BRASILEIRA
Thiago de Melo Barbosa (UNICAMP)1
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Apesar de publicado no Brasil apenas em 2002, o texto provém de uma conferência dada por Haroldo de
Campos na Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM) em 1991, e foi originalmente
publicado em espanhol com o título De la poesía concreta a Galaxias y Finismundo: cuarenta años de
actividad poética en Brasil no livro Estudios Brasileños, de 1994, organizado por Horácio Costa.
grifados, ressoam os pressupostos chaves de “Poesia e Modernidade...”, ou seja, assim
como no caso da contracapa de A Educação dos Cinco Sentidos, Haroldo novamente lê
sua produção como exemplar daquilo que defendeu no ensaio de 1985. Deste modo, tal
qual concluiu Siscar sobre a contracapa, também podemos concluir que as leituras
haroldianas dos referidos poemas funcionam como indícios de um projeto em torno do
pós-utópico.
Encerrando essa ideia de projeto (coletivo ou não?), e mesmo a título de
curiosidade, é interessante notar como o poema “Pós-tudo”3 (1984), de Augusto de
Campos, cujos versos, se lidos de modo tradicional, são “Quis/ Mudar Tudo/ Mudei
Tudo/ Agorapóstudo/ Extudo/ Mudo”, parece também ecoar os sentidos gerais da pós-
utopia haroldiana. Ante tal convergência de ideias, é possível especular que o poema de
Augusto não só revela um sentido de um “trabalho em grupo”, levando-se em conta a
relação dos irmãos Campos, como, com a sua recepção polêmica (vide o embate com o
crítico Roberto Schwarz), (re)encena os embates ideológicos típicos dos movimentos de
vanguarda.
Ecos pós-utópicos em duas antologias de poesia contemporânea
Não só na obra do próprio Haroldo podemos encontrar ecos de sua tese acerca do
ethos da poesia contemporânea brasileira. No parágrafo anterior já foi apontada a ideia
de pós-utopia reverberando no “Pós-tudo” de Augusto de Campos, porém, mais que
isso, as ressonâncias que de fato revelam toda expansão da leitura haroldiana
encontram-se, logicamente, em textos mais desligados da atuação do autor. Partindo
deste princípio é que o presente trabalho irá verificar de que modo o “pós-utópico”
aparece no discurso crítico dos organizadores de duas antologias de poesia
contemporânea: Esses Poetas: uma antologia dos anos 90 e Na Virada do Século:
poesia de invenção no Brasil.
Comentando rapidamente os aspectos gerais das obras: Esses Poetas, publicada
pela editora Aeroplano, em 1998, foi organizada por Heloísa Buarque de Hollanda,
possui 22 poetas selecionados e 318 páginas. Na Virada do Século, publicada em 2002
pela editora Landy, foi organizada por Frederico Barbosa e Claudio Daniel, possui 46
poetas selecionas e 348 páginas. Ambos os livros contam com estudos introdutórios nos
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O poema carrega aspectos visuais que podem ser observados pela sua versão digital publicada no site do
autor no seguinte endereço: http://www2.uol.com.br/augustodecampos/07_03.htm
quais seus organizadores expõem não só os critérios utilizados para a construção das
antologias, como também buscam delinear os traços gerais do momento poético
antologiado.
Tomando por base os estudos introdutórios, é possível afirmar que os antologistas
estão imbuídos do afã de responder a questão: “que geração é essa?”. Para Heloísa
Buarque de Hollanda, a resposta passa por critérios sócio-culturais, dos quais ela irá
destacar as crises no mercado financeiro, a queda do Muro de Berlim, a questão da
AIDs, da globalização, o boom de novas (e pequenas) editoras etc., tudo isso sem deixar
de traçar um perfil muito preciso daquele que ela acredita ser o poeta contemporâneo,
isto é, “um profissional culto, que preza a crítica, tem formação superior e que atua,
com desenvoltura, no jornalismo e no ensaio acadêmico” (HOLLANDA, 2001, p. 10-
11). Em viés de certo modo oposto, Claudio Daniel4, que assina o texto “Uma escritura
na zona de sombra” que serve como prefácio à Na Virada do Século, pouco se ocupa em
dar um panorama sócio-cultural à geração que antologia, e logo investe em lhe traçar
um perfil estritamente literário, afirmando tratar-se de uma geração leitora de poetas
herméticos (Lezama Lima, Paul Celan, Francis Ponge, Robert Creeley) que parte da
crise do verso de Mallarmé, dialoga com o modernismo (especialmente o de João
Cabral e Murilo Mendes), mas não recusa a herança concreta, marginal e tropicalista.
Além das expostas acima, muitas outras são as diferenças entre as antologias,
porém analisá-las detalhadamente exigiria não só um trabalho de maior fôlego como,
também, fugiria ao que aqui propomos. Diante disso, a opção pelo didatismo
esquemático do quadro abaixo pode ser útil, pelo menos, para apontar as diferenças
mais evidentes entre as obras:
Principais Diferenças
Esses Poetas Na Virada do Século
1. Antologista: crítica universitária 1. Antologistas: poetas da geração
2. Afirma afinidades eletivas 2. Nega afinidades eletivas
3. Vertente sócio-antropológica 3. Vertente exclusivamente literária
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Além do prefácio de Caludio Daniel, a antologia também conta com uma introdução de Frederico
Barbosa, porém como esta se resume a um pequeno texto de apresentação de aspectos gerais do livro, não
há necessidade de ser abordada no presente trabalho.
4. Visão mais contextual 4. Visão mais intrínseca
5. Poesia marginal como paralelo 5. Poesia concreta como paralelo
Referências
_____. A Educação dos Cinco Sentidos. São Paulo: Editora Brasiliense, 1985.
HOLLANDA, Heloísa Buarque de (Org.). Esses Poetas: uma antologia dos anos 90.
Rio de Janeiro: Aeroplano, 2001.
SISCAR, Marcos. Haroldo de Campos por Marcos Siscar (Ciranda de Poesia). Rio de
Janeiro: EdUERJ, 2015.