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Marcio Nolasco Leite

SOUZA, Marcelo Lopes de. Os conceitos fundamentais da pesquisa sócio-espacial.


Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013.

Resenha (abril/2018) – capt. 06 -10

Na obra “os conceitos fundamentais da pesquisa sócio-espacial”, de Marcelo Lopes de Souza


(2013), no interstício dos capítulos 6º ao 10º temos conceitos que o autor inferiu importância singular
para efetivar-se-á a partir de tais a pesquisa “sócio-espacial”. No capítulo 6º foram abordados por Souza
(2013) os seguintes, a saber: A região, o bairro e o setor geográfico: Neste diapasão podemos verificar
que Souza (2013) enfatizou que o caldo do debate teórico- conceitual em torno do conceito de “região”
a partir das décadas de 1970 e 1980 foi engrossado por um debate crítico provocado, principalmente
pelo geógrafo Yves Lacoste (região lablanceana) e pelo economista François Perroux (região
homogênia, região funcional e região-programa).
O bairro por sua vez, traz para a discussão uma outra escala: passando à escala urbana, àquela
da organização interna da cidade e que apresenta-se por três tipos de critérios/conteúdos: “conteúdo
composicional”; características “objetivas” concernentes à composição de classe e à morfologia
espacial, “conteúdo interacional”; relações estabelecidas entre indivíduos e ou grupos, e que ajudam
decisivamente a definir se há algum tipo de “centralidade” e o “conteúdo simbólico”; imagem de um
dado subespaço intraurbano como um espaço percebido e vivo. E, finalmente chegamos ao chamado
“setor geográfico”. “Ele pode ser entendido como um conjunto de bairros com características próprias
e “personalidade” definida”. (Souza, 2013, p.159)
Sequencialmente, no capítulo 7º o que ganha evidencia é a discussão sobre o conceito de
“rede”: revelada como uma “velha novidade”, pois o que se fizera em 1980 e 1990 fora renovar uma
discussão conceitual antiga. Várias redes: Redes técnicas, rede urbana, redes de movimentos sociais...
A indagação principal, nesse sentido, é quando uma rede é espacial ou geográfica? Desse modo,
aproveitando contribuição de K.J. Kansky, Roberto Lopes Corrêa vem responder ao indagado: “por rede
geográfica entendemos ‘um conjunto de localizações geográficas interconectadas’ entre si ‘por um certo
número de ligações’” (Corrêa, 1997d:107 apud Souza, 2013, p. 167).
Para Souza (2013) as ligações podem se referir a fluxos de vários tipos. Entretanto o autor
destacou uma “trincheira” de aplicação do conceito pelas ciências da sociedade, ou seja, àquela que
busca capturar aspectos fundamentais dessa dinâmica e do meio de estruturação de protestos e ativismos
sociais em torno do conceito sobredito. Porém muitos desses trabalhos sociólogos não dialogam com os
geógrafos (com a política das escalas). Alguns, chegam a “despacializar” as redes sociais, mas alguns
são sensíveis a dimensão espacial da sociedade, no contexto dos ativismos.
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No capítulo 8, temos o conceito de “escala” e suas coexistentes imbricações, quais sejam:


“políticas de escala” e “construção social da escala”, assim um debate foi aventado e avançado,
conformando, portanto, conceitos densamente debatidos pelos geógrafos.
Souza (2013) faz uma diferenciação básica entre “escala cartográfica” e “escala geográfica”,
ele elenca que com relação à cartográfica, obviamente, na pesquisa “sócio-espacial”, nós a precisamos
a todo momento, posto ela ser um dos elementos informativos de qualquer mapa.
Já a geográfica, constitui-se em tema a ver com a própria extensão ou magnitude do espaço
que se está levando em conta. Assim, a escala geográfica pode ser subdividida em “escala do fenômeno”,
“escala de análise” e “escala de ação”. A escala do fenômeno pode ser tanto física como social, da
relação dessa escala fenômeno com a escala de análise temos configurada a dialética sujeito/objeto e
por sua vez a escala de ação diz respeito a um aspecto especifico e diretamente político.
No capítulo 9, Souza (2013) traz para a discussão uma temática pouco inserida na pesquisa
“sócio-espacial”: os chamados “termos nativos”, uma espécie de empirismo. Inicialmente aborda a
relação entre o conhecimento científico e os outros saberes, como por exemplo o senso comum/saber
local. No tocante a pesquisa “sócio-espacial”, alguns exemplos de termos nativos não encontrados
somente em ambientes rurais, mas também grandes cidades e nas de médio porte como a título
exemplificativo teríamos as noções de “pedaço”, e de “cena”, que podem ser examinados à luz de outros
dois conceitos: território e lugar - “de quem é o pedaço?” [...] “O encontro se dá em lugares que, por
intermédio dos encontros, constituem os territórios e formam a cena” (Turra Neto, 2004: 1211 apud
Souza, 2013. p. 232). O autor portanto, nos alerta para necessidade de valorizar os “termos nativos”,
repletos de etnografia e na trama de significados antropológicos.
No capítulo 10 nos é apresentado debatido o conceito de práticas espaciais, conceito que para
Souza (2013) é pouco trabalhado na Geografia, ainda que seja objeto muito citado. O autor inicialmente
recorre a Henri Lefebvre (1974) para tratar sobre esse conceito, numa primeira abordagem. Assim, o
autor estabeleceu que “a prática espacial é uma prática social” (p.239). Asseverou que “nem todas a
práticas sociais são direta, densa ou complexamente espaciais ou especializadas” (p.240). Exemplificou
que comparecer a uma zona eleitoral para o sufrágio universal do voto, significa que o processo se
desenvolve em um espaço específico e sob diversos condicionamentos sócio-espaciais, dificilmente
poderia ser chamado de prática espacial ao contrário da situação de alterar e manipular os limites de
distritos eleitorais, que aqui conotaria uma prática espacial.
Asseverou que, “todas as práticas espaciais são sociais. Práticas espaciais são práticas sociais
em que a espacialidade (a organização espacial, a territorialidade a “lugaridade”) um componente nítido
e destacado da forma de organização, do meio de expressão e/ou dos objetivos a serem alcançados”
(Souza, 2013, p. 241)
Esses capítulos específicos da obra de Marcelo Lopes de Souza em conjunto com os cinco
primeiros dessa obra em nossa concepção são fundamentais para efetivar-se-á a chamada pesquisa
“sócio-espacial”. A impressão que fica é que o autor tenta didaticamente/dialeticamente expor conceitos
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para um público amplo, não só de geográficos, mas de pessoas que objetivam fazer a pesquisa sócio-
espacial, ou seja àqueles que se preocupam com as questões espaciais, desde sociólogos e antropólogos,
até economistas, historiadores, arquitetos e urbanistas.
O interessante é que vai de encontro ao que Souza (2013) considera na apresentação do livro
em questão, no sentido do entendimento da necessidade de se se erguer “edifícios” que nos permitam
enxergar além e melhor, partindo do pressuposto que os conceitos que ele tão cuidadosamente tenta
especificar seus significados seriam os “tijolos”; assim, a teoria seria o conjunto de “tijolos” e
“argamassa” assentados, formando um todo; e o método sendo a maneira de “assentar os tijolos”, sem
agredir a paisagem. Assim, tal metáfora explica o papel dos conceitos como “unidades explicativas
fundamentais”, bem como constitutivas de qualquer construção teórica.
Concordamos com a visão do autor no sentido de que esses conceitos são “ferramentas’, e que
elas só serão úteis se soubermos usá-las, se tivermos algum mínimo de treinamento sobre elas (daí a
importância da discussão de tais na academia) e sermos familiares com elas. E como bem ele ressaltou:
“A melhor ferramenta de carpintaria será inútil nas mãos de alguém que nada entenda do ofício.” (Souza,
2013, p. 11).
Os conceitos ora trabalhados pelo autor do capítulo 6º ao 10º, tem significados determinados
trazidos que ajudam a compreender melhor a pesquisa ‘sócio-espacial”. Nesse aspecto o autor manifesta
que é importante e preciso interessar-se com nível de profundidade e não somente epidercamente pelas
relações sociais. Bem como pela sociedade concreta, em que as relações sociais são indissociáveis.
Nesse diapasão entrará em cena o “sócio-espacial”, conceito que o autor criou para com o uso do hífen,
falar direta e plenamente das relações sociais.
No exemplo de uma análise de uma partida de futebol, o viés “sócio-espacial” da partida será
examinado em termos de processos vivos, e sem timidez epistemológica, pelas interações que se
desenrolam durante a partida, nos marcos de uma espacialidade determinada e referenciadas por ela.
Os conceitos, portanto, não são tratados, isoladamente em cada um dos capítulos, de forma
estanque, pelo contrário se coadunam e dialogam entre si, cuidadosamente, no decorrer do
desenvolvimento da obra, o que permite a formação de unidade para o pensamento do autor ao longo do
desenvolvimento destes. Assim, observa-se que os conceitos podem ser correlacionados entre si, mas
com cuidado no que se refere às perspectivas teórico-metodológicas e teórico-conceituais, tendo em
vista a bipolarização da geografia ao longo de sua história e a dicotomia das ciências sociais e a
geográfica.
A impressão nossa sobre os conceitos, tidos pelo autor como “básicos”, especificamente os
conceitos de práticas espaciais, substrato espacial material, termos nativos, é no sentido de o autor ter
trazido conceitos cheios de vida para a discussão, posto que por meio de práticas espaciais, analisando
a materialidade concreta do aqui-agora que foi construído por uma confluência de histórias e não de
uma única estória, e que tem na sabedoria do elemento nativo, ou empírico, a possibilidade de
entendimento de uma configuração que fora consubstanciada pelas relações sociais.
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O autor buscou relacionar conceitos novos com conceitos antigos, que eram frutos de uma
geografia mais tradicional, bem como sua intenção fora ir além das especializações estritas e valorizadas
pela ciência atual, permitindo a geógrafos e não geógrafos terem uma dimensão espacial da sociedade e
seus conceitos.
Marcelo Lopes de Souza (2013), conseguiu historicizar nessa obra a Geografia, principalmente
o debate epistemológico, de discussão entre geógrafos e outros atores que influenciaram a conformação,
consolidação, aprimoramento, ressignificação em torno de conceitos que para a pesquisa socioespacial
são de importância fundamental.
Até “sócio-espacial” para ele tem que ter grafia nova para mostrar que o ambiente espacial da
sociedade é dinâmico, composto de fluxos, de elementos subjetivos, produzido historicamente (por
diversas histórias) e não somente uma única. A ideia parece indicar pensar ou refletir de forma dialética,
aproveitando a bipolaridade epistemológica produzida pela Geografia quando determinou
conceituações.
O autor parece incitar-nos a ter um olhar geográfico novo, autônomo, que consiga entender uma
paisagem, como por exemplo uma fotografia de um cartão postal do Rio de Janeiro, para além da
representação imagética percebida num primeiro instante, e sim, vê-la, como um elemento da natureza
primeira usado para vender uma imagem mercadológica, que foi tirada por um determinado ângulo, que
às vezes pode ser um que revela a favela contida atrás da bela imagem do morro esplendoroso, ou a
esconde com medo de apresentá-la, dependendo, portanto do elemento subjetivo intencionalidade
visada.
Essa analogia acima serve para o que foi produzido nestes 10 capítulos da obra, e nossa
impressão é no sentido de que o desafio lançado é perceber por intermédio de conceitos entendidos na
convergência dessa busca de marcar conceitos fundamentais para a pesquisa “sócio-espacial”, como
acreditação de um espaço vivo, que podemos produzi-lo, que podemos contestá-lo mesmo ele sendo
heterônimo, que a ciência não é estática, que conceitos são produzidos a cada momento, que região,
bairro, rede, termos nativos, práticas sociais, escala, são conceitos que devem ser entendidos como
elementos complexos, e não simples estações que não dialogam e não são coetâneos.
A obra parece produzir um certo rizoma que coloca para a pesquisa “sócio-espacial” a
necessidade de fazer-se pesquisa dialogando com outras ciências, sejam naturais ou sociais, com o
espaço vivido, concreto e também o abstrato, o real e o ciberespaço, de ser uma análise sistêmica e
complexa. A impressão é que a perspectiva de entendimento dos conceitos aqui abordados pela obra de
Santos (2013), é no sentido de ser Pelo Espaço, como Dorren Massey fizera ao propor uma nova
imaginação para o espaço e é Estar Vivo como indica (Tim Ingold) no sentido de conhecimento em
movimento.

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