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CDD 050
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A REVISTA DE PESQUISA DA ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS DA UNIFEV V. 1 N°1 JAN/JUN 2006
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A REVISTA DE PESQUISA DA ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS DA UNIFEV V. 1 N°1 JAN/JUN 2006
Expediente
Conselho Editorial Interno
Profº M.Sc. Rogério Rocha Mattaruco
Profº M.Sc. Rogério Rodrigues de Souza
Profª M.Sc. Ana Maria Mateus Martins
Conselho Executivo
Médico Veterinário Celso Luiz Alvez dos Santos
Presidente da FEV
Prof. Dr. Marcelo Ferreira Lourenço
Reitor da UNIFEV
Prof. Dr. Marcelo Casali Casseb
Pró-Reitor Administrativo da UNIFEV
Prof. Dr. Luís Paulo Barbou Scott
Coordenador de Pesquisa UNIFEV
Produção
Revisão de texto : Prof. Dr. Valdomiro Ribeiro Malta;
Prof. M.Sc. Edson Roberto Bogas Garcia; Prof. Paulo
Rogério Ferrarezi.
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Sumário
Apresentação ............................................ 7
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Apresentação
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Escrever não é simplesmente um ato mecânico de borrar o espaço de uma folha em branco ou de preencher as
linhas de um caderno pautado. O exercício requer reflexão e pesquisa sobre a própria arte da escrita: o que ela significará
e o papel que poderá desempenhar para o enriquecimento de uma cultura ou de um ser (que sempre será único, apesar de
quererem fazê-lo massificado!).
A partir dessa premissa, nota-se a importância que um texto possui. Ele pode unir pessoas, mas, ao mesmo tempo,
promover a incompreensão entre povos e a falta do abraço que acabaria com pretensas guerras e mortes. A linha entre a
vida e a literatura, enfim, é muito tênue e, às vezes, questionamos se o espelho reflete nossa verdadeira imagem ou se ele
revela o que deseja nossa imaginação.
Para quem trabalha também com a palavra escrita, mudar a vida, a cada dia, deve ser um exercício constante e
prazeroso de estabelecimento de diálogos possíveis com a sociedade, deixando a intenção de que se pode mudar ou
ratificar alguns conceitos e não morrer no atavismo que nos faz voltar à concepção de homens que sobrevivem de e para
o imediatismo de idéias sem análises e sem comprometimento com o saber.
A revista Mosaico – pesquisa em Ciências Humanas e Humanas Aplicada do Centro Universitário de Votuporanga
– Unifev, nessa linha de raciocínio, traz artigos que nos induzem a ponderar temas contemporâneos no âmbito político,
arquitetônico, literário e didático. Bela demonstração do princípio inerente à educação: a pesquisa e a preocupação com
as novas descobertas.
A participação cada vez mais profícua dos docentes tem demonstrado o apoio ao desenvolvimento de práticas
histórico-pedagógicas a partir de experiências possíveis somente pela dedicação em produzir materiais que contribuam
para o aperfeiçoamento de nossa Instituição, compreendida como um todo, pois não há um estabelecimento de ensino se
não há unanimidade em aceitá-la como berço de nossas iniciativas de produção.
Aos professores, nossos agradecimentos por acreditarem mais uma vez que as árvores dão frutos e as portas têm
obrigação de se abrirem mais e mais. Aos docentes que, no futuro, pretendem fazer parte de nossas publicações, fica o
convite a novos desafios.
Dessa forma, esperamos contribuir para o estabelecimento de um diálogo cultural cada vez mais aberto com a
participação de toda a sociedade.
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Resumo
O presente texto questiona o conceito de soberania popular idealizada pela doutrina clássica, uma vez
que segundo a concepção realista, que emerge na passagem do século XIX para o século XX, a democracia
deixou de ser uma forma de organização política quando todos decidem sobre tudo. A democracia transforma-se
em procedimento para escolha dos representantes – líderes que produzirão um governo. O estudo mostra o
aumento da complexidade social como elemento que desestabiliza a participação – aumento da complexidade
somado à limitação do cidadão comum.
Palavras-chave: democracia, soberania popular, participação e competição.
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porque, dentro do Estado ainda há mecanismos teoria clássica (tradicional), que idealizou o cidadão
autocráticos que insistem numa resistência. Observa total, Schumpeter mostra um cidadão sem ideologia
a existência, dentro da democracia, de centros de poder definida, sem discernimento das questões sociais e
(exército, burocracia e serviços secretos) que com pouco conhecimento dos temas em debate – chega
constituem a parte oculta da democracia parlamentar a um diagnóstico de que o cidadão apresenta profunda
– instrumentos que não estão sob um controle incapacidade de discernimento, ou seja, é um cidadão
democrático, ou seja, “mesmo numa sociedade “primitivo e ignorante”. Para Schumpeter, a conduta
democrática, o poder autocrático está muito mais do eleitor não é independente (estando aí, a
disseminado que o poder democrático” (BOBBIO, apud importância dos meios de comunicação), o povo é
ANDERSON, 2002, p. 226). influenciável, irracional e manipulável – sem
Herança realista sociológica adquirida de Weber, consciência política. Bobbio, fazendo uma crítica ao
que também identifica elementos que esvaziam o conceito de que na democracia todos decidem sobre
estado representativo, isto é, para Weber certas tudo, chega a questionar quantos são os cidadãos que
esferas da política não são atingidas porque existe, dominam e têm condições de propor soluções às
por exemplo, o segredo da profissão. Assim, certas complexidades do cenário econômico. Bobbio está se
áreas não são transparentes e nem públicas. A referindo ao pouco conhecimento técnico do cidadão
burocracia faz uso do segredo de gabinete para elevar comum para uma luta contra a inflação, melhoria na
o seu poderio – “um parlamento mal-informado, e por educação, programa de geração de renda, dentre
isso impotente é naturalmente agradável à burocracia” outros. Alerta ainda, no que diz respeito à democracia
(WEBER apud BOBBIO, 2000b, p. 410). Percebe-se que direta, que o cidadão apresenta-se em condições
tanto para Weber quanto para Bobbio (ambos realistas) inadequadas para o trabalho legislativo, uma vez que
há um Estado visível que é regido pela transparência, o eleitor está aquém de se pronunciar sobre uma nova
tendo como contra partida o Estado invisível – privado lei que emerge a cada dia.
de transparência, ou seja, existe um movimento Nota-se que os motivos que dificultam a
ditatorial no qual uma face da democracia participação dos indivíduos na política aparecem de
representativa não é atingida. Há, entretanto, as forma diferente, segundo as análises de Schumpeter
exceções em que o segredo poderá ser considerado e Bobbio. Enquanto o primeiro dá ênfase à conduta
como legítimo – “o segredo é admissível quando garantir popular motivada por mecanismos irracionais,
um interesse protegido pela constituição sem lesar mostrando um indivíduo manipulado, dono de um
outros interesses igualmente garantidos (...) a comportamento quase que infantil ao tomar decisões
publicidade é a regra e o segredo é a exceção” (BOBBIO, - “cidadão” mais preocupado com decisões da vida
2000b, p. 414). privada do que como temas públicos - o segundo mostra
O indivíduo comum não poderia lidar com as que é o aumento da complexidade social dentro da
questões que permeiam a dimensão da política democracia que é o elemento que desestabiliza a
moderna, uma vez que se tem a necessidade do participação – aumento da complexidade somado à
conhecimento prévio para lidar com decisões limitação da cidadania comum.
complexas. Para Weber, apenas uma burocracia O cidadão idealizado pela teoria clássica
especializada poderia estar preparada para lidar com tradicional não existe, entretanto, é necessário
a expansão das questões políticas. Schumpeter destacar que, ainda assim, há diversas democracias
também faz objeção à hipótese sustentada pela no mundo, funcionando de forma satisfatória; desta
democracia de que o cidadão pode decidir sobre tudo, maneira, Schumpeter esclarece a diferença entre as
chamando inclusive a atenção para a dificuldade do elites dos regimes autocráticos da dos regimes liberais
cidadão comum em lidar com elementos técnicos que democráticos: enfoca que a concorrência entre as
vão além do seu conhecimento. Diferentemente da elites pelo eleitorado e, conseqüentemente, o controle
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periódico pelos cidadãos, dentro do regime liberal, faz Entretanto, a idéia hegemônica de democracia que
emergir uma elite que se propõe, contrariando, desta se baseia no estreitamento das formas de participação
maneira, as elites do regime aristocrático, que são popular também não pode ser considerada como a
elites que se impõem. Segundo Bobbio, Schumpeter única via acessível. Explicar a democracia parece-nos,
acerta ao sustentar que o governo democrático é a por assim dizer, um tanto complexo, entretanto, temos
presença de muitas elites em competição entre si pela que zelar pela definição de democracia dita uma vez
busca do voto popular, e não, como sustenta a “doutrina por Abraham Lincoln (antigo presidente dos Estados
clássica”, a ausência de elites. Cita ainda (Bobbio) que Unidos) que a democracia é o governo do povo, para o
a dependência desse apoio por parte do cidadão força povo e pelo povo.
os partidos e os políticos a servir aos interesses de O desinteresse da maioria das pessoas pelos
uma maioria popular.O modelo elitista destaca desta assuntos ligados à política é um dos grandes desafios
forma que a legitimidade e o respeito às regras do jogo a enfrentar. Há os que não participam do processo
é a condição para manter a estabilidade da político por desconhecer o seu papel, entretanto,
democracia. Weber, Schumpeter e Bobbio10 defendem existem os que são indiferentes cônscios, ou seja, os
as instituições democráticas e regras para garantir a apolíticos.
legitimidade do sistema político. Bobbio (2000a, p.50) A proposta à sociedade começa pela nossa
conclui: participação e as possibilidades de mudanças são
muito maiores, quando nós – intelectuais e indivíduos
comuns – participamos ativamente da política. O voto,
as promessas não cumpridas e obstáculos não
embora importante, é um instrumento limitado, de
previstos (...) não foram suficientes para “transformar”
os regimes democráticos em regimes autocráticos (...) O participação e pode servir apenas como ritual para
conteúdo mínimo do Estado democrático não encolheu: legitimar a elite no poder. Há muitas outras formas
garantia dos principais direitos de liberdade, existência de participar, a começar pela formação de brasileiros
de vários partidos em concorrência entre si, eleições conscientes, críticos, criadores de sua própria história
periódicas a sufrágio universal, decisões coletivas (...) ou política.
tomadas com base no principio da maioria, e de qualquer
modo sempre após um livre debate entre as partes ou Referências bibliográficas
entre os aliados de uma coalizão de governo. Existem
democracias mais sólidas e menos sólidas, mais
invulneráveis e mais vulneráveis; existem diversos graus ANDERSON, Perry. Afinidades Seletivas. Tradução de Paulo
de aproximação com o modelo ideal, mas mesmo a César Castanheira. São Paulo: Boitempo Editorial, 2002.
democracia mais distante do modelo não pode ser de
modo algum confundida com um Estado autocrático e
menos ainda com um totalitário. AVRITZER, Leonardo & SANTOS, Boaventura de Sousa. Para
ampliar o cânone democrático. Disponível em: <http://
www.eurozine.com/article/2003-11-03-santos-pt.html> Acesso
Considerações finais em: 20 de junho de 2004.
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Resumo
O objetivo da pesquisa é analisar os efeitos de sentido decorrentes da semelhança e da verossimilhança
na composição de uma obra literária. Justifica-se o estudo, pois, decorridos séculos de debates, subsistem
controvérsias acadêmicas acerca desses dois conceitos medulares para a compreensão da teoria enunciada
na Poética de Aristóteles. A pesquisa realizou-se por meio da análise comparativa e do confronto dialético de
diversas posições críticas, pertinentes ao problema e contribui à medida que sintetiza as aparentes
contrariedades teóricas, harmonizando-as.
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mencionadas, conclui-se que os que afirmam ser a como a lenda criada em torno de seu vulto. Manuel
semelhança uma conformidade com a realidade ou com existiu, casou-se realmente com D. Madalena e dela
a lenda primordial inspiradora restringem criatividade separou-se misteriosamente, terminando seus dias
do poeta, por desconsiderarem a possibilidade da num convento. Contudo, Garrett acrescentou
alteração ficcional, para o “embelezamento artístico”, ficcionalidade à personagem, inventando motivos,
por meio da qual a personagem pode superar a criatura situações (a volta do primeiro marido, D. João,
que o inspirou. desaparecido em combate) e falas, caracterizando
É verdade que muitos dos heróis da tragédia Manuel como patriota extremado e moralmente
antiga foram baseados em mitos pré-existentes e, à superior à média dos homens. Mas, embora fosse
primeira vista, se o poeta lhes desse destino diferente excelente em patriotismo e rigidez moral, não era
daquele conhecido pelo público, incidiria numa perfeito, sofria e sentia ciúmes, o que lhe assegura a
incoerência. Mas nada impede que um poeta queira “naturalidade” humana necessária para motivar a
criar personagens novas, sem vínculo com mitos piedade do receptor no momento da catástrofe. É um
viventes, ou mesmo mudar a fama de um mito pré- caráter semelhante, porque as alterações ficcionais
existente. Em tais casos, como ficaria a questão da foram preparadas e motivadas pelas necessidades do
semelhança? enredo e pela busca do embelezamento poético.
Por esse motivo, a posição segundo a qual a Portanto, as regras de semelhança aditadas não
personagem deve ser semelhante à natureza humana impedem as alterações embelezadoras e a colocação
parece ser mais firme. É forçoso reconhecer que, para de dados ficcionais na composição de um caráter. A
os efeitos da catarse, o herói trágico não pode se melhor idéia é, pois, aquela segundo a qual a
afastar muito da natureza do espectador, pois se não semelhança de uma personagem deve ser verificada
houver empatia e identificação entre personagens e comparando-se seus traços e suas ações com o que é
público, não surgem o terror e a piedade. Rostagni crível no mundo da ficção e não na realidade. Daí se
endossa esse posicionamento, dizendo que Aristóteles, infere que a qualidade da peça será medida não
ao afirmar em linhas seguintes a necessidade de as apenas pelos critérios de semelhança acima discutidos,
personagens serem “naturais”, repara a possível embora deles não se prescinda, mas também pela
ambigüidade gerada pela afirmação da semelhança: observação das ações no conjunto artístico, ou seja,
pela avaliação da semelhança no contexto do enredo.
Aristotele prevede una difficoltà, e la ripara Como Aristóteles, ainda nesse capítulo, após
dicendo ch’essi debbono anche essere naturali: ossia la
referir-se à semelhança e às demais qualidades do
loro superiorità non dev’essere a scapito della naturalezza:
non deve lo schiavo per eccesso di nobilità essere troppo herói trágico, trata de aspectos relacionados à
poco schiavo, o simili. (ROSTAGNI, 1945, p. 83). verossimilhança (Poética, cap. XV, p. 84), alguns críticos
tendem a misturar os conceitos de semelhança (que,
Em síntese, parece-nos possível harmonizar as como vimos, refere-se apenas ao caráter da
duas posições: o herói deve aproximar-se sempre do personagem) com a verossimilhança (que à semelhança
homem “natural”, podendo ainda conformar-se com a se liga, mas constitui coisa diferente). Tal
tradição mítica ou histórica, desde que o poeta nela identificação é imprecisa, pois a semelhança do caráter
tenha se baseado e desde que essa aproximação não é apenas um dos fatores na complexidade do enredo
negue a possibilidade da introdução de elementos conducentes à verossimilhança.
ficcionais na obra. Renata Pallottini, analisando a questão, não
Citamos como exemplo o herói Manuel de Sousa distingue claramente os conceitos de semelhança e
da obra Frei Luis de Sousa, de Almeida Garrett. O autor de verossimilhança e afirma que “os caracteres,
baseou-se em dados históricos para criá-lo. A segundo Aristóteles, devem ser semelhantes, ou seja,
existência fática desse homem é comprovada, assim devem possuir verossimilhança” (PALLOTTINI, 1989, p.
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18). Com base nessa afirmação, pode-se, Relaciona-se com a interveniência do “deus ex
desavisadamente, inferir que semelhança seja machina11”, com a existência de elementos irracionais
sinônimo de verossimilhança. A confusão deve ser em cena, com a inserção do impossível e do absurdo
desfeita, pois a semelhança (caráter da personagem) é em cena, e com a necessidade de o poeta ater-se ao
apenas um dos elementos da verossimilhança. Assim que é necessário ou provável no emaranhado do enredo,
sendo, o caráter semelhante colabora para a ou seja,com a possibilidade de embelezamento dos
verossimilhança de uma obra e, se a personagem não mitos.
é semelhante, a verossimilhança fica prejudicada. No capítulo XXIV da Poética, Aristóteles volta a
Contudo, uma obra com personagens semelhantes pode se referir à questão ao esclarecer que fatos podem ser
não alcançar a verossimilhança, pois, nesse conceito objetos de uma imitação bem sucedida, diz:
maior, interferem outros elementos vinculados aos
modos de organização da ação (enredo), além da De preferir às coisas possíveis, mas incríveis,
são as impossíveis, mas críveis; contudo, não deveriam
semelhança das personagens.
os argumentos poéticos ser constituídos de partes
Carvalho, analisando o capítulo XV da Poética, irracionais; preferível seria que nada houvesse de
esclarece que Aristóteles, após descrever os caracteres irracional, ou, pelo menos, que o irracional apenas tivesse
das personagens, desvia-se do assunto e passa a tratar lugar fora da representação. (ARISTÓTELES, 1966, p. 98)
de questões relacionadas ao enredo. (CARVALHO, p. (grifo nosso)
68).
Realmente, quando fala da verossimilhança, no E, referindo-se ao uso do irracional em cena,
capítulo XV, Aristóteles torna a se referir à questão prossegue:
da imitação poética, a qual já tratara anteriormente, se um poeta os fizer de modo que pareçam
nos capítulos iniciais, e, ao mesmo tempo, inicia uma razoáveis, esses serão admissíveis, ainda que absurdos.
outra discussão, que retomará em detalhes nos Na verdade, tudo quanto de irracional acontece no
capítulos XXIV e XXV, quando discutirá questões como desembarque de Ulisses, inaceitável seria, em obra de
a necessária preferência do poeta pelas coisas mau poeta; os absurdos, porém, Homero os ocultou sob
possíveis, mas incríveis e a presença do elemento primores da beleza. (ARISTÓTELES, 1966, p. 99) (grifo
irracional na poesia trágica. nosso).
Dessa forma, a verossimilhança difere da
E mais:
semelhança e merece ser estudada autonomamente.
Com efeito, na poesia é de preferir o impossível
que persuade, ao possível que não persuade.
1.3 Verossimilhança (ARISTÓTELES, 1966, p. 84)
Aristóteles, no capítulo XV da Poética, escreve:
Ora, se o artista deve preferir coisas
Tanto na representação dos caracteres como no “impossíveis, mas críveis” a coisas “possíveis mais
entrecho das ações, importa procurar sempre a incríveis” e se o poeta pode criar a obra valendo-se do
verossimilhança e a necessidade; por isso, as palavras e irracional desde que o “faça” de modo que os fatos
os atos de uma personagem de certo caráter devem criados “pareçam razoáveis”, está claro que a
justificar-se por sua verossimilhança e necessidade. verossimilhança depende pouco da realidade empírica/
(ARISTÓTELES, 1966, p. 84)
histórica e muito da coerência interna observada no
A semelhança, conforme demonstrado, é virtude universo poético.
que confere verossimilhança ao herói (caráter trágico) Embora pareça paradoxal, é mais natural
enquanto a verossimilhança da obra depende também acreditarmos numa história sobrenatural, referente
da confluência de outros elementos do enredo, a coisas que não compreendemos (das quais, portanto,
envolvendo intrincadas questões de coerência. não duvidamos completamente) do que numa história
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possível, mas que contradiga nossos conhecimentos desenlace. Se D. João não retornasse, toda a
e experiências sobre os fatos. A aparição de um espírito preparação se afiguraria imotivada, haveria ruptura
em cena (que é, racionalmente, impossível) pode gozar da unidade de ação no enredo e se frustrariam as
de maior credibilidade - desde que preparada no expectativas do receptor. Algo será, então, verossímil,
evolver do enredo - do que a conversão inesperada (e desde que na própria ação assim se torne, por força de
imotivada) de um vilão em homem dócil e bondoso. uma preparação psicológica conveniente (SPINA, 1967).
Embora a segunda situação seja mais “possível” do que Voltando ao conceito de semelhança da
a primeira, ela é de todo “improvável”, e afigura-se personagem, já tratado anteriormente,
contrária à expectativa que o receptor tem com relação acrescentamos que semelhantes, nessa ordem de
a tal personagem. Por esse motivo, o autor deve idéias, não serão as personagens naturais que
preferir a impossibilidade provável à possibilidade emparelham com a realidade ou com o mito (fábula
improvável. primordial), mas aquelas produzidas pelo labor de um
Segismundo Spina diz que a verossimilhança é a bom poeta, que fará parecer razoável o que seria
regra básica da tragédia. Assim, um fato histórico pode aberrante em outro contexto.
ser inverossímil e um absurdo histórico pode ser Em suma, o herói deve aproximar-se da tradição
verossímil, desde que seja aceitável poeticamente. mítica, sem se afastar do homem natural, caso
Citando Aristóteles, Spina divide as situações contrário, a semelhança fica prejudicada, mas,
dramáticas em quatro espécies: a) o possível principalmente, deve ser o produto de uma articulação
verossímil, que é a categoria propriamente poética; b) coerente, a fim de que suas ações sejam plausíveis,
o possível inverossímil, que é inaceitável bem preparadas e necessárias no universo do enredo.
poeticamente; c) o impossível verossímil, aceitável Caso contrário, embora seja semelhante, não será
poeticamente; d) impossível inverossímil, inaceitável convincente, ou melhor, não será útil à
poeticamente. Conclui-se que, poeticamente, aceita- verossimilhança da ação.
se o impossível, mas não o inverossímil (SPINA, 1967). Nesse sentido, Pallottini salienta que
O desembarque de Ulisses (Na Odisséia), personagem verossimilhante não é o mesmo que
factualmente inverossímil, alcançou verossimilhança realista ou semelhante à verdade dos fatos e das coisas
(tornou-se “aceitável”) quando o Homero ocultou os comuns.
absurdos “sob os primores da beleza”. Daí se infere Se Aristóteles desejasse apenas referir-se à
que uma afirmação inconvincente à luz da realidade semelhança com a realidade, não poderia ter citado
objetiva, no estatuto da obra de arte, pode adquirir Édipo como exemplo de herói na Poética, pois os fatos
novas potencialidades de significação, tornando-se descritos na peça não se afiguraram exteriormente
convincente, pois, ao serem remetidas à dimensão muito plausíveis. Também não se pode afirmar que
poética, as situações superam a lógica da realidade Édipo fosse uma figura muito “natural”. Nas palavras
empírica. de Pallottini:
O retorno do marido (D. João), em Frei Luís de
Sousa, após décadas de desaparecimento, conquanto um herói que mata o seu pai, casa-se com a sua
mãe, procura um assassino que é ele mesmo e, depois
seja improvável historicamente, afigura-se possível e
deste assassino encontrado, pune-se, cegando os
verossímil artisticamente. Possível, pois a peça noticia próprios olhos, com as mãos e exilando-se para sempre,
que seu corpo não fora encontrado, razão pela qual, depois de assistir à morte da mãe e esposa, não seria
sua morte não estava confirmada. Verossímil, porque verossimilhante! (1989, p. 18).
a volta fora sobejamente “preparada” no esquema da
ação pelas premonições de Maria e terrores de Portanto, a exemplificação que Aristóteles faz,
Madalena, tornando-se, por isso, mais do que citando Édipo, autoriza algumas conclusões: Édipo,
verossímil, necessária para a afirmação da unidade no nada tem de trivial. Do mesmo modo, não se pode
afirmar que os acontecimentos da peça sejam
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realistas. Logo, se Édipo é um herói ideal, para que agisse, estaríamos diante de uma possibilidade
um personagem seja semelhante, não é necessário improvável, o que abalaria completamente a
que seja, por suas ações, cópia fiel do real. Aliás, a verossimilhança e , conseqüentemente, impediria a
arte reside justamente no embelezamento peculiar ocorrência da catarse.
dos modelos. Uma vez selecionado o mito (fato lendário Ainda citando a tragédia de Sófocles, é preciso
e tema do enredo), o poeta cria algo diferente, salientar que um personagem mau (eticamente
relacionado, mas não idêntico a ele. considerado), pode ser bom (estruturalmente) e auxiliar
Assim, uma personagem só prejudica a a “verossimilhança”. Pallottini dá o exemplo de Édipo
verossimilhança quando seus atos não estão para comprovar isso, ele “desposou a própria mãe e
justificados no organismo ficcional. Um herói matou o pai; mesmo que não soubesse que matava
semelhante deve ter relação com aquilo que é próprio seu pai, matou um homem, por efeitos da cólera. É
do ser humano (para que possamos nos relacionar orgulhoso e soberbo; mas, em tudo isso, é grande,
simpaticamente com ele), mas, para o sucesso da majestoso, sólido”. (PALLOTTINI, 1989).
criação, além dessa semelhança, os fatos encenados A verossimilhança, então, é a qualidade
têm de ser verossimilhantes diante da total organização intrínseca de uma criação ficcional que decorre da
do material disponível pelo poeta. Este, conhecendo preparação prévia de situações, de modo a tornar
seus objetivos, coloca os personagens numa trilha de convincentes as ações e reações dos caracteres.
convergência e unidade, de modo que a ação alcance Envolve, além das características das personagens,
seus fins. diversos recursos do enredo. Logo, para que a ação seja
Vale ressaltar que o alcance da verossimilhança, verossimilhante é necessário, mas não suficiente que
liga-se também à ocorrência de outras três virtudes os caracteres apresentem semelhança.
da personagem, arroladas por Aristóteles ao lado da É por ser a verossimilhança interna coisa distinta
semelhança, quais sejam: bondade, conveniência e da identidade com o real que podemos acreditar na
necessidade. aparição do fantasma em Hamlet, sentir medo diante
Um herói será bom quando apresentar das premonições de Maria, em Frei Luís de Sousa e
excelência em algo e quando suas ações forem crer nas predições do oráculo em Édipo Rei. Mais
respostas plausíveis à situação engendrada. Suas modernamente, é pela verossimilhança que sentimos
ações e reações devem obedecer a um nexo de terror pela invasão de extraterrestres, aparição de
causalidade. Será conveniente quando agir de acordo fantasmas e toda série de investidas de seres
com seus atributos: idade, sexo, formação, posição provenientes da ficção científica.
social, etc. Finalmente, será coerente se mantiver seu
traço característico ao longo de toda a obra, sem
apresentar transformações de caráter imotivadas. 2. Conclusões
Se Édipo, após conhecer seu crime e descobrir- Vê-se, pois, que o melhor conceito de
se em relação incestuosa com a mãe, decidisse verossimilhança é o que, sem negar a possibilidade de
simplesmente ignorar o infortúnio e seguir adiante, uma relação com o real, reconhece, prioritariamente,
não seria um personagem bom, (pois teria perdido sua a necessidade da coerência interna entre os elementos
excelência moral), nem conveniente, (pois não teria da ação. A impressão da veracidade perseguida na
agido como um rei), nem coerente, (pois teria negado a tragédia advém da possibilidade de as situações
rigidez de seu caráter, severo e orgulhoso desde o ocorrerem plausivelmente no mundo ficcional e isso
início da ação). Portanto, se agisse brandamente, como nem sempre está relacionado diretamente com a
um leviano, não seria um herói trágico. Tal atitude verdade empírica.
covarde, embora possível, seria de todo improvável O verossímil na arte consiste numa identidade
diante do mecanismo trágico organizado. Se assim de código retórico entre emissor e receptor, o que gera
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uma espécie peculiar de credibilidade. Embora haja GARRETT, Almeida. Frei Luís de Sousa. São Paulo: Ediouro.
um certo subjetivismo inicial em cada receptor, dadas Edição dirigida e apresentada por Antônio Soares Amora;
as convicções pessoais, todos aceitarão as propostas revisão do texto por Helena de Figueiredo e Amora. [199_?].
do enredo se o poeta for hábil em suspender as HOUSE Humpry. Aristotle’s Poetics, London: Rupert Hart-
descrenças, ou seja, se houver uma preparação eficaz Davis, 1966.
e uma boa articulação interna entre os enunciados
HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Estética. Tradução de
da ação.
Orlando Vitorino. São Paulo: Nova Cultural, 2000. (Os
Para avaliar o êxito de uma composição deve-
Pensadores).
se, portanto, focalizar mais a coerência entre as partes
da composição do que a comparação com o mundo. A PALLOTTINI, Renata. Introdução à dramaturgia. São
obra ficcional deve ser pintura e não decalque da Paulo: Ática, 1988.
realidade. Caso contrário, será história e não arte. PALLOTTINI, Renata. Dramaturgia: construção do
Desse modo, muito do que na vida pode ser personagem. São Paulo: Ática, 1989.
considerado impossível, pode parecer possível na arte PINTO DE CARVALHO, A. Aristóteles: arte poética e arte
e muito do que se julga possível na vida, pode ser retórica. São Paulo: Difusão Européia do livro, 1964.
incoerente na arte, diante do insucesso da estrutura
ROSS, W., DAVID, W. Aristóteles. Tradução de Diego F.
arquitetada pelo poeta.
Pró. Buenos Aires; Editorial Sudamericana, 1957.
Em suma, os efeitos de sentido e o impacto
emocional sobre os receptores que uma composição ROSENFELD, Anatol. O teatro épico. São Paulo: Editora
produz dependem da credibilidade alcançada, ou seja, São Paulo, 1965.
da manipulação do autor, do engenho, que fará ROSTAGNI, Augusto. Aristotele: Poetica. Introduzione, texto
germinar as crenças até mesmo em quem não as e commento di, seconda edizione riveduta. Turim: Chiantore,
tenha, de modo que, na literatura, diferentemente do 1945.
que ocorre na vida, o receptor não tem mais o arbítrio SCHILLER, Friedrich. Teoria da tragédia. Tradução do
de acreditar no que quiser, mas, acabará por crer alemão por Flávio Meurer. São Paulo: Editora Herder, 1964.
naquilo que o autor quiser. 132p. Original alemão.
SHAKESPEARE, William. Hamlet. Tradução da equipe de
Referências tradutores da editora Matin Claret. São Paulo: Martin Claret,
ALBEGGIANI, Ferdinand. La Poetica, traduzione di, 2000.
Florença: La Nuova Italia Editrice, 1974. SÓFOCLES. Édipo rei. Tradução de Paulo Neves. Porto
ARISTÓTELES. Poética. Tradução, prefácio, introdução, Alegre: L&PM, 2000.
comentário e apêndices de Eudoro de Souza. Porto Alegre: SPINA, Segismundo. Introdução à poética clássica. São
Globo, 1966. Paulo: F. T. D., 1967.
CARVALHO, Alfredo Leme Coelho de. Interpretação da VALGIMIGLI, Manara. Aristotele: Poetica, a cura di, Bari:
“Poética” de Aristóteles. São José do Rio Preto: Editora Editori Laterza, 1964.
Rio-Pretense, 1998.
COOPER, Lane. Aristotle on the art of poetry. Amplified
version whith supplementary illustrations, Ithaca: Cornell
University Press, 1967.
ELSE, Gerald F. Aritotle’s Poetics: the argument. Cambridge-
Massachusetts: Harvard Univerity Press, 1963.
GALLAVOTTI, Carlo. Aristotele: dell’Art Poética. Milano:
Fondazione Lorenzo Valla Mondadori, 1974.
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Resumo:
Esse trabalho tem como objetivo principal conhecer a produção arquitetônica contemporânea,
compreendendo antes o contexto histórico da evolução da arquitetura, e proporcionar o entendimento dos
fatores que a levaram aos rumos da contemporaneidade.
Apresentado na forma de cronograma histórico, este trabalho segue a evolução desde a década de 1950
até o presente século XXI, caracterizando assim o processo evolutivo sócio-econômico e cultural, passando
pelo processo de industrialização e urbanização do país.
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preocupação com o conforto ambiental. JUNQUEIRA BASTOS, Maria Alice; PÓS-BRASILIA. Rumos
Já na parte comercial, a tipologia foi a caixa da Arquitetura Brasileira; Editora Perspectiva, São Paulo,
retangular de vidro corbusiana, que adicionou os 2003.
famosos brises na fachada, misturando a linguagem
da cultura plástica brasileira às influências externas,
SEGAWA, Hugo; ARQUITETURA NO BRASIL 1900-1990;
como no Centro Empresarial Previnor, de Fernando
Edusp - Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo;
Peixoto, Salvador (BA),1993.
2002.
O auge da contemporaneidade se insere em
edifícios históricos de grande valor nacional, que
passam por projetos de intervenção e restauração. SEGRE, Roberto; ARQUITETURA BRASILEIRA
Um dos grandes exemplos que pode ser citado é CONTEMPORANEA, Contemporary Brazilian Architetura;
o Centro Cultural – Memorial da Imigração Japonesa; Viana & Mosley Editora, Petrópolis, 2003.
Brasil Arquitetura 1955 - Revitalização 2002 conjunto
KKKK; Pinacoteca do estado de São Paulo - Paulo
ZEIN, Ruth Verde; TENDÊNCIAS ATUAIS DA
Mendes da Rocha 1928.
ARQUITETURA BRASILEIRA, Vila Nova Artigas 1915/1985;
Artes Gráficas Paulista Ltda.
Conclusão:
Independente de sua época, nota-se que os Crea do Mato Grosso do Sul, disponível em <http;//www.crea-
arquitetos brasileiros se mostram como profissionais mt.org.br/palavra_profissional.asp?id=21> Acesso em: 20/09/
muito criativos, sempre procurando representar o país 2005
tanto nacionalmente, como internacionalmente.
Como elementos de vanguarda, apresentam propostas
criativas, inovadoras, regionalistas ou não, aliando-
as à contemporaneidade.
A arquitetura contemporânea brasileira se
apresenta de forma diversificada, não seguindo
linearmente uma linha de pensamento, mas sim um
discurso múltiplo, onde a obra se molda conforme a
região e a percepção do arquiteto, tentando minimizar
as diferenças e criando novas associações formais,
como que esperando um novo Brasil livre das
dificuldades econômicas, na busca de maior
valorização dos profissionais, principalmente dos
arquitetos.
Bibliografia
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RESUMO
Nos dias de carnaval, a cidade medieval se constituía como um espaço livre, eminentemente do
povo, pois se afirmava como o lugar da inversão, da indistinção, proporcionado pelo anonimato das fantasias. O
espaço público por excelência era a praça, onde aconteciam as feiras livres e os espetáculos teatrais. Nesse
universo, em que todos estavam sujeitos a colisões, se multiplicavam as ocorrências de eventos imprevistos
e dos encontros inusitados. Na praça pública, o ambiente carnavalesco reinava. Ao contrário do mundo medieval,
o mundo burguês oitocentista foi sendo aos poucos domesticado pelas aparências e o sentido de espaço público
foi se esvaindo. Este esvaziamento só vem se agravando com os recentes espetáculos urbanos criados para
animar o capital cultural das cidades na era da globalização.
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Na Idade Média, o corpo era tido como um de lado a etiqueta da linguagem familiar, da igreja, da
suporte de diferenciação social. As procissões solenes corte ou do tribunal. Eram lugares de mistura de
da igreja, por exemplo, serviam menos como rituais vendedores, ciganos, ambulantes e dos habitantes da
sacros e mais como desfile para a sociedade da época cidade. 16 Nesse universo híbrido, em que todos
se paramentar e exibir os seus bens – traduzidos em estavam sujeitos a colisões, multiplicavam-se as
vestes e jóias. Apenas durante o carnaval, estes signos ocorrências de eventos imprevistos e dos encontros
de demarcação dos níveis sociais eram subvertidos. inusitados. O vazio da praça reforçava uma idéia
Isto porque as fantasias carnavalescas permitiam uma cambiante, de um espaço possível, a que todos tinham
indistinção entre ricos e pobres, erudito e popular, acesso. A praça medieval, a praça do mercado, as feiras
privado e público. Nos dias de carnaval, a cidade e lugar onde ficava o poço eram os espaços livres da
medieval se constituía como um espaço livre, cidade. Essa liberdade possibilitava a existência de um
eminentemente do povo, pois se afirmava como o lugar sentido efetivamente público, do inevitável diálogo
da inversão.13 com a diferença e da idéia de uso comum: “loci
communes, loci publici.” 17
“A cidade se tornava um teatro sem paredes, e os
habitantes eram os atores e os espectadores que assistiam “A praça é a cena na qual todos são atores e
à cena de seus balcões. De fato não havia uma distinção espectadores ao mesmo tempo, vive-se a ficção em que
marcante entre atores e espectadores.” 14 se exibem palhaços e mágicos, mascarados num
espetáculo de rua, no qual todos riem, um riso geral e
Fora do período dos festejos carnavalescos, os universal. O espaço urbano transforma-se nesse local
espaços da cidade medieval eram marcados por uma ambivalente: praça pública que abriga a festa da multidão
forte hierarquização social, ditada pelos ricos trajes, e cena dramática em que se invertem posições sociais e
pelos bons modos e pelas regras de etiqueta e se exibe, sob a forma da paródia, intimidade familiar ou
linguagem. Apenas alguns espaços podiam ser lidos individual nos seus aspectos caricaturais; (...) Na praça
como lugares que permitiam o avesso e a diferença: a carnavalesca a multidão colide com a inversão e sua
imagem é espontânea e descontraída.” 18
praça pública.
O vazio da praça, delineado pelas ruas e vielas Na metrópole do século XIX, assistiremos a uma
tortuosas, era o espaço das feiras livres, onde se encenação dos lugares públicos, pois uma diferença
justapunham ricos e pobres, mercadores e gatunos, fundamental que devemos destacar entre o indivíduo
erudito e popular. moderno e o sujeito medieval é o fato deste último
“A praça pública parece-nos, sobretudo o lugar de não ser apenas um espectador – caráter que define o
encontro entre as duas culturas, a popular e a erudita. Por indivíduo moderno –, mas um ator: o agente da
ocasião do mercado e da feira (...) a praça pode estar em subversão.
qualquer lugar que haja divertimento, convergência de Ao contrário do mundo medieval, que apesar das
curiosos, consumo cultural diversificado.” 15 regras impostas pela alta sociedade, ainda tolerava-
se lugares públicos pautados pela mistura e
Na praça pública era, também, onde se davam diversidade; o mundo burguês oitocentista foi sendo,
os espetáculos ao ar livre, pois era o lugar teatral, que aos poucos, domesticado pelas aparências. As antigas
servia como palco para o povo. Sobre o estrado instalado feiras transformaram-se em Exposições Universais;
no vazio da praça medieval desfilavam os tipos mais a praça pública, como teatro a céu aberto, foi
estranhos daquela sociedade urbana, transformando- substituída pela Ópera; as antigas vielas tortuosas
a no ponto de convergência de tudo o que não era foram derrubadas em favor dos grandes Bulevares. Os
oficial. Era o espaço da extraterritorialidade. oitocentos são o ápice do ato de ver e ser visto,
Na praça pública, o ambiente carnavalesco representado pelo indivíduo pequeno burguês.
reinava. No burburinho da feira, sempre era deixado Na virada do século XIX, o espaço público cedeu
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lugar aos espaços privativos, coroados por ferro e vidro, Se o espaço público na cidade medieval era
onde um teatro cotidiano era ensaiado pela alta efetivo, apenas quando o mundo estava de cabeça para
burguesia que freqüentava os cafés, protegidos do sol baixo 21; de modo controverso, assistimos em nossas
e da chuva, que pontuavam os corredores do mundo cidades a sua total aniquilação. Depois da criação dos
em miniatura das galerias cobertas. A arquitetura belos cenários burgueses do penúltimo século e dos
desta época encenava um palco para que as refinadas recentes espetáculos urbanos criados para animar o
senhoras pudessem desfilar seus trajes e consumir capital cultural das cidades na era da globalização, só
livremente, abrigadas das intempéries e dos perigos nos resta a carnavalização do espaço público. De
da rua – isto porque as grandes metrópoles do início shoppings centers às praças públicas, quase tudo
do século XIX eram comparadas a uma misteriosa produzido é mera cenografia para encenar o uso
floresta. 19 comum. A presente idéia da carnavalização dos
Nas capitais do século XIX, a multidão é sempre espaços se adere a um sentido de cenário urbano que
caracterizada como uma grande massa uniformizada. não sugere a inversão de papéis do povo durante o
Nas calçadas, os contatos diários são substituídos pela carnaval, nem a anarquia social, mas o avesso do
aversão ao toque, pelo desvio de olhares e pelo passo espaço público: o espetáculo.
rápido. Para o rico burguês, viver nessa grande cidade
opulenta é um ato controlado. Não há descontração.
Só há formas de representação domesticadas, seja de
prazer ou de medo, emolduradas pelas fantasmagorias Referências Bibliográficas:
do consumo visual desenfreado. Para Walter
Benjamin, a única saída para este mundo de imagens
oníricas é o choque ou o retorno a um estado de
selvageria humana. Apenas nesta condição, pode-se BAKHTIN, M. A Cultura Popular na Idade Média e no
extrair algo que leve à surpresa e, conseqüentemente, Renascimento o contexto de Fraçois Rabelais. São Paulo:
à ação, em uma cabal tentativa de deixar de vivenciar Hucitec, 1999.
o espaço da cidade como mero espectador. 20 BENJAMIN, W. Obras Escolhidas III, Charles Baudelaire,
Dos oitocentos para o último século, as galerias um lírico no auge do capitalismo. Rio de Janeiro: Ed.
cobertas transformaram-se em shoppings centers, Brasiliense, 1989.
especializando os espaços privativos, destinados ao BURKE, P. Cultura Popular na Idade Moderna. São Paulo:
consumo das seletas camadas sociais. As construções Cia das Letras, 1989.
nas nossas cidades contemporâneas – pautadas pelo
FERRARA, L. D. Olhar Periférico. São Paulo: Edusp, 1999.
american way of life e, depois, pelo just in time, só
espacializaram espaços públicos cenográficos, praças HABERMAS, Mudança Estrutural da Esfera Pública. Rio
de alimentação monitoradas por câmeras de de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.
vigilância, átrios onde o consumidor-espectador é LE GOFF, J. O apogeu da cidade medieval. Rio de Janeiro:
embriagado pelos vários out-doors publicitários e por Record, 1997.
uma arquitetura perdulária, feita para vender. Nestes
novos palcos do consumo ultra-midiático, todos fingem
existir uso comum. Qual? Nenhum! A não ser o direito
compartilhado de comprar. Nas protegidas praças Notas de Rodapé:
centrais dos grandes shoppings centers, a diferença se
apresenta mercantilizada, rotulada por um exótico
1
visual de qualquer lugar, numa embalagem de lugar
nenhum.
Neste aspecto Weber é igual a Marx.
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Segundo Perry Anderson em seu livro Afinidades Seletivas Solução inesperada dada a um conflito extremo, consistente na
(2002), “o pensamento de Bobbio é um liberalismo que acolhe intervenção de um Deus que surgia em cena, no teatro grego,
simultaneamente discursos socialistas e conservadores, conduzido por engrenagens. Uso de dispositivo improvável e
revolucionários e contra-revolucionários”, desta forma queremos incoerente que causa a rejeição da platéia.
13
esclarecer que, quando Bobbio promove a crítica das promessas
FERRARA, L. D. (1999). As máscaras da cidade. In:
não cumpridas pela democracia, seria o momento onde começa Olhar Periférico
o seu socialismo. . São Paulo, Edusp, p. 206.
5 14
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BURKE, P. (1989). Op. cit., p. 210 apud FERRARA, L. D. (1999). Op. cit., p.
211. Para BURKE (1989),
“ o carnaval era uma representação do mundo virado de cabeça para baix
o”, Cf. BURKE, P. (1989).
Op. cit., p. 212.
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Resumo
Este estudo busca conhecer a interação entre ensino, estágio e pesquisa no curso de Serviço Social do
Centro Universitário de Votuporanga/ UNIFEV. Acreditamos que esses elementos devem ser compreendidos
como inseparáveis e dialeticamente integrados. A aquisição e produção de conhecimento dentro de uma
concepção em que o aluno não seja objeto, mas sim, sujeito do processo de aprendizado e construção de
conhecimento calcada na prática reflexiva. Foi a partir dessas reflexões que partimos para a investigação de
como este processo estaria se desenvolvendo no cotidiano dos alunos do curso de Serviço Social. A questão
fundamental era identificar de que maneira a pesquisa, em especial a elaboração do trabalho de conclusão de
curso, estava sendo percebida e concebida pelos alunos e verificar em que medida esta experiência estaria
propiciando uma formação autônoma, geradora de sujeitos e não de objetos do conhecimento.
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A pesquisa é “maneira de estar no mundo”, é superior, já que a estrutura clássica de aula como
impossível ser sujeito sem ser pesquisador e vice- transmissão de conhecimento e avaliação como cópia
versa. Ora, se a própria base do projeto de formação de conteúdos tende a permitir a vitória do cansaço e
profissional do Serviço Social é a idéia de que a do tédio dos nossos alunos já fadigados. Por ouro lado,
profissão não pode conceber de forma dissociada à se a estrutura do curso no processo de aquisição e
técnica e à ética, a teoria e a prática, a formação e a produção de conhecimento for alicerçada em uma
intervenção, então a pesquisa deve ser núcleo central dinâmica de pesquisa, no sentido de desafios e
do processo de aquisição-produção de conhecimento indagações cotidianos, dentro e fora da sala de aula,
durante todo o decorrer do curso e especialmente em podemos superar essas barreiras.
dois momentos fundamentais; o estágio e o trabalho A descrição dos resultados da nossa pesquisa irá
de conclusão de curso. deixar claro, segundo nossa visão, que o processo de
Desenvolvimento desafio, a sensação de produzir algo significativo (no
Foi a partir dessas reflexões que partimos para caso a monografia), tende a gerar um nível de
a investigação de como este processo estaria se motivação e uma alta imagem extremamente positiva
desenvolvendo no cotidiano dos alunos do curso de no aluno.
Serviço Social da UNIFEV, no qual estamos inseridos Metodologia
como professores-orientadores e coordenadora. A Nossa pesquisa foi realizada com um total de 49
questão fundamental era identificar de que maneira alunos, dentre 75 que estavam concluindo o curso de
a pesquisa, em especial a elaboração do trabalho de Serviço Social em 2004. O método utilizado foi
conclusão de curso, estava sendo percebida e composto de duas abordagens; em primeiro lugar, a
concebida pelos alunos. Isto para verificar em que aplicação de um questionário, que foi preenchido sem
medida esta experiência estaria propiciando uma identificação dos alunos e sem a presença de
formação autônoma, geradora de sujeitos e não de professores, a fim de resguardar a privacidade e não
objetos do conhecimento. influenciar as respostas. Além do questionário,
Contudo, a relação entre pesquisa e formação realizamos entrevistas abertas, não estruturadas, com
profissional assume uma feição ainda mais delicada um grupo menor, de 10 alunos, nas quais procuramos
quando tratamos da faculdade privada e, mais nos aprofundar nas principais justificativas
especificamente, dos cursos noturnos. Isto por dois apresentadas, suas angústias, percepções e
motivos: o primeiro diz respeito às especificidades das expectativas.
Universidades Privadas, principalmente após a criação
dos Centros Universitários e a desvinculação da
obrigatoriedade da pesquisa, numa situação em que Resultados:
a maioria dos professores é remunerada por hora-aula, A Influência do TCC na Prática Profissional:
não havendo quase incentivo para pesquisa. Além A primeira vista, pelos motivos acima citados,
disto, a característica geral dos estudantes do curso esperávamos um nível de rejeição ao processo de
noturno, ao menos em nossa Instituição, distingue- construção da monografia bem maior, no entanto o
se por serem trabalhadores com longas jornadas, que podemos perceber é que a experiência da
muito deles trabalhando inclusive aos sábados, o que monografia foi extrema valia para o aluno, passemos
dificulta sobremaneira o estudo, pela ausência de a exposição. O primeiro objetivo de nossa pesquisa foi
tempo e pelo nível de fadiga produzido no dia-a-dia. analisar como os alunos avaliaram a influência do
Não obstante, as dificuldades concebem que o processo de construção da monografia na sua futura
recurso à pesquisa pode ser ao invés de um problema, prática profissional.
uma dificuldade a mais, justamente um elemento para
conseguir um nível de motivação e envolvimento
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A REVISTA DE PESQUISA DA ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS DA UNIFEV V. 1 N°1 JAN/JUN 2006
Tabela 1 – Grau de importância da monografia decidirem por realizar um curso de pós-graduação, pois
para formação profissional (em %). perceberam “os quantos estavam despreparados” para
a prática. É necessário ressaltar que não concordamos
com esta última colocação em termos absolutos, pois
Muita Importância 61,2 concebemos o preparo praxes contínua, como processo
de estar no mundo, para citar Paulo Freire, e não como
Mediana Importância 24,4 processo determinado com tempo e espaço definidos
de estanques.
Razoável Importância 6,1 No intuito de verificar até que ponto essas
respostas correspondiam ao nível de envolvimento dos
Pouca Importância 8,1 alunos como processo de construção da monografia,
optamos por inserir uma pergunta radical, qual seja,
“em sua opinião, a monografia deveria continuar a ser
Nenhuma Importância 0,0
obrigatória?”. Ressaltando novamente que o contexto
em que pesquisávamos era o de alunos que, em sua
Os resultados apresentam uma grande soma de maioria, ocupavam o domingo e as férias “adiantarem
pessoas que consideraram muito importante para a a monografia”. Obtivemos o significativo resultado de
futura prática profissional (62%), enquanto apenas 57% de respostas positivas.
8,1% dos alunos consideraram pouco importantes. Contudo, o que mais chamou a atenção foi o fato
A nosso ver, era fundamental além de verificar que dentre os 43% que responderam negativamente,
esta percepção, avaliar a relação entre o processo de a maioria negou que o tempo exigido para elaboração
construção da monografia e a visão da prática da monografia, um ano, era o maior problema. Assim,
profissional por parte dos alunos, para tantos, foi dentre o total de respostas negativas 18% sugeriram
perguntado aos alunos se haviam ocorrido mudanças que começasse desde o primeiro ano e 22% que se
na maneira de pensar a prática profissional a partir iniciasse o processo (de redação com orientador) no
da monografia. Neste item, 77% dos entrevistados terceiro ano. Além disto, houve a requisição de que
afirmaram que sim. Podemos apontar dentre as se eliminassem provas e avaliações no quarto ano e
principais modificações: o aumento da criatividade “foi que se aumentasse o tempo disponível para as
importante para a percepção da real diferença entre a orientações, o que evidencia a grande dificuldade de
assistência e o assistencialismo que é praticado por equacionar com incentivo a pesquisa com a condição
muitos profissionais”, consciência da necessidade de de vida do estudante universitário em cursos
aprofundamento teórico “reafirmou que a prática deve noturnos.
ser acompanhada de embasamento teórico” e percepção Desta maneira, percebemos que não parecia
das dificuldades e da identidade no exercício da prática haver um questionamento do mérito da monografia,
profissional “o compromisso que temos que ter perante à de sua importância para a formação profissional, mas
categoria e com os usuários”. sim uma angústia, muitas vezes relatada nas
Dentre as várias respostas desta questão, entrevistas mais profunda, pelo fato de sentirem-se
podemos perceber o quanto há dificuldade e a sem tempo e capacidade para desenvolver o trabalho
necessidade de realizar um trabalho acadêmico como deveria. Ressalta-se mais uma vez a seriedade
distinto dos rotineiros, com o nível de rigor, disciplina com que a grande maioria encarava o fato, o que não
e reflexão acentuada proporcionou um repensar a é regra geral, haja vista o grande “mercado informal”
respeito da sua formação e identidade por parte de de monografias que vem se desenvolvendo nas
vários alunos. Sendo que, em alguns casos, algum
deles afirmaram que a prática da monografia os fez
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A REVISTA DE PESQUISA DA ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS DA UNIFEV V. 1 N°1 JAN/JUN 2006
faculdades privadas e na internet, infelizmente. dos temas de pesquisa e nos métodos de pesquisa.
O segundo objetivo da pesquisa foi analisar em
que medida os alunos relacionaram os conteúdos das A influência do estágio no processo de escolha
disciplinas cursadas com a produção da monografia. do tema de pesquisa
Pois partíamos do pressuposto que a monografia deveria Neste item podemos perceber que o estágio não
funcionar como um momento de síntese23, um processo foi, de maneira geral, o elemento principal da
de análise e questionamento reconstrutivo a partir dos motivação pela escolha do tema, pelo contrário, o
conteúdos debatidos em sala. Isso, a nosso ver, é de índice daqueles que responderam negativamente à
fundamental importância para evitarmos a separação pergunta: “A escolha do tema de pesquisa está
estanque e introdutiva entre teoria-prática, ensino- relacionada com sua(s) prática(s) de estágio?” Foi de
pesquisa. 67,3% ou seja, apenas 32,6% dos alunos foram
Assim quando indagados sobre em que medida motivados a desenvolver trabalho de pesquisa
conseguiram utilizar os conteúdos das disciplinas da monográfica a partir de sua vivência no campo de
produção da monografia, responderam da seguinte estágio.
forma: Não nos foi possível nesta pesquisa aprofundar
Tabela 2 – Utilização dos Conteúdos na Elaboração a investigação sobre os motivos que levaram a esta
da Monografia (em %). taxa pequena, a nosso ver, de influência do estágio na
escolha de tema de pesquisa monográfica24. Contudo,
Plenamente 18,3 o que podemos supor a partir de resultados é que, de
Em grande parte 55,1 alguma maneira, a prática não produziu um processo
reflexivo nos graus desejados, de tal forma que
18,3
Razoavelmente influencia na escolha dos temas de pesquisa foi
pequena. A relação entre estágio e monografia
Pouco 2,0 assume, entretanto, uma feição muito mais marcada
Não conseguiu 0,0 quando analisamos a opção metodológica dos alunos.
Assim, se analisarmos o quadro geral de alunos
Sem resposta 6,0 pesquisados, percebemos que 55% deles optaram por
fazer pesquisa de campo. No entanto, quando isolamos
O resultado desta resposta parece indicar que, os alunos que escolheram o tema de pesquisa a partir
de certa maneira ao menos em suas percepções, os da experiência de estágio, o porcentual de pesquisa
alunos conseguiram utilizar o conteúdo das disciplinas de campo sobe para 81,2% dos alunos.
no processo reconstrutivo, próprio da monografia, no Isso parece indicar que nos casos em que estágio
qual, na devida escala, devem produzir conhecimento foi uma experiência significativa e reflexiva o processo
e não mera copia. De fato, a análise do quanto esta de escolha e concepção de pesquisa levou o aluno “de
percepção corresponde à verdade só poderia ser feita volta ao campo”, buscando redescobrir conhecimento
mediante a análise do resultado das avaliações das através do recurso aos dados primários e com forte
monografias feitas pelas bancas. Contudo, como o foco desejo de intervenção, uma vez que, no caso destas
desta pesquisa é a análise da percepção e vivência pesquisas, pudemos encontrar uma marcada intenção
dos alunos frente ao processo de pesquisa, não iremos de encontrar soluções, aprimorar métodos de
realizar este contraponto no espaço deste estágio. atendimento e avaliar programas.
Uma vez indicados à percepção da importância Além disto, pudemos notar através das
da monografia e à relação desta com o conjunto de entrevistas, que a dificuldade para elaborar a
disciplinas e conteúdos, nosso próximo objetivo foi problemática da pesquisa, as questões centrais a
analisar o grau de influencia do estágio na escolha serem investigadas, foi maior dentre os que não foram
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RESUMO
O artigo descreve uma experiência que buscou conciliar ensino e pesquisa no Curso de Licenciatura de
Química da UNIFEV. Trata-se do programa “Práticas Investigativas em Educação Química” desenvolvido no
ano de 2004 junto à disciplina de Didática. O artigo apresenta os objetivos da proposta, o seu desenvolvimento,
algumas dificuldades e resultados alcançados.
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propiciar uma vivência concreta das ações que conhecimento de métodos de pesquisa empregados na
constituem o trabalho do educador – planejamento, área das Ciências Humanas;
execução, avaliação. Num processo de ação-reflexão- desenvolver capacidades de planejamento,
ação permanente, esses elementos estão imbricados desenvolvimento e avaliação de atividades de
e podem ser experimentados e desenvolvidos com a pesquisa; promover o trabalho em equipe entre os
prática investigativa. acadêmicos e a interação com os sujeitos de pesquisa
Coêlho (1995, p. 40), ao repensar a formação de (alunos e professores de Ensino Médio, acadêmicos de
professores nos cursos de Licenciatura, argumenta Licenciatura em Química, etc);
que desenvolver uma postura crítica,
responsável e ética no desenvolvimento da pesquisa
e em relação aos resultados obtidos.
não basta formar os professores como técnicos e O programa uma vez inserido nas disciplinas de
especialistas no ensino de determinada disciplina ou Didática (I e II) concorreu durante os dois semestres
conteúdo e nas questões de ensino, didático- com os conteúdos curriculares específicos, tendo
metodológicas, curriculares e de avaliação, ou seja, envolvido todos os alunos do 3º e 4º períodos da
docentes capazes de transmitir os conhecimentos e as Licenciatura. As pesquisas, de caráter qualitativo,
descobertas das ciências, das letras e da filosofia (...) O
foram desenvolvidas considerando três grandes
domínio dos conteúdos, o desenvolvimento da
capacidade de selecioná-los, ordená-los e hierarquizá- etapas: (a) período exploratório, (b) investigação
los, a aprendizagem dos métodos e técnicas para sua focalizada e (c) análise final e elaboração do relatório
transmissão aos alunos e o estudo da organização da (Alves, 1991).
escola, do processo de ensino-aprendizagem, da No “período exploratório” foram desenvolvidas as
psicologia da criança e do adolescente, por si só, não seguintes atividades:
garantem uma adequada compreensão do que ocorre na 1 Organização de grupos de 4 a 5 elementos
escola e principalmente não propiciam condições para para selecionar um tema relacionado à educação e
sua transformação. merecedor de estudos.
2 Reflexão acerca da operacionalização da
pesquisa e da relevância do tema.
Partilhando dessa perspectiva de análise, no ano 3 Construção do projeto propriamente dito:
de 2004 foram incluídas atividades de pesquisa nas • delimitação do problema de pesquisa;
disciplinas Didática I e Didática II, no curso de • apresentação de justificativa pertinente;
Licenciatura em Química. Construiu-se o programa
• elaboração dos objetivos da pesquisa;
guarda-chuva denominado “Práticas Investigativas em
Educação Química”, que teve como objetivos: • seleção das atividades de pesquisa;
despertar os acadêmicos para as questões • elaboração de cronograma de atividades.
educacionais, suscitando o interesse pela prática de Na “investigação focalizada” estavam previstas
pesquisa e docência na área de Educação Química; as atividades abaixo-relacionadas:
propiciar o conhecimento da realidade Levantamento bibliográfico.
educacional, no que diz respeito ao ensino de Química Pesquisa bibliográfica (revisão de
de um modo particular, e ao Ensino Médio de um modo literatura) do tema escolhido.
geral, por meio de contato direto com essas instâncias Estudo de textos referentes às técnicas de
e por intermédio de bibliografia específica; pesquisa.
proporcionar o aprendizado de construção Pesquisa de campo:
de projeto de pesquisa, bem como, promover o • Elaboração de instrumento(s) de coleta
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obstáculos, desde que o professor saiba aplicá-lo em cotidiano quando exercemos a profissão de professor
sala de aula para que não aconteça rivalidade entre os (Alcides – “Conhecimentos básicos de Química e suas
alunos e com isso poderá causar um efeito contrário. Que aplicações no cotidiano”)
também o jogo é um ótimo recurso, pois com ele o aluno
se esforça para atingir um objetivo, mas brincando.
(Antônio Carlos – “Jogo: um mecanismo para aprender
Química”)
Essa pesquisa foi muito interessante. Primeiro
porque aprendi a fazer uma pesquisa, porque essa é minha
Podemos através desta pesquisa detectar os primeira pesquisa. Também aprendi com as bibliografias,
vários problemas que causam a falta de professores aprendi a elaborar entrevistas, elaborar questionário,
de Química: baixos salários, salas super-lotadas, áreas aprendi que questionário e entrevista são diferentes. Isso
mais atrativas, poucas horas-aula por semana, falta fora a experiência que será única porque às vezes os
resultados de uma pesquisa podem nos surpreender.
de apoio governamental. (Jesus Leonardo “A falta de
(Vanessa – “Jogo: um mecanismo para aprender Química”)
professores licenciados em Química no Ensino Médio”)
Consegui aprender a importância do planejamento Adquiri uma consciência mais atenta ao que é
para que um trabalho seja de qualidade. E mesmo feito com relação à preservação do meio ambiente, por
planejando, é difícil a realização – dados teóricos, notar o que tem sido feito nesse sentido pelas escolas
pesquisa de campo, organização. (Rodrigo – “O ensino de através dos professores e o interesse dos alunos, bem
Química e a reciclagem de lixo”) como o importante papel que a Química desenvolve nesse
sentido. (Agnaldo – “O ensino de Química e a reciclagem
de lixo”)
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Importante observar como os alunos se colocam após concluí-la, tendo a própria prática como campo de
no lugar de professores e o quanto as temáticas reflexão e de produção de conhecimentos. Ou seja, o
desenvolvidas em suas pesquisas refletem na forma licenciando é visto como um sujeito que é passado,
de se posicionarem sobre o ensino: presente e apresenta um multiciplicidade de futuros
possíveis (Fiorentini, 2004, p. 246).
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Referências Bibliográficas
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“Conhecer o humano é, antes de mais nada, situá-lo no universo, e não separá-lo dele. [...] Todo conhecimento
deve contextualizar seu objeto. ‘Quem somos? ’ é inseparável de ‘Onde estamos?’, ‘De onde viemos?’, ‘Para onde vamos?’ (MORIN)
Resumo
O presente artigo faz parte do referencial teórico de nossa tese de doutorado sobre a importância do
professor universitário na formação integral de seus alunos. Partindo desse pressuposto, o objetivo é refletir
sobre a contribuição dos professores na formação pessoal e profissional de seus alunos, considerando como
eixo de análise, o que Luckesi (1990) denomina de compromisso político e compromisso pedagógico que os
professores têm que desenvolver em seu trabalho, promovendo a educação integral, contemplando a compreensão
da pessoa humana, a partir de suas potencialidades.
.
Palavras chave: Professor universitário, trabalho, compromisso político, compromisso pedagógico, ser
humano.
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Segundo Boff (1999), o ser humano é um nó de Desta forma, podemos pensar que o professor,
relações totais. Por isso, é um ser de prática e um ser ao planejar suas atividades, deve ter presente: a
histórico. legislação de ensino, as características da instituição,
O ser humano, na verdade, nunca termina de as necessidades e as características da população a
construir-se. Cada fim é um novo começo. Ele é uma ser atingida, a realidade concreta, e ter consciência
abertura sem fim. Assim é no tempo. E assim será de seus próprios propósitos, de sua visão de homem e
também na eternidade. O ser humano é um projeto de mundo.
infinito É importante ressaltarmos então que o professor
O humano vive integrado a uma totalidade que deve contribuir para que o aluno tenha condição de
está além da sua consciência. Ter a noção que não interpretar e transformar o contexto social, bem como
sabemos nos possibilita confiar na existência de um se transformar enquanto pessoa.
fluxo continuo do conhecer. Isso também nos protege Luckesi (1994) ao propor a práxis
da angústia do não saber, que levaria, por exemplo, a transformadora, indica alguns compromissos para o
operar na exclusão, na subtração e na previsibilidade professor: o compromisso político e o pedagógico.
que garante o controle. Não saber é diferente de não – O compromisso político: que implica na
existir, o que conjuga uma nova ética, a da validação, visão de mundo do qual fazemos parte e o nosso papel
da conjugação, em contra partida a uma ética do ser humano na estrutura social.
mutilante, da disjunção. – O compromisso pedagógico: que significa
Desta forma, o trabalho do professor é uma tarefa nossa atuação em relação à formalização da mente,
complexa que envolve o entrelaçamento de questões aos conteúdos e aos métodos de abordagem da
essenciais que precisam ser compreendidas nas suas realidade.
diferentes dimensões. É preciso dizer também que, ao buscarmos
Somente o docente que tenha preocupação com conhecer os sistemas de operações e as vivências do
o homem e sua estatura restabelecerá o encontro e o professor no seu trabalho, estamos considerando, que
diálogo entre ciência e integridade; processo este que os sistemas normativos, com os quais os homens
desencadeará reflexões sobre a finalidade da raça convivem, possuem contradições, são fragmentados e
humana na terra e simultaneamente sobre a essência reúnem uma gama infinita de pontos de vista; enfim,
do que é ser humano. os sistemas normativos são fluidos e abertos, o que
Neste sentido, acreditamos que o professor deve nos permite pensar que o sujeito possui possibilidades
estar habilitado para a transmissão de um saber de ações que não são exclusivamente determinadas
profissional que possa enfrentar os dilemas que são por seu contexto sócio-econômico.
operados por razões, emoções e perspectivas políticas Nesta perspectiva, cabe elucidar uma indagação
muito diferenciadas e que circulam entre as diferentes feita por Rubem Alves (2000), em sua obra Conversas
agendas profissionais no interior das relações com quem gosta de ensinar, em relação ao professor x
organizacionais. educador:
Segundo Nóvoa (1993), para a compreensão do
trabalho do professor, três processos são essenciais:
desenvolvimento pessoal que se refere aos processos
Educadores, onde estarão? Em que covas terão
de produção da vida do professor; desenvolvimento se escondido? Professores há aos milhares. Mas o
profissional que se refere aos aspectos da professor é profissão, não é algo que se define por dentro,
profissionalização docente; desenvolvimento por amor. Educador, ao contrário, não é profissão; é
institucional que se refere aos investimentos da vocação.E toda vocação nasce de um grande amor, de
instituição para a consecução de seus objetivos uma grande esperança.
educacionais.
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encontramo-nos cada vez mais comprometidos e Paulo, n.1, p. 5-16, set. 1978.
envolvidos na construção do saber aliado ao ______. Concepção dialética da educação e educação
crescimento interior de cada um, o que vem reforçar brasileira contemporânea. Educação & Sociedade. São
nossa crença de que nós, professores, promovemos a Paulo, n. 8, p. 5-32, mar. 2000.
educação integral, contemplando a compreensão da
HELLER, A. O cotidiano e a história. Trad. Carlos Nelson
pessoa humana, a partir de suas potencialidades.
Coutinho e Leandro Konder. São Paulo: Paz e Terra, 1989.
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Encarnação Manzano
Doutora em Educação – UNESP
Docente da UNIFEV
Resumo
O presente texto oferece uma reflexão sobre a contribuição das ciências cognitivas para a
avaliação, sugerindo possibilidades para seu aperfeiçoamento.
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celular” encontrada por trás das diversas formas de se alterar as formas de trabalho, criando-se uma
aprendizagem. cultura onde as tendências herdadas possam fluir e
As considerações de Kandel apud Gardner (1994) desenvolver-se. Se os objetivos estiverem limitados à
relativas aos fatores ambientais como promotores de canalização de uma ou outra inteligência, corre-se o
capacidades latentes estão em sintonia com o peso da risco de estagnação e limitação culturais. Esses riscos
cultura no desenvolvimento das inteligências podem indicar para dificuldades de desempenho
humanas de Gardner. Estudos voltados para a satisfatório num mundo que avança rapidamente para
educação desenvolvidos por David Feldman oferecem a diversificação. As estagnações e as limitações se
indícios de que as conquistas cognitivas podem ocorrer apresentam como prejudiciais tanto ao acadêmico
em vários domínios dentre os quais, o domínio como a instituição e a sociedade.
universal, o cultural, o idiossincrásico e o singular. Dessa forma, a avaliação não pode limitar-se a
Para ele, grande parte das informações essenciais para notas e conceitos que não representam a realidade
o desenvolvimento encontra-se mais na cultura do que de cada estudante e das suas possibilidades mentais.
na cabeça das pessoas. Cada domínio passa por etapas Sua relevância deve estar no conhecimento e nas suas
e no caso de crianças prodígios, a passagem por essas possibilidades mentais, assim como nas alternativas
etapas ocorre com grande rapidez, tornando-a possíveis de condições estimuladoras de conexões
qualitativamente diferente das demais. sinápticas e não em pontuações quantitativas.
Segundo Gardner (1994), os estudos com A criação de um clima que ofereça situações
prodígios vêm demonstrando, na questão do desafiadoras, situações de conflito quer no campo
desenvolvimento das inteligências, a existência de das idéias, quer no campo da prática sugere atividades
uma notável coincidência de fatores como: propensão que provoquem reações mentais estimulando
possivelmente inata (genética), pressão dos pais e neurônios e ampliando a rede de ligações neurais.
familiares, excelentes professores, motivação elevada Entretanto, embora teoricamente se aceite essa
e, quem sabe, o mais importante, uma cultura onde premissa, compreendendo-a como uma necessidade,
a propensão inata tenha grande chance de se também ela, na prática, se coloca como um desafio
desenvolver. Estudos de David Olson sobre tanto aos pedagogos como aos cientistas cognitivos.
aprendizagem indicaram diferenças na aprendizagem A questão da avaliação passa a ser fonte de um
e raciocínio em sociedades escoladas (valorização da novo processo, o de discussões, cujo consenso em
alfabetização) e não escoladas. termos práticos fica a cargo de cada docente, de cada
instituição, no seio da qual encontram-se as mais
diversas filosofias de avaliação.
2. A contribuição dos estudos das ciências Nesse contexto surge a avaliação institucional
cognitivas. que traz em seu bojo o objetivo de melhorar a
qualidade de ensino e com ela a qualidade dos
profissionais que as instituições de ensino superior
As ciências cognitivas podem contribuir com a colocam no mercado de trabalho a cada final de curso.
avaliação institucional, em específico, com a avaliação Dessa forma, a questão da qualidade é muito
da aprendizagem, no sentido de oferecer subsídios para parecida com a questão da mente no sentido de
uma definição mais precisa do que se pretende fazer Dennet (1996), pois sabemos que ela existe, assim
das novas gerações. É notório que a cultura responde como sabemos distinguir um ser com mente de um
pela canalização de inteligências a partir do ser que não a tem. Entretanto, não temos acesso a
equipamento herdado. Assim, se os objetivos do ensino cada tipo de mente para saber com certeza o que se
superior estiverem pautados no desenvolvimento passa em cada uma delas. No caso do ensino, sabemos
da inteligência e construção do conhecimento há que distinguir um ensino de qualidade de um ensino que
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não tem qualidade. Mas o que faz essa qualidade e o peças, mas dedicando especial atenção ao funcionamento
que ela produz em cada uma das mentes, também do conjunto. Este é o enfoque que adota a avaliação
encontra-se no campo das investigações. institucional.
As diferenças individuais parecem harmonizar-
se com as diferenças de ressonância de informações
recebidas pelas mentes. Quando a sociedade absorve Na opinião de Gil Antón (1991),
profissionais alguns resultados (informações) desafiam
a própria compreensão de como essa qualidade
idealizada se comporta em cada estudante
A qualidade resulta de uma variedade de
confirmando as incertezas sobre a questão das formas componentes, entre os quais é necessário incluir: o
de apreensão disponíveis em cada mente. Mas, parece sistema de administração e gestão, as características
haver alguma certeza quanto à existência de um grau dos professores e estudantes, os programas de estudos
de competência individual relacionado aos aspectos e as técnicas e métodos de ensino, a investigação e suas
qualitativos da aprendizagem. A própria motivação ou relações com o ensino, as bibliotecas, os laboratórios e
“impulso cognitivo” no sentido de Ausubel, poderia vir outros serviços, as fontes e os recursos financeiros
ao encontro dessa disponibilidade do aprender. suficientes e a eficácia com que se utilizam, as relações
Na prática, o docente ao desenvolver uma aula, entre as universidades e suas comunidades, outras
instituições nacionais e estrangeiras, o setor produtivo e,
embora o faça com a intenção de que todos assimilem
por último, o ambiente de relações humanas, valores e
e criem novas relações de conhecimento não atitudes que predominam nas instituições.
consegue prever, como em Laplace, os resultados dessa
aula em cada um dos estudantes. E, quem sabe não
esteja nessa incerteza a corporificação de toda
sabedoria e o grande desafio do ato de ensinar. Para Fernández Pérez (1989),
Como se comporta então a avaliação
institucional em termos de resultados e como esses
resultados são analisados em termos da certeza de
todas essas incertezas. Quais as perspectivas de O lugar mais potente para institucionalizar a
melhora permanente da qualidade do ensino, é no âmbito
qualidade dos recursos humanos colocados no mercado
da capacitação profissional; as propostas devem ser
de trabalho pelas instituições com base nessas conseqüência dos processos de avaliação e investigação
incertezas. Que “condições” dão a uma instituição a levados a cabo em nível local e que podem sintetizar-se
certeza de estar oferecendo um ensino de qualidade em quatro níveis de incidência:
em nível superior.
Com relação à avaliação da qualidade
a) Descrição geral da qualidade do ensino
institucional, Tejedor (1997) faz a seguinte de universitário (avaliação inicial dos elementos funcionais,
colocação: pessoais e materiais que intervém no processo docente);
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conservadores, destruindo os avanços conseguidos em realidade, pois só o indivíduo pode avaliar seu próprio
nível de ensino. conhecimento e posicionar-se diante dos padrões
Por outro lado, o processo de ensino tem colocados como parâmetros nas comunidades
dificuldade em utilizar as conseqüências da avaliação educacional e social.
em direção ao ideal desejado. A auto-avaliação possibilita ao sujeito maior
Outro problema apresentado é quanto ao ideal clareza e certeza quanto ao seu próprio conhecimento,
desejado, o que significam as conseqüências da pois só ele tem informações capazes de situá-lo dentro
avaliação e quais os conhecimentos por elas do contexto, apontando possíveis desvios entre esses
representados. parâmetros.
Como ter a certeza de que os resultados de uma Importante questionar se a criatividade e o
“avaliação” são significativos e fidedignos? talento estão sendo despertados, desenvolvidos e bem
Essa incerteza fundamenta a certeza de que a cuidados nas instituições, ou se na maioria dos casos
“avaliação”, nos termos como vem sendo desenvolvida, continuam adormecidos.
não ajuda a desvendar a mente e seus mistérios. Não Como explicar, por exemplo, a fluência
oferece dados significativos que possam justificar a lingüística de Jean-Paul Sartre, a encantar platéias
rotulação de inteligências, pois o seu desenvolvimento aos cinco anos de idade e a sua habilidade como
e o funcionamento da mente, apesar das tentativas, escritor conforme seu próprio depoimento aos nove
ainda parecem estar longe de serem compreendidos. anos de idade:
A não compreensão dos fenômenos da mente
oferece outra certeza, a de que os paradigmas, sob a
égide dos quais a avaliação ocorre na prática, são
superficiais e não são capazes de captar as Ao escrever eu estava existindo... minha caneta
conseqüências causadas pelas informações que os corria tão rápido que era comum que meu punho doesse.
docentes passam aos acadêmicos. Os instrumentos Eu jogava os cadernos preenchidos no chão e, enfim,
são frágeis e não atingem a essência do conhecimento esquecia deles, eles desapareciam... Eu escrevia para
escrever. Não me arrependo disso; se eu tivesse lido,
no indivíduo, a não ser daqueles que podem ser
teria tentado agradar (como fiz em meus desempenhos
manifestos e observáveis. orais anteriores). Eu teria me tornado um prodígio de
A construção do conhecimento advinda de novo. Sendo clandestino eu era verdadeiro.(GARDNER,
processos interacionistas interiorizados só pode ser 1994, p. 63)
conhecida pelos próprios indivíduos. Suas ações
refletem “naturalmente” esse conhecimento
interiorizado, não refletindo as respostas e os
desempenhos cobrados, por exemplo, em uma prova E a sensibilidade de Vicent Van Gogh ao falar da
ou em um teste, formas ainda bastante utilizadas nos cor em carta para seu irmão Theo:
meios educacionais.
A evidência dessa afirmação é fácil de
constatar. Basta confrontar o discurso sobre a
Há efeitos de cor que apenas raramente encontro
“avaliação” e a sua prática nas instituições. Junte-se pintado nos quadros holandeses. Ontem à tarde, eu
a isso, as dificuldades no desenvolvimento de estava ocupado pintando um fundo um tanto oblíquo na
diferentes paradigmas de avaliação provocadores de floresta, coberto de fungos e folhas de faia secas. Você
avanços em direção ao conhecimento caracterizado não pode imaginar qualquer carpete tão esplêndido quanto
não na fragmentação, mas nas relações. aquele vermelho amarronzado ao brilho de um sol de
Dadas as considerações, parece que a prática tarde de outono temperado pelas árvores. A pergunta era
da auto-avaliação encontra-se mais próxima à – e a considerei muito difícil – como obter a profundidade
da cor, a enorme força e solidez daquele chão. E
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enquanto o pintava percebi pela primeira vez quanta luz driblar essas canalizações culturais e ficar atento a
havia naquele escuro, como se poderia manter aquela luz outras manifestações estudantis, modificando as
e ao mesmo tempo reter o brilho e a profundidade daquela formas de ensinar e de avaliar. Procedendo dessa
cor viva?(GARDNER, 1994, p. 152). forma estaria contribuindo para que a flexibilização
pudesse se manter por mais tempo, criando uma
cultura institucional capaz de oferecer as condições
necessárias ao desenvolvimento de inteligências, onde
E, o talento do pianista Arthur Rubinstein no talentos pudessem fluir e desenvolver-se.
relato: Outro aspecto evidenciado é o de que a avaliação
tem como característica a indicação de caminhos e
alternativas para avanços e não de final de
caminhada. O seu caráter positivo está exatamente
A sala de visitas tornou-se o meu paraíso... metade
em estimular inteligências, buscar saídas e provocar
por brincadeira e metade a sério aprendi a conhecer as
teclas por seus nomes e com minhas costas voltadas a investigação principalmente em assuntos
para o piano eu nomeava as notas de qualquer acorde, instigantes e problemas de difícil solução. Para
até mesmo o mais dissonante. A partir daí tornou-se mera entender o processo de avaliação é preciso entender
‘brincadeira de criança’ dominar as dificuldades do teclado que o ser humano não comete erros, mas toma
e logo fui capaz de tocar primeiro com uma mão, depois decisões de acordo com as informações que possui num
com ambas, qualquer melodia que chegasse ao meu determinado momento em uma determinada situação.
ouvido... Tudo isso, é claro, não deixou de impressionar
minha família – nenhum dos quais, devo agora admitir,
inclusive avós, tios, tias, possuía o menor talento 3. Bibliografia
musical... Por volta da época em que eu tinha três anos
minha fixação era tão óbvia que minha família decidiu
fazer algo sobre o meu talento. (GARDNER, 1994, P. 89).
DENNETT, D. C. Kinds of minds: toward in understanding
of consciousness. New York: Banc Books, 1996.
Esses relatos se justificam nas evidências de DUPUY, J. P. Nas origens das ciências cognitivas. São
que as instituições nem sempre estão atentas aos Paulo: Editora Universidade Estadual Paulista, 1996.
talentos que em geral emergem em ambientes mais
abertos e livres.
Assim, a avaliação institucional apresenta-se EPSTEIN, I. (org.). Cibernética e comunicação. São Paulo:
bastante limitada para descobrir estudantes criativos Editora Cultrix, EDUSP, 1973.
e talentosos, pois esses aspectos não compõem as
questões avaliativas. _______________. Teoria da Informação. São Paulo: Ática,
1986.
3. Conclusão
Das considerações e discussões anteriores pode- GARDNER, H. Estruturas da mente: a teoria das
se concluir que a avaliação institucional, em inteligências múltiplas. Tradução: Sandra Costa. Porto
específico, no que se refere aos aspectos comuns Alegre: Artes Médicas Sul, 1994.
quanto aos talentos e indivíduos criativos não tem
trazido conseqüências. Seus objetivos estão afetos aos
conhecimentos sistematizados e inteligências GARDNER, H. A redescoberta da mente: uma história
valorizadas culturalmente. O educador precisaria da revolução cognitiva. São Paulo: EDUSP, 1995.
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