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Diz a lenda que Rui Barbosa, ao chegar a casa, ouviu um barulho estranho

vindo do seu quintal.

Chegando lá, constatou haver um ladrão tentando levar seus patos de criação.
Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o ao tentar pular
o muro com seus patos, disse-lhe:

– Oh, bucéfalo anácrono! Não te interpelo pelo valor intrínseco dos


bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o
recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à
socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo; mas se é para zombares
da minha elevada prosopopeia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com
minha bengala fofórica bem no alto da tua sinagoga, e o farei com tal
ímpeto que te reduzirei à quinquagésima potência que o vulgo denomina
nada.

E o ladrão, confuso, diz: – Dotô, resuminu, eu levu ou deixu us pato?

O QUE ENTENDERÃO?

POR QUE O LADRÃO NÃO ENTENDEU A FALA DE RUI BARBOSA?

A escolha de Rui Barbosa por uma linguagem rebuscada se deveu ao desejo


de intimidação: Rui Barbosa, ao selecionar um vocabulário culto, conseguiu
seu intento – paralisar a ação do ladrão de patos.

Pode-se inferir do texto que, quando não existe acomodação da nossa


linguagem ao contexto, a comunicação não ocorre plenamente.

“Traduzindo” o texto de Rui Barbosa para uma linguagem mais “moderna”,


teremos: Oh, sujeito indigno, se você entrou na minha casa para roubar-me por
necessidade de sobrevivência, eu o compreendo e tolero o seu ato; mas, caso
contrário, não admitirei tamanho desrespeito.

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