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ARTIGOS

O Telégrafo

Sargento-Ajudante de Transmissões
Luciano Costa

“Ao início da madrugada, alguns membros do directório do


Partido Republicano sobem à varanda do edifício da Câmara Municipal de Lisboa e
proclamam a República. O resto do país sabe do sucedido pelo telégrafo e não refila. À
tarde D. Manuel e a família, fugidos na véspera das Necessidades para Mafra,
embarcam de soslaio na Ericeira rumo ao exílio inglês.”

Joaquim Vieira, Portugal Século XX – Crónica em Imagens, 1900-1910, Ed.


Círculo de Leitores.

AS COMUNICAÇÕES EM 1910
A ciência e a tecnologia têm satisfeito o vivo desejo do homem de comunicar. Desejo
esse proveniente de diversos interesses e da forma gregária como o homem vive. A
capacidade e a velocidade com que informações são transmitidas podem decidir o
desfecho de uma guerra ou o sucesso de uma empresa. Hoje em dia, tudo o que se passa
em qualquer parte do mundo está à distância de um clique.
Mas nem sempre assim foi. Como eram as comunicações na altura da implementação da
República Portuguesa? Quais os meios de comunicação mais usados em Portugal e no
mundo?
Em Outubro de 1910, numa época em que se davam os primeiros passos nas
comunicações rádio e se instalavam os primeiros circuitos telefónicos em Portugal, o
telégrafo era o meio de comunicação mais rápido, mais fiável e aquele que maior
implementação tinha.
No Exército Português, as primeiras referências à telegrafia aparecem 100 anos antes da
queda da monarquia. Em 1810 é criado o Corpo Telegráfico, que é considerado a
origem da telegrafia militar em Portugal. Em 1873 é inaugurada a primeira Rede
Telegráfica Militar tendo esta rede passado a prestar um serviço de carácter permanente
a partir de 17 de Setembro desse ano.
Em 1880 são instalados os primeiros pombais militares e três anos mais tarde, montada
a primeira rede telegráfica óptica.
Em 1884 é criada a Companhia de Telegrafistas, primeira Unidade de Transmissões de
Campanha.
Em 1900 são instalados os primeiros telefones militares. Um ano mais tarde é criada, no
quartel da Penha de França, a Companhia de Telegrafistas de Praça, passando a Arma
de Engenharia a superintender o Serviço Telegráfico Militar. Ainda nesse ano, o
Exército realiza as primeiras experiências de comunicações TSF.
Em 1911, já num Portugal Republicano, é criado o Grupo de Companhia de
Telegrafistas e criada a companhia de Telegrafistas sem fios.
BREVE HISTÓRIA DO TELÉGRAFO
Desde os primórdios da história, que o homem sempre sentiu a necessidade de
comunicar à distância. Essa necessidade esbarrava na morosidade com que os estafetas
transportavam as mensagens, originando não poucas vezes, situações em que as
mensagens quando chegavam ao destinatário, já pouca ou nenhuma
utilidade tinham.
Esta situação manteve-se durante muitos séculos e só nos finais do
século XVIII se assistiu a uma evolução significativa na comunicação
à distância com a invenção de um sistema visual denominado telégrafo
(do grego: Tele – longe e Grapho – escrevo).
O primeiro telégrafo, designado telégrafo óptico, foi desenvolvido
pelo engenheiro francês Claude Chappe e consistia em transmitir
letras, palavras e frases através de um código visualizado a partir de
três réguas de madeira articuladas e colocadas na parte alta de um
poste ou edifício. A primeira linha data de 1794 e ligava Paris a Lille,
Telegrafo Óptico
distantes 225 quilómetros. Um destes telégrafos ópticos esteve
instalado no alto de uma torre em Paris e foi usado para transmitir as notícias das
campanhas napoleónicas. Estes processos ópticos de comunicação estavam obviamente
dependentes das condições naturais de visibilidade.
O salto para o nível seguinte só foi possível mediante avanços nas áreas da electricidade
e do magnetismo.
Até 1825, ano em que William Sturgeon inventou o primeiro electroíman, foram muitas
as experiências para tentar aplicar as descobertas eléctricas ao campo das comunicações.
Essas sucessivas tentativas basearam-se essencialmente na pilha de Volta e na
electrólise da água, mas foi o barão russo Pawel Schilling que em 1832 inventou um
telégrafo eléctrico em que as letras transmitidas eram detectadas pelo movimento de
agulhas magnéticas colocadas sobre bobinas.
Em 1837 os ingleses William Cook e Charles Wheatstone desenvolveram e patentearam
o telégrafo de 5 agulhas, constituído por seis fios e cinco agulhas, estas eram
accionadas por electroíman. Este sistema foi usado em 1839 na Inglaterra, entre
Paddington e West Drayton, numa distância de 21 km e destinava-se a informar a
localização dos comboios. Tornou-se assim no primeiro serviço telegráfico comercial.
Dois anos depois, Cook e Wheatstone criaram o telégrafo de 2 agulhas, um telégrafo
mais simples e que podia transmitir até vinte e duas palavras por minuto.
Mas foi sem dúvida com Samuel Morse que o telégrafo deu um salto enorme em
termos de popularidade, eficiência, rapidez
de transmissão e distância percorrida. Morse
inicialmente inventou um telégrafo com um
interruptor, u, electroíman e apenas um fio.
Posteriormente, com base nas
experiências de Faraday sobre o
electromagnetismo, Samuel Morse construiu
um aparelho telegráfico com capacidade de
registo das mensagens recebidas e
estabeleceu os princípios relativos ao seu
código de pontos, traços e intervalos, com
base na presença ou ausência de corrente.
Estava assim criado aquele que talvez seja o
Samuel Morse
mais famoso código para transmissão e
recepção de mensagens – O Código Morse.
Três anos mais tarde, Morse construiu um modelo experimental, onde a acção mecânica
de um electroíman movimentava uma alavanca que suportava um lápis. Esse lápis
traçava numa fita de papel o código Morse que ia recebendo. Os pontos correspondiam
a uma acção breve sobre o electroíman, o traço a uma acção mais longa e o espaço a
uma pausa. Assim era a base do código Morse.
Após introduzir diversos melhoramentos no aparelho,
Morse transmitiu, em 1844, o primeiro telegrama entre
Washington e Baltimore, numa distância de 64
quilómetros, utilizando o seu código. Este sistema permitiu
um grande desenvolvimento do telégrafo. Em 1852 já havia
64 mil quilómetros de linhas telegráficas em todo o mundo. Código Morse
Estavam assim lançadas as bases para as sucessivas
melhorias que o telégrafo haveria de sofrer, entre as quais
se destacam:
• 1855 - O professor inglês Davis Hughes inventou
na América o telégrafo impressor;
• 1858 – O inglês Wheatstone inclui uma perfuradora de fita de papel, o que
permitiu atingir quase seiscentas palavras por minuto;
• 1872 - O americano Joseph B. Stearns inventou o telégrafo duplex que
permitia a transmissão de duas mensagens simultâneas pela mesma linha, uma
em cada sentido;
• 1872 - O francês Jean-Maurice-Émile Baudot inventou o telégrafo multiplex,
que permitia a transmissão de duas ou mais mensagens simultaneamente, pela
mesma linha e no mesmo sentido.
• 1874 - Edison demonstrou o seu telégrafo quadruplex capaz de transmitir
simultaneamente quatro mensagens pelo mesmo fio, duas num sentido e duas
no outro.
• 1915 – Creed e Kleinschmidt desenvolvera, um sistema telegráfico que
dispensava a intervenção do operador e, além disso, a fita era lida por uma
decifradora que imprimia a mensagem numa fita de papel gomada. Esta fita
era depois colada num papel e entregue ao destinatário.
• 1931 - A empresa americana ATT (American Telephone and Telegraph) criou
um sistema de comunicação utilizando uma máquina de escrever telegráfica
(TWX) ou teleimpressora, permitindo escrever em folha de papel. Além disso,
passou a ser possível a instalação e a exploração dos equipamentos pelos
assinantes.
A invenção do telégrafo sem fios atribuída ao italiano Guilherme Marconi, veio
melhorar em muito a segurança das navegação marítima, pois os barcos passam a poder
dispor de um contacto constante com o litoral distante.
Também a telegrafia sem fios foi alvo de diversos aperfeiçoamentos, podendo
estabelecer-se comunicações entre pontos que distam milhares de quilómetros entre si.
O uso massivo de outros meios de comunicação, especialmente o telefone, veio retirar
importância ao telégrafo. No entanto, não restam dúvidas que foi este equipamento o
primeiro grande meio de comunicação de alcance a longa distância e ainda hoje é
banalmente utilizado pelos navios e radioamadores.

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