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LITERATURA (7° ano) – Professora: Elizângela França

O herói da cavalaria andante na Idade Média

Percival no castelo de Brancaflor

Percival cavalgou o dia inteiro na floresta, solitário. Sentia-se muito mais à vontade do
que se estivesse em campo aberto.
A noite caía quando enxergou uma fortaleza, bem situada, mas fora dela só se via
mar,água e terra desolada.
Percival passou por uma ponte toda bamba e bateu no portão.
Uma moça magra e pálida apareceu à janela:
“Quem bate?”
“Um cavaleiro que pede hospedagem para a noite.”
A moça desapareceu e quatro homens de armas de aspecto miserável vieram abrir
o portão.
Percival seguiu-os pelas ruas desertas, ladeadas de casebres caindo aos pedaços. Nem
moinho para moer, nem forno para assar. Nenhum sinal de homem ou mulher, dois conventos
abandonados...
Chegaram ao palácio com parapeito de ardósia. Um criado levou o cavalo a um
estábulo sem trigo nem feno, com apenas um pouco de palha... Outro conduziu Percival a uma
bonita sala onde dois homens de certa idade e ar debilitado foram ao seu encontro.
Uma jovem os acompanhava. Seus olhos eram sorridentes e claros, seus cabelos louros
caíam como ouro fino sobre os ombros cobertos por um manto de púrpura escura, ornado de
pele de esquilo e com as bordas de arminho. Nunca houve moça mais linda do que ela. Seu
nome era Brancaflor.
Ela deu a mão a Percival, levou-o para um grande quarto com o teto todo esculpido
e pediu-lhe que se sentasse ao lado dela, na cama coberto de brocado.
“Aceite nossa casa tal como é. Não há fartura de nada, como verá. Temos apenas
seis pães que o superior do convento, meu tio, me mandou para a ceia desta noite. Não
háoutro alimento, salvo um cabrito selvagem que um dos meus soldados caçou esta manhã.”
Dito isso, ela ordenou que pusessem as mesas. Todos se sentaram, e o jantar foi breve.
Percival foi se deitar, ainda morto de fome. Mas os lençóis eram
imaculadamente brancos, o travesseiro macio, as cobertas ricas. Adormeceu. Foi acordado por
um choro bem próximo do seu rosto. Surpreso, viu Brancaflor soluçando de joelhos diante da
cama, com um manto curto de seda escarlate jogado em cima da camisola.
“O que houve, minha bela? Por que veio aqui?”
“Não me julgue mal. Estou desesperada. Faz um longo inverno e um longo verão que
o senescal de Clamadeu das ilhas, o pérfido Anguingeron, nos sitia. Sobram apenas cinquenta
cavaleiros dos trezentos que formavam a guarnição daqui. Os outros morreram ou estão
presos. Nossas provisões, como viu, se esgotaram. Não há nem obastante para o almoço de
uma abelha! Amanhã nos renderemos, e eu serei entregue com o castelo. Mas eles não vão me
pegar viva. Antes de me entregarem, eu me mato. Foi isso que vim lhe dizer.”
A espertinha sabia o que estava fazendo. Nenhum cavaleiro seria capaz de ouvir
indiferente tais palavras. Percival exclamou:
“Enxugue suas lágrimas, bela amiga. Vou defendê-la amanhã. Desafiarei o senescal
Anguingueron para um combate singular e o matarei!”
Na manhã seguinte, pediu suas armas, vestiu-se, montou a cavalo e saiu do castelo.
Anguingueron estava sentado diante da sua tenda, entre os sitiantes. Viu Percival se
aproximar, armou-se, pulou no cavalo e perguntou:
“Veio em busca de paz ou de batalha?”
“Responda primeiro: o que você veio fazer aqui? Matar os cavaleiros e devastar a
terra?”
“Quero que o castelo se renda, e quero a moça.”
“Ao diabo, você e suas palavras!”
Percival abaixou a lança e os dois adversários se precipitaram um contra o outro a toda
velocidade sobre seus cavalos. Foi um combate longo e furioso, mas o senescal acabou indo
ao chão. Gritava:
“Piedade! Poupe-me! Não seja cruel!”
Percival lembrou-se do conselho do bom Gornemant e hesitou.
“Se você tem um senhor, mande-me a ele”, insistiu senescal. “Contarei a sua vitoria e
depositarei nas mãos dele minha sorte.”
“Então vá ver o rei Artur. Cumprimente o rei por mim e peça que mostrem a você a
moça que foi esbofeteada por Keu por ter rido ao me ver. Entregue-se prisioneiro a ela e diga-
lhe que eu espero não morrer antes de vingá-la!”
Percival voltou ao castelo sob as aclamações dos sitiados. E Brancaflor, desde então,
amou-o.
(Jaqueline Mirande. Contos e lendas da Távola Redonda. Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Cia das Letras, 1998.
P.47-53.)

Interpretação do Texto

1-Nas novelas de cavalaria, os heróis são geralmente cavaleiros andantes, isto é, cavaleiros que
caminham solitariamente em busca de aventuras e de fama. Esse perfil de herói é confirmado no
texto?

2-No texto, Percival chega ao castelo de Brancaflor:


a)Qual a situação do castelo, da guarda e de seus habitantes?
b)Qual é a causa dessa situação?
c)Que indícios, no texto, comprovam que a situação material do castelo tinha sido diferente no
passado?

3-Brancaflor e Percival encarnam, respectivamente, o ideal feminino e o ideal do herói das novelas de
cavalaria:
a)Quais são as qualidades físicas e morais de Brancaflor?
b)E de Percival?

4-Anguingueron, por sua vez, é o típico vilão nesse tipo de história. O que o faz ser um vilão?

5-Ao combater o vilão, Percival põe em prática seus ideais de cavalaria. Que feitos do cavaleiro
confirmam seu caráter heroico?

6-Ao derrotar Anguingueron, Percival poderia matá-lo. No entanto, lembra-se do conselho dado a ele
por seu mestre, Gornemant, que o ensinara a lutar e o transformara em cavaleiro. Veja o conselho:
“Eu vos confiro a ordem de cavalaria, que não admitenenhuma baixeza. Não mateis vosso adversário
vencido, se ele vos pedir clemência. Procurai não falar demais, ajudai o homem ou a dama que virdes
em precisão e não deixeis de orar a Deus por vossa alma.”
- As ações de Percival estão de acordo com esse conselho? Justifique sua resposta.

7-Nas recomendações finais que dá a Anguingueron, Percival lhe diz que se apresente ao rei e
depois se entregue como prisioneiro à moça esbofeteada por Keu. Que outras qualidades de Percival
ficam evidentes nesse gesto?

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