade das pessoa 7 Marsitos se Mihua, 15E6, vol 2 pp 61-67 aU UR RRO TTT TFS RRR RRR EEE SER EEE 86 VISOES Da POLITICA representante da autoridade!, Marsilius aio sabia nada de histo riografia, nem tao-pouco das ligées que dai se retirariam. (A sua propria reflexdo deriva do Liveo IV da Politica de Aristoteles 10 est nada preocupada com questio da liberdade politica.) Nada disto, todavia, tem evitado um debate encrgico acerca da questo de saber se Marsilius teria desenvolvido uma «doutrina» da separagao dos poderes e, nesse caso, de saber se ele deveria ser » 0 fundador da doutrinas'. Mesmo aqueles q negam que Mursilius possa ser considerado 0 fundador da dou trina tendem a justificar as suas conclusoes a partir do texto de Marsilius’, nfo se referindo ao erro que consiste em supor que cle poderia ter tido a intengao de contribuir para um debate cujos termoy nao estavam ao seu alcance © mesmo tipo de anacronismo tem caracterizado a discussio cm tore do dictum avangado por Sir Edward Coke acerca do case de Bonham, segundo o qual as leis tradicionais inglesas escritas podem por vezes sobrepor-se aos decretos parlamentares. © comentador moderno (em particular americano) aplicaré a esta observagao as ressonincias muito mais tardias da doutrina bsolutamente (0 judicial. O préprio Coke nao sabi nada sobre essa doutrina. (O proprio contexto dessa sugestio é 0 de um politico partidario assegurando a Jaime I de que a caracte- ristica definidora da lei é 0 costume e nao, como Jaime pretendia, a vontade do soberano‘,) Todavia, nenhuma destas considera~ es hist 9 as tem evitado a insisténcia na questao, desprovida de seutido, de saber se «Coke estava realmente a defender a revisio jue ke °, OW 0s argumentos de que C fa conscientemente a definir uma enova doutrinas e, desse modo, a contribuir para o 1965, Baily, 1967 Marsilius de Padua, 1951-6, ol. 282, "Para uma bibliogefi,vej-se Marslius de Pius, 1951-6, vol. 1, p- 284m, Para una " jase Paco rejeido pramente textual dessa pretensio, veja-se DEnttves, 1989, p * Pocock, 1987, em particular pp. 30-35, Gwyn, 1965, p53 | SIGNIFICAGAO E COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDELAS 87 sso da cigncia politica»'. Uma vez mais, os especialistas im a Coke 0 crédito de ter detinido essa dow appro que no concedera trina, em vez de term contestado a pretensio de se analisar as tengdes de Coke, basearam as suas conclusbes numa reinter 1a além da eventualidade de se estar a atibuw a um auvor ados que ele nunca poderia ter transmitido, existe o peri- xinda mais insidioso de prontament ador pretende, a priori, encon. J Se procurar nos textos clissicos as doutrinas que 0 observ: rar, Considere-se, por exemplo, as observag Richard Hooker langow no Tavro Tdo sea tical Polity acerca da sociabilidade natural Tooker era simplesmente ~ tal como s aristotélicas que Podemos muito bem sentir que a intengao de F acontecia com muitos advogados escolisticos dese tempo ~ en guir as origens cnvanas dla Tgreja ay contrar uma forma de distin; Jociagies civis. “Torlavia,« come origens mais mundanas dasa dor moderno que coloca Hooker no Hooker a Lacke © deste aos Pilophes Iker de steora ale topo de uma alinha de dey cendentes» que vai «de facilmente qualificard as observagbes de Hol Sonsidere-se, da mesma forma, as abservaysnes las por John Locke mum out clas conteato social sobre fideicomisso apresentad pontos do seu Tivo Treatises of Government’, Provavelmente, Lacke a uma das analogias legais da época, Novamente, todavia, estava apenas a chamar a atengio mais recorrentes na teoria polities fo comentador moderno que olha para Locke como estando a radigao do «governo por consentimento» gumas spassagens sobre este tema que surgem disper facilmente cabeca da reunird a Phucknet, 19267, p- 68 Para a prtensio de que ct sintensiow dC raiment aplicatss, velase tl 1928.9, p. 368 cE Corwin, 1948, p42 Para umn eeeigo posamente texto, veasse Thorne, (8 "Hooke, 1989, 1. 104, pp: 899. © Mortis, 1953, pp. 1-197, og, 1. 149, p, 36711 155, pp. 370-371 * Locke, VUVRAULALLAVTATLITELLLALAILAELELELTELARLY as VISOFS Da POLITICA sas na sua obra para depois avancar com a «doutrinay de Locke sobre «confianca politica’. Constdere-se ainda as observ feitas por James Harrington em The Commonwealth of Oceana em tomo do papel dos advogados na vida politica. O historiador «que investigue as alegadas perspectivas dos republicanos ingleses da década de 1650 sobre a separagio de poderes pode sentir-se inomentancamente desconcertado ao descobrir que Harrington («curiosamente») nao az, referencia aos funciondrios pblicos, Mas um historiador que sabe 0 que pode esperar da doutrina desse Bfupo nado terd dificuldade em insistir que «isso parece ser uma Hfirmagn vaga da doutrinan”. Em todos esses casos, quando um ont estr mesma questo. Se um autor pretendia apresentar a floutrina que the € atribuida, porque é que ele nao o conseguiu fazer de forma explicita, obrigando o historiador a reconstruir as suas alegaclas intengdes a partir de conjecturas ¢ supo: ‘Ainitofogia das doutrinas pode ser igualmente ilustrada com a8 shistérias das ide’ is» em sentido estrito. O objective aqui (nas palavras de Arthur Lovejoy, pionciro nesta abordagem) é tragar a morfologia de uma dada doutrina «a partir de todos os dominios da historia em que ela surja»'. O tipico ponto de pantida € esta- belecer um tipo-ideal dessa doutrina ~ seja cle da igualdade, do progresso, da razao de Estado, do conteato social, da grande calcia do ser, da separagio de poderes ¢ por ai adiante. O perigo com esta abordagem & que a doutrina sob investigagio pode facilmente ficar reificada numa entidade, Como o historiador vai procurar uma ideia previamente caracterizada, facil sera que ele comece a referir- forma desenvolvida da doutrina como se ela fosse imanente a propria historia, mesmo se vétios pensadores Meja-se Gough, 1950, pp. 47-72 (gaverno por consentimento) © pp. 136 nisso politico). Gaya, 1965, p. 32, Gaya, 1965, p. 52 Lovejoy, 1960, p15 * Bry 1992, p.7 J SIGNIFICAGAO E COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS 89 nao a tenham conseguide «descabrirs', mesmo que ela nio se tenha «manifestado» cm diferentes perfodos do tempo’, mesmo que uma época inteira no tenha tido «consciéneian dela’, Dat resulta que os historiadores correm o risco de comegar a utilizar uma linguagem mais adequada 3 deserigdo de um organismo em crescimento. O facto de as ideias pressuporem sujeitos desapa a si prop rece facilmente quando as ideias se voltam apenas py . Dizem-nos, por exemplo, que 0 snascimento» da ideia de pro gresso teve um parto ficil, pois «transcendeu» os sabsticulos ao seu strgimento» por volta do século XVI €, por isso, consegui guintes’. Todavia, a ide desenvolver-se ao longo dos 100 anos s dla separagio de poderes teve mais dificuldade em ver alu. do dia Embora tivesse quase «emergido» durante a guerra civil ingles nunca chegow a materializar-se verdadeiramente», de tal forma culo wlesde a guerra civil inglesa até que foi preciso mais um s meados do século Xvint para que surgisse realmente © de fore sustentada uma divisio tripartidas' Estas reilicagées dio origem a dois tipos de absurdos histricos, prevalecendo ambos no género de histéria praticaca per Lewejoy ‘embora aio apenas ai”, A tendéncia para procurar aproximagic 20s tipos ideais gera uma historia quase inteiramente voltada para a identificagio das «antecipagéesr das doutrinas e, dese modo, para um clogio da clarividéncia demonstrada pelos seus autores Marsilius de P. Maquiavel’. Maquiavel € apontado como estando «na origem de Marw»". A teoria dos signos de John Locke € considerada «tnt Jua é referido pela «antecipagio notivels de any, 1982p 7. Westin, 1965, 145 Raab, 164.) Burg F982 1, Vike, 167, i Pts nce raescume a borage le Lovejoy, ease Oakey, 1984, pp 15-40 Ra, Hoye TFS SU UL U RRR RSS EUR » VISORS DA POLITICA antecipagio da metafisica de Berkeley". A teoria da causalidade de Joseph Glanvill é louvada pela forma «como antecipou obra de Humes?, A andlise de Lord Shaftesbury sobre o problema «la twadiceia € enaltecida porque, «em certo sentido, antecipou Kant» Tor ve7es, até mesmo a pretensao de que se trata de urna andlise hiistoriea & posta de lado e os autores do passado sao simples- inente elogiados ou criticados tendo em conta a dad capacidade que evelaram de pensar como nés préprios pensamos. Montesquicu antceipon as ideias do pleno emprego © do Estado-Pro tal demonstra a natureza «brithante ¢ ineisiva» do seu pensa idencians mento! Maquiavel pensou a politica tal como nés 0 fazemos iso que w torn «imortals, O mesmo j4 no acontece com os cus cantemparincos: 0 que torna as suas perspectivas politicas spletannente ireaistays’, Shakespeare («am autor eminente se ste pli) revelava grande cepticisme quanto «2 possibili chute de aie sociedad imter-racial € tolerante»: esse € um dos sspecton que confere valor aos seus «textos sobre educagao moral © politica’, K por ai adiante Encontramos um outro absurdo associado a estes disparates nas discussdes intermindveis sobre se uma dada «ideia unitéria» pode ter sreulmente emergido» num determinado periodo ¢ se cla esta «realmente presente» na obra de um certo autor. Co dere-se novamente as historias da ideia da separagio de poderes. Seri que a doutrina jf esti presente nas obras de George Bu- chanan? Nao, pois ele «ni a definiu totalmente», embora nessa poe saingucen tenba chegado to perto»”, Mas terd sido nessa altune> que comegaram a surgir as primeiras propostas consti- nctunats aprescntadas pelos realistas na guerra civil inglesa? Nao, Sento, Dp HRD Pen 198, pA ret V4, pe TL Mons, 166, pp 49-9, Aa 1%, ps 1 Lara uma eaica, vase Anglo, 1966, Hoan Pall Mb, pp 24, 86 G9, 18, 9 | SIGNIFICAGAO E COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEAS 91 Ou considere-se pois nfo se tratava ainda de «doutrina pura» ainda as historias da doutrina do contrato soci pelos Huguenotes mas guerrs al, Jf existiria a doutrina nos folhetos produzidos fio, pois as suas ideias nao estav: s estaria talvez presente nas religiasas francesas? D «suficientemente desenvolvidas», Ma: frios catdlicos? Nao, pois os seus entunciados estivessem aclaramente obras dos seus adve eram ainda «incompletos», embora eles mais avangados~” © primero cxbogo da MTOTOETT TS diferentes configuragées, num erro de interpreta ssente, nessa jas por tedricos| jo de abservagbes dispersas ¢ ocasionais produzi¢ as que os historiadores estariam & espera lassicos sobre 0s A segunda manifestagio dessa ue cles tivessem desenvolvide. Jnitologia, na qual pretend centrar agora a minha atengo, Jere-se a uma inverso desse exo. Um autor clissien que nao enka sido capaz de criar uma doutrina reconhecéve! sobre wn} dos temas obrigatérios é criticado por nav ter conseynico desem ‘A investigagao histories da (corms moray cP dencialmente eivada por uma versie demonoliig (nas com desse erro. Essas disciplinas, comme nos Lenn: grande influéncia) iF ars ewerdadeitos bram logo de inicio, estio ou leviam estar ligadas padrdese eternos ov, pelo menos, tradicionais’. Considera-se assim desejével fazer a historia desses temas tendo em conta 0 tom menos incisivo» que caracteriza a reflexdo moderna «sobre € 08 seus objectivos» c tomar como centro dessa historia a avida ‘Thomas Hobbes, ou andlise dos responsaveis por esse colapso’. por vezes Nicola Maquiavel, foi considerado o responsével pelo Vie, 1967, p46. Gong, 1957, p99 © Straus, 1957, p12 “Bloom e Jala, 1964, pp. 12. Para wna aruculagéo ou no restabelecimento de certas verdades finaly, tica desta ceenga da Bilosofia politics na ‘eja-se Kauian 1954 Para wa defsa, vase Copsey, 1982 2 VISOES DA POLETTE, pecado original da desobediének : Hiéncia humana’. Os seus contempo rineos sio assim essencialmente clogiados o eee 1 culpabilizados de fersio dess; st mesma «verdladen a itagio ou suby can dents © Principal proponente desta abordagem, «nao hese declarar, perante a8 obtas potas de Maguivel que che #5 como simorais ¢ ireligiosass'. No hesita mir que 0 vigor da sua dentincia nfo ¢ €m contradigao com o seu objective d : ans obras de Maquiav deve ser denunciad: igualmente em assun He tentar « a n F scompreender» as well. Aqui, o paradigma determina a dizeccao a investigacio histética A historia 56 pode ser re-interpretady S€ 0 proprio paradigma for abandonades “ae Todavia, a ve a, # versio mais influcnte de: doutri th veram. O que dé origem, por veze Que essas grandes figuras toda MIS consiste em atribuir aos autores cls eo sicos doutrinas que we Proprias mas que cles inexplicavelmente nio desenvol 8, a extrapolagdes a partir do Susces cs afirmaram de modo a atribuir-thes £#¢ due convent ao observador. Toms de Aq ter-se referido a sinsensata «desoh neaenate ; bediéncia civibs», mas certament “do a teria aprovados’. Marsilius de Pid cae aprovado « democea. a actia certamente P democracia, uma vez que «a sol pea berania por ele defen- 14 dizia respeito a0 pover', Richard Hooker por sew lado ono ficaria muito fel ize, jd que «a sua concepeio aristocrits religiosa e ampla da lei tem sido reduzida 4 ui Pi vontade popular, la @ um mero vefculo da This exercicios podem bizarros, mas podem também cas pase assumir um cariz mais sinistro, “es casostalvez déem a entender: uma forma de impor og ara sta per esta perspectiva sobre Hobbes vjase Straus, Cauda a Maquiael,veja-e Stausy 1948 Nestes mesmo tes ‘ein 36, por exemplo, wate desta Ascham ¢ a detesa do Earl de : ae Seuss, 1998 pp et 1 Nn Clarendon es Conan 1? etd . © Seuss, 195, pL Cranston, 1964, pp 34-45 Mars Pal 1 "id, 1951-6, vol pS Shits, 1949, p 2 a 4 SIGNIFICA, \O F COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS 95 hnossus prsiprins preconceitos a autores carismiticos sob a capa de uma especuligao histérica inofensiva. A histéria transforma-se rtidas «ue pregamos aos mortos, assim numa série de pa A estratégia mais comum, porém, € pegar nun trina que um dado autor deveria ter referido, embora € depois criticé-lo pela sua incompeténcia a certa dow. conseguido far A prova acabada do dominio exercido por esta abordagem ¢ que odo de andlise na cla nunca foi posta em causa enquanto n 6 mesmo pelo mais anti-essencia historia das ideias peliticas, lista dos cientistas politicos, T. D. Weldon. A primeira parte do livro States and Morals apresenta as diferentes «detinigées de Estado» que todos os cientistas politicos «ou formularam ou to- maram por adquirido». Ficamos a saber que todas as teorias do Estado podem ser divididas em dois grupos principais: «Alguns definem-no como uma espécie de organismo, outros como algo parecido com uma maquina». Partindo desta conclusio, Weldon vai «examinar as principais teorias sobre 0 Estaclo que té0 sido propostase, Mas, chegado a este ponto, Weldon aperele s+ ue mesmo «aqueles autores que sio considerados gencricament ‘am acabamy por ae como os teéricos mais influentes nessa 4 desiludir sobremaneiea, pois pouces entre eles sao capi « sou contradigsess. I lege] expor as suas teorias sem «inconsisté parece ser o tinico autor «totalmente fiel» a um dos dois madel considerados por Weldon como os «grandes objectivos» de tod cientista politico. Um autor menos autoconfiante chegaria sen ponto © questionar-se-ia provavelmente se a sua caracterinte inicial do que esses tedricos pensavam estar a fazer estarit cottes ta Todavia, Weldon limita-se a dizer que nao deixa de parecer vesirs ho que, depois de mais de dois mil anos de pensamentos, qurase todos se revelem to confiusos! A literatura exegética esté repleta de casos relacionados com esta mitologia das doutrinas. Considere-se, por exemplo, o ligat "Weldon, 196, pp. 20, 68-64 sR F TTT F FSR U ARERR ESSE ELALE of VISOFS Da POLETICA ocupado na teoria politica pelas questies ligadas as eleigives © 4 tomacda de decisoes ¢ ainda ao papel da opiniao publica em tex mos genéricos. Tais questdes assumem uma importincia crucial na recente teoria polit a democritica, embora nio tivessem des pentado grande interesse nos autores anteriores ) implantacio «las modernas democeacias representativas. Aparentemente, seria lesnecessario referie a importincia do contexto histérico, Ainda assim, 0s historiadores continuam a criticar a Repuiblica de Platao pelo facto de cla «omitire a «is fuéncia da opiniao pablican' ow atacar John Locke € 0 seu Tivo Tieatises por ter omitido «todas as releréncias 3 familia © A raga» e por nao ter deixado «total mente clara» a sua opiniao sobre o sufragio universal’, Ede facto surpreendente, asseguram-nos, que nenhurn dos agrandes autores «le politica © de direito» se tenha debrugado convenientemente sobre o probleura da tomada de decisao’, Considere- ‘se, da mesma forma, a questio de saber até que ponto 0 poder politico esté sujeito 3 manipula por parte dos actores socialmente privile- giados. Esta & também uma das questées m: ‘ais prementes para os a tanta importancia para aqueles que nao defendem a vontade popu te6ricos democréticos, embora nfo tenh a. O papel do con texto histérico é ébvio mas, uma vez mais, nao tem sido suli- ciente para evitar que os comentadotes critiquem M: Hobbes ¢ Locke por nenhum deles ter contribuido gresson desta discuss quase exclusivamente: mad laquiavel, para 0 «pro: ‘Uma forma de mitologia ainda mais influente consiste em ctiticar os clissicos segundo © postulado, a prior’, de que esses Sabine, 1951, p67 Aaron, 1955, pp 288-285, * Friedrich, 1964, p. 178, * Neja-se Plamense7, 1963, of, 5, sobre a rand mission dle Maal 196.578, sobeew alhango de Hobbes em vl mar conseiéaca da yur oh onflto entre diferentes elasseax; Hacker, 1961, pp. 192,285, scleral, satande omissio« no pensamento de ataquiavel assim como to de tiwte, 1950, p- xxx, sobre o facto dle Maguiavel no ter contrbuida pata a puogeever cy iia de que a arganizagso social esté ma base da pica {- SIGNIFICAGAO E COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDELAS 95 atores acreilitavain que os fentos que colawamn 8 Cserever Const? i n capazes de contribuigéo mais sistemdtica que cles eram cap nferecer 3 sua disciplina. Se comegarmos por assum de exemplo, que uma das doutrinas que RIT ee lise “as ebases das obrigagées polices, entio as perspectivas paitias de Hooker esto in completase pois ele nfo fez qualquer esforgo para refutar a (eo ria da soberania absoluta’, Da mesma maneira, se comegarmos por assumir que uma das preocupagées principais de Maquiavel em O Principe & explicar «as caracteristicas dos politicos», ndo seri entao difcil para um cientista politico contemporineo mostra que a visio de Maquiavel é cextremamente parcial ¢ nao siste a a obra e comegarmos por assumir qu mitican’. Uma vez mais, se comecarmos j Je Locke, Two Treatives, inclui todas as doutrinas que ele preten: dia enune Je politicar, posler dia enunciar sobre «a lei natural ¢ a socieda le se-é entdo perguntar por que € que cle foi incapaz de wdlefender ‘pstado : e, se comegarmos por Asstt um Estado universal’, E, novamente, AFIS mir que um dos objectivos de Montesquieu em De lEsprit des Jois tera sido enunciar uma sociologia do conhecimento, oe 4 sem diivida um «falhango» no ter conseguido expli terminantes, tal como «o deveremos constitu pais det car quais as suas princip “ a veusntr de nfo ter sido capa. de aplicar a sua propria teori a Mesmo com todos estes «falhangos» oposta desta mitologia, ha uma questio que continua por respon der: seré que esses autores alguma vez tiv poderiam ter pretendido, fazer aquilo de que sa nao ter feito? m a intengio, ou acusados de Davies, 1964, p. 80 © Dab, 1963, p13. * Cox, 1960, pp. x 182 Stark, 1960, pp. FH, 153 9% VISOFS Da POLFrICA UL Gostaria agora de anali 'rora de analisar um segundo tipo de mitologia auc tende a sucgie pelo facto de os historiadores inevitavelmente abordarcm as ideias do passado. Pode muito bem acontecer que ® Pensamento dos autores clissicos nao seja consistente ou nao Consiga mesmo dar-nos uma visio sistemytica das suas eren Suponham, todavia, que o paradigma relerente ao método dy investignezo defende novamente a n doutrinas dos autores elissicos sobre c wecessidade de definirmos as ada um dos temas essenciais «la disciplina. Torna-se entdo perigosamente fécil par historia ‘lor acreditar que a sua tarefa consiste em ateibuir a esses textos lima coeréncia que eles aparentemente nao possucin, toma sea fi ae 4s aia maior ela difeuldae nim procera ue possa ser resumida © mais facilmente transmitida'. Toda a histéria da filosotia morale politica esté impregnada a Se «a opiniao acaclémica actual» jae encontea qualquer coeréncia em Laws de Richard Hooker, igfo & continuar a procurar, pois deve desta mitologia da coeréncia existir af uma coeréncia Se houver dividas quanto aos «temas mais importantes» da filo, lever do exegeta descobrir a «coeréncia interna da sua doutrina» através da leitura siste sofia politica de Hobbes, ica de textos J¥e 0 argumento ~ numa frase reveladdora cadquira alguma cocréncia»'. Se n i” como Leviathan até facilmente acessivel> ao estudante da tcoria politica de Huan, "Param esd evened algun tomas hs laconaos, vee Lenin, 1%, py 25 nn aegumentosemethantesceecs do problema de y aco bem comme da minha, eee do ites da. beech em ned «ta cocrEaci, ja se Hey 1, Warrendes 195, 4 SIGNIEICAGAD E, COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS 9) dever do exegeta & «perserutar abra atris de obra» até encontrar, «a tol o custon, o «maior grau possivel de consisténcia do con junto»! (uma ver mais, numa frase reveladora). Se as idcias politi cas de [erder «raramente estdo organizadas de modo sistematico» ce surgem adispersas a0 longo dos seus excritos, por er do exegeta € tentar «apres textos mais inesperados», o de as suas ideias de uma forma relativamente coerente»’, As meti foras habitualmente utilizadas para descrever a tarefa do invest. gador — 0 esforco e a busca ~ nio padiam ser mais reveladeras. ‘A ambigio «chegar» a uma «interpretagio unificadar, de fora a «atingim uma «visio cocrente do sistema de um autor Este procedimento confere uiaa cocréncia ao pensament dos principais fildsofos ¢ « aparéncia de um sistema fechado, que avelmente nunca atingiram ou nunca pretenderam atin cles prov Se assumirmos de inicio, por exemplo, que o trabalho de git. $ interpretagao da filosofia de Rousseau: deve centrar-se ait dese berta do seu spensamento fundamentals, o facto de ele ter cots cas de inwestin.nse buido durante virias décadas para diferentes & facilmente deixard de ser uma questéo importante!, Se assunan mos, 4 partida, que todos os aspectos do peasamento de TI foram concebidos como contribuigéo para um sistema «Crissav deixard de fazer sentido sugerie a leitura ia ste mais abrangent tobiografia de forma a clarificar um ponto tio crucial come Ja politica’. Se partirmos do prin as relagdes entre a ética ea pio que no caso de Edmund Burke existe uma «filosofia moral screveu, nfo ha qualyurs coerenter por detris de tudo 0 que dl problema em tratar «o conjunto das suas obras publics em mo «um corpo Gnico de pensamento»’. O ponte a qu vidas c sees, 1968, pp. Barna, 1965, pp ms, 139 Watkins 1965, p10 Cassizer 954, pp 46,2 Hood, 1964, 28 Parkin, 1956, pp 2.4 QCA CAA ER EAALARARCALEREERAERERAE saa FTF F FFU TTA os VISOES DA POLITICA estes procedimentos poxlem chegar fica hem patente nun influcit estudo do pensamento social e politico de Marx, no qual se van sidera necessério, para justificar a exclusio das contribuigives «le Engels, referir que Marx ¢ Engels era n «dois seres humasios dis, Claro que acontece, por vezes, os objectivos © 0 éxito ile win dado autor serem tao diversos que acabam por contrariar os es forgos de tais exegetas para obter um sistema coerente a partir dos seus pensamentos. Nao raro, todavia, dio origem a uma forma inversa de absurdo histérico: a auséncia de um sistema torna-se bcteato para langar o descrédito sobre um autor. Por exemplo, se indispensivel em termos idcoldgicos e conveniente cm termos exegéticos que as diferentes teses de Marx estejam disponiveis em meia di a de chavies. Todavia, € apesar dos coforgos envidados pelus criticos de Marx, esse tipo de sistema continua diffeil de encontrar. Uma das razdes para t facto de M al reside no de Marx se ter prcocupado com uma grande variedade de uestdes sociais e politicas. Ainda assim, tem sido recorrentemente eriticado pela «natureza tragmentaria»” da sua teoria e por nunca a ter conseguido esteuturar de forma organizada. Estas criticas éemergem ainda mais rapidamente quando um autor & classifi 4 partida, segundo um modelo ao qual eles deveriam ter aspirado, Se asstumirmos, por principio, que todos os pensadores conserva dores defendem necessariamente uma concepgio «orpinica» do Estado, entao Lorde Bolingbroke «deveria ter assumidlo» essa posi So © nao deixa de ser estranho que cle nao tenha estruturado os seus argumentos dessa forma. quer fil6sofo que defendermos, a priori, que qual alise a teoria da justiga ter necessariamente de reflectir sobre uma das trés perspectivas ebisi Peito, entao, sem dvida, o facto de nem Plato nem Hegel tere cumprido esse requisito serve para mostrar que eles «iio quiseram Avines, 1968, p 3 Sabine, 1951, p. 682 * Heaenshany, 1928, p. 243, 4 SIGNIFICAGAO F. COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS 99 tomar uma posigao definitivas sobre essa matéria', Em todos esses casos, a coeréncia ou a falta dela deixa rapidamente de ser io histérica dos pensamentos transmitidos por um uma deserig autor A objeccio € Sbvia, mas nao foi o suficiente, na pratica, para impedir o desenvolvimento da mitologia da coeréncia em duas dircegdes que s6 podem ser designadas de metalisicas no sentido mais pejorativo do termo. Em primeiro lugar, delende-se que pode ser adequado, com o objectivo de extrair uma me \gem com o maximo de coeréncia, nio dar importancia as deelaragbes de jntengies que os préprios autores apresentam para justiicar 0 seu crabalho ou até mesmo desvalorizar obras inteiras que possam ia dos seus sistemas de pensamento. A lite- comprometer a coeré: ratura exegética sobre Hobbes ¢ Locke permite-me ilustrar ambas 2s tendéncias. Sabe-se actualmente que, nos seus primicitos livres de tcoria politica, Locke pretendia apresentar ¢ defender um mente conservador € até mesmo autori ywam a rotular ponto de vista mare: rio. Ainda assim, alguns cientistas politicos contin Locke como sliberais» sem terem em conta o facto de as teses de que Locke apenas as formulou quando ja tinha cinquen : antes'. Locke com ce que ele préprio as teria repudiado vinte anos nda nao é, evidentemente, «Locke», mostrando um no a que 6 proprio Sir Robert Filmer nunca trinta ano: grau de pat aspirou. ; : Quanto a Hobbes, sahe-se a partir das suas préprias afirma- «des qual o cardcter que ele pretendia atribuir 3 sua teoria politica O Leviathan, como Hobbes afirma na conclusio, foi escrito «sem qualquer outra intengio» para além de mostrar que 6 «Direito “hales, 167, px, Bird, 1967, p22, Adler, 1967, pp is-x,promete (no seu Pre 1 Bind, 1967) que oInsitut Fa Philosophical Research continuard a te nto ondcnad de vcavs das diferentes npinidese sie outros assuncos enum conju rosigbe claramente defindase, Ente o temas que serio objecto dessa onganizacion tnconteam-sen progesso, elicidade © 0 amor. 7, pp 7-10, 68-83, » beams, Seliger 194 nt VISOFS DA POLETICA Civil dos Soberanos eo Dever ¢ Liberdade dos Stibditose podem estar hascados «nas Inclinagdes Naturais da Humanidade» © que uma tcoria assim sustentada deve centrar-se na «Relagio mitua centre Protecgio ¢ Obediénciay'. No entanto, ha quem insista que este «elemento cientificor do pensamento de Hobbes nao passa de um aspecto disparatado de um «tado religioso» tra Além disso, 0 facto de o p scendente Sprio Hobbes, aparentar nao ter cons cigncia deste sistema superior de coeréncia leva-o a contra-argu mentar ¢ nao a retrair-se. Hobbes «nao conseguc simplesmenie deixar clarow que a sua andlise da natureza humana serve, «na verdade», um propésito religioso, ‘Tevia sido «muito mais facile se Hobbes tivesse «falado em termos de obrigagées morais ¢ civis © desse modo, a «verdadeira unidade» ¢ 0 cardcter basicamente tcligiose de todo 0 seu «sistema» tornar-se-iam evidentes Quanto a outra tendéncia metafisica a que a mitologia da coeréncia di origem: uma vez. que é suposto que os textos classicos possam uma er indspensivel Tashi 1961, pp. 47-93, 13 ttagos mais evidentes esse period. Veiase, por exemple ara ete argomento, vejase Strauss, 1953 ¢ Cox, 1960 » Wilin, 196, p 26, imiste que sum fetor atento finae Hobbes. A afiemacan est sea € a tora doginante: Mes io pode dear de reparars que Lacke pret rl pretare na grande maioria dos manuats de pensamento palitco inicio aera Inovderna, Veja-se, por exemplo, Martin, 1962, p. 120. Veh, por cil, ras, 1957, p48, para oargumento de que Hobe 0 acres de Maquiavelilesofa politica tradicion Nejase Raab, 1964, ech Chel, 1935 « Prezzotni, 1968 Dass ama anise mais completa dos problemas relacionados com a sinflagncia teceptica, vejose Skinner, It, Paria ia de que o meu argumeato €excessivam aoe estao iid cj ae Oakley. 1999, pp 138-187. Nao nego todavia, que 9 oF pia utlizo por vezes ) Defendo apenas que esto ponsa ser cnrgecee. (EU pr “fenemon tera ceneza de qe as noses wbilzacies do conceitopassaram os testes os VISOES DA POLFTICA poderia ter encontrado as doutrinas em causa em qualquer outro autor que no A; esas doutrinas, Considere-se agora 0 meu exemplo anterior tendo (iii) que B nao poderia ter chegado sozinho a em conta este modelo, Pode considerar-se que a alegada influén cia de Maquiavel em Hobbes, ¢ de Hobbes em Locke, nio con segue passar sequer o teste (i). E verdade que Hobbes nunca se refere explicit rente a Maquiavel ¢ Locke nunca se refere expli citamente a Hobbes, Pode demonstrar-se que a alegada influéncia de Hobbes em Locke ¢ de Bolingbroke em Burke nio consegue passar 0 teste (ii). Burke poderia muito bem ter encontrado as doutrin s de Bolingbroke que supostamente o influenciaram Grie de panfletarios politicos do inicio do s 40 governo de Walpole'. Locke podia com as douttinas atribuidas a Hobbes em dive de facto a dGeada de 1650 que nao é muito evidente qual o scu grau de familiaridade com -ulo Xvi hostis gualmente ter-se deparado 1s obras politicas que Locke claramente leu, a0 passo as obras de Hobbes’. Por fim, e como € dbvio, nenhum dos exem. plos citados passaria 0 teste (iii). (Pode mesmo dizer-se que nao 1 passar esse teste.) Aooutra forma dominante dessa estreiteza de espirito deriva se sabe muito bem até que ponto € possi do facto de os analistas utilizarem de forma errada, inconscien- temente, a sua posigio privilegiada na descrigio do sentido de uma dada obra, Hi sempre o perigo de o historiador estruturar um argumento de tal maneira que os seus elementos nao fami Jiares acabam por se dissolver numa familiaridade enganadora Dois exem os Sbvios serdo suficientes para ilustrar este ponto, Considerem, primeiro, 0 caso de um historiador que decide (talver de forma acertad: aracteristicas fundamentais do pensamento politico radical da Revolugio Inglesa do século XVIt era a prevcupagio com o alargamento do dircito de que uma das -ados voto. Esse historiador pode depois ser levado a conceber esta " Neja-se Foor, 1964, em particular pp. 57-109, 113-159, ara os tesricos de facto do inicio da década de 1650 e quant 3 sts lagi cn bes, vjase Vicon of Politics, capiulos 9 © 10, Sabie as feituras le Lon ke, we se Teale, 1965, 1 SGNILIC GAGE COMPREENSAO NA EHSTOREA DAS IDEIAS. 109 exiteneta tipica de Leveller como uma defesa da democracia sue quando 0 conceite de «tilosofia da democracia Open ; 1 descrigao ¢ anilise liberals! € utilizado como paradigma pa dy movimento de Leveller. O paradigma torna clesnecessariamente clificil dar conta de alguns dos tragos mais caracteristicos 7 ideo- loxia de Leveller. Se estivermos programados, por exemplo, para oe —r—— Levellet, nao nos surpreenderé que as suas ¢ monarquia © 05 scus apelos ao sentimento religioso parc tantes'. O paradigma da «democracia» terd tamb conduzir a investigagéo histérica para direcgies pouco apropria das. No pensamento de Leveller descobrir-se-4 um conceite anacrénico do «Estado-Providéncia», assim como uma crenga no io universal que nunca foram defendidos’ Considere-se, da mesina maneira, um historiador que decide mm deseoncer an tendéncia a sults (novamente, quem sabe, de forma acertada) que o argumento ie Locke em Tivo Treatises sobre o dircito de resistencia perante go ‘vernos tiranicos esté ligado ao seu argumento acerca do lugar do consentimento numa comunidade politica legitimada pela lei “Tal historiador poders depois ser levado a utilizar ‘ nocio le egoverno por consentimento» como paradigma pa argumento de Locke!, Estamos aqui perante o mesmo perige Quando falamos de governo por consentimento, estamos Hor malmente a pensar numa teoria acerca das condigoes que deven estar reunidas para legitimar as disposigdes legais de urna sso assim natural olhar para o texto de Locke através desta conceptualizagio ¢ encontrar, muito convenientemen teoria exposta de forma bastante confusa. Todavia, quando Fak parece, de todo, tet de governo por consentimento, Locke isso em mente. A preocupagio de Locke com 0 conceito de con fe Bras, 161, p. HIS et Woeston, 1985, pp. 38-58 sobre a emengcia da sclemocraci a Laterta do séeulo XU, > Bris, 161, py 118,457 * Beatson, 24.41 Woodhouse, 1938, p. 83 Sn ee ee ee ee STUUR TURRETS SELRL LARTER ELL LEL 10 VISOES DA POLITICA sentimento esta ligada & sua perspectiva acerca dis origer shy sociedades politicas legitimas!. Dificilmente se poderia considera este argumento como uma defesa do consentimento, Mas jatcss ter sido esse o argumento de Locke. Ora, se nfo conseguitins partir deste ponto, o tinico resultado que obteremos sildat se numa descrigio errada da sua teoria ¢, desse modo, acusé-lo-cnii de ter deturpado uma doutrina que ele, na verdad, no pretes dia apresentar. © problema que aqui tenho vindo a delinear diz respeito 40 facto de ser inev ra 1 mas também perigoso para os historiaclores ddas ideias abordar as suas fontes com paradigmas preconcebids. Por esta al i iter io percebido que esses perigos surgem quando o historiador ignora ce fone 8 observagdes genéricas a ter em conta na 10 dos seus materiais, A andlise destes temas permitir- ined sintetizar as lighes metodolégieas em que tenho insistido, Uma dessas observagées refere-se ao facto de nao se poder ingiu a poderia ter aceite como descrigio correcta daquilo que cle que- irmar que um actor pretendia ou 0 que ele nunca ria dizer ou alcangar. Esta autoridade especial dos actores sobre as suas intengoes nao exclui a possibilidade de um observador se poder encontrar numa posigio tal que the permita apresentar ise mais completa € mais convincente das acgdes do do que este (nesta possibilidade, a psicanslise tem uma palavr actor, mais at Itimo poderia dar de si proprio dizer). Mas ‘ével do comportamento de um actor sobreviva & demonstragao de que ela est util impede que uma perspectiv: fa dependente da 40 de critérios de descrigao e de classificagio que nao estavam disponiveis ao actor. Pois, se um discurso ou wna aegie tiverem sido levados a cabo conscientemente por um actor, ¢ tive rem um sentido para esse actor, qualquer anilise plausive! da s dizer deve necessariamente ter ems cont conjunto de descriges a que 0 actor pode ter recorridlo para sles crever € classificar 0 que ele ou ela estavans a dizer om a Laver Sobre este argumeno, ve se Dunn, 1980, pp. 29-52. | MGNIFICAGAO E COMPREENSAO Na HISTORIA DAS IDEIAS 111 Caso contrario, a andlise que d amente uma andlise do dis. que possa scr, jamais sera verdade Gunso ow da acgio do actor" Ora, € precisamente essa adverténcia que 6 ignorada sempre classicos sio criticados pelos historiadores das ideias 1s de modo que os autor por nfo terem conseguido entinciar as suas doutit cocrente, ou por terem sido incapazes de elaborar uma doutrina as alegadamente eternos. Na ver sobre um dos tem spreciacio das acgBes dos actores que defende que eles falharam cm algo nao podera ser considerada correcta, a nio ser que fique hem claro, desde o inicio, que eles poderiam ter tido, e tinham de levar a cabo essa acco em particular. Aplicar este teste implica reconhecer que muitas das questdes que pro como, por exemplo, saber se Marsi es) so, rigo- facto, a intengio de curei aqui analisar (questée lius enunciou uma doutrina da separagio dos poder. rosamente falando, inéteis e ocas. Nao € possivel formula tais ‘a que pudessem fazer sentido para os actores questdes de forma tras .esmo teste torna evidente que as pretensdes, em apreco. O mk analisadas, acerca das «antecipagoes» arar a teoria de Locker como indica dores «da antecipagao da metafisica de Berkeley» ~ sio igual- Assim, nao tem qualquer sentido pretenses que assumem a forma de spodemos enc: mente desprovidas de Iégica estudar a teoria de Locke se a nossa intengio é apenas dizer qual- quer coisa sobre Locke (dificilmente seria intengio de Locke antccipar a metafisica de Berkeley). Podemos contar essas hist6- rias se quisermos, mas escrever sobre a Histéria (embora essa seja uma atitude comum entre os filésofos) nao pode ser apenas con- tar histérias: uma outra caracteristica das andlises histéricas € que é suposto clas procurarem a verdade’. » final, que vale a pena s de pensar, Nao devemos esquecer que pen- blinhar, diz res Uma observag peito & propria acgi 135-136, 1554155, 218-216, Alguns temas apo Hampshire, 1959, 1 pseu p 1. 196A, en pacticlar pp. 54-71 Armstrong, 15,1 0 iow at alst iis, veja-se Mandelbsum, 1967, Para un de Gf SSS S'SéS*s~éo~C” == < ‘ « “ “ “ “ . « « « « « « 2 VISOFS Da POLITICA sar € uma actividade que requer grande esforgo, no apenas uma manipulagio de um conjunto de imagens mentais'. O acto de reflectir euidadosamente sobre os problemas, enquanto intros Pecgao € observagio comum aos scres humanos, nao pode ser uniformizada. Pelo contririo, implica uma luta, muitas vere, dificil de suportar, com as palavras e com os significados. E uin desalio aos limites da nossa inteligéncia, que nio raro nos dens confuses. E faz-nos frequentemente ch gar a conclusio que as tentotivas para sintetizarmos as nossas ideias tanto dio origem » lesordens conceptuais como a doutrinas coerentes. Mas é preci samente esta adverténcia que é ignorada sempre que o historiador insiste em organizar os pei mentos infelizmente adispersos» de um autor clissico € os tenta presentar de forma sistemtica, ow com descobrir algum grau de cocréncia, por intermédio do qual os esforgos © as confusdes que normalmente caracterizam o acto de pensar devem desaparecer. v Chegados aqui, pode parccer que o raciocinio que tenho vindo a expor apresenta alguns inconvenientes. Comecei por tentar examinar os perigos que se colocam caso ck : : analisemos os textos ssicos na hist6ria das ideias como objectos de investigag auto-sulicientes, concentrando-nos no que cada autor diz acerca de cada uma das doutrinas eandnicas e desse mens cue odo reconstituir o sentido ¢ o significado das suas obras, ‘Tilavia, Poder-se-i objectar dizendo que com cuiclado © saber sulicienten tais perigos podem certamente ser evitaclos, Mas se porter ser evitados, 0 que que acontece & minha acusagao inivial «ll ; le que ha algo de increntemente disparatado nessa perspectiva? Como forma de responder a essa questi, view expor tna tese complementar, embora mais consistente, i que texshi vino * Domm, 1980 pp. 13-28, apreseata um estud mais comple due vo SIGNILIEAGA0 &, COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDPIAS. 115 v efenee, Navininha opiniio, a abordagem acima analisada no jios prctinite, em principio, compreender adequackamente os textos que estuchimos na histéria do pensamento, A razio fundamen tal, Caso queiramos compreender um texto dessa natureza, é que deveremos ser capazes de interpretar nao apenas o significado do as també que foi dito, n pode ter tido ao dizer aquilo que disse. Um estudo que se con a intencio que 0 autor em questio centre exclusivamente naquilo que um autor disse acerca de uma dada doutrina, nao apenas sera inadequado, como também, em a ch. alguns casos, ser fc errada para interpretar 0 que o autor em qu Consideremos agora este ponto dbvio: os sigaificados dos ter mos cue utilizamos para expressar os nossos conceitos mudam Ho pretendia dizer ou fazer por vezes com o tempo, de tal forma que uma andlise daquilo que um autor disse acerca de um dado conceito pode levar-nos interpretar erradamente o significado do texto. Vejamos, por exemplo, a recepeio da doutrina do bispo Berkeley sobre o ima terialismo por parte dos criticos seus contemporaneos. ‘Hunt Andrew Baxter como Thomas Reid fizeram comentirios 16 segofsmor da visio de Berkeley e foi com base nesse juizs que « seu trabalho foi discutido na Enciclopédie’. Se os contemporincos de Berke mos como egofsmo, seria muito provavel que se reterissen ¥ pretendiam acusi-lo daquilo que nds hoje considera flugncia de Hobbes na sua obra, 0 que teria as suas consequcneias No entanto, quando se referem ao seu egofsmo, o que eles proton dem realmente dizer é algo parecido com o que hoje entendemes por solipsismo”. ‘Uma segunda e mais importante razao para pensar que aqui Jo que um autor diz. acerca de uma dada doutrina pode revelar-s uma forma enganadora de chegar ao que ele queria dizer € 0 facto de 0s autores utilizarem frequentemente, e de forma deliberaa, aquilo que poderfamos designar por estratégias retéricas obiqui: "Baxter, 745, wo 2.280: Reid, 1941, p. 120, acken, 1965, pp. 1-29, 9-81 sa TTT TFTA TFT TSE A RRR R TR RATTE M4 VISOES DA POLITICA Dessas, a mais ébvia a ironia, a qual implica com quie s¢ shes aquilo que € dito e aquilo que se pretendia dizer. No capital ts analiso alguns dos problemas a que esta estratégia di origem, mas 0 ponto essencial pode talvez ser aqui aflorado de fost resumida. Considere-se, por exemplo, a doutrina da tolerin sa religiosa tat como era vista pelos intelectuais ingleses por ultra do Toleration Act de 1689. Hi boas razies para se afirmar que as diferentes contribuigdes para o debate reverberam, em larg medida, uma visio semelhante. Mas s investigagio histériea mais sofisticada nos permitiria reconhecer, digamos, que tanto Shortest-Way, obra onde Daniel Defoe se refere aos dissidentes, Letter dirigida a0 Papa por Benjamin Hoaully, onde este a os poderes da Igreja, ¢ a Letter Concerning Toleration tle Jolin Locke transmitem uma mensagem similar sobre a im portdncia de tolerar a divergéncia religiosa. Um estudo acerea do que cada autor diz a respeito desse assunto daria certamente origem a equivocos intiteis no caso de Defoe ¢ a uma consideré- no caso de Hoadly. Apenas em Locke parece haver uma coincidéncia entre aquilo que ele afirma ¢ aquilo que ele pretende realmente dizer, € mesmo neste caso sera aconselhivel (lembrando Swift) gar tir que nao ha ponta de ironia no scu discurso. Em suma, € dificil saber até que ponto 0 facta de lermos esses textos «repetidas vezes», como somos convidados a fazer', nos permite pasar daquilo que € dito para uma compreensio daquilo que se pretendia dizer. Hé ainda um outro problema, de mais dificil resolugio, fi sgado as estratéyias obliquas. Podem existir razies para vida como um especialista referiu, que € shistoricamente ais er vel- dizer de um dado autor que ele «acreditava no que escreveu do que supor que cle nio estaria a ser sincero. Considere se, por exemplo, a forma como este problema se manifesta na interpreta gio de fildsofos como Thomas Hobbes ou Pierre Bayle. Qusanla Hobbes discute as leis da natureza, a doutrina que enuness * Plamenatz, 1963, wl p.m | SIGNIFICACAO F. COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS 115 tureza sie as leis de Deus Je que as leis da nai leis de L inelui a presungae d ecer as leis da naturezit, Estes senti- e aque somos obrigados a obec 1s explicitos tém sido tradicionalmente rejeitados enquanto nea a um vocabulério familiar um bra de um eéptico imprimindo javia, diversos comentadores revisionistas pro: som heterodoxo. Tod. dlora) que uraram sublinhar (a configuragao das palavras € revelad Hobbes, na verdade, pretendia «dizer de forma muito seria ides j4 havia dito, que a «Lei Naturals & Jus que em diversas ocas tum mandamento divino € deve ser abedecido porque O cepticismo de Hobbes € assim considerado es emerge ordem de Deus», um disfarce; quando a mascara € arrancada, Hobbi com Bayle, cujo Dictionnaire contém doutrinas nero mais rigoroso ¢ implacavel. Uma vez ta, rem sido frequente a mo o expoente de ama deontologia crista. O! mesmo se passa proprias de uma tcologia calvinista do g do expl mais, face a uma mens de que Bayle nao poderia tadores revisionistas afirmaram que, longe estar a ser sincero. Mas, nova mente, alguns coment de ser o protétipo de um philosophe sarcistico, Bayle fé, um pensador religioso cujas declaragbes devem ser homem de f nos compreender interpretadas pelo seu valor facial, isto se quiserm 1s seus argumentos Nio estou preocupado em saber qual destas finhas de inter quer no caso de Hobbes quer de Bayle pretago é a melhor, , ar a atengao para a insulicién: © importante, para mim, é cha cia da metodologia que est na base destas interpretagoes revi sionistas, Dizem-nos que um sestudo profundo dos textos», a Concentracio nos textos «por si préprios», serd suficiente, em qual gumentos revisionistas’ quer circunstineia, para sustentar 0s ar Todavia, nio parecem ter percebido que a aceitag 10 de algumas conjecturas peculiares fio destas inter- pretagies implica a aceitagai Tiglon 938, p AUK Waves, 1957, apse waa posigio semethante, 20 paso que Fool 196 apes ots wn angament mais radical. Para uma versio mais incsiva este rguinent orp se Mannich, 1992, pp. 7135. Vejase Dil, 15% p40 abuses, 1964, pp, 46-86, na discuss ds artigos de Bayle ely [Day stew saniquesmo, Mood, 19 se Mh U6 VISOES DA POLETICA sobre Hobbes, Bayle ca Gpoca em que eles viveram. Ambos foram considlerslos pelos philasophes como ox seus grandes antecessores fo que toca av cepticisino. Também 0s eriticos seus contempori nneos, assim como os scus simpatizantes, os analisaram dessa ma- neira, nunca duvidando que tanto um como outro pretendiam atacar violentumente as ortodosias religiosas dominantes. Claro que € possivel desvalorizar esta objecgio insistindo que todos os eriticos contempordineos de Hobbes ¢ Bayle estavam enganados, exactamiente nos mesmos pontos, quanto & natureza das intengées subjacentes aos scus textos. Mas aceita esta hipdtese improvavel torna apenas mais dificil de avaliar as atitudes de Hobbes e de Bayle, Ambos tinlam boas razdes para defender que a hetero. doxia religiosa era um compromisso perigoso. Hobbes (segundo Jobn Aubrey) vivew durante algum tempo com medo que as bis- pos «0 mandassem para a fogueira, acusado de heresiay', Bayle foi demitide do cargo de professor universitério em Sedan por s1 anti-catdlico e, mais tarde, demitido do mesmo cargo em Roter- dao por nao ser suficientemente anti-catélico. Se ambos os auto res pretendiam que as suas obras divulgassem um sentimento religioso ortodoxo, torna-se imposstvel compreender a razio pela qual nenhum deles retirou das ediges posteriores dessas mesimas obras ~ como ambos poderiam ter feito, o proprio Bayle foi alids instado a fa Jo ~ 0s excettos que aparentemente tinham sido ‘mal interpretatios ¢ ainda porque € que neahum deles procurou corrigir os supostos equivocos gerados em torno das intengdes subjacentes As suas obras! Em suma, 0s textos de Hobbes ¢ de Bayle Fevantam questées que jamais sero resolvidas através de leituras «uumas atrs cas outras» até que consigamos chegar finalmente-& conclusin que 68 conseguimos compreender. Se entretanto decislirmos como resultado de uma reflexio em torno das implicagies pasa ay qua Aubrey. HR, col p33 Para nas pormenores sobre est questo em Hobbes, wine Mint, Me! «suepene de Bae, veja se Rubinson, 1991 DE TTESY"="NCO le SIGNIFICAGAO E, COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS 117 cham’ a atengia — que ¢ muito discutivel saber se o significado, dos seus textos corresponde exactamente Aquilo que eles afir a cei a sto para além mam, a razdo para tal reside em informagies que estao p uc ha de dos propria textos. Se considerarmos, pelo contra facto uma corrsspondéncia entre o que esses textos alirmam € 0s seus significados subjacentes, ficamos perante o problema de dar conta das implicagdes inerentes a esse comprometimento, Seja 40 que adoptarmos, ndo nos € possivel qual for a interpect defendé-la com base apenas nos significados que esses textos aparentemente transmitem Muito mais importante, todavia, do que qualquer uma dessas observagies € o facto de que, no caso de qualquer declaragie importante, 0 cstudo do que alguém alirma jamais constituiré um guia suficiente para compreender o que se queria realmente dizer. Para se conseguir compreender uma alirmagdo importante, la do que foi devemos pracurar aleangar no apenas 0 significada de dito, mas também 0 valor que o autor atribufa As suas alirmagoes. 1as.0 que as Por outras palavras, devemos tentar apanhar nao apet pessoas estio a dizer mas também o que eles esto a fazer «usin doo alirmam. Estudar 0 que os pensadores do passado dissenan sobre os temas canénicos da histéria das ideias representa apenas uma das duas tarefas hermenéuticas, ambas indispensiveis se 0 nosso objectivo € compreender, em termos histéricos, aquilo que cles escreveram. Para além de tentar descortinar o significado um, devemes ao mesmo tempo procurar com: do que eles disses preender 0 que € que eles queriam dar a entender com aquilo gue estavam a afirmar. Ao insistir nestes aspectos tenho em mente os argumentos de Wittgenstein acerca do que implica recuperar os significados, bem como o desenvolvimento desses argumentos levado a cabo por J. L. Austin em torno dos significados ¢ das suas utilizagoes. Os capitulos 5 ¢ 6 apresentam uma abordagem mais aprofunda la destas teorias e da sua relevancia para o trabalho da interpre- tagdo das textos. Aqui, limito-me a analisar as implicagées, para © estudo dos textos individuais ¢ das «ideias unitérias», de se TU_T*tL° ~- ~- ~- - ~- ~- ~- ~- - - - - ~- ~- ~- - - ~- - - - - - - - - - - - PEESEERE SEE ESSE RASSSERLULAEESLLEEA us VISORS Da POLETICA tomar em consideragio 0 facto de que devemas sempre codes ara questo de saber aquilo que os autores estio a Para ilustrar este argumento, considere-se, em primciro lv fo-caso de um texto individ Descartes, nas suas Mediragve Metufisicas, considera essencial sustentar a ideia de conhecimento incontestavel, Mas qual 2470 que teré levado Descartes a calocat esta questo? Os historiadores tradicionais da filosofia quase munca areferiram; dleram por adquirido que, uma vez que Descartes er da certeza éum um epistemologista, ¢ uma vez. que o probl dios problemas centeas da epistemologia, essa era uma questan que nao levantava qualquer diivida. Desse modo, foi-Ihes possivel concentrarem-se naquilo que entendiam ser a sua principal misao interpretativa, ou sea analisar criticamente aquilo que Descarte yinma acerca de como aleangar um conhecimento infalivel. A minha insatistagdo com esta abordagem para utilizar os termos de R. G. Collingwood ~ deriva do facto de cla no nos dizer nada acerca da questio cuja solugéo, segundo Descartes, estava na sua doutrina da certeza', Consequentemente, fic sem saber 0 que Descartes pretendia a0 expor a sua doutrina da forma como o fez. Fac a isto, julgo que tem constituide um pro: gresso consideravel no conhecimento de Descartes o facto de alguns académicos ~ como Richard Popkin, E. M. Curley © ow tros ~ terem comecado a aplicar precisamente estas questées a0 cestudo das Meditacaes’. Como resposta possivel, sugeriram que parte do que Descartes estava a fazer era reagira uma novi ¢ parti cularmente corrosiva versio do cepticismo que emergira da re cuperagao ¢ divulgagao dos antigos textos Pirr6nicos no final do século XVI, Apresentaram-nos assim nao apenas um nove alhar sobre as Meditagées, como também, ao mesmo tempo, nia chuave para interpretar muitos dos seus efeitos especificos. Ao te hy, pot Colfingwoo, 1999, pp. 4-55 Veja-se Popkin, 1969, 1979 e Curley, 1978 | SIGNIFICAGAO E, COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS 119 item-nos rellectir novamente sobre questes como: porque € que tum texto esté organizado de certa maneira; porque € que se utiliza um determinado vocabulirio e nao outro; porque € que certos zumentos, em particular, sao escolhidos ¢ sublinhados; porque E que, em geral, o texto possui uma identidade ¢ uma configura io especificas : ages pode aplicar-se ae ‘Um conjunto semelhante de obser projecto de Lovejoy, que consiste em concentrar-se nas widcias tunitétiase! e em «analisar um tema importante, embora dificil de captar», durante um certo periode ou mesmo «durante virios séculos»?, Considere-se, por exemplo, 0 projecto de tentar fazer histéria da ideia de nobilitas no inicio da era moderna na Europa. O historiador poderia comegar, como alids deveria ser, por referir que o significado do termo, nessa Epoca, remetia part uma qualidade moral particularmente valorizada, Ou poderia, também com toda a legitimidade, referir que» mesmo termo ers utilizado para indicara pertenga a uma determinada classe social Como saber qual o significado a adoptat em cacla caso? Quando Francis Bacon aponta para o facto de a nobreza constituir um factor de grandeza para um monarca, embora diminua o seu poder, tanto poderiamos adoptar (tendo em mente a sua admt ragio por Maquiavel) 0 primeito significado, como também (tendo mos adoptar o segundo. em conta a sua posigio oficial) pode Coloca-se ainda um outro problema pelo facto desta ambigui dade ser muitas vezes instrumentalizada pelos moralistas de forma intencional. Em certas casos, 0 objective era insistir no argu mento de que uma pessoa pode posstir qualidades nobres mesmo into. A possibilidade de alguém quando nao se é nobre de nase ser considerado nobre «mais por questdes de virtude do que por pertenga a uma classe sociab> era um paradoxo tipico do pensa- mento moral do Renascimento?, Noutros casos, 0 objective era 1 Sobre as cio unitiriase como abjectos de estado, vine Laney, 196, er 1 cular pp 1-17 ako 1964, pw iyo, 1962, p 104 20 VISORS DA POLETICA insistir que, embora a nobreza seja uma questio de predicados Pessoais, acontece que cla esté ligada & condigao do nascimente, Esta coincidéncia feliz foi defendida por intimeros autores'. Alény isso, o moralista podia sempre virar essa ambiguidade contra o proprio conceito de nobilitas, contrastando nobreza de nascimente, © torpeza de compontamento, Quando Sir Thomas More des creve, na Utopia, 0 comportamento nobre da aristocracia militar a sua intengao podia muito bem ser desacreditar o conceito de nobilitas O meu exemplo, como € ébvio, esti muito simplificado. Ainda assim, julgo ser suffciente para mostrar duas fraquiezas incrcntes ao Projecto de escrever historias de «ideias unitariass. Em primeira lugar se quisermos compreender uma dada ideia, mesmo que seja to interior de uma determinada cultura de uma certa épaca, nio iralemos simplesmente concentrar-nos, como €o caso de Lovejoy, hoestudo dos termos em que ela foi expressa. E que esses termos foram provavelmente utilizados, camo © meu exemplo sugcre com intengics varidveis e incompativeis. Nem tao-pouco pode. ‘mos alimentar a esperanga de que o facto de conhecermos o con texto em que 0 discuiso foi elaborado resolver necessariamente essa dificuldade, pois 0 proprio contexto pode ser ambiguo, Pelo contririo, teremos de estudar os diferentes contextos em que as palavras foram utilizadas ~ todas as fungoes que des mpenham, todas as coisas que poderiam ter sido feitas com elas. O erro de Lovejoy reside nao apenas no facto de encarar o «significado essen cial» da «ideia» como algo que deve «permanecer imutivebs, mas também de supor que nio existe necessariamente um significado sessencial» (para o qual eada autor «ontribuin) Um segundo problema, quando se faz esse tipo de historia, que as nos facto com os autores do discurso. Quando cles figuram nessas historias tal acontece g vas perdem quase instantaneamente 0 con almente porque a ideia tnitiria rele Veja-se por exemple, Humphiey, 156%, Sig Ky tre Hexter, 1964, inclu uma exploragéo anguta sire ests possi Sobre sts prtensics, ela se Bateson, 1953, WMAURALALLLAC EAC ER CC etcarccee retrace 4 SIGNIFICAGAO E COMPREENSAO Na HISTORIA DAS IDEIAS 121 vante@ contrato social. a ideia le progresso, a grande cadeia do ser ¢ por af adiante ~ surge nas stias obras e, por essa razio, dciende-se que eles contribuiram para o seu desenvolvimento, O que fi trivial ou importante — que essa ideia ter: nos sem saber com essas narrativas € qual o papel desempenhado no pensamento de um dado autor, Nem to-pouco percebemos qual © lugar ~ central ou periférico —que poderé ter ocupado no clima intelectual do perie.lo em que foi claborada. Podemos talvez ficar a saber que a expres*Ao foi utilizada em diferentes momentos para dar conta de uma grande diversidade de questies. ‘Tidavia, ao nos € possivel conhecer (para recorrer ao argumento de R.G. Collingwood) quais as questées que a utilizagio dessa expression cera suposto responder ¢, desse modo, quais as razées que existiamy para continuar a recorrer a ela A critica que deve ser feita a essas narrativas histéricas nio é apenas que clas estio sujcitas a permanentemente perderem 0 indo percehemos que nao existe nenhuma sentido. O pior, qu ideia precisa para a qual os diferentes autores tenham contribuio, apenas diversas afirmagdes feitas por uma variedade de diferen tes actores com intengdes muito diferentes, é chegar & conclusie que no se justilica fazer a historia da ideia. Existe apenas a his Loria das suas diferentes utilizagdes ¢ das diversas intengdes «que presidiram ao seu uso. Essa histéria muito dificilmente podera ser considerada como a historia de uma «ideia unitarian. Na ver dade, a persisténcia no uso de determinadas expresses diz-nos muito pouco de fidedigno acerca da persisténcia das ques:3es que clas supostamente estariam a responder, como também nos dizem muito pouco sobre o que os diferentes autores queriam realmente transmitir com a sua utilizagio, Em sintese, quando percebemos que ha sempre uma questio que precisa de ser respondida acerca daquilo que os autores estio 1 fazer quand afirmam determinadas coisas, parece-me que deve- mos deixar de lado a pretensio de organizar as nossas histérias em torno de sideias unitérias» ou daquilo que os autores indivi dualmente disseram sobre as «temas etcenose. Nao pretendo com SSSLELELES 12 VISOES DA POLITICA isto negar que tenham existida pontos de continuidade wa fils sofia moral, social e politica do Ocidente, os quis sao visiveis no recurso a1 um certo niimero de conceitos-chave ¢ de tipos de argu mentos'. Pretendo apenas dizer que nfo ha razdes valida para continuarmos a organizar as nossas nartativas em torno do esti do dessas continuidades, caso contririo acabaremos por dar ori gem a cada vez mais estudos desse tipo, nos 4 , digamos, as visbes de Plato, Agostinho, Hobbes ¢ Marx sobre «a natureza do Estado justo» sao expostas © comparadas: Uma das razdes para o meu cepticismo relativamente a esas narrativas, como tentei sublinhar na primeira parte do meu argu- mento, nao é apenas que cada pensador ~ para tomar o exemplo que acabei de referir — responde & questo da justiga de modo tnnito pedprio. Tem também que ver com o facto de os termos ewalhides para abordar a q Jo — neste caso us terns «Estaddor, siustiga © enatureza» — surgirem nas suas diferentes teorias com estruturas tio divergentes que me parece um equtvoco mais que evidente partir do principio que os conccitos sao utilizados de for- ‘ma estével. O erro, em suma, reside em supor que existe um con. junto dle questoes que os difer. es pensadores procuram analisa. Uma razio mais importante para este cepticismo € aquela que tenho procurado mostra om o meu iltimo argumento. A abordagem que critico abstrai certos argumentos do contexto em que ocorrem de forma a encars-los como «contribuigbes» para os debates alegadamente eternos. Todavia, esta perspectiva impede. }os de tentar saber 0 que € que cada autor pretendia a0 apreseni a sua «contribuigio» particular ¢, desse modo, anula uma das dimensées do significado que deveremos a quisermos compreender o autor em questio. Por isso, © appesar das grandes continuidades que indubitavelmente caracterizam os padroes de pensamento que herdimos, continuo muito eéptice acerca da importincia de se fazer a hist6ria de conceitus atte Sa este pout, vase Macy, 1965, pp. 1.2 Wejnse Lockyer, 1979 eof Collingwood, 193, pp. 61-63 a historia dos usos a quie as ideias | SIGNIFICAGAO E COMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS 12. vicleias unitariase. A tinica hist6ria das ideias que deve ser feita é VI Se o meu argumento fizer algum sentido, hé duas concli sées positivas que se podem retirar. A primeira diz respeito a0 método apropriado para o estudo da histéria das ideias. A com- preensao de textos, como suger, implica procurar o sentido que subjacente e a forma como os seus autores pretendiam thes es ido. Compreender um texto deve que esse sentido fosse apreendi ser, pelo menos, compreender tanto a intengio que é suposte captarmos, como a intengao de que essa intengio seja compreen: dida, a qual o texto como acto de cumunicagio intencional deve coxporizar. A questae com que nos devemos confrontar no estado yer 0 que € que os seus autores udigncia espectica que eles tinham em escrevendo na desse textos € sua época e para uma audiéncia es ca ter procurado comunicar através do mente ~ podiam na pré ssim, que 0 procedimento mais acertado seu discurso. Parece-me implica, logo de inicio, tentar delinear toda a variedade de comu nicagées que podiam convencionalmente ter sido levaclas a cabo num dado momento por intermédio daquelas expressbes. A etapa seguinte passa por definir as relagbes entre uma dada expressio exto lingufstico mais vasto com 0 objectivo de desco- do conse- dificar as intengoes de um determinado autor'. Qu: guirmos encarar o objecto de estudo numa perspectiva essencial 7 é: © metodologia certa deve estar preocupada com a reconstituigio factos que compdem o contexto das intengoes, 0 estuto dos f surgir como parte integrante social de um didlo texto pode en Tar discusses cts sols sgestio da primazia do content, em particular 0 contest ingisivn, wa se Tan, 1S; Boucher, 1985; Gunn, 1988-1989, Zacker 1945, Spit, 8%, Aro, 14, pp. 15-21; Rig 1995; Bev, 2001 ee PRRBBRBALALBRLRELRAREALALCARARAE AA eWe eee ee eae at ae VISOES Da POLITICA deste projecto linguistico. O contexto social constitui o quadra de anéilise fundamental que nos permite saber quais os significados que alguém poderia ter tentado comunicar. Como procure de- monstrar nos casos de Hobbes ¢ de Bayle, 0 p prio contexte pode ser utilizado como uma espécie de tribunal de tltima ins- tncia pata avaliar a plausibilidade relativa de it pativeis que tenham sido atribuidas a um autor. Nao quer dizer, como € dbvio, que esta conclusio constitua, em si mesma, uma ngbes incom- novidade'. O que defendo € que esta anilise critica permite, de certa forma, enquadrar a metodologia. Nao se trata aqui de uma questio de preferéncia estética nem de laivos de imperialismo acaclémico, trata-se sim de tentar encontrar as condigbes necess4 rias para a compreensio dos discursos. A niinha segunda conclusio genériea remete para a impor cia de se estudar a hist6ria das ideias. Ai, a opgio mais interessante é a do diélogo entre a anilise filoséfica c as foutes histéricas, O estudo das afirmagoes feitas no passado levanta problemas es- peefficos e pode dar origem a novos conhecimentos que tenham imteresse do ponto de vista filosético. Entre 0s tépicos relevantes na adopea le uma abordagem fortemente diacrénica € 0 fenémeno da ino. io conceptual © 0 estudo da relagao entre a mudanga lingufstica © a mudanga ideolégica. Nos capitulos 8, 9 ¢ 10 deste volume procuro analisar algumas das implicag: 's que dai advém, A minha conclusio principal, todavia, é que a critica aqui exposta sugere um ponto mais dbvio acerea do valor filosético de se estudar a histéria das édeias. Por um lado, parece-me uma causa perdida tentar justficar 0 objecto de estulo cm termos das Fespostas que se podem dar aos «problems etcrnoss alegada- mente tratados nos textos classicos. Abordar 0 objecio nesses ter ‘mos, como tentei mostrar, € torn lo desnecessariamente ingéwu \wenuo. Para uma eve defesa do mesmo argumento, vse Greene, IS? 1918. C sant Collingwond, 1939 ¢ Dunn, 1980, pp. 13-28, das andlises qv: inci an bastante. Veja tambéin Dusnn, 1986, pp. 3, Pata uaa discon a lca ‘de Colingwnod aaqules que eomegarau a escrever soe his tica ma dee «le 1G, sea se a anise valosa con Tack, 1998, SILL At, \O ECOMPREENSAO NA HISTORIA DAS IDEIAS 125 sfirmagio representa forgosamente a declaragso de unit ae particular, coneebida com inntengien com : Jo problema ¢, nese sentido, est intuito de solucionar um dad de tal forma adscrito ao seu contexto que, no minimo, serd ingénue i Jicagao daf resultante ndo é apenas 0 peer 3s sas paris quests para recuperar a forma como R.G vat nd existem temas eternos tentar transcendé-lo, A imp! facto ake os textos classicos respo iio as nossas; € também que Collingwood colocou 0 problema’ eer ilosof cnas respostas individuais a questées 1nd 1a filosofia. Existem apenas respostas ind a Fre questaes tio diversas quantos os A viduais € provavelmente qu dores que as colocam. Em vez. de nos preocuparm ond , farfamos melhor em apreniber aligées» da histéria das ide pensar por nds prairies Nio queristo dizer, aio tenlia qualquer valor dlcos textos eléssicos respnnderem apenas co. Os textos elssicos, em particular ent jporém, que oestudo da histin das iets filosdfico. O proprio facto, parece-me, ans problemas que Ihes confere «rele Sprios colocam e no prop cia» e significado filosti pl -coria moral, social ¢ politica, podem ajudar-nos a descobr F——===ETETEF dle posigio moral e de compre antes a diversidade de tom: c a sua importincia filosiie. 1ui que reside a sua importancia fi jimentos politicos. E agp : : j ‘atendéncia (por vezes explicitamente dlefendida, por exemplo em Hegel, como forma de provediment») Je,¢ ndo meramente inevitivel, vantagen de p Jer com a nossa sittnagir e-até mesmo moral. Existe para supor que a grand fas do passado tem que ¥ : c, por definigio, a0 ponto maximo de Ibreviver ao reconheci se analisar as ide actual, jf que ela corresponde evolucio, Esse argumento nao consegue sol 5 ‘as diferengas historicas sobre qu as em termos de intengies de ces funda nto do facto de mentais poderem reflectir difereng avers espécie de competigio numa come evolucionista sis do que uma convenes, mm cs, para nio falar de wma percep nidade de valor Jo Absolute. Fe UTFT FURR RE LESS 126 VISOES DA PoLEtiICs Reconhecer, além disso, que a nossa prdpria socicaade ae € diferente de outras quanto A criagio de erengas espesift as « de convengoes da vida social e politica jai pressupse a existécta dk uma vantigem diferente ¢, na minha opinido, muito mais salitas © conhecimento da histéria dessas ideias permite perceher uc as caracteristicas das nossas convengdes, as quais podemos atc aceitar como verdades «intemporais»', podem nio passar de con tingéncias da nossa prépria historia local ¢ da nossa propria es trututa social. Descobrir, através da historia do pensamento, que io existem, na verdade, conceitos intemporais mas apenas con ccitos muito diferentes formulados por diferentes sociedades, signi fica encontrar uma verdade genérica nao apenas sobre o pasado mas sobre nds préprios E um lugar-comum ~ neste aspecto somos todos marxistas lizer que as nossas sociedades limitam secretamente a nossa imayinagdo. Merece por isso tornar-se também um lugar-comum olacto de a andlise hist6rica das crengas de outras socicdades dever ser considerada uma das formas indispensévcis ¢ insubstituiveis de reduzir esses mesmos constrangimentos. A alegacio de que a historia das ideias é constituida de «nogdes metafisicas estafadase ~ no raro apresentada, num estilo inaceeditavelmente provin ciano, como razao para rejeitar este tipo de histéria ~ tornar-se-ia assim 0 principal argumento para considerar tais nartativas como indispens: veis € erelevantess, no porque delas se possam retirar «ligdes» em bruto, mas porque da propria hist6ria se podem extrair ensinamentos que nos permitem conhecer-nos melhor. Exigir & histéria do pensamento uma solugao para os nossos problemas imediat s € incorrer no apenas numa falicia metoxloligica mas também num erro moral. Pelo contrario, aprender cam 0 passa do ~ e nio ha outra forma de aprender ~ a estabelecer rma dis tingao entre o que € essencial ¢ 0 que nao passa de unt provkite i ' I contingente das nossas préprias convengaes locais ¢ cueuntsatt uma das chaves do auto-conhecimento. Pra a ideia de que os problemas ceneis da politica so inter, ors sy Hab 1961, p20, Motivos, intengdes e interpretagio Vivemos numa época pés-modera (nao sou 0 primeiro a inquietantes da cultura referi-lo) ¢ uma das caracteristicas ma pés-moderna tem sido um cepticismo profundo em relagao 20 humanista tradicional de interpretagio de textos. Perante projecto Pera tar outra vez até que ponto se esta situagio, vale a pena perguntar : ar ~ como fiz. com algume ousadia no justifica continuar a capitulo 4 — da eecuperagio dos mot da atribuigio de significados particul distingfo entre leituras aceitaveis c " cos. £ esta tarefa ambiciosa que gostaria agora ios ¢ intengies dos autores, lares as suas expresses ¢ da Jo acecitaveis dos textos lite- ririas ou filosé de comegar, modestamente, por tratar it E dificil escolher algumas escolas de c c convergiram na ideia de que as questbes relati mento que convergira me ‘0s significados dos textos devem Retrospectivamente, pens vas aos autores, as intengdes € is, Os representantes do New Criticism langaram a hipdtese de se conseguir recupe ser abandonad: jum ataque importante contra Ene capt nw se patente no mew ago «Motes, ae eats, an Netw Literary History, 3 (1972), pp. 393-408 € também Invexprct Backs, The found of Pettoa Pilon, 4 (1996), pp. 2154,

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