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Siepierski e Gil, Religião no Brasil

0 ESTUDO DA HISTÓRIA
DAS RELIGIÕES NO MUNDO:
Notas em celebração da afiliação da Associação Brasileira
de História das Religiões (ABHR) à International Association
for the History of Religions (IAHR)

Armin W. Geertz
Para mim é um prazer especial trazer à nossa nova afiliada brasilei­
ra as saudações da IAHR, na qual tenho a honra de atuar como secretário-
geral. A ABHR foi formalmente afiliada durante o Congresso Mundial da
IAHR em Durban, África do Sul, em agosto de 2000 e é agora a primeira
afiliada nacional da IAHR na América do Sul. No contexto latino-americano
mais amplo, temos duas afiliadas nacionais: a associação mexicana (Dra_.
Yolotl González Torres, presidente) e a associação cubana (Dr. Jorge Ramírez
Calzadilla, presidente), e uma afiliada regional: a associação latino-ameri-
cana (Dr. Elio Masferrer Kan, presidente).
A IAHR é um corpo mundial de sociedades nacionais para o estudo
da religião e é membro do Conseil International de la Philosophie et des
Sciences Humaines/The International Council for Philosophy and Humanistic
Studies (CIPSH), sob os auspícios da Unesco. A IAHR foi fundada em 1950,
durante o sétimo congresso internacional de história das religiões em Ams­
terdã. Seu objetivo é a promoção do estudo acadêmico da história das reli­
giões por meio da colaboração internacional de todos os eruditos cuja pes­
quisa se relaciona com o tema.
Durante o recente congresso em Durban, África do Sul (2000), a
IAHR aumentou para 38 associações nacionais e regionais, e muitas outras
aguardam por reconhecimento. A IAHR realiza congressos mundiais inter­
nacionais a cada cinco anos; durante esse período, também patrocina con­
ferências regionais e conferências especiais e prossegue com a tradição de
realizar seus congressos e conferências, sempre que possível, nas mais
diferentes partes do mundo, a fim de encorajar o intercâmbio cultural e
promover ao máximo as afiliadas da IAHR.
Temos trabalhado arduamente para promover a IAHR e desenvolver
afiliadas nas diversas partes do mundo. De 1990 a 1995, concentramo-nos
na América Latina e, em 1995, realizou-se o Congresso Mundial da IAHR na
Cidade do México. De 1995 a 2000, voltamos nossas atenções para a Áfri-
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ARMIN W. GEERTZ

ca, e, ao final do período, realizou-se o Congresso Mundial da 1AHR em


Durban, África do Sul. Durante estes próximos anos, até 2005, concen-
traremo-nos na Ásia, e o próximo Congresso Mundial d.a IAHR será em Tó­
quio, no Japão*.
A história e o estudo1 da religião em uma
perspectiva Global
O famoso historiador das religiões, Kurt Rudolph, certa vez escreveu na
quarta conferência de sua obra intitulada Historical fundamentais and the study
ofrellgions [Fundamentos históricos e o estudo das religiões] (1985):
Somente graças às luzes orientadoras e à maioria esmagadora dos membros da
International Association for the History of Religions, os mais recentes congressos
mundiais desse corpo não ocorreram segundo o modelo de congressos de religião esta­
belecido pelo Parlamento realizado em Chicago em 1893. Se a história das religiões
almeja preservar seu espírito e incrementar sua autonomia, ela deve não apenas
elaborar as peculiaridades de seus métodos, como também reativar sua função críti-
co-religiosa. ou melhor, sua função ideológica.
Essa citação resume o perfil característico da IAHR multo bem. De
fato, a maioria dos membros da IAHR está comprometida com um esforço
comum centrado na recusa em confundir a religião com seu estudo acadê­
mico, não obstante as formas e os meios de contribuir com tal esforço se­
rem tema de contínuo debate e discordância. Ademais, esse debate está
intimamente entretecido com a problemática da identidade e autonomia do
estudo acadêmico, não confessional, da religião. É sintomático da IAHR que
seu Congresso no México tenha atuado simultaneamente como fórum para
ensaios teóricos sofisticados e como palco para um debate altamente apai­
xonado sobre o nome da organização, debate este que se manteve basica­
mente na linha divisória entre abordagens históricas, por um lado, e abor­
dagens sociais — teóricas e científicas —, por outro.
O ideal certamente seria uma combinação desses dois tipos de abor­
dagens. No espírito desta conferência em Recife, este ensaio buscará expli­
car a tensão inerente a esse debate e, ao mesmo tempo, servir como uma
resenha dos temas atuais no estudo acadêmico da religião.
* Para mais informações, favor visitar nosso webslte: http^/www.iahr.dk
' A primeira parte deste ensaio é uma versão editada de um artigo que escrevi com Russell McCutcheon
na Introdução de nosso livro. Perspectives on method and theory In the study of religion: Adjunct
proceedings of the XVII"1 Congress of the International Association for the History of Religions. Mexico
City. 1995 (Leiden. E. J. Brill. 2000). 0 título da Introdução é "The role of method and theory in
the IAHR" (pp. 3-37). Agradeço à editora a permissão de reimprimir partes daquela introdução.

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0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

Características do estudo da religião


0 estudo acadêmico da religião pode ser caracterizado da seguinte
maneira: a) é um campo de estudo composto; b) está fundamentado em um
pluralismo metodológico; c) é influenciado por especializações e tradições
culturais e institucionais locais; d) está enredado em uma teia de tensões
epistemológicas. A seguir, falarei um pouco sobre metodologia, tradições
locais e algumas das tensões.
Pluralismo metodológico
Religionswissenschaft, ou a ciência comparativa da religião, desde o
seu início tem sido caracterizada por um pluralismo metodológico. No estu­
do da religião, os eruditos utilizam métodos históricos, arqueológicos,
lingüísticos, textuais (filológicos, estruturais e semióticos), filosóficos, socio­
lógicos, psicológicos, etnográficos, antropológicos e da história da arte. Esses
métodos foram desenvolvidos por disciplinas separadas e não constituem o
que é específico do estudo comparativo da religião. Talvez a identidade da
Religionswissenschaft possa ser mais bem formulada se vista como o inte­
resse fundamental no estudo crítico e comparativo da religião como um
fenômeno global em suas expressões históricas e contemporâneas. Esse
interesse necessariamente vincula os estudiosos da religião às questões
teóricas centrais que a religião levanta, mais especificamente suas ori­
gens, causas, estruturas, formas, funções e também seus significados.2
Especializações e tradições culturais e institucionais locais
Durante uma conferência da IAHR sobre metodologia, promovida, em
1973, pela Sociedade Finlandesa para o Estudo Comparativo da Religião em
Turku (Finlândia), o anfitrião, Lauri Honko, proferiu a seguinte idéia:
... a pesquisa sobre as religiões tem sofrido uma marcante divisão em escolas diver­
gentes, em parte por causa da metodologia e em parte por causa da área de cultura
e língua. Na prática, é extremamente raro para essas escolas se defrontarem umas
com as outras. A ausência de um corpo comum de teoria tem permitido aos estudio­
sos da religião efetuar suas pesquisas sob uma variedade de orientações, e.g., histó­
ricas, fenomenológicas, filológicas, psicológicas, sociológicas, antropológicas e
etnológicas, sem qualquer necessidade bastante concreta de manter contato ou coo­
perarem entre si. Por um lado, o fato de a religião comparativa estar distribuída nas
diferentes faculdades das humanidades, na teologia, ou nas ciências sociais e, por
outro, a persistência de escolas de pesquisa nacional ou culturalmente limitadas tem
contribuído para a emergência de ambientes de pesquisa largamente contrastantes.
2 Ver: Lawson. E. Thomas. Fundamental problems in the world-wide pursuit of the study of religlon. In: Pye,
Michael (ed.). Merburg revlsited: Instltuttons and slrategies in the study otreliglon. Marburg, dlagonal-
Verlag, 1989. pp. 19-25.

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Nesses ambientes, a natureza e o desenvolvimento da religião comparativa vêm sen­


do muito mais poderosamente influenciados por objetivos para ensino e pesquisa
localmente definidos do que se admite abertamente.3
O interessante sobre essa reclamação é que ela tem sido freqüente
ao longo da história do estudo acadêmico da religião. Reconhecendo a críti­
ca à confusão de terminologia e à “babel de diversas línguas" feita pelo
canadense Louis H. Jordan no terceiro congresso de história das religiões
em Oxford, em 1908, Eric J. Sharpe escreveu, pouco depois do 13a con­
gresso da IAHR em Lancaster, em 1975:
Ninguém consegue escapar, ao ler um pouco do material de 1908, de um certo senti­
mento de que a discussão está longe de ser irrelevante para a situação de meados da
década de 1970. É verdade que nossa terminologia mudou sobremaneira, mas ainda
existe um certo grau de anarquia nela. E, no geral, não ajuda em nada perguntar se
as questões diante de nós são tão essencialmente diferentes daquelas de 67 anos
atrás... parece que vivemos em uma atmosfera de diversidade metodológica que mui­
to facilmente se torna confusão metodológica.4
Um barômetro para essa situação pode ser visto nos nomes escolhi­
dos para a disciplina.5 É a palavra alemã Religionswissenschaft que está
por trás da expressão britânica Science ofReligion [Ciência da Religião], ao
passo que “ciência da religião", nos Estados Unidos, é sinônimo de sociolo­
gia da religião. Portanto, os norte-americanos utilizam a palavra alemã
Religionswissenschaft, que também tem sido traduzida nos Estados Unidos
como Study ofReligion [Estudo da Religião] — mas não Religious Studies
[Estudos Religiosos], que é a abordagem mais teológica. Na Inglaterra, en­
contramos o termo Comparative Religion [Religião Comparada], que se en­
caixa bem no pluralismo britânico, mas, nos Estados Unidos, “religião com­
parada”, conforme foi praticada por Mircea Eliade, é denominada History
ofReligions [História das Religiões], ainda que nenhum departamento nas
universidades receba esse nome. Na Europa, o termo History ofReligions &
termos equivalentes em francês, alemão, italiano e nas línguas escandinavas
são utilizados para o estudo mais amplo da religião, ainda que ele não tenha
de fato integrado as ciências sociais. No Canadá, "história das religiões” é
considerado um termo muito limitado, daí a preferência por Study ofReligion.
Na América Latina, o termo escolhido parece ser Estúdio de las Religiones
[Estudo das Religiões]— e agora estou vendo que no Brasil prefere-se
:l Honko. L. (ed.).Science of religion: studies In methodology. Proceedings of the study Conference of the
International Association tor the History of Religions, held in Turku. Finland. August 27-31. 1973. The
Hague, Mouton Publishers. 1979. xvi-xvli.
, Eric J. (ed.). Religion. A journal of religion and religions. 1975. Iv.
Sharpe.
5 Ver o artigo esclarecedor de Reinhard Pummer, Rellglonswlssenschaftor Reilglology? Numen. International
Review for the History of Religions 19: 91-127.1972.

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0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

“História das Religiões". Já nos países asiáticos, não há preocupação com


termo algum. Os colegas da índia, Coréia, Japão e China ficaram surpresos
diante do caloroso debate que ocorreu no congresso do México.
Em 1900, “História das Religiões” foi o termo utilizado como título
para o congresso mundial em Paris e, em 1950, tornou-se o título da pri­
meira associação internacional de estudiosos de história das religiões. O
que está mais em jogo do que o nome é a identidade do tema, mas sua
identidade depende sobremaneira das tradições locais.6 Alguns exemplos
aleatórios dessa situação serão suficientes.

“ Para detalhes sobre as histórias dos tópicos em diversos países, ver: Religious studies in public universities,
ed. por Milton D. McLean (Carbondale: Southern Illinois University Press, 19671: Claude Welch. Graduate
education in religion: A critical appraisal (Missoula. University of Montana Press. 1971): The history of
religion: An international survey, edição especial de Religion. A lournal of religion and religions, 1975 (com
artigos sobre a história das religiões na Inglaterra, Sul da Ásia, Escandinávia. Europa. Japão, EUA. Austrá­
lia e Nova Zelândia. África e Israel): Jacques Waardenburg, Religionswissenschaft ln Continental Europe,.
Excluding Scandinavia. Some Factual Data, Numen. International Review for the History of Religions 23:
219-238,1976: Jacques Waardenburg. Religionswissenschaft New Style. Some Thoughts and Afterthoughts,
The Annual Review of the Social Sciences of Religion 2: 189-220.1978: J. Prytz Johansen. Religionshistorie
(Kobenhavns Universltet 1479-1979. bd. XI). Copenhagen, 1979: Joseph M. Kitagawa, Humanistic and
theological history of religions, with special reference to the North American Scene, Numen 27: 198-221,
1980: Jacques Waardenburg. Religionswissenschaft sell 1970. Eine Auswahl. VerkBndlgung undForschung
26: 2-43,1981-, Marburg revisited: Institutions and strategies In the study of religion, edited by Michael
Pye (Marburg. diagonal-Verlag, 1989, com artigos sobre a situação na Itália, Israel. Polônia, Quebec, Ale­
manha, África, China e países islâmicos): Turning points in religious studies: essays In honour of Geoffrey
Parrinder, editado por Ursula King (Edinburgh, T &T Clark, 1990): Michael Pye, Religious studies in Europe:
Structures and desiderata, in: Religious studies: Issues, prospects and proposals, editado por Klaus K.
Klostermaier & Larry W. Hurtado (Manitoba. University of Manitoba. 1991. p. 39-55); La tradition francaise
en sciences religieuses. Pages d’histolre, editado por Michel Despland, Quebec, Université Laval. 1991:
Ray L. Hart. Religious and theological studies in American higher education. Journal of the American
Academy of Religion 69: 715-827,1991; Robert S. Shepard. God's people in the ivory tower: Religion In the
early American un/Vers/iylNewYork: Carlson Publishing. 1991): Religious studies, theological studies, and
the university divinity school, ed. por Joseph Kitagawa (Atlanta. Scholars Press. 1992): The secularization
of the academy, ed. por G. M. Marsden, org. por B. J. Longfield (Oxford. Oxford University Press. 1992):
Vittorio Lanternari, La parole des exclus de l'histoire. Débuls de l'anthropoiogie religieuse en ltalie, Ethnologle
francaise 25: 497-513, 1994: Peter Antes, Approcheset traditions dans l'histoire des religions en Europe
continentale, in: The notion of "religion"in comparative research, ed. por Ugo Blanchi (Rome. "L'Erma" dl
Bretschneider. 1994. 641-644): Armin W. Geertz, Religionshistorlens religlonsvldenskabelige profit:
tiltrasdeisesforelassning (Aarhus, Institut for Religlonsvidenskab. 1995): Jacques Waardenburg. Profiles
and International developments In the scholarly study of religion (Forschungspolltlsche Frilherkennung
155) Berne: Schwelzerlschen Adakemie der Gelstes- und Sozialwissenschaften. 1995: Gary Lease edltou
uma edição especial de Method & Theory In the Study of Religion 7 (4): 1995 intitulada Pathologies In the
academic study of religion: North American Institutional case studies, sobre a situação institucional na
University of California Santa Cruz, the University of Pennsylvania. Arizona State University nos EUA e
University of Lethbridge. University of Alberta and University oflbronto no Canadá: uma edição recente da
mesma revista 10 (4): 1998 contém artigos sobre a situação institucional na Holanda, Polônia e Itália, e o
próximo número trará artigos sobre a República Tcheca e Noruega: e Donald Wlebe. Against science In the
academic study of religion: On the emergence and development of the AAR. in: Perry Festschrift, editado
por George Bond e Thomas Ryba, no prelo.

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Na Inglaterra, a demanda inicial por especialistas nas línguas e cul­


turas exóticas das colônias foi substituída depois da Segunda Guerra Mun­
dial pela necessidade do diálogo e compreensão inter-religiosos. Os diver­
sos textos introdutórios e generalizantes escritos por historiadores das
religiões, como o falecido Ninian Smart, comprovam essa mudança de inte­
resse. Na antiga Europa Oriental — especialmente na Alemanha Oriental e
na União Soviética — a história das religiões aliou-se com o ateísmo cien­
tífico, uma versão ideológica do estudo da religião que desempenhou um
papel na perseguição das Igrejas ortodoxa e romana. Depois que o muro
caiu, muitos de nossos colegas foram acusados de terem trabalhado para a
Stasi, para a KGB ou para outra organização semelhante na Europa Orien­
tal. Por causa disso, lançou-se uma nuvem sobre a produção acadêmica
passada, ainda que boa parte dela fosse trabalho histórico sólido, apesar
de bastante poluído pelos prelúdios e poslúdios marxistas obrigatórios. Esses
colegas cederam o lugar para uma nova geração de jovens acadêmicos não
influenciados pelo passado comunista, o que proporcionou certo rejuvenes­
cimento à produção acadêmica, mas também esforços por parte das igrejas
visando fechar departamentos de estudo da religião. A situação piorou ain­
da mais com os assaltos missionários praticados por centenas de organiza­
ções religiosas ocidentais à medida que fortaleceram a posição política da
teologia cristã e das igrejas por meio de sua resistência a tais assaltos. A
Hungria foi uma exceção, pois aí seu presidente sugeriu, em 1993, em um
congresso de sociólogos da religião, que eles poderiam ajudar a solucionar
os conflitos ideológicos, sociais e étnicos neste país.
Com exceção da Finlândia, a história das religiões nos países escan­
dinavos tem apresentado uma abordagem primariamente histórica e filo­
lógica. Em parte, isso se deve ao fato de que a Suécia foi um dos três prin­
cipais centros do movimento positivista no final do século XIX.7 A religião
comparativa finlandesa é singular no cenário escandinavo porque ela tam­
bém inclui estudos folclóricos e tem demonstrado um interesse especial
pelas questões teóricas e metodológicas. A revista escandinava Temenos.
Studies in Com para tive Religion Presented byScholars in Denmark, Finland,
Norway and Sweden [Temenos. Estudos em Religião Comparada Apresen­
tados por Acadêmicos na Dinamarca, Finlândia, Noruega e Suécia], publicada
na Finlândia e agora em seu 34a ano, contém muitos artigos sobre questões
teóricas e metodológicas.
1 Os centros eram Viena, Cambridge e Uppsala. Cf. Capps, W. H. Geo wldengren on syncretism: On parsing
uppsala methological tendencies. Nutnen. International Review for the History of Religions 20:163-185.
1973.

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0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

O estudo da religião nos Estados Unidos possui uma história com­


plexa. Uma das razões para isso é que a Primeira Emenda da Constituição
dos Estados Unidos proíbe o Estado de apoiar e/ou suprimir a religião.
Portanto, a teologia e o estudo confessional da religião realizados em institui­
ções particulares não podem ser praticados em instituições públicas. En­
tretanto, ainda assim a abordagem confessional predomina nos estudos reli­
giosos por todos os Estados Unidos, e o conflito entre abordagens
confessionais e não confessionais tem sido cada vez mais o foco de conflitos
organizacionais entre a American Academy of Religion [Academia Ameri­
cana de Religião] e a afiliada da IAHR, a North American Association for the
Study of Religion [Associação Norte-Americana para o Estudo da Religião],
O conceito “religião” e a história científica das religiões, por serem
invenções ocidentais, têm uma história curta na Ásia. Os países asiáticos
possuem, obviamente, longas tradições em pesquisa histórica e, nessas tradi­
ções, estudos das religiões asiáticas. Após o advento do marxismo na Chi­
na, o estudo da religião praticado no Instituto para o Estudo das Religiões
Mundiais, fundado em 1964 segundo orientação pessoal de Mao Tse-tung,
buscava criticar a religião e promover o ateísmo. É desnecessário dizer que
o tema é politicamente sensível. Nos países asiáticos não marxistas, o es­
tudo da religião tem vínculos mais íntimos com organizações religiosas. Na
índia, há um relacionamento íntimo entre o estudo da religião e os departa­
mentos de filosofia e antropologia.
Portanto, o estudo da religião é altamente influenciado por forças
culturais, políticas e religiosas, e é também determinado por interesses
nacionais que influenciam as condições econômicas e políticas de departa­
mentos e institutos. Dessa forma, pode-se dizer que os estudos britânicos
destacam-se nos clássicos e nas religiões orientais e africanas-, os estudos
franceses, nos clássicos e nas religiões africanas; os gregos e italianos, nos
clássicos; os alemães, nos estudos asiáticos e do Oriente Próximo; os ho­
landeses, nos estudos africanos e indonésios; os dinamarqueses e suecos,
nos estudos asiáticos e do Oriente Próximo, enquanto muitos países na
América Latina, na Ásia e na África concentram-se nas religiões locais do­
minantes. Na África e na América Latina está sendo realizado um excelente
trabalho sobre as igrejas autóctones, sobre o pentecostalismo etc. No en­
tanto, as coisas estão mudando em muitos países, à medida que as religiões
mais importantes vão provocando seu impacto. Por exemplo, é muito difícil
encontrar um país hoje que não possua uma cadeira de estudos islâmicos.
Por outro lado, o surgimento de religiões novas e alternativas, embora te­
nha provocado o aumento do estudo por todo o mundo, ainda não conseguiu
estabelecer um número grande de cadeiras.

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Finalmente, interesses pessoais e especializações são extremamen­


te importantes na determinação do estudo da religião. Muitos eruditos têm
dificuldades em se manter atualizados em outras áreas porque estão muito
ocupados aprendendo línguas exóticas e dominando os métodos e teorias
da disciplina principal em seu campo de interesse. Assim, especialistas em
budismo têm de aprender um grande número de línguas orientais, como
também devem conhecer bem as disciplinas orientalistas em diversas tra­
dições em línguas européias. Quem se dedica aos estudos do Oriente Próxi­
mo deve dominar não apenas as línguas semíticas, mas também a história
e as teorias da arqueologia do Oriente Próximo. Os estudiosos das religiões
africanas, além de aprenderem a língua do povo que desejam estudar, tam­
bém precisam investir um tempo significativo no trabalho de campo e, con­
seqüentemente, dominar os métodos e as teorias antropológicas sociais.
Portanto, o estudo comparativo da religião está sempre arriscado a se dis­
solver em disciplinas especializadas.
Tensões eptstemológlcas
Em virtude da natureza composta do estudo da religião, seu pluralismo
metodológico, suas especializações e seus interesses e tradições pessoais,
nacionais e culturais diversificados, há apenas um fórum possível que justifi­
que de forma razoável a autonomia e a raison d'être do estudo acadêmico da
religião, ou seja, um sustentável debate acompanhado de reflexão teórica,
metodológica e comparativa. O problema, no entanto, é que o estudo da reli­
gião está enredado por uma teia de tensão epistemológica, e o debate é freqüen­
temente desviado por disputas fúteis quanto à relação entre fato e teoria.
Durante o primeiro século de sua história, os estudiosos acadêmi­
cos da religião perceberam a si mesmos como historiadores e lingüistas
engajados em estudos dos textos canônicos sagrados das religiões mais
importantes. Assim, tais estudos fundamentavam-se em métodos e aborda­
gens históricos, arqueológicos, filológicos e etnográficos. Após o apogeu do
evolucionismo do século XIX e das grandiosas teorias psicológicas e sociais
das primeiras décadas do século XX, em todas as ciências ocorreu um pro­
fundo ceticismo para com as teorias abstratas e normativas. Os estudiosos
ficaram interessados em desenvolver uma “ciência" que fosse objetiva e
desprovida de juízos de valor e, se teórica, também empírica.
Em 1960, a metodologia tornou-se novamente o foco de interesse no
X Congresso da 1AHR em Marburgo. As atitudes religiosas de muitos dos
colegas asiáticos, que vários europeus tinham experimentado em Tóquio
durante o IX Congresso da 1AHR em 1958, foram motivo para certa preocu-

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0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

pação. O secretário-geral da IAHR naquela época, o estudioso holandês


G. J. Bleeker, utilizou o debate Ocidente/Oriente para formular um progra­
ma metodológico suavemente positivista. Já o erudito israelense J. Zwi
Werblowsky (que mais tarde também viria a ser secretário-geral da IAHR)
introduziu, por sua vez, uma declaração muito mais radical das “pressupo­
sições mínimas básicas” para o estudo da religião no contexto da IAHR , e
que merece ser citada aqui:
"Religião Comparada” é uma disciplina científica bem reconhecida, cuja metodologia
pode ainda estar necessitando bastante de mais elaboração, mas cu|o alvo é claramen­
te uma melhor compreensão da natureza da variedade e individualidade histórica das
religiões, enquanto permanece constantemertte alerta para a possibilidade de genera­
lizações cientificamente legítimas concernentes à natureza e função da religião.
... Religionswissenschatt percebe-se como um ramo das Humanidades. É uma disci­
plina antropológica que estuda o fenômeno religioso como criação, traço e aspecto da
cultura humana. A base comum na qual os estudiosos da religião se encontram é a
percepção de que a consciência do numinoso ou a experiência da transcendência
(onde estas porventura existam nas religiões) são — não obstante o que mais elas
possam ser — fatos empíricos indiscutíveis da história e existência humana, que
devem ser estudados, assim como todos os fatos humanos, pelos métodos apropria­
dos. Portanto, também os sistemas de valor das diversas religiões, formando uma
parte essencial do fenómeno empírico, factual, são objetos legítimos de nossos estu­
dos. Por outro lado, a discussão do valor absoluto da religião fica excluída por defini­
ção, embora possa ter seu lugar legítimo em outras disciplinas completamente inde­
pendentes. tais como a teologia e a filosofia da religião.8
Foi bastante marcante o fato de que muitos dos principais propo­
nentes de uma abordagem religiosa ao estudo da religião apoiaram a decla­
ração de Werblowsky, eruditos como Mircea Eliade, Erwin Ramsdell
Goodenough, Joseph Kitagawa e R. C. Zaehner. No entanto, as minutas do
debate que se seguiu revelam que a declaração suscitou oposição. Muitos
argumentaram que o estudo da religião deveria ser um instrumento na iden­
tificação da verdadeira essência da religião.
Em seu artigo no congresso de Marburgo, Werblowsky reclamou do
fato de que sociólogos e antropólogos estivessem ausentes dos congressos da
IAHR. Ele estava certo na época, e ainda hoje, no sentido de que as contribui­
ções de estudiosos nas ciências sociais são vitais ao estudo acadêmico da
religião. Ele concluiu que tais estudiosos provavelmente não participavam
dos congressos da IAHR porque em tais congressos havia um número exces­
sivo de diletantes, teólogos e idealistas religiosamente motivados.9
“ Schimmel, A. Summary of the Discussion. Numen. Iniemational Revlew for the History ofRelígions 7:
236-237, 1960.
“ Werblowsky. R. J. Zwi. Marburg and After? Numen. International Review for the History ofRelígions 7:
218. 1960.

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' " 'WKMTU'WiUBBKTIi "'

A tensão entre a teologia e o estudo das religiões é bem conhecida


em todas as partes do globo. No entanto, essa tensão também tem existido
no próprio estudo que a religião faz de si mesma, principalmente porque
muitos de seus primeiros estudiosos foram treinados em teologia, mas tam­
bém porque muitos dos estudantes de religião são religiosos. A fenomenologia
da religião tornou-se uma disciplina útil que permitiu aos estudantes da
religião buscarem seus interesses teológicos. Esses fenomenólogos da reli­
gião que exerceram um grande impacto mundial eram, cada um a sua ma­
neira, confessionais. O teólogo alemão Rudolf Otto foi de grande inspiração
para o holandês Gerardus van der Leeuw e para o romeno Mircea Eliade. É
interessante notar que Leeuw foi um dos três fundadores da 1AHR em 1950,
e foi seu presidente até sua morte no fim desse mesmo ano. No entanto,
tentativas para reorientar a fenomenologia da religião em linha com o cres­
cente positivismo do século haviam sido feitas já durante a década de 1940
pelo sueco Geo Widengren e pelo italiano Rafaelle Pettazzoni. Uma vez que
a tais tentativas faltou clareza teórica e terminológica, seus resultados são
apenas de valor parcial no presente.
Nas ciências humanas e sociais, o rompimento com o positivismo
ocorreu durante os meados da década de 1960. As filosofias especulativas
provocaram um grande impacto em diversas áreas: nas ciências do
neomarxismo10 à psicanálise,11 na hermenêutica continental,12 na análise
do discurso,13 no desconstrucionismo,14 na semiótica15 etc. Nossos colegas
em antropologia, tais como Clifford Geertz,16 nos Estados Unidos, e Claude

10 Althusser, L. Pour Marx. Paris. 1965: Althusser, L. & Balibar, E. Lire le capital. Paris. 1968.
11 Lacan, Jacques. Le séminaire de Jacques Lacan. Paris, 1973-1991: Livre h Les écrits techniques de
Prend ( 1953-1954): Livre 2: Le mol dans la théorie de Freud et dans la technique de la psychanalyse
(1954-1955): Livre 3: Les psychoses {1955-1956): Livre 7: L'éthique de la psychanalyse ( 1959-1960);
Livre 8: Le transfert (1960-1961); Livre il: Les quatre concepts fondamentaux de la psychanalyse
(1964); Livre 17: L'envers de la psychanalyse (1969-1970); Livre 20: Encore (1972-1973).
12 Gadamer. Hans-Georg. Wahrheit und Methode. Tübingen, 1960: Kleine Skrlften. Tübingen. 1969: Habermas,
Jürgen. Philosophische Rundschau. Frankfurt, 1967; Erkenntnis und Interesse. Frankfurt. 1968.
11 Foucault, Michel. Histoire de la folle. Paris. 1961 ; Naissance de la clinique. Paris. 1963; Les mots et les
choses. Paris, 1966; org. L’archaeoiogie du savoir. Paris, 1969.
14 Derrida, Jacques. La voix et le phénomèna. Paris, 1967; De la grammatologle. Paris. 1967; L’ecriture et
la différence. Paris, 1967.
15 Greimas. A. J. Sémantique structurale. Paris, Librairie Larousse. 1966.

1(1 Geektc, Clifford. Religion as a cultural system. Anthropological approaches to the study of religion. Banton,

M. (ed. ). London, Tavistock Publications. 1966 p. 1-46: Islam observed: Religious development In Morocco
and Indonesia. New Haven. Yale University Press, 1968. Ver: Geertz, Armin W. Hermeneutics in
ethnography: Lessons for the study of religion. In: Vergleichen und Erstehen in der Religionswissenschaft.
Vorträge der Jahrestagung der DVRG vom 4. bis 6. Oktober 1995 in Bonn. Klimkeit. Hans-Joachim (ed.).
Wiesbaden. Harrassowitz Verlag. 1997. p. 53-70.

22
U EgTUUU UA HI8TOKIA DfflKELKJlOEB RO MUNDO

Lévi-Strauss,'7 na França, avançaram sobremaneira no sentido de repen­


sar os fundamentos de sua ciência.
Esse rompimento maciço não influenciou de forma digna a história
das religiões na Europa até a década de 1970. A já mencionada conferência
da IAHR em Turku, na Finlândia, em 1973, foi uma tentativa de trazer his­
toriadores da religião para o mesmo tipo de reflexão teórica. Esperava-se
que tal tentativa salvaria a disciplina de sua naiveté teórica e encorajaria a
cooperação interdisciplinar. Outros temas abordados foram a questão da
relevância da pesquisa para a sociedade, problemas com o desenvolvimen­
to global e, significativamente, a crescente insatisfação com a ciência oci­
dental expressa por intelectuais das ex-colônias. O objetivo da conferência
era identificar um possível consenso metodológico e teórico e mapear li­
nhas de desenvolvimento para a ciência da religião. O resultado, porém, foi
uma confusão teórica e metodológica. Muitos dos participantes estavam
conscientes para o fato de que não há uma metateoria no estudo da reli­
gião. Podia-se dizer que a história das religiões havia desenvolvido “teorias
de médio alcance”, mas tais teorias eram incompatíveis, em virtude de in­
congruências metodológicas no nível mais abaixo na hierarquia de procedi­
mentos, ou seja, o relativo aos modos de classificação dos dados. Muitos
participantes sentiram que a transformação dos dados na história das reli­
giões estava metodologicamente subordinada até mesmo às pesquisas de
campo sociológicas e psicológicas mais positivistas, pois estas são desen­
volvidas conscientemente em uma relação dialética entre dados e teorias
de médio alcance. Os historiadores das religiões estavam freqüentemente
presos aos caprichos de seus dados e constantemente forçados a revisa­
rem a esmo suas hipóteses e teorias, e sem direção aparente. Alguns dos
participantes sentiram que aí estava seu vigor. Sua determinação, por ou­
tro lado, em simplesmente ignorar a articulação teórica, deixou-lhes
desprotegidos diante da influência de seus companheiros e de suas própri­
as pressuposições não articuladas. Durante toda a conferência houve uma
tensão distinta entre historiadores da religião orientados para textos e aque­
les interessados nas ciências sociais.
Os altos objetivos da conferência não foram alcançados, e ela termi­
nou numa nota claramente conservadora. O interesse em grandes teorias
foi rejeitado tipicamente por aqueles que enfatizavam a singularidade his­
tórica de seus dados, por aqueles que encontravam um ou dois exemplos
17 Lévi-Strauss. Claude. Le totémisme au/ourd'hul. Paris, PUF, 1962; La pensée sauvage. Paris. Pion 1962;
Le cru et le cuit. Paris: Pion 1964; Du miel aux cendres. Paris: Pion 1966: L'orlglne des manières des
tables. Paris, Pion. 1968: L'homme nu. Paris. Pion. 1971.

23
ARM1N W. GEERTZ

que supostamente “refutavam" tais teorias e por aqueles que afirmavam


obstinadamente a indução como um programa científico viável.18 No entan­
to, Honko conclui que:
Não obstante, nem o particularismo histórico nem o hermenêutico são adequados
para o estudo das religiões; além deles, devemos còntinuar a necessitar de categori­
as universais flexíveis [...] para que seja possível fazer a transferência de resultados
de uma investigação para outra.10
Durante o congresso da IAHR em Lancaster, em 1975, as coisas
foram focalizadas de forma metodológica. Conforme observado, Sharpe re­
clamou da confusão e concluiu que o congresso de Lancaster de 1975 não
seria incluído na história da pesquisa por suas inovações metodológicas.20
Por outro lado, os anais do congresso indicam que houve alguma discussão
que buscou incorporar abordagens teóricas mais competentes, como o estru-
turalismo, a semiótica, a hermenêutica e as ciências sociais. Novos nomes
surgiram nesse debate, como Donald Wiebe, Hans Penner e E. Thomas Lawson,
estudiosos que a partir desse momento têm desempenhado papéis impor­
tantes na sofisticação teórica do estudo da religião. Ademais, os anfitriões
reconheceram plenamente o pluralismo metodológico e concederam-lhe le­
gitimidade.21
Ainda mais, os membros da IAHR conscientizavam-se de seu
eurocentrismo. O presidente da IAHR, Mareei Simon, proclamou o primeiro
programa de “extensão geográfica” — a tentativa consciente de encorajar
o estabelecimento de associações afiliadas no maior número possível de
diferentes países —, principalmente em virtude da pressão dos Estados
Unidos e do Conseil International de la Philosophie et des Sciences Humaines
[Conselho Internacional de Filosofia e de Ciências Humanas] (CIPSH). Simon
até mesmo a questionou se não havia chegado o momento para a mudança
do nome da IAHR.22
Essa relação entre a crítica teórica e metodológica, por uma parte,
e o caráter internacional da IAHR, por outra, torna-se mais evidente nos
diversos congressos e reuniões regionais patrocinados pela associação. Até
mesmo uma olhadela superficial pelas páginas de Numen revelará um nú­
18 Honko. 1979, xxviii.
'» ibid.
20 Sharpe. 1975. iv.
21 History of religions. Proceedings of the Thirteenth International Congress of the International Association
for the History of Religions (Lancaster 15-22 August 1975) Pve, Michael & McKenzie, Peter (eds.). Leicester,
Department of Religion. University of Leicester, 1980.
22 Conferência por Marcel Simon em Pye & McKenzie, 1980. p. 154-156.

24
0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

mero enorme de autores cujos países de origem e/ou estudo são bastante
diversificados: Bélgica, Escócia, Inglaterra, França, Rússia, China, Japão,
Formosa, Alemanha, Itália, Polônia, Suíça, Holanda, Estados Unidos, Cana­
dá, Israel, Nigéria, Dinamarca, Finlândia, Noruega, índia, Austrália, Nova
Zelândia e México. E, talvez, ainda mais importante, os locais onde a IAHR
se reúne, tanto em seus congressos plenos a cada cinco anos como em suas
reuniões menores, regionais e anuais, verdadeiramente refletem seu caráter
internacional. Olhando para os últimos quarenta anos, os congressos ocor­
reram não apenas na Europa, como acontecia antes, mas foram realizados
em diversos lugares: Cidade do México (1995), Roma (1990), Sidney (1985),
Winnipeg (1980), Lancaster (1975), Estocolmo (1970), Claremont (1965),
Marburgo (1960) e Tóquio (1958), e, como mencionado anteriormente, em
Durban, na África do Sul, em 2000.
É em tais reuniões, incluindo as diversas reuniões regionais realiza­
das desde a década de 1960, que o compromisso da IAHR com método e
teoria mostra-se mais evidente. Por exemplo, na reunião em Varsóvia em
1989, intitulada “Estudos sobre religião no contexto das Ciências Sociaisj
relações teóricas e metodológicas" (1989), foi alcançada concordância so­
bre o seguinte:
A convergência de opinião torna-se aparente em relação à natureza de "história” que
permite a reconcepção da história das religiões como uma ciência humana e cultural.
Também houve um acordo determinando que um estudo da religião reconcebido com­
preenderia "religião" como uma realidade que interconecta tanto implícita como ex­
plicitamente as atividades sociais... Houve concordância em que a análise de proces­
sos sociais que são correlativos com fenômenos religiosos exigiria a avaliação e o uso
de modelos e teorias sociais inovadoras, como também aquelas de disciplinas cognatas.
Se tal orientação metodológica se mostrará frutífera ou não será revelado no contex­
to da pesquisa futura.23
Não diferentemente da já mencionada declaração de Werblowsky, a
declaração de Varsóvia representa um firme compromisso, há muito tempo
associado com a IAHR, de conceituar a religião como um fenômeno históri­
co, de engajá-la em pesquisa empiricamente embasada, e, talvez mais
significante, a declaração de Varsóvia percebe o estudo da religião como o
projeto mais amplo (teórico) de estudar a sociedade e a cultura humanas.
23 Michael Pye cita a declaração completa em seu artigo Religious studies In Europe: Structures and
desiderata, in: Religious studies: Issues, prospects, and proposals, editado por Klaus Klostermaier &
Larry Hurtado (Atlanta: Scholars Press. 1991. p. 39-55); em particular, ver sua nota 2. Para um relató­
rio dessa reunião, ver Armln W. Geertz, The Second Conference on Methodology and Theory, 7Temenos.
Studies In Comparative Religion Present by Scholars in Denmark. Finland, Norway and Sweden 25:
107-108, 1989.

25
ARM1N W. GEERTZ

Essa declaração também foi um desafio para a compreensão européia tra­


dicional de história.
Durante as décadas de 1980 e 1990, houve eventos importantes que
introduziram definitivamente uma maior sofisticação teórica e metodológica
no estudo da religião. Apesar dos esforços de alguns visando à reafirmação
do positivismo europeu,24 já havia sido alcançado um ponto sem retorno.
Além da firme resolução da declaração de Varsóvia, de 1989, a reunião de
Marburgo em 1988 também foi significativa. Sua singularidade está em que
ela promoveu uma agenda com as seguintes resoluções. Primeiro, foram
introduzidas estratégias sistemáticas para desenvolver em ainda mais re­
giões do globo contatos e associações.25 Isso resultou em um aumento de
afiliadas para 38 associações nacionais e regionais na IAHR, com diversas
associações presentemente à espera de reconhecimento oficial no próximo
congresso da IAHR. Segundo, a reflexão teórica e metodológica foi vista
como uma precondição necessária da comunicação intercultural que ocor­
re na IAHR.26 Isso resultou em enorme interesse em tal reflexão, especial­
mente na revista da IAHR denominada Numen. International Reviewfor the
History of Religions, e em uma nova revista estabelecida em 1989, no Ca­
nadá, por jovens acadêmicos com íntimos laços com a afiliada da IAHR, a
Associação Norte-Americana para o Estudo da Religião, intitulada Method
& Theory in the Study of Religion.
Temas atuais no estudo da religião
Creio que estamos testemunhando uma fase bastante motivadora no
estudo da religião. Novas abordagens, novas teorias e novas questões estão
sendo apresentadas às informações já conhecidas, e novas combinações de
temas e interesses estão surgindo bem diante de nossos olhos. Um bom ponto
para iniciar minha pesquisa de temas correntes é olhar os vários temas que
foram tratados durante o XVIH Congresso Mundial da IAHR em Durban, em
2000. O programa acadêmico ilustra claramente a variedade, complexidade
e dinâmica das atuais abordagens no estudo da religião. O esquema ao final
deste texto busca resumir seus principais tópicos e temas.
24 Tvukii, Witold. Introduction. In: Currenl progress ln the methodology of the science of religions. Ed. por
Wltold Tyioch. Warsaw, Pollsh Sclentlflc Publlshers, 1984. 12.
2!i Ver: Pve. Míchaeí. Cultural and organlsational perspectives In the study of religion. In: Pre, Mlchael
(ed.). Marburg revlsited: Institutions and stratégies In the study of religion. Marburg. dlagonal-Verlag,
1989. p. 11-17.
211 Ver: Lawson, E. Thomas. Fundamental Problems In the World-Wlde Pursult of the Study of Religion. In:
Pye, Mlchael (ed.). Marburg revlsited: Institutions and stratégies In the study of religion. Marburg,
dlagonal-Verlag, 1989. p. 19-25.

26
0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

Preocupações fflosóHcas e metodológicas27


Uma área claramente em crescimento, embora tenha começado a se
expandir apenas recentemente, é a da preocupação com o papel da filosofia
no estudo da religião. Tivemos muitas décadas com pouco ou nenhum inte­
resse na filosofia, principalmente porque a filosofia da religião predomina­
va. A filosofia fez contribuições significativas para as ciências humanas e
naturais. Ela não apenas desenvolveu ferramentas intelectuais, como os
diversos ramos da lógica e as várias abordagens da teoria semântica, mas
também introduziu tópicos importantes que agora estão sendo tratados por
outras disciplinas, tais como a lingüística e a psicologia cognitiva.
Uma preocupação central é, evidentemente, a filosofia como crítica
metodológica. Quais são os legítimos construtos teóricos da ciência e qual é
seu status ontológico? Que coisas podemos conhecer e como as conhecemos?
A reflexão filosófica é muito importante para o estudo da religião,
bem como para toda ciência humana ou social. Um dos objetivos primários,
acredito, no uso da filosofia no estudo da religião é promover e esclarecer a
teorização analítica. Este é, em parte, um passo necessário e definitivo de
afastamento em relação ao positivismo textual passado que caracterizou
muito da história das religiões. É essencial para o estudo científico da reli­
gião formalizar definições e tipologias em relação à cadeia explícita de
teorização que as informa, isto é, um estudo da religião teoreticamente
informado. Para definir religião e introduzir precisão teórica em seu estu­
do, muitos estudiosos estão contribuindo com esse tópico contínuo.
Assim encontramos nas primeiras duas seções do esquema final um
interesse renovado não apenas em questões analíticas, mas também um
interesse na filosofia e na sociologia da ciência. Encontramos painéis que
questionam as pressuposições do comparativismo e o uso de termos como
sincretismo. Também vemos painéis relativos aos interesses políticos e às
conexões de estudiosos da religião, ao surgimento da literatura pós-colonial,
aos novos paradigmas de pesquisa no estudo de sociedades não ocidentais'
e no estudo de povos autóctones — tudo isso refletindo um interesse na
filosofia e na sociologia da ciência. O que está em jogo aqui são preocupa­
ções quanto às implicações políticas do fundacionalismo, da masculinidade
da razão, dos problemas de justificação e verdade, do ceticismo, da estru­
tura do conhecimento, da política do conhecimento etc.
27 TVechos desta seção são excertos editados de meu ensaio. Analytical theorizing In the secular study of
religion, em Secular theories on religion. Current perspectives (Copenhagen, Museum Hisculanum Press,
2000. p. 21-31).

27
ARMIN W. GEERTZ

Ao lidarem com as religiões de culturas vivas e especialmente com


culturas que estiveram sujeitas ao colonialismo, estudiosos da cultura e da
religião têm-se defrontado, desde a década de 1960, com toda uma série de
desafios que, em parte, envolvem questões filosóficas e, em parte, exigem
respostas filosóficas. Infelizmente, os filósofos não têm sido muito prestativos
no trato de questões difíceis como o orientalismo, a construção do exótico,
a representação de outras culturas, a política da ciência e a crítica feminis­
ta. Tais críticas têm sido conjuntamente rotuladas de “crítica pós-moder-
na". Esbocei alguns dos antecedentes do desafio pós-moderno ao estudo da
religião em um trabalho anterior, e aqui serei bem breve.28 Nomeio três
principais antecedentes: a crítica do orientalismo, levantada por sujeitos
das ex-colônias-, a crítica da voz, levantada por teóricos literários e femi­
nistas; e a crítica dos fundamentos epistemológicos da ciência, levantada
por filósofos da ciência.29
O argumento básico dos críticos orientalistas é que a antropologia e
as ciênciais culturais foram geradas pelo colonialismo e se tornaram seu
instrumento.30 Uma outra área de preocupação é o fato de que europeus
têm estado "construindo" povos exóticos por toda sua história. Os estudio­
sos ocidentais têm estado profundamente envolvidos em representar, inter­
pretar e recriar culturas não ocidentais.31 Estudiosos autóctones têm exi­
gido atenção e produzido erudição altamente recomendável. Muitos deles
estiveram em Durban, e debates vívidos faiscaram sobre diversos tópicos.
Muito da crítica orientalista é bem argumentada, mas o debate precisa ser
28 Geertz. Armln W. Can we move beyond primitivism? On recovering the indigenes of Indigenous religions
In the academic study of religion, a ser publicado em Beyond "primitivismIndigenous religious traditions
and modernity, editado por Jacob Olupona, no prelo; On reciprocity and mutual reflection In the study of
native American religions. Religion. An International JournaHLos Angeles & London) 24 (1): 1 -7,1994;
Critical reflections on the postmodern study of religion. Religion. An International Journal (Los Angeles
& London) 24 (1): 16-22. 1994: Hermeneutics in ethnography: Lessons for the study of religion. In:
Verglelchen und Verstehen In der Religionswlssenschaft. Vortrâge der Jahrestagung der DVRG vom 4.
bis 6. Oktober 1995 In Bonn. Org. por Hans-Joachim Klimkeit. Wiesbaden. Harrassowitz Verlag, 1997. s.
p. 53-70; Ethnohermeneutlcs in a Postmodern World. In: Approaching Religion. Parti: Based on papers
read at the Symposium on Methodology In the Study of Religions Held at Abo. Finland, on the ‘f1’-?'1
August 1997, edltado por Tore Ahlback. Abo: The Donner Institute for Research In Religious and Cultu­
ral History and Stockholm: Almqvist & Wiksell International. 1999. p. 73-86; Global perspectives on
methodology In the study of religion. In: Perspectives on method and theory in the study of religion:
Adjunct proceedings of the XVIt* Congress of the international Association for the History of Religions.
Mexico City 1995. ed. com Russell T. McCutcheon, assistidos por Scott S. Elliott (Leiden. E; J. Brill,
2000. p. 49-73).
29 Ver a excelente introdução à totalidade do alcance das questôes em Pels & Nencel, 1991. Os próximos
poucos parágrafos estão baseados em Geertó, 1997. p. 60-67.
30 Asad. Talai (ed.). Introduction. In: Anthropology & the Colonnlal Encounter, Atlantic Highlands. Humanities
Press. 1973, 1990. p. 9-19.
31 Wagner, Roy. The invention of culture. Chicago: University of Chicago Press. 1975/1981.

28
0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

mais refinado. Uma das coisas que muitas pessoas esquecem é que a críti­
ca orientalista alveja primariamente a literatura colonial escrita por volta
do fim do século XIX. Em muitas situações são os eruditos orientalistas que
têm procurado durante muito tempo do século XX corrigir os estereótipos
que foram produzidos na literatura popular.
O exame crítico da voz é uma preocupação central na reflexão femi­
nista, a segunda principal fonte da crítica pós-moderna. Das preocupações
emancipacionistas em sua fase mais inicial, a reflexão feminista tornou-se
muito mais refinada e tem encorajado o interesse em gênero como uma
referência conceituai importante no estudo da religião em termos da cons­
trução social ou cultural de gênero,32 a construção histórica de gênero em
relação à classe, ao poder e mudanças em modos de produção,33 e análises
comparativas transculturais das variáveis no status, papel, autoridade e
poder das mulheres em diferentes culturas.34 Esses tópicos são tão impor­
tantes que estou surpreso de que tão poucos estudiosos homens tenham
assumido essas preocupações. Mas penso que a situação esteja mudando e
estamos assistindo a uma cooperação entre homens e mulheres na pesqui­
sa acadêmica sobre gênero. Como se pode ver no esquema final, há uma
variedade de tópicos interessantes sobre gênero com ênfase em gênero em
religiões e regiões geográficas específicas.
A terceira principal fonte da crítica pós-moderna vem dos filósofos
da ciência. Dessa área partem ataques devastadores sobre um dos alicer­
ces do projeto iluminista, ou seja, a racionalidade. Primeiro, tentativas para
o uso das ciências naturais como modelo têm sido questionadas, uma vez
que predição, teoria, resultados e conclusões são todos embasados em con­
venções sociais.35 Segundo, tem sido ressaltado que a cognição humana
não é suficientemente capaz de alcançar conclusões complicadas.30 Tercei­
ro, a linguagem científica não é menos metafórica do que qualquer outra
32 Duas principais coleções aqui são Nature, culture and gender, editada por Carol P. MacCormack &
Marilyn Strathern (Cambridge. Cambridge University Press. 1980); e Sexual meanings, editada por
Sherry Ortner & Harriet Whitehead (Cambridge. Cambridge University Press. 1981).
33 Duas obras importantes são Sisters and wives: The past and future of sexual equality, de Karen Sacks
(Westport. Greenwood Press. 1979), e Women and colonization, editada por Mona Etienne & Eleanor
Leacock (New York. Praeger. 1980).
3< Três exemplos disso são Female of the species, editado por Kay Martin & Barbara Voorhies (New York.
Columbia University Press. 1975); Sexual stratification: A cross-cultural view, editado por Alice Schlegel
(New York, Columbia University Press); e Female power and male dominance, editado por Peggy Reeves
Sanday (Cambridge. Cambridge University Press, 1981).
35 Pinch, Trevor. Theory testing in science—The case of solar neutrinos: Do crucial experiments test theories

or theorists? Philosophy of the Social Sciences 15 (2) 1985, 167-187.


30 Faust. David. The limits of scientific reasoning. Minneapolis, University of Minnesota Press,1984.

29
ARMIN W. GEERTZ

linguagem; na verdade, relações metonímicas e metáforas são intrínsecas


à produção de categorias no nível cognitivo mais básico.37 E, finalmente, a
racionalidade não apenas está culturalmente situada, mas está situada em
uma situação pluralista e multiparadigmática, na qual a ciência é essencial­
mente contestável.38
Como eu e Russell McCutcheon demonstramos em nosso recente
livro sobre metodologia e teoria, a reflexão metodológica sempre foi uma
grande preocupação na IAHR e nos estudos da religião. E ela também foi
tema para diversos painéis no congresso de Durban.
a) Religião e sociedade
O próximo grande tema do congresso se refere ao inter-relaciona-
mento entre religião e sociedade. Isso está claramente em acordo com a
declaração de Varsóvia de 1989. Houve ensaios que refletiram sobre temas
sociológicos clássicos, como as religiões em relação com a globalização,
secularização, autoridade, violência, política, pluralismo, a lei e o estado.
Também houve ensaios sobre novos desenvolvimentos, como ecoturismo,
guerra e direitos humanos, e ainda sobre fenômenos basicamente sociais,
como sincretismo, diáspora e o papel da religião e identidade étnica, nacio­
nal ou individual.
b) Religião e cognição
Embora não numericamente dominante no próximo congresso, um
dos mais motivadores desenvolvimentos refere-se à introdução da teoria
cognitiva no estudo da religião. Acredito que existem muitas áreas nas quais
a teoria cognitiva pode auxiliar substancialmente o estudo da religião. Por
teoria cognitiva, não estou me referindo a uma escola particular ou a uma
ciência clínica. Sigo o pensamento de filósofos, antropólogos psicológicos,
psicólogos e outros que buscam explicar e interpretar a existência social
por meio de mecanismos cognitivos.

37 VerGeorge Lakoff. Women, fire and dangerous things: What categories reveal about the mind (University
of Chicago Press. Chicago, 1987); Lakoff & Mark Johnson. Metaphors we live by (University of Chicago
Press, Chicago. 1980); Lakoff & Mark Turner. More than cool reason: A field guide to poetic metaphor
(University of Chicago Press, Chicago, 1989); Roger M. Keesing. Conventional metaphors and
anthropological metaphysics: the problematic of cultural translation, Journal of Anthropological Research
41 (2); 201-217, 1985; Keesing. Exotic readings of cultural texts, Current Anthropology 30 (4); 459-
479,1989; e Eve Sweetser. From etymology to pragmatics. Metaphorical and cultural aspects of semantic
structure (Cambridge. Cambridge University Press, 1990.
” Shweder, Richard A. Divergent rationalities, in; Metatheory In social sciences: Pluralisms and subjectivities.
Ed. por Donald W. Fiske& Richard A. Shweder. Chicago, University of Chicago Press, 1986. p. 163-196.

30
0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

Obviamente, um dos locais mais importantes para começar está na


mente. Quais são os fatos básicos da consciência humana? Como eles se
relacionam com os processos biológicos, químicos, elétricos e outros do
corpo? Como nós experimentamos e entendemos o mundo dentro e ao redor
de nós? Qual é a relação entre comportamento e pensamento? Qual é a
relação entre mente e linguagem e o papel da linguagem e outras formas de
comunicação na interação social? Como as categorias se desenvolvem na
cultura humana? Estas são apenas algumas das questões básicas que são
centrais para a ciência cognitiva e que, de uma maneira ou outra, têm con­
seqüência direta para uma compreensão e interpretação adequadas dos
processos culturais e especialmente do comportamento religioso. O encon­
tro das ciências sociais e cognitivas com a filosofia talvez seja um dos mais
motivadores desenvolvimentos neste momento (Goldman, 1992).
Um dos principais pontos de partida é obviamente o fenômeno da
consciência. Os filósofos têm tentado por milênios explicar o que é isso. As
religiões possuem teorias tão variegadas quanto possam ser imaginadas.
Os cientistas cognitivos também não têm um consenso. Uma contribuição é
a do cientista cognitivo Daniel C. Dennett, da 1\ifts University, que, em seu
livro Consciousness Explained [Consciência Explicada] (1991), defende que
devemos abandonar o dualismo cartesiano e admitir que de alguma forma o
cérebro deve ser a mente. Utilizando a analogia do computador, ele argu­
menta que o fluxo de consciência não é uma seqüência simples, unificada,
mas “retiradas múltiplas" da realidade ordenadas por uma “máquina virtu­
al” semelhante ao computador, com fios e peças [hardware] em algumas
áreas e programável [software] em outras. Ou seja, ele sugere que “o sur­
preendente poder humano de mudança, ajustamento versátil de estado
mental em resposta a quase qualquer contingência, por mais nova que seja,
não deve nada à consciência em si, mas sim à arquitetura computacional
que torna possível essa intercomunicação”.30 Essa abordagem se aproxima
muito da filosofia budista.
Uma vez que entramos no cérebro, somos confrontados com gran­
des áreas de discussão altamente relevantes para as ciências culturais.
Como psicólogo na Universidade de Chicago, Lawrence W. Barsalou discri-
30 Dennett. Daniel C. Consciousness explained. Boston/Toronto/London, Little. Brown and Company. 1991.
p. 280-281. Ver também: Churchund, Paul M. Matterand consciousness. A contemporary Introduction to
the philosophy of mind. Edição revista, novo material (orlg. publ. 1984). Cambridge. MA & London. The
MIT Press. 1992: Churchland, Patricia Smith. Neurophilosophy: Toward a unified science of the mind-
braln. Cambridge. MA & London, The MIT Press. 1986; Laugmlin Jr., Charles D.: McManus, John; d'Aquili,
Eugene G. Brain, symbol & experience. Tbward a neurophenomenology of human consciousness. New
York, Columbia University Press, 1992.

31
ARMIN W. GEERTZ

minou em seu manual sobre psicologia cognitiva de 1992 as principais áre­


as de discussão: categorização, representação, processamento de informa­
ção, memória (imediata e distante), conhecimento, estrutura de linguagem,
processos de linguagem e pensamento. Há milhares de títulos de uma vari­
edade de disciplinas aos quais poderia me referir para cada uma dessas
grandes áreas. Ao passar das ciências cognitivas para as ciências cultu­
rais, cada uma dessas funções e áreas cognitivas principais desempenham
papéis centrais nos estudos culturais. Os mais óbvios são estudos da cone­
xão entre cultura e cognição,40 estudos lingüísticos sobre estruturas se­
mânticas, análises culturais de taxonomias de grupos humanos e sistemas
de classificação biológica, estudos de terminologia de cor ou parentesco, a
organização cultural das relações sociais, processos de socialização, com­
preensão de si mesmo e dos outros, memória e tradição, modelos culturais
e a produção de sentido.
Não é preciso dizer que o estudo de modelos culturais, ou seja, es­
quemas cognitivos compartilhados por meio dos quais as realidades huma­
nas são construídas e interpretadas, despertam grande interesse nos estu­
diosos da religião. Idéias sobre pessoa, agência, estrutura cósmica, gênero,
sentido etc. são elementos essenciais da análise da religião. Mas também é
essencial a relação entre representação e comportamento ritual41 ou, na
verdade, qualquer comportamento. Uma compreensão de representação,
simbolização,42 memória,43 tradição,44 cura,45 metáfora,46 linguagem reli-
10 Cultural Psychology. Essays on comparative human development. Ed. por James W. Stlgler; Richard A.
Shweder: Gilbert Herdt. Cambridge. Cambridge University Press, 1990; Lawson, E. Thomas & McCauley.
Robert N. Rethinking religion. Connecting cognition and culture. Cambridge, Cambridge University Press,
1990; ou Human motives and cultural models. Ed. por RoyG. D'Andrade & Claudia Strauss. Cambridge,
Cambridge University Press, 1992.
41 Lawson & McCauley. 1990.
42 Lauchlin Jr., Charles D. & Stephens, Christopher D. Symbolism, canalization, and ^structure. In.- Symbol
as Sense. New approaches to the analysis of meaning. Ed. por Mary LeCron Foster & Stanley H. Bran-
des. New York etc., Academic Press. 1980, 323-363.
“ Whitehouse, Harvey. Memorable religions: Transmission, codification and change in divergent melanesian
contexts. Man 27 (4). 1992, 777-797; Inside the cull: Religious innovation and transmission in Papua
New Guinea. Oxford, Oxford University Press, 1995.
44 Boyer, Pascal. Tradition as truth and communication: A cognitive description of traditional discourse.
Cambridge. Cambridge University Press, 1990; Connecton, Paul. How societies remember. Cambridge:
Cambridge, University Press. 1989, rpr. 1992; Taylor, Anne Christine. Remembering to forget: Identity,
mourning and memory among the Jivaro. Man 28 (4). 1993, 653-678.
45 Kleinman, A. M. Cognitive structures of traditional medical systems: Ordering, explaining, and Interpreting
the human experience of illness. Ethnomedlzln 3 (1/2), 1974/75, 27-49; Patients and healers in the
context of culture. An exploration of the borderland between anthropology, medicine, and psychiatry.
Berkeley, University of California Press, 1980.
48 1987; Lakoff & Johnson, 1980: Lakoff & Turner. 1989; Beyond metaphor. The
Lakoff, theory of tropes In
anthropology. Ed. por James W. Fernandez. Stanford, Stanford University Press. 1991.

32
0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

giosa,47 categorias religiosas,48 percepções49 e, de fato, toda a idéia da cons­


trução social da realidade.50
Ao combinar essas idéias cognitivas com o estudo neurológico e bio­
lógico de experiências religiosas intensas, como visões, alucinações, união
mística, possessão espiritual etc.,51 avançamos sobremaneira na compre­
ensão das pessoas religiosas. Essa abordagem é necessariamente relativista,
uma vez que ignora a substância da crença e doutrina religiosa, mas tam­
bém é universalista, no sentido de que busca explicar as pessoas religiosas
e compreender as pessoas vivendo em uma diversidade de ambientes geo­
gráficos e culturais. De fato, uma abordagem cognitiva pode explicar temas
de outra forma inexplicáveis nos estudos teológicos ou humanistas da reli­
gião. Esse é um dos principais temas do estudioso francês Pascal Boyer em
suas publicações.
C) NOVOS RECURSOS
Diversos painéis lidaram com novos recursos para o estudo da reli­
gião. Certamente há várias áreas que precisam de pesquisa sistemática. A
primeira delas é a nova mídia: televisão, filmes, vídeos e, obviamente, a
internet. Cada uma suscita desafios aos métodos e ferramentas dos estu­
dos textuais anteriores. Não apenas devemos aprender a analisar as for­
mas pelas quais as religiões utilizam a nova mídia, mas também formular
maneiras de lidar com essa mídia como ferramenta analítica. De que forma
estudar filmes religiosos ou o uso de vídeos como textos sagrados em dife­
rentes religiões? Em relação à internet existe uma variedade de problemas
a serem resolvidos. O primeiro é, certamente, sua extensão. O segundo é
como aprender a discernir e ser crítico no uso da informação na internet? O

17 Religions and languages: A colloquium. Ed. por Bruce S. Alton. New York etc., Peter Lang. 1991.
Boyer. Pascal. The naturalness of religious Ideas: A Cognitive Theory of Religion. Los Angeles, University
of California Press. 1994.
® Rivai,, Laura. The growth of family trees: Understanding Huaorani perceptions of the forest. Man 28 (4),
1993, 635-652.
50 Berger, Peter L. & Luckmann, Thomas. The social construction of reality. A treatise in the sociology of
knowledge. Harmondsworth, 1966. 1987: Goodman. Nelson. Ways of woridmaking. New York, Bobbs-
Merrlll, 1978.
51 Barber. T. X. Toward a theory of pain: Relief In chronic pain by prefrontal leucotomy, opiates, placebos,
and hypnosis. Psychological Bulletin 56, 1958. 430-460: Religion, altered states of consciousness, and
social change. Ed. por E. Bourguignon. Columbus, 1973: Locke, R. G.& Kelley, E. F. A preliminary model
for the cross-cultural analysis of altered states of consciousness. Ethos 13, 1985. 3-55: Pomeranz, B.
Acupuncture and the endorphins. Ethos 10 (4), 1982, 385-393: Prince, R. The endorphins: A Review for
psychological anthropologists. Ethos 10 (4). 1982,303-316: Shamans and endorphins: Hypothesis for a
synthesis. Ethos 10 (4). 1982. 409-423: Trance and possession states. Ed. por R. Prince. Montreal,
1968: Tart, C. T. Altered states of consciousness. New York. 1969.

3.3
ARMIN W. GEERTZ

terceiro é qual o impacto que os esforços missionários das religiões real­


mente têm na internet?
A revolução digital nos presenteia com novos recursos. Como isso
afeta nosso trabalho e nossa capacidade de publicar e ensinar? Esses são
tópicos que merecem reflexão.
Há, porém, outros novos recursos, que não são tão novos assim, mas
que ainda não desempenharam papel tão importante quanto deveriam. Refi-
ro-me aqui à iconografia, à dança, à música, à arte, ao teatro, à estética
transcultural, entre outros. A iconografia está por perto há muito tempo, e
muito material tem sido acumulado em diferentes partes do mundo, mas ain­
da precisamos de ferramentas teóricas para que melhorem nossas análises.
As artes cênicas, a dança e a música ainda não desempenham um
papel significativo no estudo da religião. Mesmo os antropólogos apenas
recentemente começaram a demonstrar interesse pelo aspecto cênico da
religião e outros rituais. A arte como expressão religiosa, por exemplo, é
muito útil no estudo da espiritualidade contemporânea.
d) Fenômenos religiosos
Há muitos fenômenos religiosos que têm sido obieto de interesse re­
cente no estudo da religião. Um dos mais antigos é a magia e, próximo a ela,
a cura ocultista. Mas hoje, o interesse não está mais nas linhas divisórias
entre religião e magia, e sim no fenômeno em si. Feitiçaria e adivinhação
são temas tratados há muito tempo pela etnografia, mas não pela história
das religiões. Essas áreas são claramente importantes e também precisam
ser tratadas analiticamente. O ocultismo e o esoterismo têm recebido bas­
tante atenção na Europa na última década, com freqüentes conferências e
mesmo com novas cátedras em Paris e Amsterdã. Esse interesse reflete a
preocupação contemporânea com a reinterpretação da história das idéias
religiosas e religiosidade européia. Há certamente uma demanda para isso,
tendo em vista como os proponentes da Nova Era têm-se apropriado desse
tópico para si próprios.
Entretanto, também precisamos de mais percepções sobre os lados
tenebrosos da religiosidade em termos de mal e magia prejudicial. Os lados
sociais desses fenômenos precisam de mais discussão e estudo. A cura
passou a ficar muito em voga durante os últimos cinco anos também por
causa da Nova Era. O estudo de cosmovisões e filosofias de cura tradicio­
nais exige estudo acadêmico apropriado antes que o mercado esteja total­
mente inundado com filosofias de cura do tipo “faça você mesmo”.

34
0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

Outros fenômenos que têm despertado interesse nos anos recentes


são o simbolismo e o papel do corpo e da peregrinação em perspectivas
locais e globais.
e) Religiões diversas
Finalmente, houve um número de painéis relacionados às religiões
específicas, como as igrejas autóctones africanas, o cristianismo, o
islamismo, as religiões em determinadas áreas, as religiões na índia e na
Ásia, e assim por diante. Esses estudos ajudam-nos a avançar em nosso
conhecimento empírico, mas também há um número crescente de estudos
que estão nos desafiando a reavaliar esse conhecimento em termos de no­
vas perspectivas, tais como voz, construção social, a filosofia da ciência e
as análises críticas dos métodos empregados na obtenção e publicação do
conhecimento empírico.
Conclusão
Para concluir, observo que a nova Associação Brasileira promove
admiravelmente cooperação interdisciplinar e interinstitucional no estudo
da religião. Acredito que seja essa a única maneira de tentar compreender
o complexo fenômeno da religião. É, portanto, bastante adequado que esta
conferência internacional seja patrocinada por um vasto número de insti­
tuições e universidades, às quais agradeço por apoiarem o estudo acadêmi­
co da religião.

Temas e tópicos no XVIII Congresso da International Association


for the History of Religions.
Durban, África do Sul, 5 a 12 de agosto de 2000.
Quadro montado por Armin W. Geertz
Temas Tópicos
Filosofia no estudo da religião Reavaliações do papel da filosofia no estudo da
religião; não apenas a filosofia da religião (Purusho-
ttama Bilimoria), mas também a filosofia da ciência
e a filosofia em geral. Reflexão analítica no estudo
da religião; subjetividade e o estudo da religião (Bill
Paden); mente, ética, epistemologia; ciência e
religião.

35
ARMIN W. GEERTZ

Metodologia no estudo da religião Eliade (Bryan S. Rennie); comparatismo (William


E. Paden & Jeppe Sinding Jensen); novos recur­
sos na história das religiões (Enrica Garzilli); o
estudo da religião na Europa Oriental (Marat
Tscherin & Dalibor Papousek); novos paradigmas
para a pesquisa em sociedades não ocidentais
(Peter Jackson, Shun-hing chan e Houchang E.
Chehabi); literaturas pós-coloniais (Jamie Scott);
metodologia nos estudos budistas no Japão (Ma-
sahiro Shimoda); escrevendo a história da histó­
ria das religiões (Gregory D. Alies); mídia ele­
trônica no estudo da religião (Gordon Newby);
Foucault (Russell McCutcheon); metodologia em
Formosa (Geoff Foy); Rappaport (Uila Lehtonen);
estruturas teóricas para o estudo de religiões
greco-romanas (Luther Martin & Panayotis
Pachis); estudos islâmicos (Abrahim Khan); con-
textualizando estudos japoneses sobre religião
(Clark Chilson); erudição bíblica (Academia de
Religião da África do Sul).

Teorias cognitivas e psicologia Teorias cognitivas (E. Thomas Lawson); psicolo­


gia da religião (Sebastian Murken).

Religião em suas várias interações Modelo de verdade e reconciliação (Elias Bongmba);


com a sociedade religiões extremas (Tore Ahlbãck); globalização
(Michio Araki; Abdulkader Tayob); autoridade e
autenticidade; religião na vida pública (James
Cochrane); religião e mídia (Stewart Hoover; Mark
Hulsether; Lewis Rambo; Ruth Teer-Tomaselli);
milenarismo, perseguição e violência (Catherine
Wessinger); religião e direitas humanos (Arvind
Sharma& Abrahim H. Khan); islamizando a socie­
dade civil (Abrahim Khan): educação religiosa
(Robert Jackson); religião e política (Gerrie ter
Haar & Stephen Ellis): ética, cultura e sociedade
(Charles H. Reynolds); novas religiões e globa­
lização (Mikael Rothstein & Margit Warburg); re­
sidentes urbanos e religiões na Ásia (Robert
Kisala); guerra e religião (Funso Afolayan); diá­
logo inter-religioso (Elias Bongmba; Tuula
Sakaranho); África pós-independência (Jacob
Olupona); estudo da religião e envolvimento so­
cial (Abdulkader Tayob & Teresia Hinga); desa­
fios religiosos à autoridade (Rosalind Shaw);
ecoturismo (Keyan Tomaselli); lei e cultura no
pluralismo religioso e o estado (Winnifred Fallers
Sullivan); religião e guerra (Funso Afolayan).

36
0 ESTUDO DA HISTÓRIA DAS RELIGIÕES NO MUNDO

Gênero Impacto dos estudos sobre deusas nos paradigmas


teóricos na história da religião, Ásia e os Hima-
laias (Miranda Shaw); o mesmo sobre paradigmas
teóricos na história da religião, Europa e
Mediterrâneo (Miranda Shaw); mulheres e islã
(Rubina Ramji); islã e gênero (Abrahim Khan); no­
vas perspectivas (Morny Joy); mulheres profe­
tas (Robert Baum); violência contra mulheres
(Teresia Hinga); mulheres africanas e suas orga­
nizações religiosas.

Sincretismo Sincretismo e explicações teóricas (Luther Martin


& Anita Leopold); religiões tailandesas (Amarjiva
Lochan); confluências religiosas (Yolotl Gonzalez):
religiões asiáticas e africanas no Brasil (Henry
Drewal).

Diáspora Sul da Ásia (Steven Vertovec & Martin Baumann);


África, Caribe, Canadá (Bra|. M. Sinha); hinduísmo
(Knut A. Jacobsen).

Identidade Identidade e pluralismo religioso (Gerard Wiegers);


islã e formação de identidade (Richard Martin);
identidade hindu (James Fitzgerald); fazendo reli­
gião, criando identidade (Academia de Religião da
África do Sul); identidades negociadas no hin­
duísmo globalizado (Martin Baumann & Knut A.
Jacobsen); religião e identidade (Gerrie ter Haar
& Walter van Beek); identidade e pluralismo reli­
gioso (Gerard Wiegers).

Iconografia Piedade visual e o poder das imagens (David


Morgan & Mary Nooter Roberts); iconografia (Brian
Bocking); culto a imagens (Leona Anderson); es­
paço cibernético como espaço sagrado (Mark W.
MacWilliams).

Dança e música como expressão (Patrizia Burdi, Barbera Sonneman, Miranda


do sagrado Shaw, N. Jayavidhya).

Esoterismo e o oculto Esoterismo ocidental e misticismo judaico (J. A.


M. Snoek & Wouter J. Hanegraaff); feitiçaria e o
oculto na África {Jim Kiernan; Gerrie ter Haar &
Thias Kgatla); religião e cura na África (Walter
van Beek & Gerrie ter Haar); adivinhação (Umar
Danfulani).

37
ARMIN W. GEERTZ

Religião e natureza Religião e seu papel na relação da humanidade


com a natureza e a ecologia (Bron Taylor); natu­
reza, vida e salvação nas religiões japonesas
(Michio Araki).

Igrejas autóctones (Cynthia Hoehler-Fatton; Nicholas Creary).

Diversas religiões Judaísmo (Gilya G. Schmidt); cristianismo (Paula


Montero); religiões autóctones (David Shorter;
Sylvia Marcos); budismo (Miriam Levering); reli­
gião na sociedade sul-africana; relações entre cris­
tãos e muçulmanos na África (Klaus Hock); Amé­
rica Latina (Eliane Moura-Silva); hinduísmo
(James Fitzgerald); religiões greco-romanas
(Luther Martin & Panayotis Pachis); os Upanishads
(Mikael Aktor); religiões africanas (James Cox);
budismo em Formosa (Elise Devido); islã (Will
Sweetman).

Fenômeno religioso Peregrinação em perspectiva local e global (Juan


Campo); compreensões religiosas de lugar (Kim
Knott è Mary N. MacDonald); religião e memória
(Judith Coney); religião e o corpo; migrações re­
ligiosas; conversão (Lewis Rambo): votos laicos
(William Harman); cosmovisão; religião e caça
(Gary Lease); escritura (A. Tsukimoto); mal
(Mareei Sarot).

38

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