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YESHUA CHAI

21 De Setembro De 2014 • No Comments

A Blasfêmia Do Filho Do Homem

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Extraido do livro “The Jewish Gospels”, por Daniel Boyarin


Tradução/adaptação: Magno Lima

As razões pelas quais muitos judeus creram que Jesus era divino foi porque eles já
esperavam que o Messias/Cristo viesse a ser um deus-homem. Esta expectativa fazia parte
de uma parcela da tradição judaica. Os judeus aprenderam isto ao cuidadosamente lerem
o Livro de Daniel e entenderem suas visões e revelações como uma profecia que iria
acontecer ao m do tempo.

Eu gostaria de mostrar que Jesus via-se a si mesmo como o divino Filho do Homem e farei
isto explicando um conjunto de passagens difíceis do segundo capítulo do Evangelho de
Marcos.

“Ao Filho do Homem tem sido dada toda a glória, soberania e domínio por todo o mundo“,
como vemos em Daniel 7:27 “E o reino, e o domínio, e a majestade dos reinos debaixo de todo
o céu serão dados ao povo dos santos do Altíssimo; o seu reino será um reino eterno, e todos os
domínios o servirão, e lhe obedecerão“. Este verso vem uma estrutura de interpretação no
qual o capítulo procura desmitologizar a narrativa do Filho do Homem, tal esforço não
pode resistir ao poder dos versos anteriores no capítulo em que a divindade do Filho do
Homem é tão claramente marcada. Em Marcos 2:5-10 lemos:
“E Jesus, vendo a fé deles, disse ao paralítico: Filho, perdoados estão os teus pecados.
E estavam ali assentados alguns dos escribas, que arrazoavam em seus corações,
dizendo: Por que diz este assim blasfêmias? Quem pode perdoar pecados, senão
Deus? E Jesus, conhecendo logo em seu espírito que assim arrazoavam entre si, lhes
disse: Por que arrazoais sobre estas coisas em vossos corações? Qual é mais fácil?
dizer ao paralítico: Estão perdoados os teus pecados; ou dizer-lhe: Levanta-te, e toma
o teu leito, e anda? Ora, para que saibais que o Filho do homem tem na terra poder
para perdoar pecados (disse ao paralítico)“.

Ora, para que saibais que o Filho do homem tem na terra poder para perdoar pecados. O Filho
do Homem tem autoridade (obviamente delegada por Deus) para fazer o trabalho de Deus
de perdoar pecados na terra. Esta reivindicação é derivada de Daniel 7:14, na qual lemos
que aquele que é semelhante ao lho do homem foi dada “autoridade, gloria, reino”, na
qual uma “autoridade que é eterna e não irá passar”. O termo que convencionalmente
traduz-se por “autoridade” no novo testamento é ἐξουσία, que é exatamente o mesmo
que se traduz no aramaico na Septuaginta, nominadamente, “soberania” ou “domínio”. Isto
é, o que Jesus reivindica para o Filho do Homem é exatamente aquilo que foi concedido
para aquele que é semelhante ao lho do homem em Daniel; Jesus sustenta sua
reivindicação diretamente do antigo texto. De acordo com esta tradição então Jesus
reivindica ser o Filho do Homem para qual a autoridade divina na terra, “abaixo dos céus”
(Daniel 7:27), foi delegada. A soberania é a única que tem o poder de declarar exceções à
lei. A objeção dos escribas, chamando ato de perdão de Jesus “blasfêmia” é baseada na
suposição de que Jesus está reivindicando divindade através desta ação; daí a ênfase que
somente Deus pode perdoar pecados, a que Jesus responde igualmente: a segunda gura
divina de Daniel 7, um semelhante ao Filho do homem, está autorizado a agir como e para
Deus. Trata-se de uma declaração direta de uma duplicidade da Divindade, que será
naturalmente, mais tarde, a grande marca da teologia cristã. Ao longo do Evangelho,
quando Jesus a rma ἐξουσία de realizar aquilo que parece ser uma prerrogativa da
divindade, é que muito da ἐξουσία do Filho do Homem que está sendo alegada, ou seja,
uma autoridade bíblica baseada em uma leitura muito próxima de Daniel 7:35. Vemos
agora porque os rabinos posteriores, ao nomear esta visão religiosa muito antiga de
heresia, se referem a ela como “dois poderes no céu.”

“O Filho do Homem é também senhor do sábado”

A questão de como ler Daniel 7 estava muito impregnada nas mentes dos judeus daquele
período e não apenas aqueles que se tornariam seguidores de Jesus. Marcos, meio que
diretamente e intencionalmente, está oferecendo a nós uma leitura próxima de Daniel. À
sua luz podemos começar a interpretar uma das mais desa antes e essenciais declarações
do “Filho do Homem” no Evangelho. Eu coloco estes textos em um contexto inteiramente
diferente daquele no normalmente é lido; neste novo contexto, certas pistas ser tornarão
muito mais vívidas e reveladoras. É uma questão de olhar no texto de uma fomra
diferente, que por sua vez revela conexões que ajudam a esboçar um quadro totalmente
diferente do que está acontecendo, ou melhor, o que estava em jogo para o evangelista e
seus ouvintes.

Esta interpretação de Marcos 2:10 como sendo uma leitura próxima de Daniel 7:14 me
habilita a começar entender uma nova e intrigante declaração do Filho do Homem em
Marcos 2, conhecido como o incidente de colher espigas/grãos no shabat. Nesta história,
os discípulos de Jesus são descobertos colhendo grãos e comendo enquanto caminham no
shabat por alguns fariseus que então desa am Jesus quanto a esta violação
aparentemente insolente ou arrogante do shabat. Jesus os defende vigorosamente. Esta
passagem nos ajuda a entender como Jesus se via a si mesmo (ou é retratado como vendo
a si próprio), ambos como divino Redentor e Messias Davídico ao qual os judeus
aguardavam.

“E aconteceu que, passando ele num shabat pelas searas, os seus discípulos,
caminhando, começaram a colher espigas. E os fariseus lhe disseram: Vês? Por que
fazem no shabat o que não é lícito? Mas ele disse-lhes: Nunca lestes o que fez Davi,
quando estava em necessidade e teve fome, ele e os que com ele estavam? Como
entrou na casa de Deus, no tempo de Abiatar, sumo sacerdote, e comeu os pães da
proposição, dos quais não era lícito comer senão aos sacerdotes, dando também aos
que com ele estavam? E disse-lhes: O shabat foi feito por causa do homem, e não o
homem por causa do shabat.” – Marcos 2:23-27

Existem muito problemas bem conhecidos colocados nesta passagem, que (como em
Marcos 7, que irei apresentar) e é de enorme importância para a reconstrução da histórica
religiosa judaica. O maior problema é a razão dos discípulos estarem colhendo no shabat;
a natureza e signi cado de Jesus responder invocando a analogia de David; a conexão
entre a resposta nos versos 27 e 28 com a que o Filho do Homem é Senhor do Shabat, e o
Shabat que é feito para homem; e o signi cado e a conexão entre estes versos.

Jesus parece estar dando muitas justi cativas para o comportamento dos discípulos; sua
defesa baseada em um antigo princípio da halachah que o shabat pode ser violado pelo
bem-estar do ser humano, ou isto tem algo haver com o status da messianidade de Jesus?
Muitos estudiosos tem “resolvido” estes problemas ao assumir que o texto está
interpolado. Esta explicação, ainda que insatisfatória, aponta para a tensão no texto entre
a antiga controvérsia (que certamente está aqui) da halachah (legal) e uma transformação
apocalíptica radical nas palavras de Jesus (que eu acredito também estarem aqui). O que
me convence que há uma memória genuína da controvérsia da halachah aqui é o fato que
que os elementos dos argumentos de Jesus serão encontradas posteriormente nas
tradições dos Rabinos. Aqui um texto crucial para nosso propósito:
Rabi Ishmael Rabi Eleazar, lho de Azarias, e Rabi Akiva estavam andando no
caminho e Levi Hassaddar e Rabi Ismael, lho de Rabi Eleazar lho de Azarias
estavam andando atrás deles. E a pergunta surgiu entre eles: “De onde é que
sabemos que a salvação de uma vida prevalece sobre o sábado?” Rabi Ismael
respondeu: Eis que ele diz: “Se um ladrão for achado roubando e é atingido de modo
que venha a morrer, o defensor não é culpado de derramamento de sangue; Mas, se
acontecer depois do nascer do sol, ele é culpado de derramamento de sangue
“[Êxodo 22: 2-3]. E isso é verdade mesmo se não temos certeza se ele veio para matar
ou apenas para roubar. Agora, o raciocínio é a partir leve para o pesado: Assim como
a matar uma pessoa torna a terra impura e afasta a presença divina para longe
prevalesce sobre o sábado (no caso de alguém pego a noite e sendo achado
roubando), ainda mais para salvar de uma vida!”. Rabi Eleazar deu uma resposta
diferente:” Assim como a circuncisão que [salva] apenas um membro de uma pessoa
suplanta o shabat, todo o corpo ainda mais!”. Rabi Akiva diz: “Se o assassinato
substitui o culto no Templo, que suplanta o shabat, salvar uma vida mais ainda!”.
Rabi Yose Hagelili diz: “Quando se diz ‘Porém guardem os meus sábados,” a palavra
“porém” faz uma distinção: Existem sábados que você colocar de lado e aqueles que
você guardar [isto é, quando a vida humana está em jogo, este suplanta o sábado]”.
Rabino Shim’on lho de Menasya diz: “Eis que diz: Guardem o sábado porque ele é
santo para vós; para vós o sabado é entregue e não vós para o sábado”. Rabi Natan
diz: “Ele diz: E os lhos de Israel cumpriam o sábado para guardar o sábado para as
suas gerações. Profane um sábado para ele [o que está doente], a m de que ele
possa guardar muitos sábados!”
(Mechilta, Tratado Shabat 1)

Na busca de distinguir a pregação “radicalmente nova” e “não-judaica” de Jesus, os


escritores cristãos tem, normalmente, lido sua declaração de que o shabat foi feito para o
homem e não o homem para o shabat ambos como indicando total oposição quanto a
guarda das leis de shabat e a iniciação de uma religião de amor e não de casuística. Neste
texto, entretanto, vemos que os próprios rabinos sustentam pontos de vistas muito
próximos aos relacionados com a visão (mais expansiva, com certeza) do próprio Jesus,
certamente não em contradição direta com eles. A temática da similaridade entre alguns
destes argumentos e os argumentos de Jesus no Evangelho são impressionantes. Este
paralelo torna-se ainda mais forte quando consideramos o que encontramos em Mateus
12:5, que não está em Marcos: “Ou não tendes lido na lei que, aos sábados, os sacerdotes
no Templo violam o sábado e cam sem culpa?”, assim provendo um paralelo ao
argumento de rabi Akiva também a cerca do Templo.

Jesus poderia muito bem estar em controvérsia com os antigos fariseus que ainda não
tinham articulado o princípio no qual salvar uma vida suplanta o shabat. Como meu colega
Aharon Shemesh indica, semelhante era a opinião dos judeus da Comunidade do Mar
Morto.

O ensinamento de Jesus a este respeito, no entanto, ca quase em oposição ao ensino dos


tannaim mais antigos, que possivelmente aprenderam com Jesus, mas provavelmente não.
O que é distintivo para o Jesus dos Evangelhos é, penso eu, a extensão mais apocalíptica
destes princípios, a saber, a declaração do Filho do Homem, o Messias divino, que agora é
Senhor do Shabat. Isto também é o que explica uma prováveis e potencialmente grandes
diferenças entre a fala dos rabinos do evangelista (ou Jesus). As interpretações rabínicas, e
sua halachah, tende fortemente a permitir a violação do shabat por um judeu para salvar
outro judeu, enquanto que de nição do dito de Jesus e suas consequencias parecem (mas
não inescapavelmente) indicar que qualquer ser humano pode ser salvo no shabat. Se
este é o caso, como parece, que os rabinos aplicam a lei apenas aos judeus, a extensão de
Jesus dela é um produto de um momento apocalíptico radical no qual o Evangelho de
Marcos foi escrito, um momento no qual a Torah não estava sendo rejeitada, porém
expandida e “completada”- para usar a terminologia em Mateus – um momento no qual o
Filho do Homem foi revelado e requereu au autoridade total. Ao Filho do Homem, de
acordo com Daniel, foi verdadeiramente dado jurisdição sobre todas as nações e eu
gostaria de sugerir cautela pois isso explica a extensão do sábado (e portanto, a cura no
sábado) a eles. Aqui em Marcos encontramos um Jesus que está cumprindo a Torá, não
revogando-a.

Os Evangelhos são um testemunho de antigos temas e controvérsias que mais tarde


apareceriam na literatura rabínica. Desde que exista pouca razão para crer que os rabinos
realmente lêem os Evangelhos, segue-se que temos testemunhas independentes para
estas controvérsias. Os argumentos para violação do shabat por David, da a rmação que o
shabat foi feito para o ser humano e do serviço no Templo constituem uma permissão
para violação do sábado (este último encontrado em Mateus e não em Marcos) são todos
mobilizados na literatura rabínica na intenção de justi car salvar uma vida no shabat
(incluindo, sem dúvida, salvação de fome), apenas com a importante ressalva que a cura é
necessária de ser feita no shabat, isto é, caso a condição seja de ameaça à vida, ou poderá
ser se não for tratado. este encadeamento di cilmente pode ser coincidência; alguma
versão inicial de uma controvérsia para permissão de cura no shabat é para ser
encontrada nesta passagem. Precisamos lembrar que neste nível de interpretação, não
encontraremos um particularmente radical, ou mesmo estranho Jesus “rabínico” lutando
com alguns rigoristas no qual ele identi ca como Fariseus. No entanto, essa abordagem
deixa muito do texto inexplicável. Ele não explica de todo o argumento de David de ter
alimentado a si mesmo e seus seguidores com pão proibido. Veremos agora como levar
este momento textual a sério irá revelar uma outra dimensão da teologia de Jesus, de
Marcos (cristologia).
Em suma, a minha sugestão é que um conjunto de argumentos de controvérsia a favor de
permitir violação do sábado para a cura (agora uma prática aceita) foi revestida e
radicalizada por mais um momento apocalíptico sugerido pela própria conexão com o
comportamento de David. A história de David pode seguir por si só de qualquer forma.
Assim como os rabinos enfatizam a fome de David e assim o aspecto de salvar a vida na
história, justi cando brechas na lei se uma vida pode ser salva (Talmud Palestino
(Jerusalém) Yoma 8:6, 45:b), assim fez Mateus; Marcos, em contraste, entende a história
como sendo privilégios especias do Messias, empurrando-o em direção ao que ele fez.
Por conta disso, a razão para a ausência do verso 27 em Mateus (e Lucas) é que a teologia
messiânica de Marcos foi um pouco radical demais para os evangelistas posteriores. Eu
acho que os problemas desta sequência de versículos são melhor desvendados se
levarmos a sério o contexto seguinte de Marcos 2:10, como acabo de expor. Se Jesus (o
Jesus de Marcos, ou o Jesus dessas passagens) proclama-se como o Filho do Homem que
tem ἐξουσία em virtude de Daniel 7:14, então é perfeitamente plausível que ele iria
reivindicar a soberania sobre o sábado também.
Estendendo a noção claramente controversa que a cura é permitida no sábado em virtude
de vários precedentes e argumentos bíblicos, Jesus faz uma a rmação muito mais radical:
não só a Torah quem autoriza a cura do doente de morte no sábado, mas o próprio
Messias, o Filho do Homem, e é dada soberania para decidir como ampliar ainda mais e
interpretar a lei do shabat. Isto é, sugiro, motivado principalmente pelo fato de que é
David quem viola a lei para alimentar seus asseclas, então Jesus-o novo David, o Filho do
Homem-pode fazê-lo para alimentar seu minyan. A questão não é certamente – como
certos intérpretes os dão – que David violou a lei e Deus não protestou, se assim fosse, a
Lei é inválida e qualquer um poderá violá-la. Pelo contrário, é porque David, um tipo do
Messias, gostava de soberania para anular partes da lei, e assim também a Jesus, o novo
David, o Messias. Isto não é um ataque à Lei ou em alegada legalismo farisaico, mas uma
declaração apocalíptica de um novo momento na história em que um novo Senhor, o Filho
do Homem, foi nomeado à legislar sobre a Lei.

Prestando atenção para a alusão implícita de Daniel em cada uso da expressão “Filho do
Homem”, pode-se ver que em todas essas situações, Jesus em Marcos está fazendo
precisamente o mesmo tipo de reivindicação sobre o fundamento da autoridade delegada
para o Filho do Homem em Daniel como ele faz em Marcos 2:10-45 Isto permite-me
propor uma solução para a sequência dos versos 27-28. Uma objeção poderia ser que o
sábado “não está debaixo dos céus”, mas no céu e portanto, suscetível à transferência de
autoridade do Ancião de Dias para aquele como o Filho do homem. Essa objeção é
totalmente atendida pela a rmação de que o sábado foi feito para o ser humano;
consequentemente, o Filho do Homem, tendo sido dado o domínio no reino humano, é o
Senhor do Shabath. Na verdade, é uma parte necessária do argumento de que o Filho do
Homem é Senhor do sábado, pois se o sábado está (como pode-se muito bem a rmar,
com base em Gênesis 1) no céu, então a alegação de que o Filho do Homem, que tem
soberania apenas na terra pode revogar suas disposições soa muito fraco.

Eu penso que esta explicação da conexão entre os versos 27 e 28 respondem muitos


enigmas de interpretação que aparecem quando o verso 27 é lito como uma fraca
declaração humanista, algo como “o shabat foi feito para o homem, então faça o que
quiser”. Na minha perspectiva, em contraste, o que poderia ser um dito do judaísmo
tradicional para justi car a quebra do shabat a m de preservar uma vida é, nas mão de
Jesus em Marcos, a justi cação para uma ab-rogação messiânica do shabat. Esta
interpretação tem a virtude, eu penso, de resolver os dois maiores pontos de atrito
interpretativos no texto: a unidade de duas respostas de Jesus (ambas são referencias
para seu status messiânico) e a subordinação de “Assim o Filho do Homem é senhor até
do shabat”. Os argumentos halachicos na boca de Jesus aqui e no capítulo 7 são muito
bem formados e bem atestados historicamente para serem ignorados; Jesus, ou Marcos,
certamente sabia o seu caminho em torno de um argumento da halachah. Eles não são
uma relíquia, mas representam, creio, temas reais do primeiro século e como tal, eles
fornecem evidência preciosa que tais discursos e raciocínios ao redor da halachah já eram
existentes desde então.

Porém, isto não é tudo que há aqui, é claro. Existem dois elementos que destacam a
mobilização do Evangelho destes argumentos de uma controvérsia puramente halachica.
A primeira é que em ambos os casos, Jesus usa o próprio argumento e a própria halachah
como um sinal de leitura ética, um tipo de parábola (chamada assim explicitamente no
capítulo 7); a segunda e mais interessante é que o elemento apocalíptico do Filho do
Homem é introduzido aqui, como na história do paralítico, para trazer de volta a natureza
messiânica, a natureza divino-humana, da soberania de Jesus como o Filho do Homem,
agora na terra. A comparação com David, é claro, muito direta e sugere que o Redentor
em Daniel 7:13-14 é realmente entendido como um rei messiânico, lho de David. Eu
encontraria aqui, entretanto, clara evidencia da identi cação do Messias Davídico com o
Filho do Homem, uma identi cação que claramente não requer uma conexão genealógica
entre os dois, pois para o Filho do Homem é uma gura inteiramente celestial que torna-
se um ser humano. Houveram outros antigos judeus ao longo do tempo anteriores aos
Evangelhos que também leram Daniel 7 daquela forma que eu estou sugerindo. Nesta
leitura, Marcos ao dizer sobre o Filho do Homem ser o Senhor do Shabat é precisamente
um movimento escatológico radical, porém não é um que é constituído de um passo para
fora da larga comunidade israelita ou mesmo judaica. Se a visão de Daniel agora está
sendo cumprida por Jesus como uma encarnação do Filho do Homem, alguma mudança
radical é exatamente o que se esperaria durante o m dos tempos. A soberania, como
somos ensinados por políticos teóricos modernos, é de quem pode fazer exceções na lei
quando julgá-las necessárias ou apropriadas. É exatamente para semelhantes julgamentos
que ao Filho do Homem foi dada a soberania. A soberania é expressa ao estender a
permissão garantida aos judeus em violar o Shabat, para salvar vidas de outros
observantes do Shabat, pelo Messias Jesus ao incluir todos humanos. Eu argumentaria que
esta gura divina a qual autoridade é delegada é um rei Redentor, tal qual a passagem de
Daniel claramente declara. Assim ele assegura-se da identi cação com o Messias Davídico,
como ele é no Evangelho e também na literatura judaica contemporânea não cristã como
Enoque e Quarta Ezra (Esdras). O uso do termo “Filho do Homem” nos Evangelhos une-se
com a evidência de usos semelhantes em outros textos judaicos antigos para nos levar a
considerar que este tempo foi usado desta forma (e mais importante, o conceito de uma
segunda divindade implícita) como uma moeda comum – a qual eu enfatizo que não
signi ca incontestado ou universal – do judaísmo já anterior a Jesus.

De acordo com Marcos (e em Mateus mais ainda), longe de abandonar as leis e práticas da
Torah, Jesus foi um leal defensor da Torah contra aquilo que ele percebeu serem ameaças
a ela por parte dos Fariseus. Longe de ser um judeu marginal, Jesus foi um líder de um tipo
de judaísmo  que estava sendo marginalizado por outro grupo, os fariseus, e ele [Jesus]
estava lutando contra eles como inovadores perigosos, eles haviam mudado as leis da
Torah.

Sobre o autor:

Rabino Daniel Boyarin Jesus Kept Kosher Jesus e a Lei de …

Daniel Boyarin (‫ ;דניאל בוירין‬nascido em 1946) é um historiador da religião. Nascido em Asbury


Park, New Jersey, ele tem dupla cidadania dos Estados Unidos e de Israel. Treinado como um
estudioso do Talmud, em 1990, foi nomeado
Professor de Cultura talmúdica no Departamento de Estudos de Retórica do Oriente Médio, da
Universidade da Califórnia, em Berkeley, cargo que ainda ocupa.
 
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