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CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO

SENSU ON-LINE EM DIREITO DE


FAMÍLIA e SUCESSÕES
Temas avançados de Direito de
Família. Alimentos, Direito
Assistencial e Bem de Família.
Bem de Família: definição e terminologia (análise
constitucional). Regulamentação do Código Civil de
2002 e na Lei n. 8.009/1990.

Maurício Andere von Bruck Lacerda


BEM DE FAMÍLIA – CONTEXTO ATUAL
Fundamentos Constitucionais
Art. 6º CF - São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o
trabalho, a moradia (EC 26/00), o transporte, o lazer, a segurança, a
previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição.
Art. 1º - Fundamentos da República - III – Dignidade da pessoa humana
Origem: Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)

CONSAGRAÇÃO dos princípios da “dignidade da pessoa humana”;


“SOLIDARIEDADE” (art.3ºI) e “IGUALDADE lato sensu”

SÃO os ELEMENTOS NORTEADORES (estruturantes) do “Direito Civil


Constitucional” e da tendência de “constitucionalização” e
“personalização” do Direito Civil.

REFLEXO, inclusive, nos direitos de natureza eminentemente


PATRIMONIAL
(Ex. “Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo” (Luiz Edson Fachin)
Conceito
A proteção ao BEM de FAMÍLIA se caracteriza pelo direito que recai
sobre o único bem imóvel de propriedade da família, conferindo-
lhe dupla proteção legal (legal e convencional), com o propósito de
garantir o direito à moradia da família, tornando o lar familiar, em
regra, impenhorável em relação às dívidas assumidas pelos membros
da família, respeitados os requisitos e limites legais.

Caio Mário da Silva Pereira salienta que “é uma forma de afetação


de bens a um destino especial que é ser a residência da família
e, enquanto for, é impenhorável por dívidas posteriores à sua
constituição.”

Trata-se de exceção à regra geral de que todos os bens do devedor


respondem por suas dívidas (art. 391 CC)
ESPÉCIES
Bem de Família Convencional ou Voluntário

Fundamento legal: Arts. 1711 e ss. CC


Finalidade: assegurar o lar familiar no tocante às dívidas, por meio de ato de vontade da
família

Bem de Família Legal

Fundamento legal: Lei 8009, de 29.3.1990 e suas alterações


Finalidade: preservar a moradia da família, independentemente de ato prévio de vontade

Obs.: Não há conflito de normas (ressalva expressa art. 1711 CC)

Alterações recentes: Lei complementar 150 (1º.6.15) empregados


domésticos; Lei 13.144 (6.7.15) proteção ao patrimônio do novo cônjuge ou
companheiro do devedor de pensão alimentícia; Lei 13.105 (16.3.15) arts. 1º, 8º, 832 e 833
Novo CPC (repetem 648 e 649 CPC-73)
Bem de família convencional/voluntário
arts. 1711 ao 1721 CC
Código Civil 1916: tratava da figura nos artigos 70 a 73;
Código Civil 2002: deslocamento para a parte de “Direito de Família”

Finalidade: Assegurar o lar familiar com relação a dívidas posteriores à sua instituição.
(Não pode fraudar credores!).

Forma: Escritura pública ou testamento (depende de aceitação). Necessário o registro do


CRI (art. 1714 CC). Figura pouco prestigiada na prática;

Objeto proteção: prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios,
destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá abranger valores
mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família.
(art. 1712CC)

Requisitos: Que o bem não ultrapasse 1/3 do patrimônio líquido dos cônjuges
(1711); Necessidade de registro (1714 CC);
Obs.: No Bem de Família Legal NÃO HÁ ESSE LIMITE – Houve uma tentativa de limitar a
1.000 s.m., mas foi VETADO.
Bem de família convencional/voluntário

Alcance da proteção: isento da execução por dívidas posteriores à sua


instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas
de condomínio; Saldo existente será aplicado em outro prédio, como bem de
família, ou em títulos da dívida pública, para sustento familiar, salvo se motivos
relevantes aconselharem outra solução, a critério do juiz. (1715CC)
Obs.: Isenção durará enquanto viver um dos cônjuges, ou, na falta destes, até
que os filhos completem a maioridade (1716CC).

Quem pode instituir: Cônjuges, entidade familiar ou terceiros (§ún.) (podem


determinar que o bem volte ao seu patrimônio - 547 CC);

Destinação diverso: Necessário CONSENTIMENTO DE TODOS os interessados e


MP (inclusive do tutor de filhos menores) e depende de mandado do juiz que
sempre que possível deve procurar a substituição (1719CC)
Bem de família legal
Lei 8.009/90

Finalidade: Preservação da MORADIA DA FAMÍLIA – único imóvel destinado


à moradia permanente - “Teoria do PATRIMÔNIO mínimo existencial” (Luiz Edson
Fachin) – norma de ordem pública – pode ser alegada a qualquer tempo.
Art. 6º, 1º, III CF, Art. 5º, § 1º

Súmula 205 STJ - A lei 8.009/90 aplica-se a penhora realizada antes de sua vigência.

Objeto da proteção: ÚNICO imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade


familiar, destinado à moradia permanente (art. 1º e 5º). Compreende o imóvel
sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer
natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que
guarnecem a casa (para subsistência), desde que quitados. (§ único). Exclui veículos
de transporte, obras de arte e adornos suntuosos. (Art. 2º) e vagas de garagem (Súmula
449 STJ, de 2010)

Obs.: Imóvel rural: sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art.
5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural.
Bem de família legal (cont.)
Abrangência: Impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil,
comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou
pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses
previstas nesta lei.

Proteção AMPLA: Súmula 364 STJ (nov.08) – pessoa solteira, viúva, separada
tem direito; O imóvel ALUGADO NÃO PERDE o CARÁTER de BEM DE FAMÍLIA
(Súmu. 486 STJ) – Imóvel de pessoa jurídica destinado à residência – “Bem de
residência da pessoa natural”;

FRAUDE Não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente,
adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar,
desfazendo-se ou não da moradia antiga (Art. 4º ). Poderá o juiz, na respectiva ação
do credor, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a
venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese. (§ 1º )

Principais vantagens em relação ao “bem de família” convencional: NÃO HÁ


necessidade de elaboração de escritura pública e de registro e NÃO HÁ limitação quanto ao
valor do bem em relação ao patrimônio
Bem de família legal (cont.)
Questão Polêmica

BEM de FAMÍLIA LEGAL – PENHORA de ÚNICO IMÓVEL (LUXUOSO e MUITO


VALIOSO!) – RESERVAR uma parte do valor auferido com a venda para aquisição de
outro imóvel (art.5º, §ún.)

Argumentos favoráveis à impenhorabilidade (art.1º, III):


- O PL 51/06 proposto para estabelecer um valor ao que seria bem de família, foi
rejeitado. Argumento: Quebra do dogma da impenhorabilidade absoluta do bem de família;
- Preservar os nobres propósitos da lei; Viola o princípio geral do “favor debitoris”
- Lei não impõe condicionantes quanto ao valor do bem - basta que o imóvel sirva de
residência para a família do devedor, sendo irrelevante o valor do bem. (3ªT. STJ – nov.10
RESP 1.178.469)

Argumento contrário:
- Necessária valoração no caso concreto – proteção do instituto, mas sem excessos;
- Imóvel de luxo x sustento da família – satisfação do interesse legítimo credores;
Exceções: Bem de família legal
Art. 3º

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil,


fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, SALVO SE MOVIDO:

I - em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas


contribuições previdenciárias;

INCISO Revogado: LC 150/2015 (lei empregados domésticos) conferiu mesmos direitos a


todos os trabalhadores, não se justificando mais o referido privilégio

II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à


aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do
respectivo contrato;

Justificativa: diz respeito à própria coisa


Exceções: Bem de família legal
Art. 3º (cont.)

III – pelo credor da pensão alimentícia (red.orig), resguardados os direitos, sobre o


bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal,
observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida; (Alter. Lei 13.144/15)

Objetivo: Resguardar direitos do condômino inocente em razão de atos praticados por


outros condôminos. Só nos casos de união estável e casamento? E se forem irmãos? Deve
proteger o irmão inocente. Já se tutelava o condômino inocente.

IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições


devidas em função do imóvel familiar;

Abrangem: IPTU, ITR, taxas condominiais (proter rem – relacionadas à conservação e à


manutenção da coisa).

VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal
condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
Exceções: Bem de família legal
Art. 3º (cont.)
HIPÓTESE POLÊMICA: Oferecimento do bem em garantia real

V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo
casal ou pela entidade familiar;

Entendimento prevalente STJ: Perda da natureza de bem de família – dívida EM


FAVOR da ENTIDADE FAMILIAR e NÃO de TERCEIRO (ex.: sociedade de um dos
membros)
AFASTA a proteção - venire contra factum proprium - Contraria a boa-fé das relações
negociais o livre oferecimento de imóvel, bem de família, como garantia hipotecária. (STJ
2010 – Min. Nancy Andrighi REsp 1.141.732).

GARANTIA de DÍVIDA de 3º (STJ – posicionamento) – 4ªT. (4.7.12) – Penhora não


atinge bem de família que garante dívida de empresa pertencente a um dos cônjuges
Precedente do STJ: “possibilidade de penhora do bem de família hipotecado só é
admissível quando a garantia foi prestada em benefício da própria entidade familiar, e não
para assegurar empréstimo obtido por terceiro” (Ag 921.299).
DIVERGÊNCIA de ENTENDIMENTO: Ficaram vencidos os ministros Antonio Carlos
Ferreira e Isabel Gallotti.
Exceções: Bem de família legal
Art. 3º (cont.)
HIPÓTESE POLÊMICA: O bem de família do FIADOR

VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.


Incluído pela Lei nº 8.245, de 1991

1ª Corrente – Contrato acessório (depende do principal) – proteção do imóvel


residencial – contraditório proteger o devedor principal e não o fiador – quebra
da isonomia;

2ª Corrente – descaracteriza o imóvel residencial – credibilidade das relações


locatícias (Posicionamento atual do STJ). Súmulas STJ:

214 STJ - O fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao
qual não anuiu.Se for mera prorrogação do contrato, o fiador responde. (Out.98)
268 STJ - O fiador que não integrou a relação processual na ação de despejo não responde
pela execução do julgado.(Maio/02)
332 STJ - A fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total
da garantia. (5.3.08)
Exceções: Bem de família legal
Art. 3º (cont.)
HIPÓTESE MAIS POLÊMICA

FAMÍLIA MONOPARENTAL

Inquestionável a proteção atribuída às novas formas de família (inclusive monoparental),


mas pode gerar DISTORÇÕES e REFLEXOS DESASTROSOS à segurança das relações.

RESP 1.126.173 MG (2009/0041411-3) – Rel. Min Ricardo Villas Boas Cueva


EMENTA
Pai se defende alegando bem de família e oferece em substituição outro imóvel – imóvel no
qual residem filhas e genitora (“amante” - relação extraconjugal) – Embargos de 3º – STJ
reconheceu bem de família (família monoparental – sem o pai, mas formada pela mãe e
filhas)

Argumentos contrários: Proteção de um único imóvel do devedor – vedação à família


simultânea/paralela – qual a garantia dos credores? – Art. 1º e 8º NCPC “valores e normas
fundamentais da CF” “proporcionalidade”, “legalidade”, “razoabilidade”(esse argumento vale
para defesa de ambos os argumentos)

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