º ANO
ANO LETIVO: ________ / ________ ANO DE ESCOLARIDADE: 12.º Ano DATA: ______ / ______ /
______
NOME: _______________________________________________________________________________________________________ N.º: ________ TURMA: ________
CLASSIFICAÇÃO: ______________________ PROFESSOR: ________________________________ ENC. DE EDUCAÇÃO: _________________________________
DURAÇÃO DA PROVA: 120 minutos. | TOLERÂNCIA: 30 minutos.
GRUPO I
A
Leia o excerto de O Ano da Morte de Ricardo Reis, de José Saramago. Se necessário, consulte as notas.
1 Deixou de chover, o céu aclarou, pode Ricardo Reis, sem risco de molha incómoda, dar um passeio
antes do almoço. […] Ricardo Reis para diante da estátua de Eça de Queirós, ou Queiroz, por cabal respeito
da ortografia que o dono do nome usou, ai como podem ser diferentes as maneiras de escrever, e o nome
ainda é o menos, assombroso é falarem estes a mesma língua e serem, um Reis, o outro, Eça, provavelmente
5 a língua é que vai escolhendo os escritores de que precisa, serve-se deles para que exprimam uma parte 1
pequena do que é, quando a língua tiver dito tudo, e calado, sempre quero ver como iremos nós viver. Já as
primeiras dificuldades começam a surgir, ou não serão ainda dificuldades, antes diferentes e questionadoras
camadas de sentido, sedimentos removidos, novas cristalizações, por exemplo, Sobre a nudez forte da
verdade o manto diáfano1 da fantasia2, parece clara a sentença, clara, fechada e conclusa, uma criança será
10 capaz de perceber e ir ao exame repetir sem se enganar, mas essa mesma criança perceberia e repetiria com
igual convicção um novo dito, Sobre a nudez forte da fantasia o manto diáfano da verdade, e este dito, sim,
dá muito mais que pensar, e saborosamente imaginar, sólida e nua a fantasia, diáfana apenas a verdade, se
as sentenças viradas do avesso passarem a ser lei, que mundo faremos com ela, milagre é não endoidecerem
os homens de cada vez que abrem a boca para falar. É instrutivo o passeio, ainda agora contemplámos o
15 Eça e já podemos observar o Camões, a este não se lembraram de pôr-lhe versos no pedestal, e se um
pusessem qual poriam, Aqui, com grave dor, com triste acento, o melhor é deixar o pobre amargurado,
subir o que falta da rua, da Misericórdia que já foi do Mundo, infelizmente não se pode ter tudo nem ao
mesmo tempo, ou mundo ou misericórdia. Eis o antigo Largo de S. Roque, e a igreja do mesmo santo […].
NOTAS
1 diáfano: diz-se daquilo que permite a passagem da luz, mas que não permite a visão nítida dos contornos dos objetos luminosos ou
iluminados; translúcido.
2 Sobre a nudez forte da verdade o manto diáfano da fantasia: epígrafe do romance A Relíquia, de Eça de Queirós, evidenciando a relação entre
realismo e imaginação.
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Este bairro é castiço, alto de nome e situação, baixo de costumes, alternam os ramos de louro às portas das
20 tabernas com mulheres de meia-porta, ainda que, por ser a hora matinal e estarem lavadas as ruas pelas
grandes chuvas destes dias, se reconheça na atmosfera uma espécie de frescura inocente, um assopro
virginal, quem tal diria em lugar de tanta perdição […].
José Saramago, O Ano da Morte de Ricardo Reis, Porto, Porto Editora, 2016
1. Relacione a afirmação «É instrutivo o passeio» (linha 14) com o conteúdo global do excerto.
2. «Este bairro é castiço, alto de nome e situação, baixo de costumes» (linha 19). Identifique o recurso
estilístico utilizado para caracterizar o Bairro Alto e comente o seu valor expressivo.
3. Caracterize o narrador. Fundamente a sua resposta com elementos textuais pertinentes.
B
Leia o texto seguinte, constituído pelas estrofes 23, 24, 27 e 28 do poema «O Sentimento dum Ocidental»,
de Cesário Verde.
[…]
Cesário Verde, Cânticos do Realismo – O Livro de Cesário Verde, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2015
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4. Explique o modo como a perceção sensorial do real e a sua transfiguração poética se verificam nas
duas estrofes iniciais.
5. Caracterize o tipo de poesia que o «eu» deseja escrever, tendo em conta a terceira e a quarta estrofes.
GRUPO II
Leia o texto seguinte. Em caso de necessidade, consulte as notas apresentadas a seguir ao texto.
1 Como sucede com todo o escritor genial, a grandeza da obra de Eça corresponde ao triunfo de um
ponto de vista. No seu caso, é o olhar oblíquo sobre a realidade, a troça avassaladora dos segmentos do
tempo e do Mundo que lhe coube testemunhar e viver, cruzados com a emoção das experiências abismais
que aprendeu com os Românticos, associado sem dúvida ao mistério da sua própria pessoa, que lhe
5 conferiram um caráter inconfundível como criador de grande dimensão.
Pelo menos foi assim que eu aprendi a estimá-lo e a lê-lo na adolescência, quando Os Maias e A
Correspondência de Fradique Mendes significavam tudo o que poderia haver de mais moderno, mais
urbano e mais sofisticado, escrito em língua portuguesa. Pelo menos é assim que o entendo sempre que lá
regresso e encontro erguido no ar todo o final do século XIX, esse tempo hiperbólico e desastrado que ele
10 interpretou a rir, até hoje, como ninguém.
Mas se é verdade que Eça continua atual, e Portugal em muitos dos seus traços sociológicos continua
queirosiano, parece-me desajustado que se continue a divulgar a ideia de que a sua prosa e os seus tipos 3
constituem uma espécie de bitola geneticamente inultrapassável. O cânone3, por mais que o seja, não pode
ser tomado como uma medida parada. É inquestionável que Eça ultrapassou de longe a Escola Realista,
15 onde mal cabia, e chegou mesmo a pressentir o Modernismo que iria estilhaçar muito em breve o conceito
da criação como reprodução da realidade. Não viveu, porém, e infelizmente, a deflagração extraordinária
operada no seio das certezas e dos objetos, decomposição dos seres visíveis e invisíveis que viria a produzir
as grandes experiências literárias do século XX. As literaturas, e em especial a ficção que se lhe seguiu,
tornar-se-iam bem mais complexas, e também mais difíceis de apreender e aceitar, enquanto espelho da
20 vida. A partir de então, a ficção passou a ser o espelho duma outra vida bem mais lábil4 e inapreensível. A
narrativa incorporou os resíduos das aparências e o seu consumo transformou-se, naturalmente, em atos de
muito menor docilidade. É por isso que, para além do culto que a obra de Eça legitimamente merece, por
mérito próprio e grandeza genuína, se deve reconhecer, para sermos justos, que muita da admiração
totalitária que Eça desencadeia nasce porventura duma espécie de preguiça e lentidão em entender, ainda
25 nos nossos dias, a linguagem diferente daqueles que lhe sucederam. O que não parece vir a propósito,
embora venha. Como um dia veremos.
Lídia Jorge, «Sobre Eça de Queirós», Camões, n.os 9-10, abril-setembro de 2000, p. 108
NOTAS
3 cânone – conjunto de autores e de obras literárias considerados modelares num determinado período histórico.
4 lábil – variável, instável.
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1. Para responder a cada um dos itens de 1.1 a 1.7, selecione a opção correta.
Escreva, na folha de respostas, o número de cada item e a letra que identifica a opção escolhida.
1.1 No caso de Eça de Queirós, a expressão «triunfo de um ponto de vista» (linhas 1 e 2) corresponde
a uma síntese que exclui a
(A) natureza enigmática da sua personalidade.
(B) interpretação idealista daquilo que o rodeia.
(C) crítica mordaz sobre a sociedade do seu tempo.
(D) influência de importantes autores do Romantismo.
1.2 Desde as primeiras leituras realizadas na adolescência, a admiração da autora pela obra de Eça
(A) mudou consideravelmente.
(B) tornou-se inultrapassável.
(C) mantém-se inalterada.
(D) cresceu significativamente.
1.3 Segundo a autora, depois de Eça, a literatura
(A) passou a integrar o real de forma mais complexa.
(B) continuou a retratar os tipos e os ambientes queirosianos.
(C) integrou, sem ruturas, a herança de correntes literárias anteriores.
(D) começou a basear-se na ciência, espelhando a sociedade do século XX.
4
1.4 Para Lídia Jorge, a valorização da prosa de Eça nos nossos dias, ainda que legítima, resulta em
grande parte
(A) do facto de constituir o único grande testemunho literário do Realismo.
(B) da sua integração no cânone literário do final do século XIX.
(C) do seu afastamento total relativamente à corrente modernista.
(D) da dificuldade dos leitores em entenderem a literatura subsequente.
1.5 Na expressão «deflagração extraordinária» (linha 16), a autora recorre a
(A) uma antítese.
(B) um oxímoro.
(C) uma metáfora.
(D) um eufemismo.
1.6 Na expressão «se deve reconhecer» (linha 23), apresenta-se uma
(A) obrigação.
(B) permissão.
(C) possibilidade.
(D) probabilidade.
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1.7 O último parágrafo do texto é predominantemente
(A) narrativo.
(B) descritivo.
(C) argumentativo.
(D) expositivo.
GRUPO III
Elabore uma reflexão sobre o significado da liberdade, partindo da perspetiva exposta no excerto a seguir
transcrito.
Fundamente o seu ponto de vista recorrendo, no mínimo, a dois argumentos e ilustre cada um deles com,
pelo menos, um exemplo significativo.
Escreva um texto, devidamente estruturado, de duzentas a trezentas palavras. 5
«A liberdade é, antes de mais nada, o respeito pelos outros e o respeito que os outros nos devem em
função dos nossos direitos. A liberdade é a combinação entre os direitos e os deveres, sem que cada um
invada o espaço que, por direito, pertence aos outros.»
José Jorge Letria, O 25 de Abril Contado às Crianças… e aos Outros, Lisboa, Terramar, 1999
[Item do Exame Nacional do Ensino Secundário de 2009 – 1.ª fase]
Observações:
1. Para efeitos de contagem, considera-se uma palavra qualquer sequência delimitada por espaços em branco, mesmo quando
esta integre elementos ligados por hífen (ex.: /dir-se-ia/). Qualquer número conta como uma única palavra, independentemente
dos algarismos que o constituam (ex.: /2018/).
2. Relativamente ao desvio dos limites de extensão indicados – entre duzentas e trezentas palavras –, há que atender ao seguinte:
– um desvio dos limites de extensão indicados implica uma desvalorização parcial (até 5 pontos) do texto produzido;
– um texto com extensão inferior a oitenta palavras é classificado com zero pontos.
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COTAÇÕES
Item
Grupo Cotação (em pontos)
1. a 5.
I 100
5 × 20 pontos
1.1 a 2.3
II 50
10 × 5 pontos
III Item único 50
TOTAL 200
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SOLUÇÕES
GRUPO I
A GRUPO II
1. A afirmação «É instrutivo o passeio» (l. 14) tem um valor 1.1 B
de comentário relativamente à ação narrada. O «passeio 1.2 C
antes do almoço» de Ricardo Reis, num percurso 1.3 A
aparentemente aleatório, fá-lo passar pelas estátuas de Eça 1.4 D
de Queirós e de Luís de Camões, cuja contemplação o leva 1.5 C
a evocar estes dois escritores. Assim, articulam-se, neste 1.6 A
excerto, a deambulação geográfica e a viagem literária com 1.7 C
referências intertextuais. 2.1 Predicativo do sujeito.
2. Na frase transcrita, o Bairro Alto é caracterizado através 2.2 (Oração) subordinada (adjetiva) relativa (explicativa).
de uma antítese («alto»/«baixo») que contrapõe o nome e 2.3 (Ato ilocutório) compromissivo ou (ato ilocutório)
a localização geográfica do bairro à vida dissoluta a que está assertivo.
associado, estando este traço representado pela menção às
«mulheres de meia-porta». A formulação antitética é
reforçada pela referência às «grandes chuvas» que
conferem a este «lugar de tanta perdição» «uma espécie de GRUPO III
frescura inocente, um assopro virginal». Dada a natureza deste item, não é apresentado exemplo de
3. O narrador caracteriza-se como subjetivo, interventivo e resposta.
irónico, tendo em conta os comentários que tece
relativamente à ação narrada e aos assuntos que por ela
vão sendo suscitados de forma digressiva. A subversão da
frase de Eça de Queirós (l. 11), a apreciação de Camões
como «o pobre amargurado», as considerações sobre o
nome de uma rua («da Misericórdia que já foi do Mundo,
infelizmente não se pode ter tudo nem ao mesmo tempo, 7
ou mundo ou misericórdia») e do Bairro Alto são exemplos
da presença textual de um narrador que emite juízos de
valor e tece comentários apreciativos.
B
4. As duas estrofes iniciais exemplificam marcas específicas
da poesia de Cesário Verde: a perceção sensorial do real e a
sua transfiguração poética. A noite é percecionada em
termos de densidade, tornando-se quase palpável («A noite
pesa, esmaga.») e o frio que o «eu» supõe arrepiar «as
impuras» contrasta com a amena temperatura emanada
das lojas («Sai das embocaduras / Um sopro que arrepia os
ombros quase nus. // Cercam-me as lojas, tépidas.»). A rua
com lojas é transfigurada numa «catedral de um
comprimento imenso», numa cadeia associativa que liga,
pejorativamente, o comércio e a religião: as lojas tornam-se
«capelas», os produtos «santos» e os clientes «fiéis». A
realidade é apreendida através das sensações, mas é
transfigurada pela capacidade imaginativa do «eu».
5. As duas estrofes finais apresentam uma reflexão sobre a
poesia, definindo a arte poética de Cesário Verde. Trata-se
de uma poesia pensada («medito») que desperta reações
(«exacerbe»), feita a partir da realidade e da sua análise,
mas com plasticidade («pintar»). Os versos que o «eu»
deseja escrever combinam a perfeição formal
(«magistrais») com a solidez e verdade do seu conteúdo
(«salubres e sinceros»).
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