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CONSIDERAÇÕES ACERCA DA CONSTRUÇÃO DO DISCURSO DE

OBJETIFICAÇÃO DA MULHER NO SERTANEJO UNIVERSITÁRIO

Milena Océria Sales1

Alex de Castro da Costa2

RESUMO: O presente artigo visa compreender a construção do discurso de objetificação da mulher


presente no gênero musical Sertanejo Universitário, sendo esse um dos mais populares no Brasil. Para
isso, buscamos a letra da música Vidinha de Balada no site letras.mus.br e analisamos a mesma,
mostrando em cada verso o discurso dentro dos enunciados. Para nos auxiliar na busca desse objetivo,
utilizamos os pressupostos teórico-metodológicos da Análise do Discurso sob a perspectiva de
Gregolin (1995), com os conceitos de Discurso e Ideologia, que nos ajuda a demonstrar a atuação
sócia histórica do discurso; e Possenti (2009), com o conceito de Sujeito, que nos ajuda a entender o
lugar dos sujeitos na construção discursiva. A música em questão aborda, em primeiro plano, o tema
relacionamento amoroso; a análise discursiva da mesma tem por fim verificar as estratégias e figuras
de linguagem que causam no público a ideia de romantismo enquanto a enunciação traz o discurso de
objetificação da mulher, não deixando claro o posicionamento do compositor. A análise discursiva
demonstra que há uma visão sobre a mulher que tende a ser representativa da historicidade dos sujeitos
envolvidos e do momento histórico atual da sociedade brasileira. Os resultados aqui apresentados são
de relevância para a AD por levantar questionamento sobre um discurso presente em um gênero
musical que abrange um grande público no Brasil e mostrar o reflexo social sobre a mulher que está
dentro do meio musical, além de abrir espaço para novas reflexões e perspectivas em torno da
discursivização da música.

Palavras-chave: Discurso. Objetificação. Sertanejo. Ideologia.

1. INTRODUÇÃO

Considerando a grande aceitação do Sertanejo Universitário pela sociedade brasileira,


decidimos estudar a imagem de maior aparição em músicas desse gênero: a da mulher.
Através da Analise do Discurso, iremos verificar a perspectiva discursiva em torno da figura
feminina presente no gênero musical em questão e apresentar as construções discursivas
dentro dos enunciados das letras das músicas.
O que nos levou a tal investigação foi o consumo em massa dessas músicas por grande
parte dos brasileiros e a representação da mulher presente nas mesmas. No atual momento
histórico em que vivemos, no qual o debate sobre a posição da mulher na sociedade se faz
cada vez mais necessário, é por bem discutirmos a moldagem da imagem feminina pela
indústria musical.

1
Graduanda em Letras – Português pela Universidade Federal do Maranhão, UFMA – Campus de Bacabal.
milenaoceria@outlook.com
2
Graduando em Letras – Português pela Universidade Federal do Maranhão, UFMA – Campus de Bacabal.
alex.trombonecc@gmail.com
A maneira como realizamos a pesquisa foi buscando a letra da música em um site da
Web (letras.mus.br), ouvindo e analisando a mesma. Buscando assim, demonstrar como se dá
a construção do discurso de objetificação da mulher no Sertanejo Universitário.
Com este trabalho, temos por objetivo verificar as diversas estratégias de construção
discursiva, as quais estão presentes nas músicas do gênero aqui analisado e demonstrar de
forma clara esse processo de construção estratégica do discurso. Iremos ainda, identificar os
fatores que objetificam a mulher; verificar esses fatores na letra da música Vidinha de Balada;
analisar a linguagem presente na música; e analisar os discursos em torno da mulher presente
nessa música, a qual é interpretada pela dupla sertaneja Henrique e Juliano.
A relevância deste estudo se dá pelo fato do mesmo trazer uma apresentação crítica do
discurso por trás do enunciado de uma letra musical, demonstrando a maneira como a
sociedade brasileira e seu conceito de mulher se refletem dentro desse, levando assim uma
nova perspectiva aos olhos do público consumidor.
Na música analisada, vê-se a naturalização com que se fala da mulher no lugar de
objeto; percebe-se também que a mulher não tem voz ativa e está sempre sujeita às vontades
do eu-lírico, figura essa representada por um homem.
Para nos auxiliar na demonstração dessas considerações, utilizaremos conceitos
presentes na Análise do Discurso, tais como: Discurso e Ideologia (Gregolin, 1995) - os quais
nos ajudarão a entender o lugar de fala do eu-lírico da música e como isso se mostra no
decorrer das estrofes; e Sujeito (Possenti, 2009) que nos dará suporte para demonstrar quem é
o sujeito, ou seja, aquele que está sujeitado ao discurso e como ocorre o processo de sujeição
discursiva dentro da música.

2. SERTANEJO UNIVERSITÁRIO: O GÊNERO DAS MASSAS

O sertanejo universitário ultimamente tem sido um dos estilos musicais mais presente
entre adolescentes, jovens e adultos, como também, tem ocupado grande espaço no rádio, TVs
e paradas de sucesso de todo Brasil (CÁCERES , 2015). Diferente do sertanejo clássico, que
aborda em suas canções temas do cotidiano e da vida na zona rural, o universitário traz nas
letras de suas musicas temas como relacionamentos amorosos, traição, paixão, balada e amor
não correspondido, o que o torna aceito por diferentes públicos.
Segundo Rodrigues (2017), esse estilo musical surgiu com a dupla João Bosco e
Vinícius, no começo dos anos 2000, quando eles ingressaram no ambiente da universidade,
ambos na cidade de Campo Grande – MS, e começaram a fazer suas primeiras apresentações
para o público universitário.
Conforme as considerações de Bastos (2009), outras duplas sertanejas foram
essenciais ao longo dos últimos para a consolidação do sertanejo universitário atual, como
César Menotti e Fabiano e Jorge e Mateus, incorporando uma nova roupagem de ritmos e
instrumentos a esse gênero. Com isso, levando em consideração o sucesso, aceitação, e a
grande quantidade de interpretes desse gênero musical, percebemos a falta de questionamento
sobre as músicas, uma vez que abordam temas como relacionamento abusivo e sujeição da
mulher.

3. A ANÁLISE DO DISCURSO

Segundo Possenti (2009), a Análise do Discurso surgiu como uma resposta às questões
relacionadas à leitura, examinando relações entre linguística e história. Ou seja, a AD tornou-
se uma forma de compreender como a historicidade cultural e ideológica dos indivíduos
torna-os sujeitados aos seus próprios discursos, já que os mesmos não são um produto
original, trazendo sempre reflexos de outros discursos já existentes. Existem duas grandes
vertentes da AD, sendo que a primeira dedica-se aos dispositivos sociais de circulação dos
textos, não se preocupando diretamente com o com o sentido; estuda os textos que circulam
em determinado espaço, em quais épocas e por quais razões, além de levar em consideração
quem adquire e onde se compra o texto, como por exemplo, um livro de piadas. A segunda
preocupa-se propriamente com o sentido, ou seja, com aquilo que o texto significa,
considerando os aspectos implícitos e relacionando o discurso com o exterior. Podendo se
preocupar também com a circulação, caso isso afete a significação.
Deixando claras as diferenças entre as duas vertentes, utilizamos a segunda, pois nosso
propósito é mostrar o sentido implícito em Vidinha de Balada e para isso, devemos analisá-la
partindo do ponto de que a situação se relaciona com o discurso e que o texto é o suporte pelo
qual é possível realizar uma discursivização.

4. A MULHER COMO SINÔNIMO DE OBJETO

De acordo com Heldman (2012), o termo Objetificação começou a ser usado a partir
de 1970, e diz respeito ao processo que trata a pessoa como objeto. Nesse sentido, tendo
definido o significado de tal conceito, pode-se partir para a análise discursiva das música
escolhida, desenvolvendo através da AD a dissecação do processo de objetificação da mulher,
mostrando a influência da ideologia no discurso do sujeito. Ao falar de mulher objetificada na
música brasileira, devemos levar em consideração quem, quando e como fala, por isso se faz
necessária a AD neste estudo, pois a mesma nos dá uma visão para além do texto, explorando
o plano da enunciação.

Vidinha de Balada
Oi, tudo bem? Que bom te ver
A gente ficou, coração gostou não deu pra esquecer
Desculpe a visita, só vim te falar
Tô afim de você e se não tiver "cê" vai ter que ficar

Eu vim acabar com essa sua vidinha de balada


E dar outro gosto pra essa sua boca de ressaca

Vai namorar comigo sim


Vai por mim igual nós dois não tem
Se reclamar "cê" vai casar também, com comunhão de bens
Seu coração é meu e o meu é seu também

Vai namorar comigo sim


Vai por mim igual nós dois não tem
Se reclamar "cê" vai casar também, com comunhão de bens
Seu coração é meu e o meu é seu também

Vai namorar comigo, sim!


4.1 VIDINHA DE BALADA E A PERSPECTIVA ROMANTICA SOBRE A MULHER

Na primeira estrofe de Vidinha de Balada, o eu-lírico inicia com uma declaração de


amor “Oi, tudo bem? Que bom te ver / a gente ficou coração gostou / não deu pra esquecer”.
Mas logo em seguida começa a exercer sob a mulher a sua própria vontade. Isso está presente
nos versos “Desculpe a visita eu só vim te falar / tô afim de você e se não tiver cê vai ter que
ficar”. Segundo Gregolin (1995), o discurso é um pilar que sustenta diversos textos concretos.
Vemos aqui que a frase só vim te falar representa um discurso ideológico, sendo ele o de que
o homem é aquele que sempre decide e a mulher apenas recebe a decisão. Assim, podemos
analisar a relação entre língua e ideologia. Constrói-se nesses versos, um discurso que
demonstra a mulher como alguém sem voz ou vontade própria, isso é enfatizado na frase se
não tiver cê vai ter que ficar. Aqui devemos levar em consideração o contexto social atual, no
qual a mulher é sempre cobrada para aceitar imposições masculinas.
Segundo Guerra (s.d), o discurso é uma cristalização de sentidos já produzidos na
sociedade, formando uma memória discursiva. Essa memória é reavivada nos textos
produzidos, como podemos verificar na segunda estrofe: “Eu vim acabar com essa sua
vidinha de balada / e dar outro gosto pra essa sua boca de ressaca”. Percebe-se no enunciado,
uma memorização daquilo que está presente no meio em que a música foi produzida e os
ouvintes.
De acordo com Possenti “Para a AD, é consensual que um discurso não circula em
qualquer lugar, que não toma livremente uma forma genérica qualquer e que não pode ser
interpretado de qualquer maneira por qualquer um”. (POSSENTI, 2009, p. 11).
Levando em consideração tal afirmação, devemos atentar para o público, que
segundo uma pesquisa do IBOPE (2013), 58% ouvintes do sertanejo são de classe C, 33% não
concluíram o ensino fundamental, 23% têm de 25 a 34 anos e 37% participam de churrascos
com frequência. A partir desses fatos, constata-se a projeção desse contexto social na estrofe,
visto que o machismo é algo que está presente na sociedade e teve uma forte ascensão entre os
brasileiros, pois de acordo com uma pesquisa realizada pelo Instituto Avon e Data Popular
(2013), 56% dos homens admitem já ter cometido algum tipo de violência contra a mulher,
85% não considera aceitável uma mulher ficar bêbada e 69% não acha correto mulher sair
com os amigos sem o marido.
A partir desses dados sobre o público do Sertanejo Universitário, é importante levar
em conta a influência dos discursos ideológicos aqui analisados sobre tal público ouvinte,
fazendo isso a partir do pressuposto de que os interpretes desse gênero exercem em certa
medida, um papel como influenciadores, pois de acordo com Ribeiro e Silva (2017, on-line),
“podemos encarar os cantores do sertanejo universitário como líderes de opinião, aqueles que
transmitem ideias e reforçam pensamentos por meio de suas músicas para um determinado
grupo social, que é o dos seus fãs”.
Gregolin (1995), afirma que o discurso é um patamar do percurso de geração de
sentido do texto, onde se manifesta o sujeito da enunciação e também onde se recupera
relações textuais e o contexto sócio histórico.
A partir dessa constatação, percebe-se que o discurso de objetificação da mulher
como tema recorrente nas letras do gênero analisado, tem sido reforçado no meio social por
compositores e interpretes, uma vez que os mesmos, ao fazerem sucesso entre os ouvintes, são
tidos como referência por eles, e assim possuem influência para tal prática. Com isso, pode-se
afirmar que tem ocorrido uma naturalização3 desses discursos na sociedade, já que como
afirma Ribeiro e Silva (2017), essas canções ao serem entoadas para seus ouvintes com tais
letras, atuam naturalizando tais discursos, fazendo assim com que eles sejam tidos como
práticas normais do cotidiano.
Desse modo, os versos da estrofe analisada, apresentam um aviso do eu-lírico,
colocando sua vontade como predominante e a si como dono da situação e disposto a mudar
drasticamente a vida da mulher pela qual está interessado (eu vim acabar, eu vim dar), pois
como diz Drumont: “O machismo enquanto sistema ideológico oferece modelos de identidade
tanto para o elemento masculino como para o elemento feminino. Ele é aceito por todos e
mediado pela “liderança” masculina.” (DRUMONT, 1980, p. 81).
De acordo com Pêcheux (1990, p.18 apud GREGOLIN, p.18):

“O discurso é um dos aspectos da materialidade ideológica, por isso, ele só


tem sentido para um sujeito quando este o reconhece como pertencente a
determinada formação discursiva. Os valores ideológicos de uma formação
social estão representados no discurso por uma série de formações
imaginárias, que designam o lugar que o destinador e o destinatário se
atribuem mutuamente.”

Vejamos a terceira estrofe: o primeiro verso diz “Vai namorar comigo sim”, isso
ratifica a ideia trazida nas estrofes já analisadas, visto que, de acordo com Possenti (2009),
sujeito é efeito, ou seja, sujeitado à sua historicidade e aos discursos produzidos durante toda
sua vida e até aqui vimos que um discurso marcante entre os ouvintes é o machismo4. No
segundo verso é dito “vai por mim igual nós dois não tem”, demonstrando, mais uma vez, a

3
Decorre do verbo naturalizar, que significa “torna-se natural, comum ou familiar.” (NATURALIZAR, 2003-
2017).
4
Segundo DRUMONT (1980, P. 82), o conceito de machismo diz respeito ao “sistema representações-
dominação que utiliza o argumento do sexo, mistificando assim as relações entre os homens e as mulheres,
reduzindo-os a sexos hierarquizados, divididos em polo dominante e dominado.
imposição masculina diante da figura feminina, mas levando ao público a impressão de que
está sendo romântico ao dizer “igual nós dois não tem”. Possenti nos diz também que “o
leitor pode associar determinado texto a determinado discurso ao invés de associá-lo a outro, e
por isso faz dele uma leitura e não outra (...)” (POSSENTI, 2009, p. 14). Portanto, a letra é
associada pelas pessoas ao romantismo e não ao que pode ser chamado de objetificação da
mulher.
Já o terceiro verso, explícita de certa forma a objetificação contida na enunciação da
música: “Se reclamar cê vai casar também, com comunhão de bens”, no qual fica clara a
dominação discursiva do ponto de vista masculino, assim podemos levar em consideração seu
autor, Diego Silveira, de 23 anos, que compõe para grandes duplas do sertanejo universitário,
pois segundo Gregolin “Podemos observar as projeções da enunciação no enunciado; os
recursos de persuasão utilizados para criar a “verdade” do texto (relação
enunciador/enunciatário) e os temas e figuras utilizados”. (GREGOLIN, 1995, p. 18). Há uma
tendência discursiva nas músicas compostas por ele, como podemos observar em Ficadinha,
composta para a dupla Henrique e Diego; Comé que larga desse trem, e Quando o assunto é
cama, compostas para a dupla Maiara e Maraisa. Todas contendo uma contextualização da
mulher da mesma forma: sujeitada às vontades masculinas.
Dessa forma, a junção da memória discursiva do autor (isto é, os discursos que
formaram o texto) e a dos adeptos do gênero musical justifica a existência do discurso de
objetificação da mulher presente na música em análise.
Continuando a verificação da estrofe em questão, vamos ao quarto verso, que diz
“Seu coração é meu e o meu é seu também”. Para entendermos o que está implícito no
enunciado, evocamos Gregolin, que mostra:

“A coerência semântica do discurso é obtida através da tematização e da


figurativização. Na tematização os valores do texto são organizados por
meio da recorrência de traços semânticos que se repetem no discurso e o
tornam coerente.
Na figurativização os temas são concretizados em figuras que lhes atribuem
traços de revestimento sensorial (...)” (GREGOLIN, 1995, p. 20)

O compositor usa recorrentemente da figurativização para dar a impressão de estar


sendo protetor e carinhoso, associando assim, no plano da enunciação, um comportamento
abusivo ao amor. Ao dizer seu coração é meu, o eu-lírico se impõe, mas logo em seguida
justifica sua imposição na frase e o meu é seu também, agregando assim, valores opostos em
um mesmo texto e fazendo-os parecer um único valor aos ouvidos de quem escuta.
Isso é possível porque, de acordo com Possenti: “o leitor lê o texto segundo uma
chave “fechada”, que ele já domina (ideológica ou disciplinar), e acaba lendo no texto o que
já “sabia”, mesmo que o texto diga outra coisa (...)”. (POSSENTI, 2009, p. 15) Ou seja, o
leitor, que no caso é o ouvinte, é levado por suas próprias memórias discursivas a associar o
texto da música ao romantismo e a mulher idealizada pela sociedade brasileira.
Gregolin diz:
“a ‘ideologia’ é um conjunto de representações dominantes em uma
determinada classe dentro da sociedade. Como existem várias classes, várias
ideologias estão permanentemente em confronto na sociedade. A ideologia é,
pois, a visão do mundo de determinada classe, a maneira como ela
representa a ordem social. Assim, a linguagem é determinada em última
instância pela ideologia, pois não há uma relação direta entre representações
e a língua”. (GREGOLIN, 1995, p. 17)

A quarta estrofe é apenas uma repetição daquilo que é dito na terceira. Mas antes de
terminarmos a analise da música em questão, podemos acrescentar o que diz Possenti (2009),
sobre os textos: todos são heterogêneos, ou seja, sempre trazem em si misturas de diversos
outros textos. Podemos perceber isso nesta canção, que trata em tom de romantismo sobre
temas explícitos como: relacionamentos afetivos, balada, ressaca, casamento; e também temas
implícitos na enunciação, como: machismo e relacionamento abusivo.
Por fim, temos a última estrofe, que é constituída por apenas uma frase, a mesma já
citada várias vezes nos versos anteriores: “vai namorar comigo, sim!”. Essa frase resume todo
o discurso que a música traz: a objetificação da mulher enquanto produto cultural.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa permitiu identificar a maneira como a mulher é retratada no gênero


musical Sertanejo Universitário. Em que, a partir da análise da música proposta, Vidinha de
balada, conseguimos verificar e mostrar como se dá um dos discursos em torno da mulher
presente nesse estilo musical. Também identificamos a diversidade do público desse gênero, e
a influência que ele exerce sobre o mesmo.
Através da AD, constatamos que a construção do discurso de objetificação da mulher
no Sertanejo Universitário se dá de maneira implícita, visto que a primeiro momento a letra da
música Vidinha de Balada traz um fundo de romantismo, não deixando transparecer ao
público o discurso de objetificação; o discurso da música é um produto sócio histórico da
sociedade brasileira, pois vimos que ficou comprovado, através deste estudo, que o público, o
autor e o gênero musical causam efeito sobre a música e esta, por sua vez, é um reflexo
cultural; também identificamos as figuras de linguagem utilizadas para causar o efeito do
eufemismo, tornando o discurso menos perceptível.
A AD nos permitiu perceber que há um discurso ideológico enraizado na letra da
música analisada, e, portanto, no Sertanejo Universitário: o de objetificação da mulher e sua
função como provedora do prazer masculino, a qual não tem voz e vontade própria, e está
sempre sujeita às vontades do homem, o qual se coloca em posição superior à mulher, fazendo
com que haja uma relação de dominação.
Nesse sentido, é notória a colocação do eu-lírico das músicas analisadas como
dominante da situação, o qual não permite que a mulher possa fazer suas próprias escolhas,
impondo sempre as decisões masculinas.
Ademais, outro discurso verificado na letra analisada, foi o do relacionamento
abusivo, o qual é sempre encoberto pelas frases de amor, carinho e proteção, mas que carrega
uma discursivização de amor doentio e controle sobre a figura feminina. É percebido também
que tal discurso não é levado em consideração pelos ouvintes desse estilo musical, uma vez
que o mesmo soa como romântico e comum a tal público, dando a entender que há uma
cristalização desse discurso presente na sociedade, o que faz com que esses ouvintes se
posicionem de forma passiva diante de tal fato.
Assim, levando em conta o sucesso que o sertanejo universitário tem feito nos
últimos 10 anos, e a aceitação dele por grande parte da sociedade brasileira, chegamos à
conclusão de que a presença dos discursos aqui analisados em músicas desse gênero contribui
para a naturalização do relacionamento abusivo e a violência contra a mulher no meio social
em que essas canções são entoadas.
Formulamos tal hipótese a partir dos pressupostos de Ribeiro e Silva (2017), de que
os interpretes musicais atuam como influenciadores dos seus fãs, pois ao cantarem letras com
tais discursos, os mesmos fazem com que seja criada uma naturalização desses discursos
ideológicos entre seus ouvintes.
Portanto, ao analisar os discursos contidos na música em questão, é notória a
percepção de que a mulher é sempre vista sob a ótica masculina, no qual o homem se coloca
em posição de destaque, fazendo com que o nível comunicativo fique apenas entre as figuras
masculinas.
Diante do que foi exposto neste artigo, é importante dizermos que o estudo sobre o
discurso de objetificação da mulher no sertanejo universitário não se limita apenas ao que foi
aqui, mas carece de ser levada mais a fundo, tendo como análise outras músicas e também
outros interpretes desse gênero.
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