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XXVI Encontro Anual da Compós, Faculdade Cásper Líbero, São Paulo - SP, 06 a 09 de junho de 2017
Pollyana Ferrari2
Resumo
No atual século XXI as sociedades confrontam-se com mudanças comportamentais aceleradas e desencadeadas
pela sociedade da informação. Essas mutações impõem a necessidade e a urgência de repensar o tempo presente
e o jornalismo a partir da mediação das telas dos dispositivos móveis. A febre das fake news,
ou mentiras, uma vez que notícias falsas não são notícias têm feito bem ao jornalismo. Um consumidor que
queria apenas vivenciar informações sem pensar, voltou-se para assinaturas de veículos com credibilidade.
Abstract
In today's 21st century societies are confronted with behavioral changes accelerated and triggered by the
information society. These mutations impose the need and the urgency to rethink the present time and the
journalism from the mediation of the screens of the mobile devices. The fever of fake news, or lies, since fake
news is not news have done well to journalism. A consumer who just wanted to experience information without
thinking, turned to credible vehicle signatures.
“Penso, logo existo”, frase dita pelo filósofo francês René Descartes e imortalizada no
filme Blade Runner, popularizou uma discussão sobre a máquina inteligente na década de
1980 e a essência do humano ligada ao pensar. No presente do século XXI a informação
mediada por uma tela de dispositivo móvel não é mais um privilégio de poucos, ela está
presente na vida de grande parte da população global. O conceito de pós-verdade surge nesta
sociedade atual que se move em torno das pessoas, das suas histórias, de seus costumes e das
suas experiências de vida. Novos meios e interatores, alta saturação das mídias tradicionais e
1
Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho Estudos de Jornalismo do XXVI Encontro Anual da Compós,
Faculdade Cásper Líbero, São Paulo - SP, 06 a 09 de junho de 2017.
2
Pollyana Ferrari é jornalista, professora no Programa de Pós-Graduação Tecnologias da Inteligência e Design
Digital e no Departamento de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Doutora
em Comunicação Social pela Universidade de São Paulo (USP), e-mail: pollyana.ferrari@gmail.com
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consumidores cada vez mais imersos na presentificação proporcionada pelas telas faz com
que a metáfora penso, logo existo, seja alterada para compartilho, logo existo.
In Limbo (2015) é um documentário sobre nossa memória interligada global. À deriva,
está memória gigante, na nuvem, explora seus próprios sonhos e medos. "A Internet sabe
mais sobre mim do que minha própria mãe – que eu mesmo", diz um dos especialistas
entrevistados no documentário, que vai mostrando como os grandes datacenters se
transformaram nesta memória gigante que tudo vê. Estamos construindo coletivamente uma
nova catedral? Ou estamos construindo um gigantesco cemitério de dados? E o que é pior,
um cemitério de dados falsos e manipuláveis, que ganha escala nesta busca por
compartilhamentos e curtidas a qualquer preço.
O Parlamento britânico criou uma comissão para investigar como detectar e impedir a
publicação de informações maliciosas na Internet. Na Alemanha iniciou-se uma ofensiva
contra a propagação de boatos com aparência de veracidade e o primeiro passo foi um acordo
com a rede social Facebook e o centro de pesquisa jornalística Correctiv3, para evitar a
propagação de informações manipuladas. Em fevereiro, o Google fez um alerta a alguns
repórteres e colunistas norte-americanos sobre a tentativa de hackers de tentarem roubar suas
senhas e invadir a caixa de e-mails, assim como ocorreu com o partido Democrata durante a
campanha presidencial nos Estados Unidos. No mesmo período, nasce no Brasil a primeira
agência de fact-checking, a Lupa4. Na Espanha, o programa televisivo El Objetivo5 passou
em fevereiro a ser o primeiro do país a realizar fact checks de vídeos. Em Portugal, o
Observador6, que faz fact checks desde 2015, amplia o serviço para reportagens em vídeo.
Contrassenso pensarmos que a era Trump possa trazer algum respiro para o jornalismo, que
anda totalmente sufocado por fake news. “Quaisquer pesquisas negativas são notícias falsas,
como as pesquisas da CNN, ABC, NBC nas eleições”, tuitou Trump, no dia 06 de fevereiro,
redefinindo a expressão. Em declaração à imprensa, o assessor da Casa Branca, Sebastian
3
The Correctiv is a German nonprofit investigative journalism newsroom whose stated goal is "to give citizens
access to information.", disponível em https://correctiv.org/en/
4
http://piaui.folha.uol.com.br/lupa/
5
http://www.lasexta.com/programas/elobjetivo
6
http://observador.pt/especiais/como-vao-ser-os-novos-fact-checks-do-observador/
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Gorka diz que a administração continuará usando o termo “notícias falsas” até que a
imprensa entenda que “atacar” o presidente é incorreto. Gorka confessa, portanto, tratar-se de
estratégia política que nada tem a ver com a veracidade do que é dito sobre Trump. Essa
declaração nos remete a (LAGE, 2014, p. 21) quando diz que a informação deixou de ser
apenas ou principalmente fator de acréscimo cultural ou recreação para tornar-se essencial à
vida das pessoas. E o âmbito da informação necessária ampliou-se muito além da capacidade
individual de acesso do homem comum a outras fontes.
O assunto é complexo, tanto que o Observador criou categorias de classificação durante a
checagem da veracidade. “Às vezes, a resposta a uma pergunta é “sim” ou “não”; outras
vezes, a resposta é menos categórica. E o objetivo dos fact checks não é fazer de conta que o
mundo é simples ou — pior — simplista. Por isso, os fact checks do Observador têm seis
conclusões possíveis: Certo, Praticamente Certo, Esticado, Inconclusivo, Enganador e
Errado”, explica o diretor executivo, Miguel Pinheiro. “A tecnociência está cancelando o
equilíbrio entre o tempo natural e o tempo humano. Para realizar seu poder sobre o mundo,
anulou a distância entre meios e fins”, diz o psiquiatra e filósofo italiano Mauro Maldonato7
(2012) no livro Paisagens de tempo.
Um bom exemplo desta anulação de distâncias é o Snapchat, rede social, disponível para
download no iPhone e para iPad (iOS) e Android, que sugere uma forma diferente de
conversar com os seus amigos. O APP desenvolvido por estudantes da Universidade de
Stanford, nos Estados Unidos, é o melhor exemplo de presentificação que temos em 2016 e já
ultrapassou o WhatsApp em compartilhamento de imagens. Segundo dados da PhotoWorld8,
8.796 fotos são compartilhadas por segundo na plataforma e foi uma das poucas plataformas
que escapou das fake news durante a eleição presidencial norte-americana. Outro exemplo
pertinente é o uso de algoritmos pelo Facebook. Para o pesquisador nova-iorquino e autor do
blog BuzzMachine, Jeff Jarvis, em artigo9 na plataforma Medium, “as tecnologias usadas
pelo Facebook são top down (de cima para baixo), seja para formular uma regra ou para, em
seguida, permitir que o algoritmo cumpra essa regra. Isso não é só eficiente (quem precisa de
7
Trecho disponível em
http://www.sescsp.org.br/online/edicoessesc/221_AS+PALAVRAS+ENTENDIDAS+COMO+SEIVA+E+NUT
RICAO.
8
https://cewe-photoworld.com/how-big-is-snapchat/
9
https://medium.com/@jeffjarvis/dear-mark-zuckerberg-d0b48675dfaf#.ev6qlv5vk
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editores e pessoas de serviço ao cliente?), mas como também acreditam que é justo, já que
são igualmente aplicadas para todos. É escala. Exceto a vida não segue escala e isso é um
problema no Facebook e em todas as empresas que se reconhecem como empresa pós-mídia
de massa (...). Em outro trecho da publicação10, Jarvis diz que o problema com o pensamento
algorítmico, paradoxalmente, é que ele continua com uma mentalidade de massa. E, na
grande maioria dos casos, não dá conta das fake news, que já nascem embasadas em pós-
verdades.
Transpor para formatos digitais processos sociais em curso não é uma tarefa fácil, pois o
que chamamos de mídia social hoje compreende, segundo Raquel Recuero, “um fenômeno
complexo, que abarca um conjunto de novas tecnologias de comunicação mais participativas,
mais rápidas e mais populares”. O que exige das empresas um caráter de processo
permanente, que vai se modificando durante o mapeamento dos acontecimentos em tempo
real. Mas como manter a credibilidade dos fatos publicados? Conteúdo de qualidade custa e
talvez estejamos começando a ver a volta dos serviços por assinatura, pois os leitores
começam a se preocupar com a veracidade do que é lido nas redes sociais e buscam assinar
veículos confiáveis e que tenham serviços de fact checks.
Para o estrategista de mídia Ryan Holiday (2012, p. 26-27), “a preocupação da mídia já foi
proteger seu nome; na internet a preocupação é construir um nome. Em vez de pesquisar um
tópico e comunicar suas descobertas ao público, os jornalistas simplesmente pegam citações
obrigatórias – mas artificiais – de ´especialistas´ para validar seu jornalismo de visualizações
de páginas”. E isso estamos vendo acontecer também no Facebook, que continua rejeitando
seu papel de editor de conteúdo, apesar de exerce-lo por meio dos algoritmos. Como uma
10
Facebook’s The problem at work here is algorithmic thinking. Facebook’s technologists, top down, want to
formulate a rule and then enable an algorithm to enforce that rule. That’s not only efficient (who needs editors
and customer-service people?) but they also believe it’s fair, equally enforced for all. It scales. Except life
doesn’t scale and that’s a problem Facebook of all companies should recognize as it is the post-mass-media
company, the company that does not treat us all alike; like Google, it is a personal-services company that gives
every user a unique service and experience. The problem with algorithmic thinking, paradoxically, is that it
continues a mass mindset.ficient (who needs editors and customer-service people?) but they also believe it’s fair,
equally enforced for all. It scales. Except life doesn’t scale and that’s a problem Facebook of all companies
should recognize as it is the post-mass-media company (...). The problem with algorithmic thinking,
paradoxically, is that it continues a mass mindset.
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receita de bolo, Holiday vai explicando no livro “Acredite, estou mentindo: confissões de um
manipulador das mídias” como funciona o segmento da pós-verdade. Para ele, os blogueiros
– e aqui vale uma ressalva, pois o autor chama de blogueiros, todos os produtores
independentes de conteúdo digital – vasculham a internet à procura de coisas para escrever a
respeito, pois precisam postar várias vezes ao dia para conseguir cliques e assim anúncios.
Eles examinam Twitter, Facebook, seções de comentários, comunicados à imprensa, blogs
rivais e outras fontes para desenvolver seu material. “Acima deles estão centenas de
jornalistas de nível médio, on-line e off-line, em blogs, revistas e jornais, que usam esses
blogueiros como fontes e filtros. Eles têm que escrever constantemente também e fazer a
mesma busca por histórias, só que de modo mais estruturado”, explica Holiday, que chega ao
topo desta pirâmide onde estão os grandes sites, publicações e redes de TV com abrangência
nacional. Esses, por sua vez, buscam seu material nos sites menores, aproveitando suas dicas
para transformá-las em assuntos verdadeiramente nacionais.
O fake news não é novo e nem nasceu com os blogueiros, só amplificou, como tudo que é
postado nas redes sociais. Para o historiador cultural americano, Robert Darnton11, na “longa
história de desinformação, a atual manifestação de falsas notícias já garantiu um lugar
especial, com Kellyanne Conway, primeira mulher nomeada gerente de campanha de Donald
Trump, que, em agosto de 2016, inventou um massacre no Kentucky para defender uma
proibição aos viajantes de sete países muçulmanos. Na Idade Média as fake news já faziam
sucesso na cobertura midiática. Pietro Aretino, por exemplo, “tentou manipular a eleição
pontifícia de 1522, escrevendo sonetos perversos sobre todos os candidatos (exceto o favorito
de seus patronos Medici) e colando-os para o público admirar no busto de uma figura
conhecida como Pasquino, perto da Piazza Navona em Roma. O ´pasquinade´ então se
transformou em um gênero comum de difundir notícias desagradáveis, a maioria delas falsas,
sobre figuras públicas”, relembra Darnton em recente artigo para The New York Review of
Books.
11
http://www.nybooks.com/daily/2017/02/13/the-true-history-of-fake-news/
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cada povo, a partir de suas motivações e das maneiras como eles a interpretam para
equacionar necessidades particulares como ocorreu com o movimento batizado de Primavera
Árabe, iniciado primeiramente na Tunísia12. É fundamental compreendermos o caráter
rizomático13 da Internet para analisarmos algumas transformações que estão em curso no
contexto das fake news, seja em novos suportes para o jornalismo ou coberturas políticas já
pensadas com o uso de ferramentas de fact checks. Como defendido por Henry Jenkins, em
Cultura da Convergência, os antigos consumidores eram passivos, previsíveis, indivíduos
isolados e seu trabalho era silencioso e invisível. Já os novos são ativos, migratórios,
mostram um declínio na lealdade a redes ou meios, são socialmente conectados e seus
trabalhos são barulhentos e públicos (JENKINS, 2008, p.35). Ou seja, o novo comportamento
do consumidor também ajuda a propagar as fake news.
Em primeiro lugar, nota-se a ampliação das formas de conexão entre indivíduos e, entre
indivíduos e grupos. Esse aspecto proporciona a horizontalidade da comunicação e, portanto,
a ruptura com o aspecto característico dos meios de comunicação tradicionais que se
organizavam a partir da relação entre um emissor e muitos receptores. Nesse sentido, a
internet proporciona, em primeiro lugar, a multiplicidade e heterogeneidade das conexões.
Cada ponto da rede pode realizar conexões infinitas com múltiplos pontos descentralizados,
um rizoma geolocalizável de ocupação de espaços, que estão em constante movimento, pois
vivemos um presente “tagueado”, ou seja, um tempo que pode ser resgatado a qualquer
minuto por bancos de dados, mas que não se torna desejado, pois a presentificação se impõe
sobre a memória. Como o vivenciar é líquido e, no minuto seguinte, estamos vivenciando
outra postagem, o tempo necessário para o cérebro verificar a veracidade do fato narrado fica
prejudicado, pois na maioria das vezes, só para citar um exemplo, os consumidores
compartilham a informação apenas pelo título, sem dar o trabalho de ler o texto completo ou
mesmo verificar a fonte de informação.
12
A onda de manifestações e protestos, que a imprensa batizou de “Primavera Árabe”, iniciada na Tunísia no dia
18 de dezembro de 2010, por meio de protestos contra a corrupção policial e maus tratos após a autoimolação do
vendedor de rua Mohamed Bouazizi, por anos assediado pelas autoridades tunisianas. O ato de Bouazizi
funcionou como um símbolo de ação para a população, e sua história se espalhou pelo Oriente Médio através do
Twitter com a hashtag #SidiBouzid, alcançando 13 mil tuites, enquanto a mídia oficial não cobria o que
realmente estava acontecendo e o governo tunisiano bloqueava sites e prendia ativistas.
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Conceito definido pelos filósofos franceses Gilles Deleuze e Felix Guattari.
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LOGAN, Robert K. The Sixth Language: Learning a Living in the Internet Age (A Sexta Linguagem:
aprendendo a Viver na Era da Internet. Toronto: Pub Stoddart, 2000.
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http://reutersinstitute.politics.ox.ac.uk/sites/default/files/The%20Rise%20of%20Fact-
Checking%20Sites%20in%20Europe.pdf
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http://www.poynter.org/about-the-international-fact-checking-network/
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Estudo da USP embasa lista dos 10 maiores sites de "falsas notícias" no Brasil.
https://www.issoenoticia.com.br/artigo/projeto-da-usp-lista-10-maiores-sites-de-falsas-noticias-no-brasil 3/14
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mundo aparece através das notícias como se fosse iluminado por uma strobe light – vemos
poses exageradas, posturas desajeitadas, faces ameaçadoras, mas os movimentos seguros que
podem dar significado a essas aparições têm frequentemente lugar no escuro”, diz Mich
Stephens no livro A history of News (1988). Interpretar e decodificar essa presentificação em
base de dados está transformando o jeito de se fazer Jornalismo. As notícias falsas são frugais
como um brigadeiro gourmet e na opinião do jornalista Leandro Beguoci, publisher da
Revista Nova Escola, elas “só existem porque as pessoas precisam de notícias, verdadeiras ou
não, para alimentar as próprias certezas. No mercado das convicções, elas oferecem uma
solução customizada para cada necessidade. Mas isso não tem nada a ver com Jornalismo”.
O surgimento de agências de fact-checking mostra que nada mais continua a ser como era
antes: o livro não é mais o que era, o jornal não cessa de se transformar, a foto, o cinema e o
vídeo se expandem até a perda de quaisquer fronteiras. Tudo é efêmero. E um fator que
impulsionou a avalanche de fake news foi a evolução do meio internet, transformando os
consumidores em pessoas ávidas, como profetizou (LÉVY, 1999), para experimentar formas
de comunicação diferentes daquelas que as mídias clássicas nos propunham. A cultura
participativa, apontada por (SHIRKY, 2010) mostra estreitamente esta relação entre
transmídia e inteligência coletiva, com uso dos meios de comunicação e a mobilização de um
conteúdo, seja ele on-line ou off-line. Nesse contexto, o jornalismo ético está voltando para
sua essência; do mesmo modo que os biólogos fizeram. Segundo Lipton (2007, p. 16), o
ambiente funciona como uma espécie de “empreiteiro”, que interpreta e monta as estruturas e
é responsável pelas características da vida das células. Mas é a “consciência” celular que
controla os mecanismos da vida, e não os genes.
Não seria diferente no ambiente social. Pedimos comida pelo celular, mas também
frequentamos feiras de produtos orgânicos. Vamos na balada de música eletrônica e também
ouvimos jazz enquanto ajudamos na horta comunitária do bairro. Pedimos pizza pelo APP,
mas também cozinhamos para os amigos. A gente não é uma coisa ou outra, somos as duas,
temos uma consciência que nos move, seja em busca de seus pares, de causas, ou de
jornalismo com credibilidade. Para PEBORGH (2013:104), a gestão bem-sucedida dos
recursos compartilhados é essencial para estabelecer uma boa comunicação e um vínculo de
confiança entre as partes, bem como uma visão comum de futuro. Nunca se
discutiu tanto o jornalismo, pois as eleições americanas trouxeram à tona a dimensão dos
riscos trazidos por informações falsas, manipuladas.
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Os jornalistas que vivem controlados pelo relógio, obcecados pela novidade, travam,
segundo Nelson Traquina, “uma luta aparentemente perdida de reagir aos últimos
acontecimentos”. Eles esquecem – mergulhados na linha de produção – de ter um tempo de
decantação como ensinava Deleuze. É preciso tempo para apurar, equipes e verba para
construir credibilidade na era da pós-verdade. Como pensavam Milton Santos e Paulo Freire,
a globalização nasce perversa no século XX, mas pode ser repensada se trouxer de volta a
dignidade humana. Veículos tradicionais e éticos já estão vendo melhorias em suas receitas
de assinatura, pois a eleição do presidente Trump veio alertar globalmente sobre os riscos das
notícias falsas para a sociedade.
Considerações finais
Fica evidente a necessidade de um novo olhar para a questão da pós-verdade no campo
teórico-acadêmico, capaz de ir além da tendência de tratá-las de forma compartimentada,
apenas levando em conta o quesito fake news. Ser um comunicador ético é uma postura para
a vida e deve também permear todas as produções jornalísticas. Os tempos realmente estão
conturbados, a vida mais complexa e os algoritmos mais sofisticados, mas a prestação de
serviço, com credibilidade e embasada em princípios éticos, continua sendo um dos
principais pilares do Jornalismo e a implantação de códigos de princípios para fact checks nas
redações veio para validar o noticiário junto ao leitor. Iniciativas coletivas entre veículos
maiores e menores – em uma ajuda mútua – só podem trazer benefícios e receitas para os
grupos de mídia.
Referências bibliográficas
BRETON, Philippe, Proulx, Serge. A Explosão da Comunicação. Lisboa: Bizâncio, 1997.
CANAVILHAS, João. SATUF, Ivan (Orgs.) Jornalismo para dispositivos móveis:
produção, distribuição e consumo. Covilhã: UBI/Labcom, 2015. Disponível em
http://www.labcom-ifp.ubi.pt/livro/137. Acessado em 09/09/2016.
CORTÁZAR, Julio. O jogo da amarelinha. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999.
COUTO, Mia. Espaços Ficcionais. São Paulo: Autêntica, 2008.
DARNTON, Robert. A questão dos livros: passado, presente e futuro. Trad. Daniel
Pellizzari. São Paulo: Cia das Letras, 2009.
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