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Caso prático 3

Direito Constitucional I

(resolvido)

Leung Chan, filho de um português e de uma chinesa, nasceu na Austrália quando os pais
aí estavam de férias.

a) Que tem de fazer Leung Chan para adquirir a nacionalidade portuguesa?


b) Poderá o Ministério Público opor-se à aquisição da nacionalidade, pelo facto de
Leung Chan ter entretanto sido condenado a 8 anos de prisão por divulgação à
China de matérias em segredo de Estado?
c) Poderá Leung Chan, pelos mesmos motivos, vir a perder a nacionalidade?
d) Como devem ser resolvidos os conflitos que venham a colocar-se em virtude da
pluricidadania chinesa e portuguesa de Leung Chan?

a) 1.ª questão: Que tem de fazer Leung Chan para adquirir a nacionalidade
portuguesa?
Nos termos do artigo 1.º-1-f) da LN, é português de origem quem nasça no estrangeiro
e tenha um pai ou mão portuguesa, se tiver o seu nascimento inscrito no registo civil
português ou se declarar que quer ser português.

Assim, uma vez que o seu pai é português, bastará a Leung Chan a inscrição no registo
civil ou uma mera declaração para que possa ser português. Tal poderá acontecer anos
após o seu nascimento, nos termos dos artigos 8.º e 9.º do RN.

b) 2.ª questão Poderá o Ministério Público opor-se à aquisição da


nacionalidade, pelo facto de Leung Chan ter entretanto sido condenado a 8
anos de prisão por divulgação à China de matérias em segredo de Estado?
Não parece que tal seja possível.
O Ministério Público pode opor-se à aquisição da nacionalidade com fundamento na
ocorrência de uma das circunstâncias do artigo 9.º da LN. Ou seja, em certos
procedimentos administrativos tendentes à obtenção da nacionalidade o Ministério
Público é chamado a pronunciar-se, podendo apresentar uma oposição nos tribunais
administrativos à aquisição da nacionalidade, assim criando um incidente judicial
enxertado no procedimento administrativo em curso.

É verdade que um dos fundamentos de oposição é, precisamente, a condenação pela


prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3
anos. Porém, essa oposição apenas pode ocorrer em processos relativos à “aquisição”
da nacionalidade por efeito da “vontade” ou da “adoção” (ver a epígrafe do Capítulo
IV do Título I, onde se insere o artigo 9.º da LN, que trata desta matéria). Ora, Leung
Chan obtém a nacionalidade portuguesa por “atribuição” (ver epígrafe do Capítulo I do
Título I, onde se insere o artigo 1.º-1-c) da LN) e não por “aquisição” (ver epígrafes das
Secções I e II do Capítulo II e do próprio Capítulo II do Título I). Ou seja, a oposição
do Ministério Público só poderá existir em processos de obtenção da nacionalidade que
resultem de “aquisição por efeito da vontade ou da adoção” (artigos 2.º a 5.º da LN) e
não de “atribuição” (artigo 1.º da LN).

Portanto, mesmo que Leung Chan tenha sido condenado por tal crime, não é possível
ao Ministério Público apresentar oposição no procedimento administrativo tendente à
obtenção da nacionalidade.

c) 3.ª questão: Poderá Leung Chan, pelos mesmos motivos, vir a perder a
nacionalidade?
Não parece que tal possa suceder.

Os casos de perda de nacionalidade limitam-se ao previsto no artigo 8.º da LN e


dependem apenas da vontade do interessado. Ou seja, não está prevista como pena
acessória decorrente da aplicação de uma condenação ao cumprimento de uma pena de
prisão a perda da nacionalidade.

A este propósito note-se que o artigo 30.º-4 CRP impede que possa decorrer
necessariamente da condenação a uma pena a perda de qualquer direito civil,
profissional ou político. Portanto, associar automaticamente aos efeitos de uma decisão
judicial a perda da nacionalidade seria inconstitucional.
Por último, note-se que, estabelecer por lei a possibilidade de perda da nacionalidade
por efeitos de uma decisão judicial em que se determine (mesmo que de forma não
automática) a perda da nacionalidade quando um cidadão tenha sido condenado a uma
pena de prisão, parece ser proibido pela Constituição (ver artigos 26.º-1 e 30.º-1 CRP).

d) 4.ª questão: Como devem ser resolvidos os conflitos que venham a colocar-se
em virtude da pluricidadania chinesa e portuguesa de Leung Chan?
Segundo o artigo 27.º da LN, se alguém tiver duas ou mais nacionalidades e uma delas for
portuguesa, só esta releva face à lei portuguesa. Ou seja, se Leung Chan for português e
chinês, é a nacionalidade portuguesa que é relevante para o efeito da aplicação da lei
nacional.

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