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O FENÔMENO PSICOSSOMÁTICO PELOS CONCEITOS DE

PENSAMENTO OPERATÓRIO E ALEXITIMIA: POSSIBILIDADES DE


INTERVENÇÃO PSICOTERAPÊUTICA
THE PSYCHOSOMATIC PHENOMENON THROUGH THE OPERATORY THOUGHT AND
ALEXITHYMIA CONCEPTS: POSSIBILITIES OF PSYCHOTHERAPEUTIC INTERVENTION

Fernanda Fagnani Soares¹


Raquel Fernanda Blazius²
Victor Umberto Zadinello³

SOARES, F. F.; BLAZIUS, R. F.; ZADINELLO, V. U. O fenôme-


no psicossomático pelos conceitos de pensamento operatório
e alexitimia: possibilidades de intervenção psicoterapêutica.
Akrópolis Umuarama, v. 23, n. 2, p. 165-180, jul./dez. 2015.

Resumo: O presente trabalho trata-se de uma revisão bibliográfica re-


alizada através de referências ligadas ao campo de estudo da psicos-
somática. Os objetivos desse trabalho serão relacionar o conceito de
pensamento operatório desenvolvido por Pierre Marty com o conceito
de Alexitimia segundo Peter Sifneos buscando explicar o fenômeno
psicossomático e expor possibilidades de intervenção psicoterapêutica
com esses pacientes psicossomáticos. Para isso, inicialmente busca-
-se conceituar psicossomática e expor a influência da psicanálise sobre
¹Docente do curso de Psicologia da Uni-
ela. Em seguida apresentar brevemente os conceitos de pensamento
versidade Paranaense - UNIPAR, Cam-
pus Cascavel. E-mail: fernandafagnani@ operatório e alexitimia e as teorias que os embasam. Esses dois con-
hotmail.com. End. Rua Presidente Bernar- ceitos foram desenvolvidos em relação ao estudo da psicossomática.
des, 1003. Ciro Nardi. Cascavel-PR. CEP: Ambos possuem semelhanças e compartilham principalmente a inca-
85802-020. pacidade de elaboração e simbolização psíquica e dificuldades de ex-
²Acadêmica do curso de Psicologia da Uni-
pressar emoções como características marcantes em seus portadores.
versidade Paranaense - UNIPAR, Campus Ambos os conceitos parecem terem sido influenciados pelo conceito
Cascavel. E-mail: psico-raquelblazius@ de neurose atual de Freud, que já apontava para a falha de elaboração
hotmail.com. End. Rua Jorge Lacerda, 798. psíquica nas somatizações. Por fim, buscará manifestar possibilidades
Centro. Ed. Quinta do Sol, bloco A7, ap. 33. de intervenção psicoterapêutica com esses pacientes que possuem
Cascavel-PR. CEP: 85810-220.
dificuldade de manifestar seus sentimentos.
³Acadêmico do curso de Psicologia da Uni- Palavras-chave: Psicossomática; Pensamento operatório; Alexitimia;
versidade Paranaense - UNIPAR, Campus Psicoterapia.
Cascavel. E-mail: victor.uz@hotmail.com.
End. Rua Fagundes Varela, 1919. Coquei- Abstract: The present study presents a bibliographic review perfor-
ral. Cascavel-PR. CEP: 85807-480.
med through references connected to the psychosomatic field of study.
The objectives of this work are to relate the operatory thought concept
developed by Pierre Marty to the Alexithymia concept by Peter Sifne-
os, seeking to explain the psychosomatic phenomenon and exposing
possibilities of psychotherapeutic intervention with these psychosoma-
tic patients. In order to attain that, the study seeks to conceptualize
psychosomatic and the psychoanalysis influences over it. Afterwards,
the concepts of operatory thought and alexithymia are briefly presen-
ted, along with the theories underlying them. These two concepts have
been developed in relation to the study of psychosomatic. Both have
similarities and share mainly the incapability of psychic elaboration and
symbolization, and the difficulties in expressing emotion as striking cha-
racteristics in their carriers. Both concepts seem to have been influen-
ced by Freud’s current concept of neurosis, which already pointed to
the failure of the psychic elaboration in somatizations. Finally, it will
seek to manifest possibilities of pshychotherapeutic intervention with
Recebido em novembro de 2014 the patients that present difficulty in manifesting their feelings.
Aceito em abril de 2015 Keywords: Psychosomatic; Operatory thought; Alexithymia; Psycho-
therapy.

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SOARES, F. F.; BLAZIUS, R. F.; ZADINELLO, V. U.

INTRODUÇÃO samentos superficiais, desguarnecidos de valor


libidinal, direcionados em demasia para o mun-
O presente estudo trata-se de uma re- do externo e intimamente ligados à materialida-
visão bibliográfica feita por meio de referências de dos fatos. Dessa forma, propuseram que os
ligadas à área de estudo da psicossomática. O pacientes em questão se caracterizam por um
primeiro objetivo deste estudo é relacionar o déficit da habilidade de simbolização. Além dis-
conceito de pensamento operatório, criado pelo so, sugeriram que esse comprometimento ten-
psicanalista Pierre Marty e o conceito de alexi- de a se desenvolver em uma notável limitação
timia desenvolvido pelo psicanalista Peter Sif- do trabalho fantasmático e em um considerável
neos, ambos os constructos buscam explicar o apagamento de toda manifestação de ordem
fenômeno psicossomático. O último e principal psíquica, o que indica uma ausência do funcio-
objetivo deste trabalho será apresentar possi- namento psíquico (HORN; ALMEIDA, 2003; SIL-
bilidades de intervenção psicoterapêutica com VA; CALDEIRA, 1993 apud PERES, 2006).
pacientes psicossomáticos que possuem pensa- Em seguida, no capítulo “O CONCEITO
mento operatório e alexitimia. DE ALEXITIMIA SEGUNDO SIFNEOS” será fei-
Para se chegar a esses objetivos, pri- to o mesmo caminho que no capítulo anterior,
meiramente no capítulo intitulado “PSICOSSO- mas desta vez com o conceito de alexitimia.
MÁTICA” será realizado um breve resumo con- Conceito este que foi desenvolvido quando Pe-
ceituando psicossomática, que segundo Ávila ter Sifneos e John Nemiah observaram em seu
(2002 apud VARELA, 2006), a questão que esta trabalho na Escola de Medicina de Harvard, em
estabelece é a questão do corpo, sua particu- Boston, que alguns pacientes psicossomáticos
laridade, suas limitações e suas manifestações. apresentavam muita dificuldade para dizer sobre
O sintoma psicossomático pode ser compreen- seus sentimentos e emoções, dando a sensação
dido como um processo em que algo subjetivo de não entenderem o significado dessas pala-
prossegue uma via oposta ao invés de conseguir vras (FREIRE, 2010). Sifneos (1972 apud FREI-
consentir à mente como representação, ou seja, RE, 2010) desenvolveu o termo alexitimia para
processo mental; essa circunstância se traduz explicar esse modo de se comportar.
de forma corporal, exibindo-se como manifesta- Depois de caracterizados os dois concei-
ção no soma. O processo psíquico dá lugar ao tos, ambos (pensamento operatório e alexitimia)
processo somático: no sintoma psicossomático, serão relacionados entre si, por meio dessa re-
uma questão subjetiva ao invés de se simboli- lação serão apontadas semelhanças entre eles.
zar, ela se expõe. Também nesse capítulo será Por fim, no último capítulo, levando em
exposta a influência da psicanálise sobre esse consideração as características que serão apre-
campo de estudo bem como a diferenciação en- sentadas de pacientes psicossomáticos portado-
tre eles. res de alexitimia e pensamento operatório, serão
Os conceitos de pensamento operatório expostas possibilidades de intervenção psicote-
e alexitimia dentro da Psicossomática discorrem rapêutica com esses pacientes que possuem di-
de mecanismos parecidos ao que Freud (1986 ficuldade de expressar seus sentimentos.
apud VALENTE, 2012) chamou de neurose atu-
al: o aumento da estimulação somática sem a Pacientes que estão conscientes dos seus
atividade psíquica necessária pode fazer surgir sentimentos e que são capazes de os diferen-
sintomas somáticos. Elas parecem influenciadas ciar respondem mais rapidamente à terapia
por esse conceito de Freud para compreender as do que pacientes que têm que desenvolver
essas competências. Clientes que estejam
somatizações, conceito esse determinado pela
mais motivados para a mudança estarão
falta do processo de simbolização, sendo assim, mais permeáveis às questões do terapeuta
no segundo capitulo intitulado “O conceito de do que pacientes que questionam o valor da
pensamento operatório segundo Marty” será terapia. Alguns pacientes têm mais facilidade
apresentado de forma breve, o conceito de pen- em se focarem em si próprios e desenvolve-
samento operatório e a teoria que o fundamen- rem narrativas coerentes, enquanto outros
ta. Marty e M’Uzan (1994 apud PERES, 2006), necessitam de desenvolver estas competên-
desenvolveram o conceito de “pensamento ope- cias de um modo que possibilite fazerem um
ratório” para fazer referências a pacientes psi- bom uso das intervenções terapêuticas. Co-
cossomáticos que comumente manifestam pen- locadas estas diferenças parece importante

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pensar em formas de intervir que sejam mais origem da doença (JEAMMET, 1989 apud AN-
úteis para os pacientes com maior dificulda- DRADE; CASTRO; MULLER, 2006).
de de atingir resultados terapêuticos satisfa- No começo do século XX, os estudos de
tórios, como é o caso de pacientes com ní- Freud, assinalando o papel de conflitos psíqui-
veis elevados de alexitimia (SILVA; VASCO;
cos no surgimento de sintomas que não possu-
WATSON, 2013, p. 206).
íam nenhuma causa física imediata, possibili-
taram, a partir dos anos 30, toda uma linha de
PSICOSSOMÁTICA
desenvolvimento da chamada Medicina Psicos-
somática (CASTIEL, 1992; SARAFINO, 1994
A palavra “psicossomático” foi utilizada
apud TRAVERSO-YÉPEZ, 2001).
primeiramente no início do século XIX por um
psiquiatra alemão chamado Heinroth para des-
Foi nesse período que os conceitos deriva-
crever um tipo de insônia. O termo foi reutiliza- dos da teoria psicanalítica, como a relação do
do 100 anos depois, para caracterizar uma nova sintoma orgânico com a dinâmica psíquica e
concepção da medicina. Esta, introduzindo fato- o infantil, a distinção entre as psiconeuroses
res psicológicos no determinismo de alterações e as neuroses atuais, a dimensão econômi-
orgânicas, abrirá um espaço no positivismo re- ca do funcionamento psicossomático, entre
dutor que qualificava a medicina clássica desde outros, foram referenciais para o desenvol-
o final do século XIX (MARTY, 1993). vimento das teorias psicossomáticas atuais
A psicossomática é um campo de estu- (EY; BERNARD; BRISSET, 1977; MOREIRA,
2003; PENNA, 1980 apud CAPITÃO; CAR-
dos que possui cada vez mais interessados, ela
VALHO, 2006, p. 23).
é uma disciplina autônoma e se difere da medi-
cina e da psicanálise, mas tem sua origem nesta
Por meio das neuroses, Freud tornou
última. Sua particularidade habita nas respostas
evidente duas vias pelas quais processos psí-
que traz à discussão sobre a unidade essencial
quicos interagiam e interferiam nos processos
do ser humano. Estudando essa problemática
orgânicos: pela psiconeurose, em que conflitos
por meio da dialética das interações que um indi-
psicológicos podiam produzir sintomas somáti-
víduo, em sua totalidade biológica, social, histó-
cos, como a histeria; pela neurose atual, em que
rica e psicológica mantém, tanto com si mesmo
os sintomas somáticos poderiam ser gerados
quanto com os outros, a psicossomática apre-
pela ampliação da estimulação somática sem
senta uma compreensão objetiva e coerente dos
o trabalho psíquico necessário. Um caminho
fenômenos de somatização (MARTY, 1993).
acontece a partir do trabalho psíquico, e outro
Compreender o adoecimento a partir da
pela falta deste. Essas duas vias transmitem di-
relação entre fatores biológicos, psíquicos e so-
ferentes sentidos de compreensão da influência
ciais mostra uma concepção de doença como
do psiquismo sobre o somático, com suas indivi-
sendo multifatorial. Sendo assim, não se pode
dualidades, meios e resultados particulares, de
resumi-la em uma única esfera, como a suges-
tal forma que suas expressões são diferentes,
tão da psicogênese clássica que faz construir
apesar de não ser incomum acontecerem simul-
um conjunto etiológico de enfermidades espe-
taneamente (VALENTE, 2012).
cíficas, como as “doenças psicossomáticas”. A
Freud se interessa pelas psiconeuroses
influência do psiquismo no processo de adoeci-
do ponto de vista psicopatológico das neuroses,
mento acontece seja na origem, conservação ou
pois as neuroses atuais não teriam como serem
restauração, de forma que questões emocionais
interpretadas e analisadas por não fazerem par-
diminuem ou aumentam a susceptibilidade do
te do psiquismo. A discriminação entre psiconeu-
indivíduo para o adoecimento, mas sempre na
roses e neuroses atuais se deve ao mecanismo
relação com o organismo e o ambiente social em
que atua por trás: diferente das psiconeuroses,
que está inserido (VALENTE, 2012).
as neuroses atuais contêm em sua etiologia não
De maneira clássica, psicossomático
um mecanismo psíquico, mas a aplicação não
é determinado como todo distúrbio relativo ao
adequada de energia sexual. Diz respeito a uma
corpo que possui em seu determinismo um ele-
quantidade acumulada de estimulação somática
mento psicológico que intervém, não de modo
que aparece no corpo, mas que não atinge à es-
passageiro, como pode acontecer com qualquer
fera psíquica para encontrar uma saída; volta,
doença, mas por uma participação essencial na
numa deflexão, para o próprio soma, causando

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assim angústia, hipocondria, irritabilidade, etc. da em que Freud se distancia da compreensão


Não acontece um trabalho de elaboração psí- até então presente na Medicina do corpo como
quica que efetue a simbolização dessa energia. causa de todas as enfermidades humanas, ele
Não nasce de defesa, mas se origina de um faz um retorno, ao declarar o seu desempenho
mecanismo que não está localizado no psíquico central na formação do próprio sujeito e de seus
(FREUD, 1896 apud VALENTE, 2012). destinos. Essa regressão, porém, ocorre sobre
Segundo Knobloch (1998 apud VALEN- outra perspectiva, a da Psicanálise, que compre-
TE 2012), a problemática daquilo que não é re- ende o corpo não apenas como um organismo
presentável na vida psíquica aparece na teoria biológico, mas também como um organismo psí-
de Freud a partir da segunda teoria do aparelho quico (VALENTE, 2012).
psíquico, denominada de segunda tópica, com o Essa dupla racionabilidade, entretanto,
conceito de id, quando a demasia pulsional será tem um limite muito frágil. Ambas se interagem
compreendida como o que resiste à inclusão no de forma dinâmica, se regulam e se constroem
registro representacional. Ainda segundo essa de tal maneira que não é possível pensar o psí-
pensadora, Freud, com a segunda tópica e a par- quico e o somático de forma separada. Esse sa-
tir da noção de um id não identificado com o in- ber, que recorda a Antiguidade Clássica, foi ago-
consciente, aponta para o fato de sua dimensão ra recuperado de forma sistematizada e enfática
evidenciar não só a existência do inconsciente, por Freud e assumido como herança pela Psi-
mas também das pulsões sem representação, cossomática. Desse modo, a Psicanálise desen-
ou seja, pulsões que não foram inscritas e não volve sua teoria com base nesse raciocínio do
se assentaram em representantes-representa- corpo, promovendo uma visão integrada sobre,
ção. Na segunda teoria do aparelho psíquico, o considerando tanto aspectos somáticos como
id é o local, portanto, da pulsão que não possui psíquicos (VALENTE, 2012).
representação. Ainda de acordo com essa auto- Desde o começo do século XX, com o
ra, só se pode pensar em um aparelho psíquico desenvolvimento da psicanálise, Freud, por
no nível da representação inconsciente. Logo, meio do conceito de determinismo psíquico,
ao estabelecer a pulsão como constituinte do recupera a importância dos fatores internos do
aparelho psíquico, Freud se vê na obrigação de homem. Se observa que desde seu início a te-
levar em consideração o irrepresentável, o infi- oria psicanalítica partiu de estudos relacionados
gurável. ao corpo, com os estudos de Freud acerca da
histeria e sua atenção às conversões (CATAL-
Contudo, já no início da obra freudiana, essa DO, 1991 apud ANDRADE; CASTRO; MULLER,
compreensão do não representável já se 2006). Mesmo que Freud não tenha se empe-
mostrava presente. A lógica da representa- nhado particularmente pela psicossomática, ele
ção não esgota a problemática do corpo. As- parece ter sido seu incentivador (MARTY, 1993).
sim, com essa possibilidade da inscrição no
A psicossomática e a psicanálise estão
corpo de algo que foge a essa lógica da re-
presentação, abre a possibilidade para pen- intimamente conectadas, mas não se misturam.
sar o sintoma corporal como uma descarga A psicossomática procede de forma direta da
para o corpo, como um “transbordamento” psicanálise. Suas posições e seus descobri-
da libido, uma vez que ela não pôde pas- mentos importantes são produtos do trabalho de
sar por um trabalho de elaboração psíquica psicanalistas clássicos que possuem interesse
(FERNANDES, 2003 apud VALENTE, 2012, pelos pacientes somáticos. O estilo, o método, a
p. 15). interpretação geral do estudo da psicossomáti-
ca moldam-se sobre os da psicanálise (MARTY,
Ao estabelecer o corpo como uma cons- 1993).
trução particular que o sujeito faz sobre o seu
próprio organismo, há o aparecimento de um A psicossomática não se reduz à psicanálise,
corpo que é representado. Não rejeita o corpo da qual contém teoricamente o domínio eco-
biológico, mas parte dele e o inclui na vida psí- nômico. Na prática, difere dela globalmente:
quica, numa interação dinâmica e direta. O cor- quanto aos pacientes que trata (pacientes
po é o local onde se desenvolve as complexas somáticos cujo status está, às vezes bastan-
relações entre o somático e o psíquico, e per- te distante, pelo empobrecimento da sexuali-
dade, daquele dos neuróticos mentais de se-
sonagem desse conjunto de relações. Na medi-
xualidade inibida ou distorcida); quanto aos

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objetivos que persegue (permitir ao paciente, igual que se fale de psicossomática do adulto ou
antes de mais nada, restabelecer seus me- da criança, por exemplo. A utilização da palavra
canismos de defesa e a organização, mes- “psicossomática” como adjetivo para as doen-
mo neurótica, de sua sexualidade); quanto ças e os pacientes, nos parece dessa forma, su-
às técnicas que emprega (responsabilidades
pérfluo, a conter uma certa ambivalência frente
eventualmente partilhadas com outros tera-
peutas médicos ou de ordem paramédica,
ao empreendimento psicossomático (MARTY,
utilização das “transferências laterais”, ritmo 1993).
modulado e frequentemente mais lento das Ainda segundo Marty (1993), alguns es-
sessões, duração dos tratamentos adaptada tudiosos da psicossomática continuam a usar as
à conjugação doença somática-qualidade expressões “pacientes psicossomáticos”, “doen-
fundamental e variações do funcionamen- ças psicossomáticas”. Isso não teria importân-
to psíquico, posição face à face dominante, cia, se não fosse expressão de sua hesitação
relação da base prevalecendo sobre a da entre o tradicional dualismo psique-corpo e a vi-
transferência) (MARTY, 1993, p. 8-9). são monista que a psicossomática defende em
relação ao dualismo. É importante ter conheci-
Também, a psicossomática não é uma mento disso como também saber que, de acordo
especialidade da medicina, sua concepção en- com as situações, a ênfase dada ao somático
caminha-se a todas as áreas da medicina (MAR- ou ao psíquico não expressa uma visão dualista.
TY, 1993). O termo psicossomático é entendido
A psicossomática se atenta, portanto, como a indissociabilidade e interdependência
aos movimentos relativos ao soma e aos movi- dos fatores biológicos e psicológicos (RAMOS,
mentos psíquicos. Ela também se interessaria 1994 apud ANDRADE; CASTRO; MULLER,
em estudar as interações dinâmicas e harmo- 2006).
niosas do somático e do psicológico nos sujei- Segundo Caldeira e Silva (1992), o con-
tos saudáveis de acordo com sua idade, assim ceito de psicossomática tem mudado segundo a
como as desarmonias menores dessas intera- abordagem teórica de quem o utiliza. Muitos au-
ções. Ela trabalha com pacientes portadores de tores têm se esforçado para construir uma estru-
doenças somáticas de diferentes faixas etárias, tura teórica consistente apta para explicar e de
desde adultos, adolescentes, crianças até bebês tornar inteligível a manifestação psicossomática.
(MARTY, 1993). Desse modo, são muito conhecidas as ideias de
Segundo Andrade, Castro e Muller (2006, F. Dumbar sobre perfis psicossomáticos; os con-
p. 41), doença psicossomática pode ser compre- flitos específicos de F. Alexander; a nomeação
endida “como uma conjugação de fatores origi- das enfermidades psicossomáticas; a suposição
nados do corpo, da mente, da sua interação e de se tratar de doentes portadores de doenças
da interação também com o ambiente e o meio psicossomáticas, de fenômenos psicossomáti-
social.” cos, entre os mais importantes. Também foram
“As doenças psicossomáticas questio- desenvolvidos os conceitos de pensamento ope-
nam a divisão que se faz entre doenças físicas e ratório e alexitimia, relativos ao estudo da psi-
psíquicas, como se fossem de natureza diferen- cossomática, sendo o primeiro criado pela esco-
te, decorrendo esta divisão da tradição cartesia- la francesa e o segundo pela escola americana.
na que separa a mente do corpo.” (ANDRADE; Os conceitos de pensamento operatório
CASTRO; MULLER, 2006, p. 42). e alexitimia dentro da Psicossomática discorrem
Segundo Marty (1993, p. 7), “o homem é de mecanismos parecidos ao que Freud (1986
psicossomática por definição”. apud VALENTE, 2012) chamou de neurose atu-
Logo, denominar de “psicossomáticos” al: o aumento da estimulação somática sem a
as afecções somáticas e os pacientes somáticos atividade psíquica necessária pode fazer surgir
só pode, instituir uma razão de desvio ou de pro- sintomas somáticos. Elas parecem influenciadas
blema. O qualificativo psicossomático apenas por esse conceito de Freud para compreender
adquire um valor quando se emprega a concep- as somatizações, conceito esse determinado
ções gerais, para denominar o setor julgado das pela falta do processo de simbolização.
ciências humanas: a medicina psicossomática, a Sendo assim, a seguir serão apresenta-
ciência psicossomática, por exemplo. A palavra das de forma resumida as teorias que embasam
enquanto substantivo nos possibilita de forma o conceito de pensamento operatório segundo

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SOARES, F. F.; BLAZIUS, R. F.; ZADINELLO, V. U.

Pierre Marty e o de alexitimia de acordo com Pe- co dos pacientes somáticos, nasceriam novos
ter Sifneos. Após ambas as apresentações, os conceitos nosográficos, como “Depressão Es-
dois conceitos serão relacionados entre si. sencial”, “Desorganização Progressiva” e “Pen-
samento Operatório”, diferente dos neuróticos.
O CONCEITO DE PENSAMENTO OPERATÓ- Segundo Marty (1993), o psiquismo é um
RIO SEGUNDO MARTY grupo de funções complexas, que seriam devi-
do à evolução mais novas do que o somático e,
Segundo Valente (2012), em 1962 Marty por isso, mais sensível à desorganização. Ele
faz uma virada epistemológica e muda a manei- foi desenvolvido para que o organismo huma-
ra de pensar a Psicossomática. Antes ele era in- no pudesse lidar com mais eficiência diante do
fluenciado pela linha teórica de Alexander, nes- mundo, logo para lidar com os impactos emocio-
ta, o caminho a ser seguido parte do sujeito para nais ele seria quem primeiro iria ser instalado.
se chegar à enfermidade e dessa forma determi- Por meio de processos mentais, a circunstân-
nar as causas e uma sintomática. Agora, ele faz cia emocional é trabalhada e dispersada. Sen-
o caminho contrário, não para chegar à doença, do o psiquismo falho nessas funções mentais,
mas para chegar ao sujeito, estabelecendo uma ele poderia se desorganizar frente a um estado
nova perspectiva no pensamento psicossomá- emocional, no que foi denominado de “desorga-
tico que influencia até hoje, ao ouvir o sujeito, nização progressiva”, pertencendo assim ao so-
como relata Dias (1992 apud VALENTE, 2012), mático a tarefa de lidar com o estado emocional.
por meio de uma “escuta analítica” em vez de O somático apelaria a pontos de fixação, que em
escutar “via órgão”. parte seriam constituídos pela história de vida do
Pierre Marty criou o Instituto de Psicosso- indivíduo e em parte seriam herdados.
mática de Paris em 1972, tomando como ponto Frente a situações traumáticas, alguns
de partida conceitos psicanalíticos, ele compre- sujeitos podem desenvolver o que se denomi-
ende a doença somática como produto da inca- nou de “depressão essencial”, compreendida
pacidade de elaboração da excitação por meio pelo rebaixamento do tônus libidinal sem ne-
de recursos psicológicos do indivíduo, devido a nhuma compensação. Acontece um desapareci-
uma estruturação falha, no plano emocional e mento de toda dinâmica da mente (introjeções,
representativo do aparelho psíquico (HAYNAL; projeções, descolamentos, condensações,
PASINI; ARCHINARD, 2001 apud CAPITÃO; identificações, vida onírica e fantasmática), não
CARVALHO, 2006). acontecendo a relação libidinal retrógrada e rui-
Segundo Marty (1993), a perspectiva da dosa de outros tipos de depressões neuróticas
Escola de psicossomática de Paris harmoniza ou psicóticas. A energia vital perde-se por causa
as inconstâncias temporais da psique com as da desorganização e da desintegração do fun-
do corpo nos sujeitos que possuem uma doen- cionamento psíquico. Dessa maneira, frente à
ça somática. Essa perspectiva permite o estudo necessidade de lidar com um conflito emocional
da dinâmica dos diversos tipos de personalida- e não possuindo ferramentas psíquicas o bas-
des dos pacientes somáticos, da dinâmica dos tante para tal, o sujeito ficaria vulnerável ao ado-
diferentes tipos de enfermidades somáticas, e ecimento, porque seu psiquismo encontra-se
também do dinamismo dos embates entre os enfraquecido (MARTY, 1993).
pacientes e suas doenças. A depressão essencial se estabelece
A teoria sugerida por Marty (1993, 1998 quando experiências traumáticas desorganizam
apud CAPITÃO; CARVALHO, 2006), destaca a funções psicológicas, cujas habilidades de ela-
noção de que uma maior vulnerabilidade somá- boração falham. Ela é de modo frequente an-
tica é derivada de um baixo nível de atividade tecedida por angústias difusas que expressam
mental. Frente a um trauma, um indivíduo com o tormento profundo do indivíduo, provocado
atividade mental pouco desenvolvida não possui- pelo fluxo de movimentações pulsionais não
ria recursos em sua mente suficientes para lidar domadas pelo Ego. Uma das principais carac-
com a demasia de excitação e esta desorgani- terísticas deste estado é o desaparecimento dos
zação passaria então a atingir as funções relati- sentimentos de culpa inconscientes, e a anula-
vas ao corpo menos evoluídas. Deste modo, na ção das funções psíquicas normalmente ativas
suposição de uma construção inacabada ou de acontece no sistema pré-consciente (MARTY,
um funcionamento incomum do aparelho psíqui- 1993 apud CAPITÃO; CARVALHO, 2006).

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O fenômeno psicossomático...

A partir da depressão essencial, Marty da mente e os estados de tensões físicas não


compreendeu como a desorganização do apa- acham caminho para o psíquico, ficando no cor-
relho psíquico possuiria a capacidade de au- po (CALDEIRA; SILVA, 1992).
mentar a susceptibilidade de o sujeito adoecer. “Os portadores de pensamento operató-
Porém, Marty também diz de um modo de orga- rio têm mundo interno pobre e investem intensa-
nização psíquica que difere da neurose e da psi- mente na realidade externa, da qual passam a
cose, caracterizada pela negação do simbolismo ser dependentes ou “hiperadaptados”. (CALDEI-
e pela carência de certos processos da mente RA; SILVA, 1992, p. 113).
(MARTY; M’UZAN, 1994 apud VALENTE, 2012). Estes sujeitos são pragmáticos e gruda-
Estes processos não estão impedidos pelo re- dos ao circunstancial de modo tenaz. Quando
calque ou desterritorializados por separações, o experimentam conflitos existenciais, aumentam
que indica uma forma de funcionamento mental o investimento no trabalho para que este tome
ímpar, caracterizado pelo pensamento operató- posse do espaço do objeto interno segurador
rio. Sujeitos com esse modo de funcionamen- (mãe) (CALDEIRA; SILVA, 1992).
to psíquico demandariam uma compreensão e Os pacientes com pensamento opera-
abordagem distintas, próprias, que combinas- tório não desenvolvem uma interação afetiva
sem com sua atividade mental. com o outro, o qual é entendido como possuindo
O conceito de pensamento operatório faz também particularidades operatórias de pensa-
parte de uma estrutura teórica em que a pala- mento (CALDEIRA; SILVA, 1992). André Green
vra psicossomática reúne dois termos, sem ves- mencionado por Marty (1983 apud CALDEIRA;
tígio de ligação entre eles, com a intenção de SILVA, 1992, p. 114) denomina esses pacientes
abranger a unidade essencial ente o psíquico de pacientes “isto é tudo” ou nomeia essa rela-
e o soma (PEÇANHA, 1998 apud CARNEIRO; ção de “relação branca”.
YOSHIDA, 2009). A autora Mc Dougall (1986 apud CAL-
É um conceito que entende o homem por DEIRA; SILVA, 1992, p. 114) “os chama de “nor-
meio de uma compreensão monista, segundo a mopatas” ou pacientes que usam de uma pseu-
qual, o psiquismo e o corpo só são separados donormalidade como forma de viver. Para esta
por uma questão de ênfase, sendo errado dizer autora eles são “des-afetados”. A relação inter-
de forma exclusiva em sintomas somáticos ou pessoal acaba tornando-se operatória, pragmá-
físicos. Segundo essa perspectiva, a unidade tica”.
fundamental do organismo do ser humano trans- Sifneos (1974 apud CALDEIRA; SILVA,
corre da hierarquização gradual de todas as fun- 1992) relata que há a falta de sentimento e não
ções que tem participação em sua estruturação a negação das emoções.
e envolve os conceitos de: mentalização (em Referente a esses pacientes, Marty
um nível elevado), pulsão de morte, depressão (1993) relata seus pensamentos como carentes
essencial, doença somática (em um nível mais de fantasias, atividades relativas aos sonhos,
baixo), entre outros. Todos eles, de acordo com com uma forte negatividade simbólica. Não têm
Peçanha, devem ser levados em conta na ca- vínculo com a vida fantasmática, sendo factual,
racterização de pensamento operatório, que fica racional, voltado para o mundo externo, com
sem significado se descontextualizado da teoria forte realidade, afastado de imagens verbais e
(CARNEIRO; YOSHIDA, 2009). referências afetivas. Representa, então, um fun-
O princípio do pensamento operatório é cionamento psíquico com pouca quantidade de
simples, porque ele torna evidente a ausência energia libidinal e sem afetividade, cujos aspec-
das funções das atividades oníricas e das fan- tos exteriores e concretos predominam, e a abs-
tasias, as quais possibilitam inteirar as tensões tração e simbolismo são ausentes ou limitados.
pulsionais que defendem a saúde física do in- O discurso desses pacientes é usado mais no
dividuo. Dizem respeito a pensamentos sem sentido de atenuar tensões do que para dar sig-
conexões visíveis com a vida fantasiosa, carac- nificado para suas experiências.
terizados como racionais e fatuais, desprovidos
de divagações pessoais, de alusões afetivas e A vida operatória, ligada à depressão essen-
de imagens verbais (MARTY, 1993 apud CAPI- cial, constitui uma etapa de relativa cronici-
TÃO; CARVALHO, 2006). As percepções ou in- dade, um arranjo frágil, um estado instável,
terpretações repletas de afetos são distanciadas que se instala no decorrer de uma desor-

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SOARES, F. F.; BLAZIUS, R. F.; ZADINELLO, V. U.

ganização progressiva lenta. É repleta de grande dificuldade para utilizar uma linguagem
incidentes ou acidentes somáticos. As pou- adequada para manifestar e relatar sentimentos
cas representações que parecem existir são e distingui-los de sensações relativas ao corpo.
(como nos sonhos) pobres, repetitivas, con- Mostram dificuldade na habilidade de represen-
tendo a marca do atual e do factual (MARTY,
tar de forma simbólica suas emoções, de forma
1993, p. 17).
que sua condição emocional ficaria não articula-
da e cooperando para o surgimento de sintomas
Nos portadores de pensamento opera-
físicos. Têm uma habilidade de imaginar e fanta-
tório acontece que os detritos diurnos não se
siar extremamente precária e um estilo cognitivo
juntam com os traços da memória, sendo assim,
utilitário, apoiado no concreto e conduzido exter-
não se manifestam em elaborações apropriadas
namente, com tendência a comportamentos im-
de sonhos, transformando pobre a vida fantas-
pulsivos (SIFNEOS; APFEL-SAVITZ; FRANKEL,
mática e não tento a possibilidade de ser utiliza-
1977 apud VALENTE, 2012). Suas palavras
dos de forma adequada como cenário da pulsão
usadas para manifestar suas emoções são ca-
(CALDEIRA; SILVA, 1992).
rentes de significados psicológicos, não expres-
A somatização seria, assim, consequên-
sando os estados psicológicos internos, produto
cia de estruturas falhas do psiquismo na tarefa de
de perturbações na habilidade de simbolização
elaboração e representação simbólica. Logo, um
(WEINRYB, 1995 apud VALENTE, 2012).
menor nível de atividade psíquica corresponde
Em relação aos aspectos emocionais, há
a uma maior susceptibilidade somática. Frente
dificuldade em identificar e manifestar as emo-
o fluxo de estimulações pulsionais, o psiquismo
ções, sendo as expressões emocionais funda-
deve lidar com a economia pulsional. A habili-
mentalmente somáticas. Em relação aos aspec-
dade de elaboração simbólica, que revelaria a
tos cognitivos, o pensamento é orientado para
quantidade e a qualidade das representações
o mundo externo, afastado de traços afetivos e
psíquicas, Marty chamou de “mentalização”.
de caráter simbólicos, com preponderância do
Quanto melhor a mentalização, maior a habili-
pensamento operatório. Na área interpessoal,
dade do psiquismo em suportar os choques dos
interações utilitárias, ausentes de afeto, com di-
traumas no registro mental, mais desenvolvida
ficuldade de assimilar os próprios sentimentos e
é a vida psíquica e menos vulnerável ao adoeci-
os dos outros, com inclinação à solidão ou de-
mento (VALENTE, 2012).
pendência (TAYLOR et al., 1970 apud VALEN-
Segundo Épinay (1998 apud ANDRADE;
TE, 2012).
CASTRO; MULLER, 2006), o conceito de pen-
A descrição mais presente na literatura
samento operatório da Escola Psicossomática
atualmente é a de que trata-se de um conceito
de Paris, corresponde ao conceito de alexitimia.
multidimensional, caracterizado por dificuldades
em reconhecer e relatar sentimentos internos,
O CONCEITO DE ALEXITIMIA SEGUNDO SI-
dificuldades em diferenciar emoções de sensa-
FNEOS
ções físicas, carência de sonho e inabilidade de
simbolizar ou relacionar fantasia e afeto (SIFNE-
O conceito de “alexitimia” nasce na dé-
OS, 1991 apud CARNEIRO; YOSHIDA, 2009),
cada de 1970, e se transformaria recorrente no
também é compreendida por uma forma de ra-
estudo da psicossomática. (SIFNEOS, 1991
ciocínio prático, concreto, voltado para o mundo
apud VALENTE, 2012). A palavra alexitimia foi
externo (TAYLOR, 1984; TAYLOR; BAGBY, 2004
proposta por Sifneos para se reportar àqueles
apud CARNEIRO; YOSHIDA, 2009).
pacientes como uma vida emotiva pobre em fan-
Sifneos, Apfel-Savitz e Frankel (1977
tasias e sonhos e que mostravam não possuir
apud CARNEIRO; YOSHIDA) no começo de
palavras para expressar suas emoções ou no-
seus estudos, já assinalavam para uma diver-
meá-las (SIFNEOS, 1977, 1991 apud CARNEI-
sidade de fatores relacionados à causa da ale-
RO; YOSHIDA, 2009). Segundo Sifneos (1973
xitimia, como: fatores fisiológicos, genéticos,
apud CALDEIRA; SILVA, 1992), o termo alexiti-
neuroanatômicos, psicossociais, modificações
mia é traduzido como “falta de palavras para dar
neuroquímicas e alterações de desenvolvimen-
nome às emoções”.
to. Em seguida, Sifneos (1991 apud CARNEI-
Segundo Nemiah e Sifneos (1970 apud
RO; YOSHIDA) sugeriu que as diversas etiolo-
VALENTE, 2012), pacientes alexitímicos tem
gias fossem classificadas em dois gupos: as de

172 Akrópolis, Umuarama, v. 23, n. 2, p. 165-180, jul./dez. 2015


O fenômeno psicossomático...

natureza biológica e as de origem psicossocial da capacidade simbólica. Como consequência,


(ou de desenvolvimento). Assim, ele chegou a o lapso na internalização da função parental de
duas classificações de alexitimia, a “alexitimia proteção, a utilização demasiada da negação e
primária” originada por fatores biológicos e a repressão de afetos, a diminuição dos mecanis-
“alexetimia secundária” originada por fatores mos egóicos de defesa, entre outros, induziriam
psicossociais. a uma interrupção do desenvolvimento afetivo
A alexitimia primária seria uma configu- normal, tento a possibilidade de desenvolver
ração biológica da enfermidade, proveniente de transtornos psicossomáticos.
defeito estrutural neuroanatômico ou falha neu-
robiológica e presume a suspensão da comuni- Taylor (1992 apud VALENTE, 2012, p. 26)
cação entre sistema límbico e o córtex ou entre relaciona a deficiência na capacidade de
os dois hemisférios do cérebro (SIFNEOS, 1991 processar cognitivamente as emoções como
apud VALENTE, 2012). É relativo a constituição problema fundamental para a vulnerabilida-
de ao adoecimento em pacientes alexitími-
e se estrutura como um traço de personalidade
cos. Essa deficiência levaria a pessoa a 1)
(PEDINIELLI; ROUAN, 1988 apud VALENTE, focar e amplificar o componente somático
2012). da situação emocional, contribuindo para o
A alexitimia secundária teria início em surgimento da hipocondria e queixas somá-
ocasiões traumáticas em fases críticas do de- ticas, 2) utilização de comportamentos com-
senvolvimento infantil ou como resposta a situ- pulsivos como forma de aliviar a tensão emo-
ações traumáticas intensas na fase adulta. Se cional, contribuindo para o uso compulsivo
traumas acontecessem antes da utilização da de substâncias, atividades ou pessoas, e 3)
linguagem, isso comprometeria a capacidade da exacerbação de respostas fisiológicas diante
utilização de palavras para manifestar as emo- de situações de estresse, conduzindo ao de-
senvolvimento de algum distúrbio somático.
ções, sendo manifestas posteriormente ainda
a nível comportamental e somática, e não por
Inicialmente ligada aos transtornos psi-
meio de pensamentos. As vivências traumáti-
cossomáticos (TAYLOR et al., 1977 apud VA-
cas, tanto na fase infantil como na idade adulta,
LENTE, 2012), a alexitimia tem se evidenciado
poderiam ter tamanha importância que produzi-
em distintas doenças e, inclusiva, no público
riam modificações no funcionamento psíquico,
não clínico. Sua ocorrência é calculada entre 5
afetando especialmente o fator afetivo das emo-
e 10% na população não clínica, e chega a al-
ções (SIFNEOS, 1991 apud VALENTE, 2012).
cançar 50% em pessoas com transtornos psico-
Estaria ligado à utilização em demasia de nega-
patológicos (PEDINIELLI; ROUAN, 1998, apud
ção e coibição de afetos como estratégia para
CARNEIRO; YOSHIDA, 2009).
lidar com ocasiões conflituosas ou desgastante
As características já mencionadas do
emocionalmente. É passageira, constituindo um
conceitos de alexitimia e pensamento operató-
estado (PEDINIELLI; ROUAN, 1988 apud VA-
rio são encontrados em outros pacientes, mas
LENTE, 2012).
são mais frequentemente ligados aos pacientes
Segundo Carneiro e Yoshida (2009),
psicossomáticos, que mostram maior “vulnera-
pensa-se que quando traumas acontecem antes
bilidade psicossomática” (CALDEIRA; SILVA,
do desenvolvimento da linguagem, há em segui-
1992).
da dano na capacidade de utilizar as palavras
para manifestar os sentimentos. Sifneos relata
RELAÇÃO ENTRE PENSAMENTO OPERATÓ-
que como efeito, as emoções seriam expressas
RIO E ALEXITIMIA
por meio de manifestações somáticas e compor-
tamentais, em vez de se relacionar com pensa-
A história da Psicossomática por meio da
mentos.
Psicanálise mostra tentativas de entendimento
Em relação às situações traumáticas
do fenômeno psicossomático. Esses ensaios
experienciadas na infância, Krystal, Giller e Cic-
evidenciam a complexidade de tal fenômeno e
chetti (1986 apud CARNEIRO; YOSHIDA, 2009)
os significados que vão sendo desenvolvidos
pensam que aquelas transcorridas de excessos
dentro da área da Psicossomática. O que se
ou privações nas interações entre mãe e crian-
propõe é que o sintoma relativo ao corpo diz
ça dificultariam o desenvolvimento correto da
respeito a uma falta, a uma impraticabilidade de
habilidade de manifestação afetiva, assim como

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SOARES, F. F.; BLAZIUS, R. F.; ZADINELLO, V. U.

expressão psíquica. A tensão emocional, quan- GALL, 1984, apud VALENTE, 2012).
do acha dificuldades para ser elaborada pelo Nemiah e Sifneos criaram o conceito de
psiquismo, poderá criar desordens no corpo. alexitimia, com o objetivo de assinalar um trans-
(VALENTE, 2012). torno da comunicação do paciente somático, se-
Segundo Ferraz (2005), as pesquisas gundo o qual, pacientes somáticos estariam com
iniciais de Freud acerca das neuroses ficaram sua habilidade de pensar ou expressar seus
marcados pela diferenciação que ele realizava sentimentos, deficiente. Seguindo caminho pa-
entre as denominadas neuroses atuais e as psi- recido, Pierre Marty utiliza o termo “pensamento
coneuroses. Acontece que, aos poucos, o con- operatório” para caracterizar o estado mental de
ceito de neurose atual foi sendo deixado de lado certos pacientes nos quais se enxergava incli-
em seus estudos, como que sendo esquecido do nação pronunciada à ação ao invés de pensa-
campo psicanalítico. Entretanto, é interessante mento, como se o aparelho psíquico estivesse
perceber, hoje em dia, como muitos dos com- impossibilitado para conter afetos e pensamen-
ponentes por ele relatados como próprios às tos. Marty baseia-se nas compreensões origi-
neuroses atuais podem se conectar com aquilo nais de Freud em relação às neuroses atuais, o
que se entende hoje em dia como campo da psi- que não é difícil compreender também na teoria
cossomática. Laplanche e Pontalis (1967 apud de Sifneos, embora não manifestada. Isto é, o
FERRAZ, 2005) se referindo ao conceito de neu- conceito de neurose atual, desde o começo, mo-
rose atual de Freud relatam que essa ideia leva tivou todas as teorias psicossomáticas apoiadas
de forma direta às compreensões modernas so- na psicanálise, embora não ter reconhecimento
bre as doenças psicossomáticas. Estes autores declarado dessa ligação (EKSTERMAN, 1994).
chegaram a sugerir que as neuroses atuais fos- A respeito da dinâmica psíquica para as
sem classificadas na contemporaneidade com somatizações, esta diz respeito a uma dificulda-
doenças psicossomáticas. de do psiquismo em enfrentar ocasiões de ten-
Freud (1955 apud EURÉLIO, 2010) em são. Porém, estamos sujeitados o tempo todo a
seu estudo realizado sobre as neuroses se re- atravessar ocasiões de tensão emocional, sem,
feria à presença de expressões somáticas como entretanto desenvolver algum sintoma corporal
consequências de representações inaceitáveis mais significativo. Fica claro que é no desenvol-
à consciência, na medida em que deixaram de vimento crônico dessa tensão emocional que se
possuir o seu significado e se encontram des- pode surgir sintomas somáticos significativos,
vinculadas dos afetos. O afeto se encontra afas- o que leva a refletir no por que determinada si-
tado da representação da vivência e, acumula- tuação emocional se torna crônica (VALENTE,
do, orienta-se para o exterior ou para o interior, 2012). Marty (1993 apud VALENTE, 2012) diz
sendo que o último caminho produz a descarga que acontece em consequência de estruturas
pelo corpo e causa a lesão orgânica. A ocasião psíquicas deficientes na habilidade de elabora-
traumática fica retalhada na memória, impossi- ção e representação simbólica, o que acarretaria
bilitando a conexão futura entre as vivências e uma desorganização progressiva no organismo.
os fatos, isto é, a fantasia não é elaborada na Sifneos (NEMIAH; SIFNEOS, 1970 apud VA-
medida em que nunca foi recalcada, pois nem LENTE, 2012) fala que esses sujeitos possuem
foi consciente (MATOS, 2003 apud AURÉLIO, dificuldade na habilidade de representar por
2010). Na falta do mundo fantasmático, a habi- meio do simbolismo seus sentimentos, de forma
lidade de simbolização não é adquirida nem o que seu estado emocional ficaria não articulado
espaço de ilusão obrigatório à organização do e colaborando para o surgimento de sintomas
pensamento, mais especificadamente, à repre- corporais.
sentação dos objetos internos (AURÉLIO, 2010). A falta de habilidade de simbolização no
As mesmas particularidades do meca- sujeito psicossomático leva à desorganização
nismo da neurose atual – falta de simbolização, do aparelho psíquico e, consequentemente, das
sintomatologia corporal, etiologia de caráter atu- funções mentais. Esta desorganização, onde o
al – se reproduzem no mecanismo de formação objeto interno não possui representação e nem é
de sintomas somáticos, qual tal se enxerga nas representável, não possibilita a elaboração das
teorias de pensadores em Psicossomática de angústias do indivíduo estando presente uma
base psicanalítica (ALEXANDER, 1950; MAR- redução da energia sexual e uma sensação de
TY, 1993; NEMIAH; SIFNEOS, 1970; MCDOU- desorganização que determinam a depressão

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O fenômeno psicossomático...

essencial (MARTY, 1985 apud AURÉLIO, 2010). ca, ou seja, se instala em uma fase pré-verbal,
Segundo Marty (1985 apud AURÉLIO, 2010), a relacionando-se à diferenciação eu-outro, à
depressão essencial sinaliza uma desorganiza- organização do sentimento de existir e de ser.
ção psíquica que abrange o surgimento de vá- Pode ser compreendida como uma vida que
rias doenças somáticas. defende, arcaicamente, o sujeito de angústias
A falta de comunicação com o incons- dessa época, portanto angústias psicóticas ou
ciente estabelece uma cisão com a própria histó- de aniquilamento (SANTOS FILHO, 1992 apud
ria do sujeito onde o atual e o factual prevalecem GERMANO, 2010).
nas vivências quotidianas (MARTY, 1985 apud Em relação à alexitimia, Freyberger
AURÉLIO, 2010). (1977 apud AURÉLIO, 2010) diferencia duas
Em relação a essa impossibilidade de formas dela. A alexitimia primária e a alexitimia
elaboração psíquica, Marty (1991 apud FER- secundária. A primeira está ligada a um lapso na
RAZ, 2005) usou o conceito de mentalização conexão entre as fantasias ou representações
como sendo um tipo de medida das dimen- e as vivências afetivas. A segunda, como um
sões do aparelho psíquico, que dizem respeito mecanismo de defesa que expressa a negação
à qualidade e à quantidade das representações do afeto e da fantasia na presença de ocasiões
psíquicas dos sujeitos. Para ele, uma boa men- traumáticas.
talização defende o soma das descargas de es- Krystal (1979 apud AURÉLIO, 2010) as-
timulação, à medida que esta acha refúgio nas socia a alexitimia com a presença de um trauma
representações presentes no pré-consciente. psicológico que poderá acontecer tanto na fase
Ao contrário, uma mentalização pobre, deixa o infantil, causando um lapso no desenvolvimento
corpo biológico vulnerável, entregue a uma lin- afetivo, como na fase adulta expressando uma
guagem rudimentar exclusivamente somática. regressão na manifestação dos afetos. No en-
As representações psíquicas, alicerces da vida tendimento das duas teorias, pode diferenciar-se
mental, são responsáveis pela existência dos a alexitimia primária como um tipo mais grave
sonhos e das fantasias, longos caminhos as- de alexitimia, cujo seu desenvolvimento estaria
sociativos que possibilitam a vazão das excita- ligado a uma situação traumática infantil que se
ções, fornecendo-lhes um substrato psíquico. associa com a inabilidade contentora e protetora
Nos processos de somatização, pode-se dizer, do objeto materno. Sendo assim, o trauma seria
então, em indisponibilidade ou insuficiência das anterior à aquisição da linguagem e ao pensa-
representações pré-conscientes. mento simbólico o que prejudica a elaboração
No sujeito psicossomático, a interação das vivências afetivas. E a alexitimia sencudária
soma-psique está comprometida, está ausente na qual as ocasiões traumáticas externas duran-
a ligação entre expressões somáticas e confli- te a fase adulta colaborariam para a presença de
tos psíquicos, considerando-se uma desunião tensões não suportáveis que seriam culpadas
entre corpo e mente (MCDOUGALL, 1989 apud pela regressão do sujeito a um funcionamento
AURÉLIO, 2010). A perspectiva do adoecer psi- da fase pré-verbal, cuja tensão seria aliviada
cossomático nos remete para um lapso relacio- pelo caminho somático (PRAZERES, 2000 apud
nal precoce antes da aquisição da linguagem AURÉLIO, 2010).
e da introjeção de um objeto interno contentor
e securizante, considerando-se uma interação POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO PSICO-
dual disfuncional e que pouco organiza a vida TERAPÊUTICA COM PACIENTES PSICOSSO-
mental, na medida em que a mãe representa o MÁTICOS
primeiro contato do bebê com o mundo externo
(AURÉLIO, 2010). De acordo com Bion (1992 A partir da compreensão proposta até o
apud AURÉLIO, 2010), a sustentação da unida- momento de que há pacientes psicossomáticos
de psicossomática está ligada à relação precoce advindos do mecanismo de alexitimia e pensa-
bebé-mãe e na habilidade da figura materna de mento operatório e levando em consideração as
transformar as experiências corporais e afetivas características já apresentadas desses, Silva,
em linguagem simbólica. Vasco e Watson (2013) propõem que com estes
A psicossomática é uma via instaurada pacientes seja preciso um maior foco terapêuti-
de forma precoce, geneticamente antes do sur- co ao nível das tarefas emocionais. Ogrodniczuk
gimento da palavra como organizadora simbóli- (2007 apud SILVA; VASCO; WATSON, 2013)

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SOARES, F. F.; BLAZIUS, R. F.; ZADINELLO, V. U.

frisa a importância de encontrar meios de co- Pode-se dizer que não existe o que desvendar
municação terapêutica que diminuam de forma e sim o que ocultar, realizando um jogo de pa-
efetiva as características alexitímicas. Nesse ca- lavras. Segundo Germano (2010), percebe-se
minho, Taylor (2000 apud SILVA; VASCO; WAT- uma desagregação absoluta entre o evento trau-
SON, 2013) propõe que o recurso a terapias que mático e os sintomas somáticos que nos leva a
abranjam técnicas exclusivas para ampliar a cogitar a primeira grande prática terapêutica no
consciência emocional e que levem em conside- atendimento de pacientes psicossomáticos, que
ração a integralização de elementos simbólicos de acordo com Santos Filho (1992) é a reconsti-
de esquemas emocionais podem ser vantajosas tuição cronológica, a histórica e a integração en-
na diminuição das características da alexitimia. tre acontecimentos, datas e manifestações so-
Os pacientes psicossomáticos dificilmen- máticas. Isso pode possibilitar ao paciente uma
te buscam a psicoterapia de forma espontânea. consciência inicial da ligação de seus sintomas
Quase sempre são encaminhados por médicos com algo de caráter existencial, algo maior, e au-
que os atendem. Percebe-se nas entrevistas ini- xiliar a desenvolver um significado inicial e uma
ciais que diz respeito a uma pessoa que sofre idéia da justificação de ser do tratamento.
de sintomas psicossomáticos. Mas, contudo, De acordo com McDougall (1989 apud
percebe-se nesses pacientes não uma procura CLEMENTE; PERES, 2010), a sintomatologia
de subjetivação, mas uma necessidade intensa orgânica dos pacientes psicossomáticos pode
de uma interação humana próxima, de exercício ser incluída no âmbito de uma história que deve
imaginário, que consiga reduzir a intensidade ser reconstituída por meio da substituição do
das ameaças de desagregação e das angústias corpo pela mente como forma de expressão de
(SANTOS FILHO, 1992). Segundo Silva, Vasco sua historicidade. Umas das formas de se rea-
e Watson (2013), no processo terapêutico com lizar isso é impulsionar uma reconstituição de
estes pacientes a relação terapêutica é extrema- acontecimentos de perda anteriores, colocando-
mente importante. -as em uma cadeia simbólica de forma a desen-
Silva, Vasco e Watson (2013) relatam volver uma possibilidade de manifestação para
que inicialmente não haverá ampla produção as emoções que não foram experienciadas de
emocional, na medida em que há dificuldade forma adequada quando da vivência original.
ao nível do reconhecimento dos sentimentos e Mas esta é uma edificação feita com cui-
existem dificuldades ao nível da manifestação e dado, extraída pelo terapeuta, que dá a medida
regulação emocionais. do espaço por onde se andará e da atividade
Sendo assim, Santos Filho (1992) atenta ativa do psicanalista (SANTOS FILHO, 1992).
para a necessidade de uma presença viva, fa- Volich (1998 apud GERMANO, 2010)
lante, indagadora e ativa do terapeuta. Se o ana- dá ênfase para a importância da mentalização
lista silenciar-se, aguardando o sentido emergir dos afetos e do pensamento como componen-
das associações livres tem uma surpresa ruim. te regulador indispensável para uma condução
Não surge sentido. Também há o silêncio, cria- correta da atividade terapêutica. Partindo do
-se um ambiente de surpresa, de incompreen- entendimento de um panorama econômico, em
são, desapontamento, e geralmente se interrom- que se compreende que o organismo tem de for-
pe o tratamento Sendo assim, é fácil perceber ma básica três caminhos de descargas de suas
que esta terapia deve ser conduzida face a face excitações, a saber, a ação, o pensamento e a
e não com o paciente deitado. O olhar constante via somática, para esse autor é claro qual a via
do analista, de suas manifestações, de uma pre- utilizada pelo paciente psicossomática e que a
sença concreta, física, possibilita uma relação mentalização é o recurso que necessita ser ofer-
pessoal que é fundamental no processo. tado aos pacientes.
Santos Filho (1992) relata que o há de Silva, Vasco e Watson (2013) afirmam
peculiar nessas entrevistas é que a demanda que a mentalização é um modo de intervenção
inicialmente, que é oferecida por outra pessoa que promove a investigação e consciência emo-
é aceita ou assimilada pelo paciente. Funciona cionais num âmbito de confiança, segurança e
como se fosse um pedido ou prescrição de exa- valorização do outro e pode se mostrar como
me adicional. Há, inicialmente, uma solicitação uma solução apropriada ao desenvolvimento
de algo objetivo, concreto, que possa ser assi- das capacidades relacionais e emocionais em
milado, instruído e não descoberto, desvendado. déficit num funcionamento alexítimico.

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O fenômeno psicossomático...

O tratamento baseado na mentalização tende a tornar-se livre recorrendo à descarga


(FONAGY; BATEMAN, 2006 apud SILVA; VAS- somática, por não ter acesso às palavras que
CO; WATSON, 2013), tem como objetivo provo- possibilitariam torná-lo dizível. Diz respeito, em
car a mentalização, ou seja, última instância, de exercer a função materna,
especialmente por meio da decodificação de
a capacidade para compreender o compor- uma forma de comunicação cuja impregnação
tamento do próprio e dos outros através da de afetos falta. Essa intervenção justifica-se,
atribuição de estados mentais. A mentaliza- pois como defende a autora, a desafetação tem
ção pode ser vista como uma forma de activi- como fator etiológico fundamental perturbações
dade mental imaginativa, a qual permite per-
precoces na relação entre a mãe e o bebê.
ceber e interpretar o comportamento humano
em termos de estados mentais intencionais De acordo com Clemente e Peres
como, necessidades, desejos ou sentimen- (2010), essa possibilidade de intervenção parte
tos (FONAGY; BATEMAN, 2006 apud SILVA; da ideia de que a figura materna tem como prin-
VASCO; WATSON, 2013, p. 203-204). cipal função a proteção de seu bebê das tensões
vindas do mundo externo. Para isso, deve inter-
A mentalização baseia-se em processos pretar a comunicação rudimentar e dar nomes
simbólicos por meio dos quais o aparelho psí- aos estados afetivos do bebê, desenvolvendo a
quico garante a regulação das energias sexuais. gradual dessomatização do aparelho psíquico.
O trabalho fantasmático, a criatividade, o sonho O desempenho apropriado dessa função auxi-
são atividades fundamentais para a estabilidade liaria o acesso do bebê à palavra e ajudaria no
psicossomática. Um sujeito bem estruturado em desenvolvimento da habilidade de simbolização.
relação ao seu funcionamento psíquico, com re- Do contrário, seus sinais pré-verbais ficarão, se-
cursos o bastante para elaborar e descarregar a gundo Peres (2006 apud CLEMENTE; PERES,
excitação acumulada, pode tolerar níveis altos de 2010), afastados de qualquer código de lingua-
eventos traumáticos e tensão sem perturbações gem.
mais sérias para seu equilíbrio. A estruturação Marty (1993 apud CLEMENTE; PERES,
ou o funcionamento falho do aparelho psíquico 2010), afirma que no atendimento psicanalítico
traz como consequência o uso de meios mais com pacientes psicossomáticos que possuem
primitivos, da ordem da motricidade ou mesmo características do pensamento operatório, o psi-
de respostas orgânicas como recursos de regu- coterapeuta terá a função de garantir as primei-
lação da energia do sujeito (VOLICH, 2007). ras bases de uma proximidade bilateralmente
Um outro modelo de intervenção impor- identificatória.
tante poderá ser a focagem, que diz respeito ao Segundo Clemente e Peres (2010),
processo de experienciação das emoções do McDougall e Marty concordam que a realização
paciente, que é conduzido de maneira a dife- da função materna por parte do terapeuta com
renciar a sensação corporalmente ligada a uma os pacientes psicossomáticos é essencial. A fun-
ocasião ou problema. A experenciação é funda- ção materna segundo Marty (1993, p. 64) con-
mentalmente uma relação entre sentimento e siste em “um acompanhamento sobretudo, mas
símbolos (eventos, palavras) e não se deve per- não exclusivamente, verbal, que margeia, segue
guntar se o paciente experiencia, mas como ele ou precede de perto os estados e movimentos
experiencia. Devido a dificuldade em reconhecer do sujeito”. Logo, se baseia na proposição dos
sentimentos e em diferenciá-los das sensações próprios processos elementares de simboliza-
corporais da emoção de pacientes de funciona- ções, comportamentos e defesas, bem como
mento alexitimítico este tipo de intervenção pode no exercício gradual de funções fragilizadas do
trazer ganhos para um tratamento com melhores paciente e na renúncia desses papéis quando
resultados (GENDLIN, 1964 apud SILVA; VAS- surgirem os primeiros sinais de autonomia, o re-
CO; WATSON, 2013). vivescimento dessas funções em pauta (MAR-
Se assemelhando à mentalização e à TY, 1993).
focagem, McDougall (1991 apud CLEMENTE; Executando de forma adequada a função
PERES, 2010), assinala que ao psicoterapeuta materna, o terapeuta que trabalha com pacientes
se estabelecerá o desafio de trabalhar com um psicossomáticos terá a capacidade de ajudá-los
filtro, tendo a capacidade de regular o fluxo de nesse processo. Como consequência, poderá
excitações do qual o paciente psicossomático capacitá-los de modo que eles possam terminar

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SOARES, F. F.; BLAZIUS, R. F.; ZADINELLO, V. U.

o processo de dessomatização do aparelho psí- não relacionando seus sintomas com eventos
quico que não pôde ser levado adiante durante a traumáticos.
fase infantil (CLEMENTE; PERES, 2010). O tratamento baseada na mentalização
Segundo Santos Filho (1992), sendo o também é uma das intervenções que se parece
fenômeno somático constituído numa fase pré- necessária na atuação com pacientes psicosso-
-verbal, é fácil pensar com que fragilidade pes- máticos, pois, possibilita ajudar o paciente a de-
soal o terapeuta terá que lidar na análise destes senvolver sua capacidade simbólica que no mo-
pacientes. As psicoterapias com pacientes psi- mento é precária. Por meio dessa intervenção
cossomáticos acabam por demandar bem mais busca-se desenvolver habilidades emocionais e
do analista. Requerem um período maior, paci- de relacionamento que estão em déficit nesses
ência e uma disponibilidade interna de se por pacientes.
nesta posição. (GERMANO, 2010). A intervenção mediante da focagem pos-
sibilita que o paciente experiencie suas emoções,
CONSIDERAÇÕES FINAIS essa experienciação é uma interação entre sím-
bolos e sentimento. Por causa da dificuldade de
Por meio desse estudo percebe-se que pacientes psicossomáticos em identificar sen-
há semelhanças entre o conceito de pensamen- timentos e em diferenciar estes de sensações
to operatório desenvolvido por Pierre Marty e o somáticas, essa intervenção pode trazer ganhos
conceito de alexitimia criado por Peter Sifneos. para uma psicoterapia com melhores resultados.
Em relação à dinâmica psíquica para as Outra intervenção relatada neste traba-
somatizações, percebe-se que esta ocorre de- lho foi a de que o psicoterapeuta deverá exercer
vido à dificuldade do sujeito psicossomático em a função materna para o paciente, trabalhando
lidar com situações traumáticas por meio do tra- como um filtro, tendo a habilidade de regular o
balho psíquico. Tanto Marty como Sifneos apon- afluxo de excitações do paciente. O terapeuta
tam para uma dificuldade na capacidade de sim- deverá interpretar a comunicação do paciente e
bolização nos sujeitos psicossomáticos. nomear os estados afetivos dele, propor os pró-
Marty relata que essa incapacidade de prios processos elementares de simbolização,
simbolização leva a desorganização do apare- defesas e comportamentos. O desempenho
lho psíquico e consequentemente, dos processo adequado dessa função ajudaria o paciente a
mentais. A desorganização do aparelho psíqui- melhorar sua capacidade de simbolização.
co aumentaria a vulnerabilidade do sujeito para Essa intervenção parece ser indispensá-
adoecer. Sifneos fala que devido incapacidade vel e de extrema importância, uma vez que nes-
de simbolização nos sujeitos psicossomáticos, o te trabalho foi apontado que o desenvolvimento
estado emocional ficaria desorganizado e contri- de sintomas psicossomáticos se deve a uma
buiria para o aparecimento de sintomas somáti- falha relacional precoce antes da apreensão da
cos. linguagem, à uma situação traumática infantil li-
Ambos os pensadores compartilham ca- gada com a inabilidade contentora e de proteção
racterísticas em comum relacionadas aos su- do objeto materno.
jeitos psicossomáticos, como, o investimento Por fim, parece que uma psicoterapia
intenso na realidade externa, a carência de fan- pautada em intervenções no nível das funções
tasias e sonhos, a ausência de afetos, o discur- emocionais poderá trazer melhores resultados
so carente de sentido psicológico. no trabalho com pacientes psicossomáticos.
Em relação à psicoterapia com os pa-
cientes psicossomáticos descritos neste traba- REFERÊNCIAS
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EL FENÓMENO PSICOSOMÁTICO POR LOS


CONCEPTOS DE PENSAMIENTO OPERATORIO Y
ALEXITIMÍA: POSIBILIDADES DE INTERVENCIÓN
PSICOTERAPÉUTICA

Resumen: Este estudio se trata de una revisión bi-


bliográfica realizada a través de referencias relacio-
nadas al campo de estudio de la psicosomática. Los
objetivos que llevaron a esa investigación ha sido
relacionar el concepto de pensamiento operatorio
desarrollado por Pierre Marty, con el concepto de
Alexitimía según Peter Sifneos, buscando explicar el
fenómeno psicosomático y exponer posibilidades de
intervención psicoterapéutica con esos pacientes psi-
cosomáticos. Para ello, inicialmente se ha buscado
conceptuar psicosomática y exponer la influencia del
psicoanálisis sobre ella. Enseguida se ha presentado
brevemente los conceptos de pensamiento operato-
rio y alexitimía y las teorías que los embasan. Esos
dos conceptos han sido desarrollados en relación al
estudio de la psicosomática. Ambos tienen semejan-
zas y comparten principalmente la incapacidad de
elaboración y simbolización psíquica y dificultades de
expresar emociones como características destaca-
bles en sus portadores. Los conceptos parecen haber
sido influenciados por el concepto de neurosis actual
de Freud, que ya apuntaba para la falla de elabora-
ción psíquica en las somatizaciones. Por fin, buscará
manifestar posibilidades de intervención psicotera-
péutica con esos pacientes que tienen dificultad de
manifestar sus sentimientos.
Palabras clave: Psicosomática; Pensamiento Ope-
ratorio; Alexitimía; Psicoterapia.

180 Akrópolis, Umuarama, v. 23, n. 2, p. 165-180, jul./dez. 2015

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