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TEMA: COLONIZAÇÃO DA AMÉRICA INDÍGENA

TEXTO: VAINFAS, RONALDO A HERESIA DO INDIOS, CATOLICISMO E REBELDIA NO BRASIL


COLONIAL. “INTRODUÇÃO” (PP. 13-17), PARTE 1 (PP. 21-37) E CONCLUSÃO (PP.225-230)

O objetivo do professor Ronaldo Vainfas é tratar das idolatrias luso-brasileiras. A religiosidade


indígena era tratada pelos etnólogos e desprezado pela historiografia brasileira.

Fontes (p. 15): inquisitorial, correspondência jesuítica, a crônica quinhentista, os papéis da


governança e dois tratado escritos na Europa que aludiram à seria rebelde dos índios brasílicos
(a Santidade de Jaguaripe)

Encontro com os caraíbas (p. 13)

Além das belezas naturais que os portugueses encontraram a partir da chegada em 1500, eles
se estabeleceram graças ao “incentivo de certos homens”. Os caraíbas que “eram
considerados especiais, que tinham o poder de conversar com os mortos, os espíritos dos
ancestrais. [...] Faziam suas pregações desde tempos imemoriais, sendo muito respeitados
pelo seu estilo de vida errante, pelo que diziam e pela festa que promoviam nas aldeias tão
logo chegavam”.

A historiografia desconheceu as santidades ameríndias, em geral. A santidade de Jaguaripe foi


o último suspiro de resistência tupinambá no litoral baiano dos quinhentos e também foi a
mais documentada. Um dos objetivos de tal seita era a morte de portugueses e o fim da
escravidão. Irônica e interessante é saber que um senhor de engenho português, Fernão
Cabral de Taíde, se aliou a tal seita.

Dialogando com Carlo Ginzburg, “que viu no inquisidor um virtual antropólogo, ou pelo menos
etnógrafo, a abrir caminho para o historiador da cultura, sem deixar de ser inquisidor.
Inquisidor-Antropólogo, a travestir de roupagem herética ritos e crenças que conhecia mal”.
Os inquisidores consequentemente ajudaram a nós historiadores por detalhar os rituais e as
crenças dos acusados pelo Santo Ofício.

I - IDOLATRIAS E COLONIALISMO

Combate com a sombra (p. 23)

Justificando a escolha do subtítulo, Vainfas começa a obra relatando uma festa de 1550 que
contou com a presença do Rei Henrique II, Catarina de Médicis e com a participação de 50
índios recém-capturados no Brasil. “a festa foi chamada de sciamachie, cujo significado é
combate com a própria sombra, uma espécie de exercício, praticado pelos antigos, ‘que
consistia em agitar os braços e as pernas como uma pessoa que lutasse com a sua sombra’”.
Em verdade, foi uma espetacularização da cultura indígena, demonstrando “os embates
culturais deflagrados pela expansão europeia na América”. Hierarquizou-se as diferenças,
rejeitando o desconhecido por meio da animalização e da demonização.
P. 23 - Michel de Certeau criou o conceito de heterologia, a partir da literatura de viagens
quinhentistas sobre o mundo recém descoberto. Tal conceito seria um esboço do estudo
etnológico.

P. 24 - Laura de Mello e Souza “ao relacionar o saber demonológico emergente na Europa com
a literatura de viagens e com o esboço de um ‘olhar antropológico’ na velha cristandade
considerou demonologia como parte do que Certeau chamou de heterologia”. Para ela os
missionários, os eclesiásticos e os conquistadores eram “etnodemonólogos”. Ela constatou
que “as atitudes demonizadoras acabariam por triunfar sobre o ‘olhar antropológico’”.

P. 25 - Vainfas concorda com a ideia de que, em verdade, os demonios que os conquistadores


atribuíam aos ameríndios os acompanhavam desde a Europa. Nas palavras de Laura de Mello
e Souza: “era o olhar europeu assombrado com sua própria exterioridade selvagem”.

Idolatria e Demonolatria

P. 25 – “Foram os espanhóis, como diz Delumeau, os maiores demonizadores da alteridade


ameríndia dentre todos os europeus que sobre ela escreveram. Demonizaram-na através de
palavras, imagens e práticas associadas, em última análise, a um conceito específico:
idolatria.”

A ideia de idolatria tem origem no antigo testamento “indicando as impiedades dos gentios
que, ao contrário dos hebreus, adoravam estátuas, cultuavam ídolos”. Mas é a partir do
medievo que as práticas de idolatria passarão por um processo de demonização. Em solo
americano, os colonizadores verão tudo o que há no Novo Mundo como diabólico.

Poucos foram os colonizadores que não demonizaram as idolatrias, dentre eles, destaca-se o
frei dominicano Bartolomé de Las casas que “foi capaz de enxergar nas idolatrias a expressão
de sincera devoção religiosa. Não foi demonólogo, nem etnólogo. Construiu uma imagem
idealizada do índio – o índio puro que habitava o “paraíso perdido” – preconizando o mito do
“bom selvagem””.

Na América Espanhola (principalmente, no México e no Peru, ao longo dos primeiros anos de


conquista), o julgamento da idolatria foi equiparado ao crime de heresia. Podendo ser aplicada
a mais severa pena de todas, a morte. Ao contrário de Las Casas, o bispo Zumárraga destacou-
se como forte perseguidor dos costumes religiosos indígenas. Tendo como objetivo a
“extirpação das idolatrias”. Algumas das penas dadas por ele aos índios foram: degredo
(exílio), açoites, trabalhos forçado e morte na fogueira. A Espanha foi mais combativa que
Portugal.

No Brasil, portanto, foram mais amenas as perseguições estritamente religiosas aos índios. Em
verdade, os lusitanos negavam uma religião entre os índios, falando pouco em idolatria. Para
os jesuítas, “o gentio do Brasil não pronunciava as letras f, l e r porque não possuíam fé, lei e
rei”. Nóbrega foi um dos jesuítas que negavam a “existência de religião entre os índios tupi”.
Eles enxergavam o ameríndios, seguindo a ideia cunhada por John Locke, como uma “tabula
rasa”, um papel em branco.
P. 29 e 30 - A diferença no combate a idolatria entre Portugal e Espanha ocorre, de acordo com
Vainfas, devido “às características ergológicas da religiosidade nas duas Américas”. Na parte
Espanhola, México e Peru haviam “templos, variadas gama de sacerdotes, profusão de ídolos,
máscaras e cultos que se encaixavam em seu próprio saber diabólico”. A Espanha possuía um
corpo eclesiástico para o combate às feitiçarias, enquanto os jesuítas, no Brasil, tinham uma
característica mais evangelizadora.

P. 30 - No início, os portugueses não demonizavam a religiosidade indígena, o que não quer


dizer que não o faziam com a cultura indígena, em suas outras manifestações. Após um tempo,
depois de observar “a pregação de certos pajés, os jesuítas e outros cronistas não deixaram de
ver feitiçaria e até idolatria, contrariando completamente a sua opinião de que os tupi não
criam em coisa alguma.

Idolatria como Resistência

P. 31 e 32 – A idolatria pode ser entendida de duas maneiras: como culto à ídolos, visão do
colonizador, e como resistência social e cultural dos ameríndios contra a colonização. Vainfas
concorda com Serge Gruzinski que analisa a idolatria como manifestação global de resistência
ao colonialismo, ressalvando que não pode ser entendida, então, como um fenômeno pré-
colonial. Para entender a idolatria é necessário inseri-la no contexto colonial. A cultura dos
ameríndios se modificou após o contato com os colonizadores.

Tipologia das idolatrias

P. 33 – A tipologia das idolatrias apresentadas por Vainfas não deve ser vista como inflexível.
Para classificá-las, ele levou em conta dois critérios: “a morfologia específica e as relações que
mantiveram com a sociedade colonial”.

As idolatrias ajustadas são aquela cujas “práticas em que o indígena mostrava-se apegado ao
passado e à tradição sem desafiar frontalmente, quer a exploração colonial, quer o primado do
cristianismo”. Os ameríndios se submetiam ao cristianismo (seus dogmas e sacramentos)
aparentemente. A exemplo, a “idolatria invisível” observada por Hector Bruit que via como
“uma estratégia de simulação” [p. 32] e as descritas por Gruzinski no México.

As idolatrias insurgentes referem-se “antes de tudo, a movimentos hostis ao europeu,


sobretudo à exploração colonial e ao cristianismo. Algumas assimilaram características do
catolicismo. As atitudes de resistência oscilavam da ‘guerra cósmica’ à luta armada”.

Idolatrias e Milenarismo

P. 35 – Milenarismo é a crença em algum tipo de salvação e renovação, estando ligado à ideia


do mito. Vainfas utiliza a definição de Mircea Eliade para o “mito” que “conta uma história
sagrada, relata acontecimentos que teve lugar no tempo primordial, o tempo fabuloso do
começo”. O milenarismo tem como alicerce os mitos de origem e os mitos escatológicos (fim
do mundo).

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