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LIDERANDO MUDANCAS , JOHN P. KOTTER Transformando empresas com a forca das emocoes Traducao Afonso Celso da Cunha Serra Liderando Mudangas Copyright ©2017 da Statlin Alta Editora e Consultoria Eiteli. ISBN: 978-85-508-0116-2 Translated from original Leading Change by Jobn P. Kotter. Capyright © 2012 by John P. Kotter. ISBN 0-471-26867-4. This translation is published and sold by permision of Harvard Business Review Pres, the owner of all rights 0 publish and sll the same. PORTUGUESE language edition published by Starlin Alta Editora e Consultoria Eirli, Copyright © 2017 by Starlin Alea Editora e Consultoria Eireli A editora ndo se responsabiliza pelo conteiido da obra, formulada exclusivamente pelo(s) autor(es) Marcas Registradas: Todos os termos mencionados ¢ reconhecidos como Marca Registrada e/ou Comercial sio de responsabilidade de seus proprietétios. A editora informa nio estar associada a nenhum produto e/ou fornecedor apresentado no livro. Impresso no Brasil. Obra disponivel para venda corporativa e/ou personalizada. Para mais informagées, fale com projetos@altabooks.com.br Copidesque Follow-Up Revisio Isabel Cristina Rodrigues e Edna Cavalcanti Editoracéo Eletronica Estidio Castellani Produgao Editorial Elsevier Editora - CNPJ: 42.546.531/0001-24 Erratas ¢ arquivos de apoio: No site da editora relatamos, com a devida correcio, qualquer erro encontrado em :nossos livros, bem como disponibilizamos arquivos de apoio se aplicéveis 3 obra em questio. ‘Acesse o site wwwaltabooks.com.br € procure pelo titulo do livro desejado pa de apoio e/ou a outros contetidos aplicéveis i obra. ter acesso is erratas, aos arquivos Suporte Técnico: A obra é comercializada na forma em que esté, sem direito a suporte técnico ou orientagio pes- soal/exclusiva ao letor. CIP-Brasil. Catalogagao na fonte ‘Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RU Kssl Kotter, John P, 1947- Liderando mudangas: um plano de agao do mais notével ‘especialista em lideranga nos negécios / John P. Kotter; ‘radugao Afonso Celso da Cunha Serra, - Rio de Janeiro: Alta Books, 2017, 230m ‘Tradugao de: Leading change ISBN 978-85-508-0116-2 1. Lideranga. 2. Administragao. |, Titulo. 13-0956. DD: 658.4092 COU: 65:316.46 Rua Vitiva Cliudio, 91 — Bairro Industral do Jacaré (CEP: 20970-031 — Rio de Janeiro - RJ Tels: (21) 3278-8069 / 3278-8419 'ALTABOOKS wWwaltabooks.com.br — altabooks@altabooks.com.br Perrows www.lacebook.com/altabooks O AUTOR John P. Kotter é considerado, em Ambito internacional, a mais im- portante autoridade em questées de lideranga e de mudanga. E a voz mais ouvida sobre como as melhores organizacées promovem trans- formagées bem-sucedidas. Professor emérito de lideranga, na c4tedra Konosuke Matsushita, da Harvard Business School, e pés-graduado pelo MIT e por Harvard, seu trabalho desbravador sobre como acelerar com éxito as mudangas organizacionais tem sido reiteradamente valida- do em diversos setores e em diferentes culturas. E criador e cofundador da Kotter International, organizac4o voltada para temas de lideranga que ajuda lideres de algumas das cinco mil principais empresas glo- bais a acelerar a implementacdo de suas estratégias mais importantes € a liderar a mudanga em ambientes de negécios complexos e em rapida mutagao. Kotter é autor de 18 livros, dos quais 12 sao best-sellers. Seus tra- balhos foram impressos em mais de 150 edigdes em lingua estrangeira, € seus livros se incluem no 1% superior das vendas pela Amazon.com. Seus artigos na Harvard Business Review venderam mais exemplares avulsos que qualquer um dos de centenas de autores de renome que escreveram para a mesma revista, no mesmo periodo. Kotter faz parte do corpo docente da Harvard Business School desde 1972. Em 1980, aos 33 anos, conquistou estabilidade como professor pleno, tornando-se um dos mais jovens membros da academia a receber tal honraria na Harvard University. Em 2009, recebeu o Lifetime Achievement Award, da American Society for Training and Development, em reconhecimento por sua obra e pelo significativo impacto que exerceu sobre 0 aprendizado e o desempenho das organizagoes. PREFACIO A EDICAO DE NOVEMBRO DE 2012 O material deste livro, além de continuar relevante hoje, 16 anos depois da primeira publicacao, também 6, acredito, ainda mais importante que entio, ¢ por uma razio simples: a velocidade da mudanca é cada vez maior. Sabemos muito mais do que ha 16 anos. J4 publiquei quatro outros livros que, de varias maneiras, se aprofundam mais nessas ideias. Agora, estou trabalhando no quinto livro, que da outro salto (nao um passo incremental) rumo ao que o sucesso demandaré no século XXI. Mas quando me perguntam onde comecar a jornada para o aprendizado da lideranca neste mundo em mutacdo, respondo-lhes que este livro é 0 ponto de partida. Os erros mais fundamentais que as pessoas inteligentes cometem quando tentam promover grandes mudangas, mormente ao implemen- tar estratégias ou iniciativas de grande importancia, so hoje, em boa parte, ainda as mesmas (Capitulo 1). Isso nao significa que os executi- vos nao aprenderam nada nestas tiltimas décadas. Aprenderam. No en- tanto, os desafios cresceram com a mesma rapidez, ou ainda com mais velocidade, que as suas habilidades. A simples ideia de que administracao nio é lideranga (Capitulo 2) é mais bem compreendida hoje, mas nem de longe téo bem quanto seria necessdrio. A administragao faz o sistema funcionar. Ajuda-o a executar ‘© que vocé sabe fazer. A lideranga constréi novos sistemas ou transfor- ma velhos sistemas. Leva-o para novos territérios menos conhecidos ou até para rincées totalmente inexplorados. Esse ponto tem enormes implicagées neste mundo em transformagao cada fez mais acelerada. Os problemas criados pela complacéncia, mesmo que seja sé um pouco, € 0 poder do senso de urgéncia (Capitulo 3) sio maiores hoje que uma década atrds. Considero impossivel exagerar a gravidade das dificuldades resultantes do senso de urgéncia inadequado ou desali- nhado. E, aqui, até pessoas muito inteligentes e muito experientes fra- cassam — gerando consequéncias que nem sempre transparecem com nitidez durante um ano ou mais —, ao postergarem ou retardarem as agGes necessdrias, até que os destrogos (ou seu equivalente) comegam a aparecer. Aprendemos muito nos tiltimos 10 anos sobre os tipos de estruturas € recursos que constroem uma base bastante forte para o langamento de grandes mudangas sustentdveis. Mas, entre a populaco geral de lideres € gestores, os fundamentos s4o ainda muito mal compreendidos (Capi- tulo 4). Forcas-tarefas, fluxos de trabalho (work stream) e organizacées de gestio de projetos ainda s4o os motores usados com mais frequéncia para impulsionar importantes esforcos de mudanga. Essas estruturas podem ajudar, mas apresentam tendéncias que nao raro conduzem a processos equivocados, e nao sao bastante poderosas para conduzir um conjunto de tarefas extremamente dificil. E assim prossegue o livro, do Capitulo 5 em diante. Os problemas aqui descritos ainda estao presentes. A gravidade deles, e as consequén- cias negativas daf decorrentes, so as mesmas hoje, ou ainda pior. Em- bora a crescente velocidade das mudangas tenha profundas implicacées, que vao além deste livro, as paginas seguintes estao repletas de insights e de propostas de agées aplicaveis em todos os lugares, hoje, e com muito sucesso. Se alguém me tivesse dito 16 anos atrds que a revista Time inclui- tia Liderando mudangas na lista dos 25 livros mais importantes sobre administracao ¢ negdcios jé escritos, eu, com toda a certeza, nao teria acreditado. Simplesmente 0 considerava mais uma etapa de uma série de projetos de pesquisa que eu conduzia em Harvard. Mesmo hoje ain- da me surpreendo com todo o reconhecimento de que o livro foi alvo. Mas, objetivamente, estou consciente de que ele descreve a trajetéria de um conjunto de mudangas muito poderoso que remonta a meio século e que provavelmente perdurard pelo resto de minha vida. Essas tendéncias exigem organizac6es mais d4geis e mais propensas a mudan- cas; demandam mais lideranga por parte de mais pessoas, nao sé da alta administracdo; requerem mais sofisticagao estratégica; e, o mais impor- tante, imp6em muito mais capacidade de executar rapidamente inicia- tivas estratégicas ousadas, e, ao mesmo tempo, de reduzir o tamanho ea quantidade das lombadas na estrada, que retardam 0 avango. A velocidade da mudanga é a forga motriz. A lideranca competente da mudanga é a tinica resposta. John Kotter Cambridge, Massachusetts PREFACIO Em 1994, escrevi um artigo para a Harvard Business Review intitulado “Leading Change: Why Transformation Efforts Fail?”.* Ele se baseou em minha andlise de dezenas de iniciativas tomadas nos 15 anos anterio- res para produzir mudangas uteis e significativas nas empresas através de reestruturacdo, reengenharia, novas estratégias, aquisicdes, downsizing, programas da qualidade e renovacdo cultural. Mal eu estava terminando 0 artigo, jd sabia que desejava escrever mais sobre 0 assunto, raz4o pela qual comecei este livro pouco tempo depois. O artigo foi publicado na edi¢gao de margo-abril de 1995 da HBR. Quase imediatamente, ele passou a ocupar o primeiro lugar entre os milhares de edigdes vendidas pela revista, um fato surpreendente, levando-se em considerag4o a qualidade de sua grande tiragem e 0 tem- po consideravel normalmente necessdrio para se montar uma nova edi- cao. Eventos improvaveis como esse sempre tém dificil explicacdo, mas as conversas e a correspondéncia com os leitores da HBR mostraram que o artigo atingira duas importantes quest6es. Em primeiro lugar, os executivos leram a lista de erros que as organizacées geralmente come- tem ao tentarem promover uma verdadeira mudanga e disseram Sim!. E por isso que nao atingimos nosso objetivo. Em segundo lugar, os * Ver o mesmo artigo de John P. Korter “Como Liderar a Mudanca: Por que os Esforgos de ‘Transformagio Fracassam”, em Champy, J. e Nohria, N. (orgs.), Avanco rdpido, Série Harvard Business Review Book (Campus, 1997). leitores acharam estimulante a estrutura em oito etapas da mudanga. Semelhante a um mapa, ela ajudou as pessoas a falarem a respeito da transformacio e de seus problemas e estratégias. Ao escrever este livro, tentei estruturd-lo nessas duas qualidades e acrescentar algumas outras. Ao contrario do artigo, o livro traz uma série de exemplos do que parece funcionar ou nao. Nesse sentido, ele se torna mais util e prdtico. Consegui também ser mais explicito ao vincular a discusséo ao mecanismo que conduz 4 mudanga — a lideranga — ao mostrar como uma mentalidade puramente gerencial inevitavel- mente falha, independentemente da qualidade das pessoas envolvidas. Por fim, ampliei 0 espaco de tempo coberto, mostrando como os acon- tecimentos ao longo dos tiltimos 100 anos nos trouxeram até aqui ¢ analisando as implicagées para o século XXI. Aqueles que estiverem familiarizados com meu trabalho verao que este volume integra e aprofunda uma série de ideias publicadas origi- nalmente em A Force for Change: How Leadership Differs from Mana- gement, Corporate Culture and Performance e The New Rules: How to Succeed in Today’s Post-Corporate World. Embora 0 assunto deste livro seja uma extensio Iégica de meu trabalho anterior, sua forma é uma novidade. Ao contrario de meus livros anteriores, este nao contém no- tas de rodapé ou de fim de capitulo. Tampouco utilizei exemplos ou grandes ideias de qualquer outra fonte publicada, a nao ser as minhas, ou tentei citar dados apresentados em outras publicagées para reforcar minhas conclusées. Nesse sentido, este trabalho é mais pessoal do que qualquer outro que eu tenha publicado. Aqui comunico o que vi, ouvi € conclut sobre uma série de assuntos inter-relacionados que parecem ser cada vez mais importantes. Diversas pessoas leram o rascunho deste livro e contribuiram com sugest6es titeis. Essas pessoas incluem Darrell Back, Mike Beer, Richard Boyatzis, Julie Bradford, Linda Burgess, Gerald Czarnecki, Nancy Dear- man, Carol Franco, Alan Frohman, Steve Guengerich, Robert Johnson Jr., Carl Neu Jr., Charlie Newton, Barbara Roth, Len Schlesinger, Sam Schwab, Scott Snook, Pat Tod, Gayle Treadwell, Marjorie Williams e David Windom. Algumas outras pessoas ofereceram inspiracdo para o trabalho que fundamenta este livro, especialmente Ed Schein e Paul Lawrence. Meu obrigado a todos. O autor SUMARIO Prefiicio a edigdo de novembro de 2012 Preficio Parte 1 MUDANGA: O PROBLEMA E A SOLUCGAO, Parte II Parte III 1 Organizagées em transformagio: Por que as empresas falham 2 A mudanca bem-sucedida e sua forca motriz, O PROCESSO DE OITO ETAPAS Estabelecimento de um senso de urgéncia Criacao de uma coalizao administrativa Desenvolvimento de uma visao e estratégia Comunicacio da visio da mudanca N AWAY Como atribuir empowerment aos funcionarios para realizar ages abrangentes Realizagéo de conquistas no curto prazo Consolidacao de ganhos e produgao de mais mudangas 10 Estabelecimento de novos métodos na cultura X© AS CONSEQUENCIAS PARA O SECULO XXI 11 A organizacao do futuro 12 Lideranga e aprendizado vitalicio 35 51 67 85 103 ug 133 147 163 177 PARTE _ Mudanga: O Problema e a Solugao CAPITULO Organizagoes em transformacdo: Por que as empresas falham e acordo com qualquer medida objetiva, a quantidade de mu- dangas significativas e frequentemente traumdticas nas organi- zagdes tem crescido substancialmente ao longo das duas ultimas déca- das. Embora algumas pessoas acreditem que a maioria dos projetos de reengenharia, mudancas de estratégia, fusdes, downsizing, qualidade e renovacao cultural desapareceré em breve, penso que isso é altamente improvavel. Poderosas forcas macroeconémicas funcionam aqui, po- dendo crescer mais ainda nas préximas décadas. Como resultado, cada vez mais organizagées serao levadas a reduzir os custos, melhorar a qua- lidade de seus produtos ¢ servicos, estabelecer novas oportunidades de crescimento e aumentar a produtividade. Até agora, os principais esforcos de mudanga ajudaram algumas or- ganizagées a se adaptarem de forma significativa 4s condigées de trans- formag4o, aprimoraram a posicao competitiva de outras e prepararam algumas para um futuro melhor. Em muitas situagées, porém, as me- lhorias foram decepcionantes e 0 quadro final, aterrador, com recursos desperdicados e funciondrios dispensados, apreensivos ou frustrados. 4 Liderando mudancas De qualquer forma, o prego da mudanga é inevitdvel. Sempre que comunidades humanas sao forcadas a se ajustar a condi¢ées de refor- mulacdo, enfrentam dor. No entanto, uma boa quantidade de perda e angustia que testemunhamos na década passada pode ser evitada. Nés cometemos muitos erros, e os mais comuns séo os que vém a seguir. Ero 1: PERMITIR A COMPLACENCIA EXCESSIVA Com certeza, 0 maior equivoco que as pessoas cometem ao tentar mu- dar as empresas é mergulhar no projeto sem estabelecer um alto sen- so de urgéncia nos gerentes ¢ funciondrios. Esse erro é fatal porque as transformacées nunca atingem seus objetivos quando os niveis de complacéncia sao elevados. Quando Adrien foi nomeado chefe da divisio de produtos qui- micos de uma grande corporac4o, vislumbrou no horizonte muitos problemas e oportunidades, e a maioria resultava da globalizagao de seu setor. Como um executivo preparado e autoconfiante, ele traba- Ihou dia ¢ noite para langar diversas novas iniciativas para a criacdo de negécios e margens em um mercado altamente competitivo. Ele percebeu que poucas pessoas na empresa viam os perigos ¢ as possi- bilidades tao claramente quanto ele, mas achou que isso néo era um problema insuperdvel. Eles poderiam ser estimulados, influenciados ou substituidos. Dois anos depois de sua promogio, Adrien observava uma inicia- tiva apés a outra afundar no mar da complacéncia. A despeito de seus incentivos e ameacas, a primeira fase da estratégia de seu novo produ- to demorou tanto para ser implementada que as ac6es da concorrén- cia compensaram qualquer beneficio importante. Ele nao conseguiu recursos da empresa suficientes para seu grande projeto de reenge- nharia. Uma tentativa de reorganizagao foi silenciada por habii obstrucionistas da equipe. Frustrado, Adrien abandonou seu pessoal e partiu para uma empresa bem menor, que ja estava implementando com éxito muitas de suas ideias. Em seguida, em uma batalha sutil de mais dois anos, ele observou com incredulidade e horror como idosos Organizagées em transformaséo: Por que as empresas falham = 5 as pessoas em sua diviséo com pouco senso de urgéncia nao apenas ignoravam todas as intensas aulas da histéria recente da aquisi¢ao, como realmente reprimiam a capacidade de a nova unidade continuar a fazer o que vinha fazendo tao bem. Pessoas inteligentes como Adrien falham ao criar a necesséria urgén- cia no inicio da transformacao de uma empresa por muitas razées dife- rentes, porém inter-relacionadas. Elas superestimam 0 quanto podem impulsionar grandes mudancas em uma organiza¢do e subestimam a dificuldade de retirar as pessoas de suas areas de conforto. Elas nao reco- nhecem o quanto suas préprias ages podem inadvertidamente reforcar © status quo. Elas so impacientes com as agées preliminares, partin- do o mais répido possivel para 0 projeto em si. Essas pessoas sentem- se paralisadas pelas possibilidades desvantajosas associadas 4 reduco da complacéncia: pessoas na defensiva, pouca confianga e resultados inexistentes no curto prazo. Ou, ainda pior, elas confundem urgéncia com ansiedade e, deixando-se levar pela segunda, afundam as pessoas mais e mais em suas trincheiras e criam uma resisténcia ainda maior & mudanga. Se o nivel de complacéncia fosse baixo na maioria das empresas, esse problema seria de pouca importancia. Mas a verdade é exatamen- te o contrario. Muito sucesso passado, auséncia de crises visiveis, bai- xos padrées de desempenho, feedback insuficiente de componentes externos significam: “Sim, nés temos problemas, mas eles nao sao tao terriveis e eu estou fazendo bem meu trabalho” ou “Certo, nés temos grandes problemas ¢ eles estao todos ali”. Sem um senso de urgéncia, as pessoas néo empreendem aquele esforco extra que geralmente é essencial. Elas nao fazem os sacrificios necessdrios e, em vez disso, aderem ao status quo ¢ resistem as iniciativas dos superiores. Como consequéncia, a reengenharia vai por agua abaixo, as novas estratégias deixam de ser implementadas corretamente, as aquisi¢g6es nao sao as- similadas de forma adequada, o downsizing nunca atinge aquelas des- pesas menos necessdrias e os programas da qualidade tornam-se mais uma conversa burocratica superficial do que uma verdadeira matéria empresarial. 6 — Liderando mudancas Erro 2: FALHAR NA CRIAGAO DE UMA COALIZAO ADMINISTRATIVA FORTE Dizem que uma grande mudanga é impossivel a menos que o presidente da empresa ofereca apoio efetivo. O assunto tratado aqui vai além. Nas transformacées bem-sucedidas, o presidente, o gerente-geral da divisio ou o chefe de departamento e mais outras 5, 15 ou 50 pessoas empe- nhadas em melhorar o desempenho trabalham em conjunto como uma equipe. Esse grupo raramente inclui todos os ocupantes dos cargos mais elevados, pois alguns nao dardo seu aval, pelo menos a princfpio. Con- tudo, na maioria dos casos de sucesso, a coaliz4o é sempre fonte para a obtencio de titulos formais, informagées e experiéncia, reputacao, relagdes e capacidade de lideranga. Individuos isolados, independen- temente de sua competéncia ou carisma, nunca possuem as qualidades necessdrias para vencer a tradicao e a inércia, exceto em organizacées bem pequenas. Em geral, as comissées fracas so ainda menos eficazes. Os projetos que nao contam com uma coaliz4o administrativa forte podem apresentar progresso aparente por algum tempo. A estrutura orga- nizacional poderia ser modificada, ou um trabalho de reengenharia seria iniciado. Porém, mais cedo ou mais tarde, as forcas contrarias prejudi- cam essas iniciativas. Na batalha dos bastidores entre um tinico executivo ou uma comissio fraca e a tradicao, interesses pessoais de curto prazo, ou algo parecido, esses tiltimos quase sempre vencem. Tais projetos impe- dem que a mudanca estrutural produza as mudangas de comportamen- to necessérias, destroem a reengenharia através da resisténcia passiva por parte de funciondrios e gerentes e transformam programas de qualidade em fonte de mais burocracia, e nao de satisfagao do cliente. Como diretora de recursos humanos de um grande banco com sede nos Estados Unidos, Claire estava consciente de que sua autoridade era limitada e de que ela nao estava em boa posi¢ao para liderar iniciati vas fora do departamento de pessoal. No entanto, com uma crescente frustragao quanto a incapacidade de sua empresa de responder as novas pressdes da concorréncia exceto por meio de demissées, ela aceitou pre- sidir uma forga-tarefa de “melhoria da qualidade”. Os dois anos seguin- tes seriam os menos satisfatérios de toda a sua carreira. Organizasées em transformaséo: Por que as empresas falham = 7 A forca-tarefa nao incluiu nem mesmo um dos trés gerentes de li- nhas-chave da empresa. Apés encontrar grande dificuldade para pro- gramar a primeira reuniao — alguns membros da comisséo diziam estar excepcionalmente ocupados -, ela soube que estava em apuros. E nada melhorou muito depois disso. A forca-tarefa tornou-se uma caricatu- ra de todas as comiss6es ruins: lenta, politica e desagradével. A maior parte do trabalho foi realizada por um pequeno e dedicado subgrupo. No entanto, outros membros da comissao e os gerentes de linhas-chave manifestaram pouco interesse ou compreenso das atividades desse gru- Po, e praticamente nenhuma das recomendacées foi implementada. A forga-tarefa sobreviveu por 18 meses e depois caiu no esquecimento. A falha aqui normalmente esta associada 4 subestimagao das difi- culdades de producao da mudanga e, assim, da importancia de uma coalizéo forte. Mesmo quando a complacéncia é€ relativamente baixa, as empresas com um histérico pequeno de transformac4o ou traba- lho em equipe geralmente desvalorizam a necessidade de tal equipe ou supéem que ela pode ser conduzida por um executivo do quadro de recursos humanos, qualidade ou planejamento estratégico, e nao por um gerente de linha-chave. Independentemente da capacidade ou da dedicagao do chefe da equipe, as coalizées administrativas sem uma lideranga forte parecem nunca alcangar o poder necessdrio para vencer © que frequentemente sao fontes macigas de inércia. ErRo 3: SUBESTIMAR O PODER DA VISAO A urgéncia e uma equipe administrativa forte so condigées necessdrias porém insuficientes para uma grande mudanga. Dos elementos restan- tes que est4o sempre presentes em transformacées bem-sucedidas, ne- nhum é mais importante do que uma visao sensata. A visao exerce importante funcao na produgao de uma mudanca itil ao ajudar a dirigir, alinhar e inspirar aces por parte de um grande numero de pessoas. Sem uma visdo correta, um esforgo de transfor- maco pode facilmente ser dissolvido em uma lista de projetos con- fusos, incompativeis e demorados, que conduzem na diregao errada, ou nao chegam a lugar algum. Sem uma visio precisa, 0 projeto de 8 — Liderando mudangas reengenharia do departamento de contabilidade, a nova avaliagdo total de desempenho do departamento de recursos humanos, o programa de qualidade da fabrica e 0 projeto de mudancas culturais no setor de ven- das nao representarao acréscimos significativos nem irao encorajar a energia necessdria para a implementag4o adequada de qualquer uma dessas iniciativas. Ao sentirem dificuldade de realizar mudangas, algumas pessoas ten- tam discretamente manipular os acontecimentos nos bastidores e, de forma intencional, evitam qualquer avaliacéo publica sobre a futura di- recao. Entretanto, sem uma viséo que guie 0 processo decisério, toda escolha com a qual um funciondrio se defrontar poder4 transformar- se em um intermindvel debate. A menor das decisées pode gerar um. caloroso conflito que esgota as energias e destréi a confianga. Opgées tdticas insignificantes podem dominar as avaliacoes e desperdicar horas de tempo precioso. Em muitas transformagées fracassadas, vocé encontra planos e pro- gramas que tentam desempenhar o papel da visto. Como todo-poderoso responsavel pela qualidade de uma empresa de comunicagées, Conrad gastou muito tempo e dinheiro produzindo grossos cadernos nos quais descrevia minuciosamente seu projeto de mudanga. Esses livros expli- cavam procedimentos, metas, métodos e prazos. Em nenhum lugar, porém, havia uma instrucdo clara e encorajadora sobre para onde tudo aquilo levava. Nao surpreendeu muito que, ao distribuir centenas desses cadernos, ele deparasse com a confusao ou a alienacdo de seus funcio- ndrios. Esses livros grossos néo os uniam nem os inspiravam para a mu- danga. Na verdade, eles podem ter surtido justamente efeito contrario. Em projetos de transformacdo malsucedidos, a geréncia algumas ve- zes realmente tem um sentido de direcao, mas ele ¢ complicado ou nebuloso demais para ter utilidade. Recentemente, pedi ao CEO de uma empresa de manufatura inglesa de médio porte que descrevesse sua viséo e recebi de volta um discurso de 30 minutos de dificil com- preensio. Ele falou a respeito das aquisigées que esperava fazer, de uma nova estratégia de marketing para um dos produtos, de sua defini¢ao de “cliente em primeiro lugar”, dos planos para a contratacao de um novo executivo em nivel de diretoria, das raz6es do fechamento do escritério de Dallas e muito mais. Enterrados nisso tudo, estavam os elementos Onganizasées em transformaséo: Por que as empresas falham = 9 bdsicos de uma diregdo coerente para o futuro; enterrados, profunda- mente enterrados. Uma regta util: sempre que vocé nao puder descrever a visio que conduz uma iniciativa de mudanga em cinco minutos ou menos ¢ ob- tiver uma reac4o que signifique compreensio e interesse, vocé tem um problema. ERRo 4: COMUNICAR A VISAO DE FORMA INEFICIENTE Uma grande mudanga normalmente € impossivel a menos que a maio- tia dos funcionarios deseje ajudar, geralmente até 0 ponto de fazer sa- crificios no curto prazo. No entanto, as pessoas nao fardo sacrificios, ainda que estejam insatisfeitas com o status quo, a nao ser que imaginem que os beneficios potenciais da mudanga s4o atraentes e a menos que acreditem realmente que uma transformagao é possivel. Sem uma co- municac4o confidvel, e em grande quantidade, os coragées e as mentes dos funciondrios nunca serao conquistados. Ha trés padrées comuns de comunicacio ineficaz, todos guiados por habitos desenvolvidos em momentos mais estaveis. No primeiro caso, um grupo desenvolve de fato uma visdo muito boa da transformagao e, em seguida, tenta promové-la lancando mao de umas poucas reunides ou enviando apenas alguns memorandos. Seus membros, tendo assim utilizado apenas a menor frac4o da comunicagao anual interna da em- Presa, reagem com espanto quando as pessoas parecem nao entender © novo método. No segundo padrao, o diretor da empresa gasta um. tempo considerdvel fazendo discursos para grupos de funciondrios, mas a maioria dos gerentes fica praticamente em siléncio. Aqui, a vis4o cap- ta uma parcela maior da comunicagao anual total do que no primeiro caso, porém o volume ainda é lamentavelmente inadequado. No tercei- ro padrao, hd um trabalho maior de utilizag4o de boletins e discursos, mas alguns individuos altamente perceptiveis ainda se comportam de maneira oposta A visao, e o resultado é que o ceticismo entre os grupos aumenta, enquanto a confianga na nova mensagem diminui. Um dos melhores executivos que conhego admite ter falhado aqui no inicio da década de 1980. “Na época’”, diz ele, “era como se estivéssemos 10 Liderando mudangas tendo muito trabalho na tentativa de comunicar nossas ideias. Mas, alguns anos mais tarde, pudemos ver que aquilo que alcangamos estava muito aquém do esperado. Pior ainda, algumas vezes tomamos decisdes que os outros achavam incoerentes com nossa comunica¢ao. Tenho certeza de que alguns funciondrios acharam que éramos um bando de esttipidos”. A comunicagao ocorre tanto por meio de palavras como de agées. A Giltima é, em geral, a forma mais poderosa. Nada prejudica mais a mudanga do que individuos importantes que se comportam de forma incoerente com a comunicagio verbal. E isso é muito comum, até mes- mo em algumas empresas bem-conceituadas. Erro 5: PERMITIR OBSTACULOS QUE BLOQUEIAM A NOVA VISAO A implementacao de uma grande mudanga de qualquer tipo requer a agéo de um grande ntimero de pessoas. Novas iniciativas fracassam com muita frequéncia quando os funciondrios, ainda que apoiem a nova vi- so, sentem-se impotentes contra imensos obstaculos em seus caminhos. Em algumas ocasiées, esses obstdculos s4o apenas fruto da imaginacao das pessoas, e o desafio é convencé-las de que nao existem barreiras ex- ternas. Contudo, em muitos casos, os bloqueios sao bem reais. As vezes, 0 obstaculo é a estrutura da empresa. Categorias de empre- go reduzidas podem prejudicar os esforcos para aumentar a produtivi- dade e melhorar 0 atendimento ao cliente. Os sistemas de compensacao ou avaliagéo do desempenho podem forcar as pessoas a optar pela nova visio ou por seus interesses pessoais. Talvez 0 pior de tudo sejam os supervisores que nao querem adaptar-se a novas circunstancias e que fazem exigéncias inconsistentes com a transformacao. Um obstdculo no lugar certo pode interromper todo um processo de mudanga. Assim aconteceu com Ralph. Seus funciondrios em uma grande empresa da rea financeira o chamavam de “A Rocha”, um ape- lido que ele preferiu interpretar sob um aspecto favoravel. Ralph fin- giu exaltar os esforgos de uma grande mudanga de sua empresa, mas nao alterou seu comportamento nem encorajou seus gerentes a mudar. Ele nao correspondeu as ideias manifestadas na visio de mudanca ¢ Organizagées em transformagao: Por que as empresas falham = WA permitiu que os sistemas de recursos humanos permanecessem intactos mesmo quando se mostravam claramente inconsistentes com os novos ideais. Com essas ag6es, Ralph teria sido destrutivo em qualquer cargo gerencial. Acontece, porém, que ele no estava em qualquer cargo ge- rencial; ele era 0 executivo ntimero trés de sua empresa. Ralph agiu daquela forma porque nao acreditava que sua empresa precisasse de grandes mudancas, e também com receio de nao produ- zir a mudanga nem os resultados operacionais esperados. Ele nao foi punido por sua atitude porque a empresa nao tinha um histérico de confrontacdo de problemas de pessoal entre executivos, porque algumas pessoas 0 temiam e também porque seu diretor-geral estava preocupado com a possivel perda de um colaborador talentoso. O resultado foi um. desastre. Os gerentes subordinados chegaram a conclusao de que a alta diretoria os havia enganado quanto a seu compromisso com a transfor- magio, 0 ceticismo cresceu e todo o trabalho foi por 4gua abaixo. Toda vez que pessoas inteligentes e bem-intencionadas evitam encarar os obstaculos, enfraquecem os funciondrios e prejudicam a mudanga. Erro 6: FALHAR NA CRIAGAO DE VITORIAS DE CURTO PRAZO As verdadeiras transformagées levam tempo. Esforcos complexos volta- dos para estratégias de mudanga ou reestruturagao dos negécios correm 0 risco de perder o impulso se nao houver metas no curto prazo a serem atingidas e comemoradas. A maioria das pessoas néo acompanharé a lon- ga batalha se, dentro de 6 a 18 meses, nao encontrar provas de que a jornada est4 produzindo os resultados esperados. Sem vitérias no curto prazo, muitos funciondrios irao desistir ou resistir ativamente. A criacéo de conquistas no curto prazo é diferente de esperar por elas. A ultima é passiva, ao passo que a primeira é ativa. Em uma trans- formagao de sucesso, os administradores procuram ativamente meios de obter nitidas melhorias de desempenho, estabelecer metas no sistema de planejamento anual, alcangar esses objetivos e premiar as pessoas envolvidas com reconhecimento, promogées ou dinheiro. Nas inicia- tivas de mudanga fracassadas, os esforcos sistemdticos para garantir vitérias concretas dentro de 6 a 18 meses séo muito menos comuns. 12 Liderando mudangas Os administradores presumem que as boas coisas irao acontecer, ou fi- cam t4o seduzidos por uma viséo grandiosa que nao se preocupam com Os acontecimentos no curto prazo. Nelson era, por natureza, uma pessoa de “grandes ideias”. Com a ajuda de dois colegas, ele desenvolveu uma ideia de como seu grupo de controle de estoque (IC — Inventory Control) poderia usar novas tecno- logias para reduzir radicalmente os custos de estoque, sem correr 0 risco de insuficiéncia de produtos. Os trés gerentes empenharam-se na im- plementagao de sua visao por um ano, e depois dois. Pelos seus préprios padroes, eles obtiveram um grande retorno: novos modelos de IC fo- ram desenvolvidos, um novo hardware foi comprado e novos softwares foram criados. Pelos padrées dos céticos, especialmente o controlador da diviséo, que queria ver uma grande reducao dos estoques ou algum. outro beneficio financeiro que compensasse os custos, os gerentes nao produziram nada. Quando questionados, eles explicavam que as gran- des mudangas exigiam tempo. O controlador aceitou esse argumento por dois anos e depois cancelou o projeto. As pessoas geralmente reclamam de serem forgadas a obter vitérias no curto prazo, mas, nas circunstancias corretas, esse tipo de pressao pode ser um elemento util em um processo de mudanga. Quando se torna evidente que os programas de qualidade ou projetos de transformacao cultural sero demorados, os niveis de urgéncia geralmente caem. Os compromissos com a obtengao de vitérias répidas podem ajudar a man- ter a complacéncia baixa e encorajar o pensamento analitico, o que pode, convenientemente, esclarecer ou corrigir as vis6es da transformag’o. No caso de Nelson, essa pressio poderia ter forcado algumas cor- regées financeiramente vantajosas e acelerado implementagées parciais dos novos métodos de controle de estoque. E com algumas vitérias no curto prazo, esse projeto altamente vantajoso provavelmente teria so- brevivido e ajudado a empresa. Erro 7: DECLARAR PREMATURAMENTE A VITORIA Apés alguns anos de muito trabalho, as pessoas podem sentir-se ten- tadas a declarar a vitéria do projeto de uma grande mudanga com a Organizagées em transformagao: Por que as empresas falham 13 primeira melhoria considerdvel no desempenho. Embora seja bom co- memorar uma conquista, qualquer insinuacao de que o trabalho esteja praticamente conclufdo costuma ser um erro terrivel. Enquanto as mu- dangas nao estiverem profundamente assimiladas, 0 que, em uma em- presa inteira, pode levar de 3 a 10 anos, os novos métodos estao frageis € sujeitos a regressao. Nos ultimos anos, tenho observado que varios projetos de mudanga giram em torno da reengenharia. Em todos os casos, exceto dois, a vité- tia foi declarada e os caros consultores foram pagos e liberados quando © primeiro grande projeto foi concluido, apesar da pouca ou quase ne- nhuma prova de que os objetivos originais tivessem sido alcangados ou de que os novos métodos estivessem sendo aceitos pelos funcionarios. Depois de alguns anos, as mudangas proveitosas que haviam sido in- troduzidas comecaram lentamente a desaparecer. Em 2 dos 10 casos, é dificil encontrar hoje qualquer trago do trabalho de reengenharia. Recentemente, perguntei 4 diretora de uma empresa de consulto- ria em reengenharia se esses casos eram incomuns. Ela respondeu: “De modo algum, infelizmente. Para nés, é altamente frustrante trabalhar por alguns anos, realizar algo e, em seguida, ter 0 esforco prematura- mente interrompido. Isso ainda ocorre com muita frequéncia. O con- ceito de tempo de muitas corporagées é curto demais para concluir esse tipo de trabalho e estabiliza-lo.” Nas tiltimas décadas, tenho visto o mesmo tipo de coisa acontecer com projetos da qualidade, trabalhos de desenvolvimento de organizagées ¢ muito mais. Em geral, os problemas comegam no inicio do processo: 0 nivel de urgéncia nao é intenso o suficiente, a coaliz4o administrativa nao é forte o bastante ou a viséo nao est4 muito clara. Contudo, a comemora- 40 prematura da vitéria interrompe o impulso e, em seguida, as podero- sas forcas ligadas & tradicao assumem 0 controle da situagao. Ironicamente, uma combinacao de idealistas iniciadores de transfor- mages e opositores individualistas e resistentes 4 mudanga frequente- mente cria o problema. Em seu entusiasmo diante de um claro sinal de Progresso, os iniciadores tomam atitudes extremas. A eles, juntam-se 0s opositores, que, rapidamente, encontram a oportunidade de minar © projeto. Apés a comemorago, os opositores apontam para a vitéria como um sinal de que a guerra acabou e que as tropas devem se retirar. 14 Liderando mudangas As tropas, cansadas, deixam-se convencer da vitéria. Uma vez em casa, os soldados relutam em retornar ao front. Logo em seguida, a mudanga é interrompida e tradic¢ées irrelevantes ressurgem. Declarar vitéria antes do tempo é como cair em um bueiro do ca- minho da mudanga significativa. E, por diversas raz6es, mesmo pessoas inteligentes n4o apenas caem nesse buraco; algumas vezes, elas pulam nele com os dois pés. Erro 8: NEGLIGENCIAR A INCORPORAGAO SOLIDA DE MUDANGAS A CULTURA CORPORATIVA Na anilise final, a mudanga é estabelecida somente quando se torna “a maneira de fazermos as coisas por aqui”, quando ela penetra no sangue da unidade de trabalho ou corpo empresarial. Até os novos comporta- mentos se enraizarem nas normas sociais e nos valores comuns, estéo sempre sujeitos 4 deteriorac4o tao logo as pressdes associadas ao proces- so de mudanga sejam removidas. Dois fatores s4o particularmente importantes na incorporacao de novos métodos a cultura de uma empresa. O primeiro é a tentativa consciente de mostrar as pessoas como determinados comportamentos atitudes tém ajudado a melhorar o desempenho. Quando as pessoas so levadas a estabelecer as conexées por si mesmas, como frequentemente acontece, podem facilmente criar ligag6es imprecisas. Uma vez que a mudanga ocorreu quando a carismatica Coleen era chefe de departa- mento, muitos funcionarios vincularam as melhorias de desempenho a seu estilo extravagante, e nao A nova estratégia “o cliente em primeiro lugar”, que, verdade, tinha feito a diferenca. Como consequéncia, a lig4o incorporada & cultura foi “Valorize Gerentes Extrovertidos”, em. vez de “Ame Seu Cliente”. Aestabilizacao da mudanca também requer que tempo suficiente seja usado para assegurar que a proxima geraco administrativa ird realmen- te personificar 0 novo método. Se os critérios de promogao nao forem reformulados, o que é outro erro comum, as transformagées raramente irao durar. Uma decis4o de sucessao incorreta no nivel mais elevado da organizagéo pode prejudicar uma década de muito trabalho. Organizagées em transformagao: Por que as empresas falham 1S Decis6es incorretas quanto a promocées em altos cargos das empre- sas ocorrem quando os diretores nao sao parte integral do esforgo de mudanga. Em trés situagées que presenciei recentemente, os campedes da mudanga eram CEOs prestes a se aposentar. Embora seus sucessores nao fossem opositores, também nao eram lideres de mudangas. Como os diretores nao entendiam as transformagées de forma detalhada, nao poderiam perceber o problema relacionado a sua escolha de sucessores. Em um dos casos, o CEO prestes a se aposentar tentou, sem sucesso, indicar aos diretores um candidato menos preparado que melhor perso- nificava os novos métodos de trabalho da empresa. Nos outros casos, os CEOs no resistiram as escolhas da diretoria porque achavam que suas transformacées nao poderiam ser desfeitas. Todos eles, porém, estavam. equivocados. Em apenas alguns anos, os sinais de renovacao e fortaleci- mento das organizac6es comegaram a desaparecer nas trés empresas. E aqui que pessoas inteligentes erram o alvo quando se mostram insensiveis a quest6es culturais. Pessoas da drea financeira economica- mente orientadas e engenheiros de natureza analitica podem achar que normas e valores sociais estao fora de sua realidade. Desse modo, igno- ram a cultura — por sua conta € risco. Os o1TO ERROS Nenhum desses erros relacionados 4 mudanga traria tantos prejuizos em um mundo mais lento e menos competitivo. Lidar rapidamente com novas iniciativas nao é um componente basico para o sucesso em ambientes esta- veis ou do tipo cartel. O problema que nos aflige hoje em dia é que essa es- tabilidade nao é mais a regra. A maioria dos especialistas concorda que, nas préximas décadas, o mundo dos negécios se tornaré apenas mais instavel. Permitir que qualquer um dos oito erros se torne comum no proje- to de transformaga4o pode trazer sérias consequéncias (ver Figura 1.1). Reduzir a velocidade das novas iniciativas, criar uma resisténcia desne- cessdria, frustrar os funciondrios interminavelmente e, as vezes, sufo- car completamente as mudangas necessdrias, em resumo, qualquer um desses erros poderia causar o fracasso de uma empresa em oferecer os produtos e servicos que as pessoas desejam a precos compativeis, Em 16 —_Liderando mudangas seguida, os orcamentos s4o reduzidos, pessoas sio demitidas e aqueles que permanecem sao submetidos a grande estresse. O impacto sobre familias e comunidades pode ser devastador. No momento em que es- crevo isto, o fator de apreensdo gerado por essa atividade perturbadora esta atingindo até mesmo as politicas presidenciais. ERROS COMUNS + Permitir complacéncia excessiva + Falhar na criagéo de uma coalizéo administrativa forte ‘+ Subestimar 0 poder da visio ‘+ Comunicar a visdo de forma ineficiente + Permitir que obstaculos bloqueiem a nova vis&o + Falhar na criagao de vitérias a curto prazo + Declarar vitéria prematuramente + Negligenciar a incorporagao s6lida de mudangas & cultura corporativa CONSEQUENCIAS * As novas estratégias nao sao implementadas corretamente * As aquisigdes nao atingem os efeitos esperados * Areengenharia é lenta e dispendiosa * QO downsizing nao mantém os custos sob controle * Os programas de qualidade nao apresentam os resultados desejados Figura 1.1 Oito erros comuns a projetos de mudanga e suas consequéncias Esses erros nao sdo inevitdveis. Com consciéncia e habilidade, po- dem ser evitados ou pelo menos atenuados. A chave esta em entender por que as empresas resistem 4 mudanga necesséria, 0 que é exatamente © processo de varios estdgios que pode vencer a inércia destrutiva e, principalmente, como a lideranga necessaria para conduzir esse proces- so de uma forma socialmente saudavel significa mais do que um bom gerenciamento. CAPITULO A mudanca bem-sucedida e sua forca motriz A pessoas que passaram por esforgos de mudanga dificeis, dolo- rosos e nao muito bem-sucedidos geralmente acabam por tirar conclusées pessimistas ¢ irritadas. Elas passam a suspeitar dos motivos dessa necessidade de transforma¢o; preocupam-se com a impossibi- lidade de que essa importante mudanga seja realizada sem mortos ou feridos; temem que o chefe seja um monstro e que boa parte da geréncia seja incompetente. Apés assistir a dezenas de esforcos para aperfeicoar o desempenho organizacional através de reestruturacao, reengenha- ria, programas da qualidade, fusdes e aquisig6es, renovagao cultural, downsizing ¢ redirecionamento estratégico, cheguei a uma conclusao diferente. As evidéncias mostram que a maioria das empresas publi- cas e privadas pode aperfeicoar-se de forma significativa, a um custo aceitavel, mas que frequentemente cometemos enganos terriveis quan- do tentamos isso, pois a historia nao nos preparou para os desafios de transformacio. 18 —_Liderando mudangas A GLOBALIZAGAO DOS MERCADOS E A CONCORRENCIA As pessoas de minha gerac4o, ou as mais velhas, nao cresceram numa era em que a transformag4o fosse comum. Com menos concorréncia global e um ambiente de transformagées lentas em termos de negécios, a norma do passado consistia em estabilidade, e o lema dominante era: “Se nao quebrou, néo mexa.” A mudanga ocorria de forma incremental e com pouca frequéncia. Se vocé tivesse dito a um tipico grupo de ge- rentes em 1960 que os executivos hoje, no perfodo de um ano e meio a trés anos, tentariam aumentar a produtividade em 20% a 50%, me- Ihorar a qualidade em 30% a 100% e reduzir os periodos de desenvol- vimento de novos produtos em 30% a 80%, eles ririam de vocé. Essa magnitude de mudangas em tao curto periodo seria inaceitavel em suas experiéncias pessoais. Os desafios que enfrentamos agora s4o diferentes. Uma economia globalizada est4 gerando mais riscos e oportunidades para todos, for- cando empresas a fazer melhorias notaveis nao apenas para competir € prosperar, mas apenas para sobreviver. A globalizacio, por sua ver, esta sendo impulsionada por um vasto e poderoso conjunto de forgas associadas 4 mudanga tecnolégica, 4 integragao econémica internacio- nal, ao amadurecimento do mercado interno dentro dos paises mais desenvolvidos ¢ ao colapso do comunismo em todo o mundo. (Ver Figura 2.1.) Ninguém esté imune a essas forcas. Mesmo as empresas com ven- das restritas a pequenas regides geograficas podem sentir 0 impacto da globalizacao. As vezes, a rota de influéncia é indireta: a Toyota supera a GM, esta demite os funcionarios, os funciondrios com orcamentos apertados exigem servicos mais baratos da lavanderia a seco da esquina. Da mesma forma, as escolas, os hospitais, as instituigdes beneficentes € as repartic6es publicas estao sendo forcados a tentar uma melhoria. O problema é que a maioria dos gerentes nao tem histérico ou legado para orienté-los nisso. Com base no registro de acompanhamento de muitas empresas ao longo das duas décadas passadas, algumas pessoas concluiram que as organizag6es n4o so capazes de mudar muito, e que devemos aprender a aceitar esse fato. No entanto, essa avaliagdo nao deve ser considerada A mudanga bem-sucedida e sua forga motriz 19 MUDANGA INTEGRAGAO | |AMADURECIMENTO| | QUEDA DOS TECNOLOGICA ECONOMICA DOS MERCADOS REGIMES + Comunicacao INTERNACIONAL NOS PAISES COMUNISTA E melhor e mais + Menos tarifas DESENVOLVIDOS SOCIALISTA répida (GATT) '+ Crescimento + Mais paises liga- ‘Transporte melhor| |*Moedas correntes| | interno mais dos ao sistema e mais rapido ligadas portaxas | | lento capitalista + Mais redes de de cambio \+ Exportadores + Mais privatiza- informages flutuantes. mais agressivos goes conectando + Mais fluxos de '+ Mais desregula- pessoas capital global mentagao mundialmente | | | | A GLOBALIZAGAO DOS MERCADOS E A CONCORRENCIA (a MAIS MAIS RISCOS OPORTUNIDADES ‘*Maior concorréncia | | * Mercados maiores + Maior velocidade ‘+ Menos barreiras | | MAIS MUDANGAS EM GRANDE ESCALA NAS ORGANIZAGOES Para evitar riscos e/ou capitalizar oportunidades, as empresas devem tornar-se concorrentes mais fortes. Os métodos tipicos de transformagao incluem: + Reengenharia + Fusdes e aquisicdes + Reestruturagao + Mudanga estratégica + Programas da qualidade ‘+ Mudanga cultural Fonte: De The New Rules: How to Succeed in Today's Post-Corporate World, de John P. Kotter. Copyright 1995, por John P. Kotter. Adaptado com permissao da The Free Press, uma diviséo de Simon & Schuster. Figura 2.1 Forcas econémicas e sociais que impulsionam a necessidade de uma grande mudanga nas organizacées para nenhuma das surpreendentes histérias bem-sucedidas de transfor- magio ocorridas ultimamente. Algumas organizagées tém descoberto como fazer as novas estratégias, aquisices, reengenharias, programas da qualidade e reestruturaco funcionarem maravilhosamente bem para elas. Essas empresas minimizaram os erros de mudanga descritos no Capitulo 1. No processo, safaram-se da faléncia ou saitam de um papel 20 Liderando mudancas intermedidrio para se transformar em lideres do setor, ou entao conse- guiram passar bem & frente de seus maiores rivais. Um exame dessas histérias de sucesso revela dois padrées importan- tes. Primeiro, a mudanga util tende a ser associada a um processo de varias etapas que gera forca e motivacdo suficientes para anular todas as fontes da inércia. Segundo, esse processo nunca é empregado de for- ma eficaz, a ndo ser que seja impulsionado por uma lideranga de alta qualidade, e nao apenas por um excelente gerenciamento — um aspecto importante que vird diversas vezes 4 tona quando falarmos sobre a ins- titui¢go de uma mudanga organizacional significativa. O PROCESSO DE MUDANGA EM OITO ETAPAS Todos os métodos adotados nas transformagées bem-sucedidas ba- seiam-se em um critério essencial: 0 de que a mudanga fundamen- tal nao acontecerd facilmente por uma longa lista de razdes. Mesmo que um observador de objetivos possa enxergar claramente que os custos s4o altos demais, ou que os produtos nao s4o suficientemen- te bons, ou que as necessidades inconstantes dos clientes nao estao sendo adequadamente atendidas, a mudanga necessdria ainda pode estagnar por causa de culturas centradas em necessidades internas, bu- rocracia paralisante, politicas provincianas, baixo nivel de confianga, falta de trabalho em equipe, atitudes arrogantes, falta de lideranga na geréncia intermedidria e medo que o homem tem do desconhecido. Para obter sucesso, um método projetado para alterar estratégias, fazer reengenharia de processos ou melhorar a qualidade deve lidar com essas barreiras, e muito bem. Todos os diagramas tendem a simplificar excessivamente a realidade. Portanto, apresento a Figura 2.2, a seguir, com alguma apreensao. Ela resume as etapas da producao de mudangas bem-sucedidas de qualquer magnitude nas organizacées. O processo tem oito etapas, e cada uma delas associada a um dos oito erros fundamentais que minam os esfor- cos de transformagao. As etapas s4o: estabelecimento de senso de urgén- cia, criacao de uma coalizao administrativa, desenvolvimento de uma visdo e estratégia, comunicagio da visio de mudanga, como atribuir A mudanga bem-sucedida e sua forga motriz 21 11 ESTABELECIMENTO DE UM SENSO DE URGENCIA ‘+ Exame do mercado e das realidades dos concorrentes + Identiicagao e discussdo das crises, crises potenciais ou oportunidades fundamentals. 2 CRIAGAO DE UMA COALIZAO ADMINISTRATIVA ‘+ Formagao de um grupo com autoridade suficiente para liderar a mudanga ‘+ Motivagao do grupo para que trabalhe junto, como um time 3 DESENVOLVIMENTO DE UMA VISAO E ESTRATEGIA * Criagao de uma visdo para ajudar a direcionar 0 estorgo de mudanga + Desenvolvimento de estratégias para coneretizar essa visao ‘4 COMUNICAGAO DA VISAO DA MUDANCA + Uso de cada veiculo possivel para comunicar constantemente a nova visdo e estratégias + Fazer a fungao da coalizao administrativa modelar o comportamento esperado dos funcionarios, ¥ 5 COMO INVESTIR DE EMPOWERMENT OS FUNCIONARIOS PARA AGOES ABRANGENTES + Eliminagao dos obstaculos ‘+ Mudanca de sistemas ou estruturas que minem a viséo da mudanca + Encorajamento para corte riscos ¢ usar ideas, atvidades © agdes nao tracionais, 6 REALIZAGAO DE CONQUISTAS DE CURTO PRAZO += Planejamento de melhorias visivels no desempenho, ou “conquista + Criagao dessas conquistas + Visivel reconhecimento e recompensa do pessoal que tornou as conquistas possiveis 7 CONSOLIDAGAO DE GANHOS E PRODUGAO DE MAIS MUDANGAS + Uso da maior credibildade para mudar todos os sistemas, estruturas e polticas incompativeis © que no se adequam & visio de transtormagéo + Contratarao, promocéo © desenvolvimento do pessoal que possa implementar a viséo de mudanca + Revigoramento do processo com novos projetos, temas e agentes de mudanga 8 ESTABELECIMENTO DE NOVOS METODOS NA CULTURA ‘+ Criagao de um melhor desempenho por meio de um comportamento voltado para o cliente @ a produtividade, de uma lideranga mais forte e melhor e de um gerenciamento mais eficaz + Articulagao das conexGes entre os novos comportamentos @ 0 sucesso organizacional ‘+ Desenvolvimento de meios para garantir 0 desenvolvimento e sucesso da lideranca Fonte: Adaptado de John P. Kotter, “Why Transformation Efforts Fail”, Harvard Business Review (marco- abril de 1995): 61. Reimpresso com autorizagéo. Figura 2.2 O processo em oito etapas da criagao de uma grande mudanga 22 Liderando mudangas empowerment aos funciondrios para ages abrangentes, realizacao de conquistas no curto prazo, consolidacao de ganhos e produgao de mais mudangas, e estabelecimento de novos métodos na cultura. As quatro primeiras etapas do processo de transformag’o ajudam a descongelar um status quo inflexivel. Se mudar fosse facil, vocé nao pre- cisaria de todo esse esforco. As fases de cinco a sete apresentam muitas praticas novas. A ultima etapa estabelece as mudangas na cultura corpo- rativa e auxilia sua implementacao. As pessoas pressionadas a mostrar resultados sempre tentarao pular fases — algumas vezes, muitas delas -, em um esforco de grande mudan- ca. Um executivo inteligente e capacitado me contou recentemente que suas tentativas de reorganiza¢4o estavam sendo bloqueadas pela maioria de sua equipe de gerenciamento. Nossa conversa, em resumo, foi esta: — Seu pessoal acredita que o status quo é inaceitdvel? — perguntei. —Eles realmente tém um senso de urgéncia? —Alguns, sim. Mas muitos, provavelmente, nao. — Quem esté estimulando essa mudanga? —Suponho que, na maioria das vezes, eu — reconheceu ele. —Vocé tem uma visao estimulante do futuro e das estratégias que lhe permitirao atingir essa meta e ajudarao a explicar por que essa reorganizacéo é necesséria? — Acho que sim — respondeu ele -, embora no esteja certo da clareza delas. — Vocé jé tentou fazer um resumo das visdes e estratégias em al- gumas folhas de papel? —Na verdade, nao. — Seus gerentes compreendem essa visao e acreditam nela? —Acho que trés ou quatro pessoas-chave estao de acordo — disse, reconhecendo em seguida —, mas eu no ficaria surpreso se muitos outros nao compreendessem 0 conceito ou nao acreditassem intei- ramente nele. No sistema de linguagem do modelo ilustrado na Figura 2.2, esse executivo passou logo para a fase 5 do processo de transformacdo, com sua ideia de reorganizacao. Mas como pulou a maior parte das etapas anteriores, encontrou um muro de resisténcia. Se ele tivesse impingido A mudanga bem-sucedida e sua forga motriz 23 a nova estrutura ao pessoal — o que poderia ter feito —, eles teriam en- contrado 1 milhdo de formas inteligentes para minar os tipos de mu- dangas comportamentais desejadas pelo executivo. Ele sabia disso; as- sim, permaneceu numa posi¢ao na qual nao tinha como reagir. Essa histéria nao é incomum. As pessoas frequentemente tentam transformar as organizag6es em- preendendo apenas as etapas 5, 6 e 7, especialmente se parecer que uma tinica decis4o — reorganizar, fazer uma aquisic¢4o ou demitir pessoas — mudard mais do que o necessdrio. Ou, entdo, as pessoas percorrem as etapas sem ao menos concluir a tarefa. Ou nao conseguem reforcar as etapas anteriores no decorrer do processo e, consequentemente, 0 senso de urgéncia se dissipa ou a coalizéo administrativa se rompe. A ver- dade é que, ao negligenciar qualquer das atividades preparatérias, de aquecimento (etapas de 1 a 4), vocé dificilmente estabelecerd uma base sdlida o suficiente para dar continuidade ao processo. E sem a atividade complementar da etapa 8 vocé nunca atingird a linha de chegada, nao conseguindo, portanto, implementar as mudangas. A IMPORTANCIA DA SEQUENCIA Uma mudanga bem-sucedida de qualquer magnitude passa por todas as oito etapas, geralmente na sequéncia mostrada na Figura 2.2. Embora ocorram normalmente varias fases ao mesmo tempo, ignorar uma tinica etapa ou adiantar-se demais sem ter uma base sdlida quase sempre gera problemas. Recentemente, pedi aos 12 funcionarios de cipula da diviséo de uma grande fabrica que avaliassem em que ponto do processo de mudanga estavam. Eles consideraram haver concluido 80% da etapa 1, 40% da etapa 2, 70% da etapa 3, 60% da etapa 4,40% da etapa 5, 10% da eta- pa 6 e 5% das etapas 7 e 8. Também disseram que seu progresso, que tinha ido bem por um ano e meio, estava se tornando lento, o que os deixava cada vez mais frustrados. Perguntei-lhes 0 que pensavam ser a origem do problema. Apés muita discussdo, eles se lembraram do “es- critério central da empresa”. Elementos-chave da empresa, inclusive o CEO, nao participavam o suficiente da coalizao administrativa, motivo 24 — Liderando mudancas pelo qual os 12 funciondrios da diviséo acreditavam que apenas 40% do trabalho da etapa 2 haviam sido conclufdos. Como principios de ordem mais elevada nao haviam sido decididos, eles concluiram que era quase impossivel estabelecer as estratégias mais detalhadas na etapa 3. A comunicagao da visao (etapa 4) estava sendo prejudicada, acreditavam os 12 integrantes da divisio, por mensagens da empresa que os fun- ciondrios interpretavam como inconsistentes com a nova orientagao. Da mesma forma, os esforcos de atribuicgéo de empowerment (etapa 5) estavam sendo sabotados. Sem uma visao mais clara, era dificil objetivar conquistas confidveis no curto prazo (etapa 6). Dando continuidade ao processo e nao enfrentando suficientemente o problema da etapa 2, eles tiveram a ilusao momentanea de progresso. Mas sem a base sdlida, todo esforco comecou a se mostrar vacilante. Normalmente, as pessoas pulam etapas por se sentirem pressionadas a produzir. Elas também inventam novas sequéncias porque alguma légica aparentemente razodvel determina essa escolha. Depois que se saem bem na fase de urgéncia (etapa 1), todos os esforgos de mudanga acabam por funcionar em varias fases ao mesmo tempo; no entanto, ini- ciar a agéo em qualquer ordem que nao seja a especificada na Figura 2.2 dificilmente funciona bem. Esse processo nao é criado nem desenvolvi- do de forma natural. Ele parece ser artificial, forgado ou mecdnico; nao gera o estimulo necessério para superar as poderosas fontes de inércia. PROJETOS DENTRO DE PROJETOS ‘A maioria das iniciativas de grande mudanga é composta por varios projetos menores que também tendem a passar pelo processo de varias etapas. Assim, em qualquer momento, vocé pode estar na metade do esforco geral, ter concluido algumas das partes menores e estar apenas iniciando outros projetos. O resultado liquido disso € comparado a ro- das dentro de rodas. Um exemplo tfpico é 0 de uma empresa de telecomunicagées de médio a grande porte: o esforgo geral, projetado para aumentar signifi- cativamente a posicdo competitiva da empresa, levou seis anos para ser concluido. Por volta do terceiro ano, a transformacdo estava centrada A mudanga bem-sucedida e sua forga motriz 25 nas etapas 5, 6 e 7. Um projeto de reengenharia relativamente peque- no estava quase chegando ao fim da etapa 8. Uma reestruturacdo das equipes da empresa acabara de comegar, tendo a maior parte do esforcgo centrado nas etapas 1 e 2. Um programa de qualidade estava em an- damento, mas fora do cronograma, enquanto algumas pequenas ini- ciativas finais ainda nao haviam sido postas em pratica. Os primeiros resultados se evidenciaram em 6 a 12 meses, mas 0 resultado maior sé se evidenciou quase no final do esforco geral. Quando uma organizacao passa por uma crise, 0 primeiro projeto de mudanga, dentro de um processo de transforma¢4o maior, frequen- temente consiste em um esforco para evitar a quebra da empresa ou mudar a situag4o com uma reviravolta. Por 6 a 12 meses, as pessoas executam a¢ées decisivas para interromper 0 fluxo de caixa negativo e manter a organizaco funcionando. O segundo projeto de mudanga deve estar associado a uma nova estratégia ou reengenharia. Isso pode ser seguido de uma mudanga estrutural ¢ cultural significativa. Cada um desses esforgos atravessa todas as oito etapas da sequéncia de mu- danga, e cada um tem uma fungao a desempenhar no processo de trans- formacao geral. Ja que estamos falando de varias etapas e projetos, o resultado final frequentemente é complexo, dinamico, confuso e assustador. No ini- cio, aqueles que tentam gerar uma mudanga significativa com processos simples, lineares analiticos quase sempre falham. Nao que a andlise seja inuitil. Uma reflexdo cuidadosa sempre é essencial; no entanto, ha muito mais elementos envolvidos aqui do que (a) a coleta de dados, (b) a identificagao de opgées, (c) a andlise e (d) a escolha. P: Entdo, o que levaria uma pessoa inteligente a confiar demais em pro- cessos simples, lineares e analiticos? R: Isso acontece porque ela aprendeu a gerenciar, e nao a liderar. GERENCIAMENTO VERSUS LIDERANGA O gerenciamento é um conjunto de processos que podem man- ter um complicado sistema de pessoas e tecnologias funcionando 26 — Liderando mudancas satisfatoriamente. Os aspectos mais importantes do gerenciamento in- cluem planejamento, orcamento, organizacao, recrutamento de pessoal, controle ¢ solugio de problemas. A lideranga é um conjunto de proces- sos que cria organizagGes em primeiro lugar ou as adapta para modificar significativamente as circunstancias. A lideranga define como deverd ser 0 futuro, alinha o pessoal a essa viséo e as inspira para a acio, apesar dos obstaculos (ver Figura 2.3). Essa distingéo é absolutamente crucial para nossos objetivos aqui: um olhar meticuloso nas Figuras 2.2 e 2.3 nos faz perceber que a trans- formacio bem-sucedida consiste em 70% a 90% de lideranca, ¢ apenas em 10% a 30% de gerenciamento. Ainda por quest6es histéricas, mui- tas organizag6es hoje em dia nao tém muita lideranca. E quase todos pensam que o problema aqui é 0 de mudanga de geréncia. Na maior parte do século XX, a medida que criamos, pela primeira vez na histéria da humanidade, milhares e milhares de grandes empre- sas, nao tivemos gerentes bons o suficiente para manter toda essa bu- rocracia em funcionamento. Por isso, tantas empresas e universidades desenvolveram programas na drea gerencial, e centenas e milhares de pessoas foram encorajadas a aprender gerenciamento no trabalho. E aprenderam. Mas essas pessoas receberam pouco ensinamento sobre li- deranga. Até certo ponto, o gerenciamento foi enfatizado por ser mais facil de ensinar do que a lideranga. No entanto, ainda mais do que isso, 0 gerenciamento era 0 compromisso principal na agenda do século XX, pois era o necessdrio, Para cada empresirio ou homem de negécios que fosse um lider, precisavamos de centenas de gerentes para conduzir suas empresas em constante crescimento. Infelizmente para nés, hoje essa énfase no gerenciamento tem sido institucionalizada com frequéncia nas culturas das empresas, que desen- corajam os funcionarios a aprender como liderar. De forma irénica, 0 sucesso do passado é, geralmente, o ingrediente-chave para produzir esse resultado. Como tenho observado em varias ocasides, a sindrome ocor- re do seguinte modo: o sucesso gera certo grau de dominio de mercado, que, por sua vez, gera muito crescimento. Depois de algum tempo, manter sob controle uma empresa em constante crescimento torna-se 0 principal desafio. Entao, a ateng4o volta-se para dentro e as competén- cias gerenciais sao alimentadas. Com forte énfase no gerenciamento, e A mudanga bem-sucedida e sua forga motriz 27 GERENCIA + Planejamento e orgamento: estabele- cimento de etapas detalhadas © crono- gramas para alcangar os resultados ne- cessdirios @, em seguida, alocacao dos recursos necessdrios para fazer a mu- danga acontecer + Organizacao e recrutamento de pes- soal: estabelecimento de uma estrutura para executar os requisitos do plano, re- crutamento de pessoal para essa estrutu- ra, delegacao de responsabilidades e autoridade para realizar o plano, forneci- mento de politicas e procedimentos que ajudarao a orientar 0 pessoal e criacao de métodos ou sistemas para monitorar a implementagao * Controle e soluco de problemas: mo- nitoragao de resultados, identificagao de desvios do plano, e planejamento e orga- nizago para que esses problemas sejam resolvidos LIDERANCA * Estabelecimento da orientagao: de- senvolvimento de uma viséo do futuro frequentemente num futuro distante - de estratégias que produziréo as mudan- gas necessérias para se atingir essa visao *Alinhamento de pessoal: comunica- 0 da diregao a ser seguida, com pala- vras e ages, a todos aqueles cuja coope- ragao pode ser necessaria, de modo a in- fluenciar a criagdo de equipes e coalizées que compreendam a visdo e estratégias € aceitem sua validade * Motivacao e Inspiracao: injegao de ani- mo nas pessoas para que elas superem as maiores barreiras politicas, burocrati- cas e de recursos opostas @ mudanca, satisfazendo as necessidades basicas, mas frequentemente nao atendidas, dos seres humanos *Produz um grau de previsibilidade ordem, e tem o potencial para produzir de forma consistente os resultados a curto prazo esperados pelos varios acionistas (por exemplo, para os clientes, estar sempre no prazo; para os acionistas, estar dentro do orgamento) * Os produtos mudam, geraimente em um nivel surpreendente, e tem a capacidade de produzir mudangas extremamente Uteis (por exemplo, novos produtos dese- jados pelos clientes, novas abordagens das relagdes de trabalho que ajudem a tornar a empresa mais competitiva) Fonte: De A Force for Change: How Leadership Differs from Management, por John P. Kotter. Copyright 1990. Adaptado com autorizacao da The Free Press, uma divisdo de Simon & Schuster. Figura 2.3 Gerenciamento versus Lideranga nao na lideranga, a burocracia e um enfoque interno dominam a situa- 40. Mas com o sucesso continuo, resultado, na maior parte das vezes, do dominio de mercado, o problema geralmente permanece sem solu- Ao e uma arrogancia pouco saudavel comeca a despontar. Assim, todas 28 — Liderando mudancas essas caracteristicas tornam qualquer esforgo de transformac4o muito mais dificil (ver Figura 2.4.). Os gerentes arrogantes podem superestimar seu préprio desempe- nho atual e posig4o competitiva, escutar muito pouco e aprender num ritmo muito lento. Os funciondrios voltados as necessidades internas podem ter dificuldade em enxergar as verdadeiras forcas que apresen- tam ameagas e oportunidades. As culturas burocraticas podem reprimir aqueles que desejam responder as condigées mutaveis. E a falta de li- deranga nao mantém nenhuma fora dentro dessas empresas capaz de superar o problema. A combinacéo de culturas que resistem & mudanga e de gerentes que nao foram ensinados a crid-la € fatal. Os erros descritos no Capitulo 1 séo quase inevitaveis nessas condig6es. As fontes de complacéncia rara- mente so atacadas de forma adequada, pois a urgéncia nao é problema daqueles que, durante toda a vida, foram ensinados a manter o sistema atual funcionando como um relégio suigo. Uma coalizao administrati- va forte o bastante, com lideranga suficiente, nao é criada por pessoas que aprenderam a pensar em termos de hierarquia e gerenciamento. As visdes e estratégias nao sao formuladas por individuos que aprenderam apenas a lidar com planos e orgamentos. Tempo e energia suficientes nunca sao investidos na comunicacao de um novo senso de direcdo para pessoas suficientes — 0 que nao é surpreendente, levando-se em consi- deragao uma histéria que relega a ultimo plano a entrega de relatérios diretos. Estruturas, sistemas, falta de treinamento ou de supervisores permitem que funciondrios dispostos a ajudar a implementar a visao se- jam desautorizados a isso — previsivel, j4 que a maioria dos gerentes ndo aprendeu quase nada sobre empowerment. A vitéria é declarada cedo demais por pessoas que foram instruidas a pensar em tempo de ciclo do sistema: horas, dias ou semanas, e ndo anos. E as pessoas que foram ensinadas a pensar em termos de estrutura formal, e nao de cultura, raramente estabelecem novas abordagens na cultura da empresa. Con- sequentemente, aquisig6es caras nao produzem nenhuma das sinergias esperadas, downsizings notdveis nao conseguem manter os custos sob controle, grandes projetos de reengenharia levam muito tempo e pro- porcionam pouquissimos beneficios, além de novas estratégias audacio- sas nunca serem bem implementadas. A mudanga bem-sucedida e sua forga motriz 29 Uma combinagao do empreendimento visionério e/ou sorte cria e implementa uma estratégia de negécios bem-sucedida. I Uma posigao claramente dominante (e, por isso, sem forte concorréncia) é estabelecida em algum(ns) mercado(s) — normalmente em um mercado de produtos ou servigos, talvez também em mercados financeiros, de mao de obra. ou de provisées. A empresa experimenta bastante sucesso em termos de crescimento e lucros. dd | ‘A empresa precisa de As pressdes sobre os Os gerentes comegam gerentes, e ndo de gerentes vem, na a acreditar que sao os lideres, para lidar coma | | maioria das vezes, de melhores e que as suas crescente burocracia, € dentro da empresa. tradigdes idiossincréticas ‘0s contrata e promove. A criagao de uma buro- so superiores. Os gerentes de nivel cracia que possa lidar Tornam-se cada vez mais alto permitem a _—_|__| com esse crescimento mais arrogantes. A alta essas pessoas, que nao |* | 0 recrutamento de pes- geréncia ndo faz nada so lideres, tornar-se soal para fazer essa para interromper essa ‘executivos. Algumas burocracia funcionar sao tendéncia e, muitas vezes, a alta geréncia os maiores desafios. vezes, a exacerba. impede que os lideres Opinides externas sao se tornem executivos negligenciadas. seniores. Desenvolve-se uma cultura forte e arrogante. Os gerentes nao reconhecem o valor dos clientes e acionistas. Eles se comportam de forma individualista e, muitas vezes, politica. Os gerentes nao reconhecem o valor da lideranga e dos funcionérios de todos os niveis que possam apresenté-la. Eles tendem a reprimir a iniciativa e a inovagao, comportando-se de forma centralizada/burocratica. Fonte: De Corporate Culture and Performance, por John P. Kotter e James L. Heskett. Copyright (1992), por Kotter Associates, Inc. e James L. Heskett. Adaptado com autorizacao da The Free Press, uma divisio de Simon & Schuster. Figura 2.4 A ccriagdo de uma cultura empresarial supergerenciada e estratificada 30 Liderando mudangas Os funciondrios de grandes e antigas empresas geralmente tém ficuldade em iniciar um processo de transformagao devido 4 falta de lideranga, aliada a arrogancia, ao individualismo e 4 burocracia. Nessas organizag6es, em que um programa de mudanga provavelmente é su- pergerenciado e estratificado, ha muito mais ordens a dar do que suges- t6es a receber. Alguém elabora um plano, comunica-o as pessoas ¢ tenta manté-las responsdveis. Ou, entao, alguém toma uma decisdo e exige que os outros a aceitem. O problema com essa abordagem é a enorme dificuldade de implementar, por pura forca, as grandes mudangas fre- quentemente necessdrias hoje para que as organizagées tenham melhor desempenho. A transformacao requer sacrificio, dedicagao e criativida- de, ¢ nada disso surge com coercao. Os esforcos de mudanga supergerenciados e estratificados também tendem a eliminar a confusdo inerente as transformacées. As oito etapas sao reduzidas a trés. Sete projetos s4o consolidados em dois. Em vez de envolver centenas ou milhares de pessoas, a iniciativa é tomada, na maioria das vezes, por um pequeno grupo. O resultado liquido é quase sempre desapontador. A mudanga de geréncia é importante. Sem um gerenciamento com- petente, o processo de transformagao pode sair do controle. Mas para a maioria das organizagées 0 maior desafio é liderar a mudanga. Somente a lideranga pode destruir as muitas fontes de inércia da organizacao. Somente a lideranga pode motivar as ages necessdrias para alterar o comportamento de modo significativo. Somente a lideranga pode fazer a mudanga acontecer, fixando suas raizes na verdadeira cultura de uma organizacao. Como vocé verd nos préximos capitulos, essa lideranca frequentemen- te comeca com apenas uma ou duas pessoas. Em todas as organizagées, exceto nas menores, esse ntimero precisa crescer cada vez mais no decor- rer do tempo. A solucdo para o problema da mudanga nao é um indivi- duo todo-poderoso que cative milhares de pessoas para que sejam seus seguidores obedientes. As empresas modernas s4o complexas demais para que sejam transformadas por um tinico gigante. Varias pessoas precisam contribuir com a tarefa de lideranga, nao tentando imitar as inclinag6es de Winston Churchill ou de Martin Luther King Jr., mas participando modestamente do programa de lideranga em suas esferas de atividade. A mudanga bem-sucedida e sua forga motriz 31 O FuTURO O problema da mudanga dentro das organizagées se tornaria menos preocupante se o ambiente de negécios se estabilizasse logo ou, pelo menos, diminujsse 0 ritmo. Mas a evidéncia mais confidvel sugere o posto: que a taxa de transformacao do ambiente crescerd e a pressio sobre as organizagées para que se transformem aumentar4 nas préxi- mas décadas. Se esse for 0 caso, a unica solucdo racional consistira em aprender mais sobre o que gera uma mudanga bem-sucedida e passar esse conhecimento para grupos de pessoas cada vez maiores. Com o que observei ao longo das duas tiltimas décadas, ajudar os individuos a compreender melhor as transformagées envolve dois com- ponentes, e ambos serao abordados de forma mais detalhada neste livro. O primeiro componente tem a ver com as varias etapas do processo de miuiltiplos estagios. Muitos de nés ainda temos bastante a aprender so- bre o que funciona e 0 que nao funciona, qual é a sequéncia natural dos eventos e onde esta a dificuldade até mesmo das pessoas muito capazes. O segundo componente esté associado a forca motriz que impulsiona o processo: lideranca, lideranga e ainda mais lideranga. Se acredita de fato que vocé e outras pessoas importantes da empresa ja conhecem mais do que o necessdrio para produzir mudanga e, portanto, logicamente esto imaginando por que perderiam tempo com a leitura do restante deste livro, deixe-me sugerir que considerem o seguinte. O que vocé pensa que encontrarfamos se pesquisdssemos todos os documentos produzidos em sua empresa no ultimo ano em busca de duas expres- ses: “Mudanga de geréncia” e “mudanca de lideranga”? Observariamos memorandos, atas de reunides, boletins informativos, relatérios anuais, relatérios de projetos, planos formais etc. Em seguida, transformariamos os ntimeros em porcentagens — X por cento das referéncias sfo para “mu- danga de geréncia” e Y por cento para “mudanga de lideranga”. E claro que os resultados desse exercicio poderiam nao passar de se- miantica vazia. No entanto, uma vez mais, talvez pudessem refletir, de maneira precisa, o pensamento de sua organizacao no que diz respeito 4 mudanga. E, talvez, isso tenha algo a ver com a rapidez com que vocé melhora a qualidade dos produtos ou servigos, aumenta a produtivida- de, reduz os custos e implementa inovagées. PARTE _ O Processo de Oito Etapas CAPITULO Estabelecimento de um senso de urgéncia ergunte a qualquer pessoa acima de 30 anos sobre a dificuldade de gerar uma grande mudanga em uma organizacéo, ¢ a resposta provavelmente ser4 0 equivalente a “muito, muito dificil”. Muitos de nés ainda nao conseguimos isso. Usamos as palavras corretas, mas, no fundo, subestimamos a enormidade da tarefa, especialmente a primeira etapa: estabelecer um senso de urgéncia. Seja recuperando uma empresa que esteja passando por sérias difi- culdades, transformando um concorrente médio em lider de setor ou impulsionando ainda mais um lider, o trabalho requer grande coope- ragdo, iniciativa e disposicéo para o sacrificio por parte de muitas pes- soas. Em uma organiza¢4o com 100 funcionarios, pelo menos 20 deles devem ir além de seus encargos normais para produzir uma mudanga significativa. Em uma empresa com 100 mil funciondrios, 0 mesmo deve ser solicitado a 15 mil ou mais. Estabelecer um senso de urgéncia é crucial para se obter a coope- rag4o necessdria. Com um alto nivel de complacéncia, as transforma- g6es normalmente nao chegam a lugar algum, pois poucas pessoas estéo 36 Liderando mudancas igualmente interessadas em trabalhar na questao da mudanga. Com um nivel baixo de urgéncia, é dificil reunir um grupo com poder e credibili- dade suficientes para conduzir o esforgo ou convencer individuos-chave a empregar 0 tempo necessdrio para criar e comunicar uma visio de mudanga. Nas raras circunstancias em que hé um grupo comprometido e cercado de complacéncia, seus integrantes podem estar aptos a iden- tificar a dire¢do geral para a mudanga, a se reorganizarem e fazer cortes nos quadros de pessoal. Se esses executivos dirigirem uma empresa, po- derao até mesmo fazer uma aquisicdo e empreg4-la em novos sistemas de compensagao. No entanto, mais cedo ou mais tarde, nao importa o quanto eles pressionem ou ameacem, se varias outras pessoas nao com- partilharem o mesmo senso de urgéncia, o impulso para a mudanga provavelmente se extinguird antes do tempo. As pessoas encontrarao milhares de modos engenhosos para negar cooperacdo a um processo que elas realmente consideram desnecessdrio ou equivocado. UM EXEMPLO DE COMPLACENCIA Nos tltimos anos, uma importante empresa farmacéutica mundial vem enfrentando mais desafios do que 0 normal. Nem o crescimento das vendas nem do lucro liquido correspondeu as esperancas ou expecta- tivas anteriores. A empresa vem obtendo mé repercuss4o na imprensa, principalmente apés uma demiss4o que custou caro, desgastando sua reputacdo. As ag6es nao estao mais valorizadas hoje do que ha seis anos. As reclamagées com relagao a seus produtos aumentaram, se compara- das as da metade da década de 1980; além disso, um importante clien- te passou a desaprovar cada vez mais os produtos. Alguns investidores institucionais tém ameacado se desfazer de boa parte de suas quotas, uma atitude que poderia fazer cair ainda mais 0 preco da ac4o em 5% a 10%. A empresa tem um passado de orgulho, de grandes conquistas, que torna a situacdo atual bastante desanimadora. Como a empresa esta travando uma batalha com a concorréncia acir- rada, seria esperado encontrar em sua sede cenas tipicas de um filme sobre a Segunda Guerra Mundial, com salas de guerra, generais gritan- do ordens a cada dois minutos, milhares de tropas 24 horas em alerta e Extabelecimento de um senso de urgéncia — 37 ataques arriscados direcionados ao inimigo. Mas uma visita 4 empresa nao mostraré nada do género. Nao ha salas de guerra aparentes. Os generais parecem dar ordens a uma velocidade que faz o beisebol pare- cer um esporte de ritmo rapido. Varias pessoas nao mostram nenhum sinal de estar em alerta sequer por 8 horas, quanto mais por 24. H4 pouca sensagao de rivalidade ou de que a concorréncia esta sufocando a empresa. Nao existe uma ateng4o voltada para uma missao necessaria. Os ataques aos rivais so frequentemente feitos com revélveres de ar comprimido. Uma artilharia mais pesada com armas mais perigosas é almejada internamente: operdrios para gerentes, gerentes para operd- rios, vendas para a fabrica, ad nauseam. Em conversas individuais com funcionarios, todos admitem imedia- tamente que hd problemas. Em seguida, vém os “mas”. No entanto, todo o setor est4 passando por esses problemas. Mas nés estamos, na verdade, fazendo algum progresso. Todavia, 0 problema nao esté aqui; estd naquele departamento. No entanto, nao ha mais nada que eu possa fazer, por causa do meu chefe estiipido. Participe de uma tipica reuniao gerencial na empresa e vocé comecara a imaginar que todos os dados que coletou sobre impostos, rendimen- tos, preco das acées, reclamagées dos clientes, situacao da concorréncia € reputacdo estao errados. Nessas reunides, raramente se faz referéncia a quaisquer indices de desempenho inaceitdveis. O ritmo é sempre cal- mo. As questées discutidas podem ser de pouca importancia. O nivel de energia raramente é alto. Os debates sé ficam quentes quando um gerente tenta tomar recursos do outro ou pér a culpa em outro setor. E 0 mais inacreditavel é que, volta e meia, vocé ouve alguém fazer um discurso sincero sobre como as coisas estao indo bem. Apés dois dias na empresa, vocé comeca a querer saber se est parti- cipando de um episédio de “Além da Imaginagao”. Nessa empresa impregnada de complacéncia, as iniciativas de mu- danga sao natimortas. Em uma reunido, alguém sugere que longos ci- clos de desenvolvimento de novos produtos estao prejudicando cada vez, mais a empresa, mas, dentro de 20 minutos, o debate passa para outro assunto € nao se toma providéncia alguma para encurtar os perfodos de desenvolvimento. Outra pessoa oferece uma nova abordagem para a tecnologia da informacao; entretanto, néo demora muito e 0 grupo de 38 Liderando mudancas tecnologia da informagao e seu sistema ultrapassado jd est4o sendo elo- giados. Mesmo quando 0 CEO langa uma ideia de mudanga, a sugestao tende a desaparecer na areia movedica da complacéncia. Se vocé pensa que essa histéria é descabida, pois nada comparado a isso acontece em sua organizacao, sugiro que preste mais ateng4o nela. Essas condi¢ées podem ser encontradas praticamente em todo lugar. O departamento de crédito é um desastre, ainda que nao apresente indi- cios da existéncia de um tinico problema sequer. A subsididria francesa é uma reviravolta, ainda que a administrac¢4o dessa filial pareca perfeita- mente satisfeita com a situacao atual. Perdi as contas do ntimero de vezes que ouvi um executivo declarar que todas as pessoas de sua equipe gerencial reconhecem a necessidade de uma grande mudanga, e acabei por descobrir mais tarde que metade daquela “equipe” pensa que 0 status quo nao vai tio mal assim. Em pi- blico, eles repetem a linha do chefe. Em particular, ougo uma histéria diferente. “Quando a recessao terminar, ficaremos numa boa.” “Assim que os programas de conteng4o de despesas do ano anterior se inicia- rem, os ntimeros subirao.” E é claro: “Os maiores problemas estao em outro setor; o meu departamento est4 étimo.” P: Qual é 0 grau desse tipo de complacéncia? R: Enorme. FONTES DE COMPLACENCIA P: Ent4o, por que as pessoas se comportam dessa forma? R: Por muitas ¢ muitas e muitas razées. Quando mostro a estudantes de Administrag4o de 25 anos uma em- presa em dificuldades, onde novamente a complacéncia é alta, eles fa- lam dessa empresa como se estivesse sendo administrada por um grupo de pessoas com um QI médio de 40. O diagnéstico é implicito: se a empresa enfrenta dificuldades apesar de a urgéncia ser pouca, entao a geréncia deve ser formada por um bando de idiotas. Qual é a sugestéo deles? Demita-os e contrate-nos. Extabelecimento de um senso de urgéncia 39 O diagnéstico dos estudantes de Administragéo, ligando inaptidao & complacéncia, nao se ajusta bem as minhas experiéncias. Em deter- minadas ocasiées, tenho percebido um baixo senso de urgéncia surgir inadequadamente entre pessoas bastante inteligentes e bem-intencio- nadas. Ainda posso lembrar nitidamente de estar em uma reuniao en- tre dezenas de gerentes seniores de uma empresa europeia, bem abaixo do desempenho, e de ouvir um debate intelectual que poderia ser ade- quado em Harvard. E por que nao? Varias das pessoas que estavam sentadas & mesa naquele dia tinham diplomas das melhores escolas do mundo. Infelizmente, tanto a andlise dos erros alegados do concorrente como a discussao bastante abstrata da “estratégia” evitavam enfrentar os problemas-chave da empresa. Previsivelmente, nenhuma deciséo maior foi tomada ao final da reunido, uma vez que nao é possfvel tomar de- cisdes importantes sem tratar das questées reais. Tenho certeza de que as pessoas sensatas que estavam presentes nao sairam muito satisfeitas daquela reuniao. Elas nao eram tolas. Mas acharam a reunio aceitavel porque, em uma escala de urgéncia de 0 a 100, a taxa média entre esses executivos certamente estava abaixo de 50. Pelo menos nove razées ajudam a explicar esse tipo de complacéncia (ver Figura 3.1). Primeiro, nao havia nenhuma crise fortemente visivel. A empresa nao estava perdendo dinheiro. Nao existia a ameaca de uma demissdo em massa. A bancarrota nao estava em pauta. A policia nao estava batendo 4 porta. A imprensa nao estava publicando manchetes depreciativas sobre a empresa. Como um analista racional, vocé poderia argumentar que a empresa estava em crise devido a constante diminui- ao das margens ¢ fatias de mercado, mas esse é outro tipo de questao. O ponto aqui é: os funcionarios nao percebiam nenhuma ameaca forte, um dos motivos pelos quais seu senso de urgéncia era baixo. Segundo, aquela reuniao estava acontecendo em uma sala que cheirava a “sucesso”. A mesa antiga de mogno, de quase 10 metros, poderia ter sido negociada igualmente por trés Audi e um Buick novos. A parede, 0 carpete de 1a e a decoracdo do ambiente eram tao bonitos quanto caros. Toda a sede da empresa, especialmente a drea executiva, era do mesmo modo: mérmore, madeiras nobres, carpetes espessos e pinturas a dleo em abundancia. A mensagem subliminar era clara: nés somos ricos, somos vencedores, devemos estar fazendo algo certo. Entao relaxe. Almoce. 40 Liderando mudangas ‘Auséncia de uma crise maior e aparente Otimismo exagerado Excesso de recursos da geréncia sénior aparentes, \ Baixos padrées de desempenho geral Natureza humana, com sua capacidade de recusa, especialmente se as =e pessoas jé estdo ocupadas ou estressadas COMPLACENCIA Estruturas organizacionais a que voltam a atengéio dos Uma cultura de pouca funciondrios para objetivos confrontagao, pouca sinceridade r funcionais restritos e de desprezo pelo “portadcr de ale Sistemas de avaliagio mas noticias Falta de feedback de ternos que enfocam os. desempenho suficiente _indices de desempenho vindo das fontes externas errados Figura 3.1 Fontes de complacéncia Terceiro, os padrées adotados por esses gerentes para se avaliarem eram mais do que altos. Ao percorrer aquela empresa, ouvi intimeras ve- zes: “Os luctos esto 10% acima em relagio ao tiltimo ano.” O que nao foi dito é que os lucros estavam 30% abaixo em relagao aos cinco anos anteriores, enquanto os lucros de todo o setor estavam 20% maiores do que um ano atrds. Quarto, a estrutura organizacional voltava a atencao da maioria das pessoas para metas funcionais restritas, em vez de ampliar o desempe- nho dos negécios. © marketing apresentava seus indices, a producio tinha uma tendéncia diferente, o setor de pessoal, outra. Apenas o CEO era o responsavel por vendas gerais, lucro liquido e retorno da parti- cipagao acionaria. Assim, quando a maioria das medigées basicas do desempenho da empresa estava em declinio, quase ninguém se sentia responsavel. Quinto, os varios sistemas de planejamento e controle internos eram. manipulados para facilitar a todos a obtengdo de suas metas funcio- nais. O pessoal do departamento de marketing da empresa me contou que atingira 94% de seus objetivos no ano anterior. Uma meta tipica: Estabelecimento de um senso de urgéncia 41 “Langar uma nova campanha publicitéria no dia 15 de junho.” O au- mento da fatia de mercado em qualquer uma das linhas de produtos da empresa nao foi considerado um objetivo apropriado. Sexto, qualquer feedback de desempenho recebido pelas pessoas vi- nha quase inteiramente desses sistemas internos falhos. Os dados for- necidos por pessoas de fora raramente chegavam as outras pessoas. O gerente ou funciondrio de nivel médio poderia trabalhar por um més ¢ nunca encontrar um cliente insatisfeito, um acionista indignado ou um fornecedor frustrado. Provavelmente, algumas pessoas poderiam traba- Ihar desde o primeiro dia até a aposentadoria e nunca ouvir diretamente nenhuma pessoa de fora que estivesse envolvida no negécio. Sétimo, quando jovens funcionarios empreendedores saiam de sua rotina para coletar feedback externo de desempenho, geralmente eram. tratados como doentes contagiosos. Nessa cultura corporativa, um comportamento desse tipo era visto como inadequado porque poderia prejudicar alguém, reduzir 0 moral ou provocar argumentos (ou seja, debates honestos). Oitavo, a complacéncia era sustentada pela tendéncia genuinamente humana de nao aceitar aquilo que nao queremos ouvir. Normalmente, a vida é mais agradavel sem problemas e mais dificil com eles. A maio- ria de nés, grande parte das vezes, pensa ter desafios suficientes para se manter ocupada. Nao estamos 4 procura de mais trabalho. Entao, quando surge a evidéncia de um grande problema, se pudermos nos esquivar e ignorar o fato, frequentemente o fazemos. Nono, aqueles que relativamente nao foram afetados pelas fontes de complacéncia 1 a 8, preocupando-se, assim, com o futuro da empresa, foram tranquilizados por um falso senso de seguranga gerado pelo oti- mismo exagerado da alta geréncia. “Com certeza, nds temos desafios, mas veja tudo o que conseguimos.” As pessoas que viveram na década de 1960 se lembrarao de um exemplo aterrador di: trios de como os Estados Unidos estavam ganhando a Guerra do Vietna. Embora, as vezes, 0 otimismo exagerado nao seja sincero, frequente- mente é produto de uma cultura arrogante, que, por sua vez, resulta de um sucesso anterior. Boa parte do problema aqui est4 relacionada as vitérias histéricas — da empresa como um todo, dos departamentos e dos individuos. O : os varios relaté- 42 Liderando mudangas sucesso anterior proporciona muitos recursos, reduz nosso senso de ur- géncia ¢ nos encoraja a certa vaidade. Para os individuos, ele cria um problema de ego; para as empresas, um problema cultural. Egos exage- rados e culturas arrogantes reforgam as nove fontes de complacéncia, que, reunidas, podem manter a taxa de urgéncia em um nivel baixo, mesmo em uma organizacao que enfrenta grandes desafios e seja geren- ciada por pessoas perfeitamente inteligentes e sensatas. Penso termos a presungao de que, se ao menos os outros individuos fossem mais parecidos conosco — empreendedores fortes € atentos —, a complacéncia néo seria um problema. Ou pensamos que as pessoas so, em sua maioria, muito inteligentes; logo, tudo o que se tem a fazer é fornecer-lhes os dados sobre a baixa qualidade do produto, os resultados financeiros em declinio ou a falta de crescimento da produtividade. Em ambos 0s casos, subestimamos as forcas sutis e sistémicas existentes em quase todas as organizagées. Uma boa regra pratica em um esforgo de grande mudanga é: nunca subestime a grandeza das forgas que déo mais vigor a complacéncia e ajudam a manter o status quo. AUMENTO DO SENSO DE URGENCIA Aumentar o senso de urgéncia requer que vocé remova as fontes de complacéncia ou minimize 0 impacto delas: por exemplo, eliminar tais sinais de excesso em uma grande empresa aérea; definir padrées mais elevados tanto formalmente, no processo de planejamento, quan- to informalmente, na interagdo didria; mudar os sistemas de avaliagdo interna que enfocam indices incorretos; aumentar consideravelmente o feedback externo de desempenho obtido por todos; recompensar as opi- nides honestas emitidas nas reunides e as pessoas dispostas a enfrentar problemas; refrear 0 otimismo sem fundamento das pessoas que ocu- pam os cargos mais elevados. Ao depararem com uma empresa que requer renovagao, todos os ge- rentes competentes agem de uma dessas formas, Mas, geralmente, nao vao muito adiante. Um painel de clientes é levado 4 reuniao anual da geréncia, mas nao hd jeito de se voltar a atengdo para as reclamagées dos clientes semanal ou diariamente. A reuniéo anual da geréncia poderia Extabelecimento de um senso de urgéncia 43 ser realizada em um local menos luxuoso, mas os executivos continuam se reunindo em escritérios que agradariam até mesmo a Luis XIV. Uma ou duas discussées relativamente francas dos problemas sao desenca- deadas no nivel da comiss4o executiva, mas o informativo da empresa € repleto de noticias otimistas. A criacao de um forte senso de urgéncia normalmente requer acées ousadas ou até mesmo arriscadas, que normalmente sdo associadas a uma boa lideranga. Algumas atividades simples, como o painel de clien- tes na reuniao anual da geréncia, falham em face das forcas poderosas que impulsionam a complacéncia. Ousadia significa limpar o balancete e gerar uma grande perda para o trimestre. Ou vender a sede da empresa ¢ se mudar para um prédio que se assemelhe mais a um quartel-general. Ou informar a todos os seus colegas que eles tem dois anos para se tor- narem os primeiros ou segundos em seus mercados, sob pena de venda ou fechamento da empresa. Ou estabelecer 50% de remuneracao para os 10 funciondrios da ctipula, com base em objetivos consistentes de qualidade de produgao para toda a empresa. Ou contratar consulto- res para coletar informagées honestas e promover o debate delas nas reunides, mesmo sabendo que essa estratégia incomodaré fortemente algumas pessoas. (Ver Tabela 3.1, para saber quais so os nove meios basicos de se estimular um senso de urgéncia.) Nao vemos esse tipo de ousadia com muita frequéncia porque as pes- soas que vivem em culturas supergerenciadas ¢ estratificadas geralmente aprendem que essas aces nao s4o sensatas. Se esses executivos estives- sem associados a alguma empresa por um longo perfodo, também te- meriam ser responsiveis pela criagio dos problemas que enfocam. Nao é coincidéncia 0 fato de que as transformagées geralmente tém inicio quando uma nova pessoa é colocada em uma fung4o-chave, alguém que nao tenha de preservar agées passadas. Para as pessoas acostumadas a uma cultura gerencial em que ter tudo sob controle é 0 valor principal, implementar etapas que estimulem o nivel de urgéncia pode ser particularmente dificil. Agées ousadas que reduzem a complacéncia tendem a aumentar os conflitos e gerar ansie- dade, pelo menos inicialmente. Auténticos lideres partem para a acdo porque acreditam que as forcas fora de controle podem ser direcionadas para a obtengao de finalidades importantes. Mas para alguém que foi iderando mudangas Tabela 3.1 Formas de estimular o nivel de urgéncia 1 2 Gerar uma crise permitindo perda financeira, expondo os gerentes a uma fragilidade maior diante dos concorrentes, ou permitindo que os erros venham & tona, em vez de corrigi-las no ultimo minuto. Eliminar exemplos dbvios de excesso (por exemplo, instalagdes de clubes de lazer cus- teados pela empresa, uma vasta frota aérea, salas de refeicdo com cardépio executivo). Estabelecer objetivos ambiciosos para impostos, rendimentos, produtividade, satis- facdo dos clientes e ciclo de vida dos produtos, de modo que eles nao possam ser atingidos se a forma de condugao dos negécios continuar a mesma. Cessar a avaliacéo do desempenho de subunidades com base apenas em metas fun- cionais restritas. Insistir para que cada vez mais pessoas continuem responsaveis por medidas mais amplas de desempenho. Enviar mais dados sobre a satisfacdo dos clientes e o desempenho financeiro a mais funcionarios, especialmente informacdes que apontem a fragilidade diante da con- corréncia. Insistir para que as pessoas conversem regularmente com clientes insatisfeitos e acio- nistas desapontados. Usar consultores e outros meios para forcar a obtencao de dados mais relevantes e debates honestos nas reunides da geréncia. informativos da empresa e pronunciamentos da geréncia sénior debates mais honestos sobre os problemas da organizacao. Refrear o otimismo exagerado da geréncia sénior. Bombardear as pessoas com informacées sobre oportunidades futuras, sobre as noté- veis recompensas pela capitalizagao dessas oportunidades e a incapacidade atual da organizacao em persegui-las. Incluir no: recompensado durante 30 ou 40 anos por ser um gerente cauteloso, as iniciativas para o aumento dos niveis de urgéncia geralmente parecem arriscadas demais ou apenas pura tolice. Se a alta geréncia € composta apenas por gerentes cautelosos, nin- guém elevard a taxa de urgéncia o suficiente ¢ nunca ocorreré uma transformagdo importante. Nesses casos, 0 conselho de diretores tem a responsabilidade de encontrar lideres e colocd-los em fungées-chave. Se eles se esquivarem dessa responsabilidade, como fazem algumas vezes, estarao fracassando em exercer a fungao essencial do conselho. Estabelecimento de um senso de urgéncia 45 O PAPEL DAS CRISES Crises aparentes podem ser de enorme ajuda para chamar a atencao das pessoas e aumentar os nfveis de urgéncia. Conduzir os negécios da for- ma usual é muito dificil se a empresa parece estar se incendiando. Mas em um mundo de rdpidas transformagées, esperar que o fogo se alastre éuma estratégia duvidosa. E, além de chamar a atengio das pessoas, um. incéndio repentino pode causar uma série de danos. Como as crises econdmicas so aparentes, geralmente se considera uma grande mudanga impossivel até que os problemas de uma orga- nizago se tornem sérios o suficiente para gerar perdas significativas. Embora essa conclusao possa ser verdadeira nos casos em que ha neces- sidade de uma enorme e dificil transformaco, acredito que se aplique precariamente a maioria das situacdes que requerem mudanga. Tenho observado as pessoas iniciarem, com sucesso, reestruturag6es ou esforcos de qualidade durante perfodos em que suas empresas esta- vam obtendo recordes de lucro. Elas faziam isso bombardeando incan- savelmente os funciondrios com informacées sobre problemas (alta de lucros, mas redugio da fatia de mercado), problemas potenciais (um novo concorrente demonstra estar se tornando mais competitivo) ou oportunidades potenciais (através da tecnologia ou de novos mercados). Elas faziam isso definindo metas imensamente ambiciosas e que rom- piam o status quo, liquidando agressivamente sinais de excesso, otimis- mo exagerado, sistemas de informagées ilusérios e outros. Chamar a atengao das pessoas em épocas de sucesso nao € facil, mas é possfvel. Um grande empresdrio japonés normalmente refreava a compla- céncia de seus gerentes, apesar dos ganhos recordes, definindo metas exorbitantes que levariam cincos anos para serem atingidas. Somente quando as pessoas comecavam a se mostrar presuncosas por suas varias realizacées, ele dizia algo como: “Devemos estabelecer 0 objetivo de duplicar nossos rendimentos dentro de quatro anos.” Por sua credibi- lidade, seus funciondrios nao podiam ignorar esses pronunciamentos. Como ele nunca estabelecia metas impossiveis, mas pensava cuidadosa- mente até que ponto os objetivos seriam vidveis — levando-se em con- sideracdo os esforcos inspirados —, suas ideias sempre eram passiveis de defesa. E, ao defendé-las, ele unia esses objetivos aos valores basicos com 46 Liderando mudangas os quais seus gerentes se identificavam. Resultado liquido: suas metas de cinco anos tornavam-se pequenas bombas que, periodicamente, explo- diam bolsées de complacéncia. Auténticos lideres costumam gerar esse tipo de crise artificial, em vez de esperar que algo acontega. Harry, por exemplo, em vez de discutir os planos de seus gerentes, como costumava fazer, decidiu aceitar pro- jecdes de rendimentos e custos que ele sabia ser pouco realistas. O salto resultante de 30% no rendimento esperado chamou a atencao de todos. Da mesma forma, Helen aceitou o que ela acreditava serem promessas irreais sobre o lancamento de um importante produto e permitiu que tudo estourasse repentinamente — uma acd4o que nao deve ser seguida por pessoas de coracao fragil. Resultado: os negécios sem perspectiva de mudanga nao podem continuar. Algumas crises artificiais baseiam-se em grandes perdas financeiras para “acordar” as pessoas. O CEO de uma empresa famosa limpou o balancete, foi responsdvel por uma série de iniciativas novas ¢ gerou uma perda de aproximadamente US$1 bilhao no processo. Mas essa era uma situag4o pouco comum. O executivo tinha um contrato no longo prazo e a empresa estava bem financeiramente. O problema das grandes crises financeiras, quer sejam as naturais ou as forcadas, é que frequentemente esgotam os escassos recursos da em- presa, deixando poucas oportunidades para reacao. Apdés perder US$1 bilhao ou US$2 bilhdes, vocé geralmente pode chamar a atenc4o das pessoas, mas acaba tendo bem menos capital para financiar novas ini- ciativas. Mesmo que as transformagées tenham inicio mais facilmente com uma crise financeira natural, dada a escolha, é bem mais inteligente no esperar que acontega uma. E melhor vocé mesmo criar 0 problema. Melhor ainda, se possivel, é ajudar as pessoas a enxergar as oportunida- des ou a crise da situacao sem induzir a perdas incapacitantes. O PAPEL DOS GERENTES DE N{VEIS HIERARQUICOS MEDIO E INFERIOR Se 0 objetivo da mudanga é uma fabrica, escritério de vendas ou depar- tamento na base da pirimide de uma grande empresa, os individuos- Extabelecimento de um senso de urgéncia 47 chave serao os gerentes encarregados daquela unidade. Eles precisarao reduzir a complacéncia e aumentar a urgéncia. Precisaréo criar uma coalizao de mudanga, desenvolver uma visao orientadora, vender essa visdo aos outros etc. Se tiverem autonomia suficiente, poderao fazer isso com frequéncia, independentemente do que estiver em curso no resto da empresa. Se eles tiverem autonomia suficiente. Sem autonomia suficiente numa empresa em que a complacéncia é predominante (uma situacao comum hoje em dia), um esforco de mu- danca em uma unidade pequena pode estar condenado desde 0 inicio. Mais cedo ou mais tarde, as forcas mais poderosas da inércia intervirdo, nao importando o que os agentes de mudanga na escala inferior da hie- rarquia gerencial estejam fazendo. Nessas circunstancias, ir adiante com um esforgo de transformagao poder ser um erro terrivel. Quando as pessoas percebem esse fato, geralmente pensam ter apenas uma alterna- tiva: sentar-se e esperar que alguém do escalao superior passe a liderar. Assim, nao fazem nada e, no processo, reforcam as mais poderosas for- gas da inércia que tanto as aborrecem. Como detém o poder, os executivos seniores normalmente s4o os individuos-chave na redugio das forcas da inércia. Mas nem sempre. Ocasionalmente, uma alma corajosa e competente do nivel médio ou inferior da hierarquia é 0 instrumento criador das condig6es que podem sustentar uma transformacao. Meu exemplo preferido é 0 de uma gerente de nivel médio de uma grande empresa de servicos relacionados a viagens, que, praticamente sozinha, enfrentou a geréncia superior com dados sobre a posi¢éo com- petitiva cada vez mais fragil da empresa. Ela usou um procedimento nao rotineiro — colocar um produto em um novo canal de distribuicao — como desculpa para contratar consultores. Com o encorajamento ve- lado dessa gerente, os consultores afirmaram basicamente que a empre- sa nunca seria capaz de usar 0 novo canal de forma bem-sucedida, a nao ser que, primeiro, solucionasse meia diizia de problemas fundamentais. Os colegas dessa gerente se esquivaram quando viram os resultados des- se trabalho, mas ela foi adiante. Como tinha astiicia politica, dobrava-se & maior parte das criticas criadas pela rejeigao e a raiva em relac4o aos consultores. Essa gerente tinha a espantosa capacidade de dizer frases como: “Isso realmente me surpreendeu. Os consultores forjaram isso ou 48 Liderando mudangas realmente ha algo importante aqui?”; “Nao posso acreditar que tenham enviado o relatério a todas essas pessoas. Nao autorizamos isso”; “Vocé acredita nisso? Gerry Alice acreditam. Trés de vocés alguma vez. ja falaram sobre essas questées?” Se cada membro da geréncia sénior for um gerente cauteloso, com- prometido com o status quo, uma revolugao corajosa surgida no escaléo inferior nunca terd éxito. Mas nunca vi uma empresa em que toda a ge- réncia fosse contraria 4 mudanga. Mesmo nos piores casos, 20% a 30% parecem ter consciéncia de que a empresa nao esta oferecendo todo o seu potencial, querem fazer alguma coisa, mas sentem-se bloqueados. As iniciativas da média geréncia podem dar a essas pessoas a oportuni dade de atacar a complacéncia sem serem vistas como uma equipe sem recursos ou um bando de desordeiros. Para as pessoas pertencentes a geréncia de nivel médio e que nao con- seguem encontrar uma forma de ajudar a aumentar o nivel de urgéncia em uma empresa que precisa mudar, mas em que a geréncia sénior no estd fornecendo a lideranga necessdria, uma deciséo inteligente na carreira pode trazer alguma mudanga. No ambiente econémico atual, as pessoas frequentemente se agarram a seus empregos, mesmo que as empresas em. que trabalham nfo estejam progredindo. Essas pessoas estao convencidas de que, com todo o downsizing, elas tém a sorte de contar com um saldrio e com assisténcia médica. Essa atitude é compreensivel. Mas no mundo do século XXI, todos nés precisaremos aprender e crescer a0 longo de nossa carreira. Um dos muitos problemas das empresas complacentes é a severidade e 0 conservadorismo que dificultam 0 aprendizado. Limitar-se a bater 0 ponto, receber o saldrio, aprender pouco e per- mitir que a taxa de urgéncia permanega baixa, tudo isso é, na melhor das hipéteses, uma estratégia provinciana e de curto prazo. Essas estra- tégias raramente levam ao sucesso no longo prazo, ¢ isso vale tanto para as empresas quanto para os funciondrios. QUANTO DE URGENCIA £ NECESSARIO? Independentemente de como e por quem 0 processo é iniciado, a maio- ria das empresas encontta dificuldades em progredir muito nas fases de Estabelecimento de um senso de urgéncia 49 2a 4 de um esforgo de grande mudanga, a ndo ser que a maioria dos gerentes acredite honestamente que o status quo é inaceitavel. Sustentar um esforco de transformacao nas etapas 7 e 8 requer um compromisso ainda maior. A maioria dos funciondrios, talvez 75% de toda a geréncia e praticamente todos os executivos da ctipula, todos precisam acreditar que uma mudanga consideravel é absolutamente essencial. Como uma mobilizagao inicial é possivel com baixos niveis de urgén- cia e o ataque 4 complacéncia pode gerar ansiedade, vocé pode se sentir tentado a pular a etapa 1 ¢ iniciar 0 processo de transformacao com um passo maior. Jé vi pessoas comecarem pela elaboracéo da coalizéo de mudanga, pela criagdo da visio de mudanga ou pela implementagao das mudangas (reorganizacao, demissao de pessoal ou aquisic¢ao). Mas os problemas da inércia e complacéncia sempre parecem atingi-las. As vezes, elas agem violentamente, como ocorre quando a falta de urgéncia torna impossivel reunir uma equipe de lideranca poderosa o bastante para conduzir as mudangas. As vezes, as pessoas passam anos — talvez com um crescimento estimulante de aquisi¢ao e excitagdo — até que se evidencie a debilidade de varias iniciativas. Mesmo quando as pessoas iniciam esforcos de grandes mudangas com exercicios de redugdo da complacéncia, algumas vezes se conven- cem de que o trabalho foi feito, quando, na verdade, é necessdrio fazer mais ainda. Tenho visto pessoas excepcionalmente capazes cairem nes- sa armadilha. Eles conversam com seus colegas executivos, que apenas reforcam suas ideias. “Todos nés estamos prontos para isso. Cada um sabe que a situac4o atual precisa ser modificada. Nao hd muita com- placéncia aqui. Certo, Phil? Certo, Carol?” Eles prosseguem em um terreno instavel e acabam se arrependendo disso. Pessoas de fora podem ser titeis aqui. Pergunte a clientes, fornecedo- res ou acionistas bem-informados qual é a opiniao deles. A taxa de ur- géncia é suficientemente alta? A complacéncia é suficientemente baixa? N&o converse apenas com seus colegas que tm os mesmos incentivos que vocé para subestimar a realidade. E nao faca essas perguntas apenas a alguns amigos que nao pertencem 4 empresa. Converse com outros que a conhegam ou mesmo com pessoas que parecam ndo ter uma vis4o favoravel dela. E 0 mais importante: retina coragem para ouvi-los com atengao. 50 Liderando mudancas Se vocé fizer isso, descobrira que algumas pessoas nao sao adequa- damente bem informadas para oferecer um julgamento confidvel e que outras tém interesses pessoais. Mas vocé pode separar tudo isso do res- tante se conversar com um ntimero suficiente de pessoas. A questao consiste em neutralizar a miopia interna com os dados externos. Em um mundo de répidas transformac6es, a miopia interna pode ser fatal. CAPITULO Criacao de uma coalizéo administrativa randes transformag6es s4o, muitas vezes, associadas a um indivi- duo todo-poderoso. Se considerarmos a reaparic¢io da Chrysler apés quase entrar em faléncia no inicio dos anos 1980, pensaremos em Lee Jaccoca. Fale da ascenséo da Walmart, que era peixe mitido e passou a lider de setor, e nos lembraremos de Sam Walton. Informe-se sobre os esforcos de renovagao da IBM e a histéria ir4 enfocar Lou Gerstner. Depois de algum tempo, qualquer pessoa poderia chegar facilmente & concluséo de que o tipo de lideranga fundamental para qualquer mu- danga sé pode ser oferecido por um tnico individuo memoréavel. Essa é uma crenga bastante perigosa. Como é extremamente dificil realizar grandes transformacées, torna- se necessdria uma for¢a vigorosa para sustentar 0 processo. Nenhum individuo isolado, nem mesmo um poderoso CEO, é capaz de desen- volver a visio correta, comunicé-la a um grande niimero de pessoas, eliminar todos os obstaculos-chave, possibilitar vitérias no curto prazo, liderar e gerenciar dezenas de projetos de mudanga e, ainda, enraizar novas abordagens na cultura da organizacao. Comissées fracas so ainda 52 Liderando mudancas piores. Uma coaliz4o administrativa forte sempre se faz necessdria — uma coaliz4o com pessoas, nivel de confianga e objetivos comuns ade- quados. A elaboracio dessa equipe é sempre um ponto fundamental nas fases iniciais de qualquer esforco de reestruturagdo, reengenharia e reformulagao de um conjunto de estratégias. O CEO IsOLADO: AQUELE QUE FAZ TUDO SOZINHO A empresa alimenticia deste caso possuia, entre 1975 e 1990, um ex- celente registro de sua trajetéria econdmica. Depois disso, 0 setor se modificou e a empresa enfrentou sérias dificuldades. O CEO era um individuo admiravel. Com 20% de lideranga, 40% de capacidade gerencial e o restante de genialidade financeira, ele havia dirigido sua empresa com muito sucesso, efetuando aquisigdes astutas e desfrutando de total controle sobre a organizacao. Com as mudangas no setor ocorridas no final da década de 1980, ele tentou adaptar sua empresa as novas condigées. E fez isso com 0 mesmo estilo que vinha adotando ha 15 anos — 0 de um monarca, com con- selheiros. “Rei” Henry possuia uma comiss4o executiva, mas tratava-se de um grupo de coleta/distribuicao de informagées, e nao de um corpo de tomada de decisées. O verdadeiro trabalho era realizado fora das reunides. Henry iria avaliar os problemas sozinho em sua sala. De- pois, dividiria suas ideias com Charlotte e ouviria seus comentérios. No almogo com Frank, Henry faria algumas perguntas. Mais tarde, jogando golfe com Ari, ele observaria a reacdo do amigo as suas ideias. Finalmente, o CEO tomaria a deciséo sozinho. Em seguida, depen- dendo da natureza da decisdo, ele a anunciaria em uma reuniao com a comiss4o executiva ou, se o problema fosse mais delicado, Henry a informaria separadamente a cada integrante da equipe, em sua sala. Esses funciondrios, por sua vez, repassariam as informagées aos ou- tros, conforme necessario. Esse procedimento funcionou muito bem entre 1975 e 1990 por, no minimo, quatro raz6es: (1) a velocidade da mudanga nos mercados de Henry nao era muito alta; (2) ele conhecia o setor muito bem; (3) Criagio de uma coalizéo administratioa 53 sua empresa detinha uma posic¢do tao forte que uma decisao atrasada ou errada nao representava um risco téo grande e (4) Henry era um cara esperto. Foi af que o setor se modificou. Durante quatro anos, até se aposentar em 1994, Henry tentou li derar um esforgo de mudanga usando o mesmo procedimento que lhe servira tio bem durante tanto tempo. Dessa vez, contudo, a abordagem nao funcionou, pois tanto a quantidade como a natureza das decisdes tomadas eram diferentes em alguns aspectos importantes. Antes de 1990, os problemas eram, em média, menores, menos complexos, menos emocionais e menos numerosos. Uma pessoa inte- ligente, lancando mao da abordagem de discussdo individual, poderia tomar decisées corretas e implementé-las. Com o fluxo do setor e a necessidade de maiores mudangas dentro da empresa, os problemas tornaram-se repentinamente maiores e comecaram a surgir num ritmo mais acelerado. Uma pessoa, mesmo alguém incrivelmente capacitado, nao poderia mais controlar téo bem um fluxo de decisées como esse. As escolhas eram feitas ¢ anunciadas de forma muito lenta, e sem uma compreensio completa dos problemas. Os funcionrios eram chama- dos a fazer sacrificios sem entender bem o porqué. Apés dois anos, evidéncias objetivas sugeriam que a abordagem de Henry nao estava funcionando. Em vez de se modificar, ele se isolou mais e fez um esforgo ainda maior. Apés uma aquisicao questiondvel ¢ uma amarga suspenso, ele se aposentou com alguma relutancia (com algo mais do que um empurraozinho da diretoria). TuDo EM VAO: A COMISSAO DE POUCA CREDIBILIDADE Provavelmente, j4 vi esse segundo cendrio algumas dezenas de vezes. O maior campedo da mudanga ¢ 0 executivo de recursos humanos, 0 diretor de qualidade ou o responsavel pelo planejamento estratégico. Alguém convence o chefe a responsabilizar o diretor do staff por uma forca-tarefa que inclua funciondrios de varios departamentos e um ou dois consultores externos. O grupo pode incluir um lider promissor na organizacéo, mas nao possui os trés ou quatro individuos principais da 54 Liderando mudancas hierarquia executiva. E, dentre os 15 principais diretores, apenas dois ou quatro sao membros. Por ser chefiado por uma pessoa entusiasmada, a forca-tarefa progri- de durante algum tempo. No entanto, todos os animais politicos que pertencem ou nao a essa comissao logo descobrem que ela tem poucas chances de sucesso no longo prazo, e assim limitam seu auxilio, envol- vimento e comprometimento. Como todas as pessoas que pertencem & forca-tarefa estao ocupadas e algumas nao est4o convencidas de que essa éa melhor forma de usar seu tempo, torna-se impossivel marcar uma quantidade suficiente de reunides para fazer um diagnéstico dos pro- blemas da empresa e estabelecer confianga entre os membros do grupo. Mesmo assim, o lider da comissao recusa-se a desistir e uta por algum progresso visivel, muitas vezes devido a um enorme senso de dedicacao A empresa ou a seus funciondrios. Apés algum tempo, o trabalho é feito por um subgrupo de trés ou qua- tro — geralmente o chefe, um consultor e um idealista. Os demais mem- bros aceitam as ideias desse pequeno grupo, mas nao contribuem muito nem se sentem comprometidos com o processo. Mais cedo ou mais tarde, o problema se evidencia: 0 grupo nao consegue chegar a um acordo sobre as sugest6es fundamentais quando as recomendacées da comisséo néo encontram resposta ou quando a comiss4o tenta implementar uma ideia e encontra um muro de resisténcia passiva. Trabalhando arduamente, a comissio realiza algumas poucas contribuigées, que surgem de forma lenta e gradual. A avaliacao post-mortem desse caso mostra que a forga-tarefa nunca teve uma chance de se tornar uma equipe atuante, com pessoas eficientes que compartilhassem problemas, oportunidades e o comprometimento coma mudanga. Desde 0 inicio, esse grupo nunca teve a credibilidade ne- cessdria para oferecer uma lideranca forte. Sem essa credibilidade, vocé tem 0 equivalente a um caminhdo de 18 rodas que utiliza um motor de cortador de grama. Enquanto isso, 4 medida que essa abordagem falha, a posi¢io com- petitiva da empresa vai se enfraquecendo e o lider do setor vai se distan- ciando dos demais. Criagéo de uma coalizéo administratiea 55 No RITMO DA MUDANGA: A EQUIPE A questio central desses dois cendrios € que nenhuma das empresas leva em consideragdo a velocidade do mercado e as mudangas tecno- Iégicas. Em um mundo menos competitivo e mais lento, as comissdes fracas podem auxiliar a adaptacdo das organizagées em um ritmo acei- tavel. Uma comissao faz sugestes. Os gerentes de linhas-chave rejeitam a maioria das ideias. O grupo oferece sugestées adicionais. A linha se move mais alguns milimetros. A comissao tenta novamente. Quando a concorréncia e as mudangas tecnolégicas sdo limitadas, essa abordagem pode funcionar. Mas em um mundo de transformacées mais rdpidas, a comiss4o fraca sempre falha. Em um mundo lento, um chefe solitirio pode implementar as mudangas necessdrias apés conversar com Charlotte, Frank, Ari e, em seguida, refletir sobre 0 que disseram. Ele pode consult4-los no- vamente para obter mais informacées. Apés tomar uma decisao, ele pode comunicé-la a Charlotte, Frank e Ari. O processamento das in- formacées é sequencial. Enquanto o chefe for capaz e houver tempo disponivel, 0 processo funciona bem. No entanto, em um mundo mais acelerado, essa atividade linear e tediosa desmorona. Ela é muito lenta; nao dispde de informagées em tempo real, e isso dificulta sua implementagao. O mundo dos negécios de hoje exige claramente um novo processo de tomada de decisées (ver Figura 4.1). Em um mundo de répidas transformacées, individuos e comissées fracas raramente dispdem de todas as informagées necessdrias para tomar decisdes corretas que nao sejam as rotineiras. Eles nao parecem ter a credibilidade ou 0 tempo necessarios para convencer os outros a fazer os sacrificios pessoais ne- cessdtios a implementagao das mudangas. Apenas as equipes com a composi¢4o certa e confianga suficiente entre seus membros podem apresentar um alto nivel de eficdcia nessas novas circunstancias. Esse novo truismo se aplica igualmente bem a uma coalizdo administrativa de mudanga na fabrica, no processo de desenvolvimento de novos produtos ou no topo de uma organizac4o durante um grande esforgo de transformacaéo. Uma coalizao administrativa que funcione como uma equipe eficaz pode processar mais informagées de forma mais 56 Liderando mudancas AMBIENTE CORPORATIVO MODERNO + Exige mais mudangas em grande escala através de novas estratégias, reengenharia, reestruturacdo, fusdes, aquisigdes, downsizing, desenvolvimento de novos produtos ou mercados ete. ‘AS DECISOES TOMADAS DENTRO DA EMPRESA + Fundamentam-se em questées maiores, mais complexas e com maior teor emocional * Ocorrem com mais rapidez * Ocorrem em um ambiente de mais incertezas * Exigem mais sacrificios por parte dos que as implementa. UM NOVO PROCESSO DECISORIO + € necessdrio porque ninguém sozinho possui as informagdes apropriadas para tomar todas as decis6es importantes nem o tempo e credibilidade necessarios para convencer um grande numero de pessoas a implementar essas decisoes * Deve ser conduzido por uma coalizo poderosa que possa agir como uma equipe Figura 4.1 Processo decisério no ambiente corporativo moderno répida. Também pode acelerar a implementagao de novas abordagens, pois pessoas poderosas séo realmente informadas e comprometidas com as decisées-chave. Dessa forma, por que os gerentes n4o utilizam equipes com mais fre- quéncia para ajudar a produzir transformag6es? Ha certo grau de con- flito de interesses envolvido. As equipes, ao contrario dos individuos, nao s4o promovidas, e os individuos precisam de registros de trajetérias que nao deixem dtividas para que possam progredir em suas carreiras. O argumento “Participei de uma equipe que...” ndo é muito convincente na maioria das empresas hoje em dia. No entanto, em proporgées ainda maiores, o problema tem rai- zes hist6ricas. A maioria dos executivos mais antigos desenvolveu-se em uma época em que 0 trabalho de equipe nao era essencial. Eles po- dem ter falado em “equipe” e usado metéforas esportivas, mas a reali- dade era hier4rquica — tipicamente, um chefe ¢ oito relatores diretos. Apés terem visto muitos exemplos de comissées insatisfatérias, em Criagéo de uma coalizéo administrativa 57 que tudo era mais lento, eles, muitas vezes, sentem-se mais 4 vontade com o velho formato, ainda que ele esteja se enfraquecendo cada vez, mais ao longo do tempo. O resultado liquido: em muitos esforcos de reengenharia e reela- borac4o de estratégias, as pessoas ignoram essa etapa ou lhe dedicam pouca atencao. Em seguida, tentam criar uma nova visao ou reduzir o tamanho da empresa, ou o que quer que seja. No entanto, mais cedo ou mais tarde, a auséncia de uma equipe forte para conduzir esses esforcos se mostraré fatal. FORMAGAO DA COALIZAO ADMINISTRATIVA A primeira etapa na formacao do tipo de equipe que pode administrar os esforcos de mudanga consiste em encontrar a lideranca adequada. Quatro caracteristicas principais parecem essenciais para uma coalizao administrativa eficaz: 1. Poder de posigdo: Existem pegas-chave suficientes na diretoria, es- pecialmente os gerentes da linha principal, de forma que as pes- soas que ficaram de fora nao possam bloquear 0 progresso com facilidade? 2. Especializagao: Os diversos pontos de vista relevantes para a tarefa especifica — em termos de disciplina, experiéncia de trabalho, na- cionalidade etc. — s4o representados de forma adequada para que decisées inteligentes e informadas possam ser tomadas? 3. Credibilidade: O grupo conta com pessoas suficientes com boa reputacdo na empresa para que suas declaragées sejam levadas a sétio pelos outros funcionarios? 4, Lideranga: O grupo possui um nimero suficiente de lideres com- petentes para conduzir 0 processo de mudanga? Esse ultimo aspecto, a lideranga, é especialmente importante. A geréncia ea lideranga so pontos necessdrios na coalizao administrativa e devem funcionar paralelamente, como num trabalho em equipe. A geréncia mantém todo o processo sob controle, enquanto a lideranca conduz a 58 Liderando mudancas + + < < S$ S$ Z 2 = 2 z & % G ‘ o ' a : 3 ' 4 t a 1 x ' x1 Xx x Q : + 0 " + GERENCIA GERENCIA (Aptidéo de lideranga insuficiente) (Pode funcionar se X; for 0 chefe organizar 0 trabalho em equipe) + + T x; X 1x xX & & es z z H & & }-- a 3 ' a 8 [xx x ' x 0 0 : . GERENCIA GERENCIA (Aptidao de gerenciamento (Funcionara bem se houver um bom insuficiente) trabalho de equipe, independentemente de quem for o chefe) Figura 4.2 Perfis de quatro coalizdes administrativas diferentes transformacao. (As grades da Figura 4.2 representam as diversas combi nacées de lideranga e geréncia que podem ou no funcionar.) Uma coalizao administrativa com bons gerentes, mas lideres pouco qualificados, nao terd sucesso. Um conjunto de ideias gerenciais pre- concebidas ird desenvolver planos, nao uma visao; ele nao serd capaz, de comunicar a importancia e a diregéo da mudanga, e ir controlar Criaséo de uma coalizéo administrativa 59 as pessoas, em vez de lhes dar poder. Ainda assim, as empresas com boa reputacao geralmente possuem culturas corporativas criadoras des- sas ideias fixas que rejeitam lideres lideranca. Ironicamente, 0 gran- de sucesso gera um impulso que demanda cada vez mais gerentes para manter 0 crescimento da empresa sob controle, ao mesmo tempo que requer pouca ou nenhuma lideranga. Nessas empresas, é preciso muito cuidado ou as coaliz6es administrativas ficaréo sem esse elemento fun- damental. A auséncia de lideranca é geralmente resolvida de trés formas: (1) as pessoas sio trazidas de fora da empresa, (2) os funcionérios com carac- teristicas de lideranga s4o promovidos ou (3) os funciondrios que detém posiges que exigem lideranca, mas que raramente agem dessa forma, so estimulados a aceitar o desafio. Qualquer que seja 0 método esco- lhido, o resultado final — uma equipe com aptidées de lideranga — deve ser o mesmo. Nunca se esquega: uma coalizdo administrativa composta somente por gerentes — mesmo gerentes fantdsticos que sejam pessoas mara- vilhosas — arruinard os esforgos de mudanga. O tamanho de uma coaliz4o administrativa eficiente parece estar re- lacionado ao tamanho da organizacao. A mudanga geralmente comega com apenas duas ou trés pessoas. O grupo responsvel por transforma- g6es bem-sucedidas aumenta para meia dtizia em empresas de pequeno porte ou em pequenos departamentos de empresas maiores. Nas empre- sas de grande porte, 20 a 50 individuos podem vir a ser contratados. QUALIDADES A SEREM EVITADAS — OU TRATADAS COM CUIDADO Existem dois tipos de pessoas que devem ser evitadas a qualquer custo na elaboragio de uma coaliz4o administrativa: aqueles cujos egos po- dem encher uma sala sem deixar espaco para ninguém mais e as cha- madas “cobras”, pessoas que geram falta de confianga capaz de destruir qualquer trabalho de equipe. Nos niveis mais altos da maioria das organizagées, as pessoas tém egos enormes. No entanto, a menos que também possuam um conhe- cimento realista de suas fraquezas e limitagées, sejam capazes de apre- ciar as qualidades complementares dos outros e dominar seus interesses 60 Liderando mudancas imediatos em favor de um objetivo maior, provavelmente contribuirao para a coalizao administrativa tanto quanto o lixo nuclear. Se uma des- sas pessoas for a pega central da coalizdo, vocé pode dar adeus ao traba- Iho de equipe e as transformacées profundas. As cobras sao igualmente desastrosas, embora de uma forma diferen- te. Elas destroem a confianga, que é sempre um ingrediente essencial no trabalho de equipe. Uma cobra é especialista em dizer a Sally algo so- bre Fred, e a Fred algo sobre Sally que ird prejudicar o relacionamento de ambos. Egos exagerados e cobras podem ser extremamente inteligentes, motivados ¢ produtivos em determinadas circunstancias. Assim, eles podem ser promovidos a cargos da alta diretoria e se tornarem candi- datos Iégicos para uma coaliz4o administrativa. Agentes de mudanga inteligentes parecem ser muito habilidosos para descobrir essas pessoas e manté-las longe da equipe. Se isso for impossivel, lideres competentes devem vigiar e administra esses individuos com bastante cuidado. Outro tipo que deve ser tratado com cuidado é a pessoa relutante. Em organizagées com altas taxas de urgéncia, é facil contratar pessoas para a coalizéo. Contudo, como a taxa de urgéncia é rara, geralmen- te é necessdria uma quantidade maior de esforcos, especialmente para algumas poucas pessoas-chave que nao tém o menor interesse em se comprometer. Jerry é um sobrecarregado gerente financeiro em nivel departamen- tal de uma grande empresa petroleira. De natureza conservadora, ele é mais um gerente do que um lider, e suspeita das mudangas significati- vas devido a seu potencial de risco e destruigéo. No entanto, apés ter tido bom desempenho nessa empresa durante 35 anos, Jerry é muito poderoso e respeitado para ser ignorado. Como resultado, 0 chefe de seu departamento dedicou varias horas num perfodo de dois meses, na tentativa de convencé-lo de que uma grande mudanga é necessdria e de que seu envolvimento é fundamental. Na metade das negociacoes, 0 ge- rente financeiro ainda arranjava desculpas, usando sua falta de tempo e habilidade para ajudar. Mas a persisténcia compensa, ¢ Jerry finalmente aderiu & coalizao. Pode ser tentador descartar pessoas como Jerry e tentar trabalhar sem elas. Mas se essas pessoas s4o elementos centrais com muita autoridade Criaséo de uma coalizéo administrativa 61 ou credibilidade, essa tatica raramente funciona. Em geral, o problema de envolver alguém como Jerry nos remete & questao da urgéncia. Ele nao enxerga os problemas ¢ as oportunidades de forma clara, ¢ isso também se aplica as pessoas com as quais ele interage diariamente. Com altos niveis de complacéncia, vocé nunca o convencerd a despender o tempo e 0 esforco necessdrios para criar uma coalizao vencedora. Quando pessoas como Jerry retinem as caracteristicas de uma cobra ou um ego exagerado, a negociac4o de um pedido de demissao ou apo- sentadoria é quase sempre a tinica op¢ao sensata. Vocé nao as quer na coalizéo administrativa, mas também nao pode permitir que causem problemas fora das reunides. De forma geral, as organizacées relutam em confrontar essa questdo, pois essas pessoas, muitas vezes, tm habi- lidades especiais ou suporte politico. No entanto, a opgao alternativa é ainda pior — permitir que prejudiquem uma nova estratégia ou os esforcos de renovacao cultural. Receosos de enfrentar o problema, convencemo-nos de que Jerry nao é téo ruim assim, ou que podemos lidar com ele. Dessa forma, “tocamos o barco”, apenas para nos maldizermos mais tarde por nao termos resolvido o problema. Nesse tipo de situag4o, lembre-se do seguinte: problemas de pes- soal que podem ser ignorados facilmente em épocas tranquilas podem causar transtornos sérios em uma economia mais agressiva, acelerada e globalizante. A FORMAGAO DE UMA EQUIPE EFICAZ BASEADA NA CONFIANGA E NO OBJETIVO COMUM O trabalho de equipe em uma coalizao administrativa de mudanga pode ser criado de diversas formas. No entanto, independentemente do processo adotado, um componente é essencial: a confianga. Quando ela est presente, vocé geralmente pode criar um trabalho de equipe. Quando no, torna-se impossivel fazé-lo. A confianga esta ausente em muitas organizag6es. Pessoas que passa- ram a carreira em um unico departamento ou setor sao, muitas vezes, instrufdas a serem leais a seu grupo imediato e a desconfiar dos motivos 62 Liderando mudancas dos outros grupos, ainda que estejam todos na mesma empresa. A fal- ta de comunicag4o ¢ muitos outros fatores aumentam essa rivalidade inadequada. Desse modo, os engenheiros avaliam os vendedores com enormes suspeitas, a subsididria alem4 encara seu superior americano com desdém, e assim por diante. Quando funciondrios promovidos desses grupos sao solicitados a trabalhar juntos em uma coalizdo admi- nistrativa durante um esforgo de mudanga, o trabalho de equipe rara- mente é facil, devido 4 remanescente falta de confianga. Os joguinhos provincianos ocasionados por essa situacao podem impedir a realizagao das transformacées necessérias. Essa forma de pensar a confianga, por si s6, pode ser bastante titil para julgar se determinado conjunto de atividades ira gerar 0 tipo de equipe necessdrio. Se essas atividades geram compreensao miitua, res- peito e cuidado associados a confianga, vocé est4 no caminho certo. Caso contrario, esta perdido. Ha 40 anos, as empresas que tentavam formar equipes usavam, principalmente, atividades sociais informais. Todos os executivos co- nheciam as familias dos outros. Nos jogos de golfe, festas de Natal e jantares, eles desenvolviam relagdes baseadas na compreensio ¢ na confianga mituas. As atividades sociais orientadas a familias ainda s4o usadas para formar equipes, mas apresentam um grande ntimero de desvantagens hoje em dia. Em primeiro lugar, trata-se de um processo lento. As atividades ocasionais que nao tenham como principal objetivo a for- macao de equipes podem levar uma década ou mais. Em segundo lugar, isso funciona melhor com familias em que apenas um conjuge trabalha. Num mundo em que as pessoas desenvolvem paralelamente duas carreiras, poucos tém tempo para obrigacées sociais frequentes em duas empresas diferentes. Finalmente, esse tipo de processo de de- senvolvimento de grupo tende a exercer forte presso para se chegar a um acordo. Ideias politicas, estilos de vida e hobbies convergem para o meio-termo. Quem for diferente deve adequar-se ao grupo ou aban- dond-lo. O pensamento em grupo, em seu sentido negativo, pode ser uma consequéncia. Hoje em dia, a formagao de uma equipe tem de ser mais gil, permi- tir maior diversidade e funcionar sem cénjuges que ficam em casa. Para Criagéo de uma coalizéo administratioa 63 atender a essa realidade, o meio mais utilizado hoje em dia é, sem sombra de dtivida, uma espécie de encontros fora da empresa cuidadosamente planejados. Um grupo de 8, 12 ou 24 pessoas vai para algum lugar por dois a cinco dias com 0 objetivo explicito de se tornar mais equipe. Eles conversam, analisam situagées, escalam montanhas, jogam, tudo com 0 propésito de aumentar a confianga e a compreensao miituas. As primeiras tentativas desse tipo de atividade, ha cerca de 30 anos, eram uma espécie de terapia em grupo téo répida e superficial que ra- ramente funcionava. Ultimamente, a énfase passou a ser dada a tarefas mais intelectuais direcionadas 4 mente e atividades em grupo para de- senvolver o lado emocional. As pessoas aprofundam seus conhecimen- tos nos dados sobre o setor e, depois, vao velejar juntas. Um tipico retiro fora da empresa inclui de 10 a 50 pessoas por trés a seis dias. O staff interno ou os consultores externos ajudam a planejar o encontro. A maior parte do tempo é usada no encorajamento de andli- ses honestas sobre como os individuos se sentem em relacdo 4 organiza- Ao, a seus problemas e oportunidades. Os canais de comunicagio entre as pessoas sao abertos ou fortalecidos. A compreensao mtitua aumenta, eas atividades sociais ¢ intelectuais sao planejadas para estimular maior grau de confianca. Essas excurs6es para o desenvolvimento de equipes, na maioria dos casos, ainda nao conseguem atingir os resultados desejados. As vezes, espera-se atingir metas muito elevadas para um evento de apenas trés dias, ou o encontro nao € planejado com o cuidado ou a habilidade suficiente. Mas a tendéncia é clara: estamos ficando melhores nesse tipo de atividade. Por exemplo, o presidente de divisao Sam Johnson estd tentando unir um grupo de 10 pessoas em uma coalizao de mudanga eficiente para seu negécio de equipamentos eletrénicos. Nesse grupo, estarao seus sete relatores diretos, o chefe de um departamento da divisao que, provavel- mente, estard no centro dos esforcos de mudanga, 0 vice-presidente exe- cutivo da sede e ele préprio. Com grande dificuldade, ele programa um encontro de uma semana para essas 10 pessoas. Eles comegam com uma atividade externa de dois dias, em que o grupo fica junto, ao ar livre, durante 48 horas, e se submete a tarefas fisicamente extenuantes, como velejar e escalar montanhas. Nesse periodo, eles se conhecem melhor e 64 Liderando mudancas sao lembrados da importancia do trabalho em equipe. Entre o terceiro eo quinto dia, eles se hospedam em um hotel, recebem uma enorme quantidade de dados sobre os concorrentes e clientes da diviséo e sao solicitados a produzir uma série de trabalhos de andlise em um prazo bem apertado. Eles trabalham das 7h30 as 19 horas, sendo a maior parte do tempo em subgrupos rotativos, mas nao escolhidos de forma aleatéria. Todas as noites, das 19 horas as 21h30, eles jantam e con- versam sobre suas carreiras, aspiracdes outros assuntos mais pessoais. Nesse processo, eles passam a se conhecer ainda melhor e comecam a desenvolver perspectivas comuns sobre seu setor. A maior compreensao estabelecida, os relacionamentos fundados na real consecugao de tarefas € as perspectivas comuns favorecem a confianga. Reconhecendo que essa bem-sucedida atividade de uma semana é apenas o inicio de um processo, Sam organiza outro evento de trés dias para o grupo alguns meses mais tarde. Dois anos depois, com as promocées e a rotatividade alterando a composicao do grupo, ele pla- neja cuidadosamente outro retiro. Igualmente importante, entre essas atividades bem visiveis, ele toma dezenas de medidas que ajudarao a estabelecer a confianga necessdria ao trabalho em equipe. Boatos que possam diminuir a boa vontade séo imediatamente confrontados com informagées acuradas. Pessoas que nao se conhecem tao bem so colo- cadas juntas em outras forcas-tarefa. Todos os 10 sao incluidos sempre que isso for adequado as atividades sociais. P: Foi facil fazer isso? R: Nem um pouco. Dois dos 10 individuos desse exemplo eram pessoas bastante inde- pendentes que nao entendiam por que precisavam escalar montanhas juntos. Uma era tao ocupada que programar atividades de grupo pare- cia, As vezes, impossivel. Outra softia de um sério problema: ego exa- gerado. Devido a fatos passados, duas delas nao se davam muito bem. Mesmo assim, Sam conseguiu superar tudo isso e desenvolver uma coa- liz4o administrativa eficiente. Acredito que ele conseguiu essa faganha por desejar muito que a coalizao funcionasse, por estar convencido de que era necessdrio Criaséo de uma coalizéo administratioa 65 mudar drasticamente para fazer de sua empresa uma vencedora e por acreditar que essa mudanga n4o ocorreria sem uma coalizao adminis- trativa eficiente. De certa forma, Sam percebeu que nao tinha escolha. Ele precisava gerar a confianga e o senso de trabalho em equipe. E assim o fez. Quando as pessoas nao conseguem desenvolver a coalizao necesséria 4 mudanca, a razio mais comum é que, no fundo, ndo sentem a necessi- dade de realizar uma transformacdo ou de contar com uma equipe forte para administrar essa mudanga. A capacidade de formar uma equipe ra- ramente é 0 problema. Quando os executivos realmente acreditam que devem criar uma coalizao administrativa orientada a equipes, sempre tentam encontrar conselheiros competentes e aptos. Sem essa convic- 40, mesmo que tenham capacidade ou bons conselheiros, os executivos nao tomam as medidas necessarias. Além da confianga, outro elemento fundamental para o trabalho em equipe parece ser o objetivo comum. Somente quando todos os mem- bros de uma coaliz4o administrativa querem realmente atingir 0 mesmo objetivo, o verdadeiro trabalho em equipe torna-se possivel. O objetivo geral que une os membros de uma coaliza4o administrati- va de mudanga é 0 compromisso com a exceléncia, o verdadeiro desejo de que a organizac4o tenha o melhor desempenho possivel. A reenge- nharia, as aquisig6es e os esforgos de mudanga cultural falham muitas vezes porque esse desejo nao existe. Em vez disso, vemos as pessoas comprometidas com seus préprios departamentos, divis6es, amigos ou carreiras. A confianga favorece bastante a criagéo de um objetivo comum. Uma das principais raz6es pelas quais as pessoas nao se comprometem com a exceléncia total é a falta de confianga nos outros departamen- tos, setores ou, até mesmo, nos outros executivos. Elas receiam, as vezes de forma bem racional, que, se centrarem obsessivamente suas ag6es na contengao de despesas ou na satisfag4o do cliente, os outros departamentos nao irao fazer sua parte e os custos pessoais subirao vertiginosamente. Quando a confianga aumenta, a cria¢éo de um ob- jetivo comum torna-se mais facil. A lideranca também ajuda. Os lide- res sabem como estimular os outros a transcender pequenos interesses de curto prazo. 66 Liderando mudancas VIABILIZAGAO DA MUDANGA A combinagao de confianga e de um objetivo comum compartilhado por pessoas com as caracteristicas certas pode fazer surgir uma pode- rosa equipe (ver Tabela 4.1). A coalizao administrativa resultante ser4 capaz de possibilitar as mudangas necessarias, apesar de todas as forcas da inércia. Ela poderd, ao menos, realizar 0 trabalho érduo envolvido na criago da visio necesséria, na comunicacao ampla dessa viséo, na concessao de poderes a um grande grupo de pessoas para que este possa tomar as decis6es corretas, na garantia da credibilidade, na viabilizagao de vitérias no curto prazo, na lideranga e gerenciamento de dezenas de projetos de mudanca diferentes e no estabelecimento de novas aborda- gens na cultura da organizacao. Mais uma vez, em uma economia de oligopélios menos globalizada e mais lenta, todos esses esforgos em geral nao s4o necessdrios, Mas as tendéncias sao claras. Hoje em dia, e mais ainda num futuro imediato, seremos testemunhas de muitas tentativas em prol da transformacao das organizacées. No entanto, sem uma coaliz4o administrativa eficiente, a mudanga sera obstruida e o massacre aumentara. Tabela 4.1 Criacdo de uma coalizao que faz a mudanga acontecer PROCURE AS PESSOAS CERTAS + Com o poder de posicao forte, grande aptidao e alta credibilidade + Com aptidées de lideranca e geréncia, especialmente a primeira GERE CONFIANCA + Através de eventos externos cuidadosamente planejados + Com muitas atividades em grupo e conversas DESENVOLVA UM OBJETIVO COMUM + Suscetivel a mente * Atraente ao coracéo CAPITULO Desenvolvimento de uma visto e estratégia magine a seguinte situacao. Trés grupos de 10 pessoas estéo em um parque na hora do almogo e uma tempestade est prestes a desabar. No primeiro grupo, alguém diz: “Levantem-se ¢ sigam-me.” Quan- do ele comega a caminhar e apenas algumas pessoas 0 acompanham, ele grita para os que continuaram sentados: “Levantem-se, eu disse, AGORA!” No segundo grupo, alguém fala: “Temos de nos mexer. Este é 0 plano: levantarmos um de cada vez e caminharmos em dire- 40 a drvore. Por favor, mantenham uma distancia de, pelo menos, meio metro dos outros membros do grupo e nao corram. Nao deixem objetos pessoais no chao e parem ao pé da 4rvore. Quando todos es- tivermos lé...” No terceiro grupo, alguém diz aos outros: “Vai chover daqui a pouco. Por que nao vamos até ali e nos sentamos embaixo daquela grande macieira? Ficaremos secos e poderemos comer macas fresquinhas no almogo.” As vezes, fico surpreso com a quantidade de pessoas que tentam transformar organizagées usando métodos semelhantes as duas pri- meiras situac6es descritas: decretos autoritarios e microgerenciamento. 68 Liderando mudangas Ambas as abordagens tém sido amplamente aplicadas nas empresas no decorrer deste tiltimo século, na maioria das vezes, para manter os sis- temas existentes, e nao para transformd-los em algo melhor. Quando o objetivo € a mudanga de comportamento, decretos autoritdrios nao funcionam nem mesmo nas situac6es mais simples, como no caso da macieira, a menos que o chefe seja muito poderoso. Em organizacées complexas, essa abordagem tem se mostrado cada vez mais ineficaz. Sem o poder de reis e rainhas, é pouco provavel que o autoritarismo consiga romper as barreiras da resisténcia. As pessoas iréo ignord-lo ou fingir que cooperam, ao mesmo tempo que farao de tudo para dificul- tar seus esforcos. O microgerenciamento tenta contornar esse problema especificando, de forma detalhada, o que os funciondrios devem fazer e monitorando o cumprimento dessas determinagées. Essa tatica pode vencer alguns dos obstculos 4 mudanga, mas em um periodo cada vez mais inaceitavel. Como a criag4o e a comunicacao de planos detalhados sao extremamente demoradas, as mudangas assim geradas tendem a ser bastante gradativas. Apenas a abordagem da terceira situag4o descrita é capaz de vencer todas as forcas que sustentam o status quo e estimular as grandes transicGes encontradas nas transformagées bem-sucedidas (ver Figura 5.1). Essa abordagem fundamenta-se na viséo — um componente central de toda grande lideranga. Por QUE A VISAO E ESSENCIAL A viséo refere-se a um quadro do futuro com comentarios implicitos ou explicitos sobre a raz4o pela qual as pessoas devem lutar para criar esse futuro. Em um processo de mudanga, uma visao adequada atende a trés objetivos importantes. Primeiro, ao esclarecer a dire¢ao geral da transformacao, com o equivalente corporativo de “em alguns anos, te- mos de estar mais ao sul de onde estamos hoje”, ela simplifica centenas ou milhares de decisées mais detalhadas. Segundo, ela motiva as pessoas a tomar medidas certas, mesmo que as etapas iniciais sejam dolorosas. Terceiro, ela ajuda a coordenar as agées das diversas pessoas, até mes- mo de milhares de individuos, de uma forma incrivelmente r4pida e eficiente. Desenvolvimento de uma visio e estratégia 69 Decreto Autoritario Microgerenciamento Visao ¥ Forgas que Sustentam o Status Quo Figura 5.1 Como vencer a resisténcia com a visdo Definir a direcao da mudanga é importante porque, em geral, as pes- soas discordam quanto A direcao a ser seguida, sentem-se confusas ou se perguntam se transformagées significativas séo realmente necessdrias. Visao e estratégias de apoio eficazes ajudam a resolver essas questées. Elas dizem: é assim que o mundo tem evoluido, ¢ aqui estéo algumas raz6es pelas quais devemos definir esses objetivos e seguir esses novos produtos (ou aquisigées ou programas da qualidade) para atingir as me- tas. Com uma diregao bem definida, a inabilidade de tomar decisées pode desaparecer. Debates intermindveis para decidir se o dinheiro serd investido na compra de uma empresa ou na contratacao de mais vende- dores, para saber se uma reorganizacao é realmente necessdria ou se a ex- pansao internacional est ocorrendo num ritmo suficientemente veloz geralmente desaparecem. Uma simples pergunta — isso est4 de acordo com a visio? — pode ajudar a eliminar dias, horas ou, até mesmo, meses de discussées torturantes. Da mesma forma, uma viséo adequada pode ajudar a eliminar os gastos e o tempo perdido. Com uma direcéo bem definida, projetos inadequados podem ser identificados e encerrados, mesmo que tenham suporte politico. Os recursos liberados dessa forma podem ser utilizados no processo de transformacao. Uma segunda fungéo essencial da visio é facilitar grandes mudan- gas através da motivacao de acées que nao atendem necessariamente 70 Liderando mudangas aos interesses imediatos das pessoas. As modificagées exigidas por uma visao sensata quase sempre envolvem uma “ponta” de softimento. As vezes, 0 preco de um futuro melhor é pequeno; no exemplo da maciei- ra, tudo 0 que as pessoas tiveram de fazer foi sacrificar seu conforto por alguns momentos enquanto caminhavam em direcdo 4 arvore. Mas, em muitas organizacées, os funciondrios sao cada vez mais forcados a aban- donar suas dreas de conforto, trabalhar com menos recursos e aprender novas aptidées e comportamentos, além de conviverem com a ameaca do desemprego. Nessas circunstancias, ninguém deve ficar surpreso se uma pessoa encarar tudo isso sem muito entusiasmo. Ao se mostrar esperangosa e, consequentemente, motivadora, uma visio adequada ajuda a superar essa relutancia natural em se fazer 0 que é necessario (apesar de, muitas vezes, doloroso). Ela reconhece que alguns sacrificios sero necessdrios, mas deixa claro que eles trarao beneficios e satisfacao pessoal muito superiores aos disponiveis no momento — ou no futuro — sem a tentativa de mudanga. Mesmo em situagées que requeiram um downsizing radical, em que a tendéncia natural é negar o futuro porque ele é deprimente e desmora- lizante, a visao correta pode oferecer as pessoas uma causa atraente pela qual lutar. O raciocinio seria o seguinte: nossa situa¢do atual nos levaré a faléncia, mas se adotarmos essa dire¢4o conseguiremos salvar alguns empregos, evitar problemas para varios clientes ¢ fornecedores ou aju- dar milhares de familias de classe média que investiram seus fundos de pensao ou outras economias na empresa. Terceiro, uma visao ajuda a alinhar os individuos, coordenando de forma bastante eficaz as agdes de pessoas motivadas. As alternativas — um trilhao de instrugées detalhadas ou reunides intermindveis — s4o muito mais lentas e dispendiosas. Com uma viséo bem definida, os gerentes e funciondrios podem descobrir por si mesmos o que fazer sem consultar constantemente seu patrao ou os colegas. A terceira caracteristica da visao é, geralmente, muito importante. Os custos de coordenacéo da mudanga, especialmente quando hd muitas pessoas envolvidas, podem ser gigantescos. Sem um senso comum de di- recao, as pessoas interdependentes podem se ver em constante conflito € em reuniées interminaveis. Com uma viséo comum, elas podem trabalhar com certo grau de autonomia e, ainda assim, nao tropegar nas outras. Desenvolvimento de uma visio e estratégia 71 ALIDERANCA Visao Um quadro sensato e atraente do GERA { I futuro, Estratégias Uma légica sobre como a visao pode | ser alcangada AGERENCIA Planos Etapas especificas e cronogramas GERA { | para implementar as estratégias: Orgamentos Planos convertidos em projeges e metas financeiras Figura 5.2 Arelacao entre visdo, estratégias, planos e or¢amentos A NATUREZA DE UMA VISAO EFICAZ A palavra viséo lembra algo mistico ou grandioso, mas a direcao que leva a transformagées bem-sucedidas é geralmente simples e mundana, como em: “Vai chover, vamos nos abrigar embaixo da macieira e comer algumas frutas no almogo.” Uma visao pode ser mundana e simples, pelo menos em parte, pois em transformagoes bem-sucedidas ela é 0 inico elemento de um sistema maior que também inclui estratégias, planos e orgamentos (ver Figura 5.2). Embora ela seja apenas um fator de um grande sistema, é especial- mente importante. Sem a visao, a criacao de estratégias pode tornar-se uma atividade muito mais controversa e 0 orcamento pode dissolver-se em um exercicio impensado de mudar os ntimeros do ultimo ano em 5%. Ainda pior, sem uma viséo adequada, uma estratégia inteligente ou um plano légico raramente inspiram o tipo de acdo necessdrio para produzir uma grande transformacao. Mundanas ou nio, as visées eficazes parecem ter, pelo menos, seis caracteristicas-chave (resumidas na Tabela 5.1). Em primeiro lugar, descrevem como uma atividade ou organizacao ser no futuro, muitas vezes num futuro distante. Em segundo lugar, articulam um conjunto de possibilidades que interessa a varias pessoas envolvidas na situacdo: 72 Liderando mudangas Tabela 5.1 Caracteristicas de uma visdo eficaz + Imagindvel: Apresenta um quadro de como pode ser o futuro. + Desejavel: Atraente aos interesses no longo prazo dos funcionérios, clientes, acionistas e outros envolvidos na iniciativa. + Vidvel: Abrange objetivos realistas e atingiveis. + Concentrada: Clara o suficiente para fornecer uma diretriz no processo decisério. + Flexivel: Geral o suficiente para permitir iniciativa individual e respostas alternativas de acordo com as condicées inconstantes. + Comunicével: De facil comunicacao; pode ser facilmente explicada em cinco minutos. clientes, acionistas, funciondrios. Em contraposig4o, visdes incorretas, quando seguidas, tendem a ignorar os interesses legitimos de alguns gru- pos. Em terceiro lugar, visées eficazes sao realistas. Elas nao sao fantasias com poucas chances de concretizagao. As visdes ineficazes geralmente tém um aspecto ilusério. As vis6es adequadas sao claras o suficiente para motivar a ago, mas também flexiveis o suficiente para viabilizar a ini- ciativa. As vis6es inadequadas sao, algumas vezes, muito vagas e, outras vezes, muito especificas. Finalmente, é mais facil comunicar as vis6es eficazes, pois as inadequadas podem ser ininteligiveis. UM QUADRO IMAGINAVEL DO FUTURO. O que vocé iria pensar se lesse 0 seguinte no jornal da empresa: “Nossa visio é nos tornarmos uma empresa que paga os salérios mais baixos possiveis, cobra os pregos mais altos que o mercado pode suportar e divide os lucros entre os acionistas e a alta diretoria, principalmente esta ultima.” Dito dessa forma, a mensagem parece ser uma afronta; ainda assim, ela nao estd muito distante da visio de transformagao que conduz algumas empresas hoje em dia. Embora 0 cinismo existente em todos nés queira nos fazer acreditar que essas empresas estao se dando Desenvolvimento de uma visio e estratégia 73 bem, a verdade é que elas raramente tém sucesso, a nao ser por curtos periodos, e quando isso acontece. A reengenharia, a reestruturacao e outros programas de mudanga nunca funcionam muito bem no longo prazo, a menos que sejam con- duzidos por visées que atraiam a maioria das pessoas envolvidas na ini- ciativa: funcionéarios, clientes, acionistas, fornecedores, comunidades. Uma visio adequada pode exigir sacrificios de alguns ou de todos os membros do grupo para produzir um futuro melhor, mas nunca ignora os interesses no longo prazo de ninguém. As visdes que tentam ajudar alguns clientes desconsiderando os direitos de outros tendem a ser asso- ciadas aos mais diabdlicos semideuses. Embora essas visées possam ter sucesso por algum tempo, especialmente nas maos de algum lider caris- matico, elas acabam por desmoralizar seus seguidores, motivando sem- pre um contra-ataque. No mundo dos negécios de hoje, esses contra- ataques vém de grandes acionistas institucionais que pressionam a alta diretoria de diversas formas, através de clientes que param de comprar ou unem-se em ages judiciais e através de funciondrios que destroem a mudanga langando mao da resisténcia passiva. As vis6es corporativas que nao sao profundamente enraizadas na realidade dos mercados de produtos e servicgos revelam-se cada vez mais uma receita para desastres. Se Ihes ¢ dada uma escolha — e, atual- mente, na maioria dos setores, os compradores podem escolher —, os clientes raramente toleram fabricantes que nado se preocupam com seus interesses. Isso também se aplica aos mercados de trabalho ou financeiros. Se os funciondrios ou investidores tiverem alternativa, a organizacao que ignorar suas necessidades est seguindo o caminho da autodestruigao. Por que um grupo de pessoas inteligentes segue uma visao que ig- nora as necessidades de clientes, funcionarios ou investidores? Pelo que pude observar, isso normalmente acontece quando a geréncia se sente pressionada por um cliente que, a0 mesmo tempo, detém uma posigao quase monopolista sobre os outros clientes. Por exemplo: quando um sindicato trabalhista forte exige saldrios altos e beneficios, uma gerén- cia fraca resolve o problema repassando todos os custos para clientes que possuem poucas ou nenhuma alternativa. Ou o contrario: quando clientes com alternativas crescentes em todo o mundo exigem produtos

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