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Fatores psicológicos para desencadeamento do câncer? - A visão reichiana sobre a etiologia do câncer (Isa K.

Vieira)

FAT O R E S P S I C O L Ó G I C O S PA R A
DESENCADEAMENTO DO CÂNCER?
A VISÃO REICHIANA SOBRE A ETIOLOGIA DO
CÂNCER

I sa Ka p lan Vie ir a

INTRODUÇÃO

! Esse artigo busca analisar e comparar a visão clássica acerca do câncer e suas
etiologias com a de Wilhelm Reich. Propõe-se uma análise da visão atual da psicologia
neste sentido e, brevemente, a da medicina, e, com isto, uma reflexão sobre o fazer
científico, com sua metodologia, no caso do estudo do câncer assim como de outras
biopatias. Em todos esses casos, conclui-se tratar-se de questões complexas e
multifatoriais que parecem necessitar de um olhar distinto daquele definido por Reich
como ‘mecanicista’, que até hoje vigora. Busca-se uma nova abordagem através de uma
visão que possa transcender as separações disciplinares para uma consideração integral
do ser humano.

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Fatores psicológicos para desencadeamento do câncer? - A visão reichiana sobre a etiologia do câncer (Isa K. Vieira)

1) A visão hegemônica sobre o problema do câncer

! a) O que é o câncer e quais são suas causas?

! Segundo o site do INCA, Instituto Nacional do Câncer,

Câncer é o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenças que têm em comum o
crescimento desordenado (maligno) de células que invadem os tecidos e órgãos, podendo
espalhar-se (metástase) para outras regiões do corpo. Dividindo-se rapidamente, estas
células tendem a ser muito agressivas e incontroláveis, determinando a formação de
tumores (acúmulo de células cancerosas) ou neoplasias malignas. (...) Os diferentes tipos
de câncer correspondem aos vários tipos de células do corpo (...) Outras características
que diferenciam os diversos tipos de câncer entre si são a velocidade de multiplicação
das células e a capacidade de invadir tecidos e órgãos vizinhos ou distantes (metástases).

! Explica-se também no texto apresentado no site da instituição o processo de


malignização das células, o que nos ajuda a iniciar uma compreensão das causas do
câncer:

Uma célula normal pode sofrer alterações no DNA dos genes. É o que chamamos
mutação genética. As células cujo material genético foi alterado passam a receber
instruções erradas para as suas atividades. As alterações podem ocorrer em genes
especiais, denominados protooncogenes, que a princípio são inativos em células normais.
Quando ativados, os protooncogenes transformam-se em oncogenes, responsáveis pela
malignização (cancerização) das células normais (...) As células cancerosas são,
geralmente, menos especializadas nas suas funções do que as suas correspondentes
normais. Conforme as células cancerosas vão substituindo as normais, os tecidos
invadidos vão perdendo suas funções.

! O trecho acima, por mais claro, didático e atualizado que possa ser, parece deixar
lacunas, duvidas no leitor leigo; o processo de malignização parece relativamente claro,
mas... Por que ele acontece? Por que há uma mutação no DNA destas células, de forma
a fazê-las perderem suas funções? Se não se trata de uma bactéria ou vírus, qual é a
força propulsora desta mutação?

! As explicações cientificas mais difundidas das causas do câncer são muitas vezes
vistas pelo publico leigo como demasiado difusas e confusas. É comum ouvir

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comentários irônicos que refletem uma descrença da população em relação ao efeito


positivo dos ‘novos achados’ relativos a esse tema: a impressão frequentemente
expressa é a de que ‘tudo causa câncer’, e dificilmente poderíamos fugir desse destino
tão ameaçador sem seguir uma vida regrada por rígidos costumes que, ainda sim,
entretanto, não assegurariam o evitamento da doença.

! Entre os fatores que rondam a imaginação da população em relação às causas do


câncer, estão envolvidos aqueles mais ligados ao comportamento (sedentarismo, fumo,
bebida alcoólica, etc), os ligados ao ambiente (poluição, substâncias cancerígenas
presentes na comida, nos objetos, etc), hereditários e, ainda, os emocionais; todos estes
figuram sem que se tenha alguma segurança sobre o tamanho que ocupa cada um na
origem de um câncer.

! Na explicação do INCA:

As causas de câncer são variadas, podendo ser externas ou internas ao organismo,


estando ambas inter-relacionadas. As causas externas relacionam-se ao meio ambiente e
aos hábitos ou costumes próprios de um ambiente social e cultural. As causas internas
são, na maioria das vezes, geneticamente pré-determinadas, estão ligadas à capacidade
do organismo de se defender das agressões externas. Esses fatores causais podem
interagir de várias formas, aumentando a probabilidade de transformações malignas nas
células normais. De todos os casos, 80% a 90% dos cânceres estão associados a fatores
ambientais. Alguns deles são bem conhecidos: o cigarro pode causar câncer de pulmão, a
exposição excessiva ao sol pode causar câncer de pele, e alguns vírus podem causar
leucemia. Outros estão em estudo, como alguns componentes dos alimentos que
ingerimos, e muitos são ainda completamente desconhecidos. (...) Esses fatores atuam
alterando a estrutura genética (DNA) das células. (...) São raros os casos de cânceres que
se devem exclusivamente a fatores hereditários, familiares e étnicos, apesar de o fator
genético exercer um importante papel na oncogênese. Um exemplo são os indivíduos
portadores de retinoblastoma que, em 10% dos casos, apresentam história familiar deste
tumor. Alguns tipos de câncer de mama, estômago e intestino parecem ter um forte
componente familiar, embora não se possa afastar a hipótese de exposição dos membros
da família a uma causa comum.

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! Do texto apresentado tiramos algumas reflexões iniciais: o fator hereditário é


apresentado como importante, mas probabilisticamente é relativamente pouco
relevante; ressalta-se que nos casos em que há maior evidência de um forte fator
genético, esse aparece com uma porcentagem de 10%, o que resulta como fator distante
de figurar como determinante. Além disso, é importante ressaltar que parece difícil
separar nos estudos aquilo que aparece em comum em uma família como resultado de
aspectos culturais, psicológicos e sociais que uma família compartilha dos aspectos
genéticos.

! É interessante notar também que o texto ressalta que estes aspectos genéticos
estão ligados, na maioria das vezes, à capacidade do organismo de se defender das
agressões externas. Mais adiante veremos essa questão como essencial na compreensão
da visão Reichiana da causa do câncer, e quais seriam, em sua visão, os fatores
envolvidos na capacidade do organismo de se defender das agressões externas (ou
internas, como veremos mais a fundo posteriormente).

! b) O estudo dos fatores emocionais na origem do câncer - uma questão de


metodologia.

! Muitos estudos relacionam fatores emocionais com o surgimento de tumores


cancerosos. O artigo “O desafio da Relação Mente/Câncer” de Adalberto Tripicchio
(TRIPICCHIO, 2007) foi utilizado como referência para uma reflexão acerca da maneira
como essa questão vem sendo abordada por pesquisadores de diversas áreas. O autor
inicia fazendo uma importante análise da complexidade do problema do câncer e sua
dificuldade de estudo:

Qualquer investigação a respeito dos fatores envolvidos na etiologia do câncer enfrenta


problemas decorrentes da complexidade da carcinogênese, um processo de evolução
lenta (da ordem de anos), descrito em função de 'fases' (iniciação, promoção, e
progressão) de duração variável, e que envolve diferentes 'fatores etiológicos' (genéticos,
ambientais, imunológicos etc.). Soma-se o fato de que o termo "câncer" designa uma
categoria nosológica genérica, que admite ampla diversidade. (TRIPPICHIO, 2007).

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! Em uma sucinta revisão bibliográfica, o autor enquadra os estudos


epidemiológicos acerca da etiologia do câncer em duas orientações principais, uma
voltada para os ‘fatores geneticos’ e outra para os ‘fatores ambientais’, além de uma
pequena proporção dedicada aos ‘fatores psicossociais’ o que incluiria hábitos pessoais
e distúrbios psicológicos; segundo o autor, “tensões e conflitos afetivos, estados
emocionais, além de traços relativamente estáveis da personalidade; conjunto de
variáveis que denominaremos da 'esfera da mente' (ou do psiquismo)” (idem). Dentro
deste ultimo grupo de análise, Tripicchio faz uma segunda divisão em dois subgrupos:
o primeiro engloba o que chama de estados difóricos (depressão, tristeza, infelicidade,
abatimento, desânimo, desesperança, desamparo, desapontamento) e de ansiedade,
além das situações traumáticas envolvendo perda e/ou privação e o segundo reúne
variáveis definidas por características pessoais relativamente estáveis que
correspondem a ‘tipos de personalidade’. O autor ressalta que estudiosos dos séculos
XVIII e XIX acreditavam que o câncer estava associado ao que denominavam
‘constituição melancólica’ e a estados depressivos e que esse tipo de relação com
tipologias e traços de personalidade ainda é feita hoje.

! Tripicchio, ainda analisando historicamente, aponta para o fato de que a partir da


segunda Guerra, ainda se estudavam ‘sentimentos disfóricos como depressão, tristeza e
desesperança’, assim como os ‘tipos de personalidade’, refletindo influência da teoria
psicanalítica e de outras que buscavam analisar padrões de relacionamento interpessoal.
A partir dos anos sessenta, ele aponta, a metodologia dos estudos em psicologia foi cada
vez mais buscando uma maior objetividade e padronização. O autor descreve esse
processo como um aperfeiçoamento nos desenhos de estudo e instrumentos de medida,
e comenta que, ao mesmo tempo, as técnicas psicanalíticas e as avaliações de natureza
clínica foram sendo abandonadas, por serem tidas como excessivamente subjetivas.

! Neste momento podemos iniciar uma análise da compreensão atual da etiologia


do câncer através da lógica Reichiana. Pensamos, neste sentido, que esta busca
incessante por uma maior cientificidade por muitas vezes acarretou em uma visão que
poderia ser entendida através do conceito de Reich de ‘mecanicismo’ e ‘cientificismo

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mecanicista’ que com seus métodos muito estritos acabaria por ser pouco sensível a
questões urgentes e essenciais. Segundo Reich, deveríamos buscar apreender as funções
e funcionamentos e suas lógicas, sempre complexas e multifatoriais, ao invés de manter
a busca de fatos quantificáveis, relacionáveis em simples equações de causas e efeitos.
Sobre isto, Reich afirma:

O cientista mecanicista, ao se identificar com a máquina - lógica e perfeita, fica


incapacitado de incluir em sua pesquisa aspectos que ele não reconhece em si. A pessoa
encouraçada, mecanicamente rígida, pensa de forma mecânica. Não permite erros e acaba
por ignorar incertezas e situações em fluxo, limitando sua compreensão dos fenômenos.
(REICH, 2003, apud TESTA, 2008).

! Se faz importante ressaltar que Reich não pregava uma maior flexibilidade nos
métodos científicos, mas uma outra compreensão destes, o uso de uma outra
metodologia. Entendia que a percepção do cientista constitui parte importante de sua
compreensão; desta forma, a clínica não pode ser destituída de cientificidade já que
inclui observação, experimentação baseada em hipóteses, construção de conjunto de
conceitos teóricos, etc. A ciência mecanicista veria a clínica psicológica como espaço
pouco apto a construção de conhecimento pela não neutralidade do cientista/terapeuta,
envolvido nas questões do paciente através da relação terapêutica. Reich aponta,
entretanto, assim como posteriormente tantos outros nas ciências humanas (destaca-se
Foucault e Latour), e em convergência com a mudança de paradigmas na física, acerca
da impossibilidade de neutralidade do cientista. Aponta, também neste sentido, para a
necessidade de tomada de consciência destas implicações bio-psico-sociohistóricas do
cientista através do olhar voltado para si, do conhecimento de seus próprios bloqueios e
condições caracteriais.

! Tripicchio parece concordar com a crítica à metodologia usada nestes estudos


quando analisa que:

“A construção de variáveis para representar os conceitos de depressão e ansiedade


passou a se fazer através da definição de conjuntos de indicadores (itens de 'escalas'),

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escolhidos arbitrariamente entre diversas manifestações disfóricas, hedonistas e


somáticas (…)” (grifo meu) (TRIPICCHIO, 2007).

! Ele faz uma análise de que a dificuldade de reconhecer fatores comuns nos
estudos que relacionam à ‘esfera da mente’ com o surgimento do câncer se daria pela
diversidade de pressupostos teóricos e, desta maneira, de formas de definir a natureza
do objeto e construir a variável.

! Buscando uma conclusão acerca da possibilidade de relacionar ou não estas duas


esferas, o autor traz diversos e numerosos estudos que analisam a relação entre fatores
psicológicos e emocionais e o surgimento e desenvolvimento do câncer. Através desta
exposição, propõe chamar atenção para o fato de serem extremamente divergentes as
conclusões entre eles. Indagando-se acerca do que leva a esta divergência, o autor
sugere que se trate de um problema de metodologia, e não de método. Não se trataria,
portanto, de algo como uma limitação de viés amostral, imprecisão na definição das
variáveis, controle das variáveis intervenientes, etc., mas de modelos teóricos, conceitos;
de tudo aquilo que seria anterior à utilização do método. Segundo o autor, portanto,
baseando-se no pensamento de Ratcliffe & Gonzales-del-Vale que afirma que os
métodos orientados pelos paradigmas dedutivo e indutivo, incluindo o da
epidemiologia, não se adequariam aos ‘problemas mal estruturados’; sobre os quais há
pouca conformidade acerca da definição de sua natureza, este seria um exemplo de
problema mal estruturado.

! O autor chama atenção, nesse sentido, para a diversidade de maneiras de


descrever o objeto (construir a variável) entre os estudos sobre este mesmo tema;
considerando o tema como o da ligação entre a etiologia do câncer com tudo aquilo que
se refere a ‘esfera da psique’ esta pode ser entendida através de ângulos bastante
distintos, o que prejudicaria que as conclusões apresentadas fossem mais semelhantes
entre si. Para exemplificar isto, o autor aponta para determinados conceitos (de
depressão, ansiedade e distress) que são definidos de forma bastante diversa nos
estudos.

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! Trataria-se, ainda, para o autor, do que ele, ainda baseado em Ratcliffe &
Gonzales-del-Vale, definiria como um ‘erro de terceira espécie’, ou seja, um erro
fundado na incongruência entre o paradigma metodológico e a natureza do problema.
Isso se daria pela transformação de uma variável não quantificável em quantificável:

Pretende-se que a imprecisão inerente aos conceitos que enunciam os fenômenos da


'esfera da psique' possa ser contornada pela sua "redução" a uma variável definida
positivamente, por um conjunto especificado de indicadores vulneráveis à observação
empírica (mensuráveis). A diversidade de conjuntos capazes de definir a mesma variável
e o desejo de alcançar maior precisão resultam na descrição de subtipos que encobrem a
dificuldade de apreensão do conceito original (TRIPICCHIO, 2007).

! Nesse sentido, são apontadas duas importantes cisões nestes estudos analisados,
ligadas a esta incompatibilidade entre a metodologia e a natureza do problema. Estas
são: entre o doente e seu entorno, e entre os sintomas somados em cada categoria de
variável (depressão, etc) e os sintomas como um todo. O trecho abaixo explica isso:

O problema envolve um sujeito único, que exibe um conjunto particular de sinais e


sintomas, digamos 5 = {a, b, c, d, e, f}. Ao reconhecer o câncer no conjunto C = {c, d, e, f}, e
a depressão no conjunto D={a,b,c,d}, o método permite distinguir duas entidades, e
pretende separá-Ias. No entanto, mesmo que se considere o conjunto "S" como resultado
da união entre D e C, não será possível identificar a qual dos conjuntos originais pertence
cada um dos elementos comuns a "C" e a "D". Para tal seria necessário abandonar a idéia
de conjunto, e considerar que os sinais e sintomas exibidos pelo paciente se configuram
como um somatório, digamos S=a+b+c+d+e+f, em que cada parcela possui uma origem
determinada. Recorrer a tal expediente implica na abstração do sujeito doente, elemento
cuja unidade impõe o reconhecimento de "S" como um conjunto (TRIPICCHIO, 2007).

! O artigo de Tripicchio é trazido aqui pela correlação que entendemos possível de


ser feita entre suas análises e as de Wilhelm Reich, no sentido de uma aproximação na
crítica ao uso de uma determinada metodologia para o problema em questão. Tripicchio
entende que exista um erro decorrente da divergência entre a metodologia e o tipo do
problema; Reich analisa o erro científico como baseado em uma prática científica
positivista e mecanicista, prática inseparável da formação caracterial do cientista (não
entendendo como manifestação individual, mas psicossocial), que o limita.

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! Em seu livro “O éter, deus e o diabo” Reich aponta para alguns equívocos
famosos na história da ciência, por exemplo a teoria de Copérnico da centralidade do
sol, assim como o princípio de moral absoluta de Kant, e analisa-os supondo nestes algo
em comum: trata-se dos elementos estático e absoluto. Desta maneira, exemplifica a
associação que faz entre a lógica que figura na base de toda formulação de uma tese
científica e a estrutura caracterial daquele que a propõe, assim como da sociedade em
que surge e ganha espaço certa explicação de determinados fenômenos naturais. Nesse
sentido, um fator importante para o erro mecanicista estaria baseado na negligência ou
ignorância do cientista acerca de seu próprio sistema de percepções sensoriais e
consciência, como dito acima.

! Para nos aproximarmos melhor destes postulados de Reich, podemos usá-los


como ferramentas de compreensão da questão colocada acima: Tripicchio analisa
exatamente a forma com que os sintomas são entendidos nestes estudos como
expressões separadas e somadas. Para Reich, é fundamental que o paciente, como
organismo vivo, deva ser considerado como um todo: suas manifestações somáticas e
psicológicas não podem ser separadas e relacionadas tão somente por causa e efeito;
todos os sintomas, para Reich, são sinais avançados de um organismo já adoecido
integralmente, anteriormente, por uma estase energética. O trecho abaixo, do artigo de
Ana Luiza Testa, explicita isto:

Tentando superar esse reducionismo, o funcionalismo orgonômico trabalhou na


compreensão do fenômeno e não na descrição de suas partes. O funcionalismo
orgonômico estudou o fenômeno de dependência dos conteúdos psíquicos sobre o estado
energético do organismo. Dessa forma, uma terapia que engloba apenas um dos dois
aspectos isoladamente não restaria a saúde do indivíduo, apenas eliminaria sintomas.
Reich (2003) citou o exemplo da medicina para criticar a limitação de intervenções
fragmentadas: a medicina tradicional entende a produção da úlcera estomacal pela
liberação excessiva de suco gástrico. Essa descrição de como um componente químico
lesiona o tecido estomacal viabiliza o tratamento medicamentoso da área. Trata o
sintoma, mas não restabelece a saúde do organismo. Da mesma forma, o tratamento
psicológico pode até encontrar as bases inconscientes da úlcera, mas não restabelece a
saúde sem trabalhar com a estase de energia (TESTA, 2008, p. 5).

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! Entende-se, neste sentido, que “pesquisas feitas em situações artificiais, que


observam mecanicamente as partes envolvidas, perdem a compreensão do
fenômeno” (idem). O funcionalismo orgonômico, portanto, é criado por Reich como
uma resposta a esta crítica ao mecanicismo, indicando que este seria um método mais
adequado para o estudo das questões biopsicossociais, organísmicas. Este se pautaria,
como guia para a compreensão de todo e qualquer fenômeno, no aspecto funcional; o
problema do câncer, desta forma, estaria ligado a um prejuízo ou desequilíbrio na
função do orgasmo, função de carga e descarga que regularia todo organismo vivo. A
perda da função das células, e posteriormente de órgãos inteiros advinda da
malignização, estaria ligada a bloqueios que impedem o movimento de expansão e
contração em determinadas áreas do corpo.

2) A biopatia do câncer: A visão Reichiana do câncer e sua etiologia

! Diante dos resultados de uma série de experimentos e seguindo sua hipótese


inicial, Reich vai compreender o câncer como Biopatia, isto é; “toda patologia que tem
origem em uma disfunção (no sentido de uma contração) do Sistema Nervoso
Autônomo e altera toda a função biológica de pulsação plasmática do organismo
vivo” (REICH, 2009). Podemos compreendê-la, portanto, como qualquer doença que
tem em sua etiologia uma mistura de fatores em que, segundo Navarro, possui um
“componente psicológico que termina, desencadeia ou influencia os aspectos
biológicos”.

! A base da divergência de Reich das teorias clássicas do câncer consiste na


compreensão destas de que o tumor canceroso seria um ‘invasor’ diante de um
organismo que, apesar deste, apresentaria-se como completamente saudável em outros
aspectos. O câncer configura, assim, na compreensão hegemônica, quase como um
aparecimento misterioso, com fatores de origem demasiadamente numerosos e pouco
precisados, como descrito no início deste artigo.

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! Para aproximarmo-nos da maneira com que Reich iniciou suas conclusões em


relação a este processo cancerígeno, devemos conhecer alguns achados importantes
feitos por ele e sua equipe que levaram a esta compreensão. Reich observa que
protozoários e aquilo que denomina posteriormente de bacilos T se fazem presentes em
grande quantidade antes do surgimento de um tumor e até mesmo da célula cancerosa.
Esta e outras observações levam a conclusão de que não se trata de uma célula
“normal” que se tornou cancerosa, mas de uma formação celular que surge da
putrefação, em um órgão que apresenta uma respiração precária e um funcionamento
bioenergético deficiente. Ele entende que devido à estase crônica de energia e a
espasmos nos tecidos ocorreria uma desintegração protozoária, e, em decorrência disto,
uma autoinfecção, ou intoxicação, do organismo; isto significa que os tecidos em
decomposição se transformariam em bions, e logo em protozoários que auto-infectam o
organismo. Trata-se de um sistema sufocado, em que as divisões celulares se dão de
maneira anormal, e há um processo de putrefação; o ambiente torna-se ácido, com vida
anaeróbia, e a vida não pode mais se manter.

! Desta forma, Reich vê o processo do câncer como o próprio processo de morte


natural antecipado e acelerado. Neste sentido, o teste sanguíneo de resistência à
desintegração, que mediria a vitalidade dos glóbulos vermelhos seria uma ferramenta
importante de avaliação do estado de saúde do organismo como um todo. Essa saúde
não caracterizaria um organismo em que não houvesse presença de bacilos T, mas em
que existisse a capacidade de eliminá-los assim como produzir uma menor quantidade
destes através de uma menor desintegração dos tecidos.

! Aqui voltamos a outra questão colocada no início do artigo: o que faz uma
pessoa mais resistente, ou com maior capacidade para defender-se de um processo de
malignização das células? Para Reich, o fator mais essencial para esta compreensão é a
capacidade de pulsação do organismo, como entendemos em relação aos testes com
glóbulos vermelhos. Tal pulsação é descrita por Reich como relacionada à vitalidade do
organismo e ausência de bloqueios mais graves. A capacidade de pulsação, além de

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ajudar no combate aos protozoários no caso de surgimento destes, principalmente pode


prevenir a formação destas condições de desintegração dos tecidos.

! Acerca da questão dos fatores hereditários, abordada no início do artigo,


compreende-se que tudo aquilo que se pode afirmar em relação a este tema é de que se
trata de suscetibilidades, terrenos em que as biopatias podem surgir. A relevância deste
terreno para o surgimento de doenças, porém, é ainda muito discutida, mas
compreende-se que esteja longe de figurar como fator determinante no surgimento de
um câncer. Entendemos que nenhum fator possa ser considerado, sozinho,
determinante para o surgimento de um câncer, entretanto Reich organiza os principais
fatores em uma única lógica que os envolve, a do PFC (Principio de Funcionamento
Comum) ligado ao processo psicológico da ‘resignação’, que será abordado mais
adiante. Através deste conceito de Princípio de Funcionamento Comum, Reich estaria se
referindo ao próprio movimento pulsatório, função comum a todos os seres vivos,
desde o verme até o homem.

! Reich notou que o câncer estava associado, em seus pacientes, a um


encolhimento energético e muscular; este estava ligado a um distúrbio essencial nesta
pulsação biológica, decorrente de uma origem única, a estase sexual. Esta poderia se
manifestar através de distúrbios no aparelho psíquico (neuroses e psicoses) e/ou
distúrbios funcionais corporais, em doenças como o câncer. Trataria-se de uma
contração crônica e gradual do sistema plasmático, junto a uma inibição na expansão do
mesmo.

! É importante compreender alguns aspectos principais envolvidos com esta estase


sexual e paralelo encolhimento crônico do organismo. Neste processo destaca-se o
empobrecimento da respiração externa, que resulta em um distúrbio na respiração
interna (dos tecidos e células), os distúrbios na função de carga e descarga nos órgãos
autonômicos (principalmente os sexuais) e impotência orgástica crônica, entre outros.
Ressalta-se que quando Reich trata de impotência orgástica, supõe que seus leitores
compreendam que esta se refere, como explicita desde o início de seus estudos sobre A

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função do orgasmo (REICH, 1975), a uma incapacidade de satisfação plena, ligada à


descarga orgonótica que derivaria naturalmente do orgasmo. A observação de Reich
acerca da respiração também deve ser compreendida como um aspecto inseparável
deste distúrbio na capacidade de descarga do orgasmo no sentido de que ambos se
referem a bloqueios gerais da capacidade pulsatória do organismo; entretanto, estes
bloqueios, em cada caso, poderão se localizar de maneira mais forte em determinados
segmentos do corpo, em relação à estrutura caracterial, o que estará intimamente ligado
ao local onde podem surgir, posteriormente, tumores.

! Após a apresentação da questão em termos de economia energética ligados a


estase sexual, podemos nos perguntar de que forma se poderia observar fatores mais
claramente psicológicos ou emocionais neste processo. Um questionamento que nos
indica uma compreensão é acerca das múltiplas possibilidades de adoecimento diante
de uma estase sexual: esta poderia dar origem a biopatias completamente distintas
como, por exemplo, um câncer ou uma biopatia cardiovascular. Estas diferenças seriam
decorrentes de um processo distinto de reação do organismo à energia represada;
enquanto no caso da biopatia cardiovascular haveria uma reação bastante energética,
em que se mantém a sensação corporal e a excitação sexual de forma viva e em
movimento, o câncer teria como reação uma resignação, encolhimento deste movimento
que direcionaria o sujeito a uma busca por sua pulsação natural. Trataria-se de uma
resignação acerca da negação da vida que se apresenta ao sujeito em sua própria
caracterialidade. No livro “A Biopatia do Câncer” Reich descreve sua visão, nesse
sentido, ressaltando não se tratar de uma afirmação conclusiva, mas de uma hipótese,
que surge da observação prática, a ser confirmada e melhor compreendida. Explica,
desta forma, que nunca lidou com pacientes cancerosos que demonstrem emoções
violentas, acessos de raiva, etc., e que, ao contrário, os indivíduos que sofrem de
hipertensão apresentariam uma contração vascular crônica concomitante a um
comportamento frequentemente explosivo.

! Pensando no processo energético presente em cada um desses casos, trata-se, no


caso da biopatia cardiovascular, de uma energia que continua a ser gerada ao máximo,

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mesmo com os bloqueios que dificultam sua circulação, e o organismo reage a isto com
fortes contrações. Assim se dão crises de angústia, explosões de raiva, ou
hipertireoidismo, diarréia, etc. Já no caso do câncer, há uma diminuição da produção
energética, como no caso da histeria. Neste sentido, Reich afirma:

Desde um ponto de vista funcional, uma crise de angustia é uma descarga de energia,
mesmo que de natureza patológica. A quietude emocional crônica, ao contrário, é
acompanhada de calma bioenergética no sistema celular e plasmático (p. 155).

! Reich utiliza de uma metáfora para tornar essa compreensão mais clara: compara
uma água em movimento e a água parada, como em uma lagoa, considerando que na
segunda os processos de putrefação não só não são eliminados como são acelerados;
amebas e protozoários se desenvolvem muito mais facilmente em águas paradas. Reich
mais uma vez ressalta a forma com que não tem ainda muita clareza acerca de em que
consiste exatamente este processo de “asfixia” no organismo, mas afirma estar
convencido de que esses pressupostos podem nos indicar uma nítida direção para a
melhor compreensão da etiologia de um câncer.

CONCLUSÃO

! Pudemos, no presente estudo, analisar as formas com que a perspectiva de Reich


é divergente da clássica no que se refere ao câncer em diversos âmbitos; poderíamos nos
debruçar sobre estes minuciosamente incluindo os aspectos físicos e biológicos
detalhados na forma como são compreendidos por ambas as teorias. Esse trabalho
parece ser importante de ser feito continuamente, pelas atualizações do estudo do
câncer e suas eventuais aproximações à teoria Reichiana. Entre os autores que se
dedicaram a descrever este quadro comparativo, destaca-se, entre outros, Chester M.
Raphael, autor do prefácio de Biopatia do Câncer. Chester M. Raphael, neste prefácio,
indica algumas correlações possíveis, no sentido indicado acima; por exemplo, em
relação às teorias recentes sobre a possibilidade de figurar na origem do câncer a ação
de vírus, em convergência com os estudos de Reich, como indica no seguinte trecho:

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O ‘vírus do câncer’ teórico está sem duvida relacionado aos bacilos T de Reich, que
produziram tumores cancerosos em animais de laboratórios, fortalecendo desta forma a
teoria atual da infecção. No entanto, para se ajustar aos pontos de vista de Reich, a teoria
da infecção teria que incluir o fato de que o bacilo T se origina de maneira endógena a
partir da desintegração bionosa da substância viva (É claro que isso desacredita a teoria
metafísica dos “germes aéreos”, a partir dos quais se presume que todas as bactérias se
desenvolvem). A depressão psíquica ou falta de agressão, observada por especialistas em
psicossomática, é a “resignação caracteriológica” de Reich (REICH, 2009).

! O objetivo do presente estudo, entretanto, não foi no sentido de explicitar na


teoria de Reich e na teoria clássica suas minúcias biofisiológicas, mas de compreender
uma nítida distinção, mais global, que se refere à metodologia e a uma lógica geral, o
que em Reich se daria através do que chamou de funcionalismo orgonômico e da lógica
do Principio de Funcionamento Comum. A visão de Reich se distingue, nesse sentido,
pela lógica integradora de compreensão do sujeito através do fluxo energético e sua
pulsação; pulsação relacionada à formação caracterial, que se refere a um aparelho
biopsicossocial e os bloqueios adquiridos em seu desenvolvimento.

! Nesse sentido, a questão da cura, ou do tratamento, é abordada por Reich


também como uma questão necessariamente integral, sistêmica. Se se compreende que
o processo cancerígeno é anterior ao surgimento da célula malignizada, é lógico que se
entenda o tratamento posterior tradicional como parcial e pouco eficiente (além de
bastante agressivo) já que se inicia já em uma fase em que a doença já está evoluída. O
tratamento de extirpação do tumor, assim como rádio e quimioterapia, não trata do
processo de putrefação no organismo. Não se trata de menosprezá-los e tê-los como
tratamentos equivocados, mas compreender que se trata de um processo sobre os
efeitos secundários da doença, o que pode ajudar na luta imediata pela vida mas não
impedir, por exemplo, que novos tumores se formem ou que haja uma metástase,
inseridos no processo de putrefação. Mesmo que Reich tenha desenvolvido terapias
energéticas bastante eficazes (não abordadas no presente artigo, mas detalhadas
densamente nos livros Biopatia do Câncer, Éter, Deus e o Diabo, entre outros) podendo
com elas aumentar o fluxo de energia no organismo e com isso reverter alguns

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processos cancerígenos, sua aposta é na prevenção. Prevenção que passa,


necessariamente, pelo aspecto energético, que em Reich é absolutamente inseparável do
psicológico e social. Chester M. Raphael acrescenta, neste sentido, sobre a importância
da consideração do âmbito social como espaço onde este esforço de prevenção deve se
dar prioritariamente:

Reich afirma enfaticamente que a solução definitiva para o problema do câncer está na
prevenção da doença, e não em sua cura. Os meios para se chegar a essa solução devem
ser buscados em primeiro lugar no campo social, pois é nossa ordem social repressora
que cria a miséria sexual e a consequente estagnação da energia biológica em que se
origina o câncer (REICH, 2009).

! De forma bastante distinta, quando buscamos atualmente estudos sobre a


influência dos aspectos psicológicos na etiologia do câncer, nos deparamos tão-somente,
como pudemos analisar aqui, com uma visão ‘biologicista’ ou ´psicologicista´, em que o
âmbito do campo social é visto como pouco ou nada relevante. Além disso, o que
podemos observar é uma enorme dificuldade destas de unir estes dois mundos
(biologia/medicina e mundo psíquico) de forma coerente. Vemos que em estudos mais
voltados para a visão psicológica, não há uma compreensão, por trás da simples
correlação estatística, de como os aspectos psicológicos podem estar concretamente
relacionados a fatores biológicos, parece haver um mistério, um salto entre estas duas
lógicas. O trecho abaixo, de Roger Dadoun, do sumário do livro Somatopsicodinâmica,
de Federico Navarro, ressalta esta questão:

(...) toda desordem no funcionamento energético do individuo se expressa em aspectos


fisicos (somáticos) ou psíquicos, - dupla vertente que, considerada de perspectiva
energética (dinâmica), expressa a unidade funcional entre corpo e espírito, entre soma e
psique. Não se trata de privilegiar uma ou outra vertente e, menos ainda, de fazer de
uma a causa da outra, como é a tentação do positivismo médico, que só quer considerar
os fatores orgânicos, ou da psicossomática, que dá valor excessivo aos fatores psíquicos.
Mesmo que seja somente por seu valor operatório, convém assinalar o paralelismo dessa
dualidade constitutiva do homem, não deixando de procurar seguir, sistematicamente, os
traços dos fluxos energéticos que a sustentam e alimentam (NAVARRO, 1995).

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! Através desta percepção ressalta-se a importância de uma aproximação a um


pensar mais funcional, assim como é apresentado por Reich. O pensamento Reichiano
rompe com o pensamento mecanicista dualizante e categorizante que predomina,
apontando para uma compreensão sistêmica que ilumina questões complexas como as
do câncer e de outras biopatias.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

-TRIPICCHIO, A. O desafio da relação mente/câncer. 14/06/2007. Disponível em:


<http://www.redepsi.com.br/portal/modules/smartsection/item.php?itemid=518>
Acesso em: 10 março, 2013,16h31

-INCA (NSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER). O que é o câncer. Rio de Janeiro, RJ.


Disponível em <http://www1.inca.gov.br/conteudo_view.asp?id=322> Acesso em: 07
março, 2013,10h

-TESTA, A. L. A crítica de Reich sobre o paradigma mecanicista de ciência. In:


ENCONTRO PARANAENSE, CONGRESSO BRASILEIRO, CONVENÇÃO BRASIL/
LATINO-AMÉRICA, XIII, VIII, II, 2008. Anais. Curitiba: Centro Reichiano, 2008. CD-
ROM. [ISBN – 978-85-87691-13-2]. Disponível em: <http://
www.centroreichiano.com.br/artigos/Anais%202008/Ana%20Lu%C3%ADsa
%20Testa.pdf.> Acesso em 10 março, 2013.

-NAVARRO, F. A Somatopsicodinâmica. Sistemática reichiana da patologia e da clínica


médica. São Paulo, SP: Summus Editorial. 1995.137p.

-REICH, W. A biopatia do câncer. 1ª edição.São Paulo, SP: Martins Fontes, 2009. 479p.

-REICH, W. Éter, deus e o diabo. 1ª edição. São Paulo, SP: Martins Fontes, 2003. 334p.

-REICH, W. Análise do Caráter. 4ª edição.São Paulo, SP: Martins Fontes, 2001. 492p.

-REICH, W. A função do orgasmo. 9ª edição.São Paulo, SP: Editora Brasiliense, 1975.


198p. inconsciente.

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