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Presidenta da República
Dilma Vana Rousseff
Chefe de Gabinete
Yuri Rafael Della Giustina
1ª Edição
Brasília
2011
Permitida a reprodução sem fins lucrativos, parcial ou total, por qualquer meio, se citados a fonte e o
sítio da Internet no qual pode ser encontrado o original em http//:www.cidades.gov.br
1ª Edição: 2011
Pesquisa realizada com o apoio de: Ministério das Cidades/ Secretaria Nacional de Saneamento Básico
ISBN 978-85-7958-024-6
CDU 33.021:628(061)(81)
Esta publicação faz parte do conjunto de materiais técnicos que a Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental – SNSA está
publicando: Guia para Elaboração de Planos de Saneamento Básico Participativos, Política e Plano Municipal de Saneamento
Ambiental: Experiências e Recomendações, Cartilha “Plano de Saneamento Básico Participativo”. Aborda aspectos relativos
ao planejamento e à gestão, aos pressupostos e à metodologia para a elaboração de planos, ao conteúdo mínimo definido para
o diagnóstico, à participação e ao controle social, ao uso de tecnologias apropriadas e aos novos paradigmas tecnológicos, à
avaliação de políticas públicas e a atividades de regulação, fiscalização e do financiamento das ações.
Após a publicação, esses materiais serão utilizados para a divulgação e sensibilização dos municípios, titulares do serviço
e responsáveis por formular a política e elaborar o plano de saneamento básico, ações indelegáveis a outro ente, quanto à
importância do planejamento e da participação. Essas ações ilustram a preocupação da SNSA e do Ministério das Cidades
em contribuir e apoiar os municípios brasileiros no processo de reorganização do saneamento básico no país, orientado pela
nova lei do saneamento - uma conquista da sociedade brasileira.
Clênio Argolo
João Batista Peixoto
João Carlos Machado
Tatiana Santana Timóteo Pereira
Alexandre Araújo Godeiro Carlos
Otávio Silveira Gravina
Gabriella Pereira Giacomazzo
Brasília - 2011
2.3 A intersetoralidade......................................................................................................................................................21
3.4 Plano de Saneamento Básico, Plano Diretor e Plano de Bacia Hidrográfica: o diálogo necessário.................................42
5 Referências..................................................................................................................................................................48
A Lei nº 11.445/2007, ao regular a prestação dos serviços, define quatro funções de gestão: o planejamento, a prestação dos
serviços, a regulação e a fiscalização. Segundo o art. 8º dessa Lei, o titular pode delegar a organização, a regulação, a fiscalização
e a prestação dos serviços, exceto o planejamento, que é indelegável.
Por outro lado, a mesma lei prevê que o exercício de todas as funções de gestão deve atender ao princípio fundamental de
controle social estabelecido no inciso X, do art. 2º, cabendo ao titular dos serviços estabelecer os mecanismos e procedimentos
para essa função, conforme determina o inciso V, do art. 9º, visando garantir à sociedade informações, representações técnicas
e participações nos processos de formulação de políticas, de planejamento e de avaliação relacionados aos serviços públicos de
saneamento básico.
Nessa lei, o Plano de Saneamento Básico assume caráter central e condição indispensável para a gestão dos serviços. É por essa
razão que estabelece, entre outras diretrizes, que:
• a validade dos contratos de prestação dos serviços depende da existência do Plano (inciso I, do art. 11);
• os planos de investimentos e projetos dos prestadores devem ser compatíveis com as diretrizes do Plano (§ 1º, do art. 11);
• a entidade reguladora e fiscalizadora deve verificar o seu cumprimento (parágrafo único, do art. 20);
• a alocação de recursos públicos federais e os financiamentos com recursos da União ou geridos por órgãos ou entidades da
União ficam condicionados à existência do Plano (art. 50).
Nesse novo cenário, o poder local – o município – é confirmado como o grande protagonista do saneamento básico no Brasil, que,
com a Lei nº 11.445/2007, passa a contar com o suporte legal para exercer a titularidade na gestão dos serviços, restabelecendo
o que preconizou a Constituição Federal, há 20 anos, quando definiu a competência municipal para “legislar sobre assuntos de
interesse local” e para “organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre por meio de licitação,
os serviços públicos de interesse local” (BRASIL, 1988, s.p).
Esse novo ambiente jurídico da área de saneamento vem ao encontro de antigos anseios de segmentos organizados da sociedade,
no entanto, traz no seu bojo uma série de desafios que deverão ser enfrentados e superados por todos os atores envolvidos.
Até o momento, dos 5.564 municípios brasileiros, poucos dispõem de Planos de Saneamento Básico. Ou seja: a grande maioria
dos municípios ainda necessita elaborar seus Planos, de forma participativa. O fato do acesso a recursos da União e de fundos
federais estar condicionado à existência de Planos de Saneamento Básico e à regularização dos instrumentos de outorga para
prestação dos serviços, incluídos contratos de delegação, aponta para preocupações prementes em torno da elaboração desses
Planos.
Segundo dados do IBGE (2007), 72% dos municípios brasileiros têm população menor que 20.000 habitantes, o que, somados,
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correspondem a cerca de 20% da população do país. Por outro lado, em torno de 43% da população encontra-se em municípios
com população entre 50.000 e 1.000.000 de habitantes, correspondendo a 9,6% dos municípios.
Esses dados revelam desafios diferenciados para municípios que possuem populações menores, a maioria, e para os municípios
de maior população, a minoria, que guardam em seus territórios os maiores déficits sociais do país, o que inclui as regiões
metropolitanas. Essa realidade traz dois elementos para análise: o primeiro diz respeito às condições organizacionais, institucionais
e de recursos dos municípios de menor população para elaborarem seus Planos; o segundo relaciona-se à maior complexidade
das condições socioambientais e da prestação dos serviços nos municípios de maior porte populacional, o que também requer
esforços adicionais de planejamento e, consequentemente, capacidade institucional.
Embora a experiência e a literatura evidenciem que políticas públicas construídas e implementadas no nível local tenham mais
chances de obterem êxitos, em face de sua proximidade à realidade local e de sua permeabilidade a processos participativos
e democráticos, a fragilidade atual dos movimentos sociais é um fator limitador para a elaboração de Planos mais realistas e
transformadores. Aliado a esse fator, a lógica clientelista que ainda vigora nas relações entre os poderes públicos municipais e a
sociedade privilegia a manutenção do poder e, consequentemente, o status quo. A superação desse cenário implica estimular o
protagonismo do poder local e o empoderamento dos movimentos sociais, com vistas a estabelecer um pacto social entre governo
e sociedade capaz de promover as transformações necessárias.
Ciente desses desafios, o Ministério das Cidades, por meio da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental – SNSA vem
empreendendo esforços no sentido de apoiar os municípios na elaboração dos seus Planos de Saneamento Básico e o presente
ensaio busca contribuir neste processo.
A ação de planejamento envolve uma avaliação do estado presente do objeto a ser planejado para, a partir daí, definir o estado
futuro. Para isso, é necessário ter certo domínio sobre esse objeto a ser planejado. No caso desse ensaio, o saneamento básico. 13
Justifica-se, assim, a necessidade de se discutir o saneamento básico como objeto de planejamento, seus conceitos, a forma
Foucault nos ensina que os conceitos e as teorias são limitados e aproximados, construídos pelo homem tomando-se por base
uma cultura, e que a produção do conhecimento não se dá de forma neutra, estando inserida no contexto político e social onde
está se processando. O autor esclarece que todo o pensamento se estrutura a partir de um espaço de ordem que se vincula à
cultura. Essa ordem se expressa segundo épocas, vincula-se ao espaço onde é produzida, sendo constituída a cada instante pelo
impulso do tempo. Foucault acredita que a experiência da ordem em cada lugar e tempo é mais fundamental que as teorias gerais
e o conhecimento reflexivo, desempenhando sempre um papel crítico (FOUCAULT, 1992). Assim, o reconhecimento da realidade
presente pressupõe reconhecer a experiência nua da ordem e seus modos de ser. Nesse debate Marx diria: todo saber sobre o
real se dá a partir do pensar criticamente a base material. Pedro Demo diz: para compreender a realidade é preciso vivenciá-la
(DEMO, 1996). No campo do planejamento, a vivência do fenômeno, do objeto a ser planejado, pressupõe a participação ativa dos
agentes sociais.
Portanto, planejar pressupõe reconhecer e debater os conceitos, as visões de mundo sob as quais o objeto é percebido e
interpretado. Caso contrário, o plano se constituirá em mais uma peça estéril, tecnoburocrática e cartorial, incapaz de promover
transformação social. O domínio sobre o objeto a ser planejado requer o reconhecimento de sua história, de forma a entender
como, ao longo do tempo, a sociedade o apreendeu. Esse domínio envolve a distinção das diferentes compreensões, que muitas
vezes convivem e se contrapõem, e que, em última instância, se constituem em disputas de visões de mundo diferentes de atores
sociais, as quais irão influenciar a execução do Plano, reforçando umas ideias e rechaçando outras. O não entendimento desse
processo implica não reconhecer que existem projetos sociais em disputa, que necessitam ser visualizados e discutidos pela
sociedade, para que o Plano possa se constituir em um pacto social capaz de promover a transformação da realidade.
Assim, elaborar um Plano de Saneamento Básico pressupõe discutir o entendimento dos atores envolvidos sobre esse objeto,
implica discutir conceitos e a história de sua constituição. O presente texto não tem a pretensão de promover ampla discussão
sobre o tema, e sim indicar alguns pontos que merecem destaque e que poderão auxiliar o processo de planejamento.
A construção de um conceito tem um caráter multicor, que reflete a complexidade e as diversas formas de pensar o real. Nesse
sentido, o conceito de saneamento vem sendo socialmente construído ao longo da história, de acordo com as condições materiais
e sociais de cada época.
Entre os anos 40 e 60, a noção de saneamento sofreu duas influências principais: a do século XVIII, vinculada à higiene pública,
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e a do início de século XIX, relacionada com a insalubridade das cidades e a saúde da classe trabalhadora. Existia relação íntima
entre produção da cidade, condições de saneamento e nível de saúde da população. Prevalecia a noção de que era necessário
sanear a cidade para promover a saúde do trabalhador e garantir a reprodução social e produção de capital. Assim, no Brasil,
em 1942, no rastro da cooperação com os Estados Unidos, datada do início de século XX, é criado o Serviço Especial de Saúde
Pública – SESP. Esse serviço visava a melhoria das condições sanitárias em que viviam os trabalhadores, de forma a aumentar
a produtividade no trabalho. Pretendia-se criar condições para a integração do país ao modelo de desenvolvimento pautado em
uma economia de mercado subalterna, produtora de matéria-prima e consumidora de produtos industrializados da metrópole.
Para Rezende e Heller (2002), a verdadeira razão para essa cooperação era a demanda por recursos minerais e vegetais, durante
e após a Segunda Guerra Mundial. Interessava aos Estados Unidos as fontes produtoras do Vale do Amazonas, do estado de Goiás
e do Vale do Rio Doce, o que conduziu ao acordo de cooperação desse país com o Brasil, com a criação do Instituto de Assuntos
Interamericanos – IAIA, ao qual o SESP ficou subordinado.
Nesse período, o saneamento era entendido como uma medida de saúde pública, necessário para prevenir doenças e garantir a
produção de capital. As ações de saneamento voltavam-se, prioritariamente, para o controle de endemias, a exemplo da malária
e febre amarela. No campo da saúde, o saneamento vinculava-se à ideia de prevenção, constituindo-se em uma medida capaz
de interromper o ciclo da doença. A saúde, então, seria a ausência de doenças.
Entre os anos 60 e 70, o saneamento assume outros contornos. O modelo desenvolvimentista, pautado na indústria de
transformação, exigiu uma nova cidade, com infraestrutura capaz de dar suporte ao emergente ciclo produtivo. A modernização
do setor saneamento torna-se uma exigência e a prestação dos serviços de água e esgoto é vista como uma atividade que deve
ser submetida à lógica empresarial, com a recuperação dos custos via tarifa, inclusive o retorno do capital investido. Os serviços
autônomos e as empresas de economia mista colocam-se como alternativas mais viáveis para as novas exigências.
Nessa época, inicia-se o esvaziamento das ações de saneamento no âmbito do Ministério da Saúde e, consequentemente, da
FSESP1, que passa a contar com parcos recursos. Já na década de 70, o governo brasileiro, com forte influência de instituições
internacionais e com financiamento do Banco Interamericamo de Desenvolvimento – BID, consolida Nacional de Saneamento –
Planasa, por meio das companhias estaduais (REZENDE e HELLER, 2002; MERCEDES, 2002).
Nesse período, predomina a visão do saneamento como infraestrutura urbana necessária para a estruturação das cidades
industriais que se constituem naquele momento no lócus da produção de capital. As ações de abastecimento de água e de
esgotamento de esgoto são priorizadas em face da possibilidade de cobrança desses serviços e, portanto, da viabilidade
econômica e financeira da sua prestação. Os investimentos são direcionados para as cidades situadas em regiões produtivas
ligadas ao setor industrial, e os serviços são ofertados para os segmentos da população com capacidade de pagamento. Com
1 Em 1960, o convênio com os Estados Unidos expira e o Sesp passa a ser chamado de Fundação Sesp – FSESP, ligada ao Ministério da Saúde. Mais informações em: http://www.
funasa.gov.br/internet/museuFsesp.asp
Para Kowarick (1979), a periferia passa a ser a forma da força de trabalho se reproduzir nas cidades, sendo consequência direta
do tipo de desenvolvimento econômico que se processou no Brasil. Segundo o autor, tal desenvolvimento possibilitou altas taxas
de exploração do trabalho e forjou formas de espoliação que foram traduzidas nas condições de existência da classe trabalhadora.
Assim, as casas precárias, os cortiços e as favelas sem serviços urbanos, infraestrutura e saneamento passam a expressar
a precariedade do salário e da qualidade de vida do trabalhador, passam, em última instância, a refletir um desenvolvimento
desigual e excludente.
Além do setor imobiliário, é também desse período o surgimento de uma forte indústria de equipamentos, materiais e da
construção civil. Tais setores passam a influenciar as políticas públicas de habitação e saneamento, ambas sob o comando do
então Banco Nacional de Habitação – BNH. No seio desses segmentos, são forjados projetos de uso intensivo de capital. No campo
da moradia, surgem os programas habitacionais para a classe trabalhadora e investimentos públicos em infraestrutura colocados
a serviço do setor imobiliário.
No campo do saneamento, grandes investimentos focalizados são realizados a exemplo do Saneamento da Grande São Paulo
– Sanegran; do Sistema Guandu, no Rio de Janeiro; e o Complexo Pedra do Cavalo, que inclui sistema adutor para a região
metropolitana de Salvador, na Bahia; todos sob o comando das companhias estaduais de água e esgoto. Na década de 90, esses
segmentos vão se organizar em torno do Sindicato da Indústria da Construção Civil – Sinduscon, Associação dos Fabricantes de
Materiais para Saneamento – Asfamas, o Sindicato dos Fabricantes de Equipamentos e a Associação Brasileira da Infraestrutura
e Indústrias de Base – ABDIB, somando-se à Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais – Aesbe, constituída
nos anos 80, e, mais tarde, à Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto – Abcon,
constituindo-se em uma significativa força política e econômica.
Nesse mesmo período, outro segmento social também começa a se organizar na esteira das comunidades eclesiásticas de base
da Igreja Católica e do movimento sindical que, no início dos anos 80, vai formar o Movimento pela Reforma Urbana. Para esse
segmento, o saneamento vincula-se às condições de moradia dos espoliados urbanos.
O período entre os anos 80 e 90 vai ser marcado por uma nova inflexão e por disputas em torno das questões de saneamento,
disputas essas que vão influenciar o tratamento desse objeto – o saneamento –, no âmbito das políticas públicas. Nesse momento,
o Brasil vivia um ambiente de abertura política e de liberdades democráticas, o que fez emergir diversos segmentos organizados
na sociedade.
Os avanços e recuos do projeto neoliberal no país tiveram influência de um forte movimento social que emergiu no novo cenário
político. Esse movimento também passou a influenciar as políticas públicas. Assim, o Partido dos Trabalhadores; a Central Única
dos Trabalhadores – CUT; o Movimento pela Reforma Urbana, que congregava diversas entidades como associações de moradores,
associações profissionais, a Pastoral da Terra, entre outros; o Movimento pela Reforma Sanitária, que reunia intelectuais ligados
à Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva – Abrasco; além das entidades diretamente vinculadas à área de
saneamento, a exemplo da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento – Assemae e da Federação Nacional dos
Urbanitários – FNU; e, por fim, a Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental vão formar um bloco progressista que vai defender
um projeto social pautado em pressupostos do Estado do Bem-Estar Social, e, portanto, um projeto antagônico ao neoliberal.
Foi no bojo dessa disputa de projetos sociais que a Constituição de 1988 foi aprovada. No campo do saneamento, a chamada
Constituição Cidadã traz diversas concepções que, naquele momento, estavam colocadas para a sociedade.
Nos dispositivos da Carta Magna, podem ser apreendidas diversas concepções de saneamento. O saneamento é visto como:
ação de competência municipal, uma vez que é “assunto de interesse local” (inciso I, art. 30 da CF); “serviço público de interesse
local” (inciso V, art. 30 da CF), além de ser um “componente do desenvolvimento urbano” (art. 20 da CF), ao lado da habitação
e do transporte. É compreendido também como ação de saúde pública, vez que se torna competência do Sistema Único de
Saúde “participar da formulação da política e da execução das ações de saneamento básico” – inciso IV, art. 200 (BRASIL, 1988).
Constitui-se, ainda, em direito social, uma vez que a Constituição estabelece como direitos sociais, entre outros: a saúde, o
trabalho, a segurança, a moradia e a proteção à infância (BRASIL, 2000). O saneamento aparece implicitamente nesse dispositivo
no âmbito do direito à saúde e à moradia.
Pode-se dizer ainda que os dispositivos constitucionais sobre meio ambiente e recursos hídricos colocam o saneamento como
medida de controle ambiental.
Assim, o saneamento passa a ser apropriado por diversos segmentos da sociedade, caracterizando-se como ação de saúde
pública, de interesse local, direito do cidadão vinculado à moradia digna, direito social, ação de controle ambiental, estando,
consequentemente, mais voltado para o campo das políticas sociais. Por ouro lado, o saneamento, além de se constituir em
medida de infraestrutura das cidades, de desenvolvimento urbano, passa a ser a própria mercadoria, capaz de ser adquirida no
mercado de serviços públicos privatizados. Por um lado, defendem-se políticas universalistas típicas do Estado do Bem-Estar
Social, e por outro, políticas focalizadas nos espaços produtivos, capazes de possibilitar a remuneração do capital, tais como as
regiões metropolitanas e as grandes cidades, consideradas atrativas para o capital privado.
As visões de mundo do saneamento como mercadoria e como direito representam, minimamente, dois projetos sociais
Assim, nesse período, não houve uma visão de saneamento predominante. Essa característica fez emergir diversas práticas
governamentais que estimularam experiências em ambas as direções. Em diversos municípios, a exemplo de Porto Alegre, Santo
André, Guarulhos e Recife, foi possível verificar avanços em direção à ampliação do conceito de saneamento para além das ações
e serviços de água e esgoto, incorporando, entre outros, os princípios da democratização do acesso aos serviços; da melhoria
da qualidade da prestação e da implementação de processos participativos na definição de políticas. No contraponto, surgem
experiências de privatização dos serviços como em Limeira/SP, Manaus/AM, Região dos Lagos/RJ e no estado do Paraná.
O período que vai do início da década atual até os nossos dias, as visões antagônicas sobre o saneamento se mantêm. Mas,
no âmbito das políticas públicas, pode-se dizer que, nessa década, as elites dirigentes e econômicas estabeleceram um pacto
social. Assim é que, já no primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a privatização dos serviços é posta em plano
secundário; reestrutura-se o aparato estatal com a criação do Ministério das Cidades e a Secretaria Nacional de Saneamento
Ambiental; os investimentos são retomados e o projeto de uma política pública de saneamento passa a ser discutido com a
sociedade (PL nº 5296/2005). Por outro lado, novas modalidades de concessão de serviços públicos são apresentadas sob o rótulo
de parcerias público-privadas, as quais, embora concebidas no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, não deixaram
de ser estimuladas no novo período, culminando na aprovação da Lei nº 11.079/2004, que as regulamentou.
Com a criação do MCidades, o direito a cidades sustentáveis e ao saneamento ambiental, para as gerações presentes e futuras,
passa a ser considerado em atendimento à Lei nº 10.257/2001 – o Estatuto da Cidade, que estabelece diretrizes gerais da política
urbana.
Em 2007, no dia 5 de janeiro, é sancionada a Lei nº 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento
básico e para a Política Federal de Saneamento Básico. Escreve-se, assim, o mais importante capítulo da história contemporânea
do saneamento no país. Fruto de pactos e de intensas negociações, inegavelmente, a lei representa grande avanço do marco
legal.
18 Assim, nesse período, no âmbito legal e na visão dos setores mais progressistas da sociedade, prevalece a noção de saneamento
como medida de saúde pública, como ação de infraestrutura das cidades, como direito do cidadão e como medida de proteção
ambiental.
No campo do conhecimento, mais recentemente o saneamento tem sido colocado como ação de promoção à saúde, havendo
descolamento em relação à noção de prevenção de doenças. O ideário da promoção da saúde, ainda em construção, compreende
a saúde de forma mais ampla, para além da prevenção de doenças e agravos. Envolve abordagem dos macrodeterminantes do
processo de saúde-doença (SOUZA e FREITAS, 2007), a exemplo da alimentação, nutrição, habitação, saneamento, saúde mental,
entre outros. Essa concepção conduz ao conceito de saúde da OMS, a saber: “A saúde é o completo bem-estar físico, mental e
social, e não apenas a ausência de doenças”. Assim, se por um lado a definição restringe a possibilidade de se ter saúde na sua
plenitude, principalmente considerando os estilos de vida contemporâneos, por outro retira a saúde do campo estrito da doença.
Souza e Freitas (2006), ao estudarem as diversas percepções sobre saneamento, fazem um esforço de discuti-lo na perspectiva
da promoção da saúde. Os resultados revelaram que existem dois discursos: o que considera o saneamento como medida
de prevenção e o que avança para o campo da promoção. Para os autores, o saneamento promocional tem uma natureza
multidimensional, que ultrapassa a estrutura física e assume um significado mais amplo não só na dimensão da saúde na
perspectiva de ausência de doenças, mas incorporando as dimensões social, econômica, política, cultural e ambiental. Nessa
visão, o saneamento também incorpora um conjunto de ações de educação e participação social que pressupõe cidadãos ativos e
críticos para que as intervenções possam atingir a efetividade necessária para a garantia da qualidade de vida. Os autores fazem
importante contribuição ao distinguirem as diferentes práticas do saneamento visto como promoção e como prevenção (Quadro 1).
Quadro 1 – Diferenças práticas entre o saneamento como promoção da saúde e como prevenção de
doenças.
CATEGORIAS SANEAMENTO COMO SANEAMENTO COMO
PROMOÇÃO DA SAÚDE PREVENÇÃO DE DOENÇAS
Implantação de sistemas com vistas a contribuir Implantação de sistemas com vistas a
para mudanças na situação dos indivíduos e de obstaculizar a interação agente-suscetível
Objetivos dos projetos seu ambiente e, com isso, erradicar a doença, e, com isso, impedir a manifestação
melhorando a performance de indicadores da doença, melhorando a performance
sociais, de saúde e ambientais, ou seja, a de indicadores epidemiológicos e
qualidade de vida. ambientais.
Preocupação quanto à
Sustentabilidade dos sistemas para alcançar os Sustentabilidade dos sistemas para
sustentabilidade das
objetivos dos projetos. alcançar os objetivos dos projetos.
ações
Articulação institucional e
Articulação entre políticas, Articulação institucional e interinstitucional para
interinstitucional para
instituições e ações empoderamento.
implantação de sistemas.
Do exposto, pode-se constatar que o processo de formulação de políticas e planos é fortemente influenciado por fatores políticos,
sociais, econômicos, culturais, entre outros. As visões de mundo de cada época, a correlação de poder entre os segmentos
sociais, a situação econômica e social e, no campo epistemológico, o conteúdo do saber produzido formam uma malha complexa
de elementos que vão compor o cenário sobre o qual as ações do Estado são definidas. No campo do saneamento, a última
década fez emergir visões de mundo e saberes, socialmente construídos ao longo dos últimos 20 anos, e que vão compor os
pressupostos sob os quais, hoje, o planejamento das ações pode se sustentar.
Tais pressupostos vinculam-se à noção de saneamento como um direito social, como um serviço público de interesse local, como
uma medida de promoção à saúde e de proteção ambiental, como uma ação de infraestrutura que promove o desenvolvimento
urbano e a habitação salubre e, ainda, como meta social de responsabilidade do Estado, que pressupõe a universalidade, a
equidade, a integralidade, a intersetorialidade, a qualidade e regularidade da prestação, a transparência das ações, a participação
e o controle social.
Planos de Saneamento Básico que visem transformações substanciais, que sejam inclusivos e pautados em princípios de
justiça social, devem estar embasados nos pressupostos enunciados, para que, mediante processos participativos capazes de
estabelecerem pactos junto aos diferentes segmentos sociais, possam se constituir no meio de garantir saneamento de qualidade
para todos.
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• Integralidade das ações
As ações e serviços de saneamento devem ser promovidos de forma integral, em face da grande inter-relação entre os
seus diversos componentes, principalmente o abastecimento de água, o esgotamento sanitário, a drenagem de águas
pluviais, o manejo de resíduos sólidos, o controle ambiental de vetores e reservatórios de doenças. Muitas vezes, a
efetividade, a eficácia e a eficiência de uma ação de saneamento dependem da existência dos outros componentes.
• Igualdade2
A igualdade diz respeito a direitos iguais, independentemente de raça, credo, situação socioeconômica; ou seja,
considera-se que todos os cidadãos têm direitos iguais no acesso a serviços de saneamento de boa qualidade.
• Titularidade municipal
Uma vez que os serviços de saneamento são de interesse local, pois são tipicamente urbanos e suas infraestruturas são
equipamentos urbanos básicos3, e o poder local tem a competência para organizá-los e prestá-los, o município é o titular
desses serviços. Uma política de saneamento deve partir do pressuposto de que o município tem autonomia e competência
para organizar, regular, controlar e promover a realização dos serviços de saneamento de natureza local, no âmbito de seu
território, podendo fazê-lo diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, associado com outros municípios ou
não, respeitando as condições gerais estabelecidas na legislação nacional sobre o assunto.
A gestão municipal deve se basear no exercício pleno da titularidade e da competência municipal para instituir instâncias
e instrumentos de participação e controle social sobre a prestação dos serviços em âmbito local, qualquer que seja a
natureza dos prestadores, tendo como objetivo maior promover serviços de saneamento justos do ponto de vista social.
• Gestão pública
Os serviços de saneamento são, por sua natureza e definição legal4, considerados serviços públicos em sentido
estrito, de caráter essencial e universal. São vitais para a preservação e evolução da espécie humana, em face da sua
capacidade de promover a saúde pública e a salubridade ambiental. São indispensáveis para a elevação da qualidade
de vida das populações urbanas e rurais. Contribuem também para o desenvolvimento social e econômico. Por tudo isso
e, principalmente, por se constituírem em ações e serviços de saúde pública, de obrigação-dever do Estado e direito de
todos os cidadãos, a gestão dos serviços de saneamento deve ser de responsabilidade do poder público.
2 Aqui, optou-se em resgatar o termo igualdade, usado na Constituição de 1988 e no PLC 199/1993, em vez de equidade. Segundo Fonseca (1998), no modelo neoliberal, a equidade
adquiriu a noção mais relacionada à “capacidade individual” de agir diante das circunstâncias adversas, sendo a desigualdade resultado dos efeitos naturais das circunstâncias em
que os indivíduos estão inseridos. Dessa forma, a garantia dos direitos sociais passaria pela “ação individual”, debilitando o papel do Estado como provedor de políticas de garantia de
justiça social.
3 Conforme o art. 2º, § 5º, da Lei nº 6.766/1979.
4 Lei nº 11.445/2007, arts. 2º e 3º.
2.3 A intersetoralidade
A multideterminação dos fenômenos sociais tem exigido a formulação e implementação de políticas públicas intersetoriais. No
campo do saneamento, essa abordagem é mais evidente pela própria natureza das ações e serviços. Sendo o saneamento direito
social, serviço público de interesse local, medida de promoção à saúde e de proteção ambiental, e, ainda, ação de infraestrutura
para a salubridade do meio urbano e da habitação, a efetividade das ações requerem esforço de integração de diversos setores
da administração pública. Tais setores envolvem as áreas de saúde, educação, meio ambiente, planejamento urbano, habitação,
recursos hídricos, educação, administração, direito, entre outros. A intersetorialidade é, portanto, uma abordagem intrínseca às
ações de saneamento. Essa premissa foi considerada na Lei nº 11.445/2007, no inciso VI, do art. 2º, que estabelece, como um
dos princípios fundamentais da prestação dos serviços públicos de saneamento no Brasil:
articulação com as políticas de desenvolvimento urbano e regional, de
habitação, de combate à pobreza e de sua erradicação, de proteção
ambiental, de promoção da saúde e outras de relevante interesse social
voltadas para a melhoria da qualidade de vida, para as quais o saneamento
básico seja fator determinante (BRASIL, 2007, p. 1).
O conceito de intersetorialidade surgiu no âmbito do debate da produção do saber dos anos 60/70 quando a concepção de mundo
ocidental, pautada na fragmentação, no reducionismo e no mecanicismo, é colocada em questão. A ideia de dividir para conhecer
a realidade é substituída pela noção de totalidade, do todo orgânico. “O todo é maior que a soma das partes” (BERTALANFFY,
22 1975). Surgem as noções de interdisciplinaridade, transdisciplinaridade. Conceitos como holismo, visão sistêmica entram em
cena.
Minayo (2002) prefere tratar essa questão como “enfoque ecossistêmico”. Para a autora, esse enfoque busca superar o paradigma
antropocêntrico e mecanicista e aponta para a aproximação entre sociedade e natureza. E, ainda, a abordagem ecossistêmica
estaria vinculada à sustentabilidade ecológica, à democracia, aos direitos humanos, à justiça social e à qualidade de vida.
Inojosa (2001) prefere tratar essa abordagem com o conceito de transdisciplinaridade, cujas raízes se fincam na teoria da
complexidade, que trabalha com a compreensão da diversidade. A autora acredita que o prefixo “trans” expressa melhor a ideia
de inter-relação, enquanto o “inter” aponta para a ideia de proximidade de saberes isolados, sem gerar novas articulações. A
autora esclarece que, na literatura, termos como intersetorialidade e transetorialidade são usados com o mesmo sentido: a
articulação de saberes e experiências para a solução sinérgica de problemas complexos.
Para Leite e Duarte (2005), o conceito de intersetorialidade visa romper com uma visão fragmentada da ação pública, o que exige
a integração de objetivos, metas, procedimentos de diversos órgãos governamentais, implicando a necessidade de mudanças de
estratégias de ação, formas de destinar recursos públicos, estrutura organizacional e burocrática.
• Multidisciplinaridade: é um sistema que funciona por meio da justaposição de disciplinas em um único nível, estando ausente
uma cooperação sistemática entre os diversos campos disciplinares.
• Interdisciplinaridade: para além da disciplinaridade, a noção de interdisciplinaridade implica uma axiomática comum a um
grupo de disciplinas científicas conexas, cujas relações são definidas a partir de um nível hierárquico superior, ocupado
por uma delas; essa última, geralmente determinada por referência à sua proximidade a uma temática unificada, atua não
somente como integradora e mediadora da circulação dos discursos disciplinares, mas principalmente como coordenadora
do campo disciplinar.
• Transdisciplinaridade: indica a integração de disciplinas de um campo particular sobre a base de uma axiomática compartilhada
e implica a criação de um campo novo que idealmente seria capaz de desenvolver uma autonomia teórica e metodológica
perante as disciplinas que o originaram.
A complexidade da realidade contemporânea e a problemática socioambiental são fatores que impulsionam uma abordagem
interdisciplinar dos fenômenos. Esse ambiente influencia o campo das políticas públicas e das organizações. A intersetorialidade
Do ponto de vista teórico-conceitual, a necessidade de ações intersetoriais é um consenso, como também é consenso as
dificuldades e desafios para a sua implementação. A promoção de ações intersetoriais, além de demandar tempo, recebe 23
resistências diversas em função: a) do deslocamento de poder e do lócus das deliberações, da oposição do saber hegemônico,
dos interesses corporativos, da necessidade de mudanças nos processos de trabalho, os valores vigentes, e das concepções
arraigadas na administração pública (MENICUCCI, 2002).
Para Junqueira e outros (1997), as políticas públicas têm se pautado na segmentação de áreas de intervenção independente, com
estrutura organizacional verticalizada e setorizada que corresponde mais à lógica da especialização do saber e às corporações
profissionais do que às necessidades da população. Para Carneiro e Costa (2002, citado por LEITE e DUARTE, 2005), a lógica
setorial se expressa tanto na cultura organizacional, estruturada em secretarias de governos e programas, quanto nos mecanismos
de destinação dos recursos.
Junqueira e outros (1997) observam que as dificuldades para a promoção da intersetorialidade envolvem a concepção de Estado,
cujo campo de disputas ideológicas impacta a modelagem do seu aparato. Para os autores, a promoção de mudanças de paradigma
administrativo e de concepção de política relaciona-se a projetos políticos e ao estado da arte das teorias organizacionais. Para
Santos (2002, p. 175), uma das dificuldades para as novas abordagens refere-se à necessidade de “juntar disciplinas e articular
teoria e prática; e colocar à mesma mesa cientistas, atores do mundo da vida e gestores do Estado“.
Além do esforço da integração de diferentes conhecimentos, a ação intersetorial envolve o diálogo entre profissionais de diferentes
formações, entre estes os burocratas, os políticos e os cidadãos (PARSONS, 1995 citado por CKAGNAZAROFF e MOTA, 2007).
Um dos limites apontados por Gaetani (1997) refere-se ao modelo organizacional da administração pública, que não responde,
mesmo com o desejo do governo, devido à situação de incapacitação estrutural em que se encontra e do declínio das perspectivas
de superá-la. O autor chama a atenção para o fato de que grupos dos três níveis de governo costumam competir entre si,
promovendo uma concorrência intergovernamental, e não a desejada convergência sinergética.
Do ponto de vista legal, além da Lei nº 11.445/2007, o esforço de promover ações intersetoriais está em outros dispositivos, que,
inclusive, são anteriores a essa lei.
A Lei nº 9.433/1997, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos (BRASIL, 2007), dispõe de uma série de dispositivos que
visam à integração intersetorial, entre eles, pode-se citar:
• adequação da gestão de recursos hídricos às diversidades físicas, bióticas, demográficas, econômicas, sociais e culturais
das diversas regiões do país de integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental; de articulação do
planejamento de recursos hídricos com o dos setores usuários e com os planejamentos regional, estadual e nacional; de
articulação da gestão de recursos hídricos com a do uso do solo; e de integração da gestão das bacias hidrográficas com a
dos sistemas estuarinos e zonas costeiras (art. 3º);
• articulação dos estados tendo em vista o gerenciamento dos recursos hídricos de interesse comum (art. 4º);
• implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos pelos poderes executivos do Distrito Federal e dos municípios
mediante integração das políticas locais de saneamento básico, de uso, ocupação e conservação do solo e de meio ambiente
com as políticas federal e estaduais de recursos hídricos (art. 31).
• articulação do planejamento de recursos hídricos com os planejamentos nacional, regional, estaduais e dos setores usuários
(art. 35).
O Estatuto das Cidades, Lei nº 10.257/2001, que estabelece diretrizes gerais da política urbana, embora não trate especificamente
sobre a integração de ações e políticas públicas, para fins de ordenamento do desenvolvimento das funções sociais da cidade e
da propriedade urbana, estabelece entre outras diretrizes gerais:
• a garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental,
à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações
(inciso I, art. 2º);
• a integração e complementaridade entre as atividades urbanas e rurais, tendo em vista o desenvolvimento socioeconômico
do município e do território sob sua área de influência (inciso VII, art. 2º);
• a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico,
paisagístico e arqueológico (inciso XII, art. 2º).
A Lei n. 9.795/1999, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, do ponto de vista da intersetorialidade, estabelece:
• promoção, por parte dos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – Sisnama, de ações de educação
ambiental integradas aos programas de conservação, recuperação e melhoria do meio ambiente (inciso III, art. 3º);
• definição pelo poder público de políticas públicas que incorporem a dimensão ambiental (inciso I, art. 3º);
• compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos,
psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos (inciso I, art. 5º);
• fomento e fortalecimento da integração com a ciência e a tecnologia (inciso VI, art. 5º);
• desenvolvimento de prática educativa integrada, contínua e permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal (art. 10).
O estabelecimento, pela Lei nº 11.445/2007, do princípio fundamental da articulação da política de saneamento básico com
as políticas de desenvolvimento urbano e regional, de habitação, de combate à pobreza e de sua erradicação, de proteção
ambiental, de promoção da saúde, entre outras, envolve a concepção e implementação de ações intersetoriais entre diversos
ministérios, secretarias e órgãos da administração pública dos três níveis de governo (União, estados e municípios), respeitadas
as competências legais de cada ente federativo. Tal articulação representa grande desafio para a área de saneamento, pois,
O maior esforço oficial de integração das ações de saúde e saneamento que se tem registro foi realizado em 1995 com o
Plano Nacional de Saúde e Ambiente, no Desenvolvimento Sustentável: Diretrizes para Implementação (BRASIL, 1995). Naquele
ano, avaliava-se que as integrações intersetorial e intrassetorial eram incipientes, havendo descompasso entre as políticas de
saneamento, de saúde, de recursos hídricos, de meio ambiente, de desenvolvimento urbano e habitação (BRASIL, 1995). Entre as 25
propostas constantes no Plano quanto às ações intersetoriais, é importante destacar:
• implementação de mecanismos para a integração da política e das ações de saneamento com as de saúde, de recursos
hídricos, de meio ambiente, de desenvolvimento urbano e habitação. Participação do setor de saneamento nos conselhos
Inegavelmente essas propostas ainda são atuais, podendo servir de referência para a definição de estratégias governamentais de
ações intersetoriais, tão necessárias para a eficácia e efetividade das intervenções em saneamento básico, possibilitando que a
intersetorialidade saia do campo das ideias e passe a se construir em prática.
Com a Lei nº 11.445/2007 e a exigência da prática do planejamento – ação de responsabilidade do titular dos serviços, indelegável
a outro ente e concretizada no Plano Municipal de Saneamento Básico –, os caminhos para ações intersetoriais estão abertos.
A elaboração do Plano pressupõe abordagem intersetorial da problemática do saneamento básico em face das multidimensões
envolvidas na sua promoção. Aliando-se ao Plano a existência de um conselho municipal que tenha como competência participar
da elaboração e acompanhar a execução do Plano e exercer o controle social da gestão dos serviços de saneamento, conforme
previsto no art. 47 da Lei, criar-se-ão condições para a prática da intersetorialidade.
A elaboração dos Planos Diretores dos municípios, exigência definida no § 1o do art. 182, da Constituição Federal de 1988 (BRASIL,
2007), para cidades com população maior que 20 mil habitantes, também se constitui em oportunidade não só de realizar o
planejamento integrado, mas também de implementar projetos e programas que considerem a ação intersetorial. Além disso, a
participação de representantes da área de saneamento nos conselhos que definem e acompanham a política urbana, de meio
ambiente, de recursos hídricos e de saúde, também se coloca como alternativa a ser perseguida para o exercício da intersetorialidade.
No nível federal, a atuação da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, do Ministério das Cidades, e do Conselho Nacional
das Cidades constitui-se em importante meio para implementar políticas públicas que contemplem a intersetorialidade. Inclusive,
durante o primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi criado, sob liderança e coordenação da SNSA, um grupo
de trabalho interministerial com vistas a formular a minuta da Política Nacional de Saneamento e racionalizar os programas e
projetos do governo federal na área de saneamento. Tal comissão adotou diversas medidas para diminuir a superposição de ações
e promover a integração de iniciativas de ministérios e órgãos da administração federal, notadamente, do Ministério da Saúde/
Funasa, do Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Integração Nacional, Ministério da Fazenda, Ministério do Planejamento e
Caixa Econômica Federal.
Embora a atuação do grupo tenha aberto o caminho para a intersetorialidade, no segundo governo do presidente Lula, houve a
sua desmobilização. Tal fato evidencia a fragilidade das iniciativas governamentais nesse campo e a necessidade de se repensar
quais os mecanismos que devem ser adotados para que esse tipo de atuação seja mais duradouro. Certamente, a garantia de
gestão coordenada da Política Federal de Saneamento Básico, sob único comando, o que pressupõe uma ação intersetorial,
Por fim, é importante observar que o êxito de ações intersetoriais envolve a promoção de nova forma de pensar, pautada numa
visão de totalidade. Para tal, é importante resgatar e fortalecer o papel do Estado no âmbito das políticas públicas. Assim, as
instituições públicas devem buscar se adequar às novas exigências do mundo contemporâneo, onde não existe mais espaço para
26 ações fragmentadas, descontextualizadas da realidade, que, na sua essência, é complexa.
No entanto, é importante ressaltar, não existem fórmulas para o exercício da intersetorialidade. Os contextos locais de ordem
política, econômica, cultural, social e ambiental devem se constituir em pontos de partida para se pensar e agir de forma
intersetorial. A materialização das ações intersetoriais, inegavelmente, se realizará no nível local, por meio de ações coletivas, de
troca de saberes e experiências dos diversos atores socais. É nesse nível que a complexidade se expressa nas suas similaridades,
nas suas contradições e nas suas possibilidades.
Segundo Dallari (2005), a Constituição Brasileira de 1988 reafirmou o federalismo como princípio fundamental e norma pétrea
da Constituição. Além disso, como tem sido assinalado pelos teóricos do federalismo brasileiro, foi mantido o tradicional tripé
federativo, ou seja, a existência de três esferas de poder político, com o poder central fixado na União e com estados membros e
municípios, tendo todos eles os atributos da autonomia (idem p. 15).
Em razão da particularidade do modelo federativo brasileiro, a Carta Magna estabelece, de forma extensiva, as competências da
União, estados, municípios e Distrito Federal, nos âmbitos legislativos, administrativos, inclusive o tributário. Para a repartição
das competências, o legislador constituinte observou o princípio da predominância de interesse – cabendo à União as matérias
de predominante interesse geral ou nacional; aos estados os assuntos de predominante interesse regional; aos municípios os
assuntos de interesse local; e ao Distrito Federal a somatória das competências estaduais e municipais. Quanto às espécies,
as competências dos entes federativos são classificadas: no âmbito administrativo, em exclusivas ou comuns; e, no âmbito
legislativo, em exclusivas, privativas, concorrentes ou suplementares.
No campo da política urbana, cabe exclusivamente à União instituir, no âmbito legislativo, as diretrizes para o desenvolvimento
urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos (inciso XX, art. 21 da CF), no qual se insere a Lei nº
11.445/2007. No âmbito administrativo, é competência comum dos entes da federação, entre outras: cuidar da saúde; proteger o
meio ambiente e combater à poluição; promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais
e de saneamento básico (art. 23 da CF). Também no âmbito legislativo, é de competência concorrente entre a União, os estados e
o Distrito Federal legislar sobre a proteção do meio ambiente e o controle da poluição; e sobre a proteção e defesa da saúde (art.
24 da CF), sendo que, nesse caso, a competência da União limita-se a estabelecer normas gerais (§ 1º, art. 24 da CF).
Ainda no âmbito legislativo, a Constituição Federal confere aos estados competência facultativa para instituir “regiões
metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a
organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum” (§ 3º, do art. 25, grifo nosso).
No campo das políticas urbanas, após a Constituição de 88, o poder local saiu fortalecido. Os dispositivos constitucionais conferem
aos municípios competência para: legislar sobre assuntos de interesse local; suplementar a legislação federal e a estadual no
que couber; organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local;
promover, no que couber, o adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da
ocupação do solo urbano (art. 30 da CF).
A repartição das competências dos entes da federação, exclusivas e comuns, aliada aos grandes desafios para o resgate do
déficit social do país, suscitou a necessidade do regramento de novos instrumentos e mecanismos de gestão que possibilitassem
a instituição de organizações administrativas interfederativas capaz de garantir o cumprimento dos preceitos constitucionais.
Assim, em 1998, a Emenda Constitucional nº 19 altera o conteúdo do art. 241 da Constituição para estabelecer que “a União, os
estados, o Distrito Federal e os municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e convênios de cooperação entre
os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos,
serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos”. Porém, só em 2005 é que foram instituídas
as normas gerais que permitem materializar, jurídica e administrativamente, os instrumentos e os organismos de cooperação
federativa previstos nesse dispositivo constitucional, com a edição da Lei nº 11.107/2005, regulamentada pelo Decreto nº
6.017/20076.
A situação dramática e necessidades de toda a ordem, além da incapacidade de investimento da grande maioria dos municípios
brasileiros, para fazer frente às demandas sociais, são fatores que exigiram o estabelecimento dessas novas formas de gestão.
Para Dallari (2006), o Estado ampliou consideravelmente sua participação nas atividades sociais, que, por sua vez, se tornaram
mais complexas e custosas, exigindo modificações na estrutura administrativa e fazendo emergir novos tipos de organização.
Assim, ao lado da administração direta, passou-se a contar com as autarquias, concessões de serviço público, sociedades de
economia mista, empresas estatais, fundações públicas e, ainda, organismos regionais, regiões metropolitanas, cada um com
seu regime jurídico, com maior ou menor grau de subordinação às autoridades governamentais. A gestão associada vem ampliar
o leque de possibilidades da prestação dos serviços públicos.
Para Silva (2004), o consórcio público no ordenamento jurídico brasileiro é um marco histórico para o direito público, em especial
o direito administrativo, caracterizando-se como figura jurídica inovadora que exigirá algum esforço dos operadores do direito
quanto à reformulação de conceitos ligados à teoria dos contratos administrativos. Para Alves (2006), os consórcios surgem como
novo paradigma do direito público quanto aos rumos do federalismo brasileiro.
O Decreto nº 6.017/2007 garantiu maior clareza e segurança jurídica para os consórcios que já estão em funcionamento e para
os que vão ser formados. A Lei nº 11.107/2005 confere aos consórcios públicos personalidade jurídica própria, que pode ser de
direito público ou de direito privado, podendo, assim, ser sujeito de direitos e obrigações. Quando constituído como entidade de
direito público, o consórcio público integra a administração indireta de todos os entes consorciados. No caso de se revestir de
personalidade jurídica de direito privado, o consórcio público observará as normas de direito público no que concerne à realização
de licitação, celebração de contratos, prestação de contas e admissão de pessoal (art. 6º, §§ 1º e 2º, da Lei nº 11.107/2005)
5 As diretrizes da política de desenvolvimento urbano estão consubstanciadas na Lei nº 6.766/1979, que trata do parcelamento do solo urbano, e, especificamente, na Lei nº 10.257/2001
(Estatuto das Cidades).
6 A Lei nº 11.107/2005 e o Decreto nº 6.017/2007 tratam das normas gerais para constituição de consórcios públicos e para a celebração de convênios de cooperação entre
entes federados, para a realização de objetivos de interesse comum, bem como estabelecem a exigência e as normas gerais do contrato de programa, instrumento necessário para
regulamentar “as obrigações que um ente da Federação constituir para com outro ente da Federação ou para com consórcio público no âmbito de gestão associada em que haja a
prestação de serviços públicos ou a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal ou de bens necessários à continuidade dos serviços transferidos” (art. 13, da Lei nº
11.107/2005).
A gestão associada também é prevista na Lei nº 11.445/2007, cujo Capítulo III estabelece as diretrizes para a prestação regionalizada
dos serviços. Nesse caso, a prestação dos serviços é feita por um único prestador, que atende vários municípios, contíguos ou
não, e as atividades de regulação, fiscalização e remuneração dos serviços devem ser uniformes entre os consorciados. As
atividades de regulação e fiscalização podem ser exercidas por órgão ou entidade de ente da federação, constituída dentro dos
limites do respectivo estado, a que o titular tenha delegado o exercício dessas competências por meio de convênio de cooperação,
ou, ainda, por consórcio público de direito público que integre os titulares dos serviços.
No que se refere ao planejamento, tema objeto deste texto, a Lei nº 11.445/2007 estabelece a necessidade da compatibilidade
entre os planejamentos dos municípios consorciados. A lei prevê, ainda, a possibilidade da elaboração de Plano de Saneamento
Básico do serviço regionalizado para o conjunto de municípios consorciados (art. 17). Essa possibilidade, apesar de pertinente
e recomendável, implica cuidados adicionais no processo de planejamento, principalmente para não alijar as populações locais
dos processos de decisão e, ainda, para evitar planos que não levem em consideração as peculiaridades e demandas de cada
município. O Plano de Saneamento elaborado de forma conjunta deve ser criteriosamente conduzido pelos titulares dos serviços
consorciados. Assim, é recomendável que o processo de elaboração desse Plano parta de amplas discussões com os segmentos
sociais, devendo ser assegurada a autonomia política do titular dos serviços, ente da federação com competência de atuar em
assuntos de interesse local.
É importante ressaltar, contudo, que o Plano de Saneamento conjunto do serviço regionalizado não exime os consorciados
titulares de elaborar o Plano Municipal para os quatro segmentos do saneamento básico. Ou seja, a edição e aprovação do Plano
de Saneamento Básico englobando os quatro segmentos e integrando sua parte do plano do serviço regionalizado devem ser
feitas individualmente por cada titular. A referida lei determina, no seu art. 9º, que o titular dos serviços deve formular a respectiva
política pública de saneamento básico, devendo, para tanto, elaborar os Planos de Saneamento Básico, e, no § 1º do art. 19, que
os Planos de Saneamento Básico serão editados pelos titulares, podendo ser elaborados com base em estudos fornecidos pelos
prestadores de cada serviço. Dessa forma, serão resguardados os preceitos constitucionais quanto à autonomia municipal e a
As experiências de consórcios municipais, sob a nova ordem legal, têm estimulado diversos estudos sobre seus limites e
possibilidades. Neves e outros (2006), estudando os consórcios de saúde, ressaltam que essa modalidade de gestão se constitui
em uma alternativa de governança regional, favorecendo novas soluções para a execução de políticas públicas. No entanto,
segundo os autores, os consórcios de saúde têm sido objeto de avaliação quanto a seus resultados, impacto e mecanismos, sendo 29
alvo frequente de polêmicas no âmbito da comunidade acadêmica. Os estudos têm apontado as vantagens para os municípios
consorciados, mas também a necessidade de aprofundar a discussão sobre as razões de sua indução por parte dos agentes
governamentais e a sua real viabilidade, pontos que vêm sendo motivo de controvérsias.
A organização local de cada um dos municípios é apontada pelos autores como um ponto importante para o êxito da parceria
intermunicipal via consórcio. Alves (2006), ao compartilhar com essa visão, afirma que o exercício da autonomia política é requisito
indispensável para que o poder local esteja apto a se consorciar.
Como um dos problemas identificados, os autores ressaltaram a falta de participação na instância de decisão dos consórcios dos
secretários municipais de saúde e também dos usuários e representantes de associações locais (NEVES e outros, 2006).
O estudo de Neves e outros (2006) evidenciou que, no âmbito do setor saúde, o consórcio é um modelo de organização e de
cooperação típico de cidades de pequeno porte que tem sido utilizado para a superação de problemas comuns. Certamente,
as dificuldades dos municípios de pequeno porte quanto aos aspectos de planejamento, regulação e prestação podem explicar
essa tendência (SOUZA, 2001). Bonatto (2004) compartilha com essa ideia e ressalta a possibilidade do uso do consórcio na
gestão de resíduos sólidos, viabilizando a limpeza pública com a integração e qualificação gerencial e com compartilhamento de
infraestruturas operacionais e respectivos custos, especialmente as unidades de destino final, entre outras.
Para Alves (2006), os consórcios terão aplicação em regiões formadas por grupo de municípios ou por municípios e estados que
enfrentam carência de recursos humanos, financeiros e materiais. Por outro lado, o autor acredita que as regiões metropolitanas
vêm requerendo o aperfeiçoamento da cooperação interfederativa de forma a possibilitar a execução de políticas públicas, sendo
o consórcio uma possibilidade de modelo eficiente de governança metropolitana. Para Cunha (2004), diferentes mecanismos de
cooperação e coordenação intergovernamental podem ser instrumento poderoso para o enfrentamento da nova agenda federativa,
em especial a agenda das cidades e do desenvolvimento regional.
A regulamentação dos consórcios públicos pela Lei nº 11.107/2005 e Decreto nº 6.017/2007, aliada à nova conjuntura do
saneamento marcada pela reestruturação institucional, via Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das
Cidades, pela retomada dos investimentos e pela promulgação da Lei nº 11.445/2007, tem estimulado o uso dos consórcios
públicos como alternativa para a racionalização da prestação dos serviços e economia de escala.
Entre os consórcios na área de saneamento, pode-se citar: Consórcio Público Intermunicipal de Saneamento Ambiental do Vale
do Rio Sinos, com 32 municípios; Consórcio Intermunicipal de Saneamento de Serra de Santana – Conisa Serra de Santana/RN,
com o estado e sete municípios; Cisam Meio Oeste SC – Consórcio Intermunicipal de Saneamento Ambiental do Meio Oeste de
O governo federal, por meio do Programa da Modernização do Setor Saneamento – PMSS e da Funasa, tem estimulado o uso de
consórcio público, por compreender que os desafios da área de saneamento passam pela cooperação intermunicipal, em face da
30
fragilidade do poder público municipal no Brasil. A carência de recursos financeiros e humanos, a baixa capacidade institucional
e o desafio da universalização do saneamento são fatores que justificam essa estratégia. Se, por um lado, a gestão associada ou,
dita de outra forma, a parceria público-público, se mostra promissora, principalmente em um ambiente legal e de disponibilidade
de recursos, por outro, a temática merece reflexão, uma vez que as parcerias também exigem novas posturas institucionais, como
o compartilhamento de decisões e de poder, fatores que podem interferir no sucesso ou fracasso dessa iniciativa.
A herança da cultura autoritária nas relações entre o nível federal e estadual com o município, associada ao clientelismo, tem
colocado os municípios reféns de sua própria condição. Alves (2006), ao discutir as fragilidades dos municípios brasileiros, cita
Damião Alves de Azevedo, para quem a tradição centralizadora comprometeu a capacidade dos municípios de exercerem sua
autonomia. Assim, a falta do exercício da autonomia municipal é fator limitador para a prática da parceria e do compartilhamento.
Por outro lado, a gestão associada ou regionalizada de serviços de interesse local, como o saneamento, também exige a adoção
de estratégias para garantir o exercício da cidadania. O deslocamento dos níveis de decisão para esferas mais distantes do
cidadão, do cotidiano da população beneficiária dos serviços, implica perdas para a cidadania local, que passa a ter dificuldades
para interferir nos processos de planejamento, regulação e fiscalização dos serviços.
Essa discussão remete ao debate entre regionalização, descentralização, poder local e democracia, fruto de intensos debates
e controvérsias. Muitos autores têm defendido que, para assuntos de interesse local como a moradia, a escola, a saúde e o
saneamento, o poder local é mais permeável às demandas da população e a participação cidadã. Essa tese também vem sendo
defendida pelos teóricos da Reforma Sanitária e, mais recentemente, da Reforma Urbana, ao ressaltarem a importância do
fortalecimento da autonomia municipal.
Para Leite e Duarte (2005), a descentralização permite a transferência do poder de decisão para níveis mais próximos e permeáveis
à influência dos cidadãos. Para os autores, estruturas governamentais descentralizadas possibilitam a participação cidadã, uma
vez que o centro decisório está mais próximo das populações que serão beneficiadas pelos investimentos públicos. Os autores
citam Crouch (1999) para evidenciar que, “enquanto a elite pode se organizar e participar de decisões em nível nacional, as
massas populares somente podem fazê-lo localmente”. Assim, a descentralização, de forma democrática, favorece a participação
e a identificação das reais necessidades da população, sendo estratégia de inclusão social.
No início da década de 70, a descentralização se colocou como alternativa à crise do Estado do Bem-Estar Social, pois se
acreditava que reduzir o tamanho do aparato organizacional implicaria ganhos em agilidade e maior eficiência na gestão de
políticas sociais compensatórias. Para os neoliberais, o estímulo à descentralização significava promover a redução do papel
do Estado no campo das políticas públicas. Na América Latina dos anos 80, a descentralização era vista como alternativa para
reestruturar o Estado e a gestão das políticas públicas de corte social, tese disseminada em face da exclusão social gerada pelos
governos autoritários, cujas políticas eram impressas pelo governo central (JUNQUEIRA e outros, 1997). A descentralização passa
a ser vista como meio de democratizar e promover a participação social.
No entanto, apesar do fortalecimento do poder local, a transferência de responsabilidades não foi acompanhada com respaldo
fiscal e financeiro. Junqueira e outros (1997) afirmam que é preciso melhorar as condições de governabilidade do nível local, para
que seja possível prestar serviços públicos de qualidade.
Portanto, pode-se concluir que o preceito constitucional que estabelece a competência municipal para assuntos de interesse
local, como o saneamento básico, mostra-se importante na promoção de políticas públicas que visem à universalização do acesso
Milton Santos, grande pensador do território, nos ensina ao afirmar que [...] “é o lugar que dá conta do mundo. Há nele uma
empirização do mundo” [...] (SANTOS, 2000, p. 52). O que nos suscita a pensar que qualquer projeto que busque atuar na
transformação social não pode prescindir do local. Para esse autor, os territórios não são simples recortes de espaços físicos, são 31
uma construção social, produto de uma história, devendo ser visto na sua totalidade, o que envolve aspectos políticos, sociais,
econômicos, culturais, naturais, institucionais, entre outros (SANTOS, 1992). Fisher (1993, p. 11), discutindo poder local, governo
A regionalização, portanto, pressupõe considerar os diferentes territórios em suas diversas dimensões, devendo-se reconhecer a
base social e cultural que se sustentam, para que as identidades sejam preservadas e, consequentemente, a alteridade, elemento
importante para a garantia de processos democráticos e de cidadania. A regionalização não pode ser uma “união compulsória de
alguns municípios limítrofes”, deve-se garantir que as especificidades de cada região sejam consideradas.
Por outro lado, é importante reconhecer o diálogo necessário entre territórios, principalmente no estado federativo, uma vez que
os processos locais, regionais, nacionais e internacionais estão interligados, havendo conexões do local para os níveis superiores
e destes para o nível local. Essas inter-relações, para Fischer (1993, p. 13), envolvem levar em consideração os espaços políticos
locais em si mesmos e sua articulação com o poder mais global “não como simples relação de dominação, [...], mas como um
conjunto de articulações entre coletividades e espaços diversificados”.
Santos (2000), ao distinguir o espaço banal e o espaço das redes e as suas inter-relações, esclarece que o espaço banal é aquele
onde se realiza a vida coletiva, a vizinhança, a coabitação, a coexistência do diverso, onde os ricos, os pobres, os que mandam e
os que não mandam estão presentes, é o que ele define como horizontalidade. Já o espaço de redes representa a verticalidade,
de vetores, que se instalam nos lugares e que pouco se importam com o que está no seu entorno. O local, o espaço banal busca
um sentido e o espaço das redes busca um resultado. Para Santos, será o entendimento dessa dialética dos espaços em que os
movimentos sociais poderiam se inspirar para maior entendimento de suas conexões e determinações.
Brandão (2004), ao realizar análise sobre as teorias, estratégias e as políticas regionais, observa que tem existido um entusiasmo
em todo o mundo pelas questões territoriais, entusiasmo intitulado por ele de “arrebatador”. Para o autor, apesar da pertinência
do retorno do território como objeto de análise, as questões socioespaciais têm sido “vulgarizadas e reduzidas, nesse contexto de
verdadeiro deslumbramento, em que parece que tudo se tornou territorial” (BRANDÃO, 2004, p. 58), sendo solução para todos os
problemas do desenvolvimento. Segundo sua concepção, o território passa a ser o regulador autônomo de relações, com poder
de implementar projetos sociais e políticos, a partir do estabelecimento de consensos que se constituem em pressupostos, e não
como um propósito a ser construído segundo interesses comuns.
O autor chama a atenção para a necessidade de aprofundar o debate teórico sobre os impactos sociais, políticos, institucionais
e econômicos do capitalismo atual no território, com enfoque para as rupturas produzidas e os elementos que persistiram do
período anterior. Na análise de Brandão, ocorreu rebaixamento teórico das abordagens sobre o território. As análises pautadas
na história, na produção social do espaço, nas estruturas e modelos de desenvolvimento, típicas da sociologia e da economia
política, deram lugar a estudos pautados na gestão empreendedora, no marketing municipal, na competitividade entre cidades,
na administração (privada), na economia de escala, entre outros.
Vainer (2003), realizando reflexão sobre a cidade, aponta para a existência de duas utopias que inspiram e orientam projetos
e políticas urbanas: a utopia da cidade-empresa, dirigida pelos empresários, e a utopia da cidade democrática, dirigida pelos
citadinos. Para o autor,
Conforme apontam os urbanistas e pensadores do espaço, o ideal moderno promulgado por pensadores de diversas vertentes
32
teóricas de que o novo lugar, a cidade-nova, ou o planejamento da periferia, ou ainda uma nova racionalidade espacial, seria
capaz de criar uma nova ordem social não passa de uma quimera. Colocando nesses termos, tanto os limites do planejamento
como dos processos de regionalização e de racionalização da gestão ficam devidamente situados em suas reais possibilidades
de transformação da realidade.
O ato de planejar envolve uma série de decisões marcadas por visões sociais de mundo7, muitas vezes antagônicas e em disputa
entre os diversos atores/protagonistas sociais. Assim, o ato de planejar não é neutro, mas carregado de subjetividades intrínsecas
aos sujeitos que participam do processo de planejamento. Isso significa dizer que planejar, principalmente em uma sociedade
marcada por intensas desigualdades sociais, implica desenvolver a capacidade de lidar com conflitos de interesse. Dessa forma,
o planejamento, antes de tudo, é uma ação política.
Planejar pressupõe avaliar o estado presente do objeto para definir o estado futuro desejado
(Figura 1).
TRANSFORMAÇÃO
7 Lowi (1987), ao discutir a questão da ideologia e ciências sociais no mundo contemporâneo, prefere o conceito de “visão social de mundo” ao de “ideologia”, em face das controvérsias
que a chamada pós-modernidade trouxe a esse conceito.
A palavra planejamento tem o sentido de empreendimento, projeto, sonho e intenção. O planejamento revela a vontade de intervir
sobre uma dada realidade em uma determinada direção, a fim de se concretizar alguma intenção. A intenção em si carrega
subjetividades que se relacionam com as visões sociais de mundo, os valores, a cultura, entre outros aspectos. 33
O planejamento é um processo dinâmico e, portanto, deve ser bem diferenciado do plano, fruto de um processo político-social,
dos programas e projetos, que são documentos na forma de relatórios, ou outra forma material de registro, contendo todas as
O processo de planejamento deve considerar a viabilidade política, técnica, econômica, social, ambiental e institucional de sua
própria realização e dos seus produtos, de forma que as ações propostas sejam factíveis e condizentes com a realidade concreta
do município. A viabilidade política envolve considerações sobre o contexto político em que se insere o plano e as possibilidades
concretas de sua execução, a sua capacidade de dialogar e de tratar os diferentes interesses dos protagonistas da cena urbana,
ou seja: políticos, movimentos sociais, ONG, funcionários do aparato estatal e interesses privados.
Na viabilidade técnica, deve-se considerar a disponibilidade de matéria-prima e equipamentos para execução das intervenções;
a adequação das tecnologias propostas à realidade cultural, social e ambiental; e a existência de pessoal capacitado para
desenvolver as ações planejadas. Na viabilidade econômica, devem ser considerados os custos das intervenções propostas, tanto
os de implantação (investimentos) como os de operação e manutenção posterior (despesas de custeio), os recursos disponíveis
e as condições de financiamento desses custos, inclusive a capacidade de geração de receitas próprias e outras fontes e formas
de sustentabilidade ao longo do tempo.
A viabilidade social corresponde ao estudo da compatibilidade dos custos dos programas e projetos a serem implementados com
a realidade socioeconômica local e da população beneficiária, incluída sua capacidade de pagamento. Refere-se ainda à análise
dos impactos sociais da implementação do Plano, principalmente quanto à gentrificação8 que projetos de requalificação urbana
normalmente produzem em face do aumento dos custos das tarifas, taxas e impostos a serem pagos. Na viabilidade ambiental,
são avaliados os impactos do Plano sobre o ambiente físico, o natural e o patrimônio artístico, histórico e cultural. A viabilidade
institucional diz respeito à capacidade de governar, de dispor das estruturas e condições administrativas e legais para realizar e
executar a ação de planejamento (Figura 2).
ECONÔMICA
SOCIOCUL
TURAL
TÉCNICA
ESTUDO DE
VIABILIDADE
POLÍTICA DO PLANO
AMBIENTAL
INSTITUCIONAL
8 Refere-se ao fenômeno urbano de expulsão da população local após ações de requalificação urbana em face do aumento do valor da terra urbana, do aumento de impostos, taxas e
tarifas que impossibilitam que as populações se mantenham no local requalificado.
34 No campo das políticas públicas e do planejamento urbano, algumas questões são essenciais para o processo de planejamento,
a saber:
1. Qual o objeto a ser planejado?
Isso implica certo domínio, saber, conhecimento, sobre o objeto. Suas características, sua história, formas de apropriação pelos
diversos segmentos da sociedade, entre outros. Significa conceituar o objeto, identificando as diversas formas de apropriação
pelos atores sociais, suas similaridades, aproximações e distanciamentos. Significa tomar partido sobre uma concepção em
detrimento de outra. A depender dos pressupostos metodológicos do processo de planejamento, a demarcação do objeto a ser
planejado pode ser tecnocrática, e, portanto, autoritária; ou participativa, ou seja, democrática.
Uma vez que o presente ensaio trata do planejamento no campo do saneamento, o objeto a ser planejado é o saneamento básico,
cuja definição está expressa na Lei nº 11.445/2007 como sendo o conjunto de serviços, infraestruturas e instalações operacionais de:
• abastecimento de água potável: constituído pelas atividades, infra-estruturas e instalações necessárias ao abastecimento
público de água potável, desde a captação até as ligações prediais e respectivos instrumentos de medição;
• esgotamento sanitário: constituído pelas atividades, infraestruturas e instalações operacionais de coleta, transporte,
tratamento e disposição final adequados dos esgotos sanitários, desde as ligações prediais até o seu lançamento final no
meio ambiente;
• limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos: conjunto de atividades, infraestruturas e instalações operacionais de coleta, transporte,
transbordo, tratamento e destino final do lixo doméstico e do lixo originário da varrição e limpeza de logradouros e vias públicas;
• drenagem e manejo das águas pluviais urbanas: conjunto de atividades, infraestruturas e instalações operacionais de
drenagem urbana de águas pluviais, de transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de vazões de cheias,
tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas nas áreas urbanas (BRASIL, 2007, p. 2).
Ou seja, envolve a definição de quem vai participar do planejamento das ações. No Brasil, a herança autoritária e patrimonialista9,
9 Patrimonialismo é um conceito utilizado por Max Weber que visa associar a forma como a autoridade trata a coisa pública como se privada fosse. No Brasil, essa prática social das
elites é marcada pela não demarcação entre a esfera pública e a privada.
Também a participação e o controle social no processo de planejamento estão previstos naquela lei, a qual define o controle social
como um dos princípios fundamentais da prestação dos serviços de saneamento básico (art. 2º, inciso X) e assegura a ampla
divulgação do Plano e de seus estudos, prevendo-se a realização de audiências ou consultas públicas (art. 19, § 5º, inciso V).
O Capítulo VIII da referida lei foi dedicado à participação de órgãos colegiados no controle social, sendo definido que o controle
social pode incluir a participação de órgãos colegiados de caráter consultivo, com representação dos titulares dos serviços, órgãos
governamentais do setor, dos prestadores de serviços, usuários e entidades técnicas, organizações da sociedade civil e de defesa
do consumidor (art. 47)10 .
É importante registrar que a participação e o controle social nas políticas públicas é o resultado de conquistas da sociedade em
nível mundial, a partir da década de 70, no rastro dos movimentos emancipatórios dos anos 60, o que permitiu às democracias
ocidentais incorporar pressupostos da democracia direta, além da representativa. No Brasil, nos anos 80, o fortalecimento dos
movimentos sociais, a abertura política, entre outros fatores, criaram as condições para a aprovação da Constituição Cidadã de
1988 e, a partir daí, a instituição de diversos mecanismos legais que passaram a incorporar a participação dos cidadãos nas
políticas públicas.
A Constituição Federal estabelece, no art. 298, como uma das diretrizes do Sistema Único de Saúde, a participação da comunidade,
o que veio a ser regulamentado pela Lei nº 8.142/1990. A Lei Orgânica da Saúde, confirmando o dispositivo constitucional,
também define a participação da comunidade como um dos princípios do Sistema Único de Saúde (inciso VIII, art. 7º, da Lei nº
8.080/1990). A lei que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos colocou como um dos seus fundamentos a gestão dos
recursos hídricos descentralizada e a participação do poder público, dos usuários e das comunidades (inciso VI, art. 1º, da Lei nº
9.433/1997). O Estatuto das Cidades definiu como uma das diretrizes gerais da política urbana a:
O Estatuto das Cidades define o Plano Diretor como o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana,
e no processo de sua elaboração e fiscalização está prevista a promoção de audiências públicas e debates com a participação
da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade (inciso I, art. 40, da Lei nº 10.257/2001).
Assim, o ambiente legal que passa a regular as políticas públicas no Brasil, após os anos 80, prevê a participação cidadã na
elaboração e acompanhamento das políticas públicas, e a Lei Nacional de Saneamento Básico (Lei nº 11.445/2007) não poderia
deixar de estar em consonância com esse pressuposto.
10 Cabe observar que esse foi um dos pontos de discussão quando da apreciação do Projeto de Lei do Poder Executivo Federal pelo Congresso Nacional. A expectativa era de que a lei
criasse um sistema de saneamento, aos moldes dos existentes nos campos da saúde, dos recursos hídricos e do meio ambiente, com a instituição de conselhos. No entanto, o processo
de negociação no Congresso Nacional fez com que essa intenção fosse abortada. Assim, foi aprovada a indicação, no art. 47, de que o Distrito Federal, os estados e os municípios
poderiam criar conselhos de caráter consultivo. Sendo o saneamento básico assunto de interesse local e tendo o município autonomia para legislar sobre essa temática, conforme define
o art. 30, inciso I, da CF, os municípios podem instituir conselhos, inclusive de caráter deliberativo, o que não infringe a Lei nº 11.445/2007, visto que, nesta matéria, cabe à União apenas
definir as diretrizes gerais sobre as questões de saneamento básico.
Além da definição do objeto a ser planejado e dos sujeitos que participarão do processo de planejamento, o estabelecimento
dos pressupostos, dos princípios sob os quais o planejamento dar-se-á, é tarefa imprescindível para que o Plano seja factível,
realizável e não se torne mais uma peça esquecida na prateleira da burocracia.
São os pressupostos que orientam a elaboração do Plano, eles apontam a direção. A partir deles é que as bases para a promoção
das transformações necessárias são definidas. Os pressupostos se constituem em um conjunto de elementos que conformam um
projeto social. Tal projeto é o produto de disputas de hegemonias e de construção de consensos no seio da sociedade.
O debate sobre os pressupostos que devem sustentar a elaboração do Plano evidencia o caráter político do planejamento. Nessa
perspectiva, a técnica passa a ser um instrumento do planejamento capaz de identificar os meios que serão utilizados para
garantir o êxito do Plano.
No processo de planejamento é desejável que os pressupostos do Plano sejam resultados de discussões com os diversos
segmentos da sociedade. A equipe que coordena o processo de planejamento deve ter a habilidade para conduzir discussões
transparentes e democráticas, considerando as proposições e projetos de cada segmento social. É desejável, ainda, que tais
projetos ganhem visibilidade e fundamentação e sejam avaliados à luz da realidade concreta a ser transformada.
Borja (2002), ao tratar da sustentabilidade no campo do saneamento, identifica a existência de uma disputa pelo conceito de
saneamento que traduz o embate em torno de, no mínimo, dois projetos antagônicos de sociedade. O primeiro acredita nas
capacidades individuais, no mercado, na iniciativa privada, na própria comunidade em promover uma sociedade realista, eficiente,
autossustentável e regulada pelo mercado, tendo como matriz teórica o liberalismo. O segundo projeto aposta na possibilidade de
construir uma sociedade mais ética, solidária, igualitária, pautada em novas relações entre sociedade-natureza, tendo o Estado,
por meio da democracia direta e representativa, a missão de promover a justiça social, cuja matriz teórica se apoia nas teses do
Estado do Bem-Estar Social.
Lima (1997) observa que existem três visões básicas relacionadas às responsabilidades, estratégias e métodos para se atingir
a sustentabilidade do desenvolvimento:
• A visão estatista, que considera a qualidade ambiental um bem público que deve ser normatizado, regulado e promovido pelo
Estado, com complementaridade das demais esferas sociais, em plano secundário (o mercado e a sociedade civil).
• A visão comunitária, que considera que as organizações da sociedade civil devem ter o papel predominante na transição
rumo a uma sociedade sustentável. Fundamenta-se na ideia de que não há desenvolvimento sustentável sem democracia e
participação social, e que a via comunitária é a única que torna isso possível.
• A visão de mercado, que afirma que os mecanismos de mercado e as relações entre produtores e consumidores são os meios
mais eficientes para conduzir e regular a sustentabilidade do desenvolvimento (VIOLA e LEIS, 1995, citados por LIMA,1997).
Tais visões se sustentam em pressupostos diferenciados que conduzem a estratégias diferenciadas de políticas públicas,
principalmente as de cunho social. Assim é que, na visão do mercado, os problemas sociais são fruto das externalidades negativas
do modo de produção capitalista, cabendo ao Estado implementar políticas focalizadas e compensatórias para os segmentos
sociais excluídos. A visão estatal aposta em princípios de justiça social, no dever do Estado de regular a sociedade por meio de
ações planificadas e na implementação de políticas públicas universalizantes e igualitárias. A visão comunitária não acredita na
capacidade do Estado de promover as políticas públicas e confere essa tarefa para a sociedade.
No campo do saneamento, a Lei nº 11.445/2007, produto de pactos de segmentos da sociedade brasileira construído ao longo
de quase duas décadas de discussão, define como princípios fundamentais dos serviços públicos de saneamento básico: a 37
universalização, a integralidade, serviços adequados à saúde pública e à proteção do meio ambiente; adoção de tecnologias
que considerem as peculiaridades locais e regionais; articulação de políticas relacionadas com a área de saneamento básico;
eficiência e sustentabilidade econômica; uso de tecnologias apropriadas, condizentes com a capacidade de pagamento dos
A análise dos princípios citados e do próprio conteúdo da referida lei, aliada à criação do Ministério das Cidades e da Secretaria
Nacional de Saneamento Ambiental, à retomada dos investimentos em ações de saneamento, à aprovação da Lei nº 11.107/2005,
também identificada como a Lei da Parceria Público-Público, e, de outro lado, o incentivo à parceria público-privada com a
aprovação da Lei nº 11.079/2004, sugerem certo pacto social no governo do presidente Lula, no campo do saneamento.
Nesse ambiente, as políticas e seus respectivos Planos de Saneamento Básico podem assumir diversas e até divergentes
orientações. Será o debate no seio da sociedade, principalmente no nível municipal, que dará a tônica dos projetos sociais para
o saneamento no Brasil.
Todo o processo de planejamento envolve a definição de objetivos, que devem estar em consonância com os pressupostos sob
os quais o Plano será elaborado.
A metodologia envolve a definição do método, do caminho a ser adotado para a elaboração do Plano, o que significa a filiação ou
aproximação a alguma das vertentes teóricas do planejamento urbano. Há diversas vertentes teóricas de planejamento urbano.
Para permitir a compreensão dessa diversidade, essas diferentes visões são apresentadas de forma resumida no Quadro 2.
Pensa o todo em relação às partes do ponto de vista dialético. Considera as desigualdades entre as
partes. O mundo é ordenado por uma estrutura, cujas partes devem ser conhecidas para que o todo
possa ser modificado. O planejamento é realizado segundo variáveis estruturais. O planejamento não é
neutro, interage com o objeto a partir da visão social de mundo. Os planos e projetos são expressão da
realidade estruturada. Prevê a regulação do Estado com conteúdos sociais, embora admita influência
Estruturalista
de classe e grupos. Tenta alinhar os grupos que têm preocupações com questões estruturais. Não
(Europa)
afasta o longo prazo. A meta pode ser adaptada no percurso. Baseia-se na práxis, e não na utopia.
Adapta-se à noção de tempo e de recursos.
Viável é o que é desejável, e não o que é possível. Planejamento setorial na perspectiva do planejamento
estratégico. Limite: ideia de que o plano pode controlar a realidade (autores de referência: MARX,
ENGELS).
Crítica ao globalismo e incrementalismo. Planejamento feito pelo próprio interessado, pela comunidade,
Advocacional
em nível local e encaminhado pelo Estado. O planejador funciona como advogado da comunidade.
(comunitário)
Limites: organização comunitária e acesso a recursos (anos 60).
Influência da Teoria Geral dos Sistemas (TGS). O todo é maior que a soma das partes. Visão de totalidade,
Sistêmico das inter-relações. Incorpora a interdisciplinaridade. Aproxima-se da visão estruturalista: em vez de
estrutura, o sistema. Limites: trata os fenômenos da cultura segundo a mesma lógica da natureza.
Influenciada por diversas vertentes do planejamento, tendo maior aproximação com a visão sistêmica.
Inter e transdisciplinar. No final dos anos 80, incorpora a perspectiva da sustentabilidade. Busca pensar
em termos locais e globais. Visão para as presentes e futuras gerações. Já no século XIX, em plena
Ambiental
primeira revolução industrial, foi vislumbrada a escassez de recurso, motivo pelo qual esta vertente do
planejamento defendia a proteção de florestas e rios, a preservação da pureza das águas, do ar e do
solo (FRANCO, 2000).
Com a emergência do movimento social nos anos 80, surge um novo protagonista no processo de
planejamento a sociedade civil organizada (movimentos sociais, sindicatos, ONG, grupos ambientalistas,
Participativo
associações profissionais). Busca a participação crítica e ativa em todas as fases do planejamento
(diagnóstico, análises, elaboração de objetivos, planos e avaliação). Ação de parceria com o Estado.
Fonte: Adaptado de Sampaio (1995).
No Brasil a experiência do planejamento participativo iniciou nos anos 80, quando essa forma passa a ser um referencial de
atuação da administração pública. Tal planejamento prevê a abertura de diálogos entre os diversos atores que produzem a cidade,
superando a abordagem tecnicista. No entanto, esse tipo de planejamento foi e vem sendo praticado de forma restrita e pontual,
pois, além de fragilidades metodológicas, existem ainda dificuldades para a sua implementação efetiva devido a interesses
antagônicos em relação à cidade.
Nesse período, convive-se com duas abordagens de planejamento. Uma baseada nas experiências de planejamento participativo
e outra fundamentada no planejamento estratégico – que sai do âmbito empresarial e chega à administração pública.
Para Kotler (1975), “o planejamento estratégico é uma metodologia gerencial que permite estabelecer a direção a ser seguida
pela Organização, visando maior grau de interação com o ambiente”. Para Ferreira (2003), as ideias que embasam essa forma
de planejar foram disseminadas sob o argumento de que a sobrevivência das cidades ao ambiente competitivo e globalizado da
economia atual estaria condicionada ao atendimento do receituário neoliberal, condicionado a “novas” técnicas de urbanismo,
como o planejamento estratégico. A experiência de Barcelona passa a ser o ícone dessa vertente do planejamento. Esse modo de
planejar vem dar sustentação ao pleno desenvolvimento econômico do mercado, em que a cidade se torna mais uma mercadoria
a ser vendida, em um mercado de extrema competitividade.
Em contrapartida, o planejamento participativo surge com base em algumas experiências de administrações municipais alinhadas
com o ideário de construção de uma cidade mais democrática e justa para todos. Tal planejamento busca incluir a população nas
decisões governamentais, com vistas a superar o caráter excludente do neoliberalismo. Essa prática aumenta o envolvimento,
nos processos de decisão, dos excluídos do direito à cidade, possibilitando a definição de prioridades de cunho mais social. Com
a experiência do planejamento participativo, os papéis entre sociedade e Estado estão sendo reelaborados a partir da cooperação,
para que se estabeleçam pactos que busquem resolver conflitos de interesses.
Os anos 2000 podem ser considerados o marco na construção da Reforma Urbana, com a aprovação do Estatuto das Cidades
(Lei nº 10.257/2001), que estabelece diretrizes gerais da política urbana. O Estatuto cria as condições para a gestão democrática
da cidade, ao estabelecer a instituição dos órgãos colegiados de política urbana e a realização debates, audiências, consultas
públicas e conferências com instâncias e mecanismos de discussão e apreciação dos assuntos de interesse urbano, nos níveis
nacional, estadual e municipal (BRASIL, 2001).
A experiência na implementação do Estatuto das Cidades ainda é muito recente, mas já podem ser identificados problemas,
principalmente quanto à capacidade das administrações municipais superarem a prática do planejamento tecnicista e burocrático
e incorporarem as diretrizes nele previstas quanto à necessidade da abertura de diálogo com a sociedade. Como tratar os
conflitos entre os diferentes projetos para as cidades e os diversos interesses em jogo desponta como um dos grandes desafios.
Por fim, com a crise da ciência moderna, surgem as dúvidas sobre a possibilidade de esse instrumento – o planejamento – ser
40 capaz de dar conta da problemática das cidades. O modelo tecnicista, que se pautava no poder da ciência e se ancorava em
amplos diagnósticos e dados estatísticos, se mostrou incapaz de tratar a realidade complexa da cidade contemporânea (FABIANO,
2005). A crença no controle racional e centralizado dos destinos das políticas públicas urbanas, no molde keyneisiano, é posta em
questão (FERRARI JÚNIOR, 2004). A cidade ideal dos urbanistas e planejadores estava distante da realidade concreta do território
desigual, da política e das contradições de uma sociedade de mercado.
Para Ferreira (1999, p. 50), o legado do planejamento “era uma falácia asséptica, distanciada da práxis e da realidade, ou seja,
da política”. A autora observa que o processo de planejamento possui duplo movimento de alienação: “técnico em relação à
realidade, ao vivido, e do político em relação ao planejamento em si” (FERREIRA, 1999, p. 52). O resultado é a descrença no
planejamento e na sua capacidade de dar respostas aos anseios da sociedade.
Ferrari Júnior (2004) avalia que a função do planejamento pode ser entendida pelo intervencionismo e regulacionismo estatal,
com o intuito de tentar manter as condições favoráveis ao status quo capitalista. Tal interpretação sobre o papel do planejamento
na produção da cidade capitalista toma fôlego com os autores Henri Lefebvre, David Harvey e Manuel Castells. Para Harvey (1980,
p. 174),
Embora já esteja claro que nem a prática nem a execução de planos podem garantir uma sociedade mais justa, uma vez que
ambas dependem de uma ação coletiva mais ampla para a revisão do modelo de reprodução social, certamente, a execução de
planejamento que envolva os diversos atores sociais, que esteja pautado em um diálogo crítico e aberto com a realidade e que
seja elaborado considerando aspectos políticos, ideológicos, culturais e econômicos pode contribuir para a construção de uma
sociedade mais justa.
É importante observar que o planejamento não se encerra no plano, ele se constitui um processo dinâmico que deve ser
periodicamente revisto e reorientado com vistas a atingir os objetivos ou até revê-los. Um bom planejamento deve estar articulado
com as transformações da sociedade, não é uma coisa pronta, imutável, e sim dinâmica, como a própria sociedade. No entanto,
em linhas gerais, podem-se identificar etapas no processo de planejamento, conforme apresentado no Quadro 3.
Tomando como exemplo o abastecimento de água, existem diversos sistemas implantados no Brasil que usam mananciais de
suprimento de água fora dos limites administrativos dos municípios atendidos por eles. No caso, por exemplo, de projeto de
esgotamento sanitário que vise despoluir um recurso hídrico, às vezes, pode ser necessário executar ações em município situado
a montante. Pode-se citar, ainda, o sistema de resíduos sólidos municipal, cujas exigências para a localização do destino final
podem indicar a seleção de área fora do município. Do ponto de vista social, a execução de ações de saneamento, ao melhorar
a salubridade ambiental e as condições de saúde da população, pode desencadear migrações intermunicipais que irão implicar
aumento da demanda de serviços.
Ou seja, o planejamento requer considerar o território municipal e a sua relação com outros territórios, municípios. Assim, é que,
em determinadas situações, o consórcio público entre municípios e/ou plano regional, elaborado considerando as prerrogativas
municipais, mostra-se importante para construir soluções tecnológicas que atendam a mais de um município.
A forte tradição de planejamentos setoriais tem se mostrado inadequada não só por não dar conta de problemas complexos,
mas também por se mostrar imprópria para o novo marco legal, tanto da área de saneamento como de outras da administração
pública, a exemplo de recursos hídricos e saúde.
O esforço da interdisciplinaridade envolve promover o diálogo entre os diversos mecanismos de planejamento existentes. Na área
de saneamento, implica considerar o Plano Diretor Municipal, os Planos de Bacias Hidrográficas, Planos de Manejo de Áreas de
Preservação Permanente, Plano Municipal de Saúde e outros que tenham inter-relação com a área de saneamento. Tais planos
devem ser cuidadosamente avaliados e criticados, considerando a adequação de suas proposições aos pressupostos, diretrizes
e metas definidas para o Plano de Saneamento Básico.
A preocupação com a necessidade de integrar as políticas fez com que a Lei nº 11.445/2007 incorporasse dispositivo que
estimulasse essa integração (inciso VI, art. 2º). Em relação aos recursos hídricos, a lei é mais precisa ao estabelecer, no § 3º do
43
art. 19, que trata do planejamento, que “os Planos de Saneamento Básico deverão ser compatíveis com os Planos das Bacias
Hidrográficas em que estiverem inseridos” (BRASIL, 2007, p. 8).
O diálogo entre os Planos de Bacias e de Saneamento Básico mostra-se extremamente necessário. Uma importante tarefa para a
elaboração do Plano de Saneamento Básico é avaliar as condições presentes e futuras dos mananciais de fornecerem água para
suprimento humano em qualidade e quantidade e, ainda, a capacidade dos recursos hídricos de receberem cargas poluidoras de
resíduos provenientes de estações de tratamento de água e de esgotos sanitários ou de aterros sanitários. Tais elementos são
essenciais para a seleção das alternativas para o Plano de Saneamento Básico com vistas à universalização dos serviços.
É importante ressaltar, também, que tal diálogo implicará facilidades ou dificuldades na implementação do Plano de Saneamento
Básico, por exemplo, nos processos de solicitação de outorga dos direitos de uso de recursos hídricos, tanto para captação de
água como para lançamentos de efluentes líquidos.
Ciente da necessidade da integração entre essas áreas, a Lei de Recursos Hídricos, além de definir o uso prioritário dos recursos
hídricos para consumo humano, quando em situações de escassez, prevê a articulação do “planejamento de recursos hídricos”
com o dos setores usuários e com os planejamentos regional, estadual e nacional (inciso IV, art. 3º). Assim, os prestadores dos
serviços de saneamento, como usuários dos recursos hídricos, devem participar da gestão dos recursos hídricos, participação
essa que se dá via Comitê de Bacia, que têm a competência para aprovar os Planos de Bacias e cuja composição conta com
representantes de usuários.
Outro diálogo imprescindível envolve o campo do planejamento urbano, atividade prevista na Constituição Brasileira de 1988,
por meio da elaboração de Planos Diretores. O Plano Diretor é o instrumento básico da política urbana e deve assegurar a função
social da cidade com o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida e à justiça social (BRASIL, 2001).
O direito ao saneamento ambiental se constitui em uma das diretrizes da política urbana, expressa na Lei nº 10.257/2001.
O Plano Diretor, que deve propor um cenário para o município para um horizonte de dez anos, envolve definições quanto ao uso e
ocupação do solo, o que implica projetar, para espaços da cidade: densidades demográficas; tipologias de ocupação e uso do solo;
além de infraestruturas urbanas, sistema viário e de transporte; e as próprias demandas de serviços de saneamento.
Os Planos Diretores permitem avaliar as demandas em todo o território do município, inclusive de setores das cidades, e verificar a
capacidade da infraestrutura sanitária em água e esgoto instalada, de forma a identificar alternativas de atendimento à população.
No campo da drenagem, a ocupação do solo, os níveis de impermeabilização, o sistema viário, estratégias e normas para a
proteção das áreas de preservação permanentes e para o manejo das águas pluviais ou o amortecimento de cheias, a proteção
de áreas de recarga de aquíferos, entre outros, são pontos de extrema relevância para o manejo das águas pluviais.
44
Assim, a compatibilidade do Plano de Saneamento Básico com o Plano Diretor, e vice-versa, é exigência para o processo de
planejamento que tenha como objetivo garantir o direito à cidade para todos, o que implica saneamento de qualidade com acesso
universal.
No campo da saúde, a Constituição Federal de 1988 estabelece que é competência do Sistema Único de Saúde – SUS a
participação na formulação da política e da execução das ações de saneamento básico (inciso IV, art. 200). A Lei nº 8.080/1990
define a necessidade de articulação das políticas e programas de saúde e saneamento, via Comissões Intersetoriais (inciso II, art.
13). Está também prevista a integração, em nível executivo, das ações de saúde, meio ambiente e saneamento básico (inciso X,
art. 7º). No nível local, a lei define como competência da direção municipal a execução de serviços de saneamento básico (inciso
IV, art. 18)11. O planejamento das ações do SUS se dá por meio da elaboração de Planos de Saúde municipais, estaduais e federal.
Diante desses mecanismos legais, a área de saúde vem desenvolvendo diversas atividades relevantes para a área de saneamento.
Nesse sentido, o Ministério da Saúde, por meio da Coordenação de Vigilância em Saúde Ambiental, da Secretaria de Vigilância em
Saúde, com respaldo da Instrução Normativa nº 1/2005, regulamentou o Subsistema Nacional de Vigilância Ambiental – SINVSA,
extremamente importante para respaldar as ações de planejamento da área de saneamento.
Entre as ações de vigilância, a de maior interesse para a área de saneamento refere-se à qualidade da água para consumo
humano. É competência do Ministério da Saúde estabelecer normas e padrões para a qualidade da água de consumo humano.
O mecanismo legal mais recente que regula essa questão é a Portaria nº 518/2004, do Ministério da Saúde. Assim, cabe às
Secretarias Municipais de Saúde implementar a vigilância da qualidade da água de consumo humano. Para tanto, as secretarias,
com recursos da Programação Pactuada, vêm sendo estruturadas para realizar a capacitação de pessoal; o cadastramento de
sistemas de abastecimento de água; a montagem de laboratórios de analises de água; a realização de coletas e análises de
amostras de água de consumo humano; a alimentação do Sistema de Informação da Qualidade da Água de Consumo Humano
– Sisagua, que também recebe informações do controle da qualidade da água realizado pelos prestadores dos serviços, uma
exigência da Portaria nº 518/2004. Tal sistema possibilita a identificação, via indicadores produzidos, de áreas de risco, para fins
de selecionar as ações mais relevantes e priorizar investimentos no campo da qualidade da água de consumo humano.
Outra atividade relevante da área de saúde vem sendo realizada historicamente pela Fundação Nacional de Saúde – Funasa.
Atualmente, a Fundação vem apoiando os municípios com financiamento de sistemas de abastecimento de água, esgotamento
sanitário, resíduos sólidos e melhorias sanitárias, para municípios com população de até 50.000 habitantes, e drenagem de águas
pluviais em áreas endêmicas de malária. Mais recentemente, tem apoiado a constituição de consórcios intermunicipais e dado
suporte à elaboração de Planos de Saneamento Básico nas regiões em que atua. Nesse sentido, a interlocução dos municípios
com as atividades da Funasa também se mostra estratégica para os processos de planejamento na área de saneamento.
11 Aqui entendido, no sentido mais amplo, tanto da execução quanto da natureza dos serviços de saneamento básico, não se confundindo com a competência para a prestação
(gestão) dos serviços de saneamento básico conforme definido nas diretrizes da Lei nº 11.445/2007, que segue a disposição constitucional do art. 30, inciso V, da CF.
Também na própria área de saneamento, a abordagem setorial deverá ser superada. A prática da área até então tem sido a de
produção de Planos Diretores de abastecimento de água, de esgotamento sanitário, de drenagem urbana ou de resíduos sólidos e
limpeza urbana que não dialogam mesmo entre si. A prioridade dada ao planejamento das ações de água e esgoto, em detrimento
45
das de drenagem e de resíduos sólidos, legado insidioso do Planasa, também deverá ser superada.
46 O grande protagonista da formulação da política pública de saneamento e, consequentemente, do planejamento é o titular dos
serviços, sendo então reafirmado12 o preceito estabelecido no art. 30 da Constituição Federal, a saber:
A lei estabelece a competência do titular dos serviços para a formulação da política pública de saneamento básico, que deverá
envolver:
• a elaboração do Plano de Saneamento Básico;
• a prestação direta ou delegada dos serviços, esta mediante autorização legal e instrumentos contratuais;
• definição do ente responsável pela sua regulação e fiscalização, bem como os procedimentos de sua atuação;
• adoção de parâmetros para a garantia do atendimento essencial à saúde pública, inclusive quanto ao volume mínimo per
capita de água para abastecimento público, observadas as normas nacionais relativas à potabilidade da água;
• fixação dos direitos e deveres dos usuários;
• estabelecimento de mecanismos de controle social;
• estabelecimento de sistema de informações sobre os serviços, articulado com o Sistema Nacional de Informações em
Saneamento Básico – Sinisa;
• intervenção e retomada da operação dos serviços delegados, por indicação da entidade reguladora, nos casos e condições
previstos em lei e nos documentos contratuais.
Conforme o art. 19º da referida lei, a prestação dos serviços de saneamento básico observará plano que poderá ser específico
para cada serviço e abrangerá, no mínimo:
• diagnóstico da situação e de seus impactos nas condições de vida, utilizando sistema de indicadores sanitários,
epidemiológicos, ambientais e socioeconômicos e apontando as causas das deficiências detectadas;
• objetivos e metas de curto, médio e longo prazos para a universalização, admitidas soluções graduais e progressivas,
observando a compatibilidade com os demais planos setoriais;
• programas, projetos e ações necessárias para atingir os objetivos e as metas, de modo compatível com os respectivos planos
plurianuais e com outros planos governamentais correlatos, identificando possíveis fontes de financiamento;
• ações para emergências e contingências;
• mecanismos e procedimentos para a avaliação sistemática da eficiência e eficácia das ações programadas.
12
Como a Constituição também prevê, no § 3º do art. 25, que os estados, mediante lei complementar, podem fixar normas para a integração das funções públicas de interesse comum, ao
instituir regiões metropolitanas, microrregiões e aglomerações urbanas, passou a haver um conflito na interpretação da titularidade dos serviços em áreas metropolitanas, aglomerados
urbanos e microrregiões. Atualmente, o Supremo Tribunal Federal - STF está analisando duas Ações de Inconstitucionalidade que deverão dirimir tal conflito de interpretação. Uma
vez que as referidas ações ainda não tinham sido votadas no STF, a estratégia adotada foi tratar na Lei nº 11.445/2007 apenas do titular, que pode ser lido como município, estado ou
Distrito Federal.
A programação das ações e dos investimentos necessários para a prestação universal, integral e atualizada dos serviços deve ser
definida com base no estado de salubridade ambiental e nos níveis de prestação dos serviços públicos.
47
Visando possibilitar o pleno exercício da titularidade na gestão dos serviços e a consonância entre titular e prestador dos serviços,
Os planos deverão estar compatíveis com os Planos das Bacias Hidrográficas em que estiverem inseridos. E, em consonância
com o princípio da transparência das ações e do controle social, as propostas dos Planos de Saneamento Básico e dos estudos
que as fundamentam deverão ser amplamente divulgadas, inclusive com a realização de audiências ou consultas públicas
(§ 5º, art. 19).
• os Planos de Saneamento Básico deverão ser revistos periodicamente, em prazo não superior a quatro anos, antes da
elaboração do Plano Plurianual, devendo englobar integralmente o território do ente da federação que o elaborou, exceto
quando ele for regional (art. 19, §§ 4º e 8º); e
• cabe à entidade reguladora e fiscalizadora dos serviços a responsabilidade da verificação do cumprimento dos Planos de
Saneamento Básico por parte dos prestadores de serviços, na forma das disposições legais, regulamentares e contratuais.
E, assim, tem-se bem clara a importância do Plano de Saneamento Básico no novo ordenamento legal, que, além de ser
instrumento importante para o planejamento, a organização, a regulação, a fiscalização e a prestação dos serviços, torna-se
também elemento essencial de avaliação da gestão dos serviços e instrumento indispensável para o acesso a financiamentos
com recursos da União ou com recursos geridos ou operados por órgãos ou entidades da União (art. 50, da Lei nº 11.445/2007).
Conforme Decreto nº 7.217/2010, que regulamenta a Lei nº 11.445/2007, a partir do exercício financeiro de 2014, o acesso a tais
recursos, quando destinados a serviços de saneamento básico, estará condicionado à existência de plano de saneamento básico
elaborado pelo titular dos serviços.
48 ALVES, Vladmir. Comentários à lei dos Consórcios Públicos Lei Federal nº 11.107, de 06 de abril de 2005: Gestão Associada e
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Clênio Argolo
João Batista Peixoto
João Carlos Machado
Tatiana Santana Timóteo Pereira
Alexandre Araújo Godeiro Carlos
Otávio Silveira Gravina
Gabriella Pereira Giacomazzo
Brasília - 2011
A presente Peça Técnica se insere no esforço da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades de
apoiar os municípios brasileiros nos processos de elaboração de Planos de Saneamento Básico, hoje uma exigência da Lei nº
11.445/2007, que institui as diretrizes nacionais para o saneamento básico no Brasil.
Ao longo de cinco itens, são abordados aspectos relativos à ação de planejamento, aos pressupostos e princípios que devem
fundamentar a elaboração de um plano de saneamento, além de realizar orientações quanto aos aspectos metodológicos de
elaboração de Planos.
57
Esta lei, ao regular a prestação dos serviços, define quatro funções de gestão: o planejamento, ação indelegável a outro ente; a
prestação dos serviços; a regulação e a fiscalização, estas últimas passíveis de delegação (art. 8º). Em todas as funções de gestão
deve haver o controle social, de forma a atender ao princípio fundamental estabelecido no inciso X, do art. 2º desta Lei (BRASIL,
2007).
Segundo essa norma legal, cabe ao titular dos serviços formular a respectiva política pública de saneamento básico, devendo, 59
para tanto, elaborar o Plano de Saneamento Básico, conforme a primeira diretriz do seu art. 9º. O Plano assume, assim, uma
posição central na política para a prestação dos serviços, sendo sua existência condição indispensável para:
• a validade dos contratos de delegação da prestação dos serviços (inciso I, do art. 11);
Diante do exposto, nota-se que o grande protagonista do cenário atual do saneamento básico no Brasil é o poder local, o município,
que com a Lei nº 11.445/2007 passa a contar com o suporte legal para exercer a titularidade na prestação dos serviços, conforme
preconizou a Constituição Federal, há 20 anos, ao definir a competência municipal para “organizar e prestar, diretamente ou sob
regime de concessão ou permissão, sempre por meio de licitação, os serviços públicos de interesse local” (BRASIL, 1988, s.p).
Segundo a lei (art. 9º), a política pública de saneamento básico deve envolver:
• a elaboração do Plano de Saneamento Básico;
• a prestação direta ou delegada dos serviços, esta mediante autorização legal e instrumentos contratuais;
• efinição do ente responsável pela sua regulação e fiscalização, bem como os procedimentos de sua atuação;
• adoção de parâmetros para a garantia do atendimento essencial à saúde pública, inclusive quanto ao volume mínimo per
capita de água para abastecimento público, observadas as normas nacionais relativas à potabilidade da água;
• fixação dos direitos e deveres dos usuários;
• estabelecimento de mecanismos de controle social;
• estabelecimento de sistema de informações sobre os serviços, articulado com o Sistema Nacional de Informações em
Saneamento Básico – Sinisa;
• definição das hipóteses de intervenção ou de extinção da delegação e das condições para retomada da operação dos serviços
delegados, por indicação da entidade reguladora, nos casos e condições previstos em lei e nos documentos contratuais.
O processo de elaboração do Plano de Saneamento Básico deve, portanto, contemplar pelo menos os aspectos relativos a:
• realização de diagnósticos e estudos específicos, se for o caso;
• definição de princípios e diretrizes que o orientam;
• definição e proposição dos objetivos e metas, que podem ser graduais e progressivas ao longo da execução do plano;
• determinação das áreas e ações prioritárias para intervenção e dos investimentos necessários, considerando as diferentes
componentes do saneamento básico;
• formulação dos programas e projetos e das condições de sua execução para o atendimento universal e de qualidade;
60 • organização institucional, administrativa e operacional para a prestação, regulação, fiscalização e avaliação da prestação dos
serviços;
• regulamentação legal e jurídico-administrativa da gestão1 , incluídos os atos normativos de regulação, os instrumentos de
delegação da prestação e/ou da regulação e fiscalização, se o caso, e os procedimentos administrativos.
A programação das ações e dos investimentos necessários para a prestação universal, integral e adequada dos serviços deve ser
definida com base no estado de salubridade ambiental e nos indicadores quantitativos e qualitativos da prestação dos
serviços públicos.
Segundo a Lei nº 11.445/2007, os Planos de Saneamento Básico deverão ser revistos periodicamente, em prazo não superior a
quatro anos, antes da elaboração do Plano Plurianual, devendo englobar integralmente o território do ente da Federação que o
elaborou, exceto quando o mesmo for regional.
Os planos deverão ser editados pelos titulares, podendo ser elaborados com base em estudos fornecidos pelos prestadores de cada
serviço. No caso da elaboração de planos específicos para cada componente do saneamento, a consolidação e compatibilização
devem ser efetuadas pelo titular. Mesmo no caso de delegação dos serviços, o prestador deverá cumprir o Plano de Saneamento
Básico em vigor.
Os Planos de Saneamento Básico deverão ser compatíveis com os planos das bacias hidrográficas em que estiverem inseridos.
Em consonância com o princípio da transparência das ações e do controle social, as propostas dos planos e os estudos que as
fundamentam devem ser amplamente divulgados, inclusive com a realização de audiências ou consultas públicas (§ 5º, art. 19). A
referida lei determina ainda, no art. 51, que “o processo de elaboração ou de revisão dos planos deverá prever o recebimento de
sugestões e críticas por meio de consulta ou audiência pública e, quando previsto na legislação do titular, a análise e opinião de
órgão colegiado...” a que competir as atribuições de controle social. A divulgação do Plano e dos estudos deve ser feita por meio
da disponibilização integral de seu teor a todos os interessados, inclusive por meio da internet e por audiência pública.
Nos serviços regionalizados, ou seja, quando houver um único prestador do serviço para vários municípios, contíguos ou não,
deverá haver compatibilidade de planejamento dos respectivos planos municipais. Neste caso, poderá ser elaborado um Plano
para o conjunto de municípios atendidos (art. 17).
Conforme a Resolução nº 33/2007, do Conselho Nacional das Cidades, os Planos de Saneamento Básico devem ser elaborados
pelos municípios brasileiros até dezembro de 2010. Ciente do grande desafio, o Ministério das Cidades, por meio da Secretaria
Nacional de Saneamento Ambiental – SNSA, vem empreendendo esforços no sentido de apoiar os municípios na elaboração dos
seus Planos de Saneamento Básico e a presente Peça Técnica visa contribuir neste processo.
1 Gestão aqui entendida como as funções de planejamento, organização, regulação, fiscalização e prestação dos serviços.
2 Conforme definição do PL nº 5.296/2005, do Executivo Federal, que resultou na Lei nº 11.445/2007, salubridade ambiental é entendida como: qualidade das condições (ou estado de
higidez) em que vivem populações urbanas e rurais no que diz respeito à sua capacidade de inibir, prevenir ou impedir a ocorrência de doenças relacionadas com o meio ambiente, bem
como de favorecer o pleno gozo da saúde e o bem-estar (BRASIL, 2005).
A Lei nº 7.750/1992, do estado de São Paulo, define salubridade ambiental como: a qualidade ambiental capaz de prevenir a ocorrência de doenças veiculadas pelo meio ambiente e de
promover o aperfeiçoamento das condições mesológicas favoráveis à saúde da população urbana e rural (SÃO PAULO, 1992).
TRANSFORMAÇÃO
61
Estado presente Estado futuro
O estado presente é avaliado por meio de um diagnóstico do objeto a ser planejado, devendo envolver os diferentes sujeitos:
técnicos, gestores e sociedade civil organizada. Para definir o estado desejado, devem ser estabelecidos os princípios, diretrizes,
objetivos, metas e programas capazes de promover a transformação desejada.
A palavra planejamento tem o sentido de empreendimento, projeto, sonho e intenção. O planejamento revela a vontade de intervir
sobre uma dada realidade em uma determinada direção, a fim de se concretizar alguma intenção. A intenção em si carrega
subjetividades que se relacionam com as visões sociais de mundo, os valores, a cultura, dentre outros aspectos.
Assim, planejar é um ato “político, dialógico, de construção e realização de uma vontade coletiva de superação, de humanização
e de convivência profunda com a cidade” (GÓIS, 2003, p. 1), e não um ato de submeter tecnicamente a cidade aos interesses de
grupos e classes.
O processo de planejamento deve considerar a sua viabilidade política, técnica, econômica, sociocultural, ambiental e institucional
de sua própria realização e dos seus produtos, de forma que as ações propostas sejam factíveis e condizentes com a realidade
concreta do município. A viabilidade política envolve considerações sobre o contexto político em que se insere o plano e as
possibilidades concretas de sua execução, a capacidade de dialogar e de tratar os diferentes interesses dos protagonistas da cena
urbana, ou seja: políticos, movimentos sociais, ONGs, funcionários do aparato estatal e interesses privados.
Na viabilidade técnica, deve-se considerar a disponibilidade de matéria-prima e equipamentos para execução das intervenções;
a adequação das tecnologias propostas à realidade cultural, social e ambiental; e a existência de pessoal capacitado para
desenvolver as ações planejadas. Na viabilidade econômica, devem ser considerados os custos das intervenções propostas, tanto
os de implantação (investimentos) como os de operação e manutenção posterior (despesas de custeio), os recursos disponíveis
e as condições de financiamento desses custos, inclusive a capacidade de geração de receitas próprias e outras fontes e formas
de sustentabilidade ao longo do tempo.
A viabilidade sociocultural corresponde ao estudo da compatibilidade dos custos dos programas e projetos a serem implementados
com a realidade socioeconômica local e da população beneficiária, incluída sua capacidade de pagamento. Refere-se ainda à
ECONÔMICA
SOCIOCUL
TURAL
TÉCNICA
62 ESTUDO DE
VIABILIDADE
POLÍTICA DO PLANO
AMBIENTAL
INSTITUCIONAL
Considerando que não se planeja algo que não se conhece, o ato de planejar pressupõe certo domínio e conhecimento sobre o
objeto. Isso não quer dizer apenas domínio das técnicas, mas também do seu conceito, da sua história, das políticas públicas que
trataram do objeto, dos fatores políticos, econômicos, sociais, culturais e técnicos que determinaram o estado presente do objeto.
Significa, ainda, tomar ciência do conhecimento prático, da vivência das populações frente ao objeto.
No Brasil, o conceito de saneamento básico, o objeto de planejamento abordado neste texto, sempre foi tratado segundo as
Refere-se ao fenômeno urbano de expulsão da população local após ações de requalificação urbana em face do aumento do valor da terra urbana, do aumento de impostos, taxas e
tarifas que impossibilitam que as populações se mantenham no local requalificado.
No Brasil, principalmente no nível municipal, ainda predomina a visão de que o ato de planejar é uma ação que está sob o domínio
dos técnicos, que são capazes de avaliar a realidade e projetá-la para o futuro. Essa perspectiva, no entanto, desconhece um dado
de realidade: as políticas, os projetos, as obras, as ações são definidas no campo da política, sendo a técnica o instrumento de
realização. Sendo o planejamento um ato político, em um processo democrático o ato de planejar deve envolver os diversos atores
sociais, entre eles, associações de moradores, entidades de profissionais liberais, sindicatos, ONGs e entidades representativas
dos setores econômicos privados. Caberá a tais sujeitos, com suas visões sociais de mundo, travar discussões em torno de seus
projetos no campo do saneamento básico de forma a vir a compor o Plano Municipal de Saneamento Básico. Com isso, nesse
momento, o poder local torna-se o grande protagonista das políticas públicas de saneamento básico no Brasil.
Considerando a necessidade de que os sujeitos do processo de planejamento ampliem o seu conhecimento sobre o objeto a ser
planejado – o saneamento básico –, é importante que, durante a elaboração do Plano, sejam promovidas discussões, palestras e
outros eventos educativos sobre saneamento. A realização de oficinas de capacitação de gestores, técnicos e de representantes
da sociedade civil organizada, a exemplo das que vêm sendo realizadas pela Rede de Capacitação e Extensão Tecnológica em
Saneamento Ambiental – ReCESA, se constitui em uma alternativa importante a ser considerada para a capacitação dos sujeitos
envolvidos no processo de elaboração do Plano de Saneamento Básico.
São os pressupostos que orientam a elaboração do Plano, eles apontam a direção. A partir deles é que as bases para a promoção
das transformações necessárias são definidas. Os pressupostos se constituem em um conjunto de elementos que conformam um
Um item fundamental do processo de planejamento é a definição de seus objetivos. Ou seja, é preciso dar resposta às seguintes
questões: qual o alvo do Plano? Para que o Plano será realizado? Onde se pretende chegar?
Segundo a Lei nº 11.445/2007, o Plano de Saneamento Básico deve definir os “objetivos e metas de curto, médio e longo prazos
para a universalização, admitidas soluções graduais e progressivas, observando a compatibilidade com os demais planos setoriais”
(art. 19, II). Para tanto, devem ser definidos programas, projetos e ações compatíveis com os respectivos planos plurianuais e com
outros planos governamentais correlatos.
A metodologia envolve a definição do caminho a ser adotado para a elaboração do Plano, o que significa a filiação ou aproximação
a alguma das vertentes teóricas do planejamento urbano.
Uma vez que a Lei nº 11.445/2007 estabelece o controle social como um dos princípios fundamentais da prestação dos serviços
de saneamento básico, assegurando a ampla divulgação das propostas dos Planos de Saneamento Básico e dos estudos que
as fundamentam, o recebimento de sugestões e críticas por meio de audiências ou consultas públicas e sua análise por órgão
colegiado com representação da sociedade organizada, o enfoque no planejamento participativo para a elaboração do Plano é o
mais indicado.
O planejamento participativo no Brasil surge com base em algumas experiências de administrações municipais alinhadas com o
ideário de construção de uma cidade mais democrática e justa para todos. Tal planejamento busca incluir a população nas decisões
governamentais, com vistas a superar o enfoque tecnicista do planejamento tradicional. Essa prática aumenta o envolvimento das
populações nos processos de decisão, possibilitando a definição de prioridades mais voltadas para as reais necessidades sociais.
A Figura 3 sintetiza a visão atual sobre a natureza das ações de saneamento básico.
Saneamento
básico
Planos de Saneamento Básico que visem a transformações substanciais, que sejam inclusivos e pautados em princípios de
justiça social, devem estar embasados nos pressupostos enunciados para que, mediante processos participativos capazes de
estabelecer pactos junto aos diferentes segmentos sociais, possam se constituir no meio de garantir saneamento de qualidade
para todos.
São relevantes e devem ser considerados na construção dos Planos Municipais de Saneamento Básico os fundamentos, princípios,
diretrizes e objetivos enumerados a seguir.
66
Da Constituição Federal (1988)
• A cidadania e a dignidade da pessoa humana como fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º);
• A erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais, como objetivos fundamentais
da Nação (art. 3º);
• A saúde como direito de todos e dever do Estado, garantida mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação (arts. 6º e 196).
• A moradia digna, garantida pelo direito social ao trabalho e pelas políticas públicas de promoção da construção de moradias,
da melhoria das condições habitacionais, do saneamento básico, do desenvolvimento urbano fundado no adequado
ordenamento territorial e das funções sociais da cidade (arts. 6º, 23, 30 e 182);
• A participação da comunidade na organização do Sistema Único de Saúde e, por meio deste, na discussão e planejamento
das ações e serviços de saúde e na formulação da política e na execução das ações de saneamento básico (arts. 198 e 200);
• O direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade
de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações (art. 225); e
• A promoção da educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio
ambiente (art. 225).
4 Item retirado do Termo de Referência para Apoio à Elaboração de Planos Municipais e Regionais de Saneamento Básico, elaborado pelo Ministério das Cidades, sob a coordenação de
João Carlos Machado. Da Política Urbana (Lei nº 10.257/2001 - Estatuto das Cidades)
A Política Pública de Saneamento Básico deverá dispor, entre outros temas, sobre as formas como serão exercidas as funções de
gestão (planejamento, regulação, organização, prestação e fiscalização) dos serviços e, ainda, sobre os mecanismos de garantia
do atendimento essencial à saúde pública, os direitos e deveres dos usuários, o controle social e o sistema de informação.
É importante observar, contudo, que tais objetivos são indicativos, definidos a partir da história recente do setor de saneamento e
da realidade brasileira, devendo ser objeto de discussão e reflexão no nível local. É de se esperar que, no processo de discussão
no nível municipal, surjam objetivos mais voltados para as realidades locais, situação que deve ser estimulada, principalmente
em um processo democrático.
68 • Definir os instrumentos da gestão5 , os objetivos, as diretrizes e as metas para a universalização do acesso aos serviços
de saneamento básico com qualidade; os programas, os projetos e as ações; os investimentos correspondentes e sua
inserção no PPA e no orçamento de programas municipais; os instrumentos e canais da participação e controle social e os
mecanismos de monitoramento e avaliação do Plano.
• Definir as diretrizes para prestação dos serviços de saneamento básico, conforme os princípios da universalização, da
integralidade das ações, da segurança, qualidade e regularidade, das ações intersetoriais e da sustentabilidade ambiental,
social e econômica.
• Estabelecer os responsáveis e competências quanto ao planejamento, à prestação, à regulação e à fiscalização das ações de
saneamento básico, com participação e controle social, atendendo aos princípios da Lei Nacional de Saneamento Básico (Lei
nº 1.445/2007) e do Estatuto das Cidades (Lei nº 10.257/2001).
• Definir as metas físicas e financeiras baseadas nos indicadores quantitativos e qualitativos das condições sanitárias,
epidemiológicas, ambientais e socioeconômicas e nas características locais, resultantes dos diagnósticos da situação dos
serviços de saneamento básico; definir os critérios para a priorização dos investimentos, em especial para o atendimento à
população de baixa renda.
• Promover a melhoria da saúde pública e da salubridade ambiental, o direito à cidade, a proteção dos recursos hídricos, a
sustentabilidade ambiental e o desenvolvimento social local.
Conforme as características e condições locais, são objetivos específicos do Plano Municipal de Saneamento Básico, a serem
buscados de forma gradual:
• Estabelecer a adequada articulação institucional dos atores públicos, sociais e privados e demais segmentos organizados da
sociedade que atuam nos quatro componentes dos serviços públicos do saneamento básico;
• Estabelecer os mecanismos e instrumentos para a adequada articulação do planejamento e da prestação dos serviços de
saneamento básico com:
as estratégias e objetivos da política urbana, considerando o Plano Diretor, os Planos de Habitação e os Planos de Mobilidade
Urbana; e
5 De acordo com a Lei nº 11.445/2007, as funções de gestão dos serviços de saneamento básico envolvem o planejamento, indelegável a outro ente, a prestação dos serviços, a
regulação e a fiscalização, devendo-se assegurar o controle social de todas as funções.
Conforme as especificidades locais, os Planos deverão incluir, ainda, os seguintes objetivos específicos:
• Definir diretrizes e ações para promover a redução na geração de resíduos sólidos, orientadas para a adoção de práticas de
reutilização e de reciclagem, e soluções de tratamento e disposição final adequada, bem como as ações para promover a
inclusão social e econômica de catadores de materiais recicláveis;
• Estabelecer as diretrizes e ações para o manejo sustentável das águas pluviais urbanas, considerando normas e critérios
de uso e ocupação do solo; de minimização de áreas impermeáveis; de controle do desmatamento e processos de erosão
e assoreamento; de criação de alternativas de infiltração das águas no solo; de recomposição da vegetação ciliar de rios
urbanos; e da captação de águas de chuva para detenção e/ou reaproveitamento, com vistas a reduzir os riscos de enchentes,
inundações, deslizamentos de encostas e erosões. Prever, conforme as necessidades locais, a elaboração do Plano Municipal
de Redução de Riscos7;.
• Estabelecer diretrizes para implantação de sistema de monitoramento hidrológico visando minimizar os riscos associados à
6 Tecnologias sociais: são técnicas e metodologias transformadoras, desenvolvidas na interação com a população, que representam soluções para a inclusão social. Consultar o Guia para
a Elaboração de Políticas Municipais de Prevenção de Riscos de Deslizamento de Encostas. Secretaria Nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades.
7 Consultar o Guia para a Elaboração de Políticas Municipais de Prevenção de Riscos de Deslizamento de Encostas. Secretaria Nacional de Programas Urbanos do Ministério das
Cidades.
70
• Assegurar o controle social, um dos princípios fundamentais da Lei Nacional de Saneamento Básico, garantindo-se à
sociedade informações, representações técnicas e participação nos processos de formulação de políticas, de planejamento
e de avaliação.
71
• Promoção de processo democrático e participativo de elaboração do PMSB, de forma que o Plano venha refletir as necessidades
e anseios da sociedade local e ao mesmo tempo atingir sua função social.
• Definição dos meios de divulgação e de acesso às informações do PMSB, com linguagem acessível a todos os segmentos
• Promoção da integração das propostas do PMSB aos objetivos e diretrizes do Plano Diretor Municipal, no que couber.
• Promoção da integração das propostas do PMSB aos demais planos locais e regionais das políticas de saúde, habitação,
mobilidade, meio ambiente, recursos hídricos, prevenção de risco e inclusão social.
• Quando não existirem quaisquer desses planos, promover no âmbito do PMSB as discussões dos temas comuns e vinculantes
entre eles para a formulação e proposição das respectivas ações, visando inibir posteriores incompatibilidades e, ao mesmo
tempo, induzir os atores envolvidos a elaborar os referidos planos.
Portanto, a complexidade da formulação e condução desse processo requer o seu próprio planejamento, de forma metodológica
e criteriosa, para que todos os aspectos tratados anteriormente sejam satisfatoriamente contemplados e também para facilitar a
superação das dificuldades inerentes à sua realização.
73
O planejamento do processo de elaboração do PMSB pode ser dividido em três fases8 , as quais, por sua vez, podem ser
subdivididas em oito etapas, conforme mostra o quadro a seguir.
Esta fase compreende uma única etapa formada pelas atividades preparatórias para a elaboração propriamente dita do PMSB,
que podem ser resumidas nas seguintes ações: organização administrativa do processo de elaboração do PMSB, instituição do
processo de participação social, formulação preliminar dos princípios, diretrizes e objetivos, e elaboração do Termo de Referência
do PMSB (TdR).
8 Para efeito didático, o termo “fase” é utilizado aqui para designar a sequência temporal ou de encadeamento do fluxo de execução em que se divide o processo, cada fase pode conter
uma ou mais etapas, ou mesmo uma só atividade. O termo “etapa” designa cada conjunto ou grupo de atividades que compõem o processo – o critério de agrupamento pode ser: por
afinidade, interdependência, simultaneidade ou sequência das atividades ou tarefas, ou por outro critério característico de cada processo ou projeto.
A primeira medida do poder público municipal para iniciar o processo de elaboração do PMSB é tomar as providências
administrativas para a constituição da organização institucional e administrativa que dirigirá a sua execução. Para isso, sugere-se
a criação de duas instâncias: o Comitê de Coordenação e o Comitê Executivo.
O Comitê de Coordenação é uma instância de gestão e deliberativa, formalmente institucionalizada por atos do Executivo municipal,
responsável pela coordenação, condução e acompanhamento da elaboração do Plano, a ser constituída por representantes, com
função dirigente, das instituições públicas e civis relacionadas ao saneamento básico, inclusive dos prestadores de serviços
delegados. É recomendável que o Comitê inclua representantes dos Conselhos Municipais da Cidade, de Saneamento, de Saúde, de
Meio Ambiente, caso existam, e representantes das organizações da sociedade civil atuantes no município (profissionais liberais,
74 representantes sindicais e empresariais, movimentos sociais e ONGs), sendo desejável o acompanhamento de representantes da
Câmara de Vereadores e do Ministério Público.
O Comitê de Coordenação deve ser constituído independentemente da forma como serão conduzidas e realizadas as funções
executivas de elaboração do PMSB. Nos municípios em houver órgãos colegiados constituídos com atribuições de regulação de
todos os serviços de saneamento básico, o Comitê de Coordenação pode ser o próprio órgão.
O Comitê Executivo, por sua vez, é uma instância técnica responsável pela operacionalização do processo de elaboração do
PMSB. Deve ter uma composição multidisciplinar e incluir técnicos dos órgãos e entidades municipais da área de saneamento
básico e áreas afins ao tema (saúde, habitação, infraestrutura urbana, meio ambiente, educação, etc.), devendo suas atividades
ser acompanhadas por representantes dos prestadores de serviços delegados e da sociedade civil organizada.
Caso a administração municipal não disponha de técnicos qualificados em todas as áreas disciplinares e/ou em número suficiente
para compor o Comitê, o mesmo poderá contar com a participação de profissionais contratados ou cedidos, especificamente
para este fim, por instituições conveniadas, inclusive universidades, entidade reguladora delegada e outros entes da Federação.
Compete ao Comitê Executivo conduzir ou realizar diretamente todas as atividades de elaboração do PMSB previstos nas
respectivas etapas (Etapas 2 a 7 do Quadro 1).
As atribuições do Comitê Executivo não devem ser delegadas a instituições que não estejam diretamente vinculadas à
administração municipal, independentemente de sua natureza, sem prejuízo da complementação da equipe do Comitê Executivo
com profissionais contratados ou cedidos por estas instituições, tendo em vista que o processo de elaboração do PMSB se
constitui na oportunidade ímpar de formação e/ou de qualificação de quadro próprio para o exercício das funções de gestão dos
serviços de saneamento básico. 75
No assessoramento ao Comitê Executivo – conforme as especificidades e necessidades locais – poderão ser constituídos Grupos
É recomendável a busca de cooperação junto a outros processos locais de mobilização e ação para assuntos de interesse
convergente com o saneamento básico, tais como: Agenda 21 Local; Coletivos Educadores Ambientais; Conselhos Comunitários
e Câmaras Técnicas de Comitês de Bacia Hidrográfica.
É desejável que os Comitês, uma vez constituídos, passem por um processo de capacitação, de forma a ampliar, atualizar e
equalizar os conhecimentos sobre o objeto a ser planejado – o saneamento básico (ver item 2). Essa estratégia mostra-se
relevante para que os conteúdos históricos, políticos e técnicos sobre o saneamento básico possam ser discutidos, permitindo
uma melhor qualificação da equipe que conduzirá o processo de elaboração do PMSB. As universidades e ONGs podem contribuir
neste processo de capacitação, inclusive o Programa de Capacitação e Extensão Tecnológica em Saneamento Ambiental –
ReCESA, do Ministério das Cidades.
A metodologia de elaboração do Plano Municipal de Saneamento Básico deve buscar assegurar a participação social, atendendo
ao princípio fundamental do controle social da Política Nacional de Saneamento Básico. Para isso, as propostas dos Planos de
Saneamento Básico e dos estudos que os fundamentam devem ser amplamente divulgadas e, além disso, devem ser realizadas
audiências e/ou consultas públicas, como previsto no § 5º, art. 19, da Lei nº 11.445/2007.
A participação social se constitui em instrumento de democratização da gestão pública, propiciando o aperfeiçoamento contínuo
das políticas e serviços públicos e a adequação destes às necessidades da sociedade. A participação pressupõe a busca da
convergência de propósitos, a resolução de conflitos, o aperfeiçoamento da convivência social, a transparência dos processos
decisórios e o foco no interesse da coletividade.
A participação nos processos de elaboração do PMSB deve ocorrer a partir da mobilização social e incluir divulgação de estudos
e propostas e a discussão de problemas, alternativas e soluções relativas ao saneamento básico, além da capacitação para a
participação em todos os momentos do processo.
Sem esgotar as possíveis formas, mas visando apresentar indicações básicas de atuação,
são sugeridas quatro formas de participação social:
• Participação direta da comunidade por meio de apresentações, debates, pesquisas e qualquer meio que possibilite a expressão
76 de opiniões individuais ou coletivas, cursos de capacitação, etc.
• Participação em atividades coordenadas, como audiências públicas, consultas, conferências e seminários.
• Participação em fases determinadas da elaboração do PMSB, por meio de sugestões ou alegações, apresentadas na forma
escrita.
• Participação por meio de representantes no Comitê de Coordenação e no Comitê Executivo.
A participação não se limita a obter informações sobre “como funciona” o processo de elaboração do Plano ou a tomar
conhecimento das propostas do executivo, mas deve permitir que a sociedade local se reconheça como parte integrante no
processo de discussão sobre o saneamento básico; visa garantir o seu posicionamento quanto às temáticas objeto de discussão;
visa, ainda, socializar experiências e saberes. A participação também deve proporcionar o registro de informações que geralmente
não estão disponíveis nas fontes convencionais de dados e informação.
A efetiva participação social pressupõe o envolvimento dos vários atores sociais e segmentos intervenientes durante toda
a elaboração do Plano, devendo proporcionar o debate transparente e democrático sobre os múltiplos anseios na busca de
consensos em torno dos interesses comuns da sociedade.
Uma das condições para a participação é o conhecimento claro do objeto a ser planejado, dos princípios, dos objetivos, das
diretrizes e das informações necessárias para a elaboração do PMSB. Devem ser previstos mecanismos de disponibilização,
repasse e facilitação do acesso e compreensão das informações para que a sociedade possa contribuir e fazer suas escolhas nos
trabalhos de elaboração do PMSB.
Para concretização desses propósitos, deverá ser desenvolvido nesta etapa do processo um
plano de comunicação com os seguintes objetivos:
• Divulgar amplamente o processo de elaboração, informar os objetivos e desafios do Plano Municipal de Saneamento Básico
e informar sobre as formas e canais de participação;
O Plano de Saneamento Básico, exceto quando regional, deverá englobar integralmente o território do ente da Federação que o
elaborou, devendo ainda ser compatível com os Planos das Bacias Hidrográficas em que estiver inserido (art. 19, §§ 3º e 8º, da
77
Lei nº 11.445/2007).
a) Contexto/problema
Neste item, apresenta-se de forma sintética uma descrição do contexto, do histórico e do(s) problema(s) que motiva(m) a
elaboração do PMSB e cuja realidade se pretende transformar.
b) Pressupostos e princípios
Diz respeito aos pressupostos e aos princípios sobre os quais o PMSB será elaborado. Ou seja, refere-se aos conteúdos que, de
antemão, devem respaldar a elaboração do Plano (os pressupostos) e a base ou os preceitos que o orienta (ver itens 2.1.3 e 3.1).
c) Objetivos
Refere-se aos resultados que o poder público municipal espera alcançar após a realização do PMSB, às mudanças que se
pretende atingir no município na área do saneamento básico. É uma descrição dos benefícios que se espera obter utilizando os
produtos gerados durante o processo de elaboração do PMSB.
e) Metodologia
Neste item, deve ser apresentada a metodologia do processo de elaboração do PMSB, ou seja: os caminhos, os passos, os
instrumentos e as atividades que irão respaldar a elaboração do PMSB. Deve contar com a explicitação da abordagem teórica do
planejamento, as formas de participação social, os temas e as técnicas de pesquisa e de análises que deverão ser contemplados
no diagnóstico, os estudos a serem realizados e as temáticas a serem observadas no prognóstico.
f) Prazo e período
78 Refere-se ao período de tempo em que o PMSB deverá ser realizado.
g) Produtos esperados
Diz respeito à definição dos produtos a serem elaborados pela equipe técnica, devendo ser descritos de forma bastante precisa
em ternos de: número de produtos, título, objeto/temática de cada um, características e prazo para a elaboração.
h) Equipe técnica
Neste item, deve-se indicar a equipe técnica em termos de número, qualificação acadêmica e profissional, perfil e experiência
profissional que será necessária para a elaboração do PMSB.
i) Orçamento
Diz respeito aos recursos necessários para a elaboração do PMSB, discriminando-se os valores por tarefa, produto ou por horas de
trabalho, bem como os custos de material, deslocamento e hospedagem, quando for o caso. Devem ser indicados, separadamente,
os valores (parciais ou integrais) das atividades que serão executadas por profissionais da equipe própria da administração e
os das atividades que serão contratadas. Definem-se, também, os períodos ou prazos nos quais serão feitos os pagamentos, a
moeda de referência e os impostos e descontos que serão efetuados, no caso dos serviços contratados junto a terceiros.
Inicialmente, deve-se definir o enfoque metodológico da elaboração do diagnóstico. Reconhecendo que a prática de planejamento
não é uma ação meramente técnica, mas também política, atualmente, o processo de elaboração de diagnósticos e prognósticos
tem buscado contemplar o olhar técnico e o dos agentes sociais, este através da participação dos diversos segmentos da
sociedade.
Assim, o diagnóstico deve contemplar métodos que atendam tanto à racionalidade técnica (objetivos) como às demandas sociais
(subjetivos), devendo haver o diálogo entre essas duas abordagens, ou seja, as informações e dados técnicos devem alimentar
Os métodos subjetivos articulam-se com técnicas da pesquisa social, quando ocorre o envolvimento dos diversos segmentos da
sociedade como sujeito do processo de investigação. Os grupos focais, as entrevistas com informantes-chaves e as pesquisas
de opinião são exemplos de técnicas que podem ser utilizadas. Pode-se utilizar também informações extraídas de bases de
dados de sistemas de atendimento aos cidadãos e aos usuários dos serviços mantidos pela administração municipal e/ou pelos
prestadores dos serviços e pelos órgãos ou entidades de regulação e fiscalização dos serviços ou de proteção aos consumidores.
Ao analisar os princípios fundamentais da referida lei e todo o seu escopo, percebe-se que a situação referida para o diagnóstico
proposto não se restringe a aspectos da cobertura e qualidade dos serviços de saneamento básico. O diagnóstico, além de
contemplar os quatro componentes do saneamento básico (abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza
urbana e manejo de resíduos sólidos e drenagem e manejo das águas pluviais urbanas), deve prever uma a análise de áreas
afins à de saneamento básico (habitação, saúde, meio ambiente, recursos hídricos), para garantir o tratamento intersetorial. Deve
analisar as questões tecnológicas e sua adequação às realidades locais, principalmente quanto à capacidade de pagamento da
população. Deve tratar da segurança, da qualidade e da regularidade dos serviços e do controle social.
Outro ponto importante, que também deve ser contemplado no diagnóstico, são os aspectos da gestão dos serviços de saneamento
básico, ou seja: o planejamento, indelegável a outro ente; a prestação dos serviços; a regulação e a fiscalização, e como está a
questão do controle social em todas essas funções.
O diagnóstico deve também definir a abrangência territorial e as unidades de análises sobre as quais as informações e dados
serão levantados. É desejável que a área de abrangência do PMSB e, portanto, do diagnóstico, contemple todo o território do
município, área urbana e rural. Em face das desigualdades no acesso e na qualidade dos serviços, principalmente entre as áreas
rurais e urbanas e no interior destas, é recomendável o uso de unidades de análises que permitam apreender essas desigualdades.
O diagnóstico deve reunir e analisar, quando disponíveis, informações, dados, análises e proposições de outras políticas correlatas
ao saneamento básico.
As técnicas de pesquisa que irão respaldar a realização do diagnóstico devem ser explicitadas. Três técnicas são comumente
utilizadas: pesquisa documental e bibliográfica, pesquisa de dados secundários e pesquisa de dados primários.
Deve ser prevista a preparação de resumos analíticos, em linguagem acessível, para a disponibilização e apresentação à
sociedade, de forma a proporcionar o efetivo e amplo conhecimento dos dados e informações.
Recomenda-se que todos os dados obtidos durante a pesquisa sejam organizados em uma base de dados de fácil acesso e de
simples operação, devendo passar por adequado tratamento estatístico e análise crítica das informações, que poderá vir a compor
o Sistema de Informações Municipais de Saneamento Básico, indicado na Etapa 8.
80
5.2.2 Prognósticos e alternativas para a universalização – Objetivos e metas
Esta etapa envolve a formulação de estratégias para o atendimento das diretrizes e para alcançar os objetivos e metas definidas
para o PMSB, incluindo a instituição ou adequação da organização municipal para o planejamento, a prestação dos serviços, a
regulação, a fiscalização, o controle social ou, ainda, a assistência técnica e, quando for o caso, a promoção da gestão associada,
via convênio de cooperação ou consórcio intermunicipal, para o desempenho de uma ou mais destas funções.
Nesta etapa, são definidos os mecanismos de articulação e integração das políticas, programas e projetos de saneamento
básico, com de outros setores correlacionados (saúde, habitação, meio ambiente, recursos hídricos, educação) visando à eficácia,
eficiência e efetividade das ações preconizadas. Consiste, ainda, na análise e seleção das alternativas de intervenção visando à
melhoria das condições sanitárias em que vivem as populações urbanas e rurais. Tais alternativas terão por base as carências
atuais de serviços públicos de saneamento básico: abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos
e limpeza urbana e manejo de águas pluviais e drenagem urbana. Essas carências devem ser projetadas a partir da análise de
cenários alternativos, considerando a evolução gradativa do atendimento – quantitativo e qualitativo –, conforme diferentes
combinações de medidas efetivas e/ou mitigadoras que possam ser previstas no plano para o horizonte de 20 anos9 .
Nos casos de abastecimento de água e esgotamento sanitário, deverão ser realizadas projeções de demandas, considerando os
estudos realizados na elaboração e/ou nas revisões dos planos diretores, caso existam. Existindo os referidos Planos, deve-se
analisar a pertinência e a possibilidade de manutenção das metodologias, dos parâmetros, dos índices e das taxas de projeção
adotados nos mesmos, em face das atualizações censitárias do IBGE e/ou do cadastro imobiliário ou de outros serviços públicos
no município11 .
9 A Lei nº 11.445/2007 não estabelece o horizonte de vinte anos para os Planos Municipais de Saneamento Básico, sendo este prazo indicativo, por coerência com o Plano Nacional de
Saneamento Básico (Plansab) (art. 52, §1). Nos casos em que houver delegação de um ou mais serviços por prazo superior, é recomendável que o PMSB adote o mesmo como horizonte.
Idem. A integração dos cadastros dos serviços e das infraestruturas urbanas do município deve ser considerada na formulação do Sistema Municipal de Informações.
10 Idem
As projeções das necessidades de ações estruturais e não estruturais de manejo das águas pluviais e drenagem urbana deverão
basear-se nos estudos realizados no diagnóstico, considerando o horizonte de planejamento.
Devem ser construídos cenários alternativos de demandas por serviços que permitam orientar o processo de planejamento do
saneamento básico, identificando-se as soluções que compatibilizem o crescimento econômico, a sustentabilidade ambiental,
a prestação dos serviços e a equidade social nos municípios. Deve-se estabelecer uma amplitude de cenários que representem 81
aspirações sociais factíveis de serem atendidas nos prazos estabelecidos. Em resumo, esses cenários têm por objetivo identificar,
dimensionar, analisar e prever a implementação de alternativas de intervenção, considerando a incerteza do futuro e visando ao
Esta atividade consiste em analisar as disponibilidades e demandas futuras de serviços públicos de saneamento básico no
município, identificando as alternativas de intervenção, considerando a redução gradativa ou a mitigação transitória dos déficits
e as deficiências na prestação dos serviços, de forma a se estabelecerem os cenários alternativos.
A partir dos resultados das propostas de intervenção nos diferentes cenários, deve-se selecionar o conjunto de alternativas
que promoverá a compatibilização quali-quantitativa mais eficaz entre demandas e disponibilidade de serviços. Tal conjunto se
caracterizará como o cenário normativo objeto do PMSB.
Definição de política de acesso a todos, sem discriminação por incapacidade de pagamento de taxas ou tarifas, considerando a
instituição de taxa ou tarifa social ou de subsídios diretos para atender às populações de baixa renda.
11 A integração dos cadastros dos serviços e das infraestruturas urbanas do município deve ser considerada na formulação do Sistema Municipal de Informações.
Os programas, projetos e ações necessárias para atingir os objetivos e metas devem ser definidos coletivamente, devendo-se
garantir a sua compatibilidade com os respectivos planos plurianuais e com outros planos governamentais correlatos, identificando
82 possíveis fontes de financiamento e as formas de acompanhamento e avaliação e de integração entre si e com outros programa
e projetos de setores afins.
É desejável que a programação das ações do PMSB seja desenvolvida em duas etapas distintas: uma imediata, ao início dos
trabalhos, chamada de Programação de Ações Imediatas, e a outra denominada Programação das Ações resultantes do próprio
desenvolvimento do PMSB.
O plano de ação deve levar em conta a Lei nº 9.433/1997, a qual deverá subsidiar a gestão dos recursos hídricos da bacia
hidrográfica onde o município encontra-se inserido, assegurando um processo de planejamento participativo.
Deverão ser definidos sistemas e procedimentos para o monitoramento e a avaliação dos objetivos e metas do PMSB e dos 83
resultados das suas ações no acesso; na qualidade, na regularidade e na frequência dos serviços; nos indicadores técnicos,
operacionais e financeiros da prestação dos serviços; na qualidade de vida; assim como o impacto nos indicadores de saúde do
município e nos recursos naturais.
O sistema de informações deverá ser concebido e desenvolvido no processo de elaboração do PMSB. O município deverá promover
a avaliação do conjunto de indicadores inicialmente proposto, objetivando construir um Sistema Municipal de Informação de
Saneamento Básico – Simisa. Esse sistema, uma vez construído, testado e aprovado, deverá ser alimentado periodicamente para
que o PMSB possa ser avaliado, possibilitando verificar a sustentabilidade da prestação dos serviços de saneamento básico no
município.
O sistema deverá conter um banco de dados, podendo estar associado a ferramentas de geoprocessamento, para facilitar a
manipulação dos dados e a visualização da situação de cada serviço ofertado no município. Com isso, será possível identificar
os problemas e auxiliar a tomada de decisão em tempo hábil para a resolução dos problemas relacionados com os serviços de
saneamento básico.
O sistema de informação deverá ser composto por indicadores de fácil obtenção, apuração e compreensão, confiáveis do ponto de
vista do seu conteúdo e fontes. Devem, ainda, ser capazes de medir os objetivos e as metas, a partir dos princípios estabelecidos
no PMSB, e contemplar os critérios analíticos da eficácia, eficiência e efetividade da prestação dos serviços de saneamento básico.
Este sistema também deverá contemplar as funções de gestão: planejamento, prestação, regulação, fiscalização e controle social.
É de extrema importância que o Sistema Municipal de Informações seja construído atendendo às diretrizes do Sistema Nacional
de Informação em Saneamento – Sinisa, do Ministério das Cidades, criado pela Lei Nacional de Saneamento Básico.
Uma vez elaborados o diagnóstico e o prognóstico, peças que conformarão o Plano Municipal de Saneamento Básico, é
recomendável que seja realizado um evento formal, a exemplo de uma Conferência Municipal de Saneamento Básico, no qual se
discutirá ampla e democraticamente o Plano com os diversos segmentos da sociedade, de forma a proceder à sua aprovação.
84 Nessa oportunidade, é importante que exista um documento-síntese do Plano que será a base das discussões a serem travadas
na Conferência.
Uma vez aprovado o PMSB na Conferência, o mesmo deve ser encaminhado a uma instância colegiada para apreciação e
aprovação, a exemplo do Conselho Municipal das Cidades ou de saneamento, meio ambiente ou, ainda, de saúde.
Para que o PMSB passe a se constituir em um instrumento de política pública, é recomendável que o Executivo municipal o aprove
por decreto ou o encaminhe para aprovação na Câmara Municipal, conforme determinar a respectiva Lei Orgânica ou a lei que tratar
da Política Municipal de Saneamento (Lei do Plano Diretor, Lei de Políticas Urbanas ou outra).
A execução do PMSB passa, então, para a responsabilidade das diversas instituições do município, inclusive as delegatórias da
prestação e/ou da regulação e fiscalização dos serviços. O acompanhamento e avaliação continuada de sua execução ficam a cargo
da instância ou organismo instituído ou designado para esse fim no próprio processo de construção do PMSB (ver item 5.2.5).
12 Com esta finalidade, o Ministério das Cidades, por meio do PMSS e em parceria com alguns prestadores, desenvolveu um sistema integrado de gestão dos serviços de água e esgotos
(GSAN), com tecnologia moderna e com utilização de softwares livres, cuja evolução já vem sendo feita para suprir essa carência, possibilitando em futuro próximo a integração de
todos os serviços de saneamento básico. O GSAN é um software público e está disponível para acesso e utilização no portal: www.softwarepublico.gov.br, mantido pelo Ministério do
Planejamento.
MINISTÉRIO DAS CIDADES. Termo de Referência do Ministério das Cidades de Apoio à Elaboração de Planos Municipais e Regionais
de Saneamento Básico. Brasília: MCIDADES, 2008. Organizado por João Carlos Machado.
SOUZA, C. M. N.; FREITAS, C. M. O Saneamento na Ótica da Prevenção de Doenças e da Promoção da Saúde. In: Congreso de la
Asociacón Interamericana de Ingenieria Sanitária Y Ambiental, XXX, 2006, Punta del Leste. Anais.... Punta Del Leste: AIDIS, 2006.
85
VALARELLI, Leandro Lamas. Roteiro de Termos de Referência (TdR) para serviços de consultoria. Dicas Práticas. Disponível em:
<http://www.rits.org.br/gestao_teste/ge_testes/ge_mat01_dicas04.cfm>. Acesso em: nov. de 2008.
Clênio Argolo
João Batista Peixoto
João Carlos Machado
Tatiana Santana Timóteo Pereira
Alexandre Araújo Godeiro Carlos
Otávio Silveira Gravina
Gabriella Pereira Giacomazzo
Brasília - 2011
Apresentação.....................................................................................................................................................91
5 As Técnicas de Pesquisa.....................................................................................................................................................104
6.7 Diagnóstico dos setores que têm inter-relação com o saneamento básico..........................................................................111
8 Referências.........................................................................................................................................................................115
91
Assim, um Plano de Saneamento Básico deve contar com um diagnóstico e um prognóstico com objetivos, metas, programas,
projetos e ações e, ainda, mecanismos de avaliação. De acordo com a Lei nº 11.445/2007, o diagnóstico necessita contemplar
Para permitir uma maior organicidade ao processo de elaboração do diagnóstico, uma estratégia usualmente utilizada e que pode
facilitar o seu desenvolvimento é a definição de campos de análises. Esses campos devem contemplar os quatro componentes do
saneamento básico, as áreas afins e as funções de gestão. São sugeridos os seguintes campos de análise (Quadro 3)
1Embora o controle social não seja propriamente uma função de gestão, optou-se por incorporá-lo no Quadro 2 pelo fato desta atividade se constituir em um dos princípios fundamentais
da prestação dos serviços de saneamento básico (inciso X, do art. 2º da Lei nº 11.445/2007) e por esta lei estabelecer o controle social em todas as funções de gestão.
• Análise das condições de saúde por meio de indicadores das doenças relacionadas com
Saúde pública e de
a falta de saneamento, buscando discutir a sua inter-relação, e por meio de informações
qualidade de vida
sobre morbidade e estado nutricional de crianças.
98
Com isso, foi possível elaborar mapas da situação de saneamento segundo bairros de Salvador para os anos de 1991 e 2000, de
forma a avaliar a desigualdade na distribuição dos serviços e proceder às análises estatísticas do comportamento dos indicadores
entre os anos dos Censos (Figura 4).
O banco de dados é construído por trecho de via, que deve receber um código de referência, o mesmo que é informado no
questionário de campo. A área de estudo, a sub-bacia ou setor censitário, a depender do zoneamento em que se está trabalhando,
também deve possuir um código de referência.
Figura 5 – Procedimento para Divisão de Trechos de Vias. Vista da Microárea 315 da Bacia de
99
Uma vez montado o banco de dados, é possível calcular alguns indicadores sobre a área de estudo. Os valores dos indicadores
referem-se ao percentual de trecos de vias que apresentaram um determinado evento. Assim, por exemplo, no caso de uma
microárea em que, dos 83 trechos investigados, 82 possuíam fornecimento de água 3 vezes na semana, o indicador de
fornecimento de água é 98,8%. Esse indicador informa o percentual de trechos em situação crítica em termos de fornecimento
de água, que pode ser comparado com os indicadores de outras microáreas. Isso permite identificar em uma localidade, por
exemplo, onde a situação de fornecimento de água é mais crítica3 .
Outra unidade de referência para a elaboração do diagnóstico do Plano de Saneamento Básico é a bacia hidrográfica. A Lei nº
11.445/2007 (art. 19, § 3º) estabelece que “os planos de saneamento básico deverão ser compatíveis com os planos das bacias
2Excepcionalmente, pode-se trabalhar com trechos de 200 metros, uma vez que tenham características homogêneas quanto ao objeto de estudo.
3Para melhor conhecimento sobre a técnica do Levantamento das Condições Sanitárias de Logradouros (LCSL), consultar BORJA, Patrícia Campos. Avaliação da Qualidade Ambiental
Urbana - Uma Contribuição Metodológica. 1997. 283f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura, Universidade Federal da Bahia, Salvador.
100
a) coletar e sistematizar dados relativos às condições da prestação dos serviços públicos de saneamento básico;
b) disponibilizar estatísticas, indicadores e outras informações relevantes para a caracterização da demanda e da oferta de
serviços públicos de saneamento básico;
c) permitir e facilitar o monitoramento e avaliação da eficiência e da eficácia da prestação dos serviços de saneamento básico
(BRASIL, 2007a, p.18).
Segundo a lei, as informações do Sinisa devem ser públicas e acessíveis a todos, devendo ser publicadas por meio da internet.
Apesar das limitações, os sistemas disponíveis permitem realizar avaliações da situação da prestação de alguns serviços de sa-
neamento no país. Atualmente, existem seis sistemas de informação que dispõem de variáveis, indicadores e índices relacionados
com o saneamento básico, cujas características estão apresentadas no Quadro 4. 101
O sistema mais amplo é o Sistema Nacional de Informação em Saneamento – SNIS. Criado em 1995, no âmbito do Programa
de Modernização do Setor Saneamento – PMSS, o SNIS tem abrangência nacional e se apoia em banco de dados administrado
Saneamento
básico (água,
esgoto e
resíduos
sólidos), além
Censo Todos os
IBGE 10 anos Setor censitário de indicadores www.ibge.gov.br
demográfico municípios
de natalidade,
renda,
escolaridade,
condições de
moradia, etc.
Saneamento
básico (água,
esgoto e
PNAD –
resíduos
Pesquisa
Todos os sólidos), além
Nacional por IBGE Anual Estado www.ibge.gov.br
municípios de indicadores
Amostra de
de renda,
Domicílios
escolaridade,
condições de
moradia, etc.
Saneamento
básico (água,
esgoto,
Distrito
drenagem e
PNSB – censitário
resíduos sólidos),
Pesquisa (água e esgoto)
Todos os considerando
Nacional de IBGE Indefinida1 e município www.ibge.gov.br
municípios a oferta e
Saneamento (drenagem
qualidade
Básico e resíduos
dos serviços
sólidos)
prestados e
aspectos da
gestão.
Variáveis
técnicas,
operacionais e
financeiras dos
SNIS – Sistema prestadores
Municípios e
Nacional de Ministério das Municípios dos serviços de
Anual prestadores de www.snis.gov.br
Informação em Cidades amostrados2 abastecimento
serviços
Saneamento de água,
esgotamento
sanitário e
resíduos sólidos/
102 limpeza pública.
Abastecimento
de água
SISAGUA – (cobertura,
Sistema de Ministério condições de
Municípios e
Informação da Saúde/ tratamento,
Todos os sistemas de
da Qualidade Secretaria de Anual qualidade do Não disponível
municípios abastecimento
da Água de Vigilância em serviço, níveis
de água
Consumo Saúde de atendimento
Humano à Portaria nº
518/2004 do
MS).
SIAB – Sistema
de Informação
de Atenção
Básica Saneamento
PSF – Programa Secretaria básico (água,
de Saúde de Saúde do Todos os esgoto e
Anual Família www.datasus.gov.br
de Familiar Estado da municípios resíduos sólidos),
PACS – Bahia/SUS disponibilidade
Programa de filtro.
de Agentes
Comunitários de
Saúde
1A PNSB foi realizada uma vez no ano 2000 e encontra-se em andamento uma nova edição com dados coletados em 2008.
Todos os municípios cujos serviços de água e esgotos são prestados pelas companhias estaduais de saneamento e uma amostra, anualmente crescente, de municípios que prestam
diretamente os serviços de água e esgotos. Amostra específica para os serviços manejo de resíduos sólidos.
relacionadas à geologia, à demografia, à cultura, à economia, aos recursos naturais, que exigem conhecimentos específicos e o
diálogo entre os diversos saberes.
Abordagem do diagnóstico
Fonte: Borja, 1997.
Avaliação qualitativa
Indicadores quantitativos Indicadores quantitativos
Percepção ambiental:
• pesquisa de opinião
Medições no ambiente Qualificação do ambiente • pesquisa a informantes-chaves
• grupo focal
• Dados primários • Observação ambiental • pesquisa participante
• Dados secundários • Avaliação de especialistas • pesquisa etnográfica
• Pesquisa documental e bibliográfica – envolve a obtenção de informações disponíveis em instituições públicas sobre a
situação de saneamento, incluindo planos, programas, projetos, legislação, contratos de prestação de serviços, entre outros.
• Pesquisa de dados secundários – envolve a coleta de dados disponíveis em sistemas de informação dos prestadores dos
serviços e de instituições públicas, tais como: cadastros da prefeitura; banco de dados do Programa Saúde da Família; banco
de dados da vigilância e controle da qualidade da água de consumo humano; e dos sistemas de informação referidos no
Quadro 4.
• Pesquisa de dados primários – refere-se à coleta de dados de campo em domicílios, logradouros, sistemas de abastec-
imento de água, de esgotamento sanitário, em pontos de disposição final de resíduos sólidos, entre outros. Nesse caso,
após a definição do conjunto de variáveis que serão investigadas e da técnica de coleta de dados, é necessário montar uma
104
logística para a obtenção dos dados, ou seja: seleção de equipe, treinamento, definição dos instrumentos de coleta de dados
(questionário, tipo de coletores de amostras, medidores, etc.), tratamento, sistematização e análises dos dados. É necessário,
ainda, definir o universo ou a amostra a ser investigada e a unidade de análise (domicílios, moradores, crianças, trechos de
rios, pontos em unidades de tratamento de água, pontos de amostragem de solo ou corpo dá água, etc.). Também devem ser
definidos, caso necessário, a frequência da coleta de dados e os períodos do ano, estes considerando que alguns fenômenos
têm variação sazonal.
No campo da pesquisa social, diversas técnicas podem ser utilizadas, a exemplo de entrevistas, grupos focais, diagnóstico par-
ticipativo, pesquisas de opinião, etc.
As entrevistas podem ser realizadas por segmentos sociais junto a informantes-chaves, que são pessoas com liderança recon-
hecida nas localidades objeto do diagnóstico. Para tanto, é importante a realização de um levantamento das entidades repre-
sentativas da sociedade local, principalmente aquelas que atuam no campo do saneamento, da moradia, da saúde e do meio
ambiente. Comumente, as lideranças populares são: os representantes nos conselhos de saúde, meio ambiente e outras políticas
urbanas, se existentes; sindicalistas; dirigentes de ONGs; pesquisadores, entre outros. Todos eles são importantes e devem ser
consultados.
O grupo focal objetiva investigar grupos distintos da comunidade. Envolve uma discussão, guiada por um mediador, com duração
aproximada de 1 hora a 1:30 hora, de um pequeno número de informantes (6 a 12 pessoas) que falam livre e espontaneamente
a respeito dos temas considerados importantes para a investigação. Cada participante tem a oportunidade de falar, fazer pergun-
tas e responder aos comentários. Os participantes devem sentir-se à vontade para falar abertamente e o local da reunião deve
ser neutro em relação aos objetivos da investigação. Os participantes são escolhidos em qualquer grupo cujas ideias sejam de
interesse da pesquisa. A reunião é gravada, embora o observador também tome notas. Na aplicação da técnica, existem alguns
papéis que devem ser observados. O mediador tem como função manter direcionada a reunião através de um roteiro, o qual deve
incorporar o objetivo do estudo e incluir questionamentos sobre a pesquisa. Também faz parte da dinâmica a presença de uma
pessoa com a função de registrar a discussão e, eventualmente, intervir no debate. Um procedimento importante é o treinamento
A dinâmica “dois a dois” pode ser utilizada para estimular as discussões e promover o entrosamento dos participantes. Nessa
técnica, o trabalho se desenvolve a partir de dois grupos de participantes: um fixo e outro móvel, que podem ser organizados em
círculo ou em fila, um em frente ao outro, formando várias duplas (Figura 7). Cada participante dispõe de uma questão ou frase
previamente entregue e definida pela coordenação da oficina. A atividade se inicia com a discussão, entre as duplas, da questão
de cada participante, por um tempo determinado (3 minutos). Com o término do tempo, o grupo móvel se desloca formando nova
dupla, que discutirá mais duas questões diferentes. Com isso, todos os participantes debaterão todas as questões com parceiros
distintos, ouvindo a opinião de todos.
Esta técnica, portanto, evita o domínio da palavra, possibilita a fala de todos e o conhecimento das diversas opiniões sobre os
temas debatidos. As questões podem tratar de cada componente do saneamento básico (abastecimento de água, esgotamento 105
sanitário, águas pluviais e resíduos sólidos), envolvendo as problemáticas vivenciadas pelos participantes. Em seguida, os par-
ticipantes seguem para nova discussão, então organizados em grupos por temas, de forma a consolidar o debate, que deve ser
GRUPO FIXO
ABCDEFGH
HGFEDCBA
GRUPO MOVEL
Na dinâmica de “grupo por tema”, os participantes são orientados a formarem grupos para discussão de temas específicos de
interesse do diagnóstico, como, por exemplo, o abastecimento de água, o esgotamento sanitário, etc. Em um primeiro momento,
os participantes dos grupos devem se apresentar, eleger um relator e um coordenador e pactuar a forma de trabalho. Em seguida,
sugere-se que ocorra uma discussão aberta sobre o tema proposto, para depois os participantes direcionarem mais a discussão
com o preenchimento da matriz “problema – causa – solução” (Figura 6). Dada essa discussão, os participantes devem se reunir
em plenária para ouvir o relato de cada grupo e depois realizar um debate com todos os participantes, o qual também deve ser
devidamente registrado para posterior relato (Figuras 8, 9 e 10).
Para que os debates sejam frutíferos, é importante que a equipe técnica de elaboração do diagnóstico, a comissão organizadora
das oficinas e técnicos dos órgãos públicos que planejam e prestem os serviços de saneamento básico participem do processo
de discussão, de forma a permitir a incorporação de conhecimento entre técnico e comunidade e comunidade e técnico, sempre
com o cuidado de que a voz dos segmentos sociais seja garantida.
6A partir do Termo de Referência do Ministério das Cidades de Apoio à Elaboração de Planos Municipais e Regionais de Saneamento Básico (MCIDADES, 2008).
• caracterização da cobertura e qualidade dos serviços, com a identificação das populações não atendidas e sujeitas a falta de
água; regularidade e frequência do fornecimento de água, com identificação de áreas críticas; consumo per capita de água;
qualidade da água tratada e distribuída à população;
• avaliação quantitativa da disponibilidade de água dos mananciais e da oferta de água à população pelos sistemas existentes
versus o consumo e a demanda atual e futura, preferencialmente, por áreas ou setores da sede municipal e localidades do
município;
• levantamento e avaliação das condições dos atuais e potenciais mananciais de abastecimento de água, quanto aos aspectos
de proteção da bacia de contribuição (tipos de uso do solo, fontes de poluição, estado da cobertura vegetal, qualidade da
água, ocupações por assentamentos humanos, etc.);
109
• análise crítica do plano diretor de abastecimento de água, caso exista, quanto à sua atualidade e pertinência, frente às de-
mandas futuras;
• caracterização da cobertura e a identificação das populações não atendidas ou sujeitas a deficiências no atendimento a
sistemas de esgotamento sanitário (redes coletoras, fossas sépticas e outras soluções);
• avaliação da situação atual e futura da geração de esgoto versus capacidade de atendimento pelos sistemas de esgotamento
sanitário disponíveis, seja mediante soluções individuais e/ou coletivas;
• descrição e avaliação dos sistemas de esgotamento sanitário existentes no município, quanto à capacidade instalada frente
às demandas e ao estado das estruturas implantadas, a partir do uso de textos, mapas, esquemas, fluxogramas, fotografias
e planilhas, com a apresentação da visão geral dos sistemas. No caso do uso de sistemas coletivos, essa avaliação deve
envolver as ligações de esgoto, as redes coletoras, os interceptores, as estações elevatórias, as estações de tratamento, os
emissários e a disposição final;
• análise crítica do plano diretor de esgotamento sanitário, caso exista, quanto à atualidade e pertinência das propostas frente
às demandas futuras;
• caracterização do atendimento e identificação da população ou áreas não atendidas pelo sistema público de manejo de
resíduos sólidos e limpeza urbana, para as condições atuais e futuras, quanto à população atendida (urbana e rural), tipo,
regularidade e frequência dos serviços;
• caracterização dos resíduos sólidos produzidos no município em termos de quantidade e qualidade. Incluir projeções de
produção de resíduos para curto e médio prazo;
• descrição e análise da situação dos sistemas de acondicionamento, coleta, transporte, tratamento e disposição final dos
resíduos sólidos do município.
110 • Analisar os serviços de varrição e serviços especiais (feiras, mercados, espaços públicos, praias, etc.). Incluir desenhos,
fluxogramas, fotografias e planilhas que permitam um perfeito entendimento dos sistemas em operação;
• análise crítica da situação da gestão de manejo dos resíduos sólidos e limpeza urbana existentes, com análise de indicadores
técnicos, operacionais e financeiros (a partir de indicadores do SNIS);
• identificação das formas da coleta seletiva (cooperativas, associações e ‘carrinheiros’), quando existirem, quantificando-as e
qualificando-as, inclusive quanto aos custos e viabilidade social e financeira;
• inventário/análise da atuação dos catadores, nas ruas ou nos lixões, identificando seu potencial de organização;
• análise da situação socioambiental dos sítios utilizados para a disposição final de resíduos sólidos do município. No caso da
existência de catadores nos sítios, identificar a possibilidade de incorporá-los a projetos de reciclagem via cooperativas;
• identificação de áreas de risco de poluição/contaminação por resíduos sólidos e as alterações ambientais causadas por
depósitos de lixo urbano;
• avaliação das soluções adotadas para a destinação dos resíduos de serviços de saúde e dos resíduos de construção e de-
molição.
• análise crítica dos sistemas de manejo e drenagem das águas pluviais e das técnicas e tecnologias adotadas, quanto à sua
atualidade e pertinência, em face dos novos pressupostos relacionados ao manejo das águas pluviais;
• identificação de lacunas no atendimento pelo poder público, incluindo demandas de ações estruturais e não estruturais para
o manejo das águas pluviais, com análise do sistema de drenagem existente quanto à sua cobertura, capacidade e estado
das estruturas;
• identificação das deficiências no sistema natural de drenagem, a partir de estudos hidrológicos;
• análise das condições de operação e manutenção dos sistemas existentes;
6.7 Diagnóstico dos setores que têm inter-relação com o saneamento básico
No campo da habitação, identificar e analisar, quanto ao reflexo nas demandas e necessidades em termos do saneamento básico,
as seguintes informações do Plano Local de Habitação de Interesse Social, desde que já levantadas e formuladas:
Consultar: Mapeamento de Riscos em Encostas e Margem de Rios (publicação). Secretaria Nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades (www.cidades.gov.br).
• caracterização geral e delimitação das bacias hidrográficas onde o município estiver inserido, quanto ao meio físico e natural,
ao subsolo e ao clima, destacando a topografia, os tipos e usos do solo, os corpos d’água e o regime hidrológico; a cobertura
vegetal, a situação de preservação e proteção dos mananciais superficiais e águas subterrâneas, áreas de recarga e de
afloramento de aquíferos, etc.;
• caracterização geral dos ecossistemas naturais, preferencialmente por bacia hidrográfica, destacando, caso existam, indica-
dores da qualidade ambiental e as áreas de preservação permanente;
• situação e perspectivas dos usos e da oferta de água em bacias de utilização potencial para suprimento humano e lança-
mento de resíduos líquidos e sólidos de sistemas de saneamento básico, do ponto de vista quantitativo e qualitativo, com
enfoque para: a possibilidade de utilização dos recursos hídricos para o atendimento das demandas presentes e futuras para
prestação dos serviços públicos de saneamento básico, em função da previsão do aumento da demanda por esses recursos;
a identificação de condições de degradação por lançamento de resíduos líquidos e sólidos; e a verificação de situações de
escassez;
112
• identificação das condições de gestão dos recursos hídricos quanto: ao domínio das águas superficiais e subterrâneas (União
ou estados); à situação da gestão dos recursos hídricos da(s) bacia(s) do município; à existência e atuação de comitês de
bacia e de agência de bacia; ao enquadramento dos corpos d’água; à implementação da outorga e da cobrança pelo uso
da água; aos instrumentos de proteção de mananciais; aos programas e ações previstas, inclusive no Plano de Bacia, caso
exista, e de interesse do Plano de Saneamento Básico; à disponibilidade de recursos financeiros para investimentos em
saneamento básico; e situação do plano de bacia hidrográfica quanto à existência e sua atualização;
• identificação de relações de dependência entre a sociedade local e os recursos ambientais, incluindo o uso da água.
• morbidade por doenças relacionadas com a falta de saneamento básico, mais especificamente, as doenças infecciosas e para-
sitárias (Capítulo I, do CID-10), conforme lista apresentada no Quadro 5;
• estado nutricional de crianças menores de quatro anos;
• diarreia aguda em crianças menores de quatro anos;
• existência e análise do Programa Saúde da Família;
• existência e análise de programa de educação sanitária e ambiental;
• existência e análise de programa de assistência social.
Essas informações devem ser analisadas objetivando verificar o impacto das condições de saneamento básico na qualidade de
vida da população. As áreas de risco devem ser devidamente identificadas.
Deve-se buscar, ainda, a identificação dos fatores causais das enfermidades e suas relações com as deficiências detectadas na
prestação dos serviços de saneamento básico, bem como as suas consequências para o desenvolvimento econômico e social.
Devem ser analisadas as políticas locais de saúde e sua relação com o saneamento básico, incluindo as condições de participação
do setor saúde na formulação da política e da execução das ações de saneamento básico, conforme prevê o inciso IV, do art. 200
da Constituição Federal e a Lei nº 8.080/1990.
1. Introdução
2. Objetivos
2.1. Metodologia utilizada na realização do diagnóstico
3. Princípios e diretrizes gerais
4. Caracterização do município (localização, população/localidades, características, social, econômica, cultural e
inserção regional)
5. Caracterização do ambiente
114 5.1. Topografia, solo, hidrografia e hidrologia local, uso e ocupação do solo (cobertura vegetal, assentamento,
atividades, grau de impermeabilização, processos de erosão/assoreamento, riscos de enchentes, alagamentos e
escorregamentos, etc.)
5.2. Mananciais de suprimento de água
5.3. Caracterização dos resíduos sólidos e esgotos sanitários
6. A prestação dos serviços de saneamento básico
6.1. Aspectos legais, políticos, institucionais e de gestão dos serviços
6.1.1. Aspectos legais
6.1.2. Aspectos políticos e institucionais
6.1.3. Planejamento
6.1.4. Regulação e fiscalização
6.1.5. Ações intersetoriais.
6.1.6. Participação e controle social
6.1.7. Educação ambiental das ações de saneamento básico
6.2. Situação dos serviços de saneamento básico
6.2.1. Atendimento da população, por tipo de serviço, acesso, qualidade, regularidade e segurança da prestação dos
serviços
6.2.2. Análise dos sistemas de saneamento básico existentes
6.2.3. Tipo e condições da prestação dos serviços de saneamento básico (modelo de prestação dos serviços, contra-
tos de delegação e indicadores técnicos, operacionais e financeiros)
6.2.4. Impactos na saúde, na cidadania e nos recursos naturais (com enfoque para a poluição ambiental e dos recur-
sos hídricos)
8 A partir do Termo de Referência do Ministério das Cidades de Apoio à Elaboração de Planos Municipais e Regionais de Saneamento Básico (MCIDADES, 2008).
BORJA, Patrícia Campos; DIAS, Marion Cunha; ÁLVARES, Maria Lúcia; LOUREIRO, Aline Linhares; SILVA, Ricardo Macedo Lula;
DIAS NETO, Antônio Alves; CRUZ, Cristiane Santana; SANTANA, Rejane de Almeida; CRUZ, Franciane e GOMES, Fábio Soares.
Avaliação Quali-Quantitativa dos Serviços de Saneamento da Cidade do Salvador. Salvador: MEAU-UFBA/FUNASA, 2003.
Relatório Final da Pesquisa “Uso de Indicadores Quali-quantitativos para a Avaliação dos Serviços de Saneamento da Cidade do
Salvador”. Não publicado.
BORJA, P. C. Avaliação da Qualidade Ambiental Urbana - Uma Contribuição Metodológica. 230f. 1997. Dissertação (Mestrado em
Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura, Universidade Federal da Bahia, Salvador.
BRASIL. Decreto nº 6.017, de 17 de Janeiro de 2007. Regulamenta a Lei nº 11.107. Brasília (DF): Diário Oficial da União, 2007b.
115
BRASIL. Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007. Estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico e para a política
federal de saneamento básico. Brasília: Diário Oficial da União, 2007a.
Clênio Argolo
João Batista Peixoto
João Carlos Machado
Tatiana Santana Timóteo Pereira
Alexandre Araújo Godeiro Carlos
Otávio Silveira Gravina
Gabriella Pereira Giacomazzo
Brasília - 2011
119
1. O que é participação social.........................................................................................................................................123
5. Referências................................................................................................................................................................136
121
Porém, o conceito de participação é influenciado por concepções de mundo, sendo carregado de conteúdo ideológico (TEIXEIRA,
2001). A participação é vista e colocada em prática de diversas maneiras e sentidos a partir de cada concepção de mundo e
ator social. Pode significar legitimação de práticas, se constituir em ação manipuladora ou, ainda, representar o caminho para a
construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
No Brasil, de tradição autoritária e excludente, a participação social tem sido uma conquista. Na história do país, é possível
identificar diversas fases da participação social, desde as primeiras resistências indígenas e negras, passando pelos movimentos
camponeses, como Canudos, pelas lutas abolicionistas e da Independência, pelas revoltas urbanas, chegando até ao movimento
operário, camponês e urbano dos anos 1980 e 1990 (CARVALHO, 1998).
Foi na década de 1970, durante a ditadura, que emergiu um pujante movimento social que passou a ser intitulado “novos
movimentos sociais” (SADER, 1988). Esse movimento foi marcado pela criação de espaços de ação política. Na supressão da
possibilidade da participação pela via institucional, o cotidiano, o local de moradia, a periferia, o gênero e a raça tornam-se
espaços privilegiados da ação política, sendo ocupados por sujeitos de identidades e formas de atuação diferentes daquelas
do sindicato e do partido político (CARVALHO, 1998). Esse movimento contribuiu para que o Brasil promulgasse a Constituição
Brasileira de 1988, conhecida como Constituição Cidadã.
Nesse cenário, abre-se o espaço para a participação cidadã no campo das políticas públicas. Os movimentos sociais, além de 123
reivindicarem a garantia do acesso aos direitos sociais já adquiridos, buscam ampliá-los e, além disso, avançam no sentido de
participar da definição e gestão desses direitos; ou seja, seguem na direção de influenciar na definição das políticas públicas.
Essas práticas têm ampliado os espaços de participação social e, consequentemente, a esfera pública no Estado brasileiro, o
que tem contribuído para a definição de políticas mais voltadas para as demandas sociais. Para Carvalho (1998), a articulação
da democracia representativa com os espaços institucionais de gestão participativa tem contribuído para desprivatizar a gestão
pública, alterando os arranjos institucionais formadores de políticas, marcado pelo clientelismo, corrupção, privilégios de grupos
de interesse, proporcionando, desta forma, a democratização das políticas sociais.
(...) a participação é um processo político e coletivo de tomada de decisão para a construção e exercício
da autonomia, emancipação e empoderamento por meio do diálogo e cooperação (idem, p. 7).
• Participação assistencialista, filantrópica ou solidária – existe com frequência entre os grupos mais pobres e marginalizados
da sociedade como estratégia de sobrevivência.
• Participação corporativa – relaciona-se aos interesses de um segmento ou categoria social específica, como, por exemplo,
o sindicalismo moderno, cuja participação é, geralmente, motivada por lutas econômicas.
• Participação eleitoral – é a ação política direta do cidadão na sua relação com o Estado, refere-se aos direitos políticos.
• Participação política – relaciona-se diretamente com o Estado e dialoga com as formas de organização da sociedade.
124
Formula novos consensos sociais, formaliza conquistas de direitos universais que afetam o conjunto de uma sociedade.
Silva (2007) destaca a definição de Arnstein (1969), para quem a participação cidadã é “a redistribuição do poder que permite
aos cidadãos atualmente excluídos dos processos econômicos e políticos serem ativamente incluídos no futuro” (idem, s/p).
Medeiros e Borges (2007), ao citarem o trabalho de Arnstein (1969), relacionam os oitos degraus da participação (Quadro 1).
6 Parceria
5 Pacificação
Níveis de concessão
4 Consulta
mínima de poder
3 Informação
2 Terapia
Não participação
1 Manipulação
Fonte: Medeiros e Borges (2007), citando Arnstein (1969).
No campo do saneamento, quando a Lei nº 11.445/2007 define o controle social como um princípio fundamental da política
nacional de saneamento básico, situa os níveis de participação nos 6º e 7º degraus.
No Guia para a Elaboração de Planos Municipais de Saneamento – PMS (MCIDADES, 2005) são apresentados seis níveis de
participação que variam em função do grau de envolvimento da comunidade na elaboração do PMS, conforme apresentado no
Quadro 3.
1
A comunidade recebe A comunidade é informada do PMS e espera-se a sua conformidade.
informação
2
Para promover o PMS, a administração busca apoios que facilitem sua aceitação e o cumprimento
A comunidade é
das formalidades que permitam sua aprovação.
consultada
126
3 A Administração apresenta o PMS já elaborado à comunidade e a convida para que seja
A comunidade opina questionado, esperando modifica-lo só no estritamente necessário.
4 A Administração apresenta à comunidade uma primeira versão do PMS aberta, a ser modificada,
Elaboração conjunta esperando que o seja em certa medida.
5
A Administração apresenta a informação à comunidade junto com um contexto de soluções
A comunidade tem poder
possíveis, convidando-a a tomar decisões que possam ser incorporadas ao PMS.
delegado para elaborar
6
A Administração procura a comunidade para que esta diagnostique a situação e tome decisões
A comunidade controla o
sobre objetivos a alcançar no PMS.
processo
Fonte: MCIDADES, 2005.
Para tal, todos os envolvidos no processo de mobilização necessitam estar imbuídos por dois atos: a emoção e a razão. Toro
costuma dizer que mobilizar é convocar vontades. Nesse aspecto, participar de um processo de mobilização é um ato de paixão,
contudo, alerta que também é um ato de razão, na mediada em que consciências, e não somente vontades, devem ser mobilizadas.
Portanto, é necessário que as pessoas saibam por que e para que participam.
Conforme Lino (2008), para a efetivação de processos de mobilização são necessários três elementos fundamentais integrantes
de todo movimento social: o empoderamento, a irradiação e a convergência. O empoderamento é a base de todo processo de
mobilização social. Empoderar significa promover a iniciativa e a participação das pessoas. A irradiação é uma ideia fundamental
que significa:
• abrangência quantitativa, na qual cada vez mais pessoas despertem para o exercício da participação social, estando a
quantidade vinculada à qualidade, visto que as pessoas envolvidas não só devem fazer parte, mas ser parte, de forma a
compreender o processo e participar criticamente das decisões;
• pluralidade, ou seja, a sociedade é composta por pessoas e segmentos diferentes, portanto, é necessário considerar e
envolver tais diferenças e os diversos setores, faixas etárias, etnias e gênero;
• organização social – o aumento e a diversidade de participantes fortalecem os processos mobilizatórios. Nesse caso, a
criação de fóruns e redes pode contribuir para promover os processos organizativos (LINO, 2008).
127
O outro elemento é a convergência: considerando a diversidade dos atores envolvidos em processos de mobilização, é fundamental
que as pessoas, apesar de suas diferenças, sejam capazes de definir e perseguir objetivos coletivos (LINO, 2008).
Considerando o contexto de processos democráticos, a participação na gestão pública, segundo Jacobi (1999),
(...) se torna um meio fundamental de institucionalizar relações
mais diretas, flexíveis e transparentes que reconheçam os direitos
dos cidadãos, assim como de reforçar laços de solidariedade
num contexto de pressão social e polarização política na direção
de uma cidadania ativa que disponha dos instrumentos para o
questionamento permanente da ordem estabelecida (p. 31).
Os processos de participação na gestão da coisa pública, a exemplo da Política de Saneamento Básico, devem ser considerados
desde a participação na discussão da formulação da Política até o controle e avaliação das ações governamentais.
Para Borja (2004), a participação e o controle social constam dos princípios e diretrizes de uma política pública de saneamento,
constituindo ponto fundamental para democratizar o processo de decisão e implementação das ações de saneamento.
Para a instalação de tais práticas participativas, apresentam-se alguns limites e possibilidades a serem considerados que,
segundo estudiosos do tema, encontram-se resumidos nos Boxes 1 e 2.
Apesar dessas e de muitas outras dificuldades e contradições, as experiências de participação social têm levado à construção de
parâmetros públicos, procedimentos de transparência e regras de funcionamento que tencionam práticas corporativas, clientelis-
tas e tecnocráticas. As experiências têm também permitido um aprendizado aos movimentos sociais quanto à incorporação de
uma lógica mais universal e da totalidade da problemática social que pode contribuir para superar visões parcelares, assentadas
128 em critérios de grupos de interesse – inclusive partidários –, abrindo espaço para processos geradores de transformações sociais.
As possibilidades dos processos participativos podem ser vistas no Box 2.
129
Na área de saneamento, a participação e o controle social também são reivindicações do início da década de 1980, quando das
discussões em torno do Plano Nacional de Saneamento – Planasa. Naquele momento, desejavam-se mudanças substantivas na
Política de Saneamento, principalmente quanto à ação centralizada nos governos federal e estadual e aleijamento da participação
dos municípios e da sociedade. A Lei nº 11.445/2007 veio inaugurar uma nova fase da concepção e implementação de políticas de
saneamento no Brasil, incorporando anseios sociais quanto a mudanças da relação Estado e sociedade na área de saneamento.
Ao estabelecer as diretrizes nacionais para o saneamento básico, já no 2º art., a Lei nº 11.445/2007 registra a nova abordagem
quanto à participação e controle social. No inciso X desse artigo, a Lei estabelece o controle social como um dos princípios fun-
damentais da prestação dos serviços públicos de saneamento básico. No inciso IV, do art. 3º, a lei define o controle social como
sendo:
(...) conjunto de mecanismos e procedimentos que garantem à
sociedade informações, representações técnicas e participações
130 nos processos de formulação de políticas, de planejamento e de
avaliação relacionados aos serviços públicos de saneamento
básico (BRASIL, 2007, p. 2).
Assim, a lei garante elementos fundamentais para a garantia da participação, a saber: o acesso à informação, a representação
técnica e a participação na formulação, planejamento e avaliação das políticas de saneamento básico.
A lei, ao tratar da formulação da política pública de saneamento básico, no seu art. 9º, estabelece a necessidade dos titulares
fixarem os direitos e deveres dos usuários e os mecanismos de controle social.
O Capítulo VIII da lei é dedicado à temática do controle social. No seu art. 47, é estabelecido que o controle social dos serviços
públicos de saneamento básico poderá incluir a participação em órgãos colegiados de caráter consultivo, assegurada a repre-
sentação:
I - dos titulares dos serviços;
II - de órgãos governamentais relacionados ao setor de sanea-
mento básico;
III - dos prestadores de serviços públicos de saneamento básico;
IV - dos usuários de serviços de saneamento básico;
V - de entidades técnicas, organizações da sociedade civil e de
defesa do consumidor relacionadas ao setor de saneamento bási-
co (BRASIL, 2007, p. 15p).
Assim, os municípios e estados podem compor um conselho ou utilizar outro órgão colegiado existente para definir a política
pública de saneamento, contando, para isso, com a representação de diversos segmentos da sociedade, o que inclui a sociedade
Com relação à prestação dos serviços públicos de saneamento básico, a lei estabelece a necessidade da definição de mecanis-
mos de controle social nas atividades de planejamento, regulação e fiscalização dos serviços (inciso V, do art. 11). A lei prevê,
ainda, o controle social nas contratações de serviços públicos de saneamento. Como condição para a validade dos contratos de
prestação de serviços, está prevista a realização prévia de audiência e consulta públicas (inciso IV, do art. 11).
No que diz respeito ao planejamento, a Lei nº 11.445/2007 define que a prestação de serviços públicos de saneamento básico
deve observar a um Plano de Saneamento Básico cuja elaboração deverá assegurar a
(...) ampla divulgação das propostas dos planos de saneamento
básico e dos estudos que as fundamentem, inclusive com a re-
alização de audiências ou consultas públicas (§ 5º do art. 19 da
lei, BRASIL, 2007, p. 8).
No que diz respeito à regulação dos serviços públicos de saneamento, a lei prevê a elaboração de normas que deverão abranger,
dentre outros itens:
(...) padrões de atendimento ao público e mecanismos de partici-
pação e informação (inciso X do art. 23 da lei, BRASIL, 2007, p. 9).
Do exposto, o controle social, como um princípio fundamental da Lei de Saneamento Básico, deve ser garantido nas diversas
funções de gestão dos serviços públicos de saneamento básico, ou seja: no planejamento, na prestação dos serviços, na regula-
ção e na fiscalização. Para tanto, a lei prevê a necessidade do estabelecimento de normas e mecanismos para que este controle
social se efetive. A lei define o direito ao acesso à informação; a necessidade da realização de consultas e audiências públicas 131
como condição para a validade dos contratos e a divulgação dos estudos e das propostas do Plano de Saneamento Básico para
discussão da sociedade. Além disso, os municípios e estados podem compor um Conselho ou utilizar outro existente para, dentre
O controle social é um princípio fundamental da Lei de Saneamento Básico e deve ser garantido
nas diversas funções de gestão dos serviços públicos de saneamento básico, a saber:
no planejamento, na prestação dos serviços, na regulação e na fiscalização.
Inegavelmente, a Lei nº 11.445/2007, fruto de intensos debates, veio a atender aos desejos da sociedade brasileira. Por um lado, é
importante não minimizar os desafios para que esse desejo seja uma realidade. Diversos obstáculos estão postos, principalmente
em função da tradição autoritária e tecnicista de fazer planejamento no Brasil e das relações patrimonialistas e clientelistas que o
poder público tem tido com as populações. Por outro lado, as fragilidades dos movimentos sociais também são fatores limitadores
para uma nova prática, democrática e participativa, de fazer saneamento no Brasil.
Essa nova fase da Política de Saneamento no Brasil imprime muitos desafios, principalmente o de garantir espaços democráticos
de participação. Para tanto, os governos e a sociedade devem buscar identificar mecanismos para que a participação possa ser
efetiva, afastando-se da prática comum de muitos governos de promover ações cartoriais e instrumentais para cumprir exigên-
cias do órgão financiador ou da legislação. Nesse caso, os processos participativos, as ações de mobilização social e instrumentos
de comunicação devem ser promovidos, incentivados e valorizados, devendo, ainda, a participação ser compreendida como um
processo contínuo, permanente, conflituoso e de longo prazo.
132
Patrimonialismo é um conceito utilizado por Max Weber que visa associar a forma como a autoridade trata a coisa pública como se privada fosse. No Brasil, essa prática social das elites
é marcada pela não demarcação entre a esfera pública e a privada.
Alguns desafios se colocam para a realização dos processos participativos no âmbito do saneamento, considerando os novos ol-
hares e novos arcabouços político-jurídicos da atualidade resultantes da conquista de processos democráticos. Para a superação 133
Nesse sentido, para a efetivação dos Planos Municipais de Saneamento Básico – PMSB mediante a promoção de práticas partici-
pativas e de ações de mobilização e comunicação social, é necessário investimento da instituição promotora com vistas à adoção
de novas práticas que privilegiem o interesse coletivo acima do individual, assim como o desenvolvimento das ações relacionadas
abaixo:
• Realizar planejamento para organizar e pactuar os principais eixos, objetivos e recursos com os atores institucionais e sociais
envolvidos.
• Promover ações de sensibilização dos técnicos sobre a importância do PMSB e sua realização mediante metodologias partici-
pativas, assim como a necessidade de instrumentos de comunicação e informação de caráter democrático.
• Buscar contemplar espaços já constituídos para a elaboração de outros planos, a exemplo do Plano Diretor, do Plano de
Bacias Hidrográficas, Plano de Habitação, Mobilidade Urbana, Saúde e Educação.
• Realizar investimentos para a qualificação/capacitação técnica, a exemplo da elaboração de convênios junto a instituições de
ensino e pesquisa, podendo-se buscar apoio da Rede de Capacitação e Extensão Tecnológica em Saneamento Ambiental –
Tais estratégias e as ferramentas adequadas de comunicação promovem a conexão entre as informações técnicas no âmbito do
saneamento com o universo de comunicações e linguagens existentes no cotidiano do cidadão-usuário (NURENE, 2008).
135
BORJA, Patrícia C.; ELBACHÁ, Adma T. Política de Saneamento do Estado da Bahia: Uma avaliação crítica. In: CONGRESSO
BRASILEIRO DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL, 18., 1995, Salvador. Anais... Rio de Janeiro: ABES, 1995.
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NOGUEIRA, M. A. Um Estado para a Sociedade Civil: temas éticos e políticos da gestão democrática. São Paulo: Cortez, 2004.
136
NURENE-ReCESA Elaboração de planos de saneamento: guia do profissional em treinamento: nível 2. Salvador: ReCESA/MCI-
DADES, 2008.
NURENE-ReCESA. Saneamento e educação ambiental: Guia do profissional em treinamento: nível 2. Salvador: ReCESA/MCIDADES,
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1998. Não publicado.
RODRIGUES, Carmem Lúcia; MEIRA, Maria Lídia Romero; SOUZA, Amílcar Marcel de; OLIVEIRA, Renata Evangelista de. Desafios e
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TORO, J. B.; WERNECK. Mobilização social: um modo de construir a cidadania e a participação. Belo Horizonte: s/ed., 2004.
Clênio Argolo
João Batista Peixoto
João Carlos Machado
Tatiana Santana Timóteo Pereira
Alexandre Araújo Godeiro Carlos
Otávio Silveira Gravina
Gabriella Pereira Giacomazzo
Brasília - 2011
6. Saneamento Integrado......................................................................................................................................................175
7. Referências........................................................................................................................................................................181
139
O texto aborda aspectos conceituais das tecnologias apropriadas e as tendências tecnológicas atuais para os quatro componentes
141
No âmbito da reestruturação do setor foi necessário criar condições para a capacitação dos recursos humanos, a partir de novos
paradigmas tecnológicos e de gestão pública, com vistas a tornar a ação pública mais efetiva e articulada com pressupostos de
nosso tempo.
Na atualidade, capacitar um profissional no campo do saneamento envolve uma série de conteúdos que estão além da questão
tecnológica, em seu sentido restrito. A complexidade da realidade contemporânea exige um profissional com perfil capaz de
atuar a partir de uma abordagem interdisciplinar, pois, cada vez mais, a análise da realidade e a identificação de alternativas
tecnológicas exigem um olhar que contemple diversas dimensões: sociais, culturais, institucionais, políticas, ambientais, etc.
No campo da tecnologia, os novos paradigmas envolvem a adoção de tecnologias apropriadas à realidade local, como nos
anos 1980, e, ainda, indutoras de novos comportamentos, em face dos padrões atuais de consumo de água e geração de
resíduos líquidos e sólidos; ou seja, tecnologias que busquem privilegiar o controle na produção e distribuição; e na geração
a minimização, o reúso e a reciclagem das águas e dos resíduos sólidos. Com essa abordagem, certamente, será necessário
imprimir modificações profundas em termos de concepção de projeto.
A Lei nº 11.445/2007, em seu art. 2º, estabelece a necessidade da adoção de métodos, técnicas e processos que considerem as
peculiaridades locais e regionais, bem como, a utilização de tecnologias apropriadas, considerando a capacidade de pagamento
dos usuários e a adoção de soluções graduais e progressivas (BRASIL, 2007). Assim, na atualidade, a adoção de novos paradigmas
143
tecnológicos torna-se uma necessidade.
O uso de tecnologias apropriadas vem sendo estimulado em nível internacional desde a década de 1970, tanto pela Organização
Mundial da Saúde – OMS, como pelo Banco Mundial – BIRD. No Brasil, o estímulo à adoção dessas tecnologias se inicia na
década de 1980. Naquele momento, as discussões e as críticas às tecnologias denominadas “convencionais” começam a tomar
corpo, tanto em termos dos custos de implantação, operação e manutenção, como também quanto a sua adequação às diferentes
realidades socioambientais e culturais.
A tecnologia apropriada
Preocupações como: os impactos ambientais das tecnologias implantadas; a maximização da eficiência energética dos projetos;
a capacidade institucional e técnica dos gestores em implantar, operar e manter os sistemas projetados, entre outros, passam a
compor o elenco de variáveis para a adoção de tecnologias apropriadas às realidades locais. No mesmo sentido, o processo de
democratização e a ampliação da participação cidadã na gestão pública têm impulsionado a participação social na seleção das
tecnologias. Nessa perspectiva, a adoção de tecnologias apropriadas assume papel estratégico para a garantia da efetividade,
eficiência e a eficácia das ações implementadas.
Esse objetivo, no entanto, enfrenta o grande desafio de demover a resistência de certos setores da sociedade, da comunidade
técnica e dos gestores em realizar alterações nos padrões tecnológicos vigentes, em razão de interesses econômicos, corporativos
ou de conservadorismo cultural (medo de enfrentar mudanças), e até mesmo a manutenção do poder político. Contudo, o desafio
mais relevante e que deve orientar as políticas públicas é o de empreender esforços para a reversão do quadro sanitário do País, o
qual depende da adoção de tecnologias compatíveis com as realidades sociais, culturais, econômicas, financeiras, institucionais,
legais e com a capacidade de pagamento dos usuários/cidadãos.
Assim, apesar da quantidade de água doce ser suficiente para suprir as necessidades das formas de vida, a sua distribuição não
uniforme em torno do globo, bem como a má gestão, impõem, para algumas regiões e segmentos sociais, situações de escassez
e sede.
A escassez de água vem ocorrendo por diversos fatores como, por exemplo: poluição dos mananciais por resíduos líquidos e sólidos;
uso indiscriminado de agrotóxicos e fertilizantes; emissão de poluentes atmosféricos; desmatamento e aceleração de processos
erosivos e da desertificação; assoreamento de corpos d´água ampliando a evaporação de rios e lagos; impermeabilização do solo,
aumentando o escoamento superficial e diminuindo a recarga dos aquíferos subterrâneos; má gestão dos recursos hídricos, entre
outros. Nos centros urbanos, a ausência ou deficiência de saneamento têm determinado a poluição dos rios e o comprometimento
da qualidade e quantidade de água disponível para os diversos usos.
No cenário mundial a situação do Brasil, com relação à disponibilidade hídrica, é das mais confortáveis. O país detém 12% da
água doce do mundo (REBOUÇAS, BRAGA e TUNDISI, 1999). Essa disponibilidade coloca desafios ainda maiores para o Brasil, no
145
sentido de estabelecer políticas públicas que venham regular, de forma soberana, o uso desse recurso cada vez mais escasso.
Embora o país desponte entre os que detêm maior disponibilidade hídrica, a distribuição espacial desse recurso é desigual e
sofre um descompasso em relação à demanda da população. Enquanto o maior potencial hídrico brasileiro encontra-se na região
Norte, em torno de 502.338 m3/hab.-ano, esta região possui a menor demanda, pois abriga apenas 7,6% da população brasileira.
Situação oposta é observada na região Sudeste, onde o potencial hídrico é de 4.606 m3/hab.-ano e a população corresponde a
aproximadamente 44,5% da população do país, com uma demanda total de 436 m3/hab.ano. A situação mais desconfortável,
em termos de potencial hídrico e demanda da população, está na região Nordeste, principalmente nos estados de Pernambuco,
Paraíba, Rio Grande do Norte e Sergipe. No entanto, em nenhum estado brasileiro existe escassez de água (MORAES, 2002, a
partir de MAIA NETO, 1997 e IBGE-CENSO 2000).
Indicador de renovação hídrica: 1.700 m3/hab./ano (alerta de escassez); 1.000 m3/hab./ano (seca crónica); 500 m3/hab./ano (escassez absoluta) (FALKENMARK e WIDSTRAND, 1992).
A perspectiva de escassez já é uma preocupação em Regiões Metropolitanas como a de Curitiba, Recife, São Paulo e Porto
Alegre, no Vale do Rio Sinos. No caso de Curitiba, estudos realizados por Andreoli e outros (2000), evidenciam que, se mantida
a disponibilidade hídrica atual, os mananciais disponíveis serão suficientes até o ano 2050, para o crescimento populacional
mínimo estimado, e até 2040 para o crescimento máximo. A cidade do Recife sofre com a escassez de água há 20 anos, o que
tem determinado a prática do racionamento pela Companhia Estadual de Água e Esgoto. Entre os usos da água, a agricultura
brasileira é responsável pelo maior consumo (cerca de 70% do total), o restante é consumido igualmente entre o uso industrial e
doméstico (HESPONHOL, 2003). Apesar da situação confortável de disponibilidade hídrica no país e da não existência de escassez,
o acesso universal da população à água potável ainda é um grande desafio. Segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostra de
Domicílios do IBGE, em 2006 aproximadamente 18,3% da população total brasileira (ou cerca de 10% da população urbana) não
tinha acesso à rede pública de água, totalizando 34.025.000 pessoas (IBGE, 2008a).
Além desse contingente populacional excluído dos serviços públicos de água, o acesso ao abastecimento é desigual no país, em
termos regionais e faixa de renda da população. Considerando a cobertura da população com rede pública de água, a situação
mais crítica ocorre na região Norte, onde 44% da população total (31% da população urbana) não contava com esse serviço em
2006. No entanto, a pior situação foi constatada no Nordeste, uma vez que esta região detinha o maior contingente de brasileiros
excluídos do acesso à rede de água, um total de 13.779.000 de habitantes. Ou seja, 41% dos excluídos ao acesso à rede pública
de água no país vivia no Nordeste brasileiro em 2006 (Tabela 1).
Um total de 34.023.000 brasileiros, 22.628.000 na zona rural, usava outra forma de abastecimento, a exemplo de poços, rios, lagos,
barreiros e, ainda águas de chuva reservadas em cisternas. Desses, 29.460.000 não possuíam canalização interna para transportar
a água captada para o interior do domicílio, sendo que 13.106.000 viviam nas regiões Norte e Nordeste do país (Tabela 2).
147
Um dos maiores problemas relacionados ao manejo das águas refere-se ao desperdício. De acordo com dados do Sistema Nacional
de Informação em Saneamento, em 2006, as perdas de água nos Sistemas de Abastecimento de Água – SAA no Brasil são da
ordem de 33%, chegando a alcançar 86% em alguns municípios brasileiros (Ministério das Cidades, 2008a). A adoção de programas
de controle de perdas consistentes e continuados torna-se uma necessidade inadiável e nem sempre exige ações de alto custo
de implantação, possibilitando, inclusive, significativa economia de custos operacionais com as reduções das perdas, viabilizando
financeiramente a adoção de medidas que exijam o uso de técnicas mais sofisticadas. Diversos estudos vêm demonstrando as
possibilidades reais da adoção de novas práticas do uso da água. Viegas e outros (2006) ao estudarem as perdas de água e de
desperdício de energia elétrica no sistema de abastecimento de Rio Pardo, operado pela CORSAN, propõem os Planos de Ação de
Redução de Perdas Reais e Aparentes, cujos fluxogramas podem ser vistos nas Figuras 3 e 4.
Gerenciamento
e controle de pressão Fonte: Viegas e outros, 2006.
Perdas Reais
Inevitáveis
Qualidade e rapidez Controle de
da manutenção vazamentos ativos
Volume Anual de
Perdas Reais
Gerenciamento da
infra-estrutura
Gerenciamento
e controle de pressão
Gerenciamento da
infra-estrutura
Entre as ações de combate às perdas de água pode-se citar o controle de vazamentos, ampliação da micromedição e instalação de
Válvulas Redutoras de Pressão – VRP (Figura 5).
150
Fonte: http://images.google.com.br/imgres?imgurl.
Segundo Souza (2007), uma diminuição de 10% da pressão na rede de distribuição implica em uma redução de 11,5% nas vazões
de vazamentos.
A lavagem dos filtros pode representar uma perda de 2% a 5% do volume de água produzido numa Estação de Tratamento de Água
(ETA), dependendo da eficiência do tratamento (CORNWELL citado por SILVA e GOMES, 2007). Em situações de operação ineficiente
esse percentual pode ser ainda mais elevado. A reutilização dessa água representa uma medida de uso racional, diminuindo a
quantidade de efluente gerado e aumentando a disponibilidade de água para consumo. Estudos realizados por Ribeiro (2007), na ETA
de Itabirito/MG, demonstraram potencial de uso das águas de lavagem dos filtros e do lodo gerado. O autor destacou a possibilidade
do uso de leito de secagem para o deságüe do lodo e posterior uso em indústria cerâmica e a construção de decantadores específicos
para o recebimento das águas de lavagem dos filtros, para posterior recirculação do sobrenadante.
No Brasil já existem leis municipais que instituem a obrigatoriedade da instalação de hidrômetros individuais em novos condomínios,
a exemplo das cidades de São Paulo (Lei nº 12.638/1998), Rio de Janeiro, Distrito Federal (Lei nº 3.557l/2005), Recife (Lei nº 16.759),
além de algumas leis estaduais (Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Sergipe, Matogrosso do Sul, Espírito Santo, Minas
Gerais e Paraná).
Em relação às leis estaduais e projetos de leis federais tratando dessa matéria, em que pese a importância do seu objeto, sua
eficácia pode ser prejudicada, visto que se trata de assunto de competência legislativa municipal, por envolver questão de política
urbana, conforme prevê o art. 182 da Constituição Federal e a Lei Federal nº 10.257/2001 (BRASIL, 2001). Portanto, esse objetivo
terá efetividade garantida se incluído na legislação municipal pertinente (Código de Obras). A Figura 6 apresenta um esquema de
medição individualizada.
151
Fonte: http://www.saaeb.com.br/manualmicromedicaoindividual2.htm
152
A estrutura tarifária também pode estimular a economia de água. Alguns prestadores do serviço público de abastecimento de água
Contudo, para a eficácia das medidas de conservação da água é imprescindível a participação dos usuários e gestores. Portanto, a
gestão e o manejo das águas devem ocorrer de forma democrática e transparente devido à essencialidade deste elemento à vida
humana.
153
Em 2006, somente 68,2% da população urbana brasileira possuía solução adequada para o destino dos esgotos sanitários (IBGE,
2008a). Naquele ano, cerca de 59,3 milhões de brasileiros não dispunham de esgotamento sanitário, metade destes vivia nas regiões
Norte e Nordeste e nestas, pouco mais da metade, em área urbana. Nas áreas rurais, 79,7% dos moradores – 24,9 milhões – não
contavam com destino adequado dos esgotos, déficit muito superior ao das áreas urbanas. Metade desse déficit foi verificado na
região Nordeste – Tabela 3 (IBGE, 2008a).
População (em 1.000) População com esgotamento sanitário adequado (em 1.000)
Regiões
Total Urbana Rural Total % Urbana % Rural %
Norte 15.017 11.347 3.670 7.564 50,4 6.842 60,3 722 19,7
Nordeste 51.455 36.728 14.727 23.990 46,6 22.554 61,4 1.437 9,8
Sudeste 79.420 73.124 6.296 68.841 86,7 66.917 91,5 1.923 30,5
Sul 27.245 22.566 4.679 20.897 76,7 18.783 83,2 2.114 45,2
Centro-Oeste 13.226 11.429 1.797 5.784 43,7 5.663 49,5 121 6,7
Brasil 186.363 155.194 31.169 127.075 68,2 120.759 77,8 6.316 20,3
A Política de subsídios é prevista na Lei nº 11.445/07 (arts. 3º, VII; 11, § 2º, IVC; 23, IX;; 29, II E 31)
1) Até 2003, exclusive a população da área rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
2) Esgotamento sanitário adequado considera os domicílios ligados à rede geral (separadora e/ou unitária – inclui rede de drenagem e fossa séptica).
Diante desse quadro sanitário, o solo e os cursos d’água passam a se constituir em receptores de efluentes de esgotos domésticos
e de outros usos, lançados sem tratamento prévio, ocasionando a degradação ambiental e a disseminação de enfermidades
relacionadas com a falta de saneamento, entre outras consequências.
Assim, as tecnologias a serem adotadas devem considerar o grau de urbanização; a densidade populacional; as condições do solo;
o clima; a topografia; as possibilidades da adoção de soluções individuais; a capacidade dos corpos receptores de autodepuração de
cargas orgânicas e nutrientes remanescentes do tratamento dos esgotos; o reúso dos efluentes e dos nutrientes da carga orgânica
degradada; os custos de implantação, operação e manutenção; a capacidade institucional e técnica do prestador do serviço para
implantar, operar e manter o sistema de esgotamento; a capacidade de pagamento da população; além das características do
ambiente cultural e social.
A engenharia brasileira consagrou as soluções coletivas (sistema de redes) para o esgotamento sanitário como a melhor alternativa, a
mais apropriada e de melhor padrão sanitário. No entanto, o sistema coletivo é apenas uma das alternativas disponíveis, não devendo
ser encarada como norma para qualquer realidade. Como dito anteriormente, diversas são as variáveis que devem ser consideradas
para a seleção da alternativa tecnológica mais apropriada às realidades locais.
Os sistemas coletivos, geralmente, envolvem maiores custos de implantação e operação e exigem uma capacidade operacional
que muitos municípios e prestadores de serviços ainda não estão preparados para assumir. Em todas as regiões do país é comum
encontrar unidades de tratamento em péssimas condições de operação, ou paralisadas, principalmente quando fazem uso de
sistemas mecanizados. Muitas vezes, os consumos de energia das elevatórias e estações de tratamento envolvem custos altos em
relação à capacidade de geração de receita tarifária do sistema, criando problemas financeiros aos prestadores de serviços, tanto 155
para operar e manter o sistema como para ampliá-lo.
Cabe destacar que, conforme a solução adotada e/ou as características geográficas, os gastos com energia elétrica pode se constituir
na segunda maior despesa de operação do sistema de esgotamento, podendo até superar as despesas com pessoal. As redes
coletoras de esgoto, principalmente nas áreas periféricas, costumam se constituir em problemas para a população, em casos da obra
mãe mal executada ou por falta de manutenção, causando refluxos para as residências e/ou extravasamentos nas vias públicas. Esta
situação pode ser mais grave diante da ausência de outras infraestruturas e serviços urbanos, como a drenagem das águas pluviais e
a coleta de lixo, que acabam interferindo no funcionamento das redes de esgoto. A operação, na maioria dos casos, exige capacidade
institucional, pessoal qualificado e equipamentos adequados.
Inegavelmente, em algumas situações, principalmente em áreas urbanas densamente ocupadas, os sistemas coletivos se mostram
como a única solução. Mas, ainda assim, algumas questões merecem análise quanto à melhor alternativa de sistema como, por
exemplo, a escolha entre sistemas descentralizados de tratamento, concebidos conforme as bacias e sub-bacias, ou sistemas
integrados. Esses últimos geralmente são mais caros e complexos, em face da necessidade implantar, operar e manter um número
Portanto, para a escolha e adoção da alternativa mais adequada deve-se ponderar os custos dos investimentos, a capacidade
operacional do prestador do serviço e a capacidade de pagamento dos usuários-cidadãos, os quais, inclusive, devem participar dos
processos de discussão quando da seleção das tecnologias.
Por outro lado, nada impede que, em determinadas áreas da cidade, principalmente as de ocupação menos densa e solo compatível,
sejam utilizadas soluções individuais, como a fossa séptica-sumidouro, ou mesmo a fossa absorvente do tipo proposto pela OMS,
para solos de maior permeabilidade e baixo nível do lençol freático. Tais alternativas, principalmente as fossas sépticas, podem ser
operadas pelos prestadores de serviços, que devem garantir o destino adequado do lodo digerido ou o seu reaproveitamento. Em
novas áreas de expansão, de loteamentos ou condomínios, é possível também projetar sistemas que prevejam o reúso.
Assim, a seleção de tecnologias de esgotamento sanitário passa por reconhecer o tipo de urbanização das áreas objeto de intervenção.
No Brasil, o processo de urbanização ocorreu de forma acelerada em poucas décadas, havendo um grande descompasso entre
crescimento da população urbana e da infraestrutura sanitária. Hoje, segundo o IBGE (2008c), cerca de 83% da população do
país vive em áreas urbanas e 17%, em torno de 31,2 milhões de habitantes, em áreas rurais. O país conta com nove Regiões
Metropolitanas que abrigam 56,3 milhões de pessoas (30% da população total).
Segundo o IBGE, em 2000, cerca de 73% dos municípios brasileiros possuíam população inferior a 20 mil habitantes. Dos 5.560
municípios do país existentes em 2000, apenas 225 (4%) tinham população acima de 100 mil habitantes (SIMÕES, 2004). Cerca de
51% da população urbana e 12,5% da rural vive com menos de três salários mínimos, dado relevante para avaliar a capacidade de
pagamento das populações-alvo dos Planos Municipais de Saneamento Básico.
156
5.001 até 10.000 1.308 23,5 9.424.800 5,5
10.001 a 20.000 1.384 24,9 19.576.511 11,4
20.001 a 50.000 963 17,3 29.050.862 16,9
50.001 a 100.000 299 5,4 21.537.104 12,5
100.001 a 500.000 194 3,5 40.214.836 23,3
Mais de 500.001 31 0,6 48.004.567 27,8
Total 5.560 100 172.385.826 100,0
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de População e Indicadores Sociais, Indicadores Sociais Municipais 2000, citado por Simões, 2004.
O processo de seleção da tecnologia de esgotamento sanitário deve considerar também essa realidade. Certamente, para municípios
de menor porte populacional, ou com baixas densidades de ocupação e boas condições de infiltração do solo, o uso de soluções
individuais ou para pequenos conjuntos de domicílios, tais como: fossa absorvente, fossa séptica/sumidouro, vala de infiltração,
soluções de reúso, podem se constituir em alternativas adequadas e viáveis, tanto para o usuário como para o prestador do serviço,
o qual, muitas vezes, não tem capacidade técnica para operar e manter sistemas mais complexos. O fato da solução individual não
Aproximadamente 75% dos custos de implantação de um sistema de esgotamento sanitário devem-se às redes coletoras (ALEM
SOBRINHO e TSUTIYA, 1999). Desse modo, a busca por sistemas alternativos para coleta, transporte e tratamento do esgoto, visando
à minimização dos custos, torna-se fator decisivo. Entre os sistemas de coleta e transporte pode-se destacar o Sistema Condominial
de Esgoto – SCE (MELO, 1994, ANDRADE NETO, 1999a). Segundo Melo (1994), a necessidade de encontrar soluções técnicas para
substituição dos métodos convencionais de projetar redes de esgotos, a exemplo do sistema condominial, surgiu em razão do elevado
déficit de infraestruturas urbanas de esgotamento sanitário, sempre relegado ao segundo plano nas políticas de saneamento básico,
até a década passada. O SCE se apoia, fundamentalmente, na participação comunitária (ANDRADE NETO, 1999b). É substancialmente
mais econômico, em função das menores extensões e profundidades da rede coletora e da usual implantação de pequenos sistemas
descentralizados de tratamento (FUNASA, 1999). Os estudos de Azevedo Netto (1992) evidenciaram que esse sistema tem custo até
57,5 % inferior ao do sistema convencional. No sistema convencional a rede coletora acompanha o traçado das ruas contornando
todas as quadras e cada residência liga-se individualmente a essa rede. O SCE tem como ideia central, para a sua implantação, a
formação de “condomínios” de imóveis dentro de cada quadra do loteamento urbano (NAZARETH, 1997). A Figura 8 apresenta os
esquemas do sistema do tipo convencional e condominial.
Oliveira e outros (2006), ao realizar uma avaliação da aplicação da Tecnologia de Sistemas Condominiais de Esgotos em cidades
de diferentes portes, propõem um algoritmo para a adoção e implementação dessa tecnologia, que contempla quatro estágios: 1)
seleção tecnológica; 2) implantação; 3) operação; e 4) gestão (Figura 9).
Quanto às técnicas de tratamento, os sistemas ditos convencionais, além de contarem com elevados custos de implantação, operação
e grande consumo de energia elétrica, demandam extensos espaços nas áreas urbanas, já densamente ocupadas; podem causar
mau cheiro e geração de vetores. No aspecto socioeconômico, provocam desvalorização da terra e dos imóveis e diminuição de
atividades comerciais nas áreas próximas, facilitam roubos de equipamentos quando não existe esquema de segurança adequado e
outros problemas comumente observados nessas unidades.
Em alguns casos, estes sistemas requerem extensos emissários terrestres para a condução dos esgotos ao local de tratamento, que,
normalmente, geram impactos ambientais e reassentamento de famílias que ocupam os fundos dos vales, notadamente de baixa
renda, gerando problemas sociais. Os sistemas que privilegiam processos biológicos e uso da energia solar podem se constituir
158 em alternativas mais viáveis, por exemplo, os reatores anaeróbios de fluxo ascendente, combinados com lagoas de estabilização e
disposição no solo e/ou em zonas úmidas controladas. Além das facilidades operacionais e menor demanda de área, estes sistemas
também apresentam vantagens pelo menor consumo de energia.
Outra solução, que vem sendo cada vez mais estimulada, é o reúso do esgoto doméstico. O tratamento local e o reúso das águas
usadas nos domicílios, juntamente com a redução de águas servidas, são opções viáveis do ponto de vista sanitário e ecológico que
devem ser consideradas por uma política municipal de saneamento básico. Neste caso, além do estímulo ao uso de peças hidráulicas
de baixo consumo, pode-se usar as águas de banho e lavagem de roupa na descarga de vaso sanitário, após tratamento simplificado.
Há também a possibilidade do reúso do esgoto tratado em fertirrigação, hidroponia e psicicultura (BASTOS, 2003; ABUJAMRA,
ANDRADE NETO e MELO, 2007; PEREIRA, SILVA, ANDRADE NETO e MELO, 2007).
Seguindo essa tendência, para Cohim e Kiperstok (2007), o novo paradigma do saneamento ambiental deve considerar a abordagem
ecossistêmica e os ciclos de materiais, em lugar do uso de tecnologias de “fim de tubo”, caras e com uso intensivo de energia. Os
autores apostam no ecossaneamento, cujo princípio básico é garantir o ciclo de nutrientes, seguindo o exemplo da natureza. Assim,
159
as atividades do saneamento e da agricultura se entrelaçariam formando um ciclo único. O objetivo é a recuperação completa
dos nutrientes, material orgânico e água que são descartados através de sistemas de esgoto do tipo convencional. Tal estratégia
possibilita a fertilidade do solo e a melhoria da estrutura e capacidade de retenção de água, reduzindo, desta forma, o consumo de
recursos finitos e fornecendo uma alternativa natural aos fertilizantes químicos. As Figuras 10 e 11 apresentam o ciclo de nutrientes
considerando as tecnologias convencionais e o ecossaneamento.
Diante dessa realidade, as municipalidades passaram a implantar obras de drenagem urbana que buscavam, basicamente, remover
rapidamente as águas acumuladas nas vias e fundos de vale, o que resulta na transferência do problema para as áreas situadas
mais abaixo. Esse modelo, dito tradicional, de tratar a problemática das águas de chuva, típico dos anos 1940-70, caracteriza-se
pela visão pautada em medidas higienistas, na qual a água pluvial é vista como problema à saúde pública. Entre os anos 1970-90, a
visão corretiva passou a ser incorporada. Nesse período buscava-se atuar no controle das enchentes urbanas a partir da detenção e
amortecimento das cheias. Prevaleciam as medidas estruturais, pautadas na implantação de sistemas de micro e macrodrenagem,
reservatórios, diques e barragens. As limitações dessas soluções são perceptíveis diante dos prejuízos e dificuldades que as cidades
vêm enfrentando para solucionar as frequentes enchentes e inundações.
Na década de 1990 surge uma nova abordagem para a questão, pautada no “manejo” das águas de chuva, intitulada de “sustentável”,
cujo objetivo é se aproximar do ciclo natural da água. Essa visão privilegia as ações de planejamento do uso e ocupação do solo, a
incorporação dos mecanismos naturais de escoamento-infiltração das águas, a melhoria da qualidade das águas e a devolução da
rede hídrica à cidade (TUCCI e MENDES, 2006).
A drenagem sustentável tem um caráter preventivo e se sustenta em ações não estruturais, a exemplo: 161
• definição de normas, regulamentos e programas que visem disciplinar o uso e a ocupação do solo, contendo o desmatamento
e a impermeabilização do solo;
• reconstituição da vazão pré-ocupação através de trincheira de infiltração, pavimentos porosos, entre outros;
• recomposição vegetal para o aumento da taxa de infiltração, evapotranspiração, assim, consequentemente, para a redução do
escoamento superficial, das erosões e assoreamentos, e para a diminuição do pico de cheias;
• construção de reservatórios de detenção para uso ou armazenamento temporário das águas de chuva com vistas a reduzir o
impacto da cheia;
• captação de águas de chuva para detenção ou usos diversos;
• realização de alerta de enchente e evacuação;
• conscientização da população para a manutenção dos dispositivos de drenagem.
As normas e regulamentos para melhorar o manejo da água de chuva, a partir do ordenamento do uso e ocupação do solo, envolvem
os planos diretores urbanos, códigos de postura e leis específicas, entre outros instrumentos da política urbana.
A captação de água de chuva busca resolver dois problemas: o abastecimento de água humano e os picos de cheia. A primeira
Fonte: www.casa.com.br.
162 Os pavimentos permeáveis são superfícies porosas ou perfuradas que permitem a infiltração de parte das águas do escoamento
superficial para o interior de uma camada de reservação situada sob o terreno, podendo ser aplicada em calçadas, estacionamentos
e outros locais (Figura 13). Essa técnica apresenta-se bastante promissora, tanto do ponto vista técnico como urbanístico/paisagístico
e tem tido boa aceitação por parte da população (ARAÚJO, TUCCI, GOLDENFUM, 2008).
As trincheiras de infiltração são valas cujo princípio se baseia no armazenamento temporário da água no solo e posterior absorção
(Figura 14). Esse método envolve o manejo das águas no próprio lote. Segundo Nascimento (citado por SOUZA e GOLDENFUM, 1997)
as principais vantagens dessa técnica são:
• diminuição ou até mesmo eliminação da rede de microdrenagem;
• redução do risco de inundação e da poluição das águas superficiais;
• recarga das águas subterrâneas e boa integração com o espaço urbano.
Entre as desvantagens tem-se: informações sobre seu funcionamento em longo prazo e critérios de projeto e dimensionamento.
163
Segundo Tucci (2003), as medidas estruturais para a proteção de uma área inundável têm custo superior ao de medidas não
estruturais. Citando o exemplo de Denver nos Estados Unidos, em 1972, o autor observa que “o custo de proteção por medidas
estruturais de um quarto de área era equivalente ao de medidas não estruturais para proteger os restantes três quartos da área”
(idem, p. 74).
O Quadro 2 resume as principais diferenças entre os conceitos tradicionais e o sustentável para o manejo das águas de chuva e
drenagem urbana.
Redes subterrâneas, canalização de cursos d’água Valorização da presença da água na cidade, busca de menor
naturais. interferência sobre o sistema natural de drenagem.
Sistema de drenagem gravitacional, não controlado, Sistema de drenagem controlado, possibilidade de alteração na
configuração fixa da rede de drenagem. configuração da rede de drenagem.
Concepção e dimensionamento segundo um nível
Concepção e dimensionamento segundo diferentes níveis de risco de
único de risco de inundação pré-estabelecido para
inundação para atender a objetivos diferenciados.
atender a um único objetivo.
Não previsão e inoperância em face de eventos de Avaliação do funcionamento do sistema para eventos de tempos de
tempos de retorno superiores aos de projeto. retorno superiores aos de projeto, gestão do risco de inundação.
Alguns municípios e estados brasileiro vêm editando leis que visam obrigar a execução de reservatórios para a coleta de águas de
chuva, a exemplo do município de São Paulo, cuja Lei nº 13.276/2002 torna obrigatória a execução de reservatório para as águas
coletadas por coberturas e pavimentos nos lotes, edificados ou não, com área impermeabilizada superior a 500 m.
Atualmente, encontra-se em tramitação no Senado Federal um projeto de lei que determina o reaproveitamento das águas pluviais
e a reciclagem das águas servidas em edificações públicas e privadas do país, observando-se que, nesta matéria de política
urbana, salvo o que se aplicar aos imóveis da União, à lei federal cabe estabelecer as diretrizes gerais, de caráter nacional, a serem
consideradas nas legislações municipais.
A grande maioria dos resíduos, até hoje, tem disposição irregular, representando permanente ameaça para a contaminação do
ambiente e à saúde da população. O Brasil produz cerca de 240 mil toneladas de lixo por dia – número inferior ao dos EUA (607
mil t/dia), mas bem superior ao da Alemanha (85 mil t/dia) e a Suécia (10,4 mil t/dia). A produção média de resíduos sólidos
domiciliares é de 0,6kg/hab/dia (IEE/USP, 2008). Além disso, são produzidos cerca de 0,3kg/hab/dia de resíduos provenientes
da varrição, limpeza de logradouros públicos e entulhos. Essa taxa, em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba, pode
chegar a 1,3kg/hab/dia, considerando todos os resíduos manipulados pelos serviços de limpeza urbana (domiciliares, comerciais,
de limpeza de logradouros públicos, de serviços de saúde e entulhos(IEE/USP, 2008).
Os serviços de resíduos sólidos e limpeza pública são compostos basicamente por: acondicionamento, coleta, transporte,
tratamento e disposição final dos resíduos sólidos urbanos; limpeza de logradouros (varrição, capina e roçagem) e serviços
diversos, como limpeza de mercados, praias e outros espaços públicos.
Segundo a PNAD de 2006, cerca de 78% dos moradores de domicílios particulares permanentes do país dispunham de coleta
do lixo feita diretamente. Na área urbana esse indicador chegava a 89,9% e na rural 18,7% (IBGE, 2008a). Como nos outros
componentes do saneamento básico, as regiões Norte e Nordeste do Brasil dispunham dos menores indicadores com 67,5% e
60,8%, respectivamente (Tabela 5).
Norte 15.016 10.141 67,5 11.347 9.592 84,5 3.670 549 15,0
Nordeste 51.456 31.299 60,8 36.728 29.484 80,3 14.727 1.815 12,3
Sudeste 79.419 70.190 88,4 73.124 68.350 93,5 6.296 1.840 29,2
Sul 27.245 22.785 83,6 22.566 21.432 95,0 4.679 1.353 28,9
Centro-
13.226 10.941 82,7 11.429 10.683 93,5 1.797 258 14,4
Oeste
Brasil 186.362 145.356 78,0 155.194 139.541 89,9 31.168 5.815 18,7
Fonte: IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, 2008a.
A Pesquisa Nacional de Saneamento Básico – PNSB, realizada pelo IBGE em 2000, evidenciou a problemática dos resíduos
sólidos ao revelar que cerca de 30,3% dos resíduos domésticos coletados diariamente no país eram dispostos em vazadouros
a céu aberto. A pesquisa também mostrou que 40,7% dos resíduos eram encaminhados a aterros sanitários e 22,0% a aterros
controlados (Tabela 6)
Tabela 6 - Quantidade diária de lixo coletado por unidade de destino final do lixo coletado.
PNSB, 2000.
166
Unidade de destino final do lixo Quantidade diária de lixo coletado
%
coletado (Toneladas por dia)
A exemplo dos aterros sanitários da Bahia, muitas dessas unidades, principalmente em municípios de médio e pequeno porte,
não vêm sendo operadas adequadamente, vindo a se transformar em lixões. Dentre os fatos que contribuem para essa realidade,
pode-se destacar a falta de condições financeiras e técnicas dos poderes públicos municipais para operar essas unidades, que,
normalmente, são concebidas e implantadas sem considerar as realidades locais.
167
Contribuem com essa situação, os pressupostos que até os dias atuais vêm fundamentando as ações e alternativas tecnológicas
no campo dos resíduos sólidos, os quais privilegiam o uso de tecnologias e processos que não abordam a problemática maior que
é a crescente produção de resíduos descartáveis, promovida pelo padrão de consumo e estilos de vida contemporâneos.
Mais recentemente, essa abordagem vem sendo questionada e dando lugar a novos enfoques, que têm se pautado nas teses da
minimização dos resíduos e na produção mais limpa. Azevedo (2004), ao estudar a minimização desses resíduos, apresenta a
distinção entre essas abordagens (Quadro 3). Para a autora, a minimização e a recuperação de materiais proporcionam o aumento
da vida útil de aterros sanitários e, consequentemente, uma redução do ritmo da degradação do meio ambiente.
Corresponde à época em que os problemas Abordagem que pretende criar técnicas de produção
Paradigma
ambientais não eram conhecidos. para um desenvolvimento sustentável.
Moraes (2000) considera a Gestão Integrada dos Resíduos Sólidos como uma alternativa importante para o manejo dos resíduos,
que envolve quatro elementos fundamentais:
• a integração de todos os segmentos sociais na gestão do sistema municipal de resíduos sólidos;
• a incorporação de todos os elementos da cadeia de geração de resíduos sólidos, desde o processo produtivo até o descarte
final;
• a integração dos aspectos técnicos, ambientais, sociais, institucionais e políticos para assegurar a gestão adequada do ponto
de vista ambiental e social;
• a relação da problemática dos resíduos sólidos com outros sistemas urbanos, tais como drenagem de águas pluviais,
esgotamento sanitário, recursos hídricos e abastecimento de água, etc. (MORAES, 2000, apud PMPA, CNUAH e IPES, 2000).
Os resíduos recicláveis são distribuídos diariamente em nove unidades de triagem – UT, que são operadas por diferentes
associações de catadores. Além disso, a cidade conta com Pontos de Entrega Voluntária – PEV integrantes do esquema de coleta
dos resíduos recicláveis. A venda do produto gera renda para as famílias envolvidas, abrangendo, no total, 1.800 pessoas (REDE
URBAL, 2008). Assim, o sistema integrado de Porto Alegre caracteriza-se por dois eixos: o equacionamento da problemática de
destinação de resíduos potencialmente recicláveis e a geração de trabalho e renda para segmentos vulneráveis ou excluídos do
mercado de trabalho.
170
Fonte: http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://www.espacoacademico.com.br
171
Estudos realizados por Zordan e Paulon (2008), com resíduos da construção, indicaram que o entulho pode ser utilizado como
agregado na confecção de concreto não estrutural destinado à infraestrutura urbana (Figura 21).
Fonte: www.reciclagem.pcc.usp.br/a_utilizacao_entulh...
Fonte: http://www.semasa.sp.gov.br/imagens/noticias/coleta-infectantes.jpg
A destinação final dos resíduos, hoje um dos maiores desafios do país, vem sendo estudada com vistas a identificar alternativas
mais viáveis do ponto ambiental e financeiro. Para municípios de pequeno porte, algumas alternativas têm sido indicadas, tais
como: Aterro Sustentável; Aterros Sanitários em Valas, padrão CETESB; Aterros Sanitários Simplificados, tipo CONDER; e Aterros
Sanitários Manuais, padrão CEPIS/OMS (MAY, 2007).
O Aterro Sustentável foi proposto pelo PROSAB 3 para municípios com população até 10.000 habitantes (CASTILHOS JR. e outros,
172 2003), sendo caracterizado pela
Os aterros sanitários em valas do tipo CETESB, conhecidos como trincheiras de pequenas dimensões, são recomendados para
municípios que geram até 10 toneladas por dia de resíduos (CETESB, 1997 apud MAY, 2008) ou com população de até 25.000
habitantes (CETESB, 2005) e para municípios que não dispõem de recursos financeiros para aquisição de equipamentos e
implantação e operação de um aterro convencional (MAY, 2008). No caso desse tipo de aterro, os resíduos são descarregados
pelas laterais em valas de largura e profundidade de aproximadamente 3 m, com preenchimento diário das trincheiras, no sentido
longitudinal, com o próprio solo da escavação, sem o ingresso do veículo no seu interior. O comprimento das valas depende da
configuração da área escolhida e o seu seccionamento é feito a cada 20 m de comprimento com 0,5 m de espessura de solo
natural, sendo que a vida útil recomendada é de, no máximo, um mês (MAY, 2008). Na Figura 24 pode-se ver o esquema de um
aterro sanitário em valas da Cetesb.
Por fim, é importante pontuar que a problemática dos resíduos sólidos tem vínculos com o estilo de desenvolvimento, e que seu
enfrentamento depende da revisão da lógica de produção e consumo, sendo as tecnologias limpas e a gestão integrada dos
resíduos sólidos ações que deverão compor uma política mais ampla de desenvolvimento social.
174
Projetos de ações integradas de saneamento ambiental ou de saneamento integrado vêm sendo realizados em diversos
municípios brasileiros. Esse modelo de intervenção pressupõe ações integradas e intersetoriais, em nível local, e a participação da
comunidade-alvo, tendo por objetivo alterar as condições de salubridade do ambiente e a qualidade de vida da população. Nesses
projetos, a participação ativa e crítica da população deve ser garantida desde a fase do diagnóstico, passando pela concepção,
elaboração de projetos, implantação, operação e manutenção. Essa participação busca superar a visão utilitarista da população
sobre a operação e manutenção dos projetos, para construir, em conjunto com os diversos segmentos sociais e o poder público,
intervenções que, além de alterar as condições de vida da população, promovam o seu empoderamento com vistas à ampliação
de ações cidadãs.
O saneamento integrado é uma modalidade de intervenção composta de ações intersetoriais, que visam dotar as áreas de
intervenção com condições adequadas para uma vida saudável, envolvendo ações de abastecimento de água, esgotamento
sanitários, pavimentação, drenagem das águas pluviais, melhoria ou implantação de instalações hidráulicas e sanitárias,
intervenções urbanísticas, educação sanitária e ambiental, coleta, tratamento e destinação final dos resíduos, controle de vetores
175
e operação e manutenção permanente dos sistemas implantados. (MCIDADES, 2008).
As áreas objeto de intervenção em saneamento integrado geralmente são caracterizadas como favelas, invasões, loteamentos
irregulares, áreas de ocupação espontânea ou subnormais. Com o Estatuto das Cidades e a Política Nacional de Habitação – PNH,
essas diferentes características ou denominações foram unificadas sob o conceito de “assentamentos precários” (MCIDADES,
2008). Duas tipologias compõem esse tipo de assentamento: o cortiço e áreas que necessitam de ações de urbanização em face
da ausência ou precariedade de infraestrutura, saneamento, regularização fundiária, inadequação das moradias ou do terreno
ocupado (DENALDI, 2008 citado por MCIDADES, 2008). Os projetos de Saneamento Integrado são voltados para áreas enquadradas
na segunda tipologia de assentamentos precários.
As intervenções nos assentamentos precários objetivam a melhoria das condições sanitárias, o controle dos riscos geotécnicos
e de inundações e a integração física das áreas de intervenção ao bairro em que está situado, visando à inserção social da
população-alvo (MCIDADES, 2008).
Essas intervenções são financiadas pelo governo federal, mas requerem a existência de uma Política de Habitação e de um
Plano Local de Habitação de Interesse Social – PLHIS, para efetivação da contratação, requisito previsto na Lei nº 11.124/2005,
que se constitui em um dos instrumentos do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social – SNHIS. Se o projeto focar,
exclusivamente ou predominantemente, ações de saneamento básico, o município deverá, até dezembro de 2010, ter instituído a
Política e elaborado o Plano Municipal de Saneamento Básico.
As fontes de financiamentos de projetos de intervenções em assentamentos precários, como o Saneamento Integrado, envolvem
recursos do orçamento geral dos próprios municípios, da União, de órgãos estaduais de habitação ou, ainda, dos prestadores dos
serviços de água e esgoto.
No nível federal, além dos planos referidos no parágrafo anterior, os financiamentos geralmente estão condicionados à seleção
dos projetos em chamada pública do Ministério das Cidades e a atender aos requisitos estabelecidos pelo mesmo. No caso de
financiamentos com recursos não onerosos, os projetos devem estar consignados no Orçamento Geral da União (OGU), conforme
previsto no Plano Plurianual (PPA). No caso de financiamentos onerosos, com recursos do FGTS ou do FAT/BNDES, além da
seleção dos projetos em chamada pública, para o que observar os regulamentos desses fundos, o tomador – município, estado,
ou empresa municipal ou estadual de saneamento ou de habitação – deve atender aos requisitos da Lei de Responsabilidade
Fiscal, no que diz respeito ao limite de endividamento, e ter capacidade de pagamento, conforme avaliação do agente financeiro.
E ainda, a situação institucional da prestação dos serviços deve estar regular e o projeto executivo e respectivo orçamento devem
ser aprovados pelo agente financeiro.
Pode-se também solicitar financiamento externo junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Corporação Andina
de Fomento (CAF) e ao Banco Mundial (BIRD) (MCIDADES, 2008). Nesses casos, o empréstimo deverá contar com uma análise
prévia da Comissão de Financiamento Externo – Cofiex, ligada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG). As
solicitações de financiamentos devem ser feitas por meio de uma Carta Consulta, atendendo ao Decreto nº 3.502, de 12 de junho
176 de 2000, e ao Manual de Financiamentos Externos. A tramitação das propostas de financiamento se dá conforme procedimentos
definidos pelo MPOG e pelos agentes financeiros contendo, normalmente, os seguintes passos: Apresentação ao Cofiex; Carta-
Consulta; Aprovação pelo Cofiex; Identificação do Projeto; Preparação; Avaliação; Negociação; Aprovação da Diretoria; Aprovação
pelo Senado Federal e Assinatura.
Caso o projeto tenha participação dos governos estadual e/ou municipal, a contração de empréstimo externo também deve ser
aprovada pela Assembleia Legislativa e/ou pela Câmara de Vereadores. Projetos financiados por essas instituições estão sujeitos
também ao atendimento de uma série de exigências vinculadas às suas políticas para os países em desenvolvimento.
Projetos, como o de Saneamento Integrado, geralmente enfrentam dificuldades relacionadas às práticas profissionais e do poder
público, quanto ao diálogo com outros setores da administração e com a população. No entanto, as experiências até aqui realizadas
têm demonstrado que projetos de ações integradas que envolvem a participação cidadã têm maior potencial de êxito. Os avanços
sociais alcançados pelos projetos têm sido associados à democratização dos processos de decisão e, consequentemente, à
participação da sociedade. Tanto o Estatuto das Cidades como a Lei Nacional de Saneamento Básico reconhecem a importância
da participação social ao incorporarem instrumentos e mecanismos para a sua promoção.
Uma experiência que merece referência é o Projeto Aisam II desenvolvido a partir de uma parceria entre a Universidade Federal
da Bahia, a Universidade Estadual da Bahia – Projeto Thaba, a Prefeitura Municipal de Salvador, a Empresa Baiana de Águas e
Saneamento e a Fundação Nacional de Saúde – Funasa. O projeto teve por objetivo desenvolver um modelo intervenção de ações
O projeto foi desenvolvido entre os anos de 1993 a 1997, na localidade da Baixa do Camurujipe, assentamento periurbano de
Salvador, com população de 4.374 habitantes e 940 domicílios. Com financiamento do extinto Ministério do Bem-Estar Social,
no âmbito do Programa Habitar Brasil, no valor de US$ 1,5 milhão, foram implementadas ações de: abastecimento de água;
esgotamento sanitário; drenagem de águas pluviais; limpeza pública; pavimentação das vias; construção e melhoria de moradias;
e programa de educação sanitária e ambiental.
Visando abrir um espaço democrático e criativo, que promovesse a construção e exercício da cidadania, e que reconhecesse as
estratégias simbólicas e discursivas dos diferentes atores sociais envolvidos no projeto, foram criados canais de comunicação.
A intenção era promover a disseminação, apropriação ou, ainda, a rejeição dos conhecimentos provenientes do processo de
interação entre técnicos e população. Pretendia-se com isso abrir espaços para o conhecimento e reconhecimento da realidade
e propiciar negociações entre os diferentes atores. Entre os canais de comunicação utilizados, o mais importante foi o Comitê
Gestor Conjunto, composto por representantes dos três níveis de governo e da comunidade local. O Comitê se constituiu no fórum
democrático de decisões e implementação do projeto e no locus onde ocorreram as negociações e as definições das intervenções
a serem implementadas. Coube ao Comitê a definição dos projetos, da concepção até a aprovação, além do acompanhamento da
execução, funcionamento e avaliação das ações (MORAES e outros, 2002).
Alguns resultados podem ser destacados: melhoria significativa na salubridade ambiental, apesar da qualidade da água consumida
pela população não ter melhorado; impacto positivo na saúde da população local; satisfação dos moradores com as intervenções
de saneamento e moradia. O processo participativo promoveu a capacitação da população, embora não se tenha observado a 177
ampliação da capacidade crítica sobre a pobreza. Por outro lado, ocorreu um novo arranjo na organização social local, com a
ampliação de seu campo de ação.
Alguns dados sugeriram interferências positivas do projeto na melhoria da autoestima da população e na redução da violência
local, atribuídas à melhoria da imagem do lugar e aos processos participativos, principalmente, dos mutirões para a autoconstrução
de moradias. A localidade, antes vista como um espaço insalubre, marginal, com contornos típicos de “invasão”, passa a ter uma
imagem de bairro, passível de ser incorporada à cidade legal. O bairro abre-se para a cidade e torna-se mais digno, interferindo
positivamente na autoestima de seus moradores. Os indicadores de saúde antes e depois das intervenções demonstram os
impactos positivos do projeto, havendo redução substancial na diarreia de crianças entre 0 a 5 anos e das parasitoses intestinais
(Figuras 24 e 25).
50
40
30
%
20
10
0
ago/93 ago/94 fev/95 mai/95 jul/96 jul/97 jul/98
100
80
178
60
%
40
20
0
1994
% 89,18 53,34
A pesquisa realizada junto aos moradores evidenciou que cerca de 77% dos entrevistados consideraram que a vida no bairro
melhorou após as intervenções do projeto, sendo que 63% deles atribuíram este fato às obras realizadas.
Outro exemplo que merece referência é o da Prefeitura Municipal de Recife, que vem implementando projetos de ações integradas
INTERVENÇÕES EDUCAÇÃO
URBANÍSTICAS SANITÁRIA E
AMBIENTAL
INSTALAÇÕES CONTROLE DE
HIDROSANITÁRIAS
ENTO INTEGRAD
VETORES DE
DOENÇAS
AM
E
O
SA N
COLETA E
DESTINAÇÃO
DO LIXO
SISTEMA DE ÁGUA
179
Do ponto de vista institucional, a Política Municipal de Saneamento de Recife é executada pela Secretaria Municipal de Saneamento
e pela Autarquia Municipal de Saneamento, esta última criada em 2006, a partir de deliberação da I Conferência Municipal de
Saneamento de Recife, realizada em abril de 2002. A autarquia é um órgão executivo dotado de autonomia administrativa e
financeira e, portanto, com maior agilidade e racionalidade nos processos de licitação, contratação e execução de obras e
serviços, comparativamente com órgãos da administração direta. Sua criação veio coroar as negociações com o governo do
estado e a Compesa para a gestão associada dos serviços de água e esgoto no município de Recife, assegurando à prefeitura
uma participação decisiva na administração desses serviços. Para a execução dos projetos de saneamento integrado foram
constituídos Escritórios de Saneamento que têm por objetivo:
• integrar o cidadão e atender às suas necessidades, no que se refere à operação, manutenção, reforma e melhorias do sistema de
saneamento básico;
• executar ligações domiciliares e complementação de ramais de água e esgotos;
• operar e manter as estações elevatórias e estações de tratamento de esgoto (integrando a Compesa no atendimento destes serviços);
• promover ações de educação sanitária e ambiental com reuniões socioambientais, visitas domiciliares;
• executar serviços adicionais como: Planos Urbanísticos (remoções e reassentamentos, auxílio-moradia, indenizações parciais
As áreas de intervenção são selecionadas pelo poder público e pela população, por meio de votações em reuniões do Orçamento
Participativo. As primeiras localidades que sofreram intervenções foram os bairros de Mangueira e Mustardinha, mediante um
convênio entre a prefeitura municipal e o governo estadual, com interveniência da Compesa. O bairro da Mangueira, com área de
64,6 ha e população de aproximadamente 19.671 habitantes, foi contemplado com ações de Saneamento Integrado no valor de
R$ 21 milhões, incluindo a construção de moradias no interior de seu território e de um conjunto habitacional em terreno próximo.
Na Mustardinha, com área de 38,1 ha e população de 11.093 habitantes, as intervenções de Saneamento Integrado envolveram
as áreas críticas de Jacaré e Beirinha, que formavam aglomerados urbanos informais, sem condições mínimas de infraestrutura
básica (CAVALCANTI e outros, 2008). No total, entre 2002 e 2005, a Prefeitura Municipal de Recife atendeu a uma população de
181.134 habitantes, com diversas ações de saneamento, como pode ser visto na Tabela 7.
Entre os anos de 2001 a 2006, segundo o SNIS (2008), a população urbana de Recife com esgotamento sanitário cresceu 25%
(Figura 27), o que evidencia que as ações da prefeitura vêm alterando gradativamente a situação de saneamento do município.
800.000
População urbana com esgotamento sanitário
660185
600.000
586551 608950 607833
561649
486284
400.000
200.000
0
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João Batista Peixoto
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Brasília - 2011
5.Referências..........................................................................................................................................................................219
191
O documento aborda aspectos conceituais e metodológicos da avaliação de políticas públicas, discute o tema dos indicadores, os
modelos de avaliação, apresenta algumas experiências na avaliação de política de saneamento básico e recomendações para a
avaliação de Planos Municipais de Saneamento Básico.
Porém, a avaliação de política avança mais a partir da década de 1960 e, principalmente, nos anos 1970, com a nova crise
econômica em 1973. A necessidade de controlar os custos das intervenções públicas contribuiu para as avaliações de programas
governamentais. Naquele momento, diversos países, como os Estados Unidos e a França, criaram organismos que tinham a
função de avaliar as novas tecnologias.
No mesmo sentido, as avaliações têm sido mais direcionadas para o estudo do processo político de sua formulação e de tomada
de decisão, principalmente em estudos acadêmicos, sendo dada pouca atenção ao conteúdo, às consequências ou aos impactos
das políticas.
Assim, percebe-se a complexidade de um processo de avaliação e a necessidade de estabelecer, previamente, os seus objetivos
e o modelo da avaliação, devendo-se considerar a equipe técnica (número e qualificação) disponível, o tempo de sua execução,
as técnicas de pesquisa e os custos envolvidos.
Fleury (1994) afirma que o dilema das políticas sociais reside no fato de que não existe critério lógico-científico para a escolha
de um princípio de justiça coerente, consistente e superior a qualquer outro, que garanta automaticamente a produção da justiça.
Assim, qualquer avaliação de política ou programa se apóia nas subjetividades dos sujeitos que avaliam, estando fortemente
vinculada aos valores e visões de mundo desses sujeitos. Por isso é desejável que os processos de avaliação incorporem as
diferentes visões, os diferentes sujeitos sociais, isto é, sejam processos participativos. A avaliação de uma política pública envolve
o estudo da formulação, do seu desenvolvimento, das ações implementadas, dos resultados e impactos obtidos, e da análise do
contexto histórico e social.
Para Contandriopoulos e outros (1997), a avaliação tem como objetivos:
• analisar o andamento da intervenção em termos de planejamento e execução;
• auxiliar a tomada de decisão;
• determinar os efeitos da intervenção, visando decidir se a mesma deve ser mantida, modificada ou interrompida; e
196 • agregar conhecimentos para elaboração teórica.
Para Pedone (1998) a avaliação de uma política pública visa compreender os valores sob os quais a decisão política foi tomada,
visto que esta tem importante papel na criação e na defesa de valores sociais como: igualdade, liberdade, solidariedade e
democracia.
Avaliação política
Nesse tipo de avaliação não se discute o mérito da apropriação dos benefícios da política pela população e sim os fundamentos
conceituais e políticos que apoiam uma política.
Avaliação de política
Contandriopoulos e outros (1997), propõem dois tipos de avaliação de política: a normativa e a avaliativa, que têm as seguintes
características:
Pesquisa normativa
• Apreciação da estrutura da política ou programa: avalia a aplicação dos recursos, a estrutura administrativa, a capacitação
do pessoal em relação aos resultados esperados.
• Apreciação do processo: avalia o acesso, a cobertura, a adequação, a continuidade e a cortesia dos serviços para que se
atinjam os resultados, verifica, ainda, a satisfação da população e o nível de abordagem multiprofissional e interorganizacional.
Pesquisa avaliativa
• Apreciação dos resultados: compara os resultados com normas e critérios.
197
• Análise da intervenção: analisa a capacidade de os recursos e serviços disponibilizados atingirem os objetivos definidos.
• Análise da produtividade: estuda o modo como os recursos foram aplicados para produzir os serviços. Pergunta-se: era
possível produzir mais serviços com os mesmos recursos?
• Análise de rendimento: analisa a eficiência e relaciona os recursos empregados com os efeitos obtidos (análise de custo-
benefício, custo-eficácia ou custo-utilidade).
A avaliação de política envolve a análise de três critérios analíticos de políticas públicas: efetividade, eficácia e eficiência.
Efetividade
• Exame da relação entre a implementação de um programa e seus impactos e (ou) resultados.
• Avalia-se o sucesso ou o fracasso em termos de uma efetiva mudança nas condições sociais prévias das populações
atingidas pelo programa sob avaliação.
• Está fortemente relacionada a determinados ideais de igualdade e justiça social.
• Deve demonstrar que uma determinada realidade social tem uma relação de causalidade com uma política em particular.
• Os estudos de efetividade das políticas são muito difíceis e raros (FIGUEIREDO e FIGUEIREDO, 1986 e ARRETCHE, 1998).
Eficácia
• Critério mais aplicado, por ser mais factível e de menor custo.
• Verifica os objetivos e instrumentos explícitos de um determinado programa e seus resultados efetivos.
• Verifica as metas ou instrumentos propostos e os efetivamente atingidos (FIGUEIREDO e FIGUEIREDO, 1986; RICO e outros,
1998).
Eficiência
• Estuda a relação entre o esforço empregado na implementação de uma determinada política e os seus resultados alcançados.
• Verifica a utilização de recursos públicos na implementação da política, o que envolve os princípios de probidade, competência
e eficiência no seu uso (FIGUEIREDO e FIGUEIREDO, 1986; ARRETCHE, 1998).
No campo do saneamento básico, os conceitos vêm sendo debatidos mais intensamente nas três últimas décadas e, mais
recentemente, a Lei nº 11.445/2007 assim definiu as suas ações:
O saneamento básico tem sido caracterizado como: ação de saúde pública, medida de interesse local, direito do cidadão vinculado
à moradia digna e à salubridade do meio, ação de proteção ambiental, e, portanto, como direito social e ação vinculada às políticas
sociais.
Além da visão do saneamento básico como medida de prevenção à saúde, atualmente essa ação tem sido vista como medida
Saneamento básico
199
1.4. Sob quais princípios de política pública a avaliação se sustenta?
Uma vez que a avaliação de uma política pressupõe a análise da contribuição de uma determinada política, para o bem-estar da
população e da sua adequação aos princípios de justiça política e social, nota-se que um modelo de avaliação deve sustentar-
se em um paradigma de sociedade, indo além da simples coleta de dados. Tal paradigma deve contemplar as mudanças dos
processos sociais e as transformações mais profundas de concepção de sociedade e de estilo de desenvolvimento (BORJA, 1997).
Assim, o primeiro passo para a avaliação de uma política pública é definir sob quais princípios ou paradigmas de política pública
a avaliação se sustenta. Os princípios que norteiam as políticas públicas são socialmente construídos, recebendo influência da
conjuntura social, econômica, política e cultural de cada momento histórico. No campo do saneamento no Brasil, esses princípios
foram expressos na Lei nº 11.445/2007, sendo fruto de intensos debates no seio da sociedade brasileira. Uma vez que, como
Burocracia Segmentos
estatal sociais
200 Política
pública
Setores Setor
políticos empresarial
No campo do saneamento a participação e o controle social estão previstos na Lei Nacional de Saneamento Básico. Dessa forma,
o desafio que se coloca é empreender processos de avaliação transparentes, democráticos e participativos, que podem ocorrer
via conselhos, comitês de acompanhamento e avaliação e/ou audiências e reuniões públicas.
Para Will e Brigg (1995), os indicadores representam um meio de prover as políticas com informações, de demonstrar seu
desempenho ao longo do tempo e de realizar previsões, podendo ser utilizados para a promoção de políticas específicas e
monitorar as variações espaciais e temporais das ações públicas. Para um grupo de experts convocados pela ONU, para discutir
os indicadores de qualidade do desenvolvimento urbano (ONU, 1977), os indicadores permitem adquirir novos conhecimentos e/
ou transmitir os conhecimentos existentes, não só aos investigadores, mas também aos responsáveis pela tomada de decisões e
ao público em geral. Além disso, eles podem ser utilizados para descrever os prováveis resultados das políticas em curso, ou da
sua ausência, ou ainda identificar a adaptação e definição de novas políticas. Assim, os objetivos de um sistema de indicadores
devem, não apenas contemplar o interesse do poder público em avaliar a eficiência e eficácia das políticas adotadas, mas
também ser um instrumento de cidadania, na medida em que informam aos cidadãos o estado do meio ambiente e da qualidade
de vida (BORJA, 1997).
O processo de construção de um sistema de indicadores envolve uma série de decisões, não se constituindo em apenas um check
list de variáveis, indicadores. Dentre as diversas definições que são necessárias para a construção de um sistema de indicadores
pode-se citar:
Assim, a qualidade está impregnada de subjetividade – da qual, por si sós, os números e as estatísticas, elaborados na perspectiva
de técnicos e administradores, não podem dar conta.
Para Demo (1995), existem duas realidades: a visível e a invisível. A visível é mais afeta às experiências e análises, podendo,
portanto, ser captada por avaliações quantitativas. A invisível (qualitativa) exige a compreensão. Na medida em que compreender
corresponde a vivenciar, isto significa dizer que é preciso compartilhar uma realidade vivida para entender, e, compartilhar
corresponde a participar. Ou seja: para captar a dimensão qualitativa, os atores sociais devem participar do processo de avaliação.
Assim, um sistema de indicadores deve tratar de ambas as realidades, quantitativa e qualitativa.
Para Guimarães (1984), a qualidade do meio ambiente é uma meta social e comunitária, não podendo ser feudo exclusivo de
administradores, técnicos ou cientistas.
Em face da complexidade da realidade contemporânea e da dificuldade de mensurá-la por métodos quantitativos, o caminho
que alguns pesquisadores têm apontado é incorporar técnicas interativas que estimulem a interdisciplinaridade, que permitam
consultas e juízos de expert e a participação cidadã.
Como existe um alto grau de complexidade na realidade socioambiental contemporânea, qualquer modelo de sistema de
indicadores representa uma tentativa de explicação desta realidade e tem limitações. Isso porque o modelo busca explicar uma
realidade que é multifacetada, que é o resultado da interação de diversos fatores e que também é o produto de um processo
203
histórico, econômico e social difícil de ser apreendido em sua totalidade. O modelo, no entanto, cumpre um papel relevante, pois
possibilita uma aproximação a esta realidade.
Todo modelo de sistema de indicadores tem limitações, pois é uma representação da realidade.
204
Variáveis técnicas,
SNIS - Sistema operacionais e financeiras
Municípios e dos prestadores dos serviços
Nacional de Ministério das Municípios
Anual Prestadores de de abastecimento de água, www.snis.gov.br
Informação em Cidades amostrados2
Serviços esgotamento sanitário e
Saneamento resíduos sólidos/limpeza
pública.
1 A PNSB foi realizada no ano 2000 e encontra-se em andamento uma nova edição com dados coletados em 2008.
2 Todos os municípios cujos serviços de água e esgotos são prestados pelas Companhias Estaduais de Saneamento e uma amostra, anualmente crescente, de
municípios que prestam diretamente os serviços de água e esgotos. Amostra específica para os serviços manejo de resíduos sólidos.
Quadro 2 – Variáveis e indicadores propostos por Piza e Gregori (1999), para o ISA
Índice de Salubridade Ambiental.
Componente Variável Indicador
Cobertura Proporção de domicílios urbanos atendidos.
Abastecimento Qualidade da
Proporção de amostras de água potável coletadas.
de água água fornecida
(Peso: 30%) Saturação dos
Issp= VPX(1+t)n/CP, sendo VP = volume produzido, CP = capacidade de produção,
sistemas
t = taxa unitária de crescimento da demanda em n anos.
produtores
Cobertura em Proporção de domicílios atendidos por coleta de esgoto (rede ou solução
coleta individual).
Esgoto
sanitário Esgoto tratado Proporção de volume de esgoto tratado.
(Peso: 20%)
Saturação do Issp= VPX(1+t)n/CT, sendo VP = volume produzido, CT = capacidade de
tratamento tratamento, t = taxa unitária de crescimento da demanda em n anos.
Coleta de lixo Não informado pelos autores.
Resíduos Tratamento e
sólidos Não informado pelos autores.
disposição final
(Peso: 20%)
Saturação da
Não informado pelos autores.
disposição final
Definido em função de critérios de pontuação estabelecidos a partir da existência
Dengue
Controle ou não da doença.
de vetores Definido em função de critérios de pontuação estabelecidos a partir da incidência
(Peso: 10%) Esquistossomose
anual da doença.
Leptospirose Não informado pelos autores.
206 Indicador
A definir pelos
regional A definir pelos comitês de bacia.
comitês de bacia
(Peso: 10%)
Saúde Não informado pelos autores.
Indicador
socioeconômico Renda Não informado pelos autores.
(Peso: 10%)
Educação Não informado pelos autores.
Fonte: Piza e Gregori (1999).
24 - Jurídico • •
25 - Balneabilidade das águas •
26 - Energia • •
27 - Transporte • •
28 - Reciclagem lodo, químicos • •
29 - Paisagismo • •
30 - Reclamações • •
Fonte: Sarmento e outros (1999).
Quadro 4 - Indicadores propostos pelo BNDES (1999) para avaliar a adequação dos serviços
prestados pelas concessionárias estaduais de saneamento.
Componente
Índice Forma de obtenção
do saneamento
CBA = nº de imóveis ligados à rede de
distribuição x 100/ nº total de imóveis edificados na área de concessão,
Índice de cobertura – CBA ou
CBA = Extensão em Km de ruas com ligações X 100/extensão total de
ruas na área de concessão.
208
Em 1999, a Coordenação de Vigilância Ambiental da Funasa – Covam propôs um conjunto de indicadores para o sistema de
informação da vigilância da qualidade da água de consumo humano – o SISAGUA, tendo como metodologia de referência o
modelo Forças Motrizes, Pressões, Situação, Exposição, Efeitos e Ações – FPEEEA, da Organização Mundial da Saúde – OMS. Foi
estabelecida uma cadeia de causa e efeito de doenças relacionadas com a água, sendo selecionadas as seguintes enfermidades:
hepatite A e E, intoxicação por agrotóxico e mercúrio e diarréias agudas. Foram realizadas sugestões de indicadores para cada
item da cadeia de causa e efeito. No total, foram propostos 17 indicadores referentes às doenças diarréicas e Hepatite A e E,
considerados relevantes para a vigilância da qualidade da água para o consumo humano, os quais estão destacados no Quadro 5.
O Conselho Estadual de Saneamento do Estado de São Paulo – Conesan, visando atender as exigências da Política Estadual
209
dengue (idg)
leptospirose (ilp)
leishmaniose (ilm)
Saúde ambiental (Iam)
esquistossomose (ieq)
mortalidade infantil por doenças de veiculação hídrica (imh)
mortalidade infantil e de idosos por doenças respiratórias (imr)
qualidade da moradia
Salubridade da moradia (iqm)
número de moradores por dormitório (ido)
Fonte: MONTENEGRO e outros, 2001.
210
Aglomeração (número de
Número médio de habitantes por cômodo (un)
pessoas por cômodo)
Escolaridade do cabeça da Domicílios cujo “cabeça da família” possui pelo menos 10 grau
família no domicílio completo (%)
Bernardes e outros (2002) propõem à Fundação Nacional de Saúde – Funasa e à Organização Pan-americana da Saúde – OPAS
um modelo de avaliação do impacto do Projeto Alvorada com o uso de técnicas de avaliação quantitativa e qualitativa, essa última
por meio de estudos de caso. O modelo possui três dimensões de análise como pode ser visto no Quadro 8.
Modelo de
Desenvolvimento,
Modelo de desenvolvimento Ausência ou Política de
Indefinição do marco Financiamento difusão e Transparência
Forças desenvolvimento socialmente inadequação das
legal do setor público instável e
Processo acelerado desenvolvimento de
apropriação de
Precariedade da
insuficiente e
Motrizes ambientalmente excludente e política políticas públicas de de urbanização recursos humanos democracia
saneamento insuficiente tecnologia corrupção
insustentável e economicamente saneamento inadequada
insuficiente
subordinado
Inundações e
Déficit de água Moradias
empoçamentos
(irregularidade ou Água de consumo Esgoto e lixo no Esgoto e lixo nas Ambientes aquáticos desprovidas de Higiene domiciliar e
Estado Esgoto e lixo no solo provocados com
ausência no contaminada periodomicílio coleções hídricas contaminados instalações hidro- pessoal inadequado
drenagem
abastecimento) sanitárias adequadas
inadequada
População População
População População exposta à População em População exposta a
consumindo água consumindo água de População exposta a
Exposição consumindo alimento ambiente aquático contato com esgoto inundações e
em quantidade qualidade vetores
contaminado contaminado e resíduos sólidos empoçamento
insuficiente inadequada
Morbi-mortalidade
devido à
Efeito inadequação do
saneamento
ambiental
saúde das ações de saneamento: marco conceitual e estratégia metodológica”, disponível em: http://www.funasa.gov.br.
vista na Figura 4, sendo que as outras matrizes podem ser consultadas na publicação da OPAS/Funasa: “Avaliação de impacto na
efeitos na saúde, no ambiente, na cidadania e na exclusão social. A matriz construída considerando o efeito na saúde pode ser
O sistema de indicadores foi composto a partir da construção de matrizes de causa e efeito – tipo OMS, sendo considerados os
213
AVALIAÇÃO DO PLANO MUNICIPAL DE SANEAMENTO BÁSICO:
20/07/2011 17:43:31
CONCEITOS, EXPERIÊNCIAS BRASILEIRAS E RECOMENDAÇÕES
Borja (2004), ao estudar a execução de megaprogramas de saneamento ambiental no Brasil, por meio da experiência do estado
da Bahia na implantação do Programa Bahia Azul, concebeu metodologia que envolveu técnicas qualitativas e quantitativas de
investigação e duas abordagens de avaliação: 1) Avaliação Política dos fundamentos que orientaram a implantação do Programa
e 2) Avaliação de Política, para verificar a eficácia, efetividade, eficiência e o impacto do Programa. O processo de avaliação foi
norteado pelos princípios de uma política pública de saneamento, a saber: universalidade; igualdade; integralidade; titularidade
municipal; gestão pública; participação e controle social.
O estudo contemplou quatro campos de análises: condições sanitárias, gestão, ambiente natural e participação e controle social
(Quadro 9). Foram realizados estudos que envolveram a cidade de Salvador como um todo e 31 microáreas, conforme apresentado
no Quadro 10. Realizaram-se análises estatísticas dos dados, com criação de índices a partir de análises multivariadas. O
geoprocessamento dos dados permitiu conhecer a distribuição dos serviços de saneamento na cidade. As entrevistas e a pesquisa
de opinião possibilitaram verificar a percepção da população.
Heller e outros (2007) conceberam uma metodologia para a avaliação comparativa da gestão de serviços de saneamento entre
municípios da mesma bacia hidrográfica. Foram propostos dois eixos temáticos: a análise das políticas públicas de saneamento
e da gestão dos serviços, sendo que o primeiro eixo envolve a análise dos modelos de organização do Estado para a provisão dos
serviços, seus marcos legais, políticos e institucionais, e o segundo o entendimento das formas organizativas da prestação dos
215
Fonte: Heller e outros, 2007.
Conforme o diagrama, os estudos de caso são desenvolvidos segundo cinco dimensões analíticas capazes de apreender as
semelhanças e diferenças das realidades em estudo. O Quadro 11 apresenta a descrição de cada dimensão. Cada um dos
componentes do saneamento (abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza pública e drenagem das águas pluviais)
é analisado segundo as dimensões analíticas, sendo que, nos estudos de caso, deve-se avaliar a pertinência de abordar todos
os componentes citados. Para a análise dos aspectos político-institucionais foram estabelecidos seis grupos de análises com as
variáveis correspondentes, que podem ser vistas no Quadro 12.
Para a análise dos aspectos tecnológicos foi identificado um conjunto de indicadores capaz de caracterizar a prestação dos
serviços nas áreas de estudo (Quadro 13).
217
A seguir são feitas algumas recomendações que podem subsidiar a definição do modelo de avaliação do PMSB:
• É importante que o executivo municipal disponha de uma instância de discussão com participação dos diversos setores da
administração pública municipal e de entidades da sociedade civil organizada com atuação no campo do saneamento básico.
Essa instância ficaria com a responsabilidade de promover discussões transparentes e democráticas para a definição do
modelo de avaliação, devendo contar com apoio de um grupo técnico.
• Diante da subjetividade de processos de avaliação de política pública, é importante pactuar os princípios norteadores da
avaliação do PMSB, sendo recomendada a incorporação dos princípios constantes no próprio PMSB.
• Além dos princípios gerais para a avaliação do PMSB, é importante definir os pressupostos sob os quais cada componente do
saneamento básico será avaliado. Assim, por exemplo, para o componente da drenagem seria importante definir pressupostos
relacionados com o manejo sustentável das águas pluviais .
• É importante que o modelo incorpore tanto a avaliação quantitativa, via indicadores, como qualitativa, via processos
participativos, entrevistas, grupos focais, etc.
• O modelo deve considerar todos os componentes do saneamento básico (abastecimento de água, esgotamento sanitário,
manejo das águas pluviais, drenagem urbana, manejo dos resíduos sólidos e limpeza pública).
• A avaliação deve buscar contemplar todas as funções de gestão do saneamento básico, a saber: planejamento, prestação
dos serviços, regulação, fiscalização e controle social. Essa abordagem permitirá promover uma avaliação ampla do PMSB
envolvendo não só os aspectos da prestação dos serviços, mas também da base institucional e social da sua execução.
• A seleção dos indicadores a serem utilizados na avaliação do PMSB deve considerar os sistemas de indicadores já existentes,
218 a exemplo do SNIS, PNSB e DATASUS.
• Matrizes de causa e efeito – tipo OMS – podem ser construídas coletivamente para a identificação do conjunto de indicadores.
Sugere-se que sejam elaboradas matrizes para cada componente do saneamento básico e depois seja feita uma listagem do
conjunto de indicadores, uma vez que podem existir indicadores comuns entre os componentes. Sugere-se, ainda, que as matrizes
sejam construídas usando como efeito o impacto do PMSB na saúde pública, sob a perspectiva da promoção; no ambiente físico-
natural; na cidadania; e na exclusão social.
BERNARDES, Ricardo Silveira; COSTA, André Monteiro; PONTES, Carlos Antônia Alves; Brandão, Cristina Célia Silveira; HELLER,
Léo; IBANEZ-NOVION, Martin Alberto; BORJA, Patrícia Campos; SOARES, Sérgio Rodrigues Ayrimoraes; COSTA, Silvano Silvério
da. Proposta Metodológica de Avaliação das Ações de Saneamento do Projeto Alvorada: Grupo de saneamento. Brasília: FUNASA/
OPAS/UnB, 2002. Não Publicado.
BNDES. Indicadores para Metas de Universalização e Adequação dos Serviços de Saneamento Básico no Brasil - Sugestão para
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220
Clênio Argolo
João Batista Peixoto
João Carlos Machado
Tatiana Santana Timóteo Pereira
Alexandre Araújo Godeiro Carlos
Otávio Silveira Gravina
Gabriella Pereira Giacomazzo
Brasília - 2011
Apresentação...................................................................................................................................................................225
5. Referências........................................................................................................................................................................243
223
225
Uma vez que os serviços de saneamento são de interesse local e o poder público local tem a competência para organizá-los e
prestá-los, o município é o titular do serviço . Assim, uma política de saneamento deve partir do pressuposto de que o município
tem autonomia e competência constitucional sobre a gestão dos serviços de saneamento, no âmbito de seu território, respeitando
as condições gerais estabelecidas na legislação nacional sobre o assunto.
Por outro lado, segundo a Constituição de 88, é também competência dos municípios: legislar sobre assuntos de interesse local,
Apesar desses dispositivos constitucionais, foi somente com a Lei Nacional de Saneamento Básico (Lei nº 11.445/2007) que se
estabeleceram as diretrizes normativas nacionais, disciplinando de forma mais clara o exercício, pelos titulares, das funções de
gestão dos serviços de saneamento básico.
3Gestão entendida como sendo as funções de planejamento, regulação, fiscalização e prestação dos serviços, inclusive os instrumentos e mecanismos de
controle social.
228
Planejamento
Gestão do Prestação
Fiscalização Saneamento dos
Básico Serviços
Segundo o art. 9º da mesma lei, a formulação da política de saneamento básico é competência do titular dos serviços, devendo
para tanto:
A Lei nº 11.445/2007 define que o planejamento para a prestação dos serviços de saneamento básico será realizado por meio
da elaboração de um Plano de Saneamento Básico, de competência do titular do serviço (BRASIL, 2007a, art. 19). A elaboração
desse Plano deve atender aos princípios fundamentais da prestação dos serviços públicos de saneamento básico, estabelecidos
no art. 2º da referida lei, a saber:
Essa lei determina que os Planos de Saneamento Básico deverão ser editados pelos titulares, podendo ser elaborados com base
em estudos fornecidos pelos prestadores de cada serviço (art. 19, § 1º). No caso de planos específicos dos componentes do
saneamento básico, a consolidação e compatibilização devem ser efetuadas pelo titular (art. 19, § 2º). Mesmo com a delegação
dos serviços, o prestador deverá cumprir o Plano de Saneamento Básico em vigor (art. 19, § 6º).
E, ainda, a validade dos contratos de prestação de serviços de saneamento básico que tenham por objeto a prestação de serviços
públicos de saneamento básico está condicionada à existência de um Plano de Saneamento Básico (art. 11, I).
Em consonância com o princípio da transparência das ações e do controle social, as propostas dos Planos e os estudos que os
fundamentam devem ser amplamente divulgados, inclusive com a realização de audiências ou consultas públicas (BRASIL, 2007ª,
230
art. 19, § 5º). Por fim, a lei determina que deverá ser previsto o recebimento de sugestões e críticas por meio de consulta ou
audiência pública e, quando existente, a análise e opinião de órgão colegiado, bem como a divulgação do Plano e dos respectivos
estudos por meio da disponibilização integral de seu teor a todos os interessados, inclusive por meio da internet (art. 51).
A prestação dos serviços de saneamento básico é competência do município, podendo exercer essa função diretamente ou
delegá-la a outro ente. Cabe também ao titular definir o ente responsável pela regulação e fiscalização dos serviços, inclusive os
procedimentos de sua atuação, e os mecanismos de controle social.
No caso do município decidir delegar a prestação dos serviços a outro ente que não integre a sua administração, deverá promover
a celebração de contrato de programa, se o delegatário for ente público ou estatal, ou de contrato de concessão, precedida de
licitação, no caso de empresa privada. Deverá haver audiência ou consulta pública sobre o edital, no caso de licitação, e também
sobre a minuta do contrato entre titular e prestador de serviço (inciso IV, do art. 11 da lei).
Existem três formas de prestação dos serviços de saneamento básico previstas em lei: a prestação direta, a prestação indireta,
mediante delegação por meio de concessão, permissão ou autorização, e a gestão associada, conforme mostra a Figura 2.
{
pelo titular
Descentalizada Autarquia
(outorga) Empresa pública
Sociedade de economia
Prestação
indireta via
delegação { Concessão
Permissão
Autorização
Empresas Privadas
Empresas Estatais
Prestação
via gestão
associada { Contratoto
de programa
Convênio Cooperação
Consórcio Público
Os contratos de concessão, com empresa privada ou estatal, devem atender, além da legislação e regulação do titular, às normas
gerais da Lei nº 8.987/1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, sempre
precedida de licitação pública, que se processa conforme a Lei nº 8.666/1993.
A gestão associada, conforme estabelece a Lei nº 11.107/2005, é uma associação voluntária de entes da federação e sua
formalização ocorre por meio de convênio de cooperação ou de consórcio público. A referida lei confere aos consórcios públicos
“personalidade jurídica de direito público integrante da administração indireta de cada um dos entes consorciados”, podendo,
assim, ser sujeito de direitos e obrigações (art. 6º, § 1º). No caso de se revestir de personalidade jurídica de direito privado,
constituído conforme a legislação civil, o consórcio público observará as normas de direito público no que concerne à realização
de licitação, celebração de contratos de concessão, prestação de contas e admissão de pessoal (art. 6º, § 2º).
Uma vez que a gestão associada é realizada entre entes da federação, a delegação da prestação dos serviços pode ser feita com
dispensa de licitação. Essa prerrogativa é assegurada no inciso XXVI, do art. 24 da Lei de Licitação (Lei nº 8.666/1995) e amparada
no art. 241 da Constituição Federal, nos termos da Emenda Constitucional 19/98, que trata dessa matéria. Tal delegação é
formalizada por meio de um contrato de programa, após a constituição do consórcio público ou convênio de cooperação.
O contrato de programa deverá atender à legislação de concessões e permissões de serviços públicos e prever procedimentos
que garantam a transparência da gestão econômica e financeira de cada serviço em relação a cada um de seus titulares (art. 13,
§ 1º, I e II).
O consórcio público será constituído por contrato cuja celebração dependerá de prévia subscrição de protocolo de intenções. Esse
protocolo deverá conter, entre outras, as seguintes cláusulas:
Na prestação regionalizada dos serviços, ou seja, quando houver um único prestador do serviço para vários municípios, contíguos
ou não, deverá haver compatibilidade de planejamento dos respectivos planos municipais. Nesse caso, poderá ser elaborado um
Plano para o conjunto de municípios atendidos (BRASIL, 2007a).
Ribeiro (2005), ao delimitar as possibilidades de gestão associada para a prestação de serviços de água e esgoto, identifica seis
modelos de prestação dos serviços, conforme apresentados na Figura 3, 4, 5, 6, 7 e 8.
Convênio de cooperação
Estado Município
233
Modelo AA
Convênio de cooperação
Município Município
Modelo B
CEAE
Modelo BB
Companhia municipal
Companhia ou Autarquia
Intermunicipal
Modelo C
Modelo D
Prestador contratado
mediante licitação
236
OBJETIVOS DA REGULAÇÃO
• estabelecer padrões e normas para a adequada prestação dos serviços e para a satisfação dos usuários;
• garantir o cumprimento das condições e metas estabelecidas;
• prevenir e reprimir o abuso do poder econômico, ressalvada a competência dos órgãos integrantes do sistema nacional
A entidade reguladora e fiscalizadora dos serviços é a responsável pela verificação do cumprimento dos planos de saneamento
por parte dos prestadores de serviços, na forma das disposições legais, regulamentares e contratuais (art. 20). Nas atividades de
regulação dos serviços de saneamento básico, estão incluídas a interpretação e a fixação de critérios para a fiel execução dos
contratos, dos serviços e para a correta administração de subsídios (art. 25, § 2º). Segundo art. 23 da Lei Nacional de Saneamento
Básico, a entidade reguladora deve editar normas relativas às dimensões técnica, econômica e social de prestação dos serviços,
que abrangerão, pelo menos, os seguintes aspectos:
OBJETIVOS DA REGULAÇÃO
• padrões e indicadores de qualidade da prestação dos serviços;
• requisitos operacionais e de manutenção dos sistemas;
• as metas progressivas de expansão e de qualidade dos serviços e os respectivos prazos;
• regime, estrutura e níveis tarifários, bem como os procedimentos e prazos de sua fixação, reajuste e revisão;
• medição, faturamento e cobrança de serviços;
• monitoramento dos custos;
• avaliação da eficiência e eficácia dos serviços prestados;
• plano de contas e mecanismos de informação, auditoria e certificação;
• subsídios tarifários e não tarifários; 237
• padrões de atendimento ao público e mecanismos de participação e informação;
• medidas de contingências e de emergências, inclusive racionamento.
E, ainda, no caso da gestão associada ou prestação regionalizada dos serviços, os titulares poderão adotar os mesmos critérios
econômicos, sociais e técnicos da regulação em toda a área de abrangência da associação ou da prestação (art. 24).
Nos serviços públicos de saneamento básico em que mais de um prestador execute atividade interdependente com outra, a relação
entre elas deverá ser regulada por contrato e haverá entidade única encarregada das funções de regulação e de fiscalização. O
referido contrato deverá estabelecer as cláusulas que regerão as relações entre os prestadores, inclusive a designação do órgão
ou entidade responsável pela regulação e fiscalização a quem caberá definir, pelo menos:
• as normas técnicas relativas à qualidade, quantidade e regularidade dos serviços prestados aos usuários e entre os
diferentes prestadores envolvidos;
• as normas econômicas e financeiras relativas às tarifas, aos subsídios e aos pagamentos por serviços prestados aos
usuários e entre os diferentes prestadores envolvidos;
• a garantia de pagamento de serviços prestados entre os diferentes prestadores dos serviços;
• os mecanismos de pagamento de diferenças relativas a inadimplemento dos usuários, perdas comerciais e físicas e
outros créditos devidos, quando for o caso;
• o sistema contábil específico para os prestadores que atuem em mais de um município.
238
A publicidade dos relatórios, estudos, decisões e instrumentos equivalentes que se refiram à regulação ou à fiscalização dos
serviços, bem como aos direitos e deveres dos usuários e prestadores, está assegurada no art. 26 da referida lei. Segundo esse
dispositivo, qualquer pessoa pode requerer tais informações.
Nos casos de prestação dos serviços mediante concessão ou permissão, a Lei nº 8.987/1995 estabelece, no tocante à fiscalização,
que:
• “as concessionárias e permissionárias estarão sujeitas à fiscalização pelo ente fiscalizador, devendo para isso contar com a
cooperação dos usuários” (art. 3º);
• “o poder concedente terá acesso aos dados relativos à administração, contabilidade, recursos técnicos, econômicos e
financeiros da concessionária”; e
• “a fiscalização do serviço será feita por intermédio de órgão técnico do poder concedente ou por entidade com ele conveniada e,
periodicamente, conforme previsto em norma regulamentar, por comissão composta de representantes do poder concedente,
da concessionária e dos usuários” (art. 30);
• os contratos de programa ou de concessão devem conter cláusula definindo a forma de fiscalização das instalações, dos
equipamentos, dos métodos e práticas de execução dos serviços de saneamento básico (art. 23, VII); e
• os concessionários devem permitir aos encarregados da fiscalização livre acesso, em qualquer época, às obras, aos
A mesma lei ainda define que o “serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência,
segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas”, e que “a atualidade compreende a
modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço”
(art. 6º).
239
Na prestação de serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos urbanos, a lei definiu que as respectivas
taxas ou tarifas devem ter em conta a adequada destinação dos resíduos coletados, podendo considerar, para a determinação
dos seus valores:
a) o nível de renda da população da área atendida;
b) as características dos lotes urbanos e as áreas que podem ser neles edificadas;
c) o peso ou o volume médio coletado por habitante ou por domicílio (art. 35).
Por outro lado, na instituição de eventual cobrança da prestação do serviço público de drenagem e manejo de águas pluviais
urbanas, a regulação do titular deverá considerar os percentuais de impermeabilização e a existência de dispositivos de
amortecimento ou de retenção de água de chuva em cada lote urbano; o nível de renda da população da área atendida; e as
características dos lotes urbanos e as áreas que podem ser neles edificadas (art. 36).
Para a instituição de tarifas, preços públicos e taxas para os serviços de saneamento básico, o titular deve observar, ainda, as
seguintes diretrizes:
240
Visando os interesses dos usuários, essa norma legal determina que as tarifas devem ser fixadas de forma clara e objetiva, e os
reajustes e as revisões devem ser tornados públicos com antecedência mínima de 30 (trinta) dias em relação à sua aplicação; e que
os referidos reajustes serão realizados no intervalo mínimo de 12 (doze) meses, de acordo com as normas legais, regulamentares
e contratuais (arts. 37 e 39).
O plano de saneamento é um instrumento importante não só para o planejamento e avaliação da prestação dos serviços, mas
também para obtenção de financiamentos. Segundo a Lei Nacional de Saneamento Básico, a alocação de recursos federais será
feita em conformidade com as diretrizes e objetivos da Política Federal de Saneamento Básico nela estabelecidos e com os planos
de saneamento básico (arts. 48 a 50). Ou seja, os Planos passam a ser um referencial para obtenção de recursos. A liberação
desses recursos está condicionada:
a) ao alcance de índices mínimos de desempenho do prestador na gestão técnica, econômica e financeira dos serviços e de
eficiência e eficácia dos serviços, ao longo da vida útil do empreendimento;
b) à adequada operação e manutenção dos empreendimentos anteriormente financiados.
No caso da aplicação de recursos não onerosos da União, a lei estabelece que será dada prioridade às ações e empreendimentos
que visem o atendimento de usuários ou municípios que não tenham capacidade de pagamento compatível com a autossustentação
econômico-financeira dos serviços, sendo vedada sua aplicação a empreendimentos contratados de forma onerosa (art. 50, §1º).
242
BRASIL. Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico. Brasília: DOU, 2007a.
BRASIL. Lei nº 11.107, de 6 de abril de 2005, dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos e dá outras
providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11107.htm>. Acesso em: 15 out.
2008.
BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços
públicos, previsto nº art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/leis/L8987cons.htm>. Acesso em: 15 out. 2008.
FUNASA/ASSEMAE – Cooperação Técnica. Manual de Implantação de Consórcios Públicos de Saneamento. Brasília, 2008.
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