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INTRODUÇÃO 19
1 A POLlTECNIA E A ÁREA
TRABALHO-EDUCAÇÃO 29
2 PROBLEMÁTICAS E PERSPECTIVAS
DA POLlTECNIA 41
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p., autora apresenta, em duas de suas obras- Ensino de 2 sintático-semântica, mas refere-se, isto sim, ao percurso
grau,' o trabalho como ,orínc/pio eciucativo e Educação e tra- metodológico desenvolvido pelo pesquisador que busca a
ba!l70 no Brasi!: o estado da quest:3,o - um panorama das apreensão do fenômeno educativo a partir de suas reia-
diversas contribuições que propiciaram o avanço da área ções com o trabalho. Como ratifica Acácia Kuenzer (1987,
trabalho-educacão revelando assim o seu estéoio de cons-
:> ) ~j p.92),
trução. o que distingue esta ama ternatica rJc outras no campo qerai de
educação é o fato de que. nesta. a dirnensi:w trabalho constitul-
Num recorte da bibliografia brasileira de trabalho-educação,
se corno categoria central ela qual se pwte para a cornpíOmls,"o
a equipe do projeto O vaior sociai da educação e do traba- do fenàmeno educatiVo c das reciproca,; entre eL~-
lho em camadas populares (MATA, DAUSTER, 1990) elenca tas duas dimensões e Iri1b8lho.
- entre teses, livros e relatórios de pesquisa - 601 titulos Mais do que uma superespecialização de um setor da pes-
publicados no Brasil no perlodo de 19'70 a 1989. quisa e da prática em educação, a área trabalho-educaç~io
No entanto, tal crescimento nÊJO se mostrél isento de problc~· vem-se construindo enquanto um modo de se pensar a for-
mas. Tomaz Tadeu da Silva (1991, p. 7). outro pesquisador mação humana. Ou, como nos aponta ainda Kuenzer (1987,
que constata o crescimento da área, alerta: p. 93), a área se constituiria em uma "concepção teórica
Falar da entre edUCilç~1O e trabiJiho vai, pouco a pouco.
fundamentada em uma opção política".
virando moda nos ci'-culos educacionais. Da burocracia educa-
Assim, a construção da área trabalho-educação não deve
cional aos mais radicais CrítiCOS do sistema. das revistas
espeCializadas as revistas pop ele todos passaram a ser concebida enquanto cisão ou fragmentação do campo
achar que m8ncionar a relc'nda constitUI passaporto se· educacional, mas como princípio metodológico na pesqui-
guro para a aceitação e o prestíÇjio. sa em educação.
Na mesma linha, Gaudéncio Frigotto (1987) destaca o que No bojo das análises que tomam a relacão trabalho-educa-
denomina de "crise de aprofundamento teórico" no interior ção como fio condutor, vem-se avolum~ndo o debate sobre
da área trabalho-educação. O autor assinala três dimen- a concepção de educação politécnica.
sões articuladas que compõem a crise da área. Seriam elas
a hornogeneização na superfície do discurso crítico da rela- A partir da tese de doutorado de Gaudêncio Frigotto (1984).
varias outros trabalhos têm abordado a questão da
ção trabalho-educação; a inversão metodológica da apre- politecnia.
ensão trabalho-educação; e a não-·historicização das cate-
gorias valor-trabalho e capital-trabalho. No .entanto, o conceito de politecnia não é novo no Brasil e
mUito menos no cenário internacional. Em 1955 foi publi-
A inversâo metodológica apontada por Frigotto se refletia cad . ,
o um livro onde Paschoal Lemme descreveu sua via-
na antiga denominação ela área - educação e trabalho. Cabe
gem à União Soviética, especificamente aquilo que obser-
ressaltar que a questão não é meramente de uma disputa
vara da educação naquele país. Naquela obra o autor dedi-
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ca um capítulo à educação politécnica, onde tenta mostrar
foi objeto de outros estudos (NOGUEIRA, 1990 ; MANA-
as conquistas práticas e indicar os princípios fundamentais
CORDA, 1991).
dessa perspectiva educacional. Para isso, Paschoal Lemme
cita Sidney e Beatrice Webb l (LEMME, 1955, p. 74), ingle- No entanto, cabe expor uma das passagens mais conheci-
ses que já em 1935 escreveram sobre os objetivos da es- das de Karl Marx, retirada das Instruções aos delegados do
cola politécnica: Conselho Central Provisório da Associação Internacional
o que a "escola politécnica" procura [.. ] é justamente o oposto
dos Trabalhadores, de 1868. Escreveu Marx (1983, p. 60):
de adestramento para determinado ofício ou profissão; de fato. afirmamos que a sociedade não pode permitir que pais e pa-
visa-se um aperfeiçoamento intelectual de todos os alunos [... ], trões empreguem, no trabalho. crianças e adolescentes, a me-
não se procurando saber as determinadas profissões que esco- nos que se combine este trabalho produtivo com a educação.
lherão de per si [... ]. Essa ocupação pode ser em trabalho manu-
alou numa profissão intelectual. E continuando, o filósofo alemão deixa claro o que entende
por educação:
Os autores que se dedicam à temática são unânimes em
apontar que todas essas contribuições à discussão educa- Por educação entendemos três coisas:
cional são provenientes dos aportes estabelecidos por Karl 1. Educação intelectual.
Marx (1818-1883), embora o filósofo alemão jamais tenha 2. Educação corporal, tal como a que se consegue com os exer-
escrito um texto sistemático dedicado especificamente à cícios de ginástica e militares.
área da educação. Fato esse que não o impediu de produ- 3. Educação tecnológica. que recolhe os princípios gerais e de
zir o embrião de uma sociologia e uma filosofia da educa- caráter científico de todo o processo de produção e, ao mesmo
tempo, inicia as crianças e os adolescentes no manejo de ferra-
ção que produzem frutos até hoje.
mentas elementares dos diversos ramos industriais.
Ou seja, como ensina Mario Alighiero Manacorda, em sua Pode-se facilmente perceber a direção de uma educação
clássica obra, Marx e a pedagogia moderna (1991), se por multilateral preconizada por Karl Marx; seguindo, o autor
um lado as questões pedagógicas são abordadas por Marx aponta seus objetivos com a educação politécnica:
de maneira ocasional, por outro, essa discussão "acima de
Esta combinação de trabalho produtivo pago com a educação
tudo, está colocada organicamente no contexto de uma crí-
intelectual, os exercícios corporais e a formação politécnica ele-
tica rigorosa das relações sociais". vará a classe operária acima dos níveis das classes burguesa e
aristocrática.
Mas em que consiste a educação politécnica para Marx?
Certamente essa é uma questão bastante complexa, que Nessas indicações, encontra-se o embrião fundamental do
foge aos objetivos desse trabalho e que, além de tudo, já trabalho como princípio educativo, que busca na
estruturação da sociedade seus aportes básicos.
Fundamentalmente não é importante para o presente tra-
I A obra completa. onde os autores tratam da questão, foi publicada em portu- balh o, a concepçao
- mesma de Marx 'a respeito da educa-
guês em 1954 (LEMi\1E. 1955).
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ção, mas sim a interpretação e as ilações feitas pelos diver- O debate sobre a concepção de educação politécnica avan-
sos autores. De maneira alguma, essa pesquisa buscou o çou tanto na década de 80 a ponto de alguns educadores
autor mais fiel ao pensamento marxiano ou marxista. No se lançarem na busca de uma práxis que tivesse por hori-
entanto, é inevitável a confrontação entre as diversas leitu- zonte aquela concepção educacional. Com efeito, em 1988
ras feitas a partir do pensador alemão. foi iniciado o curso técnico de segundo grau da Escola Po-
Assim como foi encontrado o trabalho de Paschoal Lemme, litécnica de Saúde Joaquim Venâncio, na perspectiva de
da década de 50, é provável que se encontrem outros que realizar um projeto de ensino de segundo grau que se des-
também abordem a politecnia. No entanto, as referências vie da dualidade entre a educação geral e a formação pro-
serão - muito provavelmente - vinculadas às experiências fissional. Enfim, pensar uma educação que tenha o ser hu-
desenvolvidas nos países do chamado socialismo real. O mano como centro e não o mercado (MALHÃO, 1990).
certo é que no Brasil a discussão em torno da educação Das teses de doutorado, passando pelas revistas de divul-
politécnica ficou adormecida durante algumas décadas, não gação pedagógica e pela construção de um curso técnico,
sendo capaz de se expandir e envolver nem teóricos nem o debate acerca de uma escola/educação cujo centro seja
educadores. o conceito de politecnia tem crescido rapidamente. Por di-
Pode-se atribuir a Dermeval Saviani o papel de versas vias, a palavra politecnia vem-se tornando conheci-
desencadeado r do debate atual sobre a politecnia no Bra- da nos meios educacionais.
sil, a partir de sua atuação no curso de doutorado em edu- Com a promulgação da Constituição em 1988, abriu-se o
cação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. período dos debates acerca das chamadas leis complemen-
Através desse curso, Saviani buscava desenvolver uma crí- tares, que necessariamente decorreriam da nova Carta. Com
isso, a discussão em torno da Lei de Diretrizes e Bases da
tica consistente ao especialismo, ao autoritarismo e ao
Educação Nacional (LDB) irrompeu no país levando consi-
reprodutivismo em educação, assim como ao marxismo
go o debate da politecnia.
vulgar.
A influência desse pesquisador nesse debate pode ser per- M~is uma vez, coube ao professor Dermeval Saviani a inici-
~tlva. d: produzir um texto que, como o próprio autor diz, é
cebida, por exemplo, na constatação de que os autores mais
um IniCIO de conversa" para a formulação da nova LDB.
profícuos e consistentes no debate da politecnia -
Gaudêncio Frigotto, Acácia Kuenzer e Lucília Machado -
ond~ se destacam os conceitos de desenvolvimento
omnllateral e formação politécnica.
foram orientandos ou alunos de Dermeval Saviani.
Outro sinal da influência de Saviani pode ser percebido atra-
~m ,deputado. apropriando-se do esboço desenhado por
. aVlanl, o transformou no primeiro anteprojeto de LDB. Com
vés da caracterização da politecnia enquanto uma propos·
~so, ,tanto no texto Contribuicão à elaboração da nova Lei
ta fortemente ligada ao ensino médio.
e Diretrizes e Bases da Edu~ação: um início de conversa,
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de Dermeval Saviani (1988, p. 20), quanto no anteprojeto Neste livro, busca-se encontrar, delimitar e clarear as ten-
apresentado pelo deputado Otávio Elísio (1988), pode-se sões entre as diversas contribuições teóricas que se têm
ler: colocado no debate da politecnia.
Art.35 - A educação escolar de 2°grau [... ] tem por objetivo geral Cabe, portanto, ressaltar a finalidade político-didática desta
propiciar aos adolescentes a formação politécnica necessária à obra. Assim, o trabalho pretende servir de introdução àque-
compreensão teórica e prática dos fundamentos científicos das
les que desejam se incorporar ao debate - conseqüente-
múltiplas técnicas utilizadas no processo produtivo [grifo do au-
tor]. mente à construção - da concepção de educação politécni-
Se, por um lado, a expressão educação politécnica vem-se ca no Brasil.
tornando cada vez mais conhecida dentro e fora dos círcu- Um dos aspectos primeiros da pesquisa era determinar o
los educacionais, ao ponto de inclusive ser explicitamente que seria entendido por concepção de educação politécni-
proposta para compor a legislação educacional, por outro, ca, ou melhor, onde estariam as construções consideradas
não se pode afirmar o mesmo acerca de seu conteúdo. elementos constitutivos desta concepção.
Afinal, em que consiste o conceito de politecnia? A forma- Com o desenrolar do trabalho, foi sendo elaborada uma
ção politécnica é um modelo de educação formal a ser im- visão dinâmica de tal construção. Isto é, vislumbrou-se que
plantado no país ou é uma concepção teórico-metodológica a concepção de educação politécnica está sendo gestada
que visa (re)direcionar as políticas e práticas educativas? A num movimento combinado e interpenetrante de cinco pó-
noção de politecnia está restrita ao ensino de segundo grau, los: academia, escola, mundo do trabalho, sociedade civil,
ou é uma concepção que necessariamente perpassa todos e sociedade política.
os níveis do ensino? A concepção de educação politécnica Assim, delimitou-se o objeto de pesquisa à produção aca-
é mais uma "moda nos círculos educacionais"? Ou a dêmica. De certo modo, os estudiosos do tema em foco
politecnia representa uma necessidade histórica que se podem ser encarados como catalisadores de movimento
começa a construir no Brasil? mais amplo de construção de uma concepção, na medida
Diante de tantas questões, perplexidades e tensões teóri- em que buscam organizar os questionamentos tentando lhes
cas, cabe perguntar: Qual é a relação existente entre edu- dar maior consistência e conseqüência através de propos-
cação politécnica e o eixo trabalho como princípio educativo, tas ao conjunto dos educadores e a toda sociedade.
ou com a escola do trabalho? O que une e o que separa a A pesquisa buscou considerar - sem absolutizar - a ordem
concepção de escola politécnica das escolas do SENAI, ou de divulgação/publicação das obras, principalmente no que
ainda, das escolas técnicas federais? Afinal, como os pes- tange aos trabalhos de um mesmo autor, pois se entende
quisadores entendem a politecnia? Melhor, que concepção que e.ssa cronologia de alguma maneira reflete o itinerarium
de educação politécnica vem sendo construída no Brasil a mentls do pesquisador.
partir da década de 80?
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Na busca de se construir a exegese do pensamento dos relações entre educação e estrutura econômico-social ca-
autores sobre a politecnia, pretendeu-se em especial anali- pitalista, na q.ual, no último capítulo, .contrapõe à concep-
sar aqueles textos que abordassem explicitamente o deba- ção pedagógica liberal, consubstanc~ada no pen~a,me.nto
te sobre a educação politécnica. No entanto, em alguns bre- de John Dewey, a proposta de educaçao/escola politecnlca:
ves momentos, mostrou-se necessária a utilização de ou- Tomando-se. então as relações sociais de trabalho, mediante as
tros trabalhos que enfocassem alguns aspectos conexos quais os homens produzem sua existência, e o trabalho, enquanto
tal, como principio educativo, a análise da escola que se articula
àqueles tratados nos textos primariamente analisados.
com os interesses da classe que tem seu trabalho alienado, ex-
Esse tratamento do material estudado buscou apreender. propriado, não passa pela separação entre escola e trabalho,
mas se situa na apreensão da "escola do trabalho", como nos é
algumas continuidades e contradições que não se manifes-
posta dentro da evolução da concepção marxista de escola poli-
taram, por si mesmas, no corpo das obras que tomam obje- técnica (FRIGOnO, 1984, p. 186) [Grifo do autor].
tivamente o debate sobre a concepção de educação poli-
Assim, escolheu-se delimitar - sem limitar - a pesquisa aos
técnica.
textos editados originariamente em língua vernácula a par-
Apesar de se buscar permanências, mudanças, contradi- tir da publicação de Produtividade da escola improdutiva,
ções - a evolução - do pensamento de um autor, deve ficar logo, de 1984 até 1992, buscando obras e autores que as-
claro que esse trabalho não visou analisar a totalidade das sumissem objetivamente o debate - mas não necessaria-
concepções educacionais de cada um. Em suma, o objeto mente a defesa - da educação politécnica.
dessa pesquisa são os textos - e não os autores - que
abordam a politecnia.
Tendo optado, dentro dos campos possíveis de análise da
temática, pelo estudo da produção acadêmica que aborda
a discussão da concepção de educação politécnica, faltava
delimitar no tempo essa produção teórica.
Como já foi dito anteriormente, o debate sobre a politecnia
não é novo, nem mesmo no Brasil. Assim, seria possível
encontrar uma ou outra referência ao tema ao longo do sé-
culo XX. No entanto, o amplo debate realmente se avoluma
no país a partir do início da década de 80, através de
Dermeval Savianí.
Com efeito, em 1983, Gaudêncio Frigotto defende sua tese,
A produtividade da escola improdutiva: um (re)exame daS
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