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A DISGRAFIA E A APRENDIZAGEM:UM OLHAR PSICOPEDAGÓGICO


NERY, Daniquele Ferreira Lopes Barros.1
BITTENCOURT, Simone Maria Santos.2
SILVA, Tiara Santana da.3

RESUMO

Esse trabalho traz como tema a análise psicopedagógica da disgrafia na aprendizagem. O


referencial teórico surgiu do objetivo geral de compreender como o psicopedagogo pode
avaliar e intervir mediante a disgrafia, além de analisar o que a literatura acrescenta para
atender aos objetivos específicos. Procura-se conceituar a disgrafia, dando enfoque para a
importância do desenvolvimento psicomotor, descrever o desenvolvimento psicomotor da
criança com disgrafia e definir a importância da psicopedagogia na avaliação e intervenção do
indivíduo com disgrafia no estágio formal. Utilizam-se as contribuições de Simaia Sampaio
(2011), acerca dos transtornos e dificuldades de aprendizagens, de Victor da Fonseca (2012),
com os estudos voltados para a psicomotricidade do indivíduo e, de Rotta (2016), com os
transtornos da aprendizagem numa abordagem neurobiológica e multidisciplinar, para melhor
aprofundamento e conhecimento sobre o tema. A metodologia utilizada é de cunho qualitativo
e bibliográfico tratando-se de uma pesquisa de natureza exploratória, tendo por base um
estudo de caso desenvolvido no estágio clínico com uma adolescente, sendo também
qualitativa, já que possui caráter descritivo. Após estudos e aplicações de todo material
utilizado no estágio, observou-se: alteração na pressão exercida no ato da escrita, escrita
desorganizada, descoordenação no ato motor comprometendo o equilíbrio e a lateralidade no
ato da escrita, letras aglutinadas e traços irregulares e preensão incorreta do lápis, tendo como
resultado final o pseudodiagnóstico de disgrafia tema - ainda pouco difundido nos meios
acadêmicos.

Palavras–chave: disgrafia; psicomotricidade; psicopedagogia.

ABSTRACT

This work brings as a theme the psychopedagogical analysis of dysgraphia in learning. The
theoretical framework emerged from the general objective of understanding how the
psychopedagogue perceives dysgraphia in clinical diagnosis, as well as analyzing what the
literature adds to meet the specific objectives. We try to conceptualize the dysgraphia,
focusing on the importance of the psychomotor development of the individual, analyzing how
the writing process and the psychomotor development of the descriptive child take place. It
will also be defined the relevance of psychopedagogy in the evaluation and intervention of the

1Pós Graduanda em Psicopedagogia Institucional, Clinica e Hospitalar do Instituto Superior de Educação


Ocidente (ISEO); Graduada em Pedagogia pela Faculdade UNINASSAU/Ba; E-mail: kauanvida2@hotmail.com

2Graduada em Pedagogia pela Faculdade UNIME/Ba, Pós Graduanda em Psicopedagogia Institucional, Clinica
e Hospitalar do Instituto Superior de Educação Ocidente (ISEO); E-mail: mone.vida@hotmail.com

3Mestranda em Educação e Contemporaneidade (UNEB), Psicopedagoga (ISEO), Especialista em Coordenação


Pedagógica (UNIFACS), Pedagoga (FSBA), Docente Universitária em cursos de Graduação e Pós-graduação.
Funcionária do município de Salvador (SMED).e-mail: tsansilva@gmail.com
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individual with dysgraphia in the formal stage of learning, in order to minimize and / or
remedy the difficulties in this area. We use the contributions of Simaia Sampaio about the
disorders and difficulties of learning, of Victor da Fonseca with the studies focused on the
psychomotricity of the individual, and of Rotta with the learning disorders in a
multidisciplinary approach, to better deepen and knowledge about the subject . The
methodology used is qualitative and bibliographical in the case of a research of an exploratory
nature, based on a case study developed in the clinical stage with an adolescent, being also
qualitative, since it has a descriptive character. After studies and applications of all material
used in the stage, we reached the final result of a pseudodiagnosis of dysgraphia theme - still
not very widespread in academic circles.

Keywords: Dysphagia; psychomoticity; psychopedagogy

INTRODUÇÃO

Tomando por referência o estágio clínico, disciplina obrigatória no curso de pós-


graduação em Psicopedagogia oferecido pelo Instituto Social de Educação Ocidente-ISEO,
este trabalho tem a intenção de compreender como o psicopedagogo percebe a disgrafia no
diagnóstico clínico. Busca minimizar os problemas que causam dificuldades nas habilidades
motoras da criança, impedindo que a mesma consiga desenvolver corretamente a grafia em
seu processo de escrita, geralmente apresentando uma letra confusa para sua idade e série,
interferindo dessa forma em seu aprendizado.
Tanto a leitura quanto a escrita são elementos fundamentais que possibilitam a
inserção do indivíduo na sociedade, buscar-se-á através dos objetivos específicos, conceituar a
disgrafia, dando enfoque para a importância do desenvolvimento psicomotor da criança. Uma
vez que a psicomotricidade tem grande influência na desenvoltura das habilidades motoras do
sujeito, contribuindo para a melhora de alguma disfunção referente à motricidade global e
fina, no processo da escrita. Utilizando exercícios físicos ou cinesioterapia, como também,
jogos e atividades lúdicas, permitindo que a criança conheça seu próprio corpo, auxiliando
dessa forma sua formação integral.
A análise de como se dá o processo de evolução da escrita na criança disgráfica, uma
vez que esta ao iniciar sua vida escolar já está com sua linguagem oral definida e suas
habilidades linguísticas e cognitivas prontas para adquirir a aprendizagem da leitura e da
escrita, se deparando nesse momento com novas regras e tendo que atentar para elementos até
então não percebidos - como as unidades sonoras, fonemas e sílabas. Sendo necessário ao
educador observar as dificuldades apresentadas pela mesma, evitando dessa forma que
desenvolva dificuldades na aprendizagem dentre elas, a disgrafia.
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A disgrafia sendo detectada, mister é fazer a intervenção de uma equipe


multidisciplinar e, para tanto, a psicopedagogia tem papel relevante na avaliação e na
intervenção da criança disgráfica não só no estágio formal de aprendizagem, como em todas
as suas fases, buscando intervir e auxiliar o educando através de orientações e atividades na
área de ortografia, caligrafia, consciência fonológica etc., com o intuito de devolver ao mesmo
sua confiança, elevar sua auto-estima e sanar os problemas grafomotores.
Segundo CAPELLINI,

a avaliação da ortografia deve trazer informações do nível ortográfico que a criança


se encontra, revelando quais são os tipos de erros ortográficos e sua frequência de
ocorrência na escrita. De forma geral, deve conter a observação dos próprios
trabalhos escolares, ditado sem correção e auto-corrigido, escrita de textos longos e
curtos, ditado de pseudopalavras, cópia, ditado de letras, escrita de palavras a partir
de figuras, ditado de frases e palavras, completar palavras com um ou mais
grafemas, completar frases com palavras, tarefa de erro intencional, que fornece
informação sobre o nível de conhecimento ortográfico que os escolares possuem
(2008, p. 25).

Nesse contexto e, a fim de desenvolver estudos sobre o tema, recorreu-se como


referencial teórico, a Simaia Sampaio com suas contribuições acerca dos transtornos e
dificuldades de aprendizagens, a Victor da Fonseca com os estudos voltados para a
psicomototricidade do indivíduo, e a Rotta com os transtornos da aprendizagem numa
abordagem multidisciplinar, com o intuito de encontrar informações relacionadas ao problema
de crianças que apresentem disgrafia.
A metodologia empregada para realização do TCC foi baseada em pesquisa de
natureza exploratória, embasada em um estudo de caso, qualitativa e bibliográfica, possuindo
caráter descritivo, buscando através do problema detectado nas avaliações com a adolescente
E.C.B.C., durante o estágio clínico e da literatura existente, a forma mais adequada de se
encontrar as respostas para as questões referentes ao tema.
Para isso, os instrumentos de investigação colhidos durante o período de estágio, os
quais serão apresentados a seguir, quando se falará um pouco sobre a metodologia da pesquisa
e a função de cada instrumento durante o atendimento clínico. Estes colaboram para que o
psicopedagogo chegue ao diagnóstico final e, posteriormente as intervenções necessárias para
se alcançar a solução da disgrafia.
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2. METODOLOGIA

A metodologia utilizada para o desenvolvimento desse artigo foi o método qualitativo,


mediante a observação durante o Estágio Supervisionado Clínico, uma das disciplinas que
compõem a grade curricular no curso de Pós-Graduação em Psicopedagogia Transdisciplinar,
oferecido pelo Instituto Social de Educação Ocidente - ISEO.
Ocorreram 10 sessões com aplicação de provas: Entrevista Operativa Centrada na
Aprendizagem – EOCA, Provas Pedagógicas, Provas Operatórias, Técnicas Projetivas
Psicopedagógicas e Lúdicas, com duração de 1h (uma hora) cada sessão cumprindo a carga
horária 10 hs (dez horas) de atividades realizadas. Entre as aplicações das provas; Entrevista
Operativa Centrada na Aprendizagem – EOCA e Pedagógica foi levantado um
Pseudodiagnóstico de uma suposta disgrafia – (dis= dificuldade e grafia= grafar/escrever).
Segundo Simaia Sampaio (2017),

Na disgrafia, o sujeito apresenta letra feia e com garranchos. Isso acontece por causa
de uma incapacidade de recordar a grafia da letra, ou seja, ao tentar relembrar um
grafismo, a criança escreve muito lentamente e, com isso, acaba unindo
inadequadamente as letras, de maneira ilegível (p. 125).

Com a aplicação da EOCA, percebe-se a importância e a necessidade das intervenções


psicopedagógicas e psicomotoras, com a estudada, seguindo as orientações de Jorge Visca,
entendendo a necessidade de se estudar o sujeito como um todo e não apenas em suas
necessidades pontuais. “Todo diagnóstico psicopedagógico é, em si, uma intervenção, uma
pesquisa do que não vai bem com o sujeito em relação a uma conduta esperada. (WEISS,
2012, p. 31).
A partir desse momento, obteve-se hipóteses e passou-se a observar a escrita durante a
aplicação das demais provas principalmente as pedagógicas, instrumentos que consistem em
observar não somente as questões cognitivas, mas também as questões emocionais através do
uso de textos e problemas matemáticos com dificuldades crescentes. Nas atividades com
“interpretação de texto”, a hipótese de possível disgrafia tornou-se mais latente, pois a
adolescente demonstrou uma escrita confusa, mantendo o papel muito inclinado para a
esquerda no momento de efetuar a escrita, além da pinça do lápis de maneira incorreta.
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2.1 HISTÓRIA DO CASO


Para o estudo de caso objeto do estudo, observamos durante o estágio, foi a
adolescente E.C.S.B, com faixa etária de 14 anos, apresentando como queixa principal
“dificuldades associadas à matemática”. No decorrer das atividades realizadas, foi percebido
que a cliente encontrava-se em nível cognitivo hipotético-dedutivo, com escrita alfabética e
em estágio formal. A partir das intervenções e orientações baseadas na Epistemologia
Convergente de Jorge Visca, utilizou-se a E.O.C.A – Entrevista Operativa Centrada na
Aprendizagem, tendo como instrumento uma folha de papel ofício em branco e um lápis.
Segundo Visca,

a E.O.C.A. , deverá ser um instrumento simples, porém rico em seus resultados e


consiste em solicitar ao sujeito que mostre ao entrevistador o que ela sabe fazer, o
que lhe ensinaram a fazer e o que aprendeu a fazer”. (apud. 1987, p.72).

A cliente após as consignas, pegou o lápis desenhou de forma rápida uma casa, com
apenas uma porta, sem base de apoio, em formato grande e centralizado na folha,
demonstrando pouco compromisso com o que se propôs a fazer, desenho pobre para a sua
faixa etária. Perguntamos se gostaria de escrever algo sobre seu desenho disse – “não”,
podendo ser um indicativo de rejeição à escrita e vínculo inadequado com a aprendizagem
sistemática.
Foi solicitado que escrevesse o seu nome e data, o que foi atendido de imediato,
apresentando traços fortes, letras confusas, escrevendo muito simetricamente, raramente
fechando a letra “A” e, escrevendo o numeral 5 em formato de letra “S”. Durante a realização
das provas pedagógicas “interpretação de texto” a hipótese de possível disgrafia foi latente,
pois demonstrou letras irregulares, postura inadequada sobre a mesa, apoiando a mão que não
escreve sob o queixo e cabeça. Segundo Rotta, essas são “manifestações atípicas ligadas ao
ato gráfico, em um ciclo de elos partidos que gera conflito cada vez mais abrangentes na
personalidade do indivíduo como um todo” (2016, p.204).

2.2. INSTRUMENTOS UTILIZADOS

Além dos dois instrumentos já citados, utilizamos as Técnicas Projetivas que nos
mostrou através de desenhos como “o sujeito percebe, interpreta e estrutura o material ou a
situação e, refletirá os aspectos fundamentais do seu psiquismo” (WEISS, 2012). Essa técnica
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nos possibilitou entender diversas nuances dos fatores emocionais que impactavam nas
questões de aprendizado da adolescente.
Utilizou-se também para a avaliação, as Provas Lúdicas que tem a finalidade de
“compreender basicamente o funcionamento dos processos cognitivos e afetivos sociais em
suas interferências mútuas no Modelo de Aprendizagem do paciente” (WIESS, 2012),
complementando com as Provas Operatórias que, avalia o raciocínio e a construção do
conhecimento do sujeito em sua fase escolar, possibilitando ainda, investigar e avaliar o nível
cognitivo além de constatar se este realmente corresponde à sua idade cronológica.
Antes de finalizar as investigações e mesmo já tendo o pseudodiagnóstico de uma
possível “disgrafia”, partimos para a realização da anamnese, que consiste em um diálogo
com a genitora de nossa cliente, com preenchimento de um questionário onde constam
diversas informações desde a concepção até a fase atual.
Segundo Weiss,

essa entrevista “possibilita a integração das dimensões de passado, presente e futuro


do paciente, permitindo perceber a construção ou não de sua própria continuidade e
das diferentes gerações, ou seja, é uma anamnese da família” (2012, p. 23).

Ressaltamos ainda que, seguindo as orientações de Visca, esse instrumento deve ser
preenchido ao final das avaliações, possibilitando assim que não haja contaminação através
das informações trazidas pelo familiar, comprometendo dessa forma o diagnóstico, uma vez
que essa entrevista tem o objetivo de colher dados significativos sobre a história de vida do
paciente.

2.3 RESULTADOS ALCANÇADOS

O comprometimento na coordenação motora fina impactava nas letras aglutinadas e


traços irregulares, além da pressão e preensão do lápis no momento da escrita. Com o intuito
de melhor compreender como a disgrafia ocorre no processo de aprendizagem do indivíduo,
buscou-se um melhor aprofundamento com levantamento teórico dos principais aspectos das
dificuldades específicas de aprendizagem, tendo como objetivo definir a importância da
psicopedagogia na avaliação e intervenção da criança disgráfica, surgindo então como tema
principal a disgrafia, para o trabalho realizado de conclusão de curso – TCC.
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3. REFERENCIAL TEÓRICO

A DISGRAFIA E SEUS ASPECTOS: COGNITIVO, PSICOMOTOR E


AFETIVO.

De acordo com o DSM-5 (DiagnosticandStatistical Manual – 5th), a disgrafia é


conceituada como um “distúrbio de aprendizagem específico com deficiência na expressão
escrita”, sendo codificado como 315,2 (F81.81). Esse diagnóstico exige a presença de uma
dificuldade em relação à expressão escrita, com persistência de, no mínimo, seis meses,
apesar das sessões de intervenção. (APA, 2013).
Nesta perspectiva é muito importante observarmos em atuação psicopedágogica as
disfunções no momento da elaboração da escrita do cliente, inclusive àquelas ligadas ao
desenvolvimento psicomotor, que estão intimamente relacionados com a disgrafia.
A lateralização é um dos fatores que comprometem a escrita, algumas questões
relacionadas ao movimento na organização de tempo e espaço cabe ao domínio da
lateralidade, em cima, embaixo, frente, trás, antes, depois,etc. Esses movimentos são
decorrente do desenvolvimento da criança antes mesmo de ingressar na fase escolar e, é
necessário que a mesma tenha desenvolvido essas habilidades para elaborar a escrita. Alguns
aspectos relacionados ao segurar objetos, ao escovar os dentes, pentear os cabelos, no
momento da pinça a criança já é desde cedo orientada pela mão direita. Segundo Fonseca,
“muita gente não integra que vive em um mundo orientado para a mão direita”, (2012, p 151).
De acordo com o autor,

a lateralização manual surge no fim do primeiro ano, mas se estabelece fisicamente


por volta dos 4 a 5 anos, independentemente de muitas crianças atravessarem a
ambilateralidade e vários episódios de flutuação, antes de obterem a lateralidade de
direita e esquerda”. Fonseca, (2012 p.151).

Assim, alguns problemas relacionados à escrita ocorrem por o indivíduo não


apresentar a lateral definida. Outro fator determinante é a noção de tempo e espaço, a criança
se perde no momento do desenho do traçado com o tempo da tarefa a ser executada, além de
perturbações no esquema corporal, má organização do espaço em ralação ao corpo, inclinação
do papel ao escrever comprometendo o desenho da grafia, a posição da folha é um fator
indicativo de uma escrita mal elaborada, quanto mais inclinado o papel, mais se percebe a
descoordenação no ato da escrita.
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A tonicidade também tem um papel fundamental no desenvolvimento psicomotor


tanto “em repouso como em atividade”. Na área motora, podem surgir a hiper ou a
hipoatividade, nesse caso os comprometimentos estão ligados a pinça no momento de realizar
a escrita bem como a pressão que a criança exerce sobre o papel, podendo ser muito forte a
ponto de marcar a folha ou muito leve.
Com relação à motricidade fina, ao desempenhar a função de coordenação motora na
elaboração do traçado da grafia a criança processa a atenção, a orientação, o controle, a
adaptação (decodificação e codificação). O movimento e a postura são de fato inseparáveis
em termo de controle motor, além da inibição, pois a criança inibida não escreve corretamente
com clareza, devido a fatores psicológicos, sofridos no decorrer de sua aprendizagem como,
por exemplo, críticas destrutivas.
Vale ressaltar que, as questões visiomotora estão envolvidas no processo da escrita,
pois ao traçar uma linha a criança deve seguir com os olhos, a ação do riscar mirando o alvo a
atingir sendo necessário que a mesma utilize de suas habilidades cognitivas e lingüísticas.
Quando existe problema nessa área, a criança não consegue traçar as linhas com trajetórias
predeterminadas, ou seja, necessita decodificar as palavras e utilizar da ação adequada para a
execução do ato motor que lhe proporcionará realizar a grafia da letra, uma vez que essa
linguagem é muito mais complexa que a linguagem oral, necessitando de maior atenção e
cuidado por parte daqueles que estão no papel de mediadores, evitando-se dessa forma que a
criança desenvolva algum distúrbio de grafia durante o processo.
Segundo Cinel (2003),

A escrita é mais cuidadosa que a fala e, portanto, mais permanente e torna mais
evidente os problemas que se constituem distúrbios de grafia: disortografia ou
disgrafia. Sendo disgráficas aquelas crianças que apresentam dificuldades no ato
motor da escrita, tornando a grafia praticamente indecifrável. (p. 19).

A realização da escrita tem assim impacto não só no processo educacional do


indivíduo, como também no seu bem-estar físico e no seu desenvolvimento cerebral. Quando
essas habilidades não estão bem definidas, pode causar algumas perturbações conhecidas
como dispraxias que em termos de aprendizagem formal, se traduzem em “disgrafias”, com
manifestações atípicas ligadas ao ato gráfico, em um “ciclo de elos partidos” que geram
conflitos cada vez mais abrangentes na personalidade como um todo Rotta, (2016, p. 204).
A autora ainda ressalta que,

“os professores e orientadores de nossas crianças precisam estar atentos ao


rendimento de seus alunos em sala de aula, pois em crianças com quadros de
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disgrafia, a autora ainda ressalta que, “as experiências são dolorosas gerando os
fracassos ao escrever e, esses fracassos acumulam-se gradativamente e em níveis de
sofrimento, cada vez menos toleráveis, acabando por gerar inibição e fragilidade nas
relações de aprendizado, trabalho e convívio social, gerando assim um ciclo de
inibição”. ROTTA, (2016, p.204).

Segundo a autora, alguns sintomas se revelam e precisam ser observados como:

 Recusa na realização de temas e trabalhos escolares;

 Estresse pessoal e familiar, principalmente na hora do estudo;

 Cadernos incompletos, com rasuras, desenhos aleatórios, excesso de pressão no


traçado;

 Desatenção às solicitações do professor;

 Queixas escolares freqüentes;

 Letra ilegível;

 Desorganização pessoal (roupas, mochilas e quarto);

 Omissão de datas para entrega de trabalhos e provas escolares;

 Lentidão, morosidade (tarde inteiras para o tema);

 Repetência de séries escolares.

Rotta (2016), ainda esclarece que, “a continuidade não assistida desse “ciclo de
inibição” acaba por instalar, de forma crônica, a sintomatologia típica das drisgrafias,
especialmente “dor”, “suor” e “cansaço”. A autora diz que, “nem sempre esses sintomas são
levados a sério por parte daqueles que estão envolvidos no processo de orientação às crianças,
e que, essa é uma atitude bastante iatrogênica para o disgráfico, pois prolonga e agrava o seu
sofrimento no tempo”.
Além de todos os sintomas que precisam ser observados, existem distúrbios de ordem
psicológica que conjugados com os sintomas elencados acima, contribuem significativamente
para que a criança desenvolva a disgrafia, tornando esse processo muito mais doloroso.
ROTTA questiona: “Por que uma pessoa precisa atirar-se no chão, ou chorar, ou negar-se a
escrever, se não estiver sofrendo?” (2016, p.205).
Apesar de todos os sintomas e, de todos os distúrbios que envolvem a disgrafia o
psicopedagogo precisa realizar um trabalho bem planejado, orientando o cliente em suas
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dificuldades. Seguindo então o que preceitua o DSM-5, caso a escola e a família perceba essa
dificuldade e, tendo feito as avaliações neurológicas necessárias no sentido de descartar
qualquer outra patologia, o psicopedagogo em uma avaliação clínica pode diagnosticar ou não
a disgrafia e em sendo confirmado, o psicopedagogo realizará as intervenções através de um
trabalho de reeducação da linguagem escrita. Parafraseando WEISS, “o objetivo do
diagnóstico psicopedagógico é identificar os desvios e os obstáculos básicos no Modelo de
Aprendizagem do sujeito que o impedem de crescer na aprendizagem dentro do esperado pelo
meio social” (2003, p. 32).
No atendimento clinico, o psicopedagogo deve estudar os padrões normais e
patológicos, que envolve seu cliente, considerando as influências que a família, a escola e a
sociedade exercem sobre ele. Essa avaliação é feita através da E.O.C.A., das provas
operatórias, técnicas projetivas, provas lúdicas e pedagógicas, além da anamnese que consiste
em uma entrevista com a genitora ou responsável pela criança, com a intenção de identificar
as dificuldades e transtornos que estão impedindo que o indivíduo consiga avançar em seu
processo de aprendizagem, buscando compreender e estimular o mesmo a desenvolver as
estratégias necessárias para o seu aprimoramento.
Após as avaliações e, se confirmando as questões referentes à disgrafia –
“considerando que esse cliente chegou à clínica com a queixa de dificuldades com a
linguagem escrita”, o psicopedagogo dará a devolutiva para a família após as avaliações
realizadas e, em a família concordando, esta poderá iniciar as intervenções no sentido de
minimizar e/ou sanar as dificuldades.
O psicopedagogo então passará a desenvolver atividades que venham estimular as
funções cognitivas, quanto às dificuldades voltadas para a realização do ato gráfico, buscando
entender a relação do sujeito com as questões da escrita, como foi a sua inserção no mundo
das letras, quais os sintomas e conflitos apresentados pela criança que a impede de realizar o
processo da escrita de forma confortável e compreensível. Pode e deve utilizar recursos como
jogos, livros e computador, no intuito de descobrir os estilos de aprendizagem através dos
ritmos, hábitos adquiridos, motivações, ansiedades, defesas e conflitos em relação ao
aprender.
Esses recursos possibilitarão ao profissional fazer uma análise específica da produção
escrita de seu cliente, analisando inversão ou não de letras, letras aglutinada, espaçamento
entre as palavras, observância de margens, erros cometidos, preensão e pressão do lápis,
subsidiando dessa forma o trabalho psicopedagógico.
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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durante os estudos realizados acerca do tema principal desse trabalho, percebemos a


necessidade do profissional psicopedagogo estar em uma busca constante referente à
aprendizagem e as dificuldades associadas à disgrafia.
Nessa perspectiva, encontramos um tema pouco difundido, que nos permitiu
compreender a importância de se estudar os assuntos relacionados à psicomotricidade e sua
influência na atuação psicopedagógica ao realizar atividades voltadas para o diagnóstico
clínico da criança disgráfica.

O profissional psicopedagogo deve estar atento às dificuldades apresentadas pelo


cliente mediante seu processo de aquisição da linguagem escrita, quando este apresente
resistência ou morosidade ao realizar as atividades de classe e extraclasse; alinhar juntamente
com psicomotricista, para intervir junto às questões voltadas para a motricidade, pois o ato
motor na criança disgráfica ocasiona rigidez muscular, “dor gráfica”, descoordenação motora
e, alinhar com um psicólogo os problemas afetivos, que causam conflitos de personalidade
gerando sofrimentos, fracassos e, inibição no ato da escrita.

O indivíduo em processo de aprendizagem necessita que suas aquisições mentais,


psicológicas e motoras se organizem interiormente, favorecendo a maturação desses sistemas,
evitando-se dessa forma as manipulações pedagógicas que geralmente fragmentam o
indivíduo ocasionando distúrbios diversos, dentre esses, a disgrafia.
Considerando que a disgrafia é um problema voltado para a linguagem escrita e, sendo
a escrita muito requisitada nas escolas e na vida do indivíduo em sociedade, as dificuldades
que envolvem o processamento percepto-visual ou o desenvolvimento percepto motor,
poderão impactar nos distúrbios de aprendizagem e/ou a incapacidade da criança recordar e
executar a grafia das letras no momento de realizar a escrita. Salienta-se aqui, que a criança
disgráfica não apresenta problemas relacionados à inteligência e sim a problemas percepto
visiomotor.
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Os estudos nos mostraram a necessidade de os responsáveis pela orientação


educacional do aluno estar atentos às dificuldades apresentadas pelos mesmos, buscando um
olhar diferenciado sobre estes, desde o início do seu processo de aquisição da linguagem
escrita, quando apresentem resistência ou morosidade ao realizar as atividades de classe e
extraclasse. Nesse mesmo viés, a criança necessita de acompanhamento de um profissional
psicopedagogo que tem papel relevante, na avaliação e intervenção da criança disgráfica não
só no estágio formal de aprendizagem, como em todas as suas fases, buscando intervir e
auxiliar o educando através de orientações e atividades na área de ortografia, caligrafia,
consciência fonológica etc., com o intuito de devolver ao mesmo sua confiança, elevar sua
auto-estima e sanar os problemas grafomotores.
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REFERÊNCIAS

CARDOSO, Monique Herrera; CAPELLINI, Simone Aparecida. Compreendendo os


Transtornos Específicos de Aprendizagem:compreendendo a disgrafia. Vol. I. Editora
Booktoy, 1ª ed. 2017.

CINEL, Nora Cecília Bocaccio. Disgrafia: prováveis causas dos distúrbios e estratégias para
a correção da escrita. Revista do Professor, Porto Alegre, 19 (74): 19-25, abr./jun. 2003.

FONSCESA, Victor. Manual de Observação Psicomotora: significação psiconeurológica


dos fatores psicomotores – 2ª ed. – Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012.

MANUAL DIAGNOSTICO E ESTATÍSTICO DE TRANSTORNOS MENTAIS. 5 a.


EDIÇÃO. DSM-5. Revisão técnica: Aristides Volpato Cordioli (coordenação) ... Membros da
Divisão de Pesquisa da APA responsável pelo DSM-5.

ROTTA, Neura Tellechea; OHLWEILER, Ligia; RIESGO, Rudimar dos Santos. Transtorno
de Aprendizagem: abordagem neurobiológica e multidisciplinar. 2ª ed. Editora Artemed,
2016.

SAMPAIO, Simaia; FREITAS, Ivana Braga. Transtornos e Dificuldades de Aprendizagem:


entendendo melhor os alunos com necessidades educativas especiais/org. Rio de janeiro: Wak
Editora, 2011.

SAMPAIO, Simaia. Manual Prático do Diagnóstico Psicopedagógico Clínico – 6ª ed. – Rio


de Janeiro: Wak Ed., 2016.

WEISS, Maria Lúcia Lemme. Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica dos problemas
de aprendizagem escolar. 14ª ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Editora Lamparina, 2012.
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ANEXOS

IMAGEM 01 – LETRAS AGLUTINADAS

IMAGEM 02 – INVERSÃO DE LETRAS E PALAVRAS ILEGÍVEIS


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IMAGEM 03 – APOIO DA CABEÇA NO ATO DA ESCRITA

IMAGEM 04 – INCLINAÇÃO DO PAPEL NO ATO DA ESCRITA

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