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Universidade Federal de Goiás

Faculdade de Educação
Curso de Pedagogia – 5° Período
POLÍTICAS EDUCACIONAIS
Profa. Dra. Denise Silva Araújo
Acadêmicas: Beatriz Antunes da Silva Alves
Júlia Carvalho Leal de Souza

EDUCAÇÃO QUILOMBOLA

Goiânia, 10 de julho de 2017.


INTRODUÇÃO

Neste texto serão abordados aparatos legais e outras discussões sobre a


Educação Quilombola. Para entrar no assunto sobre a Educação Quilombola precisamos
tratar brevemente da historicidade dos negros e negros quilombolas deste país para
chegarmos a nossa finalidade. Precisamos lembrar que o quilombo, que tem como
definição no dicionário “Esconderijo no mato onde se refugiavam os escravos” (Dicionário
Aurélio, 2017), foi e é um local de resistência e não apenas um refúgio dos escravos.
Construiu-se laços, fazeres, história e todo o sentido trago pelos ancestrais de
comunidade. Composto por uma comunidade que não se identifica apenas com a
educação da cidade e assim, foi preciso tomar medidas legais para reduzir uma dívida
histórica que vem desde a escravidão, logo, é preciso tratar esta educação com outros
parâmetros, para isto criou-se leis, parecer, diretrizes e resoluções que veremos ao
decorrer do texto.

EDUCAÇÃO QUILOMBOLA

A partir do século XVI a população negra desembarcou e com precárias condições


foram escravizados pelos senhores de engenho e mesmo em 1888 com a Lei Áurea, os
negros sobreviviam em péssimas condições principalmente em relação aos direitos, mas
isso não foi motivo para que os negros parassem de se organizar. Leia o trecho abaixo
que traz um pouco desta organização e relação entre eles:

“Nas formas individuais e coletivas, em senzalas, quilombos,


terreiros, irmandades, a identidade do povo negro foi assegurada
como patrimônio da educação dos afro-brasileiros. Apesar das
precárias condições de sobrevivência que a população negra
enfrentou e ainda enfrenta, a relação com a ancestralidade e a
religiosidade africanas e com os valores nelas representados, assim
como a reprodução de um senso de coletividade, por exemplo,
possibilitaram a dinamicidade da cultura e do processo de resistência
das diversas comunidades afro-brasileiras.” (Introdução. Orientações
e Ações para a Educação das Relações Étnico-Raciais. p. 14).

Após a III Conferência de Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a


Xenofobia e as Formas Correlatas de Intolerância, é reconhecida a responsabilidade
histórica do Estado brasileiro pelo escravismo e marginalização econômica, social e
política dos descendentes de africanos. Abrindo horizontes para um plano de ação, em
especial voltadas a educação. Alguns deles abaixo:
“Igual acesso à educação pra todos e todas na lei e na prática; Adoção e
implementação de leis que proíbam a discriminação baseada em raça,
cor, descendência, origem nacional ou étnica em todos os níveis de
educação, tanto formal quanto informal; Medidas necessárias para
eliminar os obstáculos que limitam o acesso a crianças à educação;
Recursos para eliminar, onde existam, desigualdades nos rendimentos
educacionais para jovens e crianças; Apoio aos esforços que assegurem
ambiente escolar seguro, libre da violência e de assédio motivados por
racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata;
Estabelecimento de programas de assistência financeira desenhados
para capacitar todos os estudantes, independente de raça, cor,
descendência, origem étnica ou nacional a frequentarem instituições
educacionais de ensino superior.” (Introdução. Orientações e Ações para
a Educação das Relações Étnico-Raciais. p. 19).

Devido esta organização do Movimento Negro o Estado projeta programas e


políticas para a população negra. Entre elas, a Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003
sancionada pelo presidente daquela época, Luís Inácio Lula da Silva que altera a Lei 9 .
394, de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional (LDB) incluindo
no currículo da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-
Brasileira” no ensino fundamental e médio, oficiais e particulares e coloca no calendário
escolar o dia 20 de novembro como “Dia Nacional da Consciência Negra”. Seu programa
de estudo tem os seguintes objetivos:

“Incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos


negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da
sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas
áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil.”
(Artigo 26-A §1. Lei 10.639, site do planalto, acesso 09/07/2017).

Em março de 2004, o Conselho Nacional de Educação aprova o parecer que


institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e
para o Ensino e Cultura Afro-Brasileira e Africana deve ser dado em diferentes níveis de
escolaridade. Este documento também aponta a importância e necessidade de diretrizes
que vem sendo proposta pelo Movimento Negro ao longo do século XX. Observe alguns
dos objetivos propostos neste parecer:

“Destina-se, o parecer, aos administradores dos sistemas de ensino, de


mantenedoras de estabelecimentos de ensino, aos estabelecimentos de
ensino, seus professores e a todos implicados na elaboração, execução,
avaliação de programas de interesse educacional, de planos institucionais,
pedagógicos e de ensino. Destina-se, também, às famílias dos estudantes,
a eles próprios e a todos os cidadãos comprometidos com a educação dos
brasileiros, para nele buscarem orientações, quando pretenderem dialogar
com os sistemas de ensino, escolas e educadores, no que diz respeito às
relações étnico-raciais, ao reconhecimento e valorização da história e
cultura dos afro-brasileiros, à diversidade da nação brasileira, ao igual
direito à educação de qualidade, isto é, não apenas direito ao estudo, mas
também à formação para a cidadania responsável pela construção de uma
sociedade justa e democrática.” (CNE/CP. 03/2004 p. 2).

Precisamos entender o que são quilombos para continuar esta trajetória da


Educação Quilombola, a mais nova definição que vai a confronto com definição colocada
até hoje pelo dicionário citado na introdução. De acordo com o decreto nº 4.887, de 20 de
novembro de 2003:

“Art. 2° Consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos,


para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de
auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações
territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra
relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida.” (Decreto nº
4.887 11/2003).

Uma definição mais nova do que são os quilombos e que dão a eles está a
atribuição, possuem suas próprias formas de organização, conhecimentos, tecnologias,
praticas que são transmitidos por gerações e são ocupantes do território cultural como
condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica. Assim, a
Educação Quilombola foi traduzida em um decreto que questiona e indaga o currículo
normativo.
Com o parecer CNE/CEB 07/2010 que diz respeito às diretrizes gerais da
Educação Básica, o Conselho Nacional de Educação que se tem pela primeira vez o
termo Educação Quilombola dentro de um documento que reconhece outra modalidade
de educação:

“Como já referido, na oferta de cada etapa pode corresponder uma ou


mais modalidades de ensino: Educação de Jovens e Adultos, Educação
Especial, Educação Profissional e Tecnológica, Educação Básica do
Campo, Educação Escolar Indígena, Educação Escolar Quilombola e
Educação a Distância.” (CEN/CEB 07/2010 p. 35).

E então na Resolução Nº 8, de 20 de novembro de 2012, tratando da Educação


Quilombola fica defino Diretrizes Curriculares para a Educação Quilombola, observe:

“Art. 1º Ficam estabelecidas Diretrizes Curriculares Nacionais para a


Educação Escolar Quilombola na Educação Básica, na forma desta
Resolução. § 1º A Educação Escolar Quilombola na Educação Básica: I -
organiza precipuamente o ensino ministrado nas instituições educacionais
fundamentando-se, informando-se e alimentando-se: a) da memória
coletiva; b) das línguas reminiscentes; c) dos marcos civilizatórios; d) das
práticas culturais; e) das tecnologias e formas de produção do trabalho; f)
dos acervos e repertórios orais; g) dos festejos, usos, tradições e demais
elementos que conformam o patrimônio cultural das comunidades
quilombolas de todo o país; h) da territorialidade.” (Diretrizes Curriculares
Nacional para a Educação Escolar Quilombola na Educação Básica, 2012,
p.3).

A Educação Escolar Quilombola tem os seus princípios especifico que apresenta


características para proteção das manifestações culturais afro-culturais, reconhecimento
do processo histórico deste povo. Retiramos alguns dos princípios que chamaram a
atenção:

“Art. 7º A Educação Escolar Quilombola rege-se nas suas práticas e ações


político pedagógicas pelos seguintes princípios: I - direito à igualdade,
liberdade, diversidade e pluralidade; II - direito à educação pública, gratuita
e de qualidade; III - respeito e reconhecimento da história e da cultura afro-
brasileira como elementos estruturantes do processo civilizatório nacional;
IV - proteção das manifestações da cultura afro-brasileira; V - valorização
da diversidade étnico-racial; [...]XVI - reconhecimento e respeito da história
dos quilombos, dos espaços e dos tempos nos quais as crianças,
adolescentes, jovens, adultos e idosos quilombolas aprendem e se
educam; XVII - direito dos estudantes, dos profissionais da educação e da
comunidade de se apropriarem dos conhecimentos tradicionais e das
formas de produção das comunidades quilombolas de modo a contribuir
para o seu reconhecimento, valorização e continuidade; XVIII - trabalho
como princípio educativo das ações didático-pedagógicas da escola; XIX -
valorização das ações de cooperação e de solidariedade presentes na
história das comunidades quilombolas, a fim de contribuir para o
fortalecimento das redes de colaboração solidária por elas construídas.”
(Título II. Resolução 08/2012. p. 5).

Essa Educação Quilombola pode se organizar das variadas formas como séries
anuais, períodos, ciclos, grupos não-seriados, com base na idade. Deve garantir um
programa institucional de alimentação escolar que respeite as especificidades das
comunidades quilombolas, respeitando os hábitos quilombolas. O seu calendário deve
incluir:

“Peculiaridades locais, inclusive climáticas, econômicas e


socioculturais, a critério do respectivo sistema de ensino e do projeto
político-pedagógico da escola, sem com isso reduzir o número de
horas letivas previsto na LDB.” (Título IV. Resolução 08/2012 p. 7).

Foi pensada uma Educação Quilombola para todas as modalidades: Educação


Infantil, Ensino Médio, EJA, até o Ensino Profissionalizante Técnica de Nível Médio,
respeitando pensando também na finalidade destas modalidades de educação tanto
dentro da comunidade quanto para o preparo do trabalho na mesma.
E por fim a responsabilidade para a implementação dessas diretrizes cabe a União,
aos Estados e para os Municípios cada um com a suas especificidades. Leia a
recomendação geral no trecho a seguir do documento:

“Art. 61 Recomenda-se que os Entes Federados (União, Estados,


Distrito Federal e Municípios) trabalhem no sentido de articular as
ações de diferentes setores que garantam o direito às comunidades
quilombolas à educação, à cultura, à ancestralidade, à memória e ao
desenvolvimento sustentável, especialmente os Municípios, dada a
sua condição de estarem mais próximos dos locais em que residem
as populações quilombolas rurais e urbanas.” (Titulo IX. Resolução
08/2012. p. 20).

Logo, a Educação Escolar Quilombola deve ser um trabalho conjunto de todos


órgãos, juntamente com Universidade disposta, Movimento Negro. Buscando esse
resgaste das tradições afrodescendentes, uma boa educação a todos e o cumprimento
desses decretos dentro de todas as comunidades quilombolas.

CONCLUSÃO

Podemos concluir que, as comunidades quilombolas não são algo distantes da


nossa realidade, pois estas ainda existem no nosso país atualmente, e é possível
aprender muito com elas. Felizmente, comunidades quilombolas recebem apoio de
entidades federativas para continuarem suas lutas. Têm acesso a cursos, inclusive de
formação à distância, EJA e qualificação tanto social como profissional. Hoje, estão mais
próximas das cidades e vivem de acordo com necessidades impostas pelo meio urbano.
Devemos ressaltar que, embora as importantes definições listadas na legislação
nacional, a realidade concreta que são possíveis ser observadas nas comunidades
quilombolas ainda têm necessidade de serem efetivadas para que se possa realmente
discutir a existência de um ensino democrático, inclusivo, antirracista e emancipatório,
considerando as especificidades dentro de um país tão multicultural.
O número de comunidades remanescentes de quilombos no Brasil é grande, mas
ainda não existe um levantamento extensivo sobre o número exato destas. Sabe-se que
há comunidades em todas as Unidades da Federação, exceção feita ao Acre, a Roraima e
ao Distrito Federal. (MEC, 20--).
Lembrando Castilho (2008), que ressalta a necessidade de pesquisas neste
âmbito, a fim de não só enriquecer os conhecimentos da academia, como também
colaborar com a luta destas comunidades.

BIBLIOGRAFIA

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