Você está na página 1de 369
FERNANDO REY PUENTE OS SENTIDOS DO TEMPO EM ARISTOTELES Eale exemplas ccasesponde & v tedogia ial de tse lofendsta ww f e apoavida pela Cemionsa x 9 Gasadera am LELa/98 v4 ’ . x (y 4 ra u y ta wv rf Ch wv ‘Tese de Doutorado apresentada como exigéncia parcial para obiengio do grau de Doutor em Filosofia & Comissio Julgadora, sob orientagto do Prof.Dr. Francisco Benjamin de Souza Netto UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS ‘Campinas ~ 1998 Fompane BC 1 NS CHANGE © vy, a Ea | nites Be) 3 FET wre 225 18g 8K Baim, i wegen IS | [a oo Ch-001239909—3 HICHA CATALOGRAFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA DO IFCH - UNICAMP. Rey Puente, Fernando Os sentidos do tempo em Arist6teles / Fernando Rey Puente. ~~ Campinas, SP : [s.n.}, 1998, Orientador: Francisco Benjamin de Souza Netto, Tese ( doutorado ) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciéneias Humanas, 1. Aristoteles. 2. Categorias (Filosofia). 3. Fisica. 4. Tempo. 5. Meméria, .I. Souza Netto, Franciseo Benjamin, Il, Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Ciéacias Humanas. UL. Titulo. AGRADECIMENTOS Gostaria de agradecer em primeiro lugar 0 apdio financeiro recebido do CNPq, durante quatro anos, sob a forma de uma bolsa de estudos que me possibilitou desenvolver esta pesquisa no Brasil e por um ano na Itilia, mais precisamente em Padua. Gostaria também de agradecer ao meu orientador, o Prof. Dr. Francisco Benjamim de Souza Netto por ter acreditado na viabilidade de um projeto tio ambicioso quanto este, bem como pelas sugestdes e comentirios por ele tealizados a fim de melhorar a redagdo final deste trabalho. Por fim, mas nfo em iiltimo lugar, gostaria de agradecer de modo especial a gentil acothida do meu co-orientador em Padua, o Prof. Dr. Enrico Berti, com quem pude discutir ce por em prova virias idéias a respeito desta pesquisa e de quem pude receber diversas informagdes bibliograficas titeis para o aprofundamento da mesma. “Man versteht den Aristoteles nicht, wenn man bei ihm stehen bleibt. Man muss auch wissen, was er nicht sagt, und selbst muss man die Wege gewandelt haben, die et wandelt, die Schwierigkeiten, mit denen er Kampf, den ganzen Process, den er durhlaufen, durchempfunden haben, um zu verstehen, was er sagt. Bin bloss historisches Wissen ist in Bezug auf keinen Philosophen weniger als auf Aristoteles m6glich” F.W.I.Schelling, Philosophie der Mythologie iNDICE Introdugdo. pl Os Sentidos do Ente € 0 Tempo 1. O sentido eategorial do tempo... 1.1. A multiplicidade do em, do um e do tempo... 12. Moré, nocd & xpdvoc.... 2. O sentido acidentat do ente ¢ de 70E......... 3. O sentido veritative do ente ¢ de xoté.. 4.0 sentido modal do tempo... 4.1. O ato ea poténcia ¢ 0 movimento. 42. Aconigieaso temporal dovebo co nor. 0s Tipos de Substincia e o Tempo 1. Os tipos de substancia e as partes da filosofia. 2. O sentido fisico do tempo: ZOBPOG ee 2.1. A definigo do tempo. 2.2. Onimero, 2,3. O movimenio...... 2.4, O anterior-posteriot 2.5, Oagora 3.0 sentido cosmolégico do tempo: ariabv. 4. O sentido metafisico do tempo... © Ambito Humano e o Tempo 1. A dimensio psicofisioldgica do homem e o tempo... 1.1. Os sentidos proprios, 0 sentido comum e a percepeo do tempo... 1.2, A meméria e 0 tempo... 1.3. A pascagem da cognigdo a ago: o movimento animal ¢ 0 tempo... 2, A dimensio pritica do homem e 0 tempo. 2.1. A agi (apezEtg) e a produgio (087014)... 2.2. O tempo € 0 agora resignificades: 0 Ambito da ado humane... 2.3. 0 tempo recriado pela linguagem: 0 ambito da produgdo humana... 2.3.1. As formas de discurso ¢ 0 tempo... 2.3.2. A poesia ea histéria: tempo tragico e tempo histérico, Conclusao.. _p.333 Bibliografia.. INTRODUGAG Nao nos parece necessirio do ponto de vista filoséfice justificar o porqué de mais um trabalho sobre 0 tempo, tampouco do porqué mais um trabalho que se proponha a investigar este tema em Aristoteles, pois que & sabido desde a propria origem do pensar filoséfico que o tempo & um enigma © um desafio insolivel que se coloca ante a nossa capacidade de compreensio. Basta lembrarmo-nos da célebre ¢ citadissima sentenga de Agostinbo nas Confissées, de acordo com a qual, se ninguém the perguntasse 0 que seria 0 tempo, ele saberia o que ele é, entretanto, a0 ser inguirido sobre este tema, ele no seria capaz de explicé-lo. Sabe-se também que apds algumas discussées mais ou menos esparsas ¢m Plato (p.ex.: no Timeu ¢ no Parménides) 0 conceito do tempo recebeu a sua primeira e até hoje imprenscindivel anilise sistemética no quarto livro da Fisica de Aristételes, mais especificamente nos capitulos dez 4 catorze deste livro, ou seja, naquelas piginas que se convencionou denominar o tratade do tempo. A importncia deste texto para a Historia da Filosofia ¢ incalculdvel, pois é impossivel pensar em qualquer tentativa séria de pensar 0 problema do tempo, desde Plotino até Bergson ¢ Heidegger, passando por Tomas de Aquino, Kant, Hegel, Schelling e Husserl, que nio tivesse de colocar-se a favor ou em contra das idéias expostas com conciso e profundidade neste pequeno tratado. Todavia, parece-nos necessério justificar 0 porqué de no nos determos apenas na andlise deste tratado. A propria ambighidade do nosso tftulo j4 aponta para esta raziio. 0 que quer dizer exatamente os sentidos do tempo? As percepgies, as diregdes ou os significados do tempo? E precisamente por causa dessa multiplicidade de acepgdes que 0 vocdbulo “sentido” possui em portugués, que nos pareceu conveniente escolhé-to. Isto porque 0 préprio Aristételes foi o mestre do discernimento ¢ do estabelecimento de nuances entre os diversos significados de um termo e, por conseguinte, nada mais aportuno do que refletir no proprio titulo do trabalho a polivocidade de significados que o tempo possui nas obras de Aristdteles € que nos propussemos a investigar e a reconstruir. A bem da verdade, o presente estudo iniciou-se com uma tradugfo ¢ andlise minuciosa do tratado do tempo, mas A medida que avangavamos nas nossas investigagdes acerca deste texto, percebiamos que era impossivel dissoci-lo totalmente de outros textos ¢ passagens do Corpus aristoteticum que também abordavam 0 tema do tempo, bem como de outros termos além de zpédvoc que se referiam ao tempo. Entio a questo de saber como relacionar estes textos ¢ esses vocdbulos entre si foi se tomando central para nds. Em paralelo a isso, a leitura de uma imensa literatura secundaria sobre o problema do tempo em Aristoteles, convencet-nos da inexisténcia de uma anélise mais global sobre o tempo em toda a obra do Estagirita, assim como do risco, quase que inevitivel, dado a extrema concisio dos argumentos, de realizar apenas mais uma pardfrase, dentre as muitas j4 existentes, do tratado do tempo, caso nos limitissemos tinica ¢ exclusivamente andlise deste eélebre texto, Foi com base neste receio de escrever uma mera parifrase do tratado do tempo e diante da inexisténcia de uma analise global deste problema na obra de Aristételes que nos propussemos a tarefa pretensiosa e talvez inexeqiivel de levar a cabo esta andlise, a mais, universal possivel, de todos 0s textos ¢ passagens do Corpus aristotelicum do nosso conhecimento que se referissem de algum modo a problematica do tempo. Neste trabalho hereileo de levantamento de textos ¢ passagens significativos para nés, & preciso mencionar, porque no 0 fazemos no decorrer do nosso texto, @ ajuda indispensavel e imprescindivel que o Index Aristotelicum de H.Bonitz nos prestou, Sem ele nfo saberiamos nem mesmo por onde comegar neste cipoal de conceitos articulados a partir de distintos planos ¢ perspectivas de anilise que compdem a obra imortal de Aristételes. B ébvio também que estamos plenamente cOnscios da nossa diminuta proporgio face aos intimeros especialistas do pensamento aristotélico que detinham e detém um cabedal de conhecimentos sobre Aristételes muito mais vasto e preciso do que 0 nosso. O que nos motivou a seguir em frente, apesar da clara consciéncia de nosso despreparo face a esses emétitos pesquisadores pretéritos ou hodiemos, foi o encontro de alguns poucos excelentes livros ou artigos desses exegetas que acenavam na mesma diregdo da nossa intuigo, a saber, na diregdio de uma andlise mais global da problematica do tempo em Aristételes, que evitasse recair na insuficiéncia e incompletude de uma andlise que se detivesse apenas e tho somente nas reflexBes contidas no tratado do tempo. Todavia, estes mesmos livros ou artigos muitas vezes ignoram-se reciprocamente quer em razd0 da dificuldade de acesso a alguns destes textos quer em fungio dos obsticulos linguisticos envolvidos nesta tarefa, de modo que nés, tal como na oélebre metifora do ando sentado ‘nas costas do gigante, acreditamos ter podido enxergar um pouco mais longe,

Você também pode gostar