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R.T. Eng. Geotécnico Prof.

Edgar Pereira Filho

Os ensaios de prova de carga


PROVAS DE CARGA ESTÁTICAS tradicional ou estática são utilizados
principalmente como verificação de
RESUMO desempenho de um elemento estrutural de
fundação, quanto a ruptura e recalques
Neste breve artigo apresentaremos uma das
(Figura 01). São também utilizados para
técnicas para verificação da variabilidade do
fins de estudos, pesquisas ou projetos.
comportamento (capacidade de carga e
(Cudmani et al., 1994).
recalques) em elementos isolados (estacas
ou tubulões) de fundação: a prova de carga
estática.
São abordados a metodologia executiva
para as provas de carga estáticas,
aparelhagem, interpretação da curva carga-
recalque, informações importantes da
normatização brasileira a serem adotados
em projeto, bem como a materialização do
ensaio em campo.
Figura 01 - Sistema de reação para prova de
PALAVRAS-CHAVE: carga estática montado. Obra da AP&L
Geotecnia e Fundações.

Provas de carga estáticas. Curva carga –


recalque. Metodologia executiva. Capacidade A norma brasileira de provas de
de carga. carga para fundações profundas NBR
12131, em sua versão mais recente, adota
DEFINIÇÃO em igualdade de condições os ensaios de
carregamento lento SML (Slow maintained
Segundo a norma brasileira NBR load test) e de carregamento rápido QML
12131/91, a prova de carga consiste, (Quick maintained load test), e dos demais
basicamente, em aplicar esforços estáticos ensaios complementares a estes, desde que
crescentes à estaca e registrar os sua utilização seja devidamente justificada.
deslocamentos correspondentes. Os esforços (ABMS/ABEF, 1998).
aplicados podem ser axiais de tração ou O QML, denominado ensaio com
compressão, ou transversais. carregamento rápido, difere do ensaio lento
O método de prova de carga se SML basicamente por manter os estágios de
aplica a todos os tipos de estacas, verticais carga e descarga por tempos determinados,
ou inclinadas, independente do processo de independente da estabilização dos
execução e de instalação no terreno, deslocamentos. (ABMS/ABEF, 1998). As
inclusive a tubulões, que a elas se deformações correspondentes a estes dois
assemelham. (ABNT NBR 12131/91). tipos de ensaios podem ser diferentes e sua
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interpretação deve considerar o tipo de


carregamento empregado. (ABNT NBR
12131/91).

DESEMPENHO

Dentre os ensaios de campo


utilizados na engenharia de fundações, as
provas de carga estáticas destacam-se como
um dos mais importantes. Seu emprego no
Brasil data provavelmente de 1928, quando
foi realizado o estudo das fundações do
Edifício Martinelli em São Paulo (Polla et
al., 1988). Ensaios históricos sobre estacas
tipo Franki realizados pelo Instituto de
Pesquisas Tecnológicas de São Paulo em
1936 e 1942 são também citados por Vargas
(1990).
Figura 02 - Detalhe da fixação da estrutura de
reação aos blocos das estacas. Obra AP&L
Devido a confiabilidade dos Geotecnia e Fundações.
resultados quanto as informações sobre
capacidade de carga e deformações, dos Como não se conhece, de modo
solos ou do conjunto “solo-elemento geral, a curva de distribuição estatística das
estrutural de fundação”, este ensaio vem resistências das estacas ou das tensões de
sofrendo contínua evolução para permitir ruptura reais das fundações, a comprovação
sua execução da forma mais representativa da carga admissível de uma estaca ou da
da condição prevista para entrada em pressão admissível de uma camada de solo
operação da fundação estudada, bem como fica restrita à experiência anterior com
torna-lo mais preciso, rápido e econômico. aquele tipo de fundação em solos similares
(ABMS/ABEF, 1998). e, com a realização de provas de carga em
elementos isolados de fundação.
A figura 02 mostra a fixação da (ABMS/ABEF, 1998).
estrutura de reação aos elementos de
fundação: Mesmo assim, numa mesma obra
não existem dois elementos de fundação de
igual desempenho. O maciço do solo é uma
estrutura de formação complexa
diferentemente afetada pelos processos de
instalação dos elementos de fundação e que

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faz parte do conjunto estrutura-solo. pelo menos, uma prova de carga estática e,
(ABMS/ABEF, 1998). Por isso, segundo muito importante, deve-se ter em mente que
Décourt (1994), é conveniente a os ensaios de carregamento dinâmico não
recomendação de executar maior quantidade substituem as provas estáticas. (Velloso e
de ensaios, para permitir obtenção de Lopes, 2010).
valores finais através da media dos
resultados. EXECUÇÃO DA PROVA DE CARGA

A comprovação da importância dada Na execução da prova de carga, a


a este ensaio está na norma técnica estaca é carregada até a ruptura ou, ao
brasileira de projeto e execução de menos, até duas vezes o valor previsto para
fundações NBR 6122/2010 da ABNT. Em sua carga de trabalho. (ABNT NBR
seu ultimo texto, a norma admite uma 12131/91).
significativa redução em coeficientes de
segurança a serem adotados em projetos, As cargas aplicadas devem
utilizados no cálculo de cargas admissíveis, representar da melhor forma possível, as
desde que tenham sido realizadas, “a solicitações previstas quando em operação,
priori”, provas de carga em quantidade sejam elas verticais, horizontais ou
adequada. (ABMS/ABEF, 1998). inclinadas, de compressão ou de tração. São
divididas em parcelas ou estágios de
A figura 03 mostra a instalação do carregamentos sucessivos que devem
conjunto de reação estável: permanecer atuando durante algum tempo.
(ABMS/ABEF, 1998).

Segundo a ABNT NBR 12131/91, as


cargas são aplicadas, em geral, por meio de
macaco hidráulico calibrado, centradas em
relação ao eixo da fundação e sem provocar
vibrações e choques durante o
carregamento. Em caso do ensaio com carga
máxima muito elevada, utiliza-se um
conjunto de macacos hidráulicos, com
sistema elétrico ou manual de acionamento
Figura 03 - Montagem do sistema de medição
para prova de carga de compressão. Obra AP&L
simultâneo para todo o conjunto, como
Geotecnia e Fundações. mostra a figura 04 a seguir:

Mesmo quando não se deseja reduzir


o fator de segurança, é recomendável que
toda obra com mais de 100 estacas tenha,

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metálica, fixadas através de estacas


ou tirantes);

Figura 04 – Macacos Hidráulicos para aplicação


de carga. Obra AP&L Geotecnia e Fundações.
(a)

No sistema de reação para provas de


carga a compressão, o carregamento reage
contra um sistema de reação, que pode ser,
segundo a ABNT NBR 12131/91:

 Plataforma carregada (cargueira);

(b)
Figura 06 - (a) Viga metálica fixada a estaca.
Obra AP&L Geotecnia e Fundações; (b) Reação
com tirantes. (ABMS/ABEF, 1998)

Figura 05 - Reação com cargueira (Alonso apud Nas provas de carga estáticas em
ABMS/ABEF, 1998) fundações profundas, as medidas de cargas
e deslocamentos não são obrigatoriamente
 A própria estrutura, devidamente limitadas ao topo do elemento ensaiado.
verificada. Podem ser medidos os deslocamentos e
deformações em vários pontos, visando
 Estruturas fixadas ao terreno através conhecer a transferência de carga em
de elementos tracionados. profundidade, ou seja, o desenvolvimento
(geralmente viga ou estrutura de atrito lateral ao longo do fuste e a
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pressão na ponta ou base da fundação.


No mínimo 4

Descarregamento Total
(ABNT NBR 12131/91). estágios, mantidos
até a estabilização,
Após o
ENSAIOS LENTOS E RÁPIDOS com tempo mínimo
descarregamento
de 15 min. Após o
total, deve ser
descarregamento
Segundo a ABNT NBR 12131/91, feita uma leitura
total, as leituras dos
final.
os ensaios lentos e rápidos são realizados deslocamentos
devem continuar até
segundo as seguintes prescrições e a estabilização
diferenças:

Tabela 01 – Comparativo ensaios lentos e rápidos.


Ensaios Lentos Ensaios Rápidos
NBR 12131/91 com adaptações do autor.
SML QML
Carre ga-

Não superior a 20% Não superior a ANÁLISE DOS RESULTADOS


mento

da carga de trabalho 10% da carga de


prevista para a trabalho prevista As normas técnicas brasileiras de
estaca. para a estaca.
provas de carga estáticas, NBR 12131 e
cada estágio

Durante 5
Tempo em

Até a estabilização minutos, NBR 6489, descrevem os resultados que


dos deslocamentos e, independente da devem constar nos relatórios de ensaios.
no mínimo por 5 estabilização dos
minutos. deslocamentos. São basicamente: a descrição do ensaio
incluindo local, instalação, montagem,
Intervalo entre leituras

Leitura na aplicação equipamentos, data e hora de início e fim,


da carga, seguindo-se ocorrências, natureza e características do
Em cada estágio,
leituras decorridos 2
obrigatoriamente, terreno, como o perfil geotécnico em
min, 4, 8, 15 e 30
no início e no final
min. Depois, a cada sondagem próxima, descrição do elemento
do estágio.
30 min até a de fundação ensaiado, curva “carga x
estabilização.
recalque” ou “pressão x recalque” com
indicações dos tempos de inicio e fim de
Atingida a carga
máxima do cada estágio e os respectivos recalques.
Atingida a carga máxima do ensaio:

ensaio, o (ABMS/ABEF, 1998).


Não sendo atingida a descarregamento
ruptura da estaca, a deve ser feito em
carga máxima do quatro estágios, A figura 07 apresenta os deflectômetros
ensaio deve ser cada um mantido mecânicos utilizados para medições e
mantida durante um por 5 min, com a leituras dos deslocamentos do topo da
tempo mínimo de 12 leitura dos
h entre a respectivos estaca ensaiada. Os valores serão
estabilização do deslocamentos. registrados e apresentados através da curva
recalques e inicio do carga x recalque, considerando os
descarregamento.
deslocamentos iniciais e finais de cada
estágio.

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o recalque aumenta indefinidamente com


pequenos, ou nenhum, acréscimo de carga.
(Vargas, 1977).

Figura 08- Resultado da curva carga x recalque


em uma das obras da AP&L Geotecnia e
Fundações.

Figura 07 - Deflectômetros com precisão de Costuma-se interpretar os resultados


0,01mm para registro dos deslocamentos. Obra de provas de carga à luz da norma técnica
da AP&L Geotecnia e Fundações. de projeto e execução de fundações, NBR
6122. Porém é evidente que, os resultados
A NBR 12131/91, estabelece que do ensaio estão relacionados com o método
esta curva deve ser desenhada em escala tal utilizado. Por esse motivo, para permitir
que a reta ligando a origem e o ponto da análises e comparações, o método e suas
curva correspondente à carga estimada de características devem ser detalhadamente
trabalho resulte numa inclinação de (20+/- relatados com seus resultados.
5)° com o eixo das cargas. (ABMS/ABEF, 1998).

O gráfico “carga x recalque” Deve-se ficar bem claro que a


resultante de prova de carga sobre estaca condição ideal é levar qualquer prova de
individual, pode ser dividido em 3 regiões: carga, independente do tipo ou suas
a primeira, de quase proporcionalidade entre características, até a ruptura ou até a
carga e recalque, utilizada para ocorrência de grandes recalques.
determinação do coeficiente de recalque; a (ABMS/ABEF, 1998).
segunda, de deformação viscoplástica, onde
não há a possibilidade de relacionamento Quando a prova de carga não é
teórico carga x recalque; a terceira, de levada até a ruptura (ou até um nível de
ruptura, na qual se define a capacidade de recalque que caracterize a ruptura), pode-se
carga ou carga de ruptura da estaca, quando tentar uma extrapolação da curva carga-
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recalque, baseada em equação matemática reação em relação ao elemento a ensaiar,


ajustada ao trecho que se dispõe da curva excesso de capacidade de carga do sistema
carga-recalque. (ABMS/ABEF, 1998). de reação em relação à carga máxima
prevista no ensaio e outros. (ABMS/ABEF,
A figura 09 abaixo apresenta a curva 1998).
carga x recalque com linha de extrapolação:
Os insucessos são frequentes nestes
ensaios, devido a ruptura, deformação
excessiva ou diferencial do sistema de
reação. Os cuidados no dimensionamento e
execução deste sistema, a criteriosa escolha
dos equipamentos e sua montagem e,
finalmente, o controle do comportamentoe
deformações do sistema de reação e de
transmissão de cargas durante o ensaio
garantem a eliminação da maior parte das
causas de ensaios cancelados ou
Figura 09 – Resultados da curva carga x recalque
prematuramente interrompidos.
com valores calculados na linha de extrapolação. (ABMS/ABEF, 1998).

Essa consideração serve para alertar Outro aspecto que exige cuidados
para a necessidade de analise cuidadosa ao especiais é o sistema de referência para
se comparar resultados de ensaio para medidas de recalques através dos
previsão de comportamento de obras, deflectometros. Detalhado estudo
especialmente nos casos em que o efeito da (Yassuda,1985) mostra a importância da
velocidade de carregamento pode realização de uma calibração previa do
influenciar significativamente o sistema de referencia, e ate da fixação de
comportamento do solo e do conjunto uma referencia de nível profunda em alguns
“solo-fundação” (Milititsky, 1991). casos. (ABMS/ABEF, 1998).

CUIDADOS NECESSÁRIOS RECOMENDAÇÕES

Em qualquer esquema de montagem A utilização dos resultados


de prova de carga, cuidados devem ser apresentados, na análise do comportamento
tomados para evitar influências das estacas como elementos de
indesejáveis, muitos dos quais previstos nas infraestrutura da obra, considerando-se o
normas brasileiras, tais como: dimensões tipo de carregamento a que estarão
adequadas do poço para colocação da placa, submetidas, as cargas de projeto e os
distancia mínima dos tirantes ou estacas de recalques admissíveis, deve ser verificada

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pelo consultor de fundações e pelo projetista VARGAS, M. Prova de carga em estacas


das estruturas. – uma apreciação histórica. Solos e
Rochas, São Paulo, ABMS, v.13, nº único,
p.3-12, 1990.
REFERÊNCIAS

VARGAS, M. Uma experiência brasileira


ABEF - Manual de especificações e em fundações por estacas. Geotecnia,
procedimentos ABEF. São Paulo: PINI, nº23, 31 e 32, Lisboa, 1997.
2004, 3ed.
VELLOSO, Dirceu de Alencar. LOPES,
ABMS/ABEF. Fundações: Teoria e Prática. Francisco de Rezende. Fundações, volume 2:
São Paulo: PINI, 1998. 2.ed. fundações profundas. Nova Ed. São Paulo:
Oficina de Textos, 2010.
ABNT NBR 6122:2010. Projeto e Execução
de Fundações. YASSUDA, C.T. Problemas Executivos
em provas de carga. In: SEFE, São Paulo.
ABNT NBR 6118:2003 - Projeto de Anais, ABEF/ABMS, v.2, p. 147-160,
estrutura de concreto - Procedimento; 1985.

ABNT NBR 12131:1991 – Estacas: Prova


de carga estática;

CUDMANI, R.O.; SCHNAID, F.; CONSOLI,


N.C. Comportamento de sapatas assentes em
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placa. In: COBRAMSEF, 10, Foz do Iguaçu.
Anais, ABMS, v.1, p.127-134, 1994.

DÉCOURT, L. Fundações e interação


solo-estrutura, Relato geral. In:
COBRAMSEF, 10, Foz do Iguaçu. Anais,
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GUERRIN, A.; LAVAUR, Roger C. TRAITÉ


DE BETÓN ARMÉ, Murs de Soutènement
et murs de quai.

MILITITSKY, J. Provas de carga


estáticas. In: SEFE, 2, São Paulo. Anais,
ABEF/ABMS, v.2, p.203-228, 1991.

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