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Programa de Apoio à Produção de Material Didático

Carlos da Fonseca Brandão

POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA


EDUCAÇÃO BRASILEIRA

São Paulo
2008
©Pró-Reitoria de Graduação, Universidade Estadual Paulista, 2008.

Brandão, Carlos da Fonseca


L732j Política educacional e organização da educação
brasileira / Carlos da Fonseca Brandão. – São Paulo :
Cultura Acadêmica : Universidade Estadual Paulista,
Pró-Reitoria de Graduação, 2008
211 p.

ISBN: 978-85-98605-51-7

1. Educação Brasileira - Política Educacional. I. Título.

CDD 379.81

Ficha catalográfica elaborada pela Coordenadoria Geral de Bibliotecas da Unesp


Universidade Estadual Paulista
Reitor
Marcos Macari

Vice-Reitor
Herman Jacobus Cornelis Voorwald

Chefe de Gabinete
Kléber Tomás Resende

Pró-Reitora de Graduação
Sheila Zambello de Pinho

Pró-Reitora de Pós-Graduação
Marilza Vieira Cunha Rudge

Pró-Reitor de Pesquisa
José Arana Varela

Pró-Reitora de Extensão Universitária


Maria Amélia Máximo de Araújo

Pró-Reitor de Administração
Julio Cezar Durigan

Secretária Geral
Maria Dalva Silva Pagotto

Cultura Acadêmica Editora


Praça da Sé, 108 - Centro
CEP: 01001-900 - São Paulo-SP
Telefone: (11) 3242-7171
APOIO
FUNDAÇÃO EDITORA DA UNESP
CGB - COORDENADORIA GERAL DE BIBLIOTECAS

COMISSÃO EXECUTIVA
Elizabeth Berwerth Stucchi
José Roberto Corrêa Saglietti
Klaus Schlünzen Junior
Leonor Maria Tanuri

APOIO TÉCNICO
Ivonette de Mattos
José Welington Gonçalves Vieira

CAPA

DIAGRAMAÇÃO / EDITORAÇÃO ELETRÔNICA


PROGRAMA DE APOIO
À PRODUÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO

Considerando a importância da produção de material didático-


pedagógico dedicado ao ensino de graduação e de pós-graduação,
a Reitoria da UNESP, por meio da Pró–Reitoria de Graduação
(PROGRAD) e em parceria com a Fundação Editora UNESP (FEU),
mantém o Programa de Apoio à Produção de Material Didático de
Docentes da UNESP, que contempla textos de apoio às aulas, material
audiovisual, homepages, softwares, material artístico e outras mídias,
sob o selo CULTURA ACADÊMICA da Editora da UNESP, dis-
ponibilizando aos alunos material didático de qualidade com baixo
custo e editado sob demanda.
Assim, é com satisfação que colocamos à disposição da comu-
nidade acadêmica mais esta obra, “Política Educacional e Organi-
zação da Educação Brasileira”, de autoria do Prof. Dr. Carlos da
Fonseca Brandão, da Faculdade de Ciências e Letras do Campus
de Assis, esperando que ela traga contribuição não apenas para estu-
dantes da UNESP, mas para todos aqueles interessados no assunto
abordado.
Para minha esposa Lucy, para minha filha
Bruna e para meu pai Célio (in memorian),
que, à sua maneira e enquanto pôde, sempre se
orgulhou das minhas realizações.
SUMÁRIO

Introdução 13

PARTE I – Níveis de Ensino


Capítulo 1
Educação Infantil 15
1.1. Oferta e atendimento 17
1.2. Formação do profissional 19
1.3. Questões pedagógicas 22
1.4. Financiamento e gestão 24
1.5. Sugestões de leituras complementares 27

Capítulo 2
Ensino Fundamental 29
2.1. Oferta e atendimento 32
2.2. Questões pedagógicas 34
2.3. Financiamento e gestão 41
2.4. Sugestões de leituras complementares 41

Capítulo 3
Ensino Médio 45
3.1. Oferta e atendimento 51
3.2. Formação do profissional 52
3.3. Questões pedagógicas 54
3.4. Financiamento e gestão 58
3.5. Sugestões de leituras complementares 60

Capítulo 4
Educação Superior 63
4.1. Oferta e atendimento 69
4.2. Questões pedagógicas 72
4.3. Financiamento e gestão 74
4.4. Pós-graduação 79
4.5. Sugestões de leituras complementares 80
PARTE II – Modalidades de Ensino
Capítulo 5
Educação de Jovens e Adultos 83
5.1. Oferta e atendimento 89
5.2. Formação do profissional 95
5.3. Questões pedagógicas 97
5.4. Financiamento e gestão 98
5.5. Sugestões de leituras complementares 101

Capítulo 6
Educação a Distância 103
6.1. Oferta e atendimento 106
6.2. Formação do profissional 107
6.3. Questões pedagógicas 111
6.4. Sugestões de leituras complementares 113

Capítulo 7
Ensino Profissional 115
7.1. Oferta e atendimento 119
7.2. Formação do profissional 123
7.3. Sugestões de leituras complementares 124

Capítulo 8
Educação Especial 127
8.1. Oferta e atendimento 133
8.2. Formação do profissional 135
8.3. Questões pedagógicas 137
8.4. Financiamento e gestão 138
8.5. Sugestões de leituras complementares 141

Capítulo 9
Educação Indígena 143
9.1. Oferta e atendimento 147
9.2. Formação do profissional 148
9.3. Questões pedagógicas 149
9.4. Financiamento e gestão 151
9.5. Sugestões de leituras complementares 153
PARTE III – Outras Importantes Questões

Capítulo 10
Formação de Professores 155
10.1. Propostas para a Formação de Professores 161
10.2. Sugestões de leituras complementares 167

Capítulo 11
Financiamento da Educação 169
11.1. Propostas para o Financiamento da Educação 172
11.2. Sugestões de leituras complementares 177

Capítulo 12
Gestão da Educação 179
12.1. Propostas para a Gestão da Educação 182
12.2. Sugestões de leituras complementares 189

Considerações Finais 191

Referências Bibliográficas 195

Sobre o Autor 211


INTRODUÇÃO

No transcorrer dos últimos anos, especialmente a partir do início


de 1995, a educação brasileira sofreu profundas modificações em seu
arcabouço jurídico-institucional, refletindo a adoção de novas políti-
cas educacionais públicas. Tais transformações continuam a ocorrer,
demonstrando, de maneira explícita, o caráter dinâmico das políticas
públicas, especialmente as direcionadas à educação brasileira.
Se, por um lado, essa dinamicidade intrínseca às políticas pú-
blicas educacionais nos obrigam a estar constantemente atualizados,
e para isso, nos “empurram” para sermos participantes ativos na
elaboração e aplicação das mesmas, por outro lado, nos obrigam a
transformar essa participação em conteúdos que ajudem na formação
dos nossos futuros professores. Todo esse processo nos estimula a re-
alizar uma discussão, de caráter eminentemente didático, do conteúdo
das políticas públicas educacionais brasileiras atuais.
Entendemos que ao realizar uma discussão didática das
políticas públicas educacionais atuais, explicitando as possíveis
conseqüências e resultados de sua aplicação na realidade educacional
brasileira, elucidando coerências e/ou incoerências, frente às nossas
necessidades educacionais, assim como, analisando as perspectivas
vindouras, estamos contribuindo para a transformação, para melhor,
da realidade educacional do país.
Para abordar esse tema tínhamos diversas opções. Como o
mesmo é consideravelmente complexo, multifacetado, e, por muitas
vezes, tido historicamente por nossos alunos, de qualquer licencia-
tura, como um tema no mínimo “árido”, optamos pelo formato do
livro didático, no qual discutimos as políticas educacionais públicas
brasileiras atuais, para cada nível de ensino e para cada modalidade
de ensino, além de abordarmos também, em capítulos específicos,
temáticas cruciais da educação, tais como a questão da formação dos
profissionais da educação, a questão do financiamento e a questão
da gestão da educação. Porém, para que os nossos alunos/leitores
não fiquem somente com a nossa interpretação de cada uma dessas
temáticas, incluímos, em cada capítulo, sugestões de leituras comple-
mentares, que os ajudarão a se aprofundarem nos assuntos tratados.
Com esse trabalho desejamos alcançar dois objetivos princi-
14 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

pais. O primeiro é que esse livro didático venha a ajudar os profes-


sores de todos os cursos de graduação, na modalidade licenciatura,
no desenvolvimento das disciplinas que possuem como temáticas o
estudo das políticas educacionais públicas aplicadas à realidade brasi-
leira. O segundo objetivo é contribuir para uma melhor formação dos
alunos desses mesmos professores, que serão, a maioria deles e num
futuro muito próximo, professores do Ensino Fundamental e Médio.
Nosso livro pretende ajudar na melhoria da formação dos futuros
profissionais em educação, na medida em que poderá contribuir para
que professores e alunos possam discutir as políticas educacionais
públicas de maneira tão estimulante quanto aprofundada.
Com o intuito de facilitar ainda mais a utilização didática
desse trabalho, as temáticas aqui discutidas, foram divididas em
capítulos que seguem a organização atual da educação brasileira, ou
seja, na primeira parte, que engloba os capítulos 1 a 4, abordamos
questões específicas dos níveis de ensino (Educação Infantil, Ensino
Fundamental, Ensino Médio e Educação Superior), na segunda parte,
que engloba os capítulos 5 a 9, abordamos questões específicas das
modalidades de ensino (Educação de Jovens e Adultos, Educação
a Distância, Educação Tecnológica, Educação Especial e Educação
Indígena). Na terceira e última parte, que engloba os capítulos 10 a
12, abordamos outras importantes temáticas da política educacional
brasileira atual, como a questão da Formação dos Professores, do
Financiamento e da Gestão da Educação. Por fim, trazemos nossas
considerações finais e as referências bibliográficas utilizadas.
Gostaríamos de ressaltar que as nossas considerações finais
não possuem caráter conclusivo, pelo contrário, aproveitamos esse
momento para destacar apenas algumas questões atuais para debate,
apesar de sabermos que são inúmeros os pontos sobre os quais pode-
mos debater e polemizar, especialmente tratando-se da discussão da
atual política pública educacional brasileira, por si só, extremamente
dinâmica e multifacetada.
CAPÍTULO 1

EDUCAÇÃO INFANTIL

Partindo do pressuposto de que a infância é uma construção


histórica e social, o que temos assistido é, segundo alguns autores,
uma piora dos indicadores globais da situação mundial da infância,
apesar da “crescente tendência reguladora internacional, a partir da
Organização das Nações Unidas e das suas instituições autônomas,
de proteção das crianças, tais como a UNICEF” (SARMENTO, 2001,
p. 15). Assim, as crianças constituem a camada da população na qual
se concentram maior pobreza e violência em suas diversas formas
(conflitos armados, violência doméstica, abusos sexuais, AIDS, tra-
balho infantil, violência urbana, etc.). Por outro lado, fatores como a
expansão da urbanização e da participação das mulheres no mercado
de trabalho, ajudaram no aumento da conscientização da importância
da Educação Infantil (Cf. LEITE FILHO, 2001, p. 47-51).
No Brasil, desde a promulgação da atual Constituição e da
sanção da Lei nº 8.069/90, que instituiu o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), a concepção da criança como sujeito de direitos,
que é detentora de potencialidades a serem plenamente desenvolvi-
das, está em sintonia com as principais normas internacionais sobre o
direito da criança à educação, quer sejam, a Declaração Universal dos
Direitos da Criança (1959) e Convenção sobre os Direitos da Criança
(1989).
Assim sendo, a Educação Infantil, no contexto educacional
brasileiro, é um direito de toda criança e uma obrigação do Estado
(art. 208, inciso IV da Constituição). A criança não está obrigada a
freqüentar uma instituição de Educação Infantil, mas sempre que sua
família deseje ou necessite, o Poder Público tem o dever de atendê-
la. Porém, além do direito da criança, a Constituição, em seu Art. 7,
inciso XXV, também estabelece o direito dos trabalhadores, pais e
responsáveis, à educação de seus filhos e dependentes de 0 a 6 anos
em creches e pré-escolas. Para além dos argumentos sociais e econô-
micos, na base dessa questão está o direito ao cuidado e à Educação
16 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

desde o nascimento, como elemento constitutivo da pessoa e como


meio mais adequado à formação, desenvolvimento e integração social
da criança.
A importância da educação pré-escolar também está presente
em análises mundiais sobre a educação. Em seu relatório final, a
Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI – criada,
oficialmente, no início de 1993, sob o patrocínio da UNESCO –,
afirma que as crianças que usufruem da Educação pré-escolar “têm
uma disposição mais favorável em relação à escola e correm menos
riscos de a abandonar prematuramente do que as que não tiveram essa
oportunidade”, assim como
escolarização iniciada cedo pode contribuir para
a igualdade de oportunidades, ajudando a su-
perar as dificuldades iniciais de pobreza, ou de
um meio social ou cultural desfavorecido. Pode
facilitar, consideravelmente, a integração escolar
de crianças vindas de famílias de imigrantes, ou
de minorias culturais e lingüísticas. Além disso,
a existência de estruturas educativas que acolham
as crianças em idade pré-escolar facilita a partici-
pação das mulheres na vida social e econômica.
(DELORS, 2001, p. 129).
Por determinação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB – Lei nº 9.394/96), a Educação Infantil possui a fi-
nalidade de promover o desenvolvimento integral das crianças de 0
a 6 anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, de
forma a complementar a ação da família e da comunidade, sendo con-
siderada como a primeira etapa da Educação Básica (Cf. BRANDÃO,
2003, p. 84).
A LDB determina que a Educação Infantil escolar seja dividida
em creches e pré-escolas, as primeiras atendendo crianças de 0 a 3
anos, ficando a faixa de 4 a 6 anos para as pré-escolas, que, por sua
vez, deverão adotar objetivos educacionais, transformando-se em
instituições de educação, segundo as diretrizes curriculares nacionais
específicas para a Educação Infantil (Cf. SAVIANI, 1997, p. 172).
Na Educação Infantil, a forma de avaliação deverá ser feita
EDUCAÇÃO INFANTIL | 17

através do acompanhamento e registro constante do desenvolvimento


da criança, sem possuir o objetivo de promoção para o Ensino Funda-
mental. Isso significa que os alunos da pré-escola podem estar sujei-
tos às avaliações gerais de seu desenvolvimento, mas, os resultados
dessas avaliações não podem restringir o acesso da criança à primeira
série do Ensino Fundamental, visto que este acesso constitui-se em
um direito constitucional inalienável de toda e qualquer criança (Cf.
CURY, 2002).
Angela M. R. F. Barreto ressalta que é nessa etapa da Educação
Básica, ou seja, na Educação Infantil, que “a desigualdade de acesso é
fortemente sentida, especialmente quando se considera a renda fami-
liar das crianças atendidas.” (BARRETO, 2003, p. 60). Para Ana L.
G. Faria, as “ditas políticas neoliberais, já chamadas de minimalistas
com relação à educação, mostram-se ainda ‘menores’ para a educação
das crianças de 0 a 6 anos e muitas vezes não têm sequer a criança
como alvo, sequer se pronunciam a respeito da primeira etapa da
educação básica.” (FARIA, 2005, p. 1029, aspas no original).

1.1. Oferta e atendimento

Segundo dados do Censo Escolar 2006, estão matriculadas nas


creches brasileiras, pouco mais de 1, 4 milhão de crianças de 0 a 3
anos. Considerando que a população brasileira dessa faixa etária é
de aproximadamente 15 milhões, temos que a Educação Infantil, no
nível creches, atende a apenas 9,4% das crianças brasileiras de 0 a
3 anos de idade. Assim, se quisermos atingir o atendimento de 50%
dessa faixa etária, teremos que aumentar em aproximadamente 470%
o número de matrículas nas creches.
No caso das pré-escolas, são quase 5,6 milhões de crianças de 4
a 6 anos matriculadas em pré-escolas, o que corresponde a um índice
de, aproximadamente 60% do total de crianças brasileiras de 4 a 6
anos de idade. Assim, se quisermos atingir o percentual de 80% de
atendimento nessa faixa etária, teremos que aumentar, até o final des-
sa década, em aproximadamente 34% o número de matrículas nesse
nível de ensino (pré-escolas), em relação ao número de matrículas
18 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

existentes atualmente nas pré-escolas brasileiras1.


Em função desses números, para se atingir tais metas é neces-
sário um significativo investimento financeiro na Educação Infantil.
Dada a ênfase da política macroeconômica atual, focalizada na
realização de um elevado superávit primário para pagamento dos
juros, encargos e serviços da dívida externa brasileira, torna-se difícil
acreditar que esses investimentos serão realizados.
Segundo Barreto, em termos financeiros, “seriam necessários
R$ 5,2 bilhões no ano de 2006 e R$ 7,74 bilhões em 2011, para o
atendimento em creches e pré-escolas”, o que “significa um incre-
mento de recursos da ordem de 60% em cinco anos e de 140% em
10 anos, tomando-se todo o Brasil.” (BARRETO, 2003, p. 62-63).
Por outro lado, o Ensino Fundamental no Brasil passou a ser de 9
anos, estendendo a escolaridade obrigatória para crianças de 6 anos
de idade, retirando-as, assim, do nível da Educação Infantil e as in-
cluindo no nível do Ensino Fundamental, o que significará, no curto
prazo, um menor número absoluto de crianças a serem atendidas pela
Educação Infantil, o que, por sua vez, pode permitir que possamos
chegar a percentuais próximos aos citados acima.
Outra questão relacionada à oferta e ao atendimento na Edu-
cação Infantil diz respeito ao oferecimento deste nível de ensino em
tempo integral. O problema é que a adoção desta medida, quando
feita de maneira progressiva, apesar de se constituir em um objetivo
extremamente válido a ser alcançado, pode, quando não se coloca um
prazo determinado, não se efetivar, pelo contrário, quando se coloca
a idéia de adoção progressiva, corre-se o risco de nunca termos aten-
dimento em tempo integral para as crianças de 0 a 6 anos de idade,
visto que ainda não conseguimos, sequer, adotar o regime de tempo
integral para as crianças do Ensino Fundamental. Para ilustrar o que
estamos dizendo, estudos do IBGE indicam que 62,3% das crianças
matriculadas em creches públicas ficam mais de 4 horas/dia na escola
e apenas 41% das crianças matriculadas em creches privadas ficam
mais de 4 horas/dia na escola. No nível da pré-escola, os percentuais

1 Necessário se faz ressaltar que, comparado com os dados de 2005, as matrículas em 2006 recuaram 3,6%
nas pré-escolas e cresceram apenas 1% nas creches (Cf. www.inep.gov.br , acesso em 10/02/07).
EDUCAÇÃO INFANTIL | 19

são, respectivamente, 29% (públicas) e 31,6% (privadas)2.


Por último, na questão da oferta e do atendimento com quali-
dade na Educação Infantil, necessário se faz a realização de estudos
sobre o custo da Educação Infantil, com base em parâmetros de qua-
lidade, objetivando a melhorar a eficiência e garantir a generalização
da qualidade do atendimento nesse nível de ensino. O problema é que
é preciso, primeiro, definir quais são os parâmetros de qualidade.
Entendemos que para chegarmos a esses parâmetros de qualidade é
preciso que outras questões sumamente importantes para a Educação
Infantil sejam resolvidas, por exemplo, a questão da infra-estrutura
adequada para a Educação Infantil, definir os parâmetros de formação
dos profissionais em Educação Infantil, definir políticas municipais
para a Educação Infantil, garantir alimentação escolar, atingir a uni-
versalização do atendimento, assegurar o fornecimento de materiais
pedagógicos adequados, entre outros tópicos.
Definidos os indicadores de cada um desses tópicos listados
(e de outros tópicos tão importantes quanto esses), imediatamente
tornar-se-á viável a realização desses estudos. Entre outros autores,
Faria confirma a inexistência atual da definição dos parâmetros de
qualidade da Educação Infantil, bem como a definição do “custo-
aluno-qualidade” da Educação Infantil e de estudos e pesquisas sobre
custos, qualidade e expansão da oferta de Educação Infantil no Brasil
(Cf. FARIA, 2005, p. 1031).

Questão para Debate em Sala de Aula

Dados do Censo Escolar mostraram que apenas 9,4% do total


de crianças brasileiras de 0 a 3 anos estavam matriculadas em creches.
Na sua opinião, quais as maneiras mais efetivas de resolver, ou pelo
menos, minimizar, esse problema?

1.2. Formação do profissional

No que se refere à questão da formação profissional para a

2 Cf. www.ibge.gov.br , acesso em 24/03/2006.


20 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

atuação na Educação Infantil, consideramos que, pelo menos, quatro


questões devem ser destacadas. A primeira delas é que o PNE vigente
propõe a criação de um Programa Nacional de Formação dos Pro-
fissionais de Educação Infantil, com o objetivo de elevar o nível de
qualificação profissional dos dirigentes e dos professores que atuam
na Educação Infantil.
A instituição de um programa dessa natureza objetiva alcan-
çar, simultaneamente, duas metas específicas: qualificar dirigentes e
professores das instituições de Educação Infantil. Nesta questão, o
MEC ainda está realizando seminários públicos para a definição de
uma política de formação de profissionais para a Educação Infantil,
que esteja inserida no contexto de uma política nacional para esse
nível de ensino. Nesse sentido, o principal documento discutido
atualmente intitula-se Política Nacional de Educação Infantil: pelos
direitos das crianças de zero a seis anos à Educação – Documento
Preliminar, que também está disponível na home page do MEC3.
Nesse documento estão explicitadas todas as diretrizes, objeti-
vos, metas e estratégias a serem adotadas por essa política nacional
de Educação Infantil, levando-se em conta que esse documento
ainda deverá receber novas contribuições de todos os interlocutores
(entidades e sindicatos ligados à educação, especialmente o MIEIB
– Movimento Interforuns da Educação Infantil no Brasil) que parti-
cipam da discussão. Segundo Faria, no segundo semestre de 2003, o
atual governo, cumprindo os compromissos assumidos anteriormente
com o MIEIB, criou o Conselho de Políticas para a Educação Básica
(CONPEB), composto pelas seguintes entidades: ANPEd, MIEIB,
CONSED, ANFOPE, CNTE, UNDIME, FORUMDIR, CONTEC,
UNCME, CNE, além dos representantes da UNESCO e do UNICEF.
Este conselho englobou os Conselhos de Educação Infantil, de Ensino
Fundamental, de Ensino Médio e de Educação de Jovens e Adultos
(Cf. FARIA, 2005, p. 1027, 1034).
Por outro lado, segundo dados do relatório produzido pela con-
sultoria legislativa da Câmara dos Deputados, a pedido da Comissão
de Educação e Cultura, até o início de 2005, o número de professores
que atuam na Educação Infantil e possuem pelo menos o Ensino Mé-
dio, subiu para 84%, ou seja, ainda existiam 16% de professores de

3 Cf. www.mec.gov.br , acesso em 18/11/2005.


EDUCAÇÃO INFANTIL | 21

Educação Infantil que ainda não possuíam habilitação específica de


nível médio (Curso Normal ou Habilitação em Magistério)4.
Em debate público realizado em maio de 2004, Francisco C.
Fernandes, Secretário de Educação Infantil e Fundamental do MEC,
afirmou que uma das ações do MEC era a implantação do Pro-infantil
(Projeto de Formação de Professores da Educação Infantil) (Cf.
FERNANDES, 2004, p. 65). Em consulta recente ao Portal do MEC
na internet, há a informação de esse projeto seria implantado somen-
te no segundo semestre de 2005, em apenas cinco Estados (Ceará,
Goiás, Minas Gerais, Rondônia e Sergipe), como projeto piloto, e em
2006, no restante dos Estados brasileiros, não informando porém se
esse projeto foi efetivamente implementado ou não5.
Um outra proposta, no sentido de melhorar o nível de formação
dos profissionais que trabalham em creches e pré-escolas, é a de que
as instituições de Educação Infantil admitam somente profissionais
com titulação mínima de nível médio, dando preferência à admissão
de profissionais graduados em nível superior, porém essa proposta
só faz sentido se forem alcançados todos os percentuais previstos na
discussão anterior. Ou seja, se conseguirmos fazer com que todos
os dirigentes de instituições de Educação Infantil tenham formação
de nível superior e que, simultaneamente, 70% dos professores que
atuam na Educação Infantil passem a ter formação específica de nível
superior, tornar-se-á muito mais fácil conseguir que as instituições de
Educação Infantil admitam somente profissionais com titulação mí-
nima de nível médio, dando preferência à admissão de profissionais
graduados em nível superior.
Também é preciso ter claro que formação superior não significa
necessariamente habilidade para trabalhar com crianças na Educação
Infantil. Nesse sentido, os cursos de formação de magistério para
a Educação Infantil, entre outras questões, devem dar uma atenção
especial à formação humana, à questão de valores e às habilidades
específicas para com crianças de 0 a 6 anos de idade.
Uma outra questão é a do papel dos municípios no oferecimento

4 Cf. Relatório de avaliação técnica do Plano Nacional de Educação, elaborado pela área 15 (Educação,
Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia) da consultoria legislativa da Câmara dos Deputados (Cf. www2.
camara.gov.br/publicacoes/, acesso em 02/08/2005).

5 Cf. www.mec.gov.br, acesso em 08/02/2006.


22 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

de programas de formação em serviço, articulados com instituições de


ensino superior e com cooperação técnica e financeira da União e dos
Estados, objetivando a atualização permanente e o aprofundamento
dos conhecimentos dos profissionais que atuam na Educação Infantil
que, na prática, não existem na maioria dos municípios brasileiros,
mesmo porque, para que haja o oferecimento de programas dessa
natureza, é necessário que se tenha aprovado uma política nacional
para esse nível de ensino (Educação Infantil). Atualmente, o que en-
contramos são alguns programas de formação em serviço localizados
(municipais ou estaduais) não direcionados exclusivamente para os
profissionais que atuam na Educação Infantil, como por exemplo,
o Pedagogia Cidadã instituído pela Universidade Estadual Paulista
“Julio de Mesquita Filho” (UNESP).
Nesse mesmo sentido está a proposta de ampliação da oferta de
cursos de formação de professores de Educação Infantil de nível supe-
rior, com conteúdos específicos, preferencialmente nas regiões onde
é grande o déficit de qualificação desses profissionais. Infelizmente,
pensando em termos de Brasil, essa proposta ainda não se efetivou de
maneira significativa.

Questão para Debate em Sala de Aula

Até o início de 2005, 16% dos professores que atuam na Educa-


ção Infantil ainda não possuíam habilitação específica de nível médio
(Curso Normal ou Habilitação em Magistério). Em sua opinião, quais
seriam as formas mais adequadas para que todos os professores que
atuam na Educação Infantil obtivessem essa habilitação específica?

1.3. Questões pedagógicas

Dedicamos esse item à análise das questões mais importantes,


em termos pedagógicos, para a Educação Infantil. Dentro desse perfil,
estão as questões que tratam da formulação dos projetos pedagógicos
com a participação dos profissionais de educação e a questão da ex-
tinção das classes de alfabetização com a conseqüente incorporação
de todas as crianças dessas classes no Ensino Fundamental.
A elaboração dos projetos pedagógicos com a participação dos
EDUCAÇÃO INFANTIL | 23

profissionais de educação, para todas as instituições de Educação


Infantil, é uma medida de difícil comprovação empírica, visto que,
a responsabilidade sobre a Educação Infantil é dos municípios, de
acordo com o § 2º do Art. 211 da Constituição e inciso V do Art. 11
da LDB (Cf. CURY, 2000). Consideramos, porém, que trata-se de
uma proposta que possui um caráter permanente, ou seja, sempre será
papel do município, através da sua Secretaria Municipal de Educação,
exigir que todas as instituições de Educação Infantil sob sua respon-
sabilidade, portanto, integrantes do seu sistema de ensino, formulem
– e executem – seus projetos pedagógicos com a participação efetiva
dos seus profissionais em educação.
Entendemos que o que se deve ser permanentemente combati-
do é a existência de projetos pedagógicos exclusivamente formais e
burocráticos, construídos sem a participação efetiva da comunidade
escolar. Nesse sentido, assim se expressa Silva:
Na escola pública, o projeto pedagógico coletivo
tornou-se peça burocrática, pois quase sempre,
apenas reproduz a tradicional centralidade política,
executando os decretos-lei, as portarias, as resoluções
e regulamentações similares, publicados no Diário
Oficial e vigiados pelos guardiães do sistema: diretores
e supervisores. (SILVA, 2002, p. 197).

Procurando combater esse caráter burocrático de que fala Silva,


Léa Tiriba considera que, no caso específico da Educação Infantil, se
a educação das crianças pequenas é co-responsabilidade
das famílias e das instituições escolares, em vez de espe-
rar dos pais uma simples adesão aos projetos da escola,
é necessário construir uma parceria entre sujeitos que
atuam de forma diferenciada frente ao mesmo desafio, a
educação das crianças pequenas. Assim, em vez de ‘ex-
plicar’ aos pais o trabalho que a creche realiza, é preciso
construir com eles um projeto de educação e de escola.
Nessa perspectiva, as famílias deixam de ser uma ‘clien-
tela’ a quem se oferecem serviços, para serem parceiras
na implementação de um projeto que também é seu.
(TIRIBA, 2001, p. 75, aspas e itálicos no original).
24 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

A segunda importante questão pedagógica a ser implementada


pela Educação Infantil é a extinção das classes de alfabetização com
a imediata incorporação de todas as crianças dessas classes ao Ensino
Fundamental, bem como matricular – nesse nível de ensino (Ensino
Fundamental) – todas as crianças de 7 anos ou mais que ainda se
encontrem na Educação Infantil. Em 2005, ainda havia quase 360
mil alunos matriculados em classes de alfabetização e quase 7% de
crianças de 7 anos ou mais na Educação Infantil6.
Diante desses dados, claro se torna que a extinção das classes
de alfabetização depende, por um lado, da atuação efetiva das esferas
responsáveis pelo oferecimento de Ensino Fundamental (Estados e
municípios), de forma que criem as condições necessárias (estruturais
e pedagógicas) para esta extinção, com a conseqüente incorporação
de todas as crianças de 7 anos ou mais, que ainda se encontrem na
Educação Infantil e, por outro lado, de uma atenção e fiscalização
permanente das entidades e setores educacionais sobre a atuação
dessas esferas responsáveis pelo oferecimento de Ensino Fundamen-
tal (Estados e municípios), afinal, entendemos que a existência de
crianças de 7 anos ou mais, na Educação Infantil, constitui-se em um
problema educacional e pedagógico gravíssimo, e que, portanto, deve
ser sanado o mais rápido possível.

Questão para Debate em Sala de Aula

Em sua opinião, qual a melhor maneira de se acabar com as


classes de alfabetização, de forma que todas as crianças de 7 anos
ou mais, que ainda se encontram na Educação Infantil (pré-escola)
possam ser encaminhadas para o Ensino Fundamental?

1.4. Financiamento e gestão

As questões do financiamento e da gestão na Educação Infantil


se constituem em uma outra área muito importante em termos da

6 Cf. www2.camara.gov.br/publicacoes/, acesso em 02/08/2005.


EDUCAÇÃO INFANTIL | 25

política educacional implementada no Brasil nos últimos anos, tanto


no governo FHC quanto no governo Lula. No que se refere à gestão
escolar na Educação Infantil, pelo menos três questões merecem
destaque.
A primeira delas é sobre a implantação dos conselhos escola-
res e de outras formas que estimulem a participação da comunidade
escolar e local, visando à melhoria da qualidade do oferecimento de
Educação Infantil. Sabemos que em grande parte dos municípios bra-
sileiros já existem conselhos escolares que viabilizam a participação
da comunidade local na discussão sobre qualidade de ensino e melho-
ria do funcionamento das instituições escolares, porém, voltados para
o Ensino Fundamental. O que desejamos é que essa prática também
seja instituída no nível da Educação Infantil, o que, com certeza,
valorizará esse nível de ensino. Porém, a efetivação dessa medida
depende, em grande parte, da atenção e da fiscalização permanente
das entidades e setores educacionais sobre a esfera responsável pelo
oferecimento de Educação Infantil, no caso, os municípios e suas
respectivas Secretarias Municipais de Educação.
A participação da comunidade escolar e local, visando a me-
lhoria da qualidade do oferecimento de Educação Infantil, é muito
importante, mas não pode ser vista como solução para todos os
problemas desse nível de ensino. Delors considera que, independente
dessa prática estar presente especificamente na Educação Infantil,
a “participação da comunidade local na avaliação das necessidades
[educacionais], através do diálogo com as autoridades oficiais e os
grupos interessados no interior da sociedade, é uma das etapas es-
senciais para ampliar e aperfeiçoar o acesso à educação” (DELORS,
2001, p. 26).
Outra importante questão em termos de gestão da Educação
Infantil brasileira é o estabelecimento de parâmetros de qualidade
dos serviços de Educação Infantil, como um dos instrumentos para
verificação do nível de qualidade oferecido pela instituição escolar,
parâmetros esses que também seriam referenciais para as atividades
de supervisão, controle e avaliação da Educação Infantil ministrada.
Atualmente, o que temos é o documento, disponível na home page
do MEC, intitulado Parâmetros de Qualidade para a Educação
Infantil – Documento Preliminar, das Profas. Maria L. A. Machado
26 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

e Maria M. Campos7. Esse documento faz um relato histórico das


discussões sobre a questão da qualidade do atendimento na Educação
Infantil desde a década de 1960, realiza uma ampla discussão sobre
a qualidade do atendimento a ser alcançada pela Educação Infantil e
coloca princípios orientadores para a discussão sobre os parâmetros
de qualidade para a Educação Infantil.
O fato desse documento ainda estar em discussão com os seto-
res educacionais que atuam com a Educação Infantil não se constitui
em grave problema, pelo contrário, esse encaminhamento mostra a
disposição do MEC de continuar debatendo e buscando contribuições
da sociedade, principalmente contribuições advindas de setores edu-
cacionais interessados na Educação Infantil.
Segundo Faria, esse documento incorpora as principais “refe-
rências para a definição da política nacional do Governo Lula” para
a Educação Infantil, porém, já contidas no documento Critérios de
atendimento de uma creche que respeita os direitos fundamentais da
criança – que ficou conhecido na área da Educação Infantil como
“documento das carinhas” –, e no vídeo Esta creche respeita criança,
elaborados em 1995, por Fúlvia Rosemberg e Maria M. Campos, sob
encomenda do MEC (Cf. FARIA, 2005, p. 1017).
Na questão específica do financiamento da Educação Infantil,
em junho de 2005, começou a tramitar no Congresso Nacional uma
Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que cria o FUNDEB (Fun-
do de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valo-
rização dos Profissionais da Educação) em substituição ao FUNDEF
(Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental
e de Valorização do Magistério). Essa proposta foi aprovada no fi-
nal de 2006 e regulamentada pela Lei 11.494/07, que, entre outras
coisas, pretende corrigir a distorção no financiamento da Educação
Básica, destinando mais (e novos) recursos para a Educação Infantil,
Educação de Jovens e Adultos, Ensino Médio, Educação Especial e
Educação Indígena.
Roberto N. Schorr afirma que a questão do financiamento da
Educação Infantil possui, entre outros, dois problemas que precisam

7 Cf. www.mec.gov.br , acesso em 18/11/2005.


EDUCAÇÃO INFANTIL | 27

ser destacados. O primeiro problema é que, especialmente no caso


das creches – que atendem crianças de 0 a 3 anos, na maioria das
vezes em período integral –, os recursos públicos destinados a esse
atendimento são insuficientes para a cobertura da demanda das redes
mantidas pelas administrações municipais. O segundo problema é
que a maioria dessas administrações municipais considera os gas-
tos realizados com a Educação Infantil como despesas e não como
investimentos. Entender esses gastos como investimentos significa,
segundo o autor, ter como princípio que a educação, e especialmente
a Educação Infantil, é o “maior projeto de investimento público” de
uma administração pública pautada em princípios verdadeiramente
democráticos (Cf. SCHORR, 2004, p. 148-149). Acreditamos que o
FUNDEB possa vir a sanar, se não todos, pelo menos parte desses
problemas.

Questão para Debate em Sala de Aula

Na sua opinião, quais os melhores mecanismos para a efetiva


fiscalização da aplicação correta dos recursos financeiros, advindos
do FUNDEB, na Educação Infantil?

1.5. Sugestões de Leituras Complementares

FARIA, A. L. G.; PALHARES, M. S. (Orgs.). Educação infantil


pós-LDB: rumos e desafios. Campinas/São Carlos/Florianópolis:
Autores Associados/Ed. UFSCar/Ed. UFSC, 1999 (Coleção
Polêmicas do nosso tempo; 62).

MACHADO, M. L. A. (Org.). Encontros e desencontros em


educação infantil. São Paulo: Cortez, 2002.

COSTA, M. Criar o público não-estatal ou tornar público o


estatal? In: ADRIÃO, T.; PERONI, V. (Orgs.). O público e o
privado na educação: interfaces entre estado e sociedade. São
Paulo: Xamã, 2005, p. 13-30.
CAPÍTULO 2

ENSINO FUNDAMENTAL

Nossa Constituição, na Seção I (Da Educação), Capítulo III (Da


Educação, da Cultura e do Desporto), traz, parcial ou integralmente,
6 artigos que tratam do Ensino Fundamental: Art. 208, 209, 210, 211,
212 e 214. No intuito de regulamentar esses artigos constitucionais, a
LDB dedica, de maneira direta, 3 artigos ao Ensino Fundamental (Art.
32 a 34), além de mais 8 artigos sobre a Educação Básica (Art. 22 a
28), nos quais também se insere o Ensino Fundamental (Cf. DAVIES,
2004, p. 144-151).
Dos artigos constitucionais, consideramos o Art. 208 como um
dos mais importantes porque afirma que o Ensino Fundamental no
Brasil é obrigatório e gratuito, sendo, portanto, prioridade oferecê-lo
a toda a população brasileira em idade escolar e para todas as pessoas
que não tiveram acesso ao Ensino Fundamental na idade apropriada,
constituindo-se, assim, em um dever do Estado.
Oliveira considera que esse “dever do Estado para com a edu-
cação é inócuo se não for acompanhado da respectiva provisão de
recursos públicos para sua efetivação” (OLIVEIRA, 1998, p. 123).
Já com relação à questão do direito à educação, Oliveira e Araujo
consideram que
o grande desafio do atual momento histórico, no que
diz respeito ao direito à educação, é fazer com que ele
seja, além de garantido e efetivado por meio de medidas
de universalização do acesso e da permanência, uma
experiência enriquecedora do ponto de vista humano,
político e social, e que consubstancie, de fato, um pro-
jeto de emancipação e inserção social. Portanto, que o
direito à educação tenha como pressuposto um ensino
básico de qualidade para todos e que não (re)produza
mecanismos de diferenciação e de exclusão social.
(OLIVEIRA; ARAUJO, 2005, p. 16-17, parênteses no
original).
30 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

No § 1º, deste mesmo Art. 208 da Constituição, está posto que


o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo,
ou seja, o seu não-oferecimento pelo Poder Público, ou sua oferta
irregular, implica responsabilidade da autoridade competente. Sendo
assim, não é necessário ter qualquer grau de parentesco ou afinidade
com a(s) criança(s) que, porventura, esteja(m) fora da escola para
exigir, perante o Poder Público, e se necessário, perante o Poder Ju-
diciário, vaga(s) para essa(s) criança(s) nas redes públicas de ensino
(Cf. BRASIL, 1997, p. 138-139).
A prioridade em garantir o acesso, permanência e conclusão do
Ensino Fundamental obrigatório para todas as crianças, inclui a ne-
cessidade de que os sistemas de ensino se esforcem para proporcionar,
a essas crianças, a formação mínima para o exercício da cidadania,
para a aquisição de qualificações para o trabalho profissional e para
o usufruto do patrimônio cultural da sociedade moderna. Assim, os
processos pedagógicos a serem utilizados nas diversas séries do Ensi-
no Fundamental, deverão ser adequados às necessidades dos alunos e
corresponder a um ensino socialmente significativo, visto que quase
43 milhões de crianças e jovens brasileiros estão matriculados em
escolas públicas, que, somados aos estudantes das escolas privadas,
fazem com que o índice de acesso ao Ensino Fundamental no Brasil
seja de 97,2% (Cf. ARELARO, 2005b, p. 1041-1044).
O Ensino Fundamental deve ter a duração mínima de 9 anos.
Ele é constitucionalmente obrigatório e gratuito na escola pública,
tendo por objetivo a formação básica do cidadão. Essa formação
deverá ser alcançada mediante o desenvolvimento da sua capacidade
de aprender. Esse processo de aprendizagem deve ter como meios
básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo. Segundo
Luiz A. Cunha, tradicionalmente – e, infelizmente –, as políticas edu-
cacionais brasileiras “dificilmente levam à incorporação, pelo ensino
básico, dos resultados das pesquisas e dos experimentos financiados
e promovidos pelos mesmos governos”, o que, na prática, prejudica
o alcance dos objetivos do Ensino Fundamental (CUNHA, 1998, p.
24).
É permitido aos sistemas de ensino (federal, estaduais e
municipais), desdobrar o Ensino Fundamental em ciclos, dentre os
quais se incluem os regimes de progressão continuada, desde que
não haja prejuízo dos processos de avaliação da aprendizagem (Cf.
ENSINO FUNDAMENTAL | 31

BRANDÃO, 2003, p. 85-86). Creso Franco considera que, especial-


mente pela organização do Ensino Fundamental no Brasil ainda ser
majoritariamente em série (90% das escolas e 80% das matrículas),
“a repercussão da política de ciclos sobre o nível de letramento de
crianças e jovens brasileiros ainda são bastante precárias” e os “níveis
de repetência na educação básica brasileira ainda são muito elevados
para todas as séries, especialmente na primeira parte do Ensino Fun-
damental” (FRANCO, 2004, p. 30, 34, 37).
Independentemente de a escola adotar a progressão regular por
séries ou o sistema de ciclos, entendemos que o problema maior do
conceito de “progressão continuada” está na sua aplicação prática
no cotidiano da organização pedagógica da escola, ou seja, está na
transformação prática da “progressão continuada” em “promoção
automática” do aluno às séries (ou ciclos) seguintes, sem que o alu-
no tenha apreendido os conteúdos mínimos adequados àquela série
escolar (ou ciclos) (Cf. ARELARO, 2005b, p. 1055). Luiz C. Freitas
diferencia – ideológica e politicamente – não só os conceitos, mas
também as experiências já realizadas de progressão continuada e de
organização do Ensino Fundamental em ciclos, porém, admite que
“ambas são formas de organização escolar cicladas, no sentido de
que permitem ao aluno caminhar dentro de blocos plurianualizados.”
(FREITAS, 2005a, p. 115)1.
O Ensino Fundamental regular deve ser ministrado em língua
portuguesa e de forma presencial. O ensino a distância poderá ser
utilizado, porém, só como complementação da aprendizagem ou em
situações emergenciais. Em outras palavras, podemos afirmar que
o Ensino Fundamental será obrigatoriamente presencial, visto que
a idéia de “complementação” significa, nesse caso, um método de
ensino-aprendizagem que pode complementar o método presencial,
nunca substituí-lo, ou secundarizá-lo. O ensino a distância aplicado
ao Ensino Fundamental em “situações emergenciais” é permitido,
porém, tais situações devem se constituir em exceções.
Às comunidades indígenas deve ser assegurada a utilização de
suas línguas maternas no Ensino Fundamental, assim como processos

1 Para Lisete R. G. Arelaro, com relação aos ciclos, o caso do Estado de São Paulo, “é exemplar, para não
ser jamais ‘copiado’” (ARELARO, 2005b, p. 1049, aspas no original).
32 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

próprios de aprendizagem. A possibilidade de crianças das diferen-


tes comunidades indígenas terem acesso a todos os conhecimentos
ministrados no Ensino Fundamental por meio de processos próprios
de aprendizagem, os quais se utilizarão das línguas maternas de cada
comunidade indígena, constitui-se num considerável avanço pedagógi-
co, na medida em que pode contribuir para a preservação das línguas
indígenas.
No Ensino Fundamental, o ensino religioso é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais
das escolas públicas, porém com algumas restrições. A primeira delas
é que o ensino religioso deve ser de matrícula facultativa. A segunda
restrição é que esse ensino religioso deve assegurar o respeito à diver-
sidade religiosa existente no Brasil, sendo vedadas quaisquer formas
de proselitismo. Cabe aos sistemas de ensino a tarefa de regulamentar
os procedimentos que definirão os conteúdos do ensino religioso e
estabelecer as normas para a habilitação e a admissão dos professores
responsáveis pelo mesmo. Para que tais condições se façam cumprir,
os sistemas de ensino devem dialogar com as diferentes denominações
religiosas da sociedade civil, visando à definição dos conteúdos desse
ensino.
O problema da opção de matrícula facultativa dos alunos das
escolas públicas de Ensino Fundamental, na disciplina ensino religioso
é que, se por um lado a matrícula facultativa preserva a opção religiosa
do aluno, especialmente quando essa opção está em desacordo com o
conteúdo do ensino religioso oferecido pela escola, por outro lado, ao
optar por não realizar essa matrícula facultativa, esse aluno sofre, inva-
riavelmente, um certo tipo de discriminação, em função de sua opção
religiosa ser diferente do conteúdo do ensino religioso oferecido pela
escola. Essa discriminação pode se dar em maior ou menor grau, mas
será sempre uma discriminação (Cf. FREITAS, 2005a, p. 89-91).

2.1. Oferta e atendimento

A universalização da oferta de Ensino Fundamental no Brasil


já foi alcançada na medida em que as matrículas nesse nível de ensino
já atingiram 97,2% da população brasileira de 7 a 14 anos de idade,
apesar do número de matrículas, em termos percentuais, ter diminuí-
ENSINO FUNDAMENTAL | 33

do em quase 1% entre os anos de 2005 e 20062. A universalização do


acesso ao Ensino Fundamental deve ser atribuída a diversos fatores,
dentre os quais podemos citar a criação do FUNDEF (em 1996),
as políticas de renda mínima associadas à educação (bolsa escola),
a diminuição da pressão demográfica resultante da queda das taxas
de natalidade e a menor tolerância da sociedade e do Poder Público
para com o trabalho infantil. O direito ao Ensino Fundamental não
se refere apenas à matrícula, mas ao ensino de qualidade, até a sua
conclusão. Alcançada a universalização do acesso ao Ensino Funda-
mental, o novo desafio da política educacional brasileira, para esse
nível de ensino, passa a ser a criação das condições necessárias para
a permanência dessas crianças na escola, diminuindo-se os índices de
repetência e evasão escolar.
Por outro lado, a necessidade de programas específicos de
acesso e permanência no Ensino Fundamental, com a colaboração da
União, dos Estados e dos municípios, em regiões mais carentes é ex-
plicitada pela extrema desigualdade regional existente em nosso país,
tanto em termos de oferta e atendimento como em termos de sucesso
escolar. Apesar de ter ocorrido um expressivo crescimento na última
década, as regiões Norte e Nordeste ainda continuam apresentando
as piores taxas de escolarização do Brasil. Assim, é necessário que
o governo federal priorize o auxílio técnico e financeiro para essas
regiões. Ainda temos 1,9 milhão de crianças com menos de 14 anos
– idade em que qualquer tipo de trabalho é proibido pela Constituição
–, trabalhando e fora da escola. Soma-se a isso o fato de que, segundo
dados do Censo Escolar 2006, o índice de evasão no Ensino Funda-
mental é de 7,5%, e a taxa de repetência está em 13%.
Uma reorganização curricular dos cursos noturnos também se
faz necessária, contemplando, especialmente, dois objetivos: adequá-
los às características da clientela e promover uma gradual eliminação
do oferecimento de Ensino Fundamental noturno. Nenhum desses
dois objetivos foi, até o presente momento, atingido, ou seja, o en-
sino noturno não foi objeto de reorganização curricular, de forma a
adequá-lo às características da sua clientela, nem houve, até o presen-
te momento, propostas para promover, no médio prazo, a eliminação
gradual da necessidade de oferta de Ensino Fundamental noturno.

2 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 10/02/07.


34 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Questão para Debate em Sala de Aula

Segundo dados do Ministério da Educação (MEC) e do INEP


(Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais “Anísio
Teixeira”), em 2003, de cada 100 alunos que iniciavam o Ensino Fun-
damental, apenas 57 o concluíam, ou seja, uma taxa de abandono de
43%. Em sua opinião, quais medidas seriam necessárias para diminuir
os índices de evasão escolar no Ensino Fundamental, no curto, médio
e longo prazos?

2.2. Questões pedagógicas

No que se refere ao que denominamos Questões pedagógicas,


destacamos diversos problemas que a educação brasileira precisa en-
frentar – e resolver –, no mais curto espaço de tempo que for possível.
Trata-se de questões sobre a implantação do Ensino Fundamental com
duração de 9 anos; sobre a regularização do fluxo escolar como forma
de redução das taxas de evasão e repetência; sobre a formulação dos
projetos pedagógicos; sobre as escolas e classes isoladas unidocentes;
sobre a carga horária mínima diária (jornada escolar) e semanal; e,
por fim, sobre a avaliação escolar.
A ampliação do Ensino Fundamental para 9 anos de duração,
iniciando-se aos 6 anos de idade, será obrigatória para todo o sistema
escolar a partir de 2011. Se consideramos que o acesso ao Ensino
Fundamental já está universalizado em nosso país, nada impede que
a ampliação desse nível de ensino, de 8 para 9 anos, se efetive rapida-
mente. Acontece porém que, mais do que a universalização do acesso,
necessário se faz garantir a permanência dessas crianças na escola, de
forma que concluam com sucesso o Ensino Fundamental, reduzindo
drasticamente os índices de evasão e repetência escolar3.
Dados do Censo Escolar 2003 indicaram que 5 Estados e 284
municípios brasileiros já haviam implantado o Ensino Fundamental

3 Essa medida foi oficilizada com a sanção da Lei nº 11.274/06, que modifica o art. 32 da LDB, explicitando
que o Ensino Fundamental no Brasil passa a ter a duração de 9 anos. Em seu Art. 5º, essa lei estipula que todos
os Estados e municípios brasileiros terão até 2010 para implantar o Ensino Fundamental de 9 anos.
ENSINO FUNDAMENTAL | 35

de 9 anos, num total de 11.510 escolas. Porém, o Ensino Fundamental


com duração de 8 anos ainda vigorava em 159.861 escolas públicas
brasileiras. A maioria dos Estados ainda espera a definição da forma
de assistência técnica e do nível de auxílio financeiro por parte do
governo federal, para realizar essa ampliação. Por sua vez, o MEC,
possui um programa específico para o alcance dessa meta, intitulado
Programa de Ampliação do Ensino Fundamental para Nove Anos4.
Um outro problema é o da redução drástica das taxas de evasão
e repetência escolar, por meio de programas de aceleração de apren-
dizagem e de recuperação paralela. As experiências existentes pelo
Brasil afora mostram que, quando bem elaborados, quando acompa-
nhados permanentemente e avaliados criticamente, esses programas
reduzem significativamente as taxas de evasão e repetência escolar.
Porém, entendemos que o problema da repetência não se resolve com
a facilitação de aprovação para as séries escolares subseqüentes. Da
forma como alguns Estados brasileiros implementaram o sistema de
ciclos escolares, os índices de evasão e repetência escolar tendem,
num primeiro momento, a diminuir, mas, no médio prazo, produzem
um aumento, também significativo, no índice de analfabetos funcio-
nais.
Para reforçar nossos argumentos, podemos citar que a taxa de
evasão escolar era de 5,3% no ano de 1995 e caiu para 4,8% em 2000.
O índice de repetência, nesse mesmo período, diminuiu de 30% (1995)
para 21,6% (2000), ou seja, as diversas possibilidades de organização
do ensino propostas pela nova LDB, fizeram com que o índice de
evasão diminuísse, porém, não de uma maneira significativa. Já o
índice de repetência escolar diminuiu significativamente, visto que
muitos sistemas de ensino (estaduais e municipais) a eliminaram com
a implantação dos ciclos escolares.
O número de matrículas no Ensino Fundamental supera em
torno de 20% o número de crianças brasileiras de 7 a 14 anos, o que
significa que há muitas crianças matriculadas no Ensino Fundamental
com idade acima de 14 anos. A expressiva presença desses jovens no
Ensino Fundamental demanda a criação de condições próprias para a
aprendizagem dessa faixa etária, especialmente no que se refere aos

4 Cf. www.mec.gov.br , acesso em 10/08/2006.


36 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

recursos didáticos e pedagógicos. Dessa forma, temos uma situação


de inchaço nas matrículas do Ensino Fundamental, que decorre basi-
camente da distorção idade-série, a qual, por sua vez, é conseqüência
dos ainda elevados índices de reprovação. No que se refere ao finan-
ciamento da educação, não há como negar que a situação de distorção
idade-série provoca custos adicionais significativos aos sistemas de
ensino. No longo prazo, a regularização do fluxo escolar – se pedago-
gicamente bem feita –, poderá significar uma diminuição dos índices
de analfabetismo e um aumento do nível de escolaridade média da
população brasileira.
A formulação coletiva dos projetos pedagógicos se constitui
em outra questão importante. Entendemos que essa elaboração cole-
tiva evita a homogeneização dos mesmos. As diferenças podem – e
devem – existir quanto a uma maior ou menor observância das Dire-
trizes Curriculares e dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o
Ensino Fundamental. Tais diferenças, quando existem, na maioria das
vezes, são fruto de uma maior participação da comunidade escolar e
local na elaboração do projeto pedagógico. O devemos combater é a
existência de projetos pedagógicos meramente burocráticos.
A questão das escolas e das classes isoladas unidocentes é
uma outra importante questão do Ensino Fundamental brasileiro que
precisa ser debatida. Sabemos que, em termos de Brasil, as escolas
unidocentes não se constituem, atualmente, em maioria. Porém,
entendemos que essa minoria precisa ser transformada em escolas
que possuam docentes especialistas nas séries iniciais do Ensino Fun-
damental, bem como docentes especialistas nas diversas disciplinas
(história, geografia, matemática, educação física, educação artística,
português, etc) que formam o currículo das séries finais do Ensino
Fundamental. Acreditamos que essa transformação aumenta o nível
de qualidade do ensino ministrado.
A escola rural, em sua maioria unidocentes, necessita de um
tratamento diferenciado, apesar de, atualmente, serem em número
significativamente menor do que em décadas passadas, em função,
especialmente, da urbanização acelerada, e conseqüente êxodo ru-
ral, que o país sofreu nos últimos 30 anos e do fato da atual LDB
permitir que as despesas com transporte escolar sejam incluídas nos
gastos para a manutenção e desenvolvimento do ensino. Assim, a
maioria dos Estados e municípios brasileiros utilizam grande parte
ENSINO FUNDAMENTAL | 37

das verbas destinadas à educação para a criação (ou ampliação) da


frota de veículos destinados ao transporte escolar, fazendo com que
as crianças do meio rural fossem transportadas para escolas urbanas.
A soma desses dois fatores – urbanização acelerada e facilidade de
transporte escolar –, resultou na redução significativa do número de
escolas rurais no Brasil, transformando a oferta dessa modalidade de
ensino (ensino rural) em residual. Mesmo assim, necessário se faz que
a oferta de Ensino Fundamental chegue a todos os recantos do país e,
especificamente no caso das escolas rurais remanescentes, que haja a
substituição das escolas unidocentes pelas escolas multidocentes.
Um fator levantado por Sérgio C. Leite, e que justifica uma
atenção especial à escola rural, é que nem “sempre a escola se esta-
belece como força entre os rurícolas, pois em se tratando de sobrevi-
vência material da família, o trabalho em si é muito mais forte que
a escolarização, o que leva muitas vezes a família rural em direção
oposta à escola”, o que se reflete diretamente nos índices de evasão e
repetência escolar (LEITE, 1999, p. 79).
Uma das propostas existentes é a de associar as classes iso-
ladas unidocentes remanescentes a escolas de, no mínimo, 4 séries
completas. Essa é uma medida mais fácil de obter sucesso – no curto
e médio prazos –, visto tratar-se de uma medida localizada, ou seja,
basta que se identifique onde estão localizadas as classes unidocentes
e as associem às escolas mais próximas geograficamente, como uma
incorporação. Essa medida também gera um custo financeiro, porém,
perto do benefício didático e pedagógico que as crianças dessas clas-
ses unidocentes terão ao se associarem a uma escola de, no mínimo, 4
séries, esse custo é irrisório, pois, assim como as escolas unidocentes,
as classes unidocentes também se constituem em minoria no universo
escolar do Ensino Fundamental brasileiro.
A jornada escolar no Ensino Fundamental deverá ser de, no
mínimo, 4 horas de trabalho efetivo em sala de aula, podendo, esse
período, ser progressivamente ampliado, aumentando o tempo de
permanência dos alunos na escola, podendo, até, se transformar, em
escola de tempo integral, a critério do respectivo sistema de ensino.
Essas regras, porém, não se aplicam ao ensino noturno, ou a formas
alternativas de organização escolar. Isso nos permite afirmar, mais
uma vez, que, na organização da educação brasileira, é permitida
a existência de uma significativa diferença na qualidade do Ensino
38 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Fundamental oferecido, em que, do ensino diurno são exigidas deter-


minadas condições de oferecimento, que não são exigidas do ensino
noturno, resultando num Ensino Fundamental com diferenças de
qualidade em função do período oferecido. Por sua vez, a proposição
de uma jornada escolar no Ensino Fundamental que não poderá ter
menos de 4 horas diárias é louvável, porque proíbe a criação de jor-
nadas escolares menores com, por exemplo, 3 horas de aula. Esta de-
terminação inibe a possibilidade de o Poder Público suprir a carência
de vagas no Ensino Fundamental com a criação de novas turnos com
duração inferior a 4 horas nas escolas já existentes. Esse expediente
perverso, já foi utilizado, por exemplo, nos anos iniciais da década de
90, no Estado de São Paulo (Cf. FREITAS, 2005a, p. 91-92).
Nessa questão, uma recente pesquisa do IBGE demonstrou
que apenas 38,5% das crianças matriculadas no Ensino Fundamental
público ficam mais de 4 horas/dia na escola, ao passo que 56,3% das
crianças matriculadas no Ensino Fundamental da rede privada, ficam
mais de 4 horas/dia na escola5. Por seu turno, a possibilidade de que
os sistemas de ensino transformem a jornada escolar de 4 horas em
jornadas de período integral, deve ser vista no sentido de se lutar,
constantemente, pelo aumento desse período de permanência na
escola. Na prática, porém, é uma determinação de difícil cobrança e
responsabilização, exatamente pela presença da idéia da progressivi-
dade, ao invés da idéia de obrigatoriedade.
A proposta de eliminação de mais de 2 turnos diurnos e de 1 tur-
no noturno nas escolas, sem que essa modificação signifique prejuízo
no atendimento da demanda existente, é de fundamental importância
para a qualidade da educação. Importante porque proíbe a criação de
jornadas escolares inferiores a 4 horas, inibindo o Poder Público de,
ao invés de criar vagas no Ensino Fundamental com a construção de
novas escolas, já que a população escolar cresce gradativamente, criar
um maior número de turnos escolares, com menos de 4 horas cada,
para suprir a falta de vagas públicas no Ensino Fundamental.
Além da questão da quantidade mínima de horas do turno esco-
lar, consideramos que outra importante questão diz respeito à relação

5 Cf. www.ibge.gov.br , acesso em 24/03/2006.


ENSINO FUNDAMENTAL | 39

adequada de número de alunos por sala, que a LDB não especificou


em seu Art. 25. Na média nacional, a escola pública possui uma re-
lação de 27,6 alunos por sala de aula nas séries iniciais do Ensino
Fundamental, ao passo que a média de alunos por sala nas escolas
privadas do Estado de São Paulo é de 19,6 alunos e da escola públi-
ca paulista é de 32,5 alunos por sala. Já nas séries finais do Ensino
Fundamental, a média nacional na escola pública é de 33 alunos por
sala, na escola privada paulista é de 25,1 alunos por sala e na escola
pública paulista é de 35,7 alunos por sala.
As redes escolares públicas urbanas de Ensino Fundamental
devem ser progressivamente transformadas em escolas de tempo
integral, porém, dadas as inúmeras dificuldades, especialmente or-
çamentárias, tememos que dificilmente essa medida fundamental de
qualquer política educacional que prime pela qualidade de ensino,
seja efetivada no curto ou médio prazo. O problema essencial é a
idéia de progressividade, o que nos obriga a dizer que quando a
maioria dos legisladores não concordam com determinada idéia, no
caso, Educação escolar em tempo integral, e, entretanto, não querem
dizer isso publicamente, para não se indisporem com uma parcela da
população (eleitores em potencial), a melhor maneira de resolver a
questão é colocar o termo “progressivamente” no texto legal. Dessa
maneira, podem afirmar que são a favor dessa idéia, mas que, não
havendo condições (estruturais, materiais, financeiras, etc) de aplicá-
la imediatamente, eles (os legisladores), criaram as condições legais
para que essa idéia venha a ser implementada “progressivamente”, ou
seja, amanhã ou daqui a 2, 20 ou 200 anos.
O provimento de no mínimo 2 refeições diárias para as crianças
de famílias de menor renda, apoio às tarefas escolares, apoio à prática
de esportes e de atividades artísticas, devem ser elementos constituin-
tes da jornada escolar de tempo integral. Porém, o problema é que as
escolas de tempo integral são, em números relativos, muito poucas,
assim aumentar o número de escolas de tempo integral acarretaria
um investimento duplo: na própria transformação da escola de tempo
parcial em escola de tempo integral; e no aumento dos gastos com
alimentação escolar e com apoio às tarefas escolares, à prática de
esportes e às atividades artísticas.
A ampliação da jornada escolar para turno integral traz, indis-
cutivelmente, bons resultados, visto que o atendimento em tempo
40 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

integral permite o acompanhamento e a orientação no cumprimento


das tarefas escolares, a prática de esportes, o desenvolvimento de
atividades artísticas, o atendimento médico-odontológico e a oferta
de alimentação adequada. Esse tipo de atendimento também significa
um avanço considerável no sentido de diminuir as desigualdades so-
ciais e ampliar democraticamente as oportunidades de aprendizagem.
Assim, na medida em que forem implantadas as escolas de tempo
integral, provavelmente ocorrerão mudanças significativas, tanto no
que se refere à expansão da rede física, quanto no que se refere ao seu
atendimento diferenciado.
Com relação à questão da carga horária semanal mínima de
20 horas de efetivo trabalho escolar para todos os cursos diurnos, é
extremamente difícil afirmar que essa proposta está sendo cumprida
em todas as cidades e Estados do Brasil. Sabemos que nos Estados
das regiões Sul e Sudeste o efetivo trabalho escolar já compreende
20 horas semanais. Porém, ainda temos notícias de muitas cidades e
escolas localizadas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste que
não conseguiram atingir essa carga horária mínima. Cabe, portanto, à
sociedade brasileira, em cada um dos municípios, fiscalizar para que
essa carga horária mínima venha a ser atingida. Mais horas-aulas tam-
bém significam maior investimento em educação, devendo também
ser este o objetivo dessa fiscalização.
A questão da avaliação escolar também se constitui em uma
questão de fundamental importância para o Ensino Fundamental. Atu-
almente, o que temos é a manutenção do SAEB, e, em alguns Estados,
a aplicação de formas semelhantes de avaliação, como por exemplo, o
SARESP (Sistema de Avaliação do Estado de São Paulo), por meio do
qual procura-se avaliar o desempenho escolar dos alunos.
Segundo Jane S. E. Ferreti, o Banco Mundial aconselha man-
ter centralizado, entre outros quesitos educacionais, a avaliação do
desempenho escolar. Assim, exames como SARESP, SAEB, ENEM,
etc, são exemplos concretos da orientação e influência das concepções
educacionais do Banco Mundial sobre a política educacional brasi-
leira, especialmente durante o governo FHC (Cf. FERRETI, 2004,
p. 118-119). O problema é o aproveitamento dos resultados dessas
avaliações, de forma que se assegure a elevação progressiva do nível
de desempenho dos alunos, coisa que não vem ocorrendo. Em 2004,
em Língua Portuguesa, cerca de 59% dos estudantes brasileiros de
ENSINO FUNDAMENTAL | 41

4ª série do Ensino Fundamental, estavam distribuídos entre os níveis


Muito Crítico e Crítico. Em Matemática, esse percentual foi de 52%.
Já os entre estudantes da 8ª série do Ensino Fundamental, apenas 10%
estavam, em Língua Portuguesa, no estágio considerado Adequado.
Em Matemática esse percentual foi de 3%6.

Questões para Debate em Sala de Aula

Entre os anos de 2000 e 2003, o percentual de escolas com


jornada de trabalho semanais de, no mínimo, 20 horas cresceu apenas
3%, de 44% para 47% em todo o Brasil. Na sua opinião, quais medi-
das seriam necessárias para que aumente mais rapidamente o número
de escolas que oferecem o Ensino Fundamental com jornadas diárias
de, no mínimo, 4 horas de efetivo trabalho escolar?

2.3. Financiamento e gestão

O financiamento do Ensino Fundamental também é outra


importante questão que precisa ser analisada. Sobre isso, a principal
norma legal em vigor, desde o início de 2007 é a Lei nº 11.494/07, que
criou e regulamentou o FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desen-
volvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da
Educação.
O FUNDEB parte do princípio da descentralização do ensino,
relacionando, de forma direta, oferta e atendimento com financiamen-
to. Basicamente, o FUNDEB é constituído por recursos advindos, em
diferentes percentuais, do Fundo de Participação dos Estados (FPE),
Fundo de Participação dos Municípios (FPM), Imposto sobre Circu-
lação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto sobre Produtos
Industrializados para a Exportação (IPI-Exp), Desoneração de Ex-
portações (Lei Complementar n° 87/96), Imposto sobre Transmissão
Causa Mortis e Doações (ITCMD), Imposto sobre Propriedade de

6 Cf. www.inep.gov.br/estatísticas , acesso em 10/08/2006.


42 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Veículos Automotores (IPVA) e Imposto Territorial Rural (ITR).


Os núcleos da proposta do FUNDEB são: o estabelecimento
de um valor mínimo por aluno a ser despendido anualmente; a redis-
tribuição dos recursos do fundo, segundo o número de matrículas e a
subvinculação de 60% de seu valor para o pagamento dos Profissionais
da Educação. Um significativo problema da aplicação do FUNDEB é
que, apesar de atender a todos os níveis de ensino da Educação Básica
e todas as modalidades de ensino vinculadas à Educação Básica (ao
contrário do FUNDEF que só atendia aos alunos matriculados no
Ensino Fundamental, excluindo todos os demais níveis e modalidades
de ensino), e apesar de seu montante de recursos a serem aplicados
superar em muito o antigo FUNDEF, o valor mínimo anual per capita
será menor, exatamente pelo fato de atender uma população escolar
significativamente maior.
A questão da gestão escolar no Ensino Fundamental pode ser
dividida em várias questões, a saber: a promoção da participação da
comunidade na escola; o estímulo para que os municípios realizem
censos educacionais que indiquem a quantidade e a localização das
crianças que estão fora da escola; e, por último, o apoio e incentivo às
organizações estudantis como espaços de participação e exercício da
cidadania, por parte do alunado.
A primeira questão trata da participação da comunidade na es-
cola, de forma que num futuro próximo, os conselhos escolares sejam
atuantes em todas as escolas de Ensino Fundamental. O aumento da
participação da comunidade na gestão das escolas deve ser um objeti-
vo a ser constantemente buscado de forma a universalizar essa prática.
Porém, é preciso ter claro que não basta instituir, por determinação do
diretor da escola, o conselho escolar, para que se tenha a participação
efetiva da comunidade. É preciso entender que a formação do conse-
lho escolar (ou órgão equivalente) é apenas o primeiro passo para a
participação efetiva da comunidade na vida escolar.
Sandra Z. Souza considera que os conselhos contribuem para
uma gestão democrática da educação, “possibilitando um controle
social sobre a formulação, implementação e implantação das políti-
cas públicas, em que se inserem as políticas educacionais” (SOUZA,
2004, p. 235-236). Já para Falcão Filho, para se efetivar uma gestão
democrática, mais do que normas legais, é necessário também que
os dirigentes escolares sejam dotados de “qualificações pessoais
ENSINO FUNDAMENTAL | 43

validadas por componentes políticos, morais e éticos” (FALCÃO


FILHO, 2001, p. 19). A participação da comunidade na gestão das
escolas públicas, por meio da participação efetiva de pais, alunos,
professores e funcionários nos conselhos escolares, indica uma gestão
democrática da mesma. Nereide Saviani ressalta que não se pode con-
fundir participação da comunidade na gestão da escola pública com
transferência da responsabilidade sobre a educação do Estado para a
família ou a comunidade, por meio de serviços voluntários, parcerias,
etc (como, por exemplo, projetos como Amigos da Escola e afins)
(Cf. SAVIANI, 2004, p. 232-233).
A proposta de que os municípios sejam estimulados a realizar
um censo escolar próprio, para identificar e localizar a demanda por
Ensino Fundamental, ainda não matriculada nesse nível de ensino,
com o objetivo de universalizar o acesso ao Ensino Fundamental,
possui, pelo menos, um problema. O problema de propostas como
essa não está na sua intenção, mas na sua operacionalização, ou seja,
saber quem financia esse tipo de mapeamento proposto, visto que os
municípios brasileiros, em sua imensa maioria, possuem recursos
escassos para aplicar na Educação, especificamente no ensino, quanto
mais para utilizar tais recursos em censos municipais, principalmente
tendo em vista que os governos federal e estaduais já realizam censos
educacionais. A intenção desta proposta é excelente, mas, na prática,
somente os maiores municípios (que possuem orçamentos maiores),
conseguem realizá-la. Por outro lado, acreditamos que o aperfeiçoa-
mento e a consolidação dos censos escolares já existentes e a criação,
na medida do possível, de censos estaduais e municipais, que, por
um lado, permitam um acompanhamento permanente da situação
do Ensino Fundamental brasileiro, e que, por outro lado, permitam
dimensionar as necessidades futuras do Ensino Médio e Superior no
país, serão de grande valia para a universalização do atendimento e da
melhoria da qualidade do Ensino Fundamental público brasileiro.
Por último, a questão do apoio às organizações estudantis como
espaços de participação e exercício da cidadania, depende, para ser
efetivamente resolvida, em grande medida dos gestores e adminis-
tradores escolares, tanto nas escolas públicas de Ensino Fundamental
quanto nas escolas privadas. Quando os diretores valorizam o papel
das organizações estudantis como espaço de participação e exercício
da cidadania, tais organizações florescem quase naturalmente. Porém,
44 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

quando os responsáveis pela condução administrativa e pedagógica


das escolas de Ensino Fundamental não enxergam nas organizações
estudantis a função de ajudar na formação integral do aluno, como
locus privilegiado da participação ativa e do exercício da cidadania,
dificilmente ocorre a criação e manutenção dessas organizações es-
tudantis.

Questões para Debate em Sala de Aula

Quais seriam as melhores e mais efetivas formas de partici-


pação da comunidade na gestão das escolas públicas, de forma que
possamos chamar tais gestões de democráticas?

2.4. Sugestões de Leituras Complementares

CURY, C. R. J. Ensino religioso na escola pública: o retorno de uma


polêmica recorrente. Revista Brasileira de Educação - Associação
Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação / Autores
Associados, Rio de Janeiro / Campinas, n. 27, p. 183-191, set./out./
nov./dez. 2004.

GOMES, C. A. Quinze anos de ciclos no ensino fundamental: um


balanço das pesquisas sobre a sua implantação. Revista Brasileira de
Educação - Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em
Educação / Autores Associados, Rio de Janeiro / Campinas, n. 25, p.
39-52, jan./fev./mar./abr. 2004.

PARO, V. H. Políticas educacionais: considerações sobre o discurso


genérico e a abstração da realidade. In: DOURADO, L. F.; PARO, V.
H. (Orgs.). Políticas públicas & educação básica. São Paulo: Xamã,
2001, p. 29-47.
CAPÍTULO 3

ENSINO MÉDIO

O grande desafio que se apresenta para o Ensino Médio bra-


sileiro nos próximos anos é a questão da sua expansão, de forma
que chegue à universalização do seu acesso. A progressiva extensão
da obrigatoriedade do Ensino Médio está prevista tanto no Art. 208
(inciso II) da Constituição, quanto no Art. 4 (inciso II) da LDB. Se
considerarmos que o Ensino Médio pode se constituir em um impor-
tante fator de qualificação profissional, de valorização da cidadania e
de preparação para os estudos de nível superior, enfrentar esse desafio
torna-se mais imperioso ainda. Para se ter uma idéia do tamanho deste
desafio, em 2004, aproximadamente 20% dos jovens brasileiros na
faixa etária de 15 a 25 anos não estavam trabalhando nem estudan-
do1. Em 2006, 37% dos jovens dessa mesma faixa etária não haviam
sequer concluído o Ensino Fundamental2
Segundo Ramon de Oliveira, na década passada, para o em-
presariado industrial brasileiro, “a melhoria da Educação Básica
não pressupunha a universalização do Ensino Médio. Advogando a
melhoria da qualidade da educação, ele vinculou-se diretamente à
qualificação da força de trabalho, reafirmando mais uma vez a subor-
dinação da escola aos interesses imediatos de conversão industrial.”
(OLIVEIRA, 2005, p. 92-93).
O Ensino Médio é, no contexto da organização da educação
brasileira, a etapa final da Educação Básica. Essa etapa deve ter a
duração mínima de 3 anos, e deve ter a finalidade de consolidar e
aprofundar os conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental,
possibilitando o prosseguimento de estudos. Dessa maneira, Acácia
Kuenzer considera que o Ensino Médio possui uma dupla função:
“preparar para a continuidade de estudos e ao mesmo tempo para o

1 Cf. www.ibge.gov.br/pnad2004 , acesso em 21/02/2006.

2 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 13/11/06.


46 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

mundo do trabalho, uma vez que esta não é uma questão apenas peda-
gógica, mas política, determinada pelas mudanças nas bases materiais
de produção, a partir do que se define a cada época, uma relação
peculiar entre trabalho e educação.” (KUENZER, 1997, p. 10).
Durante o governo FHC (1995-2002), o Ensino Médio foi
alvo de uma reforma estrutural e curricular, por meio do Decreto
2.208/97. Esse decreto estabeleceu a separação compulsória entre o
Ensino Médio e a Educação Profissional. Logo em seguida, o Con-
selho Nacional de Educação (CNE) normatizou o referido decreto,
mediante a publicação das Diretrizes Curriculares Nacionais para o
Ensino Médio e para a Educação Profissional (Pareceres CEB/CNE
15 e 16/98, respectivamente).
A possibilidade de reintegração entre o Ensino Médio e o Ensi-
no Profissional foi instituída pelo Decreto nº 5.154/04, já no governo
Lula, porém essa reintegração não é obrigatória. Ciavatta considera
que a edição do Decreto 5.154/04, “trouxe a abertura e o estímulo à
formação integrada, mas não trouxe a garantia de sua implementa-
ção.” (CIAVATTA, 2005, p. 102). Já na opinião de Marise N. Ramos,
as recentes regulamentações do novo decreto (Dec. 5.154/04), “não
incorporam os pressupostos da integração” entre Ensino Médio e
Educação Profissional (RAMOS, 2005, p. 125).
Para Frigotto, Ciavatta e Ramos, a edição do Decreto 5.154/04,
“pretende reinstaurar um novo ponto de partida”, de forma que “o
horizonte do ensino médio seja a consolidação da formação básica
unitária e politécnica, centrada no trabalho, na ciência e na cultura,
numa relação mediata com a formação profissional específica que se
consolida em outros níveis e modalidades de ensino.” Um dos obje-
tivos deste novo decreto “é a consolidação da base unitária do ensino
médio, que comporte a diversidade própria da realidade brasileira,
inclusive possibilitando a ampliação de seus objetivos, como a forma-
ção específica para o exercício de profissões técnicas.” (FRIGOTTO;
CIAVATTA; RAMOS, 2005a, p. 29, 37, 43-44).
O aspecto estrutural mais evidente dessa reforma foi a se-
paração obrigatória do Ensino Médio de caráter propedêutico do
Ensino Médio de caráter profissionalizante. No âmbito curricular, a
modificação mais significativa foi a introdução da idéia do desenvol-
vimento das competências como objetivo central das novas diretrizes
curriculares do Ensino Médio. No entendimento de Frigotto, para
ENSINO MÉDIO | 47

voltarmos a ter um Ensino Médio entendido como parte fundamental


da Educação Básica e articulado com o mundo do trabalho, da ciência
e da cultura, precisamos, inicialmente, desconstruir no “imaginário
das classes populares, o entulho ideológico imposto pelas classes
dominantes da teoria do capital, da pedagogia das competências, da
empregabilidade, do empreendedorismo e da idéia que cursinhos
curtos profissionalizantes, sem uma educação básica de qualidade,
os introduzem rápido ao emprego.” (FRIGOTTO, 2005, p. 77). Já
para Zibas, além do “modelo de competências”, outra característica
fundamental da reforma do Ensino Médio empreendida pelo governo
FHC, foi a valorização excessiva dos “métodos ativos”. O cuidado
que se deve tomar, segundo Zibas, “é o de que a atividade e a expe-
riência não sejam transformadas em simples ‘ativismo’ e sobrepostas
aos conteúdos.” (ZIBAS, 2005a, p. 34, aspas no original).
Além de preparar para o trabalho, para o exercício pleno da
cidadania e para a continuação dos estudos, o Ensino Médio tam-
bém tem por finalidade de criar as condições para que o educando
compreenda os fundamentos científico-tecnológicos dos processos
produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada
disciplina. Nesse sentido, Frigotto considera que o
ensino médio, concebido como educação básica e arti-
culado ao mundo do trabalho, da cultura e da ciência,
constitui-se em direito social e subjetivo e, portanto,
vinculado a todas as esferas e dimensões da vida. Trata-
se de uma base para o entendimento crítico de como
funciona e se constitui a sociedade humana em suas
relações sociais e como funciona o mundo da natureza,
da qual fazemos parte. Dominar no mais elevado nível
de conhecimento estes dois âmbitos é condição prévia
para construir sujeitos emancipados, criativos e leitores
críticos da realidade onde vivem e com condições de
agir sobre ela. Este domínio também é condição prévia
para compreender e poder atuar com as novas bases
técnico-científicas do processo produtivo. (2005, p.
76)

Analisando as finalidades do Ensino Médio, notamos que as


mesmas indicam três idéias básicas: formação do cidadão, prepara-
48 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

ção para o trabalho e preparação para a continuação dos estudos. As


primeiras duas idéias reforçam nossa afirmativa de que as mesmas se
constituem nas idéias basilares da concepção de Educação presente na
atual organização do ensino brasileiro, quer seja, o binômio exercício
da cidadania/preparação para o trabalho. A terceira idéia (preparação
para a possibilidade de continuação dos estudos) se constitui em uma
finalidade específica desse nível de ensino, o Ensino Médio.
A organização do Ensino Médio segue as mesmas orientações
da Educação Básica, entre as quais se destacam a possibilidade de sua
organização em ciclos ou séries, a obrigatoriedade de que o Ensino
Médio tenha uma carga horária mínima de 800 (oitocentas) horas e
200 (duzentos) dias letivos, a busca constante de um número adequa-
do de alunos por sala, diretrizes básicas dos conteúdos curriculares do
Ensino Médio e condições de oferta de Educação Rural, também no
nível do Ensino Médio (Cf. BRANDÃO, 2004, p. 62).
As diretrizes do Ensino Médio devem destacar a educação tec-
nológica básica; a compreensão do significado da ciência, das letras
e das artes; o processo histórico de transformação da sociedade e da
cultura; a língua portuguesa como instrumento de comunicação; o
acesso ao conhecimento e o exercício da cidadania. Segundo Ferretti,
tanto as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (DC-
NEM) quanto as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Profissional de Nível Médio (DCNEPNT), são resultantes da pro-
posta da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina), cujo
“elemento central a ser perseguido é a difusão do progresso técnico,
o que sugere que toda a proposição é fortemente marcada pelo de-
terminismo tecnológico” e pela “preocupação com a introdução das
novas tecnologias de produção, de organização e gestão do trabalho”
(FERRETI, 2003, p. 323-324).
Também se constitui em diretriz do Ensino Médio, a adoção
de metodologias de ensino e de avaliação que estimulem a iniciativa
dos estudantes. Atualmente, estão em discussão novos Parâmetros
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, porém, para Frigotto,
Ciavatta e Ramos, a
manutenção da validade das Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio e para a Educação Pro-
fissional, após a edição do novo decreto [5.154/04], dá
continuidade à política curricular do governo anterior
ENSINO MÉDIO | 49

[FHC], marcada pela ênfase no individualismo e na


formação por competências voltadas para a emprega-
bilidade. Reforça-se, ainda, o viés adequacionista da
educação aos princípios neoliberais. (...) Sob as Dire-
trizes Curriculares Nacionais vigentes e um parecer
[nº 39/2004 - CEB/CNE] que sedimenta a separação,
as perspectivas de mudanças substanciais de ordem
conceptual, ética, política e pedagógica, que poderiam
ser impulsionadas pelo governo [Lula], ficam cada vez
mais afastadas. (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS,
2005b, p. 1095-1096)

Os conteúdos, as metodologias e as formas de avaliação a serem


utilizados no Ensino Médio deverão ser organizadas de tal forma que,
ao final desse nível de ensino, o aluno demonstre o pleno domínio
dos princípios científicos e tecnológicos que integram a produção
moderna, o conhecimento das formas contemporâneas de linguagem
e o pleno domínio dos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia
necessários ao exercício da cidadania, mesmo que esses conteúdos
não estejam organizados na forma de disciplinas.
O Ensino Médio, atendida a formação geral do educando,
poderá prepará-lo para o exercício de profissões técnicas. Os cursos
profissionalizantes de Ensino Médio, por sua vez, terão equivalência
legal e habilitarão ao prosseguimento dos estudos. A preparação geral
para o trabalho e, facultativamente, a habilitação profissional, podem
ser desenvolvidas nos próprios estabelecimentos de Ensino Médio,
ou em cooperação com instituições especializadas em Educação Pro-
fissional. Essa cooperação permite a celebração de convênios entre
escolas que possuem estruturas (pedagógicas e materiais) mais dire-
cionadas para a formação básica e geral do aluno do Ensino Médio,
com escolas que possuem, historicamente, estruturas direcionadas
para a Educação Profissional (por exemplo, as escolas do SENAI -
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial).
Para o Ensino Médio, o Relatório para a UNESCO da Co-
missão Internacional sobre Educação para o Século XXI propôs
que esse nível de ensino teria os objetivos de revelar e aprimorar
talentos, preparar técnicos e trabalhadores para o mercado de tra-
balho e adaptá-los, se necessário for às rápidas transformações que
esse mesmo mercado de trabalho está sofrendo como resultado da
50 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

globalização e mundialização da economia. Assim, o Ensino Médio


proposto seria mais flexível, tanto em seu tempo de duração como
em sua organização, alternando períodos de formação com períodos
de trabalho (Cf. DELORS, 2001, p. 134-139). Para Shiroma, Moraes
e Evangelista, tais proposições revelam uma concepção de educação
média “claramente elitista” (SHIROMA; MORAES; EVANGELIS-
TA, 2000, p. 67-68).
No Brasil, o acesso ao Ensino Médio possui taxas menores
do que na maioria dos demais países latino-americanos. Todavia,
por outro lado, as estatísticas demonstram que o número de alunos
que terminam com sucesso o Ensino Fundamental, e, portanto, em
condições formais de iniciarem o Ensino Médio, aumenta ano após
ano. Ainda assim, “apenas ao redor de 45% dos jovens brasileiros
concluem o ensino médio e, destes, aproximadamente 60% o fazem
em situação precária – noturno e/ou supletivo. Desagregados por re-
gião e pela classificação urbana e rural, estes dados assumem outras
dimensões da desigualdade.” (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS,
2005a, p. 7).
Segundo o IBGE, em 1997, para uma população na faixa etária
de 15 a 19 anos de pouco mais de 16,5 milhões, havia quase 6 milhões
de estudantes matriculados no Ensino Médio, ou seja, aproximada-
mente um terço da população dessa faixa etária atingia este nível de
ensino. Transcorridos cinco anos, em 2002, dos quase 28 milhões
de alunos que concluíram o Ensino Fundamental (crescimento de
aproximadamente 70% em relação a 1997), apenas pouco mais de 9
milhões se matricularam no Ensino Médio, no ano seguinte, ou seja,
continuamos tendo, aproximadamente, apenas um terço dos con-
cluintes do Ensino Fundamental efetuando suas matrículas no Ensino
Médio, o que é pouco, especialmente dada a acelerada elevação do
grau de escolaridade exigido pelo mercado de trabalho3.
Essa situação se torna mais grave por sabermos que, em virtu-
de das elevadas taxas de repetência no Ensino Fundamental, muitos
jovens chegam ao Ensino Médio mais velhos, e um grande número de
adultos volta à escola vários anos depois de concluir o Ensino Funda-

3 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 02/08/2006.


ENSINO MÉDIO | 51

mental. Assim, o Ensino Médio atende, em grande medida, a jovens


e adultos com idade acima da prevista (idealmente) para este nível de
ensino. Por sua vez, a exclusão do Ensino Médio deve-se, também,
às baixas taxas de conclusão do Ensino Fundamental (57% em 2003),
que, por sua vez, está associada à baixa qualidade daquele nível de
ensino, materializada nos elevados índices de repetência e evasão. O
Censo Escolar 2006 mostra que o índice de evasão no Ensino Médio
é de 15,3% e a taxa de repetência é de 11,5%. Estes são os maiores
índices de evasão e repetência constatados desde 1996.
Por outro lado, o Ensino Médio foi o nível de ensino que apre-
sentou maior taxa de crescimento nos últimos anos, passando, em
pouco mais de uma década, de quase 3,8 milhões de alunos matricula-
dos em 1991, para quase 7 milhões de alunos matriculados em 1998, e
para pouco mais de 9 milhões de alunos matriculados em 2003, o que,
em termos absolutos, significa uma ampliação do acesso a este nível.
Porém, o número de matrículas cresceu apenas 1% entre os anos de
2003 e 2004, ao passo que na Educação de Jovens e Adultos (EJA),
exclusivamente no nível do Ensino Médio, o número de matrículas
no setor público cresceu, no mesmo período, 26%, o que significa
uma migração acentuada dos jovens estudantes para a modalidade de
formação mais rápida, embora nem sempre de melhor qualidade.
Porém, para que a ampliação do acesso ao Ensino Médio se
traduza na efetiva universalização do atendimento desse nível de
ensino, visto que atingimos apenas 81,9% do total dos jovens que po-
deriam estar no Ensino Médio, será preciso que o aporte de recursos
orçamentários previstos pelo FUNDEB para os próximos 14 anos (R$
55,2 bilhões em 2009 para todos os níveis e modalidades de ensino
da Educação Básica, divididos proporcionalmente em relação ao
número de matrículas/ano de cada nível e/ou modalidade de ensino)
se efetive.

3.1. Oferta e atendimento

A universalização do Ensino Médio, que deve receber um con-


siderável estímulo com a implantação do FUNDEB, torna-se, cada dia
mais, um objetivo a ser urgentemente alcançado, visto que esse nível
52 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

de ensino vem crescendo extraordinariamente nos últimos anos, em


função, especialmente, de fatores como, o aumento da cobertura do
Ensino Fundamental, a regularização do fluxo escolar e as exigências
do mundo do trabalho por melhor qualificação da mão-de-obra (Cf.
OLIVEIRA, 2004, p. 121), apesar do número de matrículas no Ensino
Médio ter diminuído 1,4% entre os anos de 2005 e 20064.
Uma outra importante questão diz respeito à relação adequa-
da de número de alunos por sala no Ensino Médio, que a LDB não
especificou em seu Art. 25. Nesse nível de ensino, a média nacional
demonstra que, a escola pública possui uma relação de 37,8 alunos
por sala de aula, ao passo que a média de alunos por sala nas escolas
privadas paulistas é de 28,8 alunos e da escola pública paulista é de
38,6 alunos por sala.
Por último, na questão da oferta e do atendimento do Ensino
Médio, a questão da ampliação da oferta de vagas – nos períodos
diurno e noturno – se constitui, atualmente, em um dos grandes desa-
fios da educação brasileira. O problema de fundo é o financiamento
do Ensino Médio, ou seja, a possibilidade efetiva dessa ampliação
está diretamente relacionada à implantação do FUNDEB.

Questão para Debate em Sala de Aula

Na sua opinião, quais seriam as medidas necessárias para que


conseguíssemos alcançar a universalização do Ensino Médio?

3.2. Formação do profissional

No que se refere à formação profissional mais adequada para a


atuação no Ensino Médio, duas questões mais prementes se colocam:
que todos os professores de Ensino Médio tenham qualificação de
nível superior e que se seja estabelecido um programa emergencial
para formação de professores, especialmente nas áreas das Ciências

4 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 10/02/07.


ENSINO MÉDIO | 53

e da Matemática.
Uma das prováveis causas apontadas por especialistas para o
aumento do percentual de reprovação dos alunos do Ensino Médio
é a formação deficiente dos professores desse nível de ensino. Até
o início de 2005, 16% dos professores que atuavam nesse nível de
ensino ainda não possuíam habilitação específica de nível médio. Ba-
seada em pesquisas realizadas com docentes do Ensino Médio, entre
os anos de 2001 e 2004, Zibas afirma que
a capacitação docente em serviço – mesmo naqueles
Estados que fizeram grande investimento nessa área
– não estava tendo os desdobramentos desejados. A
crítica dos docentes recaía sobre a fragmentação dos
cursos e sobre a impossibilidade de comunicação entre
os professores que deveriam ser os multiplicadores e
seus pares. A rotina de trabalho, na maioria das escolas,
continuava baseada na atuação individual, isolada, dos
docentes. (ZIBAS, 2005b, p. 1075)

Já com relação ao estabelecimento de um programa emer-


gencial para formação de professores, especialmente nas áreas das
Ciências e da Matemática, temos que, em debate realizado em 2004,
Antonio I. Ruiz, então Secretário de Educação Média e Tecnológica
do MEC, informou que já estava em andamento o programa Pro-Ifem
(Programa de Incentivo à Formação Continuada de Professores de
Ensino Médio), “prioritariamente para as ciências” (RUIZ, 2004, p.
79). Porém, em consulta ao Portal do MEC, não encontramos esse
programa, mas apenas o programa Pró-Licenciatura (Programa de
Formação Inicial para Professores do Ensino Fundamental e Médio),
na modalidade de Eduação a Distância (EAD), e uma referência a um
Plano de Educação para a Ciência, porém sem maiores detalhamentos
ou informações5.
Se considerarmos os resultados do SAEB e do teste internacio-
nal PISA em matemática e ciências, em que os alunos do Ensino Mé-
dio brasileiro tiveram seu desempenho piorado entre os anos de 2000
e 2003, em leitura, matemática e ciências, veremos que o desempenho

5 Cf. www.mec.gov.br , acesso em 08/02/2006.


54 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

dos alunos brasileiros de Ensino Médio nessas disciplinas são proble-


máticos. Em 2003, em Língua Portuguesa, 43% dos alunos da 3ª série
do Ensino Médio estavam nos níveis Muito Crítico e Crítico, e apenas
5% estavam no nível denominado Adequado. Na média nacional, no
período compreendido entre os anos 1995-2001, o “desempenho em
Língua Portuguesa apresentou quedas constantes, caindo 10% em
todo o período”. Para piorar, as regiões mais pobres do Brasil (Norte
e Nordeste) caíram, em 2001, para o nível Crítico, e, de todos os Esta-
dos brasileiros, nenhum apresentou média de desempenho Adequado.
A maioria dos Estados (17) encontrava-se no estágio Intermediário, e
os Estados restantes estavam no nível Crítico6.
Diante desses dados, continua sendo necessária – e urgen-
te – a implantação de um programa emergencial para formação de
professores, especialmente nas áreas de Ciências e Matemática, não
só visando o aumento do número de professores dessas disciplinas
(formação inicial), mas também visando o aperfeiçoamento desses
profissionais (formação continuada). Para se ter uma idéia da im-
portância desta questão, o INEP, em 2003, estimava que, no ano de
2002, a demanda de funções docentes em Matemática havia sido de
106.634 professores, ao passo que, entre os anos de 1990 e 2001,
haviam sido licenciados apenas 55.334 professores desta disciplina
em todo o país7.

Questão para Debate em Sala de Aula

Sabendo que ainda existem 16% do total de professores que


atuam no Ensino Médio sem habilitação específica de nível médio,
que sugestões você teria para resolver esse problema?

3.3. Questões pedagógicas

Dedicamos esse item à análise das questões que, no nosso

6 Cf. INEP, 2004, p. 7-8.

7 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 16/10/2006.


ENSINO MÉDIO | 55

entendimento, tratam de aspectos prioritariamente pedagógicas, refe-


rentes ao Ensino Médio. Neste enfoque encaixam-se quatro questões:
uma nova concepção curricular para o Ensino Médio; a melhora do
desempenho dos alunos do Ensino Médio nos exames nacionais de
avaliação (SAEB, ENEM, etc); a questão da repetência e da evasão
no Ensino Médio; e, por último, a revisão da organização didático-
pedagógica (e administrativa) do Ensino Médio ministrado no período
noturno.
Uma nova estruturação curricular para o Ensino Médio já foi
implantada na maioria das escolas públicas brasileiras de Ensino
Médio, a partir das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Médio (DCNEM), elaboradas pelo MEC no governo FHC. Segundo
Zibas, os “professores têm pouca informação sobre essa reforma, re-
lacionando-a, em um primeiro momento, apenas ao material recebido,
às mudanças nas grades curriculares e aos processos de avaliação” e
os 25% do total da grade curricular para o oferecimento de disciplinas
do interesse da comunidade em que a escola se insere, “tem servido, na
verdade, para atender interesses docentes.”. Na opinião desta autora,
as DCNEM possuem o objetivo implícito de “diuturnizar” esse nível
de ensino, fazendo com que muitos em Estados brasileiros houvesse
um “incentivo para que os alunos mais velhos optassem por cursos
supletivos” (ZIBAS, 2005b, p. 1074-1076).
Já Celso Carvalho considera que os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN) elaborados no governo FHC – e de onde também
derivam as DCNEM –, transmitem “concepções de um indivíduo na-
turalizado, de uma sociedade sem história e sem contradições”. Tais
concepções “depararam-se com a dura realidade das escolas públicas.
Nelas, professores e alunos, sujeitos históricos e concretos, viviam o
embate cotidiano posto pela necessidade de reprodução de sua condi-
ção em uma sociedade historicamente contraditória.” (CARVALHO,
2005, p. 25, 29-31).
A questão da melhora do desempenho dos alunos do Ensino
Médio nos exames nacionais de avaliação (SAEB, ENEM, etc), é pro-
blemática. Na opinião de Oliveira, esse problema não pode ser tratado
sob a ótica da responsabilização individual (do aluno), mas sim como
responsabilidade da política pública de educação implementada pelo
Estado, pois, do contrário, “dificulta-se a possibilidade de elevação
dos patamares de desempenho escolar dos alunos oriundos da classe
56 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

trabalhadora.” (OLIVEIRA, 2003, p. 22).


Dados do SAEB indicam que o desempenho em matemática
dos alunos da 3ª série do Ensino Médio piorou entre os anos de 2001 e
2003. A taxa de alunos que não conseguem interpretar o enunciado de
uma questão para chegar ao resultado matemático passou de 67,4%
em 2001 para 68,8% em 2003. Some-se a esses dados o desempenho
pífio de alunos brasileiros de Ensino Médio no teste internacional
PISA. Em 2000, esse teste foi aplicado pela primeira vez e teve seu
enfoque na leitura. Os alunos brasileiros ficaram entre os últimos
colocados entre alunos de Ensino Médio de 32 países. Já em 2003,
o mesmo teste teve seu enfoque direcionado para o desempenho em
matemática e ciências e, na média geral, os alunos brasileiros ficaram
em último lugar, entre 40 países, ficando atrás, inclusive, de alunos do
Ensino Médio de países como Indonésia, Tunísia e Tailândia8. Para
Zibas, a “introdução de avaliações do sistema, por meio de exames
como o ENEM e o SAEB, ou a participação de alunos brasileiros em
testes internacionais, como o PISA, acaba trazendo indicações quanto
à fragilidade do processo escolar e ao caráter inócuo da reforma” do
Ensino Médio implementada pelo governo FHC (ZIBAS, 2005b, p.
1077).
Na questão da redução das taxas de evasão e repetência no
Ensino Médio, de forma que, no médio prazo, o tempo médio de
conclusão desse nível de ensino seja consideravelmente diminuí-
do, ainda temos muito o que fazer, visto que os dados disponíveis
mostram que, por um lado, que a taxa de evasão do Ensino Médio
se manteve praticamente estável, em torno de 12,5% (na verdade,
cresceu de 12,32% para 12,5%), entre os anos de 2002 e 2003 – o que
significou o abandono do Ensino Médio por 1,1 milhão de estudantes
em 2003 –, enquanto, por outro lado, nesse mesmo período, a taxa de
repetência no Ensino Médio aumentou quase 11%, subindo de 7,44%
para 8,23%, configurando um total absoluto de 747 mil alunos de En-
sino Médio reprovados em 2003. Por outro lado, os dados do Censo
Escolar 2005 indicam que na rede pública de Ensino Médio, 49% dos
alunos permanecem mais de quatro horas diárias na escola, ao passo

8 A classificação completa desse teste (PISA – 2000 – habilidade de leitura de alunos com 15 anos) pode ser
encontrada em Oliveira; Araujo (2005, p. 15).
ENSINO MÉDIO | 57

que na rede privada esse percentual sobe para 71,9%.


Sobre essas questões, Oliveira afirma que a
situação do sistema educacional, na qual saltam aos
olhos as altas taxas de reprovação e evasão escolar,
é explicada pelos neoliberais como decorrentes da
incompetência por parte do poder público de gerenciar
a educação. Não será nunca redundante relembrar que
a deficiência por parte do poder público em investir
em áreas sociais é conseqüência direta da captura do
Estado por parte dos setores empresariais, os quais,
em nenhum momento, deixaram de se aproveitar das
benesses políticas e econômicas promovidas pelo setor
público, que historicamente serviu como ponto de
apoio, principalmente para viabilizar a acumulação do
capital. (OLIVEIRA, 2003, p. 20)

Na questão da revisão da organização didática, pedagógica


e administrativa do Ensino Médio ministrado no período noturno,
para adequá-lo às necessidades do aluno trabalhador, infelizmente
são escassos os avanços alcançados e o Ensino Médio oferecido no
período noturno para esses alunos trabalhadores continua sendo –
historicamente na educação brasileira – de uma qualidade inferior
ao oferecido no período diurno, com diferenças materializadas desde
a menor quantidade de horas/aula até a exclusão de determinados
conteúdos e disciplinas. Zibas entende que ainda há tempo para que o
governo Lula volte a valorizar o Ensino Médio público oferecido no
período noturno, no sentido de uma “discriminação positiva dirigida
ao ensino noturno”, respeitando suas peculiaridades e dentro do con-
texto da “construção de políticas democráticas para o ensino médio.”
(ZIBAS, 2005b, p. 1079, 1083-1084).

Questão para Debate em Sala de Aula

O MEC estabelece 375 pontos como índice razoável de quali-


ficação pedagógica que o aluno de Ensino Médio deveria alcançar no
SAEB, porém, em 2003, os estudantes desse nível de ensino atingiram
58 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

apenas a média de 278,7 pontos. Já no ENEM, ocorreu uma regressão


da média de 49,55 para 45,58, entre os anos de 2003 e 2004. Em
função desse quadro, em sua opinião, que medidas de curto, médio
e longo prazos, deveriam ser tomadas para melhorar a avaliação dos
alunos do Ensino Médio brasileiro?

3.4. Financiamento e gestão

No que se refere ao financiamento do Ensino Médio, de


forma que o mesmo seja ampliado até chegarmos à sua universali-
zação, são grandes as expectativas em relação à implantação efetiva
do FUNDEB, visto que o mesmo prevê, para os próximos 14 anos
(portanto, até 2020) um aporte de recursos – já em seu terceiro ano
de funcionamento (2009) – da ordem de R$ 55,2 bilhões, a serem
divididos proporcionalmente entre todos os níveis e modalidades de
ensino da Educação Básica, respeitado o número de matrículas/ano
de cada nível e/ou modalidade de ensino.
Já no que se refere à gestão no Ensino Médio, gostaríamos de
destacar três questões: a criação de mecanismos como conselhos esco-
lares ou equivalentes para incentivar a participação da comunidade na
gestão, manutenção e melhoria das condições de funcionamento das
escolas de Ensino Médio; a efetiva autonomia das escolas de Ensino
Médio, tanto no que diz respeito ao seu projeto pedagógico, quanto
em termos de gerência de recursos financeiros, para a manutenção
da escola; e, por último, o apoio e incentivo às organizações estu-
dantis, vistas, tanto pela direção escolar quanto pelos alunos, como
espaços de participação e exercício da cidadania. Entendemos que
esse conjunto de questões, que podem ser entendidas também como
objetivos, podem, se alcançados, conduzirem à gestão democrática
plena da escola pública.
Para Luzia P. Dias, apesar da gestão democrática da escola pú-
blica já estar “inscrita no processo de democratização da sociedade”,
a escola, porém, ainda está distante de possuir uma “cultura participa-
tiva”, ressentindo-se “da frágil organização do colegiado, associação
ou conselho escolar e da pouca participação dos professores, alunos
e seus pais nos espaços decisórios.” (DIAS, 2004, p. 103). Para se
ENSINO MÉDIO | 59

ter uma noção de quanto estamos distantes de uma verdadeira gestão


democrática da escola pública – no caso, de Ensino Médio –, Zibas
relata que a
reforma de gestão com incentivo para a participação
de pais e alunos agora como ‘clientes’, não conseguiu
penetrar nos tradicionais procedimentos intramuros.
Os estudantes e seus pais continuavam a participar de
maneira apenas formal nos órgãos deliberativos, sendo
chamados a contribuir mais efetivamente apenas no
âmbito operacional, como na organização de festas e
em mutirões para a limpeza da escola. No entanto, essa
tradicional participação ‘operacional’ foi alargada, em
alguns contextos, para o alardeado estatuto de ‘amigos
da escola’, os quais foram encontrados pelos pesquisa-
dores ministrando aulas de teatro, de educação física
e até de química. (ZIBAS, 2005b, p. 1076, aspas no
original)

O maior problema para a constituição efetiva de conselhos


participativos (conselho escola, Conselho Municipal de Educação,
Conselho Tutelar, Conselho de Alimentação Escolar etc.) – é a par-
ticipação efetiva da comunidade em contraposição à influência do
Poder Executivo, muitas vezes significativa e determinante. Tais
conselhos só têm razão de existirem se os mesmos se constituírem
em instâncias mais do que legais, em instâncias representativas dos
anseios das comunidades nas quais se inserem.
Para Estela Scheinvar e Eveline Algebaile, “apesar de esses
conselhos serem uma conquista do movimento social – que sempre
contou com a participação dos agentes da escola –, a maioria deles
ainda é um objeto desconhecido tanto dos professores quanto dos
demais segmentos presentes na escola, que têm a atribuição legal
de neles participar”. Essas autoras consideram que o “processo de
institucionalização dos conselhos vem ocorrendo com matizes da
maior diversidade. Coexistem formas democráticas, amplamente
participativas, com formas que preservam e atualizam a estrutura
autoritária tradicional na política social brasileira.” (SCHEINVAR;
ALGEBAILE, 2004, p. 13).
60 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Na questão da autonomia escolar, entendemos que não é possí-


vel a existência de uma escola autônoma sem que a mesma não seja
gerida democraticamente, em todas as suas dimensões, tanto no que
diz respeito ao seu projeto pedagógico, quanto em termos de gerência
de recursos financeiros para a manutenção da escola. Temos consci-
ência de que é extremamente difícil exigir que os governos estaduais
– que são os responsáveis pelo oferecimento do Ensino Médio –, pro-
porcionem a autonomia financeira e gerencial dos recursos mínimos
para a manutenção do cotidiano escolar, bem como a autonomia real
para a elaboração do projeto político-pedagógico da escola, de forma
que o mesmo seja, também, um reflexo da identidade de cada escola.
Porém, esse pode muito bem ser um objetivo a ser alcançado no longo
prazo.
Por último, acreditamos que uma boa gestão escolar deve apoiar
e incentivar as organizações estudantis, vistas, tanto pela direção es-
colar quanto pelos alunos, como espaços de participação e exercício
da cidadania, porém, essa situação só se configurará na medida em
que gestores, administradores escolares (diretores e coordenadores
pedagógicos) e professores das escolas públicas e privadas de Ensino
Médio, atuarem como incentivadores da participação ativa dos alunos
como forma de exercício da cidadania.

Questão para Debate em Sala de Aula

Entre os anos de 2003 e 2005, o índice de evasão no Ensino


Médio cresceu de aproximadamente 14% para 15,3% e o índice de
repetência subiu de aproximadamente 10% para 11,5%. Em termos
de financiamento e gestão, o que é possível fazer para reduzir esses
índices?

3.5. Sugestões de Leituras Complementares

DIAS, L. P. Por dentro da escola: a participação da sociedade civil no


Conselho Escolar. In: SCHEINVAR, E.;ALGEBAILE, E. (Orgs.). Conselhos
participativos e escola. Rio de Janeiro: DP & A, 2004, p. 89-107.
ENSINO MÉDIO | 61

MOTA, K. C. C. S. Os lugares da sociologia na formação de estudantes


do ensino médio: as perspectivas dos professores. Revista Brasileira
de Educação - Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em
Educação / Autores Associados, Rio de Janeiro / Campinas, n. 29, p.
88-107, maio/jun./jul./ago. 2005.

OLIVEIRA, O. V.; DESTRO, D. S. Política curricular como política


cultural: uma abordagem metodológica de pesquisa. Revista Brasileira
de Educação - Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em
Educação / Autores Associados, Rio de Janeiro / Campinas, n. 28, p.
140-150, jan./fev./mar./abr. 2005.

SCHEINVAR, E. Tensões, rupturas e produções na relação entre o


Conselho Tutelar e a escola. In: SCHEINVAR, E.; ALGEBAILE, E.
(Orgs.). Conselhos participativos e escola. Rio de Janeiro: DP & A,
2004, p. 135-166.
CAPÍTULO 4

EDUCAÇÃO SUPERIOR

No Brasil, tomando-se por referência o Censo Populacional de


2000, apenas uma elite de 6,8% da população com mais de 25 anos
possuía curso superior, que significava, naquele momento, aproxima-
damente, 5,8 milhões de pessoas. Ao se comparar esse número com o
total da população (169,7 milhões em 2000), esse percentual é reduzi-
do para 3,43%. Se por um lado não há como não reconhecer que este
índice é baixo, por outro lado, este índice é aproximadamente 24%
superior ao índice, de 2,77% do total da população brasileira com
curso superior concluído, detectado em 19911.
Ainda que baixo, esse crescimento pode ser apontado como uma
tendência de valorização da Educação Superior. Assim, é exatamente
na década de 1990, mais especificamente durante os dois mandatos do
governo FHC (1995-2002), que a Educação Superior brasileira sofreu
profundas modificações na sua normatização legal, especialmente por
meio da LDB que, podemos dizer, empreendeu uma reforma neste
nível de ensino, sem que assim fosse denominada por seus principais
agentes. Na opinião de Afrânio M. Catani e João F. Oliveira, a LDB,
sozinha, “não dá conta da totalidade dos mecanismos implementados
na atual reforma da educação superior”, mas, carregando
em seu bojo, seja pela omissão, seja pela flexibilidade
de sua interpretação, possibilidades múltiplas de con-
cretização dos parâmetros e dos princípios da reforma
iniciada pelo governo. A LDB trazia, explícita ou im-
plicitamente, uma nova forma de ação e de relaciona-
mento entre o Estado e IES, especialmente as públicas,
em que o Estado assume papel destacado no controle e
na gestão de políticas para o setor, sobretudo por meio
dos mecanismos de avaliação e de financiamento.

1 Cf. www.ibge.gov.br/estatisticas , acesso em 04/12/2005.


64 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Além disso, propunha uma nova maneira de conceber


a produção do trabalho acadêmico e o atendimento às
demandas da sociedade, tomando os sinais de mercado
como norte para o processo de reestruturação. (CATA-
NI; OLIVEIRA, 2003, p. 144, itálicos no original)

Um dos principais traços dessa reforma foi a disseminação e


o fortalecimento da tese de que a Educação Superior se constitui em
um “bem de serviço privado, muito mais que público”, e, em sendo
assim, as instituições públicas de ensino superior, principalmente,
“deveriam ser geridas sob os princípios da administração gerencial.”.
Ainda, tais princípios refletem a lógica do capital, a qual está “fun-
dada também na idéia de que os bens privados se produzem e re-
produzem ao impulso da competição ou competitividade, a impor-se
gradativa e celeremente nos domínios da educação e do saber, agora
muito mais valorizados que outrora como importante mercadoria ou
quase-mercadoria dos novos modos de acumulação.” (SILVA JR.;
SGUISSARDI, 2005, p. 16)2.
Para José D. Sobrinho, a Educação Superior, “por mais que se
transforme, não pode ser renuente a seu papel de formação intelec-
tual e moral, ao mesmo tempo que de desenvolvimento material das
sociedades, por meio das atividades públicas de construção e pro-
moção de conhecimentos e valores.” Assim, a Educação Superior “é
um patrimônio público na medida em que exerce funções de caráter
político e ético, muito mais que uma simples função instrumental de
capacitação técnica e treinamento de profissionais para as empresas.
A função pública é a sua responsabilidade social.” (SOBRINHO,
2005, p. 170).
A Educação Superior está classificada em cursos seqüenciais
por campo do saber, cursos de graduação, cursos de pós-graduação
e cursos de extensão. Os cursos seqüenciais por campo do saber
deverão ter diferentes níveis de abrangência, sendo abertos a candi-
datos que atendam aos requisitos estabelecidos pelas instituições de

2 Um outro aspecto, no sentido de sintetizar o grau de privatização da educação superior brasileira é que,
dos três maiores anunciantes do Brasil, em 2002, dois eram instituições de ensino superior privadas, “só
superadas em seus gastos em publicidade pela McDonald’s” (PACHECO; RISTOFF, 2004, p. 10).
EDUCAÇÃO SUPERIOR | 65

ensino. A defesa de cursos superiores do tipo “seqüencial”, também


está presente em um relatório da UNESCO, que relata a existência,
em muitos países, de cursos superiores que foram criados para, em
prazo menor que os tradicionais cursos de graduação, “darem uma
formação profissional de qualidade e com objetivos bem definidos”,
tendo, a universidade o papel de, também, formar “diplomados de
nível médio” (DELORS, 2001, p. 23-25).
Concebidos para atender rapidamente às “exigências” do
mercado de trabalho, os cursos seqüenciais por campo de são mais
rápidos, podendo ter duração mínima de 6 meses e máxima de 2
anos. A grande desvantagem é que essa limitação de seu tempo de
duração limita também a quantidade de conteúdos a serem oferecidos
aos seus alunos. A curta duração, as diferenciadas formas de acesso e
a especificidade dos conteúdos ministrados, fazem dessa modalidade
de ensino um excepcional “nicho de mercado” para as instituições
privadas, especialmente por seu baixo custo e pela expectativa ge-
rada no aluno, de realização e conclusão mais rápida de um “curso
superior”, que lhe proporcionará uma inserção mais rápida (real ou
imaginária) no mercado de trabalho.
Os cursos seqüenciais apenas copiam os communities colleges
norte-americanos, “aplicados” à nossa realidade, vistos que os mes-
mos ajudam a diminuir a pressão exercida pela crescente demanda
por acesso ao ensino superior. Poderíamos dizer que, em última
instância, esses cursos nada mais são do que cursos de extensão uni-
versitária “incrementados” e com uma nova “roupagem”, ou dito de
outra forma, cursos de educação continuada de nível pós-médio. Para
Cunha, esses cursos nas instituições privadas, serviriam para ocupar
“as vagas não preenchidas nos cursos de graduação ou deixadas livres
pelos evadidos deles. Uma forma, portanto, de reduzir a capacidade
ociosa ou, dito de outra forma, de elevar a receita com relação aos
custos fixos.” (CUNHA, 2003, p. 43).
No Brasil, o número de cursos superiores privados saltou de
3.500 cursos em 1995 (primeiro ano da gestão FHC) para 9.100
cursos superiores privados em 2002 (último ano da gestão FHC),
resultando num crescimento de 160% (média de criação de três novos
cursos superiores privados por dia). Nesse mesmo período, os cursos
superiores públicos passaram de 2.800 para 5.200, resultando num
crescimento de 86% (média de criação de um novo curso superior
66 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

público por dia). Já o número de instituições privadas cresceu 45%,


que significou, na média, uma nova instituição privada de ensino
superior por dia.
Sobre esse processo de expansão das instituições privadas de
ensino superior com fins lucrativos, Boaventura de Souza Santos
afirma que o
modo como se constituiu esse sector privado de ensino
superior diverge de país para país. Mas nos países
periféricos e semiperiféricos, em que havia um sector
público universitário, o desenvolvimento do sector
privado lucrativo assentou em três decisões políticas:
estancar a expansão do sector público através da crise
financeira; degradar os salários dos professores uni-
versitários a fim de os forçar a buscar emprego parcial
no sector privado (no caso do Brasil, outro factor foi
permitir a aposentadoria precoce, com salário integral,
das universidades públicas); actuar com uma negli-
gência benigna e premeditada na regulação do sector
privado, permitindo-lhe que ele se desenvolvesse
com um mínimo de constrangimentos. Desse modo, o
sector privado foi dispensado de formar os seus pró-
prios quadros e aproveitar-se de todo o conhecimento
e formação produzidos na universidade pública. Isso
significou uma maciça transferência de recursos da
universidade pública para as novas universidades
privadas, uma transferência de tal montante e tão sel-
vagem que é legítimo concebê-la como um processo de
acumulação primitiva por parte do capital universitário
com a conseqüente descapitalização e desarticulação
da universidade pública. (SANTOS, 2004, p. 107).

O argumento de que o oferecimento de Educação Superior é


uma função, exclusiva e fundamental, do Poder Público, enquanto
um direito essencial e gratuito, coexiste, na realidade educacional
brasileira, com o argumento de a Educação Superior se constitui em,
apenas, mais um serviço, o qual seria regulado e comercializado no
“mercado globalizado”, já que o Poder Público teria outras prioridades
EDUCAÇÃO SUPERIOR | 67

educacionais, por exemplo, o oferecimento de Ensino Fundamental


e Médio. Marilena S. Chauí considera que se “quisermos tomar a
universidade pública por uma nova perspectiva, precisamos come-
çar exigindo, antes de tudo, que o Estado não tome a educação pelo
prisma do gasto público e sim como investimento social e político, o
que só é possível se a educação for considerada um direito e não um
privilégio, nem um serviço.” (CHAUÍ, 2003, p. 11).
Oliveira, por sua vez, nos mostra que o empresariado industrial
brasileiro, pelo menos desde 1988, defende, explicitamente, um maior
rigor na transferência de recursos públicos para o ensino superior pú-
blico, o incentivo à participação de recursos privados na manutenção
deste sistema, priorização da Educação Básica, melhores condições
para uma maior integração dos docentes universitários em atividades
fora da universidade, a transformação das melhores universidades
públicas em centros de excelência dedicados exclusivamente à reali-
zação de pesquisas científicas (sendo que as restantes se dedicariam à
docência e a extensão, com financiamentos diferenciados), a revisão
dos estatutos das universidades públicas (de forma que elas se tor-
nassem mais flexíveis e passassem a buscar “recursos no mercado”
e a adoção de avaliações nacionais, de forma que “a qualidade das
universidades pudesse ser facilmente constatada por empregadores
para que, a partir daí, fossem alocados recursos nessas instituições”
(OLIVEIRA, 2005, p. 67-68, 97).
As universidades são instituições pluridisciplinares de formação
dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão
e de domínio e cultivo do saber humano, que se caracterizam por pos-
suírem produção intelectual institucionalizada, a qual se materializa
com o estudo sistemático dos temas e problemas mais relevantes, tan-
to do ponto de vista científico e cultural, quanto regional e nacional.
Nesse sentido, Silva Jr. e Sguissardi defendem que a
universidade atual – originária do Estado moderno e
cujos objetivos sociais e forma organizacional são des-
tinados à manutenção e regulação do pacto social con-
temporâneo – deve concomitantemente contribuir para
a construção da consciência crítica institucional deste
tempo histórico da humanidade. Assim, toda a política
relativa à universidade haverá de ser uma política de
68 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Estado, e não de governo, tendo por objetivo ordenar


as relações que materializam a sociedade na direção da
intensificação de seus traços de humanidade. (SILVA
JR.; SGUISSARDI, 2005, p. 17-18)

Para ser considerada como Universidade, esta também deve


possuir um terço do corpo docente, pelo menos, com titulação aca-
dêmica de mestrado ou doutorado e um terço do corpo docente em
regime de tempo integral. Porém, o Censo da Educação Superior
2003 mostrava que apenas 15 das 84 universidades privadas brasi-
leiras (17,8%), possuíam, pelo menos, um terço do corpo docente
trabalhando em tempo integral, como determina a LDB.
O Banco Mundial entende que a Educação Superior não se
constitui, necessariamente, em um serviço público (um dever do
Poder Público), mas sim como um serviço que pode (e deve) ser ofe-
recido e regulado pelo “mercado” (iniciativa privada). Nesse ponto,
a influência do Banco Mundial sobre o Relatório para a UNESCO
da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI é
explícita, na medida em que esse relatório advoga que “os recursos
conseguidos com a cobrança de taxas podem permitir uma melhoria
qualitativa do ensino universitário”. Em seguida, esse mesmo relatório
transcreve, com o objetivo de legitimar sua tese, parte de um docu-
mento oficial do Banco Mundial, (Priorities and strategies for edu-
cation - 1995), renomeado (pelo relatório) de Prioridade à educação
básica no investimento público. Esse relatório também condiciona a
possibilidade de massificação do ensino superior (especialmente nos
chamados países em desenvolvimento) à cobrança de “taxas escola-
res, compensadas pela concessão de bolsas seletivas para estudantes
mais desfavorecidos e pelo incremento de sistemas de empréstimos”
(DELORS, 2001, p. 182-185). Em função de toda essa concepção,
exigir percentuais mais elevados de titulação docente, assim como
exigir percentuais mais elevados de docentes contratados em regime
de tempo integral, o que certamente elevaria a qualidade da educação
oferecida pelas Universidades privadas, significaria um aumento dos
custos operacionais e, portanto, uma redução de lucros.
Entendemos que o desafio que se põe para a Educação Superior
brasileira não é exatamente a questão do número de vagas totais para
se atingir o acesso à Educação Superior, mas sim o desafio de aumentar
EDUCAÇÃO SUPERIOR | 69

o número de vagas nas instituições públicas de ensino superior para


que se possa não só democratizar o acesso ao ensino superior mas
que o mesmo seja de qualidade. Para que isso efetivamente ocorra,
faz-se necessário um aumento significativo no montante de recursos
destinados à Educação Superior pública, bem como a definição de
formas claras de financiamento – a curto, médio e longo prazos – das
instituições públicas de ensino superior.
A manutenção, com qualidade, das universidades – como locus
onde se realiza, de maneira indissociável, o ensino, a pesquisa e a
extensão – e que constituem o suporte necessário para o desenvolvi-
mento científico, tecnológico e cultural, não será possível sem o for-
talecimento do setor público. Por um lado, esse setor distribui melhor
suas vagas entre as diferentes regiões brasileiras, cumprindo assim
uma importante função de diminuição das desigualdades regionais.
Por outro lado, as universidades públicas têm o importante papel de
desenvolverem a pesquisa básica e a pós-graduação stricto sensu, e
de se constituírem em padrão de referência no ensino de graduação.
Além disso, cabe às universidades públicas qualificar os docentes que
atuam na Educação Básica e na Educação Superior que atuam nas
instituições públicas e privadas, com o objetivo de melhorar a quali-
dade do ensino, da pesquisa e das atividades de extensão oferecidas
por todas as instituições de ensino superior.

4.1. Oferta e atendimento

Sobre a oferta e atendimento na Educação Superior, apenas


como referência, o atual PNE propõe que até o final dessa década, a
Educação Superior atenda um mínimo de 30% da população de 18 a
24 anos. No conjunto da América Latina, o Brasil apresenta um dos
índices mais baixos de acesso à Educação Superior, mesmo quando
se leva em consideração o setor privado. Atualmente, apenas 10%
dos jovens com idade entre 18 e 24 anos estão matriculados no ensino
superior brasileiro (Cf. DAVIDOVICH, 2005, p. 24 e MARTINS,
2005, p. 29). Para se atingir o percentual acima, precisaríamos mais
que dobrar a oferta de Educação Superior nos próximos 5 anos. Como
ainda não há um modelo estável de financiamento para as Instituições
70 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Federais de Ensino Superior (IFES), só atingiremos esse percentual


se o setor privado de ensino superior crescer mais ainda, o que tam-
bém não é provável, visto que o mesmo já possui um índice elevado
de vagas ociosas (49,5%). Por outro lado, entre os anos de 2005 e
2006, o número de estudantes no ensino superior aumentou 13,2%,
que significa, em números absolutos, quase 700 mil alunos a mais nas
instituições de ensino superior no intervalo de apenas um ano3.
Uma outra questão relacionada diretamente à oferta e ao aten-
dimento na Educação Superior é o estabelecimento de uma política de
expansão da Educação Superior que venha a diminuir as desigualdades
de oferta desse nível de ensino existente entre as diferentes regiões
do Brasil. A expectativa é que essa política, que, atualmente, dá os
seus primeiros passos, produza uma expansão do sistema público de
ensino superior brasileiro nas proporções que a demanda atual exige,
corrigindo, por conseguinte, as desigualdades na oferta de Educação
Superior pública entre as diferentes regiões.
O setor privado não está, nem nunca esteve, preocupado com
as possíveis as desigualdades regionais de oferta de Educação Su-
perior. É notório que essas desigualdades existem e são extremas. O
número de matrículas no ensino superior na Região Sudeste é 13,5
vezes maior que o número de matrículas no ensino superior na Região
Norte, 7 vezes maior que na Região Centro-Oeste, 3,7 vezes maior que
na Região Nordeste e 2,7 vezes maior que na Região Sul. Por outro
lado, entre os anos de 2002 e 2003, o número de matrículas no ensino
superior cresceu 21,1% na Região Norte (230 mil alunos), 15,3% na
Região Nordeste (625 mil alunos), 14% na Região Centro-Oeste (367
mil alunos), 10% na Região Sul (745 mil alunos) e 9,8% na Região
Sudeste (1,9 milhão de alunos), significando um crescimento médio
de 11,7% no Brasil, ou, em números absolutos, 3,9 milhões de alunos
a mais em todo o ensino superior4. Assim, além do estabelecimento
de uma política de expansão que diminua as desigualdades de oferta
existentes entre as diferentes regiões do país, necessário se faz que
haja uma expansão efetiva do ensino superior público nas regiões

3 Cf. www.ibge.gov.br , acesso em 16/09/2007.

4 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 08/08/2005.


EDUCAÇÃO SUPERIOR | 71

menos desenvolvidas.
Um outro problema relacionado à questão da oferta e do
atendimento na Educação Superior refere-se ao uso da Educação
a Distância (EAD), de modo que a mesma venha a ampliar as pos-
sibilidades de atendimento nos cursos presenciais, regulares ou de
educação continuada. O maior problema dessa questão é que ainda
não foi constituído um sistema interativo de EAD, apesar do cresci-
mento expressivo dessa modalidade de ensino nos últimos anos. Para
se ter uma idéia desse crescimento, temos mais de 300 mil alunos
matriculados em cursos a distância, em instituições autorizadas, e
um crescimento, entre os anos de 2003 e 2004 de aproximadamente
107% no número de matrículas em cursos de graduação e/ou pós-
graduação, oferecidos a distância (ANUÁRIO, 2005). Portanto, o
que falta é exatamente a criação de um amplo sistema interativo de
EAD para ampliar, em todos os níveis, mas especialmente no ensino
superior, suas possibilidades de atendimento nos cursos presenciais,
regulares ou de educação continuada.
A diversificação do sistema superior de ensino, de forma a
atender demandas específicas de formação, como, por exemplo, for-
mação tecnológica, profissional liberal, magistério, etc, é um outro
aspecto questão da oferta e do atendimento da Educação Superior.
Nesse sentido, o Decreto nº 2.207/97, classificou, quanto à organiza-
ção acadêmica, o ensino superior (público ou privado) nos seguintes
tipos: universidades, centros universitários, faculdades integradas,
faculdades e institutos superiores ou escolas superiores. Assim, como
a proliferação de cursos superiores de curta duração – e de menores
custos –, a diferenciação entre universidades, que fazem pesquisa (os
“centros de excelência”) e instituições superiores de ensino e extensão
(os Centros Universitários), também se constitui em uma das propos-
tas do Banco Mundial para os chamados países em desenvolvimento,
com o objetivo de massificar o acesso à Educação Superior.
Um outro problema diretamente relacionado à oferta e ao
atendimento da Educação Superior é a diversificação da oferta de
ensino superior por meio de cursos noturnos. Há que se ressaltar a
importância da expansão de vagas no ensino superior, no período
noturno, considerando que as universidades, especialmente as uni-
versidades federais, possuem espaço físico ocioso, que poderia ser
utilizado para este fim, necessitando apenas planejar-se para garantir
72 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

o acesso dos alunos aos laboratórios, bibliotecas e outros recursos, de


forma que assegurem ao aluno-trabalhador o ensino de qualidade a
que têm direito, nas mesmas condições de que dispõem os estudantes
do período diurno.
Pacheco e Ristoff afirmam que “dos 3,5 milhões de alunos
matriculados na educação superior, 2 milhões estudam em cursos
que funcionam à noite. Desses, 1,6 milhão estuda em instituições
privadas e os 376 mil restantes estudam em instituições públicas”, ou
seja, “as IES privadas, embora tenham 2,5 vezes mais alunos no total
de matrículas e quase empatem com as IES públicas em número de
alunos no diurno, têm cinco vezes mais alunos no noturno”. Assim,
se por um lado, “o setor privado tornou-se a principal oportunidade
de acesso à educação superior para o aluno trabalhador”, os mesmo
dados também demonstram “o quanto a capacidade instalada das IES
públicas permanece ociosa durante a noite, deixando fechadas as suas
portas para indivíduos que precisam trabalhar durante o dia para con-
seguirem o seu sustento.” (PACHECO; RISTOFF, 2004, p. 12).
Por último, na questão da oferta e do atendimento na Educação
Superior, existe a proposta de aumento da oferta de cursos de extensão
universitária, como cursos de educação continuada para adultos, com
ou não formação superior, com o objetivo, entre outros, de resgatar
a elevada dívida social e educacional brasileira. A oferta de cursos
de extensão nas diversas instituições de Educação Superior já é sig-
nificativa. Porém, muitos desses cursos de extensão acabam tendo
como público alvo, os estudantes dos cursos de graduação da própria
instituição que oferece o curso de extensão. Dessa maneira, o desafio
passa a ser conceber cursos de extensão como uma forma de educa-
ção continuada para adultos, com ou sem formação superior. Vistos
dessa maneira, os cursos de extensão poderão, numa perspectiva de
longo prazo, se tornar mais um dos muitos instrumentos possíveis de
resgate da nossa elevada dívida social e educacional.

Questão para Debate em Sala de Aula

Qual a sua opinião sobre o estabelecimento de cotas (étnicas,


sócioeconômicas ou outras) para o ingresso no ensino superior?
EDUCAÇÃO SUPERIOR | 73

4.2. Questões pedagógicas

Nesse item, analisaremos as questões que, no nosso entendi-


mento, tratam de questões prioritariamente pedagógicas, referentes
ao ensino superior. Nesse contexto, destacamos três questões. A
primeira trata do estabelecimento de diretrizes curriculares nacionais
para os cursos superiores. A segunda trata da inclusão nas diretrizes
curriculares nacionais dos cursos de formação de docentes, de temas
relacionados às problemáticas abordadas nos temas transversais. E,
por último, a terceira questão, que refere-se ao incentivo a prática da
pesquisa como elemento essencial do processo de ensino e aprendiza-
gem na Educação Superior.
As diretrizes nacionais curriculares vêm sendo estabelecidas
pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) para todos os cursos
superiores, para que, por um lado, os diferentes cursos superiores,
oferecidos por diferentes instituições, possuam flexibilidade e diver-
sidade e assim atendam às diferentes necessidades da população bra-
sileira, e, por outro lado, possuam uma base comum nacional. Dessa
maneira, essa questão já está equacionada.
Já os temas transversais, a que se refere a segunda questão,
também já foram incluídos nas diretrizes curriculares dos cursos de
formação de docentes como se pode verificar nas Resoluções nº 1,
de 18/02/2002, nº 2, de 19/02/2002, e pelos Pareceres 09/2001 e
28/2001, que também tratam de outras questões sobre a regulamenta-
ção e normatização dos cursos de formação de docentes. Todos esses
documentos foram aprovados pelo Conselho Pleno (CP) do CNE.
Na questão do incentivo à generalização da prática da pes-
quisa como elemento integrante e modernizador dos processos de
ensino-aprendizagem em toda a Educação Superior, inclusive com a
participação de alunos no desenvolvimento da pesquisa, entendemos
que esse incentivo pode se dar, de maneira efetiva, em, pelo menos
duas frentes: por meio do aumento no número de bolsas de iniciação
científica, de forma que essas bolsas proporcionem aos alunos dos
cursos de graduação melhores condições para se dedicar, desde os
primeiros anos do curso de graduação, também à prática da pesquisa;
e pela via do aumento do número de cursos de pós-graduação stricto
senso (mestrado e doutorado) de qualidade no Brasil. Se o aumento
do número desses cursos de pós-graduação é responsabilidade ex-
74 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

clusiva das instituições de ensino superior, o aumento das bolsas de


iniciação científica, por sua vez, deve ficar sob a responsabilidade não
só das agências de fomento (CNPq, CAPES, etc.), mas também sob
a responsabilidade das próprias universidades, sejam elas públicas ou
privadas, por meio de programas próprios de iniciação científica.

Questão para Debate em Sala de Aula

Em sua opinião, em termos pedagógicos, especialmente no


que se refere aos processos de ensino-aprendizagem, quais os limites,
vantagens e desvantagens, da oferta de Educação Superior por meio
da modalidade Educação a Distância (EAD)?

4.3. Financiamento e gestão

A questão do financiamento da Educação Superior pode ser


dividida em 3 questões. A primeira é a questão do estabelecimento de
um sistema de financiamento para as instituições públicas de ensino
superior. A segunda questão refere-se ao oferecimento de bolsas de
estudos para alunos carentes. Por fim, a questão da implementação
de programas de assistência estudantil, pelas instituições públicas de
ensino superior.
O sistema de financiamento das instituições públicas de Edu-
cação Superior é, atualmente, o problema central na discussão sobre
o estabelecimento de uma forma fixa e duradoura de financiamento
das instituições federais de ensino superior. Levar em consideração,
para a distribuição dos recursos, além da pesquisa, o número de alu-
nos atendidos – resguardada a qualidade dessa oferta –, se configura
em um problema complementar, visto que o problema principal é a
definição de uma forma consistente e de longo prazo, para o financia-
mento dessas instituições. Esse problema só será resolvido depois que
o governo federal estabelecer, de maneira definitiva e estável, a forma
de financiamento dessas instituições.
Na questão do oferecimento de bolsas de estudos para alunos
carentes, sabemos que as instituições públicas de ensino superior
EDUCAÇÃO SUPERIOR | 75

possuem condições mais restritas de realizar esse oferecimento. Já as


instituições privadas de ensino superior não têm interesse nesse tipo
de oferecimento, especialmente depois da implantação do Programa
Universidade para Todos (Pro-Uni), que, transfere dinheiro público
para universidades privadas na forma de isenções fiscais e tributá-
rias.
Por último, na questão da implantação de programas de as-
sistência estudantil, tais como bolsa-trabalho ou outros, destinados
a apoiar os estudantes carentes que demonstrem bom desempenho
acadêmico, é que programas dessa natureza só podem ser efetivados
quando possuem orçamento adequado para a sua execução, ou seja, o
problema não está no apoio aos estudantes carentes que demonstrem
bom desempenho acadêmico, mas sim na forma de financiar esses
programas. Para ilustrar a magnitude desse problema, Pacheco e Ris-
toff afirmam, baseados em estudo do Observatório Universitário da
Universidade Cândido Mendes (RJ), que
25% dos potenciais alunos universitários são tão caren-
tes que ‘não têm condições de entrar no ensino superior,
mesmo se ele for gratuito’. Esse percentual representa
2,1 milhões de estudantes que, para serem incluídos no
sistema de educação superior, nos próximos três anos,
dependerão, mais do que da gratuidade, de bolsas de
estudo, bolsas de trabalho, bolsas de monitoria, bolsas
de extensão, bolsas de pesquisa, de restaurantes uni-
versitários subsidiados, de moradia estudantil, ou de
outras formas que, combinadas a essas, tornem viável
a sua permanência no campus. (PACHECO; RISTOFF,
2004, p. 9, aspas no original).

Assim, as instituições públicas que possuírem um orçamento


adequado às suas necessidades, os quais devem incluir a assistência
estudantil, terão condições de resolver essa questão. Já as instituições
públicas que não tiverem essas condições orçamentárias, com certeza,
não poderão fazê-lo.
O problema da gestão na Educação Superior pode ser discutido,
de maneira específica, dividido em, pelo menos, quatro questões. A
primeira questão trata da autonomia didática, científica, administra-
76 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

tiva e de gestão financeira para as universidades públicas brasileiras.


A segunda refere-se à questão da avaliação do sistema de Educação
Superior. A terceira diz respeito às políticas de ação afirmativa. E,
por último, a questão da participação da comunidade nos conselhos
deliberativos das instituições de ensino superior.
Começando nossa discussão pela questão da autonomia (di-
dática, científica, administrativa e de gestão financeira) para as uni-
versidades públicas, entendemos que a autonomia das universidades
públicas brasileiras já está definida tanto pelo Art. 207 da Consti-
tuição, quanto pelos Arts. 53 e 54 da LDB. Na verdade, o que falta
para assegurar efetivamente essa autonomia, é a definição da forma
de financiamento das universidades públicas brasileiras, especifica-
mente das universidades federais, por exemplo, com a vinculação
de recursos5. No caso das universidades federais, pelo menos desde
1988, as propostas de regulamentação da autonomia universitária,
especificamente das formas de financiamento das universidades fe-
derais, elaboradas pelo MEC, ou não agradavam às universidades,
ou não agradavam à equipe econômica do governo de turno. Até o
momento não houve resolução para esse conflito.
Por outro lado, estender às instituições não-universitárias (pú-
blicas e privadas), diferentes prerrogativas de autonomia nos levam ao
seguinte paradoxo: se ainda não conseguimos dar efetiva autonomia
para as universidades federais, como estender as diferentes prerroga-
tivas de autonomia às instituições não-universitárias públicas e priva-
das, ainda que tal extensão esteja baseada em sistemas adequados de
avaliação? É possível estender a autonomia para instituições privadas,
porém não há como estender para as instituições não-universitárias
públicas uma autonomia (no caso, autonomia administrativa e de ges-
tão financeira) se nem mesmo as universidades federais a possuem.
Na questão da avaliação do sistema brasileiro de Educação
Superior, foi criado, em 2004, o Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Superior – SINAES, por meio da Lei nº 10.861/04. Esse

5 Ainda que não aborde especificamente a Educação Superior, Oliveira traça um histórico das vinculações
orçamentárias na educação brasileira, afirmando que, não só elas estão presentes nos momentos democráticos
da vida política brasileira (e ausentes nos períodos ditatoriais), explicitando, assim, uma opção política, mas,
também, o fato de que sempre que se é estabelecida uma vinculação orçamentária para a educação, ocorre um
aumento de recursos e investimentos na mesma (Cf. OLIVEIRA, 1998, p. 124-127).
EDUCAÇÃO SUPERIOR | 77

sistema de avaliação ainda não foi aplicado um número significativo


de vezes, de forma que se possa avaliar seus resultados, no contexto
de uma série histórica. Dessa maneira, se, por um lado, já temos um
amplo e diversificado sistema de avaliação interna e externa que
englobe os setores público e privado da Educação Superior brasileira
institucionalizado, por outro lado, ao não promover, ainda, de forma
direta, a melhoria da qualidade do ensino, da pesquisa, da extensão e
da gestão acadêmica, o mesmo ainda não atingiu o seu principal ob-
jetivo. Para comprovar o que estamos afirmando, o ENADE (Exame
Nacional de Desempenho de Estudantes) – que compõe, junto com
a avaliação institucional, o SINAES – realizado em 2006, apontou
que 30,2% dos cursos superiores oferecidos por instituições privadas
tiveram desempenho ruim (notas 1 ou 2, numa escala de 1 a 5), ao
passo que nas instituições públicas esse percentual cai quase pela
metade (16,9%)6.
Dentro da normatização da Educação Superior brasileira, exis-
te também a possibilidade da instituição de programas próprios de
avaliação institucional e de cursos nos estabelecimentos de Educação
Superior (públicos e privados) com o objetivo de elevar o padrão de
qualidade do ensino, da pesquisa e da extensão. Algumas universida-
des brasileiras, por exemplo as universidades estaduais paulistas, estão
instituindo programas próprios de avaliação institucional, porém sem
o auxílio financeiro e/ou técnico do MEC, que não possui nenhum
programa de fomento para esse fim, já que implantou o SINAES, que
engloba a avaliação institucional.
Na questão da criação e implantação de políticas de ação
afirmativa para acesso ao ensino superior, entendemos que o papel
de criar políticas públicas é, essencialmente, do Poder Público. Para
Faria, as políticas de ação afirmativa, “tão na moda”, nada mais são
do que a “filantropia neoliberal do século XXI.” (FARIA, 2005, p.
1032). Atualmente, no nível federal, está em vigor a Lei nº 11.096/05,
que instituiu o Pro-Uni. Resumidamente, esse programa concede
isenções fiscais e tributárias a universidades privadas que venham
a destinar parte de suas vagas para estudantes que tenham cursado

6 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 02/06/2007.


78 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

integralmente o ensino médio em escolas da rede pública (ou em ins-


tituições privadas, porém com bolsa integral); estudantes portadores
de deficiências; e para professores da rede pública de ensino, somente
para os cursos de licenciatura, normal superior ou pedagogia, desti-
nados à formação do magistério da Educação Básica. A instituição
também deverá destinar um percentual de bolsas de estudo para a
implementação de políticas afirmativas de acesso ao ensino superior
para cidadãos autodeclarados indígenas e negros7.
Independentemente do fato do Pro-Uni ser uma forma de
transferência de recursos públicos para universidades privadas, trata-
se de uma lei que traduz uma política de ação afirmativa que facilita
o acesso ao ensino superior de algumas minorias, não significando,
porém, que essas minorias terão acesso a uma educação de qualidade,
visto que, no Brasil, a qualidade de ensino das universidades públicas
é significativamente superior à qualidade de ensino oferecida pela
imensa maioria das universidades privadas. Por outro lado, a cria-
ção de cursinhos pré-vestibulares em muitas universidades públicas
(federais e estaduais), visa a permitir aos estudantes pertencentes a
esse mesmo público-alvo, competir em igualdade de condições nos
processos de seleção e admissão ao ensino superior. Assim, seja por
meio de uma política pública (Pro-Uni), ou por meio de ações de
instituições públicas de ensino superior (cursinhos pré-vestibulares,
estabelecimento de sistemas de cotas para ingresso e isenções de
taxas de vestibular para estudantes carentes, etc.), esse problema vem
sendo progressivamente equacionado.
Por último, com relação à questão da participação da comuni-
dade nos conselhos deliberativos das instituições de ensino superior,
temos que essa questão foi contemplada na primeira versão do projeto
de Reforma Universitária (2004), que previa, entre outros pontos, a
instituição de conselhos dessa natureza nas instituições privadas de
ensino superior, visto que em boa parte das instituições públicas de
ensino superior tais conselhos já existem. Já em sua segunda versão
(2005), esse ponto foi retirado, especialmente devido à enorme pres-

7 O percentual de negros e pardos nas universidades subiu de 18% para 30% entre os anos 2001 e 2005. Nas
instituições públicas de ensino superior esse crescimento foi da ordem de 130%, ao passo que nas instituições
privadas o crescimento foi de 223% (Cf. www.ibge.gov.br/pnad2005 , acesso em 20/11/2006).
EDUCAÇÃO SUPERIOR | 79

são advinda as instituições privadas de ensino superior (explicitada,


entre outras, pelos posicionamentos da ANUP – Associação Nacional
das Universidades Particulares – e da ABMES – Associação Brasi-
leira de Mantenedoras de Ensino Superior), que consideram que a
existência desses conselhos significa uma forma de intervenção do
Poder Público, ainda que indireta, nas instituições privadas de en-
sino superior. Sendo assim, muito provavelmente, essa questão será
resolvida parcialmente, ou seja, assim como é hoje, tais conselhos
continuarão a existir somente no âmbito das instituições públicas de
ensino superior, visto que essas instituições são mantidas com dinhei-
ro público. Já nas instituições privadas de ensino superior, essa idéia
ainda encontra forte resistência.

Questão para Debate em Sala de Aula

Qual a sua opinião sobre o Programa Universidade para Todos


(Pro-Uni)?

4.4. Pós-graduação

Sobre a pós-graduação abordaremos 3 questões, a saber: a con-


solidação e o desenvolvimento da pós-graduação e da pesquisa nas
universidades; o aumento do número de mestres e doutores formados
pelo nosso sistema de pós-graduação; e, por último, a questão do
financiamento da pós-graduação.
Na questão da consolidação e o desenvolvimento da pós-gradu-
ação e da pesquisa nas universidades, apenas como referência, o PNE
propõe que, em dez anos, seja dobrado o número de pesquisadores
qualificados. Nesse sentido, a CAPES (Coordenadoria de Aperfeiço-
amento de Pessoal do Ensino Superior) em conjunto com a FINEP
(Financiadora de Estudos e Projetos), está elaborando um projeto que
pretende capacitar até 99 instituições de ensino superior para que as
mesmas criem cursos de mestrado e doutorado, elevando o número
de instituições de ensino superior com pós-graduação stricto sensu
dos atuais 220 para aproximadamente 300 cursos de pós-graduação
80 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

stricto sensu (mestrado e doutorado), por meio de financiamentos de


longo prazo e bolsas de estudo. Esse aumento do número de cursos
de pós-graduação stricto sensu propiciará um aumento significativo
no número de pesquisadores qualificados, bem como ajudará no de-
senvolvimento e na consolidação da pós-graduação e da pesquisa nas
universidades brasileiras.
No que se refere ao aumento do número de mestres e doutores
formados pelo sistema de pós-graduação nacional, o atual PNE (aqui
utilizado apenas como uma de nossas referências), propõe que esse
aumento seja de, pelo menos 5% ao ano. Esse objetivo já foi alcança-
do, visto que, segundo dados da CAPES, em 2003, o Brasil formou
8.094 doutores e 27.630 mestres, que significa um aumento no núme-
ro de doutores de 51,72% em relação aos 5.335 doutores formados
no ano de 2000, e um aumento de 21,33% no número de programas
de mestrado e doutorado no mesmo período (2000-2003), em todo o
país. Ainda segundo a CAPES, o número de mestres e doutores tem
crescido a taxas médias de 10 a 15% ao ano, nos últimos anos8.
Na questão do financiamento da pós-graduação o papel do
governo federal é central e imprescindível, na medida em que, o
mesmo, por meio de financiamento público direto, deve incentivar
as instituições de Educação Superior, para que as mesmas constituam
programas especiais de titulação e capacitação para docentes, com o
objetivo de desenvolver e consolidar a pós-graduação no país. Visto
que os orçamentos da CAPES e do CNPq (Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico), que são duas das princi-
pais agências de fomento à pós-graduação, estão sendo aumentados
progressivamente nos últimos anos, podemos afirmar que o financia-
mento da pós-graduação brasileira está equacionado.

Questão para Debate em Sala de Aula

Na sua opinião, quais medidas deveriam ser tomadas para se


evitar a famosa “fuga de cérebros” do Brasil em direção aos países do
chamado Primeiro Mundo?

8 Cf. www.capes.gov.br , acesso em 29/06/2005.


EDUCAÇÃO SUPERIOR | 81

4.5. Sugestões de Leituras Complementares

BRANDÃO, C. F. As cotas na universidade pública brasileira: será


esse o caminho? Campinas: Autores Associados, 2005a (Coleção
Polêmicas do nosso tempo, 92).

MENEZES, L. C. Universidade sitiada: a ameaça de liquidação da


universidade brasileira. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2000.

REVISTA EDUCAÇÃO & SOCIEDADE. Universidade: reforma e/


ou rendição ao mercado? Centro de Estudos Educação e Sociedade.
CEDES, Campinas, v. 25, n. 88 (Número Especial), out./2004.

REVISTA PRO-POSIÇÕES. Educação superior: algumas tendências


políticas européias e latino-americanas. Faculdade de Educação -
UNICAMP, Campinas, v. 15, n. 3 (45) (Dossiê), set./dez. 2004.

SGUISSARDI, V. O Banco Mundial e a educação superior: revisando


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TRINDADE, H. (Org.). Universidade em ruínas: na república dos


professores. Rio de Janeiro / Porto Alegre: Vozes / CIPEDES, 1999,
39-56.
CAPÍTULO 5

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Um dos mais graves problemas educacionais do Brasil, nas


últimas décadas, é a sua alta taxa de analfabetismo. A erradicação do
analfabetismo se constitui em um dos principais problemas a serem
enfrentados por toda e qualquer política educacional pública brasilei-
ra. Assim, a Educação de Jovens e Adultos (EJA) deve ser entendida
primeiramente como um direito e, em seguida, no sentido amplo de
domínio dos instrumentos básicos da cultura letrada, das operações
matemáticas elementares, da evolução histórica das sociedades, da
diversidade do espaço físico e político mundial e da constituição da
sociedade brasileira, e ter, como objetivo, a conquista da cidadania
plena.
Segundo Celso R. Beisiegel, a EJA é sempre instrumental,
respondendo “em todos os casos à intenção de formar agentes com-
prometidos com a manutenção da ordem social vigente ou com a
reconstrução dessa ordem social no futuro.” Nesse sentido, a EJA, no
Brasil, “sempre foi muito mais uma preocupação de quem a propõe
do que daqueles a quem é dirigida.”. Assim, nas propostas de comba-
te ao analfabetismo, “é preciso assegurar, pelo menos, uma educação
que realmente ajude os educandos na plena afirmação dos direitos da
cidadania.” (BEISIEGEL, 2003, p. 35; 41, itálicos no original).
O inciso I, do Art. 214 da Constituição determina, como um
dos objetivos do PNE, a integração de ações das diferentes esferas do
Poder Público, para a erradicação do analfabetismo. Para o cumpri-
mento dessa tarefa de tamanha envergadura, é necessária uma ampla
mobilização de recursos humanos e financeiros, especialmente por
parte dos governos, e, em algumas situações específicas, também da
sociedade. A erradicação do analfabetismo também seria facilitada,
em parte, com a gradual extensão do acesso ao Ensino Médio para
todos os jovens que completam o nível anterior, e para os jovens e
adultos que não cursaram os níveis de ensino nas idades apropriadas.
Essa gradual extensão do acesso ao Ensino Médio também está pre-
84 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

vista, pelo inciso II do Art. 208 da Constituição e pelo inciso II do Art.


4 da LDB. Segundo Cleide F. Leitão, existe uma contradição entre o
que determina a Constituição e a LDB, “que apresentam avanços e
garantem direitos constitucionais”, e as políticas governamentais de
caráter compensatório, “que atribuem à educação de jovens e adultos
um papel menor.” (LEITÃO, 2004, p. 146).
No contexto da organização da educação brasileira, a EJA é
destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos
no Ensino Fundamental e Médio na idade apropriada. Devemos con-
siderar, porém que, a educação, quando entendida como um direito,
não depende da idade, portanto, toda idade deve ser “apropriada” para
que os cidadãos usufruam do direito à educação. Assim, EJA deve
“servir de instrumento pelo qual se possa fazer frente à exclusão so-
cial, minimizando alguns de seus efeitos”, bem como ser “uma arma
para a luta em favor da cidadania.” (SANTOS, 2003, p. 123).
Para que esses objetivos sejam efetivamente alcançados, os
sistemas de ensino devem assegurar, gratuitamente, aos jovens e aos
adultos que não puderam efetuar seus estudos na idade adequada,
oportunidades educacionais regulares, consideradas as características
do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante
cursos e exames. O papel do Poder Público é o de viabilizar e estimu-
lar o acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações
integradas e complementares entre si.
Tomar para si a função de viabilizar e estimular o acesso e a
permanência do trabalhador na escola pode ser vista como uma ati-
tude correta do Poder Público, porém, na opinião de Leôncio Soares,
as políticas adotadas, nos anos 1990, pelo governo brasileiro, contri-
buíram para o agravamento e a deterioração da EJA, em função de
uma alocação cada vez menor de recursos para essa modalidade de
ensino, a continuidade da utilização de professores não-qualificados,
o oferecimento de cursos e serviços de baixa qualidade, que, soma-
dos, significam uma desvalorização da EJA (Cf. SOARES, 2005, p.
124). Para Sérgio Haddad, a EJA no Brasil, vem sendo, progressi-
vamente, desvalorizada desde o governo Collor (1990-92), sendo
que a desqualificação dessa modalidade de ensino acentuou-se nos
dois mandatos de FHC, devido ao apoio às diretrizes educacionais
propostas pelo Banco Mundial (Cf. HADDAD, 2000, p. 111-127). Já,
segundo Torres, a educação de adultos não se constitui em prioridade
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | 85

para o Banco Mundial (Cf. TORRES, 1996, p. 130-132).


Do ponto de vista prático, as probabilidades de sucesso de
qualquer programa de EJA, nos níveis de Ensino Fundamental e Mé-
dio, são sempre maiores quando as empresas, que em última instância
também são beneficiadas por poderem contar, ao final do processo de
ensino-aprendizagem, com uma mão-de-obra mais qualificada, são
co-partícipes e co-responsáveis pelo acesso e, principalmente, pela
permanência do trabalhador na escola.
A questão da gratuidade obrigatória no oferecimento de EJA
se constitui em um importante fator para o sucesso de programas
e propostas pedagógicas dessa natureza. Por outro lado, imaginar
propostas pedagógicas de educação destinadas a jovens e adultos,
que consigam levar sempre em consideração as características do
alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, e assim
poderem ser consideradas como oportunidades educacionais apro-
priadas, parecem-nos idealistas demais. Para Inês B. Oliveira, um dos
principais problemas presente nas propostas pedagógicas para a EJA
é o fato de que,
não importando a idade dos alunos, a organização dos
conteúdos a serem trabalhados e os modos privilegia-
dos de abordagem dos mesmos seguem as propostas
desenvolvidas para as crianças do ensino regular. Os
problemas com a linguagem utilizada pelo professo-
rado e com a infantilização de pessoas que, se não
puderam ir à escola, tiveram e têm uma vida rica em
aprendizagens, mereceriam maior atenção. (OLIVIE-
RA, 2004, p. 105).

Entendemos que a organização da educação brasileira deva ter


alguns momentos mais idealistas, e não apenas refletir a realidade
educacional existente. Apenas consideramos que, nesse caso especí-
fico, os fatores a serem levados em consideração (características do
alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho) na oferta
de Ensino Fundamental e Médio para jovens e adultos, não podem,
em momento algum, se tornar empecilhos para a existência de classes
desta modalidade de ensino. Por outro lado, ao não ser permitido que
os recursos advindos do antigo FUNDEF fossem utilizados na ma-
86 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

nutenção e no desenvolvimento de classes de EJA, a idéia expressa


acima ficou muito mais difícil de se tornar realidade.
Segundo Di Pierro, Estados e municípios reagiram às conseqü-
ências imediatas para a EJA, quando da implantação do FUNDEF, de
modos variados, ou seja, a “ampliação, redução ou manutenção dos
serviços de educação de jovens e adultos dependeu da capacidade
financeira de cada Unidade da Federação, da vontade política dos res-
pectivos governantes, da demanda e pressão social da população local
em defesa desse direito.” Dentre as diversas estratégias para resolver
o problema de financiamento criado pela implantação do FUNDEF,
duas se destacaram: a primeira, e mais freqüente, o “falseamento das
estatísticas, declarando-se no censo escolar as matrículas na educação
de jovens e adultos como ensino regular em classes de aceleração
para estudantes com defasagem série-idade, modalidade esta passível
de captação de recursos dos fundos.” A outra estratégia foi “o esta-
belecimento de parcerias com organizações sociais para a execução
direta dos serviços educativos para jovens e adultos.” (DI PIERRO,
2005, p. 1124). Com certeza, com a implantação do FUNDEB, tais
estratégias não serão mais necessárias.
Os sistemas de ensino (federal, estaduais e municipais) devem
manter cursos e exames supletivos, os quais deverão compreender a
base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento
de estudos em caráter regular. Os exames supletivos serão realizados
no nível de conclusão do Ensino Fundamental para os maiores de
15 (quinze) anos, e no nível de conclusão do Ensino Médio para
os maiores de 18 (dezoito) anos. Os conhecimentos e habilidades
adquiridos pelos educandos (jovens e adultos) por meios informais,
serão aferidos e reconhecidos mediante exames. Entendemos que, ao
diminuir a idade mínima para a realização de exames que atestem a
conclusão satisfatória dos ensinos supletivos de nível Fundamental e
Médio (diminuição em relação a organização anterior da Educação
brasileira), cria-se uma espécie de facilitação do acesso a essas mo-
dalidades de ensino. Uma outra conseqüência imediata dessa medida
foi a elevação significativa no percentual de jovens em programas de
EJA, especialmente nas escolas noturnas dos grandes centros urbanos
(Cf. ANDRADE, 2004, p. 45).
Não há como não questionar que essa diminuição da idade mí-
nima se constitui num poderoso estímulo para que alunos do Ensino
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | 87

Fundamental e Médio, quando, porventura, forem reprovados, mais


de uma vez, nas suas séries escolares regulares (especialmente nas
últimas séries do Ensino Fundamental e em todas as séries do Ensino
Médio), optem por abandonar temporariamente a escola, para, logo
no ano seguinte, se matricularem em cursos supletivos de Ensino
Fundamental e Médio, momento no qual já terão completado, ou
estarão em vias de completar, as respectivas idades mínimas para re-
alização dos exames supletivos para cada um desses níveis de ensino
(Fundamental e Médio).
Os déficits do atendimento no Ensino Fundamental resultaram,
ao longo dos anos, num grande número de jovens e adultos que
não tiveram acesso ou não lograram terminar esse nível de ensino,
constitucionalmente obrigatório. Porém, não consideramos correto
tentar combater o resultado desse déficit de atendimento do Ensino
Fundamental, com medidas como a redução da idade mínima para a
realização de exames supletivos. Por outro lado, a exclusão escolar de
crianças, por omissão da família, da sociedade ou do Poder Público,
é a forma mais perversa de exclusão social, na medida em que nega
o direito de cidadania e alimenta o círculo da pobreza e da marginali-
dade, não permitindo, a milhões de brasileiros, sonhar com melhores
perspectivas de futuro.
Embora tenha havido progresso com relação à questão do
analfabetismo, o número de analfabetos brasileiros ainda é excessivo,
atingindo, aproximadamente, 14,5 milhões de brasileiros maiores
de 15 anos (11,6% em números relativos). Todos os indicadores
apontam para a profunda desigualdade regional na oferta de opor-
tunidades educacionais e na concentração de população analfabeta,
ou insuficientemente escolarizada, nos bolsões de pobreza existentes
no País. Cerca de 30% da população analfabeta com mais de 15 anos
está localizada no Nordeste, porém, independente da localização dos
nossos analfabetos, urge combater esse problema social. Para Pinto
e outros, “o melhor antídoto para o analfabetismo é assegurar escola
para todos na idade correta”, salientando, porém, que essa escola tem
que ser de qualidade, pois, caso contrário, “continuaremos a produzir
o analfabeto funcional, que, apesar de ficar até oito anos na escola,
não consegue avançar além das séries iniciais.” (PINTO et al., 2000,
p. 514-515).
Em função, especialmente, do processo de globalização e do
88 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

acelerado avanço científico e tecnológico dos dias atuais, jovens e


adultos necessitam fazer parte de um processo de contínuo desen-
volvimento de suas capacidades, para terem condições mínimas de
enfrentar as transformações do mundo moderno. Tudo isso alterou a
concepção tradicional de EJA, não mais restrita a um período particu-
lar da vida ou a uma finalidade circunscrita, mas funcionando como
uma educação continuada, uma educação ao longo de toda a vida, que
apenas se inicia com a alfabetização.
Outro desafio da EJA é o de atingir adequadamente a população
feminina analfabeta (ou semi-alfabetizada), ou seja, a necessidade
de “um a política que reconheça a existência de relações de hierar-
quia e desigualdade entre homens e mulheres, que se expressam em
opressão, injustiça, insubordinação e discriminação das mulheres, na
organização genérica das sociedades.” (NOGUEIRA, 2005, p. 66).
Na opinião dessa autora, há que se considerar que, por um lado, não
se constitui em
uma tarefa simples para a mulher a decisão de estudar
na idade adulta, ao contrário, trata-se de uma batalha
contra princípios, hierarquias, valores culturais arrai-
gados que ainda sobrevivem na nossa sociedade. O
momento da tomada de decisão, de se dizer ‘vou es-
tudar’, não é inconseqüente, ao contrário, é algo estu-
dado, planejado, negociado no âmbito das conflituosas
relações familiares e de trabalho. (Ib., id., p. 71-72,
aspas no original)

Por outro lado, os


elevados índices de analfabetismo feminino, presentes
no grupo etário mais velho da população, deveriam ser
motivos suficientes para que se priorizassem, nas polí-
ticas públicas voltadas para o atendimento das pessoas
jovens e adultas, as mulheres inscritas nesse grupo,
em cumprimento ao princípio constitucional que lhes
assegura o direito à educação. (Id., p. 75-76)

Assim, os “sujeitos da EJA não somente têm sexo, raça, reli-


gião, nacionalidade, etc., como também têm gênero.” (Id., 85-86).
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | 89

5.1. Oferta e atendimento

Sobre a oferta e o atendimento da Educação de Jovens e Adul-


tos (EJA), a primeira questão que abordaremos é sobre os programas
de erradicação do analfabetismo, já que, no início de 2006, o Brasil
ainda possuía mais de 4,6 milhões de alunos em programas de EJA,
ou seja, 11% da população brasileira com mais de 15 anos (Cf. CA-
FARDO, 2006, p. A12).
Durante o governo FHC foi criado o Programa Alfabetização
Solidária (PAS). Porém, esse programa não conseguiu reduzir signi-
ficativamente o número absoluto de analfabetos, visto que, segundo
dados do IBGE, se em 1999 tínhamos aproximadamente 15,4 milhões
de analfabetos com mais de 15 anos, em 2003 esse número foi redu-
zido para aproximadamente 14,7 milhões, ou seja, percentualmente,
o número de analfabetos, nesse período, diminuiu menos que 5%.
Nesse governo também foram criados outros dois programas voltados
à EJA, os programas Recomeço e Educação na Reforma Agrária.
Apesar disso, segundo Di Pierro, durante os 8 anos da gestão FHC,
o governo federal conferiu lugar marginal à educação
básica de jovens e adultos na hierarquia das prioridades
da reforma e da política educacional, fechou o único
canal de diálogo então existente com a sociedade civil
organizada – a Comissão Nacional de Educação de
Jovens e Adultos (CNEJA) – e, por meio do programa
Alfabetização Solidária, remeteu para a esfera da filan-
tropia parcela substancial da responsabilidade pública
pelo enfrentamento do analfabetismo. (DI PIERRO,
2005, p. 1128).

Sobre as propostas para a área da educação do governo Lula,


Cláudio M. Castro, utilizando o exemplo do MOBRAL, afirmou que,
no momento da implantação do mesmo, “já se sabia que programas
curtos de alfabetização de adultos não davam certo”, esquecendo-se
de incluir nessa categoria o PAS, implantado no governo FHC, que
propôs a alfabetização de jovens e adultos em apenas seis meses
(CASTRO, 2004, p. 109). Na opinião de Paiva, apesar de, no dis-
curso oficial, o governo FHC, apoiar o direito à educação dos jovens
90 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

e adultos, “as políticas governamentais não apenas descumpriam


oficialmente o preceito constitucional, como promoviam a exclusão,
deixando de garantir um dos direitos inerentes à condição cidadã a tão
largo contingente populacional, mantendo os não alfabetizados como
cidadãos pela metade” (PAIVA, 2004, p. 32).
Já no governo Lula, o primeiro ministro da Educação, Cristo-
vam Buarque, criou o Programa Brasil Alfabetizado, com o objetivo
de alfabetizar 20 milhões de jovens e adultos até 2006, ou seja, erra-
dicar o analfabetismo no Brasil1. Alguns especialistas consideraram
essa meta exagerada e inviável a curto e médio prazos, apesar de seu
significado simbólico (Cf. BEISIEGEL, 2003, p. 41). Nesse sentido,
Arelaro considera que o Projeto Brasil Alfabetizado foi “pretensioso
nos objetivos” e “não conseguiu a adesão esperada da sociedade,
mantendo-se como mais um dos que não disputaram, com o vigor
necessário, a prioridade de alfabetização urgente e competente dos
brasileiros.” (ARELARO, 2005a, p. 49). Já para Di Pierro, dentre os
aspectos polêmicos desse programa, além de contar “com recursos
orçamentários limitados e operando com um conceito estreito de
alfabetização”, destaca-se o
desenho assemelhado às campanhas de alfabetização
do passado, como a curta duração do módulo de ensino
e aprendizagem, ausência de instrumentos de acompa-
nhamento e avaliação, improvisação de alfabetizadores
com nenhuma ou escassa formação pedagógica, falta
de mecanismos que assegurem aos alfabetizandos a
continuidade de estudos e consolidação das aprendiza-
gens.” (DI PIERRO, 2005, p. 1129)

Seu sucessor, o ministro Tarso Genro, priorizou a questão da


Reforma Universitária, deixando em plano secundário o Programa
Brasil Alfabetizado, apesar de admitir, publicamente, que o Brasil
possuía, em 2004, 65 milhões de jovens e adultos, com mais de 15
anos de idade, sem o ensino fundamental completo. Desses 65 mi-

1 Segundo o IBGE, o número de analfabetos teve uma redução de apenas 134.222 pessoas, entre 2002 e
2004, e a taxa de evasão do Programa Brasil Alfabetizado em 2006 foi de 20% (Cf. www.ibge.gov.br , acesso
em 19/06/2005 e em 06/12/2006).
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | 91

lhões, 33 milhões são analfabetos funcionais que sequer completaram


a 4ª série, sendo que 16 milhões são analfabetos absolutos. Especifi-
camente entre 15 e 24 anos de idade, 19 milhões não completaram o
ensino fundamental e quase 3 milhões são analfabetos absolutos. Tais
números evidenciavam a “necessidade de resgatarmos a educação
como um direito de todos, jovens e adultos excluídos dos sistemas de
ensino.” (GENRO, 2004, p. 44), e dificilmente conseguiremos alcan-
çar o objetivo de erradicar o analfabetismo no Brasil, no curto e médio
prazo, apesar do número de matrículas, nas instituições públicas, em
cursos de EJA, ter crescido 5% em 2003 em relação a 2002, e 12,2%
no total de matrículas (aproximadamente 450 mil novas matrículas),
no mesmo período2. Porém, entre os anos de 2005 e 2006, não houve
crescimento estatístico do número de matrículas em EJA no Brasil3.
A erradicação do analfabetismo pode também ser dividida,
para se conferir uma maior eficácia à política educacional pública
dirigida ao segmento da Educação de Jovens e Adultos, em dois tipos
de ofertas específicas: o oferecimento de EJA para as séries iniciais
do Ensino Fundamental e para as séries finais do Ensino Fundamen-
tal. No primeiro segmento, há que se considerar que, além dos 14,7
milhões de analfabetos, temos mais 33 milhões de brasileiros que
não completaram a 4ª série do Ensino Fundamental, ou seja, temos
que oferecer as quatro primeiras séries do Ensino Fundamental para,
aproximadamente, 16,5 milhões de jovens e adultos, o que não conse-
guimos. No segundo segmento, temos que, para se conseguir oferecer
o Ensino Fundamental completo de 8 séries, seria necessário que as
matrículas de jovens e adultos nesse segmento, aumentassem de 3,9
milhões para 10,5 milhões, o que ainda não ocorreu.4.
Na tentativa de se chegar mais perto dessa meta, o governo Lula
lançou o PROJOVEM (Programa Nacional de Inclusão de Jovens),
destinado a jovens de 18 a 24 anos que terminaram a 4ª série, mas
não concluíram a 8ª série do Ensino Fundamental e que não possuem
vínculos formais de trabalho. Esse programa objetiva “proporcionar

2 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 10/08/2006.

3 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 09/02/2007.

4 Cf. www.mec.gov.br , acesso em 10/08/2006.


92 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

formação ao jovem, por meio de uma associação entre a elevação


da escolaridade, tendo em vista a conclusão do ensino fundamental,
a qualificação com certificação de formação inicial e o desenvolvi-
mento de ações comunitárias de interesse público.” Na opinião de
alguns autores, trata-se de mais um programa dentro do contexto das
chamadas políticas compensatórias, devido a “ausência do direito de
uma educação básica sólida e de qualidade.” (FRIGOTTO; CIAVAT-
TA; RAMOS, 2005b, p. 1102-1104).
Segundo Di Pierro, na gestão FHC, o MEC renunciou “à co-
ordenação interministerial dos programas de educação de jovens e
adultos”, mas “não abriu mão de instrumentos de controle e regulação
nacionalmente centralizados”. No governo Lula, o MEC “ainda não
foi capaz, porém, de recuperar a coordenação da política interminis-
terial da formação de jovens e adultos, que continua dispersa” entre
outros ministérios. O MEC também “não superou o padrão assimé-
trico adotado pelas gestões anteriores, pelo qual o governo federal
condiciona a cooperação técnica e financeira aos estados, municípios
e organizações sociais à adesão incondicional a projetos previamente
modelados.” (DI PIERRO, 2005, p. 1128-1130).
O estabelecimento de políticas públicas que facilitem o esta-
belecimento de parcerias para o aproveitamento dos espaços ociosos
existentes na comunidade, bem como o efetivo aproveitamento do
potencial de trabalho comunitário das entidades da sociedade civil,
para a EJA, se constitui em uma medida de fundamental importância
para o aumento da oferta e do atendimento dessa modalidade de ensi-
no. A utilização, no período noturno, dos espaços ociosos das escolas
públicas para a oferta de EJA é “uma medida que se tem mostrado
bastante eficaz em experiências distribuídas ao longo do país” (PIN-
TO et al., 2000, p. 523).
Existem diversos programas de alfabetização de jovens e adul-
tos que já se utilizam dessa estratégia de aproveitamento dos espaços
ociosos existentes na comunidade, aproveitando, também, de maneira
efetiva, o potencial de trabalho comunitário das entidades da socieda-
de civil, como, por exemplo, o Programa Especial de Jovens e Adultos
(PEJA) promovido pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), em
funcionamento há mais de 5 anos. Por outro lado, atualmente, apenas
3.397 dos 5.560 municípios brasileiros, ou seja, aproximadamente
61%, oferecem EJA, sendo que todos estes municípios recebem verba
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | 93

do MEC para esse fim, o que não ocorria até 2005 (Cf. CAFARDO,
2006, p. A12).
Outra importante questão é a da expansão da oferta de
programas de Educação a Distância (EAD), na modalidade de EJA.
Podemos dizer que essa expansão já constitui uma realidade no ce-
nário educacional brasileiro. O problema é que essa expansão nem
sempre vem acompanhada de qualidade, ou seja, a expansão, por
si só, quando não acompanhada de padrões mínimos de qualidade,
apenas garante a certificação/diplomação formal, mas não resolve os
principais desafios da EJA no Brasil, quer sejam, a erradicação do
analfabetismo e o aumento do nível de escolaridade dos brasileiros.
Associar a oferta de Ensino Fundamental para Jovens e
Adultos à oferta de cursos básicos de formação profissional também
se configura em uma importante estratégia para o aumento da oferta
de EJA. Recentemente, o MEC lançou o Programa de Integração da
Educação Profissional ao Ensino Médio na Modalidade de Educa-
ção de Jovens e Adultos (PROEJA)5, no qual as instituições da rede
federal de educação técnica e tecnológica6 são obrigadas a destinar,
a partir de 2006, 10% das vagas oferecidas em 2005 para o Ensino
Médio integrado à Educação Profissional para jovens (acima de 18
anos) e adultos que tenham cursado apenas o Ensino Fundamental,
objetivando ampliar os “espaços públicos da educação profissional
para os adultos e [como] uma estratégia que contribui para a univer-
salização da educação básica.” (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS,
2005b, p. 1097). Nessa questão, existe um outro projeto proposto pelo
MEC, iniciado em maio de 2006, denominado Saberes da Terra, que
oferece ensino fundamental aliado a uma formação profissionalizante
para 5 mil alunos (Cf. CAFARDO, 2006, p. A12).
Consideramos que tais projetos são de fundamental importân-
cia para o sucesso dos programas de EJA, por entendermos que a

5 Uma análise dos objetivos, finalidades e estrutura curricular, desse programa (PROEJA) pode ser encon-
trada, entre outros, em Frigotto; Ciavatta; Ramos (2005b, p. 1196-1100).

6 Essa rede é formada por 144 escolas de Educação Profissional, divididos da seguinte maneira: 34 Centros
Federais de Educação Tecnológica (CEFET’s, alguns já transformados em campus de Universidade Federal
Tecnológica, como é o caso dos CEFET’s localizados no Estado do Paraná, UFTPR), 43 unidades descentra-
lizadas, 36 escolas agrotécnicas federais (EAF’s), 30 escolas técnicas vinculadas às universidades federais, e
a Escola Técnica Federal de Palmas (Cf. FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005b, p. 1109).
94 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

integração desses programas com a Educação Profissional aumenta


a sua eficácia, na medida em que os torna mais atrativos, e a pers-
pectiva de uma qualificação profissional atua como incentivo aos
jovens e adultos com baixa (ou nenhuma) escolaridade. Outro aspecto
importante para o sucesso dos programas de EJA é a concessão de
incentivos financeiros, na forma de bolsas de estudo. Para Sonia M.
Rummert, a essência do problema dos alunos da EJA, “reside, preci-
samente, no fato de serem, em expressiva maioria, oriundos da classe
trabalhadora, para a qual a oferta de possibilidades de acesso e de
permanência na escola é historicamente regulada pelos interesses do
capital.” (RUMMERT, 2004, p. 139).
Uma outra medida importante seria a implantação nas unidades
prisionais e nos estabelecimentos que atendam adolescentes e jovens
infratores, programas de EJA de nível Fundamental e Médio, assim
como de formação profissional. Sabemos que em muitas unidades
prisionais e estabelecimentos que atendem adolescentes e jovens in-
fratores, já existem tais programas, porém, também sabemos que ain-
da estamos longe de atingir o objetivo de implantar esses programas
em todos os estabelecimentos prisionais existentes no Brasil, assim
como também não existe material didático-pedagógico adequado a
essa clientela específica, nem cursos a distância em estabelecimentos
prisionais.
Outra forma de aumentar a oferta de EJA é propor que as ins-
tituições de Educação Superior ofereçam cursos de extensão como
forma de educação continuada de adultos com ou sem formação
de nível superior. Atualmente, a oferta de cursos de extensão nas
diversas instituições de Educação Superior é significativa. Porém,
boa parte desses cursos de extensão acabam tendo como público
alvo, os estudantes dos cursos de graduação da própria instituição
que oferece o curso de extensão. Dessa maneira, o desafio maior é
fazer com que as instituições de Educação Superior ofereçam cursos
de extensão que configure-se efetivamente em uma modalidade de
educação continuada para jovens e adultos, público esse que pode ou
não possuir formação superior. Assim, advoga-se uma concepção de
que o conhecimento não é algo pronto e acabado, mas algo que está
em constante transformação, o que faz com que a educação continu-
ada deva ser vista como política pública e não como iniciativa e/ou
responsabilidade exclusiva do indivíduo.
Por último, nessa questão da oferta e atendimento da EJA, en-
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | 95

tendemos que as empresas públicas e privadas devem ser incentivadas


a criar programas permanentes de EJA para seus trabalhadores, assim
como condições para a recepção de programas de teleducação. Uma
significativa parte das empresas públicas e privadas brasileiras já
possuem programas dessa natureza, pois tais empresas já compreen-
deram que o aumento do nível de escolaridade de seus trabalhadores
é um fator que age diretamente no aumento do nível de produtividade,
na diminuição dos índices de acidentes de trabalho e na redução dos
níveis de desperdício. Porém, também é grande o número de empre-
sas (públicas e privadas) que ainda não deram a devida atenção a
esse problema. Assim, é de fundamental importância a compreensão
e o apoio dos empregadores, no sentido de considerar a necessidade
de formação permanente e de qualificação profissional, que pode se
dar na forma de flexibilização da jornada de trabalho, concessão de
licenças para freqüência em cursos de atualização e implantação de
cursos de EJA no próprio local de trabalho, e a criação de condições
adequadas para a recepção de programas de Educação a Distância.

Questão para Debate em Sala de Aula

Na sua opinião, quais seriam as melhores maneiras de erradicar


o analfabetismo no Brasil?

5.2. Formação do profissional

Em abril de 2006, o Brasil possuía quase 260 mil professores


de EJA, atuando em aproximadamente 45 mil escolas, o que traduz
uma proporção (aproximada) de 18 alunos por professor, média
que não pode ser considerada alta. Desse total de professores, 37%
possuem apenas o Ensino Médio completo e 63% possuem o Ensino
Superior completo. Soma-se a esses dados o fato de que apenas 14
universidades brasileiras oferecem cursos específicos de formação
de professores de EJA, das quais 4 estão situadas no Nordeste (Cf.
CAFARDO, 2006, p. A12). Para Soares, a formação de professores
de para trabalhar na EJA, “é, ainda, muito tímida” e a “habilitação
em EJA é rara nos cursos de graduação brasileiros”, fazendo com
96 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

que as diversas experiências positivas existentes nessa modalidade de


ensino, não seja “acompanhada por uma formação inicial do educador
que leve em conta as especificidades da vida jovem e adulta, fazendo
com que muitos trabalhem na base da ‘imporvisação’.” Assim, a
“falta de atenção a essas especificidades tem levado muitos profis-
sionais à mera transposição, para jovens e adultos, das atividades que
desempenham no ensino regular com crianças e adolescentes”, o que,
por sua vez, significa, na prática, uma infantilização no tratamento
desse público específico e heterogêneo (SOARES, 2005, p. 127-134,
aspas no original).
Segundo Pinto e outros, qualquer “programa que tenha como
foco a erradicação definitiva do analfabetismo no país deve priorizar
um elemento que é central para o seu sucesso: a qualificação dos alfa-
betizadores. O descuido com esse aspecto ajuda a entender o fracasso
de boa parte dos programas de alfabetização em massa que marcam
a história do país.” (PINTO et al., 2000, p. 522). Entendemos que
para se trabalhar com EJA é necessário uma especialização mínima
do corpo docente, visto que esse público específico é numeroso e
heterogêneo. Nesse sentido, programas específicos de formação de
educadores, capacitados para atuar com jovens e adultos, e habilita-
dos para, no mínimo, o exercício do magistério nas séries iniciais do
Ensino Fundamental, se constituem em um requisito primordial para
o sucesso dos programas de EJA.
Os exemplos que temos de oferta desse tipo de programa de
formação docente específica, por parte dos Estados brasileiros, são os
programas existentes nos Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro.
O MEC, por sua vez, possui, entre seus projetos, o PROFORMAÇÃO
(Programa de Formação de Professores em Exercício), que é um
curso de Habilitação para o Magistério, na modalidade Normal (a dis-
tância e de nível médio), destinado aos professores em exercício das
redes públicas, que atuam nas séries iniciais do Ensino Fundamental,
nas classes de alfabetização, ou ainda, nos programas de EJA, em
parceria com Estados e municípios. Esse programa já ultrapassou as
fronteiras brasileiras, sendo utilizado também em São Tomé e Prínci-
pe e no Timor Leste7.

7 Cf. www.mec.gov.br , acesso em 10/08/2006.


EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | 97

Questão para Debate em Sala de Aula

Na sua opinião, como fazer para aumentar o número de profes-


sores especializados em Educação de Jovens e Adultos?

5.3. Questões pedagógicas

No que se refere às questões pedagógicas proeminentes na EJA,


consideramos que o problema central é o da elaboração de parâmetros
nacionais de qualidade para as diversas etapas da EJA, respeitando-
se as especificidades da clientela e a diversidade regional, que ainda
são inexistentes. O que existe, e mais se aproxima da intenção dessa
proposta são as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
de Jovens e Adultos, que é muito diferente de parâmetros nacionais
de qualidade para as diversas etapas da EJA, e o ENCEJA (Exame
Nacional de Certificação da Educação de Jovens e Adultos), que é
um exame de certificação de conhecimentos, que não podemos, tam-
bém, afirmar tratar-se de parâmetros nacionais de qualidade para as
diversas etapas da EJA8.
Outro problema refere-se ao material didático-pedagógico a ser
utilizado pelos programas de EJA, para os cursos em nível de Ensino
Fundamental, de maneira que as escolas públicas, localizadas em
áreas com elevados índices de analfabetismo e de baixa escolaridade,
possam oferecer programas de alfabetização, de ensino e exames para
jovens e adultos. Na opinião de Paiva, educar jovens e adultos, “em
última instância, não se restringe a tratar de conteúdos intelectuais,
mas implica lidar com valores, com formas de respeitar e reconhecer
as diferenças e os iguais.” (PAIVA, 2004, p. 41). Nessa questão, o que
existe atualmente, em nível nacional, é a Coleção Viver e Aprender
produzida e distribuída pelo MEC. Essa coleção é composta por 4
volumes, cada qual composto por um Guia para o Educador e um
livro para o aluno. Existem também as Propostas Curriculares para
o 1º e 2º segmentos do Ensino Fundamental para Jovens e Adultos,
produzidas e distribuídas pela Coordenação Geral de EJA do MEC.

8 Cf. SOARES, 2005, p. 130 e www.mec.gov.br , acesso em 10/08/2006.


98 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Questão para Debate em Sala de Aula

Em sua opinião, quais os limites, vantagens e desvantagens, da


utilização da Educação a Distância (EAD) na oferta de Educação de
Jovens e Adultos (EJA)?

5.4. Financiamento e gestão

Com relação ao financiamento da EJA, sabemos que a mesma,


especificamente no nível do Ensino Fundamental, não foi contem-
plada pelo FUNDEF, ficando assim, efetivamente, prejudicada. Essa
modalidade de ensino foi prejudicada pela implantação do FUNDEF
porque as matrículas dos alunos de EJA não podiam ser computadas
para efeito de recebimento do valor redistribuído pelo FUNDEF.
Com a entrada em vigor do FUNDEB, a EJA passará a receber mais
recursos, pois suas matrículas passarão a ser computadas para efeito
de recebimento do valor a ser redistribuído pelo FUNDEB.
A questão da gestão da EJA pode ser analisada em função de
dois principais aspectos. O aspecto relacionado à avaliação (que inclui
diagnósticos, levantamentos e mapeamentos), e o aspecto relacionado
à administração da EJA.
Os levantamentos e avaliações anuais, sobre as experiências já
existentes em EJA, ainda não são realizados de maneira significativa.
A partir do momento que forem feitos e divulgados com certeza se
constituirão em mais uma referência para os agentes integrados ao
esforço nacional de erradicação do analfabetismo. Por outro lado, já
existem Estados e municípios que estão fazendo alguns mapeamentos
sobre a EJA. Como muitas dessas propostas partem de organismos da
sociedade civil, especialmente de Organizações Não-governamentais
(ONG’s), tais mapeamentos ganham maior importância ainda. Porém
sua ausência não impede a efetivação dessas propostas, apenas difi-
culta.
Para se ter uma idéia da importância de estudos específicos
(levantamentos e mapeamentos), e apenas como exemplo, na zona
rural, segundo dados do INEP, 29,8% dos adultos são analfabetos,
apenas 23% dos estudantes de 10 a 14 anos estão na série escolar
adequada à sua idade e a escolaridade média do morador das áreas
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | 99

rurais é de 3,4 anos. Já para a população urbana, esses índices são


de 10,3%, 7 anos e 47%, respectivamente. Se considerarmos que 32
milhões de brasileiros vivem no campo (aproximadamente 20% do
total da população brasileira), temos aí um significativo problema
educacional, e porque não dizer social, a ser resolvido9.
No que se refere especificamente à avaliação das propostas de
EJA, a realidade mostra que os processos de avaliação, bem como
suas respectivas divulgações, são consideravelmente onerosos, espe-
cialmente para os sistemas municipais de educação, ainda que sua
necessidade seja óbvia.
No contexto dos aspectos eminentemente administrativos da
EJA, dentro do contexto da gestão dessa modalidade de ensino, algu-
mas questões precisam ser destacadas. A primeira delas é a reestrutu-
ração, e/ou criação, e/ou fortalecimento dos setores responsáveis pela
EJA, no âmbito das secretarias estaduais e municipais de educação.
Entendemos que a resolução desse problema depende, de maneira
direta, da importância que os diversos Estados e municípios brasilei-
ros concedem à EJA. Quando se tem um município (ou mesmo um
Estado) que valoriza a questão, com certeza sua Secretaria Municipal
de Educação está preparada para o oferecimento desta modalidade
de ensino. Porém, quando o município, ou Estado, não prioriza o
oferecimento de EJA, não serão ações de reestruturação ou fortale-
cimento de secretarias (estaduais ou municipais) que transformarão a
oferta dessa modalidade de ensino em prioridade, mas sim a opção,
de caráter eminentemente político, de oferecer com qualidade, ou
não, programas de EJA.
Uma outra questão refere-se ao aperfeiçoamento do sistema
de certificação de competências para prosseguimento de estudos.
Como já afirmamos, atualmente está em vigor o ENCEJA, que é um
exame de certificação de conhecimentos que possui o objetivo de dar
condições formais para o prosseguimento de estudos. Consideramos
que essa questão é importante, porém, o problema central da EJA
não é o da certificação de competências, mas sim o da aquisição
dos conhecimentos básicos, que devem ser oferecidos pelo Ensino
Fundamental e Médio. A certificação meramente formal, por si só,

9 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 10/08/2006.


100 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

não ajuda no desenvolvimento, nem das pessoas, nem do país. Mais


do que aperfeiçoar o sistema de certificação, precisamos erradicar o
analfabetismo.
Um dos desafios mais importantes da EJA é fazer com suas
políticas sejam articuladas com as políticas de geração/proteção de
emprego/desemprego. Assim como é necessária a associação entre o
Ensino Fundamental para jovens e adultos e a oferta de cursos básicos
de formação profissional, também é fundamental que haja diferentes
formas de articulação entre os programas de EJA e as políticas públi-
cas de geração de emprego e renda, e as políticas de proteção contra
o desemprego. É fato que o Brasil possui um contingente de milhões
de trabalhadores informais e que o nosso índice de desemprego é
substancialmente alto, daí a importância crucial que essa articulação
seja efetiva.
Por último, e nessa mesma direção, é importante também que
haja uma articulação das políticas de EJA com as políticas culturais,
de forma que a clientela (jovens e adultos) seja beneficiária de ações
que permitam ampliar seus horizontes culturais. Essa articulação se
constitui em um passo importante no contexto da elaboração de políti-
cas públicas para a EJA, na medida que entendemos que as diferentes
manifestações culturais fazem parte de todos os processos educativos.
Porém, a articulação buscada deve ser conseqüência de efetivos e
coerentes programas de EJA, tanto em seus aspectos teóricos quanto,
e principalmente, em seus aspectos metodológicos.

Questão para Debate em Sala de Aula

Você considera importante a associação entre a oferta de Ensino


Fundamental para jovens e adultos e a oferta de Educação Profissional
para esse mesmo público?

5.5. Sugestões de Leituras Complementares

FÁVERO, O. Lições da história: os avanços de sessenta anos e a


relação com as políticas de negação de direitos que alimentam as
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS | 101

condições do analfabetismo no Brasil. In: OLIVEIRA, I. B.; PAIVA,


J. Educação de jovens e adultos. Rio de Janeiro: DP & A, 2004, p.
13-28 (Coleção O sentido da escola).

IRELAND, T. Escolarização de trabalhadores: apreendendo as


ferramentas básicas para a luta cotidiana. In: OLIVEIRA, I. B.;
PAIVA, J. Educação de jovens e adultos. Rio de Janeiro: DP & A,
2004, p. 55-70 (Coleção O sentido da escola).
CAPÍTULO 6

EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

No contexto do processo de universalização e democratização


do ensino brasileiro, em que os déficits educacionais e as desigual-
dades socioeconômicas e regionais são elevadas, os desafios postos
para a área da educação podem ter, na Educação a Distância (EAD),
um meio auxiliar e complementar importante. Porém, seus defensores
consideram que a EAD não pode mais ser tratada como uma modali-
dade supletiva ou complementar ao ensino presencial.
Prevista pelo Art. 80 da LDB e regulamentada pelos Decretos
2.561/98 e 2.494/98, a EAD só pode ser oferecida no Ensino Fun-
damental como forma de complementação da aprendizagem ou em
situações emergenciais (Cf. DAVIES, 2004, p. 150, 169, 186-187).
Segundo a LDB, a EAD deverá receber todo o incentivo do Poder Pú-
blico para o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino
a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educa-
ção continuada. A EAD, organizada com abertura e regime especiais,
deverá ser oferecida por instituições credenciadas pela União, que
é a instância responsável pela regulamentação dessa modalidade de
ensino.
Para Tedesco, “existe um forte consenso em reconhecer que a
incorporação das novas tecnologias da informação às escolas é prova-
velmente a estratégia mais importante do ponto de vista do acesso dos
setores desfavorecidos a essas tecnologias e que, nesse sentido, o papel
do Estado é fundamental.” Assim, dada a “diversidade de situações e
o enorme dinamismo que existe nesse campo, as estratégias políticas
deveriam basear-se no desenvolvimento de experiências, inovações
e pesquisas particularmente direcionadas a identificar os melhores
caminhos para um acesso universal a essas modalidades, que evite
o desenvolvimento de novas formas de exclusão e marginalidade.”
(TEDESCO, 2004, p. 12).
As normas para produção, controle e avaliação de programas
de EAD e a autorização para sua implantação caberão aos respectivos
104 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

sistemas de ensino, podendo haver cooperação e integração entre os


diferentes sistemas. A EAD também gozará de tratamento diferencia-
do, que incluirá a redução dos custos de transmissão de programas de
EAD, em canais comerciais de radiodifusão, e canais de sons e ima-
gens. Incluirá a concessão de canais com finalidades exclusivamente
educativas e reserva de tempo mínimo, sem ônus para o Poder Público,
pelos concessionários de canais comerciais. Apesar desses incentivos,
é necessário ressaltar que, no caso do Ensino Fundamental, a EAD só
poderá ser utilizada como complementação da aprendizagem ou em
situações emergenciais, visto que o Ensino Fundamental deverá ser,
necessariamente, presencial. No caso do sistema federal de ensino, a
Educação a Distância não poderá ultrapassar, nunca, o percentual de
20% do total dos conteúdos ministrados em aulas presenciais.
Assim como outras modalidades de ensino, a EAD possui as-
pectos positivos e negativos. Como aspectos positivos, têm-se a eco-
nomia de tempo, a liberdade de horário, a facilidade de comunicação
a partir de qualquer lugar, a possibilidade de ritmos diferenciados de
aprendizagem, a ampla oferta de material de pesquisa disponível na
internet e a possibilidade de interação por meio de salas de bate papo
(chats). Entre os aspectos negativos têm-se, entre outros, a necessida-
de – da parte do aluno – de uma disciplina maior, a ausência do conví-
vio social proporcionado pelo ensino presencial e a dificuldade de se
informar sobre a idoneidade das instituições que oferecem EAD. Por
outro lado, a EAD vem sendo bastante utilizada nas grandes empresas
por se constituir em um modo rápido de disseminar conhecimentos e
assim proporcionar treinamento em serviço para um grande número
de trabalhadores, a um custo relativamente baixo.
Nessa questão – a qualificação dos trabalhadores por meio da
EAD –, Belloni considera que em países como o Brasil, “a questão da
qualificação se coloca em todos os níveis: não apenas será necessário
oferecer à força de trabalho oportunidades de formação contínua de
atualização e retreinamento exigidas pelas mudanças econômicas e
tecnológicas, como também será imprescindível elevar o nível de
educação básica dos trabalhadores.” (BELLONI, 1999, p. 43).
Além de todos esses aspectos, no contexto da EAD, existe uma
diferença fundamental entre informação, que pode sempre ser obtida
por novas tecnologias, e formação do indivíduo, que vai muito além
da mera aquisição de informações. Programas educativos de qualida-
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA | 105

de podem ajudar no desenvolvimento social e cultural da população,


transformando-se em instrumentos de formação intelectual. Na opi-
nião de Belloni, “a escola deve integrar as tecnologias de informação
e comunicação porque elas já estão presentes e influentes em todas as
esferas da vida social, cabendo à escola, especialmente à escola públi-
ca, atuar no sentido de compensar as terríveis desigualdades sociais
e regionais que o acesso desigual a estas máquinas está gerando.”
(BELLONI, 2005, p. 10).
Por último, há que se considerar que a oferta de cursos – inte-
gralmente a distância ou semipresenciais – pode ajudar na formação
de jovens e adultos insuficientemente escolarizados, bem como aju-
dar na formação e capacitação de professores em serviço, dentro de
uma perspectiva de educação continuada, concepção que deve estar
presente em todas as áreas do conhecimento. Em todos esses casos, a
regulamentação e o controle de qualidade por parte do Poder Público
são indispensáveis e devem ser rigorosos.
Na questão do uso da EAD para programas de educação conti-
nuada, o Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre
Educação para o Século XXI, advoga que a EAD deve ser vista como
uma modalidade que ajuda a promover a educação permanente (ou
continuada), esse relatório considera que, em função das experiências
já existentes, mas “a tecnologia não pode, por si só, constituir uma
solução milagrosa para as dificuldades sentidas pelos sistemas edu-
cativos.” Assim, a EAD deve “ser utilizada em ligação com formas
clássicas de educação e não ser considerada como um processo de
substituição, autônomo em relação a elas.” (DELORS, 2001, p. 18,
85, 188).
Ainda no que se refere ao uso da EAD como mais um ins-
trumento a ser utilizado nos programas de educação continuada,
consideramos interessante observar que o atual PNE estipula 6 metas
sobre a questão da formação profissional que pode ser propiciada por
essa modalidade de ensino (EAD), o que explicita uma concepção
de educação que enxerga na EAD, bem como nas novas tecnologias
educacionais, uma das possibilidades metodológicas de formação
(inicial ou continuada), conjunta ou paralelamente, à formação pro-
fissional presencial. Para se ter uma idéia inicial da recente situação
da EAD no Brasil, segundo os últimos dados disponíveis do MEC,
em 2003, estavam credenciadas 53 instituições de ensino superior,
106 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

que ofereciam 63 cursos de EAD, para um total de quase 100 mil


alunos matriculados nesses cursos, já em 2006 havia 205 cursos de
EAD (graduação, tecnológicos ou pós-graduação), com pouco mais
de 575 mil alunos matriculados1.

6.1. Oferta e atendimento

Uma importante questão de oferta e atendimento de EAD é a


questão da utilização dos canais educativos televisivos e radiofôni-
cos, assim como redes telemáticas de educação, para a disseminação
de programas culturais e educativos, de forma que se assegure às
escolas e à comunidade condições básicas de acesso a esses meios.
Isso já ocorre, na medida em que os canais educativos já disseminam
programas culturais e educativos, ou seja, está dada a primeira das
condições básicas para uma EAD de qualidade. Por outro lado, o
governo FHC também equipou a maioria das escolas públicas para a
recepção, gravação e reprodução dos programas gerados pelos canais
educativos, por meio da compra e instalação de antenas parabólicas,
televisores e videocassetes, restando às escolas e às comunidades
fazerem uso dessa modalidade de ensino como um novo e comple-
mentar instrumental didático e pedagógico.
Outra questão importante refere-se à reserva de tempo míni-
mo, sem ônus para o Poder Público, para transmissão de programas
educativos pelos canais comerciais de rádio e televisão, inclusive em
horários nobres. Esta proposta já foi enviada ao Congresso Nacional,
porém sua tramitação encontra-se estacionada, devido, especialmen-
te, ao forte lobby contrário, exercido tanto pelas emissoras comerciais
de rádio e televisão, quanto pelos próprios deputados e senadores que,
em número considerável, são concessionários de canais comerciais de
rádio e televisão.
Por último, na questão da oferta e atendimento de EAD,
temos a questão da ampliação da oferta de programas de formação a
distância para a Educação de Jovens e Adultos (EJA), especialmente

1 Cf. www.mec.gov.br , acesso em 17/08/2005 e 15/09/2007.


EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA | 107

no que diz respeito à oferta de Ensino Fundamental, com especial


consideração para o potencial dos canais radiofônicos e para o atendi-
mento da população rural.
A oferta de EAD no Brasil têm crescido ano após ano. Segundo
o Anuário Brasileiro Estatístico de Educação Aberta e a Distância
2006, nos programas de EJA, Ensino Profissional, Ensino Médio e
Ensino Fundamental, o número de matrículas já superou 150 mil, to-
talizando pouco mais de 500 mil alunos quando se incluem os cursos
de graduação e pós-graduação a distância, em instituições autorizadas
a dar certificados ou diplomas válidos no sistema nacional de ensino
(Cf. ANUÁRIO, 2006).
Em termos de ampliação da oferta de programas de formação
a distância em programas de EJA, especialmente no que diz respeito
à oferta de Ensino Fundamental, também existe o PROFORMAÇÃO
(Programa de Formação de Professores em Exercício), projeto do
MEC que visa a conceder formação de nível médio e a distância – por
meio da oferta de Habilitação para o Magistério, modalidade Normal
–, aos professores em exercício das redes públicas, que também atuam
em programas de EJA.
Tendo como referência todas as informações acima descritas,
podemos afirmar que, apesar do aumento constante da oferta de cur-
sos de EAD, ainda falta promover uma melhor oferta de programas
de formação a distância para a Educação de Jovens e Adultos (EJA),
especialmente no que diz respeito à oferta de Ensino Fundamental di-
recionada, especificamente, para o atendimento da população rural.

Questão para Debate em Sala de Aula

Em sua opinião, a Educação a Distância (EAD) poderia ser


oferecida em todo e qualquer nível de ensino (Ensino Fundamental,
Ensino Médio e/ou Ensino Superior)?

6.2. Formação do profissional

No que se refere à formação profissional realizada por meio da


108 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

EAD, algumas questões precisam ser discutidas. A primeira delas é


a proposta de oferecimento de cursos a distância, em nível superior,
especialmente na área de formação de professores para a Educação
Básica. Silva Jr. considera que a educação a distância deve ser apenas
uma “forma de auxiliar a formação de professores, mas jamais poderá
ser a única maneira de fazê-lo.” (SILVA JR., 2003, p. 92).
Muitos Estados, na segunda metade da década de 90, com
financiamento de organismos internacionais, entre outros, do Banco
Mundial, passaram a oferecer cursos de formação de professores para
a Educação Básica, em nível superior, totalmente a distância ou semi-
presenciais. No Estado de São Paulo, por exemplo, já aconteceram o
PEC FOR PROF (Programa de Formação Continuada para Profes-
sores) e o PEC - Municípios. O primeiro foi voltado para professores
efetivos da rede estadual de ensino e o segundo foi direcionado para
professores das redes municipais que ainda não possuíam curso su-
perior. Originalmente pensado também para professores das redes
municipais que ainda não possuíam curso superior, a UNESP criou o
projeto Pedagogia Cidadã, que passou a aceitar qualquer pessoa que
já tivesse concluído o Ensino Médio. Porém, em função dessa e de
outras graves deficiências em sua concepção e execução, esse progra-
ma já está sendo remodelado pela própria universidade, pois oferecia
uma formação aligeirada. Até recentemente, a UNIREDE (consórcio
formado por 74 universidades públicas) havia aberto apenas 13 mil va-
gas, de um total de 600 mil vagas inicialmente prometidas, em cursos
de graduação a distância destinados à formação de professores2. Para
Vani Moreira Kenski, o maior desafio, no contexto brasileiro, é a
formação de professores capazes de lidar com alunos
e situações extremas: dos alunos que já possuem
conhecimentos tecnologicamente avançados e acesso
pleno ao universo de informações disponíveis nos múl-
tiplos espaços virtuais aos que se encontram em plena
exclusão tecnológica, sem oportunidade para vivenciar
e aprender nesta nova realidade; das instituições de
ensino equipadas com as mais modernas tecnologias

2 Cf. www.mec.gov.br , acesso em 14/08/2006.


EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA | 109

digitais aos espaços educacionais precários e com re-


cursos mínimos para se trabalhar. (...) Antes de tudo, é
preciso que haja transparência e clareza sobre as reais
possibilidades de ação docente com o uso de tecnolo-
gias. (KENSKI, 2001, p. 74, 76)

Torres, ao analisar as tendências de formação de professores


com base nas orientações advindas do Banco Mundial, considera
que na relação dicotômica entre professores e tecnologia educativa, a
opção é sempre pela tecnologia, buscando nela “não só um apoio ao
educador, mas um substituto e uma ‘solução’ para o problema docen-
te”, tais como “baixos salários, deficiente formação, escasso tempo
disponível, etc.” (TORRES, 1996, p. 174, aspas no original). Para
Belloni, a formação de professores por meio da EAD, mais do que um
meio utilizado para proporcionar formação inicial aligeirada, como
é o caso dos programas já citados, exige uma “reflexão sobre como
formar professores enquanto futuros usuários ativos e críticos bem
como os professores conceptores de materiais para a aprendizagem
aberta e a distância.” (BELLONI, 1999, p. 77).
Outra proposta no contexto da questão da formação do pro-
fissional realizada por meio da EAD é a que propõe a ampliação
gradativa da oferta de formação a distância em nível superior para
todas as áreas, incentivando a participação das universidades e das
demais instituições de Educação Superior credenciadas. O problema
de ampliação da oferta de formação a distância em nível superior para
todas as áreas é que, diferente da área da educação, as outras áreas de
conhecimento são mais rígidas naquilo que consideram como con-
teúdos e metodologias adequadas para suas respectivas formações.
A maioria dessas áreas não considera que a EAD seja a resolução de
todos os problemas de formação, pelo contrário, áreas mais sérias que
a educação jamais permitiriam conceder um diploma de nível supe-
rior, equivalente a um curso de graduação em Pedagogia, para alunos
que freqüentassem um curso totalmente a distância, com duração de
exíguos 15 meses e com apenas 3 dias de aulas (de 2 horas cada) por
semana, forma em que foi realizado o PEC FOR PROF, promovido
pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, alguns anos
atrás. Isso não significa que outras áreas do conhecimento não pos-
sam – ou não queiram – se utilizar dessa modalidade de ensino (EAD)
110 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

como mais um instrumental na formação inicial e/ou continuada de


seus profissionais. Significa apenas que muitas áreas de conhecimen-
to vislumbraram as possibilidades dessa modalidade de ensino, mas
também já enxergaram os seus limites.
Ainda na questão da formação do profissional realizada por
meio da EAD, outra proposta recorrente é que sejam incentivadas, es-
pecialmente nas universidades, a formação de recursos humanos para
a EAD. Entendemos que essa proposta já encontra-se em execução,
na medida em que, cada vez mais, as universidades estão oferecendo
cursos, por exemplo de graduação e de pós-graduação a distância,
que, de maneira direta, necessitam de recursos humanos qualificados
nessa modalidade de ensino. Para se ter uma idéia, se em 2004 havia
pouco mais de 300 mil alunos matriculados em cursos de graduação
e de pós-graduação, em 2005 o número de matrículas passou para
pouco mais de 500 mil. Esse crescimento “obriga”, de certa maneira,
as universidades a formar recursos humanos qualificados em EAD
(Cf. ANUÁRIO, 2006).
Uma outra proposta, no contexto da questão da formação do
profissional realizada por meio da EAD, é a de capacitar, no curto
prazo, professores das escolas públicas para a utilização plena da TV
Escola e de outras redes de programação educacional. O Programa
TV Escola é destinado ao Ensino Fundamental e Médio, sendo que
suas orientações estão ancoradas nas Diretrizes Nacionais Curricu-
lares e nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Segundo Silva Jr.,
o TV Escola se constitui no “núcleo forte” do PROINFO, que inclui
também o PROFORMAÇÃO e o programa Salto para o Futuro, que
é uma “ferramenta para a formação continuada para os professores
em exercício.” (SILVA JR., 2003, p. 84). Na opinião de Toschi, o
“Programa TV Escola não tem condições de fazer a revolução no en-
sino pretendida pelos elaboradores da política de formação docente,
nem tem possibilidade de sanar as graves deficiências de capacitação
docente, como desejavam seus implantadores.” Segundo esta autora,
o “TV Escola não é EAD, sendo mais um programa de apoio material
às atividades do professor do que programa de formação de professo-
res a distância.” (TOSCHI, 2001, p. 99, 101).
Especificamente no caso dessa proposta, mesmo considerando
todos os argumentos aqui explanados, podemos afirmar, com tranqüi-
lidade, que, como a maioria das escolas públicas já está equipada para
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA | 111

a utilização plena da TV Escola e de outras redes de programação


educacional, uma parte de seus professores já está capacitada para
esse fim. Por outro lado, em muitas escolas, especialmente nas regi-
ões menos desenvolvidas do país, as informações disponíveis são de
que essa capacitação ainda não ocorreu.
Uma outra proposta oficial de capacitação profissional realiza-
da por meio da EAD, é a de capacitar, no médio prazo, professores
multiplicadores em informática da Educação. Para o MEC, os profes-
sores multiplicadores seriam formados em cursos de pós-graduação
lato sensu, tornando-se os especialistas que formariam os professores
cursistas nas suas escolas. Porém, em termos pedagógicos, “as novas
tecnologias educacionais trazem consigo a limitação de opções para
a formação, além de tornar rígido o campo de ação dos professores
multiplicadores, e, consequentemente, mais rígida a ação dos profes-
sores cursistas.” (SILVA JR., 2003, p. 82, 84). Uma vez que o governo
federal está comprando um significativo número de computadores
destinados às escolas públicas brasileiras, em condições de acesso
à internet, o passo seguinte – e que consideramos, sine qua non –
é a capacitação dos professores em informática, de forma que eles
possam ser multiplicadores e principalmente, agentes que permitirão
a plena de utilização dos computadores pelos alunos, completando
assim de democratização do processo educativo através do uso de
novas tecnologias.

Questões para Debate em Sala de Aula

a) Você considera válidos, para fins de inserção efetiva no mer-


cado de trabalho, os cursos de formação profissional, de nível médio,
feitos totalmente a distância? Por quê?

b) Você acha que existem cursos de nível superior (graduação)


que não são passíveis de serem oferecidos totalmente a distância?
Quais? Por quê?
112 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

6.3. Questões pedagógicas

Sobre as questões pedagógicas presentes na EAD, discutiremos


duas proposições. A primeira é a que propõe que, quando do uso dessa
modalidade de ensino, sejam promovidas imagens não estereotipadas
de homens e mulheres na Televisão Educativa, incorporando em sua
programação temas que afirmem pela igualdade de direitos entre
homens e mulheres, assim como a adequada abordagem de temas
referentes à etnia e portadores de necessidades especiais.
É de conhecimento público que as Televisões Educativas exis-
tentes no Brasil já se pautam por esses princípios. O grande desafio
é estender esses princípios para as chamadas redes comerciais de
televisão. Esse desafio já está sendo enfrentado, ainda que de maneira
incipiente, pela sociedade brasileira, por exemplo, com a criação de
uma comissão existente na Câmara de Deputados, que luta contra
programas de baixo nível cultural exibidos pelas redes comerciais de
televisão. Essa comissão procura fazer uma divulgação intensa dos
patrocinadores de programas de baixo nível ético, que fazem uso de
estereótipos e das mais diversas formas de preconceito. Independete-
mente de se tratar de EAD ou ensino presencial, Oliveira e Miranda
consideram que
o multiculturalismo pode ajudar aos grupos com re-
presentação minoritária incluídos em um quadro de
hierarquias, posicionados como subalternos. Construir
uma proposta educacional com essa perspectiva nos leva
ao reconhecimento dos erros promovidos pela escolari-
zação e de suas marcas ao longo da história do sistema
educacional. (OLIVEIRA; MIRANDA, 2004, p. 67)

A segunda proposição é a de que seja oferecido amplo apoio,


financeiro e institucional, para a pesquisa na área de EAD. Esse apoio
já está ocorrendo, pois as agências de fomento brasileiras estão des-
tinando recursos cada vez mais significativos para a pesquisa nessa
área, assim como as universidades brasileiras estão apoiando institu-
cionalmente tais pesquisas. Consideramos porém que, além de apoiar
financeira e institucionalmente a pesquisa em EAD, é necessário o
estabelecimento de uma política pública para essa modalidade de
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA | 113

ensino que inclua a questão do fomento à pesquisa.

Questões para Debate em Sala de Aula

a) Na sua opinião, quais seriam os limites, as vantagens e as


desvantagens da EAD, como mais uma modalidade de ensino?

b) Se lhe fosse dada a opção de fazer um curso de graduação


presencial ou o mesmo curso, porém totalmente a distância, qual você
escolheria? Por quê?

6.4. Sugestões de Leituras Complementares

CADERNOS CEDES. Televisão, internet e educação: estratégias


metodológicas com crianças e adolescentes. CEDES - Centro de
Estudos Educação e Sociedade, Campinas, n. 65, jan./abr. 2005.

MAGALHÃES, L. K. C. Programa TV Escola: o dito e o visto. In:


BARRETO, R. G. (Org.). Tecnologias educacionais e educação
a distância: avaliando políticas e práticas. Rio de Janeiro: Quartet,
2001, p. 105-119.

TEDESCO, J. C. (Org.). Educação e novas tecnologias: esperança ou


incerteza? Tradução de Claudia Berliner e Silvana Cobucci Leite. São
Paulo: Cortez; Buenos Aires: Instituto Internacional de Planeamiento
de la Educacion; Brasília: UNESCO, 2004.

TOMMASI, L.; WARDE, M. J.; HADDAD, S. (Orgs.). O Banco


Mundial e as políticas educacionais. São Paulo: Cortez/PUC-SP/
Ação Educativa, 1996.
CAPÍTULO 7

ENSINO PROFISSIONAL

O Ensino Profissional no Brasil está estruturado a partir da


reforma implementada pelo governo FHC, do ponto de vista opera-
cional, em três níveis: básico, técnico ou tecnológico. Nas palavras
de Oliveira, a “reformulação do ensino ministrado pelas escolas
profissionalizantes de nível médio representou um dos retrocessos na
nova política do ensino profissional, pois, além de a mesma ter sido
efetivada de forma autoritária pelo MEC, expressou a recomposição
no âmbito do sistema educacional brasileiro da dicotomia entre os
ensinos geral e profissional.” (OLIVEIRA, 2003, p. 25).
Os cursos profissionais de nível básico são abertos a toda a
população, independente do nível de escolarização do aluno. Já os
cursos profissionais de nível técnico/tecnológico são cursos comple-
mentares ao Ensino Médio, e cursos superiores de graduação ou pós-
graduação, são denominados especificamente de tecnológicos. Essa
nova estruturação do Ensino Profissional foi implementada logo após
a sanção da nova LDB, por meio da edição do Decreto 2.208/97, sob
a influência das determinações teóricas do Banco Mundial para essa
modalidade de ensino, e no caso dos países da América Latina, tam-
bém sob influência das orientações da CEPAL (Comissão Econômica
para a América Latina e Caribe).
As reformas educacionais propostas pelo Banco Mundial, onde
se insere a reforma do Ensino Profissional e do Ensino Médio, pautam-
se por um processo de descentralização administrativa, de privatização
do ensino médio e superior, de condensação do ensino profissional, de
maior atenção à escola básica e do estabelecimento de instrumentos
globais de avaliação (Cf. CASTRO; CARNOY, 1997). Zibas, por sua
vez, afirma que essa opção brasileira de separar o Ensino Médio do
Ensino Profissional, nos aproxima do modelo espanhol, não só pela
nova organização do Ensino Profissional em “módulos exclusivamente
técnico-profissionalizantes, mas, principalmente, pelo seu afastamento
da via de acesso à universidade” (ZIBAS, 2001, p. 94-95).
116 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Segundo Oliveira, tanto a CEPAL como o Banco Mundial,


“com justificativas variadas, vão criando um novo ideário educacional
que, paulatinamente, vai sendo incorporado pelos responsáveis pelas
políticas educacionais. Em todas estas proposições são esquecidos os
condicionantes socioeconômicos e políticos que têm influência deter-
minante sobre o desenvolvimento educacional.” No caso específico
do Ensino Profissional, a presença da iniciativa privada justifica-se,
para o Banco Mundial, por duas razões: a primeira é o fato do poder
público, em virtude de seu aparelho burocrático, mostrar-se “incapaz
de acompanhar as mudanças e as necessidades do setor produtivo.” A
segunda razão refere-se ao fato da qualificação profissional repercutir
diretamente “no aumento da produtividade das empresas e na renda
dos trabalhadores”, sendo assim, “nada mais justo que os beneficiados
pagarem por estes serviços.” (OLIVIERA, 2003, p. 54-59).
Atualmente, quando se discute Ensino Profissional, entende-se
que a formação para o trabalho exige maiores níveis de formação
básica, geral e propedêutica, contrariando a idéia de que o Ensino
Profissional se reduz à aprendizagem de habilidades técnicas. Por
outro lado, continuam abertas as oportunidades de adaptação do tra-
balhador ao mercado de trabalho, a partir de uma formação adquirida
por meio de cursos específicos de curta duração, que proporcionam
também um aumento no seu nível de escolarização. Por um ou outro
caminho, o Ensino Profissional passa a ser concebido como educação
continuada, que, como tal, perpassa toda a vida do trabalhador.
Ainda que não trate especificamente do Ensino Profissional, o
Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educa-
ção para o Século XXI defende a adoção do que chama de “sistema
de alternância”, ou seja, “períodos de estudo alternando com períodos
de trabalho”. Esse sistema, além de aproximar a escola do mundo do
trabalho, daria aos “adolescentes os meios de enfrentar as realidades
sociais e profissionais e, deste modo, tomar consciência de suas fraque-
zas e das suas potencialidades: tal sistema será para eles, com certeza,
um fator de amadurecimento”. A alternância entre escola e trabalho
“devem ocupar um lugar cada vez mais importante na sociedade,
graças a novas formas de certificação, a uma passagem mais fácil de
um tipo ou de um nível de ensino para outro, e as separações menos
estritas entre educação e trabalho”. (DELORS, 2001, p. 122-123).
O MEC, durante o governo FHC, optou, como política educa-
ENSINO PROFISSIONAL | 117

cional para o Ensino Profissional, pela completa separação dessa mo-


dalidade de ensino do Ensino Médio, regulamentando essa medida por
meio do Decreto 2.208/97 (Cf. DAVIES, 2004, p. 187). No governo
Lula, a idéia de reunificar o Ensino Médio com o Ensino Profissional
retornou, a partir da edição do Decreto 5.154/04, o qual regulamenta
o § 2º do Art. 36 e os Arts. 39 a 41 da LDB, e da publicação do Parecer
CNE/CEB 39/2004, que dispõe sobre a aplicação do novo decreto na
Educação Profissional técnica de nível médio e no Ensino Médio.
Frigotto, Ciavatta e Ramos, consideram que a política para
o Ensino Profissional no governo Lula, não se constituiu ainda em
uma “política pública do Estado brasileiro”, pelo contrário, “o que se
revelou foi um percurso controvertido entre as lutas da sociedade, as
propostas de governo e as ações e omissões no exercício do poder.”
(2005b, p. 1088). Na opinião de Ferreira e Garcia, a gestão do minis-
tro Tarso Genro à frente do MEC, já no governo Lula, optou por “não
priorizar a política de integração do EM [Ensino Médio] com a EP
[Educação Profissional].” O conteúdo do Decreto 5.154/04 contraria
a proposta para o Ensino Profissional contida no documento Uma
escola do tamanho do Brasil, proposta de governo do então candidato
Lula (Cf. FERREIRA; GARCIA, 2005, p. 151-153).
No contexto da LDB, os artigos que tratam do Ensino Profissio-
nal são concisos e objetivos, criando maiores possibilidades de acesso
à essa modalidade de ensino, porém, sem a adoção de “fórmulas má-
gicas” que visam facilitar o ensino e a aprendizagem dos conteúdos
concernentes à mesma. Na opinião de Frigotto, Ciavatta e Ramos,
o governo Lula deveria ter realizado uma reforma integral na atual
LDB, mas optou, assim como em 1942, a fazer reformas parciais, o
que nos obriga a reconhecer “que governo Lula, também nesse campo,
não assumiu, se não marginalmente, o projeto discutido com as forças
progressistas no período pré-eleitoral” (2005b, p. 1107).
Segundo a LDB, o Ensino Profissional, deverá ser integrado às
diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia,
conduzindo o aluno ao permanente desenvolvimento de aptidões para
a vida produtiva. O aluno matriculado ou egresso do Ensino Funda-
mental, Médio e Superior, bem como o trabalhador em geral, jovem
ou adulto, terá a possibilidade de acesso ao Ensino Profissional, que
deve ser desenvolvido articuladamente com o ensino regular, ou
ainda, através de diferentes estratégias de educação continuada, em
118 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

instituições especializadas ou no ambiente de trabalho.


Assim, o Ensino Profissional pode se dar de, pelo menos, três
maneiras: Ensino Profissional articulado com o ensino regular, Ensino
Profissional ministrado na forma de educação continuada em institui-
ções especializadas ou Ensino Profissional ministrado na forma de
educação continuada no ambiente de trabalho. Interessante notar que,
no caso do ensino profissional, não estão previstas formas facilita-
doras de “avanço” no aprendizado, como por exemplo, progressão
continuada, classes de aceleração, supletivos, etc, que são permitidas
para o ensino regular dos níveis Fundamental e Médio.
O conhecimento adquirido no Ensino Profissional, inclusive o
conhecimento adquirido na forma de educação continuada no am-
biente de trabalho, poderá ser objeto de avaliação, reconhecimento e
certificação, com objetivo de permitir o prosseguimento ou conclusão
de estudos do aluno, sendo que os diplomas de cursos dos Educação
Profissional, quando registrados, são válidos em todo o território
nacional, porém, a “certificação da qualificação profissional não
permite aos seus portadores ingressarem no ensino superior, pois este
acesso é reservado exclusivamente àqueles que concluíram o ensino
médio” (OLIVEIRA, 2003, p. 31). Dessa maneira, valoriza-se toda a
experiência prática do aluno, que já se utiliza, profissionalmente, de
uma série de conteúdos próprios do Ensino Profissional. Essa era a
situação anterior, determinada pelo Decreto 2.208/97.
Na situação atual, normatizada pelo Decreto 5.154/04, onde
houver a reintegração entre o Ensino Médio e o Ensino Profissional,
o aluno poderá ter o certificado de conclusão do Ensino Médio, possi-
bilitando assim, seu acesso à Educação Superior. O reconhecimento e
certificação do conhecimento adquirido, inclusive no trabalho, possui
o objetivo de permitir que o trabalhador continue se aperfeiçoando,
por meio de novos estudos (Cf. FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS,
2005a).
As escolas técnicas e as escolas profissionais, além dos seus
cursos regulares, poderão oferecer cursos especiais, abertos à comu-
nidade, cuja matrícula estará condicionada à capacidade de aprovei-
tamento, e não necessariamente ao nível de escolaridade, aumentan-
do assim, as possibilidades de acesso aos mais diferentes cursos e
programas de Ensino Profissional. Ao valorizar a idéia de educação
continuada, ao invés da idéia de “progressão continuada”, fica claro
ENSINO PROFISSIONAL | 119

que o Ensino Profissional está muito mais dirigido para o aprendizado


efetivo dos conteúdos do que com o “avanço” do aluno em direção
à aquisição do certificado ou diploma formal, diferentemente do que
ocorre com os outros níveis de ensino (Fundamental e Médio).

Questão para Debate em Sala de Aula

Na sua opinião, qual a importância do Ensino Profissional no


atual contexto socioeconômico brasileiro?

7.1. Oferta e atendimento

Na questão da oferta e do atendimento do Ensino Profissional,


uma das propostas existentes é que seja aumentada a capacidade
instalada na rede de instituições de Ensino Profissional para haja uma
maior a oferta de cursos básicos destinados a atender à população que
está sendo excluída do mercado de trabalho. Segundo Rummert, a
“educação básica de jovens e adultos trabalhadores tem constituído,
desde meados da década de 1990, objeto de interesse e diferentes
iniciativas por parte de entidades representativas da classe trabalha-
dores”, devido, especialmente, à dois fatores:

forte presença da temática educacional nos discursos


hegemônicos que vinculam, de forma direta, a educação
e a elevação da escolaridade à superação das profundas
desigualdades sociais, que constituem marca da estru-
tura socioeconômica do país” e a “política de formação
profissional implementada pelo governo federal a partir
de 1995, por meio do PLANFOR [Plano Nacional de
Formação Profissional, hoje denominado Plano Nacional
de Qualificação], que possibilitou às entidades sindicais
acesso a significativo volume de recursos financeiros
oriundos do Fundo de Amparo do Trabalhador (FAT),
para desenvolver ações no âmbito da educação dos traba-
lhadores. (RUMMERT, 2004, p. 138)
120 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Segundo Frigotto, Ciavatta e Ramos, esses cursos foram ofere-


cidos no âmbito do PLANFOR, no contexto da política para o Ensino
Profissional do governo FHC, com o objetivo de “atender a demandas
por qualificação e requalificação profissional da população adulta de
baixa escolaridade por intermédio de uma rede específica de cursos
de curta duração, completamente dissociados da educação básica e de
um plano de formação continuada.” (2005b, p. 1096).
Existem hoje no Brasil, quase 3 mil escolas que oferecem
cursos técnicos, das quais, aproximadamente 800 são públicas. O
número de matrículas no Ensino Profissional, na Educação Básica,
cresceu 14,5% entre os anos de 2002 e 2003 (675 mil matrículas),
enquanto que em 2003, segundo Ferreira e Garcia, havia “um total
de 3.538.871 alunos matriculados no Ensino Profissional, sendo
329.256 alunos em 143 instituições da rede federal, 165.266 alunos
em 553 instituições da rede estadual, 19.479 alunos em 115 institui-
ções da rede municipal e 3.024.870 alunos em 1.213 instituições da
rede privada”, dados estes que demonstram uma nítida “expansão da
oferta da educação profissional no governo FHC, mas também, fica
evidente o acentuado caráter privado da reforma, pois se verifica que
é nesse setor a maior concentração de matrículas”, aproximadamente
85,5% do total de matrículas (FERREIRA; GARCIA, 2005, p. 149).
Por outro lado, entre os anos de 2005 e 2006, o número de matrículas
no Ensino Profissional cresceu apenas 5%1.
Há que se tomar cuidado também com a concepção presente na
idéia de se oferecer cursos básicos visando atender à população que está
sendo excluída do mercado de trabalho, que no nosso entendimento,
procura, digamos assim, “naturalizar” a questão do desemprego ou,
numa análise mais detalhada, responsabilizar o próprio trabalhador
(o indivíduo) pelo fato de estar excluído do mercado de trabalho,
quando entendemos que o desemprego, que produz um exército de
reserva de mão de obra, se constitui em uma das principais caracte-
rísticas (ou conseqüências) do modo capitalista de produção da vida
material, característica exacerbada pelo chamado neoliberalismo,
cujos propagadores no Brasil cunharam, para essa situação, o termo

1 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 09/02/2007.


ENSINO PROFISSIONAL | 121

“empregabilidade”.
Outra proposta existente é a de integrar a oferta de cursos
básicos profissionais com oferta de programas que permitam aos
alunos que não concluíram o Ensino Fundamental obter formação
equivalente. Segundo o Censo Escolar 2004, o número de matrículas
nas escolas técnicas públicas cresceu, em um ano, 7% (18 mil novas
matrículas), ao passo que nas escolas técnicas particulares o cresci-
mento foi da ordem de 21% (67 mil novas matrículas). Esse dados
corroboram a necessidade de integrar os cursos básicos profissionais
com o Ensino Fundamental e Médio, sempre que essa integração for
possível, especialmente para que os alunos que não concluíram o
Ensino Fundamental venham a obter essa formação e, concomitante-
mente, a formação profissional. Nesse sentido, o governo Lula lançou
o Programa Escola de Fábrica, que visa a dar formação profissional
inicial a jovens de 16 a 24 anos matriculados na Educação Básica
(Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação de Jovens e Adul-
tos), oriundos de famílias com renda per capita de até um salário
mínimo (Cf. FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005b, p. 1101).
Assim como o PROJOVEM, o Programa Escola de Fábrica
também se constitui em um programa inserido no contexto de uma
política compensatória de educação, com o agravante de, em algumas
situações específicas, possuir também um viés assistencialista. Para
piorar, “essa política retoma o fundamento que esteve na origem da
educação profissional no início do século passado: formar mão-de-
obra necessária ao desenvolvimento econômico e educar psicofisica-
mente os jovens trabalhadores para a divisão social do trabalho.” (Ib.,
id., p. 1104, itálico no original).
Necessária se faz também a ampliação da capacidade instalada
na rede de instituições de Ensino Profissional, para que haja um au-
mento significativo da oferta de formação de nível técnico aos alunos
nelas matriculados ou egressos do Ensino Médio. O número de ma-
trículas no Ensino Profissional no Ensino Médio cresceu apenas 1%
entre os anos de 2002 e 2003, o que torna mais premente a necessida-
de dessa ampliação. Também é necessária a ampliação da capacidade
instalada na rede de instituições de Ensino Profissional, para que
haja um aumento significativo da oferta dessa modalidade de ensino
em caráter permanente para a população em idade produtiva e que
precisa se readaptar às novas exigências e perspectivas do mercado
122 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

de trabalho. Existem no Brasil, mais de 6 mil cursos técnicos, sendo


que a região Sudeste concentra 67,6% do total de escolas técnicas
brasileiras, e 41,7% do total de escolas técnicas existentes no Brasil
estão localizadas no Estado de São Paulo. Tais dados explicitam a
urgência do aumento dessa oferta.
Outra proposta existente é a do estabelecimento de parcerias
entre os sistemas federal, estaduais e municipais e a iniciativa privada,
para ampliar a oferta de educação profissional. Essa proposta aponta,
explicitamente, para a divisão de responsabilidades entre o Poder Pú-
blico e a iniciativa privada na oferta de Ensino Profissional. Segundo
dados do Censo Escolar 2003, o setor privado responde por cerca de
70% do total de escolas técnicas no país e por, aproximadamente 55%
do número de matrículas. Já os dados do Censo Escolar 2005 mostram
que 58% do total de matrículas são feitas na rede privada de ensino
profissional e 42% na rede pública, o que significa um crescimento,
no número de matrículas, de 78% na rede privada e de 27% na rede
pública de ensino profissional. Diante desse quadro, novas parcerias
serão sempre muito bem vindas.
Uma outra importante proposta trata da reorganização da
rede de escolas agrotécnicas, de forma a garantir que cumpram o
papel de oferecer Ensino Profissional específica e permanente para
a população rural, levando em conta seu nível de escolarização e as
peculiaridades e potencialidades da atividade agrícola na região. O
problema dessa proposta é que ela ressuscita, de maneira indireta,
a Lei nº 5.465/68, que determinava a reserva de metade das vagas
nas faculdades de agronomia e veterinária para filhos de agricultores
brasileiros, assim como a reserva de 30% das vagas para essa mesma
clientela no Ensino Médio técnico agrícola. Essa tentativa forçada de
direcionar as vagas das faculdades de agronomia (e assemelhadas) e
das escolas agrotécnicas para a população rural, já redundou, 35 anos
atrás, em enorme fracasso da política educacional, proposta, naquele
momento, pela ditadura militar que governava o Brasil, visto que não
atingiu os objetivos a que se propunha, dentre os quais o de minimi-
zar o êxodo rural (Cf. MACEDO, 1999). Independente do fato dessa
reorganização da rede de escolas agrotécnicas não ter sido efetivada,
consideramos a proposta dessa meta totalmente anacrônica, que, caso
se efetive, dificilmente alcançará os resultados pretendidos. Mesmo
porque a
ENSINO PROFISSIONAL | 123

globalização de alguns setores da economia agrícola,


como por exemplo a da produção de carne e grãos,
faz com que o setor de serviços desponte fortemente
no conjunto do meio rural e, assim, profissões outrora
tipicamente urbanas apresentam-se na dinâmica de
funcionamento da economia do campo. Isso, somado
à insuficiência de renda na reprodução das unidades
familiares agrícolas, faz com que o rural recorra a ativi-
dades não-agrícolas como estratégia de manutenção do
patrimônio familiar. (BATISTA et al., 2004, p. 139)

Questão para Debate em Sala de Aula

Você considera importante a oferta de cursos básicos de Ensino


Profissional, como forma de reinserção no mercado de trabalho da
população que dele está sendo excluída, em função, por exemplo, do
processo de globalização? Por quê?

7.2. Formação do profissional

No que se refere à formação de profissionais para atuar no


Ensino Profissional, discutiremos duas questões mais específicas.
A primeira diz respeito à necessidade de se modificar as normas
atuais que regulamentam a formação de pessoal docente para essa
modalidade de ensino, de forma a aproveitar e valorizar a experiência
profissional dos formadores. Infelizmente ainda não conseguimos
fazer, de maneira efetiva, essa modificação proposta.
Uma segunda questão refere-se ao estabelecimento de par-
cerias entre o MEC, o Ministério do Trabalho, as universidades, os
CEFETs, as escolas técnicas de nível superior, os serviços nacionais
de aprendizagem e a iniciativa privada, com o objetivo de organizar
(e oferecer) programas de formação de formadores para o Ensino
Profissional. Essa colaboração ainda não se realiza na prática, porque
a iniciativa privada possui uma agilidade e flexibilidade muito maior
124 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

do que o setor público para responder às exigências mais imediatas


do mercado de trabalho, e, portanto, direcionar os seus programas de
formação de formadores para o Ensino Profissional. Segundo Olivei-
ra, o empresariado industrial brasileiro defendeu, na década passada,
“além da implementação do sistema de gestão de qualidade nas es-
colas de educação profissional, sua maior participação nos conselhos
das Instituições Federais de Educação Tecnológica e de outras ligadas
à educação profissional.” (OLIVEIRA, 2005, p. 95).
Segundo dados do Censo Escolar 2003, existem 48 mil do-
centes atuando no Ensino Profissional, dos quais 62% estão na rede
particular de Educação Profissional, e 91% do total de docentes pos-
suem curso superior completo. Portanto, em termos de qualificação,
as necessidades de formação do Ensino Profissional são muito menos
significativas do que as necessidades de formação e qualificação pro-
fissional dos docentes que atuam na Educação Básica, especialmente
na Educação Infantil e no Ensino Fundamental.

Questão para Debate em Sala de Aula

Você considera que, atualmente, a formação de nível técnico,


proporcionada pelo Ensino Profissional já é suficiente para a aquisição
de uma boa posição profissional no mercado de trabalho? Por quê?

7.3. Sugestões de Leituras Complementares

MARTINS, M. F. Ensino técnico e globalização: cidadania ou


submissão? Campinas: Autores Associados, 2000 (Coleção Polêmicas
do nosso tempo; 71).

OLIVEIRA, R. A (des)qualificação da educação profissional


brasileira. São Paulo: Cortez, 2003 (Coleção Questões de nossa
época; 101).

RAMOS, M. N. A educação profissional pela Pedagogia das


Competências: para além da superfície dos documentos oficiais.
ENSINO PROFISSIONAL | 125

Revista Educação & Sociedade. Revista de Ciência da Educação.


Centro de Estudos Educação e Sociedade. CEDES, Campinas, v. 23,
n. 80, p. 405-427, Número Especial, set. 2002.

ZIBAS, D. M. L. A reforma do ensino médio nos anos de 1990: o


parto da montanha e as novas perspectivas. Revista Brasileira de
Educação - Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em
Educação / Autores Associados, Rio de Janeiro / Campinas, n. 28, p.
24-36, jan./fev./mar./abr. 2005a.
CAPÍTULO 8

EDUCAÇÃO ESPECIAL

Este capítulo sobre Educação Especial se constitui em uma das


principais partes deste trabalho, pelo seu significado não só educativo
mas, principalmente, social e humano. Entendida como uma educa-
ção que se destina às pessoas portadoras de necessidades especiais,
originadas quer de deficiência física, sensorial, mental ou múltipla,
quer de características como altas habilidades, superdotação ou talen-
tos, a integração dessas pessoas no sistema de ensino regular é uma
diretriz constitucional (Art. 208, inciso III), fazendo parte da política
governamental há quase duas décadas, mais conhecida por Educação
Inclusiva1.
Sadao Omote considera que essa política governamental deno-
minada Educação Inclusiva poderá ser de significativa importância
se tiver êxito em, pelo menos, dois aspectos: a) prover um ensino
de qualidade em todos os níveis (da Educação Infantil ao ensino
superior) e b) ajudar a desenvolver “atitudes francamente favoráveis
às diferenças, resultando em relações produtivas para todos que par-
ticipam do convívio, e na prevenção de atitudes negativas e precon-
ceituosas.” (OMOTE, 1999, p. 20). Na opinião de Lancillotti, “a luta
pela inclusão, a despeito do que afirmam seus defensores, é uma luta
para manter a sociedade que produz a exclusão, já que não toca suas
razões de fundo e se estabelece como movimento compensatório.”
(LANCILLOTTI, 2003, p. 89).
Omote acredita que o conceito de inclusão é inovador se: a) a
inclusão for “tratada como uma atitude, uma postura filosófica, e não
um fim em si mesmo”; b) a inclusão “implicar uma profunda trans-
formação da escola, para poder prover ensino de qualidade a todos os
estudantes, representados pela grande maioria das crianças e jovens

1 Alguns autores consideram imprecisa essa denominação, pois, segundo eles, a Educação Inclusiva também
deve se referir à educação de todas as pessoas socialmente excluídas da escola, seja por motivo de gênero,
raça, religião, cultura ou por deficiências físicas e/ou mentais (Cf. TIBALLI, 2003, p. 195).
128 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

em idade escolar, portadores de uma ampla diversidade de qualida-


des, sem descaracterizar os objetivos precípuos da escolarização”; e
c) a inclusão for “tratada como um imperativo moral, em busca de
uma sociedade justa, que provê oportunidades igualitárias a todos
os cidadãos, independentemente de seus atributos, comportamentos
ou afiliação grupal.” (OMOTE, 1999, p. 20). Considera ainda que
existem, pelo menos, dois problemas nessa idéia de integração (quase
que) obrigatória. O primeiro é que, talvez, a integração “não seja um
fim em si mesmo, mas apenas um meio para buscar o exercício pleno
da cidadania e para buscar uma melhor qualidade de vida”. O segun-
do é que essa integração “talvez deva ser vista como um direito que
cabe a cada um decidir se quer exercer ou não. Cassar esse direito de
decidir sobre a sua própria vida pode até ser uma maneira velada de
promover a segregação, mediante a incapacitação e invalidação social
do deficiente.” (Ib., id., p. 19).
Na opinião de Lancillotti, os profissionais da área de Educação
Especial “têm, freqüentemente, discutido as formas de se alcançar
essa inserção prescrita, mas pouco se discute a quem ela serve ou a
pertinência desse objetivo que, no caso das pessoas com deficiência,
é dificilmente alcançado.” (LANCILLOTTI, 2003, p. 10). Enfocando
sua análise mais no aspecto político-ideológico da questão da inclusão,
Lancillotti afirma que o “movimento pela inclusão parece destinado a
favorecer o avanço mercado sobre necessidades não atendidas ou não
providas pelo Estado e a atenuar tensões sociais através de programas
assistencialistas e ações compensatórias por parte do Estado. Assim,
de uma ou outra forma serve à manutenção da sociedade capitalista.”
Por outro lado, “o fato de a escola ter de enfrentar o desafio de respon-
der, também, à educação destes homens pode promover a ampliação
de suas possibilidades de humanização.” (Ib., id., p. 90-92).
O atendimento educacional deverá ser feito em classes, escolas
ou serviços especializados, sempre que, em função das condições
específicas dos alunos portadores de necessidades especiais, não for
possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular. A
oferta de Educação Especial se constitui em um dever constitucional
do Estado, devendo ter início na faixa etária de zero a seis anos, du-
rante a Educação Infantil.
Sanfelice considera que a proposta de inclusão de alunos
portadores de necessidades especiais nas classes de ensino regular
EDUCAÇÃO ESPECIAL | 129

comporta, pelo menos, dois grandes desafios:


O primeiro refere-se à possibilidade de a escola iniciar
o seu trabalho a partir das reais condições da sua clien-
tela, ou seja, postar-se realisticamente diante da ampla
multiplicidade da clientela escolar, como parte da
diversidade social. O segundo desafio posto é o de que,
a partir de uma ação pedagógica diferenciada no início,
supere-se, tanto quanto possível, os limites colocados à
democratização do acesso ao saber humano socialmen-
te acumulado. (SANFELICE, 1989, p. 33-35)

Lancillotti considera que a questão central do problema da in-


tegração/inclusão de pessoas portadoras de necessidades especiais é a
seguinte: “em uma sociedade marcada pela exclusão, em que grandes
contingentes de pessoas são deixadas à margem do mercado, a forma-
ção profissional consistente, aliada à superação do preconceito, seria
capaz de assegurar trabalho para essa parcela da população?” Para
esta autora a resposta é simples e direta: não. Portanto, é necessário
que se pense “se é possível alcançar a tão almejada integração, no
modelo social vigente, e a que necessidades responde a colocação
de trabalhadores com deficiência no mercado de trabalho.” (LAN-
CILLOTTI, 2003, p. 12, 17).
Os sistemas de ensino deverão assegurar aos alunos portadores
de necessidades especiais currículos, métodos, técnicas, recursos
educativos e organização específicos, de forma que os mesmos aten-
dam as necessidades desses alunos, exigindo, assim, uma organiza-
ção específica da escola. Devem assegurar também a terminalidade
específica para aqueles que não possuem as condições para atingir o
nível exigido para a conclusão do Ensino Fundamental, em virtude
de suas deficiências, e, por outro lado, proporcionar condições para
a aceleração dos estudos no caso dos alunos superdotados, visando a
concluir em menor tempo possível o programa escolar2.
Cabe também aos sistemas de ensino, assegurar professores

2 O Censo Escolar 2005 identificou apenas 1980 crianças superdotadas em todo país, número que, para o
próprio INEP, pode estar subestimado.
130 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

com especialização adequada em nível Médio ou Superior para


atendimento especializado, bem como professores do ensino regular
capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns.
Tanto numa situação (professores capacitados para atendimento espe-
cializado), quanto noutra (professores do ensino regular capacitados
para a integração dos alunos portadores de necessidades especiais
nas classes comuns), a capacitação permanente do profissional que
trabalha com alunos portadores de necessidades especiais é, no nosso
entendimento, o segredo do sucesso ou do fracasso, da Educação Es-
pecial. Especificamente no caso das propostas pedagógicas, que têm
como ponto central a inclusão dos alunos portadores de necessidades
especiais, sempre que possível nas chamadas classes comuns, a ca-
pacitação constante e contínua desses docentes é o que, com certeza,
determinará o sucesso (ou insucesso) de tais propostas.
Necessário se faz ressaltar, mais uma vez, que a proposta
de inclusão de alunos portadores de necessidades especiais, não
só promove o melhor desenvolvimento (psíquico, físico, afetivo e,
principalmente social) desses alunos, como, também, elimina a pré-
via discriminação (por parte dos outros alunos, pais e professores)
dos alunos portadores de necessidades especiais que, anteriormente,
pertenciam as chamadas “Classes Especiais”. O problema central
está na efetiva capacitação dos docentes que irão trabalhar em classes
comuns, que tenham, no seu conjunto, um ou mais alunos portadores
de necessidades especiais. Se os docentes responsáveis por essas
classes forem especializados e/ou adequadamente capacitados, todos
os alunos portadores de necessidades especiais (assim como seus
pais, professores e colegas) só terão a ganhar com a sua inclusão nas
classes comuns de ensino regular.
No entender de Maria S. F. Aranha, a Educação Inclusiva,
enquanto conceito, “se fundamenta numa filosofia que reconhece
e aceita a diversidade na vida em sociedade. Isto significa garantia
do acesso de todos a todas as oportunidades, independentemente das
peculiaridades de cada indivíduo e/ou grupo social.” Ainda segundo
essa autora, a “área onde se tem encontrado maior dificuldade para a
implementação do processo de inclusão tem sido a área da Educação.”
(ARANHA, 2000, p. 2; 6).
É papel dos órgãos normativos dos respectivos sistemas de
ensino estabelecer critérios de caracterização das instituições pri-
EDUCAÇÃO ESPECIAL | 131

vadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva


em Educação Especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo
Poder Público. Porém, o Poder Público adotará, como alternativa
preferencial, a ampliação do atendimento aos educandos portadores
de necessidades especiais na própria rede pública regular de ensino,
independentemente do apoio às instituições especializadas privadas
(Cf. DAVIES, 2004, p. 161). Apesar dessa situação significar, na
prática, a transferência de recursos públicos destinados à educação
para instituições privadas, consideramos que essa transferência é
plenamente justificável, visto que o Poder Público mal dá conta de
garantir a qualidade do Ensino Fundamental e Médio regular, quanto
mais garantir condições adequadas de Educação Especial para os
educandos portadores de necessidades especiais.
No que tange à Educação Especial, esta possibilidade de sub-
venção, técnica e financeira, pelo Poder Público, explicita uma con-
tradição, ou seja, ao mesmo tempo em que se propõe a inclusão dos
alunos portadores de necessidades especiais nas classes comuns do
ensino regular, sejam elas situadas no interior de escolas públicas ou
privadas, como sendo a concepção de Educação Especial hegemônica
e oficial, também está prevista a possibilidade de transferência de re-
cursos públicos para instituições privadas “especializadas”. Lancillotti
considera que toda ampliação da oferta de Educação Especial (nesse
caso pelas instituições especializadas privadas), gera “uma contra-
dição: se de um lado oferece oportunidades educacionais às pessoas
com deficiência, de outro legitima os movimentos excludentes da es-
cola formal, segregando aqueles indivíduos que não correspondem às
exigências da sociedade capitalista.” (LANCILLOTTI, 2003, p. 81)
Assim sendo, a proposta de inclusão dos alunos portadores de
necessidades especiais será, muito provavelmente, adotada somente
na rede pública de ensino, ao passo que a rede privada de ensino
deixará para as instituições “especializadas”, com atuação exclusiva
em Educação Especial, a tarefa de oferecer essa modalidade de en-
sino. Em outras palavras, qualquer pessoa que tenha um(a) filho(a)
portador(a) de necessidades especiais, terá, em termos de Educação
Especial (e guardadas as respectivas especificidades), duas opções:
a rede pública de ensino com a sua proposta de inclusão, ou a rede
privada especializada, que oferecerá a Educação Especial a grupos
específicos.
132 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Mas, apesar de estar presente desde a Constituição de 1988, a


diretriz de integrar as pessoas portadoras de necessidades especiais no
sistema regular de ensino ainda não produziu a mudança necessária
na realidade escolar, de modo que todas as crianças, jovens e adultos
com necessidades especiais sejam atendidos em escolas da rede públi-
ca (ou privada), sempre que for recomendado pela avaliação de suas
condições pessoais. Essa diretriz de política educacional só ganhou
maior impulso na última década. Consideramos que uma política ex-
plícita e vigorosa de acesso à educação para todas as crianças e jovens,
é uma condição sine qua non para que sejam assegurados às pessoas
portadoras de necessidades especiais seus direitos à educação. Uma
política dessa natureza deve abranger um aspecto social, ou seja, ga-
rantir o reconhecimento das crianças, jovens e adultos especiais como
cidadãos e de seu direito de estarem integrados na sociedade o mais
plenamente possível; bem como o aspecto propriamente educacional,
que significa adequação do espaço escolar, de seus equipamentos e
materiais pedagógicos, qualificação dos professores e de todos os
profissionais envolvidos no processo educativo. Só assim teremos
uma escola integradora, inclusiva e aberta à diversidade dos alunos.
A Organização Mundial de Saúde estima que aproximadamente
10% da população mundial têm necessidades especiais. Estas podem
ser de diversas ordens: visuais, auditivas, físicas, mentais, múltiplas,
distúrbios de conduta e também superdotação ou altas habilidades. Se
essa estimativa se aplicar também no Brasil, calcula-se que tenhamos
cerca de 18 milhões de pessoas com necessidades especiais. Porém, se
consideramos que, segundo os dados do Censo Escolar 2004, apenas
567 mil alunos portadores de necessidades especiais estão matricula-
dos na Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e
Ensino Médio), tanto na rede pública quanto na rede privada, consta-
tamos o enorme – e grave – déficit educacional existente nessa moda-
lidade de ensino, no contexto da realidade educacional brasileira.
Para se combater esse significativo déficit educacional, os sis-
temas de ensino terão que realizar diversas ações concomitantemente,
quer sejam, a sensibilização dos demais alunos e da comunidade em
geral para a integração; as adaptações curriculares; a qualificação dos
professores para o atendimento nas escolas regulares e a especializa-
ção dos professores para o atendimento nas escolas especiais; a pro-
dução de livros e materiais pedagógicos adequados para as diferentes
EDUCAÇÃO ESPECIAL | 133

necessidades; a adaptação das escolas para que os alunos especiais


possam nelas transitar; a oferta de transporte escolar adaptado; etc3.

8.1. Oferta e atendimento

Em termos de oferta e atendimento na Educação Especial,


discutiremos algumas propostas. A primeira dessas propostas trata da
organização de programas destinados a ampliar a oferta da estimu-
lação precoce (interação educativa adequada) para as crianças com
necessidades educacionais especiais, em instituições especializadas
ou regulares de Educação Infantil, especialmente creches. Tais pro-
gramas devem ser organizados em parceria com as áreas de saúde e
assistência, em todos os municípios.
Consideramos que os maiores problemas para efetivação dessa
proposta são dois. O primeiro é conseguir uma parceria efetiva entre
as áreas da Educação, da Saúde e da Assistência Social. O segundo
problema é que se tais programas foram efetivados em instituições
regulares de Educação Infantil, essas instituições deverão estar aptas,
tanto em termos de recursos materiais e estruturais, quanto em termos
de recursos humanos especializados, para empreender tarefa de tama-
nha magnitude. O fato é que esses programas ainda não se efetivaram
na imensa maioria dos municípios brasileiros.
Especificamente em relação ao atendimento (estimulação)
precoce, Lígia M. P. Braccialli considera que esse procedimento é
de fundamental importância para o desenvolvimento das crianças
portadoras de necessidades especiais. Destaca ainda a importância do
meio em que ocorre essa estimulação precoce, visto que em “um meio
rico onde é dada a criança o direito de explorar, sentir, experimentar
e questionar, por meio de atividades as quais estimulem o pensar e o
resolver problemas, suas capacidades e habilidades serão desenvolvi-
das ao máximo.” (BRACCIALLI, 1999, p. 40-41).
A segunda proposta para a Educação Especial, no que se refere

3 Diferentemente dos capítulos anteriores, nesse capítulo sobre a Educação Especial, optamos por concentrar
ao seu final, todas as questões para debate em sala de aula, por entendermos que as mesmas tratam de
questões gerais e conceituais sobre essa modalidade de ensino.
134 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

à questão da oferta e do atendimento dessa modalidade de ensino, é a


de universalizar a aplicação de testes de acuidade visual e auditiva em
todas as instituições de Educação Infantil e do Ensino Fundamental,
em parceria com a área de saúde, de forma a detectar problemas e
oferecer apoio adequado às crianças especiais. Infelizmente, essa pro-
posta ainda não se efetivou, como prática generalizada, especialmente
nas escolas públicas de Educação Infantil e de Ensino Fundamental.
A terceira proposta trata da universalização do atendimento dos
alunos com necessidades especiais na Educação Infantil e no Ensino
Fundamental, inclusive por meio de consórcios entre municípios,
quando necessário, provendo, nestes casos, o transporte escolar. Essa
proposta é coerente com a política de Educação Inclusiva dos últimos
governos. Porém, há que se levar em consideração, para a efetivação
dessa proposta, que, segundo o Censo Escolar 2004, apenas 3,6% dos
243 mil alunos de Educação Especial matriculados em escolas priva-
das estão estudando em classes regulares, ao passo que na rede pública
esse percentual atinge 58%. Esses dados se tornam mais relevantes ao
considerarmos que o número de matrículas de alunos portadores de
necessidades especiais na rede pública passou de quase 44 mil em
1998 para quase 145 mil em 2002, que significa um crescimento de
229% nos últimos anos. Há que se considerar também que o simples
acesso não resulta, automaticamente, em uma aprendizagem de me-
lhor qualidade, que só se efetiva com apoio educacional especializado
e adequado para todos os alunos, especialmente no que se refere à
formação adequada dos profissionais (diretores, coordenadores, pro-
fessores e pessoal de apoio) que trabalham com crianças e jovens
portadores de necessidades especiais.
Uma outra proposta é a de implantação de pelo menos um cen-
tro especializado, destinado ao atendimento de pessoas com severa
dificuldade de desenvolvimento, em cada Estado, preferencialmente
em parceria com as áreas de saúde, assistência social, trabalho e com
as organizações da sociedade civil. Considerando as questões envol-
vidas no desenvolvimento e na aprendizagem das crianças, jovens
e adultos com necessidades especiais, a articulação e a cooperação
entre os setores de Educação, Saúde e Assistência Social é de funda-
mental importância, podendo potencializar a ação de cada um desses
setores. Como é sabido, o atendimento não se limita à área educa-
cional, mas envolve especialistas, sobretudo da área da Saúde e da
EDUCAÇÃO ESPECIAL | 135

Psicologia, e depende da colaboração de diferentes órgãos do Poder


Público, em particular os vinculados à Saúde, Assistência e Promoção
Social. Assim como as escolas, que se propõem a adotar a Educação
Inclusiva como princípio, esses centros especializados necessitam
possuir, em seus quadros, uma equipe multidisciplinar, composta,
entre outros, por psicólogos, fonoaudiólogos, pedagogos e psicope-
dagogos. A criação de centros especializados depende, integralmente,
dessa articulação. Já a sua implantação depende, em grande medida,
de recursos públicos, nem sempre disponíveis para esse fim. Até o
presente momento, o que existe são centros específicos, por exemplo,
os Centros de Capacitação de Profissionais da Educação e de Aten-
dimento a Pessoas com Surdez (CAS) e os Centros de Apoio para
Atendimento às Pessoas com Deficiência Visual (CAPs)4.
Por último, existe a proposta de uma ampliação gradativa dos
programas de atendimento aos alunos com altas habilidades nas áreas
artística, intelectual ou psicomotora. Ainda que essa proposta refira-se
à uma ampliação gradual, a mesma não foi efetivada, na medida em
que ainda não existe, pelo menos no setor público, nenhum programa
significativo dessa natureza. O que existe é a previsão de implanta-
ção, no curto prazo, dos Núcleos de Atividades de Altas Habilidades
/ Superdotação (NAAH/S). A proposta do MEC é que cada Estado
tenha um NAAH/S, que deverá atender 60 alunos superdotados por
ano5.

8.2. Formação do profissional

No que se refere à formação profissional mais adequada para a


atuação na Educação Especial, encontramos, no contexto da política
educacional atual, quatro propostas específicas. A primeira delas
propõe a universalização, no médio prazo, da oferta de cursos sobre
o atendimento básico a educandos especiais, para os professores em
exercício na Educação Infantil e no Ensino Fundamental, utilizando

4 Cf. www.mec.gov.br , acesso em 24/08/2006.

5 Cf. www.mec.gov.br , acesso em 23/03/2006.


136 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

inclusive a TV Escola e outros programas de Educação a Distância.


Esses cursos fariam parte dos chamados programas de formação em
serviço.
Consideramos que já se tornou consenso na área de Educação
Especial que o obstáculo principal para o sucesso das políticas de
inclusão de alunos portadores de necessidades especiais às classes
regulares recai, em grande medida, sobre a questão da formação
dos professores que irão trabalhar nestas classes. Infelizmente, até o
momento, essa proposta não foi significativamente posta em prática.
Apesar de existirem cursos sobre o atendimento básico a educandos
especiais, para os professores em exercício na Educação Infantil e
no Ensino Fundamental, não podemos afirmar que a oferta desses
cursos já foi universalizada, nem mesmo por meio da utilização da
modalidade Educação a Distância.
A segunda proposta sobre a formação profissional para atuação
na Educação Especial refere-se à inclusão nos currículos de formação
de professores, nos níveis médio e superior, conteúdos e disciplinas
específicas para a capacitação ao atendimento dos alunos especiais.
Essa proposta é de fundamental importância para se elevar o nível
de qualidade de atendimento escolar para os alunos portadores de
necessidades especiais, já que a capacitação de professores desta mo-
dalidade de ensino varia entre o insuficiente e o inexistente. Somente
com a inclusão de disciplinas e conteúdos específicos da Educação
Especial – especialmente na Educação Superior –, é que poderemos
aumentar, de maneira significativa, a oferta de materiais didáticos e
pedagógicos para essa modalidade de ensino.
A terceira proposta segue na mesma direção da proposta ante-
rior, ao propor a inclusão ou ampliação, especialmente nas universi-
dades públicas, de uma habilitação específica, em níveis de graduação
e pós-graduação, para formar pessoal especializado em Educação
Especial, garantindo, no médio prazo, pelo menos um curso desse
tipo em cada Estado brasileiro. A formação de professores com capa-
cidade de oferecer atendimento de qualidade para alunos portadores
de necessidades especiais nas creches, pré-escolas, escolas regulares
de Ensino Fundamental, Médio e Superior, bem como em instituições
especializadas e outras instituições, constitui-se em uma das priorida-
des do atual PNE. Não há como ter uma escola de qualidade, no que
se refere ao desenvolvimento e aprendizagem dos alunos portadores
EDUCAÇÃO ESPECIAL | 137

de necessidades especiais, sem que seus professores e servidores,


estejam preparados para atendê-los adequadamente.
Tanto as classes comuns, que possuem alunos portadores de
necessidades especiais, quanto as classes especiais (quando assim for
o caso, situadas nas escolas regulares e destinadas aos alunos parcial-
mente integrados), precisam contar com professores especializados.
É função da Educação Superior – portanto, das universidades, e
especialmente das universidades públicas –, formar tais profissionais.
Porém, ainda não podemos afirmar que exista, pelo menos, um curso
de formação de professores que ofereça, em sua proposta curricular e
pedagógica, habilitação específica em Educação Especial (no nível da
graduação ou de pós-graduação) em cada Estado do país.
Por último, existe a proposta de sejam introduzidos, no curto
prazo, conteúdos disciplinares referentes aos educandos com ne-
cessidades especiais nos cursos que formam profissionais em áreas
relevantes para o atendimento dessas necessidades, como Medicina,
Enfermagem e Arquitetura, entre outras. Infelizmente, no percurso
dessa nossa pesquisa, não encontramos nenhuma informação disponí-
vel que nos permita acreditar que essa proposta está se efetivando.

8.3. Questões pedagógicas

Neste item, analisaremos algumas propostas que tratam de


questões prioritariamente pedagógicas da Educação Especial. A
primeira propõe que, no médio prazo, sejam disponibilizados livros
didáticos falados, em braille e em caracteres ampliados, para todos os
alunos cegos e para os de visão sub-normal do Ensino Fundamental.
Essa proposta já está plenamente em funcionamento, a partir do mo-
mento que o Programa Nacional do Livro Didático/Braille conseguiu
distribuir livros didáticos em braille para todos os alunos do Ensino
Fundamental, além de 70 novos títulos de livros paradidáticos.
A segunda proposta defende o estabelecimento, no médio
prazo, de parcerias com as áreas de assistência social e cultura e com
organizações não-governamentais (ONG’s), redes municipais ou in-
termunicipais para tornar disponíveis aos alunos cegos e aos de visão
sub-normal livros de literatura falados, em braille e em caracteres am-
138 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

pliados. Entendemos que o cerne do problema dessa proposta não está


na viabilização de tais parcerias, mas sim na produção editorial desses
materiais, cujo custo é elevado e atinge um público relativamente
pequeno (do ponto de vista das editoras). O problema central está na
produção editorial, que, dadas essas características específicas, só se
viabilizará a partir de uma política pública de incentivos (financeiros,
fiscais, etc.) para a produção de material didático e pedagógico para
alunos portadores de necessidades especiais, incluídos, nesse público,
os alunos cegos e os alunos portadores de visão sub-normal.
Outra proposta defende a implantação e universalização, no
médio prazo, do ensino da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) para
os alunos surdos e, sempre que possível, para seus familiares e para
os servidores das escolas, mediante um programa de formação de
monitores, em parceria com organizações não-governamentais. Infe-
lizmente o ensino da LIBRAS para os alunos surdos, seus familiares
e para os demais integrantes das escolas, ainda é feito de maneira
residual. Os programas específicos de formação de monitores para
o ensino da LIBRAS também são quase inexistentes. Para Poker e
Martins, o ensino da LIBRAS é de fundamental importância, pois,
ter “condições de compartilhar uma linguagem comum constitui-se
aparentemente um pré-requisito para viabilizar a participação efetiva
do surdo na coletividade em que vive.” (POKER; MARTINS, 2000,
p. 153).
Por último existe a proposta de que sejam incentivados estudos
e pesquisas, realizados especialmente pelas instituições de ensino
superior, sobre as diversas áreas relacionadas aos alunos que apresen-
tam necessidades especiais para a aprendizagem. O problema dessa
proposta é que o verbo incentivar é excessivamente subjetivo e amplo.
Nos melhores cursos de graduação e pós-graduação em Educação do
país, estudos e pesquisas sobre essa temática já são realizados em nú-
mero significativo, porém, em outras áreas (e em cursos de qualidade
duvidosa), tais estudos e pesquisas são mais escassos.

8.4. Financiamento e gestão

A questão do financiamento e da gestão na Educação Especial


EDUCAÇÃO ESPECIAL | 139

pode ser explicitada por 4 principais propostas existentes no contexto


da atual política educacional brasileira. Dessas, 3 referem-se especifi-
camente à questão da gestão e apenas uma à questão do financiamento
da Educação Especial. Começaremos nossa análise por essa proposta,
a qual defende que sejam aumentados os recursos destinados à Edu-
cação Especial, a fim de atingir, em 10 anos, o mínimo equivalente
a 5% dos recursos vinculados à manutenção e desenvolvimento do
ensino, contando, para tanto, com as parcerias com as áreas de saúde,
assistência social, trabalho e previdência.
No ano de 2005, no setor público, o valor mínimo repassado
por aluno da Educação Especial foi de R$ 664,00/ano. Este valor
não é muito superior ao valor mínimo repassado para o custeio do
aluno do Ensino Fundamental (1ª a 4ª séries), que foi de R$ 620,56/
ano, ou seja, somente 7% a mais. Em se tratando de um aluno com
necessidades especiais, a diferença, que já foi menor, é praticamente
insignificante. Talvez, com a implantação do FUNDEB, este valor
venha a ser maior, visto que o montante de recursos estimado, será,
aproximadamente, 35% maior, podendo vir a atingir o percentual
de 5% dos recursos vinculados à manutenção e desenvolvimento do
ensino, defendido por essa proposta.
Passando para a questão da gestão na Educação Especial, a pri-
meira proposta advoga que, no curto prazo, sejam redimensionadas
e incrementadas, conforme as necessidades da clientela, as classes
especiais, as salas de recursos e outras alternativas pedagógicas reco-
mendadas, de forma a favorecer e apoiar a integração dos educandos
com necessidades especiais em classes comuns, fornecendo-lhes o
apoio adicional de que precisam. Esse redimensionamento proposto
refere-se, quase que exclusivamente, à rede pública de ensino, de
forma que ela possa melhor atender aos educandos portadores de
necessidades especiais. Infelizmente, este redimensionamento ainda
não foi realizado. Existem escolas públicas (e também privadas) em
que o processo de inclusão de alunos portadores de necessidades
especiais nas classes regulares está mais avançado, assim como exis-
tem escolas com classes especiais e com sala de recursos, onde o
redimensionamento ainda não se efetivou. Esse redimensionamento
é de fundamental importância porque, no nosso ponto de vista, as
crianças portadoras de necessidades especiais evoluem muito mais
rapidamente quando incluídas em classes regulares. Por outro lado,
140 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

essa inclusão também beneficia os demais alunos, que passam a ter a


possibilidade de entender o significado da diversidade em seu cotidia-
no, encarando-a com maior naturalidade e sem preconceitos.
Uma outra proposta é de que seja assegurada a inclusão, no
projeto pedagógico das unidades escolares, do atendimento às neces-
sidades educacionais especiais de seus alunos, definindo os recursos
disponíveis e oferecendo formação em serviço aos professores em
exercício. Essa proposta, ainda que válida, é de difícil verificação
exatamente pelo fato de os projetos pedagógicos das unidades esco-
lares (públicas e privadas) serem de responsabilidade exclusiva das
próprias escolas. Por outro lado, no caso das escolas públicas, tanto a
definição dos recursos a serem utilizados quanto a oferta de formação
em serviço aos professores em exercício, não depende da unidade
escolar, mas sim de esferas administrativas superiores, invalidando,
assim, pelo menos parcialmente, a intenção expressa por essa pro-
posta.
Por último, existe a proposta defende que, no curto prazo, esteja
funcionando, em todos os sistemas de ensino, um setor responsável
pela Educação Especial, bem como pela administração dos recursos
orçamentários específicos para o atendimento dessa modalidade, que
possa atuar em parceria com os setores de saúde, assistência social,
trabalho e previdência e com as organizações da sociedade civil. In-
felizmente, essa proposta ainda não foi integralmente efetivada, visto
que, ainda hoje, nem todos os sistemas de ensino (especialmente os
sistemas municipais de ensino) possuem um setor responsável pela
Educação Especial, com as atribuições enunciadas por essa proposta.

Questões para Debate em Sala de Aula

a) Qual a sua opinião sobre a Educação Inclusiva?

b) Quais os desafios a serem enfrentados pelas escolas (direto-


res, coordenadores, professores, funcionários e alunos) que optam por
adotar a política da Educação Inclusiva?
c) Na sua opinião, quais os limites, as vantagens e as desvanta-
gens das chamadas “classes especiais”?
EDUCAÇÃO ESPECIAL | 141

8.5. Sugestões de Leituras Complementares

MANZINI, E. J. (Org.). Educação especial: temas atuais. Marília:


UNESP - Marília Publicações, 2000, p. 1-9.

BUENO, C. C. O.; KASSAR, M. C. M. Público e privado: a educação


especial na dança das responsabilidades. In: ADRIÃO, T.; PERONI,
V. (Orgs.). O público e o privado na educação: interfaces entre estado
e sociedade. São Paulo: Xamã, 2005, p. 119-135.

LANCILLOTTI, S. S. P. Deficiência e trabalho: redimensionando o


singular no contexto universal. Campinas: Autores Associados, 2003,
(Coleção Polêmicas do nosso tempo; 85).
CAPÍTULO 9

EDUCAÇÃO INDÍGENA

A nossa Constituição assegura às comunidades indígenas a uti-


lização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendiza-
gem. Nesse sentido, a coordenação das ações escolares de Educação
Indígena está, hoje, sob responsabilidade do MEC, cabendo aos Esta-
dos e municípios, a sua execução. Porém, na opinião de Sofia L.Vieira
e Isabel M. S. Freitas, a educação indígena brasileira, “incorporada à
agenda dos governantes de agora é, contraditoriamente e ao mesmo
tempo, afirmação e negação da cidadania desses eternos esquecidos
das políticas educacionais.” (VIEIRA; FREITAS, 2003, p. 15).
Na questão das línguas maternas indígenas, Angel C. Mori sa-
lienta a importância da preservação das mesmas, “pois a exploração
econômica e a discriminação sociopolítica desembocam necessa-
riamente na perda de uma parte da identidade, nesse caso, a língua
materna”. Mori considera ainda que os indígenas “atravessam, desde
o momento de seu contato com a sociedade ocidental, processos de
desestruturação étnica, como produto da dominação socioeconômica
imposta pelos Estados-nações. Nesse aspecto, as populações indígenas
representam, na hierarquia sociopolítica, os setores mais explorados
da sociedade nacional.” (MORI, 1999, p. 6).
A população indígena brasileira apresenta os piores índices
de alfabetização e escolaridade do nosso país. Segundo o Censo
2000 do IBGE (último dado disponível), a média de escolaridade da
população indígena brasileira é de 4,1 anos, ao passo que a média
para a população branca é de 6,6 anos. A taxa de analfabetismo entre
os indígenas é de 26% contra, aproximadamente, 8% de analfabetos
entre a população branca. Outro dado alarmante detectado por esse
levantamento refere-se à taxa de mortalidade infantil entre os indíge-
nas, que é de 51,4 crianças mortas por mil nascidas vivas, ao passo
que a média brasileira é de 30,1 e 22,9, se considerarmos somente a
população branca. Para se ter uma idéia da magnitude dessa taxa, se
fosse considerada apenas a população indígena, tal taxa seria maior
144 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

que a de Botsuana (51,0 crianças mortas por mil nascidas vivas), país
africano que ocupa a 127ª posição no ranking de desenvolvimento da
ONU, que inclui 192 países.
No que se refere aos professores que trabalham com Educação
Indígena, segundo o Censo Escolar 2003, existem no Brasil, aproxi-
madamente 1.400 escolas indígenas, pouco mais de 3 mil professores
indígenas ministrando aulas para uma população de mais de 90 mil
crianças de diferentes etnias indígenas, das quais 80% estão no En-
sino Fundamental. Porém, mais da metade desses 3 mil professores
ainda é leiga, ou seja, não possuem a formação específica para o Ma-
gistério e 28% desses professores indígenas em atividade ainda não
completaram, sequer, o Ensino Fundamental. Para resolver esse grave
problema que afeta a Educação Indígena, alguns Estados brasileiros
e universidades públicas, estão oferecendo cursos de formação de
professores indígenas.
A proposta de uma escola indígena diferenciada, de qualidade,
representa uma grande novidade no sistema educacional brasileiro
e exige das instituições e órgãos responsáveis a definição de novas
dinâmicas, concepções e mecanismos, tanto para que estas escolas
sejam de fato incorporadas e beneficiadas por sua inclusão no sistema
oficial, quanto para que sejam respeitadas em suas especificidades.
Para Wilmar R. D’Angelis, as comunidades indígenas possuem
“suas formas próprias de ensinar e não está provado (nem faria sen-
tido que alguém tentasse provar) que a escola (ou o ensino escolar) é
a forma mais adequada, mais eficiente, mais segura para se garantir a
continuidade e o aprofundamento de toda e qualquer forma de conhe-
cimento.” (D’ANGELIS, 1999, p. 20, parênteses no original).
Segundo a LDB, o sistema de ensino da União, com a cola-
boração das agências federais de fomento à cultura e de assistência
aos índios, desenvolverá programas integrados de ensino e pesquisa,
para oferta de educação escolar bilíngüe e intercultural aos povos
indígenas. Sobre isso, Melià entende que um dos erros mais comuns
em programas dessa natureza é o de “esvaziar a ação pedagógica para
a alteridade” por meio de uma
atenção tão meticulosa a certas características próprias
e dialetais desse ou daquele grupo dentro de uma etnia
ou nação indígena, que a ação pedagógica fica comple-
EDUCAÇÃO INDÍGENA | 145

tamente fragmentada e atomizada num sem-número de


casos particulares, cujo desfecho é que cada um faça o
que pode e o que quer. (MELIÁ, 1999, p. 14-15)

Os objetivos da educação escolar bilíngüe e intercultural aos


povos indígenas são: proporcionar aos índios, suas comunidades e
povos, a recuperação de suas memórias históricas, a reafirmação de
suas identidades étnicas, a valorização de suas línguas e ciências,
e proporcionar o acesso às informações, conhecimentos técnicos e
científicos da sociedade nacional e das demais sociedades indígenas
e não-índias. Segundo Eunice D. Paula, para os povos indígenas, a
educação, pensada como um processo contínuo, “tem como objetivo
socializar os novos membros e isso é encarado como uma responsabi-
lidade do grupo todo. O respeito e o incentivo à atitude autônoma do
educando caracterizam as ações pedagógicas necessárias ao êxito do
processo.” (PAULA, 1999, p. 81).
A União, através do seu sistema de ensino, também deverá
apoiar técnica e financeiramente os outros sistemas de ensino no
provimento da educação intercultural às comunidades indígenas,
desenvolvendo programas integrados de ensino e pesquisa. Esses pro-
gramas serão planejados com audiência das comunidades indígenas e
terão, entre outros, os objetivos de fortalecer as práticas socioculturais
e a língua materna de cada comunidade indígena, manter programas
de formação de pessoal especializado destinado à educação escolar
nas comunidades indígenas, desenvolver currículos e programas
específicos, neles incluindo os conteúdos culturais correspondentes
às respectivas comunidades, e elaborar e publicar, sistematicamente,
material didático específico e diferenciado.
Vistas em seu conjunto, as diretrizes para a organização da
Educação Indígena, dentro da organização da educação brasileira,
são claras e abrangentes. Se forem rigorosamente aplicadas, essas
diretrizes em muito contribuirão para a preservação da cultura dos
diversos povos indígenas, por meio da oferta de uma educação esco-
lar diferenciada e específica, dirigida aos índios, suas comunidades
e, de maneira geral, a todos os povos indígenas. A questão que fica
sem resposta é a de saber se os povos indígenas necessitam de algum
tipo de educação escolar, ou, em outras palavras, se essa educação
escolar oferecida, seguindo rigorosamente todas essas disposições,
146 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

ajuda efetivamente a preservar as diversas culturas indígenas, ou se


essa educação escolar é apenas mais uma forma (ou estratégia) de
impor a cultura do homem branco a esses povos indígenas. Por outro
lado, essas diretrizes também poderão contribuir para a preservação
da cultura dos diversos povos indígenas.
Para Rosa Helena Dias da Silva, a escola, que sempre foi

um dos principais instrumentos usados durante a


história do contato para descaracterizar e destruir as
culturas indígenas, pode vir a ser hoje – na mão dos
próprios povos indígenas – um instrumento decisivo na
reconstrução e na afirmação das identidades. O desafio
que se coloca é o de pensar as escolas indígenas em
seus limites e suas possibilidades, dentro da realidade
atual, cada dia mais norteada por tendências homoge-
neizadoras e globalizantes. (SILVA, 1999, p. 64)

Já na incisiva opinião de D’Angelis, “substituir uma escola


ruim com um vasto currículo por uma boa escola que ensine só e
simplesmente a ler (e não silabar), a escrever e bem contar é a melhor
forma de contribuir efetivamente para a autonomia das comunidades
indígenas.” (D’ANGELIS, 1999, p. 22).
A Educação Indígena bilíngüe, prevista nos Arts. 78 e 79 da
LDB, adequada às peculiaridades culturais dos diferentes grupos,
pode ser melhor atendida através de professores índios. É preciso
reconhecer que a formação inicial e continuada dos próprios índios,
enquanto professores de suas comunidades, deve ocorrer em serviço
e concomitantemente à sua própria escolarização.
A formação que se contempla deve capacitar os professores
para a elaboração de currículos e programas específicos para as es-
colas indígenas; o ensino bilíngüe, no que se refere à metodologia e
ensino de segundas línguas e ao estabelecimento e uso de um sistema
ortográfico das línguas maternas; a condução de pesquisas de caráter
antropológico visando à sistematização e incorporação dos conheci-
mentos e saberes tradicionais das sociedades indígenas e à elaboração
de materiais didático-pedagógicos, para uso nas escolas instaladas em
suas comunidades.
EDUCAÇÃO INDÍGENA | 147

9.1. Oferta e atendimento

Na questão da oferta e do atendimento da Educação Indígena


analisaremos três propostas. A primeira propõe a universalização, no
médio prazo, da oferta para as comunidades indígenas de programas
educacionais equivalentes às quatro primeiras séries do Ensino Fun-
damental, respeitando seus modos de vida, suas visões de mundo e as
situações sociolingüísticas específicas por elas vivenciadas. Conside-
ramos que a universalização pretendia por essa proposta ainda não foi
alcançada, visto que, como vimos na introdução desse capítulo, a taxa
de analfabetismo entre os índios brasileiros é de 26%.
D’Angelis considera que propostas dessa natureza se cons-
tituem em apenas mais uma tentativa de escolarização formal das
comunidades indígenas – sempre presente na história das políticas
educacionais brasileiras –, que, para ele, nada mais é do que a im-
posição de uma “ditadura da escola”, onde a escola é vista como um
“templo”. (D’ANGELIS, 1999, p. 20, 24).
A segunda proposta trata da ampliação gradual da oferta de
ensino de 5ª a 8ª série à população indígena, quer na própria escola
indígena, quer integrando os alunos em classes comuns nas escolas
próximas, ao mesmo tempo que se lhes ofereça o atendimento adi-
cional necessário para sua adaptação, a fim de garantir o acesso ao
Ensino Fundamental pleno. Como essa proposta advoga uma amplia-
ção gradativa da oferta de ensino de 5ª a 8ª série à população indígena
e não a sua universalização, podemos dizer que ela encontra-se em
andamento.
Por último, na questão da oferta e do atendimento da Educação
Indígena, a terceira proposta trata da implantação, no curto prazo, de
cursos de Educação Profissional, especialmente nas regiões agrárias,
visando à auto-sustentação e ao uso da terra de forma equilibrada. Essa
proposta ainda não foi posta em prática, pelo contrário, entendemos
que antes da oferta de Educação Profissional, existe a necessidade
premente da oferta de Ensino Fundamental completo, para as popula-
ções indígenas, que ainda não se efetivou.

Questão para Debate em Sala de Aula

Quais seriam as melhores formas de universalizar, às comu-


148 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

nidades indígenas, a oferta de programas educacionais de Ensino


Fundamental, respeitando seus modos de vida, suas visões de mundo
e as situações sociolingüísticas específicas por elas vivenciadas?

9.2. Formação do profissional

Com relação a questão da formação profissional para a atuação


na Educação Indígena, discutiremos quatro propostas específicas,
atualmente existentes no contexto da política educacional brasilei-
ra. A primeira delas propõe instituir e regulamentar, nos sistemas
estaduais de ensino, a profissionalização e reconhecimento público
do magistério indígena, com a criação da categoria de professores
indígenas como carreira específica do magistério, com concurso de
provas e títulos adequados às particularidades lingüísticas e culturais
das sociedades indígenas, garantindo a esses professores os mesmos
direitos atribuídos aos demais do mesmo sistema de ensino, com
níveis de remuneração correspondentes ao seu nível de qualificação
profissional. Infelizmente, a proposta acima ainda não foi efetivada,
seja no nível estadual, municipal ou mesmo federal.
A segunda proposta defende a garantia de qualidade de pro-
gramas contínuos de formação sistemática do professorado indígena,
especialmente no que diz respeito aos conhecimentos relativos aos
processos escolares de ensino-aprendizagem, à alfabetização, à cons-
trução coletiva de conhecimentos na escola e à valorização do patri-
mônio cultural da população atendida. Essa proposta também ainda
não se efetivou visto que, um dos principais problemas da Educação
Indígena é a formação inicial de professores indígenas, para somente
depois se pensar no estabelecimento de programas contínuos de for-
mação sistemática do professorado indígena, com os seus respectivos
níveis de qualidade.
A terceira proposta que trata da formação profissional para a
atuação na Educação Indígena é a que propõe a formulação, no curto
prazo, de um plano para a implementação de programas especiais para
a formação de professores indígenas em nível superior, através da
colaboração das universidades e de instituições de nível equivalente.
Enquanto plano de implementação de programas especiais para a for-
EDUCAÇÃO INDÍGENA | 149

mação de professores indígenas em nível superior, essa proposta ainda


não se efetivou. O que temos no Brasil, atualmente, são iniciativas
isoladas de algumas universidades, que oferecem cursos de formação
de professores indígenas de nível superior, como, por exemplo, as
propostas da Universidade Federal de Roraima (UFRR) – com o
curso de Licenciatura Intercultural – e da Universidade Estadual do
Mato Grosso (UNEMAT) – com o curso de formação de professores
em três áreas: ciências da matemática e da natureza, ciências sociais e
línguas (que inclui artes, literatura e o idioma da etnia).
A quarta e última proposta referente à formação profissional
para a atuação na Educação Indígena é a que propõe que, com a
colaboração entre a União, os Estados e municípios e em parceria
com as instituições de ensino superior, seja promovida a produção
de programas de formação de professores de Educação a Distância
(EAD) de nível Fundamental e Médio. Consideramos que a utilização
da EAD como uma ferramenta para um aumento da qualificação dos
professores indígenas, como está posto nessa proposta, constitui-se
em uma intenção louvável. Porém, como ainda são poucos os cursos
de formação de professores indígenas, as propostas existentes ainda
se baseiam na metodologia do ensino presencial e, principalmente,
semi-presencial, na forma de módulos realizados nos meses de férias
do calendário escolar (janeiro, fevereiro e julho), de forma que os
professores indígenas não se afastem de suas aldeias durante o perí-
odo escolar.

Questão para Debate em Sala de Aula

Como fazer para eliminar e/ou reduzir significativamente,


no curto e médio prazos, o déficit de professores especializados em
Educação Indígena?

9.3. Questões pedagógicas

Analisaremos, neste item, as propostas existentes no contexto


da política educacional pública para a Educação Indígena que, no
150 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

nosso entendimento, tratam de questões prioritariamente pedagógi-


cas. Dentro desse critério, 4 propostas se encaixam nesse referencial.
A primeira dessas propostas defende a universalização imediata da
adoção das diretrizes para a política nacional de Educação Escolar
Indígena e os parâmetros curriculares estabelecidos pelo Conselho
Nacional de Educação (CNE) e pelo MEC. Essa proposta já foi efe-
tivada por meio do Parecer nº 14/99, da Câmara de Educação Básica
(CEB) do CNE, que trata das Diretrizes Nacionais para o funciona-
mento das Escolas Indígenas (Cf. DAVIES, 2004, p. 197) e por meio
dos Referenciais Curriculares Nacionais para a Escola Indígenas, já
em vigor. A questão é se o estabelecimento de diretrizes e referenciais
curriculares nacionais não significam, mais uma vez, uma tentativa,
por parte do Estado, de integrar “à força”, os povos indígenas.
A segunda proposta sobre questões pedagógicas da Educação
Indígena, sugere criar, tanto no MEC como nos órgãos estaduais de
Educação, programas voltados à produção e publicação de materiais
didáticos e pedagógicos específicos para os grupos indígenas, incluin-
do livros, vídeos, dicionários e outros, elaborados por professores
indígenas juntamente com os seus alunos e assessores.
Ao contrário da proposta anterior, esta proposta está longe de
ser efetivada visto que um dos principais problemas da Educação
Indígena é a formação de professores indígenas que, como vimos,
conta com apenas 3 mil professores indígenas para mais de 90 mil
alunos, sendo que quase 30% desses professores indígenas não com-
pletaram o Ensino Fundamental. Somente depois de resolvermos essa
grave questão é que teremos condições de ter professores indígenas
juntamente com os seus alunos e assessores, produzindo e publicando
materiais didáticos e pedagógicos específicos para os grupos indíge-
nas, incluindo livros, vídeos, dicionários e outros, como sugere essa
proposta.
Uma outra proposta que trata de questões pedagógicas espe-
cíficas da Educação Indígena, propõe implantar, no curto prazo, as
diretrizes curriculares nacionais e os parâmetros curriculares e uni-
versalizar, em cinco anos, a aplicação pelas escolas indígenas na for-
mulação do seu projeto pedagógico. Essa proposta já se efetivou visto
que os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Indígena
já estavam prontos – e sendo implantados –, desde o ano de 2001.
Por último, existe a proposta de que seja promovida a correta e
EDUCAÇÃO INDÍGENA | 151

ampla informação da população brasileira em geral, sobre as socieda-


des e culturas indígenas, como meio de combater o desconhecimento,
a intolerância e o preconceito em relação a essas populações. Con-
sideramos que essa proposta deve se constituir em um dos objetivos
primordiais da Educação Indígena, a ser permanentemente buscado.

Questão para Debate em Sala de Aula

Na sua opinião, o que deve ser feito, em termos pedagógicos,


para assegurar a qualidade da Educação Indígena brasileira?

9.4. Financiamento e gestão

A questão do financiamento e da gestão na Educação Indígena


serão abordadas por meio da análise de 6 propostas, porém, apenas
uma dessas propostas trata especificamente da questão do financia-
mento. Todas as outras propostas referem-se à gestão desta modali-
dade de ensino. Em vista dessa situação, optamos por começar nossa
análise pela única proposta oficial sobre financiamento da Educação
Indígena no Brasil.
Essa proposta sugere fortalecer e ampliar as linhas de finan-
ciamento existentes no MEC para implementação de programas de
Educação Escolar Indígena, a serem executados pelas Secretarias
Estaduais ou Municipais de Educação, organizações de apoio aos
índios, universidades e organizações ou associações indígenas. Acre-
ditamos que tanto o fortalecimento, quanto a ampliação das linhas
de financiamento a que se refere essa proposta, não estão ocorrendo,
em função de que não está havendo aumento das verbas destinadas
à Educação Básica, na qual se inclui a Educação Indígena. Com a
implantação do recém aprovado FUNDEB, ocorrerá um aporte maior
de recursos para a Educação Básica, e, conseqüentemente, para a
Educação Indígena.
Passando para a questão específica da gestão da Educação
Indígena, a primeira proposta defende que seja atribuída aos Estados,
a responsabilidade legal pela Educação Indígena, quer diretamente,
152 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

quer através de delegação de responsabilidades aos seus Municí-


pios, sob a coordenação geral e com o apoio financeiro do MEC.
Entendemos que a proposta explicitada acima explicita a intenção
de desresponsabilizar a União (esfera federal) de oferecer Educação
Indígena, mas por outro lado, essa mesma esfera federal, por meio
do MEC e do CNE, quer coordenar a Educação Indígena ofertada,
bem como definir a política nacional de Educação Escolar Indígena e
os respectivos parâmetros curriculares. Assim, consideramos que esta
proposta é absolutamente contraditória.
Uma outra proposta advoga a criação, no curto prazo, da cate-
goria oficial de ‘escola indígena’ para que a especificidade do modelo
de educação intercultural e bilíngüe seja assegurada. Essa proposta já
foi efetivada por meio do Parecer nº 14/99, da Câmara de Educação
Básica (CEB) do CNE, que trata das Diretrizes Nacionais para o fun-
cionamento das Escolas Indígenas (Cf. DAVIES, 2004, p. 197).
Uma outra proposta defende que seja assegurada a autonomia
das escolas indígenas, na elaboração do seu projeto pedagógico e do
uso de recursos financeiros públicos para a manutenção do cotidiano
escolar, garantindo a plena participação de cada comunidade indígena
nas decisões relativas ao funcionamento da escola. Nesta questão, é
fato que as escolas indígenas possuem a autonomia propagada por
esta proposta, desde que respeitem, na elaboração dos seus projetos
pedagógicos, os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educa-
ção Indígena (RCNEI). Já a garantia de plena participação de cada
comunidade indígena nas decisões relativas ao funcionamento da
escola depende das comunidades em que as escolas indígenas estão
inseridas. Segundo Camargo e Albuquerque, a elaboração do RCNEI,
específico para a escola indígena, por professores não-índios, não
contemplou “a realidade de muitos dos povos indígenas e que, por
ter sido escrito por não-índios, a forma e a linguagem utilizadas não
correspondiam aos seus anseios” (CAMARGO; ALBUQUERQUE,
2003, p. 340).
Uma última proposta na questão da gestão da Educação Indíge-
na, é a da criação, estruturação e fortalecimento, nas secretarias esta-
duais de educação, dos setores responsáveis pela Educação Indígena,
com a incumbência de promovê-la, acompanhá-la e gerenciá-la. Se
considerarmos todas as secretarias estaduais de educação do Brasil,
esse objetivo ainda não foi plenamente alcançado. Porém, a criação,
EDUCAÇÃO INDÍGENA | 153

estruturação e fortalecimento de secretarias estaduais de educação


dos Estados que possuem uma população indígena significativa,
como por exemplo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Roraima, já
significa um considerável avanço em termos de gestão da Educação
Indígena.

Questão para Debate em Sala de Aula

Como assegurar a autonomia plena (didática, pedagógica e de


gestão) das escolas indígenas?

9.5. Sugestões de Leituras Complementares

BORGES, P. H. P. Uma visão indígena da história. Cadernos CEDES,


São Paulo, CEDES/Cortez, ano XIX, n. 49, p. 92-106, dez./99.

OLIVEIRA, G. M. O que quer a lingüística e o que se quer da


lingüística: a delicada questão da assessoria lingüística no movimento
indígena. Cadernos CEDES, São Paulo, CEDES/Cortez, ano XIX, n.
49, p. 26-38, dez./99.

CAMARGO, D. M. P.; ALBUQUERQUE, J. G. Projeto pedagógico


Xavante: tensões e rupturas na intensidade da construção curricular.
Cadernos CEDES, Campinas, CEDES/UNICAMP, v. 23, n. 61, 338-
366, dez./2003.
CAPÍTULO 10

FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Uma das prioridades da política educacional brasileira atual é a


formação de professores, tanto inicial quanto continuada, como uma
forma direta de melhoria da qualidade do ensino e de valorização do
profissional em educação. Assim, deve fazer parte dessa valorização a
garantia das condições adequadas de trabalho, entre elas o tempo para
estudo e preparação das aulas, relação adequada de alunos por classe,
salário digno, com piso salarial e plano de carreira no Magistério.
É consenso entre os especialistas que os profissionais em
educação devem ser continuamente capacitados e avaliados, assim
como também é consenso que a qualidade do ensino está diretamente
relacionada à valorização do Magistério. Para Iria Brzezinski, apesar
do discurso oficial propagado durante o governo FHC ser de valori-
zação dos profissionais da educação, as ações desse governo, bem
como a sua política educacional de formação de professores, foram
de “desvalorização do papel social e cultural dos profissionais da edu-
cação e de desmantelamento das estruturas das instituições superiores
responsáveis pela formação de professores” (BRZEZINSKI, 2000, p.
171-172).
Diversos autores consideram que as políticas de formação de
professores no governo FHC, seguiram as orientações do Banco Mun-
dial. Barreto e Leher afirmam que nos documentos desse organismo
financeiro internacional, “os professores aparecem como obstáculos
a serem removidos para viabilizar as reformas ‘requeridas’ pelo País,
em consonância com as recomendações desse organismo. É possível
notar uma cuidadosa construção da imagem do professor: corporati-
vista, desqualificado, obsessivo por reajustes salariais, descompro-
missado com a educação dos pobres, partidário da oposição etc.”
Porém, a implantação da “reforma neoliberal, não bastaria construir
uma imagem negativa dos professores e acusá-los de corporativistas.
Seriam necessárias providências concretas, para exercer o controle
político-ideológico da sua formação e da sua atuação profissional.”
156 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

(BARRETO; LEHER, 2003, p. 48, aspas no original).


Para Luiz F. Dourado afirma que a política educacional do
governo FHC, dentro da qual se encontra a questão da formação
de professores, articula-se às teses defendidas pelo Banco Mundial,
cuja ênfase deve ser na “formação em serviço e no aligeiramento da
formação inicial, entendida como capacitação pedagógica de cunho
estritamente técnico.” (DOURADO, 2001, p. 51). Já para Leher, “esta
foi a política do ministro Paulo Renato: simplificar a educação e ali-
geirar a formação dos professores.” (LEHER, 2004, p. 35).
A implementação de políticas públicas de formação inicial e
continuada dos profissionais em educação é uma das condições para o
avanço científico e tecnológico da sociedade, uma vez que a produção
do conhecimento e a criação de novas tecnologias dependem do nível
e da qualidade da formação das pessoas. Nesse processo, os docen-
tes exercem um papel decisivo. Na formação inicial não deve haver
dicotomia entre teoria e prática nem a separação entre a formação
pedagógica e a formação no campo dos conhecimentos específicos
que serão trabalhados na sala de aula. A formação continuada torna-se
cada vez mais essencial, em decorrência do avanço científico e tec-
nológico e exigência de um nível de conhecimentos mais complexos
presentes na sociedade moderna.
A formação inicial dos profissionais da Educação Básica é res-
ponsabilidade das instituições de ensino superior (IES) e das univer-
sidades, onde a indissociabilidade entre pesquisa, ensino e extensão
pode garantir o nível de qualidade pedagógica esperado. Já a formação
continuada do Magistério é parte essencial da estratégia de melhoria
permanente da qualidade da educação, visando à abertura de novos
horizontes na atuação do profissional em educação. É papel das Se-
cretarias Estaduais e Municipais de Educação a garantia da oferta dos
cursos de formação continuada aos profissionais da educação pública,
em parceria com universidades e instituições de ensino superior.
Segundo a LDB, a formação de profissionais em educação1,
terá como fundamentos a associação entre teorias e práticas, inclusive
mediante a capacitação em serviço e o aproveitamento da formação

1 A LDB não se refere aos “trabalhadores em educação”, mas sim aos “profissionais da educação”, excluin-
do, assim, os servidores técnico-administrativos (Cf. CURY, 2003, p. 137).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES | 157

e das experiências anteriores em instituições de ensino e outras ati-


vidades. Esses fundamentos são parâmetros para que a formação dos
profissionais em educação possa atender aos objetivos dos diferentes
níveis e modalidades de ensino e às características de cada fase do
desenvolvimento do aluno. Temos, como pontos principais a valo-
rização das experiências anteriores dos docentes e as possibilidades
de capacitação em serviço, idéias pouco valorizadas anteriormente,
na história da organização da educação brasileira. Por outro lado,
a associação entre teorias e práticas se constitui em uma condição
sine qua non na formação de qualquer profissional, seja da área da
educação ou não.
A formação de docentes para atuar na Educação Básica deve
ser feita em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação
plena, em Universidades e Institutos Superiores de Educação (ISE),
porém, também é admitida, como formação mínima para o exercício
do Magistério na Educação Infantil e nas quatro primeiras séries do
Ensino Fundamental, a formação profissional oferecida em nível
médio, na modalidade Normal. Esta determinação é clara ao expli-
citar que, qualquer docente que tenha apenas a formação mínima,
oferecida em nível médio, na modalidade Normal, e que queira, por
vontade própria, continuar atuando apenas no exercício do magis-
tério na Educação Infantil e nas quatro primeiras séries do Ensino
Fundamental, não necessita ter feito, ou vir a fazer, obrigatoriamente,
qualquer tipo de curso superior. Qualquer interpretação diferente des-
ta – por exemplo, que a legislação educacional atual exige que todos
os professores, dentro de um determinado prazo, sejam obrigados a
concluir um curso superior – é uma interpretação equivocada (Cf.
BRANDÃO, 2003, p. 135-137).
Claro que acreditamos que todos os professores que ainda não
tiveram a oportunidade de freqüentar um curso superior, o farão,
assim que lhes forem dadas as condições adequadas para tal. Porém,
ameaçar com demissão, alegando que se trata de uma determinação
imposta pela legislação educacional vigente, é, no caso dos profes-
sores de Educação Infantil e das quatro primeiras séries do Ensino
Fundamental, no mínimo, um constrangimento indevido. É sempre
louvável defender a melhoria na qualidade e no nível de formação
profissional dos docentes de todas as escolas brasileiras. O que não
se pode fazer é, na falta de melhores argumentos, inclusive pedagó-
158 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

gicos, creditar à legislação educacional atual, disposições que ela não


expressa.
Na nova organização da educação brasileira, foi criada a figura
dos Institutos Superiores de Educação, que oferecerão cursos for-
madores de profissionais para a Educação Básica, inclusive o Curso
Normal Superior, destinado à formação de docentes para a Educação
Infantil e para as primeiras séries do Ensino Fundamental, programas
de formação pedagógica para portadores de diplomas de Educação
Superior que queiram se dedicar à Educação Básica, e programas de
educação continuada para os profissionais em educação dos diversos
níveis. Consideramos que essas atribuições, concedidas aos novos
Institutos Superiores de Educação, deveriam ser atribuições dos já
existentes cursos de graduação em Pedagogia.
Porém, a atribuição de oferecer cursos formadores de profis-
sionais para Educação Básica, inclusive o Curso Normal Superior,
destinado à formação de docentes para a Educação Infantil e para
as primeiras séries do Ensino Fundamental, vem preencher, especial-
mente em termos de objeto de estudo e de conteúdos, uma lacuna
inexistente. Em outras palavras, o objeto de estudo e os conteúdos a
serem ministrados por esse Curso Normal Superior, ou já fazem parte
da modalidade Normal, oferecida em nível médio, ou já fazem parte
dos cursos de graduação em Pedagogia. Não existe uma terceira op-
ção porque não foram descobertos novos conteúdos pedagógicos que
já não sejam ministrados, ou na modalidade Normal de nível médio,
ou nos cursos de graduação em Pedagogia. Também ainda não foi
descoberto um novo objeto de estudo, epistemologicamente diferente
dos já estudados por esses mesmos cursos.
O que pode ocorrer, e que provavelmente ocorrerá, é que,
se os Cursos Normais Superiores formarem os profissionais para a
Educação Básica, e os cursos de graduação em Pedagogia formarem
especialistas em educação, para que servirá o curso de nível médio
na modalidade Normal? A conseqüência imediata será o fechamento
gradual, por “inanição”, ou seja, por falta de alunos interessados, da
modalidade Normal, oferecida em nível médio. Outra conseqüência
previsível é que, em termos de futura atuação profissional, na prática,
tanto os egressos do Curso Normal Superior, quanto os egressos dos
cursos de graduação em Pedagogia, serão professores de Educação
Básica. Em função dessas observações é que afirmamos que a figura
FORMAÇÃO DE PROFESSORES | 159

do Curso Normal Superior veio preencher uma lacuna inexistente.


Já a formação de profissionais em educação que atuarão nos
níveis de administração, planejamento, inspeção, supervisão e orien-
tação educacional para a Educação Básica será feita em cursos de
graduação em Pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério
da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum
nacional, ou seja, está claro que a exigência de possuir um curso de
graduação em Pedagogia, ou cursos de pós-graduação em educação,
se refere, única e exclusivamente, aos profissionais em educação que
atuam, ou desejam atuar, nos níveis de administração, planejamen-
to, inspeção, supervisão e orientação educacional para a Educação
Básica. Não se pode confundir essa determinação específica com a
exigência ilegal, de que todos os docentes que atuam, por vontade
própria, e que queiram continuar atuando apenas no Magistério na
Educação Infantil e nas primeiras séries do Ensino Fundamental, e
que para tanto possuem a formação mínima necessária, oferecida em
nível médio, na modalidade Normal, sejam obrigados a fazer qualquer
tipo de curso superior, sob o argumento inverídico de que a legislação
educacional vigente exige que assim seja.
Excetuando-se a formação docente para a Educação Superior, a
formação do profissional docente deverá incluir a realização de práti-
ca de ensino de, no mínimo, 300 (trezentas) horas. Essa determinação
faz com que, na grade curricular de todos os cursos de licenciatu-
ra, o contato dos alunos desses cursos com a realidade do Ensino
Fundamental e Médio brasileiro seja antecipado, no mínimo, em um
ano. Por exemplo, o aluno que, anteriormente, iniciava a prática de
ensino no último ano de seu curso de licenciatura, passa a iniciar
essa prática de ensino no penúltimo ano de seu curso de licenciatura.
Se, por um lado, essa antecipação pode ser vista como positiva, no
sentido de que, ao iniciarem, mais cedo, o convívio com a realidade
educacional, os alunos podem vivenciar e apreender as relações entre
teorias e práticas pedagógicas, e terão mais tempo para discutir todos
os aspectos que envolvem a prática de ensino, por outro lado, esse
aluno, necessariamente, no momento inicial dessa prática de ensino,
possuirá menos conhecimentos pedagógicos, já que cursou, até esse
momento, um número menor de disciplinas.
Os sistemas de ensino estabelecerão as normas para a realização
dos estágios dos alunos regularmente matriculados no Ensino Médio
160 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

ou Superior em sua jurisdição. Esses estágios não são os mesmos está-


gios realizados pelas disciplinas que exigem a chamada “prática de en-
sino”, mas sim os estágios específicos de cada uma das profissões, em
nível Superior ou em nível Médio. Esses estágios também não geram
vínculos empregatícios, podendo o estagiário receber bolsa de estágio,
estar segurado contra acidentes e ter a cobertura previdenciária pre-
vista na legislação específica, evitando assim que alunos-estagiários
requeiram, a qualquer tempo, direitos trabalhistas a que não fazem jus.
No caso da preparação para o exercício do magistério superior, essa
formação terá que ser, necessariamente, em nível de Pós-graduação,
prioritariamente em programas de Mestrado e Doutorado, o que pode
significar, a médio prazo, uma significativa elevação da qualidade do
ensino, especialmente em inúmeras instituições privadas de ensino
superior.
Os sistemas de ensino, por sua vez, têm a obrigação de promo-
ver a valorização dos profissionais em educação, assegurando-lhes,
inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do ma-
gistério público, o ingresso exclusivamente por concurso público de
provas e títulos, aperfeiçoamento profissional continuado (inclusive
com licenciamento periódico remunerado), piso salarial profissional,
progressão funcional baseada na titulação ou habilitação e na avaliação
do desempenho, período reservado a estudos, planejamento e avalia-
ção incluído na carga de trabalho e condições adequadas de trabalho.
Por outro lado, a experiência docente é pré-requisito para o exercício
profissional de quaisquer outras funções de magistério, nos termos e
normas que cada sistema de ensino determinar.
Essas disposições, se cumpridas integralmente, significarão
uma efetiva valorização dos profissionais em educação, e, conseqüen-
temente, uma melhoria no padrão de qualidade do ensino brasileiro. O
problema é que algumas dessas determinações possuem um elevado
grau de subjetividade. Por exemplo, a garantia de condições adequadas
de trabalho. As interpretações do que significa “condições adequadas
de trabalho”, faz com que esse princípio possa ter poucos efeitos prá-
ticos na valorização dos profissionais em educação. É praticamente
impossível responsabilizar o Poder Público pela ausência de condi-
ções adequadas de trabalho, visto que o adjetivo “adequadas” é extre-
mamente subjetivo, podendo, cada pessoa, interpretá-lo de maneira
diferenciada. Todas as outras determinações são medidas objetivas e
FORMAÇÃO DE PROFESSORES | 161

corretas para valorizar os profissionais em educação.


A valorização do magistério implica em oferecer uma forma-
ção profissional que assegure o desenvolvimento do educador como
cidadão e profissional; o domínio dos conhecimentos e dos métodos
pedagógicos que promovam a aprendizagem; um sistema de educação
continuada que permita ao professor seu crescimento intelectual cons-
tante; uma jornada de trabalho concentrada num único estabelecimento
de ensino e que inclua o tempo necessário para as atividades comple-
mentares ao trabalho em sala de aula e, principalmente, um salário
digno e competitivo em relação à outras ocupações que requerem nível
equivalente de formação.
No que se refere à valorização salarial do profissional em edu-
cação, deve-se se ter como princípio norteador que os níveis salariais
mais elevados correspondam a exigências maiores de qualificação
profissional e de desempenho. O FUNDEF já provocou mudanças
nos níveis salariais naqueles Estados e municípios onde o professor
recebia salários muito baixos, inferiores ao salário mínimo, porém
como o FUNDEF dizia respeito somente ao Ensino Fundamental, tais
mudanças atingiram somente os salários dos professores desse nível
de ensino, ou seja, os professores de Educação Infantil, de Educação
de Jovens e Adultos e de Ensino Médio, foram prejudicados. Por outro
lado, nos Estados e municípios onde o salário já era mais alto do que o
possibilitado pelo FUNDEF, não houve melhoria para os professores,
pelo contrário, passaram a existir dificuldades adicionais para certos
municípios manter o padrão anterior de remuneração. Esperamos que
com a implantação do FUNDEB essa distorção seja corrigida e que
todos os profissionais em educação, inclusive os profissionais não-do-
centes, sejam devidamente valorizados, também em termos salariais.
Diferentemente dos outros capítulos, neste capítulo sobre Forma-
ção de Professores, não dividimos as propostas existentes em temáticas
específicas (oferta e atendimento; questões pedagógicas; financiamento
e gestão; etc.), pois entendemos que todas as propostas a serem abaixo
discutidas referem-se à questão da Formação de Professores.

10.1. Propostas para a Formação de Professores

A primeira das propostas sobre a questão da Formação de


162 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Professores trata da importante questão dos planos de carreira. Essa


proposta defende que seja garantida a implantação dos planos de
carreira segundo as determinações expressas pela Lei 9.424/96, bem
como a elaboração e respectiva aprovação dos planos de carreira do
Magistério, onde eles ainda não existirem, garantindo, tanto num caso
como noutro, piso salarial próprio e promoção por mérito.
Em cumprimento à Lei 9.424/96, estão sendo elaborados ou
reformulados os planos de carreira do Magistério, mas a verificação
da efetiva implantação dessa proposta se constitui em uma tarefa
extremamente complexa, no sentido de que existem muitos Estados
e municípios que já reformularam e implementaram seus respectivos
planos de carreira do Magistério. Por outro lado existe, também, um
número significativo de municípios que ainda não possuem plano de
carreira específico do Magistério2. Independente de uma ou outra
situação, os planos de carreira são importantes instrumentos de valo-
rização dos profissionais em educação. Já com relação aos níveis de
remuneração, ainda existem no Brasil grandes desníveis regionais,
por exemplo, no Estado do Rio de Janeiro, um professor com nível
superior, em início de carreira recebe (em agosto de 2005), por 40
horas semanais, R$ 1.351,62, ao passo que o mesmo profissional, se
atuar no Estado de Pernambuco, receberá R$ 460,69, ou seja, pouco
mais que um terço do recebe o profissional fluminenese. Já o profes-
sor, em início de carreira, no Estado de São Paulo recebia, em 2007,
39% menos do que o professor que atuava no Estado do Acre3.
Já a segunda proposta defende a implantação gradual da
jornada de trabalho de tempo integral e cumprida em um único es-
tabelecimento escolar. O maior problema dessa proposta refere-se
à implantação da jornada de trabalho de tempo integral de maneira
gradual, sem especificar objetivamente um prazo para que isso ve-
nha a se concretizar. A inexistência desse prazo pode inviabilizar a
proposta de escola de tempo integral, no curto e médio prazos. Há

2 Segundo a pesquisa Perfil dos Municípios Brasileiros, apenas 33,3% dos administradores municipais
listaram a regulamentação e valorização da carreira do magistério como uma das 5 prioridades municipais na
área da Educação (Cf. www.ibge.gov.br , acesso em 28/10/2007).

3 Essa diferença sobe para 60% se for levado em conta o custo de vida dos respectivos Estados (Cf. www.
cnte.org.br , acesso em 16/10/2007).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES | 163

que se considerar também que para o professor, seria muito bom que
ele cumprisse toda a sua jornada de trabalho em uma única escola.
Isso ainda não acontece no Brasil porque significa elevação de custos
para o sistema de ensino mantenedor (União, Estados ou municípios).
Somente quando os administradores públicos realmente priorizarem a
educação, entendendo que os gastos em educação não são gastos mas
sim investimentos, é que essa proposta será plenamente efetivada.
A terceira proposta defende destinar para a preparação de aulas,
avaliações e reuniões pedagógicas, um percentual de 20 a 25% da car-
ga horária dos docentes. Essa proposta é, em certa medida, decorrente
da proposta anterior, na medida em que, a partir do momento em que
o professor tenha a sua jornada de trabalho em um único estabeleci-
mento escolar, as possibilidades de que ele possa destinar entre 20 e
25% de sua carga horária para tais fins, aumentam exponencialmente.
Se esse mesmo professor necessita dividir a sua jornada de trabalho
entre duas, três ou mais escolas, as possibilidades de poder destinar o
percentual acima definido para reuniões, planejamentos e avaliações,
também se reduzem de forma exponencial.
Uma outra proposta sugere que sejam identificados, nos muni-
cípios onde a necessidade de novos professores é elevada, bem como
o número de professores leigos é significativo, as pessoas portadoras
de diplomas de licenciatura e de habilitação de nível médio para
o Magistério, que se encontrem fora do sistema de ensino, com o
objetivo de atrair esses profissionais para a carreira do Magistério.
Essa proposta é absolutamente inócua, na medida em que o problema
da ausência de professores ou da baixa qualificação profissional dos
professores que atuam nas redes públicas de ensino não está na identi-
ficação de profissionais com curso superior ou médio que porventura
estejam fora de qualquer sistema público de ensino. O problema é
de melhores condições objetivas de trabalho e de melhores salários.
Salários competitivos com a realidade local e melhores condições de
trabalho, se constituem em poderosos atrativos para que profissionais
qualificados adentrem ao sistema de ensino como professores. Salá-
rios baixos e condições adversas de trabalho os afastam. Assim, não
é necessário gastar tempo e dinheiro com processos de identificação,
com tais objetivos, se o cerne do problema é outro.
Uma outra proposta retoma a questão da Educação Indígena,
ao propor que nos concursos de provas e títulos para provimento dos
164 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

cargos de professor para esta modalidade de ensino, sejam incluídos


requisitos referentes às particularidades culturais, especialmente
lingüísticas, dos grupos indígenas. O que, à primeira vista, pode
parecer uma espécie de “reserva de mercado” não se aplica, no nos-
so entendimento, à análise das questões que se referem à Educação
Indígena. É consenso que a oferta de Educação Indígena bilíngüe,
de acordo com os parâmetros previstos nos Arts. 78 e 79 da LDB,
pode ser melhor atendida através de professores índios, para que a
mesma seja adequada às peculiaridades culturais dos diferentes gru-
pos indígenas. Assim, consideramos correta a inclusão dos requisitos
acima descritos, quando da realização de concursos para professores
de Educação Indígena.
Já uma outra proposta retorna à questão da qualificação
mínima exigida pela LDB para a carreira do Magistério, ao propor
a ampliação dos programas de formação em serviço, com vistas à
aquisição dessa qualificação mínima. Os programas de formação em
serviço, segundo essa proposta, devem ser oferecidos em parceria
entre União, Estados e municípios, e devem observar as diretrizes e
parâmetros curriculares existentes. A ampliação aqui proposta já se
realizou, especialmente nos primeiros anos após a sanção da atual
LDB, especialmente em função de uma interpretação equivocada do
§ 4º do Art. 87 desta lei, segundo a qual a LDB exigia que, a partir de
sua vigência, todos os professores que atuassem na Educação Básica
teriam que possuir formação de nível superior, infringindo assim o
que está posto pelo Art. 62 da própria LDB4. Independentemente da
forma de interpretação desses dispositivos legais, esta proposta está
sendo efetivada visto que, em maior ou menor grau, a colaboração
acima referida está se realizando em muitos Estados e municípios
brasileiros.
Na mesma direção da qualificação mínima exigida pela LDB
para a carreira do Magistério, uma outra proposta sugere que sejam
desenvolvidos programas de Educação a Distância (EAD) que possam
ser utilizados também em cursos semi-presenciais modulares, com o
objetivo de se alcançar essa qualificação mínima exigida pela LDB

4 No final de 2007, quase metade (47%) dos docentes que atuavam até a 4ª série do Ensino Fundamental
ainda não possuíam diploma de curso superior (Cf. www.mec.gov.br , acesso em 23/10/2007).
FORMAÇÃO DE PROFESSORES | 165

para a carreira do Magistério, de que fala a proposta anterior. Nestes


termos, são muitos os exemplos de programas de EAD já realizados,
ou em andamento, em diversos Estados brasileiros. Barreto e Leher
afirmam que “o grande alvo das iniciativas de educação a distância
tem sido os cursos de formação de professores”, que visam a “certi-
ficação em larga escala, o aumento de vagas nas universidades e a
compressão do tempo de formação profissional”, especialmente no
caso das licenciaturas (BARRETO; LEHER, 2003, p. 52, 54-55).
Continuando na questão da qualificação mínima exigida pela
LDB para a carreira do Magistério, efetivada como formação em
serviço, existe a proposta da generalização, nas instituições de ensino
superior públicas, da oferta de cursos regulares noturnos e cursos
modulares de licenciatura plena, de forma que, dessa maneira, os
docentes em exercício possam adquirir formação de nível superior.
Consideramos que ainda não podemos afirmar que a oferta de cursos
de formação de professores, em nível superior, nos moldes propostos,
esteja generalizada. Porém, já é possível afirmar que a oferta de cur-
sos dessa natureza, nessas condições, aumentou significativamente
nos últimos anos.
Uma outra proposta advoga que todos os professores de
Ensino Médio adquiram, no médio prazo, formação específica de
nível superior, obtida em curso de licenciatura plena nas áreas de
conhecimento em que atuam. A efetivação dessa proposta se constitui
em um significativo desafio, visto que, por exemplo, em 2003, no
Estado de São Paulo, existiam mais de 2.300 professores de ciências
ministrando aulas na rede pública sem possuírem o curso superior e
quase 10% dos professores de química eram profissionais de nível
superior, porém sem formação pedagógica, ou eram estudantes que
ainda não haviam terminado o curso de graduação. Se a situação é
essa, em uma área específica de conhecimentos, em um dos Estados
mais desenvolvidos do país, com certeza é mais delicada nos outros
Estados brasileiros.
Já uma outra proposta defende que em todos os cursos de
formação de professores, sejam de nível médio ou de nível superior,
sejam incluídos conhecimentos sobre Educação Especial, na perspec-
tiva da integração social. Entendemos que, mais do que se efetivar
a proposta acima, o mais importante é verificar se está ocorrendo
uma mudança na mentalidade das pessoas em relação à Educação
166 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Especial. Para se incluir os conteúdos acima propostos, ainda que na


perspectiva da integração social, basta a edição de uma norma legal.
A maior dificuldade reside em fazer com que esses conhecimentos
específicos sejam ministrados por profissionais adequadamente pre-
parados dentro da perspectiva proposta, que é a de integração social
das pessoas portadoras de necessidades especiais.
Também existe uma outra proposta de inclusão de conteúdos
específicos nos currículos e programas dos cursos de formação de
profissionais da educação, especificamente que sejam incluídos,
nesses cursos, temas específicos da história, da cultura, dos conhe-
cimentos, das manifestações artísticas e religiosas do segmento
afro-brasileiro, das sociedades indígenas e dos trabalhadores rurais e
sua contribuição na sociedade brasileira. A Lei 10.639/03 modificou
a LDB de forma a incluir, obrigatoriamente, nas escolas de Ensino
Fundamental e Médio, o ensino de História e Cultura Afro-brasileira.
Porém, a imensa maioria dos currículos e programas dos cursos de
formação de profissionais da educação, ainda não contempla essas
temáticas.
Na direção da qualificação profissional, existe a proposta de
que seja ampliada a oferta de cursos de Mestrado e Doutorado em
Educação. Segundo dados da CAPES, o Brasil titulou, em 2003,
8.094 doutores, ao passo que em 1990 esse número foi de 1.410 dou-
tores, o que significa um crescimento de quase 475% em 13 anos. Na
área da Educação, em 2005, existiam 75 programas de pós-graduação
(mestrados e doutorados) reconhecidos pela CAPES, e 30 programas
de mestrado em Educação em processo de avaliação. A melhoria da
qualidade desses cursos já significará um aumento de quase 70% na
sua oferta, que, somada ao provável aumento do número de progra-
mas de doutorados em Educação – como desdobramento natural dos
45 programas de mestrado em Educação já reconhecidos – fará com
que essa proposta seja plenamente efetivada.
Por último, existe a proposta de que a União, os Estados e os
municípios promovam a avaliação periódica da qualidade de atuação
dos professores, tendo como base as diretrizes e os parâmetros curri-
culares dos cursos superiores de formação de professores, de forma
que essa avaliação forneça subsídios para a definição de necessidades
e características dos cursos de formação continuada. Por enquanto,
temos apenas o exemplo do Estado da Bahia, que em 2004, por meio
FORMAÇÃO DE PROFESSORES | 167

da Secretaria Estadual de Educação avaliou os seus professores, para


efeito de progressão na carreira do Magistério estadual.

Questões para Debate em Sala de Aula

a) Quais os limites, as vantagens e as desvantagens da utili-


zação da Educação a Distância (EAD) como modalidade de ensino
predominante na Formação de Professores?

b) Como fazer para atrair profissionais de nível superior para a


carreira do Magistério?

c) Na sua opinião, qual a importância da Educação continuada


nos dias de hoje?

10.2. Sugestões de Leituras Complementares

AGUIAR, M. A. S.; MELO, M. M. O. Pedagogia e faculdades de


educação: vicissitudes e possibilidades da formação pedagógica e
docente nas IFES. Revista Educação & Sociedade. Revista de Ciência
da Educação. Centro de Estudos Educação e Sociedade. CEDES,
Campinas, v. 26, n. 92, p. 959-982, Número Especial, out. 2005.

MAUÉS, O. C. Reformas internacionais da educação e formação de


professores. Cadernos de Pesquisa. Fundação Carlos Chagas. São
Paulo, n. 118, p. 89-117, 2003.

MINTO, C. A.; SILVA, M. A. Treinamento travestido de formação de


nível superior. Universidade e Sociedade. Brasília, DF, Ano XI, n. 24,
p. 137-140, jun./2000.

SILVA JR., J. R. Reformas do Estado e da educação e as políticas públicas


para a formação de professores a distância: implicações políticas e
teóricas. Revista Brasileira de Educação - Associação Nacional de
Pós-graduação e Pesquisa em Educação / Autores Associados, Rio de
Janeiro / Campinas, n. 24, p. 78-94, set./out./nov./dez. 2003b.
CAPÍTULO 11

FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO

A questão do Financiamento da Educação se constitui numa


das questões mais complexas da política educacional brasileira atual,
entre outros fatores porque, na medida em que se aumenta a transpa-
rência da gestão dos recursos financeiros e o controle social sobre os
gastos de manutenção e desenvolvimento do ensino, tais medidas po-
dem garantir a efetiva aplicação dos recursos destinados à educação.
Independentemente desses fatores, segundo estudo da OCDE com 34
países, o Brasil é o que menos gasta com educação, com uma média
anual por aluno (desde a Educação Básica até a Educação Superior)
de apenas R$ 2.488,00. O percentual do PIB gasto com educação é
de apenas 3,6%, ficando a frente apenas da Rússia (3,6%) e da Grécia
(3,4%)1.
Sobre a importância da questão do financiamento da educação
e sua relação com a escola pública, Vieira afirma que no
mundo inteiro a escola pública é aquela mantida com
recursos públicos. Muito embora sejam buscadas novas
alternativas de gestão e financiamento, não há ainda
um outro modelo capaz de responder às exigências da
cidadania para todos. Assim, em que pese o imperativo
de uma severa vigilância dos diferentes atores sociais
sobre a organização escolar – pais, comunidade e ou-
tras organizações – a educação pública persiste sendo
aquela oferecida nos estabelecimentos oficiais. (...) Ao
longo da história, o Poder Público brasileiro investiu
recursos incalculáveis na montagem de um aparato
escolar. Construiu-se um sistema, cuja capilaridade se
estende por todo o país, chegando às menores unidades
da federação. Os recursos humanos e a rede física nele

1 Cf. www.uol.com.br/educacao/ultnot/ult105u5853.jhtm , acesso em 18/09/2007.


170 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

envolvidos constituem um patrimônio da sociedade


brasileira. Particularmente, dos filhos dos trabalhado-
res, que têm na escola pública talvez a única oportuni-
dade de acesso ao saber sistematizado e à transmissão
da cultura erudita. (VIEIRA, 1998, p. 41-42)
Segundo a Constituição e a LDB, são recursos públicos destina-
dos à educação aqueles originados da receita de impostos próprios da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios; da receita
de transferências constitucionais e de outras transferências; da receita
do salário-educação e de outras contribuições sociais; da receita de in-
centivos fiscais e de outros recursos previstos em outras leis. O maior
montante de recursos financeiros destinados à Educação, em termos
absolutos, provém, na maioria dos casos, de receita de impostos pró-
prios da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios e de
receita de transferências constitucionais e outras transferências.
De acordo com o Art. 212 da Constituição, a União aplicará,
anualmente, nunca menos de 18% (dezoito por cento), e os Estados, o
Distrito Federal e os municípios, nunca menos de 25% (vinte e cinco
por cento)2, ou o que consta nas respectivas Constituições estaduais
ou Leis Orgânicas municipais, da receita resultante de impostos,
compreendidas as transferências constitucionais, na manutenção e
desenvolvimento do ensino público. A assistência financeira da União
aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios, bem como a dos
Estados aos seus municípios, ficam condicionadas ao cumprimento
desse preceito constitucional.
Deve ser ressaltado que esses percentuais são percentuais
mínimos, podendo ser aplicados, na manutenção e desenvolvimen-
to do ensino público, percentuais maiores do que os definidos pela
Constituição e pela legislação infra-constitucional. Alguns municípios
brasileiros definiram, em suas respectivas Leis Orgânicas, percentuais
acima do mínimo exigido, como era o caso, até alguns anos atrás, do
município de São Paulo, que exigia a aplicação de um mínimo de

2 A Emenda Constitucional nº 14/96 e a Lei nº 9.424/96, que, respectivamente, criaram e regulamentaram


o FUNDEF, alteraram a forma de recolhimento e destinação desses percentuais. A recente aprovação do
FUNDEB novamente modifica esse cenário.
FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO | 171

30% (trinta por cento) na Educação3. Oliveira considera que a “vincu-


lação de recursos para a educação expressa a primazia da educação
no contexto das políticas governamentais. Na hipótese de não haver
vinculação, a cada elaboração da proposta orçamentária, decidir-se-
ia quanto se aplicaria em educação, como acontece com as outras
despesas governamentais.” (OLIVEIRA, 2001, p. 99).
Outro aspecto importante que merece ser ressaltado é a obriga-
toriedade de que esses percentuais sejam aplicados na manutenção e
desenvolvimento do ensino público e não na educação. Como o con-
ceito de “educação” é muito amplo, podendo englobar, por exemplo,
manifestações artísticas, culturais, esportivas, etc., a determinação
que os recursos financeiros devem ser usados na manutenção e de-
senvolvimento do ensino público possui o objetivo de definir, mais
claramente, onde esses recursos financeiros devem ser investidos,
facilitando, inclusive, a fiscalização pelas diferentes instâncias da
sociedade.
Os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, po-
dendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantró-
picas, nas seguintes condições: a) desde que as mesmas comprovem
finalidade não-lucrativa e não distribuam resultados, dividendos, bo-
nificações, participações ou parcela de seu patrimônio sob nenhuma
forma ou pretexto; b) desde que essas instituições apliquem seus ex-
cedentes financeiros em educação; c) assegurem a destinação de seu
patrimônio a outra escola comunitária, filantrópica ou confessional,
ou ao Poder Público (no caso de encerramento de suas atividades); d)
e desde que prestem contas ao Poder Público dos recursos recebidos.
Essas são as condições em que pode-se dar o financiamento público
de instituições de ensino privadas.
Para Gentili, a proposta do neoliberalismo para solucionar a
crise educacional “é produto da combinação de uma dupla lógica
centralizadora e descentralizadora: centralização do controle peda-
gógico (em nível curricular, de avaliação do sistema e de formação
de docentes) e descentralização dos mecanismos de financiamento e
gestão do sistema.” (GENTILI, 2002, p. 25, itálicos no original).

3 Outros exemplos de Estados e municípios cujos percentuais orçamentários vinculados à educação são
maiores do que esses percentuais podem ser encontrados em Oliveira (2001, p. 96-97).
172 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Assim como no capítulo anterior, neste capítulo não dividimos


nossa abordagem em diferentes temáticas (oferta e atendimento;
questões pedagógicas; formação do profissional; etc.). Optamos por
realizar a análise do conjunto das propostas sobre o Financiamento
da Educação.

11.1. Propostas para o Financiamento da Educação

A primeira das propostas sobre a questão do Financiamento da


Educação, no contexto da atual política educacional brasileira, é a da
implantação de mecanismos de fiscalização e controle para que os
percentuais mínimos a serem aplicados na manutenção e desenvolvi-
mento do ensino, determinados pelo Art. 212 da Constituição, sejam
cumpridos, em consonância ao que determina cada um dos incisos do
Art. 70 da LDB, que definem o que é legalmente considerado como
gastos com manutenção e desenvolvimento do ensino. Esta proposta
demonstra que cada vez é menor a responsabilidade da União e dos
Estados no oferecimento da Educação, principalmente no nível do
Ensino Fundamental, transferindo, cada vez mais, a responsabilidade
para os municípios. A efetividade desta proposta depende, funda-
mentalmente, da fiscalização dos quase 6 mil municípios brasileiros.
Para Vieira, o “controle da sociedade civil sobre o repasse de recursos
públicos ao sistema escolar é uma forma de publicizar a educação,
contribuindo para que a escola do cidadão seja, de fato, pública”
(VIEIRA, 2000, p. 83, itálicos no original).
Ainda que a proposta de criação de conselhos sociais e mu-
nicipais de acompanhamento e fiscalização signifique um primeiro
passo, sabemos que em muitos municípios tais conselhos são me-
ramente apêndices do Poder Executivo local. Sobre esse problema,
Maria S. S. Bueno considera que tais conselhos, “que representariam
o envolvimento da sociedade civil e garantiriam a legitimidade social
do processo gestionário”, possuem critérios de escolha de seus repre-
sentantes que, geralmente, se situam “no domínio da política local e
ao sabor de sua gramática”. Assim, “a pretensão de acompanhamento
e controle social em muitos casos foi enfraquecida, por conta de um
processo de cooptação política”, e a “assimilação das demandas, nessa
FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO | 173

perspectiva, foi várias vezes atravessada pela ânsia de popularidade


do Executivo local e assobrada pelos velhos esquemas clientelistas e
populistas” (BUENO, 2004, p. 187-188).
A segunda proposta na questão do Financiamento da Educação,
sugere a criação de mecanismos que viabilizem, de forma imediata,
o cumprimento do § 5º do art. 69 da LDB, o qual assegura o repasse
automático dos recursos vinculados à manutenção e desenvolvimen-
to do ensino para o órgão responsável por este setor. Segundo essa
proposta, entre tais mecanismos deve estar a aferição anual pelo
censo escolar da efetiva automaticidade dos repasses. O § 5º do art.
69 da LDB, ao qual se refere essa proposta, especifica os prazos em
que devem ocorrer os repasses dos recursos financeiros destinados a
educação, entre as diversas esferas do Poder Público (União, Estados
e municípios) (Cf. BRANDÃO, 2003, p. 144). Entendemos que o
maior problema para torná-la efetiva é saber quais seriam os meca-
nismos, visto que o mecanismo proposto teria periodicidade apenas
anual, o que, na questão do Financiamento da Educação, significa um
intervalo consideravelmente elevado, especialmente por estarmos tra-
tando da questão específica da fiscalização dos repasses financeiros
legalmente (e constitucionalmente) estabelecidos.
Uma outra proposta também sugere o estabelecimento de me-
canismos que assegurem o integral cumprimento das determinações
dispostas nos Arts. 70 e 71 da LDB, os quais definem os gastos ad-
mitidos como de manutenção e desenvolvimento do ensino e aqueles
que não podem ser incluídos nesta rubrica. O maior problema dessa
proposta segue na mesma direção do problema já discutido na pro-
posta anterior, quer seja, saber quais seriam esses mecanismos, além
dos já existentes, entre eles a própria LDB, os conselhos propostos
pela lei que criou o FUNDEF (Lei 9.424/96), as fiscalizações dos Tri-
bunais de Contas dos respectivos Estados, demonstrativos de gastos
fiscalizados pelo Poder Legislativo, Censos Escolares, etc.
Na mesma direção, uma outra proposta sugere que os Tribunais
de Contas, as Procuradorias da União e dos Estados, os Conselhos de
Acompanhamento e Controle Social do FUNDEF, os sindicatos, as
organizações não-governamentais e a população em geral, sejam mo-
bilizados, de forma a fiscalizarem o cumprimento das propostas aqui
discutidas. Consideramos que a questão central dessa proposta não é
mobilizar todos esses órgãos e segmentos da sociedade civil, pois a
174 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

fiscalização sugerida já deve fazer parte das atribuições específicas


dos Tribunais de Contas, das Procuradorias da União e dos Estados e
dos Conselhos do FUNDEF4. Já os sindicatos, as organizações não-
governamentais e a população devem ser mobilizados para fiscaliza-
rem não só as questões referentes ao financiamento da educação, mas
também para participarem ativamente da elaboração e implantação
das políticas públicas educacionais. A mobilização e o fortalecimento
de todas essas instâncias sociais, com certeza, garantirá uma maior
transparência no uso dos recursos destinados a educação e também
uma melhor qualidade da educação pública brasileira.
A próxima proposta que analisaremos sobre a questão do Finan-
ciamento da Educação defende que os municípios tenham a Educação
Infantil como prioridade na aplicação dos 10% dos recursos vincula-
dos à manutenção e desenvolvimento do ensino não reservados para
o Ensino Fundamental, ou seja, os 10% que não foram destinados
ao FUNDEF. O problema dessa proposta é que, ao estabelecer que
os municípios devem aplicar prioritariamente na Educação Infantil
os 10% dos recursos vinculados à manutenção e desenvolvimento
do ensino não reservados para o Ensino Fundamental, os programas
de Educação de Jovens e Adultos (EJA), até então oferecidos pelos
municípios, foram – e continuam sendo –, os grandes prejudicados,
a ponto de, em muitos lugares, serem extintos (Cf. MONLEVADE;
FERREIRA, 1998). A implantação FUNDEB deve corrigir este pro-
blema, na medida em que os recursos desse novo fundo também serão
destinados a EJA.
Uma outra proposta segue na mesma direção da proposta
anterior, ao defender que os Estados apliquem, prioritariamente, os
mesmos 10% do FUNDEF não direcionados ao Ensino Fundamen-
tal, na manutenção e desenvolvimento do Ensino Médio. No nosso
entendimento, o problema é o mesmo, ou seja, ao estabelecer esta
prioridade, os programas de EJA, até então oferecidos pelos Estados,
foram os grandes prejudicados, sendo extintos em muitos lugares.
Assim como no caso anterior, a implantação do FUNDEB corrigirá o
problema, na medida em que os recursos desse novo fundo também

4 Apesar da atual substituição do FUNDEF pelo FUNDEB, consideramos que todo esse nosso raciocínio
permanece conceitualmente válido.
FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO | 175

serão destinados tanto ao Ensino Médio, quanto a Educação de Jovens


e Adultos (EJA).
Outra proposta que segue na mesma direção que as duas pro-
postas anteriores é a que propõe a utilização prioritária para a EJA
de 15% dos recursos destinados ao Ensino Fundamental cujas fontes
não integrem o FUNDEF: nos Municípios (IPTU, ISS , ITBI, cota do
ITR, do IRRF e do IOF-Ouro, parcela da dívida ativa tributária que
seja resultante de impostos), nos Estados e no Distrito Federal (IPVA,
ITCM, cota do IRRF e do IOF-Ouro, parcela da dívida ativa tributária
que seja resultante de impostos). Os impostos e transferências que
esta proposta relaciona, geram, proporcionalmente, recursos pouco
significativos, pois, por exemplo, dentro do próprio FUNDEF, 70%
dos seus recursos advêm do ICMS (Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços) (Cf. DAVIES, 1999). Dessa maneira, essa
proposta apenas ameniza o grande prejuízo que a EJA sofreu com a
implantação do FUNDEF, mas, de forma alguma, corrige a distorção
provocada pelo mesmo, a qual será corrigida com a implantação do
FUNDEB.
Ainda tratando da questão do financiamento da Educação de
Jovens e Adultos (EJA), outra proposta sugere a criação de um pro-
grama nacional de apoio financeiro e técnico-administrativo da União
para a oferta, preferencialmente, nos Municípios mais pobres, de EJA
para a população de 15 anos e mais, que não teve acesso ao Ensino
Fundamental. Como já afirmamos na discussão do capítulo sobre
EJA, durante o governo FHC foi criado o Programa Alfabetização
Solidária, porém esse programa não conseguiu reduzir significativa-
mente o número absoluto de analfabetos brasileiros. Já no governo
Lula foi criado o Programa Brasil Alfabetizado, com o objetivo de
alfabetizar 20 milhões de jovens e adultos até 2006, ou seja, erradicar
o analfabetismo no Brasil. Esse prazo expirou e ainda temos 11,6%
da população brasileira analfabeta5. Esses dados provam que essa
proposta não foi efetivada porque a EJA não se constituiu – e nem se
constitui – em prioridade para os últimos (e recentes) governos.
Uma outra proposta aborda a questão da autonomia financeira

5 Cf. www.ipea.gov.br , acesso em 25/09/2006.


176 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

das escolas públicas, ao defender que essa autonomia seja promovida


por meio do repasse direto de recursos financeiros para as próprias
escolas, baseado em critérios objetivos. No governo FHC, essa idéia
começou a ser posta em prática a partir do Programa Dinheiro Direto
na Escola, com recursos provenientes do Salário-Educação, ou seja,
essa proposta começou a se efetivar, porém, dada a sua natureza,
entendemos que trata-se de um objetivo a ser continuamente alcan-
çado, de forma que a autonomia financeira das escolas torne-se parte
constitutiva da nossa cultura educacional6.
Outra proposta trata da cooperação entre o MEC e outros
ministérios que possuem áreas de atuação comum com a educação.
Apesar da educação se constituir em uma responsabilidade do Esta-
do e da sociedade, tal responsabilidade não deve se restringir a um
único órgão (MEC), pois tal atitude confinaria a preocupação com
a educação a um “gueto” de um único segmento da administração
pública. Acreditamos que a responsabilidade pelo Financiamento da
Educação deve envolver todo o governo e deve permear todas as suas
ações. Evidentemente, o MEC, e as Secretarias Estaduais e Munici-
pais de Educação, devem ter papel central no que se refere à educação
escolar, articulando-se com outros ministérios e secretarias, de forma
a reunir esforços e competências, seja em termos de apoio técnico ou
de recursos financeiros, em áreas de atuação comum.
Explicitando a cooperação financeira entre o MEC e outros
ministérios que atuam em áreas comuns, uma outra proposta defende
que sejam assegurados recursos do Tesouro e da Assistência Social
para programas de renda mínima associados à educação; recursos da
Saúde e Assistência Social para a Educação Infantil; recursos desti-
nados à universalização das telecomunicações, à criação de condições
de acesso da escola, às redes de comunicação informática; recursos
do Ministério do Trabalho para a qualificação dos trabalhadores;
e recursos do Fundo Penitenciário (FUNPEN) para a educação de
presos e egressos. O que essa proposta advoga é que o MEC tenha
uma atuação conjunta com, por exemplo, o Ministério do Trabalho,

6 Segundo a pesquisa Perfil dos Municípios Brasileiros, apenas 9,9% dos administradores municipais lis-
taram a autonomia financeira das suas escolas como uma das 5 prioridades municipais na área da Educação
(Cf. www.ibge.gov.br , acesso em 28/10/2007).
FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO | 177

para a qualificação, formação e treinamento de trabalhadores, nos


quais devem ser aplicados, inclusive, recursos do Fundo de Amparo
ao Trabalhador (FAT). O mesmo raciocínio vale para outras áreas,
e outros ministérios, que podem atuar conjuntamente com o MEC,
no sentido de promover o aumento da oferta e do atendimento da
educação pública brasileira, bem como de sua qualidade.

Questões para Debate em Sala de Aula

a) Em termos de Financiamento da Educação, qual a sua opinião


sobre os limites, as vantagens e as desvantagens da municipalização
do ensino?

b) Analisando os últimos 10 anos, você considera que a educa-


ção em seu município melhorou, piorou, ou manteve o mesmo nível
de qualidade? Por quê?

c) Você saberia dizer qual o valor mínimo anual por aluno que
o seu município investe? Você considera esse valor alto, baixo ou
razoável? Por quê?

11.2. Sugestões de Leituras Complementares

DAVIES, N. O Fundef e o orçamento da educação: desvendando a


caixa preta. Campinas: Autores Associados, 1999 (Coleção Polêmicas
do nosso tempo, 64).

MELCHIOR, J. C. A. A política de vinculação de recursos públicos


e o financiamento da educação no Brasil. São Paulo: Feusp, 1981
(Estudos e Documentos, v. 17).

PERONI, V.; ADRIÃO, T. Público não-estatal: estratégias para o


setor educacional brasileiro. In: ADRIÃO, T.; PERONI, V. (Orgs.). O
público e o privado na educação: interfaces entre estado e sociedade.
São Paulo: Xamã, 2005, p. 137-153.
CAPÍTULO 12

GESTÃO DA EDUCAÇÃO

A questão da Gestão da Educação se constitui em uma das mais


importantes questões da atual política educacional brasileira, espe-
cialmente porque, caminha-se para o consenso de que quanto mais
participativa for a Gestão da Educação, e, especificamente, a gestão
da escola pública brasileira, melhor será a sua qualidade.
Em termos de Gestão da Educação, o inciso VI do Art. 206 da
Constituição determina que um dos princípios da educação brasileira
é a gestão democrática do ensino público. Segundo Theresa Adrião e
Rubens B. Camargo, a presença do princípio da gestão democrática
na Constituição de 1988, se constitui em um fato, até então, inédito,
conquistado após intensos embates políticos e ideológicos, travados
no transcorrer da elaboração da mesma. Esses autores entendem que
“é no âmbito da gestão escolar que o princípio da democratização do
ensino se consolida como prática concreta. Portanto, cabe entender
os limites e possibilidades da lei, menos como expressão de normas
jurídicas e genéricas e mais como instrumento indutor de modifica-
ções de práticas sociais concretas, neste caso, das práticas escolares.”
(ADRIÃO; CAMARGO, 2001, p. 78).
Abranches considera que a LDB “aponta, mas não sustenta,
o princípio da gestão democrática. Trata do tema isoladamente, em
poucos artigos, e de uma maneira muito vaga e ambígua. Foi neste
aspecto que a Lei mais perdeu, comparando-a ao projeto anterior
aprovado pela Câmara dos Deputados, onde se defendia uma intenção
explícita de avançar contra o centralismo e autoritarismo do siste-
ma educacional.” Assim, no discurso oficial (LDB), a “democracia
e a participação estão colocadas em um jogo ideológico, que tem
como função negar a diferença, ocultar questões políticas e oferecer
uma imagem ilusória da comunidade com referência no Estado.”
(ABRANCHES, 2003, p. 41).
Uma das bases estruturais de uma gestão escolar participati-
va, para muitos autores, é a construção coletiva do projeto político
180 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

pedagógico (PPP) da escola em contraponto aos projetos políticos


pedagógicos eminentemente formais e burocráticos. Para Freitas, os
projetos pedagógicos das escolas são peças fictícias
que pouco analisam os problemas concretos da escola
e os esforços feitos por esta para solucioná-los. Não há
uma problematização consistente, ao longo do tempo,
das questões que afetam a escola e o seu dia-a-dia. Não
há igualmente registro da produção dos esforços para
resolver problemas locais, suas lutas, sua história e
suas dificuldades e/ou vitórias. (FREITAS, 2005b, p.
924-925)

Ilma P. A. Veiga ressalta a diferença entre o “projeto político-


pedagógico inovador” e a “inovação emancipatória”. O primeiro
orienta-se pela “padronização, pela uniformidade e pelo controle
burocrático”, podendo ser de “cunho empírico-racional ou político-
administrativo”, ou seja, “um documento programático que reúne
as principais idéias, fundamentos, orientações curriculares e organi-
zacionais de uma instituição educativa ou de um curso.” Já a “ino-
vação emancipatória” é a “produção humana alicerçada no caráter
emancipador e argumentativo, [que] repensa a estrutura de poder, as
relações sociais e seus valores.” Assim, a construção de um projeto
político-pedagógico
sob a perspectiva da inovação emancipatória é um
processo de vivência à medida que todos os segmen-
tos que compõem a comunidade escolar e acadêmica
participam dela, tendo compromisso com seu acompa-
nhamento e, principalmente, nas escolhas das trilhas
que a instituição irá seguir. Dessa forma, caminhos e
descaminhos, acertos e erros não serão mais da respon-
sabilidade da direção ou da equipe coordenadora, mas
do todo que será responsável por recuperar o caráter
público, democrático e gratuito da educação estatal, no
sentido de atender os interesses da maioria da popula-
ção. (VEIGA, 2003, p. 271-279)

Por fim, ainda na questão do projeto político-pedagógico, De


GESTÃO DA EDUCAÇÃO | 181

Rossi considera – em parte no mesmo sentido exposto acima por Frei-


tas – que um projeto político pedagógico “emancipador (ou alternati-
vo) é uma via privilegiada de acesso à cultura da escola, seus modos
próprios de organização, transgressão e regulação da vida escolar,
suas regras implícitas e explícitas, rotinas de trabalho, hierarquias,
relações de afeto e de poder.” (DE ROSSI, 2005, p. 946, parênteses
no original). Assim, a
característica essencial diferenciadora do PPP [projeto
político-pedagógico] emancipador para o ensino públi-
co reside no fato de que o direito à educação pública
é essencial para a democracia. Quando em seu espaço
público a escola admite todos sem discriminações, lá
podemos nos encontrar para ensaiar formas de vida em
comum a partir da diversidade social, de valores e de
opiniões. (DE ROSSI, 2003, p. 334)

O que a LDB não trata, e que consideramos de fundamental


importância quando se fala em “gestão democrática do ensino públi-
co”, seja na Educação Básica ou Superior, é da questão das eleições
diretas para diretores de escola. Torna-se impossível acreditar na idéia
de “gestão democrática do ensino público” quando, por exemplo, o
cargo de diretor de escola é um “cargo de confiança” do Poder Execu-
tivo (governadores, prefeitos) e/ou do Poder Legislativo (deputados,
vereadores), como tem sido muito comum no Brasil. Segundo dados
do INEP, quase 60% dos diretores de escolas públicas no Brasil,
em 2004, foram escolhidos por indicação política nos Estados e/ou
municípios, por outro lado, o percentual de diretores eleitos foi de
aproximadamente 20% e de diretores concursados de pouco mais de
9%1. Paro salienta que não se deve reduzir democratização da escola
à instituição de eleições diretas para o cargo de diretor de escola (Cf.
PARO, 2001, p. 81).
É também difícil crer na possibilidade de “gestão democrática”,
mesmo que haja, como ocorre em alguns Estados e municípios, con-
curso público para diretor de escola (cargo previsto em alguns planos

1 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 19/09/2006.


182 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

de carreira do magistério), quando a indicação da escola que este ou


aquele diretor irá dirigir e/ou remanejamentos a qualquer tempo, são
feitos, na grande maioria dos casos, por critérios políticos, em geral
subjetivos e nem sempre justos. Nessa questão, entendemos que os
legisladores que aprovaram a atual LDB perderam uma oportunidade
histórica de avançar na democratização da escola pública, fazendo
com que, convenientemente ou não, a LDB se omitisse quanto à
escolha de dirigentes.
Com relação ao ensino ministrado pela iniciativa privada, em
termos de gestão, o mesmo deve, segundo o Art. 209 da Constituição,
cumprir as normas gerais da educação nacional, ser autorizado e se
submeter à avaliação da sua qualidade pelos órgãos competentes.
Diferentemente da iniciativa privada, Freitas considera que “para o
setor público, a qualidade não é optativa, é obrigatória. Neste sentido,
a interface inteligente e crítica com a comunidade local e com as
políticas públicas centrais é uma necessidade.” (FREITAS, 2005b,
p. 924).
Assim como nos dois capítulos anteriores, neste capítulo,
não dividimos nossa abordagem em diferentes temáticas (oferta e
atendimento; questões pedagógicas; formação de professores; etc.).
Optamos por realizar a análise de todas as propostas sobre Gestão da
Educação conjuntamente.

12.1. Propostas para a Gestão da Educação

A primeira proposta sobre a Gestão da Educação que iremos


analisar defende que seja aperfeiçoado o regime de colaboração entre
os sistemas de ensino com vistas a uma ação coordenada entre os entes
federativos (União, Estados e municípios), compartilhando responsa-
bilidades, a partir das funções constitucionais próprias e supletivas.
Essa proposta se constitui em mais uma proposta que deve ser perma-
nentemente buscada, porém, como uma responsabilidade inerente à
esfera federal (União), pois é essa esfera de governo que deve definir
os princípios e as diretrizes do aperfeiçoamento proposto.
Uma outra proposta retoma a questão dos Conselhos Municipais
de Educação, defendendo que seja estimulada a criação dos mesmos
GESTÃO DA EDUCAÇÃO | 183

e seja oferecido apoio técnico para os municípios que optarem por


constituir sistemas de ensino. A idéia central dessa proposta segue
na mesma direção da proposta anterior. Dessa maneira, nossa análise
torna-se semelhante, ou seja, para o pleno alcance dessa proposta, é
crucial a colaboração das esferas federal e estadual de governo, tanto
no estímulo à criação dos referidos conselhos, quanto no apoio técnico
e financeiro aos municípios que optarem por constituir seus próprios
sistemas de ensino. Mais que a criação desses conselhos, Reis, con-
sidera que os já existentes estão “em quase total distanciamento dos
Conselhos Estaduais naquilo que se refere ao trato das questões gerais
dos sistemas, fato que contribui para a particularização do local em
detrimento do global, instalando-se guetos de ações duplicadas ou de-
sarticuladas, com conseqüente atendimento deficitário à população.”
(REIS, 2004, p. 43).
Já uma outra proposta advoga que cada sistema de ensino
defina as suas normas de gestão democrática do ensino público.
Acreditamos que a intenção dessa proposta é a de que, no exercício
de sua autonomia, cada sistema de ensino implante uma gestão demo-
crática do ensino público, com a participação da comunidade. Essa
idéia pode começar a se tornar realidade por meio da implantação
dos Conselhos de Municipais de Educação, os quais devem reunir
pessoas com competência técnica e representatividade dos diversos
setores educacionais e da comunidade.
No nível das instituições escolares públicas, a gestão democrá-
tica pode se efetivar por meio da formação de conselhos escolares com
a participação de toda a comunidade educacional, podendo incluir
novas formas de escolha da direção escolar, que, por sua vez, deve
associar a garantia da competência ao compromisso com a proposta
pedagógica emanada desses conselhos escolares, bem como possuir
elevado grau de representatividade no contexto da comunidade em
que a escola está inserida. Não será a definição das normas de gestão
democrática do ensino público, ainda que tais normas prevejam a
participação da comunidade, que garantirá, por si só, a gestão de-
mocrática, mas sim os próprios processos de gestão democrática do
ensino público, com seus avanços e retrocessos.
Nessa questão, Paro considera que, como um exemplo de
participação da comunidade, a integração dos pais nos processos de
tomada de decisões da escola pode ser benéfico em dois sentidos:
184 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

como interlocutores importantes diante dos trabalhadores da escola,


especialmente os professores, e como cidadãos que reivindicam,
junto ao Estado, o direito à educação de qualidade (Cf. PARO, 2001,
p. 86). Abranches, por sua vez, considera que a participação deve ser
entendida “como um exercício democrático, por meio do qual apren-
demos a eleger o poder, fiscalizar, desburocratizar e dividir responsa-
bilidades”, sendo que “os vários canais dessa participação convergem
para elaborar condições favoráveis de surgimento dos cidadãos e suas
formas de organização.” (ABRANCHES, 2003, p. 9).
Já para Adrião e Camargo, os conselhos escolares devem ter
a democracia como princípio e como método. Como princípio, a
democracia articula-se ao princípio da igualdade “ao proporcionar, a
todos os integrantes do processo participativo, a condição de sujeitos
expressa no seu reconhecimento como interlocutor válido.” Já como
método, a democracia
deve garantir a cada um dos participantes igual poder
de intervenção e decisão, criando mecanismos que faci-
litem a consolidação de iguais possibilidades de opção
e ação diante dos processos decisórios. Nesses termos,
os conselhos de escola apresentam-se como espaços
públicos privilegiados, nos quais tensões e conflitos, ao
serem superados, desestabilizam práticas monolíticas
ou pretensamente ‘harmoniosas’ de gestão, ao mesmo
tempo que se configuram como espaços institucionais
de articulação de soluções locais para os problemas do
cotidiano escolar. (ADRIÃO; CAMARGO, 2001, p.
77, aspas no original).

Por outro lado, os “mecanismos de adoção e apadrinhamento de


escolas”, são para Gentili, uma das diversas formas de participação da
comunidade que se explicitaram no passado recente (especialmente
no governo FHC). Tais mecanismos “vão se consolidando como uma
das modalidades de privatização mais idiossincráticas da reforma
educacional implementada pelas administrações neoliberais.” (GEN-
TILI, 2002, p. 85).
Uma outra proposta é a de que os sistemas de ensino formulem
e implementem normas e diretrizes gerais desburocratizantes e flexí-
GESTÃO DA EDUCAÇÃO | 185

veis, que estimulem a iniciativa e a ação inovadora das instituições


escolares. Acreditamos que, mais que a pura e simples edição de me-
didas administrativas (normas e diretrizes gerais), que busquem tornar
a escola pública mais desburocratizada e flexível, a adoção de uma
efetiva gestão democrática do ensino público, com a participação da
comunidade, em todos os seus aspectos (pedagógico, administrativo e
financeiro), é o que possibilita, a ação inovadora das escolas.
Outra proposta é a de que seja desenvolvido um padrão de
gestão que tenha como elementos a destinação de recursos para as
atividades-fim, a descentralização, a autonomia da escola, a eqüidade,
o foco na aprendizagem dos alunos e a participação da comunidade.
As idéias postas nessa proposta devem se constituir em princípios do
que imaginamos ser uma gestão democrática da escola.
Outra proposta é a de que as escolas sejam apoiadas tecnica-
mente na elaboração e execução de sua proposta pedagógica. Essa
proposta já está integralmente efetivada pois, historicamente, e como
uma de suas funções primordiais, o MEC, bem como as Secretarias
Estaduais e Municipais de Educação, sempre apoiaram tecnicamente
as escolas na elaboração e execução de sua proposta pedagógica,
muitas vezes até, impondo os projetos políticos pedagógicos (PPPs).
Uma outra proposta retoma a questão da autonomia das escolas
na medida em que propõe que, em seus aspectos administrativo e
pedagógico, seja assegurada a autonomia das escolas, e seja ampliada
a autonomia financeira das mesmas, por meio do repasse direto de
recursos, destinados às pequenas despesas de manutenção e para o
integral cumprimento da proposta pedagógica da escola. Como já afir-
mamos, durante o governo FHC, o repasse de recursos diretamente às
escolas para pequenas despesas de manutenção e cumprimento de sua
proposta pedagógica passou a vigorar a partir do Programa Dinheiro
Direto na Escola. Esse procedimento aumenta significativamente
a autonomia administrativa e pedagógica das escolas por meio da
ampliação de sua autonomia financeira. A autonomia administrativa,
pedagógica e financeira das escolas, deve se tornar parte constitutiva
da nossa cultura educacional e escolar.
Sobre a questão da informatização como elemento essencial da
Gestão da Educação, existem três propostas oficiais que se comple-
mentam. A primeira é a que propõe, no curto prazo, informatizar, com
auxílio técnico e financeiro do MEC, todas as Secretarias Estaduais
186 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

de Educação, de forma a integrá-las em rede ao sistema nacional de


estatísticas educacionais. Essa proposta já foi efetivada na medida em
que, atualmente, todas as Secretarias Estaduais de Educação já estão
minimamente informatizadas e integradas ao sistema nacional de es-
tatísticas educacionais. A segunda propõe que sejam informatizadas,
também com auxílio técnico e financeiro do MEC e das respectivas
Secretarias Estaduais de Educação, todas as Secretarias Municipais de
Educação. Atualmente, mais da metade dos municípios com mais de
20.000 habitantes já está com suas respectivas Secretarias Municipais
de Educação, minimamente informatizadas.
A terceira e última proposta sobre informatização na Gestão
Escolar, é de informatizar, progressivamente e com auxílio técnico
e financeiro do MEC, a administração das escolas com mais de 100
alunos, conectando-as em rede com as Secretarias de Educação, de
tal forma que, em 10 anos, todas as escolas estejam no sistema. A
maioria das escolas públicas brasileiras possui mais de 100 alunos e
todos esses três processos de informatização encontram-se em anda-
mento2.
Passando a outro tema, mas ainda dentro das questões sobre
Gestão da Educação, uma outra proposta defende o estabelecimento,
em todos os Estados do Brasil, de programas de formação do pessoal
técnico das secretarias, com o objetivo de suprir, no curto prazo, as
necessidades dos setores de informação e estatísticas educacionais,
planejamento e avaliação. Tais programas também devem contar com
o auxílio técnico e financeiro do MEC. Essa proposta ainda não está
plenamente efetivada pois as necessidades de formação do pessoal
técnico das Secretarias Estaduais e Municipais de Educação, nas áreas
de informação e estatísticas educacionais, planejamento e avaliação
ainda são muito maiores do que o nível de qualificação existente,
principalmente nos Estados e municípios situados nas regiões menos
desenvolvidas, necessitando assim, de constantes e diferenciados pro-
gramas de formação do pessoal técnico. Segundo Shiroma, Moraes
e Evangelista, a preocupação com a profissionalização dos recursos
humanos que trabalham no MEC e nas secretarias de educação

2 Cf. www.inep.gov.br , acesso em 31/08/2006.


GESTÃO DA EDUCAÇÃO | 187

(estaduais e/ou municipais), explicitada por esta proposta, já estava


presente em documento de 1993, intitulado Projeto Principal de Edu-
cação para a América Latina e Caribe (PROMEDLAC V), resultante
da V Reunião do Comitê Regional Intergovernamental do Projeto
Principal de Educação para a América Latina e Caribe, reunião esta
realizada em Santiago (Chile) e também financiada pela UNESCO
(Cf. SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2000, p. 70-71).
Uma outra proposta é a de adoção de medidas administrativas
que assegurem a permanência dos técnicos formados e com bom
desempenho nos quadros das secretarias. O problema desta propos-
ta é que, basicamente, o que assegura a permanência dos técnicos
formados e com bom desempenho nos quadros das secretarias não
são exatamente medidas administrativas, mas sim salários dignos
e condições adequadas de trabalho como medidas constituintes de
uma política educacional pública, o que ainda não é uma realidade no
contexto educacional brasileiro.
Três outras propostas tratam da questão da formação dos dire-
tores de escolas, aspecto fundamental da questão maior da Gestão da
Educação. A primeira dessas propostas é a de estabelecer, em todos
os Estados e com a colaboração dos municípios e das universidades,
programas diversificados de formação continuada, com o objetivo de
melhorar o desempenho no exercício da função de diretor de escola.
Nos últimos anos, as parcerias entre Estados, municípios e univer-
sidades, para oferecimento de programas de formação continuada,
tiveram como alvo prioritário os professores. Alguns Estados já
oferecem programas dessa natureza para diretores de escolas, porém,
muitos outros ainda não dirigiram esforços para a consecução dessa
proposta.
A segunda proposta sobre formação de diretores, inserida na
questão da Gestão da Educação, é a de assegurar que, no curto prazo,
a maioria dos diretores de escolas públicas possuam formação espe-
cífica em nível superior e que, no final da década, todas as escolas
contem com diretores formados em nível superior, preferencialmente
com cursos de especialização. Sabemos que nos Estados mais desen-
volvidos, essa proporção já é uma realidade. O problema maior se
dá nos Estados e municípios menos desenvolvidos, principalmente
nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, tornando essa proposta
consideravelmente idealista, no contexto do atual cenário educacional
188 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

brasileiro.
A última das propostas sobre formação específica mínima de
diretores de escolas públicas, é a de que seja ampliada a oferta de
cursos de formação em administração escolar nas instituições públi-
cas de nível superior, de forma a permitir o cumprimento da proposta
anterior. Considerando que o número de cargos de diretor de escola
é significativamente pequeno, quando comparado com o número de
cargos de professores, a ampliação da oferta de cursos de formação
em administração escolar nas instituições públicas de nível superior
é limitada, principalmente em função do papel social que as institui-
ções públicas de ensino superior possuem no oferecimento dos cursos
de Pedagogia. Assim sendo, a ampliação proposta é possível de se
realizar, porém, dentro de certos limites que, talvez, não permitam às
instituições públicas de ensino superior darem conta de, isoladamente,
formarem todos os diretores de escolas públicas brasileiras, em nível
superior e/ou cursos de especialização.
Por último, neste capítulo sobre Gestão da Educação, duas ou-
tras propostas, que abordam a questão da avaliação, merecem nossa
análise. A primeira delas propõe que seja consolidado e aperfeiçoado
o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e o
censo escolar. Acreditamos que tanto o SAEB quanto os censos esco-
lares já estão consolidados, o que não significa que não necessitem de
aperfeiçoamentos constantes. Segundo Brzezinski, a política educa-
cional implementada no governo FHC, apesar do discurso oficial de
valorização do profissional docente, insistia, equivocadamente, em
“apontar o despreparo dos professores como a única causa do fraco
desempenho dos estudantes” nas avaliações do SAEB (BRZEZINSKI,
2000, p. 172).
A segunda proposta sobre avaliação é que seja estabelecido
nos Estados, no curto prazo e com a colaboração técnica e financeira
do MEC, um programa de avaliação de desempenho que atinja, pelo
menos, todas as escolas de mais de 50 alunos do Ensino Fundamental
e Médio. O SAEB já executa essa proposta, necessitando apenas
que seja aperfeiçoado. No caso do Ensino Médio, existe também o
ENEM, que possui, porém, a característica de não ser obrigatório,
mas que é admitido por muitas universidades como parte da avaliação
nos processos seletivos de ingresso no ensino superior.
GESTÃO DA EDUCAÇÃO | 189

Questões para Debate em Sala de Aula

a) Em termos de Gestão da Educação, quais os limites, as van-


tagens e as desvantagens da municipalização do ensino?

b) Na sua opinião, como e o que seria uma “gestão democrática


do ensino público”?

c) Pensando na Gestão da Educação, qual a importância e va-


lidade de se realizar exames nacionais de avaliação, do tipo SAEB e/
ou ENEM?

12.2. Sugestões de Leituras Complementares

LIMA, A. B. Conselhos Municipais na Educação: perspectivas de


democratização da política educacional municipal. Tese (doutorado)
- PUC - SP, São Paulo, 2001.

_____. (Org.). Estado, políticas educacionais e gestão compartilhada.


São Paulo: Xamã, 2004.

SCHEINVAR, E.; ALGEBAILE, E. (Orgs.). Conselhos participativos


e escola. Rio de Janeiro: DP & A, 2004, p. 61-69.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Devemos ter claro que, quando discutimos política educacional,


partimos de uma determinada concepção de educação e, principalmen-
te, de uma determinada concepção de sociedade. Conseqüentemente,
toda e qualquer política educacional que nos propomos discutir pos-
sui, implícita ou explicitamente, suas concepções sociais, políticas
e econômicas. Sendo assim, não há como negar que organização da
educação brasileira atual, especialmente explicitada por meio da atual
LDB e do PNE vigente, é resultante de uma determinada visão de
mundo, que podemos definir, com todas as letras, como neoliberal.
Quando analisamos a política educacional levada a cabo nos
oito anos do governo FHC, podemos afirmar que a mesma foi pautada
pelos princípios do neoliberalismo econômico, disseminado e divul-
gado especialmente pelo Banco Mundial. Nossa esperança era de que
o governo Lula trilhasse um caminho diferente. Porém, infelizmente,
não foi isso que ocorreu. Ao optar por manter as diretrizes macroeco-
nômicas vigentes durante o governo FHC, e, em alguns casos – como,
por exemplo, no estabelecimento do percentual de superávit primário
-, aprofundando-as, o governo Lula manteve-se dentro dos princípios
do neoliberalismo. Portanto, nestes termos, não podemos afirmar que
a política educacional adotada no governo Lula seja diametralmente
oposta à política educacional empreendida pelo governo FHC, e,
menos ainda que política educacional do governo Lula se configure
em uma espécie de contraponto à política educacional implantada no
governo FHC. Assim, a atual política educacional brasileira já perdu-
ra, com poucas modificações, mais de 13 anos.
Ainda que, no campo educacional, o governo Lula tenha toma-
do algumas medidas diferentes (outras nem tanto) do seu antecessor,
a análise dessas medidas não nos permite afirmar nem que a educação
seja uma das prioridades do governo Lula, nem que, em termos de
concepção de educação, tais medidas signifiquem o extremo oposto
às medidas tomadas durante o governo FHC. Para sustentar esta nossa
argumentação, analisemos alguns exemplos específicos.
Na questão do financiamento da educação, que consideramos
crucial, o governo Lula substituiu o FUNDEF pelo FUNDEB, como
192 | POLÍTICA EDUCACIONAL E ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

já discutimos em mais detalhes nesse nosso trabalho. Porém, se por


um lado, o novo FUNDEB atenderá um número maior de alunos, por
outro lado, o valor per capita será menor (em relação ao último valor
per capita do antigo FUNDEF). Não há dúvida de que, nessa ques-
tão, preferimos o FUNDEB, especialmente por inserir na educação
brasileira um montante de “dinheiro novo”, ou seja, dinheiro que não
era destinado anteriormente à educação, imensamente maior que o
FUNDEF (segundo estimativas iniciais, da ordem de R$ 4,5 bilhões
de reais “contra” apenas R$ 310 milhões do antigo FUNDEF), cuja
prioridade era mais redistribuir os recursos existentes do que com-
plementar com recursos novos para a educação, ainda que fossem
destinados somente para o Ensino Fundamental. Acontece que, num
país com os déficits educacionais do Brasil, ainda que o FUNDEB
proponha, em sua concepção geral, mais recursos para a Educação
Básica, e que tais recursos sejam significativos, ainda assim, tais
recursos são pequenos perto das necessidades educacionais do país.
Uma outra medida que também diz respeito ao financiamento
da educação, direcionada especificamente ao ensino superior foi o
estabelecimento do Pro-Uni, já discutido no capítulo 4. Ainda que
tenha sido divulgado como uma ação afirmativa, na medida em que,
em tese, estaria democratizando o acesso ao ensino superior, consi-
deramos que se trata, basicamente, de um programa de transferência
de recursos públicos para a iniciativa privada, no caso, as instituições
privadas de ensino superior, resultando, na prática, no oferecimento
de um ensino pobre (de qualidade) para o aluno economicamente po-
bre. Não há nada mais neoliberal do que transferir recursos públicos,
na forma de isenções fiscais e tributárias, para instituições privadas
de ensino superior, muitas das quais de qualidade duvidosa e outras
tantas sonegadoras contumazes de impostos e tributos.
Passando para a questão da avaliação, mas ainda mantendo-nos
no ensino superior, nós, que criticávamos tanto o antigo “Provão”,
especialmente por ter sido instituído por meio de instrumento legis-
lativo antidemocrático chamado Medida Provisória, nos deparamos,
logo no primeiro ano do governo Lula, com o ENADE, instituído
da mesma maneira. Ainda que a metodologia de avaliação do ensino
superior possa ter sido modificada no novo exame, o modus operandi
(o “monstrengo” legislativo denominado Medida Provisória) que per-
mitiu a sua viabilização foi o mesmo. Acreditamos que a opção por se
CONSIDERAÇÕES FINAIS | 193

manter, tanto modus operandi, quanto a valorização de uma avaliação


nacional do ensino superior brasileiro, deu-se muito menos por ques-
tões de caráter conceitual ou pedagógico e muito mais por questões
políticas, no sentido de se dar uma satisfação à opinião pública e, em
alguns momentos, à alguns dos chamados “formadores de opinião”
dos principais meios de comunicação de massa. Some-se a isso o fato
de todas as avaliações nacionais dos outros níveis de ensino, tão criti-
cadas no governo FHC por serem um dos instrumentos indicados pelo
Banco Mundial para a definição de prioridades na área da educação, a
partir de uma concepção neoliberal, terem se mantidas intocadas.
No caso da Educação de Jovens e Adultos (EJA) o mesmo
problema, de concepção teórica (e/ou pedagógica) se repete, ou
seja, o governo Lula propôs o mesmo modelo de alfabetização de
jovens e adultos que o governo FHC, mudando-se apenas o rótulo do
programa, de Alfabetização Solidária para Brasil Alfabetizado, como
pudemos constatar na discussão realizada no capítulo 5.
Já no caso da Educação Profissional, pudemos constatar que
houve uma “quase mudança”, ou seja, o Decreto 2.208/97, que
instituiu a separação obrigatória entre o Ensino Médio e o Ensino
Profissional (governo FHC), foi substituído pelo Decreto 5.154/04
(governo Lula), que propôs a reintegração facultativa entre o Ensino
Médio e o Ensino Profissional. Dizemos que foi uma “quase mudan-
ça” porque a expectativa de boa parte dos educadores que apoiaram o
candidato Lula, era de que, entendendo como extremamente maléfica
(em termos conceituais e pedagógicos) a separação obrigatória entre o
Ensino Médio e o Ensino Profissional promovida pela governo FHC,
o governo Lula optasse pela reintegração obrigatória desses níveis de
ensino. Porém, independentemente das disputas de poder no interior
do governo Lula, como alguns autores alegam, mais uma expectativa
foi frustrada.
Feitas estas constatações, que os exemplos apenas ilustram
e que menos distinguem e mais aproximam, em termos de política
educacional, o governo Lula do governo FHC, podemos afirmar que
pouco avançamos, em termos de desenvolvimento educacional, nas
duas últimas décadas, fazendo com que tenhamos que permanecer
por mais alguns anos como a “nação do futuro”, por que não prioriza
efetivamente a educação oferecida no presente à sua população.
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Número Especial, out. 2005b.
SOBRE O AUTOR

Carlos da Fonseca Brandão é Livre-docente em Estrutura e


Funcionamento do Ensino Fundamental e Médio no Departamento de
Educação da UNESP - Assis e professor do Programa de Pós-gradua-
ção em Educação da UNESP - Marília, onde ministra disciplina sobre
o pensamento e obra do sociólogo alemão Norbert Elias. Licenciado
em Educação Física e Técnico Desportivo pela UNESP – Rio Claro,
em 1987, tornou-se Mestre em História e Filosofia da Educação pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) em 1994 e
Doutor em Educação pela UNESP – Marília em 2000. Já publicou
os seguintes livros: Batendo bola, batendo cabeça: os problemas da
pesquisa em Educação Física no Brasil (1978-1993) (Humanidades,
1994), NORBERT ELIAS - Formação, educação e emoções no proces-
so de civilização (Vozes, 2003), LDB passo a passo: Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), comentada e inter-
pretada, artigo por artigo (Avercamp, 2003), Estrutura e Funciona-
mento do Ensino (Avercamp, 2004), As cotas na universidade pública
brasileira: será esse o caminho? (Autores Associados, 2005), PNE
passo a passo: Lei nº 10.172/2001 – Discussão dos Objetivos e Metas
do Plano Nacional de Educação (Avercamp, 2006) e Os processos de
civilização e o controle das emoções (Edusc, 2007).

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