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Eleições indiretas

Uma das grandes incógnitas da eleição deste ano trata do percentual de


renovação nos parlamentos. Após a maior crise política das últimas décadas, a
expectativa de muitos vai no sentido de derrotar os atuais detentores de mandato,
como forma de trazer gente nova e mudar também as práticas políticas vigentes no país.
Outros já são mais céticos e creem que haverá pouca mudança, ficando talvez um pouco
acima da média histórica.
Minha posição pessoal é que teremos pouca alteração de nomes no Poder
Legislativo. Isto deriva dos movimentos de reação que a elite política teve desde as
jornadas de junho de 2013 e, sobretudo, da Operação Lava Jato. As reformas eleitorais
que foram feitas desde então vieram no sentido de fortalecer mais os partidos e seus
principais candidatos diante do eleitorado e, com maior ênfase, daquilo que chamo de
“indústria do voto”.
Mas há um aspecto que quero destacar e que contribuirá de forma decisiva para
que o percentual de reeleição seja muito mais alto do que muitos esperam. É que nossa
eleição proporcional vem se assemelhando cada vez a um método que vigorou no Brasil
imperial, que eram as eleições indiretas para o legislativo. Nelas um grupo muito
pequeno de eleitores elegia um colégio eleitoral para escolher os representantes de
cada Estado. O cidadão votava em alguém que votaria no escolhido final, numa
metodologia indireta de votação.
Digo que nosso sistema está muito próximo em função do elevado número de
partidos, coligações e candidaturas que presenciamos a cada eleição. Diante desta
fragmentação incentivada pelo sistema e agravada pela ampliação das vagas nas
câmaras de vereadores os eleitos saem das urnas com uma proporção cada vez menor
do eleitorado total. Acrescente-se aí a forte evolução do anti-voto ou voto ABN
(abstenção, branco e nulo), que reduz a base de cálculo dos chamados votos válidos.
No caso de Cuiabá, por exemplo, os 25 vereadores titulares eleitos somaram
cerca de 80.000 votos. Parece muito, mas representou menos de 20% dos quase 415.000
eleitores registrados em Cuiabá. Os outros 80% votaram na legenda, em outros
candidatos ou, ainda, optaram pelo ABN. Na eleição para deputado federal e estadual
em Mato Grosso tivemos percentuais um pouco mais altos, na faixa de 33 a 34%. Mas
os eleitos apresentaram em sua maioria uma estrutura organizacional e financeira
importante, que lhes permitiu garantir os seus redutos de votos e ganhar na quantidade
de seus respectivos partidos ou coligações.
Tivemos em Cuiabá um pequeno grupo de 25 candidatos num total de 474 sendo
eleitos. Isto significa que em torno de 5% ficou com quase 20% do eleitorado. Os demais
“fizeram escada” para eles como se fala na gíria do meio político. Este 95% era formado
por candidatos de média competitividade ou que erraram no cálculo político na hora de
se coligarem, como no caso do PSDB e PSB em Cuiabá de 2016. Ou ainda por candidatos
de pouca expressão que acabam entrando em espaços políticos que os mais
competitivos não conseguem ou têm dificuldade. É neste sentido que entendo a eleição
como indireta, uma vez que a maior parte dos eleitores votou nos outros candidatos
que deram condições de vitória aos eleitos.
Quer dizer, ainda que uma grande quantidade de eleitores opte por candidatos
novos, basta os antigos fidelizarem um eleitorado expressivo e repetirem as suas altas
votações individuais para garantir a sua eleição de novo. Este arranjo político sofrerá
pouca alteração este ano, em que ainda não vigorarão a cláusula de barreira e a
proibição de coligações na eleição proporcional. Existem várias formas de sair disto, mas
passam por uma reforma política decente nacional.

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