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TEOLOGIA
DEPARTAMENTO DE TEOLOGIA
Meus ag radecimentos.
Sinopse.
Palavras e co nceit o s chaves: ressurreiç ão , her menêut ica, desido lat r ização ,
esper ança das vít imas, práxis, segu iment o, missão , cu lt o .
5
Overview.
Leo nardo Bo ff, Juan Lu is Segu ndo and Jo n So br ino are amo ng t he
p io neer ing t heo lo g ians who represent an ext remely fert ile p er io d fo r Lat in
Amer ican T heo lo g y. Chr ist o lo g y o ccup ies t he pr id e o f p lace in t heir t hink ing .
This st ud y aims at analyz ing t heir u nder st and ing o f t he resurrect io n o f Jesus,
‘t he fo u ndat io nal event ’ as fo u nd in so me o f t heir bo o ks. Their u nder st and ing
is t hat ‘t he enco u nt er exper ience’ t hat t he resurrect io n is, caused fu nda ment a l
chang es in t he lives o f t he fo llo wer s o f Jesus. T he abo ve ment io ned aut ho rs
det ect an analo go us ‘enco unt er exp er ience’ in t he liberat io n mo vement t hat
t he seco nd half o f t he 20 t h cent ur y wit n essed in Lat in Amer ica. T his st ud y
enu merat es so me o f t he resu lt s t hat fo llo wed t his ‘enco u nt er exper ience’ as
t hey man ifest ed t hemselves in t he Lat in Amer ican co nt ext acco rd ing t o t hese
aut ho rs.
Key wo rds and expressio ns: resurrect io n, her meneut ics, undo ing ido l wo rship,
ho pe fo r t he vict imized, pract ice, fo llo win g, missio n, cu lt .
6
SUMÁRIO
SIGLAS
INTRODUÇÃO 09
Conclusão 151
Bibliog ra fi a 156
9
SIGLAS
Introdução
No sso est udo t em co mo o bjet ivo examin ar algu mas o bras cr ist o ló g icas
selecio nadas de Leo nardo Bo ff, Ju an Lu is Segu ndo e Jo n So br ino , t rês aut o res
ent re o s p io neiro s d e u m per ío do de cr iat iv idad e inco mu m na AL. Qu al a
co mpreensão da Ressurreição de Jesu s na Cr ist o lo g ia deles? Qual fo i o
resu lt ado dest a co mpreensão ? Ao lo ngo dest e est udo desco br ir emo s que a
Ressurreição é co mpreend id a co mo u ma exp er iência de enco nt ro co m o
Ressu scit ado e qu e d est a exper iência resu lt aram mud anças pro fu ndas q ue,
mesmo depo is d e do is mil ano s, co nt inuam a no s surpreender.
No sso s aut o res d ialo g am co m a mo der nid ade e ado t am perspect ivas
her menêut icas pró pr ias, pr io r izando , como fo i mencio nado , o hu mano e o
hist ó r ico , co nfro nt ando as fo nt es t rad icio nais d a t eo lo g ia co m a realidad e
lat ino -amer icana. Co meçaremo s a apresent ação de cad a u m d eles a part ir do
respect ivo ho r izo nt e her menêut ico , mo st rando co mo a práx is d e Jesu s e su a
co nseqüência, a mo rt e na cruz, o cupa u m lug ar impo rt ant e no esquema
cr ist o ló g ico do s t rês. Em segu id a, analis aremo s a co mpreensão que eles t êm
da Ressurreição de Jesus. Co mo ver emo s, a Ressurreição é o sust ent ácu lo d a
Cr ist o lo g ia d est es t eó lo go s. Isso ap arece de mo do especial na maneira co mo
co mpreendem as co nseqüências dest e event o , percebido co mo enco nt ro co m o
Ressu scit ado . A exper iência d est e enco nt ro causo u mudanças rad icais no s
d iscíp u lo s e o s aut o res que est udaremo s caract er izam a práxis eclesia l lat ino -
amer icana de sua épo ca co mo u ma exper iência análo ga à d as t est emu nhas do
Evangelho , práxis que se repet e na hist ó ria.
No sso t rabalho não pret ende ser exaust ivo . Examinaremo s apenas
algu mas o bras de cad a aut o r. No sso s teó lo go s t êm co nsciência d e sere m
p io neiro s. E de fat o o fo ram. No sso t rabalho pro cura co mpr eend er u m asp ect o
dest e p io neir ismo : a co mpreensão da Ressurreição de Jesu s d esde o co nt ext o
hist ó r ico lat ino -amer icano .
so lidar iedad e co m o s in ju st içado s d a hist ó ria adqu irem no vo sent ido . Isso
po rque a exper iência do enco nt ro co m o Ressu scit ado revela u m Deu s
so lidár io co m o s in ju st içado s, so lidar ied ade qu e po ss ib ilit a a man ifest ação do
“no vo Adão ”, revelado no “no vo engaja ment o ” hist ó r ico em cur so na AL.
No t erceiro cap ít u lo est udaremo s a per sp ect iva de Jo n So br ino . Part indo
da sit uação mo rt ífera e sangrent a d a gu erra civ il em E l Salvado r, o t eó lo go
cent ro -amer icano t ent a co mpreender o sent ido da vio lência e da mo rt e
aparent ement e desnecessár ias, insp ir ando -se na práxis libert ado ra de Jesu s.
Para ele, a imag em bíb lica do Deus d a vid a que lut a co nt ra o s deuses da mo rt e
reaparece no event o pascal, o nd e Deus é Aq uele q ue ag e em favo r da vít ima e
assim g era esp erança p ara as vít imas. E st a exper iência d e enco nt ro co m o
Ressu scit ado mo t iva mu it o s cr ist ão s la t ino -amer icano s a camin harem na
so lidar iedad e ju nt o co m o s in ju st içado s do co nt inent e lat ino -amer icano ,
ent regando eles t ambém suas pró pr ias vid as.
Capítulo Primeiro
O Cristianismo que celebra uma Presença:
A ressurreição na Cristologia de
Leonardo Boff
1
Le on a r do Boff n a sc eu em 14 de d ez em br o de 1 938 n o E st a do de Sa n t a Cat ar in a, Br a si l.
Fez seu s est ud os fi l os ófi c os e t e ol ógi c os em Cur i t i ba (Pa r aná ) e P et r óp ol i s ( Ri o d e
Ja n eir o). Com pl et ou s eus est ud os d e esp eci a l i z a çã o em t e ol ogi a dogm á t i ca n a E ur opa , n a
Un i ver si da de de Mun i que (Ba vi er a ), sob a or i en ta çã o de Ra hn er , Sch effcz yk e Fr i es.
2
BOF F, Le on a r do. Je sus Cri st o Li be rt ador E nsai o de Cri st ol ogi a c rí ti c a para o nosso
t e mpo. Pet r ópol i s: V oz es, 1977. D or a va n t e ci t a r em os est a obr a da segui n t e for m a : Je sus
Cri st o Li be rt ador.
3
BOFF, L e on a r do. Pai x ão de Cri st o – Pai x ão do mundo, O f at o, as i nt e rpre t aç õe s e o
si gni f i c ado ont e m e hoje . Pet r ópol i s: V oz e s, 1977. Dor a va n t e ci t a r em os e st a obr a da
segui n t e for m a : Pai x ão.
4
BOFF, L e on a r do. A Re ssurre i ç ão de Cri st o A nossa re ssu rre i ç ão na mort e . Pet r ópol i s:
Voz es, 1972, 3ª E di çã o. Dor a va n t e ci t ar em os est a obr a da segui nt e for m a : Re ssurre i ç ão.
15
A q uest ão “Quem é Jesu s?” deve ser respo nd ida po r cad a geração . Para
Bo ff, no NT enco nt ramo s u ma p luralid ade de respo st as a est a quest ão . O
Evangelist a Marco s, po r exemp lo , afir ma que Jesu s é o Messias (Cr ist o )
esco nd ido e o grande libert ado r. Já Mat eus d iz q ue Jesus é o no vo Mo isés,
enquant o Lucas afir ma qu e ele é o libert ado r do s po bres, do ent es e
marg inalizado s e Jo ão o apresent a a part ir da figura hierát ica do Logos, o
Filho Et erno de Deu s.
5
E st a cr i st ol ogi a ba sei a -s e n os s egui n t es p on t os: 1) o m od o de a gi r de Je sus; 2) sua s
exi gên ci a s l i ga n do a par ti ci pa çã o n o Rei n o e a vi n da do Fi l h o do Hom em à a desã o d e sua
pess oa ( Lc 12, 8-10); 3) a r ei vi n di ca çã o d e que c om el e se ofer ec e a úl t i m a chan ce d e
sa l va çã o; 4) a r ei vi n di ca çã o d e qu e c om el e os pobr es s er ã o c on s ol a dos e os p e ca dor e s
ser ã o r ec on ci l i a dos. Cf . BOFF, Le on a r do Je sus Cri st o Li be rt ador p. 25.
6
Na l ei t ur a de Boff, en t r e t ai s segui dor es en c on t ra m -se H. Br a un , D. Söl l e, P. van Bur en.
Cf . Ide m, p. 27.
16
Perant e o imp asse pro vo cado pela hist o r io grafia co nt empo rânea, Bo ff
sust ent a que é po ssíve l, a part ir d a anális e das fo nt es da Cr ist o lo g ia, afir mar
que o Deus que se ident ifico u co m no ssa sit uação , co m no ssas t revas e
angúst ias, é o Deus de Jesus de Nazaré, o Deus que ao ressuscit ar seu Filho
venceu a mo rt e, o pecado e t udo o que aliena o ser hu mano 7. É esse Deu s que
t ambém d iv in iza a hu man idad e. Est a imp licação de Deus na hist ó r ia co nfere a
est a u ma po sit ivid ade e lhe d á u m carát er univer sal e et er no , represent ando e
ant ecip ando o fut uro dent ro do t empo .
Na o p inião de Bo ff, a her menêut ica não sig nifica apenas a art e de
ent end er t ext o s ant igo s, mas t ambém a busca d e co mpr eend er t o das as
man ifest açõ es da vid a art icu lando -as co m a mensagem evang élica. Tais
man ifest açõ es t êm a ver co m aq ueles fat ores que d izem respe it o ao ind iv íduo
7
“O Deus qu e se i den t i fi c ou c om n ossa si t ua çã o, c om n ossa s t r eva s e a n gúst i a s, esse é o
Deus di vi n o e se ch a m a Jesus de Na z a r é” . Ibi d., p. 29.
8
E l e a na l i sa a s segui nt es t e or i a s: 1) a h erm en êut i ca “h i st ór i co-cr í t i ca ” , que pr ocur a
des en tr anh ar o sen t i do or i gi ná ri o do t ext o a t ra vé s do est ud o da h i st óri a da s for m a s,
t ra di çõe s e a r eda çã o; 2) a h er m en êut i ca “exi st e n ci a l” , que pr ocur a super a r a s l i m i ta ções
da h er m en êut i ca “hi st ór i co- cr í t i ca ” atr a vés d e e xa m e do cí r cul o h er m en êut i co jun t o c om o
que pod e s er ch am a da desi de ol ogi z a çã o e r e-i de ol ogi z a çã o da m en sa gem que o con t ext o
h i st ór i co r equer ; 3) a h erm en êut i ca “h i st ór ic o-sa l ví fi ca ” , que i n vest i ga a di a l ét i ca
exi st en t e en t r e a “pr o-post a ” sa l ví fi ca de Deus e a “r es-post a h um ana ”. Cf. Ibi d. , p. 47-56.
17
e à co let ivid ade. E les devem ser capt ado s à lu z de t emas neo t est ament ár io s,
co mo o Reino de Deu s, a ju st iça, a paz, a reco nciliação et c.
Para Bo ff, no ssa t arefa cr ist o ló g ica na Amér ica Lat ina de ho je, não é
“defin ir mo s a ele (Jesus Cr ist o ), mas a nó s mes mo s” 9. Est a defin ição se dá
nu ma re leit ura a part ir de u ma ó t ica pró pria que deve co nt er o s segu int es
t raço s: 1) A pr imazia do element o ant ropo ló g ico so bre o eclesio ló g ico , o u
seja, o ser hu mano “a quem a Igreja deve auxiliar, erguer, e hu manizar” t em
preced ência so bre a est rut ura eclesiást ica 10; 2) O acent o det erminant e não
po de ser o passado , mas o fut uro, pelo fat o de a hist ó ria do ho mem su l-
amer icano t er sido o que ela fo i. Nest e sent ido , o aspect o utó pico assu me a
pr imazia so bre o fat ual 11; 3) A pr io r idade “do element o cr ít ico so br e o
do g mát ico ”, dad a a sit uação at ual d a Amér ica Lat ina 12. Isto po rque a cr ít ica
assu me u m carát er acr iso lado r da exp er iência cr ist ã, fazendo co m que a
mesma seja encar nad a cr it icament e nas d iferent es sit u açõ es em q ue v iv e
naquele mo ment o ; 4) A pr imazia do so cial so bre o pesso al é u m imper at ivo
d iant e da “marg inalização so cial d e imensas po rçõ es da po pulação ” 13. A Igreja
“deve part icip ar da arrancada g lo bal de libert ação da so ciedad e su l-
amer icana”, dando assim, co mo fez Jesus, especial at enção ao s “sem- no me” e
ao s “sem- vo z”; 5) A “pr imazia d a o rto praxia so bre a o rto do xia” 14, po rque o
segu iment o de Cr ist o , t ema fu ndament al do s evangelho s sinó t ico s, fo i mu it o
po uco t emat izado e t raduzido em at it udes co ncret as na vida da Igreja. Bo ff
ju lg a que o mo ment o praxio ló g ico da mensag em de Cr ist o é part icu lar ment e
sensível na reflexão t eo ló g ica feit a na Amér ica Lat ina.
Co m essas o bser vaçõ es preliminar es passaremo s ago ra a examinar a
imagem de Jesus qu e Bo ff no s pro põ e e que, segu ndo ele, co rrespo nd e às
exigências de co nt ext ualização da sua t eo lo gia.
9
Ibi d. , p. 61.
10
Ibi d. , p. 57.
11
Boff di z qu e, n a desa st r osa si t ua çã o em que se en c on tr a o h om em sul -a m er i ca n o, é
op or t un o dei xa r par a trá s seu pa s sa do eur op e u, de c ol on i z a çã o e a p ost a r n um fut ur o
ut ópi c o. E st e fut ur o n a scer á do pr in cí pi o-esp er a n ça , que m an t ém o pr oces s o s oci a l em
per m an ent e a ber t ur a par a um a tr an sfor m a çã o c a da vez m a i s cr es c en t e. Cf . BOFF, J e su s
Cri st o Li be rt ador, p. 58.
12
Ide m. ,
13
Ibi d. , p. 59.
14
Ibi d. , p. 60.
18
Nest e ho r izo nt e apo calípt ico , Jesus vai in augurar seu min ist ér io . Não há,
po rém, nenhu m ind íc io de qu e t enha aliment ado o nacio nalis mo judeu o u se
id ent ificado co m as esp ecu laçõ es apo calípt icas. O ep isó d io das t ent açõ es (Mc
1,22s; Lc 4,1-3 ; Mt 4,1-11), que o s sinó t ico s co lo cam no in íc io d a vid a
púb lica de Jesus, po de ser vist o co mo o resu mo do s co nflit o s qu e ele
enfrent o u durant e to da a sua vid a e q ue t êm a ver t ambém co m as expect at ivas
messiânicas de seus co nt empo râneo s. Seus d iscípu lo s, que eram judeus,
co mu ngavam cert ament e co m essas expect at ivas, mas Jesu s vai lent ament e
mo st rando - lhes o utra fo r ma de ver o messias.
15
Ibi d. , p. 71.
19
O que d izem esses t ext o s t inha ao s po uco s se t o rnado u ma pro messa para o s
t empo s messiânico s (Is 61,1 s) 16.
Segu ndo Bo ff, o s d iscur so s de Jesu s, espec ialment e o das parábo las,
pro vo cam u ma t o mada de po sição . E las d esafiam a co mpreensão , po rque Jesu s
não é mais u m rabino q ue int erpret a as Escr it uras, mas alguém que lê a
vo nt ade d e Deu s 18. O que Deus quer po de ser d iscer nido pelo recurso à sua
palavra, pela co nsu lt a do s sina is do s t emp o s e pelo imprev ist o da sit uação .
16
Um a exp ect a t i va qu e n a h i st ór i a se t orn ou um a esper a n ça se cum pr e n est e e ven t o. Cf .
Ibi d. , p. 64 – 67.
17
Sobr e o s er m ã o da m on t anha e a pr opost a r adi ca l l eva n t a da n el a por Jesus, Boff fa z uma
r á pi da a pr eci a çã o h i st ór i ca da s posi ç õe s t om a da s. Jul i an o, o Apóst a t a , por exem pl o, vi u
n est e s er m ã o o a r gum ent o pa r a r ejei t a r o cr i st i an i sm o i n t ot o, por el e s er i m pra t i cá vel (n a
sua opi n i ã o) par a o i ndi ví duo. Há t a m bém out r a s opi n i ões s obr e o ser m ã o: um a m or a l da
boa i n t en çã o; um a m or a l do í n t er i m (a posi çã o da t eol ogi a l i ber a l ) et c. Boff di z que est e s
e m ui t os out r os n ã o c on segui r a m en xer gar a r a dica l n ovi da de qu e J esus i n t r oduz . Cf. Ibi d.,
p. 82 – 85.
18
“A d out r in a de J esus n un ca é s om en t e um a expl i ca çã o d e t ext os sa gr a dos. E l e l ê a
von t a de de Deu s t a m bém for a da s E scr i t ura s (. . .) E m sua c om pa nh i a a cei t a gen t e que um
r a bin o r ejei t a r i a in a pel a vel m en t e: (.. . ) Seus ou vi n t es en t en dem l ogo. Nã o l h es sã o exi gi da s
out r a s pr essup osi ç õe s que a s do bom sen so e d e s ã r a zã o” . Ibi d. , p. 95.
20
inq uebrant ável fid elidad e at é à mo rt e. Nisso ele at ing iu aqu ela pro fu nd id ad e
hu mana qu e co ncer ne t o do s o s seres hu mano s. “Nele se revela o que há d e
mais d iv ino no ser hu mano e o que há de hu mano em Deus” 19.
19
Ibi d. , p. 110.
20
Por exem pl o, os pr on un ci a m ent os ba sea d os n a sua pr ópr i a a ut or i da de, di fer en t e dos
pr ofet a s que usa va m expr ess ões c om o: “ Pal av ra de Iahwe h” e t c .
21
da mo rt e na r ealid ade lat ino -amer icana p ara aí anu nciar o Cr ist o
Ressu scit ado .
21
Assi m c om o os r el a t os n e ot e st a m en t ári os da vi da de Jesus est ã o m a r ca dos por ch a ves
h erm en êut i ca s que r espon dem à s per gunt a s da época em que for a m el a bor a da s, Boff
pr et en de r espon der a os desa fi os de sua ép oca . Cf. BOFF, Pai x ão, p. 11-12.
22
Boff m en ci on a o c on t ext o cúl t i c o-l i t úr gi co par a pr epar ar o t err en o que a br e a
pos si bi l i da de de s e pen sa r de out r a for m a o si gn i fi ca do da m or t e de Jesu s n um con t ext o
vi t a l di fer en t e. Cf. Ide m., p. 17-18.
22
23
E m Dn 7, 3 “um com o Fi l h o de Hom em ” – “bar nasha” , em Ar am a i co, ou “-be n’adam-”
em He br a i co, si gn i fi ca a n t es de t ud o o “s er h uman o” . Ma s a expr essã o t em a qui um
sen t i do pa r t i cul ar, em in en t e, n o qua l el a desi gn a um h om em que ul t ra pa ssa
m i st er i osa m en t e a c on di çã o h um an a . “É um a fi gur a h uman a , con tr a post a à s qua t r o fer a s;
n ã o é um ser m i st er i os o e c el est e. Nã o de sc e, s obe; m a s, do p on t o de vi st a do vi den t e, el a
‘vem ” (c f. BI BLIA DO PE RE G RIN O p. 2150). “ Ma l eá vel e i m pr eci sa , a expr es sã o Fi l ho do
Home m pod e desi gn a r t ant o o Fi l ho qua nt o o home m, e r ecobr e os out r os t í t ul os
cr i st ol ógi c os” . “Fi l h o d o h om em ” i n CARRE Z, Ma ur i ce, em LACOST E , Jea n -Yve s
Di c i onári o Crí t ic o da Te ol ogi a Sã o Pa ul o: Pa ul i n a s/ Loyol a , 2004, p. 736.
24
BOFF, Pai x ão, p. 89.
25
Ide m. , p. 95.
26
Boff est á exa m i n an do a tr a di çã o a que se r e fer e Pa ul o, em Rm 3, 24-26a . E sta tr a di çã o se
for m ou n um a com un i da de de jud eus c on ver t i dos e t em seu c on t ext o vi t a l n um a li t ur gia
euca r í st i ca e sua cl ar a for m ul a çã o: “Cr i st o foi sa cr i fí ci o de pr opi ci a çã o” . Ibi d., p . 95.
27
Ibi d. , p. 96.
23
quem o Reino já est ava aí co m o bat is mo , a fé, a eucar ist ia, e o Pneuma. E le
ins ist e po r isso na sabedo r ia de Deus qu e é capaz d e assu mir as at iv idad es
quo t id ianas e as fraq uezas present es na r ealidad e hu mana, mesmo depo is d a
Ressurreição de Jesu s. Na segu nda cart a, o Apó st o lo co mbat e u m o ut ro desvio
do s Co r ínt io s: o do s pregado res t au mat u rgo s que apresent avam Jesu s co mo
u m sup er-ho mem q ue ro mp eu as barreiras do hu mano e ent ro u na esfera do
d ivino . A eles, Pau lo co nt rapõ e a cruz e o so fr iment o , a fraqueza e a mo rt e de
Jesus. Co m isso , ele quer salvar o mist ér io cr ist ão da mit o lo g ia grega e a
redução de Cr ist o ao hero ísmo da cu lt ura helênica po pu lar.
28
Ibi d. , p. 106.
24
aut o r da Cart a ao s Hebreu s. Tais ele ment o s mo st ram a d iver sidad e co m a qua l
o NT ent end e o mist ér io da cruz. Ago ra analisar emo s as int erpret açõ es qu e
no sso auto r pro põ e da t rad ição t eo ló g ica.
29
Ibi d. , p. 118.
25
Co nt ra Mo lt mann, e em aco rdo co m Hed ing er, Do rot hea Sö lle d iz que o
so fr iment o não t em sent ido , embo ra po ssamo s dar- lhe u m. Deu s não é u m
sád ico , que envia a do r co mo cast igo . Tampo uco ele envia a do r co mo pro va
de no ssa o bed iência. O ser hu mano deve assu mir o desafio d a do r, para gerar
amo r, mesmo que precise at ravessar a do r para isso .
aí para ser assu mida e andar no caminho do filho do Ho mem qu e a assu miu e
30
po r ela no s red imiu ” .
30
Ibi d. , p. 144.
31
S obr e a a t ua çã o l i ber t a dor a do Pe. Ca r l os Al ber t o, c om o t a m bém a d e out r os c om os
qua i s Boff s e i den t i fi ca , c f . BOFF, Pai x ão, p. 145 – 150.
32
Ide m. , p. 153.
29
o pensa ment o t eo ló g ico co nt empo râneo diz so bre o Ressu scit ado ; 3) reflexão
sist emát ica de Bo ff.
Segu ndo Bo ff, o desap areciment o do co rpo de Jesu s (Mc 16,6 ; Mt 28,5 ;
Lc 24,3.12 ; Jo 20,2) levo u à ut ilização da expressão “arrebat ado ao céu 34” ( At
1,9-11.22; Mc 16,19 ; Lc 9,51; 1 T im 3,16 ; 1 Tes 4,16-17 e Ap 13,5).
O sepu lcro vazio pro vém de u ma t rad ição o rig inár ia de Jerusalém, e qu e
est á asso ciad a à t rad ição bíb lica qu e ident ifica o co rpo co m qualq uer fo r ma
da vid a. Os qu at ro evangelho s mencio nam o sepu lcro vazio e nenhu m
ad versár io das co mu nid ades nego u isso .
33
BOFF, R e ssurre i ç ão. p. 43.
34
Com o n o ca s o de Hen oc e E l i a s n o AT .
35
BOFF, R e ssurre i ç ãot , p. 47.
32
fat o , as narrat ivas deixa m bem claro par a o s leit o res a realid ade do Senho r
vivo e present e na co mu nidade.
Apó s est e exame ráp ido do s t ext o s da Sagrada Escr it ura, que at est a m
u ma d iversid ade d e t rad içõ es e de cat ego r ias para falar da ressurreição ,
vejamo s co mo Bo ff d ialo g a co m alg u ns aut o res que t êm reflet ido so bre isso
na t eo lo g ia recent e.
Bo ff co meça apr esent ando a leit ura de Bu lt mann, para quem, ao falar mo s
da ressurreição de Jesu s não est amo s bu scando saber o que aco nt eceu
hist o r icament e co m Jesu s, mas o que aco nt eceu co m o s apó st o lo s. A
ressurreição não é u m fat o hist ó rico que po de ser ver ificado . Ela aco nt eceu
cert ament e, mas escapa ao hist o riado r, só sendo acessível p ela fé. Est a é,
segu ndo Bo ff, a t ese fu nda ment al de Bu lt mann co m r elação à ressurreição de
Jesus.
apar içõ es e do sepu lcro vaz io são co nvit es par a a fé, d emo nst rando o
fu nd ament o e a razo abilid ad e da mesma fé .
O segu ndo t eó lo go que Bo ff analisa é Mar xsen. Est e, segu ndo Bo ff, é
ainda ma is r ad ical do que Bu lt mann, po is d iz que a ressurreição não é u m fat o
real, mas u ma int erpret ação co nd icio nad a pela co smo visão apo calípt ica d a
épo ca. As apar içõ es que o s Apó st o lo s t iveram fo ram int erpret adas dent ro das
cat ego rias de ressurreição . O NT no s o fer ece, po rém, u ma o ut ra po ssibilid ad e
de int erpret ar as apar içõ es, co mo a que põe ênfase na missão de v iver e pregar
a causa d e Cr ist o . Mar xsen exemp lifica sua afir mação co m Pau lo , qu e
fu nd ament a seu apo st o lado no fat o de t er vist o o Senho r (1 Co r 9,1). A
ressurreição é u m mo do de falar e não algo que aco nt eceu. O co nt eúdo e a
verdade dest a expressão deve m ser mant id o s po r nó s, já q ue p ela Igr eja e pe lo
Evangelho a cau sa de Cr ist o segue ad iant e e no s at inge ho je co mo no co meço
do crist ian ismo at ing iu ao s d iscípu lo s de Cr ist o .
Apó s est a leit ura de algu ns t eó lo go s prot est ant es, Bo ff examina a
t eo lo g ia cat ó lica, bu scando ver co mo ela t em pensado recent ement e a
ressurreição de Jesu s. Para ele, é a po sição do Marxsen qu e cau so u o maio r
nú mero de est udo s e reflexõ es t eo ló g icas ent re o s t eó lo go s cat ó lico s. Co mo
d issemo s, esses est udo s deram o r igem a q uat ro grandes t end ências.
36
Ide m. , p. 28.
37
T ra t a -se da di st in çã o que E . Dh an i s fez n a r el a çã o c on cl usi va d o Si m pósi o i n t er na ci on a l
em Rom a sobr e a pr obl em á t i ca da Ressur r ei çã o. Cf . Ibi d. , p. 30.
36
38
Ibi d. , p. 33.
37
A q uart a t endência é, segu ndo Bo ff, pro t ago nizad a pela int erpr et ação de
Sch let t e. O pano de fu ndo dest a int erpret ação é co nst ru ído pelo co nceit o d e
“ep ifania co mo hist ó r ia”. A vid a de Jesus fo i a máxima ep ifan ia de Deu s.
Apó s sua mo rt e, o s discíp u lo s, nu ma reflexão ret ro spect iva e int erpret at iva
so bre a vid a passada de Jesu s, decifraram ali a máx ima revelação de Deus.
Isso levo u-o s à afir mação : “E le ressuscit o u verdade ir ament e”. Para Bo ff,
Sch let t e é fo rt ement e influ enciado po r Marxsen. Su a leit ura fo i
veement ement e co nt est ada.
se cu mpr ir as Escr it ur as). Bo ff assinala o papel impo rt ant e que a lit urg ia
dese mpenho u na pro fissão de fé na ressu rreição . A presença real do Senho r
Ressu scit ado , descr it a no s t ext o s, t em ao mesmo t empo u m ele ment o de
co nt inu id ade co m o Jesus de Nazaré e u m element o da desco nt inu id ade. Par a
as g eraçõ es po st er io res à g eração apo stó lica, a fé na ressurre ição baseia- se n a
pregação e no s sacr ament o s que to rnam visível a presença do Senho r.
39
Boff ch a m a at en çã o s obr e a oc or r ên ci a da expressã o “ Rei n o d e D eus” u sa da n um er osa s
vez es n o N ovo T est a m en t o, prin ci pa l m en t e n a boca de Je sus. Cf . Ibi d. , p. 58.
40
Ibi d. , p. 60.
41
A pr esen ça d o Ressu sci t a d o em n oss o m ei o d es en ca dei a t r an sfor m a ções
pl ur i di m en si on a i s, por ém Boff opt a p or exa m in ar a pena s o n os s o pr ópr i o fut ur o e a n os sa
pr ópr ia r essur r ei çã o n a sua obr a A Re ssurre i ç ão. Cf . Ibi d., p. 62.
40
1.5. Conclusão.
Jesus co meço u a anu nciar a “pro ximid ade do Reino de Deu s” nu m cli ma
mar cado pela apo calípt ica e no ho r izo nt e da esperança escat o ló g ica. Sua
práx is, seu s milagres, su as curas e suas parábo las, sina lizam o Reino e
pro vo cam o po sição . Face a est a o po sição , que se cr ist alizo u na Galilé ia, ele
se d ir ig iu a Jerusalém, o nde fo i mo rt o na cruz.
Capítulo Segundo
A manifestação dos filhos de Deus:
A ressurreição na Cristologia de
Juan Luis Segundo
Nest e est udo que far emo s d e seu pensame nt o , pr ivileg iaremo s sua ú lt ima
o bra: A Hi stó ria perdida e recuperada de Jesu s de Naza ré 42. Acred it amo s qu e
ela represent a o est ág io fina l e acabado de su a reflexão cr ist o ló g ica. No ssa
hipó t ese d e t rabalho é que a ressurreição para Ju an Lu is Seg u ndo é u ma
exper iência de enco nt ro que, na AL, deve desencadear u ma práxis libert ado ra.
42
SE GUN DO, Jua n Lui s. A Hi st óri a pe rdi da e rec upe rada de J e sus de Nazaré Sã o Pa ul o:
Pa ul us, 1997. Dor a va n t e ci t ar em os est a obr a da segui n t e m an eir a: Hi st óri a.
43
A pr imeir a o bser vação que ele faz acerca da ideo lo g ia é que ela o põ e-se
ao co ncret o e ao exat o da ciência e po r isso “caem para o lado id eo ló g ico , não
apenas a mo ral, a relig ião e a met afís ica, mas t ambém a filo so fia, a est ét ica, o
d ireit o e a po lít ica” 44. Em seg u ndo lugar, a id eo lo g ia é a “co nsciência”
daqu ilo que o co rre na at ividade hu mana, o que o mar xist a refere ao p lano d a
pro dução . Em t erceiro lug ar, essa “co nsciência” t em pret ensõ es de verdad e
que não lhe co rrespo ndem. É o aspect o mais decis ivo . E m q uart o lugar, essa
“fa lsa co nsciência” so cial se baseia no int eresse do s que “do mina m a
so ciedad e t êm em que se ig no rem as mo las que regem a est rut ura da pro dução ,
em seu pró pr io benefício ” 45.
43
Pr et en dem os fa z er a pen a s a l usões a e st e e st ud o da ca r t a a os Rom a n os, ext r a in do del e o
que c on cer n e a r essur r ei çã o, já que n ossa i nt en çã o é a pen a s el uci da r a n ova ch a ve d e
l ei t ur a par a a Cr i st ol ogi a l a t in o-a m eri ca na (a ch ave pol í t i ca ) que o a ut or i ntr oduz .
44
SE GUN DO, Op. c i t. , p. 60.
45
Ibi d. , p. 60.
46
“T oda i de ol ogi a é pa r ci a l , uma vez que n enh um gr upo par t i cul ar pode pr et en der
i den t i fi ca r sua s a spir a ções c om a s da soci eda d e gl oba l . Um a i deol ogi a s er á , poi s, l egí t i ma ,
se os i n t er esses qu e d e fen de sã o l egí t i m os e se r esp ei t a os di r ei t os fun da m en ta i s dos
dem a i s gr upos da n a çã o. Ness e s en t i do posi t i vo, a s i deol ogi a s a pa r ecem c om o n ec es sá r i a s
pa ra o que fa z er s oci a l , en qua nt o sã o m edi a ç õe s pa ra a a çã o” . Pue bl a , Conc l usõe s f i nai s,
n . 535.
44
47
Ibi d. , p. 89.
48
Ibi d. , p. 96.
45
mud anças necessár ias à práxis do s cr ist ão s lat ino -amer icano s d evem fu ndar-se
nest a exper iência d e enco nt ro co m o Ressuscit ado .
49
A t es e de fun do d e Jua n Lui s Segun do é que exi st i u um a t en sã o na com un i da de pri m it i va
en tr e um Jesu s “h um a n o” e um Jesus “di vi n o” . Pa ra el e, Pa ul o l ut ou c on t r a a t en dên ci a de
di vi n i z a çã o de Je sus, c om o a pa r ec e n os pr i m ei ros oi t o ca pí t ul os da ca r t a a os Rom a n os. O
Apóst ol o si t ua a obr a de J esu s n a h i st ór ia de Isr a el pa r a , em segui da , en fa t i z ar a
n eces si da de de n ã o esqu ec er o “J esu s de Na z a r é”, m esm o qua n do a com un i da de vi ve a vi da
dos “r es sus ci t a dos” . O s si n ót i c os, que sã o cr on ol ogi ca m en t e p ost er i or es à ca r t a a os
Rom a n os, evi d en ci a m o êxi t o que a t en dên ci a divi n i z an t e obt e ve.
46
da pregação de Jesus são : 1) o reinado (go ver no ) de Deu s é pró x imo . Isso é
u ma “bo a no t íc ia” e causa alegr ia; 2) o s dest inat ár io s dest e anú ncio são o s
po bres; 3) so ment e a eles é anu nciada est a bo a no t ícia; 4) o anú ncio não é
esco nd ido do s demais, mas não é para eles u ma bo a no t ícia.
Jesus t em u ma ling uagem icô nica 50 e seu est ilo de vid a é o do s pro fet as.
Isso é impo rt ant e e decis ivo para ent end er su a mensagem e o impact o que a
mesma pro vo co u. É po ssível u sar u ma chave po lít ica par a int erpret ar a
hist ó r ia d e Jesu s? A respo st a co st umeir a é negat iva. No sso t eó lo go pensa,
po rém, que o co nflit o t razido po r Jesu s, que o põ e o s grupo s que int erag ia m
ent re si na est rut ura so cial de Isr ael, a saber, po bres e r ico s, marg inalizado s e
favo recido s, mo st ra que su a mensagem e sua práxis er am po lít icas.
51
Ibi d. ,. p, 171.
52
“ Fé ant ropol ógi c a, i st o é, a quel a que est r ut ur a t od o o pr oced er hum an o, seja est e
r el i gi oso ou n ã o” Ibi d., p. 32.
48
2.2.2. Jesus e a opção (políti ca) de Deu s pelos po bres e pecado res.
A primeira série da s parábo las apo nt a a resist ência que cert o s ant i-
valo res o põ em ao reino que Jesu s anu ncia. Cert ament e essas par ábo las se
d ir ig em a u m grupo de pesso as qu e se sent em pro t eg idas co nt ra a vind a do
53
E st a a pr esen t a çã o c om o um esboç o de um ca pí t ul o da obr a (Hi st óri a, p. 187-214) vi sa
som en t e a r essa l t ar o cun h o pol í t i co da a n ál i se que o a ut or ur ugua i o fa z . Apr esen t ar em os a
a ná l i se m a i s det a lh a da dest a s pa r á bol a s n o ca pí t ul o IV, qua n do t r a tar m os da c om pr een sã o
de Deu s vei cul a da pel a Res sur r ei çã o de J esus. P or ém quer em os pr e ven i r o l ei t or desde já
que: 1) a i ma gem de Deus que s e en c on t ra n a obr a t eol ógi ca do Jua n Lui s Segun do n ã o é
fun da m en ta da som en t e na aná l i se da s par á bol a s; 2) a s pr ópri a s par á bol a s r evel a m um a
i m a gem de Deus que t em con t or n os m a i or es do que os el em en t os que i n cl uí m os em n oss o
est ud o.
49
reino (Lc 1 2,16-21 ; 16,19-3 1 ; Mt 24,42-43; 45-51 par ; 2 5,1-12 par ; Mc 13,34 ,
et c.).
54
E st e es boç o, por m a i s i n com pl et o que s eja , r e vel a a est r ut ura de um a a çã o p ol í t i ca n a s
pa rá bol a s: 1) J esu s pr i vi l egi a um a cl a sse e i ss o oca si on a r esi st ên ci a em out r a cl a sse; 2 )
sua m en sa gem é uma i deol ogi a que vi sa a des m an t el ar a i deol ogi a dom i n an t e; 3) i st o
n eces sa r i am en t e exi ge um a opçã o dos seu s ou vi n t es.
50
mo rt e de milhares de pesso as pro vo cada pelas est rut uras po lít icas e
eco nô micas d a so ciedad e o nde esse E vang elho – o mesmo que analisamo s
aqu i – era relido e co ment ado , durant e geraçõ es, à imensa maio r ia d a
po pu lação ” 55.
A int erpret ação que Ju an Lu is S egu ndo faz das p arábo las, não deix a
nenhu ma dú vid a quant o à co mpro vação de su a t ese. E le afir ma t er Jesus ag ido
po lit icament e, e que o Deus que ele revela não simpat iza co m o s q ue
sust ent am a o rdem est abelecid a. Pelo co nt rár io , Jesu s, co m su a práxis
decid id a, sina liza a mu dança e u ma no va d ireção . Nest a alt ura examinar emo s
as co nseq üênc ias dest a práxis.
2.3.1. As tom adas de posi ção que a prá xi s de Jesus p rovo cou.
55
SE GUN DO, Op. c i t. , p. 215.
51
2.3.1.1. Os de fora
O pr ime iro grupo se to rna ad versár io de Jesu s. A ele fica sem exp licar o
sent ido ú lt imo d as parábo las (Mt 13,13). “No Ant igo Test ament o , quando
Deus qu er apressar u ma mudança benfe it o ra para seu po vo , não é raro que sua
pro vidência apar eça precisament e acelerando a det er io ração da sit u ação
ant er io r” 56. Acent uar u m co nflit o para co nsegu ir u ma so lu ção mais pro fu nda e
durável é u ma ar ma po lít ica. A fo rça da argu ment ação pro fét ica de Jesu s é a
razão pela qua l seus ad ver sár io s se mo st raram u nanima ment e o po sto s ao amo r
hu man izado r e co mp assivo de Deus man ifest ado nele.
Para o seg u ndo grupo , as par ábo las não co nst it uem pedaço s d isp erso s d e
ensina ment o s mo rais, mas um co mp lexo e co mpact o mecanismo
ant iideo ló g ico po sto a serviço do s po bres o u “pecado res”, o s beneficiár io s do
reino . “Jesu s quer u nir seus d isc ípu lo s não apenas à sua p esso a, mas à sua
at iv idad e e, po r isso mesmo , esse co nflit o é necessár io para que o reino t enha
sent ido em I srael” 57. Eis aqu i o dest ino e o sent ido do disc ipu lado . Jesus e
seu s d iscípu lo s co nst it uem u m t o do , uma co mu nidade d e pro fet as. O pro fet a é
aquele que pro fere u m “segredo ” d iv ino de p lano s e pro jet o s hist ó rico s do
Deus d a miser icó rd ia e da fidelid ade. O dest ino do pro fet a é ser silenciado .
56
Ibi d. , p. 231.
57
Ibi d. , p. 233.
52
S ilenciar o pro fet a é a at it ude ló g ica daqueles que pro sper am co m essa
sit uação vig ent e, o dio sa para Deus. Daí a t radição exist ent e em Israel de qu e
to do s o s pro fet as haviam sido persegu ido s e mo rto s de fo r ma vio lent a.
2.3.1.3. O povo.
Ap arent ement e Jesu s nad a exig ia do po vo durant e seu min ist ér io . O reino
era d est inado a est e po vo precisament e p o rque sua sit uação inu mana o fazia
so frer. Apag ar est e so fr iment o era a pr imeir a pr io r idade do Rei que chegava.
O Deu s de Jesu s é u m bo m po lít ico . Não ju lga o ho mem enqu ant o esse não
po ssa ser verdad eiro ho mem. O reino vem para devo lver ao ho mem a su a
hu man idade. Ant es de mais nada, o s po br es são o bjet o do reino . E na mesma
pro po rção , o reino não lhes exig e nada dec isivo . Vem ju st ament e par a
co nvert ê- lo s em su jeit o s p leno s.
Jesus vem co m aut o ridad e par a fazer e ensinar. A est e “fazer” chama mo s
ho je de “milagres”. E le põ e em evid ência as fo rças do reino . Jesu s t eve
53
po deres ext rao rd inár io s para aliv iar o s males e curar as do enças, po deres qu e
uso u de mo do especial co m o s mais po bres e necessit ado s. E le fez isso par a
anu nciar- lhes fided ig nament e a pro ximidade e at é a presença do reino d e
Deus.
Jo ão usa p alavras co mo : sina is, sinal, sig na, dyna mei s et c. para falar do s
milagres d e Jesu s co mo algo impo rt ant e de sua mensag em. Os sinó t ico s
mo st ram a ma io r ia do s milagres co mo fazendo part e de u ma lut a ent re do is
po deres: o po der daquele qu e t em mu it o s preso s e o pr imido s em I srael e o
po der daquele que vem libert á- lo s. Est e ú lt imo vence o pr imeiro , que é
perso nificado po r sat anás. Ao perso nificar o s po deres o po sto s ao Reino , o s
Evangelho s dão ao ensina ment o de Jesus u ma pro fu nd id ade qu e a mera cur a
de u ma do ença não po ssu i.
O “segr edo messiân ico ” 58 expressa, na realid ade, o s limit es e a cr ise das
“fo rças” do reino . O pro fet a da alegr ia anu ncia a chegada do reino . A fúr ia
cega qu e est a mensag em pro vo ca no s seu s ad ver sár io s o s levara a assassiná-
lo . Po rt anto , a mensagem do pro fet a Jesus, co mo a de t o do ho mem dest inado à
mo rt e, to rna-se u ma co rr ida co nt ra o reló g io . Ele t em necessidade de co rr ig ir
o s “milagr es” co m as “parábo las” e assim pur ificar a mensagem 59.
58
T er m o t é cn i co u sa do p el os esp eci a l i st a s d o e va n gelh o de Ma r cos, que r esum e, s egun do
el es, o c or a çã o m esm o da t eol ogi a m ar ci ana .
59
Os “m i l a gr es” de Jesus e vi den ci a m sua com pa i xã o i n t en sa e gen uín a, al ém de si gn i fi car
a i rr upçã o e a pr es en ça do Rei n o, en qua nt o a s “pa r á bol a s” c om pl et a m seu a n ún ci o
pr ofét i c o c om a s di ver sa s r ea ções a ssi n a l a da s a ci m a . Cf . Ibi d., p. 249-257.
54
d ivid e em duas part es a vid a pú blica. Jesus p ercebe que sua mensag em é
co nflit uo sa e q ue est á d est inada a cr iar adversár io s. Su a mensagem pro fét ica,
at ravés de parábo las, curas e benefíc io s, pro vavelment e não t enha feit o u m
caminho pro fu ndo e durável na ment e de seus co ncidadão s galileus.
Jesus est end e sua at ivid ade ao cent ro do mu ndo religo so -po lít ico do seu
po vo , o lugar o nd e surge e se mant ém o ficialment e u ma id éia de Deu s que não
se adeq uava àq uele que ele anu nciava em su a at iv idad e pro fét ica. E le não
60
“Su bi r a Jer usal ém ” t em a l go deci si vo e de fi n i ti vo n os E va n gel h os. E m Mc, a con fi s sã o
da m essi a n i da de de Je sus p or Pedr o pr ec ede a su bi da a Jer usa l ém . Segun do o m e sm o
e va n gel h o, os que a c om pa nh a m Jesus est ã o “ c om m edo” . Jer usa l ém é a ca pi t a l pol í t i ca e
r el i gi osa de Isr a el . Jesu s pr om et eu a pr oxi m i da de d o Rei n o e pa r a el e é i m pen sá vel que o
Rei n o se i n st a ur e for a de Jer usa l ém . Pa ra os si n ót i c os, est a é a ún i ca vi a gem de J esu s a t é
Jer usa l ém , m a s par a Joã o h á vá ri a s vi a gen s par a l á e est a nã o é um a vi a gem qua l quer. Cf.
Ibi d. , p. 263 – 266.
55
po ssu ía, po rém “o po der” para t o rnar realid ade t ot al o reino do qual ele era o
ser vido r. Ist o se cho ca co m a inco mpreen são e o imed iat is mo d aqueles que o
Nazar eno co nsiderava co mo beneficiár io s do reino , o que gero u da part e deles
cert o espaço de desco nfiança. Jesus, qu e anu nciava e preparava o reino , não
parece t o mar precaução algu ma co m a reação que seus ad ver sár io s vão
desencadear co nt ra ele em Jerusalém.
Est es t rês dado s não co nco rdam facilme nt e ent re si. A ló g ica int er na
aco nselha, po rém, qu e ap liq uemo s ao s t rês a pro va d ecis iva da d ist inção ent re
o Jesu s pré-p ascal e o Jesu s pó s-pasca l. São t rês o s equ ívo co s que leva m
Jesus e a co mu nid ad e pr imit iva a sent ir em o aparent e abando no de Deu s: 1) o
reino não chego u ao s po bres de Israel no prazo fixado ; 2) t ampo uco chego u o
fim do mu ndo durant e a geração co nt emp o rânea de Jesus; 3) o pró prio Jesu s
parece t er sido abando nado po r Deus. Um messias cru cificado era u ma
co nt rad ição no judaís mo .
61
Cf . Ibi d., p. 284-287.
62
O a ut or l am en ta o fa t o de o Cr i st i ani sm o n ã o se per gunt ar pel o si gn i fi ca do da m or t e de
Jesu s, ca s o sua r essurr ei çã o n ã o t i ves se a c on t eci do. Iss o p or que a r essur r ei çã o “en gol i u a s
per gunt a s deci si va s em que c on si st i ri a o exer cí ci o” de fa z er ta i s per gun ta s. Ibi d. p. 297.
56
para as aut o rid ades. Bo a part e da po pu lação de Jeru salé m era aliment ada po r
ela. Jesu s t ent o u purificar o t emp lo d e t o do co mércio . A mo rt e já est á
present e no mu ndo do sent ido ant es d e segu ir co mo ú lt ima palavra na
realidad e.
As narraçõ es das apar içõ es são ao to do o it o . Uma leit ura co mparat iva
das mesmas revela- no s o s segredo s d a redação e seu s co rrespo nd ent es
cr it ér io s h ist ó rico s. Não exist e u ma s ino pse po ssíve l ent re o s relat o s de
apar ição . To mando co mo po nt o de par t id a a list a das apar içõ es qu e o s
63
Hi st ór i co n o s en t i do de que sa t i s fa z a os cr it ér i os da ver i fi ca çã o da h i st or i ogr a fi a
m oder n a. Há el em en t os n a vi da h um ana que n ã o se suj ei t a m a t a i s cr i t ér i os, m a s n em por
i sso d ei xa m de ser ver da dei r os. A r essur r ei çã o de Je sus per t en ce a est a ca t egor i a . Tra t a -se
de a l go que fi ca for a do a l ca n ce dos m ét od os pos i t i vi st a s. Cf . Ibi d. , p. 304-307
57
exeget as co nsideram ma is ant igas e impo rt ant es, Juan Lu is Segu ndo d iz qu e
po demo s cheg ar a u ma t rad ição básica da mensag em cr ist ã: “O Senho r
ressuscit o u e apareceu a S imão ” (Lc 24,3 4). “Ver ” e “cr er” são fu ndament ais
aqu i. A afir mação : “É verdad e! O Senho r ressu scit o u e apareceu a S imão ”,
não po de refer ir-se a o ut ro ep isó d io fu ndado r que não seja o “ver ” e “crer ”
que aco nt ece ju nt o ao sepu lcro vaz io . Além do mais, as ap ar içõ es não po de m
ser co nt idas nu ma narração co m limit es p reciso s, po rque cada u ma faz alu são
a u m ep isó d io fu ndado r, o u a mo ment os d ifer ent es, no s quais as d ist int a s
t est emu nhas passam do simp les “ver” ao “crer”.
A co mpreensão adqu ir ida à luz da ressurreição ilu mina aqu ilo que já se
devia saber ant es da Pásco a o u aqu ilo que se saberá ma is t arde, na vid a
hist ó r ica da co mu n idad e cr ist ã. Co mo exemp lo s, no sso t eó lo go pro põ e a
reint erpret ação e a ap licação do s po emas do Ser vo So fr edo r a Jesu s, e a
aut o ridad e e respo nsab ilidad e de Pedro co m relação à co mu nidade, co mo se
vê no cap ít u lo 21 de Jo ão .
Apó s t er mo s vist o a aná lise que Juan Lu is Segu ndo faz do s sinó t ico s,
vejamo s a leit ura qu e ele pro põ e de Pau lo .
Juan Lu is Seg u ndo sust ent a que, à d ifer ença do s o ut ro s d iscípu lo s, Pau lo
t eve a exper iência da Ressurreição de Jesu s ant es de receber info r maçõ es
hist ó r icas so bre ele. Isso fo i decis ivo em sua reflexão , co mo veremo s.
64
Jua n Lui s S egun do usa est a expr es sã o pa r a in dica r o el em en t o n ega t i vo qu e fa z pa r t e da
r ea l i da de h um an a.
60
seu s pro blemas, ang úst ias e esp eranças mais genér icas, para expressar o
sent ido e a relevância de Jesu s de Nazaré.
A lut a ent re “car ne” e “esp ír it o ” (Rm 7) faz part e da exper iência
hu mana. Na o p in ião de no sso t eó lo go , o dado t ranscend ent e, o da
ressurreição , deve ser int ro duzido co mo mo d elo do “no vo ” ser hu mano p ara
ver melho r as po ssib ilid ades h ist ó ricas e o sent ido d a hist ó r ia. O qu e
chamamo s de “exp er iência” é se mpre u ma mescla de co isas verdad eirament e
exper iment adas e de dado s t ranscendent es.
Pau lo é o único escr it o r neo t est ement ar io que t ent o u fo r mu lar a visão d e
u m ju ízo fina l d e Deu s que levasse em co nt a essa inev it ável mist ura d e
caract er íst icas po sit ivas e negat ivas do ag ir hu mano . Israel acred it ava qu e u m
d ia Iahweh ir ia int er vir pesso alment e par a dar u m sent ido ao que parece se m
sent ido (Jó , Ecles iast es, Sabedo r ia). O fat o de esse ju ízo manifest ar algo
rad icalment e no vo est á present e na imagem, sempr e asso ciada ao ju ízo , de u m
“fo go ” que dever ia co nsu mir o qu e não t em valo r, p ara dar lu gar à verdad eir a
no v idad e e ao verdadeiro sent ido (Mt 3,10-12). A hist ó r ia vis ível co nt inuar á
mist urando o perecedo uro e o defin it ivo . A “Co nst rução de Deus” é, e ser á
sempre, algo no qual ent ram e se mist uram mat ér ias d e d iver sa qu alidad e e
resist ência.
pr imeiro , o Apó sto lo ressalt a as vár ias fo rças e leis qu e est ão em gu erra no
int er io r do ser hu mano . No segu ndo , ele int ro duz o dado t ranscend ent al d a
ressurreição , que o ajuda a mo st rar a d iferença qu e ela int ro duz na sit uação
hu mana, que ago ra se p arece ma is u ma “mescla” do que u ma “d iv isão ”.
Ao lo ngo de sua hist ó r ia, a hu manid ade fo i g u iada “p elo Esp ír it o ” p ara
u m fim q ue se id ent ifica, d e cert o mo do , co m o de Jesu s: fazer co m q ue o s
ho mens sejam p lenament e “filho s de Deus” (8,14). São t rês as et apas dessa
hist ó r ia: 1) a que co meço u em Adão e vai at é Mo isés; 2) a que co meço u em
Mo isés e vai at é Jesu s; 3) a q ue co meço u em Jesu s e acaba na pa rou sia. Cad a
u ma dest as et apas sig nifica u ma revelação o u uma desco bert a dest inad a a
fazer o s filho s mais filho s 65. O esp ír it o de filiação exclu i a recaída no t emo r.
Do que é herd eiro o ser hu mano graças a Cr ist o ? Da mesma co isa que Cr ist o
herda do Pai, o u seja, a po sse do univer so int eiro .
Quem é que su b met e a cr iação à inut ilid ade e faz co m que ela co nt inu e
ser vindo à co rrupção ? Pau lo não esp ecifica quem é esse agent e. Para mu it o s
exeget as, é Deus o u sat anás. Mas o Apó st o lo não ad mit e u ma espécie de d eu s
do Mal ao lado de Iahweh. A ló g ica int er na de t o da a passag em p au lina leva a
pensar qu e é o pró prio Deus que su b met e a cr iação à inut ilid ad e. Cabe ao s
seres hu mano s, at uando co mo filho s “cr iado res” de Deu s, co lo carem a cr iação
int eir a ao ser viço do valo r co mu m, q ue na visão de Ju an Lu is S egu ndo , é o
65
E xi st e um a di fer en ça en tr e n ossa com pr een sã o d e “ fi l h o” e a do t em po de Pa ul o. Pa r a
Jua n Lui s Segun do, a com pr een sã o h odi er n a é be m em pobr e ci da . Cf . Ibi d. , p. 599-600.
63
Pau lo pro clama qu e a cr iação est á ainda nu ma expect at iva ansio sa, po is
esper a ser libert ada (Rm 8,19.21-27). O mesmo E sp ír it o que ressu scit o u Jesu s
e seu pro jet o , no s “ressu scit ará” co m o s no sso s. Nu m pr ime iro mo ment o , o
Apó st o lo d iz qu al é o o bjet o da “ex pect at iva ansio sa” da cr iação : “a
man ifest ação do s filho s d e Deu s” (8,19). A segu ir, ele d iz que a libert ação da
cr iação t em em vist a a liberd ade, que é a “g ló r ia do s filho s de Deus” (8,21).
Ser herd eiro do mu ndo é ag ir nele co mo o Pai Cr iado r, o u seja, exercit ar a
pró pria liberdad e. A filiação é sinô n imo d e liberdad e. Ap esar da d iv isão o u da
mescla que afet a o s pro jet o s hu mano s, a “liberdad e cr iado ra” do ho mem est á
co nst ru indo o cu lt ament e su a o br a. So ment e quando se manifest ar o que, nest a
mescla, resist e à mo rt e e p assa a fazer part e defin it iva d a vid a, a liberd ade se
to rnará visível, “na q ualid ade da o bra” (1 Co r 3,13-14). A defin ição de
ressurreição para Pau lo é “a manifest ação da liberd ade do s ho mens, filho s de
Deus” 66.
Exist e u ma impo ssib ilid ade d e enco nt rar na hist ó ria a “ver ificação
co ncret a” do que se qu is rea lizar, po rque o rit mo de u ma vid a hu mana
66
Ibi d. , p. 606.
64
so ment e po de p erceber alg u mas d e suas d imensõ es. Mas isso não no s imp ed e
de reco nhecer que a respo nsab ilidad e do ser hu mano não se p erdeu. Graças à
sínt ese ent re a inv is ib ilidade do s resu lt ado s da no ssa pró pr ia hist ó r ia e a
relat iva viabilid ad e do s resu lt ado s da g rand e h ist ó ria hu mana, a at ividad e
hist ó r ica co nt inua sendo u ma pro messa pela qu al vale a pena apo st ar nu ma
“esp erança” feit a de “pacient e respo nsabilid ade” (8,25).
67
Noss o a ut or exa m i na det a lh a dam en t e a exeg es e qu e Pa ul o fa z de Gn 15, 6 em Rm
4: “A br a ã o t eve fé n o SE N HO R, e por i sso o SE N HO R o c on si der ou just o” (T E B) e c ol oca
65
ser viço do amo r (“a fé que energ iza o amo r” cf . Gl 5,6), se aliment a po r sua
vez, da cert eza da pro messa recebida o u pressent id a. Deu s falhar ia em seu
mais incr ível esfo rço , em seu p lano mais int ima ment e quer ido e inaud it o , se
não pudesse o bt er de u m só ser hu mano que seja, algo de amo r par a
inco rpo rá- lo à co nst rução , não apenas da no va t erra do s hu mano s, mas de seu
pró prio no vo céu !
Juan Lu is Segu ndo lembra que Pau lo mergu lho u nas pro fu nd ezas do s
mist ér io s da liber dade d a cr iat ura (Rm 5-8), nu m mu ndo mar cado pela
deso bed iência d a inst ru ment alidad e cr iad a. Co nhecemo s Deus em seu pró pr io
Filho , mas est e não apar ece d iant e d e nó s na “g ló r ia” de sua liberd ade, ma s
“nu ma car ne d e pecado ” seme lhant e à no ssa. O pecado e a mo rt e sempr e est ão
ju nt o s. O Filho d e Deu s é aquele q ue, co mo no t empo ant es de Abr aão ,
co nst ró i na hist ó r ia esp erando co nt ra to da esperança (4,18).
Para Juan Lu is S egu ndo , vist o nu ma per sp ect iva po lít ica, Jesus chamo u o
pro jet o co mu m, o nde o s hu mano s são “co -o perado res” ( synergói) de Deu s,
co m o t ermo “r eino ” o u “go ver no ” de Deus. Pau lo , em chave ant ro po ló g ica,
co mpreende esse pro jet o co m o t ermo “ágape”, amo r, so lidar iedade, qu e
co rrespo nde ao p lano de Deu s de co nst it u ir Jesu s “pr imo g ênit o da mu lt idão ”
(=tot alidade) do s ir mão s (8,29). A esse p ro jet o de co nst ru ir u ma hu man idade
pro fu nd ament e so lid ár ia, segu ndo “a imagem de Jesus”, que levo u essa
so lidar iedad e at é a mo rt e (8,29), inco rpo ram- se não ap enas o s cr ist ão s, mas
to do s o s que “amam a Deu s” (8,30) e qu e são mag nificament e represent ado s
na parábo la d e Mt 25. Essa co nvo cação ao grande pro jet o “hu manit ár io ” Deu s
a faz desde o in ício de hu man idad e. No hino final do cap ít u lo 8 de Ro mano s
(8,33-39), a escat o lo g ia, que ant es d e Pau lo – e d epo is dele – devo ro u a
hist ó r ia, t ir ando - lhe seu sent ido e seu valo r, vo lt a, co mo no Jesu s h ist ó rico , a
2.5. Conclusão.
A ressurreição de Jesu s é hist ó r ica no sent ido de que at é a hist o rio grafia
mo d er na co nsegu e ver ificar efeit o s po st erio res r esu lt ant es da mesma, co mo a
fo r mação de u ma co mu nid ade d e crent es que co nt inua at é no sso s d ias. No s
sinó t ico s, ela sig n ifica u ma no va co mpreensão , a part ir da qu al no vo s
caminho s se abr em par a a co mu nid ade. P ara Pau lo , ela é o emerg ir d a no va
cr iat ura, a manifest ação da liberd ade do s filho s d e Deu s, que co m o s seu s
pro jet o s hist ó rico s esperam co nt ra to da esp erança, enqu ant o a realid ad e
hu mana co nt inu a u ma mescla que a inda aguarda a inst auração p lena do Re ino
de Deu s anu nc iado po r Jesus de Nazaré.
68
Capítulo Terceiro
A esperança das vítimas:
A ressurreição na Cristologia do
Jon Sobrino
Sua reflexão é pro fu ndament e mar cada p elo co nt ext o no qual vive o país
que ado t o u co mo seu: desigu aldad es ext remas, gu erra civ il, v io lência
co t id iana, presença pro fét ica d a Igreja, so bret udo so b a figura d e u m d e seu s
grandes pro fet as e márt ires: Do m Oscar Ro mero .
68
SOBRIN O, Jon . Cri st ol ogi a a part i r da A mé ri c a Lat i na. Petr ópol i s: V oz es, 1983.
Dor a va n t e ci t ar em os e st a obr a da segui n t e for m a: Cri st ol ogi a.
69
SOBRIN O, Jon . J e sus, o Li be rt ador. Pet r ópol i s: Voz e s, 1996. 2 ed. Dor a va n t e ci t ar em os
est a obr a da seguin t e for m a : Je sus.
70
SOBRIN O, Jon . A Fé e m Je sus Cri st o E nsai o a part i r das v í t i mas. Pet r ópol i s: V oz es,
1999. Dor a va nt e ci t a r em os est a obr a da segui n t e for m a : A Fé .
69
A libert ação 71, cat ego ria t eo ló g ica que emerge da práxis eclesial 72, e a
desido lat r ização , cat ego ria pró pr ia ao s pro fet as do AT e reint erpret ada no
co nt ext o pro duto r de vít imas na Amér ica Lat ina, são os princ íp io s
her menêut ico s pr imo rd iais d a t eo lo g ia de So br ino .
Para So br ino , Jesus in icio u sua vid a pú blica anu nciando a pro ximid ad e
do Reino de Deus (Mc 1,14; Mt 4,17; Lc 4,1), reino que t em u ma d imensão
t ranscendent e e u ma d imensão hist ó rica. No sso t eó lo go apresent a as
71
A ca t eg or i a de l i ber t a çã o r ece beu um a a mpl a a cei t a çã o n a lin gua gem t eol ógi ca ,
i n cl usi ve n os d ocum en t os do Va t i ca n o, por exe m pl o: 1) “O e va n gel h o de Jesu s Cr i st o é
um a m en sa gem de l i ber da de e um a for ça de l i ber t a çã o” , Inst ruç ão sobre al guns aspe c t os
da “t e ol ogi a da l i be rt aç ão”, In tr oduçã o, 198 4, Apud SOBRI NO, J e sus, p. 30; 2) “O
E va n gel h o. .. é, por sua na t ur ez a , m en sa gem de l i ber da de e d e l i ber t a çã o” , A l i be rdade
c ri st ã e l i be rt aç ão, In tr oduçã o, 1, 1986. Apud SOBRINO, A Fé , p. 30.
72
Medel l í n e Pue bl a , sem pr oduz i r n enh um docum en t o cr i st ol ógi c o, i n tr oduz i ra m um
pr in cí pi o de pa r ci a l i da de (os pobre s e a pob re za), a o a pr es en t ar em a sa l va çã o c om o
“l i ber t a çã o” .
70
caract er íst icas dest e Reino percept íve is na at uação de Jesus: saú de e vid a
(que surge do s milagres), libert ação (que surg e do s exo rcismo s), perd ão do s
pecado s e fim da exclusão das p esso as (q ue surge da aco lh ida d ispensad a po r
Jesus ao s exclu ído s e marg inalizado s: pro st it ut as, publicano s, marg inalizado s,
mu lheres, cr ianças et c.).
Para So br ino , na sit uação at ual d a Amér ica Lat ina, o s po br es são : “ ...
aqueles qu e est ão pró ximo s da mo rt e lent a p ela po br eza, par a o s quais
so breviver é u ma carg a pesada e sua t arefa máxima, e ao mesmo t empo , são
o s pr ivado s de d ig n idad e so cial e às vezes t ambém de d ig nid ade relig io sa po r
não cu mpr irem co m a leg islação eclesial 74”.
73
SOBRIN O, J e sus, p. 113.
74
Ide m. , p. 126.
71
75
SOBRIN O, Cri st ol ogi a. p. 69.
72
e não simp lesment e co mo a preg ação de u ma mo ral u niver sal. Sua mensage m
cent ral é qu e o Reino de Deu s é p ara o s po bres, par a o s fr aco s e para o s
desprezado s. Deu s é par cial, po is se co lo ca ao lado do s fr aco s, mas t ambém é
r ico em miser icó rd ia. Na t rág ica sit uação do s pequeno s, ele reage e se alegr a
quando co nt ribu i p ara o bem est ar deles. Est a mensag em po sit iva d e Jesu s
desmascara a hipo cr isia de seu s ad versár io s. Po r isso , suas parábo las são
fo rt ement e cr ít icas, acent uando o aspect o de cr ise. E las t ambém geram a
esper ança e a segur ança de que o Rein o que se apro xima surg irá d e u m
co meço mu it o pequeno . E las fa lam de alegr ia e efet uam no s o u vint es a
ent rega mais ap aixo nada.
Segu ndo So br ino , est as são algu mas d as caract er íst icas do Reino , cu ja
pro ximid ade Jesu s anu ncio u. No sso t eólo go faz su a reflexão a part ir d a
sit uação lat ino -amer icana e id ent ifica o s po bres co mo o s dest inat ár io s
prefer ido s do anú ncio do Reino . A ação libert ado ra de Jesu s co nsist e em at o s
(perdão , cura e aco lh ida) e palavras (as parábo las).
Para caract er izar a exp er iência de Deus, que t ambém é mist ér io na vid a
de Jesu s, So br ino usa a palavra “co nver são ”. Para ele, as t ent açõ es d e Jesu s,
sit uad as no in ício d e su a vida pú blica, nada t êm de mo ralizant e. Ao co nt rário ,
elas mo st ram que em t o da a hist ó r ia do Nazareno , “ele deixa Deus ser Deu s e
se deixa levar para o nde quer que Deu s o leve” 78.
76
SOBRIN O, J e sus, p. 211.
77
SOBRIN O, Cri st ol ogi a, p. 175.
78
SOBRIN O, J e sus, p. 224.
74
Para So br ino , a “cr ise ga lilaica” expressa u ma rupt ura pro fu nda na
pesso a de Jesu s: “Os chefes do po vo o rejeit ar am, seu s d iscíp u lo s não o
co mpreenderam e at é as massas po pu lares o t eriam abando nado ” 79. Jesu s não
fala mais do Reino de Deus, nem faz milagres. E m seu s d iscurso s E le at aca
ao s chefes do po vo e se defende co nt ra eles. Há u ma mudança em seu
co mpo rt ament o e essa mudança não fo i evo lut iva e pacífica. “Co nver são ,
t ent ação , cr ise, são realidad es at ravés das quais se mo st ra que Jesus t eve qu e
deixar Deu s ser Deu s” 80. É a d ispo nib ilid ad e de Jesus para o Pai, qu e é Deus,
que enco nt ramo s aqu i nessa sit u ação .
79
Ide m. , p. 225.
80
Ibi d. , p. 225.
81
Há dua s p os si bi l i da des n a t ra duçã o: 1) pel a fé e m Jesu s Cr i st o ou 2) p el a fé de J esus
Cr i st o. Jun t o com a ut or es c om o Ba l t h a sar , Thüsi n g e T uñi , Sobr i n o pr efer e a segun da
op çã o, en fa t i z an do c om i ss o a r ea l i da de h uman a de J e sus d e Na z a r é. Cf. SO BRINO, J e sus ,
p. 234.
82
Ide m. , p. 234.
75
O Deu s que Jesu s r evela man ifest a-se p o rt ant o em sua o ração ; em seu
ag ir, qu e co lo ca sempre o ser hu mano acima d e t udo ; em suas t ent açõ es, qu e
t est am su a fidelid ade ao lo ngo da vid a; em sua fé inq uebrant ável, q u e
per manece mesmo no silêncio d e Deus na Cruz. Est a imag em que Jesu s revela
do Pai cho co u-se co m a q ue er a su b jacent e ao sist ema no qual ele v iv ia e qu e
gerava inú mer as vít imas.
Jesus per cebe que a maio r ia de seu s o uvin t es t inham u ma visão d ifer ent e
da dele e que est a visão d ifer ia mu it o e, at é mesmo , co nt rar iava a do Deu s
que e le anu nc iava. E le t ent a ent ão co rr ig ir a imagem de Deu s d e seu s
co ncid adão s. Sua práxis pro fét ica e messiânica t em co mo co rrelat o a
so ciedad e em si. E la t em co mo finalid ad e a t ransfo r mação dessa so cied ade:
“Na hist ó r ia exist e o verdad eiro Deu s (de vid a), sua med iação (o Reino ) e seu
med iado r (Jesus) ; exist em o s ído lo s (d e mo rt e), sua med iação (o ant i-reino ) e
83
Ibi d. , p. 236.
76
seu s med iado res (o s o presso res)” 84. Est amo s perant e a est rut ura da realidad e
que exp lica a práxis pro fét ica d e Jesu s e a d imensão t eo lo gal d a mes ma.
84
Ibi d. , p. 241.
85
Ma r cos r eun i u a s ci n co c on t r ovér si a s i n i ci ai s e m 2, 1-3, 6; en con tr a da s em L c 5, 17-6, 11.
E m Mat eus, el a s a par ecem em dua s seç ões (9, 1-17 e 12, 1-21). T am bém n o fi n a l da vi da de
Jesu s, dep oi s de sua en t ra da em Jer usa l ém , a par ecem ci n co c on t r ovér si a s: 1) a expul sã o
dos ven ded or es d o t em pl o ( Mt 21, 12-17; Mc 11, 11. 15-17; Lc 19, 45-46); 2) a c on t r ovér si a
sobr e a a ut or i da de de Jesu s (Mt 21, 23-27; Mc 11, 27-33; Lc 20, 1-8); 3) o tr i but o a Césa r
(Mt 22, 15-22; Mc 12, 13-17; Lc 20, 20-26); 4) a ressur r ei çã o d os m or t os (Mt 22, 23-33; M c
12, 18-27; Lc 20, 27-40); 5) o m a n dam en t o pr inci pa l (Mt 22, 34-40; Mc 12, 28-31. Luca s
desl oca t a i s con t r ovér si a s par a o out r o l ugar : 10,25-28). Cf. Ibi d. , p. 242.
86
1) cur a e per dã o d e um pa r a lí t i co (2, 1-12); 2) a r efei çã o c om os pe ca d or es (2, 15-17); 3)
a quest ã o s obr e o je jum (2, 18-22); 4) a s espi ga s a rr an ca da s n o sá ba do (2, 23-28); e 5) a
cur a do h om em c om a m ã o seca (3, 1-6). Cf . Ibi d., p. 242
77
e just ifica isso cr ist o lo g icament e “eu est arei no meio deles”; e mais
rad icalment e aind a, “o s po bres dest e mu n do (Mt 25,31-49)” 87.
Os ído lo s são realid ades hist ó r icas e nem sempr e enco nt ram- se no
âmb it o relig io so 91. Em no ssa épo ca, a relig ião é releg ada à esfera pr ivada e
87
Ibi d. , p. 264.
88
A pr á xi s pr ofét i ca d e J esus, a o a n un ci a r a pr oxi m i da de do Rei n o d e D eus, c om ba t eu o
a nt i -r ei n o n a s con tr ovér si a s, desm a sca r am en t os e den ún ci a s. Cf. Ibi d. , p. 239-266.
89
“E m 1979 o d ocum en t o de Pu e bl a t e ve a a udá ci a de m en ci on a r os í d ol os e d e n om ea r os
que e st ã o m a i s a t ua n t es n o pr esen t e: r ea l i da des h i st ór i ca s que a gem c on t r a o ver da dei r o
Deus (n . 405, 491, 493, 497 e 500)” Ibi d. , p. 272.
90
Ibi d. , p. 272.
91
E l Sa l va dor , n a época (n a s úl t i ma s dé ca da s da segun da m et a de d o s é cul o XX), pa s sa va
por um a fa se d e el i m i na çã o d os qu e d es e ja va m m udan ça s soci a i s em ben efí ci o d os p obr es.
O í dol o sa l va dor en h o, “o di r ei t o “a bs ol ut o” de p r opr i eda de pa rt i cul ar ”, foi d e fen di do pel a
dout r i na de segur a n ça na ci on a l . O exér ci t o sa l va dor en h o, c om esqua dr ões da m or t e e
a ssi st i dos p or A me ri c an Spe ci al Forc e s, a ssa ssi nar a m 85. 000 ci da dã os em dua s déca da s
78
Para Jesu s, o s ído lo s não são u nicament e ent idades relig io sas. E les
part icipam da co nst rução da realid ade hist ó rica q ue gera po breza. Seu no me é
Mamo n, a r iq ueza 93. Na t eo lo g ia de Jo ão , a qu est ão de Deu s vo lt a co m u ma
rad icalid ade mais pro fu nd a (cf. Jo 8, 54-55). Pau lo t rat a dest a qu est ão
lembr ando , em Rm 1,18-21, o qu e é a ido lat ria: t ro car a verd ade de Deu s p ela
ment ir a qu e co nduz à desu man ização . Na o pin ião de So br ino : “A co nclu são
simp les, mas d ecis iva, é que Jesu s e o No vo Test ament o ilu st ram so br e a
quest ão de Deu s ao fazerem p erceber a exist ênc ia at iva de o ut ro s deuse s
co nt rár io s (Mamo n, o d iabo ), e po r isso é essenc ial p ara a fé em Deu s qu e, no
mín imo , seja u ma fé ant iido lát r ica” 94.
Jesus denu ncia o Mal não só em sua realid ade t rans- hist ó r ica, mas e m
seu s respo nsáveis h ist ó rico s. O ant i-reino reage e o mat a. A mo rt e de Jesu s é
co nseqüência d e su a práxis desido lat r izad o ra, que o fez eq u iparar o amo r d e
Deus ao amo r do pró ximo . E le co rr ig e assim a imagem d ist o rcida d e Deu s
present e ent re seu s co nt empo râneo s. E le q uest io na a leg it imid ade do
exercíc io do po der est abelecido , ger ado r de vít imas. Os que det êm est e po der
se pro t egem energ icament e, eliminando aqueles que o s quest io nam.
Na t rág ica sit u ação em que viv ia a Amér ica Lat ina na segu nda met ade do
Sécu lo XX surg iu u ma pr áxis de so lid ar iedad e. So br ino faz sua reflexão
t eo ló g ica a part ir d est a sit uação , na q ual ele percebe a pr esença de u m
myst eriu m ini quitati s. Para ele, a mo rt e de Jesu s não fo i ap enas algo qu e
cr io u a co nd ição de po ssib ilidad e d a ressurreição , po is ela t em seu sent ido
pró prio . Jesu s fo i per seg u ido e mo rt o pelo que fez, ist o é, po r causa d e su a
práx is desido lat r izado ra. Da cruz emerge o sent ido da hist ó ria, po is ne la o
80
Os evang elho s mo st ram que Jesu s fo i pro gressivament e persegu ido 96. Os
que o persegu iam (o s far iseus, o s su mo s sacerdo t es, o s escr ibas, o s sadu ceu s
e o s hero d iano s) exercia m algu m t ipo de po der. As causas dest a persegu ição
são var iadas (u mas hist ó r icas e o ut ras t eolo g izad as, pr inc ipalment e em Jo ão ),
mas no fu ndo , não são o ut ras senão as o riu ndas das “d enú ncias de Jesu s
co nt ra o po der o presso r, d iret ament e o po der relig io so , em cu jo no me se
95
Ibi d. , p. 288.
96
Sã o si t ua ç ões em que J esus c or r e per i go de vi da : “N o r el a t o s obr e o pa ga m en t o do
t r i but o a Césa r (Mc 12, 13-17), os fa r i seus e os h er odi an os sã o en vi a dos “pa r a o p ega r em
pel a pa l a vr a ”. No r el a t o s obr e a r essur r ei çã o dos m or t os ( Mc 12, 18-23), os sa du ceu s
pr ocur a m desa cr edi t á -l o. A pa ssa g em da expul sã o d o t em pl o (M c 11, 15-19), c on cl ui c om a
del i ber a çã o d os sum os sa c er dot es e es cr i ba s em m a t á -l o. T a m bém a pa ssa gem da par á bol a
dos vi nh a t eir os h om i ci da s (M c 12, 1-12), c on c l ui com a i n t en çã o de pr en dê-l o p or que
c om pr een der am que se di r i gi a con tr a el es. Por úl t i m o, Mar cos e Ma t eus i n t r oduz em n est e
l ugar a pa ssa gem sobr e o m a n da m en t o pr in ci pa l (Mc 12, 28-34; Mt 2, 34-35) e a pr es en t a m a
cen a t a m bém com o t en t a çã o i n si di osa c on tr a Jesus” . Ibi d., p. 291.
81
ju st ificavam o ut ro s po deres” 97. So br ino obser va que Jesus cert ament e t inha
co nsciência do co nflit o pro vo cado e de suas pro váveis co nseqüências.
A mo rt e vio lent a não lhe so brevir á co mo u m dest ino ar bit rár io , mas
co mo algo que sempre est eve present e no ho r izo nt e. Jesus t em co nsciência d e
u ma mo rt e pro vável, mas mant eve- se fir me na persegu ição . Isto co nfir ma su a
fidelid ad e a Deu s e a u lt imidade de sua miser icó rd ia para co m o s ho mens. Po r
causa d esse fat o , sua mo rt e fo i int erpret ada co mo assu mida co m liberdad e e,
po r isso , co mo expressão de amo r. Po rém, ela mo st ra t ambém q ue Jesu s
co nhece e assu me a lut a do s deuses e a fo rça negat iva da hist ó r ia qu e aniqu ila
o pro fet a. “O ca minho p ara Jeru salé m, ap esar da p ersegu ição e at ravés d ela, é
a t radução geo gráfica da fid elid ade de Jesus no meio da lut a do s deuses” 98.
97
Ibi d. , p. 294.
98
Ibi d. , p. 295.
82
“exp licação ”, co nsid era a cru z co mo o d est ino do pro fet a (1 Ts 2,14 s; R m
11,3). Jesus mo rreu co mo u m pro fet a. O passo seg u int e, o de t ipo
apo lo gét ico , fo i dado quando se afir mo u que a cruz e a mo rt e fo ram pred it as
nas Escr it uras. Mas co mo est e passo não o fereceu lu mino sidad e su ficient e,
ent end eu-se que o sig n ificado (o u o po rquê) da cruz est ar ia esco nd ido e m
Deus, o u seja, fazia p art e do desíg n io d iv ino . Para So br ino , isso mo st ra que o
absurdo não é a ú lt ima pa lavra so bre a hist ó r ia e que a esp erança co nt inu a
sendo u ma po ssib ilid ade, po is o sent ido da hist ó r ia est á em Deus 99.
Vár io s mo d elo s exp licat ivo s são usado s para afir mar qu e na cruz há
salvação . Os ma is impo rt ant es são o do sacr ifício , o de no va aliança e o da
figura do ser vo so fredo r. Pau lo ins ist e na ressurreição de Jesus, mas a cru z é
cent ral em sua so t er io lo g ia. E le d est aca seu aspect o salvífico e sua fo r ça
99
Sobr i n o sust en t a que, em úl t i ma in st ân ci a, a esper an ça nã o t em c om o fon t e o “ sa ber ” do
m i st ér i o, ma s a “fé” n o Deus c on cr et o c om um desí gn i o c on cr et o h i st ór i co. Cf. Ibi d. , p.
321-323.
100
Pa r a Sobr in o, t oda s a s vez e s que os fr a c os sã o i n just i ça dos, s e l e va n t a m m ai s cr uz es na
h i st ór ia . E l e usa di ver sa s expr ess ões c om o: ví t i m a s, o povo cr uci fi ca d o et c. pa r a descr e ver
a quel es s obr e os qua i s o a n t i -r ei n o a par en t em ente t r i un fa . Na sua m edi t a çã o s obr e “ o p ov o
cr uci fi ca do” , n oss o a ut or c om pa r a a o “s er vo s ofr edor ” (Is 42, 1-7) e di z : “a s or t e do p ovo
cr uci fi ca do, por t a n t o, par t i ci pa h oj e a n al oga m en te do de st i n o do s er vo” . Cf . Ibi d., p. 372.
83
101
“Qu em t en t a exer cer a m i ser i cór di a pa ra com os out r os e sa l vá -l os, t em de est a r
di spost o a sofr er ” Ibi d., p. 332.
102
Ibi d. , p. 332.
103
Ibi d. , p. 332.
84
qual Deu s expressa su a irrevo gável mu dança sa lv ífica em nó s” 104. O bem que
Deus t raz at ravés da cru z é a inequ ívo ca afir mação que d iz t udo.
104
Ibi d. , p. 335.
105
Ibi d. , p. 349.
85
O pro ble ma cent ral é: o que sig n ifica d izer qu e o so fr iment o afet a a
Deus? A fé cr ist ã int ro duz u ma no vid ade rad ical no mo do de fazer afir maçõ es
do xo ló g icas so bre Deus. Est a no vid ade aparece na id éia da encar nação . Se o
Filho t o rno u-se car ne, ent ão aco nt eceu um “d evir” no Deus que não é carne.
Jesus é aqu ele que so fre na cruz, que é abando nado po r Deus. P arafr aseando
Pau lo , So br ino afir ma qu e “Deu s est ava na cru z” (Gl 3,13). Isso ap arece
t ambém em Mc 15,19, o nde o Cent ur ião , depo is da mo rt e de Jesus, faz a
co nfissão de fé: “verdadeirament e est e ho mem era filho d e Deus”. Par a
So br ino : “Se o Deus de Jesu s co nt rad iz clar ament e a apatheia, a ind ifer ença
do s deu ses grego s, dur ant e t o da a vid a d e Jesu s não há po r que presu mir que,
exat ament e na cru z, se t o rne apát ico , desint eressado ” 107.
106
Ibi d. , p. 351.
107
Ibi d. , p. 353.
86
Po rém, o ser vo é a luz das naçõ es, no sent ido de que a mera exist ência
do po vo crucificado po de desmascarar a ment ira co m que se enco bre a
realidad e dest e mu ndo . O ser vo t raz a salvação , su a crucifixão é hist ó r ica. O
po vo crucificado afir ma a ex ist ência de u m imenso pecado que exig e
co nver são , co mo em nenhu ma o ut ra realid ade.
108
É a r efer ên ci a a os p ovos de vá r i os pa í ses d a Am ér i ca La t i na , com o E l Sa l va d or,
Gua t em a l a e out r os, on de cen t en a s de m i lh ar es de pobr es, i n dí gen a s e ca m pon eses for a m
m a ssa cr a dos n a s déca da s que se segui a m à segunda guerr a m un dia l por quer er em um a vi da
m a i s di gn a m at er i al m en t e. As di t a dur a s l oca i s em c ol usã o c om os E UA, e fet ua r am essa s
ch a ci na s. Ven ci dos os pr a z os l ega i s, os d ocum en t os cl a ssi fi ca dos d o g over n o dos E UA
sobr e sua a t ua çã o n a Am ér i ca La t in a dur ant e est e per í od o, e st ã o pr ogr essi va m en t e
di spon í vei s pa r a con sul t a públ i ca . Com o um exem pl o: Cf . “St umbl i ng upon Guate mal a’s
past ” em NCRon l i n e. or g de set em br o 23 de 2005.
109
Is 42, 1; 49, 3. 7. c f . SOBRINO, J e sus, p. 373.
87
110
Cf . Ide m. , p. 378-379.
88
E m sua análise do s enfo q ues her menêut ico s de alg u ns aut o res mo der no s,
So br ino aco lhe co nt r ibu içõ es valio sas, que enr iqu ecem sua pró pr ia
perspect iva, que é a lat ino -amer icana. E le resu me a co nt r ibu ição do s grand es
t eó lo go s que marcaram o debat e t eo ló g ico do sécu lo XX d izendo que e m
111
Segun do S obr in o, a esper a n ça que a r essur r ei çã o d e J esu s su sci t a , n ã o é qua l quer
esp er an ça , m a s a esper an ça n o poder de D eus c on tr a a in just i ça que pr oduz ví t i m a s. A
r essur r ei çã o de Je sus é esp er an ça pa ra a s ví t i m a s e os cr uci fi ca dos da h i st ór i a . E xi st e,
por t an t o, um a cor r el a çã o en t r e r essurr ei çã o e cr uci fi ca dos, que é a n á l oga à cor r el a çã o
en tr e r ein o de Deus e p obr es.
89
no sso mu ndo mo der no não ser á impr ó pria a ser iedade exist encial d e
Bu lt mann, d iant e d e lev iand ades pó s- mo dernas; nem o chamado à práx is d e
Mar xsen, d iant e da ind iferença q ue se no s int ro jet a; nem a esperança, aind a
que fo sse at é so ment e na versão de Pannenberg, per ant e a geo po lít ica d a
desesp erança; o u a evo cação do mist ér io , feit a po r Rahner, d iant e da
banalização da realid ade 112.
Para elucid ar seu pr incíp io her menêut ico , So br ino ret o ma as t rês grand es
quest õ es Kant ianas refo r mu lando -as e ap licando -as à ressurreição no NT: 1) o
que eu po sso saber ? “O Senho r ressu scit o u verdadeirament e” (Lc 23,34) ; 2)
112
Cf . SOBRINO, A Fé , p. 57.
113
Ide m. , p. 32.
114
A i m a gem de um Deus s ol i dá r i o, por tan t o en vol vi do c om a sor t e d os s er es h um an os,
c om o ver em os m a i s a di ant e em n oss o ca pí t ul o IV , i t em 3.
115
E ssa c om pr een sã o da un i ã o i n di ssol úvel de Je sus c om D eus c on cr et i z ou-s e
post er i or m en t e em for m ul a ções c on ci l i ar es s obr e a pess oa de J esus de Na z a r é. Nos sa
h i pót ese de t r a ba l h o pr essup õe es sa s de fi n i çõe s e por i sso n ã o pr et en dem os a pr ofun da r
essa di m en sã o.
116
O ca pí t ul o IV va i en um er ar a s ca r a ct er í st i ca s des sa n ova si t ua çã o n a vi da d os que
segui a m Je sus e ver i fi ca r um a si t ua çã o a ná l oga i den t i fi cá vel n a pr á xi s ecl esi a l l a t in o-
a m er i can a.
90
117
SOBRIN O, A fé , p. 61.
118
Os egí pci os, por exem pl o, t i nh am um a doutr in a det a l ha da a cer ca da vi da a pós da m or t e.
E st a dout rin a er a in a cei t á vel pa r a Isr a el, por que er a ba sea da n o despr ez o da vi da t err en a ,
a l go que o i sr a el i t a con si der a va o gran de dom de Deus. Cf . Ide m. , p. 63.
91
Na t rad ição pro fét ica, I srael ent endeu o senho r io de Deus que abarcav a
t udo : passado , present e e fut uro . Est ar em co mu nhão co m est e Deu s d a vid a
era fu ndament al e po r isso , o sheol (o mu ndo do s mo rto s) não era co nsid erado
co mo u m âmb it o que impo rt ava a I ahweh. Nesse co nt ext o , a mo rt e co mo fi m
da exist ência, não era u m escândalo p ar a a fé israelit a. Aqu i, So br ino t ira
duas co nclu sõ es: 1) a afir mação do além não surg iu à margem d a hist ó r ia ne m
co nt ra ela ; 2) a fid elidade à fé e m I ahweh, fo i levando , pau lat inament e, o
po vo a afir mar u ma v ida apó s a mo rt e. Quando Israel chego u a examinar a
quest ão da vida além da mo rt e “... su rg iu a esperança escat o ló g ica qu e
Iahweh exercer ia o seu do mín io so br e to do s o s po vo s e so bre t o da realidade,
mais ainda, q ue Iahweh ser ia vencedo r so bre t o do s o s po deres hist ó r ico s e
có smico s” 119.
119
Ibi d. , p. 64.
120
Ibi d. , p. 65.
92
121
Ibi d. , p. 69.
93
122
Ibi d, , p. 70.
123
Aqui pode s e l e va n t ar a quest ã o do t em a do l i vr o de Jó. J ó, n os seu s i n for t ún i os, sur ge
c om o um h om em pr ofun do, ca pa z de a ssum i r e r epr esen t ar a h um an i da de sofr ed or a que
bus ca a uda z m en t e a Deus, per an t e o fr a ca ss o da dout r in a tr a di ci on a l da r et ri bui çã o
(In tr oduçã o a o l i vr o de J ó n a B í bl i a do pe re grino. Sã o Pa ul o: Pa ul us, 2002, p. 1060). O
pr ól og o s e de sen vol ve em d oi s pl a n os, o c el est e e o t er r est r e e o l ei t or sa be que os m a l es
que J ó s ofr e sã o um a pr ova d e sua fi del i da de. (In tr oduçã o a o l i vr o d e J ó n a B í bl i a de
J e rusal é m. Sã o Pa ul o: Pa ul us, p. 801). O l i vr o, n a sua t ot a l i da de, enr i quece o n os s o
c on h eci m en t o de Deus, d o ser h uman o e sua s r el a çõe s. Com o vi m os a ci m a , a tr a di çã o
sa pi en ci a l , da qual o l i vr o de J ó fa z pa r t e, a cres cen t ou um n ovo el em en t o à s ol uçã o d o
pr obl em a da r etr i bui çã o: a com unh ã o com Ia h we h per man ece pa r a sem pr e.
124
SOBRIN O, A Fé , p. 74.
94
125
Ide m. , p. 78.
126
Ibi d. , p. 78.
127
Cf . Ibi d., p. 40-57.
95
Para So br ino , po rt ant o , a esper ança, enqu ant o pressupo st o her menêut ico ,
recupera aspect o s fu ndament ais do NT, sendo ao mesmo t empo u ma das
cat ego rias pr iv ileg iadas das ant ro po ló g ias at uais. À luz d e sua exper iência
hist ó r ica, a fé israelit a chego u a inc lu ir t ambém a esp erança que seu Deu s
t riu nfar ia co nt ra a in just iça. A missão do s d iscípu lo s fo i t est emu nhar a
ressurreição . Ho je est e t est emu nho co nsist e em descer d a cru z o po vo
crucificado .
Nas fo r mu laçõ es neo t est ament ár ias da ex per iência pascal, o s d iscíp u lo s
afir mam qu e Jesu s est á vivo po rque Deus o ressu scit o u. De aco rdo co m
So br ino , a expect at iva apo calípt ica co nvert eu-se para eles em ho r izo nt e de
co mpreensão , co mo aparece em Pau lo . Para o Apó st o lo , em co nt inu id ade co m
suas co nvicçõ es ant er io res à exp er iênc ia de Damasco , a ressurreição sig nific a
u ma mud ança rad ical. E m si mesma, ela é salv ífica. E le parece po r isso
96
O sepu lcro vazio é o único relat o co mpart ilhado pelo s quat ro evangelho s
(Mt 27,1-8; Mc 16,1-8 ; Lc 24,1-8 ; Jo 20,1-10). O t ext o po ssu i relat iv a
ant igü id ade. So br ino co nco rda co m Kessler p ara quem o sepu lcro vazio
co nt inua sendo u ma quest ão abert a e u m fat o ambíg uo 130. As mu lheres
enco nt ram o sepu lcro vazio , mas não tiram a co nc lusão de q ue ho u ve a
ressurreição . É um an jo que lhes anu ncia a no vid ade ( Lc 24,4-7 ; 16,5-7 ; Mt
28,2-7).
128
E ssa é a posi çã o de S obr i n o em sua obr a Cri st ologi a a part i r da A mé ri c a Lat i na,
pr in ci pa l obr a do “pr i m eir o Jon Sobr i n o” , segundo AL BUQ UE RQ UE , Fr an ci sco Ch a ga s
de, “Pre s supost os, me t odol ogi a e re l e v ânc i a da c ri st ol ogi a de J on Sobri no, Bel o
Hor i z on t e: ISI-CE S. 1996. (Di sser t a çã o de Mest r a do) p. 10.
129
BÍ BLIA DE JE RUSA LÉ M, p. 2013, n ot a “a”.
130
Sobr i n o a gr upa os a r gum en t os con c er n en t es a o t úm ul o va z i o, m ost r an do a
i m possi bi l i da de de se t i r ar con cl usões cl a r a s. E le dest a ca , por ém o i n t er esse m a ni fest o n o
sepul cr o va z i o, em t oda pr oba bi l i da de a ser vi ç o da cel e br a çã o l i t úr gi ca. Cf. SOBRINO, A
f é , p. 94-97.
97
131
Ide m. , p. 97.
98
a per spect iva da desco nt inu id ade, qu e se man ifest a na pr egação de Jesu s e na
exigência do seu segu iment o ; 2) a cruz de Jesu s, que dest ru iu a fé do s
d iscíp u lo s, marcada at é ent ão pela expect at iva apo calípt ica g eral do jud aísmo
daquele t empo ; 3) a per spect iva da co nt inu id ad e ent re a apo calípt ica e a
esper ança cr ist ã, que se ev idencia na expect at iva da ju st iça de Deu s. Par a
So br ino , a apo calípt ica não é simp lesmen t e uma quest ão do final de hist ó r ia,
mas de t eo d icéia. Há qu e se p ergunt ar “q uem” ressu scit o u ? A
desco nt inu id ade não res ide no fat o de que alguém ressu scit e ant es do s o ut ro s.
O que co nst it u i o no vo e o escandalo so é que Jesu s fo i co nd enado , execut ado
e abando nado .
Para respo nder à quest ão : “o que eu po sso saber ?”, So br ino analisa a s
po siçõ es d e Bu lt mann, Pannenberg e Mo lt mann. Su a respo st a a est a pergu nt a
part e do fat o que o s d iscípu lo s são t est emu nhas da ressurreição de Jesu s. As
d ificu ldad es que a ciência hist ó r ica enco nt ra em est udar event o s co mo a
ressurreição , que t ranscend em o alcance do s meio s cient ífico s d ispo níveis,
levam no sso aut or a rejeit ar as po siçõ es do po sit ivis mo e do exist encialis mo
hist ó r ico s. Segu ndo ele, Pannenberg, qu e é co nt ra a po sição de Bu lt mann,
para quem a fé não deve apo iar-se no hist ó r ico , aceit a a hist o r ic idad e d a
ressurreição , amp liando o sig nificado da hist ó r ia, mas sem capt ar o negat ivo
da hist ó ria. A ressurreição ser ia po rt anto algo hist o ricament e co nst at áve l n a
pesso a do crucificado e na cred ib ilid ade das t est emu nhas, o s apó sto lo s. Mas,
co mo ent end er a hist o r icid ade da r essurreição de Jesu s? No sso aut o r apó ia-se
em Mo lt mann, e afir ma qu e o hist ó rico da ressurreição se capt a o bser vando -a
99
so b a cat ego r ia d a pro messa, que se abr e ao fut uro . E acrescent a: “O t rabalho
do t eó lo go , ao invest ig ar hist o r icament e a ressurreição de Jesu s, não co nsist e
em assegur ar a fé co nt ra o s co nflit o s da hist ó r ia (...), mas em co lo cá- la no
co nflit o da hist ó r ia, que a ressurreição de Jesus d esencadeia.” 132.
Segu ndo o t eó lo go salvado renho , est e “t est emu nho cr iado r” 134 define, a
chave her menêut ica de co mpreensão da ressurreição no co nt ext o lat ino -
amer icano , que é a chave po lít ica. Para ele, a ver ificação da verdade do
aco nt eciment o da ressurreição so ment e é po ssível nu ma pr áxis
132
SOBRIN O, Cri st ol ogi a, p. 263.
133
SOBRIN O, A fé , p. 110-113.
134
As n a rr at i va s que os di s cí pul os n os d ei xa r am de sua s exp er i ên ci a s de en c on tr o c om o
Ressu sci t a d o.
100
t ransfo r mado ra que pro ssiga o s ideais d est a mesma ressurreição . Ele su st ent a
que na pregação pau lina est a chave já é vis ível, po is Pau lo , co m su a
pregação , dest ró i t o das as est rut uras q ue o br ig am o ser hu mano a viver
o primido . O evang elho da ju st ificação é o prot esto co nt ra a o pressão da
relig ião e do s deu ses.
Po rém, ao lo ngo do AT, as açõ es h ist ó ricas, at ravés das qu ais Deu s se
revela, vão se deslo cando em d ir eção ao fut uro , co mo aparece em 1 R s
20,13.28 135; Ez 2 5,6-7.8-11 136, at é chegar à fo r mu lação rad ical de I s 65,17s 137.
Deus t ambém vai se revelando cada vez mais co mo u m Deu s u niversal, qu e
est ende seu senho r io no t empo e no espaço . Isso co exist e, po rém, co m a
parci alidade de sua ação fu nd ant e na h ist ó ria de Israel. A r evelação de Deu s
aco nt ece de maneira dialét ica e du élica em lut a co m o ut ras d iv ind ades. “No
135
Os d oi s ver sí cul os (1 Rs 20, 13. 28) sã o pr om es sa s da r evel a çã o d e D eus n a guerr a de
Isr a el con t ra os Ar a m eus. No v. 13, Deus pr om e t e a gi r par a que Aca b r ec on h eça Ia h weh .
“E n t ã o o pr ofet a vei o pr ocur a r Aca b, r ei de Isra el , e di sse: a ssi m fa l a Iah weh : vê s est a
i m en sa m ult i dã o? P oi s eu a en tr ego h oj e em t ua s m ã os e r ec on h ecer á s que eu s ou Ia h weh ” .
O v. 28 r epet e a pr om essa c om um a pequen a m odi fi ca çã o. “O h om em de D eus a pr oxi m ou-
se d o r ei de I sr a el e di ss e-l h e: “As si m fa l a Ia hweh . Já que Ar a m di sse que Ia h weh é um
Deus d e m on t anh a s e n ã o um Deus de pl an í ci es, en tr ego em t ua s m ã os t oda es sa m ul t i dã o e
r econ h ecer á s que eu s ou Ia h weh ” .
136
Ao I sr a el h um i lha do pel a der r ot a e exi l a do, E z equi el (25) pr ofet i z a a a çã o di vi n a con t ra
os Am on i t a s, Moa b, E dom e os fi l i st eu s pa r a que r econ h eça m a sober a n ia do Iah weh . .
137
“C om e fei t o, cr i ar ei n ovos c éus e n ova t er ra ; a s c oi sa s de out r or a nã o s er ã o l em br a da s,
n em t orna rã o a vi r a o cor a çã o. Al egr a i -vos, p oi s, e r egoz i ja i - vos pa r a sem pr e com a qui l o
que est ou pa r a cr i ar: ei s que fa r ei de Jer usa l ém um júbi l o e do m eu p ovo um a al egr ia ”
102
138
SO BRINO, A Fé , p. 129.
139
Ide m. , p. 130.
140
Ibi d. , p. 134-135.
103
141
Ibi d. , p. 140.
142
Ibi d. , p. 142.
104
hu mano s. Essa so lid ar ied ade no s revela u ma d ia lét ica d ent ro de Deu s, u m
Deus a mercê do s seres hu mano s, e ao mesmo t empo , u m Deu s qu e necessit a
de t empo para se mo st rar co mo pura po sit iv id ade. Assim a ressurreição é u ma
bo a no t ícia.
3.5. Conclusão.
desido lat r izado ra. Por causa d isso , Jesus fo i per segu ido . Sua mo rt e o bedece à
ló g ica d a encar nação nu m mu ndo marcado pelo pecado e que pro duz inú mer as
vít imas. A cat ego r ia do amo r é a q ue melho r expressa a encar nação e a
salvação , que So br ino ent end e co mo so lid ar ied ade de Deus para co m as
vít imas. No s po vo s crucificado s de ho je, est e Deus se revela quest io nando as
est rut uras que t iram a d ig n idad e de mu ito s. Ao mesmo t empo , E le o fer ece
vid a, esperança, p erdão , co nver são e so lid ar iedad e na lut a co nt ra o s d euses d a
mo rt e.
Her menêut icament e, a r eflexão Cr ist o ló g ica na Amér ica Lat ina t em u ma
co nt r ibu ição o rig inal para a t rad ição viva, qu e busca em cada épo ca
co mpreender a Ressurreição de Jesus. E la suscit a a esp erança que se expressa
nu ma práx is libert ado ra. Às p ergu nt as k ant ianas, que se fazem no r malment e
para co mpreender o s sig nificado s do s text o s so bre a ressurre ição , So br ino
acrescent a u ma o ut ra pergunt a: o que podemos celeb ra r na histó ria?
exper iências análo g as são po ssíveis. Celebram-se vit ó r ias na hist ó r ia, po rque
a p lenit ud e t ransbo rdo u de Jesu s para o s d iscípu lo s e mu do u a qualidad e de
suas vidas.
Capítulo Quarto
Uma nova abordagem teológica da Ressurreição
A experiência de encontro com o Ressuscitado
a partir de América Latina
Examina mo s no s cap ít u lo s ant er io res alg u mas o bras selet as de Leo nardo
Bo ff, Juan Lu is Segu ndo e Jo n So br ino co m o int u it o de desco br ir qu al o
lug ar da ressurreição de Jesus em suas respect ivas abo rdagens cr ist o ló g icas.
Há u m co nsenso ent re eles q uant o à fact ic idad e da r essurreição , bem co mo
quant o a seu carát er escat o ló g ico , o que os d ist ancia do s mét o do s
ver ificat ó rio s do hist o ricismo mo der no . Eles são mu it o at ent o s a est a
pro blemát ica. Só para cit ar u m exemp lo : co m a finalid ade d e se ad equar à s
necess idad es da ling uagem mo d er na, Ju an Lu is Seg u ndo faz u ma d ist inção
ent re o s ad jet ivo s “h ist ó r ico ” e “verd adeiro ”’ 143, nas o bser vaçõ es in ic iais que
faz so bre a ressurreição de Jesu s.
143
O a ut or pr et en de est a bel ec er cr i t ér i os l i n güí st i cos pa r a fa l a r coer en t em en t e da
“r essur r ei çã o” e de s eu va l or h i st ór i co. A h i st or i ogra fi a m oder n a , diz el e, n ã o c on segu e
ver i fi ca r o e ven t o da r essur r ei çã o. O qu e el a p ode con st a t a r é o qu e os t ext os di z em s obr e
o t úm ul o va z i o e a m uda n ça r a di ca l oper a da na vi da dos a p óst ol os. “A r essur r ei çã o d e
Jesu s – se ja el a ver da dei r a, h i st ór i ca ou m í t i ca – é est r i t a m en t e “h i st ór i ca ” , e nquant o
i n fl ui n a cri a çã o de um a c om un i da de ou Igr eja q ue, de a l gum m odo, pr ol on ga Jesus. Ma s,
n esse ca s o, sua h i st or i ci da de n ã o per t en ce à hi st ór i a do pr ópr i o Jesu s, m a s à h i st ór i a de
sua Igr eja . Nel a s e t or na ver i fi cá vel a i n fl uên c i a da r essurr ei çã o, p or que foi ver da dei r a
ca usa de m ui t os a con t e ci m en t os post er i or es” . SE G UNDO, Hi st óri a, p. 306.
108
mud ança fo ram as exp er iências de enco nt ro que cad a u m do s d iscípu lo s t eve
co m o Ressu scit ado 144. O NT co nser vo u o s relat o s das apar içõ es e o símbo lo
do t ú mu lo vazio par a expressar isso . Na AL, nu ma sit uação análo ga (d e
perp lexid ade d iant e da exp lo r ação desu mana d e u ns p elo s o ut ro s, e de
vio lência sem sent ido que est a exp lo ração pro vo ca), surge na práxis do s
cr ist ão s u ma no va esperança.
4.2.1. A mudança na vida e no com port am ento dos discí pulos segund o
Leonardo Boff
Po rém, a cruz não é símbo lo de resig nação , po rque o crist ão não apo nt a
para ela, mas p ara o Crucificado . E est e é ago ra o Vivent e e o Ressu scit ado .
Para o s que resist em à o pressão , “a ressurreição é o sent ido derradeiro da
insurreição pelo d ireit o e pela ju st iça” 146. A cr ist o lo g ia do t eó lo go brasileiro
est á inser ida no co nt ext o de u ma práxis eclesial d e so lidar iedade, qu e ger a
co mu nidades. E la est á ao serviço da libert ação exig ido pelo mo ment o
hist ó r ico .
144
E ssa m udan ça pode s er ca ra ct er i z ada com o a de um a m udan ça n a fé dos di s cí pul os.
E ntr e os t e ól og os a t ua i s, h á dua s posi ç ões s obr e est a “m uda n ça ” : 1) cr ia çã o de um a n ova
fé; 2) el a est á n a ori gem da fé pr é-pa sca l . De a cor do c om Jon Sobr i n o, a r essurr ei çã o
a cr esc en t a doi s el em en t os d e ci si vos, a sa ber , a de fi n i t i vi da de e o i n t egr ar a r ea l i da de da
cr uz à fé pr é-pa sca l dos di s cí pul os. Cf . SOBRIN O, A Fé, p. 162-166.
145
BOFF, Pai x ão, p. 12.
146
Ide m, p. 14.
110
Uma mu dança rad ical na vid a da co mu nid ade nascent e é t est emu nhada na
t eo lo g ia d a cart a ao s Hebreu s. Para u ma co mu n idad e abat ida e sem esperança,
147
Ibi d. , p. 103.
111
a mensag em d est a cart a é decisiva. Jesus é apr esent ado co mo o pro tót ipo e o
exemp lo d a fé e d a fidelid ade. Cr er t ambém inclu i o so fr iment o e a mo rt e
co mo mo do de ent rar na p len it ude celest e. Co m Jesus veio a salvação
defin it iva par a to do s.
4.2.2. A mudança na vida e no com port am ento dos discí pulos segund o
Juan Luis Segundo.
A expr essão “su bir a Jeru salém” evo ca no r malment e vár ias emo çõ es e
sig nificado s. A cid ade de Jeru salé m er a a cap it al po lít ico -relig io sa de Israe l
no t empo da o cupação ro mana. Perant e o fracasso de sua missão na Galilé ia,
Jesus d ir ig e-se a est a cidade. Juan Lu is S egu ndo afir ma que em chave
po lít ico -relig io sa, est e “su bir” de Jesu s t em algo d e d ecis ivo . O qu e o
Nazar eno , u m bo m po lít ico , visava era a subst it u ição das aut o ridades ind ig nas
e o presso ras, para que fo sse inst aurado um no vo reinado . No ent ant o , ele fo i
mo rt o , e sua mo rt e é o resu lt ado de u m co nlu io po r part e de seus ad ver sár io s.
148
SE GUN DO, Hi st óri a, p. 334.
112
As reflexõ es t eo ló g icas de Pau lo fo ram feit as para r eso lver o s pro b lema s
das co mu nid ades cr ist ãs. Não eram t rat ado s sist emát ico s. No ent ant o , em su a
tot alidad e, a mensagem Pau lina revela a rad ical no vid ade qu e a Ressurreição
de Jesu s int ro duziu na realid ade hu mana. Nu ma sit uação em que t o do s, pagão s
e jud eus, havia m se t o rnado escravo s do pecado , surg e u ma no va cat ego r ia: a
do s que são declarado s ju st o s pela fé, a exemp lo d e Abr aão , que viveu a
pro messa. A p lenificação hu mana e a revelação do s filho s de Deu s são
event o s escat o ló g ico s. Co nt udo a hist ó ria hu mana co nt inua sendo o que ela
sempre fo i, enqu ant o o s filho s de Deu s vão realizando co m seu s pro jet o s
hist ó r ico s, libert açõ es parcia is da hu man idade.
Igreja nascent e. Para exp licit ar a impo rt ância de Pedro , o NT evo ca dua s
vezes a apar ição do Ressu scit ado a ele (1 Co r 15,5; Lc 24,34). Co mo veremo s
mais ad iant e, no ep isó d io do bat ismo d e Co rné lio , é Pedro quem int ro duz
mud anças no s co st u mes da co mu nid ade, co nvencendo -a da necessid ade d e
adapt ar sua práxis nu ma no va circu nst ância.
Ao pro po r no vas chaves her menêut icas, q ue ilu minar iam as p ist as para a
ação e a reflexão t eo ló g ica encar nad as na AL, Juan Lu is Seg u ndo mo st ra a
necess idad e de u ma mud ança rad ical na vid a e no co mpo rt ament o do s que
ho je seguem o Ressuscit ado . Co mo o ut ro ra fizeram o s d iscípu lo s, o s que t ê m
a exper iência de enco nt ro co m o Ressuscit ado são co nvo cado s a exercer u ma
liber dade cr iat iva p erant e o s quest io na ment o s que surge m nu ma Igreja q ue
passa da “cr ist and ade” par a u m “p luralis mo ”, dent ro de u ma sit u ação so cia l
de desig uald ades gr it ant es.
4.2.3. A mudança na vida e no com port am ento dos discí pulos segund o
Jon Sobrino
A mudança rad ical que aco nt ece na AL, vist a desde a p ersp ect iva do
enco nt ro co m o Ressu sc it ado , po de ser co mpr eend id a co mo a co nt est ação do
sist ema que d urant e sécu lo s pro duziu vít imas. O sist ema reage co m vio lência,
que po r sua vez, ger a mais v io lência. Nest e amb ient e vio lent o surgem, po rém,
pesso as que ado t am u ma práxis que qu ebr a o círcu lo vic io so da vio lência e do
ó dio carregando -o s e to rnando -se v ít imas, nu ma práxis análo ga à do pró prio
Jesus. A co nclu são d e So br ino é que a esperança e o ân imo q ue mudaram a
vid a do s d iscípu lo s ao enco nt rarem o Ressu scit ado , se repet em na AL, no s
cr ist ão s que t êm u ma exper iência d e enco nt ro co m o Ressu scit ado .
149
SOBRIN O, A Fé , p. 70.
115
em seu so fr iment o . Isso quer d izer que Deus so fre. Um Deu s que não so fre
não libert a do so fr iment o .
Sem pro jet ar ind iscr iminadament e a do r e a cruz no seio de Deus (co mo
fazem Mo lt mann, Balt hasar e Sö lle) Bo ff exp licit a a so lid ar iedade d e Deu s
co mo u m andar ju nt o na hist ó ria. Sem dest ru ir a no vid ade do evang elho e
evit ando sacr ament alizar a in iqü idad e do mu ndo , ele exp lica o silêncio d e
Deus na cruz: “S e Deu s se cala d iant e da do r é porque E le mesmo so fr e,
assu me a cau sa do s mart ir izado s e so fredo res (Mt 25,31)” 151. E le a assu miu
po rque quer findar t o das as cruzes da hist ó ria.
150
BOFF, Pai x ão, p. 137.
151
Ide m, p. 141.
152
Ibi d. , p. 131.
117
Ago ra no ssa t arefa é a d e ver ificar se, na o bra de Juan Lu is S egu ndo
que est udamo s, exist em t ext o s que revelam u ma no va imagem d e Deu s
deco rrent e da exper iência de enco nt ro co m o Ressu scit ado . No ssa pesqu is a
co nst at o u uma au sência do s t ext o s que falam d ir et ament e d e u ma no va
imagem d e Deu s o r iu nda d est e enco nt ro . Po r isso , vamo s apro fu nd ar u m
po uco ma is a aná lise que o t eó lo go uruguaio faz d as parábo las, em seu est udo
do s sinó t ico s, para desco br ir a no va imagem de Deus que o ensinament o de
Jesus r evelo u. E m segu id a, acrescent aremo s algu ns co nt o rno s do “Deu s
co no sco ” co lhido s da análise q ue e le faz do s pr ime iro s o it o cap ít u lo s d a cart a
ao s Ro mano s, que co mp le ment am a aná lise preced ent e e no s dão u ma idéia do
Deus revelado em e at ravés do event o cr isto ló g ico .
153
Ibi d. , p. 194.
154
Boff est uda est e a spe ct o i m por t a n t e da r evel a çã o de D eus em J esus d e Na z a r é (a
dout r i na da Sa n tí ssi m a Tr in da de) na sua obr a A Tri ndade e a Soc i e dade Pet r óp ol i s: V oz es,
1987.
118
No segu ndo grupo de parábo las, co nst it u ído pelas parábo las da esco lh a
do s lugares (Lc 14,8-10), a o velha perd ida (Lc 15,4-7), o filho pró d igo (Lc
15,10-32) e o s co nv idado s do banqu et e nupcial ( Mt 22,1-12), o aut o r ent ende
que Jesus apó ia- se na mesma id eo lo g ia de seu s ad versár io s e aceit a que I srae l
est eja d iv id ido em do is gru po s: 1) o daq ueles qu e t êm po der; 2) o daquele s
que eram vít imas dest e po der, o u, em o ut ras palavras, o s o presso res e o s
o primido s. A id eo lo g ia v igent e classifico u est es do is grupo s co mo “ju st o s” e
“pecado res”. No final da exegese d as parábo las do banq uet e (Lc 14,15-24 e
155
Com o e voca m os n o ca pí t ul o II, em sua a n áli se da s pa r á bol a s, Jua n Lui s S egun do
cl a ssi fi ca -a s em qua tr o gr upos: 1) a fa l sa segura n ça opost a a o Rei n o; 2) os p eca d or es e a
a l egr ia de Deus; 3) os ver da dei r os pe ca dor e s e m Isr a el ; 4) a a ut ên t i ca l ei t ur a da Pa l a vra
de Deu s.
119
A quart a sér ie de p arábo las, q ue reagrupa as p arábo las do ad min ist rado r
in fiel ( Lc 16,1-9), do s t alent o s (Mt 25,14-30), e do bo m sa mar it ano (Lc 10,25-
37), exp licit a o s camin ho s pelo s qu ais a palavra libert ado ra de Deu s pô de ser
t ão mal co mpreend ida, at é pe las aut o rid ad es o ficia lment e encarreg adas de su a
int erpret ação , e co nvert ida em inst rument o de o pressão do s po bres e
pecado res. O aut o r analisa est as parábo las nu ma pro gressão , mo st rando co mo
156
SE GUN DO, Hi st óri a, p. 195.
157
Ide m. , p. 207.
120
elas levam o s o u vint es de Jesu s a chegar em a u ma aut ênt ica leit ura da Palavr a
de Deu s. E le co meça co m a p arábo la d o ad min ist rado r infiel (Lc 16,1-9),
sust ent ando que é a esco lha p arado xal do ad min ist rado r, e a mist er io sa
co incid ência co m o verd adeiro int eresse d o pro pr iet ár io , o t ema da p arábo la e
não u ma qu est ão mo ral. O fat o de Israel t er receb ido a lei não é u m
pr ivilég io , po is é preciso assu mi- la co m respo nsabilid ade e co lo cá- la ao
ser viço da hu man ização do ser hu mano . A parábo la do s t alent o s (Mt 25,14-3 0
par.) desenvo lve est e pensament o e mo st ra a impo rt ância da “co -
respo nsabilid ad e” hu mana na co nst rução do Reino . Na p arábo la do ju ízo fina l
(Mt 25,31-46), d iz Ju an Lu is Segu ndo , Jesus mo st ra qu e t o do s o s ho mens são
igu ais d iant e de u m ú nico cr it ér io – o Reino , ist o é, o s mais necessit ado s
devem ser ajud ado s a recup erar sua hu manidad e, e isso a co meçar po r suas
necess idad es mat er iais mais urgent es. O cu me do ens inament o parabó lico
enco nt ra-se na parábo la do bo m samar it ano (Lc 10,25-37), que é a respo st a d e
Jesus a u m mest re da lei que pro curo u pô -lo em apuro s co m a pergu nt a:
“quem é meu pró ximo ?”.
A imag em falsa d e Deus que Jesu s co mbat e em suas par ábo las no s
revela u ma o ut ra imag em de Deus, que p o ssu i as seg u int es caract er íst icas: 1 )
Jesus não est á int eressado em mant er o st atus quo d e Israel, mas em anu nciar
a pro ximid ade do Reino ; 2) Deus favo rece o s que fo r am t rad icio na lment e
o primido s e exclu ído s e est á do lado deles. E le se a legra co m a recup eração
dest es in fo rt unado s (parábo las d a o velha perd ida, d a dracma perd id a e o filho
perd ido : Lc 15) ; 3) Jesu s se abo rrece co m a mesqu inhar ia do s d et ent o res do
po der em Israel, que u savam o Deus hu manizado r para ju st ificar a
desu man ização prat icada; 4) u ma le it ura aut ênt ica d a Palavr a de Deu s leva a
desco br ir a co -respo nsabilid ade hu mana na realização do Reino de Deus.
Deus é Aq uele qu e ju lga a hu man idad e int eir a e a ju st ifica pela fé. Ess a
fé que ju st ifica est á rad icalment e lig ada a Jesus Cr ist o 158. É a fé naqu ele q ue
pro met e. No sso t eó lo go fr isa o fat o de qu e o Deu s q ue Jesu s revela não é u m
Deus d ist ant e. Aquele qu e viveu da pro messa, Abraão , po de t er amizade co m
Deus 159 po rque é assim qu e E le se revelo u a Abr aão 160.
158
Cf . SE GUND O, Hi st óri a, p. 490.
159
Ide m, p. 492.
160
Ibi d. , p. 495.
161
Ibi d. , p. 574.
122
desig nado o Nazareno para u ma alt íssima missão , dot ando -o para isso de
sabedo r ia e po deres ext rao rd inár io s.
162
Ibi d. , p. 599.
123
Jo n So br ino pro põ e uma reflexão bast ant e elabo rada so bre a relação
ent re a ressurreição e a revelação de Deus. Co mo vimo s no cap ít u lo III,
part indo da est rut ura bíblica da revelação de Deus, no sso t eó lo go apro fu nda
vár io s aspect o s do co nheciment o de Deus, ent re o s quais o da d ialét ica int ra-
d ivina, que se manifest a na parcia lidade de Deu s em pro l das vít imas, em su a
lut a co nt ra o s falso s deu ses pro vo cado res de o pressão ; o da fut ur id ade d e
Deus, que ev idencia a pro fu nd id ade do mist ér io reve lado em Jesus, mist ér io
que, no ent ant o , co nt inua sendo mist ér io .
Israel co nhece seu Deu s co mo libert ado r no event o do êxo do . O que est á
em jo go nest e event o é u ma ação libert ad o ra das vít imas (Dt 5,6; E x 20,2 ; Dt
26,5-9). No deco rrer do AT, essas açõ es nas qu ais Iahweh se revela, vão se
deslo cando em d ir eção do fut uro (1 Rs 20,13.28; Ez 25,6-8 ;) at é chegar à
fo r mu lação rad ical d e Is 65,17 s. Deus vai se revelando de mane ir a cada vez
mais u niver sal, est endendo seu senho r io no t empo e no esp aço . Per manece, no
ent ant o co mo co nst ant e a “parc ialid ade” de su a ação fu ndant e e libert ado ra.
Nest a ação , revela- se t ambém a maneira “d ialét ica” e “d uélica” d e Deu s e m
lut a co nt ra o ut ras d ivind ades.
cat ego rias met afó r icas do “Deu s Maio r” e do “Deu s Meno r”, e afir ma qu e
“Deu s precisa d e t empo ” para que a h ist ó ria supere a amb igü id ade que lhe é
iner ent e, po dendo assim mo st rar-se co mo pura po sit ivid ad e.
163
Num par al el o c om J o 1 (N o pr in cí pi o er a a Pa la vr a ) e Gn 1 (No pr in cí pi o Deus cr i ou o
céu e a t erra ). Cf . SOBRIN O, A Fé , p. 132.
164
Os s ei s di s cur sos d os At os d os Ap óst ol os (2, 23s ; 3, 14s; 4, 10s; 5, 30s; 10, 39s; 13, 28. 30)
a pr esen t am um esquem a di a l ét i co a nt a gôn i co pa ra fa l ar da r essur r ei çã o de Je sus.
125
165
SOBRIN O, Op. c i t. , p. 142.
166
Pa r a Pann en ber g, o “ fut ur o” é a usen t e p or que a t eol ogi a pen sou- o a pa r t ir da fi l os ofi a
gr ega . Deus é com pr een di do a par t ir da or i gem. E st e m od o de c on h ecer é “m í t i co” e sup õe
que a ver da de já est á a dequa da m en t e c on st i t uí da na or i gem . Con sequen t em en t e, ger ou-s e
n a t eol ogi a a i n ca pa ci da de de s e p en sa r a hi stór i a . E l e a pon t a par a a possi bi l i da de d e
des en vol ver um n ovo c on cei t o d e D eus on de o “ fut ur o” é c on st i t ut i vo d o ser . Iss o
pos si bi l i t a um a r ei n t er pr et a çã o dos a t ri but os cl á ssi c os da di vi n da de. A Ressur r ei çã o d e
Jesu s é a a çã o d e D eus qu e r evel a i n equi voca m en t e o D eus d o fut ur o c om o p od er cr i a dor
c on tr a a m or t e. A con cl usã o d o a ut or é que Deus a in da nã o é. Cf . Ide m, p. 143-144.
126
Em sua reflexão , So br ino int egra algu mas co nt r ibu içõ es dessas
t eo lo g ias, co mo a idéia d a “fut ur idade de Deu s”. Po r isso , ele d iz que na
ressurreição de Jesu s, Deu s “já” se revelo u, mas “aind a não ” p lenament e. A
cruz da hist ó r ia per manece mes mo dep o is da ressurreição . Deus se aut o -
revela at ravés d e u m pro cesso e a revelação aco nt ecer á de mo do p leno no
fim. O fim não só é o t ér mino t empo ral, mas é vit ó r ia co nt ra a neg at ividade.
167
Di fer en t e do Pa n n en ber g, Ra hn er n ã o con c en tr a t udo n o fut ur o e n a esp er an ça e a fi r ma
o m i st ér i o de Deu s c om o m i st ér i o do fut ur o a bs ol ut o. Cf . Ibi d., p. 144.
168
Ibi d. , p. 146.
127
169
Qua l ser á o si gn i fi ca do dest a r ec on ci l i a çã o? N a Bí bl i a , a r econ ci l i a çã o é i n i ci a t i va de
Deus (2 C or 5, 18). Seus e fei t os l e va m , n a s pa la vr a s de Pa ul o, a “ Um a n ova cr i a çã o” (2
Cor 5, 17). O pr ópr i o m un do m a t er i al , t odo o un i ver s o “n a t err a ” e “n os c éus” (Cl 1, 20) é
r econ ci l i a do c om D eus pel o sa n gue da cr uz . A r econ ci l i a çã o é i n t im am en t e l i ga da com o
cul t o. P or ém , h á a col a bor a çã o h um an a exi gida n est e pr oc es s o. No c on t ext o l a t in o-
a m er i can o, a r ec on ci l i a çã o l e va n t a per gunt a s sobr e a quest ã o da ju st i ça e i m pl i ca t a m bém
m udan ça s soci a i s r a di ca i s, que per m i t em uma r econ ci l i a çã o en t r e os opr i m i dos e s eus
opr ess or e s.
170
BOFF, J e sus Cri st o Li be rt ador, p. 266.
128
Perant e est a realid ade, a reação de Jesu s é surpreendent e. Ele não adot a
u ma po st ura igual à d e Bar Ko chba o u de Jo ão Bat ist a. Ele co nt est a o present e
ao anu nciar u m sent ido ú lt imo , est rut ural e g lo bal, qu e alcança para alé m d e
to do o fact ível e det er minável pelo ser hu mano . O no vo em Jesu s é ant ecip ar
o fut uro e revert er o utó pico em t ó pico (Mc 1,15; Mt 3,17).
No mu ndo enco nt rado po r Jesus, havia abso lut izaçõ es (da relig ião , da
Lei et c.) que escravizavam o ser hu man o . Jesus não so ment e relat iv izo u as
leis e o cu lt o , mas encar no u u m no vo t ipo de so lidar iedad e. Co m sua
capacidad e de supo rt ar o s co nflit o s e aceit ando a vida co m t o das as
co nt rad içõ es, inc lusive a mo rt e, ele abre a po ssib ilidad e de u ma missão
apro pr iada para a AL de ho je. Tudo isso era baseado na exp er iência qu e ele
t inha do Pai.
Co ncret ament e, a missão para o s crist ãos lat ino -amer icano s que t êm a
exper iência de enco nt ro co m o Ressuscit ado, se t raduz, segu ndo Bo ff, e m
carregar a cruz e so lid ar izar- se co m aqueles que são crucificado s nest e
171
Boff ca r a ct er i z a a pr á xi s de Jesu s de r e vol uci on á ri a , por ém “n ã o n o sen t i do em oci on a l e
i deol ógi c o de r e vol uci on á ri o c om o o vi ol en t o ou o r e bel d e fr en t e à est r ut ura çã o p ol í t i co-
soci a l ” . BOFF, Op. c i t ., p. 260.
129
172
Je sus Cr i st o, “ Li ber t a dor da con s ci ên ci a opr i m i da pel o pe ca d o e p or t oda s or t e de
a l i ena ções, é Li ber t a dor da tri st e c on di çã o h um a na n a s sua s r el a çõe s pa r a com o m un do,
pa ra com o out r o e pa r a com Deus” . Ide m, p. 260.
173
SE GUN DO, Hi st óri a, p. 318.
130
Ressu scit ado , sua mensagem não t em mais limit es, o u seja, a u niver salid ad e
da missão faz part e da narração da pásco a.
A pro messa que Deu s faz a Abraão é ant erio r à “aliança” que E le faz
co m Abraão . De fat o , a aliança é rat ificada mais t arde, po r o rdem de Senho r
Deus co m a circu ncisão de Abraão e de sua família (Gn 17,1-27). Para Jua n
Lu is S egu ndo , em Abraão a fé é o uto rgada co mo po ssibilid ade a t o do ho me m
e “essa qualid ade de ag ir hu mano t ão amp lo , co mo a hu man idade, é u m
prenú ncio daq uela que Jesus Cr ist o t ornará po ssíve l ao mo rrer e
ressuscit ar” 175. Abr aão eng lo ba t o da a hu man idad e, dest ru indo a o po sição
cir cu nciso / inc ircu nciso .
174
SE GUN DO, Op. c i t. , p. 454.
175
Ide m, p. 489.
176
Cf . Ibi d., p. 587.
131
O p lano de Deus co nsist e em co nduzir a hu manid ade int eir a, que viv e
u ma só hist ó ria e t em u ma ú nica vo cação , que é so brenat ural, e o co smo s,
para a sua p lenit u de d e sent ido em Cr is to . É a revelação que po ssib ilit a à
hu man idade co nhecer exp lic it ament e a grat u idad e do do m de Deus, qu e
co nt inua ment e se insere na hist ó r ia. A graça de Deu s alicer ça a ação do
ho mem co mo co nst ruto r da hist ó r ia, co nfer indo p leno valo r à sua liberd ad e
cr iado ra e impreg nando escat o lo g icament e sua exist ência.
177
SOBRIN O, A Fé , p. 76.
178
Nã o vi den t es n em vi si on á r i os.
132
co mo o Jesu s t errest re, eles devem t amb ém curar e expu lsar de mô nio s (Mc
16,17-18) 179.
A d ispo nib ilid ad e de no ssa part e para a missão é essencial. Sem ela, a
ressurreição de Jesus per manecer ia mud a. Nas apar içõ es do Ressuscit ado , não
se t rat a só de co mpreender a realidad e do mu ndo e do ho me m, mas d e
o ferecer algo no vo ao mu ndo . É preciso anu nc iar a verdade d a ressurreição
co mo u ma bo a no va: fez-se just iça a u ma vít ima e t rat a-se de t o rnar realid ad e
est a verdade.
179
O a ut or n ã o se m ost r a de a cor do c om a s l ei t ura s que pen sa m a s a par i ções c om o
l e gi t i madoras do a post ol a do, m esm o di a n t e de t ext os que a pr esen t a m a a par i çã o d o
Ressu sci t a d o c om o just i fi ca d or a da mi ssã o (1 Cor 15, 5. 8; Gl 1, 11-24; 1 Cor 15, 8-11).
133
manda co mprar espad a (Lc 22,36), em Mat eus, co ndena seu u so (Mt 26,52).
No ser mão da mo nt anha, e le ro mp eu co m o esq uema do amigo / in imigo e
apela, não para a vingança, mas par a o perdão . Para no sso t eó lo go , o que a
hist ó r ia d e Jesu s mo st ra não é a apo lit ic idade do reino que ele anu ncia nem o
pacifismo puro , mas u m mo do d iferent e p ara co nst ru ir o reino 180.
E m t erceiro lug ar, o aut or t ira pr inc íp io s o rient ado res para a at ualidad e
da at uação de Jesus. 1) É u ma exig ência abso lut a desmascar ar a inju st iça
est rut ural co mo vio lência inst it ucio nalizada; 2) To da vio lência, mesmo a q ue
po de chegar a ser leg ít ima, t em u m po t encial desu man izant e; 3) À vio lência,
Jesus o põ e a uto pia da paz co mo pro jet o a ser realizado e co mo meio par a
realizá- lo ; 4) To da vio lência precisa sempre de r edenção . “Co mo a vio lênc ia
hist ó r ica pro vém da in ju st iça, é preciso carregá- la, o que sig nifica pô r-se do
lado de su as vít imas vio lent ad as, as maio r ias po pu lares, e carregar o dest ino
que recai so bre elas: não se red ime a vio lência sem carregá- la de a lgu ma
fo r ma” 181.
180
De fa t o, Moh a n dha s Ka ra m ch an d Gan dhi (Maha t m a Gan dh i ), o pa i da m oder na n a çã o
i n di an a, pr at i cou e st e “n ovo m od o” de c on st r ui r o r ei n o em sua l ut a nã o vi ol en t a pel a
i n depen dên ci a da Ín di a, na pr im ei ra m et a de do sé cul o XX. T oda vez qu e a p opul a çã o
c om e ç ou a r ea gi r vi ol en t a m ent e c on t ra a s ba r bá r i es que os br i t â ni cos pr a t i ca va m , Ga n dh i
fa z i a gr eve de fom e e for ça va seu p ovo a vol t a r ao ca m i nh o da n ã o vi ol ên ci a .
181
SOBRIN O, J e sus, p. 317.
134
Mais u ma vez as reflexõ es t eo ló g icas so br e est a t emát ica enco nt radas nas
o bras do s no sso s aut o res t êm caract er íst icas pró pr ias. E les mo st ram d iver so s
aspect o s do segu iment o , de aco rdo co m a perspect iva her menêut ica ado t ada
po r cada u m. No ent ant o, na t o t alid ade d as reflexõ es, po demo s d iscer nir cert a
co mp lement ar id ade ent re essas d ifer ent es perspect ivas. É po ssíve l
caract er izar o segu iment o de Jesu s na t eo lo g ia de Leo nardo Bo ff co mo
co mpro misso co m o Reino de Deu s. Juan Lu is Seg u ndo , po r sua vez, insist e
no aspect o de “aprend er a aprend er”. Este é o co nceit o que se apro xima mais
da idéia d e segu iment o em sua t eo lo g ia, u ma vez que o t ema do “seg u iment o ”
em si mesmo é au sent e em suas o bras. Jo n So br ino , part indo de seu co nt ext o
vit al d e in ju st iça, so fr iment o e mo rt e, desenvo lve u ma reflexão t eo ló g ica qu e
mo st ra co mo o s cr ist ão s de ho je repet em analo g ament e em cada épo ca o
segu iment o de Jesus.
135
182
BOFF, J e sus Cri st o Li be rt ador, p. 111.
183
Boff m ost r a est a r de pl en o a c or do c om J os eph Ra t z i n ger sobr e a di vi n i z a çã o do h om em
e h om i ni z a çã o de Deus (c om un hã o c om Deus). Cf . Ide m, p. 273.
184
E st a in t ui çã o a l ca n ça uma m ai or el uci da çã o e m sua obr a Vi da se gundo o E spí ri t o, na
qua l Boff bus ca r el er o si gn i fi ca do da vi da r eli gi osa , prin ci pa l m en t e os t r ês vot os qu e
t od o r el i gi os o fa z , c om o i n t ui t o de a pr ofun da r a ót i ca de um a n ova espi r i t ua l i da de
en ca rn a da e l i ber t a dora . BOFF, Le on a r do Vi da se gundo E spí ri t o Pet r ópol i s: V oz es, 1981.
136
E m segu ndo lug ar, a práxis deco rrent e do enco nt ro co m o Ressu scit ado
ho je na AL sig n ifica co mpreend er o mu ndo a part ir de seu fut uro já
man ifest ado em Jesus. Tal co mpreensão imp lica o reco nhec iment o das
mo d alidades da presença de Cr ist o dent ro da realid ade em t o do s o s seu s
aspect o s, ent re o s quais Bo ff ressalt a o sacrament al.
185
Ibi d. , p. 236.
186
SE GUN DO, Hi st óri a, p. 89.
137
187
Cf . GOME S, Pa ul o Rober t o Humani zados e m Cr i st o, a humani zaç ão pe ssoal e soci al na
Cri st ol ogi a de J uan Lui s Se gundo Bel o Hor i z on t e: ISI-CE S, 1996. Di sser t a çã o d o
Mest r a do, p. 103.
138
188
SE GUN DO, Hi st óri a, p. 315.
139
189
Cf . Ide m, p. 96.
190
Ibi d. , p. 96.
140
Para Vera Ivan ise Bo mbo nat to , que analisa o “segu iment o ” nas o bras de
Jo n So br ino , a práxis enquant o segu iment o faz co m q ue o segu ido r repro duza
a est rut ura fu nd ament al da v ida d e Jesus, hist o r icizando -a de aco rdo co m o
co nt ext o em qu e vive e seg u ndo a ló g ica viv id a po r Jesus, que fo i a ló g ica d a
encar nação , missão , cruz e ressurreição 191.
Co mo pr ime iro passo no pro cesso de seg u iment o , a encar nação é par cial,
exclud ent e e co nflit iva. S egu ir Jesu s é o pt ar pela ex igência fu ndament al d a
so lidar iedad e. A encar nação não é so ment e o pção , mas t ambém co nver são e
no vo mo do de ver o mu ndo e avaliá- lo . Co ncret ament e ist o sig nifica ado t ar
u ma po st ura ét ica qu e se co nst it u i para a hu man idade em evangelho v ivo , bo a-
no va, do m e graça recebido s inesp erad a e imer ecida ment e. Mesmo sendo
parcial, a encar nação , em sua t ranscendência e hist o r icid ade, est á em sint o nia
co m a par cialid ade libert ado ra do Deu s q ue as E scr it uras r evela m. E la não se
o põ e à u niversalidade e não é red ut o ra. A encar nação parcia l na hist ó r ia
exclu i, po r sua nat ureza, a r iqueza e desco bre a caract er íst ica evang élica d a
alt er nat iva (Mt 6,24). Est a encar nação é co nflit iva po rque seu in imigo est á
at ivo . Encar nar- se co mo o prime iro passo no pro cesso de segu iment o na AL é,
segu ndo Bo mbo nat to, “enfr ent ar a exc lusão e o co nflit o , po is exist em p esso as
e est rut uras, so bret udo eco nô micas e p o lít icas, milit ares e relig io sas, que
t iranizam e o pr ime m o s po bres” 192.
191
Cf . BOM BONAT T O, V er a Iva n i se. Se gui me nto de J e sus uma abordage m se gundo a
Cri st ol ogi a de J on Sobri no. Sã o Pa ul o: Pa ul in a s,2002, p. 297-345.
192
Ide m, p. 304.
142
O escândalo da cru z o cupa u m lug ar especial no esqu ema da est rut ura
fu nd ament al da vida de Jesu s. O ca minho de segu iment o de Jesus passa pelo
escândalo da cruz. Co mo nó s vimo s no cap ít u lo III, as t eo rias d e Jürg en
Mo lt mann e Ig nacio E llacur ía in fluenciar am a co mpreensão que So br ino t e m
do escânda lo da cruz e isso apar ece na análise q ue ele faz do s element o s que
exp lica m a mo rt e de Jesu s. Para o t eó lo go salvado renho , est amo s per ant e o
mist ér io de Deus, po is nenhu m mo d elo nem exp licação sat isfazem à
int eligência hu mana. Uma d as at it udes básicas perant e t al mist ér io , é a de
per manecer ao pé da cruz e descer d ela o s crucificado s d a hist ó r ia. So br ino d á
u ma co nt r ibu ição t eo ló g ica o r ig inal em sua reflexão cr ist o ló g ica so bre o s
“po vo s cruc ificado s”. No co nt ext o lat ino -amer icano , a cr ist o lo g ização do
po vo crucificado passa p elo caminho da co incid ência do po vo crucificado e
do Cr ist o crucificado co m a fig ura do ser vo de Iahweh. Os po vo s de AL
repro duzem o s t raço s fu ndament ais do ser vo de Iahweh: “São po vo s se m
ro sto, pr ivado s de t o da ju st iça, t endo seus d ireit o s fu nd ament ais vio lado s,
co mo o servo de Iahweh, (eles) t ent am imp lant ar a just iça, o dir eit o e lut a m
pela libert ação ; sabem que fo r am esco lh ido s para que a salvação passe po r
eles e int erpret am su a pró pr ia o pressão co mo caminho para a libert ação ” 194.
No caminho do segu iment o , é impo rt ant e det er-no s no escândalo da cruz,
po rque a hist ó ria co nt inua pro duzindo cruzes.
193
Pa ra um a en um era çã o da s con t r ovér si a s: cf. a ci m a ca pí t ul o III.
194
BOM BON AT T O, Op. c it ., p. 329.
143
Ressu scit ado po de gerar no vid ades em no sso s d ias t ambém? Vejamo s as
leit uras q ue Bo ff, Segu ndo e So br ino fazem dest a exp er iência desde a
Amér ica Lat ina.
195
BOFF, A R e ssurre i ç ão, p. 52-53.
145
196
BOFF, Pai x ão, p. 18.
197
SE GUN DO, Hi st óri a, p. 132.
198
“S om en t e, n o fi n a l , quan do o c om pa nh ei r o de vi a gem “pa r t ir o pã o” , com o J esu s o fez
t an t a s vez es di a n t e del es, é que vã o r ec on h ecê-l o” Ide m., p. 314.
199
Cf . Ibi d., p. 320.
146
200
“d e um ba n h o pur i fi ca do r eduz i do à m í n im a expr essã o d e um a s g ot a s d e á gua
der ra m a da s sobr e a ca be ça do ca t e cúm en o” Ibi d. , p. 529.
201
SOBRIN O, A fé , p. 60.
147
necessár io p ergu nt ar: o que pod emo s cel ebra r na hi stóri a? Mesmo na t r ist e
realidad e lat ino -amer icana já exist em mo t ivo s de celebração .
Po rém, perant e a t rág ica sit uação lat ino -amer icana, So br ino t em u ma
palavra d e caut ela: “... u ma prepo nd erância ló g ica dad a ao cu lt o , co mo mo do
de acesso ao Crist o present e, d iminu i a impo rt ância d a exp ect at iva (práxica)
do Crist o que há de vir” 202.
202
SOBRIN O, Cri st ol ogi a, p. 277.
148
no sso trabalho fo i ver ificar se essa práxis resu lt o u da exper iência d e enco nt ro
co m o Ressusc it ado . Na análise q ue fizemo s, id ent ificamo s a pro fu nd a
mud ança na práxis eclesial, análo ga à que aco nt eceu co m o s d iscípu lo s depo is
da ressurreição de Jesus. Ret o mamo s ago ra br evement e o resu lt ado de no sso
t rabalho .
Jo n So br ino p ensa po r sua vez o segu iment o co mo “repro duzir a est rut ura
fu nd ament al da vida de Jesus na at ualid ad e”.
Conclusão.
As narraçõ es das apar içõ es t êm car act er íst icas pró pr ias: 1) são
aco nt eciment o s que impact aram defin it iva ment e a vid a do s d iscíp u lo s; 2) não
são narraçõ es do s aco nt eciment o s, mas t ext o s que exig em reflexão e
int erpret ação , que precisa m ser decifr ado s; 3) o ver bo ophte acent ua a
in ic iat iva que vem de fo ra.
A p luralid ade d as t rad içõ es do s t ext o s do NT em t o da sua d iver sid ad e
enfat iza: 1) a co nt inu idade ent re o Crucificado e o Ressuscit ado ; 2) o qu e
aco nt eceu fo i p ara cu mpr ir as Escr it ur as; 3) a presença rea l do Senho r
Ressu scit ado ; 4) a impo rt ância do mo mento lit úrg ico e da prát ica sacrament a l
co mo lugares pr iv ileg iado s de enco nt ro co m o Ressu scit ado ; 5) a missão que
surge dest e enco nt ro .
A hu manid ade g u iada pelo Esp ír it o passo u po r vár ias et apas e ago ra
caminha para o “fim” d a reve lação p lena do s “filho s d e Deus”. Aqu i surge a
quest ão do valo r da cr iação e Pau lo co nt rar ia o AT, afir mando que a cr iação
fo i su bmet ida à inut ilid ade. Cabe ao s seres hu mano s, at uando co mo filho s d e
Deus “cr iado res”, co lo carem a cr iação int eir a ao ser viço do amo r frat er no
(ágape) o u do “Re ino de Deus”, na ling uagem d e Jesu s.
Fina lment e, na d iver sidad e das per spect iv as her menêut icas mo st radas po r
no sso s aut o res, vimo s: 1) o aspect o inesgo t ável do mist ér io d e Deus; 2) a
po ssib ilidade de no vas int erpret açõ es dest e mist ér io dent ro do co nt ext o
hist ó r ico de cada g eração ; 3) a pr áxis cr ist ã co mo ét ica t ransfo r mado ra, qu e
surge d e u ma co nsciência da cr iação su bmet ida à inut ilid ade, já red imid a,
embo ra a inda não p lenament e; 4) na pr esença do myst eriu m iniq uitati s, “o
filho de Deu s” exer cit a sua cr iat iv idad e co m pro jet o s hist ó r ico s de libert ação
155
Bibliografia.
1. Obras Principais
3. Artigos