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Espaços Livres: Sistema e Projeto Territorial

Book · January 2008


DOI: 10.13140/RG.2.1.4311.8802

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Raquel Tardin
Federal University of Rio de Janeiro
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ESPAÇOS LIVRES:
Sistema e Projeto Territorial
ESPAÇOS LIVRES:
Sistema e Projeto Territorial

Raquel Tardin
Copyright © 2008 Raquel Tardin
Todos os direitos reservados.
A reprodução não-autorizada desta publicação, no todo ou em parte,
constitui violação de direitos autorais. (Lei 9.610/98)

Coordenação geral: Raquel Tardin


Revisão: Elisabeth Simões
Capa: Raquel Tardin e Leo Boechat
Diagramação e composição: Leo Boechat

Editora 7Letras
Rua Jardim Botânico 600 sl. 307
Rio de Janeiro - RJ cep: 22461-000
(21) 2540-0076
editora@7letras.com.br
www.7letras.com.br

CIP-Brasil. Catalogação-na-fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.

T19e Tardin, Raquel


Espaços livres: sistema e projeto territorial / Raquel Tardin. – Rio de Janeiro:
7Letras, 2008.
il. ;

Anexos
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-7577-552-3

1. Espaços livres. 2. Paisagens – Proteção. 3. Desenvolvimento sustentável.


4. Meio ambiente. 5. Percepção espacial. 6. Planejamento paisagístico urbano.
7. Planejamento regional. 8. Arquitetura paisagística urbana. I. Título.

CDD: 712
08-4849. CDU: 712.25
Para Rodrigo, Davi e Lina
Agradecimentos. Ao Professor Antonio Font, pela seriedade, paciência e dedi-
cação na orientação do trabalho da Tese de Doutorado. Aos professores Carles Llop, Nuno
Portas e Álvaro Domingues, pela atenção, incentivo e as colaborações que ofereceram ao
trabalho ao longo de seu desenvolvimento. Aos professores Joaquim Sabaté, Joan Nogué e
Enric Batlle, pelas contribuições que realizaram ao projeto. À professora Lucia Costa, pelo
apoio constante. Aos entrevistados, pela amabilidade de conceder-me seu tempo. A todos os
que facilitaram documentos importantes para o desenvolvimento das análises pretendidas.
Ao Governo do Brasil, através da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (Capes), por financiar parte do tempo necessário para a execução da Tese. Ao Go-
verno do Estado do Rio de Janeiro, através da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
do Rio de Janeiro (Faperj), por financiar a editoração deste livro. Aos que de alguma maneira
colaboraram para a finalização da pesquisa e que eu, injustamente, tenha omitido.

7
Sumário

Prólogo | 13

1 Introdução | 17
1A > Apresentação | 18
1B > Referentes disciplinares e objetivos | 25
1C > Metodologia | 29
Cartografiia e escala de análise | 29
Iconografia | 30
Fontes bibliográficas | 31
Entrevistas | 32

1D > Conteúdo do livro | 33

2 Algumas questões conceituais | 37


2A > Antecedentes disciplinares | 37
2B > Sobre o território, a paisagem artificializada | 43
e os espaços livres territoriais
2C > Sobre o sistema de espaços livres | 46
e o projeto territorial
Os espaços livres em sistema | 46
A natureza como um recurso projetual | 48
A percepção da paisagem como um recurso projetual | 51
O sistema de espaços livres no projeto territorial | 53
Sobre uma contribuição à sustentabilidade do território | 55

3 Caracterização da unidade territorial | 59


3A > O caso de estudo e sua situação territorial | 59
3B > O suporte biofísico | 65
Relevo e clima | 65
Hidrografia | 68
Principais comunidades vegetais | 70
3C > As infra-estruturas e os usos do solo | 73
Infra-estruturas: viárias, de serviços e de transporte coletivo | 73
Usos do solo | 79

3D > As características populacionais | 83

4 Evolução urbana e espaços livres a analisar | 89

4A > Etapa 1: colonização (até 1940) | 90


O planejamento | 90
As infra-estruturas viárias | 92
Os assentamentos | 93
Os espaços livres | 93

4B > Etapa 2: subtração (1940-1970) | 96


O planejamento | 96
As infra-estruturas viárias | 101
Os assentamentos | 102
Os espaços livres | 103

4C > Etapa 3: fragmentação (1970-2000) | 106


O planejamento | 107
As infra-estruturas viárias | 109
Os assentamentos | 110
Os espaços livres | 115

5 Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres | 125

5A > Atributos do suporte biofísico | 126


Cobertura vegetal | 127
Hidrologia | 130
Declividade | 134
Edafologia | 136
Avaliação final dos atributos biofísicos | 139
5B > Atributos perceptivos | 144
Elementos cênicos | 144
Áreas de emergência visual | 148
Fundos cênicos | 152
Marcos históricos | 155
Avaliação final dos atributos perceptivos | 157

5C > Acessibilidade | 160


A partir das vias existentes e previstas | 160
Avaliação final da acessibilidade | 164

5D > Vínculos de planejamento | 165


Macrozonas | 165
Superfícies protegidas | 168
Superfícies edificáveis | 170
Avaliação final dos parâmetros de proteção | 174

5E > Síntese da avaliação: possíveis espaços | 174


de oportunidade projetual
Espaços âncora | 175
Espaços referência | 176
Demais espaços livres | 176
As situações dos espaços de oportunidade projetual | 177
Continuidades | 177
Fronteiras | 177
Descontinuidades | 178
Garantias e ameaças relativas ao planejamento | 179

6 Ordenação do sistema de espaços livres: | 187


a reestruturação do território

6A > Princípios de projeto para a ordenação | 188


do sistema de espaços livres
Relações funcionais no sistema: a designação de usos do solo | 188
e de atividades
A partir da matriz biofísica | 189
A partir da significação visual | 190
A partir da acessibilidade | 192
Relações espaciais no sistema: a manutenção das continuidades | 194
A partir da matriz biofísica | 194
A partir da significação visual | 195
A partir da rede de acessos | 196
Relações sinérgicas: a sutura entre espaços livres e ocupados | 198
As naturezas urbanas | 199
Os cenários recriados | 200
As infra-estruturas paisagísticas | 201

6B > Ações de projeto sobre os espaços livres | 205


para a ordenação do sistema
Acrescentar | 206
Demarcar | 208
Conectar | 210
Adequar | 213
Articular | 216
Enlaçar | 220
Observações sobre as ações de projeto | 220

6C > Sistema de espaços livres e instrumentos de planejamento | 226


O uso alternativo dos instrumentos de planejamento | 226
A necessária flexibilização dos planos | 229

7 Epílogo: por um projeto territorial renovado | 233

8 Bibliografia | 237

Anexo 1: mapas realizados para o livro | 247

Anexo 2: entrevistas realizadas | 249

Anexo 3: unidades de conservação ambiental | 253


Prólogo
Prof. Dr. Joan Nogué
Catedrático de Geografia Humana da Universidade de Girona
e diretor do Observatório de Paisagem de Catalunha

Conheci Raquel Tardin no início de 2004 na lanchonete da livraria Laie, em Barcelona,


um local muito agradável onde o aroma do café impregna as estantes repletas de livros
e as mesas cheias de revistas e jornais. O Observatório de Paisagem de Catalunha estava
sendo criado naquele momento e Raquel estava interessada nas funções e na composição
deste organismo que uns meses mais tarde abriria suas portas. De minha parte, eu dese-
java conhecer um pouco mais a fundo o conteúdo da pesquisa que ela estava levando a
cabo e da qual haviam falado muito bem. Recordo perfeitamente aquele primeiro encon-
tro e todos que vieram depois porque, de fato, o intercâmbio de informações e de pontos
de vista foi tão frutífero que se repetiu em várias ocasiões.
Raquel é uma excelente profissional que tem uma virtude que não é muito habitual,
infelizmente: sua firme crença na transdisciplinariedade, o que a permite integrar idéias,
conceitos e perspectivas procedentes de outros campos do saber com uma incrível facili-
dade, algo que somente se consegue com um espírito aberto e curioso como o seu.
A pesquisa que Raquel estava realizando se converteu, um pouco mais tarde, em
uma excelente Tese de Doutorado defendida na Escola Técnica Superior de Arquitetura
de Barcelona no dia 26 de abril de 2005. Esta Tese de Doutorado, que tive o privilégio
de ler a avaliar com máxima nota como membro da banca, é o que o leitor tem hoje em
mãos em forma de livro. Desde o primeiro momento este trabalho despertou em mim uma

13
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

grande curiosidade, por muitas e diversas razões, mas, sobretudo, por uma: por conceder
ao espaço livre um papel protagonista no projeto territorial e na intervenção urbanística.
Raquel propunha “ler” de outra maneira os espaços livres para entendê-los em siste-
ma e como agentes ativos do projeto territorial, distintos de simples espectadores mudos,
passivos, isolados, na expectativa de ocupação ou proteção. Sempre achei que esta era
uma perspectiva não apenas sugestiva, mas necessária, e que poderia dar excelentes
frutos, tanto no caso do Rio de Janeiro, que a autora utilizava como caso de estudo,
como em muitos outros territórios. A autora é consciente disto e nos propõe um modelo
extrapolável a outros casos e uma metodologia aplicável a qualquer outro lugar. Pois bem,
conceder aos espaços livres este papel tão protagonista implica conhecê-los a fundo,
caracterizá-los, defini-los e propor a ordenação de seu sistema espacial. Daí a exaustiva
lista de atributos e indicadores que a autora nos apresenta, assim como suas pertinen-
tes reflexões sobre alguns aspectos fundamentais do sistema e sua ordenação, como os
limites destes espaços e as funções urbanas, ambientais e visuais que desempenham
somadas às sócio-culturais.
A perspectiva defendida por Raquel me interessou também porque, de certo modo,
coincide com a que estamos aplicando, a partir do Observatório de Paisagem de Catalu-
nha, aos denominados catálogos de paisagem*, ainda que, obviamente, em outra escala
e com um interesse voltado para intervenções mais políticas que físicas na paisagem. Pois
bem, ao conhecer o presente trabalho, não pude evitar estabelecer uma comparação entre
nossa experiência e a proposta pela autora e me encontrei com a agradável surpresa de
que, desconsiderando as diferenças entre escalas e objetivos, eram muitos os pontos de
contato: a visão integral da paisagem, a metodologia inter e transdisciplinar e, sobretudo,
o tratamento reservado aos espaços livres.
Também para nós estes espaços são considerados agentes prioritários no projeto
territorial, de acordo com o que já foi constatado no Convênio Europeu de Paisagem ao
afirmar: “A paisagem é um elemento importante para a qualidade de vida das popula-
ções, tanto nos meios urbanos como nos rurais, tanto nos territórios degradados como nos
de grande qualidade, tanto nos espaços singulares como nos cotidianos”.
Creio sinceramente que contribuições como a que este livro representa são fundamen-
tais para conseguir estender e difundir uma nova cultura de ordenação do território

14
Prólogo

baseada na gestão prudente e sustentável dos recursos naturais, em um tratamento inovador


do solo não urbanizável e da paisagem em seu conjunto, e em uma nova forma de governo
e de gestão do território, com base no diálogo e na participação social. Neste desejado novo
contexto, os espaços livres – e suas paisagens – vão desempenhar um papel fundamental
nas políticas de ordenação territorial e urbanística e, inclusive, nas políticas mais setoriais de
caráter social, cultural e econômico.

Barcelona, setembro de 2008.

* Os catálogos de paisagem são documentos de caráter técnico que a Lei catalã de proteção, gestão
e ordenação da paisagem, concebe como ferramentas para a ordenação e a gestão da paisagem a partir da
perspectiva do planejamento territorial e setorial. Os catálogos determinam os tipos de paisagem de Catalunha,
seus valores e estado de conservação, os objetivos de qualidade que devem cumprir e as medidas para conseguí-
los. São, portanto, uma ferramenta extremamente útil para a implementação de políticas de paisagem, com a
conivência e a participação ativa de todos os agentes sociais que intervém no território através de um intenso
processo de participação pública.

15
1
Introdução

Este livro trata do papel que podem desempenhar os espaços livres no projeto ter-
ritorial, com base no seu reconhecimento como um sistema com valores próprios, com
potencial para reestruturar o território urbano e ordenar uma possível futura ocupação.
Os espaços livres são vistos, a partir de sua estrutura espacial e funcional, como partes
do território não ocupadas pelos assentamentos e pelas infra-estruturas viárias. O território
é entendido como paisagem artificializada, lugar da natureza e do humano, isto é, espaço
passível de ser visto, interpretado, adaptado e transformado ao longo do tempo. Neste
marco, o sistema proposto reúne o conjunto de peças de espaços livres, relacionadas entre
si e com seu entorno, e é suscetível a sofrer mutações com o tempo.
Especificamente, se propõe a ordenação do sistema de espaços livres como uma es-
tratégia de projeto e possível elemento vertebrador do território, centrada na atuação
sobre unidades territoriais em vias de consolidação da ocupação urbana. A unidade ter-
ritorial conformada pelos Maciços da Pedra Branca e da Tijuca, o Oceano Atlântico, e a
Baixada de Jacarepaguá, na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, constitui o objeto
empírico deste livro.
O objetivo é a elaboração de um método interdisciplinar, que envolva o reconheci-
mento dos espaços livres territoriais, a análise e a avaliação de alguns de seus atribu-
tos mais significativos, de modo que permita uma aproximação às peças que convêm

17
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

permanecer livres da ocupação urbana. Assim, se pretende garantir a manutenção de


algumas funções essenciais dos espaços livres, entre elas, as funções urbanas e as refe-
rentes ao suporte biofísico e à sua percepção visual. Sobre esta base, e de acordo com
as relações que os espaços livres estabelecem com seu entorno, como objetivo final,
o método centra na definição de estratégias para a ordenação do sistema, como uma
possível diretriz do projeto territorial.

1A > Apresentação

Nas últimas décadas, vários autores (Boeri, 1992; Ascher, 1995; Corboz, 1995, Demat-
teis, 1995; Font et al, 1999; entre outros) vêm estudando o fenômeno da transformação
ou mutação das cidades, a partir da perspectiva das novas formas de crescimento urbano,
responsáveis pelo desenvolvimento de um novo modelo de cidade frente às mudanças
ocorridas nas tecnologias de transporte, da informação e na ordem econômica. Neste
processo, a amplidão alcançada pela urbanização modificou a tradicional relação centro-
periferia, conformando manchas urbanas que ocuparam o território de forma desigual e
descontínua, formando uma intricada rede de relações com realidades físicas e funcionais
cada vez mais complexas.
Nas cidades amuralhadas era possível diferenciar claramente os tecidos urbanos dos
espaços livres territoriais, através dos limites dos muros. Também, até épocas bem recen-
tes do séc. XX, se podia identificar as partes do território e sua estruturação de modo mais
ou menos compacta, pois a cidade tinha um “fim”, mais ou menos perceptível.
Entretanto, os territórios atuais apresentam conformações inusitadas, com uma estru-
tura espacial descontínua e estendida, com centros compactos, que se misturam a assenta-
mentos dispersos e áreas naturais e rurais, conectados por uma rede viária potencializada,
e que conformam uma realidade urbana distinta, na qual a cidade invadiu as áreas rurais,
misturando ambas as instâncias, oferecendo uma visão conjunta entre cidade e campo no
território. Neste contexto de afetação mútua, os meios urbano, natural e rural passaram a
constituir uma só realidade, a realidade dos territórios urbanos. Estes são territórios ame-
açados pela ocupação desmedida e fragmentada, e que apresentam, por um lado, uns

18
Introdução

“buracos” ou peças territoriais não consolidadas no meio da urbanização existente e, por


outro, frentes urbanas que avançam para a conquista de espaços não ocupados.
Frente a esta problemática, os territórios urbanos se mostram mutantes, assim como
a definição dos conceitos e instrumentos necessários para a análise e a elaboração de
propostas de intervenção sobre eles, o que impulsiona a busca de novas ferramentas para
sua interpretação que sejam, ao mesmo tempo, estratégias de projeto para uma ocupação
urbana mais sensível aos recursos do território e às necessidades de sua gente.
Diante desta realidade, a atenção às unidades territoriais em vias de consolidação
na urbanização descontínua pode aconselhar possíveis atuações nestes lugares, que con-
duzam à consolidação urbana de forma concentrada e favoreçam o aproveitamento das
estruturas existentes, compactando e evitando a ocupação extensiva do território. Deste
modo, se evitaria a expansão desordenada e, entre outros problemas, a excessiva imper-
meabilização do solo e o elevado consumo de energia, os quais tendem as ser produzidos
pela dispersão urbana.
Os espaços livres, neste marco, podem deixar de ser simplesmente áreas de futura
ocupação para representar a possibilidade de redirecionar o processo de construção do
território e atuar a favor da delimitação das condições de sua consolidação, se baseando
na coerência e na complementaridade entre espaço livre e ocupado.
Esta proposta brinda a possibilidade de reivindicar o papel protagonista do espa-
ço livre como ativo na intervenção urbanística, contra posturas mais protecionistas e/ou
vitimistas frente às lógicas dominantes da ocupação. Trata-se de buscar estratégias de
projeto que considerem os espaços livres como as oportunidades que “restam” em um
território amplamente urbanizado e que reconheçam a manutenção de seus atributos
mais significativos como recursos essenciais à sustentabilidade urbana1. Estratégias que
busquem aglutinar as peças fragmentadas, até alcançar um todo amalgamado e coerente,
com força para atuar nos “buracos” do território, na forma de um sistema de espaços
livres como possível condutor da estrutura urbana.
A intenção deste livro é alcançar um enfoque interdisciplinar sobre o sistema de es-
paços livres a partir de sua dimensão física, que inclua, além das análises genuinamente
relacionadas com a arquitetura e o urbanismo, aquelas de ordem biofísica (relacionadas
com os processos naturais) e perceptiva (relacionadas com a percepção visual) que per-
mitam investigar outras possibilidades de “fazer cidade”, que estejam mais próximas do

19
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

caráter plural destes espaços e que contribuam para reconduzir a construção do território.
Para tanto, utilizam-se instrumentos que derivam de disciplinas próximas, como o urbanis-
mo, a geografia, a ecologia e o paisagismo.
Longe de concepções protecionistas ou desenvolvimentistas que resultam em pai-
sagens fragmentadas e isoladas, seja através de tecidos urbanos que não se relacionam
entre si, seja através de espaços livres protegidos como ilhas da “natureza”, o que se
pretende é promover a coesão ao invés da separação, misturar, construir o território po-
tencializando uma estreita relação entre espaços ocupados e não ocupados, ao ponto de
a própria ocupação poder ser decisiva na manutenção de alguns espaços livres, quando
da constatação de que as funções urbanas que estes desempenham, como a possível
articulação entre tecidos, configurem uma condição singular para sua permanência sem
ocupação urbana, à parte seus valores biofísicos, perceptivos, entre outros.
Segundo Pesci (1999), é nas fronteiras entre realidades distintas que se apresentam
as oportunidades mais ricas de intercâmbio, de proximidade, de agregação, de atração.
Estas constituem lugares privilegiados para a compreensão dos processos funcionais na
paisagem com o objetivo de fornecer respostas compatíveis, enriquecedoras, inovadoras,
que resultem em espaços adaptáveis à realização de distintas dinâmicas. Correspondem
a lugares heterogêneos, onde importam a relação e o equilíbrio dinâmico entre eles e
não a homogeneização. Isto induz a um olhar intencionado sobre estes “encontros fron-
teiriços”, a fim de juntar as partes, costurar, inter-relacionar as diferenças em prol de um
território agregado e contínuo.
A eleição de um caso de estudo na América Latina, e em especial no Rio de Janeiro,
responde, por uma parte, a um interesse pessoal sobre esta realidade e, por outra, à consta-
tação da presença de algumas das maiores metrópoles mundiais nesta parte do continente
americano, que possuem muitos aspectos em comum quanto à conformação de seus ter-
ritórios, por exemplo: os graves problemas relacionados com a condução de um processo
de urbanização selvagem, ligado à presença de importantes reservas de espaços livres e a
poucos recursos para a reconversão deste quadro, o que agrava a condição atual.2
A isto se soma a coincidência das dimensões territoriais das paisagens na América, as
quais, diferentemente da maioria das metrópoles européias, geralmente compactas den-
tro do âmbito administrativo do seu núcleo central, apresentam imensas áreas em pleno
processo de ocupação urbana dentro destes âmbitos, que ultrapassam a dimensão dos

20
Introdução

1. Rio de Janeiro (1990) 1


(F.: http://www.inpe.br, 2002).
2. São Paulo (2000)
(F.: http://www.inpe.br, 2002).
3. Paris (2000)
(F.: http://www.inpe.br, 2002).
4. Buenos Aires (1991)
(F.: http://www.inpe.br, 2002).

3 4

21
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

tecidos urbanos em si mesmos e são definidos pelos espaços livres pertencentes a uma
escala mais ampla do território. Estas características e, especificamente, as dimensões dos
espaços livres que as conformam, as convertem, funcional e espacialmente, em exemplos
representativos de realidades territoriais com uma ocupação urbana não consolidada, onde
a intervenção em prol de sua consolidação tenderia a atuar a favor do “remate” destes
núcleos centrais que, na maioria dos casos, já apresentam infra-estruturas que poderiam
ser utilizadas na futura consolidação, evitando o consumo de solos mais distantes.
Dentro desta realidade, além dos problemas referentes à urbanização e às reservas de
espaço livre, o Rio de Janeiro constitui, por si mesmo, um símbolo mundial, pela relevância
da presença de uma paisagem inconfundível. O Rio não só é uma metrópole com um tipo
de crescimento e de ordenação urbanos extremamente complexos, e ainda carentes de
instrumentos de análise como os que se propõe neste trabalho, como possui uma grande
quantidade de espaços livres, que influenciaram, e ainda o fazem, na configuração espacial
de seu território, como marco de sua estrutura urbana muito mais que sua arquitetura, o
que demonstra o potencial vertebrador destes espaços dentro das dinâmicas de crescimen-
to da metrópole.
Para realizar as análises, a eleição do caso de estudo buscou atender alguns critérios que
o legitimariam dentro da intenção de trabalhar uma unidade territorial concreta, que fosse de-
limitada por elementos geográficos decisivos na conformação do território em sua totalidade
e que permitisse traçar o sistema de espaços livres como uma unidade espacial e funcional.
Segundo Font et al (1999), as unidades territoriais estariam representadas por alguns
fatores, como, por exemplo, estar ligadas a uma unidade fisiográfica e a um sistema par-
ticular de organização espacial, morfológica e funcional.
Neste sentido, a unidade territorial objeto de estudo apresenta algumas particulari-
dades significativas que tendem a reforçar as análises e a compreensão do fenômeno que
se quer explicar, principalmente com relação a:

• Sua posição geográfica. A unidade está situada no centro geográfico da metrópole,


relativamente próxima ao centro tradicional, o que permite apostar na sua consolidação
urbana e, conseqüentemente, de parte da cidade central.

• Sua fisiografia. A unidade apresenta uma geografia muito bem delimitada pelos maci-
ços, a planície e o mar, o que favorece a compreensão do sistema de espaços livres que se

22
Introdução

Situação do caso de estudo: 5


5. Com relação à América Latina e Brasil
(F.: http://parnaiba.ana.gov.br, 2008).
6 e 7. Fotos satélite da Região Metropolitana do Rio de
Janeiro (F.: http://www.cdbrasil.cnpm.embrapa.br, 2002 e
SMAC, 2000).

caso de estudo

23
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

propõe e as distintas escalas das partes componentes. Este marco de relações apresenta a
possibilidade de associar, em uma mesma unidade, distintas escalas de espaços livres como
oportunidades para a ordenação do sistema e para a reestruturação do território, realçando
a força do sistema como uma unidade representativa do conjunto de espaços relacionados
entre si e com seu entorno imediato.

• Sua particular estrutura urbana. As organizações espacial, morfológica e funcio-


nal do caso de estudo espelha, de modo geral, a problemática abordada no livro, isto é,
uma unidade territorial em vias de consolidação da ocupação urbana, com importantes
reservas de espaços livres e uma grande variedade de tipos, que vêm sofrendo uma forte
pressão por parte da produção de novos assentamentos e infra-estruturas. Além disso, a
unidade apresenta características funcionais e espaciais diversas e com uma rica história
quanto à sua formação e transformação ao longo dos anos, fruto de planos urbanísticos
carregados de valores representativos das principais tendências urbanísticas do séc. XX e
de uma intensa ocupação urbana, formal e informal.

Por suas peculiaridades, se considera que o caso de estudo escolhido pode represen-
tar um desafio para a demonstração do método interdisciplinar proposto ao ilustrar algu-
mas problemáticas representativas de muitas das tensões e necessidades que poderiam
apresentar os espaços livres dentro da dinâmica urbana do território.
Cabe ressaltar que o método apresentado pode ser repetido, isto é, pode ser aplicável
a outros territórios. O caso de estudo constitui uma de suas possibilidades de aplicação,
que certamente terá limitações e, portanto, não pretende ser ilustrativo de todas as possi-
bilidades de análises e propostas que abarquem a infinidade de elementos espaciais e as
funções correlativas que possam existir.
O que se pretende é contribuir, ainda que modestamente, para o enriquecimento do
marco teórico e prático do urbanismo com a intenção de, através de um enfoque inter-
disciplinar, superar discursos que muitas vezes se dão isoladamente, considerando que o
tema e todo o material acadêmico que este reúne, permite outros tantos olhares, inesgo-
táveis e legitimados pela crença em territórios urbanos mais humanos.

24
Introdução

1B > Referentes disciplinares e objetivos

A complexidade do tema do sistema de espaços livres e seu papel no projeto territo-


rial se reflete nos diversos e heterogêneos enfoques que este pode suscitar. Em primeiro
lugar, cabe destacar os trabalhos que partem de premissas ecológicas e sócio-culturais,
embora esta não seja uma seleção exaustiva.
As aproximações ecológicas valorizam os atributos biofísicos dos espaços livres e
adotam a conservação e a recuperação dos processos naturais, a partir da ecologia urbana
até a ecologia da paisagem, como diretrizes para a ordenação do sistema de espaços li-
vres e a estruturação do território. São referências os trabalhos de McHarg, 1969; Forman,
1995; Hough, 1995; Odum, 1998; Burel e Baudry, 1999; entre outros.
As aproximações sócio-culturais valorizam, sobretudo, a percepção da paisagem como
uma experiência sensorial complexa, embora prevaleça a percepção visual. Desta forma,
percebe-se o espaço livre na paisagem, e seu possível sistema, como lugar de construção
de imagens e práticas coletivas, abarcando suas dimensões estéticas, formais, sociais e
culturais para a leitura e/ou intervenção no território. São referências neste campo Lynch,
1976; Spirn, 1998; Cosgrove, 1984; Roger, 2000; entre outros.
De fato, estes enfoques são complementares no estudo do sistema de espaços livres e
no projeto territorial, tanto no que se refere aos diferentes elementos componentes destes
espaços, quanto à aproximação a uma possível ordenação do sistema. Alguns trabalhos
tendem, inclusive, a utilizar ambas as instâncias ao compaginar valores sócio-culturais e
ecológicos na análise dos espaços livres (por exemplo, McHarg, 1969).
Entretanto, ao afrontar a complexidade urbana contemporânea, a partir da perspectiva
da conquista de um território estruturado e sustentável, parece necessário abordar o espaço
livre não somente a partir de seus atributos ecológicos e sócio-culturais como também a par-
tir dos papéis que possam desempenhar no contexto da estrutura urbana relativos a outros
elementos (assentamentos, infra-estruturas viárias, etc.), que podem ser vistos como determi-
nantes para a ordenação do sistema. Neste sentido, este constitui um importante enfoque do
presente trabalho, em contribuição aos demais.
Por outro lado, observa-se uma lacuna quanto à elaboração de abordagens mais pro-
positivas que descritivas sobre o sistema de espaços livres, mais focadas em estratégias
concretas de projeto e, conseqüentemente, de ordenação e intervenção. Nesta direção,

25
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

alguns autores realizaram importantes contribuições teóricas, entre eles, Barba (1987) e
Batlle (2002), no contexto catalão.
Na sua Tese de Doutorado, Barba propõe a leitura do território a partir da identifica-
ção de sua composição geométrica e da caracterização de suas principais conformações,
através de uma análise abstrata da forma territorial, que permitiria determinar princípios
de intervenção na paisagem.
Na sua Tese de Doutorado, Batlle busca identificar o sistema de espaços livres da
metrópole e estabelecer como o projeto dos espaços livres pode considerar recursos eco-
lógicos e morfológicos para a melhoria da estrutura urbana e quais as linhas de projeto
que deveriam ser adotadas.
Este livro também pretende contribuir nesta linha de trabalhos, que se diferencia das
abordagens tradicionais de descrição e intervenção sobre o sistema de espaços livres
como diretriz para o Projeto Territorial.
De modo geral, o livro aponta um método de enfoque interdisciplinar, que envolve a
análise e a avaliação e que resulta em estratégias de intervenção sobre a ordenação do
sistema de espaços livres no território, sobre as seguintes bases:

• O reforço da idéia de sistema em contraposição à intervenção pontual nos espaços livres.

• O reconhecimento da natureza complexa dos espaços livres e da pluralidade de seus


respectivos atributos, sejam biofísicos, perceptivos ou urbanos, entre outros.

• A ênfase na ordenação do sistema tomando a complementaridade entre o sistema de


espaços livres e a conformação de seu entorno como uma possível guia do projeto territorial.

Neste marco, o método traçado visa a compreensão do sistema de espaços livres no


território, entendido como parte da paisagem artificializada, onde se encontram a nature-
za e a construção humana, em sentido amplo, junto a suas distintas instâncias espaciais
e funcionais, que pode resultar em diretrizes de projeto em âmbitos territoriais concretos.
Para tanto, o método centra em um enfoque transversal, que se pretende adaptável no
tempo e no espaço, e consiste basicamente em:

• Reconhecimento dos espaços livres a analisar. As análises referidas a este tópico per-
mitem a identificação e caracterização dos espaços livres existentes e das dinâmicas urbanas
nas quais se inserem. Apontam a importância que tiveram os espaços livres na organização da

26
Introdução

unidade territorial de referência e as conseqüências que sofreram relativas à ocupação urbana


e à maneira como esta se desenvolveu. Para tanto, foram consideradas as relações espaciais e
funcionais estabelecidas entre os espaços livres, os assentamentos, as infra-estruturas viárias
e os vínculos de planejamento em três momentos distintos, marcados por diferentes maneiras
de construir o lugar em cada época (segundo, entre outros aspectos, a ideologia dos planos, a
lógica imobiliária e a apropriação do espaço pelas pessoas): até 1940, etapa de colonização;
entre 1940 e 1970, etapa de subtração; entre 1970 e 2000, etapa de fragmentação.

• Análise e avaliação dos atributos dos espaços livres. Estas análises buscam avaliar
cada espaço livre, de acordo com os seus atributos, respectivamente, com respeito ao supor-
te biofísico, aos aspectos perceptivos, à acessibilidade e aos vínculos de planejamento. Os
critérios de avaliação buscam priorizar, entre outros fatores, os espaços cujos atributos favo-
reçam o desenvolvimento dos processos biofísicos e visuais, e que possam ter um importante
papel na reestruturação espacial e funcional do território3. Como síntese da avaliação se
propõe a elaboração de um diagnóstico relativo aos espaços livres analisados, destacando
as qualidades de cada peça segundo seus atributos, cujo objetivo é identificar os possíveis
espaços de oportunidade projetual para a ordenação do sistema e as relações espaciais que
estabelecem entre eles e com seu entorno, como dados para a intervenção no território.
Em primeiro lugar, são privilegiados os espaços com as melhores qualificações4 obtidas na
avaliação dos atributos biofísicos e perceptivos, aos quais se denominam espaços âncora, se
estes alcançam qualificações A/MA, e espaços referência se alcançam qualificações M/MB.
Por último, estão os demais espaços livres sem atributos significativos. Sobre este lastro, são
descritas as situações dos espaços no território com a identificação das principais continui-
dades e descontinuidades entre eles e as características de suas fronteiras, relativas a outros
espaços livres e aos tecidos urbanos. Em segundo lugar, são observadas as possíveis garan-
tias e ameaças pendentes sobre os espaços livres, relativas à avaliação final dos parâmetros
de proteção estabelecidos pelo planejamento que, a princípio, determinaria uma maior ou
menor tendência à ocupação. Constata-se que os espaços com uma avaliação final A/MA
são, atualmente, os mais propensos a permanecerem livres de ocupação.

• Ordenação do sistema de espaços livres e reestruturação do território. Com


base nas análises e na avaliação anterior, e segundo a situação das peças em relação a
seus entornos, interessa identificar possíveis estratégias de projeto para a ordenação do

27
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

sistema de espaços livres. Por um lado, se propõem alguns princípios de projeto, referentes
às relações espaciais e funcionais estabelecidas entre os espaços livres e seus entornos,
como determinantes de algumas diretrizes projetuais, que podem ser aplicadas a cada
um dos espaços e que possibilitariam a ordenação do sistema de espaços livres. Por outro
lado, sugerem-se algumas ações de projeto, estabelecidas segundo a avaliação prévia dos
atributos dos espaços e a situação que apresentam em relação a seu entorno, como resul-
tado de uma análise relacional que indicaria os possíveis papéis que desempenharia cada
peça de espaço livre na ordenação do sistema e seu potencial estruturador. Conjunta-
mente, se destacam os possíveis desafios e alternativas que corroborariam a consolidação
efetiva do sistema de espaços livres a partir dos instrumentos de planejamento.
Cabe ressaltar que em um enfoque amplo e de caráter interdisciplinar, como o proposto,
é impossível abarcar todos os aspectos e dados que este poderia gerar e, como já foi ex-
posto anteriormente, esta não é a intenção, ainda mais considerando-se que este trabalho
é fruto de um esforço individual e não de uma equipe interdisciplinar. O que se propõe é
um processo de investigação aberto que busca no pluralismo disciplinar, mais que na visão
unidirecionada, uma possível via de trabalho.
Neste sentido, se percebe a exigência cada vez maior, em relação às intervenções
no território, de uma tomada de posição que considere proposições estratégicas plurais,
com formalizações flexíveis, embora bem delineadas em sua intenção conceitual, como
diretrizes capazes de reconduzir uma possível ocupação urbana, de se adaptar e de gerir
a complexidade de acordo com as imposições das dinâmicas territoriais atuais.
Tendo em conta as características das intervenções urbanísticas tradicionais, comu-
mente embasadas em critérios de ocupação urbana, o livro destaca a importância de
considerar os espaços livres como um agente ativo na construção do território, como
espaços repletos de conteúdo dentro da estrutura territorial e não apenas como áreas não
urbanizáveis, manchas abstratas. Isto significa passar da definição de “manchas” à com-
preensão dos valores que estes espaços reúnem e como eles podem significar, de acordo
com seus atributos, oportunidades de intervenção com base na proposta de um sistema
relacionado com seu entorno e capaz de influenciar na sua configuração, mais que como
peças protegidas isoladamente e suscetíveis a intervenções pontuais.
Ao mesmo tempo, se questionam alguns modelos urbanísticos, sobretudo aqueles com
base na ecologia, que se preocupam com a proteção dos espaços livres e/ou com a relação

28
Introdução

respeitosa entre espaços livres e ocupados, sem considerar a complementaridade entre os fe-
nômenos existentes nestes espaços como parte de um todo, que é a paisagem artificializada,
na qual convivem e se relacionam espaços livres e ocupados e como estes últimos podem ser
determinantes para a permanência e ordenação dos espaços não ocupados. Assim, a inter-
venção nos espaços livres envolveria outras variáveis, além das ecológicas, e possibilitaria criar
novas oportunidades de projeto e soluções para a construção do território.

1C > Metodologia

De acordo com os objetivos pretendidos, que compreendem, sobretudo, o reconheci-


mento dos espaços livres na evolução urbana do caso de estudo, a análise e a avaliação
de seus atributos atuais e a proposta de estratégias de ordenação do sistema, se fez
necessário adotar métodos quantitativos e qualitativos, ainda que o enfoque das análises
seja qualitativo. Para tanto, a fim de aproximar o espaço da forma e da função, interessa
a nossas análises a determinação das relações entre os elementos do sistema de espaços
livres segundo uma lógica morfo-topológica, com o objetivo de identificar suas principais
características e problemas.
Entre os métodos utilizados se encontram: a elaboração de uma cartografia detalha-
da, a pesquisa de campo, que inclui o registro fotográfico da área, a pesquisa bibliográfica
e iconográfica e entrevistas.

Cartografia e escala de análise

O âmbito espacial cartografado, correspondente ao caso de estudo, totaliza 427,7km2.


A representação cartográfica se define pelos limites da Baixada de Jacarepaguá, incluindo
o entorno dos Maciços da Tijuca e da Pedra Branca, delimitados por duas retas perpendi-
culares ao mar, desde os extremos leste e oeste da planície. Estes limites espaciais resul-
tam oportunos ao permitir visualizar e analisar a unidade territorial como um todo.
A escala de análise elegida é 1:25.000, pois se ajusta às necessidades das análises
pretendidas, que deveriam incluir desde a estrutura dos espaços livres relativamente pe-
quenos até as características territoriais das superfícies maiores. Deste modo, a escala

29
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

1:25.000, entre a 1:50.000, de caráter marcadamente territorial, e a 1:10.000, de caráter


mais urbano, atende às intenções propostas ao permitir manipular informações que pro-
vêm tanto de uma como de outra realidade.
Apesar do propósito de definir estratégias de projeto, não é objetivo deste livro realizar
o projeto deste âmbito espacial, senão desenvolver uma possível aproximação metodoló-
gica. Este fato justificaria as possíveis imprecisões cartográficas. Apesar disto, a confecção
dos planos (desenvolvida em sua totalidade pela autora) foi o mais rigorosa possível, com a
intenção de trabalhar, a todo o momento, com fontes oficiais e primárias de informação.
Entretanto, devido à escala e aos temas abordados, nem sempre foi fácil obter as in-
formações adequadas nos órgãos estatais, principalmente no que se refere a detalhes dos
atributos biofísicos, como, por exemplo, estudos detalhados das comunidades vegetais e
faunísticas existentes. A escala dos planos disponíveis (elaborados pelos órgãos estatais) é
1:50.000; para muitos dos atributos estudados, por exemplo, a hidrologia, não existem de-
talhes a menor escala, embora para a identificação da vegetação o detalhe chegue à escala
1:2.000. Deste modo, os dados que puderam ser detalhados foram compilados nas escalas
1:2.000 e 1:10.000 e, posteriormente, se realizou uma síntese a escala 1:25.000. Para os
dados restantes se reproduziu a informação original. Cabe ressaltar que para a confecção
dos documentos cartográficos se utilizou a informação recolhida até julho de 2003.
A cartografia5 foi o instrumento de trabalho fundamental, utilizado para as análises
relacionadas com o reconhecimento do caso de estudo como uma unidade territorial e
para as análises históricas sobre sua evolução urbana e as relações espaciais estabeleci-
das entre os espaços livres e seu entorno, onde se encontram os principais dados sobre os
atributos físicos e de usos do solo existentes. Do mesmo modo, através da cartografia foi
possível manejar os principais dados relativos aos atributos dos espaços livres para sua
análise e avaliação, e a superposição dos planos em cada situação específica permitiu al-
cançar as avaliações finais dos atributos e sua síntese, assim como identificar as situações
de oportunidade projetual e as bases para as estratégias de projeto.

Iconografia

A iconografia6 foi de grande importância para a análise da história da ocupação ur-


bana e com relação aos atributos perceptivos. Com respeito a estes últimos, se realizou a

30
Introdução

documentação fotográfica como registro das principais visadas. Para tanto, a autora per-
correu as principais vias da unidade territorial em questão, nos dois sentidos, fotografou
as principais vistas, visitou os edifícios mais altos da área e os pontos panorâmicos, a fim
de captar as vistas gerais, e efetuou o reconhecimento dos parques existente e demais
espaços livres de dimensões mais relevantes.
Este trabalho de campo permitiu abarcar os atributos perceptivos mais significativos
do caso de estudo, que ficaram registrados em mais de 1.000 fotografias digitais, tomadas
desde dezembro de 2001 até julho de 2004 em visitas ao local para a pesquisa de campo
de uma duração variável entre um e dois meses.
Para a análise da história da ocupação urbana, além das fotografias obtidas na
pesquisa de campo, foram utilizadas fotografias históricas, ortofotos na escala 1:8.000,
que compreendem todo o caso de estudo (e que serviram de apoio à confecção da car-
tografia utilizada em outros itens), e fotografias aéreas que ofereceram uma visão geral
do âmbito estudado.
A iconografia também foi um recurso importante para a elaboração das estratégias de
intervenção, principalmente as que se referem a alternativas projetuais sobre os espaços
livres do sistema. Para isto, se levou a cabo uma ampla pesquisa, em revistas e livros, de
exemplos que poderiam ser ilustrativos do que se pretendia demonstrar em cada item.

Fontes bibliográficas

Com relação às fontes bibliográficas, foram usadas fontes primárias e referências


secundárias, embora em sua maior parte foram fontes primárias, sobretudo com relação
ao planejamento, histórico e atual, para a área. Neste sentido, a bibliografia geral segue
duas vertentes, uma mais relacionada com o caso de estudo especificamente, e outra mais
relacionada com a teoria geral, com referência, em grande parte, ao urbanismo, à ordena-
ção do território, à ecologia, à ecologia da paisagem, ao paisagismo, à geografia física e
à geografia humana e cultural, conforme se mostrará ao longo do livro.
Através da interpretação das fontes bibliográficas foi possível determinar os princi-
pais conceitos considerados no livro, assim como identificar os antecedentes disciplinares
que tratam do tema do sistema de espaços livres e do projeto territorial e determinar o

31
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

enfoque da abordagem adotada. Do mesmo modo, a pesquisa bibliográfica permitiu o


conhecimento de outras propostas de intervenção no território a partir dos espaços livres,
que são complementares às que se introduz neste trabalho, resultando no que se supõe
um diálogo enriquecedor.
Por outra parte, a bibliografia permitiu o conhecimento de planos e projetos realizados
na área de estudo e de trabalhos que tratam de temas relacionados com o que se aborda,
especificamente, sobre a unidade territorial como um todo e seu encaixe no território, os
espaços livres, o planejamento, a condição dos assentamentos e das infra-estruturas na
área, os quais foram fundamentais para as análises empreendidas. Cabe ressaltar que
para uma compreensão detalhada do caso de estudo foram feitas pesquisas em arquivos
oficiais, em páginas Web, periódicos e revistas, entre outras fontes.

Entrevistas

Para a obtenção de todos os dados necessários para as análises, sobretudo os relacio-


nados aos projetos urbanísticos que estão previstos no caso de estudo pelo setor público,
foram realizadas entrevistas com as pessoas responsáveis por eles em dezembro de 2001
e em julho de 2003 (ver anexo 2).
As entrevistas permitiram conhecer os interesses e as ações levadas a cabo pelo setor
público, tanto referentes ao planejamento e gestão dos espaços livres, quanto à planifi-
cação e gestão do caso de estudo como um todo, desde suas respectivas regiões admi-
nistrativas. Para tanto, foram realizadas entrevistas com os responsáveis pelos principais
parques, com as pessoas responsáveis pelos projetos que a prefeitura desenvolve na área
e com os administradores públicos do âmbito.
Por outra parte, se identificou a necessidade de compreender a relação da população
local com os espaços livres, social e culturalmente. Para o que, foram realizadas entrevistas
com pessoas responsáveis pelas associações de moradores existentes em distintas partes
da unidade territorial. Devido à amplitude do caso de estudo e à grande quantidade de
associações, denominadas Câmaras Comunitárias, foram consultadas associações legi-
timadas para representar a cada uma das seguintes partes da unidade: Barra da Tijuca,
Recreio, Vargem Grande, Vargem Pequena e Jacarepaguá, a fim de obter uma idéia geral
do contexto social e cultural do lugar.

32
Introdução

No total foram 19 entrevistas, com uma duração aproximada de uma hora cada,
realizadas entre as pessoas representantes do setor público e da comunidade local. Em
geral, as entrevistas, todas gravadas, se desenvolveram de modo semi-estruturado, dei-
xando espaço para que o entrevistado pudesse se estender sobre outros aspectos que lhe
parecessem relevantes com relação ao tema proposto. O procedimento das entrevistas
aportou um material valioso para o livro, já que permitiu relacionar características físicas,
foco das análises, com as realidades sociais e culturais do caso de estudo referentes aos
espaços livres, proporcionando, assim, pistas para as estratégias de projeto, além de con-
tribuir para sua validação.

1D > Conteúdo do livro

Depois da introdução geral, no capítulo 2 se compilam algumas contribuições pre-


cedentes que apostaram na estruturação do território a partir da ordenação do sistema
de espaços livres. Posteriormente, se explicitam os conceitos aplicados no livro e se
identificam os atributos biofísicos e perceptivos dos espaços livres como recursos pro-
jetuais e se formula a hipótese do sistema de espaços livres como possível diretriz do
projeto territorial.
No capítulo 3 se aborda a caracterização da unidade territorial de referência, como
introdução ao caso de estudo, através das análises sobre seu encaixe territorial, o relevo
e o clima, a hidrografia, as infra-estruturas (viária, de serviços e de transporte coletivo), as
principais comunidades vegetais, os usos do solo e as características populacionais.
No capítulo 4 se objetiva compreender o processo histórico de configuração dos
espaços livres no território em questão e seu contexto urbano, através da análise da trans-
formação urbana sofrida pela unidade territorial estudada ao longo do séc. XX, como uma
primeira aproximação à problemática dos espaços livres que se analisará.
Em seguida, no capítulo 5, se analisam e avaliam os espaços livres objetivando rea-
lizar uma primeira aproximação aos espaços mais adequados a serem preservados como
espaços não ocupáveis, em conseqüência dos atributos do suporte biofísico, dos atributos
perceptivos, da acessibilidade e dos vínculos de planejamento.

33
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Finalmente, no capítulo 6, se propõem estratégias de projeto para a ordenação do


sistema de espaços livres no território, de acordo com as análises e avaliações prévias e
segundo a situação das peças com relação a seus entornos, ocupados ou não. As estraté-
gias consistem na definição de princípios de projeto e ações de projeto, que incidirão so-
bre os espaços, e no enfoque de alguns instrumentos de planejamento que possibilitarão
a consolidação do sistema de espaços livres.

Notas
1
“El concepto de ciudad sostenible reconoce que las ciudades deben responder a determinados objetivos
sociales, medioambientales, políticos y culturales, así como físicos y económicos. Se trata de un organismo di-
námico tan complejo como la propia sociedad y suficientemente sensible para reaccionar debidamente ante los
cambios. La ciudad sostenible es una ciudad con múltiples facetas:
– Una ciudad justa, donde la justicia, los alimentos, el cobijo, la educación, la sanidad y las posibilidades
se distribuyan debidamente y donde todos sus habitantes se sientan partícipes de su gobierno.
– Una ciudad bella, donde el arte, la arquitectura y el paisaje fomenten la imaginación y renueven el espíritu.
– Una ciudad creativa, donde la amplitud de miras y la experimentación movilicen todo el potencial de
sus recursos humanos y permitan una más rápida capacidad de respuesta ante los cambios.
– Una ciudad ecológica, que minimice su impacto ecológico, donde la relación entre espacio construido y
paisaje sea equilibrada y donde las infraestructuras utilicen los recursos de manera segura y eficiente.
– Una ciudad que favorezca el contacto, donde el espacio público induzca a la vida comunitaria y a la movili-
dad de sus habitantes y donde la información se intercambie tanto de manera personal como informáticamente.
– Una ciudad compacta y policéntrica, que proteja el campo de alrededor, centre e integre a las comuni-
dades en el seno de vencidarios y optimice su proximidad.
– Una ciudad diversa, en la cual el grado de diversidad de actividades solapadas anime, inspire y pro-
mueva una comunidad humana vital y dinámica” (Rogers, 2000, p.168).
2
As metrópoles latino-americanas possuem muitas características comuns na sua configuração urbana,
apesar das diferenças inerentes ao lugar ou ao tipo de influência que apresentam em relação a suas respecti-
vas regiões, como, por exemplo: a irreversibilidade do êxodo rural, a presença de grandes propriedades rurais
e urbanas, a variação nos ritmos econômicos, a presença de zonas de degradação urbana como as favelas,
altos índices de pobreza e desigualdade na distribuição de renda e, entre outros fatores, fortes pressões de
crescimento urbano e uma expansão descontrolada (Santos, 1982).
3
Como referências, para estabelecer critérios de análise e avaliação dos atributos dos espaços livres, foram
utilizados os seguintes trabalhos: Lynch (1969); McHarg (1969); Bolós (1992); Gómez Orea (2001), entre outros.
4
Foram designados valores alto (A), médio-alto (MA), médio (M), médio-baixo (MB) e baixo (B), confor-
me o caso analisado.

34
Introdução

5
A cartografia se desenvolveu com base nas seguintes fontes:
• Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro:
– Plantas digitais na escala original de 1:10.000, 1999 (via Internet).
– Plantas digitais na escala original de 1:2.000, 1997.
– Informações provenientes do CD Atlas Rio (1998), principalmente referentes à cartografia de favelas e
loteamentos irregulares na área de estudo, e atualizadas segundo uma planta impressa na escala 1:80.000,
2001, produzida pela Secretaria de Habitação da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.
– Mapa impresso da cidade do Rio de Janeiro na escala 1:50.000, 1999 e 2003.
– Informações provenientes do CD Zoneamento Urbano 99, referentes à ordenação territorial existente.
– Plantas em PDF provenientes do Estudo de Impacto Ambiental para o Projeto de Recuperação Ambien-
tal da Macrobacia de Jacarepaguá. RJ: Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, SMAC, 1998, V.2.
• Fundação CIDE, Estado do Rio de Janeiro:
– Plantas digitais na escala original de 1:50.000 correspondentes às folhas: 2744-4 e 2745-3 (Santa
Cruz e Vila Militar, respectivamente) referentes às informações sobre o uso do solo e cobertura vegetal, dinâ-
mica urbana e condicionantes físicos e ambientais.
– Planta digital da Região Metropolitana do Rio de Janeiro sobre o uso do solo e a cobertura vegetal a
escala 1: 200.000, 1994.
• Centro Nacional de Pesquisa de Solos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA):
– CD relativo ao estudo e caracterização dos solos do Estado do Rio de Janeiro, 2001.
6
As fontes da documentação fotográfica (não realizadas pela própria autora) são:
• Fotografias aéreas realizadas pelo arquiteto Rodrigo Rinaldi em 2001.
• Instituto Pereira Passos (IPP) – Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro:
– Ortofotos na escala 1:30.000, ENGEFOTO, vôo 12/07/99.
– Ortofotos na escala 1:8.000, 2000.

35
2
Algumas questões conceituais

Neste capítulo se analisam algumas contribuições teóricas que servem como base
para o desenvolvimento do livro.
Em primeiro lugar, se estuda como o sistema de espaços livres foi utilizado como eixo
estratégico para a intervenção no território ao longo da história, considerando distintos
enfoques e finalidades com relação ao crescimento das cidades.
Posteriormente, se definem os conceitos de território, paisagem artificializada, es-
paços livres territoriais e sistema e se traçam linhas gerais sobre o sistema de espaços
livres enquanto possível reestruturador do território, segundo seus atributos e os papéis
que pode desempenhar na integração de âmbitos fragmentados, vítimas de intervenções
urbanas pouco atentas ao equilíbrio territorial.

2A > Antecedentes disciplinares

A idéia de sistema de espaços livres como diretriz da ordenação do território surgiu


no fim do séc. XIX, a partir do trabalho de Frederik Law Olmsted no Sistema de Parques de
Boston (1887) (fig.8). O Sistema partiu da conversão da zona pantanosa de Back Bay em
parque público, e se estendeu para uma sucessão de parques conectados por caminhos
até culminar com o Emerald Necklace (1887).

37
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Com esta proposta, Olmsted procurava integrar a cidade ao campo como partes de
um mesmo desenho, através do sistema de espaços livres. O espaço livre no sistema
adquiriu uma nova dimensão, para além dos parques públicos encerrados em si mesmos,
pois estavam conectados através de parkways. Estas, além de unir os parques entre si,
contribuíam com uma nova concepção para o desenho das vias, mais próxima do desfrute
da paisagem do que propriamente destinada a resolver as questões de tráfego, podendo
se apresentar como ruas arborizadas, caminhos panorâmicos ou elementos de continuida-
de paisagística, que cruzavam parques e outros espaços livres (Jellicoe, 1995).
Estas idéias que se aplicaram no início do séc. XX em outras cidades como Chicago
(1909) e Nova Iorque (1928), denotavam a preocupação em introduzir a natureza na
cidade e oferecê-la para o desfrute coletivo, conectando o estrato construído e o estrato
livre através do caráter contínuo das vias-parque, ao mesmo tempo em que atendiam ao
desejo de embelezar a urbe. De fato, as propostas se aproveitavam do projeto simultâneo
do espaço livre e das vias e sua respectiva consolidação espacial como guias para a cons-
trução da cidade.
Posteriormente, frente ao crescimento das cidades industriais, surgiu a proposta das
cidades-jardim de Howard como alternativa de ordenação do território. As cidades-jardim
buscavam evitar o excessivo adensamento urbano, a contaminação, os problemas sociais
e a separação abrupta entre a cidade e o campo. Em sua concepção se propunha a criação
de novos núcleos urbanos, fora dos grandes centros tradicionais, dotados de grande auto-
nomia funcional, com indústrias, agriculturas e equipamentos públicos, e com um desenho
que procurava integrar de forma harmônica a cidade e a natureza através de um sistema
de espaços livres (Hall, 1996).
Na ocupação do território, estas cidades tinham limites claros, tanto físicos quanto
demográficos. À medida que uma cidade se aproximasse de seu limite, se criaria uma nova
ao lado, e ambas estariam separadas entre si por seus próprios cinturões verdes (Hall,
1996). As cidades seriam ligadas por infra-estruturas viárias, e a idéia era garantir a ocu-
pação planejada do território incorporando o respeito pela natureza, embora as questões
de fundo fossem mais sociais que propriamente ecológicas ou de embelezamento.
Também com o objetivo de ordenar o crescimento da cidade e estabelecer novas
cidades, Le Corbusier iniciou o urbanismo do Movimento Moderno como alternativa aos

38
Algumas questões conceituais

padrões densos e “sujos” da cidade industrial, no qual o sistema de espaços livres tem
uma presença importante. Na Ville Radieuse (1935), os assentamentos e o espaço livre
ocupavam lugares distintos, ao mesmo tempo em que, desde um enfoque funcionalista,
os usos do solo eram específicos e não se misturavam. A cidade do Movimento Moderno
incorporava o espaço livre na ordenação, embora de modo abstrato, como lugar idealiza-
do e como “fundo” do edificado.
Na verdade, neste modelo o espaço livre aparece, por um lado, como tapete verde, seja
como acompanhamento das vias (os espaços verdes lineares de Chandigard, 1950), seja
como superfície marcada pelas edificações. Por outro lado, o espaço livre aparece como
reserva de características singulares do território, cena paisagística. Nem uma nem outra
concepção deixa claro o caráter do espaço livre como elemento estruturador, e sim reforçam
seu afastamento da conformação espacial da cidade, fundamentada nos assentamentos e
nas vias (Jellicoe, 1995). Outros exemplos desta concepção são o plano para a cidade de
Brasília (1960) e as propostas do próprio Le Corbusier para o Rio de Janeiro (1929) (fig.9).
Na tentativa de ordenar o crescimento das cidades, que aumentava em um ritmo ver-
tiginoso, algumas urbes se empenharam em traçar planos gerais, que tinham no sistema
de espaços livres um importante aliado para sua ordenação.
A cidade-jardim e sua lógica de localização se incorporaram ao plano de Abercrombie
para a Grande Londres (1943), junto à previsão de estradas perimetrais e cinturões verdes
que separavam zonas mais ou menos concêntricas, ao mesmo tempo em que isolavam as
novas cidades do antigo centro (Hall, 1996). Como um conceito norte-americano, os cintu-
rões verdes também foram usados no Plano Regional de Nova Iorque, assim como as cunhas
verdes. Por uma parte, os cinturões verdes, conformados por espaços naturais ou rurais, fun-
cionavam como freio à expansão urbana e, por outra, as cunhas verdes penetravam nas cida-
des e estabeleciam um contato mais direto entre a ocupação urbana e os espaços livres.
Nesta mesma direção, o interesse dos países do norte da Europa pela natureza tam-
bém trouxe alternativas para sua introdução nos centros urbanos. No Copenhagen Fin-
ger Plan (1947) (fig.10), os “dedos verdes” invadiam a cidade, ajudados pela topografia
natural, permitindo um contato respeitoso entre o estrato construído e os espaços livres,
ao mesmo tempo em que ordenavam o desenvolvimento de novas ocupações. O objetivo
principal do plano era frear o crescimento da cidade e concentrar a ocupação urbana ao

39
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

10

8. Sistema de Parques de Boston (1887)


(F.: http://www.archives.gov, 2008).
9. Proposta de Le Corbusier para
o Rio de Janeiro (1929) (F.: http://www.
fondationlecorbusier.asso.fr, 2008).
10. Copenhagen Finger Plan (1947)
(F.: http://www.regjeringen.no, 2008).

40
Algumas questões conceituais

redor destes eixos. O mesmo ocorreu no Plano Regional de Estocolmo (1967), que procu-
rava vincular a construção da cidade ao sistema de espaços livres (Jellicoe, 1995).
Entretanto, a explosão das cidades, a partir da década de setenta, teve impactos em
diversas instâncias: a perda da qualidade de vida nos centros urbanos, a tendência geral
à degradação dos espaços livres e o crescimento intenso e descontrolado, que resultou na
dispersão urbana pelo território.
As reações a estes fatos tiveram início ainda nos anos sessenta, com trabalhos orien-
tados para a qualidade de vida coletiva nos espaços livres públicos urbanos e a valoriza-
ção da paisagem7. Ao mesmo tempo, a partir dos anos setenta, começaram a se introduzir
preocupações de fundo ecológico expressas em trabalhos como o de McHarg (1969), na
criação do National Environment Policy Act (NEPA) nos Estados Unidos (1969), no desen-
volvimento de idéias de planejamento ecológico e de ecologia da paisagem na Holanda,
além de outras iniciativas que defendiam uma melhor integração entre as distintas instân-
cias da paisagem. Neste contexto, a importância dada pelos governos a esta problemática
deu origem à Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (Estocol-
mo, 1972) e à Cúpula do Meio Ambiente (Rio de Janeiro, 1992), que tentaram consolidar
as idéias sobre o desenvolvimento urbano sustentável, tema que foi objeto de muitos ou-
tros encontros internacionais (Rio+10, Kyoto, entre outros). Este tipo de desenvolvimento
deveria envolver três componentes básicos: a ecologia, a economia e as necessidades
sociais, originando as denominadas Agendas 21 para o desenvolvimento.
Neste sentido, a busca da sustentabilidade como parâmetro urbanístico começou a se
refletir em muitos planos, e a proposta do sistema de espaços livres, presente em diversos
deles, representa um mecanismo de ordenação que tenta integrar a ocupação urbana e o
respeito aos recursos do território.
Percebe-se esta tendência em algumas propostas de planejamento que surgiram na
década de noventa em cidades como Paris (fig.12), Berlim (fig.11) e Barcelona (fig.13).
Nestes planos, o sistema de espaços livres está composto por uma série de elementos
morfológicos que tanto resgatam tipos do passado quanto propõem novas soluções (as
cunhas verdes, os corredores verdes, as vias verdes, as redes ecológicas, os corredores
biológicos, etc.), ao mesmo tempo em que cumprem distintas funções que garantem a
sustentabilidade da paisagem.

41
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

11

12

13

11. Plano para Berlim e Brandenburgo (1998)


(F.: http://www.mlur.brandenburg.de, 2004).
12. Plano Verde de Paris (1995) (F.: Conseil
Régional d´Île-de-France, 1995).
13. Anel Verde de Barcelona (1999)
(F.: http://www.diba.cat/parcsn/parcs, 2008).

42
Algumas questões conceituais

Estas aproximações são importantes referências, em um contexto global, na busca


de novas soluções para a reestruturação do território urbano, que conciliem o desenvolvi-
mento urbano com um plano de conservação de recursos, fundamental para proporcionar
a qualidade de vida nas cidades.
Longe da proposta romântica de proximidade da natureza do séc. XIX, o sistema de
espaços livres, neste marco, desempenha um papel central enquanto espaços que podem
ser planificados com antecedência em relação às propostas de ocupação urbana, ao mes-
mo tempo em que oferecem recursos em distintas escalas e instâncias de análise para a
ordenação física dos territórios.

2B > Sobre o território, a paisagem artificializada


e os espaços livres territoriais

Na realidade, não existe um consenso sobre os conceitos de território, paisagem e


espaço livre, nem uma definição exata do que representam, dado que podem conter di-
ferentes fenômenos. Muitas referências, derivadas sobretudo do urbanismo, da geografia,
da ecologia e do paisagismo, os definem de distintos modos, entre eles, como lugar da
estrutura física em si mesma, das relações socioculturais que estabelecem as pessoas que
os habitam, da composição e do funcionamento dos ecossistemas existentes. Deste modo,
território, paisagem e espaço livre, em sua pluralidade, denotam conotações variadas, e
cada uma delas destaca as características mais adequadas para as análises que se deseja
realizar, o que permite dizer que são, principalmente, conceitos instrumentais.
Sobre o território pode-se dizer que corresponde às marcas do homem, que podem ser
chamadas de artificiais (em contraposição a naturais, pois o homem é parte da natureza),
é o produto humano, o artifício humano sobre a natureza. Deste modo, o território, que
um dia foi o território da natureza, passa a ser, em grande medida, o território do homem,
onde convivem o artifício em si mesmo e a natureza “artificializada”8 (Folch, 2003).
O território como paisagem artificializada pressupõe a idéia de espaço habitado, es-
paço adaptado às necessidades humanas e às suas intenções de transformação. Espaço
que, além de sua configuração física, das atividades que se estabelecem nele e de sua

43
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

possível percepção visual, envolve a leitura humana, como a interpretação do suporte


físico que possibilita a atuação sobre ele (Cosgrove, 1984).
Isto é, o território é considerado como espaço construído pelo homem, sobre uma
primeira natureza, e a paisagem se aborda como a introdução da interpretação humana
sobre este espaço físico. O resultado desta união, a paisagem artificializada, abarcaria a
construção física do espaço e o uso em si mesmos, a percepção visual e a leitura do lugar,
em sentido figurado, com significação própria para cada lugar e para cada comunidade. A
leitura do lugar determinaria as práticas da comunidade sobre a paisagem e suas inten-
ções de atuação, em um processo de evolução contínua, que comportaria na sua realidade
espacial a testemunha de um passado e as indicações para a transformação futura.
O território como paisagem artificializada reuniria, portanto, uma dimensão espacial
e uma dimensão funcional, relativa a seus atributos naturais e artificiais, que incluiria a
percepção visual do espaço. A interpretação da realidade espacial da paisagem e das
relações funcionais estabelecidas no território permite compreender algumas das bases
lógicas de construção que permanecem em sua estrutura física9. Ao mesmo tempo, a in-
terpretação intencionada da paisagem, dotada de intenção projetual, permite dinamizar
estas bases lógicas existentes resultando em uma concepção do território como objeto
transformável onde convergem o espaço, a função e a intenção.
A paisagem artificializada, isto é, a natureza trabalhada pelo homem, pode apre-
sentar diferentes formalizações possíveis, embora, finalmente, resulte em um território
ocupado, transformado, colonizado. Paisagem adaptada às necessidades humanas (viver,
produzir, alimentar-se, mover-se, etc.) que comporta fisicamente os elementos indispen-
sáveis para satisfazer estas necessidades. Paisagem vista a partir do artifício construído,
da mobilidade humana, da exploração da terra e de seus recursos e que, portanto, reúne
diversos componentes em sua estrutura física: os assentamentos, as infra-estruturas e os
espaços livres (Font et al, 1999; entre outros).
Os espaços livres têm grandes probabilidades de transformação no processo de cons-
trução da paisagem. Conformam o componente mais flexível da estrutura do território,
seja funcional ou espacialmente. São também os lugares mais frágeis e um dos mais
promissores tendo em conta a possibilidade de reestruturação do território, já que podem
assumir algumas importantes funções, por exemplo, como lugar dos ecossistemas, da
percepção da paisagem e como possível lugar para o futuro da ocupação urbana.

44
Algumas questões conceituais

Como lugar da natureza, os espaços livres reúnem elementos biofísicos responsáveis


pela qualidade ecológica do território, através das relações que estabelecem entre os se-
res vivos e seu meio inorgânico (McHarg, 1969; Odum, 1998; entre outros). Neste sentido,
os elementos biofísicos materializam o resultado, positivo ou negativo, das causas e das
conseqüências entre os processos naturais e artificiais que se desenvolvem em um local, o
que pode envolver a vegetação, a água, a estrutura do solo, o clima, etc.
Como lugar da percepção da paisagem, o espaço livre é a parte visível do território,
que permite estabelecer relações entre os elementos territoriais e construir uma imagem
do lugar, através da possibilidade de reconhecimento e preservação de suas características
específicas e, conseqüentemente, de sua qualidade visual. As características de uma pai-
sagem lhe conferem um caráter especial, que varia de sítio para sítio, e podem ser identi-
ficadas com base em seus componentes formais, provenientes tanto da natureza como da
artificialização (González Bernaldez, 1981; Bolós, 1992; Zoido, 2002; entre outros).
Como possível lugar para a futura ocupação urbana, os espaços livres constituem a
oportunidade para a reestruturação do território. A possibilidade de um manejo consciente
dos componentes físicos territoriais, que se proponha respeitoso e coerente com os valores
destes espaços e que esteja, sobretudo, interessado em manter seus recursos e em apontar
seu caráter ordenador (Batlle, 2002; Font, 2003; Sabaté, 2003; Llop, 2003; entre outros).
Neste sentido, na escala do território, os espaços livres podem apresentar distintos ca-
racteres, entre eles, o rural, o hídrico, o florestal, o das grandes peças urbanas não ocupadas
ou outros, segundo suas características espaciais (tamanho, posição e elementos compositi-
vos) e funcionais (o alcance, ou a repercussão, das funções que se realizam no seu âmbito).
Deste modo, a análise dos espaços livres territoriais recai sobre as superfícies não
ocupadas, protegidas por lei ou não, de propriedade pública ou privada, cobertos por ve-
getação ou não, que possam representar oportunidades para a reestruturação do territó-
rio. A importância das análises sobre estas superfícies se fundamenta no fato de que, por
um lado, geralmente são áreas cujo valor estrutural não é reconhecido pelo planejamento
(com exceção daquelas já protegidas e de valor indiscutível) e, por outro lado, constituem
espaços ameaçados pela ocupação urbana. Ao mesmo tempo, se crê que devam perma-
necer livres de ocupação e que possam formar um sistema, sendo elementos estratégicos
do projeto territorial.

45
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

2C > Sobre o sistema de espaços livres


e o projeto territorial

Os espaços livres em sistema

O sistema espacial ao qual se refere este livro é o representado por um conjunto de


elementos de distintas escalas, susceptíveis de estabelecer relações de distintas naturezas,
abertas e intrincadas entre si e com seu entorno, sob influências mútuas e em relativa
autonomia. Isto é, relações que recebem e emitem influências desde seu interior para seu
exterior, e vice-versa. No sistema, elementos e relações compõem um todo, cujas dinâmi-
cas influenciam na sua estrutura geral, sem que se estabeleça a hegemonia de um ou ou-
tro elemento ou relação sobre o conjunto. Entretanto, nem toda dinâmica tem as mesmas
repercussões no todo e estas variam de acordo com as escalas dos fatos. Considerando
a escala como a fração de espaço dentro do espaço total, quanto maior é a escala do
fenômeno, maior tende a ser sua repercussão no sistema. Como um sistema, o conjunto
de espaços livres é mais que a soma das partes, e compõe um todo mais significativo do
que uma simples justaposição (Santos, 2002)10.
Para a ordenação do sistema é importante reconhecer os elementos que o compõem
e as relações que se estabelecem entre eles e com seu entorno imediato. Segundo For-
man (1995), a composição do sistema de espaços livres, como mosaico de ecossistemas,
reuniria espaços descontínuos e contínuos e estaria definida por fragmentos, corredores,
matrizes e fronteiras, as quais o autor denomina patches, corridors, matrix e boundary
zone, de acordo com os seguintes critérios:

• Patches. São entendidos como fragmentos, peças do mosaico que possuem caracte-
rísticas homogêneas e que podem adquirir distintos formatos, alongados ou largos, com
limites retos ou curvos.

• Corridors. São definidos como elementos lineares que diferem de seu entorno e atra-
vessam um lugar. Podem ser de três tipos básicos:
– Trough corridors. São faixas com vegetação baixa comparada com a vegetação das
matrizes do entorno.

46
Algumas questões conceituais

– Wooded strips. São corredores com vegetação mais alta que as matrizes adjacentes.
– Stream and river corridors. São faixas com vegetação, que pode ser mais alta ou
mais baixa que a das matrizes do entorno, e que contém um canal de fluxo de água.

• Matrix. Representa os ecossistemas que ocupam áreas extensas, englobam fragmentos


e corredores, é muito conectada e controla as dinâmicas da paisagem regional. Possui três
atributos básicos:
– A área. Corresponde à cobertura vegetal predominante de um lugar.
– A conectividade. Corresponde ao grau no qual uma área está conectada às demais.
– Controle sobre as dinâmicas. Corresponde à presença de elementos que são a fonte
dos recursos necessários para a conformação do meio.

Cada elemento do sistema possui uma margem, que é a fronteira que o separa dos
elementos adjacentes. Duas margens combinadas geram um boundary zone ou zona de
fronteira, que pode ser entre espaços livres ou entre espaços livres e estrato construído.
As escalas dos elementos do sistema são variáveis, pois podem ser grandes ou pequenas,
igualmente, a continuidade entre eles pode se dar em distintos graus. Entre os elementos do
sistema de espaços livres se distinguem os que são contínuos e os que são descontínuos. Os
elementos contínuos estão conectados entre si, como a água, por exemplo. Os elementos
descontínuos estão separados por porções do território que impedem sua conexão direta
e se apresentam como peças “satélites” do sistema contínuo. O fato de ser contínuo ou
descontínuo pode favorecer ou prejudicar o desenvolvimento dos fluxos no sistema, dado
que os fluxos, sobretudo os energéticos, são um elemento fundamental para que o sistema
funcione. Sem fluxos não existe sistema; os fluxos são a vida do sistema e, para que existam
fluxos, é muito importante a continuidade. Caso contrário, seriam componentes estanques
em si mesmos ou, no máximo, justapostos. Entretanto, ambas as peças, conectadas ou não,
grandes ou pequenas, são partes importantes do todo e podem ter um papel relevante com
relação à manutenção dos processos naturais que se dão em seu próprio seio.
Por outro lado, os espaços livres, contínuos ou não, possuem relações espaciais com
seu subsolo, suas fronteiras e seu entorno. Os fenômenos que ocorrem no subsolo aflo-
ram à superfície, como por exemplo, a água que nasce ou a planta que brota, e os que
ocorrem nas superfícies afetam o subsolo, como é o caso das impermeabilizações do solo,

47
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

que impedem o fluxo de água. Do mesmo modo, tudo o que sucede nas fronteiras e no
entorno também afeta diretamente os espaços livres, como as conseqüências das ocupa-
ções urbanas na conformação destes espaços e as interferências que podem ocasionar
nos seus processos naturais.
Em conjunto, as funções do sistema compõem um quadro integrado, com relações
entre seus próprios elementos e com seus entornos. Isto supõe que à função geral do
sistema, seguem situações de desenvolvimento local que se refletem em cada peça de
espaço livre em particular, condicionando seus fluidos.
Um sistema espacial constitui um todo dinâmico que varia com o tempo (Santos, 2002).
A influência do tempo no sistema de espaços livres se comprova na forma como, ao longo
dos anos, os espaços revelam sua força e sua debilidade; na observação de como intervém a
ocupação urbana; de como se movem as águas, enchendo e baixando seus cursos; de como
se modifica o clima e a vegetação; de como evoluem os solos, entre outros aspectos. Os
espaços livres podem passar de não ocupados a ocupados, de espaços com água a espaços
secos, de espaços explorados a espaços abandonados, etc. Além disso, as modificações não
são lineares e ocorrem simultaneamente, em diferentes direções e sobre distintos aspectos.
Nesta medida, o sistema não é um sistema de um tempo único, e sim a estratificação de dis-
tintas idades do sistema, no qual confluem as permanências e as modificações que sofreu ao
longo dos anos e que permitem identificar as cicatrizes e as simbioses existentes na atuali-
dade, cuja análise intencionada pode traduzi-las em estratégia de intervenção no território.

A natureza como um recurso projetual

Segundo o método ecológico de Mc Harg (1969), cada um dos espaços livres, de


acordo com os elementos bióticos e abióticos que possui, apresenta características eco-
lógicas fundamentais para sua manutenção e para a sustentabilidade do território, cujo
desenvolvimento da ocupação urbana deveria respeitar.
Entre os elementos naturais dos espaços livres, é indiscutível a importância da presença
da vegetação nos territórios atuais pelas distintas funções que ela cumpre: a diversidade
das paisagens e da vida silvestre, a estabilidade que oferece às estruturas do solo e o modo
como favorece a manutenção dos fluxos de água, as influências que exerce sobre o clima e

48
Algumas questões conceituais

14. Manaus e os rios Negro e Solimões 14


(F.: http://www.inpe.br, 2002).
15. Floresta Amazônica (F.: http://www.
fmc.am.gov.br, 2008).
16. Paisagem agrícola (F.:http://www.
flickr.com, 2008).

15

16

49
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

a diminuição da contaminação atmosférica, até suas funções recreativas e educativas, como


oferta de descanso psíquico e de atividades de lazer para os habitantes da cidade, passando
por uma função extrativa (McHarg, 1969; Hough, 1995; Turner, 1998; entre outros).
Os lugares com vegetação ou aqueles sem vegetação, mas que podem ser recupe-
rados a favor do desenvolvimento dos ecossistemas, merecem que se preste atenção a
seus processos naturais como um dado significativo para a manutenção da qualidade
ecológica do território.
A agricultura, muitas vezes diretamente relacionada com a identidade de um lugar, cos-
tuma ocupar espaços que freqüentemente sofrem a pressão da urbanização, em particular,
quando se encontram em condições produtivas pouco rentáveis. Entretanto, incentivar a
agricultura no território representa uma oportunidade de recreio, de educação ambiental,
de criação de postos de trabalho, de criação de condições de produção e comércio para
as produções urbanas em pequena escala e de manutenção do espaço livre a baixo custo.
Além disto, quando os cultivos são adequados, podem ser compatíveis com as melhores
condições para a manutenção do equilíbrio ecológico, seu próprio e da agricultura do en-
torno (Hough, 1995; Turner, 1998; entre outros).
A rede hídrica, entre outros fatores, abastece de água o território, oferece oportuni-
dades de lazer, possibilita a agricultura, o funcionamento das cidades, a higiene, a saúde
e gera ecossistemas próprios relativos à água. Além disto, a água é um fator que, junto à
declividade, incide sobre a possibilidade de riscos, principalmente referentes a enxurradas,
que favorecem as inundações, e à acumulação hídrica e de sedimentos, que podem gerar
problemas de drenagem. Estes fatos indicam que os “lugares da água”, superficial ou
subterrânea, têm influência no funcionamento dos fluxos ecológicos e do território como
um todo, cuja manutenção é essencial para o desenvolvimento dos processos naturais.
Da mesma maneira, a observação do relevo e das condições dos solos constituem
um fator importante para a manutenção dos processos naturais. A estabilidade do solo é
uma referência, entre outros fatores, para a possibilidade de fixação da cobertura vegetal,
para evitar a interferência dos movimentos de terra nos leitos dos rios e para permitir a
ocupação do solo de modo seguro.
De modo geral, as contribuições relativas aos elementos biofísicos no sistema de
espaços livres revelam tanto a possibilidade de preservar os processos naturais, como a

50
Algumas questões conceituais

oportunidade de promover a interseção entre ecologia e meio urbano no projeto territo-


rial, levando em conta que a ecologia é uma dimensão importante no processo de toma-
da de decisão relativo às intervenções urbanísticas, mais que um atributo acrescentado
posteriormente, mediante exigências de estudos de impacto ambiental para intervenções
concebidas a partir de considerações puramente formais ou funcionais.

A percepção da paisagem como um recurso projetual



A percepção da paisagem pode ter grande relevância na ordenação do sistema de es-
paços livres, enquanto um elemento essencial para a manutenção da qualidade visual de
um lugar, com repercussões sobre o desenvolvimento da qualidade de vida da população
e a preservação de seu patrimônio natural e artificial (Zoido, 2002).
Os espaços livres são elementos que participam na estrutura visual de um lugar e lhe
outorgam características singulares, cuja manutenção favorece a diversidade visual local e
significa valorizar algumas permanências depois de um longo processo de artificialização.
Segundo McHarg (1969), significa valorizar o que permanece como elemento da identi-
dade física do lugar, como obra coletiva que, por questões do acaso ou intencionalmente,
permaneceram em sua evolução urbana. Trata-se de preservar aquilo que é resultado de
uma conservação voluntária ou involuntária, manter certos elementos que são significati-
vos no reconhecimento do lugar tal como este se apresenta e permitir que sejam compar-
tilhados pela comunidade que o freqüenta. Neste sentido, os elementos cênicos, as áreas
de emergência visual, os fundos cênicos e os espaços livres de interesse histórico-cultural
constituem um dos principais conteúdos visuais da paisagem de um lugar. Aquilo que faz
com que um lugar seja distinto de outro, porque se constitui de modo distinto e é reconhe-
cido de modo distinto. São elementos singulares que determinam a particularidade locais,
sua diversidade e qualidade visual.
Os elementos cênicos dão caráter a um lugar. Permitem abarcar sua conformação
física e destacar seus atributos mais significativos (as formas singulares do relevo, da
hidrografia e da vegetação). Estes elementos funcionam como referentes e como marco
do lugar, constituindo parte de sua identidade territorial e do potencial visual de sua
paisagem (McHarg, 1969).

51
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

17

18

19

17. Rio de Janeiro (Foto:


Rodrigo Anda, 2000).
18. Marrocos (Foto:
Autora, 2004).
19. Patagônia Argentina
(Foto: Autora, 2000).

52
Algumas questões conceituais

Os fundos cênicos permitem visualizar o caráter de um lugar de forma genérica. Eles pro-
porcionam vistas que integram os elementos significativos que o conformam em relação aos
grandes rasgos de sua geografia, pelo que revelam o cenário da paisagem, geral ou parcial,
desnudando as metáforas das relações entre seus elementos componentes (Bolós, 1992).
A percepção das áreas de emergência visual, como enquadramentos de elementos cêni-
cos da paisagem possibilitados a partir do deslocamento pelas vias, marca a individualidade
das zonas onde estão localizadas e promove a orientação no percurso pelas vias, ao mesmo
tempo em que, por sua singularidade, podem ser pontos de enlace entre seqüências visuais.
Além disto, são espaços destacáveis que podem ser reconhecidos como um bem coletivo,
que deveriam ser compartilhados por toda a comunidade (Lynch, 1976; Spirn, 1998).
Os espaços livres de interesse histórico-cultural costumam ser testemunhas da transfor-
mação de um lugar, enquanto remanescentes da evolução urbana, que podem ter importân-
cia na conservação de alguns de seus rasgos mais representativos (McHarg, 1969).
Preservar os rasgos físicos significativos dos espaços não ocupados, portanto, pode
constituir um referente para a ordenação do sistema de espaços livres, e levaria à garantia
da manutenção da qualidade visual do território e ao fortalecimento de sua identidade.

O sistema de espaços livres no projeto territorial

Ao analisar a realidade urbana das grandes cidades na atualidade como cidades


estendidas, transformadas e fragmentadas, se comprova que o espaço livre sofreu um lon-
go processo de desintegração para adequar-se à ocupação urbana. A lógica da conexão
viária, das novas formas de construção do território, que tendem à dispersão, frente a um
planejamento defasado com relação ao acompanhamento das mudanças urbanas, entre
outros fatores, possibilitaram a proliferação de espaços livres sem um caráter definido
relativo à estrutura urbana.
Neste contexto, à margem dos que já possuem um status preestabelecido (como par-
que, campo agrícola produtivo, reserva natural, etc.), os espaços livres são freqüentemente
o que “sobra”, seja como restos da construção das vias, como reservas de mercado de
espaços urbanizáveis, como restos “sem valor” dos assentamentos, como campos agrícolas
improdutivos, entre outros. E, em conjunto, independentemente de seu status, constituem o
que se pode denominar espaços de resistência frente à incessante expansão urbana.

53
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Entretanto, o papel do planejamento foi decisivo na conformação desta realidade.


Com muita freqüência, os planos no séc. XX foram propostos a partir da perspectiva da
antropização extensiva, onde o espaço livre desempenhou, em geral, o papel de reserva
para sua posterior ocupação ou de espaço para a proteção ambiental. Em ambos os casos,
a tendência foi uma atuação passiva e pontual, onde as normas de ocupação se faziam
de “fora para dentro” em relação aos espaços livres. Isto conduziu à insularidade destes
espaços, devido a suas escassas relações com os assentamentos e com as infra-estruturas,
e a sua apresentação como um fato isolado, com lógicas intrínsecas e desvinculadas entre
si, que destacam seu caráter residual.
Deste modo, ordenar o território de forma segmentada, sem a devida preocupação
por seus recursos, em especial pelos espaços livres, é um dos fatores que caracterizam a
dissipação urbana das metrópoles atuais, cuja urbanização se dissemina sem fronteiras e
sem atenção às necessidades coletivas, ocasionando toda sorte de desequilíbrios.
Frente a esta conjuntura, alguns autores (Batlle, 2002; Font, 2003; Sabaté, 2003;
Llop, 2003; entre outros) vêm reclamando a dimensão ativa dos espaços livres no projeto
territorial11. Isto é, propõem a inserção do sistema de espaços livres como uma diretriz
da ordenação territorial, que permite pensar a construção do território de “dentro para
fora”, relativamente aos espaços livres. Este enfoque baseia-se nos princípios dirigidos
para a modificação da postura passiva com respeito aos espaços livres no planejamento
e à transformação destes espaços “vazios” em espaços cheios de significado, capazes de
ser reestruturadores do território, demonstrando que as infra-estruturas ou as pressões
imobiliárias não são a única lógica possível para a urbanização.
De modo geral, se reclama a redefinição do mosaico de espaços livres como um guia
para a reestruturação do território. Isto implica em atuar sobre o sistema, não apenas a fim
de preservar e conectar os espaços livres entre si, mas também para estabelecer a integração
entre eles e seu entorno, proporcionando algumas diretrizes tanto para a ordenação do sis-
tema quanto para a da ocupação urbana, que podem, entre outras atuações, limitar, confor-
mar e relacionar os espaços livres e ocupados. O sistema de espaços livres ocuparia o lugar
central e não residual, cuja determinação tenderia a ordenar aquilo que “deve” permanecer
livre e aquilo que “pode” receber algum grau de ocupação e “como”, segundo os recursos
que possuem estes espaços e as intenções que norteiam o desenvolvimento do território de
forma geral, representando princípios e ações alternativas para o planejamento.

54
Algumas questões conceituais

Neste marco, o espaço livre é um espaço de oportunidade para as intervenções no


território, de acordo com o reconhecimento das potencialidades que oferece e com o
desenvolvimento integral de seus atributos para uma melhor qualidade urbana, onde o
equilíbrio entre as necessidades coletivas e os recursos, através da manifestação ordenada
da urbe, significaria a possibilidade de habitar, viver e projetar, de acordo com as necessi-
dades de cada trecho do território e de suas comunidades.

Sobre uma contribuição à sustentabilidade do território



As pautas da sustentabilidade surgiram nas últimas décadas para orientar as atua-
ções urbanas que buscam, entre outros aspectos, o consumo respeitoso dos recursos do
território, mantendo suas funções e sua distribuição eqüitativa no espaço e no tempo
(Rogers, 2000; Folch, 2003b; entre outros).
De fato, a sustentabilidade resulta eloqüente como paradigma de transformação para
territórios cada vez mais corrompidos por crescimentos urbanos aleatórios e dispersos e
que, freqüentemente, tendem a provocar a desintegração espacial e funcional dos espa-
ços livres. Entretanto, a sustentabilidade, por si mesma, pode ser um objetivo inalcançável,
um mito impossível ou cheio de contradições insolúveis, embora permita apontar algumas
saídas possíveis, criar ilusões no mínimo saudáveis, instigar a atitude proativa ao se suge-
rir propostas projetuais e não apenas a descrição diante da observação da realidade de
nossos territórios.
A busca de um sistema de espaços livres como uma possível diretriz do projeto ter-
ritorial tende a refletir alguns princípios de atuação sustentável, relativos a manutenção
dos espaços livres e a possibilidade de desenvolver novas ocupações urbanas, como, por
exemplo, conservar a heterogeneidade dos espaços livres, garantir a integridade dos pro-
cessos humanos e naturais e promover as coesões física, ecológica, visual e social do
território (McHarg, 1969; Hough, 1995; Zoido, 2002; entre outros).
A manutenção da heterogeneidade dos espaços livres traduz, entre outros fatores, a pre-
servação da diversidade dos elementos biofísicos, dos elementos visuais mais significativos, a
variedade social, a variedade funcional e tipológica e a mobilidade alternativa. Em princípio,
manter a heterogeneidade dos espaços livres levaria à individualização de cada porção do

55
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

território, com o reforço de suas características próprias, contra a homogeneização, a banali-


zação e a segregação das diferenças que vêm assolando nossos territórios atuais.
A garantia da integridade dos processos humanos e naturais revela, principalmen-
te, a possibilidade de realização integral dos processos biofísicos, das possibilidades
perceptivas, de acesso e de convivência, de modo que se designem usos de solo e
atividades que respeitem os recursos dos espaços livres e sejam compatíveis com suas
características fundamentais.
A promoção da coesão física, ecológica, visual e social do território permite relevar as
relações entre os espaços livres e seus entornos, privilegiando-os como lugares integra-
dores, que relacionam as distintas instâncias da paisagem, que promovem a agregação
frente a compartimentação. De fato, na promoção da coesão se busca, em primeiro lugar,
fazer do espaço livre atual o reflexo de um possível pacto de integração entre os compo-
nentes do território e a comunidade que o vivencia.

Notas
7
Os trabalhos de Lynch (1960) em A Imagem da Cidade, de Jacobs (1961) em The Death and Life of Great
American Cities, e Alexander (1965) em The City is not a Tree, são contribuições fundamentais neste sentido,
que reclamam uma maior atenção à relação entre assentamentos, acessos e espaços livres nas cidades.
8
Alguns autores distinguem natureza e artifício considerando a natureza como os meios biótico e abiótico
(organismos vivos e não vivos), que não necessitam energia externa para seu desenvolvimento, e o artifício
como o meio antrópico (a ocupação urbana) e o meio antropizado (exploração do meio natural), que necessi-
tam energia externa para seu desenvolvimento (Bolós, 1992).
9
“El paisaje [como sistema causal] es el resultado formal de diferentes relaciones físicas y biológicas; con-
secuencia simultáneamente, de un proceso y una estructura geológica, del moldeado que en la misma realizan
los elementos del clima, de la ocupación biológica de un soporte físico o de las relaciones entre diversos flujos
energéticos, entre otras causalidades naturales. En espacios intensamente ocupados por los seres humanos,
el paisaje es en gran medida un artificio, puesto que el espacio natural ha podido ser deforestado y roturado,
parcelado, construido y hasta alterado irreversiblemente en sus condiciones naturales más básicas. En estas si-
tuaciones, el paisaje suele ser comparado a un palimpsesto, figuradamente, en el sentido de que en él se puede
rastrear e interpretar las huellas de varios periodos históricos y de diferentes intervenciones humanas. El paisaje
contiene, materializadas, distintas soluciones que las diferentes generaciones, en distintas condiciones técnicas,
han ido dando a la ocupación y utilización de un territorio” (Zoido, 2002, p.24).

56
Algumas questões conceituais

10
“Um sistema se define por um nódulo, uma periferia e a energia mediante a qual as características
pioneiras elaboradas e localizadas no centro conseguem projetar-se na periferia, que será então modificada
por elas. É somente a partir deste esquema que seremos capazes de apreender sistematicamente as articu-
lações do espaço e compreender sua própria natureza. Isto deveria possibilitar a definição, de maneira exata
e particular, de cada pedaço de terra. Cada sistema espacial e as localizações correspondentes aparecem
então, como um resultado de um jogo de relações; a análise será tanto mais rigorosa quanto sejamos capazes
de escapar às confrontações entre variáveis simples que na maioria das vezes levam a análises causais ou
a relações de causa e efeito que isolam artificialmente certas variáveis e impedem de abranger a totalidade
das interações. Sempre um sistema substitui um outro porque o sistema espacial é sempre conseqüência da
projeção de um ou vários sistemas históricos. Como o espaço contém características das diferentes idades
correspondentes, tal enfoque deveria permitir uma interpretação mais cuidadosa e mais sistemática das so-
brevivências e das filiações” (Santos, 2002, p.79).
11
“Una visión renovada del planeamiento territorial, que por sus características actuales hemos preferi-
do denominar “proyecto territorial”, que sea capaz de hacer del territorio físico el protagonista del plan, frente
a la abstracción economicista de los equilibrios y de las iluministas vocacionalidades territoriales de la etapa
anterior, parece el perfil más adecuado para dar una respuesta eficaz a los problemas y situaciones actuales,
desde la diversidad de requerimientos sociales y desde los avances tecnológicos (Font, 1996, p.175).”

57
3
Caracterização
da unidade territorial

A caracterização geral da unidade territorial de referência tem como objetivo definir


o caso de estudo em seus principais aspectos, que serão importantes no desenvolvimen-
to das análises posteriores. As descrições correspondem a aproximações ao lugar, sem
constituir um estudo detalhado sobre os temas tratados: a introdução ao caso de estudo
e seu encaixe territorial, o relevo e o clima, a hidrografia, as infra-estruturas (viárias, de
serviços e de transporte coletivo), as principais comunidades vegetais, os usos do solo e
as características populacionais.

3A > O caso de estudo e sua situação territorial

Com respeito à realidade territorial da metrópole do Rio de Janeiro, se verifica a


existência de distintas unidades territoriais com “reservas” de solo livre em situações de
pressão relativa ao avanço da ocupação urbana.
A Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ) está situada no Estado do Rio de
Janeiro e conta hoje com 10.872.76812 de habitantes. Possui uma superfície de 5.693 km2
e está composta por 19 municípios, cuja principal cidade é o Rio de Janeiro. Os espaços
livres têm um importante papel na definição de sua paisagem, já que mais de dois terços

59
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

do território se apresentam livres de ocupação e são determinantes na definição de sua


estrutura urbana, o que demonstra a força destes espaços na metrópole, além de seu
indiscutível valor ecológico e visual13.
As linhas de ocupação do território, em geral, estão dispostas em forma radial relati-
vamente ao centro tradicional da metrópole, e muitas áreas possuem importantes espaços
rurais e naturais, seja nos extremos da ocupação urbana, seja entremeados, misturados
com outros espaços livres14.
Algumas das unidades territoriais da região, que carecem de um quadro urbano con-
solidado, se encontram dentro dos limites administrativos da cidade central. Na cidade
do Rio de Janeiro, com 5.851.914 habitantes, 63,06%15 de seus 1.255 km2 de território
se encontram desocupados, o que faz com que algumas áreas apresentem um quadro
muito disperso quanto à ocupação urbana, com pontos muito adensados, outros com
edificações isoladas ou pequenos grupos de edificações, e imensas áreas de espaços livres
dentro dos limites edificáveis. Estas áreas se encontram na zona oeste da cidade, onde se
localiza a unidade territorial em questão.
O caso de estudo, composto pela Baixada de Jacarepaguá, os maciços da Pedra Bran-
ca e da Tijuca e o oceano Atlântico, conta com uma população de 743.634 habitantes e,
desde o ponto de vista administrativo, corresponde, praticamente, à área de planejamento
4 (AP4), composta pelas regiões administrativas de Jacarepaguá (VI RA), Barra da Tijuca
(XXIV RA) e Cidade de Deus (XXXIV RA), as quais abarcam os seguintes bairros16: VI
RA – Jacarepaguá, Anil, Gardênia Azul, Cidade de Deus, Curicica, Freguesia, Pechincha,
Taquara, Praça Seca, Tanque, com 575.992 habitantes; XXIV RA – Joá, Barra da Tijuca,
Itanhangá, Camorim, Vargem Grande, Vargem Pequena, Recreio e Grumari, com 129.632
habitantes; XXXIV RA – Cidade de Deus, com 38.010 habitantes. A unidade está limitada
a oeste pelos bairros de Guaratiba e Campo Grande, ao norte pelos bairros de Bangu,
Realengo e Madureira, e a leste pelos bairros do Méier, Vila Isabel, Tijuca e São Conrado.
Este âmbito territorial ocupa 24% do território municipal, e 65%17 deste total corres-
pondem a espaços livres que cumprem um papel decisivo na definição espacial da cidade
central, além de serem determinantes para sua qualificação ecológica e para a confor-
mação de suas características visuais mais significativas, o que, entre outros fatores, lhes
outorga uma conotação especial na sua organização espacial.

60
Caracterização da unidade territorial

Região Metropolitana do Rio de


Janeiro (adaptação do mapa da
RMRJ (1994) – Fundação CIDE):
20. Estrato vegetal.
21. Estrato hídrico.
22. Estrato ocupado.
23. Composição geral.

20

21

22

23

61
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Os maciços da pedra Branca e da Tijuca são as duas áreas naturais protegidas mais
importantes da cidade do Rio de Janeiro (além de serem reconhecidos pela UNESCO como
Reservas da Biosfera18), e têm um papel fundamental na estrutura urbana, já que cons-
tituem suas estruturas geográficas internas mais importantes e definem, junto a outras
montanhas e o mar, as planícies que conformam sua fisiografia e suportam seus principais
centros urbanos. Entre os quais, além da unidade de referência, estão: a zona sul e o cen-
tro, que ocupam a planície na vertente leste do Maciço da Tijuca (são áreas de serviços
e moradias do estrato mais rico da população); a zona norte, que ocupa as Baixadas de
Inhaúma e de Irajá, na vertente norte do Maciço da Tijuca (são áreas suburbanas caracte-
rizadas pela moradia e pela indústria), e o resto da zona oeste, que ocupa as Baixadas de
Bangu, Santa Cruz e Guaratiba, nas vertentes norte e oeste do Maciço da Pedra Branca
(cada uma com características funcionais distintas, que abarcam desde as atividades in-
dustriais ao redor da Avenida Brasil até as atividades agropecuárias em Guaratiba).
Sobre a ocupação da unidade influi uma série de interesses públicos e privados, dado
que se trata de uma área que oferece algumas condições de urbanização e turismo ade-
quadas, como os atrativos naturais combinados com a oferta de conexão viária com o
resto do território, a presença de equipamentos metropolitanos e a relativa proximidade
dos centros tradicionais da cidade (Villaça, 1998).
Desde meados dos anos oitenta, este âmbito adquiriu importância como nova centra-
lidade e como alternativa de residência fora dos centros mais congestionados, ao contar
com potentes infra-estruturas viárias, atrair sedes de grandes empresas e atividades ter-
ciárias e apresentar uma produção imobiliária, tanto residencial como de grandes centros
comerciais (Villaça, 1998). Entretanto, isto não exclui a presença de assentamentos irre-
gulares que, paralelamente, conformam um quadro de precariedade e pobreza urbana.
O processo de construção de infra-estruturas viárias que vem sofrendo a unidade
desde os anos setenta reforça os vínculos com o centro da cidade e as zonas norte e sul
e, ao mesmo tempo, significa a potencialização de seu crescimento (industrial, residencial,
comercial e de serviços). Basicamente, a unidade se estrutura através da auto-estrada
Avenida das Américas, paralela ao mar, que conecta a zona sul à zona oeste, da auto-es-
trada Avenida Ayrton Senna e da via-expressa Linha Amarela, que acentuam as conexões
com a zona norte da cidade.

62
Caracterização da unidade territorial

Por causa do próprio processo histórico de urbanização – um lugar de origem rural


que foi objeto específico de um plano moderno executado por Lúcio Costa (1969) e, pos-
teriormente, se transformou em uma área com um dinâmico desenvolvimento urbano – a
unidade territorial apresenta na atualidade complexas relações espaciais na sua organi-
zação urbana, tanto pela existência de formas tradicionais de infra-estruturas viárias e
edificações, como pelo desenvolvimento de novas formas de crescimento, freqüentemente
fechadas e introvertidas (como centros comerciais e moradias com baixa densidade em
âmbito fechado conectadas por vias-expressas) e pela rápida aparição de áreas urbani-
zadas ilegalmente. Nesta realidade, os fortes contrastes sociais se refletem, entre outros
aspectos, na presença de favelas junto a áreas fechadas com moradias de luxo, os con-
domínios, frutos de uma distribuição de renda muito desigual e de um sistema público
deficiente com relação à saúde, à educação, ao transporte e ao saneamento.
De modo geral, o caso de estudo possui algumas características duais, representa-
das tanto pelas singularidades de sua ocupação urbana quanto pelas características de
sua população, o que permite sua divisão em duas partes principais, com características
distintas: a Barra da Tijuca e Jacarepaguá. A Barra da Tijuca ocupa a frente marítima até
o sul dos maciços, coincidindo com o norte das lagoas no centro da planície. É onde se
concentram os principais centros de serviços, uma dinâmica expansão imobiliária e a
população mais rica.
Jacarepaguá, localizado no interior, ocupa a planície desde as lagoas até o encontro
entre os dois maciços. Está estruturado de acordo com os subúrbios industriais da cidade,
tende ao crescimento baseado na transformação desta estrutura inicial e possui uma
população mais pobre, como se comentará mais adiante.
Neste contexto, é possível identificar o espaço livre da unidade territorial, em linhas
gerais, em algumas das seguintes formas: os já consagrados, como as extensões florestais
ou os mangues, muitos deles protegidos pelo planejamento; os de grande extensão ainda
não protegidos e que apresentam certa “amorfia” (considerando sua forma espacial pouco
definida e a tendência à degradação de seu valor ambiental); e os de dimensões mais mo-
destas que se apresentam como fragmentos da urbanização. São espaços com uma grande
qualidade visual e ecológica, muito frágeis dentro do processo de ocupação urbana, sofrendo
a ameaça constante da expansão urbana e de graves problemas ambientais, que abarcam
desde a contaminação das águas até a erosão das encostas e a perda da cobertura vegetal.

63
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

24

25

26

Jacarepaguá

Barra da Tijuca

24. Vista de parte do caso de estudo (Foto: Autora, 2003).


25. Vista aérea do caso de estudo (Foto: Rodrigo Rinaldi, 2001).
26. Localização da Barra da Tijuca e de Jacarepaguá (Mosaico de ortofotos, F.: IPP, 2000).

64
Caracterização da unidade territorial

Em certa medida, estes espaços se conformam a partir da lógica de proteção e iso-


lamento, da reserva especulativa da terra, da exploração agropecuária ou, simplesmente,
como remanescentes dos assentamentos e das vias. Os espaços livres protegidos, neste
marco, cumprem não apenas um papel ambiental importante, como também funcionam
como áreas de controle da ocupação urbana no âmbito. Entre os espaços livres protegidos
se destacam, principalmente, os parques da Pedra Branca, da Tijuca e Marapendi, que
podem ser considerados as peças livres mais relevantes.
Por suas características, tanto relativas a seu encaixe territorial como a suas particu-
laridades internas, se supõe que a atenção intencionada a esta unidade territorial pode
possibilitar uma análise enriquecedora, que permitirá acessar estratégias de projeto desde
a proposta de um sistema de espaços livres como um todo integrado, capaz de atuar
favoravelmente na reestruturação do território.

3B > O suporte biofísico

Relevo e clima

A conformação fisiográfica da área, em forma de anfiteatro, apresenta uma dupla


estrutura:

• As encostas e as conformações rochosas dos maciços. Estas montanhas se loca-


lizam nas partes oeste (Maciço da Pedra Branca) e leste (Maciço da Tijuca), encontram o
mar nos seus extremos, suavizando-se na parte norte, onde se reúnem.

• A planície. A grande planície central está constituída por uma sucessão de reentrâncias
em suas margens, devido à disposição dos maciços. É de formação quaternária e de formato
“triangular”. Está composta por colinas, lagoas e canais e termina no encontro com o mar.

Na realidade, os maciços estão formados por uma série de serras. Entre as serras
dos maciços orientados em direção à área de estudo se encontram as que pertencem ao
Maciço da Pedra Branca (Serra do Engenho Velho, Serra do Barata, Serra do Nogueira,

65
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Serra do Rio Pequeno, Serra do Quilombo, Serra do Caçambê, Serra do Alto do Peri, Serra
de Santa Bárbara, Serra do Rio da Prata, Serra Geral de Guaratiba, Serra do Grumari) e as
que pertencem ao Maciço da Tijuca (Serra do Inácio Dias, Serra dos Pretos Forros, Serra
dos Três Rios e parte da Serra da Carioca). Os cumes são lugares de difícil acesso, geral-
mente muito expostos ao sol e à chuva. São visíveis desde a planície e contêm os pontos
de máxima cota, que na área cartografada são: Pico da Pedra Branca (1.025 m), Morro
da Bandeira (964 m), Pedra do Ponto (938 m), Morro Santa Bárbara (857 m), Pedra do
Quilombo (735 m), Pico do Sacarrão (714 m), Morro dos Caboclos (696 m), Toca Grande
(577 m), Santo Antônio da Bica (482 m), Morro da Boa Vista (456 m), no Maciço da Pedra
Branca; Pico da Tijuca (1.022 m), Bico do Papagaio (989 m), Morro da Cocanha (982 m),
Pedra da Gávea (842 m), Pedra Bonita (696 m), Pretos Forros (482 m), Morro do Inácio
Dias (449 m), no Maciço da Tijuca. A maioria dos pontos mais altos é acessível por trilhas,
através das áreas florestais.
Os pontos de cota mais baixa correspondem ao encontro entre serras e se apresen-
tam como confluências das águas que descem desde os maciços. Estão distribuídos ao
redor das encostas das montanhas seguindo, em geral, a radialidade dos cumes.
A planície apresenta praticamente três subdivisões19: uma parte costeira, outra inter-
mediária, na altura das lagoas e seus canais, e outra no vértice norte da planície. Na pri-
meira, o relevo apresenta pequenas ondulações, geradas por processos de sedimentação
marinha ou eólica; na segunda, a superfície é muito plana; e na terceira, as terras são qua-
se horizontais, com uma suave declividade que converge em direção à linha da costa.
Neste contexto, as colinas presentes na planície constituem elementos destacados da
paisagem, entre as quais se identificam: a Pedra da Panela, o Morro da Freguesia, a Pedra
de Itaúna, o Morro do Amorim, o Morro do Cantagalo, o Morro do Portelo, o Morro do
Urubu e o Pontal de Sernambetiba.
Relativamente ao clima, o caso de estudo possui um microclima típico da região lito-
ral tropical. Além de temperaturas altas, os climas tropicais apresentam uma estação de
chuvas e uma estação seca, como as duas principais estações do ano, e, dependendo do
lugar, podem apresentar variações relacionadas com a latitude, a proximidade do mar, a
topografia e a presença eventual de frentes frias.
Em geral, o período pluviométrico mais intenso é no verão (de dezembro a março)
e o menos intenso no inverno, sendo julho o mês mais seco e janeiro o mais chuvoso. A

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27. Perfis do relevo (A, B e C, respectivamente) (F.: Autora).


28. Mapa do relevo.

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ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

temperatura média anual é de 23,5ºC. A média anual de evaporação alcança os 700 mm,
e a umidade relativa do ar chega a 88% no verão e a 65% no inverno, o que determina
um clima muito úmido grande parte do ano (SMAC, 1998).

Hidrografia

A hidrografia da área pertence ao âmbito da Bacia de Jacarepaguá, que se distribui
por toda a planície e desemboca no oceano. Os cursos de água tendem a ser permanentes
e se conformam de modo radial a partir dos maciços, seguindo a direção das pendentes
até o mar ou a planície. Na planície, seguem como rios e riachos, conformam lagoas e
ilhas e são conduzidos a canais. Na realidade, a presença das águas na unidade tem
uma importância fundamental na sua configuração, e as maiores retenções superficiais
e subterrâneas se estendem por quase toda sua base até a altura das lagoas no meio da
planície. A hidrografia está conformada principalmente por:

• A frente marítima. São águas abertas do oceano Atlântico, em geral com forte movi-
mento de ondas, que se estendem em aproximadamente 20 Km de praias.

• As superfícies lagunares. Representadas pela Lagoa de Jacarepaguá, pela Lagoa da Tiju-


ca (e Camorim), pela Lagoa de Marapendi e pela Lagoinha. São um subproduto das restingas,
isto é, a acumulação de sedimentos que formam cordões no litoral fechando uma porção de
água. Alimentam-se de águas superficiais, predominantemente, e subterrâneas, além do inter-
câmbio com as águas marinhas, que caracteriza seus índices de salinidade (SMAC, 1998).

As lagoas de Jacarepaguá e da Tijuca, por sua posição central na planície e suas


grandes dimensões (as duas lagoas somam um total de 9,3 km2, com 13 km de longitude,
aproximadamente), atuam literalmente como um divisor de águas ao receber e distribuir
as águas que descem dos maciços e dividir a área em duas partes bem marcadas, o que
se reflete na formação das duas regiões administrativas da Barra da Tijuca e de Jacare-
paguá. As principais ilhas presentes nas lagoas são: Ilha da Gigóia, Ilha Primeira, Ilha dos
Pescadores, Ilha do Ribeiro e Ilha Pombeba.

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29. Vista de parte do caso de estudo (Praia e Lagoa de Marapendi) (Foto: Autora, 2003).
30. Mapa da hidrografia.

69
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

A Lagoa de Marapendi, paralela ao mar na porção mais ao sul da planície, se apre-


senta com uma forma alongada de aproximadamente 3,5 km2 de superfície, 10 km de
longitude e 350 m de largura, e está conectada às lagoas de Jacarepaguá e da Tijuca.
A Lagoinha completa o quadro lagunar. Encontra-se dentro do Parque Chico Mendes,
possui baixos índices de salinidade e está ligada à Lagoa de Marapendi.

• Os canais lagunares. Os principais são o Canal da Joatinga, no extremo leste, o Canal


de Sernambetiba, no extremo oeste, ambos perpendiculares às lagoas, o Canal do Portelo,
o Canal do Urubu e o Canal do Cortado a oeste, dispostos em forma longitudinal, e o
Canal de Marapendi e o Canal das Taxas, que cortam a Lagoa de Marapendi longitudinal-
mente. Na sua maioria são artificiais, construídos com o objetivo de melhorar a drenagem
da área que se estende entre as lagoas e o mar, que apresenta cotas muito baixas com
grande acumulação de água superficial e subterrânea. Na planície, o Canal de Sernambe-
tiba e o Canal da Joatinga, constituem os principais leitos de deságüe no mar.

• Os rios. A Baixada de Jacarepaguá compreende as reentrâncias que se formam entre


as serras dos maciços, que coincidem com os leitos dos rios e riachos. Os rios desenham
o território desde os maciços, seguindo as características topográficas do lugar, desembo-
cam nas lagoas e, finalmente, no mar. Os cursos dos rios delimitam duas zonas na planície:
uma superior e uma inferior às lagoas da Tijuca e de Jacarepaguá; em ambas predominam
cursos contínuos de águas transversais e radiais. Em geral, os leitos dos rios são estreitos
e de pequenas dimensões.

Principais comunidades vegetais

A fisiografia da área, junto às características da hidrografia, aos solos e ao clima, de-


termina a existência de uma grande diversidade de comunidades vegetais de inestimável
valor ecológico, relacionados com o mar, as lagoas, as áreas úmidas e inundáveis, os rios
e as montanhas20.
Entre elas podemos destacar21:

• Floresta. Área de floresta densa, pouco alterada ou totalmente recuperada, geralmen-


te nas cotas mais altas dos maciços, embora ainda existam algumas áreas próximas à cota
100, sobretudo na vertente sul do Maciço da Pedra Branca. São áreas remanescentes das

70
Caracterização da unidade territorial

atividades antrópicas no meio ou restituídas em função das mesmas. Constituem reser-


vas florestais de grande valor ecológico e uma parte significativa do patrimônio natural
da cidade. O estrato arbóreo apresenta distintas alturas, onde árvores de 30m, ou mais,
compõem o estrato superior.

• Floresta secundária. Inclui vários tipos de estratos arbóreos e espécies introduzidas


posteriormente na floresta de origem. Corresponde a grande parte da área dos maciços,
com presenças isoladas na planície, onde em muitos casos estão acompanhadas por um
afloramento rochoso. Na maioria dos casos estas áreas constituem as fronteiras entre os
maciços e a área urbana, e são importantes reservas do meio biótico.

• Floresta degradada. Corresponde a áreas desmatadas. Encontra-se em algumas en-


costas dos maciços e apresenta um estado avançado de degradação relativo à floresta de
origem. Localiza-se, principalmente, nas partes superiores da vertente leste do Maciço da
Pedra Branca, e oeste do Maciço da Tijuca.

• Mangue. É um tipo de comunidade vegetal presente ao redor das lagoas, de porte


arbustivo-arbóreo. Na atualidade são encontrados em áreas bastante reduzidas, tais como
faixas relativamente estreitas nas margens das lagoas da Tijuca e de Jacarepaguá, e em
algumas áreas da Lagoa de Marapendi. Corresponde a um ecossistema muito particular e
frágil, adaptado à alta salinidade e à mobilidade das águas.

• Brejo. É uma área permanentemente úmida, com vegetação de porte herbáceo. Trata-
se de um ecossistema muito frágil e, devido a antropização intensiva, em geral encontra-
se reduzido às margens dos canais e dos rios ou como manchas dispersas no meio de
outras áreas inundadas próximo ao Maciço da Pedra Branca, a oeste da planície.

• Vegetação em área inundável. Área de vegetação que se desenvolve em solos


inundados ou susceptíveis à inundação, em geral com porte herbáceo. O grau de umidade
varia segundo a drenagem, a proximidade das águas subterrâneas, a presença de aterros
e as chuvas. De acordo com os níveis das águas, se produzem variações na vegetação.
Encontra-se ao redor das lagoas da Tijuca e de Jacarepaguá e de seus principais canais, a
oeste da unidade territorial, como conseqüência das baixas cotas das terras da planície.

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31. Vista de parte do caso de estudo (Campos de Sernambetiba) (Foto: Autora, 2003).
32. Mapa das principais comunidades vegetais.

72
Caracterização da unidade territorial

• Restinga. Área de vegetação típica da costa, que cresce em solos arenosos e possui porte
arbóreo-arbustivo e arbustivo-herbáceo relativamente denso. Ocupa uma grande área na
porção inferior da planície, junto à Lagoa de Marapendi e seus canais. Apresenta fauna e
flora adaptadas às altas temperaturas, aos ventos e aos solos pobres em nutrientes.

• Campo antrópico. Corresponde a áreas geralmente compostas por vegetação de


baixo porte, como grama, capim ou floresta em regeneração. A maioria destas áreas se
encontra na parte oeste da planície e na vertente sul do Maciço da Pedra Branca. Ocupam
as cotas mais baixas, embora em algumas áreas cheguem até a cota 100.

• Cultivo. Corresponde a áreas de cultivos agrícolas de subsistência, de flores e de bana-


na, predominantemente. Concentram-se na parte oeste da unidade e se relacionam dire-
tamente com as condições de relevo. As plantações de banana estão mais concentradas
nas encostas do Maciço da Pedra Branca, e os demais cultivos na planície.

• Jardim. Corresponde à vegetação arbóreo-arbustiva e arbustivo-herbácea cultivada


nos parques ou outros espaços destinados à recreação e à ornamentação. Distribui-se por
toda a planície.

3C > As infra-estruturas e os usos do solo

Infra-estruturas:
Viárias, de serviços e de transporte coletivo

A organização espacial da rede viária estabelece vínculos estreitos com o suporte ter-
ritorial, sobretudo com o relevo e as águas. Apresenta distintas escalas de vias e conexões,
como também diferentes localizações, seções e capacidade de suporte de fluxos de veículos.
A partir destas variáveis se identificam três níveis de redes viárias: a rede principal de conexão
com a cidade e sua região; a rede secundária de vias, que conecta o caso de estudo com seu
entorno; e a rede geral de ruas de conexão entre a rede secundária de estradas e os bairros.
A rede principal de conexão com a cidade e sua região está constituída pelas auto-
estradas e a via-expressa, cujos percursos perpendiculares se localizam paralelamente à
linha da costa, entre o mar e a lagoa (a auto-estrada Avenida das Américas), e a partir da

73
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

linha da costa para o interior, entre as lagoas (a auto-estrada Avenida Ayrton Senna e a
via-expressa Linha Amarela). Os principais pontos de acesso de ambas vias são os túneis
que cortam o Maciço da Tijuca. Seu encontro é definido por uma rotunda de distribuição
de tráfico, chamada Trevo das Palmeiras.
Quanto às secções, na via-expressa Linha Amarela elas são constantes, apresentando
duas vias com três pistas em cada direção. Sua capacidade de fluxo é praticamente ho-
mogênea, com pequenas variações em alguns trechos relacionados com a demanda de
mobilidade do entorno.
A auto-estrada permite o deslocamento direto, praticamente sem interrupções, o que
reduz o tempo de percurso. Ao mesmo tempo, este canal expresso de mobilidade, de acor-
do com sua morfologia, estabelece poucos contatos com seu entorno; especificamente, os
pontos de contato se resumem aos nós de acessibilidade e às vias derivadas deles.
As secções da auto-estrada Avenida Ayrton Senna também são bastante homogêne-
as, com algumas variações no trajeto quanto ao número de pistas: duas vias centrais, com
três ou quatro pistas, e duas laterais, com duas ou três pistas. Embora também priorize o
tráfego rápido, em comparação com a auto-estrada, esta via apresenta um caráter mais
“aberto”, mais relacionado com seu entorno, pela localização das edificações em contato
direto com esta. Entretanto, devido a sua largura, as duas laterais se relacionam pouco
entre si. Nos últimos anos, por iniciativa do setor público, criaram-se ciclovias nas laterais
e no espaço central; um incentivo ao uso da bicicleta como transporte alternativo, apesar
de não ter obtido muito êxito. Nas respostas às entrevistas constatou-se a forte depen-
dência do uso do automóvel, em um lugar onde os deslocamentos são quilométricos e
vias como esta não são convidativas à presença humana.
A secção da auto-estrada Avenida das Américas é similar à da auto-estrada Avenida
Ayrton Senna, embora sofra mais variações no seu percurso. As mais notáveis são:

• A transformação da auto-estrada, com duas vias centrais, com três ou quatro pistas, e
duas laterais, com duas ou três pistas, em duas vias com seis pistas cada uma (a partir da
Avenida Salvador Allende).

• A transformação da auto-estrada, com duas vias com seis pistas cada uma, numa estra-
da de mão dupla com duas pistas (depois da estrada Vereador Alceu de Carvalho).

74
Caracterização da unidade territorial

A circulação na Avenida das Américas varia entre 116.843 veículos/dia22 no primeiro


trecho citado, 61.441 no segundo trecho, e 7.959 no terceiro trecho, claramente com
pouco tráfego. Algo parecido ocorre com o transporte público, cujo volume de circulação
é maior no primeiro trecho (7.051 veículos/dia), reduz ligeiramente no segundo (6.813
veículos/dia) e drasticamente no terceiro (1.528 veículos/dia).
Cabe ressaltar que a Avenida das Américas, que começa como uma auto-estrada e
termina como uma estrada de dimensões mais modestas, não se encontra totalmente
consolidada, coincidindo o último trecho da via com a parte da unidade estudada onde a
ocupação urbana é mais escassa.
Em geral, as características morfológicas da Avenida das Américas, inclusive as pro-
postas de implantação das ciclovias e a pouca aceitação por parte da população, coinci-
dem com as que são apresentadas na Avenida Ayrton Senna.
A rede secundária de vias, que conecta o caso de estudo com seu entorno, apre-
senta vias que se entrelaçam na planície e nas margens dos maciços, permitindo identifi-
car as seguintes situações:

• Vias de contorno dos maciços: Estrada dos Bandeirantes, Estrada de Jacarepaguá, Estra-
da do Pontal e Avenida Estado da Guanabara.

• Vias de corte dos Maciços: Estrada dos Teixeiras, Estrada do Catonho, Estrada de Furnas,
Estrada do Joá, Estrada Grajaú-Jacarepaguá e Rua Cândido Benício.

• Vias diagonais: Avenida Salvador Allende.

• Vias longitudinais: Avenida Lúcio Costa, Avenida Embaixador Abelardo Bueno, Estrada
da Boiúna, Estrada do Cafundá, Estrada do Rio Grande, Estrada do Tindiba e Estrada do
Pau Ferro.

As secções das vias costumam ser homogêneas em todo seu percurso, com exceção de
algumas estradas. Entretanto, podem ser identificados dois tipos de secções:

• As de mão-dupla com duas pistas cada uma.

• As de mão-dupla com uma pista cada uma.

75
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Quanto ao volume de tráfego, este tende a variar de acordo com o entorno e seu grau
de urbanização. No caso da Estrada dos Bandeirantes, por exemplo, nos bairros mais urba-
nizados, o fluxo de veículos, por dia, pode chegar a 57.136, enquanto nos bairros pouco
urbanizados, este mesmo índice cai para aproximadamente 6.115. Do mesmo modo, a circu-
lação do transporte público varia entre 9.305 veículos por dia, nos bairros mais urbanizados,
e 1.188 em outros trechos.
As vias da rede secundária diferem das anteriores, principalmente pela largura e por
seu caráter mais dirigido ao deslocamento local, permitindo a presença de pedestres e
bicicletas. Isto induz a velocidades muito mais reduzidas e a uma maior proximidade e
relação com os assentamentos nas suas laterais.
A rede geral de ruas, que conecta a rede secundária de vias e os bairros, possui
situações variadas, com menor capacidade de suporte de fluxo de veículos e, geralmente,
secções mais reduzidas que as outras vias citadas (embora algumas estejam superdimen-
sionadas com respeito à demanda de tráfego). Compõe-se das ruas principais dos bairros
e da rede geral de ruas. Algumas das vias ainda não se encontram totalmente urbaniza-
das, embora o setor público venha incentivando obras de melhoria e criação de ciclovias.
Entre as ruas principais cabe destacar: Avenida Zilke Machado, Avenida Gláucio Gil e Ave-
nida Alfredo Balthazar da Silveira, no Recreio dos Bandeirantes; Avenida Olegário Maciel
e Avenida Rodolfo Amoedo, no Jardim Oceânico; Rua André Rocha, na Taquara; Rua Edgar
Werneck e Geremário Dantas, na Freguesia; Estrada Benvindo de Novaes e Vereador Alceu
de Carvalho, em Vargem Pequena e Vargem Grande, respectivamente.
Quanto às vias previstas, podem ser identificadas as seguintes iniciativas:

• Estradas estatais e municipais. A serem executadas de acordo com o Departamento de


Estradas e Rodagens do Estado do Rio de Janeiro (DER)23, entre elas estão a RJ-075, a
RJ-089, a RJ-091, a RJ-240 e RJ-120.

• Ruas. Segundo determinação do Decreto No. 3.046, estão previstas as vias No. 2, 4 e
7, do projeto de alinhamento (PA) 8.997, e a via parque, parte já construída, presente no
projeto de alinhamento (PA) 9.822.

• Propostas de vias em processo de definição e/ou aprovação24:


– Anel viário. O anel viário da cidade do Rio de Janeiro é um projeto da Secretaria de Trans-
porte do Município, que objetiva conectar as principais vias perimetrais da cidade, facilitando o

76
33 34 35

36

33. Linha Amarela (Foto: Autora, 2003).


34. Avenida das Américas (Foto: Autora, 2003).
35. Exemplo de rua principal (Foto: Autora, 2003).
36. Mapa das infra-estruturas viárias.

77
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

acesso desde a zona sul até a zona oeste. No caso de estudo, especificamente, afeta a Avenida
das Américas, a Avenida Ayrton Senna e a via-expressa Linha Amarela, e segue algumas das
previsões já aprovadas para estradas e ruas, por exemplo, a RJ-091, a RJ-075 e a via 5. O pro-
jeto ainda está em execução e até agora conta com propostas preliminares.
– Obras para os Jogos Panamericanos (2007). Estão previstas modificações na Es-
trada dos Bandeirantes, e melhorias na Avenida Ayrton Senna, assim como a criação de
ciclovias, aumentando a rede já existente.

Resumindo, a rede viária da unidade está bem distribuída e apresenta conexões com
outras partes da cidade e sua região, caracterizando a boa acessibilidade da área. Entre-
tanto, as principais vias da rede principal se encontram “estranguladas” nos túneis que
cortam os maciços, onde a interrupção do tráfego costuma causar problemas em toda a
mobilidade da área.
No que tange à infra-estrutura de serviços, se constata que o rápido crescimento
urbano do caso de estudo não foi acompanhado por uma adequada rede de abasteci-
mento de água e de esgoto, além de apresentar muitos problemas de drenagem, devido
à topografia com cotas muito baixas em algumas áreas, inclusive abaixo do nível do mar.
Da mesma forma, a distribuição de energia elétrica é deficiente, principalmente nas áreas
menos acessíveis dos maciços, e, com freqüência, se estabelecem conexões clandestinas
na rede de energia, a maioria em áreas de ocupação ilegal.
Grande parte das estações de tratamento de água é particular, e a maioria dos resí-
duos é armazenada em fossas, ou vai diretamente para as lagoas e cursos de água, que
aumentam, assim, sua contaminação, originando graves problemas relacionados com a
ecologia do lugar. Por outro lado, existem conexões clandestinas que enviam as águas
residuais diretamente para a rede de águas pluviais, transformando os cursos de água em
esgotos a céu aberto.
A deficiente infra-estrutura de serviços, um dos maiores problemas da área, foi objeto
de algumas iniciativas realizadas pelo setor público nos últimos tempos, como, por exem-
plo, o emissário submarino, ainda não concluído.
Paralelamente a isto, cabe ressaltar a problemática gerada pela coleta insatisfatória dos
resíduos sólidos no caso de estudo, que vão parar nos espaços livres existentes, afetando
as águas e os solos da unidade. No caso das águas, o lixo colabora para sua contaminação

78
Caracterização da unidade territorial

e também para a proliferação de doenças e outros problemas. Sobre esta questão, falta
uma política eficiente de coleta e reciclagem seletiva do lixo, esta última praticamente
inexistente até o momento.
Quanto ao transporte público coletivo, a maioria dos deslocamentos se realiza através
de ônibus e vans. O terminal Alvorada é o principal terminal de ônibus da unidade e se
encontra na rotunda onde confluem a Avenida das Américas e a Avenida Ayrton Senna. Os
condomínios (áreas residenciais com população de alto poder aquisitivo) dispõem de trans-
porte coletivo privado. Em geral, a área apresenta carências na oferta de transporte público,
que é inferior à demanda da população. Neste sentido, as previsões se referem às novas
possibilidades de acesso através de VLT (veículo leve sobre trilho), metrô, barca e corredores
exclusivos para ônibus. Entretanto, as propostas de infra-estruturas de transporte coletivo,
ainda em processo de definição e/ou aprovação25, são somente as linhas 4 e 6 do metrô. A
linha 4 prevê a conexão da Barra da Tijuca com a zona sul, através de um percurso superficial
na Avenida das Américas, a linha 6 prevê a conexão da Barra da Tijuca com a zona norte da
cidade com alguns trechos superficiais, como, por exemplo, na Avenida Ayrton Senna.
Numa unidade territorial onde predominam os deslocamentos de carro, se destaca
a importância de melhorar a oferta de transporte coletivo e de promover formas alter-
nativas de transporte, como a bicicleta ou o VLT, para os percursos dentro da unidade,
e o transporte marítimo, para os acessos externos. Melhorar as condições de transporte
público implicaria em melhores condições ambientais e sociais, uma vez que contribuiria
para diminuir os índices de contaminação e proporcionaria a democratização da rede de
transporte ao oferecer oportunidades mais eqüitativas para o deslocamento e o acesso
das pessoas, numa área onde as desigualdades sociais são muito acentuadas.

Usos do solo

A observação dos usos do solo no caso de estudo revela que, em geral, os usos
comerciais e os serviços se distribuem pelas áreas mais ocupadas, tanto nas áreas pró-
ximas ao mar como no interior, sobretudo perto dos principais centros locais e ao redor
das principais vias. A extensão da Avenida das Américas, desde o Maciço da Tijuca até,
aproximadamente, o encontro com a Avenida Ayrton Senna, constitui o principal eixo de

79
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

comércio e serviços da Barra da Tijuca. Os centros comerciais e as grandes estruturas desti-


nadas ao lazer são as principais concentrações terciárias deste trecho e sua distribuição se
estende pela Avenida Ayrton Senna, conformando um pool de comércios e serviços. Alguns
centros comerciais (Barra Shopping, Downtown) são representativos de centralidades26 na
área, devido a suas características funcionais. Em Jacarepaguá, o comércio e os serviços
estão mais dispersos, embora se identifiquem grandes concentrações próximas do centro
da Taquara e da Freguesia. Entre estes dois centros, a Rua Geremário Dantas constitui o
principal eixo de comércio e serviços.
As indústrias se concentram, prioritariamente, em Jacarepaguá, e conformam a zona
industrial da unidade, embora também existam indústrias nas margens do Maciço da Pe-
dra Branca, em Vargem Pequena. Em geral, as indústrias estão voltadas para a produção
de produtos farmacêuticos, bebida, reciclagem de lixo, entre outros.
A clara zonificação dos usos terciários e industriais expressa as determinações do
planejamento, que tendem à setorização dos usos na sua distribuição pela unidade ter-
ritorial, o que conduz à conformação de poucos tecidos urbanos com usos mistos e à
conseguinte falta de autonomia funcional dos núcleos edificados.
Os usos residenciais ocupam grande parte dos assentamentos da unidade, seja em
áreas próximas ao mar, no interior da planície e nas margens dos maciços. Na Barra da
Tijuca, as moradias multifamiliares conformam blocos diferenciados, claramente perceptí-
veis nos dois extremos próximos ao mar, e em algumas áreas nos espaços intermediários.

37 38

37 e 38. Vista aérea de parte da Barra da Tijuca (Foto: Rodrigo Rinaldi, 2001).

80
39 40

41

39. Riocentro (Foto: Rodrigo Rinaldi, 2001).


40. Vista aérea das margens da Lagoa da Tijuca (Foto: Rodrigo Rinaldi, 2001).
41. Mapa dos usos do solo e centralidades.

81
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Comparativamente às moradias unifamiliares, as multifamiliares são em maior número.


Em Jacarepaguá, ao contrário, predominam as moradias unifamiliares, com algumas con-
centrações de moradias multifamiliares situadas, sobretudo, entre os principais centros
citados anteriormente. A oeste da planície, as moradias unifamiliares se encontram dis-
persas, conformando uma área pouco ocupada, embora a tendência seja a reconversão
dos espaços livres dedicados a usos agropecuários em áreas para a ocupação urbana
(Bicalho, 1992)27. Nas margens dos maciços e, cada vez mais, em seu interior, se observam
moradias unifamiliares.
Neste marco, as favelas e os loteamentos irregulares se distribuem de forma hetero-
gênea pela área, embora estejam mais concentrados em Jacarepaguá, e apresentem uma
forte tendência à proliferação. A urbanização informal das favelas se encontra dispersa
tanto na planície como nas montanhas; geralmente ocupam os locais mais desvalorizados
em termos imobiliários ou aqueles adversos à ocupação urbana pelas condições do relevo
ou da água. Nas montanhas, costumam se localizar em terrenos pouco adequados à edi-
ficação, sobretudo por causa das encostas acentuadas, onde coexistem, paradoxalmente,
com moradias unifamiliares de luxo (Lobato, 1992).
Os equipamentos menores, como escolas, igrejas, bibliotecas, etc., estão distri-
buídos por todo o âmbito, embora sejam mais deficientes a oeste da planície e em
Jacarepaguá. As concentrações dos equipamentos de maior envergadura se situam ao
redor das lagoas, na Avenida Ayrton Senna, e na margem oeste do Maciço da Pedra
Branca. Às margens do maciço se localizam principalmente hospitais, que aproveitam
as condições naturais do lugar. Merecem destaque os equipamentos metropolitanos
representados pelo centro de feiras e exposições Riocentro, o autódromo Nelson Piquet
e o aeroporto, nas margens das lagoas de Jacarepaguá e da Tijuca. De certo modo, estes
equipamentos, localizados no centro da unidade, reforçam sua posição central e servem
como ponto de atração entre ambas as partes da área, Barra da Tijuca e Jacarepaguá.
Ao mesmo tempo em que, junto a outros centros comerciais e de serviços de alcance
metropolitano, denotam a centralidade geográfica da unidade em relação à metrópole,
como centralidade funcional.

82
Caracterização da unidade territorial

3D > As características populacionais

Para identificar as características da população no caso de estudo analisaram-se os


dados contidos no Anuário Estatístico da Cidade do Rio de Janeiro, de 1998, e os dados
da publicação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do ano 2000 (http:/
www.ibge.gov.br).
Dos 743.634 habitantes da unidade territorial, a maioria se concentra em Jacarepa-
guá, o que corresponde a aproximadamente 80% deste total. Na região administrativa
de Jacarepaguá, os bairros de Jacarepaguá,Taquara, Freguesia e Praça Seca são os mais
povoados, com 60% de sua população. Na região administrativa da Barra da Tijuca, os
bairros da Barra da Tijuca e de Grumari são os mais representativos quanto ao número
populacional, correspondendo-lhes 63% e 15%, respectivamente, do total.
As taxas geométricas de crescimento anual também variam de acordo com a região
administrativa. A Barra da Tijuca apresenta uma taxa de 6,58, enquanto Jacarepaguá
possui uma taxa de 2,13 e, por último, Cidade de Deus tem uma taxa de crescimento ne-
gativo, de –0,06. Comprova-se, assim, a tendência ao forte crescimento urbano da Barra
da Tijuca relativo a outras partes da unidade.
Entretanto, grande parte do caso de estudo apresenta densidades populacionais
muito baixas, com uma média aproximada de 10 habitantes/ha, na Barra da Tijuca, e 46
habitantes/ha, em Jacarepaguá. As densidades mais elevadas ocorrem nas favelas e nos
bairros mais populosos de Jacarepaguá, onde variam de 103 a 268 habitantes/ha.
Contrariamente, a densidade construída é muito variável. Em Jacarepaguá, a densi-
dade das construções chega a 792,91 m2/ha, e na Barra da Tijuca, a 468,83 m2/ha, o que
significa, praticamente, a metade. Este dado comprova estatisticamente uma realidade
que a partir da observação do estrato construído (fig.42) já se pode intuir. Neste sentido,
num contexto de baixas densidades, se considera-se somente a questão quantitativa, não
se justificaria uma aposta pela ocupação de mais espaços livres como primeira alternativa
para o desenvolvimento urbano. Cabe ressaltar, entretanto, as fortes pressões da edifica-
ção na unidade, que entre 1990 e 2000 passou de 924 novas moradias construídas para
um total de 28.707, apresentando nestes dez anos um crescimento exponencial.

83
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Quanto ao perfil dos residentes, em geral, o âmbito apresenta uma grande concen-
tração de população jovem (25% do total) e população produtiva (15 a 60 anos), que
chega a 67% do total, enquanto as pessoas mais velhas representam somente 8%. Este
dado poderia ser explicado pela cronologia de formação dos tecidos urbanos, já que é
uma área com um desenvolvimento urbano mais acentuado relativamente recente (a
partir de 1970), e que por suas características específicas, acabou por não atrair a popu-
lação de maior idade.
Relativo ao nível de instrução, a média dos anos de estudo (do cabeça de família) se
diferencia ligeiramente entre as regiões administrativas da Barra da Tijuca e de Jacarepaguá.
Na Barra da Tijuca esta média alcança os 10,91 anos, e em Jacarepaguá, os 8,33 anos, en-
quanto que na Cidade de Deus a média cai para 5,03 anos. De fato, os dados da Cidade de
Deus se aproximam da realidade da baixa escolaridade existente nas favelas da área.
O nível de renda dos habitantes revela uma diferença fundamental entre as regiões ad-
ministrativas. A Barra da Tijuca possui os índices mais elevados, aproximadamente 85% da
população tem uma renda acima de três salários mínimos28, em Jacarepaguá esta realidade
corresponde apenas a 50% dos habitantes, enquanto que na Cidade de Deus a média cai
para 30%. As atividades terciárias e de construção imobiliária destacam-se na economia
local, seguidas das industriais. A agricultura e a pecuária são as menos representativas em
termos gerais, e o turismo se apresenta como uma atividade em crescimento.
Estes dados indicam as desigualdades econômicas existentes no caso de estudo. Tam-
bém confirmam a existência das favelas como verdadeiros núcleos de pobreza o que, em
parte, caracteriza a segregação social a que está submetida a comunidade local. Neste
contexto, a desigualdade social, com uma desequilibrada distribuição das oportunidades
de desenvolvimento, tende a agravar um quadro de insegurança urbana que se desenvol-
veu ainda mais nos últimos anos, com um aumento da taxa de criminalidade em propor-
ção inversa à capacidade de vigilância e controle social.
Nas entrevistas realizadas, os discursos refletem a desigualdade social, onde os distin-
tos estratos sociais dificilmente conversam entre si, e possuem necessidades e objetivos,
muitas vezes, divergentes. Entretanto, estes discursos convergem em alguns pontos, que
podem ter uma relação direta ou indireta com os espaços livres. Por exemplo, a defesa
comum do uso da água de modo sustentável e com melhores condições de saneamento;

84
42

42. Mapa do estrato construído.

85
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

a previsão de um uso adequado dos espaços livres protegidos, freqüentemente relegados


à sua própria sorte; a necessidade de um transporte público eficiente; a maior eficiência
no recolhimento do lixo; uma maior segurança pública, e a proibição da ocupação urbana
ilegal, da invasão irregular de espaços livres, protegidos ou não. Em geral, a comunidade é
sensível à necessidade de proteção ecológica e dos marcos visuais da área, sendo esta uma
das principais preocupações de diversas organizações não-governamentais da cidade.

Notas
12
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), URL <http:/www.ibge.gov.br> (consultada
em agosto de 2003).
13
A configuração geográfica do Rio e sua região próxima responde a um relevo e a uma hidrografia
particulares. As montanhas, as planícies e as águas são padrões constantes em sua geografia, chegando a
constituir os grandes eixos condutores das principais relações territoriais entre os assentamentos e as infra-
estruturas viárias.
A peculiaridade de seu litoral, entre o mar aberto e a baía, definiu as primeiras ocupações em terras
mais protegidas no seu interior, que resultou na localização atual do centro tradicional da metrópole. Por
outro lado, a água acumulada nas planícies próximas ao mar, nas lagoas e mangues, foi, ao longo da história,
e ainda o é na atualidade, um dos principais obstáculos para a construção dos assentamentos e das infra-
estruturas, e deu origem a uma necessária transformação da paisagem, entre aterros e modificação dos cursos
d`água, a fim de possibilitar a consolidação urbana (Amador, 1992).
Neste marco, as montanhas exerceram um importante papel como elementos condutores da urbaniza-
ção, além de constituírem verdadeiros pulmões urbanos. Historicamente, os maciços montanhosos atuaram
como um fator negativo na expansão urbana, como barreiras à urbanização, numa realidade que, freqüen-
temente, utilizou os rios, o litoral e as margens das principais infra-estruturas viárias que circundavam as
montanhas na planície, como diretrizes para a ocupação da metrópole (Abreu, 1992).
14
A observação da ocupação atual da região, a partir de infra-estruturas viárias e assentamentos, que
foram colonizando os espaços rurais e naturais, permite detectar alguns eixos de sua estrutura urbana ainda
não consolidada, com atenção aos fatores de acessibilidade e às principais atividades que sustentam a ocu-
pação (Abreu, 1992; Amador, 1992; Lobato, 1992; entre outros). Entre eles estão:

• A Baixada Fluminense. O centro tradicional da metrópole, assim como a zona sul e a zona norte da
cidade central, são áreas amplamente consolidadas. Historicamente, a partir desta última se originou um
continuum urbano em direção às cidades vizinhas, onde os eixos das estradas Presidente Dutra (principal
conexão entre Rio e São Paulo) e Washington Luis, junto a linha férrea e às estradas de menor porte, são

86
Caracterização da unidade territorial

os principais orientadores da ocupação da grande planície da Baixada Fluminense. Esta área se caracteriza,
principalmente, pela atividade industrial.

• O eixo Niterói-Manilha e a região oceânica de Niterói. No leste, a ocupação urbana segue, praticamente, o
percurso da estrada Niterói-Manilha, com vocação industrial, e a frente litoral, a partir da cidade de Niterói
até a cidade de Maricá, com uma forte vocação turística.

• O eixo da Avenida Brasil e a Baixada de Jacarepaguá. Na zona oeste da cidade central se verifica a ocupação
dos terrenos ao redor da Avenida Brasil e da linha férrea, com usos industriais, e da Baixada de Jacarepaguá,
entre os maciços da Pedra Branca e da Tijuca, com a expansão do setor terciário e a produção de moradias,
como as atividades mais destacadas, principalmente nas áreas mais próximas ao mar.

15
Fonte: SMAC, 2000.

16
Fonte: Anuário Estatístico da Cidade do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Prefeitura da cidade do Rio de
Janeiro, Instituto Pereira Passos, 1998.

17
Fonte: SMAC, 2000.

18
Os maciços são parte da área que compreende o Consórcio Mata Atlântica no Brasil como Reserva
da Biosfera (1992), cujo âmbito inclui um amplo conjunto de áreas de mata atlântica em diversos estados
brasileiros, inclusive o Rio de Janeiro.

19
Fonte: Estudo e caracterização dos solos. Rio de Janeiro: Centro Nacional de Pesquisa de Solos da
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), 2001.

20
Fonte dos dados: Mapeamento e caracterização do uso das terras e cobertura vegetal no Município do
Rio de Janeiro entre os anos 1984 e 1999. Rio de Janeiro: Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, SMAC, 2000;
Mapa de usos do solo e cobertura vegetal (folhas 2744-4 e 2745-3) (esc: 1:50.000). Rio de Janeiro: Estado
de Rio do Janeiro, Fundação CIDE, 1999; Mapeamento digital da cidade do Rio de Janeiro (esc: 1:2.000). Rio
de Janeiro: Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, IPP, 1997.

21
As comunidades vegetais compreendidas pelos brejos, os cultivos e os jardins foram desmembradas
das categorias originais contidas em SMAC (2000), a partir do detalhe na escala 1:2.000 segundo a cartogra-
fia digital do Instituto Pereira Passos (1997).

22
Dados do mês de outubro de 2000, obtidos na Secretaria de Transporte da Prefeitura da cidade do
Rio de Janeiro.

23
Segundo informações obtidas até julho de 2003.

24
Informações obtidas em entrevistas com os profissionais responsáveis pelos projetos e através de
material publicado pelas devidas instâncias da Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro.

87
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

25
Informações obtidas em entrevistas com os profissionais responsáveis pelos projetos e através de
material publicado pelas devidas instâncias da Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro.
26
Como centralidades se entende algumas zonas dos assentamentos com grande potencial de atração,
que se consolidaram na evolução urbana do lugar como polarizadoras de certas atividades como, por exem-
plo, o comércio.
27
“A reconversão urbana é intensa a oeste da baixada, no contato com a serra de Guaratiba, numa situ-
ação de piemonte. Os sítios estão num processo avançado de transformação em residências, sedes campestres
de colégios e empresas, havendo a presença de alguns haras” (Bicalho, 1992, p.308).
28
O salário mínimo em 2003 era de aproximadamente 80 US$.

88
4
Evolução urbana e espaços
livres a analisar

Neste capítulo são analisadas as transformações dos espaços livres no processo evo-
lutivo do território estudado, com o objetivo de identificar o papel que desempenharam
na configuração da ocupação urbana da área e as relações espaciais e funcionais que se
estabeleceram com:

• O planejamento. O tratamento dispensado pelos planos aos espaços livres e sua


influência na configuração destes.

• As infra-estruturas viárias. A expansão das infra-estruturas viárias e a possibilidade


de ocupação urbana do território, ao mesmo tempo em que se produz a fragmentação
dos espaços livres.

• Os assentamentos. A expansão edificada e o surgimento de novas tipologias e ocu-


pações, como um fator para refletir sobre a mutação dos espaços livres.

O marco temporal adotado nesta análise aborda os fatos ocorridos em três períodos,
claramente diferenciados quanto às formas de interpretar e construir o território:

• Etapa 1: colonização (até 1940). Etapa rural e processo de colonização do espaço livre.

• Etapa 2: subtração (1940-1970). Etapa suburbana e realização do Plano Piloto.

89
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

• Etapa 3: fragmentação (1970-2000). Processo de fragmentação do espaço livre e


introdução de novas formas de crescimento urbano.

Desta maneira, é possível averiguar e compreender como as infra-estruturas viárias,


o planejamento e os assentamentos contribuíram para a insularização e degeneração dos
espaços livres, e sob quais processos de ocupação do solo permanecem como tais.

4A > Etapa 1: colonização (até 1940)

A configuração do território neste período apresenta mudanças fundamentais, que


vão desde a situação rural existente na unidade territorial há séculos, até o início de uma
urbanização de caráter suburbano, iniciada pela expansão da cidade do Rio de Janeiro
(capital do país desde o séc. XVIII) para fora do seu centro tradicional.
Até os anos quarenta, a área de estudo apresentava um caráter estritamente rural, de
difícil acesso por terra, devido à presença dos maciços. Mantinha-se imune ao crescimento da
cidade, que se dirigia para as terras suburbanas da zona norte, através do desenvolvimento
industrial ao redor da linha férrea, presente desde o final do séc. XIX. A linha férrea penetrava
entre as montanhas e permitia a ocupação das planícies. A unidade territorial, junto à zona
oeste, constituía, até então, a área rural da cidade, com tímidas urbanizações e uma impor-
tante produção de alimentos que abastecia a área central, já consolidada (Abreu, 1987).

O planejamento

Nos anos trinta se levou a cabo o primeiro plano diretor da cidade, realizado pelo
urbanista francês Alfred Agache. O plano abarcava as áreas próximas ao centro da cidade,
sem alcançar a zona oeste, embora previsse a relação do crescimento da cidade com o
oeste, incluindo a área de estudo. Na unidade, o plano propunha a criação do Parque
Nacional da Tijuca, no Maciço da Tijuca, e também a criação de reservas “mais afastadas”
que interessariam ao futuro da cidade, entre as quais estavam os arredores das lagoas da
Baixada de Jacarepaguá29.
Tratava-se de um plano baseado em princípios de embelezamento e higiene urbanos,
e apostava em uma política territorial de espaços livres que poderia, inclusive, se estender

90
Evolução urbana e espaços livres a analisar

até as cidades do entorno do Rio, como um dado fundamental para o futuro desenvolvi-
mento da cidade.

“… insistimos novamente sobre a necessidade, para os poderes municipais,


de aplicar com vigor uma política territorial de espaços livres, de estabelecer
um orçamento exclusivo a este fim e não descurar de exprimir topografica-
mente o programa e os projetos previstos a este respeito, conjuntamente com
os planos gerais da rede de circulação e os meios de transporte. Estas últimas
obras de urbanização apresentam-se sempre com toda a sua importância,
porquanto, como foi dito alhures, numerosos interesses particulares estão
apensos. É em nome do interesse geral que os poderes públicos devem esta-
belecer, manter e defender os terrenos livres e os jardins indispensáveis, não
só por causa do agrado e do luxo que oferecem, como por causa da higiene
da cidade, do desenvolvimento e da vida de seus habitantes. Todo o projeto
de melhoramento ou de extensão deve ser considerado incompleto se não
for acompanhado da aquisição dos terrenos indispensáveis a sua respiração”
(Agache, 1930, p. 211).

O Plano Agache considerava que os espaços livres eram indispensáveis ao desenvol-


vimento urbano, cuja multiplicação seria aconselhável frente à expansão da cidade. Desta-
cava a importância do espaço livre de acordo com os benefícios que poderia proporcionar,
tanto físicos como mentais, fossem parques, campos para o lazer ou espaços florestais, e
deixava claro o fato de que deviam estar conectados entre si.

“A fim de proporcionar efeitos úteis, estes espaços verdejantes deverão ser


ligados entre si por avenidas arborizadas, as quais, todas as vezes que a tal
se prestarem, não serão consideradas simples estradas, mas verdadeiros pas-
seios livres das correntes de maior circulação ou bastante espaçosas para
serem protegidas contra os excessos de barulho, poeira e perigos. Destar-
te, chega-se a construir um ou vários sistemas de “parkways” ligando, não
somente os parques entre si, mas conduzindo igualmente para as matas e
os passeios exteriores, assim como para os grandes espaços da zona rural
consagrados à cultura ou à criação – reservatórios de ar puro indispensáveis
à respiração da grande aglomeração“ (Agache, 1930, p.205).

91
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

As infra-estruturas viárias

Nesta época, os acessos à área se efetuavam através das montanhas. Na tentativa de


transpor os limites impostos pelos rasgos fisiográficos, os caminhos foram construídos por
onde as irregularidades do relevo permitiam, seguindo os vales e as linhas de cotas mais
convenientes, cruzando as águas nos sítios mais inóspitos e promovendo cortes no relevo,
principalmente no Maciço da Tijuca, com a abertura das Estradas da Covanca, da Tijuca e
de Furnas (Abreu, 1992).
As estradas, inicialmente caminhos rurais, se formaram entre os maciços, seguindo
suas margens, e ao norte da planície. Conformavam uma rede radial de vias a partir de
três pontos principais: Largo da Freguesia, Largo da Taquara e Largo do Tanque. Coinci-
dentemente, os três lugares que, mais tarde, se transformariam nos principais centros de
Jacarepaguá.
A invasão da área pelos franceses, no séc. XVII, determinou a necessidade de uma
maior atenção à sua ocupação, e obrigou as autoridades a construir o Caminho da Grota
Funda, que atravessava toda a área paralelamente ao mar, desde o Maciço da Tijuca até
Guaratiba, que mais tarde seria a base para o traçado da Avenida das Américas, um dos
principais eixos viários da unidade (Costa, 2002). Neste marco, também foram traçados
outros caminhos, como a Avenida Litorânea, junto à linha do mar, e outro perpendicular
a este, para o interior.
O traçado das estradas permitia estruturar a produção agrícola e transportar os pro-
dutos aos centros de consumo. Das estradas principais na planície se abriam caminhos
de acesso aos maciços, que se adaptavam às más condições das encostas. Por outro lado,
foram realizadas importantes obras de drenagem, que resultaram nos canais hidrográficos
artificiais, citados anteriormente (Nogueira, 1956). Nas margens dos canais e junto a al-
guns rios e riachos, nas zonas inundadas a oeste da planície, foram construídos caminhos
que, paralelamente às estradas e as demais vias em direção aos maciços que atraves-
savam a área, constituíram a rede viária que permitia o funcionamento do lugar como,
predominantemente, agrícola.

92
Evolução urbana e espaços livres a analisar

Os assentamentos

Até os anos quarenta, a ocupação urbana se deu ao redor das sedes de fazendas e
igrejas localizadas nas propriedades agrícolas, com algumas edificações isoladas às mar-
gens dos caminhos e nas áreas próximas ao mar.
Com o início da ocupação da área, no fim dos anos trinta, criou-se uma nova frente urba-
na, ainda incipiente, mas que possibilitava novas oportunidades de lazer, recreação e moradia
em um lugar de natureza abundante, onde imensas extensões de praia se misturavam às
montanhas. Neste contexto, a população que mais se beneficiava da área e de suas oportuni-
dades de lazer era a que vivia nos subúrbios da zona norte da cidade, dado que a população
da zona sul e do centro (mais favorecida economicamente) já tinha suas praias e montanhas
ao alcance (como a praia de Copacabana e o Maciço da Tijuca) (Pinheiro, 2001).
Neste marco, o crescimento dos bairros ao redor das estações de trem, na zona norte,
provocou o início da ocupação urbana da planície de Jacarepaguá, ao norte da unidade,
no encontro dos maciços, que tinha nos traçados dos caminhos as principais estruturas da
urbanização. Estes pequenos núcleos começaram a se desenvolver com um forte caráter
suburbano, similar ao dos subúrbios que se distribuíam ao redor da linha férrea.
As urbanizações perto do mar eram poucas, sobretudo a leste, com os loteamentos de
Tijucamar e Jardim Oceânico, e a oeste no Recreio dos Bandeirantes. O desenho atribuído
ao Jardim Oceânico se assemelhava às urbanizações dentro do modelo das cidades-jar-
dim, com uma praça central a partir da qual se irradiavam vias longitudinais, paralelas ao
mar, transversais e diagonais, e se apoiava no caminho que se converteria na Avenida das
Américas e no caminho da frente marítima. Estes assentamentos eram balneários que, por
falta de infra-estrutura na área, impediam a residência permanente servindo, em muitos
casos, como segunda residência.

Os espaços livres

As terras do caso de estudo foram doadas no séc. XVI por Salvador Corrêa de Sá a seus
dois filhos, Gonçalo e Martim Corrêa de Sá. Desde então possuíam um caráter agrícola e,
mais tarde, se caracterizaram como lugar de grandes propriedades, de até 21km2.

93
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

O loteamento mais evidente destas grandes propriedades se iniciou na década de


1930, quando começou a ocupação urbana da área (Fridman, 1999).
No início do séc. XX, as propriedades agrícolas eram trabalhadas pelos próprios donos
ou por pessoas contratadas. Muitos dos proprietários não viviam no lugar, preferindo as áre-
as mais centrais e consolidadas da cidade. As terras ao redor da Estrada dos Bandeirantes já
estavam mais loteadas, o que originou propriedades rurais menores em relação às grandes
terras produtoras de café, açúcar ou utilizadas para a criação de gado (Nogueira, 1956)30.
Até os anos quarenta, o espaço livre predominava na área, constituído por proprie-
dades agrícolas e espaços naturais, cuja conformação espacial definia, em termos gerais,
o caráter e a ocupação da área.
A abertura dos caminhos, a ocupação pela agricultura e a retirada de madeira da
floresta foram, na época, alguns dos principais elementos transformadores da cobertura
vegetal e do relevo da área. Determinaram a transformação da vegetação original pela
implantação dos cultivos, pela retirada massiva da cobertura vegetal, especificamente no
Maciço da Tijuca, e por movimentos de terra, provenientes da erosão provocada pelas vias
e o desmatamento. Tudo isto causou, entre outros problemas, uma diminuição da diversida-
de dos ecossistemas e a redução da oferta de água. Neste contexto, o Maciço da Tijuca foi
objeto, ainda no séc. XIX, do início de um reflorestamento, que tentou devolver a cobertura
vegetal ao maciço, revertendo o quadro de devastação que vinham sofrendo as florestas e
que começava a comprometer o abastecimento de água da cidade (Abreu, 1992).
A abertura dos canais determinou uma primeira grande modificação na hidrografia da
área, ao permitir a conexão entre as lagoas e entre estas e o mar, além da drenagem de toda
a planície inundada. Por outro lado, com os canais, foi possível sanear as áreas pantanosas,
transformando os extensos brejos, não propícios ao cultivo, em produtivos solos agrícolas
e, conseqüentemente, modificando os perfis das plantações, que puderam se estender por
áreas até então não cultivadas (Nogueira, 1956). Os canais e os principais rios e riachos
estabeleceram um desenho nas áreas rurais, que pode ser percebido até hoje, com as marcas
características dos seus traçados paralelos e perpendiculares ao mar, que se distribuem em
forma de pente no extremo oeste, onde conectam com as águas que descem do maciço.
Deste modo, a lógica da colonização se adequava às condições naturais locais, ou as
modificava, e se misturava com as formas originais do território.

94
Evolução urbana e espaços livres a analisar

43. RMRJ – área urbana em 1922 (adaptação


de mapa da RMRJ em 1922) (F.: Villaça,1998).
44. Morros de Jacarepaguá e Dois Irmãos (início
do séc. XX) (Foto: Maurice Perret) (F.: Acervo
AGCRJ).
45. Estrada da Barra da Tijuca (início do séc. XX)
(F.: Acervo AGCRJ).
46. Esquema da ocupação do caso de estudo
até 1940.
43

44 45

46

95
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

4B > Etapa 2: subtração (1940-1970)



Este período corresponde à suburbanização da área, quando a lógica anterior do es-
paço livre, orientador dos assentamentos e da implantação das infra-estruturas, começou
a ser substituída pelos artifícios da urbanização sobre as barreiras físicas que a geografia
da unidade territorial apresentava.
Antes do golpe militar (1964) que instaurou um regime ditatorial, ainda nos anos cin-
qüenta, o país se viu envolvido em uma atmosfera de desenvolvimento incentivado pela ex-
pansão das indústrias, por um grande otimismo por parte da população e por grandes iniciati-
vas em distintos âmbitos, algumas claramente urbanísticas, como a criação de Brasília (1960).
No Rio de Janeiro, especificamente, estas atuações urbanísticas se refletiram nos planos para
a ordenação e ocupação da cidade e em grandes obras de infra-estruturas (Abreu, 1987).
As décadas de 1940 a 1960 foram marcadas pelo avanço da cidade para fora de
seus limites administrativos, com o crescimento das áreas suburbanas ao redor das vias:
Avenida Brasil (1946), Presidente Dutra (1951) e Washington Luís, estas duas últimas em
direção a São Paulo e a Petrópolis, respectivamente. A Avenida Brasil constituiu uma espé-
cie de cinturão viário da cidade em sua parte norte, traçada como alternativa de conexão
entre o Rio e sua região metropolitana que, junto com as outras vias citadas, permitiam a
expansão urbana nestas direções (Abreu, 1987).
Em 1960, o Rio deixou de ser a capital do país, que transferiu-se para Brasília, e se
transformou na cidade-estado da Guanabara. Com isto, a cidade perdeu poder político,
enquanto reforçavam-se as intenções de industrialização e criação de centros de serviços
como motores da economia local.
Deste modo, aumentava a pressão do crescimento urbano na área de estudo, que
então era considerada a área mais propícia à expansão da cidade, por seus vastos espa-
ços livres disponíveis e por sua posição entre as zonas norte, sul e oeste, constituindo um
lugar de unificação da cidade e de possível conexão com a região metropolitana.

O planejamento

Uma das primeiras tentativas de ordenar a área de estudo foi tomada pelo setor público,
mediante o Plano de Diretrizes para as Vias Arteriais na Planície de Jacarepaguá (1950). Este

96
Evolução urbana e espaços livres a analisar

plano incluía a previsão de uma rede viária para a área e a Reserva de Parques de Preserva-
ção dos Ecossistemas Lagunares. A intenção era evitar a ocupação descontrolada nos arre-
dores das lagoas, e mencionava a criação da Reserva Biológica de Jacarepaguá, abarcando
todas as lagoas da unidade e a Restinga de Itapeba.
Já nos anos sessenta, efetuaram-se algumas propostas de desenvolvimento urbano
para a cidade-estado, que pretendiam traçar suas diretrizes urbanas até o ano 2000, e
que originou o Plano Doxiadis (1965) (fig.48 e 49). Em sua concepção, este plano consi-
derava a cidade e sua região metropolitana. Uma das principais idéias consistia em dividir
a cidade em uma série de comunidades autônomas e interconectadas por vias-expressas;
além disso, o plano tinha previsões para a habitação, o transporte e o saneamento (Leme,
1999). Relativo ao caso de estudo, especificamente, o plano considerava a necessidade
de criar um novo centro de negócios, que deveria se localizar em algum ponto entre a
unidade e o resto da zona oeste.
O espaço livre no Plano Doxiadis era considerado um espaço de recreio e lazer e, com
exceção dos grandes elementos geográficos, como os maciços, o mar e as lagoas, que
deveriam ser preservados e protegidos, este não era mais que um espaço compartimenta-
do em meio as comunidades divididas pelas vias-expressas. Isto é, se seguia o critério da
ocupação disseminada pelo território e se enclaustravam os espaços livres como superfí-
cies intermediárias.
O pensamento predominante era o da ocupação urbana extensiva, na qual o papel
dos espaços livres era pouco valorizado como elemento estruturador do território, no sen-
tido de que as determinações funcionais e espaciais dos espaços livres em si mesmos, de
acordo com as necessidades de manutenção e/ou restauração de suas funções fundamen-
tais, não eram consideradas como possíveis determinantes da estrutura urbana, que, além
de permitir ou não a ocupação, ou de serem belos, poderiam incidir sobre a consolidação
urbana e atuar como qualificador do ambiente como um todo. Cabe ressaltar que, neste
momento, os parâmetros da ecologia, ou da inserção da paisagem de maneira mais geral
na ordenação, ainda não eram vigentes. Deste modo, o pensamento desenvolvimentista
no qual se baseava o plano, aplicado ao longo dos anos, engendraria a necessidade de
uma abordagem mais sensível à paisagem, principalmente devido à deterioração ecológi-
ca e da qualidade visual causada pelo meio urbano.

97
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

No final dos anos sessenta surgiu o Plano Piloto (1969) (fig.50 e 51), para ordenar a
urbanização da planície. Encabeçado por Lucio Costa (1969) e baseado nos princípios do
Movimento Moderno, como na contemporânea Brasília, este plano tinha a singularidade
de tentar ordenar a ocupação urbana relacionada com algumas diretrizes ditadas pelo
espaço livre, trabalhando para manter ao máximo as conformações naturais existentes.
O Plano Piloto de Lucio Costa, diferentemente do Plano Doxiadis, estabelece vínculos
com a percepção da paisagem, até o ponto de ser, ela mesma, condicionante da ordena-
ção urbana, embora a questão ecológica, tal como no outro plano, ainda não constituísse
um guia para a ordenação.
No contexto do plano o edificado era considerado como uma série de edifícios sobre-
postos à superfície verde do espaço livre, dispostos como torres isoladas ou como conjuntos
horizontais de baixa densidade (cujas localizações foram desenhadas no plano mediante
uma zonificação rigorosa). Estes assentamentos estavam relacionados com os centros de co-
mércio e serviços e se encontravam interconectados por vias de pedestres. Em geral, o plano
seguia a idéia da natureza vista como cenário, sobre o qual “pousavam” as edificações.
As vias, concebidas para o uso exclusivo do automóvel e hierarquizadas entre si, contor-
nariam o mar, os maciços, as lagoas e as colinas da planície, e se previa a criação de faixas
de proteção contra possíveis espaços livres lineares ao redor das infra-estruturas viárias mais
movimentadas. A execução da Avenida das Américas e da Via 11 (atual Avenida Ayrton Sen-
na), perpendiculares entre si, articularia toda a área com o resto da cidade. Ao norte deste
cruzamento se desenvolveria o futuro centro metropolitano do Rio de Janeiro.
O espaço livre servia de referência para o traçado das vias. Na realidade, as vias princi-
pais seguiam o traçado dos antigos caminhos já existentes na área e foram previstas para
o tráfego rápido, através do transporte motorizado com o mínimo de interrupções possível.
Cabe ressaltar a previsão da Via Parque, que circundaria as lagoas de Jacarepaguá e da Tiju-
ca, pela sua margem sul, compreendendo grandes extensões de espaços livres ao redor.
O plano propunha, em geral, a urbanização longitudinal na base da planície, entre as
lagoas e o mar, em ligação direta com as infra-estruturas viárias e com os centros de ser-
viços e comércio principais (cada um em um extremo da planície, próximo ao mar), onde
as lagoas lhes serviam de fundo, com poucas conexões até o mar. A frente marítima de-
veria estar livre de edificações em toda sua extensão, com exceção do ponto de encontro

98
Evolução urbana e espaços livres a analisar

47. RMRJ - área urbana em 1958


(adaptação de mapa da RMRJ em
1958) (F.: Villaça,1998).
48 e 49. Plano Doxiadis (1965) (F.:
Constantinos and Emma Doxiadis
Foundation).
50. Plano Piloto (1969) (F.: Acervo
AGCRJ).

47

48

49

50

99
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

51

51. Plano Piloto (1969) (F.: Acervo AGCRJ).

entre as duas grandes vias, que poderia contar com edificações em forma de torres, e com
alguns equipamentos para uso coletivo, de pouca altura, que se distribuiriam ao longo da
praia. Os maciços arrematavam todo o conjunto, em cujas margens, na planície a oeste da
unidade, se previa a manutenção do caráter rural existente.
Tratava-se da idealização do grande parque ocupado por edificações em algumas
áreas, que pretendia manter e proteger o ambiente natural original no meio da ocupação
urbana. Entre as áreas a serem preservadas se encontravam: a Lagoa de Marapendi e as
lagoas da Tijuca e de Jacarepaguá, suas margens e canais, e o Bosque da Barra.
Entretanto, na proposta do plano, embora o estrato livre e o ocupado mantivessem
uma relação respeitosa entre eles, permaneciam justapostos, sem entrelaçar-se, até certo
ponto, afastados entre si, como o cheio e o vazio. Os espaços livres eram, sobretudo, espa-
ços para serem contemplados e não necessariamente para conduzir a ocupação segundo
a integridade de seus valores. Constata-se assim, uma abstração existente entre as for-
malizações do território e os espaços livres, expressa, por exemplo, através dos conjuntos
geométricos de residências e as torres que, em muitos casos, se dispunham sobre o plano
verde como um todo homogêneo.

100
Evolução urbana e espaços livres a analisar

As infra-estruturas viárias

Neste período se produziram modificações significativas na rede viária da unidade,
com interferências diretas sobre a transformação da estrutura do território e a geração de
tensões determinantes para o futuro dos espaços livres na área.
Incentivar a ocupação da área era uma das metas estabelecidas pelo governo. Para
tanto, era importante estabelecer conexões de acesso direto para a zona sul e o centro,
então as áreas mais consolidadas da cidade. A intenção deixava clara a idéia de transfor-
mar o caráter rural da área, com uma produção agropecuária significativa, em um centro
comercial e industrial, e em um novo mercado imobiliário.
A construção do Elevado das Bandeiras (composto por diversos túneis e 1,3km de
ponte, que serpenteia as encostas do Maciço da Tijuca sobre o oceano) e da via-expressa
Lagoa-Barra, concluída no final dos anos sessenta, aumentou a acessibilidade às áreas
próximas ao mar. As vias uniam a zona sul à Barra da Tijuca, e seu traçado seguia pela
auto-estrada Avenida das Américas, paralelamente ao mar. Ao mesmo tempo, foi constru-
ída a Via 11 e a Avenida Alvorada, perpendicular à Avenida das Américas, consolidando a
conexão Barra-Jacarepaguá e possibilitando novas oportunidades de reforçar os acessos
a Jacarepaguá pela zona norte.
Devido às cotas muito baixas do relevo, foi necessário realizar aterros quilométricos
ao longo de toda a Avenida das Américas e da Via 11. Ao mesmo tempo, se fizeram me-
lhorias na urbanização das vias da rede secundária, com a implementação da pavimenta-
ção e infra-estrutura de serviços.
A tendência à concentração de esforços para a construção de infra-estruturas era,
claramente, próxima ao mar, pois esta constituía a área que prometia maior desenvolvi-
mento, tanto em relação às moradias de luxo, apoiadas na presença do mar e de amplas
visuais, quanto à previsão de modernos centros de comércio e serviços e ao aumento da
atividade turística, posto que o turismo vinha aumentando consideravelmente pelo uso
crescente da área para atividades de lazer, favorecidas por um clima que beneficiava as
atividades ao ar livre grande parte do ano.
Ambas as vias de maior tamanho, a Avenida das Américas e a Via 11, construídas segun-
do a previsão do Plano Piloto, seguiam por onde se cruzavam os antigos caminhos, paralela

101
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

e perpendicular ao mar, respectivamente. Estas vias determinaram algumas modificações na


acessibilidade da área, diferenciando os acessos internos, relacionados com o entorno mais
imediato da unidade, e os acessos externos, de alcance mais amplo. Por conseguinte, como
acessos internos, permaneceram as estradas e os caminhos de acesso aos maciços, que
pouco a pouco foram sendo pavimentados, e os caminhos rurais nas margens das águas nas
áreas inundadas a oeste da planície, que, na realidade, eram poucos e de difícil circulação, e
que servem de acesso atualmente, na sua maioria, a áreas de criação de bois.
Desta maneira, as vias maiores, produtos de notáveis artifícios como os túneis, os
viadutos e os aterros, modificaram o panorama original da rede viária da unidade. Por
um lado, estabeleceram uma hierarquia nítida entre as infra-estruturas viárias, que em
conjunto permitiriam uma ocupação da unidade distinta da adotada até então, de cará-
ter mais rural, e marcaram o início de sua caracterização como uma área de expansão
urbana. Por outro lado, estas vias estabeleceram novas relações físicas com o território,
determinadas por artifícios que se sobrepuseram à constituição física do relevo, da água e
dos solos, diferentemente dos caminhos da etapa anterior, que, de um modo ou de outro,
se acomodavam como podiam aos obstáculos que se apresentavam a sua construção.

Os assentamentos

A subtração de solo livre, bastante estabilizada nos anos cinqüenta pela deficiência
na oferta de acessos à área, se intensificou nos anos sessenta com o incremento das infra-
estruturas viárias, que deram continuidade à expansão suburbana de Jacarepaguá junto à
expansão das áreas próximas ao mar.
Assim, se estimulava a intensificação dos assentamentos nas duas principais concen-
trações já existentes: Barra da Tijuca e Jacarepaguá. Na Barra da Tijuca se expandiram os
núcleos iniciais, isto é, Recreio dos Bandeirantes e Jardim Oceânico/Tijucamar, e se criaram
outros. Os núcleos existentes seguiam as margens do Maciço da Tijuca, a Estrada de Ja-
carepaguá, o traçado da Avenida das Américas, a então chamada Avenida Sernambetiba
e as margens das águas (principalmente a Lagoa da Tijuca, o Canal de Marapendi e o
mar). Até então, o mais comum nestes crescimentos era o uso residencial, como segunda
residência para fim de semana, e comercial; entretanto, ainda refletiam um modo de vida

102
Evolução urbana e espaços livres a analisar

quase rural. Em Jacarepaguá, o incremento dos bairros suburbanos tendia a seguir a Es-
trada dos Bandeirantes e avançava em direção aos maciços.
Por um lado, as construções residenciais na Barra da Tijuca vendiam a qualidade de
vida que se podia desfrutar na área, ligada à imagem moderna do Plano Piloto, à preser-
vação ambiental, aos assentamentos junto à natureza, além da baixa densidade edificada
e a promessa de atrativos comerciais e de serviços. Comparava-se esta área a uma novís-
sima zona sul, extensão dos assentamentos litorais de Copacabana, mas com um modo
de viver diferente deste, que já apresentava padrões edificados com altas densidades,
insegurança urbana, ruídos, contaminação, poucas áreas livres, edifícios que conformam
uma verdadeira barreira de concreto frente ao mar, etc., e caracterizava um processo de
ocupação desordenado (Leitão, 1999).
Por outro lado, Jacarepaguá ia se distinguindo como uma área à margem, literalmente,
dos avanços do modelo urbano adotado próximo ao mar, se consolidando como uma área
industrial voltada para a moradia da população com menor poder aquisitivo. Uma mostra
expressiva desta condição é a localização, por parte do setor público, de conjuntos habitacio-
nais para a população expulsa das favelas da zona sul (muitas das quais foram queimadas)
e reassentada em lugares “afastados” dos centros de alto poder aquisitivo, onde o preço
da terra era baixo e onde estes conjuntos não seriam um obstáculo aos empreendimentos
imobiliários. Exemplo desta prática é o bairro Cidade de Deus, no centro da unidade.

Os espaços livres

As melhorias nas infra-estruturas viárias da área se traduziram em um aumento da
ocupação urbana, com a valorização imobiliária das terras livres, que passaram a estar na
expectativa entre a ocupação e a preservação. Ao mesmo tempo, as vias e os assentamen-
tos provocaram modificações no relevo e na rede de água da unidade.
Os viadutos e os túneis constituíram intervenções significativas sobre o relevo dos
espaços livres. Por um lado, os túneis representaram a possibilidade de uma intervenção
pontual no relevo e sua respectiva cobertura vegetal. Por outro lado, os viadutos permi-
tiram transpor os obstáculos do relevo e da água, o que provocou uma interferência nos
espaços livres que, a princípio, poderia ser controlada nos pontos de contato/conflito

103
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

entre ambas partes. Em ambos os casos, comparativamente com os movimentos de terra


provocados pelos cortes do relevo, o impacto sobre os espaços livres tenderia a ser mais
concentrado e menos extensivo.
A consolidação da rede viária, através de aterros e da pavimentação, produziu algu-
mas modificações importantes na rede de água da unidade e nos seus ecossistemas cor-
relativos, principalmente quanto à separação entre as lagoas e as áreas inundáveis, que
agora se encontravam “acima e abaixo” da Avenida das Américas. Além disso, os cursos
de água da unidade que estavam no meio dos traçados das vias foram canalizados ou
cruzados por pontes, com a alteração e, em muitos casos, redução de seus leitos.
Entretanto, a construção dos viadutos e das vias rápidas potencializou as vistas da
área, através dos percursos que permitiam vislumbrar o panorama agreste dos espaços
livres de então. Embora estivessem sendo substituídos pela urbanização, estes ainda man-
tinham algumas características fundamentais de sua conformação original, no que se
refere à presença dos maciços, das lagoas e das extensas áreas rurais.
A ocupação industrial, introduzida a partir dos anos sessenta em Jacarepaguá (Abreu,
1987) e ainda sem regras estritas relativas aos resíduos industriais, desempenhou um
papel chave no processo de contaminação das águas e do ar da unidade (Costa, 2002).
Por outro lado, a ocupação mais intensa representou uma mudança nas comunidades
vegetais da área, centrada na redução das áreas de restinga, nas zonas próximas ao mar,
e das áreas florestais, nos maciços, que sofriam com o desenvolvimento desordenado dos
assentamentos de Jacarepaguá ou com as novas construções da Barra. A acomodação dos
assentamentos, tanto nas dunas como nos maciços, determinou modificações no relevo
da área, ao contribuir para a desaparição, ao longo do tempo, das dunas existentes e ao
promover cortes e movimentos de terra na topografia acidentada das montanhas, aumen-
tando os riscos de erosões.
A partir dos anos sessenta, as ocupações começaram a fragmentar os campos agrícolas e
os pastos ao induzir a um maior loteamento das propriedades para fins residenciais (Fridman,
1999). Na realidade, a presença das vias de maior tamanho, próximas aos espaços livres,
protegidos ou não, representava uma aproximação perigosa para elementos de grande valor
natural e visual, cuja provável ocupação levaria à criação de outras infra-estruturas viárias
para atender às necessidades funcionais dos novos assentamentos, tendendo a causar mais

104
52. Viaduto Santos Dumont (1973) 52
(Foto: M. S. Rocha) (F.: Acervo AGCRJ).
53. Auto-estrada Lagoa-Barra. Túnel do Joá
(1971) (Foto: M. S. Rocha) (F.: Acervo AGCRJ).
54. Esquema da ocupação do caso de estudo
até 1970 (Detalhe: Avenida das Américas,
Ayrton Senna e túnel).

53

54

105
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

rupturas no território ao dar continuidade ao processo de consumo e impermeabilização do


solo livre. Ao mesmo tempo, devido à ocupação dos espaços livres, a tendência era afastar,
cada vez mais, as conexões entre mar e montanha e entre um maciço e outro.

4C > Etapa 3: fragmentação (1970-2000)



O terceiro período se caracteriza pelo desenvolvimento urbano intenso da unidade ter-
ritorial e pela incorporação de novas formas construídas e de novos usos do território, que
provocaram profundas transformações na conformação dos espaços livres e nas suas relações
espaciais e funcionais com as infra-estruturas viárias e os assentamentos. Observa-se neste
período um forte avanço urbano em direção aos maciços e um maior adensamento da área.
Os anos setenta foram marcados por uma progressiva dinamização da economia
brasileira e por dois principais movimentos de expansão metropolitana no Rio. Por um
lado, a urbanização avançava em direção aos municípios da Baixada Fluminense, a partir
da zona norte da cidade (crescimento urbano marcado, sobretudo, pelas atividades in-
dustriais, pela presença de potentes infra-estruturas viárias e por um processo contínuo
e desordenado de ocupação urbana com o desenvolvimento de vastas zonas faveladas).
Por outro lado, continuava a ocupação da zona oeste da cidade, através dos acessos per-
mitidos pela Avenida Brasil e pela linha férrea (Abreu, 1987). Neste contexto, o processo
de crescimento metropolitano dos anos setenta sofreu um incremento nos anos oitenta e
nos noventa, com a ocupação da costa em direção ao oriente e ao ocidente, franqueado
pela construção da ponte Rio-Niterói (1974).
A princípios dos anos setenta se consolidaram algumas tendências opostas na ocu-
pação da metrópole, tanto espacial como funcionalmente. Uma em direção à Baixada
Fluminense, caracterizada pela carência de infra-estruturas, equipamentos e, entre outros
aspectos, por uma ocupação urbana não planejada e pela presença da população mais
carente. Outra em direção à Baixada de Jacarepaguá, principalmente na Barra da Tijuca,
caracterizada pelos impulsos proporcionados pelo Plano Piloto como um ponto de atra-
ção da população de maior poder aquisitivo, onde se fomentava a construção de infra-
estruturas e equipamentos, com o aumento crescente da especulação imobiliária (Abreu,

106
Evolução urbana e espaços livres a analisar

1987). A diferença entre a Barra da Tijuca e o restante da metrópole era tal que, em 1988,
foi proposto um plebiscito para a sua emancipação como um novo município dentro do
Estado do Rio de Janeiro, embora a proposta não tenha tido sucesso.

O planejamento

Em 1974 se levou a cabo a fusão da cidade-estado da Guanabara (município do
Rio de Janeiro) com o Estado do Rio de Janeiro, e a criação da região metropolitana.
Produziu-se, então, um novo intento de reformulação do desenvolvimento metropolitano,
visando disciplinar o crescimento urbano e dotar o território de condições adequadas para
suportá-lo.
Nesta direção, a elaboração do Plano Urbanístico Básico da Cidade do Rio de Janeiro
(Pub-Rio) (1977) tinha como objetivo a distribuição de infra-estruturas relativas à habita-
ção e à produção, e propunha a integração das instâncias administrativas de gestão do
espaço urbano (Rezende, 1982).
Na realidade, o Pub-Rio, um plano físico-territorial, estabeleceu as bases do desen-
volvimento urbano com indicações para a ocupação edificada, para as infra-estruturas
viárias, para os serviços urbanos, etc., mas não fez referência ao tratamento dos espaços
livres como uma estratégia de ordenação territorial, restringindo-se a atuações isoladas
sobre estes, voltadas ao lazer e à necessidade de criar praças, jardins, etc., entre outras
intervenções de caráter pontual. Relativamente ao caso de estudo, o Pub-Rio mantinha as
indicações do Plano-Piloto.
Às estratégias gerais ditadas por este plano deviam se seguir planos especiais, deno-
minados Planos de Estruturação Urbana (PEU), desenvolvidos e aplicados sobre distintas
partes da metrópole. Nos PEUs, que ainda seguem sendo elaborados, os espaços livres ti-
veram algum protagonismo, onde prevaleceram as opções de proteção das características
ambientais que serviram de base para a elaboração das diretrizes de ordenação.
Em seguida foi elaborado o Plano Diretor da cidade (1992), ainda vigente. Este plano,
frente ao crescente interesse pela proteção do meio ambiente promovido desde a realização
da Cúpula do Meio Ambiente no Rio de Janeiro (1992), incorpora indicações de conteúdo
ambiental para a ordenação do caso de estudo, como área de “prioridade para estudos meio

107
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

ambientais e posterior alteração, por lei, da ordenação urbanística vigente, com o objetivo de
compatibilizar o uso e a ocupação do solo com suas características geológicas”.
Paralelamente ao Plano Diretor, foi elaborado o Plano Diretor de Meio Ambiente
(1991), ao qual se seguiram medidas de proteção da natureza contidas na Legislação do
Meio Ambiente (1994). A aplicação de ambos se reflete na área de estudo, e a estes se
soma uma série de projetos e decretos de leis municipais, estatais e nacionais, aprovadas
ao longo dos anos noventa31, que tratam de preservar e manter a natureza. Na realidade,
as medidas legais para a proteção dos espaços livres da unidade foram sendo tomadas
lentamente no correr das três últimas décadas. A primeira, relativa ao Parque Nacional da
Tijuca (em 1967), e a segunda ao Parque Estadual da Pedra Branca (em 1974), demons-
tram o reconhecimento, por parte das autoridades governamentais, da importância destas
duas reservas de espaços livres como elementos naturais.
O Plano Diretor define, entre outros parâmetros, as diretrizes da zonificação, da legis-
lação edílica e parcelária e da macrozonificação para a cidade. Em linhas gerais, suas prin-
cipais determinações seguem a premissa de que a ocupação urbana deve consolidar os
grandes vetores de crescimento da cidade, entre eles, a unidade territorial em questão.
Parte do plano constitui um instrumento de detalhe do Plano Piloto da Baixada de
Jacarepaguá e mantém suas definições, determinando o âmbito espacial da zona especial
5 (ZE-5). A ZE-5, segundo o decreto N.° 3.046, de 27 de Abril de 1981, se subdivide em
46 subzonas com as devidas condições de zonificação, parcelamento e edificação, e man-
tém os espaços livres protegidos previamente previstos pelo Plano Piloto. Para o resto da
unidade, o Plano Diretor estabelece diretrizes de ocupação distintas.
Em geral, o Plano Diretor não propõe a criação de novos acessos à área, considerando-
se que já existiam previsões de novas infra-estruturas viárias ainda remanescentes do Plano
Doxiadis (como a via-expressa Linha Amarela), das determinações do Departamento de Es-
tradas e Rodagens do Estado do Rio de Janeiro (DER), do Pub-Rio e do Plano Piloto. Deste
modo, o plano determina o incremento da acessibilidade à área a partir da implementação
das vias previstas, de uma maior conexão entre as infra-estruturas viárias existentes e do
fomento dos meios alternativos de transporte individual e coletivo, como a bicicleta e o VLT,
respectivamente. Ao mesmo tempo, ressalta a necessidade de fomentar a integração entre
os bairros da Baixada de Jacarepaguá e entre estes e a zona oeste e a zona norte.

108
Evolução urbana e espaços livres a analisar

Uma das intenções do plano é a criação de programas de oferta de lotes urbanizados


e a construção de moradias para a população de baixa renda, a fim de evitar a ocupação
desordenada das áreas livres públicas da Baixada de Jacarepaguá.
Relativo aos espaços livres, o plano define algumas figuras de proteção, umas novas
e outras já previamente estabelecidas, como as unidades de conservação ambiental, as
áreas de proteção permanente e as áreas não edificáveis. (No item 5D encontram-se mais
detalhes sobre o planejamento.)
Cabe ressaltar que o plano faz referência à observação de alguns atributos biofísicos
e perceptivos dos espaços livres frente à ocupação, como: a elaboração e execução de um
macroplano de drenagem e aterros; a definição de áreas que integrem o patrimônio pai-
sagístico da cidade sujeito à proteção ambiental; a revisão dos critérios de ocupação da
área considerando as características geológicas; e a definição de parâmetros de ocupação
compatíveis com a proteção da área.
Desta maneira, o Plano Diretor agrega alguns critérios ambientais sobre as previsões
de ocupação urbana da área e conserva os derivados das determinações do Plano Piloto
e, em geral, tende a adotar políticas protecionistas sobre os espaços livres.

As infra-estruturas viárias

Durante os anos setenta se assistiu à realização de inúmeras obras de infra-estrutura
viária e de serviços, com a expansão das principais avenidas e estradas. Estas obras já
anunciavam a transformação destas vias em corredores de transportes e eixos comerciais
e industriais, adaptados às demandas da ocupação urbana da unidade. Apesar da ex-
pansão das infra-estruturas, estas eram insuficientes para a demanda existente na área,
principalmente quanto ao abastecimento e ao saneamento da água e a distribuição de
energia elétrica.
Os anos oitenta foram anos de crise. No final dos anos setenta a economia brasileira
entrou em crise por causa, entre outros fatores, da alta dos preços do petróleo, o que
provocou uma forte queda nos investimentos em infra-estrutura e em construção. Mesmo
assim, a área de estudo continuou seu processo de ocupação urbana.

109
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Somente no final dos anos noventa se produziu a principal intervenção viária no âmbito
de estudo, com a construção da via-expressa Linha Amarela, em 1997, que já estava prevista
no Plano Doxiadis. A via-expressa se estendia entre os bairros de Jacarepaguá e o Maciço da
Tijuca, como continuação da Avenida Ayrton Senna, e se apresentava como uma alternativa
de acesso à área e de conexão com a zona norte da cidade e com a região metropolitana.
Para a construção da via-expressa também foram feitos túneis e viadutos. Diferente-
mente das vias abertas do período anterior, os viadutos não apenas venciam distâncias
sobre a água, como também se sobrepunham aos assentamentos e aos acessos existen-
tes. Na realidade, em muitos trechos a via foi construída diretamente sobre o solo, e foram
realizados aterros e outras adaptações que criaram cortes na ocupação urbana existen-
te, sem estabelecer vínculos mais estreitos com o entorno. Por um lado, a sobreposição
causou modificações na rede viária original, a princípio, hierarquizada entre si. Por outro
lado, a segmentação resultou em espaços livres que sobraram ao lado da via, sem uma
função definida relativamente a esta, como também a seu entorno. Em ambos os casos
percebem-se as relações da via-expressa dirigidas à função urbana de via de trânsito
rápido, de conector entre áreas funcionais com suas distintas atividades, sem estabelecer
vinculações com os espaços livres e com o resto de seu entorno.
As conexões com a metrópole, permitidas pela via-expressa, não apenas determina-
ram novas oportunidades de acesso à área, como também amplificaram seus atributos de
atração, enquanto centro de comércio e serviços com grande potencial turístico.

Os assentamentos

A via-expressa aumentou significativamente a acessibilidade da área, ao retirar a
dependência de acesso quase exclusivo através da Avenida das Américas e ao facilitar a
ocupação urbana, incentivando novos investimentos imobiliários, que ainda são parte do
quadro atual de desenvolvimento da unidade. Estas ocupações tenderam a se localizar
tanto em Jacarepaguá como na Barra da Tijuca, ainda que a maior oferta de espaços livres
nesta última, provavelmente revele sua maior tendência ao crescimento urbano.
As fortes pressões imobiliárias na unidade, principalmente na Barra da Tijuca, aumen-
taram nos anos setenta. Durante esta década, a unidade contou com um órgão especial

110
Evolução urbana e espaços livres a analisar

para a implementação do Plano Piloto, a Superintendência para o Desenvolvimento da


Barra da Tijuca (SUDEBAR), vinculado à prefeitura da cidade, que garantia a implemen-
tação da normativa para os novos assentamentos. No final dos anos setenta se produziu
uma crise na área devida, por uma parte, à não adequação do Plano Piloto às demandas
existentes e, por outra, à fuga de capital e à necessidade de mais infra-estrutura. Para
resolver estes problemas foram introduzidas modificações no planejamento para a área
da Barra da Tijuca, relativas a questões de infra-estrutura, transporte coletivo, novos pa-
râmetros de ocupação urbana e incentivos ao turismo, o que incluía a produção e venda
de residências para uso temporário e, entre outras modificações, a possível previsão de
assentamentos populares (que ao final não foram adiante).
Neste contexto, as indicações iniciais do Plano Piloto para a ocupação urbana foram
sofrendo algumas transformações32, principalmente quanto às condições de loteamento
da terra, à densidade dos assentamentos e ao uso do solo inicialmente previsto pelo
plano. Acrescenta-se, além disso, a aparição de favelas (com lotes mínimos, sem infra-
estrutura e equipamentos) e condomínios33 (áreas imensas, fechadas, com infra-estruturas
e equipamentos e certa autonomia funcional), como dados não previstos no modelo mo-
derno (Leitão, 1999).
Próximo ao mar se localizava a população de maior poder aquisitivo. Ao longo do
tempo, esta parte da unidade foi atraindo não apenas sedes de empresas, que antes
estavam no centro tradicional da cidade, como também grandes estruturas comerciais,
empresariais e de serviços, que se fixaram ao longo das principais vias. Surgiram também
pólos industriais e universitários, que se somaram aos equipamentos públicos de grandes
dimensões já existentes na área (autódromo, centro de feiras e exposições e aeroporto).
Na transição da década de 1980 para a de 1990, e ao longo desta última, se produziu
o adensamento da planície, tanto na Barra da Tijuca como em Jacarepaguá. Realizava-se
desta maneira, a intensificação dos dois movimentos de ocupação urbana identificados
anteriormente, e que ainda persistem: um próximo ao mar e ao redor das principais vias,
em direção ao oeste da planície, que possui mais equipamentos, infra-estruturas e es-
paços livres públicos, e outro em Jacarepaguá dirigido, principalmente, às margens dos
maciços, desenvolvido de modo descontínuo, através da adição de terrenos loteados de
forma aleatória, sem planejamento, e com uma estrutura urbana aparentemente desor-
denada, carente de infra-estruturas, equipamentos e espaços livres públicos. Deste modo,

111
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

a posição das lagoas da Tijuca e de Jacarepaguá, estrategicamente no centro da planície,


faz com que elas funcionem como limite e, ao mesmo tempo, transição, entre as duas
ocupações distintas.
Atualmente, o âmbito ao redor das lagoas, pela proximidade de pontos de referências
locais, municipais e metropolitanos e pela presença dos importantes eixos de comércio
e serviços (Avenida das Américas e Avenida Ayrton Senna), tende a ser uma área cada
vez mais valorizada para a ocupação urbana, cujas margens estão ocupadas por grandes
infra-estruturas comerciais, empresas, universidades e conjuntos de residências.
Nas margens do Maciço da Tijuca, os assentamentos se apresentam, em sua maioria,
como urbanizações de baixa densidade residencial de classe média e classe média-alta,
embora haja manifestações de favelas e loteamentos irregulares. O mesmo ocorre em
Jacarepaguá, na ocupação das margens dos Maciços da Pedra Branca, se bem que se ve-
rifique ali a presença de equipamentos sanitários. Em Vargem Grande e Vargem Pequena,
a oeste da planície, a ocupação consiste em sítios e em urbanizações residenciais de baixa
densidade. Muitas destas residências eram utilizadas, até pouco tempo, como segunda
residência – cujos proprietários viviam nos centros mais consolidados da cidade – que,
depois, se tornaram primeira residência. A busca de vistas amplas e do afastamento do ru-
ído da cidade, com um entorno bucólico e a proximidade da natureza, atrai investimentos
imobiliários e representa uma tendência de ocupação das encostas dos maciços.
Neste marco, se ressalta a localização dos assentamentos, sobretudo os destinados
a usos comerciais e de serviços, diretamente vinculada à presença de infra-estruturas
viárias. Na realidade, muitos assentamentos que surgiram a partir de finais dos anos
setenta, denotam uma tendência ao isolamento e à introversão, seja como grandes estru-
turas comerciais, edifícios de escritórios, condomínios, equipamentos metropolitanos, etc.
São edifícios resultantes de grandes operações imobiliárias, que ocupam lotes imensos e
estão pouco relacionados entre si, excetuando-se o movimento que pode ocorrer entre
eles, permitido pelas infra-estruturas viárias, o que enfatiza a unilateralidade das relações
assentamento-via, com certa anulação do entorno.
De fato, se pode afirmar que grande parte destes assentamentos representa uma
tendência de caráter mais geral, que ultrapassa a unidade em si mesma e tem reflexos

112
Evolução urbana e espaços livres a analisar

55. RMRJ – área urbana em 1994


(adaptação de mapa da RMRJ da
Fundação CIDE, 1994).
56 e 57. Vista aérea do caso de
estudo (Foto: Rodrigo Rinaldi,
2001).

55

56

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ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

58

59

58. Vista aérea do caso de estudo


(Foto: Rodrigo Rinaldi, 2001).
59. Vista aérea do caso de estudo
(Foto: Autora, 2003).

em um processo de ocupação urbana inclinada à adoção de tipos mais genéricos, que


podiam, em certa medida, se localizar em qualquer lugar, e que possuem, mais ou menos,
as mesmas características morfológicas e funcionais, e não estabelecem, necessariamente,
vínculos com a estrutura física e sociocultural do lugar, além dos estritamente indispensá-
veis ao seu funcionamento. Diferentemente dos primeiros assentamentos construídos na
unidade, estes são, de certo modo, assentamentos desgarrados do contexto mais geral da
área, e estão mais relacionados com sua dimensão funcional a uma escala superior, no
contexto da metrópole.
O ideal de um lugar que afirmasse um novo modo de viver e que encarnasse a cara mais
moderna da cidade foi sendo concretizado, lado a lado com a pobreza e a fragmentação da
área, seja espacial, funcional ou social, e a conseqüente deterioração dos espaços livres.

114
Evolução urbana e espaços livres a analisar

Os espaços livres

Entretanto, o destino do espaço livre previsto pelo Plano Piloto não se consolidou to-
talmente. Os espaços livres foram, paulatinamente, se transformando em espaço à espera
de ocupação, sem uma participação efetiva na conformação urbana do lugar, quase como
uma vítima da urbanização, devido à perda de sua identidade original ou ao tratamento
como espaços isolados, protegidos ambientalmente, muitas vezes ameaçados pela pres-
são da ocupação urbana.
Na realidade, se pode afirmar que, embora existam grandes áreas desocupadas na
unidade, tanto na planície como nas encostas, as pressões da ocupação se distribuem
por todos os lados, em maior ou menor grau, dependendo da existência favorável de
condições físicas (acesso, relevo, solo, infra-estruturas, etc.) e funcionais (especialmente
na oferta de serviços existentes), entre outros fatores.
Em termos gerais, o traçado das grandes infra-estruturas viárias de alta velocidade e
a urbanização com padrões de edificação como caixas “quase” anônimas ou conjuntos
fechados determinaram, entre outros aspectos, a fragmentação dos espaços livres, desen-
volvida desde a continuidade entre planície e maciços até o solo livre restante no meio da
urbanização extensiva.
No processo de ocupação urbana da unidade, o espaço livre sofreu um rápido proces-
so de desmantelamento com a ocupação mais acentuada da planície e das encostas dos
maciços, iniciada no período anterior. As grandes conformações geográficas tenderam a
se isolar cada vez mais, tanto na relação maciço-maciço como na relação entre as lagoas
e entre estas e o mar. Os espaços livres, além das grandes reservas naturais, passaram a
apresentar uma leitura descontínua, cuja estrutura dispersa dissolve a percepção de seu
papel estruturador do espaço urbano.
As modificações no relevo, a maior probabilidade de incêndio, a poluição acentua-
da, as explorações clandestinas dos recursos naturais, a ocupação irregular de áreas de
risco, a ruptura das continuidades hídricas, e a retirada da vegetação, foram as principais
transformações provocadas pela construção das vias e dos assentamentos. Sobre os
espaços livres ocasionaram, entre outras conseqüências, uma diminuição da diversidade
dos mosaicos vegetais e a degradação dos cursos de água, com uma maior tendência

115
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

60 60 a 62. Vista aérea do caso de


estudo (Foto: Rodrigo Rinaldi, 2001).
63. Vista aérea do caso de estudo
(Foto: Autora, 2003).

61

62

63

116
Evolução urbana e espaços livres a analisar

64 e 65. Vista aérea


do caso de estudo
(Foto: Autora, 2003).
66. Esquema da ocupação
do caso de estudo até 2000
(Detalhe: a via-expressa
Linha Amarela e os túneis).

64

65
66

117
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

às inundações e erosões devido às mudanças nos cursos de água e, conseqüentemente,


no seu ciclo.
As alterações nos espaços livres também se refletem nas novas explorações neles
introduzidas nos anos oitenta e noventa, com o surgimento de espaços privados destina-
dos ao lazer, como, por exemplo, os parques temáticos baseados em atividades aquáticas
junto ao Maciço da Pedra Branca, e o campo de golfe junto ao Maciço da Tijuca. De fato,
ambos funcionam como clubes e se caracterizam pelo tipo fechado, com jardins dedi-
cados ao lazer. Por analogia, se pode afirmar que, de forma similar aos assentamentos
encerrados em si mesmos, estes espaços também tendem ao isolamento em relação a seu
entorno e à conseqüente segmentação espacial. São espaços que costumam transformar
a cobertura vegetal original, embora, em muitos casos, privilegiem as continuidades da
água. Dependem de uma boa acessibilidade e, socialmente, tendem a reforçar o quadro
das desigualdades sociais quanto às oportunidades de lazer, devido à carência de equipa-
mentos públicos destinados à recreação em grande parte da área.
Por outra parte, o surgimento de parques ao redor da Lagoa da Tijuca, principalmen-
te com a participação da iniciativa privada, revela uma maior preocupação no cuidado
dos espaços livres próximos ou dentro dos assentamentos, com a recuperação de seus
ecossistemas e seu tratamento paisagístico (Chacel, 2001), ao mesmo tempo em que se
incrementa a oferta de espaços livres públicos. Na realidade, muitos destes investimentos
pretendem afastar a ameaça, quase sempre presente, da ocupação ilegal nas margens das
águas, em áreas que apresentam uma tendência ao aumento de seu valor de mercado.
A crescente ocupação das áreas rurais determinou, além de um maior parcelamento
das propriedades, o surgimento de tensões. A introdução de usos alheios às atividades
agropecuárias, como equipamentos de ensino e parques temáticos, por exemplo, atraindo
um público externo à área, suscitou um movimento distinto na dinâmica urbana existente,
paralelamente à valorização da área e à construção de mais infra-estruturas, que trou-
xeram como conseqüência a diminuição das atividades relacionadas com a terra e uma
maior tendência à atração do uso residencial, comercial e de serviços.
O espaço livre da área (aproximadamente 30.000 ha no total) é um produto da de-
sagregação espacial desta paisagem ao longo do tempo, cuja principal conseqüência foi a
fragmentação e a desarticulação destes espaços. Este processo de degeneração retrata uma

118
Evolução urbana e espaços livres a analisar

perda das relações estabelecidas entre os espaços livres no primeiro período analisado, ao
retirar, ou corromper, os atributos que determinavam a qualidade ambiental da área.
Hoje, os espaços livres existentes na unidade são, na sua maioria, espaços de grandes
dimensões, resultantes do tipo de ocupação e loteamento34 (fig. 67) da terra ao longo da
história, cujas consideráveis porções pertencem a proprietários únicos, geralmente priva-
dos35, que estabelecem uma evidente política de reserva de terra, juntamente com agen-
tes imobiliários (Fridman, 1999).
O loteamento atual da área se caracteriza por uma situação jurídica confusa, não ha-
vendo, em muitos casos, títulos de propriedade. Situação que se repete em muitas outras
regiões do Rio. É comum identificar a ocupação dos terrenos por “posseiros”, gente que
se apropria ilegalmente dos terrenos, que invade a terra, estabelece sua propriedade e,
muitas vezes, promove novas divisões na terra e/ou a vende a terceiros, sem o título de
propriedade (fato que ocorre desde o séc. XVI)36 (Fridman, 1999).
O loteamento não segue um critério claramente definido, e as divisões são aparente-
mente aleatórias, embora a lógica da divisão dos lotes apresente alguma relação com os
acessos e a água, que facilitariam sua delimitação e estrutura, principalmente consideran-
do-se as poucas referências espaciais relativas ao relevo plano e a necessidade do terreno
ser acessível e drenado. Deste modo, a geometria é variável e não é possível estabelecer
um critério regular ou uma ordem repetível.
Em síntese, a análise da evolução histórica dos espaços livres na unidade territorial
demonstra que, geralmente, o processo de conformação destes espaços se baseou em
critérios distintos, entre eles:

• As configurações das infra-estruturas viárias, que historicamente, seguindo a topografia e,


mais tarde, as intervenções modificadoras do relevo por cortes e aterros, foram delimitando
alguns espaços livres, ao mesmo tempo em que permitiam a ocupação urbana.

• As configurações dos assentamentos, que foram ocupando as terras livres e impondo


limites aos espaços livres que sobraram.

• A configuração da forte topografia dos maciços e a natureza dos espaços, como, por exem-
plo, os campos inundáveis, que praticamente inibiram a ocupação urbana nestes locais.

119
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

• A intenção conformadora e defensiva dos planos, que atuaram a favor da proteção dos
espaços livres e da definição de seus limites.

Em geral, existe uma superposição de critérios: transporte e assentamentos, por um lado,


e espaço livre, como “parcela” isolada e/ou protegida, por outro, o que ressalta a carência de
uma estrutura reconhecível entre estes elementos, a qual se mostra como uma aparente de-
sordem. Hoje, a maioria dos espaços livres se mantém não ocupados, sobretudo pela definição
dos planos, embora constantemente sofram a pressão da ocupação urbana, “legal” ou “ile-
gal”, constituindo o conjunto espaço livre, infra-estrutura viária e assentamentos, um somató-
rio de elementos com critérios estruturadores próprios, que pouco se relacionam entre si.
Entretanto, ainda é possível observar os espaços que mantiveram uma configuração simi-
lar à original, e aqueles que, de alguma maneira, se transformaram. Isto é, permaneceram as
características geográficas mais significativas: os maciços, os mangues, a praia, os espaços que
sofreram algum tipo de proteção, os que se transformaram nas grandes extensões de terras
rurais; e ainda, os terrenos baldios e as áreas de reserva de solo, entre outras modalidades.
Neste marco, se reconhecem algumas características dos espaços livres que indica-
riam possíveis bases para uma atuação na unidade como um todo. Entre outros aspectos,
podemos identificar os seguintes:

• A fragmentação da matriz biofísica, que ressalta a necessidade de intervenção a fim de


recuperar os cursos de água, os ecossistemas, a estabilidade dos solos, etc., a favor de seu
desenvolvimento de modo equilibrado.

• A perda da qualidade visual, que mostra a necessidade de identificar e preservar as carac-


terísticas visuais significativas que sobreviveram ao desenvolvimento urbano da área e de
estimular sua preservação e percepção integrada a partir do sistema de espaços livres.

• A necessária atenção à acessibilidade dos espaços livres e suas conseqüências relativas


às atividades que potencializam a ocupação urbana, assim como a adequação da constru-
ção de infra-estruturas viárias aos recursos que comportam estes espaços.

• A necessidade de um planejamento que enfoque as questões relativas aos espaços livres


de modo que permita sua proteção e seu desenvolvimento sustentável, que garanta a pos-
sível consolidação do sistema e o papel estruturador deste relativo à ocupação urbana.

120
Evolução urbana e espaços livres a analisar

Na realidade, os planos urbanísticos até agora, desde o Plano Agache (1930), o Plano
Doxiadis (1965) ou o Pub Rio (1977), conceberam a cidade do ponto de vista da artificia-
lização e da tentativa de ordenação e controle. E, embora alguns planos, como o Plano
Diretor Municipal de 1992 ou os planos especiais (PEUs), tenham dado atenção ao tema dos
espaços livres, sua proteção e gestão, um plano integrado, que considere a relação entre os
espaços livres em sistema como condutores da ocupação urbana, ainda não foi concebido.

67

67. Mapa da leitura morfológica do loteamento dos espaços livres.

121
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Nos últimos anos, grande parte das ações do setor público no Rio recaíram sobre os
espaços livres públicos a escala local ou, inclusive, sobre a recuperação e revitalização do
edificado, geralmente em áreas com uma vitalidade urbana assegurada e com alta densida-
de. Este fato reforça a importância do tratamento e da reabilitação do espaço livre público,
mas estas intervenções respondem, principalmente, ao critério de justaposição de espaços
dentro de enfoques pontuais, que pouco contribuem para a integração dos espaços livres na
escala do território, não sendo, portanto, eficazes na atuação sobre os processos específicos
de fragmentação e desequilíbrio do espaço urbano de modo mais amplo.

68

68. Espaços livres atuais (adaptação de mosaico de ortofotos) (F.: IPP, 2000).

122
Evolução urbana e espaços livres a analisar

Deste modo, as análises apresentadas ressaltam a oportunidade que pode represen-


tar a ordenação de um sistema de espaços livres, como o que se propõe, que estruture as
peças livres fragmentadas e se relacione com seu entorno, como uma possível diretriz do
projeto territorial.

Notas
29
Um dado singular do planejamento na área foi a criação, em 1932, da “Reserva Biológica de Goethea”,
na Restinga de Itapeba, sendo a mais antiga reserva decretada no Brasil a nível municipal.
30
“Desde o século XVI esta região, ocupada por grandes concessões territoriais aforadas, dedicava-se eco-
nomicamente à pecuária e aos engenhos de açúcar. No século XVIII, as atividades se expandiram com a introdu-
ção dos cafezais, que conheceram seu auge e decadência durante o século XIX” (Fridman, 1999, p. 130).
31
O final dos anos oitenta esteve marcado pela municipalização das leis ambientais no Brasil, que antes
eram ditadas apenas em âmbito nacional ou estadual.
32
Algumas destas modificações no Plano Piloto foram regularizadas pelo decreto N.° 3.046 de 27/04/81.
Entretanto, apesar do aumento da densidade na área, as transformações espaciais não previstas pelo Plano
provocaram muitos problemas, entre eles, a ausência de uma adequada rede de saneamento básico, a satu-
ração do tráfego e a degradação ambiental (PCRJ, 1991).
33
Os condomínios se caracterizam, principalmente, por ser áreas fechadas em sentido literal, com muros
e grades que não permitem o contato com o entorno. Em geral, possuem amplos espaços livres e serviços,
que atendem às necessidades diárias da comunidade que vive ali, reproduzindo um pedaço de cidade. Alguns
também incluem equipamentos para uso coletivo, como escolas abertas à comunidade externa. Na realidade,
os condomínios são a adaptação das propostas de assentamentos de residências do Plano Piloto, embora
proponham, entre outras modificações, seu fechamento. Uma das idéias intrínsecas a estes lugares é a sa-
tisfação das necessidades sem precisar sair de seus âmbitos espaciais e sem permitir a entrada livre. Tudo
está controlado, se evita não apenas a mistura social, como também o contato com a cidade, ao criar ilhas
ensimesmadas que tendem à fragmentação espacial, funcional e social. Ilhas que se vendem como lugares
seguros, tranqüilos, sem as perturbações urbanas, e que acabam por conformar verdadeiros guetos.
34
Não foi possível obter a carta cadastral da área de estudo junto ao setor público municipal, O que se
apresenta é a leitura morfológica do loteamento dos espaços livres a partir da interpretação de ortofotos,
segundo a cartografia digital do Instituto Pereira Passos (1997).
35
“De um total de 15 km2 na região da Barra da Tijuca que engloba os bairros da Barra, do Recreio dos
Bandeirantes, do Joá e parte de Jacarepaguá, 7 km2 pertencem, desde 1958, à ESTA – Empresa Saneadora Ter-
ritorial e Agrícola S.A […] Esta empresa é parcialmente sucessora do banco de Crédito Móvel, que comprou as

123
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

terras de Camorim, Vargem Grande e Vargem Pequena em 1981. Ao Banco elas foram transferidas quando a
Companhia Engenho Central de Jacarepaguá foi extinta. Esta Companhias haviam comprado do Mosteiro de
São Bento que, por sua vez, recebeu grande parte das terras como doação de Dona Vitória de Sá em 1667.
Há 3 km2 que pertencem a Carvalho Hosken no local conhecido como Saco y Saquinho […], e 1 km2
no Recreio dos Bandeirantes. Há ainda 1 km2 pertencentes aos irmãos Ramos, empresários, […]. Há outras
grandes glebas que totalizam cerca de 3,8 km2. Deste total, 2,5 km2 são de empresas de construção civil“
(Fridman, 1999, p.246, 247).
36
Na área, especificamente, esta prática colaborou, na segunda metade do séc. XIX, com o loteamento
das grandes propriedades rurais, ao permitir que os “posseiros” mantivessem os lotes que ocupavam, através
da regularização de suas propriedades. Por outra parte, a abolição da escravatura, na mesma época, forçou
alguns donos das grandes propriedades a abandonar seus cultivos e a criação de animais, ao mesmo tempo
em que parcelavam e vendiam a terra, possibilitando sua urbanização (Fridman, 1999).
37
São exemplos de intervenções urbanísticas os projetos: Favela-Bairro, Rio-Cidade e Rio-Orla.

124
5
Análise e avaliação:
os atributos dos espaços livres

Neste capítulo são analisados alguns atributos dos espaços livres: os atributos do
suporte biofísico, os atributos perceptivos, a possibilidade de acesso e os vínculos de pla-
nejamento existentes. A proposta é avaliar cada atributo segundo parâmetros específicos
e compor uma escala de valores, a fim de determinar uma primeira aproximação aos
espaços livres mais adequados para constituir o sistema que se pretende vertebrar.
As análises são realizadas segundo os seguintes parâmetros:

• Os atributos do suporte biofísico. A análise dos atributos biofísicos objetiva avaliar


os espaços livres que colaborariam para a manutenção dos processos naturais do lugar
como áreas sensíveis à exploração e à ocupação urbana. Para tanto, são examinados os
seguintes elementos: a cobertura vegetal, a hidrologia e a declividade (a edafologia é ana-
lisada, mas não foi considerada na avaliação final das atributos biofísicos dos espaços).

• Os atributos perceptivos. A análise dos atributos perceptivos busca avaliar os es-


paços livres desde o ponto de vista visual, de acordo com a singularidade dos lugares,
centrando-se nos elementos cênicos, nas áreas de emergência visual, nos fundos cênicos
e nos espaços livres como marcos históricos.

• A acessibilidade. A análise da acessibilidade procura aferir o grau de acessibilidade existen-


te e potencial (segundo as vias previstas) dos espaços livres da área e identificar aqueles com
maior ou menor risco de sofrer modificações pela ocupação urbana e/ou por alguma atividade.

125
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

• Os vínculos de planejamento. A análise do planejamento objetiva verificar os parâ-


metros de proteção aos quais estão submetidos os espaços livres, segundo sejam suscep-
tíveis à ocupação urbana ou estejam sob alguma medida de proteção estrita, com vistas
a identificar os que estão mais ou menos assegurados pelo planejamento atual como
espaços livres de ocupação.

5A > Atributos do suporte biofísico

Para determinar a avaliação dos atributos biofísicos dos espaços livres, se busca iden-
tificar a vulnerabilidade à exploração e à ocupação urbana em cada peça, relativo à ma-
nutenção de seus processos naturais e, conseqüentemente, como um fator que atuaria a
favor de sua não ocupação. Para tanto, se descreve e avalia as seguintes variáveis:

• A cobertura vegetal. Destaca-se a permanência das comunidades vegetais menos


alteradas em comparação com as mais alteradas, de acordo com as modificações que
sofreu um determinado ecossistema em relação a sua conformação original.

• A hidrologia. Priorizam-se os lugares mais expostos às inundações e aos deslizamen-


tos frente aos menos expostos, dada a necessidade de preservar os lugares essenciais às
dinâmicas hídricas.

• A declividade. Ressaltam-se os lugares menos vulneráveis aos desmoronamentos


frente aos mais vulneráveis, de acordo com as encostas e as condições de solo que
apresentam.

• A edafologia. Busca-se detectar os terrenos mais aptos para o uso agrícola em com-
paração com os menos aptos, segundo reúnam condições favoráveis ao desenvolvimento
da agricultura. Os espaços livres, sendo mais aptos para a agricultura, podem ser um fator
privilegiado na eleição dos usos do solo e das atividades compatíveis ou adequadas a um
determinado lugar. Cabe ressaltar que a edafologia é considerada como dado a levar em
conta na caracterização dos espaços livres, embora não tenha feito parte da avaliação
final dos atributos biofísicos dos espaços.

126
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

Cobertura vegetal

Ao considerar a manutenção dos processos naturais no sistema de espaços livres, se
supõe que a conservação da cobertura vegetal atua na direção contrária à alteração de
um determinado ecossistema. Assim, quanto menos alterada determinada comunidade
vegetal, maior será a conservação de sua estrutura original e de seus processos natu-
rais. Ao contrário, as comunidades mais alteradas se encontram degradadas ou carecem
de outras fontes de energia, como o trabalho humano ou componentes químicos, por
exemplo. Conseqüentemente, em geral, são menos auto-suficientes e apresentam maiores
transformações na sua estrutura original que, muitas vezes, comprometem a qualidade de
seus ecossistemas (Hough, 1995; Odum, 1998; entre outros).
Nesta perspectiva, as comunidades vegetais menos alteradas representam elementos
de grande qualidade ecológica, fundamentais para o funcionamento dos processos na-
turais no sistema de espaços livres, enquanto que as mais alteradas têm distintos graus
de importância, desde um papel positivo, se são exploradas e estão adequadas ao fun-
cionamento dos processos naturais, até um papel negativo, se representam um risco para
estes processos, seja por seu elevado grau de degradação ou por incompatibilidades que
possam causar o tipo de exploração e/ou a maneira pela qual esta se realiza.
Assim, se toma como parâmetro de avaliação o grau de alteração de cada comunida-
de vegetal, onde se destacam:

• As comunidades menos alteradas. São as comunidades vegetais que sofreram ne-


nhuma ou escassa alteração na sua estrutura original ou que se encontram recuperadas.

• As comunidades mais alteradas. São as comunidades vegetais com sua estrutura


original muito alterada ou degradada.

Para medir os graus de alteração das comunidades vegetais no caso de estudo, foram
observados, além dos resultados dos estudos oficiais do Estado38, os usos atuais desenvolvi-
dos nos espaços livres e a forma como podem afetar a estrutura original do tipo vegetal.
As extensões de espaços livres com explorações mais significativas correspondem ao
uso agrícola e à pecuária, localizados em terrenos a oeste do caso de estudo. Nas áreas
de planície estão presentes, entre outros, cultivos de subsistência, flores e a pecuária. A

127
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

maioria das plantações de banana se distribui pelas encostas dos maciços. A introdução
da agricultura e da criação de gado, entre outros fatores, contribuiu para a transformação
da vegetação nas áreas inundáveis e para a retração das áreas florestais mais próximas à
produção agrícola. Entretanto, os brejos, embora sofram as conseqüências da exploração
agropecuária, principalmente pelos aterros e pela contaminação, não são áreas favoráveis
a este tipo de exploração devido às suas características como área alagadiça, portanto
mantém importantes aspectos de seu ecossistema original.
As extensões florestais incluem as sedes dos parques naturais, que comportam algu-
ma infra-estrutura de uso público, e despertam cada vez mais um maior interesse para as
atividades relacionadas com o lazer e o ecoturismo, mas sem comprometer as estruturas
florestais. Também se encontram áreas florestais em propriedades industriais e em algu-
mas zonas de equipamentos coletivos em bom estado de conservação. Como exemplo
cabe citar o hospital psiquiátrico Colônia Juliano Moreira (nas margens do Maciço da
Pedra Branca), que abarca parte da área florestal do Maciço. Em meio à floresta também
podem ser encontradas algumas pedreiras, umas ativas, outras desativadas, principalmen-
te nas margens do Pedra Branca, que constituem um dos mais importantes fatores de
degradação da vegetação nas encostas do Maciço (Costa, 2002). Mas, em geral, as áreas
florestais mais prejudicadas pelas explorações são as que apresentam sua vegetação de-
gradada. Correspondem a áreas que foram desmatadas e, geralmente, servem para pasta-
gem ou não são utilizadas. Os jardins correspondem aos espaços livres de dimensões me-
nores destinadas a sedes de clubes, e incluem, entre outros: o clube de golfe, os parques
aquáticos, os campings, os clubes privados, os jardins públicos e partes de propriedades
de equipamentos coletivos e industriais. Em geral, apresentam uma vegetação cultivada,
que não é a original, e que em alguns lugares está degradada.
Os mangues e as restingas não costumam ser alvos de um uso intenso, seja porque
estão em espaços protegidos, seja por apresentarem condições adversas a certas explo-
rações. Mesmo assim, se constata a tendência à localização de clubes nestas áreas, so-
bretudo naquelas originalmente cobertas pelas restingas, o que conduziria a uma retirada
desta vegetação e sua transformação em jardim. Em geral, estas comunidades vegetais
estão mais conservadas, embora sofram os efeitos da contaminação das águas, dos ater-
ros clandestinos e da retirada ilegal da cobertura vegetal, entre outros fatores.

128
129
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Neste marco, todas as comunidades vegetais são importantes para a manutenção dos
processos naturais no sistema de espaços livres, ao se considerar a possibilidade de sua
recuperação ou reabilitação, segundo seja conveniente. Conforme o interesse da conser-
vação, sem apresentar exclusões fundamentais, se atribuiu os graus alto e médio.
Através deste critério, foram identificados os seguintes grupos de comunidades vege-
tais, com valores classificados como alto e médio respectivamente:

• As comunidades mais preservadas. Floresta, floresta secundaria, mangue, brejo e


restinga.

• As comunidades menos preservadas. Floresta degradada, vegetação em área


inundável, campo antrópico, cultivo e jardim.

No mosaico formado pelas comunidades vegetais da área predominam as superfícies


com comunidades vegetais mais preservadas sobre as menos preservadas, o que confirma a
importância da presença da vegetação nesta unidade territorial e o seu potencial como con-
tribuição à manutenção dos processos naturais na ordenação do sistema de espaços livres.
As comunidades vegetais mais preservadas são também as mais vulneráveis ao dano,
e correspondem, sobretudo, àquelas que fazem fronteira com as áreas mais densamente
urbanizadas, como as florestas e as restingas, ou às que culturalmente são pouco valoriza-
das, como os brejos. Pelas qualidades que reúnem, se ressalta a necessidade de valorizar
e considerar estes tipos vegetais para sua proteção e gestão.

Hidrologia

Resguardar os “lugares da água” significa agir a favor da manutenção dos processos
naturais no sistema de espaços livres. A águas superficiais ou subterrâneas e suas respec-
tivas dinâmicas de circulação e inundação são fatores determinantes para o bom funcio-
namento hídrico de um lugar. Neste contexto, além dos leitos dos mananciais e suas mar-
gens, essenciais para a manutenção das dinâmicas hídricas, cabe identificar as áreas que
podem sofrer inundações e/ou deslizamentos, por causas naturais ou artificiais. Identificar
estas áreas significa estar atento aos espaços necessários para o funcionamento da água
nos espaços livres, cuja ocupação ou exploração pode ter conseqüências catastróficas.

130
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

De acordo com os processos naturais, segundo a quantidade de água recebida ou


trocada entre os aqüíferos, o volume de água pode ser maior ou menor, o que faz com que
varie seu nível e pode resultar em um risco de inundação e/ou deslizamento.
Entretanto, o risco de inundação e de deslizamento pode ser potencializado por al-
terações artificiais provocadas nas dinâmicas naturais, seja por uma exploração, seja por
uma ocupação urbana que modifique o volume de água relativo à capacidade de seu leito.
A ocupação urbana nas margens das águas favorece a acumulação de sedimentos nos
leitos dos rios e nas zonas úmidas, o que impede a circulação da água e aumenta a ve-
locidade das enxurradas e, como conseqüência, a propensão aos riscos. O mesmo ocorre
com os canais artificiais, as represas e as canalizações para o abastecimento urbano que,
entre outros fatores, costumam causar problemas no ciclo da água, seja pelo estrangula-
mento do curso ou por sua dispersão, o que pode significar um risco de inundação e/ou
de deslizamento (Hough, 1995).
Relativo à dinâmica hídrica do caso de estudo, o quadro é complexo, particularmente
quanto à acumulação de água na planície e aos problemas de drenagem mencionados
anteriormente, que se distribuem pelas extensas áreas úmidas ao redor das lagoas e na
parte oeste da planície. Além disso, estas áreas se encontram junto a águas subterrâneas
muito próximas à superfície do solo, havendo grande possibilidade de movimentos de
terra nas suas margens e inundações (SMAC, 1998).
Os rios que drenam a área apresentam enxurradas torrenciais, que descem dos maci-
ços no verão, época na qual a pluviosidade aumenta consideravelmente, o que eleva, con-
seqüentemente, o volume dos mananciais, e tende a provocar deslizamentos e impactos
bruscos contra a planície, propiciando as inundações (Costa, 2000). Neste movimento, a
grande amplitude das serras e as encostas com declividades acentuadas, principalmente
em áreas de cota mais elevada, potencializam a descida das águas e de sedimentos e, nos
casos de encostas pouco acentuadas, facilitam as inundações.
Na realidade, os riscos de inundação e deslizamento tendem a se acentuar nas áreas
ocupadas por cultivos, campos antrópicos ou edificações muito próximas aos aqüíferos,
devido, entre outros fatores, à excessiva impermeabilização e compactação do solo, à
maior possibilidade de erosões nas margens e à presença de possíveis pontos de estran-
gulamento dos leitos (SMAC, 1998). Neste contexto, a ocupação urbana nas áreas expos-

131
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

tas aos riscos de inundação e deslizamentos é um problema crescente no caso de estudo,


seja pela ocupação legal, seja pela ocupação ilegal das favelas.
Dado que as áreas expostas à inundação e aos deslizamentos são parte fundamental
dos espaços livres para a manutenção dos cursos de água e suas dinâmicas, quanto mais
exposto se encontra um lugar, mais estará sujeito a permanecer não ocupado. A partir
deste critério, se atribuem os seguintes valores às superfícies39:

• Alto: zonas críticas. Áreas mais expostas a inundações e/ou deslizamentos.

• Médio: zonas susceptíveis. Áreas onde podem ocorrer inundações e/ou deslizamentos.

• Baixo: zonas idôneas. Áreas não expostas a inundações e/ou deslizamentos.

No caso estudado, as planícies constituem uma grande superfície susceptível de inunda-


ção, embora as zonas críticas estejam restritas a alguns pontos específicos próximo à Lagoa
da Tijuca e no meio da planície de Jacarepaguá. Entre as áreas mais críticas se encontram os
espaços livres ao redor dos rios Pavuninha, Arroio Fundo, Anil e das Pedras. Cabe ressaltar
que as demais áreas planas susceptíveis à inundação são atualmente objeto da ocupação
urbana e estão sujeitas a alterações cruciais indispensáveis à ocupação, que compreendem
desde a abertura de canais para a drenagem até aterros e terraplanagens ou outras inter-
venções. Estas ações tendem a alterar o processo hídrico, provocando o aumento da cota de
inundação e a possibilidade de erosões e de transporte de sedimentos.
Quanto às zonas susceptíveis a sofrer deslizamentos, elas se encontram concentradas,
sobretudo, nas margens dos maciços, ocupando quase toda a extensão oeste do Maciço
da Tijuca e leste do Maciço da Pedra Branca, com exceção das margens da Serra de Gua-
ratiba. Aqui as áreas críticas, ao contrário, são mais pontuais e, em grande parte, ocupam
as cotas mais altas das montanhas. Nos maciços, as encostas muito abruptas tendem a
facilitar os deslizamentos e, quando associadas à ocupação urbana, aos cultivos agrícolas
e à retirada da vegetação, estes riscos podem ser ainda maiores.
Estas áreas expostas a inundações e a deslizamentos costumam ser muito vulneráveis
e mereceriam uma proteção e uma gestão atentas às possíveis ocupações urbanas.

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ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Declividade

A observação da declividade é essencial para identificar os lugares mais vulneráveis aos
desmoronamentos, de acordo com as inclinações das encostas e as condições do solo que
apresentam. Estes lugares não deveriam ser ocupados e mereceriam uma atenção especial
com relação a possíveis explorações, de modo que fosse priorizada a preservação dos pro-
cessos naturais nos espaços livres. No que diz respeito à ocupação urbana, as condições
físicas das encostas condicionam o acesso, tanto de estradas quanto de infra-estruturas de
serviços, e podem representar riscos para a ocupação ou, até mesmo, impossibilitá-la.
A bibliografia que aborda o tema desaconselha a ocupação em encostas com declivi-
dade de mais de 20%, pois podem apresentar riscos de desmoronamentos ao intensificar
processos de erosão e desertificação, principalmente se coincidem com a presença de
solos, cuja textura, estrutura e permeabilidade, entre outros fatores, influenciam nesse
fato (McHarg, 1969).
Um estudo sobre o Maciço da Pedra Branca (Costa, 2002) revela que as declividades que
contribuem para os deslizamentos são as de 15 a 20% e, sobretudo, de 25 a 45%, associa-
das a solos pouco estáveis; dados que estão de acordo com as indicações anteriores. Mesmo
assim, estas indicações variam de acordo com o processo de ocupação urbana já existente,
que pode acentuar os riscos naturais de deslizamentos devido ao processo de artificialização
imposto, principalmente em áreas de fortes declividades, em geral não aptas à ocupação.
Com base nestas informações, são atribuídos os seguintes valores às superfícies se-
gundo sua propensão aos desmoronamentos:

• Baixo. Com inclinação entre 0 a 10%.

• Médio. Com inclinação entre 11 a 20%.

• Alto. Com inclinação ≥ 21%.

A observação das declividades da área revela que desde a cota 0m até a de 25m
predominam as inclinações que variam de 0 a 20%. Entretanto, na parte sul do Maciço
da Tijuca, as inclinações se acentuam a partir da cota 25m, apresentando variações desde
20% até 60%, antes de alcançar a cota de 100m. As inclinações no Maciço da Pedra
Branca, na parte sul, chegam a 30% em algumas áreas, entre a cota 25m e a cota 50m,

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ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

mas em geral tornam-se mais acentuadas a partir da cota de 50m, fenômeno que se
repete no Maciço da Tijuca.
Neste contexto, a planície se mostra como uma grande superfície que tende a sofrer
pouca influência dos desmoronamentos. Em contrapartida, grande parte dos maciços,
com inclinações muito acentuadas, estaria mais propensa aos mesmos, portanto se de-
saconselharia por completo sua ocupação, ressaltando a importância da fiscalização das
explorações nestes lugares.

Edafologia

Um dos critérios para análise dos solos é seu maior ou menor potencial para o uso agrí-
cola. Este fator pode indicar, por um lado, o possível desenvolvimento de cultivos em certas
áreas e, por outro, a conveniência de limitar a ocupação urbana a favor da agricultura.
O crescimento efetivo da agricultura, de modo otimizado, depende da conjunção en-
tre a qualidade do solo (fertilidade, acidez, estrutura física, etc.) e outros fatores como a
drenagem e a declividade (Turner, 1998). Entretanto, alguns cultivos se adaptam a declivi-
dades mais acentuadas e muitos deles se aproveitam das transformações no relevo para
se desenvolver, o que demonstra que o relevo é adaptável e, em definitivo, não constitui
um elemento de exclusão.
Segundo o grau de aptidão maior ou menor que apresentam para a prática agrícola,
os solos podem ser:

• Solos muito aptos. São solos excelentes para o desenvolvimento das atividades agrícolas.

• Solos moderadamente aptos. São solos que necessitam medidas de correção para
o desenvolvimento agrícola.

• Solos não aptos. São solos onde não se recomenda o uso agrícola.

De acordo com esta classificação se atribui aos solos valores alto, médio e baixo,
respectivamente, segundo sejam muito aptos, moderadamente aptos ou não aptos, de
acordo com a tendência que apresentam mais ou menos favorável ao desenvolvimento
da exploração agrícola40:

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137
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

• Solos muito aptos:


– Brunizem. São solos bem estruturados e férteis, embora se encontrem em áreas
com declividade acentuada com grande propensão à erosão.

• Solos moderadamente aptos:


– Solos Gley. São solos pouco drenados e pouco profundos, muito comuns nas mar-
gens hidrográficas. São terrenos planos, não susceptíveis à erosão, embora apresentem
limitações à agricultura pelo excesso de água ou acidez.
– Solos aluviais. São solos que se desenvolvem em terrenos planos. Sua profundida-
de depende da localização das águas subterrâneas, enquanto que sua estrutura depende
da natureza dos materiais depositados. Apresentam restrições ao uso agrícola devidas à
possibilidade de inundações.
– Solos orgânicos. São solos pouco drenados, que provêem da acumulação de res-
tos vegetais, e são muito ácidos. Apresentam limitações relativas à fertilidade.
– Planosolos. São solos muito variáveis quanto a sua estrutura, sofrendo um excesso
de umidade nos períodos de chuva e de ressecamento nos períodos secos. Geralmente são
terrenos planos com pouca erosão, embora a variação hídrica represente dificuldades para
o uso agrícola.
– Latosolos vermelho-amarelo. São solos muito porosos e bem drenados, com
boa resistência à erosão. Em geral se encontram em áreas de relevo acidentado e monta-
nhoso. Apresentam limitações em relação à fertilidade.

• Solos não aptos:


– Areias marinhas. São solos muito drenados, ácidos e, quase sempre, profundos,
bastante permeáveis, além de pobres em nutrientes e susceptíveis à erosão. Não são indi-
cados para a agricultura.
– Mangues. São solos inundados, muito ácidos, e geralmente não são indicados para
o uso agrícola.
– Podzol. São solos profundos, arenosos, ácidos ou moderadamente ácidos. Desen-
volvem-se em áreas de relevo plano. Não são indicados para o uso agrícola.
– Podzólico vermelho-amarelo. São solos pouco férteis e susceptíveis à erosão.
Possuem poucas condições para a agricultura.

138
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

Observa-se que a maioria dos solos da área estudada apresenta uma fertilidade fraca
ou moderada, localizando-se os solos mais férteis em algumas manchas concentradas no
Maciço da Pedra Branca, em áreas com declividades acentuadas e, geralmente, de difícil
acesso. É importante destacar que um desenvolvimento de cultivos nas áreas florestais
pode incrementar a já crescente substituição da floresta pela agricultura, o que não seria
aconselhável. Pode-se concluir que, de forma geral, a área não apresenta boas condições
para o uso agrícola.

Avaliação final dos atributos biofísicos



A avaliação final dos atributos biofísicos é o resultado da soma dos valores obtidos na
avaliação das diferentes categorias expostas neste item, e informa sobre o grau de conve-
niência relativo à não ocupação dos espaços livres analisados, segundo sua importância
para a manutenção dos processos naturais.
Para categorizar os valores obtidos de forma sintética, se optou pela soma dos valores
atribuídos às distintas categorias de análise (cobertura vegetal, hidrologia e declividade),
segundo sua classificação como alta (A), média (M) ou baixa (B). Foram obtidos três
mapas gerais representativos de cada classificação (A/M/B), cuja posterior sobreposição
resultou em cinco qualificações finais:

• Alta (A)41. São espaços livres muito bem avaliados, cujos processos naturais apresen-
tam pouca tolerância com relação à exploração e à ocupação urbana.

• Média-alta (MA)42. São espaços livres com uma avaliação média-alta, cujos processos
naturais apresentam uma tolerância “média-baixa” com relação à exploração e à ocupa-
ção urbana.

• Média (M)43. São espaços livres com uma avaliação média, cujos processos naturais apre-
sentam uma tolerância “média” com relação à exploração e à ocupação urbana.

• Média-baixa (MB)44. São espaços livres com uma avaliação média-baixa, cujos pro-
cessos naturais apresentam uma tolerância “média-alta” com relação à exploração e à
ocupação urbana.

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ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

• Baixa (B)45. São espaços livres com uma avaliação baixa, cujos processos naturais apre-
sentam uma “alta” tolerância com relação à exploração e à ocupação urbana.

Paralelamente, se mostra um mapa de síntese, onde foram sobrepostos os resultados


das avaliações dos parâmetros relacionados com a preservação das comunidades vege-
tais e a susceptibilidade aos riscos (inundação, deslizamento e desmoronamento), o que
permite identificar os elementos biofísicos que incidem em cada peça de espaço livre e
sua avaliação.

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ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

5B > Atributos perceptivos

Para determinar a avaliação dos atributos perceptivos dos espaços livres no caso de
estudo, se busca identificar as características mais genuínas dos elementos físicos que com-
põem os espaços e que podem ser percebidos como parte da identidade visual da área, e se-
riam merecedores de conservação. Cabe ressaltar que este tipo de avaliação possui um alto
grau de subjetividade e está sujeita a distintas considerações sobre seu valor. Na análise dos
atributos perceptivos das superfícies livres se descrevem e avaliam os seguintes elementos:

• Os elementos cênicos. São considerados como elementos cênicos os componentes


naturais dos espaços livres com uma qualidade visual intrínseca.

• As áreas de emergência visual. Referem-se aos elementos singulares que compõem


os espaços livres, especificamente o relevo e a hidrografia, e que podem ser percebidos
desde os percursos pelas vias.

• Os fundos cênicos. Correspondem às visuais mais amplas permitidas desde os espa-


ços livres e que abarcam os elementos mais significativos da paisagem de maneira parcial
(as vistas parciais) ou geral (as vistas panorâmicas).

• Os marcos históricos. São os espaços livres com interesse histórico-cultural que, em


geral, perduraram na evolução urbana da área.

É importante ressaltar que, neste item, não foram considerados os espaços livres com
importância relativa aos valores imateriais presentes na área, devido à amplitude da pesqui-
sa exigida e à impossibilidade de realizá-la sem o apoio de uma equipe. Mas, considera-se a
relevância de tal aspecto, que poderia ser acrescentado às análises realizadas como mais um
fator favorável à incorporação destes espaços livres ao sistema que se quer propor.

Elementos cênicos
Os elementos cênicos constituem os componentes naturais dos espaços livres com
maior atrativo visual, o que lhes confere uma qualidade intrínseca. A importância dos
elementos cênicos se reflete no caráter que imprimem à composição de determinada
paisagem, sendo parte significativa de sua identidade visual, como, por exemplo, as sin-
gularidades do relevo, da vegetação e da hidrografia.

144
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

O atrativo visual de um elemento pode ser medido pelas particularidades de sua com-
posição formal, por exemplo, os acidentes topográficos, que são quase esculturas a céu
aberto; a cobertura vegetal que apresenta uma variedade de cores, de estratos variados,
ou conforma uma massa densa com uma presença contrastante; ou a água com formas
distintas e amplas (González Bernaldez, 1981; Bolós, 1992; entre outros).
Neste contexto, se avaliam os elementos cênicos presentes no caso de estudo, cuja
localização é um dado importante que deve ser considerado para que permaneçam visí-
veis e preservados.
A percepção do relevo da área está influenciada pela sucessão de cumes que tipificam
a unidade territorial como um grande anfiteatro emoldurado por montanhas. As serras
que conformam os maciços ressaltam as principais formações que contém os pontos de
maior altura e se destacam na composição topográfica. Elas determinam uma geometria
singular em relação à planície e aos cumes, como linhas diretrizes em direção aos pontos
mais centrais dos maciços, dispostas de modo radial em distintas direções da planície.
Exemplificando, se pode nomear as serras do Engenho Velho, do Inácio Dias, dos Pretos
Forros e a Serra Geral de Guaratiba, as quais apresentam uma continuidade quase com-
pleta na zona norte da planície, onde se produz o encontro entre os maciços, e formam o
arco limite da planície. A Serra Geral de Guaratiba define a parte oeste da planície, como
um grande braço do Maciço da Pedra Branca, perpendicular ao mar.
Nos cumes, como seqüências de pontos mais altos, predominam as zonas escarpadas
e, no caso específico dos maciços estudados, em alguns pontos há grandes afloramentos
rochosos, que podem ser percebidos como esculturas naturais, monumentais, como, por
exemplo, a Pedra da Gávea e o Morro Dois Irmãos.
Os pontos de cota mais baixa, em geral menos visíveis, não apresentam caracterís-
ticas de interesse visual. Da mesma maneira, a grande extensão da planície, com seu
relevo muito homogêneo, também não oferece atrativos visuais. Entretanto, as colinas
na planície se apresentam como elevações topográficas que contrastam com a planura
e lhe emprestam um caráter especial. Além disso, algumas possuem uma conformação
particular, que as realça ainda mais, por exemplo, a Pedra da Panela, ou estão em lugares
muito específicos e claramente diferenciados dos demais, como o Pontal de Sernambetiba.
Algumas destas colinas se apresentam cobertas, total ou parcialmente, pela vegetação, o
que reforça as diferenças e o contraste com o plano.

145
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

A hidrografia é um fator decisivo na caracterização do lugar. Identificam-se na área


formações muito importantes, como as lagoas, os canais e o mar, que, por suas dimensões
e perenidade, fortalecem sua identidade visual.
A frente marítima é a linha longitudinal mais externa ao sul da unidade territorial. O
mar aberto oferece uma superfície ampla de águas azuis, que se impõe por sua extensão
e define com clareza o limite sul da área junto à praia.
Em geral, as lagoas são monumentais. Especificamente, as lagoas de Jacarepaguá e
da Tijuca são aqüíferos que se destacam na conformação central da planície. Suas formas
alongadas e sua grande largura não permitem abarcá-las em uma só visada, e são atri-
butos realçados na paisagem. A Lagoa de Marapendi se dispõe paralela ao mar, na parte
mais ao sul da planície, e possui uma forma linear ao longo do litoral em grande parte
de sua extensão, o que reforça sua posição longitudinal e a potencializa visualmente.
Em uma escala menor, a Lagoinha se destaca, entre outros aspectos, pelo contraste que
provoca sua forma com os canais conectados a ela, ao se conformar como uma bolsa de
água no meio das linhas de água circundantes, o que a converte em um dos principais
elementos que compõe a paisagem de seu entorno.
Os canais lagunares que apresentam um volume de água significativo são o Canal da
Joatinga, o Canal de Sernambetiba, o Canal de Marapendi e o Canal das Taxas. Estes ca-
nais descrevem traçados lineares, longitudinais e transversais, que percorrem a paisagem
desde seu extremo leste até o oeste. São importantes elementos lineares e contínuos que
conformam a paisagem e colaboram na percepção do lugar.
Relativo às comunidades vegetais, freqüentemente, as mais conservadas coincidem
com as massas vegetais visualmente mais significativas, o que acrescenta a sua importân-
cia ecológica um valor estético, como componentes fundamentais da diversidade visual da
área. Uma exceção pode ser considerada: o campo de golfe do Itanhangá Golf Clube, com
jardins projetados visualmente relevantes, valorizados pelos contrastes que criam com o
maciço ao fundo, embora estejam cercados por muros que impedem a visão externa.
Entre as massas vegetais visualmente mais significativas, se observa como uma cons-
tante visual o mosaico que conformam as florestas, onde se dispõe uma grande variedade
de tipos em seus distintos estratos vegetais. Na realidade, as áreas florestais se apre-
sentam como uma grande massa verde, densa e extensa, que ocupa a maior parte dos
maciços e tem uma forte presença visual.

146
69 70

71 72

O relevo, a vegetação e a água como elementos cênicos:


69. (Foto: Autora, 2003).
70 a 72. (Foto: Rodrigo Rinaldi, 2001).

147
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Os fragmentos de florestas nos campos de Sernambetiba, a oeste da planície, se des-


tacam pelo contraste de seu porte com a vegetação mais baixa e homogênea das áreas
úmidas e dos campos antrópicos. Neste contexto, a percepção dos mosaicos agrícolas não
é significativa, pois estes não configuram uma estrutura clara que possa ser apreendida
visualmente, seja pelos cultivos dispersos, seja pela grande extensão dos campos, que lhes
conferem um aspecto monótono e pouco atrativo.
Os mangues formam massas vegetais com tipos muito particulares, relativamente
densos, cujo conjunto sobressai junto às águas. Localizam-se nas margens das lagoas da
Tijuca e de Jacarepaguá, de Marapendi e Lagoinha. Também se destacam as restingas,
principalmente ao redor da Lagoa de Marapendi e Lagoinha. Estas possuem um estrato
vegetal bastante singular, cuja densidade realça suas massas no contexto da paisagem e,
em alguns casos, ainda podem ser encontradas sobre algumas dunas que persistem no
local, o que as distingue ainda mais.
Concluindo, se ressalta a relevância de um tratamento respeitoso à integridade física
dos elementos cênicos como um dado fundamental para a preservação da diversidade
visual da área.

Áreas de emergência visual



Detectar as áreas de emergência visual permite identificar e preservar as principais refe-
rências topográficas e hidrográficas dos espaços livres com focos visuais que caracterizam a
estrutura física do lugar e que podem ser percebidos a partir do movimento pelas vias. São
“aberturas” visuais que se descortinam e revelam formações singulares que, em geral, con-
trastam com o entorno, seja como um monumento topográfico, seja como amplas lâminas
de água que definem uma paisagem. Por suas características especiais e sua alta visibilidade,
podem ser interpretadas como um bem significativo que deve ser preservado.
De modo geral, as áreas de emergência visual se apresentam como enquadramentos
singulares que marcam as seqüências dos percursos como elementos diferenciados, que
favorecem mudanças no ritmo freqüente da paisagem percebida. Podem funcionar como
elementos de tensão que despertam o interesse pelo entorno visual, estabelecendo a
relação entre o comum e o diferenciado.
Entretanto, segundo o meio de transporte utilizado produzem-se variações na percep-
ção visual, que será diferente caso se circule de carro, de bicicleta, de trem ou a pé. Cada

148
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

meio de transporte oferece possibilidades perceptivas distintas, que podem ser mais ou
menos diretas, com ou sem obstáculos, mais ou menos pausadas, entre outras.
Por outro lado, as variações também são afetadas pelo tipo de via: se é uma estra-
da herdada dos tempos históricos, uma auto-estrada, uma via-expressa, etc. A estrada
permite viver o entorno, quando se circula a uma velocidade moderada, compartilhando
impressões relativamente diretas e amplas com o exterior. Ao contrário, a auto-estrada e
a via-expressa estimulam a alta velocidade e certo desinteresse pelo entorno, na medida
em que o objetivo dos condutores é o deslocamento mais rápido possível.
De acordo com a escala de análise que se adota e com os tipos de vias presentes no caso
de estudo, nos centraremos na percepção visual a partir das seguintes vias: estradas, auto-
estradas e vias-expressas, e em termos motores, a partir do carro ou do transporte público, que
são as vias e os meios majoritários dos fluxos territoriais e os mais destacados na área.
Deste modo, a determinação dos pontos específicos a partir dos quais são visíveis as
áreas de emergência visual pode aportar dados importantes para futuras intervenções no
território, que tenderiam a potencializar seu valor visual. Neste sentido, são identificadas
as seguintes áreas de emergência visual no caso de estudo:

• Áreas de emergência visual percebidas a partir da via-expressa e das auto-


estradas:

Relativas ao relevo:
– Morro da Freguesia, visto a partir da via-expressa Linha Amarela.
– Pedra da Panela, vista a partir da via-expressa Linha Amarela.
– Pedra da Gávea, vista a partir da Avenida das Américas.
– Morro do Rangel, visto a partir da Avenida das Américas.
– Pedra de Itaúna, vista a partir da Avenida das Américas.

Relativas à água, vistas a partir da:


– Ponte Santos Dummont, localizada na Avenida Ayrton Senna, em direção à Lagoa
do Camorim.
– Ponte na Avenida Ayrton Senna em direção à Lagoa de Marapendi.
– Ponte da Joatinga, localizada na Avenida das Américas, em direção ao Canal da
Joatinga.
– Ponte na Avenida das Américas em direção ao Canal de Marapendi.

149
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

– Ponte na Avenida das Américas em direção ao Canal de Sernambetiba.


– Avenida das Américas (trecho Avenida Armando Lombardi) em direção ao Canal da
Joatinga.

• Áreas de emergência visual percebidas a partir das estradas:

Relativas ao relevo:
– Morro Dois Irmãos, visto a partir da Estrada dos Bandeirantes, da Avenida Salvador
Allende e da Estrada da Curicica.
– Pedra do Itanhangá, vista a partir da Estrada de Jacarepaguá.
– Morro da Freguesia, visto a partir da Estrada dos Três Rios.
– Pedra da Gávea, vista a partir da Avenida Lúcio Costa.
– Morro do Rangel, visto a partir da Estrada do Pontal.
– Pontal de Senambetiba, visto a partir da Estrada do Pontal e da Avenida Lúcio Costa.
– Morros Cantagalo, Amorim, Portelo e Urubu, vistos a partir da Avenida Salvador
Allende.
– Pedra da Baleia, vista a partir da Avenida Salvador Allende.

Relativas à água, vistas a partir de:


– Viaduto do Pontal, localizado na Estrada do Pontal, em direção ao Canal de Ser-
nambetiba.
– Ponte na Avenida Salvador Allende em direção ao Rio Marinho.
– Estrada de Jacarepaguá em direção à Lagoa da Tijuca.

73 74

73. Vista do Pontal de Sernambetiba a partir da Av. Lucio Costa (Foto: Autora, 2003).
74. Vista da Pedra da Gávea a partir da Av. das Américas (Foto: Autora, 2003).

150
75. Vista do Morro do Rangel a partir da Av. das Américas 75
(Foto: Autora, 2003).
76. Vista a partir da ponte na Av. Ayrton Senna em direção
à Lagoa de Marapendi (Foto: Autora, 2003).
77. Vista a partir da ponte na Av. das Américas em direção
à Lagoa da Tijuca (Foto: Autora, 2003).
78. Vista a partir da ponte na Av. das Américas em direção
ao Canal de Sernambetiba (Foto: Autora, 2003).
79. Vista dos Morros Cantagalo e Amorim a partir da Av.
Salvador Allende (Foto: Autora, 2003).

76

77 78

79

151
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Fundos cênicos

Os fundos cênicos correspondem às visadas mais amplas da paisagem permitidas
pelos espaços livres, que podem ser: vistas parciais, que abarcam uma parte mais limitada
da paisagem, e vistas panorâmicas, que podem ser contempladas a partir de pontos com
cota mais elevada e oferecem visadas mais gerais.
Os fundos cênicos melhor avaliados possibilitam reconhecer os traçados mais carac-
terísticos dos espaços livres junto com seu entorno. Nestas vistas, os elementos cênicos
conformam panoramas que combinam contrastes entre a topografia, a água e a vegeta-
ção, percebidos em conjunto.
As vistas parciais recortam a paisagem e explicitam a conformação morfológica local e
suas peculiaridades. Entre as vistas parciais mais significativas no caso de estudo estão as
percebidas a partir da Avenida das Américas e da Avenida Lúcio Costa, localizada na frente
marítima, a partir das quais é possível abarcar grande parte dos elementos cênicos mais
singulares da área, e o resultado de suas combinações formais, como atributos de grande
qualidade visual. Pela proximidade entre observador e paisagem observada, estas visadas
evidenciam também elementos de conflito visual nos espaços livres; como exemplo no caso
de estudo, cita-se a presença de favelas nas margens de alguns cursos de água.
As vistas panorâmicas oferecem visuais mais amplas da paisagem, abarcando em al-
guns pontos quase a totalidade da unidade territorial. As vistas panorâmicas transformam
a paisagem em espetáculo, e os contrastes, as diversidades e as variações entre as formas
alcançam seu clímax, o que denota sua qualidade visual.
Neste marco, algumas estradas que passam pelos maciços e os morros permitem,
pelas grandes diferenças de cota entre maciço e planície, a abertura de amplas visadas
com grande qualidade visual. Podem ser destacados os seguintes pontos:

• Na Estrada de Furnas, com vista em direção à Baixada de Jacarepaguá.

• Na Estrada da Grota Funda, com vista em direção aos Campos de Sernambetiba.

• Na Avenida Estado da Guanabara, com vista em direção à praia da Barra da Tijuca.

• Na Pedra da Gávea, com vista em direção à Baixada de Jacarepaguá.

152
Vistas Panorâmicas:
80. A partir da Av. Estado da Guanabara, em direção à praia da Barra da Tijuca (Foto: Autora, 2003).
81. A partir da Pedra da Gávea, em direção à Baixada de Jacarepaguá (Foto: Autora, 2003).
82. A partir do Morro da Freguesia, em direção à Baixada de Jacarepaguá (Foto: Autora, 2003).
83. Vista Parcial (Foto: Autora, 2003).

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82

83

153
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

• No Morro da Freguesia, com vista em direção à Baixada de Jacarepaguá.

• No Morro da Capela de Nossa Senhora de Montserrat, com vista em direção aos Cam-
pos de Sernambetiba.

Os fundos cênicos podem ser transformados rapidamente mediante a ocupação dos


espaços livres. Neste contexto, se destacam as superfícies edificáveis entre a paisagem
observada e os pontos de observação das vistas parciais, os “corredores visuais” (Laurie,
1975), que, na realidade, correspondem a grande parte dos espaços livres da planície e
conformam lugares que mereceriam uma atenção especial com relação às condições da
ocupação urbana a fim de permitir a manutenção de determinadas vistas.

84

85

84 e 85. Vistas Parciais (Foto: Autora, 2003).

154
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

Marcos históricos

Como marcos históricos são privilegiados os espaços livres de interesse histórico-


cultural que, geralmente, permaneceram como remanescentes da ocupação urbana. Estes
espaços costumam ser testemunhas da história e representativos de valores tradicionais,
que requerem ser identificados e avaliados, portanto deveriam ter a ocupação urbana
limitada (Bolós, 1992).
Embora possa haver inúmeras razões para sua permanência, seja como um lugar de prá-
ticas comunitárias que se manteve ou, simplesmente, como uma propriedade esquecida, de
acordo com sua significação para a comunidade local, os marcos históricos poderiam reforçar
as relações entre a comunidade e seu entorno físico, e sua conservação e avaliação contribui-
riam para manter vivo o passado, além de permitir a preservação dos espaços livres.

“Nosotros conservamos las señales actuales del pasado o controlamos el


presente para satisfacer nuestras imágenes del futuro. Nuestras imágenes
del pasado y del futuro son imágenes presentes, continuamente recreadas
[…] El entorno espacial puede fortalecer y humanizar esta imagen presente
del tiempo, y yo supongo que esta función es uno de los papeles más am-
pliamente menospreciados” (Lynch, 1972, p.75).

Em muitos casos, estes espaços livres comportam elementos edificados que estão visu-
almente incorporados a eles, como parte deles, e, conseqüentemente, formam parte de seu
significado, como, por exemplo, o Cristo Redentor e o Corcovado, no Rio de Janeiro, e a Acró-
pole e a colina, em Atenas (McHarg, 1969). Em alguns destes casos, a presença edificada
costuma ser um dos principais motivos pelo qual determinado espaço livre permanece como
tal, sem sofrer transformações físicas substanciais. No caso de estudo, a identificação de tais
marcos coincide com bens patrimoniais já considerados pelo setor público, entre eles:

• O Morro da Capela de Nossa Senhora de Montserrat.

• A Colônia Juliano Moreira.

• O Morro da Freguesia com a Igreja Nossa Senhora da Penha.

155
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

86 Marcos históricos:
86. Morro da Freguesia com a Igreja Nossa
Senhora da Pena (Foto: Autora, 2003).
87 e 88. Colônia Juliano Moreira
(Foto: Autora, 2003).
89. Morro da Capela Nossa Senhora
de Montserrat (Foto: Autora, 2003).

87

88 89

156
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

• A Fazenda da Taquara.

• A Fazenda do Engenho d’água.

Na realidade, estes espaços livres históricos são remanescentes do passado rural da


área e sobrevivem no meio das infra-estruturas viárias e dos assentamentos, que foram
ocupando espaços dos cultivos agrícolas e da vegetação original da unidade territorial.
Por seu testemunho singular, constituem espaços que devem ser preservados e geridos de
acordo com suas características mais genuínas.

Avaliação final dos atributos perceptivos



A avaliação final dos atributos perceptivos dos espaços livres determina os espaços
relevantes na conformação visual do lugar, que possuem uma grande significação visual
e deveriam ser considerados espaços não ocupáveis para a ordenação do sistema. Nesta
direção, os elementos identificados, e que merecem uma alta (A) qualificação, são:

• Áreas de emergência visual. São aquelas percebidas a partir da via-expressa, das


auto-estradas e das estradas, relativas ao relevo e à água.

• Elementos cênicos. No que toca ao relevo, são consideradas as serras dos maciços,
os grandes afloramentos rochosos dos picos e das colinas das planícies. Relativo à hidro-
grafia são considerados o mar, as lagoas da Tijuca, de Jacarepaguá, de Marapendi e a
Lagoinha e os canais lagunares da Joatinga, de Sernambetiba, de Marapendi e das Taxas.
Quanto às comunidades vegetais, são consideradas as grandes massas florestais, os frag-
mentos de florestas nos Campos de Sernambetiba, os mangues, as restingas ao redor das
lagoas e os jardins do Itanhangá Golfe Clube.

• Fundos cênicos. São as vistas parciais e as vistas panorâmicas descritas anteriormente.

• Marcos históricos. São considerados os bens patrimoniais citados.

157
158
159
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

5C > Acessibilidade

Na análise da acessibilidade das superfícies livres se descreve e avalia a capacidade de aces-


so a partir das vias existentes e das vias previstas no caso de estudo, de acordo com os
seus atributos. O objetivo é determinar o grau de acessibilidade das superfícies, entendido como
um fator que tende a potencializar a maior ou menor probabilidade de que um espaço livre sofra
algum tipo de intervenção relativo à ocupação urbana ou ao desenvolvimento de atividades.
Embora a acessibilidade seja um atributo que pode estar vinculado a distintos meios
de mobilidade, a atenção recai sobre a acessibilidade motora, por ser a mais freqüente
nesta unidade territorial e a que atende um maior número de pessoas.
Cabe assinalar que a possibilidade de ocupação urbana ou o desenvolvimento de
uma atividade em algum espaço livre também estariam sujeitos a existência de outras
infra-estruturas, não somente da viária. Entretanto, este aspecto não foi abordado na
análise que segue por considerar-se que, de modo geral, a área apresenta-se bem infra-
estruturada, à parte o saneamento deficiente, como foi comentado anteriormente. Não
representando, deste modo, as condições das infra-estruturas um diferencial relativo à
possibilidade de ocupação ou ao desenvolvimento de atividades.

A partir das vias existentes e previstas



A acessibilidade, como possibilidade de movimento ao longo de um percurso até um
destino específico, é um importante atributo funcional para a ordenação do sistema de
espaços livres. As vias permitem manter a seqüência e a continuidade entre os espaços, fran-
queiam o acesso a estes, permitem sua vivência por parte da população e também podem
representar uma oportunidade para o aumento da ocupação urbana ou das explorações.
Em geral, quanto mais potente é a via, mais ela tenderia a funcionar como um canal
de conexões rápidas entre os diversos pontos do território, o que pode criar oportunidades
favoráveis à localização de assentamentos. Mas, isto não significa necessariamente que,
por existirem infra-estruturas viárias, a construção de assentamentos seja a melhor alter-
nativa para os espaços livres. Por isto, se aconselha um cuidado com os recursos destes
espaços para uma melhor determinação dos lugares mais adequados a estes fins.
Por outra parte, a acessibilidade pode favorecer as atividades nos espaços livres e
garantir sua vitalidade, já que potencializa a presença humana. Entretanto, em algumas

160
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

situações, as atividades podem ser incompatíveis com os atributos dos espaços livres, se-
jam perceptivos, biofísicos, ou outros. Por isso, o grau de acessibilidade dos espaços livres
pode servir como parâmetro de medição para futuras limitações aos possíveis usos.
Para medir o grau de acessibilidade dos espaços livres a partir das vias que os mar-
geiam são analisados certas variáveis, entre elas:

• O tipo de via. Faz referência à escala da via, ao alcance de suas conexões, ao tipo de
seção e a sua capacidade de suporte de fluxo de veículos.

• A velocidade de tráfego permitida nas vias. É uma variável que determina o tempo dis-
pendido para chegar a um espaço livre determinado.

• O alcance territorial das conexões. Mostra a extensão viária que pode ser percorrida a
partir das vias-expressas até às ruas do entorno, e desde aí até os espaços livres e, conse-
qüentemente, a quantidade de pessoas e lugares que podem ser conectados.

• A capacidade de tráfego. Refere-se ao perfil da via, à quantidade de pistas e de veículos


que podem circular, assim como ao tipo de veículo permitido em cada via.

• As variações no relevo. Faz referência à facilidade dos deslocamentos nos relevos planos
e ao aumento da dificuldade quando estes se tornam acidentados.

Por estes critérios, a acessibilidade dos espaços livres é variável e apresenta distintas
características de acordo com as vias existentes:

• Relativo às superfícies que margeiam a via-expressa e a auto-estrada. A via-expressa e as


auto-estradas permitem o percurso em alta velocidade, possuem uma grande capacidade de
tráfego e estabelecem longas conexões territoriais. Deste modo, cabe ressaltar as distintas
possibilidades de acesso de acordo com os diferentes tipos de vias. A via-expressa às vezes
permite o “efeito túnel”, ao conectar áreas afastadas do território em um curto espaço de
tempo, e apresenta uma acessibilidade restringida a suas conexões. Ao contrário, as auto-
estradas determinam um percurso por seqüências espaciais determinadas por velocidades
mais modestas e oferecem maior acessibilidade ao longo de suas margens.

• Relativo às superfícies que margeiam as estradas. As estradas permitem um percurso


mais pausado, a uma velocidade média, e ligam distâncias menores que as auto-estradas

161
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163
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

e as vias-expressas, ao mesmo tempo em que possuem uma considerável capacidade de


tráfego e permitem o acesso a partir de suas margens.

• Relativo às superfícies que margeiam as ruas principais. As ruas principais dos bairros são,
geralmente, bem conectadas à rede viária principal e secundária, admitem velocidades médias
e baixas e sua capacidade de tráfego é média, permitindo o acesso a partir de suas margens.

• Relativo às superfícies que margeiam a rede geral de ruas. A rede geral de ruas oferece distin-
tos graus de acessibilidade, embora, hierarquicamente, estes estejam abaixo das possibilidades
de acesso, de velocidade e de capacidade de tráfego, que possuem as ruas principais.

Avaliação final da acessibilidade



Neste marco de relações, se avalia a acessibilidade dos espaços livres a partir das vias
existentes e previstas (acessibilidade potencial), de acordo com sua hierarquia. Considera-
se a distância acessível à superfície livre segundo as variações relacionadas com o relevo
que apresenta, se é plano 500m a partir da via, se é acidentado 200m, distinguindo assim,
esquematicamente, diferenças relativas ao relevo que possam afetar à acessibilidade dos
espaços. Os resultados obtidos foram os seguintes:

• Alta (A). Para as superfícies que margeiam a via-expressa (conexões) e as auto-estradas.

• Média-alta (MA). Para as superfícies que margeiam as estradas.

• Média (M). Para as superfícies que margeiam as ruas principais.

• Baixa (B). Para as superfícies que margeiam a rede geral de ruas.

Concluindo, se detecta uma acessibilidade baixa em grande parte das margens dos
maciços, o que se traduz em uma relativa manutenção da qualidade da vegetação nestes
lugares e reforça a opção de não incentivar sua ocupação urbana ou exploração.
Ao contrário, a acessibilidade alta e média-alta nos espaços livres da planície, existen-
te ou prevista, exige que se atente para a necessidade de um controle efetivo da ocupação
urbana e das atividades nestes lugares de acordo com seus atributos biofísicos e percep-
tivos, o que requer considerações estritas com relação à coerência das intervenções. Entre

164
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

estes espaços se destacam as áreas a oeste da planície, principalmente aquelas próximas


às margens do Maciço da Pedra Branca, e as áreas ao norte das lagoas da Tijuca e de
Jacarepaguá.
Por outro lado, percebe-se acessibilidades médias, também existentes ou previstas,
junto a áreas de grande interesse biofísico e perceptivo, principalmente ao redor das
lagoas da Tijuca, de Jacarepaguá e de Marapendi, que exigiriam atenção à gestão de
possíveis intervenções.

5D > Vínculos de planejamento



Na análise dos vínculos de planejamento são verificados os parâmetros de proteção
a que estão submetidos os espaços livres e se pretende identificar os espaços com maior
ou menor probabilidade de permanecerem livres de ocupação urbana de acordo com as
determinações do planejamento atual, sua precisão espacial e restrição à ocupação. Para
tanto, são descritos e avaliados os seguintes elementos:

• As macrozonas e a área de interesse agrícola. Correspondem às áreas que po-


dem apresentar restrições à ocupação urbana.

• As superfícies protegidas. Referem-se às áreas que não podem ser ocupadas.

• As superfícies edificáveis. Abarcam as áreas destinadas à edificação (analisadas,


mas não são consideradas para a avaliação final dos parâmetros de proteção).

Macrozonas

A macrozonificação define o território municipal para fins de ordenação da ocupação


do solo em:

• Macrozonas urbanas.

• Macrozonas de expansão urbana.

• Macrozonas de restrição à ocupação urbana.

165
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

As macrozonas de restrição à ocupação urbana estão constituídas pelas áreas agríco-


las, as áreas com condições adversas à ocupação e/ou as áreas inadequadas à urbaniza-
ção, e as áreas destinadas à proteção ambiental. Respectivamente, correspondem a:

• Áreas agrícolas. São áreas delimitadas com a intenção de manter a atividade agropecu-
ária e compreendem áreas com vocação agrícola e outras inadequadas à ocupação urba-
na, recuperáveis para o uso agrícola ou indispensáveis para a manutenção do equilíbrio
biofísico. Por outro lado, as áreas agrícolas podem servir para usos residenciais com baixa
densidade, atividades comerciais e serviços complementares ao uso agrícola e residencial,
agroindústrias e atividades turísticas, recreativas e culturais.

No caso de estudo, a Área Agrícola 7 corresponde, em grande parte, a zonas dos


bairros de Vargem Grande e Vargem Pequena, atualmente em processo de revisão de sua
normativa por parte da prefeitura, ao constatar a tendência a modificações relativas ao
tipo de uso da área46.

• A áreas com condições adversas à ocupação e/ou inadequadas à urbanização. São áreas
sujeitas a inundações, deslizamentos e/ou desmoronamentos ou outras alterações que
podem afetar sua estabilidade. Para a ocupação destas áreas são exigidos estudos prévios
e obras técnicas, que condicionarão sua viabilidade.

• As áreas de proteção ambiental. São áreas que, na maioria dos casos, não devem ser
ocupadas. Mas, em algumas situações, podem ser compatíveis com usos residenciais,
agrícolas, de lazer ou de investigação, sempre que assegurada sua proteção e mediante
autorização prévia.

Na realidade, a macrozonificação corresponde a intenções gerais, que podem ser


implementadas ou não, mediante instrumentos de planejamento mais específicos.

166
167
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Superfícies protegidas

As superfícies protegidas incluem todas as superfícies livres submetidas a uma medi-
da legal de proibição da ocupação urbana. Pode ocorrer, em alguns casos, a superposição
de vários instrumentos de proteção em um mesmo âmbito espacial. Entre as superfícies
protegidas pelo plano se encontram:

• As unidades de conservação ambiental47 (ver Anexo 3). São áreas protegidas com
limites estritos, que se encontram sob um regime especial de gestão. Estas podem ser:

Unidades de proteção integral:


– Reserva biológica.
– Parque.
– Bem natural.

Unidades de uso sustentável:


– Áreas de proteção ambiental.
– Áreas de proteção ambiental e recuperação urbana.

• As áreas de proteção permanente48 (APP). Correspondem, entre outras, às mar-


gens dos rios, lagos, lagoas e estuários com uma largura mínima de 30m; às encostas com
inclinação superior a 45°; aos cumes dos montes e montanhas; às áreas com mangues; às
áreas de restinga que sejam fixadoras de dunas; às florestas (segundo algumas recomen-
dações específicas); às praias, etc.

• As áreas consideradas como zona especial 149. Correspondem às áreas acima da


cota de 100 m, em quase todo o município.

• As áreas não edificáveis. A zonificação urbana denomina áreas não edificáveis a cer-
tas porções do território, previamente definidas, que devem permanecer livres de ocupa-
ção. Também incluem as cessões obrigatórias de terra para possíveis ocupações urbanas
destinadas a espaços livres públicos.

Neste sentido, além da normativa específica do município, a Lei Federal Nº 6.766 (19
de dezembro de 1979) define as regras sobre o loteamento do solo urbano, onde fica proi-
bido o loteamento em, por exemplo, terrenos inundáveis, terrenos com inclinação igual ou

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169
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

superior a 30%, lotes onde as condições geológicas não aconselham a ocupação, áreas
de preservação ecológica, etc. Além disso, esta lei define as porcentagens relacionadas
com a densidade de ocupação prevista e com as cessões de solo para o setor público,
referentes à rede de circulação, à implantação de equipamentos urbanos e comunitários
e aos espaços livres de uso público.
De fato, se verifica que nem todas as figuras de proteção possuem a mesma especifici-
dade com respeito à delimitação física da área protegida, o que resulta em variações quanto
à especificidade da normativa sobre o âmbito concreto dos espaços livres. As unidades de
conservação ambiental e as áreas não edificáveis, previamente definidas, possuem sua deli-
mitação física bem estabelecida. Ao contrário, as áreas de proteção permanente e as zonas
especiais 1 são atribuições mais genéricas sem uma delimitação espacial específica.

Superfícies edificáveis

Em geral, as considerações relativas à ocupação do solo no caso de estudo levam em
conta o desenvolvimento das áreas que já possuem infra-estruturas, o que se constata
em Jacarepaguá, principalmente, e nos bairros do Pechincha, Freguesia, Taquara, Tanque
e Praça Seca.
A normativa prevê a consolidação das áreas destinadas ao uso industrial, que ocupariam
o centro da planície de Jacarepaguá e a margem sul da Estrada dos Bandeirantes. Por outra
parte, promove o incentivo ao desenvolvimento das atividades turísticas, desportivas e cultu-
rais, especialmente ao redor das lagoas da Tijuca e de Jacarepaguá e ao longo da praia.
A previsão de equipamentos se concentra em pontos específicos, também próximos
às lagoas da Tijuca e de Jacarepaguá. Ao contrário, as previsões de residências são mais
amplas e se distribuem por toda a planície. Estas se misturam com os usos comerciais em
algumas partes mais próximas ao mar e ao redor da Lagoa de Jacarepaguá, nas margens
da Estrada dos Bandeirantes e na planície de Jacarepaguá. Ao redor da Estrada dos Ban-
deirantes, próximo à margem sul do Maciço da Pedra Branca, também podem associar-se
a indústrias. O uso comercial é priorizado ao redor das vias com maior movimento, como
a Avenida das Américas e a Estrada dos Bandeirantes.
Neste contexto, se verifica que, além das áreas que já estão protegidas, sendo áreas
que não podem ser ocupadas, todo o espaço livre que permanece é susceptível à ocupa-
ção urbana (ver Anexo 3).

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173
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Avaliação final dos parâmetros de proteção



Na avaliação final dos parâmetros de proteção aos quais estão submetidos os espaços
livres se observa a especificidade (no que se refere à delimitação física da área protegida)
e o grau de restrição à ocupação urbana apresentada pelos instrumentos normativos que
regulam cada superfície. Com este critério, a análise das qualificações do planejamento
resulta na seguinte classificação:

• Alta (A). Para as unidades de proteção integral e as áreas não edificáveis. Estas áreas
estão especificamente delimitadas pelo planejamento em termos espaciais e sob a condi-
ção estrita de não ser ocupados.

• Média-alta (MA). Para as unidades de uso sustentável. São áreas que têm uma delimi-
tação específica pelo planejamento, embora permitam a ocupação em condições especiais
de gestão.

• Média (M). Para as áreas de proteção permanente e as zonas especiais 1. São áreas
sem uma demarcação espacial específica, embora, genericamente, apresentem indicações
de âmbitos espaciais que devem ser protegidos.

• Baixa (B). Para as macrozonas de restrição à ocupação urbana. São áreas que estão
sob intenções gerais de proteção/ocupação, mas que carecem de instrumentos de plane-
jamento mais específicos para garantir sua efetivação.

5E > Síntese da avaliação:


possíveis espaços de oportunidade projetual

A síntese das análises anteriores oferece um panorama geral dos atributos conside-
rados e da forma como eles qualificam as peças de espaços livres, o que permite uma
primeira interpretação das superfícies mais adequadas à ordenação do sistema e reúne
indicações para a intervenção no território. Neste contexto, identificam-se alguns espaços
de oportunidade projetual, ressaltando suas principais características e as situações espa-
ciais que estabelecem entre eles e com o entorno. Em ordem decrescente com respeito à

174
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

qualificação final dos espaços estariam: os espaços âncora, os espaços de referência e os


demais espaços livres.
Finalmente, se elabora uma avaliação das determinações atuais do planejamento
sobre os espaços de oportunidade identificados, com o propósito de reconhecer as su-
perfícies livres que seriam mais ou menos favoráveis para integrar o sistema segundo a
avaliação final dos parâmetros de proteção existentes (quanto mais alta é a avaliação,
mais atua em direção contrária à possibilidade atual de ocupação urbana).

Espaços âncora

Os espaços âncora são aqueles que obtiveram avaliações finais alta e média-alta com
respeito aos atributos biofísicos e que possuem uma notável significação visual, embora
possam apresentar distintos graus de acessibilidade. Por suas características, constituem
espaços-chave do sistema, que tenderiam a ser preservados frente à ocupação urbana.
Neste contexto, cabe ressaltar que os espaços âncora mais acessíveis merecem uma
maior atenção quando se trata de ordenar o sistema segundo a propensão que apresen-
tam à exploração e/ou ocupação urbana.
Eles possuem heterogeneidades que lhes conferem características especiais quanto
a seus atributos. As altas qualificações biofísicas e perceptivas compaginadas tendem a
caracterizar distintos espaços: entre eles, aqueles com uma feição claramente ecológica
ou reconhecidamente visual e aqueles onde se mesclam ambas as características. Na re-
alidade, pela coincidência entre as comunidades vegetais mais preservadas e sua grande
significação visual, a maioria dos espaços âncora possui fortes características ecológicas
e visuais conjuntamente. Entretanto, alguns espaços que não possuem um valor biofísico
notável também podem ser de grande significação visual, como alguns marcos históricos
identificados. Por outra parte, alguns espaços de alto valor biofísico não possuem uma
alta significação visual, por exemplo, os brejos.
A observação dos espaços âncora revela que, pela extensão que ocupam, sua presen-
ça é expressiva no caso de estudo. Algumas de suas referências importantes são os cursos
de água e as respectivas margens, as superfícies florestais e as restingas.

175
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Espaços referência

Os espaços referência são aqueles que obtiveram uma avaliação final média e média-baixa
com relação aos atributos do suporte biofísico, cuja significação visual não é notável, embora
possam apresentar distintos graus de acessibilidade. Isto indica que são espaços que possuem
a cobertura vegetal menos preservada, ou que estão sem vegetação, sendo medianas ou bai-
xas as possibilidades de sofrerem risco de inundação, deslizamento ou desmoronamento.
Por suas características eles podem desempenhar distintas funções no sistema, desde
a proteção até a ocupação; uma vez que se verifique a conveniência de uma ou outra
opção, segundo as relações que se estabeleçam nestas peças e entre estas e seu entorno,
seja livre ou ocupado. Por isso, os espaços referência que possuem alta acessibilidade po-
dem apresentar-se como espaços muito vulneráveis à ocupação urbana e/ou à exploração,
o que exigiria diretrizes claras relativas a seu desenvolvimento futuro.
Estes espaços ocupam a maior parte das terras da planície e se caracterizam, princi-
palmente, pelos campos antrópicos, a vegetação nas áreas inundáveis, os cultivos e os jar-
dins. Nas encostas estão representados pelas áreas com vegetação florestal degradada.

Demais espaços livres



Os demais espaços livres são os espaços sem atributos biofísicos e perceptivos rele-
vantes e com distintos graus de acessibilidade. Estes espaços, em geral, estão represen-
tados por solos expostos, sem vegetação, e pouco propícios a sofrer riscos naturais. Na
realidade, são espaços com alta probabilidade de ocupação, sobretudo se possuem uma
boa acessibilidade.
Entretanto, inclusive sem qualificações notáveis, os demais espaços livres podem de-
sempenhar papéis importantes na ordenação do sistema, na forma de intervenções dirigidas
ao restabelecimento de algumas relações funcionais e espaciais nos espaços livres, e entre
eles e seu entorno, cujas conseqüências podem ser significativas na composição do todo.
Estes espaços se apresentam em número e tamanho reduzidos, como casos esporá-
dicos na planície de Jacarepaguá.

176
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

As situações dos espaços de oportunidade projetual



A observação da situação dos espaços de oportunidade projetual permite identificar as
continuidades, descontinuidades e as fronteiras dos espaços livres, de acordo com sua posição
na relação com o entorno e as possibilidades que oferecem para a ordenação do sistema.

Continuidades

As continuidades, sobretudo dos espaços âncora, podem favorecer a manutenção e
o desenvolvimento dos elementos e processos naturais e possíveis conexões perceptivas.
Ao mesmo tempo, são lugares que, pela ameaça que representa a ocupação urbana,
mantêm sua condição de continuidade sob o risco constante de desaparecer e merece-
riam proteção. Entretanto, justamente por seu caráter contínuo, são espaços que, além de
contribuir para a qualidade ecológica, poderiam estabelecer uma estreita relação entre
tecidos urbanos e espaços livres.
A observação dos espaços de oportunidade projetual no caso de estudo revela que,
entre os espaços âncora, os cursos de água e suas respectivas margens representam os
elementos de maior continuidade. Ao contrário, as demais áreas compõem, em geral, um
quadro espacial muito fragmentado.

Fronteiras

As fronteiras são os “filtros” mais imediatos dos espaços livres e permitem seu tra-
tamento oportuno, segundo as características de cada peça em particular, a fim de favo-
recer a sustentabilidade entre o sistema e seu entorno. Isto é, são lugares que ressaltam
as questões relativas aos espaços livres em si mesmos (biofísicas, perceptivas, etc.), as
funções sociais que podem desempenhar e a integração física com o entorno ocupado
(Forman, 1995; Pesci, 1999; entre outros).
As fronteiras entre os espaços livres, principalmente aquelas entre espaços altamente
qualificados e os mais degradados, podem representar uma limitação dos processos natu-
rais e uma influência negativa na qualidade visual das peças. Do mesmo modo, a presença
de ocupação ou exploração pouco qualificadas (como ferros velhos, lixões, etc.), próximas

177
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

aos espaços âncora, tende a ser um fator degradante de sua qualidade visual, além de
poder ocasionar outros danos relativos a seus atributos biofísicos. Deste modo, são locais
que requerem atenção quanto às possíveis intervenções para a ordenação do sistema
visando promover sua requalificação. Ao contrário, as fronteiras que se estabelecem entre
espaços livres altamente qualificados são lugares com potencial para serem preservados.
Assim, entre as fronteiras, estão as mais vulneráveis à ocupação urbana e as menos
vulneráveis, segundo as condições físicas que apresentam. Ambas as situações podem
representar oportunidades de intervenção que respeitem os atributos dos espaços livres
e valorizem as melhores condições para seu desenvolvimento, junto a possíveis inter-
relações com seu entorno, como possibilidades de agregar os meios urbano e natural,
marcar suas diferenças e promover sua melhoria.
Entre as mais vulneráveis estão aquelas próximas às infra-estruturas viárias e as que
apresentam uma topografia pouco acidentada, associada a boas condições de solo e
drenagem, favoráveis à ocupação.
No caso de estudo podem ser citadas, principalmente, grande parte das peças no
centro e a oeste da planície, as encostas menos acentuadas dos maciços e a maioria das
peças livres na frente marítima.
Entre as fronteiras menos vulneráveis estão as que não dispõem de infra-estruturas
viárias e as que são pouco adequadas à ocupação, devido ao relevo muito irregular, solos
pouco estáveis e más condições de drenagem, entre outros fatores.
Como exemplo, no âmbito de referência, estaria grande parte das superfícies livres
dos maciços e dos brejos a oeste da planície, entre outros.

Descontinuidades

As descontinuidades entre os espaços comumente estão associadas à presença da


ocupação urbana que foi se introduzindo, pouco a pouco, na totalidade dos espaços
livres originais.
As descontinuidades entre os espaços livres podem alterar a possibilidade de continuida-
de entre eles segundo a posição que ocupam, mais ou menos isolados ou, inclusive, mais ou
menos distantes entre si, o que dificultaria o estabelecimento das conexões do sistema.

178
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

Entretanto, em alguns casos, os espaços descontínuos, à margem das conexões biofí-


sicas e perceptivas, podem constituir uma oportunidade para relacionar os tecidos urbanos
que não possuem uma interação entre si, cuja ordenação do sistema poderia reverter este
quadro de isolamento permitindo, através da atuação sobre os espaços livres, uma maior
integração entre os tecidos.
No caso de estudo, devido à urbanização intensiva do centro e da parte norte da
planície, os espaços livres se encontram muito fragmentados, conformando peças, na sua
maioria, isoladas e distantes entre si, que pouco poderiam contribuir para as conexões
biofísicas, embora possam ser espaços de interação entre os tecidos urbanos do entorno.
Ao contrário, o conjunto formado pelos espaços âncora representados pelas áreas
florestais, as lagoas e suas margens, os brejos, a praia e as restingas, ainda que apresen-
tem certas descontinuidades, por sua relativa proximidade, constituem peças potencias a
serem conectadas.
Neste contexto, podem ser percebidos segmentos espaciais com dimensões signifi-
cativas, sem interrupções, que, por sua posição relativa, facilitariam a atuação sobre eles
a fim de promover a continuidade entre alguns dos espaços âncora, como, por exemplo,
a maioria das peças com vegetação em área inundável e campos antrópicos (a oeste da
planície), entre outras.

Garantias e ameaças relativas ao planejamento



Com a intenção de ordenar o sistema de espaços livres se faz necessário verificar,
além dos possíveis espaços de oportunidade projetual e suas características, as garantias
e ameaças relativas à possibilidade destes espaços se manterem livres ou serem ocu-
pados, de acordo com a avaliação final dos parâmetros de proteção estabelecidos pelo
planejamento sobre cada peça.
Ao observar as determinações do planejamento vigente podem ocorrer as seguintes
situações:

• Favoráveis. Situações nas quais estão previstos instrumentos de proteção qualificados


como alto e médio-alto, conforme sua precisão espacial e restrição à ocupação urbana,
pelo que a área em questão apresentaria certa garantia, de acordo com o planejamento,
como espaço destinado a não ser ocupado.

179
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

• Não favoráveis. Situações nas quais estão previstos instrumentos de proteção qualifi-
cados como médio e baixo ou são peças edificáveis. Mudar esta realidade representa um
grande desafio que exigiria esforços de gestão (embora em determinados casos possa ser
sumamente importante), pois se considera latente a ameaça de ocupação.
A avaliação dos espaços de oportunidade projetual consoante seus atributos poderia
determinar a necessidade de uma maior ou menor proteção segundo cada tipo, mas este
fato pode entrar em conflito com as condições impostas pelo planejamento vigente, que
nem sempre coincidem com os resultados obtidos nesta avaliação.
Em todo caso, pode ocorrer que espaços âncora não tenham uma proteção notável
e, ao contrário, que espaços referência ou alguns dos espaços sem atributos biofísicos e
visuais relevantes se encontrem sob um potente instrumento de proteção.
Algumas áreas em situações favoráveis, segundo a avaliação final dos parâmetros
de proteção, coincidem com os espaços âncora, entre elas: grande parte das superfícies
florestais acima da cota de 100m dos maciços, as áreas dos mangues e grande parte
das restingas, algumas áreas consideradas marcos históricos, algumas áreas dispersas
pela planície, como, por exemplo, o Bosque da Freguesia e o Bosque da Barra, e outras
áreas mais a oeste da planície, que incluem, por exemplo, os Morros Cantagalo, Amorim,
Portelo e Urubu. A coincidência entre as situações favoráveis à proteção e os espaços
âncora reforça a sua alta qualificação, observada anteriormente, e tende a garantir sua
permanência para a ordenação do sistema.
Em outras áreas as situações favoráveis não coincidem com os espaços âncora, entre
elas: uma parte significativa das áreas florestais correspondentes ao Maciço da Tijuca, os
brejos, parte da praia do Recreio dos Bandeirantes e as áreas florestais da Colônia Juliano
Moreira. Este fato ressalta as ameaças de ocupação que pairam sobre estas áreas.
Por outra parte, embora sejam poucas as ocasiões, as situações favoráveis podem
coincidir com os espaços referência e demais espaços livres, o que, levando em conta
somente a questão normativa permitiria pensar na sua consideração para a ordenação do
sistema devido a seu estado de proteção já consolidado. Em geral, isto ocorre quando a
área protegida abarca dimensões maiores relativas ao que realmente interessa proteger
(como é o caso de muitas áreas de proteção ambiental),podendo esta proteção atuar
favoravelmente na preservação do meio.

180
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

Neste marco, são consideradas situações favoráveis aquelas preestabelecidas pelo


planejamento que podem ser aproveitadas na ordenação do sistema, e se vislumbra a
necessidade de atuação sobre as demais áreas que apresentam uma situação não favorá-
vel, a fim de determinar quais delas, indo mais além da consideração sobre os vínculos de
planejamento, deveriam integrar um sistema de espaços livres e quais seriam as determi-
nações relativas a eventuais intervenções sobre estas.

181
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Análise e avaliação dos atributos dos espaços livres

Variáveis Avaliação parcial Avaliação final

Atributos do suporte biofísico Atributos do suporte biofísico Atributos do suporte biofísico

Preservação
Cobertura vegetal
A/M
Risco de inundação e deslizamento
Hidrologia
A/M/B A/MA/M/MB/B
Risco de desmoronamento
Declividade
A/M/B
Aptidão agrícola Não considerada para a avaliação
Edafologia final dos atributos biofísicos.
A/M/B

Atributos perceptivoss Atributos perceptivoss


Atributos perceptivoss
Significação visual Significação visual

Elementos cênicos A A

Áreas de emergência visual A A

Fundos cênicos A A

Marcos históricos A A

Acessibilidade Acessibilidade

Desde as vias existentes e previstas. Segundo a hierarquia viária.

Via-expressa e auto-estrada A

Estradas MA

Ruas principais M

Rede geral de ruas B

182
Análise e avaliação: os atributos dos espaços livres

Análise e avaliação dos atributos dos espaços livres (cont.)

Variáveis Avaliação parcial Avaliação final

Parâmetros de proteção

Vínculos de planejamento Segundo:


– A restrição à ocupação urbana.
– A precisão espacial de cada
instrumento.

Superfícies protegidas A/MA/M

Macrozonas (de restrição


B
à ocupação urbana)

Não consideradas para a avaliação


Superfícies edificáveis
final dos parâmetros de proteção.

Síntese da avaliação

Espaços de Avaliação final Avaliação final


Avaliação final
oportunidade dos atributos dos atributos
da acessibilidade
projetual biofísicos perceptivos

Âncora A/MA A Qualquer

Referência M/MB – Qualquer

Demais espaços livres B – Qualquer

Garantias e ameaças relativas ao planejamento

Garantias de proteção Avaliação final dos parâmetros de proteção A/MA

Ameaças de ocupação Avaliação final dos parâmetros de proteção M/B

183
184
185
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Notas
38
O setor público municipal ou estadual não oferece estudos detalhados sobre a fauna e a flora atuais
da região, o que limitou, em muitos sentidos, a análise desejada.
39
Fonte dos dados: Estudo de Impacto Ambiental para o Projeto de Recuperação Ambiental da Macrobacia
de Jacarepaguá. Rio de Janeiro: Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, SMAC, 1998, V.2; Mapeamento digital da
cidade do Rio de Janeiro (esc.:1:2.000). Rio de Janeiro: Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, IPP, 1997.
40
Fonte dos dados: Estudo de Impacto Ambiental para o Projeto de Recuperação Ambiental da Macrobacia
de Jacarepaguá. Rio de Janeiro: Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, SMAC, 1998, V.2.

Compreendem os espaços livres que apresentam as comunidades vegetais mais preservadas e que
41

possuem um alto grau de risco.


42
Compreendem os espaços livres que apresentam as comunidades vegetais mais preservadas e que pos-
suem médio e baixo grau de riscos, os espaços livres que apresentam as comunidades vegetais menos preserva-
das (ou os solos expostos, sem vegetação) e que possuem um alto grau de risco.
43
Compreendem os espaços livres que apresentam as comunidades vegetais menos preservadas (ou os
solos expostos, sem vegetação) e que possuem um médio grau de risco.
44
Compreendem os espaços livres que apresentam as comunidades vegetais menos preservadas (ou os
solos expostos, sem vegetação) e que possuem um baixo grau de risco.

Compreendem os espaços livres que se apresentam como solos expostos, sem vegetação, e que pos-
45

suem um baixo grau de risco.


46
As novas normativas que estão sendo desenvolvidas para a unidade territorial correspondem aos Planos de
estruturação urbana “Vargens” (que engloba a área agrícola citada) e “Taquara”, e abarcam os seguintes trechos,
respectivamente: os bairros de Vargem Grande, Vargem Pequena, Camorim e parte do bairro do Recreio, na Barra
da Tijuca, e os bairros do Tanque, Taquara, Freguesia e Pechincha, em Jacarepaguá. Ambos PEUs estão ainda sem
aprovação definitiva por parte do setor público.
47
Segundo a Lei Federal No. 9.985 de 18 de julho de 2000, a unidade de conservação “consiste no espaço
territorial e nos seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes,
legalmente instituído pelo setor público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de
administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção.”
48
Resolução CONAMA Nº. 303, de 20 de março de 2002; Lei No. 4.771 de 15 de setembro de 1965.
49
Zoneamento do Município – Regulamentação. Rio de Janeiro: Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro.
Secretaria de Obras e Serviços Públicos, 1976, artigo 163.

186
6
Ordenação do sistema
de espaços livres:
a reestruturação do território

Neste capítulo final interessa propor algumas estratégias de projeto que permitam
ordenar o sistema de espaços livres, de forma a manter e desenvolver seus atributos e
relacioná-los entre si e com seu entorno, como uma oportunidade para a reestruturação
do território. Deste modo, as estratégias de projeto correspondem a indicações para a
ordenação dos espaços e consistem em:

• Princípios de projeto para a ordenação do sistema de espaços livres. Refe-


rem-se às relações funcionais e espaciais a serem estabelecidas entre os espaços livres e
seu entorno como possíveis diretrizes projetuais para a ordenação do sistema.

• Ações de projeto sobre os espaços livres. Correspondem a ações de intervenção


urbanística aplicáveis sobre cada espaço livre, sejam peças singulares ou conjuntos de pe-
ças, cujo objetivo é constituir o sistema de espaços livres da futura ordenação territorial.

• Sistemas de espaços livres e instrumentos de planejamento. Trata-se de identi-


ficar algumas oportunidades oferecidas pelos instrumentos de planejamento existentes e
de reclamar a necessária flexibilização dos planos, o que possibilitaria a consolidação do
sistema de espaços livres como um guia para a ordenação do território.

187
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

6A > Princípios de projeto para a ordenação


do sistema de espaços livres

Neste item se objetiva estabelecer alguns princípios de projeto para a ordenação do


sistema de espaços livres como estratégia de reestruturação do território, segundo as
seguintes variáveis:

• As relações funcionais no sistema. Considera-se a importância de levar em conta


os atributos relativos à matriz biofísica, à percepção visual e à acessibilidade para a ade-
quada designação dos usos do solo e das atividades nos espaços livres.

• As relações espaciais no sistema. Estão baseadas, principalmente, na necessidade


de continuidade entre os elementos do sistema enquanto uma condição fundamental
para sua ordenação, que influi na orientação espacial da ocupação urbana, das atividades
e da conexão viária entre os espaços.

• As relações sinérgicas. Correspondem às relações funcionais e espaciais entre espa-


ços livres e ocupados que significam a sutura entre ambas as partes, ao mesmo tempo em
que supõem o desenvolvimento dos recursos dos espaços livres, a oferta de oportunidades
de lazer e produção e a criação de novas estruturas na paisagem territorial, com possíveis
repercussões no sistema e em seu entorno.

Relações funcionais no sistema:


a designação de usos do solo e de atividades

A observação das relações funcionais que se estabelecem nos espaços livres pode per-
mitir equilibrar os usos do solo, como um fator de limitação física, caracterizando-se como
indícios de ordenação ao apontar os lugares mais ou menos aptos a serem ocupados, de
acordo com a conservação e o desenvolvimento dos recursos existentes no sistema.
A recomendação de quais peças ocupar e quais não, além dos graus de urbanização
adequados a cada trecho de espaço livre, tem como objetivo proporcionar indicadores de
intervenção no território que se baseiam nas vantagens que pode representar a preservação

188
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

do meio, ao se propor uma atuação mais responsável do que a ocupação aleatória, expan-
siva e especulativa.
Além da possibilidade de preservação dos recursos frente à ocupação urbana, é ine-
gável a importância de sua exploração para a cultura e a vida urbana, por seus valores,
sejam sociais ou econômicos, na agricultura, no turismo, no lazer ou na extração de mate-
riais. Nesta direção, o uso consciente dos recursos representa a compreensão das relações
estreitas existentes entre o homem e o espaço livre, garantindo a sobrevivência de ambos
e uma convivência compatível.

A partir da matriz biofísica

As relações funcionais na matriz biofísica podem indicar certos critérios referentes à


possibilidade de ocupar ou não um lugar, além das localizações mais adequadas para as
distintas atividades nos espaços livres, de acordo com os elementos bióticos e abióticos
que possuem e com as características fundamentais para sua própria manutenção e para
a sustentabilidade do território.
As características que apresentam os elementos biofísicos nos espaços livres, que
determinam suas potencialidades frente à ocupação e ao uso, também permitem o fun-
cionamento geral dos processos naturais no sistema.
Isto é, embora os elementos biofísicos e suas respectivas funções e valores se desen-
volvam em situações locais, estão vinculados a um contexto determinado por níveis hie-
rárquicos, inter-relacionados e interdependentes, onde os níveis superiores estabelecem
as diretrizes de funcionamento dos níveis inferiores (Forman, 1995). Neste marco de re-
lações, existe uma lógica superior ligada ao funcionamento dos elementos biofísicos que
coordena as manifestações inferiores e determina as dinâmicas dos processos naturais e
seus fluxos, onde a ocupação ou a atividade podem ser incompatíveis ou devem adaptar-
se a condições estritas ditadas por estas funções.
Como exemplo, o desmatamento nas nascentes influi na diminuição do volume dos
cursos de água. Da mesma maneira, a redução das massas florestais tem uma repercus-
são negativa em todo o ciclo da água, seja pela eliminação da passagem intermediária
da água pela vegetação, seja pelo aumento da possibilidade de impactos erosivos da

189
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

água sobre o solo, principalmente se este se encontra em encostas acentuadas. Por isso, a
manutenção das florestas nas encostas pode atuar na prevenção da erosão e da retenção
hídrica, favorecendo, assim, o ciclo da água (Hough, 1995).
Dado que os processos naturais estão encadeados na matriz, os espaços livres te-
riam lógicas funcionais, gerais e superiores que, devido a seu alcance e importância no
desenvolvimento dos fluxos naturais do sistema, podem ser consideradas diretrizes das
possíveis ocupações e atividades futuras em cada peça, com vista ao conjunto de espaços,
na totalidade do sistema.
Isto leva a supor que as lógicas funcionais da matriz biofísica no sistema de espaços
livres podem ser traduzidas em princípios de intervenção urbanística, como parâmetros
para a ordenação do sistema a partir da escala local até a escala geral, que permitiriam
a avaliação das melhores condições para desenvolver a ocupação urbana e as atividades.
Para tanto, devem ser consideradas algumas indicações relativas a possíveis intervenções,
como, por exemplo, em casos de risco explícito de invasões urbanas, promover a proteção
da vegetação mais frágil com barreiras físicas ao crescimento, e limitar a ocupação de
modo que garanta a necessária permeabilização do solo em congruência com os proces-
sos naturais, entre outras possibilidades.

A partir da significação visual

A visibilidade das características físicas mais significativas dos espaços livres pode
ser considerada uma referência para a orientação das atividades e o condicionamento de
possíveis ocupações, que respeitem a integridade física dos espaços como diretriz para a
reestruturação do território.
A permanência das características físicas de uma paisagem com maior significação
perceptiva tende a favorecer a apropriação dos espaços livres pela população como um
fato coletivo. A valorização desta apropriação costuma servir como um instrumento de
conservação ambiental e de validação do pertencimento do lugar à comunidade que o
vivencia cotidianamente (Lynch, 1976; Hough, 1995).
O caráter coletivo do espaço livre não significa, necessariamente, que ele deva ser
público. Sua coletivização se refere ao acesso, físico e/ou visual, independentemente de

190
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

que seja público ou privado, que faculte o estabelecimento de códigos e vivências comuns.
Embora, em alguns espaços livres privados possa ser conveniente sua transformação em
espaços de uso público, caso possuam grande interesse para a coletividade devido a seus
atributos singulares.
Alguns destes espaços, por estarem muito expostos, dada a sua qualidade visual, são
vulneráveis, sobretudo quando têm seus atrativos visuais afetados por uma ocupação
urbana ou exploração; por isso, exigem especial atenção quanto a possíveis intervenções,
que poderiam deteriorar suas estruturas físicas características, seja no seu entorno ou na
sua própria conformação.
A vulnerabilidade visual pode ser medida, principalmente, com relação à vegetação e
às características topográficas da área (orientação e declividade). Isto é, se uma área está
muito exposta, por exemplo, em uma encosta muito acentuada, será mais visível e mais
vulnerável a intervenções que causem dano na percepção do todo. Da mesma maneira,
uma área será mais vulnerável visualmente se possui conformações específicas que não
poderiam ocultar alterações provocadas pelo uso ou pela ocupação, como, por exemplo,
no caso da vegetação de menor porte ou de outra característica que não possa se susten-
tar visualmente mediante uma intervenção (Bolós, 1992).
Entretanto, os possíveis danos à percepção visual dos espaços livres podem corres-
ponder a alterações que afetam desde os elementos cênicos até os fundos cênicos, onde,
na realidade, ambos estão interconectados, sendo os elementos parte fundamental dos
fundos. Nesta medida, as intervenções nas composições visuais dos espaços livres deve-
riam estar atentas às escalas das alterações que possam ser produzidas e a seus respec-
tivos impactos, a fim de atuar na direção oposta à ocorrência de possíveis danos visuais
na paisagem.
As características visuais mais significativas costumam ser lugares propícios às ativi-
dades ou ocupações urbanas dedicadas, por exemplo, à recreação ou ao turismo; segundo
sua formalização, estes usos podem ser contrários à manutenção da qualidade visual des-
tas áreas, afetando-as irreversivelmente, razão pela qual exigem intervenções cuidadosas
e, preferencialmente, qualificadoras. Além disso, podem surgir situações de conflito visual
nos espaços livres diferentes destas, como as pedreiras e as linhas de alta tensão, por
exemplo, as quais merecem um controle efetivo.

191
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

A partir da acessibilidade

A acessibilidade dos espaços livres constitui um dado muito importante na designação


dos usos do solo e das atividades. A rede viária costuma impulsionar novos assentamentos
e usos que dependem dos acessos para se desenvolver e, ao mesmo tempo, pode significar
um obstáculo à realização das relações funcionais do sistema, devido a possíveis incompati-
bilidades com relação aos atributos biofísicos ou perceptivos dos espaços livres.
Entretanto, a acessibilidade também pode representar oportunidades de intervenção
que favoreçam a manutenção dos espaços livres, seus recursos e funções, frente às ocu-
pações e às atividades.
Freqüentemente, na atualidade, os assentamentos que se desenvolveram nas mar-
gens das vias mais potentes seguem um caráter disperso, em geral, com padrões edifi-
cados com baixa densidade e sem autonomia funcional. Mas, também, ao longo destas
vias podem ser encontradas grandes edificações de cunho comercial ou outros, que se
posicionam em relação direta com a via, se aproveitando da acessibilidade e da exposição
sobre a mesma (Font et al, 1999). Ambos os tipos de assentamentos tendem a se estender
pelo território e provocam inumeráveis conflitos relativos à manutenção dos atributos dos
espaços livres e suas funções.
Além da criação de novos assentamentos, as vias existentes também podem significar
a oportunidade de compactação dos assentamentos atuais e a constituição de núcleos
urbanos mais auto-suficientes, que dispensariam a implementação de novas infra-estru-
turas viárias, bem como evitariam uma maior mobilidade obrigada e, conseqüentemente,
promoveriam um menor gasto energético e a redução da contaminação do ar e do solo.
Neste sentido, a acessibilidade aos espaços livres pode dar pistas para a gestão de futuras
ocupações urbanas.
Do mesmo modo, relativamente às atividades, a acessibilidade aos espaços livres
permite pensar em usos alternativos pouco impactantes e que possibilitem a conservação,
o desfrute e, inclusive, o desenvolvimento e melhoria dos recursos biofísicos e perceptivos.
Entretanto, é recomendável levar em conta os usos atuais e possíveis considerações rela-
tivas a sua adequação, junto às necessidades e carências da comunidade.
Com base nestes argumentos, podem ser sugeridas algumas indicações às interven-
ções, como, por exemplo, assinalar os usos existentes indesejáveis por sua nocividade

192
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

Exemplo de intervenção ilustrativa 90


de princípios de projeto baseados
em relações funcionais a partir da
matriz biofísica:
90 a 92. Recuperação do curso
e das margens do rio Gállego,
Zuera, Espanha, 1999. Exemplo
de margem delimitada e projetada
para controlar a ocupação urbana,
garantir a permeabilização do solo
e oferecer um espaço de lazer à
cidade (F.: Acervo Arqto. Iñaki Alday).

91

92

193
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

ao meio ambiente, como as pedreiras ou o turismo de massas nas áreas mais frágeis,
incluindo a sugestão de recondução das atividades a outras mais adequadas às condições
de cada lugar específico; limitar os pontos de maior fragilidade em contato com o sistema
viário, aqueles mais sujeitos a explorações, delimitando de modo expresso a proliferação
de atividades não desejadas em alguns pontos das vias, que prejudicariam as estruturas
espaciais dos espaços livres; controlar as atividades geradoras de resíduos sólidos ou
outros, e controlar os tipos de acessos aos espaços livres, de acordo com os valores e
possibilidades formais de cada comunidade vegetal.

Relações espaciais no sistema:


a manutenção das continuidades

O sistema de espaços livres supõe o contato espacial aberto e contínuo entre as peças
como uma condição fundamental para que o sistema funcione como um todo integrado,
para que os fluxos possam escoar, onde o rompimento das relações espaciais tende a
afetar o funcionamento do todo ou de uma parte do todo.
As continuidades entre os espaços livres no sistema significam que estes deveriam
ser contíguos e podem influenciar na ordenação das peças e de seus entornos, no sen-
tido de que podem determinar os lugares e as condições mais oportunas para garantir
a continuidade espacial entre os espaços e, conseqüentemente, a orientação espacial do
estrato construído. Desta maneira, a atenção à garantia das continuidades entre as peças
do sistema de espaços livres poderia funcionar como freio, como controle do desenvolvi-
mento da ocupação e dos possíveis problemas causados à integridade e diversidade dos
recursos que estes comportam.

A partir da matriz biofísica

As continuidades na matriz biofísica permitem a conectividade biológica entre os ani-


mais em busca de alimento e acasalamento, e a conectividade ecológica, que agrega os
fluxos abióticos (ar, água, nutrientes, solo, etc.). As continuidades costumam ser a ponte
espacial entre distintos ecossistemas e podem possuir vários habitats. Por outro lado, as

194
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

continuidades permitem manter e desenvolver a diversidade dos mosaicos vegetais e dos


distintos tipos de espaços destinados à água, que coexistem e co-evoluem (Forman, 1995;
Hough, 1995; entre outros).
Deste modo, a manutenção e a restauração das continuidades atuam contra a frag-
mentação dos ecossistemas e, por conseguinte, a favor da manutenção de sua diversidade
e do desenvolvimento integral de seus processos naturais, constituindo possíveis limites à
ocupação urbana. As continuidades biofísicas tendem a evitar a interrupção dos processos
naturais, seja por uma via, um aterro ou um corte de terra, o que implicaria em perturbações
nas estruturas bióticas e abióticas do lugar e interromperia as trocas de energia provocando
impactos físicos, que geralmente favorecem a degradação ecológica e podem representar
graves riscos à ocupação urbana. Portanto, o reflorestamento de espaços compartimenta-
dos, o restabelecimento do volume dos cursos de água degradados ou dos corredores de
fauna sob as vias, entre outras soluções, tem um enorme significado na composição espacial
destas continuidades e de seus entornos e beneficia as dinâmicas biofísicas.
As fronteiras das continuidades biofísicas costumam ser frágeis e facilmente deterio-
ráveis, sobretudo próximo às ocupações urbanas, o que exigiria soluções espaciais que
apostem na sua flexibilização, através de transições que levem ao desenvolvimento das
matizes funcionais da água ou da vegetação entre um meio e outro. Isto é, a conformação
de espaços fronteiriços que permitam as dinâmicas, seja da subida ou descida da água e
a troca gradual do tipo de vegetação, como lugares de mobilidade para os animais e de
transição para as comunidades vegetais, que favoreçam as plantas espontâneas e que, em
resumo, possibilitem a conservação de suas condições naturais (Forman, 1995).
Neste sentido, a inclusão das presenças naturais do lugar na ordenação das ocupações
urbanas tenderia a funcionar como referência espacial e limite às atuações na paisagem.

A partir da significação visual

A percepção da paisagem também demanda certa continuidade. Ou seja, situações que


levem o observador a identificar e desfrutar dos rasgos visuais de um lugar sem interrupções
bruscas, percebendo seus traços e sua inserção dentro da paisagem como um todo.
A manutenção das continuidades perceptivas pode ser um indício de formalização
da paisagem, ao criar situações onde se fazem necessárias a consideração relativa à

195
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

“potencialidade” perceptiva de cada peça do sistema e seu enlace visual com o território
de modo geral, em busca de uma congruência entre os valores perceptivos dos espaços
livres e as intervenções urbanas.
As continuidades perceptivas podem se dar de distintas formas. Freqüentemente, es-
tão relacionadas com um tipo de acesso: uma via, um caminho, uma passagem, a água,
uma trilha, etc. Estes atuam como corredores perceptivos e tendem a oferecer uma visão
articulada do lugar, mais que a vivência de informações fragmentadas e descontínuas.
Estas continuidades podem propiciar a formação de uma imagem do lugar a partir da coe-
são perceptiva, o que permite ler a seqüência dos acontecimentos e facilita a identificação
coletiva e pessoal com o lugar (Lynch, 1976; Alexander, 1977; entre outros).
As continuidades perceptivas valorizam a percepção da diversidade dos mosaicos
espaciais existentes no sistema de espaços livres e podem ocorrer pela manutenção das
vistas existentes ou pela criação de acessos dirigidos, principalmente para o desfrute visu-
al, como itinerários que atravessariam as peças visualmente mais qualificadas e possibili-
tariam a integração dos elementos mais destacados.
Para a manutenção destas continuidades é imprescindível determinar as áreas sujei-
tas à intervenção cuidadosa, de acordo com a sua significação visual. Assim, se requer a
orientação espacial da ocupação urbana com o objetivo de possibilitar, entre outras coi-
sas, a reabilitação do patrimônio arquitetônico presente no espaço livre, a maior abertura
possível dos lugares visualmente mais significativos, a criação de novas perspectivas que
valorizem suas estruturas espaciais e não ocultem os traços do relevo mais destacados,
como, por exemplo, os morros e cumes, o que pode significar um cuidado especial com
o skyline das edificações e sua interseção com as vistas; do mesmo modo, deveria ser
evitada a ocupação das frentes de água que tendem a bloquear a visão dos cursos dos
rios e do mar, entre outras conseqüências, para valorizar a percepção visual do sistema de
espaços livres (Zoido, 2002).

A partir da rede de acessos

A rede de acessos possui continuidade por excelência e permite estabelecer relações


espaciais entre os espaços livres e entre estes e os espaços ocupados. Entretanto, esta

196
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

mesma rede que, freqüentemente, pode significar a fragmentação do território e dos es-
paços livres entre si, também pode colocar os espaços livres e construídos em contato,
física e visualmente.
A rede de acessos se compõe de distintos tipos de vias, desde trilhas que margeiam
a água ou que entram na vegetação, caminhos rurais, a própria água e as infra-estruturas
viárias, entre outras alternativas.
No contexto dos territórios urbanos, os acessos, em suas diversas escalas, são os ele-
mentos que mais revelam a continuidade entre os espaços livres territoriais e os espaços
livres urbanos e, especificamente, os espaços livres públicos tradicionais, cuja malha final
determina o percurso pelo sistema e inter-relaciona as partes pertencentes aos diferentes
níveis, tornando visíveis os processos naturais e urbanos e permitindo a realização de
percursos que explorem o território (Lynch, 1976).

93

94 95

Exemplo de intervenção ilustrativa de princípios de projeto baseados em relações espaciais a partir da rede de acessos:
93 a 95. Generación del istmo de la Lanzada, Pontevedra, Espanha, 1994. Exemplo de proposta de uma rede de caminhos que cria percursos
que penetram no espaço natural (F.: Acervo Arqto. Fernando Agrasar).

197
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

São percursos que podem ressaltar os recursos que comportam os espaços livres e os
tecidos urbanos, como, por exemplo, os atributos biofísicos e os atributos perceptivos dos
espaços não ocupados, o patrimônio edificado, os equipamentos coletivos mais significa-
tivos, as centralidades, etc., presentes nas ocupações. Nos casos em que os espaços livres
funcionam como separadores entre as ocupações urbanas, provocando seu isolamento,
estas continuidades podem significar a transposição destas barreiras e a oportunidade de
uma maior integração entre as ocupações e entre estas e os espaços intermediários.
A rede de acessos denota uma possível conciliação entre os espaços livres territoriais,
que freqüentemente se encontram isolados ou abandonados, e os espaços livres urbanos;
pode, inclusive, ser um argumento para intervenções urbanísticas mais gerais, que não
estão centradas somente na recuperação dos acessos da rede local, mas também levam
em conta a extensão da rede no território, entre espaços ocupados e não ocupados, sem
esquecer a avaliação da capacidade dos espaços para suportar o aumento de sua acessi-
bilidade, segundo o tipo de via e a capacidade de fluxo de veículos e pessoas.
Portanto, convém definir a hierarquia das vias, propor a criação de percursos que
penetrem no espaço natural conectando a rede de caminhos rurais com um caráter lúdico
e cívico e a recuperação dos cursos dos rios de modo que comportem, em suas margens,
caminhos para pedestres, para bicicletas, cavalos, etc., entre outras possibilidades. Por
outro lado, se ressalta a importância de fomentar uma boa rede de transporte público, que
promoveria uma maior interação entre os tecidos urbanos e os espaços livres.

Relações sinérgicas:
a sutura entre espaços livres e ocupados

As relações sinérgicas supõem a sutura entre o sistema e seu entorno, mais que a
adaptação ou o respeito mútuo entre espaços livres e ocupados. Na sutura é onde ambos
se entrelaçam e onde podem existir outras formalizações do espaço livre distintas dos
parques e reservas tradicionais, originando um acordo de mão dupla entre espaço livre e
ocupado. Isto é, trata-se de situações nas quais o espaço livre seria capaz de aceitar uma
possível ocupação urbana e, ao contrário, a ocupação urbana garantiria algumas condi-
ções “vitais” dos espaços livres, e ambos se autocomplementariam (Hough, 1995; Batlle,
2002; Pesci, 2003, entre outros).

198
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

Deste modo, incluir a sutura entre as áreas não ocupadas e os tecidos urbanos tende
a conformar estruturas complexas, que permitem misturar instâncias formais e usos que
garantiriam a sustentabilidade do meio, conformando o que pode ser identificado como
espaços de sinergia, aproximando tecido urbano e espaço livre ao criar outras referências
para a estruturação do território. A sutura permite pensar em lugares que reuniriam as di-
versidades, no encontro entre as partes, na transição entre a ocupação e os espaços livres,
que significaria não agir apenas com vistas a soluções ecológica ou visualmente corretas,
mas também poderia representar outra maneira de ver, construir e interpretar o território
e implementar intervenções nos espaços livres e ocupados.

As naturezas urbanas

As naturezas urbanas representam a interseção entre meio urbano e natural e ten-


dem a evitar a separação entre ambos. Como espaços de sinergia, as naturezas urbanas
ressaltam a possibilidade de inserção de usos urbanos nas áreas naturais, diretamente
relacionados com a população; também podem significar, em alguns casos, o equilíbrio
funcional e espacial dos tecidos urbanos do entorno, ao suprir possíveis falhas na oferta
de equipamentos coletivos ou a carência de espaços livres públicos, sobretudo em áreas
muito densas; ao mesmo tempo, podem atuar como elementos urbanos de ligação entre
as partes da cidade.
As naturezas urbanas, como os leitos dos rios e suas margens, os bosques, as praias,
etc., tendem a tirar proveito das qualidades do lugar e dos seus recursos, que poderiam
impulsionar a apropriação e a manutenção dos espaços naturais e o seu aproveitamento
pela população. Por exemplo, nas atividades relacionadas com a água, na extração de
madeira ou na inserção na agricultura de técnicas e tipos de cultivo adequados às funções
biofísicas e perceptivas, que sejam respeitosos com o meio (Hough, 1995).
A preservação e a criação de equipamentos ecológica e visualmente adequados
aproximam a comunidade da natureza, principalmente no âmbito de novas ocupações,
estabelecendo uma fronteira híbrida onde conviveriam características distintas, mas não
contraditórias, que, entre outros aspectos, poderiam proporcionar o reconhecimento de
elementos naturais pouco valorizados e equipar os tecidos urbanos.

199
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Além disso, o uso otimizado dos recursos também pode significar boas condições de
manutenção e gestão dos espaços livres, com vantagens para os investimentos públicos e
privados, e uma maneira de controlar a ocupação do território (Hough, 1995).
Entretanto, alcançar este objetivo exigiria algumas medidas fundamentais, como, por
exemplo, definir as atividades compatíveis com cada espaço livre e sua respectiva delimi-
tação espacial; delimitar os lugares destinados à proteção integral ou que podem possuir
um padrão mais variável entre o natural, o recreativo, o rural ou o urbano; limitar as áreas
propícias para a instalação de equipamentos comunitários e áreas de uso público, e criar
infra-estruturas de suporte para atividades turísticas e de lazer compatíveis com o lugar, a
atividade e a quantidade de pessoas previstas para seu desfrute.
Paralelamente, as naturezas urbanas podem estar envolvidas nas dinâmicas urbanas,
ao redor das quais se desenvolvem a urbanização e várias de suas principais funções;
como exemplo podem ser citados os rios, que constituem o eixo central de alguns centros
urbanos e estabelecem as relações entre seus tecidos.
Em determinadas circunstâncias, recuperar tais naturezas, numa ação aliada à rees-
truturação do território, pode ser o início de um processo de reconversão de uma área
natural e uma área urbana ao mesmo tempo, onde a possibilidade de estabelecer novas
relações espaciais e funcionais pode criar sinergias que tenderiam ao uso sustentável e a
destacar a interseção entre a natureza e a ocupação urbana.

Os cenários recriados

Os cenários recriados representam a “ressignificação” visual dos espaços livres degene-


rados e permitem pensar em resultados espaciais que criam belas paisagens, além de pos-
síveis requalificações biofísicas adaptadas à vivência coletiva e a usos sustentáveis, como,
por exemplo, a implantação de verdadeiros parques a partir de agriculturas obsoletas e dos
espaços residuais na ocupação urbana. Em muitos casos, criar espaços de sinergia implica
na transformação de espaços livres cotidianos ordinários, grandes ou pequenos, em espaços
envolvidos com seus entornos, que convidariam à visita, à participação e ao encontro, ao
mesmo tempo em que representariam novas referências na estrutura do território.
Os cenários recriados a partir da agricultura podem recuperar a qualidade dos campos
cultivados através de programas de intervenção que conjuguem a produção e o recreio, junto

200
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

com outras atividades, complementares às dos tecidos urbanos do entorno. São oportunida-
des para, entre outros aspectos, requalificar visualmente os campos agrícolas degradados e
potencializar interesses que possam existir, inclusive o turismo (Hough, 1995).
Neste contexto, frente à possibilidade de reconversão das agriculturas obsoletas, e conside-
rando que freqüentemente elas ocupam solos destinados à expansão urbana, principalmente
se a produtividade não se sustenta, se enfatiza a real necessidade de promover o crescimento
da cidade e a importância da permanência destas áreas para a ordenação do entorno, sem
falar de possíveis significados para a gente do lugar, nas suas tradições e práticas coletivas.
Por outro lado, os cenários recriados podem corresponder a intervenções totalmente re-
generadoras, ao atuarem sobre lugares muito degradados, em geral, marginais ou voltados
para usos pouco qualificadores, como é o caso dos lixões ou pedreiras. Estes lugares podem
constituir uma oferta de espaços livres públicos em áreas periféricas e gerar atrativos que,
em algumas situações, poderiam vir acompanhados de intenções de reforma urbana.
Os cenários recriados também podem possibilitar a criação de jardins em áreas residu-
ais, que sobraram na ocupação urbana, como, por exemplo, os terrenos dos grandes equi-
pamentos ou indústrias. Estes jardins podem combinar os elementos naturais das peças
com a agricultura em pequena escala, intervenções artísticas e funcionais e possibilidades
de lazer, que, além de requalificar visualmente os espaços em si mesmos oferecendo-os à
comunidade, poderiam ser associados a intervenções de renovação urbana em áreas com
uma ocupação em desuso (Hough, 1995).

As infra-estruturas paisagísticas

As infra-estruturas viárias, além de facilitar a circulação pelo território e o contato entre os


assentamentos e os espaços livres, são elementos que, freqüentemente, por suas características
espaciais, promovem a separação física e/ou visual entre os espaços livres, a qual pode causar
danos nas instâncias biofísica e perceptiva, ou na própria acessibilidade dos espaços.
Estas dissociações produzidas pelas vias no sistema de espaços livres nos levam a pen-
sar na possibilidade de que a própria via seja, por sua condição de continuidade, um espaço
de sinergia, um espaço de sutura do sistema, com paisagens distintas e próprias em conso-
nância com os espaços livres, e que traga, a partir dela mesma, novos significados para os
tradicionais conflitos entre as infra-estruturas viárias e os espaços não ocupados.

201
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

A presença de infra-estruturas viárias tende a ocasionar conflitos de ordem biofísica


que merecem ser considerados, como a probabilidade de provocar um “efeito barreira”, ao
impossibilitar o cruzamento de indivíduos de um ecossistema, fragmentando um habitat;
provocar o estrangulamento de fluxos de água, por pontes e viadutos pouco adequados;
ou a erosão de solos, principalmente em encostas muito acentuadas (McHarg, 1969).
Por outro lado, segundo sua posição e secção, as vias podem causar importantes confli-
tos visuais com a paisagem, interceptando espaços de grande qualidade visual ou impedin-
do sua visibilidade. Neste sentido, também podem comprometer o movimento das pessoas e
funcionar mais como um obstáculo que propriamente como um elemento de conexão.
A adequação das vias aos elementos biofísicos e perceptivos resulta imprescindível.
Assim, convém delimitar os lugares mais convenientes para o traçado das infra-estruturas
viárias a fim de conservar os recursos dos espaços livres. Entretanto, além dos danos ao
meio biofísico ou à integridade perceptiva dos lugares, as infra-estruturas viárias também
podem potencializar estes atributos (Lynch, 1966; entre outros).
Para evitar danos ou amplificar certos atributos dos espaços livres, podem-se propor
soluções de passagem para a fauna ou túneis, que tenderiam a favorecer o desenvolvimento
das comunidades bióticas; como também, as intervenções nas vias poderiam envolver inicia-
tivas que privilegiassem a naturalização dos cursos de água com soluções de drenagem com-
patíveis; o aproveitamento da vegetação local no seu desenho; os viadutos respeitosos com
as dinâmicas hídricas; o respeito pelas características do terreno a fim de mitigar, entre outros
problemas, a erosão; a potencialização das melhores visadas (por exemplo, com a criação de
mirantes); o respeito pelos elementos de maior valor visual com a manutenção de sua diversi-
dade e integridade física, etc.; e, sobretudo em estradas e vias-expressas, a previsão de áreas
de serviços qualificadas e pistas e passarelas para a circulação de pedestres e bicicletas.
Neste marco de relações, onde exista a possibilidade de concretizá-lo, se poderia in-
duzir a um uso mais humano entre vias, pessoas e espaços livres, franqueando a presença
dos elementos naturais, o incremento da visibilidade e a circulação de pessoas e veículos,
criando condições espaciais de acordo com as necessidades humanas de circular com
segurança e proteção, fazendo das vias eixos cívicos, perceptivos e naturais, parte impor-
tante do sistema de espaços livres e da integração com seu entorno, enquanto espaços
que criam paisagens mais que um problema a ser resolvido. Isto inclui o tratamento dos
canteiros, das franjas de proteção, das rotundas, dos nós viários e ilhas, dos taludes de

202
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

96 97

98 99

Exemplo de intervenção ilustrativa de princípios de projeto baseados em relações sinérgicas a partir dos cenários recriados:
96 a 99. Parc agrari del Baix Llobregat, Barcelona, Espanha, 1999. Exemplo de ordenação de área agrícola com a manutenção da atividade
agrária e a introdução de novos parâmetros de ordenação com repercussões em sua qualidade visual e biofísica e nas relações que estabelece
com seu entorno urbano (F.: Acervo Arqto. Joaquín Sabaté).

203
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Princípios de projeto
RELAÇÕES
Funcionais Espaciais Sinérgicas
REFERÊNCIAS
Manutenção dos proces- Manutenção das conti- Criação de naturezas
sos naturais nos espaços nuidades biofísicas. urbanas.
livres.

O estabelecimento de crité- A consideração da manu- A criação de espaços naturais


Matriz rios referentes à possibilidade tenção e da recuperação das que estabeleçam a interseção
biofísica de ocupar ou não um lugar continuidades biofísicas no entre os meios urbano e na-
e às localizações mais ade- sistema de espaços livres a tural, como possibilidades de
quadas para as distintas ati- favor da diversidade e do equilíbrio espacial e funcio-
vidades nos espaços livres, desenvolvimento integral nal dos tecidos urbanos, en-
de acordo com os elemen- de seus processos naturais, tre áreas livres e ocupadas, e
tos e processos naturais que como referências espaciais como elementos urbanos de
possuem. à ocupação urbana. ligação entre as partes
da cidade.

Manutenção da visibili- Manutenção das conti- Intervenção na paisa-


dade das características nuidades perceptivas. gem que resulte em
mais significativas cenários recriados.
dos espaços livres
do território.
O respeito pelos elementos A manutenção das continui- A requalificação visual dos
Significação físicos visualmente mais re- dades perceptivas como um espaços livres degradados,
levantes dos espaços livres indício de formalização da através da criação de belas
visual
como referências para a in- paisagem, de acordo com paisagens, além de possí-
dicação das atividades e o as considerações relativas à veis requalificações biofísicas,
condicionamento de possíveis significação perceptiva de adaptadas à vivência coletiva
ocupações e explorações. cada peça do sistema e seu e a usos sustentáveis, como
enlace visual com o território novas referências na estrutu-
de modo geral. ra do território.

Controle das interven- Manutenção e melhoria Criação de infra-estrutu-


ções nos espaços livres da rede de acessos. ras paisagísticas.
acessíveis.

A limitação das intervenções A manutenção e melhoria da A criação de infra-estru-


Acessos nos espaços livres acessíveis rede de acessos como uma turas viárias adequadas
de acordo com seus atribu- possibilidade de estabelecer aos elementos biofísicos
tos biofísicos e perceptivos, relações espaciais entre os e perceptivos dos espaços
como uma oportunidade para espaços livres e entre estes e livres e às respectivas condi-
a compactação dos assenta- os espaços ocupados. ções para a manutenção
mentos atuais e a criação de e desenvolvimento de sua
usos alternativos de pouco integridade e diversidade.
impacto.

204
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

proteção acústica ou outros espaços ermos provenientes das vias, como espaços livres
potenciais a integrar o sistema (Lynch, 1966; Hough, 1995; entre outros).

6B > Ações de projeto sobre os espaços livres


para a ordenação do sistema

A determinação das ações de projeto requer a prévia identificação dos espaços livres
sobre os quais atuar para a ordenação do sistema e a respectiva caracterização de seu
potencial estruturador. Para tanto, se observam os espaços já protegidos pelo planejamen-
to e os que não estão sob a sua égide e que sofrem a pressão da ocupação urbana. Com
este propósito, se desenvolve o seguinte processo:

• A observação dos atributos dos espaços livres. Verifica-se a qualificação de cada


espaço livre como espaço de oportunidade projetual: espaços âncora, espaços referência,
demais espaços livres.

• A observação da situação do espaço livre em relação a seu entorno. Referem-


se às condições oferecidas pelo entorno da peça estudada em relação à presença de
espaços protegidos, tecidos urbanos, espaços âncora, espaços referência ou espaços livres
que não oferecem nenhuma característica relevante.

• A observação das condições necessárias para estabelecer as relações espa-


ciais e funcionais no sistema. Corresponde à indicação das melhores oportunidades
para que se realizem as relações entre as peças do sistema e entre estas e seus entornos,
garantindo a integridade, diversidade e coesão entre ambos os meios, tanto a partir dos
atributos dos espaços livres como da situação que apresentam no contexto urbano.

Cabe advertir que as ações que se apresentam não correspondem a todas as ações pos-
síveis sobre os espaços livres, e sim constituem algumas modalidades, as mais importantes,
de incidir na ordenação do sistema e nas relações entre espaços livres e ocupados.
Neste marco, as ações de projeto podem ser resumidas em: acrescentar, demarcar,
conectar, adequar, articular e enlaçar. Algumas peças, apesar de apresentar uma maior

205
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

tendência em direção a uma ou outra ação, podem admitir mais de uma modalidade de
atuação, embora aqui se apontará a principal.

Acrescentar

A ação acrescentar equivale à possibilidade de somar espaços livres àqueles já sob


proteção de instrumentos específicos, contíguos entre si, de maneira que se ampliaria o
limite da área protegida.
Em geral, as peças que podem “somar-se” aos espaços protegidos correspondem a
espaços âncora (espaços de oportunidade projetual que possuem uma qualificação final
média-alta e alta). Entretanto, em alguns casos, espaços referência (com uma qualificação
final média-baixa e média) ou demais espaços livres (sem atributos relevantes) possam ser
áreas a acrescentar. Por exemplo, em situações nas quais as peças compõem o entorno de
elementos perceptivos notáveis, sejam áreas de emergência visual ou elementos cênicos
já resguardados, e ainda não foram considerados pelos instrumentos de proteção.
Devido a seu valor, os espaços a acrescentar representam a possibilidade de conser-
vação dos recursos dos espaços livres, que até o momento estão sem um instrumento de
proteção estrito, e tendem a atuar a favor da continuidade biofísica e da preservação de
seu significado perceptivo.
Comumente, correspondem a áreas vulneráveis, cujas fronteiras estão próximas da
ocupação urbana, pelo que exigiriam cuidados específicos, sobretudo nas áreas com co-
munidades vegetais muito preservadas, naquelas com alto risco de inundação, deslizamen-
to e desmoronamento e nas áreas com atributos perceptivos significativos que, segundo
seus recursos, podem ser objetos de distintas ações com vistas à intervenção urbanística.
Em alguns casos, podem demandar recuperação ambiental para integrar-se devidamente
ao entorno, como, por exemplo, áreas muito expostas a riscos que estão degradadas ou,
inclusive, áreas já protegidas, embora sem boas condições biofísicas ou perceptivas, que é
o caso de algumas áreas de floresta degradada e cultivo no âmbito de estudo.
Em geral, as áreas a acrescentar vem merecendo pouca atenção no que diz respeito à
manutenção de seus recursos e aos papéis que podem desempenhar junto aos espaços já pro-
tegidos na estrutura urbana, seja como espaços de sinergia entre as realidades naturais mais

206
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

preservadas e as ocupações urbanas do entorno, seja como espaços de controle de tais ocupa-
ções. Neste sentido, estes papéis, como espaços de sinergia ou de controle, podem ir juntos.
No que concerne à combinação de espaços naturais protegidos e ocupações urbanas,
como uma oportunidade de relação entre ambos os meios e de estruturação do entorno,
podem ser citadas algumas ordenações recentes para os parques regionais franceses. Estes
parques são considerados lugares adequados para a reconciliação entre meio urbano e
natural, segundo diretrizes que propõem, entre outras coisas, o desenvolvimento de agri-
culturas em suas margens, que colaboram na marcação de seus limites; e a referência do
parque, com seus recursos e fragilidades, como base para o incremento de possíveis novas
ocupações. Ao mesmo tempo, incentivam a participação da população dos tecidos urbanos
localizados dentro dos limites do parque e em seus arredores em programas de conservação
e na oferta de serviços e atividades diretamente relacionadas com a natureza, o que con-
tribui para sua manutenção50. Deste modo, se estabelecem alguns critérios que permitem a
proteção dos espaços livres e sua consolidação como referência da estrutura urbana.

100

Parques regionais franceses:


100. Ocupações urbanas próximas a áreas protegidas
junto a zonas de plantio agrícola (F.: http:// www.
parcs-naturels-regionaux.tm.fr, 2008).

207
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Como exemplo das possíveis peças a acrescentar, no caso estudado, estão as superfí-
cies contíguas aos grandes parques florestais da Tijuca e da Pedra Branca e parte da praia
do Recreio dos Bandeirantes.
Na realidade, as margens dos maciços têm, sobretudo, uma função clara como área
de “pré-parque”, que está envolvida com seus entornos, ocupados e explorados, e que
pode ser objeto de intervenções intencionadas para manter os atributos biofísicos e per-
ceptivos do lugar, o que, em alguns casos, pode impossibilitar qualquer uso.
Especificamente, em se tratando das áreas florestais com favelas próximas, as áreas
protegidas teriam um papel importante, cujo tratamento como espaços de sinergia e de
controle pode resultar em lugares capazes de qualificar a ocupação com equipamentos
para o lazer e a educação, por exemplo, e, ao mesmo tempo, frear seu desenvolvimento.
Nos espaços menores, as áreas a acrescentar podem ser áreas naturais relacionadas
com os espaços livres públicos urbanos do entorno, e constituem uma boa oportunidade
para realizar atividades ambientais com a comunidade.

Demarcar

Demarcar como ação de projeto significa colocar limite onde não existe um limite
estabelecido e, além disso, onde não existem referências de espaços protegidos ao redor.
De modo geral, demarcar indica a ação de proteção sobre os espaços âncora ainda
não considerados pelo planejamento com instrumentos de proteção mais específicos.
Tais como os espaços a acrescentar, os espaços a demarcar também tendem a atuar
a favor da continuidade biofísica e da preservação dos atributos perceptivos, incluindo
seus entornos.
Em geral, os espaços a demarcar são espaços problemáticos quanto à possibilidade
de ocupação e ainda não receberam a devida atenção quanto ao tratamento que devem
ter, relativo a possíveis diretrizes de intervenção. Portanto, eles podem cumprir os mesmos
papéis que os espaços a acrescentar e, como estes, estão sujeitos a distintas ações relati-
vas à intervenção urbanística, segundo suas escalas, recursos e vulnerabilidades, e podem
desempenhar as funções de espaços de sinergia e de controle entre as áreas que deveriam
ser protegidas e as ocupações, operando como possíveis estruturadores urbanos.

208
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

Horseshoe Park: 102


101 a 103. Vistas do parque
(F.: http://www.scsc.k12.ar.us, 2008).

101

103

209
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Nos casos específicos relacionados com a água que deve ser protegida e que pode
atuar como eixo de estruturação urbana, um exemplo interessante é o tratamento dis-
pensado aos leitos dos rios e suas margens na zona de Denver (Colorado, EUA). Por lei
deve ser definido um corredor ao longo dos fluxos de água, que não pode ser ocupado e
que deve ser ordenado e controlado pelas prefeituras, a fim de mantê-los e evitar riscos
de inundação de zonas vizinhas. Para tanto, as áreas a serem protegidas deveriam ser
definidas antes da ocupação de seus entornos e mantidas como espaços livres destinados
à valorização de seus atributos naturais e visuais e à opções de lazer.
Para alcançar estes objetivos, a ordenação do Horseshoe Park (1986)51, em uma
zona de brejos, canais e rios, sugere a potencialização das conexões entre os leitos
fluviais em congruência com os brejos. Na proposta sugerida foram substituídas as tra-
dicionais estruturas de concreto que canalizavam os rios por soluções mais flexíveis,
utilizando plantas e desníveis nos leitos e nas margens, e foram criados espaços mais
adaptáveis ao lazer, à implementação de caminhos junto à água, à manutenção dos
habitats naturais, à estabilidade das margens e ao controle das inundações. Deste modo,
se pode consolidar o espaço fluvial e conceder-lhe força estruturadora diante de uma
possível ocupação urbana.
Na realidade, isto demonstra a necessidade de consolidação dos espaços protegidos
e a proteger, mediante uma ordenação eficaz, porque, quando relegados ao azar, tendem
a converter-se em áreas propícias às ocupações ilegais.
São exemplos de espaços a demarcar no caso de estudo, os brejos, distribuídos na
parte oeste da planície, e a maioria das margens das águas e áreas críticas aos riscos,
sobretudo, de inundação e deslizamento, presentes em distintas zonas.

Conectar

A ação conectar representa a possibilidade de unir, em termos biofísicos e percep-
tivos, espaços já protegidos e acrescentados aos espaços a demarcar, através de uma
superfície contínua.
Neste sentido, conectar quer dizer atuar nos espaços referência e nos demais espaços
livres a fim de estabelecer ligações entre as peças do sistema.

210
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

Os espaços conectores são estratégicos para o projeto do sistema, onde as áreas de


conexão, que atenderiam tanto às funções biofísicas como as perspectivas, podem ser
planejadas previamente para sua ordenação. Para tanto, se prioriza a conquista da maior
continuidade possível entre os espaços livres, o que favorece o desenvolvimento e a re-
cuperação de seus atributos e de seus respectivos processos em busca de paisagens que
mantenham suas funções essenciais.
De fato, os espaços conectores, junto aos espaços já protegidos e os espaços a acres-
centar e a demarcar, corresponderiam a eixos centrais do sistema que poderiam ser pre-
vistos antes da ocupação urbana e constituiriam sua estrutura, atuando como condicio-
nantes espaciais e elementos de controle. Ao mesmo tempo, nestes mesmos espaços, que
freqüentemente coincidiriam com áreas de alta significação visual, poderiam ser propos-
tas rotas paisagísticas que permitiriam vislumbrar os atributos mais qualificados do lugar,
além de outras possibilidades de se criar conexões visuais.
Relativo à determinação das continuidades biofísicas, a atenção aos espaços protegi-
dos, e aos que deveriam ser, e às respectivas continuidades e descontinuidades existentes
entre eles, pode indicar algumas direções para a eleição das superfícies livres que pode-
riam atuar como possíveis espaços conectores.
Neste sentido, os cursos de água são relativamente fáceis de manejar, se for necessá-
ria uma recomposição de seu traçado. Ao contrário, a recomposição da vegetação é muito
mais complicada, já que, freqüentemente, a existência de ocupações urbanas provoca
descontinuidades que impedem a conexão entre as partes. Entretanto, a presença de
jardins e agriculturas, além de outras comunidades vegetais alteradas, embora possam
apresentar deficiências em termos ecológicos, seguem sendo uma alternativa de conexão
entre os elementos biofísicos e permite sua adaptação e gestão para contribuir para a
continuidade das peças do sistema. Por outro lado, quando fosse necessário restabelecer
as conexões através de áreas já ocupadas, que constituíssem obstáculos a elas, pode ser
previsto, inclusive, o desmantelamento ou a reestruturação destas.
Neste marco, a ordenação da frente litoral da Albufera (Valencia, Espanha, 1995)52 é
uma experiência interessante que tenta conciliar o restabelecimento dos ecossistemas de
restinga existentes na frente marítima com uma grande pressão urbana, sobretudo turística.
Para alcançar seus objetivos, foi proposta a eliminação de vias, do deck existente e de outros

211
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Ordenação da frente litoral da Albufera (F.: Acervo Arqto. Alfredo Fernández de la Reguera):
104. Vista aérea de parte da área.
105. Detalhe das dunas.
106. Detalhe da área de estacionamento.

104

105

106

212
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

elementos da ocupação urbana e sua substituição por dunas estabilizadas, mediante a in-
trodução da vegetação autóctone. A passagem através da restinga foi controlada, devido à
vulnerabilidade do sistema, com a criação de zonas de piquenique entre as dunas e equipa-
mentos concentrados em pontos específicos, que permitem a conexão dunas-praia de modo
fluído e o controle das atividades. O conjunto se completa com a recuperação de lagos no
meio da vegetação, que limitam à penetração no bosque. Deste modo, se conquistam as
conexões desejadas e se estabelecem as regras da relação com o entorno.
No caso de estudo, as principais oportunidades de espaços conectores estariam nas
áreas inundáveis com vegetação (que ocupam grande parte dos espaços livres da planí-
cie) e se relacionam diretamente com espaços descontínuos com importantes atributos
biofísicos e perceptivos.

Adequar

Adequar os espaços livres significa adaptar as suas condições a favor da integridade e da
diversidade de seus atributos biofísicos e perceptivos diante de possíveis ocupações urbanas.
Os espaços a adequar estão representados por espaços referência e demais espaços
livres. Considera-se que, devido a suas peculiaridades, com respeito aos atributos percep-
tivos e do suporte biofísico, estes espaços seriam peças susceptíveis de suportar certo grau
de ocupação urbana.
Entretanto, algumas limitações podem ser necessárias de acordo com a vulnerabili-
dade dos espaços livres à ocupação. Deste modo, estas limitações podem ser argumento
não apenas para inserir as características dos espaços livres nas ocupações, como também
para estruturá-las.
De modo geral, as limitações à ocupação urbana responderiam, além da consideração
das continuidades e dos valores biofísicos e relativos à preservação da qualidade visual
do lugar, à boa acessibilidade e a algumas peculiariadades dos assentamentos, que estão,
direta ou indiretamente, relacionadas com os espaços livres.
Por uma parte, relativo à acessibilidade, se esta é boa, a partir das vias atuais, pode
propiciar a ocupação cuidadosa que utilize as qualidades biofísicas e perceptivas como
guias da ordenação e pode representar uma boa alternativa para a programação de novos

213
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

usos do solo. Com relação à acessibilidade prevista, a adequada ocupação do solo exigi-
ria maiores detalhes e estudos, pois pode ser conveniente pensar em resolver questões
relativas à necessidade de criar assentamentos sem construir mais vias. Entretanto, se a
acessibilidade é ruim, a ocupação não seria aconselhável, entre outros fatores, pela au-
sência de vias, o que poderia implicar na criação de mais infra-estruturas, expondo mais
solo livre à possível ocupação.
Por outra parte, em relação a algumas características que já apresentam os assen-
tamentos atuais, os espaços a adequar para a ocupação urbana deveriam responder a
outros critérios com vistas a beneficiar a consolidação do sistema, como, por exemplo, a
observação das centralidades atuais e a possibilidade de concretizar a ocupação ao redor
destes centros sem promover mais dispersões, e a conveniência que pode representar a
existência prévia de equipamentos, serviços, etc., o que facilitaria novos crescimentos.
Cabe ressaltar a importância, no controle da expansão urbana e na transição entre
esta e as áreas naturais, da preservação de certos usos presentes nas peças a adequar,
como, por exemplo, cultivos produtivos e jardins qualificados ou, inclusive, a recupera-
ção ou estabelecimento de outros usos, como a conversão de lixões ou antigas pedrei-
ras em parques.
Com relação à construção de novas ocupações, os espaços a adequar supõem a
delimitação clara das áreas que podem suportar a ocupação, explicitando as condições
oportunas para sua formalização e, se possível, a inserção dos elementos dos espaços
livres na futura ordenação urbana. Entretanto, a definição de que espaços podem ou não
ser ocupados, ao fim e ao cabo, responde mais a estudos de demanda da necessidade
de crescimento urbano, embora isto não exclua a observação da capacidade de suporte
destes espaços segundo seus atributos.
Um exemplo da tentativa de propor a compaginação do espaço livre com a ocupação,
respeitando os atributos destes espaços e utilizando-os como estruturadores urbanos,
é a ordenação da região de Ørestad (Copenhague, Dinamarca, 1994)53. Sem entrar em
detalhes sobre as polêmicas que rondam o projeto, ao envolver uma possível reserva
natural, e com foco na solução urbana proposta, pode-se dizer que esta procura a união
entre natureza e ocupação, a fim de integrar ambas dentro das indicações contidas no
Copenhagen Finger Plan (1947).

214
107 108 109

Ordenação da região de Ørestad (F.: Acervo ARKKI-architects):


107. Planta geral com a linha férrea prevista.
108. Conjunto edificado.
109. Rede hídrica.

215
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Na região de Ørestad a nova ocupação urbana foi concebida com o objetivo de pre-
servar as áreas úmidas existentes integrando-as aos novos acessos e assentamentos,
mantendo as continuidades da água e entrelaçando-as às funções urbanas. Criou-se, des-
ta maneira, um grande eixo vertical cujo protagonista é a água, que circunda os espaços
sob distintas formas e escalas, desde os grandes mangues até lagos, canais e lagoas. A
água funciona como um lugar de percurso e circulação, ao mesmo tempo em que rela-
ciona os espaços ocupados e cria espaços livres públicos e canais de mobilidade. O canal
mais externo coincide com a criação da via que conecta a parte nova à já ocupada, junto
com ciclovias, em cujo subsolo estaria prevista a instalação de uma nova linha férrea. A
ordenação da área propôs aumentar a densidade edificada em altura para liberar mais
solo e tentar propor espaços livres como “dedos” entre a ocupação que, além de pre-
servar a natureza e relacionar as áreas ocupadas, constituiriam uma área de lazer para
a comunidade. Deste modo, se preservariam os atributos essenciais dos espaços livres e
estes seriam utilizados como elementos de estruturação urbana.
Alguns exemplos de áreas a adequar no caso de estudo são as que possuem florestas
degradadas, pedreiras, vegetação em áreas inundáveis, pastos, áreas de cultivo e jardins.
São áreas que podem aceitar certo grau de ocupação, ao mesmo tempo em que poderiam
contribuir para a manutenção de importantes funções do sistema.

Articular

A ação articular representa a possibilidade de atuar nos espaços livres que relaciona-
riam tecidos urbanos sem interação entre si, ou que seriam pontos de articulação dentro
dos próprios tecidos, juntando partes destes, o que pode ser um fato muito importante,
sobretudo em contextos urbanos fragmentados.
Portanto, articular corresponde à ação sobre as peças que, independentemente da
qualificação de seus atributos, se localizam nos tecidos urbanos existentes, ou entre eles,
e, em geral, podem comportar certa vitalidade e dispõem de uma boa acessibilidade.
Neste sentido, os espaços articuladores podem reunir espaços âncora, espaços referência
ou os demais espaços livres e, inclusive, espaços já protegidos que se encaixariam no perfil
descrito. Portanto, estes espaços podem apresentar distintos atributos e perfis, mais ecológicos

216
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

ou visuais, passando pelos de interesse histórico; além disso, os espaços sem atributos notáveis,
que podem ser lugares potenciais de atuação, poderiam significar a reconversão do quadro de
degeneração que apresentam a favor de sua qualificação espacial e funcional.
Em geral, estes espaços reuniriam lugares propícios para o incentivo da urbanidade,
que permitiriam promover a convivência coletiva, o reconhecimento visual do lugar e a
aproximação da natureza aos cidadãos, e podem ser peças importantes no âmbito local
ou, segundo suas dimensões, promover o interesse na escala da unidade ou superior.
Os espaços articuladores também podem atuar para a melhoria e controle da ex-
pansão dos tecidos urbanos, como limites à ocupação urbana e como oportunidades de
equipá-los, de fomentar atividades coletivas, de designar espaços para hortas comunitá-
rias, para câmaras comunitárias, para festas populares, etc. Podem trazer um equilíbrio
às densidades edificadas e a restauração de alguns espaços atuais degradados, e sua
conversão em lugares de convivência.
Como exemplo de articulação pode ser citada a ordenação do Parque da Juventude
em São Paulo (São Paulo, Brasil, 2003)54. O terreno do parque (240.000 m²), a princípio,
uma área residual resultado da desativação do Complexo Penitenciário do Carandiru, lo-
calizado em uma área urbana densamente consolidada, inclui parte do edifício do antigo
presídio e as ruínas de um presídio inacabado. A estrutura do parque proposto alberga
áreas de vegetação pré-existente a serem preservadas e efetua a relação com a cidade
através de áreas arborizadas setorizadas em três partes: um parque esportivo, uma área
central para o lazer contemplativo, que contém a área de proteção da vegetação e as
ruínas, e um parque institucional, dotado de uma estação de metrô, teatro e espaços para
atividades culturais. No meio do parque, atravessando as três partes, foi proposta uma
alameda, que conecta as partes do parque e os acessos a este. De modo geral, se cria
um espaço que articula o tecido urbano do entorno e torna possível a oportunidade de
equipá-lo, de promover a vivência coletiva e com a natureza, além de permitir percursos
alternativos e de limitar seus crescimentos.
Entretanto, para definir com precisão os espaços articuladores são indispensáveis
estudos detalhados que considerem as necessidades do entorno, como, por exemplo, a
carência de espaços livres públicos, a possibilidade real de que estes espaços sejam uti-
lizados de acordo com as práticas coletivas locais, as condições dos assentamentos, se
estão degradados ou abandonados, entre outros fatores.

217
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

No caso de estudo, algumas áreas que poderiam ser possíveis espaços articuladores
são os fragmentos de espaços livres localizados, sobretudo, na parte central e ao norte
da planície, que, em sua maioria, se encontram em tecidos urbanos consolidados, ou
entre eles, e que poderiam colaborar para uma maior relação entre as ocupações, em sua
melhoria e controle.

110

Parque da Juventude:
110. Planta de implantação (F.: Acervo Arqta. Rosa Kliass).

218
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

111

112

113

Parque da Juventude:
111 a 113. Detalhes do projeto
(Foto: José Luiz Brenna).

219
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Enlaçar

Enlaçar é a ação de projeto a ser adotada sobre os espaços livres que se encontram
em superfícies descontínuas devido à presença de algum elemento de interrupção, como,
por exemplo, as vias, e que poderiam atuar favoravelmente no enlace de algumas peças
do sistema, especialmente aquelas com alta significação visual e biofísica, que pudessem
ser desfrutadas para o lazer, através da criação de caminhos com um entorno aprazível.
Na realidade, a ação enlaçar se aplicaria aos espaços referência e aos demais espaços
livres que possam colaborar na composição da rede de acessos do sistema. Estes espaços
representam a possibilidade de criar conexões, permitindo a passagem e a seqüência
entre os espaços livres que estão, a princípio, segmentados.
Desta maneira, a ação enlaçar tenta criar enlaces, literalmente, em espaços desa-
gregados, privilegiando o fato de ir e vir através deles, ao mesmo tempo em que permite
a criação de áreas de lazer e equipamentos coletivos ao longo de suas rotas, as quais,
freqüentemente, necessitariam requalificação.
Muitos destes espaços estão sujeitos à ocupação urbana. Portanto, cabe ressaltar que
os espaços propícios à ação enlaçar poderiam ser previstos antes de uma futura ocupação,
e projetados e geridos com o objetivo de serem consolidados como verdadeiros itinerários
paisagísticos, para que a possível ocupação esteja de acordo com suas condições de pas-
sagem, além de respeitar as limitações do entorno biofísico e visual.
No caso de estudo, os possíveis espaços a enlaçar se encontram, sobretudo, pró-
ximos às lagoas e à frente marítima e poderiam colaborar na melhoria dos acessos a
estes lugares.

Observações sobre as ações de projeto



Concluindo, pode-se dizer que a ordenação do sistema de espaços livres proposto
permitiria alcançar uma maior relação entre as principais peças existentes no caso de
estudo e, ao mesmo tempo, reestruturar o território.
Entre as intervenções propostas neste âmbito podem ser destacadas as possíveis
conexões entre os maciços, as lagoas e a praia; a ligação entre as peças menores, e

220
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

muito valorizadas, com outras do sistema igualmente qualificadas; a conquista das con-
tinuidades da água; a requalificação de alguns espaços, quando necessário; e uma maior
relação entre espaços livres e ocupados. Estas intervenções poderiam supor atuações nas
ocupações urbanas e explorações existentes a fim de possibilitar as conexões necessárias
relativas ao sistema, assim como diretrizes para futuras ocupações e possíveis transforma-
ções das atuais, tendo como eixo estrutural o sistema de espaços livres.
Em conjunto, isto significa uma mudança na percepção dos espaços livres cujas peças,
que até agora foram massacradas pela ocupação urbana, poderiam assumir as rédeas de
sua vertebração, sobretudo as águas (lagoas, rios, canais, etc.) e a vegetação mais qualifi-
cada, sem esquecer os espaços não qualificados, mas com grande potencial estruturador,
como os espaços articuladores, por exemplo.
Embora as ações de projeto se refiram aos espaços livres mais importantes, cruciais
para a conformação do sistema, devido à escala das análises desenvolvidas, não se consi-
derou outras peças que, entretanto, podem ter uma participação significativa nele.
Neste sentido, são observadas as peças menores que, devido à sua localização e
dimensões, se apresentam como fragmentos de espaços livres distribuídos pela área.
Estas peças, que podem possuir atributos de grande interesse ou simplesmente serem
terrenos sem qualidade, teriam potencial para serem consideradas, em função de uma
análise apropriada, possíveis espaços livres capazes de fomentar a urbanidade e a vi-
vência coletiva local e representariam a possibilidade de incrementar a rede atual de
espaços livres públicos.
Neste marco, se incentivaria a permanência de espaços livres com usos coletivos já
existentes, como os pequenos parques, clubes ou como parte dos equipamentos públicos,
independentemente das determinações do planejamento de outros possíveis usos futuros,
como uma oportunidade de manter a harmonia paisagística aliada a usos pouco impac-
tantes e incentivadores de práticas coletivas.
Na mesma direção, se incentivaria o tratamento das margens das vias como ligação
social, como eixo cívico e, ao mesmo tempo, de circulação, incluindo as bicicletas e os
pedestres, aliados da qualificação ambiental.
Além das observações sobre os espaços livres, a atenção à estrutura social do lugar é
um fator de suma importância para a concretização do sistema se se deseja alcançar os

221
222
223
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

objetivos propostos, pois a ordenação do sistema de espaços livres não se sustenta se não
existe uma interação humana, em particular ao se tratar de lugares onde as desigualdades
sociais são muito fortes e corroboram para a fragmentação urbana devido à vivência seg-
mentada dos espaços e a existência de regras, muitas vezes silenciosas, de exclusão social.
Neste sentido, promover a democratização do sistema de espaços livres diz respeito, em
última instância, a uma postura ética sobre que cidade projetar, que cidade se deseja,
através do incremento de áreas públicas.
Na sua totalidade, a ordenação do sistema significaria reconsiderar as bases da
ocupação urbana até então vigentes e propor outra estrutura para o planejamento do
lugar e, conseqüentemente, para a configuração urbana futura, privilegiando, sobretu-
do, a determinação do sistema de espaços livres como uma possível diretriz do projeto
territorial.

224
Ações de projeto

Espaços de
Ações de projeto Conceito Situação oportunidade
projetual

Acrescentar Somar espaços livres a Espaços livres contíguos Espaços âncora.


outros já considerados a áreas protegidas.
com instrumentos
específicos de proteção.

Demarcar Colocar limite onde Espaços livres sem Espaços âncora.


não existe um limite referências de áreas
estabelecido. protegidas ao redor.

Conectar Unir os espaços Superfícies contínuas Espaços referência e


já protegidos e entre espaços protegidos demais espaços livres.
acrescentados aos ou a proteger.
espaços a demarcar.

Adequar Adaptar as condições Qualquer. Espaços referência e


dos espaços livres diante demais espaços livres.
de possíveis ocupações
urbanas e para o adequado
desenvolvimento de seus
papéis.

Articular Relacionar os tecidos Espaços livres entre Qualquer.


urbanos, ou parte tecidos urbanos ou dentro
dos tecidos, que não dos próprios tecidos.
apresentam interação
entre si.

Enlaçar Criar caminhos entre Superfícies descontínuas Espaços referência e


peças do sistema. que estejam, sobretudo, demais espaços livres.
entre peças muito
qualificadas em termos
biofísicos e perceptivos.

225
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

6C > Sistema de espaços livres


e instrumentos de planejamento

Neste item se objetiva ressaltar alguns argumentos que possibilitariam a ordenação


do sistema de espaços livres como uma oportunidade para a reestruturação do território, a
partir da avaliação dos instrumentos de planejamento existentes e da necessidade de flexibi-
lização dos planos ao longo do tempo, de modo que permitam a consolidação do sistema.

O uso alternativo dos instrumentos de planejamento



A inserção do sistema de espaços livres como vertente estratégica do projeto territorial
pode ter conseqüências muito importantes sobre os instrumentos de planejamento existen-
tes, por propor a criação de outras bases para a ordenação do território, distintas das que
habitualmente se desenvolvem a partir da premissa da ocupação extensiva. Isto envolveria a
proteção e a conservação indispensáveis dos espaços livres e a elaboração de diretrizes para a
ocupação urbana segundo referências funcionais e espaciais em consonância com o sistema.
Entretanto, colocar em prática esta proposta supõe uma série de desafios para a
aplicação de instrumentos de planejamento concretos que permitam a consolidação física
do sistema e a reestruturação do território.
Trata-se de propor alternativas de planejamento às tradicionais práticas de ocu-
pação, tendo consciência dos desafios existentes e sendo realista com relação às con-
dições locais: a propriedade, o loteamento, o planejamento vigente, as necessidades
da população que será atendida, os conflitos e interesses entre os agentes públicos e
privados e, entre outros aspectos, as possibilidades de realizar, gerir e manter o sistema
de espaços livres.
Para tanto, os instrumentos de planejamento atuais, que variam de um lugar para o
outro e que se referem a distintas escalas e a diferentes graus de determinação espacial55,
podem proporcionar algumas possibilidades se utilizados segundo outra perspectiva na
construção do território que pode, em alguns casos, ir contra interesses relacionados com
a especulação imobiliária e a grandes investimentos, sejam comerciais, residenciais, in-
dustriais ou turísticos.

226
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

Em geral, concretizar o sistema de espaços livres e reconduzir a ocupação urbana é


uma proposta de longo prazo, que envolve uma série de atores com interesses divergentes
e que pode ter um custo alto se não são adotados mecanismos adequados de viabilidade
e gestão, além de requerer vontade política, causa pela qual muitas das propostas aca-
bam por não se realizar.
Portanto, cabe ressaltar a importância do tempo de planejamento e implementação
que garanta a sustentabilidade do projeto, o que inclui a fiscalização dos investimentos
sobre o território e o acompanhamento posterior da evolução da paisagem segundo cri-
térios preestabelecidos pelas estratégias gerais. Com relação ao tempo de execução e
aprovação do plano, a questão política pode se converter em um grande problema em
função da duração dos mandatos e do surgimento de novos planos de um mandato para
o outro. É comum, em muitas realidades, o abandono dos planos entre um mandato e
outro que, por motivos políticos, sejam incompatíveis.
Entretanto, a princípio, uma vez aprovado um plano, seu seguimento constituiria um
compromisso com os cidadãos. Isto significa que, uma vez aprovado um plano que previs-
se um sistema de espaços livres, teria que ser assegurada a factibilidade do sistema e a
adaptação das regras de ocupação de seus entornos a esta realidade. Uma atenção volta-
da para a utilização mais eficaz dos instrumentos de atuação já estabelecidos pode contri-
buir expressivamente sem provocar alterações fundamentais no planejamento, como, por
exemplo, as expropriações, as cessões obrigatórias, a compensação, etc.
O emprego destes instrumentos implicaria em não modificar os índices edificáveis
existentes, e sim em adaptá-los, através da determinação rigorosa de critérios de ocu-
pação, ajustando, deste modo, as obrigações já definidas pelo planejamento, relativas à
propriedade e às intervenções urbanísticas propostas pelo projeto territorial com base no
sistema de espaços livres.
Certamente, estas adaptações tendem a gerar conflitos entre o setor público e o
privado, o que requer a negociação das propostas de planejamento com os agentes cons-
trutores do território e, sobretudo, a vontade de aplicá-los.
As negociações com agentes privados correm o risco de serem moldadas pelos inte-
resses privados frente aos públicos, o que, em uma realidade onde o setor público está
cada vez mais distante dos investimentos diretos na cidade, poderia resultar em ações que
atendam mais a interesses econômicos que aos de caráter coletivo.

227
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Entretanto, a fim de alcançar alguns dos objetivos envolvidos na consolidação do


sistema de espaços livres e a adaptação de seus entornos, principalmente no que se refere
à permanência de espaços em áreas urbanizáveis, podem ser sugeridas algumas conside-
rações com respeito ao planejamento, tais como:

• A determinação e defesa de áreas específicas que permaneçam sem ocupar, nas quais
existam interesses para a configuração do sistema. Por exemplo, a permanência das conti-
nuidades biofísicas e perceptivas que podem ser parte das cessões obrigatórias, das áreas de
servidão, das negociações sobre transferência de índices de edificação ou, inclusive, quando
resulte necessário, das aquisições pelo setor público como parte de seu banco de solo.

• O incentivo à concentração da urbanização, ao invés de sua dispersão. Por exemplo,


mediante o controle sobre os usos do solo e a legislação correspondente à gestão do pro-
cesso de consolidação das urbanizações e dos acessos, estabelecendo formas de controle
a partir da aprovação da concepção projetual até a implementação, incluindo constantes
negociações com investidores através do setor público.

• A possibilidade de estabelecer distintos graus de proteção para os espaços livres com


regras claras de uso e ocupação, adequando o regime do solo a esta realidade.

• A incorporação ao plano de outras possibilidades de desenvolvimento econômico que se


aproveitem das oportunidades de uso oferecidas pelos espaços protegidos, como o turis-
mo ou a agricultura, com compromissos que revertam em qualidade paisagística, social e
ecológica. Isto é, estabelecer a obrigatoriedade de consolidar e manter os espaços livres,
que inclua a previsão do tratamento de água, a manutenção da vegetação, através de
limpeza, substituição e reflorestamento, a coleta de lixo e sua reciclagem, etc.

• A proposta de gestão público/privada dos espaços livres, com gestão pública de solo
privado, quando for de uso público, ou gestão privada sob controle público.

• O emprego das grandes operações urbanísticas como um motivo para consolidar mais
espaços livres, como, por exemplo, a duplicação de infra-estruturas viárias, a criação de
vias de metrô, a reconversão de zonas obsoletas, a construção de centros comerciais e
empresariais ou grandes condomínios residenciais, etc.

228
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

Ordenar o sistema de espaços livres e reestruturar o território, sobretudo com relação


aos espaços urbanizáveis e seus direitos adquiridos, representa uma grande dificuldade,
mas também pode significar oportunidades para reconhecer os benefícios que estes espa-
ços podem oferecer na proteção de alguns recursos essenciais para garantir a qualidade
ecológica e perceptiva do território, como também a possibilidade de reconduzir a ocupa-
ção urbana de acordo com a presença dos espaços livres como seus eixos vertebradores.
Nesta perspectiva, propostas como a do anel verde de Vitoria-Gasteiz (Espanha) (Plan
General de Ordenación Urbana, 1999), o sistema de espaços livres de Lleida (Espanha)
(Pla General de Lleida, 1995), o sistema de espaços livres de Paris (Plan Vert Régional
d´Île-de-France, 1995), entre outras, constituem exemplos concretos de ordenação que
estão sendo levados a cabo e que propõem a adequada localização dos espaços livres e
sua sistematização, com influências no seu entorno. Estas propostas foram realizadas em
distintas escalas, desde a mais geral até a mais local, cujos desenvolvimentos seguiram
procedimentos que as tornaram viáveis.
Entre os procedimentos indicados por estes planos para consolidar o sistema se en-
contram o aproveitamento dos espaços livres de domínio público, as propostas de nego-
ciação com os proprietários privados, quando necessário, e um plano estrito de gestão
técnica, econômica e de rentabilidade social, que tende a permitir a viabilidade do siste-
ma, a transformação e ordenação de seu entorno, nos casos previstos, e a preservação
dos espaços livres como um valor social e um ativo econômico do território, segundo
propostas de atuação de longo e curto prazo.
Neste sentido, propor a ordenação do sistema de espaços livres no projeto territorial
e a possibilidade de sua consolidação física, como uma diretriz indispensável para a re-
estruturação do território, implicaria buscar oportunidades para utilizar os instrumentos
de planejamento existentes de modo alternativo e consciente das oportunidades que reú-
nem, assim como abrir possibilidades futuras de criação de novos instrumentos de acordo
com cada situação específica.

A necessária flexibilização dos planos



A proposta de estratégias gerais de projeto, através das diretrizes dos princípios e das
ações a seguir para a ordenação do sistema de espaços livres, de fato, se concretizará na

229
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

consolidação de cada peça particular, onde o espaço livre tenderá a assumir uma regula-
mentação variável, e se desenvolverá sob uma gestão estrita da urbanização.
Para tanto, surge a exigência de adaptação da legislação urbanística às necessidades que
possam aparecer ao longo dos anos, relativas ao crescimento urbano e às novas demandas
da população, nos modos de vida e de habitar, entre outros fatores, o que obrigaria à flexi-
bilização dos planos, de maneira que permitam a consolidação do sistema de espaços livres
relativo à temporalidade de sua realização, em um horizonte a priori difícil de determinar.
Nos modelos tradicionais de planejamento se constata a falta de instrumentos que
possibilitem esta flexibilidade, isto é, a partir de posturas mais estratégicas que definido-
ras do território em todos os seus conteúdos.
Neste sentido, alguns autores abordam esta questão da flexibilização propondo so-
luções de plano mais processuais, que não determinem uma imagem final preconcebida.
Assim, os planos mais territoriais determinariam as estratégias a seguir, e os planos mais
locais promoveriam a concretização de tais estratégias e, inclusive, poderiam oferecer
outras referências às diretrizes mais amplas, mediante a análise detalhada do lugar, que
corroboraria os estudos anteriores ou conflitaria com estes, e poderia sugerir adaptações
às indicações já realizadas (Sabaté, 2000a; Font, 2003; entre outros)56.
A flexibilização da planificação implicaria em planos ajustáveis ao longo dos anos,
através da manutenção de estratégias-chave e da clareza das bases conceituais para a
proposta de futuras mudanças. Isto se refere a determinar as regras fundamentais para a
concretização do sistema e a ordenação da ocupação urbana a partir da proposta de fle-
xibilidade dos planos dentro de intenções estritas, contra posicionamentos imutáveis, que
ao final acabam por sofrer, irremediavelmente, uma série de modificações pontuais, sem a
necessária consideração do todo, fragmentando ainda mais o território já fraturado.
Neste contexto, cabe ressaltar possíveis distinções entre estabilidade e flexibilidade,
termos que, a princípio, podem parecer incongruentes se são considerados como equi-
valentes aos conceitos de rigidez e instabilidade. Deste modo, a estabilidade dos planos
se referiria, sobretudo, ao rigor do planejamento e não à rigidez, ao estabelecimento
de alguns pontos inflexíveis, isto é, pivôs ao redor dos quais poderiam ser manejadas
as diferenças territoriais. Por outra parte, a flexibilidade do planejamento remeteria aos
matizes dos planos dentro de sua estabilidade, de acordo com as heterogeneidades que o

230
Ordenação do sistema de espaços livres: a reestruturação do território

território gera quando congrega em um mesmo espaço características físicas, funcionais e


populacionais específicas, que requerem suas próprias determinações.
Entretanto, a questão da flexibilização dos planos e da criação de novos instrumentos
para a ordenação do território, que possibilitem a consolidação do sistema de espaços
livres, constitui um desafio ainda incipiente, um caminho a ser percorrido, que se dirige a
alternativas mais eficazes em termos instrumentais e democráticos.
Para alcançar este objetivo seria importante uma mudança de mentalidade, de cons-
ciência e a crença de que esta pode ser uma decisão viável para a conquista de territórios
mais sustentáveis. Para tanto, cabe ressaltar a importância de envolver os agentes sociais
em sentido amplo, desde políticos e investidores até o cidadão comum, o que supõe o
desenvolvimento de programas de participação cidadã e educação ambiental.
A participação cidadã no processo de definição, aprovação e modificação dos planos leva
ao diálogo entre os representantes da administração promotora e as forças civis em busca
de um consenso político e um apoio público, através de um processo aberto de compromisso
social que permita opinar e defender a qualidade do território. Por outro lado, a participação
cidadã cumpre uma função importante nas formulações técnicas, pois ao trazer o ponto de
vista da população, não constitui um objetivo somente político ou um jogo de interesses, e se
apresenta como uma dado imprescindível para conhecer realmente o problema e estabelecer
onde existe o interesse local para resolver as questões mais conflitantes. Para fomentar a
participação se pode amplificar as informações através dos meios mais habituais, convertendo
a cidade em notícia nos jornais e nos noticiários televisivos, estimulando a participação nas es-
colas, nas associações de moradores, nas instituições governamentais e não governamentais.
Para um diálogo proveitoso, paralelamente, se deveria sensibilizar os agentes sociais. Na
realidade, a educação ambiental é um fato que se destaca cada vez mais por sua urgência e
que abarca um público amplo que inclui os responsáveis do setor público, os investidores, os
arquitetos e urbanistas e a comunidade em geral. Além disso, os meios tradicionais de ensino,
a publicidade das boas e más práticas, as exposições públicas e outras medidas de divulgação
podem ser eficazes para aproximar a população dos problemas que vivem cotidianamente,
conhecer suas causas e conseqüências e promover práticas diárias mais sustentáveis.
Definitivamente, a flexibilização e a estabilidade dos planos levariam a uma atuação
mais harmônica entre os instrumentos de planejamento e a realidade física e da popu-
lação sobre as quais se aplicam, podendo resultar na consolidação de um sistema de
espaços livres estruturador do território e inserido nas práticas coletivas locais.

231
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Notas
50
Institut d´Amenagement et d´Urbanisme de la Région d´Île-de-France. “Les parcs naturels régionaux,
un enjeu pour I´Île-de-France”. In: Les Cahiers, 109-110, 1995, pp. 6-10.
51
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52
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53
Kvorning, Jens. “Ørestad: Copenhagen´s finger in green space”. In: Topos 17, 1996, pp. 95-99.
54
Kliass, Rosa. “Parque da Juventude”. In: Kliass, Rosa. Desenhando paisagens, moldando uma profis-
são. São Paulo: Editora Senac, 2006.
55
Por exemplo, na Catalunha, em geral, existem, na escala do território, planos territoriais e planos terri-
toriais parciais e setoriais; na escala da cidade, planos diretores urbanísticos, planos de ordenação urbanística
municipal e planos urbanísticos setoriais e, na escala de partes da cidade, planos parciais, especiais e de
melhoria. No Rio de Janeiro, na escala da cidade, estão os planos diretores municipais e, na escala de partes
da cidade, os planos de estruturação urbana.
56
“Els nous instruments que necessitem, o la utilizació diversa dels que ja disposem, ja no podran treballar
a llarg termini i amb objectius i escenaris alternatius i processos per aproximarnos-hi. Els plans no podran ser
omnicomprensius, sinó selectius, cercant efectes multiplicadors d’unes poques intervencions estratègicament
triades. Els processos d’aproximación a la proposta seran més circulars que lineals, més temptatius que definitius,
més estratègics que globals. Ens hem d’acostumar ja a treballar sobre hipòtesis en contínua revisió, més que
sobre supòsits inalterables.
Potser ens cal una nova aproximació, una metodologia interactiva d’ordenació-projecte-verificació i ajust
per abordar problemes específics de cada situació i oferir solucions progressives i contextuals.
Potser caldrà apostar per un doble ritme en el projecte territorial, reprenent la lliçó que ens ofereixen
els bons projectes urbanístics, desllindant els elements essencials, estructuradors, que vertebren la proposta,
d’aquells altres de caràcter accessori, que poden evolucionar i adaptar-se en el temps, que són susceptibles de
definició posterior, de mirades esbiaixades” (Sabaté, 2000a, p.96).

232
7
Epílogo: por um projeto
territorial renovado

A observação da realidade dos territórios urbanos atuais evidencia a urgência em re-


novar as bases nas quais se apóia sua ordenação. A ocupação urbana segue avançando
sobre os espaços não ocupados, seja através da criação de mais infra-estruturas viárias, seja
através de novos núcleos de assentamentos, que respondem mais a questões funcionais do
território que propriamente a um interesse dirigido à preservação de seus recursos.
Entretanto, esta situação engendra algumas contradições, entre as quais, o fato de que
o território como um todo, entre espaços ocupados e não ocupados, representa, por si mes-
mo, a possibilidade de manutenção das atividades de exploração e da estrutura da ocupação
e, sob condições que não promovam o limite de seus usos, pode terminar por colapsar.
Um projeto territorial renovado significaria a possibilidade de reverter o quadro atual
da estruturação territorial e, neste contexto, os espaços livres em sistema representam
uma oportunidade relevante para se propor algo distinto do pensamento tradicional ba-
seado nas ocupações extensivas.
Diante deste quadro, este livro traz uma reflexão sobre a oportunidade que apresen-
tam os espaços livres para reestruturar o território segundo os recursos que estes compor-
tam, sejam biofísicos, perceptivos ou relativos a suas funções urbanas, e por constituírem
a parte não ocupada deste conjunto, aquilo que ainda pode ser planejado, previsto e

233
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

transformado com uma margem de tolerância relativamente ampla com relação a possí-
veis intervenções, dado que permitem uma extensa gama de configurações.
Esta proposta descortina um novo olhar sobre os espaços livres, que deixariam de ser
considerados apenas como espaços que sobram no “fundo” da ocupação (que freqüente-
mente estão representados pelos solos não urbanizáveis ou urbanizáveis ainda não ocupa-
dos), passando, ao contrário, a serem vistos como espaços com força suficiente para reverter o
quadro ocupado, requalificar e orientar a ocupação, como uma diretriz do projeto territorial.
Neste sentido, o sistema de espaços livres na ordenação territorial vai além das tradi-
cionais propostas de configuração de espaços conectados entre si, posto que o enfoque
recai sobre estes espaços como elementos vertebradores com uma função estrutural clara,
que relaciona, integra, atrai e possibilita outra perspectiva para a construção urbana.
Portanto, os espaços livres seriam elementos ativos na composição da paisagem arti-
ficializada, do território humano, cuja contribuição para sua ordenação levaria a uma con-
cepção complexa desta realidade, capaz de reunir no projeto territorial os fenômenos dos
espaços ocupados e dos não ocupados, relacionando ambas as partes. O sistema de espaços
livres ganha relevo, salta da condição opaca a que, freqüentemente, foi relegado, à condição
de diretriz da ordenação, através da consciência de seus potenciais estruturadores.
O método desenvolvido constitui uma aproximação à realidade dos espaços livres
sobre um território concreto, como uma tentativa de ordenação do sistema e sua inserção
no projeto territorial, a fim de verificar sua viabilidade projetual efetiva.
O raciocínio elaborado ressaltou, sobretudo, a necessidade de reconhecer, analisar,
avaliar e propor diretrizes de intervenção sobre os espaços livres dentro da realidade
urbana do âmbito estudado, em um intento de conhecer o que é próprio destes espaços,
seus matizes, debilidades e fortalezas, seus traços característicos e os de seu entorno, com
um enfoque marcadamente propositivo. Portanto, se valorizou a importância de mapear
o território palmo a palmo, identificar seus pontos mais e menos vulneráveis, a situação
relativa a seus entornos e as condições indicadas pelo planejamento vigente, de acordo
com um processo de análise onde foi necessária a observação desde baixo, da condição
de cada peça específica, até mais em cima, na visão panorâmica do todo, e vice-versa.
Este quadro geral permitiu traçar algumas estratégias de projeto para a ordenação do
sistema de espaços livres e a reestruturação do território, que se pretende aplicáveis, não
apenas neste âmbito concreto, como também em outros que apresentem espaços livres
potenciais para uma nova proposta de construção do território.

234
Epílogo: por um projeto territorial renovado

Entretanto, um projeto territorial renovado, tendo o sistema de espaços livres como


vertebrador do território urbano, implicaria desafios para sua execução, tanto com relação
aos instrumentos de planejamento quanto a respeito de sua implementação, justamente
por envolver medidas a serem tomadas para a reestruturação da condição urbana atual, o
que inclui a modificação de algumas normas estabelecidas, entre direitos e deveres. Neste
marco, se constata a importância da estabilidade e da flexibilidade do plano no desenvol-
vimento do território, para que se possa alcançar os objetivos pretendidos; conquistar a
credibilidade da população e envolvê-la no processo de planejamento; traçar uma política
de solo coerente e durável e levar a cabo a construção do meio urbano por partes.
Neste contexto, o livro foi desenvolvido em uma escala determinada, que se situa
entre fatos de caráter mais urbano e outros de caráter mais territorial, e em um tempo de-
terminado, o que impõem certas limitações às análises, em particular ao se compreender
o território como um ente vivo, em constante transformação, que inclui fenômenos que
se desenvolvem nas escalas menores, com interseções que ocorrem e interferem também
em outras escalas.
A observação destes fenômenos pode despertar certas inquietações que provocariam
outras investigações sobre o mesmo tema, a partir, por exemplo, de uma escala menor
ou mais ampla. Certamente, os desafios e as problemáticas tratadas seriam outras, e com
elas viriam outros enfoques e seus respectivos instrumentos de análise. Na realidade,
estes constituiriam possíveis caminhos a seguir no tema do sistema de espaços livres e o
projeto territorial, que poderiam refletir-se em contribuições ao projeto urbano e às esca-
las regionais de planejamento.
A partir das diretrizes traçadas pelo projeto territorial na escala adotada neste livro, e
com relação ao projeto urbano, o potencial estruturador do sistema de espaços livres traz
indicações significativas, que influiriam desde a ordenação local dos tecidos urbanos até
a interferência na construção das próprias edificações e vias.
Nesta direção, além dos tradicionais enfoques orientados para a preservação dos
processos naturais e visuais e o tratamento paisagístico dos espaços livres, se afirma a
complementaridade entre o sistema de espaços livres territoriais e a ocupação urbana,
onde ambos criariam condições de vertebração que poderiam ir mais além da configu-
ração dos espaços livres em si mesmos, como guias para a ordenação da ocupação na
escala local. Afinal, é nesta realidade que os fatos ocorrem, ainda que possam responder

235
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

a diretrizes mais gerais, e correspondem às necessidades mais próximas e cotidianas da


população e da cidade.
Por outra parte, a hipótese apresentada, transposta a uma experiência concreta de
planejamento regional, poderia revelar a necessidade de um enfoque mais genérico, pela
impossibilidade de abarcar certos detalhes na escala que seria adotada. Entretanto, se
comprova que, ainda que mude a escala, os princípios relativos aos espaços livres e às
relações espaciais e funcionais entre eles e com seus entornos tendem a permanecer.
Neste sentido, a ordenação da ocupação urbana deveria ser direcionada, como nas esca-
las menores, à manutenção e ao desenvolvimento dos processos que se levam a cabo no
sistema como argumento para a sustentabilidade do território.
Entretanto, o planejamento regional comporta outros problemas, seja pela dimensão
dos territórios abordados, seja pela participação de diferentes administrações, desde as
municipais até as estaduais. Nesta realidade, a proposta de um sistema de espaços livres
reestruturador do território pode sugerir possibilidades de ordenação que não apenas
transformariam e relacionariam tecidos urbanos entre si, como poderiam fomentar as
relações espaciais e funcionais entre municípios, mediante futuras regras de cooperação
que deveriam ser estabelecidas.
Concluindo, independentemente da escala da análise e da proposta projetual, se
considera fundamental ter claro, para o projeto do território, os princípios de base, o
reconhecimento dos espaços livres e as dinâmicas urbanas nas quais estão envolvidos, as
análises e avaliações e as propostas de intervenção, a partir da concepção da paisagem,
e dos espaços livres em particular, como uma realidade plural, com significados variados,
cuja interpretação segmentada tende a impossibilitar sua compreensão mais completa e
profunda, sobretudo quando se pretende “ressignificar” esta paisagem, renová-la estru-
turalmente e conquistar territórios mais sustentáveis.
De modo geral, este livro ressalta o ganho que pode representar a transformação
do significado dos espaços livres de espaços residuais a estruturadores do território, a
partir da inserção do sistema destes espaços no projeto territorial, que pode conduzir
à sensibilização da sociedade frente aos recursos que estes possuem e à conformação
de territórios urbanos distintos dos atuais, mais congruentes na ordenação de seus
espaços livres e ocupados.

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246
Anexo 1:
Mapas realizados para o livro

Capítulo 3

Mapa do relevo.
Mapa da hidrografia.
Mapa das principais comunidades vegetais.
Mapa das infra-estruturas viárias.
Mapa dos usos do solo.
Mapa do estrato construído.

Capítulo 4

Esquema da ocupação do caso de estudo até 1940.


Esquema da ocupação do caso de estudo até 1970.
Esquema da ocupação do caso de estudo até 2000.
Mapa do loteamento dos espaços livres.
Mapa dos espaços livres atuais.

247
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Capítulo 5

Mapa da cobertura vegetal e exploração dos recursos.


Mapa da hidrologia.
Mapa de declividade.
Mapa da edafologia.
Mapa dos atributos do suporte biofísico.
Mapa da avaliação final dos atributos biofísicos.
Mapa da avaliação final dos atributos perceptivos.
Mapa da avaliação final da acessibilidade.
Mapa das macrozonas.
Mapa das superfícies protegidas.
Mapa das superfícies edificáveis e usos do solo previstos.
Mapa da avaliação final dos parâmetros de proteção.
Mapa de síntese da avaliação.

Capítulo 6

Mapa das ações de projeto.

248
Anexo 2:
Entrevistas realizadas

Anexo 2A > Pessoas entrevistadas

Profissionais da administração pública

Responsáveis pelos planos e projetos no caso de estudo:


• Mario Carlos Silva Lopes – Companhia de Transportes sobre trilhos do Estado do
Rio de Janeiro (RIO Trilhos).
• Priscila Sholl Rodrigues Machado – Secretaria Municipal de Urbanismo (responsá-
vel pelo Projeto de Estruturação Urbana Taquara).
• Alice Amaral dos Reis – Secretaria Municipal de Urbanismo (responsável pelo Pro-
jeto de Estruturação Urbana Vargens).
• Vladimir de Souza – Secretaria Municipal de Urbanismo (Instituto Pereira Passos).
• Solange Cintra – Secretaria Municipal de Urbanismo (Instituto Pereira Passos).
• Brasiliano Vito Fico – Secretaria Municipal de Meio Ambiente.
• Paulo Sérgio de Barros Gama do Nascimento – Secretaria Municipal de Meio Ambiente.
• Luiz Gustavo de Oliveira Barreto – Secretaria Municipal de Transportes.

Responsáveis pelos parques no caso de estudo:


• João Marcos Brandão da Fonseca – Parque Estadual da Pedra Branca.
• Celso Junius F. Santos – Parque Nacional da Tijuca.

249
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Responsáveis pelas regiões administrativas:


• Fabio Lins e Silva Nery Costa – Administração Regional da Barra da Tijuca.
• Delfim Aguiar – Administração Regional Vargens e Camorim.
• Rubens Alves dos Santos Júnior – Administração Regional de Jacarepaguá.

Comunidade

• Newton Moura Júnior – Câmara Comunitária do Recreio dos Bandeirantes.


• William Augusto de Souza Paluma – Câmara Comunitária de Jacarepaguá.
• José Laurindo – Associação de Moradores e amigos do Fontela.
• Delair Dumbrosck – Câmara Comunitária da Barra da Tijuca.
• Cleomar Paredes – Associação de Moradores do Recreio dos Bandeirantes.
• Luiz Carlos dos Santos – Associação de Moradores de Vargem Grande.

Anexo 2B > Estrutura das entrevistas

Profissionais da administração pública

As entrevistas com os responsáveis pelos planos e projetos empenhados pela adminis-


tração pública foram desenvolvidas com base em cada plano ou projeto específico, o que
inclui, entre outros, os planos de estruturação urbana, as previsões de novas infra-estruturas
e de novos assentamentos. O objetivo era conhecer as propostas e estabelecer possíveis
relações entre elas e os espaços livres. Para tanto, foram considerados os seguintes pontos:

• As características físicas das propostas, seus programas e instrumentos de atuação.


• As previsões de proteção e gestão dos espaços livres.
• O modo como é abordado o tema da inserção dos espaços livres na elaboração das
propostas.
• As possíveis conseqüências, diretas ou indiretas, que as propostas possam gerar
nos espaços livres com relação aos atributos biofísicos e perceptivos.
• Se os planos ou projetos representam um incremento da acessibilidade e a criação
de novos assentamentos nos espaços livres.
• Quais são as medidas para mitigar os problemas que possam gerar.
• Como se considera a participação coletiva na definição das propostas.
• A previsão de medidas de educação ambiental.

250
Entrevistas realizadas

O objetivo das entrevistas com os responsáveis pela administração dos principais


parques (Parque Estadual da Pedra Branca e Parque Nacional da Tijuca) era conhecer,
principalmente, como se leva a cabo a gestão dos parques, seus principais problemas
ambientais e o caráter das relações que estabelecem com seu entorno. Estas entrevistas
abordaram os seguintes pontos:
• As características físicas mais relevantes do parque.
• Os principais acessos ao parque.
• A propriedade das terras do parque e os possíveis problemas de gestão entre terras
públicas e privadas.
• A existência de um plano de gestão.
• Os principais problemas com os riscos naturais ou provocados, entre eles, de inva-
sões pelos assentamentos, desmatamento, desmoronamento e deslizamento, incêndio e
poluição.
• As propostas atuais de gestão, incluindo uma possível gestão do solo do parque.
• As explorações previstas dentro do parque e em seu entorno e os problemas que
provocam as existentes.
• Os programas existentes ou previstos de educação ambiental e de participação da
comunidade da área na conservação do parque.
As entrevistas com os responsáveis pelas regiões administrativas buscaram obter infor-
mações relativas à gestão do caso de estudo como uma totalidade, às atuações públicas
sobre os espaços livres, às infra-estruturas existentes e aos possíveis programas que envol-
veriam a população na gestão dos espaços. As entrevistas abordaram os seguintes pontos:
• A gestão dos espaços livres de domínio público, incluindo sua conservação, a seguran-
ça pública, a capacidade de manter a fiscalização e uma possível política de solo no âmbito.
• As condições de transporte público na área.
• As condições da infra-estrutura de serviços na área.
• Os principais centros de comércio e serviços considerados pela administração pública.
• As atuações que se levam a cabo com relação à ocupação irregular.
• Os possíveis efeitos dos planos e projetos previstos para a área de estudo com
relação aos espaços livres.
• A fiscalização das obras referentes aos assentamentos e às infra-estruturas a res-
peito da manutenção dos espaços livres e seus atributos mais significativos.
• As explorações regulares e irregulares na área e suas conseqüências sobre os espa-
ços livres.

251
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

• As iniciativas atuais de qualificação dos espaços livres: arborização, ciclovias, jar-


dins, recuperação de áreas degradadas, etc.
• Os programas de educação ambiental e participação coletiva na gestão dos espa-
ços não ocupados.

Comunidade

As entrevistas realizadas com os representantes das associações de moradores existentes


no caso de estudo buscaram conhecer como se relacionam as pessoas que vivem no lugar com
seus espaços livres; além disso, se buscou identificar os principais problemas e perspectivas
com relação à estrutura física e social da área. As entrevistas abordaram os seguintes pontos:

• As atividades desenvolvidas pelas pessoas nos espaços livres e a forma pela qual
estas afetam suas vidas, seja para o lazer, a produção, a convivência próxima à residência,
entre outros.
• Como as pessoas ocupam os espaços livres e como consideram os elementos com-
ponentes destes espaços (a vegetação, a água, o relevo, etc.) na sua construção.
• Como as pessoas se deslocam pela área, seja de bicicleta, ônibus, carro ou outro
meio de transporte, e como são as condições de transporte coletivo no caso de estudo,
segundo seus pontos de vista.
• Quais são os principais centros de comércio e serviços que utilizam.
• Quais são os aspectos físicos dos espaços livres da área que consideram mais
significativos.
• A participação das pessoas na conservação dos espaços livres do lugar.
• Quais sãos as condições da infra-estrutura de serviços da área.
• A existência de plataformas de defesa e ONGs relacionadas com os espaços livres
e seus respectivos objetivos.

252
Anexo 3:
Unidades de conservação ambiental 57

Anexo 3A > Áreas de proteção Lei Municipal 1.206/88.


Área Protegida: APA DO MACIÇO DA PEDRA BRANCA.
ambiental
Bairros: Jacarepaguá, Taquara, Vila Valqueire, Camorim, Var-
gem Pequena, Vargem Grande, Recreio dos Bandeirantes,
Decreto Municipal 18.849/88.
Grumari, Jardim Sulacap, Realengo, Padre Miguel, Bangu,
Área Protegida: APA DA PAISAGEM E DO AREAL
DO PONTAL. Senador Camará, Santíssimo, Campo Grande, Senador Vas-
Bairro: Recreio dos Bandeirantes. concelos, Guaratiba e Barra de Guaratiba.
Área total (ha): 24,44. Área total (ha): 5.386,68

Decreto Municipal 18.199/99. Decreto Municipal 11.830/92.


Área Protegida: APA DAS TABEBUIAS. Área Protegida: APA DA FREGUESIA.
Bairro: Barra da Tijuca. Bairro: Freguesia.
Área total (ha): 71,69. Área total (ha): 366,00.

Decreto Municipal 19.145/00. Decreto Municipal 10.368/91.


Área Protegida: APA DA SERRA DOS PRETOS FORROS.
Área Protegida: APA DO PQ. MUNICIPAL ECOLÓGICO
Bairros: Lins de Vasconcelos, Méier, Engenho de Dentro,
DE MARAPENDI.
Água Santa, Encantado, Piedade, Campinho, Quintino
Bairro: Barra da Tijuca.
Bocaiúva, Cascadura, Madureira, Jacarepaguá, Freguesia,
Pechincha, Tanque e Praça Seca. Área total (ha): 932,62.
Área total (ha): 2.715,15.

––––––––
57
Fonte: Página web, URL <http://www.rio.rj.gov.br/smac> (consultada em agosto de 2003).

253
ESPAÇOS LIVRES: Sistema e Projeto Territorial

Lei Municipal 1.208/90. Anexo 3C > Bem natural tombado


Área Protegida: APA DA ORLA DA BAÍA DE SEPETIBA.
Bairros: Grumari, Santa Cruz, Sepetiba, Guaratiba e Barra
Área Protegida: PEDRA DA PANELA.
de Guaratiba.
Bairro: Anil.
Área total (ha): 11.608,09.

Lei Municipal 1.534/90. Área Protegida: MORRO DO PORTELO.


Área Protegida: APA DA PRAINHA. Bairro: Recreio dos Bandeirantes.
Bairros: Recreio dos Bandeirantes e Grumari.
Área Protegida: MORRO DO URUBU.
Área total (ha): 157,43.
Bairro: Recreio dos Bandeirantes.
Lei Municipal 944/86.
Área Protegida: PONTAL DE SERNAMBETIBA.
Área Protegida: APA DE GRUMARI.
Bairros: Recreio dos Bandeirantes, Grumari e Barra de Bairro: Recreio dos Bandeirantes.
Guaratiba. Área Protegida: PEDRA DE ITAPUÃ.
Área total (ha): 966,32. Bairro: Recreio dos Bandeirantes.

Lei Municipal 1.272/90. Área Protegida: PEDRA DA BALEIA.


Área Protegida: APA DA ORLA MARÍTIMA. Bairro: Jacarepaguá.
Bairros: Leme, Copacabana, Ipanema, Leblon, Vidigal, São
Conrado, Joá, Barra da Tijuca e Recreio dos Bandeirantes. Área Protegida: MORRO DO CANTAGALO.
Área total (ha): 268,26. Bairro: Camorim.

DM 21.209/02. Área Protegida: MORRO DO AMORIM.


Área Protegida: APA DA FAZENDA DA BARONESA. Bairro: Recreio dos Bandeirantes.
Bairro: Taquara. Área Protegida: MORRO DO RANGEL.
Área total (ha): 8,31. Bairro: Recreio dos Bandeirantes.

Área Protegida: PEDRA DE ITAÚNA.


Anexo 3B > Áreas de proteção Bairro: Barra da Tijuca.
ambiental e recuperação urbana Área Protegida: GRUMARI.
Bairro: Grumari.
Decreto Municipal 11.301/92.
Área Protegida: APARU DO ALTO DA BOA VISTA. Área Protegida: MORRO DOIS IRMÃOS.
Bairros: Rio Comprido, Santa Teresa, Jardim Botânico, Bairro: Jacarepaguá.
Gávea, São Conrado, Tijuca, Alto da Boa Vista, Grajaú,
Jacarepaguá e Itanhangá.
Área total (ha): 3.212,39.

254
Unidades de conservação ambiental

Anexo 3D > Parque Decreto Federal 50.923/61.


Área Protegida: PARQUE NACIONAL DA TIJUCA.
Bairros: Santa Teresa, Laranjeiras, Cosme Velho, Botafo-
Lei Estadual 2.377/74.
go, Humaitá, Jardim Botânico, Gávea, São Conrado, Tiju-
Área Protegida: PARQUE ESTADUAL DA PEDRA
ca, Alto da Boa Vista, Andaraí, Grajaú, Jacarepaguá, Joá,
BRANCA.
Itanhangá, Barra da Tijuca e Rocinha.
Bairros: Jacarepaguá, Taquara, Tanque, Praça Seca, Vila Val-
Área total (ha): 3.359,19.
queire, Camorim, Vargem Pequena, Vargem Grande, Recreio
dos Bandeirantes, Grumari, Jardim Sulacap, Realengo, Padre Decreto Municipal 20.149/2001.
Miguel, Bangu, Senador Camará, Santíssimo, Campo Gran- Área Protegida: PARQUE NATURAL MUNICIPAL
de, Senador Vasconcelos, Guaratiba e Barra de Guaratiba. DE GRUMARI.
Área total (ha): 12.983,94. Bairro: Grumari.
Área total (ha): 804,73.
Decreto Municipal 11.830/92.
Área Protegida: BOSQUE DA FREGUESIA. Decreto Municipal 4.105/83.
Bairros: Anil e Freguesia. Área Protegida: PARQUE ARRUDA CÂMARA
Área total (ha): 30,33. (BOSQUE DA BARRA).
Bairro: Barra da Tijuca.
Lei Municipal 2.331/95.
Área total (ha): 54,04.
Área Protegida: PARQUE MUNICIPAL BOSQUE
DE JERUSALÉM.
Bairro: Barra da Tijuca.
Área total (ha): 14,77.
Anexo 3E > Reserva biológica

Decreto Municipal 17.445/99. LM 1540 / 90.


Área Protegida: PARQUE MUNICIPAL ECOLÓGICO Área Protegida: PAU DA FOME E CAMORIM.
DA PRAINHA.
Bairros: Recreio dos Bandeirantes e Grumari. Área Protegida: RESERVA BIOLÓGICA
Área total (ha): 146,93. E ARQUEOLÓGICA DE GUARATIBA.
Área total (ha): 2.800,00.
Lei Municipal 61/78.
Área Protegida: PARQUE MUNICIPAL ECOLÓGICO
DE MARAPENDI.
Bairro: Barra da Tijuca.
Área total (ha): 247,85.

Decreto Municipal 8.452/89.


Área Protegida: PARQUE ECOLÓGICO MUNICIPAL
CHICO MENDES.
Bairro: Recreio dos Bandeirantes.
Área total (ha): 43,64.

255
Este livro foi composto em Frutiger, sobre
couché 115g/m2.. A impressão e o acabamento
se deram na Sol Gráfica em novembro de 2008.

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