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Albert P.

Dahoui
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Índice
1 – Introdução
1.1 – As devidas explicações 5
1.2 – Palavras de incentivo 7
1.3 – Diferença entre ficção e não-ficção 10
1.4 – Os vários tipos de ficção 12
1.5 – Tema, gênero e trama 13
1.6 – Rápidas palavras sobre Estilo 14
2 - Personagens
2.1 – Introdução à teoria dos personagens. 15
2.2 – Definindo os personagens 18
2.2.1 – Apresentando os personagens ao leitor. 19
2.3 – Os vários tipos de personagens 22
2.4 – Arquétipos 26
2.5 – A mente masculina e feminina 32
2.6 – Contrariando o desejo do Protagonista 34
2.7 – Definindo o Antagonista 35
3 – Estrutura da história
3.1 – Estruturas básicas 38
3.2 – Estrutura básica de uma história 39
3.3 – Algumas dicas de como estruturar uma história 43
3.4 – Um método de estruturar uma história 45
4 – Narrativa
4.1 – O Método do Actor’s Studio de Nova Iorque 51
4.2 – Mostrando e não dizendo (Show not tell) 52
4.3 – Escolhendo um Ponto-de-Vista (POV) 56
4.4 – Ritmo da história 59
4.5 – Progressão da história 64
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O sucesso de escrever

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4.6 – Técnicas para enriquecer a narrativa


4.6.1 – Cadinho: chave para uma boa história 66
4.6.2 – Circunscrição da história (Espaço e Tempo) 67
4.6.3 – Suspense – mantendo o leitor interessado 69
4.6.4 – Criando tensão 70
4.6.5 – Flashbacks 71
4.6.6 – Criando credibilidade: suspensão da descrença 72
4.6.7 – Quando o menos é mais 74
4.6.8 – Técnica do instantâneo 75
4.6.9 – Ressonância 76
4.7 – Cenas de amor 78
4.8 – Problemas imprevistos no decorrer da história 79
4.9 – Como salvar uma história que está caminhando mal ou empacou 81
5 – Diálogos
5.1 – Introdução 84
5.2 – Marcadores de diálogos 88
5.21 – Marcadores anteriores, no meio e posteriores. 90
5.22 – Estilo jornalístico de marcação 91
5.3 – Monólogos 92
5.4 – Diálogos que não funcionam e os que quebram as regras 94
5.4.1 – Diálogos telegráficos (excessivamente rápidos) 95
5.4.2 – Quebrando as regras do diálogo tradicional 96
5.4.3 – Diálogos melodramáticos 97
5.4.4 – Diálogos cospe-fogo 100
5.4.5 – Diálogos esdrúxulos 101
5.5 – Comentário final sobre diálogos 102
6 – Revisão
6.1 – Revisar é fundamental 103
6.2 – Lipoaspiração 107

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7 – Escrevendo para cinema, televisão, teatro e outras mídias.
7.1 – Cinema 111
7.1.1 – Comentários gerais sobre escrever para cinema 116
7.2 – Televisão 117
7.3 – Teatro 119
7.4 – Outras mídias 121
8 – Não-Ficção
8.1 – Técnicas de ficção aplicadas a não-ficção 123
8.2 – Pesquisa: chave para o sucesso. 124
8.3 – Algumas sugestões para a não-ficção 126
9 – Embalando o produto
9.1 – Procurando uma editora 129
9.2 – O mercado americano 133
9.3 – Lançando o livro 141
9.4 – Aspectos financeiros 144
9.5 – Cuidados que o autor deve ter 146
10 – Informações e um modelo de estrutura
10.1 – Informações na Internet
10.1.1 – Mecanismos de busca 150
10.1.2 – Sites brasileiros de interesse 150
10.1.3 – Sites internacionais de interesse 151
10.1.4 – Print-On-Demand – Impressão Por Encomenda (IPE) 152
10.2 – Um modelo de estrutura de romance 154
Bibliografia 157

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1 - Introdução

1.1 – As devidas explicações

Quando me decidi a escrever este livro, uma voz no meu interior me dizia que não
devia fazê-lo. Afinal de contas, não sou nenhum autor laureado nem meu trabalho é
objeto de estudo e pode servir de exemplo.
No momento em que estou escrevendo este livro, tenho nove livros publicados no
Brasil e um nos Estados Unidos. Meu primeiro livro conseguiu vender razoavelmente
bem, considerando que não foi apoiado por grande esforço publicitário. Há alguns
anos, decidi traduzi-lo para o inglês na tentativa de publicá-lo nos Estados Unidos e
eventualmente, no Reino Unido (Inglaterra, Escócia, Gales e Irlanda). Para tanto, além
do trabalho físico da tradução em si, resolvi pesquisar o mercado americano. Descobri,
através da Internet, que existiam uma série de livros que ensinavam a escrever. Só para
sua informação, no site Amazon.com relacionei, em 2000, 185 títulos diferentes. Comprei
dois livros de imediato e, posteriormente, adquiri mais alguns.
O primeiro fato que descobri é que no Brasil não existia nenhum livro sobre como
escrever um romance (pelo menos que eu saiba). Portanto, este livro é uma tentativa de
preencher essa lacuna. Tomara que venham outros ainda melhores, pois a arte de
escrever merece um tratamento melhor do que temos no Brasil.
O segundo fato é que detectei que, mesmo tendo nove livros publicados, eu
escrevia muito mal (não é cabotinismo). Quando comecei a escrever, fi-lo mais por puro
prazer do que com a intenção de ganhar dinheiro. No entanto, fi-lo sem nenhuma
técnica, seguindo apenas meu instinto, que – confesso – não é suficiente para tornar-me
um bom escritor.

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Aliás, sempre fui audacioso, pois não domino a língua portuguesa quanto deveria e
minhas concordâncias nem sempre obedecem às estruturas e normas que a regem.
Mesmo com essas limitações, resolvi escrever, pois tinha algo que sobrepujava todas as
dificuldades: determinação. Nada me impediu de realizar o meu desejo de escrever.
Nem falta de tempo, nem minha falta de conhecimento da língua portuguesa, nem as
centenas de desculpas que eu podia arranjar para não escrever.
Quando comecei a ler os livros americanos sobre como se deve escrever e notei que
escrevia muito mal, resolvi que reescreveria o meu primeiro livro. Não só o traduzi,
como também reescrevi mais de noventa e cinco por cento das cenas. Foi um exercício
notável e isto me ajudou a treinar a arte. Se você me perguntar se agora eu escrevo bem,
responderei que não, mas melhorei muito.
Qual era o meu principal erro? Eu narrava em demasia e não deixava espaço para o
leitor imaginar a história. Eu não praticava a técnica que os americanos chamam de
Show not Tell. O escritor deve mostrar e não descrever. É como no amor. Não adianta
dizer à pessoa amada o quanto você a ama. Mostre através de ação, ao invés de proferir
intermináveis frases de amor que, provavelmente, serão um clichê. Demonstrar amor
através da ação produz muito mais efeito na pessoa amada do que apenas belas
palavras. Portanto, se o leitor ler meus livros publicados até 2000, notará sua
imperfeição. Não importa, pois o que vale é aprender sempre e treinar. Nunca se dê por
satisfeito.
Deste modo, resolvi escrever este livro para dar ao futuro escritor algumas
ferramentas para que não cometa os mesmos erros que cometi. Por outro lado,
respondendo àquela voz interior que me dizia que eu não devia me meter a professor
de um assunto que não domino, eu respondi ao meu crítico interior que há excelentes
técnicos de futebol que são incapazes de jogar e há excelentes jogadores que são
péssimos técnicos. Portanto, ensinar é apenas alertar, é despertar a vontade adormecida,
pois só aprende quem quer. O professor é mero veículo da aprendizagem.

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O sucesso de escrever

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O leitor notará que menciono exemplos americanos e europeus. Não veja nisto
nenhum desdouro ao escritor brasileiro, mas, como este trabalho é uma compilação de
vários livros americanos e europeus, é óbvio que os exemplos provêm deles. Por outro
lado, prefiro não mencionar escritores brasileiros, seja para elogiá-los, seja para criticá-
los (para o que, aliás, me falta conhecimento) evitando ferir suscetibilidades.
Não procurem por perfeição, pois o trabalho de compilar nem sempre é fácil.
Muitas vezes, encontrarão exemplos simplórios. Foram feitos de propósito para chamar
a atenção sobre escritas pobres e mal redigidas. O exemplo estapafúrdio alerta mais do
que o bom exemplo. Não vejam, portanto, as linhas escritas aqui como as de um mestre
que, magnânimo, passa seus conhecimentos. Vejam apenas o trabalho de um
compilador, pois este trabalho é, de fato, uma compilação das principais técnicas que
estão sendo ensinadas nos Estados Unidos e Europa.

1.2 – Palavras de incentivo

Se você se decidir a escrever, nada poderá impedi-lo a não ser você mesmo. O pior
inimigo do escritor é ele mesmo. Portanto, tenha cuidado com as seguintes desculpas:
– Não tenho tempo para escrever.
Invente tempo. Se você escrever apenas uma página por dia, no final de um ano,
você terá escrito um livro de 365 páginas. Para escrever uma página por dia, você levará
apenas meia hora. Acorde meia-hora mais cedo e escreva. O ideal é estabelecer um
determinado horário do dia e, com vontade ou não, sente-se e escreva. Invente, treine,
reescreva o que já escreveu, aperfeiçoe-se. Se você se habituar a escrever todos os dias
um pouco, no dia em que não escrever, sua mente solicitará tal exercício e você se
tornará um ‘viciado’. Vicie-se em escrever, pois é um vício maravilhoso que não faz mal
à saúde.
– Assim que tiver completado minha pesquisa, poderei escrever.

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Excelente desculpa. Com isto, você passará anos pesquisando e jamais escreverá
uma página sequer. O que você deve fazer é escrever e pesquisar simultaneamente.
Escreva, pois assim verá qual o assunto que precisa ser pesquisado mais a fundo. Não
pare para pesquisar – faça as duas coisas simultaneamente.
– Não tenho talento.
Ninguém nasce sabendo. Escrever é como fazer musculação. No começo dos
exercícios, você fica com os músculos doídos e só consegue levantar um quilo. Após
treinar por vários dias, seus músculos não doem mais e você levantará vinte quilos
facilmente. Treine, escreva e reescreva. Saiba que escrever é, antes de tudo, treinar e
reescrever muito.
– Tenho vontade de escrever, mas não sei sobre o quê. Não consigo imaginar uma boa
história.
Saiba que o escritor só escreve sobre aquilo de que gosta. Para ser escritor é preciso
ser primeiro um leitor. Você gosta de ler? Sobre o que você lê? Então escreva sobre o
que você gosta de ler. Outra coisa: o escritor é uma pessoa atenta. Está sempre ouvindo
histórias, imaginando situações e procurando assuntos. A televisão, o cinema, os
jornais, as revistas e as conversas com amigos podem dar boas histórias. Basta querer: o
mundo está repleto de assuntos interessantes.
– Tenho vontade de escrever sobre um determinado assunto, mas muitos já
escreveram sobre isto. Não creio que possa escrever melhor ou de forma mais
interessante do que alguns gênios da literatura.
Cada escritor irá abordar o mesmo assunto do seu modo particular. Cada um há de
contribuir com algo que o outro não vislumbrou. Basta desejar e ter confiança em si
próprio. Naturalmente é preferível escrever sobre um tema inédito, mas nem sempre é
fácil encontrar um. Nada impede que você escreva sobre um tema batido e, ao mesmo
tempo, seja original. Pode ser que, no início, você não consiga ser absolutamente
original, mas lembre-se de que tudo que você escrever servirá de treino. Imagine um
corredor. Ele treina horas a fio, imaginando o que fará no dia da competição. No
entanto, se ele só correr em competições, provavelmente não será um vencedor, pois
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não treinou o suficiente. O escritor deve encarar o que escreve como um treino, uma
forma de se aperfeiçoar. Por que os atletas, os bailarinos, os músicos, os cantores, os
atores ensaiam e treinam horas a fio diariamente? Para se aperfeiçoarem. O mesmo
deve acontecer com os escritores.
– Meu português é fraco. Não posso ser um escritor.
É uma dificuldade inicial, mas não é insuperável. Primeiro é preciso que você leia
bastante, pois aquele que lê vai se munindo de um vocabulário mais rico, vai
assimilando um estilo e, com o tempo, consegue escrever. Não é necessário fazer um
curso superior de Letras, mas um bom livro de Português ajuda, assim como um bom
dicionário. No entanto, nada disto adianta se você não treinar.
– Assim que eu comprar um computador, começarei a escrever.
Esta é outra desculpa. Você nunca comprará um computador, nunca aprenderá a
mexer no mesmo e sempre colocará isso como desculpa. Então como fizeram aqueles
escritores que não tinham computadores, pois nem sequer existiam? Eles escreviam em
máquinas de escrever, com canetas, lápis, etc. Houve prisioneiros que escreveram com
lápis em papel jornal e, mesmo assim, conseguiram escrever obras primas. O que você
precisa para começar a escrever? Vontade! Se não tiver, ninguém poderá obrigá-lo.
– Perco a coragem quando imagino que ainda faltam muitas páginas para terminar.
Como é que alguém corre uma maratona? Metro após metro. O mesmo acontece
com o escritor. Palavra após palavra, frase após frase, parágrafo após parágrafo, cena
após cena, capítulo após capítulo, o livro vai sendo escrito. Ponha na sua mente que
deseja apenas escrever uma única cena. Imagine que ela terá de quatro a seis páginas.
Portanto, você não vai escrever um livro de trezentas páginas, apenas uma cena de seis
laudas. No outro dia, você irá escrever outra cena e, assim, irá enganando sua preguiça
e adquirindo coragem e confiança em você.
– Escrevi uma história, mas não acho que é suficientemente boa para publicá-la.
Provavelmente não deve ser mesmo muito boa, pois o maior crítico do escritor deve
ser ele mesmo. Saiba que escrever é antes de tudo REESCREVER. Você sabia que Ernest
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Hemingway reescreveu 36 vezes o seu livro Adeus às Armas antes de publicá-lo? Sabia
que Sol Stein, um dramaturgo, escritor e editor americano de grande sucesso, com nove
livros publicados, reescreveu doze vezes o seu best-seller The Magician, que vendeu um
milhão de cópias? Por que você acha que o seu livro não deverá passar por inúmeras
revisões e que você será o único a escrever uma obra-prima logo da primeira vez? Há
escritores que escrevem e não precisam reescrever nada. São os Mozarts da literatura,
mas pergunto-lhe: quantos Mozarts existiram na História universal? Não é preciso
nascer gênio; há muito mais mérito em se tornar gênio, mesmo tendo nascido mediano.
Escreva e reescreva!
– Tenho vergonha de me expor. O escritor de ficção ou de não-ficção se expõe demais.
Por que alguém escreve? Em primeiro lugar pelo prazer de escrever. Se não for
esta a primeira razão, então procure outra coisa para fazer. Aquilo que não for feito com
prazer, com satisfação, com amor, provavelmente será medíocre. Quanto a se expor,
saiba que a exposição pública de um escritor é menor do que a de um ator, de um
político ou de criminoso. Portanto, ao expor seu ponto-de-vista num livro, você estará
apenas manifestando aquilo que você é. Não tenha medo de ser você mesmo; saiba que
cada ser humano é um ser divino, mesmo que, muitas vezes, esteja com sua luz
bloqueada pelas trevas do medo.
– Não quero ser um escritor. Só quero dinheiro e fama.
Então mude de profissão ou de hobby. Poucos são os escritores que vivem de
escrever e menos ainda os que ficam ricos e famosos.

1.3 – Diferença entre ficção e não-ficção

Podemos definir de forma rápida os dois estilos literários, como segue:

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– Ficção tem como objetivo emocionar o leitor. É a arte de explorar um tema, fazendo-o
passar através da consciência do imaginário para, num jogo de cumplicidade, o tornar
aceitável pela consciência real.

– Não-ficção tem como objetivo informar o leitor sobre um determinado assunto.

Se nos ativermos à definição acima de ficção, poderemos ser encorajados a não


informar adequadamente o nosso leitor sobre aquilo de que estamos tratando. Deste
modo, o livro de ficção pode também informar o leitor sobre uma série de assuntos
pertinentes à obra. A sua diferença em relação à não-ficção é que as informações
prestadas no decorrer do livro fazem parte do enredo, mas não constituem um tratado
sobre determinado tema.
Por exemplo: Se o livro está falando sobre a história de um médico, não é necessário
descrever exaustivamente todos os procedimentos médicos, assim como o tipo de
doença que o médico está tratando. Pode ser feita uma abordagem rápida que dê uma
boa noção ao leitor sem, contudo, entrar em minudências exaustivas e enfadonhas.
Já, por outro lado, um livro de não-ficção deverá abordar o máximo de informações
para que o leitor possa entender o assunto de modo completo. Abordaremos mais
adiante algumas técnicas de não-ficção.
Voltando ao caso da ficção, devemos abordar um aspecto fundamental. Este tipo de
literatura tem como objetivo emocionar – como já dissemos – mas também fazer o leitor
‘viajar’. Usamos propositalmente a gíria ‘viajar’, pois é a que melhor reflete a
necessidade do leitor.
Expliquemo-nos: Ninguém, em sã consciência, deseja meter-se numa situação tensa,
cheia de perigos, dramática, ou até mesmo, trágica. Todos queremos paz e sossego, mas,
em termos de história, escrita ou visual (TV, cinema), esta é a última coisa que
desejamos. Queremos algo que nos transporte para um mundo de fantasia, de faz-de-

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conta, onde iremos viver aventuras, emoções, conhecer novas pessoas, colocarmo-nos
em risco e sair de nosso cotidiano, muitas vezes aborrecido e claustrofóbico.
Assim, iremos procurar histórias que nos emocionem. Estamos todos à procura de
um certo tipo de emoção: amor, medo, terror, tensão, ódio, aventura, etc. O escritor
deve estar ciente disto para que seus escritos transmitam tais sensações ao leitor.

1.4 – Os vários tipos de ficção.

Relacionamos abaixo alguns tipos de ficção apenas para que o leitor possa
familiarizar-se. Entretanto, tal relação reflete apenas o que os editores internacionais
consideram como tal. Provavelmente outra pessoa que venha a fazer tal relação, poderá
relacionar outros tipos de ficção. Procurei, pois, basear-me nos moldes internacionais.

Ação ou Aventura.
Confessionais.
Assuntos contemporâneos.
Detetive/Policial/Crimes.
Eróticos (não é pornografia).
Étnicos.
Experimentais.
Saga familiar.
Fantasia.
Feminista.
Homossexual (não é pornografia).
Históricos.
Horror (terror).
Humor/Sátira.
Juvenil.

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Drama.
Tragédia.
Mistério/Suspense.
Espiritualista/Esotérico/Espírita/Sobrenatural.
Regional.
Romântico.
Ficção científica.
Esportes.
Espionagem/Thriller.
Aventura ou assuntos para adolescentes.

É muito natural que a pessoa normalmente escreva sobre aquilo que gosta de ler.
Por razões pessoais, alguém se sente atraído por determinado tema, trata de ler sobre o
assunto e acaba por desenvolver suas próprias histórias a esse respeito. Sua atenção fica
sempre polarizada por este assunto e as demais notícias do mundo não o impactam
tanto quanto o assunto pelo qual se sente atraído. É natural que este escritor irá
direcionar sua criatividade para um dos temas acima. Não significa dizer que não possa
atuar em outro segmento, mas terá que se sentir atraído pelo novo assunto.

1.5 – Tema, gênero e trama.

Quando vamos escrever uma história temos três aspectos globais a serem
considerados. O primeiro é o tema, o segundo é o gênero e o terceiro é a trama. Em
poucas palavras, poderíamos definir como:
Tema é o assunto. O tema aborda um assunto das relações humanas. Não é uma
coisa independente como trama ou personagens, mas é uma relação entre trama e
personagens.

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Um exemplo facilita a compreensão. Você resolveu escrever sobre a maneira como o
homem está destruindo o meio-ambiente. O tema é, portanto, ecológico.
Já o gênero é a forma como você irá abordar esse tema. Pode ser uma história
repleta de ação onde nosso herói resolve lutar contra uma grande empresa que mata
baleias para extrair seu óleo e ganhar dinheiro. Neste caso, o gênero é aventura.
A trama é como vamos desenvolver nossa história. Pode ser a história de um
baleeiro que fica horrorizado com a morte das baleias e resolve mudar de vida. Ele é
perseguido por seu antigo capitão; sabe coisas demais. A trama é, pois, o conjunto dos
fatos encadeados que constituem a ação de uma obra de ficção.
Resumindo, neste exemplo, o tema é ecológico, o gênero é aventura e a trama é a
história de um ex-baleeiro que é perseguido por seu antigo capitão e, resolve denunciar
o morticínio das baleias à televisão na tentativa de impedir que tal degradação continue.
É importante estabelecer-se antecipadamente o tema, o gênero e a trama, pois irão
influenciar a forma de escrever e a pesquisa sobre o assunto. Pode-se escrever sobre o
mesmo tema, modificando o gênero e, conseqüentemente, a trama e com isto se obter
uma história original e fresca com uma trama que impele o leitor até o fim. Escolher
certo o tema – deve ser algo atual, mesmo que possa relacionar-se com algo do passado
– é meio caminho para se escrever algo que encontre eco no público.

1.6 – Rápidas palavras sobre Estilo

Se há algo subjetivo é Estilo. Um leitor pode adorar um determinado escritor e


achar seu estilo encantador, já outro leitor poderá achá-lo tedioso e excessivamente
rebuscado. Como então escolher o seu estilo, a sua própria voz? Como ser original e não
tentar copiar alguns ‘monstros sagrados’ da literatura?
Seja você mesmo. Você tem uma personalidade que lhe é própria e que ninguém
poderá copiar. Ao escrever, procure se lembrar de que o escritor escreve sobre o que
gosta e sobre um assunto que domina. Seja simplesmente você e tudo há de correr bem.

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2 - Personagens

2.1 – Introdução à teoria dos personagens.

Vamos partir do pressuposto que você nunca escreveu um livro. Durante sua vida
escreveu algumas páginas, mas sempre teve vontade de escrever algo maior do que
simples contos ou algumas páginas onde você colocou um pouco de si. Se, por outro
lado, você é um escritor renomado, não custa ler um pouco sobre a teoria dos
Personagens, pois, com sua experiência, você poderá tirar algumas idéias interessantes
para aprimorar sua arte. Afinal de contas, todos nós estamos sempre aprendendo.
De repente, você teve a idéia de escrever sobre um determinado tema e deseja
contar uma história que imaginou. Como o processo criativo é muito individual, seria
impossível estabelecer o que vem primeiro: o desejo de escrever ou a idéia de uma
história. Provavelmente, as duas aparecem simultaneamente, uma em sinergia com a
outra.
Apenas para podermos estabelecer um método didático, vamos estabelecer que
você vai escrever um livro de ficção. (Para aqueles que pretendem escrever um livro de
não-ficção, o processo é muito parecido, mesmo que algumas etapas possam ser
diferentes. Todavia, no capítulo dedicado aos trabalhos de não-ficção, iremos abordar
técnicas de ficção ligadas à não-ficção que poderão ser úteis para o seu livro de não-
ficção. Deste modo, mesmo que seu apetite esteja voltado para a não-ficção, sugerimos
que leia o que iremos abordar em ficção, pois você verá que lhe será de valia. Aliás,
sugiro sempre que o escritor de ficção também escreva não-ficção, e vice-versa, pois isto
só irá enriquecê-lo como escritor. Nada como conhecer os dois lados da medalha).

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Por alguma razão pessoal – e cada escritor tem a sua – você decidiu que irá escrever
um romance. Provavelmente o que lhe veio à mente é uma história ainda incompleta,
com personagens não muito bem definidos e situações ainda não totalmente resolvidas.
Pode ser que você tenha todo um arcabouço já pronto e, neste caso, você está apto para
começar. Como este é um livro que pretende ajudá-lo a escrever, devemos instigar você
com alguma teoria. Por quê? Pela simples razão de que a teoria irá dar-lhe a base para
você se movimentar. Será como um mapa. Metaforicamente, uma história é uma
viagem, com princípio, meio e fim de um percurso percorrido pelos personagens. Assim
sendo, precisamos de um mapa para não nos perder.
A primeira coisa que temos ao desejar viajar é a vontade de conhecer um certo lugar
ou rever um local já conhecido. Desta forma, a primeira coisa que nos leva a escrever é o
desejo de escrever. Conforme abordamos no primeiro capítulo, é preciso evitar as
desculpas para não escrever, pois são elas as inimigas mais ferrenhas do escritor. Elas
municiam a mente do escritor e aplacam a criação. Viajar é preciso, escrever ainda mais!
Tudo bem! Você tem em mente um roteiro de sua viagem – a sua história. A
primeira coisa é planejar a viagem. Começaremos nossa viagem em que local e qual será
nosso destino? Qual será nosso meio de transporte? De quanto dispomos? Iremos fazer
uma viagem de trem, de carro, de avião? Visitaremos todos os pequenos e lindos
vilarejos entre nosso ponto de partida e nosso destino, ou iremos o mais rápido que
pudermos até nosso destino? Ou sairemos sem destino, navegando de acordo com
nossa vontade e só obedecendo ao nosso coração? Saiba que na arte de escrever tudo é
válido, desde que nos traga felicidade.
Sua história está fervilhando em sua mente e, como acontece com muitos escritores,
tornou-se uma obsessão – você só pensa nela. Ótimo, um pouco de loucura é necessário
para que o artista possa liberar seu fluxo mental criativo (falaremos disto mais adiante).
Mas, pare por um instante e se pergunte o que é prioritário: estabelecer a trama ou
elaborar o personagem ou personagens? O que nos diz a teoria?

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A teoria mais aceita nos dias de hoje é que uma trama não subsiste sem um
personagem que lhe seja apropriado. Muitos dirão que é mais fácil partir de uma trama
bem urdida para, aos poucos, ir inserindo os personagens. Nada contra, enquanto você
estiver no recesso de seu lar e o seu livro não for apresentado a ninguém. Pode ser até
que você construa seu personagem a partir da trama, mas saiba que, no final, é o seu
personagem que irá marcar o leitor e nem tanto a trama.
O leitor irá identificar-se com o seu personagem principal e viverá com ele e através
dele as emoções de sua viagem. Ele também irá ‘viajar’ e sentirá o que seu personagem
principal, que chamaremos doravante de Protagonista, irá sentir. Se o leitor rejeitar seu
Protagonista ou tiver dificuldade, impossibilidade mesmo, de se identificar com o
Protagonista, muito provavelmente, largará o livro.
É o Protagonista que motivará o leitor a percorrer a sua viagem, sua busca, para
atingir seu objetivo. E qual é o objetivo? É aquilo que o Protagonista mais deseja
naquele ponto de sua vida. É aquilo que o impulsiona, aquilo que o faz mover céu e
terra para alcançar seu objetivo, enfrentando todos os perigos de sua viagem. Portanto,
há dois pontos fundamentais a serem analisados de imediato. O primeiro é se o leitor
irá identificar-se com o desejo do Protagonista e se tal desejo será exeqüível.
Imaginemos que o Protagonista deseja algo de imoral e pérfido. Dificilmente o leitor irá
desejar se identificar com alguém com tais desejos. Por outro lado, imaginemos que
nosso Protagonista deseja algo de fútil ou facilmente alcançável. Qual a graça disto? É
uma banalidade com que o leitor também não irá identificar-se. É preciso ser um desejo
forte, algo de moralmente correto e que seja difícil de alcançar. Aí, sim, o leitor irá
torcer, irá se contorcer de emoção, acompanhando avidamente os passos do
Protagonista.
Desse modo, antes de entrarmos em maiores detalhes de como estruturar a história
e de como iremos narrá-la, vamos nos deter na teoria sobre Personagens.

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2.2 – Definindo os personagens

Cabe ao escritor definir seus personagens com sabedoria. Muitas vezes o escritor
deseja escrever a história de uma pessoa absolutamente comum. Não há nenhum
inconveniente, desde que este personagem possa vir a fazer coisas incomuns. Ninguém
quer ler uma história de uma pessoa comum vivendo uma vida aborrecida, em que
nada acontece. Isto todos já temos isto no nosso dia-a-dia, de um modo ou de outro. O
leitor deseja emocionar-se e não adormecer de tédio.
Cada tipo de literatura tem seu público-alvo e seus desejos próprios. Se o escritor
vai escrever para um determinado público tem que saber quais são os seus interesses.
De certa forma isto não constitui um grave problema; o escritor irá sempre escrever
sobre aquilo de que gosta, atingindo pessoas que gostam das mesmas coisas. O núcleo
da questão ao definir-se um personagem é estabelecer o seu desejo, aquilo que o motiva,
que o fará lutar para alcançar o seu objetivo.
Um livro feminista poderá abordar a história de uma moça pobre que luta para se
formar na faculdade e conseguir um bom emprego. Este é seu desejo: formar-se e
conseguir um bom emprego. Os personagens que irão ajudá-la serão os coadjuvantes da
história, enquanto que tudo aquilo que a obstaculizar serão os antagonistas. Pode ser
que os coadjuvantes sejam até mais importantes socialmente do que ela na história,
mas, na trama não deverão sê-lo. O personagem pode ser ajudado por um rei ou um
nobre, porém, na história, o monarca ou o rico empresário ou o condestável deverá ser
apenas um coadjuvante.
Por outro lado, os vilões podem ser pessoas ou circunstâncias ou, até mesmo,
pessoas que nem sequer a conhecem, mas que dificultam seu desejo. Por exemplo, a
pobreza de sua família é uma circunstância. Digamos que ela conseguiu juntar o
dinheiro suficiente para pagar sua faculdade, mas sua mãe fica gravemente doente e ela
tem que usar estes recursos para uma operação que irá salvá-la ou a sua mãe morrerá.

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O sucesso de escrever

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Neste caso, o vilão – aquele ou aquilo que obstaculiza o seu desejo – é uma
circunstância fortuita – a doença da mãe.
No momento em que se constrói um personagem, seja principal ou secundário, é
importante que se tenha em mente o tipo de literatura que se vai escrever. Se estivermos
escrevendo uma fantasia, o personagem pode ter poderes especiais, tais como voar,
atravessar paredes e o que mais se desejar. Todavia, se estamos escrevendo um drama
contemporâneo, tais características são impossíveis de se encontrar numa pessoa.
Com exceções, o personagem principal deve ser alguém com quem o público-alvo
irá identificar-se. Seus desejos serão os mesmos que os do seu público-alvo ou, pelo
menos, que os leitores possam entendê-lo com facilidade. Caso contrário, não haverá
identificação com o personagem e poderá haver desinteresse. Deste modo, o leitor se
sente entediado e abandona a leitura e, pior do que isso, não irá recomendar o livro aos
seus amigos.
O personagem poderá ter defeitos, vícios e fraquezas, assim como formas de falar
que o diferenciem dos demais – gago, língua presa, etc. – e deformidades físicas – ser
manco, vesgo, etc. –, no entanto, tais características devem ser vistas como obstáculos
íntimos que ele deverá esforçar-se para superar. É óbvio que, se tivermos um
personagem coalhado de defeitos e sem vontade de superá-los, o público não irá desejar
identificar-se com alguém com tais falhas.

2.2.1 – Apresentando os personagens ao leitor.

Quando você começar a escrever, procure usar algumas técnicas para apresentar os
personagens ao leitor. Alguns escritores gostam de caracterizar o personagem de modo
rápido, como se fosse uma fotografia instantânea. É uma técnica boa, ainda que nem
sempre possa ser usada, especialmente se for um romance de época. Em primeiro lugar,
procure definir quem é o personagem principal. Alguns escritores gostam de imaginar

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de imediato um ator conhecido, ou uma pessoa que lhes seja familiar. Desta forma,
conseguem visualizar melhor suas características físicas e emocionais.
Dependendo do tipo de ficção, você pode defini-lo imediatamente através de
alguém mundialmente conhecido. Por exemplo: Jorge era um Tom Cruise brasileiro. Ou
então: Se Tom Cruise tivesse um irmão gêmeo, então Jorge, sem dúvida, seria o próprio.
Se o escritor não deseja caracterizá-lo demais, para não transmitir uma carga
emocional provavelmente negativa ao personagem, pode optar por defini-lo através de
uma ação. Cuidado, entretanto, quando se está escrevendo na primeira pessoa e o
próprio terá a incumbência de passar esta informação ao leitor. Se ele disser que é assim
ou assado, o cuidado deverá ser no tom da narrativa, pois pode se tornar cabotino,
depreciativo, pretensioso ou jocoso em excesso.
Os personagens secundários não devem ser introduzidos numa única cena. Por
exemplo: numa história em que dez pessoas se unem para assaltar o trem pagador, não
é recomendável que o escritor gaste várias páginas descrevendo cada um dos dez
personagens reunidos numa sala, onde estão planejando o assalto. Introduza-os
gradativamente. Veja quem são os mais importantes e os faça interagir. Em outra cena,
introduza mais um personagem através de alguma ação. Não faça excessivos flashbacks
(registro de recordação ou de fato já ocorrido) para não cansar o leitor e desviar a
atenção da trama principal.
Cuidado para não se perder na descrição de personagens sem importância. Por
exemplo: Numa cena onde Manoel e Maria estão almoçando em seu restaurante
favorito, são servidos por Josefina, moça que não tem a menor importância na trama.
No entanto, o escritor resolve escrever a seguinte cena.
“Manoel virou-se para Josefina, a garçonete, e pediu-lhe mais um chope. Ele sabia
que poderia contar com Josefina, uma jovem de vinte anos que estava trabalhando em
seu restaurante favorito há dois anos. Ela viera do nordeste e mandava todo o seu
dinheiro para a mãe doente, lá pelas bandas de Campina Grande. Seu sotaque
nordestino não traía sua procedência e sua magreza mostrava que sempre se alimentara

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O sucesso de escrever

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mal. No entanto, desde que chegara ao Rio de Janeiro, havia engordado e já se mostrava
mais cheinha”.
Se a garçonete Josefina não irá aparecer mais na trama, para que assoberbar o leitor
com mais um personagem, definindo-o e ainda dando informações desnecessárias?
Quem irá se importar com a pobre Josefina, já que não irá mais aparecer na história.
Se for importante que, naquela cena, Josefina se destaque, seja breve e rotule-a:
“Manoel virou-se para a garçonete e pediu-lhe mais um chope. Ele sabia que
poderia contar com a atenciosa Josefina; sempre se sentava em sua praça e era muito
bem atendido pela franzina paraibana”.
A rotulação de personagens nada tem de imoral ou de leviano. É apenas um meio
rápido de defini-lo para que o leitor saiba de quem se trata. Por exemplo: O ursino
Paulo. O bovino Paulo. O taurino Paulo. O atarracado Paulo. O magricela Paulo, etc.
Ao mencionar uma característica psicofísica de um personagem você está apenas
conferindo certas características gerais e imprecisas, sem definir em excesso, deixando
margem para que o leitor possa imaginar. Neste caso, você estará apenas direcionando
a imaginação do leitor, não o deixando completamente à deriva. Se o escritor não der
pelo menos uma certa caracterização, corre o risco do leitor imaginar algo diferente. No
entanto, use o bom senso. Por exemplo:
“O deputado Macedo ficou satisfeito com a presença do taurino Paulo. Desde que
fora ameaçado de morte contratara os serviços daquele guarda-costas”.
Ao definir taurino, estamos nos referindo a um homem forte, mas se tivéssemos
usado ursino, seria diferente, pois um touro é forte, músculos bem definidos e tem certa
agilidade e elegância. Já um urso é gordo, pançudo e, embora também seja muito forte,
é basicamente desengonçado.
Veremos, mais adiante, outras formas de introduzir os personagens através da ação.
É importante entendermos bem os vários tipos de personagens que interagem numa
história.

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2.3 – Os vários tipos de personagens

Numa história, teremos uma série de personagens que, vamos fazer de conta, estão
sentados num carro bem grande. No banco da frente, poderemos ter vários personagens
que chamaremos de passageiros principais, enquanto no banco de trás, estão sentados
os passageiros secundários.
Cuidado: nas diversas paradas do veículo, os passageiros poderão trocar de lugar,
mas de modo geral, os da frente continuarão mais importantes para a trama do que os
secundários, que estão sentados atrás.
Definiremos cada um como fazendo parte de um par de personagens que está
sempre em litígio – não necessariamente num combate de vida e morte. Colocar um
contra o outro é parte da trama.
Atenção: no decorrer da história quem é amigo num instante da trama pode mudar
de lado ou nem sempre estar de acordo com o outro.
O primeiro passageiro é o motorista, aquele que conduz a história. É o personagem
principal (alguns gostam de chamá-lo de Protagonista). Ele é antagonizado pelo
personagem denominado de Antagonista. Ambos estão no banco da frente da história.
Cuidado: O Antagonista pode ser uma pessoa, mas, como já mencionamos, pode
ser uma circunstância fortuita – uma guerra, uma doença, um evento cataclísmico, ou o
Império (Vide Guerra nas Estrelas – O Império do mal é o antagonista de Luke
Skywalker – o protagonista ou o herói do filme). Eles formam um par: é o duelo entre o
Protagonista e o Antagonista que faz a trama ficar emocionante.
Ainda no banco da frente, temos mais um par a que chamaremos candidamente de
Anjo da Guarda ou Guardião e o Demônio da Tentação ou o Tentador. Ambos estão em
conflito um com o outro e têm influência sobre o Protagonista. Enquanto o Guardião é
aquele que aconselha e orienta o herói para melhor alcançar o seu objetivo, o Tentador é
aquele que oferece caminhos alternativos, muitas vezes mais conciliadores e até mesmo

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O sucesso de escrever

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mais instigantes, mas que poderão desviar nosso herói do seu real objetivo. Em Guerra
nas Estrelas, o Guardião é o velho cavaleiro Jedi Obi-Wan-Kenobi (Todos devem
lembrar-se como ele dizia sempre a Luke para que tivesse cuidado com o lado negro da
Força!) enquanto o Tentador é o arquivilão Darth Vader (dizendo: “Venha para o lado
negro da Força, jovem Jedi”). Muitos poderão dizer que Darth Vader é o Antagonista,
mas, se observar bem, verá que Darth Vader deseja que seu filho (Luke) venha para o
seu lado e não o quer morto.
No banco de trás, temos mais dois pares de personagens. Um é o Incentivador que
faz par com o Cético. O Incentivador é o amigo de todas as horas que deseja que o
Protagonista vença. Já o Cético é aquele que duvida do sucesso do Protagonista. Em
Guerra nas Estrelas, o Incentivador é o robozinho AR2D2, enquanto que o Cético é Han
Solo (Nada para ele dará certo e lutar contra o Império é loucura, assim como não
acredita na existência da Força).
O outro par do banco traseiro é o Racional que faz par com o Emotivo. Para o
Racional as decisões são obviamente lógicas. Há mesmo uma certa frieza em seu
procedimento, enquanto o Emotivo é o contrário, sendo dominado pela Emoção.
Essas definições são o que denominamos de Arquétipos e, como todo arquétipo, são
estruturas simples, já que são simplificações da realidade. No entanto, em histórias que
denominamos de Argumento Completo ou Grandes Romances, os personagens são
muito mais complexos. Nada impede que o autor tenha em mente os principais
arquétipos e os vá tornando mais complexos. Não há inconveniente que o escritor os
mescle ou que os faça alternar o comportamento. Por exemplo, o Cético pode se tornar
Emotivo e mudar seu ponto-de-vista para depois retornar ao seu estado primitivo. O
que se deve evitar é que os personagens tenham características díspares ao MESMO
TEMPO, pois isto confunde o leitor e torna a história inverossímil.
Por exemplo, como pode um Cético, que acha que tudo vai dar errado, ser, AO
MESMO TEMPO, Incentivador. Imaginem a seguinte cena.

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Jorge quer construir um Shopping Center e Roberto é Cético e AO MESMO TEMPO
Incentivador. Teríamos um diálogo surrealista.
– Jorge, sua idéia de construir um Shopping Center é ótima, mas não vai dar certo.
No entanto, se você conseguir o dinheiro pode ser que até consiga, mas com certeza
você irá fracassar.
Qual é a posição deste personagem? Ninguém age desta forma. Ou é a favor ou é
contra e nunca ‘muito pelo contrário’, como se diz vulgarmente.
O mesmo acontece com os pares – Protagonista e Antagonista, etc. Ninguém pode
servir A DOIS MESTRES AO MESMO TEMPO. Imaginem o Guardião sendo também,
simultaneamente, o Tentador.
Salientamos agora outro aspecto da criação de Personagens: o Obstaculizador. Este
personagem não é necessariamente o Antagonista, mas aquele que cria obstáculos para
o Protagonista. Por exemplo, em Guerra nas Estrelas, o Obstaculizador é Obi-Wan-
Kenobi. Como é possível que ele seja simultaneamente o Guardião e o Obstaculizador?
Para todos os efeitos, a nossa primeira idéia é que seria Darth Vader. Todavia, se
observarmos atentamente, veremos que é Obi-Wan quem diz a Luke que ele não está
pronto ainda para enfrentar Darth Vader; que ele deve se preparar aprimorando-se nas
técnicas Jedi. Ou seja, ele obstaculiza sua ação imediata por não achá-lo pronto ainda,
mas não é o seu Antagonista que, no caso, continua sendo o Império.
Numa história, o Obstaculizador pode ser um pai ou uma mãe que mesmo sendo
um Guardião eventual não permite que o filho saia de casa para enfrentar os desafios
da vida. O Obstaculizador pode criar obstáculos seja por amor ou ódio ou outra razão
qualquer ao Protagonista. O Obstaculizador não é o Antagonista. O Antagonista é o que
se opõe aos desejos do Protagonista, já o Obstaculizador é aquele que impõe obstáculos
não necessariamente para impedir o Protagonista de atingir seu objetivo, mas com o
intuito, muitas vezes, de prepará-lo, defendê-lo e aperfeiçoá-lo.
Retornando um pouco ao Protagonista, temos que salientar alguns fatos relevantes.
O nosso herói ou anti-herói, não importa, deverá ter UMA das duas características de

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AÇÃO: ou ele será um Realizador Ativo ou será um Realizador Passivo. Na maioria das
histórias, o Protagonista é um Realizador Ativo, ou seja, ele realiza coisas devido ao seu
ímpeto, sua vontade, sua determinação. Já um Realizador Passivo será alguém que
atingirá seu objetivo levado por circunstâncias fortuitas ou sobre as quais não tem
domínio ou, nem sequer, desejo de dominá-las.
Nada contra os realizadores passivos, mas normalmente não dão boas histórias. O
público deseja gente que vença a sua própria inércia, que vença as circunstâncias
negativas, que vença os desafios, portanto, Realizadores Ativos. Entretanto, nada
impede que se consiga uma boa história sobre um realizador Passivo, mas não o
recomendo a um escritor neófito.
Outro aspecto sobre o personagem principal ou Protagonista é se, no final da
história, ele terá se modificado intimamente ou se permanecerá o mesmo de quando
começou. Cada história poderá abordar um ÚNICO aspecto. Ninguém poderá
continuar o mesmo e ter se modificado. Escolha, portanto, como ficará o seu
personagem. Normalmente o Realizador Ativo também se modifica no curso da
História, de preferência para melhor. Em Guerra nas Estrelas, Luke é um Realizador
Ativo (é ele que quer lutar contra o Império, é ele que deseja derrotar Darth Vader, pois
acha que foi ele que matou seu pai, sem saber que ele é de fato seu pai). Ele começa a
história como um simples garoto do interior num planeta esquecido na Galáxia e
termina como um poderoso e sofrido cavaleiro Jedi. Para tanto, teve que vencer os
obstáculos e a si próprio. Nada impede, entretanto, que o herói não se modifique e que
seja esta a sua grande virtude. Vencendo todos os obstáculos, ele não se desvirtua e
continua impoluto. Pode dar uma boa história.
Daremos a seguir dezesseis arquétipos que ajudarão a construir personagens mais
interessantes. Para torná-los mais empolgantes, mescle dois ou mais aspectos de cada
um deles. Nada os impede de mesclar os dois aspectos, o feminino e o masculino, já que

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todos temos os dois aspectos nos nossos hemisférios cerebrais, sendo que o ideal é
balancear ambos de modo equilibrado.

2.4 – Arquétipos

Desenvolvemos 16 tipos, sendo que servem apenas para dar uma base inicial. O escritor
poderá usar e mesclar os vários arquétipos à sua vontade.

O Comerciante

• Principais características de caráter: Articulador inato. Político por natureza.


Gosta do comércio e das finanças e tem forte aptidão para os negócios. Inspira
confiança por sua natural simpatia. Sensual. Debochado.
• Lado negativo do caráter: Enganador e astucioso. Traiçoeiro e caluniador.
Depravado e com tendência aos vícios.
• Características físicas: Esguio, sorriso debochado e olhar perscrutador. Não é
fisicamente bonito, mas o conjunto agrada.

O Guerreiro

• Principais características de caráter: Violento, briguento e impulsivo. Franco em


excesso. Não se abate mesmo nas piores derrotas. Mudança rápida de humor.
Ataques rápidos de fúria. Não guarda rancor.
• Lado negativo do caráter: Cruel. Mesquinho e egoísta. Acovarda-se perante o
perigo físico. Tendência a ataques de fúria destrutiva.
• Características físicas: Forte com tendência a ser magro. Rosto arrogante, nem
sempre belo.

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O Caçador

• Principais características de caráter: Esperto, rápido um tanto nervoso, sempre


em movimento e alerta. Tem iniciativa. Generoso e hospitaleiro.
• Lado negativo do caráter: Inconseqüente, infantil, buliçoso e inconstante. Gosta
de aumentar seus feitos (mente mais para se vangloriar do que para enganar com
propósitos escusos), arrogante e despótico.
• Características físicas: Alto, longilíneo, atlético, bonito e másculo. Simpático,
mas altaneiro.

O Mago

• Principais características de caráter: Equilibrado, mais para velho, controla bem


suas emoções. Não tem uma concepção estreita de moral e de justiça. Tem uma
forte energia criadora, mas tem a tendência de ser um realizador mais passivo do
que ativo.
• Lado negativo do caráter: Raivoso, vingativo e rancoroso. Estreiteza de mente.
Não mede esforços para se vingar de um desafeto.
• Características físicas: Magro, pequeno e algumas vezes apresenta defeitos
físicos nas pernas. Rosto sério que pode inspirar respeito ou temor.

O Ancião

• Principais características de caráter: Rabugento, mais para negativo perante a


vida, ponderado e experiente. O Cético, por natureza.
• Lado negativo do caráter: Masoquista, doenças imaginárias, antipático,
insatisfeito com a vida, lamuriento.

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• Características físicas: magro e raquítico. Rosto sério que inspira respeito.

O Terapeuta

• Principais características de caráter: Racional, sério, obstinado, infunde


confiança, experiente e solicito.
• Lado negativo do caráter: Antipático, arrogante e despótico.
• Características físicas: Alto, forte tendência à obesidade, mais para ursino do
que taurino.

O Monarca

• Principais características de caráter: Ponderado, organizado, político no bom


sentido, simpático, conciliador e bom administrador de homens e recursos,
mescla equilibradamente benevolência e severidade.
• Lado negativo do caráter: Enganador, fraudulento, insidioso e manipulador,
além de mulherengo e desonesto nas suas relações. Tendências suicidas se vier a
perder seu domínio.
• Características físicas: Forte, taurino, com certa tendência à obesidade e porte
majestoso.

O Príncipe

• Principais características de caráter: Altivo, simpático, brigão e rixento, ar


levemente debochado, sincero e determinado. Persegue seus objetivos com
tenacidade e inteligência.
• Lado negativo do caráter: Violento, inconseqüente, obstinado, juvenil.
• Características físicas: Alto, esguio, forte, elegante, viril e rosto másculo e bonito.
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O Mestre

• Principais características de caráter: Simpático, meigo, determinado, adaptável e


de gênio brando.
• Lado negativo do caráter: tendência ao vício e ao sexo desbragado, teimosia
burra, falsidade.
• Características físicas: Magro, baixo, rosto simpático nem sempre belo, mas
agradável.

O Pescador

• Principais características de caráter: Alerta, buliçoso, esperto, um tanto recluso,


infantil.
• Lado negativo do caráter: Misógino, espantadiço, tendências homossexuais.
• Características físicas: Atlético, rosto feminino, simpático.

O Xamã

• Principais características de caráter: Paciente, perseverante, generoso,


equilibrado e sábio.
• Lado negativo do caráter: tendência ao descontrole emocional, astúcia, tendência
à duplicidade.
• Características físicas: Alto, esguio, rosto feio lembrando um animal de rapina
ou uma cobra.

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A Donzela

• Principais características de caráter: Meiga, graciosa, maternal, elegante e


sedutora.
• Lado negativo do caráter: Falsidade, sensualidade exacerbada, consumismo
doentio. Exagero no vestir.
• Características físicas: Bela, roliça e naturalmente sensual. Tendência à
obesidade quando mais velha.

A Cerebrina

• Principais características de caráter: Forte, autoritária, organizada e inteligente.


Adora crianças, mas nem sempre tem paciência para educá-los.
• Lado negativo do caráter: Tirânica, tendências ao descontrole emocional,
loucura.
• Características físicas: Quadris e seios largos, rosto sério. Tendência à obesidade
e ar matronal.

A Guerreira

• Principais características de caráter: Belicosa, fiel, ciumenta e sensual.


Demonstra determinação e age, algumas vezes, usando mais o emocional do que
o racional.
• Lado negativo do caráter: Infiel e explosiva. Tendência à prostituição e a
vulgaridade.
• Características físicas: Sensual, nem sempre bela, mas atraente.

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A Anciã

• Principais características de caráter: Calma, benevolente, justa e digna.


• Lado negativo do caráter: Rixenta, explosiva e tendência a julgar
precipitadamente as pessoas.
• Características físicas: Rosto severo com certa bondade, corpo esguio.

A Militante

• Principais características de caráter: Valorosa, ciumenta e muitas vezes


incompreendida devido ao seu modo um tanto masculino.
• Lado negativo do caráter: Ciúme doentio, força excessiva e tendência à tirania.
Nem sempre usa a inteligência para obter o que deseja, preferindo a força bruta.
• Características físicas: Forte, masculinizada e rosto severo.

Se desejar basear-se nos arquétipos acima, sugerimos que mescle os tipos, tornando-
os mais complexos. Construa um personagem usando os lados positivos e negativos de
sua personalidade, ou seja, seus pontos fortes e fracos, para conseguir alguém bem
próximo da realidade. Para aqueles que gostam dos aspectos esotéricos da realidade,
pode usar as definições de Raios (os sete raios divinos), o que facilita a construção dos
personagens. Há, também, um estudo psicológico intitulado Eneagramas, que podem
lhe dar nove aspectos sobre a personalidade humana. Além destes instrumentos, é
muito comum que um personagem tenha aspectos masculinos e femininos em
proporções variadas. Caberá ao escritor brincar de Deus – é divertido – e arquitetar um
personagem interessante. Quanto mais original o seu personagem for, mais instigará o
leitor a continuar lendo.

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2.5 – A mente masculina e a feminina

Um outro aspecto sobre a personalidade dos personagens: mesmo sendo de sexo


masculino, o personagem pode ter características femininas sem que, com isso, seja
homossexual. Aliás, a homossexualidade nada tem a ver com a personalidade, pois há
homens que tem características masculinas – um Guerreiro, por exemplo – e são
homossexuais. O mesmo acontece com mulheres que podem ter a sensualidade de uma
Donzela, mas optarem por relações com outras mulheres. Portanto, é preciso ter
cuidado ao construir um personagem que seja homossexual para não transmitir idéias
equivocadas ao leitor.
Daremos a seguir algumas características da mente masculina e da mente feminina,
sempre lembrando que nada impede que um homem também tenha a mente feminina
desenvolvida e uma mulher, a uma mente masculina bem desperta. Deste modo, se o
escritor optar por ter uma personagem feminina, por exemplo, poderá dar-lhe algumas
características do arquétipo O Caçador, por exemplo, sem que isto provoque
inconsistências na mente do leitor.
Para entendermos bem este complexo assunto, começaremos dizendo que muito do
que aprendemos nos é ensinado. Todavia, durante a gravidez, quando nosso sexo é
definido, nossa mente passa a ter características que, por falta de uma definição melhor,
chamamos a essa mente de masculina ou feminina.
A mente masculina define uma forma de pensar mais espacial que tem a tendência
de resolver os problemas de um modo mais linear, construindo seu raciocínio de modo
lógico e racional. A mente masculina estabelece um determinado objetivo, determina os
passos necessários para atingi-lo e envida, então, os esforços necessários para alcançá-
lo.
Já a mente feminina é mais temporal (há uma percepção de que as coisas se
modificam e podem ser modificadas como um todo e não só em parte) e tem a
tendência de resolver os problemas de um modo mais holístico, ou seja, de uma forma

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mais global. Ela imagina as coisas como deviam ser, determina como as coisas devem
ser modificadas para que fiquem de acordo com sua visão global e depois faz os ajustes
para alcançar o desejável.
A aquisição do saber se faz por duas vias. Uma é racional, analítica, lógica e linear
que irá resultar numa abstração que se manifesta na função psíquica do pensamento. Já
a segunda via é através da sensação que o hemisfério direito do cérebro processa como
se fosse uma imagem, algo que chamamos de intuitivo. Para que a sabedoria se
manifeste é necessária uma via experimental, sintética, não-linear, intuitiva e de um
mergulho na essência, que é resultante do trabalho do lado direito do cérebro. A
musicalidade, a captação dos padrões, a percepção direta e imediata, mística e intuitiva
é função da mente situada no lado direito do cérebro.
Para se ter uma idéia mais precisa, daremos algumas abordagens:

A mente feminina procura por motivações, enquanto a masculina olha para o


propósito, as causas.
A mente feminina observa conexões entre os fenômenos, enquanto que a masculina
tenta juntar evidências.
A mente feminina estabelece condições, enquanto que a masculina estabelece
exigências.
A mente feminina estabelece os pontos em que irá restabelecer o equilíbrio,
enquanto a masculina subdivide o assunto em partes para poder abordar cada item
individualmente (mais espacial e menos temporal).
A mente feminina busca realização (que pode ser a longo prazo), enquanto a
masculina procura por satisfação (quase sempre imediata).
A mente feminina se concentra nos ‘por quês?’ e nos ‘quando?’, enquanto a
masculina procura entender os ‘como!’ e os ‘de que forma!’.

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A mente feminina procura colocar os assuntos num dado contexto, enquanto a
mente masculina procura discutir os assuntos especificamente, isolando-os do contexto.

Nos arquétipos acima citados, são predominantemente femininos: a Donzela, a


Guerreira e a Anciã. São predominantemente masculinos: o Comerciante, o Guerreiro, o
Caçador, o Mago, o Ancião, a Militante, o Terapeuta, o Rei e o Príncipe. Já os
personagens: o Mestre, o Pescador, a Cerebrina e o Xamã são ambivalentes, tendo tanto
raciocínio masculino como feminino, sendo, portanto, mais completos e complexos.
De posse dessas ferramentas, o escritor estará pronto para construir personagens
únicos, pois sem que haja, pelo menos, um Protagonista de fato especial, dificilmente se
poderá vir a ter uma história interessante.

2.6 – Contrariando o desejo do Protagonista

Como já mencionamos, toda a história deve girar em torno de um objetivo que o


Protagonista anela imensamente. Deve ser algo de real importância ou simplesmente
não haverá história. Repetindo, apenas para fixar bem na mente do leitor, dizemos que
um personagem não deve querer algo de fútil ou mesmo de terrível (matar alguém,
provocar uma calamidade tenebrosa como uma guerra nuclear), pois o leitor poderá
não concordar com tal desejo. Por outro lado, se o desejo do personagem for algo de
fácil obtenção, a história ficará sem atrativos. Se não houver conflito, não há trama, nem
história.
Por exemplo, um homem deseja se casar com uma determinada mulher. Ela
também o ama e quer se casar. Não há obstáculos. Ele é dono de um grande colégio. É
rico e desimpedido e ela também. Onde está o problema? Onde está o conflito? Final da
história, eles se casam, tem filhos maravilhosos e vivem felizes para sempre. Que ótimo
para eles, mas que chatice para o leitor!

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Sem conflito, sem que haja um desejo contrariado, não há a menor graça. No
entanto, imaginem agora que dentro do quadro acima pintado, na véspera de seu
casamento, o homem é acusado de molestar sexualmente várias crianças de sua escola.
Ele jura inocência. Devido à natureza tenebrosa do crime, a noiva se afasta horrorizada
– mais um elemento complicador – e agora, além de ter que demonstrar sua inocência, o
noivo precisa ganhar novamente a confiança da mulher amada. Para complicar, ele é
preso e não tem liberdade para movimentar-se e poder provar a sua inocência. Ele é
condenado a dez anos de prisão. Na prisão, ele é sodomizado e surrado. A mulher
amada casa-se com um antigo namorado e manda um recado dizendo que nunca mais
deseja vê-lo. Agora sim temos uma história. Como irá se livrar da acusação? Quem o
ajudará? Reconquistará a mulher amada ou encontrará outra? Mas, será que ele é
inocente mesmo? Agora temos os ingredientes de um belo drama.

2.7 – Definindo o Antagonista

Assim como definimos o Protagonista, temos que definir o Antagonista – aquele ou


aquilo que irá criar todos os obstáculos para que nosso protagonista não consiga o
sucesso que almeja – o seu desejo satisfeito.
Mais uma vez depende do tipo de literatura. Se estivermos escrevendo fantasia,
nosso vilão poderá ser um tenebroso demônio com características fantásticas. Podemos
ter um vilão estereotipado, cheio de vícios, uma pessoa nociva, possuída de
pensamentos maldosos e que nem sempre age com lógica. Sua vida resume-se em
atrapalhar nosso herói ou heroína. Todavia, se estamos escrevendo uma história
contemporânea, nosso vilão deverá ter características mais humanas. Ele deverá ter sua
própria vida, provavelmente com mulher, filhos, amigos que o acham uma excelente
pessoa.

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O fato de ele ser o Antagonista não o coloca como um ser desprezível de imediato.
Imaginemos que duas pessoas disputam uma promoção numa empresa. Um é nosso
herói e o outro, pela própria colocação do escritor, torna-se nosso Antagonista. Mas isto
não o torna um monstro, nem um Darth Vader – vilão de Guerra nas Estrelas – nem o
professor Moriart, arquiinimigo de Sherlock Holmes ou um Lex Luthor, inimigo mortal
de Super-Homem. Poderá ser também uma pessoa simpática, com seus próprios desejos
e necessidades. Deverá necessitar tanto desta promoção quanto o nosso Protagonista.
Poderá ser o melhor amigo de nosso herói, o que é elemento complicador. Aliás, isto
dará mais pimenta à nossa história. Por quem torceremos? Ambos são excelentes, mas a
vaga é de um só. Quem a conseguirá? Ou subitamente, num final surpreendente, os
dois são despedidos e o sobrinho do dono é guindado à posição desejável? Mas, quem
sabe se os dois não juntam forças e se tornam sócios numa empresa concorrente? Estas
reviravoltas são importantes na história para dar um certo toque moral à narrativa.
Uma outra situação é que os dois, por causa desta luta pela vaga de diretor e seu
salário multimilionário se tornam inimigos e, no final, o sobrinho do dono passa a perna
neles. Valeu perder a amizade por dinheiro?
Todavia, pode ser que o nosso vilão não seja uma pessoa, mas circunstâncias, como
já foi mencionado, que o impeçam de realizar seu intento. Pode ser um temporal, um
acidente, uma guerra, algo que foge de seu controle. Nosso herói terá que vencer
circunstâncias além de pessoas para atingir seu objetivo.
CUIDADO: Nem sempre o vilão é o Antagonista. Pode ser o Tentador (lembrar
Darth Vader).
Se for um drama psicológico, pode ser que o maior adversário seja o próprio
personagem. Pode ser que ele tenha uma falha de caráter que ele sabe que tem e se
detesta por isto. Sua luta é para vencer um vicio, uma deficiência ou uma fobia. O vilão
é, portanto, sua limitação que o impede de ser feliz.
Não é incomum que o vilão da história seja mais interessante do que o próprio
personagem principal. Hannibal, o canibal de O Silêncio dos Inocentes torna-se mais

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O sucesso de escrever

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interessante do que a mocinha que persegue o assassino serial (Hannibal aqui é um


estranho Guardião!), assim como Darth Vader chama mais a atenção dos fãs de Guerra
nas Estrelas. Isto pode ser um problema, pois a identificação do leitor com o vilão pode
levá-lo a não gostar do final, quando o herói finalmente consegue o que deseja. Nos
antigos filmes de Hollywood, muitos torciam pelos índios e ficavam tristes quando
eram vencidos pela cavalaria americana que sempre chegava na última hora para salvar
o mocinho.
Se o escritor intuir que o vilão pode se tornar amado pelo leitor, ele poderá sempre
chegar a um final em que o vilão não é totalmente derrotado (Em Guerra nas Estrelas,
Darth Vader se transforma no final, retorna à Luz e mata o Imperador do mal. Aliás, é
um final excelente já que evita que o mocinho tenha que matar o Imperador
pessoalmente, o que seria um mau exemplo para os jovens. Tal ato demonstraria que os
meios justificam os fins, o que é moralmente inaceitável). O herói conseguirá seu
objetivo, mas um outro tipo de vitória pode ser conferido ao vilão, recompensando-o.
Resumindo: defina bem a personalidade do antagonista – o vilão da história –, pois
grande parte do conflito, que irá gerar uma boa história, repousa sobre seus ombros. Ao
definir a forma de agir e de pensar do antagonista e o ardente desejo do protagonista,
você terá meio caminho andado para escrever um best-seller. Deixe o seu Fluxo mental
Criativo (FMC) conduzi-lo pelos meandros da alma humana e você terá uma excelente
trama, sem ter que ficar inventando voltas, reviravoltas e embargos que não fazem a
história progredir.

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3 – Estrutura da história

3.1 – Estruturas básicas

Falemos inicialmente de Ficção. Há várias formas de se contar uma história.


Abordaremos algumas, mas lembrando ao escritor que da quebra de regras, muitas
vezes, nasce uma obra-prima. Todavia, até para se quebrar uma regra é preciso
conhecê-la.
Normalmente uma história é dividida em Capítulos. O tamanho do capítulo pode
variar grandemente, contudo, mais adiante, falaremos de tamanho quando falarmos em
ritmo e progressão da história. Normalmente os capítulos são numerados. Em algumas
histórias, além da numeração, pode-se atribuir um subtítulo, mas isto de certa forma,
antecipa ao leitor o que vai acontecer. Se for bem feito, pode ser uma forma de instigá-lo
a ler o capítulo, mas é preciso cuidado para não revelar antecipadamente a trama.
Normalmente, um capítulo aborda vários eventos que podem ser sucessivos,
simultâneos ou apresentados em flashbacks. Cada um desses eventos pode ser visto
como uma cena. Pode-se, no entanto, não dividi-los em cenas e mesclá-los. Esta técnica
pode ser confusa e para melhor entendimento do leitor, é preferível que as cenas sejam
bem distintas. Para separar uma cena da outra, pode-se numera-las (o que é mais raro)
ou apenas dar o espaço de uma ou duas linhas entre a última linha da cena que
terminou e da cena que está preste a começar. Pode-se também usar símbolos como ***
ou ••• para caracterizar o fim de uma cena e o início da outra. Fica a critério da editora
e/ou do autor.
Não há um tamanho definido para uma cena. Ela pode ocupar, no mínimo, um
parágrafo, mas pode chegar a várias páginas. O que caracteriza a cena é um evento,
completo ou incompleto. Para maior clareza, não é recomendável misturarem-se dois

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O sucesso de escrever

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ou mais acontecimentos numa mesma cena, a não ser que se deseje expressar uma
simultaneidade imperiosa.
O parágrafo é uma das menores divisões de uma cena. Também não há regra para o
tamanho do parágrafo. Em tese, o parágrafo foi feito para agrupar um sub-evento ou
uma linha de raciocínio. No entanto, há escritores que fazem parágrafos gigantescos, até
mesmo de várias páginas. Mais adiante, veremos em ritmo e progressão da história, as
vantagens e desvantagens do tamanho do parágrafo.
Finalmente, chegamos ao período que é uma frase composta de uma ou várias
proposições formando um sentido completo. Difere um pouco quando se trata de um
diálogo, pois este pode ser interrompido por um outro personagem ou por um fato
súbito, ficando incompleto. Quando mencionarmos ritmo e progressão, falaremos de
tamanho do período. Todavia, apenas mencionaremos agora que um período pode ou
não ser dividido por vírgulas, ponto e vírgula ou dois pontos e terminará sempre por
um ponto, um ponto de exclamação, um ponto de interrogação ou, mais raramente,
reticências (três pontos).
Resumindo, tanto um livro de ficção como um trabalho de não-ficção é
normalmente dividido em capítulos, e estes, em cenas. Uma cena tem um ou vários
parágrafos que, por sua vez, têm um ou vários períodos. Alertamos, porém, para o fato
de que há livros de sucesso que não são divididos em capítulos e cenas, e sua estrutura
linear não apresenta interrupções nem intermissões. Não há, portanto, método infalível,
mas sistemas que podem dar certo num caso e no outro não funcionar tão bem. Tudo
dependerá de como se estruturar a história.

3.2 – Estrutura básica de uma história

Uma história pode ser estruturada de diversas maneiras. O normal é levarmos


algumas páginas introduzindo os personagens e seus dramas pessoais. Assim, o leitor

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irá identificando a situação que irá sendo criada. A boa técnica nos avisa que o leitor é
impaciente por natureza e se o escritor perder muito tempo em circunlóquios, corre o
risco de perder também o leitor. Hoje em dia, com o leitor extremamente visual é
recomendável que se ingresse logo na ação. É preciso fazê-lo participar logo da situação
e não perder tempo com belas frases de efeito que não têm efeito nenhum.
Tendo disposto as cartas na mesa, por assim dizer, o escritor deve logo expor o
problema. Este conflito é chamado em cinema de Plot Point ou Ponto de Virada. É
chamado assim, pois a história ia sendo apresentada com a introdução dos personagens
e do desejo do Protagonista, quando então – no Ponto de Virada – somos levados a um
primeiro impacto (ou surpresa) e o conflito se instaura. Neste ponto, o leitor já
identificado com o Protagonista e conhecendo a maioria dos personagens é levado ao
cerne do embate.
Chamamos de Introdução (os americanos chamam de Set Up) todos os assuntos –
apresentação dos personagens, situações antecessoras e necessárias para o
estabelecimento do conflito e, finalmente, o conflito – pertinentes para levar o leitor a
entender para onde se encaminha a história. A Introdução é o Primeiro Ato ou Parte e
termina com o estabelecimento do conflito propriamente dito.
Os americanos dividem suas histórias em três atos. Todavia, como o termo Ato é
próprio do Teatro, usaremos a nomenclatura Partes.
Na segunda parte teremos o Confronto ou também chamado de Confrontação.
Durante vários capítulos, os contendores irão se digladiar (física ou emocionalmente)
para que o Protagonista e o Antagonista possam alcançar seus respectivos objetivos. O
Objetivo do Antagonista nem sempre é impedir o Protagonista de alcançar o dele, mas
pode ser um objetivo excludente. Por exemplo: Ambos desejam se casar com a mesma
pessoa. Basta um alcançar o objetivo que o outro estará automaticamente eliminado.
Não há como os três conviverem juntos. Ou há? O escritor é que sabe!
Normalmente a segunda parte – Confrontação – é a mais longa de todas. É comum
que os autores dividam esta parte em duas sub-partes devido à sua longa extensão. Isto

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é feito com o intuito de se criar mais tensão e tornar a história mais complexa e
intrigante. Se o autor optar em dividir a segunda parte em dois, teremos que ter por
volta do meio da primeira sub-parte o que o americano chama de Pinch, Embaraço.
Desta forma, no meio da primeira sub-parte da Segunda Parte, teremos o Embaraço 1.
Não é um Ponto de Virada, onde a história leva uma guinada; é apenas um ponto onde
o conflito se acirra devido a uma confrontação mais dramática dos personagens.
Exatamente no meio do livro, entre a sub-parte 1 e 2, você terá o Ponto Médio. Este
ponto pode ser ou de calmaria ou um momento de grande impacto dramático (ou
cômico), se você estiver escrevendo uma comédia. Pode ser algo parecido como a
descoberta do Protagonista sobre a mulher amada é, na verdade, sua irmã. Chocante,
não é?
Na segunda sub-parte da Segunda Parte – ainda na Confrontação – você terá
também, no meio, outro Embaraço, chamado de Embaraço 2. Mais uma vez, um
momento de dificuldade será vivido pelos nossos heróis, mas cuidado, o Embaraço não
é um Ponto de Virada; é apenas mais uma dificuldade que nosso herói terá que superar.
A Segunda Parte – Confrontação – termina com um segundo Ponto de Virada ou,
simplesmente, Reviravolta. Este é um novo elemento complicador, algo que,
subitamente, muda toda a perspectiva da história. Ele é de tal natureza que surpreende
o leitor e o leva a ficar mais tenso no desenrolar da história. Tudo estava indicando que
nosso herói iria resolver o problema de modo seguro, quando – tchan, tchan, tchan,
tchan – apareceu um novo e inusitado problema que o irá lançar num novo caminho.
Há casos em que a Confrontação, muitas vezes, é dividido em várias partes. Isto é
particularmente verdadeiro quando se trata de um romance longo. Não será, portanto,
apenas uma segunda parte, mas duas ou até mais Segundas Partes, em que através de
Reviravoltas sucessivas, a história vai crescendo em tensão e suspense. Neste caso,
teremos Confrontação 1, Confrontação 2, Confrontação 3 e assim sucessivamente. Cada
final das diversas Confrontações terá que terminar com uma Reviravolta. O autor pode

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se dar ao luxo de criar várias Reviravoltas, inclusive para personagens secundários,
desde que, no final, essas tramas secundárias se interliguem com a trama principal. É
obvio que se isto não acontecer, teremos pontas soltas, o que irrita o leitor e empobrece
a história. Portanto, crie quantas Reviravoltas quiser, mas não exagere, pois reviravoltas
em excesso podem dar a idéia ao leitor de que o escritor o está enganando, ‘enchendo
lingüiça’ como dizemos no linguajar cotidiano. E se há uma coisa que os leitores
toleram mal é se sentirem enganados – compraram um livro de 500 páginas que podia
ser resumido em 200: pagaram a mais por 300 páginas inúteis.
Finalmente, temos a Terceira Parte, onde nossos personagens irão resolver
definitivamente suas querelas. Por isto, chama-se a Terceira Parte de Resolução. Como a
história termina é que irá definir o aspecto moral da história.
Volto a insistir que escrever é algo muito particular: cada escritor desenvolverá seu
próprio estilo. Ele poderá, portanto, não ter este tipo de estrutura e inovar de forma
sensacional. Todavia, gostaria de alertar os novatos de que, enquanto não dominarem
bem a técnica, não devem aventurar-se em desenvolver sistemas próprios. Poderão
perder muito tempo e não obter resultados consistentes. Porém, assim que dominarem
a técnica, convido-os a inovarem, pois somente desta forma é que iremos progredir em
termos de literatura.
É preciso tomar cuidado com os finais, pois se for muito óbvio, o leitor ficará
desapontado. Se for trágico, provavelmente, o leitor não irá ficar satisfeito – ninguém
gosta de derrotas. É fundamental que seja surpreendente, seja através de uma revelação
de última hora, seja resolvendo um ou mais enigmas que durante a trama foram sendo
apresentados ao leitor. Já dizia Syd Field, um célebre e laureado escritor de roteiros para
cinema, que ele jamais começa a escrever uma história sem se ter decidido quanto ao
final. Ele até se permite não conhecer o meio, nem mesmo as tramas principais e
secundárias, mas já conhece como irá terminar sua história. Tendo em mente o final, ele
poderá arquitetar tudo que desejar no meio, poderá introduzir um grande número de
variáveis, mas sua viagem – coloquemos assim – já tem um destino final, e ele não

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mudará este final por mais tentadores que sejam outros finais que venham a dançar em
sua mente. Faça o mesmo. Tenha sempre o final em sua mente. É o destino de sua
viagem. Não importando os meandros, as reviravoltas do destino de seus personagens,
no final, chegarão ao destino. Um autor que se aventura a escrever um livro sem ter em
mente um final é como um viajante que parte para uma jornada sem saber para onde se
dirige. A fatalidade será sua eterna companheira.

3.3 – Algumas dicas de como estruturar uma história

Como é que você estrutura sua história? Mentalmente, responderá a maioria dos
escritores. Na maioria dos casos, o escritor vai imaginando sua história (quase sempre
começa pela trama) e vai construindo a história em torno de uma idéia. Outras vezes,
ele é atraído por um evento e imagina toda uma história em torno deste evento
verdadeiro ou imaginário. Outras vezes, ele imagina algumas cenas ou até mesmo um
diálogo impactante. Há, no entanto, autores mais organizados que procuram escrever
sucintamente suas cenas, construindo sua história à medida da inspiração (ou
transpiração). Muitos têm um método enquanto outros confiam apenas em sua
memória e na sua musa inspiradora.
Não há método infalível e muito menos algo que seja perfeito. Os Americanos têm
diversos métodos de desenvolvimento de histórias. Muitos estão disponíveis em
softwares que ajudam o escritor a organizar sua história. Mencionaremos apenas
alguns, pois, se o escritor desejar e souber razoavelmente bem a língua inglesa, poderá
adquiri-lo. Ainda que não venha a utilizá-lo na íntegra poderá ser um instrumento
interessante para ajudá-lo a raciocinar sobre sua história.

Dramatica Pro: é um software que o ajuda a escrever uma história de Grande


Argumento. O software vai lhe perguntando uma série de coisas a respeito dos seus

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personagens, classificando-os de acordo com suas respostas e ajudando-o a raciocinar
sobre as características e modo de agir dos personagens. Por outro lado, ele vai lhe
oferecendo opções que o escritor pode ou não aceitar. Ajuda-o também a escrever uma
sinopse da história, assim como da trama e da estruturação geral.

Storyview: é um software da mesma empresa que desenvolveu o Dramatica Pro que o


ajuda a fazer uma sinopse de sua história, cena por cena, evento por evento, capítulo
por capítulo. Possibilita mexer na seqüência das cenas e dos eventos, assim como
reestruturar tudo. É particularmente útil para quem quer escrever para cinema e
televisão, pois há mecanismos de tempo que lhe dão idéias excelentes sobre a duração
das cenas. Desta forma, você poderá escrever para televisão com quatro cenas de 12
minutos e uma entrada (teaser) de 3 minutos. Ajuda também a estruturar um filme com
90, 120 ou 150 minutos.

Podem ser adquiridos pelo site dramatica.com. O custo dos dois alcança os 250 dólares.

Há também tutoriais excelentes e recomendamos os do Sol Stein, que oferece vários


sistemas desde os mais simples até os mais complexos para escritores já experientes.
Visite o site writepro.com. Os preços variam de 75 a 200 dólares. Sua forma de ensinar é
muito fácil e exige bastante da mente do escritor, o que é ótimo. O seu Flabeditor é
bastante útil e falaremos de flabs (gorduras) mais adiante em Lipoaspiração.
Existe uma variedade de outros, mas não me sinto à vontade para recomendá-los já
que não os experimentei pessoalmente. Mas sinta-se à vontade para testá-los.

O escritor experiente perguntará: onde está a inspiração? Onde está a arte? Se você
usa um software para escrever, onde está a graça? Na realidade, esses softwares não
escrevem o livro para você e nem lhe dão um produto embalado. Eles dão-lhe
instrumentos para ajudá-lo a corrigir sua história, oferecer alternativas para quando sua

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história ‘empaca’ e o ajudam a fazer um brainstorming. Todavia, se você não escrever


sua história, nenhum desses softwares o fará. Há escritores que usam estes softwares
depois que terminaram de escrever seu livro para testá-lo e para aprimorar o que já foi
feito. É como se fosse um grande especialista, o qual você consulta e, utilizando o
método do filósofo grego Sócrates – a maiêutica – de perguntas e respostas, o conduz
pelos labirintos de sua mente e de sua história.

3.4 – Um método de estruturar uma história

Para aqueles que não dominam bem o inglês, sugerimos alguns instrumentos abaixo.

a) Antes de tudo, dê um título ao seu trabalho. É sempre bom dar um nome ao seu filho,
mesmo que possa trocá-lo na hora do registro civil, por assim dizer. No final, você
poderá sempre dar um novo título, se assim desejar. Provavelmente, o editor vai
também sugerir outros nomes que você irá aceitar ou não.

b) Comece sua história por uma Storyline – Fio Condutor. O Fio Condutor é um resumo
de, no máximo, cinco linhas. É um excelente exercício mental para você focar bem,
desde o início, a sua história.

Por exemplo: Fio Condutor de A Guerra nas Estrelas.

É a história de Luke Skywalker, um jovem contra o Império do Mal que tiraniza uma
Galáxia. Inicia com seu ingresso na seita de cavaleiros Jedi após a morte de seus tios. É
treinado por um velho cavaleiro Jedi e, após um sem-número de peripécias, torna-se
um mestre. Luta contra o Império na figura de Darth Vader, sem saber que se trata de

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seu pai. No final, ele derrota o Império e seu pai retorna para o lado brilhante da Força,
após Darth Vader matar o Imperador.

No Fio Condutor, você sumariza a sua história. É um exercício excelente para que possa
entender a sua intenção ao escrever a história. Não se preocupe: até o final você sempre
poderá mudar o Fio Condutor, pois provavelmente sua história irá mudar também.

c) Agora escreva um sumário de, no máximo, uma página sobre sua história, baseando-
se sobre seu Fio Condutor. No decorrer deste sumário você poderá começar a
desenvolver a sua história. Tente fazer quatro parágrafos. No primeiro, você
apresentará sucintamente os personagens, o desejo do Protagonista que deverá ser
contrariado e o primeiro Ponto de Virada. No segundo e terceiro parágrafo, você
descreverá a luta do Protagonista para alcançar o seu objetivo e terminará com a
Reviravolta. No quarto e último parágrafo, você encerrará a história.
Este sumário é interessante para visualizar a história em maior profundidade. Sem
dúvida, você poderá estabelecer os oito mais importantes personagens da história:
Protagonista, Antagonista, Guardião, Tentador, Incentivador, Cético, Racional e
Emocional. Obrigará você a definir pelo menos dois pontos de virada (você poderá ter
quantos quiser, mas não exagere, pois o excesso de viradas pode cansar o leitor – ele
poderá perguntar-se se essa história não termina nunca).
Tudo que você estiver fazendo agora irá apenas ajudá-lo a começar a escrever a
história. É muito comum que, no decorrer da história propriamente dita, haja grandes
mudanças. Não se preocupe. Isso é ótimo. Se você não gostar, sempre poderá voltar
para sua história original. Pior é não ter história para voltar.
Saiba que o lado direito de seu cérebro irá assumir grande parte da escrita e os
personagens irão adquirir vida própria. Não se assuste – é normal. Chama-se Fluxo
Mental Criativo (FMC). Dá a impressão de que outra pessoa tomou conta de você e está
escrevendo, mas na realidade é o lado direito de seu cérebro, a parte mais criativa, que

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está atuando. Isto acontecerá de forma natural. Deixe-o fluir. Poderá acontecer que um
ou mais personagens tomem um rumo que você não previu. Deixe-o caminhar. Você
sempre poderá ‘podar’ o seu comportamento depois ou, então, gostar do que o seu lado
direito escreveu, mesmo que contrarie todo o seu trabalho anterior. Você sempre poderá
reescrever o que não gostou ou simplesmente deletar.

d) Procure agora fazer um sumário de poucas linhas de cada cena. Se você tiver o
software Storyview ficará fácil, mas, se não tiver, você tem duas opções: usar cartões ou
escrever no computador. Pessoalmente prefiro o computador, mas quem não usa este
instrumento, use cartões. Neste caso, não precisam ser muito grandes; 15 cm por 10 cm
é suficiente. Escreva a lápis, pois é mais fácil de apagar. Você pode fazer anotações no
verso do cartão para se lembrar de fatos importantes a serem descritos.

O que deve ser escrito no cartão ou no computador? Um sumário bem resumido da


cena. Por exemplo:

Cena 1. (Se quiser, dê um título apenas para você saber do que se trata. Por exemplo:
Perseguição em Nova Iorque).

Um executivo é perseguido nas ruas de Nova Iorque por três homens bem
vestidos. Consegue entrar num edifício e vai até o último andar. Bate na
porta de um escritório e tenta desesperadamente entrar, mas não há
ninguém e a porta está trancada. Um dos homens fica no saguão e dá
indicações aos dois que estão no elevador em qual andar o outro elevador
parou. O elevador chega trazendo os dois perseguidores. Ele os vê, corre
para a escadaria e consegue chegar ao topo do prédio. Os perseguidores o

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cercam e sua única saída é precipitar-se no vazio e cair os cinqüenta
andares até a morte. Ele olha para trás e um dos perseguidores grita:
– Manoel, não seja tolo. Só queremos conversar.
Ele vira-se e prepara-se para saltar para morte. No momento em que vai
pular, se vira e grita: – A verdade prevalecerá.

Macete: Se quiser mudar depois a ordem da cena, e estiver usando o MS-Word, abra
uma tabela no computador. Na primeira coluna, numere as cenas. Na segunda coluna, o
título resumido da ação (se desejar). Na terceira e mais larga das colunas, escreva o
texto. Se desejar abrir uma quarta coluna, poderá fazê-lo para anotações, como por
exemplo, o nome dos personagens, o tipo (Protagonista=Guerreiro+Cerebrina), outras
informações que achar pertinente, por exemplo: descrever a roupa dos perseguidores
para mostrar que são homens ricos. Ao colocar isto numa tabela, você poderá modificar
a ordem das cenas, apenas alterando o número e dando um comando para reorganizar,
pois o computador fará o resto. Você poderá também escrever tudo em Excel, pois é
mais fácil organizar tabelas e numerar de forma crescente as cenas e eventualmente
somar alguma coluna adicional que você deseje, como por exemplo, o tempo de cada
cena. Isto é particularmente útil para televisão e cinema ou teatro.
Se estiver usando cartões, numere-os na parte superior direita, de preferência a
lápis. Desta forma, você poderá trazer uma cena para a frente ou para trás, apenas re-
numerando os cartões.
Escreva todas as cenas e veja os Pontos de Virada. Anote o número da cena do
Ponto de Virada em vermelho. Analise para ver se estão bem distribuídos. Se optar por
dois Pontos de Virada e seu livro tiver cerca de 200 páginas, o primeiro deverá estar
entre as páginas 40 e 45, terminando na página 50. O segundo Ponto de Virada –
Reviravolta – deverá estar entre as páginas 140 e 145 e terminar a cena na página 150. O
restante ficará para o desfecho da história.

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– Mas eu não escrevo assim – dirá um escritor. – Eu simplesmente me sento e deixo


a história fluir livremente. Quem me guia é a inspiração!
– Maravilha – responderei. – Você não deixa de ter um método de trabalho, mesmo
que aparentemente não tenha nenhum. É um método intuitivo que funciona muito bem
para certos escritores talentosos, mas que pode levar a uma barafunda terrível aquele
que está começando.
Todavia, este livro é dedicado ao escritor novato ou que deseja ampliar sua gama de
conhecimentos. Para esses, é interessante ter um certo método. Nada impede que você
depois reveja como ficou sua história e compare com o que tinha planejado
inicialmente. Com certeza, a sua história ficou muito mais interessante do que quando a
planejou, mas responda-me com sinceridade: se você não tivesse planejado pelo menos
uma trilha, você teria chegado ao seu destino? Provavelmente não. É muito fácil o
escritor se perder nos meandros da inspiração e, no final de um trabalho, ou pior ainda,
no meio dele, se encontrar perdido. E agora, para onde vai essa história? Seu herói virou
bandido, seu vilão arrependeu-se e entrou para um convento, seu conflito morreu por
falta de motivação e seus personagens tornaram-se inócuos e desvitalizados. O que
fazer? Voltar atrás e reescrever, mas agora, do alto de sua experiência, você poderá
guiar melhor o FMC – Fluxo Mental Criativo – para que ele não se transforme numa
babel de idéias e que a parte racional de seu cérebro possa dar direção e estrutura à
história.

Se você optar por escrever cena a cena, você poderá ter as seguintes vantagens:

1 – Uma visão geral da história antes mesmo de se aventurar a escrevê-la. Se a


sinopse cena-a-cena já é impactante, trata-se, pois, de uma boa história. Então
você sabe que terá menos cenas a reescrever no final.

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2 – Fica mais fácil agrupar as cenas por capítulos. Você não terá um capítulo
com 5 páginas e outro com 40. Se, já na sinopse, uma cena é muito comprida,
divida-a.
3 – Poderá analisar cena a cena para ver se você está revelando demais e,
portanto, tirando a tensão do leitor, ou se você está caminhando bem deixando
sempre o leitor ‘enganchado’ para a próxima cena.
4 – Você poderá analisar se a história está fluindo ou se ela se diluiu em algum
ponto.
5 – Ponha em sua mente que um livro é um produto a ser comercializado por
uma editora e, portanto, deve ser estruturado para agradar ao leitor. Se sua
história não lhe agrada, como irá agradar o leitor? Neste ponto, o escritor
poderá dizer que escreve somente para seu próprio prazer. Sem problema!
Acho excelente, mas se a história lhe agrada, provavelmente vai agradar a uma
série de pessoas que pensam como você. E por que não ganhar dinheiro com
isso? Não há nada de errado em se ganhar dinheiro escrevendo. Portanto,
prepare seu livro para ser um sucesso e não apenas mais um produto medíocre.

No final deste livro, dou um Método mais detalhado para estruturar uma história.

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4 - Narrativa

4.1 – O Método do Actor’s Studio de Nova Iorque

O famoso Actor’s Studio de Nova Iorque desenvolveu um método que considero


muito imaginativo. No seu curso de escritores de peças teatrais, o professor chama dois
escritores e separadamente, dá a cada um deles dois roteiros diferentes e os manda
improvisar uma peça na hora, ao vivo, em frente dos demais da classe.
Darei um exemplo: O professor chama um dos alunos da classe de escritores
teatrais e, sem que o outro o escute, lhe diz que fará o papel de diretor de um colégio
que expulsou um aluno e que irá atender a mãe ou pai do aluno. O professor diz que o
aluno era terrível, indisciplinado e extremamente brigão. Vivia discutindo com os
professores, além de ter surrado um colega, sem nenhum motivo aparente. Em hipótese
nenhuma deverá readmitir o encrenqueiro.
Já com o outro aluno da classe teatral, o professor o leva para um canto e, também
sem que o outro saiba, lhe diz que fará o papel da mãe ou do pai do aluno expulso. Diz-
lhe que o menino é uma pérola rara: um aluno disciplinado, estudioso, amado por todos
e jamais brigou com ninguém. O Diretor o expulsou injustamente por motivos escusos
e, quiçá, inconfessáveis. Deverá pedir – forçar mesmo da maneira que puder – para que
seu filho seja readmitido; toda a sua vida depende disto – não poderá entrar em
Harvard com uma expulsão em sua ficha escolar. E sem Harvard, sua vida nunca será a
mesma.
De posse destes dois roteiros diferentes e conflitantes, os dois alunos da classe
teatral irão se digladiar perante o resto da turma que nada sabe sobre o que o
maquiavélico professor preparou para ambos. Não é preciso dizer que a discussão se

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tornará acalorada. Cada um irá defender seu ponto de vista até as últimas
conseqüências. Este é o tipo de conflito engendrado por dois pontos de vista
diametralmente opostos: num o aluno é péssimo e no outro, maravilhoso.
Este método é de grande importância para o desenvolvimento do conflito – não se
esqueçam de que sem conflito não há história. Dê aos seus personagens roteiros
diferentes, com pontos de vista que cada um ache absolutamente correto e moralmente
certos, e deixe-os digladiarem-se até o final.
No fundo, a vida é isto: cada pessoa tem um roteiro que acha correto e procura
defender seu ponto de vista. É deste choque que nasce o conflito e desta luta de
contrários surge uma boa história. Lembre-se mais uma vez: sem conflito não há
história.

4.2 – Mostrando e não dizendo (Show not tell)

Um dos primeiros pontos que o escritor moderno deve ter em mente é que ele deve
envolver o leitor em sua história. Se o leitor não ficar enredado, provavelmente irá
abandonar a leitura e você não terá atingido seu objetivo: emocionar o leitor.
Se observarmos a literatura atual e a compararmos com a dos séculos anteriores,
iremos notar que atualmente a história é muito mais dinâmica, com muito menos
detalhamento sobre roupas, locais, cenários e acessórios de cena. Até a metade do
século XX, os escritores se viam obrigados a descrever detalhadamente, e algumas
vezes, exaustivamente, tanto os cenários como o tipo de roupa que cada personagem
usava. Já nos últimos anos, tal nível de detalhamento reduziu-se tremendamente. Por
quê?
Após a aparição do cinema e da televisão, o leitor tornou-se muito mais visual. Por
causa destes novos meios visuais, seu grau de imaginação tornou-se muito mais
aguçado. Assim a descrição de cenários, de roupas e outros atributos ficou em segundo
plano. Ao invés de longos parágrafos descrevendo lindos campos verdejantes por onde

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O sucesso de escrever

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um personagem vai levar horas atravessando-os, o escritor apenas menciona o fato de


relance e deixa o leitor imaginar o que desejar. A não ser que seja algo de suma
importância no contexto da história, o escritor evita detalhar algo em excesso, seja
objetos, frutas, doces, roupas, etc., indo rapidamente ao cerne da questão.
Por outro lado, o escritor evita ‘dizer’ e prefere ‘mostrar’. Daremos alguns exemplos
que ajudarão a elucidar a questão.

“Alberto estava zangado”.


Neste caso, o escritor ‘disse’ – Não é uma técnica recomendável. Não há espaço para
o leitor imaginar nada, pois o escritor afiançou que Alberto estava zangado.

“Alberto esmurrou a mesa e, bufando, cobriu a sala com seus passos”.


Neste caso, o escritor descreveu melhor a raiva que o personagem sente. Já começou
a mostrar mais. O leitor já começou a vivenciar mais a cena.

“Alberto esmurrou a mesa. Levantou-se com o rosto congestionado e começou a


cobrir a sala com seus passos. Esfregava as mãos uma na outra enquanto seu rosto
crispava-se num ricto que o deformava. Parou no meio da sala e, em plenos pulmões,
quase babando, berrou: – Este canalha ainda me paga”.
Com esta descrição, a raiva de Alberto ficou mais bem caracterizada. O leitor
consegue visualizar bem o fato e as reações do personagem.

O mesmo acontece com a descrição de personagens.

“Maria era linda”.


Esta é uma opinião do escritor. Não revela o que os demais personagens pensam a
respeito dela, pois beleza é relativo.

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“Alberto olhou atentamente para aquela morena de olhos verdes e concluiu que
seria a esposa ideal”.
O autor mostrou um pouco mais. Na realidade, mesmo sem descrever muito, ele
deu a idéia de que o personagem Alberto a achou bonita e que desejava se casar com
ela.

“Seu coração disparou, suas mãos subitamente tornaram-se frias e suadas e seus
olhos abriram-se desmesuradamente. Seu olhar ficou tão fixo na figura longilínea
daquela morena clara, que passou a não ver mais nada na sala. Avaliou suas curvas de
forma despudorada e sua imaginação passeou pelo seu colo. Durante intermináveis
instantes, observou seu andar e suas ancas largas e, sem saber o motivo, pensou que ela
poderia ser uma boa parideira – com aqueles quadris largos, ela não teria problemas em
ter quantos filhos quisesse. Este pensamento o fez voltar à realidade e envergonhou-se:
será que as pessoas notaram que ficara tão embevecido por aquela jovem de imensos
olhos verdes?”
Pode-se notar que mostrar ocupa mais espaço do que apenas dizer, mas faz o leitor
viver melhor a emoção do personagem. Ao mesmo tempo, descreveu a mulher, sem,
contudo, perder tempo ou cortar a narrativa dizendo como ela é. Revelou também algo
do caráter do personagem masculino. Sem dizer, mostrou que ele tinha um interesse
subjacente em se tornar pai – para que pensaria que aquela mulher poderia ser uma boa
parideira, se não tivesse interesse em gerar descendência?

A técnica de mostrar tornou-se importante por dois fatores. O primeiro é para não
cortar o fio condutor da narrativa, descrevendo cenários, vestuários e personagens de
forma cansativa. Tais descrições quebram a seqüência de eventos e ao cortar o fio dos
acontecimentos, o leitor desperta de seu transe – ler não deixa de ser um estado mental
em que o leitor é transportado para uma realidade virtual. Assim, ele pode perder o

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O sucesso de escrever

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interesse na história, ou pular todo o parágrafo que descreve algo do qual não tem tanto
interesse assim.

Imagine só a seguinte situação: o livro vem contando a história de um homem que


está pronto para assaltar uma moça. Toda a narrativa é voltada para a tensão do
instante em que a vítima está para ser atacada e possivelmente estuprada e morta. Neste
instante, o escritor resolve detalhar a roupa com que a moça está vestida.

“A jovem apareceu no fim da alameda e Alberto a observou enquanto se


aproximava. Ela vestia um tailleur azul marinho bem cortado, com botões prateados. A
saia era justa logo acima do joelho e não tinha pregas. Um fecho éclair situado na parte
traseira da saia possibilitava que ela pudesse despir-se com facilidade. O casaco
assentava bem na cintura, mostrando que era uma jovem curvilínea. Sobre os seios,
havia uma prega que dava um charme todo especial ao casaco que terminava logo
abaixo dos quadris. Ela vinha portando uma bolsa de pelica marrom que reluzia com as
luzes difusas da rua. Os saltos de metal de seus sapatos faziam um barulho
característico e a altura dos saltos a abrigava a rebolar seus quadris. Alberto ficou
excitado com a possibilidade de assaltar uma mulher tão bela.”
Perdemos um tempo excessivamente longo para descrever uma roupa como se
estivéssemos relatando um desfile de moda. Para o leitor, tal cena poderia ficar mais
curta e não desviaria a atenção se fosse apresentada como segue:
“A jovem apareceu no fim da alameda e Alberto a observou enquanto se
aproximava. Pela qualidade de sua roupa, ele deduziu que era rica e, pela
voluptuosidade de suas curvas, ele teve certeza de que seria a vítima certa”.
Deixe o leitor imaginar que tipo de roupa, desde que não seja importante para a
história. Se for absolutamente vital, o escritor poderá sempre descrever a moça em cena
anterior se vestindo e reclamando do fecho éclair, já que será este um motivo

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importante para que o bandido não consiga estuprá-la, ou até mesmo matá-la num
acesso de fúria. Isto posto que seja o ponto nevrálgico da cena ou até mesmo de toda a
história.
O mesmo acontece com longas descrições de salas, de quartos, onde o escritor se
transforma num decorador de interiores tentando descrever uma série de detalhes com
os quais o leitor se sente entediado e, muitas vezes, pula a descrição. Quanto trabalho
para nada!
Com este ponto em mente, continuemos nossa viagem.

4.3 – Escolhendo um Ponto-de-Vista (POV)

Ponto-de-vista (POV) indica em que pessoa a história é escrita. Em tese, há três


formas, mesmo que, na prática, só sejam usadas duas. As formas são:
A) Primeira pessoa. Neste caso narra-se a história pelo ponto-de-vista de um dos
personagens. Por exemplo: “Lembro-me bem do verão passado quando minha tia veio
visitar-me...”
B) Segunda pessoa. Neste caso narra-se a história pelo ponto-de-vista de alguém
que pode ou não ser protagonista. Por exemplo: “Você deve se lembrar do verão
passado quando sua tia veio visitá-lo...” Este tipo de narrativa é complicado e só se usa
em diálogos – que veremos mais adiante. Pelo fato de não ser quase usado, o leitor não
está acostumado e, aliás, nem os editores. Portanto, cuidado ao escolher este ponto de
vista para todo um livro: é difícil de escrever, cansativo para o leitor e oferece limitações
na descrição de cenas e pensamentos íntimos dos personagens.
C) Terceira pessoa. Neste caso narra-se a história pelo ponto-de-vista de alguém
que está de fora. Por exemplo: “Alberto lembrava-se bem do verão passado quando sua
tia veio lhe visitar...” Esta é a forma mais usual e que permite grande flexibilidade para
se abordar a história.

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O sucesso de escrever

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É preciso ressaltar que as duas formas mais usuais, oferecem seus pró e contras, o
que iremos abordar agora.

Primeira pessoa

Quando se conta uma história pelo ponto-de-vista de um personagem, fica-se


limitado ao que o personagem vive, vê, sente e sofre. Não se pode entrar na cabeça dos
outros, a não ser por suposição, ou seja, o personagem supõe o que o outro pensa e
sente. Não se deve quebrar a seqüência da narrativa para mostrar fatos fora da visão do
personagem – como é que ele pode saber o que está acontecendo fora de sua área de
visão? Por outro lado, não se deve misturar vários pontos de vista, pois confunde o
leitor e torna a história difícil de se entender. No entanto, tal ponto-de-vista é excelente
para contar dramas psicológicos, onde o personagem pode dar-se o luxo de digressões
sobre o que pensa, o que sente, suas vontades, suas limitações, etc. Para aventuras, onde
vários personagens se misturam, fica difícil que um único personagem possa descrever
tudo o que os demais estão fazendo e muito menos o que sentem, pensam e decidem.

Terceira pessoa

Além de ser a forma mais usual de narrativa, é a que oferece maior flexibilidade.
Todavia, é a que oferece o maior perigo de se confundirem diversos pontos-de-vista
expressos simultaneamente. Deve-se tomar cuidado com um ponto-de-vista conhecido
como onisciência, ou seja, é quando o escritor entra na cabeça de todos os personagens
e descreve suas sensações e pensamentos. Isto pode tornar confusa a narrativa. Senão
vejamos:

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“Com passo firme, Alberto adentrou a sala e viu Joana sentada, lendo. Ela o olhou e
sorriu: como era bonito em sua roupa de tênis. Ele a observou enquanto descruzava as
pernas e se levantava. Gostava de suas pernas bem torneadas. Escolhera bem”.
Esta narrativa aborda simultaneamente os pensamentos de Alberto e Joana. Torna-
se confuso. Quem gostava das pernas bem torneadas? Alberto ou Joana? Quem
escolhera bem? A mesma cena podia ser reescrita de modo a ficar mais compreensível
para o leitor.
“Com passo firme, Alberto adentrou a sala e viu Joana sentada, lendo. Observou
que ela o olhava com um sorriso nos lábios e uma expressão de contentamento no rosto.
Sabia que ela adorava vê-lo suado em sua roupa de tênis. Com um olhar guloso, ele a
desnudou enquanto ela se levantava. Pôde ver um pedaço de sua coxa enquanto ela
descruzava as pernas e deleitou-se com a rápida visão. Simplesmente adorava suas
pernas bem torneadas e conclui que escolhera a mulher certa para ser sua amante”.
Esta cena agora foi abordada pelo ponto-de-vista do personagem Alberto. Já não
ficou confusa.
Há escritores que escrevem uma história inteira na terceira pessoa, mas apenas
focalizando um único personagem. Isto também limita a narrativa, pois se cai no caso
da primeira pessoa.
Acredito que uma das formas mais interessantes é a onisciência, mas tomando-se os
devidos cuidados. Por exemplo, num mesmo parágrafo não se deve misturar o ponto-
de-vista de dois ou mais personagens, pois o leitor não consegue saber quem pensou o
quê. Alguns autores preferem abordar toda uma cena a partir do ponto-de-vista de um
único personagem, mesmo que seja escrito na terceira pessoa.
Por exemplo, vamos desenvolver a história de assalto do Banco. Durante o assalto
propriamente dito, toda a cena é vista pelo gerente do banco, ou então por um dos
bandidos – o chefe, por exemplo, ou um deles que foi compelido a ser assaltante porque
precisa desesperadamente de dinheiro para pagar a conta do hospital, senão seu filho
não poderia submeter-se a uma delicada operação do coração.

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Já na próxima cena, o ponto-de-vista será de um policial que sai de casa, entra no


carro, é interpelado pela dona de um gatinho que está preso numa árvore e que lhe
pede ajuda. A cena descreve o esforço enorme para subir à árvore, retirar o gato,
entregá-lo à dona e, depois, retomar seu caminho em direção ao banco.
Um dos aspectos perigosos na narrativa do ponto-de-vista da terceira pessoa é o
escritor passar a contar a história sem mostrá-la. Aliás, é até tolerável para alguns casos
(veja flashbacks), mas não é recomendável para um livro inteiro.

4.4 – Ritmo da história

Cada tipo de narrativa tem uma progressão e um ritmo próprio, assim como cada
cena. Digamos, à guisa de exemplo, que vamos programar nosso livro para ter cerca de
200 páginas. O primeiro quarto, cerca de 50 páginas, seria para a Apresentação, onde
introduziremos os personagens, o protagonista e seu antagonista, assim como as
pessoas coadjuvantes de ambos os lados. Por volta da página 40 a 50 iremos apresentar
o Ponto de Virada: o confronto de desejos. Se dividirmos esta parte do livro em 3
capítulos, teremos aproximadamente 16 páginas por capítulo.
As próximas 100 páginas, portanto cerca de 6 capítulos, serão dedicados à
Confrontação. Por volta da página 140 a 150, vamos ter a Reviravolta, o elemento
complicador que irá determinar o final. Neste ponto, a Reviravolta, tudo deve estar
contra nosso herói. É o ponto de maior tensão da história e agora teremos 50 páginas,
cerca de 3 capítulos para a arrancada final, a Resolução. Nosso herói será vitorioso? E a
que custo?
No nosso caso, teremos uma história de 12 capítulos, cada um com mais ou menos
16 páginas. Agora vem a pergunta crucial: que ritmo deveremos dar à nossa história?
Coloque em sua mente que um livro é um produto. Pode até tornar-se um best-
seller, ser laureado e faze-lo entrar na Academia Brasileira de Letras, mas nunca deixará

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Albert P. Dahoui
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de ser um produto. O seu editor o olhará como uma possibilidade de venda, assim
como o dono da livraria onde será vendido. Se não vender nada, seu sonho de escrever
se tornará um pesadelo.
Baseado nesta máxima, você deve desenvolver sua história para que seja vendável.
Para que o seja, a história deve ser uma novidade (provavelmente é um assunto velho
apresentado de forma inovadora) e a trama deve obrigar o leitor a virar as páginas, não
deixá-lo ir para a cama, nem largar o livro até que chegue sofregamente ao final. Para
tanto, você deve apresentar seu manuscrito com um determinado ritmo. Se você errar o
ritmo, poderá fazer a história encurtar demais ou esticá-la além do tolerável. As cenas
poderão ser saltadas pelo leitor e ele sem dúvida irá perder alguns tópicos relevantes e,
mais adiante, sua história não será completamente apreendida por ele.
Não há como sugerir um ritmo predeterminado, pois cada história demanda seu
próprio andamento, como se fosse uma música. No entanto, usando o método
cinematográfico, poderemos inferir:

1) As cenas iniciais devem ser rápidas. Devem impactar o leitor para agarrá-lo.
As três primeiras páginas são tudo (pode parecer um exagero, mas não é) e, por
conseqüência, o primeiro parágrafo é o mais importante de seu livro. Se o leitor,
que está folheando o seu livro numa livraria, ler o primeiro parágrafo e ficar
interessado, ele continuará lendo até, no máximo, a página três (de acordo com
uma pesquisa feita nos Estados Unidos). Se você conseguiu prender sua
atenção, ele comprará seu livro. Caso contrário, ele o fechará e sua atenção será
conduzida para outro livro. (Pode até parecer um exagero, mas a experiência
tem demonstrado que se você não agarrar a atenção do leitor na primeira cena,
adeus!)

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O sucesso de escrever

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2) O meio do livro – a Confrontação deverá alternar passagens de ritmo rápido


para passagens mais lentas, o que dará ao leitor tempo de saborear mais alguns
aspectos íntimos de cada personagem ou aspectos intrincados da situação.

3) A Resolução deve ser dinâmica e objetiva. Não significa dizer que o final
deve ser brusco e atabalhoado. Pelo contrário, deve ser bem conduzido para
que o leitor não sinta que está lendo uma novela de televisão, onde o final foi
apressado por razões de audiência.

Agora vem a questão fundamental: como fazer com que uma cena tenha um ritmo
mais rápido. Uma cena de batalha ou de perseguição automobilística pode ser
extremamente lenta e enfadonha se for descrita em todas as suas minudências. Por
outro lado, uma cena de amor pode ter um ritmo rápido. O que determina tal estado de
coisas?
A regra de ouro do ritmo é como o leitor apreende a cena. Se ele vira a página com
rapidez, se ele progride rapidamente na página e se ele alcança o final da cena ou do
capítulo, ele terá a impressão de que o passo é rápido. Ele se sente feliz, pois, em sua
mente, a história está indo de forma rápida e ele descobrirá em breve a trama toda.
Como então fazê-lo virar as páginas de modo rápido? Daremos algumas regras.

1) Frases longas, cheias de vírgulas, diminuem o passo da leitura e da compreensão.


Veja abaixo:

Certa manhã de Outono, quando as geadas começavam a cobrir as estepes siberianas e


o vento frio vindo das regiões polares já soprava com fúria, a tribo de Anank, o chefe de
um grupo de homens brancos da grande família indo-européia, levantou seu
acampamento de verão e começou a se movimentar em direção ao seu local de inverno.

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Observe como esta frase dita centopéica – cheia de pernas – vírgulas – leva muito mais
tempo para ser entendida. O leitor deverá parar para se lembrar qual é o grande grupo
indo-europeu de raças, etc. Se quiser aumentar o passo, divida a frase em várias.

Quando o frio invernal ameaçou se estabelecer nas estepes siberianas, a tribo do chefe
Anank levantou seu acampamento. Rumaram para o lugar especial para passar o
inverno abrigado das borrascas mortais.

Deixe para falar da grande família indo-européia mais adiante, se for preciso.

Os americanos usam poucas vírgulas mesmo em sentenças longas, a não ser quando são
absolutamente imprescindíveis. Já na língua portuguesa colocamos vírgula em todos os
lugares como se fosse uma absoluta necessidade. A regra que recomendo é só colocar
vírgulas em lugares obrigatórios, ou então divida a frase em duas ou mais.

2) Parágrafos muito longo são cansativos e mesmo que sejam lidos na mesma
velocidade, dão a impressão de ser intermináveis. Alguns autores portugueses e até
mesmo alguns brasileiros estão achando que parágrafos longos são mais elegantes e
demonstram um estilo maravilhoso de escrever. É uma reação à escola americana que
tem diminuído os parágrafos. Opte pelo que desejar, mas saiba que parágrafos muito
longos são cansativos, e, portanto, diminuem o ritmo de leitura do leitor médio.

3) Diálogos fazem o ritmo aumentar, não só porque ocupam muito espaço na página,
mas também porque transportam o leitor para dentro da história. Quanto mais o leitor
estiver envolvido, mais o ritmo será rápido. Mas, cuidado com os diálogos – vejam as
regras de diálogos que daremos a seguir e procure segui-las, ou então rompa com todas
e inove, porém sabendo dos riscos de tal audácia.

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O sucesso de escrever

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4) Descrições longas de personagens, de locais, de eventos tornam a narrativa lenta.


Imaginem que duas longas páginas sejam ocupadas para descrever a mansão dos
Cavalcantis para, no final, terminar com o velho Cavalcanti passando uma rápida
descompostura em seu filho que chegou bêbedo na véspera. O leitor sentir-se-á
roubado, pois ele pouco se importa com o tipo de mobília da casa, mas com o conflito
entre pai e filho. Todavia, esta parte foi resolvida com um rápido diálogo. Diminuam a
descrição da casa e aumentem a discussão entre os personagens. Tragam à tona velhas
feridas que possam aumentar o conflito entre pai e filho.

5) Os americanos não estão preocupados com a excessiva repetição de certas palavras


numa frase. No entanto, na língua portuguesa achamos isto uma falta de estilo. Para
tanto, vamos trocando as palavras que se repetem por sinônimos, quando estão muito
próximas uma das outras. Excelente! Mas é preciso cuidado para não colocar palavras
difíceis, pois elas diminuem o ritmo da leitura. O leitor irá parar de ler para tentar
entender o que aquela estranha palavra significa. Se a cena é propositalmente lenta,
então tal artifício é válido (mas tenha cuidado, assim mesmo), mas se for uma cena
rápida, evite palavras de pouco uso diário para não interromper o fluxo de imaginação
do leitor.

6) Capítulos muito longos dão a impressão de que não acabam nunca. Capítulos mais
curtos aceleram o passo, mas nunca faça capítulo com menos de três páginas, pois são
insuficientes para descrever bem uma ação. Uma cena pode ter três páginas, mas não é
recomendável que um capítulo seja tão pequeno.

A pergunta que se deve fazer é se a história tem que ter um ritmo rápido o tempo
todo. É óbvio que não se pode ter toda a narrativa num ritmo frenético do início ao fim.

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Assim como numa viagem de carro, é preciso, de vez em quando, reduzir-se a
velocidade para apreciar a paisagem. Essas diminuições de velocidade são necessárias,
especialmente durante a Confrontação, para que o aspecto íntimo de cada personagem
possa ser explorado pelo escritor, o que dará maior entendimento e credibilidade à
história. No entanto, diminuir o ritmo ou aumentá-lo nada tem a ver com a progressão
da História, mesmo que possam estar associados em certo instante.

4.5 – Progressão da história

Progressão é a forma como a história está sendo contada. Imagine uma história
como sendo uma viagem. Estamos indo de um lugar para o outro, porém a passeio. Não
temos absoluta pressa de chegar, mas queremos alcançar nosso objetivo. De vez em
quando, vemos à beira da estrada um restaurante simpático ou uma cidadezinha
histórica. Podemos dar-nos o luxo de parar, entrar e desfrutar do local, mas não
podemos perder de vista o fato de que precisamos chegar ao nosso destino.
Uma história pode ser vista como uma viagem. Podemos sair da história principal –
a rodovia – para fazer digressões sobre personagens e eventos relacionados com a
história – são os restaurantes, as cidades históricas e os museus dessas localidades –,
mas devemos retomar o caminho e chegar ao nosso destino – o desfecho da história.
Entretanto, devemos evitar a todo custo fatos inúteis que apenas enchem as páginas
com assuntos aborrecidos – pneus furados, falta de gasolina ou, pior ainda, acidentes, a
não ser que sejam os embaraços e pontos de virada que dão molho à história (isto
dentro de nossa analogia de que a história é uma viagem).
Cada cena está associada a outras, sejam imediatas, sejam mediatas, e devem fazer
parte da narrativa. Assim, cada cena deve ser parte da viagem até o destino.

É muito comum o escritor cometer os seguintes erros de progressão:

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a) O escritor se empolga com um determinado diálogo e o deixa arrastar-se por várias


páginas. É preciso ser conciso, direto e evitar as repetições. A não ser que o diálogo seja
absolutamente necessário e seja o ápice da história, ele não deve estender-se demais
dando a impressão de que a história não progride, de que está dando voltas e voltas,
repetindo-se em outros termos, e cansando o leitor.

b) O escritor se empolga com algo que nada tem a ver com a história. Por exemplo:
Simone e Lourdes estão visitando Paris. Vão até o palácio de Versalhes. O escritor se
empolga e começa a contar a história de Louis XIV, o rei-sol. Passa dez páginas
descrevendo seu banho diário, sua rotina, suas guerras, etc. Pode ser até que seja de
grande interesse e magnificamente bem escrito, mas como foge da história de Simone e
Lourdes torna-se maçante. Quando o escritor retorna à narrativa, o leitor já se esqueceu
da trama e leva algum tempo para retomar a narrativa.

c) Divagações sobre aspectos psicológicos de um personagem. Digamos que temos um


personagem com uma agorafobia (medo mórbido e angustiante de lugares públicos e
grandes espaços descobertos). Com o intuito de descrever esta fobia em detalhe, o
escritor se estende por páginas a fio. Quando retorna, o leitor já abandonou seu livro. Se
for imprescindível detalhar a agorafobia, faça-o usando a técnica de mostrar e não dizer
(show not tell). Dessa forma, poderá manter o leitor no curso e conduzi-lo ao seu destino.

d) O escritor se torna angustiado e deseja expor logo toda a trama. Se for muito cedo,
tira a graça. É o viajante que quer chegar logo ao destino. Neste caso, é melhor viajar de
avião e não de carro. Um livro é uma viagem pelo campo e não uma viagem por
teletransportação. Porém, acontece muitas vezes que o escritor leva vários capítulos em
circunlóquios e, quando vai chegando ao final da história, é tomado de uma febre para
acabar logo sua obra. As páginas finais, portanto, são iguais as novelas de televisão,

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onde, por fatores alheios ao desejo do novelista, ele se vê forçado a terminar logo e
embrulha o final numa rapidez vertiginosa. O leitor sente que foi burlado; foi arrastado
em infindáveis tramas laterais sem grande importância e, subitamente, foi conduzido a
um final abrupto.

e) O escritor deseja mostrar erudição e esmera-se nas palavras, em frases de efeito e


longas dissertações sobre um determinado tema. Como literatura, pode até ser
classificado como de excelente qualidade, mas como forma de emocionar o leitor pode
ser que seja pobre. As palavras e as frases existem como meio de comover o leitor. O
livro de ficção foi feito para transportar o leitor para um outro mundo, enquanto está
sentado confortavelmente em sua poltrona, ou deitado em sua cama ou se esquecendo
de sua vida, muitas vezes monótona, enquanto chacoalha num transporte público
superlotado. A palavra é meio de comunicação e não um fim em si própria. Assim como
existem pessoas que se deliciam com o som de suas vozes, há escritores que atingem o
orgasmo escrevendo palavras muito bem engendradas, mas que nem sempre fazem o
leitor sonhar. E a regra é simples: não sonhou, não vendeu.

Progressão é algo imensurável. Ainda não se inventou um meio seguro de saber se


estamos indo bem ou mal, mas quando falarmos de revisão e lipoaspiração, poderemos
dar algumas indicações que poderão ajudar o escritor a aquilatar se a sua história
progride ou se arrasta em certos trechos.

4.6) Técnicas para enriquecer a narrativa e sua história.

4.6.1 – Cadinho: chave para uma boa história

Os dicionários definem figurativamente cadinho como sendo um lugar onde as


coisas se misturam; onde se fundem. A partir desta definição, nosso enredo deve estar

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sempre circunscrito a um cadinho. Ou seja, o conflito deve acontecer de tal forma que os
personagens não possam fugir deste cadinho, do lugar onde suas emoções se fundem e
se chocam. Se o leitor sentir que os personagens poderiam fugir do local e, com isto,
terminar o conflito, então a história ganha contornos de inverossimilhança e é
abandonada.
Se tivermos duas pessoas disputando uma vaga num emprego, dois vizinhos
discutindo por causa de um problema, ou duas pessoas disputando a afeição de uma
terceira, esses fatos estão circunscritos a um determinado local, a uma dada época e não
possibilita a fuga. Qualquer escape termina o conflito e, conseqüentemente, a própria
história.
Se o cadinho é por natureza um local onde se fundem as coisas, ele deve ser quente
e quanto mais esquentar, melhor para a trama. Mesmo quando se trata de uma história
onde se relata uma fuga de uma penitenciária, a trama deve contemplar a possibilidade
de uma perseguição. Se estivermos relatando a fuga de judeus da Alemanha nazista,
por exemplo, temos que colocar a Gestapo – a polícia política nazista – no encalce dos
fugitivos. Se a história apenas narra eventos de uma fuga bem sucedida, a trama
termina com os fugitivos alcançando a liberdade. No entanto, pode-se acrescentar
outros fatores que manterão a chama do enredo acesa e, por conseguinte, a atenção do
leitor.

4.6.2 – Circunscrição da história (Espaço ou Tempo)

O conflito deve ser circunscrito não só num cadinho, ou seja, num ‘local’ fechado,
como também pode estar circunscrito num determinado tempo. A tensão aumenta à
medida que o tempo passa.
Imaginem que um homem deve desarmar uma bomba que vai explodir
pontualmente às dez horas – Ponto de Virada. Trata-se de uma bomba atômica colocada

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por terroristas na cidade de Washington. É necessário não só desarmar a bomba, como
fazer evacuar a cidade. Eles só têm dez horas. Para complicar nossa trama, Embargo 1, a
esposa do nosso herói está tendo o seu primeiro filho. Trata-se de um sonho do casal e
eles haviam envidado todos os esforços para que a esposa pudesse engravidar.
Gastaram todas suas economias e sofreram durante dois anos até que agora ela entrou
em trabalho de parto. Ela não pode ser removida, mas além de não haver nenhum
médico – todos fugiram – a bomba, ao ser mexida, disparou um mecanismo de tempo –
Embargo 2 – e ao invés de explodir daí dez horas, adiantou e explodirá dentro de meia
hora – tempo insuficiente para retirar a esposa e mais de cinco milhões de pessoas que
bloqueiam as saídas da cidade. Quando ele acha que terá sucesso, pois encontrou um
mecanismo especial, entra em cena o terrorista que deseja matá-lo para que não
desarme a bomba – Reviravolta. Agora, além de ter que desarmar a bomba, nosso herói
deve evitar ser morto pelo terrorista e, quiçá, matá-lo e voltar a tempo para impedir a
explosão. Como é que ele irá resolver a situação? Ele está preso tanto em termos de
espaço como, principalmente, de tempo.
Numa outra história, nosso Protagonista foi envenenado por um poderoso produto
químico, que o matará em oito horas. Ele deve descobrir porquê e quem o envenenou,
assim como deve encontrar quem produziu a potente droga, pois ninguém jamais viu
tal veneno e não conhecem a cura – só quem o produziu pode conhecer o antídoto.
Quanto mais o tempo passa, mais suas chances diminuem e mais ele se aproxima da
morte. A tensão irá crescer a cada esperança de cura que o escritor descrever para o
leitor. Será que ele irá morrer?
Tempo pode ser um grande aliado do escritor para fazer o leitor sentir desespero e
se transportar para dentro da História e viver cada segundo de ansiedade do
Protagonista. Nada o impede de mesclar espaço e tempo. Nosso herói está preso, tanto
em termos de localidade, como em termos de tempo. Isto só irá aumentar ainda mais a
tensão.
Use-os com sabedoria.

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O sucesso de escrever

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4.6.3 – Suspense – mantendo o leitor interessado

Como já dissemos, é interessante se dividir a história em uma série de cenas. O


escritor novato tem a tendência de contar tudo muito rapidamente e, com isto, revela
precocemente partes importantes de sua trama ou chega muito rapidamente ao final.
Para tanto, há técnicas de se manter o suspense, ou seja, a história fica, por algum
tempo, em suspenso. O leitor deve ficar intrigado, ou seja, enganchado como um peixe
num anzol.
Por exemplo, digamos que estamos escrevendo a história de um assalto. Os
bandidos entram no banco e apontam as armas, exigindo todo o dinheiro do cofre. O
gerente diz que o cofre só abre a certa hora e que ainda faltam vinte minutos. Os
bandidos decidem então ficar o tempo necessário para que o cofre abra
automaticamente.
Se o escritor terminar a cena com os bandidos esperando o cofre abrir e depois
levando o dinheiro, a cena – desde que seja de fato importante na história – estará
terminada e o leitor não ficou nem intrigado nem emocionado. Foi apenas mais uma
cena de um assalto. Todavia, se o escritor cortar a cena assim que os bandidos souberam
que vão ter que esperar os tais vinte minutos e começar uma outra cena, o leitor há de
querer saber se eles conseguiram roubar o banco ou não. O desfecho foi adiado para
outra cena mais adiante. Com isto, o leitor há de querer saber o que aconteceu e
continuará lendo. A próxima cena pode ser a de um policial que irá fazer sua ronda
diária e terá que passar naquela agência. Ele chegará na hora do assalto? O que irá
acontecer? Ele impedirá o roubo? Ele será morto pelos bandidos?
Veja como o suspense está criado. Neste caso, o leitor, mesmo que não esteja
gostando totalmente da história – não é o seu estilo de livros, por exemplo –ficará, no
mínimo – curioso.

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4.6.4 – Criando tensão

A função do escritor de ficção é criar expectativas no leitor e não de revelar a trama


logo de início. Imagine-se na fila de um cinema, esperando para entrar e você ouve as
pessoas que estão saindo comentando que gostaram do filme, mas foi uma pena que o
personagem principal tivesse morrido no final. Só esta informação é uma ducha de água
fria em sua vontade de ver o filme. O mesmo acontece quando o escritor revela
precipitadamente aspectos importantes da trama, tirando a expectativa do leitor: ele já
sabe o que vai acontecer e não terá surpresa nenhuma em descobrir no momento azado.
Para criar tensão, é preciso que o escritor se controle e não revele tudo ao leitor.
Voltando ao caso anterior. Nossos ladrões decidiram ficar no banco os vinte
minutos, ou seja, até às nove horas em ponto. A cena terminou com esta decisão. A
próxima cena abre com o policial decidindo fazer sua ronda e saindo de casa mais cedo.
Se tudo correr como se espera, ele vai passar no banco em sua ronda diária por volta
das nove horas. O leitor sabe, portanto, que ele vai pegar os ladrões com a boca na
botija. No entanto, no caminho para sua ronda, aparece uma mulher desesperada que
pára seu carro e lhe pede ajuda, pois seu gatinho de estimação subiu numa árvore e não
consegue descer. Ele atende a mulher. O leitor fica tenso: ‘ele vai se atrasar por causa de
um gatinho e não irá prender os ladrões’. O leitor fica ainda mais tenso. ‘Pega logo este
gato e corre para o banco, seu estafermo’. Pronto, você criou tensão e o leitor agora
mergulhou de cabeça na história. A cena termina com o policial entregando o gatinho
para a dona e entrando no carro. Ele se lembra do banco, sua primeira parada diária, e
liga o motor para ir até lá. A cena termina aí. Será que vai dar tempo? Ou ele chegará
depois que os assaltantes já se foram com todo o dinheiro?
Nada impede que o escritor crie outra cena de tensão antes do desfecho deste
episódio. Ele pode começar nova cena, mostrando que um dos maiores inimigos de um
dos assaltantes se dirige ao banco. Se ele entrar, provavelmente, será morto por um dos

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assaltantes, ou então, haverá um tiroteio dos diabos e inocentes poderão morrer. O


escritor vai criando tensão em cima de tensão, fazendo sua trama ficar cada vez mais
tensa e adicionando elementos de complicação crescente à história. O leitor só terá
motivos para lhe agradecer.

4.6.5 - Flashbacks

O flashback se caracteriza como sendo uma cena que aconteceu no passado e é


trazida para o presente da narrativa.
Por exemplo: Estamos descrevendo a cena de um assalto a um banco e focalizamos
um dos assaltantes. No meio da narrativa do assalto, damos uma parada e retornamos
ao passado do personagem para contar algo relevante de sua vida. Por exemplo, uma
surra que levou do seu pai quando era adolescente, fato este que o influenciou
negativamente e o levou a uma vida de crimes.
A boa técnica nos diz que não devemos cortar o fluxo da imaginação do leitor. Se
ele está vivendo um assalto, provavelmente não é hora de trazer à tona um flashback. Se
for absolutamente imprescindível, procure inserir a cena que você julga importante
antes ou, então, depois numa hora em que você poderá revelar o assunto. Por exemplo,
o bandido foi preso, está sozinho em sua cela e relembra um fato de sua adolescência
que o levou a uma vida de crimes.
O ideal é não cortar a cena do presente, trazendo um fato do passado para não
distrair o leitor com excesso de informações que podem não ser importantes naquele
instante, ou que podem ser introduzidas, seja gradativamente, seja numa cena
reveladora dos motivos íntimos. Como, por exemplo, um diálogo entre o bandido e sua
amante, ou uma discussão entre o bandido e seu pai, acusando-o de, com aquela surra,
tê-lo levado a uma vida de crime.

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É natural que, se for apenas um pensamento ou a lembrança de um fato passado, o
fluxo da história não sofrerá uma quebra. Neste caso, o flashback não fica caracterizado
como tal, ou seja, é apenas uma lembrança e não a descrição de uma longa cena
extemporânea.
Por exemplo: no meio do assalto em questão, Alberto lembra-se de algo.
“Se aquele guarda se mexer, vou lhe dar uma coronhada. Chega de ser bonzinho.
Não vou levar um tiro como naquele assalto ao banco de Ipanema”.
A frase que menciona um fato passado (... como naquele assalto ao banco de
Ipanema) não caracteriza um flashback. Neste caso é até bem vindo para demonstrar
uma experiência anterior do bandido. Seria um flashback se o autor resolvesse descrever
o assalto ao banco de Ipanema, o tiro que o bandido levou, como conseguiu escapar,
suas dores e sua recuperação. Tal cena levaria várias páginas e tiraria o leitor do assalto
presente para um outro crime ocorrido há algum tempo. Tal flashback seria um intruso
indesejável.
Se o flashback deve ser evitado, imagine então um flashback dentro de um flashback.
Terá tudo para confundir o leitor. Evite-o!

4.6.6 – Criando credibilidade: suspensão da descrença

Todos já fomos ao cinema e vimos um filme de ficção científica – Guerra nas estrelas,
por exemplo. É mais do que óbvio que sabemos que nada disto aconteceu de fato, mas
vibramos quando o personagem Luke Skywalker consegue trazer para perto de si,
apenas usando seus poderes mentais, o seu sabre de luz que havia caído a certa
distância e foge de uma cilada terrível articulada pelo arquivilão Darth Vader. Por que
vibramos se sabemos que nada disto é real? Porque, em nossa mente, suspendemos
temporariamente a descrença e a aceitamos como se fosse um fato real. Isto acontece
porque o filme é bem realizado, com detalhes técnicos impecáveis e uma razoável dose

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O sucesso de escrever

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de lógica que nos leva a acreditar que se tudo é apenas fantasia, bem que poderia ter
acontecido.
O mesmo acontece numa história de ficção. Cabe ao escritor criar os fatos que levam
à credibilidade, ou seja, à suspensão da descrença. Se estivermos falando de um médico
que desenvolveu um método para gerar um novo ser humano através da união de
partes de vários corpos, como é caso de Frankenstein, temos que descrever o processo
como o cientista irá fazer isso. Se a descrição do método for convincente, o leitor
aceitará a possibilidade de se construir um ser humano a partir da união de partes de
diferentes organismos humanos.
Há um caso clássico de suspensão de descrença: O cavalo de Tróia de J.J. Benitez.
Conheço inúmeros leitores que juram que a NASA realmente desenvolveu o
equipamento que Benitez descreve no livro e que torna a viagem ao passado plausível.
Isto porque a descrição do processo é tão perfeita que o leitor é levado a acreditar que
isso exista mesmo.
Devemos sempre desenvolver algo que levante a descrença. Não apenas em
romances de ficção científica, mas também em qualquer outro tipo de romance. Por
exemplo, se estivermos escrevendo sobre um advogado que tenta livrar da prisão um
suspeito de um crime, temos que abordar, mesmo que ligeiramente, os aspectos legais
do processo, as técnicas policiais de coleta de provas, etc. Isto dará credibilidade à
história.
Na realidade, qualquer livro que se venha a escrever, seja ficção ou não, deverá ter
um certo embasamento daquilo que se deseja transmitir ou o leitor poderá não
suspender a descrença. Todavia, é preciso alertar que não deve haver exageros na
descrição de métodos, pois a longa descrição pode entediar o leitor e ela poderá
abandonar o livro. Isto é válido tanto em termos de descrições de equipamentos, como
de fatos históricos e de pessoas reais ou imaginárias que entram apenas para dar
credibilidade à narrativa. A não ser que você esteja escrevendo um livro de não-ficção

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sobre a batalha de Waterloo, ninguém quer saber que a X Brigada de hussardos tinha
280 cavalos e que atacou a posição tal e tal, na hora tal e tal. Se o personagem participa
desta batalha e lhe acontece algo de importante, conte apenas o que foi relevante ao
personagem, deixando o excesso de detalhes militares para outro tipo de livro.
Coloque-se no lugar do leitor e veja o que é relevante para ele, e não para você. Na
dúvida, menos é mais.

4.6.7 – Quando o menos é mais.

O escritor está empolgado com sua história e resolve descrever algo mais para que o
leitor entenda bem. Portanto, ele se repete e se torna prolixo. Exemplifiquemos:
“Era uma tarde chuvosa. O céu estava cinza e chovia a cântaros. Tudo estava
molhado e úmido, enquanto os céus despejavam suas torrentes de água.”
Analisando esta passagem, notamos que há excesso de informações e que se torna
enfadonho. (Aliás, este é um erro que cometi várias vezes, pois como sou prolixo por
natureza, meus escritos refletem este traço de minha personalidade). A cena já ficaria
perfeitamente definida com apenas: Chovia torrencialmente. Mas se só esta descrição é
suficiente, pode-se descrever uma situação. Por exemplo.
“Ter saído de casa sem agasalho foi um erro que Alberto arrependeu-se quando a
chuva começou a cair: jamais vira tamanho aguaceiro. Lembrou-se de ter dado de
ombros quando sua mulher lhe falou para levar o guarda-chuva, mas ele jamais
carregaria aquele trambolho. Além do que, o sol brilhava e não tinha um nuvem sequer
no céu. De onde aparecera aquela tempestade tão súbita?”
Desta forma, você descreve melhor a cena e não ‘diz’.
O que fazer? Não se preocupe em excesso na primeira passagem, pois na revisão
você poderá fazer uma lipoaspiração. Mas, se puder, desde o início evitar as repetições
óbvias, você terá menos trabalho na revisão.

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O sucesso de escrever

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4.6.8 – Técnica do instantâneo

Define-se instantâneo como sendo uma fotografia tirada sem muita pose. Não é
algo premeditado e muitas vezes sai tremida e escura, mas não importa; é o momento
que vale. Uma foto de um casamento retrata um instante da cerimônia, portanto vem
carregada de emoção. Não é todo dia que alguém casa, nem que seu filho faz cinco
anos, nem que você visita o Museu do Louvre. São instantâneos que retratam parte de
sua vida. Pedacinhos através dos quais se alguém de fora observa a foto, poderá
entender num átimo a emoção que você sentiu.
Num romance, você pode usar a técnica da foto instantânea para produzir uma
carga emocional no leitor. Por exemplo, um policial sai de casa de madrugada e sabe
que vai participar de uma operação extremamente arriscada. Antes de sair, ele entra no
quarto do filho de três anos que está dormindo e fica por trinta segundos – uma
eternidade – olhando docemente para o menino. Ele observa seus cabelos revoltos, sua
boquinha levemente entreaberta e seus olhos cerrados. Sente um frio no estomago e
funga levemente, recolhendo suas lágrimas para o interior – sua profissão não tem lugar
para sentimentalismo. Sai do quarto e, finalmente, da casa, com passos firmes.
(Cuidado, aqui eu apenas descrevi a cena. Caso alguém fosse escrevê-la, deverá usar a
técnica de mostrar e não dizer).
O leitor entende que o policial adora seu único filho e que tem medo de morrer e
deixar o menino só no mundo, pois ele não tem mãe que morreu no parto. É um
instantâneo que fará o leitor ficar com aquele sentimento no coração e torcer para que
nada aconteça ao policial. Esta técnica aumenta a emoção do leitor e o faz participar
mais ativamente da história. A história ficará mais rica do que apenas mencionar que o
policial tem um filho de três anos. Sem a cena dele olhando o menino, a criança é
apenas um fato distante do qual o leitor não enxergará, de chofre, a importância para o
personagem.

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4.69 - Ressonância

Ressonância é uma frase de efeito que ressoa na mente do leitor, fazendo-o


participar ainda mais da história. Não é necessariamente uma frase rebuscada, mas algo
que chama a sua atenção.
“Houve uma pausa tão grande que eu me perguntei se mamãe e papai voltariam a
se falar”.
Esta frase de Rebecca West em seu livro The Fountain Overflows, ressoa. Poderia ter
sido escrita da seguinte maneira: “Durante a discussão, meus pais ficaram calados.”
Na realidade, esta última frase não tem graça, não tem impacto, mas a sentença de
miss West ressoa.

Exemplos de frases que ressoam e que não ressoam.

Ressoa: Assim que o carro arrancou, cantando os pneus no asfalto, Mathews achou
que não teria tempo para encomendar sua alma a Deus.
Não ressoa: Mathews se assustou com a forma como Marilyn dirigia: era rápida
demais.
Ressoa: É óbvio que a Bíblia foi escrita por pecadores. De que outro modo eles
poderiam conhecer todos os pecados?
Não ressoa: Somente pecadores poderiam escrever a Bíblia decido a sua experiência
pessoal.
Ressoa: Não adianta discutir. Somente o demônio negocia. Deus nunca fez acordos
com ninguém.
Não ressoa: Mário sentiu que não tinha alternativas para seu problema, pois nem
rezas ou orações iriam mudar o curso de sua história.

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A ressonância também está ligada à credibilidade. Se o escritor está escrevendo um


livro sobre um arquiteto, é interessante que, num determinado trecho do livro – de
preferência assim que introduzir o personagem na história – o autor possa fazer o
personagem falar algo de inteligente e sucinto sobre arquitetura. Tal sentença irá dar
ressonância ao personagem. É óbvio que um arquiteto tem que conhecer algo de
arquitetura!
O uso de aforismos pode trazer ressonância à sua história. Aforismo é uma sentença
curta que emite um conceito. O escritor pode usar aforismos próprios ou dos outros.
Por exemplo:
“Eu sou o caminho e a luz. Somente através de mim se vai ao Pai. Jorge escreverá
isto acima de sua cama. Ninguém sabia se o fizera por ser católico ou porque, no fundo,
ele se achava um enviado dos Céus”.
Ao começar com uma sentença bíblica, o escritor ‘agarra’ o leitor na primeira linha,
pois é interessante começar uma cena com uma frase de efeito que prenda a atenção do
leitor.
Não tente, todavia, escrever o tempo todo frases de efeito, pois torna a leitura
cansativa e pode passar a idéia de que você é muito pomposo. Uma frase de efeito no
início de uma cena, uma no meio e uma no final já é o bastante.
As frases de efeito podem também vir da boca de personagens, desde que o estilo
do personagem condiga com elas. Um personagem debochado pode falar as mais cruas
verdades em tom de brincadeira, assim como um velho mestre pode discursar sobre um
tema árido de modo circunspeto. O cuidado é não inverter os papéis, pois ficaria
estranho se ter um velho guru transformado subitamente num frenético gozador e
fazendo pilhérias de mau gosto sobre um tema sério. Cuidado também para não usar de
falsa cultura para não tornar sua personagem um Conselheiro Acássio, famoso
personagem de Eça de Queirós, que só falava coisas óbvias com um ar de profunda
sapiência, dando origem ao termo ‘verdade acassiana’.

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4.7 – Cenas de amor

As cenas de amor são sempre difíceis, pois podem descambar para um erotismo
exacerbado – o que pode não ser próprio para o tipo de leitor que o escritor quer atingir
– ou para situações ridículas – o que fará o leitor rir e não se emocionar com o romance
entre os dois personagens – ou finalmente, poderá se tornar maçante – que é o pior dos
casos.
Mesmo se tratando de um livro destinado a adultos, o escritor deve tomar cuidado
para não vulgarizar a ação. Cenas de sexo implícito podem até existir desde que sejam
imprescindíveis para a compreensão da história. Todavia, não devem ser descritas de
forma chula para não ferir a sensibilidade do leitor, a não ser que o livro seja
definitivamente pornográfico, quando, então, termos de baixo nível serão aceitos.
Por outro lado, a descrição de uma cena de amor que implicará em sexo não precisa
ser um rol de lavanderia. Ou seja, não há a necessidade de se descrever cada peça de
roupa que os personagens estão retirando como se estivesse descrevendo um desfile de
moda. Deixe que o leitor imagine que cor de saia Maria está usando ou que tipo de
camisa Jorge está a ponto de retirar.
Os diálogos devem ser bem aquilatados; o que se diz no calor da paixão, é muitas
vezes um lugar comum ou ridículo. Imaginem encher páginas de ‘eu te amo’e ‘eu
também’. O leitor ficará enfastiado e tenderá a pular rapidamente a cena, indo ao final.
Para que escrever algo se você já sabe que o leitor não lerá?
Muitas vezes, a cena de amor é o desfecho de um romance, portanto, não precisa ser
exaustivamente descrito. Por outro lado, com o intuito de criar tensão no leitor, o
escritor pode interromper a cena quando ela está chegando ao seu auge.
Imaginem que dois personagens desejam ardentemente um ao outro. Lutam contra
uma série de circunstâncias que os atrapalharam no passado. Finalmente estão a sós e se
beijam e, quando estão a ponto de se despirem, chega o marido da personagem e o

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amante se vê obrigado a fugir pela janela dos fundos para não ser pego em flagrante. A
tensão é muito mais interessante do que simplesmente uma ardente cena de sexo.
Autores de sucesso conseguem arrastar uma cena de amor por várias páginas,
usando diálogos interessantes, quase nenhum contato físico a não ser os olhos nos
olhos, e sem chegar ao sexo ou a intimidades maiores. Neste caso, o escritor usa da
emoção, dos desencontros, do desejo dos personagens, sem que haja a necessidade de
descrições de cenas picantes. O picante é a própria situação dos personagens que se
desejam, se amam, mas por uma série de razões não conseguem satisfazer seu amor.
Um livro não ficará melhor nem pior só porque o escritor descreveu uma cena de
amor físico, a não ser que isto seja absolutamente imprescindível para o entendimento
de algum personagem e da história em si. Podendo, evitem dar o desfecho apenas para
manter o leitor agarrado ao livro.

4.8 – Problemas imprevistos no decorrer da história

Lá pelas tantas, após escrever várias páginas, você olha para o que escreveu e vê
que não é o que você queria. Você sente que a história está com problemas sérios. Sua
história, na sua opinião, está indo para a UTI.
O primeiro passo é identificar o tipo de problema. Dependendo do que seja, é
possível salvar o paciente. Vamos relacionar alguns dos muitos tipos de problema que
podem surgir.
A) Você deixou que um personagem tomasse as rédeas da história e agora ele está
descambando para um terreno do qual você não está gostando.
É muito natural o escritor deixar livre o seu Fluxo Mental Criativo (FMC) e, assim,
os personagens tomam vida própria e fazem o que bem desejam. Há duas opções. A
primeira é deixar o FMC livre e ver para onde tudo isso irá levá-lo. Posso garantir-lhe
que você se surpreenderá, de forma agradável ou desagradável, dependendo do que o

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seu FMC ditar. Como catarse é ótimo – você estará expulsando seus demônios internos
e podem até ajudá-lo a se conhecer melhor –, todavia, como literatura pode não ser
muito aconselhável. Neste caso, verifique o que você já escreveu, veja para onde está se
dirigindo a história, faça os cortes que achar necessários para voltar ao que você
planejou (Você planejou mesmo ou está escrevendo de qualquer modo?) ou então reveja
os rumos de sua história. Pode até se tornar melhor do que você imaginou.
Quando estava escrevendo um dos romances que publiquei (Moisés, o enviado de
Yahveh), eu tinha planejado que Moisés seria um calhorda da pior laia, mas, no
decorrer da história, eis que o personagem tomou-se de brios, gritou a plenos pulmões
que não era o canalha que eu tinha imaginado e acabou por se tornar um Protagonista
moralmente poderoso. Quando terminei de escrever e reli, deixei como estava, pois até
eu passei a gostar dele, mesmo que, no início, minha idéia fosse fazer dele um anti-
herói. Portanto, não desanime e continue a escrever; pode ser que você venha a
descobrir coisas maravilhosas das quais nem sequer suspeitava.
Para evitar que seu personagem descambe demais e mude completamente sua
história, planeje bem e escreva uma sinopse cena-a-cena. Ao fazer isto, você terá a
chance de rever cada um dos personagens e observar se estão corretamente
personificados.

B) Um desânimo profundo tomou conta de você. Você se deu conta de que sua
história é por demais comum (não é grave), ou é uma mixórdia de vários livros que
você leu (o que é pior). Sua vontade é largar tudo e dedicar-se a outro hobby.
Volto a insistir: planeje sua história no início, pois se assim fizer, descobrirá que ela
é fraca. Terá, portanto, tempo para dar uma guinada antes de escrever 500 páginas e
descobrir que fez uma miscelânea horrorosa. Todavia, você ainda pode salvar a sua
história. Mude o destino de sua viagem. Reveja o final e transforme-a em algo que nem
você previu. Como? Diremos em breve.

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C) Você pesquisou um determinado evento e começou a escrever. Após escrever


várias páginas, você descobriu outros fatos que invalidam sua tese ou sua história.
Tudo que você escreveu não serviu para nada.
Confesso que isto é desagradável. Você deveria ter pesquisado um pouco mais, mas
não jogue fora o que já escreveu. Guarde para ser aproveitado em outra história ou em
outra idéia. Não desanime e recomece.
Se lhe serve de consolo, já me aconteceu. Após 80 páginas descobri que a minha
história não correspondia a certos fatos históricos que eu levantei posteriormente. E daí?
Nada. Não chore nem se ache um infeliz – veja isto como um treino e recomece. Boa
sorte!
O leitor mais atento dirá que eu mesmo cometi um erro que disse para não cometer.
É verdade. No início deste livro, eu disse para não perder tempo pesquisando e,
portanto, usar tal fato como desculpa para não escrever. Aconselhei-o a pesquisar
durante o processo de escrita. Ora, se tivesse pesquisado antes, não teria que reescrever
tudo. Como explico isto? Na realidade, o ideal é pesquisar bem o assunto antes para ter
todos os dados em sua mente, mas tenho observado que isto tem se tornado uma
desculpa para que o futuro escritor continue pesquisando e jamais venha a escrever.
Deste modo, usando o bom-senso, é preciso pesquisar, mas sem fazer disso uma
desculpa para procrastinar o ato de escrever propriamente dito.

4.9 – Como salvar uma história que está caminhando mal ou


empacou

Digamos que a sua história, mesmo que você a tenha planejado, não está indo bem.
Analise os seguintes pontos:
1) Seu Protagonista é um personagem interessante. É uma pessoa com que seu leitor
simpatizaria de imediato? Se não é, veja como você pode mudar seu perfil, suas ações e

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seus desejos. Faça-o realizar algo de imprevisível. Imagine um executivo de uma grande
empresa, ganhando milhares de dólares por ano e com responsabilidades
extraordinárias. O que é que este homem faria que fosse completamente imprevisível e
que seu leitor pudesse achar incrível (não no sentido de não acreditar, mas no sentido
de espantoso, de causar surpresa). Será que ele abandonaria tudo para se tornar um
ermitão? Pode ser, mas provavelmente o leitor não iria gostar de alguém que foge de
seus problemas. Será que ele largaria tudo para ser um travesti? Surpreendente, mas o
leitor dificilmente se identificaria com tal mudança, a não ser que fosse uma comédia
picante. Então, procure algo que ele jamais faria, mas que, se o fizesse, todos achariam
fascinante.
2) O desejo e o conseqüente conflito que norteia a história é interessante? Será que o
leitor acha que vale a pena estressar-se por tal desejo? Será que o desejo corresponde à
personalidade do Protagonista? Imagine uma dona de casa que se aborrece porque sua
filha quer ir ao baile de formatura com um vestido preto e ela quer que ela vá de rosa.
Será que tal conflito dará uma boa história? Parece óbvio que não, mas... Pode até se
tornar um best-seller se for bem escrito. O conflito de mãe e filha parece piegas e
insignificante, mas – aí está a beleza da história – por baixo do iceberg se esconde o
verdadeiro conflito, algo de tenebroso, algo de inimaginável, um segredo de tamanha
repercussão que, se a mãe o divulgasse, seria um desastre. Aí você teria uma história
sensacional. Escondido por trás de uma simples discussão por causa da cor de um
vestido se esconde um segredo abominável. Sem dúvida, o leitor vai querer saber qual é
e lerá avidamente o livro até a última linha.
3) Os Pontos de Virada se destacam? Ou são eventos apagados? Se não trouxerem
tensão e suspense à história, então, é preciso revê-los. Ninguém quer ler sobre um tédio
massacrante onde tudo corre bem e nada acontece. O leitor quer conflito, ação e
emoção. Quando criar o conflito – fruto do desejo contrariado – faça-o com criatividade
e surpreenda o leitor. Faça-o correr perigo (de vida, de perder a sua posição, sua
liberdade, etc.). Faça-o correr riscos que normalmente o leitor não iria gostar de correr,

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mas que ele deseja ver como alguém parecido com ele poderia sair-se em uma situação
estressante e perigosa. Faça as Reviravoltas valerem cada centavo de seu tempo e do
bolso do leitor. Não se satisfaça com pouco. Exija de sua mente algo de imprevisível e
quase impossível de acontecer (não se esqueça de suspender a descrença do leitor antes
de apresentar tal evento inesperado).
Nem sempre é possível salvar uma obra quando ela se encaminha para o ralo. Se de
todo for impossível, recomece. Não desanime nunca – o segredo do sucesso é a
persistência.

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5 – Diálogos

5.1 - Introdução

Esta é uma das partes mais complexas da Ficção. Muitos escritores de alta qualidade
tropeçam nas linhas do diálogo. A primeira coisa a entender-se é que o diálogo não é a
reprodução da conversa do dia-a-dia. Numa história, o diálogo foi feito para enfatizar
um momento dramático (ou cômico). Ele foi feito para gerar ou estimular o conflito ou
um aspecto dinâmico de uma cena. Portanto, o bom diálogo deve ser oblíquo e não
direto. Oblíquo? Explicaremos:

Exemplo de um diálogo direto.

– Eu amo você. Não posso viver um dia sem você.


– Eu também. Sou louca por você e não saberia mais viver sem os seus carinhos.

Que lindo! Mas também extremamente chato. Qual é a graça de duas pessoas se
declarando? Agora imaginem a mesma cena com um diálogo oblíquo.

– Eu amo você. Não posso imaginar minha vida sem você.


– Pois eu posso – respondeu Maria.

Isto sim, é que é uma resposta que gera conflito, que gera tensão no leitor. Isto é um
diálogo oblíquo. O que ela quis dizer com isso? Será que ela não acreditou na
declaração de amor do homem? Ou será que ela não o ama e, por isso, pode imaginar a
sua vida sem ele?

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Outro diálogo direto, também chamado de ‘lugar comum’.

– Bom dia, Jorge.


– Bom dia, Manoel.
– Está tudo bem?
– Sim, Manoel, tudo está bem e você?
– Estou ótimo!

Vamos parar por aqui antes que o leitor adormeça e deixe cair o livro no chão. Qual é a
graça da conversa diária? Nenhuma. É apenas repetitiva e dificilmente se chega a
alguma conclusão. Agora veja como um diálogo oblíquo pode trazer tensão à história.

– Bom dia, Jorge, como está passando?


– Será que meu estado é assim tão visível?

Agora sim a resposta suscita dúvidas no leitor. O que será que o tal Manoel tem? Ele
está doente? É grave? É terminal? Quais são as conseqüências para a história? Estas
perguntas estimulam o leitor a continuar lendo.

Muitos escritores querem reproduzir o diálogo do dia-a-dia em seus livros com o


intuito de serem realistas. A resposta é que o diálogo de um livro de ficção não foi feito
para ser a fiel reprodução de um diálogo realista. Foi feito para estimular o conflito, a
dúvida e a curiosidade.
O diálogo não foi feito para ser um informativo, mas pode eventualmente informar.
Ficou na dúvida? Explicarei com exemplos.

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– Estou vendo que você está usando a calça caqui que você comprou por sessenta reais
na liquidação da loja Renner em Março deste ano.
– Estou sim e você ficou bem com o vestido rosa que seu namorado lhe deu na Páscoa.

Não só o diálogo soa falso, mas é informativo. Ninguém irá dizer que o outro
comprou a roupa pelo preço tal, pois afinal foi o próprio que pagou e sabe onde foi
comprado. Quanto mais uma resposta da qual novamente há uma informação. Se o
escritor quer dizer que o personagem está de calça caqui e a outra está de vestido rosa,
poderá fazê-lo na descrição da cena, desde que isso tenha real importância na história.
Se não houver, não mencione. Não se esqueça de que neste caso o menos vale mais.

Há, entretanto, alguns casos em que um diálogo pode ser informativo.

– Até que enfim que a polícia prendeu o assassino do Presidente.


– Só que prendeu a pessoa errada – e vendo a expressão de espanto no rosto do amigo,
ele complementou quase sussurrando – o verdadeiro assassino é Fulano.

Neste caso, o diálogo é informativo – está informando que o verdadeiro ou suposto


assassino é outra pessoa. Todavia, neste caso, o diálogo é quase direto e não tem tanto
impacto. Seria melhor se fosse mais oblíquo. Por exemplo:

– Até que enfim que a polícia prendeu o assassino do Presidente.


– É mais um Cristo que vai pagar o pato.
– Como assim? Ele não é o assassino?
– Quem sou eu para contestar a polícia.
– Fala logo, cara, desembucha. Diz logo o que sabe.

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O sucesso de escrever

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Com uma expressão de safardana, ele apontou para Manoel que estava se esgueirando
entre as pessoas que foram ver a prisão de suposto assassino. – Eu não sei de nada, mas
ele bem que sabe.

Agora o leitor não sabe se o assassino é Manoel ou se é ele quem conhece o assassino.
Criamos tensão e só iremos revelar o fato no momento certo.

Outro exemplo de diálogo que informa, sem ser informativo.

– Não entendo o comportamento dela. Tinha tudo para ser feliz.


– Vejo que você não conhece nada da vida dela. Se conhecesse, não diria isso.
– Realmente não conheço, mas a sua atitude foi uma loucura. Como pôde matar seus
três filhos e depois se matar daquela forma?
– Não que eu concorde com isto, mas você sabia que todos os seus filhos eram
portadores do vírus da AIDs? E que ela mesma também estava infectada? Sabia que,
com a morte do marido, ela ficou na rua da amargura e não tinha dinheiro sequer para
comprar comida, quanto mais os caríssimos remédios para tratar seus filhos. Eram
todos doentes terminais, meu amigo.

Neste caso, é perfeitamente plausível a informação, pois ela vem em decorrência de


um diálogo oblíquo e tenso. Naturalmente que o exemplo aqui foi trágico, mas o que
vale é a forma. Podia ser uma informação jocosa que também valeria. O que se deve
evitar é a informação redundante, aquela em que fica evidenciada a voz do autor
relatando algo pela boca dos personagens.
O escritor novato poderá ficar ansioso, já que muitos acham que o diálogo é a
reprodução fiel do que acontece entre as pessoas, mas posso lhes afiançar que o diálogo
oblíquo traz muito mais tensão à sua história do que o ’clichê’ do dia-a-dia. Treine-o!

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Albert P. Dahoui
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5.2 – Marcadores de diálogo.

Marcador de diálogo é quando informamos o leitor de quem está falando. O


marcador é importante, pois imagine o seguinte caso: Jorge, Maria, José e Manoel estão
numa sala.

– Não disse que ele viria.


– Não faltaria por nada neste mundo.
– Mas você não trouxe meu livro.
– Esqueci-me por completo. Amanhã eu trago.
– Que nada, todo mundo o conhece. Você só não esquece sua cabeça por que ela está
presa ao seu corpo.

Quem é que está falando? Quem é que chegou e quem esqueceu o livro? Sem
marcadores, o diálogo fica irritante e nunca devemos irritar nosso leitor; é a única
emoção que ele não deseja.

Há também o excesso de marcadores que também pode atrapalhar. Por exemplo:


dois homens estão falando – João e Paulo.

– Desde que saí da cadeia que não consigo emprego – disse João.
– Quem vai dar emprego a um ex-ladrão – retrucou Paulo.
– Você disse tudo – ex-ladrão. Não sou mais – afirmou João.
– O difícil é provar – disse Paulo.

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O sucesso de escrever

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Não que esteja errado, mas como são apenas dois personagens, bastaria definir o
primeiro a falar, pois as demais linhas de diálogo estariam implícitas. Isto dará maior
velocidade à cena.

No tópico marcador, também há o caso de marcadores confusos que, na realidade,


não informam que está falando. Por exemplo, três pessoas falando – João, Manoel e
Jorge.

– Nunca vi nada tão estúpido quanto isto – disse ele.


– O que aconteceu foi que ninguém esperava por um pacote tão grande – disse ele.
– Poucos podem carregar algo tão pesado – disse ele.
– Eu não me importo de levar no meu carro, desde que alguém me ajude a colocá-lo no
porta-malas – disse ele.
– Vamos lá, então – disse ele.

Caímos no mesmo caso de não ter marcador. Quem começou o diálogo e quem
foram os que falaram a seguir? O tal pacote irá no carro de quem?
Outro aspecto é que há excesso de ‘disse ele’. Se tivermos que usar marcadores,
podemos usar várias formas de definir a entonação. Por exemplo: atalhar (interromper),
vociferar (gritar com raiva), retrucar, responder, murmurar e sussurrar, entre outras
(desde que seja importante na história – se não for, não use marcadores, pois o leitor é
capaz de identificar o tom pela forma como o escritor escreveu a cena). Podem,
entretanto, existir modos diferentes de interpretar uma reação e pode ser que apenas a
sentença do diálogo seja insuficiente. Neste caso, o marcador deve ser bem definido.

– Como sempre você está atrasado – vociferou João.


– Mas, desta vez, não tive culpa.

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Há várias maneiras de definir a sentença. Será que ele respondeu lamuriando-se? Ou


retrucou com um sorriso maroto nos lábios? Ou agitou-se todo e respondeu com
energia e ódio? Neste caso, o escritor deve definir melhor como foi a resposta.

5.2.1 – Marcadores anteriores, no meio e posteriores.

Há três tipos de marcação de diálogo. Eles podem ser colocados de modo anterior, no
meio ou posteriormente ao diálogo. Daremos alguns exemplos a seguir.

– Certa vez, quando vinha de São Paulo, encontrei a Márcia na Ponte Aérea – informou
Jorge.
Com uma expressão aparvalhada, Manoel retrucou: – Como é possível? Ela jamais
mencionou ter ido a São Paulo!

Neste caso, o marcador da resposta antecede a sentença proferida. Ficamos sabendo de


antemão quem é que vai falar.

A mesma cena poderia ter uma outra forma de marcação.

– Certa vez, quando vinha de São Paulo, encontrei a Márcia na Ponte Aérea – informou
Jorge.
– Como é possível? – retrucou Manoel, com uma expressão aparvalhada. – Ela jamais
mencionou ter ido a São Paulo!

Neste caso, a marcação ficou no meio, ou seja, intercalada entre as duas sentenças.

A última forma é:

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– Certa vez, quando vinha de São Paulo, encontrei a Márcia na Ponte Aérea – informou
Jorge.
– Como é possível? Ela jamais mencionou ter ido a São Paulo! – retrucou Manoel com
uma expressão aparvalhada.

Qual a certa? Todas. Caberá ao escritor escolher a que fica melhor no contexto de seu
manuscrito. Poderá escolher, inclusive, não ter marcador nenhum.

5.2.2 – Estilo jornalístico de marcação

Deve-se evitar o estilo jornalístico de marcação, ou seja, explicar uma cena e depois
citar o que o personagem disse. Fica bem num jornal, mas deve-se evitar num livro.

Exemplo:
“Os dias passavam morosos e João não tinha mais nada a fazer. Era tempo de espera e
ele estava cansado de fazer isso. Passava os dias lendo, vendo televisão e tomando
banho. Também com o calor que fazia e sem ar condicionado, era só isso que podia
fazer. Bufando de calor, disse: – Ah! Se eu tivesse pelo menos um ventilador”.

Não há nada de errado na citação, mas deve-se evitar o uso abusivo no decorrer do
livro. Alguns mestres estrangeiros reputam isto como exemplo de um estilo literário
pobre. Discordo, pois pode ser necessário narrar-se uma situação anterior e terminar-se
com um diálogo do tipo citação jornalística. Não vejo nada demais, desde que seja
usado com certa parcimônia. Todavia, como cito e me repito várias vezes, as regras
podem e devem ser quebradas, mas domine-as primeiro antes de se aventurar em
descartá-las.

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5.3 - Monólogos

Cuidado com monólogos muito longos, ou diálogos onde somente um personagem


fala e os demais escutam. É preferível que, ao invés de um monólogo, este seja
substituído por diálogos ou outras formas de discurso indireto. Vejamos uma cena e
como ela pode ser escrita de diversas formas.

1a Opção (Neste caso, temos um monólogo puro e simples.)

O chefe convocou seu grupo e adentrou no assunto assim que viu que todos tinham
chegado.
– Amigos, chegou o grande dia. Temos os meios e o momento é adequado. O povo
há de ficar do nosso lado e poderemos derrubar o governo sem grande morticínio. Falei
com os generais do exército e eles concordam que o atual governo já durou demais.
Amanhã irei à casa do ditador e lhe darei ordem de prisão. Se ele reagir, serei obrigado
a matá-lo. Assim que tiver tomado o poder, irei à televisão e anunciarei o fato. Marcarei
eleições gerais para daqui a três meses. Enquanto isto, o governo será comandado
provisoriamente por mim e mais dois generais.

Esta opção é meramente informativa e tem pouco ou nenhum impacto emocional.

2a Opção – A mesma cena pode ser dividida em diálogos.

O chefe reuniu seu grupo e adentrou no assunto assim que viu que todos tinham
chegado.
– Amigos, chegou o grande dia. Temos os meios e o momento é adequado.
– Meu maior receio é a reação popular – atalhou Guimarães.

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– O povo há de ficar do nosso lado e poderemos derrubar o governo sem grande


morticínio – respondeu o chefe.
– E o exército? Será que eles hão de nos apoiar? – perguntou um outro conspirador.
Sabia que sem o apoio do exército, o golpe palaciano viria a fracassar.
– Falei com os generais e eles concordam que o atual governo já durou demais.
– E o que você pretende fazer? Como destituirá Zibran? – voltou a inquirir
Guimarães.
– Amanhã irei à casa do ditador e lhe darei ordem de prisão.
– Meu Deus, isto é uma temeridade! O que acontecerá se ele reagir? – Pelo tom de
voz de Jorge era visível o seu medo, mas agora era tarde demais: já haviam gasto meses
planejando o golpe.
– Se ele reagir, serei obrigado a matá-lo.
O silêncio caiu entre os demais. Sabiam que tal estado de coisas não se poderia
prolongar indefinidamente. Era melhor que Zibran fosse morto; evitariam revoltas das
forças legalistas.
Vendo que todos concordavam tacitamente com ele, prosseguiu em sua alocução: –
Assim que tiver tomado o poder, irei à televisão e anunciarei o fato. Marcarei eleições
gerais para daqui a três meses.
– E quem há de governar? – inquiriu um dos presentes.
– Enquanto isto, o governo será comandado provisoriamente por mim e mais dois
generais.

Esta opção tem mais impacto emocional e mostra a disposição do grupo em praticar um
ato.

3a Opção – A mesma cena pode ser apresentada de outra forma. (Aliás, esta cena pode
ser apresentada de centenas de modos diferentes).

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O chefe expôs seu plano: tomaria o poder e destituiria o déspota de seu trono.
Detalhou os acordos que fizera com os generais e sabia que o povo ficaria feliz com a
derrubada de um governo tão tirânico. Terminou sua exposição dizendo que anunciaria
na televisão a deposição de Zibran e que eleições gerais estariam marcadas para dentro
de três meses.
Quando um dos seus amigos conspiradores lhe perguntou o que faria se Zibran
reagisse, sua resposta foi seca e contundente.
– Serei obrigado a matá-lo.

Cabe ao escritor escolher a forma que melhor lhe convier. Se for uma cena de
grande importância na história, a segunda forma – a de diálogos menores – é melhor,
pois permite descobrir a personalidade de cada personagem (Guimarães, Jorge, etc.).
Mas se for apenas uma cena sem maior importância no contexto geral da história, é
melhor ficar com a última cena: é mais rápida e termina dramaticamente.

5.4 – Diálogos que não funcionam e os que quebram as regras

Tudo que é dito que não funciona em termos de diálogos, pode funcionar
perfeitamente em certos casos. Caberá ao leitor a última palavra, mas como o autor não
tem acesso a ele e quando tem, tudo já está escrito, é preferível não inovar a não ser que
se tenha absoluta certeza do que está se fazendo.
O que apresentamos a seguir são exemplos do que se deve evitar. Saiba que pode
parecer exagero, mas já vi vários casos em manuscritos (livros não publicados) de
escritores neófitos (mesmo que talentosos) que incorreram nestes erros aparentemente
grosseiros. Portanto, se você também costuma cair nas esparrelas abaixo; cuidado. Saiba
que diálogos podem ser a melhor parte de seu livro, mas também pode acabar com ele.

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O sucesso de escrever

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5.4.1 – Diálogos telegráficos (excessivamente rápidos).

Muitas vezes, o escritor com o intuito de dar um ritmo acelerado à cena, usa de
excesso de diálogos telegráficos (também chamados de pingue-pongue) ou sem
descrições adequadas que transportem o leitor de um lado para o outro.

Vejamos um caso.

– Por que eu? – perguntou Jorge, dirigindo-se ao Manoel.


– É o destino.
– Como assim?
– O karma, meu amigo, é o karma.
– O que significa isto?
– É algo que você fez.
– O que será que eu fiz?
– Você é que sabe.
– Mas eu não sei.

Chega! Neste caso a velocidade não é importante, pois não estamos indo a canto
nenhum. Não há progressão na história: estamos girando em volta sem concluir nada.

Vejamos um outro caso de diálogo telegráfico.

– Levante os braços. Você está preso.


– Não atire. Eu me rendo.
– Entre no carro. Vou colocar as algemas.
– Sou inocente, mas irei sem resistir.

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– Cuidado com a cabeça ao entrar no carro.
– Tomarei cuidado.
– Pronto, agora que está sentado no carro, eu o conduzirei até a delegacia.
– Estou ansioso para chegar e falar com o delegado.
– Pronto, chegamos. Vamos descer do carro. Cuidado com a cabeça.
– O delegado está? Quero logo falar com ele.
– Sente-se aqui na sala dele. Ele virá em seguida. Ah! Lá vem ele.

O diálogo, além de ser pobre, é informativo. Está dizendo o tempo todo o que está
acontecendo. Para piorar o que já está ruim, não há descrição das locações (local onde a
ação se passa). O sujeito é preso e colocado no carro sem que haja uma descrição do
fato. Ele é levado até a delegacia sem também se mencionar o fato do carro se
locomover. Para finalizar, ele sai do carro, entra na delegacia e é levado até a sala do
delegado num átimo, sem que este fato seja mencionado. Este tipo de diálogo soa falso e
acelera demais o passo da narrativa. Nem sempre o que é rápido é bom. Um bom
diálogo é como fazer sexo; tem que ter ritmo, tensão e ser envolvente.

5.4.2 – Quebrando as regras do diálogo tradicional

O diálogo é basicamente um discurso direto, onde os personagens expressam seus


sentimentos e interagem uns com os outros. O discurso indireto é aquele em que o autor
relata o que o personagem disse, sem a necessidade de expressar por extenso o que foi
dito. O exemplo abaixo mescla, com maestria, os dois discursos, diretos e indiretos, e
alcança o efeito dramático que o autor se prepunha.

“Naquela noite Marie veio me ver e me perguntar se eu queria casar com ela. Eu
respondi que isso não faria nenhuma diferença para mim e nós poderíamos, se ela
assim o quisesse. Então ela quis saber se eu a amava. Eu respondi da mesma maneira

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que eu o havia feito anteriormente, que não representava nada para mim, mas que
provavelmente não a amava. – Por que então se casar comigo? – ela perguntou. Eu lhe
expliquei que isso realmente não importava, mas se ela quisesse, poderíamos nos casar.
Além do que, ela era a única a fazer perguntas e eu apenas respondia sim. Então ela
disse que casamento era uma coisa séria. Eu disse – Não. – Ela parou de falar por um
minuto e olhou para mim sem dizer nada. Então ela quis saber se eu aceitaria a mesma
proposta de casamento vindo de outra mulher com quem eu tivesse o mesmo
envolvimento. Eu respondi – Claro. – Então ela me disse que se questionava se ela
realmente me amava, mas não havia jeito de eu saber disto. Após outro momento de
silêncio, ela tartamudeou que eu era peculiar, e era por isso que, provavelmente, ela me
amava e que pela mesma razão, eu poderia vir a detestá-la um dia. Eu não disse nada
porque eu não tinha nada a acrescentar, então ela me pegou pelo braço e com um
sorriso afirmou que queria casar-se comigo.”

Este trecho (tradução livre da versão inglesa) de O Estranho do laureado escritor


francês Albert Camus é considerado como uma passagem clássica. Entretanto, não é o
tipo de diálogo tradicional. Camus quebrou as regras do diálogo e conseguiu um efeito
notável de nonchalance (indiferença). Mesmo sendo um diálogo tenso e oblíquo, não o
sugiro para o escritor novato. Espere ter mais experiência e desenvolva algo parecido.
Foi apresentado aqui apenas para que se tenha em mente que escrever tem suas regras,
mas que elas podem ser quebradas.

5.4.3 – Diálogos melodramáticos

É preciso evitar os diálogos melodramáticos. Quase sempre aparecem no texto, pois o


autor, com a tentativa de dramatizar uma cena, abusa do lugar comum e inunda o leitor
com diálogo de qualidade duvidosa. Veja o exemplo abaixo:

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– Como você pode me abandonar por outra mulher? E nossos filhos? O que será
deles?
– Sinto muito – respondeu Jorge, tomado por uma crise convulsiva de choro, – mas
a paixão por Denise foi mais forte. Não significa dizer que os abandonarei, mas não
posso mais viver sem ela.
– Oh! Jorge! – choramingou Maria. – Eu dediquei os melhores anos de minha vida a
você. Agora que estou velha e acabada, você me troca por uma menina que podia ser
sua filha.
– Não me atormente mais do que já estou – respondeu Jorge, debulhando-se em
lágrimas. – é a sua beleza e seu corpo que me fascinam. Não posso tirá-la de minha
mente. Nossas noites de amor são tão quentes que passo o resto do dia com uma febre
que não me abandona. Creio que vou enlouquecer.
– Pare, não me atormente mais.

Vamos parar também. O diálogo não retrata um drama, mas um dramalhão barato
que nada acrescenta ao leitor. Ou ele vai achar tudo ridículo ou enjoativo. De qualquer
modo, este tipo de melodrama não encontra eco na mente dos leitores – há exceções, é
claro!

Está certo, dirá você, mas como escrever uma cena em que o marido abandona a
esposa velha e gasta por alguém que poderia ser sua filha? Darei um exemplo.

Aproveitando o horário em que Maria não estava, Jorge entrou em casa e começou
a reunir suas roupas. Não levaria tudo; apenas o suficiente para passar alguns dias.
Depois, quando a tempestade amainasse, pediria para o amigo João vir buscar o resto:
faltava-lhe coragem para encarar uma esposa dedicada que o aturara por dezoito anos,

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mas agora que enlouquecera por Denise, uma ninfeta que bem poderia ser sua filha, não
havia mais volta.
No momento em que ia fechar a mala, escutou passos atrás de si. Com o coração aos
pulos, virou-se e deparou-se com Maria. Ela estava segurando sua cueca.
Provavelmente, pensou num átimo, ela caíra no chão quando ele estava arrumando a
mala. Ela levantou a cueca e perguntou: – Não vai levar também?
– Não. Está suja – respondeu com um sorriso amarelo.
– Não se esqueça de levar o Viagra; bem que vai precisar.
Pensou em lhe responder que, com Denise, ele nunca precisara daquele estimulante
sexual, mas achou melhor não discutir. Abriu a gaveta do criado mudo, pegou o vidro e
jogou-o na mala.
Ela olhou para a mala que ainda estava escancarada e com um olhar triste,
perguntou:
– E o resto? Quando vem buscar?
– Eu peço para o João pegar.
Sem perder mais tempo, ele fechou a mala e saiu arrastando-a. Não queria ficar
mais um segundo naquela casa; tinha medo que Maria se debulhasse em lágrimas.
Quando chegou na rua, sentiu um alívio quando o vento fresco de Agosto bafejou em
seu rosto: sentiu-se finalmente livre.
Maria o viu sair. Ficou em pé estática e depois notou que ainda estava segurando a
cueca entre dois dedos. Cheirou-a com certo nojo estampado no rosto e notou que
realmente estava suja. Entrou no banheiro, jogou a cueca na privada e deu a descarga.

Nesta cena, tudo fica implícito, sem melodramas. O que precisa ser dito foi dito. A
cena fecha com a mulher jogando a cueca do marido na privada como se estivesse se
desfazendo de algo que lhe fora sujo e doloroso. Tem impacto mais pelo que não foi
dito do que pelo que foi expresso.

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5.4.4 – Diálogos cospe-fogo

Os diálogos do tipo cospe-fogo são aqueles em que dois ou mais personagens


trocam palavras de forma excessivamente rápidas. Não significa dizer que está errado,
mas é cansativo e, na maioria das vezes, não há progressão na história.

Exemplo:

– Foi lá?
– Fui.
– E como foi?
– Chato.
– Como assim?
– Não aconteceu nada.
– Era para acontecer?
– Era.
– E por que não aconteceu?
– Sei lá.

Desta forma, enchemos dez linhas sem nada dizer. Já que é do tipo cospe-fogo,
pode-se usar o estilo de Albert Camus, mesclando o discurso direto e indireto. Ficaria
algo assim:

Ele me perguntou se eu tinha estado com Maria. Respondi que sim. Ele mordiscou
o lábio numa expressão nervosa e, com a voz trêmula, perguntou-me como as coisas se
passaram. – Chato – respondi. Ele explodiu de ansiedade e me questionou o que eu
queria dizer por aborrecido. Respondi-lhe que não acontecera nada. Quase beirando a

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indignação, perguntou-me: – Era para acontecer? – Estava tão desapontado com tudo
que lhe disse que sim; claro que algo tinha que ter acontecido. Aí ele perguntou por que
nada tinha acontecido e eu lhe respondi, sacudindo os ombros: – Sei lá.

5.4.5 – Diálogos esdrúxulos.

Apenas para terminar este importante ponto, lembramos que os diálogos devem
refletir as características dos personagens, mas – cuidado – não devem dificultar a
compreensão do leitor.
Por exemplo, para um personagem gago, seus diálogos não devem ser gagos.
– Ma.. ma.. mas vo... vo...você me a...a...ama?

Imaginem, então, um diálogo longo. Ficaria cansativo. No caso, o escritor pode


escrever a frase de modo normal (Mas você me ama?) e enfatizar que ele gaguejara.

O mesmo acontece com gírias.

– Ma meu irmão, vou ter que encarar um batente. Vou me arrancar senão chego
tarde no basquete.

Para quem não conhece a gíria deste grupo social, o diálogo é incompreensível. O
escritor pode ‘traduzir’ a gíria para o leitor, facilitando a compreensão. Por exemplo.

– Meu amigo, vou ter que trabalhar. Vou-me embora senão chego tarde ao trabalho
– disse Mário usando o linguajar peculiar dos morros do Rio de Janeiro.

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Desta forma, o leitor sabe que Mário se expressa na gíria própria de seu grupo
social.

É óbvio que uma frase ou outra não compromete o andamento da história. Estamos
apenas nos referindo a longos diálogos travados em gíria.

5.5 – Comentário final sobre diálogos.

Diálogos não são para serem colocados o tempo todo. Seria a vulgarização de um
instrumento dramático. Por outro lado, um trabalho apenas descritivo, narrativo, do
início até o fim pode perder em impacto emocional. Termina por virar um livro didático
e, por isso mesmo, aborrecido para quem espera um trabalho de ficção. Os diálogos são,
portanto, armas emocionais que o escritor usará para sacudir o leitor e mantê-lo
interessado na história.

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6 – Revisão

6.1 – Revisar é fundamental

Muito bem, você terminou seu livro. Não é bem o que você imaginou e você acha
que não está bom? Não se preocupe, agora chegou a hora de reescrevê-lo. Se você julga
que ele está bom, ótimo, mas mesmo assim, revise-o. Está na hora de melhorá-lo ainda
mais, reescrevendo algumas cenas ou frases.
Primeira coisa que você vai fazer é afastar-se do seu manuscrito por, pelo menos,
uma semana. Deixe-o descansar, assentar a poeira. Neste período, procure ler outro
livro, distrair a cabeça. Se puder, viaje!
Agora que ele ficou quieto por algum tempo, imprima-o. O ideal é imprimi-lo em
papel carta (216 X 280 mm), mas serve também A4 (210 x 297 mm). Dê margens de 2,5
cm em todos os lados. Para aqueles que estão preparando um manuscrito para ser
enviado aos Estados Unidos, saiba que os americanos não justificam a margem direita,
deixando-a sinuosa. Para o mercado brasileiro, justifique a margem direita, mas não
mande o computador hifenizar o documento ainda. Use espaço duplo, dê preferência ao
tipo de letra Times New Roman corpo 12 e numere as páginas. Imprima uma página
por folha, só frente. Melhor imprimi-lo em ordem decrescente: a última página impressa
será a primeira a sair e você não terá o trabalho de inverter as folhas.
Comece a ler como se fosse um leitor estranho à obra. Aliás, o ideal é que você se
imagine como sendo o mais feroz dos críticos literários que, por alguma razão
misteriosa, detesta tudo que você escreve. Se você conseguir entrar na pele dele e ler o
livro pelos olhos perscrutadores deste seu inimigo imaginário, você se tornará o mais
temível dos críticos e conseguirá enxergar o que antes sequer imaginou.

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Tenha uma caneta vermelha à mão. Leia cena por cena. Vá anotando na margem as
mudanças que você deseja, assim como as correções ortográficas e gramaticais.
O que é você deve procurar prioritariamente?

1) A abertura de cada cena ressoa? Não? Então anote para que seja rescrita.
2) A cena faz a história progredir? A cena é importante para a compreensão da história?
Se não for, elimine-a. O leitor irá lhe agradecer.
3) O final da cena deixou o leitor com vontade de ler mais? Será que você não revelou
demais? Não seja estraga-prazeres: não revele a trama antes da hora. Você deixou seu
leitor interessado?
4) Procure observar se você está contando ou mostrando a história. Nos lugares onde
você sente que está contando, marque para reescrever mais tarde. Se quiser, para não
perder tempo, circule em vermelho e escreva SNT ou MNC (Show Not Tell – Mostre Não
Conte). Assim você não perde tempo. Não queira reescrever na hora e voltar ao
computador. Refreie seu desejo de perfeição e continue lendo. Não se desespere se tiver
que reescrever quase tudo. Você não está tirando o pai da forca e nem o mundo está
aguardando ansiosamente pela sua obra-prima. Ela o será se você realmente aperfeiçoa-
la.
5) Faça uma lipoaspiração no seu texto (Vide Lipoaspiração a seguir).
6) Os diálogos são oblíquos? Primeiro verifique se o diálogo é necessário. Nada de ‘bom
dia’ e ‘como vai’. Isto é perda de tempo. Entre logo no assunto. Seja objetivo: leve o seu
leitor diretamente para a ação. Não encha lingüiça, como se diz na gíria. Se o diálogo
não leva à tensão, provavelmente pode ser substituído ou eliminado. Os marcadores
estão adequados? É possível reconhecer quem fala ou o leitor irá se perder sem saber
quem está falando? Faça seus personagens também se mexerem. Um diálogo não
precisa ter duas pessoas estáticas. Elas bebem, elas olham para o teto, elas se levantam,
elas esmurram mesas, elas torcem as mãos nervosamente, elas ficam irrequietas na

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O sucesso de escrever

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cadeira, elas fazem centenas de coisas que mostram o seu estado anímico (tensão,
felicidade, nervosismo, etc.).
7) Seus personagens são fortes? São intrigantes? Cuidado para não torná-los
excessivamente comuns, ou caricaturas grotescas (a não ser que seja absolutamente
necessário – neste caso procure justificar – suspendendo a descrença) ou fisicamente
incapazes de atos que você descreveu (como é que Jorge com oitenta e dois anos pulou
uma cerca de oito metros e correu um quilômetro em dois segundos?) Tudo é válido em
literatura, mas neste caso, é preciso suspender a descrença do leitor. Por exemplo, Jorge
é um velho com poderes especiais devido a algo fantástico que lhe aconteceu.
8) A cena se arrasta em algum lugar? Será possível acelerar e torná-la mais dinâmica?
Ou será que é o contrário? A cena está rápida demais e ninguém vai entender como um
personagem conseguiu fazer tanta coisa em tão pouco tempo. Seja crítico e reveja a
velocidade da cena. Anote na margem para reescrever.
9) A trama predomina? Ou é o personagem que predomina? Os eventos devem girar
em torno do personagem e não o contrário. A trama é tensa? Cuidado para não deixar
pontas soltas. Todos os personagens (pelo menos os mais importantes) introduzidos na
história devem chegar ao final com as suas respectivas situações resolvidas.
10) As cenas estão interligadas? A história progride? Mesmo que você termine a cena
com o personagem X e comece a próxima cena com o personagem Z, as duas cenas
devem estar conectadas, mesmo que isto só aconteça mais adiante.

Agora que você reviu sua história, não reescreva ainda. Deixe-a dormir por alguns
dias. Vá viajar, distrair-se com outras coisas.
Antes de começar a reescrever, sua mente andou trabalhando este tempo todo.
Queira ou não, acredite ou não, o lado direito de seu cérebro (se você for destro – o
contrário se você for canhoto) andou visualizando várias coisas novas. É hora de deixar

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este lado do cérebro falar. Releia novamente, só que desta vez você irá usar uma técnica
nova.

Comece pelo ÚLTIMO CAPÍTULO, releia e reveja seus comentários a respeito da


história. Por quê? É muito normal que na primeira passada você tenha dedicado mais
atenção aos primeiros capítulos e, ansioso – assim como todo mundo é –, você acelerou
a revisão dos últimos capítulos para chegar logo ao final. Agora você vai fazer o
contrário. A maior demão que você vai dar é de trás para frente. Coisa de louco, não é?
Confie em mim! Vai dar certo. Você dedicará maior atenção aos últimos capítulos e
menos aos primeiros que você já trabalhou bem na primeira demão.
Refaça tudo de novo: siga os dez passos novamente.
Terminou? Ótimo! Descanse mais alguns dias.
Comece a reescrever. Quem disse que ia ser fácil?

Passaram-se alguns dias (ou meses) e você já conseguiu reescrever tudo que
desejava. Cortou, aumentou, mudou a cor dos cabelos de Fulano e colocou alguns
excelentes defeitos em Sicrano. É a hora da verdade. Refaça tudo que eu lhe disse.
Reimprima várias cópias (não seja econômico e gaste papel e tinteiro – anda caro, não
é?) e procure um leitor externo. Não pode ser pai, mãe, familiar, amigo do peito. Essas
pessoas estão por demais emocionalmente envolvidas com você para aquilatar
corretamente seu trabalho. Procure um leitor – não é fácil – que esteja em seu público-
alvo. Se tiver que pagar, pague. Uma crítica sincera vale cada centavo pago. Se
conseguir dois ou três, ótimo. Quanto mais, melhor. O ideal é que você desenvolva um
pequeno questionário e que eles o preencham. Isto orientará melhor tanto o leitor como
ao escritor.

Agora você recebeu as críticas de seus leitores. Critique as críticas. Nem tudo que
eles dizem deve ser levado em conta. Não se esqueça de que no Brasil não há leitores

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O sucesso de escrever

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profissionais, nem Book Doctors como existem nos Estados Unidos. Mas também não
jogue fora o que eles disseram, pois, em última instância, eles representam a opinião de
seu futuro leitor.
Veja o que pode ser revisto. Veja se as idéias dos leitores-teste serviram para
alguma coisa. De vez em quando eles dão excepcionais sugestões. No entanto, o que
vale é a visão geral da história. Emocionou? Teve cenas em que eles choraram – ótimo,
você tem talento. Eles riram também – maravilha, você é demais – é mais difícil fazer rir
do que chorar.
Os elogios foram fartos? Desconfie. As criticas foram mordazes? Desconfie. O que
vale mesmo é a sua opinião, mas se as críticas não foram boas – comece tudo de novo,
reescreva.

6.2 – Lipoaspiração

Este termo é usado em medicina e é uma técnica cirúrgica utilizada para extrair o
excesso de gordura de certas partes do corpo, tais como barriga, braços, etc. Se esta
técnica for bem utilizada, proporciona rapidamente uma perda de gordura localizada
que enfeia o corpo. Todavia, infelizmente, tem havido alguns casos de óbito.
Em literatura, usamos este termo técnico emprestado da Medicina para a operação
que fazemos durante as revisões. Ela é feita para extrair a ‘gordura’ do texto,
apresentando um manuscrito mais enxuto e fácil de ser lido.
Se você tiver o Flabeditor do Sol Stein, este trabalho irá facilitar-lhe a vida. Por quê?
Pela razão que este software lhe permite retirar a ‘gordura’ do seu texto e, num simples
toque, voltar ao texto original para que você julgue qual ficou melhor, ou se é preciso
ainda reescreve-lo. Mas se não tiver, não tem importância, basta você comparar os dois
textos.
Quais são as gorduras que normalmente acontecem?

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a) As repetições enfáticas. O escritor, empolgado por sua obra e com a intenção de


marcar um determinado ponto de vista, repete-se, seja de forma imediata, seja no
decorrer do livro. Veja o exemplo abaixo:

Um dia frio como aquele era simplesmente intolerável. O frio era tão intenso que nem
os pássaros voavam e os animais selvagens procuravam abrigo. Um clima tão frio assim
era capaz de matar em segundos e Jorge procurara abrigo da nevasca numa gruta. No
entanto, o frio o perseguira e mesmo protegido da neve que caia incessantemente, ele
estava enregelado. Num dia como aquele em que o frio era cortante, teria sido
preferível ficar em casa, mas ele tinha uma missão a cumprir.

Usamos 76 palavras para dizer que estava frio. Ora, com um pouco de trabalho
podemos reduzir isto enormemente, tornando a leitura mais rápida e amena. De todas
as sentenças acima, poderíamos ficar apenas com:

Um clima tão frio assim era capaz de matar em segundos e Jorge procurara abrigo da
nevasca numa gruta. Num dia como aquele teria sido preferível ficar em casa, mas ele
tinha uma missão a cumprir.

Reduzimos para 36 palavras. As 40 palavras que economizamos tornaram nosso texto


mais leve e gostoso de ler.

b) Como já mencionamos, podemos cortar o uso de adjetivos e advérbios. Veja o


exemplo abaixo.

Um homem gordo, baixo, careca e com uma pança proeminente como Alberto chamava
a atenção de todos assim que chegava. Quando jogava seu corpo de um lado para o

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outro, dava a impressão de que iria tombar como uma estátua de Sadam Hussein de seu
pedestal. Mas, quando os tiros começaram a espocar, ele demonstrou que era ágil, veloz
e lesto. Correu com grande velocidade e, como se fosse um goleiro atrás de uma bola
chutada no ângulo, voou atrás da imensa e carregada carreta que estacionara há pouco.

As palavras sublinhadas podem ser revistas. Ao invés de gordo, baixo e careca,


criem uma ação onde o personagem é visto pelos olhos de outro personagem da
história. Usem um símile para descrever a ação do personagem Alberto. Ágil, veloz e
lesto significam praticamente a mesma coisa. Neste caso, podemos usar um símile. Por
exemplo, ao invés de dizer: ‘Mas, quando os tiros começaram a espocar, ele demonstrou
que era ágil, veloz e lesto’, podemos escrever: ‘Mas, quando os tiros começaram a
espocar, ele demonstrou ser uma gazela.’
Correu com grande velocidade pode ser substituído por ‘disparou’.
Dizer que uma carreta era imensa é redundante. Toda carreta é grande por
natureza. Dizer que estava carregada é desnecessário. Faça uma lipoaspiração; seu texto
ficará mais elegante.
Macete: Durante a revisão você pode ir cortando essas coisas. Se você estiver
usando o MS-Word, você pode dar um comando de Localizar (CTRL+L) e escrever um
a um todos os advérbios e adjetivos que você conhece e, um a um, julgar a necessidade
de usá-los. Num texto de 100.000 palavras, eu cheguei a cortar 2.200 palavras só em
adjetivos e advérbios. Incrível, não é?

c) A repetição de uma mensagem. Isto é particularmente verdadeiro quando o autor


está escrevendo não-ficção. No afã de ‘vender’ o seu ponto-de-vista, ele se repete no
decorrer do texto. Neste caso, saiba que é importante fixar bem sua mensagem, mas não
através da repetição sistemática do cerne de sua tese. Procure fixar a idéia através de
técnicas de ficção (Mostrar não dizer, personagens, fatos bem narrados, etc.). Se for

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imperativo, deixe para o final do livro quando você pode e até deve repetir,
sumarizando tudo que você escreveu no seu trabalho.

ATENÇÃO: Lembra-se do aviso sobre mortes na lipoaspiração? O mesmo vale para


o seu manuscrito. Corte a gordura, mas não corte os músculos e os ossos, pois assim
você pode matar seu trabalho. Veja cada cena para ver se é preciso cortá-la (ela é de fato
importante para o entendimento da história ou é perfumaria?). Veja se você não está
‘dizendo’ demais. Não se esqueça de que mostrar é muito mais extenso do que apenas
dizer, portanto mostrar aumentará o número de páginas de seu livro, levando-o à
necessidade de lipoaspirar as gorduras excessivas de outras cenas.
Na dúvida entre lipoaspirar ou não uma cena inteira, lipoaspire. A simples dúvida
já mostra que a cena não é tão importante assim. Se fosse, você sequer cogitaria em
retirá-la. Mas guarde tudo que você lipoaspirou num arquivo a parte; você pode vir a
precisar amanhã para um novo trabalho. Nada é perdido, tudo é reciclável.

Agora, passaram-se meses de escritas, rescritas e novas rescritas e você não agüenta
mais. Finalmente, você está satisfeito com seu trabalho. A sua história está pronta para
ser publicada, mas saiba que agora chegou a parte mais dura do seu trabalho: conseguir
um editor.

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7 – Escrevendo para cinema, televisão,


teatro e outras mídias.

7.1 - Cinema

Escrever para cinema segue as mesmas regras de escrever para um romance. Temos
também a história dividida em três atos ou partes: Apresentação (Set Up), Confrontação
(Confrontation) e Resolução (Resolution). O Segundo Ato – Confrontação – é dividido em
duas partes, sendo que no meio de cada uma das partes temos um Embaraço (Pinch) e
uma transição entre as duas partes chamada de Ponto Médio (Mid Point). Naturalmente
o cinema é uma arte muito mais visual do que um romance e, portanto, cenas de
profunda introspecção de algum personagem devem ser revistas e apresentadas de
modo visual. Tal técnica inviabiliza, muitas vezes, algumas cenas, mesmo que se possa
traduzir em ação todas as emoções de um ser humano. Por outro lado, a técnica
cinematográfica exige uma apresentação muito mais sucinta do que um romance, o que,
de certa forma, facilita a escrita.
Vamos exemplificar:
Estavam todos reunidos debaixo do grande pé de jacarandá. Com seu enorme
chapéu de couro, Mateus havia se colocado numa posição proeminente e mascava
lentamente seu fumo de rolo. Vez por outra, soltava, no chão, uma cusparada que
enchia o ar de um cheiro acre de fumo e saliva. Os demais homens estavam sentados de
cócoras, escutando a longa dissertação de Mateus que gostava de se estender sobre os
mais comezinhos problemas com um ar intelectual de sábio.

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O governo havia decidido construir uma ferrovia que passaria por suas terras. Um
homem da ferrovia havia visitado os fazendeiros e prometera comprar suas terras por
um preço que todos acharam ridiculamente baixo. Tinham poucos dias para decidir
sobre o assunto antes que o governo tomasse a decisão de encampar suas terras. Aí sim,
elas não valeriam mesmo mais nada.
Um dos presentes, Jorge Almeida, um homem que todos sabiam ter uma paciência
inversamente proporcional ao seu enorme tamanho, brincava com as duas pedrinhas
enquanto aguardava o desfecho da alocução. Pela sua expressão de enfado, era óbvio
que achava toda aquela discussão desnecessária. Após controlar-se por alguns minutos
que lhe pareceram intermináveis, jogou as pedras no chão com visível raiva e
perguntou para onde tudo aquilo os levaria.
– À luta armada – respondeu Mateus com um ar dramático.

Esta cena teria que ser revista completamente para o cinema, mas, como poderão
observar, tornar-se-á muito mais simples de escrever.

(Atenção: ao escrever para cinema, use sempre o tipo de letra COURIER corpo 12.
Utilizando qualquer outro tipo de letra o cineasta saberá que está tratando de alguém
que não é profissional e nós não queremos isso, queremos?)

EXT. DEBAIXO DE UM JACARANDÁ - DIA


MATEUS, MARCELO, JORGE ALMEIDA e mais oito homens estão
reunidos.
MATEUS
Como todos sabem o governo resolveu que
teremos de sair de nossas terras para a
construção de uma ferrovia. Querem nos
pagar uma verdadeira miséria.
JORGE ALMEIDA

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E por que eles não constroem a ferrovia


um pouco mais abaixo?
MATEUS
Pelo que o engenheiro do governo me
explicou, qualquer desvio representaria
perda de tempo e de dinheiro.
MARCELO
E por causa disto, nós temos que perder
tudo aquilo por que trabalhamos tão
duramente?
MATEUS
Só vejo outro jeito.
JORGE ALMEIDA
Outro jeito de quê, Mateus? De que
forma poderemos resistir ao governo?
MATEUS
(jogando as pedras com que brincava no chão)
Pela luta armada.

Como puderam notar a cena não é descrita com detalhes, apenas é mencionado o
personagem em CAIXA ALTA, havendo muito mais diálogos. Não se esqueça das
regras dos diálogos – elas valem também para o cinema e outros meios visuais. Nada de
diálogos chamados realistas, com ‘bom dia’, ‘como vai’, etc. Quanto mais oblíquo for o
diálogo mais impactante será.
Não podemos deixar de lembrar que cinema e outros meios visuais trabalham em
cima de tempo. Um filme dura de 90 a 120 minutos. Há superproduções que chegam a
180 minutos, mas são raras e obviamente extremamente caras. Para calcular o tempo,
saiba que quase sempre uma página irá se transformar num minuto. Portanto, se você
escreveu 120 páginas, você acaba de planejar um filme de 120 minutos. Pode ser que

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uma determinada página dê mais do que um minuto, especialmente se você descreveu
uma cena de batalha, uma perseguição ou algo muito cheio de ação, mas, no final,
somando-as com as páginas lentas de diálogo, tudo se resumirá em uma página
equivalente a um minuto de filme.

Daremos a seguir uma relação de coisas a FAZER e de coisas a NÃO FAZER.

A FAZER:

1) Consiga um bom editor de texto especial para Screenwriting. Sugerimos FINAL


DRAFT 6.0, SCREENMASTER 2000, etc. Sem isso, sua apresentação será um desastre ou
então você terá uma trabalheira infernal para centralizar os textos, colocar certa
passagem em caixa alta e outras em alta e baixa.
2) Toda cena começa com SCENE HEADING, ou seja, o CABEÇALHO DA CENA. É
simples. Basta escrever se a cena é externa (EXT.) ou interna (INT.) ou se começa num
lugar e, sem cortes, termina em outro: EXT/INT. Além disto, especifique a locação, ou
seja, o lugar onde a cena acontece – ESCRITÓRIO DE JORGE – e, finalmente,
especifique a hora do dia em que a cena acontece, ou seja, DIA, NOITE (é óbvio que é só
uma dessas opções). TUDO EM CAIXA ALTA (MAIÚSCULA).
3) A próxima coisa a definir é a AÇÃO. Escreva tudo na terceira pessoa do singular e no
PRESENTE do INDICATIVO. A AÇÃO deve ser descrita de forma extremamente
sucinta. Veja como é descrita uma cena em STARWARS – EPISODE 1:

NUTE GUNRAY and DAULTRAY DOFINE stand, stunned, before TC-14


(NUTE GUNRAY e DAULTRAY DOFINE estão de pé, atoleimados, na frente de TC-
14).

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O sucesso de escrever

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4) Quando tivermos diálogo, escrevemos centralizado o nome do PERSONAGEM, que


sempre deverá ser escrita em CAIXA ALTA.
5) Podemos ter logo a seguir, entre PARÊNTESES, uma breve descrição de como o
personagem irá falar ou reagir. Esses PARENTHICAL, como se denominam em inglês,
só deve ser utilizado em último caso. Diálogos normais devem ser interpretados pelo
Diretor do Filme e os atores. O escritor só deve interferir se for algo importante ou que
possa deixar margem à dúvida.
6) Abaixo do PERSONAGEM e dos PARÊNTESES, no caso de haver, entrará o
DIÁLOGO. Tudo deverá ser em caixa baixa, exceção da primeira letra do início de cada
frase e da primeira letra dos nomes próprios (regra universal).
7) TRANSIÇÕES (TRANSITIONS) só devem ser mencionadas se houver uma cena
interrompida por outra. Neste caso, saímos de uma cena inacabada para adentrar em
outra. Não se esqueça de voltar e terminar a cena anterior – senão ficarão pontas soltas e
situações não resolvidas.
8) Escreva sempre em fonte COURIER tamanho 12. Não justifique a margem direita,
deixa-a solta.

NÂO FAZER:

1) Não descreva cenários. Se for absolutamente necessário, mencione na NOTAS DO


ROTEIRO (SCRIPNOTES), que normalmente é um adendo. Os cenários serão
elaborados pelo Diretor de Arte.
2) Não descreva Personagens e muito menos dê indicações de elenco (Casting). Por mais
que você queira que Sean Connery faça o papel principal, restrinja sua vontade. Isto é
assunto da Produção. Se for absolutamente necessário descrever Personagens devido a
certas características físicas marcantes, faça-o em SCRIPTNOTES.

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3) Não descreva posições de Câmera. Os diretores detestam isto. Este é o trabalho deles
com o diretor de Fotografia.
4) Não descreva sons nem músicas. Só deve ser descrito som na AÇÃO, se isto implicar
numa reação do PERSONAGEM. Por exemplo.

JORGE escuta um baque surdo e o cantar de pneus de um carro e se


assusta. Olha pela janela e vê o corpo caído de uma mulher.

5) Não numere as cenas. Quem fará isto e organizará as cenas a serem filmadas será o
pessoal da produção. Não há necessidade do escritor planejar nada, a não ser que ele
faça parte da Produção ou ele seja o próprio Diretor do filme. Neste caso, o fará numa
outra cópia do roteiro, chamado de Roteiro de Produção (Production Script) e não no
original.

7.11 - Comentários gerais sobre escrever para cinema.

No Brasil, escrever para cinema é muito difícil, pois a indústria brasileira ainda é
muito incipiente. Mesmo nos Estados Unidos é muito complicado. Além de tudo, nos
Estados Unidos, você irá precisar de um bom agente literário especializado em Cinema
para conseguir vender um roteiro.
Para entender o mercado americano, é preciso salientar que eles fazem de 80 a 90
filmes por ano. (O país que mais produz filmes é a Índia – quase 800 por ano). Isto
significa dizer que só se aproveita um em cada vinte mil roteiros escritos por ano nos
Estados Unidos (uma loucura, não é?). Cerca de dez por cento dos scripts são
adaptações de livros e vinte por cento – este número tem crescido – são scripts escritos
pelos próprios diretores e/ou produtores. Isto limita terrivelmente o escritor.
Para que serve, então, escrever um roteiro original ou adaptá-lo de um livro?
Prazer, puro prazer de imaginar sua história na tela grande. Há, todavia, um outro

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aspecto. Ao passar seu livro para um roteiro ou vice-versa, você poderá notar que certos
diálogos não funcionam na tela grande ou mesmo na telinha de televisão. Com esta
ferramenta, você poderá rever diálogos. Há cenas também que são muito paradas. Num
roteiro, você as percebe de imediato enquanto que num livro isto é mais difícil. Como a
AÇÃO, num roteiro, é extremamente sucinta, é possível verificar que a cena precisa ser
mais trabalhada. Quem sabe se você não escreveu no LIVRO algo que lhe agrada, mas
que é extremamente maçante. Ao passar o livro para um roteiro, você descobre a falha e
isto é meio caminho andado para consertá-la.
O escritor mais tradicional dirá que isso que mencionei acima é um absurdo. São
dois meios de comunicação diferentes, dirá visivelmente indignado. Um livro tem que
ser mais amplo, mais profundo do que um filme que normalmente é uma diversão
superficial. Concordo! Um livro sempre terá muitas cenas que jamais funcionarão num
filme. Contudo, o que propus acima – cotejar seu roteiro com seu romance – é apenas
uma ferramenta para ver onde certas cenas não funcionam.

7.2 - Televisão

Antes de você começar a sonhar com televisão, saiba que é um mercado ainda mais
restrito do que o cinema. Poucos canais produzem novelas, mini-séries e histórias
específicas para uma única apresentação. O mercado americano ainda é mais rico e
diversificado, pois além das Soap Operas (novelas), também produzem um grande
número de seriados do tipo Friends, Seinfeld, McGyver, Third Rock from the Sun, E.R., etc.
Isto abre um campo maior para escritores, especialmente porque é possível a
contratação de um escritor apenas para um capítulo (não em novela) de uma sitcom
(situation comedy) ou de um episódio de aventura (McGyver e Jornada nas Estrelas).
Não podemos deixar de mencionar, entretanto, que há um mercado crescente –
ainda incipiente – para documentários. O documentário segue basicamente a mesma

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estrutura de um sitcom ou uma série de televisão, ou seja: uma cena de abertura de 3
minutos que inclui um teaser, ou seja, os highlights (pontos altos) que serão apresentado
no programa, e quatro segmentos de 12 minutos. No fundo, todos devem seguir a
mesma estrutura. A primeira parte é a Apresentação, terminando com um ‘gancho’. A
Segunda parte com a Confrontação 1, terminando com um Ponto de Virada que, num
documentário, é algo que deixa o espectador intrigado. A Confrontação 2 segue a
mesma estrutura e, finalmente, a Resolução, com o término do programa. É de se prever
que tanto um (série de televisão) como o outro (documentário) devem terminar com
uma mensagem moral, um apelo à resolução do problema focado ou a revelação de um
segredo (quando se tratar de documentários históricos).
Já a Novela (soap opera) é um assunto muito mais complexo. Todos já tiveram
oportunidade de seguir uma novela de sucesso e observaram os seguintes detalhes:

1) A Novela é dividida em capítulos. Normalmente vai de 90 a 150 capítulos. É feita


para durar entre 4 e 5 meses.
2) Cada capítulo é dividido em abertura de 3 minutos e 4 partes de 12 minutos cada.
3) É constituída de uma trama principal com, pelo menos, 3 a 5 tramas secundárias. As
tramas secundárias têm relação com a trama principal; não são histórias soltas que nada
tem a ver com a história principal.
3) Cada uma das tramas tem vários pontos de virada, vários Pinch (Embargos) – pontos
de intensidade dramática e cada capítulo termina com um ‘gancho’, que deixa o
espectador com vontade de assistir ao próximo capítulo.
4) As novelas acompanham sistematicamente a reação do público e podem ser reescritas
de acordo com o andamento da aceitação do público. A novela Redenção foi tão bem
aceita pelo público de então que ficou sete meses no ar. Outras que não fizeram sucesso
foram retiradas rapidamente e substituídas por outra novela. O acompanhamento do
público é fundamental, já que a novela é produto que vive de audiência. Se estiver
obtendo sucesso, a Televisão poderá cobrar mais caro pelo segundo de anúncio durante

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O sucesso de escrever

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a audiência. Caso a audiência caia, os anunciantes poderão retirar seu apoio e o produto
irá fracassar. Tal produto, portanto, poderá sofrer grandes mudanças no decurso da
apresentação. Tramas secundárias podem ser priorizadas, enquanto que personagens
que não agradaram podem ‘viajar’ ou até mesmo ‘morrer’.
5) A Novela tem um autor principal, mas, na realidade, é escrita por vários autores da
casa, como são chamados. Trata-se, portanto, de uma obra coletiva (ou quase). Isto
exigirá, por parte do autor, muito desprendimento, pois terá que ‘aturar’ várias pessoas
mexendo em seu ‘filho’.
6) O final da novela é resolvido através de um conjunto de fatores: autor, diretor, atores
importantes e, especialmente, a reação popular. Ela pode ser adiada ou acelerada de
acordo com a receptividade popular. Se não houve identificação do público com os
personagens e a história, é melhor realmente encerrar a novela, mesmo que
abruptamente, para evitar a debandada da audiência para o concorrente.

Trabalhar numa grande rede, entretanto, é privilégio de poucos. Conheço autores


que não agüentaram a pressão e desistiram. Num ambiente onde se fundem várias
personalidades fortes para estruturarem uma história é inevitável que surjam conflitos,
exigindo um espírito de trabalho em equipe muito apurado. Os individualistas não
encontram espaço num ambiente com esse e a adaptação nem sempre é possível. Mas é,
sem dúvida, uma experiência memorável para quem conseguir mesclar-se no ambiente
da televisão.

7.3 Teatro

De todos os meios de comunicação, o teatro é o que oferece o melhor termômetro


em relação à aceitação do público. Pelo fato de se ter uma audiência presente, é possível
sentir-se de chofre o que está funcionando e o que não está. Por outro lado, o teatro

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exige muito menos ação física do que o cinema, mas muito mais ação emocional através
do diálogo e das situações criadas. Como não se pode ficar trocando o cenário a toda
hora, é necessário trabalhar com um cenário (no máximo 3 – um para cada ato) e isto
exige um diálogo muito mais atraente. Num filme de ação, os diálogos são levados a
um mínimo, mas no teatro, eles são a própria alma do espetáculo.
Quem estuda teatro, acaba adquirindo uma experiência em diálogos extremamente
rica. Por outro lado, a criação de situações equívocas, que levam ao riso ou à tristeza,
são fundamentais nesta milenar arte. É neste ponto que o método do Actor’s Studio de
Nova Iorque, já mencionado anteriormente, é de suma importância para se criar o
conflito, seja ele cômico ou dramático. Se cada personagem tem um roteiro diferente em
sua mente, as situações terão que ser equívocas e, portanto, hilariantes ou até mesmo
trágicas.
Sugerimos a leitura de peças clássicas, sejam recentes sejam antigas, para que o
escritor de peças teatrais se acostume com o ritmo e andamento, que diferem muito dos
das demais artes.
Não se esqueça, entretanto, que uma peça teatral precisa ser encenada. Desta forma,
não escreva a peça inteira antes de ter um produtor disposto a bancar o custo de
produção. Escreva apenas um argumento (uma sinopse mais detalhada), que pode
variar de 12 a 20 páginas. O produtor, provavelmente, terá suas próprias idéias, as quais
o escritor terá que incorporar, caso deseje trabalhar em conjunto com o produtor e os
atores. Um ator experiente sabe de antemão o que funciona e o que não funciona. Um
escritor novato terá muito que lucrar se escutar o que o produtor, o diretor e os atores
terão a sugerir.
Um ator experiente é importante quando se tratar de diálogos. Como são eles que
irão interpretar o que o escritor escreveu, ele poderá sugerir mudanças importantes.
Muitas vezes, um diálogo parece funcionar no papel, mas quando é falado, torna-se um
desastre. É neste ponto que o ator torna-se valioso em suas críticas e sugestões.

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Um autor menos experiente perguntará, indignado: então, diretores, produtores e


atores, especialmente as estrelas, irão desvirtuar sua peça? De fato, mas se o Argumento
for bem escrito e for claro, a maioria dos acima citados só trarão contribuições válidas. E
não se esqueça: o importante é que você terá uma peça de teatro encenada, o que, por si
só, já é uma grande vitória.

7.4 – Outras mídias

Com a ampliação do mercado de diversão, o escritor poderá encontrar várias outras


formas de aproveitar sua veia literária. Algumas são instigantes e exigem uma
criatividade muito grande.
As mídias alternativas são:

1) Histórias em quadrinhos (Comic Books, também chamados de Graphic Novels):


Normalmente este tipo de veículo se destina ao público infantil e infanto-juvenil, porém
há histórias em quadrinhos também voltadas para o público adulto. Muitos envolvem
personagens altamente sensuais e histórias picantes (não pornográficas, que é outro
segmento de mercado). Isto exige um bom desenhista e um trabalho em conjunto com
um escritor.
2) Desenhos animados: O mesmo que as histórias em quadrinhos, só que mais
dinâmico. Hoje com as técnicas de computação gráfica é possível fazerem-se filmes de
longa metragem de tamanho realismo que dispensam atores de carne e osso (vide Final
Fantasy).
3) Videogames: Mesmo que não haja diálogos, é preciso que haja uma história. O
escritor poderá fazer a concepção do jogo – salvar a princesa, conseguir um anel
mágico, etc.

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4) Filmes publicitários: É uma arte difícil, pois é preciso ‘vender’ uma idéia, um
conceito ou uma mensagem em apenas 30 segundos. Exige-se uma grande dose de
criatividade. Normalmente, o escritor de tais mídias trabalha em agências de
publicidade e desenvolve sua atividade junto com um grupo de pessoas da produção
para atender à demanda de um cliente.
5) Filmes de Documentário (já citados): Envolvem técnicas de Não-Ficção e Ficção. Veja
o capítulo de Não-Ficção.
6) Jornais e revistas. Devido às peculiaridades próprias de cada veículo, sugerimos que
tal assunto seja abordado por um profissional do ramo. Alertamos, entretanto, que os
melhores jornais, atualmente, usam das técnicas de ficção para narrar suas notícias. Isto
traz à vida um personagem distante. O que importa que um José qualquer tenha sido
morto por uma bala perdida? Ele se torna um dado estatístico – lamentavelmente –
devido à banalidade do fato. No entanto, torna-se um caso diferente, se abordarmos a
história de José, que, naquele dia, saiu de casa para comprar uma bicicleta para seu filho
que estava completando sete anos. Ele economizou durante anos e deixou de tomar a
cervejinha que ele tanto prezava só para satisfazer o seu filho, que nem mais dormia à
espera do presente, e que indo para a loja, viu-se no meio de um fogo cruzado. Atingido
no peito, ainda teve força para se arrastar até a porta da loja e entregar o dinheiro ao
vendedor para que seu filho não ficasse sem a sua bicicleta. Veja que agora José não é
mais estatística: ele é pessoa de carne e osso, que ama seu filho. A notícia terá muito
mais impacto e emocionará o leitor. Ele lembrará de tal fato para sempre.
7) Outras mídias. A cada dia nascem novas formas de comunicação. A Internet é uma
delas. O escritor deverá preparar-se para cada uma delas. A Internet, por exemplo, é
uma mídia rápida. Exige mensagens concisas e objetivas. Nada de longos textos, pois o
internauta é, antes de tudo, um apressado. Use a idéia de Teasers, ou seja, de textos
curtos que atraem a atenção do internauta e de páginas subseqüentes onde ele possa
descarregar (download) textos mais detalhados da mensagem. Assim, ele poderá ‘baixar’
o texto e ler posteriormente.

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O sucesso de escrever

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Para o escritor de talento (99% transpiração e 1% inspiração), existe um mercado


amplo e novo a ser conquistado. Dependerá de sua vontade e de um pouco de sorte
para alcançar o sucesso.

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8 – Não-Ficção

8.1 – Técnicas de ficção aplicada à não-ficção

É preciso esclarecer que um livro de não-ficção não é um livro didático, voltado


para alunos de um curso específico. Trata-se de um livro escrito por alguém que
domina uma determinada técnica ou conhecimento. É, portanto, um livro voltado para
o grande público e não como um livro didático que está voltado para um público
específico.
Como se trata de um livro voltado para um público mais abrangente, o escritor tem
como objetivo informar, mas também, muitas vezes, convencer o leitor de um ponto de
vista específico. Tanto informar como convencer é apreendido de forma indelével
quando o leitor se emociona. A emoção consolida a informação.
Os livros de não-ficção são divididos em dois tipos: prático e literário. A não-ficção
prática é aquela cujo objetivo é informar sobre um certo assunto eminentemente prático.
São livros de auto-ajuda e de técnicas que podem ser aplicadas no dia-a-dia, tais como
jardinagem, cozinha, etc. Já as não-ficções literárias têm como objetivo abordar certos
fatos de modo mais profundo, analisando, conjeturando e expondo aspectos novos de
temas de interesse específico ou geral.
A diferença básica entre os dois tipos de não-ficção é de estilo. Enquanto a não-
ficção prática deve ser escrita de forma simples e objetiva; a literária pode ser redigida
num linguajar um pouco mais rebuscado, procurando convencer o leitor de seu ponto
de vista. Tanto um tipo como o outro, podem apropriar-se de algumas técnicas de ficção
para enriquecer sua apresentação.
O escritor pode, por exemplo, iniciar um ponto com um exemplo, apresentando-o
com aspectos de técnica de ficção (o fato – ou seja, a história a ser relatada pode e deve

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O sucesso de escrever

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ser verdadeira, mas apresentada através de técnicas de ficção). Quais são estas técnicas?
Mostrar e não dizer, caracterização dos personagens, diálogos oblíquos e uma cena bem
escrita. Após emocionar o leitor, o escritor pode adentrar nos aspectos técnicos de sua
obra, pois o seu ponto-de-vista será entendido de modo mais eficiente.
Pessoalmente, acho um dos livros de não-ficção mais bem redigidos é Inteligência
Emocional de Daniel Goleman, Ph.D. (Editora Objetiva). Cada ponto é precedido de um
case (um caso exemplar) e, depois que o leitor está ‘enganchado’ pelas técnicas de Ficção
(Dizer não mostrar, diálogo, personagens interessantes e um conflito) o autor aborda o
aspecto teórico. Não se trata, pois, de um assunto árido – o case tornou-o humano e
palpável. Magnífico exemplo a ser seguido.
Relacione todas as técnicas de ficção e veja como elas poderão ajudá-lo a escrever de
forma mais emocionante. O leitor irá lhe agradecer, divulgando a excelência de seu
trabalho entre seus amigos.

8.2 – Pesquisa: chave para o sucesso

Tanto a ficção como a não-ficção irá beneficiar-se de uma boa e elaborada pesquisa.
Mesmo que você esteja escrevendo sobre um tema que domina, é sempre interessante
levantar mais dados. Isto será especialmente útil no caso de não-ficção. Entretanto,
alertamos para alguns pontos importantes.

1) Quando você estiver lendo algum livro com o intuito de pesquisar, tenha à mão um
caderno para ir anotando as passagens importantes. Não confie em sua memória, pois
após alguns meses de pesquisa e de ter lido vários livros, você terá uma lembrança do
assunto que o atraiu, mas dificilmente vai lembrar-se do local exato onde leu. Para
reencontrar a passagem que o cativou, você perderá muito tempo e pode até não vir a
encontrá-la. Não marque o livro, nem rabisque. Livros devem ser mantidos íntegros. Ao

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anotar no seu caderno, procure ser sistemático. Um outro método prático é o fichário.
Coloque primeiro o assunto que o atraiu e depois o título do livro e a página.
2) Quando estiver escrevendo o seu livro e tiver que fazer citações, faça-o de modo
comedido. Há autores que abusam das citações e isto cansa o leitor. Cada vez que se faz
uma citação, transfere-se a atenção do leitor para o nome de outro autor, diminuindo a
velocidade de leitura. Após páginas de citações, isto se torna monótono.
3) Adote um ponto de vista e defenda-o. Isto é particularmente verdadeiro quando
estamos tratando de um acadêmico que não deseja adotar uma posição pessoal, seja
para não melindrar alguns de seus colegas, seja porque discorda de algum ‘monstro
sagrado’ de sua especialidade que, com isso, poderá ficar vulnerável, ou finalmente,
porque ‘ficar em cima do muro’ é uma posição cômoda. Neste caso, sugerimos que
escreva um livro didático, pois poderá citar todas as correntes sem adotar uma posição
pessoal. Isso foge do escopo deste livro, pois os livros didáticos seguem regras mais
definidas, procurando elucidar os alunos de acordo com sua faixa etária e o grau de
desenvolvimento acadêmico que já conseguiram. No entanto, se o escritor de um livro
de não-ficção está trabalhando sobre um determinado tema, sugerimos fortemente que
adote um ponto de vista e o defenda. Não fique dando voltas como uma mariposa em
volta da luz: adentre o assunto com determinação. Exponha-se; não tenha medo da
crítica.
4) O tom, nos trabalhos de não-ficção literária, deve ser objeto de constante
preocupação. É muito comum que alguém no afã de discordar de alguém ou de uma
corrente de pensamento, se torne irônico, mordaz e, até mesmo, agressivo. Algumas
vezes, o autor aborda o tema como se estivesse se desculpando por discordar e adota
uma posição de falsa humildade, o que também não é correto. Nem oito nem oitenta.
Não é preciso arrasar o contendor, nem se desculpar por discordar. Procure fazê-lo num
tom agradável, sem deboches, sem ser altaneiro, sem falsos moralismos e pudores
exagerados.

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O sucesso de escrever

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5) Para quem está escrevendo ficção, a pesquisa também é importante. Todavia,


alertamos para um aspecto prático da questão: (estou me repetindo propositalmente) a
perda de motivação de escrever para se fazer a pesquisa. É muito comum o autor iniciar
um livro e descobrir que precisa conhecer mais a fundo determinado assunto. Desta
forma, ele pára e vai iniciar sua pesquisa. Após ler vários livros sobre o assunto, ele
conclui que não é o mais qualificado para falar sobre o assunto, ou que precisa conhecer
ainda mais e desanda a pesquisar, ou outra desculpa qualquer. O romance ou não-
ficção acaba ficando para quando terminar a pesquisa. Não caia nessa esparrela:
continue escrevendo e pesquisando simultaneamente. Você poderá sempre reescrever
as cenas que achar que não ficaram exatamente como a sua pesquisa demonstrou que
deveriam ser. Enquanto o livro não estiver impresso, você poderá sempre modificar,
acrescentar e retirar, em suma, reescrever. Aliás, até mesmo quando um livro foi
publicado, você poderá fazer alterações numa segunda edição. Eu mesmo fi-lo em dois
dos meus livros (Os patriarcas de Yahveh & Jesus, o divino discípulo – entre a 1a e 2a
edições) e não fui criticado pelos leitores. Normalmente quem lê a primeira edição,
dificilmente vai ler a segunda.

8.3 – Algumas sugestões para não-ficção

Os livros de não-ficção têm alcançado altos índices de venda. Alguns se tornaram


best-sellers internacionais e tornaram seus autores conhecidos. Todavia, é preciso seguir
alguns aspectos importantes para alcançar sucesso nesta árdua tarefa.

1) Pesquise bem o assunto a ser escrito. Não seja um copy cat, ou seja, não escreva
mais um livro sobre um tema batido, copiando o que outros já fizeram. Por exemplo, se
você vai escrever um livro sobre Cabala ou Tarô, procure ler o que os outros já
escreveram e veja como apresentar o tema de forma diferente. Ninguém irá comprar

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uma fotocópia de um livro de sucesso. Seja inovador e criativo. Mostre os lados
positivos e negativos do que você irá escrever. Pesquise e refute algumas idéias
preestabelecidas de autores famosos. Tenha coragem de inovar.
2) Se você vai escrever um livro sobre os cátaros, por exemplo, procure ser objetivo.
Muitas vezes, um livro sobre determinado assunto só dará 50 páginas e como você quer
escrever algo sério, você imagina que só será levado em consideração se escrever um
livro de 400 páginas. Assim, você se torna repetitivo e irá atacar a posição contrária – a
Igreja Católica que perseguiu os cátaros. Com este enfoque, você tornou a leitura
maçante e, ao invés de conseguir impor seu ponto de vista, você consegue exatamente o
contrário: enervar o leitor. No exemplo acima – os cátaros – procure usar técnicas de
Ficção e narre a vida de vários santos que aparecem lutando contra esta heresia. Conte a
vida dos personagens, usando para tal as técnicas de Ficção (mostrar não dizer,
diálogos, personagens fortes e conflitos). Desta forma, você irá levar seu livro a 400
páginas, só que bem mais interessantes e empolgará o leitor. Ao descrever a história de
alguém martirizado, não será apenas mais um nome a ser levado à fogueira, mas
alguém que você tornou real, de carne e osso, que irá sofrer e emocionar o leitor.
3) Este tópico é dirigido especificamente aos leitores de livros esotéricos e
espiritualistas. Para aqueles que escrevem para o público espiritualista, é preciso um
alerta. Muitos escrevem dizendo que receberam canalizações de espíritos ou de Mestres
ou deuses e até mesmo do próprio Inefável. Pode ser até que seja verdade, mas quando
o leitor lê o assunto e verifica que se trata de uma repetição de milhares de coisas que já
foram ditas, ele fica desconfiado de que tudo isso não passa de um embuste. É
preferível dizer que o assunto que você está abordando é fruto de seus pensamentos e,
por isso, sujeito a falhas e interpretações errôneas de sua parte. O leitor irá levar muito
mais em consideração um assunto tratado com sinceridade do que algo que lhe cheira a
uma charlatanice grosseira. O espiritualista dirá que há casos de psicografia ou
canalizações verdadeiras. Não discutirei tal fato, mas lembro que o próprio Alan
Kardek, codificador do espiritismo, alertou que nem tudo que procede dos espíritos

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O sucesso de escrever

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deve ser aceito sem o crivo de uma análise judiciosa. Ele lembra que existem os espíritos
pseudo-sábios que se apresentam como grandes mestres, mas que só ditam baboseiras e
repetições inócuas que em nada engrandecem a doutrina espiritualista. Todo cuidado é
pouco.
4) Já mencionei o aspecto do tom e do estilo, mas vale a pena ser novamente
enfático. Se você está escrevendo um livro exclusivamente para um determinado
público – os advogados e juristas em geral, por exemplo – você pode dar-se o luxo de
usar um linguajar técnico. Ele será facilmente compreendido pelo seu público e não
exigirá muito dele. Todavia, se o assunto está sendo escrito para o grande público que,
na maioria desconhece o jargão técnico de um dado grupo de especialistas, é importante
que os assunto mais técnicos sejam abordados com um linguajar mais popular. Nada
impede que você escreva o fato de um modo simples e compreensível ao leigo e
mencione o nome técnico numa nota explicativa.

A importância de se escreverem livros de não-ficção ultrapassa a necessidade de


livros de ficção, já que o público está sequioso de saber. Mas, lembre-se de que as
pessoas gravam melhor uma mensagem quando os aspectos emocionais são
devidamente despertados. Uma mensagem nua e crua não tem tanto impacto e,
portanto, não marca tanto quanto aquela que vem carregada de emoção. Ao escritor de
não-ficção, exorto que use as técnicas de Ficção para ressaltar suas mensagens: o sucesso
estará garantido.

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9 – Embalando o Produto

9.1 – Procurando uma Editora

Chegou a parte mais difícil de seu trabalho: encontrar uma editora que esteja
disposta a publicar seu trabalho. Para que possamos conversar no mesmo diapasão,
vamos nos estender um pouco sobre editoras e seu método de funcionamento.
As editoras são empresas cujo objetivo principal é ganhar dinheiro e ter lucro. Por
mais que os editores possam dizer que sua função social seja de levar cultura ao grande
público, em última instância, eles precisam vender seus títulos e auferir lucro senão
fecham as portas. Aliás, diga-se de passagem, não há nada de errado, em minha
opinião, sobre o lucro. Pelo contrário, sem lucro, não há progresso. Portanto, ao começar
a escrever um livro pense que ele deve ser vendável. Todo assunto é vendável, mas
existem segmentos mais lucrativos do que outros. Se você sabe que seu assunto é um
tanto hermético e que seu público-alvo é restrito, não desanime, mas não sonhe grande.
Já se o seu assunto é amplo e pode interessar o grande público, ótimo! Trabalhe para tal.
Cada editora tem o que eles chamam de linha editorial. Ou seja, eles se especializam
num determinado tipo de assunto. O primeiro passo, antes mesmo de começar a
escrever (especialmente se você vai escrever não-ficção), é levantar quais são as editoras
que podem vir a interessar-se pelo tipo de livro que você há de escrever. Faça uma
relação delas. Para tal, sugerimos alguns passos simples.

a) Vá a uma boa e sortida livraria com um bloco e uma caneta.


b) Procure os livros do gênero que você escreve ou pretende escrever e anote as
editoras. Normalmente nas páginas iniciais vem impresso o nome da editora e o
endereço completo. Muitas têm websites. Anote-os.

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O sucesso de escrever

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c) Se tiver um website, visite-o. Veja o que gostam de publicar. Veja a forma de entrar
em contato com ela. Veja o que pedem (manuscrito, carta, etc.). Procure guardar isto
para o momento azado e dê o que eles pedem.
d) Outra forma é navegar pela Internet e ir descobrindo as editoras. Entre num
mecanismo de busca do tipo Google, Radix, Yahoo, etc. e procure editoras Brasil.
Descubra seus sites e navegue.
e) Se você domina o inglês, navegue em algumas editoras americanas e veja como elas
trabalham. Você notará uma diferença enorme de solicitação e de atuação. Isso, no
entanto, é apenas para você ter uma idéia de como funciona um mercado muito maior
do que o brasileiro. As regras no Brasil são outras. Portanto, limite-se ao que as editoras
nacionais pedem, a não ser que queira escrever para o mercado americano.

Cada editora solicita que o manuscrito seja enviado de uma determinada maneira.
Todavia, a maioria pede que seja impresso em formato A4 (210 x 297 mm), em tinta
preta, em Times New Roman ou similar (não envie nada em “script” – um tipo de letra
que imita a escrita, pois é cansativo). O corpo deve ser 12. Não envie um manuscrito
impresso com tinteiro cansado, letras pequenas (corpo menor do que 12) nem em letras
garrafais (corpo maior do que 16). Normalmente, devem-se usar margens justificadas
tanto pela direita como pela esquerda. Usem margens de, no mínimo, 2 centímetros de
todos os lados. O manuscrito deve ser aprisionado e encapado. Na primeira página,
além do título, coloque também o seu endereço completo. Envie-o junto com uma carta
objetiva, procurando vender seu livro, assim como um currículo sucinto e objetivo. Não
mencione no currículo coisas que não ajudam a promover seu trabalho: você não está
solicitando um emprego. Portanto, não cite sua carreira profissional a não ser que seja
fundamental para vender seu livro (isto é válido para não-ficção literária do tipo
acadêmica em que a experiência profissional é imperativa para ele ser levado a sério).
Envie por Sedex, pois, além de ser mais seguro, demonstra profissionalismo. Fique

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quieto e aguarde. Não fique enviando cartas, nem telefonando toda a semana para ver
se foi aprovado. Normalmente as editoras dão algum tipo de retorno – uma carta
padrão que diz que recusaram seu original por alguma razão (quase nunca é a verdade,
portanto, não se amofine).
Você pode e deve enviar uma cópia de seu livro para cada uma das editoras que
você relacionou. No entanto, seja criterioso: não envie algo fora da linha editorial, pois a
possibilidade de recusa é muito grande. Uma editora que publica livros jurídicos não irá
publicar um romance esotérico. Aliás, mesmo que o fizessem, você sairia
provavelmente prejudicado, pois a distribuição dos livros jurídicos é bem diferente da
dos livros esotéricos. Seu livro poderia ir parar num lugar para livros jurídicos e o
público esotérico não iria visitar tal parte da livraria. Procure uma editora especializada
no que você escreve e as possibilidades são maiores.
Qual é o caminho das pedras? Alguém que lhe apresente diretamente ao(à)
editor(a) chefe. Assim como em todos os ramos da atividade humana, quem tem
padrinho não morre pagão. Mas se você não tem padrinho, o caminho é enviar
manuscritos, procurar marcar entrevistas com o editor (dificílimo) e visitar a Bienal de
livros (todo ano há uma, seja em São Paulo, seja no Rio de Janeiro).
Vamos abordar o lado da editora para que você entenda o que está acontecendo na
outra ponta.
O editor brasileiro recebe, em média, de cinco a trinta manuscritos mensais. Como
ele não tem tempo de ler todos, ele lê a carta de apresentação que normalmente dá uma
visão do tipo de livro que a pessoa escreveu e julga se vale a pena ou não dar o próximo
passo. Se não valer a pena, em sua opinião, ele manda a secretária ou um assistente
responder (isto quando eles respondem). Na maioria das vezes, seu manuscrito cairá no
‘buraco negro’, o que a americano chama de slush pile – pilha de lixo.
Digamos que o assunto interessou ao editor, então, ele tem alguns caminhos. O
primeiro é ler o manuscrito, o que é raro nas grandes empresas, mas razoavelmente
comum nas empresas menores. O segundo é destacar algum funcionário (normalmente

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O sucesso de escrever

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mal pago) para ler e lhe dar a sua opinião. Terceiro, mandar o manuscrito para um
leitor profissional que o lerá e dará sua avaliação. Poucos fazem isto, pois custa
dinheiro.
Qual é o critério para avaliar se seu manuscrito vale a pena ser editado? O que lhe
direi agora não deve tirar sua vontade de escrever, mas o critério é pessoal, como só
poderia ser. Portanto, os meses de trabalho insano que você teve estão na mão de uma
pessoa, no máximo, três, que formam o comitê de leitura (é apenas um nome bonito,
mas muitos nem sequer tem tal comitê).
Maravilha! A editora acaba de informá-lo de que irá editar seu livro. Agora pode
começar sua nova peregrinação. Primeiro, a editora pode pedir para alterar aquilo de
que não gostaram: faça-o, pois vale a pena. Segundo, ela pode não alterara nada, e irá
propor-lhe um contrato. Excelente! Mas, cuidado, pois todo contrato tem suas
armadilhas. Se o contrato foi redigido pelos advogados da editora, eles não vão escrever
algo em que você sairá beneficiado. Mas o que você pode fazer? Nada, aceite-o, mas
procure negociar algumas coisas, tais como, uma data firme para que o livro seja
publicado, com uma tolerância de seis meses, no máximo. E se eles não publicarem
neste período? Pelo menos você estará livre para negociar com outra editora. Procure
negociar também os direitos para a publicação no exterior: não os deixe ficar com a
parte do leão. Não negocie direitos subsidiários (televisão, cinema, etc.) a não ser que
você fique com a melhor parte.
Agora que você acertou todos os detalhes, é esperar o lançamento do livro. A
maioria das editoras fecha os títulos que vão vender no próximo ano até Julho/Agosto
do ano anterior. Portanto, é possível que você tenha que esperar um ou dois anos para
ver seu livro publicado. Aguarde com paciência; ainda há muito trabalho antes de ser
publicado. Você terá que tratar das correções, alterações que provavelmente eles lhe
pediram, assim como da capa, um eventual plano de mídia – se você conseguiu
arrancar isto deles, você pode ser considerado um vitorioso.

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Falaremos do lançamento no próximo ponto, mas, antes, quero lhes passar como
agem os americanos. Se algum editor brasileiro estiver lendo, poderá extrair algumas
boas idéias, já que o mercado americano é, no mínimo, vinte vezes maior do que o
brasileiro.

9.2 – O mercado americano

Há alguns anos, os grandes conglomerados compraram a maioria das grandes


editoras americanas. Como esses gigantes são orientados para o lucro, eles modificaram
a forma de trabalho das grandes editoras, visando diminuir despesas e aumentar as
receitas.
Como trabalhavam antes?
As editoras tinham um corpo de editores, chefiados por alguns monstros sagrados
do ramo, que liam quase tudo que lhes caía nas mãos e quando encontravam um
manuscrito de fato bom, apresentavam ao editor-chefe e quando ele gostava, ele
fechava contrato com o escritor. Entretanto, era agora que começava o verdadeiro
trabalho do editor-chefe. Ele fazia um trabalho de edição minucioso que, muitas vezes,
levava vários meses. Ele analisava cada aspecto da história: os personagens, a trama
principal, as tramas secundárias, os diálogos, as descrições, a narrativa. Mandava
reescrever cenas, capítulos inteiros e somente quando estava absolutamente satisfeito,
ele publicava o livro. As editoras estavam atrás da perfeição dentro dos limites da
possibilidade humana.
Quando os conglomerados chegaram, eles mudaram a perspectiva das editoras.
Como as editoras eram apenas mais um negócio dentro de seus vastos interesses, eles
optaram não mais por publicar obras-primas que muitas vezes não vendiam, mas
davam status à editora. Agora eram precisos de resultados e não necessariamente de
prêmios.

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O sucesso de escrever

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Começaram por despedir os caros e poderosos editores, aqueles que, inúmeras


vezes, transformaram manuscritos medíocres em obras-primas e em sucessos de venda.
Substituíram-nos por editores mais jovens, com menos experiência, mais baratos, porém
orientados para as grandes tiragens.
Neste período começaram a florescer os agentes literários – que, aliás, já existiam,
mas não tinha tanto peso nas decisões – e eles passaram a ser um filtro antes do
manuscrito chegar à mesa do editor de uma publishing house de peso. Eles passaram a
fazer um trabalho de seleção, de análise e de encaminhamento dos manuscritos.
Deste modo, as grandes e poderosas editoras não aceitam mais manuscritos
diretamente, mas apenas através de agentes literários. Por quê? Porque sabem que os
agentes, para continuarem no negócio, só lhe trazem excelentes manuscritos, já
devidamente elaborados, finalizados e prontos para publicar. Nada do cansativo e
demorado trabalho de edição, de aprimoramento e de rescritas. O produto já vem
pronto e eles evitam o desperdício de tempo e, conseqüentemente, de dinheiro em
manuscritos que demandam longas revisões (não as revisões ortográficas, pois estas
continuam sendo feitas, mas de estilo que são muito mais subjetivas). Eles estão
errados? Não, eles estão certos. Para que fazer um trabalho insano se já existe gente
profissional para faze-lo.
Por outro lado, o agente literário viu-se assoberbado por uma avalanche de
manuscritos (mais de 30 por dia, de acordo com informações colhidas diretamente com
os agentes americanos pelo autor). Óbvio está que ninguém é capaz de ler 30
manuscritos por dia, portanto, eles desenvolveram um método de triagem inicial,
chamado de query. Trata-se de uma carta especialmente escrita (uma página) onde o
escritor procura interessar o agente a ler o seu manuscrito. O leigo poderá achar que é
fácil, mas o query se tornou uma arte tão complexa que existem vários livros no mercado
americano para ensinar como escrever uma pungente carta query. Explica o que dizer e
o que não mencionar. (Para quem tem interesse, não deixe de ler de CAMESON,

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BLITHE & COOK, MARSHALL J. – Your novel proposal – From Creation to Contract –
Writers Digest Books).
Além disto, cada agente se especializou em certo tipo de literatura. Uns só tratam
de não-ficção, outros aceitam ambos, todavia em se tratando de ficção, alguns só
aceitam certos tipos e não aceitam o que não for especificado. Isto se deve
principalmente aos seus próprios contatos nas editoras. O agente literário conhece os
editores e sabe aquilo de que eles estão atrás. Sabem que não adianta mandar algo que
eles não desejam. Além de que aquilo que realmente importa para eles é fechar negócio
e só o conseguirão levando o que os editores desejam. Jamais irão ‘queimar-se’ levando
um tipo de literatura que aquele editor específico não está interessado.
Digamos que você mandou um query. Provavelmente será recusado por 99 em cada
cem agentes literários, pois esta é a média de rejeição. Continue insistindo, mas apenas
para o bem de nosso exemplo, digamos que você foi aceito. Então, ele o informará
daquilo que deseja. Quase sempre solicitará apenas o primeiro capítulo, ou os três
primeiros capítulos ou as 50 primeiras páginas. Raramente solicitará o manuscrito
inteiro. E você, uma pessoa obediente, mandará o que ele lhe pediu. Após algum tempo,
prepare-se para as rejeições. Provavelmente você enviará quatro manuscritos (só as
primeiras páginas) e receberá negativas em todas. Por quê? Eles não têm paciência e
nem tempo de ler nada que não esteja absolutamente perfeito. Não se esqueça: eles não
são book doctors nem farão este trabalho para você. Procure antes um.
O que é um book doctor?
Você lembra-se de que quando os conglomerados chegaram há cerca de dez anos e
mandaram os grandes editores embora? Pois muitos desses poderosos editores se
tornaram médicos de livro (book doctors). É claro que depois deles, vieram vários outros
e existem muitos que são verdadeiros farsantes, que só estão interessados em roubá-lo
de forma despudorada (dinheiro, não idéias). Entretanto, há os excelentes e que podem
ajudar enormemente qualquer escritor, seja novato, seja veterano. Seus serviços vão
desde simples avaliações até ajudá-lo a reescrever cenas, capítulos e um manuscrito

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O sucesso de escrever

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inteiro. Alguns são também ghost-writers (escritores fantasmas), que podem escrever o
livro para você, enquanto os louros da vitória ficarão a seu crédito (isto é o caso de
quem quer escrever suas memórias, mas acha que não tem talento ou tempo para
escrever. Existem alguns bons ghost-writers no Brasil.).
Digamos que o agente deseja ver seu manuscrito. Saiba que ele irá avaliar cada
detalhe do trabalho. De certa forma, eles já estabeleceram a forma como querem receber
o manuscrito e eu sugiro que, quem desejar entrar no mercado americano, siga o que
eles pedem, pois corre o risco dele nem sequer o ler se você mandar de outro modo.
Darei a seguir as recomendações.

1) Imprima em excelente impressora com tinteiro novo, em formato carta (216 X 280),
SOMENTE FRENTE. Não mande em A4, o americano não usa este tipo de padrão: o
agente estranhará, mas não rejeitará de imediato.
2) Use papel branco de 75 g/m2 (nada de desenhos, filigranas, papel colorido, etc.).
3) Coloque o seu manuscrito para atender as seguintes exigências.
- Tipo de letra: Times New Roman
- Corpo: 12.
- Margens: uma polegada, cerca de 2,54 cm.
- Não justificado, ou seja, a margem direita ficará irregular. Parece
estranho, mas é assim mesmo. Seu computador fará isto automaticamente.
No Microsoft Word, basta ir para Formatar, depois Parágrafo e clicar em
Alinhamento e escolher Esquerdo.
- No seu computador, coloque no cabeçalho o seguinte: nome do autor
(seu nome), o título do livro e no canto direito o número da página.
- ATENÇÃO: é fundamental que você dê ESPAÇO DUPLO entre as
linhas. Seu computador fará isso automaticamente. No Microsoft Word,

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basta você ir para Formatar, depois para Parágrafo e clicar em Entre
Linhas, selecionando Duplo.
- Na primeira página, você deverá escrever no canto esquerdo o seu nome,
seu endereço, Cep, telefone (55YY, 55 é o código do Brasil e YY é o código
de sua cidade) e e-mail. No canto direito, escreverá o word count (o
número de palavras – MS-Word lhe dirá. Para tal vá em Arquivo, depois
Propriedades e depois Estatísticas). No meio da página, você colocará o
Título do livro e depois a palavra by (por) e na próxima linha o seu nome
novamente.
- NOVAMENTE ATENÇÃO: Todas as páginas devem ser enviadas SOLTAS.
Não as aprisione a não ser com um elástico grosso. Se não tiver elástico, não coloque
nada, nem clipe, nem grampo, em suma, NADA. Se quiser enviar dentro de uma caixa
plástica para proteger o manuscrito, tudo bem. Procure uma caixa de cor neutra, não
muito berrante, nem cheia de florzinhas, desenhos infantis (a não ser que seu livro seja
destinado ao público infantil). Pode parecer estranho, mas explicarei cada exigência a
seguir para que não fique parecendo magia ou algo excessivamente hermético.

Tudo tem uma razão de ser. Senão, vejamos.

A) O tipo de letra Times New Roman no corpo 12 é considerado pelos agentes literários
como o mais fácil de ler.
B) Quando você coloca todo o seu manuscrito em corpo duplo num papel carta e dá
uma margem de uma polegada em todos os lados e deixa a margem direita solta, a sua
página dará praticamente a página de um livro de formato final de página de seis por
nove polegadas. Desta forma, o agente terá uma avaliação do tamanho final de seu
manuscrito.
C) Como ele irá lendo e fazendo anotações, ele precisa da margem direita bastante
ampla. Como ele também irá corrigindo o texto, ele precisa do espaço duplo para poder

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O sucesso de escrever

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ter espaço para fazer estas correções. Ele precisa também do verso limpo para anotações
mais longas. Deste modo, ele precisa da página solta, pois é mais fácil de virar e levá-la
para uma mesa, escrevendo o que deseja.
D) Se o vento derrubar todas as páginas que estão em sua mesa, ou se ele esquecer uma
página sobre a mesa ao levantar-se para atender um cliente ou ir ao banheiro, o fato de
ter seu nome, o título da obra e o número da página no cabeçalho fará com que ele não
perca aquela página solta, ou um mundaréu de páginas que o vento espalhou pelo seu
escritório.
E) Papel branco ajuda na leitura. Filigranas no manuscrito não passam a idéia de
profissionalismo e americano adora profissionalismo. O papel branco deve ter 75 g/m2.
Entretanto, na folha do query, você pode e deve mandar um papel carta bem bonito, que
retrate quem você é – sem exageros. Procure ser profissional.

Voltando ao query. Finalmente, um agente leu seu manuscrito inteiro e achou que
era vendável. Não significa dizer que está publicado. Agora ele tem que vender o seu
manuscrito a um editor. Pode levar dias ou meses, ou nunca. Acalme-se e não fique
telefonando para ele toda a semana. Quando ele tiver alguma notícia, avisá-lo-á.
Digamos que ele conseguiu uma editora interessada em publicar seu trabalho, não
significa dizer que será um best-seller, mas já é um passo gigantesco para o sucesso.
Normalmente o agente literário cobra 15% do que o autor auferir para o mercado
americano e 20% para o mercado estrangeiro (ou seja, ele consegue através de um co-
agente estrangeiro – fora do Estados Unidos – publicar seu livro). Os agentes não
cobram reading fee (taxa de leitura), mas há, entretanto, os que cobram. Atualmente há
uma discussão entre os agentes se é lícito cobrar uma taxa de leitura. Muitos são contra,
pois isto pode se tornar um negócio por si próprio e o agente irá se tornar um
pseudoleitor e viver disto.

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Albert P. Dahoui
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Senão vejamos: imaginem 30 manuscritos por dia a US$ 100,00. São US$ 3.000 por
dia. São mais ou menos US$ 60.000 a US$ 90.000 por mês. Um belíssimo dinheiro. Quem
é que vai dizer que ele leu mesmo o seu manuscrito? E se ele disser que leu e lhe der
uma resposta padrão do tipo: ‘seu manuscrito é excelente, mas precisa de mais trabalho
– reescreva-o’. O que é que você vai fazer? Nada, a não ser chorar a perda de US$
100,00. Para evitar cair numa cilada desta natureza, procure sempre agentes que não
cobram taxas para ler, nem antes nem depois de aprovar seu manuscrito.
Normalmente, nas grandes editoras, quando o contrato é fechado, elas dão um
adiantamento por conta de futuros direitos autorais a receber. Nas grandes editoras,
esse adiantamento varia de US$ 15.000 a US$ 50.000 (no máximo). Há casos em que o
adiantamento pode superar a casa dos dez milhões de dólares, mas são raríssimos.
Trata-se de casos em que, para eles, a vendagem do livro é mais do que garantida. Por
exemplo, se Osama Bin Laden escrevesse um livro: Como destruirei os Estados Unidos,
então a editora estará disposta a comprar os direitos autorais por esta soma
astronômica, pois eles sabem que irão vender pelo menos dez milhões de cópias no
mundo inteiro (desculpem o exemplo tenebroso). Mas se você escreveu um belo
romance sobre o amor de João e Maria, ou sobre a vida secreta dos urubus, e conseguiu
US$ 15.000,00 de adiantamento, dê-se por felicíssimo.
O que é que você vai fazer agora que recebeu o adiantamento de US$ 15.000?
Primeiro, não foi você que recebeu, foi o agente. Todo dinheiro é pago diretamente ao
agente e ele é que paga a você. Portanto, escolha bem um agente para não ter problemas
depois. Mas, digamos que você escolheu um agente filiado a uma das associações
importantes dos Estados Unidos e ele recebeu os quinze mil dólares. Ele primeiro retira
seus 15% e lhe paga, normalmente trinta dias depois, os 85%, ou seja, US$ 12.750,00. O
que você vai fazer com isto? Depende!
Se você NÃO DESEJA fazer uma carreira como escritor poderá gastar todo o
dinheiro como quiser, mas se você DESEJA fazer uma carreira como escritor, destinará
US$ 10.000 para um novo tipo de ajudante: o publicist. Que é um publicist? Mal

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O sucesso de escrever

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comparando é o que chamamos no Brasil de relações públicas. No entanto, nos Estados


Unidos, além de escrever os press-releases (notas para a imprensa, informando do
lançamento do livro, seu conteúdo, pontos fortes e quem é o autor) e enviá-los para os
jornais, eles fazem um trabalho em conjunto com o agente, a editora e o escritor, e
conseguem penetração em programas de televisão de real importância, noite de
autógrafos em mega livrarias, etc. Em suma, eles promovem o escritor, além do livro. O
escritor deve se promover mais do que o seu livro, pois ele não só venderá o seu
trabalho atual como os futuros.
ATENÇÃO – Há, entretanto, as editoras menores e especializadas em certos
assuntos que, muitas vezes, aceitam manuscritos para ser analisados sem ser através de
agentes literários. Muitos aceitam escritores que nunca publicaram nada. No entanto, é
muito comum que esses editores só publiquem entre cinco a dez novos títulos por ano.
Suas tiragens, quase sempre, são pequenas – de 2 a 5 mil exemplares e seus
adiantamentos ou são inexistentes ou insignificantes. Não deixa de ser uma brecha
para, no futuro, o escritor conseguir uma editora maior, pois há um problema que
deixei de mencionar, mas acho adequado alertar agora o leitor para o fato.
A maioria dos agentes só deseja representar escritores que já publicaram trabalhos
anteriores. Deste modo, é um ciclo vicioso difícil de vencer. Se você não publicou nada,
como irá ser publicado? No entanto, se você conseguiu ser publicado por alguma
editora pequena e o sucesso não foi retumbante, então, também você terá dificuldades,
pois quem quer publicar alguém que não conseguiu fazer sucesso?
Outro aspecto do mercado americano. Para quem está de fora e ouve falar em
milhões de exemplares vendidos, saiba que são as exceções. Anualmente são publicados
cerca de 1.800 livros de ficção e 20.000 livros de não-ficção. A média de venda é de
10.000 exemplares. Quem consegue vender por volta de 20.000 exemplares é
considerado um best-seller. Desse montante, somente cerca de 20 livros conseguem
ultrapassar a tiragem de 1.000.000 de exemplares e só 3 ou 4 livros de ficção

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ultrapassam este número. Portanto, cuidado com os sonhos: em matéria de livro, o
caminho é muito mais árduo do que se pode imaginar.
A próxima pergunta que o escritor poderá fazer é se vale a pena escrever para ter
que passar por toda esta agrura. A resposta está no seu coração. Por que você quer
escrever? Se for pelo prazer de escrever, pura e simplesmente, ‘tudo vale a pena quando
a alma não é pequena’, diria Fernando Pessoa. Mas se for apenas para ganhar dinheiro,
tente – você pode até conseguir, mas a maioria não obtém grandes êxitos.

9.3 – Lançando o Livro

Finalmente chegou o grande dia; seu livro acaba de ser impresso e agora é preciso
fazê-lo levantar vôo. A não ser que você tenha negociado antes, dificilmente a editora
vai articular um lançamento ou apoio publicitário para seu livro. Isto, naturalmente,
não irá acontecer se você for um escritor de renome, ou se já for uma figura famosa que
está lançando um livro polêmico ou terrivelmente interessante. Na maioria das vezes, a
editora apenas envia uns exemplares para alguns jornais, junto com um press-release. Se
você tiver sorte, algum crítico vai ler seu livro e dedicar algumas linhas a seu respeito.
Na realidade, o maior trabalho será seu, o que nem sempre é fácil – é muito comum o
escritor não ser um bom vendedor ou ficar constrangido de divulgar seu trabalho.
Alguns até acham que estão mendigando um favor.
Tudo gira em torno de dinheiro. Se você tem e está disposto a gastá-lo, siga os
seguintes passos:

a) Contrate um bom assessor de imprensa. Contrate-o pela sua experiência anterior no


ramo específico de literatura. Como tal profissional terá certa abertura em praças
específicas, você terá que contratar um para o Rio de Janeiro, outro para São Paulo e, em
cada praça importante, você terá que ter um. Não precisa contratar todo mundo ao

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O sucesso de escrever

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mesmo tempo: contrate-os à medida que o dinheiro for entrando e que haja
disponibilidade de recursos.
b) Procure estabelecer com ele um plano de trabalho. Não apenas press-releases, mas
também noite de autógrafos em livrarias importantes, entrevistas em programas de
rádio e televisão, além de reportagens em jornais e revistas. Faça com que ele estabeleça
metas objetivas e faça valer cada centavo que ele lhe cobrar. O ideal é pagar-lhe por
resultados obtidos. Conseguiu colocá-lo no Programa do Jô Soares? Então, isto vale
tantos reais previamente acordados. Não conseguiu? Então não vale nada.
c) Atenção para as noites de autógrafos. Não adianta lançar um livro se o público não
vier para vê-lo e comprar o seu livro autografado. Muitas livrarias têm uma relação de
clientes, que podem ceder para que você envie uma mala direta. Saiba, entretanto, que
sem algo mais – canapés, drinks (vinho branco de boa qualidade dá conta do recado) e,
eventualmente, um conjunto musical –, as pessoas não sairão de casa para o lançamento
do livro de um autor desconhecido. Chame os amigos e parentes, mas não fique
chateado se não aparecerem – santo de casa não faz milagre.
d) É importante divulgar o evento através de jornais, assim como fazer publicidade do
seu livro em jornais, revistas e bus-door (aquele anúncio no pára-brisa traseiro do
ônibus).
Todavia um dos pontos mais importantes será o próprio ponto de venda. Se a
livraria comprar uma razoável quantidade de livros (pelo menos 20), ele os empilhará
num lugar de boa visibilidade para o público. Este lugar é o aspecto mais importante de
sua promoção, pois quanto mais destaque você tiver no ponto-de-venda, mais você terá
possibilidade de vender. Verifique, outrossim, se a editora tem um promotor de venda,
pois será ele que fará a divulgação no ponto de venda e instigará o livreiro a colocar o
seu título num lugar de destaque. Caso a editora não tenha promotor, verifique a
possibilidade de contratar um ou de você mesmo fazer tal serviço – pelo menos nas
livrarias de maior importância de sua cidade.

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Um dos aspectos mais difíceis da promoção de um livro novo é que nem sempre o
autor ou a editora tem recursos financeiros disponíveis para tal. Algumas vezes, a
editora não deseja dispor de tais recursos, mesmo que os tenha. Para uma editora que
lança sessenta livros por ano, pode-se tornar um investimento pesado, se ela tiver que
promover todos os seus livros. Por outro lado, pode lhe criar embaraços com outros
autores, se ela resolver investir em alguns títulos e não em todos. Muitas editoras, por
falta de recursos, deixam de investir na promoção. Para o escritor que almeja o sucesso,
resta-lhe a opção de investir o seu próprio dinheiro.
E se ele não tiver recursos financeiros disponíveis? Resta-lhe o corpo a corpo. Ou
seja, a opção de pegar seu livro debaixo do braço e tentar falar com os gerentes de
livrarias (pelo menos das mais importantes), dos jornais, revistas, etc. Nem todo mundo
tem esta disposição nem a faceta de vendedor (ou promotor, como queiram).
Entretanto, não se devem desprezar os amigos dos amigos. Muitas vezes, um certo
amigo seu tem um amigo que é amigo de alguém que pode ajudá-lo a promover o seu
livro. Use-o com parcimônia já que ele estará lhe prestando um favor, mas use-o, pois é
uma abertura importante.
Para um autor de não-ficção, que tenha escrito um trabalho acadêmico, resta-lhe a
interessante opção de divulgá-lo no seu meio. Muitos são sócios de associações de classe
e pode ser que consigam uma noite de autógrafos na própria associação ou, pelo menos,
possam comprar (ou ganhar, é ainda melhor) um mailing-list dos associados.
De qualquer modo, saiba que sem promoção, divulgação, publicidade, etc.
dificilmente seu livro vai decolar. Há, no entanto, uma possibilidade: a divulgação boca
a boca. Ou seja, seu livro começa vendendo pouco, quase por impulso, e os leitores se
encarregam de divulgá-lo para você. É uma esperança que todos têm, ou seja, sem
esforço, o livro se tornar um best-seller. Isso existe? Sim, mas cuidado. Da imensa
constelação de livros lançados no mundo, um ou outro consegue tal proeza. Muitos hão
de se lembrar deste ou daquele exemplo, mas atenção – nem tudo que reluz é ouro –
pois nunca divulgam a verdade dos fatos.

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O sucesso de escrever

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Darei um exemplo. Um certo livro fez um grande sucesso internacional. Divulgou-


se que o autor mandou publicar uma tiragem pequena e que, graças às vendas boca a
boca, o livro se tornou um sucesso mundial. Parte verdade, parte propaganda. A
verdade: o autor realmente mandou publicar seu livro e realmente vendeu-o bem.
Propaganda: Uma grande editora ao ver que era um bom livro e que estava fazendo
sucesso (isso é que foi fundamental!), comprou os direitos de publicação e fez uma forte
promoção em cima do fato de que o livro tornara-se um best-seller apenas com a boca-a-
boca. Na realidade, com a promoção feita pela editora, o livro tornou-se um best-seller
internacional. Pergunta: se a editora não tivesse comprado os direitos e feito a
promoção, teria este livro se tornado um best-seller internacional? A resposta é
imprevisível, pois pode ser que o autor, ao ver que tinha uma mina de ouro na mão,
resolvesse investir por conta própria e conseguisse bons resultados. Todavia, duvido
muito que se tornasse um best-seller mundial já que o autor iria necessitar da
distribuição de uma grande empresa, dos agentes literários que venderam os direitos
para fora de seu país de origem e de uma promoção maciça em vários países para que
seu livro fosse divulgado.
Em última instância, é que sem divulgação seu livro não decolará. Prepare-se, pois,
para gastar algo na promoção de seu trabalho.

9.4 – Aspectos financeiros

Chegamos ao âmago da questão. Você escreve ou deseja escrever para ganhar


dinheiro? Se for para obter resultados financeiros é melhor repensar todo o seu plano.
Por quê? Escrever não dá dinheiro? Para a maioria, não. Há, entretanto, alguns autores
que conseguem sucesso financeiro (nem sempre de crítica). Mas são raros e podem ser
contados nos dedos da mão. Nos Estados Unidos, somente vinte livros de um total de
milhares de livros lançados anualmente passam de um milhão de cópias vendidas e

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quase sempre são de escritores sobejamente conhecidos. No Brasil, tal número só é
alcançado por livros didáticos.
Agora se você escreve porque gosta do ato de criar, porque acha que tem algo para
dizer às pessoas, porque deseja deixar algo para a posteridade, então o seu caminho
poderá ser pavimentado por algo mais do que sucesso financeiro: prazer pessoal – o
sucesso de escrever. Vá em frente; terminar um trabalho é extremamente prazeroso e
enche você de orgulho. Não o orgulho despropositado, mas aquele que se sente por ter
realizado uma obra que se deseja para si próprio. Se os outros lerem, ótimo, senão você
terá conseguido algo mais do que simplesmente dinheiro no bolso – o que é ótimo –,
terá conseguido a satisfação pessoal, que pode ser uma grande motivação para viver.
Isto é especialmente válido para pessoas de certa idade. Quanto mais velho você
for, melhor. A atividade intelectual será benéfica para você, tanto quanto a atividade
física. Para escrever, você escarafunchará suas memórias à procura de lembranças, de
situações vividas, de histórias ouvidas e lidas. Você irá dedicar parte de seu tempo –
provavelmente ocioso – e lerá outros livros, seja para pesquisar, seja para ver como os
outros escrevem. Cuidado com as desculpas para não escrever. Atenção: não é preciso
escrever suas memórias (nem sempre há algo de inovador para contar), mas use sua
vivência para articular bem seus personagens (alguém interessante que você conheceu
ou gostaria de ter conhecido) e tramas que nem sempre você viveu, mas de que ouviu
falar, leu a respeito ou que simplesmente gostaria de ter vivido.
Se você é jovem ou no início da madureza, melhor ainda. Terá tempo para dominar
a arte de escrever e, provavelmente, se persistir, chegará ao sucesso pessoal e financeiro
– um bom casamento.
Como já dissemos, dinheiro pode não ser sua meta, mas o simples prazer de
escrever, de brincar com as palavras, de expor suas opiniões ou passar às pessoas seu
conhecimento e experiência sobre algum tema que você domina, já é, por si só, uma
grande vitória pessoal. No entanto, de nada adianta escrever se não publicar seu

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O sucesso de escrever

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trabalho. Deste modo, saiba o que normalmente as editoras pagam ao escritor para
poder negociar adequadamente.

a) Direitos autorais: o normal é a editora pagar 10% (dez por cento) do preço de capa. O
que é preço de capa? É o preço pelo qual o livro é vendido na livraria. É o preço que o
leitor há de pagar para levar o livro. Normalmente, a editora estabelecesse o preço de
capa, não importando se a livraria o pratique ou não. A livraria é livre para cobrar mais
caro ou vender mais barato, mas para o autor o que vale é o valor estabelecido pela
editora, não importando que tenha havido desconto ou majorações por parte da
livraria. Por exemplo: a editora estabeleceu que o seu livro irá ser vendido por R$ 40,00,
você terá direito a receber 10% deste valor, ou seja, R$ 4,00.
B) Data do pagamento: Normalmente a editora paga mensalmente, após a liquidação
da fatura por parte da livraria. Como é comum a editora dar um prazo para pagamento
para as livrarias, que pode variar de 60 a 90 dias, eles só lhe pagarão depois de ter
recebido delas. Se dividirem o pagamento, também dividirão o pagamento dos direitos
autorais. Como podem acontecer devoluções por parte das livrarias, mesmo após terem
efetuado o pagamento, a editora deduzirá tais devoluções dos seus honorários, no
acerto de contas. Há casos em que a editora paga trimestral ou semestralmente. Há
casos, mais raros, de pagamentos efetuados anualmente.

9.5) Cuidados que o autor deve ter

Siga esses passos com cuidado:

1) Escolha bem a editora. Cuidado com algumas editoras muito pequenas ou


desconhecidas. Nada as impede de dizer que mandaram imprimir uma certa
quantidade e, na realidade, imprimiram muito mais. Como no Brasil a venda, muitas

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vezes, é feita sem nota fiscal ou com meia-nota (50% do valor), o autor será espoliado
em seus direitos autorais. É muito difícil controlar a editora e caso você desconfie que
está sendo enganado, é melhor procurar outra do que ir para a justiça. Somente se você
tiver provas, é que deve processar a editora – normalmente é caro, não compensa e o
deixa com má fama no restrito mercado editorial. Procure, pois, verificar a idoneidade
da editora antes de fazer um contrato com a editora.
2) Procure um advogado antes de assinar um contrato. Isto normalmente não é feito,
mas pode poupar-lhe algumas dores de cabeça, posteriormente. Mas não se esqueça de
que você é a parte fraca da negociação. A não ser que já seja famoso, portanto, deve
levar suas exigências com certa cautela e modéstia. Não se esqueça de que é difícil
conseguir-se uma boa editora, mas também não aceite qualquer coisa.
3) Verifique os valores do preço de capa do livro a serem estabelecidos e quem os irá
estabelecer. Se a editora quiser cobrar um preço muito alto, ou alterar o preço após ter
publicado o livro, é bom que você opine. Um preço muito alto pode inviabilizar a venda
do livro.
4) Cuidado com os prazos. No contrato deve ser bem definido o prazo de publicação,
com o mês e o ano da publicação, com uma tolerância de, no máximo, seis meses de
atraso. Após tal prazo, o contrato deve mencionar que se tornará nulo de fato e você
poderá negociar com outra editora. Sem esta cláusula, você poderá ficar preso a uma
editora que nunca irá publicar seu trabalho.
5) Cuidado com direitos subsidiários e internacionais. O direito subsidiário é o direito
de um livro vir a gerar um filme, uma série de televisão, uma série de bonecos, um livro
de RPG, um desenho animado, uma história em quadrinhos, um vídeo game ou algo
similar. O autor não deve negociar o pacote todo: ele deve ser o proprietário do mesmo
ou estabelecer que a editora tem direitos sobre os efeitos subsidiários até um percentual
máximo de 15%. O mesmo acontece com os direitos internacionais. A editora não deve
ficar com mais de 15% dos direitos autorais recebidos de editoras estrangeiras. Na
realidade, há editoras que só dão 10% dos direitos autorais que recebem das editoras

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internacionais, o que achamos ser abusivo. Só para efeito informativo: as editoras


americanas não ficam com nada quando o livro é negociado com outra editora fora dos
Estados Unidos e os agentes literários cobram um total de 20%, os quais dividem com
os agentes internacionais dos outros países envolvidos. O autor fica com 80% dos
direitos autorais, o que é justo. Já no Brasil, o autor, sendo a parte mais fraca, é muitas
vezes ludibriado com a conversa de que se trata de uma praxe internacional, o que não
é verdade.
6) Tente negociar um pacote promocional. Veja bem quem faz o quê, quando e como.
Assim como quem será responsável pelos pagamentos – o autor ou a editora.
7) Tente negociar um adiantamento por conta de direitos autorais a receber. Há várias
vantagens para o autor. Primeiro ponto: ele terá um dinheiro disponível para promover
seu livro. Segundo ponto: é fundamental certificar-se de que a editora irá de fato
publicar seu livro. Se ela já investiu um certo montante, irá querer recuperar o dinheiro
o mais rápido possível. Terceiro ponto: provavelmente, a editora que aceitou dar-lhe
um adiantamento, empenhar-se-á em promover seu livro. Isto é não totalmente
impossível. Não se esqueça de que uma editora paga um adiantamento para editoras
estrangeiras para publicar livros estrangeiros. Por que não pagar para publicar um livro
nacional?
8) Não se esqueça de acompanhar as suas vendas. Não significa dizer que você irá
todos os dias para a editora e montará acampamento lá dentro, mas quando receber o
relatório de vendas, veja o quanto cada loja vendeu, se puder visite-as para ver o que
pode ser feito para vender mais e qual foi a receptividade do público. Cuidado:
identifique-se com o gerente e procure-o num dia de menos movimento. Evite os
sábados. Não fale somente com os vendedores; a maioria desconhece a verdadeira
venda do seu livro. Não se esqueça de que ele vende centenas de títulos e nem sempre
conhece sua obra, mas vale a pena ser agradável e identificar-se, pedindo seu apoio. Ele
não pode fazer muito, mas se alguém lhe pedir uma informação sobre seu livro, ou uma

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sugestão, ele poderá ser decisivo no fechamento da venda. Faça, portanto, cartões de
visita com o seu nome (não coloque o título – autor – é por demais cabotino), o nome de
seu livro, o telefone da editora e o e-mail da editora e o seu. Cuidado para não dar seu
telefone pessoal, pois você pode vir a ser incomodado além da conta com pedidos
extemporâneos, o que o obrigará a ser indelicado. Já com o e-mail, é mais fácil recusar
um pleito indesejado ou repassá-lo a quem de direito na editora para que analise a
solicitação e tome as medidas cabíveis.
9) Negocie um site na Internet. Hoje em dia, a Internet é um instrumento valioso de
divulgação e de venda. Portanto, solicite da editora se eles podem colocar seu livro em
destaque não só no site deles – o que é quase uma obrigação – mas também nos sites
dos principais vendedores de livros do mercado. Mas, veja a possibilidade da editora
desenvolver um site especifico para você e seu livro. Não é caro e com R$ 300,00 ou
menos você pode ter cinco páginas na Web. Procure se vender, pois não se esqueça de
que outros livros seus virão e fica mais fácil vende-los após você se tornar conhecido.
Do seu próprio site, o leitor interessado poderá linkar-se com os demais sites – editora e
principais vendedores de livros. Não se esqueça de que um site na Internet não é um
investimento caro e sua manutenção é bem em conta (em torno de 30 reais mensais).
Vale a pena!

Agora que você está municiado de armas, escreva seu livro! Já!

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O sucesso de escrever

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10 – Informações gerais e um Modelo


de estrutura.

10.1 – Informações na Internet

10.1.1 – Mecanismos de Busca

Atualmente, a Internet tem sido um instrumento magnífico para quem deseja


pesquisar. Todo escritor deve ser antes de tudo um pesquisador. Ele sempre terá
necessidade de descobrir algo sobre uma época, um personagem histórico ou um fato
médico, jurídico, etc. para compor sua história. Dessa forma, sugerimos alguns sites que
facilitam a busca. Entre eles, os que mais apreciamos é o Google e o Yahoo. Ambos têm
mecanismos de busca em português, o que facilita a procura para quem não domina
outra língua. Eles podem ser acessados após o indefectível www. (World Wide Web).
Basta inserir google.com ou yahoo.com.br

10.1.2 – Sites brasileiros de interesse

Há vários sites nacionais que oferecem informações importantes ao escritor. Entre


eles:

a) sintra.ong.org – Este site fornece a relação de tradutores assim como de revisores.


Vale a pena conhecê-los para quando tiver que fazer uma revisão profissional.

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b) pnlbrasil.com.br – Este site fornece a relação das principais editoras brasileiras. A
partir deste site você poderá linkar-se aos sites das editoras e conhecer sua linha
editorial. Navegue com calma e anote as editoras que se casam com seu trabalho e veja
como enviar o manuscrito. Mas, não se esqueça de que uma apresentação pessoal é a
melhor forma de vencer as resistências naturais a um escritor novo.

Devem existir muitos outros sites, no entanto, caberá a cada autor pesquisar e ver
aquele que melhor lhe serve.

10.1.3 – Sites internacionais de interesse

Estes sites estão na sua maioria em inglês, exigindo, portanto, que o internauta
domine razoavelmente bem o idioma. Há, entretanto, softwares de tradução de idiomas
que podem facilitar a vida de quem não conhece bem a língua estrangeira. Algumas
vezes a tradução sai um pouco truncada, mas com boa vontade, é se capaz de decifrar o
significado da frase. Todavia, é completamente impossível relacionar todos os sites de
real interesse para quem deseja dedicar-se à arte de escrever, devido ao altíssimo
número de endereços eletrônicos. Daremos apenas alguns e, a partir dos mecanismos de
busca, o escritor poderá navegar à vontade.

A) writersdigest.com: este site proporciona vários bons contatos com o mundo


editorial. Eles têm uma excelente publicação anual chamada ‘Guide to Literary Agents’.
Este anuário traz a relação de mais de 570 agentes literários dos Estados Unidos, assim
como uma lista bastante ampla de Publicist, agentes literários especializados em scripts,
além de vários artigos e dicas preciosas. Vale a pena comprar o anuário, desde que o
autor deseje aventurar-se no difícil mercado americano.
B) wga.org: Writers Guild of América. Este site é para quem deseja conhecer mais a
respeito de cinema. Eles aceitam o registro de scripts para não-membros por US$ 20,00

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O sucesso de escrever

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(no wga.west) e US$ 22,00 no wga.east. Tudo pode ser feito pela internet, inclusive o
pagamento.

Há uma enorme quantidade de sites disponíveis, sendo que há aqueles que oferecem
cursos via Internet (custo variando de US$ 200,00 a US$ 300,00, de 4 a 8 semanas). Há
também uma infinidade de livros específicos sobre como aprimorar a sua escrita,
podendo ser adquiridos através da Amazon.com. Basta navegar e saber o que procurar.
Sugiro que procurem nos mecanismos de busca pelas palavras writing skills, writers,
screenwriting, etc. Eles levá-lo-ão a sites incríveis.

10.1.4 – Print-On-Demand – Impressão Por Encomenda (IPE)

Devido à introdução de novas tecnologias de impressão no final dos anos 90 foi


possível o aparecimento de editoras que imprimem livros sob encomenda. Para perfeito
entendimento, esclarecemos que o processo de impressão do livro é feito
individualmente, em alta velocidade, como se fosse uma impressora a laser caseira, mas
com qualidade de impressão a off-set. Desta forma, a editora não tem necessidade de
imprimir milhares de livros e estocá-los à espera da venda. Ela os produz à medida que
as vendas acontecem. Isto possibilita que a editora não faça investimentos em estoques
físicos de livros, que podem vir a encalhar e gerar prejuízos.
Por outro lado, começaram a aparecer editoras que aceitavam imprimir trabalhos
para escritores que não conseguiam penetrar no dificílimo círculo de editoras. Estes
livros feitos sob encomenda passaram a ser vendidos através de sites eletrônicos, tais
como Amazon.com e 25.000 outros pontos de venda (físicos e eletrônicos). A grande
diferença entre as editoras do tipo IPE (Impressão Por Encomenda) e as pequenas
editoras que também aceitavam auto-publicados autores, é que as editoras IPE, além do
cobrar muito mais barato, oferecem uma coisa incomparável – a distribuição de seu

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livro entre os principais sites eletrônicos de venda de livros e também em livrarias
físicas (em menor escala). Só isto já vale os 200 a 500 dólares que eles cobram. Além do
que, graças à tecnologia, um livro impresso em IPE ou em gráfica normal são
exatamente iguais, já que nem mesmo um técnico gráfico é capaz de diferenciar um do
outro.
Esta nova forma de trabalhar deu um enorme impulso aos escritores que não
conseguiam publicar seus trabalhos. No início, muitas editoras aceitavam qualquer
coisa, mas, com o passar do tempo, passaram a selecionar os trabalhos de tal forma que
pudessem publicar livros de qualidade.
Hoje, em 2004, este mercado expandiu-se e já engloba cerca de 25% de todos os
títulos publicados nos Estados Unidos. Muitos autores estrangeiros traduziram seus
trabalhos para o inglês e entraram no mercado americano através de IPE. Muitos
consideram que é uma forma de entrar no mercado pela porta de trás. Concordo, mas é
melhor estar na festa mesmo que se tenha ‘penetrado’ o local do que ficar do lado de
fora apenas escutando a música.
Para maiores informações, sugerimos o site booksandtales.com. Este site faz uma
análise bastante criteriosa sobre várias editoras do tipo IPE e através dele, há a
possibilidade de se linkar com a maioria das editoras. O site é editado por uma
argentina supersimpática chamada Clea Saal, que também é escritora e utilizou os
serviços de uma das editoras.
Muitos escritores tradicionais podem torcer o nariz pelo fato do autor ter que pagar
(entre 200 a 500 dólares) para publicar seu livro. Respondo que é mero preconceito.
Alguns grandes escritores só conseguiram publicar seus primeiros livros após ter
investido em sua primeira edição. Entre eles citarei apenas um dos mais famosos: John
Grisham. O que importa é divulgar seu trabalho. Após tal fato, se ele for do agrado do
público, pode-se trabalhá-lo à medida dos recursos financeiros e, quem sabe se não se é
contratado por alguém realmente grande? Melhor do que ficar em casa imaginando
como seria bom tornar-se rico e famoso se um dia se conseguisse escrever um romance

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O sucesso de escrever

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maravilhoso, publicá-lo em uma grande editora internacional e fazer da história um


filme de sucesso. Pare de sonhar e escreva. Já!

10.2 – Um modelo de estrutura de romance.

Apenas à guisa de informação, preparei um modelo simplificado de estrutura de


um romance. Quero deixar claro que se trata de um modelo apenas para dar uma base
ao escritor novato. Lembro que o escritor pode quebrar as regras – e até deve fazê-los,
pois é desta quebra que nascem as obras primas – mas até para quebrar as regras é
preciso conhece-las. Este modelo é apenas um deles e o escritor poderá – até deverá –
fazer o seu próprio para cada história que for escrever. No entanto, acho que é melhor
ter um modelo, mesmo imperfeito, do que não ter nenhum. Siga-o na medida em que o
satisfizer e depois crie o seu próprio. Inove sempre: o público precisa disto.

O modelo começa dividindo a história em três partes: Apresentação, Confrontação e


Resolução.

PARTE 1 – APRESENTAÇÃO
Cena 1 – Local 1 – Apresentação do Protagonista (cena de impacto onde, através da
ação, passamos a conhecer o caráter do Protagonista.)
Cena 2 – Local 2 – Apresentação do Guardião (ou Antagonista). (Pode ser uma cena
para cada um, em um ou dois locais diferentes).
Cena 3 – Local 3 – Uma situação desestabilizadora começa a surgir.
Cena 4 – Local 1 – O Protagonista se vê envolvido numa promessa ou numa
expectativa.
Cena 5 – Local 2 – O Antagonista se desenha de forma mais nítida e ameaça a
estabilidade do Protagonista.

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Cena 6 – Local 3 – O Protagonista vê seu desejo obstruído e nasce o CONFLITO.
(PONTO DE VIRADA).

PARTE 2 – CONFRONTAÇÃO

Cena 7 – Novo local – O problema se complica.


Cena 8 – Local diferente – O Antagonista se prepara para obstaculizar de modo
completo o Protagonista.
Cena 9 – Terceiro Local – Surge uma ajuda inesperada de um novo personagem.
Cena 10 – Retorno a algum Local anterior – O Guardião orienta o Protagonista, criando
um obstáculo imprevisto. (EMBARAÇO 1).
Cena 11 – Um outro local – O Antagonista se choca com os amigos do Protagonista.
Cena 12 – Retorno a algum Local anterior – O Protagonista se vê entre duas correntes de
decisão. (MEIO DA HISTÓRIA) (Pode ser uma calmaria – cena de amor ou de
discussões filosóficas – ou de forte impacto emocional – um abandono imprevisto de
seu amor ou de uma amizade importante).
Cena 13 – Um novo local – A situação se deteriora.
Cena 14 – Novo local – O Protagonista tenta normalizar a situação. (EMBARAÇO 2)
Cena 15 – Mais um Local – Uma nova e imprevista crise se instaura e muda o rumo da
História. (REVIRAVOLTA)

PARTE 3 - RESOLUÇÃO

Cena 16 – Retorno ao Local do Conflito – Reversão de expectativas. Protagonista se vê


engolfado em problemas e parece não ter mais saída.
Cena 17 – Novo Local – Sub-tramas começam a se resolver. (Não deixe pontas soltas).
Cena 18 - Um outro Local – A Hora da revelação. A luta entre Protagonista e
Antagonista. Todos os segredos começam a ser desvendados.

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O sucesso de escrever

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Cena 19 –Novo Local – Todas as sub-tramas são resolvidas, para o bem ou para o mal.
Cena 20 – Um Local novo e nunca visitado ou renovado – RESOLUÇÃO FINAL. Todos
os segredos são desvendados. Surpresa completa para o leitor. Termina com a Moral da
História.

Neste modelo, tivemos 20 cenas, mas nada impede que haja mais ou até mesmo
menos cenas. A cena pode ser quebrada em duas ou três cenas, sem nunca dar ao leitor
a finalização completa, a não ser a última, por razões óbvias já que a história deve
terminar. Se fosse um filme, tais cenas seriam divididas em pelo menos uma dúzia de
cenas menores e mais dinâmicas.
Quando mencionamos um novo LOCAL é para exatamente irmos criando uma
seqüência de suspense e de cenas interrompidas, o que traz ainda mais tensão à história.
Nada impede, entretanto, que tudo ocorra dentro de uma mesma locação (no caso do
teatro).
Faça alguns exercícios com tal modelo e crie o seu próprio para ir treinando o
planejamento estrutural de sua história. O conselho dos grandes mestres é de perder
um certo tempo planejando a história e somente depois que a tiver bem definida,
começar a escrever. Procure, neste caso, manter-se dentro da trilha (não um trilho que
impede a criatividade) para não fugir demais daquilo que você mesmo planejou. Boa
sorte e comece a escrever. Já!

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Bibliografia

CLEAVER, JERRY – Immediate Fiction: A complete writing course – St. Martin’s Press
KRESS, NANCY - Beginnings, Middles & Ends (Elements of Fiction Writing) – Writers Digest Books
BURROWA, JANET – Writing Fiction – Pearson Longman Publishers
LUKEMAN, NOAH – The First Five pages – A writer’s guide to staying out of the rejection pile –
Fireside
LUKEMAN, NOAH – The Plot Thickens: 8 ways to bring fiction to life.– St. Martin’s Press
STEIN, SOL – Stein on Writing – Griffin Trade Paperback
CHIARELLA, TOM – Writing Dialogues – Writers Digest Books
HUNTLEY, CHRIS & PHILLIPS, M. A. – Dramatica Theory – Screenplay Systems Inc.
HUNTLEY, CHRIS & PHILLIPS, M. A. – Storyview - Screenplay Systems Inc.
CAMESON, BLITHE & COOK, MARSHALL J. – Your novel proposal – From Creation to Contract –
Writers Digest Books
FIELD, SYD – Manual do Roteiro – Editora Objetiva.
COMPARATO, DOC – Roteiro, Arte e Técnica de escrever para cinema e televisão – Editorial Nórdica
ltda.
DICKERSON, DONYA – Guide to Literary Agents – Writers Digest Books

RELAÇÃO DE LIVROS PUBLICADOS PELO AUTOR.


Pela Heresis – um selo das Publicações Lachatre Editora Ltda (lachatre.com.br)
1) A Queda dos Anjos; 2) A Era dos Deuses; 3) O primeiro faraó; 4) Os patriarcas de Yahveh; 5) Moises,
O enviado de Yahveh; 6) Jesus, o divino discípulo; 7) Jesus, o divino mestre; 8) The Making of de A Saga
dos Capelinos; 9) Shiva, a alvorada da Índia.
Pela Virtualbookworms.com – Estados Unidos (virtualbookworms.com/outcaste.html)
1) Outcaste; 2) Dispersed (lançamento planejado para Maio 2004)

Este trabalho foi revisado graciosamente por Maria Albertina F.G. Estácio
 2004 – Albert Paul Dahoui

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