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PÓS-GRADUAÇÃO EM PEDAGOGIA

ESPECIALIZAÇÃO EM ALFABETIZAÇÃO: TEORIA E PRÁXIS

Ingrid Alves

LEITURA E ESCRITA:
favorecendo a aprendizagem simultânea

PORTO ALEGRE

2013
2

INGRID ALVES

LEITURA E ESCRITA: FAVORECENDO A APRENDIZAGEM SIMULTÂNEA

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado como requisito parcial para
obtenção do título de Especialista em
Alfabetização: Teoria e Práxis.

Orientadora: Me. Síntia Lúcia Faé Ebert

Porto Alegre

2013
3

INGRID ALVES

LEITURA E ESCRITA: favorecendo a aprendizagem simultânea

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado como requisito parcial para
obtenção do título de Especialista em
Alfabetização: Teoria e Práxis.

Aprovado em ____________ de ____________________ de _______ .

Banca Examinadora:

_______________________________________________

_______________________________________________

_______________________________________________
4

A minha mãe, pelo apoio incondicional em todos os momentos.


5

AGRADECIMENTOS

Agradeço aos alunos que tive, até o presente momento, os quais foram
fundamentais para a definição da questão de pesquisa;

aos colegas professores da escola em que trabalho, na Rede Municipal de


Ensino de Porto Alegre, pelo apoio para o desenvolvimento do presente Trabalho de
Conclusão de Curso;

à professora Valderez Marina do Rosário Lima, pela oportunidade a mim


proporcionada para trabalhar com pesquisa científica durante o Curso de Graduação
em Pedagogia: Séries Iniciais do Ensino Fundamental, na Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), o que foi de suma importância para a
minha formação profissional e acadêmica;

à professora Zuleica Almeida Rangel, pela extrema dedicação e sensibilidade


demonstradas durante o semestre em que cursei a disciplina intitulada “Estágio
Supervisionado nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental”, do Curso de Graduação
em Pedagogia: Séries Iniciais do Ensino Fundamental, da PUCRS, o que contribuiu
significativamente para a complexificação dos meus conhecimentos teóricos e
práticos enquanto docente;

a todos os professores do Curso de Especialização em Alfabetização: Teoria


e Práxis, da Faculdade Porto-Alegrense (FAPA), pelas excelentes aulas, as quais
me possibilitaram muitas aprendizagens sobre os processos de leitura e de escrita;

finalmente, à minha orientadora do Trabalho de Conclusão de Curso, do


Curso de Especialização em Alfabetização: Teoria e Práxis, da FAPA, Mª. Síntia
Lúcia Faé Ebert, pela exímia orientação, pela tranquilidade, pela clareza e pela
atenção a mim dedicada durante a elaboração do presente trabalho.
6

RESUMO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso analisa elementos fundamentais para o


desenvolvimento do trabalho pedagógico dos alfabetizadores a fim de favorecer a
evolução simultânea dos processos de leitura e de escrita em alunos em fase de
alfabetização. A pesquisa apresenta caráter qualitativo, de cunho bibliográfico, tendo
sido utilizados diversos autores relacionados ao estudo, tais como, Ferreiro (2011),
Fortuna (2013), Haidt (2006), Jolibert (1994), Moyles (2006), Oñativia (2009), Piletti
(2010) e Soares (2010). Aborda diferentes concepções acerca do conceito de
alfabetização no Brasil, os quais surgiram em função da evolução social do país.
Discute o conceito e a importância do letramento para a aprendizagem da leitura e
da escrita por parte das crianças. Destaca as características dos métodos de
alfabetização – sintético, analítico e eclético – e, logo após, o surgimento do
construtivismo, concepção pedagógica responsável pelo deslocamento do foco de
quem ensina para o sujeito que aprende. Explicita as características dos níveis de
escrita propostos por Emilia Ferreiro. Explica o conceito de leitura e o processo de
desenvolvimento de leitura de palavras, frases e textos por parte dos alfabetizandos.
Menciona a definição de planejamento, os elementos fundamentais que o compõem
e a relevância de tal ato para a construção e para a complexificação de
conhecimentos por parte dos alunos. Comenta os diferentes entendimentos de
professores e de familiares dos educandos em relação ao brincar na escola. Salienta
a valia de aulas lúdicas para favorecer a alfabetização das crianças. Define os
termos “estratégias de ensino” e “recursos pedagógicos”. Propõe três procedimentos
didáticos que favorecem o desenvolvimento simultâneo da leitura e da escrita em
crianças em fase de alfabetização e sugere uma reflexão acerca do papel do
alfabetizador na aprendizagem dos atos de ler e de escrever por parte dos
educandos.

Palavras-chave: Aprendizagem simultânea. Leitura. Escrita. Alfabetização.


Organização do trabalho pedagógico.
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RESUMEN

El presente Trabajo de Conclusión de Curso analiza elementos fundamentales para


el desarrollo del trabajo pedagógico de los alfabetizadores con el fin de favorecer la
evolución simultánea de los procesos de lectura y de escritura en alumnos en etapa
de alfabetización. La investigación cualitativa presenta naturaleza bibliográfica y ha
relacionado autores como Ferreiro (2011), Fortuna (2013), Haidt (2006), Jolibert
(1994), Moyles (2006), Oñativia (2009), Piletti (2010) e Soares (2010). Aborda
diferentes concepciones del concepto de alfabetización en Brasil, que surgieron con
la evolución social del país. Discute el concepto y la importancia de la lecto-escritura
para el aprendizaje de la lectura y escritura de los niños. Destaca las características
de los métodos de alfabetización - sintético, analítico y ecléctico - y, poco después,
la aparición del constructivismo, abordaje pedagógico responsable por el cambio de
orientación de quienes enseñan hacia los sujetos que aprenden. Explicita las
características del nivel de escritura propuesto por Emilia Ferreiro. Explica el
concepto de lectura y el proceso de desarrollo de lectura de palabras, frases y textos
de los alumnos. Menciona la definición de planificación, los elementos
fundamentales que lo componen y la importancia de este acto para la construcción y
la complejidad de los conocimientos de los estudiantes. Comenta las diferentes
concepciones de los profesores y las familias de los estudiantes en relación a jugar
en la escuela. Resalta el valor de las clases lúdicas para promover la alfabetización
de los niños. Define "estrategias de enseñanza" y "recursos de aprendizaje".
Propone tres procedimientos didácticos que favorecen el desarrollo simultáneo de la
lectura y la escritura de los niños en etapa de alfabetización y sugiere una reflexión
sobre el papel de los alfabetizadores en el aprendizaje de los actos de leer y escribir
de los estudiantes.

Palabras clave: Aprendizaje simultáneo. Lectura. Escritura. Alfabetización.


Organización del trabajo pedagógico.
8

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Roletas dos Contos de Fadas................................................................. 75

Figura 2 – Música “A Formiguinha” ..........................................................................77

Figura 3 – Fichas contendo gravuras e escrita ........................................................79

Figura 4 – Fichas contendo apenas escrita .............................................................79

Figura 5 – Ficha para registro das perguntas e das respostas................................81

Figura 6 – Fichas contendo a indicação da elaboração da pergunta ou da resposta


.................................................................................................................................82
9

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 10

2 A EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL ............... 14

3 A CRIANÇA E A CONSTRUÇÃO DA ESCRITA ............................................... 27

4 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO DA LEITURA ................................ 41

5 ARTICULANDO A LEITURA E A ESCRITA: CRIANDO POSSIBILIDADES ....... 56

5.1 A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO E A PRESENÇA DO LÚDICO ............ 56

5.2 RECURSOS BEM SELECIONADOS E ESTRATÉGIAS DESAFIADORAS


E CRIATIVAS...................................................................................................... 69

5.2.1 Contos de fadas: conhecendo, criando e recriando histórias


fantásticas ......................................................................................................... 72

5.2.2 Música: cantando, escrevendo, rimando e lendo ........................................ 76

5.2.3 Interpretando histórias de literatura infantil ................................................ 80

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 84

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 89
10

1 INTRODUÇÃO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), do Curso de


Especialização em Alfabetização: Teoria e Práxis, versa sobre a organização do
trabalho pedagógico do professor alfabetizador para favorecer o desenvolvimento
simultâneo dos processos de leitura e de escrita em crianças em fase de
alfabetização.

A escolha da referida temática originou-se dos questionamentos que eu,


enquanto professora alfabetizadora, em uma escola pública de Porto Alegre, me fiz
acerca do porquê de algumas crianças em fase de alfabetização conseguirem
escrever palavras no nível alfabético (OÑATIVIA, 2009), mas, não lerem sequer uma
palavra (JOLIBERT, 1994). O processo inverso também instigou minha curiosidade:
por que algumas crianças conseguiam ler palavras, mas ainda estavam em um nível
bastante inicial de escrita (pré-silábico)?

Desde agosto de 2011, eu estava exercendo a função de Supervisora


Educacional das turmas de Jardim B e do 1º Ciclo da escola (1º, 2º e 3º anos do
Ensino Fundamental). Tamanha responsabilidade instigou-me ainda mais a
aprofundar meus conhecimentos sobre os processos de leitura e de escrita, pois,
com minhas colegas, eu era responsável pela aprendizagem de cerca de 500
alunos.

A certeza de que eu gostaria de estudar tal tema emergiu no ano de 2012, em


que minhas colegas alfabetizadoras compartilharam comigo a angústia gerada em
função das dificuldades explicitadas por alguns alfabetizandos. Elas, inclusive,
relataram que a incidência de crianças alfabéticas na escrita de palavras que não
conseguiam ler sequer uma palavra era maior do que o processo inverso. Ou seja,
por alguma razão, a dificuldade desses alfabetizandos estava centrada na
aprendizagem da leitura. Tal defasagem em relação à leitura estaria relacionada a
fatores emocionais, sociais, culturais, ou, até mesmo, biológicos das crianças? Ou
seríamos nós, enquanto alfabetizadoras, que estaríamos enfatizando o processo de
escrita durante as aulas em detrimento da leitura? Nós não tínhamos respostas para
esses questionamentos. De qualquer modo, precisávamos alfabetizar essas
crianças.

Diante de tal desafio, estabeleci minha questão de pesquisa principal: como


desenvolver o trabalho pedagógico para que os processos de leitura e de escrita
evoluam simultaneamente em alunos em fase de alfabetização?

Para conseguir responder a tal questão, elaborei alguns objetivos


específicos,expressos a seguir:

a) compreender o desenvolvimento do processo de escrita em crianças que


estão em fase de alfabetização;
11

b) compreender o desenvolvimento do processo de leitura em crianças que


estão em fase de alfabetização;
c) conhecer possibilidades de organização do ambiente alfabetizador para
favorecer o desenvolvimento simultâneo dos processos de leitura e de escrita
nas crianças que estão em fase de alfabetização;
d) conhecer possibilidades de organização do tempo das atividades para
favorecer o desenvolvimento simultâneo dos processos de leitura e de escrita
nas crianças que estão em fase de alfabetização;
e) conhecer estratégias de ensino que favoreçam o desenvolvimento simultâneo
dos processos de leitura e de escrita nas crianças que estão em fase de
alfabetização.

Estabelecida a questão de pesquisa principal e os objetivos específicos do


TCC, iniciei a leitura de diversas obras, sugeridas pela minha orientadora. Os
materiais científicos lidos embasaram a teoria abordada nos capítulos desenvolvidos
no presente trabalho.

O capítulo intitulado “A evolução do conceito de alfabetização no Brasil”


apresenta os diferentes conceitos de alfabetização, desde décadas anteriores a
1940 até os dias atuais (SOARES, 2008). É revisitado o processo de invenção da
escrita por nossos ancestrais, relacionando-se tal momento com o processo de
construção de conhecimentos das crianças sobre o ato de escrever. A
aprendizagem da escrita resume-se à codificação de fonemas? A leitura consiste em
uma simples decodificação de grafemas? Por que os “erros” cometidos pelas
crianças ao escreverem palavras, via de regra, não são compreendidos pelos
adultos enquanto a fala dos pequenos, mesmo não considerando os padrões
sociais, é tão estimulada? Tais questionamentos são trabalhados no capítulo em
questão. Além de explicitar o conceito de alfabetização na concepção de diversos
autores, são mencionadas, também, as dimensões do letramento para diversos
estudiosos e a importância por eles atribuída à utilização de práticas pedagógicas
envolvendo o uso social da leitura e da escrita.

No capítulo seguinte (“A criança e a construção da escrita”), são abordadas


questões referentes à evolução da escrita – desde os pictogramas até a escrita
alfabética. São destacadas, também, as características relacionadas aos métodos
de alfabetização – sintético, analítico e misto – e a querela ocorrida entre estudiosos
que defendiam um ou outro desses métodos. A seguir, é mencionado o surgimento
do construtivismo e, consequentemente, o deslocamento do foco da pessoa que
ensina para o sujeito que aprende. Nesse contexto, são apresentadas definições
relacionadas aos níveis de escrita propostos por Oñativia (2009), as quais estão
baseadas nos estudos realizados por Emilia Ferreiro. Tendo em vista essa nova
concepção pedagógica, o papel do alfabetizador é repensado. O professor deixa de
ser o detentor de todos os saberes e torna-se o profissional responsável pela
12

realização de intervenções significativas a fim de possibilitar a complexificação dos


conhecimentos dos alfabetizandos em relação à escrita. Seguindo tal linha de
raciocínio, é apresentado, também, o método integral, surgido na Argentina, na
segunda metade do século XX, proposto por Oscar Oñativia.

O capítulo denominado “Aprendizagem e desenvolvimento da leitura”


apresenta o conceito de leitura (JOLIBERT, 1994). Além disso, alguns
questionamentos são abordados: primeiro as crianças devem aprender a ler para
depois poderem “ler de verdade”? Tal processo é legítimo e significativo para os
alfabetizandos? Outra questão fundamental, abordada no capítulo em questão,
refere-se ao modo de aprendizagem da leitura, por parte dos alfabetizandos, desde
a leitura de palavras até a compreensão de textos. Além disso, o papel do
alfabetizador para que as crianças aprendam a ler também é discutido. Outra
instituição fundamental para a construção de conhecimentos relacionados ao ato de
ler é a família. Sendo assim, o capitulo também menciona a importância da
participação dos pais e/ou cuidadores das crianças na escola e expõe algumas
ações importantes para que haja sucesso na parceria entre a família e instituição
escolar.

O capítulo final, intitulado “Articulando a leitura e a escrita: criando


possibilidades”, é dividido em duas partes, quais sejam: “A importância do
planejamento e a presença do lúdico” e “Recursos bem selecionados e estratégias
desafiadoras e criativas”. A primeira parte explicita o conceito de planejamento,
considerando dois diferentes tipos – planejamento de ensino e planejamento de
aula. Além disso, é mencionada a importância de se planejarem as aulas,
considerando-se os elementos fundamentais do planejamento, e de transformar tal
planejamento em planos de aula (HAIDT, 2004). É abordada, também, a dificuldade
existente para conceituar o “brincar” e a importância de tal atividade para a
aprendizagem dos alfabetizandos (MOYLES, 2006). São explicitadas, ainda, as
diferentes concepções dos alfabetizadores acerca do brincar na escola e a
dificuldade demonstrada pelos familiares dos alfabetizandos para valorizar tal
atividade na instituição escolar. São comentadas as diferentes posturas adotadas
pelos educadores que valorizam o brincar na escola – desde o direcionamento total
da brincadeira até a não intervenção na atividade, independentemente da
necessidade demonstrada pelas crianças. Considerando-se tal contexto, é
salientado o papel do docente no brincar infantil e a postura ideal a ser adotada pelo
professor. Mas, uma aula lúdica seria apenas aquela em que o educador propõe
brincadeiras? Tal questionamento também é discutido. Por fim, é comentada uma
questão que influencia diretamente a aprendizagem da leitura e da escrita por parte
das crianças: o número de alunos matriculados nas turmas de alfabetização.

A segunda parte do capítulo final, denominada “Recursos bem selecionados e


estratégias desafiadoras e criativas”, aborda o conceito de estratégias de ensino e
de recursos didáticos e a responsabilidade do alfabetizador na escolha de tais
elementos do planejamento pedagógico. Além disso, são mencionados três
13

procedimentos de ensino lúdicos que contribuem para a aprendizagem simultânea


da leitura e da escrita: Contos de fadas: conhecendo, criando e recriando histórias
fantásticas; Música: cantando, escrevendo, rimando e lendo; e Interpretando
histórias de literatura infantil.
14

2 A EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE ALFABETIZAÇÃO NO BRASIL

Ao longo do tempo, o conceito de alfabetização foi sendo modificado em


função da evolução social vivida no Brasil.

De acordo com Soares (2008), o conceito de alfabetização varia, de modo


geral, entre dois polos. O primeiro considera a alfabetização como um processo
mecânico, ou seja, como a aquisição das habilidades relacionadas à codificação e à
decodificação de caracteres. Por sua vez, o outro polo vai além, pois caracteriza
como alfabetizado o indivíduo capaz de compreender diversos materiais escritos e
de produzir diferentes escritas para que outras pessoas possam ler. Entretanto,
nenhum desses dois conceitos dá conta do aspecto social da alfabetização, ou seja,
das diferentes funções e da importância que o fato de saber ler e de saber escrever
assume dentro de uma sociedade, em um determinado tempo. Portanto, o conceito
de alfabetização “(...) depende, assim, de características culturais, econômicas e
tecnológicas” presentes na sociedade (SOARES, 2008, p. 17).

Cabe salientar que um conceito não exclui o outro; ao contrário,


complementam-se.

Uma teoria coerente da alfabetização deverá basear-se num conceito desse


processo suficientemente abrangente para incluir a abordagem “mecânica”
do ler/escrever, o enfoque da língua escrita como um meio de
expressão/compreensão, com especificidade e autonomia em relação à
língua oral, e, ainda, os determinantes sociais das funções e fins da
aprendizagem da língua escrita (SOARES, 2008, p. 18).

Tendo em vista que o conceito de alfabetização modifica-se em função do


tempo e do espaço em que está sendo caracterizado, cabe resgatar um pouco da
história dessa evolução. Segundo Soares (2010), até a década de 1940, era
considerado alfabetizado o indivíduo que soubesse apenas assinar seu nome, pois,
na época em questão, o conhecimento exigido pela sociedade estava diretamente
relacionado à assinatura de documentos como contratos de trabalho e
comprovantes de eleições.

A partir da década de 1940, para ser considerado alfabetizado, o indivíduo


precisava dominar outras habilidades, além da assinatura do próprio nome. Essas
habilidades estavam relacionadas à leitura e à escrita de bilhetes simples. Pela
primeira vez, na história do nosso país, para ser alfabetizado, o indivíduo deveria
utilizar a leitura e a escrita em seu cotidiano. Em contrapartida, ao final da década de
1950, Paulo Freire já definia a alfabetização como “(...) conscientização, politização,
meio de tornar o homem consciente da sua realidade e de sua possibilidade de
transformá-la” (SOARES, 2008, p. 120). Sendo assim, podemos concluir que, desde
o início da conceituação do termo “alfabetização”, havia divergências significativas
entre autores que se dedicavam ao estudo de tal temática.
15

De acordo com Ferreiro (2011), a escrita pode ser concebida como uma
representação da linguagem ou como uma codificação de fonemas. Tal concepção
dos docentes está relacionada ao conceito que os professores alfabetizadores
construíram acerca da escrita, fator este que influencia diretamente a ação
pedagógica empreendida por tais profissionais durante as aulas. Para Ferreiro
(2011), se a escrita fosse uma simples transcrição de fonemas, os alunos que não
apresentam dificuldades relacionadas aos sentidos de audição e de visão não
demonstrariam problema algum para aprender a escrever, pois a correta utilização
desses sentidos do corpo humano seria suficiente para compreender tal objeto de
estudo. Além disso, o fato de conceber a escrita como uma simples codificação de
fonemas privilegia apenas a grafia das palavras (significante), desconsiderando o
significado dos vocábulos, elemento que, unido ao significante, forma o signo
linguístico. Para que as crianças aprendam a escrever de modo significativo, é
fundamental que o significado das palavras acompanhe seus respectivos
significantes, impedindo, assim, que o signo linguístico seja destituído.

Em relação à leitura, cabe uma análise semelhante. Se a leitura fosse uma


simples decodificação de grafemas, crianças sem problemas relacionados à visão e
à audição conseguiriam ler quaisquer enunciados. O problema da concepção da
escrita e da leitura como codificação e decodificação de caracteres está no fato de
que a linguagem é reduzida a processos mecânicos, os quais não apresentam
sentido para as crianças. Além disso, desse modo, os alfabetizandos não
conseguem compreender os processos envolvidos na construção de tais objetos de
conhecimento.

Ao concebermos a escrita como um código de transcrição que converte as


unidades sonoras em unidades gráficas, coloca-se em primeiro plano a
discriminação perceptiva nas modalidades envolvidas (visual e auditiva). Os
programas de preparação para a leitura e a escrita que derivam desta
concepção centram-se, assim, na exercitação da discriminação, sem se
questionarem jamais sobre a natureza das unidades utilizadas. A
linguagem, como tal, é colocada de certa forma “entre parênteses”, ou
melhor, reduzida a uma série de sons (contrastes sonoros a nível do
significante). O problema é que, ao dissociar o significante sonoro do
significado, destruímos o signo linguístico. (FERREIRO, 2011, p.18)

Em contrapartida, se a escrita é concebida como uma representação da


linguagem, o signo linguístico (significante e significado das palavras) é preservado.
É permitido que as crianças realizem reflexões sobre os processos envolvidos na
leitura e na escrita, exteriorizando seus conhecimentos prévios e complexificando-os
à medida que pensam sobre tais objetos de estudo. Nesse caso, a interação entre
os alfabetizandos, a leitura, a escrita e pessoas alfabetizadas permite a evolução do
processo de aprendizagem das crianças.

Se voltarmos no tempo e recordarmos a invenção da escrita, perceberemos


que, na verdade, tal conhecimento foi construído pela civilização. Houve um tempo
em que a escrita era representada através de desenhos (escrita pictográfica),
16

cabendo destacar que os desenhos pareciam-se com elementos da realidade.


Entretanto, após algum tempo, os caracteres representativos da realidade deixaram
de se parecer com os elementos reais e foram substituídos por códigos, os quais
foram modificados pela civilização até conhecermos as letras hoje utilizadas para
escrever. A evolução da escrita ocorreu a partir de lógicas desenvolvidas pelos
povos vinculados a tal processo, o que demandou a reconstrução e a
complexificação de conhecimentos relacionados à linguagem.

Então, se a escrita foi inventada a partir de raciocínios lógicos empreendidos


por civilizações anteriores, por que privar as crianças de conhecer tal processo de
construção? Por que obrigá-las a reduzir a leitura e a escrita a simples processos de
codificação de fonemas e de decodificação de grafemas? Ferreiro (2011) não
defende a ideia de que as crianças criem um novo código de escrita, mas que
possam, durante o período de alfabetização, vivenciar o processo de construção do
código já existente.

A invenção da escrita foi um processo histórico de construção de um


sistema de representação, não um processo de codificação. Uma vez
construído, poder-se-ia pensar que o sistema de representação é aprendido
pelos novos usuários como um sistema de codificação. Entretanto, não é
assim. (...) Bem entendido: não se trata de que as crianças reinventem as
letras nem os números, mas que, para poderem se servir desses elementos
como elementos de um sistema, devem compreender seu processo de
construção e suas regras de produção (...) (FERREIRO, 2011, p.16-17).

Cabe destacar que, nem sempre, os conhecimentos prévios das crianças


acerca da leitura e da escrita correspondem àqueles passíveis de compreensão pela
sociedade. Mas, por mais distantes que tais conhecimentos estejam daqueles
socialmente aceitos, devem ser valorizados, pois demandaram uma série de
análises por parte dos alfabetizandos sobre a leitura e a escrita. Isso se deve ao fato
de que as crianças começam a aprender sobre os elementos da linguagem desde
seu nascimento, não sendo necessário, então, ingressar na escola para construir
suas primeiras teses sobre a leitura e a escrita. As crianças aprendem sobre tais
objetos de conhecimento ao transitarem nas ruas, ao observarem pessoas
alfabetizadas realizando a leitura de materiais de uso cotidiano (jornais, revistas,
receitas, bilhetes, placas com o nome das ruas, identificação dos ônibus etc.) e/ou a
escrita de materiais (cartas, bilhetes, convites, listas de compras etc.).

Entretanto, para que os alfabetizandos possam complexificar seus


conhecimentos sobre tais objetos de estudo, é necessário que os professores
alfabetizadores realizem as intervenções adequadas, considerando o nível de
desenvolvimento da escrita e da leitura por parte de cada aluno. De acordo com
Ferreiro (2011), há três questões merecedoras de atenção em relação às
concepções dos professores acerca da alfabetização: escrever é diferente de copiar;
as concepções dos alfabetizadores sobre a escrita; a concepção dos alfabetizadores
sobre a leitura como simples ato de saber o nome das letras e seu respectivo som.
17

A primeira questão (escrever é diferente de copiar) está diretamente


relacionada à concepção de aprendizagem dos professores. Alguns educadores
entendem que os alunos aprenderão a escrever se copiarem palavras escritas pelos
alfabetizadores e repetirem tais modelos diversas vezes.

A análise detalhada de algumas das muitas crianças que são “copistas”


experientes, mas que não compreendem o modo de construção do que
copiam é o melhor recurso para problematizar a origem desta confusão
entre escrever e desenhar letras (FERREIRO, 2011, p.34).

Por sua vez, a segunda questão está imbricada à primeira, pois se refere à
compreensão que os alfabetizadores têm da construção da escrita por parte dos
alfabetizandos. Para considerar a escrita uma construção de conhecimentos, os
professores precisam pensar nos diferentes níveis de escrita existentes e, pelos
quais as crianças passam até escreverem do modo socialmente compreensível
pelas pessoas alfabetizadas (escrita alfabética).

Há discussões, também, acerca da ordem em que as letras devem ser


apresentadas aos alunos e se os alfabetizadores devem ensinar primeiro o nome da
letra ou o som que ela faz. Tais questionamentos são considerados reducionistas
quando o assunto é a formação do leitor. “Os adultos já alfabetizados têm tendência
a reduzir o conhecimento do leitor ao conhecimento das letras e seu valor sonoro
convencional” (FERREIRO, 2011, p.34).

Para incitar a reflexão dos alfabetizadores acerca da leitura, Ferreiro (2011) e


seus colaboradores organizam grupos de quatro ou cinco educadores, fornecem, a
cada grupo, materiais escritos em uma língua diferente da Língua Portuguesa e
solicitam que o material seja lido. Em um primeiro momento, os professores
recusam-se a ler, pois não compreendem a língua constante em tal portador de
texto. Após serem novamente desafiados a tentar descobrir informações sobre o
material, os alfabetizadores começam a analisar que tipo de portador de texto têm
em mãos (jornal, livro, revista etc.), considerando algumas características referentes
a cada tipo de material. Então, as análises referem-se à presença ou à ausência de
título, à orientação da escrita (se está escrito da esquerda para a direita ou da direita
para a esquerda; de cima para baixo ou de baixo para cima), se o material contém
gravuras, data, caracteres que se repetem, se está organizado em colunas ou em
linhas, dentre outros aspectos. Após cerca de uma hora de exploração do material,
os grupos socializam suas hipóteses e percebe-se que todos conseguem extrair
algumas informações importantes como, por exemplo, que tipo de portador de texto
têm em mãos e o assunto abordado em cada um dos materiais. Além disso, os
grupos justificam suas descobertas.
18

É interessante observar, nessa experiência, que os grupos que mais


avançam nas hipóteses são aqueles que recebem materiais contendo gravuras.
Diante dos resultados, é dito aos educadores que as crianças em processo de
alfabetização agem da mesma forma em relação aos esforços por eles
empreendidos para a compreensão do material escrito que têm em mãos.
Entretanto, há uma diferença a ser considerada: a maioria dos alunos não conhece
as características dos diferentes portadores de texto, o que os deixa em
desvantagem no que se refere à inferência do conteúdo escrito no material. Após a
dinâmica, os educadores

(...) descobriram que construir antecipações sobre o significado e tratar


depois de encontrar indicações que permitam justificar ou rejeitar a
antecipação é uma atividade intelectual complexa, bem diferente de pura
adivinhação ou da imaginação não controlada. Assim descobrem que o
conhecimento da língua escrita que eles possuem, por serem leitores, não
se reduz ao conhecimento das letras (FERREIRO, 2011, p.36).

Ainda sobre a leitura, cabe salientar que as crianças devem sentir prazer ao
ler, mas esse prazer não deve estar associado somente a textos de ficção
(literatura). A leitura apresenta um valor social, o qual está relacionado à
compreensão do conteúdo de diversos portadores de textos capazes de fornecer
informações importantes acerca dos mais variados assuntos.

Esclarecidos tais aspectos, cabem destacar outras questões relacionadas à


concepção da escrita, as quais extrapolam a querela dos métodos de alfabetização.
Uma das polêmicas está relacionada à ordem em que os alunos devem aprender:
primeiro ler ou primeiro escrever? De acordo com Ferreiro (2011, p.36-37), “na
América Latina, a tradição tende a utilizar uma introdução conjunta das duas
atividades”. A ideia de dissociação das práticas de leitura e de escrita não tem
sentido, pois, para tornar possível a compreensão do sistema de escrita, o
alfabetizando tem de realizar atividades relacionadas à interpretação e à produção
de escrita.

Outra dúvida comum dos alfabetizadores refere-se à ordem de apresentação


das letras do alfabeto e à questão de primeiro nomear as letras ou ensinar o som.
Segundo Ferreiro (2011), tal questionamento perpassa por uma questão relacionada
à facilidade e à dificuldade de aprendizagem das letras. Se estabelecermos uma
ordem de apresentação das letras para as crianças, tal ordem estará de acordo com
as concepções do que é fácil ou do que é difícil para o adulto e não para a criança;
no entanto, ao entrar em contato com o mundo, o alfabetizando não visualizará
apenas as letras ensinadas na escola.

Além disso, o professor não é o único detentor do saber. As crianças podem


aprender com outros adultos e com outras crianças alfabetizadas:

“É evidente que, por si só, a presença isolada do objeto e das ações sociais
pertinentes não transmitem conhecimento, mas ambas exercem uma
19

influência, criando as condições dentro das quais isto é possível”


(FERREIRO, 2011, p.44).

As experiências vivenciadas pelas crianças fora da escola permitem que


algumas delas cheguem ali conhecendo o funcionamento do sistema de escrita e
sua importância na sociedade.

Por exemplo, a mãe escreve a lista de compras do mercado, a mãe leva


consigo essa lista e a consulta antes de terminar suas compras: sem
querer, está transmitindo informações sobre uma das funções da língua
escrita (serve para ampliar a memória, como lembrete para aliviar a
memória). Busca-se na lista telefônica o nome, endereço e telefone de
algum serviço de conserto de aparelhos quebrados; sem querer, essa
leitura transmite informações sobre algo que não sabíamos antes de ler.
Recebe-se uma carta ou alguém deixa um recado que deve ser lido por
outro familiar ao chegar; sem querer, transmite-se informação sobre outra
das funções da língua escrita (serve para comunicar-se à distância, para
dizer algo a alguém que não está presente no momento de se escrever a
mensagem). (FERREIRO, 2010, p. 19-20)

Entretanto, há outras crianças que sequer têm noção do que tal objeto de
conhecimento significa, pois não tiveram oportunidade de vivenciar experiências tão
ricas e significativas em relação à escrita. Principalmente para essas crianças, que,
pelos mais diversos motivos, não tiveram oportunidade de perceber a importância da
língua escrita e que também não conhecem as convenções de tal objeto de
conhecimento, é que a escola e, mais especificamente, o docente responsável pela
alfabetização, apresenta um papel fundamental. Na verdade, não se espera que a
escola revele todos os segredos da escrita para as crianças, mas que crie condições
para que os alfabetizandos possam construir e reconstruir suas hipóteses acerca de
tal objeto de conhecimento. Considerando a permanente construção e reconstrução
de saberes, todo o processo evolutivo da construção da escrita por parte dos alunos
é devidamente valorizado, desde as hipóteses mais primitivas até a elaboração da
hipótese alfabética.

Entretanto, segundo Ferreiro (2010), nem sempre isso acontece. Há uma


grande diferença entre a valorização das primeiras manifestações orais das crianças
e as primeiras tentativas de escrita dos pequenos. Em relação à oralidade, os
adultos costumam valorizar consideravelmente qualquer tentativa de fala das
crianças, quando estas ainda estão ensaiando seus primeiros balbucios. Há um
esforço por parte dos adultos para compreender o que a criança quis dizer com
determinado som emitido e, quando compreendido, dá-se o feedback em relação à
tentativa de fala da criança; ou seja, o adulto repete de maneira correta a palavra
que a criança tentou falar, mas ainda não conseguiu pronunciar corretamente. Tal
atitude por parte dos adultos incentiva as crianças a continuarem ensaiando falas,
até que os “erros” se transformem em acertos. As crianças sentem-se motivadas a
continuarem tentando acertar em função da alegria exteriorizada pelos adultos
diante do esforço empreendido por elas.
20

Sobre a escrita, via de regra, não acontece desse modo, principalmente


quando se trata de concepções acerca de métodos de alfabetização tradicionais, os
quais apenas consideram um acerto se a palavra for escrita de acordo com o nível
alfabético de escrita, ou seja, de modo que todos possam ler o(s) vocábulo(s) e
compreendê-lo(s).

Ninguém tenta compreender o que a criança quis escrever, porque se


supõe que não possa escrever nada até ter recebido a instrução formal
pertinente (na realidade: é melhor que não escreva até não saber grafar de
modo conveniente). Ninguém tenta retraduzir o que a criança escreveu,
porque lhe nega o direito de aproximar-se da escrita por um caminho
diferente do indicado pelo método escolhido pelo professor (FERREIRO,
2010, p. 31).

Desse modo, as crianças ficam inibidas para escrever e acabam, muitas


vezes, desenvolvendo bloqueios em relação à escrita. Se a escrita é um processo,
por que não tratá-la como tal? Por que desconsiderar os resultados da caminhada
que os alfabetizandos precisam percorrer até conseguir compreender a lógica da
escrita e escrever do modo socialmente aceito? Por que existe essa diferença entre
a valorização das primeiras tentativas de fala das crianças e suas primeiras
tentativas de escrita? Seria porque os adultos consideram que a fala é uma
aprendizagem social e que a escrita é uma aprendizagem escolar? Conforme
referido anteriormente, copiar não é escrever. As crianças aprendem quando
conseguem elaborar seus conhecimentos acerca dos objetos de estudo e não
apenas quando conseguem reproduzi-los de modo oral ou escrito. A escrita “é um
processo difícil para a criança, mas não mais difícil que outros processos de
aquisição de conhecimentos” (FERREIRO, 2010, p. 32).

O mesmo ocorre em relação à leitura. Se a criança ler uma palavra de modo


incorreto, por exemplo, poderá ser repreendida e, do mesmo modo, poderá negar-se
a ler materiais escritos por medo das críticas que serão feitas a ela. Entretanto, para
Ferreiro (2010, p. 48), “a alfabetização não é um estado ao qual se chega, mas um
processo cujo início é, na maioria dos casos, anterior à escola e que não termina ao
finalizar a escola primária”. Sendo assim, durante a fase de alfabetização, os alunos
cometerão erros construtivos até que o processo esteja devidamente avançado.

De acordo com Ferreiro (2010, p. 48),

(...) a correção contínua e imediata gera inibição e impede a reflexão e a


confrontação. Os erros também necessitam ser interpretados pelo
professor, já que nem todos os erros se parecem (não têm a mesma origem
nem „dizem‟ o mesmo com respeito à evolução).

O fato de não compreender o processo de alfabetização das crianças e,


consequentemente, desconsiderar suas diferentes fases, implica um problema
social, pois se ensina a ler e a escrever não apenas para que as pessoas possam ler
materiais que outras escrevem, mas também para que possam exercer sua
cidadania – o que é um direito de todos – escrevendo o que pensam acerca de
21

diferentes assuntos. Outro aspecto importante acerca da escrita refere-se ao


princípio alfabético (cada fonema é representado por um grafema diferente).
Entretanto, de acordo com Ferreiro (2010), com a evolução dos tempos, foram
ocorrendo algumas defasagens nesse sentido.

Isto se dá por duas razões: a primeira tem a ver com uma variável temporal
– as ortografias das línguas escritas evoluem muito mais lentamente do que
a fala; a segunda razão é de caráter espacial – na medida em que uma
língua se estende a um número crescente de usuários dispersos numa área
geográfica ampla, surgem variantes dialetais que se distanciam em maior
ou menor medida do que se representa por escrito (FERREIRO, 2010, p.
27-28).

Considerando tais fatores, cabe destacar que o dialeto falado pelas crianças
não deve ser julgado negativamente e nem corrigido nos primeiros momentos da
alfabetização, quando a criança escreve palavras, frases ou textos de acordo com
sua cultura. A desvalorização da produção escrita dos alfabetizandos em função das
variações dialetais sugere não apenas a ridicularização da criança, mas, também, de
sua família e da comunidade na qual está inserida. Além disso, tal ação representa
um erro teórico por parte do professor alfabetizador, pois “a escrita representa a
língua e não a fala” (FERREIRO, 2010, p. 28).

Para Ferreiro (2010), a escrita

(...) envolve mais que aprender a produzir marcas [...] algo que é mais que
decifrar marcas feitas por outros, porque é também interpretar mensagens
de diferentes tipos e de diferentes graus de complexidade; algo que também
supõe conhecimento acerca deste objeto tão complexo – a língua escrita – ,
que se apresenta em uma multiplicidade de usos sociais (p. 80).

Para se introduzir a língua escrita, é necessário que a criança tenha acesso a


diferentes portadores de texto; que alguém leia, em voz alta, para a criança, o
conteúdo constante em tais materiais; que a criança possa ensaiar escritas sem
medo de cometer erros e ser criticada por isso; que a criança possa realizar
exercícios relacionados à antecipação do conteúdo escrito constante em diferentes
portadores de texto a partir da observação de imagens e, em seguida, da análise do
texto; e que a criança participe de diferentes atos sociais de escrita.

Foi, então, que, na segunda metade da década de 1980, surgiu o termo


letramento. Mas, afinal, por que tal palavra foi incorporada ao vocabulário da Língua
Portuguesa? Se pararmos para pensar, sempre que um vocábulo é inventado,
significa que existe algum conceito novo, que ainda não foi nomeado. O conceito de
letramento tornou-se importante a partir do momento em que o analfabetismo
começou a diminuir; ou seja, a partir do momento em que mais pessoas aprenderam
a ler e a escrever e que nossa sociedade foi se tornando “cada vez mais centrada na
escrita” (SOARES, 2010, p. 45). Sendo assim, uma diversidade maior de materiais
escritos estava sendo disponibilizada para as pessoas. Tais portadores de texto
tinham diferentes objetivos: desde informar os indivíduos (como, por exemplo, os
22

jornais) até livros para lazer. Entretanto, o fato de os indivíduos saberem ler e
escrever não significava que fariam uso dessas habilidades na sociedade. Foi nesse
momento que emergiu o conceito de letramento. De acordo com Soares (2010), a
palavra letramento é a versão, na Língua Portuguesa, da palavra literacy, a qual,
antes da década de 1980, já fazia parte do vocabulário da Língua Inglesa.

(...) literacy é o estado ou condição que assume aquele que aprende a ler e
escrever. Implícita nesse conceito está a ideia de que a escrita traz
consequências sociais, culturais, políticas, econômicas, cognitivas,
linguísticas, quer para o grupo social em que seja introduzida, quer para o
indivíduo que aprenda a usá-la. (SOARES, 2010, p. 17)

Desse modo, literacy abrange todas as mudanças positivas envolvidas na


vida dos sujeitos em função da utilização da leitura e da escrita na vida cotidiana.
Segundo Soares (2010), letramento, então, está relacionado a todos os avanços
cognitivos, sociais, psicológicos, linguísticos e políticos que ocorrem na vida das
pessoas em decorrência do uso das habilidades de ler e de escrever no mundo em
que esses indivíduos estão inseridos.

Para Soares (2010), há diferenças entre os processos de alfabetização e de


letramento. “Alfabetizado” é o sujeito capaz de ler e de escrever; “letrado” é o sujeito
que utiliza seus conhecimentos relacionados à alfabetização para resolver situações
práticas que se apresentam no cotidiano. De acordo com a referida autora, “(...) não
basta apenas saber ler e escrever, é preciso também saber fazer uso do ler e do
escrever, saber responder às exigências de leitura e de escrita que a sociedade faz
continuamente” (SOARES, 2010, p. 20). Essas exigências podem variar de acordo
com os diferentes locais (países ou regiões de um mesmo país) e com o tempo
(passado ou presente):

(...) durante muito tempo, considerava-se analfabeto o indivíduo incapaz de


escrever o próprio nome; nas últimas décadas, é a resposta à pergunta
“sabe ler e escrever um bilhete simples?” que define se o indivíduo é
analfabeto ou alfabetizado. Ou seja: da verificação de apenas a habilidade
de codificar o próprio nome passou-se à verificação da capacidade de usar
a leitura e a escrita para uma prática social (ler ou escrever um “bilhete
simples”) (SOARES, 2010, p.21).

Em relação à outra variável (diferentes locais), há concepções distintas


quando se trata de alfabetização e de letramento em países desenvolvidos e em
países em desenvolvimento, como o Brasil. Já em países desenvolvidos, em que a
educação básica é obrigatória e universal, não existe uma especial preocupação
com a aprendizagem da leitura e da escrita, pois os níveis de analfabetismo ficam
próximos a zero. As estatísticas revelam dados relacionados àquelas pessoas que,
apesar de saberem ler e escrever, não utilizam tais conhecimentos no cotidiano; em
outras palavras, às pessoas que são alfabetizadas, mas não são letradas, ou que
apresentam níveis baixos de letramento.
23

Em contrapartida, no Brasil, assim como em outros países em


desenvolvimento, ainda há uma grande preocupação com indivíduos que não foram
alfabetizados. Cabe destacar que, de acordo com Soares (2010), um indivíduo
analfabeto pode ser letrado. Uma pessoa que não sabe ler e não sabe escrever,
mas, no cotidiano, ouve a leitura de diferentes materiais escritos por parte de
indivíduos alfabetizados e que, do mesmo modo, dita enunciados referentes a
diferentes portadores de texto, considerando as especificidades de cada material,
para que outra pessoa escreva, é considerada letrada. As crianças em fase de
alfabetização, por exemplo, podem ser letradas, apesar de não dominarem as
técnicas relacionadas à leitura e à escrita. Os alfabetizandos podem reconhecer as
características de diferentes portadores de textos e exteriorizá-las, mas ainda não
conseguir fazer a leitura de materiais escritos e nem escrever de modo que todos os
leitores possam compreender sua escrita.

Nas palavras da autora,


Há, assim, uma diferença entre saber ler e escrever, ser alfabetizado, e
viver na condição ou estado de quem sabe ler e escrever, ser letrado [...] Ou
seja, a pessoa que aprende a ler e a escrever – que se torna alfabetizada –
e que passa a fazer uso da leitura e da escrita, a envolver-se nas práticas
sociais de leitura e de escrita – que se torna letrada – é diferente de uma
pessoa que não sabe ler e escrever – é analfabeta – ou, sabendo ler e
escrever, não faz uso da leitura e da escrita – é alfabetizada, mas não é
letrada, não vive no estado ou condição de quem sabe ler e escrever e
pratica a leitura e a escrita (SOARES, 2010, p. 36).

Em relação às crianças em fase de alfabetização, o ideal seria que fossem


alfabetizadas e letradas ao mesmo tempo;
ou seja, que os educadores ensinassem as técnicas de leitura e de escrita aos
alunos em contextos reais de alfabetização. Segundo Soares (2010), existem
algumas condições para que o letramento se torne possível. Primeiramente, seria
necessário que a totalidade da população brasileira tivesse acesso à escola e que, a
partir das experiências vivenciadas na instituição escolar, almejasse mais do que
apenas saber ler e escrever. Entretanto, não adiantará que crianças e adultos
aspirem mais do que simplesmente estar alfabetizados se o país não facilitar o
acesso dessas pessoas aos materiais escritos.

O que ocorre nos países do Terceiro Mundo é que se alfabetizam crianças e


adultos, mas não lhes são dadas as condições para ler e escrever: não há
material impresso posto à disposição, não há livrarias, o preço dos livros e
até dos jornais e revistas é inacessível, há um número muito pequeno de
bibliotecas. (SOARES, 2010, p. 58)

Mas, afinal, será possível elaborar uma única definição para a palavra
letramento? De acordo com Soares (2010), o letramento é um conceito complexo,
que envolve um conjunto de habilidades, as quais não podem ser abordadas em um
único conceito. Sendo assim, há autores que utilizam a palavra “letramentos” e,
24

outros, que conceituam tal vocábulo de modo superficial, considerando apenas uma
de suas dimensões.

Segundo a autora (2010), o conceito de letramento pode estar centrado em


uma de suas duas dimensões: a dimensão individual ou a dimensão social.
Sobre a dimensão individual do letramento, cabe salientar-se que é um
conceito que desloca o foco para o sujeito aprendente, considerando-se a aquisição
das técnicas de leitura e de escrita. Na dimensão individual, às vezes, estas são
tratadas como processos iguais, ou seja, que exigem as mesmas habilidades. Nesse
caso, se o indivíduo souber ler com fluência e compreensão, saberá escrever com a
mesma destreza. Tal visão dos processos de leitura e de escrita configura um
problema, pois ler e escrever envolvem diferentes habilidades, e o desenvolvimento
de uma não está diretamente relacionado ao nível de desenvolvimento da outra.
Alguém pode saber ler muito bem e não escrever com clareza; do mesmo modo,
uma pessoa pode escrever muito bem, mas apresentar dificuldades para ler
materiais escritos.

Ainda na dimensão individual de letramento, há autores que destacam o


processo de leitura em detrimento do processo de escrita. Assim, o conceito de
letramento está diretamente relacionado à capacidade que o sujeito apresenta para
ler. Mas, o que o conceito de leitura abrange na dimensão individual do letramento?
A leitura

(...) é um conjunto de habilidades linguísticas e psicológicas, que se


estendem desde a habilidade de decodificar palavras escritas até a
capacidade de compreender textos escritos. [...] a leitura é um processo de
relacionar símbolos escritos a unidades de som e é também o processo de
construir uma interpretação de textos escritos (SOARES, 2010, p. 69).

Além disso, cabe destacar que tal compreensão estende-se aos mais
diversos portadores de textos, desde uma lista de compras até um livro de poesias,
por exemplo.

Já em relação à escrita, de acordo com a dimensão individual de letramento,


cabe destacar que esta

(...) é também um conjunto de habilidades linguísticas e psicológicas, mas


habilidades fundamentalmente diferentes daquelas exigidas pela leitura. [...]
as habilidades de escrita estendem-se da habilidade de registrar unidades
de som até a capacidade de transmitir significado de forma adequada a um
leitor potencial. [...] a escrita é um processo de relacionar unidades de som
a símbolos escritos, e é também um processo de expressar ideias e
organizar o pensamento em língua escrita (SOARES, 2010, p. 69-70).

Assim como na leitura, as habilidades relacionadas à escrita estendem-se a


diferentes portadores de texto. Isso significa que o sujeito deve ser capaz de
escrever desde o próprio nome até um livro, por exemplo.

Para aqueles autores que enfatizam a dimensão social,


25

letramento não é simplesmente um conjunto de habilidades de leitura e


escrita, mas, muito mais que isso, é o uso dessas habilidades para atender
às exigências sociais. [...] letramento não pode ser considerado um
“instrumento” neutro a ser usado nas práticas sociais quando exigido, mas é
essencialmente um conjunto de práticas socialmente construídas que
envolvem a leitura e a escrita, geradas por processos sociais mais amplos,
e responsáveis por reforçar ou questionar valores, tradições e formas de
distribuição de poder presentes nos contextos sociais (SOARES, 2010, p.
75).

Um dos autores que compartilha da dimensão social de letramento é Paulo


Freire, que considera a leitura e a escrita como habilidades que devem ser
utilizadas para modificar a realidade na qual estamos inseridos. Sendo assim, um
dos objetivos seria acabar com o domínio das pessoas economicamente mais
favorecidas sobre aquelas pertencentes a classes sociais menos favorecidas.

Segundo Soares (2008), se considerarmos a definição da palavra “método”


como um meio, um tipo de fazer pedagógico para alfabetizar crianças, jovens ou
adultos, é incorreto afirmar que Paulo Freire foi responsável pela criação de um
método de alfabetização.. O próprio Paulo Freire dizia-se favorável ao método
eclético, ou seja, o método de alfabetização que utilizava tanto palavras, frases ou
textos para analisar unidades menores, tais como, sílabas e letras (método analítico)
e, em outros momentos, propunha a síntese de unidades menores como, por
exemplo, letras e sílabas para formar unidades maiores, tais como, palavras, frases
e/ou textos (método sintético). Sendo assim, Paulo Freire não é responsável pela
criação de um método. Tal educador, no entanto, é reconhecido internacionalmente
pela criação de uma nova concepção de educação e, consequentemente, de
alfabetização:
(...) uma concepção de educação como prática de liberdade, educação
como conscientização; e disso, realmente, foi ele o inventor. [...] uma
concepção de alfabetização, como meio de democratização da cultura,
como oportunidade de reflexão sobre o mundo e a posição e lugar do
homem (SOARES, 2008, p. 119).

Na verdade, Paulo Freire redirecionou o meio e o objetivo da alfabetização.


Segundo ele, não deveriam ser utilizadas palavras que estivessem fora do contexto
dos sujeitos aprendentes para alfabetizar. A disseminada sentença “Ivo viu a uva”,
por exemplo, pode ser útil para ensinar as técnicas de alfabetização como, por
exemplo, a família silábica da letra “v”. Entretanto, o questionamento de Paulo Freire
referia-se ao quanto significativa era essa sentença para os alfabetizandos: será que
eles, algum dia, conheceram alguém que se chamasse Ivo? Será que a uva é uma
fruta que faz parte da realidade dos alfabetizandos? A proposta de Paulo Freire era
que as palavras ou os temas eleitos para serem trabalhados em aula com os
alfabetizandos estivessem diretamente relacionados ao cotidiano desses sujeitos.

Na proposta de Paulo Freire, trata-se, sim, de selecionar palavras do


universo vocabular dos alfabetizandos, trata-se também de selecionar
26

palavras que atendam a uma sequência adequada de aprendizagem


fonema-grafema, mas não se selecionam quaisquer palavras: selecionam-
se aquelas carregadas de significado social, cultural, político, vivencial. [...]
Na verdade, não são só palavras geradoras, mas temas geradores
(SOARES, 2008, p. 120).

Desse modo, o objetivo da alfabetização é voltado não apenas para a


aprendizagem de técnicas de codificação e de decodificação de caracteres, mas
para a formação de sujeitos críticos e capazes de modificar as relações sociais
impostas pela sociedade.

Considerando que a escrita constitui um dos processos diretamente


relacionados à alfabetização, nas linhas que seguem, será abordada a construção
de tal conhecimento por parte da criança.
27

3 A CRIANÇA E A CONSTRUÇÃO DA ESCRITA

Assim como o conceito de alfabetização, o processo de construção da escrita


evoluiu ao longo do tempo, considerando-se as necessidades das pessoas que
viviam em diferentes lugares do mundo. A evolução social possibilitou o
desenvolvimento de atividades que exigiam registro escrito a fim de que as tarefas
fossem mais bem organizadas e de que a memória dos sujeitos não fosse a única
fonte de consulta posterior dos fatos e/ou de transações realizadas. Segundo
Oñativia (2009),

a escrita nasceu na segunda metade do quarto milênio antes de nossa era,


aproximadamente no ano 3300 a.C., em Uruk, cidade suméria no sul da
Mesopotâmia. Surgiu, antes de tudo, por uma necessidade de urbanização:
com o nascimento das cidades-estados, passou a ser essencial uma
ferramenta intelectual que possibilitasse o registro de contratos comerciais e
políticos (entre outros). Com a escrita, a memória se fixa, fica documentada.
O pensamento humano, deixando de ser mítico, faz-se racional, reflexivo,
com a possibilidade de retornar ao que se pensou, criticar o passado e
inferir sobre o futuro (p. 68).

Desde essa época, então, a escrita vem sendo utilizada no cotidiano,


considerando o raciocínio lógico implementado para realizar os registros e as
ferramentas disponíveis em cada parte do mundo. Os primeiros registros escritos,
denominados pictogramas, consistiam em desenhos que se pareciam muito com o
objeto ou o animal representado. As letras ainda não haviam sido inventadas e a
escrita não apresentava qualquer relação com o som das palavras representadas.

Algum tempo depois, as pessoas repensaram a forma de representação da


escrita e criaram os ideogramas, escrita que ainda era baseada em desenhos, mas,
não eram mais tão parecidos com os objetos e com os animais representados. Foi
então, que, passado algum tempo, houve um grande progresso na invenção da
escrita: os fonogramas. De acordo com Oñativia (2009, p. 68), “o homem consegue
unir dois grandes universos que até então tinham permanecido separados: o da
palavra, com sua configuração fonética, e o icônico, dos desenhos gráficos”. Cada
signo icônico representava um som existente na língua, o qual significava uma
palavra. Unindo esses signos icônicos, os indivíduos conseguiam representar várias
palavras por meio da língua escrita.

De acordo com Oñativia (2009, p. 70), “outra linha terminal da escrita surgiu
da simplificação e transformação do sistema ideográfico chinês em caracteres
silábicos. Nascem, assim, os silabários [...] Um exemplo de silabário é a língua
japonesa”. Nos silabários, cada representação gráfica corresponde a uma sílaba, as
quais, combinadas, representam as palavras.

Finalizando a linha de evolução histórica da escrita, cabe destacar que “em


determinado momento de sua evolução – na Grécia, por volta do ano 900 a.C. – (a
28

escrita) adquiriu sua expressão definitiva: o sistema alfabético” (OÑATIVIA, 2009, p.


70). Este sistema, adotado pelo Brasil, considera que os caracteres escritos (letras)
correspondem a sons (fonemas). Sendo assim, o processo de escrita consiste na
codificação desses fonemas, os quais, unidos, originam as palavras. Entretanto,
cabe salientar que a escrita é um produto social, pois foi construída pelos sujeitos ao
longo dos séculos, com finalidades específicas. Sendo assim, a escrita não consiste
apenas em uma simples técnica de codificação de caracteres. A utilização da
técnica é essencial para escrever, mas a escrita deve ser utilizada de acordo com as
necessidades dos sujeitos no cotidiano, os quais devem ser capazes de expressar
ideias com clareza, a fim de que possam exercer a cidadania.

Após a definição da utilização do sistema de escrita alfabético no Brasil, entre


outros países, houve uma grande preocupação: como ensinar às crianças tal
sistema de escrita? Durante muito tempo, o foco das discussões acerca da
alfabetização esteve voltado para os métodos utilizados pelos alfabetizadores. Havia
dúvidas sobre o melhor método para ensinar as crianças a ler e a escrever. Cabe,
então, mencionarem-se os principais métodos de alfabetização adotados pelos
professores, desde a Antiguidade.

O método de alfabetização mais antigo é o método sintético, o qual foi


utilizado com exclusividade pelos alfabetizadores, desde a “(...) Antiguidade a
meados do século XVIII [...]” (OÑATIVIA, 2009, p. 12). O método sintético baseia-se
na concepção de que os conhecimentos acerca da língua escrita estão externos ao
sujeito aprendente. Isso significa que, inicialmente, os alfabetizandos não
apresentam conhecimento algum sobre a escrita. Tal concepção está diretamente
relacionada com a teoria que a embasa: o behaviorismo, o qual considera que a
criança, ao nascer, é uma tabula rasa, ou seja, não apresenta conhecimento algum
e que só é capaz de aprender se alguém a ensinar. Desse modo, o ensino da escrita
por meio do método sintético ocorre “(...) do simples para o complexo, num processo
cumulativo. Assim, em geral a criança aprende primeiro as letras, depois vêm as
sílabas, as palavras, as frases e, finalmente, o texto completo” (OÑATIVIA, 2009, p.
12).

Cabe destacar, ainda, sobre o método sintético, que o caminho do simples


para o complexo apresenta dois significados: das unidades menores (letras,
fonemas, sílabas) para unidades maiores (palavras, frases e textos), conforme
mencionado anteriormente; e, na ordem de ensino das letras: primeiro, são
ensinadas as letras que apresentam uma única correspondência fonêmica
(correspondência unívoca) como, por exemplo, a letra “t”. Depois que todas as letras
com essa característica tiverem sido ensinadas, são trabalhadas as demais letras,
as quais apresentam múltiplas correspondências sonoras como, por exemplo, a letra
“x”. Um dos tipos de método sintético, o método fônico, baseia-se no ensino dos
sons das letras do alfabeto como menor unidade trabalhada. A partir do
conhecimento dos sons das letras, os alfabetizandos aprendem a formar as sílabas
e as palavras.
29

Outro método de alfabetização bastante utilizado é o método analítico ou


global. Tal método surgiu ainda no século XVIII, em contraposição ao método
sintético, efetivando-se no século XX. A crítica do método analítico em relação ao
método sintético é embasada no fato de que este desconsidera a psicologia da
criança, o que o torna um método artificial e demasiadamente mecânico. Tal crítica
está diretamente relacionada à influência da psicologia genética, teoria que embasa
o método analítico.

Sua metodologia propunha que se escrevessem palavras significativas para


a criança em pedaços de papel de diferentes formatos. Com essa pequena
ajuda, tomando como base os formatos, a criança logo conseguia
reconhecer as palavras. Passado certo tempo, as mesmas palavras eram
então escritas em pedaços de papel de formato idêntico. Aos poucos, a
criança reconhecia diretamente as palavras escritas. Depois, ela passava a
escrever frases com essas palavras e, em pouco tempo, conseguia realizar
a leitura delas. Segundo Adam, a análise da palavra deveria ocorrer numa
etapa bem posterior ao domínio das palavras apreendidas globalmente
(OÑATIVIA, 2009, p. 14).

Entretanto, alguns estudiosos, defensores do método analítico, consideravam


que a análise das palavras deveria ocorrer no início do processo. Sendo assim,
surgiu o método misto, conhecido também como analítico-sintético ou eclético. De
acordo com tal método, os alfabetizadores deveriam apresentar aos alunos algumas
palavras-chave, as quais seriam utilizadas como base para a análise de unidades
menores: as sílabas e, na sequência, as letras.

Após serem travadas diversas discussões e disputas entre os métodos


mencionados (sintético, analítico e misto), aproximadamente, no final da década de
1970, ocorreu uma transformação conceitual, a qual foi proposta por Emilia Ferreiro.
O foco das discussões acerca da aprendizagem da leitura e da escrita foi deslocado
dos métodos de alfabetização para a criança, ou seja, a proposta visava ao
deslocamento da atenção de quem ensina para quem aprende. A partir desse
momento, o alfabetizando foi considerado um sujeito capaz de pensar e elaborar
suas próprias concepções acerca dos objetos de conhecimento, incluindo, entre
estes, os processos de leitura e de escrita:

Essa mudança radical não implicou uma nova proposta metodológica, e sim
uma concepção pedagógica que emerge de uma visão de sujeito capaz de
produzir conhecimento com base na interação com o objeto de
aprendizagem – nesse caso, a língua escrita. Tal concepção baseia-se na
epistemologia genética de Jean Piaget (1896-1980) e passa a se denominar
construtivismo. [...] Trata-se de compreender o processo de construção,
por parte da criança, do conhecimento sobre a língua escrita (OÑATIVIA,
2009, p. 16).

De acordo com Oñativia (2009), Emilia Ferreiro considera que a criança


realiza uma redescoberta do código linguístico por meio das interações que ocorrem
entre ela e tal objeto de conhecimento. Isso não significa que os alfabetizandos
fazem novas descobertas para a humanidade, mas que eles, de certa forma,
30

refazem os passos dos sujeitos responsáveis pela invenção da escrita. Sendo


assim, os professores alfabetizadores devem estar atentos às hipóteses construídas
pelos alunos a fim de que possam realizar intervenções significativas, as quais
possibilitem o avanço cognitivo dos alfabetizandos em relação à escrita.

Entretanto, Emilia Ferreiro constata três entraves relevantes relacionados à


concepção de escrita das crianças e dos professores:

a) os alfabetizadores, que são adultos que já dominam o código escrito, o


concebem como um código, e a criança, que está aprendendo a lógica de tal objeto
de conhecimento, considera a escrita um sistema de representação;

b) escrever letras é diferente de copiá-las, pois a cópia demanda apenas


desenvolvimento motor, e a escrita de letras exige não apenas habilidade motora,
mas um conhecimento conceitual sobre a própria escrita e sobre a função da letra
na palavra em que está sendo inserida;

c) para aprender a ler, os alfabetizandos, muitas vezes, ficam restritos à


aprendizagem do nome das letras e de seus sons.

Nas palavras de Oñativia (2009, p. 25),

realizando uma comparação entre as concepções da criança e as do adulto,


observamos que são pontos de vista diferentes. O primeiro é o de alguém
que está em processo de apropriação do sistema de escrita, imerso em um
ambiente em que os produtos desse sistema aparecem das formas mais
variadas possíveis. O segundo é o de alguém que já detém esse sistema e
que, portanto, tem uma visão dele como algo acabado, pronto, isto é, um
código. ,

Segundo a referida autora, a concepção pedagógica proposta por Emilia


Ferreiro, denominada socioconstrutivista, considera que

(...) a alfabetização é um processo de interação com a língua escrita, em


que o grande desafio não é apenas decodificar, mas também compreender
os usos sociais da escrita. Um ser alfabetizado é aquele capaz de utilizar a
escrita como um instrumento que lhe permite sugerir, pensar, apreciar, se
comunicar, ou seja, entrar na cultura escrita e ser membro de pleno direito
(OÑATIVIA, 2009, p. 24).

Antes mesmo de ingressar na escola, a criança constrói concepções acerca


da escrita, pois vive imersa em um ambiente letrado. Contudo, os conhecimentos
construídos podem variar de acordo com as experiências que cada criança tem
oportunidade de vivenciar. Sendo assim, os alfabetizadores devem estar sempre
atentos, observando as hipóteses construídas pelos alfabetizandos enquanto estes
estão envolvidos em atividades, individuais ou em grupos, em que a escrita esteja
sendo discutida pelos sujeitos aprendentes.

Oñativia (2009) considera a classificação dos níveis de escrita dos


alfabetizandos de acordo com a proposta dos estudiosos Fernandes e Hailer, a qual
31

é bastante semelhante aos níveis de escrita definidos por Emilia Ferreiro, em sua
obra “Psicogênese da Língua Escrita”. As diferenças estão centradas na
nomenclatura de alguns níveis, incluindo a subdivisão do nível pré-silábico em três
fases e a inserção de um nível denominado “intermediário I”, o qual também é
abordado pela autora, mas sem nomeá-lo como um nível à parte.

O Nível 1 de escrita, denominado pré-silábico, divide-se em três fases “(...)


fase pictórica, fase gráfica primitiva e fase pré-silábica propriamente dita”
(OÑATIVIA, 2009, p. 27). A primeira fase do nível pré-silábico (fase pictórica)
caracteriza-se pelos desenhos que a criança representa para se comunicar por meio
da escrita. Essa é a fase das garatujas.

No início, esses rabiscos são linhas retas em zigue-zague ou em diferentes


direções que aos poucos vão se fechando, tomando formas arredondadas,
as conhecidas „bolinhas‟, que futuramente representarão letras. (OÑATIVIA,
2009, p. 28).

Nessa fase, os adultos podem auxiliar a desenvolver o raciocínio lógico das


crianças acerca da escrita ao perguntar-lhes o significado dos registros constantes
do papel. Mesmo que a criança não tivesse pensado em atribuir um significado à
produção, o adulto instiga-a a fazê-lo. É comum que, em determinado momento, a
criança atribua um significado à sua escrita e, algum tempo depois, quando
indagada novamente sobre a mesma produção, outro significado seja concedido à
escrita realizada.

Na segunda fase do Nível 1 de escrita (fase gráfica primitiva), as respostas


das crianças sobre o significado de suas produções escritas continuam oscilando.
Entretanto, nesta fase, diferentemente da anterior, os alfabetizandos já possuem a
intencionalidade de escrever, utilizando diferentes caracteres: letras, números,
pseudoletras, dentre outros sinais gráficos.

Nessa fase, a criança começa a diferenciar o ato de desenhar do ato de


escrever. Mesmo não sabendo realizar a grafia correta das letras, ela
realiza tentativas de aproximação da escrita, e em resultado produz
pseudoletras, letras misturadas com números, rabiscos. A grande diferença
em relação à fase anterior reside no fato de que, mesmo se tratando de
rabiscos, eles têm uma intencionalidade bem definida: escrever.
(OÑATIVIA, 2009, p. 28)

Na fase pré-silábica propriamente dita, as crianças conseguem diferenciar


letras, números e desenhos e compreendem que as letras servem para escrever,
embora ainda não tenham clareza de como funciona o processo de escrita. Nesta
fase, as crianças apresentam algumas hipóteses acerca de tal objeto de
conhecimento:

a) sabem que a escrita é registrada de cima para baixo e da esquerda para


a direita;
32

b) utilizam as letras do próprio nome ou de palavras conhecidas para


realizar suas primeiras escritas;

c) continuam oscilando na atribuição de significado para as escritas que


produzem;

d) leem as palavras de modo global, sem analisar cada sílaba que as


compõe;

e) relacionam a escrita das palavras com as características dos objetos


representados, sem associá-las a qualquer som, processo que se denomina
realismo nominal;

f) via de regra, escrevem apenas substantivos, pois pensam que apenas


tais palavras têm significado. Os verbos e os artigos podem ser omitidos na
produção escrita;

g) consideram que uma palavra só pode ser escrita com mais do que três
ou quatro letras; ou seja, existe uma quantidade mínima de caracteres para
que uma palavra possa ser escrita e para que possa ser lida. Essa é a
hipótese da quantidade mínima de caracteres;

h) variam a posição das letras em diferentes palavras, embora nem todas as


letras do alfabeto sejam conhecidas, pois pensam que palavras diferentes
não podem ser escritas da mesma forma. Essa é a hipótese da variedade
de caracteres;

i) pensam que as letras e as sílabas não se repetem na mesma palavra.


“Palavras como „babá‟, „Lili‟, „lelé‟ e „papá‟ carecem de significado (...)
(OÑATIVIA, 2009, p. 29).

Após o Nível 1 (pré-silábico), a criança passa por uma fase de transição, que
corresponde ao Nível 2, também denominado intermediário I. Esta fase caracteriza-
se pela percepção, por parte da criança, de que diferentes substantivos começam
com a mesma letra, tais como “Mariana” e “Manoel”. Isso se deve ao fato de que o
alfabetizando começa a estabelecer “(...) algumas relações entre pronúncia e
escrita, principalmente no que se refere a sons iniciais” (OÑATIVIA, 2009, p. 30).
Normalmente, as primeiras relações entre letra inicial e som inicial das palavras são
realizadas a partir do nome próprio do sujeito. Nesse nível, a criança ainda escreve
considerando a hipótese da quantidade mínima de caracteres e a hipótese da
variedade de letras na escrita de palavras. É abandonado o realismo nominal, ou
seja, a relação anteriormente estabelecida pela criança entre as características do
objeto e/ou do animal e a quantidade de letras necessárias para escrever tais
nomes.

É no Nível 3, denominado silábico, que ocorre uma grande evolução cognitiva


no que se refere à compreensão do processo de escrita por parte do alfabetizando:
a criança percebe que a escrita está diretamente relacionada à fala. Sendo assim, “é
muito comum ouvir crianças dizendo que precisam escrever o número de letras que
corresponde à quantidade de vezes que abriram a boca para falar” (OÑATIVIA,
2009, p. 30). No início do nível silábico, os alfabetizandos podem não realizar a
33

previsão do número de letras necessárias para escrever as palavras antes de


representá-las por meio da escrita. Entretanto, como o pensamento da criança que
se encontra no nível silábico já está direcionado para representar uma letra para
cada sílaba, é comum que, após escrever a palavra, ela queira apagar caracteres
excedentes. Em outros casos, quando o nível silábico já constitui uma hipótese bem
aceita pela criança, normalmente, ela conta as sílabas das palavras antes de
escrevê-las e já registra uma letra para cada sílaba emitida oralmente.

No início do nível silábico, as crianças podem enfrentar conflitos cognitivos no


que se refere à hipótese da quantidade mínima de caracteres para escrever e à
hipótese da variedade de caracteres para formar as palavras. Ao tentarem escrever
uma palavra dissílaba, por exemplo, os alfabetizandos podem considerar que não
existem palavras com apenas duas letras e, por isso, podem acrescentar letras a
essa palavra para se sentirem mais confortáveis com a própria escrita. Quanto à
variedade de caracteres, no início de tal nível, as crianças que utilizam apenas
vogais para escrever podem entrar em conflito cognitivo durante a escrita da palavra
“banana”, por exemplo, pois, de acordo com a hipótese dos alfabetizandos silábicos,
essa palavra seria escrita com três letras “a” (AAA). As dúvidas podem aumentar se
for solicitado que as crianças escrevam outra palavra que exija as mesmas vogais
constantes da palavra anterior como, por exemplo, a palavra “cabana”. Tal vocábulo
seria representado do mesmo modo que a palavra banana (AAA). Entretanto, se a
“(...) hipótese silábica estiver bastante sedimentada, manterá a escrita, apesar do
conflito” (OÑATIVIA, 2009, p. 31).

Em relação à escrita da criança que se encontra no nível silábico de escrita,


cabe destacar, ainda, que

em geral, no início da fase silábica, ela ainda coloca quaisquer letras


independentemente do som que elas representam; aos poucos, vai
percebendo que cada palavra é grafada com letras específicas, de acordo
com seu som. Há crianças que utilizam as vogais, outras as consoantes, e
ainda outras que misturam vogais e consoantes. Outras características
comuns deste nível são a escrita de uma letra para cada palavra nas frases
e a falta de definição das categorias linguísticas (artigo, substantivo, verbo,
etc.) (OÑATIVIA, 2009, p. 31).

No que se refere à leitura das crianças no nível silábico, cabe mencionar que
esta deixa de ser global e passa a ser realizada termo a termo.

O Nível 4, denominado silábico-alfabético ou intermediário II, caracteriza-se


pela correspondência entre as letras escritas e o som que elas representam. É
nessa fase, também, que a criança percebe a necessidade de escrever mais de uma
letra para cada sílaba pronunciada, pois os adultos alfabetizados não conseguem ler
as palavras escritas com apenas uma letra para cada sílaba. Além disso, ao
analisarem a escrita convencional, os alfabetizandos percebem que cada sílaba
pronunciada é representada por mais de uma letra. No nível 4, então, a criança
acrescenta letras à escrita de cada sílaba, em geral contemplando, inicialmente, a
34

sílaba inicial das palavras, considerando o valor sonoro das letras que a compõem.
É importante que os alfabetizadores tenham clareza em relação ao progresso
realizado pela criança no nível silábico-alfabético, pois, muitas vezes, é considerado
um erro o fato de ainda faltarem letras na escrita das palavras quando estas são
comparadas à escrita convencional. Contudo, se os níveis de evolução da escrita
forem considerados pelos alfabetizadores, estes verificarão que não se trata de um
erro, mas de uma evolução em relação ao nível anterior.

O nível alfabético de escrita, também chamado de Nível 5, é aquele em que o


alfabetizando demonstra a compreensão do sistema alfabético, em que cada som é
representado por uma letra. Sendo assim, a criança

“(...) descobre que uma sílaba é em geral grafada por mais de uma letra
(normalmente duas ou três). Portanto, ela evolui de maneira significativa no
que diz respeito ao conhecimento do valor sonoro convencional de todas as
letras (...)” (OÑATIVIA, 2009, p. 32).

Nesse nível, o alfabetizando começa a diferenciar letras, sílabas, palavras e


frases em um texto. Em relação à leitura das crianças alfabéticas, cabe mencionar
que deixa de ocorrer termo a termo, pois

(...) passa aos poucos a adquirir característica lexical, isto é, a criança lê a


palavra como um todo e gradativamente vai ganhando fluência, sobretudo
nas palavras muito conhecidas, que já fazem parte de seu repertório
(OÑATIVIA, 2009, p. 32).

Conforme mencionado anteriormente, os níveis de escrita abordados fazem


parte da concepção pedagógica denominada socioconstrutivismo, a qual, por meio
de Emilia Ferreiro, possibilitou a mudança do foco do método de alfabetização para
o sujeito aprendente. Entretanto, existem outras propostas relacionadas à
construção da escrita por parte dos alfabetizandos. Dentre elas, Oñativia (2009)
destaca o método integral.

O método integral surgiu na Argentina, em 1965, tendo sido criado por Oscar
V. Oñativia. Inicialmente, foi utilizado para auxiliar crianças que frequentavam
escolas públicas e tinham dificuldades para aprender a ler e a escrever. Após tal
experiência, o método foi ajustado para atender alunos (crianças e adultos) que
estudavam em escolas particulares e, também, crianças que apresentavam
necessidades especiais, tais como, “(...) dislexia, autismo, afasia e lesão cerebral,
bem como para cegos e surdos severos” (OÑATIVIA, 2009, p. 67). No Brasil, o
método integral foi utilizado, pela primeira vez, em 1975, pela psicopedagoga Celma
Vieira Cenamo,

(...) que o aplicou no tratamento de uma criança surda, com ótimos


resultados. (...) Depois da experiência com essa criança, o método começou
a ser aplicado em crianças e adolescentes com deficiência auditiva severa,
atendidos no Instituto Anne Sulivan, em São Paulo (OÑATIVIA, 2009, p. 67).
35

Mas, por que o método integral recebeu esse nome? Sua denominação
explica-se por “(...) trabalhar simultaneamente – e desde o começo – três aspectos
básicos da estrutura da língua escrita” (OÑATIVIA, 2009, p. 67) – o aspecto
semântico, o aspecto gramatical e o aspecto fonológico – e por se basear em três
fundamentos: históricos, linguísticos e psicológicos. Nas palavras da autora,

1) Aspecto semântico, que se refere ao significado, ao sentido da expressão


na língua.

2) Aspecto gramatical, que se refere, de um lado, à sintaxe, ou seja, à


combinação interna do texto e à sucessão de elementos para formar um
sintagma; de outro, à morfologia, isto é, à constituição das palavras e suas
variações (gênero, número, terminações verbais).

3) Aspecto fonológico, que se refere às unidades sonoras que fazem parte


da palavra falada (OÑATIVIA, 2009, p. 67).

Quanto aos fundamentos do método integral, cabe destacar que os históricos


remetem-se à evolução da escrita ao longo dos milênios, desde a invenção dos
pictogramas até a complexificação de tal processo por meio da escrita alfabética,
conforme explicitado anteriormente. Os fundamentos linguísticos consistem na
integração da semântica, da sintaxe, da morfologia e da fonologia. A escrita constitui
a união de dois universos semióticos: os fonemas e as gravuras. Oscar Oñativia
concorda com André Martinet em relação à teorização dos eixos da escrita. Para ele,
a escrita possui dois eixos: o sintagmático (horizontal) e o paradigmático (vertical). O
eixo sintagmático contempla a sequência das palavras em um sintagma, conferindo-
lhe uma unidade dotada de sentido. Por sua vez, o eixo paradigmático contempla as
alterações morfológicas que podem ser realizadas no sintagma (gênero, número,
etc.). Tais mudanças não influenciam o eixo sintagmático no que se refere à
estrutura, mas altera o significado do sintagma.

Ainda sobre os fundamentos linguísticos do método integral, cabe salientar


que a escrita não é reduzida a um simples processo de codificação de fonemas,
pois, se assim fosse, seria considerada uma mera técnica e perderia todo o sentido
primordial: a comunicação.

Uma metodologia integral deve “didatizar” o sistema completo e simultâneo


da gramática e da semântica expresso nos dois eixos da escrita, pois esse
é o sistema semiótico da linguagem. Aqui se consolida o grande passo que
o método integral propõe em relação à didática da leitura e da escrita
(OÑATIVIA, 2009, p. 73).

Os fundamentos psicológicos do método integral referem-se ao


desenvolvimento dos sujeitos (ontogenética) e à maneira por meio da qual
aprendem a ler e a escrever. Para conseguirem se alfabetizar, as crianças precisam
interagir com outros sujeitos e, também, demonstrar motivação para construir tais
conhecimentos, pois os alfabetizandos devem, primeiramente, realizar as tarefas
36

propostas pelo professor para que, então, em momento posterior, possam seguir
seus impulsos imediatos.

Mas, afinal, como funciona o método integral? Como as crianças aprendem a


ler e a escrever por meio de tal método? Este método propõe a utilização de
recursos específicos para o ensino da leitura e da escrita. A primeira etapa do
método integral inicia-se com as cartelas-pictográficas, também denominadas
cartelas-desenho.

“Nelas, encontra-se representada, de forma esquemática, a ideia da „coisa‟,


da „ação‟ ou da „qualidade‟ que o aluno ou o professor querem nomear (...)
As cartelas-desenho têm sua cor definida conforme a função gramatical das
palavras que representam” (OÑATIVIA, 2009, p. 75).

Apesar de haver um código de cores utilizado no Brasil, as escolas têm


autonomia para alterar as cores de cada cartão representativo de uma função
gramatical. O importante é que, para todos os alunos da escola, seja utilizado o
mesmo código de cores. Tais cartelas podem ser confeccionadas em tamanho
grande, a fim de que, em alguns momentos, sejam trabalhadas com todos os alunos
simultaneamente, e, também, em tamanho menor para que cada discente trabalhe
com as próprias cartelas. Essas cartelas-pictográficas conterão desenhos
representativos de cada substantivo e de cada verbo utilizado pelo grupo de alunos.
Salienta-se que tais desenhos deverão ser pensados pelo professor e pelos
alfabetizandos, havendo um consenso entre as partes, pois, uma vez elaborada a
representação para determinado verbo ou substantivo, ela deverá ser utilizada por
todos os educandos, durante todo o processo. Em relação à representação dos
verbos nas cartelas, é interessante que os alunos possam realizar o movimento
proposto pela ação a fim de que este seja representado com mais propriedade.

Mas, como devem ser utilizadas essas cartelas-desenho? “As cartelas-


pictográficas deverão ser apresentadas num contexto de brincadeira ou diálogo com
o aluno. Recomenda-se mostrar primeiro os substantivos no singular, para só então
introduzir o plural” (OÑATIVIA, 2009, p.78). Logo após trabalhar os substantivos, o
método integral sugere apresentar aos alfabetizandos os artigos definidos, os quais
serão flexionados de acordo com o nome que estiver depois dele. “Os artigos
indefinidos serão introduzidos mais tarde, pois seu uso depende do sentido da frase,
quando se fala de um substantivo que ainda não foi especificado” (OÑATIVIA, 2009,
p. 79). Cabe destacar que os artigos serão representados por uma cartela vazia. Na
sequência, serão introduzidos os verbos. Inicialmente, é importante que os verbos
trabalhados sejam intransitivos e estejam no pretérito perfeito, pois, assim, não será
necessário acrescentar cartelas referentes aos complementos verbais. Em seguida,
poderão ser adicionados os sinais de pontuação, os quais serão representados em
seus formatos reais, na metade de uma cartela, na posição vertical. Os advérbios
também poderão ser representados nas cartelas, conforme a necessidade
demonstrada pelo grupo de alunos para sua utilização. O advérbio “não”, por
exemplo, poderá constar das cartelas contendo um “X” que ocupe todo o espaço de
37

cada uma delas. Outra classe de palavras importante a ser trabalhada com os
alunos é o adjetivo.

A fim de facilitar a compreensão do emprego dos adjetivos, é conveniente


trabalhar inicialmente com o verbo „ser‟. A atividade sugerida é a descrição
de um objeto, pessoa ou animal com adjetivos antônimos, já que a
representação por contraste facilita relacioná-los e compreender o
significado de cada um. (OÑATIVIA, 2009, p. 80)

Os pronomes, por sua vez, deverão ser introduzidos depois que os alunos
dominarem a construção de frases simples. “Pode-se começar pela substituição do
nome da criança pelo pronome pessoal „eu‟” (OÑATIVIA, 2009, p. 80).

Para que o material dos alfabetizandos fique organizado, é relevante que, a


cada classe de palavras estudada, seja confeccionado um envelope, o qual
conserve a cor da cartela a ser guardada em seu interior. É interessante que, do
lado de fora do envelope, conste uma cartela como modelo e algumas gravuras que
remetam o educando à classe gramatical correspondente a tal envelope. As frases
elaboradas pelo grupo de alunos e pelo alfabetizador com as cartelas-pictográficas
poderão ser montadas no fraselógrafo, o qual

(...) é.um dispositivo que serve como suporte para que se pendurem as
cartelas-palavra, as pictográficas ou as silabadas. Consiste numa moldura
com cerca de 1,60m de largura e altura graduável, na qual se colocam três
fileiras paralelas de arame ou barbante para se pendurar as cartelas, talvez
até mesmo com pregadores de roupa. A primeira fileira se destina às
cartelas pictográficas, a segunda, às cartelas-palavra e a terceira, às
silabadas (OÑATIVIA, 2009, p. 78).

Mas, o que são as cartelas-palavra e as cartelas silabadas? As primeiras são


cartelas em que as palavras, representadas nas cartelas-pictográficas, aparecem
escritas a fim de que, em determinado momento do processo de alfabetização, tais
palavras possam ser associadas às cartelas-pictográficas. As cartelas-palavra
devem conservar a cor das cartelas-pictográficas às quais correspondem. Já as
silabadas consistem em cartelas semelhantes às cartelas-palavra; a diferença entre
elas está em linhas pontilhadas que dividem as sílabas das palavras. No entanto, a
utilização das cartelas-palavra e das cartelas silabadas são recomendadas apenas
na segunda etapa do método integral.

Para concluir a primeira etapa,

(...) devem ser introduzidos exercícios de dinâmica gramatical e morfológica.


(...) O objetivo desses exercícios é que o aluno adquira plasticidade no
pensamento e, assim, os esquemas mentais necessários para a leitura já
estarão adaptados às construções mais complexas a ser enfrentadas
(OÑATIVIA, 2009, p. 81).

Na segunda etapa do método integral, a intenção é realizar a introdução das


cartelas-palavra, inicialmente, junto com as cartelas-pictográficas. A ideia é que os
38

alfabetizandos possam construir frases com as cartelas-desenho e, em seguida,


associar cada uma dessas cartelas à cartela-palavra correspondente. Para isso, o
alfabetizador poderá realizar atividades coletivas no freselógrafo e, em seguida,
propor que os alunos o façam em seu material. Nesse momento, poderão ser
utilizadas frases construídas anteriormente com as cartelas-pictográficas, além de
novas frases elaboradas individual ou coletivamente. É relevante que algumas
dessas frases sejam selecionadas para ficarem registradas no flip chart, o qual

(...) consiste em um cavalete com duas ripas de madeira, unidas entre si por
dois parafusos com porcas do tipo borboleta dispostas nas extremidades,
de modo que se possa colocar entre ambas certa quantidade de folhas de
papel de tamanho grande, que são viradas para trás quando se termina de
utilizá-las. O flip chart é usado para escrever, com caracteres grandes,
algumas das frases previamente construídas no fraselógrafo. Dessa forma,
passa a ser uma espécie de “livro de aula”, que poderá ser consultado todos
os dias pelos alunos (OÑATIVIA, 2009, p. 78).

Depois que houver certa quantidade de frases no flip chart, poderá ser
iniciado o trabalho silábico. O alfabetizador deverá selecionar frases que contenham
sílabas simples e, em seguida, destacará as sílabas que serão trabalhadas com os
alunos.

“Depois de destacadas algumas sílabas – o suficiente para construir novas


palavras –, serão usadas as cartelas-sílaba imantadas. Na lousa magnética,
o aluno poderá combinar as sílabas a fim de formar novas palavras, que
serão integradas em outras frases”. (OÑATIVIA, 2009, p. 83).

As cartelas-sílaba, conforme o nome sugere, são pequenos pedaços


retangulares de cartolina branca, em cada um dos quais consta uma sílaba. A lousa
magnética “(...) é uma prancha metálica, de aproximadamente 1m x 0,6m, sobre a
qual se prendem, com pequenos imãs, as cartelas silabadas” (OÑATIVIA, 2009, p.
78). Depois que os alfabetizandos estiverem seguros com o trabalho envolvendo
sílabas simples, poderão ser estudadas as sílabas complexas.

Além do método integral e da proposta sociointeracionista, Oñativia (2009)


destaca outra concepção pedagógica, que é baseada na psicologia cognitiva. A
psicologia cognitiva emergiu em 1956, pelo fato de haver estudiosos que
discordavam do behaviorismo no tocante à aprendizagem dos sujeitos. Segundo
Oñativia (2009, p. 117),

(...) a psicologia cognitiva surgiu da necessidade de oferecer uma


explicação mais complexa para a cognição humana do que aquela oferecida
pelo behaviorismo; uma explicação que levasse em conta os processos de
pensamento e as estratégias envolvidas na solução de problemas.

Em relação aos processos específicos da leitura e da escrita, cabe salientar


que a psicologia cognitiva busca compreender como se processam as informações
para que ocorra a transformação dos grafemas em fonemas. Em pesquisas
realizadas recentemente, há relatos de que muitas das dificuldades demonstradas
39

pelos alfabetizandos na aprendizagem da leitura e da escrita estão imbricadas a


problemas no processamento da consciência fonológica. Mas, o que vem a ser
consciência fonológica?

(...) uma das habilidades necessárias para a leitura e a escrita consiste na


capacidade de analisar e sintetizar as partes constituintes da língua, isto é,
os fonemas, as sílabas e as palavras. Essa capacidade peculiar foi
estudada por diversos linguistas e é identificada como consciência
fonológica. Ela implica uma competência metalinguística capaz de analisar
diferentes níveis da linguagem: segmentar as frases em palavras, as
palavras em aliterações e rimas ou em sílabas e as sílabas em fonemas
(OÑATIVIA, 2009, p. 119).

Oñativia (2009) salienta que, de acordo com alguns pesquisadores, há três


estratégias para lidar com a palavra escrita: a logográfica, a alfabética e a
ortográfica. A estratégia a ser utilizada pelo educando dependerá do nível de
alfabetização em que se encontra em determinado momento do processo.

Na escrita logográfica, o alfabetizando escreve as palavras utilizando sua


memória visual como aliada. É comum que a letra inicial das palavras escritas seja
conservada e que haja inversão da posição de algumas letras. Já na escrita
alfabética, a criança é capaz de associar os fonemas aos grafemas
correspondentes; ou seja, o educando consegue realizar a análise fonética das
palavras. A escrita ortográfica, por sua vez, é caracterizada pela competência que as
crianças demonstram para escrever, considerando as normas de escrita dos
vocábulos na Língua Portuguesa. Tal processo torna-se possível em função de que
as palavras já fazem parte de seu léxico, ou seja, de seu vocabulário. Nas palavras
da autora: “(...) as crianças escrevem de acordo com a estrutura morfológica de cada
palavra. Isso porque elas já fazem parte do seu léxico” (OÑATIVIA, 2009, p. 120).

Para auxiliar os alfabetizandos na evolução do nível de escrita e,


consequentemente, das estratégias por eles utilizadas para escrever, é fundamental
que o alfabetizador observe atentamente cada um dos discentes, pois, assim,
poderá realizar as intervenções pedagógicas adequadas, nos momentos mais
propícios para tais ações. Além disso, é imprescindível que o professor conheça não
apenas os métodos e as concepções pedagógicas sobre alfabetização, mas
também, as teorias que embasam cada uma delas. De acordo com Oñativia (2009),

(...) tendo como base uma cuidadosa observação ou diagnóstico do seu


grupo de alunos, ou de um aluno em particular, o professor alfabetizador
procurará o caminho ou percurso – isto é, o método – mais adequado a
cada situação. Contudo, temos a firme convicção de que o educador deverá
conhecer profundamente os princípios teóricos que sustentam sua ação
para que faça a escolha mais acertada. Não é mais possível “fazer por
fazer” ou “fazer porque está na moda” ou “porque funcionou com alguém”.
Temos nas mãos a construção de um alicerce que sustentará todas as
outras aprendizagens (p. 145).
40

Assim como é relevante que o professor alfabetizador conheça as teorias que


norteiam a construção da escrita por parte dos alunos, é de igual importância que o
alfabetizador tenha clareza acerca do desenvolvimento do processo de leitura por
parte dos educandos, temática esta que será abordada nas linhas a seguir.
41

4 APRENDIZAGEM E DESENVOLVIMENTO DA LEITURA

De acordo com Jolibert (1994), o aluno deve ser considerado sujeito no


processo de aprendizagem não apenas no que se refere à leitura, mas em relação a
todos os conteúdos trabalhados nas aulas.

É na medida em que se vive num meio sobre o qual é possível agir, no qual
é possível, com os outros, discutir, decidir, realizar, avaliar... que são
criadas as condições mais favoráveis ao aprendizado. Todos os
aprendizados, não só o da leitura. E isso vale para todos, inclusive para os
adultos (JOLIBERT, 1994, p. 12).

Nesse sentido, o papel do professor não é exigir que os educandos decorem


conceitos e/ou procedimentos, mas possibilitar que os sujeitos aprendentes reflitam
sobre o(s) objeto(s) de conhecimento estudado(s) por meio de intervenções
adequadas durante todo o processo de aprendizagem. Quando o objeto de
conhecimento estudado é a leitura, cabe destacar que os alfabetizandos precisam
estar em contato com situações reais que envolvam o ato de ler. Em outras
palavras, situações em que o sujeito necessite utilizar a leitura para se apropriar de
informações relevantes em dado momento ou para realizar atividades relacionadas
ao lazer. Segundo Jolibert (1994),

é lendo que nos tornamos leitor e não aprendendo primeiro para poder ler
depois: não é legítimo instaurar uma defasagem, nem no tempo, nem na
natureza da atividade, entre “aprender a ler” e “ler”. Colocada numa
situação de vida real em que precisa ler um texto, ou seja, construir seu
significado (para sua informação ou prazer), cada criança mobiliza suas
competências anteriores e deve elaborar novas estratégias para concluir a
tarefa (...) (p. 14).

Mas, afinal, o que é ler? Para Jolibert (1994), a leitura é um processo


complexo que envolve a aprendizagem de diversas competências por parte do leitor.
“Ler é atribuir diretamente um sentido a algo escrito” (p. 15); ou seja, é compreender
o sentido de um texto escrito sem que seja necessário decifrar todas as palavras
constantes do enunciado; é compreender uma palavra sem que haja a necessidade
de decifrar todas as suas letras e todas as suas sílabas. “Ler é questionar algo
escrito como tal a partir de uma expectativa real (necessidade-prazer) numa
verdadeira situação de vida” (p. 15); assim, questionar um texto significa elaborar
hipóteses sobre o significado de tal material escrito e, posteriormente, verificar a
veracidade das hipóteses levantadas por intermédio de estratégias de leitura. E,
enfatizando o conceito mencionado anteriormente, nas palavras da autora,
ler é ler escritos reais, que vão desde um nome de rua numa placa até um
livro, passando por um cartaz, uma embalagem, um jornal, um panfleto,
etc., no momento em que se precisa realmente deles numa determinada
situação de vida, “para ler” como dizem as crianças. É lendo de verdade,
42

desde o início, que alguém se torna leitor e não aprendendo primeiro a ler...
(p. 15).

São diversas necessidades cotidianas que tornam necessária a


aprendizagem da leitura. As crianças leem:

- para responder à necessidade de viver com os outros, na sala de aula e


na escola;

- para se comunicar com o exterior;

- para descobrir as informações das quais se necessita;

- para fazer (brincar, construir, levar a termo um projeto-empreendimento);

- para alimentar e estimular o imaginário;

- para documentar-se no quadro de uma pesquisa em andamento


(JOLIBERT, 1994, p. 31).

Para que os indivíduos possam conviver em harmonia com os demais, é


fundamental que regras sejam respeitadas nas diferentes instituições sociais. Tais
combinações, frequentemente, são registradas por meio da escrita. Sendo assim, é
necessária a utilização da leitura para conhecê-las e para relembrá-las, quando for o
caso. Na escola, por exemplo, há diversos momentos em que ocorrem situações
reais de leitura, como nas combinações elaboradas em relação à utilização do pátio
durante o recreio, para entender o motivo pelo qual o diretor da instituição envia um
bilhete aos familiares dos alunos solicitando atenção em relação aos piolhos, ou
para obter informações acerca da data, do local e do(s) objetivo(s) de uma reunião
escolar. Do mesmo modo, na sala de aula, são diárias as situações que envolvem a
leitura: para obter informações acerca do cardápio do dia oferecido pelo refeitório,
para se situar no tempo por meio da análise do calendário afixado na parede da sala
de aula, para verificar os alunos presentes e os ausentes por meio da lista de
chamada da turma etc.

A leitura também se faz necessária quando as pessoas precisam comunicar-


se com o mundo exterior. Na escola, os alunos leem quando recebem o convite para
o aniversário de um colega, quando recebem o jornal da escola, quando precisam
compreender a receita de um bolo enviada pela mãe de um dos colegas a fim de
que tal alimento possa ser preparado, quando recebem um folder referente ao
convite para uma sessão de cinema ou para assistir a uma peça de teatro, dentre
outras situações.

Além disso, ler também é fundamental quando os indivíduos precisam


descobrir informações constantes em determinado(s) portador(es) de texto. As
crianças podem necessitar da leitura para descobrir o número de um telefone por
meio da exploração da lista telefônica e/ou de uma agenda telefônica; para obter
informações referentes à temática estudada em aula durante o desenvolvimento de
determinado projeto; para consultar o valor cobrado por diferentes empresas de
brinquedos visando à reforma da pracinha da escola etc.
43

Outra situação em que o ato da leitura mostra-se muito importante para as


crianças ocorre quando elas precisam ler para executar uma ação. Para brincar com
determinado jogo, por exemplo, precisarão compreender suas regras. Para montar
um brinquedo que apresente várias peças, os pequenos precisarão ler o manual de
instruções; caso contrário, talvez, não consigam construí-lo. Para possibilitar que um
projeto, como uma horta, seja iniciado, será necessário que as crianças leiam
revistas e/ou embalagens de sementes de plantas para verificarem quais espécies
poderão se desenvolver na sala de aula.

Cabe destacar, também, outra situação relevante envolvendo o ato de ler: a


leitura para estimular o imaginário.

Trata-se de tudo quanto é conto, poesia e literatura infantil. O canto de


leitura da aula, a Biblioteca Municipal ou a biblioteca móvel e os aportes das
próprias crianças são os principais recursos. Elas consultam ou retiram
álbuns, fichários, poemas-cartazes, obras variadas, revistas, histórias em
quadrinhos, etc. (JOLIBERT, 1994, p. 39).

Há, ainda, a possibilidade de ler para se documentar. Tal situação pode


ocorrer quando as crianças desejam obter informações sobre um assunto específico,
o qual pode estar sendo estudado na escola. Durante a coleta de dados, os
pequenos poderão ter de analisar diferentes portadores de textos, como, rótulos,
folhetos e enciclopédias. Cabe salientar a importância de os educandos
estabelecerem contato direto com esses diferentes portadores de texto, já que
fazem parte do mundo em que as crianças estão inseridas. O resumo elaborado
pelo professor, fornecido aos alunos durante o desenvolvimento de projetos, deve
conter a síntese da análise realizada pelos discentes.

As situações de leitura dos diferentes materiais escritos mencionados podem


ser organizadas considerando os textos e os objetos e de acordo com a função dos
suportes.

Em função dos textos e objetos, lê-se:

- sozinho (carta individual, poema, álbum, livro, etc.);

- em grupos pequenos para posterior comunicação aos outros do produto


das pesquisas (...)

- em grande grupo (cartazes, cartas coletivas, reprodução ampliada de um


conto, etc.).

Em função dos suportes (que vão desde o anúncio classificado até o cartaz,
passando pelo livro), lê-se sentado, de pé, deitado, na aula, no corredor, na
rua! Em suma, vive-se... (JOLIBERT, 1994, p. 43)

A existência de diversos portadores de texto instiga as crianças a


desenvolverem estratégias de leitura para que consigam se apropriar do material
escrito. Tais estratégias desenvolvidas pelos pequenos começam a ser elaboradas
antes do ingresso deles na escola.
44

(...) as crianças não têm esperado por nós para questionarem livremente o
escrito: na rua, em casa, até na escola, elas dedicam muito tempo em
avançar hipóteses de sentido sobre os cartazes, as vitrinas das lojas, as
prateleiras dos supermercados, as embalagens dos produtos alimentícios,
os jornais, as histórias em quadrinhos, as obras de literatura infantil, etc.
(JOLIBERT, 1994, p. 44)

Com relação ao desenvolvimento das estratégias de leitura por parte das


crianças, segundo Jolibert (1994, p. 44),

elas fazem isso a partir de indícios que vão desde as ilustrações até o
formato e a cor, passando, entre outros, pelas palavras e que, de todo o
modo, estão muito ligados ao contexto no qual tais escritos são
encontrados.

Sendo assim, qual é o papel da escola e, mais especificamente, dos


professores alfabetizadores, no que se refere ao desenvolvimento da leitura por
parte dos alfabetizandos? Considerando-se que, quando ingressam na escola, as
crianças já construíram hipóteses acerca da leitura, cabe aos educadores a
valorização de tais aprendizagens e, também, a elaboração de estratégias de ensino
que incentivem os alunos a dar continuidade ao processo de compreensão da
leitura.

No que se refere à leitura de textos, por exemplo, cabe destacar a leitura


coletiva do episódio de uma história que esteja sendo trabalhada com o grupo de
alunos. Para isso, o professor apresenta uma página do episódio escrito aos alunos
em um cartaz, o qual não contém gravuras. Primeiramente, os educandos realizam a
leitura silenciosa do material. Após familiarizarem-se com tal escrito, os alunos
poderão localizar palavras conhecidas no texto, as quais podem estar presentes no
ambiente alfabetizador. Continuando o raciocínio, os discentes analisam outras
palavras do episódio da história e formulam hipóteses acerca dos vocábulos que
estariam escritos. Durante tal processo, os alunos poderão entrar em conflito
cognitivo, pois a hipótese elaborada por uma das crianças pode ser descartada por
um colega a partir da análise da última letra e/ou da última sílaba do vocábulo, por
exemplo. Diante do conflito, o professor solicita a um dos educandos que escreva,
no quadro, a palavra analisada no momento. Logo após a escrita, o alfabetizador
pergunta aos alunos o local em que tal palavra aparece no texto (em qual linha, em
qual posição). Em seguida, continua instigando os alunos por meio da análise da
letra e/ou da sílaba inicial da palavra. Nesse momento, a hipótese elaborada pelos
alfabetizandos é confirmada ou descartada. Caso os discentes não consigam
desvendar a palavra constante do texto, outros materiais escritos presentes no
ambiente alfabetizador deverão ser analisados pelos alunos para que auxiliem na
leitura do vocábulo em questão. Lida a palavra, os educandos continuarão os
processos de localização de palavras conhecidas e de formulação de hipóteses
acerca da história, pois o início da obra literária já é conhecido pelos alunos. O
objetivo, nesse caso, é conhecer a parte seguinte da história, atividade essa que
exige a leitura do episódio apresentado pelo docente por meio da língua escrita.
45

Para atingir o objetivo almejado, o professor continuará questionando os


discentes a fim de que consigam compreender o enunciado escrito. Entretanto, as
perguntas elaboradas pelo alfabetizador não visarão à decifração de todas as
palavras do texto, mas à decifração dos principais vocábulos do material escrito e à
formulação de hipóteses acerca de outras palavras-chave que contribuam para o
processo de compreensão do texto. Realizadas tais tarefas por parte dos
alfabetizandos, o professor mostrará uma gravura que estará diretamente
relacionada ao episódio lido e, em seguida, lerá o texto, em voz alta. Cabe salientar
que a visualização da gravura, após a compreensão do texto por parte dos alunos,
constituirá parte importante do processo, pois, por meio da figura, os alfabetizandos
ratificarão as hipóteses elaboradas nos momentos anteriores.

Nesse contexto, cabe, ainda, uma pergunta: qual(is) a(s) diferença(s)


existentes entre a estratégia de ensino mencionada anteriormente e as aulas de
decifração que ocorrem em algumas escolas?

Em primeiro lugar, o próprio texto. (...) é um texto que se tem realmente


vontade de ler (...) ao invés de um texto que é lido “apenas para aprender a
ler”. A priori, o professor, marcado por anos vividos com outra abordagem
da leitura, teria a tendência a apresentar textos numa ordem bem
determinada, isto é, cada vez mais longos e complexos ao longo do ano.
Felizmente, os escritos sociais propostos às crianças pela vida e não
escolhidos pelo professor apagam rapidamente essa tendência, e ele
descobre que as crianças não são incomodadas pelo tamanho e pela
complexidade e vão diretamente ao essencial, de acordo com suas
pesquisas/investigações. (JOLIBERT, 1994, p. 48-49)

Para que a compreensão dos materiais escritos torne-se possível, é desejável


que os alfabetizandos realizem reflexões em cada uma das fases da leitura: “„a fase
de leitura individual‟, (...) „a primeira colheita oral do “que foi entendido”‟, (...) e a
„fase do intercâmbio‟” (JOLIBERT, 1994, p. 49). Tais fases, que estão presentes na
estratégia de ensino mencionada anteriormente (referente à leitura de textos) serão
conceituadas a seguir.

A primeira fase (leitura individual) consiste na leitura silenciosa do texto.

“É possível ver os olhares fixarem o texto, pularem de um lugar a outro,


varrerem em todas as direções, sem que a criança mexa os lábios, num
silencioso ambiente de atenção. SIM, MAS cada criança trabalha: está
procurando um sentido para o texto” (JOLIBERT, 1994, p. 49).

Na fase seguinte (primeira colheita do oral), as crianças exteriorizam, por


meio da linguagem oral, as palavras identificadas no texto. Os vocábulos não
precisarão estar na ordem do texto, pois a primeira palavra identificada pelos
alfabetizandos pode estar localizada no final do material escrito. Cabe destacar que
as palavras exteriorizadas pelos educandos geralmente consistirão em palavras
significativas, não sendo levado em consideração o nível de complexidade de sua
formação. De acordo com Jolibert (1994, p. 49),
46

“quando palavras são dadas, na maioria das vezes são palavras carregadas
de sentido, mesmo que complicadas (palhaço, biblioteca) antes do que
„palavrinhas‟ de articulação (a, em, sobre) que não ensinam nada sobre o
exato sentido desse texto”.

A terceira fase consiste em um processo bastante interessante da leitura, pois


é na fase do intercâmbio que os alfabetizandos confrontam as hipóteses elaboradas
por eles mesmos, com base nos conhecimentos construídos até o momento em
questão. O alfabetizador, nessa fase, instigará os conflitos cognitivos, interferindo
diretamente apenas se, após todas as análises possíveis por parte dos alunos, eles
não conseguirem ler uma palavra importante constante do portador de texto
analisado. Nas palavras da autora,

a fase do intercâmbio é o momento em que este ocorre de forma intensa


entre as crianças: confrontam-se hipóteses e achados, os mesmos sendo
também justificados e verificados. O professor limita-se (?) a animar esses
intercâmbios, a ressaltar as contradições, sendo procurados os indícios que
permitem superá-las. (...) Para-se quando se entendeu o que se procurava
(JOLIBERT, 1994, p. 49-50).

Alguns alfabetizadores podem considerar tal processo um tanto quanto


desconcertante. Entretanto, para as crianças, que não tiveram as experiências que
um adulto alfabetizado já teve na escola, trata-se de um processo natural, pois, para
os pequenos,

(...) ler é atribuir um sentido a um escrito a partir de um verdadeiro


questionamento, nascido de uma real necessidade (informação/prazer),
tirando de todos os indícios que podem ser coletados hipóteses de sentido
verossímeis e verificando-as (JOLIBERT, 1994, p. 50).

Os indícios coletados pelas crianças podem estar relacionados à situação de


vida:

- por que caminho o texto chegou à escola?

pela professora;

pelo correio;

por um professor da escola;

por uma criança da aula;

por uma criança da escola;

- em que momento?

às 8h30;

às 13h30;

durante o dia;

durante o recreio: é a hora do carteiro (JOLIBERT, 1994, p. 72).


47

Além disso, os alfabetizandos percebem outros indícios diferentes de


palavras, os quais estão diretamente relacionados às características do portador de
texto a ser lido. O primeiro passo consiste em definir o tipo de portador de texto que
os educandos terão de ler, pois, assim, não esperarão encontrar, por exemplo,
expressões como “era uma vez” em uma notícia de jornal. Os alunos analisam se o
portador de texto apresenta gravuras, qual(is) é(são) o(s) tipo(s) de letra utilizado(s),
se o portador de textos é colorido etc. Segundo Jolibert (1994),

(...) desde o início do ano letivo, as crianças encontram indícios de


significado nos suportes do escrito: “É uma palavra de catálogo”, “É o papel
do cinema”, “É uma folha de mimeógrafo”. Acham os indícios também na
apresentação do escrito: “É um cartaz”, “É uma carta”, “É uma história”, “É
uma etiqueta,...”. As cores, os tipos de letras, os espaçamentos, o
comprimento das palavras, os sinais múltiplos (algarismos, maiúsculas,
aspas e pontos de interrogação) são tantas outras informações tão
preciosas para as crianças quanto os desenhos e as fotografias (p. 71-72).

Após todo esse processo de coleta de indícios, é que as crianças iniciarão a


análise do texto propriamente dito. Com o passar do tempo e com o enriquecimento
das experiências com diferentes portadores de texto, os alfabetizandos começam a
refinar suas análises, chegando, finalmente, às palavras.

Depois das procuras por analogias no escrito, após os “começa como...”,


“termina como...”, “aqui se vê isso e lá também”, que não são senão jogos
de observação do escrito, as crianças chegam a pesquisas mais complexas,
ligadas ao sentido, e, rapidamente, identificam palavras como “fim”, “era
uma vez” e “queridos amigos da pré-escola” e as palavras familiares à
turma, os nomes dos dias, os nomes, tudo quanto elas manipulam
diariamente (inclusive as marcas publicitárias das caixas do armazém).
(JOLIBERT, 1994, p. 72)

Sendo assim, os alfabetizandos analisam palavras significativas constantes


do texto, elaboram hipóteses acerca do significado dessas palavras e as verificam
junto ao texto e aos colegas.

Após a explicitação dessas estratégias de leitura utilizadas pelos


alfabetizandos para ler diferentes portadores de texto, alguns alfabetizadores podem
indagar:

E a decifração nisso tudo? Nunca? Sim, ela ocorre, e logo desde o início,
porém como um instrumento entre outros, nunca sistematicamente
privilegiada.

Por exemplo: “fugiam” começa como “fuga”.

Em certos casos, entretanto (nomes próprios de personagens ou de ruas,


de produtos ou medicamentos), se o professor não os fornecer, a decifração
é um jogo... e um bom instrumento (JOLIBERT, 1994, p. 75).
48

É verdade também que não é suficiente que as crianças apenas tenham


contato com diferentes portadores de texto para que desenvolvam a capacidade de
ler. Nesse sentido, o professor apresenta papel fundamental ao realizar as
intervenções necessárias, nos momentos corretos. De acordo com Jolibert (1994),
os alfabetizadores devem auxiliar os alunos a:

- serem exigentes, a não se contentarem com o aproximativo, a


estruturarem suas aquisições e a utilizá-las de maneira mais operatória e
mais autônoma possível;

- terem uma atividade reflexiva sobre suas estratégias (o como-a gente-fez


para encontrar uma informação ou construir o sentido de um texto) para
torná-las mais eficientes;

- melhorarem seu desempenho de leitor através do exercício da


automatização da aplicação das competências próprias do ato lexical:
antecipação, discriminação visual e identificação das palavras, etc.

- recapitularem de maneira metódica, à medida que as observações são


feitas, tudo quanto foi descoberto sobre o próprio funcionamento da língua
escrita (p. 77).

Sendo assim, o alfabetizador deve auxiliar os alunos em diferentes momentos


da aprendizagem da leitura. No apoio à compreensão imediata, por exemplo, o
professor apresenta uma atuação bastante discreta, permitindo que as crianças
coletem os indícios relacionados ao portador de texto estudado, que elaborem suas
hipóteses sobre o material escrito e que as verifiquem entre si. Muitos dos conflitos
cognitivos surgidos entre os alfabetizandos poderão ser solucionados com simples
questionamentos do educador e, quando tal atuação não for suficiente, ele poderá
fornecer alguma(s) resposta(s) a fim de que a discussão evolua. “O professor
intervém junto a cada criança, modulando sua ação de acordo com as necessidades
(...) insistindo mais nos pontos altos do que nos fracos, conforme os princípios de
uma pedagogia do sucesso” (JOLIBERT, 1994, p. 78). Cabe destacar que o
professor não é o único detentor do saber e que os alunos podem aprender muito na
relação com seus pares.

Outra situação didática bastante relevante no que se refere à atuação do


alfabetizador consiste no apoio da elucidação das estratégias. Não basta que o
professor auxilie os educandos a compreenderem um texto. É igualmente relevante
que os alunos percebam quais estratégias utilizaram para conseguir fazê-lo. Mas,
como possibilitar tal aprendizagem? Enquanto o professor propõe a compreensão de
um texto, deverá fazer com que cada criança explicite suas hipóteses acerca do
material escrito e os indícios que sustentam tais hipóteses. Nesse momento, os
discentes deverão confrontar suas hipóteses com as dos colegas e, para defender
suas ideias, cada um deverá utilizar argumentos consistentes. Entretanto, cada
alfabetizando precisará estar preparado, também, para modificar suas hipóteses
iniciais ao deparar-se com outras hipóteses e outros argumentos mais adequados.
49

Além disso, diante de determinado portador de texto, o alfabetizador deverá


auxiliar os alunos a definirem qual tipo de leitura será necessário realizar: “(...) leitura
(relativamente) integral para um conto, por exemplo, ou leitura parcial e seletiva para
uma procura de informações num catálogo de brinquedos ou num programa de
televisão” (JOLIBERT, 1994, p. 78). Outro auxílio significativo por parte do docente,
tendo em vista a elucidação das estratégias utilizadas pelo aluno para ler, consiste
em possibilitar que os alfabetizandos percebam e utilizem os diferentes recursos
presentes no portador de texto analisado:

(...) sumário, índice, ordem alfabética, títulos e subtítulos, tipografia de


relevo (caracteres em negrito, em itálico, etc.), as colunas de um jornal ou
revista, as diversas formas de classificação (por exemplo, as páginas
amarelas da lista telefônica), etc. (JOLIBERT, 1994, p. 79).

É relevante, também, que o alfabetizador auxilie os educandos na elaboração


e na utilização de recursos de referência. Esses materiais escritos podem ser
coletivos, individuais ou de pequenos grupos.

Os recursos coletivos deverão estar expostos permanentemente no ambiente


alfabetizador e terão sido analisados e compreendidos pelos alunos em momentos
anteriores. Tais textos servirão como material de consulta para os alfabetizandos
quando estiverem vivenciando alguma situação didática que permita consultá-los na
sala de aula para resolver algum conflito cognitivo relacionado à leitura de um novo
texto e/ou palavra. Outra possibilidade de material coletivo são os fichários de
classificação. Nesse material, as palavras são organizadas de acordo com critérios
previamente estabelecidos como, “(...) os nomes, os dias, as palavras da
correspondência, as da meteorologia, etc.” (JOLIBERT, 1994, p. 79). Os critérios
utilizados para a classificação dos vocábulos podem ser complexificados. Segundo
Jolibert (1994, p.79), “a própria classificação desses fichários é evolutiva: por
exemplo, é possível passar de uma primeira classificação temática (...) a uma
classificação alfabética (...)”.

Dentre os materiais individuais, cabe destacar o caderno de vida de cada


aluno, que deve conter todos os textos estudados em aula e o qual o alfabetizando
pode revisitar sempre que julgar conveniente, e o repertório alfabético, que consiste
em palavras descobertas pelo educando e organizadas, em colunas, de acordo com
a letra inicial. Em relação aos materiais construídos para pequenos grupos, Jolibert
(1994) salienta “a pasta que contém fichas alfabéticas nas quais aparecem
colunas/palavras, ou fichas de palavras-instrumentos (artigos, preposições), ou
estruturas particulares (por exemplo, a interrogação) (...)” (p. 81).

Todos esses materiais escritos, sejam eles utilizados para consulta coletiva,
individual ou de pequenos grupos, podem ser úteis tanto para auxiliar os
alfabetizandos na leitura de textos e de palavras novas quanto para embasar a
escrita de palavras e de textos.
50

Para melhorar o desempenho dos alunos no que se refere à leitura, a autora


destaca as “atividades metódicas de exercício do ato lexical” (JOLIBERT, 1994, p.
84). Para atingir tal objetivo, algumas aptidões relacionadas à leitura são
desenvolvidas por meio de estratégias de ensino: “exercícios para formular
hipóteses e para antecipá-las” (p. 84); “exercícios: discriminação visual rápida e
identificação de palavras” (p. 86); e “exercícios: olhar rápido e leitura descontínua”
(p. 88). Atividades que envolvam a análise de materiais escritos ou de gravuras
para que, a partir desses elementos, os alfabetizandos façam inferências, estarão
contemplando o desenvolvimento da aptidão relacionada à formulação de hipóteses
com vistas à antecipação de fatos. Dentre as estratégias de ensino mencionadas por
Jolibert (1994, p, 84-85), cabem destacar:
- Ler um conto ou apresentar um livro ou história em quadrinhos e parar
num momento crucial: as crianças inventam um final coletando um máximo
de indícios conhecidos. (...)

- Jogo da palavra desconhecida: apresenta-se uma palavra que não faz


parte do vocabulário usual das crianças. Aceitam-se todas as propostas de
sentido e justificativas e, por fim, as crianças aprendem o sentido correto,
integrando a palavra ao contexto. (...)

- Inventar uma história a partir de três elementos, desenhos ou palavras,


extraídos aleatoriamente de uma caixa ou “marcadas” num livro ou
dicionário.

- Mostrar uma história escrita numa língua estrangeira (conto árabe, manual
de utilização em japonês, jornal inglês, etc.): as crianças fazem hipóteses
sobre a natureza desse escrito e, quando possível, do seu conteúdo mais
preciso. (...)

- Leitura de um texto com a frequente escolha entre duas palavras (de


conformação parecida ou não).

- Reconstituição de frases a partir de palavras dispersas.

- Reconstituição de textos a partir de frases dispersas.

Outra aptidão relevante relacionada à leitura consiste na “discriminação visual


rápida e identificação de palavras” (JOLIBERT, 1994, p. 86), para a qual serão
mencionadas, a seguir, algumas das atividades salientadas pela autora. Em uma
das estratégias de ensino, o professor mostra, durante três segundos, uma gravura
contendo uma cena aos alfabetizandos e, em seguida, mostra a eles uma palavra,
durante cinco segundos. Após a visualização da cena e da palavra, os discentes
deverão dizer ao alfabetizador se a palavra vista durante cinco segundos estava
presente na cena. Não é necessário que os educandos decifrem a palavra. O
processo inverso também poderá ser feito. Outra atividade interessante consiste na
análise de uma lista de palavras por parte dos alfabetizandos a fim de que eles
localizem a “palavra intrusa”, ou seja, a palavra, da lista, que não tem relação
alguma com os demais vocábulos. Um exercício que também explora a visualização
e a identificação rápida de palavras é aquele em que o discente terá de circular,
sublinhar, pintar, enfim, indicar de alguma maneira, a palavra ditada pelo professor
ou o vocábulo que completa adequadamente o espaço constante em um texto
51

explorado pelo grupo de alunos. Além da visualização e da identificação de palavras,


também pode ser realizada a visualização e a identificação de letras em comum
dentre palavras que apresentam grafias semelhantes. Os alunos podem visualizar
palavras, tais como, “boca” e “sopa”, “toca” e “toalha” e apontar as letras que tais
vocábulos têm em comum.

A habilidade relacionada ao olhar rápido e leitura descontínua, por sua vez,


refere-se a atividades que contemplem a coleta de indícios num portador de texto,
os quais possibilitem que os alfabetizandos encontrem a informação procurada sem
que o texto seja decifrado, palavra por palavra. São algumas das atividades
destacadas por Jolibert (1994), a fim de desenvolverem tal aptidão:

- Encontrar rapidamente uma palavra numa página inteira ;.

- Frente a um desenho, marcar com um círculo a palavra adequada numa


lista cada vez mais longa;

- Contar quantas vezes é encontrada uma palavra num texto (sem lê-lo
palavra por palavra), por exemplo: a palavra “futebol” num artigo esportivo
(p. 88).

Um projeto que permite o aperfeiçoamento das habilidades relacionadas ao


ato de ler é a organização do canto da leitura em sala de aula. Além de
possibilitarem tal benefício, os livros de literatura infantil também contribuem para o
desenvolvimento da imaginação das crianças. Cabe destacar que o canto da leitura
não deve ser utilizado pelos alunos apenas após a conclusão das atividades
propostas pelo professor nas aulas, mas deve ser organizado de modo que os
alfabetizandos explorem as obras literárias sistematicamente. Nas palavras da
autora: “O essencial, para nós, é que o canto da leitura não seja mais o canto „onde-
se-vai-quando-se-terminou-a-tarefa‟, mas que seja vivo, familiar, aproveitado e
continuamente renovado” (JOLIBERT, 1994, p. 95). Ela sugere algumas ações e
estratégias de ensino visando à organização do canto da leitura em sala de aula, as
quais serão abordadas nas linhas que seguem.

Segundo a autora (1994), primeiramente, os educandos precisam apropriar-


se dos livros constantes do canto da leitura. Para isso, os alunos devem classificá-
los de acordo com os atributos por eles escolhidos. Assim, eles se apropriam, de
modo geral, dos livros constantes do acervo. Semanalmente, o alfabetizador pode
apresentar-lhes um ou mais livros novos e contar a eles parte da história, ou apenas
ler o título da obra, ou, ainda, somente dizer quais são as personagens principais da
história a fim de despertar a curiosidade e, com isso, a vontade de ler a(s) obra(s). É
provável que, após algum tempo, os alunos apresentem para o professor e para os
colegas os livros que leram e cujas histórias lhes agradaram.

Além disso, o educador pode propor jogos em pequenos grupos de alunos, os


quais proporcionem que eles se apropriem de informações constantes do(s) livro(s).
Os discentes podem, por exemplo:
52

- Procurar o livro no qual a galinha ruiva pede para os outros animais que a
ajudem a fazer um bolo.

- Procurar todos os livros cujo título contém o nome de uma cor, um nome
de pessoa, etc.

- Quem vai encontrar o livro que fala de um rato na página 16? (JOLIBERT,
1994, p. 93).

É desejável que as obras literárias sejam trocadas a cada semana, pois,


assim, os discentes podem ampliar o repertório de livros de literatura conhecidos,
mantendo-se interessados na descoberta das histórias. Tal momento deve ser
vivenciado ativamente pelos alfabetizandos.

O local da sala de aula em que o canto da leitura é instalado deve ser


escolhido pelas crianças, ainda que possa ser modificado ao longo do ano letivo:

As crianças decidem onde e como instalá-lo na sala (carpete, almofadas


ou, simplesmente, mesas e cadeiras de seu tamanho). Pode-se decidir,
durante o ano, mudá-lo para outro local ou modificar sua organização
(JOLIBERT, 1994, p. 93).

Mas, afinal, que tipo de materiais escritos podem fazer parte do canto da
leitura? Seria esse espaço destinado apenas para livros de literatura infantil? O
canto da leitura deve ser um lugar em que as crianças possam encontrar uma
diversidade de portadores de texto, tais como, poemas, letras de canções, revistas
para recortar e para buscar informações, livros de receita, histórias em quadrinhos,
jornais, álbuns e, também, livros de literatura infantil. A exploração de tal variedade
de materiais escritos possibilitará que os alfabetizandos ampliem seus
conhecimentos acerca da leitura, formulando hipóteses e estabelecendo relações a
partir dos indícios constantes em cada portador de texto.

Convém destacar, ainda, que várias atividades podem ser desenvolvidas


utilizando-se o canto da leitura. Uma estratégia interessante consiste em uma
exposição sobre determinado tema que esteja sendo estudado em aula. Após, por
exemplo, trabalhar-se um livro de literatura infantil cuja personagem principal é uma
ovelha, os alfabetizandos podem buscar informações sobre tal animal em diferentes
portadores de texto para que, a partir dessa pesquisa, possa ser montada uma
exposição. Jolibert (1994) menciona outras possibilidades de atividades, dentre as
quais, cabem citar as que seguem:
- Lê-se um livro para si, sem ter que relatá-lo nem para o professor, nem
para os colegas. Pode ser folheado em grupo.

- Tiram-se livros que podem ser levados para casa. Autogestão do fichário
de retirada: cada criança tem uma ficha com seu nome sobre a qual escreve
o nome do livro escolhido.

- Emprestar um belo álbum novinho, para cada criança, que se compromete


a devolvê-lo no mesmo estado. Isso é feito no início do ano e permite que a
criança familiarize-se com o objeto-livro e tenha intercâmbios com sua
família. Quando toda a turma o leu, fala-se coletivamente sobre ele.
53

- Uma criança apresenta a alguns colegas o livro que leu em casa; ou a


professora lê, ou conta, uma história completa ou em episódios (p. 94-95).

Dentre as estratégias salientadas, estão algumas que enfatizam a


participação de uma instituição muito importante no processo de aprendizagem dos
alunos: a família. Os pais e/ou outros responsáveis pelas crianças devem ser
parceiros da escola e devem acompanhar a construção de conhecimentos por parte
de seus filhos. Devem ainda ser acolhidos pela instituição escolar a fim de que
participem do processo de aprendizagem das crianças de modo adequado, ou seja,
em consonância com os objetivos almejados pelo professor e com as estratégias por
ela elaboradas para viabilizar a aprendizagem dos pequenos.

De modo geral, as famílias valorizam a aprendizagem da leitura e da escrita,


pois têm consciência da importância de saber ler e escrever na sociedade em que
vivemos. Sendo assim, muitas vezes, os familiares mostram-se dispostos a auxiliar
os filhos na aprendizagem da leitura, mas muitas vezes não sabem, exatamente,
como fazê-lo, ou o fazem considerando a maneira como aprenderam a ler no
período em que estavam sendo alfabetizados.

(...) se não existe mais nenhum manual de leitura para “revisar os sons” do
dia, reler o que foi visto de manhã na aula, o que há de ser feito, então? Se
não se lê mais em voz alta, sílaba após sílaba, como fazer? A pior das
“soluções” consiste em comprar um manual e mandar as crianças, à noite,
em casa, fazerem o contrário do que fazem o dia na escola, ou seja, oralizar
e silabar (JOLIBERT, 1994, p. 127).

Para que os pais e/ou responsáveis pelos alfabetizandos possam, de fato,


auxiliar as crianças no processo de aprendizagem da leitura, Jolibert (1994)
considera que a escola deve mantê-los informados para que, assim, seja construída
uma relação de parceria.

A referida autora destaca algumas ações imprescindíveis para que os


familiares dos educandos compreendam a proposta pedagógica da escola em
relação à aquisição da leitura. No início do ano letivo, as famílias devem ser
recebidas na escola, preferencialmente na sala de aula em que o(s) filho(s)
estudará(ão), para que a docente possa explicar a organização dos materiais
constantes do ambiente alfabetizador e a importância de cada um deles no processo
de aprendizagem da leitura por parte dos alfabetizandos. Nesse momento, é
importante que o alfabetizador esclareça que a oralização e a decifração não serão
atividades privilegiadas durante as aulas, com vistas à construção de conhecimento
dos alunos acerca do ato de ler. Além disso, os familiares devem sentir-se
suficientemente acolhidos para elaborar perguntas ao professor e para interagir
livremente com os demais pais e/ou responsáveis pelas outras crianças que
integrarão a turma.
54

Mas, será que apenas a explicação acerca do funcionamento da


aprendizagem da leitura é suficiente para que os familiares sintam-se seguros para
não privilegiar a decifração? Segundo Jolibert (1994),

(...) nada é mais difícil do que entender a afirmação segundo a qual


“aprender a ler não é aprender a decifrar”; por isso é que propomos aos pais
que venham a nossas aulas verem como as crianças fazem para questionar
um texto, emitir hipóteses, coletar indícios, confrontar, conferir. Essa sessão
é seguida por uma entrevista informal com as crianças e por uma sessão de
trabalho entre adultos sobre o que acaba de ter lugar (p. 128).

Para assegurar a compreensão dos pais e/ou responsáveis pelos


alfabetizandos sobre a aprendizagem da leitura por parte das crianças, devem ser
propostos encontros em que tais adultos vivenciem o processo proposto pela escola
para que os alfabetizandos aprendam a ler. Nesse momento, os familiares têm a
oportunidade de experimentar a elaboração de hipóteses acerca de um texto a partir
dos indícios coletados e confrontá-las com as hipóteses construídas pelos pares.
Entretanto, a escola deve ter cuidado para não provocar algum constrangimento aos
pais e/ou aos responsáveis pelos alunos. Para evitar isso, alguns professores são
convidados a participar desse momento e vivenciar tais experiências.

Outra questão merecedora de destaque refere-se ao fato de a escola mostrar


aos familiares que a metodologia de leitura proposta não é absurda e nem diferente
de todas as outras. Para isso, professores de outras instituições são convidados a
participar de reuniões com os familiares dos alunos. Além do recurso humano,
também são utilizados recursos audiovisuais, como filmes, por exemplo. Diante dos
esclarecimentos oferecidos pela escola, é natural que os pais e/ou responsáveis
pelos alunos interajam com o alfabetizador, exteriorizando observações acerca da
aprendizagem da leitura por parte dos discentes. De acordo com Jolibert (1994),

(...) pais informados fazem docentes informados: nos falam com prazer das
observações que fazem sobre as descobertas ou os bloqueios de seus
filhos, de seu progresso dia após dia, nos interpelam com suas perguntas
pertinentes, inesperadas, etc. Nos dão sugestões de melhoras ou de
atividades. Ousam. E nós escutamos (p. 129).

Além disso, os familiares dos alunos que aprenderam a ler na escola em anos
anteriores interagem com os pais e/ou responsáveis pelos educandos que estão em
fase de alfabetização, contando-lhes como ocorreu o processo com os seus próprios
filhos, já alfabetizados pela escola. Essa interação constitui outra fonte de
tranquilidade para os familiares dos alfabetizandos.

Mas, mesmo após a compreensão do processo de aprendizagem da leitura


por parte dos pequenos, os familiares podem perguntar-se: o que fazer, em casa,
para auxiliar a criança a aprender a ler? Jolibert (1994) considera que,
primeiramente, é importante deixar claro o que não deve ser feito: as noites, por
exemplo, não devem ser ocupadas com tarefas de visem à decifração de textos
(sílaba a sílaba; palavra a palavra); o aprendizado da leitura não pode ser
55

considerado um fardo para o alfabetizando, mas deve consistir em um momento de


prazer. Os familiares dos alunos podem explorar com os educandos os portadores
de texto que fazem parte do cotidiano da família (rótulos de produtos, notícias de
jornal, placas de ônibus, placas contendo o nome das ruas, receitas, etc.).

Não se trata nem de lerem tudo para seus filhos, nem de lhes fazer
pronunciar sílaba após sílaba, mas, sim, de ajudá-los a “adivinharem cada
vez mais corretamente” o sentido daquilo que prende seu interesse graças a
indícios que serão justificados a seguir. É importante dizer também o quanto
pode ser significativo que os pais leiam histórias para seus filhos ou
folheiem com eles um álbum de literatura infantil, levando-os a dizerem o
que imaginam que irá acontecer na página seguinte depois de virada
(JOLIBERT, 1994, p. 129).

Cabe mencionar, ainda, que nem todos os familiares participam ativamente


da vida escolar dos educandos. Sendo assim,

(...) cabe a nós procurar entradas múltiplas que permitam que cada um
encontre um lugar onde se sinta à vontade, envolvido, criativo, eficaz: desde
o pai analista de sistemas até a mãe portuguesa (JOLIBERT, 1994, p. 130).

Firmada tal parceria, a tríade alfabetizando-família-aluno estará formada e


consolidada, o que tende a facilitar o processo de aquisição da leitura por parte dos
alfabetizandos.

Nas linhas a seguir, serão abordados outros aspectos imprescindíveis para a


alfabetização dos alunos: a presença do lúdico nas aulas e a seleção de estratégias
de ensino e de recursos pedagógicos que favoreçam, paralelamente, a construção
de conhecimentos relacionados à escrita e à leitura.
56

5 ARTICULANDO A LEITURA E A ESCRITA: CRIANDO POSSIBILIDADES

5.1 A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO E A PRESENÇA DO LÚDICO

De acordo com Haidt (2004), o planejamento é um ato presente no cotidiano


das pessoas. Com o passar do tempo, o ato de planejar tornou-se ainda mais
importante em função da complexidade das atividades desenvolvidas pelos sujeitos.
Do mesmo modo, na escola, o planejamento consiste em uma tarefa imprescindível
a ser realizada pelo professor para que os alunos possam atingir os objetivos
almejados. Mas, afinal, o que vem a ser planejamento?

Planejar é analisar uma dada realidade, refletindo sobre as condições


existentes, e prever as formas alternativas de ação para superar as
dificuldades ou alcançar os objetivos desejados. Portanto, o planejamento é
um processo mental que envolve análise, reflexão e previsão. Nesse
sentido, planejar é uma atividade tipicamente humana, e está presente na
vida de todos os indivíduos, nos mais variados momentos. (HAIDT, 2004, p.
94)

Complementando tal conceito, Piletti (2006) considera que planejar nada mais
é do que estudar; ou seja, significa estar diante de uma situação a ser resolvida e
conseguir fazê-lo seriamente, tendo como motivação a curiosidade e/ou a
necessidade.

Um dos tipos de planejamento presente nas escolas é denominado


planejamento de ensino ou didático (HAIDT, 2004). Segundo a autora, o
planejamento didático consiste na elaboração de estratégias de ensino, por parte do
docente, que considerem as ações a serem desenvolvidas pelos alunos, a fim de
que os objetivos almejados sejam atingidos. O planejamento de aula consiste em um
subtipo do planejamento didático ou de ensino. Mas, qual é a diferença entre o
planejamento de ensino ou didático e o planejamento de aula?

O planejamento de ensino é elaborado considerando-se as diretrizes


nacionais, estaduais e municipais, conservando, entretanto, as especificidades
relacionadas ao público para o qual as ações didáticas estão sendo pensadas.
Trata-se de um planejamento que considera as necessidades da comunidade em
que l a escola está inserida, a qual participa ativamente da construção dos objetivos
a serem trabalhados pela escola. O planejamento de ensino ou didático é um
planejamento mais amplo, é elaborado para ser executado em um período de tempo
maior do que um dia letivo.

O planejamento de aula, por sua vez,

(...) é a sequencia de tudo o que vai ser desenvolvido em um dia letivo. É a


especificação dos comportamentos esperados do aluno e dos meios –
conteúdos, procedimentos e recursos – que serão utilizados para sua
realização. Assim, o planejamento de aula é a sistematização de todas as
atividades que se desenvolvem num período de tempo em que o professor
57

e o aluno interagem, numa dinâmica de ensino-aprendizagem (PILETTI,


2006, p. 72).

De acordo com Haidt (2004), ao planejar uma aula, o professor deve


considerar alguns elementos fundamentais do planejamento. São eles: os objetivos
imediatos a serem atingidos; os conteúdos a serem trabalhados durante a aula em
questão (conceituais – relacionados à construção de conceitos; procedimentais –
relacionados à aprendizagem do modo de realização de diferentes atividades
propostas; e atitudinais, diretamente ligados à construção de atitudes positivas em
relação à temática desenvolvida); as estratégias de ensino mais adequadas ao
grupo de alunos em questão, que podem ser propostas para os educandos
individualmente ou em grupos; os recursos que estimularão a participação, a
curiosidade, a criatividade e a compreensão de determinado objeto de estudo por
parte dos discentes; e, por fim, a avaliação das atividades.

Além disso, para a autora,

ao elaborar o seu plano de aula, o professor deve levar em conta as


características dos alunos e partir dos conhecimentos que eles já possuem.
Por isso, é importante que o professor faça uma sondagem do que os
alunos já sabem sobre os conhecimentos a serem desenvolvidos (HAIDT,
2004, p. 103).

Nesse contexto, cabe salientar que, quando se trata da aprendizagem da


leitura e da escrita, a sondagem se mostra imprescindível, pois o planejamento do
alfabetizador deve considerar os diferentes níveis de escrita em que se encontram
os alfabetizandos e, também, os conhecimentos que eles apresentam sobre a leitura
de diferentes materiais escritos. Sendo assim, as intervenções do docente durante a
realização de atividades serão adequadas e auxiliarão os educandos na
complexificação de conhecimentos acerca dos atos de ler e de escrever. Além de
aprenderem com o alfabetizador, os alunos também podem aprender com seus
pares.

Entretanto, para que isso aconteça, é necessário que o professor saiba em


que nível de escrita está cada um dos seus alunos, pois, para que os conflitos
cognitivos resultem em reconstrução de conhecimentos por parte dos pequenos, é
fundamental que os grupos de alunos sejam sistematicamente pensados pelo
alfabetizador. O ideal é que os alunos que estejam formulando hipóteses de escrita
cujo nível seja próximo realizem, em alguns momentos, atividades em duplas ou em
pequenos grupos.

Alguns educadores ainda podem questionar sobre o quão importante é


planejar as aulas ou se, após tantos anos de experiência docente, o planejamento
de aula ainda será fundamental. Segundo Haidt (2004), a resposta a essas
perguntas é afirmativa, já que o planejamento das atividades é imprescindível
porque tem como funções:
58

a) Prever as dificuldades que podem surgir durante a ação docente, para


poder superá-las com economia de tempo.

b) Evitar a repetição rotineira e mecânica de cursos e aulas.

c) Adequar o trabalho didático aos recursos disponíveis e às reais


condições dos alunos.

d) Adequar os conteúdos, as atividades e os procedimentos de avaliação


aos objetivos propostos.

e) Garantir a distribuição adequada do trabalho em relação ao tempo


disponível (p. 103-104)

No que se refere à aprendizagem da leitura e da escrita, cabe destacar ser


muito importante que o alfabetizador distribua o tempo das aulas contemplando, de
modo homogêneo, a proposição de atividades que envolvam a escrita e de tarefas
relacionadas à leitura. Os alfabetizandos podem, por exemplo, durante uma aula,
explorar determinado portador de texto, realizar a leitura de tal material escrito e
escrever palavras relacionadas à temática do texto analisado. Desse modo, tanto a
leitura quanto a escrita estariam contempladas no planejamento da aula, o que
possibilitaria que os alunos desenvolvessem habilidades e competências
necessárias para evoluir, simultaneamente, na construção de conhecimentos
relacionados aos atos de ler e de escrever.

Mas, afinal, o que um bom plano de aula deve ter? De acordo com Haidt
(2004, p. 104-105), é fundamental que um plano de aula apresente: a) coerência e
unidade; b) continuidade e sequência; c) flexibilidade; d) objetividade e
funcionalidade; e) precisão e clareza.

Considera-se que um plano de aula apresenta coerência e unidade quando


os objetivos almejados estão relacionados aos conteúdos propostos, quando as
estratégias de ensino elaboradas pelo professor visam a atingir os objetivos e
quando a avaliação contempla os conteúdos trabalhados em aula. Outro aspecto
relevante do plano de aula consiste na continuidade e na sequência, que se trata
da “(...) previsão do trabalho de forma integrada do começo ao fim, garantindo a
relação existente entre as várias atividades” (HAIDT, 2004, p. 105).

Além desses itens, a flexibilidade também deve ser destacada, visto que o
plano de aula deve ser reformulado, sempre que necessário, para atender as
necessidades e as curiosidades dos alunos. Entretanto, os objetivos essenciais a
serem alcançados não podem ser desconsiderados.

O aspecto relacionado à objetividade e à funcionalidade também é


imprescindível em um plano de aula, pois consiste em:

levar em conta a análise das condições da realidade, adequando o plano ao


tempo, aos recursos disponíveis e às características da clientela
(possibilidades, necessidades e interesses dos alunos). Assim, os
59

conhecimentos a serem trabalhados e assimilados devem atender aos


interesses e necessidades dos alunos de forma funcional, efetiva e prática
(HAIDT, 2004, p. 105).

A precisão e a clareza do plano de aula também constituem aspectos


relevantes. O plano de aula, por consistir na sistematização do planejamento por
meio da escrita, deve conter uma linguagem compreensível não apenas para aquele
que o elabora, mas para todos os professores que desejarem consultá-lo. A leitura
do plano de aula deve resultar em uma única interpretação por parte de todos os
docentes. É importante, segundo Haidt (2004), mencionar que o plano de aula
não deve ser considerado um mero documento cuja intencionalidade seja cumprir
uma tarefa burocrática. Tal plano deve ser o material em que constem todas as
ideias inerentes ao planejamento do professor, que deve privilegiar, dentre outros
aspectos, os interesses dos discentes.

Mas, afinal, como despertar o interesse dos alunos durante as aulas? E, mais
especificamente, quais são os fatores que contribuem para motivar os alunos a
aprender a ler e a escrever? Um desses fatores que pode favorecer a motivação dos
educandos e a aprendizagem dos conteúdos propostos é a realização de atividades
lúdicas. De acordo com Fortuna (2000, p. 1), “(...) a palavra latina ludus
originalmente refere-se à escola, jogo, diversão infantil”.

Uma das estratégias de ensino que proporciona diversão e construção de


conhecimentos por parte dos discentes é a brincadeira. Segundo Moyles (2006), os
adultos, em geral, compreendem a importância do brincar para o desenvolvimento
infantil. Muitos pais brincam com seus filhos desde a mais tenra idade e, quando não
o fazem, conseguem observar a criança brincando sozinha ou com outras crianças.
Entretanto, quando a proposta de brincar é realizada dentro da escola, alguns
familiares dos pequenos tendem a pensar que estes não estão complexificando
conhecimentos na instituição escolar, pois, para alguns adultos, o brincar não é
capaz de possibilitar a aprendizagem de conteúdos escolares. Tal postura
demonstra uma confusão conceitual em relação ao brincar, assunto sobre o qual
Moyles (2006) afirma que

(...) lidar com o conceito do brincar é análogo a tentar agarrar bolhas de


sabão, pois sempre que parece que temos algo a que nos agarrar, sua
natureza efêmera impede que o agarremos (...) faz mais sentido considerar
o brincar como um processo que, em si mesmo, abrange uma variedade de
comportamentos, motivações, oportunidades, práticas, habilidades e
entendimentos (p. 13).

As diversas variedades do brincar tornam a definição de tal conceito algo


complexo, pois qualquer definição estanque elaborada sobre o brincar correria o
risco de simplificá-lo e, com isso, reduzi-lo. Sendo assim, a interpretação dos pais
dos educandos sobre o ato de brincar na escola pode não estar de acordo com os
objetivos almejados pelo professor por meio das estratégias de ensino propostas.
Sobre isso, Curtis (2006) considera que
60

(...) as definições do brincar são muitas e variadas, mas a maioria inclui a


ideia do brincar como uma experiência prazerosa, que não tem um produto
final e é intrinsecamente motivada. (...) Subjacente a essa interpretação
está a filosofia da dicotomia trabalhar/brincar, que permeia grande parte do
pensamento nas sociedades ocidentais. A ideia de que o trabalho pode ser
uma experiência prazerosa e que certo brincar envolve trabalho é estranha
ao pensamento de muitos na nossa sociedade. (p. 39).

Mas, diante de tal situação, o que os docentes podem fazer para que os
familiares dos alunos compreendam a importância do brincar na escola?
Primeiramente, é fundamental que os próprios professores tenham clareza em
relação à diferença entre o brincar recreacional e o brincar educacional para que, em
seguida, tais esclarecimentos sejam realizados aos pais e/ou cuidadores dos
educandos. Segundo Moyles (2006),

(...) o brincar em ambientes educacionais deveria ter consequências de


aprendizagem. É isso o que separa o brincar nesse contexto educativo do
brincar recreacional – os educadores precisam mostrar claramente que, e o
que, as crianças estão aprendendo por meio do brincar (p. 14).

A afirmação de Fortuna (2000) vem ao encontro do que nos diz Moyles


(2006). Essa autora destaca:

“a brincadeira que propugnamos não é alienante, tampouco o prazer que


proporciona, mas, para que assim seja, é necessário que se inscreva em
um projeto, tenha intencionalidade. É preciso, de igual forma, que preserve
suas características lúdicas (...)” (FORTUNA, 2000, p. 5).

Cabe destacar que cada tipo de brincar possibilita a aprendizagem de


diferentes habilidades, as quais são fundamentais para o desenvolvimento dos
aspectos cognitivo, emocional e social da criança. De acordo com Smith (2006), o
biólogo suíço Jean Piaget classificou o brincar em três categorias: o brincar prático,
o brincar simbólico e o jogo com regras.

O brincar prático refere-se às atividades realizadas pelos bebês entre 6


meses e 2 anos de idade, fase esta em que os pequenos exploram o próprio corpo e
os elementos constantes do mundo no qual estão inseridos. O brincar simbólico, por
sua vez, pode ser observado em crianças com faixa etária entre 2 e 6 anos de idade,
abrangendo o brincar de faz-de-conta e o sociodramático. No brincar simbólico, os
pequenos atribuem um significado – do usual, na vida real – a determinados objetos,
diferente. As crianças brincam com esses objetos, considerando o novo significado a
eles atribuído. Se as atividades da brincadeira estiverem encadeadas, o brincar é
considerado dramático, pois a criança estará desempenhando um determinado
papel na brincadeira. Se a brincadeira envolver duas ou mais crianças, o brincar é
classificado como sociodramático.

De acordo com Fortuna (2000), o brincar simbólico consiste em uma atividade


relevante para a criança, pois
61

(...) invertendo simbolicamente as posições, suporta, no mundo do faz-de-


conta, uma situação real, habilitando-se a compreendê-la. Através do
simbolismo do brinquedo, transfere interesses, fantasias, ansiedades e
sentimentos de culpa. Brincar, então, é um meio de compreender e
relacionar-se com o meio (p. 6).

Cumpre mencionar que, ao ingressar no ensino fundamental, aos 6 anos de


idade, a criança encontra-se em um período de transição entre o brincar simbólico e
o jogo com regras. É aos 6 ou 7 anos de idade que as crianças começam a brincar
com jogos que apresentam regras.

Ainda sobre a importância do brincar para aprendizagem das crianças, cita-se


Fortuna (2000, p. 4), “(...) a dimensão lúdica do homem é responsável pelo
progresso do conhecimento, através da criação e da invenção que oportuniza”. O
brincar, portanto, favorece o desenvolvimento da criatividade, que, por sua vez,
contribui para o processo de aprendizagem dos mais variados conteúdos propostos
durante as aulas.

Entretanto, Heaslip (2006) alerta para o fato de que, no sistema educacional,


muitas vezes, crianças e adultos não são considerados sujeitos do próprio
conhecimento, sendo submetidos à obediência ou, na pior das hipóteses, à
subserviência imposta pelo sistema implementado em tais instituições de ensino.
Nesses casos, o brincar consiste em uma estratégia imprescindível para a mudança
desse paradigma, pois possibilita o desenvolvimento da autonomia e da
autoconfiança do discente. Isso contribui para tornar os alunos sujeitos responsáveis
pela reconstrução e pela complexificação de seus saberes. O sentimento de
autoconfiança auxilia os educandos a compreender que o erro construtivo faz parte
do processo de aprendizagem, o que evita, assim, que o discente iniba-se e/ou
desenvolva algum tipo de bloqueio no que se refere à construção de conhecimentos
relacionada a algum(ns) conteúdo(s).

Nas palavras de Heaslip (2006),

(...) por meio do brincar, as crianças podem tentar e tentar novamente até
terem sucesso ou decidirem o momento de pedir ajuda, de desistir ou de
modificar planos e intenções, sem sentir que essas tentativas foram um
fracasso. Estão também desemaranhando o mundo em seu próprio ritmo,
saboreando as novas experiências conforme elas acontecem,
reconstruindo-as e revisitando-as (p. 124).

A concepção de Anning (2006) corrobora com tal ideia, pois a autora afirma
que os alunos se sentem mais seguros para exteriorizar os conhecimentos prévios
em ambientes que favorecem o brincar: “(...) seja adulto ou criança, um contexto
„lúdico‟ permite ao aprendente a liberdade de experimentar sem o medo de erros
potencialmente dispendiosos ou embaraçosos” (p. 87).

Apesar de o erro construtivo consistir em um elemento natural do processo de


aprendizagem, Heaslip (2006) salienta que o professor deve estar sempre atento às
62

condições reais de desenvolvimento cognitivo das crianças no momento em que


propõe a construção de conhecimentos sobre determinado(s) objeto(s) de ensino. É
desejável que o docente desafie os educandos considerando os conhecimentos
prévios que estes apresentam.

É necessário ter expectativas elevadas, mas realistas, em relação às


crianças e estar disponível para ajudar quando a criança fracassa, para que
o fracasso seja visto como uma experiência de aprendizagem positiva. Os
professores precisam planejar cuidadosamente como podem ajudar as
crianças a terem expectativas elevadas e a serem realistas quando essas
expectativas não puderem ser atingidas. (...) É evidente que as crianças
adoram ter sucesso, mas o ambiente lúdico deve ser suficientemente
seguro para que a criança se sinta encorajada a tentar sem ter a certeza de
um sucesso imediato (p. 126).

As atividades desenvolvidas pelas crianças durante o brincar fornecem pistas


valiosas para os educadores, desde que estes as observem atentamente durante as
brincadeiras e analisem criteriosamente as ações de cada um dos pequenos
envolvidos em tal atividade lúdica. A observação e a análise dos alunos durante a
brincadeira possibilitarão que o educador identifique o nível de desenvolvimento
cognitivo de cada discente e, consequentemente, proponha atividades adequadas
ao conhecimento real de cada educando (ABBOTT, 2006).

Sobre uma possível unanimidade dos professores quanto a concordarem com


a ideia de que o brincar na escola é fundamental para a aprendizagem dos alunos,
Fortuna (2000) diz que isso não existe. Em algumas escolas, existem poucos
brinquedos – ou mesmo ausência de recursos materiais lúdicos – no pátio e nas
salas de aula. O fato de não haver brinquedos no pátio, geralmente é justificado pelo
cuidado com os alunos, tendo em vista que eles poderiam se machucar ao brincar.
Outro argumento para tal situação é que, com o passar do tempo, os brinquedos
sofreriam um processo de deterioração, além de haver a possibilidade de serem
estragados pelas crianças. Por sua vez, em algumas salas de aula, quando há
brinquedos, são nitidamente separados dos demais materiais pedagógicos e são
utilizados pelas crianças apenas quando “sobra tempo”, ou seja, após a realização
de todas as atividades propostas pelo professor, ou no dia do brinquedo.

Só se brinca na escola se sobrar tempo ou na hora do recreio, sendo que


estes momentos correm, permanentemente, o risco de serem suprimidos,
seja por má conduta, seja por não ter feito o tema ou ainda por não ter dado
tempo. Às vezes, a supressão do recreio se estende à hora da merenda, e
mesmo que esta não seja, a priori, uma atividade lúdica, representa um
momento prazeroso diferenciado das tarefas tipicamente escolares, em que
um rasgo de espontaneidade é possível (FORTUNA, 2000, p. 3).

Entretanto, para Curtis (2006), os docentes valorizam o brincar. As dúvidas


dos professores em relação ao brincar não estão relacionadas à necessidade de
contemplar essa atividade no cotidiano escolar, mas às formas de intervenção nas
brincadeiras.
63

Especialistas em educação veem o brincar, especialmente o imaginativo,


com tendo um papel crucial no desenvolvimento de capacidades como
solução de problemas, criatividade e flexibilidade nas crianças pequenas.
Nós acreditamos que, por meio do brincar, as crianças podem praticar
habilidades e vir a compreender o mundo que as cerca. As diferenças entre
os profissionais se relacionam não ao fato de o brincar ser ou não uma
maneira importante de desenvolver capacidades e habilidades nas crianças
pequenas, mas se ele deve ser iniciado pela criança ou mais dirigido pelo
professor (p. 49).

Em relação às intervenções dos professores, cabe salientar que existem


diversas concepções. Há aqueles que acreditam que a aprendizagem ocorre apenas
quando as atividades são totalmente controladas pelos educadores; existem aqueles
que consideram que o docente não deve realizar intervenção alguma durante o
brincar das crianças; e, ainda, há os professores que defendem a ideia de que a
intervenção deve ocorrer de modo adequado, sempre que necessário.

Segundo Smith (2006), há professores que estruturam de modo exarcebado


as atividades propostas aos alunos, o que dificulta o desenvolvimento da criatividade
e da autonomia dos educandos. Os professores adeptos dessa concepção “(...)
criam muita estrutura para as crianças: elas não exercem muitas escolhas e seguem
rigidamente a estrutura de regras da atividade ou imitam o que o adulto modela”
(SMITH, 2006, p. 34).

Dependendo do contexto em que estão inseridas, as atividades baseadas na


repetição de modelos propostos pelos docentes podem se tornar um tanto quanto
desgastantes e dotadas de nenhum sentido para as crianças. Smith afirma que

(...) é improvável que os métodos de repetição ajudem a desenvolver o


pensamento e o planejamento independentes e criativos: não é isso o que
eles pretendem fazer. E a repetição pode, às vezes, ser muito mecânica e
chata, obrigando as crianças a realizarem tarefas que muitas não
compreendem direito (2006, p. 35).

Além disso, o autor (2006) destaca outras duas restrições relacionadas à


aprendizagem por repetição. A primeira delas refere-se ao fato de a atividade ser
realizada, via de regra, com um grande grupo de alunos – ou, mesmo, com a turma
inteira. Desse modo, os diferentes níveis de desenvolvimento cognitivo dos
educandos não são considerados pelo professor. Isso representa um entrave para a
construção e para a complexificação dos conhecimentos dos discentes, pois, para
alguns, a atividade proposta será realizada com considerável facilidade, tendo em
vista que os seus conhecimentos prévios já ultrapassaram as habilidades exigidas
pela tarefa. Em contrapartida, haverá educandos que sequer compreenderão a
solicitação do docente, pois os seus conhecimentos prévios ainda não são
suficientes para realizar a atividade. O terceiro grupo de crianças, por sua vez,
resolverá a tarefa – que estará de acordo com o seu nível cognitivo – sem
demonstrar dificuldades.
64

A segunda limitação relacionada à aprendizagem por repetição refere-se ao


fato de ser atribuído um papel passivo aos discentes durante a aprendizagem. Nas
palavras de Smith (2006, p. 38): “(...) existe o perigo de ser dada uma ajuda
excessiva, de modo que a contribuição da criança fica perdida”.

Opondo-se à concepção de controle total do docente sobre as atividades


propostas, está o paradigma baseado na não intervenção do professor durante a
realização das atividades propostas. De acordo com Fortuna (2000), há educadores
que optam por não realizar intervenções durante a realização das atividades por
parte dos alunos para evitar que o caráter lúdico seja inviabilizado. Segundo a
autora,

A intocabilidade do jogo é tributária da perspectiva espontaneísta da


Educação, onde não há compromisso da escola com o desenvolvimento, já
que se apoia na crença de que este desenvolvimento ocorre à revelia das
interações e condições ambientais prévias. Neste caso, o jogo deve ser
realizado de forma tão livre e espontânea que à escola não cabe intervir,
mesmo que, durante sua consecução, o aluno demonstre dificuldades de
operacionalização ou, até mesmo, dificuldades de aprendizagem. A escola
encobre/não assume suas funções pedagógicas de cumprir e colaborar com
o desenvolvimento e estimular a aprendizagem. (...) Daí que o papel do
professor é contemplativo da atividade lúdica de seus alunos, sob o
argumento de que não intervir é preservar sua genuinidade (FORTUNA,
2006, p. 6-7).

Considerando as duas concepções sobre a intervenção dos professores


durante a realização das atividades lúdicas por parte dos discentes – intervenção
exacerbada; nenhuma intervenção –, cabe salientar que o ideal seria os educadores
adotarem uma postura intermediária, menos extremista. Para isso, os professores
precisariam fornecer recursos lúdicos estruturados para as crianças, observar o
brincar dos alunos, participar da brincadeira quando convidados pelos pequenos e
avaliá-los durante o brincar para realizar intervenções visando à complexificação de
conhecimentos por parte das crianças.

Segundo Smith (2006),

apesar da diversão e da aprendizagem que podem ocorrer pelo brincar livre,


certas formas de brincar podem se tornar muito repetitivas. Portanto,
argumenta-se que os educadores têm um papel-chave a desempenhar:
ajudar as crianças a desenvolver o seu brincar. O adulto pode, por assim
dizer, estimular, encorajar ou desafiar a criança a brincar de formas mais
desenvolvidas e maduras. [...] oferecendo-se materiais estruturados que a
criança é estimulada a usar (p. 30).

Anning (2006) salienta a importância de o docente envolver-se no brincar dos


alunos assumindo também a posição de ouvinte em vez de interferir na brincadeira
das crianças apenas por meio de perguntas e de outras observações orais acerca
da atividade. Ao observar o brincar dos educandos e ficar atento à fala dos
pequenos, o educador estará coletando informações imprescindíveis para a
65

proposição de tarefas que considerem o nível de conhecimento de cada discente.


Considerando-se o conhecimento prévio dos pequenos, as atividades propostas
tendem a despertar o interesse dos alunos e, consequentemente, a apresentar
caráter significativo. De acordo com a autora, “uma maneira de o adulto poder apoiar
a aprendizagem da criança é garantir que as tarefas apresentadas a ela sejam
significativas” (p. 90).

Outra maneira de o professor envolver-se na atividade lúdica realizada pelos


educandos é brincar com eles sempre que for convidado. Abbott (2006) menciona
que “para que as crianças aceitem os adultos em seu brincar, precisam ser
desenvolvidos relacionamentos baseados em mútua confiança e respeito” (p. 105).
Ao envolver-se nas atividades lúdicas realizadas pelos pequenos, o professor
consegue compreender melhor cada uma das crianças, bem como o nível de
desenvolvimento cognitivo e os interesses do grupo e de cada educando. Sendo
assim, é capaz de identificar os tipos de atividades que motivariam a aprendizagem
dos alunos.

Apesar de as tarefas que visam à aprendizagem por repetição não serem


valorizadas por muitos dos professores ocidentais, tendo em vista os aspectos
mencionados anteriormente, cabe enfatizar que, em algumas circunstâncias, tais
atividades podem ser relevantes para a complexificação do conhecimento das
crianças (SMITH, 2006). Nas palavras do autor:

(...) eu devo dizer que não compartilho totalmente essa visão negativa da
aprendizagem e do treinamento por repetição. Dependendo das
circunstâncias, isso pode ser prazeroso – aprender um exercício físico ou
uma coreografia de dança, por exemplo (SMITH, 2006, p. 34-35).

Além disso, ainda segundo Smith (2006), alguns pesquisadores salientam que
“a aprendizagem de canções também pode ser educativa; as rimas e a aliteração
com frequência presentes nas canções infantis revelaram-se uma atividade muito útil
de leitura inicial” (p. 35).

Na verdade, espera-se que o professor conheça o grupo de alunos com o


qual trabalha para que, a partir disso, possa decidir se o momento em questão é
propício para fazer uso de atividades lúdicas com todas ou com determinadas
crianças, ou se a aprendizagem a ser realizada exigirá a utilização de tarefas
envolvendo a repetição.

Mas, e em relação à aprendizagem da leitura e da escrita? Será que as


atividades lúdicas apresentam um papel tão significativo? De acordo com Hall (2006,
p. 135),

(...) os programas de ensino de leitura e escrita sugerem que parte da


experiência infantil com o letramento deve estar inserida em atividades
lúdicas. Também existe o reconhecimento da importância do ambiente com
materiais impressos nesse brincar.
66

Abordar a leitura e a escrita com os alunos a partir de materiais que fazem


parte do cotidiano das crianças consiste em um fator relevante para a
aprendizagem, pois, desse modo, o educador possibilita que o discente reconheça a
importância dos atos de ler e de escrever. A alfabetização a ser proposta não será
uma aprendizagem utilizada apenas dentro da escola, mas, também, na vida real.

Hall (2006) salienta diversas vantagens do brincar para a aprendizagem da


leitura e da escrita por parte das crianças.Um dos fatores destacados pelo autor
refere-se ao fato de que o aluno, ao participar das mais variadas brincadeiras, pode
assumir diferentes papéis e entrar em contato com diversos portadores de texto.
Para Hall (2006),

o letramento é utilizado para tudo o que for apropriado no brincar: fazer


compras, almoçar ou jantar em um restaurante, viajar de trem, visitar um
hospital e assim por diante. O letramento ocorre por ser necessário no
contexto do brincar, não porque o ensino exige (p. 137).

Durante o brincar, a criança pode perceber as características dos materiais


escritos com os quais tem contato e elaborar hipóteses acerca da leitura e da
escrita. Outro aspecto relevante a ser considerado refere-se ao fato de que o brincar
permite que as crianças utilizem as habilidades de leitura e de escrita conforme
julgarem necessário durante a brincadeira. Nas palavras do autor, quando o
letramento é utilizado na vida real,

(...) as pessoas alternam os modos de leitura e de escrita ou os empregam


juntos. Nós não nos programamos antecipadamente para usar a leitura ou a
escrita. É a nossa percepção da situação que estrutura a nossa resposta.
Igualmente, no brincar relacionado ao letramento, é o evento de faz-de-
conta que determina a natureza da resposta letrada, e não uma página de
um livro de exercícios que, arbitrariamente, decide focalizar a leitura ou a
escrita (HALL, 2006, p. 137).

Além dessas vantagens, enfatiza-se ainda, que, ao brincar, as crianças


tendem a estreitar os laços, interagindo mais umas com as outras. Durante a
brincadeira, é natural que os alunos cooperem uns com os outros; ou seja, que
aprendam entre si. O brincar favorece a construção e a reconstrução de
conhecimentos entre os pares, o que salienta que o professor não é o único detentor
do saber. Segundo Hall (2006),

as crianças muitas vezes têm mais sucesso do que os professores ao


ajudar outras crianças a aprender. Elas trazem para o brincar diferentes
experiências e conhecimentos, que compartilham durante a atividade lúdica.
Quando uma criança demonstra um aspecto novo de letramento, ele fica
imediatamente disponível para as outras. Dessa maneira, os significados do
letramento são negociados pelos membros do grupo durante o brincar (p.
137).

Entretanto, para que as atividades lúdicas envolvendo a leitura e a escrita


sejam significativas, faz-se necessário que o docente considere os conhecimentos
67

prévios dos educandos, que proporcione um ambiente rico no que se refere a


materiais escritos, que proponha atividades estruturadas e que valorize a cultura
oral. A questão relacionada à valorização dos saberes já construídos pelas
crianças não é exclusiva da aprendizagem da leitura e da escrita. De qualquer
modo, cabe mencionar que Smith (2006) afirma ser essencial que os docentes
considerem o conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP), elaborado pelo
estudioso Vygotsky. Tal teórico salienta a importância da interação social para a
aprendizagem dos alunos, interação esta que pode ocorrer entre o professor e os
discentes ou entre os pares.

Mas, o que vem a ser a ZDP? A ZDP é o espaço em que o educador e/ou os
colegas podem atuar para auxiliar um sujeito a evoluir do nível de desenvolvimento
real, ou seja, dos conhecimentos já construídos por ele, para o nível de
desenvolvimento potencial, que se refere aos conhecimentos que o aprendente pode
complexificar com a ajuda do docente e/ou de seus pares. Por isso, no caso da
escrita, por exemplo, é imprescindível que o professor saiba em qual nível está cada
um dos educandos. Organizando duplas ou pequenos grupos de alunos de acordo
com o nível de escrita dos alfabetizandos, as crianças que estão em níveis próximos
podem entrar em conflito cognitivo e, com isso, evoluir no que se refere à
aprendizagem de tal objeto de conhecimento.

No caso da leitura, as atividades podem ser propostas em duplas, em


pequenos grupos ou no grande grupo. Ao explorar um texto, por exemplo, o
educador pode solicitar aos alfabetizandos que tentem ler tal material escrito para
que, em seguida, as principais palavras, as quais possibilitam a compreensão do
texto, sejam exploradas e compreendidas pelos alunos.

É importante que o professor, ou mesmo os colegas que estão em níveis mais


avançados em relação à leitura e à escrita, não exijam do alfabetizando a
complexificação de um conhecimento que, no momento em questão, o sujeito não
está preparado para reconstruir. Cada alfabetizando deve ser desafiado,
considerando os conhecimentos prévios que já possui acerca dos atos de ler e de
escrever. Sendo assim, os alunos poderão sentir-se seguros ao exteriorizar suas
hipóteses acerca da leitura e da escrita, sem que haja qualquer tipo de
constrangimento e/ou a propensão ao desenvolvimento de uma autoimagem
negativa. Nesse sentido, Heaslip (2006) destaca que

os educadores precisam perguntar-se que ambientes permitirão às crianças


a socialização, a exploração, a experimentação, a interação satisfatória e a
competência com os outros e permitirão também que a criança sinta
admiração, encantamento, uma crescente confiança em sua própria
capacidade, para desenvolver uma autoimagem positiva e respeito pela
individualidade dos outros (p. 129-130).

Além de considerar os conhecimentos prévios dos alfabetizandos acerca da


leitura e da escrita e de organizar um ambiente que favoreça o desenvolvimento de
uma autoimagem positiva por parte das crianças, é fundamental, também, que o
68

alfabetizador proponha atividades lúdicas estruturadas, por meio das quais sejam
utilizados materiais escritos diversificados.

Segundo Anning (2006), alguns pesquisadores afirmam que apesar da


importância da proposição de estratégias de ensino envolvendo a língua escrita, a
cultura oral não deve ser desprezada nas aulas de alfabetização. Para a autora, se o
trabalho com a leitura e com a escrita for imposto aos alfabetizandos sem que estes
tenham oportunidade de refletir sobre os sons da língua, o processo de
aprendizagem das habilidades e das competências necessárias para o
desenvolvimento dos atos de ler e de escrever pode ser prejudicado:

(...) devemos prestar muita atenção ao som como uma maneira de


promover desenvolvimento. (...) a vida intelectual das crianças pequenas
está extremamente sintonizada com uma cultura oral – sons, em vez de
palavras – e que, ao introduzir cedo demais “as tecnologias” da escrita e da
leitura, nós empobrecemos suas vidas intelectuais ao obrigá-las a operar
com instrumentos de pensamento que, na verdade, deprimem seus poderes
de raciocínio e as deixam mais lentas (ANNING, 2006, p. 92).

Cabe mencionar, entretanto, que o alfabetizador pode contemplar, em seu


plano de aula, todos os aspectos anteriormente citados para possibilitar que as
atividades lúdicas sejam significativas, mas tal fato não exclui a possibilidade de que
a prática pedagógica seja diretamente influenciada por um fator relevante e inerente
a sua vontade: o número excessivo de alunos em uma turma de alfabetização.
Quanto a isso, Heaslip (2006) destaca que

(...) os atarefados professores dos anos iniciais enfrentam um dilema. O


número de crianças na turma pode ser grande demais para uma interação
ótima com as crianças, e o momento e o estilo da intervenção são
decisivos. Se a intervenção ocorrer cedo demais ou for excessivamente
dirigida, ela destrói a descoberta. Se for tarde demais, a criança pode se
aborrecer com a repetição desnecessária, e valiosas oportunidades de
aprendizagem e desenvolvimento podem ser desperdiçadas. (...) É
frequente que o professor, limitado pelo tempo, faça uma intervenção que
não contribui em nada e que pode, inclusive, desvalorizar a atividade em
que as crianças estão envolvidas (p. 124-125).

Mas, afinal, será que uma aula somente é lúdica quando contempla
brincadeiras? De acordo com Fortuna (2000), a resposta para tal questão é “não”.
Para a autora, é considerada lúdica a aula que

(...) desafia o aluno e o professor e situa-os como sujeitos do processo


pedagógico. A tensão do desejo de saber, a vontade de participar e a
alegria da conquista impregnarão todos os momentos dessa aula (p. 9).

E é considerando-se os fatores relevantes para uma atividade lúdica e a


dificuldade relacionada ao grande número de alunos em uma turma de alfabetização
que, nas linhas que seguem, serão descritas algumas atividades cuja intenção será
possibilitar o desenvolvimento paralelo das habilidades e das competências
69

necessárias para a aprendizagem da leitura e da escrita por parte das crianças em


fase de alfabetização.

5.2 RECURSOS BEM SELECIONADOS E ESTRATÉGIAS DESAFIADORAS E


CRIATIVAS

A utilização de estratégias de ensino e de recursos pedagógicos que


possibilitem a motivação e despertem o interesse dos alunos é fundamental para o
sucesso do processo de aprendizagem dos discentes. Sendo assim, cabe ao
professor a tarefa de escolher os procedimentos didáticos e os materiais mais
adequados a cada momento do processo de construção e de reconstrução de
conhecimentos por parte dos educandos. Nesse contexto, cabe salientar, portanto, a
definição de estratégias de ensino e o conceito de recursos.

Segundo Haidt (2006), estratégias de ensino, também denominadas


procedimentos didáticos, consistem nos “(...) procedimentos e recursos didáticos a
serem utilizados para atingir os objetivos desejados e previstos” (p. 144). A escolha
das estratégias de ensino por parte dos professores não é um ato neutro, pois tem
como base a concepção desses docentes acerca da sociedade e das pessoas nela
inseridas. Mesmo que de modo inconsciente, os educadores são diretamente
influenciados por tais fatores ao proceder a escolha das estratégias de ensino
utilizadas em cada aula (HAIDT, 2006).

Entretanto, Haidt (2006) afirma que existem alguns aspectos básicos a serem
considerados no momento de eleger os procedimentos de ensino propostos aos
educandos:

a) adequação aos objetivos estabelecidos para o ensino e a aprendizagem;

b) a natureza do conteúdo a ser ensinado e o tipo de aprendizagem a


efetivar-se;

c) as características dos alunos, como, por exemplo, sua faixa etária, o nível
de desenvolvimento mental, o grau de interesse, suas expectativas de
aprendizagem;

d) as condições físicas e o tempo disponível.

(...) é a partir desses aspectos que se estabelece o como ensinar, isto é,


que se definem as formas de intervenção na sala de aula para ajudar o
aluno no processo de reconstrução do conhecimento (p. 145).

Para Haidt (2006), os procedimentos didáticos mais eficientes são aqueles


que consideram o aluno o sujeito da própria aprendizagem e, com isso, possibilitam-
lhes que participem ativamente das atividades por meio da observação, de
reflexões, da interação com o objeto de aprendizagem, com o docente e com os
demais alunos da classe. Tais processos favorecem a compreensão dos conteúdos
abordados em aula e a complexificação dos conhecimentos dos discentes.
70

Cabe destacar, ainda, que, independente do tipo de estratégia de ensino


escolhida pelo professor para desenvolver determinado(s) conteúdo(s) com os
alunos, algumas ações didáticas devem ser observadas:

a) incentivar sempre a participação dos alunos, criando condições para que


eles se mantenham numa atitude reflexiva.

b) aproveitar as experiências anteriores dos alunos, para que eles possam


associar os novos conteúdos assimilados às suas vivências significativas.

c) adequar o conteúdo e a linguagem ao nível de desenvolvimento cognitivo


da classe.

d) oferecer ao aluno oportunidade de transferir e aplicar o conhecimento


aprendido a casos concretos e particulares, nas mais variadas situações.

e) verificar constantemente, por intermédio da avaliação contínua, se o


aluno assimilou e compreendeu o conteúdo desenvolvido (HAIDT, 2006, p.
149-150).

Sendo assim, o papel do docente para que o processo de aprendizagem dos


educandos seja significativo consiste em coordenar e organizar as ações
empreendidas, as quais devem ser explicitadas com clareza aos alunos, para que
eles consigam obter êxito diante de situações desafiadoras.

Os recursos didáticos, por sua vez, estão diretamente relacionados às


estratégias de ensino desenvolvidas pelos professores. Chamam-se recursos de
ensino (PILETTI, 2010) àqueles elementos presentes no ambiente de aprendizagem,
que são escolhidos pelo educador para estimular o processo de aprendizagem dos
discentes. Segundo Piletti (2010), os recursos podem ser classificados de acordo
com diferentes critérios, dependendo do estudioso que os analisa.

Há pesquisadores, por exemplo, que consideram a existência de dois


diferentes tipos de recursos – os humanos e os materiais. Os recursos humanos
contemplam os professores, os alunos e demais membros da comunidade escolar.
Os recursos materiais, por sua vez, podem ser provenientes do ambiente – natural
ou escolar – ou da comunidade. Dentre os recursos obtidos no ambiente natural,
podem ser mencionados a água e as pedras, por exemplo. Já dentre os recursos
oferecidos pelo ambiente escolar, podem ser destacados os jogos e os livros. Os
recursos materiais podem ser obtidos, também, na comunidade: lojas, bibliotecas
etc.

Outros estudiosos, entretanto, classificam os recursos em três diferentes


tipos, quais sejam, os visuais, os auditivos e os audiovisuais. Tal organização
está diretamente relacionada com o(s) sentido(s) utilizado(s) pelos aprendentes para
construir e reconstruir os conhecimentos. Estão contemplados nos recursos visuais
todos os materiais que os alunos exploram apenas por meio da visão, como, por
exemplo, os cartazes. Os recursos auditivos são aqueles que permitem aos
educandos a aprendizagem unicamente por intermédio da audição, e aqui cabe
71

destacar o rádio. Os recursos audiovisuais, por sua vez, são aqueles que
possibilitam que os sentidos da visão e da audição sejam utilizados
simultaneamente para possibilitar a aprendizagem; por exemplo, o cinema.

De qualquer modo, independente da classificação dos recursos de ensino, é


importante mencionar que tais elementos, quando utilizados de modo adequado, são
fundamentais para o processo de aprendizagem dos alunos. Nas palavra Piletti:

Quando usamos de maneira adequada, os recursos de ensino colaboram


para:

- motivar e despertar o interesse dos alunos;

- favorecer o desenvolvimento da capacidade de observação;

- aproximar o aluno da realidade;

- visualizar ou concretizar os conteúdos da aprendizagem;

- oferecer informações e dados;

- permitir a fixação da aprendizagem;

- ilustrar noções mais abstratas;

- desenvolver a experimentação (2010, p. 152).

Piletti (2010) salienta ainda que, para que todos esses objetivos em relação
ao processo de construção e de reconstrução de conhecimentos por parte dos
discentes sejam atingidos, é indispensável que o professor utilize alguns critérios
para selecionar os recursos didáticos. Dentre eles, destaca-se a necessidade de o
docente:

- dominar o recurso a ser oferecido aos educandos;


- considerar os objetivos de aprendizagem almejados, não utilizando um recurso
apenas pelo fato de o mesmo estar na moda; e
- levar em conta o tempo disponível para a montagem e para a utilização do
recurso.
A união de estratégias de ensino e de recursos adequados ao nível de
desenvolvimento dos alunos e aos objetivos a serem atingidos tende a proporcionar
a complexificação dos conhecimentos dos discentes, nas mais diferentes áreas do
conhecimento.

Nas linhas a seguir, serão descritos três exemplos de procedimentos de


ensino, acompanhados dos recursos necessários, os quais visam a possibilitar aos
alfabetizandos a aprendizagem da leitura e da escrita de modo simultâneo. Tais
estratégias de ensino e recursos foram selecionados a partir da leitura das obras
utilizadas para a escrita do presente TCC, das experiências por vivenciadas pela
autora em aula, enquanto alfabetizadora, e das atividades compartilhadas por
72

colegas que também trabalham com crianças que estão aprendendo a ler e a
escrever.

5.2.1 Contos de fadas: conhecendo, criando e recriando histórias fantásticas

Primeiro Momento

O alfabetizador iniciará a atividade mostrando a capa de um conto de fadas


aos alunos para que, a partir das ilustrações constantes dessa capa, os educandos
possam elaborar hipóteses acerca do título da obra literária em questão. O educador
deverá ocultar o título do conto constante da capa do livro para evitar que, nesse
momento, os alunos tentem lê-lo. Todos os títulos exteriorizados pelos
alfabetizandos por meio da linguagem oral serão registrados no quadro pelo
docente. Assim será até que todos os alunos que desejarem tiverem participado da
atividade e justificado a escolha do(s) título(s) sugerido(s) ao educador e aos
colegas.

Segundo Momento

O professor instigará os alfabetizandos a elaborar hipóteses acerca de alguns


elementos dos contos de fadas, tais como: personagem(ns) principal(is), local em
que a história acontece, enredo, inimigo(s) e desfecho. O docente deverá organizar
as ideias exteriorizadas pelos alunos, registrá-las no quadro, na forma de um texto,
para que, ao concluir tal escrita, o conto elaborado pelo grupo de educandos possa
ser lido. Durante a elaboração do conto de fadas coletivo, o docente deverá salientar
palavras-chave de tal gênero textual, tais como, “era uma vez”, “em um lugar muito
distante”, “de repente” e “então”. Enquanto estiver registrando o texto no quadro, o
professor poderá solicitar aos alfabetizandos que o auxiliem na escrita de alguns
vocábulos imprescindíveis para a compreensão da história. Concluído o registro no
quadro, o alfabetizador instigará os discentes a escolherem um título para o conto.
Para eleger tal elemento, o professor deverá registrar todas as sugestões dos
educandos no quadro. Em seguida, deverá ser realizada uma votação para que o
título mais votado seja contemplado.

Terceiro Momento

O educador lerá, em voz alta, o conto de fadas elaborado pelo grupo de


alunos. Se houver alguns que, pelo fato de saberem ler, desejarem fazê-lo ao
professor e aos colegas, tal(is) aluno(s) poderá(ão) proceder a leitura do conto
coletivo. Após a leitura, o alfabetizador convidará os alunos a localizarem algumas
palavras-chave para a compreensão do conto. Os discentes que desejarem deverão
se dirigir ao quadro e mostrar em que parte do texto estará(ão) escrita(s) a(s)
palavra(s) exteriorizada(s) pelo docente. Localizado(s) o(s) vocábulo(s), o(s)
alfabetizando(s) poderá(ão) marcá-lo(s) no texto por meio de uma linha sublinhada
ou de um círculo ao redor da palavra. Posteriormente, o educador deverá afixar, na
73

parede da sala de aula, um cartaz contendo o conto de fadas elaborado pelo grupo
de alunos. Além disso, cada aluno deverá receber uma cópia de tal história coletiva
para colar no caderno ou para guardar na pasta individual de atividades. A partir
disso, tal material poderá ser utilizado como fonte de consulta para novas escritas.

Quarto Momento

O alfabetizador deverá mostrar novamente o livro que contém o conto de


fadas original aos alunos, para que, nesse momento, eles tentem ler o título da
história. Cabe salientar que, se os alfabetizandos apresentarem dificuldades para ler
o título da obra literária em questão, o professor deverá auxiliá-los no processo por
meio da comparação das letras e/ou sílabas iniciais e finais das palavras que
compõem o título com portadores de texto constantes do ambiente alfabetizador.
Após a leitura do título do conto de fadas, o docente deverá retomar com os alunos
as hipóteses por eles exteriorizadas no primeiro momento a fim de que se verifique
se algum dos alfabetizandos havia realizado a inferência correta. Para que tal
verificação seja feita, o professor – ou o(s) aluno(s) que se dispuser(em) a fazê-lo –
deverá(ão) ler, em voz alta, cada um dos títulos elaborados pelos discentes no
primeiro momento.

Quinto Momento

O docente deverá proceder à leitura do conto de fadas original aos


educandos. Durante a contação da obra literária, o alfabetizador deverá interromper
a leitura em momentos que possibilitem aos alunos a realização de antecipações
relacionadas à continuação da história. Assim será até que todo o conto de fadas
tenha sido contado pelo educador.

Sexto Momento

O professor distribuirá uma folha de ofício branca a cada alfabetizando para


que todos possam desenhar a parte preferida do conto de fadas. Além do desenho,
os alunos deverão registrar o próprio nome na folha e o nome das personagens
envolvidas na parte da história preferida de cada um. Os educandos deverão ser
instigados, também, a registrar, por meio da escrita, o(s) fato(s) ocorrido(s) em tal
parte do conto.

Sétimo Momento

O educador poderá propor uma atividade envolvendo a leitura do conto de


fadas original aos alfabetizandos que se encontram em estágios mais avançados do
ato de ler. Tal tarefa poderá ser realizada individualmente ou em duplas. De
qualquer modo, cada aluno receberá três gravuras, as quais estarão na sequência
lógica do conto de fadas trabalhado (início, meio e fim). No material em questão,
constarão, também, três parágrafos escritos, os quais não estarão organizados de
acordo com a ordem dos acontecimentos na história. Os alfabetizandos deverão ler
cada um dos parágrafos para que, em seguida, consigam ordená-los de acordo com
74

a sequência do conto de fadas. Logo após, o docente distribuirá uma cópia da


história original para que os alunos possam lê-la e colá-la no caderno ou guardá-la
na pasta individual de trabalhos. Tal material escrito será relevante, também, para
que os alunos possam conferir a correta realização da atividade de ordenação dos
parágrafos do conto de fadas.

A referida atividade também pode ser realizada com alunos que ainda não
estão em estágios avançados de leitura. Nesse caso, seria interessante que eles
resolvessem a tarefa em pequenos grupos, com auxílio da professora, sempre que
necessário. Outra possibilidade para contemplar os alfabetizandos que estiverem
em estágios menos avançados, no que se refere à leitura, consiste na distribuição
de uma cópia do conto de fadas original para cada aluno, material este que, além do
texto, conterá ilustrações referentes à história. Diante de tal portador de texto, os
alunos poderão realizar diversas atividades como (por exemplo): localizar palavras-
chave para a compreensão do material escrito; registrar palavras que iniciem e que
terminem com a mesma letra e/ou com a mesma sílaba de palavras do texto e que
tenham sido localizadas no ambiente alfabetizador; ligar as palavras –
acompanhadas das respectivas gravuras – que começam com a mesma letra ou
com a mesma sílaba, entre outras.

Oitavo Momento

O alfabetizador mostrará aos discentes as roletas dos contos de fadas (Figura


1). O professor deverá organizar os alunos em duplas para que cada uma das
roletas seja girada. Em uma folha de ofício – ou no caderno – os alunos deverão
escrever os elementos selecionados em cada roleta para que possam criar um conto
de fadas, contemplando a personagem principal, o lugar, o inimigo e o desfecho
indicado pelas roletas. Um dos discentes poderá ser o escriba, enquanto o colega
acompanha atentamente a escrita produzida por seu par. Nesse momento, alguns
conflitos cognitivos poderão surgir. Se necessário, o professor deverá realizar as
intervenções necessárias para possibilitar a continuidade e, posteriormente, a
conclusão da atividade. Finalizada a escrita do conto de fadas de todas as duplas de
alunos, um dos colegas de cada dupla deverá ler, em voz alta, a produção textual
elaborada. O docente poderá reescrever os contos de fadas junto com cada dupla
de alunos a fim de que todas as histórias sejam registradas no nível alfabético de
escrita. Logo depois, cada conto poderá ser ilustrado pelos respectivos autores a fim
de que seja organizado um livro de contos de fadas da turma.
75

Figura 1 – Roletas dos Contos de Fadas

ROLETAS DOS CONTOS DE FADAS

PERSONAGEM PRINCIPAL LUGAR

INIMIGO DESFECHO

Fonte: Figura elaborada pela autora do TCC


76

5.2.2 Música: cantando, escrevendo, rimando e lendo

Primeiro Momento

O docente colocará uma música para que os alunos a ouçam com atenção. É
desejável que a canção escolhida pelo professor considere a preferência dos
alfabetizandos. Depois que todos tiverem escutado a música, o educador a colocará
novamente para que os educandos possam cantá-la e, se desejarem, dançá-la.

Segundo Momento

O professor afixará a letra da música na parede da sala de aula; algumas


palavras-chave da canção estarão representadas por meio de lacunas e de
gravuras, conforme o exemplo da Figura 2. Nesse momento, os alfabetizandos
poderão ouvir a música novamente, tentando acompanhar a letra da canção.
77

Figura 2: Música “A Formiguinha”

A FORMIGUINHA

FUI NO MERCADO COMPRAR ________________

VEIO A FORMIGUINHA E SUBIU NO MEU ________________

EU SACUDI, SACUDI, SACUDI

MAS A FORMIGUINHA NÃO PARAVA DE SUBIR

FUI NO MERCADO COMPRAR ________________ ROXA

VEIO A FORMIGUINHA E SUBIU NA MINHA ________________

EU SACUDI, SACUDI, SACUDI

MAS A FORMIGUINHA NÃO PARAVA DE SUBIR

FUI NO MERCADO COMPRAR ________________

E A FORMIGUINHA SUBIU NA MINHA ________________

EU SACUDI, SACUDI, SACUDI

MAS A FORMIGUINHA NÃO PARAVA DE SUBIR

FUI NO MERCADO COMPRAR ________________

E A FORMIGUINHA SUBIU NO MEU ________________

EU SACUDI, SACUDI, SACUDI

MAS A FORMIGUINHA NÃO PARAVA DE SUBIR

FUI NO MERCADO COMPRAR UM ________________

VEIO A FORMIGUINHA E SUBIU NO MEU ________________

EU SACUDI, SACUDI, SACUDI

MAS A FORMIGUINHA NÃO PARAVA DE SUBIR


Fonte: Figura elaborada pela autora do TCC
78

Terceiro Momento

O educador solicitará aos discentes que, em duplas, escrevam o nome das


gravuras constantes da letra da música com letras móveis. Cabe destacar que o
alfabetizador deverá organizar as duplas de alunos de acordo com o nível de escrita
em que cada um se encontra no momento em questão. Sempre que necessário, o
professor deverá realizar intervenções para solucionar conflitos cognitivos que os
alfabetizandos, sozinhos, não consigam resolver.

Quarto Momento

O docente solicitará que um aluno dirija-se até o quadro e escreva a palavra


referente à primeira lacuna da letra da canção. Concluída a escrita, todos os colegas
e o alfabetizador deverão analisar a escrita do alfabetizando. Se estiver correta, as
letras móveis correspondentes à escrita do vocábulo deverão ser coladas no cartaz
afixado na parede da sala de aula, o qual conterá a letra da música. Assim será até
que todas as lacunas constantes da letra da canção sejam substituídas por letras
móveis.

Quinto Momento

O alfabetizador distribuirá uma cópia da letra da canção para cada discente, a


qual conterá lacunas no lugar das gravuras. As ilustrações continuarão sendo
contempladas na letra da música para auxiliar os alunos a localizar o lugar em que
cada palavra deverá ser escrita. A atividade será realizada pelas mesmas duplas
formadas no momento anterior. Finalizada a tarefa, cada educando deverá colar a
letra da música no caderno ou guardá-la na pasta individual de atividades.

Sexto Momento

O professor distribuirá um envelope colorido para cada dupla de alunos, o


qual conterá fichas referentes às palavras da canção escritas anteriormente com
letras móveis. Caso os alunos estejam em um nível de leitura inicial, o docente
poderá optar por fichas contendo a escrita das palavras e as gravuras que as
representam (Figura 3). Entretanto, se os discentes estiverem em um estágio de
leitura mais avançado, o jogo poderá ser realizado com fichas contendo apenas as
palavras escritas (Figura 4).
79

Figura 3: Fichas contendo gravuras e escrita

MELÃO MÃO

Fonte: Figuras elaboradas pela autora do TCC

Figura 4: Fichas contendo apenas escrita

MELÃO MÃO

Fonte: Figuras elaboradas pela autora do TCC

A proposta consiste em um jogo de memória das palavras que rimam. Em um


lado da mesa, serão colocadas as fichas referentes às palavras constantes do
primeiro verso de cada estrofe da música, com a face escrita e ilustrada – ou apenas
escrita – virada para baixo. No outro lado, serão colocadas as fichas contendo as
palavras presentes no segundo verso de cada estrofe da canção, com a face
igualmente organizada. Na dupla, os educandos decidirão qual dos dois colegas
iniciará o jogo. Em seguida, tal discente escolherá uma das fichas posicionadas do
lado esquerdo da mesa e lerá a palavra (ou a identificará por meio da gravura,
prestando atenção também na escrita do vocábulo). Na sequência, o alfabetizando
selecionará uma das fichas presentes no lado direito da mesa e, do mesmo modo,
lerá a palavra. Se o aluno virar fichas que rimam, deverá pegar as duas fichas e
continuar jogando. Se ele virar fichas que não rimam, deverá devolvê-las à mesa,
em seus respectivos lugares, e aguardar que o colega da dupla realize uma jogada.
Assim será até que todas as fichas do jogo tenham sido recolhidas da mesa pelos
alunos da dupla. Vencerá o educando que tiver arrecadado o maior número de
fichas da mesa.
80

5.2.3 Interpretando histórias de literatura infantil

Primeiro Momento

O educador elegerá uma história de literatura infantil para contar aos


alfabetizandos. Durante a contação, ele interromperá a leitura em momentos que
permitam a antecipação de fatos por parte dos discentes.

Segundo Momento

O alfabetizador proporá aos educandos que, em grande grupo, recontem


oralmente a história. Nesse momento, os alunos poderão ter o auxílio das
ilustrações constantes do livro ou de outros recursos pedagógicos selecionados pelo
docente, tais como elementos da história confeccionados em EVA – ou em outro tipo
de material –, dispostos no quadro, considerando a sequência lógica dos fatos
ocorridos na história; e um varal contendo as ilustrações mais significativas da obra
literária, as quais possibilitem que os discentes a recontem.

Terceiro Momento

O docente organizará os alunos em duplas, considerando o nível de escrita e


o estágio de leitura em que cada um se encontra. Em seguida, distribuirá uma ficha
(Figura 5) aos educandos, na qual eles deverão escrever o nome de cada um dos
colegas da dupla, o nome da(s) personagem(ns) escolhida(s) e/ou do(a) autor(a) da
obra literária e duas perguntas que a dupla gostaria de fazer à(s) personagem(ns)
e/ou ao(à) escritor(a). Concluído tal procedimento, as fichas serão trocadas entre as
duplas de alunos. Uma das outras duplas deverá ler as perguntas elaboradas pelos
colegas e respondê-las de acordo com a criatividade. Respondidos os
questionamentos, as fichas retornarão para as duplas que elaboraram as perguntas
a fim de que possam ler as respostas. Por fim, haverá a socialização da atividade.
Cada dupla deverá revelar a todos os colegas e ao educador a(s) personagem(ns)
escolhida(s) e/ou o(a) autor(a) da história, ler, em voz alta, as perguntas elaboradas
e as respostas criadas pela dupla de colegas que realizou tal tarefa. Cabe destacar
que esse modelo de atividade é adequado para alunos que estão no nível alfabético
de escrita e em estágios mais avançados de leitura.
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Figura 5: Ficha para registro das perguntas e das respostas

HISTÓRIA: “O COELHINHO QUE NÃO ERA DE PÁSCOA”

AUTORA: RUTH ROCHA

PERGUNTAS FEITAS PELOS(AS) ALUNOS(AS): __________________________

___________________________________________________________________

NOME DA PERSONAGEM ESCOLHIDA OU DA AUTORA DA HISTÓRIA:


___________________________________________________________________

PERGUNTA 1:
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

RESPOSTA:
___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

NOME DA PERSONAGEM ESCOLHIDA OU DA AUTORA DA HISTÓRIA:


___________________________________________________________________

PERGUNTA 2:
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

RESPOSTA:
___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

Fonte: Figura elaborada pela autora do TCC


82

Se consideradas algumas adaptações, essa atividade também poderá ser


realizada com alunos que estejam em níveis iniciais de leitura e de escrita,
considerando algumas adaptações. Nesse caso, ao invés de organizar os alunos em
duplas, o alfabetizador poderá separá-los em dois grandes grupos. Após decidir qual
dos dois grupos começará o jogo, um dos educandos desse grupo sorteia, de dentro
de uma caixa colorida, uma ficha contendo a indicação da ação a ser realizada pelo
grupo – elaborar uma pergunta ou uma resposta para uma das personagens ou para
o(a) autor(a) da obra literária – (Figura 6). Consequentemente, o grupo oponente
deverá realizar a tarefa contrária. Os alunos responsáveis pela elaboração da
pergunta terão cerca de dois minutos para elaborar um questionamento e
exteriorizá-lo, em voz alta, para o professor e para os colegas.

O alfabetizador, então, escreverá, no quadro, o nome da personagem


escolhida pelo grupo e a pergunta elaborada. Após tal registro, o docente convidará
a todos os educandos para lê-lo, em voz alta. O outro grupo terá dois minutos para
pensar em uma resposta para os demais colegas e para o educador. Findo o tempo,
um dos alfabetizandos explicita, em voz alta, a resposta elaborada pelo grupo e o
educador a registra no quadro. Concluída a escrita da resposta no quadro, o
professor convidará a todos para lê-la, em voz alta. Cabe mencionar que, se o
educador desejar, poderá solicitar o auxílio dos alunos para escrever algumas
palavras-chave no quadro e/ou para localizar alguns vocábulos imprescindíveis para
a compreensão da resposta. Em seguida, a resposta será analisada por todos para
verificar se o grupo poderá marcar ponto. É desejável que os grupos sempre
consigam marcar pontos, pois todas as respostas poderão ser aceitas quando
contam com a criatividade dos discentes. Eventualmente, quando o grupo elaborar
uma pergunta que exija uma resposta explícita, a validade do ponto poderá ser mais
criteriosamente analisada. A ideia é que, cada vez mais, os grupos consigam
elaborar perguntas e respostas criativas.

Figura 6: Fichas contendo a indicação da elaboração da pergunta ou da resposta

PERGUNTA RESPOSTA

Fonte: Figuras elaboradas pela autora do TCC


83

Vale salientar que são muitas as atividades capazes de possibilitar aos


alfabetizandos o desenvolvimento simultâneo das habilidades e das competências
necessárias para ler e para escrever. Sendo assim, o presente TCC não tem a
intenção de esgotar as possibilidades de estratégias de ensino e de recursos que
permitam a complexificação dos conhecimentos dos discentes no que se refere a
tais objetos de estudo. A finalidade do presente trabalho consiste em fornecer
contribuições para os alfabetizadores em relação a procedimentos de ensino e
recursos que podem ser úteis para a aprendizagem simultânea da leitura e da
escrita.
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O conceito de alfabetização, no Brasil, modificou-se com o passar do tempo,


considerando o processo de complexificação das relações sociais estabelecidas
entre os indivíduos (SOARES, 2008). Até a década de 1940, era considerado
alfabetizado o sujeito que soubesse assinar o próprio nome, pois essa era a
competência básica exigida pela sociedade no momento em questão (SOARES,
2010). A partir de 1940, para ser considerada alfabetizada, a pessoa deveria
conseguir escrever e ler bilhetes simples, pois, tal tempo histórico exigia a referida
habilidade relacionada aos atos de ler e de escrever (SOARES, 2010).

Entretanto, já na década de 1950, o estudioso Paulo Freire sinalizava que a


alfabetização apresentava um cunho mais social e revolucionário, ou seja,
diretamente relacionado à mudança da sociedade na qual as pessoas estavam
inseridas. Para que todos os sujeitos pudessem exercer a cidadania, era
fundamental que conseguissem compreender a leitura de diferentes tipos de
documentos e que se expressassem livremente por meio da língua escrita
(SOARES, 2008).

Segundo outra pesquisadora que aborda o conceito de alfabetização, Emilia


Ferreiro, a escrita não consiste em uma simples codificação de fonemas e a leitura
não se resume a decodificação de grafemas. Se as habilidades de codificar e de
decodificar fossem suficientes para que a criança aprendesse a ler e a escrever,
todos os alfabetizandos que não apresentam problemas relacionados à visão e à
audição aprenderiam a ler e a escrever com notável facilidade. Entretanto, de acordo
com essa autora, a criança, para conseguir obter sucesso no processo de
alfabetização, precisa compreender os processos de leitura e de escrita. Não se
trata de o aluno criar um novo código ou uma nova lógica relacionada aos atos de ler
e de escrever, mas de ter a oportunidade de vivenciar os passos da invenção da
escrita, assim como fizeram nossos ancestrais.

Para que os alfabetizandos possam compreender o funcionamento da escrita,


é fundamental que os professores alfabetizadores valorizem os conhecimentos
prévios dos discentes acerca de tal objeto de conhecimento e, também, que
realizem as intervenções adequadas sempre que necessário. Cabe salientar que os
alfabetizadores devem ter muito cuidado durante o processo de intervenção para
que nenhum tipo de bloqueio seja desenvolvido pelas crianças. É preciso que os
erros construtivos acerca da leitura e da escrita sejam interpretados pelos docentes
e compreendidos como um produto natural do processo de complexificação dos
conhecimentos dos alfabetizandos.

Mas, será que o fato de a criança saber ler e escrever garante que ela utilize
tais conhecimentos na vida real, ou seja, fora da escola? Para Soares, a resposta ao
referido questionamento é “não”. Por isso, na segunda metade da década de 1980,
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surgiu o termo “letramento”, o qual se refere ao uso da escrita e da leitura para


diversas situações cotidianas. Há autores que afirmam ser mais adequado o uso da
expressão “letramentos”. Outros se referem ao letramento considerando apenas a
dimensão individual. Todavia, estudiosos como, Paulo Freire, compartilham a
concepção relacionada à dimensão social de letramento, ou seja, ao uso da leitura e
da escrita para modificar a sociedade na qual o sujeito está inserido.

Para poder modificar a realidade na qual vivem, os indivíduos precisam estar


alfabetizados. Durante muito tempo, houve discussões relacionadas à melhor
maneira de ensinar as crianças a ler e a escrever. Os alfabetizadores buscavam
encontrar o melhor método de alfabetização, dentre os quais cabem destacar o
sintético, o analítico e o misto. Entretanto, na querela dos métodos, os
alfabetizadores eram o foco, pois eles decidiam como as crianças deveriam
aprender, qual ordem de apresentação das letras ou dos sons seria mais fácil para o
entendimento dos alfabetizandos, ou, ainda, que tipo de textos seriam mais
facilmente compreendidos pelos pequenos.

Foi então que, no final da década de 1970, surgiram os estudos realizados


por Emilia Ferreiro em relação aos níveis de escrita, os quais deslocaram o foco da
pessoa que ensina para o sujeito que aprende. A pesquisadora divulgou a existência
de diferentes níveis de escrita, os quais têm relação direta com o pensamento da
criança acerca do ato de escrever. A concepção de Oñativia sobre tais níveis vai ao
encontro da proposta de Emilia Ferreiro. Entretanto, Oñativia utiliza nomenclaturas
um pouco diferentes para referir-se a cada um dos níveis.

Em suma, para ambas as autoras, há o nível de escrita em que a criança não


relaciona a fala à escrita, o qual é denominado pré-silábico. Na fase inicial desse
nível, o alfabetizando pode utilizar apenas desenhos para registrar a escrita. Outras
crianças, que apresentam conhecimentos mais avançados, podem utilizar letras
para escrever, embora tais caracteres não correspondam necessariamente à escrita
convencional da palavra representada. Os alfabetizandos podem utilizar tantas letras
quantas forem necessárias para preencher todo o espaço disponível na folha.
Entretanto, outro pensamento também pode ser empreendido: relacionar o número
de letras necessárias para escrever uma palavra com as características do objeto a
ser representado por meio da escrita. Outra possibilidade consiste na fixação de um
número de letras para escrever, variando, normalmente entre quatro e cinco letras. A
partir de tal pensamento, o alfabetizando pode escrever todas as palavras utilizando
as mesmas letras, na mesma ordem, ou variar a ordem das letras para representar
cada vocábulo.

O nível seguinte, denominado silábico, marca um grande avanço nas


hipóteses de escrita elaboradas pela criança, pois, nesse nível, o alfabetizando
relaciona a fala à escrita das palavras. Cada sílaba dos vocábulos é representada
por um caractere, seja este uma bolinha, um risquinho, um número ou uma letra,
dependendo do raciocínio empreendido pela criança. O alfabetizando pode utilizar
86

apenas letras para escrever, mas o valor sonoro dessas letras pode não estar de
acordo com o som das sílabas das palavras a serem escritas. Nesse caso, o nível de
escrita da criança é classificado como silábico sem valor sonoro. Entretanto, a
criança pode estar no nível silábico, considerando o valor sonoro. Isso significa que
cada letra escrita pelo alfabetizando estará relacionada ao som de cada uma das
sílabas que compõem a palavra.

O nível silábico-alfabético, por sua vez, é caracterizado pela representação de


mais de uma letra para cada sílaba das palavras, considerando o valor sonoro dos
grafemas. Por fim, o nível alfabético é aquele em que a criança consegue
estabelecer correspondência entre todos os fonemas pronunciados e as letras
escritas.

Contudo, o processo de escrita não é o único envolvido na alfabetização.


Além de aprender a escrever, as crianças precisam construir e complexificar os
conhecimentos relacionados à leitura. O processo de leitura é um ato complexo que,
assim como a escrita, exige uma série de reflexões por parte dos alfabetizandos.
Quando as crianças estão em um estágio inicial de leitura e deparam-se com um
texto, não é indicado que o professor exija que o alfabetizando decifre palavra por
palavra, frase por frase do material escrito para que o significado possa ser
compreendido. Tal procedimento não é indicado, inclusive, pelo fato de que o
alfabetizando, em estágio inicial de leitura, provavelmente, não conseguirá decifrar o
texto inteiro e, tampouco, construir o significado constante de tal material escrito.

Mas, então, como trabalhar a leitura de textos com leitores iniciantes? É


imprescindível que o alfabetizador permita que as crianças elaborem hipóteses
acerca do material escrito a ser analisado. Em um primeiro momento, o docente
deve instigar os alfabetizandos a coletar indícios relacionados ao tipo de portador de
texto a ser lido. Nesse momento, os educandos poderão analisar se o material
contém gravuras, quais são os possíveis significados dessas ilustrações, se o texto
está escrito da esquerda para a direita, em linhas ou em colunas, se o material
apresenta apenas letras ou também números, o que tais números poderiam
significar, dentre outras inferências.

Tais hipóteses elaboradas pelos discentes devem ser compartilhadas com o


grupo de alunos e com o professor da turma. Em seguida, é desejável que os
alfabetizandos identifiquem algumas palavras no texto. Tal processo pode ocorrer
com o apoio de materiais presentes no ambiente alfabetizador e, sempre que
necessário, com a intervenção do educador. É imprescindível que os alunos
justifiquem suas hipóteses acerca do significado das palavras constantes do texto
para que possa haver um conflito cognitivo entre os educandos da turma. Decifradas
as principais palavras constantes do material escrito, é desejável que os alunos
sejam instigados a compreender o sentido geral do texto e que, em seguida, o
alfabetizador o leia para os alunos.
87

Cabe salientar, ainda, sobre a leitura, que as crianças devem aprender a ler a
partir materiais escritos significativos, ou seja, portadores de texto que estejam
presentes não apenas na escola, mas, também, no cotidiano dos pequenos fora da
instituição escolar. Essa é a grande diferença entre a estratégia de leitura baseada
na inferência para a compreensão do significado e a decifração. Na decifração,
muitas vezes, os materiais escolhidos pelos alfabetizadores são aqueles
considerados mais fáceis de ler por apresentarem palavras formadas por sílabas
simples como, por exemplo, o padrão consoante/vogal. Entretanto, em geral, tais
textos não são interessantes, pois não apresentam significado real para as crianças.
Os materiais escritos que os alfabetizandos visualizam na rua são formados por
palavras compostas por sílabas simples e complexas. Então, por que não utilizar tais
textos nas aulas? A escola e, mais especificamente, os alfabetizadores, precisam
valorizar não apenas os conhecimentos prévios das crianças, mas, também, o
mundo no qual estão inseridas, que está muito além dos muros da instituição escolar
(JOLIBERT, 1994).

Sendo assim, é fundamental que o docente planeje as aulas e elabore os


planos de aula considerando o perfil dos alunos no que se refere à cognição e às
características sociais e culturais dessas crianças. Tal organização das aulas evitará
que o trabalho pedagógico corra o risco de ser repetitivo e desinteressante para os
alfabetizandos. Além disso, ao planejar as aulas, o alfabetizador deve observar os
objetivos a serem atingidos, os conteúdos a serem estudados, as estratégias de
ensino e os recursos mais apropriados para o contexto e realizar uma avaliação que
contemple as metas almejadas (HAIDT, 2004).

A fim de motivar os alfabetizandos durante as aulas e despertar seu interesse,


podem realizar-se aulas lúdicas. A ludicidade está presente em vários tipos de
brincadeiras. Entretanto, nem todos os professores têm clareza em relação às
intervenções a serem realizadas durante a atividade (CURTIS, 2006). Cabe aos
alfabetizadores disponibilizar aos discentes materiais pedagógicos interessantes, os
quais contemplem a possibilidade de atingir os objetivos desejados; observar cada
um dos alunos enquanto brincam a fim de coletar informações sobre o
desenvolvimento cognitivo das crianças; brincar com os educandos, quando for
convidado a participar da brincadeira; e realizar intervenções que instiguem os
alunos a continuar a atividade lúdica, considerando novos elementos (ANNING,
2006).

Mas, uma aula é lúdica apenas se propuser brincadeiras aos alfabetizandos?


Não, pois uma aula lúdica é aquela em que o professor aprende com seus alunos e
aquela em que os educandos aprendem com o docente e com os colegas. Toda a
aula em que os discentes demonstram curiosidade e satisfação ao aprender pode
ser considerada lúdica (FORTUNA, 2000).

E, afinal, o fato de planejar aulas lúdicas garante a aprendizagem simultânea


da leitura e da escrita por parte dos alfabetizandos? Aqui, cabe destacar que a
88

aprendizagem simultânea da leitura e da escrita pode ser possibilitada se o


alfabetizador considerar os aspectos relacionados à construção da escrita por parte
dos educandos, à aprendizagem da leitura, à importância do planejamento de aulas
lúdicas e à organização do tempo das atividades, de modo que os atos de ler e de
escrever sejam igualmente contemplados. Entretanto, não é possível afirmar que
todos os alfabetizandos desenvolverão, paralelamente, as habilidades e as
competências necessárias para a aprendizagem da leitura e da escrita.

Faz-se necessário lembrar que cada aluno é único e, por ser único,
apresenta características próprias em relação aos aspectos cognitivo, emocional,
social, físico e cultural. O que nós, alfabetizadores, podemos fazer é possibilitar as
melhores condições de alfabetização para as crianças, considerando todos os
aspectos mencionados no presente trabalho e buscar, constantemente, possíveis
soluções para os desafios com os quais nos depararmos durante nossa caminhada
enquanto docentes.
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REFERÊNCIAS

ABBOTT, Lesley. “Brincar é bom!” Desenvolvendo o brincar em escolas e salas de


aula. In: MOYLES, Janet R. A excelência do brincar. Porto Alegre: Artmed,
2006. cap. 6, p. 94-107.

ANNING, Angela.O brincar e o currículo oficial. De volta ao básico: uma visão


alternativa. In: MOYLES, Janet R. A excelência do brincar. Porto Alegre:
Artmed, 2006. cap. 5, p. 83-93.

CURTIS, Audrey. O brincar em diferentes culturas e em diferentes infâncias. In:


MOYLES, Janet R. A excelência do brincar. Porto Alegre: Artmed, 2006. cap.
2, p. 39-49.

FERREIRO, Emilia. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo: Cortez, 2011.

_____. Com todas as letras. São Paulo: Cortez, 2010.

FORTUNA, Tânia Ramos. 2000. Sala de aula é lugar de brincar?. Disponível em:
http://brincarbrincando.pbworks.com/f/texto_sala_de_aula.pdf. Acesso em: 31
out. 2013.

HAIDT, Regina Célia Cazaux. Escolha dos procedimentos de ensino e organização


das experiências de aprendizagem. In: HAIDT, Regina Célia Cazaux. Curso de
Didática Geral. 8. ed. São Paulo: Ática, p. 143-153, 2006.

_____. O planejamento e a ação didática. In:_______. Curso de Didática Geral. 7.


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HALL, Nigel. O brincar, o letramento e o papel do professor. In: MOYLES, Janet R. A


excelência do brincar. Porto Alegre: Artmed, 2006. cap. 9, p. 135-147.

HEASLIP, Peter. Fazendo com que o brincar funcione na sala de aula. In: MOYLES,
Janet R. A excelência do brincar. Porto Alegre: Artmed, 2006. cap. 8, p. 121-
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JOLIBERT, Josette. Formando crianças leitoras. Porto Alegre: Artes Médicas,


1994.

MOYLES, Janet R. Introdução. In:______. A excelência do brincar. Porto Alegre:


Artmed, 2006. p. 11-21.

OÑATIVIA, Ana Cecília. Alfabetização em três propostas: da teoria à prática. São


Paulo: Ática, 2009.

PILETTI, Claudino. Recursos de Ensino. In:______. Didática Geral. 24. ed. São
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90

______. Planejamento de ensino. In:______. Didática Geral. 23. ed. São Paulo:
Ática, p. 60-75, 2006.

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do brincar. Porto Alegre: Artmed, 2006. cap. 1, p. 25-38.

SOARES, Magda. As muitas facetas da alfabetização. In: ____ . Alfabetização e


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______. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.

______. Paulo Freire e a alfabetização: muito além de um método. In: SOARES,


Magda. Alfabetização e Letramento, São Paulo: Contexto, p. 117-123, 2008.

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