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Direitos Reais — Casos Resolvidos nas Aulas Praticas [3° Ano] I~ Principios Gerais de Direitos Reais ———— Hipétese n® 1 Hipstese n° 2 Hipdtese n° 6. Hipétese n° 7 I~ Publicidade: a protecetio registra nnn 1B Hipstese n° 8 Hipétese n° 9 Hipotese n* I Hipétese n° 1 HI~A Posse. Hipétese n° 1 Hipdtese n° I Hiipétese n° I Hipétese n° 2 IV—A usueapito —————— Hippétese n° 21 Hipétese n° 22— Hipétese n° 2: Hipétese n° 2 V~ Causas de extincdo dos direitos reais- Hipétese n? 25 Hipétese n° 26-——— Hipétese n° 2 VI— Factos constitutivos do direito de propriedade ————————————-—— $1 Hiphtese n° 2 Hipétese n° 29— Hipétese n° 3 VIE— Diretto de propriedade—————______—_-—_______-57 Hipétese n° 3 Hipstese n° 3 Hipstese n° 3: Carlos Femandes ~ 2005/2006 Direitus Reais: I— Principios Gerais de Direitos Reais [Hipétese n° 1) = Principios Gerais de Direitos Reais : 4 : z Hipétese n* 1 lustragao 1 A, proprietério do automével X, acorda com B a venda do mesmo a este pelo prego de 10,0006. [Nos termos acordados, o preco seria pago 3 meses depois e a entrega da coisa efectuada 30 dias apés ‘a conclusao do contrato. A entrega o automével a B no prazo acordado, mas este nao pagow o preco. Entretanto, B doow o automével ao seu sobrinho C, que desconhecia o contrato entre A e B. A pretende agora que C the entregue 0 carro, alegando que o contrato de compra e venda celebrado com B nao foi cumprido, Esclarega quem é 0 proprietirio do automavel, Aspectos a considerar: 1. Da validade do contrato entre A e B 2. Da validade do contrato de doagio entre B e C 3. Da pretenséio de A relativamente a C tee 1, Da validade do contrato entre Ac B AB celebraram enire eles um contrato de compra e venda do automével ~ 874. O negécio & Iicito, fisica e legalmente possivel, nfo contrério A ordem piblica e aos bons costumes, tendo por ‘objecto coisa presente e determinada — 280, 400. A tinha legitimidade para alienar 0 automével, uma vez que era seu proprietirio — 892 a contrario. Trala-se de um contrato real quanto aos efeitos (quoad effectum) ~ 879/a), pelo que, tendo negécio eficdcia real, a propriedade transmite-se no momento da celebragio do contrato — 408/1 879/a (principio da consensualidade), © B no pagou o prego, no entanto, a falta de pagamento do preyo nfo da ao A o direito de resolugdio do contrato ~ 886. Conclustio: B adquiriu a propriedade do automével no momento em que celebrou 0 contrato, independentemente de nfo ter pago o prego ~ 408/1 ¢ 879/a). 2. Da validade do contrato de doagio entre Be C B tinha legitimidade para doar o carro a C, uma vez que era seu proprietério desde que celebrou ‘0 contrato de compra e venda com o A — 408/1 ¢ 879/a). ‘A eficicia real da doagao de coisa mével, quando néo tiver a forma escrita, exige a tradiglo da coisa (sendo um contrato real quoad constitutionem). O emunciado é omisso quanto a forma da doagio de B a C: oral ou por escrito, No entanto, independentemente deste aspecto, podemos concluir que houve tradig&io da coisa, uma vez. que A vern Carles Fernandes ~ 2005/2006 | 2 Direitos Reais: T— Princfpias Gerais de Direitos Reais [Hipstese n° 2) cexigit de C (€ nao de B) a entrega do caro. Tendo havido tradigtio da coisa de B para C, houve aceitagio da coisa doada ~ 945°, pelo que C adquiriu o direito de propriedade sobre 0 carro no momento da entrega deste, independentemente do momento da celebragao do contrato — 954/a). Logo, 0 carro é deC. 3. Da pretensio de A relativamente a C A pretensio de A nio tem raziio de ser: ele nfo pode exigir de C a restituigio do automével, uma vez. que este ¢ 0 titular do dircito real de propriedade sobre o mesmo. O que cle tem & um direito de erédito sobre B por falta do pagamento do prego, a exigir nos termos do art, 817° e no através da cgi de reivindicagao prevista no art. 1311° (aplicdvel apenas a diteitos reais). Vi nto seria assim se 0 negécio entre A e B nfo tivesse produzido o efeito real de transferéncia da propricdade, caso em que C nifo poderia opor 20 A o principio da “posse vale titulo”, pois este nfo vigora em Portugal (ao contrério da Franga e outros ordenamentos juridicos...) Bastaria ao A, neste caso, fazer prova da sua propriedade para que o carro lhe devesse set eniregue, independentemente dos negécios ¢ vicissitudes que levaram a coisa a entrar na posse do C. Hipdiese n® 2 a Ae B celebram um contrato de doagdo de um anel. Com efeito, Abel, fabricante de anéis, possui 3 anéis consigo ¢ decidiu doar um a B. Contulo, nao ficou esclarecido entre as partes qual dos 3 andis era o doado. Dois dias depois, antes que A procedesse & entrega do anel a B, o primeiro vendeu a C um dos anéis que tinha na sua posse, B reclama que esse anel é seu e prepara-se para interpor uma acgdio de declaragdo de nulidade com fundamento em venda de bens alheios. Esclareca se B tem razito, Aspectos a consider: 1. Da validade do contrato de doagio 2. Da modalidade da obrigagao 3. Do momento da transmissto da propriedade 4, Da pretensfio de B wee 1, Da validade do contrato de doagio A doagio de coisa mével que no seja acompanhada da tradigdo da coisa s6 pode ser feita por escrito (947). Logo, a presente doacdio s6 nio seré nula por vicio de forma (220) se tiver sido feita por escrito, Admitamos que assim é, para efeitos académicos. 2. Da modalidade da obrigagio Bm que modalidade do obrigagbes se integra a doagio sub judice? A obrigagfo € indeterminada, regendo nesta matéria as regres do art. 400, Mas seré cla Carlos Fernandes 2003/2006 Direitos Reais: I ~ Principias Gerais de Direitos Reais _[Hipétese n° 3) genérica? Ou alternativa? ‘Nao 6 modalidade de obrigagbes alternativas (543), uma ver. que existe apenas uma ¢ niio duas ou mais prestagdes alternativas de natureza diferente. ‘Nao se oferece clara a distingfio, mas a explicago do assistente relativamente aos cinco quadros de Vieira da Silva é uma situagio paralela e que este classificou como “obrigagdo genérica de género limitado”. Sendo assim, a transferéncia da propriedade do anel doado néo segue o regime do art. 408/1 (princfpio da consensualidade), integrando-se antes numa das excepedes do n° 2 deste artigo, que ‘manda aplicar 0 regime previsto nos artigos 539 e ss. 3. Do momento da transmissio da propriedade Nas obrigagdes genéricas a transferéncia de propriedade verifica-se apenas com a concentragiio da obrigagio e esta dé-se com o cumprimento, cuja regra é a entrega da coisa (540 e 541), ‘Nilo tendo sido entregue a B qualquer dos trés anéis antes da venda de um deles a C, nfo se dera ainda a concentrago, permanecendo o direito de propriedade sobre os trés anéis na esfera juridiea do doador (A). Logo, A no vendeu bens alheios, mas proprios, nao se verificando a nulidade prevista no art, 892 ~ 540, ‘Mas jé no poderia vender o terceiro, pois no momento em que vendesse o segundo o género cextinguir-se-ia ao ponto de restar apenas uma das coisas nele compreendidas (um anel) e este ser 0 niimero exigido satisfagio do credor, considerando-se, neste caso, que se deu a concentragao antes do cumprimento (541). 4. Da pretensio de B B nfo tinha razfo ao afirmar que o ancl que 0 A vendeu a C era o seu, tanto mais que a escolha ‘cabia ao devedor (A) ¢ a propriedade s6 transitava para a sua esfera jurfdica com a concentragio, nfo tendo esta ocorrido até ento, Hipotesé 0°3° A celebrou com B um contrato de compra e venda do imével X pelo prego de 500.000€. No contrato convencionou-se a reserva de propriedade a favor de A enquanto o preco niio fosse pago ¢ a entrega do prédio no momento da conclusdo do contrato. O prego deveria ser pago em 3 prestagées, a tiltima das quais 6 meses apés a conclustio do conirato. Este contrato foi registado, incluindo a cldusula de reserva de propriedade. ‘Trés meses depois, A vende a C o direito de propriedade, obrigando-se a entregar 0 prédio 6 meses depois Uima semana depois do contrato celebrado entre A e C, B vende a propriedade do prédio a D. No prazo de vencimento da tltima das prestagdes, B cumpre, pagando a parte do preco em divida. @) Quem é 0 proprietario do prédio X e desde que momento? 8). Supondo que B néo pagasse a tltima prestagdo ¢ estivesse impossibilitado de o fazer, quem ‘seria entdo o proprietério do imbvel? Carlos Fernandes ~ 2005/2006 Direitos Reais: 1 Principias Gerais de Direitos Reais [Hipsese n° 3) Esquema dos negécios: Aspectos a considerar: 1, Dos efeitos da reserva de propriedade 2, Da validade do contrato entre Ae C 3. Da resposta a questo da alinea b) eee 1.Dos efeitos da reserva de propriedade 1— 0 contrato de compra e venda A — B tem eficdcia real diferida, mantendo-se o direito de propriedade sobre o imével na esfera juridica do vendedor até a0 pagamento integral do prego, a realizar seis meses apés a celebragio do contrato, por efeito da reserva de propriedade ~ 409, Sendo o prego pago, como o veio a ser, a reserva de propriedade a favor de A extingue-se, 0 que desencadeia a transferéncia do direito de propriedade para a esfera juridica de B. A questo que importa agora dilucidar é a de saber a partir de que momento se deve reportar a transferéncia da propriedade: se ao momento em que se verifica o cumprimento total da obrigago de B, se A data em que este celebrou o contrato com A. Ou soja, a pedra de toque é saber so a eficécia real resultante do pagamento do prego, que poe fim a reserva de propriedade, opera a partir de ento ou retroage a0 momento da celebragaio do contrato, Tl — 0 Prof. defende a retroactividade; Menezes Leitio nega-a: Para Menezes Leitio, o que sucede & que B, comprador com reserva de propriedade, é titular de tum direito real de aquisigdo oponivel a C, que adquiriu o direito depois dele. A cficdcia real dé-se apenas com o fim da reserva de propriedade e opera apenas para o futuro. Isto gora, segundo o Prof. Coelho Vieira, um efeito inconveniente: quer B quer C tomam-se proprietérios da mesma coisa ‘imével! Para 0 Prof. Coelho Vicira, pelo contririo, a verificagao do evento de que depende a reserva de propriedade faz, retroagir os efeitos da compra e venda ao momento da celebragio do contrato, Carlos Fernandes ~ 2005/2006 | $ Direitas Reais: I— Princpios Gerais de Diritas Reais [Hipotese n° 4) ‘operando-se entifo a transmisstio da propriedade nos tormos do art, 408/1 e 879/a). B passa a ser proprietario do imével com efeitos reportados ao momento da celebragtio do contrato de compra e venda com A. O evento a que as partes subordinam a reserva de propriedade, embora no o sendo em sentido téenico (desde logo por nio se tratar de facto futuro incerto ~ 270), funciona como uma condigao suspensiva, 2. Da validade do contrato entre A eC Este contrato & nulo por falta de legitimidade do vendedor (892), uma vez. que quando A vendeu ‘8 C jf nfo era proprietério da coisa. Sendo 0 contrato nulo, nada foi transmitido da esfera juridica de A para C, tanto mais que nada havia para transtnitr. Em contrapartida, 0 contrato de compra e venda entre B e D é perfeitamente valido © produz, efeitos no momento da celebragio do contrato (por retroactividade), 3.Da resposta & questiio da alinea b) ‘Uma vez. que a resposta & primeira questo j4 foi dada, resta ver 0 que sucederia se a hipétese da alinea b) se verificasse. ‘Se 0 B niio tivesse pago o prego ¢ estivesse impossibilitado de 0 fazer, onto a propriedade manter-se-ia na esfera juridica do A, sendo a venda deste a C perfeitamente valida ¢ produzindo os seus efeitos A data da celebragiio do contrato — 408/1 e 879/a — mas s6 depois de confirmada a no vorificagio do evento de que dependia a reserva de propriedade e a impossibilidade de tal verificago vir a ocorrer no futuro. [Nesse caso, 0 contrato entre A —B seria valido mas ineficaz, nfo chegando a producir os efeitos esperados, enquanto que 0 contrato entre B —D seria nulo, por falta de legitimidade do yendedor ~ 892, Hipotese n°4 > Por contrato de compra e venda, A vendeu a B um direito de enfiteuse pelo prazo de 20 anos. No contrato, as partes estipularam que o direito em causa, ndio obstante ter sido revogado em 1977, se regularia pelo regime em vigor até essa altura. @) Esclareca a validade deste contrato: 3) Suponha agora que o direito de enfiteuse era admitido pelo ordenamento portugués, mas com contetido diverso daquele que as partes estipularam. Quid juris? Aspectos a considera Alinea a) 1. Da tipicidade dos direitos reais Carlos Fernandes ~ 2005/2006 Direitos Reais: I — Princfpias Gerais de Direitos Reais [Hipotese n° 4) Alinea a) —¥ 1. Da tipicidade dos direitos reais (apontamentos da Marina) © contrato é nulo nos termos do art. 280 —violaglo da tipicidade legal, HA conversio legal do nogécio nos termos do art. 1306/1: o negécio é nulo como real, mas Subsiste como direito obrigacional — direito de crédito, Esta conversio opera se houver natureza crediticia no contrato. Azt. 1306/1 ~ 0 Principio da tipicidade dos direitos reais implica que as partes nfo possam criar ‘novos tipos de direitos reais por contrato. Direito real de habitago periddica — direito real de gozo nao tipificado no CC. Direito do locatério: sera um direito real ou um direito de crédito? Prof. Menezes Co Cordeiro © Oliveira Ascensio defendem a sua qualificagio como direito real, com base na interpretagto e'nio do’ legislator. Dat-que-possam-ser qulificados tomo-dieitos reais sent her iii especificagio: Direitos ‘menores, como figuras decompostas do direito de propriedade. “Golocagto sistematica do preceito em relagdo A propriedade. A imterpretagio do art. 1306 tem de ser feita ora restritivamente ora extensivamente, Fora do catélogo loge as partes néo podem criar direitos reais. (apontamentos do Renato) Nulo como nogécio real, subsiste como direito de crédito, ficendo a ser regulado pelo regime do direito das obrigagées, por forga do art. 1306/1 in fine. © titular de um direito de propriedade pode constituir direitos reais menores ¢ no ao dosmembramento do direito de propriedade. A criago de um direito real menor sobre um direito real menor chama-se oneraca0. Alinea b) (Apontamentos da Marina) principio da tipicidade (que abrange quer a escolha do direito real quer do seu contetido) nto assenta na escolha de um direito real nfo constante do catélogo. Cada direito real tem um contetido injuntivo que permite autonomizé-lo face aos outros, = aeianeeans as ‘As partes niio podem escolher um direito real © nfo estabelecer 0 seu contefido, As consequéncias sio as mesmas da alinea a). (Apontamentos do Renato) Tem a ver com o tipo de direito real. As partes n&io podem estabelecer um negécio com conteiido diverso do tipo de dircito real consagrado na lei. Principio da tipicidade outra vez de outra perspectiva. Respeito pelo contetido de aproveitamento da coisa de acordo com 0 tipo de dicito real. ‘ Carlos Fernandes ~ 2005/2006 Direitos Reais: I- Prinipios Gerais de Direitos Reais [Hipdtese n° 5] Hipdtese n° 5 : : Bae A, proprietirio e possuidor do automéyel X, foi vitima de furto praticado por B. Este, com 0 carro em seu poder, vendew o mesmo a C, que desconhecia o furto. Dois meses depois do furto, C doou 0 automével X ao seu sobrinko D. Em Novembro de 2005, A vem a saber que 0 carro se enconira com D e pretende reavé-lo. @) Quem é 0 proprietirio do automével? 1). Fundamente com 0s prinelpios juridico-reais conhecidos a possibitidade de A fazer valer a sua propriedade contra D, nomeadamente se A tem de impugnar os negécios juridicos celebrados entre Be C ¢ entre Ce D. Aspeetos a considera 1. Da figura da “posse vale titulo” 2. Do prinefpio da absolutidade see 1. Da figura da “posse vale titulo” -se que 0 automével continua a ser propriedade de A, independentemente dos OE ObJeCt, Celebrados apOS vO Tirko do Mesmio. Tsid sucede assim porque em Portugal nfo vigora o principio da posse vale titulo: easo contrario, C, que adquirin a posse de boa fé, poderia opor este principio ao proprietirio do automével. A aquisigaio de um direito real depende de um facto juridico valido — principio da causalidade. Logo, neste caso néio hé transferéncia de propriedade, sendo a boa ou mé fé irrelevantes. Quer 0 contrato B - C quer o C —D so nulos, por violagdo do prinefpio da causalidade. Concretamente, 0 B nio tinha legitimidade para a yenda (892), 0 mesmo sucedendo com o C para a doagio (956). Para B, o furto nfo & titulo legitimo de aquisigdo da propriedade; para C, nio sendo a compra e venda B — C vilida, também nfo adquire a propriedade. 2. Do principio da absolutidade Relativamente & questo que nos coloca a alinea b), devemos procurar arrimo no principio da absolutidade, consagrado no art. 1311, para encontrar a resposta, Significa este principio que a afectagfo da coisa ao titular do direito de propriedade nfo ¢ feita através de uma relaglo juridica, pelo que pode ser oponivel erga omnes através da acy tipica de reivindicagto, seja esse pessoa possuidora da coisa ou mera detentora. proprietario do automével (A) néo nevessita,.assim,.de. impugnar a validade dos sucessivos negdeios juridices qué Ievaram a Coisa a sor colocada sob 0 poder do actual possuidor ow detentor, bastando ‘exigir deste o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituigdo da coisa, nos termos do art. 1311 CC. Carlos Fernandes ~ 2003/2006 Direitos Reais: I— Principios Gerais de Direitos Reais [Hipstese n° 6] Como escreve Vaz Serra, 0 contrato de compra e venda de um mon dominus a favor de um terceiro é ineficaz contra o proprietério, pelo que nao tem que discutir a validade do contrato entre ‘aquoles, mas tio 6 provar 0 seu direito de propriedade para que a entrega da coisa Ihe néio possa ser recusada, Nao significa isto, no entanto, que por nao ter de 0 fazer no possa o A arguir a nulidade dos contratos, nomeadamente nos termos do art. 286. Nota: 0 Prof. ndo considera a sequela uma caracteristica dos direitos reais; quanto & prevaléncia, esta s6 existe nos direitos reais de garantia e ndo entre os direitos reais e as direitos de crédito, Hipdtese n°6 ae Dado pelo Assistent rese | Anténio, agricultor, deslocou-se, em Janeiro de 2004, a quinta do Barnabé, que se dedica & sactividade agro-pecuciria, tem em vista a aquisi¢do de varios produtos daquela, Depois de uma visita pela quinta ¢ de uma longa conversa, ficou acordado entre ambos. ‘a venda por Barnabé a Anténio: @) De cinco vacas, que Anténio escolheu pelo seu elevado peso e grande capacidade de produciio de leite, e que Barnabé Ihe deveria entregar no prazo de um més; 4) De todas as galinhas que nascessem na quinta durante o ano de 2004; ©) Do.trigo que Barnabé combinara comprar ao seu vizinko Malaquias por altura da colheita de Julho; & De todas as magas do pomar de Barnabé, que deveriam ser cothidas em Marco; e) De wma tonelada de madeira de carvatho, a escother de entre as varias toneladas que -Barnabé tinha armazenadas, Em Maio de 2004, Barnabé, que ainda ndo emtregara a Aniénio nada do que tinha sido acordado, vende ao seu primo Carlos a quinta com todo 0 seu contetido. Interpelado por Antonio, Carlos recusa-se a entregar-the o que quer que seja, alegando ser totalmente estranko a qualquer contrato que Barnabé tenha celebrado. Quid juris? Na resolugiio deste caso pritico ha que levar em linha de conta os seguintes aspectos: 1) Tipo de negécio: obrigacional; real quoad efféctum ou quoad constitutionem; 2) 874°—Contrato de compra e venda: definig&o; 3) 879° —Bfeitos do contrato de compra e venda: efeito real ¢ efeitos obrigncionais, 4) Momento da transmissio da propriedade: a, 408°/1: regra geral — Principio da Consensualidade; b. 4089/2: a excepso a rogra: i, Obrigagdes sobre coisa futura; i. Obrigagdes sobre coisa indeterminada; ©. °408°/2, in fine: a excepgaio a excepgio: 7 Carlos Fernandes ~ 2005/2006 Direitos Reais: 1 ~ Principios Gerais de Direitos Reais [Hipetese n° 6] i. Obrigagdes genéricas; ii, Obrigagdes respeitantes a frutos naturais e partes componentes ou integrantes; 4d, 879°a)~ Do contrato de compra ¢ venda em especial; ©, 1317%a)—~ Dos direitos reais; 5) 406° ~ Eficicia dos contratos: ligagiio com o principio da relatividade (nto eficécia do contrato relativamente a terceiros; excepgdes — 443°); 6) Meios de defesa do direito: 817° ou 1311°? Estando em causa nas diversas alineas situagdes diferentes, a exigit diferente regime e solugfo, iremos ‘ratar cada uma delas separadamente. ‘Resolugio da alinea a) 1. Tipo de contrato ¢ obrigagio I — Enire A e B foi celebrado um contrato de compra ¢ venda (874°) tendo por objecto dcterminado a alienagio, por parte do B, ¢ a compra, por parte do A, de cinco vacas determinadas, escolhidas pelo A no momento da celebragdo do negécio, tendo sido estipulado um prazo de ccumprimento também ele determinado — um més a contar da data de celebrayio do nogécio. 0 objecto do negévio & determinado, licito, fisica ¢ legalmente possivel e nfo ofende quer a ordem pablica quer os bons costumes — 280° e 400°. ‘Do contrato de compra e venda resultam trés efeitos essenciais: um, de natureza real, que se traduz na transmissiio da propriedade da coisa ou da titularidade do direito (879%), © 08 dois outros do natureza obrigacional: a obrigagio de entregar a coisa, por parte do alienante, e a de pagar 0 prego, por parte do adquirente. II —0 contrato de compra ¢ venda € 0 contrato real quoad effectum prototipico, tendo inteira e cabal aplicagtio neste caso o principio da consensualidade incorporado no art. 4087/1; e, sendo assim, @ propriedade das cinco vacas objecto deste negécio transmitiu-se da esfera juridica do Barnabé para a do Anténio no preciso momento da celebragio do contrato, independentemente de quaisquer outros actos posteriores. © facto de ter sido acordada a entrega dos animais numa data wm més depois da celebragio nada releva quanto a0 momento da verificagio do efeito real de transmisstio da propriedade, atento o principio do consensualismo que vigora entre nés. Recorde-se que negécios reais quoad constitutionem s8o aqueles que fazem depender da entrega ‘ou tradigio da coisa a constituigio, modificagdo ou extingdio do direito real, de que so exemplos pparadigmiticos o penhor e a doagio de coisa mével que no é feita por escrito. IIL ~~ Nao se deve esquecer, por outro lado, que hf casos em que os negécios sto simultaneamente quad constitulionem_¢ quoad effectum. Veja-se 0 EXeiniplo do coiitrato dé mite (11425): é real quanto & constituigtio porque exige, para aiém do consenso, a entrega da coisa mutuada; ‘mas é também real quanto aos efeitos porque com a celebracdo do negocio ¢ a entrega da coisa se verifica o efeito real da transmissio do direito de propriedade da coisa mutuada para a esfera juridica do mutuério (note-se que o dinheiro que cada um dos depositantes “empresta” ao Banco passa a ser propriedade deste. O que fica a pertencer aos depositantes ¢ um direito de crédito e nio o direito real de propriedade sobre o dinheiro mutuado. E isso, de resto, 0 que explica que 0 risco corra por conta do Banco em caso de assalto ou outras causas de perecimento do dinheiro mutuado). Cortos Fernandes 200572006 |10 Direitos Reais: — Principios Gerais de Direitos Reais [Hipétese n° 6} 2. Eficacia do contrato relativamente a Carlos I — Ao ser interpelado pelo A, C alegou que nada tinha a ver com 0 negécio que aquele cclebrara com B, do qual nem sequer tomara conhecimento. Sera este argumento valido? Poder C invocar 0 principio da relatividade dos contratos expresso no art. 406° em seu favor? T— A resposta é, desde logo, negativa. E a razio € que ndo estamos aqui perante um contrato de eficacia meramente obrigacional, que implica uma relagdo juridica entre sujeitos determinados (ou determindveis) e que se caracteriza pelo principio da mediagio ou cooperagio, © contrato de que falamos 6, como se viu, um contrato real quanto aos efeitos no qual intervém outros principios priprios dos direitos reais, como o principio do consensualismo e da absolutidade Por mero efeito do contrato, 0 direito de propricdade sobre as vacas objecto do negécio transmitiu-se para a esfera juridica do A no preciso momento em que o negécio foi celebrado, conforme estipulam os artigos 408°/1, 879%/a) e 1317") do CC. A partir de entio, o novo proprictério Pode opor esse seu direito a quem quer que seja, independentemente de haver ou nfo uma relagio Juridica entre eles. Meios de defesa do direito 1— Coneluimos no ponto anterior que A passou a ser proprietirio das cinco vacas a que se refere 0 negécio descrito na alinea a) do exercicio desde 0 momento da celebragio do negécio, ou seje, Janeiro de 2004, independentemente da data de entrega ou do pagamento do progo, Assim, quando B vende a quinta a C com todo o seu contetido as vacas nfo estio jf incluidas no negécio, pois jé niio pertencem aquele. Se B vendesse essas vacas a C estaria a fazer uma venda de bens alheios, o que acarretaria a nulidade do negécio nos termos do art. 892°, por falta de legitimidade do vendedor. . : ah Poderia perguntar-se: teria o A de interpor uma acgo de anulag#o do negécio entre B e C para fazer valer 0 seu direito? E, depois de anulado tal negécio, seria ele obrigado a fazer uso do artigo 817° para ver satisfeito 0 seu direito? Se 0 negécio entre A e B fosse meramente obrigacional, a resposta a ambas as questies seria positiva. Mas nao ¢ disso que aqui se trata: aqui estamos perante um direito real, que tem um regime préprio. 1— A poderia, assim, defender 0 seu direito contra quem quer que fosse ~ possuidor ou mero detentor da coisa ~ através de uma acgto de reivindicagdo prevista no art. 1311°. Sendo 0 direito de propriedade absoluto, no sentido de que ¢ oponivel a todos, ndo tem o A de impugnar a validade ou a eficécia do ou dos negécios que colocaram a coisa sob 0 poder de facto do actual possuidor ou detentor. Ele pode exigir judicialmente que estes reconheam 0 seu direito do propriedade e Ihe restituam a coisa, ‘Resolugdo da alinea b); Cortos Fernandes 200572006 Fi Dirvites Reais: 1— Prinipios Gerais de Direitos Reais [Hipétese n° 1. Tipo de contrato e obrigagio I — Também o contrato a que se refere esta alfnea tem natureza de negécio real quanto aos cfeitos, sendo-lhe aplicével muito do que foi dito relativamente ao des vacas. Contudo, a0 contririo do anterior, cujo objecto era presente a data da celebragaio do negécio, este segundo contrato tem como objecto coisas futuras (2119),-i.,.todas.as.galinhas que nascerem na quinta durante o ano de 2004. A transferéncia do direito de propriedade sobre as galinhas dé-se, assim, nos termos do n° 2 do art. 408° e nio do seu n° 1, integrando-se-quma.das.excepgiics.ao_prinefpio.da,consensualidade ali definidas, Em qual delas, é o que importa de seguida apurar, - Tl—Recorde-se que 0 n° 2.comporta trés excepeGes & regra do consensualismo provista no n° 1, a saber: a) ‘Transferéncia de direitos reais relativos a coisa futura: dé-se quando @ coisa for adquirida pelo alienante; b) Transferéncia de direitos reais relativos a coisa indeterminada: dé-se quando a coisa for determinada com conhecimento de ambas as partes. Este regime admite, no entanto, duas excepgdes: a. A das obrigagdes genéricas: aplica-se 0 regime que resulta da conjugag8o dos artigos 540° ¢ S41°— nofe-se que a regra no regime das obrigacdes genéricas é de ‘a concentragao da obrigagdo se dar com 0 cumprimento, ie., com a entrega; esta regra admite, contudo, que a concentragdo se dé antes do cumprimento em quatro casos, ofr. art. 541°: (i) havendo acordo das partes nesse sentido; (ii) quando _género se extinguir ao ponto de restar apenas uma das coisas nele compreendidas; (Gil) quando 0 credor incorrer em mora — 813°; (iv) e no caso previsto no art. 797°. b, A dos contratos de empreitada —- ver 1207°e ss. CC. ©) Transferéneia_de direitos reais relativos a frutos naturnis ¢ 9_partes componentes ou integrantes: dé-se apenas no momento da colheita ou separagilo — ver 204° 210°. I — A primeira questio a dilucidar é a que se prende com a diivida de saber se estamos perante uma obrigagao determinada ou indeterminada (400°) e genérica ou espeeifica (539° ¢ ss.), uma vez que a classificagdo como obrigagaio de prostagio de coisifutura (211°, 880°) no oferece dificuldades. IV — Relativamente a determinabilidade/indeterminabilidade da obrigagfio, parece-nos que 0 objecto esti suficientemente preciso para que a prestag#o possa sor exigida e cumprida sett necéssidade’ de qualquet” outa acyao” das”partes rio que-se-refere” a escolhia. De facto, & prestii¢ao abrange “todas” as galinhas qué WaseeFeM na quinta durante o ano de 2004, independentemente de serem uma centena ou 10 milhares. V — Devemos, também, afastar a tentago de classificar a obrigagfo resultante do contrato como uma obrigagio genérica, Apesar de 0 objecto ser referido pelo género e de a quantidade io estar, a partida, perfeitamente determinada — porque se ignora quantas galinhas vio nascer na. quinta durante 0 ano de 2004, sabemos partida que toda e qualquer galinha que nasga na quinta nesse periodo faz parte do objecto da prestagiio. Nao é, assim, necesséria qualquer escolhs da coisa por parte quer do devedor quer do comprador: essa escotha esti feita ab initio, Entendemos, assim, que nfo ¢ aplicdvel a este caso 0 regime das obrigagbes genéricas previsto nos artigos 539° e ss. do CC, salvaguardado pelo art. 408°/2 CC. Carlos Fernandes ~ 2005/2006 Diretos Reais: I— Principios Gerais de Direitos Reais __[ipétese n° 6] 2. Meios de defesa do direito 1 — Concluimos que a obrigagdo resultante do contrato ora om andlise ¢ uma obrigagao de prestagiio de coisa futura. Neste caso, 0 contrato s6 tem eficécia real quando a propriedade se transfore para o comprador, ., no momento em que 0 alienante adquire o direito alienado, O efeito real da transferéncia do direito ocorre & medida que as galinhas vao nascendo na quinta. Logo, todas as galinhas nascidas até Maio de 2004 ~ data da venda da quinta ao Carlos —- so propriedade do Antonio, que pode intentar contra aquele uma acedo de reivindicagio nos termos do ja citado artigo 131 1° CC. As galinhas que venham a nascer dai por diante so propriedade de C, dono da quinta, uma vez que sobre essas jé 0 B nao teria legitimidade para delas dispor, Qualquer contrato celebrado por B ‘como alienante relativo a essas galinhas seria nulo por se tratar de bens alheios (892°) ¢ nfo poderia ser oponivel a terceiros (nomeadamente C). Resolugio da alinea ¢): 1 — 0 enunciado diz-nos que A acordou com B a compra do trigo que este iria adquirir de M or altura da colheita, Ora, perante isto, podem colocar-se duas situagdes distintas: ) Ou o trigo 6 comprado por B a M quando ainda se encontra ligado ao solo, ¢ entio trats-se de frutos naturais —212/1-2; b) Ou ¢ comprado por B a M ja depois de ter sido por este colhido e, eventualmente, armazenado, caso em que estarémos perante bens futuros - 211 ‘No primeiro caso, a transmissto da propriedade dé-se no momento da colheita; no segundo caso, quando a coisa for adquirida pelo alienante — 408/2. : Caso se verifique a primeira hipétese, o trigo considera-se coisa imével enquanto estiver ligado a0 solo (204/e). No entanto, ndo faz. sentido exigir a forma de contrato dos iméveis, pois quando so transaccionam frutos naturais entende-se que se esti a negociar bens méveis, sendo a forma aplicdvel estes a mais adequada. A.venda pelo Barnabé de algo que ainda ndo Ihe pertence no importa nulidgde nos termos do art, 892 (verida de bens alheios), uma Vez que a coisa é vendida na qualidade de bens 8, tds \Eritios do art. 880. Seria nula, sim, se B os vendesse como se fossem bens préprios e niio como bens faturos. Note-se que este negécio nada tem a ver com a quinta vendida pelo B: os produtos vendidos fio foram nem irdo ser produzidos nesta, pelo que a sua alienago no afecta a validade do contrato. Por conseguinte, quando o B adquirir 0 trigo a M este passard a ser sua propriedade no preciso momento em que fizer a respectiva colheita, sendo também esse 0 momento em que se preenche 0 requisito Provisto no art. 408/2 de que depende a transmissio da propriedade para o A. Seté entio que se verifica a eficécia real do contrato. Por outro lado, se 0 B adquiriro trigo j4 depois de colhido, seri no momento em que adquire a propriedade sobre o mesmo que este ditito se transferira para a esfera juridica de A. Trata-se aqui de lum contrato de compra e venda com eficécia real diferida, sujeita & aquisiggo do direito de Ppropriedade de bens futuros (211°) por parte do vendedor — 880° e 408/2. Até ao momento em que adquiro o direito de propriedade sobre o trigo vendido por M, 0 B esta Obrigado perante 0 A através de um vinculo obrigacional que the impéc uma certa conduta: a de exercer as diliggncias necessérias para que o A adquira os bens vendidos ~ 880°. Carlos Fernandes -200s/2006 [13 Direitos Reais: I— Principios Gerais de Direitos Reais [Hipstese n° 6) Resolueiio da alinea d): 1 — 0 contrato tem por objecto todas as mags do pomar de B - que se deduz fazer parte {ntegrante da quinta, Nos termos do art. 212°/1 e 2, as macds em causa integram.o conceito.de-frutos naturais, sendo que 0 n° 2 do art, 408°, im fine, estabelece um regime especifico quanto a estes. ‘Seigiido este regime, a transferéncia do direito de propriedade dos frutos naturais verifica-se apenas ‘no momento da colheita Diz-nos o enunciado que a colheita deveria ser feita em Margo, mas parece que ndo foi isso que sucedeu, uma vez que quando vendeu a quinta a C, em Maio, o B nada entregara a A do que tinha sido acordado. No entanto é omisso quanto & responsabilidade pela realizagio dessa colheita: nao diz se & do devedor ou do comprador. I— Suponhamos que a responsabilidade pela colheita era do devedor e que este a realizon em Margo, como devido. Neste caso, a propriedade das mags transferiu-se do imediato para 0 A, passando este a poder reivindicar © reconhecimento desse seu direito © consequente restituigio nos termos do art. 1311°; e280 0s frutos no tenham sido colhidos antes de a quinta ser vendida com todo o set contesido a C, 06 frutos sio propriedade deste, uma vez que 0 contrato entre A © B no chegou a ter eficdcia real, pelo que deverd seguir-se 0 regime das obrigagdes © néo dos direitos reais. B 0 vinculo obrigacional nfo tem eficdcia quanto a terceiros fora dos casos ¢ termos previstos na lei — 406972 II —E so a responsabilidade pela colheita fosse do A? Bom, neste caso ele deveria ter colhido 0s frutos no més de Margo, como acordado. Mas niio parece té-lo feito, ov nao faria sentido estar agora a exigir do C a entrega desses bens. E, assim sendo, A entraria em mora a partir do momento em que deveria ter feito a colheita e nao o fez— 813°, Caso estivéssemos perante uma obrigacdo genérica, verificar-se-ia uma das situagGes previstas no art. 541° em que a concentragdo da obrigaglio se dé antes do cumprimento. Mas, como se compreende, esta nfo & uma obrigagtio genérica: ela esti perfeitamente determinada desde a celebragio do negécio: sao todas as mags do pomar do B.~ a titi! IV — Atente-se ainda neste outro aspecto: sobre as mags objecto do negécio entre A e B incidem dois direitos conflituantes: o dircito de erédito de A o 0 direito real de propriedade do C. Ora, pelo principio da prevaléncia, o direito de crédito code perante o direito real, pelo que A nao pode ‘opor 0 seu direito ao direito de C. Sendo assim, s6 resta ao A exigir de Bo pagamento de uma indemnizagio, j& que 0 ‘cumprimento se tornou impossivel — 790°, Resoluefio da alinea e): 1—A obrigagio resultante deste contrato tem natureza claramente genérica, sendo um exemplo Gaquilo que o Prof, assistente designou por “obrigacdo genérica de género limitado” Segundo a explicago dada na aula de 18-11-2005, as obrigagées ordenam-se de forma escalonada segundo um critério de grau pela ordem seguinte: Carlos Fernandes ~ 2005/2006 } 14 Direitos Reais: I — Princfpios Gerais de Direitos Reais [Hipétese n° 7) J* Indeterminadas: a transmissio dé-se logo que a prestagdo & determinada com conhecimento de ambas as partes ~ 40872, 2° Gonéricas (ditas normais): a transferéncia dé-se com a concentragéo; esta dé-se com 0 cumprimento ¢ este, em regra, com a entrega — 540° ¢ 541°. Nestas 0 risco corre pelo devedor, ficando este obrigado enquanto houver (no mercado) coisas do género sobre que @ obrigasdo incide. Enquanto subsistir 0 género ndo ha impossibilidade ~ 0 540” afasta 0 790°, 3°. Genéricas “de pénero limitado”: ex: A promete a B vender-the um dos 5 quadros de Vieira da Silva que tem lé em casa (admitindo que para o comprador os quadiros da autora eram fangiveis), O regime depende do que as partes quiserem. Se o género limitado perecer, e ainda que haja no mercado coisas do mesmo género, a prestacdo torna-se impossivel — 790° 4°. Alternativas: a iransmissio dé-se com a escolha — 543°. Porqué de género limitado? Porque a obrigacio se toma impossivel no caso de toda a madeira armazenada por B perecer, mesmo que haja no mercado quantidades infinitas do mesmo género de madeira. Se fosse genérica (normal), enquanto fosse possivel ao vendedor adquirir madeira do mesmo género para realizar 0 cumprimento da prestagio esta ndo seria impossivel e nfo se aplicaria o 790°, mas sim o 540%; no entanto, no caso vertente apenas ¢ possivel escolher.a.tonelada de madeira de carvalho que o A comprou de entre as varias toneladas que o B tem armazenadas ¢ de nenhuma.ontra. I — Que consequéncias praticas resultam desta classificagio? Segundo o docente, isto implicaria que o regime a aplicar quanto ao momento da transferéncia da propriedade nao fosse 0 previsto nos artigos 540° ¢ 541° ex vi artigo 408°/2, mas antes aquele que as partes resolvessem estipular. Mas nao ¢ isso que se passa face a qualquer obrigagio genérica, por forga do art. 541°? Diivida a esclarecer... Hips ae Dado pelo Assistente ~ Hipétese 2 Daniel, acompanhado de seu filho Francisco, dirighu-se a um stand de automéveis pertencente a Enmesto com o intuito de escolher um automével novo para si ¢ uma mota para Francisco, Depois da escotha dos yefculos, foi acordado-o seguinte: Fe @ Daniel comprou o automével a Ernesto pelo montente total de € 20,000, a pagar em 10 prestagées; Daniel podia levar imediatamente 0 automdvel, mas 0 registo da aguisigao sé seria efectivado depois do pagamento da tiltima prestacéo, uma vez que, até esse momento, Emesto mantinha a titularidade do mesmo; 4) Daniel compraria a mota para o seu Francisco, pelo montante de € 500, caso ele passasse no exame de Direitos Reais, a realizar dai a uma semana, comprometendo-se Ernesto a, durante esse periodo, nao a vender a ninguém. Dois dias depois, Daniel, desapontado com o sistema de travdes do automével, resolveu vendé-lo ao ‘seu vizinho Xavier. Ermesto, como retaliagio, vendeu no dia seguinte a mota a um outro cliente Quid juris? 1, Da reserva de propriedade 2. Reserva de propriedade em caso de miituo : Carlos Fernandes 2008/2006 [15 Direits Reais: I— Principios Gerais de Direitos Reais ___[Hipétese w° 7) 3. Da venda a prestaydes/venda com espera do prego 1. Da reserva de propriedade I~ O negécio celebrado entre Ee D configura um contrato de compra e venda (874) com reserva de propriedade (409) — visto que, até ao pagamento integral do prego, o Emesto mantinha @ titularidade do automével. Esta reserva de propriedade, uma vez que incide sobre uma coisa mével sujeita a registo, nfio pode ser oponivel a terceiros se nao tiver sido registada (409/2). © contrato de compra e venda entre D e X é nulo, por falta de legitimidade do vendedor, que realizou uma venda de bens alheios ~ 892. Nao. consta, no entanto, do texto que a reserva de propriedad tenba sido registad, pelo que esta nfo seria oponivel ao Xavier. TI — A reserva de propriedade tem como finalidade essencial acautelar 0 direito do vendedor. De facto, havendo transmissio da propriedade (¢ esta dé-se, como sabemos, por mero efeito do -contrato — 408/2 ¢ 879/a) ¢ entroga da coisa, a falta de pagamento nao resolve 0 contrato (886). Assim, ‘0 vendedor que no reserve a propriedade vé-se na contingéncia de nao ver o seu crédito satisfeito; e mesmo que mova contra o comprador uma acgio em que, por exemplo, pretenda a penhora do automével, terd de concorrer em pé de igualdade com os demais credores do devedor inadimplente, face ao principio par conditio creditorum. ms Havendo reserva de propriedade pode o credor, por um lado, exigir a restituigfo da coisa através de uma acgao de reivindicago (1311) uma vez que ainda ¢ 0 seu proprietirio e, por outro, ficaré a salvo dos etedores do comprador sobre a coisa transaccionada. 2. Reserva de propriedade em caso de miituo Existe uma modalidade sui generis de reserva de propriedade hoje em dia bastante utilizada, ‘mas cuja natureza levanta algumas questies (incluindo de legalidade): € a que tem a ver com a cexigéncia de reserva de propriedade por parte das financeiras sobre os bens adquiridos através de cempréstimo bancério, ‘Como se passam as coisas? Vejamos em esquema: Carlos Fernandes ~ 2005/2006, Direitos Reais: I — Prinefpios Gerais de Diresitos Reais [Hopétese n° | mito no é um contrato sinalagmitico, uma ver que sé faz. nascer obrigages para uma das partes, Por banda do mutuante exige-sc a entrega do dinheiro (entrega esta que constitui um efeito real do contrato; a transferéncia da propriedade do dinheiro para o mutudrio no é uma obrigagdo, mas um ressuposto do contrato); quanto ao mutuétio, pelo contrétio, verifica-se a adstrigo deste a um vineulo obrigacional — o de resttuir outro tanto do dinheiro que recebeu. No sendo um contrato sinalagmético, ndo se aplica a este a excepgo do cumprimento simultineo das obrigagGes. 0 objecto do contrato de mituo & © dinheiro mutuado, pelo que apenas sobre ele poderia a financeira exigir reserva de propriedade. Mas isso nao faria sentido, uma vez que em caso de pperecimento do dinheiro o riseo correria por conta do banco (que se manteria proprietério). ‘Assim, os bancos exigetit que-a reserva de propricdade incida sobre o carro, que era do stand ¢ nfo dele, o que nfo deixa de ser absurdo. Apesar de no haver suporte legal para esta reserva, o que é facto € que ha quem aceite esta modalidade de reserva de propriedade. 3. Da venda a prestagdes/venda com espera do prego Quanto a forma de pagamento, podemos enquadré-ta em duas modalidades distintas: 8) Ade compra e venda a prestages ~ 934 b) A de compra e venda com espera do prego, que nao tem regulamentagdo expressa. ‘No caso de venda a prestagées com reserva de propriedade, a falta de pagamento de uma das prestages que no exceda a oitava parte do prego nio dé dircito a resolugdo do contrato. No entanto, por forea do art. 781, a falta de pagamento de uma das prestagdes da divida importa o vencimento das restantes, ‘| Carlos Fernandes — 2005/2006 Direites Reais; I Publicidad: a protegio rgistral [Hipstese n° 8) Ti =Publicidade: a protecgao repistral’ 0. AE Hipétese n*8 O proprietario inscrito na Conservatoria do Registo Predial de Evora, por compra do prédio X a Z, vendew 0 mesmo prédio a B. Esta venda nda foi registada, Dois meses depots, F, credor de A, registow uma penhora sobre 0 prédio X. Seis meses depois, A tornow a vender o prédio a C, que desconhecia a anterior venda a B. C registow ‘a aguisieao Ao saber do registo de C, B interpés uma acedo de declarado de mulidade da venda concluida entre Aec. 4) Rsclareca a efiedcia real dos negécios celebrados por A com Be C. 8) Analise a falta de registo do contrato de compra e venda celebrado entre A e B. ©) Diga se a declaragio de nulidade requerida poderia afectar a posigito de C. d) Estaréo F protegido pelas regras do registo? Aspectos a considera 1. Bficdcia real dos contratos 2. Venda por non dominus 3. Obrigatoriedade ou nao do registo 4, Conceito de terceiro para efeitos de registo 5. Bfeitos da falta de registo, Questito da alinea a): © caso em anilise pode ser representado esquematicamente da seguinte forma: 2Mews P08 4 depois © Pesos O contrato entre A ¢ B é valido © produz efeitos no acto da sua celebragio, pelo que a propriedade se transmitin do primeiro para 0 segundo nesse preciso momento ~ 408/1 Carlos Fernandes ~ 2005/2006 Direitos Reais: IT — Publicidade: a protegioregistral [Hlipéiese n° 8) © contrato entre A © C é nulo, por falta de legitimidade do alienante, uma vez que jé nfo era proprietirio do prédio & data da alienagao. Tratou-se de uma venda de bens alheios — 892" Questo da alinea B): Embora a aquisigio do direito de propriedade seja um dos factos sujeitos a registo (2°/1.a) do ‘CRProp), este registo nao é obrigatério, pelo que o direito de B nfo é afectado pela sua falta.” No entanto, fala-se de uma “obrigatoriedade indirecta” (Oliveira Ascenso), uma vez que 0 titular do direito nao pode dele dispor sem 0 prévio registo. ae O art. 9° CRProp dirige-se ao Notério: este nio pode titular um acto de disposig&o de um direito sujeito a registo sem-que este tenha sido definitivamente inscrito. E aqui que se baseia o Prof. Oliveira Ascensio para afirmar que existe obrigatoriedade indirecta do registo predial. ; (O Prof. Carvatho’ Fernandes fala, ao invés, de legitimagio: s6 pode dispor de um direito (sé test ~ Tegitimidade para tal) aquele que beneficiar de um registo. O Prof. Coelho Vieira profere esta posisio.. anterior. : Apesar de o registo no ser necessirio para a transmissto do direito de propriedade para a esfera Juridica do B, que opera por mero efeito do contrato (408/1), 0 registo tem um efeito consolidative ou ‘confirmativo: néo constitui o dircito, mas coloca o seu titular ao abrigo do efeito aiributivo. Seo B 1i¥880 registado a aquisigdo do sou direito este consolidava-se, néo permitindo a C adquiri-lo por via tabular. eeree Questiio da alinea ¢}: Seré C protegido pelo registo da sua aquisigo? Para responder a esta questio importa esclarecer 0 que se entende por terceiro, para os efeitos previstos no art, 5° do CRProp. Podemos encarar este conceito numa acepgo ampla © numa acepsao restrita. Na primeira, terceiro soria qualquer pessoa exterior a relagdo juridica considerada; na restrita, s6 & assim considerado quem preencha 05 requisitos constantes da n?-4 do citado-artigo. ———~>Até ha pouco tempo, esta questio gerava fortes polémicas, sendo interessante analisar os Acérdios STJ.4/97.¢.3/99 (confirmar as referéncias). Hoje,o n° 4 resolveu essa questio, ———> Terceiro, para este efeito, ¢ aquele que tiver adquirido de um autor _comum direitos incompativeis entre si. No caso em aprego, F niio ¢ fereeiro, pois nada adquiriu de A; C é tereeiro, pois adquitiu de Aum direito de_propriedade incompativel.com.o direito que B adquiriu do mesmo lade C nada adquiriu, uma vez que A jé nfo dispunha do direito para o alienar; mas ele ‘io © sabia nem tinha obtigaggo de o saber, dada a presungio do art. 7 CRProp. Resumindo, B e C adguiriam de A ~ autor comum — direitos incompativeis, pelo que C & terceiro em relagio a B, titular substantivo do direito, (O caso configura aquilo que se designa como dupla disposigiio do mesmo direito, Do ponto de vista substantivo, esta situagdo tem uma solugio muito simples: quando A vende 0 prédio a C jé nio tinha legitimidade para o fazer. O que fez. foi uma venda de bens alheios (892°) que 6, assim, nula. Como foi entio possivel realizar esta segunda venda? O que se passa & que 0 Notirio, ao ser-the exibida uma certidio que dé A como proprietério, nada pode fazer a néo ser titular a aquisigio da propriedade por parte de C. Caras Fernandes 2008/2006 [19 : [Hiporese n° 9) (Quo efeitos tem a precedéncia do registo da aquisisao do C sobre a de B? O art. 5°/1 CRProp refere que os factos sujeitos a registo 96 so oponiveis a tereciros depois da data do respectivo registo, Esta norma vai, aparentemente, a0 arrepio do principio da absolutidade, segundo o qual-uin direito real 6 oponivel erga ommes. Mas 0 sentido desta ¢ o de conferir protecgao a terceiro, sem afectar a oponibilidade erga omnes dos direitos reais, que existe independentemente de registo, Vimos ja que C & terceiro para efeitos do art. 5/1. Mas para que possa obter protecgo por via registal é necessério que, para além disso, preencha cinco requisites cumulativos: 1) Que exista um registo anterior desconforme; J 2) Que o acto de disposieao ¢ alienaggo se fundamente no registo desconforme; 3) Que o negécio seja oneroso; ee 4) Que o tereeiro adquirente esteja de boa £é (subjectiva ética); 5) Que o terveiro adquironte tenha registado o facto juridico relativo & sua aquisig&o antes do registo da acedio de impugnaeas, Prof. Carvalho Eernandes, em nota dissonante de toda a doutrina autorizada, defende que 0 neta peoicea mesa caso de neg gre. ibutivo, também E o que acontece a0, titular do direito de propriedade em termos substantivos? Bem, 0 seu direito extingue-se por efeito da aquisig#o tabular do C, uma vez que sio incompativeis entre si e nfl podem subsistir. Na esfera jurfdica do C constitui-se um direito ex novo, uma vez que esta aquisigdo é originéria e niio derivada, Mas serd que é sempre assim, ie., que sempre que seja adquirido um direito real por via tabular se dari a exting&o do direito adquirido substancialmente por um titular diferente. Por outras palavras, se o C tivesse adquirido, em lugar de um direito de propriedade, um mero usufruto, ainda assim se cextinguiria o direito de propriedade de B? ‘A resposta é negativa: uma vez que os direitos nfo sto absolutamente incompativeis entre si, 0 primeiro subsiste, mas fica onerado com o segundo. Questio da alinea d): Relativamente & penhora que F registou sobre o prédio de B, pode este, em qualquer momento, cancelar esse registo, uma vez que aquele nao pode onerar bens que no pertencem ao patriménio do seu devedor (A) ~ 8° 13° CRProp. Pela divida de A responde o patrimdnio desto 6 0 prédio X jé nfo faz parte desse patriménio. Logo, nfo sendo F abrangido pelo conceito de terceiro constante do art. 5°/2, no pode ele beneficiar da protecgo do n° 1 deste artigo. Hipotese n° 9 A celebrou com B um contato de doagdo do prédio X. A inka insrigto regisal a seu favor desde 02- 01-2000. O contrato de doagdo néo foi registaco. Dois anos depois, B vendeu a C 0 referido prédio. C registou de imediato a respectiva aquisicdo. Dois anos apés a compra e venda entre B e C, A intentou uma acciio de declaragéo de nulidade da doagiio, acgéo essa que veio a ser declarada procedente, com irdnsito em julgado, em 05-12-2005. Carlos Fernandes 2005/2006 [20 Direitos Reais: II — Publiidade: a proteso regstral [Hipétese n° 9) Diga, findamentadamente, quem & 0 proprietirio do prédio X. Aspectos nsiderar: 1. Da validade dos contratos e seus efeitos 2. Da legitimagao de direitos sobre imbveis e suas consequéncias 3. Da validade/invalidade do registo da aquisigo de Ce seus efeitos 4, Da proteegaio de terceiro de boa fé — regime aplicavel 1. Da validade dos contratos ¢ seus efeitos © contrato de doagio tem eficécia real, transmitindo-se © direito de propriedade para a esfera juridica do donatério no momento da sua celebragiio ~ 408/1 ¢.954/a) Sabemos, no entanto, que 0 contrato de doagéo A - B ¢ nulo (cfr. sentonga transitada em julgado). Ora, um contrato nulo nfo produz quaisquer efeitos Linco sb ilo, Por eonsepunt, 0 direito de propriedade sobre o prédio nunca se transmitiu de A para B (289). 11— Também no contrato de compra venda se verifica eficécia real, transmitindo-se 0 direito de propriedade do alienante para o adquirente no momento da celebragdo — 408/1 ¢ 879/a), Verifica-se, cantudo, que por efeito da nulidade.do contrato de. doaciio.o prédio.era.ainda.de A quando B 9 yendeu,a.C. Logo, o contrato de compra ¢ venda B - C é igualmente mulo, por falta de legitimidade do alienante, que praticou uma venda de bens alheios como sendo do préprio (892). A propricdade continua, em termos substantivos, na esfera juridica de A. 2. Da legitimagio de direitos sobre iméveis ¢ suas tonsequéncias 1—A aquisigao dos direitos de propriedade 6 um facto sujeito a registo, nos termos do art,2/1.a do CRProp. E diz-nos o texto que o A tinha uma inscrigiio registal em seu favor relativa ao prédio X. Ora, nos termos do art. 9/1 CRProp, a transmisstio de direitos sobre iméveis nfo podem ser titulados som que os bens estejam definitivamente inscritos a favor da pessoa de quem se adquire 0 direito. ‘Como foi entio possivel a celebragao do contrato entre B C, tendo em atengao que, por ser um imével, a lei exige forma especial -escritura piblica? ‘Tal-deveu-se.a0 facto de.o.Notétio, a quem 0 art. 9/1 CRProp se ditige, alo ter cumprido com esta disposigaio legal, titulando a transmissio do imével sem verificar que 0 mesmo nao estava insérito a favor de B, alienante. “TL — As consoquéneias da violagio do art. 9/1 sto diferentes consoante os autores: pata Menezes Cordeiro, 0 acto de aquisig’o & nulo; para Oliveira Ascenso, milo passa de mera imregularidade, gerando paralelamente responsabilidade diseiplinar por parte do notério responsivel. © Prof. Coelho Vieira segue esta posigao, Carlos Fernandes 2005/2006 [21 Direitus Reais: I— Publicidade: a protec registral [Hipotese n° 9] 3, Da validadclinvalidade do registo da aquisicao de Ce seus efeitos I — O principio do trato.sucessivo, consagrado no art. 34° do CRProp, diz-nos que o registo definitive “de aquisigao de direitos depende de prévia inscriglio dos bens em nome de quem os transmite. Assim, para poder ser registada a aquisigdo de C feita a B, era necessério que 0 prédio alienado estivesse registado em nome deste iltimo. Mas, como vimos, este registo nfio foi feito, verificando-se, assim, violagdo deste principio. Ora,.a.violaptio do-prine\pio.do-trato-sueessivo 6, precisamente, a causa de nulidade do registo prevista no art. 16/e), pelo que o registo da aquisigio de C é nulo. 1 — Que efeitos, se é que alguns, se podem verificar em relagio a C em resultado deste registo nulo? Seré que pode o adquirente C almejar protecgo conferida pelo art. 17/2 do CRProp a terceiros. de boa £8? A resposta tem de ser liminarmente negativa, Terveiro, para eftitos do art. 17/2, 6 aqucle que adquire de beneficidrio de um registo nulo. Mas aqui ‘© beneficidrio é 0 proprio C, logo, este nfio ¢ considerado terceiro no ambito desta norma. ‘Note-se que a ratio da lei ao dar protecgiio a tereciro de boa fé contra os efeitos da nulidade do registo em favor de quem adquire é a necessidade de ir de encontro as expectativas de certeza e seguranga juridica que este criow ao confiar na verdade e exactidio dos registos piiblicos. Mas 0 C nem esse argumento tem em seu favor, uma ver que adquiriu de quem néo tinha a scu favor uma inscrigéo registal. Facto que ele sabia ou tinha a obrigagao de conhecer, dada a fungio de publicidade do registo. ~ ee 4. Da protecciio de tereeiro de boa fé — regime apliciivel 1 — Afastada a possibilidade de C beneficiar da proteogio do art. 17/2 CRProp, resta-nos verificar se a sua situago pode ser abrangida pelo regime previsto no art. 291° CC. Este regime exige, para a sua aplicabilidade, seis requisites cumulativos: 1) Pré-existéncia de um registo desconforme ("); 2) Acto de disposigtio (negocial) fundado no registo mulo ¢ ferido de ilegitimidade por provir de titular aparente; 3) Quo a aquisiglo seja onerosa; 4) Que o registo da aquisigiio pelo terceiro preceda o rogisto de acgio de nulidade; 5) Que o terceiro esteja de boa fé, na acepeao do art, 291/3 do CC; 6) Que a acgiio niio tenha sido interposta nos 3 anos seguintes contados da data do negseio nulo ou anuldvel, TI — Vejamos se preenche os requisitos assinalados. Desde logo, verifica-se que nfo existe, antes da celebragio do negécio entre B e C, um registo desconforme, pelo que néo hé como o subadquirente possa invocar qualquer fé pablica ou presungao fundada no registo. Logo, também aqui a protecedo do C no pode ter lugar, sendo irrelevante que ‘enham decorrido os 3 anos referidos no art, 291/2 ou qualquer outro ~ todos os requisitos tém que estar cumulativamente preenchidos. 2 Note-s que a desconformidade do rogisto de aquisigo pelo terceiro(subadguirente) no releva pera este eftito; 0 regis ‘que importa & 0 de auisigso em favor de quem alisnou o bem a0 teeciro. Cartos Fernandes 200972006 [22 Wet Ore se er ee Direites Reais: U— Publcidade: a protcpo reistral [Hlipotesen? 10) Quer nos casos abrangidos pelo art. 17/2 C.R.Pr., quer naqueles em que ¢ aplicével o art. 291 CC, 86 pode beneficiar da protecgdo registal o subadquirente ¢ noo beneficisrio do registo desconforme. Vejamos em esquema: - on regis (alo) Subadqurente ( ) : (©) C) nmin —— mer, laze, ee coere ceed tr eel eee Conclui-se, assim, que o proprietério actual do prédio X ¢ 0 proprietétio original, ie., 0 C. Hipstese nn 10 A, aproveitando o facto do prédio X nto constar do Registo Predial, forjou uma justificagao notarial de usucapiao da propriedade e promoveu o registo dessa aquisigdo a seu favor. Dois meses mais tarde, A vendeu a B a propriedade do prédio X, ignorando o comprador que estava a comprar um bem alheio. B registou a aquisicdo. Entretanto, C, 0 verdadeiro proprietirio, interpGe uma acgdio de relvindicagdo contra B pedindo 0 reconhecimento do seu direito de propriedade e a condenagéo de B na enirega da coisa, @) Diga quais sao os aspectos registais envolvidos nesta hipstese 2) Esclarega se a acgao seria procedente se B invocasse também ele ser proprietirio da coisa. Aspectos a considerar: 1. Da omissdo de registo do prédio 2. Da validade dos titulos de aquisigao e dos registos 3. Da protecgto de terceiro de bos fé — regime aplicével aes 1, Da omissio de registo do prédio A primeira questiio que se levanta é a de saber como é possivel a existéncia de prédios omissos no registo, A resposta a esta questo prende-se com a nio obrigatoriedade de registo que vigora em Portugal. Cartos Fernandes 2005/2006 [23 Dirvites Reais: Il — Publicidade: a protesgo registral [Hipétese n° 10 art, 2° do CRProp enuncia quais os factos juridicos sujeitos a registo, mas o art. 41 sujeita esse registo ao prinefpio da instGncia, o que significa que o impulso inicial cabe aos interessados; s6 a pedido destes serio os factos registados, Mas, poderlamos perguntar-nos, a existéncia de prédios omissos niio vai contra os fins do registo predial expressos no art. 1°? E claro que sim, mas a situagiio nfo é assim to grave pois os interessados acabardo, mais tarde ou mais cedo, por fazer esse registo, uma vez que s6 assim teri legitimidade para alienar esses bens (9° CRProp). por isso que, conforme jé referido no desenvolvimento do caso anterior, Oliveira Ascensio fala da existéncia de uma espécie de “obrigatoriedade indirecta” © o Prof. Coelho Vieira, seguindo 0 Prof. Carvalho Fernandes, de legitimagao. Conclui-se, assim, que o A teria que proceder & descrigéo do prédio para poder inscrever @ aquisigdo da propriedadc. E foi o que fez, recorrendo embora a um titule forjado. 2. Da validade dos titulos de aquisigio e dos registos O enunciado fala-nos de uma escritura de justificagéio notarial. Em que consiste esta escritura de |justificagao notarial? Trata-se de uma escritura que, obedecendo a certas formalidades especificas, tem por fim a justficaglo da aquisigao da propriedade do prédio Por exemplo, alguém que esteja em cor de um titulo que Ihe permita registar essa aquisi tal escritura de justificagdo para o cftito, No caso presente, essa eseritura de justificasio notarial que voio a servir de titulo para a realizagio do registo foi forjada pelo proprio B. Para além da responsabilidade criminal em que incorre pela pratioa desse ilicito (crime de falsificagaio de documentos ~ art, 256 do Cédigo Penal), a falsidade do titulo determina a nulidade do registo, nos termos do art. 16/a) do CRProp. E facil constatar que, nada tendo o A adquirido, nada poderia transmitir ao B por falta de legitimidade. © A é um non dominus, apesar da presungdo do art, 7°, tendo procedido a uma venda de bens alheios, que ¢ nula nos termos do art, 892 CC, pelo que o B nada adquiriu. © registo da sua aquisisdo 6, por conseguinte, nulo também pelos mesmos motivos, igdes de adquirir a propriedade por usucapido precisa do em seu nome. Dirige-se entio ao notirio e obtém a Em termos substanciais, o prédio continua a pertencer aC. 3. Da protecgio de terceiro de boa {6 — regime apliciivel 1 — Enquanto os primeiros dois pontos procuravam responder, essencialmente, & questo da alinca a), este debruga-se sobre o que 6 perguntado na seguinte Dissemos hé pouco que o C continua a set, substantivamente, o propristirio do prédio X. O facto do nifo ter rogistado a aquisigo da propriedade do prédio em seu nome nao basta para negar-lhe a titularidade do seu direito, Este existe independentemente do registo, que, como vimos, nem sequer obrigatério. A oponibilidade erga ommes do direito de propriedade, como direito real tipico, advém-lhe do principio da absolutidade que Ihe & caracteristico, ‘Mas a falta de registo nfo é isento de consequéncias: apesar de 0 registo niio ser constitutive do direito, ele niio deixa de ter um efeito consolidativo, o que significa que quem dele beneficia fica ‘protegido contra uma eventual aquisigdo tabular por parte de terceito, i.e. fica salvaguardado do efeito atributivo do registo. Tl —Hverd, neste caso, protecgtio registal de B? ‘A protecgio conferida pelo art. 5° CRProp é de afastar liminarmente: 8 no preenche o conceito de terceiro definido no n° 4 deste artigo: quer A quer B nada adquiriram de C. Carlos Fernandes 200s2006 [4 Direitus Reais: I~ Publicidade: a protegio regitral [Hpétese n° 17) A protecgio a conferir pelo art. 17°/2 depende da verificactio cumulativa de cinco requisitos: 7) Pré-existéncia de um registo nulo; 8) Que a aquisigdo pelo terceiro se funde na pré-existéncia do rogisto nulo 7); 9) Que a aquisigao seja oncrosa; 10) Que o registo da aquisig&o pelo terceiro preceda o registo de acgo de nulidade; 11) Que o terceiro esteja de boa fi, na acepgfio do art. 291/3 do CC, Pela andlise que fizemos, podemos concluir que esto preenchidos todos os requisitos que a lei exige para protecgiio do terceiro. De facto, (i) existe um registo nulo prévio ao negécio de compra e venda entre A e B (0 que registou a aquisi¢ao a favor de A com base numa escritura de justificagio notarial forjada) (ji) a compra pelo B fundou-se nesse registo desconforme; (ii) 0 negécio foi oner0so (compra e venda); (iv) 0 B registou a aquisig&o antes de C registar a acgdo de reivindicagdo ¢ (v) 0 B estava de boa fé, pois ignorava a falsidade do titulo de aquisigao do A e do registo deste © nao the era exigivel que fizesse mais do que consultar o registo predial relativo ao prédio, face A f€ publica destes registos e & prosungiio estabelecida no art. 7° do eédigo respectivo. Assim, a acgio de reivindicacdo ndo poderia proceder, sendo B o legitimo proprietério actual do prédio por aquisi¢ao tabular (efeito atributivo do registo), nos termos do citado art. 17/2 do CRProp. IL— Ponto a reter que todas as hipsteses do art. 17/2 se idemtificam pela pré-existéncia de um registo nulo, Haver alguma forma de evitar o efeito atributivo do registo quando, por falta de registo do proprietario (em termos substanciais) no se verificou o efeito consolidativo? A resposta é afirmativa ¢ é-nos dada pelo art. 5/2.a CRProp: quando a propriedade ¢ fundada na aquisi¢ao por usucapitio tal facto afasta a possibilidade de aquisi¢&o por via tabular. Hipotese n? es z ee a Entre Ae B foi celebrado um contrato de doagao do prédio X, no dia 03-Jan-2002. O contrato, celebrado por escritura publica, foi levado ao registo por A. Um ano depois, em 03-Fev-2003, B vendleu a C o direlto de propriedade adquirido no negocio com A, Cregistou a sua aquisicdo. Em 02-Jan-2006, 0 Supremo Tribunal de Justiga declara nulo o contrato celebrado entre A e B. Com base nesta decisdo, A reclama de C a entrega do prédio, Quid iuris? 108 a con: 1. Da validade dos contratos seus efei 2. Da validade/invalidade do registo da aquisigfio de C e seus efeitos 3, Da protecgao de terceiro de boa fé — regime aplicavel s * Note-se que « milidade do registo de aquisigho pelo tercero nko releva para este efeito; © registo nulo que importa & 0 de ‘aquisigdo em favor de quem alicnou o bem ao teezir, : Carlos Fernandes — 2005/2006 |25 Direitos Reais: I — Publividade: a protecpao registral [Hipéiese n° 17) 1, Da validade dos contratos e seus efeitos T— 0 contrato de doagSo tem eficécia real, transmitindo-se o direito de propriedade para a esfora juridica do donatario no momento da sua celebragiio — 408/1 ¢ 954/a). [CI \bém art. 947°/1 CC ~ embora ni tenha sido referido pelo Prof.) —EE fi Sabemos, no entanto, quo o contrato de doagio A — B é nulo (cf. sentenga). Ora, um contrato rnulo no produz. quaisquer efeitos juridicos ab initio. Por conseguinte, 0 direito de propriedade sobre 0 prédio nunca se transmitiu de A para B (art. 289° CC). {Importa aqui considerar 0 PRINCIPIO DA. CONSENSUALIDADE em vigor na ordem juridica portuguesa] I — Também no contrato de compra e venda se verifica eficdcia real, transmnitindo-se 0 direito de propriedade do alienante para o adquirente no momento da celebragdio — 408/1 ¢ 879/a). Verifica-sé, contudo, que por efeito da nulidade do contrato de doago o prédio era ainda de A quando B o vendeu a C. Logo, 0 contrato de compra ¢ venda B ~ C € igualmente nulo, por falta de egitimidade do alienante, que praticou uma venda de bens alheios’ como sendo do proprio (892). A propriedade continua, em termos substantivos, na esfera juridica de A. Tal remete-nos para uma desconformidade entre a realidade substantiva (A é proprietirio) e a realidade registal (B é proprietirio). ee 2..Da validade/invalidade do registo Considerando que estamos em presenga de factos contemplados nos artigos 2° e 3° do Cod. Registo Predial, tal dado remete-nos para o art. 7° do mesmo diploma no que eonceme a presungto da. titularidade do direito. ‘A poderia ter registado? Sim — eft. art. 36° Cd. Registo Predial (neste easo niio foi o donatério a registar mas sim o doador). 3. Da protecsio de terceiro de boa fé~ regime aplicivel Tendo por base a desconformidade existente entre a realidade substantiva (A é proprietario) © a realidade registal (B 6 proprictério), entende o legislador que o terceiro, neste caso C, beneficia de profecgfio nos termos do art.291° CC. Este regime exige, para a sua aplicabilidade, seis requisitos cumulativos: - 1. Preexisténeia de um registo desconforme ('); 2. Acto de disposigo (negocial) fundado no registo nulo e forido de ilegitimidade por provir de titular aparente; 3. Que a aquisigaio seja onerosa; 4. Que o registo da aquisig&o pelo terceiro preceda o registo de acgiio de mulidade; Que o terceiro esteja de boa fé, na acepyao do art. 291/3 do CC; > Uma mésima que importa reter a de que “Ninguém pode transmitr direlios que ndo tem”. Cf. ar. 892° CC (compra venda) ¢ art. 956° CC (doagio}. * Note-se que a desconformidade do registo de aquisigho pelo terceiro (subadquirente) nfo releva para este efit; 0 rgisto «que importa € 0 de aqusigao em favor de quem alienou o bem ao fereciro. Carlos ernandes 2005/2006 {26 Dirvitos Reais: I — Publicidade: a proteegao reistral [Hipotese n° 11) 6. Que a acgdio nifo tena sido interposta nos 3 anos seguintes contados a partir da data do negécio invalid’ (nulo ou anulavel). [Importante: Aqui o que conta é que a acpiio de declaragéo de nulidade ou de anulagdo seja proposta e registada dentro daquele prazo, nif0 relevando a data da deciséo do tribunal]. Conclusdo: Considerando que (pelo menos tudo o indica uma vez que uma acgio nfo chega a0 cconhecimento do Supremo tribunal em menos de um ano) que a acgao de declaragio de nulidade foi interposta nos 3 anos seguintes, contados a partir da data do negécio, entende o legislador que nestes casos prevalece a posigao substantiva em detrimento da posigao registal. Nota: Artigos 5° ¢ 17° Céd. Registo Predial — a protecgdo do terceiro é automética © ocorre por via do registo. Artigo 291° CC - a protecgao do terceiro s6 se da desde que nonhuma acgtio tenha sido interposta nos 3 ‘anos soguintes contados a partir da data do negécio invalido. Hipétese Suponha agora que a acgdo de declaractio de nulidade foi intentada apenas em 02-Jan-2006.Poderia esta aceao influenciar o conflito entre Ae C? Nilo. Mesmo que o tribunal viesse a declarar nulo 0 negécio entre A e B, tal seria irrelevante para C {que beneficiaria de protecgto registal (adquirindo o direito real a que se reporta o seu registo). Apontamentos: Artigos 5° ¢ 17° Céd., Registo Predial + Artigo 291°CC ‘A aquisigo tabular de um direito implica a extingfio do direito anterior, O direito adquirido tabularmente é um direito ex novo, Art. 5°/1 Céd. Registo Predial: aplica-se em hipsteses de dupla disposigdo (A mesma pessoa dispoe duas vezes do mesmo direito) ~ Conjugar com art. 5°4 Cd. Registo Predial Art. 17°72 Cbd Registo Predial: aplica-se em hipéteses de sub-aguisicdo com nulidade registal (ver art. 16° Céd. Registo Predial) — cenério de sucesso de contratos, Art, 291° CC’: -se om hipétoses de sub-aqui negécio invilide— cenério de sucessio de contratos. ‘fo em que se verifica a preexisténcia de um $ Tratarse do 1° negécio nulo ou anulvel, aquele negécio que nfecta» cadcia dos negécios subsequentes, * drtigns 5°@ 17° Cbd Registo Predial. sto ambos casos de protecgéo automstica do terceiro. " drigo 291° CC: a proteasso do tereciro nto é antamisica, Carlos Fernandes — 2005/2008 [27

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