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Narrativas

do Poder
Feminino
Organizadores
Maria José Ferreira Lopes
Ana Paula Pinto
António Melo
Armanda Gonçalves
João Amadeu Silva
Miguel Gonçalves

Publicações da Faculdade de Filosofia


Universidade Católica Portuguesa
BRAGA  2012
Ficha Técnica

Título : Narrativas do Poder Feminino


Organizadores : Maria José Ferreira Lopes  .  Ana Paula Pinto  .  António Melo
Armanda Gonçalves  .  João Amadeu Silva  .  Miguel Gonçalves
Edição : ALETHEIA – Associação Científica e Cultural
Distribuição : Faculdade de Filosofia
e Venda : Universidade Católica Portuguesa
Praça da Faculdade de Filosofia, 1
4710‑297 BRAGA
Tel. 253 208 080 / Fax 253 213 940
www.publicacoesfacfil.pt
Tiragem : 250 exemplares
Dezembro 2012
© Todos os direitos reservados

Design da capa: Whatdesign, Lda. - Braga


E xecução gráfica: Graficamares, Lda.
R. Parque Industrial Monte Rabadas, 10
4720-608 Prozelo - Amares
Depósito Legal: 352547/12
ISBN: 978-972‑697‑205-1

9 789726 972051

O conteúdo dos artigos, bem como a norma ortográfica usada, é da responsabilidade dos autores.
A mulher cristã na Antiguidade Tardia
entre fontes documentais e epigrafia

Mélanie Wolfram
Universidade de Évora – CHAIA
melanie.wolfram1@gmail.com

Abstract
This paper aims to gather and analyse a set of information that sheds light on the role of women during Late
Antiquity between the 4th and 7th century in the Western Empire, more specifically in Lusitania. By comparing
various sources of documents – vitae or passio, travel accounts and councils texts – with archaeological
information based on epigraphic sources, we propose to come to know the behaviour and social relevance of
these women in the Late Roman society.
Keywords :  Christianity, councils, Epigraphy, Lusitania, women

[...] santa e admirável pela virtude de sua alma, ainda que mulher pelo seu corpo.
Eusébio de Cesareia (Hist. Ecl., 8,12,3)

1. Introdução
A historiografia das mulheres na Antiguidade parece, à primeira vista, contraditória.
Os textos de época imperial idealizam a mulher considerando que as suas principais vir-
tudes eram as de uma óptima senhora da sua domus, tecendo lã no recanto de uma sala,
concebendo e educando os seus filhos, apoiando incondicionalmente o marido, não tendo
assim qualquer poder cívico nem político. Uma mulher física e mentalmente inferior
ao homem mas respeitada se não exceder o seu quadro doméstico (Alfaro Giner 1997).
Ora a epigrafia do período imperial e a arqueologia revelam mulheres com altos cargos
cívicos, demonstrando o seu peso na sociedade, chegando por vezes a serem tão res-
peitadas como os homens (Enjuto Sánchez 2000: 304 e seg.). Pelo contrário, a partir do
século III até ao século VI, os textos cristãos retratam-nos uma mulher pecadora,1 descen-
dente de Eva, que será salva somente se se redimir de todos os seus pecados, tais como os
textos hagiográficos relatam as santas que se automutilam até à morte (Coon 1997: 71 ss.).

1.  Leiam-se as variadas cartas de São Jerónimo descrevendo a soberba e vaidade das ricas matronas
romanas (Select Letters of St. Jerome e Blázquez Martínez 1991) ou também a obra de Tertuliano, De cultu femi-
narum, livro I e II.
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Apercebemo-nos, através do estudo dos concílios2 (Vives 1966), que a mulher tem de ser
cada vez mais afastada dos homens, por representar a tentação maléfica do poder sexual.
Paradoxalmente é neste período que vemos mulheres realizando peregrinações, mandando
construir igrejas, dirigindo mosteiros, as viúvas e as virgens estão no centro das atenções
cristãs; a partir do século V a epigrafia mostra mulheres cultas e respeitadas.

2. Uma historiografia androcêntrica


Parece deste modo haver uma “não correspondência” entre o real papel das mulheres
na sociedade e a interpretação deste papel. A subjectividade está subjacente ao processo
interpretativo da História, sendo um texto consciente ou inconscientemente escrito com
propósitos políticos, religiosos e/ou morais predefinidos. Uma vez que são maioritaria-
mente homens que escrevem a História, e por conseguinte, a História das mulheres, existe
uma distância entre a imagem desta e a sua verdadeira acção na sociedade, porque passa
irremediavelmente através do filtro do olhar masculino. Esta distância manter-se-á ao longo
da paulatina cristianização da sociedade, dado que continuam a ser homens a escrever
e interpretar as acções das mulheres, e reforçar-se-á, uma vez que a mulher será pouco a
pouco, mas definitivamente, afastada do clero.
Afinal, que mudanças trará o Cristianismo neste processo? Existe de facto uma inversão
do papel das mulheres na sociedade ao longo da Antiguidade, ou antes uma mutação do
contexto social e religioso mantendo o papel da mulher idêntico? Após uma pequena intro-
dução acerca do androcentrismo da historiografia, iremos tentar entender qual foi a vida de
certas mulheres cristãs através dos textos conciliares e hagiográficos, para no fim estudar
aquelas que são unicamente conhecidas pela epigrafia presente no território português.
A escrita histórica é quase exclusivamente uma obra masculina. Esta realidade tor-
na-se ainda mais evidente no que se refere ao processo literário cristão e consequentemente
à construção da memória colectiva cristã. Apesar das variadas tentativas da última década
para demonstrar a importância do papel das mulheres na Bíblia e na vida de Jesus Cristo,3
o que está patente nas diversas fontes (Evangelhos, textos patrísticos, concílios, leis) é o de
um claro androcentrismo. Tal como escreve Gillian Clark “Almost no writings by women
survive from the ancient world, and when they do, someone is sure to argue that they were
really written by a man.” (2004: 42)
Não se pode estudar as mulheres cristãs na Antiguidade a não ser através da mão e do
pensamento de homens, a chamada “patrística” ou “patrologia”, cuja etimologia provem de
pater, os pais da Igreja. Uma rápida consulta ao DECA (Di Bernardino 1990) é elucidativa:

2. Doravante, todas as citações de cânones dos concílios ibéricos têm como referência a obra de José
Vives (1966), sendo livremente traduzidas do espanhol por nós.
3.  Ver “Revista 2” do jornal Público de Abril 2012 + bibliografia final.
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a patrística grega é composta por 164 membros masculinos exclusivamente; a patrística


ocidental é constituída por 159 homens e três mulheres.4 De facto, estas raras excepções
existem: o Itinerarium ad loca santa redigido pela monja Egeria ou Etheria, provavel-
mente originária da Gallaecia e a passio de Perpétua de Cartago, escrita por ela na prisão5.
No século VII, a religiosa Baudonivia escreveu a vida da rainha Radegunda de Poitiers, mas
a maioria dos textos hagiográficos foram redigidos por homens, tal como a vida de Melânia-
a-Jovem o foi por Gerôncio, a de Paula por Jerónimo, a de Helena por Eusébio de Cesareia,
ou ainda Pelagia de Antioquia por João Crisóstomo. Se uma ínfima presença feminina é
perceptível na redacção de textos hagiográficos, esta é totalmente ausente nos textos evan-
gélicos, conciliares, dogmáticos e nas leis cívicas.

3. A mulher através dos concílios ibéricos


É interessante notar que no primeiro concílio conhecido na Península Ibérica, o de
Illiberis que se reuniu no início do século IV, 25 cânones em 81 tratam de legislar as acções
da mulher, o que representa quase um terço dos cânones. Esta alta percentagem continuará
até finais do século IV: no concílio Saragoça I (380) dois em somente oito cânones tratam
da questão das mulheres e virgens, enquanto que em 21 cânones do concílio de Toledo I
(397-400) ainda seis são relativos a mulheres. O silêncio das fontes para o século V não nos
permite conhecer a evolução desta situação6. Temos a redacção do Código Teodosiano nos
meados do século V cujo livro XVI remete somente a cinco leis sobre as mulheres (2. 20, 22,
27, 28 e 44). Contudo, nos vários concílios que se reúnem durante a primeira metade do
século VI, apesar de serem redigidos poucos cânones e tratarem essencialmente de questões
dogmáticas, raros são aqueles que não tratam de legislar sobre as mulheres (Tarragona, 516,
dois cânones em treze; Gerona, 517, dois em onze; Toledo II, 527, dois em cinco; Lérida,
546, três em 16). A partir de meados do século VI a atenção sobre as acções das mulheres
começa “a perder terreno”, ganhando em força as questões dogmáticas e litúrgicas. Assim,
no concílio de Braga I reunido em 561, somente um cânone em 22 é relativo à presença
das mulheres; no de Braga II (572) serão doze num total de 84 cânones, três em 23 no de
Toledo III (589), desaparecendo quase por completo durante os concílios da última década
do século VI. No século VII, o concílio de Sevilha II (619) trata somente da organização
dos mosteiros de virgens e no concílio de Toledo IV (633), cinco em 75 cânones legislam
acerca das mulheres.

4.  Egeria, Baudonivia e Eucheria, esta última tendo no entanto deixado um canto satírico, não propria-
mente religioso.
5. Esta Passio foi durante muito tempo atribuída a Tertuliano e não é ainda consensual a sua atribuição a
Perpétua (Di Berardino 1990: 1994).
6. Este silêncio documental é aliás o reflexo do período político e administrativo confuso em que a
Península vivia (vd. Wolfram 2011).
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Apesar de se constatar uma percentagem cada vez mais reduzida de cânones referin-
do-se às mulheres entre o século IV e VII, explicada pela importância crescente da definição
de uma ortodoxia e de uma liturgia por parte da Igreja ocidental, nota-se uma constante
preocupação em limitar a acção das mulheres nas suas vidas e sobretudo a sua presença na
vida dos homens que frequentam. Esta necessidade em controlar o mais possível o raio de
acção das mulheres na sociedade cristã, em formação nesse início do século IV, evidencia a
sua forte presença na vida social tardo-romana e o ascendente que as mulheres tinham nos
homens (Viciano 2006: 574).
No início do século IV, no concílio de Illiberis, os bispos da Baetica proíbem por exem-
plos as mulheres de abandonarem os seus maridos e de se casarem com outros (cân. 8),
também de abandonar os seus maridos adúlteros e de se unirem a outros (cân. 9), ou de se
casar com outro se forem abandonadas (cân. 10); proíbem as mulheres cristãs de se casar
com gentis (cân. 16); um clérigo que não repudie imediatamente a sua mulher adúltera não
receberá a comunhão nem na hora da sua morte “para que não pareça que os exemplos de
maldade procedam daqueles que devem ser modelos de boa conduta” (cân. 66). Em 516, no
concílio de Tarragona (e mais tarde em Braga, 572, cân. 28), obriga-se o afastamento de um
membro do clero que tenha casado com uma mulher adúltera (cân. 9). Assim, era a repre-
sentação do homem cristão que se pretendia proteger perante a sociedade, mais ainda a de
um membro do clero, sendo que a mulher era de alguma forma duplamente acusada: por
ter praticado o adultério e por condenar assim a boa imagem do marido. Uma mulher adúl-
tera será também pior do que um homem que o tenha cometido, porque ele só sucumbiu à
tentação enquanto que ela a provocou, tal como Eva provocou Adão. Carmen Alfaro Giner
refere assim:
Es como si el hombre, básicamente raciocínio, fuera incapaz de ordenar sus actos no racio-
nales (âmbito de lo feminino-sensorial). Tal imposibilidad de control le disculpa totalmente
ante sí mismo y ante la sociedad, trasladando por completo la responsabilidad a quien sí puede
controlar esos fenómenos con su modéstia, discreción, humildad y buena conducta: la mujer.
(1997: 137)

Desta forma, o cânone 7 do concílio de Toledo I (397-400) autoriza os clérigos a


castigar a mulher que pecou, colocando-a em “reclusão e atá-la em sua casa, obrigando-a a
jejuns saudáveis, não mortais” (pelo que se depreende que alguns o tenham sido...).
Um outro aspecto recorrente ao longo de todos os concílios entre o século IV e VII
é o da proibição de mulheres “estranhas” em casa dos clérigos (Elvira, cân. 27 e 33; Tarra-
gona, cân. 1; Gerona, cân. 7; Toledo II, cân. 3; Lérida, cân. 15; Braga I, cân. 15; Sevilha I,
cân. 3; Toledo IV, cân. 42 e 43). Somente mulheres pertencendo à sua família (mãe, irmãs,
tias, filhas) eram aceites. Esta lei está igualmente vigente no Código Teodosiano (Livro
XVI, 2.44). A reiteração desta proibição ao longo de três séculos significa, por um lado,
que a mulher sem laços de sangue era considerada como sendo intrinsecamente malévola,
podendo atrair o homem na tentação, e por outro, que os membros do clero continuavam a
A mulher cristã na Antiguidade Tardia 651

aceitar a presença de tais mulheres nas suas casas. O cânone 44 de Toledo IV (633) é explí-
cito: “Alguns clérigos, sem estarem casados legitimamente, procuram uniões que lhes são
proibidas com mulheres estranhas ou com as suas servas, e portanto se alguma destas está
unida a algum clérigo, será separada e vendida pelo bispo, enquanto que aqueles que man-
charam com a sua leviandade, farão penitência durante algum tempo.” Aqui vários aspectos
estão patentes: os membros do clero continuam a procurar uniões com mulheres estranhas;
elas são as principais pecadoras pelo que podem ser vendidas, enquanto que o membro do
clero em causa só terá de passar por uma fase de penitência, por não ter resistido à tentação
de tal mulher. Depreende-se igualmente que a escravatura – venda e compra de pessoas –
era praticada em meios cristãos em meados do século VII.
Paulatinamente, em todo o Império ocidental e oriental, a proibição do contacto físico
com mulheres se estenderá à presença das esposas, começando pela abstenção (Illiberis,
cân. 33; Niceia, cân. 3; Cartago, cân. 2). Gregório-o-Grande escreverá entre 590 e 604, em
várias cartas e de forma indirecta, a importância da continência para os sacerdotes (Stickler
1998); esta será reforçada no século XI com a Reforma Gregoriana, mas somente em 1139
durante o Concílio de Latrão o casamento dos membros do clero será considerado “ilícito e
inválido”, afastando definitivamente as mulheres do mundo clerical.
Um único cânone refere a presença indesejada das mulheres no espaço sagrado da
igreja: em 572, no Concílio de Braga II, no cân. 42: “Não é lícito que as mulheres entrem na
sacristia.” Será aqui talvez o início de um longo período de presença exclusivamente mascu-
lina nas paróquias, em que as mulheres serão proibidas de fazerem parte da ordem eclesiás-
tica7. Tal como refere Ross Kraemer:
In Antiquity, no one argues that women cannot be priests because the priest represents Christ
in the Congregation, and Christ came, necessarily, in the form of a male. Only later, in the
Middle Ages, does this become a key weapon in the arsenal against women’s ministry, as
Christians begin to argue that, contrary to the Genesis, woman was not created in the image
of God and therefore was unable to fulfil the office of priest. (1992: 198)

Neste contexto, a criação dos mosteiros será entendida não como uma “promoção” do
estatuto da mulher, mas antes como uma maneira de a circunscrever num espaço próprio,
para que não possa interferir na vida religiosa masculina. Relembremos que as esposas do
clero eram expeditas para mosteiros, no contexto de afastamento de mulheres que foi aqui
tratado.
Uma análise um pouco mais aprofundada acerca da organização destes mosteiros
revela uma discreta mas contínua liderança masculina. O cânone 11 do concílio de Sevilha
II reunido em 619 é claro: “Acerca dos mosteiros das virgens. Que sejam protegidos pelos

7.  Será esta uma das razões para a tão severa condenação do Priscilianismo, uma vez que esta corrente
cristã autorizava as mulheres a serem ordenadas e fazerem assim parte do clero (Escribano Paño 1988), tal como
já tinha acontecido com o Montanismo (Kraemer 1992: 174 e seg.)
652 Mélanie Wolfram

monges.” Determina-se a presença de um abade como praepositus virginum, pai espiritual


das virgens, que as ajudará na direcção do mosteiro e “na edificação da doutrina”, e que cui-
dará também “de administrar as propriedades das religiosas, tanto rústicas como urbanas,
construir edifícios [...] para que as servas de Cristo, solícitas unicamente no aproveitamento
das suas almas, se entreguem unicamente ao culto divino e se consagrem às suas tarefas”.
Os mosteiros levam a questionar-nos sobre a importância da virgindade e existência
das virgens consagradas a Deus. Estas já eram conhecidas no mundo pagão, como as
Vestais em Roma, mas a partir dos séculos II e III constitui-se no seio das comunidades
cristãs um lugar próprio para as “virgens”, o que era particularmente valorizado na altura
(Viciano 2006: 572). Esta categoria nasceu no contexto de parousia, da espera do fim do
mundo iminente, em que não seria necessário procriar (Kraemer 1992: 128 ss.). A partir do
século IV, com o aparecimento dos mosteiros, esta “ordem de virgens” transformou-se na
ordem das monjas, que continuavam a renunciar por completo ao casamento, casando-se
metaforicamente com o próprio Cristo.
Um número importante de grandes damas da aristocracia romana do século IV man-
dava construir mosteiros e dirigia-os, talvez ainda sem praepositus virginum. Já Cipriano de
Cartago (finais do século III) escreveu um discurso às mulheres ricas que tinham dificul-
dades em abandonar os seus hábitos mundanos. Esta questão será recorrente no tratamento
da imagem da mulher como um ser vaidoso que tinha de se despir das vestes sumptuosas,
trocando-as por peles de animal rugosas e desistir da maquilhagem e de pintar o cabelo, a
fim de não ofender a Deus (Coon 1997: 95 ss.).

4. A mulher cristã através das fontes documentais


Quando estudamos as fontes documentais podemos definir três tipos de mulher cristã
durante a Antiguidade Tardia que, cada uma à sua maneira, abandonou a vida terrestre para
trocá-la por uma vida de contemplação e pobreza. Todas são apresentadas como mulheres
que tiveram de se purificar, de se redimir de todo o fausto em que viviam e/ou dos pecados
que as sujaram.
Eve, c’est toi, et tu l’oublies! La sentence de Dieu pèse ici-bas sur tout le sexe; il faut donc que
le châtiment pèse sur lui. Tu es la porte du démon; c’est toi qui as brisé les sceaux de l’arbre
défendu; toi qui as violé la première la loi divine; toi qui as persuadé celui que Satan n’osait
attaquer en face; l’homme, cette auguste image de la divinité, tu l’as brisé d’un coup. (Tertu-
liano, De cultu feminarum, Livro I,1)

O primeiro tipo de mulheres são as ricas benfeitoras do século IV que doavam a tota-
lidade da sua riqueza para a distribuir aos pobres, construir igrejas e mosteiros, dirigindo
geralmente um deles. Nesta categoria fazem parte Helena (250-330), mãe do imperador
Constantino, que realizou uma peregrinação até aos locais exactos onde aconteceu a
A mulher cristã na Antiguidade Tardia 653

Paixão de Cristo e recolheu os alegados primeiros pedaços do santo lenho (Vita Constan-
tini e Coon 1997: 97-103). Helena representa um dos primeiros modelos da mulher cristã,
modelo que será conhecido por todo o Império graças à Vida de Constantino redigida por
Eusébio de Cesareia. A importância de Helena foi alimentada pelos hagiógrafos durante
vários séculos:
Hagiographers recreated the Helena legend to magnify a growing Christian interest both
in the pilgrimage to the Holy Land and in the efficacy of the relics of the Passion. (Coon
1997: 102)

Algumas décadas depois, a nobre Paula (347-404) iniciou uma peregrinação para
Jerusalém, abdicando dos seus cinco filhos em Roma, mandando construir mosteiros em
Belém e vivendo em extrema ascese, trocando as suas roupas de seda por peles de cabra,
recusando dormir numa cama e deixando quase de se alimentar (Ibid.: 103-109). Será o
exemplo mais puro em termos de renúncia de estilos de vida mundanos. Temos igualmente
o exemplo de Melania-a-Jovem (383-439), uma das mais ricas aristocráticas romanas, que
desde a juventude se tinha prometido a ela própria uma virgindade eterna, mas que foi for-
çada a casar-se com o jovem Piniano (Vie de Sainte Mélanie e Coon 1997: 109-118). Após a
morte do seu segundo filho, o casal decide optar por uma vida de castidade total. Começou
por abrir as portas da sua domus romana aos pobres, viajantes e doentes. A seguir Melania-
a-Jovem vendeu a totalidade dos seus terrenos pelo Império do Ocidente e doou grande
parte do dinheiro para a construção de igrejas e mosteiros na África do Norte e por fim na
Palestina, vivendo em ascese.
Não queremos deixar de referir um outro aspecto interessante acerca de certas
mulheres realçado nas cartas de São Jerónimo, o da hipocrisia de mulheres ricas que prati-
cavam actos de generosidade para serem bem vistas socialmente:
She [the greatest lady in Rome] was giving money to the poor with her own hand to increase
her reputation for sanctity; and she gave them each a penny! At that moment [...] an old
woman, full of years and rags, ran in front of the line to get a second coin; but when her turn
came she got, not a penny, but the lady’s fist in her face, and for her dreadful offence she had to
pay with her blood. (São Jerónimo, Carta XXII,32)

Em segundo lugar destacaremos as monjas, mulheres reclusas em mosteiros mas


também viajadas. O caso de Egeria é o melhor exemplo conhecido apesar de se saber pouco
sobre a sua vida, nem de onde era originária (provavelmente da Gallaecia). O que se conhece
da sua vida é uma parte do relato de uma peregrinação que efectuou até ao Médio Oriente
no ano de 383 (Egeria, Itinerarium ad loca sancta). A originalidade desta obra reside no facto
de ter sido escrito na primeira pessoa. Entendemos, através da leitura deste diário de viagem,
que Egeria tinha um grande conhecimento das realidades geográficas israelitas, visitou um
grande número de igrejas mas também conviveu com um número importante de monges
654 Mélanie Wolfram

e sacerdotes que sempre a acolherem com muita efusão. O secundo caso mais conhecido
trata-se de um exemplo já de época visigótica, entre os anos 645 e 655, o da monja Benedicta
(Orlandis Rovira 1992: 180 e seg.). Trata-se de uma jovem virgem, provavelmente prove-
niente de uma família aristocrática senatorial, que recusou em casar-se com o seu noivo, um
jovem godo de ascendência nobre, escolhendo fugir da autoridade paterna para junto do
mosteiro masculino de São Frutuoso, próximo da costa gaditana. Enfrentou o noivo e o juiz
que se deslocaram até ao lugar e pôde continuar a viver em castidade. É referido aqui um
praepositus como intermediário entre a virgem e o noivo, confirmando a existência deste
elemento nos mosteiros ou em cenóbios femininos, mas provavelmente também em mos-
teiros masculinos. A história e a presença de Benedicta num cenóbio tiveram um grande
impacte para o resto da população. Como refere Mª Rosario Valverde Castro “La fama de
Benedicta se extendió con rapidez y pronto llegaron nuevas vírgenes para las que se fundó
un monasterio femenino.” (2008: 32)
Durante a Antiguidade Tardia temos, por fim, as mulheres que se martirizam até à
morte, a fim de se redimir dos seus pecados, tal como por exemplo Maria do Egipto ou
Pelagia, que se infligiram males abomináveis (Coon 1997: 71 ss.). Estas mártires distin-
guem-se das dos três primeiros séculos da nossa Era, uma vez que o eram voluntariamente
e se auto-mutilavam, contrariamente às anteriores que eram violentadas e perseguidas
(Pedregal 2000). Podemos considerar que este tipo de mulheres será o mais radical na his-
tória do Cristianismo e que não tenha tido tanto seguidores como as que descrevemos ante-
riormente.
Não queremos deixar de referir, em último, uma história contada na Vita Constan-
tini (Livro 1, 33, 34) sobre a atitude de uma mulher cristã, desconhecida, que reflecte a
mudança psicológica e moral que se operou na mentalidade das mulheres cristãs em geral:
Por ejemplo, [Constantino] sustraía de sus maridos a las mujeres legítimamente casadas,
remitiéndoselas después de haberlas ultrajado del modo más abyecto, y se comportaba así
no precisamente con personas de segundo orden y sin relieve, sino que llegó a insultar hasta
a los optimates del Senado romano. [...] Mas como también la emprendiera con cristianas, ya
no le fue posible explotar la vía expeditiva [de los adulterios], pues aquellas damas prefirieron
ser condenadas a muerte a hacerle entrega del cuerpo para la corrupción. Al caso: una de
ellas, mujer de un senador de aquel lugar que desempeñaba la prefectura, apenas advirtió que
estaban en su casa [era cristiana] los que servían al tirano en tales menesteres, y como se diera
cuenta de que el marido, por miedo, les estaba ordenando que se la llevaran consigo, solicitó
un breve espacio de tiempo para acicalar su cuerpo de modo conveniente; entra en la cámara
y, quedándose sola, se clava una espada en el pecho [...]. (Vita Constantini, Livro 1, 33,34)

Este exemplo, apesar de se tratar de novo de uma mulher de estatuto social elevado,
mostra que a mudança de mentalidades terá sido atingida por um grande número de
mulheres já nos inícios do século IV, ultrapassando o conhecimento que nos deixam as
poucas fontes documentais que ficaram para a posteridade. No século VII, ao ler a história
A mulher cristã na Antiguidade Tardia 655

de Benedicta, damo-nos conta do impacte que esta monja teve não só entre virgens, mas
também entre mulheres casadas que vinham com as filhas:
[...] Mas no fueron jóvenes vírgenes las únicas en llamar a las puertas del cenobio de Bene-
dicta: llegaron también mujeres casadas con sus hijas que, enardecidas de fervor religioso,
habían abandonado el hogar de acuerdo con sus maridos y hijos, los cuales se incorporaban a
su vez a la congregación de monjes. (Orlandis Rovira 1992: 183)

5. O contributo da epigrafia cristã


Através das fontes documentais conhecemos sobretudo as mulheres das classes mais
elevadas da sociedade: as que faziam parte da casa imperial, da aristocracia ou da classe
senatorial, e aquelas que tinham posses fora do comum. Pouco sabemos da mulher cristã
de classe média ou baixa. Esse será o contributo da epigrafia: estudaremos aqui as inscrições
funerárias (e uma votiva) de mulheres cristãs que foram sepultadas no território actual-
mente português. Neste território, que inclui parte da Lusitania e da Gallaecia, foram encon-
tradas ao todo 163 inscrições datadas entre 462 e 729 d.C. (Dias & Gaspar 2006). De entre
estas inscrições, somente 27 pertencem a mulheres (fora aquelas fragmentadas de que se
desconhece o sexo do defunto).
A grande maioria provém do Conventus Pacensis, denominação administrativa que terá
sido ainda utilizada até à chegada das populações muçulmanas. Temos assim 19 inscrições
provindas do “Sul” (n.os 1 a 19), com uma esmagadora maioria de Mértola (n.os 7 a 19), o
que é natural uma vez que a basílica suburbana do Rossio do Carmo em Mértola foi o local
com o maior número de inscrições (93) de todo o território português. Cinco inscrições
provêm do Conventus Scallabitanus (n.os 12 a 24), enquanto que na Gallaecia foram somente
encontradas três inscrições referentes a mulheres (n.os 25 a 27).
No Conventus Pacensis, entre o século V e VII, temos uma onomástica essencialmente
latina (Rogata, Maura, Donata, Auriola, Fortunata, Antonia, Rufina, Vincentia, Domitia,
Venancia, Petra, Marturia, Florentia, Servanda, Flaviana), com duas referências gregas
(Orania e Talassa) e dois nomes de origem celta (Mannaria e Aianes8), enquanto que no
Norte do território os nomes são de raiz germânica (godo: Suinthiliuba, suevo: Remisnuera,
Thuresmuda e Marispalla), geralmente datando já do século VII. Estas realidades estão con-
formes às estatísticas onomásticas de toda a Hispania durante a Antiguidade Tardia (Franco
2007: 211). No que se refere à onomástica germânica, fazemos nossas as palavras de Henar
Gallego Franco:
Podríamos deducir, por tanto, que en el siglo VII d.C. la adopción de nombres de origen
germánico ganó terreno entre las mujeres de los grupos poblacionales populares, al menos

8.  Ver Franco (2007: 214, nota 14).


656 Mélanie Wolfram

en aquellas zonas geográficas más familiarizadas con la presencia de los recién llegados [...].
(2007: 217)

A origem essencialmente latina dos nomes e a localização do achamento da maioria


destas inscrições, perto de antigas grandes villae baixo-imperiais, revela a evolução da socie-
dade cristã num mundo hispano-romano evidente, mesmo se a origem onomástica não
significar obrigatoriamente uma origem étnica. Entre a onomástica latina, alguma é cla-
ramente cristã, lembrando o nome de santos ou mártires (Petra, Marturia, Vincentia) ou
virtudes propriamente cristãs (Donata, Fortunata, Amanda, Servanda). Aqui, usaremos
mais uma vez o texto da mesma Autora para ilustrar as conclusões acerca da origem destas
mulheres cristãs:
El estudio pormenorizado al que hemos sometido la documentación epigráfica recogida
establece que ésta emana básicamente de mujeres de tradición cultural hispanorromana y
cristiana, con un nivel económico como mínimo de cierto acomodo, encabezadas por una
minoría de epígonos de la antigua aristocracia fundiaria bajoimperial hispanorromana. Hay
que considerar que dejar memoria epigráfica supondría para un individuo o su familia no
sólo contar con ciertos recursos materiales, sino también mantener algún grado de contacto
con los restos de los mecanismos de funcionamiento de las antiguas relaciones romanas de
influencia social y de poder, y por consiguiente de sus formas de expresión características, una
de las cuales sin duda es el hábito epigráfico. (Franco 2007: 218)

O facto de as mulheres só se identificarem com um cognomen pode significar essa nova


condição de cristãs, com o chamado nome de “baptismo”, mas uma razão social também
não será de descartar: identificar-se sem gentilício pode revelar uma vontade de não estar
associada a um marido ou a um patronus (Kraemer 1992: 137).
Além da onomástica, as inscrições acerca destas mulheres cristãs oferecem-nos mais
informações: três são honestae famulae (n.os 10, 12 e 18) de Mértola. Esta expressão encontra
o seu equivalente masculino em vir honestus igualmente só existente em Mértola e em Silvei-
rona e que será talvez um equivalente ao vir inlustris que se observa em Mérida. Trata-se de
pessoas que se distinguem dentro de um grupo social e religioso. Rufina (n.o 16), por sua parte,
identifica-se como relegiosa, o que pode revelar uma função num mosteiro ou a virtude de
uma grande piedade. A menina Petra (n.o 5) distingue-se por ter vivido num mosteiro Lancia,
o que mostra que crianças já ingressavam estas instituições desde a Antiguidade Tardia.
Maura (n.o 1) e Florentia (n.o 22) representam a perfeição feminina por terem morrido virgens.
Por fim, de entre todas estas mulheres lusitanas e galegas, temos uma doadora e benfeitora que
mandou construir um templo: Marispalla Devota (n.o 25) no século VI.
Antes de concluir, gostaríamos de referir os dois poemas métricos (n.os 1 e 3) datados
de finais do século VI e meados do século VII, que mostram o elevado nível cultural destas
mulheres. A inscrição de Venantia (n.o 3) tem a particularidade de ter sido escrito em nome
próprio, relatando a sua vida, o seu marido e os seus filhos.
A mulher cristã na Antiguidade Tardia 657

6. Conclusão
Todas estas mulheres, célebres e desconhecidas, têm um ponto em comum: denotam
uma emancipação, uma vontade em viver em castidade, escolhendo assim uma vida à
margem daquilo que a sociedade pagã lhes podia oferecer (Enjuto Sánchez 2000: 309).
Existe também uma vontade em sair do jugo do pai e do marido, querendo dirigir a sua vida
em nome próprio.
Estes movimentos de “emancipação feminina” que registamos sobretudo entre
o século IV e VII são no entanto contraditórios com a resposta dada pela própria Igreja:
se esta parece ter oferecido uma maior liberdade de acção às mulheres, estas serão paula-
tinamente afastadas do mundo eclesiástico, tal como vimos através dos concílios, e serão
constantemente acusadas de atrair o homem para mal. Assim, embora haja hoje leituras
“positivistas” por parte das comunidades científicas acerca do papel das mulheres cristãs no
início do Cristianismo e durante a Antiguidade Tardia, o certo é que a condição da mulher
não deverá ter mudado muito com o Cristianismo.

7. Fontes epigráficas
1 – Epitáfio métrico de Maura
Vale de Aguilhão (Beja)
Dimensões: alt.: 62 × larg.: 33 × esp. 7 cm
crux 
 ircundate vos omnes  punctum  pariter / plorate mecum quia hoc novum / non est
C
mori  punctum  flete mecum om / nes quos valde tangit causa dolo / ris et adflictio mor-
tis  punctum  promi / te luctibus et meritis almis Mau / ra[m] fuit mici subrina
 punctum  pulcra / illa nimis aspectibus decora et / facie pulcra quem (!) mater castam /
generavit et terra virginem sus / cepit et sine iniquitate sepulcro restituit  punctum  eu me
miseram (!) qui ta / lem etatis florem a XVm anno / perdidi  punctum  eu me desolatum
/ qui dum cepi gaudere tunc de / solabor et multis dolo / rib[u]s pro te adfligo hoc ego /
Calandronius oro D[eu]m ut ti / bi det requiem sempiterna[m] / requievit in pace D[omi]
ni / quarto Kal[endas] Agustas era / DCCIII
Tradução: Formai círculo, vós todos; em uníssono chorai comigo, porque boa nova não é
esta: morrer… Chorai comigo todos quantos atinge profundamente a causa da
(minha) dor e a aflição da morte. Trazei a público em lamentações e em reconhe-
cimento de altos méritos Maura!
Era minha sobrinha; de beleza invulgar e formosa de feições. A ela criou-a a mãe
em castidade, virgem a recebeu a terra e, sem inquinamento, a restituiu à sepultura.
Ai de mim, na desolação, que a esta na flor da idade, nos seus quinze anos, perdi!
658 Mélanie Wolfram

Ai de mim, abandonado, que, quando começava a minha alegria, aí começou a


minha desolação!
Por tudo isto, eu, Calandronius, peço a Deus que a ti te dê repouso sempiterno.
Descansou na paz do Senhor no dia quatro (antes) das Calendas de Agosto da
Era de 703 (= 29 de Julho de 665)

2 – Epitáfio de Domitia
(Desaparecida).
Herdade de Galharda, Vila Viçosa (Évora).
Dimensões: alt.: 84 × larg. 45 cm
 alpha chrismon in circulo omega 
Domitia / p[uell]a vixit / annum / m[enses] IIII d[ies] XIIII
Tradução:  A menina Domitia viveu um ano, quatro meses e catorze dias.

3 – Epitáfio métrico de Venantia


Monte da Azinheira, Reguengos de Monsaraz (Évora)
Dimensões: alt. 175 × larg. 59
Dum simul d<u>lce /  crux  m cum viro carpe / re vitam  signum  / ilico [m]e fortu-
natu / na (!) tulit semper nox / sea (!) cuntis (!)  signum  / vita dum vix<i> Venantia
/ nomen in seculo (!) gesi  signum  ter deciens quater in pa / ce quietos pertiu (!) annos
<  signum  > / ultimum iam solvi de / vitum comunem omni / bus unum  signum  hoc
/ loco erga meos elegi / quiescere proles  signum  / [no]ndum quos Dominus / [vo]cavit
purgatos un / [da] labacri  signum  requi / [evi]t in pace sub d(ie) XI / [Kal(endas)]
Februar[ias] er<a> DCXXXI
Tradução: Quando em companhia do meu marido gozada as doçuras da vida, de impro-
viso me levou uma sorte para todos sempre adversa. Enquanto vivi, o nome
de Venantia tive no século, trinta e quatro anos passei tranquilos em harmonia.
O último tributo que a todos é comum, já satisfiz. Neste lugar, frente aos meus
filhos, escolhi para descansar. A eles o Senhor ainda não os chamou, mas estão
purificados pela água do baptismo. Repousou em paz, no dia 11 (antes) das
Calendas de Fevereiro da era de 631 (22 de Janeiro de 593).

4 – Epitáfio de Talassa
Silveirona, Estremoz (Évora)
Dimensões: alt. 104 × 51,1 × esp. 9,5 cm
 crux 
Talâssa famo / la Dei vixsit / annos XLIIII / et requiet /in pace XV / Cale[ndas] Septembres
era DLXXXII
A mulher cristã na Antiguidade Tardia 659

Tradução: Talassa, servidora de Deus, viveu 44 anos e descansou em paz no dia


15 (antes) das Calendas de Setembro, da era de 582. (= 18 de Agosto
de 544).

5 – Epitáfio de Petra
Monte da Palhinha, Fronteira (Portalegre)
Dimensões: alt. 135 × 50 × esp. 10 cm
 omega chrismon alpha in corona 
Depositio in / fantis Petre / Lancie mon(a)st(erio) / tempuus vixit
Ann[o]s VIII /
 alpha chrismon omega in circulo 
Tradução: Sepultura da menina Petra, viveu o tempo de 8 anos no mosteiro de Lancia.

6 – Epitáfio de Rogata
Quinta do Marim, Olhão (Faro).
Dimensões: alt.: 25 × larg.: 21cm
Rogata / famola (!) / dei vix[it] a / nnorum LV / rece[ssit] / i[n pace ---]
Tradução:  Rogata, servidora de Deus, viveu 55 anos; partiu em paz...

7 – Epitáfio de Donata
Rossio do Carmo, Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 45 × larg. 44 × esp. 3 cm
 chrismon crux 
 onata puel[la]  Christ   i / vixsit ann[os] XXII / requievit in pace / D[omi]ni d[ie] III
D
N[ona]s Iul[ias]
Era DIII
Tradução: Donata, jovem de Cristo, viveu 22 anos; descansou na paz do Senhor ao 3.º dia
das Nonas de Julho da era de 503 (= 5 de Julho do ano de 465)

8 – Epitáfio de Mannaria
Junto do Rossio do Carmo, Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 71 × larg. 23 × esp. 2,5 cm
 columba crux columba 
 in circulo alpha chrismon omega 
Mannaria / Famula  Christ   i / vixit annos / novem men / ses quattu / or requievit / in
pace d[ie] XVI / Kal[endas] Apriles era / DXXXII
660 Mélanie Wolfram

Tradução: Mannaria, servidora de Cristo, viveu 9 anos e 4 meses e descansou em paz no 16


(antes) das Calendas de Abril da era de 532 (= 17 de Março de 494).

9 – Epitáfio de Orania
Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 27,5 × larg. 29,2 × esp. 3,8 cm
 chrismon crux 
 litterae in corona 
Orani / a p[a]m[u]l[a] D[e]i vixit / ann[os]t<r>es requievit / in pace d[ie] Idu /
Novembr[es]er / a DXL as
Tradução: Orania, servidora de Cristo, viveu 3 anos e descansou em paz no 1.º dia dos Idos
de Novembro, da era de 541 (= 13 de Novembro de 503).

10 – Epitáfio de Auriola
Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 124 × larg. 48,5 × esp. 5,5 cm
 columba crux in circulo columba 
Auriola / honesta / femina vi / xit  hedera  na[nos] XXVII / req[uie]vit in pace
 hedera  / IIII  hedera  Id[us]  hedera  (?) Maias / era DXLVIII
Tradução: Auriola, mulher de condição social superior, viveu 27 anos e descansou em paz
no 4.º dia dos Idos de Maio da era de 548 (= 12 de Maio de 510).

11 – Epitáfio feminino
Rossio do Carmo, Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 39 × larg. 24
[ ---] famula Dei / vixit an / nos LXX  hedera  / p[lus]  hedera  m[inus]  hedera 
requi / evit in pa / ce D[omi]ni diae / pridiae Kal[endas] / Februarias / era DLVI
Tradução: …, servidora de Deus, viveu mais ou menos 70 anos, descansou na paz do
Senhor, um dia antes das Calendas de Fevereiro da era de 556 (= 31 de Janeiro
de 518).

12 – Epitáfio de Aianes
Rossio do Carmo, Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 58 × larg. 28
  columba crux columba
 ianes hon[esta] fem[ina)] / fam[ula] D[e)]i vixit annos / pl[u]s m[inu]s XXVIII requi
A
/ evit in pace D[omi]ni / d[ie] V Non[as] Iulias / era DLXI as  hedera 
A mulher cristã na Antiguidade Tardia 661

Tradução: Aianes, mulher de condição social superior, servidora de Deus, viveu mais ou


menos 28 anos, descansou na paz do Senhor, no dia cinco das Nonas de Julho da
era de 562 (= 3 de Julho de 524).

13 – Epitáfio de Fortunata
Basílica, Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 75 × larg. 31 × esp. 7,5 cm
 sub arcu crux in circulo 
Fortunata / famula Dei / vixit annos / XXII requievit / in pace d[ie] V Kal[endas] / Ianu-
arias era / DLXV  chrismon 
Tradu4ção: Fortunata, servidora de Deus, viveu 22 anos, descansou em paz no dia cinco
(antes) das Calendas de Janeiro da era de 565 (= 28 de Dezembro de 527).

14 – Epitáfio de Amanda
Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 44,5x larg. 38,3 × esp. 4,2 cm
 transenna circulo in quo crux transenna 
  crux monogramática  Amanda famu<l>a  Christ   i vixit / annos plus min<u>s /
XXXII menses V requie / vit in pace D[omi]ni sub d[ie] VII / Kal[endas] Mart[ias] era /
DLXXXII
Tradução: Amanda, servidora de Cristo, viveu mais ou menos 32 anos e cinco meses, des-
cansou na paz do Senhor no dia sete (antes) das Calendas de Março da era de
582 (= 23 fevereiro de 544).

15 – Epitáfio de Antonia
Basílica, Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 38 × larg. 26
 sub arcu crux in circulo 
Antonia fa / mula Dei vix[i]t / annos XLVIIII / requievit in / pace Do[mi]ni ter / tio
Nonas Ag / ustas (!) era DC / VIIII
Tradução: Antonia, servidora de Deus, viveu 49 anos, descansou na paz do Senhor no
3.º (dia das) nonas de Agosto da era de 609 (= 3 Agosto de 571)
662 Mélanie Wolfram

16 – Epitáfio de Rufina
Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 41 × larg. 38 × esp. 3,5 a 4,5
 crux in circulo crux in circulo 
  crux  Rufina / relegiosa famula /  Christ   i vixit na[nos] p[lus] m[inus] / XXXXV
requievit / in pace D[omi]n[i] d[ie] V Kal[endas] Octob[res] era DC XXV
Tradução: Rufina, religiosa, servidora de Cristo, viveu mais ou menos 45 anos, descansou
na paz do Senhor no dia 5 (antes) das Calendas de Outubro da era de 625 (= 27
de Setembro de 587)

17 – Epitáfio de Vincentia
Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 23,5 × larg. 19 × esp. 2
   crux in circulo  / [Vin]centia fam[ula] D[e]i / [vix]it na[nos] XI ric[ess]i[t] / [in
pa]ce d[ie] V Kal[endas] [---] / [--- era -] LVII
Tradução: Vincentia, servidora de Deus, viveu 11 anos, descansou em paz no dia 5 (antes)
das Calendas de … da era de ... (?) 57.

18 – Fragmento de epitáfio de feminino


Rossio do Carmo, Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 60 × larg. 42
 crux in circulo crux in circulo 
E [---h]onesta / [femina ---] EN [---]
Tradução:  …, mulher de condição social superior…

19 – Fragmento de epitáfio de feminino


Rossio do Carmo, Mértola (Beja)
Dimensões: alt. 60 × larg. 42
 corona 
[---]ntia / [---fa]m[u]la Dei [---]
A mulher cristã na Antiguidade Tardia 663

20 – Epitáfio de Marturia
Conimbriga (?)
Dimensões: alt. 64,2 × larg. 39,8 × esp. 15,5
  crux  Marturia famu / la D(e)i vixit ann[os]  o  / XXXIII requ[ievit]  o  in p[ace]  o  / II
non[as]  o  No / vemb[res] era / DLXX
Tradução: Marturia, servidora de Deus, viveu 33 anos, descansou em paz no 2.º dia das
nonas de Novembro da era de 570 (= 4 de Novembro de 532).

21 – Epitáfio de Flaviana
Quinta do Caracol, Aldeia Gavinha (Alenquer)
Dimensões: alt. 35 × larg. 29 × esp. 4 cm
Flaviana / fam[u]l[a] Dei / req[u]ievit in / pace d[ie] III  signacula  kal[endas]
Mai[as]  signacula  era DLXX
Tradução: Flaviana, servidora de Deus, descansou em paz no dia 3 (antes) das Calendas de
Maio da era de 570 (= 29 de Abril de 532).

22 – Epitáfio de Florentia
Ermida de Santa Maria de Seixas, Lamego (Viseu)
(Desaparecida)
  chrismon 
Florentia virgo /  Christ   i vixit ann[os] XXI et vi / ta brevi explevit te / mpora multa /
obdormi / vit in pace Iesu quem dile / xit Kal[endas] April[es] era DCXXVI
Tradução: Vincentia, virgem de Cristo, viveu 21 anos e em vida breve levou a termo longos
tempos. Descansou na paz de Jesus, a quem amou, nas Calendas de Abril da era
de 626 (= 1 de Abril de 588).

23 – Epitáfio de Servanda
Igreja de São João Baptista, Vide (Guarda)
(Desaparecida)
[--- Ser] / vanda  Christ   i fam / ula  o  vix[it]  o  annos / XLII quievit in / pace  o  D[ie] 
o  IX  o  Kal[endas]  o  Iul / ias era DCXXIIII  alfa chrismon omega  

Tradução: Servanda, servidora de Cristo, viveu 42 anos, descansou em paz no dia 9 (antes)


das Calendas de Julho da era de 624 (= 23 de Junho de 586).
664 Mélanie Wolfram

24 – Epitáfio de Suinthiliuba
Igreja de Santa Maria dos Açores, Celorico da Beira (Guarda)
Dimensões: alt. 50 × larg. 86 cm
  crux   requievit  o  famula  o  / Christ   i  o  in pace  o  Suinthi / liuba  o  sub die  o  non[as]
/  o  Novenbres  o  era  o  DCCIIII hedera 
Tradução: Descansou, a servida de Cristo, Suinthiliuba, em paz, no dia das Nonas de
Novembro da era de 704 (= 5 Novembro de 666).

25 – Inscrição votiva de Marispalla


Mosteiro de S. Bento, S. Salvador do Vairão (Porto)
Dimensões: alt. 32,5 × larg. 286 cm
I n n[omin]e D[omi]ni perfectun est tenplun hunc per Marispalla Dovota sub die XIIII
K[alendas] Ap[riles] er[a] DLXXIII regnante serenissimo Veremundu re (!)
Tradução: Em nome de Deus, foi concluído este templo por Marispalla Devota, no dia 13
(antes) das Calendas de Abril da era de 573 (?), reinando o Serenissimo rei Vere-
mundo.

26 – Epitáfio de Remisnuera
Igreja de São Vicente, Braga
Dimensões: alt. 41 × larg. 140
  crux  hic requiescit  o  Remisnuera / in Kal[endas]  o  Maias  o  era  o  DC  o  quinquagis /
VI die  o  secunda  o  feria in pace  o  amen
Tradução: Aqui repousa Remisnuera nas Calendas de Maio da era de 656, dia de Segunda-
feira, em paz. Amen ( = 1 de Maio de 618).

27 – Epitáfio de Thuresmuda
São Martinho do Peso, Mogadouro
Dimensões: desconhecidas
  crux  Protheus fecit / Thuresmude uxo / ri sue obiit ipsa / sub die VIIII K[a]l[endas] Ia
/ nuar[ias] era DCLXXII
Tradução: Protheus fez para sua esposa Thuresmuda. Faleceu ela no dia 9 (antes) das
Calendas de Janeiro da era de 672 (= 24 de Dezembro de 634).

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