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DEWEY E A PROPOSTA DEMOCRÁTICA NA EDUCAÇÃO

Rosa de Lourdes Aguilar Verástegui*


Resumo: O trabalho de John Dewey tem sido uma fonte de inspiração para as noções
de democracia participativa ou deliberativa. Ele acredita que a política, ao administrar a
vida pública, pode ajudar na formação de um indivíduo integrado de maneira harmônica
com a natureza e a sociedade, no sentido aristotélico do zoon politikon. Analisamos sua
proposta ético-política, que constitui uma nova visão idealista liberal e uma crítica ao
liberalismo tradicional, sobretudo quanto à concepção de indivíduo como uma entidade
independente, em concorrência com outros indivíduos. Dewey propõe uma educação
com consciência, que fortalece a liberdade, propicia a integração e colaboração. Esta
educação é um requisito necessário para o exercício da democracia.
Palavras-chave: Dewey, política liberal, ética, democracia.

Abstract: The work of John Dewey has been a source of inspiration for the notions of
participatory or deliberative democracy. He believes that politics, in administering
public life, can help in the formation of an individual integrated harmoniously with
nature and society, in the Aristotelian sense of the zoon politikon. I reviewed your
proposed ethical-political, which is a new liberal and idealistic view and a critique of
traditional liberalism, especially regarding the design of the individual as an
independent entity in competition with other individuals. Dewey proposes an education
of conscience, which strengthens the freedom, enables the integration and collaboration.
This education is a necessary requirement for the exercise of democracy.
Key-words: Dewey, liberal politics, ethics, democracy.

1. Introdução

Sabemos que a vida é melhor quanto mais alargamos nossa atividade, pondo em
exercício todas as nossas capacidades. Esse cuidado que vem desde Aristóteles é uma
preocupação não somente do individuo, senão também da sociedade: o máximo
desenvolvimento de cada um, dirigido de modo que se assegure o máximo
desenvolvimento de todos. O nosso ideal é uma vida socialmente produtiva.
Estudar as propostas políticas nos permite observamos a conduta coletiva e
individual dos homens que se repete ao longo da história. Na procura da ordem natural
da sociedade, Aristóteles conclui que a felicidade é o objetivo da vida humana. E para
conseguir a felicidade o ser humano tem que colocar sua alma em concordância com a
virtude (areté) e a razão. A definição aristotélica de virtude é excelência, que esta ligada
à justiça, ao comportamento equilibrado, ao melhor esforço por realizar uma ação.

*
Universidade Estadual de Londrina, Departamento de Educação rosaguilar@hotmail.com
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A sociedade ideal para Platão é o Estado em forma de república, segundo uma
divisão que estaria mais para a divisão em castas do que para a divisão em classes,
enquanto que o Estado, na formulação de Aristóteles, é o Estado democrático que abriga
uma divisão específica entre os homens. Apesar das distinções entre estes filósofos,
ambos estão preocupados para que o homem procure o seu melhor desenvolvimento
dentro de uma sociedade ordenada.
Quando lemos Dewey observamos também grande afinidade com as propostas
gregas, com a preocupação ética e social de Platão e Aristóteles. A proposta pragmática
de Dewey na educação é muito conhecida, mas esta não se pode entender se não
vislumbramos a sua preocupação ética e política. Neste contexto, ressaltamos a
coerência entre sua teoria e sua vida, sua participação em diversas atividades públicas e
políticas, incluídas a presidência do sindicato dos professores e sua constante
preocupação pela política norte americana e internacional, como mostram suas
publicações e declarações em nome de muitas causas.
Para compreender a filosofia política de Dewey temos que observar a proposta
ético-política, que é uma nova visão liberal. Ele crítica o liberalismo tradicional,
sobretudo a concepção do indivíduo como uma entidade independente, em concorrência
com outros indivíduos. O filósofo norte-americano propõe um individualismo baseado
na liberdade com responsabilidade. Para isto, o indivíduo tem que ter uma educação que
oriente seu critério ético. Formar um cidadão político, no sentido de Dewey,consiste em
aproximar a um liberalismo com responsabilidade social, tarefa esta que constitui um
desafio para a educação.

2. O problema da liberdade e a individualidade

Dewey rejeita a visão da vida social e política como um agregado de interesses


privados conflitantes. Em vez disso, ele propõe formar indivíduos relacionados e
integrados, porque “sociedade significa associação; relaciona o convívio com a ação
para a melhor realização de qualquer forma de experiência” (EDMAN, p.84). A
individualidade pode ser sustentada apenas onde a vida social é entendida como um
organismo, em que o bem-estar de cada parte está ligado ao bem-estar do todo.
Dewey critica o liberalismo clássico por conceber o indivíduo como algo dado,
que já está acabado, para a sociedade e para a visualização das instituições sociais. Em
vez disso, ele argumenta que, as instituições sociais não são meios para os indivíduos

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obter algo, elas são meios para a criação de indivíduos. Quando o liberalismo clássico
trata o indivíduo como "algo dado” erra em sua visão essencialista, porque o indivíduo
não é nada fixo, dado pronto. O indivíduo é ser em construção, que vai sendo e
consegue isto não isoladamente, mas com a ajuda e apoio das condições culturais e
físicas. Em realidade Dewey vê que o meio social forma a disposição mental e
emocional dos indivíduos exerce uma influência educativa ou formativa de modo
inconsciente e desligado de qualquer propósito estabelecido - entendendo meio social,
como as condições econômicas, instituições jurídicas e políticas, bem como a ciência e
a arte.
O liberalismo clássico formula sua ética a partir da abstração do indivíduo do
contexto social. Se o indivíduo é pensado como existente antes das instituições sociais,
então aparentemente, é mais fácil garantir a liberdade do indivíduo em termos apenas da
remoção das barreiras externas na ação individual, tais como as restrições legais à
liberdade de expressão. Assim, “na tradição clássica, a lei e a razão estão intimamente
ligadas como pai e filho. Conquanto essa máxima atribua à lei uma origem e autoridade
que nada tem a ver com a liberdade” (EDMAN, p.270). Dewey explica que a mera
ausência de restrição externa não é uma condição suficiente para a liberdade no sentido
em que este último é um valor para os liberais.
Para o liberalismo clássico ou individualismo velho, o indivíduo é visto como
rodeado por um cordão de proteção de direitos, que define a sua liberdade. A liberdade
é tomada como a ausência de alguma restrição intencional sobre a capacidade do
indivíduo de perseguir seus objetivos escolhidos. Para Dewey, essa visão negativa da
liberdade é a raiz dos defeitos sociais, éticos e políticos desta forma de individualismo.
E é também a crítica que Bobbio faz ao capitalismo paternalista, que acredita que a
solução é o estabelecimento de mais leis e direitos, o que nos tem levado a uma situação
que ele denomina “a era dos direitos”, na qual todos lutam pelos direitos e estes estão
crescendo cada vez mais, desequilibrando os deveres, pois ninguém quer assumir
responsabilidades. As responsabilidades cabem ao estado, a população só quer
conquistar direitos.
O que é valioso sobre a liberdade não é sua forma negativa, como a ausência de
interferência, mas a forma positiva de poder ser um eu individualizado. Dewey entende
a liberdade em um sentido "positivo", que consiste não apenas na ausência de
constrangimentos externos, mas no fato positivo da participação numa ordem social

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eticamente desejável. Para ele, os homens não são isolados, são átomos sociais, mas
somente são homens nas relações intrínsecas com os outros, e o Estado os representa na
medida em que se tornaram organicamente relacionados entre si, ou são dotados de
unidade de propósitos e interesses. Mas o estado e as leis são legítimos na medida em
que protegem a dignidade humana, sendo assim “as leis e o código podem estar errados,
e o indivíduo pode ter o direito a seu favor, recusando-se a obedecê-los” (DEWEY,
1964, p. 76). A individualidade permite que o cidadão discorde de uma lei ou tradição,
permitindo que ele se destaque e diferencie do resto como um ser consciente que pode
questionar aquilo que agride seus interesses. A história nos mostra que o progresso
moral foi conquistado graças àqueles que foram contra o que consideraram injusto nas
tradições ou leis e que na época foram considerados imorais ou até criminosos.
O conceito de individualidade em Dewey é complexo, porque a individualidade
é reflexiva, social e deve ser exercida, a fim de ser apreciada. A individualidade consiste
na capacidade e vontade por parte de uma pessoa de refletir sobre ela ou, sobre seus
próprios objetivos e projetos, e revisá-los. Existe individualidade nas distintas respostas
ao ambiente e cada pessoa apresenta uma forma diferente e particular de sentir os
impactos do mundo. Para os liberais, a individualidade consiste na capacidade pessoal
para a escolha a qual está intimamente ligada à liberdade.
Tanto a liberdade como a individualidade são sociais. A liberdade é a realização
das potencialidades pessoais que ocorrem somente em associações enriquecidas pelos
outros. A liberdade é o poder de ser um “eu” individualizado, contribuir de forma
distintiva e desfrutar de maneira particular dos frutos da associação. A liberdade, então,
só é possível em uma forma canônica de ordem social, em que todos participem na
formação das condições de vida em comum.
Dewey propõe o conceito de “exercício” da liberdade, em vez de uma
“oportunidade” de liberdade. Assim, eu estou de posse de minha liberdade só se eu
realmente agir desta maneira. Ele vê a liberdade no ato, não na potencia, ou seja, não
existe o “teoricamente livre” senão o “livre na prática”. O valor da liberdade individual
requer a reconstrução da ordem social através da participação e da democracia, que
Dewey vê como algo intrínseco a este valor.
Dewey tem sido uma fonte de inspiração para as noções de democracia
participativa ou deliberativa. Ele é antielitista, e argumenta que a capacidade de poucos
sábios para discernir o interesse público tende a ser distorcida. A participação
democrática não é considerada unicamente como um suporte contra o governo das

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elites, mas, também, como uma forma de liberdade individual. Ademais, a democracia
não é simplesmente uma forma de governo, ela se constitui num ideal social e pessoal,
não apenas uma propriedade das instituições políticas, mas de uma ampla gama de
relações sociais. O ideal democrático é comum a uma série de esferas sociais, no meio
industrial, bem como no civil e político.
Para que a democracia seja eficaz é necessária a existência de uma cidadania
participativa que a educação ajuda a forjar. Dewey coloca uma ênfase especial na
importância da educação pragmática para a democracia.

3. A ética, a educação e a ação social

Dewey argumenta que os valores podem ser vistos como construções para
resolver problemas práticos. Um valor passado foi construído para resolver um
problema em um conjunto de circunstâncias e pode extrapolar sua utilidade, tornando-se
um obstáculo para o desenvolvimento das pessoas. Isso, Dewey acredita, é o caso com
respeito aos valores do liberalismo clássico. Estes têm bloqueado a capacidade de
resolver problemas sociais de forma compatível com o compromisso do liberalismo,
que tem por núcleo à liberdade individual. É desta forma que as palavras de ordem do
liberalismo, em um período, podem tornar-se os baluartes da reação nos próximos.
Nenhum professor pode ser apolítico, isto é, indiferente diante das diversas
possibilidades que se oferecem a seu aluno. Se o professor tenta aliviar os problemas de
desequilíbrio social e individual, que são sintomas que indicam a necessidade de
encontrar o verdadeiro sentido à educação, ele deve procurar o crescimento ou evolução
dele próprio e de seus alunos, como destaca Dewey:
Desde que a evolução é a característica da vida, a educação está toda no desenvolvimento;
outra não é sua finalidade. O valor da educação escolar está na intensidade com que ela cria o
desejo de aperfeiçoamento contínuo, proporcionando os meios de concretizá-lo. (DEWEY,
1959).

Acreditamos que o equilíbrio humano pode conseguir-se graças à educação. De


acordo com Dewey a experiência educativa pode ser propiciada pela escola, desde que
essa instituição seja regida por princípios democráticos e integradores.
Uma educação que procura o equilíbrio humano pode ajudar a constituir uma
sociedade formada por diversos grupos sociais, que por sua vez estão constituídos por
indivíduos diferentes. Mas, apesar da individualidade e a liberdade que os caracterizam,

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esses indivíduos têm algo em comum, o respeito pelos valores morais. Isto permite que
seus interesses sejam compartilhados por todos.
Para Dewey, a democracia é a condição para que a educação promova o
aprimoramento da vida social e humana; respeitando a pluralidade e, ao mesmo tempo,
procurando interesses comuns. A educação deve ter um fim social, de tal maneira que:
Um programa de estudos, que tenha em vista as responsabilidades sociais da
educação, deve apresentar situações cujos problemas sejam relevantes para a vida em
sociedade e, em que se utilizem as observações e conhecimentos para desenvolver a
compreensividade e o interesse social. (DEWEY, 1959, p. 212)
A importância da educação está em que ela ajuda diretamente nos problemas
sociais relevantes. A preocupação com a responsabilidade social é fundamental em
Dewey, tanto que ele considera “o maior perigo que ameaça o trabalho escolar é a
ausência de condições que tornem possíveis a impregnação de espírito social”
(DEWEY, 1959, p. 393). Se quisermos um ser humano equilibrado, devemos procurar
que sua formação seja justa, isto é, teórica e prática, seja coerente com sua problemática
social e, que estas possibilidades não fiquem unicamente como uma prática escolar,
senão que:
Deve haver continuidade entre o aprendizado escolar e o extraescolar. Deve
existir livre interação entre os aprendizados. Isto só é possível quando existem
numerosos pontos de contato entre os interesses sociais de um e de outro. (DEWEY,
1959, p. 394)
Se a escola não cumpre este papel social, ela se converte em uma organização
fora da realidade. A educação deve ajudar o aluno a não ter medo do poder do Estado, a
aprender a exigir dele e a não ambicionar o poder como forma de subordinar seus
semelhantes. A união entre teoria e prática é fundamental para o conhecimento porque
este só atinge a maturidade quando se aplica. Um conhecimento científico fora da
realidade é estéril.
Dewey chama ação social à exigência da liberdade positiva ou individualidade,
em condições industriais modernas. A identificação da liberdade com a individualidade,
no sentido de Dewey, permite que os meios necessários para alcançar a individualidade
devem ser entendidos como condições necessárias de liberdade. Ao longo de sua vida,
ele argumentou que a educação é fundamental para permitir o surgimento de cidadãos
livres, que possuam individualidade.

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Dewey se baseou em uma ampla gama de fontes para reforçar a sua concepção
de ação social, no entanto, vale ressaltar o caráter liberal e democrático desta
concepção. Ele era antiautoritário, no sentido de que não acreditava que os direitos
liberais protegidos em nome da liberdade individual (como as liberdades de expressão,
pensamento, movimento, e assim por diante) devam ser dispensados. Individualidade,
como um ideal ético, exige que as pessoas encontrem seu próprio caminho, não tendo
doutrinas particulares ou papéis sociais que lhes sejam impostos. A individualidade só
abre a possibilidade da ação política em nome da liberdade, mas nunca deve ser
imposta. (EDMAN, 1960).
A democracia deve ser entendida como a proteção dos interesses populares e
como a expressão da individualidade. A democracia envolve a expressão de interesses
por parte dos eleitores, posto que, o voto ajuda a proteger os indivíduos das elites. Além
da participação, é necessária a deliberação. Neste sentido, Dewey sublinha a
importância da discussão, da consulta, persuasão e debate democrático na tomada de
decisões. Estes processos alargam e aprofundam o conhecimento público sobre os
problemas em discussão, e ajudam a informar sobre as necessidades sociais.
A expressão “cidadania” vem sendo empregada não apenas para definir a
pertença a uma determinada organização estatal, mas também para caracterizar os
direitos e deveres dos cidadãos. Na filosofia do direito encontramos duas interpretações
contrárias e conflitantes acerca da cidadania ativa. Na tradição liberal do direito natural,
que remonta a Locke, cristalizou-se uma compreensão individualista e instrumentalista
do papel do cidadão; ao passo que a tradição republicana da doutrina do estado que
remonta a Aristóteles, gira em torno de uma compreensão ética comunitária desse papel.
As pessoas vivem em comunidades com limites e obrigações, que podem ser
de diferentes tipos. Somente uma cidadania democrática que não se fecha num sentido
particularista, pode preparar caminho para um status de cidadão do mundo, que já
começa a assumir contornos em comunicações políticas de nível mundial.
A cidadania é uma resposta à questão “quem sou eu?” e “o que devo fazer?” a
partir do momento em que sou introduzido na esfera pública. A pertença a uma
comunidade política fundamenta obrigações especiais, a lealdade a uma determinada
comunidade a qual se expressa através da vontade de sacrificar-se em benefício da
comunidade. As próprias potências mundiais não podem mais ignorar a realidade dos

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protestos que atingem dimensões planetárias. O estado de cidadão do mundo deixou de
ser uma quimera, mesmo que ainda estejamos muito longe de atingi-lo.
Dewey comenta sobre a educação grega, que se apresenta de forma bastante
compacta, dado que todos os domínios estabelecem relações de interdependência. E um
dos fatores que nos permite entender este tipo de pedagogia já se encontra inserido em
sua própria nomeação: enkyklios paidéia, da qual deriva a palavra “enciclopédia”. O
autor ressalta o caráter social da educação na Grécia antiga:
De acordo com os interesses de uma vida verdadeiramente compartida ou
associada, tornam-se então, esses recursos, o cabedal positivo da civilização. Se a
Grécia, com um restrito acervo de nossos recursos materiais, perfez uma digna e nobre
carreira intelectual e artística, foi porque trabalhou, para fins sociais, com os recursos de
que dispunha. (DEWEY, 1979, p. 40).
Dewey observa que unicamente com a ciência e a técnica não se faz florescer
uma sociedade, é preciso uma consciência política e social que integre a todos seus
membros num mesmo fim. A preocupação de Dewey por uma educação que ajude à
formação humana e que, a sua vez, consiga um equilíbrio social, isto é, uma
democracia, é evidente em suas obras. A união que faz este autor entre filosofia e
educação, como uma oportunidade de refletir e uma necessidade de crescer, ressalta a
importância da prática dentro do conhecimento.
O bem agir, tão defendido pelos gregos antigos, vinculava o saber a uma
prática: a formação de hábitos morais e de atitudes responsáveis, integradas com os fins
da sociedade. O exercício do poder demanda, pois, um sentido moral, sem o qual pode-
se ter gênios sem caráter, cientistas sem ética e cidadãos desumanos. Poder-se-ia
perguntar se é possível ensinar valores e como fazê-lo. Respondemos: não é nas solenes
declarações de princípios que se manifestam a solidariedade. Não se aprende
solidariedade, a não ser sendo solidário na vida cotidiana.
Considerações finais
A democracia é vista como a melhor maneira de lidar com os conflitos de
interesses em uma sociedade. A política democrática não é simplesmente um canal
através do qual podemos afirmar os nossos interesses, mas um fórum ou o modo de
atividade em que podemos chegar a uma concepção dos nossos interesses. A
democracia é experimental para Dewey, na medida em que permite, ou deve permitir,
um questionamento profundo das ideias e correções da ordem estabelecida.

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Dewey tem uma concepção de democracia não convencional. Ele acredita que
as sociedades complexas e industrializadas podem ser caracterizadas por um alto nível
de harmonia entre os interesses de seus membros, através da discussão pública e da
comunicação.
A cidadania está em crise, tanto na representação como na participação. O
exercício livre das faculdades morais dos indivíduos tem como consequência o
pluralismo moral e cultural. Não é a sociedade que garante a virtude de seus membros,
por isso acreditamos que é necessária uma discussão sobre a cidadania e seu exercício.
Devemos tentar erradicar o sistema de educação livresco, tão isolado da vida,
que é antes prejudicial, do que vantajoso. Estreitar os vínculos entre ética e cidadania
nos leva a esclarecer os vínculos entre filosofia e política. A ética não constitui um
código abstrato repleto de comandos e regras incontestáveis. A ética não constitui um
sistema ideal que seja coerente em teoria mas impossível na prática. A filosofia se
materializa na educação, na reflexão fértil que é capaz de nos enriquecer e melhorar.
Fora da educação, a filosofia se converte numa reflexão erudita, estéril, livresca. A
teoria tem que estar unida à prática, ela a torna real.
A prática tem que ter um fim social, para que o crescimento humano não seja
um crescimento egoísta, senão um crescimento social; e, também, para que o homem
possa atingir a tão desejada felicidade e não unicamente o prazer. Com efeito, para que
o indivíduo alcance o equilíbrio e possa ter a oportunidade de viver numa sociedade
equilibrada, esta educação deve ser uma oportunidade para todos.

Referências

ARISTÓTELES. A Política. Tradução de Mario de Gama Kury. Brasília: UnB, 1997.


BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 2000.
DEWEY, John. Democracia e educação. Tradução de Godofredo Rangel e Anísio
Teixeira. 3° ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1959.
_______. Experiência e Educação. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971.
_______. Teoria da vida Moral. Tradução de Leônidas Gontijo de Carvalho. São
Paulo: IBRASA, 1964.
EDMAN, Irwin. John Dewey: sua contribuição para a tradição americana. Rio de
Janeiro: Editora Fundo de Cultura, 1965.
Recebido em 25/5/2012
Avaliado em 15/06/2012
Aceito em 18/06/2012

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