Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Robespierre,
ou a “divina violência” do terror
Q
uando o primeiro-ministro chinês Chou En-lai estava
em Genebra, em 1953, nas negociações de paz para aca-
bar com a Guerra da Coréia, um jornalista francês pergun-
tou-lhe o que pensava sobre a Revolução Francesa; Chou
En-Lai respondeu: “Ainda é muito cedo para dizer alguma
coisa.” De certo modo, ele tinha razão: com a desintegração
das “democracias populares” no final dos anos 1990, desen-
cadeou-se mais uma vez a luta pelo significado histórico da
Revolução Francesa. Os revisionistas liberais tentaram im-
por a idéia de que o fim do comunismo, em 1989, ocorreu
no momento exato: marcou o fim da era que tivera início
em 1789, com o fracasso final do modelo estatal-revolucio-
nário que entrara na cena histórica pela primeira vez com
os jacobinos.
Em nenhuma circunstância a máxima “toda história é
uma história do presente” é mais verdadeira que no caso
da Revolução Francesa: sua recepção historiográfica sempre
refletiu de perto os giros e reviravoltas das lutas políticas. A
marca que identifica
jeição direta todos osatipos
do movimento: de conservadores
Revolução Francesa foié auma
re-
8 Virtude e Terror
A dialética materialista assume, sem particular alegria, que até agora ne-
nhum sujeito político foi capaz de chegar à eternidade da verdade que
estava desenvolvendo sem momentos de terror. Saint-Just perguntou: “O
que querem aqueles que não querem nem a Virtude nem o Terror?” A
resposta dele é bem conhecida: querem a corrupção – outro nome para a
derrota do sujeito.4
bemOu,
geralcomo definiu
é sempre sucintamente
terrível.”
5 Saint-Just:
Essas palavras “Aquiloserque
não devem produz o
interpreta-
10 Virtude e Terror
Que pretendeis vós, que quereis que a verdade não tenha força na boca dos
representantes do povo francês? A verdade, sem dúvida, tem sua potên-
cia, sua cólera, seu despotismo; ela tem entonações tocantes, terríveis, que
ecoam com força tanto nos corações puros como nas consciências culpa-
das, e que a mentira não pode imitar, assim como Salomé não pode imitar
os raios do céu. Mas acusai disso a natureza; acusai disso o povo, que quer
a verdade e que a ama.11
É isso que Robespierre tem como objetivo, em sua famosa acusa-
ção aos moderados, de que o que realmente querem é uma “revolução
sem revolução”: desejam uma revolução destituída do excesso em que
a democracia e o terror coincidam, uma revolução que respeite as re-
gras sociais, subordinada a normas preexistentes, uma revolução na
qual a violência é privada da dimensão “divina” e assim reduzida a uma
intervenção estratégica que serve a objetivos precisos e limitados: