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ABDÔMEN AGUDO INFLAMATÓRIO

O abdômen agudo é uma condição clínica caracterizada por um dor abdominal severa
que requer uma decisão terapêutica urgente.
Pode variar de doenças com risco de vida até condições benignas autolimitadas.

.Ruptura de aneurisma .Apendicite .Gastroenterite


Aórtico .Colecistite .Linfadenite
.Pancreatite .Sigmóide diverticulite .Apendagite epiploica
.Isquemia intestinal .Salpingite .Infarto omental
.Úlcera péptica perfurada .Diverticulite cecal
.Diverticulite perfurada
O manejo do paciente pode variar de uma cirurgia de emergência até o
acompanhamento do paciente, e um diagnóstico errado pode atrasar um tratamento
necessário ou levar a cirurgias desnecessárias.
O US e TC permitem uma triagem acurada dos pacientes com abdômen agudo.
Estratégia radiológica
Em geral, a acurácia da TC é maior que da US. Em pacientes com achados inconclusivos
pela US, a TC pode ser um adjunto à ultrassonografia e vice- versa.
A abordagem radiológica segue duas etapas:
.Confirmação ou exclusão da doença mais comum.
.Avaliar os sinais gerais da patologia.
Clínica, exames laboratoriais e radiografia simples
A clínica e os achados laboratoriais normalmente são inespecíficos. Podem ser normais
em pacientes com doenças cirúrgicas (como apendicite) e anormais em pacientes com
doenças que não tenham indicação cirúrgica (como salpingite).
A radiografia abdominal simples tem valor limitado na evolução do abdômen agudo.
Não exclui íleo (um íleo não pode ser visto em uma radiografia simples, se suas alças
estiverem preenchidas com líquido e não ar) ou outras patologias e pode tranquilizar
falsamente o clínico. Pode ser útil para identificar cálculo renal ou pneumoperitônio.
Para todas as outras indicações usar: US ou TC.
Radiografia simples de um paciente com abdômen agudo, não identificando nenhuma
anormalidade. TC feita posteriormente identificou distensão das alças do ID que não
foram vistas na radiografia simples porque elas estavam preenchidas por líquidos
somente, e não continham ar dentro do lúmen.
Confirmação ou exclusão das doenças mais comuns

Dor em abdômen inferior direito: apendicite


Dor em abdômen inferior esquerdo: diverticulite
Dor em quadrante superior direito: colecistite
-APENDICITE
.Apêndice normal: Na US e TC o apêndice é visto como uma estrutura tubular de fundo
cego aperistáltica localizada no fundo do ceco. Um apêndice normal tem um diâmetro
máximo de 6 mm, é rodeado por tecido gorduroso homogêneo não inflamado, é
compressível e frequentemente contém ar intraluminal.
Imagem A: Apêndice normal em corte longitudinal: US demonstrando o apêndice
como uma estrutura tubular de fundo cego (cabeça das setas), com o diâmetro
máximo de 6mm, circundado por tecido gorduroso não inflamado. Imagem B: corte
axial. O apêndice pode ser comprimido pelos vasos ilíacos.

A tc mostra o apêndice não distendido, contendo ar e rodeado por tecido gorduroso


não inflamado (cabeça das setas).
.Apêndice inflamado: O apêndice inflamado tem um diâmetro maior que 6 mm e é
usualmente circundado por tecido gorduroso inflamado. A presença de fecalito ou
hipervascularização dão suporte à inflamação.

US demonstrando um apêndice dilatado, não compressível, rodeado por tecido


gorduroso inflamado, hiperecoico (cabeça das setas). Cortes longitudinal e transversal.

Doppler demonstrando a hipervascularização na parede do apêndice.


A us demonstrando o apêndice aumentado de tamanho (seta), circundado por tecido
gorduroso inflamado hiperecoico (cabeça das setas).
TC demonstrando o apêndice como uma estrutura terminal, tubular, cega, preenchida
por líquido, distendida, com tecido gorduroso inflamado adjacente.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DA APENDICITE:


-LINFADENITE MESENTÉRICA: É a segunda maior causa de dor em abdômen superior. É
definida como um processo inflamatório autolimitado benigno dos linfonodos
mesentéricos sem um processo inflamatório subjacente identificável. Mais comum em
crianças.
US demonstrando no quadrante inferior direito um cacho de linfonodos mesentérios
aumentados. O apêndice está normal (não demonstrado) e outras anormalidades não
foram encontradas.
Apêndice normal (seta verde) com linfonodos aumentados (setas amarelas).
-APENDAGITE EPIPLOICA: Apêndices epiplóicos são protrusões adiposas da face serosa
do cólon. Um apêndice epiplóico pode sofrer torção e inflamação secundária,
causando dor abdominal focal que pode simular apendicite quando localizada no
quadrante inferior direito ou diverticulite quando localizada no quadrante inferior
esquerdo. É um processo autolimitado. A us e tc demonstram uma massa adiposa
inflamada adjacente ao cólon. Na tc há um anel hiperatenuante correspondendo ao
revestimento visceral peritoneal inflamado.
A tc demonstrando uma apendagite epiploica caracterizada por uma massa gordurosa
no lado direito, circundada por uma anel hiperatenuante.
Uma massa gordurosa no lado esquerdo correspondendo à apendagite epiploica, em
um paciente com suspeita de diverticulite. Há o sinal característico do anel
hiperatenuante.

US do quadrante inferior direito demonstrando uma massa gordurosa inflamada


(cabeças das setas) adjacente ao cólon (setas). A tc demonstrando o sinal do anel
hiperatenuante (seta).

-INFARTO OMENTAL: O infarto omental tem uma fisiopatologia e clínica semelhante a


apendagite epiploica, com o tecido gorduroso infartado no segmento do lado direito
do omento. Imagine ver uma massa de tecido gorduroso inflamado como se fosse um
bolo, mais larga que uma apendagite epiploica sem o anel hiperatenuante na tc.
A us da metade direita do abdômen mostra uma larga área gordurosa intraperitoneal
inflamada (cabeças das setas). A tc mostra uma área de densa gordura omental
inflamada (cabeça das setas), semelhante a um bolo, mais larga que uma apendagite
epiploica e sem o anel hiperatenuante.
Em alguns casos é mais difícil diferenciar uma apendagite epiploica de um infarto
omental. Mas essa diferenciação não tem importância clínica, pois ambas possuem
uma história natural benigna similar.

A tc mostra uma massa gordurosa ovoide inflamada (cabeça da seta) com alças
intestinais regionais normais. O tamanho da lesão sugere ser uma apendagite
epiploica, porém, a lesão não contém o anel hiperatenuante. Neste caso, é difícil
discriminar entre uma apendagite epipoploica e um infarto omental.
- DIVERTICULITE:
Se a dor se localizar no quadrante inferior esquerdo, o principal diagnóstico é
diverticulite no sigmoide. Na diverticulite, a US e a TC mostra diverticuloses com um
segmento da parede do cólon espessado e inflamação na gordura que circunda o
divertículo.
Diverticulite no sigmoide. A us demonstra um divertículo hipoecoico circundado por
um tecido gorduroso inflamado hiperecoico (setas amarelas).

Complicações da diverticulite como abcessos e perfurações, são mais bem excluídas na


tc.
A tc mostra diverticulite de sigmóide descomplicada. Há tecido gorduroso e
espessamento focal da parede do cólon em uma área com divertículos. Sem formação
de abscesso.
Uma importante armadilha é o câncer de cólon que pode se apresentar com imagem
semelhante, principalmente quando o ca de cólon é rodeado por gordura.

Esquerda: Divertículo no sigmoide rodeado por gordura hiperatenuante. A parede do


sigmoide está espessada. Direita: Carcinoma de cólon rodeado por gordura.

-COLECISTITE:
Ocorre quando um cálculo obstrui o ducto cístico. A bile presa causa inflamação na
parede da vesícula biliar.
Os cálculos biliares estão frequentemente ocultos na TC, a us é o método de escolha
para a avaliação da colecistite.
O diagnóstico de vesícula hidrópica é exclusivamente feito quando não há compressão
da vesícula. Não confie em medições. Algumas vesículas biliares acontecem de ser
pequena e outras grandes.

Sinais de colecistite:
.espessamento da parede da vesícula
.vesícula biliar hidrópica
.Sinal de Murphy positivo

Us de uma vesícula biliar normal. O normal da parede da vesícula biliar aparece como
uma linha ecogênica fina na ultra-sonografia (imagem à esquerda). A espessura da
parede da vesícula biliar depende do grau de distensão da vesícula biliar e um
pseudoespessamento pode ocorrer no estado pós-prandial (esquerda).
A tc contrastada mostra a parede normal da vesícula biliar como uma borda fina com
densidade de tecidos moles.

À esquerda tem-se uma us de uma mulher com colecistite mostrando o aparência em


camadas da parede espessada da vesícula biliar, com uma região hipoecoica entre
linhas ecogênicas. Direita: Na Tc contrastada a vesícula biliar de parede espessas
contem uma camada externa hipodensa devido o edema subseroso.

Uma mulher com 43 anos de idade com colecistite calculosa. A tc contrastada mostra
uma vesícula biliar distendida (cabeça das setas) com a parede levemente espessada e
uma região com aumento da atenuação da gordura ao redor (asterisco). Há um cálculo
impactado obstruindo o pescoço da vesícula biliar.
Imagem à esquerda: Homem com 62 anos com colecistite calculosa. Us transversal
mostra uma vesícula biliar com paredes espessadas, distendidas, hidrópicas e não
compressível, com um cálculo intraluminal. Imagem à direta: TC contrastada
demonstra uma extensa inflamação de gordura (cabeça das setas) rodeando a vesícula
(seta).

Imagens longitudinal e transversal da parede espessada da vesícula biliar. A vesícula


não é compressível (hidrópica) e causa uma impressão na parede anterior do abdômen
(cabeça das setas).
A aparência da imagem da colecistite consiste em vesícula larga hidrópica (não
compressível) com uma parede espessada em uma região de máxima sensibilidade
(dito sinal de Murphy).
Significado encontrado para vesícula hidrópica: VB tensa com diâmetro transverso
maior que 4 cm.
A vesícula biliar inflamada geralmente contém pedras ou sedimentos, ao passo que o
cálculo pode ou não ser visto porque está localizado mais no fundo da vesícula ou no
ducto cístico. A vesícula biliar pode estar rodeada por gordura inflamada, mas na US
isso normalmente não é visto, enquanto a TC em alguns casos pode demonstra-la.
Colecistite na tc. A vesícula biliar está maior com espessamento da sua parede (cabeça
da seta) e alguma região de gordura pode ser vista.
-PANCREATITE:
INTRODUÇÃO
É definida como uma inflamação aguda do pâncreas e tecido peripancreático. Varia de
uma doença rotineira suave até uma doença severa com falência de múltiplos órgãos,
com choque, falha renal, respiratória e morte.
ETIOLOGIA
Cálculo biliar e álcool são as principais causas.
CLÍNICA
80-85% das pancreatites agudas apresentam um curso suave sem o desenvolvimento
de falha em múltiplos órgãos e com baixa mortalidade. O restante apresenta um curso
severo com necrose pancreática e de tecidos peripancreáticos e com falha de
múltiplos órgãos. Dentre os casos de necrose, 60% são estéreis e 40% se tornam
infectadas.
A pancreatite aguda severa assume um curso bifásico: Nas primeiras 1-2 semanas há
uma resposta pró-inflamatória que resulta na síndrome da resposta inflamatória
sistêmica (SIRS). É uma resposta essencialmente estéril em que sepse ou infecção
raramente ocorrem. Umas SIRS severa pode levar a uma falência precoce de órgãos.
Depois de 1-2 semanas há a transição de uma resposta pró-inflamatória para uma
resposta anti-inflamatória. Durante essa resposta anti-inflamatória, o paciente tem
risco para translocação da flora intestinal e desenvolvimento de infecção da necrose
pancreática ou tecidos peripancreáticos. A sepse subsequente resultaria em falência
tardia dos órgãos.
MORTALIDADE
Mortalidade precoce na pancreatite aguda resulta de uma resposta inflamatória
severa com falência de múltiplos órgãos. Mortalidade tardia resulta de infecção da
necrose pancreática e tecidos peripancreáticos que resulta em sepse.
IMAGEM NA PANCREATITE AGUDA
TC é a modalidade de escolha para diagnóstico e estadiamento da pancreatite aguda e
suas complicações. US é importante para determinar se cálculos biliares são a causa da
pancreatite aguda (pancreatite biliar). CPER com extração do cálculo é indicado em
pacientes com pancreatite biliar e sinais de obstrução biliar. RM é tão sensível quanto
a tc, mas não é uma realidade acessível na maioria dos centros.
Não há valor adicional em uma TC precoce (em até 72h após o começo dos sintomas)
em pacientes com pancreatite aguda. O diagnóstico é usualmente feito pelos achados
clínicos e laboratoriais. Uma tc precoce pode ser enganosa em relação à severidade da
pancreatite, porque ela pode subestimar a presença e quantidade de necrose. TC
precoce só é recomendada quando o diagnóstico é incerto, ou nos casos de suspeita
de complicações precoces como perfuração intestinal e isquemia.
O caso mostra um realce normal do pâncreas, comparável ao baço no primeiro dia. A
condição desse paciente piorou e uma segunda tc foi feita no terceiro dia. Olhe como a
maior parte do corpo e cauda do pâncreas não realçou. De fato, somente uma
pequena parte da cabeça do pâncreas realçou. O paciente faleceu no 3 dia por uma
SIRS severa e falência de múltiplos órgãos.
ESTADIAMENTO DA PANCREATITE AGUDA
A estratificação precoce da severidade da pancreatite aguda é importante por várias
razões. A identificação de paciente com maior morbidade e mortalidade é crítica
porque estes pacientes podem se beneficiar com a transferência para unidades de
terapia intensiva ou centros de referência terciária para tratamento de suporte ou
terapia alvo (isto é, intervenção endoscópica ou alimentação enteral).
Sistemas de pontuação relacionados à TC são o testes de imagem mais estudados em
pancreatite aguda. Desde a introdução da tomografia computadorizada para
diagnóstico e avaliação da gravidade da pancreatite aguda na década de oitenta, foram
desenvolvidos muitos sistemas baseados em imagem.
Determinantes da maioria dos sistemas de pontuação radiológicos incluem alterações
pancreáticas, características peripancreáticas e extrapancreáticas .
De todos os sistemas de avaliação para estadiamento radiológico, o índice de
gravidade da TC (CTSI) é o mais estudado. O CTSI combina a graduação de Balthazar (0-
4 pontos) com a extensão da necrose pancreática (0-6 pontos) em uma escala de 10
pontos. O cálculo da CTSI pode ser subdividido em 3 categorias (CTSI 0-3, 4-6 e 7-10)
correspondendo a doença leve, moderada e severa, respectivamente.

CTSI
Inflamação pancreática
A .pâncreas normal 0pt
B .aumento do pâncreas 1pt
C .inflamação peripancreática 2 pts
D .1 coleção líquida peripancreática 3pts
E .> ou = 2 coleções líquidas peripancreáticas 4pts
Necrose pancreática
.nenhuma 0 pt
.<30% 2 pts
.30-50% 4 pts
.>50% 6pts
Máximo de 10pts

A predição da severidade da doença ajuda mais o clínico no dia da admissão, que o


paciente pode ser transferido para cuidados médios e intensivos.
Estudos recentes mostram que os sistemas de pontuação com base em imagens não
superam os sistemas de pontuação com base em parâmetros clínicos e bioquímicos no
dia da admissão no que diz respeito à previsão de resultados clínicos e morte.
Portanto, realização de TC no dia da admissão exclusivamente para fins de previsão
não é recomendado.
CLASSIFICAÇÃO REVISADA DE ATLANTA 2012
A classificação revisada de Atlanta 2012 discrimina 2 tipos morfológicos de pancreatite
aguda e classifica a severidade clínica da pancreatite aguda em 3 categorias baseadas
nos achados clínicos e morfológicos; leve, moderadamente severa e severa,
dependendo da presença de falência de órgãos e complicações locais ou sistêmicas.
Pancreatite aguda leve é definida pela ausência de falência de órgãos e complicações
locais ou sistêmicas.
Pancreatite moderadamente severa é definida como a falência transitória de órgãos
(duração menor que 48h) e/ou presença de complicações locais ou sistêmicas.
Pancreatite aguda severa é definida como a presença ou persistência da falência de
órgãos com duração maior que 48h.
A pancreatite aguda tem basicamente duas diferentes formas morfológicas:
pancreatite intersticial ou edematosa e pancreatite necrotizante. A pancreatite
intersticial realça normalmente na TC contrastada com ou sem alterações
inflamatórias peripancreáticas ou líquido. A marca da pancreatite necrotizante é a
presença de tecido necrotizante no parênquima pancreático (demonstrado por áreas
não realçadas do pâncreas), nos tecidos peripancreáticos (manifestado por áreas
heterogêneas rodeando o pâncreas) ou ambas.
Na prática, a severidade morfológica e clínica frequentemente se sobrepõem (isto é,
pacientes com pancreatite intersticial tem uma clínica leve, e a maioria dos pacientes
com pancreatite necrotizante irão sustentar uma clínica severa de pancreatite aguda).
Entretanto, a premissa nem sempre é verdadeira. Assim, é importante perceber que a
gravidade clínica prevalece sobre gravidade morfológica.
Pancreatite leve: Pacientes com pancreatite, mas sem coleções ou necroses (isto é,
Balthazar A-C) tem uma pancreatite leve. Ela é também dita pancreatite edematosa ou
intersticial (não pancreatite necrotizante). É uma doença autolimitada com uma
recuperação sem intercorrências ocorrendo em 80% dos pacientes com pancreatite
aguda.
Há uma forma intermediária da pancreatite sem necrose com um curso clínico
intermediário. Ela é chamada necrose extrapancreática (EXPN). Em alguns casos, o
termo pancreatite exsudativa é usado. Os pacientes possuem um Balthazar D ou E.
Estes pacientes tem um curso relativamente leve, porque não há necrose pancreática,
mas há uma mortalidade maior que a pancreatite intersticial, porque há coleções
peripancreáticas que podem se tornar infectadas.
Pancreatite severa ou pancreatite necrotizante: Ocorre em 20% dos pacientes. É
caracterizada por um curso clínico prolongado, uma alta incidência de complicações
locais e uma alta mortalidade.
Pancreatite intersticial não tem necrose, não tem coleções e nem complicações. A
mortalidade é <1%. Na EXPN não há necrose, mas há coleções, 12% de complicações e
<8% de mortalidade. A pancreatite necrotizante tem necrose, usualmente tem
coleções, 82% de complicações e 10-23% de mortalidade.

PANCREATITE INTERSTICIAL
Pacientes com realce normal (isto é, Balthazar A-C) sem necrose em tecidos
extrapancreáticos. Usualmente, é um processo autolimitado com a cura ocorrendo
sem intercorrências em cerca de 80% dos pacientes com pancreatite aguda. A imagem
mostra um realce normal de todo o pâncreas com somente uma leve infiltração de
gordura circundante. Não há coleções de líquido ou necrose (Balthazar C, CTSI: 2).

Pancreatite intersticial.

EXPN –PANCREATITE EXSUDATIVA


Na EXPN, há realce normal de todo o pâncreas associado com extensas coleções
peripancreáticas. Estas são frequentemente heterogêneas na aparência (isto é, tem
densidade de líquido e não líquido na TC) e podem ser progressivas. EXPN consiste em
necrose da gordura peripancreática, líquido pancreático extravasado e componentes
inflamatórios e hemorrágicos. Quando coleções peripancreáticas persistem ou
aumentam isso é usualmente devido à presença de necrose gordurosa. Como gordura
não realça na TC, o diagnóstico de necrose gordurosa pode ser difícil. No caso abaixo,
no dia 18 há uma expansão das coleções peripancreáticas. Há finalmente duas
coleções, mas não há necrose no parênquima pancreático (Balthazar E, CTSI 4).
Pancreatite exsudativa (EXPN).

PANCREATITE NECROTIZANTE
Necrose do parênquima pancreático e/ou dos tecidos peripancreáticos ocorre em 20%
dos pacientes. Se caracteriza por curso clínico prolongado, uma alta incidência de
complicações locais e uma alta mortalidade. Há 3 subtipos de pancreatite
necrotizante:
.Necrose do parênquima pancreático sem necrose dos tecidos peripancreáticos
circundantes.
.Necrose de tecidos extrapancreáticos sem necrose do parênquima pancreático
ou necrose extrapancreático (EXPN).
.Necrose de ambos parênquima pancreáticos e tecidos peripancreáticos.
A tc mostra uma necrose pancreática aguda. Há 2 ou mais coleções líquidas e mais que
50% da glândula pancreática não realça (Balthazar E e CTSI 10). A detecção da necrose
pancreática na prática clínica é importante porque complicações fatais ocorrem em
pacientes com necrose pancreática.
Necrose pancreática: realce apenas na cabeça do pâncreas.
Necrose pancreática e peripancreática.

No caso abaixo o corpo e a cauda do pâncreas não realçaram após contraste


intravenoso (setas azuis). Há, entretanto, realce normal da cabeça do pâncreas (seta
amarela).
Mais que 50% do pâncreas está necrosado e há pelo menos 2 coleções (CTSI 10).
Necrose pancreática do corpo e cauda.

Duas semanas depois a coleção no omento e corpo pancreático aumentou


significativamente. A cauda pancreática ainda realça e também a cabeça pancreática
(setas). O paciente desenvolveu septicemia e passou por uma cirurgia.
COLEÇÕES PERIPANCREÁTICAS
A classificação revisada de Atlanta discerne 4 tipos de coleções peripancreáticas na
pancreatite aguda dependendo do conteúdo e grau de encapsulamento.
.Coleções líquidas agudas peripancreáticas (APFC): contém apenas líquido, não
são ou são parcialmente encapsuladas.
.Coleções necróticas agudas (ANC): Contém uma mistura de líquido e material
necrótico, não são ou são parcialmente encapsuladas.
.Pseudocisto: contém apenas líquido e é totalmente encapsulado.
.Necrose pancreática delimitada (WON): contém uma mistura de líquido e
material necrótico e é totalmente encapsulada.
APFC e pseudocisto ocorrem somente na pancreatite intersticial, já ANC e WON
ocorrem somente na pancreatite necrotizante. O determinante primário que
diferencia cada coleção peripancreatica são os conteúdos (somente líquido na APFC e
pseudocisto e mistura de líquido e material necrótico na ANC e WON) e grau de
encapsulamento (nenhum ou parcial na APFC e ANC; e completo no pseudocisto e
WON). Na TC, a discriminação entre APFC e ANC pode ser difícil, principalmente nas
primeiras semanas, por isso, o termo coleções peripancreáticas indeterminadas pode
ser usado. Todas essas coleções podem permanecer estéreis ou se tornarem
infectadas.

Coleção líquida aguda peripancreática: <4 semanas; ocorre na pancreatite intersticial;


tem a densidade homogênea de líquido; não é totalmente delimitada por uma parede;
é adjacente ao pâncreas.
Pseudocisto: >4 semanas; ocorre na pancreatite intersticial; tem a densidade
homogênea de líquido; paredes bem definidas; adjacente ao pâncreas; não tem
componente que não seja líquido.
Coleção necrótica aguda: <4 semanas; ocorre na pancreatite necrotizante; é uma
coleção com material heterogêneo; não é totalmente delimitada por uma parede; é
intra ou extrapancreático.
Necrose pancreática delimitada: >4 semanas; ocorre na pancreatite necrotizante; é
uma coleção com material heterogêneo; é bem delimitado; é intra ou
extrapancreático.
Coleções líquidas intra-abdominais e coleções de tecido necrótico são comuns na
pancreatite aguda. Essas coleções se desenvolvem precocemente no curso da
pancreatite aguda. No estágio inicial, tais coleções não têm uma parede ou cápsula.
Locais preferenciais são a bolsa omental, espaço retroperitoneal e subperitoneal. Essas
coleções resultam da atividade das enzimas pancreáticas (isto é, lipase, tripsina e
amilase) que também são causa da necrose dos tecidos circundantes. Isso explica
porque muitas destas coleções abrigam restos necróticos sólidos (ANC). Cerca de 50%
dessas coleções mostra regressão espontânea. Os 50% restantes permanecerão
estáveis ou aumentarão e passam por organização e demarcação com a liquefação.
As coleções podem permanecer estéreis ou desenvolverem infecção.

Regressão de uma coleção peripancreática.


Baseado somente na TC é algumas vezes impossível determinar se as coleções contêm
líquido somente ou uma mistura de líquido e tecido necrótico e se elas estão
infectadas ou não. Consequentemente, ao invés de nomeá-las como pseudocisto ou
coleção de líquido pancreática aguda, é melhor as descrever como coleção pancreática
indeterminada.
A TC abaixo mostra um paciente com pancreatite aguda. Há uma coleção na área da
cabeça do pâncreas no espaço pararenal anterior direito (impossível de distinguir
entre APFC e ANC). Em uma imagem de seguimento a coleção no espaço pararenal
anterior direito aumentou de tamanho. Ela tem uma densidade de fluido e uma
parede fina de reforço (pode ser um pseudocisto ou WON). Um dia depois do paciente
desenvolveu septicemia e uma drenagem percutânea foi feita. Depois da drenagem a
coleção mal diminuiu de tamanho e consequentemente houve uma suspeita de tecido
necrosado. A paciente foi submetida a cirurgia e o achado da coleção consistiu em
necrose, que não foi demonstrada na TC (portanto, isso era uma WON e não
pseudocisto!). A necrose era muito viscosa para ser drenada com sucesso.
NECROSE INFECTADA
A necrose infectada é
.a infecção do parênquima pancreático necrótico
.e/ou tecido gorduroso extrapancreático necrótico
Ocorre, usualmente, na 2ª-3ª semana.
É mais severa complicação local da pancreatite aguda.
Causa mais comum de morte em pacientes com pancreatite aguda.
Bolhas de ar são vistas em 20% dos casos de necrose infectada.
O caso abaixo é um típico exemplo de necrose pancreática infectada.
No 3 dia não há realce do pâncreas, consistente com necrose (compare o realce do
baço).
No seguimento, as coleções pancreáticas aumentaram de tamanho e finalmente há as
bolhas de ar consistente com necrose pancreática infectada.
PSEUDOCISTO VERSUS NECROSE BEM DELIMITADA
O pseudocisto é uma coleção de suco pancreático ou líquido enclausurado por uma
completa parede de tecido fibroso. Ocorre na pancreatite intersticial.
Ausência de tecido necrótico é imperativo para o diagnóstico.
Normalmente comunica com o ducto pancreático.
Requer 4 semanas ou mais para desenvolver.
Diagnóstico diferencial inclui necrose bem delimitada e algumas vezes
pseudoaneurisma ou até um tumor cístico.
Mais frequentemente, ocorre na bolsa omental.
Pseudocisto na pancreatite aguda é uma ocorrência rara porque na fase aguda da
pancreatite aguda a maioria das coleções contém alguma quantidade de material
necrótico (ANC/WON).
O paciente no caso baixo apresentou uma obstrução na saída gástrica 2 meses após
um episódio de pancreatite aguda. Há uma larga, homogênea, coleção pancreática
bem delimitada na bolsa omental. Este paciente não apresentou febre. A coleção foi
drenada com sucesso e mostrou o líquido com um aumento de amilase. Isso
provavelmente é um pseudocisto pancreático.

Na TC abaixo de um paciente na UTI no dia 40 com necrose central da glândula e com


febre. A TC mostra uma coleção semelhante (densidade do fluido) com o do paciente
anterior, exceto pela sua localização no pâncreas. A coleção é homogênea e bem
demarcada com uma fina parede adjacente ao estômago. Durante o debridamento
endoscópico essa coleção continha fluido e tecido necrótico (isto é, WON), que foi
removida da área do pâncreas. Embora as características da imagem sejam similares
ao caso anterior, isso provou ser uma WON infectada.
O paciente abaixo também teve uma coleção pancreática e peripancreática
homogênena bem demarcada com um realce da parede, no dia 25 de um episódio de
pancreatite aguda necrotizante. Este paciente teve febre e falência de múltiplos
órgãos. Portanto, suspeitou-se de WON infectada e não pseudocisto. À cirurgia, a
coleção continha muito material necrótico, que não foi demonstrado na TC.
RNM é superior que TC na diferenciação entre líquido e material necrótico sólido.
Abaixo um paciente com uma coleção pancreática homogênea severa na TC. Essas
coleções mostram uma hiperintensidade na sequência T2 da RNM e, portanto, contém
líquido (isto é, pseudocisto).

Abaixo outro paciente 2 meses após um episódio de pancreatite necrotizante aguda


(subtipo EXPN) com uma coleção pancreática homogênea no mesocolon transverso
(seta). A sequência da RM ponderada em T2 mostra que a coleção tem uma
hipointensidade (seta). Provavelmente é um tecido gorduroso necrótico (WON). Este
paciente não teve febre ou sinais de sepse (necrose estéril ou estéril WON). Drenagem
endoscópica ou percutânea teria pouco ou nenhum efeito neste tamanho. Há um
aumento no risco de infecção quando a coleção é colonizada após colocação do dreno.
Esses casos ilustram que em alguns casos a TC não pode diferenciar com segurança as
coleções que consistem em líquido daquelas que contêm líquido e material necrótico
com ou sem infecção.

Limitações das imagens nas coleções peripancreáticas: Imagem pode não diferenciar
entre coleções estéreis ou infectadas. TC não pode diferenciar líquido de debris. RM é
superior que a TC na diferenciação entre líquido e debris sólidos. Ar está presente em
apenas 40% das coleções infectadas.

No paciente abaixo há uma realce normal do pâncreas com coleções peripancreáticas


heterogêneas circundantes com densidade de líquido e gordura (imagens à esquerda).
Duas semanas depois (imagens à direita) há bolhas de ar nas coleções
peripancreáticas, consistente com necrose infectada. Este paciente foi submetido à
cirurgia. O cirurgião removeu uma grande quantidade de tecido necrótico e estima
que removeu mais de 90% do pâncreas.

Notavelmente, uma TC feita 6 meses após a cirurgia mostrou um pâncreas normal. O


que indica que durante a cirurgia a diferenciação entre necrose pancreática e necrose
de tecidos peripancreáticos é algumas vezes impossível.
INTERVENÇÃO

O manejo atual da pancreatite aguda tende a ser conservadora tanto quanto possível.
Nas primeiras duas semanas os pacientes com pancreatite aguda severa e falência de
múltiplos órgãos devem ser estabilizados na UTI. Intervenções devem ser atrasadas o
quanto possível. O que permite demarcação das coleções. Lembre que muitas coleções
irão se resolver espontaneamente.

Manejo da pancreatite aguda: abordagem conservadora para pancreatite aguda leve e


severa. Alívio adequado da dor. Fluido intravenoso. Alimentação (enteral) precoce.
Não antibióticos profiláticos. No caso de falência de múltiplos órgãos: cuidados
intensivos.

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