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O CONCEITO DE IDEOLOGIA NO OuTImMo LuKAcS As palavias que se seguem discutirao 0 modo pelo qual o slrimo Lukées chegou a uma determi- rnasdo ontoldgica da categoria da ideologia. Abor- daremos as obras da alta maturidade do pensador Iadingaro, especialmente a sun derradcita Oncologia do ser social IpeqLosia como FUNGAD social, De inicio, 0 correto delineamento do comple- xo idealégico exige de Lukes « determinacio rigo rosa da categoria do trabalho: sob todos os aspec- tos, trata-se da interasio entre o homem e 2 rnatureaa; coletivo ou nao, ¢ estricamente criagao de nnalores de wo. Tal procedimento impede que 0 filé- sofo hingaro caia nas ambivaléncias de Marx, Como se sabe, ainda que tome enquanto trabalho 1 metabolismo com a natureza, Marx teata resol ver ¢ questio do trabalho produtivo no ambito dz produgio capitalisearecorrenda a um exemplo “fora dda producao material”: “ur mestre-escola € um tra balhador produrivo quando trabalha no «6 pars dleseavolves a'mente das criangas mas também para enriquecer-o dono da escola. Que este invista seu capital numa fabrica de ensinar, om vex de fazer salsicha, em nada modifica a sieuagio".’ Embor2 Mare diga o contririo, a modificagio é em verda. de determinante, O fato de que um educador este ja submetido as relagies capitalistas nfo o transfor- ‘ma em um trabalhador no sentido estrito do termo, Para Lukies, 0 trabalho implica sempre a apro: priacéo da natureza: 0 seu produto possui uma rea (Graduate mesreem citndassocaisedoutorando en servgo social pela UFR) (__ Rane Cari" ) lidade corpdrea ¢ este nto é 0 caso da atividade pedagdgica. do mestre-escola de Marx. Essas ponderagées séo de sums importincia para 0 nosso presente assunto, porque apenas com essa determinacao estrita do trabalho Lukics pide desenvolver a caracterizagio da produgio ideolégi- ca: concebendo-se 0 trabalho como as posigoes teleoldgicas que se dirigem wransformagio da ob- jecividade natural, a ideologia encontia o gérmen de sua consecusio nas formas de teeologia que nao visa a naturesa sende a impulsionar, a regrar a atic vidade dos trabalbadores Aqui no se tata de elaborar um fragmento da sacurcea de scordo com finalidades humanas, mas, 20 contririo, um homem (ou vétios homens) € duzido realizar algumas posigbes ccleoldgicas segundo um modo predeterminado. J que um de- terminado trabalho (por mais que poses ser dife- renciada a divisio do trabalho que o caracteriza) pode ter apenas uma nica finalidade principal uni- tra, comna-se necessirio encontrar meios que ger rantam essa unitariedade finalisica na preparacio e na exccugio do trabalho. Por iss9, essas novas posicdes teleoldgicas deve entrar em aio no ‘mesmo momento em que surge a divisio do trabs- Iho: ¢ continuam a ser, mesmo posteriormente, um meio indispencivel em todo rabalho que se funda sobre a divisio do trabalho. ‘AS agoes que induzem os trabalhadores 2 © eugio de determinado trabalho sio as posicées teleologicas secunditrias, Essa espécie de teleologia possui como objeto nio a nacureza, mas sim a con- uta dos demais, visando inicialmence a unidade de acao da coletividade que trabalha: “encontrame- nos, enfim, no imbito daquelas pos 1s teleolgicas aque nao pertencem & esfera econdmica propriamen- Novos Runoi Q Ano 22 = 26 47 = 2007 ce dita, mas de cuja existncia esta depende para se manter e reprodu- vii?) situam-se fora do esttito do- ‘minio do provesso de interacio entre 0 homem « a nacurees, significando, com eito, a interacao clos homens entre si — Ambito no qual esearia o mestre-escola de- Marx. Com 0 desenvolvimento histd- rico ulterior: diz Lukics que proce dem daqui as formas de ideologia: Com a diferenciacio social de nivel superior. com o inaacimnens das clases socials com interes anragnicon ‘esse tip de posgtoteleolggica rorna-sea base espciual estuurance do que 0 marsismo chama de ideologiz, (Ox tejar noe conflios sucitados pelas contadigtes das modalidades de producto mais descnvolidas aidcologia prod as formas através das quaisos homens rornan-se conscienterdestes confltose neler se inserem mediante Com o surgimento das sociedades divididas em lasses, as posigaes eeleolégicas secunds formam-se qualitativamente, constituindo-se na “base espiritual” da ideologia: « modalidade de com portamento social « partir do qual se interfere nor con- {flitos consretamente porto. Isso equivale 2 abordar 0 complexo ideologico enquanto fiasco social. Ape- ras & ideolagia aquels “forma de elaboracio ideal da realidade que serve para transformar em cons- ciente ¢ opetativa a prévis sicio-humand Dessa maneita, de acordo com 0 sentido dado por Lukics, « conversio de uma ideia em ideologia significa a sua ceansformacio em comeitncia pratics dos conflitos posos® A funcionalidade da ideologia ¢ “cer veiculo dos confit sociais ~ lembremos: nem fovdes redutiveis 3s lutas de classe ~ que cotidiana- mente sio postos pela reproducio da sociedade Essa concepgio ao cra alheia ao fundador do materialismo histérico-dialético, Lukécs prontamente a encontra na tese de douroramento de Mars, no momento em que se dliscute a prova omtoldgics éa exiséncia de Deus As provis da exsténcia de Deus io so mais em parte, {do que tautelagia varias. A prova ontoldgics nfo vit lem da. inte afiamasio: “0 que eu represents realmente & utna fepresentegso ceal para mim’, stun sobre mim: ¢, nesta ditegio, tad or dewes ~ pagios ou critios — possulram uma existéncia real. O antiga Moloch nto exsrseu ums dominasio? O ‘Apolo delfco nao era uma porencia teal na vida dos grepos? Diante disse, de nada vale sem seimo 1 crides de Kant, Se algaém actedica possuir 100 tere, sc ema no € pata cle apenas umé representagio srbirira, subjetva, s¢ ele acreita nea. entéo os 100 Lulersimaginados possuem para sleo meme valor de 100 cileres sais. Por exemplo, de conta dividas em fungio dese sea daco imagindrio, 0 qual teré wma sp fsin: fot atin, deren, guttedca bumanidaae consrin dvi: comtande com v1 dese’ Esse texto € representante de uma fase em que Marx nao ¢ ainda um marerialista, nessa epoca, sua visio de mundo consiste em um pantesmo r2- dical com tsages de idealismo objetivo? No entan- to, a despeito das profundas mudangas em sua re- lexio, particularmente a ideologia como “poténcia real na vida" manteve-se ao longo de suas interven- goes. No "Preficio de 1859", em uma passagem facilmente localizavel ao longo da Onvlegia, Marx revela a funcio social das ideologias ao falar de “for- mas juridicas, pollticas, scligiosas, artisticas ou 6 loséficas, em resumo, as formas ideoldgicas pelas quais os homens romam consciéncia deste conflito € 0 condi em sua mem até 0 fim”. Posteriormente, obrs méxima, 20 analisac a atuagio da farca polii- a das nagbes curopéias na bruca tranaformagio das sociedades tribais da América colonizada, Marx conclui: “a forga é 0 partcito de toda sociedade velha que traz uma nova em suas entranhas. Ela "© que Mare diz sobre a politica pode-se ampliar como caracte- rizagao universal da ideologia: um complexo ideal mesma é uma potéacia econémica" adquite © papel ideoldgico quando se toma uma poténcia eferioamente pritica. Bo fato de que Max denomine de ‘parteiza” a forsa ideolégica & suges- tivo uma vez que a “concepsdo” est objetivamente vinewlida & dinimica econémica em si mesma Convém ressalvar que nem sempre 0 Lukes marxista apresencou essa concepgio de ideologia. Em Histéria e consciéncia de clase, bi uma cl vinculagio da categoria & “fala consciéncia’. A consciencia proletaria aparecia como a Unica capaz de superar o falseamento do real, as distorci lugicas da reificagio da coridianidade burgue: Conforme comentz Konder, de acordo com Histé- ria e conviévcia de case, "a ‘consciéncia possivel do movimento operério altrapass2, emtao, os limi- tes da perspeetiva parcial e da fiagmentariedade” !* ideo- Ao longo de sua trajetdria filoséfica, Lukics csbosa a superagéo dos seus anos de aprendizagem de Mare até a sua conclusio na Onologia. Oldrini sustenca que as polémicas na década de 1930 a propésito das vanguardas ‘esiéticas jf se baseavam em uma no: gio ontologica de arte," E Netto vé cama o primeito grande resulcado dessa nova impostagao as forrmulagées sobre a alienagio em Q jovem Hegel concluido em 1938," Por enquanto leiamos A des- iruigao da racdo, Pode-se divet que se apresenta ma ‘obra um tratamento ontol6gico da ideologia seme- Iance aos exesitos derradiros de Lukées. € 9 que indica a Jeitura que © marsista hingaro promove do ireacionalismo de Schel- ling, por exemplo: no pe- riodo maduro, a filosofia de Desea maneira, de acordo ‘com 0 sentido dado por Lukées, a conversao de: uma idéia em ideologa fica a sua Schelling serve A reagio prustiana de Guilherme IV contra 0 progresso tipificado na dialética hegeliane; Lu- kes explica que a queda de Schelling na mistica rigio- sa da resauragio rom: marca a sua maturidade e 3s transloragao.em ovadnelas qi cin se ps consoibncapritica doo | s4mento juvenil posulam conflitos postos. mantém-se fiel, desenvol- oan ves dialéticos."” Nao € outra coiea Seno uma constelagio ideal adquirindo a fun- sao cfetivamente prética de ingeréncia nos coali- tos postos (no caso, contra o racionalismo de Hegel), tornado ideologia Devesse frisar 0 cariter ontoligico de A des: truigao da rezéo para que mio se incorra no erro de Agnes Heller (da segunda fase). que simplifica a estrutura da obra a0 dizer que, para Lukes, s+ tivescem sido todos os racionaliseas marxisas ou iracionalima ado teria se devenvalvido eslancs Je porconsequéncis onazismo nto posuiria qualquer tipo de ideologia ¢ possivelmente no ceria salto Heller redus © problema ao ambito das ideas Na perspectiva de Lukes, 0 irtacionalismo foi um movimento necessirio que responde 20 perfodo de decadéncia ideolégica da burguesia, Schelling concede respostas & histé ria de seu tempo, assim como 0 fiz Hitler. Ambos sé0 compreendidos no perfodo histdrico a que pertencem (a Resauragio prussiana € 0 estigio imperialista do capital); sio conste~ lagoes ideais que possuem efetividade pritica em lutas concretamente his- téricas € apenas assim contex- tualizadas recebema sta vera? elucidagéo. Por exem- plo, K-se no livro que “toda a barbitie, todo 0 cinismo, ete, do periade hitleriano s6 podem com- preender-se e criticar-se partindo da economia, da cstrutura social, das tendéncias de deseavolvimen- to social do capitalismo monopolista™." © que A destruct dt rasio busca ressalar & que 2 anatomia de Hitler lanca nova luz sobre @ anatomia de Schelling ¢ seus continusdores, © que nio que o advento do nazismo obtenha a sua compre- ensio pelo simples recurso ao movimento das idéi- as, como a segunda Heller sugere que Lul feito." tenha ‘Ao tomar 0 complexo ideoldgico enquanto com- ponente de ums totalidade historicamente situada, o Lukécs dz maturidade consegue ainda uma nova ruptura: desia-se da ficileorrelagio entre ideologia ¢ fala consciéncia.? Uma ruptura que atinge mesmo ‘a sua obrs de aprendizado do marxismo, Hiitéria e consciéncia de clase, como vimos acima. Em uma passagem exclareccdora da Onzolegia, 0 10390 pen sador descarta essa relagio imediata: ‘A corregio ou a faldaee nao basta para fuer de uma opiniéo uma ideologia. Nem uma epinido individual comets ou ertines seqier uma hipdtese, uma teoria ieologia: podem apenas, como vimos, vir a sé Somente depois de trem se zomado veiculo tebrico ov pricico para combater conflros saciais, quais sejam. grandes ou poquenos, episddiens ou decisivos pars © destino da sociedade, ¢ que 130 ideologia” Em seguide, Lukes tras 3 baila exemplos de auténticas terias cientificas que se transformaram em ideologia, em “instrumentos de futa’ de um hic et nunc especifico. Pensemos na astronomi hliocéntrica de Galileu ou na biologia evolucionista de Darwin, diria Lakées, Novos Ramos @) Ano 22 + w47 + 2007 Esse € um dos golpes contia a vulgerizagio de Marx, um dos prin- cipals vos da Onelogia. A redugao da ideologia 2 mera falsa consciéncia € 0 movimento caracteristico de Althusser: “2 ideologia representa a adividuos com as suas condigoes reais de exis- relagio imagindria dos tncia’ "ex realizagio material se rmanifestaria nos aparelhos ideolégi- cos do Estado. Sob a perspectiva ex truturalista de Alchusser, néo seria Cates Ow possivel de entender como Galileu € Darwin se tornaram yeiculos para a resolusio de conflitos sécio-histéricos sendo que, a0 contritio, estivessem longs de ser “relagies imagindrias” A leicura que Lukées promove de Marx esc isenta desses reducionismos. Anotemos uma outta vez que 2 dimensio material ¢ a eafera a discerair se uma constelagio ideal ¢ ou nao ideologia. Nao std inscrito nas idéias 0 seu cariter ideoldgico, sejam “Talsa consciéncia™ ou nio; isso diz respeito 2 sua atuacio nos embates de uma determinada particularidade hiswrica. Decididamente, a conquis. ta do espago possula a funcao idcolégica na época da guerra fria entre a URSS os Estados Unidos: atualmente, pode restringir-se 8 apropriagio da na- valesé paraese tipo de ideologis. A exéacia econémica gersl de ums sociedade aio engendrs nunca rodasas formas fenoménicss conctetas de sua existéncia e de seu desenvolvimento com um determinismo Uunilaceral © unisoca ~ em reemos pueden logos, preudosicnlices ~ dirtamente da pesquisa de tal sséncia”? A ser acrescido posterior mente: “0 lado problematico de sua formu- lacko é somente que ele (Engeli] en- frenta aqui a questao da ideologia uni- lateralmente do ponto de vista cieniifico-gnosioligico € nao onvolégico-pritico’.* Em face dos equivocos engelsianos, Lukécs recorre A Marx para fazer notar que a critica gnosioligica nao é suficiente para com- preender a posigéo das for mas idcoldgicas na vida co- Toda a berbirie, tidiana de uma decerminada particularidade historia todo cirismo, etc., Lukics aludea um momen- iodo hitteriano ‘ode O capital em que Marx ee chamaa atencio paraascon- | 86 podem compreender-se tradigées entre as formas ener aeanes correntes do pensamento.co- tidiano € © materialismo es pontinea com o qual os ho- da economia, da tureza, a0 recuo das barreiras natursis sem que ne estrutura social, das cessariamente decorra dai a sua metamorfose em "ENS Portam-se em sua ideologia cotidianidade: tendéncas de [As mediagScs das forms desenvolvimento socal AA woria mais complexs no campo, por exemplo, da i Aeicr midletta ML, b's perhl CoA Gea, iracionasem que aparece do capitalismo ieologia pelammesma casio que nfo ocrao agrupamicnro epee eee : imediato ds petras adequadas 20 aflamento por parte leterminadas lage sce monopolista. i Kece pastes sémicas nfo preosupar os | Em decorvéncia, com a recusa em asociar ime- diatamente a ideologia & falsa consciéncia, Lukécs formula que a oritice gnesiolégica & limicante & au- tentica abordagem teérica do complexo ideol6gi- co. E essa adverténcia fere mesmo a Engels. Ao analisar as formas primitivas de consciéncia social, Engels adotou o ponto de visa gnosiolégica, como embra Lukics em uma das passagens mais censas da Ontologie: Engels definiu, com grande rodera, 0 conteide das ideologias rascdas desta maneira enquanto “estupider primitive’, negando que para fendmenos de tal expécie rubesse procurar as causas esondmicas, Mas iso nfo agentes pritis desis rel Bes em seus negicion tstands acorumados a se mover no misio delat, sus ineligéncianelas nzové problema algumn. Parades ums «ontraigo perfeits nada tem de misterioso, Sentemse 2 vontade, como peixe ma sgua, em meio as forma: fenoménicasalheadas da contertura interna, dbsurdas se corsiderads joladamente, Aplic-se agai o que Hegel sobre eras formulas matemdtieax: 0 que o bore senso considers iacional £ tacional, « 0 que achs raclonal é » prépra iroionslidede.” Consideradas isoladamente, determinadas for mas ideoldgicas so “absurdas” contexto histérico, adquitem explicaczo racional Talver Engels teria considerad “estupides” a con porém, em seu RoR +47 + 1007 @ Noves Ramos Consideradas tradiggo que Marx encontrou ao partir de uma au- téntica ontologia da vida cotidiana A referéncia is sociedades primitivas & impor- tante e deve ser retida, Lukes encontrard nelas os gérmens do complexo da ideologia, Ainda cue os principals problemas brorem dos antagonismmos de classes, certos tipos de producto ideolégica remon- tam aos primérdios da histétia, As pincuras rupestees sio os modelos de produtos ideolégicos de alto va- los, com os quais Lukécs exemplifice o surgimento inicial das caregorias ideol6gicas."* A sua Fitética demonstrari isso com maior evidencia, legando uma po- sigo de descaque as arces rupesties no processo de di- ferenciacao da legalidade estética, Ademais, Lukas no pe em chivida o fato de que a eolisio entre individuo € sociedade reve lugar jé nos perfodos iniciais da hu- manizagéo do homem ~ colisio que implica a sua resolugao pelo complexo ideoldgico. Como diz 0 nos- 40 filgsof0, mesmo que scia impossivel para a ciéncia reproduzir com exatidio as ctapas primitivas, seria um preconceito metafisico considerar que as normas generalizadas de conduca especifeas daguela época fossem idén ticas em todos os exemplares singulares. DeTeRMINAGOES DAS FORMAS IDeoLecicas A mengio aos costumes da tradigao primitiva faz a Ontologia caminhar tumo ao entendimento de determinadas formas particulates da ideologia que deles nasceram, A primeira a surgir no corpo do texto ¢ 2 esfera do direito, Segundo Lukdcs, quando 6 avango das Forgas produtivas ampliou 0 “raio de agdo € de imporrincia® dos costumes ¢ usos das sociedades primitivas, as tais normas de conduta terminaram por ceder espaso para a formayio de “esferas ideolbgicas expectficas (antes de tudo 0 di- reito) para satifaser essas necessidades da rotalids de social”? Essas novas necessidades criam © imperativo da regulagio juridica. A idevlegia alem diz que ‘a diviséo do trabalho 6 se converte em verdadeira divisio a partir do momento em que s¢ separam 0 teabalho Fisico © o intelectual”. Vimos com as observagdes lukacsianas que nem todo trabalho in- telectual € ideologia. Como bem recorda Lukics, fo resultado de qualquer trabalho intelectual pode em decerminadas Suagle sacias transforear-ee em deologia, € diet, a dvisto social do uabalbo eagendra continuamentestuigies em que eta pasagem se ‘oma neeessiria © permanente.” Isso € 0 que ocorre com a esfera juridica: a partir de um certo estigio de evolugio do ser so- ial, 4 produgao material nao posleriz expandir-se sem “a regulagao juridica da «roca, do contrato. etc, para cuja realizagdo se rorna [-«] necessdrio uum grupo de homens que viva desta atividade”. A situacio sScio-histérice que produz a neces- sidade do diteito ¢ o advento das classes ancagdnicas ~ especificamente a esctavidio, de acordo com a Ontologid, Nas sociedades divididas em classes opos- tas, ap lado das normas culeurais, a reproducio s0- cial requer uum forma de regulamentacio qualitaivamente distinc, acarge de um corpo de jurist, advogados, arcerciros, polisiais, milicares, ec, que controlam a vida social segundo os interesses da classe dominant ¢ panem pela forga as violates desas reprs.* Para Lukacs, 0 direito € sempre um “direito de classe’. Nesse sentido, as investigagSes de Luledcs coincidem com aquelas de Engels. Em_A origem da familia: da propriedade privada e da Fstads, Engels descreye © poder da tradigao nas comunidades pri- mitivas: “todas as querelas, todos os conflitos sio dicimidos pela coletividade a que concernem, pela gens ou pelz tribo, ou ainda pelas gens entre si”. A wansformasio qualitative wratida pela excravidio determina 0 nascimento da esfera legal: uma socie- dade escravocrata io podia subsist enio sob o dominio de um cerceto poder que: sitaado aparentemente por cima das clases cm luta, suprimisse os conflices aberios destas e 56 permivsse alu decasses no campo eccnémico, numa ferma dita legal” Trata-se da génese do poder coercitivo do Esta- do (que posiui como um de seus momentos a este- ra da jurisdisio). Novor Rumor @ Ane 22 + we 47 » 2007 Nos fecundas resultados de A rev via geval do diveite € 0 marxisms, Pasukanis vai ainda mais longe e afi- ma queo direito apenas assume a “for ma acabada’ na sociedade barguest: “as relagdes dos produtores de mer- cadorias entre si engendram a mais deservolvida, universal e acabada me- diag juurfdiea”.© FE um movimento que responde as questdes postas pela produgio material, pela toca de mer. cadorias no mercado, pela defesa po- sitiva (‘nio natural”) da propriedade privada: “assim como a riqueza da s0- ciedade capitalista tem a forma de uma enorme acumulagao de merci- dorias, a sociedade, em seu conjumo, apresenta-se como uma cadeia inintermupta de relacées juridi- cas”. Com a teificagio de extigio monopolista do capital, a barocratizagio juridica da vida cotidiana tiva da classe dominance, numa ex- pressio, todavia, maximamente generalizance, a0 limie da sociabi- lizagio concreta aleangada’ * Weber constarou o fendmeno di sistematizagio do diteito sem, no en- tanto, capturar 0 seu conretide his torico: Para 9 nosso atual modo de pensar, [a sistematizagio} significa 0 inter-rela ro de todas disposigdesjudicas cbiidss mediante aanilise,de tl modo que formem entte si um sistema de regras Iogicamente caro, internamente conssente «6, sabreiudo, em principio, sem lacunas Um sistema, portanto, que busea 2 possibilidade de subsumir logcamente 2 uma de suas normas todas as onstage de fats imagindves, porque, a0 contri, 1 ordem baseada nests normas careceria de gerantla tende 3 expandir-se quantitativa e qualitativamen- juvidica“ te. Além do que, Pasukanis consaa um dado rele vante para a teorinacdo do direiro vigente nas rela- Embora nfo determine 0 seu carduer de classe, ses atuais 0 socidlogo diz. com razio que o direito forma um sistema comsistente c, por 1egra, sem lacunas. @— Lukics costumava exprimir 0 cardter classista des proleiris mnge come alguéen qe depse du:aua forge apenas na sociedade burgues caitaisa, ex a sa sistematizagio com uma citagio de Anatole de trabalho como mercaderia, que. relagfo econdmicsz France contida no romance da exploracio € jusiicamente mediatizadn ob a forma © fin vermelhor ela ext te _—— ferida em meio 3s suas par- eas anoeagées sobre a ética Pela primeira vex na historia, temos um contra Bseaenoves to jurtdico a intermediar wma relacto de exploracée —* Iei profbe com a mesma nie br lacs engin imajestade que tanto pobre necessidades criam 0 quanto o rico durmam ex Para Lukics, a peculiaridade de dircio esd na fae poke Bink imporativo da regulagao sua forma de solucionar os conficos socialmente ova univer, que sub | _juribloa A ae postos. Cabe & esferajuridiea abarearsistematica NOV MMUSIMY ad eed mente aos single, agapendo-as em ume sii” gue diz que ‘adivisdo do norma univeral, A medida que os confit adqui Templo dicots cla ecm "et SUS determinacs taba sb secamerte em ‘ de classe, abserato em sua formalidadeligica, Segundo Lukics, serdacaiia Ghiséo a partir casa sistematizasio légica 6 estabelecida Cabe agora reter uma das deficiencias da Onto- do momento|em que se io pela objtividad socal propriamenre di, mas pelo Logie. © elo. mais fraco da separam o trabelho fisico © teoria lukacsiana sobre a Se eS’ nade ame sendo a polftica. Coutinho Conforme Vaisman, o direito € u esti coma razdo quando lem- bra que “no ha na Ontologia (como, de resto, em toda obra marxista de Lukécs) um tratamento av eo a servign da resolusio de pro blemas (num ample niido), “a partir da perspec Avo 22 + H'47 + 2007 @Novor Runes tonomo satisfatsrio da especificidade da politica enquanto esfera do ser social”. Esse atamento pouco satsfatério comesa com Lukécs corroborando com a afirmativa de que “tudo politica’. cuja aucoria & de Gorttied Keller! Em outro extudo, Lukics ita 0 testemunho do reaista aleméo por extenso: hoje ude ¢ politi e dla depend, do couro que sola moss sapatos 20 azuleo superior no clhados ss farnagas que flutuam por cima ca laeirs sin polities, suspen= dendo-se em auveas perigosas sobre ar cabanas © of palicos, vagueando por ence chads ¢ alde'as.* A concordancia com Keller serve para que o rmarxista hiingato credice & politica uma wnitersali- dade em mio is Formas de objetivagio do ser socal politica ¢ um complexe waiver da totalidede social, todavia percencente 4 pritis ¢ exatamence & prixis imediata, uma vex que néo pode ter uma uriverslidade ‘pontine eperntanenie similar, digas Alingungem:” Esse cariter universal que Lukécs attibui & po- Iicica the diftculea 2 determinagéo rigorosa da cate- goria: “conceder uma definigao, isto é, fixar conceitualmente ne plano formal os confins de onde a politica provém e onde termina, € impossive”.* ‘A bem dizer, hé uma série de problemas por tds dessas quest6es inicialmente levantadas, De Pronto, a fizagao conceitual da politica é obstada justamente porque Lukics impute-the uma universali- dade inevistente se conside- ramos a totalidade exensi- va da histéria humana Lessa & muito preciso a0 corrigir 2 teorizagao hukac- sanz: “a0 caracterizar a po- ligca como uma prix ‘uni- versal’ ¢ tendo como objeto as questdes que dizem res- peito ao destino da socieda- de como um todo, Likics deixow escapar um fato decisivo’. Esse fito é efetivamente a delimitacao rigorosa que esté ausente da Ontologie: “refiro-me a que a esséncia da politica diz respeito, de modo direto, 3s atividades socizis voltadas 4 reproduio de dominagio do homem pelo homem”.? Em ou- tras palavras, a politica é em verdade uma ebjetivicao daterminada pelas sociedades divididas em clases tl categoria responde a questées colocadas pelo ad- vento da divisdo classista das sociedades, da domi- nacao do homem pelo homem. A circunscrigao his- térica da politica ao perfodo dos antagonismos de classes jé poe em xeque aquela universalidade conferida por Lukédcs. A idéia que Marx possats da privis politica te presentava justamente a sua limitagio as socieda- des de classe. Recorramos a um autor que nao pode ser acusado de nao conhecer a Ontologia de Lukics, As investigagies de Chasin autenticam a tese de que, para Marx, a politica estd historicamente res- Uta 8s sociedaces de classe (nzo sendo asim uni- versalmente pertencente 2 todo modo de produgio « reproduydo do ser social). Argumenta Chasin que 4 teoria marxiana procura uma decerminasdo onte- negative da polticdade: ‘Tratndo-sede umaconfiguracio de natures ontoligica ‘opropssitoesencil dessa ori [mariana] éidentificar ‘o carder da polite, esclarecer sua origem e configurar sua peculiaridade na constelagio dos predicados do ser sucial. Donde. & onto-negetsa, precisamente, porque excl o aeriburo da polica da csncia do ser social 6 ‘oadmitindo como extrinseco e contingente 20 mesmo, isto €, ma condigao de historicamente cicunstancial, ‘uma expresso mas enfiica.enquanto predicado pico do sr cial, apenas juseamiente na partiularidade do longo curso de sua pre-nstéra. A politica restringe-se entio & pré-hivtéris do ser social. Chasin ainda acrescenta que, segundo Marx, a politica ea propriedade privada so “sia- mesas, no vivendo uma sem a outra, do mesmo modo que sé podem morrer como vive, juntas”.”) ‘Tomemos 3 mio 0 texto marxiano. Um grande documento de caracterizagio da politica feita por Marx é 0 Manifesto do partide comunista. Nele, po- demos encontrar uma teora erftica do polftice. possivel de ler nas paginas do Manifesto que a poli- tica € uma objetivacio do ser social especificamen- te dividido em clas Ac diferencas de classes ums ver desaparecia no cura do desenvolvimento, wda « produgio cxtande soncen- tradi nas mies dos individaos associados, o poder piblico perde entio seu cariter polltien. © poder politico proprismente dio é pote organi de urna chsse par a opressio de uma outa. Marx ¢ Engels evidenciam: a politica & deter- minada pele existencia das classes © néo subsiste Novos Romos @J Avo 22 + 147 + 2007 a Ee de sem elas, Torna-se explicito assim 0 que Chasin no. meou scima de exciusia da politice dos predicado: essenciais do ser social, Vale cessalear que nem toda a caracterizagio da categoria presente no Manifesto scja correta, O certo esti marcado por uma nogi simplificadora das lutas politicas na sociedade bur- guess! peculiar de nossa época, da época burgues de er implifeadn os antagoniamosdeclasse. A saciedade intdiwcinde-te cada ver mait-eo dois vstot campos inimigos, em duas grandes clases que se confront slrccamente: : burguesiz € o proleraiado.™ Por certo, embora a colisio antagonica en:te trabalhadores ¢ capitalistas persista em seu protag dade ao longo da histéria — fito negligenciado pelo nnismo, 2 luta politica ganhou em complesi- Manifesto. Porém, quanto a delimitagao histérica da politica & pré-hiseéria do homem, o texto de 1848 acerta em seu alvo, Para Lessa, a crenca de Lukacs na efetiva con: solidagio do socialism na Unio Soviteica deter minou as suas anilises acerca da politica. A pro- posta da extingio da esfera da politica (e do Estado) ‘entraria em conflito com sua concepc2o segundo a qual 2 Unio Sovietica seria um sacialismo defor- mado, no qual as tarefas econdmicas de cransigao estariam efetivadas, faltando apenas a transigio po~ Iitice”,"* Certamente, Lukiics manteve-se convicto até 0 tiltimo momento de que a Uniio Soviética vivenciava um perfodo de efetiva cransigao socia- lista. Entreranto, nao di famos como Lessa que este equiveco renha condicionado a teorizacao da Ontologia sobre a politica. Se assim 0 fosse, por conseqiléncia, Lukécs teria que dizer o mesmo so b to da politica nos paises do socialismo real. Apesat direito. Havia tanto a esfera do direito quan- disso, Lukics no hesitou em determinar a esfera do dircito como pertencente apenas as sociedades divididas em classes. A crenga na Uniio Sovietica nfo ofuscou as teses lukacsianas a propésito do di reito, Na Critica ao programa de Gotha, Marx diz 1m toda clareta que o dircito pecsistird nos exté gis de tansigao; mas também o afitma a sespeito da polltica (que assumi mente nova com a ditadura do prolerariadc). Se Lukécs, seguindo a linha marviana, tivesse consi 2 uma FeisSo qualitativa derado a politica como objetivagio do ser social cindido. em classes, 0 pensador hiingaro. no seria incoerente com a conwviegio de que as relacdes so- jalistas vigorariam no Leste europeu, haja vista que ld estaria sendo praticada uma “politica” que produziria a furura extingio de si mesma. Ademais, Carlos Nelton Coutinho chama 4 atengao para um outro ponto fraco da teoria polit ca da Ontologie lukies acentua excesivamente o carter individual do sujeito politico, romando modelo a personalidade de nin (de modo bastante Segundo Mam, sndlogo, ais. Squele com P que Hegel watos Napo- inh aii lean) privada sao ‘siamesas, Como se sabe, Hegel nao vivendo umasem a considerava Napoleao en- quanto um individu hist ‘ico-mandial, isto & quem permite a passagem de um | cstigio pars outro do desen volvimento do espirie, cuja gio produr o acesso do espirito a uma nova. etepa de evolugao. Segundo Coutinho, o estatuto de pol tico modelar que Lénin adquire nas teorias de sukdcs di margem a essa paridade: Napoledo estd para Hegel assim como Lénin esta para Lukées. O Ano 22 + wi 47 + 2007 Novos Rumor outra, do mesmomodo que 36 podem morrer como transtormagées. revolucionatio russo seria um individuo hiseérico-mundial: aquele que permice a passagem de um estigio a outro do dé senvolvimento histérico. Em nossa opi nigo, a texe de Coutinho explicatia por- que em sua luta a favor do renascimento do marxismo diante dos escombros da cra stalinista, Lukécs argumentava que Suma das queitées mais importantes ¢ 0 retorno a um tipo de revoluciondrio que Lénin representa’. A personalidade de Lénia aparece assim como a solugio em face das deformacSes da burocracia stalinista, Apesar de suas limiarées, isso nao significa que Lukées nio tenha obtido grandes avangos para a dialética materialista no estudo da praxis politica. Por exemplo, Lukes acerta no instante em que afir- ma que a efcicia imediata de uma agae nao determi- na o cen cardter epecificamente politico. Sob este as- pecce, vale come critétio a duragae: Quando recoreetor 1 dusagie nde pedaendemon cbviamente alucit « um iatervile do tempo absiato, eteemindvel em termos quantitativos, mas & questo 4, prescindindo ds eonsciénsia que se tenhs dels, 0s ovat mavimentoe cause poreoe em movimento com a posigio rcleoldgica inckdem sobre ay tendéncian ccondmicas determimantes que envearam em crise.” Em outras palaveas, a politica & tanto mais efi a2 quando, por meio do fenoménico, atinge a es- séncia das lutas histéricas em jogos quando modifi- ca “o mundo fenoménico onde se desdobra o conflico, movimentando as alternativas postas pela er cssencialidade socal evisan- apenas 0 do, 20 mesmo tempo, a eta iodas transformaso da prdpria es Rie eters Quanco a durabilidade produ fatalments as da acio politica, hd certa- mente um grau de incerte- an as posicoes teleol6gicas secundérias ataam sobre as posigdes de outros homens ( nio sobre as causaidedes naturais, como ocorre com as posigdes primarias). Os desdobramentos adquitem envio um coeficiente de incerters, dada a diversidade de receps6es possiveis, que nav pode ser determinado a priori. De qualquer modo, lem- Tats felon Cou bra Lukics, “esa diversidade entrecanto niio rolhe 3 validade da base ontolégica comum ora relatada: a necessidade [da political de incidir sobre o ser’.”” Por isso Lukes concede uma importincia Vital a0 jator subjetivo, Ainda que, como vimos com Coutinho, 0 fildsof hiinga- ro eleve a personalidade de Lénin a um estaruto mitolégico, iso nfo modifi exatiddo de sua caracterizagao teéricanes- te especifico momento: end a cargo da subjetividade a descoberta des tendencias reais, a excolba eficas entre as altemetivas posta para (que este grau de incerta soja rebaivado. As grandes épocas revolucionarias apresentam-se aos olhos de Lukées como 0 exemplo de que “o ser social nfo se transforma simplesmente, mas vem & ser transfor: mado”. Quer dizer que apenas 0 desenvolvimento das forgas produtivas nfo produ fatalmente as tans- formagoes. O desenvolvimento exondmico pade criar situaghes objerivamente revoluciondrias, mas ‘no produz ao mesmo tempo ¢ obrigaroriam fator subjetivo que nos fatos ¢ na pritica é decerminante. Além dessas formas de ideologia que estio vin culadas diretamente as lutas classstas, Lukes en- contra outras duas formas caja denominsgio rece bida € ideologias pura, Sao elas.aflsofia ea arte. A posigao acupada por essas formas do complexo ideoldgico € de todo distin: 0 valor maximo [da arte e da filesfial consiste ‘eatamente aia elevasao do ser humano do hemem, formando nele roves drgaes pars compreender demodo mais rca e mais profundoa ceaidade, erornando 2 sua individualidade atravédesseensiquecimento, an mesmo tempo mais individual e mats genérica Quanto 4 Filosofia, Lukes € muito claro a0 afirmar que 9 seus momentos mais elevados esto cm Aristoteles, Hegel ¢ Mars.® Aqui se tm as ten- cativas de se entender 0 ser social de modo jantais intentedo, E aan, em seu urno, concede ap homem 2 antoconsciencia. Eo instante em que’ 9 homem é posto em contaro com 0 destino de sia prépria es pécie, tipificado nas grandes obras estéticas, de Homero a Thomas Mana. Nesee sentido, a arte significa uma conquista da objetividade social de uma mancira muito peculiar; € uma aquisigao a Novos Runoe @ Ano 22 +n 47 + 2007 respeito das vivencias concretas desse coletivo que forma a humanidade: A conquista da reaidade objetva, iris veves exposta como fundamenta imprescindivel de ods arte, + infinidade incensiva do conteddo, « criica da vida, & univeralidade do estético, que se evela a0 plualismo das artes e das obras, todos esses momentos si0 camninhos acé uma tl autoconsciéncia da humanidsde, © mundo, mudo em si para os heamens, € a pidprin muder do homem ante o musde € ance si mesmo s¢ discolver com etsa auraconiciéncia em uma nova ‘apacidide de expresso. Ext auroconscigncin sbirca todas as alegrias e todos os soffimestos que 0 homem pode experimencar e viver ante © mundo, ¢ atva nas obras aguels vor que eleva ctsa mudes expreifica & Tinguagem aucoconsccote €‘rccule eam cle Em suma, a arte e a filosofia abarcam ques- tGes que se aproximam da generalidade © se afas tam da mera singularidade, Certamence, elas dao conts do singular, mas néo © fizem romando-o em sua imediaticidade cotidiana; ambas elevam 0 sin- gular 2 esfera da particularidade concreta, a0 ex pressar cada uma a sua maneira os problemas concernentes a uma toralidade intensiva do devir histérico do homem, A GUISA DE CONCLUSAG? AS GIENGIAS Bocas © Oo MARKIEMO Sob 0 pretexto de concluirmos, cabe estrucurar © modo pelo qual 0 pensamento social abarca as questes que envolvem a ideologia Em seu tempo, as ciéncias burguesas operam geralmente com 2 separacio rigida entre ciéncia ¢ ‘deologia, Trata-se de um procedimente de eviden te Tango positivista, As ciéncias sociais nascem smareadas a ferro e fogo por esta rigides meraffsca 4 cigncia cabe 0 que ¢, a0 passo que © dever ser esté a cango da ideologia (da “arte”, segundo Durkheim, ou das “reccitas normativas”, segundo Weber). Dai 4 fantasia do apartamento das pré-nogdes ¢ da neu- tralidade axiolégica. No conhecido ensaio sobre A ‘objerividade” do conbecimento na ciéncia social e na ciéncia paltica, Wieber estahelece que “jamais pode set tarcfe de uma cigncia empirica proporcionar normas ¢ ideais obrigatérios, dos quais se posse devivar ‘receitas’ para a pritica”® Embora nao posse ser considerado um positivista clisico, Weber nao age de modo diverso de Durkheim: para 0 socidlo- g0 fiancés, 0 mécodo cientifico difere-se da arte por “aplicar-se a um certo objeco em vista de conhesé.lo sem nenhums preocuparao utili A Sociologia liberta-se assim da obrigagao de inge- réncia ma lua de clases, encasulando-se na putea do formalismo vaio, A economia politica vulgar também se viu conduzida a utilizar tal artficio, caindo as vezes no positivismo grosseizo, Com o surgimento do novo sujeito revoluciondtio, soz 0 “dobre de finados” da cigncia burguesa: “0s pesquisadores desinteresss dos foram substituidos por espadachins merceni- rios, a investigagéo cientifica imparcial cedeu sea lugar 4 conscigneia deformada € as incengbes per- versas dz apologética”** A perigosa teoria do valor- trabalho, tio cara aos economistas dlissicos, € ter- minantemente excluida, Lembrem-se de que uma des figuras candnicas da escola marginalisa, Stanley Jevons, afirma que 4 conclusio a que estou chegando, cada ver mair claramente,¢ 2 de que a nica esperanga de angie um veidadeiro sistema de Economia é deiar de lado, ce tuma vex por todas. as suposig6es confusase absurdas da Ercole riardiana.®™ Waleas caminha na mesma ditegio: em sua obra, cle enderega criticas aos fisiocratas c, espe- cialmente, & economia politica inglesa no tocante & teoria do valor A propésico do valor-trabalho de Smith, Waltas declara, substituindo-a por um su- perficial urilicarismo: "a teoria que pie origem do valor no trabalho € menos uma teoria muito es- treita que uma teoria completamente vazia, menos uma afiimagio inexara que uma afirmagio gratui- ta’. Como diriam Marx ¢ Engels, os marginalistas esbofetciam-se com a realidade”; mas 0 fazem em nome da ciéncia, entendida ndo como a veraz apreensio do movimento histbrico, sengo enquan- to a castidade positivista da neutralidade axiolégica: Aare “aconselha, prescreve, dge” porque tem como objeto os fatos que tém sua o: cicio da vontade humana e, sendo 2 vontade hums- 1a, pelo menos até certo ponto, uma forca clarivi- deme € livre, cabe aconselhd-la, prescrever-Ihe tal ‘ow qual condura dirigi-la. A ciéncia “observa, ex ée, explica” porque tem como objeto facos que tém sua origem no jogo das forgas da Natureza e, sendo as Forgas da Naturcza cogas « fatais, nio hi outra coisa a fazer com elas além de observé-las ¢ explicar seus efeitos. boo 22 + 47 + 2007 @Nows Runos Hé em Manxum vinciulo Indissoluvel ao : ‘Movimento operdrio; a dialética materialista rolvindica desde sua génese 0 esiatuto de ‘Oeciogia proletaria. Como dissemos, as cigncias decadentes (socio- logia ou economia vulgar) buscam @ pureza da ‘ientificidade positivisa. Ea expressio da “rigida contraposicao meratisica entre ideologia (subje vva) ¢ pura objetividade enquanto principio exclusi vo da ciéncia’.” A ideologia aparece aqui na forma de desvins subjetives Todavia, 10 contrério do que pretende a apologetica vulgar o carater deoligico é marca- damente atuante nas ciéncias scat. Tado porque 4 base onrologica de cada cigacia da sociedade & aida de posisdes teleologicas que almejam provocar fasSes aa conssidacia dos homens; ern asas posigdesrelcoldgics furuns. Iso i denota a preseng, ‘eli na génese. se)2 no agit de um elemento ideol6gico inelimindvs © fato de situarem-se no Ambito das posipter telco. | legicus secundirias fax. com que a ideologia esceja inex. tricavelmente no seio das Giéncias sociais, Isso nao quer dizer que a8 ciéncias sociais nao sejam capazes de atingir a resulra- dos verdadeiramente efica- zzs, Na Ontologia, Lukies no descacta as possibilida- des contidas nas. pesquisas das ciéncias particulares, como aparents rejcitar em A destrvigdo de vaso — que se recordle a admiragio do tlkimo Lukics pelos trabalhos de um socidlogo como Weight Mills, Na- quele texto, © Fldiofo hiingaro excreve que adlvisto social do trabalho faz naseer em ttmos sempre ‘mais difererciades, ciznciae iveta: para poder dominar sespeciice do se: socal de mesmo modo que ¢possre] ddominar o intercambio orginico com a natuteza por meio das citncias natarsis.™ Entretanto, permanece 0 caréter ontoldgico universal das ciéncias da sociedade: seria mera ila- sio pensar que os resultados objecivamente cient ficos dessas teorias excluem os seus momentos ideo- ligicos.* A situagio do marxismo em face desses proble- ‘mas € peculiar: Sobre ela, eis 0 que a Ontolagia dia: “o maraismo [..] nunea escondeu a sua génese € 4 sua fungan ideologi ler freqitentemente gia do proletario’. Hi em Mare um vinculo indissolivel a0 movimento operiri nos seus clissicos pode-se je ca € com efeito, « ideolo- # dialécica materialista reivindica desde sua géneie 0 estaruto de ideolo; cexclui em hipétesealguma a auténtica cientificidade de suas tetes. Lukécs fiz constat qué * marxismo pretende sempre, em todos os seus discursos tedri- proletitia, Por outro lado, isso nio 0s, historicas € de critica social, ser cientifico” A contraposigzo posit cia inexiste em Marx. Mesmo em uma obra que ‘utiora foi identificada com a “fase cientifica’ de Marx, em coniraste com sua “fase ideolégics” ini cial, podemos ler que a vor a partir da qual se ouve a critica ao capital "6 pode ser-a de classe cuja missdo histérica € derrubar © modo de produgio capitalisia e abolir, finalmente, radas as classes: 9 proletirio’, a entte ideologia e cién- Desde 1923, Lukaes reconhecia 0 caréter pate ticular do marxismo. De fato, segundo Lukics, a ciemificidade de Marx depende mesmo de seu vin- culo ao proletitio. Somente 2 partir do ponto de vista das classes operdrias pode-se cer a perspectiva da rotalidade ~ categoria que determina 2 apreen- so da realidade concreta em suas contradigoes Fun- damentais Com a perspectiva da classe do proletariado, enconira-se um ponto de vista a partir do qual a totalidade da sociedade torna-se visivel. Com 0 advento do materialismo histirico surge, 20 mes- mo tempo, a doutrina “das condigées da liberiagio do proletariado” € a douttina da realidade toral do desenvolvimento hiseérico, Dai provém a superioridsde do marxismo frente as ciéncias burguesas, Lukics qualifica a dialética materilista como “ciéncia de tipo superior” prec: samente porque cabe a ela a apreensao da toralida- de contraditéria das relagées eapicalistas, 0 que no € mais possivel 2 ideologia burguesa, Vale fisar que, conforme Netto, esta avalisgio lukacsiana nao ¢ fruco de uma simples opgao subjecives 2 verifleagio dy aupetioridade do marcismo aio ¢ ‘eenhuuma premissa, mas deriva de um meticuloso tudo ‘9 decorrer do qual Lukécs comprova a incapacidade dd refleio burpues para elacidar ox problems decisivos dda sociedade capitals.” Novos Ramos @) Ano 22 © w 47 + 2007 Com 0 marxismo, Lukécs encontea 9 métode justo de explicacio das relagées sociais, apés ter passado. pelo ncokantisme ¢ hegelianismo em sua trajetéria tebrica; a prioridade do ser sobre @ cons- ciéncia do ser, cuja unidade perfaz uma coralidade ‘entre diversos que se contradizem em seu movi- mento processual, aparecia para Lulics como 2 propria expressao ideal da dialética imanente a0 ser. € no como apenas outro “tipo ideal”, outta conscrucio légica com que nos brinda a ilosofia de tempos em tempos. Notas, Karl Mars, 0 capita, Lior I (Ri de Janeiro: Civica Brasilia, 2002), p. 578 ‘Georg Laie, "As bases ontalogite do pestamence « de acvidae do homer’, em Tema de Coit Harare 2 4 ‘Sto Paulo, Livia EdivoradeCigncias Humanas 178.9. > BsterVaisan, "A ideolgia sua determiracio onli” ern Ena, n* especial, Sio Pail: Fnaio, 1989. pp. 413-414. Geng Lukécs, “As bases oncoligieas do, pensamenco « da ativiace do homem ip. 9. Georg Lakes, — Fer Fon (Roma: Russi 1981), p. 46. € On ia delle soca, vo. dos em Crannii poder notar arma clan inflagnci do marisa lalano nes sogtolukacsana de kologin ‘Seago Lesa, “Luks: creic politic’, em Sérgio Lessa & “Maria Orlnda Pinas (orgs), Luhie es amatidededomaresmo (Séo Paulo: Boiterpo Faivonal, 2002), p. 108 © Kal Mars, Difrrsa entree flioademovriana yepiesret dela natarace (Meio: Fondo de Cutan Economic, 1987) po. Georg Lukics, Lejeune Mane —son volition philsphigue de 18402 1844 (Dai: Lex Edom: dels Passion, 2002).p. 28, Karl Mar, Conribuae paracrities da economia posica a0 Paulo: Nova Culearl, (999), p. 32. Karl Man, O capa Lit cp. 864. Leandro Kander, quite de devo Sto Palo: Companhia dos Levan, 2002), p63. "Guido Oldeni,"Em busca ds aes da omtoogla (marta) ddeLakscs em Séigio Lesa & Matia Olanda Pinas orgs. Lakies 4 atuaidade do marion cic. 2 4 Joné Paulo Neto, “G.Lakdcrum exis maps eerie”, em Sergio Lass & Mara Orlanda Pina (ong), Ladd’ ea aruaidade do marsismo cit, 89. 1 Georg Luks, Fl aul ale rain Barclona/México: Ediciones Grijlbo. 1958), p. 155, 1 Agnes Helles *Lukdc' Later Philosophy", cen Agaes Heller (org). Lakaes Reapprated (New York: Columbia Univesity Pres, 1983), p. 186 Georg Lutes. Flat la racin. cit p. 59, Puagye niohsia divides, ocarkerontoligico de A detripo de razio ‘ala 108 olhes quando Lulics critics a petensa ‘objetivdae de Dithey:"purs urn metodo tealments objetivo {ainda qu sea 6 do ideaismo objesve), &evidente que 2 ‘uxegris, pelo menos em ses Set em i estho conidas ma relidade je, imstando-se outa cognonent deere las" (Georg Lud, Ease a la razbn, cp 347). ara Lukics a fala consciéncia¢ um momenco da ideologi, ‘mas aio €0tnic: a determinardooaroldyia da Weologiaé ‘mutta mais amplad que ita consiéncia, Georg Luks, Per Fomolegia delesere scale, vol 1 cits pp. 440-449, Louis Alster, Idelopa e apaelhsideolgos do Estado ishos: Edcorial Presenca, 1974), p. 77. (Gary Lukes, Per lontdgie del eer seca, va Ut pp. 341542, Tid, p. 460. Bids p46 Karl Marx, O Capita. Lio Ul, vol 6 (Rio de Janci: CGivitagao Beale, 1980), p. 894, Georn Lukdcs, Per Foncologie deltesere scale, vel UN city p49, 7 Hid, p 456 Ibid, p. 468. Karl Mars & Fieich Engel, Lelia alemana(Moncei- de: Béicinre Puchloe Unider Barcelana: Ediones Geilo, 1972), pe 32. Georg Lukics, Per Homolog dellesee setae, wl. My cits a7. Tide Strgio Les, “Luldes disco epoca’ ip. 115. oid, p13, Fodrich Engels A origam da feliz do Estado eda propriedade prinads (Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. 2000), p. 106, id, 9. 190 Eugeny Pasokanis, A tori eral do direto eo merismo (Rio de Janeiro: Resovar, 1989) p 9. Bhidy $5. To, 9. 10. “0 escravo ¢ totalmente subordinido a0 seu senhor © & precsamente po est rare que esta relacio de exploracionio pecesita de nenhums eaborasio jurdica partcalar. O ‘tubulbadoe sslariado, ao contri, surgene mercado como livre vendedor de ora de trabalho ¢ per iso que aelayso de cexplorian capitalista se mediatiaa sob a forma furitica de conirato” (ip. 82), Georg Lui, Per Vonvologia delle aca, val. I ci 480. ster Valman, “A ideolgia sua dererminasio onl ty p 424 Max Weber, Famomiarindade, vol 1! 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