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Volume 2 - No 2- Julho/Dezembro de 2012

Estudo da percepção de risco associado a deslizamentos no bairro


do Maceió, Niterói, RJ

Marcos Barreto de Mendonça

Escola Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro

mbm@poli.ufrj.br

Mariana Talita Gomes Pinheiro

Escola Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil

Resumo

A eficiência das ações preventivas para a redução de desastres associados a


deslizamentos depende fortemente da participação da população moradora na
gestão dos mesmos. Para buscar a aproximação entre gestores públicos e a
comunidade diretamente afetada, visando orientar e executar ações preventivas, é
necessário se conhecer previamente a percepção de risco dos moradores. A
percepção de risco depende da vivência e dos valores culturais do sujeito que a
define. Por sua vez, a análise técnica do problema ignora essa dimensão social do
risco. O presente artigo discorre sobre a experiência no levantamento da percepção
de risco dos moradores de uma área caracterizada pela elevada susceptibilidade a
deslizamentos e ocupação desordenada. Os resultados indicam que, apesar dos
moradores terem consciência da significativa susceptibilidade da comunidade a
deslizamentos, é feita uma relativização do risco frente a outras ameaças e
oportunidades. Constata-se também um distanciamento social entre agentes
públicos e moradores.

Palavras-Chave: Percepção de Risco, Deslizamentos, Desastres, Gestão


Participativa.

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Study of Study of risk perception associated with landslides in the


neighborhood of Maceió, Niterói, RJ

Abstract

The effectiveness of preventive actions to landslides disaster reduction depends


heavily on the participation of the population. In order to make public managers and
directly affected population work together to plan and implement preventive actions, it
is necessary to know in advance the landslide risk perception of dwellers. The risk
perception depends on the personal experience and cultural values. The technical
point of view about landslide risk ignores its social dimension. This paper presents an
experience in assessing landslide risk perception of dwellers that lives in a high
susceptible site to mass movements. The results indicate that although the residents
are aware of significant susceptibility to landslides community, they balance
landslides risk against other kind of risks, considering different threats they are
exposed. It was also verified a social distance between public managers and
dwellers.

Keywords: Risk Perception , Landslides , Disasters, Participatory Management.

Introdução

Os desastres provocados por deslizamentos no Brasil vêm se disseminando com o


aumento de sua quantidade, magnitude e extensão territorial afetada. Como
consequência, têm-se perdas materiais e de vidas humanas e graves danos sociais
devido a desabrigados e desalojados. A diretriz comumente adotada para a redução
desses desastres consiste basicamente na execução de obras de engenharia para a
recuperação das encostas atingidas ou para a prevenção de novos eventos. Em
função dos elevados custos envolvidos nesse tipo de ação sem frear o
recrudescimento dos desastres evidencia-se uma deficiência na gestão do sistema
de controle dos mesmos.

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Feições geológico-geotécnicas são importantes condicionantes para a ocorrência


dos deslizamentos. Entretanto a forma desordenada de uso e ocupação do solo
aumenta consideravelmente a susceptibilidade do terreno a deslizamentos. A
ocupação desordenada de áreas impróprias resulta de uma organização social
desigual que faz com que grupos mal assistidos de bens urbanos e serviços sociais
básicos (transporte, saúde, educação, emprego) migrem para regiões onde essa
deficiência é menor, mesmo sob a ameaça de precárias condições de habitabilidade.

Na situação atual esse quadro está distante de ser revertido. Ainda persistirão por
vários anos condições impulsionadoras de ocupações de áreas tecnicamente
impróprias a habitação.

O problema dos desastres tem caráter, portanto, interdisciplinar, envolvendo


aspectos técnicos (estabilidade das encostas; ações preventivas), sociais (processo
de ocupação; impacto das consequências e ações preventivas) e de políticas
públicas (gestão dos desastres e proteção social).

Para a mitigação do problema, urge inicialmente a aproximação dos gestores


públicos a esses grupos menos favorecidos da sociedade que habitam áreas de alta
susceptibilidade a deslizamentos e, a partir daí, o engajamento dos mesmos em
ações preventivas. O planejamento e execução das ações mitigadoras dos
desastres (obras, realocação de moradores, sistema de alarme e atividades
educativas) devem ser precedidos da compreensão pelos órgãos executores e saber
perito de como a população moradora se relaciona com esse tipo de desastre, como
constrói sua relação com o espaço a partir de suas trajetórias e demandas
específicas. Sem esse conhecimento as ações correm o risco de não terem
sucesso.

Ressalta-se, portanto, que qualquer trabalho nessa linha deve partir do


conhecimento da percepção de risco por parte da população afetada. Devem ser
clareadas as formas de ver e lidar com o problema por ambas as partes da
sociedade, aquela mais favorecida que garante a sobrevivência de forma satisfatória
e a constituída pelos mais vulneráveis.

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Não é de se esperar um consenso entre o grau de risco percebido pelos diferentes


atores sociais envolvidos, principalmente técnicos e moradores. Sem a compreensão
dessas diferenças para a busca de um consenso a mobilização da sociedade é
dificultada.

O presente trabalho apresenta uma discussão sobre o tema e a experimentação de


uma metodologia desenvolvida para levantamento da percepção de risco de uma
comunidade do bairro do Maceió, Niterói (área metropolitana do estado do Rio de
Janeiro), bastante afetada por desastres associados a deslizamentos.

Percepção do Risco

Segundo o glossário de defesa civil sobre estudos de riscos e medicina de desastres


da Secretaria Nacional de Defesa Civil (Castro, 2012), risco é definido como: “1.
Medida de dano potencial ou prejuízo econômico expressa em termos de
probabilidade estatística de ocorrência e de intensidade ou grandeza das
consequências previsíveis. 2. Probabilidade de ocorrência de um acidente ou evento
adverso, relacionado com a intensidade dos danos ou perdas, resultantes dos
mesmos.” O Comitê Técnico de Escorregamentos e Encostas Artificiais (JTC-1), que
faz parte das associações técnico-científicas internacionais mais importantes nessa
área temática (ISSMGE, IAEG e ISRM), define risco como “uma medida da
probabilidade e severidade de um efeito adverso à saúde, propriedade ou meio
ambiente”, sendo “frequentemente estimado pelo produto da probabilidade de um
fenômeno de uma dada magnitude multiplicado por suas consequências” (Fell et al,
2008).

Observa-se, portanto, um consenso no meio técnico para conceituar


qualitativamente o risco segundo a Equação 1.

R=PxC (1)

onde

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R: risco;

P: probabilidade de ocorrer um acidente associado a um determinado perigo ou


ameaça;

C: potenciais consequências danosas do acidente.

Esse tipo de conceito de risco definido pelo meio técnico apresenta uma perspectiva
objetivista radical (Lieber e Lieber, 2002). O grau de risco não faz nenhum sentido
para um determinado sujeito a menos que o mesmo faça parte da população do
denominador do risco. Qualquer sujeito poderia se tornar um “especialista”
presumindo o que deve ser feito ou não deve ser feito, resultando, em seu conjunto,
numa “aceitação cultural”. Risco pressupõe conceitos atados aos entendimentos que
incluem os aspectos da cultura e experiências ou vivências empíricas do passado.
Risco, portanto, não pode ser tratado a partir de uma visão técnica absoluta e
objetiva, mas sim como objeto de construção social por grupos sociais diferenciados.
O risco pode ser estabelecido sob argumentos objetivos, mas sua percepção e
aceitação estão sujeitas a aspectos culturais e pessoais dos sujeitos sob “risco” e
não dos analistas técnicos externos (Lieber e Lieber, 2002).

Em função disso, evidencia-se a diferença entre a percepção de técnicos e leigos,


entendendo que os sujeitos têm percepções diferentes de um mesmo perigo a que
estão expostos (Vargas, 2006).

Segundo March (1992) apud Lieber e Lieber (2002), em geral, as pessoas se


expõem mais ao “risco” quando as alternativas a essa exposição são ruins a partir
de um conhecimento acumulado.

“Risco” está associado a algo adverso sujeito a incerteza. Mas essa “incerteza”
condiciona tanto o adverso como também o seu oposto, o “favorável”, que, por sua
vez, indica uma “oportunidade” para o sujeito (Lieber e Lieber, 2002). Portanto, se
existe “risco”, existe “oportunidade” (O), que poderia ser definida como:

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O = (1-P) x C (2)

C, neste caso, consiste nas consequências desfavoráveis que seriam evitadas caso
não ocorresse o evento adverso. C pode ser visto também como a manutenção das
condições consideradas propícias pelo morador.

Desta forma fica claro que o que é visto como “risco” para uns pode ser ressaltado
como “oportunidade” para outros. Aplicando-se ao tema envolvido no presente
trabalho, cabe, então, a pergunta: a ocupação de encostas com alta susceptibilidade
a deslizamentos é resultado da “ignorância” ou da percepção de uma
“oportunidade”?

Uma das principais ferramentas para a redução de desastres é a participação da


população afetada na gestão dos mesmos através de ações preventivas, como
evacuação emergencial, atividades educativas e redução das ações antrópicas
nocivas à estabilidade das encostas. Entretanto, qualquer ação com a participação
da população depende do grau de risco percebido pelos moradores em relação à
ameaça que os deslizamentos especificamente representam. Para tal, estudos de
percepção de riscos são importantes como meio de entendimento de motivações de
diferentes grupos populacionais para o enfrentamento de situações potencialmente
danosas e entender os contrapontos entre técnicos e leigos (Peres, 2002).

Pesquisas sobre percepção de risco associados a desastres naturais apresentadas,


por exemplo, por Finlay e Fell (1997), Lucena (2006) e Ho et al, (2008), têm
mostrado diferentes metodologias para tal levantamento, ressaltando sua
importância para o planejamento da redução de desastres.

Metodologia do Levantamento

O levantamento da percepção de risco realizado na presente pesquisa foi feito


através de entrevistas com a população moradora de uma determinada área de
estudo e da análise de seus resultados. As entrevistas foram realizadas pelo método

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semiestruturado, aplicando-se questionário com perguntas fechadas e abertas em


que o entrevistado tem a possibilidade de discorrer sobre o tema (Minayo et al,
2012).

Foi elaborado um questionário para o presente trabalho, cujas perguntas visavam


levantar crenças, opiniões e condutas da população sobre deslizamentos de terra,
suas causas, a influência das ações antrópicas e a hierarquização desse tipo de
ameaça frente a outras às quais a população está submetida. Procurou-se saber
também sobre quais pessoas/instituições que os atendem na situação de
emergência e as que eles julgam ser responsáveis pelo problema. A Tabela 1
apresenta parte das questões realizadas, cujas respostas são discutidas no presente
trabalho.

Tabela 1: Parte do questionário aplicado para levantamento da percepção de


risco.

Item Questão
1 Qual é o principal problema que afeta
sua vida e de sua família?
2 O que você mais gosta e o que te
incomoda no seu bairro?
3 Quando começa a chover forte, qual a
sua principal preocupação?
4 Você já foi afetado ou conhece
alguém próximo que foi afetado por
algum desastre provocado por
deslizamento?
5 Quem deveria ser o responsável
pelos prejuízos provocados por
deslizamentos de terra?
6 O que você acha que o homem faz
que possa causar o deslizamento de
terra? Coloque em ordem de
importância: jogar lixo e entulho na
encosta; fazer cortes muito inclinados
para construção de casas; água e
esgoto lançados no terreno; retirada
de árvores.
7 Quem ajuda mais a comunidade em
um momento da necessidade dos
moradores?

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Os questionários foram aplicados por uma equipe de campo, sendo que o morador
não era informado sobre os objetivos específicos da entrevista para evitar uma
possível indução das respostas.

Como se trata de uma pesquisa da realidade social do ser humano, apesar de se


basear em indicadores quantitativos das frequências das respostas, as análises
desses valores foram feitas de forma qualitativa.

O levantamento foi realizado numa comunidade caracterizada por ser um


assentamento precário severamente afetado por deslizamentos. O questionário foi
aplicado entre novembro de 2011 e abril de 2012.

Área de Estudo
A comunidade, objeto de estudo do presente trabalho, se situa na região central do
Município de Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro. A área envolve
aproximadamente 700.000 m2, sendo o relevo em forma de vale. O bairro, com uma
população de aproximadamente de 4.500 habitantes, tem uma situação precária no
que diz respeito à infraestrutura básica. Quanto ao saneamento, 71% dos domicílios
têm o abastecimento de água feito através de poços ou nascentes, 53% fazem uso
da fossa séptica e é frequente o lançamento de lixo e entulho diretamente sobre o
terreno.
A área está inserida no contexto geomorfológico denominado Maciços Costeiros
com seus níveis regulares e pequenos vales de fundo aluvial, com as encostas
meridionais mais abruptas e pontões rochosos. São predominantes amplitudes
topográficas superiores a 300 m e declividades muito elevadas, com ocorrência de
depósitos de colúvio e tálus.

A ocupação do solo, principalmente nas encostas do bairro se dá de forma bastante


desordenada (Figura 1), sendo facilmente observadas ações de desmatamento,
grande quantidade cortes e aterros para a implantação de moradias e vias
carroçáveis e de pedestres, lançamentos de esgotos e detritos diretamente sobre o
terreno.

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Baseando-se nas características geológico-geotécnicas naturais e nas ações


antrópicas observadas na área, foram identificados vários setores de elevada
susceptibilidade a movimentos de massa (Mendonça, 2013).

Como consequência das características geotécnicas e geomorfológicas


desfavoráveis associadas à forma de ocupação do solo, têm-se registrado
significativos eventos destrutivos de deslizamentos de terra. Destacam-se os
eventos de abril de 2010 (Figura 1) quando, após um período de intensa
pluviosidade, uma grande quantidade de movimentos de massa provocou mortes,
perdas materiais e elevados danos sociais devido a desabrigados e desalojados. Os
principais tipos de movimentos de massa da área são deslizamentos de terra e
movimentos de corpos rochosos.

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Figura 1: Vista de encostas da área de estudo (bairro do Maceió, Niterói, RJ),


incluindo cicatrizes de movimento de massa ocorridas em abril de 2010.

Resultados

O questionário (Tabela 1) foi aplicado a um total de 50 moradores. Os resultados, em


termos de frequência de respostas, estão apresentados nas tabelas 2 a 9. Os
entrevistados tiveram liberdade de dar qualquer resposta sem nenhuma opção
fornecida pelo entrevistador, com exceção das questões 5, 6 e 7.

Tabela 2: Respostas a questão 1.


Qual é o principal problema que
Frequência
afeta sua vida e de sua família?
Saúde 22%
Problemas financeiros 18%
Nenhum 12%
Falta de água e esgoto 10%
Violência 8%
Deslizamento de terra 8%
Problemas familiares 6%
Outros 6%
Falta de estrada / acesso 4%
Falta de emprego 4%
Falta de luz 2%
Falta de transporte 0%

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Tabela 3: Respostas a questão 2 – 1ª. parte.


O que você mais gosta no bairro? frequência
Tranquilidade 64%
Vizinhança 13%
Natureza (vegetação, vista etc) 6%
Esporte 2%
Não conseguiu especificar 9%
Outros 6%

Tabela 4: Respostas a questão 2 – 2ª. parte.


O que você te incomoda no Frequência entre
bairro?- Citar 3 itens. os três itens.
Saneamento Básico 26%
Falta de transporte 20%
Falta de luz 18%
Vizinhos 12%
Limpeza do bairro. 10%
Deslizamento 10%
Estradas precárias 8%
Falta de médicos 6%
Falta de acessos 4%
Dengue 2%
Localização 2%
Falta de escola 2%
Violência 2%

Tabela 5. Respostas a questão 3.


Quando começa a chover forte,
qual a sua principal Frequência
preocupação?.
Problemas relacionados com o
deslizamento de terra 70%
Nenhuma 12%
Problemas com os
acessos/estradas 8%
Segurança dos Vizinhos 6%
Outros 4%

Tabela 6. Respostas a questão 4.


Você já foi afetado ou conhece
alguém próximo que foi afetado
Frequência
por algum desastre provocado
por deslizamento?
Sim 92%
Não 8%

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Tabela 7. Respostas a questão 5.


Quem deveria ser o responsável
pelos prejuízos provocados por Frequência
deslizamentos de terra?
Órgãos públicos 84%
Moradores 14%
Outros 2%

Tabela 8. Respostas a questão 6.


O que você acha que o Frequência da
homem faz que pode posição da resposta
causar o deslizamento
de terra? Colocar em 1° 2° 3° 4°
ordem de importância.
Jogar lixo e entulho na 43 26 17 13
encosta % % % %
Fazer cortes muito
inclinados para 15 26 41 17
construção de casas % % % %
Lançar água e esgoto 28 28 20 24
no terreno % % % %
13 20 22 46
Retirar árvores % % % %

Tabela 9. Respostas a questão 7.

Quem ajuda mais a comunidade


em um momento da necessidade Frequência
dos moradores?
Os próprios moradores 78%
Ninguém 10%
Defesa Civil / Bombeiros 8%
Prefeitura 2%
Líderes comunitários 2%
Comerciantes 0%
Polícia 0%
Pessoal do posto de saúde 0%

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Análise dos Resultados

As respostas indicam que para a população local, mesmo tendo vivência e memória
de desastres provocados deslizamentos de terra (Tabela 6: 92% vivenciaram um
desastre; Tabela 5: 70% se preocupam com deslizamentos quando chove), o perigo
relacionado a esses eventos tem pouca importância frente a outras ameaças
(tabelas 2 e 4). Os deslizamentos são citados como algo que incomoda no bairro por
somente 10% da população entrevistada, percentual abaixo daqueles referentes aos
problemas associados a saneamento básico, transporte, luz e vizinhos e empatado
com limpeza pública (Tabela 4). Quando o morador foi questionado sobre o principal
problema em sua vida (Tabela 6), o problema do deslizamento só é mencionado por
8%, aparecendo em 5º lugar empatado com a violência. Esses resultados indicam
que problemas que são percebidos como mais relevantes pelos moradores são
aqueles que os afetam cotidianamente. Entretanto, quando é focado o período de
chuvas (Tabela 5), os deslizamentos tornam-se os mais evidentes. Observa-se,
assim, a importância da frequência, além da magnitude das consequências do
problema, na percepção dos riscos.

Isso significa, portanto, que os moradores não negam o risco associado ao


deslizamento (tabelas 5 e 6), mas este é relativizado frente a outros problemas.

A “tranquilidade” citada por 64% dos moradores como o aspecto que mais gostam no
bairro (Tabela 3) indica que morar na comunidade significa para os moradores locais
uma “oportunidade” (vide Eq. 2), apesar dos “incômodos” (Tabela 4) e seus riscos
associados (Eq. 1), conforme observado em estudos de Lieber e Lieber (2002) e
Vargas (2009).

Constata-se também o sentimento dos moradores de desassistência pelos órgãos


públicos, posto que 90% não contam com estes numa situação de emergência na
comunidade (Tabela 9), o que contribui para que a responsabilidade pelos danos
provocados pelos deslizamentos seja imputada aos mesmos (Tabela 7).

Quanto às ações antrópicas que contribuem para deslizamentos de terra (Tabela 8),
os moradores dão mais importância ao lançamento de lixo (43% indicaram essa

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ação em 1º lugar) e ao lançamento de água e esgoto diretamente sobre o terreno


sem dispositivos adequados (28%). Por outro lado, a retirada de árvores foi a ação
mais citada em último lugar, ou seja, a ela foi atribuída uma menor importância pela
maioria dos habitantes da região.

Conclusões

Ações para redução de riscos definidas sob o ponto de vista puramente técnico não
são suficientes para a redução satisfatória dos desastres associados a
deslizamentos, posto que, para tal, é necessária a participação da população nas
ações preventivas.

O ponto de partida da mobilização social para se ter a participação efetiva da


população nas ações de redução dos desastres deve ser o conhecimento da
percepção dos riscos e de seus fatores por essa população. Esse conhecimento
permite saber como a população se relaciona com o risco e, daí, planejar uma
política pública mais eficiente para a redução de desastres.

A pesquisa da percepção de riscos realizada no presente trabalho indicou que


apesar da população da área de estudo não negar a existência do risco associado a
deslizamentos na comunidade, o grau de risco é relativizado em função de outras
ameaças existentes na comunidade e das oportunidades oferecidas pelo local de
moradia. Somente 10% dos entrevistados citou o deslizamento como algo que mais
incomoda no bairro. Conclui-se que a população percebe que a “incerteza” que
condiciona o adverso (nesse caso, os deslizamentos) também condiciona o seu
oposto, o “favorável” (ex: tranquilidade do bairro) e que o balanço de ambas se
traduz nessa relativização do risco.

Destaca-se também o sentimento, por parte dos moradores, de um distanciamento


entre os mesmos e os gestores públicos, posto que quase a totalidade dos
entrevistados não contam com órgãos públicos numa situação de emergência.

Observa-se, ainda, que importantes ações antrópicas para a ocorrência de


deslizamentos (remoção da vegetação e cortes no terreno) recebem pouca atenção

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dos moradores.

Essas conclusões auxiliam compreender a distância entre os pontos de vista técnico


e dos moradores e, assim, orientar atividades socioeducativas e reiterar a
necessidade de “aproximação” dos gestores públicos na direção dos moradores da
comunidade visando uma gestão participativa nas ações preventivas de desastres.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo a Pesquisa do


Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) pelo apoio a atividades desenvolvidas neste
trabalho.

Referências

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Sobre os Autores

Marcos Barreto de Mendonça

Possui graduação em Engenharia Civil pela Universidade do


Estado do Rio de Janeiro (1987), mestrado (1990) e
doutorado (2000) em Engenharia Civil pela
COPPE/Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
ambos na área de Geotecnia. É Professor Adjunto do Setor
de Mecânica dos Solos do Departamento de Construção Civil
da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ).

Mariana Talita Gomes Pinheiro

Graduanda de Engenharia Civil pela Universidade Federal do


Rio de Janeiro. Atua em pesquisas nas áreas de Engenharia
Geotécnica e Gestão de Risco em Empreendimentos de
Energia. e-mail: marianatalita@poli.ufrj.br

o
Revista Comunicação e Educação Ambiental - ISSN: 1982-6389 - Volume 2 - N 2- Julho/Dezembro
de 2012. Submetido em: 2/5/2012 e aceito para publicação em 23/6/2012.

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