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CLÍNICA CIRÚRGICA II AP2

Prof. Neivaldo Santos – Trauma vascular

TRAUMA VASCULAR

Considerações Gerais

Atualmente, o trauma vascular é uma das patologias que mais mata indivíduos jovens.
Portanto, é uma patologia grave, principalmente, em função da alta frequência de acontecimentos
e da alta mortalidade que está envolvida. Normalmente, o trauma vascular pode ser proveniente
de um trauma único por arma branca, por exemplo, ou pode vir associado a um quadro de
politraumatismo.

Antigamente, havia muita dificuldade na abordagem do paciente traumatizado ou


politraumatizado, devido à inexistência do ATLs. Não havia, por exemplo, preocupação nenhuma
com a manutenção da via aérea do paciente. No entanto, com o advento do ATLs, a abordagem a
esse tipo de paciente é muito mais concisa e adequada. A abordagem pré-hospitalar inadequada
do paciente acarreta piora do prognóstico do quadro e até mesmo óbito.

Perfil do paciente traumatizado:

 Adulto jovem, sexo masculino- mulher está tão exposta quanto o homem, no entanto, a
prevalência continua a ser maior no sexo masculino.
 Abuso de álcool e entorpecentes.
 Acidente de trânsito- quando maior o desenvolvimento da indústria automobilística,
maior o número de acidentes, pois os veículos passam a alcançar maiores
velocidades.
 Baixo nível socioeconômico e de instrução.
 Propriedade e porte ilegal de armas com predomínio de arma branca- A arma de fogo
atinge o vaso através de duas maneiras: cinética= da bala e lesão de queimadura.
Geralmente, no caso de ferimentos por arma de fogo, é quase que impossível se
realizar uma anastomose término-terminal, necessitando-se de interposição de uma
veia para fechar a lesão no vaso.
 Predomínio de acometimento do membro superior (mecanismo de defesa).

Realizou-se um trabalho nos municípios de Botucatu e de Sorocaba, ambos no Estado de


São Paulo, com o intuito de definir o perfil do trauma ocasionado por mulheres e por homens.
Quando a mulher é o agente causador, o movimento é vertical (de cima pra baixo), geralmente
em hemitórax esquerdo determinando lesão torácica na maioria dos casos. Em ferimentos
cardíacos, o ponto não pode ser em X pois pode tamponar os vasos, devendo ser sempre em U,
pois, determina menor isquemia da área cardíaca lesionada. Quando se fala de arma de fogo a
mulher atinge principalmente o abdome, pois não tem firmeza na mão fazendo com que a arma
abaixe.

O homem, geralmente, possui movimento horizontal e a lesão causada por ele é


abdominal. É importante saber que a aparência externa da lesão e sua extensão não
determinam o prognóstico e gravidade da mesma, uma vez que lesões aparentemente extensas
podem ser menos graves que lesões discretas. A mulher, geralmente, causa lesões menos
extensas, por imprimir menos força no trauma, mas que podem ser fatais.

Etiologia

 Arma branca;
 Arma de fogo;
 Acidentes automobilísticos;
 Procedimentos vasculares= causas iatrogênicas (diagnóstico e terapêutico)

Procedimentos vasculares

A cirurgia endovascular vem alcançando grande desenvolvimento nos últimos anos. No


entanto, mesmo esses procedimentos não estão isentos de complicações. Nas salas de
hemodinâmica, os procedimentos são realizados com o auxílio do arco em C, que permite que a
cirurgia seja orientada por angioscopia.

O Arco Cirúrgico em "C" é um


aparelho de raio-x adaptado para ser
usado dentro do Centro Cirúrgico,
auxiliando em cirurgias abdominais,
urológicas, traumatológicas,
ortopédicas, vasculares, entre outras.
Com a utilização dele, o médico pode
acompanhar detalhes da cirurgia, em
tempo real, através de um monitor.

Quadro Clínico

O quadro clínico do trauma vascular está relacionado a três fatores: isquemia, hemorragia e
síndrome tumoral/hematoma.

1) Isquemia – As secções totais de vasos são mais graves, pois, os cotos se retraem e o
sangramento para, mas a perfusão do membro também é cessada. O quadro isquêmico
depende muito do tempo decorrido desde o trauma até o atendimento, o que define
também o prognóstico.
2) Hemorragia – Nas lesões parciais de vasos, os cotos não sofrem retração e o sangramento
continua.
 Com relação ao que é melhor: lesão parcial é melhor em relação a isquemia, e
lesão total é melhor em relação a hemorragia.
3) Hematoma ou Síndrome Tumoral – tumorações pulsáteis e ausência de pulso distal no
membro, mesmo na ausência de sangramento ativo, indicam trauma vascular.

Mecanismos Hemodinâmicos Compensatórios

Lesão Vascular
Hemorragia ou sangramento

Hipotensão arterial

Taquicardia compensatória

Estímulo do sistema renina-angiotensina

Liberação de aldosterona

Retenção de sódio e água

Aumento da pressão oncótica

Aumento do débito cardíaco

Sangramento arterial x Sangramento venoso

Geralmente, o sangramento arterial é vermelho-rutilante e por sincronismo e o sangramento


venoso é mais escuro e sem sincronismo.

Hematoma ou Síndrome Tumoral

Quando o paciente tem um ferimento por arma de fogo e apresenta tumoração pulsátil, pode
ser duas coisas: pode haver uma fístula arteriovenosa traumática ou um pseudoaneurisma. A
fístula arteriovenosa traumática é uma comunicação anormal entre artéria e veia em função do
trauma ocorrido. Como a artéria possui maior pressão, o sangue passa todo para a rede venosa.
No pseudoaneurisma, não há comunicação entre vasos, mas há uma lesão unilateral da artéria,
que é contida pela musculatura adjacente. Os dois quadros determinam a clínica de tumor ação
pulsátil e para distinguir esses casos é necessária a utilização de Arteriografia.

Os efeitos imediatos de uma fístula arteriovenosa traumática seriam Hipertensão Venosa,


Hipotensão Arterial e aumento do débito e da frequência cardíaca, devido à passagem de
sangue em alta pressão da artéria para a veia.

Os efeitos tardios englobam:


1. aumento cardíaco- Esse aumento do coração por dilatação ainda é discutido. A
formação da fístula determina maior chegada de sangue ao átrio direito, mas a
dilatação somente ocorre quando a fístula é próxima ao coração ou quando é de alto
débito. O volume sanguíneo é o mesmo, mas a chegada de sangue é maior.
2. Circulação colateral (devido à Hipertensão Venosa).

Portanto, o quadro clínico é definido por presença ou não de hematoma pulsátil, isquemia
distal, Insuficiência Venosa Crônica (varizes) e repercussão cardíaca e fase mais tardia e se a
fístula for de alto débito.

Ao exame físico da Fístula Arteriovenosa, podem ser notadas, à inspeção e palpação, cicatriz
e síndrome tumoral, que produz uma sensação pulsátil à palpação.

Há dois sinais importantes na palpação:

 Sinal de Nicoladoni-Branham= consiste em produção de bradicardia reflexa à


compressão da artéria proximal à fístula.
 Sinal de Gundermann= consiste em aumento da pressão arterial sistêmica à
compressão direta na fístula.

À ausculta, o sopro é do tipo maquinaria/locomotiva, de caráter sistodiastólico contínuo.

Abordagem do paciente com trauma vascular

1) Em suspeita de lesão vascular, a conduta é basicamente cirúrgica.


2) O controle da hemorragia, principalmente em casos graves, é realizado por compressão
da artéria proximal. O garroteamento é utilizado em caso de inviabilidade do membro,
como em esmagamentos com impossibilidade de reconstrução. Em casos de possibilidade
de reconstrução dos membros, como algumas lesões em guilhotina, deve-se recorrer à
compressão apenas. Se a compressão for ineficaz e houver possibilidade de recuperação
do membro, deve-se garrotear e soltar o garrote periodicamente.
3) No pré-atendimento, deve-se coletar o sangue do indivíduo para realização de dois
exames rápidos: tipagem sanguínea e Hematócrito/Hemoglobina. O hematócrito inicial não
é parâmetro para transfusão do paciente, pois, pode ainda estar estável na hora da coleta.
O que define a necessidade de transfusão é somente o quadro clínico (palidez,
sudorese...). De preferência, a transfusão deve ser realizada com o sangue específico do
paciente e, se não for possível, deve-se usar O -.
4) Utilizam-se duas Abocath de grosso calibre no membro contralateral (em caso de lesão em
MMSS), por meio do qual se coleta exame e infunde cristaloide (Ringer Lactato 2000 ml),
enquanto não chega o sangue para transfusão. É importante que as soluções infundidas
sejam aquecidas. Uma das causas de óbito nos hospitais é a infusão de soluções geladas,
o que determina hipotermia e acidose, pois as duas situações guardam íntima relação.
5) Controle da dor e Profilaxia do Tétano deve ser feita sempre.

Reparo Vascular

Tempos do Reparo Vascular

1) Controle proximal e distal à lesão, abordando o vaso nesses dois pontos. Se paciente
tem lesão em artéria femoral, tem que ser abordada a artéria femoral comum e poplítea.
2) Embolectomia com cateter de Fogarty – O cateter de Fogarty possui um balão na sua
extremidade e é graduado em números de acordo com o tamanho do balão (1 a 8). É
insuflado e puxado através de todo o vaso, retirando assim os trombos residuais.
3) Heparinização locorregional – Após a retirada dos trombos, deve-se injetar heparina no
local da lesão para evitar que novos trombos se formem. Dilui-se 1 ml de heparina em 100
ml de solução salina, injetando-se 20-25 ml distalmente à lesão e 20-25 ml proximalmente
à lesão. Em situações de lesão vascular ou outras condições que determinem
sangramento, como plaquetopenia, deve-se utilizar o chamado Filtro de Veia Cava, para
evitar que o paciente tenha TEP.
4) Arteriorrafia – Consiste no reparo da lesão.

 Dicas: utilizar sempre duas luvas, para uma proteção melhor e quando for fazer o
curativo ao final da cirurgia ele ficar limpo. Utilizar óculos de proteção individual.
Umedecer a mão do cirurgião com soro fisiológico com uma seringa (quebra-se a ponta
da agulha). Fazer Reparo protegido, consiste em colocar gaze em volta do fio e pinça-
los, para evitar que, na hora que o fio seja pinçado, arrebente com mais facilidade .

O controle do vaso consiste em compressão para conter hemorragias ou manutenção


temporária da circulação até que o reparo possa ser realizado. Existem várias formas de fazer o
controle do vaso, entre eles a utilização unicamente de fita cardíaca, o Hummel ou o Shunt.

1) O Hummel é realizado da seguinte forma: passa-se uma fita cardíaca em torno do vaso,
usa-se um pedaço pequeno cortado de sonda nasogástrica, passam-se as duas pontas da
fita pelo interior da sonda e comprime a sonda com uma pinça, o que pressiona o vaso e
faz contenção.
2) O Shunt é a tentativa de manutenção da perfusão do membro lesado, evitando assim a
perda do mesmo. É utilizado quando não há possibilidade de reparar a lesão no local em
que se encontra o paciente. Coloca-se um shunt na artéria proximal e distal e na veia
proximal e distal. Coloca-se, portanto, uma sonda nasogastrica no vaso lesado, dando um
ponto com categute para segurá-la por algumas horas até ser possível a realização do
procedimento cirúrgico.

MODOS DE REPARO VASCULAR

 Sutura simples- Quando a lesão é discreta e dá pra suturar.


 Sutura com plastia ou remendo, quando a lesão é de um segmento pequeno, pode
ser um pedaço de veia, dacron, PTFE, pericárdio bovino.
 Anastomoses término-terminais (ferimentos por arma branca), quando é lesão em
guilhotina, secção total do vaso e as bordas ficam próximas.
 Interposição de segmento de veia no local lesado. É sempre importante retirar o
segmento de veia do lado contralateral e inverter sua direção, devido à presença das
válvulas venosas.
 Interposição com próteses (PTFE, Dacron, etc) para substituição da artéria, em caso
de não haver veia adequada. Na sutura com plastia/remendo, utiliza-se um segmento
pequeno de veia para substituir a área lesada, mas a artéria não é removida. Já na
interposição venosa, retira-se um segmento da artéria lesada e se coloca uma veia no
lugar.
O melhor substituto para uma artéria é outra artéria, em segundo a veia, a mais utilizada é
a safena Magna.

CONTINUA EM PARTE 2 TRAUMA VASCULAR

Usei a transcrição do período passado como base.

Por: Nágila

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