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216 crescentemente nos servigos figados & limpeza e higiene™*, 0 espago urbano lentamente se modificou © foram implementadas medidas para tomar a cidade "mais habitavel", aumentaram as preocupagSes com a agua encanada ¢ com as altemativas de distribui-la, ias “7: os “podere considerada fundamental para evitar as epid " da figua passaram a ser ressaltados™) Também as preacupagées com a formagia do médico tornaram-se cada vez maiores. © Cotéaio do Rio de Janeiro, antigo nome da Faculdade de Medicina que funcionava junto a Santa Casa de Misericérdia, buscou aperfeigoar ¢ atualizar seu ensino, tornou-se mais exigente, ¢ futuramente exigiria até mesmo a confeccao de teses para a concesstio do titulo de doutor. A medicina francesa desembarcot em tercas cariocas, ainda dividindo espago com curandeitos ¢ charlatdes. Nesse contexto, os banhos de mar passaram a ser sugeridos camo pritica terapéutica’”, Jé em 1850, a Camara Municipal langou edital com uma série de conselhos para evitar as epidemias, entre os quais fazer uso repetido de banhos de mar. Note-se que no edital era recomendado que se devia evitar ago prolongade do sol. Loge. 0 mar nfo era encerado como forma de lazer, mas como solugdo para problemas de sauide. Nao por acaso, a primeira casa de saiide do Rio de Janeiro foi aberta em 20, Botafogo, bairro ainda distante, mais aprazivel e perto de um *mar mais limpo' 2 Em 1882, as autoridades municipsis jt investiam 12:0008 contos de réis para a limpeza das praias © 8808 contos de rei para 2 limpeza das ruas e construglo de rede encansda, quantias pagas & empresa Gary, O mau servigo levava a crtieas consrantes dx imprensa, Maiores informagdes podem ser obtidas em: RENAULT, Delso. O dia-a-dia do Rio de Janeiro segundo os Jornais - 1870-1879. Rio de Janeiro: Civilizagdo Brasileira” MEC, 1982. Ouso exemplo de investimento pode ser encontrado no ampliar da rede de espotos. Se em 1872 cerca de 46,5 % dos prédios cidade eram atendides, em 1890 esse niimero ja aleangava a ordem de 60% (SOLIS, RIBEIRO, 1985). "Oscar Caustattatfema que na déeada de 1870 0 consumo de agua na Ria de Janeita ja era maior do ‘que em outras grandes cidades, ¢ que alguns viajantes affrmavarn que era uma das cidades em que mais se ‘consumia Agua no mumdo Un: REBELO, op cit) SF Gor 1878, encontrasse um exemplo de preocupastes de volgarizaglo das nosBes de higiene. © zoverno deu a Joseph Fogliami a concessio de banhos piblicos, uma subvena0 de 8000 réis, fixou o prego a ser cobrado pelo bantio em 200 réis e divulgou que distribuiria 600 banhos 4 populace que no tiyesse dinheiro, A imprensa e a populagto critiearam ferozmente, etal iniiativa ndo avancou, 2° Um dos marcos apontados pelos memerialstas na mudanga da relagaa dos habitantes cariocas com ‘mar foj a utlizagao por D. Jodo VI dos banitos de mar para curar uma inflamage na pera esquerda, fcasionada por mordidas de carrapato, a partir de sugest3o de um médico francés, Para tal fnalidade, {comprot ma quinta com uma casa na praia do Caju. no Ioeal conhecido como Prainba. Provavelmente devido aesse fato e outros semeliantes a partir de entdo tal baliro passou a ser eoniecida como Saude Em 1851 fot crindo o Hospital dos Alienados, também em Botafogo. E possivel que a instalagdo deste estabelecimento em tal lugar esteja relacionada @ distancia do cenira ("eolocar os foueos distances"), ras também aos beneficios para a sae, na época 3A bem divalgades, de paragens proximas 20 mar. 81 E compreensivel, entilo, que uma das agdes relacionadas & busca de melhores condigdes de higiene tenha sido a redugio do uso do mar para deposigao. de exerementos, notadamente observivel a partir dos anos 1860. maw para banhos: repercussbes na cidade Jo das praias na Europa tem também relagio O aumento da poputaridade do uso. De acorto com Corbin, a 0% dlireta com a queda da influéncia da visdo religiosa catélica acerca do mar, que induzia a uma certa reputsa ¢ medo””', Esta é uma questo que ndo pode ser desconsiderada no Brasil. Deverse levar em conta que 0 século XIX foi bastante rico no que se refere a chegada @ cidade de novas religides (destacando-se as. protestantes, principalmente presbiterianas @ metodistas”™, ¢ o espiritismo), sem falar nas j4 existentes religides Iocais (de origem indigena), bem como as tradigdes originalmente trazidas pelos negros. sintetizadas ¢ sincretizadas nfo sé com a religio’ catéliea, como também com as tradigdes religiosas indigenas, sem diivida influentes na estrutura social brasileira”. Mais do que propagarem uma visto scctea do mundo diferenciada, deve-se considerar influéncias diretas. Por exemplo, nfo se pode negara influéncia dos professores imigrantes nos eolégios religiosos. Os protestantes estiveram entre os primeiros a introduzir as priticas esportivas na escola e a propagar habitos higiénicos, estimulando os banhos de mat, a ginastica, as caminhadas, entre outras”™*, De fato, no decorrer do séeulo XIX foi diminuindo sensivelmente a influéncia da Igreja Catéliea entre a populagéo do Rio de Janeiro. Mesmo as comemoragdes deaicadas aos santos catdlieos, sempre um grande motivo de festas, foram ganhando um carter pronunciadamente profano, mais do que propriamente religiaso””’, Assim, & possivel supor que o ampliar do leque de religiosidades possiveis na sociedade carioca daquele momento tenha tido alguma influéncia na ocupagao das “a do banho de mar. praias e no desenvolvimento da pr = Opt 2 Também no séeulo XIX chegaram ao Rio de faneiro a igrejas luteranas, congregacionas, batistas € episcopais Sabre a sintese das celigides afrocbrasileias sua influéncia na sociedade brasileira, ver 0 estudo: PRANDI, Reginaldo. Herdeiras do axé Sociologia das relies afro-brasieiras, Sao Paulo: HucitecSP, 1996, ="Maioresjnformagses podem ser abtidas no estudo: MELO, Victor Andrade de. A Educagio Fisiea nas estolas brasileias do século XIX: esporte ou gindstica? In: FERREIRA NETO, Amailio(org.). Pesquisa: Istésica na Educaco Fisica ~3. Aracnuz: FACHA, 1998a, p.48-68, BS SILVA, opcot. O estudo da autora apresenta uma consistente andlise da influencia da retigito oa sociedade carioca do inicio de séeulo XIX Com os banhos de mar ganhando espago na cidade € sendo exaltados pelas propriedades terapéuticas, observou-se o surgimento de um mercado ao redor dessa pratica, Os aliguéis na Praia de Botafogo, por exemplo, tomaram-se mais caros. sempre sendo ressaltadlas nos amincios as facitidades que o bairco oferecia para 0 acesso is praias As empresas de bonde também utilizaram 0 mar como estratégia de marketing. oferecendo passeios para as preferidas Praia do Passeio ¢ do Russel (hoje. Praia do Flamengo). Os passeios maritimos ¢ as excursdes para as praias mais distantes (como, | Copacabana) se tornaram mais frequentes. De fato, a estrutura urbana de ps, na Epo ‘transporte passa a se desenvolver em diregdo a Zona Sul Livros ressaltando os ganhos, s hora adequada, os procedimentos, © vestuério necessério € as precaugdes com os banhos de mar foram traduzidos do franess, como Banhos de mar, em 1876, e Conselhos aos banhistas, do Dt, Claparéde, em 18822", Criou-se uma verdadeira estrutura comercial ao redor dos banhos de mar, que ia desde sua utilizagtio como pano de fundo para propagandas ligadas a remédios ¢ tGnicos, a venda de produtos especificos para os banhos (como os sapatos de Iona), até ‘sua utilizagdo como vantagem oferecida por casas de saide”™ e hotéis™”, Os banhos de mar somente se tomariam realmente mais difundidos j4 no quartel final século XX, no momento que precede o desenvolvimento de uma reforma urbana mais radical e quando se articula um novo estilo de vida na cidade*™, Todavia, deve se observar que, no decorrer do final do segundo e no terceiro quartel do século XIX, crescentemente essa prética vai ganhando espago na cidade. Segundo Delso Renault, a partir dos anos 1850 2 primeira companhia de honds para a Zona Sul foi inaugurada na cidade em 1866: a Botanical Ggeden Rail Ron SU RENAULT, 1982, op it Nos exemplares do Jornal do Brasil sto faramente encontrados anincios de hots, "Villas Balneérias’ e insttutos medicinais, como o Institute Kneipp, eferecendo banhos de mar *para 0 cxganismo” e’ou banhos hidroterapicos. Por exemplo, em 1879 0 Hotel do Leme anuncia a possibilidade de banhos de mar tangs, igchusive com o oferecimento de salva-vidas para 0s hospedes (RENAULT, 1982, op cit) 55 Para maiores informagdes, sugiro 0 estudos: ARAUIO, op cit: SEVCENKO, Nicolau, A capital inadiante: tSnica,ritmos e ritos do Rio. dr: (ore). Miséria da vide privada no Brasti «3. SA0 Paulo: Compania das Letras, 1998. p 513-518. 8 "O fluminense mais esclarecido, no entanto, se preocupa com satide. (..) Recorre aos meios que podem preservé-ta’ os passeios campestres, a eguitacdo, o banho de mar e a gindstica, que se introduz, pouco a pouco, nos seus kabitos"*' Fanfim, observa-se 0 crescimento de certas preocupagdes com a saiide, que passava pelo uso do mar para banbos, agora normatizad ¢ constituindo uma pritica minuciosa: "O banho de mar, em particular, e sobretudo a partir de 1820-1830, que explora as afirmagdes dos higienistas do século XVII, torna-se uma pratica claramente especifica' ‘Assim, nao € surpreendente que tal prética chamasse a atengao do olhar atento ¢ 2 eritieo de Artur Azevedo. Na erdniea "Banhos de Mar, Azevedo narra a historia de um homem velho e rico que se casa com uma mulher mais nova. A mulher havia abandonado um namorado que muilo amava, por pressio ¢ interesse familiar: no entanto, no conseguia engravidar, o que deixava o marido decepeionado. Procurando ico. este afirma néo ver muitas opgdes, sugerindo os banhos de mar: "0 médico aduciu, para animé-to - Todavia, Verrier, se ndo me engano, Diz que os bankos salgados Dao belos resultados... Experimente o oceano!" Pode-se identificar como os banhos de mar eram vistos como uma alternative médica, muitas vezes um remédio para todos os males. Seguindo a recomendagao, 0 casal alugou uma casa de praia e por lé ficou por trés meses, até que a senhora engravidou de gémeos: ". Viva o banko de mar! Ditoso banho! Dizla, ardendo em jtibilo, 0 marido. Eu pedia-the um filho, e dots apanho! Doutor, meu bom doutor, agradecido!" °!, RENAULT, Delso. Rio de Janeiro: a vida de cidade refletda nos jornais - 1850-1870. Rio de Janeito: Civilizagio Brasileira MEC, 1978. p.S3. Renault observa também que na Travessa do Pago, ji os anos 1880, um certo prof Bidegory oferecia igbes de zindtica, com 0 objetivo de tratamento de deformidades ¢ fiaquezas.O referido professor logrou grande sucesso ¢ reconhecimento na ciiade, sendo inclusive designado pelo Imperador pera organizar a preparagto fisica do recém-eriado Corpo de Bombeiros da cidade. Maiores informagies podem ser obtidas em: COUTO, Evandro. Samo Apontamentos historicos da Educagto Fisica no Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro dda riagdo em 1856 até a década de 30. fm: VOTRE, Sebastito Josué (org), Congresso Brasileiro de Historia do Esporte, Lazer e Educagao Fisica, 6, Riode Janeiro, 1998, Coletince. 22° VIGARELLO, op ci, p10. °°. In: COSTA, Flavio Moreira da (org). Archur Azevedo ~ Plebiscito e outros contos de humor, Rio de Janeiro: Revan, 1995. p.105-110, Azevedo nao estava fazendo, na verdade, uma apologia aos banhos de mar, e sim criticando a erenga exacerbada em seu aspecto medicinal. Mais a frente, afirma que 0 antigo namorado alugara uma casa perio do casal, durante a estada na praia, insinuance ter ocorriuo uma trai¢do, Inclusive lembra que. depois que o velho morreu, casou-se com a vitiva ¢ demonstrava amor jamais visto pelos enteados. Com tal popularizagio erescente, desde cedo surgiram preocupagdes com a regulamentagio” ¢ nfo foram poucas as diividas quanto ao pudor dos banhos, que supostamente despertariam 0 desejo dos que deles fizessem uso. A questo do pudor merece ser mais profundamente discutida, pois a ela também est diretamente ligado o desenvolvimento do remo na cidade. 2.3.ds casas de banho e as preveupacies com o pudor Nao é de se estranhar os rigorosos trajes de banho que deviam ser utilizados: 'O pudor ¢ 0 medo da violaydo ocular determinam 0 traje de bartho, As primeiras mulheres a merguihar no mar enfiavam um espesso vestido de la. (..) Na Branga (..) € assim vestidas que as damas tomam banho, Em Rayan, no inicio dos anos 1820, homens & tmudheres vestem ian longo traje de burit marrom sobre wma calca comprida Par muito tempo proliferam ridiculas vestimentas individuais"**, Ao desctever mais minuciosamente um traje de banho utilizado na Europa nos anos 1840, Corbin possibilita peteeber ainda melhor as similitudes com as roupas de hanho utilizadas no Brasil, ou como possivelmente 9 Brasil importou tais modelos da Europa: "a calga impoe-se as banhistas: a roupa de banho (..) compe-se entao de uma camisa e wma calca coladas no corpo e montadas num mesmo molde, de modo a formar um todo continuo, (..) As jovens acrescentam um pequeno saiote ‘ajustado a cintura, com a finalidade de dissimular os quadris. Convém no sublinkar demais esse elemento promissor do dote estético"*. ™ Iniciativas povernamentais de regulamentagao dos banhos de mar sfo observaveis na cidade até os anos 1920. 2°, CORBIN, Alain. O tertério do vaca, praia e 0 imaginirio oeidental. Séo Paulo: Compania das Leas, 1989. 9.93, Ibid. p. 93. 85 E qualquer “inovagio mais ousada, mesmo que lograsse alguma aceitagao popular, recebia logo restrigfes dos responsiveis pelos "bons costumes” "No inicio dos anos 1840 aparece 0 ‘coiete calgdo de banko’, em tricd de la, geratmente de cor marrom, pois se procura evitar a transparéncia do braneo. Como observa Le Coeur em 1846, ‘sGo verdadeiros maids de uma sé peca Sao muito leves, cmodos para os nadadores [..]' Infelizmente, acentuam demais as formas, e 0 bom doutor duvida de que ‘possam algum dia ser adotados, como roupas de hanho, pelas mulheres **", Ligadas as preocupagies com o pudor, as casas de banho se deslocaram para a proximidade das praias. Se a prineipio etam simplesmente locais onde se ofereciam "parhos de cachoeira’ (chuveiros), tais casas adquiriam um intuit diferenciado: passaram a ser locais para se trocar a roupa, jd que ndo se devia andar com a "escandalosa" vestimenta de banho pelas ruas da cidade. Além disso, ofereciam alguma estrutura de seguranga. Por exemplo, algumas colocaram amarradas na areia cordas com dias na ponta, que avangavam no mar, € contrataram salva-vidas para prevenir e evitar problemas. © perigo dos afogamentos era uma constante preocupagao. O mar era um desafio, e nao foram poucos os relatos de acidentes nos jomais da cidade, Machado de Assis foi um dos autores que utilizou tal temética em seus romances, Em Dom Casmurro, Escobar falece afogado em um dia de mar agitado. Vejamos um trecho do romance que narra tal acontecimento. Primeiro, o didlogo entre Escobar e Bentinho’ ~ O mar amanha esta de desafiar a gente, disse-me a voz de Escobar, ao pé de mim - Vocé entra no mar amanha? - Tenko entrado com mares matores, muito maiores. Voce ndo imagina o que é wm bom mar em hora bravia. E preciso nadar bem, como eu, ¢ ter estes pulmies, disse ele batendo no peito, & estes bragos; apalpa"***, E depois, o tragico destecho: 27 a ps. 2 ASSIS, Machado. Dom Casomra, S80 Paulo: Klick Editora, 1997, p.212, 86 “Era um escravo da casa de Sancha que me chamava: ~ Para ir lé..sinhd nadando, sinké morrendo (..) Em caminho, fui adivinhando a verdade. Escobar metew-se a nadar, como usava fazer. arriscou-se um pouca mais fora que de costume. apesar do mar bravio, foi enrolado e morreu. As canoas que actdivant mal puderam trazer-the o eadéver"™. ‘Mas as preocupagées com a seguranga niio eram as principais. Central mesmo ra 0 erotismo, realmente acentuado para os padres da época, mesmo com tanta roupa € tantas restrigdes ao encontro de homens ¢ mulheres nos banhos de mar. No Rio de Janeiro, a ago da policia na restrigdo aos banhos de mar era 120 rigorosa que, segundo conia-nos Renault”, ‘em 1878 os jornais noticiaram que um banhista, em sinal de protesto, entrou no mar vestido de easaca, sapato de verniz ¢ claque. A regulamentagio juridica era decorréncia dos muitos imperativos morais, e quem desrespeitasse e/ou extrapolasse os limites era admoestado pela policia, niio raro sendo noticia na imprensa™”. Aliava-se a isso 0 que os médicos determinavam como adequado a satide, Havia uma série de regras, um verdadeiro receituario, que variava segundo as coneepedes de cada médico a respeito dos beneficios dos banhos ¢ dos meios de aleance de tais beneficios. Como os banhos de mar eram concebidos como priticas terapéuticas, sua utilizagdo devia ser estritamente codificada pelos detentores do "conhecimento cientifico”, O aspecio juridico, o aspecto moral eo aspecto médico se articulavam e constituiam um todo coerente. Com 0 decorrer do tempo, as casas de banho também comegaram a abandonar suas caracteristicas modestas ¢ tornarant-se requintadas. Par volta do final da década de 1870, um moderno e confortavel estabelecimento de casas de banho foi inaugurado na rua Bardo do Flamengo, cobrando pregos elevados pelos seus servigos, selecionando claramente a clientela possivel™”. © aumento da aceitabilidade ¢ da presenga dos banhos de mar no cotidiano, mesmo que a prineipio compreendidos somente como pritica terapéutica, semearam boas condigées para © desenvolvimento de uma nova sociabilidadle nas pcaias, abrindo a © shies 9215, 2 1978, opcit %Observe-se esta noticia publicada no Cruzeiro de [0 de dezembro de 1882, com reclamagies & policia telativas ao vestuario de banhistas” "2 apreseruam em srajes imprdprios e indecentes, offendond assim ‘g.pudor das familtas, a moral e ox bons costumes”. 2 Ibi possibilidade de sua utilizagio como forma de lazer e langando as sementes dos esportes nduticos na cidade. Vejamos como se deu o desenrolar desse proceso. 24 Os anitecedentes do desenvolvimento do remo na vidade Com as mudangas significativas no que se retre a ocupagao e utilizag’io do mar © das praias, as areias comegaram a ser utilizadas para atividades de lazer, como piqueniques. e nesse contexto surgiram as primeitas eorridas de canoa. Inicialmente, a utilizagiio de canoas ¢ barcos nao estava ligada a realizagao de competiges, mas sim a contemplagio do mar e da praia a partir de um outro angulo. Estava relacionada a uma nova orientago estética. perceptivel no proprio desenvolvimento dos modelos de contemplagao do romantismo. J4 as corridas de canoa (primérdios ainda nfo estruturados do remo) carregam um sentido mais notivel de desafio: contra 0 outro, contra si mesmo, mas também 0 de superagie do préprio mar. Tal diferenca de sentidos fica clara quando se observa duas manifestagdes proximas que se desenvolveram diferenciadamente: 0 jalismo eo remo. Pode-se comegar pela propria caracteristica inerente a cada atividade: enquanto no iatismo as embareagdes so movimentadas por ventos nas velas, no remo, é a forga humana que determina o deslocamento. Também pode-se observar um tempo diferenciado na forma de estruturagao das atividades: enquanto 0 remo logo se desenvolveu como competigiio, 0 iatismo ainda guardou durante um bom tempo, ¢ de certa forma ainda mantém, o sentido de viagem contemplativa pelo mar. ‘A primeira corrida de canoa mais divulgada no Rio de Janeiro foi realizada em 1846, entre as canoas Lambe-Agua e Cahocla, ja contande com grande piiblico na assisténeia: “Bra de se esperar a notavel concurrencia, que hontem affluin a praia de Santa Lucia, para assistir emocionada ao desafio (..) grande era a anciedade entre a multidao, que jé ao longe divisava a tuta homerica entre as rivais. a qual se decidiu afinat a favor da Cabocla, ewja guarnigdo foi carregada em triumpho pela mocidade alegre e festiva"™®. Mesmo que desde 0 inicio as corridas de canoas se estabelecessem como um acontecimento social que mobilizava grande pablico, ainda demoraria algum tempo para se tomarem mais organizadas, embora desde essa primeira iniciativa ficasse 2, JORNAL DO COMMERCIO, Rio de Janeiro, 1846. 88 ".assentado para breve a creago de um grupo para promover passeios maritimos e corridas em embarcagdes @ remos ¢ vela” “, Faliavam os elubes para que as corridas deixassem de ser "a malar parte das quaes tripoladas por affoitox amadores" Como bem percebe Luiz Edmundo, depois dessa corrida marcante "Desafios. idénticos reproducem-se (..) Iniviativas, entanto, merameme pessoais, uma vez que as associagaes nduticas, que se dispusessem a explorar 0 esporte, cuidando de regatas, sé muito mais tarde & que apareceriam" ** Para que essas associagdes se desenvolvessem, contudo, ainda eram necessérios os desdobramentos de algumas mudangas nos costumes da cidade. Sem divida a cccupagdo das praias foi um elemento de grande importaneia para © surgimento do remo na cidade, mas ainda existiam muitas resisténcias a outro uso que nfo fosse com objetives terapéuticos. Era necessiria uma mudanga relativa acs sentidos de sua ‘cupagio, que também estavam ligados a uma nova estética corporal a ser accita 2.5_Lim novo padrao estético para o corpo do brasileira Voltemos as palavras de Luiz Edmundo, nas primeiras linhas do capitulo dedicado a0 esporte de seu livro de memérias sobre a cidade do Rio de Janeiro, j& utilizadas no primeira capitulo deste estuco: “ré 0 fim do séeulo que passou nds viviamos, a bem dizer, indiferentes aos prazeres e as alegrias salutares do esporte, A geragiio que vai proclamar a Repiiblica, excegdo feita dos homens que seguiam a carreira das armas, era uma geragéo de fracos e enfesados, de languidos e de ragutticos, sempre enrolada em grossos cache-nez de 1a, a galocha no pé e um guarda-chuvas de cabo de volta debaixo do brago. (..) Mens Sana in Corpore Sano ndo passava de uma frase inexpressiva ¢ vaga do velho Juvenal. Nao se cuidava de cultura fisica, O que se fazta, entao, era evitar esforcos tidos como nocivos saiide”*, Embora 0 autor estivesse enganado quanto ao momento de desenvolvimento do esporte na cidade (ou talvez tivesse uma representagao diferenciada do conceito adotado neste estudo), jé que na segunda metade do século XIX percebe-se 0 campo espartivo Ibid. 8 MENDONCA. op cit. p.7. = EDMUNDO. Lil. O'Ria dle Janeiro do mew tempo, Rio de Janeio: Conquista, 1957. p. $35 °F bid. p831 9 organizado na cidade (no caso ja eitado do turfe), nao se pode negar que os tipos fisicos valorizados eram os magros e fracos. Segundo o autor, a mocidade "Nao (se) pratica a gindstica dlo corpo. A ilo sentimento basta. E nesse particular, ninguém supera o jovem desse tempo, (..) Vive ainda da lirica do poeta Casimiro de Abreu, acha linda softer- do-peito, bebe absinto e, de melenas caidas nas orelhas, ainda insiste em recitar ao piano, Téda uma pléiade de mogos de oiheiras profundas, magrinhos. escurinhas, pequeninhos. (...) Tipos como o do aileta José Flortano Peixoto, sao olhadas, por todos, com espanto Embora s6 no século XX um novo modelo de corpo se tomasse mai amplamente accito, ja no quartel final do XIX pode-se perceber _mudangas significativas, Ventos que continuavam a chegat da Europa traziam um novo modelo de homem e€ novas preacupagdes com a estétiea corporal. Os tipos fisicos fortes comegaram a ser, ainda que lentamente, valorizados. Observo que Vigarella considera que as questdes estéticas ao redor do corpo tém, sagd0 direla com as mudangas nas representagdes e nos padres de higiene e saiide. Quando tais padroes deixam de ser prioritariamente determinados pelos livros de decoro, passando a ser estipulados pelos médicos e arquitetos ("cientistas"), acabam tendo ligagao direta com a valorizagio de um novo tipo fisico, com a possibilidade de consteugdo de ums nova imagem corporal: "Bxiste, portanto, um imaginirio do corpo, & este imaginério tem a sua nistéria e os seus determinantes. (..) mesmo preciso que as imagens do corpo mudem para que os constrangimentos possam mudar também"? Nos tiltimos 25 anos do século XIX ja é possivel identificar mudangas claras nos banhos de mar, que passam também a ser encarados como exercicios fisicos para melhoria do padraio estético corpéreo, o que se articula plenamente com um outro parimetro de saiide. Os homens ".jd comecam a mostrar corpos rijos e bem desenhados de misculos, muito orgulhosos de suas linhas, exibindo-se em calgdes, mas 250 dos longos, dos que vaio abaixo da linka do joetho’ 2 1d, p83 2 VIGARELLO, op.it, .10. 2° EDMUNDO, op.eit, p. 840. 90 Até mesmo uma alteragio no critério de pudor, por localizagio geogratica, se estabeleceu. As familias mais respeitosas buscavam as praias mais afastadas, como Copacabana e Leme: "..as mégas pegavam no brago dos pescadores e tomavam o seu banho, Tudo com muito respeito e othe ld Depois do banko, todo mundo ia beber rm copo de leite ao pé da vaca, num estébulo que havia na Rua Barata Ribeiro" ** Ja nas praias do centro da cidade (as praias do Russel e de Santa Luzia/Boqueirio, 0 balnedtio mais chic da ocasiao), as coisas aconteciam de forma diferente, com maior liberdade, ¢ onde logicamente a exposigdo corporal era maior, jd aque essa regido era a mais habitada da cidade. Logo © teatro tematizaria esses avangos nos costumes, como por exemplo na pega "O Rio Nu", de Moreira Sampaio. No que se refere aos banhos de mar, podemos encontrar algumas citag6es irénicas: "Os rapazes elegantes La da Rua do Owidor E as raparigas galantes Que sé vivem para 0 amar Para o calor mitigar Nesta ealmosa estacao Nunca deixam de tomar Os banhos do Boqueirdo"?™. Influéneia dessa nova aceitabilidade no que se refere 4 exposigdo corporal, de um novo modelo aceitével de corpo, da valorizagio da "busca de satide" e da ocupagaio das praias com outros sentidos que no somente terapéuticos (dimensdes com certeza bastante articuladas), 0 remo comega a se desenvolver. Tornara-se possivel assistir homens "nus" e musculosos competindo nos mares da cidade: "“queles a quer: ameaga a melancolia cevem buscar, ao mesmo tempo, 0 ar puro, 0 exercicia ¢ as emogdes produzidas pelo espetdculo sublime. Devem movimentar ‘as partes musculares do corpo mais grosseiras', mas também ‘excitar’, ‘exercilar as partes mais delicadas'. Estética, moral € terapéutica, aqui artificialmente separadas, formam um todo coerente”** *" BARBOSA li: REBELO, op cit, p.150. 2 Apu iid, p-150. = CORBIN, vp.eit,p. 146. a Joao da Rio esté entre os que percehem a redugo das resisténeias para com os exercicias fisicos no quartel final do século XIX e © consequente avango da aceitagio do remo: "Fazer esporte hid 20 anos ainda era para 0 Rio uma extravagancia. As maes punham as mdos na cabeca, quando ium dos meninos arranjava um altere. Estava perdido. Rapaz sem tun pincenes, sem discutir lverarura dos outros, sem cursar as academias ~ era um homem estragado” ** Parece que até enti havia uma relagio direta entre o esporte © a nfo intelectualidade. Isto 6, supostamente 0 esportista nao se interessava pelas letras, nil participava da vida intelectual, no estudava; relagtes que até hoje de alguma forma ainda persistem no senso comum. Pode-se pereeber também tal mudanga se compararmos a apreens3o de Joao do Rio com a de oulro importante cronista da cidade: Raul Pompéia, Se antes Pompéia comentava que os remadores: "..apresentavam-se com 0 vestudrio préprio, de meia justa ao corpo. Mais do que 0 aproveitamenio dos exercicios de carreira, devia interessar ao observador a desagradivel exibigéio de forma sem elegancia e sem mtisculo que @ roupa de meia proporcionava, Bem pobre pldstica a da nossa mocidade para um espeticulo de gindsios. Corpore Sano! Meus amigos"**, alguns anos depois Joo do Rio afirmava que: “Rapazes discutiam ‘nuque' em téda.parte. Pela cidade, jovens, oultrora raguiticos ¢ balofes, ostentavam largos peitorais ¢ a cinta fina e a perna nervosa e a musculatura herculeama dos bracos. Bra o delirio do rowing, era a paixdo dos esportes. Os dias de regatas tornavan-se acontecimentos urbanos"*? A propria forma de vestir-se tornava-se mais leve, ¢ se 0 remo nao foi o tinico responsiivel, sem ditvida teve uma significativa influéncia, A comegar que as roupas de remo eram “escandalosamente" curtas (e poueas) para a época. Também porque os Jovens se vestiam mais levemente para comparecer as competigdes. Nao era adequado ir “4 BARRETO, Paulo. O futebol. apud. COSTA, Nélson. Péginas eariocas. Guanabara: Secretaria Geral dg Educagao e Cultura, 1961. p.278 “Sim: POMPEIA, Raul. Crdnicas do Rio. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, 1996, p65. *BARRETO, Paulo, O futebol, opctt. apud COSTA, op.ct, p27. de fraque as regatas, prineipalmente para os que itiam competir, O palet6 saco era mais leve, mais adequado, mais sportivo®”. Enfim, tendo o remo como um dos simbolos. no final do século XIX ¢ no decomer do século XX o padrao de estética corporal valorizada/aceito na cidade modificou-se substancialmente. Quais eram os sentidos e signiticados do remo para a populagao do Rio de Janeiro? Quais as diferentes representagdes entre as camadas sociais? Qual a importincia do remo para as mulheres? Comecemos a responder estas questies diseutindo © envolvimento das elites com 0 remo. Na verdade, as mudangas na estrutura sociocultural da cidade (onde articulavam-se saiide © estética) também estavam relacionadas com modificagdes no ambito das elites. As reno ALL Asetites, 0 mar eo remo na cidade do Rio de Janeiro Desde 0 segundo quartel do século XIX as elites comegaram a inverter 0 eixo de desenvolvimento da cidade. Se primeiro habitavam preferencialmente a Zona Norte, Jogo avangaram para a Zona Sul, & procura de locais mais "arejados" e adequados para residir™™, Deve se compreender tal mudanga a partir de trés fatores articulados: a) a influéncia de estrangeiros que vinham morar no pais"; b) © impacto do aumento com, aS preocupagdes com a saiide € sua relagdo com o mar; ¢) "pela difusdo da ideotogia que associava a beira-mar aos estilos de vida moderna, banindo os tracas rurais das residléncias e dos bairros"*™, Logo, nio € surpreendente que os estrangeiros estivessem envolvidos com a criag%o do primeiro grupo de regatas mais organizado (Mareantes - 1851)"*', naio na °* Por certo ainda era uma roupa pestda, se eonsiderarmos os padrdes de hoje. Os aletas competiam 9m bong, camisa, algdo, cinto, meia esapato, “Com o deeorrer do tempo isso fica cada ver mais notivel. Um exemplo interessante € 0 fato de © presidente ¢ sua familia, ao contririo da familia real, morarem nessa parte da cidade, O cixo de poder se {eslacava do sentido Centro-Zona Norte para 0 sentido Centro-Zona Sul © Desde o inicio Jo sfelo alguns estrangeiros (principalmente ingleses € franceses) j6 residiam em Botafogo, por 0 eonsiderar mais parecido com a Europa e possuidar de conigges "mais habitiveis" de ‘ida, por influgneia das madificagdes de padrbes eulturais ocorridas ern seus paises de origer. Naquele momento os estangetos 3 viem os beneficios dos bans de mar, o que muitas vezes era encarado pels brasileiros como excentricidade, Anteriormentc, os poueos ndo-cstrangeiros que "ariscavann" a se banhar faviam uso das "fuivantes" eriadas nos anos 1810, Fram na vendade barcos ancorados no meio da Baia dde Guanabara, sonde se ehewava utlizando bots. 2 ARAUJO, Rosa Maria Barboza de. A vocaeto do pra rgpuileano, Rio ge Jane; Resco, 1993, p23 5° grupo nfo era exatamente uma sociedade bem estrtureda. Apenns realizaramy uma regata em 3 de dezembro do referido ano, se desfuzendo no ano sezuint. = cidade a familia ao Rio de Janeiro 93 cidade do Rio de Janeiro, capitatista Jodo de Mattos e que ficava situada no pitroresco Vallonguinko mas em Niterdi: "..na dependencia da chacara do avultaio 282 Algumas consideragées podem ser feitas para explicar 0 surgimento desse grupo no no Rio de Janeiro, mas 2m uma cidade vizinha, Tal eringio pode estar ligada a caracteristics da colonizagio e dos habitantes de Niterdi, de natureza diferenciada do Rio de Janeiro. Contudo, pode também explicitar que ainda existiam resisténcias na sede da Corte, sendo nevessério realizar atividade tio avangada para a época, devido a exposigiio corporal denotada ¢ seu caréter de exereicio fisico intenso, em local mais afastado. De fato, somente nos anos 1860 novos impulsos podem ser observados, desta ver jd na cidade do Rio de Janeiro. Em 1861, uma regata agitou a cidade, mobilizando grande pablico. Segundo um jomalista, as regatas deveriam ser realizada outras vezes com maior fre porgue (..) retinem as neia, ja que faltavam diversdes na cidade © duas condigdes recomendadas (..): utile et dulce. Nés somos um povo essencialmente importador: no admira, portanto, que importemos as regatas da Inglaterra” **. Como no caso do turle, a influéneia européia cra marcante no desenvolvimento do remo. Em 1862 surgiram duas associagdes, capitaneadas por figuras de influéncia na cidade: 9 grupo Regata e¢ © British Rowing Club, esta wltima de formagio eminentemente inglesa, As competigdes ja estavam mais organizadas ¢ contavam com a presenga de figuras importantes da cidade (como o proprio Imperador). Naquele ‘momento, deve ser considerada como relevante para o desenvolvimento do esporte a adesto de importantes personalidades da Armada (Marinha), que passaram a exaltar 0 rem como uma pritica louvavel: "Em Lt de julho dese anno effectuava-se, ainda, sob os auspicios da nossa Armada, wma regata (..) na qual estrearan novas turmas de rowingmen, além do aparecimenta de outros iypos de embarcagdes, mais appropiados ao nosso sport" ™*, Na verdade, as discussdes acerca da necessidade de desenvolvimento de novas ‘embarcagdes muito preeacemente se estabeleceram no remo fluminense, antes mesmo da cringdio de clubes bem estniturados. Tais preocupagdes tinham duas dimensdes destaciiveis: uma era interna ao remo - tratava-se de consteuir barcos tecnologicamente MENDONCA, op cit 28 CORREIO MERCANTIL, 1861 apud. RENAULT, 1978, op cit p.209, 24 MENDONCA, op cit. p11 9 mais adequados 0 desempenho esperado, para tomar mais emocionantes as competigdes; a outra era externa - uma forma de mostrar para a sociedade o valor do remo, j& que supostamente contribuiria para o progresso da nagio; algo similar a0 argumento de desenvolvimento da ‘raga cavalar", no caso do turfe. Pode-se perceber como 0 avango tecnolégico sempre foi uma dimensdo marcante para o remo na citago de Mendonga: 0 nosso rowing ndo se limitou a realizacao de regatas, como abjectiva ao seu ideal, a0 conirdrio, eram animadores 0 cuidado com que se construia, embarcagdes aperfeicoadas e seu conjunto, assim como a febre de imporiagae que comecava a se revelar com a acquisigdo de out-riggers e pequenos gigs” ™* A primeira associagao de remo methor estruturadn surgiu em 1867 (0 Club de Regatas), realizando regatas na enseada de Botafogo nesse mesmo ano ¢ em 1868. A despeito da importincia dessa associagdo, ela também teve problemas para manter suas atividades © somente em 1874 foi fundado © clube que definitivamente vai marear 6 desenvolvimento do remo na cidade - 0 Club Guanabarense™®: "..balwarte que defnitivameme implantou @ regimen das associagies nduticas ¢ abrin de vez novos Aorizontes ao seu desenvolvimento" *" Isto é, apesar dos avangos do remo entre os anos 1850-1870, ainda nao existiam as condigdes organizacionais nem tampouca a accitabilidade total, tanto por parte dos membros das elites quanto da populagdo em geral, para que o esporte se desenvolvesse plenamente. Os fracassos ¢ descontinuidades eram constantes™*. Foi no ultimo quartel do século, prineipalmente a partir de meados da década de 1880, que surgiram muitos clubes de remo™*, muitas competigées foram tealizadas e 0 remo comegou a Gefinitivamente se implantar na cidade, *, Jbid, p12. Oucriggerse gigs eram ipos de enibarcagbes mais velozes ¢ adequadas para a pritica do *. Embora fundade em 1874, somente em 1876 tal clube realizaria sua primeira regara fa pA %! No final do ano de 1862, por exempio, uma rogata fartamente divulgada nos jornais, nfo se realiza, para & decepeso geral: "alt vinas vapors, botes, lanchas, pave como forniga, menas os botes da ‘parea” (CORREIO MERCANTIL, 1862) Para sc ter uma idéin: Clube de Regatas Guanabarense (1874); Club de Regatas Paquetaense (1884) CCajuense (1885); de Regatas Intemacional (1887), Union des Canioners e Fluminense (1892); Botafogo, 15 de Agosio e Escola Militar (1894); Gragoat Icarai e Flamengo (1893); Netagao e Rewatas (1896): Boqueirdo do Passeio (1896); Caju (1897); Sao Crstovdo e Vasco da Gama (1898), Guanabara (1899): [Nautico ¢ Internacional de Regats (1900), Sem falar em dissidéneias que surgitam no interior de clubes, dando origem a novas associagies, come © Grupo Luiz, Cakias, © Sul Americano © 0 Veteranos, ‘origindtios do Botafogo. Curioso também ebservar gue em 1900 suryiu um clube de regatas infantil, que teve cura durasao. 95 Nos cineo iltimes anos do século © avango do remo na cidade parece ter sido ainda maior, com a minimizagio da crise financeira e das dificuldades ocasionadas com a grande renovagdo nos quadros de dirigentes © associados aos clubes. A criagdo do Club de Regatas do Flamengo” parece ter sido luminar da quebra de resisténeias a0 remo na cidade: "E 0 clube de Regatas do Flamengo fot 0 micleo de onde irradiow a avassaladora paixita pelos esportes (..) As pessoas graves othavam ‘aquilo' a principio com susto. O povo encheu- se de simpatia. F os rapazes passavam de calgdo e camisa de ‘meta dentro do mar. a manha inteira e a noite imieira"*”" © caso do Flamengo ¢ bastante interessante, por refletir as mudangas que ocorriam no ambito do Rio de Janeiro, © clube, fundado como Grupo de Regatas (0 objetivo prioritario inicial era promover regatas e divertimentos niuticos, embora sompre se aventasse a possibilidade de se ampliar para outros esportes), era uma ssociagdo formada principalmente por jovens pertencentes aos setores urbanos das elites da cidade, entusiastas e ja praticantes do remo, ¢ envolvidos diariamente com os fpanhos de mar. 10°", de forma romanceada, que por ocasiio da Conta Mério Rodrigues criagao do Flamengo, observando 0 entusiasmo dos jovens fundadores, 0 padre Nattuzi procurou 6 Dr. Lourengo Cunha, pai de José Sobrinho (um dos criadores do clube), the perguntando se nifo ficava preocupado com tamanho interesse, pois a fama das regatas “nao era ld das melhores". Cunha respondeu que acreditava no esporte como uma escola de formagio € disciplina, uma prética sondivel, por isso nfo se importava. O padre replicou que Cunha pensava assim porque era um pai a moderna”, Parece que era ainda um fato inusitado e ‘moderno’ um pai ndo se preocupar com o interesse acentuado do filbo pelo esporte. °", Sopundo o autor, este clube: “E 0 novo ground. O Clube de Regatas do Flomenga tem wma divida cabrar das eartocas. Dalt partiu a formardo das navas geragces, a giortficasdo do exorcico fisico para 4 saidle do corpo et satide da alma” (BARRETO, Paulo, © futebol. opt. COSTA, Nelson. 2p cit, 278). 1 ibid. 9.279. "= RODRIGUES FILHO, Mio. Histérias do Flamengo. Rio de Janciro: Irmdes Pongetti “As mudangas na estrutura sociocultural interferiram dliretamente nos padrbes familiares, De fato, a referida familia tinha hibitos considerados modemos para a época, como a permissio para os filhos traturem os pais par voeé. Cunha sb ndo permitia que se fumasse na sua frente, o que significaria “muita liberdade” itores, 96 Sintomaticamente, depois de um periodo inicial de desinteresse por parte da populaedo residente no bairro © muita dificuldade financeira, 0 clube s6 se desenvolveu realmente quando um embarcagdo do grupo naufragou, deixando seus tripulantes em situagdo de grande dificuldade, s6 sendo salvos horas depois do acidente, Se a principio ‘0 naufragio causou um impacto negative entre os pais, logo estes passaram # considerar seus filhes como herdis, jovens que "estavam se preparando para os desaftos da vida". © caso do Vasco da Gama também ¢ bastante revelador do perfil dos membros, dios clubes de regatas naquele final de século. Surgida no bairro da Satide, local ainda bastante ligado aos setores urbanos das clites e onde moravam muitos comerciantes ¢ comerciarios”” foi criado porque seus fundadores, além de ja praticarem © remo no Clube de Regatas Gragoaté, no tinham dinheiro para adquirir bicieletas ¢ aderir a0 ciclismo, Assim, no final do século o remo ja se tornara aceito pela populagao e valorizado pelas elites. O que teria eriado condigdes para tal desenvolvimento? Eo que veremos no préximo item. 3.2 O projeto de modernizacdo da cidade ¢ 0 reme Se preocupagdes com a urbanizagao, 0 saneamento e a modemizagdo da cidade ‘jd existiam desde as primeiras décadas do século XIX, no quartel final do século XX (denotadamente na transigdo para o século XX) esse processo ganha caracteristicas especiais e diferenciadas. Nos anos finais do século XIX e iniciais do século XX, pereebe-se um conjunto de preocupagdes relacionadas com o reordenamento econdmico do pais, de forma a melhor inserir 6 Brasil no quadro internacional do fluxo de capital?’ Nesse contexto, passa-se crescentemente a se preocupar com que o Rio de Janeiro, a capital do pats, expressasse o sinal dos noves tempos, dos novos intuitos econdmicos, de uma suposta nova organizagdo politica (a Repiblica). A cidade precisava ter uma nova aparéncia "civilizada” que levasse a populagao ¢ os investidores = Um das fundadores do clube ¢ seu primeiro presidente (Francisco Gongalves Couto), inclusive era proprictaro de um estabelecimento de produtas néuicos ¢ empresou as primeiros barcos ao clube *"peve-se considerar que, no Brasil, 0 periodo que vai 8e 1870 a 1930 & marcado por forte tansigSo para o eapitalismo (LOBO, STOTZ, 1985) internacionais a esquecerem o "mundo atsasado colonial” da monarquia, © modero stave Tigado ao progresso, a limpeza, ao embelezamento” "4A cidade transformara-se, adequando-se ao seu papel de capital da Reptiblica, moderna e bigiénica, (...) Rodrigues Alves mosirara sua preocupagde quanto ao conceito de cidade insalubre de que gozava 0 Rio de Janeiro no exterior. Garantir © fluxo imigratéria e 0 préprio funcionamenta do comércio internacional foram, sem divvida, as metas tragadas..."*" Para garantir tal construgdo, economia e cultura deveriam ser trabathadas de forma articulada, Tratava-se de promover uma série de intervengées no espago urbano de forma a facilitar 0 coméreio € a indiistria (como a reformulagao do porto ¢ a melhoria das vias de cireulagao, como radovias ¢ estradas férreas), mas também de construir um novo imagindrio para a cidade: "O capitalism industrial quebrava a auto-suficiéncia da familia, introduzinda no seu interior navos valores de civilidade, amor, satide, civismo etc.. efetivando um verdadeira ‘saneamento’ ndo s6 do esparo fisice, mas dos hibitos ¢ des costumes” Isto & & construgao desse novo imagindrio também estava ligada a idéia de um maior controle dos habitantes, em um periode onde @ populagtio urbana aumentaya de tenlar submeter a populagiio tanto a mudanga de ordens fisicas quanto culturais, rapidamente € a expansto industrial acentuava problemas que jé existiam, Tratav dimensdes que devem ser compreendidas de forma articulada, Como afirma Vigarello: "A experiéncia munca é clara. Ela mistura 0 imagindrio ¢ 0 real, 0 fisico e « sociat Mas, com ela, certamente mudam as representagBes do quadro urbano e a do vigor dos corpos"™™, passa a ser fundamental a criagdo de uma nova imagem para a cidade, E em grande parte des vezes isso significava colocar-se em oposigdo € incompatiblizar-se com 0 que era considerado atrasado © tradicional. Uma consisteme diseussdo sobee 0 forjar de uma nova imagem para a cidade pode ser encontrada no esuudo: CURY, Maria Zilda Ferreira. © avesso do cartae postal: F000 do Rio perambula pel captel da Repablia, iteranra e Sociedad, Sto Paulo, 1, pA4-$3, 1996. PADILMA, Sylvia F. Da "Cidade Velha" & periferia. Revisiz do Ria de Janeiro, Rio de Janeizo, v.1, fn. p.15-23.dezembro1985. p22. LBUQUERQUE. Marli Brito Moreira de. Porto do Rio de Janeiro: estigms e histéria. Revisra do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, v1, 1.1, p 87-93, dezembro/1985. p 39. ”- VIGARELLO, Georges. O trabalho dos corpos e dos espagas, Frojeto Histiria, Ste Paulo, n.13.p.7= 20, jushe/1996.p.7 98 Se o projeto de urbanizago estava diretamente ligado a um avango das relagées de produgo capitalista, 0 Rio de Janeiro se reorganiza no ambito da disputa enue setores diferenciadas das elites que, em um processo que tinka comegado no quartel final do séeulo XIX, mudavam sew perfil. HA que se entender como tal mudanga se estruturou e quais foram seus desdobramentos. Berenice de O, Cavalcante™” argumenta que o processo de modemizagao que se desenvolve com forga nos primeiros anos do século XX tem stia origem com 0 inicio da campanha ¢ das propagandas abolicionistas. Os primeiros sinais de uma mudanga no eixo de poder da cidade podem ja ser identificados embrionariamente ma virada da gcada de 1860 para a década de 1870. © Rio de Janciro comegara 2 se articular como um centro politico diferenciado, ndo mais representante das elites rurais € sim como um foco de contestagio e pensamento independente, Os novos setores das elites urbanas comegam a questionar os privilégios © 0 poder das elites rurais © passam’a progressivamente se organizar politicamente, inicisimente lutando pelo fim da escravidao. Nae por acaso, a base fundamental do movimento republicano que se articula propde & construgao de um pais modemo e industrializado, em oposicgo a realidade aerdria, Embora os setores urbanos cariocas conseguissem fazer muito banalho, nfo seria possivel ascenderem ao poder se niio compusessem uma alianga com o setor agrério ‘oticamente estavam paulistano, descontente com a situagdo de desprestigio a que h relegados. A Repiblica é proclamada a partir de uma agio complexa de: setores turbanos, que a principio conseguem © poder, mas logo so alijados pelas maquinas eleitorais montadas no inerior; elites agrérias paulistas, mascaradas por uma eapa ue modernidade, que logo teriam 0 poder nas mios: e mesmo alguns ex-monarquistas que logo aderiram ao poder. Fortalece-se um conflito no interior das elites, e mesmo que os setores urbanos nao conseguissem manter 0 poder ainda manteriam alguma influéncia, principalmente na capital Se na virada do século a situag2o torna-se relativamente pacifica entre a indistria, © coméreio € a lavoura, no funda observasse uma acomodagao mal engendrada entre 05 diversos setores das elites. A reforma efetuada na cidade nos primeiros anos deste século acaba refletindo essa dupla dimensdo: ao mesmo tempo que °°. CAVALCANTE, Berenice de 0. Beleza, limpeza, ordem e propresso: a questo hi do Rio de Janeiro final do século XIX. Revisia vo Rio de Janeiro, Rio de Jansio, v1 1, p9S-105, dezemro/1985. 9 consagra a heyemonia do capital comercial cafeeiro, cria as condigdes para o crescimento da industrializagao™'. Atendia-se aos interesses tanto do capital agrario quanto do urbano, Ajustavam-se continuidade e mudanga. © Rio de Janeiro passaria a viver entre dois polos: a realidade colonial e 0 desejo de implementar o dinamisto das metrépoles: "Esse fato é crucial para a compreensita da cultura e da sociedade da elite carioea. Todavia, nem no Rio nem no Brasil como um todo, tal continwidade significava auséncia de mudanga, ¢ sim seu refreamento (..) a elite do Rio - centro das ‘mudancas do século XIX brasileiro - viu-se obrigada a vivenciar @ a superar contradicées Gbvias, passando assim por uma prov" conflito entre as elites pode ser claramente petcebido no desenvolvimento do campo esportivo, até mesmo porque os clubes ocupavam um lugar de desteque na sociedade carioca. Se a principio os dirigentes © membros dessas associages cram I muitos industriais e profissionais liberais na dirego dos clubes: indidrios e grandes comereiantes, no quartel final do séeulo XIX jd se encontravam ‘Nese conflito também se encontra uma explicagao possivel para os ataques que 6 turfe vinha softendo desde © fim do século passado, principalmente no que se refere a seu catiter de jogo. Os setores urbanos das elites o consideravam algo ultrapassado, colonial; logo, devendo ser combatido. £ importante compreender que mesmo que o turfe lembrasse algo io do. atrasado/colonial, em oposig&o ao remo, cada vez mais ligado ao imagi moderno, ele ainda manteria muito de seu prestigio, j4 que as elites rurais continuavam ater influéneia, mesmo porque o proceso de modemizagao era paulatino, somente aos poucos se implementanda © também porque os clubes de turfe passaram por uma mudanga de sentidos em seu interior, como vimos no capitulo anterior. Sem falar que 0 mais incémodo nao era a imagem rural do turfe, mas tudo aquilo que lembrasse algo barbaro ¢ ultrapassado, como as préticas da cultura popular, estas sim constantemente alvo de agdes restritivas. E importante ressaltar que nfo se pode dizer que os clubes de remo eram totalmente diferentes dos clubes de turf, Se houve enfoques ¢ compreensdes \ Denoladaments a partir de 1890, a industratizagfo encontra uma situagdo mais propicia para desenvolvimento, © mercado intemo se forulece, 2 populagdo urbana aumenta, inclusive devido a problemas na eericutura © a aboligdo da eseravatura, 8 NEEDELL, op cit, p40. diferenciadas entre as diferentes associagdes, as elites da cidade foram construindo uma atuagdio que se aproxima mais da idgia de ajuste e continuidade do que de uma ruprura propriamente dita. Na verdade, se houve uma ruptura no que se refere as imagens concepgies de sociedade, os valores ligados A coergdo € a hierarquizagio foram mantidos, se nao até mesmo enfiatizados. No Ambito desse complexo de mudangas (na cidade, nas elites, na cultura), 0 remo se desenvolveria em uma cidade bastante diferenciada daquela na qual o turfe surgira “E bom lembrar que na década de 1850, a corte nao passava de uma capital portiiria menor, dependente do café provincial e da politica imperial. O Rio de 1900, por sua vez, transformara-se em um conglomerado urbano, no qual as carreiras burocrdticas, profissionais e empresarias da elite eram a regra”™ Além disso, a cidade assumira 0 papel de metrépole brasileira, ditando (ainda istemas de valores, formas de viver. Nao por mais que antes) modas, comportamentos, caso, 9 remo se desenvolveu pioneiramente nessa cidade, influenciando © desenvolvimento do esporte em muitos outros municipios ¢ esiados. Como afirma Sevcenko, temos que compreender que na virada do século "0 Rio passa a ditar no sé novas modas e comportamentos, mas acima de tudo os sistemas de valores, 0 mado de vida, a sensibilidade, 0 estado de espirito e as disposicées pulsionais que articulam a modernidade como uma experiéncia existencial ¢ intima" ™* Nao podeni.os também esquecer que o remo se desenvolve no auge da -onhecida ‘belle epoque carioca'™**, um periodo de grande euforia cultural, onde o novo patamar de riqueza fomenta o consumo conspicuo, a sensualidade © um modelo de vida luxuoso, um mundanismo permitido. Enfim, assistit-se nese momento ao auge da influéncia ‘européia na cidade do Rio de Janeiro”. thi. 153 Opel. pS22. Maiores informasdes sobre a belle epoque carioca podem ser obtidas nos estudos de Needel (op.ct.) gAratijo (op.cit.)- SE importante deixar claro que isso nde significa que o Rio de Janeiro fosse uma edpia exata das cidades européias. Richard Morse, por exemplo, ¢ bem enfitico ao afimar que: "A cidade periférica nfo 4 mimética, mas responde a uma iigica interna. Paris podia mspirar parcialmente, mas ndo podia Imvemar a hiperconsciéncta do homem do subterranéo” (p.217). Maiores informagdes podem ser obtidas fem: MORSE, Richard M. As cidades "perifércas” come arenas culturas: Russia, Astra, America Latina, Estudos Histéricos, Rio de Janeiro, v.8, 0.16, p.205-225, julho-dezemro1995, wo Nesse contexto, cada vez mais a populagdo passa da convivéneia no espaco privado da easa para o espago pitblico da rua. Na virada do século, 0 consumo do lazer, a busca da diversto, o culto do prazer e da alegria passam a ser caracteristicas notaveis na sociedade carioca, marcando definitivamente sua identidade™”, Ana Maria Mauad de S. Andrade, em seu estudo sobre as representagdes na fotografia dos novos comportamentos das elites no Rio de Janeiro do inicio do século XX™* da algumas pistas para desvendar o papel do esporte. A autora procura compreender a lotografia no contexto do desenvolvimento cientifico da transi¢to do século, argumentando que por meio dela as elites divulgam os seus valores culturais, forjam uma eonsciéneia de classe © exercem poder nas camadas populares. E, entre suas conelusdes, percebe que © esporte © muitas situagdes ligadas as priticas esportivas so bastante retratadas. A anilise de Andrade reforga a apreensio de que o contexto sociocultural valotiza 0 esporte enquanto uma pritica social. Segundo a autora, as clites estavam preocupadas em: retratar sua freqiiéncia em locais de luxo e onde fosse possivel expor suas riquezas (logo, os hipidromos © depois 0 Pavilhio de Regatas eram locais plenamente adequados)™; percebis-se uma valorizagio do plano coletivo, idéias de estabilidade © unio, de coesiio de classe (niio por acaso, muitas fotos de eventos esportivos so tiradas de planos amplos, gerais, demonstrando 0 grande piblico amontoado ao redor das competigaes); era notavel a valorizagao dos momentos de lazer, de preferéncia em locais exclusives (hipédromos ¢ arquibancadas das regatas reservavam espagos diferenciados para 0 piblico, de acordo com a camada social). Por certo iais dimensdes acabaram por privilegiar o desenvolviments. do esporte enquanto um espeticulo piiblico. © remo (e 0 esporte em geral, a partir de entio) carrega em seu interior uma dimenstio que a principio pode parecer paradoxal, mas é na verdade complementar. Ao mesmo tempo que “eiviliza" segundo os novos padrées modernos, também permite ‘momentos de éxtase controlado, expresstio "saudavel” de vivéncia social. ARAUIO, op cit * ANDRADE, Ana Maria Mauad de S. Sob o signo da imagem: a burguesia carioca de 1900-1950, margem, Niter6i, ano 1,1, p-5-14, 1993, © Segundo a autora, a cidade € 9 palco "para o desfile de personalidades da classe em ascens (p.13), 02,

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