Márcia Amara! Montezuma absolutamente particular. Todo pintarroxo, ao contrário, repete o
mesmo comportamento de exibir o peito vermelho ao se deparar com um semelhante, como maneira de demarcar seu território. “O Foi-se o tempo em que a clínica da psicanálise se opunha à vermelho tem aqui uma função imaginária, da ordem das relações de clínica da psiquiatria. O fato é que praticamos e precisamos compreensão”. das duas, como recursos para minorar o sofrimento das Tentamos reduzir dois discursos essencialmente diferentes, se não pessoas que nos procuram. O próprio Freud dizia que: opostos, a paradigmas que chamaremos respectivamente de clínica do “O que se opõe à psicanálise não é a psiquiatria, mas os olhar e clínica da escuta, a fim de facilitar o exercício de psiquiatras. A psicanálise relaciona-se com a psiquiatria formalização da clínica na saúde mental. Sabemos que o exercício aproximadamente como a histologia se relaciona com a dessa prática não é apenas a psicanálise propriamente dita, a anatomia: uma estuda as formas externas dos órgãos, a outra intervenção psiquiátrica sintomatológica ou um trabalho exclusivo de reabilitação social. Essas distintas abordagens do doente, se utilizadas estuda sua estruturação em tecidos e células” (Freud 1917c: isoladamente, não têm chance de eficácia. Além disso, queremos 301). Ele jamais descartou a fenomenologia em seus estudos, e incluir em nossas elaborações outros recursos com os quais mantinha uma profícua interlocução com a psiquiatria. contamos: psicologia, terapia ocupacional, assistência social e Bleuler, por exemplo, aproveitou as contribuições de Freud enfermagem. Queremos, na verdade, estabelecer uma forma ética de para estabelecer sua terminologia: o termo autismo vem do atendimento, não import- d mie área de atuação ela provenha. termo freudiano auto-erotismo. Além disso, a histeria indiscutivelmente ganhou novo estatuto a partir da psicanálise, Clínica do olhar Do lado da função imaginária, das assim como podemos encontrar inúmeros pontos dc contato na teorização da psicose. Se em certo momento foi necessário que relações de compreensão, generalização e concepção de o discurso psicanalítico fizesse oposição ao discurso totalidade do ser e de seu bem-estar, está a clínica do olhar, psiquiátrico, isso se deu em função da iatrogenia e dos abusos termo ligado ao trabalho de Foucault. Em seu livro O decorrentes da prática psiquiátrica no que diz respeito aos nascimento da clínica, ele partiu de um texto de 1807: “E direitos humanos, cerceados pelo modelo manicomial de preciso, tanto quanto ela autoriza, tornar a ciência ocular”. atendimento, que gerava a exclusão do sujeito tanto de sua Tantos poderes sobre a obscuridade são formas através das comunidade, quanto do próprio tratamento que, em princípio, quais se instaura a soberania do olhar : “olho que sabe e que deveria inclui-lo. Obviamente, a psicanálise não cabe nesse decide, olho que rege”. A clínica médica a que o autor se modo, pois, como clínica do particular, leva o sujeito a se refere não é a primeira tentativa de ordenar uma ciência pelo posicionar permanentemente e, conseqüentemente, a se incluir olhar; a história natural já analisava e classificava os seres não só em seu próprio tratamento como também em seu naturais segundo suas características visíveis. Nela, contudo, a contexto social. As iniciativas para marcar a diferença radical doença passa a se apresentar ao observador como sintomas e entre esses modelos, e para fazer a psicanálise ocupar espaço signos, o que introduz um código de saber que nos faz lembrar nas instituições de saúde pública, levaram a um confronto de Saussure. O significante, correspondendo aos sinais e teórico e político, que resultou numa mudança efetiva de sintomas, está diretamente ligado ao significado. Dor, rubor, caráter nacional no atendimento psiquiátrico. calor, tumor e edema juntos significam inflamação. Dc modo geral, não vemos mais os “porões da loucura” nas A clínica, portanto, abriu um campo que se tornou visível pela instituições públicas. Apesar de ainda existirem muitas introdução da linguagem no domínio do biológico. E, desde controvérsias de ambos os lados, os campos da psiquiatria e da então, não se parou mais de nomear. Os nomes se antecipam à psicanálise estão bem delimitados, conforme suas diferenças, escuta do observador, que, pelo olhar, já porta um saber, limites e aproximações. A legislação da reforma psiquiátrica tornado prévio. Olhar que sabe, ensina. Olhar que procura o tem vários pontos de sua fundamentação ancorados em que já conhece e que não faz conhecer permite, quando —
contribuições da psicanálise. O momento, portanto, não é mais muito, reconhecer.
dc ofensiva generalizada, e sim de busca dc uma formalização Esse tipo de clínica gera efeitos diversos tanto nos pacientes da clínica que é praticada na saúde mental e que se baseia em quanto nos profissionais de saúde. Os pacientes, desprovidos critérios, conceitos e estratégias psicanalíticos e psiquiátricos, de sua condição de sujeito, aprendem a dizer o que o em 133 conformidade com uma ética comum, determinada pelo observador quer ouvir, por exemplo, o que devem confessar e reconhecimento do sujeito. Para essa formalização, proponho um o que devem criticar de seu delírio, em função do que querem retorno não apenas à clínica, mas também aos clássicos, já que essas obter de quem os atende. As histéricas e os obsessivos, cada orientações são fundamentais para a definição do que é saúde mental. um a sua maneira, também o fazem. Eis o observador a nomear: “desconfiado”, “dissimulado”, “pouco cooperativo”. Temos empregado o termo saúde mental para nos referirmos ora ao Ana Cristina Figueiredo, em uma vasta pesquisa de campo atendimento “psi” em geral, ora ao atendimento “psi” no serviço feita pela rede de saúde mental no Rio de Janeiro, nos público. Embora a diferença entre eles nem sempre seja tão grande quanto se pensa, a saúde mental pode ser pensada conforme dois forneceu uma série de exemplos, entre eles o de um paciente paradigmas, a partir dos quais se define o tratamento possível, de hipertenso que mentia para sua médica porque ela era muito acordo com os limites de quem atende e de onde se atende, em brava. Conta para a psicóloga, e não para ela, que continuava consonância com a demanda e o desejo do sujeito que o procura. tomando sua cachacinha e comendo sua lingüicinha. Se essa O primeiro paradigma é representado pela definição da Organização última também estivesse orientada pela clínica do olhar, Mundial de Saúde: o bem-estar físico, psíquico e social, e a suposição provavelmente o tacharia de esperto, burro ou suicida. da possibilidade de uma perfeita harmonia. O segundo se baseia em Duas armadilhas entravam nesse diálogo clínico, precipitando Freud, para quem o mal-estar é inarredável e estruturante do ser as condutas: a primeira é o medicajismo, que responde ao humano. Para Freud, o ser humano não é perfeito porque está pedido de “remédio” com a solução química, tida como mais estruturado pela linguagem e tem — ao contrário dos animajs, que respondem apenas pela natureza de seus instintos —, direitos e deveres. rápida e eficaz, como se não houvesse outro “remédio” para o O que impede a mens sana in corpore sano é a existência sofrimento. desarmônica do pensamento, da pulsão e do desejo. Na medicina, a definição de saúde é outra: o silêncio dos órgãos. Essa definição não pode ser aplicada ao mental, uma vez que referido a esse registro está o inconsciente que não se cala jamais. A segunda é o psicologismo, que responde ao pedido de soluções para o “trauma”, entendido como ameaça ou castigo psicológico por uma conduta errada, com a tarefa moral de corrigir o erro através de uma pedagogia supostamente esclarecida (Figueiredo 1997). Não seriam ambas armadilhas da clínica do olhar? Nessa lógica do saber prévio, o cliente se encontra segmentado também política e ideologicamente, destinando-se o corpo Lacan sugere que só existe saúde mental nos animais. Para falar dos para a psiquiatria biológica, o social para a psiquiatria três registros — real, simbólico e imaginário —, descreve a diferença democrática e a linguagem para a psicanálise. Conforme esse que a cor vermelha toma para o sujeito conforme sua estrutura, seu paradigma, tanto o remédio quanto a cidadania podem ser desejo etc., e como ela é tomada por um animal, no caso, o antecipados ao sujeito, assim como as mais mirabolantes pintarroxo. Um psicótico com idéias de auto-referência diria que o carro vermelho que acabou de passar na rua não o fez por acaso, interpretações psicanalíticas. Podemos pensar com Freud que naquele exato momento, e daria ao fato uma significação o praticante desse tipo de clínica é um “trapaceiro que dá mais do que tem” ou que acha que sabe mais do que sabe. — obedecem a uma cronologia rígida. Na avaliação clínica, deve-se “Você não tem nada” ou “é de causa hereditária” são respostas fazer o diagnóstico da estrutura clínica do sujeito: neurose, psicose ou de quem não tem resposta para dar e ainda posa de autoridade. perversão. Se houver dúvidas, o usual é prolongar o período de entrevistas. E fundamental, por exemplo, saber Quando se diz isso a uma histérica, por exemplo, significa que reconhecer um psicótico através dos fenômenos elementares atuais seus sintomas não existem no discurso médico e, (geralmente fenômenos de linguagem) ou do relato de sua história, principalmente, que ela própria não existe como sujeito. sob pena de a análise provocar nele o desencadeamento da psicose. Clínica da escuta Do lado da função do real, da posição A localização do sujeito é feita questionando sua posição em relação de “douta ignorância”, que é a daquele profissional que, apesar aos próprios ditos. Quando, por exemplo, um sujeito expõe seu dos estudos e da experiência, não fecha os ouvidos para o que sofrimento rindo, demonstrando algum tipo de prazer associado a há de novo em cada sujeito, antes privilegiando a esse sofrimento, a pontuação do fato provoca a elucidação ou ao singularidade de cada um, está a clínica da escuta. Não menos o questionamento de sua atitude. Outra maneira de sabendo a priori sobre o sujeito, esse profissional sabe que ele localizar o sujeito é a modalização do dito, que pode se dar porta uma falta constitutiva, estrutural, que provoca o através do tom de voz ou quando, a posteriori, percebe-se que indefectível mal-estar, o que não significa que o paciente não ele estava citando alguém com quem se identificava, possa melhorar do sofrimento produzido por seus sintomas. acreditando porém que a idéia era sua. Um exemplo de Antes, é conduzido a admitir e lidar da maneira que puder com interpretação antecipada do dito. Um psiquiatra, em visita essa falta, como condição da realidade, e nunca iludido com a domiciliar, encontrou o paciente agitado e angustiado, em possibilidade de sua supressão. “Eu não procuro, acho”, frase pleno surto psicótico. Ao vê-lo, o paciente perguntou: “Você de Picasso citada por Lacan, ilustra bem essa posição. veio me internar?” Tomado pelo preconceito contra esse tipo A fala deve ser privilegiada como possibilidade de fazer de intervenção, respondeu prontamente que não. aparecer uma outra dimensão que implique o sujeito, que o Posteriormente, percebeu que o paciente estava pedindo uma leve a pensar na sua participação e em por que mantém seus internação. A localização subjetiva consiste em uma sintomas no nível da queixa, de forma que possa descobrir e apropriação do dito pelo sujeito. Não há nada que se fale em escolher outros caminhos para se haver com as dificuldades da que não exista a questão de quem está falando ou de que vida. Para tanto, quem o atende também está implicado, já que posição se está falando, o que e para quem se está falando. é a pessoa a quem se está supondo algum saber que possa Escutar não é fácil. Muitas vezes o sujeito não sabe ajudá-lo, e cujas intervenções abrem novas cadeias de exatamente o que está dizendo, mas ele deve tomar pensamento. Essa suposição de saber instaura a transferência, conhecimento disso, a ponto de se interrogar sobre o que quer que por sua vez determina o que vai ser dito e de que maneira dizer com o que diz. E a partir da formulação dessa pergunta o será. Obviamente, decide também o encaminhamento que que ele se dirige ao encontro do inconsciente: “che vuoi?” será dado a esse dito, como, por exemplo, quando o cliente é ou “o que você quer dizer com isso?” As entrevistas escutado em lugares de triagem, e não continuará a ser preliminares não servem apenas para descobrir em que posição atendido pelo mesmo profissional. está o sujeito, mas também para mudá-la. Lacan chamava de O signíficante, nesse caso, não é compreendido em relação retificação subjetiva a passagem do queixar-se dos outros para direta com o significado, e sim em sua relação com os outros o falar de si com implicação e responsabilidade. Para que ela significantes que surgem a posteriori. Esse é o inodus ocorra, é desejável que o sujeito se refira ao que disse, operandi da psicanálise, e é questão de bom senso reconhecer guardando certa distância em relação ao dito, de forma a poder que é possível e desejável adotá-lo sem que se esteja buscar seu sentido. Os princípios das entrevistas preliminares necessariamente num contexto psicanalítico. Recorro a Ana trazem grandes contribuições para o âmbito da saúde mental, Cristina Figueiredo mais uma vez: uma pediatra encaminhou mesmo nos casos em que o tratamento não terá continuidade para a psicologia uma paciente cuja queixa era estar comendo no mesmo lugar ou com a mesma pessoa. O diagnóstico da muito, bebendo muita água, urinando demais e emagrecendo. situação do sujeito e a retificação subjetiva podem encaminhar O diagnóstico de diabetes foi dado pela psicóloga, com o o paciente para o tratamento adequado e promover seu simples trabalho de ouvir a paciente. Como vemos, escutar serve a compromisso com esse tratamento, ou ele pode perceber que muito mais do que somente à prática da psicanálise. na verdade não precisa de tratamento, mas de alguma outra Prosseguiremos tentando articular esses paradigmas a um percurso providência de ordem prática. Esse procedimento é clínico básico, que vai das entrevistas iniciais à forma como se completamente diferente da triagem, que muitas vezes entende o sintoma e como através dele se chega a um diagnóstico e a encaminha o paciente para um lugar onde ele jamais porá os um bom encaminhamento ou tratamento do caso. pés, continuando a retornar ao local da emergência numa Entrevistas queixa sem fim. Sintoma. Para a psiquiatria, o sintoma é A anamnese é um modelo médico de entrevista descrito pelo apenas uma manifestação patológica. Ele é constituído pelo dicionário Aurélio como “relato dos padecimentos feito pelo doente à psiquiatra, que o observa, descreve, classifica e por fim lhe dá cordialidade inquisidora do médico”. Lembre-se que falamos de um modelo, ou seja, não significa que ele seja sempre usado em um nome. A psiquiatria clássica combinava os sintomas de medicina, e muito menos em psiquiatria. maneira que formassem quadros clínicos. Após o advento do A inquisição é ensinada como técnica em muitos manuais, CID-1O, no entanto, ele passou a ser tomado como transtorno principalmente nos americanos: são dadas sugestões desde como independente, associado ou não a outros transtornos, cada um perguntar ou responder até a posição em que devem ficar as cadeiras deles correspondendo diretamente a uma medicação. São cada no consultório ou o tempo que deve durar a sessão. As tradicionais vez mais freqüentes os questionários de sala de espera, em que perguntas: “tem depressão?”, “tem alucinação?”, “ouve vozes?”, os próprios pacientes redigem sua anamnese catalogando seus “dorme bem?”, “come bem?”, apesar de não se pretenderem sintomas à medida que respondem a perguntas objetivas. E a indutoras, o são. clínica do olhar rumo à lnternet.
O mais importante é a coleta de informações, que geralmente
privilegia aquelas obtidas junto à família e à assistente social, em Não negamos a relativa padronização do sintoma. Os delírios detrimento da fala do cliente. Esse tipo de entrevista, aliás, parece de grandeza não diferem muito dos delírios místicos e as visar mais a demanda social ou de quem trouxe o doente — família, conversões histéricas são semelhantes aos rituais obsessivos. polícia, amigos — que a escuta de sua própria demanda. Essa relativa padronização é o que dá fundamento à clínica. O No modelo psicanalítico, a ética em relação ao sujeito e a técnica são que distingue uma clínica da outra, no entanto, é a escuta indissociáveis. Não se trabalha com padrões, e sim com princípios. daquilo que o sujeito faz de seu sintoma, de como o insere em As entrevistas são chamadas de preliminares, de maneira que se possa sua história e em seu discurso. E, enfim, a escuta de sua realizar um diagnóstico da estrutura do sujeito e também localizar sua particularidade demanda, que pode ser aceita, recusada ou retificada. O sujeito dá as informações essenciais, uma vez que a clínica confirma a descoberta Para a psicanálise, o sintoma só existe quando é falado pelo de Freud de que a realidade é a realidade psíquica. No texto “A cliente sob transferência, ou seja, quando é endereçado ao direção do tratamento e os princípios do seu poder” (l961a), Lacan analista. Por essa razão torna- se possível uma reorganização sublinhou três funções da entrevista: a avaliação clínica, a localização do sintoma, a partir da modificação da demanda a ele subjetiva, com sua conseqüente retificação, e a introdução ao articulada. O percurso do sintoma na teoria freudiana pode ser inconsciente. E claro que são funções que se superpõem, e que não pontuado em quatro momentos: sintoma e trauma; sintoma e formações do inconsciente; sintoma e fantasia; e sintoma e transtorno. Pela homogeneização dos diagnósticos, que tem pulsão. Enquanto o sintoma foi associado somente ao trauma o finalidade de pesquisa, principalmente farmacológica, quadros paciente não saiu da posição de vítima. Quando Freud clínicos clássicos como a histeria foram reduzidos a uma listagem de transtornos. percebeu que nem sempre o trauma correspondia a um fato, o A psicanálise opera praticamente com os mesmos quadros sintoma passou a ser escutado em um registro simbólico, como nosológicos da psiquiatria clássica. A diferença está na causa e na uma formação do inconsciente semelhante ao sonho ou ao ato conseqüência extraída desse trabalho diagnóstico. Distinguir serve falho. Freud acreditava que podia tratar tudo simbolicamente, para visar a causa. Por isso Freud não separou a semiologia da através da catarse. Se houvesse elaboração ou interpretação, psicopatologia e da terapêutica. Ao instalar a demarcação dos resolver- se-ia o sintoma. Quando abriu mão definitivamente mecanismos da Verdrdngung (recalque), Verwer[ung (foraclusão) e da realidade da sedução para introduzir a fantasia de sedução Verleugnung (recusa), na neurose, na psicose e na perversão, nas histéricas, concluiu que no sintoma havia a realização de respectivamente, abriu o campo para a formalização da teoria das uma cena fantasmática. Essa fantasia teria importância estruturas de Lacan. Essa teoria tem sua raiz no estruturalismo de determinante na constituição dos sintomas: sendo a janela pela Claude Lévi-Strauss, do qual Lacan retirou a concepção de que as qual se via a realidade, seria através dela que se tornaria relações entre os elementos são mais importantes que os elementos em si. Para Lévi-Strauss, a estrutura é de linguagem, já que a cultura possível a correção da realidade insatisfatória. Na fantasia equivale ao simbólico, se insere no simbólico. Tudo o que é da ordem tudo seria possível, até mesmo escamotear a castração. Dessa do humano é do registro do simbólico, e portanto da linguagem. forma, o sintoma passou a ser uma metáfora da fantasia. Quando dizemos que na estrutura interessam menos os elementos do Para Lacan, o sintoma era também o modo como cada um que a relação entre eles, falamos de um diagnóstico com base na goza, uma vez que o inconsciente o determina. No dizer de escuta, em que os significantes são ouvidos em sua relação com os Freud, isso significa que todo desprazer neurótico é um prazer outros significantes do sujeito. Trata-se, portanto, do diagnóstico da que não pode ser sentido como tal. Logo, o sintoma causa o posição do sujeito diante da falta constitucional, que se dá de maneira gozo e também o barra, assim como faz com a castração. E diferente em cada uma das estruturas. Na rrvíç cio recalQue, o sujeito algo do real que se escreve no simbólico através de um tenta encobrir ou negar a falta, apesar de saber de sua existência. significante que não remete a outro significanre mas, Na psicose, por meio da foraclusão, o sujeito simplesmente associado a uma quota de gozo, isola e fixa o sintoma. O que a desconhece a falta, e com isso não permite intermediação análise pode fazer é inseri-lo numa cadeia associativa, de simbólica alguma entre o real e o imaginário. E na perversão, maneira que possa ser deslocado e trabalhado pelo sujeito. ele obtura a falta com o objeto fetiche, recusando-se a um Diagnóstico Florence Kerr, psiquiatra de São Paulo, tem uma confronto direto com ela e atribuindo-a ao outro. posição interessante sobre a gênese do diagnóstico: “Existem três coisas que não deveríamos saber como são feitas — Conclusão - A psiquiatria clínica oferece um tratamento salsichas e linguiças, as leis de um país e a classificação das medicamentoso voltado para a sintomatologia; a democrática, doenças mentais”. A principal função do diagnóstico é a um tratamento pela via da reabilitação social. Por sua vez, a denominação. Além disso, presta-se à definição do prognóstico, ao psicanálise propõe um tratamento do sujeito pela fala. Todas encaminhamento do caso, à avaliação dos riscos, às providências podem cair num dos dois modelos apontados: a clínica do sociais (atestados para licença, aposentadoria etc.), à interlocução olhar e a clínica da escuta. Isso se aplica não só a elas, mas com colegas e ao direcionamento do tratamento. Mesmo que não possa ser elaborado na primeira ou segunda entrevistas, funciona também à psicologia, à terapia ocupacional, ao serviço social e como norteador provisório, como ponto de partida e como à enfermagem. O paciente que mensalmente apanha sua instrumento de medida da evolução do caso. receita com um psiquiatra que mal o convida a sentar vive em O sonho da psiquiatria sempre foi descobrir o substrato anatômico e o crise ou estabilizado em uma posição em que aparentemente agente etiológico das doenças que, juntamente com o quadro não sofre, mas também não existe como sujeito. O usuário que descritivo, formariam as três dimensões definoras de uma doença. é pressionado a trabalhar, seja em oficinas, seja pela causa da Entretanto, apesar de todos os esforços, a relação entre a etiologia reinserção social sofre o mesmo destino. E o cliente sujeito às orgânica e as manifestações psíquicas nunca ficou clara. mais selvagens “interpretoses”, não menos. O método descritivo nasceu da fenomenologia de Husseri, que Um paciente bem escutado, por sua vez, pode ser medicado entendia a filosofia como uma ciência do homem, ou seja, da percepção pelo homem daquilo que ele podia ver: o fenômeno. As para facilitar sua inserção no âmbito social, o que contribuirá funções psíquicas, seus distúrbios e sua classificação eram para uma apropriação do seu problema, muitas vezes apresentados como descrições fenomenológicas as manifestações suficiente para que consiga reconhecer a possibilidade de patológicas, classificadas e agrupadas em quadros nosológicos, nos recaídas ou para tomar providências que dispensem soluções quais adquiriam sentido e especificidade. Era na relação com o todo, extremas, como internações. Daí a tentativa de estabelecer os portanto, que cada sintoma ganhava sentido. A teoria evolutiva, parâmetros da escuta para que possamos utilizar da melhor representada pelo organodinamismo de Henri Ey, levava em conta maneira possível tantos recursos, sem a rigidez do ainda, nessa classificação, a evolução da doença. A criação do DSM- corporativismo, da política e da detenção da verdade, e sim 11I modificou essa forma de classificação ao introduzir o conceito de com o rigor de uma boa formação pessoal e profissional.